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DEMec

CINEMÁTICA

Marcelo Francisco S. F. de Moura


Carlos A. Magalhães Oliveira

PORTO – 2002
(Revista em 2020)
AGRADECIMENTOS

Para a realização deste trabalho muito contribuíram várias pessoas, às


quais os autores desejam expressar o seu agradecimento.

Uma primeira palavra de apreço para o Professor Vasco Sá, autor da


sebenta anterior, na qual todos nós aprendemos cinemática. A evolução natural
do conteúdo da disciplina e das ferramentas à disposição, justifica a execução
deste novo texto.

Aos colegas que nos últimos anos têm estado ligados à disciplina pelo
empenho e dedicação que têm sido frutuosos, no que concerne a uma melhor
aprendizagem e taxa de aproveitamento por parte dos alunos. Destacaríamos,
neste contexto, os Professores José Chousal, Pedro Reina, José Magalhães e
Pedro Ribeiro.

À Ana Cristina pela excelente colaboração prestada na datilografia do


presente texto.
ÍNDICE

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................1

2 CINEMÁTICA DO PONTO ...............................................................4

2.1 TRAJECTÓRIA E MOVIMENTO ............................................... 4

2.2 MOVIMENTO RECTILÍNEO - Análise escalar ........................... 5


2.2.1 Lei do Movimento ........................................................... 5
2.2.2 Velocidade ..................................................................... 6
2.2.3 Aceleração ..................................................................... 7

2.3 MOVIMENTO CURVILÍNEO- Análise vectorial ......................... 9


2.3.1 Componentes cartesianas .............................................. 9
2.3.1.1 Vector posição ..................................................... 9
2.3.1.2 Vector velocidade .............................................. 11
2.3.1.3 Vector aceleração .............................................. 12
2.3.2 Componentes intrínsecas ou naturais .......................... 14
2.3.2.1 Posição .............................................................. 14
2.3.2.2 Vector velocidade .............................................. 14
2.3.2.3 Vector aceleração .............................................. 15
2.3.3 Coordenadas polares e cilíndricas ................................19
2.3.3.1 Coordenadas polares .........................................19
2.3.3.1.1 Vector posição ..................................... 19
2.3.3.1.2 Vector velocidade ................................ 20
2.3.3.1.3 Vector aceleração ................................ 21
2.3.3.2 Coordenadas cilíndricas .................................... 22
2.3.3.2.1 Vector posição ..................................... 22
2.3.3.2.2 Vector velocidade ................................ 22
2.3.3.2.3 Vector aceleração ................................ 23
2.3.3.2.4 Movimento helicoidal ........................... 23
2.4 MUDANÇAS DE REFERENCIAL .................................... 23

2.5 MOVIMENTO DE ROTAÇÃO .......................................... 27


2.5.1 Velocidade angular ............................................... 27
2.5.2 Vector velocidade angular ou rotação .................. 29
2.5.3 Aceleração angular instantânea ........................... 30
2.5.4 Vector aceleração angular .................................... 31

2.6 SÍNTESE DE 2.1 A 2.5 .................................................... 32

2.7 CONCEITO DE PARÂMETRO E GRAU DE LIBERDADE. 32

2.8 MOVIMENTOS COM MAIS DE UM GRAU DE


LIBERDADE .................................................................... 34
2.8.1 Vector velocidade num referencial fixo ................ 34
2.8.2 Vector velocidade num referencial móvel ............ 36
2.8.3 Vector aceleração ................................................ 41

2.9 SÍNTESE DE 2.7 E 2.8 .................................................... 42

2.10 EXERCÍCIOS PROPOSTOS ......................................... 42

3 CINEMÁTICA DO SÓLIDO ........................................................... 45

3.1 INTRODUÇÃO ................................................................. 45

3.2 MOVIMENTO DE TRANSLACÇÃO ................................. 46

3.3 MOVIMENTO DE ROTAÇÃO .......................................... 48


3.3.1 Vector velocidade ................................................. 49
3.3.2 Vector aceleração ................................................. 50

3.4 MOVIMENTO GERAL DE UM SÓLIDO .......................... 51


3.4.1 Vector velocidade ................................................. 52
3.4.1.1 Propriedade projectiva ............................ 54
3.4.2 Vector aceleração ................................................. 56

3.5 MOVIMENTOS PARTICULARES DOS SÓLIDOS .......... 59


3.5.1 Movimento plano .................................................. 59
3.5.1.1 Métodos para a obtenção do CIR ........... 60
3.5.1.1.1 Método da perpendicularidade .. 60
3.5.1.1.2 Método da proporcionalidade ... 62
3.5.2 Movimento polar ................................................... 63
3.5.3 Movimento helicoidal ............................................ 63

3.6 SÍNTESE DO CAPÍTULO 3 ..................................................... 65

3.7 EXERCÍCIOS PROPOSTOS ................................................... 68

4 TEORIA DE MOVIMENTOS RELATIVOS .................................... 69

4.1 INTRODUÇÃO ................................................................. 69

4.2 VELOCIDADES ............................................................... 72


4.2.1 Campo de velocidades ......................................... 72
4.2.2 Determinação dos CIR pela propriedade
do alinhamento ................................................... 75

4.3 ACELERAÇÕES .............................................................. 78

4.4 PARALELISMO ENTRE A TMR E A TEORIA DAS


DERIVADAS RELATIVAS ............................................. 80

4.5 SÍNTESE DO CAPÍTULO 4 ............................................. 83

4.6 EXERCÍCIOS PROPOSTOS ........................................... 84


5 CINEMÁTICA DOS SÓLIDOS EM CONTACTO PERMANENTE 85

5.1 INTRODUÇÃO ................................................................ 85

5.2 IMPORTÂNCIA DO ROLAMENTO E


ESCORREGAMENTO .................................................. 85

5.3 SÓLIDOS EM CONTACTO PONTUAL ........................... 86


5.3.1 Movimento de permutação .................................. 86
5.3.2 Velocidade de escorregamento ........................... 88
5.3.3 Especifidades do torsor gerador do movimento
relativo 2/1 no ponto de contacto ........................ 89
5.3.4 Escorregamento puro ........................................... 91
5.3.5 Rolamento puro – sólidos em movimento plano ... 91
5.3.5.1 Definição matemática da base
e da rolante .............................................. 93
5.3.5.2 Generalização da análise a quaisquer
movimentos planos .................................. 94
5.3.5.3 Velocidade de permutação ..................... 96
5.3.5.4 Aceleração relativa do ponto de
contacto (ou CIR) ..................................... 99

5.4 SÓLIDOS EM CONTACTO LINEAR ............................. 101


5.4.1 Superfícies axoides ............................................ 102
5.4.2 Superfícies axoides nos movimentos planos .... 106

5.5 SÍNTESE DO CAPÍTULO 5 ........................................... 107

5.6 EXERCÍCIOS PROPOSTOS ......................................... 108

6 ANEXO – PROBLEMAS DE EXAME ...........................................113


Cinemática 1. Introdução

CAPÍTULO 1

INTRODUÇÃO

A Mecânica Teórica é uma ciência que aborda temas como o equilíbrio


dos corpos e o movimento mecânico. No primeiro caso (estudo do equilíbrio
dos corpos em repouso) estamos no domínio da Estática. Quando se estuda o
movimento dos corpos estamos no âmbito da Cinemática e/ou Dinâmica. A
Cinemática estuda o movimento dos corpos única e exclusivamente do ponto
de vista geométrico sem se preocupar, nem com as causas que originam esse
movimento (forças e/ou momentos), nem com a inércia dos corpos (massas
e/ou momentos de inércia). Pode-se afirmar que a Cinemática traduz o estudo
da geometria do movimento, estabelecendo relações entre deslocamento,
velocidade, aceleração e tempo sem qualquer referência às causas que
originam ou alteram o movimento. A Dinâmica também se ocupa do
movimento dos corpos, nomeadamente do estudo da relação existente entre as
solicitações que atuam num corpo (forças e/ou momentos), a sua inércia
(massa e/ou momento de inércia) e o movimento resultante. Rapidamente se
conclui que o estudo dinâmico de um movimento implica a sua abordagem
prévia em termos cinemáticos.

FEUP – DEMec 1
1. Introdução Cinemática

Para melhor compreender a relação entre Estática, Cinemática e


Dinâmica recordemos a bem conhecida Segunda Lei de Newton do
movimento

F = ma (1.1)

em que F é a resultante das forças atuantes, m é a massa do corpo e a é a


aceleração resultante. Nesta equação, que é a base de toda a Dinâmica, a
obtenção da aceleração requer previamente, uma análise cinemática do
movimento do corpo. Na ausência de movimento, o segundo membro da
equação anula-se e teremos um problema de Estática. Pode-se então concluir
que a Estática é um caso particular da Dinâmica e que deveria ser estudada
depois desta. Tal não sucede por questões de ordem pedagógica. Na verdade,
é mais fácil a assimilação de conceitos partindo da situação particular
(Estática), para o caso geral (Dinâmica).
O objetivo último deste documento é a apresentação do estudo
cinemático de mecanismos simples. Um mecanismo é um conjunto de corpos
ligados entre si e dimensionados de forma a obter-se à saída um movimento
com as características cinemáticas e dinâmicas desejadas. Por exemplo, o
sistema biela-manivela transforma o movimento retilíneo alternativo dos
êmbolos em movimento de rotação da manivela (ver figura 1.1).

B
Manivela Biela
C
Êmbolo
A

Figura 1.1 – Sistema biela-manivela.

Teoricamente, conhecer o movimento de um mecanismo é saber definir,


em todos os instantes, a trajetória, a velocidade e a aceleração de um ponto
genérico de qualquer um dos corpos que o constituem. Na prática, o
conhecimento do movimento de alguns pontos notáveis ou a redução dos

2 FEUP – DEMec
Cinemática 1. Introdução

movimentos aos seus elementos teóricos essenciais, através de modelos


matemáticos adequados, resolve o problema.
Inicialmente, a abordagem será feita recorrendo à Cinemática do Ponto
Material. Um ponto material genericamente representa um corpo com massa,
mas de dimensões desprezáveis relativamente ao seu movimento. Assim, a
Terra no seu movimento em torno do Sol pode ser assimilada a um ponto
material. Um sistema de pontos materiais pode ser contínuo ou discreto. Os
corpos rígidos que constituem os mecanismos podem ser assimilados a
sistemas contínuos de pontos materiais, em que estes permanecem a
distâncias fixas uns dos outros durante o movimento. Embora os corpos se
deformem durante o movimento, essas deformações consideram-se
desprezáveis relativamente ao próprio movimento. A abordagem cinemática
dos corpos rígidos constitui o tema da Cinemática do Sólido. Realce para a
aplicação da Teoria dos Movimentos Relativos e a sua relação com a Teoria
da Derivação (Cinemática do Ponto) e as Equações de Mozzi (Cinemática
do Sólido). Finalmente, dedicaremos especial atenção ao estudo do
Movimento de Sólidos em Contacto Permanente, situação que ocorre com
frequência em muitos mecanismos.

FEUP – DEMec 3
2. Cinemática do Ponto Cinemática

CAPÍTULO 2

CINEMÁTICA DO PONTO
2.1 TRAJETÓRIA E MOVIMENTO

A trajetória é o lugar geométrico das diversas posições assumidas por


um ponto quando este se desloca entre duas posições diferentes. A trajetória
é uma linha necessariamente contínua.
O conceito de movimento é essencialmente relativo. Diz-se que um
ponto está em movimento em relação a outro quando a sua posição,
relativamente a este, muda com o tempo. Saliente-se que esta mudança de
posição se pode traduzir por uma variação da distância entre eles ou por uma
variação da direção definida por esses dois pontos. Efectivamente, se um dos
pontos descreve uma circunferência relativamente ao outro com centro neste,
não há alteração de distância, mas há alteração de posição. Num movimento
geral poderá haver variação de distância e direção em simultâneo. Pode-se
também afirmar que dois pontos estão em repouso um em relação ao outro se
não houver alteração das posições relativas.
Esta noção de movimento está intrinsecamente associada à noção de
referencial. Na verdade, a existência de movimento ou repouso de um ponto
depende do referencial a que o observador está ligado: a trajetória, a
velocidade e a aceleração do ponto são diferentes conforme o referencial

4 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

ligado ao observador. Assim, dois passageiros sentados num autocarro estão


em repouso um em relação ao outro, mesmo quando o autocarro se desloca.
No entanto, ambos estão em movimento relativamente a um terceiro indivíduo
que se encontre sentado na paragem. Mas esse movimento é ainda diferente
relativamente a um quarto passageiro que se desloque no corredor do
autocarro. Também o será relativamente a um condutor de automóvel que
nesse instante ultrapasse o autocarro. Temos, assim, uma série de exemplos
que ilustram de modo claro o conceito essencialmente relativo de qualquer
movimento. Poder-se-á mesmo dizer que nenhum movimento é cem por cento
absoluto. Se considerarmos que a Terra, o Sistema Solar, as galáxias e todos
os corpos celestes estão em movimento, compreendemos melhor o alcance da
afirmação anterior.

2.2 MOVIMENTO RETILÍNEO – Análise escalar

2.2.1 LEI DO MOVIMENTO

O movimento de um ponto diz-se retilíneo quando a sua trajetória é uma


linha reta. Consideremos o eixo OX como a direção da trajetória (ver figura
2.1). A posição do ponto material P e o sentido do deslocamento ficam
definidos pelo modo como varia a distância ao ponto de referência O em cada
instante (sentido crescente ou decrescente do eixo coordenado x). Por outras
palavras, é necessário conhecer a função x(t), que se designa por lei do
movimento.

O t t+∆ t x

x(t )

x(t+∆ t)

Figura 2.1 – Referencial usado para o movimento retilíneo.

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2. Cinemática do Ponto Cinemática

2.2.2 VELOCIDADE

Observando a figura 2.1 vamos supor que nos instantes t e t+∆t a


partícula se encontra nas posições x(t) e x(t+∆t) respetivamente. O
deslocamento ∆x entre estes dois instantes pode ser dado por

∆x = x (t + ∆t ) − x (t ) . (2.1)

A velocidade média durante o intervalo de tempo ∆t é definida como

∆x
vm = (2.2)
∆t

ou seja, pelo quociente entre o deslocamento ∆x e o intervalo de tempo ∆t. Em


termos físicos podemos dizer que a velocidade representa o deslocamento por
unidade de tempo, sendo a sua unidade no sistema internacional o metro por
segundo. A velocidade instantânea será dada pelo limite deste quociente
quando ∆t tende para zero ou, em termos matemáticos, será a derivada do
deslocamento em ordem de tempo

∆x dx
v = lim ∆t →0 = = x& (t ) . (2.3)
∆t dt

Utilizaremos com frequência x& (omitindo o t) para denominar a velocidade


instantânea que, daqui em diante, será apenas designada por velocidade. O
ponto por cima de uma variável significa a sua derivada em ordem ao tempo
em notação condensada. A velocidade é representada por um número real,
que pode ser positivo ou negativo consoante o valor de x aumente ou diminua
com o tempo. Por outro lado, a própria velocidade pode variar de instante para
instante, ou seja, pode variar no tempo e temos, então, v=v(t).
A relação entre o deslocamento de um ponto e a velocidade pode ser
estabelecida a partir da equação (2.3), escrevendo

6 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

dx = v dt . (2.4)

Integrando temos

x t

x0
dx =  v dt
t0
(2.5)

e finalmente

t
x = x0 +  v dt
t0
(2.6)

sendo x0 o deslocamento do ponto no instante inicial t0 considerado para


origem da contagem dos tempos. A obtenção do deslocamento x para um
determinado instante t implica o conhecimento da função v(t). No caso
particular da velocidade ser constante o movimento é uniforme e temos

x = x 0 + v (t − t 0 ) . (2.7)

2.2.3 ACELERAÇÃO

Recordando a figura 2.1 vamos supor que nos instantes t e t+∆t a


partícula apresenta velocidades v(t) e v(t+∆t). A variação de velocidade pode
ser positiva ou negativa e é dada por

∆v = v (t + ∆ t ) − v (t ) . (2.8)

A aceleração média no intervalo de tempo ∆t é igual a

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2. Cinemática do Ponto Cinemática

∆v
am = . (2.9)
∆t

A aceleração instantânea (daqui em diante será designada apenas por


aceleração) obtém-se calculando o limite do quociente de (2.9) quando ∆t
tende para zero

∆v dv
a = lim ∆t →0 = = v& . (2.10)
∆t dt

A unidade da aceleração no sistema internacional é o metro por segundo ao


quadrado. Atendendo à equação (2.3) podemos ainda escrever

dv d  dx  d 2 x
a= =  = = x&& . (2.11)
dt dt  dt  dt 2

Os dois pontos por cima da variável significa a segunda derivada desta em


ordem de tempo, ou seja, a aceleração é também dada pela segunda derivada
do deslocamento em ordem ao tempo. Note-se que, genericamente, o
deslocamento, a velocidade e a aceleração são funções do tempo. No
entanto, por simplificação da notação, é comum omitir-se o t na designação da
variável. A relação entre a aceleração e a velocidade é obtida a partir da
equação (2.10)

dv = a dt , (2.12)

e integrando

v t

v0
dv = 
t0
a dt (2.13)

logo

8 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

t
v =v0 + t0
a dt (2.14)

em que v0 é a velocidade no instante inicial t0. A lei dos deslocamentos obtém-


se integrando a equação anterior em ordem ao tempo (ver equações (2.4) e
(2.5)), sendo, no entanto, fundamental conhecer a função a(t). No caso
particular da aceleração ser constante o movimento é uniformemente variado
(positiva ou negativamente) e temos

v = v 0 + a (t − t 0 ) . (2.15)

Neste caso, a obtenção da lei dos deslocamentos pode ser feita recorrendo à
equação (2.5)

x t

x0
dx =  (v
t0
0 + a (t − t 0 ))dt (2.16)

e finalmente,

1
x = x 0 + v 0 ( t − t 0 ) + a (t − t 0 ) 2 . (2.17)
2

2.3 MOVIMENTO CURVILÍNEO – Análise vetorial

2.3.1 COMPONENTES CARTESIANAS

2.3.1.1 Vetor posição

Acabámos de apresentar o cálculo do deslocamento, da velocidade e da


aceleração no movimento retilíneo, utilizando um modelo de análise
unidimensional e um método de resolução escalar. Todavia, para localizar
um ponto P que se desloca no espaço tridimensional é mais cómodo recorrer a

FEUP – DEMec 9
2. Cinemática do Ponto Cinemática

uma análise vetorial, em que a posição do ponto em cada instante se obtém


através das suas coordenadas no referencial escolhido. Através da figura 2.2
constata-se que a posição do ponto P fica definida no referencial com origem
no ponto O arbitrariamente escolhido, através do vetor posição

r
r = OP (2.18)

ou
xP 
 
r = y P  . (2.19)
z 
 P

sendo xP, yP e zP as coordenadas escalares do vetor posição OP no referencial


r
da figura 2.2. Em geral, este vetor é uma função do tempo ( r (t)) e pode variar
não só em módulo, mas também em direção.

s P Q
∆r
P0 r (t)
r (t + ∆ t)

O zP

y xP y
x P

Figura 2.2 –Vetor posição em coordenadas cartesianas.

10 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

2.3.1.2. Vetor velocidade

Observando a figura 2.2, vemos que o ponto adquire as duas posições P


e Q da trajetória nos instantes t e t+∆t, respetivamente. O deslocamento entre
estes dois instantes é dado por

∆r = r (t + ∆ t ) − r (t ) (2.20)

e a velocidade média neste intervalo de tempo será

∆r
vm = (2.21)
∆t

ou

 xQ − xP 
1  
vm = y Q − yP  . (2.22)
∆t z
 Q − zP 

r
Dado que ∆ r é um vetor e ∆t um escalar conclui-se, da equação (2.21), que
r
vm é um vetor com a direção de ∆ r , ou seja, da reta secante à trajetória que
passa pelos pontos P e Q (ver figura 2.2), e o sentido é o do vetor
deslocamento.
A velocidade instantânea obtém-se considerando intervalos de tempo
r
∆t cada vez menores e, consequentemente, vetores ∆ r cada vez mais curtos.
Por outras palavras, a velocidade instantânea pode ser obtida como sendo o

limite de vm quando ∆t tende para zero. Como se depreende da figura 2.2, a


velocidade instantânea é um vetor tangente à trajetória no ponto P, pois
r
quando ∆t tende para zero, Q tende para P e a direção da secante ∆ r tende
para a direção da tangente. Temos então,

FEUP – DEMec 11
2. Cinemática do Ponto Cinemática


∆r d r
v = lim∆t →0 = =r (2.23)
∆t dt

sendo

•  x& 
 
r = y&  . (2.24)
 z& 
 

O módulo da velocidade será dado por

v = x& 2 + y& 2 + z& 2 . (2.25)

2.3.1.3 Vetor aceleração

A velocidade do ponto pode variar de instante para instante.


Consultando a figura 2.3, admitimos que nos instantes t e t+∆t, o ponto ocupa

as posições P e Q da trajetória e que as velocidades são v (t) e v (t+∆t),


respetivamente . A variação da velocidade é dada por

∆ v = v (t + ∆t ) − v (t ) (2.26)

e a aceleração média por

∆v
am = (2.27)
∆t

ou
v Qx − v xP 
1  
a m = v Q y − v yP  . (2.28)
∆t  Q
v z − v zP 

12 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

z
v(t ) v(t )
P v ( t +∆ t )
Q
r(t) ∆v

r ( t +∆ t )
v ( t +∆ t )

y
x

(a) (b)

Figura 2.3 – Representação geométrica da variação de velocidade:


(a) No espaço de referência;
(b) Considerando os vetores velocidade com a mesma
origem.

Mais uma vez, a aceleração instantânea obtém-se calculando o limite


de (2.26) quando ∆t tende para zero. Assim temos,


∆v d v
a = lim ∆t →0 = =v (2.29)
∆t dt

ou

v x   x&& a x 
d      
a = v y  = y&& = a y  . (2.30)
dt      
v z   z&& a z 

O módulo da aceleração será dado por

a = ax2 + ay2 + az2 . (2.31)

FEUP – DEMec 13
2. Cinemática do Ponto Cinemática

2.3.2 COMPONENTES INTRÍNSECAS OU NATURAIS

2.3.2.1 Posição

Em 2.3.1 obtivemos a posição do ponto P a partir das suas coordenadas


cartesianas. Todavia, uma vez conhecida a trajetória do ponto, podemos definir
a sua posição de uma forma alternativa e que consiste em (ver figura 2.2):

1) Definir um ponto fixo sobre a trajetória (P0) para contagem do


comprimento de arco s;
2) Arbitrar um sentido de percurso positivo a que corresponde valores de s
crescentes;
3) Definir a posição do ponto pelo comprimento de arco P0P que
designamos por s.

2.3.2.2 Vetor velocidade

Vimos que a velocidade é um vetor que é tangente à trajetória em cada


instante. Vamos então exprimir o vetor velocidade segundo a direção da
tangente.
A partir da definição do vetor velocidade expresso na equação (2.23)
podemos escrever

d r d r ds
v= = . (2.32)
dt ds dt

Como facilmente se depreende da figura 2.2, quando ∆t tende para zero e Q

tende para P, a corda d r tende para o valor do arco ds, logo o seu quociente

14 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

tende para a unidade. Por outro lado, d r , que é uma secante à curva, tenderá
para a direção da tangente no ponto P. Assim,

dr
=τ (2.33)
ds

sendo τ o versor (módulo unitário) da tangente e cujo sentido é o do


movimento. Podemos então definir o vetor velocidade em componentes
intrínsecas como

ds
v= τ = s& τ (2.34)
dt

em que s& nos dá o módulo e τ nos identifica a direção e o sentido do vetor


velocidade.

2.3.2.3 Vetor aceleração

Ao contrário do vetor velocidade que é tangente à trajetória, o vetor


aceleração pode decompor-se segundo duas direções; uma tangencial e outra
normal à trajetória em cada ponto. Estas direções são conhecidas por
“componentes intrínsecas” ou “componentes naturais” da aceleração.
Recorrendo às equações (2.29) e (2.34) podemos escrever

d v d 2s ds d τ
a= = 2 τ+ . (2.35)
dt dt dt dt

A variação do versor das tangentes τ com o tempo, pode ser tratada como

d τ d τ ds d τ &
= = s. (2.36)
dt ds dt ds

FEUP – DEMec 15
2. Cinemática do Ponto Cinemática

A variação do versor τ consiste numa mudança de direção, uma vez que o seu
módulo (unitário) se mantém constante. Assim, e recorrendo à figura 2.4(a),

podemos dizer que a variação ∆ τ dos versores entre os pontos P e Q pode ser
escrita como

∆ τ = τQ − τ P . (2.37)

y A
ρ
ρ τQ
∆τ
∆α Q
τQ
∆α
P
τP
τP

O x

(a) (b)

Figura 2.4 – Representação da variação do versor das tangentes:


(a) No espaço de referência;
(b) Perspetiva aumentada dos dois versores considerados
com a mesma origem.

A figura 2.4(b) permite-nos definir com facilidade o módulo de ∆ τ . Dividindo

simetricamente o triângulo isósceles constituído por τ P, τ Q e ∆ τ a partir da sua

base ∆ τ , podemos obter dois triângulos retângulos onde

16 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

∆τ  ∆α 
= τQ sen   (2.38)
2  2 

ou

∆τ  ∆α 
= sen   (2.39)
2  2 

uma vez que τQ é unitário. Calculando o limite da equação anterior quando

∆ τ tende para zero obtemos

d τ = dα (2.40)

uma vez que lim x → 0 sen x = x . Por outro lado, quando ∆ τ → 0 a direção de d τ

tende para a normal a τ (versor n ) como facilmente se depreende da figura


2.4(b), imaginando Q muito próximo de P. Assim, podemos escrever

d τ = dα n . (2.41)

O valor do comprimento de arco ds correspondente a dα pode ser obtido pelo


produto do raio de curvatura ρ por dα (ver figura 2.4 (a))

ds = ρ dα . (2.42)

Assim, retornando à equação (2.35), podemos escrever

dτ dτ & dα & n &


= s= n s= s. (2.43)
dt ds ρdα ρ

FEUP – DEMec 17
2. Cinemática do Ponto Cinemática

Finalmente, recorrendo às equações (2.34) e (2.43) temos

s& 2
a = s&& τ + n. (2.44)
ρ

Podemos então dizer que o vetor aceleração se pode decompor em duas


componentes:

- a tangencial a t = s&& τ que é devida unicamente à variação do módulo da


velocidade;
s& 2
- a normal a n = n que é devida à curvatura da trajetória.
ρ
Num movimento ao longo de uma trajetória no espaço, podem-se definir no
ponto P inúmeras normais. A definição da normal principal que conterá o versor

n , pode ser feita a partir do plano osculador em P, que se define como o plano

que contém os versores τ P, τ Q e ∆ τ quando Q tende para P (ver figura 2.4(b)).

Como se constata da observação de 2.4(b), este plano contém o versor n .


Um exemplo que retrata a importância desta componente normal da
aceleração, é o projeto de linhas ferroviárias. Neste caso, um segmento reto de
via nunca é seguido diretamente de um troço circunferencial; utilizam-se
secções especiais de transição, para suavizar a passagem do raio de curvatura
infinito do segmento reto para o raio de curvatura finito da secção circular.
Caso contrário, existiriam mudanças bruscas na aceleração das carruagens, o
que para além de ser prejudicial aos materiais seria também desagradável e
perigoso para os passageiros.
A conclusão mais importante a reter é que num movimento curvilíneo a
aceleração nunca é nula. Assim, se esse movimento for uniforme, s& será
constante e a componente tangencial de aceleração será nula, mas existirá a

s& 2
componente normal . Esta componente só será nula quando a velocidade
ρ

18 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

for nula (ausência de movimento) ou nos pontos de inflexão em que o


movimento terá, ainda que momentaneamente, uma trajetória retilínea, que se
caracteriza por ρ = ∞.

2.3.3 COORDENADAS POLARES E CILÍNDRICAS

2.3.3.1 Coordenadas polares

2.3.3.1.1 Vetor posição

Nalguns problemas de movimento plano, a posição do ponto material P

pode-se definir através das suas coordenadas polares r e θ de versores u r e

u θ , respetivamente (ver figura 2.5).

uθ ur

θ
O

Figura 2.5 – Coordenadas polares.

Torna-se então conveniente decompor a velocidade e a aceleração

segundo a direção radial identificada pelo versor u r e a direção transversal

(versor u θ ) perpendicular à anterior. No caso do ponto P se movimentar ao


longo de uma trajetória retilínea teremos r a aumentar ou a diminuir mantendo-

se θ constante e o movimento faz-se segundo u r . Por outro lado, se houver

variação de θ, e r se mantiver constante, o movimento faz-se segundo u θ . Num


caso geral haverá alteração de r e θ simultaneamente.

FEUP – DEMec 19
2. Cinemática do Ponto Cinemática

O vetor posição do ponto P pode-se escrever

r = r ur . (2.45)

2.3.3.1.2 Vetor velocidade

Derivando o vetor posição, obtemos o vetor velocidade

• •
v = r = r& u r + r u r . (2.46)

Recordando a figura 2.4(b), que nos permitiu estudar a derivada de um versor


animado de movimento de rotação, podemos usar um procedimento análogo

para a obtenção de u r . Assim considerando u rP , u rQ , ∆u r e Δθ em vez de τ P,

τ Q, ∆ τ e ∆α respetivamente, temos, a partir da figura 2.4(b)

∆ ur Δθ
= u r sen (2.47)
2 2

ou

∆u r = Δθ (2.48)

quando ∆ θ tende para zero. Para calcular a variação média de ∆u r em

relação ao tempo fazemos

∆u r Δθ
= (2.49)
∆t ∆t

20 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

cujo limite será θ& quando ∆t tende para zero. Tal como sucedia com ∆ τ (ver

equação 2.41), também aqui a direção de ∆u r tenderá para a perpendicular a

u r para valores muito pequenos de ∆θ. Podemos então escrever



ur = uθ = θ& uθ (2.50)
dt

e, consequentemente

r
v = r& u r + rθ& uθ . (2.51)

2.3.3.1.3 Vetor aceleração

Derivando o vetor velocidade obtemos o vetor aceleração

• • •
a = v = r&&u r + r& u r + r& θ& u θ + r θ&&u θ + r θ& u θ . (2.52)


Seguindo um raciocínio análogo ao que permitiu a obtenção de u r , obtemos

para u θ


u θ = − θ& u r (2.53)

logo, o vetor aceleração fica

( ) ( )
a = r&& − r θ& 2 u r + 2 r& θ& + r θ&& uθ (2.54)

ou seja, tal como no vetor velocidade, temos uma componente radial e uma
componente transversal.

FEUP – DEMec 21
2. Cinemática do Ponto Cinemática

2.3.3.2 Coordenadas cilíndricas

2.3.3.2.1 Vetor posição

Por vezes torna-se cómodo definir a posição do ponto material P no

espaço recorrendo às coordenadas cilíndricas r, θ e z de versores u r , u θ e k ,


respetivamente (ver figura 2.6). Neste caso podemos decompor o vetor posição
do ponto material P segundo os versores e temos

r = r ur + z k . (2.55)

k
P uθ
ur
r

O zk

θ
r ur
y
x
Figura 2.6 – Coordenadas cilíndricas.

Note-se que o versor k para além do módulo também tem direção constante, o
que o torna um vetor constante.

2.3.3.2.2 Vetor velocidade

Derivando a equação anterior obtemos o vetor velocidade


v = r = r& u r + r θ& u θ + z& k . (2.56)

22 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

2.3.3.2.3 Vetor aceleração

O vetor aceleração obtém-se por derivação do vetor velocidade


( ) ( )
a = v = r&& − r θ& 2 u r + 2 r& θ& + r θ&& u θ +z&&k . (2.57)

2.3.3.2.4 Movimento helicoidal

Um caso típico da aplicação das coordenadas cilíndricas é o movimento


helicoidal descrito por um ponto P na periferia do filete de um parafuso de
secção constante. Neste caso, a coordenada z é proporcional a R θ , sendo R
uma constante. Temos então,

z =hRθ (2.58)

r = R u r + hR θ k (2.59)

v = R θ& uθ + h R θ& k (2.60)

a = − R θ& 2 u r + R θ&&uθ + h R θ&& k . (2.61)

2.4 MUDANÇAS DE REFERENCIAL

No capítulo 2.3 vimos diferentes modos de exprimir os vetores


velocidade e aceleração em diversos tipos de coordenadas: cartesianas,
intrínsecas, polares e cilíndricas. Na verdade, tratam-se de perspetivas
diferentes de visualização das mesmas entidades físicas. Por outras palavras,
um determinado vetor (posição, velocidade ou aceleração) pode ser expresso,
por exemplo, em coordenadas cartesianas, intrínsecas ou cilíndricas. Embora
nestes três sistemas de coordenadas o vetor tenha, matematicamente, um

FEUP – DEMec 23
2. Cinemática do Ponto Cinemática

aspeto diferente, ele representa a mesma entidade física. Um observador no


centro da cidade do Porto tem uma perspetiva diferente da Torre dos Clérigos
relativamente a outro que a sobrevoe, mas a entidade física (Torre dos
Clérigos) é a mesma. Na realidade, trata-se de recuperar o conceito de
referencial já referido no capítulo 2.1, embora num contexto diferente. Por
vezes existe a necessidade de projetar um vetor num referencial diferente
daquele em que ele se encontra projetado. O método mais cómodo é recorrer
ao operador matemático conhecido por matriz transformação. Para ilustrar a
construção desta matriz passemos a um exemplo concreto retratado na figura
2.7, onde se representam dois referenciais SA (xA, yA, zA) e SB (xB, yB, zB), em
que os eixos x são coincidentes e os eixos y e z se encontram desfasados de

θ . Imaginemos um vetor OP que em SA tem como componentes

a 
 
OP S = b  . (2.62)
c 
A

 

Podemos obter OP projetado em SB fazendo

OP S = [TAB ]OP S (2.63)


B A

sendo [TAB ] a matriz transformação de A em B.

zB zA

yB
θ
O yA

xA x B

Figura 2.7 – Referenciais SA e SB.

24 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

Para elucidar a construção desta matriz consideremos a projeção dos

versores do sistema SA ( i A , j A , k A ) em SB.

• O versor de xA projetar-se-á de igual modo em SB. Podemos então


preencher a primeira linha e a primeira coluna desta matriz com o valor 1
na posição correspondente à transformação de xA em xB e zero nas
outras posições.
xA yA zA
1 0 0  xB
(2.64)
[TAB ]= 0 y
 B
0  zB

• O versor de yA ( j A ) projeta-se em yB multiplicando-o por cos θ e em zB


multiplicando-o por −sen θ (ver figura 2.8)

zB zA

yB
jA cos θ
θ
O
jA yA
jA sen θ

Figura 2.8 – Projeção do versor de yA em yB e em zB.

Podemos então acrescentar mais duas projeções na nossa matriz

FEUP – DEMec 25
2. Cinemática do Ponto Cinemática

xA yA zA
1 0 0  xB
(2.65)
[TAB ]= 0 cos θ y
 B
0 − sen θ  zB

• O versor de zA ( k A ) projeta-se em yB multiplicando-o por sen θ e em zB


por cos θ (ver figura 2.9).

zB zA

kA yB
kAcosθ
θ
O
k Asen θ yA
Figura 2.9 – Projeção do versor de zA em yB e em zB.

Temos então a matriz transformação completa

xA yA zA
1 0 0  xB
(2.66)
[TAB ]= 0 cos θ sen θ  y B
0 − sen θ cos θ  zB

e a projeção de OP S será (ver equação (2.63))


B

26 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

1 0 0  a   a 
   
OP S = 0 
cos θ sen θ  b  =  b cos θ + c sen θ  (2.67)
− sen θ cos θ  c  − b sen θ + c cos θ 
B

0

Os vetores OP S e OP S representam exatamente a mesma entidade física (a


A B

posição do ponto P relativamente ao ponto O), embora apresentem um


aspeto matemático diferente (comparar 2.62 com 2.67). Calculando o módulo

de OP S e OP S obtemos exatamente o mesmo valor, como é obvio,


A B

OP = a 2 + b 2 + c 2 . (2.68)

Note-se que este exemplo, poder-se-ia aplicar à transformação de


coordenadas cilíndricas em cartesianas. Assim, se considerarmos o sistema SB
como sendo de coordenadas cilíndricas (r, θ e z), a matriz [TBA ] permite a
transformação referida. Saliente-se ainda que, pelo facto dos sistemas SA e SB
serem ortonormados a matriz transformação [TBA ] é igual à transposta de
[TAB ] . Como é óbvio, [TBA ] permite passar um vetor representado em SB para
SA. Sugere-se como exercício, a aplicação da matriz [TBA ] ao vetor OP S (ver
B

equação (2.67)) e obter OP S (ver equação (2.62)).


A

2.5 MOVIMENTO DE ROTAÇÃO

2.5.1 VELOCIDADE ANGULAR

No subcapítulo 2.2.2 definimos velocidade linear como sendo a derivada


do deslocamento em ordem ao tempo num movimento retilíneo. A velocidade
angular segue uma filosofia semelhante, bastando para tal considerar
deslocamentos angulares em vez de lineares. Para melhor compreensão

FEUP – DEMec 27
2. Cinemática do Ponto Cinemática

consideremos então o caso particular do movimento circular descrito num


plano xy (ver figura 2.10).

θQ P
θP
O x

Figura 2.10 – Movimento circular plano.

Considerando duas posições para o ponto material, P e Q


respetivamente, em dois instantes diferentes a velocidade angular média
define-se como

Δθ
ω med = . (2.69)
Δt

O limite deste quociente quando ∆t tende para zero é a velocidade


angular instantânea.

Δ θ dθ &
ω = lim ∆t →0 = =θ (2.70)
Δt dt

cuja unidade no sistema SI é o radiano por segundo.


O deslocamento angular obtém-se da equação anterior fazendo

d θ = ω dt (2.71)

28 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

e após integração

t
θ = θ 0 +  ω dt . (2.72)
t0

No caso do movimento circular uniforme temos

θ = θ 0 + ω 0 (t − t 0 ) . (2.73)

2.5.2 VETOR VELOCIDADE ANGULAR OU ROTAÇÃO

Recordando a figura 2.10 vamos calcular o vetor velocidade no ponto P

recorrendo a um produto vetorial do vetor velocidade angular ω pelo


respetivo vetor posição. Por uma questão de simplificação e sem perda de
generalidade imaginemos que o ponto P se encontra sobre o eixo x na sua
trajetória circular. Como já sabemos que a velocidade é tangente à trajetória e
admitindo um sentido de rotação anti-horário, o vetor velocidade será vertical e
positivo

0 0
vP = v P = r θ& (2.74)
0 0

e vamos calculá-lo fazendo

v P = ω x 0P . (2.75)

0 r
r θ& = ω x 0 . (2.76)
o 0

FEUP – DEMec 29
2. Cinemática do Ponto Cinemática

Pela regra do produto vetorial rapidamente concluímos que o vetor ω só pode


ter componente segundo z positiva, ou seja

0 0
ur
ω= 0 = 0 . (2.77)
ω θ&

Daqui se depreende que o vetor velocidade angular ou rotação apresenta as


seguintes características:
• o seu módulo é igual à velocidade angular instantânea θ& ;
• a sua direção é perpendicular ao plano do movimento circular;
• o seu eixo suporte contém o centro da trajetória circular;
• o seu sentido é definido pela regra da mão direita, ou seja,
ascendente para uma rotação com sentido anti-horário e
descendente no caso contrário.

2.5.3 ACELERAÇÃO ANGULAR INSTANTÂNEA

Recordando a figura 2.10 vamos admitir que nas posições P e Q do


ponto material existe uma variação de velocidade angular Δω . A aceleração
média angular α m será dada por

Δω
αm = . (2.78)
Δt

O limite desta quantidade quando ∆t tende para zero será a aceleração angular
instantânea dada por

Δω dω
α = lim Δt →0 = = ω& = θ&& . (2.79)
Δt dt

Da equação anterior podemos escrever

30 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

dω = α dt (2.80)

e integrando temos

t
ω = ω0 +  α dt . (2.81)
t0

No caso particular do movimento circular uniformemente variado temos

ω = ω 0 + α (t − t 0 ) . (2.82)

Integrando novamente podemos obter o ângulo rodado

1
θ = θ 0 + ω 0 (t − t 0 ) + α (t − t 0 ) 2 . (2.83)
2

2.5.4 VETOR ACELERAÇÃO ANGULAR

O vetor aceleração angular obtém-se a partir da derivação do vetor

velocidade angular. No caso particular do movimento circular plano o vetor ω


tem direção constante segundo z. Assim o vetor aceleração angular vem

dω &
α= = ω k = θ&&k . (2.84)
dt

Podemos então dizer que no caso de um movimento plano o vetor aceleração


angular tem as seguintes características:
• o seu módulo é igual à aceleração angular instantânea α ;

• a sua direção é a mesma do vetor ω , ou seja, perpendicular ao


plano do movimento;

FEUP – DEMec 31
2. Cinemática do Ponto Cinemática

• o sentido é o definido pela derivada do vetor ω .


Note-se que, se estivermos em presença de um movimento não plano a

direção do vetor ω varia, o que alterará o cálculo de α . Voltaremos a este


assunto mais à frente.

2.6 SÍNTESE DE 2.1 A 2.5

Antes de prosseguirmos vamos fazer uma síntese dos conceitos


fundamentais transmitidos nos cinco primeiros subcapítulos da Cinemática do
Ponto. Assim, após uma detalhada definição de trajetória e movimento em
2.1, introduzimos os conceitos de velocidade e aceleração em 2.2, recorrendo
ao movimento retilíneo e a uma análise escalar. Estes conceitos foram
aprofundados em 2.3 com a introdução do movimento curvilíneo. Aqui recorreu-
se a uma análise vetorial e usaram-se diferentes tipos de sistemas de
coordenadas (cartesianas, intrínsecas, polares e cilíndricas) para exprimir
os vetores velocidade e aceleração. Em 2.4 apresentamos a matriz
transformação, um operador matemático que permite, de uma forma expedita,
projetar um vetor num referencial diferente daquele em que ele se encontre.
Finalmente em 2.5 recorremos ao movimento circular plano para, de uma forma
simples, introduzir os vetores velocidade e aceleração angulares. Nos
subcapítulos que se seguem vai fazer-se a extensão destes conceitos a
problemas com mais de um grau de liberdade.

2.7 CONCEITO DE PARÂMETRO E GRAU DE LIBERDADE

Para definir a posição de um ponto material P recorre-se a um certo


número de grandezas geométricas, parâmetros, que, consoante o sistema
usado, poderão ser coordenadas lineares ou angulares. Assim se usarmos
coordenadas cartesianas a posição do ponto ficará definida pelas três
coordenadas x, y e z no sistema escolhido. Caso utilizemos coordenadas

32 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

cilíndricas usaremos duas distâncias e um ângulo. A escolha dos parâmetros


depende da geometria geral do mecanismo e adopta-se o que for mais simples
para o tratamento analítico. Um parâmetro é dito independente se a sua
variação não é condicionada pela dos outros. O número de graus de liberdade
é igual ao número de parâmetros independentes utilizados para definir a
posição do ponto material. Se um parâmetro não é independente é porque
existe uma relação analítica que o liga a outros parâmetros. Para clarificar
recuperemos o exemplo do mecanismo biela-manivela (ver figura 2.11). A
posição do ponto C define-se pela equação

AC = R cos α + L cos β . (2.85)

sendo R e L as dimensões, conhecidas, da manivela e biela, respetivamente. O


sistema só tem um único grau de liberdade porque entre os dois parâmetros α
e β existe uma relação de dependência

R sen α = L sen β . (2.86)

Assim, podemos dizer que a posição de C fica definida por um único parâmetro
α , escrevendo

R2
AC = R cos α + L 1− 2
sen 2 α . (2.87)
L

B
L
R
α β C

Figura 2.11 – Sistema biela-manivela.

FEUP – DEMec 33
2. Cinemática do Ponto Cinemática

2.8 MOVIMENTOS COM MAIS DE UM GRAU DE LIBERDADE

2.8.1 VETOR VELOCIDADE NUM REFERENCIAL FIXO

Vamos começar por estudar um sistema com dois graus de liberdade


recorrendo a um exemplo simples como é o do mecanismo dos aviões de feira
(ver representação geométrica na figura 2.12). Designando por P a posição do
passageiro, vemos que este, poderá estar sujeito a dois movimentos
independentes entre si:
- uma rotação do disco de base (corpo 1) em torno do eixo vertical
(parâmetro cinemático θ);
- movimento de rotação do braço de comprimento r (corpo 2), em torno
de um eixo horizontal (parâmetro cinemático β).

z0 z1
β P z
2

θ r 2

1
O
θ y1
θ
β y0
x0 β
x1 x 2
y2

Figura 2.12 – Representação geométrica do mecanismo de dois graus de


liberdade.

Na análise de mecanismos com n graus de liberdade é habitual, por uma


questão de simplificação, assumir-se a existência de n+1 referenciais. No
nosso exemplo teremos:

34 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

• Referencial S0 (Ox0y0z0) – referencial fixo, caracterizado pelo facto de


um dos seus eixos (z0) ser o eixo de rotação do corpo 1 e os outros (x0 e
y0) estarem no seu plano de rotação horizontal (plano do disco);
• Referencial S1 (Ox1y1z1) – referencial móvel que acompanha o
movimento do corpo 1. Regra geral constrói-se em conjugação com S0.
O eixo que coincide com o eixo de rotação do corpo 1 será o eixo
homólogo ao que foi considerado em S0, ou seja z1. Os outros dois
eixos, x1 e y1, estarão no mesmo plano de x0 e y0, mas desfasados de
um ângulo θ (parâmetro cinemático que traduz o movimento do corpo 1)
e terão de ser colocados de modo a obedecer ao sentido de rotação
(indicado por θ& );
• Referencial S2 (Ox2y2z2) – referencial móvel que acompanha o
movimento do corpo 2. O eixo que coincide com o eixo de rotação do
corpo 2 relativamente ao corpo 1, será o eixo homólogo ao que foi
considerado em S1, ou seja, x2. Os outros dois eixos, z2 e y2, estarão no
mesmo plano de z1 e y1, mas desfasados de um ângulo β (parâmetro
cinemático que traduz o movimento do corpo 2 relativamente ao corpo 1)
e terão de ser colocados de modo a obedecer ao sentido de rotação
(indicado por β& ).

Vamos começar pela obtenção da velocidade de P a partir de um vetor


posição representado em S0. Este vetor terá a sua origem num ponto fixo
(ponto O) e é facilmente representável em S2,

0
OP S = 0 . (2.88)
2

Em seguida por projeção direta ou recorrendo à matriz transformação


[T21 ] podemos obtê-lo em S1

FEUP – DEMec 35
2. Cinemática do Ponto Cinemática

0
OP S = [T21 ]OP S = r sen β (2.89)
1 2

r cos β

e finalmente em S0 recorrendo a [T10 ]

− r sen β sen θ
OP S = [T10 ]OP S = r sen β cos θ . (2.90)
0 1

r cos β

Sugere-se aos leitores, como exercício, a obtenção das matrizes


transformação. Finalmente, a velocidade de P pode-se obter por derivação de

OP relativamente a S0,

• − r β& cos β sen θ − r θ& sen β cosθ


vP S0
= OP = r β& cos β cos θ − r θ& sen β sen θ . (2.91)
S0 S
0
− r β& sen β

2.8.2 VETOR VELOCIDADE NUM REFERENCIAL MÓVEL

Regressando à figura 2.12 vamos imaginar um ponto genérico Q (não


representado) cujas coordenadas em S1 sejam

x1
OQ = y1 = x1 i1 + y1 j1 + z1 k1 . (2.92)
S1
z1

O cálculo da velocidade de Q implica a derivação de (2.92)

36 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

• • •
v Q = x& 1 i1 + x1 i1 + y& 1 j1 + y 1 j1 + z&1 k 1 + z1 k 1 . (2.93)

A obtenção da derivada dos versores segue um processo similar ao descrito



em 2.3.2.3 e 2.3.3.1.2. Assim, de uma forma sintética temos para i1 ,

∆ i1 Δθ
= i1 sen (2.94)
2 2

ou

Δ θ = ∆ i1 . (2.95)

Para calcular a variação relativamente ao tempo fazemos

Δθ ∆ i1
= (2.96)
∆t ∆t

Calculando o limite quando ∆t tende para zero obtém-se


θ& = i1 (2.97)

logo


i1 = θ& j1 (2.98)

pois, como nos casos anteriormente referidos, quando Δ θ tende para zero a
uur ur uur
direção de ∆ i1 tende para a normal a i1 , ou seja j1 .

FEUP – DEMec 37
2. Cinemática do Ponto Cinemática

Um aspeto importante é constatarmos que a derivada do versor i1 pode ser


obtida recorrendo a um produto vetorial

• 0
0 i1
&
i1 = ω x i1 = 0 x 0 = θ i1 . (2.99)
θ& 0 0

Do mesmo modo temos


j1 = ω x j1
(2.100)

k 1 = ω xk 1 .

Regressando à equação da velocidade (2.93) podemos agora escrever,

vQ = x&1 i1 + y&1 j1 + z&1 k1 + x1 ω × i1 + y1 ω × j1 + z1 ω × k1 (2.101)

ou

vQ = x&1 i1 + y&1 j1 + z&1 k1 + ω × ( x1 i1 + y1 j1 + z1 k1 ) (2.102)

ou ainda,

x&1 x1
vQ = y&1 + ω × y1 (2.103)
S1 S1
z&1 z1
S1 S1

e finalmente, de uma forma mais sintética,



vQ S1
= OQ + ω10 × OQ (2.104)
S1 S1
S1 S
1

38 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

sendo que OQ representa a velocidade de Q relativamente a S1 e


S1 S
1

ω10 × OQ a velocidade de um ponto imaginário Q1 solidário de S1 e que


S1 S1

coincide com Q nesse instante. A equação (2.104) traduz o modo como se


deriva um vetor relativamente (S0), estando ele projetado noutro referencial
diferente (S1), que se movimenta relativamente ao primeiro. Na sua forma mais
geral a equação (2.104) terá a seguinte forma,

• •
AB = AB + ω yx × AB (2.105)
Sy Sy
Sx S Sy
y Sy

independentemente do significado do vetor AB (vetor posição, velocidade


linear ou angular, força, etc.) e é conhecido como Teorema das Derivadas
Relativas.
Regressando ao nosso problema (figura 2.12) podemos agora calcular a
velocidade do ponto P partindo do respetivo vetor posição representado em S1
(equação 2.89). Assim, temos

• •
vP S1
= OP = OP + ω10 × OP (2.106)
S1 S1
S0 S S1 S
1 1

o que resulta

− r θ& sen β
v P S = r β& cos β . (2.107)
1

− r β& sen β

FEUP – DEMec 39
2. Cinemática do Ponto Cinemática

Também podemos obter a velocidade de P partindo do vetor posição


representado em S2 (equação (2.88)) fazendo

• •
vP S2
= OP = OP + ω 20 × OP (2.108)
S2 S2
S0 S S2 S
2 2

sendo que,

ω 20 = ω 21 + ω10 (2.109)
S2 S2 S2

ou,

− β& 0 − β&
ω 20 = 0 + − θ& sen β = − θ& sen β . (2.110)
0 θ& cos β θ& cos β

o que origina

− r θ& sen β
vP = β& r . (2.111)
S2
0

Um aspeto de particular relevância é a comparação que se deve fazer


entre os vetores de (2.91), (2.107) e (2.111). Embora apresentem um aspeto
diferente, estes três vetores representam a mesma coisa – a velocidade do
ponto P. O diferente aspeto matemático dos três vetores está relacionado com
o facto de estarem escritos em referenciais distintos. Sugere-se como
exercício, a aplicação de matrizes transformação que demonstrem a
veracidade desta afirmação.

40 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

2.8.3 VETOR ACELERAÇÃO

Recorrendo mais uma vez ao nosso problema da figura 2.12, e


admitindo que a velocidade angular θ& é constante, obtemos o vetor aceleração
do ponto P no referencial fixo S0 a partir da derivação relativamente a S0 de

vP
S0

• − r β&& cos β sen θ + r β& 2 sen β sen θ − r β& θ& cos β cos θ
aP S0
= vP = r β&& cos β cos θ − r β& 2 sen β cos θ − r β& θ& cos β sen θ +
S0 S
0
− r β&& sen β − r β& 2 cos β
(2.112)
− r β& θ& cos β cos θ + r θ& 2 sen β sen θ
+ − r θ& β& cos β sen θ − r θ& 2 sen β cos θ .
0

A aceleração de P a partir do vetor velocidade em S1 vem

• •
aP S1
= vP = vP + ω10 × vP (2.113)
S1 S1
S0 S S1 S
1 1

ou seja,

− 2 r θ& β& cos β


a P S = − r β& 2 sen β + r β&& cos β − r θ& 2 sen β . (2.114)
1

− r β& 2 cos β − r β&& sen β

Também se pode obter o vetor aceleração a partir de v P s2

• •
aP S2
= vP = vP + ω 20 × vP . (2.115)
S2 S2
S0 S S2 S
2 2

FEUP – DEMec 41
2. Cinemática do Ponto Cinemática

− 2 r θ& β& cos β


aP S2
= β&& r − r θ& 2 cos β sen β . (2.116)
− β& 2 r − r θ& 2 sen 2 β

2.9 SÍNTESE DE 2.7 E 2.8

Nestes dois subcapítulos da cinemática do ponto começamos por


recordar os conceitos de parâmetro e grau de liberdade. Em seguida, em 2.8,
estudámos movimentos com mais de um grau de liberdade. Recorrendo a um
exemplo simples, apresentou-se o procedimento de colocação de referenciais,
bem como o cálculo do vetor velocidade a partir de um vetor posição projetado
num referencial fixo. O cálculo do mesmo vetor velocidade a partir de um vetor
posição escrito em referenciais móveis permitiu a apresentação do Teorema
das Derivadas Relativas, que foi, posteriormente, aplicado ao cálculo do vetor
aceleração.

2.10 EXERCÍCIOS PROPOSTOS


1)

θθ&&
P


ββ&
y

Figura 2.13 – Ventoinha com dois graus de liberdade.

A hélice de uma ventoinha de raio r roda com velocidade angular β& constante
em relação ao compartimento do motor. Este, por sua vez, roda em torno de

42 FEUP – DEMec
Cinemática 2. Cinemática do Ponto

um eixo vertical com velocidade angular θ& conhecida (ver figura 2.13).
Admitindo que a dimensão segundo y entre o centro do sistema de eixos e o
centro de hélice mede L e que o ponto P se encontra na periferia da hélice,
determine:

a) A velocidade do ponto P a partir de um vetor posição projetado em S1;

− r β& cos β − Lθ&


Solução: vP S1
= − r θ& sen β
− r β& sen β

b) A velocidade do ponto P a partir de um vetor posição projetado em S2;

− r β& − Lθ& cos β


Solução: vP S2
= − r θ& sen β
L θ& sen β

c) Mostre que as duas velocidades são iguais recorrendo à respetiva matriz


transformação;

d) A aceleração do ponto P a partir do vetor velocidade projetado em S1;

r β& 2 sen β − Lθ&& + r θ& 2 sen β


Solução: aP S1
= − r θ&& sen β − 2 r θ& β& cos β − L θ& 2
− r β& 2 cos β

e) A aceleração do ponto P a partir do vetor velocidade projetado em S2;

− Lθ&& cos β + r θ& 2 sen β cos β


Solução: aP S2
= − r θ&& sen β − 2 r θ& β& cos β − L θ& 2
Lθ&& sen β − r θ& 2 sen 2 β − r β& 2

f) Mostre que as duas acelerações são iguais recorrendo à respetiva matriz


transformação.

FEUP – DEMec 43
2. Cinemática do Ponto Cinemática

2)

y
x θ&

Figura 2.14 – Lança telescópica com três graus de liberdade.

A lança telescópica espacial da figura roda em torno de um eixo vertical com


velocidade angular θ& e, em torno de um eixo horizontal com velocidade
angular β& constante. Para além disso a sua extremidade translada segundo a

direção da própria lança com velocidade L& constante. Repita as seis alíneas do
problema anterior.

L β& cos β + L&sen β β& L


Soluções: a) v P S = L θ& sen β b) v P S2
= L θ& sen β
1

− L β& sen β + L&cos β L&

2 L& β& cos β − L β& 2 sen β − L θ& 2 sen β


d) a P S = L θ&& sen β + 2 L θ& β& cos β + 2 L& θ& sen β
1

− L& β& 2 cos β − 2 L& β& sen β

2 β& L& − L θ& 2 cos β sen β


e) a P S2
= 2 L& θ& sen β + L θ&& sen β + 2 L θ& β& cosβ
− L θ& 2 sen 2 β − β& 2 L

44 FEUP – DEMec
Cinemática 3. Cinemática do Sólido

CAPÍTULO 3

CINEMÁTICA DO SÓLIDO
3.1 INTRODUÇÃO

No capítulo 2 estudou-se o movimento de pontos materiais. Como foi


oportunamente referido, quando as dimensões de um determinado corpo se
podem desprezar face ao seu movimento, ele pode ser assimilado a um ponto
material. Em contrapartida, neste capítulo considerar-se-á a cinemática dos
corpos rígidos, ou seja, pretender-se-á calcular em cada instante a posição, a
velocidade ou aceleração de diferentes pontos do mesmo sólido rígido. Define-
se sólido rígido, como sendo um corpo em que as eventuais deformações de
caráter elástico, que ocorrem durante o funcionamento da generalidade dos
mecanismos, são desprezáveis em relação aos deslocamentos sofridos
durante o movimento. Assim, na Cinemática do Sólido dedicar-nos-emos ao
estudo do movimento de alguns pontos notáveis de um sólido. De facto, como
a distância entre dois pontos quaisquer é considerada invariável, o
conhecimento das características cinemáticas (trajetória, velocidade e
aceleração) de alguns pontos do sólido permite a obtenção das mesmas
características em qualquer outro ponto. O recurso a referenciais solidários do
sólido no seu movimento, facilitará a extensão do movimento ao de um espaço
rígido ilimitado que lhe seja associado. Na realidade, se um automóvel se

FEUP – DEMec 45
3. Cinemática do Sólido Cinemática

desloca numa estrada, tudo o que ele transporta, tal como, passageiros, carga
e a massa de ar circunscrita ao seu interior, se movimenta à mesma
velocidade.
Os movimentos dos sólidos podem ser agrupados em três tipos
diferentes:
 translação;
 rotação;
 movimento mais geral de um sólido.

3.2 MOVIMENTO DE TRANSLAÇÃO

Um movimento é dito de translação se qualquer linha reta no interior do


corpo se mantiver na mesma direção durante o movimento. Todas as partículas
que formam o corpo deslocam-se segundo trajetórias paralelas, ou seja,
qualquer vetor definido por dois quaisquer pontos do sólido desloca-se por
equipolência. Se estas trajetórias forem linhas retas, o movimento é dito de
translação retilínea; se as trajetórias forem linhas curvas, estaremos em
presença de uma translação curvilínea (ver figura 3.1).

A2 A2

B2 B2

A1

A1
B1

B1

Translação retilínea Translação curvilínea

Figura 3.1 – Translação retilínea e translação curvilínea.

46 FEUP – DEMec
Cinemática 3. Cinemática do Sólido

Consideremos o sólido da figura 3.2 em movimento de translação relativamente


ao referencial S0 representado. Podemos então escrever,

OB  OA  AB . (3.1)

z0
B

y0
x0
Figura 3.2 – Sólido em translação.

Para calcular a velocidade vamos derivar a equação anterior

  

OB  OA  AB (3.2)
s0 s0 s0

Mas, AB é um vetor nulo, uma vez que AB é um vetor constante em


s0

módulo, direção e sentido. Em módulo porque A e B são dois pontos de um


corpo rígido e em direção pela própria definição de translação. Logo temos,

vB  v A . (3.3)

Por derivação da equação anterior temos

FEUP – DEMec 47
3. Cinemática do Sólido Cinemática

aB  a A . (3.4)

Pode-se então concluir que quando um corpo rígido translada todos os pontos
do corpo têm, em qualquer instante, a mesma velocidade e a mesma
aceleração. No caso da translação curvilínea, a velocidade e a aceleração
alteram-se quer em direção, módulo e sentido. No caso da translação retilínea,
todas as partículas se deslocam em linhas retas paralelas e as suas
velocidades e acelerações mantêm a mesma direção durante todo o
movimento.

3.3 MOVIMENTO DE ROTAÇÃO

Um sólido tem um movimento de rotação quando pelo menos dois dos


seus pontos não têm velocidade durante todo o intervalo de tempo
considerado. A reta definida por esses dois pontos é o eixo de rotação, que
pode pertencer ao corpo ou não, e todos os seus pontos têm velocidade nula.
Todos os pontos do sólido descrevem arcos de circunferência em planos
perpendiculares a esse eixo e com centro nele.
z

vP
P


r


y
x
Figura 3.3 – Ponto genérico P de um sólido em rotação em torno de um eixo
fixo.

48 FEUP – DEMec
Cinemática 3. Cinemática do Sólido

3.3.1 VETOR VELOCIDADE

Considere-se um sólido que roda em torno de um eixo fixo (eixo Oz da

figura 3.3). Seja P um ponto do corpo e r o vetor posição de P relativamente à


origem do referencial. O ponto B representa a projeção de P sobre o eixo de

rotação. O segmento BP faz um ângulo θ com plano xz. Este ângulo é


conhecido como coordenada angular do corpo. Quando o corpo roda de um
ângulo Δθ , o comprimento Δs do arco descrito por P é

Δs  BP Δθ  r sen φ Δ θ . (3.5)

e, dividindo ambos os membros por t obtemos no limite, quando t tende para


zero

ds
vP   r θ& senφ . (3.6)
dt

Podemos então concluir que o vetor velocidade de P é um vetor perpendicular

ao plano que contém o eixo OZ e OP , e o seu módulo é dado pela equação


(3.6).
Estas mesmas conclusões e resultados podem ser obtidas recorrendo a

cálculo vetorial. O vetor velocidade angular ω do corpo está dirigido segundo o


eixo de rotação e o seu sentido é obtido pela regra da mão direita. Podemos
então dizer que

0 r sen φ cos θ  r θ& sen φ sen θ


v P  ω x OP  0 x r sen φ sen θ  r θ& sen φ cos θ (3.7)
θ& r cos φ 0

ou seja,

FEUP – DEMec 49
3. Cinemática do Sólido Cinemática

v P  r 2 θ& 2 sen 2 φ sen 2 θ  r 2 θ& 2 sen 2 φ cos 2 θ  r θ& sen φ (3.8)

que é o mesmo resultado obtido na equação (3.6). Demonstra-se assim a


equivalência dos dois métodos e a justificação do uso do cálculo vetorial em
problemas mais complexos.

3.3.2 VETOR ACELERAÇÃO

A obtenção da aceleração do ponto P também pode ser feita


vetorialmente a partir da diferenciação da equação (3.7)

d vP
aP 
dt

d
dt

ω x OP 
 

 ω x OP  ω x OP
(3.9)
 α x OP  ω x v P

 α x OP  ω x ω x OP . 
Note-se que neste caso (movimento de rotação em torno de um eixo fixo), o

vetor aceleração angular do corpo α , é um vetor dirigido segundo o eixo de

rotação do corpo e de módulo igual à taxa de variação de ω com o tempo. A


aceleração de P é a soma de dois vetores. O primeiro vetor α x OP é tangente 
à trajetória descrita por P e é conhecido como sendo a componente

tangencial da aceleração. O segundo vetor é igual ao produto vetorial de ω

 
por ω x OP que representa a velocidade P e que, como sabemos, é tangente
à trajetória. Assim, o vetor resultante do referido produto, aponta para o centro

50 FEUP – DEMec
Cinemática 3. Cinemática do Sólido

de curvatura da trajetória (ponto B na figura 3.3) e é conhecido como


componente normal de aceleração.

3.4 MOVIMENTO GERAL DE UM SÓLIDO

Define-se movimento geral de um sólido como sendo um movimento que


não seja de translação nem de rotação. No entanto, como facilmente se
demonstra na figura 3.4, o movimento geral pode ser sempre considerado
como a soma de uma translação com uma rotação. Assim, consideremos
uma barra AB que se vai deslocar para uma posição AB  . Neste seu
deslocamento, podemos assumir que a barra translada entre a posição inicial e
uma posição intermédia AB  para, finalmente adquirir a sua posição final
através de uma rotação em torno de um eixo que contém A (ver figura 3.4
(a)). Do mesmo modo poderíamos também assumir que a barra transladava
entre AB e AB  e que adquiria a sua posição final através de uma rotação em
torno de B  (ver figura 3.4 (b)).

B
B '' B
B'

B'
 w

A'
A A'
A A''
w

(a) – Translação + Rotação (b) – Translação + Rotação

Figura 3.4 – Movimento geral de um sólido.

FEUP – DEMec 51
3. Cinemática do Sólido Cinemática

3.4.1 VETOR VELOCIDADE

Vejamos agora como se pode obter de uma forma expedita o vetor


velocidade num movimento geral. Observemos a figura 3.5 que representa um
sólido em movimento relativamente a um referencial S0. A posição do ponto P
do sólido fica definida pela equação vetorial.

z0
z
1
P

y
1

O1

x1

y
0
x0

Figura 3.5 – Sólido em movimento relativamente a S0.

OP  OO 1  O1P . (3.10)

Para calcular a velocidade de P fazemos

  
OP  OO1  O1P . (3.11)
S0 S0 S0

Todavia, O1P é um vetor constante no referencial S1 solidário do sólido, uma


vez que são dois pontos do corpo considerado rígido. Podemos então escrever

52 FEUP – DEMec
Cinemática 3. Cinemática do Sólido

 
O1P  O1P  ω x O1P . (3.12)
S0 S1


sendo que O1P é nulo e ω representa a velocidade angular instantânea do
S1

referencial S1 relativamente a S0. Rescrevendo a equação (3.11) temos

v P  v O1  ω x O1P . (3.13)

Esta equação, conhecida como primeira equação de Mozzi diz-nos que a


velocidade de um ponto genérico P de um sólido em movimento se pode
considerar como sendo a soma de dois vetores:

 um vetor constante v O1 , que é a velocidade de um ponto O1 arbitrário


tomado para pólo. Este vetor num dado instante é o mesmo para todos
os pontos de um sólido e pode ser considerado como a componente de
translação;

 a velocidade ω x O1P , que o ponto P teria se estivesse animado de um

movimento de rotação de velocidade angular instantânea ω , em torno


de O1 .

Como conclusão podemos afirmar que o regime cinemático de um sólido


num dado instante fica determinado se conhecermos a velocidade de um dos

seus pontos v O1 e o vetor ω , ou seja, se conhecermos as coordenadas de um

torsor de velocidades ( ω , v O1 ), sendo ω o vetor principal e v O1 o vetor

momento. O vetor principal do torsor ( ω ) é um invariante vetorial do sistema


num dado instante, ou seja, é um vetor livre e como tal não depende do ponto
do sólido que esteja a ser considerado. Efetivamente, num dado momento, as
velocidades de dois pontos P e Q do sólido podem ser dadas por:

FEUP – DEMec 53
3. Cinemática do Sólido Cinemática

v P  v O1  ω x O1P
(3.14)
v Q  v O1  ω x O1Q .

Subtraindo membro a membro temos

v P  v Q  ω x QP . (3.15)

Podemos também obter a velocidade de P diretamente a partir de Q, admitindo

que o vetor velocidade angular em Q, ω  , é diferente de ω . Temos então,

v P  v Q  ω x QP . (3.16)

Como o ponto P não pode ter duas velocidades distintas no mesmo instante,

conclui-se imediatamente que ω  ω  .

O vetor momento do torsor ( v ) depende, obviamente, do ponto


considerado. A relação entre a velocidade de dois pontos diferentes num
mesmo instante é susceptível de ser obtida a partir da primeira equação de
Mozzi. Pode-se assim afirmar que este torsor permite a obtenção do campo de
velocidades contemporâneas.

3.4.1.1 Propriedade Projetiva

Uma importante propriedade do campo de velocidades, é o facto das


projecções das velocidades de dois pontos quaisquer sobre a reta que os une
ser constante. É conhecida como propriedade projetiva e demonstra-se de
uma forma simples. Como num corpo rígido a distância entre dois pontos P e Q
quaisquer é invariável temos,

PQ   K
2
(3.17)

54 FEUP – DEMec
Cinemática 3. Cinemática do Sólido

sendo K uma constante. Em termos vetoriais pode-se escrever (3.17) como o

produto interno de PQ por si próprio, ou seja,

PQ PQ  K (3.18)

e, derivando em ordem ao tempo teremos

PQ
2 PQ  d 0 . (3.19)
dt

O vetor PQ pode ser escrito como

PQ  OQ  OP (3.20)

que, derivando em ordem ao tempo origina

d PQ
 vQ  v P . (3.21)
dt

Retomando a equação (3.19) podemos escrever

 
PQ  v Q  v P  0 (3.22)

o que origina

PQ  v Q  PQ  v P (3.23)

que traduz o facto da projeção da velocidade de dois pontos quaisquer P e Q


sobre a reta que os une ser constante. A figura 3.6 (sistema biela-manivela)
elucida-nos como, através da propriedade projectiva, podemos obter
graficamente, a velocidade do êmbolo (ponto B) a partir do conhecimento da

FEUP – DEMec 55
3. Cinemática do Sólido Cinemática

velocidade de rotação da manivela ω . A velocidade do ponto A (articulação


entre a manivela e a biela) é obtida através da relação

v A  ω x OA . (3.24)

vA
A

w B

O vB
Figura 3.6 – Exemplo de aplicação da propriedade projectiva.

A projeção de v A na direção de AB será a mesma de v B no ponto B


(articulação entre a biela e o êmbolo). Como conhecemos a direção da

velocidade do êmbolo (translação horizontal), obtemos v B uma vez que


sabemos que é um vetor horizontal cuja projeção na direção AB é conhecida.

3.4.2 VETOR ACELERAÇÃO

Para obtermos o vetor aceleração do ponto P basta-nos derivar a


primeira equação de Mozzi (equação (3.13)). Assim temos,

   

aP  vP  vO 1 ω x O1P  ω x O1P (3.25)


s0 s0 s0 s0

e, com a ajuda da equação (3.12) obtemos

a P  a O1  α x O1P  ω x ω x O1P .   (3.26)

56 FEUP – DEMec
Cinemática 3. Cinemática do Sólido

que é conhecida como segunda equação de Mozzi e que nos diz que a
aceleração de um ponto P é a soma de três componentes (ver figura 3.7):

 a aceleração a O1 de um ponto O1 de referência, arbitrário, que é a


mesma para todos os pontos do sólido no mesmo instante e que pode
ser considerada como a componente de translação;

 uma aceleração tangencial a t  α x O1P , que o ponto P teria se estivesse


animado de um movimento de rotação em torno de O1 . Note-se que no

movimento geral de um sólido o vetor ω pode variar em grandeza e em

direção e que portanto α não tem necessariamente a direção de ω ,


como acontecia no movimento de rotação;

  
uma aceleração normal a n  ω x ω x O1P , que o ponto P teria se
estivesse animado de um movimento de rotação em torno de O1 .

z0

P
at

aO1 an

O1
O
aO1

y
0
x0

Figura 3.7 – Vetor aceleração num movimento mais geral de um sólido.

Vejamos um exemplo de um mecanismo com este tipo de movimento na


figura 3.8.

FEUP – DEMec 57
3. Cinemática do Sólido Cinemática

z2
z0 z1 z 1' P
 2
OO1=e

  r y1

O1 1

O
x2
x1

Figura 3.8 – Movimento geral de um sólido (corpo 2).

O corpo 1 roda em torno do eixo vertical z0 com velocidade angular θ& . Por sua

vez, o corpo 2 roda relativamente ao corpo 1 em torno de um eixo x 2 com

velocidade angular β& . Os dois eixos de rotação destes dois movimentos


contêm os pontos O e O1 que se encontram separados por uma distância e. O
facto destes eixos não se intersetarem implica a inexistência de pontos de
velocidade nula do corpo 2 e do espaço a ele associado. Podemos então
apresentar algumas características deste tipo de movimento:

 o invariante escalar do torsor do campo de velocidades


contemporâneas, que se obtém através do produto interno do vetor

momento do torsor num ponto qualquer ( v O1 por exemplo) pelo vetor

 
principal ω 20 do torsor, é diferente de zero

 e θ&  β&
Ι  v O1  ω 20  0  0  e β& θ&  0 . (3.27)
0 θ&

58 FEUP – DEMec
Cinemática 3. Cinemática do Sólido

 o eixo central que representa o lugar geométrico dos pontos onde o


vetor momento do torsor de velocidades é mínimo, é o suporte do vetor

ω 20 e designa-se por Eixo Instantâneo de Rotação (EIR), e costuma


representar-se por T20. Neste caso a sua posição varia de instante para
instante e diz-se que o movimento é tangente a um movimento
helicoidal. Voltaremos a este assunto mais à frente.

3.5 MOVIMENTOS PARTICULARES DOS SÓLIDOS

3.5.1 MOVIMENTO PLANO

O movimento plano é um caso particular do movimento mais geral de um


sólido. Pode-se dizer que o movimento de um sólido é plano quando todos
os seus pontos descrevem trajetórias situadas em planos paralelos entre
si. Torna-se assim suficiente estudar o movimento de qualquer das figuras
descritas pela trajetória do sólido num plano qualquer paralelo ao plano de
movimento.

y0

y1 vP

P x1
vO w
1
O1

O x0

Figura 3.9 – Movimento plano de um sólido.

FEUP – DEMec 59
3. Cinemática do Sólido Cinemática

Consultando a figura 3.9 podemos calcular a velocidade de um ponto genérico


P do sólido recorrendo à primeira equação de Mozzi,

v P  v O1  ω x O1P . (3.28)

e constatar que as características intrínsecas a qualquer movimento plano são:

 os vetores posição OO 1 e O1P , e os vetores velocidade v O1 e v P estão

todos no mesmo plano que é também o plano do movimento;

 o vetor velocidade angular ω é perpendicular ao plano do movimento e,


portanto, perpendicular aos vetores posição e velocidade;
 o invariante escalar do torsor de velocidades é nulo, uma vez que são
vetores perpendiculares

  vP ω  0 . (3.29)

Neste caso o valor da velocidade no eixo central é nulo;


 a interseção do eixo central (ou EIR) com o plano do movimento é o
Centro Instantâneo de Rotação Ι  , que representa o ponto solidário

do plano que tem velocidade nula nesse instante v   0 .

3.5.1.1 Métodos para a obtenção do Centro Instantâneo de Rotação (CIR)

Dada a importância que o centro instantâneo de rotação adquire na


caracterização de um movimento plano, vamos estudar, desde já, dois métodos
gráficos expeditos para a sua obtenção.

3.5.1.1.1 Método da perpendicularidade

Se conhecermos, num dado instante, a velocidade de um ponto qualquer


P no movimento plano, podemos, através da primeira equação de Mozzi
relacioná-la com a velocidade do CIR,

60 FEUP – DEMec
Cinemática 3. Cinemática do Sólido

v P  v   ω x ΙP (3.30)

mas, pela própria definição v   0 e portanto

v P  ω x ΙP . (3.31)

Pela regra do produto vetorial, e tendo em conta que ω é perpendicular ao

plano do movimento, concluímos imediatamente que o vetor ΙP será

perpendicular a v P que se pressupôs conhecida. Caso conheçamos também a


velocidade de um outro ponto Q que não seja colinear com P e Ι , podemos

obter uma segunda perpendicular a v Q que também conterá o ponto  ,


bastando para tal escrever a equação (3.31) entre Q e  ,

v Q  ω x ΙQ . (3.32)

A intersecção destas duas perpendiculares permite a fácil obtenção do CIR.


Para exemplificar recordemos, uma vez mais, o sistema biela-manivela (ver
figura 3.10). O CIR do corpo 1 é obviamente o ponto O. O êmbolo (corpo 3)
tem um movimento de translação rectilíneo. Nestas circunstâncias assume-se
que o respectivo CIR (  30 ) se encontra no infinito numa direção perpendicular

à da translação1. A regra da perpendicularidade aplica-se na perfeição à


determinação de  20 . De facto, o conhecimento da velocidade de dois pontos

do corpo 2 ( v A e v B ) permite a obtenção de duas perpendiculares que se


intersectam em  20 . Note-se que, ao contrário do que acontece a propósito do

 10 que é fixo,  20 muda de posição de instante para instante (voltaremos a


este assunto mais à frente). Por outro lado, neste caso, nem era necessário
conhecer as velocidades dos pontos A e B. Na realidade a análise do

movimento do corpo 1 permite a obtenção da direção de v A (perpendicular a

1 Matematicamente, uma linha reta corresponde a um arco de circunferência de raio infinito.

FEUP – DEMec 61
3. Cinemática do Sólido Cinemática

OA ). A direção de v B também é conhecida à partida, devido ao movimento de


translação retilínea a que o corpo 3 está submetido. Assim sendo, as
perpendiculares a estas duas direções determinam  20 .

I 20

vA 8

I30
2
1 A
3

w
B
O I10 vB

Figura 3.10 – Determinação dos CIR no sistema biela-manivela.

3.5.1.1.2 Método da proporcionalidade

Durante a apresentação do método anterior, foi referido que o ponto Q


não poderia ser colinear com P e  . Se tal acontecer (ver figura 3.11) o
conhecimento da velocidade nos dois pontos origina duas perpendiculares
coincidentes, o que impossibilita a obtenção do respectivo CIR. Por outro lado,
através da análise das equações (3.31) e (3.32), rapidamente concluímos que
os módulos das velocidades de dois pontos são proporcionais às suas
distâncias em relação a  . Assim, se dois pontos P e Q de velocidade
conhecida estão alinhados com  , a determinação gráfica de  obtém-se por
proporcionalidade.

vP
vQ

I Q P

Figura 3.11 – Método da proporcionalidade na determinação do CIR.

62 FEUP – DEMec
Cinemática 3. Cinemática do Sólido

3.5.2 MOVIMENTO POLAR

O movimento polar é o movimento de um sólido que mantém um único


ponto permanentemente fixo no espaço de referência. Voltemos a analisar o
mecanismo já estudado no capítulo 2 (ver figura 3.12). A rotação do disco
(movimento do corpo 1 relativamente a S0) é feita em torno de um eixo (z0  z1)
que contém o ponto O. Por sua vez, a rotação da barra (corpo 2) relativamente
ao disco (corpo 1) faz-se em torno de um eixo (x1  x2) que também contém O.
Logo, este ponto é um ponto fixo do espaço.

z0 z1
 P z
2

 r 2

1
O
 y1

 y0
x0 
x1 x 2
y2
Figura 3.12 – Mecanismo com movimento polar.

Neste tipo de movimento, o invariante escalar é nulo. O eixo central (ou

EIR), que contém o vetor ω e, permanentemente, o ponto O, muda de direção

de instante para instante, o que obviamente também sucede ao vetor ω .

3.5.3 MOVIMENTO HELICOIDAL

O movimento helicoidal é um movimento em que todos os pontos do


sólido descrevem hélices em torno de um eixo fixo (ver figura 3.13).

FEUP – DEMec 63
3. Cinemática do Sólido Cinemática

z z1

O1

x1 y1

O vP
 r

x y

Figura 3.13 – Movimento helicoidal de um sólido cujo ponto O1 pertence ao


eixo central.

Existe um eixo fixo no espaço (EIR), e o sólido translada segundo a sua


direção e roda em torno dele, de tal modo que a rotação e a translação mantêm
uma relação constante entre si. No movimento helicoidal existe
proporcionalidade entre as duas componentes da velocidade, que se escreve

v P  r θ& i θ  z&O1 k (3.33)

sendo que

 r θ& i θ corresponde à rotação em torno de z e é-lhe perpendicular

 z&O1 k corresponde à translação retilínea segundo z e cujo módulo é

proporcional ao módulo da componente de rotação, ou seja,

z&O1  h r θ& (3.34)

onde h representa o coeficiente de proporcionalidade.

64 FEUP – DEMec
Cinemática 3. Cinemática do Sólido

Neste movimento, o invariante escalar é diferente de zero, pois o vetor ω tem


a direção do eixo z (eixo central). Como a velocidade também tem uma
componente segundo z temos,

I  z&O1 k  ω  0 . (3.35)

A conclusão imediata é que o eixo central que, recorde-se, representa o lugar


geométrico dos pontos onde o vetor momento do torsor das velocidades é
mínimo, não é neste caso, um eixo de velocidades nulas. Podemos então dizer
que o EIR num movimento helicoidal é o lugar geométrico dos pontos onde a
velocidade é mínima e não nula, e onde os dois vetores do torsor de
velocidades têm a mesma direção.

3.6 SÍNTESE DO CAPÍTULO 3

Após uma abordagem inicial aos movimentos de translação e rotação,


que foram estudados em termos de vetor velocidade e vetor aceleração,
passou-se à análise do movimento mais geral de um sólido. Concluiu-se que
este tipo de movimento, pode ser sempre considerado como a soma de uma
translação com uma rotação e foram apresentadas as equações de Mozzi da
velocidade e da aceleração. De seguida, foram estudados casos particulares
de movimentos de sólidos, nomeadamente o movimento plano, o movimento
polar e o movimento helicoidal. A caracterização destes movimentos foi feita
tendo por base a teoria dos torsores e as principais conclusões sintetizam-se
em função do valor do invariante escalar. Assim temos:

I) Invariante escalar nulo (  =0)

Como o invariante escalar é o produto interno do vetor velocidade pelo vetor


rotação, podemos ter diversas hipóteses:

FEUP – DEMec 65
3. Cinemática do Sólido Cinemática

 Ambos os vetores são nulos ( ω =0 ; v P =0).


Este caso retrata obviamente a ausência de movimento.

 Vetor rotação nulo, mas vetor velocidade diferente de zero ( ω =0 ;

v P ≠0).
Aplicando a primeira equação de Mozzi entre dois pontos quaisquer
temos

v P  v O1  ω x O1P . (3.36)

Uma vez que o vetor rotação é nulo, temos que v P  v O1 quaisquer que

sejam P e O1. Estamos então, em presença de um movimento de


translação onde todos os pontos do sólido têm a mesma velocidade.

 Vetor rotação não nulo e vetor velocidade nulo ( ω ≠0 ; v P =0)


Neste caso duas situações podem ocorrer:

- se ω é diferente de zero e tem direção constante, e P é um ponto

fixo e permanentemente sem velocidade, então ω pertence a um eixo


de rotação que coincide com o eixo central e o sólido está animado de
movimento de rotação. Todos os pontos não pertencentes ao eixo têm

velocidades perpendiculares a este, isto é v P é sempre perpendicular a

ω;
- se P é o único ponto fixo do sólido, este está animado de
movimento polar. O movimento em cada instante é como se fosse uma

rotação de vetor ω , que passa sempre por P, mas que não mantém a
direção fixa no tempo.

66 FEUP – DEMec
Cinemática 3. Cinemática do Sólido

 Ambos os vetores do torsor são diferentes de zero mas, qualquer que

seja o ponto considerado, são sempre perpendiculares entre si ( ω ≠0 ;

v P ≠0 ; ω  v P P).
Neste caso, todos os pontos do sólido descrevem trajetórias situadas em
planos paralelos entre si, ou seja, o sólido está animado de movimento

plano. O sólido roda em cada instante em torno do vetor ω , eixo central


do torsor, que se mantém paralelo a si próprio, mas que pode mudar
constantemente de posição.

Vale a pena referir que os movimentos descritos nos dois últimos pontos,

caracterizados por ω ≠0, se costumam englobar numa única designação que é,


movimentos tangentes a uma rotação.

II) Invariante escalar não nulo (  ≠0)

 O vetor rotação e o vetor velocidade são paralelos sobre o eixo central

que é fixo ( ω  v O sendo O um ponto do eixo central).

Se a direção de ω é fixa e nos pontos do eixo central o sólido translada

paralelamente a ω , estaremos em movimento helicoidal se existir

uma relação linear entre v P e ω x OP .

 O vetor rotação e o vetor velocidade são paralelos sobre o eixo central

que muda de direção de instante para instante ( ω  v O sendo O um


ponto do eixo central).
Se o eixo central não é fixo no espaço e o invariante escalar não é nulo,
o sólido está animado de um movimento instantaneamente helicoidal,
isto é tudo se passa como se o sólido tivesse um movimento helicoidal
em torno do eixo central que muda de direção a cada instante. Esta é a
característica de um movimento geral de um sólido.

FEUP – DEMec 67
3. Cinemática do Sólido Cinemática

3.7 EXERCÍCIOS PROPOSTOS

Para os mecanismos representados nas figuras 2.12, 2.13 e 2.14


determine:

a) Os campos de velocidades de todos os corpos.

b) A velocidade do ponto P.

c) Os campos de acelerações de todos os corpos.

d) A aceleração do ponto P.

68 FEUP – DEMec
Cinemática 4. Teoria de Movimentos Relativos

CAPÍTULO 4

TEORIA DE MOVIMENTOS
RELATIVOS
4.1 INTRODUÇÃO

Sabemos que o movimento de um corpo em relação a um referencial se


traduz pela alteração da sua posição relativa. Vimos também, que conhecer o
movimento do sólido é equivalente a conhecer, em cada instante, a posição do
referencial que lhe está intrinsecamente associado. Até agora estudámos
unicamente o movimento relativamente a referenciais que considerámos fixos.
Neste capítulo vamos estudar o movimento relativamente a corpos (ou
referenciais) que também se movimentam em relação a um terceiro referencial.
Intuitivamente, sabemos que o movimento relativamente a um referencial S0 é
diferente do movimento em relação a S1, isto é, são diferentes as trajetórias, as
velocidades e as acelerações relativamente a cada um deles. Regressando ao
exemplo dos passageiros do autocarro que se movimenta, facilmente
entendemos que o movimento do passageiro (A) que se desloca no corredor do
autocarro, relativamente ao passageiro (B) sentado no mesmo autocarro, é
diferente do movimento em relação a um terceiro indivíduo (C) imóvel na
paragem. Poderá até acontecer que, em translação, (A) se encontre imóvel

FEUP – DEMec 69
4. Teoria de Movimentos Relativos Cinemática

relativamente a (C) se o movimento de (A) em relação a (B) tiver a mesma


velocidade, mas sentido contrário ao movimento de (B) relativamente a (C).
Na Teoria dos Movimentos Relativos (TMR) temos de considerar três
referenciais (ver figura 4.1):

• S0 – Referencial de base – É considerado o referencial fixo;


• S1 – Referencial móvel intermédio – Este referencial move-se
relativamente ao anterior, mas não é solidário do movimento do sólido
em análise;
• S2 – Referencial móvel solidário do sólido – Move-se em relação aos
outros dois já considerados e acompanha o movimento do sólido em
análise.

z2

z0 P
B
x2

S2
O z y2
y0 1

x0
S0 y
1

x1 S1

Figura 4.1 – Referenciais usados na TMR.

Podemos então definir três tipos de movimentos diferentes:

• Movimento Absoluto – É o movimento de S2 relativamente a S0;


• Movimento Relativo – É o movimento de S2 relativamente a S1;
• Movimento de Transporte – É o movimento do ponto de S1, que no
instante considerado coincide com o ponto em análise de S2,

70 FEUP – DEMec
Cinemática 4. Teoria de Movimentos Relativos

relativamente a S0. Pode-se também dizer, que este movimento traduz o


efeito que o movimento do referencial S1 tem sobre o movimento final do
ponto P.

Os movimentos absoluto e relativo são facilmente entendíveis à luz do


exemplo do autocarro anteriormente referido. Assim, o movimento absoluto é o
do passageiro (A) em relação a (C) e o movimento relativo o do passageiro (A)
relativamente a (B). O movimento de transporte é o do ponto do autocarro
coincidente com a posição do passageiro (A), no instante considerado,
relativamente a (C). Vejamos um segundo exemplo que nos ajude a entender
melhor o conceito do movimento de transporte (ver figura 4.2). Imaginemos um
cursor que se move ao longo de uma guia circunferencial de raio R, com
velocidade vc, e dois pontos P e Q que se deslocam relativamente ao cursor
com velocidades vP e vQ supostas iguais. O movimento de transporte destes
dois pontos é o dos pontos do cursor que, no instante considerado, coincidem
com eles.

vP
vc
P
r
r Q

vQ

Figura 4.2 – Movimento de transporte.

FEUP – DEMec 71
4. Teoria de Movimentos Relativos Cinemática

Como é óbvio, neste caso o movimento de transporte de P é diferente do


de Q, pois a distância OP = R + r é superior a OQ = R − r . Assim, embora as
velocidades relativas sejam iguais, o movimento absoluto destes pontos será
diferente devido à sua componente de transporte.

4.2 VELOCIDADES

4.2.1 CAMPO DE VELOCIDADES

Para a obtenção do campo de velocidades absoluta, relativa e de


transporte podemos, recorrendo à figura 4.1, começar por escrever a seguinte
relação,

OP = OA + AP (4.1)

sendo P um ponto genérico do espaço S2. Derivando temos,

• • •

OP = OA + AP (4.2)
s0 s0 s0

Como o ponto O é um ponto fixo (pertencente a S0), as derivadas relativamente


uuur uuuur
a S0 dos vetores OP e OA originam velocidades relativamente a S0. O mesmo
uuur
não acontece com o vetor AP , dado que a origem do vetor (o ponto A) não
pertence a S0, mas sim a S1. Por este motivo, vamos executar a derivada
uuur
relativamente a S0 do vetor AP derivando relativamente a S1 e recorrendo ao
Teorema das Derivadas Relativas. Escreve-se então,

ur uur •r
uuu ur uuur
v P20 = v A + AP + ω10 x AP (4.3)
10 s1

72 FEUP – DEMec
Cinemática 4. Teoria de Movimentos Relativos

•r
uuu
O vetor AP representa a variação da distância entre o ponto A (pertencente a
s1

S1) e o ponto P vista por um observador solidário de S1, dado que a derivada é
executada relativamente a S1. Este vetor representa assim a velocidade do
ur
ponto P de S2 relativamente a S1, v P21 . Reescrevendo a equação anterior

v P20 = v P21 + ( v A10 + ω10 x AP ) (4.4)

sendo que as parcelas entre parêntesis representam a velocidade absoluta de


um ponto de S1 (designemo-lo por P1) coincidente com P no instante
considerado. Podemos então escrever,

v P20 = vP21 + vP10 (4.5)

o que se traduz pelo facto de a velocidade absoluta ser igual à soma da


velocidade relativa a S1 com a de transporte de S1. Obviamente, que esta
relação também se aplica aos vetores rotação, daí que possamos concluir que:
“O campo de velocidades contemporâneas absolutas pode ser decomposto
na soma de um campo de velocidades relativas a dado referencial, com um
campo de velocidades de transporte, que acaba por ser um campo de
velocidades absolutas deste último referencial”. Podemos então escrever,

ω 20 = ω 21 + ω 10
(4.6)
v P20 = v P21 + v P10 ∀P ∈ S 2

e, no caso geral teremos,

ω n 0 = ω n,n −1 + ... + ω10


(4.7)
v Pn 0 = v Pn,n −1 + ... + v P10 ∀P ∈ S n

FEUP – DEMec 73
4. Teoria de Movimentos Relativos Cinemática

Vejamos o exemplo da figura 4.3. O cursor (corpo 2) translada ao longo da


barra (corpo 1) com uma velocidade s&(t ) . Por sua vez a barra roda em torno do

ponto O com velocidade angular θ&(t ) . Vamos calcular o campo de velocidades


absolutas do corpo 2 nos pontos A e B,

h
B
2 l

1
A
θ
O
s(t)

Figura 4.3 – Mecanismo em movimento plano.

Ponto A
0
ω20 = ω21 + ω10 =0 (4.8)
S1 S1 S1
θ&

v A20 = v A21 + v A10 (4.9)


S1 S1 S1

sendo
s&
v A21 =0 (4.10)
S1
0

e
0
v A10 = v O10 + ω10 x OA = θ& s . (4.11)
S1 S1 S1 S1
0

74 FEUP – DEMec
Cinemática 4. Teoria de Movimentos Relativos

Ponto B

O vetor ω , sendo o vetor principal do torsor das velocidades, é um


invariante vetorial, logo é o mesmo em qualquer ponto do espaço. Quanto ao
vetor velocidade temos,

v B20 = v B21 + v B10 . (4.12)


S1 S1 S1

De imediato se conclui que v B21 = v A21 , pois o movimento do corpo 2


relativamente ao corpo 1 é uma translação, o que significa que todos os pontos
neste movimento têm a mesma velocidade. Para a velocidade de transporte
aplicamos a primeira equação de Mozzi,

− θ& l
v B10 = vO10 + ω10 x OB = θ& (s + h ) . (4.13)
S1 S1 S1 S1
0

Conclui-se de imediato que a velocidade de transporte é diferente para os


pontos A e B. De facto, os pontos do espaço associado ao referencial S1 que
coincidem com A e B no instante considerado têm vetores posição diferentes
em relação ao ponto O, que é o CIR do movimento do corpo 1 em relação a S0.

4.2.2 DETERMINAÇÃO DOS CIR PELA PROPRIEDADE DO ALINHAMENTO

A TMR permite a definição de um método alternativo para a obtenção


gráfica da posição de CIR em movimentos planos. A propriedade do
alinhamento dos CIR de movimentos que se decompõem entre si é muito útil e
facilmente demonstrável. Imaginemos três corpos i, j e k. Pela TMR podemos
escrever
 i   i  j 
  =     . (4.14)
k   j k 

FEUP – DEMec 75
4. Teoria de Movimentos Relativos Cinemática

Suponhamos conhecidos os CIR dos movimentos ik e jk e tentemos determinar


a posição do CIR ij que vamos designar por P. Numa primeira análise (ver
figura 4.4 (a)) vamos admitir uma posição qualquer para P e calcular as
velocidades dos movimentos ik e jk em P. Temos então que

v Pik = ω ik x I ik P
(4.15)
v Pjk = ω jk x I jk P.

As equações anteriores permitem a obtenção gráfica de dois vetores v Pik e v Pjk

que têm direções diferentes. A partir da equação (4.14) podemos escrever

vPik = v Pij + v Pjk (4.16)

e, uma vez que P é o CIR ij, vPij = 0 , ou seja,

vPik = vPjk . (4.17)

Direcção de P Direcção de
vP ik vPjk

Direcção comum de
vP jk e vP
ik

P
I ik I jk I ik I jk

(a) (b)
Figura 4.4 – Propriedade do alinhamento dos CIR de movimentos que
decompõem entre si.

Imediatamente se conclui que, para que a equação (4.17) se verifique, é


necessário que o ponto P pertença à reta que une I ik e I jk (ver figura 4.4 (b)),

dado que só nessa reta os dois vetores têm a mesma direção. Podemos então

76 FEUP – DEMec
Cinemática 4. Teoria de Movimentos Relativos

dizer que os CIR de movimentos que se decompõem entre si estão sempre


alinhados segundo a mesma reta.

Retomemos o sistema biela-manivela (ver figura 4.5) para ilustrar a


aplicação desta propriedade. À partida identificamos logo alguns CIR, tais
como:

• I 10 ≡ O

• I 21 ≡ A
• I 32 ≡ B

• I 30 no infinito e na perpendicular à translação do corpo 3.

Para a obtenção gráfica de I 20 podemos fazer as seguintes decomposições:

 2   2   1
1º   =     - daqui ficamos a saber que I 20 estará sobre a reta
 0   1  0 
que une os pontos O e A;
 3   3   2
2º   =     - daqui concluímos que I 20 estará sobre a reta
 0  2  0
vertical que passa por B.

A interseção das duas retas permite a obtenção imediata da posição do I 20 .

I 20

8
I30

2
1
A I 21
3

w
O I10 B I32
Figura 4.5 – Determinação de I 20 pela regra do alinhamento.

FEUP – DEMec 77
4. Teoria de Movimentos Relativos Cinemática

4.3 ACELERAÇÕES

Para a obtenção das acelerações pela TMR podemos partir da derivação da


equação (4.5),

• • •
v P20 = v P21 + v P10 (4.18)
S0 S0 S0

sendo que

v P20 = a P20 (4.19)
S0

• •
v P21 = v P21 + ω10 x v P21 (4.20)
S0 S1

sendo


v P21 = aP21 . (4.21)
S1

Quanto a v P10 temos (ver equação (4.4)),


S0

• • • •

v P10 = v A10 + ω 10 S x AP + ω10 x ( AP + ω10 x AP ) (4.22)


S0 S0 0 S1

ou

v P10 = a A10 + α10 x AP + ω10 x v P21 + ω10 x (ω10 x AP) . (4.23)


S0

78 FEUP – DEMec
Cinemática 4. Teoria de Movimentos Relativos

Substituindo as equações (4.19) a (4.23) na equação (4.18) temos

aP20 = aP21 + a A10 + α10 x AP + ω10 x (ω10 x AP ) + 2 ω10 x v P21 (4.24)

e, finalmente,

aP20 = a P21 + a P10 + 2 ω10 x vP21 (4.25)

sendo que,

• a P20 é a aceleração absoluta e representa a aceleração que o ponto P do


referencial S2 tem relativamente a um observador solidário de S0;

• a P21 é a aceleração relativa e representa a aceleração do ponto P do


referencial S2 relativamente a um observador solidário de S1;

• a P10 é a aceleração de transporte e representa a aceleração de um


ponto P1 solidário de S1 que no instante considerado coincide com P;

• 2 ω10 x v P21 é a aceleração de Coriolis e representa o efeito que a

mudança de direção da velocidade relativa ( v P21 ) tem na aceleração


absoluta.

Note-se que, se não fosse o termo respeitante à aceleração de Coriolis,


poder-se-ia escrever uma relação semelhante a (4.5) para a aceleração.
Contudo, é claro que tal relação estaria incorreta e, por isso, devemos
incluir o termo adicional de Coriolis. Como já foi dito, a mudança de direção
de velocidade relativa origina esta componente de Coriolis. Assim, se o
movimento de transporte não for de translação e, portanto se caracterizar

por ω ≠ 0 , a aceleração de Coriolis não será nula. O conceito da aceleração


de Coriolis é extremamente útil, por exemplo no estudo do movimento de
projéteis de longo alcance que são consideravelmente afetados pela

FEUP – DEMec 79
4. Teoria de Movimentos Relativos Cinemática

rotação da Terra. No caso geral de movimentos mais complexos poderemos


escrever

aPn 0 = a Pn,n−1 + ... + a P32 + a P21 + a P10 + 2 ωn −1,0 x vPn ,n−1 + ... + 2 ω10 x vP21 . (4.26)

Note-se que, ao contrário do que acontece com os vetores rotação (ver


as primeiras equações (4.6) e (4.7)) os vetores aceleração angular não são
decomponíveis entre si. Devem ser sempre obtidos por derivação dos
respetivos vetores rotação.

4.4 PARALELISMO ENTRE A TMR E O TEOREMA DAS


DERIVADAS RELATIVAS

Vamos de seguida demonstrar que em alguns casos particulares, existe


uma correspondência entre a TMR e o Teorema das Derivadas Relativas. O

paralelismo ocorre quando um determinado vetor OP tem a sua origem


solidária do referencial móvel intermédio, relativamente ao qual se vai proceder
à derivação. Caso o ponto O não satisfaça esta condição o paralelismo não
existe.

No exemplo da figura 2.12, o vetor OP satisfaz as referidas condições e,


como vimos, a derivada total de P é dada por duas componentes:
• a derivada do vetor em relação ao referencial móvel; vamos demonstrar
que corresponde à velocidade relativa na TMR;
• a velocidade que resulta do referencial móvel rodar em relação ao fixo e

que é igual a ω x OP ; representa a velocidade de transporte na TMR


como veremos.

Retomemos o exemplo da figura 2.12 para verificarmos estas relações.


Assim, podemos calcular a velocidade do ponto P do corpo 2 fazendo:

80 FEUP – DEMec
Cinemática 4. Teoria de Movimentos Relativos

v P20 = v P21 + v P10 (4.27)


S1 S1 S1

sendo

v P21 = v O21 + ω 21 x OP =
S1 S1 S1 S1

(4.28)
− β& 0 0
&
= 0 + 0 x r sen β = r β cos β
0 r cos β − r β& sen β

v P10 = v O10 + ω 10 x OP =
S1 S1 S1 S1

(4.29)
0 0 − r θ& sen β
= 0 + 0 x r sen β = 0 .
&
θ r cos β 0

Comparando estes resultados com a equação (2.106) obtemos as seguintes


relações:

OP = v P21
s1 S1
S1

(4.30)
ω10 x OP = v P10 .
S1 S1 S1

Constata-se a existência de uma correspondência direta entre as duas teorias


ao nível dos vetores velocidade.
No que diz respeito aos vetores aceleração temos

FEUP – DEMec 81
4. Teoria de Movimentos Relativos Cinemática

aP20 = a P21 + aP10 + aPcor (4.31)


S1 S1 S1 S1

sendo que,

a P21 = a O21 + α 21 x OP + ω 21 x  ω 21 x OP  (4.32)


S1 S1 S1 S1 S1  S1 S1 

ou seja,

0
a P21 = r β cos β − r β& 2 sen β
&& (4.33)
S1
− r β&& sen β − r β& 2 cos β

e,

aP10 = aO10 + α10 x OP + ω10 x  ω10 x OP  (4.34)


S1 S1 S1 S1 S1  S1 S1 

ou seja,

0
aP10 & 2
= − r θ sen β (4.35)
S1
0

e,

− 2 θ& β& r cos β


a Pcor = 2 ω10 x v P21 = 0 . (4.36)
S1
0

Na teoria da derivação de vetores tínhamos visto que (ver equação (2.113)),

82 FEUP – DEMec
Cinemática 4. Teoria de Movimentos Relativos

−θ& β& r cos β


ur•
v P20 = r β&& cos β − r β& 2 sen β (4.37)
s1
S1
−r β&& sen β − r β& 2 cos β

e que,

− θ& β& r cos β


uur ur
ω10 x vP20 = − θ& 2 r sen β (4.38)
s1 s1
0

donde imediatamente se conclui que

ur• r 1r
v P20 = aP21 + aPcor (4.39)
s1 2

uur ur r 1r
ω10 x v P20 = aP10 + aPcor (4.40)
2

o que evidencia que, ao contrário do que sucedia nos vetores velocidade, nos
vetores aceleração não há uma correspondência direta termo a termo. Na
realidade, na aceleração a componente de Coriolis divide-se em partes iguais
por cada uma das parcelas do Teorema das Derivadas Relativas.

4.5 SÍNTESE DO CAPÍTULO 4

Inicialmente, começámos por definir os três referenciais (base, móvel


intermédio e móvel solidário com o sólido), que nos permitiram definir os três
tipos de movimentos diferentes que surgem numa decomposição pela TMR:
absoluto, relativo e de transporte. Em seguida, obtiveram-se os campos de
velocidades e as relações entre eles. Ainda no âmbito das velocidades, fez-se
uma referência à propriedade do alinhamento dos CIR de movimentos planos

FEUP – DEMec 83
4. Teoria de Movimentos Relativos Cinemática

que se decompõem entre si. A apresentação das acelerações evidenciou um


modo distinto na decomposição de movimentos devido ao aparecimento do
termo de Coriolis. Finalmente, e para alguns casos particulares, mostrou-se a
existência de um paralelismo entre a TMR e o Teorema das Derivadas
Relativas para as velocidades, o que não se verificou para as acelerações.

4.6 EXERCÍCIOS PROPOSTOS

1) Para o mecanismo representado na figura 2.13 determine recorrendo


à TMR:
a) A velocidade absoluta do ponto P fazendo a decomposição
 2   2   1
  =     ;
 0   1  0 
b) A aceleração absoluta do ponto P fazendo a decomposição
 2   2   1
  =     .
 0   1  0 

2) Para o mecanismo representado na figura 2.14 determine recorrendo


à TMR:
a) A velocidade absoluta do ponto P fazendo as decomposições
 3   3   2   2   2   1
  =     e   =     ;
 0   2   0   0   1  0 
b) A aceleração absoluta do ponto P fazendo as decomposições
 3   3   2   2   2   1
  =     e   =     .
 0   2   0   0   1  0 

84 FEUP – DEMec
Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

CAPÍTULO 5

CINEMÁTICA DOS SÓLIDOS EM


CONTACTO PERMANENTE
5.1 INTRODUÇÃO

Existem inúmeras aplicações práticas de mecanismos em que dois ou mais


dos seus pontos se mantêm permanentemente em contacto segundo um ponto
ou uma reta, admitindo nesse ponto ou ao longo dessa reta um plano tangente
comum. Um caso típico, é o movimento de um automóvel, onde as rodas
contactam permanentemente com o piso. Os rolamentos, as engrenagens, as
transmissões por atrito são exemplos típicos de mecanismos onde se
encontram sólidos em contacto permanente.

5.2 IMPORTÂNCIA DO ROLAMENTO E ESCORREGAMENTO

Na maioria das situações o escorregamento ou deslizamento entre


sólidos é indesejável, uma vez que provoca aquecimento e desgaste prematuro
das superfícies, limitando as capacidades de trabalho do mecanismo e
reduzindo a vida útil dos corpos em contacto. A determinação da velocidade de
escorregamento é importante pois o seu valor condiciona as pressões
admissíveis pelos materiais que constituem os dois corpos. Quanto maiores

FEUP – DEMec 85
5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

forem as velocidades de escorregamento menores serão as pressões possíveis


de transmitir entre os sólidos para se evitarem desgastes prematuros.
O rolamento é essencial para diminuir o atrito e o desgaste entre os corpos
que contactam com movimento entre si. A ausência de escorregamento só é
possível se os sólidos contactarem apenas num ponto (contacto pontual) ou em
vários pontos colineares (contacto linear). Todavia, o contacto puramente
pontual ou linear entre dois corpos reais é uma idealização, uma vez que a
própria deformabilidade dos sólidos induz um contacto de carácter superficial
mais ou menos extenso em torno dos pontos de contacto.

5.3 SÓLIDOS EM CONTACTO PONTUAL

5.3.1 MOVIMENTO DE PERMUTAÇÃO

Consideremos dois sólidos S1 e S2 em movimento relativamente a um


referencial S0 suposto fixo e em movimento entre si, de tal modo que em cada
instante contactem num só ponto (ponto P na figura 5.1).

z0
S2
y0
O C2 π
x0
P

C1

S1

Figura 5.1 – Sólidos em contacto pontual. Trajetórias do ponto de contacto (C1


e C2) em cada um dos corpos.

Suponhamos também que os dois sólidos admitem um plano tangente


comum (π) no ponto P. Para uma melhor compreensão dos fenómenos
envolvidos vamos, artificialmente, separar o ponto P em três pontos diferentes
no contacto (P1, P2 e P3). Assim, na figura 5.2, em que os sólidos estão
artificialmente separados, vemos que:

86 FEUP – DEMec
Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

• P1 e P2 são os pontos materiais dos corpos 1 e 2 que coincidem com o


ponto de contacto;
• P3 é o ponto geométrico do espaço que, em cada instante, coincide com
o ponto de contacto; este ponto não pertence a nenhum dos dois corpos.

Em geral, o ponto de contacto entre os corpos 1 e 2 não permanece o


mesmo em cada um deles. Vai sendo substituído, ou seja, vai permutando de
instante para instante, pelo que quando observado a partir dos próprios sólidos
parece mover-se, descrevendo uma determinada trajetória. Esta sucessiva
alteração do ponto, que em cada um dos corpos é, em cada instante, ponto de
contacto, origina três trajetórias (ver figura 5.2):

• a permutação do ponto de contacto no corpo 2, quando observada a


partir do próprio corpo 2 origina a curva C2;
• a permutação do ponto de contacto no corpo 1, quando observada a
partir do próprio corpo 1 origina a curva C1;
• a curva C0 é a trajetória de descrita pelo ponto geométrico P3 no espaço
fixo S0.

C2

C0 P2
P3
P1

C1

Figura 5.2 – Identificação dos pontos materiais (P1 e P2) e geométrico de


contacto (P3) sobre as trajetórias em cada um dos corpos.

Note-se que, assim como C0, também as curvas C1 e C2 se podem imaginar


como sendo descritas pelo ponto P3 (ponto geométrico do espaço sempre

FEUP – DEMec 87
5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

coincidente com o ponto de contacto), relativamente a observadores solidários


dos corpos 1 e 2 respetivamente.

5.3.2 VELOCIDADE DE ESCORREGAMENTO

Comecemos por calcular a velocidade do ponto geométrico P3


relativamente ao referencial fixo recorrendo à decomposição pela TMR por
duas vias distintas:

 P3   P3   S1 
  =     (5.1)
 S 0   S1   S 0 

 P3   P3   S 2 
  =     (5.2)
 S0   S2   S0 

donde se conclui que

v P30 = v P31 + v P10 (5.3)

v P30 = v P32 + vP20 (5.4)

sendo que:

• v P31 e v P32 representam as velocidades de P3 relativamente a S1 e a S2


respetivamente, são tangentes às trajetórias C1 e C2 e estão contidas no
plano tangente comum;

88 FEUP – DEMec
Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

• v P10 e v P20 representam as velocidades dos pontos materiais P1 e P2


solidários de S1 e de S2 respetivamente, que coincidem com P3 no
instante considerado.

Igualando as equações (5.3) e (5.4) obtemos,

v P20 − v P10 = v P31 − vP32 = v e21 (5.5)

sendo que v e21 é a velocidade de escorregamento que se pode definir como:

“A velocidade de escorregamento entre dois corpos em movimento


com contacto pontual permanente entre si, é dada pela diferença das
velocidades referidas a um mesmo referencial de observação (fixo
ou móvel) dos pontos P2 e P1 solidários de um e de outro corpo que
coincidem com o ponto de contacto no instante considerado.”

Como facilmente se constata da equação (5.5), v e12 é igual e de sinal

contrário a v e21 . Da mesma equação se conclui que a velocidade de

escorregamento pertence ao plano tangente comum (π) aos dois sólidos em


contacto (ver figura 5.1), uma vez que é obtida pela diferença de dois vetores,

v P31 e v P32 , que pertencem a esse plano. Note-se que tal não implica que os

vetores v P10 e v P20 também estejam contidos nesse plano; a diferença entre

eles é que pertence ao plano π.

5.3.3 ESPECIFICIDADES DO TORSOR GERADOR DO MOVIMENTO


RELATIVO 2/1 NO PONTO DE CONTACTO

O torsor gerador do movimento de S2 relativamente a S1 no ponto de


contacto é dado por,

FEUP – DEMec 89
5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

(
τ P21 ≡ ω 21 ; v P21 ) (5.6)

sendo que os vetores se podem obter a partir do conhecimento de τ P20 e τ10


P
,

τ P21 = τ P20 − τ10


P
(5.7)

ou seja,

ω 21 = ω 20 − ω10
(5.8)
v P21 = v P20 − v P10

em que, como é obvio, v P21 é a velocidade de escorregamento. A

representação esquemática dos vetores de τ P21 está feita na figura 5.3, sendo

que ω 21 está projetado segundo o plano tangente (componente de rolamento

ω t ) e segundo a normal a esse plano (componente de giração ω n ).

S2

ωn
ω21
vP = ve
21 21
P
ωt

S1

Figura 5.3 – Representação esquemática do torsor τ P21 .

Num movimento relativo de dois corpos em contacto, poderão ocorrer os


seguintes casos:

90 FEUP – DEMec
Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

• Escorregamento puro: v e21 ≠ 0 , ωn = 0 e ωt = 0

• Rolamento puro: v e21 = 0 , ωn = 0 e ωt ≠ 0

• Giração pura: v e21 = 0 , ωn ≠ 0 e ωt = 0

• Rolamento + Giração: v e21 = 0 , ωn ≠ 0 e ωt ≠ 0

• Escorregamento + Rolamento: v e21 ≠ 0 , ωn = 0 e ωt ≠ 0

• Escorregamento + Giração: v e21 ≠ 0 , ωn ≠ 0 e ωt = 0

• Escorregamento + Rolamento + Giração: v e21 ≠ 0 , ωn ≠ 0 e ωt ≠ 0

Os casos mais importantes e aos quais vamos dar maior realce, relacionam-
se com o escorregamento e rolamento puros.

5.3.4 ESCORREGAMENTO PURO

Como se depreende da definição anterior, este caso traduz-se por


ausência completa de rotação no movimento 2/1. Logo, conclui-se
imediatamente que estamos em presença de um movimento de translação. É o
caso do exemplo da figura 4.3 em que uma corrediça (corpo 2) escorrega sobre
uma guia (corpo 1). Ambos têm, neste caso, a mesma rotação, pelo que o vetor
rotação do movimento relativo é nulo.

5.3.5 ROLAMENTO PURO – SÓLIDOS EM MOVIMENTO PLANO

Como vimos, esta situação traduz-se pela inexistência de velocidade de


escorregamento e da componente normal do vetor rotação. Só há unicamente
rotação em torno do eixo contido no plano tangente comum aos dois corpos
que contactam.
A figura 5.4 mostra um exemplo típico deste tipo de movimento.
Representa o movimento de um disco em contacto com uma superfície plana.

FEUP – DEMec 91
5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

O movimento plano equivalente, será o rolamento de uma circunferência sobre


uma reta com a qual contacta sem escorregar.

P I21
1

Figura 5.4 – Exemplo de rolamento sem escorregamento.

Uma vez que se admite a inexistência de escorregamento, o ponto de


contacto entre os dois corpos da figura 5.4 é um ponto de velocidade relativa
nula; consequentemente esse ponto coincide com o CIR do movimento 2/1.
Vamos, uma vez mais, considerar os corpos artificialmente separados (ver
figura 5.5) e distinguir três pontos (P1, P2 e P3) que na realidade são
coincidentes. O movimento de permutação do ponto de contacto gera, no corpo
2, uma linha que é a circunferência envolvente desse mesmo corpo. É a curva
C2 que se designa por rolante, uma vez que S2 é considerado o sistema móvel
no movimento 2/1. À trajetória descrita em S1 (neste caso, curva C1) designa-se
por base, uma vez que S1 é o sistema considerado fixo no movimento 2/1.
Note-se que, caso estivéssemos a estudar o movimento 1/2 a base seria a
curva C2 e a rolante a C1. A trajetória de P3 relativamente a S0, denominada por
C0, é, neste caso, também uma reta horizontal. Se admitirmos que o corpo 1
está fixo, C1 e C0 coincidirão, como se pode ver na figura 5.5.

C2
P2
C0
P3

1 C1 P1

Figura 5.5 – Trajetórias no movimento de permutação.

92 FEUP – DEMec
Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

5.3.5.1 Definição matemática da base e da rolante

Como já vimos, a base é a trajetória que o ponto de contacto P3


descreve sobre o espaço considerado fixo (espaço S1 no movimento 2/1).
Podemos assim defini-la como sendo o vetor posição de P3 em relação a um
ponto fixo de S1,

x 
O1P3 =  1 . (5.9)
S1  y1

Vimos também que a rolante é a trajetória que o ponto de contacto P3 descreve


sobre o espaço considerado móvel (espaço S2 no movimento 2/1). Podemos
defini-la como sendo o vetor posição de P3 em relação a um ponto fixo de S2,

x 
O 2P3 =  2. (5.10)
S2  y2 

Retomemos o exemplo anterior para obtenção das equações da base e


da rolante (ver figura 5.6). O primeiro passo consiste na definição de dois
referenciais solidários com cada um dos corpos (S1 e S2). A obtenção da base
e da rolante torna-se imediata através da construção dos vetores posição do
ponto de contacto em cada um dos sistemas,

 x = b + Rθ 
Base  1  (5.11)
 y1 = 0 

 x = R senθ 
Rolante  2 . (5.12)
y 2 = − R cosθ 

FEUP – DEMec 93
5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

Observando as equações (5.11) e (5.12) concluímos que no primeiro caso se


trata de uma reta horizontal (y1=0) e no segundo de uma circunferência pois,

x 22 + y 22 = R 2 (5.13)

o que confirma as observações feitas a propósito da figura 5.4.

y1
2 y2

O2

θ R

x2
O1 x1
b
1
b+Rθ

Figura 5.6 – Localização dos referenciais S1 e S2.

5.3.5.2 Generalização da análise a quaisquer movimentos planos

Consideremos dois corpos em movimento plano que não contactam


entre si, como mostra a figura 5.7.

1 2

I21
y1 y2

x2
O1 x1 O2

Figura 5.7 – Corpos em movimento relativo plano.

Neste caso, o CIR I 21 é um ponto de velocidade relativa nula.


Considerando associado a cada corpo um espaço rígido, podemos imaginar

94 FEUP – DEMec
Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

que o espaço S2 e o espaço S1 contactam sem escorregar no CIR I 21 , já que aí


a velocidade de escorregamento (velocidade relativa no movimento 2/1) é nula.
Também neste caso podemos imaginar a existência de um ponto não
pertencente a nenhum dos dois corpos, mas coincidente com o CIR (o
equivalente ao ponto P3 referido nos exemplos anteriores). Este ponto vai
mudar de posição de instante para instante, descrevendo uma trajetória em S1
(base) e outra em S2 (rolante). Estas duas curvas pertencem respetivamente a
S1 e S2 e contactam sem escorregar no ponto I 21 (ver figura 5.8).
Podemos então concluir que qualquer movimento relativo entre dois
corpos, quer contactem fisicamente ou não, pode ser estudado como um
movimento de rolamento sem escorregamento da rolante sobre a base.
Trata-se, portanto, de uma generalização de um conceito desenvolvido para
corpos em contacto, a qualquer movimento plano.

1 2

y1 y2
I21
x2
O1 x1 O2

Base Rolante
Figura 5.8 – Movimento 2/1 equivalente ao rolamento sem escorregamento da
rolante sobre a base.

Para a obtenção destas duas curvas (base e rolante) temos a


necessidade de determinação prévia da posição do CIR do movimento relativo
2/1. Assim, partindo do princípio que conhecemos o torsor do movimento 2/1
no ponto O2 podemos fazer,

v I 21 = vO21 + ω 21 x O2I 21 = 0 (5.14)

o que nos permite obter O 2I 21 . Se exprimirmos este vetor em coordenadas de


S2 temos a rolante

FEUP – DEMec 95
5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

x 
O2I 21 =  2. (5.15)
S2
 y2 

A base obtém-se através de um vetor posição de I 21 com origem num ponto


fixo de S1 e expresso em coordenadas de S1,

x 
O1I 21 = O1O2 + [T21 ]O2I 21 =  1 . (5.16)
S1 S1 S2
 y1 

5.3.5.3 Velocidade de permutação

Já vimos que, quando dois corpos rolam sem escorregar um sobre o


outro, o ponto de contacto permuta de posição em cada um dos corpos. A
velocidade com que esta permuta se realiza denomina-se velocidade de
permutação. Consultando as figuras 5.5 e 5.6, podemos escrever,

v P31 = v P32 + v P21 (5.17)

sendo v P21 = 0 devido à ausência de escorregamento. Assim temos,

v P31 = v P32 = V P21 (5.18)

ou seja a velocidade de permutação do CIR 2/1 ( V P21 ) é dada pela velocidade


com que o ponto genérico P3 se movimenta relativamente a qualquer um dos
corpos em contacto. As velocidades relativas ao ponto P3 na equação anterior
podem ser obtidas por derivação de vetores posição,

v P31 = O1P3 (5.19)


1

96 FEUP – DEMec
Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

e

v P32 = O2P3 . (5.20)


2

Observando as equações (5.9), (5.10), (5.19) e (5.20) constatamos que a


velocidade de permutação se pode obter por derivação das equações da base
e da rolante relativamente aos seus próprios referenciais. Todavia, nem sempre
é necessário a obtenção prévia da base ou da rolante para o cálculo da
velocidade de permutação. Com efeito, da equação (5.18) vemos que a
velocidade de permutação se pode obter pelo cálculo, relativamente a S1 ou a
S2 da velocidade de P3. Assim, se conseguirmos associar ao movimento de P3
um espaço rígido S3, para o qual seja eventualmente simples a caracterização
do respectivo campo de velocidades, o cálculo da velocidade de permutação
far-se-á recorrendo à primeira equação de Mozzi.
Vejamos o exemplo da figura 5.9. Para além do disco que rola sem
escorregar sobre o plano fixo, existe ainda uma barra de vidro transparente que
está articulada ao disco no ponto C e se mantém permanentemente na vertical
(movimento de translação). Pelo facto da barra 3 ser transparente, o ponto de
contacto entre 2 e 1 (P) é sempre visível e é sempre acompanhado pelo corpo
3. Assim, podemos dizer que o movimento 3/1 é uma translação entre a barra e
o plano, ou seja, a velocidade do centro do disco, ao qual a barra está
articulada, relativamente ao plano, é a velocidade de permutação. O
movimento 3/2 é uma rotação em torno do ponto C e a velocidade de
permutação pode-se calcular como sendo a velocidade num movimento de
rotação em torno do centro do disco.

1 3 P

Figura 5.9 – A consideração de um terceiro corpo que seja solidário de P3 é útil


no cálculo da velocidade de permutação.

FEUP – DEMec 97
5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

Vemos assim que este corpo 3 ajuda ao cálculo da velocidade de permutação.


No entanto, ele não tem necessariamente que existir. Assim, por vezes, com
alguma perspicácia conseguimos imaginar um espaço S3 que, embora não
existindo fisicamente, nos seja útil na obtenção da velocidade de permutação.
Basta para tal, que seja simples a caracterização do seu campo de velocidades
contemporâneas.
Vejamos um segundo exemplo (ver figura 5.10). O disco 2 rola sem
escorregar no interior do disco 1. O ponto de contacto P é acompanhado no
seu movimento de permutação pelo movimento da barra 3 que transporta o
disco 2. Então, a velocidade de permutação pode ser dada por

V P21 = v P31 = v P32 (5.21)

sendo

v P31 = ω31 x OP (5.22)

v P32 = ω32 x AP . (5.23)

Neste caso também seria simples a derivação de vetores posição

v P31 = OP (5.24)
1

v P32 = AP . (5.25)
2

98 FEUP – DEMec
Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

Vemos assim uma vez mais, que o ponto de contacto, embora não
pertencendo fisicamente ao corpo 3, está solidário do espaço S3 pois o ponto P
está sempre sobre a reta que une O a A (dois pontos solidários do corpo 3).

1
3

ω O

A 2
P

Figura 5.10 – Mecanismo conhecido por trem epicicloidal.

5.3.5.4 Aceleração relativa do ponto de contacto (ou CIR)

O ponto do espaço S2 que, em cada instante, tem velocidade nula


relativamente a S1 está, em geral, permanentemente a ser substituído por outro
em cada um dos dois espaços (movimento de permutação). De facto, ele tem
velocidade relativa nula apenas instantaneamente, o que significa que a sua
aceleração relativa é diferente de zero. Para calcular esta aceleração
comecemos por recordar a equação (5.18) da velocidade de permutação

V P21 = v P31 = v P32 . (5.26)

Derivando (5.26) relativamente ao espaço S1 temos

• •
v P31 = v P32 (5.27)
S1 S1

ou seja,


aP31 = v P32 + ω 21 x vP32 (5.28)
S2

FEUP – DEMec 99
5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

e ainda

aP31 = a P32 + ω 21 x v P32 . (5.29)

Recorrendo à teoria do movimento relativo também podemos escrever

aP31 = a P32 + a P21 + 2 ω21 x v P32 . (5.30)

Igualando (5.29) a (5.30) temos

aP21 = vP32 x ω 21 (5.31)

ou

aP21 = V P21 x ω21 . (5.32)

Constata-se assim que o ponto de contacto num movimento de


rolamento sem escorregamento tem velocidade relativa nula, mas a aceleração
relativa é diferente de zero e calculável através da velocidade de permutação e
do vetor rotação do próprio movimento relativo. Este processo de cálculo é útil
sempre que a velocidade de permutação seja facilmente calculável. Caso
contrário, esta aceleração pode e deve ser calculada a partir das coordenadas
vetoriais num outro ponto do campo de acelerações contemporâneas desse
movimento relativo.
Retomemos o exemplo do disco que se desloca sobre um plano. A
trajetória do ponto P2 que, no instante considerado é ponto de contacto, é
visível na figura 5.11. Verifica-se que P2 tem uma trajetória de aproximação e
após o contacto uma trajetória de afastamento. Esta inversão do movimento
r
explica-se pela existência da aceleração relativa aP21 nesse instante.

100 FEUP – DEMec


Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

aP 21

P I21
1

Figura 5.11 – Aceleração relativa do ponto de contacto.

5.4 SÓLIDOS EM CONTACTO LINEAR

Um contacto diz-se linear quando ele se dá segundo uma linha, que


designaremos por T. Se há ausência de escorregamento em todos os pontos
dessa linha, ela tem de reduzir-se necessariamente a uma reta que é o suporte
do vetor velocidade angular instantânea do movimento 2/1. Sejam então T1,
T2,..., Ti,..., Tn os pontos dessa linha de contacto. Para que não haja
escorregamento em T1, as velocidades dos pontos de S1 e S2 (T11 e T21 ) que
coincidem com T1, relativamente ao mesmo referencial S0 terão de ser iguais,

vT11 = vT21  vT121 = 0 . (5.33)

A velocidade relativa entre dois pontos quaisquer, por exemplo T1i e T2i , seria
dada por,

vT1i − vT2i = vT12i = ω12 x T 1 T i . (5.34)

Para que haja rolamento sem escorregamento

vT12i = ω12 x T 1 T i = 0 . (5.35)

o que implica que T 1 T i seja paralelo a ω12 pois ω12 ≠ 0 . Vemos assim, que
qualquer ponto i da linha de contacto é um ponto do suporte do vetor rotação

FEUP – DEMec 101


5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

ω12 . Depreende-se imediatamente desta demonstração, que se o contacto


ocorre em vários pontos não colineares, é impossível que em todos eles não
haja deslizamento. Mesmo quando o contacto é linear o escorregamento
poderá ocorrer se o invariante escalar do torsor τ 21 não for nulo (como é o
caso de um movimento tangente a um movimento helicoidal) ou, no caso de o
ser, se os pontos de contacto entre os dois sólidos não pertencerem ao eixo
T21.

5.4.1 Superfícies axoides

As superfícies axoides são as superfícies geradas pelo EIR do


movimento relativo i/j, no seu movimento de permutação relativamente a cada
um dos dois espaços i e j, desse movimento relativo. A superfície gerada no
espaço considerado fixo (j) é conhecida como Superfície Axoide Fixa (SAF); a
superfície gerada no espaço considerado móvel (i) é conhecida como
Superfície Axoide Móvel (SAM).

2
T31

3 T23
D
C

O A B T21
1

Figura 5.12 – Tronco de cone com movimento de rolamento sem


escorregamento sobre uma superfície horizontal.

Para melhor compreender a obtenção das superfícies axoides,


comecemos por considerar o exemplo da figura 5.12 em que um tronco de

102 FEUP – DEMec


Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

cone (corpo 2) contacta sem escorregar ao longo de uma geratriz, com uma
superfície horizontal de um outro sólido (corpo 1). O movimento de entrada é

uma rotação relativamente ao corpo 1 ( ω 31 ) do corpo 3 (que transporta o corpo


2) em torno de um eixo vertical que passa por O. Devido à inexistência de
escorregamento entre os corpos 2 e 1, necessariamente que vai ser nula a
velocidade relativa em A e B; consequentemente, passará por esses dois
pontos o respetivo EIR 2/1 (T21). Uma vez que o corpo 2 é transportado pelo
corpo 3 que lhe serve de eixo suporte, o movimento 2/3 é uma rotação em
torno de CD e, consequentemente, T23 contém estes dois pontos. Já vimos
anteriormente que os EIR (T31, T21 e T23), correspondem ao lugar geométrico
dos pontos com velocidade mínima (neste caso velocidade nula), no respetivo
movimento relativo e contêm o vetor rotação. Assim, se decompusermos o
movimento 2/1 na soma dos movimentos 2/3 e 3/1, podemos escrever

ω 21 = ω 23 + ω 31 (5.36)

cuja representação gráfica se esquematiza na figura 5.13.

ω 21

ω 31 ω23

Figura 5.13 – Representação gráfica dos vetores rotação.

Note-se que, qualquer que seja a posição relativa dos três corpos, T21 está
sempre no plano ABCD, ou seja move-se solidário com o corpo 3. Logo, o
movimento de permutação do EIR 2/1 é o movimento (relativo ao corpo 1 ou ao
corpo 2) de um eixo contido no espaço solidário do corpo 3 e que passa pelos
pontos de contacto. Este eixo, solidário de S3, gera duas superfícies no seu
movimento relativamente aos dois corpos em contacto (1 e 2):

FEUP – DEMec 103


5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

• a superfície axoide fixa (SAF) que é a superfície gerada pelo EIR 2/1 no
espaço considerado fixo (espaço S1 no movimento 2/1);
• a superfície axoide móvel (SAM) que é a superfície gerada pelo EIR 2/1
no espaço considerado móvel (espaço S2 no movimento 2/1).

O movimento 3/2 é uma rotação em torno do eixo CD (T23≡T32). Assim, a SAM


será uma superfície cónica gerada pela reta AB (T21), quando esta roda em
torno de CD (ver figura 5.14). O movimento 3/1 é uma rotação em torno do
eixo vertical que passa por O. Então a SAF é a superfície gerada por T21
quando este roda em torno desse eixo (ver figura 5.14). Podemos então dizer
que estudar o movimento relativo do corpo 2, tronco de cone, sobre o corpo 1,
superfície horizontal, é equivalente a estudar o rolamento sem escorregamento
da SAM 2/1 sobre a SAF 2/1 que contactam segundo uma geratriz que é, em
cada instante, a posição do EIR 2/1.

SAF 2/1

SAM 2/1

O C
D
A
B
T21

Figura 5.14 – Superfícies axoides no movimento 2/1.

Identificado o movimento de permutação, a determinação da velocidade de


permutação de um ponto qualquer do EIR 2/1 é imediata. Assim, se
escolhermos o ponto A podemos escrever

V A21 = v A31 = v A32 (5.37)

ou

104 FEUP – DEMec


Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

V A21 = ω31 x OA = ω32 x CA . (5.38)

Vejamos um segundo exemplo de um mecanismo semelhante ao anterior, mas


onde existe agora um movimento de rolamento com giração e escorregamento
(ver figura 5.15). O corpo 2 (cilindro) está em movimento provocado pela
rotação do seu eixo de simetria material em torno de uma direcção vertical.
Admitamos por hipótese, que o corpo 2 rola sem escorregar relativamente ao
corpo 1 (plano horizontal) no ponto B, que pertence à linha de contacto entre os
dois corpos. Decompondo o movimento 2/1 na soma dos movimentos 2/3 e 3/1,
facilmente concluímos que, nesse movimento 2/1, o ponto O tem velocidade
nula. De facto, O é um ponto de velocidade simultaneamente nula nos
movimentos relativo 2/3 e de transporte 3/1, uma vez que pertence
simultaneamente a T23 e a T31 (ver figura 5.15). Assim, e como por hipótese o
ponto B também é um ponto de velocidade nula nesse movimento, a reta OB é
o suporte do eixo T21.

T31 2

3
O C D T23

A B T21
1

Figura 5.15 – Movimento tridimensional com rolamento, giração e


escorregamento.

FEUP – DEMec 105


5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

Saliente-se a existência de escorregamento entre os corpos 2 e 1 para


todos os pontos de contacto à excepção de B. De facto, só os pontos
colocados sobre T21 são pontos de rolamento sem escorregamento. Também
neste exemplo, o movimento de permutação do EIR 2/1 é identificável com o
movimento (relativo a S1 ou a S2) de uma reta solidária de S3 coincidente com o
referido EIR. Mais uma vez, o EIR 2/1 vai descrever duas superfícies (ver figura
5.16):
• a SAF em S1 constituída por uma superfície cónica com geratriz OB e
eixo vertical, uma vez que o movimento 3/1 é uma rotação em torno
desse eixo;
• a SAM em S2, também constituída por uma superfície cónica de geratriz
OB mas de eixo OC , uma vez que o movimento 3/2 é uma rotação em
torno desse eixo.

T31
SAM 2/1

SAF 2/1 C D T23


O

T21
A B

Figura 5.16 – Superfícies axoides do mecanismo da figura 5.15.

Pode-se então concluir que o movimento 2/1, que apresenta escorregamento


para todos os pontos de contacto real excepto B, é equivalente ao rolamento
sem escorregamento da SAM 2/1 sobre a SAF 2/1. Daqui se compreende a
importância deste tipo de análise prévia no projecto de mecanismos. De facto,
o redesenhar deste mecanismo, no sentido de aproximar o mais possível a
linha de contacto real da direcção OB , permite minimizar o desgaste e usufruir
de uma série de óbvias consequências benéficas: menores vibrações, menor

106 FEUP – DEMec


Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

aquecimento, maior duração, etc. A solução óptima seria a do mecanismo da


figura 5.12.

5.4.2 Superfícies axoides nos movimentos planos

Como já vimos, os movimentos planos caracterizam-se pelo facto dos


EIR serem paralelos entre si e perpendiculares ao plano do movimento. A
interseção dos EIR com o plano do movimento permite a definição dos CIR.
Pelo facto dos EIR terem todos a mesma direcção as superfícies axoides
geradas nos movimentos de permutação são cilíndricas. A interseção destas
superfícies com o plano do movimento, dá origem às curvas já anteriormente
definidas como base e rolante. Assim, como se pode ver na figura 5.17, a
rolante e a base são, respetivamente, a intersecção da SAM e da SAF com o
plano do movimento.

SAF
SAM Base

Rolante

Figura 5.17 – Correspondência entre as superfícies axoides (SAF e SAM) e a


base e a rolante, respetivamente.

5.5 SÍNTESE DO CAPÍTULO 5

Numa breve introdução começou-se por realçar a importância do


rolamento e escorregamento no projecto de mecanismos. No capítulo 5.2
fez-se a abordagem do movimento de sólidos em contacto pontual. Foi
introduzido o conceito de movimento de permutação e velocidade de
escorregamento. Após uma caracterização do torsor do movimento relativo

FEUP – DEMec 107


5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

nas diversas situações possíveis, deu-se especial ênfase ao rolamento puro


em movimento plano. Os conceitos de base e rolante permitiram a extensão
da teoria do movimento de sólidos em contacto permanente a qualquer
movimento com existência ou não de contacto. A importância da velocidade
de permutação foi evidenciada no cálculo da aceleração relativa do CIR. No
capítulo 5.3 estudou-se o movimento tridimensional de sólidos em contacto
linear, tendo sido dada especial atenção à obtenção das superfícies axoides,
bem como à sua importância na concepção de mecanismos.

5.6 EXERCÍCIOS PROPOSTOS

1) O disco (corpo 1) roda excentricamente em torno do ponto O com


velocidade angular θ& conhecida e contacta permanentemente em P com o
impulsor (corpo 2), que translada verticalmente (ver figura 5.18). Determine:

OC=e

1
P
O x
C
θ

θ
Figura 5.18 – Disco e impulsor.

a) A velocidade de escorregamento no ponto P e a velocidade do impulsor;

108 FEUP – DEMec


Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

− θ& (R − e cos θ ) 0
Solução: v P12 = 0 v P20 &
= e θ sen θ
0 0

b) A posição do CIR I 21 gráfica e analiticamente.

e sen θ
Solução: Analiticamente: I 21 ≡ 0
0

Graficamente: I21 determina-se pela interseção das retas (1) e (2) da figura
seguinte. A primeira advém da propriedade do alinhamento decompondo
 2   2  1  ur ur
  =    e a segunda da perpendicularidade à velocidade v P21 ou v P12 .
 0   1  0 
y

OC=e

2
vp12
1
P (1) Ι20 ∞
Ι10≡ O x
Ι21
C
θ

θ
(2) Contém Ι21

2) O corpo 1 (cunha) move-se com uma velocidade v0 conhecida.


Admitindo que o corpo 2 (disco) rola sem escorregar sobre o corpo 1, calcule:

y
2
1

C B v0
h A θ
x

Figura 5.19 – Cunha em translação.

FEUP – DEMec 109


5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

a) A velocidade absoluta do ponto B do corpo 2;

0
Solução: v B20 = v 0 tg θ
0

b) A velocidade de escorregamento em C;

0
ur v
Solução: vC20 = v 0 tg θ + 0
cos θ
0

c) A posição do CIR I 20 gráfica e analiticamente.

r + r sen θ
Solução: Analiticamente: I 20 ≡ h
0

Graficamente: I20 determina-se pela interseção das retas (1) e (2) da figura
seguinte. A primeira advém da propriedade do alinhamento decompondo
 2   2  1  ur
  =    e a segunda da perpendicularidade à velocidade vC20 .
 0   1  0 

y
2
vC20
1
(2) Contém Ι20 Ι20
C B v0
h Ι21≡ A θ
x

110 FEUP – DEMec


Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

3) A barra (corpo 1) de comprimento L, move-se de modo a que os


pontos A e B transladem sobre os eixos coordenados. O ponto B move-se com
velocidade s& conhecida.

y
B 1

s
A
O x
Figura 5.20 - Barra com extremidades em translação.

a) Determine a base e a rolante do movimento da barra relativamente ao


referencial S0;

L2 − s 2
L
L2 − s 2
uuuur uuur
Solução: Base ≡ OI10 = s Rolante ≡ BI10 = s L2 − s 2
S0 S1
0 L

b) Determine a velocidade de permutação do CIR I10.


s s&

•r
L2 − s 2
uuuu
Solução: VI10 = OI10 = s&
S0 0

c) Determine a aceleração do CIR I10.

s& 2
L2 − s 2
uuur ss& 2
d) Solução: aI10 = 2 2
S0 L −s
0

FEUP – DEMec 111


5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente Cinemática

4) No mecanismo representado na figura 5.21, o corpo 1 roda com


velocidade angular constante θ& e o corpo 2 rola sem escorregar relativamente
ao corpo fixo. Determine:
y

C
2
0
B
1

θ A x

Figura 5.21 – Trem epicicloidal.

a) O vetor rotação ω 20 ;

0
Solução: ω 20 = 0
− l θ&
r

b) As equações cartesianas da base e da rolante no movimento 2/0;

Rolante → x 22 + y 22 = r 2
Solução: 2
Base → x 02 + y 02 = (l + r )

c) A velocidade de permutação no movimento 2/0;

− (l + r ) θ& sen θ
Solução: VC20 = (l + r ) θ& cos θ
0

d) A aceleração absoluta do ponto B utilizando a segunda equação de

− θ& 2 l cos θ
Mozzi e o ponto C; Solução: a B20 = − θ& 2 l sen θ
0

112 FEUP – DEMec


Cinemática 5. Cinemática dos Sólidos em Contacto Permanente

5) O corpo 1 roda com velocidade angular θ& constante em torno do eixo


z, e movimenta a esfera (corpo 2) através de um contacto de rolamento sem
escorregamento no ponto A. A esfera rola sem escorregar nos pontos P e Q
relativamente à caixa (corpo 0), que se mantém fixa. O corpo 2 transmite
movimento em B com rolamento sem escorregamento ao corpo 3, que roda em
torno do eixo z. Determine:

OA=r1

B A O
x 3

45º 2
1
P C θ 0
r2

Q
Figura 5.22 – Redutor de fricção.

a) A velocidade angular do corpo 3, ω 30 ;

0
uur
Solução: ω30 = 0
r θ&1

(1+ 2 )( r + r 2 )1 2

b) A velocidade de permutação no movimento 2/1;


0
ur − r1 θ&  2r2 
Solução: V A21 =  + 2
1 + 2  2r1 + 2r2 

0

c) As superfícies axoides nos movimentos 2/1 e 3/2. Identifique os


respetivos movimentos de permutação.

FEUP – DEMec 113


Cinemática 6. Anexo – Problemas de Exame

ANEXO – PROBLEMAS DE EXAME


1) Cinemática - Movimento 2D

GH = e

O mecanismo de elevação representado é constituído por:

- um cilindro hidráulico, (Cilindro exterior - Corpo 1 e Êmbolo - Corpo 2),


articulado ao exterior em C. O comprimento CD é dado pelo parâmetro
conhecido s(t). A velocidade relativa entre o êmbolo e o cilindro exterior é
constante, (s& = const .) ;

- uma barra, Corpo 3, articulada ao êmbolo do cilindro hidráulico no ponto D,


obrigada a rodar em torno de um ponto fixo E;

- uma barra, Corpo 4, que está articulada ao Corpo 3 no ponto F e ao Corpo


5 em H;

- uma plataforma, Corpo 5, com movimento de translação na direção vertical.

a) Determine a velocidade absoluta da plataforma, Corpo 5.

b) Determine a aceleração do ponto F do Corpo 4 para um observador solidário


do movimento do corpo 1.
c) Defina graficamente a posição do eixo instantâneo de rotação do movimento
relativo 4/1.
d) Determine a base e a rolante no movimento 5/3.

FEUP – DEMec 113


6. Anexo – Problemas de Exame Cinemática

2) Cinemática - Movimento 2D

AB ⊥ BC

O mecanismo representado na figura permite bascular a pá (corpo 2) de


uma escavadora. A barra de acionamento (corpo 1) é obrigada a deslocar-se na
horizontal através do guiamento existente no corpo 4 (lei s(t) conhecida). As
ligações B e C são articulações planas, enquanto A e D são ligações do tipo
pino/rasgo. Considerando o corpo 4 imóvel, determine:

a) A velocidade absoluta do ponto D.

b) A aceleração do ponto A do corpo 1 relativamente à pá.

c) Graficamente a posição de I31.

d) A velocidade de permutação do ponto I31.

114 FEUP – DEMec


Cinemática 6. Anexo – Problemas de Exame

3) Cinemática – Movimento 2D
4

F
Y b

E
1
D

2 R
C

A
θ X
B
a

O mecanismo plano representado é constituído por:


- um excêntrico (corpo 1) que roda em torno do ponto fixo B com velocidade
angular constante, ω 10 = θ& ;
- uma barra (corpo 2) obrigada a rodar em torno de um ponto fixo A;
- um disco (corpo 3) que roda relativamente ao corpo 4; ligação de rotação em
F;
- um impulsor (corpo 4) guiado na direção BF.

Em D (ponto de contacto entre os corpos 1 e 2) existe rolamento com


escorregamento. Sabendo que os corpos 2 e 3 rolam sem escorregar entre si
(ponto de contacto E), determine:

a) Os campos de velocidades contemporâneas dos movimentos absolutos de


todos os corpos.
b) A aceleração do ponto F do corpo 4 para um observador solidário do
movimento do corpo 1.
c) A base e a rolante no movimento 2/1.
d) A aceleração do ponto de contacto da base com a rolante no movimento
relativo 2/1.

FEUP – DEMec 115


6. Anexo – Problemas de Exame Cinemática

4) Cinemática - Movimento 2D

x
3 2

4 CB = CD = R
D B s(t) 1
5 CB⊥CD

y γ(t β(t DE = L
θ(t A
AC = b
E C

A figura representa um mecanismo constituído por cinco corpos. O cilindro


1 roda em torno do ponto fixo A e o êmbolo 2 translada em relação ao corpo 1,
sendo o parâmetro s(t) conhecido. O corpo 3 roda em torno do ponto C, que é
um ponto fixo, transmitindo movimento à barra 4 através da articulação em D. O
corpo 5 sofre uma translação horizontal.

Determine:

a) O campo de velocidades contemporâneas dos movimentos 2/0 e 4/0.


b) A aceleração do ponto D do corpo 4 relativamente ao corpo 1
recorrendo à teoria do movimento relativo e fazendo intervir o corpo 2.
c) Graficamente, a posição do centro instantâneo de rotação no
movimento 5/2.
d) A base e a rolante no movimento 3/5.

116 FEUP – DEMec


Cinemática 6. Anexo – Problemas de Exame

5) Cinemática - Movimento 3D

O mecanismo representado na figura é constituído por três corpos:


• corpo 1: um disco que roda em torno do eixo z com velocidade angular
θ& , conhecida;
• corpo 2: uma manga que roda juntamente com o corpo 1, mas que
pode transladar relativamente a este na direção z (s(t) conhecido);
• corpo 3: um braço de comprimento l, articulado ao corpo 2 em A e
ligado ao corpo 1 pelo contacto esfera/rasgo em B.

Determine:
a) Os vetores velocidade e aceleração angulares absolutos do corpo 3.
b) A velocidade de escorregamento no ponto B.
c) A aceleração do ponto B relativamente a um referencial fixo recorrendo
à Teoria dos Movimentos Relativos e fazendo a decomposição

 3   3  2 
  =    .
 0   2  0 
    
d) Diga, justificando convenientemente a resposta, se o movimento 3/0 é
tangente a uma rotação ou a um movimento helicoidal. Esboce o perfil de
velocidades desse movimento.

FEUP – DEMec 117


6. Anexo – Problemas de Exame Cinemática

6) Cinemática - Movimento 3D

F
y

3 2
B
5
C
E A

1
G D O
x

A figura representa esquematicamente um mecanismo de engrenagens


cilíndricas constituído por cinco corpos. O corpo 1 roda em torno do eixo x (w10
conhecido e negativo) e transmite movimento à roda 2 (rolamento puro) que está
solidária da roda 3. A roda 5, que está solidária da caixa exterior, roda em torno
de x (w50 conhecido e positivo) e contacta com rolamento puro com a roda 3.
Determine:

a) A velocidade angular do veio de saída (corpo 4).


b) A velocidade do ponto C do corpo 4 relativamente ao corpo 5.
c) A aceleração absoluta do ponto A do corpo 2 recorrendo à teoria do
movimento relativo e fazendo a decomposição do movimento

 2   2  1 
  =   
 0   1  0 

d) Como classificaria a generalidade dos movimentos do mecanismo?

5
Esboce as superfícies axoides fixa e móvel no movimento   .
2  

118 FEUP – DEMec


Cinemática 6. Anexo – Problemas de Exame

7) Cinemática - Movimento 3D

W3

(4)

(2)

(3)
D r
C

B α

(1)

R
W1

No mecanismo da figura o movimento entra pelo corpo (3) (velocidade


angular conhecida, mas não constante) e sai pelo corpo (1). Não há
escorregamento nos pontos B e D. O corpo (4) está fixo. Conhecendo o ângulo
α que a direção do eixo do corpo 2 faz com a horizontal, determine:
a) A velocidade angular do veio de saída (corpo 1).
b) A aceleração absoluta do ponto C do corpo 2 recorrendo, num dos
passos da resolução, à teoria do movimento relativo e fazendo a

 2   2  1 
decomposição do movimento   =    .
0     
1 0

 2
c) Caracterize, justificando, o movimento   . Identifique analiticamente
0  
a posição do respetivo eixo instantâneo de rotação, determinando o
ângulo que este faz com a horizontal.
d) Justifique detalhadamente a seguinte afirmação:

“O movimento relativo mais geral entre dois corpos pode ser estudado
como o movimento de dois sólidos em contacto permanente”.

FEUP – DEMec 119


6. Anexo – Problemas de Exame Cinemática

8) Cinemática - Movimento 3D

z
zR
2

C B 2

ω10
−s&
y

R1

A figura representa um mecanismo de engrenagens de uma hélice de


avião. O corpo 1 roda em torno do eixo y (ω10 conhecido) e transmite movimento
à roda 2 (sem escorregamento no ponto B). A roda 2 rola em relação ao corpo
3, sem escorregamento em C e o conjunto translada ao longo do eixo y com
velocidade − s& .
Determine:
a) A velocidade angular da hélice (corpo 4).
b) A aceleração angular do corpo 2.
c) A aceleração absoluta do ponto C do corpo 2 recorrendo à teoria do
movimento relativo e fazendo a decomposição do movimento

 2   2  1 
  =    .
 0   1  0 
 2
d) Esboce as superfícies axoides fixa e móvel no movimento   .
1
Identifique os movimentos que dão origem à geração dessas
superfícies.

120 FEUP – DEMec


Cinemática 6. Anexo – Problemas de Exame

SOLUÇÕES
0
(b + c ) s&
1) a) v H 50 = (senθ − cos θ tgθ ) , sendo e + d senφ = (b + c ) senθ
b sen(θ + β )
0

2 a
(b + c ) (ω& 30 cos θ − ω30 senθ − ω&10 ( − cos θ ))
b+c
2 2 a
aF41 = (b + c ) (ω& 30 senθ + ω30 cos θ + ω&10 senθ + ω10 ( − cos θ )) +
b+c
0
b)
2 2
( − ω10 senθ − 2 ω10 ω30 senθ − 2 ω10 senθ ) (b + c )
2 a
+ (2 ω10 ω30 cos θ − 2 ω10 ( − cos θ ) (b + c )
b+c
0

c)

 x = (b + c ) (senθ − cos θ tgφ ) - e


Rolante  5
 y 5 = − [d cos φ − (b + c ) cos θ ]
d)
 x = (b + c ) (sen2θ − cos θ senθ tgφ )
Base  3 2
y 3 = (b + c ) (senθ cos θ − cos θ tgφ )

FEUP – DEMec 121


6. Anexo – Problemas de Exame Cinemática

R senϕ (ϕ& - α& )  s


 tgϕ =
2) a) v D30 = 0 sendo  R
0 L senα = R senϕ

− s&& + Rϕ&& + sϕ& 2


b) a A12 = 2 s& ϕ& + s ϕ&& − R ϕ& 2
0

c)

y& sen α + y α& cos α


ϕ&
d) V I 31 = y& cos α − y α& sen α sendo y = R senϕ ( - 1)
α&
0

122 FEUP – DEMec


Cinemática 6. Anexo – Problemas de Exame

0 0 0 0
3) a) ω10 = 0 ; vB10 = 0 ω 20 = 0 ; v A 20 = 0
θ& 0 β& 0

0 − AE β& sen β
ω 30 = 0 ; v E 30 = AE β& cos β
&
AE β sen β
− 0
b cos β

0 0
AE β&
ω 40 = 0 ; v F 40 =
cos β
(
cos 2 β − sen 2 β )
0 0

AD cos β = a + e cos θ − R sen β


AD sen β = e sen θ + R cos β
(R + b ) sen β − e cos θ
DE =
cos β
AE = AD + DE

AE β& θ&
cos β
( )
cos2 β − sen2 β − θ&2 (e cosθ − (R + b ) senβ + DE cosβ )

b) aF41 = v&F40 − θ&2 (e senθ + (R + b ) cosβ + DE senβ )


0

cosθ
 a θ& 
Base − BI 21 S =  & & − a  − senθ
1
 β −θ  0
c)
cosβ
a θ&
Rolante − AI 21 S = & & senβ
2
β −θ
0

β& (cos2 β − sen2 β )


β&&
d) a I 21 = a θ& & & + 2 β& cosβ senβ
β −θ
0

FEUP – DEMec 123


6. Anexo – Problemas de Exame Cinemática

0 s& senθ
uur ur
4) a) ω20 = 0 ; v A 20 = s& cosθ
s& ( b 2 − s 2 − R 2 ) 0
2 b s 2 senθ

0 − R β& senβ s cosθ + R cosβ = b


uur ur
ω 40 = 0 ; vD 40 = R β& cosβ sendo s senθ − R senβ = 0
− R β& senβ 0 l senγ = R cosβ
L cosγ

− R (senβ + cosβ ) − R (senβ − cosβ ) senθ


b) aD41 = ( β&& + θ&&) R (senβ − cosβ ) − (θ& 2 + β& 2 ) R (senβ + cosβ ) + s&& cosθ
0 0 0

c)

124 FEUP – DEMec


Cinemática 6. Anexo – Problemas de Exame

d)
l senγ + R senβ tgγ
Base − EI 35 S = − l cosγ − R senβ
5

(l senγ + R senβ tgγ ) cosβ


Rolante − CI 35 S = − (l senγ + R senβ tgγ ) senβ
3

− β& − β&&
5) a) ω30 = 0 ; α30 = − β& θ& sendo β =arcsen (s/l)
θ& θ&&

0
ur
b) v B31 = − l β& sen β
0

− l θ&& cos β + 2 l θ& β& sen β


c) aB30 = − β&& l sen β − β& 2 l cos β − θ& 2 l cos β
− β&& l cos β + β& 2 l sen β + s&&

d) O movimento 3/0 é um movimento tangente a um movimento


ur r
helicoidal. De facto, o invariante escalar I30 = v A30 • ω30 = s& θ& ≠ 0 é

diferente de zero, o que significa que a velocidade nos pontos do


eixo instantâneo de rotação (T30) não é nula, mas sim mínima e tem
a direção do próprio eixo

T30

vH30

H Є T30

Perfil de
velocidades

FEUP – DEMec 125


6. Anexo – Problemas de Exame Cinemática

 ω R R + ω10 R1 R2   1 
 − ω10 R1 + 50 5 2  x  
 R2 + R3   R1 + R2 
6) a) ω 40 = 0
0

0
b) vC 45 = 0
− R3 ω35

0
2
c) a A20 = − ω10 R1 + ω21 ω41 R1
− ω&10 R1

d) O invariante escalar é nulo, os vetores posição e velocidade


estão todos no plano yz e os vetores velocidade angular todos
segundo x. Logo, todos os movimentos podem ser classificados
como movimentos planos. As superfícies axoides são todas
cilíndricas: a SAM 5/2 é uma superfície cilíndrica de eixo OG e raio
GF; a SAF 5/2 é uma superfície cilíndrica de eixo BE e raio EF.

0
 R sen α 
7) a) ω10 = 2 ω30 1+ 2 
 R1 
0

126 FEUP – DEMec


Cinemática 6. Anexo – Problemas de Exame

b)
(ω y
20
x
)(
− ω10 ω20 R2 cos α − (ω20
y
− ω10 ) R2 sen α + ω31 R1 )
20 (
aC 20 = ω R2 − ω cos α − (ω − ω10 ) sen α + ω30 sen α − ω31 R1 ω20
x x
20
y
20
x
+ )
x x x
( )
ω& 20 R2 cos α − ω20 − ω10 ω20 R2 sen α − ω&10 R1
2
x
ω30 ω20 R2 cos α − ω10 R1
+ 0
0

 R1 sen α + R2 (sen2 α − cos2 α ) 


c) α = arctg  
 R1 cos α + R2 sen 2α 

d) Qualquer movimento relativo entre dois corpos, quer contactem


fisicamente ou não, pode ser estudado como um movimento de
rolamento sem escorregamento da rolante sobre a base. De facto,
para qualquer movimento relativo podem-se obter as respetivas
base e a rolante desse movimento relativo (sucessivas posições
adquiridas pelo CIR em cada um dos dois espaços) e estudar o
movimento de rolamento sem escorregamento da rolante sobre a
base. Este movimento traduz rigorosamente o movimento original.

0
uur − ω10
8) a) ω 40 =
2
0

− ω10 2 R1
4R2
ur − ω&10
b) α20 =
2
ω&10 R1
2R2

FEUP – DEMec 127


6. Anexo – Problemas de Exame Cinemática

z
− ω&10 R1 − α 20 2 R2
c) aC20 = − s&& − ω24 (ω40 − ω10 ) R1 − ω24
2
2 R2
2
(ω40 − ω10 ) R1 − ω10 R1 + α 20 2 R2 + ω24 ω40 2 R2
2 x

d)
SAM 2/1
≡T42
R2 T21

C D B 2

ω10
E ≡T10≡T40≡T41
O

R1 SAF 2/1

O ponto O é a interseção dos eixos T41 e T42. Consequentemente,


ur ur ur r
pode-se escrever vO21 = vO24 + vO41 = 0 , logo o ponto O pertence ao
T21. Este eixo T21 pertence a S4 (acompanha o ponto D localizado
sobre o T42 que pertence ao corpo 4) e, ao acompanhar o ponto de
contacto B, gera duas superfícies cónicas: a SAF 2/1, que é uma
superfície cónica de vértice em O e abertura OB gerada pelo T21 no
movimento 4/1; a SAM 2/1, que é uma superfície cónica de vértice
em O e abertura DB gerada pelo T21 no movimento 4/2.

128 FEUP – DEMec

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