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Ronni Amorim1,2 , Vinicius Rispoli*2 , Leandro Xavier Cardoso2 , Alexandre Russi Junior1
1
Universidade de Brasília, Instituto de Física, Brasília, DF, Brasil.
2
Universidade de Brasília, Faculdade Gama, Brasília, DF, Brasil.
In this work we present a formalism to describe the fractional Newtonian mechanics based in conformable
fractional calculus. In this sense, a brief revision about integral and differential conformable calculus is
implemented. In sequence, the conformable version to Lagrangian and Hamiltonian formalism are presented.
As examples, the conformable harmonic oscillator and conformable wave equation are discussed. In all situations,
usual results are obtained when we consider α = 1. An interesting result is that in the case 1 − α 1 the
conformable harmonic oscillator behaves like usual harmonic oscillator with time dependent and dissipation
term.
Keywords: Fractional Calculus, Conformable Fractional Derivative, Fractional Classical Mechanics.
Lagrangiano é possível a obtenção dos mesmos re- das teorias físicas trazem consequências interessantes, às
sultados obtidos por meio da abordagem de Newton; quais muitas vezes respondem bem alguns fenômenos
porém, dentre suas vantagens destaca-se a possibilidade da natureza, tais como a possibilidade de se analisar
de se analisar mais claramente as dos sistemas físicos, sistemas dissipativos ou sistemas de massa variável
bem como permite a generalização das ideias da me- sem a necessidade de se introduzir novos termos na
cânica clássica a outros aspectos, tais como a teoria Lagrangiana do sistema livre [4, 8].
de campos. Já o formalismo Hamiltoniano, proposto Esse é o objetivo deste trabalho, apresentar o cálculo
pelo matemático irlandês William Rowan Hamilton conformável e aplicá-lo na construção da mecânica New-
(1805–1865) [1], estendeu as concepções do formalismo toniana conformável. Sendo assim, a apresentação deste
Lagrangiano, trabalhando com uma coordenada extra trabalho se baseará nos seguintes tópicos: na seção 2
denominada momentum canonicamente conjugado, a apresentamos o cálculo diferencial e integral conformá-
qual se obtém a partir da Lagrangiana. Nesse arcabouço, vel; na seção 3 o formalismo Lagrangiano conformável
o formalismo proposto por Hamilton apresenta algumas é discutido; o formalismo Hamiltoniano conformável é
vantagens, quais sejam: a possibilidade de se trabalhar abordado na seção 4; na seção 5 trazemos a versão
com equações diferenciais de primeira ordem, apesar conformável do oscilador harmônico como exemplo; na
da duplicação na quantidade de equações; a introdução seção 6 a equação de onda conformável é apresen-
das transformações canônicas; a concepção do espaço tada; por fim, a seção 7 traz as considerações finais e
de fase e da variedade simplética. Além das vantagens perspectivas.
já mencionadas, com os formalismos Lagrangiano e
Hamiltoniano torna-se mais simples a análise de siste- 2. O cálculo diferencial e integral
mas físicos particulares, os quais quando estudados no
conformável
contexto Newtoniano são demasiadamente complicados.
O ponto principal neste texto é que o conhecimento
Nesta seção desenvolveremos a ferramenta matemática
matemático mais aprofundado permite a obtenção de
que nos guiará na formulação de uma versão fracionária
novas vertentes teóricas, e isso ocorre sobretudo na física.
da mecânica Newtoniana. De forma mais específica,
O cálculo conformável, considerado por alguns autores
abordaremos o cálculo conformável, donde apresenta-
como uma vertente do cálculo de ordem fracionária, é um
remos as principais definições e propriedades acerca
exemplo de abordagem matemática diferente do cálculo
dessa modalidade da derivada de ordem fracionária.
diferencial e integral usual que pode trazer consequências
As demonstrações serão discutidas de forma detalhada,
às teorias físicas. O conceito de derivada conformável foi
com a perspectiva de preparar o leitor para as seções
recentemente apresentado por Khalil et al. [3]. Coube a
posteriores. O conteúdo apesentado nesta seção tomou
Abdeljawad [4] aprofundar os estudos desse novo tipo de
como base as referências [5, 6]
derivada, e desenvolver alguns conceitos e deduzir algu-
mas propriedades, fundando assim o cálculo diferencial
2.1. A derivada conformável
e integral conformável. A definição e as propriedades da
derivada conformável satisfaz as propiedades da derivada Definição 1: Considere uma função f : [0, ∞) → R, a
usual quando se toma o limite da ordem da derivada derivada conformável de ordem α de f é definida por
tendendo à unidade. É importante que o leitor não con-
funda a palavra conformável, atribuída a essa definição f (t + ht1−α ) − f (t)
Dtα f (t) = lim , (1)
de derivada fracionária, ao nome conforme, que é usu- h→0 h
almente utilizado em teorias físicas (como por exemplo
para todo t > 0 e α ∈ (0, 1). O sobrescrito t na
na teoria de campos conforme) e que tem relação com
notação Dtα f (t) representa a variável em relação à qual
um tipo de transformação no bojo da variável complexa.
estamos derivando. Se a derivada conformável de ordem
Não se conhece a motivação de Khalil ao denominar tal
α exisitir, dizemos que a função f é α-diferenciável.
modalidade de derivada fracionária como conformável,
Note que se f é uma função derivável no sentido usual,
mas sabe-se que ele pretendia obter um tipo de derivada
então podemos usar a regra de L’Hôpital na Equação (5)
fracionária que apresentasse propriedades mais próximas
e com isso obtemos o seguinte resultado
com a derivada usual.
Para alguns autores, a derivada conformável não é Dtα f (t) = f 0 (t)t1−α . (2)
considerada uma legítiva derivada fracionária, pois não
satisfaz algumas propriedades que definem as deriva- O leitor deve se lembrar que a interpretação geométrica
das fracionárias previamente definidas, como Riemann- da derivada usual tem relação com a inclinação da reta
Liouville e Caputo [5–7]. A derivada conformável é local tangente à função num dado ponto, e a interpretação
e, portanto, não apresenta efeitos de memória. Além física é ligada a velocidade da partícula. Além disso,
disso, a derivada conformável satisfaz algumas regras na derivada usual, enquanto a variável independente
que as derivadas fracionárias tradicionais não satisfazem, muda h, o valor da função varia de acordo com tam
como veremos em diante. Contudo, o seu estudo no bojo mudança.Assim, o limite dado reflete a intensidade
Revista Brasileira de Ensino de Física, vol. 44, e20220064, 2022 DOI: https://doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2022-0064
Amorim et al. e20220064-3
DOI: https://doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2022-0064 Revista Brasileira de Ensino de Física, vol. 44, e20220064, 2022
e20220064-4 Mecânica Clássica Conformável: uma revisão pedagógica
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Amorim et al. e20220064-5
•
2.3. A série de Taylor conformável ∞
t(2k+1)α
1 α X
Consideremos uma função função f (t) que seja infini- sin t = (−1)k .
α (2k + 1)! · α2k+1
tamente α-diferenciável no ponto t0 , i.e., a aplicação k=0
DOI: https://doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2022-0064 Revista Brasileira de Ensino de Física, vol. 44, e20220064, 2022
e20220064-6 Mecânica Clássica Conformável: uma revisão pedagógica
Calcularemos essa derivada com o uso da Propriedade Com isso, obtemos a versão conformável das equações
5 a qual estabelece a regra da cadeia da derivada de movimento da mecânica Newtoniana, isto é,
conformável. Procedendo assim, temos ∂V
m(Dtα x)2 = − (22)
∂x
Dα S[α ] = I α α
[(DX L)(Dα X)X α−1
α
Podemos definir a velovidade conformável da seguinte
+(DD α
t X
L)Dα (Dtα X)(Dtα X)α−1 ]. forma
A Equação (15) nos dizem que Dα X = η e Dα (Dtα X) = v = Dtα x.
Dtα η. Com isso, obtemos
Nessa mesma perspectiva, a aceleração conformável fica
Dα S[α ] = αI α [(DX
α
L)X α−1 η dada por
α
+(DD α
t X
L)(Dtα X)α−1 Dtα η]. a = (Dtα x)2 .
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Assim, a versão conformável da segunda Lei de Newton É interessante notar a partir do resultado dado na
pode ser escrita como Equação (31) que a velocidade da partícula pode ser
calculada a partir da derivada em relação à variável τ ,
F = m(Dtα x)2 . (23) isto é, v = dx
dτ .
O comportamento da solução dada na Equação (30)
Um resultado interessante é obtido a partir da Equação
para diferentes valores de α podem ser visto na Figura.
(22) no caso em que 1 − α = δ é suficiente pequeno. A
seguir apresentaremos dois exemplos simples para ilus-
trar os resultados desta seção, num primeiro momento 3.1.2. Movimento com aceleração constante
analisaremos a versão conformável do movimento de Nesta subseção avançaremos em relação ao aspecto
uma partícula com velocidade constante e na sequência, analisado na precendente, pois trataremos agora de uma
trataremos a abordagem conformável para o movimento partícula que se move com aceleração constante. Para
de uma partícula com aceleração constante. esse fim, consideremos a seguinte equação diferencial
conformável
3.1.1. Movimento com velocidade constante
Dtα v = a, (32)
Consideremos uma partícula se movendo com velocidade
cosntante de módulo v. Dessa forma, podemos escrever em que a é a aceleração constante. Essa equação pode ser
a equação de movimento como resolvida de forma análoga à Equação (25), fornecendo
tα
Dtα x(t) = v. (24) v(t) = v(0) + a . (33)
α
Aplicando o operador integral conformável em ambos os Se usarmos
lados da Equação (25), temos
a = Dtα v,
α
I Dtα x(t) α
= I v. (25)
podemos aplicar o operador integral conformável,
Usando a Equação (8), obtemos Equação (8), em ambos os lados da Equação (33),
tα
Z t
x(t) − x(0) = α−1 vd I α v(t) = I α v(0) + a . (34)
0
α
α t Fazendo os cálculos obtemos
= v |
α 0 tα t2α
x(t) = x(0) + v(0) + a 2. (35)
tα α 2α
= v . (26)
α A partir da Equação (35) podemos obter um resultado
Considerando δ = 1 − α pequeno o suficiente, podemos interessante se admitirmos novamente que δ = 1 − α é
α
t−δ pequeno o suficiente. Assim, usaremos a expansão
expandir a expressão tα = t 1−δ até os termos de pri-
meira ordem em δ. Para esse fim, considere as seguintes t1−δ
expansões ≈ t + tδ − tδ ln t, (36)
1−δ
1 já demonstrada na subseção precedente. Necessitamos
= 1 + δ + δ2 + · · · (27)
1−δ mostrar a expansão para o termo
e, fazendo a série de MacLaurin de f (δ) = t−δ em torno t2(1−δ)
de δ = 1, podemos escrever .
(1 − δ)2
t−δ = 1 − δ ln t + · · · (28) É conhecido que
Dessa forma, com os resultados dados nas Eqs.(27)–(28), 1
= 1 + 2δ + · · · (37)
obtemos que (1 − δ)2
t−δ t1−δ e, se desenvolvermos a série de McLaurin para f (δ) =
t = ≈ t + tδ − tδ ln t. (29)
1−δ 1−δ t2(1−δ) em torno de δ = 1, obtemos
E assim, chegamos à aproximação t2(1−δ) ≈ 1 + 2 ln t − (2 ln t)δ. (38)
x(t) = x(0) + vt[1 + δ(1 − ln t)]. (30) Assim, com os resultados dados nas Eqs.(37-38), chega-
mos à aproximação
Denotando τ = t[1 + δ(1 − ln t)], podemos escrever
t2(1−δ)
x(t) = x(0) + vτ. (31) = 1 + 2 ln t + 2δ[1 + ln t]. (39)
(1 − δ)2
DOI: https://doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2022-0064 Revista Brasileira de Ensino de Física, vol. 44, e20220064, 2022
e20220064-8 Mecânica Clássica Conformável: uma revisão pedagógica
Se substituirmos as Eqs.(36)-(39) na Equação (35), ob- É relevante notar que as equações de Hamilton usuais
temos, finalmente, a aproximação para a função posição são obtidas se tomarmos α = 1 na Equação (47).
τ2 Note que as Eqs.(47) podem ser escrita da seguinte
x(t) = x(0) + v(0)τ + a, (40) forma
2
dx ∂H
em que τ = t[1 + δ(1 − ln t)]. Note que dessa forma, a = tα−1
aceleração pode ser obtida a partir da segunda derivada dt ∂p
2
da Equação (40) em relação a τ , isto é, a = ddτx2 . dp ∂H
= −tα−1 . (48)
dt ∂x
4. Formalismo Hamiltoniano Em termos do parêntese de Poisson, definido por {a, b} =
conformável ∂a ∂b ∂a ∂b
∂x ∂p − ∂p ∂x , a Equação (48) pode ser escrita na forma
Revista Brasileira de Ensino de Física, vol. 44, e20220064, 2022 DOI: https://doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2022-0064
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com as condições iniciais dadas por x(0) = X e Dtα (0) = Se substituirmos as aproximações nas Equação (63) e
0. Para esse fim, consideraremos que a solução seja Equação (64) na Equação (62), chegamos a
dada por
d2 x dx
1 α
rα t
m(1 + 2δ ln t) + mδ(1 − ln t) + mω 2 x = 0.
x(t) = e , (56) dt2 dt
(65)
em que r é uma constante. Agora, derivaremos a
Equação (56) e substituíremos na Equação (57). Sabe- Se definirmos m(t) = m(1+2δ ln t) e γ(t) = mδ(1−ln t),
mos que a Equação (66) fica escrita da seguinte forma
1 α ω α d2 x dx
(Dtα x)2 (er α t ) = r2 er α t . m(t) + γ(t) + mω 2 x = 0, (66)
dt2 dt
Com isso, a Equação (57) fica dada por a qual corresponde a equação de um oscilador com massa
e coeficiente de amortecimento dependentes do tempo
r2 + ω 2 = 0, (57) e com termo de dissipação. A presença do termo de
dissipação, isto é, o termo de derivada primeira, mesmo
que é a equação característica associada a Equação (57).
no problema do oscilador harmônico simples é um resul-
Condiderando ω uma constante positiva, temos duas
tado compartilhado pela oscilador harmônico fracionário
raízes para r, quais sejam: r1 = iω e r2 = −iω. A solução
segundo Caputo, por exemplo. Ou seja, o resultado para
do problema ficada dada por
o oscilador harmônico conformável para o caso em que
ω α
x(t) = C1 ei α t + C2 e−i α t ,
ω α
(58) 1 − α pode ser considerado suficientemente pequeno é
comparável ao caso do oscilador harmônico fracionário.
em que C1 e C2 são constantes. Podemos escrever as
exponencias conformáveis em termos das funções das 6. Equação de onda conformável
funções trigonométricas conformáveis e definir A = C1 +
C2 e B = i(C1 −C2 ). Dessa forma, a solução fica dada por Nesta seção trataremos de outra aplicação física muito
ω ω relevante: o caso conformável da equação da onda. Nessa
x(t) = A cos tα + B sin tα . (59) situação, a equação de onda conformável em (1+1)-
α α dimensão pode ser escrita como [13]
As condições iniciais nos levam a concluir que B = 0 e 1
A = X, assim (Dxα )2 ψ(x, t) − (Dα )2 ψ(x, t) = 0, (67)
v 2α t
em que v = ωk . Vamos mostrar que uma solução possível
ω
x(t) = X cos tα . (60)
α para esta equação é dada por
α
k α ωα α
Essa solução é bem similar a usual, com a ressalva de que
a variável t no argumento da função cosseno está elevado ψ(x, t) = A sin x − t , (68)
α α
ao expoente de grau igual a ordem da conformalidade. α α
É interessante a análise da Equação (57) quando δ = em que A é a amplitude da onda e kα xα − ωα tα é a fase
1 − α 1. Note antes disso que a Equação (57) pode da onda.
ser escrita na seguinte forma Para mostrar que a função dada na Equação (68) é de
fato a solução da Equação (67), calculemos a partir da
dx d2 x Equação (68) as derivadas
(1 − α)t1−2α + t2−2α 2 , (61)
dt dt α
k α ωα α
α α
Ou, em termos de δ, Dx ψ(x, t) = k A sin x − t . (69)
α α
dx d2 x Aplicando novamente o operador Dxα na Equação (69),
δt2δ−1 + t2δ 2 . (62)
dt dt temos
α
k α ωα α
Expandindo t2δ−1 numa série de Taylor em torno de δ = (Dxα )2 ψ(x, t) = −k 2α A sin x − t . (70)
1 até primeira ordem em δ, obtemos a aproximação α α
De forma análoga encontramos
1
t2δ−1 ≈ 1 + 2 ln t δ − . (63) α
k α ωα α
2 α 2 2α
(Dt ) ψ(x, t) = −ω A sin x − t . (71)
α α
2δ
Por outro lado, a expansão de t numa série de Maclau-
rin nos fornece Substituindo a Equação (70) e a Equação (71) na
Equação (67), obtemos a identidade, mostrando assim
t2δ ≈ 1 + 2 ln tδ. (64) que a Equação (68) é solução da equação da onda.
DOI: https://doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2022-0064 Revista Brasileira de Ensino de Física, vol. 44, e20220064, 2022
e20220064-10 Mecânica Clássica Conformável: uma revisão pedagógica
Revista Brasileira de Ensino de Física, vol. 44, e20220064, 2022 DOI: https://doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2022-0064
Amorim et al. e20220064-11
DOI: https://doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2022-0064 Revista Brasileira de Ensino de Física, vol. 44, e20220064, 2022