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FICHA DE IDENTIFICAÇÃO
MODALIDADE PRESENCIAL
EQUIPE DE ELABORAÇÃO DO
CADERNO DE TEXTOS
FRANCISCO DAS CHAGAS COSTA
LETRAS PORTUGUÊS/ESPANHOL – FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DO TOCANTINS
ESPECIALISTA EM LÍNGUA PORTUGESA E LITERATURA – FLATED
MESTRANDO EM ESTUDOS DE LINGUAGEM – UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE/ NITERÓI – RJ
MARIA DAÍSE DE OLIVEIRA CARDOSO
LETRAS PORTUGUÊS/ ESPECIALISTA/ MESTRE
DISCIPLINA
PROFESSOR FORMADOR
- DEB
- UFPI
ESP–
1. IDENTIFICAÇÃO
CURSO: LETRAS PORTUGUÊS TIPO DE FORMAÇÃO: 1ª LICENCIATURA MUNICÍPIO DE REALIZAÇÃO:
PEDRO II
DISCIPLINA: LÍNGUA E CULTURA LATINA BLOCO:
MODALIDADE: Presencial PERÍODO LETIVO: 2023.1
CARGA HORÁRIA:60H CRÉDITOS:4.0
2. EMENTA
A relevância linguístico-cultural do estudo do latim nos cursos de Letras. História e formação da Língua latina.
Literatura latina. Abordagens paradigmáticas e sintagmáticas das línguas analíticas e sintéticas. Gramática básica
latina. Leitura, tradução e análise de textos diversos em latim. Traços latinos em línguas românicas.
3. OBJETIVOS
o Apresentar o panorama e aspectos da história externa e interna da língua latina; o Ler/transcrever palavras
e expressões da língua latina de acordo com a pronúncia reconstituída; o Fornecer uma visão geral das classes de
palavras latinas presentando os casos latinos e as suas respectivas funções sintáticas;
o Mostrar os paradigmas das cinco declinações e como reconhecê-las no dicionário, por meio do genitivo;
Mostrar a presença de elementos da cultura clássica e termos latinos nos dias atuais
4. CONTEÚDO PROGRAMÁTICO
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO – MEC
COORDENAÇÃO DE APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL DE NÍVEL SUPERIOR - CAPES
DIRETORIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ
PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE GRADUAÇÃO PREG
COORDENADORIA DE SELEÇÃO E PROGRAMAS ECIAIS - CSPE
PROGRAMA NACIONAL DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA - PARFOR
- DEB
- UFPI
–
ESP
Os alunos serão avaliados seguindo os critérios: participação em aula, realização das leituras, estudo dirigido,
realização dos exercícios, provas, seminários, escrita e entrega de textos.
O aluno será avaliado de acordo com as Normas de Funcionamento dos Cursos de Graduação da UFPI, aprovadas
através da Resolução 177/12 de 05/11/2012 do Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão - CEPEX, e da Resolução
101/2021-CEPEX, de 15.07.2021, levando-se em consideração, principalmente os seguintes pontos:
1. Para efeito de registro no diário de classe, serão consideradas 3 (três) avaliações, expressas em nota,
obedecendo a uma escala de 0 (zero) a 10 (dez).
2. Será aprovado na disciplina, por média, o aluno que obtiver frequência mínima de 75% e média aritmética
igual ou superior a 7 (sete).
3. O aluno que não for aprovado por média poderá submeter-se ao exame final, desde que tenha média aritmética
mínima de 4,0 (quatro) e frequência mínima de 75%.
Apreciação de desempenho se efetivará a partir da observação do envolvimento dos acadêmicos no decorrer das
aulas, sobretudo na produção e refacção satisfatória diante dos registros realizados pelos próprios acadêmicos
durante toda a aula;
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO – MEC
COORDENAÇÃO DE APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL DE NÍVEL SUPERIOR - CAPES
DIRETORIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ
PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE GRADUAÇÃO PREG
COORDENADORIA DE SELEÇÃO E PROGRAMAS ECIAIS - CSPE
PROGRAMA NACIONAL DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA - PARFOR
BÁSICA
ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Gramática latina: curso único e completo. – 29. ed. – São Paulo:
Saraiva, 2000.
CARDOSO, Zélia de Almeida. Iniciação ao latim. Ática, 1993.
GALVÃO, José Raimundo. Fundamentos da Língua Latina. Universidade Federal do Sergipe. São
Cristovão: CESAD, 2007.
LAGARES, Xoán Carlos. Qual Política Linguística? São Paulo: Parábola Editorial, 2018. RÓNAI, Paulo.
Curso Básico de Latim I: Gradus Primus. São Paulo: Editora Cultrix, 1986.
COMPLEMENTAR
RÓNAI, Paulo. Curso Básico de Latim II: Gradus Secundus. São Paulo: Editora Cultrix, 1986.
SOUZA, Douglas Gonçalves de [et al]. Latim Genérico: v. 1 e 2. Rio de Janeiro: CECIERJ, 2014
- DEB
- UFPI
–
ESP
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COORDENAÇÃO DE APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL DE NÍVEL SUPERIOR - CAPES
DIRETORIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA - DEB
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PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE GRADUAÇÃO – PREG
COORDENADORIA DE SELEÇÃO E PROGRAMAS ESPECIAIS - CSPE
PROGRAMA NACIONAL DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA - PARFOR
I História do Aula expositivia 10.07 5 Material Vide plano Seminário 26.08 10 Textos - 60h
Latim apostilado temático complementares
I Introdução à Aula expositivae 10.07 5 Material - SIMPARFOR 18.10 10 Textos -
fonética Latim atividades apostilado complementares
II Nominativo (e Aula expositiva 11.07 10 Material -
as 5 declinaçôes apostilado
III Gêneros neutro Aula expositiva e 12.07 05 Material -
atividades apostilado
III Estrutura do Aula expositiva e 12.07 05 Material -
verbo atividades apostilado
Atividades Realização individual 11 e 10 Texto -
extras 12.07 extra
1 Carga horária total= carga horária do período intensivo + carga horária do período complementar.
UNIDADE I
Resumo
3 Os gregos sitiaram a cidadela de Troia por cerca de dez anos e finalmente a destruíram porque o belo Páris, filho de Príamo, rei
de Troia, raptara a belíssima princesa Helena, esposa do chefe grego Menelau. Dentre os gregos, destacavam-se o engenhoso Odisseu,
protagonista da Odisseia do poeta grego Homero, e o furioso Aquiles, tema do outro poema épico homérico, a Ilíada. Também durante a
Guerra de Troia, encontramos o ardil do cavalo de madeira cheio de soldados, o famoso “presente de grego”.
Os destinos e os deuses então guiam Enéias por terras distantes, até que ele
chega na foz do Rio Tibre, por volta do século VIII a.C., perto das famosas sete
colinas que hoje ficam em Roma. Lá, seu filho Ascânio dá origem a uma linhagem
de reis que misturam sua ascendência com as dos povos locais, que incluíam
etruscos, faliscos, oscos, sabinos, entre outros, e que, com seus descendentes
Rômulo e Remo, fundam a cidade de Roma.
Assim, se falamos português hoje, é porque a região onde hoje fica Portugal
fez parte desse processo de recepção da cultura dos conquistadores romanos, e a
língua latina lá falada foi aos poucos se diferenciando do latim falado pelas outras
regiões, até que já não fosse a mesma língua. Somos, de certa forma, herdeiros
1 Tradução de Carlos Alberto Nunes para os versos 847 a 853 do Livro VI da Eneida. Em latim: Excudent alii spirantia mollius aera, / credo equidem,
vivos ducent de marmore voltus, / orabunt causas melius, caelique meatus / describent radio, et surgentia sidera dicent: / tu regere imperio populos,
Romane, memento; / hae tibi erunt artes; pacisque imponere morem, / parcere subiectis, et debellare superbos.
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História do latim e as línguas neolatinas
linguísticos da empreitada do mítico Enéias e, por isso, é muito importante
aprendermos ao menos um pouco dessa língua que constitui um dos pilares
fundamentais da cultura ocidental.
A hipótese do indo-europeu
Ao longo principalmente do século XVIII, estudiosos europeus interessados em
várias línguas e culturas começaram a perceber similaridades muito claras entre
palavras de línguas que já se sabia serem aparentadas, como o grego e o latim, e
línguas de regiões muito afastadas da Europa Ocidental, como o sânscrito, língua
sagrada da antiga civilização dos vedas, da Índia. Perplexos, os pesquisadores
começaram a perceber relações entre essas línguas e a maioria das línguas faladas
na Europa, e foram mapeando semelhanças que levaram à hipótese de que todas
essas línguas teriam derivado de algum ancestral comum. Em 1786, sir William
Jones, magistrado do Império Britânico que fora enviado para a Índia, pronunciou
em um discurso na Sociedade Asiática aquilo que seria o pontapé inicial da ciência
linguística que viria a se desenvolver ao longo do século XIX: a linguística histórico-
comparativa. Eis o famoso trecho do discurso:
O sânscrito, sem levar em conta a sua antiguidade, possui uma estrutura maravilhosa: é mais
perfeito que o grego, mais rico que o latim e mais extraordinariamente refinado que ambos.
Mantém, todavia, com essas duas línguas tão grande afinidade, tanto nas raízes verbais quanto
nas formas gramaticais, que não é possível tratar-se do produto do acaso. É tão forte essa
afinidade que qualquer filólogo que examine o sânscrito, o grego e o latim não pode deixar de
acreditar que os três provieram de uma fonte comum, a qual talvez já não exista. Razão idêntica,
embora menos evidente, há para supor que o gótico e o celta tiveram a mesma origem que o
sânscrito. (ROBINS, 1983, p. 107)
2 Chamam-se protolínguas as línguas originárias de todo um ramo de uma família linguística ou da família inteira. Assim, a família das línguas indo-
europeias tem a sua protolíngua, o indo-europeu, enquanto que dentro dessa família várias outras são protolínguas, como o protogermânico, o
protoeslavo e assim por diante.
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História do latim e as línguas neolatinas
sociedade patriarcal) por diversas regiões em ondas migratórias que deixaram o
grupo original fragmentado em grupos menores, sem contato uns com os outros.
Assim, as regiões que, em períodos e locais diferentes, receberam grupos de
nômades indo-europeus, desenvolveram seus dialetos de maneiras diferentes,
gerando ramos dialetais que foram se diferenciando e formando línguas distintas.
Dessa forma, temos o ramo indo-iraniano, do qual fazem parte línguas como o
persa, o sânscrito e o bengalês; o ramo eslávico, do qual fazem parte línguas como
o russo, o búlgaro, o servo-croata, o polonês; o ramo germânico, do qual fazem
parte línguas como o alemão, o inglês, o islandês, o norueguês, o holandês; o ramo
helênico, do qual fazem parte, entre outras, o grego antigo e o grego moderno; o
ramo céltico, do qual fazem parte línguas como o gaulês, o gaélico escocês e
irlandês, o galês, entre outras; o ramo anatólico, do qual fazem parte línguas de
locais bastante distantes da Europa, como o tocário, falado numa região da Ásia
Central, hoje pertencente à China, e, por fim, o ramo itálico, do qual fazem parte
o latim, o osco e o umbro, por exemplo.
Ê -E Ê Ê
Ger
Assim como nos outros ramos, línguas mais antigas deram origens a línguas
mais novas com base em processos de dialetação semelhantes aos que levaram o
protoindo-europeu a vários lugares diferentes e que o transformaram em várias
línguas diferentes. Do mesmo modo que do gótico antigo nós temos hoje o
alemão e o inglês modernos, do latim antigo nós temos hoje um sub-ramo,
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História do latim e as línguas neolatinas
chamado de ramo das línguas neolatinas ou românicas, composto por línguas
como o português, o francês, o italiano, o espanhol, entre outras.
Latim arcaico
Supõe-se que o latim tenha sido falado na região do Lácio por volta do século
XI a.C., mas os primeiros registros da língua escrita encontrados datam do século
VII ou VI a.C. Mais tarde, por volta do século III a.C., começam a ser produzidos
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História do latim e as línguas neolatinas
textos literários em latim, em grande parte por meio de um processo de
assimilação da cultura e literatura gregas do período.
Latim clássico
Convencionou-se chamar de latim clássico o estilo literário da língua ao longo
do primeiro século a.C. até o início do primeiro século da era cristã. São desse
período a prosa elaborada do político, filósofo e orador Cícero, a poesia lírica e a
épica nacional de Virgílio, com As Bucólicas e a sua Eneida, e a lírica amorosa de
Catulo, Propércio, Tibulo, Horácio e Ovídio. Em geral, o latim que ensinamos hoje
em dia é a língua literária desse período, tanto por causa da beleza do estilo
cuidadosamente trabalhado desses autores quanto pelo fato de que grande parte
do corpus mais substancial dos textos clássicos é literário, o que nos deixou sem
muito acesso aos outros registros linguísticos do período.
3 A Comédia Nova grega surge no período da virada do século IV para o III a.C., e baseia-se em tramas familiares, convencionais, com personagens
caricaturais, como o velho imbecil, seu filho sem responsabilidades e, em geral, apaixonado por uma moça que não pode se casar com ele, o escravo
sagaz do velho que ajuda o filho em suas desventuras etc. O principal autor grego dessa tradição é Menandro.
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História do latim e as línguas neolatinas
Latim culto
O latim culto era a variedade falada pela classe culta de Roma. Esse dialeto era
a base do latim clássico, a variante literária. O latim culto deveria ser muito mais
rígido quanto às normas gramaticais que estudamos hoje como sendo a gramática
do latim, mas certamente muito menos estilizado que a língua literária, o
chamado latim clássico. Documentos escritos nessa variedade linguística são
menos comuns, mas é possível encontrar esse tipo de registro, por exemplo, em
cartas de autores antigos, como as de Cícero para seu irmão ou as de Sêneca para
sua mãe, nas quais a estilização e o trabalho estético consciente com a linguagem
são menos intensos, ainda que presentes.
Latim vulgar
A variedade do latim chamada de latim vulgar é a língua das massas, dos
analfabetos, do povo em geral. Os registros dessa língua são mais difíceis de se
encontrar, mas dão testemunhos muito interessantes da evolução do latim. As
inscrições encontradas em muros, em banheiros públicos, e até mesmo em obras
literárias que tentavam retratar a variedade linguística (como o romance chamado
Satyricon, de Petrônio, autor do século I d.C., que apresenta longas passagens que
tentam representar a língua do povo de Roma) nos mostram uma língua viva,
muito frequentemente aberta às mudanças que ocorrem naturalmente nas
línguas.
4 De onde vem, por exemplo, “auricular” em português? Essa é uma palavra que foi emprestada do latim muito tempo depois de a forma “orelha” já
estar em uso pelos falantes de português. Esse tipo de empréstimo é considerado “erudito”, pois os falantes voltam ao latim para recuperar formas
que, quando depois acolhidas pela língua, vivem lado a lado com as formas populares que já existiam. Os exemplos são muitos, como a forma popular
“maduro” e a forma erudita “maturidade”, vindos do latim maturus, a forma popular “pai” e as formas eruditas como “patronímico”, ambos do latim
pater, patris.
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História do latim e as línguas neolatinas
a passagem do latim para o português, vemos que é sistemática e regular essa
mesma mudança de ditongos a vogais plenas, essas quedas de vogais, e, além
disso, vemos que frequentemente formas como -cla resultam em “-lha” e que
vogais como i podem se “transformar” em e. Assim, “orelha” em português
descende diretamente de auris ou de oricla? Parece claro que, ao menos nesse
caso, a instrução do Appendix não funcionou, pois, mais de 20 séculos depois,
sobrevive a forma “errada”! Curiosamente, como vimos, oricla já era uma forma
diminutiva, então, etimologicamente, quando dizemos “orelha”, remetemo-nos
historicamente ao jeito de dizer “orelhinha” em latim.
Latim tardio
Após o período do latim clássico, o latim continuou sendo usado como língua
do Império Romano, que cresceu cada vez mais e, posteriormente, o latim tornou-
se a língua oficial da Igreja Católica ocidental. Assim, ao longo de muitos séculos,
o latim foi usado como língua universal para relações internacionais, para
administração do Império e da Igreja e, ao longo da Antiguidade e da Idade Média,
tudo que fosse importante era escrito em latim. Aos poucos, as comunidades
foram desenvolvendo seus dialetos de forma que se afastassem mais e mais do
latim, dando origem a línguas diferentes. Mas a língua escrita continuava a seguir,
na medida do possível, os padrões do latim culto, de forma que temos muito
material escrito em latim “culto” por falantes nativos de outras línguas ou de
outras variedades do latim. Como exemplo, temos desde a tradução latina dos
textos bíblicos, a Vulgata, vertida por São Jerônimo para o latim nos fins do século
IV, até os documentos portugueses de administração e legislação do século XI,
passando pela filosofia medieval e renascentista. Encontramos, escritas em latim,
até mesmo teses e monografias de universidades no século XX, como a
monografia de Karl Marx sobre a filosofia do grego Epicuro.
É evidente que o latim, ao longo de tantos séculos de usos tão variados, foi
sofrendo alterações substanciais, de forma que as variedades linguísticas
resultantes foram se tornando incompreensíveis entre si, resultando, no curso dos
séculos, em línguas diferentes, as chamadas línguas românicas.
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História do latim e as línguas neolatinas
Como sabemos, além do latim, que foi a língua de um dos maiores impérios
que o mundo já viu durante tantos séculos e da administração religiosa, da
produção científica e filosófica de grande parte da Europa por tanto tempo, as
línguas diretamente derivadas dele também encontraram seu caminho ao redor
do mundo. O português, como sabemos, é falado não só no Brasil e em Portugal,
mas também em Angola, Cabo Verde, Macau, Moçambique, Guiné-Bissau, Timor
Leste, São Tomé e Príncipe, entre outros países asiáticos e africanos pelos quais
os portugueses passaram nos séculos XV e XVI, quando navegaram ao redor do
mundo. Os espanhóis, de modo similar, levaram seu idioma a grande parte das
Américas, o que explica o nome América Latina. O francês, também falado no
Canadá, Suíça, Luxemburgo, Congo, Haiti, Senegal e em vários outros países, ajuda
a dar uma ideia da importância das línguas românicas ou neolatinas ao redor do
globo.
Além disso, mas não somente por esse fato, grande parte do vocabulário do
inglês (que, embora seja uma língua indo-europeia, faz parte de outro ramo, o das
línguas germânicas) é de origem latina, via empréstimos do francês, ocorridos
durante o período em que a Inglaterra foi dominada pelos Normandos, por volta
dos séculos XI e XII. Assim, a expansão de um vocabulário de origem latina ao
longo das línguas mais importantes do mundo na atualidade faz com que grande
parte do núcleo comum dessas línguas seja aparentado, facilitando a nós, falantes
de uma língua latina, o reconhecimento de muitas palavras das outras línguas
europeias importantes.
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História do latim e as línguas neolatinas
A latinização
Tendo sido exposta a importância das línguas neolatinas no contexto mundial,
passemos ao estudo de como o latim veio a se transformar nessas outras línguas.
Esse processo não é nada simples. Por exemplo, embora o latim tenha sido
usado nas Ilhas Britânicas, uma das últimas províncias a serem conquistadas (o
que se deu por volta do século I d.C.) ao longo do período de queda do Império
Romano5, as províncias mais afastadas e aquelas onde havia menor centralização
do poder e unidade cultural não mantiveram o latim como língua “oficial”. Isso
explica porque territórios mais próximos de Roma, como as terras onde hoje
temos França, Espanha, Portugal e Itália, mantiveram-se falando latim, enquanto
províncias como a Bretanha acabaram por continuar a falar as línguas locais, e isso
aconteceu em grande parte do resto da Europa e das outras regiões ao redor do
5 A queda do Império Romano atinge seu ápice quando o Império Romano Ocidental deixa de ter um centro político no século V, em virtude das invasões
bárbaras.
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História do latim e as línguas neolatinas
Mar Mediterrâneo, da Ásia Menor, entre outros. Por isso, os ingleses, os egípcios,
os escandinavos e tantos outros hoje em dia não falam uma língua neolatina.
Nos locais em que a língua latina foi falada por mais tempo, mesmo com o
enfraquecimento e posterior queda do domínio do império, os dialetos foram se
diferenciando cada vez mais dos dialetos das outras regiões falantes do latim. Aos
poucos, falantes do latim da Ibéria já não conseguiam entender plenamente
falantes da península Itálica, por exemplo.
Latim unus duo tres quattuor quinque sex septem octo novem decem
Espanhol uno dos tres cuatro cinco seis siete ocho nueve diez
Catalão un dos tres quatre cinc sis set vuit nou deu
Galego un dous tres catro cinco seis sete oito nove dez
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História do latim e as línguas neolatinas
Português um dois três quatro cinco seis sete oito nove dez
Francês un deux trois quatre cinq six sept huit neuf dix
Italiano uno due tre quattro cinque sei sette otto nove dieci
Romeno unu doi trei patru cinci şase şapte opt noua˘ zece
Texto complementar
O seguinte texto corresponde a um trecho da Eneida de Virgílio, na tradução
do paraense Carlos Alberto Nunes. O trecho conta o início da história do Cavalo
de Troia, e consiste no início do Canto II do poema. Nele, o protagonista Enéias
narra à sua amante, Dido, a rainha de Cartago, como foi esse episódio da Guerra
de Troia, na qual ele lutou e da qual ele saiu como sobrevivente e com a missão
de encontrar a terra prometida, a Nova Troia, que viria a ser Roma.
Prontos à escuta calaram-se todos, dispostos a ouvi-lo.
O pai Enéias, então, exordiou do seu leito elevado: Mandas,
rainha, contar-te o sofrer indizível dos nossos, como os
aquivos1 a grande potência dos teucros2 destruíram,
reino infeliz, espantosa catástrofe que eu vi de perto, e de que
fui grande parte. Quem fora capaz de conter-se sem chorar
muito, mirmídone ou dólope ou cabo de Aquiles? A úmida noite
do céu já descamba, e as estrelas, caindo devagarinho no
poente, os mortais ao repouso convidam. Mas, se realmente
desejas ouvir esses tristes eventos, breve relato do lance
postremo3 da Guerra de Troia, bem que a lembrança de tantos
horrores me deixe angustiado, principiarei. – Pela guerra
alquebrados, dos Fados4 repulsos em tantos anos corridos, os
cabos de guerra da Grécia com a ajuda da arte de Palas5
construíram na praia um cavalo alto como uma montanha, de
bojo com tábuas de abeto.
1 Gregos.
2 Troianos.
3 Último.
4 Os Fados são os destinos, os desígnios que fogem até mesmo à vontade dos deuses.
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História do latim e as línguas neolatinas
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História do latim e as línguas neolatinas
com o ferro, então, deixaríamos frustra a malícia dos
gregos, e em pé, ó Troia, estarias, o paço luxuoso de
Príamo.
(Eneida, II, 1-56)
Dicas de estudo
Sugerimos dois filmes e uma série que tratam da cultura romana e que nos
ajudam a visualizar a vida cotidiana dos povos antigos, além de nos dar
informações importantes sobre os costumes das pessoas daquela época:
Atividades
1. Analise as indicações do Appendix Probi abaixo e discuta em que medida ainda
hoje cometemos os mesmos “erros” e por quê. a) umbilicus non imbilicus.
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História do latim e as línguas neolatinas
26
Introdução à fonética do latim
Como não há mais falantes nativos de latim na atualidade, grande parte do
conhecimento que temos sobre a fonética latina se deve ao que
nos deixaram os antigos gramáticos e a estudos baseados em
textos tais como inscrições populares, comédias e poemas.
Por volta do século VIII a. C., o alfabeto latino primitivo contava com 21
letras, semelhantes às maiúsculas em português A, B, C, D, E, F, G, H, I, K, L,
M, N, O, P, Q, R, S, T, V e X. As letras Y e Z foram incorporadas ao alfabeto no
período clássico, a fim de facilitar as transcrições de nomes estrangeiros,
principalmente gregos.
Como auxílio didático, usam-se dois sinais gráficos para indicar a quantidade
vocálica/silábica: a braquia ( ˘ ) e o mácron ( ˉ ). A braquia indica que a vogal
é breve, enquanto o mácron indica que a vogal é longa. Essas marcas gráficas
não existiam no período clássico e nem são usadas normalmente na escrita
da língua latina. Elas são usadas tão somente em dicionários, gramáticas e
livros didáticos, ou em estudos em que a marcação da quantidade das sílabas
é essencial.
No entanto, mais importante para nós do que pronúncia das vogais longas e
breves é a tonicidade da sílaba, isto é, ler as palavras latinas com a
acentuação correta. Para tanto, observe as seguintes regras:
25
que, como vimos, marcam graficamente a quantidade silábica, são
recursos facilitadores para sabermos se o acento recai sobre a
penúltima ou antepenúltima sílaba. Se a vogal da penúltima sílaba é
breve, o acento recai na sílaba anterior. Se a vogal da penúltima sílaba
apresentar um mácron ( ˉ ), significa que aquela vogal é a longa e,
portanto, estando na penúltima sílaba, faz com que essa seja a tônica.
a) São longas as sílabas que contêm ditongo – ae, au, ei, eu, oe, ui;
Pronúncias
A questão da pronúncia do latim é sempre marcada por muitas variações e
debates. Para fins de simplificação, explicaremos aqui apenas três
pronúncias do latim: a tradicional portuguesa, a eclesiástica ou italiana e a
reconstituída ou clássica.
27
A pronúncia eclesiástica romana é a adotada pela Igreja Católica, por
recomendação do papa Pio X (In liturgico castu). Nasceu da necessidade de
haver uma pronúncia única para ser utilizada na evangelização e nas
comunicações da igreja. Nela, o latim é lido com várias características
comuns à da pronúncia do italiano.
• As consoantes B, F, e P são
pronunciadas como em português.
• As consoantes T e D, quando
acompanhadas da vogal I, não são
pronunciadas /ci/ ou /tchi/ e /dji/, mas /ti/ e /di/, dentais;
quando acompanhadas das outras vogais, soam como em
português.
29
• As letras M e N não anasalam a
vogal precedente, mas articulam-se
distintamente. A palavra rosam, por exemplo, lê-se “rossa-
m”. Esta é uma característica que a língua italiana manteve: a não
nasalação das vogais.
Sugestão de atividade:
Em pares, os alunos leem os pequenos diálogos abaixo, com bastante
atenção à pronúncia. Depois, leem-se os diálogos em voz alta, para toda a
turma. Por fim, os alunos devem criar seus próprios diálogos, acrescentando
suas próprias informações:
Julia, Livia
Petrus, Marcus
A – Hui, Petre!
B – Salve, Marce! Quid novi?
A – Nihil novi. Ut vales?
B – Bene valeo! Et familia tua?
A – Omnes bene se habent, gratias!
B – Quo agis?
A – Ad bibliothēcam! Vale!
B – Bene valeas!
31
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Bellum Troiānum
Entre a história e o mito, a Guerra de Troia, contada nos poemas épicos de Homero – Ilíada
e Odisseia –, foi por muito tempo vista pelos gregos como um fato histórico, mas referida
como lenda por historiadores até o século XIX. Porém descobertas arqueológicas começaram
a suscitar discussões entre estudiosos sobre a historicidade da guerra.
Lectio Prima
EQUUS TROIĀNUS
Priamus rex Troiānus est. Paris princeps Troiānus est. Paris Helĕnam, Graecam regīnam,
surripuit. Itaque Troiāni et Graeci pugnant. Tum Graeci insidias parant. Graeci equum
aedificant et relinquunt ad Troiae portas. Troiāni gaudent quia Graeci discēdunt.
GLOSSARIUM
ad Troiae portas – junto aos portões de Troia
aedifico, ās, āre, āvi, ātum* – construir, edificar, criar
discēdo, is, ere, cessi, cessum* – afastar-se, retirar-se, sair, partir
equus, equi* m. – cavalo et* – conj. e
gaudeo, ēs, ēre, gavīsus sum* – alegrar-se, ficar feliz, comemorar
Graecus, a, um* – adj. grego, grega
Hĕlĕna, Hĕlĕnae f. – Helena insidia, insidiae f. – laço,
emboscada, armadilha, ardil, perfídia, traição
itaque* – conj. por isso, assim (ideia de
consequência); assim, por exemplo
paro, as , āre, āvi, ātum* – preparar, fazer preparativos, arranjar,
aparelhar, dispor, alcançar, aprontar Paris, Paridis m. –
Páris
Priamus, Priami m. – Príamo princeps,
principis* m. – príncipe
pugno, as, āre, āvi, ātum* – lutar, batalhar, guerrear, fazer a guerra
quia* – conj. porque
regīna, regīnae* f. – rainha
relīnquo, is, ere, līqui, līctum* – deixar para trás, abandonar, esquecer,
deixar
rex, rēgis* m. – rei
sum, es, esse, fui* – ser, estar, haver, existir (est – é)
surripio, is, ere, ripui, rēptum* – furtar, roubar, raptar
(surripuit – raptou)
timeo, ēs, ēre, timui* – temer, ter medo de Troiānus, a,
um* – adj. troiano, troiana tum* – adv. então, naquele
tempo (ideia de
tempo); além disso, então
36
Bellum Troiānum
Respōnde Latīne
Respōnde Lusitānice
Exercitia:
Complete as frases:
1. Helena est...
2. Priamus est...
3. Paris est...
4. Equus est...
5. Troiāni sunt...
6. Graeci sunt...
7. Princeps est...
8. Rex est...
9. Regina est...
10. Ego sum...
11. Tu es...
12. Nos sumus...
37
Bellum Troiānum
ODISSEIA E ILÍADA:
A EPOPEIA E O INÍCIO DA LITERATURA OCIDENTAL
Parte dos eventos da Guerra de Troia é contada na Ilíada, de Homero. Sua outra obra poética,
a Odisseia, conta o retorno do guerreiro Ulisses (em grego, Odisseu) e seus soldados à ilha
de Ítaca.
Muitos consideram que a tradição literária ocidental começou com essas duas epopeias,
atribuídas a Homero, que teria vivido por volta do século VIII a.C., na Jônia. Mais
recentemente, entretanto, acredita-se no caráter lendário de Homero e que ele, em
verdade, seria uma figura representante de vários poetas que foram construindo os textos
oralmente, até a posterior fixação dos mesmos, no século VI a.C. Seja como for, as duas obras
são os documentos literários gregos mais antigos de que se tem notícia e o marco fundador
da literatura ocidental.
O CAVALO DE TROIA
O cavalo de madeira responsável pelo fim da disputa entre gregos e troianos, segundo a obra
poética de Homero, foi uma invenção de Ulisses executada por Epeu. Os gregos fingem
preparativos para abandonar a região periférica de Troia, onde há dez anos fazem um cerco.
Constroem, então, um imenso cavalo em madeira e, fingindo ser um sacrifício oferecido a
Minerva, abandonam-no às portas da cidada troiana. Os troianos, acreditando na partida
definitiva do povo grego, abrem as portas da cidade e encontram o cavalo. Depois de muito
especularem a respeito do inusitado presente, levam-no para o interior de Troia. O fim da
cidade se dá à noite, quando os gregos saem do cavalo, abrem as portas para os seus
companheiros entrarem, atacam e incendeiam Troia.
PRESENTE DE GREGO
43
Uma terceira epopeia, essa escrita por volta do ano 20 a.C., conta parte da história da Guerra
de Troia, mas sob outro ponto de vista. Na Eneida, escrita pelo romano Vergílio, conta-se
como um grupo de troianos, liderados pelo
Lectio Prima
príncipe Eneias, conseguiu fugir da destruição de Troia e partiu por mar, em busca de uma
nova terra, onde seria fundada uma nova cidade, tão bela e imponente quanto Troia. Após
uma série de aventuras, no mar e em locais em que eles aportam, os troianos chegam à
Itália, onde os descendentes de Eneias fundarão Roma, a nova Troia.
No Canto II, quando Eneias conta à rainha Dido os tristes momentos de sua partida de Troia,
ele narra o episódio do cavalo e como Laocoonte fora o único a desconfiar do estratagema
grego. Eis o trecho, em tradução poética de Odorico Mendes e em tradução mais recente,
porém em prosa, de Tassilo Orpheu Spalding:
Neste momento, à testa de numerosa multidão que o escoltava, Laocoonte, furioso, acorreu
do alto da cidadela e de longe grita: “Ó infelizes cidadãos, que loucura é a vossa? Acreditais
que o inimigo se retirou? Ou julgais que os presentes dos dânaos carecem de enganos? É
assim que conheceis Ulisses? Ou os aqueus se ocultam encerrados neste madeiro, ou esta
máquina foi fabricada contra as nossas muralhas para observar nossas habitações e investir
contra a cidade; ou alguma outra traição nele está oculta; ó teucros, não confieis no cavalo!
Bellum Troiānum
Seja o que for, temo os dânaos, mesmo quando nos trazem presentes.” (Eneida. trad.
Tassilo Orpheu Spalding)
Desse episódio nasceu a expressão “presente de grego”, que usamos até hoje.
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treiNaNdo a ProNÚNCia
MENAECHMI
Os Menecmos é uma peça de teatro escrita nos fins do século II a.C. Ela é simples,
engenhosa e, principalmente, engraçada, como todas as peças de Plauto. Simples em sua
trama; engenhosa em seus efeitos; engraçada, porque desenvolve de maneira superior
tema propício ao riso fácil, mais do que explorado por aqueles que desejam fazer rir, em
todas as épocas e em vários meios: a presença de duas personagens absolutamente
idênticas em um mesmo lugar. No capítulo 7 encontraremos com mais vagar o autor desta
peça; mas, até lá, leremos uma cena a cada lição, como forma de treinar nossa pronúncia
do latim.
DRAMATIS PERSONAE
Um mercador de Siracusa, cidade da Sicília, tinha dois filhos, gêmeos idênticos. Quando as
crianças tinham sete anos de idade, o pai levou um deles, chamado Menecmo, em uma
viagem de negócios a Tarento. No entanto, durante a viagem, o menino se perdeu num
45
grande mercado na cidade. Um comerciante de Epidano que por lá se achava adotou-o e o
fez herdeiro de sua fortuna. O pai, desesperado com a perda do filho, acabou adoecendo e
morreu. Quando a notícia chegou ao ouvido do avô, em Siracusa, este
Lectio Prima
resolveu trocar o nome do neto que restara. Como gostava muito do neto que havia se
perdido, deu ao que ficou em casa, chamado Sósicles, o nome de Menecmo, que era o nome
do outro e, por sinal, o seu também.
Já adulto, Menecmo, morador de Epidano, casou-se com uma mulher muito rica e herdou a
fortuna de seu pai adotivo depois de sua morte. Enquanto isso, Menecmo Sósicles, junto de
seu escravo Messênio, por obra do destino chega a Epidano, depois de muito viajar em busca
de seu irmão.
Após mais uma briga com sua esposa, Menecmo resolve sair e ir à casa da prostituta Erócia.
Leva consigo Vassourinha, seu parasito (indivíduo que não trabalha, habituado a viver à custa
alheia), e a mantilha de sua mulher para dar de presente à amante.
MENAECHMVS Ego istic mihi hodie adparāri iussi apud te convivium. Hoje eu quero que
prepare um banquete para mim aí na sua casa.
MENAECHMVS Ut ego uxōrem, mea volūptas, ubi te aspicio, odi male. Quando te vejo, minha
querida, como odeio a minha esposa!
EROTIVM Interim nequis quin eius aliquid indūtus sies. Quid hoc est? Mesmo assim você não
consegue se livrar do que pertence a ela. O que é isso?
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MENAECHMVS Cape tibi hanc, quando una vivis meis morigera moribus. Pegue-a para você,
porque é a única que dá atenção ao meu prazer.
EROTIVM Hoc animo decet animātos esse amatōres probos. Desta maneira devem
pensar os amantes honestos.
MENAECHMVS Iube igitur tribus nobis apud te prandium accurarier. Nos prodimus ad forum.
Iam hic nos erimus: dum coquētur, interim potabimus.
Enfim, manda que preparem um jantar para nós três na sua casa. Nós dois vamos à praça, mas já
voltamos. Enquanto vocês cozinham, nós vamos beber.
EROTIVM Quando vis veni, parāta res erit. Venha quando quiser,
tudo estará pronto.
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MENAECHMVS (ad Peniculum) Sequere tu.
Você, me siga.
PENICVLVS Ego hercle vero te et servābo et te sequar, neque hodie ut te perdam, meream
deōrum divitias mihi.
Por Hércules, com certeza hoje eu vou te seguir e te servir, e nem por todas as riquezas dos deuses eu
vou te perder de vista!
6
Latim Genérico | Descobrindo o gênero neutro
Vamos relembrar:
108 CEDERJ
Quadro 6.1: Paradigma da 3ª declinação
Agora, compare:
Por apresentar uma terminação diferente para cada declinação, o genitivo singular é tradicionalmente
utilizado para estabelecer a distinção entre os temas nominais. Como você pode observar, tanto a palavra
mortis quanto a palavra temporis apresentam a terminação -is, própria de palavras da terceira declinação.
Contudo, tal terminação de genitivo singular não é a mesma para todas as declinações: 1ª declinação: -ae;
2ª declinação: -i; 4ª declinação: -us; 5ª declinação: -ei.
Quanto à palavra irreparabile, trata-se de um adjetivo biforme de 2ª classe, já estudado em aulas
anteriores. Este tipo de adjetivo apresenta uma forma correspondente ao masculino e ao feminino e outra
forma correspondente ao neutro. No vocabulário, este adjetivo em nominativo singular aparece da
seguinte maneira:
irreparabilis, -e
(masc./fem.) (neutro)
No verso virgiliano, as duas palavras em destaque pertencem ao gênero neutro do latim. De um modo
geral, uma palavra de gênero neutro se comporta da mesma forma que as outras palavras do mesmo
paradigma fl exional. Deve-se atentar, no entanto, para algumas especifi cidades morfológicas
características dessas palavras. Continuando o estudo sobre a categoria gramatical de gênero no sistema
morfológico latino, nesta aula você vai estudar o gênero neutro e, por conseguinte, vai sistematizar o
quadro dos adjetivos latinos.
O GÊNERO NEUTRO: ASPECTOS CONCEITUAIS E MORFOLÓGICOS
A divisão dos substantivos latinos em três gêneros (masculino, feminino e neutro) não está
relacionada ao que chamamos gênero natural ou biológico, isto é, sexo masculino ou feminino.
Quando abordamos assuntos linguísticos, tratamos de gênero gramatical: algo conceitualmente
arbitrário, e, portanto, imotivado, pautado numa concepção específi ca de mundo. Tomemos como
exemplo a palavra mar: em latim, a palavra mare pertence ao gênero neutro; em francês mer é uma
CEDERJ 109
Latim Genérico | Descobrindo o gênero neutro
palavra feminina; e em português, mar é um substantivo masculino. Desse modo, podemos dizer que
cada língua é constituída por elementos culturais que a particularizam em relação a outras.
Para Saussure, a arbitrariedade do signo linguístico diz respeito ao fato de o signo não ser motivado, isto é, não
haver nenhuma justifi cativa a priori para que um signifi cante (a palavra em si) se una a um signifi cado (o
conteúdo da palavra). Não há uma relação necessária entre ambos.
Podemos dizer que a própria divisão, em latim, nos três gêneros, masculino, feminino e neutro,
confi gura um estado secundário, pois que resulta do desenvolvimento de um estágio inicial, quando
a categoria gramatical de gênero, ainda no indo-europeu, constituía-se com base na oposição entre
os seres animados e os seres inanimados ou coisas. De acordo com Faria (1995):
Assim, a primitiva divisão dos gêneros teria sido esta: os substantivos que designavam os seres
vivos, bem como os adjetivos ou pronomes que a eles se referissem, pertenciam ao gênero
animado, enquanto que os substantivos que designassem coisas, ou os adjetivos ou pronomes
que a eles se referissem, pertenciam ao gênero inanimado. Deste modo, o gênero animado
compreendia sem distinção o masculino e o feminino, enquanto que o inanimado, o neutro (p.
65-66).
É importante que você saiba que o gênero inanimado ou neutro, no latim, não engloba apenas
os nomes de coisas ou de objetos, engloba também alguns nomes de seres vivos: neste caso, o uso
do inanimado privaria estes seres animados de qualquer autonomia jurídica, ou seja, são seres que
não são reconhecidos pela personalidade ativa. Podemos afi rmar, que, de um modo geral, o
inanimado é utilizado para despersonalizar um ser vivo. São exemplos disto o nome do escravo
(mancipium) e o nome da cortesã (scortum).
A palavra latina mancipium é formada pelo substantivo da 4ª declinação manus (mão), seguida do verbo latino
capio (infi nitivo: capere – tomar, apanhar). Como você pode notar, por meio de estudos da fi losofi a da
linguagem, tal palavra demonstra um componente sociocultural do povo romano: escravo era aquele que tinha
as suas mãos tomadas por alguém. Metaforicamente, não ter as mãos signifi ca não ter poder nenhum, não ter
autonomia, ser, portanto, propriedade de alguém.
110 CEDERJ
O gênero neutro, morfologicamente, caracteriza-se pela ausência de desinência para o
nominativo-vocativo singular na 2ª declinação e para o nominativo-vocativo-acusativo singular nas 3ª
e 4ª declinações. Esse fato está estritamente ligado à noção de que os seres do gênero neutro não
têm autonomia, não podem ser agentes. Ora, o nominativo é o caso funcional próprio do agente, em
oposição ao acusativo, que é o caso funcional característico do paciente. Assim, nós temos o esquema:
A 2ª declinação
– templum, -i:
A 3ª declinação
CEDERJ 111
Latim Genérico | Descobrindo o gênero neutro
– animal, -is:
– calcar, -is:
Observação:
Os neutros sonânticos têm o tema terminado em -i, como os masculinos e os femininos já
estudados na Aula 4. Apresentam, no nominativo-vocativo-acusativo singular, a desinência zero.
Contudo este -i, em fi nal de palavra, evolve para -e, por isso a forma mare. Quando precedida, porém,
de -l ou de -r, como nos sufi xos -ali- ou -ari-, costumava sofrer apócope, isto é, desaparecia, donde
as formas animal e calcar. Note-se que o -i se mantém no nominativo-vocativo-acusativo plural antes
da desinência -a.
112 CEDERJ
b) Os consonânticos: – caput, -pitis:
– nomen, -inis:
– corpus, -oris:
– cor, cordis:
CEDERJ 113
Latim Genérico | Descobrindo o gênero neutro
Observação:
Os neutros de tema consonântico do tipo caput e nomen apresentam, nos casos ablativo,
genitivo e dativo, a apofonia (mudança de timbre) da vogal breve do tema: -u > -i; -e > -i.
A 4ª declinação
– genu, -us:
114 CEDERJ
Fatos da Língua | Lectio Quarta - Reges Romāni
Lectio Quarta
Reges Romani
Fatos da língua I:
O GêNERO NEUTRO
Não há, em latim, nomes neutros de tema -A; ou seja, não há nomes neutros com
nominativo singular em -A, acusativo em -AM, ablativo em -Ā. Não há, portanto, como
confundir um nome neutro com um de primeira declinação.
Há, contudo, vários nomes neutros de tema -O e que fazem o nominativo e o acusativo
singular em -UM e o ablativo em -Ō, como bellum; há ainda nomes neutros do terceiro grupo,
de tema -I ou atemáticos. Todos esses terão
227
Exemplos:
SINGULAR PLURAL
Nom Acus Abl Nom Acus Abl
bellum bellum bellō bella bella bellīs
oppidum oppidum oppidō oppida oppida oppidīs
fulmen fulmen fulminĕ fulmina fulmina fulminibus
animal animal animali animalia animalia animalibus
Há, todavia, uma diferença no ablativo singular, apenas nos nomes neutros de tema em -i,
como você pode observar no quadro acima.
Até aqui, tínhamos visto que há na terceira declinação palavras de tema -I e palavras
atemáticas ou consonantais. Não havíamos, porém, aprendido a diferenciá-las, porque o
tema da palavra não implicava diferença na desinência casual. No entanto, há uma diferença
na desinência casual de ablativo singular entre as palavras neutras de tema em -i e as
atemáticas.
Os neutros de tema -I têm desinência de ablativo singular -I, como na palavra animal no
quadro acima.
Os neutros atemáticos têm desinência de ablativo singular -E, como na palavra fulmen no
quadro acima.
Como, entretanto, saber se uma palavra neutra de terceira declinação é de tema -i ou
atemática, se o genitivo singular de ambas será o mesmo? É fácil. Os neutros temáticos (ou
seja, de vogal temática -I) sempre têm nominativo singular terminado em -AR, -E ou -AL.
Assim, por exemplo, a palavra calcar, calcaris – substantivo neutro é certamente uma palavra
temática. Já a palavra corpus, corporis – substantivo neutro
228
é um neutro atemático, pois seu nominativo não termina em -AR, -E ou -AL e, portanto, faz
o ablativo singular em -E, como todos os demais substantivos de terceira declinação.
templum, templi –
sacrum, sacri –
incendium, incendii –
imperium, imperii –
nomen, nominis –
flumen, fluminis –
mare, maris –
verbum, verbi –
Observe, porém, que vimos aqui a distinção entre temáticos e atemáticos de terceira
declinação apenas no que tange às palavras neutras. Falaremos dos masculinos e femininos
em ocasião futura.
229
Deus an dei
São Jerônimo
No século IV da nossa era, o grego, língua em que estavam escritos vários textos
fundamentais para a religião cristã, era dificilmente compreendido pelos adeptos da nova
religião, a não ser para uma minoria culta. Consciente dessa dificuldade da maioria dos
cristãos frente aos escritos sagrados da religião, o Papa Dâmaso delegou a São Jerônimo
(347-420) a tarefa de traduzir satisfatoriamente para o latim, a partir do hebraico, do
aramaico e do grego, todo o Antigo e o Novo Testamento, empresa que durou mais de quinze
anos. Não foi essa a primeira tentativa de tradução dos textos sagrados cristãos: por cerca
de duzentos e cinquenta anos, outras versões, realizadas por diversas pessoas e
coletivamente chamadas de bíblia latina ou ítala, mas a tradução de Jerônimo passou a ser
a versão oficial.
SECUNDUM MATTHAEUM
145
GLOSSARIUM
adimpleo, es, ere, evi, etum – encher, aumentar, satisfazer aperio,
is, ire, ui, ertum* – abrir, descobrir, oferecer, dar beatus, a, um*
– adj. feliz, ditoso, bem-aventurado
consolo, as, are, avi, atum – consolar copiosus, a, um* – adj.
abundante, numeroso, copioso, eloquente
esurio, is, ire, iui ou ii, itum* – ter fome, ter apetite, cobiçar euanesco,
is, ere, uanui* – desaparecer, dissipar-se, desvanecer-se exulto, as,
are, avi, atum – exultar, ensoberbecer-se iustitia, iustitiae* f. –
justiça
lugeo, es, ere, luxi, luctum – chorar, lamentar-se, estar de luto lux,
lucis* f. – luz, brilho, claridade
maledico, is, ere, xi, ctum – amaldiçoar, dizer mal de, injuriar
mentior, iris, iri, itus sum – mentir, fingir, enganar, inventar
merces, mercedis f. – graça, mercê, salário, paga mitis, e
– adj. tenro, doce, brando, maduro
os, oris* n. – boca, palavra, voz; rosto, face, feição
pacificus, a, um – adj. pacífico pauper,
eris* – adj. pobre
146
PERVIGILIUM VENERIS
vivificante do universo, a deusa da fertilidade e a responsável por dar a cada criatura seu par.
No poema, todos são convidados a entregarem-se ao amor pelo refrão que se repete em
intervalos ao longo do poema: cras amet qui numquam amavit, quique amavit cras amet.
Não é fácil classificar a que gênero de poesia A vigília de Vênus pertence. Em primeiro lugar,
é claramente poesia acentuada, isto é, não obedece ao esquema de sílabas longas e breves
da poesia latina clássica, mas a um padrão de acentuação regular. Em segundo lugar, sua
temática é leve, natural e destoa dos motivos recorrentes na poesia clássica. No entanto, é
um poema interessante e agradável, representativo do ambiente de mudanças do período
em que foi escrito.
147
Cras amet qui numquam amavit quique amavit cras amet.
GLOSSARIUM
arcus, arcūs m. – arco; objeto em forma de arco; arco-íris;
abóbada
caveō, ēs, ēre, cāvī, cautum* – tomar cuidado, precaver-se, acautelar-se;
velar por, cuidar de
148
Deus an dei
Respōnde Latīne:
149
Plautus
Inicialmente, o teatro romano era parte das atividades religiosas e recebia grande influência
dos etruscos, mas, após o contato com a cultura helênica, passou a utilizar as formas gregas:
a tragédia e a comédia.
A comédia nova é uma modalidade teatral que se desenvolveu na Grécia, cujos principais
representantes eram Menandro, Filemon e Dífilo, e que também inspirou muitos autores
romanos na criação de suas peças. Os assuntos mais comuns desse tipo de comédia eram os
fatos corriqueiros, e as personagens eram dos mais variados tipos: velhos, jovens, escravos,
soldados, prostitutas, deuses.
Dentre os autores romanos que se inspiravam nas obras gregas para escrever suas peças,
destacam-se os comediógrafos Plauto – que você conheceu durante esta Unidade – e
Terêncio. Embora ambos se inspirassem na comédia nova grega. Diferenciavam-se
significativamente no que diz respeito ao estilo: Plauto se destacava pelas cenas exageradas
e engraçadas, pela utilização de expressões burlescas e injuriosas, dando nomes estranhos
e engraçados às personagens e se valendo de trocadilhos maliciosos, muitas vezes
intraduzíveis. Já Terêncio se caracterizava por utilizar uma linguagem mais refinada, de tom
contido, sarcástico, polido e elegante, dando preferência às ações mais tranquilas, em
oposição à exagerada movimentação que se pode facilmente observar em Plauto.
PLAUTO NA POSTERIDADE
Assim como os romanos se inspiraram na comédia nova grega, escritores de outras épocas
recorreram ao teatro e à comédia latina para criarem suas obras. A obra Amphitruo
influenciou diversos autores da posteridade como
153
Lectio Septima
Camões (Auto dos Enfatriões), Molière (Anfitrião), Guilherme Figueiredo (Um deus dormiu lá
em casa) e também Antonio José da Silva, que escreveu a peça Anfitrião ou Júpiter e
Alcmena, uma obra do barroco português. Ariano Suassuna inspirou-se na Aululária para
escrever O Santo e a Porca. Shakespeare inspirou-se na peça Os Menecmos, que vem sendo
usada na seção Treinando a pronúncia, para sua Comédia dos Erros.
Abaixo, um trecho da peça de Camões em que Mercúrio conta seu plano a Júpiter:
154
SÓSIA E ANFITRIÃO
Muitas palavras que utilizamos atualmente foram retiradas de obras literárias ou mitos. Os
escritores e contadores de história estão sempre criando novas expressões que enriquecem
o nosso vocabulário. Também nomes de personagens e lugares podem originar palavras
novas. As palavras anfitrião, que hoje usamos para designar aquele que recebe os visitantes
em sua casa, e sósia, o duplo de outrem, ganharam esse significado por causa do mito de
Anfitrião, tema da peça Amphitruo, de Plauto, que você conheceu no início dessa unidade.
155
Muitos outros escritores foram responsáveis pela criação de inúmeras outras expressões e
palavras,como por estupendo, crepitante e lácteo, que apa-
Lectio Septima
receram pela primeira vez na obra do escritor português Camões. No Brasil, João Guimarães
Rosa, que escreveu o romance Grande Sertão: Veredas, se destaca como criador de muitos
neologismos.
treiNaNdo a ProNÚNCia
Após outra discussão entre Menecmo e a mulher, esta resolve chamar o pai e um médico,
pois crê que o marido tenha ficado louco.
ATO V, CENA V
MEDICVS Quid esse illi morbi, dixeras? Narra, senex. Num larvatust aut cerritus? Fac sciam.
Num eum veternus aut aqua intercus tenet?
Que doença você tinha dito que ele tem? Conta, velho. Está possuído ou enfeitiçado? Faz com que eu
saiba. Acaso ele tem letargia, ou inchaço? SENEX Quin ea te causa duco, ut id dicas mihi atque
illum ut sanum facias. Mas por esta razão fui te buscar,para que me digas isso e para que o cure.
MEDICVS Perfacile id quidem est. Sanum futūrum, mea ego id promitto fide.
Mas isto é muito fácil. Ele ficará são, dou minha palavra.
SENEX Magna cum cura ego illum curāri volo. Quero que ele seja
cuidado com muito cuidado.
MEDICVS Quin suspirābo plus sescenta in diē: ita ego eum cum curā magnā curābo tibi.
Plautus
Pois eu suspirarei por ele mais de seiscentas vezes por dia, tamanho será o cuidado com que cuidarei
dele para ti.
156
SENEX Atque eccum ipsum hominem. Observēmus, quam rem agat. Mas aí vem o homem em
pessoa: observemos o que vai fazer.
157
A estrutura do verbo latino
A estrutura do verbo latino
Características
morfológicas dos verbos
em latim
Os verbos em latim funcionam de maneira bastante parecida com os
verbos em português. Há uma base temática (radical e, às vezes, vogal
temática, como ama- do verbo “amar” em português) que carrega o
significado básico do verbo, a que se seguem uma eventual vogal de ligação,
infixos específicos de tempo, aspecto, modo e voz (como o infixo -va do
imperfeito no português) e as desinências número-pessoais, que carregam
a informação de pessoa (primeira, o locutor, segunda, o interlocutor, ou
terceira, aquele de quem se fala) e de número (singular ou plural); exemplos
de desinências número-pessoais em português seriam -s para a segunda do
singular (“amas”) e -mos para a primeira do plural (“amamos”).
As conjugações
Assim como os nomes latinos sofrem o mecanismo de flexão
morfológica que chamamos de declinação, conjugação é o mecanismo de
flexão morfológica dos verbos, responsável por nos dizer, de cada forma
verbal, a qual número, pessoa, modo, voz, tempo e aspecto o verbo faz
referência. Conheceremos essas categorias gramaticais aos poucos.
Comecemos pela
110
A estrutura do verbo latino
Vejamos uma listagem das conjugações com o verbo básico que usaremos de
exemplo:
6 Daremos aqui a entrada do verbo nas seguintes formas: primeira pessoa do singular do presente do indicativo, segunda pessoa do singular do presente
do indicativo, primeira pessoa do singular do perfeito do indicativo, supino/particípio perfeito e infinitivo presente. Com essas formas, como veremos
adiante, seremos capazes de derivar todas as outras formas possíveis dos verbos latinos. Em geral, os dicionários apresentam os verbos com essas formas
listadas, nessa ordem (eventualmente sem a segunda do singular). Os hífens servem apenas para fins didáticos, eles não são parte das palavras latinas.
7 O -i- aqui é uma vogal breve que serve apenas para ligar o tema consonantal à desinência que o segue.
111
A estrutura do verbo latino
com uma desinência -o que às vezes mascara algumas características dos verbos e,
para conhecermos com toda a certeza a conjugação a que o verbo pertence,
precisaremos conhecer também o infinitivo do referido verbo. Com esses dois
elementos, não restarão dúvidas quanto a que conjugação um verbo pertence.
Vejamos o quadro a seguir, que contém apenas a primeira pessoa do singular do
presente do indicativo e o infinitivo presente dos verbos das cinco conjugações.
Primeira conjugação amo amāre amar
Os tempos
O verbo latino flexiona-se em tempo (presente, passado e futuro) e em aspecto
(eventos concluídos ou pontuais, ou seja, perfectivos, e não concluídos ou durativos,
ou seja, imperfectivos). Há uma separação entre formas verbais de aspectos
112
A estrutura do verbo latino
imperfectivos e perfectivos, que resulta em um sistema verbal com os seguintes
tempos principais:
Tempos principais da voz ativa – Tempos principais da voz ativa –
infectum perfectum
Presente amo, amat, amo, ama, (pretérito) amaui, amei,
amamus... amamos Perfeito amauisti... amaste
113
A estrutura do verbo latino
2.ª pessoa do singular -s -ris -isti
As vozes
Diferentemente do português, que constrói a voz passiva sempre com formas
analíticas (particípio mais verbo auxiliar), o latim, em vários tempos, constrói a voz
passiva sinteticamente, ou seja: através de desinências número-pessoais específicas
de voz passiva. Falaremos mais sobre a voz passiva adiante, mas, aproveitando o
quadro de desinências número-pessoais apresentado anteriormente, já é possível
identificar, por exemplo, como seriam construídas as vozes passivas dos tempos
principais:
Tempos principais da voz ativa – Tempos principais da voz passiva –
infectum infectum
114
A estrutura do verbo latino
Presente amo, amo, Presente amor, sou amado, é
ativo amat, ama, passivo amatur, amado, somos
amamus... amamos amamur... amados
Os modos
Há em latim quatro modos: o indicativo, ligado à denotação de eventos tidos como
factuais, “reais”; o subjuntivo, que carrega os significados básicos de irrealidade,
hipótese, desejo; o imperativo, modo responsável pelas ordens; e o infinitivo, a forma
verbal sem tempo nem pessoa. Não haverá espaço para tratarmos dos modos
individualmente, mas na apresentação das conjugações, que iniciaremos a seguir,
haverá a indicação das formas de todos os modos.
Exemplo de primeira conjugação na voz ativa: amo, amas, amāre, amaui, amatum
“amar”.
Presente do Presente do Perfeito do
Perfeito do
indicativo: subjuntivo: subjuntivo9:
indicativo: “amei,
“amo, amas...” amaste...” “ame, ames...” “tenha amado”
9 O perfeito do subjuntivo é um tempo que não apresenta correlação direta com nenhum tempo específico do português, e que, em latim, é usado ou com
um sentido de subjuntivo jussivo/desiderativo aoristo, ou seja, com um tempo indeterminado (algo como: amauerim = “que eu ame!”) ou como tempo
relativo em estruturas de subordinação, como a maioria dos casos de subjuntivo.
115
A estrutura do verbo latino
1.ª pessoa do
singular amo amāui amem amauĕrim
2.ª pessoa do
singular amas amauisti ames amauĕris
3.ª pessoa do
singular amat amāuit amet amauĕrit
1.ª pessoa do
plural amāmus amauĭmus amēmus amauerĭmus
2.ª pessoa do
plural amātis amauistis amētis amauerĭtis
Mais-
queperfeito
Imperfeito do Mais-que-perfeito Imperfeito do
do
indicativo: do indicativo: subjuntivo:
subjuntivo:
“amava, “tinha amado, “amasse, “tivesse
amavas...” amara...” amaria...” amado, teria
amado...”
1.ª pessoa do
singular amābam amauĕram amārem amauissem
2.ª pessoa do
singular amābas amauĕras amāres amauisses
3.ª pessoa do
singular amābat amauĕrat amāret amauisset
Mais-
Imperfeito do Mais-que-perfeito Imperfeito do queperfeito do
indicativo: do indicativo: subjuntivo: subjuntivo:
“amava, ama- “tinha amado, “amasse, ama- “tivesse
ria...” amado,
vas...” amara...”
teria amado...”
1.ª pessoa do
amabāmus amauerāmus amarēmus amauissēmus
plural
2.ª pessoa do
amabātis amauerātis amarētis amauissētis
plural
116
A estrutura do verbo latino
3.ª pessoa do
amābant amauĕrant amārent amauissent
plural
Futuro do Futuro perfeito do Infinitivo
indicativo: indicativo: “te- presente: Imperativo
“amarei, ama- rei amado, terás amāre presente
rás...” amado...” “amar”
Infinitivo ama “ama tu”
1.ª pessoa do perfeito: amāte “amai vós”
amābo amauĕro
singular amauisse “ter
amado”
Infinitivo futuro: Particípio
amaturus, a, um perfeito: amatus,
2.ª pessoa do esse “estar por
amābis amauĕris a, um “amado,
singular amar” aquele que foi
amado”
Particípio
Gerúndio10
3.ª pessoa do presente: amans,
amābit amauĕrit (acusativo):
singular amantis “o que
amandum
ama, amante”
Particípio futuro:
Gerúndio amaturus, a, um
1.ª pessoa do
amabĭmus amauerĭmus (genitivo): “o que está por
plural amandi amar”
Gerundivo:
Gerúndio
2.ª pessoa do amandus, a, um
amabĭtis amauerĭtis (dativo): amando
plural “para ser amado,
“para amar”
a ser amado”
Gerúndio Supino: amatum
3.ª pessoa do (ablativo): “para amar”
amābunt amauĕrint
plural amando “por
amar”
10 O gerúndio nada mais é, em latim, que a forma flexionada do infinitivo nos outros casos (o infinitivo é a forma de “nominativo”, ou seja, é o sujeito de
uma nominalização verbal), por isso a tradução vai depender fortemente do contexto.
117
A estrutura do verbo latino
laboro “trabalhar” loco “colocar, pôr” monstro
118
A estrutura do verbo latino
3.ª pessoa do
habēbat habuĕrat habēret habuisset
singular
119
A estrutura do verbo latino
Mais-que-per- Mais-
feito do queperfeito
Imperfeito do Imperfeito do
indicativo: do
indicativo: subjuntivo:
“tinha tido, subjuntivo:
“tinha, tinhas...” “tivesse, teria...” “tivesse tido,
tivera...”
teria tido...”
1.ª pessoa do
habebāmus habuerāmus haberēmus habuissēmus
plural
2.ª pessoa do
habebātis habuerātis haberētis habuissētis
plural
3.ª pessoa do
habēbant habuĕrant habērent habuissent
plural
Futuro perfeito
Futuro do do indicativo: Infinitivo
Imperativo
indicativo: “terei tido, terás presente: habēre
presente
“terei, terás...” tido...” “ter”
Particípio
Infinitivo futuro: perfeito:
2.ª pessoa do
habēbis habuĕris habiturus, a, um habitus, a, um
singular esse “estar por ter” “tido, aquele
que foi tido”
Particípio
Gerúndio presente:
3.ª pessoa do
habēbit habuĕrit (acusativo): habens,
singular habendum “ter” habentis “o que
tem”
Particípio
futuro:
1.ª pessoa do Gerúndio (genitivo):
habebĭmus habuerĭmus habiturus, a, um
plural habendi “de ter”
“o que está por
ter”
Gerundivo:
2.ª pessoa do Gerúndio (dativo): habendus, a, um
habebĭtis habuerĭtis
plural habendo “para ter” “para ser tido, a
ser tido”
Supino: habitum
3.ª pessoa do Gerúndio (ablativo): “para ter”
habēbunt habuĕrint
plural habendo “por ter”
120
A estrutura do verbo latino
Segue uma lista de verbos comuns da segunda conjugação:
fletus “chorar”
paritus “obedecer”
timui, –, “temer, ter medo de” uideo, uidere, uidi, uisus “ver”
Texto complementar
No Canto IV da Eneida de Virgílio, do qual tiramos o trecho a seguir,
conhecemos a história trágica do amor entre Dido, rainha de Cartago, e Enéias,
sobrevivente troiano que deverá fundar Roma. Dido e Enéias, ambos viúvos, veem-
se reféns de um amor motivado pelos deuses, e o amor de Dido. Ela,
121
A estrutura do verbo latino
Dica de estudo
Consulte em diferentes gramáticas as explicações que os autores dão para o
sistema verbal latino.
122
A estrutura do verbo latino
Atividades
1. Descreva todas as informações possíveis dos verbos a seguir, conforme o exemplo:
a) celaremus:
b) locat:
c) respondi:
d) uidebimus:
e) seduit:
f) mansissem:
123
A estrutura do verbo latino
g) flexeratis:
124