Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
infância e da infân
juventude juven
vulnerável do vulne
Brasil Brasi
Os desafios e os caminhos para aumentar
a proteção dessa parcela da sociedade
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
Direitos Reservados:
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
2
Ficha Técnica
VISÃO MUNDIAL BRASIL
Thiago Crucciti - Diretor Nacional
Thiago Machado - Diretor de Operações
Andrea Freire - Gerente Sênior de Programas
COORDENAÇÃO DA PESQUISA
Cristiane dos Anjos – Assessoria de Desenho, Monitoramento e Avaliação
Márcia Maria Pinheiro Monte – Ponto Focal em Salvaguarda
Ruth Lima - Gerência de Programa
CONSULTORA NACIONAL
Lucileila de Sousa Cardoso Almeida
(Treinamento, Sistematização e Análise da Pesquisa)
PESQUISADORES LOCAIS
Lorrayne Rosado de França – RN
Mariana do Carmo Matias – CE
Mônica de Souza Melo – PE
Pâmela K. Zaparolli Barbosa – SP
Ronivon do Nascimento Amorim – AL
Silvia Carla Macedo Cardoso Furtado – AM
Tatiane dos Anjos – BA
DIAGRAMAÇÃO
Máquina do Bem
Marcelo Colares - Infográfico
REVISÃO
Renata Pessoa Vaz
Marcela Fernandes
AGRADECIMENTOS
A Visão Mundial agradece a todos os atores da Rede de Proteção e do Sistema de Garantia de
Direito que voluntariamente contribuíram para esta pesquisa em todos os estados onde ela
acorreu. As nossas crianças, adolescentes, mães, pais e lideranças comunitárias que partici-
param dos grupos focais enriquecendo o documento com suas reflexões. A nossas parcerias
locais, as quais sempre nos dão apoio na mobilização e colaboram para que tudo aconteça da
melhor forma possível.
3
LISTA DE SIGLAS
ACNUR – Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados
ADAPT – Análise, Desenho e Planejamento
AL – Alagoas
AM – Amazonas
BA – Bahia
CE – Ceará
CEPAL – Comissão Econômica para América Latina
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
4
LISTA DE GRÁFICOS E TABELAS
Gráfico 1 – Número de Crianças e Adolescentes por Gênero no Brasil ..............................................
Tabela 3 – Tipologias de Desastres nos Estados de atuação da Visão Mundial Brasil .....................
5
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
PALAVRA DO DIRETOR
A Visão Mundial é uma organização que tem em sua essência a garantia da proteção de cri-
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
anças e adolescentes. Esta pesquisa traduz-se em nossa contribuição para a reflexão sobre as
principais brechas na garantia da proteção da infância e adolescência no Brasil. Portanto, dis-
ponibilizar este documento para toda a sociedade, para nossos parceiros e para os setores do
governo brasileiro é bem mais que fundamentar programas e ações dentro das comunidades
mais vulneráveis, pois expressa todo o cuidado, respeito e gratidão que esta organização sente
pelas crianças e adolescentes e por quem as protege.
Na leitura da pesquisa percebem-se grandes desafios como violência sexual, violência letal,
fome e trabalho infantil, que afetam nossas crianças e adolescentes de diversas regiões. Por-
tanto, nos caminhos de mudanças, recomendamos que a proteção seja pensada a partir do
fortalecimento intersetorial, interinstitucional e de autoproteção da infância e adolescência,
além da integração dos diversos setores públicos e privados.
O envolvimento de todos, a valorização dos saberes técnicos, do campo e de ação são funda-
mentais para o enfrentamento de problemas graves, históricos e culturais. Precisamos mudar
nossa cultura adultocêntrica para uma pautada na proteção de crianças e adolescentes sujeitos
de direitos. Para tanto, precisamos primeiramente aprender a ouvir este público. Em seguida,
as leis precisam ser fortalecidas e implementadas. Importa compreender a realidade e promo-
ver a articulação pública (com seus três poderes) e privada (com sua função de monitoramento
e/ou investimento) na garantia de uma pais melhor para nossas crianças.
Thiago Crucciti
Diretor Nacional
6
Apresentação
Desde 2012 os países de atuação da World Vision na América Latina e Caribe pactuaram por
uma causa: “Meninos e meninas protegidos e promovendo uma sociedade mais justa e segu-
ra”. Para isso, tecnologias sociais e recursos foram desenvolvidos, dentre eles, o kit ferramentas
para Diagnóstico ADAPT, que possibilita para a partir da escuta e participação de crianças e
adolescentes, sociedade e informantes-chaves governamentais e da sociedade civil (formais e
informais) ter conhecimento da situação do país e das localidades de atuação da Visão Mundial a
respeito do Sistema de Proteção da Infância e Adolescência.
Para a Visão Mundial Brasil, o Sistema de Proteção da Infância e Adolescência precisa ser
analisado em sete elementos: leis e políticas, serviços e mecanismos de prestação de serviços
(obrigatórios) do governo, serviços e mecanismos de prestação de serviços (atitudes informais)
feitos pela sociedade, transparência e prestação de contas, cuidados fora de casa e, por fim,
resiliência e participação dos meninos e das meninas.
No Brasil, o diagnóstico participativo aconteceu entre os meses de abril e setembro de 2021, em oito
cidades/estados: Recife (PE), Fortaleza (CE), Governador Dix-Sept Rosado (RN), Inhapi (Alagoas),
Manaus (AM), Nova Iguaçu (RJ), Salvador (BA) e São Paulo (SP), com a participação de 729 pessoas.
7
SUMÁRIO
1. MAPEAMENTO E ANÁLISE DO CONTEXTO NACIONAL 10
1.1 A Metodologia ADAPT ............................................................................................................................................. 12
1.1.1 Níveis de Pesquisa ...................................................................................................................................................13
1.1.2 Instrumentos de Coleta de Dados Qualitativos ............................................................................................14
1.1.3 Universo da Pesquisa .............................................................................................................................................14
1.1.4 Grupos de Sujeitos e Participantes ...................................................................................................................15
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
8
6.6 Círculos de Cuidados de meninos e meninas (atitudes, valores, comportamentos
e práticas tradicionais) .....................................................................................................................................................96
6.7 Resistência e participação de meninos e meninas ......................................................................................98
6.8 Melhoria, Prevenção e Proteção contra a Violência, o Abuso e a Exploração ................................99
9
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L | VISÃO MUNDIAL BRASIL
10
Análise
Nacional
do Contexto
Mapeamento e
Proteção de Crianças e Adolescentes no Brasil
População
213 milhões
de habitantes
50,9% 49,1%
Meninos Meninas
Etnia
11
MAPEAMENTO E ANÁLISE DO SISTEMA
DE PROTEÇÃO À INFÂNCIA
Para uma análise do contexto e situação da infância e adolescência no Brasil, foram pesquisa-
das as realidades no âmbito nacional e local, com a finalidade de identificar dados estatísticos
e descritivos dos marcadores de vulnerabilidades sociais. A pesquisa apresenta a atuação das
redes formal e informal de proteção, destacando avanços e brechas desse Sistema de Proteção
da Infância e Adolescência na busca por uma análise crítica com base em evidências que apoi-
em os esforços de Advocacy da Visão Mundial neste país. Um ponto de destaque no documento
é a valorização das vozes do campo, tanto de crianças mais vulneráveis como dos operadores
de direito do Brasil.
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
e adolescência no Brasil.
Deste modo, a Visão Mundial considera o Sistema de Proteção dos meninos e meninas, cons-
tituído por essa relação entre órgãos estatais e sociedade civil, uma ação e atuação conjunta,
coordenada entre diversos segmentos e instituições, e decorrentes de uma obrigação legal.
Observando, portanto, leis, regulamentos, políticas, mandatos, processos e serviços prestados
pelo governo; bem como crenças, atitudes e vínculos comuns com mecanismos tradicionais e
não formais de proteção à criança (Visão Mundial, 2020).
A Visão Mundial Brasil percebe a importância desse Diagnóstico sobre a realidade brasileira,
uma vez que aponta os desafios e oportunidades tanto para a infância e adolescência quanto
para os(as) trabalhadores(as) que advogam por esses direitos.
O Kit de ferramentas ADAPT tem o objetivo de abordar de forma holística, prevenindo e for-
talecendo os papéis e ativos críticos dos principais atores responsáveis pela proteção da cri-
ança. Estes recursos servem socialmente para ajudar a priorizar e analisar as causas raiz das
questões de proteção infantil, neste caso, de abuso infantil, negligência, exploração, violência
e trabalho infantil, bem como identificar e mapear sistemas formais e não formais que existem
para proteger as crianças.
O Diagnóstico para a Visão Mundial serve como processo estratégico de intervenções rele-
vantes baseado no conhecimento da realidade brasileira e na validação social, para então in-
tencionalmente incidir sobre as políticas públicas, advogando em prol da superação das causas
básicas identificadas, e lacunas sistêmicas para fortalecer a proteção de meninas e meninos
contra as violências.
12
Para o registro dos dados quantitativos, realizamos uma Análise de Contexto Nacional e Local,
e para a coleta de dados locais, utilizamos uma abordagem qualitativa (vozes) cuja as técnicas
foram: oficinas para meninos e meninas (cumprindo as devidas medidas sanitária nesse perío-
do de Pandemia), grupos focais para adultos, entrevistas com informantes-chaves (formais e
informais do Sistema) e seminário virtual envolvendo todos os participantes e sociedade civil
para validação dos dados e brienfings em prol do caminho para mudanças.
Essas vozes foram coletadas aplicando algumas técnicas: entrevistas, Grupos Focais vir-
tuais com adultos e oficinas socioeducativas presenciais para crianças e adolescentes,
cumprindo as medidas de proteção e segurança sanitária necessárias de distanciamen-
tos e de higienização, conforme decretos estatais estabelecidos em período de pandemia.
As entrevistas, grupos focais e oficinas também foram usadas para mapear os mecanismos de
denúncia e resposta que existem nas comunidades como fonte para referência e reporte de
casos de violação de direitos.
Um Seminário Nacional virtual (Debriefing Comunitário) de reflexão e visão geral sobre os da-
dos foi implementado. Isto garantiu que as opiniões daqueles que participaram do diagnóstico
fossem registradas corretamente e que as análises refletissem as situações reais do contexto.
Espera-se que os dados levantados em respostas sobre caminhos de mudanças gerem possíveis
modelos e metodologias que possam ser utilizadas, viabilizando a segunda parte (Estratégia
para Ação) desse processo de Análise, Desenho e Planejamento com a participação popular.
Para compreensão do contexto nacional, foram realizados um levantamento e a análise de dados se-
cundários a respeito dos marcadores de vulnerabilidades que afetam a infância e adolescência no Bra-
sil. Os marcos legais, regulamentos e protocolos nacionais, bem como os mecanismos, serviços soci-
ais e políticas públicas disponíveis para os meninos e meninas foram pesquisados para compreensão
das atuais brechas e avanços do Sistema de Proteção da Infância e Adolescência no Brasil, e se as leis
brasileiras estão ratificadas segundo as convenções e declarações acordadas internacionalmente.
Como fonte de pesquisa, contou-se com os dados quantitativos das plataformas e relatórios
oficiais de órgãos públicos e institutos governamentais de pesquisas como: IBGE, PnadC, INEP,
Cadastro Único, Censo SUAS, Cadastro Nacional da Justiça, Fórum Brasileiro de Segurança
Pública, DATASUS, dentre outros; agências internacionais (UNICEF, UNESCO, PLAN, ACNUR),
Observatórios da Infância e Adolescência, inclusive os de universidades públicas, dentre ou-
tros que demonstram credibilidade em pesquisas sobre a temática em questão. As legisla-
ções nacionais e convenções internacionais foram consultadas em sites do Diário Oficial da
União (DOU), Portal do Cidadão, sites de agências internacionais como: UNICEF, ONU, ACNUR.
Nesta etapa, os conteúdos foram levantados, organizados, estudados e analisados de forma mi-
nuciosa. Todos os achados foram descritos e interpretados buscando evidenciar narrativas ex-
plicativas dos problemas investigados e produção de conteúdo relevante (TRIVIÑOS, 1987, p.160).
Nesta etapa, foi aplicada uma pesquisa de campo para levantamento de dados primários
amostrais, com critérios de inclusão e exclusão predefinidos para cada público da pesquisa:
crianças (8 a 11 anos) e adolescentes (15 a 17 anos), adultos e atores sociais.
13
em alguns casos, de forma virtual (remota). No que tange aos Grupo Focais (GF) com adultos,
as orientações técnicas foram mantidas conforme ferramentas ADAPT, apenas adaptando-as
às formas de aplicação virtual através das metodologias ativas Jamboard e Mentimenter. A
maioria dos municípios aplicou os Grupos Focais de adultos de forma virtual, exceto Salvador
(BA) e Inhapi (AL), por questões referentes às condições de acesso à internet das famílias e o
município ser em zona rural, respectivamente. Com as crianças e adolescentes, a aplicação da
coleta de dados foi a partir de oficinas socioeducativas e presenciais.
As entrevistas foram aplicadas com atores sociais que estão engajados no Sistema e Rede de
Proteção de Crianças e Adolescentes nos oito estados de atuação direta na Visão Mundial e
parceiros, igualmente, de forma criteriosa e justa.
As perguntas foram predefinidas por uma comissão de especialistas que utilizam a ADAPT como
ferramenta, primando pela objetividade, coleta de informações mais relevantes, diminuição de
vieses, pensando num processo que garantisse a aplicabilidade, para pessoas executarem a
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
Os Grupos Focais virtuais foram desenvolvidos com pessoas adultas, definidas por gênero
(masculino e feminino) e representatividade geográfica com critérios de inclusão – mulheres
e homens que estão nos territórios de vulnerabilidades com atuação da Visão Mundial. Os(as)
pesquisadores(as) tiveram em mãos um roteiro de perguntas abertas e uma proposta de seções
que envolvia: acolhimento com explicação dos objetivos da Pesquisa; coleta de questões priori-
tárias de Proteção da Infância; causas, com a aplicação da Árvore de Problemas e Análise Causal
utilizando-se da tecnologia digital Jamboard; entrevista emparelhada com as demais seções
que buscava o entendimento dos adultos sobre a atuação da Rede, leis e mecanismos de Pro-
teção da Infância, bem como das crenças, valores e formas de proteção de meninos e meninas
feitas na comunidade. Ao final do Grupo Focal, os participantes avaliaram o momento com sua
expressão de sentimentos através da ferramenta Mentimenter.
Oficinas Socioeducativas
As Oficinas Socioeducativas foram feitas presencialmente com as crianças e adolescentes, res-
peitando as medidas de proteção sanitária orientadas pelos Decretos de cada Estado.
A aplicação dessas oficinas seguiu um roteiro predefinido, que coletou as vozes dos meninos e
meninas a partir de dinâmicas de grupos e jogos educativos, que intencionaram o conhecimen-
to das crianças e de suas realidades com a dinâmica “Te conhecer”, descoberta das questões
prioritárias da Proteção da Infância e as causas dos problemas com a construção da Árvore de
Problemas e Análise Causal. Também foi utilizada a ferramenta Rede de Apoio, para entender
se, a quem e como as crianças recorrem em casos de necessidade de proteção. A Dinâmica da
Canção “Peixe Vivo” gerou respostas para evidenciar a sua participação e busca comunitária
para proteção em Rede.
14
25 estados
e Distrito
Federal
I. Relações Abusivas (trabalho infantil, abuso sexual, abuso físico, matrimônio infantil e gravi-
dez precoce)
II. Privação Extrema (crianças desnutridas, crianças fora da escola, crianças abaixo da linha de
pobreza, crianças órfãs, abandonadas e descuidadas)
IV. Discriminação Grave (crianças com deficiência, as que pertencem a grupos marginalizados,
crianças refugiadas, adolescentes em sistema de justiça juvenil e as crianças sem Registro de
Nascimento).
Quanto aos atores sociais (representantes do governo e da sociedade civil), os critérios foram
definidos e baseados na idade mínima (18 anos) e da representatividade nas funções e papéis
exercidos na proteção da criança e do adolescente, buscando a equidade de gênero, na medida
do possível. Conforme vemos os critérios de inclusão da Pesquisa no Quadro 1 que segue.
15
Quadro 1 - Critérios de Inclusão na Pesquisa por Estado
VM geracional
- Repres. de Forúns/Redes locais:
- Recorte de Gênero: desejável - Quantidade por grupo: 01
50% meninos e 50% meninas
Mín: 10
- Líder de associação: 2
Máx: 15
- Quantidade por grupo:
- Líder religioso (confissões de fé
Mín: 10
diferentes): 3
Máx: 15
- Diretor de escola: 1
- Agente de saúde: 1
No que tange aos critérios de exclusão de participação na Pesquisa, são todas as pessoas
que não atenderam aos critérios pré-definidos descritos no Quadro 1. Ressaltamos que
tivemos sete grupos de participantes nesta pesquisa diagnóstica. Vejamos o Quadro de
sujeitos participantes:
16
Importa ressaltar que cada um dos oito estados envolvidos na pesquisa abordou uma média de
14 meninos e 14 meninas de 8 a 11 anos; cerca de 10 adolescentes masculinos e 11 adolescentes
femininos da faixa etária de 15 a 17 anos; aproximadamente 20 mulheres e 11 homens das comu-
nidades vulneráveis, e 11 atores-chaves.
Vale ressaltar que a Visão Mundial capacitou os(as) oito pesquisadores(as) a respeito do di-
agnóstico ADAPT e de alguns aspectos, tais como: sua função, aspectos éticos, instrumentos,
técnicas e processo de análise. O treinamento teve a carga horária de 20 horas/aula. Esses
profissionais foram acompanhados por uma consultora nacional e assessorados por equipe
multidisciplinar de técnicos(as) especialistas da Visão Mundial, por meio de reuniões virtu-
ais e redes sociais, garantindo apoio e suporte em materiais e instruções full-time que foram
necessários para a pesquisa.
Ressaltamos que todos os participantes envolvidos (meninos e meninas, adultos e atores so-
ciais) foram consultados no interesse de participação voluntária, informados quanto à sua de-
sistência a qualquer momento, riscos e benefícios da pesquisa, e assinaram o Termo de Con-
sentimento Livre e Esclarecido. Os Termos de Autorização dos Pais foram coletados quando
os participantes tinham abaixo de 18 anos de idade, garantindo o sigilo dos nomes, a confi-
dencialidade das informações para uso exclusivo da pesquisa, e todas as medidas de proteção
necessárias apresentadas nos Decretos Estaduais e normas sanitárias, quando a pesquisa foi
realizada de forma presencial.
Lembramos que os pesquisadores tiveram educadores sociais como assistentes que, nos casos
específicos de violência sexual, trabalho infantil, dentre outros casos evidenciados durante a
aplicação da pesquisa, apoiaram, encaminhando os meninos e meninas para a Rede e Sistema
de Proteção da Infância e Adolescência do Território.
Não apenas nos termos naturais, mas na sua cultura, na sociedade brasileira, há diversidade em
costumes, tradições, folclore, comidas típicas e religiões. Há também uma miscigenação étni-
ca. A população formou-se pela interação entre os povos europeu, africano e nativos indígenas.
Mais tarde, depois da libertação dos escravos negros, o país recebeu vários fluxos migratórios
(alemães, italianos, espanhóis, japoneses e sírio-libaneses) que contribuíram também para a
formação étnica atual da população.
17
No que tange à religião, a predominante no Brasil é a Católica. Entretanto, a maior parte das
crenças seguidas pelos brasileiros é cristã (católica, pentecostais, episcopais, metodistas, lute-
ranas, batistas). Há também grande presença de kardecistas – seguidores da doutrina espírita
– além de judeus, muçulmanos e budistas. As religiões de matriz africana, como a umbanda e o
candomblé, também têm grande número de adeptos em todo o território nacional (Ministério
do Turismo, 2021).
Nos aspectos econômicos, o Brasil é o 12º país de maior economia do mundo, sendo medido
pelo valor do Produto Interno Bruto – PIB, ou seja, a soma de todos os bens e serviços finais
produzidos por um país, estado ou cidade, geralmente em um ano. Segundo o IBGE (2021), o
PIB do Brasil em 2020, por exemplo, foi de R$ 7,4 trilhões. No último trimestre divulgado (1º
trimestre de 2021), o valor foi de R$ 2,048 bilhões.
Apesar do PIB em alta, isso não quer dizer que no Brasil tudo vai bem. Há uma série de fatores,
dentre eles poder de consumo; impasse orçamentário; o baixo esforço do Poder Executivo em
encaminhar reformas que ajudem a controlar os gastos obrigatórios; um ambiente político
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
Vale ressaltar que a economia brasileira ainda é firmada em boa parte em produtos primários
(agronegócios), que têm um baixo valor agregado. O Brasil é ainda carente na indústria pesada
e tímido nas tecnologias, o que gera uma balança comercial desfavorável.
O cenário político brasileiro não vai bem. A pandemia esteve fora de controle no país. O espe-
cialista Amorim Neto, professor da Fundação Getúlio Vargas EBAPE, afirma no Boletim Macro
(FGV IBRE, 2021) “que a economia está anêmica e a inflação cresce, gerando insegurança, an-
gústia e pessimismo com relação ao país”. Diversos setores sentiram os impactos econômicos
da pandemia devido à necessidade de adoção de medidas de isolamento social para diminuir o
ritmo de contágio da Covid-19.
No que tange aos aspectos sociodemográficos do Brasil, há pouco mais de 213 milhões de
habitantes (Estimativa IBGE/2021). Destes, a população residente de crianças e adolescentes
(0 a 17 anos) é de 29,5%, totalizando 62,8 milhões. Esses meninos e meninas estão vivendo, em
sua maioria, na área urbana (83,5%) e apenas 16,5% se encontram na zona rural brasileira.
Gênero masculino
Gênero feminino
26,060,8 25,139,2
Fonte: Dados coletados do Educa IBGE (2018)
PINHEIRO, A.C. e MATOS, S. Piora da Pandemia e os seus impactos na economia. in: Boletim MACRO. Março 2021 , n. 117. FGV IBRE.
Disponível em: FGV.br/ibre/blog-da-conjuntura-economica
18
Dados do Educa IBGE (2018) apresentam um cenário de 50,9% de meninos e 49,1% de meni-
nas, com um recorte étnico de 49,8% de crianças pardas, 42,4% brancas, as declara-
das negras com 6,9% e as demais, apenas 0,9%, sendo amarelas ou indígenas1.
A respeito da população indígena no Brasil, segundo dados do último Censo IBGE (2010), há
cerca de 1 milhão de habitantes. Esses grupos estão espalhados em todas as regiões brasileiras
e possuem uma enorme diversidade étnica e linguística. Em 2010, foram recenseados 305 dis-
tintos povos indígenas, falantes de 274 línguas diferentes. As crianças e adolescentes indígenas
são maioria nas comunidades. O percentual em relação ao total é de 45%, chegando a ser de
55% entre aqueles que residem nas terras indígenas.
Vale ressaltar que especialistas como Márcia Acioli (2012), antropóloga, avalia que o Sistema
de Garantia de Direitos no Brasil ainda não está maduro o suficiente a ponto de ter políticas
sociais e públicas específicas pensando nas necessidades e processos educativos e culturais
dos povos indígenas. O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – Conanda
regulou em Resolução de número 91, de 23 de junho de 2003, que o ECA fosse aplicado com
respeito às peculiaridades socioculturais dos povos indígenas.
Atualmente, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos se projeta para aper-
feiçoamento de diretrizes, parâmetros e fluxos de atendimento relacionados às crianças e ado-
lescentes indígenas em situação de vulnerabilidade2. As ações de prevenção contra a violência,
o cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) nessas comunidades indígenas,
bem como a atuação da rede de proteção no caso de afastamento da criança de sua família são
os principais desafios a serem repensados.
Uma investigação sobre as questões étnicas brasileiras no que tange às crianças e adolescentes
deste país constata uma história marcada por muitos anos de escravidão e morte para os ne-
gros e genocídio para indígenas. Os apontamentos do Anuário 2020 do Fórum Brasileiro de
Segurança Pública revelam a repercussão da exclusão e da discriminação histórica contra os
negros, evidenciadas nos números de vítimas por homicídios dolosos, perfazendo 75,7% dos
casos registrados no DATASUS no ano de 2018 (FBSP, 2020).
Outro dado que nos chama a atenção no que tange à relação étnica, etária e territorial no Bra-
sil diz respeito ao envolvimento de adolescentes nos conflitos com a lei, sendo eles, em sua
maioria, pobres, pardos/negros e da periferia urbana, se encontrando nas estatísticas dos con-
siderados “matáveis”, como afirma os pesquisadores Mota Brasil, Freitas e Almeida (2002). Os
dados mencionados nos levam a perceber que a exclusão social no Brasil tem cor, idade, classe
e área demarcada, evidenciando fragilidades e desafios no processo de Proteção das Crianças
e Adolescentes.
Outro dado que merece destaque no Brasil refere-se ao crescimento da extrema pobreza nos
últimos anos. Segundo o Panorama Social da América Latina, publicado em 2020 pela Comissão
Econômica para a América Latina e Caribe - CEPAL, o Brasil foi um dos países dessa região que
cresceu em 0,1% de 2018 para 2019. Ao considerar os anos de 2014 a 2019, a mesma pesquisa
informa o crescimento médio anual de 0,5%, por ano.
Importante ressaltar que, de 14,7 milhões de famílias beneficiárias, 9,6 milhões recebem/re-
ceberam o Auxílio Emergencial 2021 via público Bolsa Família, 395 mil recebem/receberam o
1 -desigualdades-sociais-por-cor-ou-raca-no-brasil Dados encontrados no site: https://educa.ibge.gov.br/criancas/
brasil/2697-ie-ibge-educa/jovens/materias-especiais/21039.html , consultado em: 13. Maio de 2021.
1 -desigualdades-sociais-por-cor-ou-raca-no-brasil Dados encontrados no site: https://educa.ibge.gov.br/cri-
ancas/brasil/2697-ie-ibge-educa/jovens/materias-especiais/21039.html , consultado em: 13. Maio de 2021.
2 Texto retirado do Site: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2021/julho/sistema-de-garan-
tia-de-direitos-na-protecao-de-criancas-indigenas-sera-aperfeicoado , consultado em: 23/07/2021.
2 Texto retirado do Site: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2021/julho/sistema-de-ga-
ratia-de-direitos-na-protecao-de-criancas-indigenas-sera-aperfeicoado , consultado em: 23/07/2021.
A Pesquisa Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população bra-
sileira (2018), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) fez a medição
de restrições críticas para as condições de vida de famílias sem acesso às dimensões: educação,
proteção social, moradia adequada, serviços de saneamento básico e comunicação. Uma medi-
ção multidimensional que diz respeito a alguns dos direitos previstos na Constituição Federal
do Brasil e também alinhadas à meta 1.2 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável: “até
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
2030, reduzir pelo menos à metade a proporção de homens, mulheres e crianças de todas as
idades, que vivem na pobreza, em todas as suas dimensões, de acordo com as definições nacio-
nais” (Nações Unidas, 2016).
Esta pesquisa de Síntese de Indicadores Sociais (IBGE, 2018) apresentou que 14,8% das cri-
anças de 0 a 14 anos, que estão na condição de pobreza, têm pelo menos três restrições das
dimensões apresentadas. Desses meninos e meninas, 21,2% vivem em moradias inadequadas;
quase a metade das crianças brasileiras com privações (42,8%) não possui acesso a serviços de
saneamento básico; 25,7% têm acesso restrito à proteção social e 24,7% ao acesso à comuni-
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
cação (internet).
Analisando as tendências reveladas na Pesquisa Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das
condições de vida da população brasileira (2020), percebemos que, no período de dois anos,
houve uma melhoria de acesso a saneamento básico apenas 2% da população de baixa renda,
perfazendo o percentual de 44,8% de moradias com esgotamento por rede coletora ou pluvial.
A pesquisa aponta que as situações de precariedade e vulnerabilidade nas condições de mora-
dia afetam em maior proporção a população em situação de pobreza monetária, uma vez que
os problemas não estão focados apenas das estruturas da casa ou no adensamento domiciliar
excessivo, mas na pouca condição do pagamento do aluguel e na informalidade da posse do
imóvel.
A pesquisa também apontou que em 71,9% dos domicílios em situação de pobreza monetária,
pelo menos um morador tem acesso à internet. No ano de 2018, 24,7% dos domicílios nessa
mesma condição socioeconômica não tinham acesso à internet.
Em 2020, houve um aumento de 3,4 pontos percentuais de domicílios sem qualquer acesso
à internet. Em um momento de pandemia, em que os trabalhos migraram para os domicílios
(home office), atendimentos públicos e até os estudos (educação) tornaram-se on-line (e/ou
remoto) 28,1% são um alto índice de exclusão digital.
Aqui se apresenta um paradoxo que merece reflexão. Muitos estados adotaram a medida de
distribuição e gerenciamento de chips de celulares com acesso à internet para estudantes de
ensino médio e superior dentro dos critérios de baixa renda, docentes e profissionais da edu-
cação nesse período de pandemia. E por que a situação agravou? Pensamos que o desemprego,
e, portanto, todas as implicações decorrentes da ausência de renda, afetaram diretamente a
condição de acesso à internet, uma vez que o celular é declarado na pesquisa como o principal
instrumento de acesso à internet, mas a falta de condições monetárias impediu a contribuição
para o acesso.
Os achados restritivos acima mencionados apontam para outros efeitos que, a partir des-
sas condições objetivas e determinantes sócio estruturais, podem afetar os desenvolvimen-
tos físico, cognitivo, social, econômico, educacional, político e cultural de nossas crianças e
adolescentes.
Nesse sentido, a condição de pobreza alinhada à exclusão tem, em muitos casos, potencializado
3 Consulta no dia 23 de julho de 2021, no site: https://www.gov.br/cidadania/pt-br/acoes-e-programas/bolsa-fa-
milia/informe-gestores/informe-gestores/pagamentos-de-junho-do-beneficio-do-bolsa-familia-e-do-auxil-
io-emergencial-2021-aos-trabalhadores-de-familias-beneficiarias
3 Consulta no dia 23 de julho de 2021, no site: https://www.gov.br/cidadania/pt-br/acoes-e-programas/bolsa-fa-
milia/informe-gestores/informe-gestores/pagamentos-de-junho-do-beneficio-do-bolsa-familia-e-do-auxil-
io-emergencial-2021-aos-trabalhadores-de-familias-beneficiarias
20
o envolvimento de crianças e adolescentes às vulnerabilidades sociais, dentre elas à exploração
no trabalho infantil, exploração sexual, envolvimento com os delitos e o tráfico de drogas e,
muitas vezes, sendo vítimas ou algozes da letalidade infanto-juvenil. É notório que na realidade
brasileira quem mais sofre são os meninos e meninas, pois em momentos de crise, desemprego
em massa, e, portanto, fome e pobreza, essa população, pela sua especial condição de desen-
volvimento e necessidade de proteção se torna mais propensa às vulnerabilidades.
Desse modo, a Visão Mundial percebe a necessidade de conhecer a realidade para sua inter-
venção social em quatro dimensões prioritárias: 1) Relações Abusivas; 2) Privação Extrema; 3)
Vulnerabilidades a Impacto Negativo de Catástrofes ou Epidemias/Pandemia e 4) Discriminação
Grave.
21
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L | VISÃO MUNDIAL BRASIL
22
no Brasil
Situação dos
Marcadores de
Vulnerabilidades
2.1 Dimensão das Relações Abusivas
As relações humanas são dinâmicas e interacionais e, por isso, instáveis devido sua com-
plexidade, que envolve conhecimento, ações, experiências de vida e contexto, sentimentos e
emoções, que podem estabelecer relações de poder. Segundo Foucault (1995) o poder existe
em todas as relações sociais e pode ter a violência como agregado. Esse poder tem uso físico
ou simbólico, ou seja, se entre duas ou mais pessoas houver, por um lado, alguém forçando a
submissão, e da outra parte, submissão e passividade do(a) abusado(a), utilizando sentimento
de posse, excesso de poder e de controle, podemos considerar que ali há uma relação abusiva
(Barreto, 2018).
Neste sentido, a Visão Mundial percebe que o trabalho infantil, o abuso sexual e o físico, o
matrimônio infantil e a gravidez precoce estão situados nas Relações Abusivas e, por isso, é
uma questão social emergente que precisa ser efetivamente enfrentada e erradicada para que
crianças e adolescentes sejam e sintam-se protegidos.
No Brasil, as relações abusivas estão bem elevadas. Em estudos realizados a partir do Relató-
rio do Disque Direitos Humanos (Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos,
2019), identificamos que, das notificações registradas de violações de direitos entre os diversos
segmentos sociais (idosos, mulheres, pessoas com deficiência, dentre outros), as crianças e
adolescentes foram as mais afetadas, representando 55% do total de denúncias. Ou seja, foram
86.837 novos casos de violação de direitos da infância e adolescência no Brasil só em 2019, sem
considerar os anos anteriores ou os que não foram ainda registrados. Vejamos o Gráfico 2 que
segue.
Discriminiação 620
5,1
V. Institucional
34
Abuso Sexual 17,029
Violência Física 33,374
Violência Psicológica 36,304
Negligência 62,019
Denúncia de Violação de Direitos - 2019 86,837
0
80 00
30 0
40 0
50 00
10 00
20 00
60 00
70 0
90 00
0
0
0
00
,0
,0
,0
,0
,0
,0
,0
,0
,0
0,
10
No que tange às violações de direitos contra crianças e adolescentes no Brasil, o Relatório DDH
2019, conforme Gráfico 2, apresenta uma maior incidência de negligência, com 62 mil casos
registrados, seguida de violência psicológica (36.304), a física, com 33.374 casos notificados,
sendo estes violados principalmente pelos próprios familiares e/ou responsáveis da criança.
Os estudos do Disque Direitos Humanos (2019) apontam que, em 82% dos casos de negligência
denunciados, os suspeitos são as mães. Essa violação de direitos acontece principalmente com
crianças de 0 a 11 anos de idade em 70% dos casos notificados.
A Visão Mundial tem desempenhado uma atenção especial à violência sexual e ao abuso físico,
23
inclusive construindo diálogos com Secretarias Estaduais e/ou Municipais de Educação para
seu enfrentamento a partir do ambiente escolar. Neste sentido, destacamos para a análise, os
casos de abuso sexual e abuso físico, foco prioritário da Visão Mundial no Gráfico 3 que segue.
86.837
Nº Geral de Notificações
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
O abuso sexual é o quarto maior número de notificações registrada no país, sendo esse um
dado preocupante, pois, além de agredir fisicamente a criança, deixa marcas e sequelas psi-
cológicas e relacionais. Segundo o Relatório do DDH de 2019, esse tipo de agressão acontece
principalmente dentro dos domicílios das crianças (73%), um espaço que deveria ser de pro-
teção. Outro dado relevante é que, geralmente, o agressor (suspeito) é o pai ou padrasto em
40% dos casos, sendo o perfil dos(as) abusados (as), meninas de 12 a 17 anos em 46% dos casos
registrados no Brasil.
O abuso físico ocupou o terceiro registro mais alto de denúncias no Disque 100, em 2019, para
os casos de violação de direitos da infância e adolescência no Brasil. Intervir preventivamente
a respeito desse dado é um desafio no trabalho com famílias. Métodos e tecnologias sociais
são necessárias para que se desenvolva, junto às famílias, o entendimento de alguns conceitos,
como: a diferença entre autoridade dos pais e autoritarismo e/ou práticas abusivas, bem como
trabalhar o resgate de valores éticos e aspectos socioemocionais que promovam a resiliên-
cia, autoconhecimento, afeto, domínio próprio, participação, solidariedade, respeito ao outro,
compromisso social, dentre outros.
Vale ressaltar que estudos do IBGE (2019) apresentam 1.015.620 de casos/registros novos casa-
mentos no Brasil. Destes, 102.156 matrimônios registrados em cartório civil foram de adoles-
centes e jovens de 15 a 19 anos. Conforme vemos no Gráfico 4 que segue.
24
Gráfico 4: Matrimônio Infantil no Brasil (2019)
80,660
15 a 19 anos
21,496
12,167
17 anos
1,352
8,631
16 anos
351
226
15 anos
31
169
Menos de 15 anos
7
0
80 00
30 0
40 0
50 00
10 00
20 0
60 00
70 0
90 00
0
0
0
0
00
,0
,0
,0
,0
,0
,0
,0
,0
,0
0,
10
Homem Mulher
Nos registros de 2019, das 102.156 pessoas de 15 a 19 anos que se casaram, 80.660 eram meni-
nas e 21.496 meninos. Esses dados apontam sérias preocupações que podem ser reflexo de
uma concepção tradicional de casamento no Brasil como “uma representação social de união,
segurança e ritualidade”, mas também de uma problemática cultural que subjuga as meninas
a uma condição financeira favorecida por um adulto e submetidas a violências de gênero,
privando-as de seu desenvolvimento natural, liberdades e descobertas, tornando-se uma
concepção paradoxal. Vale ressaltar que as uniões homoafetivas e as uniões informais (que
são muitas no Brasil) não estão nesses números apresentados (PLAN, 2018).
Muitas adolescentes (meninas) casam-se por se encontrarem grávidas, por uma questão que
é reproduzida social e culturalmente e, na maioria dos casos, impostas pelos pais. Entretanto,
muitas delas ainda não estão preparadas para a rotina de cuidados que os múltiplos papéis fe-
mininos impostos socialmente requer.
No que tange à Gravidez da Adolescência, o Gráfico 5 revela algumas situações que possibili-
tam reflexões.
25
Gráfico 5: Adolescentes Grávidas no Brasil por Estado Civil
450,000
400,000 419,255
350,000
300,000
250,000 289,928
200,000
150,000
100,000 27,362
50,000 96,782
0
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
Outro marcador que evidencia relações abusivas de intensa expressão no Brasil é o Trabalho
Infantil. Em 2019, o IBGE registrou 1,8 milhão de crianças com até 14 anos nessa situação. O
ano de 2021 é comemorado pela Organização das Nações Unidas como o ano da erradicação,
porém, o Brasil colocou sua meta de erradicação para 2025.
26
Outro dado relevante encontrado no Observatório de Prevenção e Erradicação do Trabalho
Infantil é o de crianças e adolescentes que estão estudando nas escolas públicas e que fizeram
a Prova Brasil em 2017. A Prova Brasil é um exame de qualidade de ensino do Governo Federal
para alunos que estão apenas no 5º e no 9º ano e estudam nas escolas públicas brasileiras,
aplicada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP
no Censo Escolar. No resultado desse Censo foram detectadas 479.900 crianças e adolescentes
que declararam na Prova Brasil que trabalham fora de casa.
Ainda na perspectiva do trabalho infantil como relação abusiva, temos o risco de tráfico de
crianças e adolescentes para os tipos de exploração sexual comercial como um desafio no país.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) considera a Exploração Sexual para fins comer-
ciais como um trabalho ilícito e degradante, de acordo com o art.3º, alínea “b” da Convenção
182, da OIT.
Neste sentido, as privações múltiplas “são o resultado da inter-relação entre privações, exclu-
sões e as diferentes vulnerabilidades a que meninas e meninos estão expostos e que impactam
seu bem-estar” (UNICEF, 2018).
A Visão Mundial adota como uma de suas dimensões de estudo e atuação no Brasil a Privação
Extrema, com foco nas crianças que estão fora da escola, crianças desnutridas, que sobrevivem
abaixo da linha de pobreza, aquelas que são órfãs, abandonadas e descuidadas. Na realidade
brasileira há aproximadamente 47 milhões de famílias em situação de pobreza, e vale ressaltar
que cerca de 17,1 milhões estão em privação extrema, conforme retrata o Gráfico a seguir.
27
Gráfico 6 - Comparativo Nº de Famílias
Baixa Renda x Famílias Abaixo da Linha de Pobreza - Brasil
0 20,000,000 40,000,000
Neste cenário, cerca de 6,3 milhões de crianças com até cinco anos sofrem sem acesso a ali-
mentos suficientes e de qualidade, por viverem em lares que apontam grau de insegurança
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
Outro agravante fator que dimensiona a privação extrema é o fator de crianças fora da escola.
No Brasil, mais de 1 milhão (precisamente 1.096.468) de crianças e adolescentes na idade esco-
lar de 4 a 17 anos tiveram seu direito à educação negado em 2019.
28
Gráfico 7 - Crianças e Adolescentes em Processo de Adoção x Disponíveis para Adoção e
Nº Geral de Institucionalizados
0 20,000 40,000
Por outro lado, o processo de adoção deve ser cuidadoso. A insuficiência de profissionais que
fazem a intermediação dos processos também é um outro desafio que tem gerado. Uma vez
que o cadastro de pessoas que desejam adotar no Brasil é cerca de seis vezes maior do que as
crianças disponíveis para adoção.
29
2.3 Dimensão das Vulnerabilidades a Impactos Nega-
tivos Catastróficos ou Epidemia/Pandemia
As vulnerabilidades de crianças e adolescentes às situações de calamidade pública e emergência
se constituem num tema muito relevante no Brasil dado à ocorrência simultânea de emergên-
cias Humanitárias Prolongadas (PHE), eventos de categoria de magnitude I [1] que afetam os
meios de vida das populações, especialmente as mais vulneráveis. Tais eventos tanto geram
perdas materiais e econômicas e causam riscos à saúde da população, quanto na capacidade
dessas comunidades de prover recursos para recuperação diante das situações de vulnerabili-
dades provocadas por esses desastres (Organização Pan-Americana da Saúde, 2014).
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
Emergência Humanitária
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
Quando os desastres passam a afetar profundamente não só o contexto ambiental, mas signi-
ficativamente populações e as questões socioeconômicas de um município ou região, a legis-
lação brasileira possibilita que essas cidades e/ou estados se declarem em emergência e/ou
Calamidade Pública. O Estado de Calamidade Pública é um reconhecimento (legal) pelo poder
público de situação anormal, provocada por desastres, causando sérios danos à comunidade
afetada, inclusive à incolumidade e à vida de seus integrantes.
Nos anos de 2020 e 2021 o Brasil foi alvo de intensas preocupações devido ao incêndio florestal
no Amazonas, secas, inundações, enchentes por todo país, e ainda a pandemia da Covid-19;
constituindo-se nas ocorrências mais declaradas pelos municípios e estados brasileiros como
emergências ou Situação de Calamidade Pública. A Confederação Nacional de Municípios (2021)
registrou que os desastres decorrentes de tempestades, ciclones, alagamentos, inundações,
deslizamentos, entre outros causaram a morte de 235 pessoas, e o excesso de chuvas também
deixou mais de 96.535 mil pessoas desabrigadas e 306.035 desalojadas. Sendo assim, somando
todos os desastres que ocorreram em 2020, mais de 41 milhões de pessoas foram afetadas. No
que diz respeito aos desastres no Brasil, dados do Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil
(SINPDEC) reportam que, nos últimos casos, os desastres mais recorrentes dentro da área (ter-
ritório) pesquisada, foram:
30
Tabela 2 - Situação de Desastre no Brasil - Famílias e Municípios - Por estado de referência
A Tabela 2 revela que em 2021 são 13.272 famílias (usuários ativos) registradas em situação de
Emergência ou Calamidade Pública no Brasil. Considerando os estados pesquisados, a Bahia se en-
contra com situação mais desafiadora, seguida por São Paulo (955), Pernambuco (535) e Ceará (470).
Na análise dos números de municípios informados pelo Governo Federal sobre a ocorrência de
casos de emergência ou Calamidade Pública, destacam-se os estados de São Paulo (431), segui-
dos por Bahia (384) e Ceará (183) com maior número de municípios necessitando de contribui-
ções para superar os impactos negativos decorrentes desses desastres. Os eventos de maior
frequência, por estado, são declarados abaixo.
Amazonas Inundações
31
Pela Tabela 3 entendemos que, na maioria dos estados de atuação da Visão Mundial Brasil, há a
situação de calamidade pública provocada por doenças infecciosas virais, no caso, a pandemia
da Covid-19. Com exceção do Amazonas, que enfatizou como prioridade as inundações que
estão ocorrendo, afetando principalmente as comunidades ribeirinhas, bem recorrente nesse
Estado (SINPDEC, 2021).
Vale ressaltar que as estiagens e secas estão presentes nos estados da Região Nordeste (Ala-
goas, Bahia, Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte) sendo esses desastres de origem cli-
matológica, que provocam consequências ambientais e socioeconômicas. Segundo estudo
técnico realizado pela Confederação Nacional de Municípios (2021), dentre os desastres na-
turais que ocorreram durante a pandemia causada pelo coronavírus, a seca foi o desastre que
mais causou prejuízos nos municípios afetados. Ela ficou mais concentrada nas regiões Nor-
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
deste e Sul, somando um grande prejuízo no valor de R$ 39,6 bilhões. A CNM chama atenção,
ainda, aos prejuízos causados pelos incêndios florestais, os quais somaram R$ 75,9 milhões aos
municípios afetados.
No que tange ao aspecto socioeconômico, os desastres naturais irão impactar, de forma nega-
tiva, diretamente no fornecimento da água, na quantidade e qualidade do consumo humano de
água, nas atividades agrícolas, pecuárias e pesqueiras, na quantidade e qualidade de alimentos,
nos prejuízos econômicos na fonte de renda e trabalho, e perdas materiais e sentimentais em
casos de pessoas que migram pela sua incapacidade de se manter na localidade, e assim sus-
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
Sobre o contexto da pandemia, até 17 de setembro de 2021, o Brasil atingiu um total de 589.240
mortes. Com isso, os estados permanecem em alerta diante da alta taxa de ocupação e colapso
do sistema de saúde, apesar da tendência de estabilidade de óbitos. O estado de São Paulo é o
mais afetado em números absolutos de casos (4.321.189) e de mortes (147.811) no Brasil. A vaci-
nação no país continua lenta, tendo atingido apenas 36,47% da população que estão totalmente
imunizados com as duas doses e/ou dose única [2] no período de execução desta pesquisa,
de março a julho de 2021. O surgimento de novas cepas no início de 2021, a flexibilidade das
medidas de distanciamento social e a ampliação do funcionamento das atividades econômicas
e lazer podem ter contribuído com o aumento do número de casos e mortes entre pessoas
mais jovens, incluindo crianças e adolescentes, tornando o Brasil o epicentro da pandemia no
mundo.
32
Tabela 4 – Distribuição dos Registros de casos de pessoas com Covid-19 confirmados, e de
óbitos nos estados
A insegurança alimentar trouxe consequências imediatas para a população, já que esta precisa
se expor para buscar comida no contexto pandêmico[3]. Os dados do Inquérito Nacional sobre
Insegurança Alimentar em Contexto de COVID revelam que 55,2% da população brasileira
sofrem alguma ameaça ao direito aos alimentos, sendo a região Norte a mais afetada, tendo
18% de sua população em situação de fome [4]. Já no Sul e Sudeste, regiões mais ricas, 6% de
sua população enfrentam a falta de acesso pleno aos alimentos e uma insegurança alimentar
grave. O estudo aponta que a pandemia provocou o agravamento de um problema que já vinha
acontecendo há algum tempo em todo o país. Casos mais severos atingem principalmente mul-
heres chefes de família, pretas ou pardas, com baixa escolaridade e trabalho informal.
33
ocorridos nesse período e o aumento dos casos de homicídios, feminicídios e conflitos diversos
causados no processo de interação das pessoas no ambiente domiciliar, dentre outros.
de Pacaraima e Boa Vista, esta última sendo a capital do estado. Os governantes do estado de
Roraima declararam que havia uma sobrecarga dos serviços públicos e que o estado não era
capaz de atender a demanda de migrantes que lá se instalaram. Alegaram também a impossi-
bilidade de os inserir em programas públicos relacionados à saúde, educação ou ao mercado de
trabalho. O estado de Roraima possui cerca 505.665 habitantes (IBGE 2015).
Segundo Marcilene da Silva Moura (2021), diretora do Hospital Geral de Roraima, os medica-
mentos solicitados para atender a população durante todo o ano de 2018 já haviam acabado em
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
meados de agosto [6]. A área da saúde foi a maior impactada pelo fluxo migratório. Doenças
como sarampo, que já haviam sido eliminadas em território brasileiro, reapareceram, e Rorai-
ma apresentou quase 300 casos confirmados da doença até o dia 10 de agosto de 2018. No que
tange à educação, a Prefeitura solicitou do Governo Federal verba para que novas salas fos-
sem construídas a fim de atender o número de venezuelanos que se matricularam nas escolas.
Nesse mesmo período, a governadora do estado de Roraima, Suely Campos, publicou um de-
creto no qual restringiu o acesso dos venezuelanos aos serviços públicos de saúde, e solicitou
o fechamento da fronteira. Apesar das ações de interiorização que contabilizaram, até março
de 2021, mais de 49 mil pessoas interiorizadas em diferentes localidades do país, mesmo com
o fechamento de fronteiras devido à pandemia, ainda são verificados fluxos migratórios sig-
nificativos em Roraima, Amazonas e São Paulo. Em especial, no estado de Roraima, devido à
grande quantidade de migrantes que permanecem chegando, sem possuir nenhuma documen-
tação. Desde 2010, 79,4 mil bolivianos foram regularizados no Brasil, concentrados, em sua
maioria, em São Paulo.
Cabe ressaltar também a migração de indivíduos de outras nacionalidades no país. Desde 2010,
cerca 101,9 mil haitianos foram regularizados, quantidade de migrantes maior que qualquer
outra nacionalidade entrando no Brasil naquele ano, tendo maior concentração de migrantes
haitiano em São Paulo e Brasília.
[2] https://especiais.g1.globo.com/bemestar/vacina/2021/mapa-brasil-vacina-covid/
[3] https://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2021/03/no-pior-momento-da-pandemia-fome-avanca-em-
sao-paulo.shtml?origin=uol
[4] https://ac24horas.com/2021/05/24/pesquisa-mostra-que-181-dos-moradores-da-amazonia-estao-passando-
fome/
34
35
2.4 Dimensão da Discriminação Grave
A Discriminação Grave é uma das dimensões de atuação da Visão Mundial, que busca atingir
a redução dos marcadores de vulnerabilidades referente ao suporte social às crianças com
deficiência, aquelas pertencentes a um grupo considerado marginalizado, às crianças e ado-
lescentes refugiadas, meninos e meninas em conflito com a lei (sistema juvenil), em situação de
rua, e as crianças sem registro de nascimento – dados do IBGE de 2018 apontam a existência de
70 mil crianças na faixa etária de até 10 anos sem seu registro civil.
feito logo no momento do nascimento, bem como em mobilizações sociais realizadas nas co-
munidades.
No ano de 2018, o IBGE fez um levantamento do número de crianças com deficiência no Brasil
a partir de registros de matrícula no ensino regular. Os dados revelaram a existência de 1,18
milhão de crianças e adolescentes que possuem algum tipo de deficiência. Destes, 992 mil
estudam em escolas públicas. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), pessoas com
deficiência são indivíduos que respondem ter, pelo menos, muita dificuldade em uma ou mais
dessas questões: enxergar, ouvir, caminhar ou subir degraus, ou de natureza mental/intelec-
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
tual. No último Censo de 2010, tínhamos 12,5 milhões de brasileiros, de todas as idades, com
grande ou total dificuldade nessas habilidades (6,7% da população).
No Brasil, apesar da trajetória de marcos legais para pessoas com deficiência ser robusta e pen-
sada na totalidade dos seus aspectos e necessidades, a realidade aponta uma exclusão acen-
tuada, desde a estrutura para mobilidade nas ruas, escolas e órgãos públicos e/ou privados;
oportunidades de trabalho que valorizem e reconheçam suas potencialidade; dificuldades no
acesso a uma educação que garanta materiais e equipamentos apropriados; profissionais no
atendimento despreparados e/ou não qualificados para o processo de inclusão; até a falta de
propostas que, de fato, engajem as pessoas nessa condição para luta e conquista de seus direi-
tos, as quais a Lei nº 13.146 de 2015 (Lei brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência) afirma
assegurar.
Um marcador de discriminação grave que merece atenção está nas crianças e adolescentes
que vivem em situação de rua. Segundo nota técnica divulgada pelo IPEA (2020), existem 90.158
pessoas em situação de rua, de várias faixas etárias, que foram informadas no Censo SUAS
2019, e 134.374 cadastradas no Cadastro Único. Segundo o IPEA (2020), essa população está
principalmente em grandes cidades e metrópoles, entretanto há a presença de população em
situação de rua em todos os portes de municípios.
É importante ressaltar que o IPEA (2020) observou, a partir dessa pesquisa, um aumento ex-
pressivo (140%) da população em situação de rua ao longo do período analisado (setembro de
2012 a março de 2020) e estima que existe no total, até março de 2020, 221.869 pessoas em
situação de rua. Mesmo que, no cotidiano das cidades, presenciamos a existência de crianças e
adolescentes em situação de rua, não há levantamentos recentes que evidenciem a quantidade
desse segmento social, tornando-os, mais uma vez, invisíveis para uma atuação mais efetiva
das políticas públicas.
36
de cuidados básicos como saúde, alimentação, educação, dentre outras) e busca por liberdade
e diversão. A pesquisa Crescer para Conhecer (2020) apresentou uma multiplicidade de infor-
mações sobre as crianças e os adolescentes em suas trajetórias entre as ruas, a casa e as insti-
tuições de acolhimento. De um total de 554 participantes contemplados na pesquisa, 73% eram
do sexo masculino; 73% eram adolescentes, 86% eram negros ou pardos; 8% tinham filhos; 62%
frequentavam a escola; 45% trabalhavam; 71% já dormiram na rua; 96% tinham pelo menos um
documento; 48% faziam atividades físicas; 62% mantinham contato diário ou semanal com
a família; 54% tinham um relacionamento bom ou muito bom com os pais; 41% recebiam ou
sua família recebia algum tipo de benefício social; 85% afirmaram já terem sido vítimas de
violência; 64% haviam experimentado ou fizeram uso de drogas e 41% declararam ainda usar;
62% passaram por instituições de acolhimento; 61% afirmaram manter relações sexuais com
pessoas do sexo oposto; 58% costumavam usar métodos contraceptivos; 9% sofreram algum
aborto e 32% se consideravam em situação de rua(CIESPI/PUC–Rio, 2020).
Analisamos, a partir dos dados acima expostos, que a trajetória dos meninos e meninas em
situação de rua é atravessada por uma violação de direitos que inicia na família, a partir de
relatos de vidas e histórias de intensos conflitos e negligência familiares. O uso de drogas
também está relacionado em mais da metade dos casos. Pessoas do sexo masculino são mais
presentes na situação de rua, e quase 90% dos meninos e meninas em situação de rua são de
cor parda ou preta.
Cabe ao Estado e as Organizações da Sociedade Civil atentarem para a proteção dos meninos
e meninas em situação de rua e, principalmente neste período de pandemia, expostos não só a
Covid-19, mas aos riscos diversos do isolamento que eles não conseguem ter, e ainda contando
com limitados e precários meios de sobrevivência.
57,956
30,873
37
O Gráfico 8 revela que, das 57,9 mil mortes por homicídios no Brasil, 30,8 mil foram de jovens
de 15 a 29 anos, perfazendo um percentual de 53,2% dos casos. Entre os anos de 2017 e 2018
há uma queda de números de homicídios, porém ainda alto, sendo um desafio para o governo
brasileiro a prevenção e o controle/enfrentamento dos índices de homicídios no país.
Quanto aos adolescentes que respondem à justiça no Brasil, no último Censo, realizado em
2017, houve o registro de que 142.316 adolescentes cumprem alguma das medidas socioeduca-
tivas (FBSP, 2020). Abaixo, apresentamos os dados do Brasil e dos Estados de atuação da Visão
Mundial.
Ceará 2,566
Bahia 2,477
Amazonas 1,661
Alagoas 2,378
Brasil 142,316
Fonte: Dados retirados do Anuário 2020, referente ao Censo 2017 (Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2020).
O Gráfico 9 aponta a situação de quase 143 mil adolescentes em conflitos com a lei e respon-
dendo ao Sistema de Justiça Juvenil no país. As medidas socioeducativas podem ser de seis
tipos: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviço à comunidade, liberdade
assistida, semiliberdade, privação de liberdade (ECA, 1990).
Vale ressaltar que, por reentradas, entendemos os adolescentes que não tiveram necessaria-
mente sentença condenatória transitada em julgado. Já as reiterações são aquelas situações de
mais de uma sentença condenatória em julgado. Tais conceitos são adotados pelo Conselho
Nacional de Justiça em uma pesquisa realizada em 2019, denominada Reentradas e Reiterações
Infracionais: um olhar sobre o Sistema Socioeducativo e prisional brasileiro, que acompanhou os
adolescentes que tiveram sua entrada no Sistema de Justiça em 2015, observando-os até 2019.
38
tráfico de drogas. A partir dos dados obtidos, foi possível afirmar que, de um universo de 5.544
indivíduos, 1.327 retornaram ao menos uma vez ao sistema socioeducativo entre 2015 e 30
de junho de 2019, perfazendo uma taxa de reentrada de 23,9%. A taxa de reiteração em ato
infracional foi de 13,9%, o que demonstra que, embora cerca de dois a cada dez adolescentes
tenham voltado ao Sistema Socioeducativo após o primeiro trânsito em julgado, apenas pouco
mais da metade dessas reentradas foi confirmada pelo Poder Judiciário como efetiva ocorrên-
cia de novo ato infracional (CNJ, 2019).
No que tange ao número de atendimento de adolescentes que respondem à justiça nas medi-
das socioeducativas de semiliberdade e internação (privação de liberdade), foi revelado pelo
Conselho Nacional de Justiça a partir de um relatório em 2018, apresentando, conforme tabela
abaixo.
2018
Nº Adolescentes em
Localidade Nº Adolescentes Internos (privação de liberdade)
Semiliberdade
Alagoas 15 189
Amazonas 25 67
Bahia 42 566
Ceará 79 528
Pernambuco 161 1.469
Rio de Janeiro 360 1.423
Rio Grande do Norte 26 139
São Paulo 418 6.770
Fonte: Dados coletados a partir do Relatório de 2018 do Conselho Nacional de Justiça
A tabela acima destaca São Paulo com o maior número de adolescentes que respondem à justiça
em Semiliberdade (418) e em Privação de Liberdade (6.770). Depois vem Rio de Janeiro, com 360
adolescentes em Semiliberdade e 1.423 em sistema de internação.
Cada vez mais crescente, os pedidos de solicitação de reconhecimento como refugiado à justiça
brasileira são solicitados ano após ano, conforme tabela que segue.
39
Tabela 6. Número de solicitações de refúgio, por gênero, segundo principais países de nasci-
mento - Brasil, 2011-2019.
Em uma pesquisa realizada em Boa Vista (RR) a respeito da inobservância dos direitos das cri-
anças refugiadas venezuelanas em Roraima, a autora Raffoul (2020) ratifica que a busca por tra-
balho e renda para sustentar sua família é a principal motivação de procurarem a cidade. Além
disso, necessidades na área da saúde pública (vacinas, procedimentos e cirurgias) também fo-
ram apontadas. As crianças, especialmente as venezuelanas refugiadas nos abrigos desta ci-
dade, estão com seus direitos negados, uma vez que se encontram em insegurança alimentar e
expostas às vulnerabilidades – faltam-lhes a moradia e estão fora da escola.
40
Tabela 7 - Número de refugiados reconhecidos por gênero e grupos de idade, Brasil - 2019
Refugiados reconhecidos
Grupos de Idade Gênero declarado
Total
Masculino Feminino
Total 21.515 11.094 10.421
0 a 4 anos 96 53 43
5 a 14 anos 190 80 110
15 a 24 anos 6.536 3.323 3.213
25 a 39 anos 9.734 5.236 4.498
40 a 59 anos 4.410 2.185 2.225
60 anos ou mais 539 210 329
Não Especificado 10 7 3
Fonte: Elaborado pelo OBMigra, a partir dos dados do Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE/MJSP), 2019.
41
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L | VISÃO MUNDIAL BRASIL
42
no Brasil
na Proteção
da Infância e
Adolescência
Principais brechas
3.1 Enfrentando a Insegurança Alimentar
Fome, desemprego dos pais e/ou responsáveis, desnutrição, baixo rendimento escolar e po-
breza são questões interligadas e vinculadas à insegurança alimentar, as quais afetam as cri-
anças e adolescentes, potencializando-os a outras vulnerabilidades.
Por insegurança alimentar compreendemos não apenas a falta de alimento, mas a substituição
de alimentos nutritivos e vitaminados pelos que são mais baratos e de menor valor nutricional,
devido às suas condições financeiras, para garantia da sobrevivência (Galindo Et Al, 2021).
Um grupo de pesquisa chamado Alimento para a Justiça: Poder, Política e Desigualdades Ali-
mentares na Bioeconomia realizou o estudo Efeitos da pandemia na alimentação e na situação
da segurança alimentar no Brasil (2021), identificando o crescimento da insegurança alimentar
nos últimos anos no país e revelando que o quadro se deu por uma conjunção de fatores rela-
cionados a crises sociais, econômicas e políticas recentes, e foi aprofundado, no cenário atual,
pela crise sanitária mundial, tendo a pandemia da Covid-19 como um dos principais motivos
do agravamento.
Vale ressaltar os dados interseccionais que essa pesquisa aponta, ou seja, as diferenças de
gênero, raça ou cor, perfil domiciliar, contextos regionais, territoriais e de renda são marca-
dores que Influenciam a maior ou menor incidência de insegurança alimentar nos domicílios
(Galindo
Et Al, 2021).
Vale salientar que, apesar da insegurança alimentar ter um sentido mais abrangente que a
fome, podemos enfatizar que está bem relacionada com a questão de classe e, portanto, das
famílias que estão na linha de pobreza ou de extrema privação. Os Gráficos que seguem en-
fatizam os estados de atuação da Visão Mundial em comparação com a situação de pobreza e
extrema pobreza no Brasil.
43
Gráfico 10 - Distribuição de Famílias na Linha de Pobreza
– Brasil x estados de atuação da Visão Mundial
Roraima 101.200
Pernambuco 2.048.200
Ceará 1.892.400
Bahia 3.186.300
Amazonas 673.500
Alagoas 671.800
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
Brasil 29.592.000
00
00
00
00
.0
.0
.0
.0
00
00
00
0
00
.0
.0
.0
.0
10
30
40
20
Podemos identificar no Gráfico 10 que, das 29.592.000 pessoas em situação de pobreza no Bra-
sil, 14,65% estão em São Paulo, 10,77% estão na Bahia, 6,92% em Pernambuco, 6,45% no Rio de
Janeiro (6,45%) e, em menor índice, no Ceará, com 6,39%.
Para a situação de extrema pobreza, com 17.140.000 brasileiros, permanece São Paulo na frente,
tendo 12,47% das pessoas mais afetadas, seguido da Bahia com 12,32%, Pernambuco, com 8,06%
e Ceará com 7,14% de privação extrema dentro dos estados de atuação da Visão Mundial, con-
forme vemos no Gráfico que segue.
Roraima 65.100
Pernambuco 1.381.500
Ceará 1.223.500
Bahia 2.111.900
Amazonas 468.400
Alagoas 461.800
Brasil 17.140.000
44
Essas expressões numéricas nos trazem reflexões de que a insegurança alimentar, quando
atrelada à pobreza, possui causas mais profundas associadas aos aspectos estruturantes das
desigualdades sociais, as quais podem ser enfrentadas por tomadas de decisões políticas e
articulações intersetoriais que perpassam desde o montante de investimentos, suporte na
agricultura familiar, inovações para o mercado de trabalho, novas propostas e formas de
geração de trabalho e renda, incentivos à empregabilidade, estando atentos às tendências
que a pandemia provocou, mas também potencializou com os trabalhos nos domicílios,
vendas pela internet, uma vida interligada com as tecnologias e redes sociais.
O fato é que estamos numa situação de alto índice de desemprego, com medidas sanitárias
necessárias para o controle da pandemia e meninos e meninas com insegurança alimentar se-
vera. Ou seja, a pandemia comprometeu diretamente o rendimento de milhões de brasileiros,
com impacto maior nos setores econômicos que empregam proporcionalmente mais mulheres,
negros, trabalhadores informais, pessoas que ganham menores salários e de famílias mais po-
bres (Souza Et Al, 2020), o que gerou a necessidade de visualizarmos as tendências e estraté-
gias de enfrentamento à pobreza de modo que a proteção das crianças e adolescentes sejam
garantidas.
Relativo às perspectivas e tendências durante e pós a pandemia (Souza et al., 2020) será neces-
sário o Governo assegurar: a renda básica e programas de transferência de renda, o Programa
de Aquisição de Alimentos (PAA) como mecanismo de compra direta de alimentos da agri-
cultura familiar, sendo uma importante estratégia de fortalecimento da agricultura familiar e
promoção do acesso à alimentação, sobretudo para populações em insegurança alimentar. A
entrega de kits com alimentos in natura para as famílias é uma estratégia que assegura quali-
dade nutricional da alimentação e possibilita manter a compra da agricultura familiar. Outro
exemplo é o Cartão Merenda, utilizado por alguns municípios para alunos de escola pública.
Outro caminho é que a sociedade exerça seu direito de controle social e de participação na ela-
boração e implementação de políticas e ações para garantia da Segurança Alimentar Nacional.
Vale ressaltar que a pesquisa realizada pela Rede PENSSAN (2021), denominada Inquérito Na-
cional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, apresenta
que a insegurança alimentar no contexto pandêmico está relacionada diretamente às desigual-
dades sociais e, também, regionais. O Norte e Nordeste do país sofrem com maiores índices de
insegurança alimentar. Este Inquérito também aponta a associação entre insegurança alimen-
tar e insegurança hídrica, especialmente na área rural, onde a redução da produção de alimen-
tos para autoconsumo e comercialização de excedentes podem impactar o consumo alimentar
dos moradores e, também, seus rendimentos.
O presente Inquérito ainda ratifica que a perda do emprego e o endividamento da família são
as duas condições que mais impactaram o acesso aos alimentos no período pesquisado. Nos
domicílios localizados na área rural, chama muito a atenção o impacto na Segurança Alimen-
tar dos moradores em decorrência da redução dos preços de comercialização da produção.
Assim, condições que levam à eliminação da fome e outras iniquidades e que promovam o di-
reito humano à alimentação adequada e saudável para todas e todos no Brasil são as principais
recomendações dessa pesquisa (Rede PENSSAN, 2021).
Diante dessa realidade, a articulação entre os setores sociais (Estado, Sociedade Civil e Empre-
sas) se constitui numa estratégia essencial e urgente para que crianças e adolescentes sejam
protegidos da insegurança alimentar e os efeitos que ela produz: fome, desnutrição, baixo ren-
dimento escolar, trabalho infantil, envolvimento com o tráfico de drogas, dentre outras. Em-
presas conscientes de sua responsabilidade social, sociedade atuante e um Estado interventor
(protetor) pode ser o começo de um caminho para mudanças na sociedade brasileira.
45
3.2 Prevenção e
enfrentamento às violências
Durante a pesquisa de análise de contexto brasileiro, identificamos um alto número de vio-
lações de direitos humanos contra crianças e adolescentes em nosso país em dados consoli-
dados e detalhados pelo Ministério de Direitos Humanos em seu relatório de 2019, conforme
destacado em seção anterior desse relatório.
32,014
São Paulo 20,355
2,506
Rio Grande do Norte 2,050
18,841
Rio de Janeiro 9,028
4,053
Pernambuco 2,872
4,060
Ceará 3,418
6,242
Bahia 4,471
2,453
Amazonas 2,291
1,544
Alagoas 1,292
Brasil 86,837
128,408
Fonte: Dados do Painel Nacional de Ouvidoria dos Direitos Humanos (2021) e Dados do Relatório Direitos Humanos (Disque 100, 2019)
46
violências sexuais como maiores incidências, com o total de 7.143 casos, sendo 5.290 (74%) com
meninas e 909 (12,72%) com meninos, incluindo 950 (13,29%) que não foram divulgados o gêne-
ro. Conferimos os dados, e as meninas de 15 a 17 anos permanecem sendo as mais violentadas
sexualmente, com 3.496 casos denunciados.
Os dados expostos nos trazem algumas reflexões: o que acontece no caso brasileiro, que os
números de crianças e adolescentes violentados só crescem? Percebemos pelo comportamen-
to dos marcadores que, por um lado, o estímulo social à denúncia tem sido um efeito positivo
de enfrentamento às relações abusivas e, dentre elas, a negligência como a mais recorrente e
a violência sexual como a mais emergente problemática que exige esforços dos atores formais
(governo) e informais (sociedade civil) de proteção da infância e adolescência no país.
Por outro lado, o alto número de denúncias requer providências não apenas na elaboração
de leis, mas na sua efetivação, com compromissos e pactuações que, de fato, evidenciam res-
postas para o atendimento dos casos e uma proposta eficaz para a redução desses números.
Isso requer investimentos em ampliação de equipamentos sociais, equipes multidisciplinares,
capacitação adequada para acolhimento infanto-juvenil, propostas que possibilitem uma re-
produção social de uma cultura que reconheça a criança como sujeito de direitos. Isso remete
a uma extensão de ações e providências que alcancem o âmago da família, se dela tem vindo os
principais suspeitos das relações abusivas.
Outras reflexões surgem: o que o Sistema e Rede de Proteção da Infância tem feito para pro-
teger seus meninos e meninas contra as violências? A construção de políticas, metodologias, e
tecnologias sociais que promovam a prevenção e o enfrentamento a essas questões precisam
ser atingíveis às causas para que os efeitos sejam alterados positivamente.
Mas, como intervir socialmente sobre as relações abusivas? Estas podem também estar rela-
cionadas às questões culturais que envolvem a reprodução do machismo, violência de gênero,
de um olhar adultocêntrico sobre crianças e adolescentes e um racismo estrutural, num país
que tem uma postura submissa - como afirma Roberto da Matta (1995) – que os brasileiros
são cordiais e fogem de conflitos. Esses comportamentos culturais foram produzidos por uma
longa história de colonialismo entranhados nos hábitos e costumes em sociedade e que certa-
mente estimulam, mantêm e reproduzem as relações abusivas.
Nesse sentido, destacamos três dentre as principais lacunas referentes às violências contra
crianças e adolescentes no Brasil, as quais necessitam ser enfrentadas, a saber: Violências
Sexuais, Matrimônio Infantil e a Gravidez na Adolescência.
As possíveis causas da não denúncia são: o silêncio que culturalmente as famílias mantêm a
respeito de seus problemas, pois em seu imaginário refere-se ao privado; o poder opressor do
adulto (agressor) sobre a criança, que a mantém refém do medo das ameaças da morte de quem
eles(as) amam, bem como o medo da exposição pública. O desconhecimento da criança sobre
47
seus direitos, ou ainda, a imaturidade (pela própria fase de desenvolvimento) de não saber dis-
cernir a demonstração do afeto, ou seja, o limite entre carinho e carícias (abusivas), uma vez
que os dados apontam que os principais agressores sexuais são os pais, padrastos e/ou amigos
próximos da família. O sentimento de culpa que as crianças e adolescentes desenvolvem ao
longo do processo de abuso sexual também pode ser outra causa que influencia negativamente
as crianças e adolescentes a denunciarem.
Diante disso, refletimos: como alcançarmos as crianças nos aspectos que envolvem desde o
conhecimento de seus direitos, do que é afeto ou violência, do que deixa de ser privado para
ser uma causa/responsabilidade pública em prol de sua proteção ao respeito à preservação e
garantia dos seus direitos sexuais? Cabe ao Governo, universidades e sociedade civil encontrar
caminhos de respostas para estímulo a denúncias, identificação e registro de casos de abuso e
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
Até porque é comum, ou seja, naturalizada, a união precoce entre adolescentes ou entre ado-
lescente e adultos, seja ela registrada em cartório ou a união estável consentida, que conhecemos
como “morar junto”. A especialista Márcia Monte (2021) afirma: “quando uma prática nociva
como o casamento infantil é naturalizado culturalmente, a própria sociedade tem dificuldade
de reconhecer como um problema em si”.
Segundo o Observatório do Terceiro Setor (2021), o Brasil ocupa o 5º lugar entre os países com
maior incidência de casamento infantil no mundo e a pandemia pode agravar mais ainda esta
realidade, uma vez que a condição socioeconômica é um dos principais fatores propulsores
dessa prática cultural nociva. Assim, no Brasil, as principais pessoas afetadas com essa prática
são: meninas em situação de vulnerabilidade e pobreza, grávidas na adolescência e que acabam
evadindo da escola, trazendo para si – a partir do casamento – responsabilidades demasiadas
numa fase em que estão ainda em processo de desenvolvimento, sendo as principais impli-
cações a violência de gênero e os muitos impedimentos de trilharem seus projetos de vida e
oportunidades de melhoria nas suas condições socioeconômicas. Essa prática cultural merece
atenção e uma emergente intervenção.
Entretanto, para aquelas meninas que já vivenciam esse momento da maternidade, são
necessárias estratégias que possibilitem suporte e cuidados tanto para a saúde quanto para
a sustentabilidade dessas vidas envolvidas e que, mais do que nunca, precisam de proteção.
Para as demais meninas e para os meninos, ações preventivas são o caminho, evitando con-
sequentes problemas socioeconômicos, evasão escolar e ruptura com suas projeções de vida.
Em período de pandemia, novos problemas se agregam, dentre eles o medo, ansiedades e in-
certezas, e intensificam-se na vida dessas meninas grávidas, que em meio ao isolamento social
e com as necessidades de acompanhamento do pré-natal, sentem receio de pegar a doença, o
48
que é um risco também ao feto, uma vez que a ciência ainda não tem tudo esclarecido a respei-
to dessa situação pandêmica.
A partir da garantia do direito à educação, as crianças se alimentam para uma parte de seu dia.
É um espaço de interação social, de oportunidades à sua ambientação com artes e cultura, com
a cidadania e, para estudantes de ensino médio, as escolas profissionalizantes possibilitam a
sua iniciação com a qualificação profissional.
A escola tem sido um alvo de muitas expectativas. Porém, na realidade brasileira, principal-
mente no ensino público, há muitos desafios a serem superados. Segundo os dados do Censo
Escolar INEP 2020, há 179.533 escolas públicas e particulares no Brasil na Educação Básica.
Destas, 138.487 são públicas nas instâncias federais, estaduais e/ou municipais.
O Censo Escolar INEP 2020 afirma que das 138.487 escolas de ensino básico que são públicas,
77% (106.497) possuem televisão, 61% (83.834) têm aparelho de DVD, 62% (85.814) possuem im-
pressora, 18% (25.110) têm antenas parabólicas, 36% (49.392) têm máquina copiadora e 12%
(17.101) têm retroprojetor. Dependendo da zona (rural ou urbana), bem como o nível de acesso à
internet de alunos, em período de pandemia, as copiadoras e impressoras são importantes para
a continuidade das atividades escolares de meninos e meninas.
Outro fator preocupante é a acessibilidade nas escolas públicas brasileiras, uma vez que cerca
de 1.308.900 de estudantes estão matriculados na educação especial. O Censo Escolar INEP
(2020) apresenta que apenas 57% (78.842) das escolas públicas têm dependências acessíveis aos
portadores de deficiência e 44% (61.382) de suas escolas apresentam sanitários acessíveis aos
portadores de deficiência.
Do que pode ser mensurado na instância nacional quanto à evasão escolar, apresentamos o
número de crianças que estiveram fora da escola em 2019, comparada com os estados de atu-
ação direta da Visão Mundial.
49
Gráfico 13 – Distribuição de crianças fora da Escola no Brasil
e nos estados de atuação da Visão Mundial
Pernambuco 56.277
Ceará 49.900
Bahia 77.309
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
Amazonas 43.334
Alagoas 31.922
Brasil 1.096.468
Fonte: Dados coletados da Pesquisa Cenário da Exclusão Escolar no Brasil, UNICEF (2021)
De acordo com os dados coletados da pesquisa Cenário de Exclusão Escolar no Brasil (UNICEF,
2021) apontados no Gráfico 13, o país tem 1,09 milhão de crianças fora da escola. Dos estados
com maior atuação da Visão Mundial destacam-se São Paulo (142.874), com o maior número de
meninos e meninas de 4 a 17 anos que não frequentam a escola, seguido de Bahia (77.309), Rio
de Janeiro (59.459), Pernambuco (56.277) e Ceará (49.900).
O UNICEF (2021, p.29-30) apresenta que, das crianças e adolescentes fora da escola em todo o
país, a maioria é de pretas(os), pardas(os) e indígenas, que são, também, a maioria dos(as) que
vivem em famílias com renda domiciliar per capita de até ½ salário mínimo (61,9%). Há um
destaque na alta relação entre pobreza e exclusão escolar. Apenas 9,9% dos que estavam fora
da escola e tinham de 4 a 17 anos em 2019 vivem em famílias com mais de um salário-mínimo
(SM) per capita; 90,1% vivem em famílias com renda familiar per capita menor que um salário
mínimo. Desses, 32,3% em famílias com até ¼ (um quarto) do SM de renda familiar per capita,
29,6% entre ¼ (um quarto) e ½ (meio) e 28,2% de ½ (meio) até um SM per capita.
Além dessas questões supracitadas, pensamos que outros fatores podem estar influenciando
a evasão escolar, como: metodologias de ensino que alcancem o interesse e necessidades de
aprendizagem, o envolvimento das crianças e adolescentes com trabalho infanto-juvenil (que
será evidenciado no subitem que segue), a gravidez precoce, bem como conflitualidades no
ambiente escolar (violências dentro da escola, assédios, bullying, tráfico de drogas no entorno,
conflitos territoriais e ameaças provocadas pelas facções criminosas), dentre outros que acon-
tecem no âmbito familiar e que afetam diretamente nas relações socioafetivas e desempenho
de aprendizagem dos meninos e meninas.
No atual cenário de pandemia, a educação (pública e particular) foi afetada. No que tange à
educação pública, apesar das estratégias e esforços, a reorganização das ações pedagógicas
50
e de cuidados com as crianças, adolescentes e jovens gerou um ônus financeiro expressivo e
necessário para o aprimoramento da infraestrutura escolar e o retorno seguro das atividades
presenciais (Instituto Unibanco, 2020).
Outras medidas tomadas pelo Governo Federal em período de pandemia no Brasil também fo-
ram identificadas: Projeto de lei nº 3477/20207 (Câmara) e nº 3462/20208 (Senado) que garan-
tem acesso à internet a alunos(as) e professores(as) por meio do Fundo de Universalização dos
Serviços de Telecomunicações (FUST) e de auxílio-conexão. O Projeto de Lei (PL) nº 3165/2020
estrutura um pacote anticolapso financeiro das redes de educação do país, e o PL nº 3551/2020
para a garantia de recursos federais, distribuídos pelo Programa Dinheiro Direto na Escola
(PDDE) a ações relacionadas à estratégia de retorno às aulas (Instituto Unibanco, 2020).
Destacamos que a aprovação da Emenda Constitucional (EC) nº 108/2020 gera uma esperança
à rede de educação frente à pandemia, uma vez que reconhece a necessidade permanente e o
aprimoramento do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valori-
zação dos Profissionais da Educação (Fundeb).
No caminho de mudanças que a pandemia provocou na Educação, temos hoje, no ensino re-
moto, os desafios de proteção social das crianças e adolescentes que são evidenciados no
abandono escolar, nas reprovações, no desalinhamento da idade-série (ano de estudo), nos
impedimentos que as crianças e adolescentes em situação de pobreza passam com despesas
como acesso à internet, celular, computador, tablet, do baixo poder aquisitivo para a garantia
de materiais didáticos, pedagógicos e higiênicos, ou até mesmo a alimentação que suas famílias
desempregadas não têm como adquirir. Tudo isso são novas despesas que o Estado deve garan-
tir para que o direito à educação não seja negado.
O Instituto Unibanco (2020), em seu Terceiro Relatório Covid-19 – Impacto Fiscal na Educação
Básica, apresentou recomendações para a educação diante do retorno às aulas presenci-
ais, a saber: realizar processo de coordenação nacional, no bojo da implementação da Lei nº
14.040/2020, para a organização adequada de um retorno gradual e seguro às atividades esco-
lares presenciais, mediante planejamento orçamentário das despesas necessárias e articulação
interfederativa para troca de práticas de racionalização de custos. Além disso, cinco blocos
de despesas foram evidenciados: aquisição de materiais, reformas, avaliações diagnósticas,
infraestrutura pedagógica para redução de déficits de aprendizagem e formação de equipes
operacionais.
É unânime que o déficit de aprendizagem constitui um dos mais desafiadores efeitos que terão
repercussões em longo prazo, intensificadas pela pandemia. Para isso, nos lembramos das ori-
entações do Banco Mundial com relação a uma das metas dos Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável – ODS para superar a “pobreza de aprendizagem”. O Banco Mundial (2021) percebe
a necessidade de um pacote de políticas de alfabetização que consiste em intervenções foca-
das especificamente na promoção da aquisição de proficiência em leitura na escola primária.
Uma abordagem educacional renovada para fortalecer sistemas educacionais inteiros - de
modo que as melhorias na alfabetização possam ser sustentadas e ampliadas e todos os outros
resultados educacionais possam ser alcançados, bem como uma ambiciosa agenda de medição
e pesquisa - para fechar as lacunas de dados e continuar a pesquisa orientada para a ação e a
inovação sobre como desenvolver habilidades fundamentais.
51
A Pobreza de Aprendizagem diz respeito à incapacidade de ler e compreender um texto sim-
ples aos 10 anos. Este quesito reúne indicadores de escolaridade e aprendizagem, a começar
com a proporção de crianças que não alcançaram a proficiência mínima de leitura (medida nas
escolas) e é ajustado pela proporção de crianças que estão fora da escola (e se presume que não
sabem ler com proficiência) e que afetam diretamente no capital humano, na prosperidade e na
inserção destas no mercado de trabalho, no futuro. (Banco Mundial, 2021)6.
Cabe ao governo atentar para seus compromissos com a Proteção da Infância e Adolescência e
metas acordadas internacionalmente, bem como a sociedade civil exercitar seu controle social
na busca por respostas a esses intensos desafios do direito à educação.
O trabalho infantil é um dos marcadores com intensos desafios para atuação na Proteção da
Infância e Adolescência no país. Apesar da redução que o Brasil teve entre os anos de 2016 a
2019, de 2,1 milhões para 1,8 milhão, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PnadC), em 2019, havia 706 mil pessoas de 5 a 17 anos em ocupações classificadas como piores
formas de trabalho infantil, o que corresponde a 45,8% do total de crianças e adolescentes tra-
balhadores. O maior percentual, 65,1%, está na faixa etária de 5 a 13 anos de idade.
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
Entretanto, há desafios diversos no Brasil quando nos referimos ao trabalho infantil, que vão
desde a cultura e tradições nas regiões brasileiras que cultivam o reconhecimento
e valorização comunitária da criança nessa condição, até mesmo os trabalhos domésticos
que não são vinculados ao sistema econômico e, portanto, não são alcançados na fiscalização
realizada pelo setor público, dentre outras que envolvem a exploração comercial do corpo, e
6 Conceito de Pobreza de Aprendizagem retirado do Site: https://www.worldbank.org/en/topic/education/brief/
learning-poverty , disponível em: 09 de julho de 2021
7 Avanços definidos pelo Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação ao Trabalho Infantil no site: https://fnpeti.org.
br/avancosedesafios/ consultado dia 10
52
as facções criminosas, com suas estratégias lucrativas de venda de drogas, ascensão rápida e
hierárquica no mundo do crime organizado, num pais extremamente desigual.
A pesquisa O Trabalho Infantil no Brasil: análise dos microdados da PnadC 2019, realizada pelo
FNPETI em 2021, que teve como objetivo contribuir para o aprofundamento do debate sobre
o tema no Brasil, definição e implementação de políticas públicas, programas e ações de en-
frentamento a essa grave violação dos direitos fundamentais de milhões de crianças e adoles-
centes brasileiros, aponta que as experiências bem-sucedidas de combate ao trabalho infantil
resultam de políticas públicas de transferência de renda condicionada à frequência escolar, da
adoção da jornada escolar integral, da garantia do direito ao não trabalho e do apoio e proteção
social às famílias.
Assim, pensamos que as políticas públicas e sociais fortalecem o Sistema de Garantia de Direi-
tos e a rede de proteção de crianças e adolescentes com papel estratégico das ações do PETI
(AEPETI), do Programa Bolsa Família (PBF), das ações de inspeção e fiscalização do trabalho e
da atuação do Ministério Público do Trabalho (MPT) como afirma a Pesquisa do FNPETI (2021).
Diante dos desafios, apresentamos o Gráfico 13 com dados encontrados em consultas no Ob-
servatório de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil que, vinculado aos órgãos oficiais
de pesquisa como IBGE, PNAD Contínua, INEP, Cadastro único dentre outros, nos proporcionou
comparar a situação do Brasil em estados de atuação da Visão Mundial.
O Gráfico 14 nos revela que há 34.200 famílias acompanhadas pelo Governo Brasileiro, com
crianças abordadas na situação de Trabalho Infantil, a partir do Cadastro Único. A Bahia (5.836)
é o estado que mais o governo cadastrou famílias na situação de crianças no trabalho infantil,
seguida do Amazonas (1725) e Rio Grande do Norte (1711).
Entretanto, na pesquisa realizada pelo INEP, a partir da declaração de alunos da escola pú-
blica do 5º e do 9ª ano, o estado de São Paulo é apresentado como o que mais necessita uma
intervenção, uma vez que são 74.700 casos de alunos que trabalham fora de casa, seguido por
53
Bahia (39.700), Rio de Janeiro (27.000) e Pernambuco (23.700). Segundo o Fórum de Prevenção e
Erradicação do Trabalho Infantil (2021), os efeitos desse fenômeno deixam marcas físicas, psi-
cológicas e educacionais para a vida adulta. Por isso, entende que o Estado e Rede de Proteção
devam atuar com urgência no cumprimento efetivo da legislação de proibição do trabalho in-
fantil; no direito à formação profissional do adolescente; na adoção de novas ações e progra-
mas governamentais e da sociedade civil, priorizando recortes de faixa etária, gênero, cor, local
de residência, renda familiar e escolaridade de crianças e adolescentes.
por parte do Governo Federal. O agravamento da situação atual será captado pelas pesquisas
de 2020 e 2021.
Pensando numa tendência no aumento do trabalho infantil no Brasil devido à pandemia, o UNI-
CEF(2021)9 e a OIT, para reverter, em nível global, recomendam: proteção social adequada para
todos, incluindo benefícios universais para crianças e adolescentes; aumento dos gastos com
educação de qualidade e retorno de todas as crianças e adolescentes à escola, incluindo quem
estava fora da escola antes da pandemia; promoção de trabalho decente para adultos, para que
as famílias não tenham que recorrer às crianças e aos adolescentes para ajudar a gerar renda
familiar; o fim das normas prejudiciais de gênero e da discriminação que influenciam o traba-
lho infantil; investimento em sistemas de proteção infantil, desenvolvimento agrícola, serviços
públicos rurais, infraestrutura e meios de subsistência.
8 Avanços e Desafios do Trabalho Infantil no Brasil, consultado no dia 18 de junho de 2021. Disponível: https://fnpeti.
org.br/avancosedesafios/
54
3.5. Enfrentamento à letalidade infantojuvenil
O Brasil, desde meados dos anos 80, tem sofrido com o crescimento da violência juvenil e en-
volvimento de crianças e adolescentes no uso e no tráfico de drogas. Crianças-soldados são
preparadas, inicialmente como olheiros, e de forma hierárquica, ritualizados com “batismos”
e fidelidade às facções criminosas que apresentam o narcotráfico como uma “carreira” a ser
percorrida.
O envolvimento desses meninos e meninas com o uso e vendas de drogas tem gerado conse-
quências e efeitos graves na sociedade, dentre eles conflitos com a lei e, consequentemente,
quando apreendidos, os adolescentes respondem à justiça; embates com a polícia, ocasionando
inclusive chacinas e, portanto, uma curta trajetória de vida, devido à letalidade infanto-juvenil.
Numa estatística realizada pela FLACSO (2015) com 85 países, o Brasil ocupou o terceiro lugar
na lista de nações com as maiores taxas de homicídios de adolescentes de 15 a 19 anos. Com o
índice de 54,9 homicídios para cada 100 mil pessoas nessa faixa etária, o país é superado apenas
por México e El Salvador.
O Gráfico a seguir aponta a situação dos Homicídios em Geral em comparação com a Letali-
dade Juvenil por estado de atuação da Visão Mundial.
8.000
7.000 6.787
6.455
6.000
4.900
5.000
4.141 4.190
4.000 3.724 3.727
3.000 2.812
2.269
1.825
2.000 1.441 1.542 1.461
843 859 1.067
1.000
0
te
rá
ulo
as
o
s
co
hia
oa
or
ei r
a
on
bu
Ce
Ba
Pa
N
ag
Ja n
az
am
Al
do
o
Am
Sã
de
rn
e
Pe
nd
o
Ri
ra
G
o
Ri
55
Conforme dados coletados no Atlas da Violência (2020) expostos no gráfico acima, dos esta-
dos de atuação da Visão Mundial no Brasil, a Bahia lidera o ranking no que tange às mortes
de adolescentes e jovens com 4.141 casos. Depois, seguem Rio de Janeiro (3.724), Ceará (2.812),
Pernambuco (2.269) e São Paulo (1461).
O alto índice de mortes violentas contra adolescentes e jovens geralmente são ocasionadas por
dívida de drogas, pela polícia, por extermínio de milícias, por conflitos pessoais e/ou territo-
riais envolvendo a venda das drogas (Atlas da Violência, 2019). Estas evidências nos indicam a
necessidade de uma intervenção intersetorial que preveja uma prevenção eficaz, promoção de
políticas sociais e públicas até o controle e repressão do tráfico de drogas.
Segundo os estudos apontados no relatório Cada Vida Importa (2019), uma pesquisa realizada
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
pelo Comitê Cearense pela Prevenção aos Homicídios de Adolescentes afirma que as políticas
sociais e públicas que envolvem a educação, a geração de trabalho e renda, esporte, cultura e
lazer, o acesso a equipamentos de saúde e de assistência social ainda são as principais alterna-
tivas de enfrentamento a essa questão social.
Outras recomendações são feitas por esse Comitê Cearense ao Estado (2019), que são perti-
nentes ao enfrentamento a essa questão: força-tarefa para revisão de dados; integração e ar-
ticulação interinstitucional; conexão digital; autonomia e fortalecimento da atividade pericial;
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
56
A Estrutura do
Sistema de
Proteção
à Criança no País
57
4.1 Marco Legal
No Brasil, o Sistema de Proteção da Infância e Adolescência é resultado de um lento pro-
cesso de reconhecimento no que tange à proteção integral de meninos e meninas. A for-
mação sociopolítica brasileira para esse segmento é marcada, desde o período colonial, de
prática assistencial voltada para crianças em situação de pobreza e se pautava no trabalho,
objetivando a proteção da sociedade e não da infância (Merlim, 2012).
Desde o período colonial até o republicano, o predomínio de ações e legislações eram vol-
tadas para crianças abandonadas ou aquelas que cometiam delitos, reforçando a imagem
da criminalização da pobreza. Exemplo disso foi o Código de Menores de 1927, que apenas
reforçava as práticas anteriores. (Merlim, 2012).
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
Desde o ECA, então, a luta pelos direitos das crianças e dos adolescentes do Brasil se faz
na constituição do Sistema de Garantia de Direitos – SGD (conjunto articulado de ações e
políticas sociais básicas, de assistência social, proteção especial e de garantias) e da Rede
de Proteção da Infância e da Adolescência.
Pelos achados, pode-se inferir que há diversos fatores que influenciam a sociedade (seja
desconhecimento dos direitos e/ou descumprimento de deveres) e o Estado - que apesar
de saber de sua obrigatoriedade – não consegue atingir o número de demanda existente,
bem como ainda lidam com incógnitas que perpassam entre a letra da lei e a sua aplica-
bilidade, além das causas estruturais brasileiras decorrentes das desigualdades sociais.
No levantamento dos marcos normativos, segundo o Relatório do Ministério de Direitos
Humanos (2018), o Brasil ratificou os seguintes Instrumentos Internacionais de Proteção
à Infância:
• Convenção sobre a Idade Mínima para Admissão em Emprego (Convenção nº 138 – OIT)
– 1973
58
• Convenção sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e a Ação Imediata
para a sua Eliminação (Convenção NO 182 – OIT) – 1999
• Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transna-
cional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mul-
heres e Crianças - Protocolo de Palermo – 2000
No que tange às leis relevantes que, de alguma forma, regulam a proteção da infância e adoles-
cência no Brasil e responsabiliza os autores de violência contra esse segmento da sociedade,
destacamos a Constituição, Leis e Códigos Nacionais:
Quanto aos Planos e Políticas que expressam a proteção da Infância e o alinhamento às normas
internacionais e regionais até os anos 2011, apresentamos:
59
• Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças
e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária – 2006
Importa ressaltar a existência de algumas normas do Poder Executivo Federal ao que tange à
Proteção da Infância, especialmente à violência, ao abuso, ao abandono e à exploração de cri-
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
• Norma Técnica - Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da Violência Sexual contra
Mulheres e Adolescentes – 2012. 16
• Resolução CIT nº 04/2011 - Parâmetros nacionais para o registro das informações no CRAS e
CREAS – 2011
• Resolução CIT nº 07/2011 - Prazo e procedimentos para criação de CRAS e CREAS – 2011
A partir de 2012, novas legislações e planos foram instituídos na nação brasileira e em alguns
estados (unidades federativas) para assegurar a proteção de meninos e meninas no que tange
ao atendimento a adolescentes nas medidas socioeducativas; violações de direitos (violência
doméstica, sexual, física); matrimônio infantil; gravidez na adolescência; faltas escolares; pes-
soas desaparecidas; prevenção a homicídios; prevenção e proteção às violências nas escolas, a
saber:
60
Lei nº 12.594, 18 de janeiro de 2012, que institui o Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo – SINASE
Lei nº 13.010, 26 de junho de 2014, conhecida como Lei Menino Bernardo, contra os maus
tratos
Lei nº 13.431, 04 de abril de 2017, conhecida como Lei da Escuta Especializada, que institui
ouvidorias, disque denúncias e comitês em proteção da infância nos órgãos públicos
Lei nº 13.798, 03 de janeiro de 2019, conhecida como Lei da Semana Nacional de Prevenção
da Gravidez na Adolescência
Lei nº 13.803, 10 de junho de 2019, conhecida como Lei da Notificação de Faltas Escolares
ao Conselho Tutelar
Lei nº 13.811, 12 de março de 2019, conhecida como Lei de Proibição do Casamento antes
dos 16 anos
Lei nº 13.812, 16 de março de 2019, conhecida como Lei do Cadastro Nacional da Pessoa
Desaparecida
Lei nº 10.151, 21 de julho de 2020, uma Lei municipal de São José dos Campos, no estado
de São Paulo, que trata da criação de Comitês nas Escolas para prevenção e proteção da
infância e adolescência
Lei nº 17.253, 29 de julho de 2020, uma Lei Estadual do Ceará que trata da criação de
Comitês nas Escolas para prevenção e proteção da infância e adolescência
Lei nº 9.116, 30 de novembro de 2020, uma Lei Estadual do Rio de Janeiro que trata
da criação de Comitês nas Escolas para prevenção e proteção da infância e adolescência
Vale ressaltar que as Legislações Lei nº 13.010, 26 de junho de 2014 (Lei Menino Bernardo), Lei nº
10.151, 21 de julho de 2020 (São José dos Campos), Lei nº 17.253, 29 de julho de 2020 (Ceará) e Lei
nº 9.116, 30 de novembro de 2020 (Rio de Janeiro) foram conquistas diretas da Visão Mundial no
Brasil, com a participação de seus profissionais nos Conselhos de Direito municipais, estaduais
e nacional, e mobilização social junto à sociedade civil.
Relativo aos Planos que previnem os homicídios, é necessário relatar que antes mesmo no Pla-
no Nacional de Segurança Pública e Defesa Social instituído no Brasil em 2018, com o objetivo
de reduzir as diversas formas de violência, inclusive aos crescentes números de homicídios
letais e o narcotráfico, iniciativas voltadas para a prevenção de mortes violentas contra jovens
no âmbito nacional já existia o Plano de Prevenção à Violência contra a Juventude Negra no ano
de 2012.
61
No que diz respeito aos Planos de Prevenção aos Homicídios, destacamos que alguns estados
de atuação da Visão Mundial já possuem o Plano e/ou Programa de Prevenção a Homicídios
e/ou Comitês, a saber: Ceará, Bahia, Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do
Norte. No estado do Amazonas, devido à sua extensão e especificidade, encontramos o Plano de
Prevenção a Conflitos Agrários.
Durante este diagnóstico foi identificado um relatório de âmbito nacional realizado pelo
Ministério de Direitos Humanos e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD
Brasil) apresentando as Ações de Proteção a Crianças e Adolescentes contra violências: levan-
tamentos nas áreas de saúde, assistência social, turismo e direitos humanos, no ano de 2018.
Alguns estados e municípios do país fazem consultas públicas a respeito de sua atuação na
Proteção da Infância e poucos mantém a prática de avaliações sobre suas ações, o que pode
ser uma lacuna tanto para governo quanto para a sociedade civil que controla socialmente o
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
Com os seus três eixos estruturantes – promoção, defesa e controle – o Sistema de Garantia de
Direitos tem a finalidade de mobilizar e construir uma nova cultura na sociedade e nas insti-
tuições cujas crianças e adolescentes sejam percebidos e atendidos como sujeitos de direitos.
Assim, os órgãos do governo, quanto os de controle social em que têm representação da so-
ciedade civil, aplicarão instrumentos normativos para o funcionamento dessas finalidades na
efetivação dos Direitos Humanos, nos níveis federal, estadual e municipal.
A Promoção dos direitos deve ser realizada tanto pelos órgãos públicos, quanto pelos repre-
sentantes da sociedade civil e pessoas da comunidade, promovendo e efetivando os direitos da
população infanto-juvenil através da elaboração e implementação da política de atendimento
(Farinelli e Pierini, 2016). A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente
refere-se a serviços e programas das políticas públicas, especialmente das políticas sociais,
afetos aos fins da política de atendimento dos direitos humanos de crianças e adolescentes;
serviços e programas de execução de medidas de proteção de direitos humanos e os serviços e
programas de execução de medidas socioeducativas e assemelhadas (Paiva, 2020).
Relativo ao Controle da efetivação dos direitos, esse é o espaço específico “para o acompanha-
mento, avaliação e monitoramento dos mecanismos de promoção e defesa dos direitos, con-
sistindo, portanto, em espaço de vigilância que será exercido prioritariamente pela sociedade
civil organizada, por organismos institucionais e mistos, como o Conselho de Direitos”
(Farinelli e Pierini, 2016, p.65).
Ainda que exista o jogo de interesses e poderes nos espaços de participação, o controle social
62
é exercido soberanamente pela sociedade civil, através das suas organizações e articulações
representativas. Nessa finalidade é essencial o papel do Conselho de Direitos da Criança e do
Adolescente que acompanha as instituições públicas e da sociedade civil, bem como delibera
políticas prioritárias e deve ficar “de olho” no orçamento público destinado às crianças e ado-
lescentes em cada instância de atuação nacional, estadual e municipal.
No que tange à Defesa, atuam os órgãos públicos judiciais, especialmente as Varas da Infância e
da Juventude e suas equipes multiprofissionais, as Varas Criminais especializadas, os Tribunais
do Júri, as comissões judiciais de adoção, os Tribunais de Justiça, as Corregedorias Gerais de
Justiça, Polícia Civil, Polícia Técnica, Polícia Militar, Centros de Defesa da Criança e do Adoles-
cente, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Ministério Público (UNICEF, 2021).
No que tange ao eixo da Gestão da Política, este visa a garantia das condições necessárias para
que os direitos das crianças e adolescentes sejam respeitados, bem como o fortalecimento das
instâncias do Sistema de Garantia dos Direitos, das estruturas de coordenação da política nas
três esferas de governo e do financiamento da Política são reafirmadas como condições funda-
mentais para se alcançar os fins propostos.
Assim, definidos em Lei, cada órgão que compõem os eixos estruturantes e estratégicos de
ação do Sistema de Garantia de Direitos (Promoção, Defesa e Controle) terá suas atribuições
específicas nesse processo, de modo que culmina numa proposta integral de direito às crianças
e adolescentes e integrada entre setores, desenvolvendo a partir das relações de articulação
e responsabilidades de cada representante institucional, família e sociedade a constituição e
funcionamento da Rede de Proteção.
Baseado nessa tese, Paiva (2020) aponta que Sistema pressupõe a uma ação e/ou atuação con-
junta e coordenada entre segmentos ou instituições decorrentes de uma obrigação legal e, por
Rede, apenas uma adesão, de caráter voluntário, que se consolida na formulação de um pacto, a
ser firmado por pessoas e/ou instituições para uma ação de interesse comum. Nesse sentido,
cabe destacar que no Brasil há uma articulação definida em lei entre o Sistema de Garantia de
Direitos e a Rede de Proteção, com a compreensão de que o Estado (e seus órgãos) tem a obri-
63
gatoriedade de assegurar a garantia e efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes
no país e que a Rede de Proteção (de caráter complementar) constituída pelas organizações da
sociedade civil organizada (formal) ou não (informal) contribui para a promoção de ações, mas
também enquanto instituição participativa, representativa e como mecanismo de tensões para
que o Estado cumpra seu papel social de cuidados com a infância e adolescência no Brasil.
Desse modo, a Visão Mundial considera como uma ação e atuação conjunta, coordenada entre
diversos segmentos e instituições, decorrentes de uma obrigação legal. Observando, portan-
to, leis, regulamentos, políticas, mandatos, processos e serviços prestados pelo governo; bem
como crenças, atitudes e vínculos comuns com mecanismos tradicionais e não formais de pro-
teção à criança (Visão Mundial, 2020).
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
64
Diagnóstico e
Análise no Nível
Comunitário
65
O Diagnóstico no Nível Comunitário teve o propósito de conhecer a realidade dos municí-
pios de atuação da Visão Mundial nos estados brasileiros, para a análise e compreensão das
questões prioritárias que afetam a infância e adolescência, as causas fundantes, se essas co-
munidades conhecem as leis, políticas, serviços prestados, e a quem recorrem como rede de
apoio, bem como os avanços e brechas do Sistema e Rede de Proteção, a partir de uma escuta
comunitária junto aos grupos mais vulnerabilizados (crianças, adolescentes e adultos), bem
como os atores sociais que desenvolvem ações para proteção dos meninos e meninas em cada
território pesquisado. A pesquisa no Nível Comunitário demandou um processo que merece
ser mencionado.
A Pesquisa Local (comunitária) aconteceu em oito cidades brasileiras, cada uma pertencente
a um estado, a saber: Recife (PE), Fortaleza (CE), Governador Dix-Sept Rosado (RN), Inhapi
(Alagoas), Manaus (AM), Nova Iguaçu (RJ), Salvador (BA) e São Paulo (SP). Como já afirmamos, a
escolha dos municípios tem a ver com a intervenção direta da Visão Mundial por Programas de
Áreas e/ou Projetos Especiais em territórios que apresentam intensas vulnerabilidades sociais.
Lembramos que no item da Metodologia (1.1) já descrevemos os critérios de escolha dos par-
ticipantes no que tange aos meninos, meninas e adultos (mulheres e homens) e atores sociais
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
A respeito dos contextos, algumas das cidades escolhidas são de áreas urbanas/metropolitanas
(Fortaleza, Manaus, Nova Iguaçu, Recife, Salvador, São Paulo) e outras de zonas rurais (Inhapi e
Governador Dix Sept Rosado). Esses contextos foram percebidos no processo de planejamento
da pesquisa, uma vez que, junto com os pesquisadores e assessores da Visão Mundial Brasil de
cada estado foram consultados a viabilidade do uso, de acesso e das condições financeiras das
famílias para que a internet fosse utilizada na aplicação da pesquisa (grupos focais com adultos
e entrevistas com informantes chaves) de modo virtual (remoto). Vale ressaltar que as formas
remotas nas zonas rurais se tornaram inviáveis.
Algumas áreas urbanas como em Salvador, Nova Iguaçu, Recife e Fortaleza, mesmo sendo
metrópoles, devido às baixas condições financeiras das famílias, os constantes furtos de cabos
telefônicos na cidade e/ou o desconhecimento do uso das tecnologias, foram os principais mo-
tivos dos grupos focais com famílias (adultos) serem presenciais, e não virtuais. Vale ressaltar
que todos(as) os(as) pesquisadores(as) foram preparados(as) para a aplicação da pesquisa de
forma virtual e presencial.
Para a divulgação da pesquisa, tivemos dois caminhos: mobilização das comunidades e outro
para órgãos/instituições sociais. Para os órgãos, primeiramente mapeamos e identificamos,
dentro e/ou próximo ao território de aplicação da pesquisa, as delegacias, Conselho Tutelar,
CRAS e/ou CREAS, postos de saúde, movimentos e redes de atuação com crianças e adoles-
centes, instituições da sociedade civil, igrejas e espaços religiosos, diretores de escola, Juizado
da Infância e/ou promotoria, bem como vereadores e/ou deputados que atendem os territórios
escolhidos. Logo após, contatamos por telefone os possíveis representantes daquele órgão e
enviamos ofícios apresentando a Pesquisa, seus objetivos e o Termo de Consentimento Livre,
Voluntário e Esclarecido por e-mail institucional. Diante da disponibilidade, agendamos en-
trevistas de acordo com o interesse do informante-chave, se presencial e/ou virtual, devido à
pandemia. Para os comunitários, as estratégias de mobilização e sensibilização foram: convites
entregues em domicílio, e/ou pelo WhatsApp. Escolas e associações também foram visitadas
para sensibilização da direção escolar como apoio na mobilização de crianças, adolescentes e
famílias e cessão de espaço físico para a aplicação da pesquisa, quando presencial.
66
Em todos os estados, tivemos dificuldades de mobilizar os adultos (homens), sendo necessária
a estratégia de sensibilização dos espaços religiosos nos territórios vulneráveis, onde havia
grupos formados, os quais facilitaram nesse processo de adesão à pesquisa. Devido à pandemia,
e como forma de atrair participação masculina, utilizamos em alguns estados a estratégia de
distribuição de kits de higienização e/ou cestas básicas.
As oficinas e grupos focais presenciais foram organizadas pela equipe de pesquisadores e edu-
cadores locais. Espaços para a realização da pesquisa foram cedidos por escolas, associações
comunitárias, igrejas (salões paroquiais) e CRAS, os quais estavam com estrutura adequada para
acolher os participantes da pesquisa, dentro dos padrões estabelecidos no período de pande-
mia (sem aglomeração, com distanciamento, higienização, medição de temperatura, dentre
outros). As oficinas com meninos e meninas e os grupos focais com mulheres e homens foram
fotografados. Os grupos focais virtuais e entrevistas presenciais e/ou remotas foram gravadas
e transcritas com o apoio da ferramenta disponibilizada pelo Gmail, com atenção à fidelidade
das vozes e sigilo na identificação dos nomes.
Após o processo de transcrição dos dados primários, iniciamos a organização dos mesmos da
seguinte forma: separação dos dados por grupos etários e por estado para a catalogação de ex-
pressões-chaves de cada um dos sete fatores questionados pela pesquisa: como proteger cri-
anças e adolescentes, quais as questões prioritárias e as causas, se conhecem as leis, políticas
e protocolos, se tem serviços e mecanismos de atendimento em caso de violações de direitos,
quais as redes de apoio para as crianças, quais os círculos de cuidados (crenças, valores e
costumes), se as crianças e adolescentes resistem e/ou participam dos processos da sua vida.
Vale ressaltar que as hipóteses conclusivas desse momento de coleta de dados primários locais
(comunitárias) passaram por uma análise comparativa com o contexto nacional, sendo validada
no Briefing Comunitário, que foi executado nesse período de pandemia, a partir da realização do
Seminário Nacional, envolvendo os participantes da pesquisa e sociedade civil dos oito estados
brasileiros, totalizando 729 pessoas mobilizadas, de forma virtual, participativa e remota. As-
sim, a pesquisa e seus resultados passaram por um processo de concordância e/ou discordân-
cia quanto às conclusões, assegurando a confiabilidade e a participação comunitária em todo
o processo da Pesquisa.
Sobre Localidades
Antes de adentrarmos às vozes e análises de cada grupo etário abordado em pesquisa primária,
apresentamos um breve panorama das cidades pesquisadas e resultados gerais da pesquisa
local.
Recife (PE)
Recife surgiu como Ribeira de Mar dos Arrecifes dos Navios no ano de 1537. Desde o século XVI,
os arrecifes de arenito que protegem a bacia dos rios Capibaribe, Beberibe e Tejipió fizeram
de Recife o porto natural de escoadouro das riquezas aqui produzidas. Com área territorial de
aproximadamente 218 km², a cidade tem uma população de aproximadamente 1.653.461 habi-
tantes. Em 2019, teve 21.132 nascidos vivos e uma taxa de mortalidade infantil de 11,50%. Cerca
de dois terços do PIB são provenientes de Comércio e Serviços.
67
com as crianças; 4) Violências sexuais contra crianças e adolescentes e 5) Extrema pobreza
(destaque no desemprego, ausência de oportunidades e fome). As causas fundantes foram defi-
nidas pelos participantes como: 1) Famílias com vínculos fragilizados apresentados nas vozes
como “ausência de apoio familiar” ou “falta diálogo entre pais e filhos”; 2) Cultura de violência;
3) Pobreza; 4) Pouco investimento público nos serviços que poderiam beneficiar as crianças
(ex.: lazer, esporte, cultura, dentre outros) e 5) Insegurança Pública.
Em pesquisa, Recife apresentou como crenças, valores e tradições de cuidados com a Prote-
ção o cultivo de uma cultura adultocêntrica, com práticas disciplinares para criança por meio
da violência física. A discriminação por classe, etnia e/ou gênero também foi apontada como
costumes que impedem a proteção. As principais brechas que necessitam ser percebidas para
a resiliência dos meninos e meninas são a necessidade de Educação Integral que possibilite
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
habilidades para a vida, e de iniciação profissional, uma garantia de escuta segura e protegida
para as crianças e adolescentes, engajamento em projetos sociais/comunitários e religiosos, e
acompanhamento das organizações formais e informais das crianças com direitos violados até
o final dos processos.
Fortaleza (CE)
Fortaleza foi fundada em 13 de abril de 1726. Mas em 1799, com o declínio da pecuária e devido à
Seca Grande de 1790-1793, tornou-se autônoma e a capital do Ceará, passando a fazer comércio
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
direto com Lisboa. É uma cidade litorânea e possui uma extensão territorial de 312.353 km², tem
cerca de 2.686.612 de habitantes, segundo estimativas do IBGE (2020). O PIB (IBGE, 2018) per capita
era de 25.356, 73 reais. Segundo o IBGE (2010) o IDH do Município apresentou 0,754.
As principais atividades que geram o PIB no município são os serviços, seguidos das atividades
de administração pública (defesa, educação, saúde pública e previdência social); indústria e agro-
pecuária. No início da pandemia, segundo o IBGE (2019), a proporção de pessoas ocupadas em
relação à população total era de 31.8%, totalizando 849.116 pessoas. Em 2019, teve 34.957 regis-
tros de nascidos vivos e uma taxa de mortalidade de 13,81% para cada 1000 nascidos vivos.
No que tange às crenças, valores e tradições as quais podem afetar na proteção da infância e
adolescência, a população pesquisada em Fortaleza afirma que a cultura da violência reprodu-
zida de pai para filhos, o machismo, a valorização do trabalho precoce naturalizando essa atitu-
de pelas necessidades financeiras, e o desconhecimento de direitos são as mais percebidas em
sua realidade. Especialmente no Ceará, a influência da internet e uma cultura de preconceito
devido à classe e etnia foram também citadas.
68
nicípio em 1948, que surge a partir de um caminho que oferecia acesso ao Rio Mossoró, ainda
no século XVII. Hoje, tem uma população estimada em 13.076 pessoas (IBGE, 2020) com um
território de 1.129,55 km² de bioma Caatinga e na microrregião da Chapada do Apodi. A per
capita do Produto Interno Bruto é de R$ 20.229,67. Nesta cidade, a sua economia vem da in-
dústria, atividades de serviços, administração pública e agropecuária. Há apenas 10,5% das
pessoas ocupadas de acordo com dados do IBGE (2018). Em 2019 nasceram 139 crianças e o
índice de mortalidade infantil ainda é alto, de 28,78%.
As causas estruturantes citadas foram: 1) Insegurança pública nas ruas, principalmente devido
ao tráfico de drogas; 2) Ausência de apoio familiar para as crianças; 3) Pobreza e desemprego;
4) Desconhecimento das leis e direitos pela população e 5) Sentimento de Insegurança que
intimida a denúncia.
Relativo à participação das crianças e o que pode influenciar na proteção da infância e ado-
lescência, os participantes de Governador Dix-Sept Rosado afirmam que é necessário um es-
tímulo à participação de meninos e meninas nos espaços comunitários e religiosos, garantir a
divulgação e canais de escuta comunitária protegida para esse segmento social afetado.
Inhapi (AL)
O nome do município do sertão alagoano tem origem tupi e significa buraco na pedra ou água
sobre pedra, expressão utilizada pelos índios quando se referiam aos lajedos que juntavam água
das chuvas nas partes mais baixas na região. A emancipação política de Inhapi se deu através
da Lei 2.460, de 22 de agosto de 1962. Tem uma extensão territorial de 372,020 km² e uma po-
pulação estimada em 18.392 habitantes (IBGE, 2020). Em 2019 foram registrados 309 nascidos
vivos e a taxa de mortalidade Infantil é de 6,47%.
Segundo último senso IBGE (2010), Inhapi tem um Índice de Desenvolvimento Humano
Municipal (IDH-M) de 0.484. O PIB per capita de R$ 6.413,19 (IBGE, 2018) e suas prin-
cipais atividades econômicas são: agricultura familiar, pecuária, comércio e vigilância
patrimonial. Há 784 pessoas ocupadas (4,3%), segundo pesquisa de IBGE (2018).
Dentre as crenças, valores e atitudes que podem afetar na proteção de meninos e meninas,
ressaltamos os mais enfatizados: machismo, cultura que promove sexualidade desde cedo, fal-
ta de diálogo nas famílias e valorização do Trabalho Precoce. No que tange à participação das
crianças, os pesquisados responderam: há a necessidade de garantir canais de escuta segura e
protegida, estímulo à participação em espaços sociais e decisórios, e assegurar a formação de
lideranças e/ou no conhecimento dos direitos para adquirirem a resistência.
69
Manaus (AM)
Manaus foi criada no século XVII, localizada à margem esquerda do Rio Negro, teve início com
a construção do Forte da Barra de São José em 1669, data que foi convencionada a usar como
o nascimento da cidade. A partir de 1870, Manaus viveu o surto da economia, encerrando-se
em 1913, em virtude da perda do mercado mundial para a borracha asiática, fazendo com que a
cidade retornasse a um novo período de isolamento até o advento da Zona Franca de Manaus,
em 1970.
A cidade de Manaus possui uma área territorial de 11.401,092 km² e tem uma população estima-
da pelo IBGE (2020) de 2.219.580 habitantes. Segundo o IBGE, em 2019, o município teve 37.939
novos nascidos vivos e a taxa de mortalidade infantil é de 13,81%. Neste mesmo ano, o salário
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
médio mensal era de 3.1 salários-mínimos. A proporção de pessoas ocupadas em relação à po-
pulação total era de 23.7%, totalizando 518.306 pessoas trabalhando. As principais atividades
são: serviços, indústria, administração pública (defesa, educação, saúde, previdência social) e
agropecuária.
estruturais (falta espaço de lazer, segurança, dentre outros); 4) Extrema Pobreza (desemprego,
fome) e 5) Violência sexual.
As causas estruturantes constatadas em pesquisa foram: 1) Pouca segurança pública (falta po-
lícia nas ruas, muitos assaltos, tráfico de drogas); 2) Baixo investimento nos serviços e políticas
públicas (incluíram a corrupção dos governantes como foco causal); 3) Pobreza e desemprego;
4) Conflitos familiares (a ausência de diálogo entre membros das famílias foi mais ressaltada)
e 5) Desconhecimento sobre as leis que protegem as crianças e adolescentes, bem como a au-
sência de valores humanos que não são cultivados, justificando assim os efeitos evidenciados
nas questões prioritárias.
As pessoas pesquisadas na cidade de Manaus percebem sua cidade com uma forte cultura de
violência, presença do machismo, desrespeitos para com as crianças e a reprodução de uma
sexualidade precoce, principalmente das meninas, evidenciado pela expressão: “aqui as jovens
têm filhos muito cedo”.
Quanto à participação de crianças em seu processos de habilidades para a vida, Manaus revela
que há necessidade de investimento na educação, com mais espaços de lazer, esporte e de ini-
ciação profissional principalmente para adolescentes; as famílias necessitam serem orientadas
quanto aos valores humanos, respeito, confiança e autonomia para as crianças, bem como na
prevenção da violência doméstica, a opinião das crianças devem ser levadas em consideração,
formação para lideranças a respeito dos direitos para proteção do segmento social em questão.
Hoje, Nova Iguaçu é o maior município da Baixada Fluminense em extensão territorial, com
520.581 km² e segundo em população, com a estimativa de 823.302 habitantes (IBGE, 2020).
Possui um dos centros comerciais mais importantes do Estado do Rio de Janeiro, um polo que
atrai consumidores das cidades de seu entorno, sendo seu PIB per capita de R$ 20.538,67 e
IDH-M de 0,713 (IBGE,2010). Os nascidos vivos em 2019 foram de 11.490 e a taxa de mortali-
dade infantil de 13,58%. Segundo as últimas atualizações de registros do IBGE (2018), 13,1% da
70
população está ocupada, perfazendo 107.346 trabalhadores. Em Nova Iguaçu (RJ), 71 crianças e
adolescentes, 38 adultos e 12 atores sociais foram abordados pela pesquisa de campo, e o resul-
tado das questões prioritárias foram: 1) Conflitos com a lei (incluindo o envolvimento com o uso
abusivo e o tráfico de drogas); 2) Poucos serviços e baixo acessos aos direitos de esporte, lazer,
moradia; 3) Abusos físicos na família 4); Violências sexuais e 5) Preconceito e discriminação
contra crianças e adolescentes pela questão de classe, gênero e etnia.
Os participantes da pesquisa em Nova Iguaçu relataram que suas atitudes, valores e crenças
evidenciam uma cultura de violência, de preconceito com os de classe social com baixa condi-
ções socioeconômicas e de cor, há desrespeito com as crianças, prevalecendo o poder opressor
do adulto, as famílias não dialogam entre si, machismo e hábitos de consumo e uso abusivo de
drogas na família e nas ruas da comunidade.
Sobre as brechas para que aconteça habilidades, resistência e participação das crianças e ado-
lescentes, as pessoas pesquisadas responderam que as famílias necessitam de orientação e
oportunidades, bem como os casos de violação de direitos precisam ter acompanhamento das
organizações formais e informais , os meninos e meninas devem ser ouvidos em sua opinião e,
portanto, suas vozes levadas em consideração, bem como necessitam ter mais espaços desti-
nados a formação e atendimentos psicossociais para os meninos e meninas.
Salvador (BA)
São Salvador da Bahia de Todos os Santos foi descoberta pelos colonizadores em 1510, quando
um navio francês naufragou em terras baianas. Salvador foi capital da administração colonial
do país até 1763, quando a sede do Império foi transferida para o Rio de Janeiro. Com a exten-
são territorial de 693.453 km², cidade litorânea e com uma população estimada de 2.886.698
(IBGE,2020), Salvador é a capital do estado da Bahia com 32.988 nascidos vivos registrados em
2019 e 15,58% de mortalidade infantil no mesmo ano. O PIB per capita (2018) é de R$ 22.232, 68,
sendo o número de ocupados de 849.711 pessoas perfazendo 29,7% da população. As principais
atividades econômicas são comércio, serviços, indústria e turismo.
No que tange a crenças, valores e atitudes locais, as pessoas pesquisadas em Salvador afirmam
que há a cultura de violência e hábitos de uso abusivo de álcool e outras drogas, desconheci-
mento dos direitos e uma cultura adultocêntrica. Com citação diferenciada de outras cidades,
uma pequena parte dos pesquisados apresentaram que Salvador tem uma cultura de Políticas e
de Sistema frágeis, e as crianças e adolescentes também sofrem com imposição religiosa.
Como fragilidades para habilitar as crianças e adolescentes para a vida e resistência às viola-
ções de direitos, as pessoas pesquisadas responderam que é necessária a formação de lideran-
ças na área dos direitos, desenvolver os meninos e meninas a partir de valores socioemocionais
como: confiança, respeito e autonomia, bem como há necessidade de estimular a participação
em espaços sociais, garantindo uma escuta segura e protegida, bem como acompanhar e con-
cluir os casos que passam pelo Conselho Tutelar e Justiça.
71
São Paulo (SP)
A colonização de São Paulo iniciou em 1532 quando Martim Afonso de Souza fundou a Vila de
São Vicente (hoje Baixada Santista). Em 1554, iniciou a construção das primeiras casas, dando
origem ao povoado de São Paulo de Piratininga com o Colégio dos Jesuítas. A importância desta
cidade cresce com a expansão cafeeira. Hoje é conhecida como uma grande potência industrial
no Brasil. Segundo estimativas do IBGE (2021), a cidade possui uma população de 12.396.372
habitantes num território de 1.521,110 km².
São Paulo apresenta 92.6% de domicílios com esgotamento sanitário adequado, 74.8% de do-
micílios urbanos em vias públicas com arborização e 50.3% de domicílios urbanos em vias pú-
blicas com urbanização adequada (presença de bueiro, calçada, pavimentação e meio-fio). Se-
gundo o IBGE, em 2019 teve 158.597 nascidos vivos e a taxa de mortalidade infantil é de 11,21%.
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
Neste mesmo ano, o salário médio mensal era de 4.1 salários mínimos. A proporção de pessoas
ocupadas em relação à população total era de 47.1%.
As causas relatadas em pesquisa foram: 1) Baixo investimento público nas políticas; 2) Pobreza,
devido ao desemprego; 3) Ausência de espaços de lazer e esportivos; 4) Tráfico de drogas; 5)
Escolas estilo remoto e 6) Pouco diálogo entre membros da família fortalecem as raízes dos
problemas citados.
Com relação a crenças, valores e tradições, as pessoas pesquisadas na cidade de São Paulo
afirmam a presença da cultura de violência, desrespeitos dos adultos para com as crianças,
discriminação e preconceito, cultura machista, e não há hábitos de diálogos nas famílias.
Quanto à participação das crianças e adolescentes e as brechas que podem afetar a resistência
destas, a população pesquisada respondeu que há falta de engajamento social, comunitário e
religioso, necessidades de espaços destinados à formação de direitos, de valores como respei-
to, confiança e autonomia, para meninos e meninas e que a Escola Integral é uma boa opção
para participação e proteção das mesmas.
É válido destacar que, na cidade de São Paulo, uma das facções criminosas conhecidas no Brasil
apareceu durante as vozes coletadas em pesquisa como aquela que de fato garante a proteção
não só das crianças, mas da comunidade. Essa situação evidencia uma conclamação de que
quando o Estado (e seus equipamentos) se ausenta da comunidade, a presença do narcotráfico
se fortalece, obtendo da população local a “sensação de segurança” conquistada pelos favores,
prestação de serviços, por meio dos relacionamentos e vínculos comunitários de confiança e
credibilidade, fortalecendo seu poder e legitimidade de suas práticas ilegais.
72
5.2 Ouvindo as Crianças
Perfil das Crianças
Nas oito cidades pesquisadas, tivemos a participação de 222 meninos e meninas da faixa etária
de 8 a 11 anos. A questão paritária de gênero foi devidamente atendida em nossas expectativas,
tornando possível a percepção e entendendo assim o que pensam, o que necessitam e como
cada gênero se posiciona diante das situações que lhes estão expostas. O Gráfico 16 que segue
retrata a participação infantil nesta pesquisa, distribuída por gênero.
111 111
Meninos Meninas
Fonte: Dados da própria pesquisa Visão Mundial 2021
Conforme Gráfico 16 acima, as 222 crianças participantes da pesquisa aplicada pela Visão Mun-
dial na faixa etária de 8 a 11 anos foram 111 meninos e 111 meninas. Na percepção dos oito pes-
quisadores, essa faixa etária demandou maiores esforços e cuidados para a coleta de dados e
transcrição das vozes, uma vez que suas expressões acompanhavam sua linguagem e processo
de desenvolvimento etário. Assim, desenhos e frases curtas foram compilados, catalogados e
interpretados.
73
Gráfico 17 -Crianças Participantes 8 a 11 anos por Localidade
Fortaleza 17
Manaus 28
Inhapi 30
Nova Iguaçu 37
Salvador 22
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
Recife 29
São Paulo 28
0 5 10 15 20 25 30 35 40
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
O Gráfico 17 revela onde essas crianças moram: 17 delas em Fortaleza (CE), 28 em Manaus (AM),
30 em Inhapi (AL), 37 em Nova Iguaçu (RJ), 22 em Salvador (BA), 31 em Governador Dix Sept
Rosado (RN), 29 em Recife (PE) e 28 em São Paulo (SP). Ressaltamos que os números se dife-
renciam, sendo resultado da mobilização de cada estado e grau de interesse dos participan-
tes. Lembramos ainda que é uma amostra qualitativa, de percepção da realidade específica de
crianças em situação de pobreza, em territórios vulneráveis. É livre e consentida.
A categoria considerada Conflito com a Lei expressa às vozes infantis no que tange à insegu-
rança pública que sentem, principalmente devido aos constantes assaltos, roubos, chacinas,
venda de drogas e envolvimento com uso e o tráfico de drogas.
“No meu bairro tem muito assalto, falta segurança.” (12 anos, Rio de Janeiro, 2021)
“Tem um salão de festa na minha rua e lá teve um tiroteio.” (10 anos, Rio de Janeiro, 2021)
“Tia, a gente não pode brincar na rua porque tem muitos bandidos” (8 anos, Pernambuco, 2021)
“Quando as crianças usam drogas elas ficam diferentes” (10 anos, Alagoas, 2021)
“Na rua tem pilantra vendendo droga e gente vai ser presa. (8 anos, Amazonas, 2021)
O segundo problema mais apontado pelas crianças diz respeito à categoria Abusos físicos e
Maus tratos, somando a negligência e a violência psicológica. Vale ressaltar que esta pesquisa
confirma os acontecimentos da violação de direitos da criança mais recorrente no âmbito fa-
miliar a nível nacional, ou seja, a violência doméstica física e a negligência são percebidas, sen-
74
tidas e evidenciada em relatórios oficiais de Governo, realizadas pelo Ministério de Cidadania a
partir do Disque Denúncia (2019), bem como nos relatos das crianças participantes da presente
pesquisa realizada pela Visão Mundial:
“Algumas crianças sofrem maus tratos dos pais” (9 anos, Rio Grande do Norte, 2021)
“Tem muitos casos de pais que batem nos filhos, porque estão aperreados, ou cansados
e quando chegam em casa descontam nos filhos” (11 anos, Pernambuco, 2021)
“Fico sozinha e preciso deixar a porta trancada” (10 anos, São Paulo 2021)
“Acho que é falta de respeito com as crianças, o xingamento” (10 anos, São Paulo, 2021)
“Não tem quadra pra jogar bola” (11 anos, Amazonas, 2021)
“Muitos não têm casas para morar” (8 ANOS, Rio Grande do Norte, 2021)
“Na minha rua não passa ônibus” (10 anos, Rio de Janeiro, 2021)
“Na minha comunidade não tem escola municipal” (10 anos, Rio de Janeiro, 2021)
Em regiões especificas como Ceará, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte, as crianças conse-
guem perceber problemas no Acesso à Serviços Básicos para a proteção da Infância vinculados a
questão da Pandemia da Covid-19 a partir da demora da vacina, problemas de saúde mental das
crianças e de membros de sua família, sendo uma preocupação revelada por elas na questão do
acesso a serviços de Saúde e de Educação:
“Também tem muitas mães em depressão, tem um monte de gente que eu conheço, a minha mãe tá,
eu é que ajudo ela nas coisas, ela não bate em mim não, ela só fica deitada” (10 anos, Pernambuco,
2021)
“Eu fico triste por causa da pandemia atrapalhar de eu ir para a escola” (12 anos, Rio de Janeiro, 2021)
“Tia, acho que a depressão vem por não poder brincar, e as pessoas ficam tristes em casa, por causa
da Pandemia” (11 anos, Ceará, 2021)
“Por causa da pandemia, ter que ficar longe dos colegas e das ruas, as crianças ficam tristes (10
anos, Ceará, 2021)
“Falta de vacina para todos” (11 anos, Rio Grande do Norte, 2021)
A quarta questão prioritária percebida, sentida e vivida pelas crianças é a Pobreza. Assim, estas
apontam que a fome, o desemprego, a falta de oportunidades para seus pais, mães, responsáveis
e para elas mesmos, e, enquanto crianças não terem condições financeiras e a garantia de sua
alimentação possibilitam o engajamento no trabalho infantil e nos atos infracionais. Vejamos
alguns desses relatos:
“Eu acho que eles roubam por causa da fome, roubam para comer” (11 anos, Pernambuco, 2021)
75
“Roubou porque não conseguem emprego” (9 anos, Rio de Janeiro, 2021)
“Ah, tem gente que passa fome, daí tem que trabalhar, daí faz isso aí, com as drogas” (Sérgio, 11 anos,
São Paulo, 2021)
“Tia a falta de comida também porque tem crianças que não tem o que comer” (9 anos, Rio Grande
do Norte, 2021)
“Tem muita criança que precisa trabalhar para ganhar dinheiro” (11 anos, Alagoas, 2021)
“Muitas crianças precisaram trabalhar. Algumas teve pais que perderam o emprego e a criança
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
A Violência Sexual é a quinta maior questão prioritária da Proteção da Infância, na visão das
crianças pesquisadas, enquanto nas pesquisas oficiais ela aparece em quarto lugar no Relatório
do Ministério da Cidadania (2019). Nesta pesquisa realizada pela Visão Mundial foram expres-
sados pelas vozes infantis o estupro nas ruas, e, principalmente o abuso sexual nos domicílios,
feitos por parentes, vizinhos e/ou amigos, conforme podemos evidenciar nos relatos que seg-
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
uem:
“Quando nossos parentes, tios e avôs pegam nas partes íntimas das crianças” (11 anos, Amazonas, 2021)
“Tem meninas que sofrem com isso, com o abuso sexual” (11 anos, São Paulo, 2021)
“Tem vezes que os bandidos estupram e até matam” (10 anos, Pernambuco, 2021)
“Em Inhapi tem casos de violência sexual. Isso é ruim para nós” (9 anos, Alagoas, 2021)
“Meu irmão de maior idade... isso aconteceu quando eu tinha seis anos, ele que fez algo ruim comi-
go” (11 anos, Amazonas,2021)
Quando questionadas sobre as causas dessas questões, as crianças afirmam: 1) Pobreza; 2) In-
segurança Pública e pedem “mais policiamento nas ruas”; 3) Pouco investimento público e/ou
descompromisso do Governo; 4) Pouco diálogo e/ou apoio dos pais, informando a presença de
conflitos familiares em seus lares e 5) Cultura de violência, apontando principalmente que as
mães (e/ou responsáveis) querem que eles aprendam sobre a vida através de práticas nocivas:
disciplinando-os com violência física e psicológica relatados como “xingamentos” e “chinela-
das”.
Assim, pela observação dos relatos das crianças, analisamos que a Cultura de Violência foi a mais
mencionada pelas crianças pesquisadas com relação a atitudes, crenças e valores culturais que
podem afetar sua proteção. Podemos também ressaltar, como segundo lugar, o poder opressor
do adulto sobre as crianças. Muitas crianças afirmam o desejo de se sentirem ouvidas dentro
de casa. Já o terceiro mais visibilizado refere-se ao cultivo da valorização do trabalho precoce.
As crianças se sentem responsáveis por também contribuir com as atividades domésticas e o
suprimento de alimentos, uma vez que percebem que seus pais, mães ou responsáveis estão
desempregados. Em quarto lugar, a convivência dessas crianças com o hábito dos pais e vizinhos
no consumo do álcool e outras drogas, conforme as vozes que seguem:
76
“Minha tia mora no interior, ela tem 3 filhos e eles apanham muito do meu tio quando ele bebe [...],
quando vem para casa, bate neles. Ela está com depressão por causa disso. Quando o tio chega,
bate na bebezinha de 2 anos, uma criança de 6 anos e outra de 7 anos” (10 anos, Pernambuco, 2021)
“Às vezes os pais podem bater nos filhos e não procuram conversar com eles e falar as coisas certas”
(10 anos, Rio Grande do Norte, 2021)
“Também tem crianças que trabalham para ajudar os pais e deixam de brincar e de ir para escola.
Talvez achem que é culpa delas e querem ajudar seus pais” (11 anos, Rio Grande do Norte, 2021)
“Às vezes ficam muitas pessoas passando drogas na nossa frente” (12 anos, Bahia, 2021)
Ainda que a escolha das crianças pesquisadas tenha a característica peculiar de extrema vul-
nerabilidade, esse dado aponta uma falha das instituições do Sistema e da Rede de Proteção
da Criança e do Adolescente, os quais não conseguiram ainda atingir os mais vulneráveis na
disseminação dos seus direitos. É bem provável que os cuidados institucionais têm sido apli-
cados quando os problemas já aconteceram, necessitando de estratégias de disseminação do
conhecimento das leis e das políticas em massa numa instância ainda preventiva. Desse modo,
podemos analisar que mesmo sem a devida consciência - por parte das instituições - a cen-
tralidade e o cultivo da participação dos adultos nas decisões levam à perda da oportunidade
de empoderamento, autonomia e argumentos para a autoproteção dos meninos e meninas de
nossa nação.
Esses dados apontam que a família é - no imaginário infantil - a primeira referência de Prote-
ção. As escolas vêm como um espaço que podem apoiá-las com seus professores e profissio-
nais ouvindo-as e procurando ajudá-las. A respeito do Conselho Tutelar, os dados das crianças
constatam que há pouco conhecimento dessa instância de proteção, sendo necessário a divul-
gação e presença dos conselheiros nas escolas e espaços comunitários.
77
5.3 Ouvindo Adolescentes
Perfil dos Adolescentes
Relativo ao perfil de adolescentes nesta pesquisa, tivemos a participação de 174 adolescentes na
faixa etária de 15 a 17 anos. Destes, 92 eram meninas e 82 meninos, conforme aponta no Gráfico
18 que segue.
92 82
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
Diferente do Gráfico 16 de crianças de 8 a 11 anos, o gráfico 18 revela que, apesar dos esforços
dos pesquisadores e educadores no processo de mobilização, e cumprimento das metas, o in-
teresse dos adolescentes na participação presencial na pesquisa foi bem menor que o de cri-
anças.
Fortaleza 24
Manaus 28
Inhapi 23
Nova Iguaçu 34
Salvador 24
Recife 14
São Paulo 16
0 5 10 15 20 25 30 35 40
Em Nova Iguaçu (RJ) foi o maior número de presença de adolescentes, seguida de Manaus (AM),
Fortaleza (CE) e Salvador (BA).
78
Questões Prioritárias e Causas - Adolescentes
As questões prioritárias de Proteção da Infância e Adolescência apontadas pelos(as) adoles-
centes de 15 a 17 anos que participaram nesta pesquisa foram: 1) Conflitos com a Lei; 2) Desem-
prego e/ou poucas condições financeiras; 3) Conflitos familiares, incluindo nessa categoria as
violências físicas e maus tratos; 4) Violências sexuais e 5) Educação (abandono e evasão escolar,
escolas fechadas devido à pandemia, estrutura insuficiente e baixa qualidade de ensino).
Vale destacar que os (as) adolescentes se queixam e apresentam a Discriminação e o Preconcei-
to como sendo uma das questões prioritárias, no caso, a sexta mais comentada, principalmente
nos aspectos de classe, etnia e de gênero.
Sobre as situações que promovem o Conflito com a Lei, principalmente envolvendo adoles-
centes, passa-se por uma questão que envolve classe social, gerando revolta pelo desrespeito
de alguns órgãos que deveriam proteger a comunidade, como a polícia, mas que os coloca num
perfil estigmatizador pela sua condição de pobreza. Ao mesmo tempo que interligam as vivên-
cias desprotegidas com fatores vinculados às ausências estruturais (de emprego e/ou opor-
tunidades) e familiares (de apoio e/ou referência de proteção). Essas ausências seriam o vetor
que impulsiona adolescentes a se envolverem com as violências e/ou sentirem vulneráveis às
mesmas, conforme evidenciamos nos relatos que seguem:
“Falta segurança na cidade para andar na rua, abuso moral” (16 anos, Alagoas, 2021)
“A polícia não respeita e não sabe diferenciar os caras da gente, quando a gente ta na rua” (17 anos,
Bahia, 2021)
“Como os jovens não têm emprego, acabam se sujeitando a trabalhos que colocam eles em situações
de violências” (16 anos, Alagoas, 2021)
“Quando tinha uns 5 anos, fui aliciada pelo meu irmão mais velho [...] mas ainda tive que ouvir que
a culpa era minha. Isso me dói bastante. Até hoje escuto esse absurdo da pessoa que deveria estar ao
meu lado... nenhuma criança escolhe ser aliciada por uma pessoa que acreditava ser super-herói”
(15 anos, Amazonas, 2021)
“Falta de apoio em casa, dos pais. Se a gente quer fazer algo diferente da vida, não existe um apoio”
(16 anos, São Paulo, 2021)
A partir das vozes acima descritas, no que tange às crianças e adolescentes que tiveram os
seus direitos sexuais violados pela própria família, constatamos que o sofrimento e as marcas
ocasionadas intensificam-se pela decepção ao descumprimento da esperada proteção familiar.
Assim, analisamos a importância de desenvolver estratégias de intervenção que retome junto
às famílias o cultivo de valores éticos e humanos, bem como os direitos que as crianças têm e
o dever da sua família, comunidade, sociedade em geral e do Estado na sua proteção integral,
assim como o art. 3 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
A respeito da percepção das causas destacadas pelos adolescentes em pesquisa foram: 1) Po-
breza; 2) Insegurança Pública, provocada pela pouca quantidade de policias, violência policial
e/ou corrupção; 3) Conflitos familiares, destacando a separação dos pais, ausência de diálogo
entre pais e filhos, pouco apoio familiar para com adolescentes, desrespeito entre os membros
da família; 4) Baixo investimento público para projetos sociais e/ou serviços que apoiem e/ou
ocupem o tempo das crianças e adolescentes também foram apontados; 5) Cultura de Violência
na sociedade e 6) Desconhecimento dos direitos conforme vemos nas vozes que seguem:
“O fato de correr o risco de serem violentadas na rua como também em casa. Falo isso tanto men-
talmente como fisicamente serem reprimidas em casa e serem abusadas também” (15 anos, Ceará,
2021)
“Porque a gente confia mais nos malfeitores da comunidade do que nessas polícias, e pensar nisso
a gente vê o quão problemático é porque confiamos mais em traficantes do que na polícia porque
79
são preconceituosos, não temos opção de confiar no policiamento” (17 anos, Ceará, 2021)
“Falta de segurança pela cidade, ocasionando o aumento da criminalidade, de modo que boa parte
das vítimas são crianças e adolescentes” (15 Anos, Rio Grande do Norte, 2021)
“O preconceito existe porque as pessoas não respeitam as diferenças” (17 anos, Rio Grande do Norte,
2021)
Dos relatos acima, alguns pontos merecem ser destacados: a) Violência e suas multivariadas
formas de expressão; b) Em quem os adolescentes depositam sua Credibilidade e Confiança e c)
Respeito às diferenças. A violência aqui está intrinsecamente relacionada às ações reproduzi-
das socialmente entre os indivíduos nos diversos espaços sociais, ou seja, todo sentimento de
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
confiança e credibilidade em atores sociais que deveriam proteger (família, sociedade e Estado,
aqui evidenciados pela polícia) estão sendo projetados no envolvimento com as drogas e no
fortalecimento de relações das crianças e adolescentes com as lideranças do narcotráfico, os
quais certamente acolhem as diferenças, promovem renda, afirmam garantir a segurança da
comunidade a qual dominam, e mantêm sua palavra ainda que seja pela via do ilegal e da cruel-
dade para aqueles que não o seguem.
Sobre as atitudes, crenças e valores percebidos pelos adolescentes da sociedade em que vivem,
ressaltamos: 1) Cultura da Violência; 2) Atitudes preconceituosas e de discriminação; 3) Cultura
machista; 4) Reconhecimento do Adulto como detentor de um “poder opressor” que trata as
crianças com desrespeito e 5) Hábitos que cultivam o uso abusivo de álcool e outras drogas no
ambiente familiar e comunitário. Segundo respostas que seguem:
“Existe isso de bater nos filhos, de ser rígido. Acho que eles foram criados assim também” (15 anos,
São Paulo, 2021)
“A educação dos pais... muitos foram criados de um modo diferente das crianças de hoje e acham
que gritar, agredir é normal, mas nem tudo é o que eles pensam” (18 anos, Pernambuco, 2021)
“Os homens se sentem superiores às mulheres” (17 anos, São Paulo, 2021)
Assim, percebemos a necessidade de incidir pelas políticas públicas, que têm sido o principal
caminho para as mudanças, mas também encontrarmos estratégias sobre as possíveis mu-
tações culturais. Refletimos então: o que tem influenciado sobre a cultura dos povos? O que
pode manter ou quebrar uma tradição? Que tipo de prática ou teoria pode influenciar sobre
uma mudança de hábitos? O que ou quem pode influenciar numa adesão de valores? Nor-
bert Elias (1993), quando trata do processo civilizatório, nos oferece pistas de como os hábitos,
etiquetas e costumes são construídos historicamente. Mesmo que não identificando se foram
planejados (ou não) por um grupo social sobre outros, esse autor afirma que, por exemplo, a
reprodução dos conflitos, assim como a manutenção da cultura, a partir de regras sociais se
mantem pela tensão provocada socialmente, legitimada pelas normas e/ou código de condu-
tas. Dessa forma, “torna viáveis mudanças mais ou menos violentas nos laços mútuos entre
pessoas, dando assim origem a novas formas de integração” (Elias, 1993).
Nesse sentido, as estratégias de intervenção governamental pelos regulamentos, protocolos
e leis são fundamentais. Mas também é necessário perceber que a construção cultural é for-
mada pelas pequenas ações que são reproduzidas socialmente entre pais e filhos, no conteúdo
dos currículos escolares, nas músicas que são tocadas, na partilha das comidas, no cultivo de
novas ou tradicionais danças, nas pinturas, artes e festivais, nas propagandas e mídias sociais,
inclusive, pelas diversas instituições e, dentre elas, destacamos como importante reprodutor
da cultura na sociedade as famílias e as religiões.
80
foram consultados se conheciam alguma lei, regulamento ou política que protege a infância e a
adolescência no Brasil, 157 não conhecem e/ou não citaram. Apenas 16 adolescentes conhecem
o Estatuto da Criança e do Adolescente, e 1 citou a política de transferência de renda Bolsa
Família.
Analisamos que uma das falhas do Sistema e da Rede de Proteção esteja na divulgação dos
direitos das (e para) as crianças e adolescentes. Se conhecemos a verdade, ela nos gera a liber-
tação. Nesse sentido, entendemos que meninos e meninas empoderados(as), cientes de seus
direitos, provavelmente haverá em si uma primeira atitude: consciência da violação e a certeza
de que alguém deve protegê-las e saberão o caminho dos mecanismos para sua proteção. E
numa segunda tese, a da autoproteção, seria uma ação de prevenção da violação de direitos.
Entretanto, alguns argumentos do senso comum afirmam que a demanda aumentaria. Porém,
se não há estrutura suficiente, o problema não é da criança, mas das Instituições e do Estado,
os quais devem garantir e assegurar o aparato necessário, conforme a Lei Nº 8069 de 1990.
É perceptível que os(as) adolescentes estão um pouco mais apropriados que as crianças das
variadas possibilidades da Rede de Apoio e Proteção. Entretanto, no processo educacional para
autoproteção é necessário que, além do conhecimento da existência dos aportes institucionais,
de sua funcionalidade e do fluxo desde a denúncia ao acompanhamento, também saibam como
monitorar o Estado a respeito da aplicabilidade das leis e nos resultados que têm alcançado. E
cabe ao Poder Público, conforme art.265 “periodicamente a ampla divulgação dos direitos da
criança e do adolescente nos meios de comunicação social”, sendo o ECA posto à disposição das
escolas, das entidades de atendimento e defesa dos direitos desse segmento social.
81
Gráfico 20 - Nº de Participantes da Pesquisa Adultos por Gênero
36%
Mulheres da Comunidade
Homens da Comunidade
64%
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
A idade dos adultos pesquisados variava entre 25 a 60 anos. Esses eram pais, mães, avós, tios/
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
tias das crianças e adolescentes dos territórios pesquisados, sendo eles os responsáveis dire-
tos.
Fortaleza 34
Manaus 20
Inhapi 48
Nova Iguaçu 38
Salvador 25
Recife 28
São Paulo 20
0 10 20 30 40 50 60
Conforme Gráfico 21, Inhapi (AL) teve o maior número de participantes adultos na pesquisa
com 48 pessoas, seguido por 38 participantes em Nova Iguaçu (RJ), 34 em Fortaleza (CE), 31 em
Governador Dix Sept Rosado (RN), 28 em Recife (PE), 25 em Salvador (BA), 20 em Manaus (AM)
e 20 participantes em São Paulo (SP), totalizando 244 adultos.
82
Em segundo lugar são os Conflitos familiares, por exemplo, as constantes brigas, violências
físicas e psicológicas entre casais, entre pais e filhos, entre irmãos. Os adultos denominam de
“desestrutura familiar” o que consideramos como as fragilidades e/ou quebra nos vínculos. Há
alguns relatos dos adultos que conectam essa “desestrutura” à separação dos pais, outros,
a ausência paterna, e/ou problemas financeiros que afetam diretamente os filhos e toda a
família. Observamos que os adultos também compreendem que a “desestrutura” está interliga-
da a necessidade de “valores que se perderam ao longo dos anos” no seio familiar.
Em terceiro lugar, destacamos o Acesso a Serviços Básicos, no qual a distância, a falta de equi-
pamentos em seus territórios, principalmente de espaços de lazer e esporte, são problemas
que negam o “direito de brincar” e de “ser criança” que a “violência nas ruas” tomou. Bem como
poucas oportunidades de acessar a educação integral e/ou cursos de iniciação profissional
para adolescentes e jovens também são bem ressaltadas em pesquisa.
A Violência Sexual na concepção dos adultos pesquisados, vem em quarto lugar, cujos relatos
apontam os fatos ocorridos com vizinhanças, e destacando os casos que entrelaçam trabalho
infantil doméstico de meninas e abuso sexual. Em quinto lugar, destacamos a Pobreza, e, geral-
mente conectada às respostas, vem a percepção do desemprego, falta de oportunidades e da
fome. O sexto problema mais citado foram as Escolas, que incluem a exposição de suas vivên-
cias com relação ao baixo acesso à internet e à aparelhos de celular, abandono e evasão escolar
de crianças e adolescentes que a vida remota em período de pandemia intensificou. Vejamos
algumas vozes desse segmento:
“Temos em nossa cidade de tudo, desde crianças que trabalham por falta de escolha para não pas-
sar fome, até muitas que são assediadas nas casas de famílias pelos patrões” (37 anos, Alagoas, 2021)
“Precisamos de mais investimento na educação, tendo escola em tempo integral com vários tipos
de modalidades, matérias para ocupar o tempo da criança e nesse sentido também haver tempo
dos pais trabalharem e correr atrás de emprego. Esse é meu ponto de vista” (32 anos, Amazonas, 2021)
“O índice de crianças e adolescentes que não tem assistido aula é bem maior que antes. Elas não
têm um celular, um computador. Então está mais difícil ainda” (38 anos, Rio Grande do Norte, 2021)
“Eu acho que o principal mesmo foi o que se perdeu nesse tempo: valores, questão da família se
perdeu esses valores né, aquele respeito que existia, isso aí se perdeu ao longo desses anos. Foi isso.
E tem várias consequências, devido ter se perdido esses valores, gerou-se famílias desestruturadas
(...)” (57 ANOS, Rio Grande do Norte, 2021)
“As drogas que deviam ser mais controladas não são, já é normal nas comunidades. Acredito
também que a violência vem da pobreza, eu vi uma vez um menininho pedindo comida e foi violen-
tado por isso. Acho que devia ter uns 12 anos e isso pode gerar nele uma sede de violência também”
(47 anos, Ceará, 2021)
Destacamos a partir do último relato supracitado, que as drogas têm se naturalizado nas co-
munidades. E que, apesar de Sérgio Adorno (1999) esclarecer que o fato de as pessoas estar-
em na condição de pobreza não necessariamente serão violentos e/ou criminosos, porém, a
pobreza gera exclusão social, e esta última é um potencializador para as diversas formas de
violações de direitos e violências.
No que tange às causas apontadas pelos adultos em pesquisa, destacamos: 1) Conflitos Familia-
res; 2) Pouco investimento do poder público em serviços de esporte, lazer e cultura; 3) Desem-
prego e Fome provocados pela desigualdade social; 4) Insegurança Pública e 5) Educação inter-
rompida devido ao colapso da pandemia, conforme as respostas que seguem, respectivamente:
“As causas da violência são a agressão, as bebidas e drogas, e as separações dos pais” (33 anos, Per-
nambuco, 2021)
“Falta lazer – As crianças, além da sua liberdade, ficam sem lazer no seu cotidiano, pois ficam sem
lugares e atividades para brincar e realmente serem crianças, ficando isoladas em casa à mercê de
83
rede social e aparelhos eletrônicos” (44, anos, Ceará, 2021)
“A desigualdade social é muito grande e as crianças mais pobres são as mais prejudicadas (44 anos,
Alagoas, 2021)
“Falta de segurança pública deixa as crianças carentes muito vulneráveis, uma vez que os pais são
usuários de drogas, não têm uma fonte de renda segura, saem todo dia pra fazer trabalho de flane-
linha, guardar o carro, vender picolé e muitos deles, desorientados, deixam as crianças na rua e,
uma vez que as crianças ficam nas ruas, elas ficam sujeitas a todos os ataques possíveis, inclusive
para o aliciamento do tráfico de drogas esse é um grande problema nas nossas cidades” (37 anos,
Amazonas, 2021)
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
A falta dos estudos cada dia afeta num todo, pois onde nossas crianças tinham o direito de ter
liberdade, lazer e alimentação, estão fechadas por causa do colapso da pandemia” (52 anos, Rio de
Janeiro, 2021)
Analisamos que, na percepção dos adultos, os problemas de proteção se misturam com as cau-
sas e os efeitos. Entretanto, há clareza entre eles que a desigualdade social, desemprego e
ausência da educação são causas estruturantes que precisam ser resolvidas e que afetam dire-
tamente a proteção da criança e do adolescente em nosso país.
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
84
Proteção de
Crianças e
Adolescentes
na Prática
85
6.1 Lei, Políticas e Regulamentos
No Brasil, as legislações, normas e regulamentos de proteção à infância e adolescência são
precisos no que tange aos direitos dos meninos e meninas e as responsabilidades da família e
da sociedade, dever do Estado, limites das instituições sobre esse segmento social, conforme
vemos na Constituição Federal de 1988.
Além da Lei Magna (CF/88), o Brasil, em 1990, instituiu o Estatuto da Criança e do Adoles-
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
cente, que embasa legalmente a argumentação pelos direitos da proteção; as medidas proteti-
vas para salvaguardar as famílias naturais e substitutas (sendo esta última pela guarda, tutela
ou adoção); institui as medidas aplicáveis aos pais e responsáveis pela violações de direitos,
expondo os que são proibidos; e revela os principais atores sociais que devem realizar/pro-
mover, garantir, assegurar, controlar e fiscalizar essa Proteção.
Para proteção, no caso brasileiro, por lei, a suspeita ou confirmação de castigo físico, de tra-
tamento cruel ou degradante e de maus-tratos contra a criança ou adolescente deve ser obri-
gatoriamente comunicada ao Conselho Tutelar da respectiva localidade. Em pesquisa primária
com atores sociais (informantes-chaves), representantes formais e informais da sociedade nos
oito estados brasileiros, identificamos que há a compreensão legal do caminho da denúncia
vinculado prioritariamente ao Conselho Tutelar, à polícia e delegacias e equipamentos de As-
sistência Social. Para esses atores, as leis, especialmente o ECA, a Constituição Federal de 1988,
a LOAS, LOS, e a Lei de instituição do Sistema de Garantia de Direitos, Lei da Escuta Especia-
lizada e Lei Menino Bernardo colaboram diretamente para a proteção de meninos e meninas.
Os serviços de saúde, desde a porta de entrada (postos de saúde) e independentes dos níveis
hierárquicos de regionalização do SUS, todos os equipamentos possuem protocolos de no-
tificação com prazos para comunicação, bem como os serviços de assistência social, como o
Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) e os demais órgãos do Siste-
ma de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente devem conferir máxima prioridade ao
atendimento das crianças na faixa etária da primeira infância com suspeita ou confirmação de
violência de qualquer natureza.
86
O programa foi instituído oficialmente pelo Decreto Presidencial nº 6.231/2007, com a finalidade
de proteger crianças e adolescentes expostos a ameaças de morte, por meio de uma medida
protetiva.
Desde o ano de 1999, o Brasil criou a Lei nº 9.807, de 13 de julho de 1999 e Decreto nº 3.518, de 20
de junho de 2000, que institui o Programa de Proteção Especial a Vítimas de Testemunhas. Es-
sas medidas de proteção são requeridas por vítimas ou por testemunhas de crimes que estejam
coagidas ou expostas a grave ameaça em razão de colaborarem com a investigação ou processo
criminal serão prestadas pela União, pelos estados e pelo Distrito Federal. Vale esclarecer que
as leis e normas instituídas pela União, estados, municípios ou Distrito Federal não divergem
entre si no Brasil. O que pode apresentar de diferente são as competências estabelecidas entre
as instâncias, mas que são antecipadamente predefinidas na Lei Magna.
No que tange aos crimes sexuais cometidos contra crianças e adolescentes, sejam de crimes
contra a dignidade sexual, liberdade sexual ou daqueles contra vulneráveis, os agressores res-
pondem perante o Código Penal Brasileiro (1940) e em regra pública condicionada e excepcio-
nalmente pública incondicionada, somente quando a vítima for menor de 18 anos ou vulnerável.
No Brasil, a implementação das leis a partir das políticas, bem como a elaboração de nor-
mas para a proteção da infância e adolescência são feitas pelo poder Executivo, através dos
Ministérios, Secretarias Especiais, Secretarias Setoriais e quanto às resoluções, são delibera-
das pelos Conselhos de Direitos da Infância e da Adolescência, nas instâncias nacional, es-
tadual, municipal ou do Distrito Federal. Os planos são feitos a cada quatro anos (plurianuais)
no Poder Executivo, e no âmbito nacional existe o compromisso do Plano Decenal. Os planos
plurianuais devem ser pensados a partir do que foi demandado nas Conferências e consultas
públicas com participação popular.
As Políticas para a Proteção da Infância são financiadas pelos setores, partindo dos Ministérios
para os municípios de forma descentralizada, conforme orienta a Constituição Federal de 1988.
Para que as unidades federativas e municípios recebam o financiamento público, eles deverão
apresentar: um Planejamento construído coletivamente através de conferências, um Conselho
de Direito com a participação paritária (Governo e Sociedade Civil Organizada) e um Fundo
Público destinado exclusivamente à criança e ao adolescente, por exemplo. Mas esse procedi-
mento acontece em todas as políticas setoriais. Ainda que a Lei Máxima oriente a prioridade
absoluta do orçamento e atendimento à criança e ao adolescente em todos os setores das po-
líticas, não há uma cota mínima em percentual declarada em lei.
87
6.2 Serviços e Mecanismos Governamentais de Proteção
à Infância e Adolescência
Conforme já comentamos anteriormente, o Sistema de Proteção da Infância e Adolescência no
Brasil convive com outros sistemas nacionais, como: assistência social, trabalho, saúde, educa-
ção, segurança pública, planejamento orçamentário, relações exteriores e promoção da igual-
dade e valorização da diversidade, dentre outros. Conforme vemos na ilustração que segue.
Fonte: UNICEF/2021
Cada uma das instituições mencionadas na Figura 2 faz parte do Sistema e da Rede de Pro-
teção da Infância e Adolescência no Brasil, tendo sua função e responsabilidades. Na pesquisa
primária realizada nas oito cidades/estados de atendimento da Visão Mundial, identificamos
as seguintes brechas no que tange aos Serviços de Atendimento e de Prevenção, os quais divi-
dimos nos seguintes blocos para facilitar a análise: 1) Estrutura; 2) Comunicação; 3) Gerência
Administrativa e 4) Contexto Social.
No que tange à estrutura dos Serviços e Mecanismos de atendimento, foram mencionados: Es-
trutura dos equipamentos assistenciais deficitária; poucas qualificações para agentes públicos;
burocracias no atendimento e/ou para receber benefícios. Nos processos comunicacionais, os
atores sociais apresentam a desinformação da população sobre o acesso a serviços e os ruídos
de comunicação dos equipamentos públicos são os maiores entraves para a proteção da infân-
cia e adolescência.
Com relação à gerência administrativa desses serviços, os atores apontam que os atendimen-
tos que as políticas públicas possibilitam necessitam ser mais eficientes, eficazes e efetivos.
Sugerem reformas no Sistema de Justiça e mudanças nas atividades e serviços preventivos.
Durante a pesquisa, os atores sociais mencionaram o contexto social da pandemia de Covid-19,
e as implicações das escolas fechadas, bem como a falta de participação das famílias nas ações
preventivas e processos de proteção. Importa salientar que no Brasil, há um fluxo para registro
de denúncias de casos de violações de direitos contra a Infância, que pode ser de forma pres-
encial, por escuta ou online. De qualquer forma, é garantido o sigilo. No que tange ao presen-
cial, as pessoas podem recorrer diretamente aos órgãos: Conselho Tutelar, prioritariamente.
Entretanto, ressaltamos que qualquer evidência de abuso, a obrigatoriedade de registro é de
88
todos os profissionais, de qualquer órgão público, privado ou de organização da sociedade civil.
É bem recorrente que os casos cheguem primeiro nos CRAS (Centro de Referência da Assistên-
cia Social) e CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social), que fazem parte
dos equipamentos de Assistência Social no Brasil localizados nos territórios vulneráveis, ou
seja, mais próximos às famílias. Entretanto, os atores sociais entrevistados apontam que há
falências no reporte de incidências de proteção à infância quando “a família tem medo e/ou
vergonha de denunciar”; “a família tem dependência emocional e/ou financeira do agressor”;
“falta de equipamentos públicos próximos”; “desconhecimento da leis e a respeito dos espaços
de proteção”; “garantia de sigilo dos casos”; “sentimento de impunidade”; “negligência, omissão
e/ou despreparo dos agentes públicos”; sendo essas as principais motivações para a “subnoti-
ficação dos casos” de violação de direitos contra crianças e adolescentes.
Assim, entendemos que há necessidade das crianças e famílias conhecerem o fluxo de denún-
cias e a funcionalidade de cada órgão. A demanda certamente aumentaria, bem como o controle
social e, respectivamente, a ação do Estado no aumento de equipamentos para atendimento e
proteção, para que as denúncias não ficassem sem respostas e/ou resolutividade dos casos.
O Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro possui um tipo de atendimento para o acompanha-
mento e tratamento psicossocial nos casos de transtornos mentais desenvolvidos ou, ainda, o en-
volvimento dessas crianças com álcool e outras drogas, devido às vulnerabilidades decorrentes
do efeito e consequências ocasionadas pelas relações abusivas e de exploração: os Centros de
Referência Psicossocial Infanto-Juvenil – CAPSi. Durante a pesquisa quantitativa, localizamos
no site do Ministério da Saúde (2021) a existência de 2.661 CAPS, incluindo todos os tipos e
faixas etárias. Porém, não conseguimos um relatório recente que apresentasse o número de
CAPS exclusivamente para o público infanto-Juvenil.
89
Gráfico 22 - Equipamentos Sociais para atendimentos as violações de direitos
à crianças e adolescentes no Brasil - SUAS
Nº de Centros-Dia 1664
Nº de CRAS 8357
Nº de CREAS 2723
Pelo Gráfico 22, acima expresso, o governo brasileiro em 2019, a partir dos registros no Censo
SUAS, possui 26.781 equipamentos sociais a disposição de crianças e adolescentes, bem como
suas famílias para atenderem qualquer tipo de vulnerabilidades. Para um melhor esclareci-
mento, o CRAS presta serviços e implementa programas socioassistenciais de proteção básica
às famílias e aos indivíduos e à articulação desses serviços no seu território de abrangência à
ação intersetorial na perspectiva de potencializar a proteção social. No Brasil, até 2019 havia
8.357 CRAS em todo território nacional, sendo este o maior número de equipamento do Sis-
tema Único da Assistência Social que é disponível para crianças, adolescentes e suas famílias.
Em seguida, vêm os Centros de Convivência, com 8.041 unidades pública de assistência social
destinadas ao atendimento de famílias e indivíduos em situação de vulnerabilidade e risco
social. São espaços que promovem atividades em grupo e estão vinculados aos Centros de
Referência de Assistência Social (CRAS), podendo ser administrados tanto pelo poder público
quanto por entidades sociais. Em 2019, havia 5.768 instituições de acolhidas, entretanto, essas
podem acolher apenas crianças e adolescentes (em caso de abandono, órfãos, com direitos se-
xuais violados pela própria família) mulheres vítimas de violência, idosos ou ainda, famílias em
situação de proteção às ameaças de morte.
Vale destacar o número de CREAS (2.723) que ainda são insuficientes para o número de vi-
olações de direitos que tem se acumulado durante esses últimos oito anos no Brasil. Estes
ofertam serviços especializados e continuados a famílias e indivíduos nas diversas situações de
violação de direitos. O CREAS articula os serviços de média complexidade e opera a referên-
cia e a contrarreferência com a rede de serviços socioassistenciais da proteção social básica
e especial, com as demais políticas públicas setoriais e com os órgãos do Sistema de Garantia
de Direitos (Ministério dos Direitos Humanos, 2018). Além dos equipamentos do SUAS, para a
Proteção da Infância e Adolescência no país, existe o Conselho Tutelar. Este órgão permanente
e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos di-
reitos da criança e do adolescente no Brasil (ECA, 1990).
No que tange aos Conselhos Tutelares no Brasil, em 2019 existiam 5.956 Conselhos Tutelares
(CTs) em todo o território nacional, segundo dados da Secretaria Nacional dos Direitos da Cri-
ança e do Adolescente (SNDCA). O número de equipamentos sociais públicos aparentemente
90
é expressivo. Entretanto, não basta ter os equipamentos nos territórios vulneráveis, mas ob-
servar seu funcionamento; se os serviços estão sendo prestados; se há, de fato, benefícios
entregues às famílias; se a equipe é, de fato, qualificada e tem uma carreira ou se o fluxo de
profissionais é contínuo; o que vai atingir diretamente na intervenção social e nos impactos,
que podem ser positivos ou negativos.
Em uma pesquisa recente desenvolvida sobre Sistema de Garantia de Direitos para a Infância
no Brasil (UNICEF, 2021), dentre os desafios apontados, encontramos as seguintes limitações
para uma efetiva ação do Estado Brasileiro na Proteção da Infância: baixa articulação e integra-
ção do Sistema; falta de institucionalização de parte da Rede de Proteção; pouco alinhamento
entre profissionais da segurança pública (policiais) com a garantia de Direitos Humanos; au-
sência de formação dos profissionais envolvidos; poucos profissionais; escassez de recursos;
falta de investimento para ampliação da oferta de programas e serviços da rede de proteção;
falta de apoio aos equipamentos; descrença da população em relação à cooperação da Rede;
baixa cobertura do Conselho Tutelar; baixa resolutividade por parte dos conselheiros tutela-
res; necessidade de trabalhar a integração entre os setores das políticas públicas para o atendi-
mento das necessidades da população; na formulação de políticas não se pensa como políticas
universais e especiais; e a necessidade de uma mudança cultural e de paradigma, na compreen-
são e avaliação de Direitos Humanos por parte da sociedade.
Quanto aos avanços ou as consideradas “práticas promissoras” (UNICEF, 2021), sobre o Sistema
de Garantia de Direitos no Brasil, destacamos o que encontramos no referencial teórico: es-
forços do Ministério Público e Defensoria Pública para a formação da Rede de Proteção; ações
e planos de trabalhos em prol da Rede de Proteção e do fluxo de atendimento em plantão dos
Conselhos Tutelares; avanços na criação de legislações em prol da Proteção da Criança como,
por exemplo: a Lei da Escuta Especializada; Organizações da Sociedade Civil que ofertam pro-
gramas no fortalecimento e proteção da infância; Conselhos de Direitos da Criança e do Ado-
lescente; Centro de Referência da Assistência Social - CRAS e Centro de Referência Especiali-
zado de Assistência Social - CREAS se aproximando das escolas em algumas cidades brasileiras;
pesquisas baseadas em evidências; meios de comunicação e redes sociais têm sido um possível
espaço de disseminação de direitos e internalização de comportamentos.
A pesquisa primária, a partir das ferramentas ADAPT junto aos atores sociais, apontou sobre as
brechas na capacidade dos serviços formais e informais do Sistema e Rede de Proteção da In-
fância e Adolescência no Brasil: Pouco investimento público em equipamentos e agentes públi-
cos; ausência do Estado nos territórios mais vulneráveis; falta de articulação entre setores pú-
blicos e Organização da Sociedade Civil; desconhecimento sobre todas as formas de proteção
da infância nas equipes de atendimento; as atividades com egressos do sistema socioeducativo
não são continuadas; pouca qualificação para as equipes; segurança para as informações
sigilosas, assim como há problemas decorrente de alimentação incorreta no sistema ou os
há registros de denúncias incompletos.
91
Gráfico 23 - Número de OSC na área da Assistência Social no Brasil
Total de OSC
Outras Ofertas
Benefícios Eventuais
0
0
0
.0
.0
20
40
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
Fonte: Dados coletados no site no IPEA sobre Mapa OSC no Brasil, 2018.
O Gráfico 23 revela que das 33.911 Organizações da Sociedade Civil que atuam na Assistência
Social, 14.364 desenvolvem ações de assessoramento e defesa da garantia de direitos, seguidas
de 10.138 que prestam serviços de proteção social básica, 6.033 de outras ofertas, 3.674 orga-
nizações que desenvolvem serviços de proteção social de alta complexidade, 3.503 de média
complexidade e, por fim, 2.226 OSC que atendem com benefícios eventuais.
Essas Organizações da Sociedade Civil são reguladas por legislações de âmbito nacional, mui-
tas possuem parcerias com o Estado, e outras são sustentadas por agências internacionais, por
doações de pessoa física e/ou de recursos de empresas provenientes de incentivos fiscais. As
que desenvolvem serviços para crianças e adolescentes devem ser cadastradas no Conselho de
Direitos da Criança e do Adolescente nos âmbitos municipal, estadual ou nacional, dependendo
da amplitude de atuação da Organização.
No uso de suas atribuições diante da Lei nº 8.242, de 12 de outubro de 1991, o Conselho Nacio-
nal de Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA – estabelece parâmetros de criação e
92
funcionamento dos Fundos de Direitos da Criança e do Adolescente – FDCA em todo territó-
rio nacional no ano de 2010 no Brasil. Nesta resolução de nº 132, de 21/01/2010, o CONANDA
apresentou que os recursos do Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente devem ter um
registro próprio, de modo que a disponibilidade de caixa, receita e despesa fique identificada
de forma individualizada e transparente.
Nesse Congresso, foi discutido e apresentado um guia que orienta a metodologia de prestação
de contas do Poder Executivo e dos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente para des-
tinação mais adequada e transparência na utilização dos recursos para Proteção da Infância e
Adolescência no país. É importante ressaltar que esta preocupação também provém devido aos
incentivos fiscais que a legislação brasileira fomenta a partir da doação incentivada de pessoas
físicas e empresas do seu imposto de renda para os Fundos de Direitos da Infância no país.
Essas iniciativas de capacitação ainda são consideradas pontuais por não atingirem a maioria
dos profissionais com a capacitação continuada, até porque no Brasil, devido à precarização
do trabalho (baixos salários, seleções temporárias, instabilidade) e riscos enfrentados (devido
a conflitos territoriais por facções), há um fluxo de profissionais, sendo uma boa parte
terceirizados, temporários e/ou de cargo de confiança política. No caso dos Conselheiros
Tutelares, há um processo de escolha a cada quatro anos, o que demanda uma permanente
necessidade de formação de conselheiros tutelares.
93
6.4. Cooperação e Coordenação (intersetorialidade)
do sistema
As ações integradas e articulações intersetoriais, na busca por cooperação e coordenação so-
bre o atendimento ao público infanto-juvenil, além de previstas na Constituição Federal e no
Estatuto da Criança e do Adolescente, são objetivos e metas do Plano Decenal dos Direitos
Humanos da Criança e do Adolescente no Brasil (2011-2020).
dialógica, interações horizontalizadas na gestão pública, precisando ser pensada para além de
um trabalho conjunto, mas reunindo esforços, numa atuação sinérgica em prol dos objetivos
comuns, no caso, para a proteção de meninos e meninas de nosso país.
atores chaves apontam a necessidade de articulação entre setores do SGD e Rede de Proteção,
destacando principalmente a respeito da atuação dos Conselhos Tutelares nesse processo.
Outro ponto de cooperação em destaque sugerido pelos atores sociais entrevistados foi a ne-
cessidade de formação sobre SGD e Rede de Proteção não apenas envolvendo equipamentos
do Governo, mas também OSCs, escolas, igrejas/centro religiosos, dentre outros. Além disso,
foram citados: momentos de diálogo entre sociedade e governo, práticas de monitoramento de
políticas públicas, fiscalização sobre a entrega dos serviços e benefícios prestados pelo estado,
estudos e pesquisas sobre a infância e adolescência para conhecimento da realidade e precisão
na elaboração de políticas públicas e aumento de canais de escuta nos municípios.
Quando questionamos os atores sociais a respeito das brechas da Capacidade das Forças de
Ordem, eles declaram que temos estrutura precária, é forte a sensação de impunidade ou de
uma justiça lenta. Também foram comentadas que há denúncias falsas, trotes e famílias que
desistem da denúncia, que nos equipamentos de ordem há profissionais não qualificados para o
atendimento a crianças e adolescentes, agentes públicos da área não sensíveis a causa da Pro-
teção da infância e que parte da população não confia nos equipamentos, bem como a presença
das facções criminosas pratica a justiça na comunidade com as próprias mãos.
No caso brasileiro, a burocracia é outro ponto para ser evidenciado. Mesmo considerada ne-
cessária para a transparência pública, ela requer saberes e ações interdisciplinares, bem como
habilidades e competência estatal em seu corpo técnico para a busca de caminhos coordena-
dos e cooperativos para a Proteção da Infância (Carmo e Guizzardi, 2017).
No que tange à cooperação em prol de ações integradas entre Estado e Sociedade Civil, é vá-
lido destacar a influência do contexto tanto para as ações políticas quanto para o contexto da
prática, pois no que tange a proteção social (Rezende e Baptista, 2015) e, prioritariamente, da
proteção de crianças e adolescentes as divergências partidárias, ideológicas e/ou religiosas
94
que são perceptíveis na realidade política brasileira devem ser suprimidas pela causa da ética,
pela vida, respeitando o Estado laico.
Retornando ao foco da intersetorialidade, outro desafio está na visualização, interpretação que
se organiza uma vida política nas suas fases que são sequenciais, porém interdependentes. A
cooperação e a coordenação a partir da intersetorialidade precisa estar sendo planejada e exe-
cutada em conjunto desde a identificação dos problemas, formação das agendas, formulação de
alternativas, tomada de decisão, implementação das políticas, avaliação e, no caso de algumas
políticas sem retornos sociais, o momento da sua extinção (Secchi,2010).
De forma prática, no Poder Executivo, a Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Ado-
lescente (SNDCA) é responsável pela condução da Política Nacional de Promoção, Proteção e
Defesa dos Direitos das Crianças e Adolescentes, vinculada à pasta dos Direitos Humanos no
Governo Brasileiro. Possui a função de apoiar ações intersetoriais, interinstitucionais e inter-
federativas, promovendo a articulação de diversos órgãos e sociedade civil, estimulando essa
intersetorialidade na instância nacional (Ministério da Mulher, Família e dos Direitos Huma-
nos, 2020). Esta Secretaria, na instância nacional, executa as medidas pensadas e priorizadas
pelo Conselho Nacional de Direito da Criança e do Adolescente – CONANDA.
Além disso, o Ministério Público, baseado no artigo 127 da Carta Magna, tem a função institu-
cional de zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública
aos direitos assegurados da Constituição, promovendo as medidas necessárias à sua garan-
tia (artigo 129, Inciso II).
Nesse sentido, o Ministério Público atua em duas linhas de frente: para garantir que as leis
orçamentárias especifiquem as metas físicas a serem atingidas pela administração pública
através das ações previstas nos seus respectivos orçamentos, bem como na execução do orça-
mento, acompanhar a implementação dessas políticas públicas já definidas na Legislação Orça-
mentária (Lima, 2016).
Apesar da existência desses órgãos, das leis e decretos que descrevem sua funcionalidade, há
diversos impedimentos na concretização desses processos na realidade brasileira. Um deles é
a destinação de recursos para avaliação das políticas. Ainda não há uma cultura de priorização
para avaliação de políticas no país. Outro problema é a quantidade de profissionais no Ministério
Público para a grande demanda, necessitando de concursos para a sua ampliação. Quanto aos
Conselhos de Direitos, pesquisas acadêmicas apontam que há participação de conselheiros de
direitos, porém muitos ainda precisam entender o seu papel e exercitá-lo.
95
Podemos também mencionar que o Orçamento Criança e Adolescente - OCA, enquanto fer-
ramenta, precisa ser expandido e estimulado para adesão entre as Organizações da Sociedade
Civil, como mais uma possibilidade de intervenção e controle social, para assim, garantir a
transparência e prestação de contas em números, sobre a Proteção Social da Infância e Ado-
lescência no país.
tradicionais, mas também de pensar em estratégias que influenciam atitudes, valores e com-
portamentos sociais e institucionais para apoio e proteção imediata dos meninos e meninas
nos ambientes sociais. No Brasil, no que tange ao governo a respeito da proteção da infância
e adolescência, constatamos algumas políticas que evidenciam linhas de cuidados fora do
domicílio: nas políticas de Saúde, da Assistência Social e algumas iniciativas na Educação.
96
O afastamento da criança ou adolescente do convívio familiar é de competência exclusiva da
autoridade judiciária e importará na deflagração, a pedido do Ministério Público ou de quem
tenha legítimo interesse, de procedimento judicial contencioso, no qual se garanta aos pais ou
ao responsável legal o exercício do contraditório e da ampla defesa. (Incluído pela Lei nº 12.010,
de 2009)
Nesse sentido, os equipamentos sociais da área da Assistência Social deverão entender os pro-
cedimentos metodológicos e operacionais do atendimento e acompanhamento de crianças e
adolescentes que estão na situação considerada de alta complexidade: o acolhimento institu-
cional e a medida protetiva. Caso a família extensa – quando contatada e analisada pela equi-
pe dos equipamentos sociais – tenha condições e aceite cuidar da criança ou adolescente na
situação de orfandade, de rua ou violação de direitos pelos pais, a justiça emitirá a guarda,
oficializando a criação desses meninos e meninas.
No que tange à proteção de meninos e meninas no contexto educacional nos anos 2004, o Go-
verno Federal, através da Secretaria de Educação Continuada Alfabetização e Diversidade – SE-
CAD em parceria com outros órgãos, implementou o Projeto Escola que Protege, uma estratégia
de política pública de educação para prevenção e enfrentamento das violências (físicas e se-
xuais) contra crianças e adolescentes no contexto escolar, propondo formação continuada aos
professores da rede pública da educação básica, implantação de escola para pais; e acolhimen-
to, avaliação diagnóstica e atendimento psicossocial a crianças e adolescentes matriculados.
Um debate social e de publicações acadêmicas surgiu nos últimos anos denunciando as di-
versas violências que as crianças e adolescentes enfrentam no ambiente escolar: bullying, vi-
olência física, violência verbal, ameaças, assédio sexual, assédio moral, que acontecem tanto
97
entre alunos, entre professores e alunos, alunos e comunidade. Além destes, há os recorrentes
conflitos territoriais devido às facções criminosas e ao narcotráfico, que circulam as escolas
públicas como alvo de vendas de drogas. Todas essas demandas requerem do governo uma ur-
gente intervenção sobre a proteção de meninos e meninas no contexto escolar, sendo questões
internas e externas que acabam influenciando no desempenho escolar e no seu desenvolvi-
mento pleno.
da elaboração de projetos de leis, bem como na sua aprovação pelo Poder Legislativo.
Para as famílias em situação de rua, tanto o governo quanto a Rede de Proteção (OSCs) desen-
volvem um trabalho interinstitucional para abordagem social de rua nas capitais e grandes
cidades, com ações articuladas para crianças em situação de rua. Entretanto, na realidade, mi-
lhares de pessoas (e famílias inteiras) estão em situação de rua no Brasil, sendo que pesquisas
e Censos para essa população são raros, invisibilizando-os nas estatísticas e análises sociais.
Ou seja, nos deparamos na realidade com essa população, mas não conseguimos nem sequer
evidenciá-los.
98
O Brasil, diferente de alguns países na América Latina, ainda não tem a cultura de participação
de crianças e adolescentes tendo as suas vozes expressas em audiências públicas e nos espa-
ços do legislativo/parlamento (Câmara dos Vereadores, Assembleia ou Congresso). Há apenas
comitês e Frente Parlamentar em prol de questões prioritárias à infância e adolescência que
estudam a realidade (pesquisas) e debatem socialmente para a elaboração de legislações em
prol da criança, porém, feitas por adultos.
Quanto à questão da busca das opiniões das crianças e adolescentes a respeito das tomadas de
decisões que as afetam, os atores sociais entrevistados sugerem: garantida da escuta segura e
protegida; acompanhamentos pelas organizações formais e informais; estimulo ao engajamen-
to em espaços de participação social e comunitária; valores como respeito, confiança, bem
como a autonomia sendo orientados pelas famílias e órgãos de atendimento e proteção; con-
sideração pela opinião das crianças nos processos de decisão que remetem a elas; desenvolver
linhas de cuidados e propostas de autoproteção.
Analisamos que a resistência de crianças, bem como as habilidades desenvolvidas para a vida e
opinião que envolvem tomadas de decisões para meninos e meninas partem de um desenvolvi-
mento de estratégia sobre a cultura no que tange ao reconhecimento da criança como sujeito
de direitos desde a escuta, a aproximação e garantia de espaços de participação, bem como de
desenvolvimento de tecnologias sociais que gerem a sua autoproteção.
99
por caminhos de mudanças envolvendo adultos (mulheres e homens) e atores sociais de oito
cidades/estados brasileiros que foram pesquisados durante os meses de abril a setembro do
ano corrente. De forma remota (virtual), o encontro se deu através de um Seminário Nacional
pela plataforma Zoom em tempo real e com inscrição prévia para participação, totalizando 166
inscritos/participantes. Este evento foi dividido em três momentos, a saber: 1) Apresentação
dos Dados Nacionais da Pesquisa; 2) Validação Comunitária e 3) Caminhos para Mudanças, re-
comendados pela comunidade participante do evento.
Vale ressaltar que, após apresentação das questões prioritárias e causas estruturantes do Bra-
sil pela Consultora Nacional, dividimos os participantes por estado, em oito salas virtuais. Essa
divisão teve o propósito de sistematizar as especificidades regionais/locais durante a valida-
ção e elaboração de caminhos de mudanças, para que, em seguida, fossem expostas de forma
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
100
Validação e
Caminhos de
Mudanças
101
7.1 Validação Comunitária
O momento de Validação Comunitária apontou o reconhecimento das seguintes Questões
Prioritárias para a Infância de Adolescência no Brasil: 1) Violência Sexual; 2) Trabalho Infantil; 3)
Gravidez na Adolescência; 4) Conflito com a Lei e 5) Pobreza, evidenciadas no Seminário Nacio-
nal de Validação, compiladas pelas planilhas de relatoria dos Pesquisadores locais (por Estado).
Como Causas Estruturantes que afetam nessa proteção: 1) Insegurança Pública devido, prin-
cipalmente, ao tráfico de drogas, violência institucional e a morte de crianças, adolescentes
e jovens da periferia; 2) Desemprego que provém das desigualdades sociais e é acentuado pela
crise sanitária da pandemia; 3) Investimento Público Insuficiente, e que não prioriza recursos/
orçamentos à criança e ao adolescente, inclusive nos acessos a serviços básicos de educação,
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
É válido destacar que houve uma causa apresentada que não foi reconhecida pelos atores so-
ciais e famílias a respeito de sua localidade, a saber: desinformação sobre educação sexual, no
estado de Alagoas. As famílias e atores sociais participantes no Seminário reconhecem que
há informação sobre educação sexual, o que realmente acontece em Alagoas é uma aceitação
do casamento infantil, uma cultura de casar e iniciar uma nova família ainda na adolescência,
sendo reproduzida e estimuladas pelos próprios pais/mães e parentes. A mudança foi acolhi-
da numa instância local. Quanto às terminologias, tivemos um ajuste de “Baixo Investimento
Público” para “Investimento Público Insuficiente”, no Estado de São Paulo. Posteriormente, os
dados foram catalogados e analisados pela consultoria nacional e assessores da Visão Mundial
de suporte e revisão da pesquisa.
Para uma melhor compreensão, dividimos as respostas (ideias) comunitárias em sete eixos
descritivos: Fortalecimento do Protagonismo Infanto-juvenil; Percepção das Fortalezas Co-
munitárias, Engajamento de Atores Sociais, Definição de Ação Comunitária para Proteção da
Infância, Definição de Espaço, Tempo e Responsável pela Atuação, Desenvolvimento de Meto-
dologias e Monitoramento e Avaliação das Ações. Vejamos o resultado a seguir.
102
Percepção das Fortalezas Comunitárias
A comunidade respondeu que pode mudar seus hábitos, tem a força da participação, da mobi-
lização, da juventude, da experiência das mulheres e articulação nas relações e espaços sociais,
bem como vivência da solidariedade e da ajuda mútua nos territórios vulneráveis.
103
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L | VISÃO MUNDIAL BRASIL
104
Lições
Aprendidas
8. Lições Aprendidas
Nesse processo de validação e busca por caminho de mudanças, destacamos o con-
trole social, especialmente as expressões chaves: acompanhamento e monitoramen-
to das políticas públicas como respostas mais ressaltadas entre os comunitários e
atores sociais presentes no Seminário Nacional. Assim, analisamos que uma atuação
de monitoramento e avaliação das políticas tem sido uma das principais estratégias
que a população consultada evidencia como prática que, de fato, incide e provoca
mudança social em prol da Proteção da infância e adolescência no Brasil.
• Aprendemos a nos adaptar com as mudanças provocadas pela Covid-19 no âmbito da pesquisa
social, realinhando os métodos de construção e aplicação de técnicas de forma participati-
va, respeitando decretos de distanciamento social, mantendo a qualidade, confidencialidade e
credibilidade dos dados.
• Nas cidades, a pesquisa com as ferramentas ADAPT provocou não só encaminhamentos soci-
ais aos casos percebidos no ato de sua aplicação, mas também sensibilização dos atores sociais,
adultos e dos próprios pesquisadores à militância pela causa da Proteção da Infância, gerada
pelo seu processo de realização.
• Aprendemos com o tempo necessário nas etapas da pesquisa, desde a aplicação, transcrição,
cuidados com a fidelidade e quantificação de vozes semelhantes e diferentes registradas, bem
como no trato dos dados (codificação, a importância da catalogação), necessitando de dedi-
cação maior para a reflexão e análise da pesquisa.
• Aprendemos que cada etapa nos habilita e respalda a práticas mais assertivas ao valorizarmos
a voz e a vez dos sujeitos de direitos pelas vias democráticas, zelando pela autonomia, em-
poderamento e emancipação dos participantes envolvidos.
105
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L | VISÃO MUNDIAL BRASIL
106
Considerações e
Recomendações
9.1. Considerações Finais
A Pesquisa de Análise de Contexto Nacional sobre o Sistema de Garantia de Direitos no
Brasil: Da Percepção das Crianças aos Operadores de Direitos. nos possibilitou identificar
- a partir dos relatórios de órgãos de credibilidade nacional e internacional – o comporta-
mento dos principais marcadores de vulnerabilidades, a saber: crianças e adolescentes em
situação de trabalho infantil, morando em instituições, no sistema de adoção, casamento
infantil, adolescentes grávidas, crianças em situação de violências (negligência, violência
física, sexual, dentre outras), crianças com deficiência, adolescentes em conflito com a lei
e respondendo ao sistema de justiça, crianças refugiadas, mortalidade infantil e letalidade
juvenil.
Constatamos que esses marcadores são mais recorrentes entre meninos e meninas em
situação de pobreza e aquelas de extrema privação; em concordância entre os estudos já
realizados, há um recorte étnico, sendo em sua maioria pardos e negros, com baixa es-
colaridade, os quais estão localizados nas periferias urbanas. Especificamente o Trabalho
Infantil tem se revelado em maior frequência nas zonas rurais, atingindo a faixa etária de
5 a 14 anos. Ou seja, o comportamento dos marcadores afeta preferencialmente um tipo de
classe (a mais pobre), em etnias específicas (pardos e pretos), numa faixa etária (crianças e
adolescentes) e em territórios demarcados.
107
temente, a fome para as crianças e adolescentes. Que o confinamento domiciliar como
medida para conter a pandemia provocou o aumento das conflitualidades nas relações fa-
miliares, dentre elas as violações de direitos na Infância e Adolescência, principalmente as
violências físicas e sexuais.
Relatos confirmam que o fechamento das escolas devido ao isolamento social provocou uma
série de transtornos à educação que variam desde a evasão, abandono escolar, ausência de
acesso e/ou condição à educação remota, e acompanhamento escolar, dentre outras.
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
Constatamos que as vulnerabilidades estão interligadas e que demandam uma ação pensada/
planejada, executada, monitorada e avaliada de forma interdisciplinar, intersetorial com um
olhar multidimensional. E que, no caso brasileiro, a elaboração das leis é, em geral, cuidadosa
na Proteção da Infância e estão vinculadas com as normas e convenções internacionais, porém,
entre a lei e sua aplicabilidade existe um hiato evidenciado nos números crescentes de viola-
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
Além disso, há vários desafios que já foram registrados por outras pesquisas secundárias sobre
o sistema de Proteção da Infância e também evidenciadas na nossa pesquisa primária, a saber:
demanda reprimida de atendimento, burocracias, rotatividade de profissionais, necessidade de
formações/capacitações, necessidade de profissionais qualificados para atendimento infan-
to-juvenil, investimentos insuficientes em serviços, equipamentos e benefícios sociais, ou seja,
há a necessidade de um Estado interventor e rigoroso na proteção da infância.
Relativo aos avanços encontrados durante a pesquisa de âmbito nacional, identificamos as ini-
ciativas do Governo Federal em equipar minimamente os Conselhos Tutelares, implantar ou-
vidorias e observar os marcadores de violação de direitos da infância e adolescência no país,
centralizando essas informações, propondo agendas e metas conciliadas com compromissos
acordados internacionalmente em prol dos direitos humanos da criança e do adolescente, vin-
culando normas, protocolos e linhas de cuidados com a infância e adolescência nos vários
setores sociais.
108
ça, mediação de conflitos e/ou justiça restaurativa) para a garantia da Proteção Infanto-juvenil.
Entretanto, em pesquisas primárias, o desconhecimento sobre direitos e políticas de proteção
à infância foi uma das causas mencionadas que aprofundam a problemática de desproteção de
nossos meninos e meninas, evidenciando que estamos muito distantes do que o Brasil precisa
desenvolver na linha de cuidados, promoção da autonomia e autoproteção nessa etapa da vida.
9.2. Recomendações
Recomendamos ao Governo que:
- Desenvolva estratégias que incidam sobre as causas estruturantes: desemprego, insegurança
pública, conflitualidades e discriminação étnica e de classe;
• Se atualizem nas tendências a partir das mudanças provocadas pela pandemia, desenvol-
vendo tecnologias sociais simples e de alcance ampliado, focando sempre nas evidências,
impactos e sustentabilidade em prol da proteção da Infância e adolescência;
• Percebam os espaços potenciais (formais e informais) para uma intervenção em massa (es-
109
colas, igrejas/centros religiosos, clubes esportivos, dentre outros) nos seus territórios de
atuação;
• Desenvolvam uma intervenção social que ataque as causas centrais dos problemas
priorizados coletivamente, publicizando suas ações e resultados;
• Busquem atuações que incidam sobre as políticas públicas em prol das crianças e ado-
lescentes, fazendo do monitoramento e avaliação suas principais ferramentas de controle
social.
• Reproduza novos modos de vida (mudanças de hábito) valorizando os gêneros, sem precon-
ceito e/ou discriminação, reconhecendo as crianças como sujeitos de direitos e cultivando
cuidados, respeito e afetos, bem como fazendo da família o principal espaço de proteção
social;
• Escute com atenção suas crianças e adolescentes, valorizando suas potencialidades, com
afeto e respeito;
110
Referências
111
Legislações
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Sena-
do Federal: Centro Gráfico, 1988.
_____. Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adoles-
cente e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF,
16 jul. 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8069.htm#art266 .
Acesso em: 26 de abril de 2021.
______. Lei nº 13.811/2019. Confere nova redação para suprimir as exceções legais permis-
sivas do casamento infantil. Disponível no link: https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legisla-
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
em 14 de maio de 2021.
______. Lei nº 13.257, de 8 de março de 2016. Dispõe sobre as políticas públicas para a primei-
ra infância. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/
l13257.htm Acesso em: 22. abril de 2021.
______. Lei nº 13.010, de 26 de junho de 2014. Lei Menino Bernardo. Altera a Lei no 8.069, de
13 de julho de1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para estabelecer o direito da criança
e do adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de castigos físicos ou de tratamento
cruel ou degradante, e altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da União.
Publicado em: 27/06/2014. Edição: 121. Seção: 1. Página: 2. Disponível em: https://www.in.gov.
br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/30057416/do1-2014-06-27-lei-
n-13-010-de-26-de-junho-de-2014-30057411 Acesso em: 17 de maio de 2021.
RIO DE JANEIRO. Lei Nº 9.116, de 30 de Novembro de 2020. Dispõe sobre a criação de Comissões
112
9. Referências
Legislações
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Sena-
do Federal: Centro Gráfico, 1988.
_____. Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adoles-
cente e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF,
16 jul. 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8069.htm#art266 .
Acesso em: 26 de abril de 2021.
______. Lei nº 13.811/2019. Confere nova redação para suprimir as exceções legais permis-
sivas do casamento infantil. Disponível no link: https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legisla-
cao/684871305/lei-13811-12-marco-2019 Acesso em: 14 de maio de 2021.
______. Lei nº 13.812 de 16 de março de 2019. Institui a Política Nacional de Busca de Pessoas
Desaparecidas, cria o Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas. Disponível no link: https://
rodoviarialajeado.com.br/assets/site/imagens/LEIN13.812DE16DEMARCODE2019.pdf Acesso
em 14 de maio de 2021.
______. Lei nº 13.257, de 8 de março de 2016. Dispõe sobre as políticas públicas para a primei-
ra infância. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/
l13257.htm Acesso em: 22. abril de 2021.
______. Lei nº 13.010, de 26 de junho de 2014. Lei Menino Bernardo. Altera a Lei no 8.069, de
13 de julho de1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para estabelecer o direito da criança
e do adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de castigos físicos ou de tratamento
cruel ou degradante, e altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da União.
Publicado em: 27/06/2014. Edição: 121. Seção: 1. Página: 2. Disponível em: https://www.in.gov.
br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/30057416/do1-2014-06-27-lei-
n-13-010-de-26-de-junho-de-2014-30057411 Acesso em: 17 de maio de 2021.
113
Defesa Civil. 2021. Disponível: https://www.cnm.org.br/cms/biblioteca/Estudo-danos-e-pre-
juizos-causados-por-desastres-durante-a-pandemia-em-2020_14.06.2021.pdf
elaboração de Joacy de Deus Pinheiro – Documento eletrônico – Brasília: Ministério dos Dire-
itos Humanos, 2018, 255 p.
MINISTÉRIO DOS DIREITOS HUMANOS. Secretaria Nacional de Proteção dos Direitos da
Criança e Adolescente. Letalidade infanto-juvenil: dados da violência e políticas públicas ex-
istentes
/ elaboração de Thaís Cristina Alves Passos – Documento eletrônico –Brasília: Ministério dos
Direitos Humanos, 2018, 110 p.
ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DE SAÚDE. Ministério da Saúde. Desastres Naturais e Saúde
R E L ATÓ R I O F I N A L 2 0 2 1 - CO N T E X TO S N AC I O N A I S E CO M U N I TÁ R I O S N O B R A S I L
no Brasil. Brasília, DF: OPAS, Ministério da Saúde, 2014. 49 p:. il. (Série Desenvolvimento Sus-
tentável e Saúde, 2)
RIO DE JANEIRO. Lei Nº 9.116, de 30 de Novembro de 2020. Dispõe sobre a criação de Comissões
de Conscientização, Prevenção e Enfrentamento à Violência e Promoção dos Direitos da Cri-
ança e do Adolescente nas Escolas Públicas e Privadas no Âmbito do Estado do Rio de Janeiro.
Disponível em: https://leisestaduais.com.br/rj/lei-ordinaria-n-9116-2020-rio-de-janeiro-dis-
poe-sobre-a-criacao-de-comissoes-de-conscientizacao-prevencao-e-enfrentamen-
to-a-violencia-e-promocao-dos-direitos-da-crianca-e-do-adolescente-nas-escolas-publi-
cas-e-privadas-no-ambito-do-estado-do-rio-de-janeiro . Acesso em: 17 de maio de 2021.
SÃO JOSÉ DOS CAMPOS. Lei N. 10.151, de 21 de julho de 2020. Autoriza o Poder Executivo Mu-
nicipal a criar comissões de atendimento, notificação e prevenção à violência doméstica contra
crianças e adolescentes nas escolas da rede pública do município de São José dos Campos e dá
outras providências. Disponível no link: http://camarasempapel.camarasjc.sp.gov.br/legisla-
cao/norma.aspx?id=44647 Acesso: 14 de maio de 2021.
Produções Acadêmicas
CARMO, Michelly Eustáquia do; e GUIZARDI, Francini Lube. Desafios da intersetorialidade nas
políticas públicas de saúde e assistência social: uma revisão do estado da arte. Physis Revista
de Saúde Coletiva. Rio de Janeiro, 27 [ 4 ]: 1265-1286, 2017.
MERLIM, Juliana Iglesias. Trajetória da proteção social brasileira à infância e à adolescência nos
marcos das relações sociais capitalistas. Revista Serviço Social e Saúde. V.11, Nº2 jul-dez/2012.
114
MONFREDINI, M. I. Proteção integral e garantia de direitos da criança e do adolescente: de-
safios à intersetorialidade. 2013. 296f. Tese (Doutorado) – Universidade Estadual de Campinas.
GALINDO, Eryka; Marco Antonio Teixeira, Melissa De Araújo, Renata Motta, Milene Pessoa,
Larissa Mendes e Lúcio Rennó. 2021. Efeitos da pandemia na alimentação e na situação da
segurança alimentar no Brasil. Food for Justice Working Paper Series, no. 4. Berlin: Food for
Justice: Power, Politics, and Food Inequalities in a Bioeconomy. DOI 10.17169/ refubium-29554
RIZZINI, I; PILOTTI, F. (Orgs.) A arte de governar crianças: a história das políticas sociais, da
legislação e da assistência à infância no Brasil.3ª ed.,. São Paulo: Cortez, 2011.
Souza BFNJ, Bernardes MS, Vieira VCR, Francisco PMSB, Marín-León L, Camargo DFM, et al.
(In)segurança alimentar no pré e pós pandemia. InterAm J Med Health. 2021;4:e202101001.
VERGARA, S.C. Métodos de Pesquisa em Administração. 3ª Ed. São Paulo: Atlas, 2008.
Brasil. Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Reentradas e reinterações infracionais: um olhar so-
bre os sistemas socioeducativo e prisional brasileiros / Conselho Nacional de Justiça – Brasília:
CNJ, 2019.
CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS MUNICÍPIOS. Danos e prejuízos causados por outros desas-
tres no Brasil durante a pandemia em 2020. Estudo Técnico. Desenvolvimento Territorial da
Defesa Civil. 2021. Disponível: https://www.cnm.org.br/cms/biblioteca/Estudo-danos-e-pre-
juizos-causados-por-desastres-durante-a-pandemia-em-2020_14.06.2021.pdf
115
O cenário de receitas e despesas nas redes estaduais e municipais em 2020. Disponível em:
https://www.institutounibanco.org.br/wp-content/uploads/2020/10/Estudo_impacto_
covid-19-educacao-vol3.pdf consultado em:09 de julho de 2021
MINISTÉRIO DOS DIREITOS HUMANOS. Secretaria Nacional de Proteção dos Direitos da Criança e
Adolescente. Letalidade infanto-juvenil: dados da violência e políticas públicas existentes
/ elaboração de Thaís Cristina Alves Passos – Documento eletrônico –Brasília: Ministério dos Direitos
| VISÃO MUNDIAL BRASIL
PAIVA, Leila. Violência sexual – conceitos. Programa de Ações Integradas e Referenciais de En-
frentamento da Violência Sexual Infantojuvenil no Território Brasileiro – PAIR. Material Didáti-
co – 2 Conteúdos para Capacitação. Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, 2012.
WORLD VISION. ANALYSIS, DESIGN AND PLANNING TOOL For Child Protection in Humani-
tarian Action (CPHA ADAPT). February, 2020.
https://www.conjur.com.br/2016-jun-20/mp-debate-cabe-mp-garantir-poder-publico-atin-
ja-metas-orcamento
116
117
www.visaomundial.org.br
0800 70 70 374
@visaomundialbr visaomundialbrasil @visaomundialbr visaomundial visaomundialbrasil