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Raio-X da Raio-

infância e da infân
juventude juven
vulnerável do vulne
Brasil Brasi
Os desafios e os caminhos para aumentar
a proteção dessa parcela da sociedade
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Direitos Reservados:
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Visão Mundial Brasil


Rua do Fogo, 22 – 4º Andar
Santo Antônio | Recife/PE
CEP 50010-340
Tel.: (81) 3081-5600

Primeira edição: 2021

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Ficha Técnica
VISÃO MUNDIAL BRASIL
Thiago Crucciti - Diretor Nacional
Thiago Machado - Diretor de Operações
Andrea Freire - Gerente Sênior de Programas

COORDENAÇÃO DA PESQUISA
Cristiane dos Anjos – Assessoria de Desenho, Monitoramento e Avaliação
Márcia Maria Pinheiro Monte – Ponto Focal em Salvaguarda
Ruth Lima - Gerência de Programa

CONSULTORA NACIONAL
Lucileila de Sousa Cardoso Almeida
(Treinamento, Sistematização e Análise da Pesquisa)

PESQUISADORES LOCAIS
Lorrayne Rosado de França – RN
Mariana do Carmo Matias – CE
Mônica de Souza Melo – PE
Pâmela K. Zaparolli Barbosa – SP
Ronivon do Nascimento Amorim – AL
Silvia Carla Macedo Cardoso Furtado – AM
Tatiane dos Anjos – BA

DIAGRAMAÇÃO
Máquina do Bem
Marcelo Colares - Infográfico

REVISÃO
Renata Pessoa Vaz
Marcela Fernandes

AGRADECIMENTOS
A Visão Mundial agradece a todos os atores da Rede de Proteção e do Sistema de Garantia de
Direito que voluntariamente contribuíram para esta pesquisa em todos os estados onde ela
acorreu. As nossas crianças, adolescentes, mães, pais e lideranças comunitárias que partici-
param dos grupos focais enriquecendo o documento com suas reflexões. A nossas parcerias
locais, as quais sempre nos dão apoio na mobilização e colaboram para que tudo aconteça da
melhor forma possível.

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LISTA DE SIGLAS
ACNUR – Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados
ADAPT – Análise, Desenho e Planejamento
AL – Alagoas
AM – Amazonas
BA – Bahia
CE – Ceará
CEPAL – Comissão Econômica para América Latina
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CIESP – Centro Internacional de Estudo e Pesquisa sobre a Infância


CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas
DATASUS – Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde
EC – Emenda Constitucional
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
FBSP – Fórum Brasileiro de Segurança Pública
FGV – Fundação Getúlio Vargas
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FUST – Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações


FNPETI – Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação ao Trabalho Infantil
GF - Grupos Focais
IS – Insegurança Alimentar
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
ODS – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
OIT – Organização Internacional do Trabalho
OMS – Organização Mundial da Saúde
ONU – Organização das Nações Unidas
PE – Pernambuco
PIB – Produto Interno Bruto
PNADC - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua
PNAE – Programa Nacional de Alimentos Escolar
Rede PENSSAN – Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional
RJ – Rio de Janeiro
RN – Rio Grande do Norte
SP – São Paulo
SUAS – Sistema Único de Assistência Social
SUS – Sistema Único de Saúde
SINPDEC – Sistema Nacional da Proteção e Defesa Civil
UNESCO – Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura
UNICEF – Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para a Infância

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LISTA DE GRÁFICOS E TABELAS
Gráfico 1 – Número de Crianças e Adolescentes por Gênero no Brasil ..............................................

Gráfico 2 – Número de violações de Direitos contra Crianças e Adolescentes notificados no Brasil

Gráfico 3 – Comparativo do nº Geral de Notificações Violência Física x Abuso Sexual ..................

Gráfico 4 – Matrimônio Infantil no Brasil – 2019 ...............................................................................

Gráfico 5 - Adolescentes Grávidas no Brasil por Estado Civil ............................................................

Gráfico 6 – Comparativo de nº de Famílias Baixa Renda x Famílias abaixo da linha de Pobreza ..

Gráfico 7 – Crianças e Adolescentes em Processo de Adoção x Disponíveis para Adoção


x nº Geral de Institucionalizadas no Brasil ..................................................................................................
Gráfico 8 – Comparativo entre Homicídios Gerais x Letalidade Juvenil .............................................

Gráfico 9 – Distribuição de Adolescentes respondendo à Justiça no Brasil e por Estado


de atuação da Visão Mundial ..........................................................................................................................
Gráfico 10 – Distribuição de Famílias na Linha de Pobreza Brasil x Estados de Atuação
da Visão Mundial ................................................................................................................................................
Gráfico 11 - Distribuição de Famílias de Extrema Pobreza Brasil x Estados de Atuação
da Visão Mundial ................................................................................................................................................
Gráfico 12 – Comparativo de denúncias de Violações de Direitos Brasil e nos Estados de
atuação da Visão Mundial ................................................................................................................................
Gráfico 13 – Distribuição de crianças fora da escola do Brasil e nos Estados de atuação
da Visão Mundial ................................................................................................................................................
Gráfico 14 - Comparativo da Situação de Trabalho Infantil no Brasil ..................................................

Gráfico 15 - Homicídios Gerais x Letalidade Juvenil por Estado ...........................................................

Gráfico 16 - Nº de crianças pesquisadas por gênero (8-11 anos) ...........................................................

Gráfico 17 - Crianças participantes (8 a 11 anos) por Localidade ...........................................................

Gráfico 18 - Participação de Adolescentes por Gênero ...........................................................................

Gráfico 19 - Adolescentes (15 a 17 anos) por Localidade ..........................................................................

Gráfico 20 - Nº de Participantes Adultos por Gênero .............................................................................

Gráfico 21 - Adultos participantes por Localidade ...................................................................................

Gráfico 22 - Equipamentos Sociais para atendimento às violações de Direito às crianças


e adolescentes no Brasil – SUAS ....................................................................................................................
Gráfico 23 - Nº de OSC na área de Assistência Social no Brasil ............................................................

Tabela 1 - Categorias de Emergências no Brasil WVI...............................................................................

Tabela 2 - Situação de Desastres no Brasil – Nº de Famílias e Municípios por Estado de Referência

Tabela 3 – Tipologias de Desastres nos Estados de atuação da Visão Mundial Brasil .....................

Tabela 4 – Distribuição dos Registros de casos de Pessoas com Covid-19 confirmados


e Nº de óbitos nos Estados de atuação da Visão Mundial........................................................................
Tabela 5 – Número de Adolescentes em Semiliberdade e em Privação de Liberdade
nos Estados de Atuação da Visão Mundial...................................................................................................
Tabela 6 – Número de Solicitações de Refúgio no Brasil por sexo, segundo principais países
de nascimento (2011-2019) ...............................................................................................................................
Tabela 7 – Nº de Refugiados reconhecidos por sexo, segundo grupos de idade no Brasil (2019)

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PALAVRA DO DIRETOR
A Visão Mundial é uma organização que tem em sua essência a garantia da proteção de cri-
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anças e adolescentes. Esta pesquisa traduz-se em nossa contribuição para a reflexão sobre as
principais brechas na garantia da proteção da infância e adolescência no Brasil. Portanto, dis-
ponibilizar este documento para toda a sociedade, para nossos parceiros e para os setores do
governo brasileiro é bem mais que fundamentar programas e ações dentro das comunidades
mais vulneráveis, pois expressa todo o cuidado, respeito e gratidão que esta organização sente
pelas crianças e adolescentes e por quem as protege.

Na leitura da pesquisa percebem-se grandes desafios como violência sexual, violência letal,
fome e trabalho infantil, que afetam nossas crianças e adolescentes de diversas regiões. Por-
tanto, nos caminhos de mudanças, recomendamos que a proteção seja pensada a partir do
fortalecimento intersetorial, interinstitucional e de autoproteção da infância e adolescência,
além da integração dos diversos setores públicos e privados.

O envolvimento de todos, a valorização dos saberes técnicos, do campo e de ação são funda-
mentais para o enfrentamento de problemas graves, históricos e culturais. Precisamos mudar
nossa cultura adultocêntrica para uma pautada na proteção de crianças e adolescentes sujeitos
de direitos. Para tanto, precisamos primeiramente aprender a ouvir este público. Em seguida,
as leis precisam ser fortalecidas e implementadas. Importa compreender a realidade e promo-
ver a articulação pública (com seus três poderes) e privada (com sua função de monitoramento
e/ou investimento) na garantia de uma pais melhor para nossas crianças.

A Visão Mundial é uma organização humanitária cristã de desenvolvimento, advocacy e respos-


ta às emergências, dedicada ao trabalho com crianças, famílias e comunidades para superar a
pobreza e as injustiças. Inspirados pela sua fé e valores cristãos, se dedica a trabalhar com as
pessoas mais vulneráveis em todo o mundo. Serve e colabora com todas as pessoas, indepen-
dentemente de religião, raça, etnia ou gênero. Integra a parceria World Vision International,
que atua em quase 100 países e está no Brasil desde 1975, oferecendo benefícios diretos a mais
de 700 mil crianças, jovens e adultos. Esse trabalho se multiplica em benefícios indiretos para
mais de 2,8 milhões de brasileiros em vários estados.

Thiago Crucciti
Diretor Nacional

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Apresentação
Desde 2012 os países de atuação da World Vision na América Latina e Caribe pactuaram por
uma causa: “Meninos e meninas protegidos e promovendo uma sociedade mais justa e segu-
ra”. Para isso, tecnologias sociais e recursos foram desenvolvidos, dentre eles, o kit ferramentas
para Diagnóstico ADAPT, que possibilita para a partir da escuta e participação de crianças e
adolescentes, sociedade e informantes-chaves governamentais e da sociedade civil (formais e
informais) ter conhecimento da situação do país e das localidades de atuação da Visão Mundial a
respeito do Sistema de Proteção da Infância e Adolescência.

Para a Visão Mundial Brasil, o Sistema de Proteção da Infância e Adolescência precisa ser
analisado em sete elementos: leis e políticas, serviços e mecanismos de prestação de serviços
(obrigatórios) do governo, serviços e mecanismos de prestação de serviços (atitudes informais)
feitos pela sociedade, transparência e prestação de contas, cuidados fora de casa e, por fim,
resiliência e participação dos meninos e das meninas.

No Brasil, o diagnóstico participativo aconteceu entre os meses de abril e setembro de 2021, em oito
cidades/estados: Recife (PE), Fortaleza (CE), Governador Dix-Sept Rosado (RN), Inhapi (Alagoas),
Manaus (AM), Nova Iguaçu (RJ), Salvador (BA) e São Paulo (SP), com a participação de 729 pessoas.

O presente Diagnóstico tem a finalidade central de analisar o Sistema de Garantia de Direitos e


a Rede de Proteção da Infância e Adolescência no Brasil e se esses direitos têm sido respeitados,
a partir das vozes dos sujeitos que as vivenciam. E, especificamente, apontar comportamentos
dos principais marcadores de vulnerabilidades (violências física, sexuais e psicológicas, dentre
outros) à luz do desemprego de provedores, desgastes nas relações familiares, confinamento
de crianças e adultos em espaços pouco salubres e saudáveis, óbitos, incertezas quanto às
sequelas diante da pandemia da Covid-19; assim como apresentar a atuação das redes formal e
informal de proteção da infância e adolescência no Brasil, seus desafios e avanços.

Assim, a pesquisa O Sistema de Garantia de Direitos no Brasil: Raio-X da infância e da juventude


vulnerável do Brasil busca, a partir das vozes, participação e validação dos sujeitos envolvidos
em suas etapas, encontrar respostas e caminhos para mudanças, fazendo com que a sociedade
se importe, cuide e proteja suas crianças e seus adolescentes.

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SUMÁRIO
1. MAPEAMENTO E ANÁLISE DO CONTEXTO NACIONAL 10
1.1 A Metodologia ADAPT ............................................................................................................................................. 12
1.1.1 Níveis de Pesquisa ...................................................................................................................................................13
1.1.2 Instrumentos de Coleta de Dados Qualitativos ............................................................................................14
1.1.3 Universo da Pesquisa .............................................................................................................................................14
1.1.4 Grupos de Sujeitos e Participantes ...................................................................................................................15
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1.2 Contexto Nacional ......................................................................................................................................................17

2. SITUAÇÃO DOS MARCADORES DE VULNERABILIDADES NO BRASIL 22


2.1 Dimensão das Relações Abusivas ........................................................................................................................ 23
2.2 Dimensão da Privação Extrema ............................................................................................................................ 27
2.3 Dimensão das Vulnerabilidades a Impactos Negativos
Catastróficos ou Epidemia/Pandemia ....................................................................................................................... 30
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2.4 Dimensão da Discrinimação Grave ..................................................................................................................... 36

3. PRINCIPAIS BRECHAS NA PROTEÇÃO DA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA NO BRASIL 42


3.1 Enfrentamento à Insegurança Alimentar .......................................................................................................... 43
3.2 Prevenção e enfrentamento às violências ........................................................................................................ 46
3.3 Garantia ao acesso à Educação como Proteção.............................................................................................. 49
3.4 Erradicação do Trabalho Infantil ............................................................................................................................52
3.5 Enfrentamento à Letalidade Infantojuvenil ..................................................................................................... 55

4. A ESTRUTURA DO SISTEMA DE PROTEÇÃO À CRIANÇA NO PAÍS 57


3.1 Marco Legal .................................................................................................................................................................. 58
3.2 Sistema de Garantia de Direitos: Eixos e Atribuições .....................................................................................62
3.3 Rede de Proteção da Infância e Adolescência no Brasil.................................................................................63

5. DIAGNÓSTICO E ANÁLISE NO NÍVEL COMUNITÁRIO 65


5.1 O que as crianças e adolescentes percebem, sentem e vivem a respeito da proteção ..................... 72
5.2 Ouvindo as crianças .................................................................................................................................................. 73
5.3 Ouvindo adolescentes ............................................................................................................................................. 78
5.4 Ouvindo adultos ......................................................................................................................................................... 81

6. PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA PRÁTICA 85


6.1 Leis, Políticas e Regulamentos ............................................................................................................................... 86
6.2 Serviços e Mecanismos Governamentais de Proteção à Infância e Adolescência .............................. 88
6.3 Capacidades e Recursos .......................................................................................................................................... 92
6.4 Cooperação e Coordenação (intersetorial) do Sistema. ............................................................................... 94
6.5 Mecanismos de Responsabilização..................................................................................................................... 95

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6.6 Círculos de Cuidados de meninos e meninas (atitudes, valores, comportamentos
e práticas tradicionais) .....................................................................................................................................................96
6.7 Resistência e participação de meninos e meninas ......................................................................................98
6.8 Melhoria, Prevenção e Proteção contra a Violência, o Abuso e a Exploração ................................99

7. VALIDAÇÃO E CAMINHO PARA MUDANÇAS 101


7.1 Validação Comunitária ...........................................................................................................................................102
7.2 Caminho para mudanças ......................................................................................................................................102

8. LIÇÕES APRENDIDAS 104

9. CONSIDERAÇÕES E RECOMENDAÇÕES 106


9.1 Considerações Finais ...............................................................................................................................................107
9.2 Recomendações .......................................................................................................................................................109

10. REFERÊNCIAS 111

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Análise

Nacional
do Contexto
Mapeamento e
Proteção de Crianças e Adolescentes no Brasil

População
213 milhões
de habitantes

83,5% Área que residem 16,5%


Urbana Rural

População residente de crianças


e adolescentes (0 a 17 anos) é de
29,5% , totalizando 62,8 milhões .

50,9% 49,1%
Meninos Meninas

Etnia

49,8% 42,4% 6,9% 0,9%

Parda Branca Negra Amarela


Indígena

Brechas na Proteção Infantojuvenil no Brasil


Insegurança Alimentar Letalidade Infantojuvenil Matrimônio Infantil
46,7 milhões de famílias Mais de 30 mil crianças, adolescentes e jovens morrem 102.156 matrimônios
com privação extrema por homicídio a cada ano (Atlas da violência 2020) infantis em 2019

1,8 milhões milhões de crianças Gravidez na Adolescência


Educação Interrompida em situação de trabalho infantil 419.255 adolescentes grávidas por
1,09 milhões de crianças fora da escola ano (IBGE, 2019)
Violência Sexual
Mais de 17 mil casos notificados de
abusos sexuais por ano

Violações de direitos contra crianças e adolescentes crescem assustadoramente em tempo de pandemia


da COVID-19 no Brasil.
Apenas 10% dos casos de Abuso Sexual contra crianças e adolescentes são notificados
Matrimônios Infantis são naturalmente aceitos no Brasil.

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MAPEAMENTO E ANÁLISE DO SISTEMA
DE PROTEÇÃO À INFÂNCIA
Para uma análise do contexto e situação da infância e adolescência no Brasil, foram pesquisa-
das as realidades no âmbito nacional e local, com a finalidade de identificar dados estatísticos
e descritivos dos marcadores de vulnerabilidades sociais. A pesquisa apresenta a atuação das
redes formal e informal de proteção, destacando avanços e brechas desse Sistema de Proteção
da Infância e Adolescência na busca por uma análise crítica com base em evidências que apoi-
em os esforços de Advocacy da Visão Mundial neste país. Um ponto de destaque no documento
é a valorização das vozes do campo, tanto de crianças mais vulneráveis como dos operadores
de direito do Brasil.
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Por Sistema de Proteção da Infância e Adolescência no Brasil, há uma articulação definida em


lei entre o Sistema de Garantia de Direitos e a Rede de Proteção, com a compreensão de que o
Estado e seus órgãos têm a obrigatoriedade de assegurar a garantia e efetivação dos direitos de
crianças e adolescentes no país e que a Rede de Proteção (de caráter complementar) constituída
pelas organizações da sociedade civil organizada (formal) ou (informal) contribui para a pro-
moção de ações, mas também enquanto instituições participativas, representativas e como
mecanismos de controle social para que o Estado cumpra seu papel de cuidados com a infância
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e adolescência no Brasil.

Deste modo, a Visão Mundial considera o Sistema de Proteção dos meninos e meninas, cons-
tituído por essa relação entre órgãos estatais e sociedade civil, uma ação e atuação conjunta,
coordenada entre diversos segmentos e instituições, e decorrentes de uma obrigação legal.
Observando, portanto, leis, regulamentos, políticas, mandatos, processos e serviços prestados
pelo governo; bem como crenças, atitudes e vínculos comuns com mecanismos tradicionais e
não formais de proteção à criança (Visão Mundial, 2020).

A Visão Mundial Brasil percebe a importância desse Diagnóstico sobre a realidade brasileira,
uma vez que aponta os desafios e oportunidades tanto para a infância e adolescência quanto
para os(as) trabalhadores(as) que advogam por esses direitos.

1.1 A Metodologia ADAPT


Com o intuito de dar aos participantes os meios de responderem com mais eficiência aos proble-
mas da situação em que vivem, esta intervenção foi estruturada como uma pesquisa-ação, sendo
utilizado o Kit de Ferramentas de Análise, Desenho e Planejamento (ADAPT), desenvolvida pela
World Vision International que avalia o Sistema de Proteção da Infância no mundo.

O Kit de ferramentas ADAPT tem o objetivo de abordar de forma holística, prevenindo e for-
talecendo os papéis e ativos críticos dos principais atores responsáveis pela proteção da cri-
ança. Estes recursos servem socialmente para ajudar a priorizar e analisar as causas raiz das
questões de proteção infantil, neste caso, de abuso infantil, negligência, exploração, violência
e trabalho infantil, bem como identificar e mapear sistemas formais e não formais que existem
para proteger as crianças.

O Diagnóstico para a Visão Mundial serve como processo estratégico de intervenções rele-
vantes baseado no conhecimento da realidade brasileira e na validação social, para então in-
tencionalmente incidir sobre as políticas públicas, advogando em prol da superação das causas
básicas identificadas, e lacunas sistêmicas para fortalecer a proteção de meninas e meninos
contra as violências.

O diagnóstico é constituído, segundo ADAPT, em duas partes: I – Análise de Contexto e II –


Estratégias para Ação. Na primeira parte, além da pesquisa documental, os próprios sujeitos
(crianças, adolescentes, famílias e atores sociais) foram escutados, identificaram e priorizaram
situações e problemas que os afetam, bem como contribuíram com respostas para as soluções.

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Para o registro dos dados quantitativos, realizamos uma Análise de Contexto Nacional e Local,
e para a coleta de dados locais, utilizamos uma abordagem qualitativa (vozes) cuja as técnicas
foram: oficinas para meninos e meninas (cumprindo as devidas medidas sanitária nesse perío-
do de Pandemia), grupos focais para adultos, entrevistas com informantes-chaves (formais e
informais do Sistema) e seminário virtual envolvendo todos os participantes e sociedade civil
para validação dos dados e brienfings em prol do caminho para mudanças.

Essas vozes foram coletadas aplicando algumas técnicas: entrevistas, Grupos Focais vir-
tuais com adultos e oficinas socioeducativas presenciais para crianças e adolescentes,
cumprindo as medidas de proteção e segurança sanitária necessárias de distanciamen-
tos e de higienização, conforme decretos estatais estabelecidos em período de pandemia.

As entrevistas, grupos focais e oficinas também foram usadas para mapear os mecanismos de
denúncia e resposta que existem nas comunidades como fonte para referência e reporte de
casos de violação de direitos.

Um Seminário Nacional virtual (Debriefing Comunitário) de reflexão e visão geral sobre os da-
dos foi implementado. Isto garantiu que as opiniões daqueles que participaram do diagnóstico
fossem registradas corretamente e que as análises refletissem as situações reais do contexto.
Espera-se que os dados levantados em respostas sobre caminhos de mudanças gerem possíveis
modelos e metodologias que possam ser utilizadas, viabilizando a segunda parte (Estratégia
para Ação) desse processo de Análise, Desenho e Planejamento com a participação popular.

1.1.1 Níveis de Pesquisa


Pesquisa Nacional Quantitativa

Para compreensão do contexto nacional, foram realizados um levantamento e a análise de dados se-
cundários a respeito dos marcadores de vulnerabilidades que afetam a infância e adolescência no Bra-
sil. Os marcos legais, regulamentos e protocolos nacionais, bem como os mecanismos, serviços soci-
ais e políticas públicas disponíveis para os meninos e meninas foram pesquisados para compreensão
das atuais brechas e avanços do Sistema de Proteção da Infância e Adolescência no Brasil, e se as leis
brasileiras estão ratificadas segundo as convenções e declarações acordadas internacionalmente.

Como fonte de pesquisa, contou-se com os dados quantitativos das plataformas e relatórios
oficiais de órgãos públicos e institutos governamentais de pesquisas como: IBGE, PnadC, INEP,
Cadastro Único, Censo SUAS, Cadastro Nacional da Justiça, Fórum Brasileiro de Segurança
Pública, DATASUS, dentre outros; agências internacionais (UNICEF, UNESCO, PLAN, ACNUR),
Observatórios da Infância e Adolescência, inclusive os de universidades públicas, dentre ou-
tros que demonstram credibilidade em pesquisas sobre a temática em questão. As legisla-
ções nacionais e convenções internacionais foram consultadas em sites do Diário Oficial da
União (DOU), Portal do Cidadão, sites de agências internacionais como: UNICEF, ONU, ACNUR.

Nesta etapa, os conteúdos foram levantados, organizados, estudados e analisados de forma mi-
nuciosa. Todos os achados foram descritos e interpretados buscando evidenciar narrativas ex-
plicativas dos problemas investigados e produção de conteúdo relevante (TRIVIÑOS, 1987, p.160).

Pesquisa Local Qualitativa

Nesta etapa, foi aplicada uma pesquisa de campo para levantamento de dados primários
amostrais, com critérios de inclusão e exclusão predefinidos para cada público da pesquisa:
crianças (8 a 11 anos) e adolescentes (15 a 17 anos), adultos e atores sociais.

Foram utilizados instrumentos e técnicas do Kit de Ferramentas ADAPT, testados e aplicados


em mais de 40 países. No caso do Brasil, mantivemos as perguntas originais nas entrevistas
com os atores sociais (informantes-chaves) as quais foram aplicadas de forma presencial e,

13
em alguns casos, de forma virtual (remota). No que tange aos Grupo Focais (GF) com adultos,
as orientações técnicas foram mantidas conforme ferramentas ADAPT, apenas adaptando-as
às formas de aplicação virtual através das metodologias ativas Jamboard e Mentimenter. A
maioria dos municípios aplicou os Grupos Focais de adultos de forma virtual, exceto Salvador
(BA) e Inhapi (AL), por questões referentes às condições de acesso à internet das famílias e o
município ser em zona rural, respectivamente. Com as crianças e adolescentes, a aplicação da
coleta de dados foi a partir de oficinas socioeducativas e presenciais.

1.1.2 Instrumentos de Coleta de Dados Qualitativos


Entrevistas
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As entrevistas foram aplicadas com atores sociais que estão engajados no Sistema e Rede de
Proteção de Crianças e Adolescentes nos oito estados de atuação direta na Visão Mundial e
parceiros, igualmente, de forma criteriosa e justa.

As perguntas foram predefinidas por uma comissão de especialistas que utilizam a ADAPT como
ferramenta, primando pela objetividade, coleta de informações mais relevantes, diminuição de
vieses, pensando num processo que garantisse a aplicabilidade, para pessoas executarem a
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entrevista em qualquer local do mundo, mantendo uma padronização.

Grupos Focais Virtuais

Os Grupos Focais virtuais foram desenvolvidos com pessoas adultas, definidas por gênero
(masculino e feminino) e representatividade geográfica com critérios de inclusão – mulheres
e homens que estão nos territórios de vulnerabilidades com atuação da Visão Mundial. Os(as)
pesquisadores(as) tiveram em mãos um roteiro de perguntas abertas e uma proposta de seções
que envolvia: acolhimento com explicação dos objetivos da Pesquisa; coleta de questões priori-
tárias de Proteção da Infância; causas, com a aplicação da Árvore de Problemas e Análise Causal
utilizando-se da tecnologia digital Jamboard; entrevista emparelhada com as demais seções
que buscava o entendimento dos adultos sobre a atuação da Rede, leis e mecanismos de Pro-
teção da Infância, bem como das crenças, valores e formas de proteção de meninos e meninas
feitas na comunidade. Ao final do Grupo Focal, os participantes avaliaram o momento com sua
expressão de sentimentos através da ferramenta Mentimenter.

Oficinas Socioeducativas
As Oficinas Socioeducativas foram feitas presencialmente com as crianças e adolescentes, res-
peitando as medidas de proteção sanitária orientadas pelos Decretos de cada Estado.

A aplicação dessas oficinas seguiu um roteiro predefinido, que coletou as vozes dos meninos e
meninas a partir de dinâmicas de grupos e jogos educativos, que intencionaram o conhecimen-
to das crianças e de suas realidades com a dinâmica “Te conhecer”, descoberta das questões
prioritárias da Proteção da Infância e as causas dos problemas com a construção da Árvore de
Problemas e Análise Causal. Também foi utilizada a ferramenta Rede de Apoio, para entender
se, a quem e como as crianças recorrem em casos de necessidade de proteção. A Dinâmica da
Canção “Peixe Vivo” gerou respostas para evidenciar a sua participação e busca comunitária
para proteção em Rede.

1.1.3 Universo da Pesquisa


A Pesquisa foi aplicada de forma qualitativa nas oito cidades – um município em cada estado de
atuação da Visão Mundial e parceiros, a saber: Recife (PE), Fortaleza (CE), Governador Dix-Sept
Rosado (RN), Inhapi (Alagoas), Manaus (AM), Nova Iguaçu (RJ), Salvador (BA) e São Paulo (SP). A
escolha desses municípios de atuação da Visão Mundial facilitou a sensibilização e mobilização de
atores sociais, meninos e meninas, bem como adultos nesses territórios em situação de vulnera-
bilidade.

14
25 estados
e Distrito
Federal

1.1.4 Grupos de Sujeitos Participantes


A escolha dos sujeitos participantes da pesquisa baseou-se em um conjunto de critérios de ele-
gibilidade (Quadro 1) para meninos e meninas, bem como os adultos em torno de faixa etárias,
situações socioeconômicas e territoriais específicas incluindo riscos às dimensões de vulnera-
bilidades foco da atuação da Visão Mundial:

I. Relações Abusivas (trabalho infantil, abuso sexual, abuso físico, matrimônio infantil e gravi-
dez precoce)

II. Privação Extrema (crianças desnutridas, crianças fora da escola, crianças abaixo da linha de
pobreza, crianças órfãs, abandonadas e descuidadas)

III. Vulnerabilidades a Impacto Negativo de Catástrofes ou Epidemias /Pandemia (crianças que


vivem em área de conflitos, as que vivem propensas a sérios danos e crianças afetadas pela
Pandemia)

IV. Discriminação Grave (crianças com deficiência, as que pertencem a grupos marginalizados,
crianças refugiadas, adolescentes em sistema de justiça juvenil e as crianças sem Registro de
Nascimento).

Quanto aos atores sociais (representantes do governo e da sociedade civil), os critérios foram
definidos e baseados na idade mínima (18 anos) e da representatividade nas funções e papéis
exercidos na proteção da criança e do adolescente, buscando a equidade de gênero, na medida
do possível. Conforme vemos os critérios de inclusão da Pesquisa no Quadro 1 que segue.

15
Quadro 1 - Critérios de Inclusão na Pesquisa por Estado

Meninos e meninas Adultos Atores-Chaves


(Oficinas) (Grupos focais) (Entrevistas)

- 2 grupos na faixa etária de 8 a 11 - 2 grupos de mulheres - Idade: acima de 18 anos


anos (1 de meninas e 1 de meninos) e 2 grupos de homens
- Representantes do Sistema e da
- 2 grupos na faixa etária de 15 - Idade acima de 21 anos Rede de Proteção da Infância e
anos a 17 anos (1 de meninas e 1 de Adolescência
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meninos) - Pais e mães de crianças


adolescentes - Membro do Fórum DCA: 1
- As crianças e adolescentes
prioritariamente devem estar - Moradores das áreas de - Conselheiro(a) Tutelar da área de
em situação de 3 ou 4 fatores de intervenção da VM e/ou pesquisa. atuação do PA ou projeto: 1
violações de direitos, segundo
Dimensões VM - Assegurar a representatividade - Advogado/ ou Defensor(a) e/ou
de todas as áreas a serem Promotor Público e/ Juiz da Vara
- Deve ser assegurado a pesquisadas da Infância e Juventude: 1
representatividade de todas as
áreas geográficas de atuação da - Assegurar representatividade - Policial por Estado: 1
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VM geracional
- Repres. de Forúns/Redes locais:
- Recorte de Gênero: desejável - Quantidade por grupo: 01
50% meninos e 50% meninas
Mín: 10
- Líder de associação: 2
Máx: 15
- Quantidade por grupo:
- Líder religioso (confissões de fé
Mín: 10
diferentes): 3
Máx: 15
- Diretor de escola: 1

- Agente de saúde: 1

- Assistente social de CREAS ou


CRAS: 1

- Vereador e/ou prefeito, ou


secretário de Direitos Humanos: 11

- Atenção equilíbrio de gênero

No que tange aos critérios de exclusão de participação na Pesquisa, são todas as pessoas
que não atenderam aos critérios pré-definidos descritos no Quadro 1. Ressaltamos que
tivemos sete grupos de participantes nesta pesquisa diagnóstica. Vejamos o Quadro de
sujeitos participantes:

Quadro 2 – Grupo de Participantes

16
Importa ressaltar que cada um dos oito estados envolvidos na pesquisa abordou uma média de
14 meninos e 14 meninas de 8 a 11 anos; cerca de 10 adolescentes masculinos e 11 adolescentes
femininos da faixa etária de 15 a 17 anos; aproximadamente 20 mulheres e 11 homens das comu-
nidades vulneráveis, e 11 atores-chaves.

Sobre Pesquisadores, Treinamento,


Pré-Teste e Aspectos Éticos
Para a escolha dos(as) pesquisadores(as) foi realizada uma seleção em cada estado, buscando
pessoas que, além da experiência em pesquisa, ser da área de ciências humanas e sociais, tives-
sem o conhecimento da Rede e do Sistema de Proteção da infância e adolescência em seu esta-
do para facilitar a articulação e contato com os públicos estabelecidos nas etapas da pesquisa.

Vale ressaltar que a Visão Mundial capacitou os(as) oito pesquisadores(as) a respeito do di-
agnóstico ADAPT e de alguns aspectos, tais como: sua função, aspectos éticos, instrumentos,
técnicas e processo de análise. O treinamento teve a carga horária de 20 horas/aula. Esses
profissionais foram acompanhados por uma consultora nacional e assessorados por equipe
multidisciplinar de técnicos(as) especialistas da Visão Mundial, por meio de reuniões virtu-
ais e redes sociais, garantindo apoio e suporte em materiais e instruções full-time que foram
necessários para a pesquisa.

Os(as) pesquisadores(as) tiveram a oportunidade de aplicar um pré-teste de grupo focal virtual,


em virtude da pandemia da Covid-19, bem como para os ajustes necessários à pesquisa no pro-
cesso das seções, uso de metodologias ativas adequadas, entendimento das perguntas pelos(as)
participantes.

Ressaltamos que todos os participantes envolvidos (meninos e meninas, adultos e atores so-
ciais) foram consultados no interesse de participação voluntária, informados quanto à sua de-
sistência a qualquer momento, riscos e benefícios da pesquisa, e assinaram o Termo de Con-
sentimento Livre e Esclarecido. Os Termos de Autorização dos Pais foram coletados quando
os participantes tinham abaixo de 18 anos de idade, garantindo o sigilo dos nomes, a confi-
dencialidade das informações para uso exclusivo da pesquisa, e todas as medidas de proteção
necessárias apresentadas nos Decretos Estaduais e normas sanitárias, quando a pesquisa foi
realizada de forma presencial.

Lembramos que os pesquisadores tiveram educadores sociais como assistentes que, nos casos
específicos de violência sexual, trabalho infantil, dentre outros casos evidenciados durante a
aplicação da pesquisa, apoiaram, encaminhando os meninos e meninas para a Rede e Sistema
de Proteção da Infância e Adolescência do Território.

1.2. Contexto Nacional


O Brasil está situado na América do Sul, sendo o maior país dessa região continental. Sua área
tem uma extensão territorial de 8.516.000 km². À leste, o país é banhado em uma vasta extensão
pelo Oceano Atlântico, com um litoral que percorre um total de 7.367km², que o coloca como
16º no ranking mundial de maiores áreas litorâneas. Uma das marcas naturais do Brasil é a sua
biodiversidade em termos de fauna e flora, suas belas praias, bacias hidrográficas e variadas
florestas, vegetações Amazônica, Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga, Araucárias e Pampa.

Não apenas nos termos naturais, mas na sua cultura, na sociedade brasileira, há diversidade em
costumes, tradições, folclore, comidas típicas e religiões. Há também uma miscigenação étni-
ca. A população formou-se pela interação entre os povos europeu, africano e nativos indígenas.
Mais tarde, depois da libertação dos escravos negros, o país recebeu vários fluxos migratórios
(alemães, italianos, espanhóis, japoneses e sírio-libaneses) que contribuíram também para a
formação étnica atual da população.

17
No que tange à religião, a predominante no Brasil é a Católica. Entretanto, a maior parte das
crenças seguidas pelos brasileiros é cristã (católica, pentecostais, episcopais, metodistas, lute-
ranas, batistas). Há também grande presença de kardecistas – seguidores da doutrina espírita
– além de judeus, muçulmanos e budistas. As religiões de matriz africana, como a umbanda e o
candomblé, também têm grande número de adeptos em todo o território nacional (Ministério
do Turismo, 2021).

Territorialmente, o Brasil é organizado em 26 estados e o Distrito Federal, ao todo são 27 uni-


dades federativas. Destes estados, a Visão Mundial Brasil atua diretamente em nove, os quais
são: Amazonas, Roraima, Alagoas, Bahia, Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Rio de Ja-
neiro e São Paulo e, através de parcerias, em todo território nacional.
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Nos aspectos econômicos, o Brasil é o 12º país de maior economia do mundo, sendo medido
pelo valor do Produto Interno Bruto – PIB, ou seja, a soma de todos os bens e serviços finais
produzidos por um país, estado ou cidade, geralmente em um ano. Segundo o IBGE (2021), o
PIB do Brasil em 2020, por exemplo, foi de R$ 7,4 trilhões. No último trimestre divulgado (1º
trimestre de 2021), o valor foi de R$ 2,048 bilhões.

Apesar do PIB em alta, isso não quer dizer que no Brasil tudo vai bem. Há uma série de fatores,
dentre eles poder de consumo; impasse orçamentário; o baixo esforço do Poder Executivo em
encaminhar reformas que ajudem a controlar os gastos obrigatórios; um ambiente político
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

muito conturbado, e o efeito prejudicial da pandemia da Covid-19 sobre os fundamentos fiscais.


Há o risco de haver mais gastos acima do teto, que tem sido um pilar da sustentabilidade das
contas públicas brasileiras e que são pontos de preocupação relatados por estudiosos como
Pinheiro e Matos no Boletim Macro de Abril do ano corrente (FGV IBRE, 2021).

Vale ressaltar que a economia brasileira ainda é firmada em boa parte em produtos primários
(agronegócios), que têm um baixo valor agregado. O Brasil é ainda carente na indústria pesada
e tímido nas tecnologias, o que gera uma balança comercial desfavorável.

O cenário político brasileiro não vai bem. A pandemia esteve fora de controle no país. O espe-
cialista Amorim Neto, professor da Fundação Getúlio Vargas EBAPE, afirma no Boletim Macro
(FGV IBRE, 2021) “que a economia está anêmica e a inflação cresce, gerando insegurança, an-
gústia e pessimismo com relação ao país”. Diversos setores sentiram os impactos econômicos
da pandemia devido à necessidade de adoção de medidas de isolamento social para diminuir o
ritmo de contágio da Covid-19.

No que tange aos aspectos sociodemográficos do Brasil, há pouco mais de 213 milhões de
habitantes (Estimativa IBGE/2021). Destes, a população residente de crianças e adolescentes
(0 a 17 anos) é de 29,5%, totalizando 62,8 milhões. Esses meninos e meninas estão vivendo, em
sua maioria, na área urbana (83,5%) e apenas 16,5% se encontram na zona rural brasileira.

Gráfico 1 – Número de Crianças e Adolescentes por Gênero no Brasil

Gênero masculino

Gênero feminino

26,060,8 25,139,2
Fonte: Dados coletados do Educa IBGE (2018)

PINHEIRO, A.C. e MATOS, S. Piora da Pandemia e os seus impactos na economia. in: Boletim MACRO. Março 2021 , n. 117. FGV IBRE.
Disponível em: FGV.br/ibre/blog-da-conjuntura-economica

18
Dados do Educa IBGE (2018) apresentam um cenário de 50,9% de meninos e 49,1% de meni-
nas, com um recorte étnico de 49,8% de crianças pardas, 42,4% brancas, as declara-
das negras com 6,9% e as demais, apenas 0,9%, sendo amarelas ou indígenas1.

A respeito da população indígena no Brasil, segundo dados do último Censo IBGE (2010), há
cerca de 1 milhão de habitantes. Esses grupos estão espalhados em todas as regiões brasileiras
e possuem uma enorme diversidade étnica e linguística. Em 2010, foram recenseados 305 dis-
tintos povos indígenas, falantes de 274 línguas diferentes. As crianças e adolescentes indígenas
são maioria nas comunidades. O percentual em relação ao total é de 45%, chegando a ser de
55% entre aqueles que residem nas terras indígenas.

Vale ressaltar que especialistas como Márcia Acioli (2012), antropóloga, avalia que o Sistema
de Garantia de Direitos no Brasil ainda não está maduro o suficiente a ponto de ter políticas
sociais e públicas específicas pensando nas necessidades e processos educativos e culturais
dos povos indígenas. O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – Conanda
regulou em Resolução de número 91, de 23 de junho de 2003, que o ECA fosse aplicado com
respeito às peculiaridades socioculturais dos povos indígenas.

Atualmente, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos se projeta para aper-
feiçoamento de diretrizes, parâmetros e fluxos de atendimento relacionados às crianças e ado-
lescentes indígenas em situação de vulnerabilidade2. As ações de prevenção contra a violência,
o cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) nessas comunidades indígenas,
bem como a atuação da rede de proteção no caso de afastamento da criança de sua família são
os principais desafios a serem repensados.

Uma investigação sobre as questões étnicas brasileiras no que tange às crianças e adolescentes
deste país constata uma história marcada por muitos anos de escravidão e morte para os ne-
gros e genocídio para indígenas. Os apontamentos do Anuário 2020 do Fórum Brasileiro de
Segurança Pública revelam a repercussão da exclusão e da discriminação histórica contra os
negros, evidenciadas nos números de vítimas por homicídios dolosos, perfazendo 75,7% dos
casos registrados no DATASUS no ano de 2018 (FBSP, 2020).

Outro dado que nos chama a atenção no que tange à relação étnica, etária e territorial no Bra-
sil diz respeito ao envolvimento de adolescentes nos conflitos com a lei, sendo eles, em sua
maioria, pobres, pardos/negros e da periferia urbana, se encontrando nas estatísticas dos con-
siderados “matáveis”, como afirma os pesquisadores Mota Brasil, Freitas e Almeida (2002). Os
dados mencionados nos levam a perceber que a exclusão social no Brasil tem cor, idade, classe
e área demarcada, evidenciando fragilidades e desafios no processo de Proteção das Crianças
e Adolescentes.

Outro dado que merece destaque no Brasil refere-se ao crescimento da extrema pobreza nos
últimos anos. Segundo o Panorama Social da América Latina, publicado em 2020 pela Comissão
Econômica para a América Latina e Caribe - CEPAL, o Brasil foi um dos países dessa região que
cresceu em 0,1% de 2018 para 2019. Ao considerar os anos de 2014 a 2019, a mesma pesquisa
informa o crescimento médio anual de 0,5%, por ano.

No período de pandemia, esses dados intensificaram-se, mesmo com os auxílios emergenciais


financiados pelo Estado. Até junho de 2021, apenas 14,7 milhões de famílias estão sendo atendi-
das pelos benefícios das 29.592.000 famílias brasileiras em situação de pobreza e 17,14 milhões
de famílias em extrema pobreza pelo Cadastro Único do Sistema Único de Assistência Social
- SUAS (IBGE, 2021).

Importante ressaltar que, de 14,7 milhões de famílias beneficiárias, 9,6 milhões recebem/re-
ceberam o Auxílio Emergencial 2021 via público Bolsa Família, 395 mil recebem/receberam o
1 -desigualdades-sociais-por-cor-ou-raca-no-brasil Dados encontrados no site: https://educa.ibge.gov.br/criancas/
brasil/2697-ie-ibge-educa/jovens/materias-especiais/21039.html , consultado em: 13. Maio de 2021.
1 -desigualdades-sociais-por-cor-ou-raca-no-brasil Dados encontrados no site: https://educa.ibge.gov.br/cri-
ancas/brasil/2697-ie-ibge-educa/jovens/materias-especiais/21039.html , consultado em: 13. Maio de 2021.
2 Texto retirado do Site: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2021/julho/sistema-de-garan-
tia-de-direitos-na-protecao-de-criancas-indigenas-sera-aperfeicoado , consultado em: 23/07/2021.
2 Texto retirado do Site: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2021/julho/sistema-de-ga-
ratia-de-direitos-na-protecao-de-criancas-indigenas-sera-aperfeicoado , consultado em: 23/07/2021.

3 Consulta no dia 23 de julho de 2021, no site: https://www.gov.br/cidadania/pt-br/acoes-e-programas/bolsa-fmil-


ia/informe-gestores/informe-gestores/pagamentos-de-junho-do-beneficio-do-bolsa-familia-e-do-auxilio-emer-
gencial-2021-aos-trabalhadores-de-familias-beneficiarias 19
Auxílio Emergencial 2021 via público Cadastro Único ou Público Geral, e 4,7 milhões recebem/
receberam benefícios do PBF. Em razão do recebimento do Auxílio Emergencial 2021, 9,9 mil-
hões de famílias estão com os benefícios do PBF suspensos3. O auxílio emergencial é uma ne-
cessidade para as famílias e, consequentemente, as crianças e adolescentes que estão sofrendo
com os multivariados efeitos da Covid-19 no Brasil.

A Pesquisa Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população bra-
sileira (2018), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) fez a medição
de restrições críticas para as condições de vida de famílias sem acesso às dimensões: educação,
proteção social, moradia adequada, serviços de saneamento básico e comunicação. Uma medi-
ção multidimensional que diz respeito a alguns dos direitos previstos na Constituição Federal
do Brasil e também alinhadas à meta 1.2 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável: “até
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2030, reduzir pelo menos à metade a proporção de homens, mulheres e crianças de todas as
idades, que vivem na pobreza, em todas as suas dimensões, de acordo com as definições nacio-
nais” (Nações Unidas, 2016).

Esta pesquisa de Síntese de Indicadores Sociais (IBGE, 2018) apresentou que 14,8% das cri-
anças de 0 a 14 anos, que estão na condição de pobreza, têm pelo menos três restrições das
dimensões apresentadas. Desses meninos e meninas, 21,2% vivem em moradias inadequadas;
quase a metade das crianças brasileiras com privações (42,8%) não possui acesso a serviços de
saneamento básico; 25,7% têm acesso restrito à proteção social e 24,7% ao acesso à comuni-
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

cação (internet).

Analisando as tendências reveladas na Pesquisa Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das
condições de vida da população brasileira (2020), percebemos que, no período de dois anos,
houve uma melhoria de acesso a saneamento básico apenas 2% da população de baixa renda,
perfazendo o percentual de 44,8% de moradias com esgotamento por rede coletora ou pluvial.
A pesquisa aponta que as situações de precariedade e vulnerabilidade nas condições de mora-
dia afetam em maior proporção a população em situação de pobreza monetária, uma vez que
os problemas não estão focados apenas das estruturas da casa ou no adensamento domiciliar
excessivo, mas na pouca condição do pagamento do aluguel e na informalidade da posse do
imóvel.

A pesquisa também apontou que em 71,9% dos domicílios em situação de pobreza monetária,
pelo menos um morador tem acesso à internet. No ano de 2018, 24,7% dos domicílios nessa
mesma condição socioeconômica não tinham acesso à internet.

Em 2020, houve um aumento de 3,4 pontos percentuais de domicílios sem qualquer acesso
à internet. Em um momento de pandemia, em que os trabalhos migraram para os domicílios
(home office), atendimentos públicos e até os estudos (educação) tornaram-se on-line (e/ou
remoto) 28,1% são um alto índice de exclusão digital.

Aqui se apresenta um paradoxo que merece reflexão. Muitos estados adotaram a medida de
distribuição e gerenciamento de chips de celulares com acesso à internet para estudantes de
ensino médio e superior dentro dos critérios de baixa renda, docentes e profissionais da edu-
cação nesse período de pandemia. E por que a situação agravou? Pensamos que o desemprego,
e, portanto, todas as implicações decorrentes da ausência de renda, afetaram diretamente a
condição de acesso à internet, uma vez que o celular é declarado na pesquisa como o principal
instrumento de acesso à internet, mas a falta de condições monetárias impediu a contribuição
para o acesso.

Os achados restritivos acima mencionados apontam para outros efeitos que, a partir des-
sas condições objetivas e determinantes sócio estruturais, podem afetar os desenvolvimen-
tos físico, cognitivo, social, econômico, educacional, político e cultural de nossas crianças e
adolescentes.

Nesse sentido, a condição de pobreza alinhada à exclusão tem, em muitos casos, potencializado
3 Consulta no dia 23 de julho de 2021, no site: https://www.gov.br/cidadania/pt-br/acoes-e-programas/bolsa-fa-
milia/informe-gestores/informe-gestores/pagamentos-de-junho-do-beneficio-do-bolsa-familia-e-do-auxil-
io-emergencial-2021-aos-trabalhadores-de-familias-beneficiarias
3 Consulta no dia 23 de julho de 2021, no site: https://www.gov.br/cidadania/pt-br/acoes-e-programas/bolsa-fa-
milia/informe-gestores/informe-gestores/pagamentos-de-junho-do-beneficio-do-bolsa-familia-e-do-auxil-
io-emergencial-2021-aos-trabalhadores-de-familias-beneficiarias

20
o envolvimento de crianças e adolescentes às vulnerabilidades sociais, dentre elas à exploração
no trabalho infantil, exploração sexual, envolvimento com os delitos e o tráfico de drogas e,
muitas vezes, sendo vítimas ou algozes da letalidade infanto-juvenil. É notório que na realidade
brasileira quem mais sofre são os meninos e meninas, pois em momentos de crise, desemprego
em massa, e, portanto, fome e pobreza, essa população, pela sua especial condição de desen-
volvimento e necessidade de proteção se torna mais propensa às vulnerabilidades.

Desse modo, a Visão Mundial percebe a necessidade de conhecer a realidade para sua inter-
venção social em quatro dimensões prioritárias: 1) Relações Abusivas; 2) Privação Extrema; 3)
Vulnerabilidades a Impacto Negativo de Catástrofes ou Epidemias/Pandemia e 4) Discriminação
Grave.

21
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L | VISÃO MUNDIAL BRASIL

22
no Brasil
Situação dos
Marcadores de
Vulnerabilidades
2.1 Dimensão das Relações Abusivas
As relações humanas são dinâmicas e interacionais e, por isso, instáveis devido sua com-
plexidade, que envolve conhecimento, ações, experiências de vida e contexto, sentimentos e
emoções, que podem estabelecer relações de poder. Segundo Foucault (1995) o poder existe
em todas as relações sociais e pode ter a violência como agregado. Esse poder tem uso físico
ou simbólico, ou seja, se entre duas ou mais pessoas houver, por um lado, alguém forçando a
submissão, e da outra parte, submissão e passividade do(a) abusado(a), utilizando sentimento
de posse, excesso de poder e de controle, podemos considerar que ali há uma relação abusiva
(Barreto, 2018).

Neste sentido, a Visão Mundial percebe que o trabalho infantil, o abuso sexual e o físico, o
matrimônio infantil e a gravidez precoce estão situados nas Relações Abusivas e, por isso, é
uma questão social emergente que precisa ser efetivamente enfrentada e erradicada para que
crianças e adolescentes sejam e sintam-se protegidos.

No Brasil, as relações abusivas estão bem elevadas. Em estudos realizados a partir do Relató-
rio do Disque Direitos Humanos (Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos,
2019), identificamos que, das notificações registradas de violações de direitos entre os diversos
segmentos sociais (idosos, mulheres, pessoas com deficiência, dentre outros), as crianças e
adolescentes foram as mais afetadas, representando 55% do total de denúncias. Ou seja, foram
86.837 novos casos de violação de direitos da infância e adolescência no Brasil só em 2019, sem
considerar os anos anteriores ou os que não foram ainda registrados. Vejamos o Gráfico 2 que
segue.

Gráfico 2 – Número de Violações de Direitos


contra Crianças e Adolescentes no Brasil -2019

Discriminiação 620
5,1
V. Institucional
34
Abuso Sexual 17,029
Violência Física 33,374
Violência Psicológica 36,304
Negligência 62,019
Denúncia de Violação de Direitos - 2019 86,837
0

80 00
30 0
40 0
50 00

10 00
20 00

60 00
70 0

90 00

0
0
0

00
,0
,0
,0
,0

,0
,0

,0
,0

,0

0,
10

Fonte: Dados coletados do Relatório DDH (2019)

No que tange às violações de direitos contra crianças e adolescentes no Brasil, o Relatório DDH
2019, conforme Gráfico 2, apresenta uma maior incidência de negligência, com 62 mil casos
registrados, seguida de violência psicológica (36.304), a física, com 33.374 casos notificados,
sendo estes violados principalmente pelos próprios familiares e/ou responsáveis da criança.

Os estudos do Disque Direitos Humanos (2019) apontam que, em 82% dos casos de negligência
denunciados, os suspeitos são as mães. Essa violação de direitos acontece principalmente com
crianças de 0 a 11 anos de idade em 70% dos casos notificados.

Quanto à Violência Institucional e a Discriminação, são violações que consideramos ocor-


rentes, principalmente no âmbito externo ao domicílio. O que nos chama a atenção é por
serem cometidas por pessoas que são remuneradas (ligadas a uma instituição) e/ou servindo
ao interesse público e, certamente, reproduzindo uma cultura adultocêntrica e abusiva na
sociedade.

A Visão Mundial tem desempenhado uma atenção especial à violência sexual e ao abuso físico,

23
inclusive construindo diálogos com Secretarias Estaduais e/ou Municipais de Educação para
seu enfrentamento a partir do ambiente escolar. Neste sentido, destacamos para a análise, os
casos de abuso sexual e abuso físico, foco prioritário da Visão Mundial no Gráfico 3 que segue.

Gráfico 3: Comparativo de Nº de Geral de


Notificações x Violência Física x Abuso Sexual

Nº Abuso Sexual 17.029


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Nº Violência Física 33.374

86.837
Nº Geral de Notificações
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

Fonte: Dados coletados do Relatório DDH (2019)

O abuso sexual é o quarto maior número de notificações registrada no país, sendo esse um
dado preocupante, pois, além de agredir fisicamente a criança, deixa marcas e sequelas psi-
cológicas e relacionais. Segundo o Relatório do DDH de 2019, esse tipo de agressão acontece
principalmente dentro dos domicílios das crianças (73%), um espaço que deveria ser de pro-
teção. Outro dado relevante é que, geralmente, o agressor (suspeito) é o pai ou padrasto em
40% dos casos, sendo o perfil dos(as) abusados (as), meninas de 12 a 17 anos em 46% dos casos
registrados no Brasil.

O abuso físico ocupou o terceiro registro mais alto de denúncias no Disque 100, em 2019, para
os casos de violação de direitos da infância e adolescência no Brasil. Intervir preventivamente
a respeito desse dado é um desafio no trabalho com famílias. Métodos e tecnologias sociais
são necessárias para que se desenvolva, junto às famílias, o entendimento de alguns conceitos,
como: a diferença entre autoridade dos pais e autoritarismo e/ou práticas abusivas, bem como
trabalhar o resgate de valores éticos e aspectos socioemocionais que promovam a resiliên-
cia, autoconhecimento, afeto, domínio próprio, participação, solidariedade, respeito ao outro,
compromisso social, dentre outros.

O Matrimônio Infantil é um dos marcadores de vulnerabilidades sociais que a Visão Mundial


busca compreender para uma intervenção social. A ONU considera o matrimônio infantil, ou
seja, o casamento antes de 18 anos como prematuro e forçado, uma vez que prejudica no seu
direito à educação por estar na fase final de sua infância e relacionado às desigualdades estru-
turais que podem colocá-los numa condição de controle e violência de gênero (PLAN, 2018). No
Brasil, como forma de proteger as crianças, no ano de 2019, foi instituída a Lei nº 13.811, que
proíbe o casamento antes dos 16 anos de idade.

Vale ressaltar que estudos do IBGE (2019) apresentam 1.015.620 de casos/registros novos casa-
mentos no Brasil. Destes, 102.156 matrimônios registrados em cartório civil foram de adoles-
centes e jovens de 15 a 19 anos. Conforme vemos no Gráfico 4 que segue.

24
Gráfico 4: Matrimônio Infantil no Brasil (2019)

80,660
15 a 19 anos
21,496

12,167
17 anos
1,352

8,631
16 anos
351

226
15 anos
31

169
Menos de 15 anos
7
0

80 00
30 0
40 0
50 00

10 00
20 0

60 00
70 0

90 00

0
0
0
0

00
,0
,0
,0
,0

,0
,0

,0
,0

,0

0,
10

Homem Mulher

Fonte: Dados coletados do IBGE/Registro Civil (2019)

O número de matrimônios infantis registrados no Brasil passa pela lógica heteronormativa, ou


seja, a união estável e legalizada entre homens e mulheres nos cartórios de registro civis. No
que tange aos índices, os casamentos infantis são mais recorrentes para o gênero feminino.

Nos registros de 2019, das 102.156 pessoas de 15 a 19 anos que se casaram, 80.660 eram meni-
nas e 21.496 meninos. Esses dados apontam sérias preocupações que podem ser reflexo de
uma concepção tradicional de casamento no Brasil como “uma representação social de união,
segurança e ritualidade”, mas também de uma problemática cultural que subjuga as meninas
a uma condição financeira favorecida por um adulto e submetidas a violências de gênero,
privando-as de seu desenvolvimento natural, liberdades e descobertas, tornando-se uma
concepção paradoxal. Vale ressaltar que as uniões homoafetivas e as uniões informais (que
são muitas no Brasil) não estão nesses números apresentados (PLAN, 2018).

Muitas adolescentes (meninas) casam-se por se encontrarem grávidas, por uma questão que
é reproduzida social e culturalmente e, na maioria dos casos, impostas pelos pais. Entretanto,
muitas delas ainda não estão preparadas para a rotina de cuidados que os múltiplos papéis fe-
mininos impostos socialmente requer.

No que tange à Gravidez da Adolescência, o Gráfico 5 revela algumas situações que possibili-
tam reflexões.

25
Gráfico 5: Adolescentes Grávidas no Brasil por Estado Civil

450,000
400,000 419,255
350,000
300,000
250,000 289,928
200,000
150,000
100,000 27,362
50,000 96,782
0
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

Nº Total (até 19 anos)


Solteiras
União Consentida
Casado

Fonte: Dados coletados do IBGE/Nascidos Vivos/ SISVAN (2019)


R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

O Gráfico 5 apresenta um comparativo entre o número total de meninas grávidas na faixa


etária de 15 a 19 anos com seu estado civil, revelando que, do total de 419.255 meninas grávidas
que passaram pelo Sistema Único de Saúde e registraram seus filhos vivos em 2019, 289.928
crianças não tiveram a paternidade reconhecida, ou seja, são 69% das meninas que tiveram
uma gravidez precoce que criarão seus filhos sem a presença do pai biológico. Do total, 27.262
(6%) adolescentes casadas e 96.782 (23%) informaram que estão numa união consentida.

Outro marcador que evidencia relações abusivas de intensa expressão no Brasil é o Trabalho
Infantil. Em 2019, o IBGE registrou 1,8 milhão de crianças com até 14 anos nessa situação. O
ano de 2021 é comemorado pela Organização das Nações Unidas como o ano da erradicação,
porém, o Brasil colocou sua meta de erradicação para 2025.

Apesar do compromisso na agenda internacional, o Brasil ainda apresenta um alto número de


crianças que trabalham e sustentam suas famílias. O Cadastro Único, como meio que identifica
as famílias de baixa renda no Brasil, registrou em 2019 o número de 34.200 crianças em situ-
ação de Trabalho Infantil. Essas crianças são as que foram alcançadas pelo programa governa-
mental e recebem auxílio de transferência de renda para que suas famílias acompanhem seu
retorno para a escola e sua continuidade nos estudos. Ressaltamos que 938 crianças e adoles-
centes foram resgatados de Trabalho Escravo apontados pelo IBGE de 2003 a 2018.

26
Outro dado relevante encontrado no Observatório de Prevenção e Erradicação do Trabalho
Infantil é o de crianças e adolescentes que estão estudando nas escolas públicas e que fizeram
a Prova Brasil em 2017. A Prova Brasil é um exame de qualidade de ensino do Governo Federal
para alunos que estão apenas no 5º e no 9º ano e estudam nas escolas públicas brasileiras,
aplicada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP
no Censo Escolar. No resultado desse Censo foram detectadas 479.900 crianças e adolescentes
que declararam na Prova Brasil que trabalham fora de casa.

Essas informações potencializam a emergência de uma ação voltada para a erradicação do


trabalho infantil, uma vez que apenas dois grupos (5º e 9º ano) do Ensino Fundamental apre-
sentaram dados relevantes para uma intervenção, sendo ainda baixa a contribuição gover-
namental para a erradicação dessa problemática em questão. Além disso, destacamos que o
Censo 2017 Agropecuário, Florestal e Agrícola, realizado pelo IBGE, apontou 587.800 crianças
e adolescentes menores de 14 anos ocupados em estabelecimentos agropecuários em situação
de trabalho infantil. Ou seja, uma boa parte das crianças está no campo (zona rural) e con-
tribuindo com a renda de seus domicílios.

Ainda na perspectiva do trabalho infantil como relação abusiva, temos o risco de tráfico de
crianças e adolescentes para os tipos de exploração sexual comercial como um desafio no país.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) considera a Exploração Sexual para fins comer-
ciais como um trabalho ilícito e degradante, de acordo com o art.3º, alínea “b” da Convenção
182, da OIT.

A exploração sexual comercial de crianças e adolescentes é uma situação difícil e complexa no


Brasil, por vários motivos, como a ausência de dados estatísticos confiáveis e fidedignos quanto
aos casos, apuração penal, inexistência e/ou ineficácia de fluxos de atendimento dos casos nos
municípios/território recorrentes, periculosidade durante investigação, dentre outros (Child-
hood, 2020).

Entretanto, encontramos no Relatório Mapear, desenvolvido pela Polícia Rodoviária Federal


em parceria com a Childhood, 3.651 pontos vulneráveis à exploração sexual de crianças e
adolescentes nas rodovias federais por todo o Brasil, relativos ao biênio 2019/2020. Esse
dado nos alerta para uma atuação preventiva e de enfrentamento a essa questão, uma vez que
o território pode ser percebido como um espaço de controle e investimento na produção e re-
produção cultural de um determinado fenômeno com a necessidade de incidência política para
sua erradicação (Childhood, 2020).

2.2. Dimensão da Privação Extrema


A pobreza tem várias linhas teóricas de análise. A mais recorrente a analisa de forma mone-
tária. Entretanto, quando tratamos de crianças e adolescentes, além da percepção monetária,
precisamos compreender que, atrelados ao desenvolvimento e necessidades infanto-juvenis,
há um olhar sobre a pobreza que enfatiza as privações múltiplas.

Neste sentido, as privações múltiplas “são o resultado da inter-relação entre privações, exclu-
sões e as diferentes vulnerabilidades a que meninas e meninos estão expostos e que impactam
seu bem-estar” (UNICEF, 2018).

No que tange à intensidade das privações múltiplas, há a intermediária e a extrema. A privação


intermediária diz respeito ao acesso ao direito de maneira limitada ou com má qualidade. Já a
extrema é aquela sem nenhum acesso ao direito (UNICEF, 2018).

A Visão Mundial adota como uma de suas dimensões de estudo e atuação no Brasil a Privação
Extrema, com foco nas crianças que estão fora da escola, crianças desnutridas, que sobrevivem
abaixo da linha de pobreza, aquelas que são órfãs, abandonadas e descuidadas. Na realidade
brasileira há aproximadamente 47 milhões de famílias em situação de pobreza, e vale ressaltar
que cerca de 17,1 milhões estão em privação extrema, conforme retrata o Gráfico a seguir.

27
Gráfico 6 - Comparativo Nº de Famílias
Baixa Renda x Famílias Abaixo da Linha de Pobreza - Brasil

Nº Famílias abaixo da linha da


17,140,000
pobreza - Março/2021

Nº Famílias Baixa Renda


29,592,000
- Março/2021
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

0 20,000,000 40,000,000

Fonte: Dados Coletados do Estimativa IBGE (2021)

Neste cenário, cerca de 6,3 milhões de crianças com até cinco anos sofrem sem acesso a ali-
mentos suficientes e de qualidade, por viverem em lares que apontam grau de insegurança
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

alimentar severa (IBGE, 2018).

Segundo a Pesquisa Impactos Primários e Secundários da Pandemia em Crianças e Adolescentes


no Brasil (UNICEF, 2020), desde o início dessa crise sanitária provocada pelo coronavírus, 13%
dos brasileiros deixaram de comer porque não havia dinheiro para comprar comida, o que tota-
liza 20,7 milhões de pessoas. Também encontramos nos relatórios de acesso público do Sistema
de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN (2020) um Brasil que ainda apresenta 485.423
crianças desnutridas. A fome ainda é um desafio para essa nação!

Essa complexa multidimensionalidade da pobreza no Brasil é fruto de um sistema estrutural


ocasionado pelas desigualdades sociais e concentração de renda nas mãos de poucas pes-
soas. A crise sanitária e financeira – agravada pela pandemia – no quarto trimestre de 2020
ainda intensificou mais essa problemática no Brasil, atingindo 14 milhões de desempregados
(IBGE,2021).

Outro agravante fator que dimensiona a privação extrema é o fator de crianças fora da escola.
No Brasil, mais de 1 milhão (precisamente 1.096.468) de crianças e adolescentes na idade esco-
lar de 4 a 17 anos tiveram seu direito à educação negado em 2019.

Na Pesquisa Enfrentamento da Cultura do Fracasso Escolar (UNICEF Brasil, Instituto Claro e


Cenpec, 2021) a pandemia agravou ainda mais a situação dos meninos e meninas no país, com
um alto índice de reprovação (2.115.872) e 620 mil em abandono escolar.

Relativo à temática do abandono de crianças e a orfandade, no Brasil há 38.624 meninos e me-


ninas institucionalizados, ou seja, em casas de acolhida, porque perderam a família por mor-
te, foram abandonados, ou tiveram algum direito gravemente violado pela própria família. No
Brasil, por lei, esses meninos e meninas não podem ficar mais de dois anos institucionalizados.
Essa condição tenciona as organizações (casas de acolhida) a restabelecer um elo com demais
membros da família natural, extensa, substituta ou em último caso para processo de adoção.

O Gráfico 7 retrata sobre as crianças e adolescentes institucionalizadas e as que estão dis-


poníveis para adoção, bem como os meninos e meninas que já estão em processo de adoção,
relativo aos dados de 2021 que foram coletados no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento
do Brasil – SNA.

28
Gráfico 7 - Crianças e Adolescentes em Processo de Adoção x Disponíveis para Adoção e
Nº Geral de Institucionalizados

Em processo de Adoção 4,249


Disponível par adoção 4,971
C & A Institucionalizados 38,624

0 20,000 40,000

Fonte: Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (2021)

Conforme visualizamos no Gráfico 7, destas 38.624 crianças e adolescentes institucionaliza-


dos, 4.971 estão legalmente prontas para receber uma família a partir da adoção e 4.249 já se
encontram em processo de adoção. O que podemos refletir sobre os dados acima expostos é
que os meninos e meninas órfãos, abandonados e descuidados estão privados do direito de
habitar em família. Além disso, pensamos que para essas crianças institucionalizadas, além de
sofrerem pela rejeição/abandono/violação familiar e as expectativas para terem uma família,
os costumes e rituais coletivos vivenciados numa instituição podem gerar alguns efeitos e con-
sequências emocionais e relacionais no futuro.

Por outro lado, o processo de adoção deve ser cuidadoso. A insuficiência de profissionais que
fazem a intermediação dos processos também é um outro desafio que tem gerado. Uma vez
que o cadastro de pessoas que desejam adotar no Brasil é cerca de seis vezes maior do que as
crianças disponíveis para adoção.

29
2.3 Dimensão das Vulnerabilidades a Impactos Nega-
tivos Catastróficos ou Epidemia/Pandemia
As vulnerabilidades de crianças e adolescentes às situações de calamidade pública e emergência
se constituem num tema muito relevante no Brasil dado à ocorrência simultânea de emergên-
cias Humanitárias Prolongadas (PHE), eventos de categoria de magnitude I [1] que afetam os
meios de vida das populações, especialmente as mais vulneráveis. Tais eventos tanto geram
perdas materiais e econômicas e causam riscos à saúde da população, quanto na capacidade
dessas comunidades de prover recursos para recuperação diante das situações de vulnerabili-
dades provocadas por esses desastres (Organização Pan-Americana da Saúde, 2014).
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

Tabela 1 -Categorias de Emergências no Brasil WVI

Categoria de Eventos no Modelo de


Localização
Magnitude Brasil Resposta

Emergência Humanitária
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

Prolongada (PHE) Pandemia COVID-19 Global Todo o país

Emergência Humanitária Migração Venezuelana Regional Amazonas, e São Paulo


Prolongada (PHE)

Categoria I Cheias / enchentes Nacional Acre e Amazonas

No Brasil de dimensões continentais, os eventos são diversos e os impactos negativos gerados


são recorrentes e tornam-se mais severos em decorrência das mudanças climáticas, assim
como pela intervenção humana, deixando municípios inteiros arrasados pelo excesso de chu-
vas, enchentes, estiagens e seca (Confederação Nacional de Municípios, 2020).

Quando os desastres passam a afetar profundamente não só o contexto ambiental, mas signi-
ficativamente populações e as questões socioeconômicas de um município ou região, a legis-
lação brasileira possibilita que essas cidades e/ou estados se declarem em emergência e/ou
Calamidade Pública. O Estado de Calamidade Pública é um reconhecimento (legal) pelo poder
público de situação anormal, provocada por desastres, causando sérios danos à comunidade
afetada, inclusive à incolumidade e à vida de seus integrantes.

Nos anos de 2020 e 2021 o Brasil foi alvo de intensas preocupações devido ao incêndio florestal
no Amazonas, secas, inundações, enchentes por todo país, e ainda a pandemia da Covid-19;
constituindo-se nas ocorrências mais declaradas pelos municípios e estados brasileiros como
emergências ou Situação de Calamidade Pública. A Confederação Nacional de Municípios (2021)
registrou que os desastres decorrentes de tempestades, ciclones, alagamentos, inundações,
deslizamentos, entre outros causaram a morte de 235 pessoas, e o excesso de chuvas também
deixou mais de 96.535 mil pessoas desabrigadas e 306.035 desalojadas. Sendo assim, somando
todos os desastres que ocorreram em 2020, mais de 41 milhões de pessoas foram afetadas. No
que diz respeito aos desastres no Brasil, dados do Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil
(SINPDEC) reportam que, nos últimos casos, os desastres mais recorrentes dentro da área (ter-
ritório) pesquisada, foram:

30
Tabela 2 - Situação de Desastre no Brasil - Famílias e Municípios - Por estado de referência

Nº de Usuários Ativos Nº de Municípios usuários


Localidade (2021) por Estado (2021)

Brasil 13.272 4650


Alagoas 237 95
Amazonas 299 62
Bahia 1230 384
Ceará 470 183
Pernambuco 535 179
Rio de Janeiro 387 92
Rio Grande do Norte 303 161
São Paulo 955 431

Fonte: Dados coletados do Relatório Gerencial SINPDEC (Jun-2021)

A Tabela 2 revela que em 2021 são 13.272 famílias (usuários ativos) registradas em situação de
Emergência ou Calamidade Pública no Brasil. Considerando os estados pesquisados, a Bahia se en-
contra com situação mais desafiadora, seguida por São Paulo (955), Pernambuco (535) e Ceará (470).

Na análise dos números de municípios informados pelo Governo Federal sobre a ocorrência de
casos de emergência ou Calamidade Pública, destacam-se os estados de São Paulo (431), segui-
dos por Bahia (384) e Ceará (183) com maior número de municípios necessitando de contribui-
ções para superar os impactos negativos decorrentes desses desastres. Os eventos de maior
frequência, por estado, são declarados abaixo.

Tabela 3 – Tipologias de desastres mais frequentes nos estados


de atuação da Visão Mundial no Brasil

Localidade Tipo de Desastre

Alagoas Estiagem (maioria), Seca e Doenças Infecciosas Virais

Amazonas Inundações

Bahia Estiagem e doenças infecciosas virais

Ceará Doenças infecciosas virais (maioria), estiagem e seca

Pernambuco Estiagem e doenças infecciosas virais

Rio de Janeiro Tempestade Local/Chuvas Intensas e doenças infecciosas virais

Rio Grande do Norte Estiagem, seca, alagamentos e doenças infecciosas virais

São Paulo Tempestade Local/Chuvas Intensas e doenças infecciosas virais

Fonte: Dados coletados do Relatório Gerencial /SINPDEC (2021)

31
Pela Tabela 3 entendemos que, na maioria dos estados de atuação da Visão Mundial Brasil, há a
situação de calamidade pública provocada por doenças infecciosas virais, no caso, a pandemia
da Covid-19. Com exceção do Amazonas, que enfatizou como prioridade as inundações que
estão ocorrendo, afetando principalmente as comunidades ribeirinhas, bem recorrente nesse
Estado (SINPDEC, 2021).

Vale ressaltar que as estiagens e secas estão presentes nos estados da Região Nordeste (Ala-
goas, Bahia, Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte) sendo esses desastres de origem cli-
matológica, que provocam consequências ambientais e socioeconômicas. Segundo estudo
técnico realizado pela Confederação Nacional de Municípios (2021), dentre os desastres na-
turais que ocorreram durante a pandemia causada pelo coronavírus, a seca foi o desastre que
mais causou prejuízos nos municípios afetados. Ela ficou mais concentrada nas regiões Nor-
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

deste e Sul, somando um grande prejuízo no valor de R$ 39,6 bilhões. A CNM chama atenção,
ainda, aos prejuízos causados pelos incêndios florestais, os quais somaram R$ 75,9 milhões aos
municípios afetados.

No que tange ao aspecto socioeconômico, os desastres naturais irão impactar, de forma nega-
tiva, diretamente no fornecimento da água, na quantidade e qualidade do consumo humano de
água, nas atividades agrícolas, pecuárias e pesqueiras, na quantidade e qualidade de alimentos,
nos prejuízos econômicos na fonte de renda e trabalho, e perdas materiais e sentimentais em
casos de pessoas que migram pela sua incapacidade de se manter na localidade, e assim sus-
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

tentar sua família (Organização Pan-Americana da Saúde, 2014).

Sobre o contexto da pandemia, até 17 de setembro de 2021, o Brasil atingiu um total de 589.240
mortes. Com isso, os estados permanecem em alerta diante da alta taxa de ocupação e colapso
do sistema de saúde, apesar da tendência de estabilidade de óbitos. O estado de São Paulo é o
mais afetado em números absolutos de casos (4.321.189) e de mortes (147.811) no Brasil. A vaci-
nação no país continua lenta, tendo atingido apenas 36,47% da população que estão totalmente
imunizados com as duas doses e/ou dose única [2] no período de execução desta pesquisa,
de março a julho de 2021. O surgimento de novas cepas no início de 2021, a flexibilidade das
medidas de distanciamento social e a ampliação do funcionamento das atividades econômicas
e lazer podem ter contribuído com o aumento do número de casos e mortes entre pessoas
mais jovens, incluindo crianças e adolescentes, tornando o Brasil o epicentro da pandemia no
mundo.

32
Tabela 4 – Distribuição dos Registros de casos de pessoas com Covid-19 confirmados, e de
óbitos nos estados

Localidade Nº Casos Confirmados Nº de Óbitos

Brasil 21.069.017 589.240

Alagoas 236.963 13.709

Amazonas 435.844 13.701

Bahia 1.227.870 26.712

Ceará 935.383 24.138

Pernambuco 614.860 19.586

Rio de Janeiro 1.161.182 64.472

Rio Grande do Norte 366.665 7.313

São Paulo 4.325.159 147.811

Fonte: Painel Coronavirus4, atualizado em 16 de setembro de 2021

Além do impacto direto na saúde da população brasileira, a pandemia da Covid-19 e as medi-


das sanitárias necessárias para conter a disseminação da doença vêm gerando diversos outros
impactos negativos, principalmente de caráter econômico. A falta de emprego e o baixo valor
do auxílio emergencial levam parte da população às ruas para tentar colocar comida na mesa.
Uns saem para trabalhar, outros vão atrás de doações, as quais também registraram uma queda
significativa em 2021.

A insegurança alimentar trouxe consequências imediatas para a população, já que esta precisa
se expor para buscar comida no contexto pandêmico[3]. Os dados do Inquérito Nacional sobre
Insegurança Alimentar em Contexto de COVID revelam que 55,2% da população brasileira
sofrem alguma ameaça ao direito aos alimentos, sendo a região Norte a mais afetada, tendo
18% de sua população em situação de fome [4]. Já no Sul e Sudeste, regiões mais ricas, 6% de
sua população enfrentam a falta de acesso pleno aos alimentos e uma insegurança alimentar
grave. O estudo aponta que a pandemia provocou o agravamento de um problema que já vinha
acontecendo há algum tempo em todo o país. Casos mais severos atingem principalmente mul-
heres chefes de família, pretas ou pardas, com baixa escolaridade e trabalho informal.

Relativo à morte de crianças e adolescentes infectadas pelo coronavírus, no portal da trans-


parência do Cartório de Registro Civil do Brasil [5], até a segunda semana de setembro de 2021
foram registrados 3.706 óbitos confirmados pela Covid-19 na faixa etária de 0 a 19 anos. Destes,
968 tinham até 9 anos e 2.738 estavam na faixa etária de de 10 a 19 anos de idade. Identificamos
que o maior número de mortes foi no gênero masculino, nos dois recortes de faixa etária.

Relativo à pandemia, no Brasil, o número crescente de mortes tem impactado diretamente e


de forma transversal e multidimensional na vida de meninos e meninas, seja pela própria con-
dição de saúde, pela perda de parentes e, consequentemente, tornando-se órfãos; na questão
da renda; cada vez mais submetidos à privação extrema ou ainda a prejuízos à saúde mental,
provocados pelo isolamento social e mudanças de hábitos, seja nas relações sociais e no modo
de expressar o afeto ou ainda nas alterações de rotinas escolares, com a necessidade de uso da
tecnologia digital e ausência e/ou pouco acesso à internet; o número crescente de divórcios

4 https://covid.saude.gov.br/, consultado dia 10 de setembro de 2021

33
ocorridos nesse período e o aumento dos casos de homicídios, feminicídios e conflitos diversos
causados no processo de interação das pessoas no ambiente domiciliar, dentre outros.

A Visão Mundial intervém socialmente com a dimensão vulnerabilidades à impacto negativo


de desastres/catástrofes e epidemias/andemia. Nesse sentido, seu foco prioritário está em
mitigar os impactos nos meninos, meninas e suas famílias afetadas, aqueles vivendo em áreas
de conflito e, no presente momento, diretamente os mais vulnerabilizados pela pandemia.

Com o agravamento da crise econômica e social na Venezuela, o fluxo de cidadãos venezuela-


nos para o Brasil cresceu maciçamente nos últimos anos. Entre 2015 e 2019, o Brasil registrou
mais de 178 mil solicitações de refúgio e de residência temporária. A maioria dos migrantes en-
tra no país pela fronteira norte do Brasil, no estado de Roraima, e se concentra nos municípios
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

de Pacaraima e Boa Vista, esta última sendo a capital do estado. Os governantes do estado de
Roraima declararam que havia uma sobrecarga dos serviços públicos e que o estado não era
capaz de atender a demanda de migrantes que lá se instalaram. Alegaram também a impossi-
bilidade de os inserir em programas públicos relacionados à saúde, educação ou ao mercado de
trabalho. O estado de Roraima possui cerca 505.665 habitantes (IBGE 2015).

Segundo Marcilene da Silva Moura (2021), diretora do Hospital Geral de Roraima, os medica-
mentos solicitados para atender a população durante todo o ano de 2018 já haviam acabado em
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

meados de agosto [6]. A área da saúde foi a maior impactada pelo fluxo migratório. Doenças
como sarampo, que já haviam sido eliminadas em território brasileiro, reapareceram, e Rorai-
ma apresentou quase 300 casos confirmados da doença até o dia 10 de agosto de 2018. No que
tange à educação, a Prefeitura solicitou do Governo Federal verba para que novas salas fos-
sem construídas a fim de atender o número de venezuelanos que se matricularam nas escolas.
Nesse mesmo período, a governadora do estado de Roraima, Suely Campos, publicou um de-
creto no qual restringiu o acesso dos venezuelanos aos serviços públicos de saúde, e solicitou
o fechamento da fronteira. Apesar das ações de interiorização que contabilizaram, até março
de 2021, mais de 49 mil pessoas interiorizadas em diferentes localidades do país, mesmo com
o fechamento de fronteiras devido à pandemia, ainda são verificados fluxos migratórios sig-
nificativos em Roraima, Amazonas e São Paulo. Em especial, no estado de Roraima, devido à
grande quantidade de migrantes que permanecem chegando, sem possuir nenhuma documen-
tação. Desde 2010, 79,4 mil bolivianos foram regularizados no Brasil, concentrados, em sua
maioria, em São Paulo.

Cabe ressaltar também a migração de indivíduos de outras nacionalidades no país. Desde 2010,
cerca 101,9 mil haitianos foram regularizados, quantidade de migrantes maior que qualquer
outra nacionalidade entrando no Brasil naquele ano, tendo maior concentração de migrantes
haitiano em São Paulo e Brasília.

[1] World Vision. Disaster Management Standards 2020 Edition.

[2] https://especiais.g1.globo.com/bemestar/vacina/2021/mapa-brasil-vacina-covid/

[3] https://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2021/03/no-pior-momento-da-pandemia-fome-avanca-em-
sao-paulo.shtml?origin=uol

[4] https://ac24horas.com/2021/05/24/pesquisa-mostra-que-181-dos-moradores-da-amazonia-estao-passando-
fome/

[5] Consultado dia 10 de junho de 2021, disponível no link: https://transparencia.registrocivil.org.br/especial-covid .

[6] Solicitar a Leo.

34
35
2.4 Dimensão da Discriminação Grave
A Discriminação Grave é uma das dimensões de atuação da Visão Mundial, que busca atingir
a redução dos marcadores de vulnerabilidades referente ao suporte social às crianças com
deficiência, aquelas pertencentes a um grupo considerado marginalizado, às crianças e ado-
lescentes refugiadas, meninos e meninas em conflito com a lei (sistema juvenil), em situação de
rua, e as crianças sem registro de nascimento – dados do IBGE de 2018 apontam a existência de
70 mil crianças na faixa etária de até 10 anos sem seu registro civil.

Campanhas governamentais vêm sendo realizadas a partir de equipamentos sociais ligados


e em parceria com as Secretarias de Assistência Social para a divulgação da gratuidade da
primeira via desse documento, em articulação com os hospitais e maternidades, para que seja
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

feito logo no momento do nascimento, bem como em mobilizações sociais realizadas nas co-
munidades.

No ano de 2018, o IBGE fez um levantamento do número de crianças com deficiência no Brasil
a partir de registros de matrícula no ensino regular. Os dados revelaram a existência de 1,18
milhão de crianças e adolescentes que possuem algum tipo de deficiência. Destes, 992 mil
estudam em escolas públicas. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), pessoas com
deficiência são indivíduos que respondem ter, pelo menos, muita dificuldade em uma ou mais
dessas questões: enxergar, ouvir, caminhar ou subir degraus, ou de natureza mental/intelec-
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

tual. No último Censo de 2010, tínhamos 12,5 milhões de brasileiros, de todas as idades, com
grande ou total dificuldade nessas habilidades (6,7% da população).

No Brasil, apesar da trajetória de marcos legais para pessoas com deficiência ser robusta e pen-
sada na totalidade dos seus aspectos e necessidades, a realidade aponta uma exclusão acen-
tuada, desde a estrutura para mobilidade nas ruas, escolas e órgãos públicos e/ou privados;
oportunidades de trabalho que valorizem e reconheçam suas potencialidade; dificuldades no
acesso a uma educação que garanta materiais e equipamentos apropriados; profissionais no
atendimento despreparados e/ou não qualificados para o processo de inclusão; até a falta de
propostas que, de fato, engajem as pessoas nessa condição para luta e conquista de seus direi-
tos, as quais a Lei nº 13.146 de 2015 (Lei brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência) afirma
assegurar.

Um marcador de discriminação grave que merece atenção está nas crianças e adolescentes
que vivem em situação de rua. Segundo nota técnica divulgada pelo IPEA (2020), existem 90.158
pessoas em situação de rua, de várias faixas etárias, que foram informadas no Censo SUAS
2019, e 134.374 cadastradas no Cadastro Único. Segundo o IPEA (2020), essa população está
principalmente em grandes cidades e metrópoles, entretanto há a presença de população em
situação de rua em todos os portes de municípios.

É importante ressaltar que o IPEA (2020) observou, a partir dessa pesquisa, um aumento ex-
pressivo (140%) da população em situação de rua ao longo do período analisado (setembro de
2012 a março de 2020) e estima que existe no total, até março de 2020, 221.869 pessoas em
situação de rua. Mesmo que, no cotidiano das cidades, presenciamos a existência de crianças e
adolescentes em situação de rua, não há levantamentos recentes que evidenciem a quantidade
desse segmento social, tornando-os, mais uma vez, invisíveis para uma atuação mais efetiva
das políticas públicas.

Em 2020, a Associação Beneficente O Pequeno Nazareno e o Centro Internacional de Estudos


e Pesquisas sobre a Infância da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (CIESPI/
PUC -Rio) publicaram um relatório a respeito de um projeto chamado Conhecer para Cuidar,5
que teve como objetivo o levantamento de dados qualitativos e quantitativos sobre as crianças
e adolescentes em situação de rua e/ou aquelas em situação de acolhimento institucional em
17 cidades brasileiras, aquelas que tinham mais de 1 milhão de habitantes. Sobre as crianças e
situação de rua, a pesquisa revelou que as principais motivações deles estarem nas ruas eram,
principalmente, os conflitos familiares (violências físicas, verbais, etc.), negligência (ausência

5 Dados encontrados no site: https://criancanaoederua.org.br/dados/ , consultado em 09 de julho de 2021.

36
de cuidados básicos como saúde, alimentação, educação, dentre outras) e busca por liberdade
e diversão. A pesquisa Crescer para Conhecer (2020) apresentou uma multiplicidade de infor-
mações sobre as crianças e os adolescentes em suas trajetórias entre as ruas, a casa e as insti-
tuições de acolhimento. De um total de 554 participantes contemplados na pesquisa, 73% eram
do sexo masculino; 73% eram adolescentes, 86% eram negros ou pardos; 8% tinham filhos; 62%
frequentavam a escola; 45% trabalhavam; 71% já dormiram na rua; 96% tinham pelo menos um
documento; 48% faziam atividades físicas; 62% mantinham contato diário ou semanal com
a família; 54% tinham um relacionamento bom ou muito bom com os pais; 41% recebiam ou
sua família recebia algum tipo de benefício social; 85% afirmaram já terem sido vítimas de
violência; 64% haviam experimentado ou fizeram uso de drogas e 41% declararam ainda usar;
62% passaram por instituições de acolhimento; 61% afirmaram manter relações sexuais com
pessoas do sexo oposto; 58% costumavam usar métodos contraceptivos; 9% sofreram algum
aborto e 32% se consideravam em situação de rua(CIESPI/PUC–Rio, 2020).

Analisamos, a partir dos dados acima expostos, que a trajetória dos meninos e meninas em
situação de rua é atravessada por uma violação de direitos que inicia na família, a partir de
relatos de vidas e histórias de intensos conflitos e negligência familiares. O uso de drogas
também está relacionado em mais da metade dos casos. Pessoas do sexo masculino são mais
presentes na situação de rua, e quase 90% dos meninos e meninas em situação de rua são de
cor parda ou preta.

Cabe ao Estado e as Organizações da Sociedade Civil atentarem para a proteção dos meninos
e meninas em situação de rua e, principalmente neste período de pandemia, expostos não só a
Covid-19, mas aos riscos diversos do isolamento que eles não conseguem ter, e ainda contando
com limitados e precários meios de sobrevivência.

Na realidade brasileira, outro marcador de vulnerabilidade que merece destaque é o atual


cenário de envolvimento de crianças, adolescentes e jovens no crime organizado, levando-os
para a estatística relevante de letalidade infanto-juvenil. O Atlas de Violência 2019 indica, no
caso brasileiro, o maior nível histórico de letalidade violenta intencional do país, com destaque
para o ano de 2017, com 65.602 homicídios. Destes, 59,1% referem-se a óbitos de jovens, de
gênero masculino, situados na faixa etária de 15 a 19 anos (IPEA, 2019, p.5). Em 2019, no que
tange à faixa etária de 0 a 19 anos, o número é de 4.971 mortes violentas intencionais contra
crianças e adolescentes apontadas pelo Anuário (FBSP, 2020).

Quando estudamos dados do Atlas de Violência 2020, encontramos e destacamos os seguintes


números no Gráfico 8, relativo a Homicídios no Brasil.

Gráfico 8 - Comparativo entre Homicídios Geral x Letalidade Juvenil

57,956

30,873

Nº de Homicídios Geral Nº de Letalidade Infantil


(15 a 29 anos)

Fonte: Dados retirados do Atlas da Violência 2020

37
O Gráfico 8 revela que, das 57,9 mil mortes por homicídios no Brasil, 30,8 mil foram de jovens
de 15 a 29 anos, perfazendo um percentual de 53,2% dos casos. Entre os anos de 2017 e 2018
há uma queda de números de homicídios, porém ainda alto, sendo um desafio para o governo
brasileiro a prevenção e o controle/enfrentamento dos índices de homicídios no país.

Quanto aos adolescentes que respondem à justiça no Brasil, no último Censo, realizado em
2017, houve o registro de que 142.316 adolescentes cumprem alguma das medidas socioeduca-
tivas (FBSP, 2020). Abaixo, apresentamos os dados do Brasil e dos Estados de atuação da Visão
Mundial.

Gráfico 9 - Distribuição de adolescentes respondendo à Justiça no Brail e por estado de atua-


ção da Visão Mundial
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

São Paulo 59,963


Rio Grande do Norte 2,683
Rio de Janeiro 5,984
Pernambuco 3,759
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

Ceará 2,566
Bahia 2,477
Amazonas 1,661
Alagoas 2,378
Brasil 142,316

0 50,000 100,000 150,000

Fonte: Dados retirados do Anuário 2020, referente ao Censo 2017 (Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2020).

O Gráfico 9 aponta a situação de quase 143 mil adolescentes em conflitos com a lei e respon-
dendo ao Sistema de Justiça Juvenil no país. As medidas socioeducativas podem ser de seis
tipos: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviço à comunidade, liberdade
assistida, semiliberdade, privação de liberdade (ECA, 1990).

Pela distribuição do Gráfico 9, o maior número de adolescentes que responde à justiça se


encontra em São Paulo (59.963), seguido pelo Rio de Janeiro (5.984), Pernambuco (3.759), Rio
Grande do Norte (2.683), Ceará (2.566) e Bahia (2.477). Os menores índices estão no Amazonas,
com 1.661, e em Alagoas, com 2.378 adolescentes.

Os dados apontam claramente um desafio para o Sistema de Proteção da Criança e do


Adolescente no Brasil, principalmente no que tange à Justiça (Poder Judiciário), pois
reflete o comprometimento de uma etapa significativa na vida de adolescentes e jovens já
afetados pela exclusão de processos preventivos, porém manejáveis, se reduzidos os fatores
predisponentes às reentradas e reiterações em atos infracionais, sendo esse uma evidente lacu-
na para o Governo, para a rede de proteção e para a sociedade civil.

Vale ressaltar que, por reentradas, entendemos os adolescentes que não tiveram necessaria-
mente sentença condenatória transitada em julgado. Já as reiterações são aquelas situações de
mais de uma sentença condenatória em julgado. Tais conceitos são adotados pelo Conselho
Nacional de Justiça em uma pesquisa realizada em 2019, denominada Reentradas e Reiterações
Infracionais: um olhar sobre o Sistema Socioeducativo e prisional brasileiro, que acompanhou os
adolescentes que tiveram sua entrada no Sistema de Justiça em 2015, observando-os até 2019.

A pesquisa apontou que adolescentes ingressam no sistema socioeducativo principalmente


pela prática de atos infracionais equiparados aos crimes de porte de arma, roubo, furto e

38
tráfico de drogas. A partir dos dados obtidos, foi possível afirmar que, de um universo de 5.544
indivíduos, 1.327 retornaram ao menos uma vez ao sistema socioeducativo entre 2015 e 30
de junho de 2019, perfazendo uma taxa de reentrada de 23,9%. A taxa de reiteração em ato
infracional foi de 13,9%, o que demonstra que, embora cerca de dois a cada dez adolescentes
tenham voltado ao Sistema Socioeducativo após o primeiro trânsito em julgado, apenas pouco
mais da metade dessas reentradas foi confirmada pelo Poder Judiciário como efetiva ocorrên-
cia de novo ato infracional (CNJ, 2019).

No que tange ao número de atendimento de adolescentes que respondem à justiça nas medi-
das socioeducativas de semiliberdade e internação (privação de liberdade), foi revelado pelo
Conselho Nacional de Justiça a partir de um relatório em 2018, apresentando, conforme tabela
abaixo.

Tabela 5 – Nº de Adolescentes em Semiliberdade e em Privação de Liberdade nos estados de


atuação da Visão Mundial.

2018
Nº Adolescentes em
Localidade Nº Adolescentes Internos (privação de liberdade)
Semiliberdade

Alagoas 15 189
Amazonas 25 67
Bahia 42 566
Ceará 79 528
Pernambuco 161 1.469
Rio de Janeiro 360 1.423
Rio Grande do Norte 26 139
São Paulo 418 6.770
Fonte: Dados coletados a partir do Relatório de 2018 do Conselho Nacional de Justiça

A tabela acima destaca São Paulo com o maior número de adolescentes que respondem à justiça
em Semiliberdade (418) e em Privação de Liberdade (6.770). Depois vem Rio de Janeiro, com 360
adolescentes em Semiliberdade e 1.423 em sistema de internação.

Esses números evidenciam a necessidade de estudos e metodologias de intervenção social que


ataquem as causas influenciadoras dessa reentrada e reiteração com as infrações, possibilitan-
do aos/às adolescentes novas oportunidades, projetos de vida e sentimentos de pertencimento
social, os quais ressignifiquem e promovam uma curva de vida em suas trajetórias.
Um marcador de Discriminação Grave de preocupação nacional e de intervenção direta da
Visão Mundial é a situação de Refugiados no Brasil. Segundo Moreira (2005), Refugiados são
pessoas que deixam seus países porque suas vidas, segurança ou liberdade estão ameaçadas,
seja por conflitos internos, tensões políticas, violação massiva dos direitos humanos ou outra
perturbação grave de ordem pública.

Cada vez mais crescente, os pedidos de solicitação de reconhecimento como refugiado à justiça
brasileira são solicitados ano após ano, conforme tabela que segue.

39
Tabela 6. Número de solicitações de refúgio, por gênero, segundo principais países de nasci-
mento - Brasil, 2011-2019.

Países Total Homens Mulheres Não Informado

Total 239.706 148.699 89.852 1.155


Venezuela 135.665 74.692 60.916 57
Haiti 32.073 19.737 12.186 150
Cuba 10.203 6.363 3.817 23
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

China 4.869 2.970 1.898 1


Bangladesh 5.439 5.311 83 45
Angola 4.888 2.663 2.169 56
Síria 4.863 3.417 1.378 68
Colômbia 1.675 1.044 549 82
Senegal 8.760 8.544 177 39
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Nigéria 3.134 2.769 328 37


Índia 1.000 953 39 8
Marrocos 736 616 113 7
Guiné Bissau 1.810 1.425 341 44
Líbano 1.770 1.442 317 11
Outros países 22.821 16.753 5.541 527
Fonte: elaborado pelo OBMigra, a partir dos dados da Polícia Federal, Solicitações de Refúgio - 2011 - 2019

A Visão Mundial se dedica ao trabalho com migrantes e refugiados, especialmente venezuela-


nos no Brasil. E por essa razão ressalta a importância do acompanhamento junto ao número de
crianças e adolescentes envolvidas nesse processo, pois muitos dos refugiados não estão ocu-
pados, ou seja, trabalhando, o que leva também as crianças a situações de privações extremas e
relações abusivas, dentre elas, exploração no trabalho infantil e mendicância, crianças fora da
escola e sem acessar alguns direitos por ainda não terem o reconhecimento e regularização de
seu status migratório pela justiça no país.

Em uma pesquisa realizada em Boa Vista (RR) a respeito da inobservância dos direitos das cri-
anças refugiadas venezuelanas em Roraima, a autora Raffoul (2020) ratifica que a busca por tra-
balho e renda para sustentar sua família é a principal motivação de procurarem a cidade. Além
disso, necessidades na área da saúde pública (vacinas, procedimentos e cirurgias) também fo-
ram apontadas. As crianças, especialmente as venezuelanas refugiadas nos abrigos desta ci-
dade, estão com seus direitos negados, uma vez que se encontram em insegurança alimentar e
expostas às vulnerabilidades – faltam-lhes a moradia e estão fora da escola.

40
Tabela 7 - Número de refugiados reconhecidos por gênero e grupos de idade, Brasil - 2019

Refugiados reconhecidos
Grupos de Idade Gênero declarado
Total
Masculino Feminino
Total 21.515 11.094 10.421
0 a 4 anos 96 53 43
5 a 14 anos 190 80 110
15 a 24 anos 6.536 3.323 3.213
25 a 39 anos 9.734 5.236 4.498
40 a 59 anos 4.410 2.185 2.225
60 anos ou mais 539 210 329
Não Especificado 10 7 3

Fonte: Elaborado pelo OBMigra, a partir dos dados do Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE/MJSP), 2019.

A Tabela 7 apresenta um total de 21.515 refugiados reconhecidos no Brasil em 2019. Destes,


286 são crianças de 0 a 14 anos de idade, e 6.536 são adolescentes e jovens. Há um maior nú-
mero de meninas que meninos de 0 a 14 anos. Quanto aos adolescentes e jovens, com pouca
diferença, os rapazes são em maior quantidade. Na vida adulta e velhice (40 anos em diante) o
número de mulheres é bem mais expressivo que o de homens como refugiados reconhecidos
no Brasil em 2019.

41
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L | VISÃO MUNDIAL BRASIL

42
no Brasil
na Proteção
da Infância e
Adolescência
Principais brechas
3.1 Enfrentando a Insegurança Alimentar
Fome, desemprego dos pais e/ou responsáveis, desnutrição, baixo rendimento escolar e po-
breza são questões interligadas e vinculadas à insegurança alimentar, as quais afetam as cri-
anças e adolescentes, potencializando-os a outras vulnerabilidades.

Por insegurança alimentar compreendemos não apenas a falta de alimento, mas a substituição
de alimentos nutritivos e vitaminados pelos que são mais baratos e de menor valor nutricional,
devido às suas condições financeiras, para garantia da sobrevivência (Galindo Et Al, 2021).

Um grupo de pesquisa chamado Alimento para a Justiça: Poder, Política e Desigualdades Ali-
mentares na Bioeconomia realizou o estudo Efeitos da pandemia na alimentação e na situação
da segurança alimentar no Brasil (2021), identificando o crescimento da insegurança alimentar
nos últimos anos no país e revelando que o quadro se deu por uma conjunção de fatores rela-
cionados a crises sociais, econômicas e políticas recentes, e foi aprofundado, no cenário atual,
pela crise sanitária mundial, tendo a pandemia da Covid-19 como um dos principais motivos
do agravamento.

Vale ressaltar os dados interseccionais que essa pesquisa aponta, ou seja, as diferenças de
gênero, raça ou cor, perfil domiciliar, contextos regionais, territoriais e de renda são marca-
dores que Influenciam a maior ou menor incidência de insegurança alimentar nos domicílios
(Galindo
Et Al, 2021).

A pesquisa Efeitos da Pandemia na alimentação e na situação da segurança alimentar no Bra-


sil (2021) concluiu que os percentuais de insegurança alimentar se apresentam mais altos em
domicílios com única/o responsável (66,3%), sendo ainda mais acentuada nos casos em que a
responsável é mulher (73,8%) ou pessoa de raça ou cor parda (67,8%) e preta (66,8%). Também
é maior nas residências habitadas por crianças de até quatro anos (70,6%) ou crianças e ado-
lescentes de 5 a 17 anos (66,4%). A frequência de insegurança alimentar é também significativa
nos domicílios situados nas regiões Nordeste (73,1%) e Norte (67,7%) do país e nas áreas rurais
(75,2%).

Esses dados possibilitam a seguinte interpretação: a insegurança alimentar no Brasil se encon-


tra nos lares onde habitam crianças pequenas (0 a 4 anos), chefiados por mulheres (de onde
provém a renda) em sua maioria, e desses domicílios há um recorte étnico: pardas e pretas.
Essa população afetada pela insegurança alimentar está situada principalmente nas regiões
Norte e Nordeste, cujas estiagens, secas ou inundações (algum tipo de desastre) são parte de
seus climas. Notemos também a maior ocorrência nos domicílios da zona rural.

Vale salientar que, apesar da insegurança alimentar ter um sentido mais abrangente que a
fome, podemos enfatizar que está bem relacionada com a questão de classe e, portanto, das
famílias que estão na linha de pobreza ou de extrema privação. Os Gráficos que seguem en-
fatizam os estados de atuação da Visão Mundial em comparação com a situação de pobreza e
extrema pobreza no Brasil.

43
Gráfico 10 - Distribuição de Famílias na Linha de Pobreza
– Brasil x estados de atuação da Visão Mundial

São Paulo 4.336.000

Roraima 101.200

Rio Grande do Norte 657.000

Rio de Janeiro 1.907.800


| VISÃO MUNDIAL BRASIL

Pernambuco 2.048.200

Ceará 1.892.400

Bahia 3.186.300

Amazonas 673.500

Alagoas 671.800
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

Brasil 29.592.000
00

00

00
00
.0

.0

.0
.0
00

00

00
0

00
.0

.0

.0
.0
10

30

40
20

Fonte: Dados Coletados do IBGE (2021)

Podemos identificar no Gráfico 10 que, das 29.592.000 pessoas em situação de pobreza no Bra-
sil, 14,65% estão em São Paulo, 10,77% estão na Bahia, 6,92% em Pernambuco, 6,45% no Rio de
Janeiro (6,45%) e, em menor índice, no Ceará, com 6,39%.

Para a situação de extrema pobreza, com 17.140.000 brasileiros, permanece São Paulo na frente,
tendo 12,47% das pessoas mais afetadas, seguido da Bahia com 12,32%, Pernambuco, com 8,06%
e Ceará com 7,14% de privação extrema dentro dos estados de atuação da Visão Mundial, con-
forme vemos no Gráfico que segue.

Gráfico 11 - Distribuição de Famílias em situação


de Extrema Pobreza: Brasil x estados de atuação da Visão Mundial

São Paulo 2.137.900

Roraima 65.100

Rio Grande do Norte 416.500

Rio de Janeiro 1.200.400

Pernambuco 1.381.500

Ceará 1.223.500

Bahia 2.111.900

Amazonas 468.400

Alagoas 461.800

Brasil 17.140.000

0 5.000.000 10.000.000 15.000.000 20.000.000

Fonte: Dados Coletados do IBGE (2021)

44
Essas expressões numéricas nos trazem reflexões de que a insegurança alimentar, quando
atrelada à pobreza, possui causas mais profundas associadas aos aspectos estruturantes das
desigualdades sociais, as quais podem ser enfrentadas por tomadas de decisões políticas e
articulações intersetoriais que perpassam desde o montante de investimentos, suporte na
agricultura familiar, inovações para o mercado de trabalho, novas propostas e formas de
geração de trabalho e renda, incentivos à empregabilidade, estando atentos às tendências
que a pandemia provocou, mas também potencializou com os trabalhos nos domicílios,
vendas pela internet, uma vida interligada com as tecnologias e redes sociais.

O fato é que estamos numa situação de alto índice de desemprego, com medidas sanitárias
necessárias para o controle da pandemia e meninos e meninas com insegurança alimentar se-
vera. Ou seja, a pandemia comprometeu diretamente o rendimento de milhões de brasileiros,
com impacto maior nos setores econômicos que empregam proporcionalmente mais mulheres,
negros, trabalhadores informais, pessoas que ganham menores salários e de famílias mais po-
bres (Souza Et Al, 2020), o que gerou a necessidade de visualizarmos as tendências e estraté-
gias de enfrentamento à pobreza de modo que a proteção das crianças e adolescentes sejam
garantidas.

Relativo às perspectivas e tendências durante e pós a pandemia (Souza et al., 2020) será neces-
sário o Governo assegurar: a renda básica e programas de transferência de renda, o Programa
de Aquisição de Alimentos (PAA) como mecanismo de compra direta de alimentos da agri-
cultura familiar, sendo uma importante estratégia de fortalecimento da agricultura familiar e
promoção do acesso à alimentação, sobretudo para populações em insegurança alimentar. A
entrega de kits com alimentos in natura para as famílias é uma estratégia que assegura quali-
dade nutricional da alimentação e possibilita manter a compra da agricultura familiar. Outro
exemplo é o Cartão Merenda, utilizado por alguns municípios para alunos de escola pública.
Outro caminho é que a sociedade exerça seu direito de controle social e de participação na ela-
boração e implementação de políticas e ações para garantia da Segurança Alimentar Nacional.

Vale ressaltar que a pesquisa realizada pela Rede PENSSAN (2021), denominada Inquérito Na-
cional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, apresenta
que a insegurança alimentar no contexto pandêmico está relacionada diretamente às desigual-
dades sociais e, também, regionais. O Norte e Nordeste do país sofrem com maiores índices de
insegurança alimentar. Este Inquérito também aponta a associação entre insegurança alimen-
tar e insegurança hídrica, especialmente na área rural, onde a redução da produção de alimen-
tos para autoconsumo e comercialização de excedentes podem impactar o consumo alimentar
dos moradores e, também, seus rendimentos.

O presente Inquérito ainda ratifica que a perda do emprego e o endividamento da família são
as duas condições que mais impactaram o acesso aos alimentos no período pesquisado. Nos
domicílios localizados na área rural, chama muito a atenção o impacto na Segurança Alimen-
tar dos moradores em decorrência da redução dos preços de comercialização da produção.
Assim, condições que levam à eliminação da fome e outras iniquidades e que promovam o di-
reito humano à alimentação adequada e saudável para todas e todos no Brasil são as principais
recomendações dessa pesquisa (Rede PENSSAN, 2021).

Diante dessa realidade, a articulação entre os setores sociais (Estado, Sociedade Civil e Empre-
sas) se constitui numa estratégia essencial e urgente para que crianças e adolescentes sejam
protegidos da insegurança alimentar e os efeitos que ela produz: fome, desnutrição, baixo ren-
dimento escolar, trabalho infantil, envolvimento com o tráfico de drogas, dentre outras. Em-
presas conscientes de sua responsabilidade social, sociedade atuante e um Estado interventor
(protetor) pode ser o começo de um caminho para mudanças na sociedade brasileira.

45
3.2 Prevenção e
enfrentamento às violências
Durante a pesquisa de análise de contexto brasileiro, identificamos um alto número de vio-
lações de direitos humanos contra crianças e adolescentes em nosso país em dados consoli-
dados e detalhados pelo Ministério de Direitos Humanos em seu relatório de 2019, conforme
destacado em seção anterior desse relatório.

Em registros recentes encontrados no Painel de Dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Hu-


manos, que semanalmente são atualizados, identificamos do período de janeiro a maio de 2021,
ou seja, em apenas cinco meses foram 516.260 denúncias contra os Direitos Humanos para
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

todas as faixas etárias e, destas, 128.408 foram para crianças e adolescentes.

Se observado o crescimento de 2019, do número de denúncias apenas para crianças e adoles-


centes com direitos violados, nos cinco primeiros meses de 2021, houve um crescimento de
44,8% a mais que todos os casos denunciados no ano de 2019 nesse segmento social. Evidenci-
amos que o isolamento social provocou aos nossos meninos e meninas maior vulnerabilidade e,
portanto, número de casos de violências em período de pandemia, conforme gráfico que segue.
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

Gráfico 12 - Comparativo de denúncias de violações de Direitos no Brasil e nos estados de atua-


ção da Visão Mundial

Nº de Violações de Direitos contra e Adolescentes


(Painel Nacional de Ouvidoria dos Direitos Humanos Jan a Mai de 2021
Nº de Violações de Direitos contra Crianças e Adolescentes (Disque 100, 2019)

32,014
São Paulo 20,355
2,506
Rio Grande do Norte 2,050
18,841
Rio de Janeiro 9,028
4,053
Pernambuco 2,872
4,060
Ceará 3,418
6,242
Bahia 4,471
2,453
Amazonas 2,291
1,544
Alagoas 1,292

Brasil 86,837
128,408

0 50,000 100,000 150,000

Fonte: Dados do Painel Nacional de Ouvidoria dos Direitos Humanos (2021) e Dados do Relatório Direitos Humanos (Disque 100, 2019)

No Gráfico 12 também constatamos um crescimento de denúncias em todos os estados de


atuação da Visão Mundial. Vale destacar que o estado do Rio de Janeiro dobrou o número de
crianças e adolescentes sofrendo violências diversas quando comparamos o ano de 2019 (9.028
casos) com os cinco primeiros meses referentes a 2021, evidenciando 18.841 novos casos. Das
violências contra crianças e adolescentes denunciadas de janeiro a maio de 2021, o Painel Na-
cional de Ouvidoria dos Direitos Humanos revelou, nesses cinco primeiros meses de 2021, as

46
violências sexuais como maiores incidências, com o total de 7.143 casos, sendo 5.290 (74%) com
meninas e 909 (12,72%) com meninos, incluindo 950 (13,29%) que não foram divulgados o gêne-
ro. Conferimos os dados, e as meninas de 15 a 17 anos permanecem sendo as mais violentadas
sexualmente, com 3.496 casos denunciados.

Os dados expostos nos trazem algumas reflexões: o que acontece no caso brasileiro, que os
números de crianças e adolescentes violentados só crescem? Percebemos pelo comportamen-
to dos marcadores que, por um lado, o estímulo social à denúncia tem sido um efeito positivo
de enfrentamento às relações abusivas e, dentre elas, a negligência como a mais recorrente e
a violência sexual como a mais emergente problemática que exige esforços dos atores formais
(governo) e informais (sociedade civil) de proteção da infância e adolescência no país.

Por outro lado, o alto número de denúncias requer providências não apenas na elaboração
de leis, mas na sua efetivação, com compromissos e pactuações que, de fato, evidenciam res-
postas para o atendimento dos casos e uma proposta eficaz para a redução desses números.
Isso requer investimentos em ampliação de equipamentos sociais, equipes multidisciplinares,
capacitação adequada para acolhimento infanto-juvenil, propostas que possibilitem uma re-
produção social de uma cultura que reconheça a criança como sujeito de direitos. Isso remete
a uma extensão de ações e providências que alcancem o âmago da família, se dela tem vindo os
principais suspeitos das relações abusivas.

Outras reflexões surgem: o que o Sistema e Rede de Proteção da Infância tem feito para pro-
teger seus meninos e meninas contra as violências? A construção de políticas, metodologias, e
tecnologias sociais que promovam a prevenção e o enfrentamento a essas questões precisam
ser atingíveis às causas para que os efeitos sejam alterados positivamente.

Mas, como intervir socialmente sobre as relações abusivas? Estas podem também estar rela-
cionadas às questões culturais que envolvem a reprodução do machismo, violência de gênero,
de um olhar adultocêntrico sobre crianças e adolescentes e um racismo estrutural, num país
que tem uma postura submissa - como afirma Roberto da Matta (1995) – que os brasileiros
são cordiais e fogem de conflitos. Esses comportamentos culturais foram produzidos por uma
longa história de colonialismo entranhados nos hábitos e costumes em sociedade e que certa-
mente estimulam, mantêm e reproduzem as relações abusivas.

Nesse sentido, destacamos três dentre as principais lacunas referentes às violências contra
crianças e adolescentes no Brasil, as quais necessitam ser enfrentadas, a saber: Violências
Sexuais, Matrimônio Infantil e a Gravidez na Adolescência.

“No Brasil, apenas 10% da Violência


Sexual contra Crianças e Adolescentes
é notificada”.
Apesar do crescimento de denúncias de Abuso Sexual no Brasil, esse marcador é uma violação
que ainda é subnotificada. A Cartilha denominada Abuso Sexual Contra Crianças e Adolescentes:
Abordagem de Casos Concretos em uma Perspectiva Multidisciplinar e Interinstitucional (2021)
apresenta que apenas 10% deste tipo de violação são notificados no país, devido à mesma acon-
tecer majoritariamente dentro dos lares, sob a cultura e o pacto do silêncio, estabelecido pelo
agressor com a vítima e estendido a família.

As possíveis causas da não denúncia são: o silêncio que culturalmente as famílias mantêm a
respeito de seus problemas, pois em seu imaginário refere-se ao privado; o poder opressor do
adulto (agressor) sobre a criança, que a mantém refém do medo das ameaças da morte de quem
eles(as) amam, bem como o medo da exposição pública. O desconhecimento da criança sobre

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seus direitos, ou ainda, a imaturidade (pela própria fase de desenvolvimento) de não saber dis-
cernir a demonstração do afeto, ou seja, o limite entre carinho e carícias (abusivas), uma vez
que os dados apontam que os principais agressores sexuais são os pais, padrastos e/ou amigos
próximos da família. O sentimento de culpa que as crianças e adolescentes desenvolvem ao
longo do processo de abuso sexual também pode ser outra causa que influencia negativamente
as crianças e adolescentes a denunciarem.

Diante disso, refletimos: como alcançarmos as crianças nos aspectos que envolvem desde o
conhecimento de seus direitos, do que é afeto ou violência, do que deixa de ser privado para
ser uma causa/responsabilidade pública em prol de sua proteção ao respeito à preservação e
garantia dos seus direitos sexuais? Cabe ao Governo, universidades e sociedade civil encontrar
caminhos de respostas para estímulo a denúncias, identificação e registro de casos de abuso e
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

exploração sexual de nossos meninos e meninas no Brasil.

“O Matrimônio infantil é uma prática


nociva naturalizada na sociedade brasileira”.
O matrimônio infantil é uma temática pouco explorada e/ou debatida na sociedade brasileira.
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

Até porque é comum, ou seja, naturalizada, a união precoce entre adolescentes ou entre ado-
lescente e adultos, seja ela registrada em cartório ou a união estável consentida, que conhecemos
como “morar junto”. A especialista Márcia Monte (2021) afirma: “quando uma prática nociva
como o casamento infantil é naturalizado culturalmente, a própria sociedade tem dificuldade
de reconhecer como um problema em si”.

Segundo o Observatório do Terceiro Setor (2021), o Brasil ocupa o 5º lugar entre os países com
maior incidência de casamento infantil no mundo e a pandemia pode agravar mais ainda esta
realidade, uma vez que a condição socioeconômica é um dos principais fatores propulsores
dessa prática cultural nociva. Assim, no Brasil, as principais pessoas afetadas com essa prática
são: meninas em situação de vulnerabilidade e pobreza, grávidas na adolescência e que acabam
evadindo da escola, trazendo para si – a partir do casamento – responsabilidades demasiadas
numa fase em que estão ainda em processo de desenvolvimento, sendo as principais impli-
cações a violência de gênero e os muitos impedimentos de trilharem seus projetos de vida e
oportunidades de melhoria nas suas condições socioeconômicas. Essa prática cultural merece
atenção e uma emergente intervenção.

“Gravidez na Adolescência é bem propensa


a consequências negativas e irreversíveis”
A gravidez na adolescência é uma das lacunas entre os marcadores de vulnerabilidades que ne-
cessitam de atenção pública, uma vez que a maternidade neste período, na maioria dos casos,
traz consequências negativas e irreversíveis, “Todo o projeto de vida da adolescente muda, sua
dependência econômica aumenta e suas perspectivas de trabalho e estudo se evaporam”, assim
afirma Harold Robinson (2020), diretor do Escritório Regional para América Latina e o Caribe.

Entretanto, para aquelas meninas que já vivenciam esse momento da maternidade, são
necessárias estratégias que possibilitem suporte e cuidados tanto para a saúde quanto para
a sustentabilidade dessas vidas envolvidas e que, mais do que nunca, precisam de proteção.
Para as demais meninas e para os meninos, ações preventivas são o caminho, evitando con-
sequentes problemas socioeconômicos, evasão escolar e ruptura com suas projeções de vida.
Em período de pandemia, novos problemas se agregam, dentre eles o medo, ansiedades e in-
certezas, e intensificam-se na vida dessas meninas grávidas, que em meio ao isolamento social
e com as necessidades de acompanhamento do pré-natal, sentem receio de pegar a doença, o

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que é um risco também ao feto, uma vez que a ciência ainda não tem tudo esclarecido a respei-
to dessa situação pandêmica.

3.3 Garantia ao acesso à Educação como Proteção


A escola é um fator de proteção para crianças e adolescentes, uma vez que, por meio da in-
clusão social que promove, é possível garantir as principais estratégias para prevenção e pro-
teção de várias questões interligadas, a saber: violências físicas e sexuais, trabalho infantil,
insegurança alimentar, dentre outras.

A partir da garantia do direito à educação, as crianças se alimentam para uma parte de seu dia.
É um espaço de interação social, de oportunidades à sua ambientação com artes e cultura, com
a cidadania e, para estudantes de ensino médio, as escolas profissionalizantes possibilitam a
sua iniciação com a qualificação profissional.

A negação do direito à escola é ainda evidenciada em alguns estados. No Nordeste, o Relatório


do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência aponta que 60% dos ado-
lescentes abandonaram a escola antes de morrer (Cada Vida Importa,2016).

A escola tem sido um alvo de muitas expectativas. Porém, na realidade brasileira, principal-
mente no ensino público, há muitos desafios a serem superados. Segundo os dados do Censo
Escolar INEP 2020, há 179.533 escolas públicas e particulares no Brasil na Educação Básica.
Destas, 138.487 são públicas nas instâncias federais, estaduais e/ou municipais.

O Censo Escolar INEP 2020 afirma que das 138.487 escolas de ensino básico que são públicas,
77% (106.497) possuem televisão, 61% (83.834) têm aparelho de DVD, 62% (85.814) possuem im-
pressora, 18% (25.110) têm antenas parabólicas, 36% (49.392) têm máquina copiadora e 12%
(17.101) têm retroprojetor. Dependendo da zona (rural ou urbana), bem como o nível de acesso à
internet de alunos, em período de pandemia, as copiadoras e impressoras são importantes para
a continuidade das atividades escolares de meninos e meninas.

Outro fator preocupante é a acessibilidade nas escolas públicas brasileiras, uma vez que cerca
de 1.308.900 de estudantes estão matriculados na educação especial. O Censo Escolar INEP
(2020) apresenta que apenas 57% (78.842) das escolas públicas têm dependências acessíveis aos
portadores de deficiência e 44% (61.382) de suas escolas apresentam sanitários acessíveis aos
portadores de deficiência.

Além de uma estrutura adequada para a acessibilidade, equipamentos e materiais didáticos/


pedagógicos suficientes, número de vagas e que estas estejam próximas ao domicílio das cri-
anças e adolescentes, quantidades de professores e profissionais especializados para a edu-
cação inclusiva são necessários.

Outro agravante no contexto escolar é a ausência do acompanhamento para os casos de evasão


e abandono escolar. A Lei nº 13.803 (10 de junho de 2019), conhecida como Lei da Notificação de
Faltas Escolares, tem sido uma alternativa para a garantia do direito à educação via Conselho
Tutelar no acompanhamento dos casos. Entretanto, essa realidade, principalmente em período
de pandemia, tem aumentado os casos de abandono escolar e reprovação, como vimos no item
de contexto nacional, evidenciada pelo UNICEF (2021).

Do que pode ser mensurado na instância nacional quanto à evasão escolar, apresentamos o
número de crianças que estiveram fora da escola em 2019, comparada com os estados de atu-
ação direta da Visão Mundial.

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Gráfico 13 – Distribuição de crianças fora da Escola no Brasil
e nos estados de atuação da Visão Mundial

São Paulo 142.874

Rio Grande do Norte 11.994

Rio de Janeiro 58.459

Pernambuco 56.277

Ceará 49.900

Bahia 77.309
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Amazonas 43.334

Alagoas 31.922

Brasil 1.096.468

0 200.000 400.000 600.000 800.000 1.000.000 1.200.000


R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

Fonte: Dados coletados da Pesquisa Cenário da Exclusão Escolar no Brasil, UNICEF (2021)

De acordo com os dados coletados da pesquisa Cenário de Exclusão Escolar no Brasil (UNICEF,
2021) apontados no Gráfico 13, o país tem 1,09 milhão de crianças fora da escola. Dos estados
com maior atuação da Visão Mundial destacam-se São Paulo (142.874), com o maior número de
meninos e meninas de 4 a 17 anos que não frequentam a escola, seguido de Bahia (77.309), Rio
de Janeiro (59.459), Pernambuco (56.277) e Ceará (49.900).

O UNICEF (2021, p.29-30) apresenta que, das crianças e adolescentes fora da escola em todo o
país, a maioria é de pretas(os), pardas(os) e indígenas, que são, também, a maioria dos(as) que
vivem em famílias com renda domiciliar per capita de até ½ salário mínimo (61,9%). Há um
destaque na alta relação entre pobreza e exclusão escolar. Apenas 9,9% dos que estavam fora
da escola e tinham de 4 a 17 anos em 2019 vivem em famílias com mais de um salário-mínimo
(SM) per capita; 90,1% vivem em famílias com renda familiar per capita menor que um salário
mínimo. Desses, 32,3% em famílias com até ¼ (um quarto) do SM de renda familiar per capita,
29,6% entre ¼ (um quarto) e ½ (meio) e 28,2% de ½ (meio) até um SM per capita.

Além dessas questões supracitadas, pensamos que outros fatores podem estar influenciando
a evasão escolar, como: metodologias de ensino que alcancem o interesse e necessidades de
aprendizagem, o envolvimento das crianças e adolescentes com trabalho infanto-juvenil (que
será evidenciado no subitem que segue), a gravidez precoce, bem como conflitualidades no
ambiente escolar (violências dentro da escola, assédios, bullying, tráfico de drogas no entorno,
conflitos territoriais e ameaças provocadas pelas facções criminosas), dentre outros que acon-
tecem no âmbito familiar e que afetam diretamente nas relações socioafetivas e desempenho
de aprendizagem dos meninos e meninas.

Vale destacar a necessidade de investimentos estatais na ampliação de escolas com atendi-


mento de creches. Há uma luta histórica dos movimentos sociais, conselhos de direitos e frente
parlamentares em prol da Primeira Infância, para que o Estado reconheça e dê mais atenção
às crianças de 0 a 4 anos de idade. Uma vez que essa faixa etária, por lei, não é obrigatória
para sua inclusão escolar, porém o equipamento público disponível a esse público etário pos-
sibilitaria a alimentação mais adequada, socialização e cuidados com a coordenação motora
que são trabalhados nos espaços educacionais. Além disso, possibilitaria um suporte e tempo
para que mães, pais ou responsáveis pela criança pudessem ocupar seu tempo com trabalho e
renda para sua família. As creches hoje no Brasil são insuficientes e precisam ser ampliadas em
número de atendimento.

No atual cenário de pandemia, a educação (pública e particular) foi afetada. No que tange à
educação pública, apesar das estratégias e esforços, a reorganização das ações pedagógicas

50
e de cuidados com as crianças, adolescentes e jovens gerou um ônus financeiro expressivo e
necessário para o aprimoramento da infraestrutura escolar e o retorno seguro das atividades
presenciais (Instituto Unibanco, 2020).

O Governo brasileiro precisou alterar e adaptar rapidamente as estratégias de intervenção so-


bre a educação pública no país, inclusive financeira. Assim, identificamos mudança no Progra-
ma Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que distribui um valor monetário às famílias sen-
do incorporado ao Projeto de Lei de Conversão (PLV) da Medida Provisória (MP) nº 934/2020
aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado Federal na forma da Lei nº 14.040/2020.

Outras medidas tomadas pelo Governo Federal em período de pandemia no Brasil também fo-
ram identificadas: Projeto de lei nº 3477/20207 (Câmara) e nº 3462/20208 (Senado) que garan-
tem acesso à internet a alunos(as) e professores(as) por meio do Fundo de Universalização dos
Serviços de Telecomunicações (FUST) e de auxílio-conexão. O Projeto de Lei (PL) nº 3165/2020
estrutura um pacote anticolapso financeiro das redes de educação do país, e o PL nº 3551/2020
para a garantia de recursos federais, distribuídos pelo Programa Dinheiro Direto na Escola
(PDDE) a ações relacionadas à estratégia de retorno às aulas (Instituto Unibanco, 2020).

Destacamos que a aprovação da Emenda Constitucional (EC) nº 108/2020 gera uma esperança
à rede de educação frente à pandemia, uma vez que reconhece a necessidade permanente e o
aprimoramento do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valori-
zação dos Profissionais da Educação (Fundeb).

Nesse período de pandemia e isolamento social, os meios de vida, de trabalho, de estudo, da


economia, de sobrevivência, costumes e de relações sociais foram alterados e não sabemos
bem a abrangência ou a intensidade dos efeitos provocados e como ainda serão repercutidos
nas crianças e adolescentes.

No caminho de mudanças que a pandemia provocou na Educação, temos hoje, no ensino re-
moto, os desafios de proteção social das crianças e adolescentes que são evidenciados no
abandono escolar, nas reprovações, no desalinhamento da idade-série (ano de estudo), nos
impedimentos que as crianças e adolescentes em situação de pobreza passam com despesas
como acesso à internet, celular, computador, tablet, do baixo poder aquisitivo para a garantia
de materiais didáticos, pedagógicos e higiênicos, ou até mesmo a alimentação que suas famílias
desempregadas não têm como adquirir. Tudo isso são novas despesas que o Estado deve garan-
tir para que o direito à educação não seja negado.

O Instituto Unibanco (2020), em seu Terceiro Relatório Covid-19 – Impacto Fiscal na Educação
Básica, apresentou recomendações para a educação diante do retorno às aulas presenci-
ais, a saber: realizar processo de coordenação nacional, no bojo da implementação da Lei nº
14.040/2020, para a organização adequada de um retorno gradual e seguro às atividades esco-
lares presenciais, mediante planejamento orçamentário das despesas necessárias e articulação
interfederativa para troca de práticas de racionalização de custos. Além disso, cinco blocos
de despesas foram evidenciados: aquisição de materiais, reformas, avaliações diagnósticas,
infraestrutura pedagógica para redução de déficits de aprendizagem e formação de equipes
operacionais.

É unânime que o déficit de aprendizagem constitui um dos mais desafiadores efeitos que terão
repercussões em longo prazo, intensificadas pela pandemia. Para isso, nos lembramos das ori-
entações do Banco Mundial com relação a uma das metas dos Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável – ODS para superar a “pobreza de aprendizagem”. O Banco Mundial (2021) percebe
a necessidade de um pacote de políticas de alfabetização que consiste em intervenções foca-
das especificamente na promoção da aquisição de proficiência em leitura na escola primária.
Uma abordagem educacional renovada para fortalecer sistemas educacionais inteiros - de
modo que as melhorias na alfabetização possam ser sustentadas e ampliadas e todos os outros
resultados educacionais possam ser alcançados, bem como uma ambiciosa agenda de medição
e pesquisa - para fechar as lacunas de dados e continuar a pesquisa orientada para a ação e a
inovação sobre como desenvolver habilidades fundamentais.

51
A Pobreza de Aprendizagem diz respeito à incapacidade de ler e compreender um texto sim-
ples aos 10 anos. Este quesito reúne indicadores de escolaridade e aprendizagem, a começar
com a proporção de crianças que não alcançaram a proficiência mínima de leitura (medida nas
escolas) e é ajustado pela proporção de crianças que estão fora da escola (e se presume que não
sabem ler com proficiência) e que afetam diretamente no capital humano, na prosperidade e na
inserção destas no mercado de trabalho, no futuro. (Banco Mundial, 2021)6.

Cabe ao governo atentar para seus compromissos com a Proteção da Infância e Adolescência e
metas acordadas internacionalmente, bem como a sociedade civil exercitar seu controle social
na busca por respostas a esses intensos desafios do direito à educação.

3.4. Erradicação ao Trabalho Infantil


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O trabalho infantil é um dos marcadores com intensos desafios para atuação na Proteção da
Infância e Adolescência no país. Apesar da redução que o Brasil teve entre os anos de 2016 a
2019, de 2,1 milhões para 1,8 milhão, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PnadC), em 2019, havia 706 mil pessoas de 5 a 17 anos em ocupações classificadas como piores
formas de trabalho infantil, o que corresponde a 45,8% do total de crianças e adolescentes tra-
balhadores. O maior percentual, 65,1%, está na faixa etária de 5 a 13 anos de idade.
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Segundo a PnadC (2019) as atividades agrícolas concentram 20,6% do total de trabalhadores


infantis em 2019. Embora não seja o setor com maior número de crianças e adolescentes ex-
plorados, 41,9% dos meninos e meninas encontravam-se nas piores formas trabalho infantil na
agricultura.

O Brasil tem e adota um arcabouço de legislação e convenções nacionais e internacionais que


prima pela proteção da criança e do adolescente contra o trabalho infantil, a saber: Consti-
tuição da República de 1988; Consolidação das Leis do Trabalho (CLT); Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECA); Declaração Universal dos Direitos da Criança – Organização das
Nações Unidas; Convenção n° 138 da OIT, sobre a idade mínima de admissão ao emprego –
Recomendação nº 146; Convenção nº 182 da OIT, sobre as piores formas de trabalho infantil
- Recomendação nº 190; Decreto n° 6.481/2008 – Lista das piores formas de trabalho infantil;
Decreto nº 5.598/2005 que regulamenta a contratação de aprendizes e outras providências; e
Decreto n° 9.579/2018 que consolida atos normativos sobre a proteção à infância e ao aprendiz.

Assim, identificamos, a partir da concepção do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do


Trabalho Infantil (2021)7, os seguintes avanços no Brasil: definição da idade mínima de 16 anos
para ingresso no mercado de trabalho; ratificação da Convenção 138 da Organização Interna-
cional do Trabalho, que dispõe sobre a idade mínima para o trabalho; definição da proteção
ao adolescente trabalhador e garantia da formação profissional (Lei da Aprendizagem); ratifi-
cação da Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho; aprovação do Decreto nº
6481/2012; elaboração de edições do Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho
Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador; realização de ações eficazes de fiscalização do
trabalho infantil pela Subsecretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério da Economia; rea-
lização de ações eficazes do Ministério Público do Trabalho para o enfrentamento ao trabalho
infantil; incidência política da sociedade civil no Congresso, no Executivo e Judiciário contra os
retrocessos sociais que reduzem direitos e a garantia de proteção às crianças e adolescentes e
controle social das ações e programas governamentais destinados à prevenção e ao enfrenta-
mento do trabalho infantil.

Entretanto, há desafios diversos no Brasil quando nos referimos ao trabalho infantil, que vão
desde a cultura e tradições nas regiões brasileiras que cultivam o reconhecimento
e valorização comunitária da criança nessa condição, até mesmo os trabalhos domésticos
que não são vinculados ao sistema econômico e, portanto, não são alcançados na fiscalização
realizada pelo setor público, dentre outras que envolvem a exploração comercial do corpo, e
6 Conceito de Pobreza de Aprendizagem retirado do Site: https://www.worldbank.org/en/topic/education/brief/
learning-poverty , disponível em: 09 de julho de 2021
7 Avanços definidos pelo Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação ao Trabalho Infantil no site: https://fnpeti.org.
br/avancosedesafios/ consultado dia 10

52
as facções criminosas, com suas estratégias lucrativas de venda de drogas, ascensão rápida e
hierárquica no mundo do crime organizado, num pais extremamente desigual.

A pesquisa O Trabalho Infantil no Brasil: análise dos microdados da PnadC 2019, realizada pelo
FNPETI em 2021, que teve como objetivo contribuir para o aprofundamento do debate sobre
o tema no Brasil, definição e implementação de políticas públicas, programas e ações de en-
frentamento a essa grave violação dos direitos fundamentais de milhões de crianças e adoles-
centes brasileiros, aponta que as experiências bem-sucedidas de combate ao trabalho infantil
resultam de políticas públicas de transferência de renda condicionada à frequência escolar, da
adoção da jornada escolar integral, da garantia do direito ao não trabalho e do apoio e proteção
social às famílias.

Assim, pensamos que as políticas públicas e sociais fortalecem o Sistema de Garantia de Direi-
tos e a rede de proteção de crianças e adolescentes com papel estratégico das ações do PETI
(AEPETI), do Programa Bolsa Família (PBF), das ações de inspeção e fiscalização do trabalho e
da atuação do Ministério Público do Trabalho (MPT) como afirma a Pesquisa do FNPETI (2021).

Diante dos desafios, apresentamos o Gráfico 13 com dados encontrados em consultas no Ob-
servatório de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil que, vinculado aos órgãos oficiais
de pesquisa como IBGE, PNAD Contínua, INEP, Cadastro único dentre outros, nos proporcionou
comparar a situação do Brasil em estados de atuação da Visão Mundial.

Gráfico 14 - Comparativo da situação de Trabalho Infantil


(no Brasil e nos estados de atuação da Visão Mundial)

São Paulo 660 74700

Rio Grande do Norte 1711


7400
Rio de Janeiro 364
27000
3435
Pernambuco 23700
Ceará 787
74700
5836
Bahia
39700
Amazonas 1725
14400
Alagoas 1622
9600
Brasil 34200
479900
0 200.000 400.000 600.000

Nº de Famílias em situação de Trabalho Infantil


(Cadastro Único 2019)
Nº de alunos da 5º e do 9º ano de Escolas públicas
que trabalha de Casa (INEP/Prova Brasil 2017)

Fonte: Dados coletados do Observatório de Prevenção e Erradicação ao Trabalho Infantil

O Gráfico 14 nos revela que há 34.200 famílias acompanhadas pelo Governo Brasileiro, com
crianças abordadas na situação de Trabalho Infantil, a partir do Cadastro Único. A Bahia (5.836)
é o estado que mais o governo cadastrou famílias na situação de crianças no trabalho infantil,
seguida do Amazonas (1725) e Rio Grande do Norte (1711).

Entretanto, na pesquisa realizada pelo INEP, a partir da declaração de alunos da escola pú-
blica do 5º e do 9ª ano, o estado de São Paulo é apresentado como o que mais necessita uma
intervenção, uma vez que são 74.700 casos de alunos que trabalham fora de casa, seguido por

53
Bahia (39.700), Rio de Janeiro (27.000) e Pernambuco (23.700). Segundo o Fórum de Prevenção e
Erradicação do Trabalho Infantil (2021), os efeitos desse fenômeno deixam marcas físicas, psi-
cológicas e educacionais para a vida adulta. Por isso, entende que o Estado e Rede de Proteção
devam atuar com urgência no cumprimento efetivo da legislação de proibição do trabalho in-
fantil; no direito à formação profissional do adolescente; na adoção de novas ações e progra-
mas governamentais e da sociedade civil, priorizando recortes de faixa etária, gênero, cor, local
de residência, renda familiar e escolaridade de crianças e adolescentes.

Outro desafio é o investimento em políticas públicas de proteção, promoção e garantia dos


direitos da infância; o comprometimento do Sistema de Garantia de Direitos com o enfren-
tamento ao trabalho infantil; a adoção de medidas eficazes para o cumprimento da meta 8.7
dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) de eliminar todas as formas de trabalho
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infantil até 2025; e a sensibilização e comprometimento de governos, trabalhadores, em-


pregadores, sistema de justiça, organizações da sociedade civil, organismos internacionais e
parceiros estratégicos para a eliminação de todas as formas de trabalho infantil até 20258.

Segundo o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação ao Trabalho Infantil – FNPETI, o cum-


primento da meta torna-se ainda mais improvável devido ao agravamento da crise socioeco-
nômica no contexto da pandemia, pela desestruturação de políticas públicas de prevenção e
erradicação do trabalho infantil, pela ausência de apoio às famílias em situação de vulnerabili-
dade e também pela redução de recursos financeiros para as ações de fiscalização do trabalho
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por parte do Governo Federal. O agravamento da situação atual será captado pelas pesquisas
de 2020 e 2021.

Pensando numa tendência no aumento do trabalho infantil no Brasil devido à pandemia, o UNI-
CEF(2021)9 e a OIT, para reverter, em nível global, recomendam: proteção social adequada para
todos, incluindo benefícios universais para crianças e adolescentes; aumento dos gastos com
educação de qualidade e retorno de todas as crianças e adolescentes à escola, incluindo quem
estava fora da escola antes da pandemia; promoção de trabalho decente para adultos, para que
as famílias não tenham que recorrer às crianças e aos adolescentes para ajudar a gerar renda
familiar; o fim das normas prejudiciais de gênero e da discriminação que influenciam o traba-
lho infantil; investimento em sistemas de proteção infantil, desenvolvimento agrícola, serviços
públicos rurais, infraestrutura e meios de subsistência.

8 Avanços e Desafios do Trabalho Infantil no Brasil, consultado no dia 18 de junho de 2021. Disponível: https://fnpeti.
org.br/avancosedesafios/

9 Recomendações para reduzir o aumento do Trabalho Infantil no Brasil: https://www.unicef.org/brazil/comunica-


dos-de-imprensa/trabalho-infantil-aumenta-pela-primeira-vez-em-duas-decadas-e-atinge-um-total-de-160-mil-
hoes-de-criancas-e-adolescentes-no-mundo , consultado em 09 de julho de 2021

54
3.5. Enfrentamento à letalidade infantojuvenil
O Brasil, desde meados dos anos 80, tem sofrido com o crescimento da violência juvenil e en-
volvimento de crianças e adolescentes no uso e no tráfico de drogas. Crianças-soldados são
preparadas, inicialmente como olheiros, e de forma hierárquica, ritualizados com “batismos”
e fidelidade às facções criminosas que apresentam o narcotráfico como uma “carreira” a ser
percorrida.

O envolvimento desses meninos e meninas com o uso e vendas de drogas tem gerado conse-
quências e efeitos graves na sociedade, dentre eles conflitos com a lei e, consequentemente,
quando apreendidos, os adolescentes respondem à justiça; embates com a polícia, ocasionando
inclusive chacinas e, portanto, uma curta trajetória de vida, devido à letalidade infanto-juvenil.

Numa estatística realizada pela FLACSO (2015) com 85 países, o Brasil ocupou o terceiro lugar
na lista de nações com as maiores taxas de homicídios de adolescentes de 15 a 19 anos. Com o
índice de 54,9 homicídios para cada 100 mil pessoas nessa faixa etária, o país é superado apenas
por México e El Salvador.

Diversos estudos têm evidenciado o crescimento expressivo da violência letal de adolescentes


e jovens, especialmente os do gênero masculino, negros e com baixa escolaridade (Ministério
dos Direitos Humanos, 2018). Entretanto, o envolvimento de meninas em conflito com a lei,
inclusive com homicídios, também tem crescido.

O crescente número de homicídios de adolescentes e jovens no Brasil tem evidenciado


que as nossas atuais intervenções precisam ser repensadas, sejam das políticas públicas ou
provenientes da sociedade civil, uma vez que, além da dependência química, a rentabilidade e
as estratégias de agregação ao tráfico de drogas estão sendo mais poderosas que a nossa pro-
teção aos mesmos.

O Gráfico a seguir aponta a situação dos Homicídios em Geral em comparação com a Letali-
dade Juvenil por estado de atuação da Visão Mundial.

Gráfico 15 - Homicídios Geral x Letalidade Juvenil - Por Estado

8.000
7.000 6.787
6.455
6.000
4.900
5.000
4.141 4.190
4.000 3.724 3.727

3.000 2.812
2.269
1.825
2.000 1.441 1.542 1.461
843 859 1.067
1.000
0
te

ulo
as

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s

co
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G
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Nº de Homicidios Geral Nº de Letalidade Juvenil (15 a 29 anos)

Fonte: Dados Coletados do Atlas da Violência (2020)

55
Conforme dados coletados no Atlas da Violência (2020) expostos no gráfico acima, dos esta-
dos de atuação da Visão Mundial no Brasil, a Bahia lidera o ranking no que tange às mortes
de adolescentes e jovens com 4.141 casos. Depois, seguem Rio de Janeiro (3.724), Ceará (2.812),
Pernambuco (2.269) e São Paulo (1461).

O alto índice de mortes violentas contra adolescentes e jovens geralmente são ocasionadas por
dívida de drogas, pela polícia, por extermínio de milícias, por conflitos pessoais e/ou territo-
riais envolvendo a venda das drogas (Atlas da Violência, 2019). Estas evidências nos indicam a
necessidade de uma intervenção intersetorial que preveja uma prevenção eficaz, promoção de
políticas sociais e públicas até o controle e repressão do tráfico de drogas.

Segundo os estudos apontados no relatório Cada Vida Importa (2019), uma pesquisa realizada
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

pelo Comitê Cearense pela Prevenção aos Homicídios de Adolescentes afirma que as políticas
sociais e públicas que envolvem a educação, a geração de trabalho e renda, esporte, cultura e
lazer, o acesso a equipamentos de saúde e de assistência social ainda são as principais alterna-
tivas de enfrentamento a essa questão social.

Outras recomendações são feitas por esse Comitê Cearense ao Estado (2019), que são perti-
nentes ao enfrentamento a essa questão: força-tarefa para revisão de dados; integração e ar-
ticulação interinstitucional; conexão digital; autonomia e fortalecimento da atividade pericial;
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

fortalecimento do sistema de investigação; proteção a vítimas e testemunhas; responsabili-


zação dos autores de homicídio; aperfeiçoamento dos dados sobre óbitos; formação e treina-
mento de profissionais; transparência das informações criminais e, por fim, centralização de
informações.

56
A Estrutura do
Sistema de
Proteção
à Criança no País

57
4.1 Marco Legal
No Brasil, o Sistema de Proteção da Infância e Adolescência é resultado de um lento pro-
cesso de reconhecimento no que tange à proteção integral de meninos e meninas. A for-
mação sociopolítica brasileira para esse segmento é marcada, desde o período colonial, de
prática assistencial voltada para crianças em situação de pobreza e se pautava no trabalho,
objetivando a proteção da sociedade e não da infância (Merlim, 2012).

Desde o período colonial até o republicano, o predomínio de ações e legislações eram vol-
tadas para crianças abandonadas ou aquelas que cometiam delitos, reforçando a imagem
da criminalização da pobreza. Exemplo disso foi o Código de Menores de 1927, que apenas
reforçava as práticas anteriores. (Merlim, 2012).
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

Foi a partir da Constituição Federal de 1988 que as crianças e os adolescentes recebem a


garantia, por lei, da prioridade absoluta nas políticas públicas e nos investimentos orça-
mentários, gerando uma abertura para debate social e, nos anos 90, com o Estatuto da Cri-
ança e do Adolescente (ECA), passam a ser reconhecidos por lei como sujeitos de direitos,
tendo como foco a Doutrina de Proteção Integral. Esta última legislação também explicita
os mecanismos de participação popular e fiscalização das políticas públicas de atendimen-
to a essa população (Farinelli e Pierini, 2016).
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

Na luta pela proteção integral da infância e adolescência no Brasil “a tríade Família-Socie-


dade-Estado não deve atuar isoladamente, mas de forma coletiva e complementar, visto
consistir em sujeitos de fiscalização e controle civil e estatal” (Farinelli e Pierini, 2016, p.64).

Desde o ECA, então, a luta pelos direitos das crianças e dos adolescentes do Brasil se faz
na constituição do Sistema de Garantia de Direitos – SGD (conjunto articulado de ações e
políticas sociais básicas, de assistência social, proteção especial e de garantias) e da Rede
de Proteção da Infância e da Adolescência.

Apesar da garantia de Proteção da Infância e Adolescência em lei, o Estado brasileiro ainda


tem muito a avançar para que os direitos das crianças e adolescentes se tornem efetivos e
reais, inclusive que o reconhecimento desses direitos se torne cultura tanto nos trâmites
e estruturas administrativas estatais quanto no cotidiano das famílias em sociedade.

Pelos achados, pode-se inferir que há diversos fatores que influenciam a sociedade (seja
desconhecimento dos direitos e/ou descumprimento de deveres) e o Estado - que apesar
de saber de sua obrigatoriedade – não consegue atingir o número de demanda existente,
bem como ainda lidam com incógnitas que perpassam entre a letra da lei e a sua aplica-
bilidade, além das causas estruturais brasileiras decorrentes das desigualdades sociais.
No levantamento dos marcos normativos, segundo o Relatório do Ministério de Direitos
Humanos (2018), o Brasil ratificou os seguintes Instrumentos Internacionais de Proteção
à Infância:

• Convenção sobre os Direitos da Criança – 1989

• Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança relativo à Venda de Cri-


anças, Prostituição e Pornografia Infantis – 2000

• Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança relativo ao Envolvimento


de Crianças em Conflitos Armados – 2000

• Convenção Interamericana sobre Tráfico Internacional de Menores – 1994

• Convenção sobre a Idade Mínima para Admissão em Emprego (Convenção nº 138 – OIT)
– 1973

58
• Convenção sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e a Ação Imediata
para a sua Eliminação (Convenção NO 182 – OIT) – 1999

• Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional – 2000

• Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transna-
cional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mul-
heres e Crianças - Protocolo de Palermo – 2000

• Convenção relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em matéria de Adoção Interna-


cional – 1993

• Convenção sobre a Jurisdição, Lei Aplicável, Reconhecimento, Execução e Cooperação em


Matéria de Responsabilidade Parental e Medidas de Proteção de Crianças – 1996

• Convenção sobre os aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças – 1980

• Convenção Suplementar sobre Abolição da Escravatura, do Tráfico de Escravos e das Institu-


ições e Práticas Análogas e agrave; Escravatura - 1956

• Convenção sobre a Escravatura e emenda pelo protocolo aberto à assinatura ou à aceitação


na sede da Organização das Nações Unidas - 1953

• Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher


Convenção de Belém do Pará – 1994.

• Convenção Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher – 1979

• Convenção Internacional relativa à repressão do tráfico de mulheres – 1933

• Relatório da Conferência Internacional sobre população


e Desenvolvimento - Plataforma de Cairo – 1994

• Convenção para a Supressão do Tráfico de Pessoas e da Exploração da Prostituição de


Outrem – 1950

No que tange às leis relevantes que, de alguma forma, regulam a proteção da infância e adoles-
cência no Brasil e responsabiliza os autores de violência contra esse segmento da sociedade,
destacamos a Constituição, Leis e Códigos Nacionais:

• Constituição Federal – 1988


• Estatuto da Criança e do Adolescente – 1990
• Código Civil – 2002
• Código de Processo Civil – 1973
• Código Penal – 1940
• Código de Processo Penal – 1941

Quanto aos Planos e Políticas que expressam a proteção da Infância e o alinhamento às normas
internacionais e regionais até os anos 2011, apresentamos:

• Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Infantojuvenil – 2000

• Plano Decenal dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes – 2011

• Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas – 2008

• Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas – 2006

59
• Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças
e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária – 2006

• Plano Nacional dos Direitos Humanos 3 - PNDH 3 – 2009

• Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente


Trabalhador – 2011

• Lei no 12.435/2011, que dispõe sobre a organização da Assistência Social –2011

Importa ressaltar a existência de algumas normas do Poder Executivo Federal ao que tange à
Proteção da Infância, especialmente à violência, ao abuso, ao abandono e à exploração de cri-
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anças e adolescentes no país:

• Norma Técnica - Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da Violência Sexual contra
Mulheres e Adolescentes – 2012. 16

• Portaria Interministerial no 02/2006 - GTI para elaboração do Plano de Atenção e Proteção


Integral às crianças, aos adolescentes - 2006

• Portaria nº 458/2001 - Estabelece Diretrizes e Normas do Programa de Erradicação do Tra-


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balho Infantil – PETI – 2001

• Portaria MS nº 2.048/2009 - Aprova o Regulamento do SUS – 2009

• Portaria MS nº 2.230/2009 – Aplicação da portaria que aprovou a regulamentação do SUS

• Portaria MS nº 04/2011 - Define terminologias adotadas no Regulamento Sanitário Interna-


cional, a relação de doenças, agravos e eventos em saúde pública de notificação compulsória
– 2011

• Resolução CIT nº 04/2011 - Parâmetros nacionais para o registro das informações no CRAS e
CREAS – 2011

• Resolução CIT nº 07/2011 - Prazo e procedimentos para criação de CRAS e CREAS – 2011

No Brasil, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA, apre-


senta resoluções que orientam os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, bem como a
Sociedade Civil a reconhecerem os direitos da infância e adolescência. Assim, destacamos as
principais até 2011:

• Resolução nº 105, de 2005


• Resolução nº 113, de 2006
• Resolução nº 117, de 2006
• Resolução nº 139, de 2010
• Resolução nº 141, de 2010
• Resolução nº 144, de 2011
• Resolução nº 148, de 2011

A partir de 2012, novas legislações e planos foram instituídos na nação brasileira e em alguns
estados (unidades federativas) para assegurar a proteção de meninos e meninas no que tange
ao atendimento a adolescentes nas medidas socioeducativas; violações de direitos (violência
doméstica, sexual, física); matrimônio infantil; gravidez na adolescência; faltas escolares; pes-
soas desaparecidas; prevenção a homicídios; prevenção e proteção às violências nas escolas, a
saber:

60
Lei nº 12.594, 18 de janeiro de 2012, que institui o Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo – SINASE

Lei nº 13.010, 26 de junho de 2014, conhecida como Lei Menino Bernardo, contra os maus
tratos

Lei nº 13.257, 08 de março de 2016, conhecida como Lei da Primeira Infância

Lei nº 13.431, 04 de abril de 2017, conhecida como Lei da Escuta Especializada, que institui
ouvidorias, disque denúncias e comitês em proteção da infância nos órgãos públicos

Lei nº 13.798, 03 de janeiro de 2019, conhecida como Lei da Semana Nacional de Prevenção
da Gravidez na Adolescência

Lei nº 13.803, 10 de junho de 2019, conhecida como Lei da Notificação de Faltas Escolares
ao Conselho Tutelar

Lei nº 13.811, 12 de março de 2019, conhecida como Lei de Proibição do Casamento antes
dos 16 anos

Lei nº 13.812, 16 de março de 2019, conhecida como Lei do Cadastro Nacional da Pessoa
Desaparecida

Lei nº 10.151, 21 de julho de 2020, uma Lei municipal de São José dos Campos, no estado
de São Paulo, que trata da criação de Comitês nas Escolas para prevenção e proteção da
infância e adolescência

Lei nº 17.253, 29 de julho de 2020, uma Lei Estadual do Ceará que trata da criação de
Comitês nas Escolas para prevenção e proteção da infância e adolescência

Lei nº 9.116, 30 de novembro de 2020, uma Lei Estadual do Rio de Janeiro que trata
da criação de Comitês nas Escolas para prevenção e proteção da infância e adolescência

Plano Decenal de Direitos Humanos da Criança e do Adolescente no Brasil 2011-2020

Plano de Prevenção aos Homicídios nos estados

Vale ressaltar que as Legislações Lei nº 13.010, 26 de junho de 2014 (Lei Menino Bernardo), Lei nº
10.151, 21 de julho de 2020 (São José dos Campos), Lei nº 17.253, 29 de julho de 2020 (Ceará) e Lei
nº 9.116, 30 de novembro de 2020 (Rio de Janeiro) foram conquistas diretas da Visão Mundial no
Brasil, com a participação de seus profissionais nos Conselhos de Direito municipais, estaduais
e nacional, e mobilização social junto à sociedade civil.

Relativo aos Planos que previnem os homicídios, é necessário relatar que antes mesmo no Pla-
no Nacional de Segurança Pública e Defesa Social instituído no Brasil em 2018, com o objetivo
de reduzir as diversas formas de violência, inclusive aos crescentes números de homicídios
letais e o narcotráfico, iniciativas voltadas para a prevenção de mortes violentas contra jovens
no âmbito nacional já existia o Plano de Prevenção à Violência contra a Juventude Negra no ano
de 2012.

Os movimentos sociais, principalmente os que lutam pela causa da infância e da juventude,


fizeram o controle social junto ao Estado para efetivar o compromisso com a Organização das
Nações Unidas e, portanto, cumprir agendas públicas. Tal pressão social fez surgir os Comitês
de Prevenção de Homicídios aos adolescentes pela via legislativa nas instâncias estaduais.
Esses comitês têm contribuído no engajamento político e social em torno da agenda de
prevenção à letalidade infanto-juvenil, fortalecendo as relações do Sistema de Garantia de
Direitos e da Rede de Proteção da Infância, Adolescência e Juventude no país.

61
No que diz respeito aos Planos de Prevenção aos Homicídios, destacamos que alguns estados
de atuação da Visão Mundial já possuem o Plano e/ou Programa de Prevenção a Homicídios
e/ou Comitês, a saber: Ceará, Bahia, Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do
Norte. No estado do Amazonas, devido à sua extensão e especificidade, encontramos o Plano de
Prevenção a Conflitos Agrários.

A respeito do último Plano Decenal de Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes, no


âmbito nacional brasileiro, foi o de 2011-2020. Este Plano foi desenvolvido a partir da con-
tribuição de vários setores da sociedade, de forma transversal e, portanto, a partir de todo
o arcabouço legal que embasa a política brasileira de promoção, proteção e defesa dos Di-
reitos Humanos de crianças e adolescentes, especialmente, em condições de vulnerabilidade
(Ministério de Direitos Humanos, 2018).
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Durante este diagnóstico foi identificado um relatório de âmbito nacional realizado pelo
Ministério de Direitos Humanos e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD
Brasil) apresentando as Ações de Proteção a Crianças e Adolescentes contra violências: levan-
tamentos nas áreas de saúde, assistência social, turismo e direitos humanos, no ano de 2018.

Alguns estados e municípios do país fazem consultas públicas a respeito de sua atuação na
Proteção da Infância e poucos mantém a prática de avaliações sobre suas ações, o que pode
ser uma lacuna tanto para governo quanto para a sociedade civil que controla socialmente o
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

orçamento público e, consequentemente, a prioridade absoluta no atendimento e proteção às


crianças e adolescentes no país.

4.2. Sistema de Garantia de Direitos no Brasil: eixos e


atribuições
O Sistema de Garantia de Direitos no Brasil é um sistema estratégico, de atendimento e de
efetivação integral dos direitos das crianças e adolescentes, que articula ações com outros
sistemas (de saúde, assistência social, educação, trabalho, segurança pública, planejamento,
orçamentária, relações exteriores e promoção da igualdade e valorização da diversidade) os
quais viabilizam a prioridade do atendimento à infância em qualquer situação e de forma in-
tersetorial, interinstitucional, intersecretarial e até intermunicipal.

Com os seus três eixos estruturantes – promoção, defesa e controle – o Sistema de Garantia de
Direitos tem a finalidade de mobilizar e construir uma nova cultura na sociedade e nas insti-
tuições cujas crianças e adolescentes sejam percebidos e atendidos como sujeitos de direitos.
Assim, os órgãos do governo, quanto os de controle social em que têm representação da so-
ciedade civil, aplicarão instrumentos normativos para o funcionamento dessas finalidades na
efetivação dos Direitos Humanos, nos níveis federal, estadual e municipal.

A Promoção dos direitos deve ser realizada tanto pelos órgãos públicos, quanto pelos repre-
sentantes da sociedade civil e pessoas da comunidade, promovendo e efetivando os direitos da
população infanto-juvenil através da elaboração e implementação da política de atendimento
(Farinelli e Pierini, 2016). A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente
refere-se a serviços e programas das políticas públicas, especialmente das políticas sociais,
afetos aos fins da política de atendimento dos direitos humanos de crianças e adolescentes;
serviços e programas de execução de medidas de proteção de direitos humanos e os serviços e
programas de execução de medidas socioeducativas e assemelhadas (Paiva, 2020).

Relativo ao Controle da efetivação dos direitos, esse é o espaço específico “para o acompanha-
mento, avaliação e monitoramento dos mecanismos de promoção e defesa dos direitos, con-
sistindo, portanto, em espaço de vigilância que será exercido prioritariamente pela sociedade
civil organizada, por organismos institucionais e mistos, como o Conselho de Direitos”
(Farinelli e Pierini, 2016, p.65).

Ainda que exista o jogo de interesses e poderes nos espaços de participação, o controle social

62
é exercido soberanamente pela sociedade civil, através das suas organizações e articulações
representativas. Nessa finalidade é essencial o papel do Conselho de Direitos da Criança e do
Adolescente que acompanha as instituições públicas e da sociedade civil, bem como delibera
políticas prioritárias e deve ficar “de olho” no orçamento público destinado às crianças e ado-
lescentes em cada instância de atuação nacional, estadual e municipal.

No que tange à Defesa, atuam os órgãos públicos judiciais, especialmente as Varas da Infância e
da Juventude e suas equipes multiprofissionais, as Varas Criminais especializadas, os Tribunais
do Júri, as comissões judiciais de adoção, os Tribunais de Justiça, as Corregedorias Gerais de
Justiça, Polícia Civil, Polícia Técnica, Polícia Militar, Centros de Defesa da Criança e do Adoles-
cente, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Ministério Público (UNICEF, 2021).

No Plano Decenal dos Direitos Humanos da Criança e do Adolescente (2011-2020) aparecem


dois novos eixos: Participação de Crianças e Adolescentes e Gestão da Política. O Eixo da Par-
ticipação se destaca ainda por sua transversalidade e conectividade, ou seja, as crianças e os
adolescentes devem ser ouvidos nas ações de promoção, proteção e defesa dos seus direitos
que fazem parte dos eixos iniciais, mas também na formulação e implementação da Política,
constituintes dos eixo-meios subsequentes.

No que tange ao eixo da Gestão da Política, este visa a garantia das condições necessárias para
que os direitos das crianças e adolescentes sejam respeitados, bem como o fortalecimento das
instâncias do Sistema de Garantia dos Direitos, das estruturas de coordenação da política nas
três esferas de governo e do financiamento da Política são reafirmadas como condições funda-
mentais para se alcançar os fins propostos.

Quando pensamos sobre as Competências e Atribuições do Sistema de Garantia de Direitos


para meninos e meninas no Brasil, entendemos que se concentra em torno de promover, de-
fender e controlar a efetivação dos direitos (civis, políticos, econômicos, sociais, culturais, co-
letivos e difusos) em sua integralidade; garantir que esses direitos e que essa população se
sinta sujeito de direitos, e que seu processo de desenvolvimento seja reconhecido e respeitado;
salvar as crianças e adolescentes de ameaças e violações de qualquer um de seus direitos e, por
fim, garantir a apuração, o reparo dessas ameaças e violações (CONANDA, 2006).

Assim, definidos em Lei, cada órgão que compõem os eixos estruturantes e estratégicos de
ação do Sistema de Garantia de Direitos (Promoção, Defesa e Controle) terá suas atribuições
específicas nesse processo, de modo que culmina numa proposta integral de direito às crianças
e adolescentes e integrada entre setores, desenvolvendo a partir das relações de articulação
e responsabilidades de cada representante institucional, família e sociedade a constituição e
funcionamento da Rede de Proteção.

4.3. Rede de Proteção da Infância e Adolescência


no Brasil
No Brasil, a legislação inclui a Sociedade Civil como um dos responsáveis pela proteção da
infância e adolescência, inclusive responsabilizando-a em caso de negligência ou omissão de
qualquer violação de direitos contra esse segmento e, principalmente, quando organizada,
pode ser interpretada como parte do Sistema de Proteção e Garantia de Direitos. Entretanto,
alguns teóricos e militantes desta causa sustentam a tese de que apesar da sociedade se rela-
cionar e interagir com o Sistema de Garantia de Direitos, pela sua relação voluntária, pode ser
compreendida como Rede de Proteção da Infância, de forma complementar a uma obrigação
estatal. Pois nessa teoria, Sistemas são diferentes de Redes.

Baseado nessa tese, Paiva (2020) aponta que Sistema pressupõe a uma ação e/ou atuação con-
junta e coordenada entre segmentos ou instituições decorrentes de uma obrigação legal e, por
Rede, apenas uma adesão, de caráter voluntário, que se consolida na formulação de um pacto, a
ser firmado por pessoas e/ou instituições para uma ação de interesse comum. Nesse sentido,
cabe destacar que no Brasil há uma articulação definida em lei entre o Sistema de Garantia de
Direitos e a Rede de Proteção, com a compreensão de que o Estado (e seus órgãos) tem a obri-

63
gatoriedade de assegurar a garantia e efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes
no país e que a Rede de Proteção (de caráter complementar) constituída pelas organizações da
sociedade civil organizada (formal) ou não (informal) contribui para a promoção de ações, mas
também enquanto instituição participativa, representativa e como mecanismo de tensões para
que o Estado cumpra seu papel social de cuidados com a infância e adolescência no Brasil.

Desse modo, a Visão Mundial considera como uma ação e atuação conjunta, coordenada entre
diversos segmentos e instituições, decorrentes de uma obrigação legal. Observando, portan-
to, leis, regulamentos, políticas, mandatos, processos e serviços prestados pelo governo; bem
como crenças, atitudes e vínculos comuns com mecanismos tradicionais e não formais de pro-
teção à criança (Visão Mundial, 2020).
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

64
Diagnóstico e
Análise no Nível
Comunitário

65
O Diagnóstico no Nível Comunitário teve o propósito de conhecer a realidade dos municí-
pios de atuação da Visão Mundial nos estados brasileiros, para a análise e compreensão das
questões prioritárias que afetam a infância e adolescência, as causas fundantes, se essas co-
munidades conhecem as leis, políticas, serviços prestados, e a quem recorrem como rede de
apoio, bem como os avanços e brechas do Sistema e Rede de Proteção, a partir de uma escuta
comunitária junto aos grupos mais vulnerabilizados (crianças, adolescentes e adultos), bem
como os atores sociais que desenvolvem ações para proteção dos meninos e meninas em cada
território pesquisado. A pesquisa no Nível Comunitário demandou um processo que merece
ser mencionado.

Processo de Implementação da Pesquisa


Local (comunitária)
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A Pesquisa Local (comunitária) aconteceu em oito cidades brasileiras, cada uma pertencente
a um estado, a saber: Recife (PE), Fortaleza (CE), Governador Dix-Sept Rosado (RN), Inhapi
(Alagoas), Manaus (AM), Nova Iguaçu (RJ), Salvador (BA) e São Paulo (SP). Como já afirmamos, a
escolha dos municípios tem a ver com a intervenção direta da Visão Mundial por Programas de
Áreas e/ou Projetos Especiais em territórios que apresentam intensas vulnerabilidades sociais.
Lembramos que no item da Metodologia (1.1) já descrevemos os critérios de escolha dos par-
ticipantes no que tange aos meninos, meninas e adultos (mulheres e homens) e atores sociais
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

(vide Quadro 1 - p.9).

Nesse momento, focamos no processo de implementação da pesquisa nos diferentes contextos:


divulgação da pesquisa, mobilização e sensibilização da população pesquisada, planejamento
das oficinas e estratégias/adaptações durante a aplicação das oficinas, grupos focais e entre-
vistas, ferramenta utilizada para a transcrição dos dados, catalogação e análise do conteúdo.

A respeito dos contextos, algumas das cidades escolhidas são de áreas urbanas/metropolitanas
(Fortaleza, Manaus, Nova Iguaçu, Recife, Salvador, São Paulo) e outras de zonas rurais (Inhapi e
Governador Dix Sept Rosado). Esses contextos foram percebidos no processo de planejamento
da pesquisa, uma vez que, junto com os pesquisadores e assessores da Visão Mundial Brasil de
cada estado foram consultados a viabilidade do uso, de acesso e das condições financeiras das
famílias para que a internet fosse utilizada na aplicação da pesquisa (grupos focais com adultos
e entrevistas com informantes chaves) de modo virtual (remoto). Vale ressaltar que as formas
remotas nas zonas rurais se tornaram inviáveis.

Algumas áreas urbanas como em Salvador, Nova Iguaçu, Recife e Fortaleza, mesmo sendo
metrópoles, devido às baixas condições financeiras das famílias, os constantes furtos de cabos
telefônicos na cidade e/ou o desconhecimento do uso das tecnologias, foram os principais mo-
tivos dos grupos focais com famílias (adultos) serem presenciais, e não virtuais. Vale ressaltar
que todos(as) os(as) pesquisadores(as) foram preparados(as) para a aplicação da pesquisa de
forma virtual e presencial.

Para a divulgação da pesquisa, tivemos dois caminhos: mobilização das comunidades e outro
para órgãos/instituições sociais. Para os órgãos, primeiramente mapeamos e identificamos,
dentro e/ou próximo ao território de aplicação da pesquisa, as delegacias, Conselho Tutelar,
CRAS e/ou CREAS, postos de saúde, movimentos e redes de atuação com crianças e adoles-
centes, instituições da sociedade civil, igrejas e espaços religiosos, diretores de escola, Juizado
da Infância e/ou promotoria, bem como vereadores e/ou deputados que atendem os territórios
escolhidos. Logo após, contatamos por telefone os possíveis representantes daquele órgão e
enviamos ofícios apresentando a Pesquisa, seus objetivos e o Termo de Consentimento Livre,
Voluntário e Esclarecido por e-mail institucional. Diante da disponibilidade, agendamos en-
trevistas de acordo com o interesse do informante-chave, se presencial e/ou virtual, devido à
pandemia. Para os comunitários, as estratégias de mobilização e sensibilização foram: convites
entregues em domicílio, e/ou pelo WhatsApp. Escolas e associações também foram visitadas
para sensibilização da direção escolar como apoio na mobilização de crianças, adolescentes e
famílias e cessão de espaço físico para a aplicação da pesquisa, quando presencial.

66
Em todos os estados, tivemos dificuldades de mobilizar os adultos (homens), sendo necessária
a estratégia de sensibilização dos espaços religiosos nos territórios vulneráveis, onde havia
grupos formados, os quais facilitaram nesse processo de adesão à pesquisa. Devido à pandemia,
e como forma de atrair participação masculina, utilizamos em alguns estados a estratégia de
distribuição de kits de higienização e/ou cestas básicas.

As oficinas e grupos focais presenciais foram organizadas pela equipe de pesquisadores e edu-
cadores locais. Espaços para a realização da pesquisa foram cedidos por escolas, associações
comunitárias, igrejas (salões paroquiais) e CRAS, os quais estavam com estrutura adequada para
acolher os participantes da pesquisa, dentro dos padrões estabelecidos no período de pande-
mia (sem aglomeração, com distanciamento, higienização, medição de temperatura, dentre
outros). As oficinas com meninos e meninas e os grupos focais com mulheres e homens foram
fotografados. Os grupos focais virtuais e entrevistas presenciais e/ou remotas foram gravadas
e transcritas com o apoio da ferramenta disponibilizada pelo Gmail, com atenção à fidelidade
das vozes e sigilo na identificação dos nomes.

Após o processo de transcrição dos dados primários, iniciamos a organização dos mesmos da
seguinte forma: separação dos dados por grupos etários e por estado para a catalogação de ex-
pressões-chaves de cada um dos sete fatores questionados pela pesquisa: como proteger cri-
anças e adolescentes, quais as questões prioritárias e as causas, se conhecem as leis, políticas
e protocolos, se tem serviços e mecanismos de atendimento em caso de violações de direitos,
quais as redes de apoio para as crianças, quais os círculos de cuidados (crenças, valores e
costumes), se as crianças e adolescentes resistem e/ou participam dos processos da sua vida.

Após a catalogação, verificamos as mais citadas expressões-chaves, dando continuidade ao


próximo passo: interpretação dos dados primários. Para isso, buscamos as ligações com os
temas classificados, sendo possível assim a formulação das hipóteses conclusivas sobre os
resultados. O procedimento foi feito de grupo a grupo, pensando nas atividades que foram
realizadas, nos marcadores sociais, nos temas classificados pelos próprios participantes e as
ligações observadas com o que é prescrito na lei e o que efetivamente acontece na realidade.

Vale ressaltar que as hipóteses conclusivas desse momento de coleta de dados primários locais
(comunitárias) passaram por uma análise comparativa com o contexto nacional, sendo validada
no Briefing Comunitário, que foi executado nesse período de pandemia, a partir da realização do
Seminário Nacional, envolvendo os participantes da pesquisa e sociedade civil dos oito estados
brasileiros, totalizando 729 pessoas mobilizadas, de forma virtual, participativa e remota. As-
sim, a pesquisa e seus resultados passaram por um processo de concordância e/ou discordân-
cia quanto às conclusões, assegurando a confiabilidade e a participação comunitária em todo
o processo da Pesquisa.

Sobre Localidades
Antes de adentrarmos às vozes e análises de cada grupo etário abordado em pesquisa primária,
apresentamos um breve panorama das cidades pesquisadas e resultados gerais da pesquisa
local.

Recife (PE)
Recife surgiu como Ribeira de Mar dos Arrecifes dos Navios no ano de 1537. Desde o século XVI,
os arrecifes de arenito que protegem a bacia dos rios Capibaribe, Beberibe e Tejipió fizeram
de Recife o porto natural de escoadouro das riquezas aqui produzidas. Com área territorial de
aproximadamente 218 km², a cidade tem uma população de aproximadamente 1.653.461 habi-
tantes. Em 2019, teve 21.132 nascidos vivos e uma taxa de mortalidade infantil de 11,50%. Cerca
de dois terços do PIB são provenientes de Comércio e Serviços.

A partir da ferramenta ADAPT em Recife (PE), 43 crianças e adolescentes, 28 adultos, 9 atores


sociais foram abordados pela pesquisa de campo, os quais apresentaram as seguintes questões
prioritárias: 1) Conflitos Familiares (incluindo abusos físicos); 2) Conflitos com a lei (contendo
nas falas o uso abusivo e tráfico de drogas); 3) Negligência e Abandono dos familiares para

67
com as crianças; 4) Violências sexuais contra crianças e adolescentes e 5) Extrema pobreza
(destaque no desemprego, ausência de oportunidades e fome). As causas fundantes foram defi-
nidas pelos participantes como: 1) Famílias com vínculos fragilizados apresentados nas vozes
como “ausência de apoio familiar” ou “falta diálogo entre pais e filhos”; 2) Cultura de violência;
3) Pobreza; 4) Pouco investimento público nos serviços que poderiam beneficiar as crianças
(ex.: lazer, esporte, cultura, dentre outros) e 5) Insegurança Pública.

Em pesquisa, Recife apresentou como crenças, valores e tradições de cuidados com a Prote-
ção o cultivo de uma cultura adultocêntrica, com práticas disciplinares para criança por meio
da violência física. A discriminação por classe, etnia e/ou gênero também foi apontada como
costumes que impedem a proteção. As principais brechas que necessitam ser percebidas para
a resiliência dos meninos e meninas são a necessidade de Educação Integral que possibilite
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

habilidades para a vida, e de iniciação profissional, uma garantia de escuta segura e protegida
para as crianças e adolescentes, engajamento em projetos sociais/comunitários e religiosos, e
acompanhamento das organizações formais e informais das crianças com direitos violados até
o final dos processos.

Fortaleza (CE)
Fortaleza foi fundada em 13 de abril de 1726. Mas em 1799, com o declínio da pecuária e devido à
Seca Grande de 1790-1793, tornou-se autônoma e a capital do Ceará, passando a fazer comércio
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direto com Lisboa. É uma cidade litorânea e possui uma extensão territorial de 312.353 km², tem
cerca de 2.686.612 de habitantes, segundo estimativas do IBGE (2020). O PIB (IBGE, 2018) per capita
era de 25.356, 73 reais. Segundo o IBGE (2010) o IDH do Município apresentou 0,754.

As principais atividades que geram o PIB no município são os serviços, seguidos das atividades
de administração pública (defesa, educação, saúde pública e previdência social); indústria e agro-
pecuária. No início da pandemia, segundo o IBGE (2019), a proporção de pessoas ocupadas em
relação à população total era de 31.8%, totalizando 849.116 pessoas. Em 2019, teve 34.957 regis-
tros de nascidos vivos e uma taxa de mortalidade de 13,81% para cada 1000 nascidos vivos.

Em Fortaleza (CE) as questões prioritárias para Proteção da Infância e adolescência apontadas


foram: 1) Conflito com a lei (incluindo o envolvimento com o tráfico de drogas e mortes violen-
tas); 2) Depressão; 3) Extrema Pobreza (incluindo desemprego dos pais e/ou responsáveis, falta
de oportunidade para jovens); 4) Violências sexuais e 5) pandemia da Covid-19.

As causas fundantes comentadas durante a pesquisa foram: 1) Pobreza (incluindo a concepção


de desigualdade social, fome e desemprego); 2) Isolamento social como principal causa do
medo e depressão; 3) Conflitos Familiares (brigas entre membros da família, separação entre
os casais e ausência de diálogos entre pais e filhos); 4) As pessoas precisam de mais Educação e
de valores humanos a serem trabalhados na Família.

No que tange às crenças, valores e tradições as quais podem afetar na proteção da infância e
adolescência, a população pesquisada em Fortaleza afirma que a cultura da violência reprodu-
zida de pai para filhos, o machismo, a valorização do trabalho precoce naturalizando essa atitu-
de pelas necessidades financeiras, e o desconhecimento de direitos são as mais percebidas em
sua realidade. Especialmente no Ceará, a influência da internet e uma cultura de preconceito
devido à classe e etnia foram também citadas.

Quanto à resistência de crianças e adolescentes para sua proteção e as habilidades para a


vida, Fortaleza apresentou como brechas: falta de estímulo à participação efetiva de crianças e
adolescentes nos espaços de decisão, falta de educação integral, mais espaços de lazer, esporte
e cultura para engajamento social, baixa divulgação dos canais de escuta qualificada, necessi-
dade de ampliação dos atendimentos psicossociais para as crianças.

Governador Dix-Sept Rosado (RN)


Governador Dix-Sept Rosado é o terceiro nome dado a mesma cidade reconhecida como mu-

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nicípio em 1948, que surge a partir de um caminho que oferecia acesso ao Rio Mossoró, ainda
no século XVII. Hoje, tem uma população estimada em 13.076 pessoas (IBGE, 2020) com um
território de 1.129,55 km² de bioma Caatinga e na microrregião da Chapada do Apodi. A per
capita do Produto Interno Bruto é de R$ 20.229,67. Nesta cidade, a sua economia vem da in-
dústria, atividades de serviços, administração pública e agropecuária. Há apenas 10,5% das
pessoas ocupadas de acordo com dados do IBGE (2018). Em 2019 nasceram 139 crianças e o
índice de mortalidade infantil ainda é alto, de 28,78%.

Dentre as questões prioritárias ressaltadas na cidade de Governador Dix-Sept Rosado, desta-


camos: 1) Abuso físico e Conflitos familiares; 2) Extrema pobreza; 3) Poucos serviços e acesso a
direitos básicos (moradia, transporte, esporte, lazer); 4) Escolas fechadas e/ou crianças fora da
escola devido à pandemia; 5) Trabalho Infantil e 6) Discriminação e Preconceito.

As causas estruturantes citadas foram: 1) Insegurança pública nas ruas, principalmente devido
ao tráfico de drogas; 2) Ausência de apoio familiar para as crianças; 3) Pobreza e desemprego;
4) Desconhecimento das leis e direitos pela população e 5) Sentimento de Insegurança que
intimida a denúncia.

Relativo à participação das crianças e o que pode influenciar na proteção da infância e ado-
lescência, os participantes de Governador Dix-Sept Rosado afirmam que é necessário um es-
tímulo à participação de meninos e meninas nos espaços comunitários e religiosos, garantir a
divulgação e canais de escuta comunitária protegida para esse segmento social afetado.

Em Governador Dix-Sept Rosado (RN) a cultura da violência, a valorização do trabalho precoce


e a falta de diálogo entre pais e filhos foram os mais comentados a respeito dos costumes, cren-
ças, valores e atitudes dessa região.

Inhapi (AL)
O nome do município do sertão alagoano tem origem tupi e significa buraco na pedra ou água
sobre pedra, expressão utilizada pelos índios quando se referiam aos lajedos que juntavam água
das chuvas nas partes mais baixas na região. A emancipação política de Inhapi se deu através
da Lei 2.460, de 22 de agosto de 1962. Tem uma extensão territorial de 372,020 km² e uma po-
pulação estimada em 18.392 habitantes (IBGE, 2020). Em 2019 foram registrados 309 nascidos
vivos e a taxa de mortalidade Infantil é de 6,47%.

Segundo último senso IBGE (2010), Inhapi tem um Índice de Desenvolvimento Humano
Municipal (IDH-M) de 0.484. O PIB per capita de R$ 6.413,19 (IBGE, 2018) e suas prin-
cipais atividades econômicas são: agricultura familiar, pecuária, comércio e vigilância
patrimonial. Há 784 pessoas ocupadas (4,3%), segundo pesquisa de IBGE (2018).

Em Inhapi (AL), participaram da pesquisa 53 crianças e adolescentes, 48 adultos e 10 atores


chaves do Sistema e Rede de Proteção da Infância e Adolescência, elencando como questões
prioritárias: 1) Conflito com a lei (envolvimento com uso abusivo e tráfico de drogas); 2) Abuso
físico entre membros da família; 3) Violências sexuais; 4) Trabalho infantil e 5) Crianças e ado-
lescentes em situação de rua. As causas identificadas pelas pessoas pesquisadas foram: 1) Inse-
gurança pública e tráfico de drogas; 2) Pouco investimento público para serviços de assistência
às famílias; 3) Pobreza e desemprego; 4) Machismo; 5) Desconhecimento e/ou desinformação
sobre educação sexual e 6) Espiritualidade, ou o que chamam de “falta Deus na vida das pes-
soas”.

Dentre as crenças, valores e atitudes que podem afetar na proteção de meninos e meninas,
ressaltamos os mais enfatizados: machismo, cultura que promove sexualidade desde cedo, fal-
ta de diálogo nas famílias e valorização do Trabalho Precoce. No que tange à participação das
crianças, os pesquisados responderam: há a necessidade de garantir canais de escuta segura e
protegida, estímulo à participação em espaços sociais e decisórios, e assegurar a formação de
lideranças e/ou no conhecimento dos direitos para adquirirem a resistência.

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Manaus (AM)
Manaus foi criada no século XVII, localizada à margem esquerda do Rio Negro, teve início com
a construção do Forte da Barra de São José em 1669, data que foi convencionada a usar como
o nascimento da cidade. A partir de 1870, Manaus viveu o surto da economia, encerrando-se
em 1913, em virtude da perda do mercado mundial para a borracha asiática, fazendo com que a
cidade retornasse a um novo período de isolamento até o advento da Zona Franca de Manaus,
em 1970.

A cidade de Manaus possui uma área territorial de 11.401,092 km² e tem uma população estima-
da pelo IBGE (2020) de 2.219.580 habitantes. Segundo o IBGE, em 2019, o município teve 37.939
novos nascidos vivos e a taxa de mortalidade infantil é de 13,81%. Neste mesmo ano, o salário
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médio mensal era de 3.1 salários-mínimos. A proporção de pessoas ocupadas em relação à po-
pulação total era de 23.7%, totalizando 518.306 pessoas trabalhando. As principais atividades
são: serviços, indústria, administração pública (defesa, educação, saúde, previdência social) e
agropecuária.

Na pesquisa realizada em Manaus com a participação de 56 crianças e adolescentes, 20 adultos


e 14 Atores sociais, identificamos como questões prioritárias: 1) Insegurança Pública; 2) Pouco
serviços públicos e/ou baixo acesso a serviços básicos (infraestrutura, moradia, lazer, esporte,
saúde); 3) Exclusão escolar, incluindo desde a qualidade de ensino, da merenda escolar, ou
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estruturais (falta espaço de lazer, segurança, dentre outros); 4) Extrema Pobreza (desemprego,
fome) e 5) Violência sexual.

As causas estruturantes constatadas em pesquisa foram: 1) Pouca segurança pública (falta po-
lícia nas ruas, muitos assaltos, tráfico de drogas); 2) Baixo investimento nos serviços e políticas
públicas (incluíram a corrupção dos governantes como foco causal); 3) Pobreza e desemprego;
4) Conflitos familiares (a ausência de diálogo entre membros das famílias foi mais ressaltada)
e 5) Desconhecimento sobre as leis que protegem as crianças e adolescentes, bem como a au-
sência de valores humanos que não são cultivados, justificando assim os efeitos evidenciados
nas questões prioritárias.

As pessoas pesquisadas na cidade de Manaus percebem sua cidade com uma forte cultura de
violência, presença do machismo, desrespeitos para com as crianças e a reprodução de uma
sexualidade precoce, principalmente das meninas, evidenciado pela expressão: “aqui as jovens
têm filhos muito cedo”.

Quanto à participação de crianças em seu processos de habilidades para a vida, Manaus revela
que há necessidade de investimento na educação, com mais espaços de lazer, esporte e de ini-
ciação profissional principalmente para adolescentes; as famílias necessitam serem orientadas
quanto aos valores humanos, respeito, confiança e autonomia para as crianças, bem como na
prevenção da violência doméstica, a opinião das crianças devem ser levadas em consideração,
formação para lideranças a respeito dos direitos para proteção do segmento social em questão.

Nova Iguaçu (RJ)


Em 1858, com a inauguração da Estrada de Ferro Dom Pedro II, a denominada Maxambomba se
tornou um novo centro econômico. Em 1916, Maxambomba passa a se chamar Nova Iguaçu. No
século XX, a principal atividade do município passa a ser o plantio de laranjas. Nova Iguaçu fi-
cou conhecida como “Cidade Perfume” por causa do cheiro das frutas. Entretanto, na década de
1940 surgiu o processo de emancipação da cidade. Com a Rodovia Presidente Dutra e a recupe-
ração da malha ferroviária, Nova Iguaçu passou a ser dormitório e corredor de acesso à capital.

Hoje, Nova Iguaçu é o maior município da Baixada Fluminense em extensão territorial, com
520.581 km² e segundo em população, com a estimativa de 823.302 habitantes (IBGE, 2020).
Possui um dos centros comerciais mais importantes do Estado do Rio de Janeiro, um polo que
atrai consumidores das cidades de seu entorno, sendo seu PIB per capita de R$ 20.538,67 e
IDH-M de 0,713 (IBGE,2010). Os nascidos vivos em 2019 foram de 11.490 e a taxa de mortali-
dade infantil de 13,58%. Segundo as últimas atualizações de registros do IBGE (2018), 13,1% da

70
população está ocupada, perfazendo 107.346 trabalhadores. Em Nova Iguaçu (RJ), 71 crianças e
adolescentes, 38 adultos e 12 atores sociais foram abordados pela pesquisa de campo, e o resul-
tado das questões prioritárias foram: 1) Conflitos com a lei (incluindo o envolvimento com o uso
abusivo e o tráfico de drogas); 2) Poucos serviços e baixo acessos aos direitos de esporte, lazer,
moradia; 3) Abusos físicos na família 4); Violências sexuais e 5) Preconceito e discriminação
contra crianças e adolescentes pela questão de classe, gênero e etnia.

As causas estruturantes identificadas em pesquisa foram: 1) Ausência de apoio familiar (falta


diálogo entre pais e filhos e os conflitos familiares são constantes; 2) Cultura de violência e o
uso abusivo de drogas são consideradas como propulsoras; 3) Pouco investimento público em
serviços assistenciais e de esporte e lazer, descompromisso e impunidade foram ressaltadas;
e 4) Desconhecimento e desinformação para as questões da educação sexual e direitos de ex-
pressar suas identidades.

Os participantes da pesquisa em Nova Iguaçu relataram que suas atitudes, valores e crenças
evidenciam uma cultura de violência, de preconceito com os de classe social com baixa condi-
ções socioeconômicas e de cor, há desrespeito com as crianças, prevalecendo o poder opressor
do adulto, as famílias não dialogam entre si, machismo e hábitos de consumo e uso abusivo de
drogas na família e nas ruas da comunidade.

Sobre as brechas para que aconteça habilidades, resistência e participação das crianças e ado-
lescentes, as pessoas pesquisadas responderam que as famílias necessitam de orientação e
oportunidades, bem como os casos de violação de direitos precisam ter acompanhamento das
organizações formais e informais , os meninos e meninas devem ser ouvidos em sua opinião e,
portanto, suas vozes levadas em consideração, bem como necessitam ter mais espaços desti-
nados a formação e atendimentos psicossociais para os meninos e meninas.

Salvador (BA)
São Salvador da Bahia de Todos os Santos foi descoberta pelos colonizadores em 1510, quando
um navio francês naufragou em terras baianas. Salvador foi capital da administração colonial
do país até 1763, quando a sede do Império foi transferida para o Rio de Janeiro. Com a exten-
são territorial de 693.453 km², cidade litorânea e com uma população estimada de 2.886.698
(IBGE,2020), Salvador é a capital do estado da Bahia com 32.988 nascidos vivos registrados em
2019 e 15,58% de mortalidade infantil no mesmo ano. O PIB per capita (2018) é de R$ 22.232, 68,
sendo o número de ocupados de 849.711 pessoas perfazendo 29,7% da população. As principais
atividades econômicas são comércio, serviços, indústria e turismo.

Em Salvador (BA), os participantes da pesquisa apontam como questões prioritárias da infância


e adolescência: 1) Conflitualidades, principalmente decorrente do tráfico de drogas; 2) Pouco
acesso a serviços básicos: moradia, transporte, lazer esporte; 3) Abusos físicos; 4) Trabalho in-
fantil e 5) Violências sexuais contra crianças e adolescentes.
Relativo às causas estruturantes, as 31 crianças e adolescentes, 25 adultos e os 13 atores sociais
que foram abordados pela pesquisa de campo afirmam: 1) Violência institucional (principal-
mente a policial); 2) Cultura de violência; 3) Baixos investimentos públicos em serviços, políti-
cas, e impunidades; 4) Tráfico de drogas e 5) Ócio são as principais raízes das questões.

No que tange a crenças, valores e atitudes locais, as pessoas pesquisadas em Salvador afirmam
que há a cultura de violência e hábitos de uso abusivo de álcool e outras drogas, desconheci-
mento dos direitos e uma cultura adultocêntrica. Com citação diferenciada de outras cidades,
uma pequena parte dos pesquisados apresentaram que Salvador tem uma cultura de Políticas e
de Sistema frágeis, e as crianças e adolescentes também sofrem com imposição religiosa.

Como fragilidades para habilitar as crianças e adolescentes para a vida e resistência às viola-
ções de direitos, as pessoas pesquisadas responderam que é necessária a formação de lideran-
ças na área dos direitos, desenvolver os meninos e meninas a partir de valores socioemocionais
como: confiança, respeito e autonomia, bem como há necessidade de estimular a participação
em espaços sociais, garantindo uma escuta segura e protegida, bem como acompanhar e con-
cluir os casos que passam pelo Conselho Tutelar e Justiça.

71
São Paulo (SP)
A colonização de São Paulo iniciou em 1532 quando Martim Afonso de Souza fundou a Vila de
São Vicente (hoje Baixada Santista). Em 1554, iniciou a construção das primeiras casas, dando
origem ao povoado de São Paulo de Piratininga com o Colégio dos Jesuítas. A importância desta
cidade cresce com a expansão cafeeira. Hoje é conhecida como uma grande potência industrial
no Brasil. Segundo estimativas do IBGE (2021), a cidade possui uma população de 12.396.372
habitantes num território de 1.521,110 km².

São Paulo apresenta 92.6% de domicílios com esgotamento sanitário adequado, 74.8% de do-
micílios urbanos em vias públicas com arborização e 50.3% de domicílios urbanos em vias pú-
blicas com urbanização adequada (presença de bueiro, calçada, pavimentação e meio-fio). Se-
gundo o IBGE, em 2019 teve 158.597 nascidos vivos e a taxa de mortalidade infantil é de 11,21%.
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

Neste mesmo ano, o salário médio mensal era de 4.1 salários mínimos. A proporção de pessoas
ocupadas em relação à população total era de 47.1%.

A pesquisa realizada na cidade de São Paulo, com 44 crianças e adolescentes, 20 adultos e 11


atores chaves afirma que as principais questões da infância e adolescência nesta cidade são: 1)
Conflitos com a lei, ou seja, crianças e adolescentes envolvidos com o tráfico de drogas, assal-
tos; 2) Pobreza, com muitos relatos de desemprego, fome e ausência de oportunidades; 3) Con-
flitos familiares, incluindo violência doméstica, e abusos físicos; 4) Negligência com crianças,
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ficando sozinhas em casa e expostas a outros riscos e 5) Violência sexual.

As causas relatadas em pesquisa foram: 1) Baixo investimento público nas políticas; 2) Pobreza,
devido ao desemprego; 3) Ausência de espaços de lazer e esportivos; 4) Tráfico de drogas; 5)
Escolas estilo remoto e 6) Pouco diálogo entre membros da família fortalecem as raízes dos
problemas citados.

Com relação a crenças, valores e tradições, as pessoas pesquisadas na cidade de São Paulo
afirmam a presença da cultura de violência, desrespeitos dos adultos para com as crianças,
discriminação e preconceito, cultura machista, e não há hábitos de diálogos nas famílias.
Quanto à participação das crianças e adolescentes e as brechas que podem afetar a resistência
destas, a população pesquisada respondeu que há falta de engajamento social, comunitário e
religioso, necessidades de espaços destinados à formação de direitos, de valores como respei-
to, confiança e autonomia, para meninos e meninas e que a Escola Integral é uma boa opção
para participação e proteção das mesmas.

É válido destacar que, na cidade de São Paulo, uma das facções criminosas conhecidas no Brasil
apareceu durante as vozes coletadas em pesquisa como aquela que de fato garante a proteção
não só das crianças, mas da comunidade. Essa situação evidencia uma conclamação de que
quando o Estado (e seus equipamentos) se ausenta da comunidade, a presença do narcotráfico
se fortalece, obtendo da população local a “sensação de segurança” conquistada pelos favores,
prestação de serviços, por meio dos relacionamentos e vínculos comunitários de confiança e
credibilidade, fortalecendo seu poder e legitimidade de suas práticas ilegais.

5.1 O que as Crianças e Adolescentes Percebem, Sentem


e Vivem a respeito da Proteção
A pesquisa ora delineada representa as vozes, ou seja, a descrição das necessidades, per-
cepções e vivências das crianças e adolescentes, bem como do que compreendem por Sistema
e Rede de Proteção, por isso a importância de incluir as famílias (adultos) e todos os Atores
Sociais que estão no círculo de apoio interno e externo desse segmento social em Proteção.
Assim, descrevemos quem são essas pessoas que participaram da pesquisa, onde vivem, o
que percebem da Proteção da Infância e Adolescência, quais seus principais problemas, seus
olhares sobre as causas desses problemas, o que eles conhecem sobre as leis, regulações,
serviços e mecanismos de proteção, quais as pessoas ou instituições que podem proteger os
meninos e meninas, e, se existe a percepção de suas resiliências, e como participam ou podem
participar como forma de habilidades para as suas vidas.

72
5.2 Ouvindo as Crianças
Perfil das Crianças
Nas oito cidades pesquisadas, tivemos a participação de 222 meninos e meninas da faixa etária
de 8 a 11 anos. A questão paritária de gênero foi devidamente atendida em nossas expectativas,
tornando possível a percepção e entendendo assim o que pensam, o que necessitam e como
cada gênero se posiciona diante das situações que lhes estão expostas. O Gráfico 16 que segue
retrata a participação infantil nesta pesquisa, distribuída por gênero.

Gráfico 16 - Nº de Participante da Pesquisa - Crianças por Gênero(08-11 anos)

111 111

Meninos Meninas
Fonte: Dados da própria pesquisa Visão Mundial 2021

Conforme Gráfico 16 acima, as 222 crianças participantes da pesquisa aplicada pela Visão Mun-
dial na faixa etária de 8 a 11 anos foram 111 meninos e 111 meninas. Na percepção dos oito pes-
quisadores, essa faixa etária demandou maiores esforços e cuidados para a coleta de dados e
transcrição das vozes, uma vez que suas expressões acompanhavam sua linguagem e processo
de desenvolvimento etário. Assim, desenhos e frases curtas foram compilados, catalogados e
interpretados.

Localidades que crianças vivem


As 222 crianças pesquisadas vivem em comunidades periféricas urbanas e/ou rurais. Porém,
nos dois estilos geográficos, apresentam pontos comuns: a situação socioeconômica e assis-
tencial é precária, nas de área rural, ou nas metropolitanas e/ou capitais. Todas as crianças ne-
cessitam ser visibilizadas pela sua condição de extrema pobreza, privações no acesso aos seus
direitos básicos, e, portanto, exclusão social. Problemas diversos, que foram intensificados com
a crise gerada pela pandemia da Covid-19.

73
Gráfico 17 -Crianças Participantes 8 a 11 anos por Localidade

Fortaleza 17

Manaus 28

Inhapi 30

Nova Iguaçu 37

Salvador 22
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

Governador Dix Sept 31

Recife 29

São Paulo 28

0 5 10 15 20 25 30 35 40
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Fonte: Dados da própria pesquisa Visão Mundial 2021

O Gráfico 17 revela onde essas crianças moram: 17 delas em Fortaleza (CE), 28 em Manaus (AM),
30 em Inhapi (AL), 37 em Nova Iguaçu (RJ), 22 em Salvador (BA), 31 em Governador Dix Sept
Rosado (RN), 29 em Recife (PE) e 28 em São Paulo (SP). Ressaltamos que os números se dife-
renciam, sendo resultado da mobilização de cada estado e grau de interesse dos participan-
tes. Lembramos ainda que é uma amostra qualitativa, de percepção da realidade específica de
crianças em situação de pobreza, em territórios vulneráveis. É livre e consentida.

Questões Prioritárias e Causas - Crianças


Conforme já apresentamos nos aspectos metodológicos desta pesquisa, aplicamos oficinas so-
cioeducativas para a coleta de dados, utilizando estratégias na linguagem, dinâmicas e proces-
so de aplicação apropriados para essa faixa etária de 8 a 11 anos. A partir dos dados coletados,
as 222 crianças participantes da pesquisa as questões prioritárias da Proteção da Infância na
sua localidade foram: 1) Conflitos com a lei; 2) Abusos físicos e maus tratos no âmbito familiar;
3) Acesso a serviços básicos insuficientes; 4) Desemprego e Fome e 5) Violências Sexuais.

A categoria considerada Conflito com a Lei expressa às vozes infantis no que tange à insegu-
rança pública que sentem, principalmente devido aos constantes assaltos, roubos, chacinas,
venda de drogas e envolvimento com uso e o tráfico de drogas.

“No meu bairro tem muito assalto, falta segurança.” (12 anos, Rio de Janeiro, 2021)

“Tem um salão de festa na minha rua e lá teve um tiroteio.” (10 anos, Rio de Janeiro, 2021)

“Tia, a gente não pode brincar na rua porque tem muitos bandidos” (8 anos, Pernambuco, 2021)

“Quando as crianças usam drogas elas ficam diferentes” (10 anos, Alagoas, 2021)

“Na rua tem pilantra vendendo droga e gente vai ser presa. (8 anos, Amazonas, 2021)

O segundo problema mais apontado pelas crianças diz respeito à categoria Abusos físicos e
Maus tratos, somando a negligência e a violência psicológica. Vale ressaltar que esta pesquisa
confirma os acontecimentos da violação de direitos da criança mais recorrente no âmbito fa-
miliar a nível nacional, ou seja, a violência doméstica física e a negligência são percebidas, sen-

74
tidas e evidenciada em relatórios oficiais de Governo, realizadas pelo Ministério de Cidadania a
partir do Disque Denúncia (2019), bem como nos relatos das crianças participantes da presente
pesquisa realizada pela Visão Mundial:

“Algumas crianças sofrem maus tratos dos pais” (9 anos, Rio Grande do Norte, 2021)

“Tem muitos casos de pais que batem nos filhos, porque estão aperreados, ou cansados
e quando chegam em casa descontam nos filhos” (11 anos, Pernambuco, 2021)

“Fico sozinha e preciso deixar a porta trancada” (10 anos, São Paulo 2021)

“Acho que é falta de respeito com as crianças, o xingamento” (10 anos, São Paulo, 2021)

A respeito do “Acesso a Serviços Básicos”, as crianças identificam que precisam de áreas de


lazer para brincarem, esporte, moradia, transporte, escolas e a saúde pública é requisitada ao
expressarem que necessitam de mais hospitais.

“Não tem quadra pra jogar bola” (11 anos, Amazonas, 2021)

“Mais hospitais” (11 anos, Amazonas, 2021)

“Muitos não têm casas para morar” (8 ANOS, Rio Grande do Norte, 2021)

“Na minha rua não passa ônibus” (10 anos, Rio de Janeiro, 2021)

“Na minha comunidade não tem escola municipal” (10 anos, Rio de Janeiro, 2021)

Em regiões especificas como Ceará, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte, as crianças conse-
guem perceber problemas no Acesso à Serviços Básicos para a proteção da Infância vinculados a
questão da Pandemia da Covid-19 a partir da demora da vacina, problemas de saúde mental das
crianças e de membros de sua família, sendo uma preocupação revelada por elas na questão do
acesso a serviços de Saúde e de Educação:

“Também tem muitas mães em depressão, tem um monte de gente que eu conheço, a minha mãe tá,
eu é que ajudo ela nas coisas, ela não bate em mim não, ela só fica deitada” (10 anos, Pernambuco,
2021)

“Eu fico triste por causa da pandemia atrapalhar de eu ir para a escola” (12 anos, Rio de Janeiro, 2021)

“Tia, acho que a depressão vem por não poder brincar, e as pessoas ficam tristes em casa, por causa
da Pandemia” (11 anos, Ceará, 2021)

“Por causa da pandemia, ter que ficar longe dos colegas e das ruas, as crianças ficam tristes (10
anos, Ceará, 2021)

“A Pandemia também é um problema” (11 anos, Rio Grande do Norte 2021)

“Falta de vacina para todos” (11 anos, Rio Grande do Norte, 2021)

A quarta questão prioritária percebida, sentida e vivida pelas crianças é a Pobreza. Assim, estas
apontam que a fome, o desemprego, a falta de oportunidades para seus pais, mães, responsáveis
e para elas mesmos, e, enquanto crianças não terem condições financeiras e a garantia de sua
alimentação possibilitam o engajamento no trabalho infantil e nos atos infracionais. Vejamos
alguns desses relatos:

“Eu acho que eles roubam por causa da fome, roubam para comer” (11 anos, Pernambuco, 2021)

75
“Roubou porque não conseguem emprego” (9 anos, Rio de Janeiro, 2021)

“Ah, tem gente que passa fome, daí tem que trabalhar, daí faz isso aí, com as drogas” (Sérgio, 11 anos,
São Paulo, 2021)

“Tia a falta de comida também porque tem crianças que não tem o que comer” (9 anos, Rio Grande
do Norte, 2021)

“Tem muita criança que precisa trabalhar para ganhar dinheiro” (11 anos, Alagoas, 2021)

“Muitas crianças precisaram trabalhar. Algumas teve pais que perderam o emprego e a criança
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

que foi trabalhar” ( 10 anos, Ceará, 2021)

A Violência Sexual é a quinta maior questão prioritária da Proteção da Infância, na visão das
crianças pesquisadas, enquanto nas pesquisas oficiais ela aparece em quarto lugar no Relatório
do Ministério da Cidadania (2019). Nesta pesquisa realizada pela Visão Mundial foram expres-
sados pelas vozes infantis o estupro nas ruas, e, principalmente o abuso sexual nos domicílios,
feitos por parentes, vizinhos e/ou amigos, conforme podemos evidenciar nos relatos que seg-
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

uem:

“Quando nossos parentes, tios e avôs pegam nas partes íntimas das crianças” (11 anos, Amazonas, 2021)

“Tem meninas que sofrem com isso, com o abuso sexual” (11 anos, São Paulo, 2021)

“Eu já fui abusada” (9 anos, São Paulo, 2021)

“Tem vezes que os bandidos estupram e até matam” (10 anos, Pernambuco, 2021)

“Em Inhapi tem casos de violência sexual. Isso é ruim para nós” (9 anos, Alagoas, 2021)

“Meu irmão de maior idade... isso aconteceu quando eu tinha seis anos, ele que fez algo ruim comi-
go” (11 anos, Amazonas,2021)

Quando questionadas sobre as causas dessas questões, as crianças afirmam: 1) Pobreza; 2) In-
segurança Pública e pedem “mais policiamento nas ruas”; 3) Pouco investimento público e/ou
descompromisso do Governo; 4) Pouco diálogo e/ou apoio dos pais, informando a presença de
conflitos familiares em seus lares e 5) Cultura de violência, apontando principalmente que as
mães (e/ou responsáveis) querem que eles aprendam sobre a vida através de práticas nocivas:
disciplinando-os com violência física e psicológica relatados como “xingamentos” e “chinela-
das”.

Atitudes, Crenças e Valores percebidos pelas Crianças


Coletar das crianças as atitudes, crenças e valores foi a experiência mais desafiadora entre
pesquisadores. Ainda que, durante as oficinas, os pesquisadores estimularam a participação em
cada temática, compreender os relatos infantis e interpretá-los foi a resposta para o caminho
das análises.

Assim, pela observação dos relatos das crianças, analisamos que a Cultura de Violência foi a mais
mencionada pelas crianças pesquisadas com relação a atitudes, crenças e valores culturais que
podem afetar sua proteção. Podemos também ressaltar, como segundo lugar, o poder opressor
do adulto sobre as crianças. Muitas crianças afirmam o desejo de se sentirem ouvidas dentro
de casa. Já o terceiro mais visibilizado refere-se ao cultivo da valorização do trabalho precoce.
As crianças se sentem responsáveis por também contribuir com as atividades domésticas e o
suprimento de alimentos, uma vez que percebem que seus pais, mães ou responsáveis estão
desempregados. Em quarto lugar, a convivência dessas crianças com o hábito dos pais e vizinhos
no consumo do álcool e outras drogas, conforme as vozes que seguem:

76
“Minha tia mora no interior, ela tem 3 filhos e eles apanham muito do meu tio quando ele bebe [...],
quando vem para casa, bate neles. Ela está com depressão por causa disso. Quando o tio chega,
bate na bebezinha de 2 anos, uma criança de 6 anos e outra de 7 anos” (10 anos, Pernambuco, 2021)

“Às vezes os pais podem bater nos filhos e não procuram conversar com eles e falar as coisas certas”
(10 anos, Rio Grande do Norte, 2021)

“Também tem crianças que trabalham para ajudar os pais e deixam de brincar e de ir para escola.
Talvez achem que é culpa delas e querem ajudar seus pais” (11 anos, Rio Grande do Norte, 2021)

“Às vezes ficam muitas pessoas passando drogas na nossa frente” (12 anos, Bahia, 2021)

Conhecimento das Leis, Regulamentos e Políticas - Crianças


A pesquisa identificou que as leis, regulamentos e políticas que protegem a infância no Brasil
não chegam ao conhecimento das crianças. Das 222 crianças de 8 a 11 anos que participaram
das oficinas realizadas durante a pesquisa, apenas cinco mencionaram o conhecimento do Es-
tatuto da Criança e do Adolescente – ECA, 1 (uma) criança comentou sobre o Programa Bolsa
Família e 2 (duas) crianças citaram a “Lei dos Maus Tratos”. Quanto aos Planos, apenas 2 (duas)
citaram que viram na televisão a divulgação a respeito do Plano de Enfrentamento à Violência
Sexual contra Crianças e Adolescentes. Ou seja, 212 crianças desconhecem qualquer política ou
lei que as protegem.

Ainda que a escolha das crianças pesquisadas tenha a característica peculiar de extrema vul-
nerabilidade, esse dado aponta uma falha das instituições do Sistema e da Rede de Proteção
da Criança e do Adolescente, os quais não conseguiram ainda atingir os mais vulneráveis na
disseminação dos seus direitos. É bem provável que os cuidados institucionais têm sido apli-
cados quando os problemas já aconteceram, necessitando de estratégias de disseminação do
conhecimento das leis e das políticas em massa numa instância ainda preventiva. Desse modo,
podemos analisar que mesmo sem a devida consciência - por parte das instituições - a cen-
tralidade e o cultivo da participação dos adultos nas decisões levam à perda da oportunidade
de empoderamento, autonomia e argumentos para a autoproteção dos meninos e meninas de
nossa nação.

Serviços, Redes de Apoio e Círculos de Cuidados mencionados pelas Cri-


anças
A respeito dos Serviços e Rede de Apoio, as crianças apontam a família (mãe, pai e irmãos) e
os parentes (avôs, avós, tios/as e primos/as) como as principais referências de cuidados e
proteção, em quem de fato podem contar e recorrem nos casos de abuso sexual, assédio, ex-
ploração, abuso de poder dentre outras. Logo em seguida, vêm os professores e profissionais
da escola como rede de apoio, as polícias e delegacias, Conselho Tutelar e amigos.

Esses dados apontam que a família é - no imaginário infantil - a primeira referência de Prote-
ção. As escolas vêm como um espaço que podem apoiá-las com seus professores e profissio-
nais ouvindo-as e procurando ajudá-las. A respeito do Conselho Tutelar, os dados das crianças
constatam que há pouco conhecimento dessa instância de proteção, sendo necessário a divul-
gação e presença dos conselheiros nas escolas e espaços comunitários.

Sobre a Participação das Crianças


A pesquisa com crianças registrou poucas vozes relativas ao que pensam sobre a participação
delas nos espaços sociais, de sua resistência, ou ainda sobre o que podem fazer para a sua
proteção e de amigos. Dos poucos registros, destacamos: a necessidade de “serem ouvidas”,
de “ouvir seus amigos”, “aconselhá-los”, “oferecer acolhida em casos de abusos sexuais” e de se
sentirem com “maior participação, especialmente nas escolas”.

77
5.3 Ouvindo Adolescentes
Perfil dos Adolescentes
Relativo ao perfil de adolescentes nesta pesquisa, tivemos a participação de 174 adolescentes na
faixa etária de 15 a 17 anos. Destes, 92 eram meninas e 82 meninos, conforme aponta no Gráfico
18 que segue.

Gráfico 18 - Participação de Adolescentes de 15-17 anos, por Gênero


| VISÃO MUNDIAL BRASIL

92 82
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

Adolescentes Meninos (15-17 anos) Adolescentes Meninas (15-17 anos)

Fonte: Dados da própria pesquisa Visão Mundial 2021

Diferente do Gráfico 16 de crianças de 8 a 11 anos, o gráfico 18 revela que, apesar dos esforços
dos pesquisadores e educadores no processo de mobilização, e cumprimento das metas, o in-
teresse dos adolescentes na participação presencial na pesquisa foi bem menor que o de cri-
anças.

Localidades que os Adolescentes vivem


O Gráfico 18 apresenta a localidade onde os 179 adolescentes pesquisados residem. Destes, 24
moram em Fortaleza (CE), 28 em Manaus (AM), 23 em Inhapi (AL), 34 em Nova Iguaçu (RJ), 24 em
Salvador (BA), 16 em Governador Dix-Sept Rosado (RN), 14 em Recife (PE) e 16 em São Paulo (SP).

Gráfico 19 - Adolescentes por Localidade -15 a 17 anos

Fortaleza 24

Manaus 28

Inhapi 23

Nova Iguaçu 34

Salvador 24

Governador Dix Sept 16

Recife 14

São Paulo 16

0 5 10 15 20 25 30 35 40

Fonte: Dados da própria pesquisa Visão Mundial 2021

Em Nova Iguaçu (RJ) foi o maior número de presença de adolescentes, seguida de Manaus (AM),
Fortaleza (CE) e Salvador (BA).

78
Questões Prioritárias e Causas - Adolescentes
As questões prioritárias de Proteção da Infância e Adolescência apontadas pelos(as) adoles-
centes de 15 a 17 anos que participaram nesta pesquisa foram: 1) Conflitos com a Lei; 2) Desem-
prego e/ou poucas condições financeiras; 3) Conflitos familiares, incluindo nessa categoria as
violências físicas e maus tratos; 4) Violências sexuais e 5) Educação (abandono e evasão escolar,
escolas fechadas devido à pandemia, estrutura insuficiente e baixa qualidade de ensino).
Vale destacar que os (as) adolescentes se queixam e apresentam a Discriminação e o Preconcei-
to como sendo uma das questões prioritárias, no caso, a sexta mais comentada, principalmente
nos aspectos de classe, etnia e de gênero.

Sobre as situações que promovem o Conflito com a Lei, principalmente envolvendo adoles-
centes, passa-se por uma questão que envolve classe social, gerando revolta pelo desrespeito
de alguns órgãos que deveriam proteger a comunidade, como a polícia, mas que os coloca num
perfil estigmatizador pela sua condição de pobreza. Ao mesmo tempo que interligam as vivên-
cias desprotegidas com fatores vinculados às ausências estruturais (de emprego e/ou opor-
tunidades) e familiares (de apoio e/ou referência de proteção). Essas ausências seriam o vetor
que impulsiona adolescentes a se envolverem com as violências e/ou sentirem vulneráveis às
mesmas, conforme evidenciamos nos relatos que seguem:

“Falta segurança na cidade para andar na rua, abuso moral” (16 anos, Alagoas, 2021)

“A polícia não respeita e não sabe diferenciar os caras da gente, quando a gente ta na rua” (17 anos,
Bahia, 2021)

“Como os jovens não têm emprego, acabam se sujeitando a trabalhos que colocam eles em situações
de violências” (16 anos, Alagoas, 2021)

“Quando tinha uns 5 anos, fui aliciada pelo meu irmão mais velho [...] mas ainda tive que ouvir que
a culpa era minha. Isso me dói bastante. Até hoje escuto esse absurdo da pessoa que deveria estar ao
meu lado... nenhuma criança escolhe ser aliciada por uma pessoa que acreditava ser super-herói”
(15 anos, Amazonas, 2021)

“Falta de apoio em casa, dos pais. Se a gente quer fazer algo diferente da vida, não existe um apoio”
(16 anos, São Paulo, 2021)

A partir das vozes acima descritas, no que tange às crianças e adolescentes que tiveram os
seus direitos sexuais violados pela própria família, constatamos que o sofrimento e as marcas
ocasionadas intensificam-se pela decepção ao descumprimento da esperada proteção familiar.
Assim, analisamos a importância de desenvolver estratégias de intervenção que retome junto
às famílias o cultivo de valores éticos e humanos, bem como os direitos que as crianças têm e
o dever da sua família, comunidade, sociedade em geral e do Estado na sua proteção integral,
assim como o art. 3 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

A respeito da percepção das causas destacadas pelos adolescentes em pesquisa foram: 1) Po-
breza; 2) Insegurança Pública, provocada pela pouca quantidade de policias, violência policial
e/ou corrupção; 3) Conflitos familiares, destacando a separação dos pais, ausência de diálogo
entre pais e filhos, pouco apoio familiar para com adolescentes, desrespeito entre os membros
da família; 4) Baixo investimento público para projetos sociais e/ou serviços que apoiem e/ou
ocupem o tempo das crianças e adolescentes também foram apontados; 5) Cultura de Violência
na sociedade e 6) Desconhecimento dos direitos conforme vemos nas vozes que seguem:

“A pobreza gera muitos problemas” (17 anos, Alagoas, 2021)

“O fato de correr o risco de serem violentadas na rua como também em casa. Falo isso tanto men-
talmente como fisicamente serem reprimidas em casa e serem abusadas também” (15 anos, Ceará,
2021)
“Porque a gente confia mais nos malfeitores da comunidade do que nessas polícias, e pensar nisso
a gente vê o quão problemático é porque confiamos mais em traficantes do que na polícia porque

79
são preconceituosos, não temos opção de confiar no policiamento” (17 anos, Ceará, 2021)

“Falta de segurança pela cidade, ocasionando o aumento da criminalidade, de modo que boa parte
das vítimas são crianças e adolescentes” (15 Anos, Rio Grande do Norte, 2021)

“O preconceito existe porque as pessoas não respeitam as diferenças” (17 anos, Rio Grande do Norte,
2021)

Dos relatos acima, alguns pontos merecem ser destacados: a) Violência e suas multivariadas
formas de expressão; b) Em quem os adolescentes depositam sua Credibilidade e Confiança e c)
Respeito às diferenças. A violência aqui está intrinsecamente relacionada às ações reproduzi-
das socialmente entre os indivíduos nos diversos espaços sociais, ou seja, todo sentimento de
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

confiança e credibilidade em atores sociais que deveriam proteger (família, sociedade e Estado,
aqui evidenciados pela polícia) estão sendo projetados no envolvimento com as drogas e no
fortalecimento de relações das crianças e adolescentes com as lideranças do narcotráfico, os
quais certamente acolhem as diferenças, promovem renda, afirmam garantir a segurança da
comunidade a qual dominam, e mantêm sua palavra ainda que seja pela via do ilegal e da cruel-
dade para aqueles que não o seguem.

Atitudes, Crenças e Valores percebidos pelos Adolescentes


R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

Sobre as atitudes, crenças e valores percebidos pelos adolescentes da sociedade em que vivem,
ressaltamos: 1) Cultura da Violência; 2) Atitudes preconceituosas e de discriminação; 3) Cultura
machista; 4) Reconhecimento do Adulto como detentor de um “poder opressor” que trata as
crianças com desrespeito e 5) Hábitos que cultivam o uso abusivo de álcool e outras drogas no
ambiente familiar e comunitário. Segundo respostas que seguem:

“Existe isso de bater nos filhos, de ser rígido. Acho que eles foram criados assim também” (15 anos,
São Paulo, 2021)

“A educação dos pais... muitos foram criados de um modo diferente das crianças de hoje e acham
que gritar, agredir é normal, mas nem tudo é o que eles pensam” (18 anos, Pernambuco, 2021)

“Os homens se sentem superiores às mulheres” (17 anos, São Paulo, 2021)

Assim, percebemos a necessidade de incidir pelas políticas públicas, que têm sido o principal
caminho para as mudanças, mas também encontrarmos estratégias sobre as possíveis mu-
tações culturais. Refletimos então: o que tem influenciado sobre a cultura dos povos? O que
pode manter ou quebrar uma tradição? Que tipo de prática ou teoria pode influenciar sobre
uma mudança de hábitos? O que ou quem pode influenciar numa adesão de valores? Nor-
bert Elias (1993), quando trata do processo civilizatório, nos oferece pistas de como os hábitos,
etiquetas e costumes são construídos historicamente. Mesmo que não identificando se foram
planejados (ou não) por um grupo social sobre outros, esse autor afirma que, por exemplo, a
reprodução dos conflitos, assim como a manutenção da cultura, a partir de regras sociais se
mantem pela tensão provocada socialmente, legitimada pelas normas e/ou código de condu-
tas. Dessa forma, “torna viáveis mudanças mais ou menos violentas nos laços mútuos entre
pessoas, dando assim origem a novas formas de integração” (Elias, 1993).
Nesse sentido, as estratégias de intervenção governamental pelos regulamentos, protocolos
e leis são fundamentais. Mas também é necessário perceber que a construção cultural é for-
mada pelas pequenas ações que são reproduzidas socialmente entre pais e filhos, no conteúdo
dos currículos escolares, nas músicas que são tocadas, na partilha das comidas, no cultivo de
novas ou tradicionais danças, nas pinturas, artes e festivais, nas propagandas e mídias sociais,
inclusive, pelas diversas instituições e, dentre elas, destacamos como importante reprodutor
da cultura na sociedade as famílias e as religiões.

Conhecimento das Leis, Regulamentos e Políticas - Adolescentes


Dos(as) 174 adolescentes que participaram das oficinas com as ferramentas ADAPT, quando

80
foram consultados se conheciam alguma lei, regulamento ou política que protege a infância e a
adolescência no Brasil, 157 não conhecem e/ou não citaram. Apenas 16 adolescentes conhecem
o Estatuto da Criança e do Adolescente, e 1 citou a política de transferência de renda Bolsa
Família.

Analisamos que uma das falhas do Sistema e da Rede de Proteção esteja na divulgação dos
direitos das (e para) as crianças e adolescentes. Se conhecemos a verdade, ela nos gera a liber-
tação. Nesse sentido, entendemos que meninos e meninas empoderados(as), cientes de seus
direitos, provavelmente haverá em si uma primeira atitude: consciência da violação e a certeza
de que alguém deve protegê-las e saberão o caminho dos mecanismos para sua proteção. E
numa segunda tese, a da autoproteção, seria uma ação de prevenção da violação de direitos.
Entretanto, alguns argumentos do senso comum afirmam que a demanda aumentaria. Porém,
se não há estrutura suficiente, o problema não é da criança, mas das Instituições e do Estado,
os quais devem garantir e assegurar o aparato necessário, conforme a Lei Nº 8069 de 1990.

Serviços, Redes de Apoio e Círculos


de Cuidados mencionados pelos Adolescentes
Quando os adolescentes foram consultados a respeito dos Serviços e Mecanismos, Rede de
Apoio e Círculos de cuidados para a Proteção da Infância e Adolescência, 63 adolescentes
afirmam que a família e parentes são a principal referência para recorrerem, seguidos de 21
que declararam as polícias e delegacias, 21 se sentem seguros com amigos e vizinhos, 14 contam
com professores e profissionais da escola, 14 recorreriam ao Conselho Tutelar, 12 acreditam
nas Associações de bairro e/ou Visão Mundial, 9 citam CRAS e CREAS, 5 afirmam recorrerem
às igrejas, 4 à Postos de Saúde e 2 ao Ministério Público e Defensorias Públicas.

É perceptível que os(as) adolescentes estão um pouco mais apropriados que as crianças das
variadas possibilidades da Rede de Apoio e Proteção. Entretanto, no processo educacional para
autoproteção é necessário que, além do conhecimento da existência dos aportes institucionais,
de sua funcionalidade e do fluxo desde a denúncia ao acompanhamento, também saibam como
monitorar o Estado a respeito da aplicabilidade das leis e nos resultados que têm alcançado. E
cabe ao Poder Público, conforme art.265 “periodicamente a ampla divulgação dos direitos da
criança e do adolescente nos meios de comunicação social”, sendo o ECA posto à disposição das
escolas, das entidades de atendimento e defesa dos direitos desse segmento social.

5.4 Ouvindo Adultos


Perfil dos Adultos
A pesquisa realizou grupos focais com o total de 244 adultos nas oito cidades, especificamente,
mulheres e homens moradores de comunidades, dentro dos territórios socioeconomicamente
vulneráveis. Destes, 156 eram mulheres e 88 homens. Vale salientar que, mesmo intensificando
as estratégias de sensibilização masculina, a presença massiva de interesse e participação a
respeito da Proteção da infância e da Adolescência é especialmente feminina, conforme apon-
tam os percentuais no Gráfico 20, que segue.

81
Gráfico 20 - Nº de Participantes da Pesquisa Adultos por Gênero

36%
Mulheres da Comunidade
Homens da Comunidade
64%
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

Fonte: Dados da própria pesquisa Visão Mundial 2021

A idade dos adultos pesquisados variava entre 25 a 60 anos. Esses eram pais, mães, avós, tios/
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tias das crianças e adolescentes dos territórios pesquisados, sendo eles os responsáveis dire-
tos.

Localidades que os adultos vivem


A respeito das localidades dos adultos, foram as mesmas das crianças e adolescentes pesquisa-
dos. Entretanto, a participação de cada localidade também teve números variados de presença
nos Grupos Focais, sendo eles virtuais na maioria das cidades, e uma parte presencial.

Fortaleza 34

Manaus 20

Inhapi 48

Nova Iguaçu 38

Salvador 25

Governador Dix Sept 31

Recife 28

São Paulo 20

0 10 20 30 40 50 60

Fonte: Dados da própria pesquisa Visão Mundial 2021

Conforme Gráfico 21, Inhapi (AL) teve o maior número de participantes adultos na pesquisa
com 48 pessoas, seguido por 38 participantes em Nova Iguaçu (RJ), 34 em Fortaleza (CE), 31 em
Governador Dix Sept Rosado (RN), 28 em Recife (PE), 25 em Salvador (BA), 20 em Manaus (AM)
e 20 participantes em São Paulo (SP), totalizando 244 adultos.

Questões Prioritárias e Causas - Adultos


A pesquisa com adultos revelou que as principais questões prioritárias relacionadas à proteção
da Infância e adolescência são, em primeiro lugar, os Conflitos com a Lei, incluindo envolvimen-
to de crianças e adolescentes com drogas, sendo apontada uma relação destas com os delitos
(assaltos, roubos, mortes) e as facções criminosas.

82
Em segundo lugar são os Conflitos familiares, por exemplo, as constantes brigas, violências
físicas e psicológicas entre casais, entre pais e filhos, entre irmãos. Os adultos denominam de
“desestrutura familiar” o que consideramos como as fragilidades e/ou quebra nos vínculos. Há
alguns relatos dos adultos que conectam essa “desestrutura” à separação dos pais, outros,
a ausência paterna, e/ou problemas financeiros que afetam diretamente os filhos e toda a
família. Observamos que os adultos também compreendem que a “desestrutura” está interliga-
da a necessidade de “valores que se perderam ao longo dos anos” no seio familiar.

Em terceiro lugar, destacamos o Acesso a Serviços Básicos, no qual a distância, a falta de equi-
pamentos em seus territórios, principalmente de espaços de lazer e esporte, são problemas
que negam o “direito de brincar” e de “ser criança” que a “violência nas ruas” tomou. Bem como
poucas oportunidades de acessar a educação integral e/ou cursos de iniciação profissional
para adolescentes e jovens também são bem ressaltadas em pesquisa.

A Violência Sexual na concepção dos adultos pesquisados, vem em quarto lugar, cujos relatos
apontam os fatos ocorridos com vizinhanças, e destacando os casos que entrelaçam trabalho
infantil doméstico de meninas e abuso sexual. Em quinto lugar, destacamos a Pobreza, e, geral-
mente conectada às respostas, vem a percepção do desemprego, falta de oportunidades e da
fome. O sexto problema mais citado foram as Escolas, que incluem a exposição de suas vivên-
cias com relação ao baixo acesso à internet e à aparelhos de celular, abandono e evasão escolar
de crianças e adolescentes que a vida remota em período de pandemia intensificou. Vejamos
algumas vozes desse segmento:

“Temos em nossa cidade de tudo, desde crianças que trabalham por falta de escolha para não pas-
sar fome, até muitas que são assediadas nas casas de famílias pelos patrões” (37 anos, Alagoas, 2021)

“Precisamos de mais investimento na educação, tendo escola em tempo integral com vários tipos
de modalidades, matérias para ocupar o tempo da criança e nesse sentido também haver tempo
dos pais trabalharem e correr atrás de emprego. Esse é meu ponto de vista” (32 anos, Amazonas, 2021)

“O índice de crianças e adolescentes que não tem assistido aula é bem maior que antes. Elas não
têm um celular, um computador. Então está mais difícil ainda” (38 anos, Rio Grande do Norte, 2021)

“Eu acho que o principal mesmo foi o que se perdeu nesse tempo: valores, questão da família se
perdeu esses valores né, aquele respeito que existia, isso aí se perdeu ao longo desses anos. Foi isso.
E tem várias consequências, devido ter se perdido esses valores, gerou-se famílias desestruturadas
(...)” (57 ANOS, Rio Grande do Norte, 2021)

“As drogas que deviam ser mais controladas não são, já é normal nas comunidades. Acredito
também que a violência vem da pobreza, eu vi uma vez um menininho pedindo comida e foi violen-
tado por isso. Acho que devia ter uns 12 anos e isso pode gerar nele uma sede de violência também”
(47 anos, Ceará, 2021)

Destacamos a partir do último relato supracitado, que as drogas têm se naturalizado nas co-
munidades. E que, apesar de Sérgio Adorno (1999) esclarecer que o fato de as pessoas estar-
em na condição de pobreza não necessariamente serão violentos e/ou criminosos, porém, a
pobreza gera exclusão social, e esta última é um potencializador para as diversas formas de
violações de direitos e violências.

No que tange às causas apontadas pelos adultos em pesquisa, destacamos: 1) Conflitos Familia-
res; 2) Pouco investimento do poder público em serviços de esporte, lazer e cultura; 3) Desem-
prego e Fome provocados pela desigualdade social; 4) Insegurança Pública e 5) Educação inter-
rompida devido ao colapso da pandemia, conforme as respostas que seguem, respectivamente:

“As causas da violência são a agressão, as bebidas e drogas, e as separações dos pais” (33 anos, Per-
nambuco, 2021)

“Falta lazer – As crianças, além da sua liberdade, ficam sem lazer no seu cotidiano, pois ficam sem
lugares e atividades para brincar e realmente serem crianças, ficando isoladas em casa à mercê de

83
rede social e aparelhos eletrônicos” (44, anos, Ceará, 2021)

“A desigualdade social é muito grande e as crianças mais pobres são as mais prejudicadas (44 anos,
Alagoas, 2021)

“Falta de segurança pública deixa as crianças carentes muito vulneráveis, uma vez que os pais são
usuários de drogas, não têm uma fonte de renda segura, saem todo dia pra fazer trabalho de flane-
linha, guardar o carro, vender picolé e muitos deles, desorientados, deixam as crianças na rua e,
uma vez que as crianças ficam nas ruas, elas ficam sujeitas a todos os ataques possíveis, inclusive
para o aliciamento do tráfico de drogas esse é um grande problema nas nossas cidades” (37 anos,
Amazonas, 2021)
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

A falta dos estudos cada dia afeta num todo, pois onde nossas crianças tinham o direito de ter
liberdade, lazer e alimentação, estão fechadas por causa do colapso da pandemia” (52 anos, Rio de
Janeiro, 2021)

Analisamos que, na percepção dos adultos, os problemas de proteção se misturam com as cau-
sas e os efeitos. Entretanto, há clareza entre eles que a desigualdade social, desemprego e
ausência da educação são causas estruturantes que precisam ser resolvidas e que afetam dire-
tamente a proteção da criança e do adolescente em nosso país.
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Atitudes, crenças e valores percebidos pelos adultos


Os adultos pesquisados afirmam que em sua localidade há uma cultura de violência, princi-
palmente com relação a práticas nocivas de disciplinar os filhos com “palmadas”, “batendo nos
filhos” na tentativa de corrigi-los e conseguir que estes os respeitem como pais/mães, ressal-
tando que, dessa forma, foram criados e reproduzem o que aprenderam. Também responsa-
bilizam os aparelhos eletrônicos (internet, jogos, televisão) e músicas como reprodutores da
cultura da violência. Reconhecem que os adultos desrespeitam as crianças, e muitos até os
oprimem. Afirmam que o machismo é cultural e que a população infanto-juvenil desconhece
seus direitos.

Conhecimento das Leis, Regulamentos e Políticas - Adultos


Dos 244 adultos, 227 desconhecem e/ou não citaram qualquer lei, política ou regulamento que
protegem a infância e adolescência no Brasil. Apenas 13 adultos citaram o conhecimento do
Estatuto da Criança e do adolescente, 1 a Lei Orgânica da Assistência Social, 1 a Lei do Sistema
Único de Saúde e 2 (duas) pessoas, a Lei Menino Bernardo.

Serviços, Redes de Apoio e Círculos de Cuidados


mencionados pelos adultos
Dos 244 adultos pesquisados, 22 apresentam conhecimento do Conselho Tutelar, 13 conhecem
CRAS e CREAS, 12 buscariam as polícias e delegacias, 12 apenas contam com famílias e parentes,
10 com a Associação do Bairro, sendo que parte dessas pessoas reconhecem a Visão Mundial
como suporte, 7 adultos apontaram as igrejas, 6 consideram os professores e/ou profissionais
da escola como apoio, 5 recorreriam ao Posto de Saúde e 4 a vizinhos e/ou amigos. Apenas 1
adulto citou o Ministério Público.

84
Proteção de
Crianças e
Adolescentes
na Prática

85
6.1 Lei, Políticas e Regulamentos
No Brasil, as legislações, normas e regulamentos de proteção à infância e adolescência são
precisos no que tange aos direitos dos meninos e meninas e as responsabilidades da família e
da sociedade, dever do Estado, limites das instituições sobre esse segmento social, conforme
vemos na Constituição Federal de 1988.

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao


adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde,
à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,


exploração, violência, crueldade e opressão.”
(BRASIL, 1988. Art.227)

Além da Lei Magna (CF/88), o Brasil, em 1990, instituiu o Estatuto da Criança e do Adoles-
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cente, que embasa legalmente a argumentação pelos direitos da proteção; as medidas proteti-
vas para salvaguardar as famílias naturais e substitutas (sendo esta última pela guarda, tutela
ou adoção); institui as medidas aplicáveis aos pais e responsáveis pela violações de direitos,
expondo os que são proibidos; e revela os principais atores sociais que devem realizar/pro-
mover, garantir, assegurar, controlar e fiscalizar essa Proteção.

“Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de


negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão,
punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus
direitos fundamentais”
(BRASIL, 1990. Art. 5).

Para proteção, no caso brasileiro, por lei, a suspeita ou confirmação de castigo físico, de tra-
tamento cruel ou degradante e de maus-tratos contra a criança ou adolescente deve ser obri-
gatoriamente comunicada ao Conselho Tutelar da respectiva localidade. Em pesquisa primária
com atores sociais (informantes-chaves), representantes formais e informais da sociedade nos
oito estados brasileiros, identificamos que há a compreensão legal do caminho da denúncia
vinculado prioritariamente ao Conselho Tutelar, à polícia e delegacias e equipamentos de As-
sistência Social. Para esses atores, as leis, especialmente o ECA, a Constituição Federal de 1988,
a LOAS, LOS, e a Lei de instituição do Sistema de Garantia de Direitos, Lei da Escuta Especia-
lizada e Lei Menino Bernardo colaboram diretamente para a proteção de meninos e meninas.

Os serviços de saúde, desde a porta de entrada (postos de saúde) e independentes dos níveis
hierárquicos de regionalização do SUS, todos os equipamentos possuem protocolos de no-
tificação com prazos para comunicação, bem como os serviços de assistência social, como o
Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) e os demais órgãos do Siste-
ma de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente devem conferir máxima prioridade ao
atendimento das crianças na faixa etária da primeira infância com suspeita ou confirmação de
violência de qualquer natureza.

No campo das ameaças de morte, existe o Programa de Proteção às Crianças e Adolescentes


Ameaçados de Morte – PPCAM, um instrumento de combate à violência letal contra crianças e
adolescentes e, excepcionalmente, jovens adultos de até 21 anos, se egressos do sistema socio-
educativo, destinando-se a situações de risco à vida, havendo ou não situação de vulnerabilidade.

86
O programa foi instituído oficialmente pelo Decreto Presidencial nº 6.231/2007, com a finalidade
de proteger crianças e adolescentes expostos a ameaças de morte, por meio de uma medida
protetiva.

Desde o ano de 1999, o Brasil criou a Lei nº 9.807, de 13 de julho de 1999 e Decreto nº 3.518, de 20
de junho de 2000, que institui o Programa de Proteção Especial a Vítimas de Testemunhas. Es-
sas medidas de proteção são requeridas por vítimas ou por testemunhas de crimes que estejam
coagidas ou expostas a grave ameaça em razão de colaborarem com a investigação ou processo
criminal serão prestadas pela União, pelos estados e pelo Distrito Federal. Vale esclarecer que
as leis e normas instituídas pela União, estados, municípios ou Distrito Federal não divergem
entre si no Brasil. O que pode apresentar de diferente são as competências estabelecidas entre
as instâncias, mas que são antecipadamente predefinidas na Lei Magna.

No que tange aos crimes sexuais cometidos contra crianças e adolescentes, sejam de crimes
contra a dignidade sexual, liberdade sexual ou daqueles contra vulneráveis, os agressores res-
pondem perante o Código Penal Brasileiro (1940) e em regra pública condicionada e excepcio-
nalmente pública incondicionada, somente quando a vítima for menor de 18 anos ou vulnerável.

No Brasil, a implementação das leis a partir das políticas, bem como a elaboração de nor-
mas para a proteção da infância e adolescência são feitas pelo poder Executivo, através dos
Ministérios, Secretarias Especiais, Secretarias Setoriais e quanto às resoluções, são delibera-
das pelos Conselhos de Direitos da Infância e da Adolescência, nas instâncias nacional, es-
tadual, municipal ou do Distrito Federal. Os planos são feitos a cada quatro anos (plurianuais)
no Poder Executivo, e no âmbito nacional existe o compromisso do Plano Decenal. Os planos
plurianuais devem ser pensados a partir do que foi demandado nas Conferências e consultas
públicas com participação popular.

As Políticas para a Proteção da Infância são financiadas pelos setores, partindo dos Ministérios
para os municípios de forma descentralizada, conforme orienta a Constituição Federal de 1988.
Para que as unidades federativas e municípios recebam o financiamento público, eles deverão
apresentar: um Planejamento construído coletivamente através de conferências, um Conselho
de Direito com a participação paritária (Governo e Sociedade Civil Organizada) e um Fundo
Público destinado exclusivamente à criança e ao adolescente, por exemplo. Mas esse procedi-
mento acontece em todas as políticas setoriais. Ainda que a Lei Máxima oriente a prioridade
absoluta do orçamento e atendimento à criança e ao adolescente em todos os setores das po-
líticas, não há uma cota mínima em percentual declarada em lei.

Mas o que acontece no Brasil?


O problema do Brasil não está na elaboração de suas leis e normas, e nem na ratificação com os
protocolos internacionais, pois elas, a cada dia, vêm detalhando e especificando as garantias de
direitos. A lacuna brasileira no que tange à legislação e normatização está na sua aplicabilidade,
na insuficiência de equipamentos sociais e de profissionais para o atendimento a demanda reprimi-
da, no acesso e apreensão dessas leis junto e pela população, principalmente os mais vulneráveis,
na ausência e/ou baixo monitoramento das políticas públicas, nos poucos espaços de diálogo do
poder público com a sociedade, no sentimento de impunidade gerado pela demora da justiça na
conclusão dos processos, sendo essas as principais brechas identificadas pelos atores chaves em
pesquisa primária aplicada pela Visão Mundial.

Quanto às barreiras na implementação das leis, políticas e regulamentos, os atores sociais


identificaram problemas ético-políticos como os casos de corrupção, omissão dos agentes pú-
blicos e/ou descompromisso com a legislação e a proteção e fiscalização do Orçamento Criança.
A dominação das facções criminosas e suas normas de condutas nas periferias das cidades foram
apontados pelos atores sociais entrevistados como impedimentos. Assim, analisamos que não
há hábitos populares de conhecer as leis, assim como, não há estratégias incisivas de regula-
mentos que normatize especificamente essas legislações no currículo escolar, por exemplo. O
desconhecimento das leis e políticas consequentemente torna o controle social ainda tímido,
ou seja, a população não participa e pouco exercita seus direitos.

87
6.2 Serviços e Mecanismos Governamentais de Proteção
à Infância e Adolescência
Conforme já comentamos anteriormente, o Sistema de Proteção da Infância e Adolescência no
Brasil convive com outros sistemas nacionais, como: assistência social, trabalho, saúde, educa-
ção, segurança pública, planejamento orçamentário, relações exteriores e promoção da igual-
dade e valorização da diversidade, dentre outros. Conforme vemos na ilustração que segue.

Figura 2 – Sistema de Garantia de Direitos no Brasil


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Fonte: UNICEF/2021

Cada uma das instituições mencionadas na Figura 2 faz parte do Sistema e da Rede de Pro-
teção da Infância e Adolescência no Brasil, tendo sua função e responsabilidades. Na pesquisa
primária realizada nas oito cidades/estados de atendimento da Visão Mundial, identificamos
as seguintes brechas no que tange aos Serviços de Atendimento e de Prevenção, os quais divi-
dimos nos seguintes blocos para facilitar a análise: 1) Estrutura; 2) Comunicação; 3) Gerência
Administrativa e 4) Contexto Social.

No que tange à estrutura dos Serviços e Mecanismos de atendimento, foram mencionados: Es-
trutura dos equipamentos assistenciais deficitária; poucas qualificações para agentes públicos;
burocracias no atendimento e/ou para receber benefícios. Nos processos comunicacionais, os
atores sociais apresentam a desinformação da população sobre o acesso a serviços e os ruídos
de comunicação dos equipamentos públicos são os maiores entraves para a proteção da infân-
cia e adolescência.

Com relação à gerência administrativa desses serviços, os atores apontam que os atendimen-
tos que as políticas públicas possibilitam necessitam ser mais eficientes, eficazes e efetivos.
Sugerem reformas no Sistema de Justiça e mudanças nas atividades e serviços preventivos.
Durante a pesquisa, os atores sociais mencionaram o contexto social da pandemia de Covid-19,
e as implicações das escolas fechadas, bem como a falta de participação das famílias nas ações
preventivas e processos de proteção. Importa salientar que no Brasil, há um fluxo para registro
de denúncias de casos de violações de direitos contra a Infância, que pode ser de forma pres-
encial, por escuta ou online. De qualquer forma, é garantido o sigilo. No que tange ao presen-
cial, as pessoas podem recorrer diretamente aos órgãos: Conselho Tutelar, prioritariamente.
Entretanto, ressaltamos que qualquer evidência de abuso, a obrigatoriedade de registro é de

88
todos os profissionais, de qualquer órgão público, privado ou de organização da sociedade civil.

É bem recorrente que os casos cheguem primeiro nos CRAS (Centro de Referência da Assistên-
cia Social) e CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social), que fazem parte
dos equipamentos de Assistência Social no Brasil localizados nos territórios vulneráveis, ou
seja, mais próximos às famílias. Entretanto, os atores sociais entrevistados apontam que há
falências no reporte de incidências de proteção à infância quando “a família tem medo e/ou
vergonha de denunciar”; “a família tem dependência emocional e/ou financeira do agressor”;
“falta de equipamentos públicos próximos”; “desconhecimento da leis e a respeito dos espaços
de proteção”; “garantia de sigilo dos casos”; “sentimento de impunidade”; “negligência, omissão
e/ou despreparo dos agentes públicos”; sendo essas as principais motivações para a “subnoti-
ficação dos casos” de violação de direitos contra crianças e adolescentes.

Assim, entendemos que há necessidade das crianças e famílias conhecerem o fluxo de denún-
cias e a funcionalidade de cada órgão. A demanda certamente aumentaria, bem como o controle
social e, respectivamente, a ação do Estado no aumento de equipamentos para atendimento e
proteção, para que as denúncias não ficassem sem respostas e/ou resolutividade dos casos.

Outro mecanismo de denúncias se dá por meio de órgãos de Escuta Especializada (Ouvidorias


online, Disque Denúncia 100, aplicativo Proteja Brasil). A maioria dos casos são registrados no
Disque Denúncia Direitos Humanos – Disque 100. Mas também há registros pelos profissionais
da área da Saúde que são centralizadas, as informações pelo Sistema de Notificação Compul-
sória – SNC, a partir de uma ficha que é realizada por profissionais informando o tipo de vio-
lação de direitos e o nível de gravidade, tendo a responsabilidade de encaminhar ao Conselho
Tutelar, bem como a equipamentos de apoio da saúde física, mental e assistencial das crianças
e adolescentes com seus direitos violados. Durante as entrevistas com atores sociais, estes
reportaram como fortalezas os serviços do Conselho Tutelar, as polícias e as delegacias espe-
cializadas, a relevância de canais de escuta - como exemplo, o Disque 100 - os equipamentos
do SUAS, as escolas, profissionais e iniciativas estudantis, os profissionais da saúde em todos
os equipamentos do SUS.

O Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro possui um tipo de atendimento para o acompanha-
mento e tratamento psicossocial nos casos de transtornos mentais desenvolvidos ou, ainda, o en-
volvimento dessas crianças com álcool e outras drogas, devido às vulnerabilidades decorrentes
do efeito e consequências ocasionadas pelas relações abusivas e de exploração: os Centros de
Referência Psicossocial Infanto-Juvenil – CAPSi. Durante a pesquisa quantitativa, localizamos
no site do Ministério da Saúde (2021) a existência de 2.661 CAPS, incluindo todos os tipos e
faixas etárias. Porém, não conseguimos um relatório recente que apresentasse o número de
CAPS exclusivamente para o público infanto-Juvenil.

No que tange ao número de instituições públicas de atendimento das crianças e adolescentes


em situação de abusos (físicos ou sexuais), explorações sexuais e de trabalho infantil, dentre
outras violações de direitos, no Sistema Único de Assistência Social (SUAS) apresentam-se os
seguintes dados:

89
Gráfico 22 - Equipamentos Sociais para atendimentos as violações de direitos
à crianças e adolescentes no Brasil - SUAS

Nº de centro de Convivência Social 8041

Nº de Centros-Dia 1664

Nº de Acolhimento Institucional 5768


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Nº de CRAS 8357

Nº de CREAS 2723

Nº de Centro Pop 228


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0 2000 4000 6000 8000 10000

Fonte: Dados coletados do Censo SUAS 2017

Pelo Gráfico 22, acima expresso, o governo brasileiro em 2019, a partir dos registros no Censo
SUAS, possui 26.781 equipamentos sociais a disposição de crianças e adolescentes, bem como
suas famílias para atenderem qualquer tipo de vulnerabilidades. Para um melhor esclareci-
mento, o CRAS presta serviços e implementa programas socioassistenciais de proteção básica
às famílias e aos indivíduos e à articulação desses serviços no seu território de abrangência à
ação intersetorial na perspectiva de potencializar a proteção social. No Brasil, até 2019 havia
8.357 CRAS em todo território nacional, sendo este o maior número de equipamento do Sis-
tema Único da Assistência Social que é disponível para crianças, adolescentes e suas famílias.

Em seguida, vêm os Centros de Convivência, com 8.041 unidades pública de assistência social
destinadas ao atendimento de famílias e indivíduos em situação de vulnerabilidade e risco
social. São espaços que promovem atividades em grupo e estão vinculados aos Centros de
Referência de Assistência Social (CRAS), podendo ser administrados tanto pelo poder público
quanto por entidades sociais. Em 2019, havia 5.768 instituições de acolhidas, entretanto, essas
podem acolher apenas crianças e adolescentes (em caso de abandono, órfãos, com direitos se-
xuais violados pela própria família) mulheres vítimas de violência, idosos ou ainda, famílias em
situação de proteção às ameaças de morte.

Vale destacar o número de CREAS (2.723) que ainda são insuficientes para o número de vi-
olações de direitos que tem se acumulado durante esses últimos oito anos no Brasil. Estes
ofertam serviços especializados e continuados a famílias e indivíduos nas diversas situações de
violação de direitos. O CREAS articula os serviços de média complexidade e opera a referên-
cia e a contrarreferência com a rede de serviços socioassistenciais da proteção social básica
e especial, com as demais políticas públicas setoriais e com os órgãos do Sistema de Garantia
de Direitos (Ministério dos Direitos Humanos, 2018). Além dos equipamentos do SUAS, para a
Proteção da Infância e Adolescência no país, existe o Conselho Tutelar. Este órgão permanente
e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos di-
reitos da criança e do adolescente no Brasil (ECA, 1990).

No que tange aos Conselhos Tutelares no Brasil, em 2019 existiam 5.956 Conselhos Tutelares
(CTs) em todo o território nacional, segundo dados da Secretaria Nacional dos Direitos da Cri-
ança e do Adolescente (SNDCA). O número de equipamentos sociais públicos aparentemente

90
é expressivo. Entretanto, não basta ter os equipamentos nos territórios vulneráveis, mas ob-
servar seu funcionamento; se os serviços estão sendo prestados; se há, de fato, benefícios
entregues às famílias; se a equipe é, de fato, qualificada e tem uma carreira ou se o fluxo de
profissionais é contínuo; o que vai atingir diretamente na intervenção social e nos impactos,
que podem ser positivos ou negativos.

Em uma pesquisa recente desenvolvida sobre Sistema de Garantia de Direitos para a Infância
no Brasil (UNICEF, 2021), dentre os desafios apontados, encontramos as seguintes limitações
para uma efetiva ação do Estado Brasileiro na Proteção da Infância: baixa articulação e integra-
ção do Sistema; falta de institucionalização de parte da Rede de Proteção; pouco alinhamento
entre profissionais da segurança pública (policiais) com a garantia de Direitos Humanos; au-
sência de formação dos profissionais envolvidos; poucos profissionais; escassez de recursos;
falta de investimento para ampliação da oferta de programas e serviços da rede de proteção;
falta de apoio aos equipamentos; descrença da população em relação à cooperação da Rede;
baixa cobertura do Conselho Tutelar; baixa resolutividade por parte dos conselheiros tutela-
res; necessidade de trabalhar a integração entre os setores das políticas públicas para o atendi-
mento das necessidades da população; na formulação de políticas não se pensa como políticas
universais e especiais; e a necessidade de uma mudança cultural e de paradigma, na compreen-
são e avaliação de Direitos Humanos por parte da sociedade.

Quanto aos avanços ou as consideradas “práticas promissoras” (UNICEF, 2021), sobre o Sistema
de Garantia de Direitos no Brasil, destacamos o que encontramos no referencial teórico: es-
forços do Ministério Público e Defensoria Pública para a formação da Rede de Proteção; ações
e planos de trabalhos em prol da Rede de Proteção e do fluxo de atendimento em plantão dos
Conselhos Tutelares; avanços na criação de legislações em prol da Proteção da Criança como,
por exemplo: a Lei da Escuta Especializada; Organizações da Sociedade Civil que ofertam pro-
gramas no fortalecimento e proteção da infância; Conselhos de Direitos da Criança e do Ado-
lescente; Centro de Referência da Assistência Social - CRAS e Centro de Referência Especiali-
zado de Assistência Social - CREAS se aproximando das escolas em algumas cidades brasileiras;
pesquisas baseadas em evidências; meios de comunicação e redes sociais têm sido um possível
espaço de disseminação de direitos e internalização de comportamentos.

Nesse fator de Serviços e Mecanismos de Prestação de Serviços para crianças e adolescentes


expostas às violências, abuso, abandono e exploração, outros protagonistas estão intervindo
socialmente na Rede de Proteção da Infância, que são as Organizações da Sociedades Civil –
OSC. Essas Organizações, apesar de serem instituições jurídicas privadas, não têm finalidades
lucrativas, e nesse sistema estão atuando no eixo da promoção e do atendimento.

A pesquisa primária, a partir das ferramentas ADAPT junto aos atores sociais, apontou sobre as
brechas na capacidade dos serviços formais e informais do Sistema e Rede de Proteção da In-
fância e Adolescência no Brasil: Pouco investimento público em equipamentos e agentes públi-
cos; ausência do Estado nos territórios mais vulneráveis; falta de articulação entre setores pú-
blicos e Organização da Sociedade Civil; desconhecimento sobre todas as formas de proteção
da infância nas equipes de atendimento; as atividades com egressos do sistema socioeducativo
não são continuadas; pouca qualificação para as equipes; segurança para as informações
sigilosas, assim como há problemas decorrente de alimentação incorreta no sistema ou os
há registros de denúncias incompletos.

No levantamento realizado a partir do mapeamento de OSC feito pelo Instituto de Pesquisa


Econômica Aplicada – IPEA em 2018, identificamos o número de 33.911 instituições que tra-
balham na área de Assistência Social e atendimento às famílias vulneráveis. Esse número ainda
é maior que os equipamentos disponíveis pelo Estado na área da Assistência Social no Brasil
(26.781), evidenciando que na área de Assistência Social, o esforço da Sociedade Civil organiza-
da está sendo maior que o Estado no que tange à Proteção da Infância.

91
Gráfico 23 - Número de OSC na área da Assistência Social no Brasil

Total de OSC

Serviços de Prestação Social Especial de Média Complexidade

Serviços de Prestação Social Especial de Alta Complexidade

Serviços de Prestação Básica Brasil


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Outras Ofertas

Benefícios Eventuais

Ações de Assessoramento, Defesa e Garantia de Direito

0
0

0
.0

.0
20

40
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Fonte: Dados coletados no site no IPEA sobre Mapa OSC no Brasil, 2018.

O Gráfico 23 revela que das 33.911 Organizações da Sociedade Civil que atuam na Assistência
Social, 14.364 desenvolvem ações de assessoramento e defesa da garantia de direitos, seguidas
de 10.138 que prestam serviços de proteção social básica, 6.033 de outras ofertas, 3.674 orga-
nizações que desenvolvem serviços de proteção social de alta complexidade, 3.503 de média
complexidade e, por fim, 2.226 OSC que atendem com benefícios eventuais.

Essas Organizações da Sociedade Civil são reguladas por legislações de âmbito nacional, mui-
tas possuem parcerias com o Estado, e outras são sustentadas por agências internacionais, por
doações de pessoa física e/ou de recursos de empresas provenientes de incentivos fiscais. As
que desenvolvem serviços para crianças e adolescentes devem ser cadastradas no Conselho de
Direitos da Criança e do Adolescente nos âmbitos municipal, estadual ou nacional, dependendo
da amplitude de atuação da Organização.

6.3. Capacidades e Recursos


O financiamento de recursos destinados às políticas públicas no Brasil provém dos impos-
tos, taxas, tarifas, vendas de títulos públicos, multas, concursos e encargos sociais que são
distribuídos nas Políticas de Seguridade Social (assistência social, saúde e previdência) e as
demais políticas setoriais, as quais devem aportar destino dos recursos para a Proteção da
Infância e Adolescência no país. No que tange ao orçamento público destinado às crianças e
adolescentes, temos a orientação internacional da Convenção dos Direitos da Criança, que diz
em seu art. 4º que “os Estados Partes devem adotar tais medidas utilizando ao máximo os re-
cursos disponíveis” (ONU, 2016), ou seja, todo o esforço possível para mobilizar, alocar e gastar
os recursos orçamentários para atender os direitos de todas as crianças em sua integralidade
com efetividade, de maneira eficiente e transparente.

Há também recursos destinados e exclusivos a um Fundo especial em cada esfera de governo


(nacional, estadual e municipal) denominado Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente,
que são acompanhados pelos Conselhos de Direitos em cada instância de execução. No Brasil,
tanto os Conselhos de Direitos quanto o Ministério Público são responsáveis por monitorar e
avaliar o Orçamento Público destinado às crianças e adolescentes do país.

No uso de suas atribuições diante da Lei nº 8.242, de 12 de outubro de 1991, o Conselho Nacio-
nal de Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA – estabelece parâmetros de criação e

92
funcionamento dos Fundos de Direitos da Criança e do Adolescente – FDCA em todo territó-
rio nacional no ano de 2010 no Brasil. Nesta resolução de nº 132, de 21/01/2010, o CONANDA
apresentou que os recursos do Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente devem ter um
registro próprio, de modo que a disponibilidade de caixa, receita e despesa fique identificada
de forma individualizada e transparente.

A destinação dos recursos do Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente, em qualquer


caso, dependerá de prévia deliberação plenária do Conselho dos Direitos da Criança e do Ado-
lescente, devendo a resolução ou ato administrativo equivalente que a materializar ser anexada
à documentação respectiva, para fins de controle de legalidade e prestação de contas. Após 10
anos desta resolução no I Congresso do Ministério Público Brasileiro em 2020, o Ministério
Público lançou as “Orientações sobre Orçamento e Fundos dos Direitos da Criança e do Ado-
lescente”, com a proposta de incentivar o uso adequado dos recursos públicos e dos Fundos do
Direito da Criança e do Adolescente.

Nesse Congresso, foi discutido e apresentado um guia que orienta a metodologia de prestação
de contas do Poder Executivo e dos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente para des-
tinação mais adequada e transparência na utilização dos recursos para Proteção da Infância e
Adolescência no país. É importante ressaltar que esta preocupação também provém devido aos
incentivos fiscais que a legislação brasileira fomenta a partir da doação incentivada de pessoas
físicas e empresas do seu imposto de renda para os Fundos de Direitos da Infância no país.

Quanto à capacitação para equipe de profissionais do Sistema de Garantia de Direitos no Brasil,


no levantamento realizado em pesquisa documental, percebemos que existem iniciativas que
vem da Escola Superior do Ministério Público, da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança
e do Adolescente, sendo que esta última implementou, até o presente momento, 19 escolas de
Conselhos Tutelares no Brasil. Também identificamos iniciativas do Ministério da Cidadania
com o programa CapacitaSuas para as equipes dos CRAS, CREAS, Centro Pop, Centros de Con-
vivência e Centro Dia, bem como Organizações da Sociedade Civil que têm como bandeira de
luta a defesa e proteção da criança e do adolescente.

Essas iniciativas de capacitação ainda são consideradas pontuais por não atingirem a maioria
dos profissionais com a capacitação continuada, até porque no Brasil, devido à precarização
do trabalho (baixos salários, seleções temporárias, instabilidade) e riscos enfrentados (devido
a conflitos territoriais por facções), há um fluxo de profissionais, sendo uma boa parte
terceirizados, temporários e/ou de cargo de confiança política. No caso dos Conselheiros
Tutelares, há um processo de escolha a cada quatro anos, o que demanda uma permanente
necessidade de formação de conselheiros tutelares.

Quanto às instalações, o Brasil já enfrentou momentos piores na questão de equipamentos


necessários aos órgãos de proteção da infância, principalmente nos equipamentos junto aos
Conselhos Tutelares. Hoje, há uma designação de composição mínima da Secretaria Especial
de Direitos Humanos da Presidência da República que cada Conselho Tutelar deverá ter: 1
automóvel, 5 computadores desktop, 1 (uma) impressora multifuncional, 1 refrigerador e 1
bebedouro.

Entretanto, consideramos que há ainda a necessidade de formações continuadas para Conse-


lheiros Tutelares e equipe técnica que os apoiam. E, principalmente no que tange ao monito-
ramento da atualização dos dados no SIPIA, que é o Sistema Nacional de registro e tratamento
de informações sobre a garantia e defesa dos direitos fundamentais preconizados no Estatuto
da Criança e do Adolescente.

93
6.4. Cooperação e Coordenação (intersetorialidade)
do sistema
As ações integradas e articulações intersetoriais, na busca por cooperação e coordenação so-
bre o atendimento ao público infanto-juvenil, além de previstas na Constituição Federal e no
Estatuto da Criança e do Adolescente, são objetivos e metas do Plano Decenal dos Direitos
Humanos da Criança e do Adolescente no Brasil (2011-2020).

Dentre os desafios dessa proposta de cooperação e coordenação, podemos considerar como


um dos principais focos de análise a intersetorialidade. Ressaltamos então, baseado em auto-
res como Secchi (2010), Resende e Baptista(2015) que a intersetorialidade requer uma postura
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

dialógica, interações horizontalizadas na gestão pública, precisando ser pensada para além de
um trabalho conjunto, mas reunindo esforços, numa atuação sinérgica em prol dos objetivos
comuns, no caso, para a proteção de meninos e meninas de nosso país.

Entretanto, não só no Sistema de Proteção da Infância, mas em todas as políticas setoriais no


Brasil, a Intersetorialidade vem sendo um desafio. Possivelmente pelo seu sentido de busca
da eficiência, eficácia e efetividade das políticas, alinhada à potencialização de recursos e/
ou redução de gastos a partir da articulação e estratégias que são desenvolvidas em prol e no
processo de proteção social. Esse desafio foi apontado em nossa pesquisa primária, quando
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L

atores chaves apontam a necessidade de articulação entre setores do SGD e Rede de Proteção,
destacando principalmente a respeito da atuação dos Conselhos Tutelares nesse processo.

Outro ponto de cooperação em destaque sugerido pelos atores sociais entrevistados foi a ne-
cessidade de formação sobre SGD e Rede de Proteção não apenas envolvendo equipamentos
do Governo, mas também OSCs, escolas, igrejas/centro religiosos, dentre outros. Além disso,
foram citados: momentos de diálogo entre sociedade e governo, práticas de monitoramento de
políticas públicas, fiscalização sobre a entrega dos serviços e benefícios prestados pelo estado,
estudos e pesquisas sobre a infância e adolescência para conhecimento da realidade e precisão
na elaboração de políticas públicas e aumento de canais de escuta nos municípios.

Aqui, destacamos em especial, a respeito das vozes de Conselheiros Tutelares entrevistados,


que afirmaram a necessidade de apoio na cooperação da Segurança Pública para proteção da
infância. Durante a pesquisa, Conselheiros Tutelares e alguns profissionais da Assistência So-
cial apontaram o risco nas visitas domiciliares nos territórios vulneráveis, quando envolvia
casos de exploração do trabalho infantil, abuso e/ou exploração sexual ou tráfico de seres
humanos. A disponibilidade de agendas, estratégias e ações conjuntas entre policiamento e
Conselho Tutelar nas comunidades se faz necessária, uma vez que muitos territórios estão
dominados pelo Narcotráfico e, nesta realidade, agentes públicos não conseguem mais entrar
para o exercício de suas atividades sem correr o risco de perder a vida.

Quando questionamos os atores sociais a respeito das brechas da Capacidade das Forças de
Ordem, eles declaram que temos estrutura precária, é forte a sensação de impunidade ou de
uma justiça lenta. Também foram comentadas que há denúncias falsas, trotes e famílias que
desistem da denúncia, que nos equipamentos de ordem há profissionais não qualificados para o
atendimento a crianças e adolescentes, agentes públicos da área não sensíveis a causa da Pro-
teção da infância e que parte da população não confia nos equipamentos, bem como a presença
das facções criminosas pratica a justiça na comunidade com as próprias mãos.

No caso brasileiro, a burocracia é outro ponto para ser evidenciado. Mesmo considerada ne-
cessária para a transparência pública, ela requer saberes e ações interdisciplinares, bem como
habilidades e competência estatal em seu corpo técnico para a busca de caminhos coordena-
dos e cooperativos para a Proteção da Infância (Carmo e Guizzardi, 2017).

No que tange à cooperação em prol de ações integradas entre Estado e Sociedade Civil, é vá-
lido destacar a influência do contexto tanto para as ações políticas quanto para o contexto da
prática, pois no que tange a proteção social (Rezende e Baptista, 2015) e, prioritariamente, da
proteção de crianças e adolescentes as divergências partidárias, ideológicas e/ou religiosas

94
que são perceptíveis na realidade política brasileira devem ser suprimidas pela causa da ética,
pela vida, respeitando o Estado laico.
Retornando ao foco da intersetorialidade, outro desafio está na visualização, interpretação que
se organiza uma vida política nas suas fases que são sequenciais, porém interdependentes. A
cooperação e a coordenação a partir da intersetorialidade precisa estar sendo planejada e exe-
cutada em conjunto desde a identificação dos problemas, formação das agendas, formulação de
alternativas, tomada de decisão, implementação das políticas, avaliação e, no caso de algumas
políticas sem retornos sociais, o momento da sua extinção (Secchi,2010).

De forma prática, no Poder Executivo, a Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Ado-
lescente (SNDCA) é responsável pela condução da Política Nacional de Promoção, Proteção e
Defesa dos Direitos das Crianças e Adolescentes, vinculada à pasta dos Direitos Humanos no
Governo Brasileiro. Possui a função de apoiar ações intersetoriais, interinstitucionais e inter-
federativas, promovendo a articulação de diversos órgãos e sociedade civil, estimulando essa
intersetorialidade na instância nacional (Ministério da Mulher, Família e dos Direitos Huma-
nos, 2020). Esta Secretaria, na instância nacional, executa as medidas pensadas e priorizadas
pelo Conselho Nacional de Direito da Criança e do Adolescente – CONANDA.

6.5. Mecanismos de Responsabilização


Como já mencionado, na Constituição Federal do Brasil de 1988, cada política tem o seu Con-
selho de Direitos, o qual uma de suas funções é deliberar prioridades e/ou aprovar orçamento
público destinado àquele setor. No caso, para meninos e meninas, o Conselho de Direitos da
Criança e do Adolescente em cada instância faz essa função.

Os Conselhos de Direitos são instâncias de participação da sociedade civil para a construção


democrática de políticas públicas. Dessa forma, o(a) cidadão(ã), a partir de uma Organização
da Sociedade Civil, pode fazer parte da formulação, supervisão e avaliação de políticas públi-
cas junto a representantes do governo. Os Conselhos de Direitos podem ter caráter delibera-
tivo, normativo ou consultivo.

Além disso, o Ministério Público, baseado no artigo 127 da Carta Magna, tem a função institu-
cional de zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública
aos direitos assegurados da Constituição, promovendo as medidas necessárias à sua garan-
tia (artigo 129, Inciso II).

Nesse sentido, o Ministério Público atua em duas linhas de frente: para garantir que as leis
orçamentárias especifiquem as metas físicas a serem atingidas pela administração pública
através das ações previstas nos seus respectivos orçamentos, bem como na execução do orça-
mento, acompanhar a implementação dessas políticas públicas já definidas na Legislação Orça-
mentária (Lima, 2016).

A Governança pública brasileira, na letra da Lei, adotou a partir do Decreto nº 9.203/2017: 1)


monitorar o desempenho e avaliar a concepção, a implementação e os resultados das políti-
cas e das ações prioritárias para assegurar que as diretrizes estratégicas sejam observadas;
2) avaliar as propostas de criação, expansão ou aperfeiçoamento de políticas públicas e de
concessão de incentivos fiscais e aferir, sempre que possível, seus custos e benefícios; e 3)
manter processo decisório orientado pelas evidências, pela conformidade legal, pela qualidade
regulatória, pela desburocratização e pelo apoio à participação da sociedade.

Apesar da existência desses órgãos, das leis e decretos que descrevem sua funcionalidade, há
diversos impedimentos na concretização desses processos na realidade brasileira. Um deles é
a destinação de recursos para avaliação das políticas. Ainda não há uma cultura de priorização
para avaliação de políticas no país. Outro problema é a quantidade de profissionais no Ministério
Público para a grande demanda, necessitando de concursos para a sua ampliação. Quanto aos
Conselhos de Direitos, pesquisas acadêmicas apontam que há participação de conselheiros de
direitos, porém muitos ainda precisam entender o seu papel e exercitá-lo.

95
Podemos também mencionar que o Orçamento Criança e Adolescente - OCA, enquanto fer-
ramenta, precisa ser expandido e estimulado para adesão entre as Organizações da Sociedade
Civil, como mais uma possibilidade de intervenção e controle social, para assim, garantir a
transparência e prestação de contas em números, sobre a Proteção Social da Infância e Ado-
lescência no país.

6.6. Círculos de Cuidados de meninos e meninas (ati-


tudes, valores, comportamentos e práticas tradicionais)
Quando evidenciamos os círculos de cuidados com crianças e adolescentes como um dos fa-
tores que merecem atenção, creditamos a importância de conhecer a realidade das práticas
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

tradicionais, mas também de pensar em estratégias que influenciam atitudes, valores e com-
portamentos sociais e institucionais para apoio e proteção imediata dos meninos e meninas
nos ambientes sociais. No Brasil, no que tange ao governo a respeito da proteção da infância
e adolescência, constatamos algumas políticas que evidenciam linhas de cuidados fora do
domicílio: nas políticas de Saúde, da Assistência Social e algumas iniciativas na Educação.

Na área da Saúde, identificamos a Política de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Vi-


olências instituída pela Portaria nº 737 de 2001, com objetivo da redução destes índices no país,
mediante o desenvolvimento de um conjunto de ações articuladas e sistematizadas. A Portaria
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do Ministério da Saúde nº 1.968 de 28 de outubro de 2001, que dispõe sobre a notificação, às


autoridades-competentes, de casos de suspeita ou de confirmação de maus-tratos contra cri-
anças e adolescentes atendidos nas entidades do Sistema Unido de Saúde; e a Portaria 1.863
– GM de 2003, da Política de Atenção à Urgências, com uma de suas finalidades a de garantir a
universalidade, equidade e a integralidade no atendimento às urgências clínicas, cirúrgicas, gi-
neco-obstétricas, psiquiátricas, pediátricas e as relacionadas às causas externas (traumatismos
não-intencionais, violências e suicídios).

Em 2010, o Ministério de Saúde lança a Cartilha de orientação denominada “Linha de Cuidado


para a Atenção Integral à Saúde de Crianças, Adolescentes e suas Famílias em Situação de Vi-
olências”, destinadas a gestores e profissionais da saúde, apresentando como necessário ser o
processo de acolhimento, apresentando como domicílio: nas políticas de Saúde, da Assistência
Social ser o processo de acolhimento, atendimento, cuidados profiláticos e tratamento para
a violência sexual, a notificação e o seguimento junto à rede de cuidados e de proteção social
(intrassetorial e intersetorial).

No setor de Assistência Social, identificamos um caderno de orientação chamado de “Linha


de Cuidado Aplicada ao Acompanhamento de Crianças e Adolescentes em Situação de Acolhi-
mento e suas Famílias”, lançado em 2013 com o apoio do CONANDA e da Secretaria dos Direitos
Humanos da Presidência da República, a partir da experiência do Projeto de Volta para Casa
em Mato Grosso do Sul.

Neste caderno de orientações supracitado, relativo às Linhas de Cuidados na Assistência Social


(2013) tem a finalidade de unificar ações de proteção social, preventivas e interventivas de se-
gurança, de sobrevivência (socioeconômica), de convívio ou vivência familiar e acolhida, como
também proporcionar o acesso a todos os recursos tecnológicos que o usuário necessita, des-
de visitas domiciliares realizadas pela equipe de orientação familiar (CRAS e CREAS) e outros
dispositivos da rede de proteção à criança/adolescente, até os serviços de alta complexidade.

Vale ressaltar que, quando meninos e meninas se tornam órfãos, ou os pais/responsáveis se


tornam incapazes de cuidar de seus filhos, ou ainda os próprios pais violam os direitos de seus
filhos, há um procedimento pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA em função da
garantia do direito à convivência familiar e comunitária: a sociedade e ou profissionais deve
comunicar ao Conselho Tutelar, que notificará ao Ministério Público e Defensoria Pública e
acionará o CRAS e CREAS para estudo diagnóstico da situação/caso e a tomada de decisão,
se irá apenas acompanhar a família ou solicitar um acolhimento institucional. Em um prazo
determinado em lei, será acionada para que uma instituição específica de acolhimento receba
a criança ou o adolescente.

96
O afastamento da criança ou adolescente do convívio familiar é de competência exclusiva da
autoridade judiciária e importará na deflagração, a pedido do Ministério Público ou de quem
tenha legítimo interesse, de procedimento judicial contencioso, no qual se garanta aos pais ou
ao responsável legal o exercício do contraditório e da ampla defesa. (Incluído pela Lei nº 12.010,
de 2009)

A Instituição Acolhedora se responsabilizará, em parceria com a justiça na busca da família


extensa biológica/ampliada como prioridade; caso não seja possível, a substituta ou em último
caso, a justiça possibilitará a adoção.

Nesse sentido, os equipamentos sociais da área da Assistência Social deverão entender os pro-
cedimentos metodológicos e operacionais do atendimento e acompanhamento de crianças e
adolescentes que estão na situação considerada de alta complexidade: o acolhimento institu-
cional e a medida protetiva. Caso a família extensa – quando contatada e analisada pela equi-
pe dos equipamentos sociais – tenha condições e aceite cuidar da criança ou adolescente na
situação de orfandade, de rua ou violação de direitos pelos pais, a justiça emitirá a guarda,
oficializando a criação desses meninos e meninas.

As Instituições de Acolhimento no Brasil são de interesse público, não só as governamentais,


mas também as provenientes da Sociedade Civil Organizada. Ambas, para seu funcionamento,
são credenciadas do Conselho de Direito da Criança e do Adolescente, bem como no Conselho
de Assistência Social, nas instâncias municipal e nacional.

Pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (1990], as Instituições de Acolhimento devem seguir


princípios para a organização desses serviços (Art. 92). O Ministério de Desenvolvimento Social
e Combate à Fome, hoje denominado de Ministério de Cidadania, em 2008, publicou um docu-
mento oficial de Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes,
que esclarecem os princípios, orientações metodológicas e parâmetros de funcionamento para
abrigo institucional, Casas-Lar, Famílias Acolhedoras e Repúblicas, informando a estrutura mí-
nima e tipos de profissionais (equipe) necessários para esse tipo de atendimento social.

No Brasil, os profissionais no sociojurídico (assistentes sociais e psicólogos da Vara da Infância


e Juventude), que deveriam fazer acompanhamento nos casos de famílias acolhedoras ou as
que pretendem adotar, são poucos e, a maioria, terceirizados ou credenciados – o que dificulta
um acompanhamento familiar sistemático e periódico para acompanhamento da criança, e
inclusão no ambiente familiar. Há demora na liberação da guarda e no processo da adoção. A
precarização do trabalho é outro fator que merece destaque. Os profissionais credenciados na
justiça utilizam seu próprio transporte, não têm ajuda de custo e são pagos por produtos, sem
qualquer tipo de direitos trabalhistas, e correm riscos de vida ao entrar nas comunidades, pois,
em muitas periferias das grandes capitais no Brasil, o acesso precisa de conhecimento de um
líder comunitário e/ou permissão do tráfico de drogas.

No que tange à proteção de meninos e meninas no contexto educacional nos anos 2004, o Go-
verno Federal, através da Secretaria de Educação Continuada Alfabetização e Diversidade – SE-
CAD em parceria com outros órgãos, implementou o Projeto Escola que Protege, uma estratégia
de política pública de educação para prevenção e enfrentamento das violências (físicas e se-
xuais) contra crianças e adolescentes no contexto escolar, propondo formação continuada aos
professores da rede pública da educação básica, implantação de escola para pais; e acolhimen-
to, avaliação diagnóstica e atendimento psicossocial a crianças e adolescentes matriculados.

Capacitação, produção de material didático e paradidático voltados para a promoção e defesa


dos direitos das crianças e adolescentes eram seus grandes focos. Teve seu projeto piloto em
Fortaleza, Belém e Recife inicialmente e, em 2006, estendeu sua atuação para 84 municípios
em todo Brasil. Depois de 2008, não se ouviu mais falar de nenhuma iniciativa na educação na
instância federal exclusiva para enfrentamento às violências sexuais.

Um debate social e de publicações acadêmicas surgiu nos últimos anos denunciando as di-
versas violências que as crianças e adolescentes enfrentam no ambiente escolar: bullying, vi-
olência física, violência verbal, ameaças, assédio sexual, assédio moral, que acontecem tanto

97
entre alunos, entre professores e alunos, alunos e comunidade. Além destes, há os recorrentes
conflitos territoriais devido às facções criminosas e ao narcotráfico, que circulam as escolas
públicas como alvo de vendas de drogas. Todas essas demandas requerem do governo uma ur-
gente intervenção sobre a proteção de meninos e meninas no contexto escolar, sendo questões
internas e externas que acabam influenciando no desempenho escolar e no seu desenvolvi-
mento pleno.

A Visão Mundial no Brasil, em parceria com outras organizações, no âmbito do enfrentamen-


to às violações de direitos da infância e adolescência, tem se articulado com o poder público
em prol de estratégias de enfrentamento às violências físicas e sexuais, com a experiência de
Comitês Escolares formados entre profissionais da educação, adolescentes e pais. Esta expe-
riência resultou na incidência de políticas públicas sobre três estados de sua atuação, a partir
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da elaboração de projetos de leis, bem como na sua aprovação pelo Poder Legislativo.

No caso de desaparecimento de crianças, o Brasil possui uma legislação de nº 11.259/2005


conhecida como Lei da Busca Imediata, que determina a investigação policial imediata em caso
de desaparecimento de crianças e adolescentes. Recentemente, o Decreto nº 10.622, de 9 de fe-
vereiro de 2021, designa a autoridade central federal de que trata a Lei nº 13.812, de 16 de março
de 2019, institui o Comitê Gestor da Política Nacional de Busca de Pessoas Desaparecidas e
dispõe sobre a Política Nacional de Busca de Pessoas Desaparecidas e o Cadastro Nacional de
Pessoas Desaparecidas.
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Para as famílias em situação de rua, tanto o governo quanto a Rede de Proteção (OSCs) desen-
volvem um trabalho interinstitucional para abordagem social de rua nas capitais e grandes
cidades, com ações articuladas para crianças em situação de rua. Entretanto, na realidade, mi-
lhares de pessoas (e famílias inteiras) estão em situação de rua no Brasil, sendo que pesquisas
e Censos para essa população são raros, invisibilizando-os nas estatísticas e análises sociais.
Ou seja, nos deparamos na realidade com essa população, mas não conseguimos nem sequer
evidenciá-los.

6.7. Resistência e Participação de Meninos e Meninas


A participação de meninos e meninas é incentivada pela Convenção sobre os Direitos da Cri-
ança (ONU) e assegurada pela Constituição Federal do Brasil (1988) e pelo Estatuto da Criança e
do Adolescente (1990) para o seu melhor interesse e bem-estar. No âmbito nacional, a pesquisa
registra uma iniciativa do CONANDA para o fortalecimento do Comitê de Participação de
Adolescentes (CPA) instituído pela Resolução Nº 191, de 7 de junho de 2017, do comitê. É for-
mado por 47 adolescentes escolhidos no âmbito dos espaços de participação de adolescentes
nos Conselhos Estaduais dos Direitos da Criança e do Adolescente, de grupos sociais diversos e
por meio do ambiente virtual de participação. Para a realização desse processo de participação
dos adolescentes, o CONANDA criou uma plataforma virtual.

Entretanto, a participação infanto-juvenil destinada à incidência política ainda está em pro-


cesso de contínua construção no caso brasileiro. Estudos acadêmicos apontam maiores inter-
esses desse público para a participação em outras esferas da vida associativa: esporte e lazer,
religião, cultura (dança, música, literatura, artes), dentre outras com dimensão simbólica para
suas expressividades.
Atualmente, as iniciativas denominadas de Coletivos envolvendo meninas e meninos são cres-
centes e objetos de novas tendências de organização, interesses, e ressignificação de sua
identidade, sentimentos de pertenças, interações sociais e projeções de vida. São manifes-
tações que se originam de grupamentos juvenis e compartilham propósitos e cultura que, para
Montoya (2010), apontam forma de resistência à organização hierárquica, favorecendo o au-
togoverno e a gestão horizontal. Entretanto, muitos desses coletivos de resistência, a figura
do “adulto” pouco está presente, e alguns desses movimentos não aceitam a intervenção, nem
sequer o apoio financeiro governamental, como forma de expressar sua independência.

98
O Brasil, diferente de alguns países na América Latina, ainda não tem a cultura de participação
de crianças e adolescentes tendo as suas vozes expressas em audiências públicas e nos espa-
ços do legislativo/parlamento (Câmara dos Vereadores, Assembleia ou Congresso). Há apenas
comitês e Frente Parlamentar em prol de questões prioritárias à infância e adolescência que
estudam a realidade (pesquisas) e debatem socialmente para a elaboração de legislações em
prol da criança, porém, feitas por adultos.

Assim, entendemos que há necessidade no Brasil de uma intervenção social em estímulos de


reconhecimentos de direitos, participação e processos de engajamentos infanto-juvenis para
sua proteção social, nos diversos ambientes sociais: famílias, escolas, igrejas/centros religi-
osos, clubes esportivos, associações, no legislativo, nos conselhos de direitos, e acesso aos
coletivos de resistência.
Durante a nossa pesquisa primária, os atores sociais apresentaram como oportunidades
necessárias para habilitar as crianças e adolescentes para vida: o estímulo à participação nos
espaços sociais, comunitários e religiosos; a educação integral (segundo mais destacado nas
vozes da pesquisa); a formação em liderança e no conhecimento de direitos; espaços desti-
nados ao lazer, esporte, cultura e atendimentos psicossociais; a divulgação ampla dos canais
de denúncia; as orientações para a família sobre violência doméstica; e oportunidades de ini-
ciação profissional e trabalho para jovens seriam as principais estratégias.

Quanto à questão da busca das opiniões das crianças e adolescentes a respeito das tomadas de
decisões que as afetam, os atores sociais entrevistados sugerem: garantida da escuta segura e
protegida; acompanhamentos pelas organizações formais e informais; estimulo ao engajamen-
to em espaços de participação social e comunitária; valores como respeito, confiança, bem
como a autonomia sendo orientados pelas famílias e órgãos de atendimento e proteção; con-
sideração pela opinião das crianças nos processos de decisão que remetem a elas; desenvolver
linhas de cuidados e propostas de autoproteção.

Analisamos que a resistência de crianças, bem como as habilidades desenvolvidas para a vida e
opinião que envolvem tomadas de decisões para meninos e meninas partem de um desenvolvi-
mento de estratégia sobre a cultura no que tange ao reconhecimento da criança como sujeito
de direitos desde a escuta, a aproximação e garantia de espaços de participação, bem como de
desenvolvimento de tecnologias sociais que gerem a sua autoproteção.

6.8 Melhoria, Prevenção e Proteção contra


a Violência, o Abuso e a Exploração
Para obtermos sugestões de nosso público a respeito da melhoria da Proteção da Infância e
Adolescência, bem como o que poderiam deixá-los(as) seguros(as), os atores sociais respon-
deram: meninos e meninas engajados em projetos sociais, conhecendo seus direitos; sendo
acompanhados por seus familiares; comunidades protegendo suas crianças e participando
dos espaços de decisão; políticas públicas monitoradas; mais equipamentos de proteção na
Assistência Social; escola em tempo integral; aplicabilidade das leis; resolutividade dos casos;
mais policiamento e práticas de denúncias.

Percebemos então que a melhoria sugere investimento de recursos materiais, financeiros e


humanos, de formação, de engajamentos, monitoramento e controle social e de tempo, em uma
tríplice aliança que envolve Família, Governo e Sociedade Civil em prol de caminhos de respos-
tas cuja prevenção seja feita de modo que gere conhecimento, empoderamento, autocuidado
e autoproteção; a promoção do atendimento acolha, acompanhe e tenha resolutividade nos
casos de violação; que a defesa desempenhe seu papel de garantia de aplicabilidade da lei de
justiça social e de segurança pública, de modo que a Proteção da Infância e Adolescência seja
de fato percebida, sentida e vivida pelos meninos e meninas no Brasil.

A Pesquisa Análise do Sistema e da Rede de Proteção da Infância e Adolescência no Brasil, no


dia 29 de setembro de 2021, teve seu último encontro para a validação comunitária e busca

99
por caminhos de mudanças envolvendo adultos (mulheres e homens) e atores sociais de oito
cidades/estados brasileiros que foram pesquisados durante os meses de abril a setembro do
ano corrente. De forma remota (virtual), o encontro se deu através de um Seminário Nacional
pela plataforma Zoom em tempo real e com inscrição prévia para participação, totalizando 166
inscritos/participantes. Este evento foi dividido em três momentos, a saber: 1) Apresentação
dos Dados Nacionais da Pesquisa; 2) Validação Comunitária e 3) Caminhos para Mudanças, re-
comendados pela comunidade participante do evento.

Vale ressaltar que, após apresentação das questões prioritárias e causas estruturantes do Bra-
sil pela Consultora Nacional, dividimos os participantes por estado, em oito salas virtuais. Essa
divisão teve o propósito de sistematizar as especificidades regionais/locais durante a valida-
ção e elaboração de caminhos de mudanças, para que, em seguida, fossem expostas de forma
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coletiva, numa instância nacional, percebendo as necessidades e nuances locais.


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100
Validação e
Caminhos de
Mudanças

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7.1 Validação Comunitária
O momento de Validação Comunitária apontou o reconhecimento das seguintes Questões
Prioritárias para a Infância de Adolescência no Brasil: 1) Violência Sexual; 2) Trabalho Infantil; 3)
Gravidez na Adolescência; 4) Conflito com a Lei e 5) Pobreza, evidenciadas no Seminário Nacio-
nal de Validação, compiladas pelas planilhas de relatoria dos Pesquisadores locais (por Estado).

Como Causas Estruturantes que afetam nessa proteção: 1) Insegurança Pública devido, prin-
cipalmente, ao tráfico de drogas, violência institucional e a morte de crianças, adolescentes
e jovens da periferia; 2) Desemprego que provém das desigualdades sociais e é acentuado pela
crise sanitária da pandemia; 3) Investimento Público Insuficiente, e que não prioriza recursos/
orçamentos à criança e ao adolescente, inclusive nos acessos a serviços básicos de educação,
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saúde, moradia, profissionalização, transporte, cultura, esporte e lazer;

4) Cultura de Violência, estimuladas pelo machismo, adultocentrismo, sentimentos de intimi-


dação, e fortalecidas pela ausência de diálogo e/ou apoio familiar; 5) Desconhecimento dos di-
reitos e das políticas de Proteção.

Conforme já descrito, a validação comunitária aconteceu por cidade/estado, com a partici-


pação dos(as) pesquisadores(as) e assistentes de pesquisa (educadores(as) locais) que acom-
panharam seus respectivos estados durante o processo de pesquisa. Quanto à programação,
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o(a) pesquisador(a) apresentou as questões prioritárias e causas estruturantes coletadas pela


pesquisa ao seu público em salas virtuais os quais reconheceram, e/ou ajustaram termos.

É válido destacar que houve uma causa apresentada que não foi reconhecida pelos atores so-
ciais e famílias a respeito de sua localidade, a saber: desinformação sobre educação sexual, no
estado de Alagoas. As famílias e atores sociais participantes no Seminário reconhecem que
há informação sobre educação sexual, o que realmente acontece em Alagoas é uma aceitação
do casamento infantil, uma cultura de casar e iniciar uma nova família ainda na adolescência,
sendo reproduzida e estimuladas pelos próprios pais/mães e parentes. A mudança foi acolhi-
da numa instância local. Quanto às terminologias, tivemos um ajuste de “Baixo Investimento
Público” para “Investimento Público Insuficiente”, no Estado de São Paulo. Posteriormente, os
dados foram catalogados e analisados pela consultoria nacional e assessores da Visão Mundial
de suporte e revisão da pesquisa.

7.2 Caminho para Mudanças


Momento de debate e sistematização de respostas para cada “causa estruturante”, que foi
reconhecida e validada, apontando as fortalezas comunitárias, as potencialidades dos atores
sociais envolvidos e como estes podem contribuir para a proteção da infância. Houve também o
registro das ideias sobre “o que fazer”, “como fazer”, “quando”, “onde”, e “com quem fazer” sobre
cada causa validada, que denominamos de respostas para Caminho de Mudanças

Para uma melhor compreensão, dividimos as respostas (ideias) comunitárias em sete eixos
descritivos: Fortalecimento do Protagonismo Infanto-juvenil; Percepção das Fortalezas Co-
munitárias, Engajamento de Atores Sociais, Definição de Ação Comunitária para Proteção da
Infância, Definição de Espaço, Tempo e Responsável pela Atuação, Desenvolvimento de Meto-
dologias e Monitoramento e Avaliação das Ações. Vejamos o resultado a seguir.

Fortalecimento do Protagonismo Infantojuvenil


Ampliação de espaços de escuta, ações cotidianas que promovam autonomia, resiliência, auto-
confiança e autoproteção, conhecimento dos valores e dos Direitos Humanos, principalmente
alcançando meninos e meninas mais vulneráveis.

102
Percepção das Fortalezas Comunitárias
A comunidade respondeu que pode mudar seus hábitos, tem a força da participação, da mobi-
lização, da juventude, da experiência das mulheres e articulação nas relações e espaços sociais,
bem como vivência da solidariedade e da ajuda mútua nos territórios vulneráveis.

Engajamento de Atores Sociais


As leis, políticas e normas responsabilizam a família, o Estado e seu poderes (Legislativo,
Executivo e Judiciário) e a Sociedade Civil (formal ou informal) a protegerem as crianças e
adolescentes. A resposta comunitária sugere que profissionais de todas as políticas seto-
riais do Sistema de Garantia de Direitos e da Rede de Proteção, bem como o empresariado
devem ser estimulados ao engajamento em prol da promoção, defesa e controle dos direi-
tos dos meninos e meninas no Brasil.

Definição da Ação Comunitária para


a Proteção da Infância (O que fazer?)
Os participantes do Seminário Nacional Virtual de Validação e Caminho de Mudanças respon-
deram que devem ser retomados o trabalho de base comunitária, o Ciclo de Rodas ativo nas es-
colas, OSCs, igrejas; audiências públicas; abaixo-assinados; atos públicos, cartas de manifesto;
campanhas, seminários e formações sobre temáticas em torno do SGD; acompanhamentos de
planos e orçamento municipais, estaduais e nacionais sobre e para a infância e adolescência;
articulações junto a empresários e bancos de fomento em prol da melhoria das condições,
oportunidades e proteção de crianças e adolescentes.

Definição de espaço, tempo


e responsável pela atuação (Onde? Quando? Quem?)
Os espaços sociais – segundo atores sociais e famílias consultadas em Seminário Nacional –
públicos e/ou comunitários, privados, de interesse social e/ou governamental, independente
de expressão de fé, necessitam se organizar para acolhida, atendimento, prevenção, promoção,
proteção, defesa e controle social dos direitos da criança e do adolescente. Assim, conselhos,
escolas, associações, Igrejas, clubes, coletivos, de Organizações da Sociedade Civil, de univer-
sidades, da segurança pública, equipamentos públicos da justiça, do legislativo e do executivo,
dentre outros foram citados que devem trabalhar de forma integral, em tempo contínuo, per-
manente, sistemático e/ou periodicamente em prol da Proteção da Infância e Adolescência no
Brasil.

Desenvolvimento de Metodologias (Como?)


No que tange ao desenvolvimento de metodologias, foram citadas aquelas que promovam
estratégias de participação e mobilização comunitária; da cooperação interinstitucional,
intersetorial e de relações de trabalho em rede; que fomentem o empoderamento do exercício
dos direitos e práticas de denúncias nas comunidades, que potencializem os espaços de escu-
ta e diálogos entre sociedade e poder público. Tecnologias sociais que promovam o controle
social, monitoramento e avaliação das políticas e orçamentos públicos em prol das crianças e
dos adolescentes. Oportunidades para fomentar os Projetos de Lei que potencializam e geram
uma certa estabilidade aos profissionais do setor público (concursos) e das OSCs (editais e
subvenções) gerando continuidade de ações de proteção. Ideias inovadoras que potencializem
a comunicação e, portanto, a divulgação, disseminação e formação em prol dos direitos da
criança.

103
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104
Lições
Aprendidas
8. Lições Aprendidas
Nesse processo de validação e busca por caminho de mudanças, destacamos o con-
trole social, especialmente as expressões chaves: acompanhamento e monitoramen-
to das políticas públicas como respostas mais ressaltadas entre os comunitários e
atores sociais presentes no Seminário Nacional. Assim, analisamos que uma atuação
de monitoramento e avaliação das políticas tem sido uma das principais estratégias
que a população consultada evidencia como prática que, de fato, incide e provoca
mudança social em prol da Proteção da infância e adolescência no Brasil.

• Aprendemos a nos adaptar com as mudanças provocadas pela Covid-19 no âmbito da pesquisa
social, realinhando os métodos de construção e aplicação de técnicas de forma participati-
va, respeitando decretos de distanciamento social, mantendo a qualidade, confidencialidade e
credibilidade dos dados.

• O respeito aos diferentes contextos locais, suas vivências/experiências desde a mobilização


dos participantes, parcerias estabelecidas, desdobramentos e articulações necessárias para
execução da pesquisa, no tempo estabelecido.

• Aprendemos com as realidades, respostas e cada relato registrado, com as dificuldades


percebidas, sentidas e vividas pelas pessoas pesquisadas e na visão registradas pelos pesquisa-
dores a partir das análises locais.

• Nas cidades, a pesquisa com as ferramentas ADAPT provocou não só encaminhamentos soci-
ais aos casos percebidos no ato de sua aplicação, mas também sensibilização dos atores sociais,
adultos e dos próprios pesquisadores à militância pela causa da Proteção da Infância, gerada
pelo seu processo de realização.

• Aprendemos com o tempo necessário nas etapas da pesquisa, desde a aplicação, transcrição,
cuidados com a fidelidade e quantificação de vozes semelhantes e diferentes registradas, bem
como no trato dos dados (codificação, a importância da catalogação), necessitando de dedi-
cação maior para a reflexão e análise da pesquisa.

• O Seminário Nacional Virtual e seu processo de validação e construção de caminhos de


mudanças foi uma experiência ímpar na riqueza de ideias, no sentimento de compromisso
ocasionado pelo espaço de participação, escuta e validação do processo pelos atores sociais e
famílias envolvidas.

• Aprendemos que cada etapa nos habilita e respalda a práticas mais assertivas ao valorizarmos
a voz e a vez dos sujeitos de direitos pelas vias democráticas, zelando pela autonomia, em-
poderamento e emancipação dos participantes envolvidos.

105
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106
Considerações e
Recomendações
9.1. Considerações Finais
A Pesquisa de Análise de Contexto Nacional sobre o Sistema de Garantia de Direitos no
Brasil: Da Percepção das Crianças aos Operadores de Direitos. nos possibilitou identificar
- a partir dos relatórios de órgãos de credibilidade nacional e internacional – o comporta-
mento dos principais marcadores de vulnerabilidades, a saber: crianças e adolescentes em
situação de trabalho infantil, morando em instituições, no sistema de adoção, casamento
infantil, adolescentes grávidas, crianças em situação de violências (negligência, violência
física, sexual, dentre outras), crianças com deficiência, adolescentes em conflito com a lei
e respondendo ao sistema de justiça, crianças refugiadas, mortalidade infantil e letalidade
juvenil.

Em pesquisa primária com crianças, adolescentes, adultos e atores sociais em validação,


identificamos que as principais questões de Proteção da Infância são os conflitos familiares,
a violência sexual, o trabalho infantil, a gravidez na adolescência, adolescentes em conflito
com a lei, pobreza, desemprego, fome, violações de direitos e insegurança pública.

Constatamos que esses marcadores são mais recorrentes entre meninos e meninas em
situação de pobreza e aquelas de extrema privação; em concordância entre os estudos já
realizados, há um recorte étnico, sendo em sua maioria pardos e negros, com baixa es-
colaridade, os quais estão localizados nas periferias urbanas. Especificamente o Trabalho
Infantil tem se revelado em maior frequência nas zonas rurais, atingindo a faixa etária de
5 a 14 anos. Ou seja, o comportamento dos marcadores afeta preferencialmente um tipo de
classe (a mais pobre), em etnias específicas (pardos e pretos), numa faixa etária (crianças e
adolescentes) e em territórios demarcados.

Identificamos que dos marcadores pesquisados de forma documental, as principais brechas


que se evidenciaram nesse período de pandemia, se encontram na insegurança alimentar
(privação extrema decorrentes principalmente do desemprego), crescimento das violências
contra às crianças e adolescentes (negligência e violência física e sexual), exclusão escolar
(evasão, abandono, alto índice de reprovação), trabalho infantil, e letalidade infanto-juvenil,
necessitando um enfrentamento de emergência.

Dentre os principais achados, constatamos, em dados secundários, que cerca de 47 milhões


de famílias estão em situação de privação extrema e, em dados primários, essas famílias
revelam que a pobreza, o desemprego e a fome são sentidos e vividos pelas crianças e ado-
lescentes no Brasil.

Tanto em pesquisa secundária quanto em primária, principalmente meninas estão sendo


afetadas com relações abusivas, dentre elas: abuso e exploração sexual, trabalho infantil
doméstico, matrimônio infantil e gravidez na adolescência.

A pesquisa primária reafirma as pesquisas secundárias quando descrevem que meninos


“3Ps” - pretos, pobres e da periferia - sofrem mais preconceitos e discriminação grave na
sociedade e são mais propícios à vida institucionalizada, sob medidas socioeducativas.

Contatamos uma ambiguidade a respeito do ambiente familiar. À medida que a pesquisa


primária aponta que a família é o principal referencial de proteção, os dados secundários
revelam que é o espaço social que mais viola direitos da infância e adolescência no Brasil,
registrado em denúncias como: negligência, maus tratos, abusos físicos, psicológicos e
sexuais.

Identificamos em relatos da pesquisa secundária que a pandemia no Brasil, além de deixar


as crianças órfãs, suas consequências geram impactos negativos na renda, saúde mental, na
educação, relação familiar e social, bem como na cultura. Nesse sentido, ao analisar os rela-
tos da pesquisa primária, encontramos algumas relações entre a pandemia e as questões da
Proteção da Infância e Adolescência no Brasil.

Podemos considerar que a pobreza aumentou, assim como o desemprego e, consequen-

107
temente, a fome para as crianças e adolescentes. Que o confinamento domiciliar como
medida para conter a pandemia provocou o aumento das conflitualidades nas relações fa-
miliares, dentre elas as violações de direitos na Infância e Adolescência, principalmente as
violências físicas e sexuais.

A morte por Covid-19 e o isolamento social, além da orfandade de crianças e adolescentes,


geraram medo e ansiedade, afetando a saúde mental, causando quadros de depressões no con-
texto familiar.

Relatos confirmam que o fechamento das escolas devido ao isolamento social provocou uma
série de transtornos à educação que variam desde a evasão, abandono escolar, ausência de
acesso e/ou condição à educação remota, e acompanhamento escolar, dentre outras.
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

A pandemia da Covid-19 aumentou a percepção de pessoas (dentre elas, crianças e adolescen-


tes) em situação de rua, e a situação de rua as deixa mais expostas aos riscos.

Constatamos que as vulnerabilidades estão interligadas e que demandam uma ação pensada/
planejada, executada, monitorada e avaliada de forma interdisciplinar, intersetorial com um
olhar multidimensional. E que, no caso brasileiro, a elaboração das leis é, em geral, cuidadosa
na Proteção da Infância e estão vinculadas com as normas e convenções internacionais, porém,
entre a lei e sua aplicabilidade existe um hiato evidenciado nos números crescentes de viola-
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ções de direitos contra a infância e adolescência registradas, inclusive a institucional, mortes


violentas, crianças fora da escola, adolescentes em conflito com a lei, dentre outros.

No que tange à atuação da Rede Formal (equipamentos do governo) há um crescimento grada-


tivo e lento de equipamentos sociais para atendimento da criança e do adolescente com seus
direitos violados, porém a pesquisa evidenciou que, por exemplo, na área da Assistência Social,
as Organizações da Sociedade Civil existem em maior quantidade que as do próprio Estado
vinculadas ao Ministério da Cidadania.

Em pesquisa primária, identificamos o Conselho Tutelar, escolas, CRAS, CREAS, Associações


do bairro, polícias e delegacias, igrejas, como os mais reconhecidos equipamentos sociais que
podem ser acessados para a proteção da infância e adolescência no Brasil.

Além disso, há vários desafios que já foram registrados por outras pesquisas secundárias sobre
o sistema de Proteção da Infância e também evidenciadas na nossa pesquisa primária, a saber:
demanda reprimida de atendimento, burocracias, rotatividade de profissionais, necessidade de
formações/capacitações, necessidade de profissionais qualificados para atendimento infan-
to-juvenil, investimentos insuficientes em serviços, equipamentos e benefícios sociais, ou seja,
há a necessidade de um Estado interventor e rigoroso na proteção da infância.

Relativo aos avanços encontrados durante a pesquisa de âmbito nacional, identificamos as ini-
ciativas do Governo Federal em equipar minimamente os Conselhos Tutelares, implantar ou-
vidorias e observar os marcadores de violação de direitos da infância e adolescência no país,
centralizando essas informações, propondo agendas e metas conciliadas com compromissos
acordados internacionalmente em prol dos direitos humanos da criança e do adolescente, vin-
culando normas, protocolos e linhas de cuidados com a infância e adolescência nos vários
setores sociais.

Em pesquisa primária, constatamos em quantidades expressivas de relatos que o investimento


público é insuficiente, há necessidade de fiscalização sobre o orçamento criança e adolescente,
há insegurança pública, tendo territórios vulneráveis com ausência de equipamentos de pro-
teção para o segmento em citação.

Também destacamos em pesquisas secundárias (documentais), iniciativa do Conselho Nacio-


nal de Direitos da Criança e do Adolescentes com o incentivo à participação de adolescentes
e jovens e o Ministério Público com as capacitações para a Rede de Proteção dentro de suas
escolas, controle sobre a transparência dos recursos e investimento orçamentário em prol da
criança e do adolescente, e a preocupação de disseminar ações alternativas (orçamento crian-

108
ça, mediação de conflitos e/ou justiça restaurativa) para a garantia da Proteção Infanto-juvenil.
Entretanto, em pesquisas primárias, o desconhecimento sobre direitos e políticas de proteção
à infância foi uma das causas mencionadas que aprofundam a problemática de desproteção de
nossos meninos e meninas, evidenciando que estamos muito distantes do que o Brasil precisa
desenvolver na linha de cuidados, promoção da autonomia e autoproteção nessa etapa da vida.

9.2. Recomendações
Recomendamos ao Governo que:
- Desenvolva estratégias que incidam sobre as causas estruturantes: desemprego, insegurança
pública, conflitualidades e discriminação étnica e de classe;

- Assegure investimentos para ampliação de equipamentos sociais, Conselhos Tutelares e, con-


sequentemente, atendimentos à demanda de crianças e adolescentes com seus direitos vio-
lados;

- Revise processos de atuação intersetoriais e interinstitucionais para a compreensão de fragi-


lidades e aperfeiçoamento nas tomadas de decisões coletivas em prol da proteção da infância;

- Priorize recursos para avaliações de políticas públicas, estudos territoriais e pesquisas de


boas práticas nacionais e internacionais em prol de tecnologias sociais que tenham evidências
e impactos sociais na proteção da infância;

- Garanta canais e ampliação da participação de crianças e adolescentes nos processos decisó-


rios que impliquem em ampliar interesse e bem-estar;

- Garanta no Currículo e no ambiente escolar das crianças e adolescentes mecanismos e canais


de participação que alcancem o conhecimento das leis, dos equipamentos e fluxos de proteção
contra todas as formas de violência. E que também trabalhe valores éticos, humanos e os seus
aspectos socioemocionais e projeções de vida;

- Desenvolva campanhas, protocolos e políticas que alcancem e envolvam as famílias, comu-


nidades, empresas, igrejas/centros religiosos, clubes esportivos e organizações da sociedade
civil na proteção integral dos meninos e meninas com o objetivo de reprodução social e da
concepção da criança enquanto sujeito de direitos;

- Amplie os meios, as capacitações e o número de profissionais dos órgãos para agilização de


processos e da fiscalização em prol da proteção das crianças e dos adolescentes;

- Invista na estabilidade (concurso) da equipe de proteção à infância, evitando rotatividade de


profissionais para o fortalecimento do trabalho continuado e em respeito às crianças e adoles-
centes atendidos com seus direitos violados;

- Efetive as leis que potencializam a proteção da criança e do adolescente, principalmente nas


escolas, em prol da redução e gerenciamento de conflitos sociais e violações de direitos.

Recomendamos às Organizações da Sociedade Civil que:


• Ampliem suas estratégias de conhecimento da realidade de modo que evidenciem a parti-
cipação e as vozes das crianças, adolescentes e suas famílias, gerando o comprometimento
em prol da emancipação dos sujeitos, autoproteção e sua autonomia;

• Se atualizem nas tendências a partir das mudanças provocadas pela pandemia, desenvol-
vendo tecnologias sociais simples e de alcance ampliado, focando sempre nas evidências,
impactos e sustentabilidade em prol da proteção da Infância e adolescência;

• Percebam os espaços potenciais (formais e informais) para uma intervenção em massa (es-

109
colas, igrejas/centros religiosos, clubes esportivos, dentre outros) nos seus territórios de
atuação;
• Desenvolvam uma intervenção social que ataque as causas centrais dos problemas
priorizados coletivamente, publicizando suas ações e resultados;

• Retomem práticas de base comunitária: ciclos de rodas de conversas, audiências públicas,


abaixo-assinados, cartas de manifesto, dentre outras que exercitem o controle social;

• Reconheçam a existência de novas formas de participação juvenis, e pensem em estraté-


gias que estimulem o desejo destes pela incidência política e exercício de sua cidadania;

• Desenvolvam agendas conjuntas entre os equipamentos formais e informais para o


fortalecimento em prol da proteção dos meninos e meninas do país;
| VISÃO MUNDIAL BRASIL

• Busquem atuações que incidam sobre as políticas públicas em prol das crianças e ado-
lescentes, fazendo do monitoramento e avaliação suas principais ferramentas de controle
social.

Recomendamos à comunidade/sociedade que:


• Conhecer mais as leis e mecanismos de proteção da infância e adolescência;
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• Se engaje em espaços e processos associativos que estimulem a emancipação e autonomia


dos sujeitos;

• Reproduza novos modos de vida (mudanças de hábito) valorizando os gêneros, sem precon-
ceito e/ou discriminação, reconhecendo as crianças como sujeitos de direitos e cultivando
cuidados, respeito e afetos, bem como fazendo da família o principal espaço de proteção
social;

• Escute com atenção suas crianças e adolescentes, valorizando suas potencialidades, com
afeto e respeito;

• Lute pelo reconhecimento de identidade, da classe trabalhadora, do seu território, de me-


lhorias de vida, pela assistência social, geração de trabalho e renda e sua liberdade de ex-
pressão;

• Perceba suas fortalezas, poder de mobilização e articulação em prol da proteção da infân-


cia e adolescência no Brasil.

110
Referências

111
Legislações

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13 de julho de1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para estabelecer o direito da criança
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RIO DE JANEIRO. Lei Nº 9.116, de 30 de Novembro de 2020. Dispõe sobre a criação de Comissões

112
9. Referências

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