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Vinicius Sassine
Lalo de Almeida relacionadas
Perdas humanas
TEFÉ (AM)O rio Solimões é uma veia central da Amazônia. Carrega ancestralidade, conecta lideram custos
associados à crise do
regiões e países, dá vida a uma infinidade de comunidades tradicionais em suas margens e
clima, mostra
nas margens de afluentes e igarapés. pesquisa
O trecho que banha a Terra Indígena Porto Praia de Baixo, na região de Tefé (AM), virou
deserto. O rio caudaloso, que ditava o ritmo da comunidade, foi substituído por enormes Fumaça em Manaus provoca aumento nos
atendimentos pelo Samu, diz secretaria de
bancos de areia a perder de vista. Saúde
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Rio Solimões sofre com a seca
PLANETA EM TRANSE
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Em 2022, as águas do rio Solimões chegavam à Terra Indígena Porto Praia, na região do Médio Solimões; um ano depois, o
leito está seco - Lalo de Almeida - 13.out.23/Folhapress
O rio secou muito, os bancos de areia são mais extensos, os barcos ancoram cada vez mais
longe, a estiagem já dura mais tempo e a expectativa é de que esse cenário de deserto
continue até novembro.
"A gente tem de tirar esses barcos daqui hoje, senão tudo vai estar atolado amanhã", dizia um
dos indígenas de Porto Praia nesta sexta-feira (13), em relação a cerca de 30 barcos parados
em frente à comunidade. "O rio segue descendo", diz.
RR
AM
Terra Indígena PA
Boará/Boarazinho
Manaus
Tefé
RO
200 km
A Folha esteve pela primeira vez na terra indígena em 23 de agosto de 2022. Era o início da
estiagem, que se mostrou severa no ano passado, mas havia um rio no lugar. "A gente ainda
pescava bem em setembro", relembra um integrante da comunidade. Bancos de areia só se
formaram em outubro daquele ano.
Em 2022, chegar ao território foi simples: 30 minutos de barco de Tefé à escada de acesso à
comunidade. Agora, os barcos só chegam a dois quilômetros da aldeia. É preciso percorrer a
pé a margem enlameada do rio. Outro percurso possível é pelos bancos de areia,
contornando poças de água que resistem à estiagem.
1/8 Seca faz rio Solimões virar deserto e indígenas sofrem com a falta de água
O indígena kokama Sebastião Penha carrega o motor de sua canoa nas costas até a comunidade de Porto Praia, em Tefé
(AM), temendo ação de pir… MAIS
"É tudo muito triste. Não tem como sair para pescar, ou levar nossos produtos para vender
na cidade", afirma o cacique Amilton Braz da Silva Kokama, 52. As mais de 100 famílias do
território produzem principalmente farinha e banana.
Os indígenas improvisam pequenas dragagens, tentando abrir caminho para a água e para os
barcos. Funciona muito pouco. A cada dia, há menos água.
O deserto que se formou é cruzado por quem insiste na pesca num lago após a margem
oposta. Ou por carregadores de produtos da cidade e de motores dos barcos deixados a
quilômetros da comunidade.
O medo é de que os motores sejam roubados por piratas, comuns no médio Solimões. Eles
seguem atuando mesmo na estiagem severa.
A reportagem esteve em Porto Praia em 2022 para uma série sobre terras indígenas não
demarcadas, como é o caso do território.
Membros da guarda indígena patrulham comunidade Porto Praia, localizada às margens do rio Solimões, próximo a Tefé
Lalo de Almeida/Folhapress
"A mortandade de peixes foi enorme, como não ocorreu na seca de 2010", diz o cacique.
"Aqui não ‘fechava’ assim. Ficavam uns poços mais profundos."
Um poço artesiano garante o consumo de água pelas famílias. Porto Praia insiste em
contornar o isolamento: os indígenas tentam acessar lagos para pesca e a cidade de Tefé,
onde vendem seus produtos. O rio segue em vazante, um indicativo de que a seca ainda vai
avançar nesse ponto do Solimões.
Nova Esperança vive um crônico problema de falta d’água. Até um mês atrás, a comunidade
não tinha alternativa senão usar a água barrenta do igarapé. O resultado foi uma "pandemia"
—palavra usada pelo cacique Cláudio Cavalcante, 44— de diarreia, vômito, febre e dor de
estômago, especialmente entre as crianças.
As casas flutuantes do rio Solimões ainda boiavam no ano passado, mas este ano estão encalhadas em frente à cidade de Tefé
- Lalo de Almeida - 12.out.23/Folhapress
A Defesa Civil levou água potável às 17 famílias kokamas de Nova Esperança, mas em
quantidade insuficiente.
Sem água para beber, foi necessário paralisar as aulas das crianças. Nada é mais urgente na
aldeia do que a busca por uma solução para que as famílias tenham água potável durante o
prolongamento da seca.
"A gente sofre com a ‘pandemia’ dessas doenças todo ano. Mas este ano foi pior, já começou
em agosto", diz o cacique. "A gente não consegue tratar a água."
Ribeirinho caminha pelo leito seco do Paraná de Tefé, no Médio Solimões, durante seca extrema que atinge a região…
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