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M145b McGinnis, Peter M.

Biomecânica do esporte e do exercício [recurso


eletrônico] / Peter M. McGinnis ; tradução: Débora Cantergi
... [et al.] ; revisão técnica: Jefferson Fagundes Loss. – 3. ed.
– Porto Alegre : Artmed, 2015.

Editado como livro impresso em 2015.


ISBN 978-85-8271-202-3

1. Educação Física. 2. Biomecânica I. Título.

CDU 613.71

Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094


Capítulo 3
Cinética linear
Explicando as causas do movimento linear

Objetivos
Ao terminar de ler este capítulo, você deverá ser
capaz de:
• Explicar as três leis do movimento de Newton
• Aplicar a segunda lei do movimento de
Newton para determinar a aceleração de um
objeto se as forças atuando sobre ele forem
conhecidas
• Aplicar a segunda lei do movimento de
Newton para determinar a força resultante
atuando sobre um objeto se sua aceleração for
conhecida
• Definir impulso
• Definir quantidade de movimento
• Explicar a relação entre impulso e quantidade
de movimento
• Descrever a relação entre massa e peso
Você está assistindo à competição de levantamento de peso nas olimpíadas. A carga da barra é
mais que o dobro do peso do levantador. O atleta se aproxima do implemento e o agarra firme-
mente com ambas as mãos. Com um grito, ele pega a barra do chão e a levanta sobre sua cabeça
em um movimento suave. Quais forças o atleta precisou exercer sobre o implemento para criar
o movimento que você viu? A segunda lei do movimento de Newton – proposta há mais de 300
anos – nos fornece a base para analisar situações como essa. Este capítulo introduz as leis do mo-
vimento de Newton e a aplicação dessas leis para analisar o movimento humano.

Isaac Newton foi um matemático britânico. Ele A primeira lei do movimento


nasceu no dia de Natal no ano de 1642,* o mesmo ano em de Newton: Lei da Inércia
que Galileu faleceu e três meses após a morte de seu pai
(Westfall, 1993, p. 7), e morreu em 20 de março de 1727. Corpus omne perseverare in statu suo quiescendi
Newton estudou na Universidade de Cambridge, onde de- vel movendi uniformiter in directum, nisi quate-
pois foi professor. Muitas de suas ideias sobre mecânica (e nus a viribus impressis cogitur statum illum mu-
cálculo) foram concebidas durante um retiro de dois anos tare. (Newton, 1686/1934, p. 644)
na propriedade de sua família em Lincolnshire, quando
o matemático estava com pouco mais de 20 anos. Esse Essa é a primeira lei do movimento de Newton, em
retiro foi incitado por uma epidemia da praga na Inglater- Latim, como foi originalmente apresentada no Prin-
ra, que causou o fechamento temporário da Universidade cipia. Ela costuma ser referida como a lei da inércia.
**
em Cambridge entre 1665 e 1667. Apesar da devastação Traduzindo, essa lei afirma: “Todo corpo continua em
causada, um benefício da praga foi ter permitido a Isaac seu estado de repouso ou de movimento uniforme em li-
Newton um período ininterrupto de tempo para estabele- nha reta, a menos que seja compelido a mudá-lo por for-
cer os fundamentos da sua versão da mecânica. ças imprimidas sobre ele” (Newton, 1686/1934, p. 13).
Mais de 20 anos passaram antes de Newton comparti- Essa lei explica o que acontece com um objeto se nenhu-
lhar seu trabalho em 1686, quando seu livro, Philosophiae ma força externa atuar sobre ele ou se a força externa re-
Naturalis Principia Mathematica (Princípios matemáti- sultante (o somatório de todas as forças externas em ação)
cos da filosofia natural), ou Principia, como é comumen- for zero. De forma mais simples, a primeira lei de Newton
te referido, foi publicado. Principia foi escrito em latim, o diz que, se nenhuma força externa resultante atuar sobre
idioma utilizado pelos cientistas naquela época. Na obra, um objeto, ele não vai se mover (vai permanecer em seu
Newton apresenta suas três leis do movimento e sua lei da estado de repouso) se não estava em movimento no início,
gravitação, as quais formam a base da mecânica moder- ou vai continuar em movimento com velocidade constante
na. São elas que fornecem o fundamento para um ramo em linha reta (permanecer em seu estado de movimento
da mecânica chamado de cinética. Dinâmica é o ramo da retilíneo uniforme) se já estivera se movimentando.
mecânica preocupado com a mecânica de objetos em mo-
vimento: cinética é aquele que se ocupa das forças que Se nenhuma força externa resultante
causam o deslocamento. Este capítulo, especificamente, atuar sobre um objeto, ele não vai se
lida com cinética linear, ou as causas do movimento li- mover se não estava em movimento no
near. Aqui, você vai aprender sobre as leis do movimento início, ou vai continuar em movimento
de Newton e como elas podem ser usadas para analisá-lo. com velocidade constante em linha reta
O que você vai aprender neste capítulo vai lhe fornecer se já estivesse se movimentando.
as ferramentas básicas para analisar e explicar as técnicas
usadas em muitas habilidades esportivas. Vejamos como a primeira lei do movimento de Newton
é aplicada ao movimento humano no esporte. Você pode
pensar em qualquer situação na qual nenhuma força externa
atue sobre um objeto? Isso é difícil. A gravidade é uma for-
* N. de T.: As datas de nascimento (25 de dezembro de 1642) e ça externa que atua em todos os objetos próximos da terra.
morte (20 de março de 1727) são do calendário Juliano, que era
Aparentemente, não há situações nos esportes ou no movi-
usado na Inglaterra na época. O calendário usado na maior parte
da Europa naquele tempo era o Gregoriano, o mesmo utilizado
na maior parte do mundo atualmente. Os calendários diferem em ** N. de T.: Na versão em inglês, o autor afirma ter traduzido di-
11 dias. De acordo com o Gregoriano, Newton nasceu em 4 de retamente do latim. Para a educação em português, o enunciado
janeiro de 1643 e morreu em 31 de março de 1727. da lei foi traduzido a partir da versão inglesa.
Biomecânica do Esporte e do Exercício 87

mento humano para as quais a primeira lei do movimento de dem ser representadas por equações para as três dimen-
Newton se aplique. Talvez possamos achar aplicações para sões (vertical, horizontal – para frente e para trás; e hori-
essa lei no esporte se considerarmos somente movimentos zontal – lado a lado):
de um objeto ou um corpo em uma direção específica.
Na verdade, nós já usamos a primeira lei do movi- constante se (3.2a)
mento de Newton diversas vezes nos capítulos anteriores. se constante (3.2b)
No Capítulo 2, analisamos o movimento de projéteis. Fi-
zemos isso decompondo o deslocamento do projétil em constante se (3.3a)
componentes vertical e horizontal. Verticalmente, a velo- se constante (3.3b)
cidade de um projétil estava de modo constante, mudando,
e ele acelerava para baixo a 9,81 m/s2 devido à força da constante se (3.4a)
gravidade. Na direção vertical, a primeira lei do movi-
se constante (3.4b)
mento de Newton não se aplica. Horizontalmente, porém,
a velocidade do projétil era constante, e sua aceleração Para manter as coisas simples nos problemas e exemplos
era zero, uma vez que nenhuma força horizontal atuava deste livro, quase sempre nos limitaremos a análises em
sobre ele. Este é um caso no qual a primeira lei do mo- apenas duas dimensões – vertical (y) e horizontal (x).
vimento de Newton se aplica! Se a resistência do ar for Nós já fizemos análises baseadas na primeira lei do
desprezível, a força horizontal atuando sobre um projétil é movimento de Newton nos Capítulos 1 e 2, apenas não sa-
zero, então, a velocidade horizontal do projétil é constan- bíamos disso. Agora que conhecemos essa lei, vamos ten-
te e não muda. A primeira lei do movimento de Newton tar outra análise. Imagine-se segurando um haltere de 4,5
fornece a base para a equação que descreve o movimento kg em sua mão. Qual o tamanho da força que você deve
horizontal de um projétil usada no capítulo anterior. realizar sobre implemento para mantê-lo parado? Quais
A primeira lei do movimento de Newton também é forças externas atuam sobre ele? Verticalmente, a gravi-
aplicável se forças externas atuarem em um objeto, des- dade exerce uma força para baixo igual ao peso do haltere,
de que o somatório das forças seja zero. Assim, um ob- 4,5 kg. Sua mão exerce uma força de reação para cima
jeto pode continuar seu movimento em uma linha reta ou contra ele. De acordo com a primeira lei de Newton, um
permanecer em seu estado de repouso se a força externa objeto vai permanecer em repouso somente se nenhuma
resultante atuando sobre ele for zero. No Capítulo 1, apren- força externa atuar sobre ele ou se a força externa resultan-
demos sobre equilíbrio estático – a soma de todas as for- te sobre ele for zero. Como o haltere está em repouso (não
ças externas atuando sobre um objeto é zero se ele está em se movendo), a força externa resultante deve ser zero. A
equilíbrio estático. A primeira lei do movimento de Newton Figura 3.1 mostra um diagrama de corpo livre do haltere.
é a base para tal equilíbrio. Porém, essa lei também se es- As duas forças externas atuando sobre o haltere são
tende para corpos em movimento. Se um objeto está se mo- verticais: a da gravidade atuando para baixo e a de rea-
vendo com velocidade constante em uma linha reta, então a ção da sua mão atuando para cima. Já que o implemento
soma de todas as forças externas atuando sobre ele é zero.
A primeira lei do movimento de Newton basicamente diz
R
que se a força externa resultante atuando sobre um objeto
for zero, então, não haverá mudanças no movimento dele.
Se já está em movimento, vai continuar se movimentando
(em linha reta e velocidade constante). Se está em repou-
so, vai permanecer assim (não se mover). A primeira lei de
Newton pode ser expressa matematicamente como segue:
constante se (3.1a)
ou:
se constante (3.1b)
onde:
v = velocidade instantânea e W

ΣF = força resultante Figura 3.1 Diagrama de corpo livre de um halter quando


mantido parado com uma mão. De acordo com a primeira
Como a primeira lei de Newton também se aplica a lei de Newton, esse diagrama também é correto para um
componentes do movimento, as equações 3.1a e 3.1b po- halter se movendo com velocidade constante em linha reta.
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não está se movendo (v = constante = 0), podemos usar a Ao mover o haltere de 4,5 kg para cima com velocida-
equação 3.3b para resolver a força de reação da sua mão. de constante, a força que você deve exercer contra ele para
manter o movimento ascendente com velocidade constan-
te é de 4,5 kg para cima. Ao segurar o haltere parado, a
(3.5) força que você exerce sobre ele é de 4,5 kg para cima.
Se movê-lo para baixo com velocidade constante, a força
exercida sobre ele também será de 4,5 kg para cima.
onde: A primeira lei do movimento de Newton pode ser in-
terpretada de várias formas:
R = a força de reação da sua mão e
1. Se um objeto estiver em repouso e a força externa re-
P = o peso do haltere = 4,5 kg sultante atuando sobre ele for zero, ele permanecerá
em repouso.
Ao segurar um haltere de 4,5 kg na sua mão, a força que 2. Se um objeto estiver em movimento e a força externa
deve exercer contra ele é de 4,5 kg para cima. O problema resultante atuando sobre ele for zero, ele permanecerá
foi resolvido considerando para cima como o sentido po- em movimento com velocidade constante em linha reta.
sitivo. Já que a resposta obtida foi um número positivo, ele 3. Se um objeto estiver em repouso, a força externa re-
representa uma força para cima. sultante atuando sobre ele deve ser zero.
Agora, vejamos o que acontece se o haltere estiver 4. Se um objeto estiver em movimento com velocida-
em movimento. É melhor se você sentir isso, então tente o de constante em linha reta, a força externa resultante
Autoexperimento 3.1. atuando sobre ele deve ser zero.

Autoexperimento 3.1 A primeira lei do movimento de Newton se aplica


ao movimento resultante de um objeto e às componentes
Pegue um haltere, se você tiver um – senão, use um livro desse movimento resultante. Uma vez que forças e velo-
ou qualquer outro objeto conveniente que pese mais de cidades são vetores, a primeira lei de Newton pode ser
2 kg e considere-o um halter. Vamos supor que ele pesa aplicada em qualquer direção do movimento. Se nenhuma
4,5 kg. Segure-o parado em sua mão. Se você começar força externa atuar, ou se as componentes de uma força
a levantá-lo e durante o levantamento ele se mover com externa atuando na direção específica somam zero, não há
velocidade constante para cima, qual o tamanho da força nenhum movimento do objeto nessa direção ou a veloci-
que você deve exercer sobre ele para mantê-lo se mo- dade naquela direção é constante.
vendo para cima com velocidade constante? O que você
percebe em comparação à força necessária para segurar A primeira lei do movimento de Newton
o haltere parado? Lembre-se, estamos tentando descobrir se aplica ao movimento resultante de
a força que você realiza quando o implemento se move um objeto e às componentes desse
para cima com velocidade constante, não quando ele ini- movimento resultante.
cia o movimento. Quais forças externas atuam sobre ele?
Verticalmente, a gravidade exerce uma força para baixo
igual ao peso do haltere, 4,5 kg, e sua mão ainda realiza Conservação da
uma força de reação para cima contra ele. De acordo com quantidade de movimento
a primeira lei de Newton, um objeto vai se mover em
velocidade constante em linha reta apenas se não houver A primeira lei do movimento de Newton fornece a base
forças externas atuando sobre ele ou se a força externa para o princípio de conservação da quantidade de movi-
resultante em ação for zero. Como o haltere se move com mento (se considerarmos apenas objetos com massa cons-
velocidade constante em linha reta, a força externa líqui- tante). Na realidade, o princípio de conservação da quan-
da atuando sobre ele deve ser zero. Volte ao diagrama de tidade de movimento foi primeiramente introduzido por
corpo livre do haltere na Figura 3.1. As duas forças exter- René Descartes e Christian Huygens (um matemático ho-
nas em ação nesse experimento são exatamente iguais às landês) antes da publicação do Principia de Newton, mas
que estavam presentes quando o haltere estava parado: a essa é outra história. O que é quantidade de movimento?
força da gravidade atuando para baixo e a força de reação Quantidade de movimento linear é o produto entre a
da sua mão atuando para cima. Nós usaremos de novo a massa de um objeto e sua velocidade linear. Quanto mais
equação 3.5 para solucionar a força da sua mão. Como rápido o objeto se mover, maior será sua quantidade de
os valores são os mesmos, obtemos a mesma força de movimento. Ela também é proporcional à massa de um
reação de 4,5 kg para cima. objeto em movimento. Assim, quantidade de movimento
é uma forma de quantificar o movimento e a inércia de
Biomecânica do Esporte e do Exercício 89

um objeto simultaneamente em uma medida. Do ponto de sa, o sistema. Se forem considerados juntos como um todo,
vista matemático, é definida pela equação 3.6. então as forças que um objeto exerce sobre outro são con-
sideradas forças internas e não afetam o movimento do sis-
(3.6) tema. Nós não precisamos saber quais são! Somente forças
onde: externas – aquelas exercidas pelos agentes externos – vão
mudar o movimento do sistema. De acordo com o princípio
L = quantidade de movimento linear, de conservação da quantidade de movimento, a quantidade
de movimento total de um sistema de objetos é constante
m = massa e
se a força resultante atuando sobre ele for zero. Esse prin-
v = velocidade instantânea cípio é representado matematicamente pela equação 3.11.
Para um sistema constituído por um número de objetos, a
A primeira lei do movimento de Newton basicamente
soma das quantidades de movimento de todos eles em al-
afirma que a velocidade de um objeto será constante se a
gum tempo inicial é igual a de um momento posterior, ou
força resultante sobre ele for zero. Nos esportes e no movi-
final, se nenhuma força externa atuar sobre o sistema. Se o
mento humano, a maior parte dos objetos com que lidamos
sistema for constituído por somente um objeto, isso é muito
tem massa constante (pelo menos na curta duração das ati-
simples – velocidade e massa não mudam. Mas, se ele for
vidades que podemos estar analisando). Se a velocidade
constituído por dois ou mais, a velocidade inicial e final de
de um objeto é constante, então sua quantidade de movi-
um objeto dentro do sistema pode mudar. No caso de um
mento também é já que a massa não muda. A quantidade
sistema com muitos objetos, se a velocidade de um deles
de movimento será constante se a força externa resultante
aumenta, a velocidade de outro tem de diminuir para manter
for zero. Isso pode ser expresso matematicamente como:
a quantidade de movimento total do sistema constante.
L = constante se (3.7)
onde: constante (3.11)
L = quantidade de movimento linear e onde:
ΣF = força externa líquida Li = quantidade de movimento linear inicial,
Uma vez que velocidade é uma grandeza vetorial Lf = quantidade de movimento linear final,
(com magnitude, direção e sentido), quantidade de movi-
mento também é. A quantidade de movimento total de um m = massa de parte do sistema,
objeto pode ser decomposta em componentes, ou se estas u = velocidade inicial e
forem conhecidas, podem ser adicionadas (usando adição
vetorial) para determinar a quantidade de movimento re- v = velocidade final
sultante. A conservação da quantidade de movimento se
aplica às componentes da quantidade de movimento, as- A quantidade de movimento total de um
sim a equação 3.7 pode ser representada pelas equações sistema de objetos é constante se a força
para as três dimensões (vertical, horizontal – para frente e externa resultante atuando sobre ele for
para trás; e horizontal – lado a lado). zero.

Lx = constante se (3.8) O princípio de conservação da quantidade de movi-


Ly = constante se (3.9) mento é especialmente útil para analisar colisões. Estas
são comuns no esporte: bolas de beisebol colidem com
Lz = constante se (3.10) bastões, as de tênis com raquetes, as de futebol com pés,
as de jogadores de defensiva colidem com os atacantes no
Usar o princípio de conservação da quantidade de
futebol americano e assim por diante. O resultado dessas
movimento para analisar um objeto isolado não vale a
colisões pode ser explicado com o princípio de conserva-
pena. Por que complicar as coisas com massa quando
ção da quantidade de movimento.
tudo com que precisamos nos preocupar na primeira lei
de Newton é velocidade? A importância do princípio de
conservação da quantidade de movimento é mais evidente Colisões elásticas
quando nos preocupamos não com um único objeto, mas Quando dois objetos se chocam em uma colisão frontal,
com um grupo deles. sua quantidade de movimento combinada é conservada.
A análise de um sistema de dois ou mais objetos é sim- Para ver uma simples demonstração desse princípio, tente
plificado se todos eles forem considerados parte de uma coi- o Autoexperimento 3.2. Nós podemos usar esse princípio
90 Peter M. McGinnis

para predizer os movimentos dos objetos após a colisão é totalmente transferida para o outro após o impacto, ou,
em algumas situações, caso suas massas e suas velocida- de forma mais simples, matematicamente,
des antes da colisão sejam conhecidas.
u1 = v2 (3.15)
Autoexperimento 3.2 e
Para este experimento, vamos usar duas moedas de mesmo u2 = v1 (3.16)
peso, por exemplo, duas moedas de cinco centavos . Pegue
as duas e coloque-as sobre uma mesa (ou outra superfície E se as massas dos dois objetos colidindo não forem
plana dura) separadas por cerca de 5 cm. Empurre uma delas iguais? A quantidade de movimento vai se transferir por
(vamos chamá-la de moeda A) contra a outra (moeda B), de completo de um objeto para o outro em todas as colisões
modo que atinja esta no centro e não em um lado ou outro. perfeitamente elásticas de frente?
Tente isso algumas vezes. O que acontece? Logo após a co-
lisão, a moeda A para e praticamente não se move, enquanto Autoexperimento 3.3
a moeda B agora se move na mesma direção com mais ou Vamos repetir o Autoexperimento 3.2, mas dessa vez
menos a mesma velocidade que a moeda A tinha antes da substitua a moeda A de cinco centavos por uma de 50
colisão. No momento imediatamente anterior à colisão, a centavos. Empurre-a (moeda A) contra a de 5 centavos
quantidade de movimento total do sistema era a massa da (moeda B). O que acontece quando a moeda A bate na B?
moeda A vezes sua velocidade. Como a moeda B não estava Nesse caso, a moeda B se move rapidamente na mesma
em movimento, ela não contribuía para a quantidade de mo- direção que a moeda A estava antes da colisão, mas esta
vimento total. Logo após a colisão, o momento total do sis- última também continua se movendo nesse sentido, apesar
tema é a massa da moeda B vezes sua velocidade. A quanti- de muito mais devagar. Se quantidade de movimento fos-
dade de movimento é conservada. Quando a moeda A atinge se transferida por completo da moeda A para a B e vice-
a moeda B, ela lhe transfere sua quantidade de movimento. -versa, a moeda A não estaria se movendo após a colisão.

Vamos examinar a colisão das duas moedas do Auto- O Autoexperimento 3.3 mostra que, em uma colisão
experimento 3.2. Para um sistema com apenas dois obje- perfeitamente elástica com dois objetos de massa diferente,
tos, a equação 3.11 é simplificada para: a quantidade de movimento de cada objeto não é transferida
por completo para o outro objeto. Vamos tentar descobrir
(3.12) as velocidades das moedas de 50 centavos após a colisão
no Autoexperimento 3.3. Nós sabemos da observação que,
Essa equação nos dá algumas informações sobre o que após a colisão, a velocidade da moeda A não é zero, assim,
acontece após a colisão, mas não o suficiente para resol- as equações 3.15 e 3.16 não funcionam. A equação 3.13
ver as velocidades após o choque, a menos que saibamos ainda é válida, mas uma única equação não é suficiente se
mais sobre o que acontece depois dele. É uma única equa- quisermos resolver duas incógnitas – as velocidades das
ção, mas temos duas variáveis desconhecidas (u1 e u2). moedas A e B após a colisão. Duas equações são neces-
Para o exemplo da nossa moeda, essa equação fica: sárias. Em uma colisão perfeitamente elástica, não apenas
quantidade de movimento é conservada, mas a energia ciné-
mAuA + mBuB = mAvA + mBvB (3.13)
tica também. Nós aprenderemos mais sobre energia cinética
Nesse exemplo, sabemos alguma coisa do que aconte- no próximo capítulo, mas a conservação da energia cinética
ce após a colisão. Nós observamos que a velocidade da nos dá a equação adicional de que precisamos para deter-
moeda A foi zero (ou próximo disso) depois do choque. minar as velocidades das moedas após a colisão ou quais-
A velocidade da moeda B antes da colisão foi zero (uB = quer dois objetos em uma colisão perfeitamente elástica de
0), e a velocidade da moeda B após o choque foi zero (vA frente. As equações que descrevem as velocidades após a
= 0). Assim, colisão em uma colisão perfeitamente elástica de frente são:

mAuA = mBvB (3.14)


(3.17)
As massas das moedas são iguais, mA = mB, então:
e
uA = vB
A velocidade da moeda A logo antes da colisão é igual à (3.18)
da moeda B logo depois dela. Para colisões de frente per-
feitamente elásticas entre dois objetos com massa igual, a Note que, se m1 for igual a m2, então as equações 3.17 e 3.18
quantidade de movimento de cada objeto antes do choque são simplificadas nas equações 3.15 e 3.16, respectivamente.
Biomecânica do Esporte e do Exercício 91

Agora, vamos tentar determinar as velocidades após estão em movimento ao longo da mesma linha, mas em sen-
a colisão das duas moedas do Autoexperimento 3.3. Use tidos opostos? Essas equações ainda serão aplicadas?
o subscrito 5 para representar a moeda de 5 centavos e Se ambos os objetos em uma colisão perfeitamente
o subscrito 50 para representar a de 50 centavos. Assim, elástica estão se movendo ao longo da mesma linha, mas
usando as equações 3.17 e 3.18, obtemos as velocidades em sentidos opostos, devemos lembrar que a quantidade de
após a colisão das duas moedas como: movimento é uma grandeza vetorial; assim, a quantidade
de movimento de cada objeto é oposta à do outro objeto na
colisão. Tente o Autoexperimento 3.2 outra vez, mas, ago-
ra, empurre duas moedas de 5 centavos, uma contra a outra,
de modo que se batam de frente ao longo da mesma linha.
e O que acontece? Imediatamente após colidir, elas repelem
uma à outra e se movem no sentido oposto ao da sua velo-
cidade anterior à colisão. Se uma moeda (vamos chamar
de moeda A) está mais rápida que a outra (moeda B) antes
do impacto, esta última vai se mover naquela velocidade e
A massa de uma moeda de 5 centavos de Real cunhada sentido após a colisão, enquanto a moeda A vai se mover na
após 1998 é de aproximadamente 4,10 g; a de uma de 50 velocidade mais lenta na direção oposta após o choque. Se
centavos cunhada após 2002 é cerca de 7,81 g. A massa da a colisão das duas moedas é perfeitamente elástica, então a
*
moeda de 50 centavos (m50) é mais ou menos o dobro da quantidade de movimento pré-colisão de cada uma é trans-
massa da de 5 centavos (m5), ou m50 = 2m5. Nós também ferida para a outra após o impacto. Uma vez que o choque
sabemos que a velocidade pré-colisão da moeda de 5 cen- é perfeitamente elástico, a quantidade de movimento pré-
tavos era zero. Substituindo m50 por 2m5 e u5 por zero nas -colisão da moeda A é igual à quantidade de movimento
equações anteriores, temos: pós-colisão da moeda B, enquanto a quantidade de movi-
mento pré-colisão da B é igual à quantidade de movimento
pós-colisão da A. As equações 3.15 e 3.16 se aplicam, e:
uA = vB
e:
uB = vA

Pré-colisão Pós-colisão

2,0 m/s 0,67m/s 2,67m/s


Assim, a velocidade após a colisão da moeda de 50 cen-
tavos (v50) é um terço da velocidade da moeda de 50
centavos antes da colisão, e a velocidade da moeda de 5 Nickel: Penny: Nickel: Penny:
centavos é quatro terços a da moeda de 50 centavos an- mN = 5,0 g mP = 2,5 g mN = 5,0 g mP = 2,5 g
tes do choque. Suponha que a velocidade da moeda de 50 uN = 2 m/s uP = 0 m/s vN = 0,67 m/s vP = 2,67 m/s
centavos era 2 m/s antes da colisão. Imediatamente após
mPuP + mNmN = mPvP + mNvN
o impacto, essa moeda teria velocidade de m/s, e a de
(5 g)(2 m/s) + (2,5 g)(0 m/s) = (2,5 g)(2,67 m/s) + (5,0 g) 0,67 m/s
5 centavos teria velocidade de 4 m/s. O problema e a
10 g·m/s = 10 g·m/s
solução são apresentados graficamente na Figura 3.2.
As colisões das moedas nos Autoexperimentos 3.2 e Figura 3.2 Colisão perfeitamente elástica de uma
3.3 foram exemplos de colisões perfeitamente elásticas em moeda de R$ 0,50 se movendo e uma de R$ 0,05 parada.
duas dimensões entre um objeto em movimento e outro em
repouso. Se os corpos colidindo têm massas iguais, como no
Pré-colisão Pós-colisão
Autoexperimento 3.2, as equações 3.15 e 3.16 se aplicam.
Se suas massas são diferentes, como no Autoexperimento u1 u2 v1 v2
3.3, as equações 3.17 e 3.18 se aplicam. O que acontece se
ambos os objetos, em uma colisão perfeitamente elástica, m1 m2 m1 m2

m1u1 + m2u2 = m1v1 + m2v2


* N. de T.: Na versão original, o exemplo sugere a utilização m1u1 = m2v2
de moedas estadundinenses com massas de 2,5 e 5,0 g. Para a m2u2 = m1v1
versão em português, foram escolhidas moedas brasileiras que
apresentassem aproximadamente a mesma proporção, ou seja, Figura 3.3 Colisão elástica perfeita entre duas moedas
uma com o dobro da massa da outra. de R$ 0,05 se movendo em sentidos opostos.
92 Peter M. McGinnis

Em nosso exemplo, se a moeda A estava se movendo uA = vB = +2m/s


para a direita com velocidade de 2 m/s, e a moeda B esta- e
va se movendo para a esquerda com velocidade de 1 m/s,
então a quantidade de movimento total do sistema seria uB = vA = –1 m/s
4,0 g·m/s para a direita (a massa de uma moeda de 4,0 g). A velocidade após a colisão da moeda A é de 1 m/s para
Se definirmos o sentido positivo para a direita, então: a esquerda, e a da moeda B é de 2 m/s para a direita. A

Problema ilustrativo 3.1


Uma pequena bola de borracha (25 g) é empilhada no topo de uma grande bola de borracha (100 g), e ambas
são largadas de uma altura de 2 m do chão. A maior quica no chão primeiro e rebate para cima para colidir com
a menor, que está caindo. No instante da colisão, a maior tem velocidade de 4,4 m/s para cima, e a menor tem
velocidade de 4,4 m/s para baixo. Se a colisão entre elas foi perfeitamente elástica, qual a velocidade de cada
bola imediatamente após o impacto?

Solução:
Passo 1: Liste as grandezas conhecidas. , ,
vmenor
mmaior = 100 g
mmenor = 25 g
vmenor
umaior = 4,4 m/s
umenor = −4,4 m/s vmenor ,

Passo 2: Identifique as incógnitas. Passo 5: Verificação de senso comum.


Puxa! A velocidade da bola maior após o impacto pa-
vmaior =? rece razoável. Ela deve se mover para cima se a quanti-
dade de movimento da bola menor for completamente
vmenor =?
transferida para ela. Mas a velocidade de 9,68 m/s da
Passo 3: Procure as equações que apresentem as bola menor após o impacto parece muito alta. Como
grandezas conhecidas e as incógnitas. ela pode se mover tão mais rápido que antes? Vamos
conferir novamente usando a equação da conservação
da quantidade de movimento original (equação 3.13).

mAuA + mBuB = mAvA + mBvB


mmaiorumaior + mmenorumenor = mmaiorvmaior + mmenorvmenor
(100 g)(4,4 m/s) + (25 g)(−4,4 m/s) =
menor menor maior menor maior (100 g)(0,88 m/s) + (25 g)(9,68 m/s)
vmaior
maior menor 440 g·m/s + (−110 g·m/s) = (88 g·m/s) + 242 g·m/s

vmenor
maior maior menor maior menor 330 g·m/s = 330 g·m/s
maior menor Puxa, confere! Isso é um exemplo do “truque da
Passo 4: Agora, substitua os valores das variáveis superbola mortal”. Se uma bola pequena é colocada
conhecidas e encontre a velocidade após impacto de no topo de outra muito maior e ambas são largadas
cada bola. juntas, a menor vai rebater na maior com uma velo-
cidade muito rápida se a colisão for quase perfeita-
, , mente elástica. Atenção: isso é um problema ilustra-
vmaior
tivo, não um autoexperimento. Não tente esse truque
em casa sem proteção nos olhos e proteção pessoal.
É difícil largar as bolas de modo que a menor caia per-
vmaior
feitamente no topo central da maior. Batidas fora do
centro vão lançar a bola menor, voando muito rápido,
vmaior , em uma direção inesperada!
Biomecânica do Esporte e do Exercício 93

ilustração geral dessa situação de impacto é apresentada colidem de frente. Há um terceiro tipo de colisão perfeita-
na Figura 3.3. mente elástica linear, em que os dois objetos estão se mo-
Tente o Autoexperimento 3.3 de novo, mas dessa vez vendo no mesmo sentido, mas com velocidades diferentes.
empurre ambas as moedas, de 50 e 5 centavos, uma em O objeto mais rápido alcança e colide com o mais lento. Se
direção à outra de modo que se batam de frente ao longo os dois têm a mesma massa, a quantidade de movimento do
da mesma linha. O que acontece? Imediatamente após a objeto mais rápido é transferida completamente para o mais
colisão, elas repelem uma a outra e se movem no sentido lento, e as equações 3.15 e 3.16 se aplicam. Logo após a
oposto da sua velocidade anterior à colisão. Se as veloci- colisão, o objeto que era mais rápido passa a ter velocidade
dades pré-colisão das duas forem iguais, mas em sentidos daquele que era mais lento, e o que era mais lento passa a
opostos, então a velocidade pós-colisão da moeda de 5 ter a velocidade do que era mais rápido. Esse tipo de colisão
centavos será maior que sua velocidade pré-colisão, en- e as equações que a descreve são mostradas na Figura 3.4
quanto, no caso da moeda de 50 centavos, será menor. Va- para duas moedas de 5 centavos. Se os objetos têm massas
mos supor que a moeda de 5 centavos estava se movendo diferentes, então as equações 3.17 e 3.18 se aplicam.
para a direita com velocidade de 2 m/s, e a de 50 centavos
para a esquerda com uma velocidade de 2 m/s. Lembre-se Colisões inelásticas
que a moeda de 50 centavos pesa o dobro da de 5 centa-
As colisões que examinamos até aqui eram perfeitamente
vos, 8,0 g contra 4,0 g. Se determinarmos nosso sentido
elásticas, mas nem todas as colisões são assim. O oposto de
positivo para a direita, então a velocidade pós-colisão das
uma colisão desse tipo é a perfeitamente inelástica (também
duas moedas ainda é descrita pelas equações 3.17 e 3.18.
chamada de colisão perfeitamente plástica). Nesta, a quan-
tidade de movimento também é conservada, mas, em vez
de repelirem um ao outro, os objetos permanecem unidos
após o impacto e se movem juntos com a mesma veloci-
, , dade. Essa condição pós-colisão nos fornece a informação
, adicional que precisamos para determinar a velocidade pós-
-colisão dos objetos em um coque desse tipo. As equações a
seguir descrevem o movimento de dois objetos envolvidos
, em uma colisão linear perfeitamente inelástica. Independen-
temente de a colisão ser elástica ou inelástica, começamos
,
com a equação 3.12, que descreve a conservação da quanti-
e: dade de movimento para a colisão de dois objetos.

m1u1 + m2u2 = m1v1 + m2v2


,
, Em uma colisão perfeitamente inelástica,
v1 = v2 = v = velocidade final

, Assim,

, m1u1 + m2u2 = (m1 + m2)v (3.19)

A velocidade pós-colisão da moeda de 5 centavos é


de 3,33 m/s para a esquerda, e a velocidade pós-colisão Pré-colisão Pós-colisão
daquela de 50 centavos é de 0,67 m/s para a direita. Isso
u1 u2 V1 v2
concorda com nossa observação que a moeda de 5 cen-
tavos rebate na de 50 centavos com velocidade maior se
m1 m2 m1 m2
comparada à que tinha antes da colisão, enquanto esta re-
bate na moeda de 5 centavos com velocidade menor que a
m1u1 + m2u2 = m1v1 + m2v2
que tinha antes da colisão. m1u1 = m2v2
Nós descrevemos dois tipos de colisões perfeitamen- m2u2 = m1v1
te elásticas lineares envolvendo dois objetos. No primeiro
caso, um corpo em movimento colide com um em repouso. Figura 3.4 Colisão elástica perfeita de duas moedas de
No segundo, dois objetos se movendo em direções opostas R$ 0,05 se movendo no mesmo sentido.
94 Peter M. McGinnis

A maioria das colisões no futebol americano é do tipo que se afastam um do outro. O coeficiente de restituição
inelástica. Jogadores ofensivos colidem com jogadores costuma ser abreviado com a letra e. Matematicamente,
defensivos, receptores colidem com jogadores de cober-
tura e assim por diante. Na maior parte desses choques, os (3.20)
dois atletas se movem em conjunto após colidirem. O que
acontece depois dessas colisões afeta muito o desfecho de
cada jogada e, em última análise, o resultado do jogo. Um onde:
atacante mais leve e rápido pode igualar a quantidade de e = coeficiente de restituição,
movimento de um jogador de defesa mais lento e pesado?
O futebol americano valoriza a quantidade de momento – v1, v2 = velocidades pós-impacto dos objetos um e
massa e velocidade têm a mesma importância. Jogadores dois e
rápidos e grandes são os mais bem-sucedidos. Vamos ex-
u1, u2 = velocidade pré-impacto dos objetos um e
perimentar um problema para ilustrar a mecânica de uma
dois
colisão inelástica.
Suponha que um atacante de 80 kg colide no ar com um O coeficiente de restituição é adimensional. Para as
jogador de defesa de 120 kg na linha de pontuação durante perfeitamente elásticas, o coeficiente de restituição é 1,0,
uma tentativa de marcar o gol a uma curta distância. Logo seu valor máximo. Para as perfeitamente inelásticas, é
antes do impacto, o atacante tem uma velocidade de 6 m/s zero, seu valor mínimo. Se sabemos o coeficiente de res-
no sentido da linha de pontuação, e o defensor tem velocida- tituição para dois objetos em uma colisão elástica, isso,
de de 5 m/s no sentido oposto. Se a colisão for perfeitamen- junto com a equação da conservação da quantidade de
te inelástica, o atacante vai se mover para frente e marcar movimento, nos dá as informações necessárias para deter-
logo após o choque, ou o jogador de defesa vai prevalecer? minar as velocidades pós-colisão dos objetos.
Para responder essa questão, vamos começar com a O coeficiente de restituição é afetado pela natureza
equação 3.19: dos dois corpos envolvidos na colisão. Para bolas espor-
m1u1 + m2u2 = (m1 + m2)v
Vamos considerar positivo o sentido que aponta para a li-
nha de pontuação. Substituindo os valores conhecidos das
massas e velocidades pré-colisão, teremos:

Isolando v (a velocidade final dos dois jogadores), temos:


Altura da queda

,
Altura do quique

O atacante não vai marcar. Ele e o jogador de defesa vão


se afastar da linha de pontuação com uma velocidade de
0,6 m/s.
A maior parte das colisões em esportes não é nem per-
feitamente elástica nem inelástica, mas algo entre elas. Há
colisões elásticas, mas não perfeitamente elásticas. O coe-
ficiente de restituição é uma forma de quantificar o quão
elástica as colisões de um objeto são.

Coeficiente de restituição
O coeficiente de restituição é definido como um valor
Coeficiente altura da queda
absoluto da razão da velocidade de separação com a ve- = P=
de restituição altura do quique
locidade de aproximação. A velocidade de separação é a
diferença entre as velocidades dos dois objetos colidindo Figura 3.5 Determinação do coeficiente de restituição a
logo após o choque, ou seja, descreve a velocidade com partir das alturas de queda e do quique.
Biomecânica do Esporte e do Exercício 95

tivas, é facilmente mensurado se o objeto com que a bola O coeficiente de restituição é uma medida crítica na
colide é fixo e imóvel. Assim, somente suas velocidades maior parte dos esportes com bola, uma vez que o “rico-
pré e pós-impacto precisam ser medidas. Na verdade, se a chete” entre uma bola e o implemento ou superfície que
bola é largada de uma altura específica em uma superfície bate afetará bastante o resultado de uma competição. Se
de impacto fixa, então a altura máxima que ela alcança bastões tivessem coeficientes de restituição maiores com
após o impacto com o solo (altura do quique) e a altura bolas de beisebol, ocorreriam mais home runs (e mais ar-
da queda fornecem informação suficiente para que calcu- remessadores seriam lesionados pelas bolas rebatidas). Se
lemos o coeficiente de restituição (Fig. 3.5). (Você pode tacos de golfe tivessem coeficientes de restituição maiores
derivar essa equação a partir das equações 3.20 e 2.18?) com bolas de golfe, batidas de 300 jardas poderiam ser co-
muns. Obviamente, os criadores das regras devem regular
altura do quique o coeficiente de restituição para os implementos e bolas
(3.21)
altura da queda envolvidos em seus esportes.

Problema ilustrativo 3.2


Uma bola de golfe é atingida por um taco. A massa da bola é 46 g, e a da cabeça do taco é 210 g. A velocidade
da cabeça do taco logo antes do impacto é 50 m/s. Se o coeficiente de restituição entre a cabeça do taco e a bola
é 0,80, qual a velocidade desta última imediatamente após o impacto?

Solução:
Passo 1: Liste as grandezas conhecidas. vtaco vbola
ubola utaco
mbola = 46 g
mtaco = 210 g ubola utaco vtaco vbola

ubola = 0 m/s vtaco ubola utaco vbola


utaco = 50 m/s Passo 5: Agora, vamos substituir essa expressão para
a velocidade pós-impacto do taco na equação da con-
e = 0,80 servação da quantidade de movimento.
Passo 2: Identificar a variável que deve ser solucionada. mbola ubola mtacoutaco mbola vbola mtacovtaco
vbola =? mbola ubola mtacoutaco mbola vbola mtaco
Passo 3: Busque por equações que apresentem as
ubola utaco vbola
grandezas conhecidas e desconhecidas. Passo 6: Substitua os valores conhecidos e isole a ve-
locidade pós-impacto da bola.

mbola ubola mtaco utaco mbola vbola mtaco vtaco vbola


, vbola
vtaco vbola vbola
ubola utaco ,
Passo 4: Nós temos duas variáveis desconhecidas, vta- , vbola
coe vbola, que representam as velocidades pós-impacto
do taco e da bola. Também temos duas equações para
usar. Se o número de equações independentes é igual
vbola
ao número de variáveis desconhecidas, estas podem
ser calculadas. Nós precisamos resolver uma das equa-
ções de modo a obter uma das variáveis desconhe- vbola
cidas em termos da outra. Vamos usar a equação do
coeficiente de restituição e resolver para a velocida- Passo 7: Verificação de senso comum.
de pós-impacto do taco. Nós queremos manipular a Essa velocidade ultrapassa os 260 km/h, mas parece
equação para que essa velocidade esteja em um lado estar correto se você pensar o quão rápido uma bola
da equação sozinha. de golfe dispara do suporte.
96 Peter M. McGinnis

As maiores partes dos regulamentos de esportes com Essa é a segunda lei do movimento de Newton em la-
bola direta ou indiretamente especificam qual deve ser tim como foi originalmente apresentada no Principia. Ela
o coeficiente de restituição para bolas em superfícies de costuma ser referida como lei da aceleração. Traduzido, o
jogo ou implementos. As regras U.S. Golf Association texto afirma: “A mudança do movimento de um objeto é
(USGA) proíbem tacos com coeficiente de restituição proporcional à força aplicada; e ocorre no sentido da linha
com uma bola de golfe superior a 0,830. As regras de reta na qual a força é exercida” (Newton, 1986/1934, p.
basquete National Collegiate Athletic exigem que a bola 13). Essa lei explica o que acontece se uma força externa
quique até uma altura entre 49 e 54 polegadas ou 1,24 a resultante atua sobre um objeto. De forma mais simples, a
1,37 metros (mensurados do topo da bola) quando lar- segunda lei de Newton afirma que, caso uma força externa
gada a 6 pés (1,83 m) do chão (mensurados da base da resultante seja exercida sobre um objeto, este vai acelerar
bola). As regras de raquetebol afirmam que a bola deve no sentido dela, e sua aceleração vai ser diretamente pro-
quicar até uma altura de 68 a 72 polegadas (1,73 a 1,83 porcional a força externa resultante e inversamente pro-
m) se largada de uma altura de 100 polegadas (2,54 m). porcional a sua massa. Isso pode ser escrito em linguagem
Qual é a taxa de valores permitida para o coeficiente de matemática da seguinte forma:
restituição (equação 3.21) para o raquetebol de acordo
com essa regra? ΣF = ma (3.22)

altura do quique onde:


altura da queda ΣF = força externa resultante,
Valor baixo: m = massa do objeto e
a = aceleração instantânea do objeto
, ,
Essa é outra equação vetorial, já que força e acele-
Valor alto: ração são vetores. A segunda lei de Newton então é apli-
cável aos componentes de força e aceleração. A equação
, , 3.22 pode ser representada por equações para as três di-
mensões (vertical, horizontal – anteroposterior – e hori-
De acordo com as regras desse esporte, o coeficiente zontal – médio-lateral).
de restituição da bola deve ser entre 0,82 e 0,85. O coe- Σ Fx = max (3.23)
ficiente de restituição de uma bola de basebol com um
taco de madeira é cerca de 0,55; o de uma bola de tênis Σ Fy= may (3.24)
na quadra é cerca de 0,73. A maneira como a bola rebate é
Σ Fz= maz (3.25)
determinada por seu coeficiente de restituição.
Nossa exploração da primeira lei do movimento de A segunda lei de Newton expressa uma relação de
Newton nos levou ao princípio da conservação da quan- causa e efeito. Forças causam aceleração. Aceleração é
tidade de movimento e colisões. Na análise de colisões, o efeito das forças. Se uma força externa resultante atua
consideramos os dois objetos como parte do mesmo siste- sobre um objeto, este acelera. Se ele acelera, uma força
ma e, assim, ignoramos a força do impacto – por ser uma externa resultante deve estar atuando para causar a acele-
força interna. Se isolarmos somente um dos objetos envol- ração. A primeira lei do movimento de Newton é, de fato,
vidos na colisão, então essa força de impacto se torna uma apenas um caso especial da segunda lei do movimento de
força externa, e a primeira lei de Newton já não se aplica. Newton – quando a força resultante atuando em um objeto
O que acontece quando as forças externas atuando sobre é zero, sua aceleração também é zero.
um objeto resultam em uma força externa líquida que não
é igual a zero? Newton encontrou uma resposta para essa A qualquer instante que um objeto inicia
questão em sua segunda lei do movimento. ou interrompe o movimento, aumenta
ou diminui a velocidade ou muda sua
direção, ele está acelerando e uma força
Segunda lei do movimento externa líquida está atuando para causar
de Newton: Lei da aceleração essa aceleração.

Mutationem motis proportionalem esse vi motrici A segunda lei do movimento de Newton explica como
impressae, et fieri secundum lineam rectam qua a aceleração ocorre. Vamos ver se conseguimos aplicá-la.
vis illa imprimitur. (Newton, 1686/1934, p. 644) No Capítulo 2, examinamos o movimento de projéteis.
Biomecânica do Esporte e do Exercício 97

A aceleração vertical de um projétil é governada pela se-


gunda lei do movimento de Newton. Se a única força em
ação for a da gravidade para baixo, então a aceleração do
projétil também será para baixo e proporcional a tal força.
Como a força da gravidade é o peso do objeto (P), usando
a equação 3.24, temos o seguinte resultado:

Isso não é novidade para nós, já que peso e aceleração


devido à gravidade foram introduzidos no Capítulo 1 com
a equação 1.2. Vamos considerar outras aplicações da se-
gunda lei de Newton, as quais envolvam forças de contato
além da força da gravidade. Tente o Autoexperimento 3.4.
W
Autoexperimento 3.4
Tente encontrar um elevador em sua escola ou local de
trabalho, ou procure por um em um prédio alto de sua ci-
dade. Entre nele e suba e desça várias vezes. O que acon-
tece quando ele está subindo? O que você sente quando
ele inicia a subida? Você se sente mais pesado ou mais
leve? Quando o elevador está entre os andares, você se
sente mais pesado ou mais leve? E quando ele para no úl-
timo andar? Você se sente mais pesado ou mais leve con-
forme o elevador diminui a velocidade e para? Você pro-
vavelmente se sente mais pesado à medida que ele inicia
a subida e mais leve conforme ele diminui a velocidade e
para. Entre os andares, você provavelmente não se sente R
nem mais pesado nem mais leve. Por que isso acontece?
Você ganhou peso e depois perdeu peso à medida que o
elevador aumentava ou diminuía a velocidade?

Figura 3.6 Diagrama de corpo livre de uma pessoa pa-


Agora, vamos examinar o que acontece quando você rada em um elevador.
anda no elevador, como no Autoexperimento 3.4, usando
a segunda lei do movimento de Newton. Primeiro, vamos
desenhar um diagrama de corpo livre e determinar quais onde:
forças externas atuam sobre você enquanto está no eleva-
dor. A Figura 3.6 mostra um diagrama de corpo livre de ΣFy= força externa resultante na direção vertical,
alguém em pé em um elevador. A gravidade o puxa para m = sua massa,
baixo com uma força equivalente ao seu peso. Há alguma
outra força atuando sobre você? Que tal a força de reação ay = sua aceleração vertical,
sob seus pés? O chão do elevador exerce uma força de rea-
P = seu peso e
ção para cima em seus pés. Se você não está em contato
nada além do chão, então as únicas forças em ação são a R = a força de reação exercida em seus pés pelo
gravidade (seu peso) e a força de reação do solo. Estas são elevador
verticais, então, se quisermos saber qual é a sua acelera-
ção ou seu sentido, podemos usar a equação 3.24: Se a força de reação, R, é maior que seu peso, você
se sente mais pesado, e a força resultante atua para cima,
gerando uma aceleração para cima. Isso é exatamente o
que acontece quando o elevador aumenta a velocidade no
sentido ascendente; ele lhe acelera para cima, e você se
98 Peter M. McGinnis

sente mais pesado. Se a força de reação, R, é igual ao seu Quando o levantamento parece mais difícil? Quando pare-
peso, você não se sente nem mais leve nem mais pesado, ce mais fácil? Para começá-lo, você deve acelerar o halter
e a força resultante é zero, gerando uma aceleração zero. para cima, assim a força resultante atuando sobre ele deve
Se você e o elevador já estiverem se movendo para cima, ser ascendente. A força que você faz sobre o implemento
você continuaria se movendo para cima com velocidade deve ser maior que 4,5 kg. Isso é como o que ocorre no
constante. Se a força de reação, R, é menor que seu peso, exemplo do elevador. Uma vez que você iniciou o movi-
você se sente mais leve, e a força resultante atua para bai- mento do halter para cima, continuá-lo exige apenas que
xo, gerando uma aceleração para baixo. Isso é exatamente uma força resultante zero atue, e ele vai se mover com
o que acontece quando o elevador diminui a velocidade; velocidade constante. A força que você exerce no halter
você desacelera para cima (diminui a velocidade no sen- deve ser igual a 4,5 kg. Conforme você termina o levan-
tido ascendente e acelera para baixo) e se sente mais leve. tamento, precisa diminuir a velocidade do movimento do
Vamos confirmar nossa análise com algumas medidas halter para cima, assim a força resultante atuando sobre
grosseiras no Autoexperimento 3.5. ele é para baixo. A força que você exerce deve ser menor
que 4,5 kg. Quando o implemento para no final da tra-
Autoexperimento 3.5 jetória de subida, não está mais em movimento, assim a
força resultante atuando sobre ele é zero. A força que você
Você pode chegar grosseiramente aos valores da força de
exerce sobre o halter deve ser igual a 4,5 kg.
reação, R, exercida pelo chão do elevador em seus pés,
Agora, vamos considerar quanta força é necessária
se levar uma balança de banheiro consigo em seu passeio
para iniciar o movimento horizontal de alguma coisa. Na
vertical. A balança indica a força que você exerce sobre
ela, que é igual àquela que ela exerce sobre você – a for- próxima vez que você jogar boliche, tente isso. Pegue uma
ça de reação, R. A balança aponta um valor superior ao bola de 7,3 kg (16 lb) e coloque-a sobre o solo. Tente fazê-
seu peso quando o elevador começa a subir e você acelera -la rolar horizontalmente empurrando-o com apenas um
para cima. Depois, ela volta a marcar o seu peso corpo- dedo. Você conseguiu? Quanta força horizontal foi neces-
ral enquanto o elevador e você continuam subindo com sária para iniciar o movimento horizontal da bola? Você
velocidade constante. A balança aponta um valor abaixo precisou fazer apenas uma pequena força. Isso é facilmen-
do seu peso quando o elevador diminui a velocidade e sua te feito com um dedo. Vamos ver a equação 3.23 para ex-
aceleração é para baixo. plicar a razão disso.
Vamos ver o que acontece quando você desce com o
elevador em vez de subir. O diagrama de corpo livre e as
equações utilizadas para analisar a subida são as mesmas Na direção horizontal, a única outra força horizontal
de antes. Quando o elevador iniciar a descida, ele aumenta atuando sobre a bola é uma pequena força de atrito hori-
a velocidade para baixo. Você se sente mais leve. A força de zontal exercida nela pelo chão, então:
reação do solo (mostrada na balança) é inferior ao seu peso
corporal, assim a força resultante é para baixo, bem como
sua aceleração. À medida que o elevador continua descen-
do, ele para de aumentar a velocidade descendente. Você
sente seu peso normal. A força de reação do solo (mostrada onde:
na balança) é igual ao seu peso corporal, assim a força resul- Px = empurrão do dedo e
tante é zero e você se move com velocidade constante para
baixo. Quando o elevador diminui a velocidade para parar Ff = força de atrito do solo
no andar de baixo, ele diminui a velocidade no sentido para
Para acelerar uma bola horizontalmente e iniciar seu
baixo, e você se sente mais pesado. A força de reação do
movimento, a força do empurrão do dedo deve ser apenas
solo (mostrada na balança) é maior que seu peso corporal,
um pouco maior que a pequena força de atrito exercida
assim a força resultante é ascendente e você acelera para
pelo chão. Nesse caso, a força que você exerce pode ser
cima (a velocidade de seu movimento para baixo diminui).
inferior a 4,5 N (1 lb), e a bola vai iniciar seu movimento.
Agora, tente levantar a bola com o mesmo dedo (use
O exemplo do elevador não parece ter muita relação um dos buracos mesmo assim nela). Você consegue fazer
com o movimento humano em esportes, mas considere a isso? Se não, use toda sua mão e os três buracos. Quanta
força que você deve exercer contra um halter de 4,5 kg (10 força é necessária para iniciar o movimento da bola para
lb) para levantá-lo. As forças externas atuando sobre o im- cima? É bastante difícil fazer isso usando a força de ape-
plemento são a gravidade, para baixo, e a força de reação nas um dedo. Por que é necessária tanta força a mais para
de sua mão, para cima. A força resultante é, portanto, a acelerar um objeto para cima do que para os lados? Veja a
diferença entre essas duas forças, assim como no elevador. equação 3.24 novamente.
Biomecânica do Esporte e do Exercício 99

Problema ilustrativo 3.3


Um corredor de 52 kg está correndo para frente a 5 m/s quando seu pé toca o chão. A força de reação vertical do
solo atuando sob seu pé nesse instante é de 1.800 N. A força de atrito atuando sob seu pé é uma força de frena-
gem de 300 N. Essas são as únicas forças externas atuando sobre o atleta além da gravidade. Qual é a aceleração
vertical do corredor como resultado dessas forças?

Solução:
Passo 1: Liste as gandezas conhecidas e as que podem ser derivadas facilmente.

m = 52 kg
Rx = 300 N
Ry = 1.800 N
P = mg = (52 kg)(9,81 m/s) = 510 N
Passo 2: Identificar a variável que deve ser solucionada.
W = 510 N
ay =?
Passo 3: Desenhe o diagrama de corpo livre do corredor.

Rx = 300 N

1.800 N = Ry

Passo 4: Procure equações com as variáveis conhecidas e não


conhecidas – a segunda lei de Newton funciona aqui.

Passo 5: Substitua os valores e isole a variável desconhecida.

Passo 6: Verificação de senso comum.


A resposta, 24,8 m/s2, é cerca de duas vezes e meia a aceleração devido à gravidade (2,5 g). Isso é aproximada-
mente adequado para a fase de impacto de um passo de corrida. O número é positivo, então indica uma acelera-
ção para cima. A velocidade para baixo do corredor é diminuída à medida que o pé atinge o solo.
100 Peter M. McGinnis

sar essa aceleração. Da onde vem a força horizontal ex-


terna? Pense no que acontece quando você tenta correr
Na direção vertical, a única outra força vertical exercida em uma curva em um rinque de gelo. Isso não é possível,
sobre a bola é a da gravidade, porque não há atrito suficiente. Atrito é a força externa ho-
rizontal que faz você mudar a direção à medida que corre
em uma curva.

onde:
Impulso e quantidade
Ry = força para puxar para cima do dedo (ou mão) e de movimento
P = peso Matematicamente, a segunda lei de Newton é expressa
pela equação 3.22:
Para iniciar o movimento da bola para cima, você deve
exercer sobre ela uma força para cima maior que seu peso
– nesse caso, maior que 7,3 kg. Em geral, fazer algo ini-
ciar o movimento horizontalmente requer bem menos for- Isso mostra o que acontece apenas em um instante de
ça (e, assim, menos esforço) do que fazer algo iniciar o tempo. A aceleração causada pela força resultante é ins-
movimento para cima. A Figura 3.7 ilustra isso. tantânea. Essa é a aceleração experimentada pelo corpo
Agora, sabemos que uma força resultante é necessária ou objeto no instante em que a força resultante atua e vai
para diminuir ou aumentar a velocidade de algo. Diminuir mudar se esta variar. Exceto pela gravidade, a maior parte
ou aumentar a velocidade são exemplos de aceleração. das forças que contribuem para a força externa resultante
Uma força resultante é necessária para mudar direções? mudam com o tempo. Assim, a aceleração de um objeto
Sim, uma vez que a aceleração é causada por uma força que está sujeito a essas forças também muda com o tempo.
resultante e mudança na direção é uma aceleração, uma Nos esportes e no movimento humano, com frequência
força resultante é necessária para trocar direção. O que estamos mais preocupados com o resultado final das for-
acontece quando você corre em uma curva? Você muda ças externas atuando sobre um atleta ou objeto durante um
sua direção de movimento e, portanto, está acelerando. determinado período de tempo do que com sua aceleração
Uma força resultante atua na direção horizontal para cau- instantânea em algum instante da aplicação da força. Nós
queremos saber o quão rápido a bola de beisebol estava indo
depois que o lançador exerceu força durante o arremesso.
A segunda lei de Newton pode ser usada para deter-
minar isso. Olhando a equação 3.22 levemente diferente,
nós podemos considerar qual aceleração média é causada
por uma força resultante média:

(3.26)
onde:
Σ = força resultante média e
= aceleração média
Uma vez que aceleração média é a mudança na velocidade
UGH!
pelo tempo (equação 2.9),

AAH!

A equação 3.26 se torna:

Figura 3.7 É muito mais fácil acelerar alguma coisa no (3.27)


sentido horizontal do que no vertical.
Biomecânica do Esporte e do Exercício 101

Multiplicando ambos os lados por Δt, teremos: de saltos e outras atividades. Em todas essas práticas, as
técnicas usadas podem ser explicadas em parte pela rela-
(3.28) ção impulso-quantidade de movimento. Uma grande mu-
(3.29) dança na velocidade é produzida por uma grande força re-
sultante média atuando por um longo intervalo de tempo.
Essa é a relação impulso-quantidade de movimento. Im- Como há limites nas forças que humanos são capazes de
pulso é o produto da força pelo tempo de durante o qual produzir, muitas técnicas esportivas envolvem aumentar a
esta atua. Se a força não é constante, o impulso é a média duração da aplicação de força. Tente o Autoexperimento
dos tempos de força, a duração da força resultante média. 3.6 para ver como a duração da força afeta o desempenho.
O impulso produzido por uma força resultante atuando
por um período de tempo causa uma mudança na quanti- Autoexperimento 3.6
dade de movimento de um objeto. Nós podemos interpre-
tar essa alteração como uma mudança média na velocida- Pegue uma bola na sua mão de lançamento e veja quão
de, porque a maior parte dos objetos tem massa constante. distante (ou com qual velocidade) você consegue lançá-la
Se quisermos alterar a velocidade de um objeto, podemos usando somente movimentos do punho. Mexa apenas sua
produzir uma maior mudança na velocidade fazendo uma mão e mantenha seu antebraço, seu braço e o resto do cor-
força resultante média maior atuar sobre ele ou aumentan- po parados. Essa não é uma técnica muito efetiva, é? Ago-
do o tempo durante o qual ela atua. ra, tente lançá-la de novo, mas dessa vez use seu cotovelo
Quando Newton declarou sua segunda lei do movi- e punho. Mova somente sua mão e antebraço, mantendo o
mento, ele realmente quis se referir ao movimento do im- braço e o resto do corpo imóveis. Essa técnica é melhor,
pulso. A mudança no movimento de um objeto é propor- mas ainda não é muito efetiva. Tente uma terceira vez
cional à força aplicada. usando punho, cotovelo e ombro. Mova apenas sua mão,
A relação impulso-quantidade de movimento descrita seu antebraço e seu braço, mantendo o resto do seu corpo
matematicamente pela equação 3.29 é, na verdade, apenas parado. Essa técnica é um avanço em relação à anterior,
uma outra maneira de interpretar a segunda lei de Newton. mas você ainda pode fazer melhor. Tente uma quarta vez
Essa interpretação pode ser mais útil para nós no estudo lançando como você normalmente faria, sem restrições.
do movimento humano. A força resultante média agindo Esse lançamento foi provavelmente o mais rápido. Em qual
sobre um intervalo de tempo irá causar uma mudança na deles você conseguiu exercer força contra a bola pela maior
dinâmica do objeto. Podemos interpretar a mudança na quantidade de tempo? E pela menor quantidade de tempo?
quantidade de movimento a partir da mudança na veloci-
dade, pois a maioria dos objetos tem massa constante. Se
queremos mudar a quantidade de movimento do objeto, Durante o Autoexperimento 3.6, você exerceu o
podemos produzir uma força resultante média atuando por maior impulso na bola quando usou sua técnica normal
algum intervalo de tempo. de lançamento. Como resultado, a quantidade de movi-
mento dela mudou bastante, e ela deixou sua mão com
A força resultante média atuando por a maior velocidade. O grande impulso foi o resultado de
algum intervalo de tempo causará uma uma força resultante média relativamente alta sendo exer-
mudança na quantidade de movimento cida sobre a bola por um tempo relativamente longo. Você
do objeto. exerceu o menor impulso quando usou apenas seu punho.
A quantidade de movimento da bola não mudou muito, e
Usando impulso para aumentar a bola deixou sua mão com a menor velocidade. O impul-
so pequeno foi resultado de uma força resultante média
quantidade de movimento relativamente pequena sendo exercida sobre bola por um
A tarefa em muitas habilidades esportivas é causar uma curto tempo. A técnica de lançamento normal envolveu
grande mudança na velocidade de alguma coisa. Em even- mais segmentos na ação do arremesso, e você foi capaz de
tos de lançamento, a bola (ou peso, disco, martelo, fris- aumentar o tempo durante o qual pôde exercer uma força
bee, etc.) não tem velocidade no início do arremesso, e sobre a bola (e provavelmente foi capaz de exercer uma
a tarefa é dar ao objeto uma alta velocidade no final do força média maior). O resultado final foi um lançamento
lançamento. Nós queremos aumentar sua quantidade de mais rápido. Em função do período mais longo de aplica-
movimento. Do mesmo modo, em eventos de colisão, a ção de força, a bola teve mais tempo para aumentar a velo-
raquete (ou bastão, punho, taco, vara, etc.) não tem ve- cidade e, assim, sua velocidade no lançamento foi maior.
locidade no início do balanço (ou golpe ou soco), e a ta- Uma coisa importante para lembrar sobre a relação
refa é dar-lhe a maior velocidade logo antes do impacto. impulso-quantidade de movimento (equação 3.29),
Nossos corpos podem ser os objetos cuja quantidade de
movimento queremos aumentar, como ocorre em eventos
102 Peter M. McGinnis

é que a força resultante média, , no termo do impulso Seus treinamentos e seleções têm sido baseados em sua ha-
é um vetor, assim como são as velocidades, vf e vi, no ter- bilidade para produzir altas forças ( no impulso). Lan-
mo da quantidade de movimento. Um impulso vai causar çadores do beisebol e atletas de arremesso de dardo não
uma mudança na quantidade de movimento e, assim, uma são tão fortes. Eles têm sucesso porque suas técnicas ma-
alteração na velocidade na direção da força. Se você quer ximizam o período de aplicação de força (Δt no impulso).
mudar a velocidade de um objeto em uma direção espe- Agora, vamos experimentar uma atividade na qual o
cífica, a força aplicada, ou algum de seus componentes, elemento de força no impulso é limitado, de modo que se-
deve ocorrer nessa direção específica. jamos forçados a enfatizar a duração da aplicação de força
Qual é a maior limitação no impulso – a força ou o (Δt) na equação do impulso. Tente o Autoexperimento 3.8.
tempo? Tente o Autoexperimento 3.7 para ajudar a res-
ponder essa questão. Autoexperimento 3.8
Encha vários balões com água até que fiquem mais ou me-
Autoexperimento 3.7 nos do tamanho de uma bola de softball. Leve-os para um
Veja quão distante (ou com qual velocidade) você conse- campo aberto ou estacionamento vazio. Agora, veja quão
gue lançar um objeto muito leve (como uma bola de tênis rápido consegue lançar um sem que ele estoure em sua
de mesa) em comparação a outro muito pesado (como um mão. Se você exercer uma força muito alta contra o balão,
peso de 7,3 kg). O que restringiu o desempenho do seu ele vai estourar. Para lançá-lo longe, é preciso maximizar
lançamento com o objeto mais leve? O fator limitante foi a duração do período de aplicação de força no lançamen-
sua força (você precisa ser excepcionalmente forte para to enquanto limita a magnitude da força exercida contra
lançar uma bola de tênis de mesa rápido?) ou sua técni- ele para que não estoure. Não limite sua técnica ao que
ca (duração da aplicação da força)? O que limitou seu você considera estilos normais de lançamento. Lembre,
desempenho com o objeto mais pesado – força ou técnica a melhor técnica será aquela na qual você acelera o balão
(duração da aplicação da força)? pelo maior tempo possível enquanto aplica a maior força
contra o balão (mas que não o estoure).

No Autoexperimento 3.7, o fator limitante para lançar


o objeto muito leve foi sua técnica, não sua força. Mais Vamos resumir o que aprendemos sobre impulso e
especificamente, o período de tempo durante o qual você quantidade de movimento até agora. A relação é descrita
pôde exercer força sobre a bola foi limitado. Muito curto. matematicamente pela equação 3.29:
A bola acelerou tão rapidamente que sua mão teve dificul-
dade de acompanhá-la e ainda exercer força.
Reciprocamente, nesse experimento, o fator limitante impulso = quantidade de movimento
para lançar o objeto muito pesado foi sua força, não sua
onde:
técnica. Quando você tentou arremessar (ou lançar) o peso
de 7,3 kg, o fator limitante não foi a duração da aplicação = força resultante média atuando em um objeto,
da força, mas o tamanho dela. A força que você exerceu
foi definitivamente maior que aquela exercida ao lançar a Δt = intervalo de tempo durante o qual essa força atua,
bola de tênis de mesa, mas a quantidade de força foi limi- m = massa do objeto sendo acelerado,
tada pela sua capacidade de produção de força. Se sua ca-
pacidade fosse maior, a força que você poderia exercer no vf = velocidade final do objeto no final do intervalo
peso seria maior, e ele teria ido mais longe e mais rápido. de tempo e
Quando você lançou a bola de tênis de mesa no Au-
vi = velocidade inicial do objeto no início do
toexperimento 3.7, a força resultante média, , não foi o
intervalo de tempo
problema; o seu tempo de aplicação, Δt, foi. No arremesso
de peso, o tempo de aplicação foi longo, mas a quantidade Em muitas situações esportivas, a meta é conferir
de força aplicada foi limitada. Nos dois exemplos, maxi- uma velocidade alta a um objeto. Sua velocidade inicial
mizar ambas as quantidades, e Δt, resultaria em lança- é zero, e a velocidade final alta, então queremos aumen-
mento ou arremesso mais rápido. Contudo, ao lançar um tar sua quantidade de movimento. Nós alcançamos isso
objeto mais leve, técnica (duração da aplicação da força) é exercendo uma força alta contra o objeto pelo maior tem-
mais importante para se obter êxito, enquanto, no caso de po possível (exercendo um grande impulso). Técnicas em
objetos pesados, é a força aplicada. Compare lançamentos atividades esportivas como arremessos ou saltos são lar-
do beisebol e arremessadores de martelo a atletas de lan- gamente baseadas no aumento do tempo de aplicação da
çamento de peso. Estes últimos são maiores e mais fortes. força para obter um alto impulso.
Biomecânica do Esporte e do Exercício 103

As técnicas de atividades esportivas Autoexperimento 3.10


como arremessos ou saltos são
largamente baseadas no aumento do Fique de pé em uma cadeira. Agora, salte da cadeira e caia
tempo de aplicação da força para obter de pé. Como você reduziu a força de impacto? Você fle-
um alto impulso. xionou seus joelhos, tornozelos e quadril. Isso aumentou o
tempo de impacto – o tempo que levou para diminuir sua
velocidade –, o que, por sua vez, aumentou do Δt na equação
Usando impulso para diminuir impulso-quantidade de movimento (equação 3.29), dimi-
quantidade de movimento nuindo, assim, a força média de impacto, , já que a mu-
Em algumas outras atividades, pode ser que um objeto te- dança na quantidade de movimento, m(vf – vi), seria a mesma
nha uma velocidade inicial alta e nós queiramos reduzi-la independentemente de você flexionar ou não suas pernas.
ou zerá-la. Nós queremos diminuir a quantidade de movi-
mento. Você consegue pensar em situações assim? Que tal
O que aconteceria se você aterrissasse com as pernas
a aterrissagem de um salto? Agarrar uma bola? Receber
rígidas? Não tente isso! O tempo de impacto seria muito
um soco? A relação impulso-quantidade de movimento se
menor, e a força média de impacto seria muito maior, uma
aplica à análise dessas situações? Sim. Vamos tentar outra
vez que a mudança na quantidade de movimento ainda se-
atividade. Tente o Autoexperimento 3.9 (é melhor fazer
ria a mesma. Essa força de impacto pode ser alta o bastan-
isso em um dia quente).
te para causar uma lesão.
Vamos examinar a equação de impulso-quantidade de
Autoexperimento 3.9 movimento (equação 3.29) novamente para ver por que
Encha mais balões com água e vá para a rua. Com um isso é assim:
amigo, joguem um para o outro um balão d’água. Veja
quão distantes vocês podem ficar um do outro e ainda
agarrar o balão sem estourá-lo. Se você não conseguir um O lado direito da equação é o mesmo se você saltar da ca-
amigo disposto a participar da brincadeira, tente sozinho. deira e aterrissar com pernas rígidas ou flexioná-las. Sua
Jogue um balão para cima e agarre-o sem que estoure. massa, m, não muda. Sua velocidade final, vf, é a mesma
Tente jogá-los cada vez mais alto. em ambas as condições. Essa é sua velocidade no final
da aterrissagem, que será zero. Sua velocidade inicial, vi,
Como é sua técnica quando você tenta agarrar o ba- também é a mesma nos dois casos e se você saltar da mes-
lão d’água no Autoexperimento 3.9? Para que ele não ma altura. Essa é sua velocidade quando seus pés fazem
estoure, seus braços devem “ceder” com o balão. Você o primeiro contato com o solo. Sua mudança de velocida-
começa com os braços estendidos e depois os move na de, (vf – vi), é a mesma para ambas as condições. Assim
direção do movimento do balão à medida que começa a sua mudança de quantidade de movimento, m(vf – vi), o
agarrá-lo. lado direito da equação 3.29, permanece o mesmo inde-
Essa ação de ceder aumenta o tempo de impacto, Δt, pendentemente de você aterrissar com suas pernas rígidas
na equação impulso-quantidade de movimento, equação ou flexioná-las. Mas como as forças médias de impacto
3.29. Esse aumento no tempo de impacto diminui a força podem mudar entre as condições?
média do impacto, , necessária para parar o balão. Essa A mudança na quantidade de movimento é a mesma
força média de impacto menor diminui as chances de o para as duas técnicas de aterrissagem. Isso significa que
balão estourar. o impulso, Δt, o lado esquerdo da equação 3.29, tam-
Por que fica mais difícil agarrar o balão conforme bém deve ser igual para as duas técnicas. Isso não quer
você e seu amigo se afastam ou conforme você o lança dizer que a força média de impacto, , deve ser a mesma
mais alto? À medida que se afasta ou joga o balão mais para ambas as condições ou que o tempo de impacto, Δt,
alto, o impulso que você exerce sobre ele deve ser maior deve ser igual. Significa apenas que o produto dos dois,
para criar a grande mudança na quantidade de movimen- vezes Δt, deve ser o mesmo para as duas técnicas de
to necessária para pará-lo. Torna-se mais difícil criar um aterrissagem. Se o tempo, Δt, for pequeno, a força mé-
impulso alto o bastante para parar o balão sem permitir dia de impacto, , deve ser grande; se for grande, Δt, a
que a força de impacto exceda o ponto no qual o balão vai força média de impacto, , deve ser pequena. Enquanto
estourar. A técnica usada na aterrissagem de um salto é a mudança na quantidade de movimento, m(vf – vi), for
similar àquela usada para agarrar um balão d’água se você a mesma para ambas as atividades, mudanças no tempo
pensar no atleta como o balão. Tente o Autoexperimento de impacto, Δt, são acompanhadas por mudanças inversa-
3.10 para ver. mente proporcionais na força média de impacto, .
104 Peter M. McGinnis

Em alguns esportes e atividades, atletas ou participan- que atletas de salto com vara caem de uma altura maior
tes podem não ser capazes de aterrissar sobre seus pés e e têm velocidades mais altas no impacto, de modo que o
flexionar as pernas para reduzir a força média de impacto. tempo de impacto deve ser reduzido ainda mais para redu-
Como atletas de salto em altura e salto com vara aterris- zir as forças médias de impacto a níveis seguros.
sam? Eles caem sobre suas costas – não no solo duro, mas Os ginastas não costumam aterrissar sobre suas cos-
em colchões de aterrissagem. Se eles realizassem a queda tas, mas sua aterrissagem na saída dos aparelhos ou nos
sobre as costas no chão duro, o tempo de impacto seria exercícios da rotina do solo recebem mais pontos se eles
pequeno, e as altas forças de impacto definitivamente cau- flexionarem menos seus joelhos, tornozelos e quadril. Se
sariam lesão. Como os colchões de aterrissagem previnem essas aterrissagens ocorressem no solo duro, haveria mui-
que eles se lesionem? Esses colchões são feitos de mate- to mais lesões nesse esporte. Porém, esses atletas não ater-
rial macio que reduz a velocidade do atleta por um tempo rissam no solo duro; as saídas dos aparelhos ocorrem em
longo. Esse tempo de impacto mais longo significa que superfície acolchoada. Da mesma forma, as aterrissagens
as forças médias de impacto são reduzidas proporcional- nas acrobacias do exercício de solo se dão sobre o solo da
mente. Os colchões de aterrissagem do salto com vara são ginástica, com molas, elevado e acolchoado. Esse tempo
mais grossos que aqueles usados no salto em altura por- de impacto aumentado diminui a força média de impacto.

Problema ilustrativo 3.4


Um boxeador está socando um saco pesado. O tempo de impacto da luva é 0,10 s. A massa da luva e de sua mão
é 3 kg. A velocidade da luva logo antes do impacto é 25 m/s. Qual é a força de impacto média exercida pela luva?

Solução:
Passo 1: Liste as grandezas conhecidas.
,

Assuma que a luva fique completamente parada no final do impacto, que o soco ocorre no plano horizontal e que
nenhuma outra força horizontal significativa atue sobre luva ou a mão.

Passo 2: Identifique a variável desconhecida que a questão pede.

Passo 3: Busque por equações que possuam as variáveis conhecidas e desconhecidas (equação 3.29).

Nesse caso, a força resultante média é a força exercida pelo saco na luva.

Passo 4: Substitua as quantidades conhecidas na equação e isole a força desconhecida.

O sinal negativo indica que a força que o saco exerce sobre a luva ocorre na direção oposta à da velocidade
inicial da luva.

Passo 5: Verificação de senso comum.


Não sabemos muito sobre forças de impacto no boxe, mas 750 N parecem razoáveis. É cerca de 75 kg.
Biomecânica do Esporte e do Exercício 105

Deve-se notar que esse aumento no tempo de impacto não Se um objeto exerce uma força sobre
é da mesma magnitude daquele experimentado por atletas outro, este último exerce a mesma força
de salto em altura e salto em distância, ainda que os ginas- sobre o primeiro, mas em sentido oposto.
tas possam saltar – e cair – de alturas similares. Assim, os
praticantes de ginástica têm maior chance de sofrer lesões Autoexperimento 3.11
devido a quedas duras do que atletas de salto em altura.
Agora, pense em outros equipamentos usados para Vá até uma parede e empurre-a com força. O que acontece
amortecer impactos por meio do aumento do tempo de im- quando você faz isso? A parede empurra você de volta. A
pacto. Você pode ter pensado no equipamento de proteção força que ela exerce sobre você é exatamente igual àquela
usado pelos jogadores de futebol americano e hóquei, luvas que você exerceu contra ela, mas no sentido oposto. Pense
de boxe, luvas de beisebol, o material usado entre a sola de no que você sente com suas mãos à medida que a empur-
sapatos de corrida, colchões de luta e assim por diante. ra. Qual o sentido da força que sentiu? A força sentida
A relação impulso-quantidade de movimento ofe- é de fato a da parede empurrando você, não a sua força
rece as bases para técnicas usadas em muitos esportes e empurrando. Quando você empurrar ou puxar algo, o que
habilidades do movimento humano. Em eventos de arre- você sente não é a sua força empurrando ou puxando; é
messo, um atleta aumenta a duração da aplicação da força a força de reação igual, mas em sentido oposto, que está
para aumentar a mudança na quantidade de movimento empurrando ou puxando você.
do objeto sendo arremessado. Isso resulta em uma maior
velocidade do objeto no lançamento. O mesmo princípio Ao empurrar a parede no Autoexperimento 3.11, por
se aplica às atividades de salto, mas, nesse caso, o corpo que você não acelerou como resultado da força exercida
sendo “lançado” é o atleta. Na recepção, na aterrissagem pela parede? Primeiramente, você pode dizer que a força
e em outras situações de impacto, o objetivo pode ser di- que ela exerceu sobre você foi cancelada pela que você
minuir a magnitude da força de impacto. Aumentando a exerceu sobre ela, assim a força resultante foi zero e ne-
duração da aplicação dessa força (aumentando o tempo de nhuma aceleração ocorreu. Essa seria uma explicação cor-
impacto), o tamanho da força média de impacto é reduzi- reta? Não. A força que você exerceu contra a parede não
do. Vejamos a terceira lei do movimento de Newton, que atua sobre você, então não pode cancelar o efeito da força
fornece mais informações sobre o que é uma força. que a parede exerce sobre você. Que outras forças atuam
sobre você quando empurra a parede? A gravidade o puxa
para baixo com uma força igual ao seu peso. O chão em-
Terceira lei do movimento de purra para cima contra a sola dos seus sapatos ou seus
Newton: Lei da ação e reação pés. E uma força de atrito do chão também atua contra
seus pés. Essa força de atrito se opõe à força da parede lhe
Actioni contrariam semper et aequalem esse re- empurrando e evita que você acelere.
actionem: sive corporum duorum actiones in se E as forças que causam aceleração – elas também
mutuo semper esse aequales et in partes contra- vêm em pares? Vamos tentar o Autoexperimento 3.12.
rias dirigi. (Newton, 1686/1934, p. 644)
Essa é a terceira lei do movimento de Newton em la- Autoexperimento 3.12
tim como apresentada no Principia. É comumente referi- Segure uma bola na sua mão. O que acontece quando
da como a lei da ação e reação. Traduzida, essa lei afirma: você a empurra no sentido horizontal (como faz quando
“para cada ação há sempre oposta uma reação igual: ou a vai arremessá-la)? A bola lhe empurra de volta no sentido
ação mútua de dois corpos um contra o outro são sempre oposto com uma força exatamente igual à que você exerce
iguais e no sentido da parte contrária” (Newton, 1986/1934, sobre ela. Nesse caso, porém, a bola acelera como resul-
p. 13). Newton usou as palavras ação e reação para signi- tando da força. Ela ainda exerce força sobre você enquan-
ficar força. O termo força de reação refere-se à força que to acelera. Mais uma vez, pense no que você sente na mão
um objeto exerce sobre outro. Essa lei explica a origem das quando realiza o lançamento. A bola empurra sua mão. Se
forças externas necessárias para alterar o movimento. De você tentar lançá-lo mais forte, sentirá uma força maior
forma mais simples, ela afirma que se um objeto (A) exerce contra sua mão. Em qual direção essa força atua? Ela atua
uma força sobre outro (B), este último (B) exerce a mesma na direção oposta à da aceleração da bola. Ela empurra
força sobre o primeiro (A), mas em sentido oposto. Assim, contra sua mão. A força que sua mão exerce sobre a bola
as forças existem em pares espelhados. Seus efeitos não atua na direção da aceleração dela.
são cancelados um pelo outro porque atuam em objetos di-
ferentes. Outro ponto importante é que as forças são iguais,
mas opostas, e não seus efeitos. Vamos tentar o Autoexpe- Vamos imaginar a seguinte situação. Você está ali-
rimento 3.11 para melhor entender essa lei. nhado de frente para um jogador ofensivo de uma equipe
106 Peter M. McGinnis

da National Football League. Ele pesa o dobro que você. da praga (Fig. 3.8). Ele apresenta essa lei em duas par-
Seu trabalho é empurrá-lo para fora do caminho. Quando tes. Primeiro, afirma que todos os objetos atraem uns aos
você o empurra, ele lhe empurra de volta. Quem empurra outros com uma força gravitacional que é inversamente
mais forte? De acordo com a terceira lei do movimento de proporcional ao quadrado da distância entre eles. Segun-
Newton, a força com que ele empurra você é exatamente do, afirma que essa força da gravidade é proporcional à
igual à que você o empurra. E o efeito dessas forças? A massa de cada um dos dois corpos que se atraem. A lei
segunda lei do movimento de Newton diz que o efeito de universal da gravitação pode ser representada matemati-
uma força sobre um corpo depende da massa desse cor- camente como:
po e das outras forças atuando sobre ele. Quanto maior
a massa, menor o efeito. Quanto menor a massa, maior o (3.30)
efeito. Como a massa dele é bem maior, e a força de atrito
sob seus pés provavelmente é grande também, o efeito da onde F é a força da gravidade, G é a constante universal
sua força ao empurrá-lo será pequeno. Como sua massa é de gravitação, m1 e m2 são as massas dos dois objetos en-
pequena em relação à dele, e o atrito sob seus pés é pro- volvidos e r é a distância entre os centros de massa dos
vavelmente menor que o atrito sob os pés dele, o efeito da dois objetos.
força dele empurrando você vai ser maior. A lei de Newton da gravitação universal foi importan-
A terceira lei do movimento de Newton ajuda a ex- te porque forneceu uma descrição das forças que atuam
plicar como as forças atuam e sobre o que elas atuam. A entre cada um dos objetos no universo. Essa lei, quando
terceira lei nos fornece a base para desenhar diagramas de usada com as leis do movimento, prediz o movimento dos
corpo livre. Porém, ela não explica qual será o efeito de- planetas e estrelas. As forças gravitacionais entre a maior
las. Ela nos diz apenas que as forças vêm em pares, e que parte dos objetos em esportes são muito pequenas – tão
cada força sobre um par atua sobre um objeto separado. pequenas que podemos ignorá-las. Entretanto, existe um
objeto com que devemos nos preocupar no esporte, o qual
Lei de Newton da é grande o suficiente para produzir uma força gravitacio-
nal substancial sobre outros objetos. Esse objeto é a Terra.
gravitação universal A força gravitacional do planeta atuando sobre um corpo
A lei de Newton da gravitação universal nos dá uma me- é o peso dele. Para um objeto próximo da superfície da
lhor explicação do peso. Essa lei foi supostamente inspi- Terra, vários dos termos na equação 3.30 são constantes.
rada pela queda de uma maçã na fazenda da família de Esses termos são G, a constante universal da gravidade;
Newton, em Lincolnshire, quando ele morava lá nos anos m2, a massa da Terra, e r, a distância entre o centro da terra
e sua superfície. Se introduzirmos uma nova constante,

(3.31)

A equação 3.30 se torna:

ou:

onde P é a força da gravidade da Terra atuando sobre o


objeto, ou seu peso; m é a massa do objeto; e g é a acele-
ração do objeto causada pela força de gravidade da Terra.
Essa é a mesma equação para peso que vimos no Capítulo
1. Agora, nós sabemos a base para a equação.

Resumo
As bases da cinética linear, explicando as causas do movi-
mento linear, estão nas leis do movimento de Newton. A
Figura 3.8 A suposta inspiração para a lei de Newton da primeira lei de Newton explica que objetos não se movem
gravitação universal. nem mudam seu movimento a menos que uma força exter-
Biomecânica do Esporte e do Exercício 107

na resultante atue sobre eles. Uma extensão da primeira lei movimento humano. As bases para as técnicas usadas em
é o princípio da conservação do movimento. A segunda lei muitas habilidades esportivas estão nessa relação. Aumen-
do movimento de Newton explica o que acontece se uma tar a duração da aplicação da força aumenta a mudança na
força externa resultante atua sobre um objeto. Ele vai ace- quantidade de movimento. A terceira lei de Newton explica
lerar na direção da força externa resultante, e sua acelera- que as forças atuam em pares. Para cada força atuando so-
ção será inversamente relacionada a sua massa. A relação bre um objeto, há outra, igual, atuando no sentido oposto
impulso-quantidade de movimento apresenta a segunda sobre outro objeto. Finalmente, a lei de Newton da gravi-
lei de Newton em uma forma mais aplicável a esportes e tação universal nos dá as bases para a força da gravidade.
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UNIDADE 3
Fórmula integral de Cauchy
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Definir a integral de Cauchy a partir da fórmula comumente utilizada


no cálculo.
 Resolver integrais envolvendo variáveis complexas a partir da fórmula
de Cauchy.
 Utilizar a fórmula integral de Cauchy em situações aplicadas.

Introdução
Neste capítulo, vamos abordar a fórmula da integral de Cauchy, que
recebe esse nome em homenagem a Augustin Louis Cauchy. A fórmula
de Cauchy é um importante teorema para a análise complexa. A fórmula
nos diz que uma função holomorfa, definida em uma curva simples
fechada C, é completamente determinada pelos seus valores na fronteira
dessa curva. Dessa forma, será possível determinar a integral da curva
desconsiderando a sua singularidade.

Integral de Cauchy
Seja uma função f, analítica em um conjunto aberto , em cada ponto de
G dessa função, existe uma expansão em série de potências.
Da definição de conjunto conexo, temos que um conjunto Ω é conexo se
não pode ser dividido em dois subconjuntos fechados simples em que não haja
pontos em comum entre eles. Ou seja, um espaço é conexo se, para percorrer
os intervalos entre dois pontos quaisquer, não for preciso sair do espaço
delimitado pelo conjunto.
74 Fórmula integral de Cauchy

Teorema de Cauchy
Sejam Ω um conjunto simplesmente conexo, um contorno contido em Ω
orientado no sentido anti-horário. Se f é uma função analítica, então:

para todo contido no interior de .


A integral acima também é comumente representada com o símbolo da
integral de linha , já que a integral é em um percurso circular:

Porém, esse diferencial é apenas estético e gráfico, não prejudicando nosso


desenvolvimento.
Uma generalização para a integral de Cauchy, sendo a função analítica, é:

onde n é a derivada n-ésima no ponto a.


Essa fórmula é denominada integral de Cauchy generalizada, que afirma
que uma função é analítica em um ponto, então as suas derivadas de todas as
ordens existem nesse ponto, além de serem analíticas nesse ponto.
Observe que a integral generalizada para n = 1 nos dá a fórmula da integral
de Cauchy inicial. Decorre o teorema da integral de Cauchy:
Fórmula integral de Cauchy 75

Vamos supor uma função f holomorfa (o mesmo que analítica), dentro de um caminho
regular .

sendo um caminho simples que faz uma volta em torno do ponto a no sentido
anti-horário.
Vamos calcular . Como f(z) está dividido por z − a, temos que a é
uma singularidade de f; nesse caso, existe uma série de potência de a delimitada:

Se percorrido o caminho por e usarmos o conceito de “ponte” para o contorno de


a, teremos que os caminhos e se anulam, já que estão em sentidos contrários.
Na prática, essa “ponte” ocorre no mesmo ponto da curva.

O resultado pode ser mostrado pelo integral de fora, menos o integral de dentro:

quando não houver singularidade na área hachurada, sendo R o raio da circunferência


que circunscreve a.
76 Fórmula integral de Cauchy

Mas, se , então e .
Vamos fazer uma substituição de variável com :

Quando w tende a zero, tende à derivada da função. Mas,


sendo a função holomorfa, conforme mencionado no início da demonstração, o seu
módulo é menor ou igual ao produto do majorante M dividido pelo módulo de 2Π e
pelo comprimento da curva de raio R.

Como R é o raio da circunferência que envolve a singularidade, ela está contida na


função f, então a desigualdade é válida, em especial quando R tende a zero. Nesse caso,
o módulo vai para zero. Sendo o módulo majorado por zero, temos que:

Nos restando apenas:

Faremos , então:

Portanto,
Fórmula integral de Cauchy 77

Existem diversas demonstrações para a integral de Cauchy. Algumas simples, outras


elegantes, e algumas que acabam precisando do uso de várias ferramentas de cálculo.
É bom conhecer alguns destes caminhos.

Demonstração da integral de Cauchy de forma geométrica (IEEEACADEMIC, 2014a):


https://goo.gl/mDZauA

Uma demonstração simples da Fórmula Integral de Cauchy (PAULA, 2014):


https://goo.gl/NTQKXU

Integral de Cauchy e números complexos


Diferentemente de integrais no plano real, em que o comportamento é previsí-
vel, o plano complexo pode apresentar diferentes integrais para determinadas
situações, como, por exemplo, percorrer o caminho entre dois pontos:

Figura 1. Caminho entre dois pontos.

Para forçarmos que o caminho percorrido entre i e 1 seja o caminho em


cinza, faremos , com parte real x = t e parte
imaginária y = 1 − t
78 Fórmula integral de Cauchy

Para a integral do caminho, dZ = dx + idy, então:

Como e , com 0 < t < 1, temos que:

Que tem como primitiva:

que é a integral procurada.


Outra forma de calcular a mesma integral é a seguinte.
Sendo Z = t + i – it, então e dZ = (1 – i) dt.
Portanto,
Fórmula integral de Cauchy 79

Nos importa perceber, do exemplo acima, que, independentemente do


caminho, sendo Z um número complexo,

será dado por , não importando o caminho.

Determinar

para o mesmo segmento de i até 1.


Solução:
Temos, como primitiva:

Agora vejamos um exemplo com duas singularidades.

Determinar

ou seja, uma integral com singularidades em e 3.


80 Fórmula integral de Cauchy

Vamos usar a soma dos integrais de Cauchy para as duas singularidades, de forma que:
Para ½

Por Cauchy, temos:

Para 3:

Por Cauchy, temos:

Como ,

Assim, temos que:


Fórmula integral de Cauchy 81

Integral de Cauchy em situações aplicadas


As integrais de Cauchy têm diversas aplicações práticas. Entretanto, o processo
de integração é passo necessário ao teorema do resíduo. Contudo, somente
com a fórmula integral de Cauchy já é possível deduzir as suas diversas apli-
cações práticas e industriais para determinar, por exemplo, a área de contornos
definidos por funções que contenham uma singularidade interna.
Ao longo deste capítulo, vimos vários exemplos que poderiam ser traduzidos
para esse tipo de situação.

Acesse o link abaixo ou o código ao lado para ver uma


demonstração da fórmula de Cauchy
(IEEEACADEMIC, 2014b):

https://goo.gl/uAJ2Fd

1. Qual é o valor de , 2. Qual é o valor de ,


onde ? onde ?

a) . a) .

b) . b) .

c) 0. c) 0.
d) 2. d) 2.
e) . e) .
82 Fórmula integral de Cauchy

3. Dado um contorno fechado a) .


, qual é o b) .
valor de ? c) .

a) . d) .

b) . e) .
c) . 5. Seja um contorno que envolve
a origem. A integral
d) . tendo e é:
a) 0.
e) . b) 1.
c) 2.
4. Dada um contorno fechado d) .
, qual é o e) .
valor de ?

IEEEACADEMIC PORTUGAL. A fórmula de Cauchy (demonstração). YouTube, 2014b. Dispo-


nível em: <https://www.youtube.com/watch?v=vemIyEyAFYg>. Acesso em: 20 fev. 2018.
IEEEACADEMIC PORTUGAL. O teorema de Cauchy. YouTube, 2014a. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=9pMv4eO9eK0>. Acesso em: 20 fev. 2018.
PAULA, H. L. Uma demonstração simples da Fórmula Integral de Cauchy. 2014. 29 f. Monografia
(Especialização em Matemática) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte,
2014. Disponível em: <http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/han-
dle/1843/EABA-9MFJ8G/monografia_hellen.pdf?sequence=1>. Acesso em: 20 fev. 2018.

Leituras recomendadas
JESUS, D. V. Aplicações do Teorema do Resíduo. 2007. 79 f. Trabalho de Conclusão de Curso
(Licenciatura em Matemática) — Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis,
2007. Disponível em: <https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/96550/
Daynitti.pdf?sequence=1>. Acesso em: 20 fev. 2018.
SASSE, F. D. Fórmula Integral de Cauchy: exemplo. YouTube, 2012. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=AmYVez8r8I4>. Acesso em: 20 fev. 2018.
WEISSTEIN, E. W. Cauchy Integral Formula. Wolfram MathWorld, 2018. Disponível em:
<http://mathworld.wolfram.com/CauchyIntegralFormula.html>. Acesso em: 20 fev. 2018.
ZANI, S. L. Funções de uma variável complexa. São Paulo: USP, 2018. Disponível em:
<http://conteudo.icmc.usp.br/pessoas/szani/complexa.pdf>. Acesso em: 20 fev. 2018.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
Conteúdo:
UNIDADE 4
O teorema dos resíduos
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„ Definir o teorema dos resíduos de Cauchy.


„ Utilizar o teorema dos resíduos de Cauchy para calcular integrais.
„ Verificar a teoria de resíduos na matemática aplicada.

Introdução
O teorema dos resíduos de Cauchy é um método para o cálculo de
integrais em caminhos fechados e simples que facilita e generaliza a
fórmula de Cauchy.
Neste capítulo, analisaremos o teorema dos resíduos de Cauchy.
Veremos, ainda, o uso desse teorema para o cálculo de integrais em
caminhos e as suas aplicações prática. Além disso, vamos abordar a
teoria de resíduos em uma função analítica de variáveis complexas na
disciplina de Cálculo.
Concluiremos este capítulo esperando que você seja capaz de identi-
ficar uma função de variável complexa, de construir toda a conceituação
teórica a respeito dos elementos desse tipo de função e de calcular a
integral no caminho dessa função.

Teorema dos resíduos de Cauchy


7HQGRVHDSURSULDGRGRVFRQFHLWRVQHFHVViULRVSDUDHQFRQWUDUHFODVVL¿FDU
XPDVLQJXODULGDGHGHXPDIXQomRFRPSOH[DEHPFRPRSDUDLGHQWL¿FDUR
seu polo e calcular os seus resíduos, podemos estudar o teorema do resíduo
de Cauchy, que generaliza a fórmula de Cauchy para o cálculo de integrais
ao longo de caminhos fechados simples.
96 O teorema dos resíduos

Teorema
Seja C um caminho fechado tal que uma função f é analítica sobre C e no
LQWHULRUGH&H[FHWRHPXPQ~PHUR¿QLWRGHSRQWRVVLQJXODUHVz0, z1, ..., zn
interiores a C. Então:

onde a integral é calculada no sentido positivo ao longo de C. Ou seja,


esse teorema caracteriza que a integral curvilínea de uma função curva
IHFKDGDGHIRUPDTXHHQYROYDXPQ~PHUR¿QLWRGHSRQWRVVLQJXODUHV
isolados, pode ser obtida pelo produto de 2ȆL pela soma dos resíduos nos
pontos singulares:

Para mostrar o teorema, vamos considerar caminhos fechados orienta-


dos positivamente, no sentido anti-horário. Os caminhos Cj são traçados em torno de
cada um dos pontos singulares Zj, de forma que cada caminho Cj esteja inteiramente
contido em C. Os caminhos Cj, junto com o caminho C, formam a fronteira de uma
região fechada multiplamente conexa em que f é analítica. Veja a figura abaixo.

Para prosseguir na demonstração, precisamos utilizar o teorema de


Cauchy-Goursat.
O teorema dos resíduos 97

Teorema de Cauchy-Goursat
Sejam C um caminho fechado e CjXPQ~PHUR¿QLWR j = 1,2,...,n) de caminhos
fechados contidos no interior de C, tais que os interiores de Cj não tenham
pontos em comum. Seja R a região fechada consistindo de todos os pontos de
C e dos pontos interiores de C, exceto os pontos interiores a cada Cj, e seja B a
fronteira orientada de R, consistindo de C e de todos os Cj, orientados de modo
a deixarem os pontos de R à esquerda de B. Então, se f(z) é analítica em R:

Esse é o teorema de Cauchy-Goursat para uma função analítica com um


número finito de caminhos fechados internos ao caminho da função.
Pelo Teorema acima, temos que:

Como f é analítica no interior e sobre os caminhos Cj, exceto nos próprios


pontos singulares zj, então:

ou, isolando a integral de f:

Concluímos que:
98 O teorema dos resíduos

Cálculo de integrais pelo teorema do resíduo


Do teorema dos resíduos, temos que o cálculo das integrais complexas de
funções analíticas em curvas que contenham singularidades internas torna-se
um processo mais simples, uma vez que conhecemos os resíduos da função.
&RQWXGRHVVDVHUiXPDGDVQRVVDVSULQFLSDLVGL¿FXOGDGHV

Revise o conteúdo de resíduos de uma função complexa e exercite as técnicas para


determinar os resíduos de uma função (CÁLCULO, 2018; SINGULARIDADES, 2018):

https://goo.gl/P7jWXY

https://goo.gl/ZsQyRT

Vejamos alguns exemplos do cálculo de integrais por meio do teorema


dos resíduos:

Calcule o valor da integral , onde C é o círculo , percorrido no


sentido anti-horário.
Solução:
A integral tem um ponto singular em z0 = 1, que está no interior de C.
Como já visto nesse capítulo, temos que:
O teorema dos resíduos 99

Para determinar o resíduo em z0 = 1, podemos escrever:

Dessa forma:

Portanto:

Podemos, ainda, estender os conceitos das integrais complexas e do teorema


dos resíduos para calcular integrais impróprias reais da forma .
Considerando f uma função racional, do tipo , onde p e q são polinômios
com coeficientes reais, devem ser satisfeitas as condições:

„ q (x SDUDWRGRx real;
„ se n é o grau de p e m é o grau de q, então .

Sabemos que as condições acima garantem a existência da integral


imprópria:

Pelo teorema dos resíduos, temos que integrais desse tipo podem ser cal-
culadas por:

soma dos resíduos de nos polos contidos no semiplano positivo.


100 O teorema dos resíduos

Calcule:

Solução:
Vamos tomar p(z) = 1 e q(z) = x4 + 1. As condições para a existência da integral
imprópria estão satisfeitas, então precisamos saber os polos de que estão no 1º e
2º quadrantes.
A equação z4 + 1 = 0, possui quatro raízes, que podem ser escritas na forma expo-
nencial como:

e
ou que podem ser obtidas por meio da lei de Moivre:

Com k variando entre 1 e n – 1. Isso daria as raízes:

e .
Contudo, apenas z e z fazem parte do semiplano positivo.
1 2

Como z4 + 1 possui quatro raízes distintas, a sua fatoração possui quatro fatores de
expoente unitário; logo, z4 + 1 possui polos simples.
Vamos calcular os resíduos de z1 e z2 por meio da fórmula:

Então:

Como equivale a 135º, temos o complexo na forma trigonométrica

Então:
O teorema dos resíduos 101

De forma análoga, encontramos:

E, portanto:

Teoria dos resíduos na matemática aplicada


8PDGDVDSOLFDo}HVGDWHRULDGRVUHVtGXRVpQDGLQkPLFDGHÀXtGRV1HVVD
iUHDRHVWXGRGDVLQWHJUDLVFRPSOH[DVVHUDPL¿FDHWHRUL]DGHXPDIRUPD
JUDQGLRVD2QGHVHSRGHYHUXPPRYLPHQWRGHÀXtGRTXHSRGHVHUGHVGH
simples água até movimentos de ondas de plasma, um especialista enxerga a
GLQkPLFDPDWHPiWLFDGRVÀXtGRV

No link abaixo, você poderá acompanhar uma série de


aulas sobre a dinâmica dos fluídos (ME SALVA, 2014):

https://goo.gl/Rz7ETX

Vamos calcular a integral abaixo, na variável , no intuito de deter-


minar a dinâmica de um fluído que se comporta de acordo com a função
.
102 O teorema dos resíduos

Solução:
Observe que não há singularidades no denominador, que não se anula para qualquer
quer seja o valor de
Vamos aproveitar para deixar registrada uma fórmula para resolução de integrais
indefinidas trigonométricas. O método do resíduo será especialmente útil nesses
casos, quando aplicado na dinâmica de fluídos, nos quais esse tipo de integral surge
com frequência.
Sendo uma integral do tipo:

onde f será o quociente de um polinômio de e . Sendo o argumento


do complexo z no círculo unitário, temos e podemos escrever:

e
Dessa forma:

onde C é um círculo com e as raízes, pontos singulares são


e ; porém, este último não é interno ao círculo . Logo, vamos
considerar apenas .
O cálculo do resíduo nesse ponto é dado por:

E, pelo teorema dos resíduos de Cauchy:

Portanto, o resultado obtido pela integral acima representa o comprimento da onda


no intervalo [0,2π], de acordo com a função dada.
O teorema dos resíduos 103

Existem diversas fórmulas que facilitam sobremaneira o cálculo de integrais indefini-


das. Nos links abaixo, você poderá verificar algumas delas (JESUS, 2007; PIRES, 1998;
WILHELM, 2005):

https://goo.gl/zqDvkq

https://goo.gl/xygzQb

https://goo.gl/sHZoAx

1. Determine a integral dada pela fronteira do semicírculo


, onde é uma ,
curva de equação paramétrica onde R > 3, percorrida
: no sentido positivo.
a) 0
a)
b) 1
b)
c)
c)
d)
d)
e)
e)
2. Determine a integral ,
onde a curva é percorrida no 4. Calcule a integral .
sentido negativo (sentido horário). a)
a) 2 b)
b) 4 c)
c) d)
d) e)
e)
3. Seja a função definida por 5. Determine a integral .
. Determine ,
onde R é uma curva fechada simples a)
104 O teorema dos resíduos

b) d)

c) e)

CÁLCULO de Resíduos. Aracaju: CESADUFS, 2018. Disponível em: <http://www.ce-


sadufs.com.br/ORBI/public/uploadCatalago/19155016022012Vari%C3%A1veis_Com-
plexas_12.pdf>. Acesso em: 27 fev. 2018.
JESUS, D. V. Aplicações do Teorema do Resíduo. 2007. 79 f. Trabalho de Conclusão de Curso
(Licenciatura em Matemática) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis,
2007. Disponível em: <https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/96550/
Daynitti.pdf?sequence=1>. Acesso em: 20 fev. 2018.
ME SALVA. Mecânica dos Fluidos. YouTube, 2014. Disponível em: <https://www.you-
tube.com/watch?v=k_li5lJvXDo&list=PLf1lowbdbFICGuf8AgDT9Dy9ulNwK7tVa>.
Acesso em: 27 fev. 2018.
PIRES, G. E. Notas em Análise Complexa. Lisboa: Instituto Superior Técnico, 1998. Dis-
ponível em: <https://www.math.tecnico.ulisboa.pt/~gpires/Complexa/complexa.
pdf>. Acesso em: 21 fev. 2018.
SINGULARIDADES e Resíduos. Lisboa: Instituto Superior Técnico, 2018. Disponível em:
<https://fenix.tecnico.ulisboa.pt/downloadFile/3779572089125/aced-apontamentos-
sec6.pdf>. Acesso em: 21 fev. 2018.
WILHELM, V. E. Apostila de Cálculo IV. Curitiba: UFPR, 2005. Disponível em: <https://
docs.ufpr.br/~volmir/CM044.pdf>. Acesso em: 27 fev. 2018.

Leituras recomendadas
ÁVILA, G. Variáveis complexas e aplicações. 3. ed. São Paulo: LTC, 2000.
INSTITUTO GOIANO DE MATEMÁTICA. Exercícios resolvidos: teoria dos resíduos. Goiânia,
2011. Disponível em: <http://www.igm.mat.br/aplicativos/index.php?option=com_co
ntent&view=article&id=657%3Aresiduos&catid=38%3Aconteudosfvc&Itemid=43>.
Acesso em: 27 fev. 2018.
OLIVEIRA, G. S.; SANTOS, E. R. Aplicações da teoria dos resíduos no cálculo de integrais reais.
Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, [2015]. Disponível em: <www.seer.ufu.br/
index.php/horizontecientifico/article/download/33478/20431>. Acesso em: 27 fev. 2018.
ZANI, S. L. Funções de uma variável complexa. São Paulo: USP, 2018. Disponível em:
<http://conteudo.icmc.usp.br/pessoas/szani/complexa.pdf>. Acesso em: 20 fev. 2018.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
Conteúdo:
FUNDAMENTOS
DE FÍSICA E
MATEMÁTICA

Cristiane da Silva
Leis de Newton e
suas aplicações
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Definir força e sua relação com o movimento.


 Aplicar as leis de Newton para situações de equilíbrio e não equilíbrio.
 Determinar as leis de Newton para situações retilíneas e circulares.

Introdução
Neste capítulo, você vai estudar a mecânica newtoniana, que descreve a
relação entre forças e acelerações. Você vai conhecer a primeira, a segunda
e a terceira leis de Newton, com exemplos ilustrados e aplicados.

Força e movimento
A mecânica newtoniana descreve a relação entre forças e acelerações. Con-
sidera-se que a velocidade de um objeto pode mudar, ou seja, pode sofrer
aceleração, se o objeto for submetido a uma ou mais forças, como empurrões
ou puxões por parte de outros objetos (HALLIDAY; RESNICK; WALKER,
2018). Que tal conhecer a primeira lei de Newton?
A primeira lei de Newton diz que, se nenhuma força atuar sobre um corpo, a
sua velocidade não mudará, ou seja, o corpo não sofrerá aceleração. Ou ainda:
se o corpo está em repouso, permanece em repouso; se ele está em movimento,
continua com a mesma velocidade (mesmo módulo e mesma orientação). O
módulo da força é definido em termos da aceleração que a força produziria
em um quilograma-padrão. Por definição, uma força que produz uma acele-
2 Leis de Newton e suas aplicações

ração de 1 m/s2 em um quilograma-padrão tem módulo de 1 Newton (1 N)


(HALLIDAY; RESNICK; WALKER, 2018). A Figura 1 ilustra essa ideia.

Figura 1. Uma força aplicada ao quilograma-padrão pro-


voca uma aceleração .
Fonte: Halliday, Resnick e Walker (2018, p. 96).

Agora você vai ver alguns aspectos das forças, como a sua unidade, a sua
natureza vetorial, a combinação de várias forças e as circunstâncias em que
podem ser medidas. Assim, você vai estar pronto para aplicar as leis de Newton.

Você pode aprender mais sobre as leis de Newton e as suas aplicações consultando
o livro Biofísica Essencial (MOURÃO; ABRAMOV, 2017).

Força
O conceito de força é desenvolvido em termos da aceleração que ela produz
quando aplicada a determinado corpo. Pense em um objeto, como um bloco de
cobre, por exemplo. Para aplicar a força no objeto e medir a sua aceleração, é
necessário garantir que o efeito das outras forças causadas pela vizinhança no
movimento do corpo seja desprezível (RESNICK; HALLIDAY; KRANE, 2003).
Leis de Newton e suas aplicações 3

Considere que o agente que fornece a força é uma mola com baixa rigidez. As molas
são construídas com diferentes valores de rigidez, necessitando-se de diferentes
valores de força para distendê-las. Observa-se que o esforço necessário para distender
determinada mola aumenta à medida em que ela é distendida. O corpo padrão é
colocado sobre uma superfície horizontal sem atrito e a mola é acoplada a ele, como
você pode ver na figura (a) a seguir.

Fonte: Adaptada de Resnick, Halliday e Krane (2003, p. 51).

Por tentativa e erro, a mola é distendida até fornecer ao corpo padrão uma aceleração de
exatamente 1 m/s2, como mostra a figura (b) a seguir. A força exercida é definida como uma
unidade de força. Repete-se o experimento, distendendo a mola de um valor maior, até
que o corpo padrão experimenta uma aceleração de 2 m/s2. Agora, encontra-se a distensão
que fornece uma aceleração de 3 m/s2, correspondente a três unidades de força. Assim,
tem-se uma calibração completa da mola, a qual fornece o valor da distensão da mola
necessário para promover determinada aceleração no objeto padrão. Outras molas, com
diferentes valores de rigidez, podem ser calibradas de modo similar, com o mesmo corpo
padrão. Assim, é possível medir forças desconhecidas usando esses dispositivos de medição.

Fonte: Adaptada de Resnick, Halliday e Krane (2003, p. 51).

Dinamômetro
Como você viu, a força é o resultado da interação entre dois ou mais corpos.
Um dispositivo que pode medir a força chama-se dinamômetro. Veja a Figura 2.
4 Leis de Newton e suas aplicações

Figura 2. Dinamômetro.
Fonte: Almeida ([201-?]).

O dinamômetro possui:

 estrutura;
 mola;
 gancho em uma das extremidades da mola;
 graduação na estrutura.

Em uma das extremidades da mola, encontra-se presa a estrutura graduada.


Na outra extremidade, o gancho, que se localiza fora da estrutura, como mostra
a Figura 2. O princípio de funcionamento consiste na deformação que a mola
sofre em razão da ação de uma força que é proporcional à força aplicada. Sua
intensidade é indicada na graduação existente na estrutura. Em algumas feiras,
vendedores de peixes utilizam um dispositivo com essas características com
a finalidade de medir o peso dos peixes vendidos.
Outra maneira de medir força é usar um transdutor de força eletrônico. Esse
equipamento pode ser conectado a um computador para a leitura das forças.
A força aplicada ao transdutor gera uma pequena deflexão em um dispositivo
mecânico ou eletromagnético. Essa deflexão pode ser lida eletronicamente
e calibrada contra uma mola “padrão” (Figura 3) (RESNICK; HALLIDAY;
KRANE, 2003).
Leis de Newton e suas aplicações 5

Figura 3. Uma massa pendurada em uma mola está


acoplada a um transdutor eletrônico para medir forças.
Fonte: Resnick, Halliday, Krane (2003, p. 52).

Unidade de força

Conforme Halliday, Resnick e Walker (2018), é possível medir a unidade de força


em termos da aceleração que uma força imprime sobre o quilograma-padrão, em
que a massa é definida exatamente como 1 kg. Por exemplo, se você colocar o
quilograma-padrão sobre uma mesa horizontal sem atrito e puxar horizontalmente
(Figura 1) até que adquira uma aceleração de 1 m/s2, a força exercida terá um
módulo de 1 Newton (1 N). Cabe destacar que, ao exercer uma força de 2 N sobre
o corpo, a aceleração será de 2 m/s2, ou seja, a aceleração é proporcional à força.

Vetores

A força é uma grandeza vetorial, então ela possui um módulo e uma orientação.
Assim, quando duas ou mais forças atuam sobre um corpo, pode-se calcular a
força total (ou força resultante) por meio da soma vetorial das forças. Uma única
força com o módulo e a orientação da força resultante tem o mesmo efeito sobre
um corpo do que todas as forças agindo simultaneamente. Esse é o chamado prin-
cípio de superposição para forças (HALLIDAY; RESNICK; WALKER, 2018).
6 Leis de Newton e suas aplicações

Como você viu, a primeira lei de Newton afirma que, se nenhuma força resultante
atua sobre um corpo , a velocidade não pode mudar, ou seja, o corpo não
pode sofrer aceleração. Supondo que um corpo esteja submetido a várias forças, se
a resultante das forças for zero, o corpo não sofrerá aceleração.
A primeira lei de Newton não se aplica a todos os referenciais, mas em todas as
situações é possível encontrar referenciais nos quais essa lei é verdadeira. Esses re-
ferenciais são chamados de referenciais inerciais. Veja um exemplo: suponha que
o solo é um referencial inercial (desprezando os movimentos astronômicos da Terra,
como rotação e translação).
A figura (a) mostra a trajetória de um disco que escorrega a partir do polo norte,
do ponto de vista de um observador estacionário no espaço. A figura (b) mostra a
trajetória do disco do ponto de vista de um observador no solo.

Fonte: Adaptada de Halliday, Resnick e Walker (2018, p. 98).

Essa hipótese é válida se um disco metálico desliza em uma pista curta de gelo, de
atrito desprezível; assim, o movimento do disco obedece às leis de Newton. Suponha,
porém, que o disco deslize em uma longa pista de gelo a partir do polo norte. Se você
observar o disco a partir de um referencial estacionário no espaço, constatará que ele se
move para o sul ao longo de uma trajetória retilínea, já que a rotação da Terra em torno do
polo norte apenas faz o gelo escorregar por baixo do disco. Entretanto, se você observar
o disco a partir de um ponto do solo que acompanha a rotação da Terra, a trajetória
do disco não será uma reta. Como a velocidade do solo sob o disco, dirigida para leste,
aumenta com a distância entre o disco e o polo, do seu ponto de observação fixo no
solo o disco parecerá sofrer um desvio para oeste. Essa deflexão aparente não é causada
por uma força, como exigem as leis de Newton, mas pelo fato de que você observa o
disco a partir de um referencial em rotação. Nessa situação, o solo é um referencial não
inercial, e a tentativa de explicar o desvio como se fosse causado por uma força leva a
uma força fictícia. Um exemplo mais comum de força fictícia é o que acontece com os
passageiros de um carro que acelera bruscamente; eles têm a impressão de que uma
força os empurra para trás (HALLIDAY; RESNICK; WALKER, 2018).
Leis de Newton e suas aplicações 7

Massa
Halliday, Resnick e Walker (2018) destacam que a mesma força produz acele-
rações de módulos diferentes em corpos diferentes. Os autores tomam como
exemplo uma bola de futebol e uma bola de boliche. O objeto de menor massa
é mais acelerado; mais precisamente, a aceleração é inversamente proporcional
à massa. Assim, a massa de um corpo é a propriedade que relaciona uma força
que age sobre o corpo com a aceleração resultante.

Para compreender melhor o conceito de massa, veja este exemplo. A massa fornece a
proporcionalidade entre força e aceleração. A figura deste exemplo ilustra experimentos
que mostram a relação entre força (dada em unidades arbitrárias), massa e aceleração. Os
vetores de aceleração estão desenhados em escala, acima dos blocos. Ao longo de cada
linha, você pode ver que a aceleração é sempre proporcional à força, mas a proporciona-
lidade é diferente para massas diferentes. Ao longo de cada coluna, você pode notar que,
quando a mesma força está atuando, a aceleração é inversamente proporcional à massa.

Fonte: Halliday, Resnick e Krane (2003, p. 53).

Para entender como medir a massa, imagine uma série de experimentos em um


referencial inercial. No primeiro experimento, é exercida uma força sobre um corpo
padrão cuja massa m0 é definida como 1,0 kg. Suponha, então, que o corpo padrão
sofra uma aceleração de 1,0 m/s2. Portanto, a força que atua sobre esse corpo é 1,0 N.
Em seguida, considere que a mesma força (seria preciso garantir, de alguma forma,
que a força é a mesma) é aplicada a um segundo corpo, o corpo X, cuja massa não é
conhecida. Suponha que esse corpo sofre uma aceleração de 0,25 m/s2.
8 Leis de Newton e suas aplicações

Uma bola de futebol, que possui massa menor, adquire uma aceleração maior que
uma bola de boliche quando a mesma força (chute) é aplicada a ambas. Considere
a seguinte conjectura: a razão entre as massas de dois corpos é igual ao inverso da
razão entre as acelerações que adquirem quando são submetidos à mesma força. Para
o corpo e o corpo padrão, isso significa que:

Explicitando mX, você obtém:

Essa conjectura será útil, evidentemente, apenas se continuar a ser válida quando
a força aplicada assumir outros valores. Por exemplo: quando uma força de 8,0 N é
aplicada a um corpo padrão, se obtém uma aceleração de 8,0 m/s2. Quando a força
de 8,0 N é aplicada ao corpo , é obtida uma aceleração de 2,0 m/s2. A conjectura,
portanto, está correta.
Muitos experimentos que fornecem resultados semelhantes indicam que essa
conjectura é uma forma confiável de atribuir massa a dado corpo. Os experimentos
realizados aqui indicam que massa é uma propriedade intrínseca de um corpo, ou
seja, uma característica que resulta automaticamente da existência do corpo. Indicam
também que a massa é uma grandeza escalar (HALLIDAY; RESNICK; WALKER, 2018).

Segunda lei de Newton


A segunda lei de Newton diz que a força resultante que age sobre um corpo
é igual ao produto da massa do corpo pela aceleração. Matematicamente
falando, você tem:

A seguir, você vai estudar alguns pontos importantes dessa lei: a escolha do
corpo, a independência das componentes, as forças em equilíbrio, os diagramas
e as forças externas e internas (HALLIDAY; RESNICK; WALKER, 2018).

Escolha do corpo
Você deve escolher o corpo ao qual vai aplicar a equação. deve ser uma
soma vetorial de todas as forças que atuam sobre o corpo. É importante você
Leis de Newton e suas aplicações 9

notar que apenas as forças que atuam sobre esse corpo é que devem ser in-
cluídas na soma vetorial. As forças que agem sobre outros corpos envolvidos
na mesma situação não podem ser incluídas.

Independência das componentes


Como outras equações vetoriais, a equação é equivalente a três
equações para as componentes, uma para cada eixo de um sistema de coor-
denadas xyz:

Um cuidado especial: cada uma dessas componentes das equações relaciona


a componente da força resultante em relação a um eixo, com a aceleração ao
longo do mesmo eixo. Por exemplo, a primeira equação diz que a soma de
todas as componentes das forças em relação ao eixo x produz a componente
ax da aceleração do corpo, mas não produz uma aceleração nas direções y e
z. Então, a componente ax da aceleração é causada apenas pelas componentes
das forças em relação ao eixo x.

Forças em equilíbrio
A equação diz que, se a força resultante que age sobre um corpo é
nula, a aceleração do corpo é . Se o corpo está em repouso, permanece
em repouso; se está em movimento, continua a se mover com velocidade
constante. Nesses casos, as forças que agem sobre o corpo se compensam.
Assim, se diz que o corpo está em equilíbrio.

Diagramas
É comum, na resolução de problemas que envolvem a segunda lei de Newton,
desenhar o diagrama de corpo livre. Nesse diagrama, o corpo mostrado é
unicamente aquele para o qual somam-se as forças. As forças que agem sobre o
corpo podem ser representadas por setas com a origem no ponto. Normalmente
inclui-se um sistema de coordenadas. Além disso, a aceleração do corpo em
geral é mostrada por meio de outra seta que acompanha um símbolo, para
indicar que se trata de uma aceleração. Esses diagramas têm como objetivo
concentrar a atenção no corpo de interesse.
10 Leis de Newton e suas aplicações

Suponha um caixote cuja massa é . Ele está sobre a carroceria de um veículo que se
move com uma velocidade . Imagine que o motorista freia e o veículo reduz a sua
velocidade. Essa situação pode ser representada por um diagrama de corpo livre,
como mostra a figura a seguir.

Fonte: Adaptada de Resnick, Halliday, Krane (2003, p. 56).

Forças externas e forças internas


Um sistema é formado por um ou mais corpos. Qualquer força exercida sobre
os corpos do sistema por corpos que não pertencem a ele é chamada de força
externa. As forças internas são as forças entre dois corpos pertencentes ao
sistema. Considere este exemplo: uma locomotiva e um vagão formam um
sistema; se um reboque for utilizado para puxar a locomotiva, a força exercida
pelo reboque agirá sobre o sistema locomotiva-vagão.

Terceira lei de Newton


A terceira lei de Newton afirma que, quando dois corpos interagem, as forças que
os corpos exercem um sobre o outro são iguais em módulo e têm sentidos opostos.
Leis de Newton e suas aplicações 11

Suponha que você apoiou um livro L em uma caixa C. Nesse caso, o livro e a caixa
interagem: a caixa exerce uma força horizontal sobre o livro, e o livro exerce uma
força horizontal sobre a caixa. Observe a figura a seguir.

Fonte: Halliday, Resnick e Walker (2018).

(a) O livro L está apoiado na caixa C e (b) as forças e têm o mesmo módulo
e sentidos opostos.
No caso do livro e da caixa, é possível escrever a lei como uma relação escalar:

(módulos iguais)

Ou ainda como uma relação vetorial:

=– (módulos iguais e sentidos opostos)

O sinal negativo significa que as duas forças têm sentidos opostos. O livro e a caixa
estão em repouso, mas a terceira lei seria válida mesmo que eles estivessem em
movimento uniforme ou acelerado (HALLIDAY; RESNICK; WALKER, 2018).
12 Leis de Newton e suas aplicações

Agora você vai examinar os pares de forças da terceira lei que existem na figura (a),
que mostra uma laranja, uma mesa e a Terra. A laranja interage com a mesa, e a mesa
interage com a Terra, ou seja, há três corpos interagindo.
Observe a força que age sobre a laranja, na figura (b). A força é a força normal
que a mesa exerce sobre a laranja, e a força é a força gravitacional que a Terra
exerce sobre a laranja. e formam um par de forças da terceira lei? Não, pois
são forças que atuam sobre um mesmo corpo, a laranja, e não sobre dois corpos
que interagem.
Para encontrar um par da terceira lei, você precisa se concentrar não na laranja, mas
na interação entre a laranja e outro corpo: na interação laranja-Terra, como mostra a
figura (c). A Terra atrai a laranja com uma força gravitacional , e a laranja atrai a Terra
com uma força gravitacional . Essas forças formam um par de forças da terceira
lei? Sim, porque atuam sobre dois corpos que interagem, e a força a que um está
submetido é causada pelo outro. Observe as figuras a seguir.

Fonte: Halliday, Resnick e Walker (2018).

=– (interação laranja — mesa)

Na interação laranja-mesa, a força da mesa sobre a laranja é , e a força da laranja


sobre a mesa é . Essas forças também formam um par de forças da terceira lei.
Portanto:
=– (interação laranja — mesa)
Fonte: Halliday, Resnick e Walker (2018).
Leis de Newton e suas aplicações 13

ALMEIDA, F. B. O Dinamômetro. Brasil Escola. [201-?]. Disponível em: <https://brasilescola.


uol.com.br/fisica/o-dinamometro.htm>. Acesso em: 30 set. 2018.
HALLIDAY, D.; RESNICK, R.; WALKER, J. Fundamentos de física. 10. ed. Rio de Janeiro:
LTC, 2018.
RESNICK, R.; HALLIDAY, D.; KRANE, K. Física 1. Rio de Janeiro: LTC, 2003.

Leitura recomendada
MOURÃO JÚNIOR, C. A.; ABRAMOV, D. M. Biofísica essencial. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2017.
Conteúdo:
CINEMÁTICA E
DINÂMICA DA
PARTÍCULA

Mariana Sacrini Ayres Ferraz


Leis de Newton
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Relacionar os conceitos envolvidos na dinâmica do movimento: força


resultante, inércia e aceleração.
„„ Conceituar as três leis de Newton.
„„ Aplicar as leis de Newton a situações básicas do cotidiano.

Introdução
O estudo da dinâmica teve grandes avanços com as leis de Newton, que
formularam a conexão entre a movimentação observada de um corpo
e as forças que atuam nele. Com essas leis, é possível explicar, modelar e
prever a movimentação dos objetos que pertencem ao nosso cotidiano,
a partir das forças atuantes neles — por exemplo, a aceleração de um livro
ao ser empurrado ou a aceleração de um trenó puxado por cachorros.
Podemos também inferir a força resultante atuante em um objeto, a
partir da sua aceleração.
Neste capítulo, você vai estudar as relações entre força e movimento,
compreendendo conceitos como força e inércia, essenciais para os es-
tudos de dinâmica. Você também vai aprender sobre as leis de Newton
e vai verificar alguns casos aplicados.

1 Conceitos importantes da dinâmica


Quando observamos um objeto, este pode estar parado ou se movimentando;
podemos observar também mudanças em sua aceleração. Quando observamos
tais mudanças de aceleração, podemos também observar alterações em suas
proximidades — isso porque a aceleração de um objeto está relacionada com a
interação entre ele e a sua vizinhança (HALLIDAY; RESNICK; WALKER, 1996).
Isaac Newton (1642-1727) propôs as conhecidas leis do movimento e solucionou a
questão de como a interação com a vizinhança gera a movimentação observada.
2 Leis de Newton

Para entendermos as leis propostas por Newton, precisamos entender


alguns conceitos físicos, como força e massa. A Figura 1 ilustra a relação
entre as grandezas que constituem a mecânica. As leis de força nos auxiliam
a encontrar as forças atuantes em um corpo, e as leis do movimento nos dizem
qual será a aceleração de um objeto, dadas as forças atuantes nele.

As leis de força

Vizinhança Força Corpo (massa) Aceleração

As leis do movimento

Figura 1. Relações entre as grandezas referentes ao estudo da mecânica.


Fonte: Adaptada de Halliday, Resnick e Walker (1996).

Existem casos em que a mecânica newtoniana não se aplica corretamente. Quando


a velocidade do objeto em questão for da ordem da velocidade da luz, devemos
usar a teoria da relatividade especial de Einstein. E, para questões em escala atômica,
devemos usar a mecânica quântica.

Vamos, a seguir, estudar o conceito de força.

Força
Podemos listar algumas características associadas às forças, com base em
Knight (2009):

„„ uma força pode ser vista como um “empurrão” ou um “puxão”;


„„ uma força representa uma ação sobre um objeto;
„„ uma força necessita de um agente;
„„ uma força é um vetor, pois precisa de módulo, direção e sentido;
„„ uma força pode ser de contato ou agir a distância.
Leis de Newton 3

A Figura 2 mostra três exemplos de forças e suas representações vetoriais.


Podemos observar uma pessoa puxando um caixote com uma corda, uma
mola empurrando um caixote e um caixote caindo sob a ação da gravidade.
Em todos os casos, temos agentes de força.

Figura 2. Exemplos de força e suas representações vetoriais.


Fonte: Knight (2009, p. 128).

Note que podem existir várias forças atuando em um mesmo objeto. Dessa
maneira, podemos encontrar uma força resultante. Para tal, usamos a super-
posição de forças, que nada mais é do que a soma vetorial de todas as forças
atuantes. Assim, supondo n forças agindo em um objeto, a força resultante
F⃗R será dada por:

A seguir, vamos verificar alguns tipos específicos de força.


4 Leis de Newton

Tipos de forças

Existem alguns tipos específicos de força que são muitos usados e estudados
em mecânica (KNIGHT, 2009; BAUER; WESTFALL; DIAS, 2012). Alguns
exemplos são mostrados na Figura 3.

Figura 3. Exemplos dos diferentes tipos de força.


Fonte: Adaptada de Knight (2009).

Gravidade

A força gravitacional é uma força que age a distância. Ela existe entre todos
os corpos e é responsável por manter pessoas, animais e objetos na superfície
do planeta e por fazer um objeto cair em direção ao chão. Ela sempre aponta
em direção ao chão e é indicada por . O seu módulo é a quantidade que
chamamos de peso.

Força elástica de uma mola

A mola pode empurrar um objeto, quando comprimida, ou puxar, quando


estendida. Geralmente, a força elástica é indicada por F⃗elast.
Leis de Newton 5

Força de tensão

A força de tensão ocorre quando uma corda, ou algo do tipo, puxa algum
objeto. Ela é geralmente identificada como T⃗. A orientação dessa força é a
mesma que a da corda.

Força normal

Para entendermos a força normal, podemos fazer uma associação com a força
elástica. Da mesma maneira que a mola empurra um objeto posto acima dela,
os átomos de uma estrutura se comportam como molas atômicas e empurram o
objeto colocado acima dessa estrutura. Assim, a força normal é aquela exercida
por uma superfície contra um objeto que a esteja pressionando. Essa força é
geralmente indicada por n⃗ ou N⃗, e sua direção é perpendicular à superfície.

Força de atrito

A força de atrito é uma força de contato que ocorre entre um objeto e uma
superfície, no sentido oposto ao do movimento, ou seja, tangente à superfí-
cie. É geralmente indicada por f⃗. É essa força que dificulta a movimentação
sobre superfícies, já que ela se opõe ao movimento. Quanto mais rugosa uma
superfície, maior o atrito entre o objeto e a superfície. Podemos dividir essa
força em dois tipos: a força de atrito cinética ( f⃗c) e a força de atrito estática
( f⃗e). A força de atrito cinética aparece quando o objeto está deslizando sobre
alguma superfície. Já a força de atrito estática aparece quando o objeto está
parado, com o atrito o impedindo de se movimentar.

Força de arraste

A força de arraste também é uma força de resistência ao movimento, mas


ocorre quando algum objeto se move em algum fluido, gás ou líquido. Essa
força é indicada por D⃗ e tem direção e sentido opostos ao movimento.
Mostramos aqui apenas alguns tipos principais de forças. Existem outras,
como força de empuxo e força magnética. Outro conceito importante para
o estudo da dinâmica e das leis de Newton é a massa, apresentado a seguir.
6 Leis de Newton

Massa
Podemos dizer, coloquialmente, que a massa de um objeto é a quantidade
de matéria existente nele. Porém, você já deve ter notado que, aplicando
uma mesma força em objetos com massas diferentes, estes se moverão com
acelerações diferentes. Assim, quanto maior a quantidade de matéria que um
objeto possui, mais ele resistirá a acelerar frente uma força aplicada. Essa
tendência que um objeto tem de apresentar variações na velocidade é conhe-
cida como inércia (HALLIDAY; RESNICK; WALKER, 1996; MARQUES,
2007). Dessa forma, podemos dizer que objetos com maiores quantidades
de matéria têm mais inércia do que os que possuem menos matéria. A partir
desse entendimento, podemos definir a massa inercial como uma propriedade
de todos os corpos que determina como um corpo acelera, dada uma força.

2 As leis de Newton
A partir do entendimento dos conceitos básicos da mecânica, podemos estu-
dar as três leis de Newton. As leis de Newton são a base da mecânica e são
amplamente usadas nos estudos do movimento. São elas que fazem a conexão
entre movimentação e forças existentes, explicando a maioria dos fenômenos
da mecânica que observamos em nosso cotidiano.

1ª lei de Newton
A 1ª lei de Newton diz respeito à inércia. Seu enunciado é o seguinte (HALLI-
DAY; RESNICK; WALKER, 1996; KNIGHT, 2009; HEWITT, 2015; MAR-
QUES, 2007): um corpo que se encontra em repouso permanecerá em repouso,
e um corpo em movimento seguirá se movendo com velocidade constante, se,
e somente se, a força resultante sobre ele for nula. Essa lei também é conhecida
como lei da inércia. Podemos dizer que, se não existe uma força resultante,
o objeto possui uma velocidade constante.
Então, quando a força resultante em um objeto for zero, ou seja, F⃗res = 0⃗,
dizemos que ele está em equilíbrio mecânico. De acordo com a 1ª lei de
Newton, podem existir dois tipos de equilíbrio mecânico: o equilíbrio estático,
quando o objeto estiver parado, e o equilíbrio dinâmico, que ocorre quando
o objeto possui velocidade constante em uma linha reta. Veja um exemplo de
cada caso na Figura 4.
Leis de Newton 7

Figura 4. Exemplos de equilíbrio mecânico.


Fonte: Knight (2009, p. 140).

2ª lei de Newton
O que acontece com um objeto cuja força resultante não é nula? Esse caso é
retratado pela 2ª lei de Newton. Um objeto pode receber influência de várias
forças, e a sua aceleração será determinada pela força resultante. Newton
foi o primeiro a conectar força e movimento, o que resultou na seguinte lei
(KNIGHT, 2009; HEWITT, 2015): um corpo de massa m, sujeito às forças
F⃗1, F⃗2, F⃗3, …, sofrerá uma aceleração a⃗ dada por:

onde F⃗res = F⃗1 + F⃗2 + F⃗3 + ⋯ é a soma vetorial de todas as forças exercidas
sobre o corpo.
8 Leis de Newton

Note que o vetor de aceleração possui a mesma orientação que o vetor de


força resultante. Alternativamente, podemos escrever a 2ª lei de Newton como
(HALLIDAY; RESNICK; WALKER, 1996):

E, como a equação é vetorial, podemos escrever que:

∑Fx = max,  ∑Fy = may,   ∑Fz = maz

A unidade da força em SI é dada em Newton (N), que é:

1 N = (1 kg)(1 m/s2) = 1 kg m/s2

Exemplo

Suponha que três pessoas estejam brincando de cabo de guerra. Estas seguram
um pneu, como mostrado no esquema da Figura 5.

Alex
Charles

137°
Betty

Figura 5. Três pessoas brincam de cabo de


guerra com um pneu.
Fonte: Adaptada de Halliday, Resnick e Walker (1996).
Leis de Newton 9

O pneu se mantém em repouso. Qual seria a força aplicada por Bete, FB?
Considere que FA = 200 N e FC = 140 N. Para resolver essa questão, primei-
ramente construímos um diagrama de forças, como mostrado na Figura 6.

FA
FC

47.0° Ø
x
Pneu

FB

Figura 6. Diagrama de forças da brinca-


deira do exemplo.
Fonte: Adaptada de Halliday, Resnick e Walker
(1996).

Como o pneu está em repouso, a somatória das forças deve ser igual a
zero. Assim,

Podemos escrever duas equações, uma para a componente x e outra para


a componente y. Assim, temos que:
10 Leis de Newton

De onde podemos encontrar o ângulo Φ. Ou seja,

Agora, a equação para a componente y é:

A partir dessa equação, podemos encontrar FB. Assim, temos que:

FB = FCsen(Φ) + FAsen(47,0°)

= (140 N)sen(13,0°) + (200 N)sen(47,0°)

= 177,8 N

Portanto, para o pneu se manter parado, FB tem que ser igual a 177,8 N.

3ª lei de Newton
A 3ª lei de Newton trata da interação entre corpos. Se, por exemplo, um martelo
exerce uma força sobre um prego, o prego também exerce uma força sobre o
martelo, igual e de sentido oposto (HALLIDAY; RESNICK; WALKER, 1996).
Observe a Figura 7. Nela temos dois corpos de massas mA e mB. Se o corpo A
exerce uma força em B, F⃗AB, o corpo B também exerce uma força em A, F⃗BA,
de mesmo módulo, mas sentido oposto. Assim, a 3ª lei de Newton também
é chamada de lei da ação e reação, que pode ser reduzida como: dados dois
corpos A e B, se A exerce uma força sobre B, F⃗AB, então B exerce uma força
sobre A, F⃗BA, de igual módulo e sentido oposto. Ou seja,

F⃗AB = – F⃗BA
Leis de Newton 11

mA FAB FBA mB
A B
FAB = –FBA

Figura 7. Corpos sob a ação de forças de ação e reação.


Fonte: Adaptada de Halliday, Resnick e Walker (1996).

A partir da 3ª lei de Newton, podemos concluir que, sempre que houver


uma ação, haverá uma força de reação. Por exemplo, vamos analisar o caso
de um melão em repouso em cima de uma mesa (Figura 8a). A Terra exerce
uma força sobre o melão para baixo, F⃗MT, que é o peso do melão. O melão
está em repouso, ou seja, ele não é acelerado, pois existe uma força oposta de
igual módulo e sentido oposto, que é a normal F⃗Mm exercida pela mesa sobre
o melão (Figura 8b). Porém, note que as forças F⃗MT e F⃗Mm não são um par de
ação e reação, visto que elas atuam no mesmo corpo. A força reação para
F⃗MT é a força F⃗TM, que é a força gravitacional pela qual o melão atrai a Terra
(Figura 8c). E a força reação para F⃗Mm é a força F⃗mM, que é a força do melão
sobre a mesa (Figura 8d).

Melão Melão

FMT
Mesa
FMm (normal da mesa) FMm
FTM
Terra FMT (peso do melão) FmmM
Terra

(a) (b) (c) (d)

Figura 8. Exemplo de pares de forças envolvidas no sistema com um melão em repouso


sobre uma mesa na superfície da Terra.
Fonte: Halliday, Resnick e Walker (1996, p. 91).
12 Leis de Newton

3 Aplicações das leis de Newton


Nesta seção, vamos ver alguns casos de aplicação das leis de Newton,
na forma de exemplos envolvendo situações do cotidiano.

Problema 1
A Figura 9 mostra um esquema de um bloco preso por cordas que se encontra
em repouso. A massa do bloco é de m = 10,0 kg. Determine as tensões nas
cordas. Considere g = 9,8 m/s2, α = 30° e β = 40°.

α β
A B

C

m
Figura 9. Massa presa por cordas.

Para resolvermos esse problema, primeiramente precisamos esboçar os


diagramas de forças (Figura 10). No bloco, temos a força peso para baixo e
a força de tração da corda para cima. Já no ponto de encontro das cordas,
que é o nó, temos a ação das forças de tração dos três segmentos de cordas.
Leis de Newton 13

TB
TC TA

α β
Bloco
Nó x
mg
TC

Figura 10. Diagramas de forças no bloco e no nó.

Como o sistema está em repouso, temos o que chamamos de equilíbrio


estático, e podemos usar a 2ª lei de Newton. Assim, para o bloco, as compo-
nentes y das forças resultam em:

De onde podemos encontrar TC. Então,

TC = mg = (10,0 kg)(9,8 m/s2) = 98,0 N

Agora, podemos usar as forças atuantes no nó e a 2ª lei de Newton para


determinarmos as outras forças de tração. Como o nó está também em repouso,
temos que:

Assim, podemos escrever essa equação em termos de suas componentes


x e y. Dessa maneira, temos que:
14 Leis de Newton

e:

Da equação da componente x, vamos isolar TB. Assim, ficamos com:

Substituindo os valores, encontramos que:

Agora, podemos substituir a relação encontrada na equação da componente


y. Dessa maneira, ficamos com:

Substituindo os valores, ficamos com:


Leis de Newton 15

Agora, podemos encontrar TB. Assim,

Portanto, usando a 2ª lei de Newton, fomos capazes de determinar todas


as forças de tração do sistema dado.

Problema 2
Neste problema, vamos resolver um caso de bloco deslizante. Suponha o
sistema mostrado na Figura 11. Nele, é mostrado um bloco de massa M em
uma superfície sem atrito sendo puxado por uma corda, que passa por uma
roldana, também sem atrito, que se encontra presa a um bloco suspenso de
massa m. Nesse sistema, o bloco suspenso puxa o outro bloco e o faz acelerar.
Qual é a aceleração dos blocos e a força de tração na corda? Considere que
g = 9,8 m/s2, m = 2,0 kg e M = 3,5 kg.

Figura 11. Esquema de bloco desli-


zante puxado pelo bloco suspenso.
16 Leis de Newton

Para resolvermos essa questão, vamos desenhar o diagrama de forças dos


dois blocos (Figura 12). No bloco de massa M, temos a ação da força peso, da
força normal e da tração da corda, que puxa o bloco no sentido positivo de x.
Já no bloco de massa m, temos a ação da força peso e da tração da corda; esse
bloco puxa o outro bloco, com aceleração na direção negativa de y.

y a y a

N T
m
M T
x x
m
M g
g

Figura 12. Diagrama de forças para os blocos de massa


M e de massa m.

Podemos, então, usar a 2ª lei de Newton. Para o bloco de massa M, temos


a componente x da força resultante igual à força de tração; assim:

Ou seja,

T = Ma

Agora, para o bloco de massa m, temos forças ao longo da direção de y.


Assim, usando a 2ª lei de Newton, encontramos que:

Ou seja,

mg – T = ma
Leis de Newton 17

Substituindo o valor da tração encontrado anteriormente, ficamos com:

Substituindo os valores dados no problema, temos que:

A força de tração será:

T = Ma = (3,5 kg)(3,56 m/s2) = 12,5 N

Portanto, com o uso da 2ª lei de Newton, novamente conseguimos deter-


minar as incógnitas do problema, no caso, a aceleração e a força de tração.

BAUER, W.; WESTFALL G. D.; DIAS, H. Física para universitários: mecânica. Porto Alegre:
AMGH, 2012.
HALLIDAY, D.; RESNICK, R.; WALKER, J. Fundamentos de física: mecânica. 4. ed. Rio de
Janeiro: LTC, 1996. v. 1.
HEWITT, P. G. Física conceitual. 12. ed. Porto Alegre: Bookman, 2015.
KNIGHT, R. D. Física: uma abordagem estratégica. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2009. v. 1.
MARQUES, G. da C. Mecânica (Universitário). [S. l.], 2007. Disponível em: http://efisica.
if.usp.br/mecanica/universitario/. Acesso em: 11 jun. 2020.
18 Leis de Newton

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cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a
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CINEMÁTICA E
DINÂMICA DA
PARTÍCULA

Luciana Maria Margoti


Aplicações das leis
de Newton
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Identificar a aplicação das leis de Newton.


„„ Aplicar as três leis de Newton para a solução de problemas que en-
volvam força, massa e aceleração.
„„ Construir desenhos e croquis que possibilitem a análise, o cálculo e a
resolução de situações que envolvam as três leis de Newton.

Introdução
Neste capítulo, você vai aprender sobre as leis de Newton e a sua aplicação
na compreensão de eventos do cotidiano. As três leis de Newton estão in-
seridas na área da física denominada mecânica, ou mecânica newtoniana.
Elas compreendem o estudo das forças existentes nos movimentos dos
corpos. A relação entre todas as forças envolvidas em um determinado
corpo determina seu estado de repouso ou movimento. Com o estudo
e a compreensão das leis de Newton, torna-se possível compreender
mais a fundo os eventos relacionados a movimento do nosso dia a dia.

1 Conceito
Para iniciar o estudo das leis de Newton, deve-se partir do entendimento da
grandeza força. O esforço que fazemos para puxar ou empurrar algum objeto
é a força. É aquela grandeza capaz de causar uma aceleração no corpo que a
recebe. A força é uma grandeza vetorial, pois tem módulo e orientação. Sendo,
então, uma grandeza vetorial, sempre será necessário indicar seu módulo,
sua direção e seu sentido, para que haja a correta interpretação da ação dela
sobre o corpo.
2 Aplicações das leis de Newton

A força é medida em quilograma-força [kgf], convencionalmente. Porém, no


Sistema Internacional de Unidades (SI), a unidade de força é o newton [N]. A rela-
ção que descreve a unidade quilograma-força com a unidade newton é a seguinte:

1 kgf = 9,8 N

Ou seja, 1 N equivale a, aproximadamente, 0,10 kgf.


Uma ou mais forças podem atuar sobre corpos em repouso ou em movi-
mento. Dessa forma, quando mais de uma força atua sobre o mesmo corpo,
é necessário determinar a força resultante, ou força total, que incide sobre ele.
Essa força total será a soma vetorial de todas as forças que atuam no corpo.
Esse é o princípio da superposição para forças.
No estudo do movimento, outro aspecto a ser entendido é a inércia, presente
em todos os corpos, em repouso ou em movimento. Para que haja mudança na
aceleração de um corpo, a força aplicada sobre ele precisa vencer sua inércia.
Trata-se da primeira lei de Newton. Sem a atuação de uma força sobre um
corpo em movimento, por exemplo, sua inércia faz com que ele continue
se movimentando em linha reta. Caso outra força seja capaz de sobrepor a
inércia do corpo, ela pode acelerá-lo, aumentando sua velocidade, pará-lo ou,
até mesmo, mudar sua direção. Na Figura 1, a força exercida pelo martelo
sobre o prego precisa ser maior do que a inércia do prego, para que este seja
introduzido na madeira (desprezando-se o atrito envolvido inicialmente).

Figura 1. O martelo exerce força sobre o prego,


para vencer a inércia do prego e fixá-lo na madeira.
Fonte: Adaptada de Fouad A. Saad/Shutterstock.com.
Aplicações das leis de Newton 3

Quando pensamos em corpos em movimento, além da força e da inércia,


é necessário considerar outra grandeza vetorial: o atrito. Normalmente, quando
duas superfícies se encontram, uma oferece atrito à outra, principalmente por
pequenas irregularidades presentes nas superfícies de contato. O atrito pode
ser uma força que dificulta o movimento do corpo, fazendo com que a força
aplicada sobre o corpo, para colocá-lo em movimento, precise vencer sua
inércia e o atrito. Caso um corpo se movimente sem atrito, ele permanecerá
em movimento.
O atrito estático é uma força variável; ele sempre vai realizar uma força
contrária e de mesmo módulo que aquela que tende a colocar o corpo em
movimento, mantendo o corpo em repouso. Quando a força aplicada sobre o
corpo para colocá-lo em movimento consegue superar a força de atrito está-
tico, o corpo começa a se movimentar. Um corpo caindo no ar está sujeito à
resistência do ar, que é o atrito que o meio impele ao corpo (HEWITT, 2009).
Embora o atrito possa parecer uma força prejudicial, graças ao atrito,
quando corremos ou andamos, somos empurrados para a frente. Caso o atrito
não existisse, ficaríamos no mesmo lugar, como se estivéssemos patinando.
De acordo com a segunda lei de Newton, a força resultante que age sobre
um corpo é igual ao produto de sua massa pela sua aceleração (HALLIDAY;
RESNICK; WALKER, 2016). Com base nela, é possível definir a força gravita-
cional (Fg), que é uma força de atração que um corpo exerce sobre outro corpo.
Como exemplo, se pensarmos em um paraquedista (Figura 2) sendo atraído
pela gravidade da terra (g) — que será a sua aceleração —, considerando-se
sua massa (m) e desprezando-se os efeitos do ar, podemos descrever a força
gravitacional como sendo:

Fg = mg

O peso de um corpo também pode ser descrito com o auxílio da segunda lei
de Newton, uma vez que o peso (P) é igual ao módulo da força gravitacional
(Fg) que age sobre ele (BAUER; WESTFALL; DIAS, 2012).

P = Fg

ou:

P = mg
4 Aplicações das leis de Newton

Figura 2. Paraquedista em queda livre, quando se despreza o efeito do ar.


Fonte: Adaptada de Vecton/Shutterstock.com.

Já a terceira lei de Newton indica que, quando dois corpos interagem, um


exerce sobre o outro uma força de igual módulo e sentido oposto. Podemos
pensar nessa lei como forças de ação e reação, como quando um carro se
choca com outro. Em módulo, a força de ação que o carro a (Fa) exerce sobre
o carro b é igual à força de reação que o carro b (Fb) exerce sobre o carro a:

Fa = Fb

Vetorialmente, essas forças são contrárias:


Aplicações das leis de Newton 5

Isaac Newton (1642-1727) foi um físico inglês que publicou, em 1686, sua obra intitulada
Princípios matemáticos da filosofia natural, em que apresentou suas três leis. As leis
de Newton foram desenvolvidas a partir de suas observações e de estudos sobre as
descobertas de outros cientistas, como Galileu e Kepler (HEWITT, 2015).

As leis de Newton se aplicam a quase todas as situações que envolvem


movimento de corpos. Caso as velocidades dos corpos em análise sejam
extremamente altas, aproximando-se da velocidade da luz, as leis de Newton
devem ser substituídas pela teoria da relatividade de Einstein.

2 Problemas com as leis de Newton


Quando um paraquedista salta no ar, além da força gravitacional (que o puxa
para baixo), há a resistência do ar. Porém, como a força gravitacional está
diretamente relacionada à massa do corpo, como você verificou na seção
anterior, um paraquedista mais pesado, que tenha maior massa corporal
(Figura 3), descerá mais rapidamente. Isso porque a força gravitacional do
paraquedista mais pesado será maior do que a força gravitacional que atua no
paraquedista mais leve. A força resultante em cada um será a diferença entre
a força gravitacional e a resistência do ar, fazendo com que o paraquedista de
maior massa tenha maior aceleração.
6 Aplicações das leis de Newton

Figura 3. Forças atuantes em dois


paraquedistas com massas corporais
diferentes.
Fonte: Hewitt (2015, p. 77).

Suponha que a massa do paraquedista mais pesado seja 1,5 vezes a massa
do paraquedista mais leve. A resistência do ar será representada por R. Como
força é igual à massa multiplicada pela aceleração (gravidade), no paraquedista
mais leve, teremos:

Fg = mg

Já para o paraquedista mais pesado, teremos:

Fg = (1,5m)g

O que explica que a força gravitacional será maior no paraquedista mais


pesado.
Aplicações das leis de Newton 7

Quanto às interações entre forças de ação e reação, diversos são os exemplos


que podem ilustrar um pouco melhor a terceira lei de Newton. Nela, considera-
-se que, sempre que um corpo exerce força sobre determinada superfície ou
outro objeto, o primeiro corpo recebe uma força de reação de mesmo módulo e
de sentido oposto. Assim, na Figura 4, você pode observar exemplos cotidianos
da terceira lei de Newton.

Figura 4. Forças de ação e reação.


Fonte: Hewitt (2009, p. 80).

Para entender melhor o que é a inércia, você pode fazer um experimento simples
em sua casa. Pegue um copo, um pedaço de papel mais firme, que seja maior do
que a boca do copo, e uma moeda. Coloque o copo com a boca virada para cima e
o papel sobre ele. Sobre o papel, no centro, coloque a moeda. Tente retirar o papel,
em um movimento horizontal, de cima da boca do copo. Você vai perceber que, ao
aplicar uma força no papel, a moeda não será movida com a mesma velocidade. Isso
pode ser explicado pela inércia da moeda, que não recebeu nenhuma força sobre
ela, e, assim, o movimento do papel não será capaz de causar igual movimento nela.
8 Aplicações das leis de Newton

Alguns vetores de força podem não ser visualmente percebidos, mas


não podem deixar de ser considerados no momento da resolução de proble-
mas. Na próxima seção, você vai verificar como estabelecer, vetorialmente,
as forças atuantes em um corpo e determinar os vetores de forças resultantes
nos movimentos.

3 Solução para problemas envolvendo


as leis de Newton
Como a força é uma grandeza vetorial, e diferentes forças podem atuar simul-
taneamente sobre um corpo, é necessário pensar em como determinar a força
resultante sobre um corpo, a fim de descrever o sentido de seu movimento.
Observe a Figura 5, que mostra como se pode determinar a força resultante a
partir de duas forças atuando sobre um corpo.

Figura 5. Forças resultantes sobre um objeto.


Fonte: Hewitt (2015, p. 28).

Conhecendo-se a necessidade de operar vetorialmente com as forças apli-


cadas sobre um corpo, vamos agora verificar como podem ser construídos
diagramas para facilitar a resolução de problemas com a aplicação das três
leis de Newton. Por exemplo, quando uma pessoa empurra um caixote sobre
o chão, conforme mostra a Figura 6, as forças presentes nessa situação podem
ser descritas tanto para o homem quanto para o caixote (KNIGHT, 2009).
Aplicações das leis de Newton 9

Figura 6. Pessoa empurrando um caixote.


Fonte: Knight (2009, p. 186).

Primeiramente, vamos traçar um diagrama com as forças que atuam no ho-


mem. O homem (H) será representado por um círculo, e nele serão desenhados
os vetores das forças atuantes (Figura 7). Inicialmente, a força gravitacional
(Fg) está presente, devido à massa do corpo. O atrito causado pelo movimento
do pé do homem sobre o chão (que empurra a superfície para trás) fará uma
força no elemento homem para a frente (direita) toda vez que ele der um
novo passo (Fa). Uma vez que a massa do homem exerce força sobre a terra,
a terra oferece uma reação a essa força (Fr). E, por fim, ao empurrar o caixote,
o caixote oferece também uma força de reação sobre o homem (Fc).

Figura 7. Forças presentes sobre o homem.


10 Aplicações das leis de Newton

A força total, ou resultante, que atua sobre o elemento homem será descrita
pela soma vetorial de todas as forças envolvidas:

Para o caixote (C), as forças atuantes estão representadas na Figura 8.


Observe que a massa do caixote dará origem a uma força gravitacional (Fg) e,
consequentemente, haverá uma força de reação da terra sobre o caixote (Fr).
O homem faz força, empurrando o caixote para a direita (Fh), e o atrito se
opõe ao movimento do caixote (Fa).

Figura 8. Forças presentes sobre o caixote.

A resultante, ou força total, das forças que atuam no caixote será descrita
pela soma vetorial:

Conseguir observar o cenário em que ocorre o movimento e desenhar a


atuação das forças, com as orientações e os módulos adequados, garante que
você tenha êxito no cálculo da força resultante sobre um corpo. Acompanhe
o exemplo a seguir e aprenda mais sobre o tema.
Aplicações das leis de Newton 11

Descreva as forças atuantes em um corpo parado em um plano inclinado, de acordo


com a figura a seguir, e determine a relação da força resultante sobre o bloco.

Fonte: Adaptada de Richard L. Bowman/Shutterstock.com.

A massa do bloco ocasiona o aparecimento da força gravitacional (Fg), que, conse-


quentemente, gera a reação da terra sobre o bloco (Fr), perpendicular ao plano em
que o bloco está apoiado. Pelo atrito causado no contato das duas superfícies, a força
de atrito (Fa) se opõe ao movimento do caixote para baixo. Assim,

A força resultante será determinada pela soma vetorial:

Ou, em termos dos módulos dessas forças para a componente x:

Para a componente y,

O vetor resultante será a soma das duas forças anteriores:


12 Aplicações das leis de Newton

BAUER, W.; WESTFALL, G. D.; DIAS, H. Física para universitários: eletricidade e magnetismo.
Porto Alegre: AMGH, 2012.
HALLIDAY, D.; RESNICK, R.; WALKER, J. Fundamentos de física: mecânica. 10. ed. Rio de
Janeiro: LTC, 2016. 1 v.
HEWITT, P. G. Física conceitual. 12. ed. Porto Alegre: Bookman, 2015.
HEWITT, P. G. Fundamentos de física conceitual. Porto Alegre: Bookman, 2009.
KNIGHT, R. Física 3: uma abordagem estratégica. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2009. 3 v.
HISTÓRIA DA
MATEMÁTICA
História da
matemática
Cristiane da Silva

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Descrever o papel da história da matemática como metodologia de ensino


da disciplina.
>> Relacionar a história da matemática com a metodologia de projetos na
sala de aula na educação básica.
>> Reconhecer a história da matemática como área de conhecimento e
investigação científica no campo de pesquisa da educação matemática.

Introdução
A história da matemática destaca-se enquanto metodologia de ensino pelo
seu caráter de ordem prática, revelando quais problemas foram originários de
determinados conteúdos matemáticos. Ao estudar a história da matemática,
constatamos que ela não está pronta e acabada, mas em constante processo
de construção. Como metodologia de ensino, a história da matemática auxilia
em muitas necessidades educacionais, dando ênfase ao valor da matemática
em sala de aula, contribuindo para que os estudantes percebam o que perpassa
os cálculos (ALVES, 2016).
Neste capítulo, você verá a história da matemática como uma importante
ferramenta metodológica para o ensino da matemática em sala de aula.
Conhecerá diferentes métodos, como o da falsa posição, o teorema de Thales,
as proporções de Eudoxo e o teorema de Pitágoras, bem como os problemas
associados a eles. Você verá que a metodologia de projetos na sala de aula da
educação básica, mesmo quando dentro de um projeto maior, multidisciplinar,
2 História da matemática

pode ser excelente para a inserção da história da matemática como elemento


fundamental nos problemas culturais de cada época. Além disso, estudará a
história da matemática como área de conhecimento e investigação científica no
campo de pesquisa da educação.

A história da matemática como


metodologia de ensino
A discussão sobre o ensino de matemática bastante presente especialmente
no que se refere à abordagem didático-pedagógica dos conteúdos na educação
básica. No entanto, é importante destacar que há um movimento histórico até
chegar na forma como vemos e entendemos a matemática atualmente. Nesta
seção, será descrito o papel da história da matemática como metodologia
de ensino da disciplina.
Os conteúdos matemáticos dos problemas a serem solucionados têm
origem histórica e dispõem de métodos históricos para sua resolução.
Um mesmo tipo de problema pode ser resolvido por métodos diferentes. Isso
ocorre devido ao desenvolvimento do conhecimento matemático, à medida
que métodos foram aprimorados e novos foram surgindo com o avanço dos
trabalhos de estudiosos (BRANDEMBERG, 2019).
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para a área de matemática
reforçam a importância do acesso ao conhecimento matemático que viabilize
de fato a inserção dos alunos como cidadãos no mundo do trabalho, das
relações sociais e da cultura. A matemática faz parte da vida das pessoas
enquanto criação humana, por isso é importante mostrar que ela tem sido
desenvolvida para dar respostas às necessidades e preocupações de diferentes
culturas, em diferentes momentos históricos (BRASIL, 1998).
Nesse sentido, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) alerta para a
necessidade de haver um contexto significativo para os alunos no ensino
da matemática, não apenas considerando o cotidiano, mas também outras
áreas do conhecimento e da própria história da matemática. É importante
incluir a história da matemática como recurso para despertar interesse e
representar um contexto significativo para aprender e ensinar matemática.
Na fase final do ensino fundamental, é importante estimular os estudantes
para a compreensão, análise e avaliação da argumentação matemática, isso
envolve a leitura de textos matemáticos e o desenvolvimento do senso crítico
em relação à argumentação neles utilizada (BRASIL, 2018).
História da matemática 3

Na Antiguidade, a matemática era dividida em dois ramos: um que en-


volvia a resolução de problemas práticos relacionados às necessidades da
época, que desencadeou o que chamamos de aritmética; e outro mais ligado
a problemas envolvendo observação e explicação de fenômenos naturais,
que se consolidou como geometria. Uma maior interação entre essas duas
vertentes se deu em meados do século XIX, quando a álgebra assumiu o papel
de ligação entre os aspectos aritméticos e geométricos, garantindo maiores
avanços para a matemática, tanto na academia quanto no contexto escolar
(BRANDEMBERG, 2019).
No final do século XX as escolas brasileiras passaram a supervalorizar
o ensino de álgebra. Essa forte influência na educação básica permitiu que
muitos métodos de resolução de problemas aritméticos ou geométricos,
interessantes e profícuos, de simples aprendizagem e vasta aplicabilidade,
fossem retirados do espaço da sala de aula.
Um dos métodos de grande relevância é o método (ou regra) da falsa
posição, originário do Antigo Egito (BRANDEMBERG, 2019). Esse método é
historicamente considerado um procedimento aritmético. Ele consiste em
uma técnica ou procedimento aritmético que parte de um número “escolhido”,
denominado valor inicial falso, e a partir do qual se busca o valor que será
a verdadeira solução do problema. Para ficar mais claro, podemos recorrer
aos problemas 24 e 26 do papiro de Rhind: “Uma quantidade adicionada de
sua sétima parte resulta 19” e “Uma quantidade e sua quarta parte perfazem
15” (BRANDEMBERG, 2019, p. 18).
De acordo com Brandemberg (2019), este tipo de problema do primeiro grau,
que envolve apenas operações de adição, subtração, multiplicação e divisão
é bastante antiga. Um dos documentos mais antigos que faz referência ao
método é o papiro de Rhind, por volta de 1650 a.C. (Figura 1). Cabe destacar
que sempre houve relutância em tomar o método da falsa posição como um
procedimento algébrico.
No problema 26, utilizando o método da falsa posição, somos levados a
escolher o quatro como solução inicial, assim, temos 4 + 1 = 5, e para obtermos
15, basta multiplicarmos 5 por 3. De onde, é possível inferir que, multiplicando
o valor inicial 4 por 3 se obtém 12, que é a solução desejada (BRANDEMBERG,
2019).
4 História da matemática

Figura 1. Papiro de Rhind.


Fonte: Kniss (2015, p. 21).

Na resolução do problema 24, o raciocínio é análogo:

(
1 1
19 = 8 2 + +
4 8 )
Logo, para obter a solução desejada, faz-se:

(
7 2+
1 1
+
4 8 )
Aqui, utilizamos a notação das frações unitárias que são típicas do Antigo
Egito (BRANDEMBERG, 2019). Vejamos um exemplo utilizando o método da
Falsa Posição.

Aqui jaz Diofanto, que viveu bastante (x). Cuja infância ocupou a
sexta parte de sua existência (6 ). Sua juventude durou cerca de um
duodécimo de sua vida (12). Durante um sétimo de sua vida foi casado (7 ). Após
5 anos, nasceu seu filho; o qual viveu a metade da vida de seu pai (2 ). Triste,
Diofanto morreu 4 anos depois de enterrar seu filho. Qual a idade de
Diofanto?
História da matemática 5

Solução:

O número a ser escolhido para evitar o cálculo com frações, “temido” pelos
egípcios, deve ter como divisores 6, 12, 7 e 2. Nossa escolha recai em 84. Que,
coincidentemente, é a solução desejada.
Em linguagem algébrica temos a equação:

= + + +5+ +4
6 12 7 2

Resolvendo a equação, obtemos que Diofanto viveu 84 anos. Além disso,


podemos afirmar que ele se casou aos 21, foi pai aos 38, e perdeu seu filho aos
80 anos. (BRANDEMBERG, 2019).

Brandemberg (2019) explica que podemos tomar o método válido para


problemas que envolvam equações lineares do tipo ax = b. Caso tenhamos
problemas que recaiam em uma equação do tipo ax + d = c, é possível rees-
crever como ax = b, em que b = c – d. Podemos afirmar que o método da falsa
posição, em sua origem, consiste em tentar resolver problemas partindo de
uma solução provisória e conveniente para depois modificá-la por meio de
um raciocínio que envolve proporções, em uma similaridade a problemas
geométricos que envolvem relações de semelhança.
Os gregos herdaram o conhecimento da matemática em grande parte do
Egito e da Mesopotâmia. A matemática grega era prioritariamente geométrica,
sem muito interesse em questões práticas e aritméticas de contagem e medida.
Conforme afirmam historiadores, os primeiros matemáticos gregos foram
Thales de Mileto e Pitágoras de Samos, e eles teriam aprendido matemática
com os egípcios e babilônicos (BRANDEMBERG, 2019).
Thales de Mileto, nascido no início do século VI a.C., foi considerado o
primeiro dos filósofos naturais, e possuía grande habilidade tanto na política
quanto na produção de fazeres práticos. Também foi o primeiro matemático
grego a tentar uma demonstração geométrica, usando o caso de congruência
de triângulos (ALA) para medir a distância até pontos inacessíveis (alturas de
pirâmides, largura de rios). Ele buscou justificativa para os resultados obtidos,
não por demonstrações formais, mas por meio de uma argumentação do
processo de descoberta associando intuição e dedução (BRANDEMBERG, 2019).
6 História da matemática

Brandemberg (2019) afirma que a maneira como Thales calculou a distância


de um navio até a costa (Figura 2) pode não ter sido inovadora, mas Thales
apresentou uma justificativa do tipo generalização de casos particulares
observados empiricamente, como a observação de que os objetos projetam
sombras que em algum momento são iguais às suas alturas.

Figura 2. Medição da distância de um navio


até a costa.
Fonte: Brandemberg (2019, p. 28).

A justificativa usava a congruência de triângulos, baseando-se no processo


de deslocamento de triângulos de tal forma a obter uma sobreposição. É im-
portante observar que a verificação de Thales resolve problemas envolvendo
elementos (segmentos, grandezas) comensuráveis. Para maior generalização,
é necessário conhecer as proporções de Eudoxo (BRANDEMBERG, 2019).
Os matemáticos gregos tinham conceitos aritméticos limitados que não
possibilitava associar as figuras geométricas, números para medir suas áreas
e volumes. Para determinar quadraturas (áreas) ou cubaturas (volumes) de
figuras geométricas, os matemáticos gregos, especialmente Eudoxo, Euclides
e Arquimedes, produziam uma razão com outra figura conhecida (quadrados
e cubos). Para isso, os gregos desenvolveram uma sofisticada teoria de gran-
dezas (magnitudes) e proporções (BRANDEMBERG, 2019).
Brandemberg (2019) explica que o matemático e filósofo Eudoxo foi aluno
de Platão e trabalhou nas cortes do Egito. Sua teoria das proporções foi
descrita no livro V dos Elementos de Euclides de Alexandria (300 a.C.). A teo-
ria das proporções de Eudoxo baseia-se nas noções de parte e múltiplo e
da definição de razão. Trata-se de uma teoria considerada inovadora, pois
se aplica a grandezas comensuráveis e incomensuráveis. Eudoxo de Cnido
idealizou um método para relacionar magnitude de uma área (ou volume) de
uma figura curvilínea com o “limite” das áreas progressivas de polígonos. Ele
História da matemática 7

demonstrava que é possível encontrar um polígono na sucessão cuja área


difere da requerida grandeza por uma diferença tão pequena quanto se queira.
O método de exaustão de Eudoxo, atualmente denominado axioma de
Eudoxo-Arquimedes, se torna a principal ferramenta na resolução de pro-
blemas de quadraturas e cubaturas que envolvem questões infinitesimais,
empregando uma forma de demonstração indireta e evitando a necessidade
de continuar indefinidamente as comparações das magnitudes envolvidas.
Eudoxo também é citado na astronomia, em função de suas explicações do
movimento das estrelas e dos planetas em esferas concêntricas, tendo a Terra
como centro, e, pelo cálculo, a circunferência terrestre (BRANDEMBERG, 2019).
Um método anterior ao de Eudoxo, de grande aplicação e relevância
histórico-cultural para o desenvolvimento da matemática, é o teorema de
Pitágoras. Pitágoras foi um filósofo grego do século VI a.C. Evidências históri-
cas sugerem que o teorema que leva seu nome já era conhecido por diversas
culturas da antiguidade, pois foi encontrado em diferentes documentos
egípcios, babilônicos, árabes, chineses e gregos. Acredita-se que o teorema
tenha sido introduzido na Grécia por Pitágoras, mas que provavelmente ele
não o tenha descoberto (BRANDEMBERG, 2019).
Quando se estudam as culturas antigas é possível encontrar trios de nú-
meros inteiros que funcionam como lados de um triângulo retângulo, o mais
famoso deles é: 3, 4 e 5. Entretanto, esses trios não são fáceis de identificar,
especialmente quando se trata de números maiores. Veja o exemplo a seguir,
encontrado em um tablete de argila.

Um lado de um triângulo retângulo mede 119m de comprimento,


enquanto o lado maior mede 169m de comprimento. Qual é o com-
primento do outro lado?
Como 1692 – 1192 = 14.400 = 1202, obtemos o trio: 119, 120 e 169 (BRANDEMBERG,
2019).

No livro dos elementos de Euclides, na proposição 47, há um enunciado


do teorema de Pitágoras que diz o seguinte: “Nos triângulos retângulos,
o quadrado sobre o lado que se estende sob o ângulo reto é igual aos qua-
drados sobre os lados que contém o ângulo reto” (BRANDEMBERG, 2019,
p. 39). Observe a Figura 3.
8 História da matemática

Figura 3. Proposição 47 do livro dos elementos de Euclides.


Fonte: Clavius (2012, documento on-line).

Leia mais sobre os métodos históricos para resolução de problemas


matemáticos na obra Métodos históricos: sua importância e aplicações
ao ensino de matemática, de Brandemberg (2019).

Nesta seção, constatamos a importância da história da matemática como


metodologia de ensino da disciplina por meio do estudo de métodos surgidos
na antiguidade, aperfeiçoados posteriormente e que contribuíram com avanços
importantes para a história. Também conhecemos o método da falsa posição,
o teorema de Thales, as proporções de Eudoxo e o teorema de Pitágoras.
Na próxima seção, aprofundaremos o estudo da história da matemática com
a metodologia de projetos.
História da matemática 9

Metodologia de projetos
Estabelecendo continuidade do estudo da história da matemática, faremos
aqui uma relação com a metodologia de projetos na sala de aula na educa-
ção básica. O propósito é oferecer subsídios aos professores de modo que
as aulas tenham mais proximidade com a vivência dos estudantes e façam
sentido dentro de um contexto que vem desde a Antiguidade. Para tanto, será
apresentado o exemplo a seguir, de Garnica e Souza (2011).
Garnica e Souza (2011) relatam a experiência realizada por meio de um pro-
jeto com alunos de uma turma de 3º, uma de 4º e uma de 5º ano da educação
básica no grupo escolar Eliazar Braga, que funcionou de 1920 a 1975, onde
hoje fica o prédio da atual Escola Municipal Eliazar Braga, no município de
Pederneiras, em São Paulo. Os autores têm como metodologia norteadora a
história oral, e buscam produzir uma gama diversificada de fontes e situações
a partir das quais determinado objeto possa ser tematizado e investigado.

Professores de matemática podem desenvolver projetos cujo tema


não seja necessariamente um conteúdo matemático, como, por
exemplo, projetos que proponham situações em que a historicidade possa ser
problematizada, para que o aluno seja capaz de se perceber como ser histórico.

Nesse contexto, Garnica e Souza (2011) desenvolveram um estudo em


que a proposta foi integrar várias comunidades e, ao mesmo tempo, fazer
funcionar vários projetos. Os resultados dos projetos seriam compartilhados
não somente com os membros da comunidade acadêmica, mas também com
o grupo de colaboradores da pesquisa.
Nesse projeto, o município permitiu livre acesso ao acervo dos documentos
do arquivo inativo do período de vigência do grupo escolar durante a pes-
quisa. Uma importante parceria que permitiu aos pesquisadores selecionar
informações que apoiariam entrevistas com antigos professores e diretores
do grupo escolar. Além disso, os alunos que ocupavam as salas do antigo
prédio puderam contribuir formulando questões que seriam integradas ao
roteiro das entrevistas. Foram recuperadas e estudadas antigas fotografias
e edições do jornal escolar, e fez-se uma campanha para resgatar materiais
dispersos (GARNICA; SOUZA, 2011).
10 História da matemática

Alguns projetos foram desenvolvidos com alunos do ensino fundamental.


Um dos projetos tinha como objetivo aproximar os estudantes do conceito de
historicidade, ou seja, que eles pudessem se perceber como seres históricos,
situados em um espaço marcado pela historicidade, seja sua escola, família,
cidade, comunidade, etc. O projeto tinha como propósito explorar a noção
de história local tendo a oralidade como meio tanto para conhecer quanto
para divulgar histórias. As fases previstas para o projeto eram (GARNICA;
SOUZA, 2011):

a) a exploração do prédio onde as crianças estudavam e a busca por


alguns objetos ou espaços da época do grupo escolar;
b) ouvir e contar histórias sobre objetos e curiosidades encontradas
durante a busca;
c) instigar as crianças a buscar histórias sobre a época de funcionamento
do grupo escolar junto a seus pais, avós e vizinhos;
d) motivá-las a procurar por fotos, livros ou cadernos da época;
e) narrar as histórias ouvidas, os materiais coletados e os processos de
busca;
f) organizar um roteiro para entrevistar uma ex-aluna do grupo escolar;
g) assistir ao vídeo resultante desta entrevista.

Na primeira semana do projeto, organizou-se um bate-papo com as crianças


proporcionando discussão e oferecendo possibilidade de criar, conhecer e
narrar histórias. Foi solicitado às crianças que perguntassem aos pais, avós e
vizinhos sobre o grupo escolar e, sendo possível, que trouxessem fotos, livros,
ou outros registros daquela época. Na semana seguinte, os alunos reporta-
ram seus sucessos ou fracassos na identificação dos locais fotografados e
expostos a eles no encontro anterior. A cada projeção de fotos fazia-se um
esclarecimento sobre sua localização no prédio e um histórico sobre o objeto
e sua função hoje e à época em que ali funcionava o grupo escolar Eliazar
Braga (GARNICA; SOUZA, 2011).
Os próximos encontros oportunizaram espaço nas aulas dedicado aos
contadores de história. As crianças descobriram, em conversas com pais e
avós, histórias sobre o grupo escolar e se inscreviam para narrá-las. Surgia,
então, um cenário de lendas urbanas, uniformes, merendas, divisão de salas
por gênero, presença de pipoqueiros próximos ao portão de saída, o pomar,
o comportamento dos alunos frente aos professores, memórias de toda uma
comunidade (GARNICA; SOUZA, 2011).
História da matemática 11

Garnica e Souza (2011) relatam que de todo esse movimento desenca-


deado pelo projeto e pelas descobertas das crianças surgiram dúvidas e
curiosidades sobre como o espaço em que estudam foi vivenciado por seus
pais e avós. As discussões que foram surgindo foram elencadas e elaborado
um roteiro com temas que estavam mobilizando aquele momento a partir
da seguinte questão: “Se pudessem conversar, neste momento, com alguém
que estudou aqui na sua escola antes de 1975, o que perguntariam?”. A partir
dessa pergunta, foram elencadas as seguintes questões:

1. Em que época estudou no grupo escolar Eliazar Braga?


2. Os alunos eram educados, comportavam-se em sala de aula?
3. O que acontecia com eles quando faziam artes, quando não faziam
as tarefas?
4. Como eram as salas de aulas, as carteiras?
5. O que era o mata-borrão? Do que era feito?
6. Estudou no grupo na época em que tinha um pomar?
7. Os alunos tinham acesso a esse pomar? Podiam pegar as frutas?
8. E o uniforme, como era?
9. A escola fazia bastante festas, por exemplo, como agora, que é tempo
de festa junina?
10. Tinha quadra de esportes?
11. Tinha educação física?
12. Dizem que a merenda era paga, você lembra mais ou menos o valor?
13. Matemática era difícil?
14. Os professores costumavam desenvolver projetos com as crianças?
15. O que tinha no porão?
16. Por que meninos estudavam em salas separadas das meninas?

Esse foi o roteiro utilizado para entrevistar a ex-aluna do grupo escolar


Eliazar Braga, a ex-diretora da Escola Municipal Eliazar Braga e, naquele
momento, a secretária de Educação e Cultura do município de Pederneiras.
A entrevista gerou um vídeo que seria apresentado às crianças (GARNICA;
SOUZA, 2011).
Garnica e Souza (2011) destacam que, embora o projeto aqui relatado tenha
se centrado mais especificamente na historicidade do ambiente escolar, ele
pode ser ampliado para incluir outros enfoques, como a vizinhança da escola,
a rua, o bairro, a cidade, a região, etc. A proposta evidencia possibilidades nas
práticas cotidianas dos professores das séries iniciais que podem envolver
toda a comunidade escolar.
12 História da matemática

Em propostas como a de Garnica e Souza (2011), professores de mate-


mática podem desenvolver pequenos projetos em que o tema central não é
a matemática em si, ainda que alguns projetos possam tê-la como tema de
fundo, mas propor situações em que a historicidade possa ser problematizada,
proporcionando um ambiente em que o aluno possa conceber-se como ser
histórico, reconhecer o seu presente, seja em sua singularidade ou em sua
coletividade, revisitando o passado e criando perspectiva de futuro (GARNICA;
SOUZA, 2011).
Projetos na sala de aula na educação básica podem ser desenvolvidos por
uma equipe de professores de disciplinas distintas, e podem ser coordenados
por professores de matemática sem qualquer problema. As propostas podem
ser interdisciplinares, pois, ao mesmo tempo, mobilizam conceitos e permitem
problematizar objetos, situações e posturas que se situam na interseção de
vários campos do saber (GARNICA; SOUZA, 2011).
Conforme Garnica e Souza (2011), estudar a história local contribui para que
o aluno se sinta inserido em sua comunidade, contribui para a percepção de
sua historicidade e criação da sua identidade. Além disso, possibilita, a partir
do cotidiano, ações investigativas, facilita a participação em atividades sob
várias perspectivas: econômica, política, social e cultural. Também contribui
para a percepção de mudanças e permanências na história.
Nesse tipo de projeto é importante que toda a escola participe, sugere-se
uma programação de atividades que possa incluir, a cada ano, uma ou duas
séries diferentes, para que todos participem e contribuam com as atividades
do projeto. Quanto às entrevistas que fazem parte do projeto, é interessante
dividir a sala em grupos de 4 a 6 pessoas, dessa forma, um aluno fica como
observador e relata posteriormente o que julgou significativo. Ainda, é fun-
damental que o professor organize as atividades propostas conforme a série
dos estudantes, de modo que as tarefas do projeto estejam de acordo com
cada faixa etária, dada a complexidade que algumas oferecem (GARNICA;
SOUZA, 2011).
No caso do professor de matemática, ele pode envolver-se nas atividades
de caráter mais geral e pensar em complementar a proposta tematizando,
por exemplo, programas, métodos e legislações específicas para a aula de
matemática. Também refletir sobre os recursos didáticos e as diferentes
exigências que cada época impõe às crianças (GARNICA; SOUZA, 2011).
História da matemática 13

Você pode saber mais sobre propostas de projetos na educação básica


consultando a obra Historicidade e escola: propostas de projetos com
crianças e adolescentes, de Garnica e Souza (2011).

Com base na proposta apresentada, podemos pensar em diversas alter-


nativas que permitem relacionar a história da matemática com a metodologia
de projetos na sala de aula na educação básica. Com as crianças pequenas,
pode-se refletir sobre os brinquedos que eram comuns à época, quais suas
formas, cores, tamanhos, qual era a proposta de cada brinquedo. Com crianças
maiores, podemos planejar medições, como, por exemplo: as salas de aula
eram do mesmo tamanho? O espaço externo estava dividido de que forma?
Como o tempo era organizado no espaço escolar (havia intervalo)? Usava-se
calculadoras? Como eles calculavam?
Isso se seguirmos pensando na proposta do ambiente escolar, entretanto,
é possível, ainda, ampliar para outros enfoques, como: compreender como as
famílias organizavam seu orçamento (quem trabalhava? homens ou mulheres?);
descobrir se a maioria dos matemáticos eram homens ou mulheres; fazer um
levantamento de dados, buscar informações por meio de entrevistas, usar
recursos tecnológicos, sites governamentais com séries históricas.
Como você viu, são muitas as possibilidades de projetos envolvendo a
história na matemática e a história da matemática, respeitando o conheci-
mento dos alunos, instigando-os para que fiquem cada vez mais curiosos por
avançar no projeto proposto.
Conforme aponta Skovsmose (2015), o trabalho com projetos pode ser um
veículo para que os aspectos políticos da educação matemática possam emer-
gir. O autor defende um ensino da matemática em que a principal atividade do
estudante não é frequentar aulas, mas, sim, gerar e desenvolver projetos com
base em interações com professores e com delimitações preestabelecidas.
Ele argumenta que é essencial que a educação matemática busque caminhos
que a desviem da educação tradicional dos estudantes, tornando-os mais
críticos.
Nesta seção, conhecemos a metodologia de projetos que pode ser empre-
gada na sala de aula na educação básica. Partimos da discussão da relevância
da história oral e vimos que a historicidade pode ser problematizada de modo
que o estudante seja capaz de se perceber como ser histórico. Neste contexto,
podemos perceber que o professor de matemática, assim como de outras
14 História da matemática

áreas do conhecimento, tem fundamental importância no desenvolvimento


da metodologia de projetos.

Conhecimento científico
Nesta seção, veremos a história da matemática como área de investigação
científica no campo de pesquisa da educação matemática. Um dos principais
meios de divulgação de pesquisas na área, é a Sociedade Brasileira de His-
tória da Matemática (SBHMat). Ela foi fundada em 1999, e tem como objetivo
promover levantamentos, pesquisas e estudos para divulgar dados, reflexões
e informações no que diz respeito à história da matemática. A SBHMat pro-
move seminários, eventos, edita e divulga publicações brasileiras no campo
da história da matemática, da história da educação matemática e afins. Nas
publicações da SBHMat, encontramos anais de seminários e encontros rea-
lizados em diferentes cidades brasileiras, além de livros e periódicos como
a revista brasileira de história da matemática (RBHM), a revista história da
matemática para professores (RHMP) e a revista de história da educação
matemática (HISTEMAT). Além disso, é possível conhecer vários grupos de
pesquisa que atuam na área.
Valente (2013) desenvolveu um estudo que trata de oito temas relativos à
história da educação matemática. O autor mostra como o Grupo de Pesquisa
de História da Educação Matemática (GHEMAT), que foi fundado em 2000, vem
orientando suas investigações e produzindo conhecimento histórico sobre
a educação matemática. Temas como o significado de produzir história da
educação matemática, justificando a sua necessidade; o papel da história
da educação matemática na formação de professores; história cultural da
educação matemática; história oral; história comparativa; história do presente;
e fontes de pesquisa para a história da educação matemática foram tratados
de modo a levar em conta a educação matemática em perspectiva histórica.
Como primeiro tema “o que é história da educação matemática”, o GHEMAT
deixa claro que considera a história da educação matemática um tema dos
estudos históricos, uma especificidade da história da educação — o que
implica na necessidade de apropriar-se e fazer uso do ferramental teórico-
-metodológico elaborado por historiadores para escrita da história. Isso
significa considerar que o aparato conceitual utilizado pelas clássicas pes-
quisas da história da matemática e os aportes levados em conta pela didática
da matemática, dentro do estudo dos processos de ensino e aprendizagem
da disciplina no tempo presente; e, a elaboração de cunho filosófico sobre
História da matemática 15

a produção histórica não dão conta de tratar adequadamente o estudo do


passado da educação matemática, seja ele o mais longínquo ou próximo de
nossos dias. A história não é uma cópia do que aconteceu no passado, e sim
uma construção do historiador, a partir de vestígios que o passado deixou
no presente, a história é uma produção. Sendo assim, a história da educação
matemática é a produção de uma representação sobre o passado da educação
matemática construída pelo historiador (VALENTE, 2013).
O segundo tema, “para que serve a história da educação matemática”,
poderia gerar uma afirmação de que a história da educação matemática é
importante para entender os problemas do presente. No entanto, não há uma
transmissão direta, linear, do passado para o presente. A história não é regida
por leis de causa e consequência. O historiador da educação matemática
constrói ultrapassagens de relações ingênuas, míticas, românticas sobre
práticas do ensino de matemática e afirma que um professor que mantenha
uma relação histórica com seus antepassados profissionais, apropriando-se
da história, irá relacionar-se de modo menos fantasioso e mais científico com
esse passado. Assim, é possível que altere suas práticas cotidianas de modo
a fazê-las mais consistentemente (VALENTE, 2013).
No terceiro tema, “história da educação matemática na formação do profes-
sor de matemática”, o autor destaca a necessidade de aprofundar os estudos
sobre questões epistemológicas relativas à matemática e à matemática escolar
(VALENTE, 2013). Principalmente, buscar a compreensão das relações entre
matemática científica e matemática escolar, ao longo do tempo, em termos
da produção dos saberes elementares matemáticos. O GHEMAT adota uma
postura teórico-metodológica, estuda a matemática escolar como elemento
produzido historicamente no embate da cultura escolar com outras culturas,
em especial com a cultura matemática, vista como a matemática acadêmica,
uma cultura do ensino de matemática em nível superior. É fundamental que o
professor em formação tenha ciência de como a matemática que ele irá ensinar
em sua prática docente organizou-se e reorganizou-se, levando em conta
as suas alterações durante as diferentes épocas escolares (VALENTE, 2013).
Como o quarto tema, “história cultural da educação matemática”, Valente
(2013) destaca que os estudos históricos culturais da educação matemática
deveriam se caracterizar pelas pesquisas que buscam entender como histo-
ricamente foram construídas representações sobre os processos de ensino e
aprendizagem da matemática e de que forma tais representações passaram
a ter um significado nas práticas pedagógicas dos professores em seus mais
diversos contextos e épocas.
16 História da matemática

Quanto ao quinto tema, “história oral da educação matemática” destaca-se


que a história oral é uma metodologia que pode existir em qualquer disciplina,
ela não constitui um campo de saber. O GHMAT, converge com esta perspectiva
e afirma que não existe uma história oral da educação matemática para além
de uma história da educação matemática (VALENTE, 2013).
No sexto tema, “[...] história local, história global, história comparativa da
educação matemática”, (VALENTE, 2013, p. 41) ressalta que se os estudos locais
de educação matemática forem realizados em articulação com formas mais
amplas, haverá contribuição relevante à história da educação matemática.
O sétimo tema, “fontes e acervos para a história da educação matemática”,
trata dos vestígios para a produção histórica, da necessidade de reconhecer
no presente, traços deixados pelo passado. No caso da história da educação
matemática não é difícil enumerar tipos de documentos importantes para
investigação, no entanto, nem sempre é fácil obtê-los para pesquisa. Isso
ocorre por várias razões, dentre elas o fato de não haver uma tradição de
guarda de documentação escolar (cadernos, materiais, livros, documentos
de congressos, etc.). Apenas recentemente alguns países vêm constituindo
seus museus escolares e elaborando bancos de dados sobre a documentação
de ensino (VALENTE, 2013).
No oitavo tema, “história do presente da educação matemática”, aborda-se
a produção crescente de trabalhos, teses, dissertações, artigos, entre outros
na área de história da educação matemática. Esse movimento aumenta a
responsabilidade dos pesquisadores com a educação matemática. A prática
da história da educação matemática do presente poderá levar a uma altera-
ção paradigmática das perspectivas para o campo da educação matemática
(VALENTE, 2013).

Uma excelente fonte de pesquisa no que diz respeito à história da


matemática é o Centro Brasileiro de Referência em Pesquisa sobre
História da Matemática (CREPHIMat). Ao acessar o site da instituição, você encon-
trará informações sobre as produções de pesquisas em história da matemática
realizadas no Brasil, publicações e materiais didáticos relativos à temática de
estudos científicos.
História da matemática 17

Nesta seção, reconhecemos a história da matemática como área de co-


nhecimento e investigação científica no campo de pesquisa da educação
matemática. Adicionalmente, abordamos a importância do conhecimento
de métodos históricos para aprofundar os conceitos matemáticos que são
estudados na educação básica e vimos a história da matemática como meto-
dologia de ensino. Também destacamos como é possível incorporar a história
da matemática em projetos.

Referências
ALVES, J. M. S. Dos mínimos quadrados à regressão linear: atividades históricas sobre
função afim e estatística usando planilhas eletrônicas. 2016. 305 f. Dissertação (Mes-
trado) — Centro de Ciências Exatas e da Terra, Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, Natal, 2016. Disponível em: https://repositorio.ufrn.br/handle/123456789/21304.
Acesso em: 9 fev. 2021.
BRANDEMBERG, J. C. Métodos históricos: sua importância e aplicações ao ensino de
matemática. São Paulo: Livraria da Física, 2019. v. 6.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018. Dis-
ponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/. Acesso em: 9 fev. 2021.
BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto
ciclos do ensino fundamental: introdução aos parâmetros curriculares nacionais. Bra-
sília: MEC, 1998. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/introducao.
pdf. Acesso em: 9 fev. 2021.
CLAVIUS, C. Christopher Clavius's Edition of Euclid's Elements. In: MATHTREASURES.
[S. l.: s. n.], 2012. Disponível em: https://mathtreasures.blogspot.com/2012/06/chris-
topher-claviuss-edition-of-euclids.html. Acesso em: 9 fev. 2021.
GARNICA, A. V. M.; SOUZA, L. A. Historicidade e escola: propostas de projetos com
crianças e adolescentes. Natal: Sociedade Brasileira de História da Matemática, 2011.
KNISS, P. O ensino da trigonometria e a história da matemática. 2015. 85 f. Trabalho de
Conclusão de Curso (Licenciatura em Matemática) — Universidade Tecnológica Federal
do Paraná, Curitiba, 2015. Disponível em: http://repositorio.roca.utfpr.edu.br/jspui/
handle/1/8845. Acesso em: 9 fev. 2021.
SKOVSMOSE, O. Educação matemática crítica: a questão da democracia. Campinas:
Papirus, 2015.
VALENTE, W. R. Oito temas sobre história da educação matemática. REMATEC, v. 8,
n. 12, 2013. Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/38424062.pdf. Acesso
em: 9 fev. 2021.

Leitura recomendada
CREPHIMAT. [S. l.: s. n.], 2021. Disponível em: http://www.crephimat.com/centro. Acesso
em: 9 fev. 2021.
18 História da matemática

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HISTÓRIA DA
MATEMÁTICA
A matemática
na Grécia
Daniele Cristina Thoaldo

Objetivos de aprendizagem
>> Analisar as origens da matemática grega.
>> Explicar a álgebra e a geometria desenvolvidas na Grécia.
>> Demonstrar técnicas da matemática grega na sala de aula de matemática.

Introdução
A matemática que existia na Mesopotâmia e no Egito antigo possuía apenas o
objetivo de resolver problemas concretos e práticos. Na Grécia Antiga, a matemática
teve uma mudança na sua evolução, deixando de ser empírica e se tornando uma
ciência abstrata. O uso de demonstrações e técnicas para validar os resultados
se tornou parte fundamental da estrutura matemática.
Ao longo da história é possível verificar a utilização e evolução da Geometria
plana, por exemplo. Os conceitos de homotetia, que é a ampliação ou a redução
de distâncias e áreas a partir de um ponto fixo, e de semelhança de figuras geo-
métricas já eram aplicadas pelos povos antigos, como os egípcios, que utilizavam
quadriculados para determinarem figuras semelhantes. Já na geometria grega,
existiam trabalhos voltados ao real também, mas tinha-se a preocupação de
construir propriedades gerais de figuras geométricas abstratas.
Neste capítulo, veremos como se desenvolveu e floresceu a matemática grega,
que tanto contribuiu para a evolução da matemática.
2 A matemática na Grécia

Origens da matemática grega


Por volta do século VI a.C., houve um elevado desenvolvimento comercial entre
o Egito e a Grécia, possibilitando que o conhecimento dos egípcios ficasse
acessível aos gregos. Assim, a matemática, nas mãos dos gregos, começava
a assumir uma nova forma (ARAGÃO, 2009). A matemática dedutiva passou a
vigorar e muito do que sabemos hoje se deve às descobertas e aprimoramentos
dos gregos. Muitos dos pensadores que se destacaram nessa disciplina no
mundo antigo eram da civilização grega, especialmente durante o período
que vai de 800 a.C. a 336 a.C.
Foi nessa época que a civilização grega teve um elevado crescimento
cultural, intelectual e cientifico, considerado por muitos historiadores como
o período de maior evolução nessas áreas. Dentre muitos pensadores impor-
tantes dessa época, podemos citar os filósofos Sócrates, Platão e Aristóteles,
que em torno de 400 a.C. chamavam a atenção com suas ideais e pensamentos
(ZANARDINI, 2017).
A seguir, examinaremos as contribuições de alguns pensadores importan-
tes para o desenvolvimento matemático em ordem cronológica, destacando
Tales, Pitágoras, Platão e Aristóteles.

Tales de Mileto
Tales, nascido na cidade de Mileto (624 a.C.–548 a.C.), uniu o estudo da as-
tronomia ao da geometria e da teoria dos números, fundando a chamada
Escola Ioniana. Desenvolveu um dos trabalhos mais importantes no estudo
das proporções. Ele observou que a cada instante a altura dos objetos e
o comprimento de suas respectivas sombras projetadas mantinham uma
razão constante. Sendo comerciante, fazia muitas viagens e tinha contato
com muitos povos diferentes. Numa de suas viagens ao Egito, foi desafiado
a medir a altura da grande pirâmide de Quéops. Com o uso de um bastão,
aplicou seus conhecimentos sobre segmentos proporcionais, comparando
a altura do bastão e de sua sombra com a altura da pirâmide e sua sobra
(ARAGÃO, 2009).
Matematicamente, Tales de Mileto desenvolveu a proporção para os seg-
mentos de duas retas transversais a um feixe de retas paralelas, conforme
exemplifica a Figura 1.
A matemática na Grécia 3

Figura 1. Feixe de retas paralelas cortadas por duas retas transversais.

Nesse caso, a razão entre as medidas de dois segmentos quaisquer de


uma delas é igual à razão entre as medidas dos segmentos correspondente
da outra, ou seja:

Tales de Mileto é considerado por muitos pesquisadores o criador da


geometria dedutiva, sendo a ele atribuídas as primeiras demonstrações
matemáticas, incluindo os resultados ou as tentativas de demonstração dos
seguintes resultados sobre figuras planas:

„„ todo círculo é dividido em duas partes iguais por seu diâmetro;


„„ os ângulos da base de um triângulo isósceles são iguais;
„„ o ângulo inscrito em um semicírculo é reto;
„„ quando duas retas se interceptam, os ângulos opostos são iguais;
„„ os lados de triângulos semelhantes são proporcionais;
„„ dois triângulos são congruentes se possuem dois ângulos e um lado
iguais.

Vale lembrar que tanto a geometria quanto a aritmética praticada na


Mesopotâmia e no Egito nessa época se preocupavam apenas em resolver
problemas práticos, sem se preocupar com os princípios filosóficos mate-
máticos (BOYER; MERZBACH, 2018).
4 A matemática na Grécia

Pitágoras
Pitágoras (580 a.C–500 a.C) nasceu na cidade Samos, próxima à cidade de
Mileto, e foi aluno de Tales. Após se estabelecer na cidade de Crotona, na
atual Itália, teve início a formação de uma irmandade religiosa, filosófica e
científica chamada Escola Pitagórica, onde foram abertas as portas pela
primeira vez às mulheres. Na Escola Pitagórica, em que os conhecimentos
eram transmitidos de forma oral, dava-se grande destaque aos estudos de
aritmética, música, geometria e astronomia. Seus membros tinham a ideia de
que o universo era aritmética e que, no fundo, todas as coisas são números
(BOYER; MERZBACH, 2018).
São atribuídas a Pitágoras a definição do ponto como unidade com posi-
ção, a classificação dos ângulos e a concepção geométrica do espaço como
entidade homogênea, contínua e limitada. Além disso, foi o primeiro a de-
senhar poliedros regulares convexos e demonstrou que não existe qualquer
fração racional cujo quadrado é dois, sendo um dos mais belos raciocínios
matemáticos (ARAGÃO, 2009).

Vale a pena conferir a dissertação “O teorema de Pitágoras: demons-


trações e aplicações”, de Alfredo Luiz Chaves de Oliveira (2013), que
apresenta um relato histórico da vida desse personagem histórico e uma análise
do legado matemático de um teorema básico da trigonometria.

Mas talvez o trabalho mais famoso atribuído a Pitágoras seja o teorema


de Pitágoras, segundo o qual as medidas dos catetos de um triângulo retân-
gulo, b e c, e a medida do maior lado do triângulo, chamado de hipotenusa,
representado por a, são relacionadas pela equação:

a2 = b 2 + c2

É importante frisar que esse resultado já era conhecido na geometria da


Mesopotâmia e do Egito e que não existem evidências de que Pitágoras ou
os pitagóricos tenham trabalhado nele (MOL, 2013).
A escola de Pitágoras foi destruída após uma rebelião popular e a ir-
mandade pitagórica deixou de existir como um grupo organizado, mas
muitos dos seguidores ainda mantiveram seus estudos e atividades por
mais dois séculos.
A matemática na Grécia 5

Platão
Por volta do século V a.C., a cidade de Atenas consolidou-se como o principal
centro econômico e cultural do mundo helênico, tornando-se referência com
em seu estilo de governo, a democracia. Nesse período, o debate público era
a base para esse sistema democrático, o que levou ao compartilhamento de
conhecimento e ideias. Assim, a primeira grande escola filosófica ateniense
foi a dos sofistas, que eram professores que vendiam seus conhecimentos e
treinavam cidadãos para os confrontos verbais.
Nesse ambiente de debates verbais e assembleias públicas, a cidade de
Atenas teve a maior contribuição para a estruturação da matemática na Grécia
Antiga dada pelo filósofo Platão (427 a.C.–347 a.C.).
A escola chamada de Academia foi fundada por Platão e durante um século
dominou a vida filosófica da cidade. A Academia pode ser considerada como
o primeiro exemplo de instituição de ensino e pesquisa de alto nível. Era uma
escola destinada ao estudo, pesquisa e ensino da filosofia e da ciência, e
tinha na matemática sua principal disciplina, sendo considerada indispensável
para a formação intelectual do cidadão. Dessa forma, a Academia se tornou
o centro dos trabalhos matemáticos mais importantes do seu tempo, apesar
de não se ter provas de contribuições técnicas de Platão para a matemática
(MOL, 2013).
Segundo o autor, Platão foi influenciado por Pitágoras na visão de como
a matemática estruturava o universo, porém diferenciava-se na concepção
geométrica, contrastando com a concepção aritmética pitagórica. Para Platão,
a matemática era um domínio autônomo e autossuficiente, cujas verdades
podem ser conhecidas a priori, independentemente dos sentidos. Essa maneira
de pensar influenciou a própria concepção de demonstração, pois apenas
o uso do raciocínio dedutivo passou a ser permitido, não sendo admitido o
recurso à experiência sensível. Para Platão, os objetos sensíveis são susce-
tíveis a mutações, enquanto seus modelos abstratos são imutáveis, eternos
e universais. Assim, exigia-se na matemática o uso do método analítico das
demonstrações com a identificação clara da tese que se deseja provar.
Platão criou novos modelos para compreender e desenvolver a estrutura e
a natureza da matemática. Sabia do caráter abstrato dos objetos matemáticos
ao distinguir o “mundo real”, onde vivem os objetos sensíveis, do “mundo
das ideias”, alcançado pela razão. Pode-se dizer que a maior contribuição de
Platão para a matemática foi a concepção da matemática pura.
Talvez pela falta de registros, muitos historiadores acreditam que Platão
era obcecado pela matemática, embora não fosse um matemático em si, sendo
6 A matemática na Grécia

muito provável que nunca tenha resolvido uma questão geométrica. Suas con-
tribuições à geometria estão mais no melhoramento de seu método do que em
adições a seu conteúdo. De qualquer forma, sendo considerado efetivamente um
matemático ou não, é inegável que Platão contribuiu para o desenvolvimento
da matemática grega, em especial da geometria, o que levou a uma das maiores
obras da antiguidade, os Elementos de Euclides (BICUDO, 1998).

Aristóteles
Aristóteles (384 a.C.–322 a.C.) estudou e trabalhou na Academia de Platão,
sendo considerado seu discípulo mais famoso. Em sua trajetória, Aristóteles
foi professor de Alexandre, o Grande, e professor de outro futuro rei, que teve
um papel importante na ciência do mundo clássico, Ptolomeu Sóter.
Em suas concepções matemáticas, Aristóteles discordava de seu mestre
em relação à natureza da matemática e de seus objetos. Acreditava que as
formas geométricas e numéricas não existem como entidades independentes
do mundo real, ou seja, os objetos matemáticos existem como abstração dos
objetos reais, mas sua existência depende da existência do próprio objeto.
Ao contrário da visão racionalista de Platão, Aristóteles tinha uma visão
empirista, segundo a qual os elementos matemáticos têm vida independente
no “mundo das ideias” (MOL, 2013).
Aristóteles entendia a matemática como uma ciência dedutiva, como um
edifício estruturado por verdades encadeadas por relações lógicas, fundado
sobre alguns pressupostos básicos não demonstrados. Para Aristóteles, era
fundamental produzir um discurso capaz de explicá-lo de acordo com certas
regras, estabelecidas por meio da lógica formal, criada e sistematizada por
ele mesmo. Esse modelo de lógica, chamado de modelo aristotélico, dominou
o Ocidente até meados do século XIX, quando foi incorporado à lógica formal
moderna (MOL, 2013).
Conforme explica Mol (2013), entre seus estudos, Aristóteles analisou a
noção de infinito, distinguindo infinito atual e infinito potencial. Além disso,
contribuiu para as noções matemáticas fundamentais, como de axioma,
definição, hipótese e demonstração.

Ao analisar a ideia de infinito, Aristóteles subdividiu-o em duas


formas: o infinito atual, que é uma quantidade infinita acabada,
e o infinito potencial, que é uma quantidade finita que poderia aumentar
indefinidamente.
A matemática na Grécia 7

Aristóteles (Figura 2) fez uma síntese organizada de todo o saber do seu


tempo, interessando-se pela matemática como método de raciocínio e for-
mulando o primeiro sistema de lógica. Contudo, tampouco produziu resul-
tados ou teorias matemáticas ele próprio. Seja como for, suas contribuições
acabaram influenciando como a matemática seria construída nos séculos
seguintes (MOL, 2013).

Figura 2. Platão e Aristóteles no centro, em detalhe do afresco Escola de Atenas, de Rafael (1511).
Fonte: Zucker (2014, documento on-line).

Álgebra e geometria na Grécia Antiga


No século IV a.C., Felipe II da Macedônia conquistou a Grécia, dando fim à
autonomia e à democracia das cidades gregas. Seu filho, Alexandre, o Grande,
expandiu e unificou o império, chegando a conquistar desde a atual Grécia até
o Afeganistão, passando pela Turquia e Oriente Médio. Quando conquistou
o Egito, Alexandria acabou se tornando o centro intelectual do mundo. Após
a morte de Alexandre, em 323 a.C., Ptolemeu Sóter (323 a.C.–283 a.C), que era
um cientista grego e um de seus generais, estabeleceu-se como rei do Egito,
dando início a uma dinastia (MOL, 2013).
Nesse momento da história, Ptolemeu Sóter fundou a Escola de Alexan-
dria, com o intuito de proporcionar um ambiente favorável ao saber, onde
a cultura grega e cultura egípcia viriam a se ligar, sendo lar de alguns dos
maiores matemáticos da Antiguidade, como Euclides e Arquimedes, entre
outros (ARAGÃO, 2009).
8 A matemática na Grécia

Segundo Mol (2013), o sistema de funcionamento da Escola de Alexandria


era muito semelhante ao das nossas universidades atuais. Muitos estudiosos
iam para a Escola de Alexandria fazer pesquisas, pois o local possuía uma
biblioteca que chegou a ter 700 mil rolos de papiro em seu acervo, propor-
cionando um status para a cidade de metrópole intelectual da época.
Assim, é nesse cenário que veremos alguns dos ilustres matemáticos
que viriam a contribuir para a evolução da matemática, como Euclides, que
foi escolhido para ser chefe do departamento de matemática da Escola de
Alexandria, além de Arquimedes, Diofante e Ptolomeu.

Euclides
O livro Elementos, escrito pelo matemático grego Euclides em Alexandria,
por volta de 300 a.C., é um tratado matemático e geométrico composto por
13 livros. A obra trata da geometria plana conhecida da época, da teoria dos
números, dos incomensuráveis e da geometria espacial, sendo considerado a
mais brilhante obra matemática grega e um dos textos que mais influenciaram
o desenvolvimento da matemática e da ciência em todos os tempos (MOL, 2013).
Nele, são abordados aspectos da geometria plana ou, como ficou conhecida,
geometria euclidiana plana, segundo um processo já dedutivo, sem nenhuma
preocupação com aplicação em situações reais ou práticas. Euclides definiu
objetos geométrico cujas propriedades desejava estudar, totalizando 23 defini-
ções. Temos como exemplo as definições de ponto, reta, círculo, triângulo, etc.

O artigo “Do mito da geometria euclidiana ao ensino das geometrias


não euclidianas” (BARRETO; TAVARES, 2007) pode colaborar para o
enriquecimento do assunto e melhorar sua percepção da história da geometria.

O método utilizado por Euclides é o método axiomático. Esse método


consiste em mostrar que uma afirmação é verdadeira por meio de outra
afirmação que se acredita ser verdadeira. Assim, se quisermos provar que P1 é
uma afirmação verdadeira, utilizamos uma afirmação P2 que seja verdadeira, e
mostramos logicamente, por P2, que P1 é verdadeira. Nesse processo, existem
duas condições que devem ser cumpridas para que uma prova esteja correta:

„„ aceitar como verdadeiras certas afirmações, chamadas de axiomas ou


postulados, sem a necessidade de prova;
„„ saber como e quando uma afirmação segue logicamente de outra.
A matemática na Grécia 9

Assim, os axiomas podem ser entendidos como afirmações que foram


tantas vezes provadas na prática que é muito pouco improvável que alguém
duvide delas. No trabalho de Euclides, com apenas cinco postulados ele foi
capaz de deduzir 465 proposições, muitas com alto grau de complexidade e
não intuitivas (ZANARDINI, 2017).
Sobre a vida de Euclides pouco se sabe, apenas que viveu no século III a.C.
em Alexandria e que foi um dos estudiosos que trabalhou no museu da cidade.

Arquimedes
Após Euclides, outro importante matemático grego foi Arquimedes (c. 287
a.C.–212 a.C.), que nasceu e viveu na cidade de Siracusa, na Sicília, mas estudou
em Alexandria. Sua obra apresentava o rigor que a matemática exigia com a
preocupação para a aplicação.
Arquimedes foi muito conhecido entre os gregos por suas invenções. As
máquinas de guerra que construiu, usadas para defender a cidade de Sira-
cusa, eram famosas. Pode-se dizer que foi um pioneiro na área da física e da
mecânica teórica. Em sua obra que trata do equilíbrio do plano, escreveu de
maneira de formal e com estrutura semelhante à dos Elementos de Euclides,
partindo de definições e postulados simples para chegar a resultados mais
complexos.
Foi Arquimedes quem descobriu a primeira lei da hidrostática. Na sua obra
Sobre corpos flutuantes, prova duas proposições que compõem o chamado
princípio hidrostático de Arquimedes, que afirma que, quando um corpo é
mergulhado em um fluido, recebe um empuxo de intensidade igual ao peso
do volume de água deslocado (ZANARDINI, 2017).
Também contribuiu para o desenvolvimento de métodos rudimentares de
cálculo diferencial e integral em estudos relacionados à geometria espacial
sobre esferas, cilindros e cones. No seu trabalho chamado Sobre a medida
do círculo, avaliou a razão entre a circunferência e o diâmetro de um círculo.
Começou com um hexágono regular inscrito e um hexágono circunscrito a um
determinado círculo, para então ir progressivamente dobrando o número de
lados, até chegar a um polígono de 96 lados. Como resultado de seus cálculos,
chegou a uma aproximação de π com enorme precisão para a época: 3,1408
< π < 3,1428 (MOL, 2013).
No início do século XX, foi descoberto um dos mais importantes trata-
dos de Arquimedes, chamado de O método. Nele, há uma série de cartas
escritas por Arquimedes ao matemático Erastóstenes de Cirene, que era
chefe da Biblioteca de Alexandria. Nessa obra, Arquimedes comenta que a
10 A matemática na Grécia

existência de indicações sobre a validade de um resultado facilitaria sua


demonstração. Essas indicações eram obtidas por meio de investigações
mecânicas, ou seja, pesos teóricos dos objetos matemáticos envolvidos,
em que uma prova rigorosa deveria ser construída pelo método geométrico
tradicional (MOL, 2013).

Diofante
Vários estudiosos da matemática acreditam que Diofante de Alexandria viveu
no século III a.C., mas seu período de vida não é preciso. Pouco se sabe sobre
sua vida com exatidão, apenas que morreu aos 84 anos, fato que foi descrito
em um poema da antologia grega que serviu de epitáfio a Diofante.
Das obras de Diofante, a mais importante é intitulada Aritmética, um
tratado analítico de teoria algébrica dos números, composta de 13 livros.
É bem provável que o a obra Aritmética seja uma compilação e sistemati-
zação dos conhecimentos da época, assim como os Elementos de Euclides.
Tal obra possui problemas de aritmética com enunciados abstratos e
gerais, sendo os dados numéricos especificados apenas a posteriori. Já
na resolução desses problemas, não utiliza as referências geométrica,
diferenciando-se assim da álgebra geométrica grega tradicional. De certa
forma, é um trabalho muito diferente dos demais trabalhos gregos da
época, pois não apresenta uma exposição sistemática de proposições,
apenas uma centena de problemas formulados em termos de exemplos,
cujas demonstrações são apenas ilustrações, em alguns casos particulares
concretos (MOL, 2013).
Entre os assuntos abordados por Diofante, estão as chamadas equações
indeterminadas, cujos coeficientes, assim como suas soluções, eram sempre
números racionais positivos, quase sempre inteiros. Desse modo, não tinha
preocupação na obtenção de soluções gerais, apenas buscava soluções
particulares com exemplos numéricos.
Diofante incorporou símbolos, notações e abreviações em seus trabalhos,
contribuindo para o primeiro passo da álgebra simbólica, que seria desen-
volvida apenas no século XVII, sobretudo por René Descartes. Muitos estu-
diosos consideram Diofante o pai da álgebra, mas avaliando seus trabalhos
talvez seja mais adequado tratá-lo como precursor da moderna teoria dos
números, que deslancharia com o trabalho de Fermat no século XVII (BOYER;
MERZBACH, 2018).
A matemática na Grécia 11

Ptolomeu
Cláudio Ptolomeu (90 d.C.–168 d.C.), também conhecido como Ptolomeu de
Alexandria, foi um astrônomo, geógrafo e matemático de origem grega. Nas-
ceu em Ptolemaida Hérmia, no Egito, na época de domínio romano. Foi um
importante cientista grego, contribuindo de forma significativa nas áreas da
matemática, geografia, cartografia, astrologia, astronomia, óptica e teoria
musical. Também vale ressaltar que não possui parentesco com os reis da
dinastia ptolemaica (MOL, 2013).
Ptolomeu se esforçou muito para sintetizar os trabalhos de seus an-
tecessores e também escreveu uma série de trabalhos matemáticos, mas
foram as teorias sobre trigonometria esférica e sobre o movimento do Sol
e da Lua e a catalogação dos corpos celestes que o tornaram reconhecido.
Escreveu um tratado astronômico e matemático sobre o movimento estelar
e planetário segundo um modelo geocêntrico do universo, tornando-se um
dos textos científicos de maior influência de todos os tempos. Esse tratado
é composto por 13 livros, sob o título de Síntese Matemática, mas ficou co-
nhecido como Almagesto, que em árabe significa “o maior”, destacando-se
de outros tratados de astronomia. Nele, Ptolomeu mostra o conceito da
esfericidade do céu e a descoberta da forma esférica da Terra, aplicados
à geometria do círculo e da esfera, contribuindo significativamente para
trigonometria da Antiguidade e criando ferramentas que dariam suporte
para lidar com essa geometria.
De acordo com Mol (2013), Ptolomeu estendeu os trabalhos de Hiparco e
de Menelau, criando uma maneira de calcular as cordas subentendidas por
arcos de um círculo. Na Grécia, já se fazia uso da divisão de um círculo em
360°, mas a prática foi incorporada de vez por Ptolomeu. Também construiu
uma tabela de cordas de arcos, com os ângulos variando de 0,5° a 180°,
em intervalos de 0,5°. Essa tabela de cordas serviria de referência para os
astrônomos por mais de mil anos. O que Ptolomeu construiu é equivalente
a construir uma tabela de senos de 1/4° a 90° e, uma vez que cos θ = sen
(90° − θ), indiretamente também fornecia uma tabela de cossenos.

Declínio da matemática grega


Com o início do domínio romano no Egito por volta de 30 a.C., temos o fim da
dinastia ptolemaica. Quando Roma assumiu a administração da região, houve
uma série de conflitos sociais, fazendo com que o progresso do conhecimento
12 A matemática na Grécia

científico ficasse adormecido. Alguns matemáticos, como Ptolomeu de Ale-


xandria, atuaram nesse período, mas sem o apoio de seus antigos patronos.
O último tratado matemático significativo que se tem registro da Antiguidade
Clássica, chamado de Coleção, foi escrito por Papos de Alexandria, em torno
de 320 d.C.
Junto com o domínio do Império Romano, o cristianismo vinha crescendo e
dificultando ainda mais a produção científica. O imperador romano Teodósio
I publicou no ano 391 d.C. um decreto que bania o paganismo. A Biblioteca
e o Museu de Alexandria, sendo considerados templos pagãos, tiveram seu
fechamento ordenado. O imperador romano do Oriente, Justiniano, acusou a
escola de Atenas de ensinar uma filosofia pagã que ameaçava o cristianismo,
sendo fechada em 529 d.C. Assim, muitos filósofos fugiram de Atenas e se
exilaram na Pérsia, o que foi um marco para o fim do desenvolvimento da
matemática grega da Antiguidade (MOL, 2013).

Técnicas da matemática grega na sala


de aula
Ao examinarmos a história da matemática, podemos perceber a evolução
dessa ciência. A matemática não é uma ciência pronta e acabada, e muitos
alunos, por exemplo, se enganam quando veem a matemática como um mero
monte fórmulas.
Com a ajuda da história da matemática, é possível transpor essa barreira
e promover uma aprendizagem para os alunos que faça mais sentido. Nesta
seção, serão apresentadas duas técnicas da matemática grega antiga que
podem ser usadas em sala de aula para os alunos de ensino básico, dando
uma ideia de como os matemáticos da época pensavam e como aplicavam
os conhecimentos matemáticos.

O desafio da pirâmide
Tales de Mileto, em uma de suas viagens ao Egito, foi desafiado a medir a
altura da grande pirâmide de Quéops. Com o uso de um bastão, aplicou
seus conhecimentos sobre segmentos proporcionais, comparando a altura
do bastão e da sua respectiva sombra com a altura da pirâmide (Figura
3). Dessa forma, Tales estimou que a altura da pirâmide de Quéops era de
158,8 metros. Originalmente, a altura da pirâmide era de 146,5 metros, mas
com o passar do tempo e devido à erosão e a vandalismos, sua altura hoje
é de 138,8 metros.
A matemática na Grécia 13

Figura 3. Sombra e altura da Pirâmide comparada com a sombra e altura do bastão.

Podemos aplicar esse mesmo conceito pedindo para os alunos de uma


turma determinarem a altura de um poste usando apenas um bastão. Em
certo momento do dia, o poste projeta uma sombra de um certo comprimento.
Fixando o bastão próximo ao poste, podemos notar que este também fará
uma sombra (Figura 4).

Figura 4. Sombra e altura de um poste comparada com a sombra e altura do bastão.

Comparando a altura do bastão e de sua sombra com a altura do poste


e de sua sombra, aplicamos o teorema de Tales, que determina que altura
do poste está para o tamanho da sombra do poste assim como a altura do
bastão está para o tamanho da sombra do bastão. Matematicamente, temos:
14 A matemática na Grécia

Fazendo as medições do tamanho de cada sombra e altura do bastão,


consegue-se chegar à altura aproximada do poste — aproximada pois há
os erros que podem ser cometidos ao realizar as medições, podendo ser de
milímetros.
Está é uma tarefa fácil e que pode ser explorada em sala de aula sem a
exigência de recursos sofisticados. O aluno pode perceber que Tales de Mileto,
mediante um processo matemático e uma forma simples, conseguiu medir a
altura de uma pirâmide colossal por volta do ano 600 a.C.

Triângulo pitagórico
Talvez a maioria dos estudantes já tenha ouvido falar do famoso teorema
de Pitágoras. Pitágoras e seus discípulos, os pitagóricos, abordavam entre
seus estudos a matemática. Na área de figuras, uma delas está relacionada
ao triângulo retângulo, importante figura, que tem inúmeras aplicações no
nosso cotidiano.
Pode-se mostrar o teorema de Pitágoras já no ensino fundamental com
a demonstração por semelhança de triângulos ou com a demonstração de
Perigal, em que a ideia de que a soma de quadrados dos catetos é igual
ao quadrado da hipotenusa é demonstrada com o recurso geométrico
das áreas. Também pode-se utilizar um dos triângulos retângulos mais
conhecidos, chamado triângulo pitagórico, que possui os lados medindo
3, 4 e 5 unidades, e que sempre formará um triângulo com um dos ângulos
retos (Figura 5).

Figura 5. Triângulo pitagórico de lados 3, 4 e 5 unidades.


A matemática na Grécia 15

A atividade que se propõe é pedir para os alunos traçarem uma linha reta
que seja ortogonal a uma das paredes da sala usando um barbante. Primeiro,
deve-se dar nós no barbante espaçados a distâncias iguais. Ao todo, devemos
fazer 13 nós. Com esse barbante, desenhamos a forma de um triângulo, no
caso um triângulo pitagórico com os lados 3, 4 e 5 unidades (Figura 6).

Figura 6. Utilizando um barbante pra criar um triangulo pitagórico.

Dessa forma, basta colocar o lado menor do triângulo, que possui três
espaços, paralelamente à parede e formar o triângulo pitagórico, com o outro
cateto com quatro espaços, formando um ângulo de 90° com a parede.
Desse modo, com material de fácil acesso e sem muito custo é possível
mostrar o triângulo pitagórico e como pode ser utilizado na prática. É muito
provável que os alunos vão gostar da experiência, entendendo o conceito e
a história por trás dele.
Assim, foram apresentadas duas técnicas da matemática grega a serem
aplicadas em sala de aula como apoio ao professor. Há muitas outras que
podem ser aplicadas, ajudando na aprendizagem do aluno. Esse olhar dife-
renciado para a matemática, para sua evolução e como os antigos faziam
para determinar e resolver problemas, ajuda na construção do saber e no
entendimento do assunto.

Referências
ARAGÃO, M. J. História da matemática. Rio de Janeiro: Interciência, 2009.
BARRETO, M. S.; TAVARES, S. Do mito da geometria euclidiana ao ensino das geometrias
não euclidianas. Vértices, Campo dos Goytacazes, v. 9, n. 1/3, p. 73-81, 2007. Disponível
em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/maio2013/matematica_ar-
tigos/artigo_barreto_tavares.pdf. Acesso em: 8 mar. 2021.
BICUDO, I. Platão e a matemática. Letras clássicas, Rio Claro, n. 2, p. 301-315, 1998.
BOYER, C. B.; MERZBACH, U. C. História da matemática. São Paulo: Blucher, 2018.
16 A matemática na Grécia

MOL, R. S. Introdução à história da matemática. Belo Horizonte: CAED-UFMG, 2013.


OLIVEIRA, A. L. C. O teorema de Pitágoras: demonstrações e aplicações. 2013. 78 f.
Dissertação (Mestrado profissional em matemática) — Universidade Estadual do
Ceará, 2013. Disponível em: http://siduece.uece.br/siduece/trabalhoAcademicoPublico.
jsf?id=88664. Acesso em: 8 mar. 2021.
ZANARDINI, R. A. D. Um breve olhar sobre a história da matemática. Curitiba: Intersa-
beres, 2017.
ZUCKER, S. Raphael, Plato and Aristotle (close). In: FLICKR. [S. l.], 2014. Disponível em:
https://www.flickr.com/photos/profzucker/14586731218. Acesso em: 8 mar. 2021.

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HISTÓRIA DA
MATEMÁTICA
Matemáticas
chinesa, hindu
e árabe
Daniele Cristina Thoaldo

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Analisar a matemática desenvolvida na China.


>> Explicar a matemática desenvolvida pelos hindus e árabes.
>> Demonstrar técnicas da matemática chinesa, hindu ou árabe na sala de
aula de matemática.

Introdução
A matemática oriental — chinesa, árabe e hindu — que conhecemos hoje surgiu
em razão do domínio de Roma em toda a Grécia e do fechamento da escola de
Atenas. Isso fez com que muitos filósofos e pensadores fugissem da Grécia e se
aproximassem do Oriente Médio. As ideias do oriente se espalharam rapida-
mente, contribuindo para o desenvolvimento da matemática (ARAGÃO, 2009).
Neste capítulo, você vai estudar as matemáticas chinesa, árabe e hindu e
suas contribuições para a matemática que conhecemos hoje. Vamos começar
pela chinesa, que teve seu início há mais de 3 mil anos, e depois veremos as
hindu e árabe, bases do sistema de numeração que usamos atualmente.
2 Matemáticas chinesa, hindu e árabe

Matemática chinesa
A civilização chinesa é uma das mais antigas do mundo, sendo anterior aos
egípcios e aos babilônicos. Historicamente, é dividida em períodos: China
Antiga (2000 a.C. a 600 a.C.), China Clássica (600 a.C. a 221 d.C.), China Imperial
(221 a 1911) e China Moderna (1911 até hoje). Em qualquer um desses períodos,
sempre foi comum a existência de grandes impérios.
As batalhas e os combates entre entidades políticas eram inevitáveis.
Contudo, sempre foi destacado o interesse pela cultura, principalmente nas
áreas das artes, literatura e filosofia. A matemática ficava de lado e, por isso,
sofreu um atraso (BOYER; MERZBACH, 2018).
Apesar desse atraso e do pouco interesse pela matemática, é possível
encontrar obras matemáticas relevantes, como o livro das permutações, es-
crito por Wog-Wang por volta de 1150 a.C., e Os nove capítulos sobre a arte da
matemática, em que são apresentados 246 problemas de diversas naturezas,
como agricultura, negócios e engenharia (ZANARDINI, 2017). No livro Sun Tzu
Suan Ching (Manual de Aritmética de Sun Tzu, em tradução livre) é possível
encontrar o primeiro problema chinês de análise indeterminada, conhecido
como teorema chinês dos restos:

Certo número desconhecido de coisas, quando dividido por 3,


deixa resto 2. Quando dividido por 5, deixa resto 3.
Quando dividido por 7, deixa resto 2. Qual é o menor número?

No trabalho de Wang Hs’iao-t’ung, encontra-se a primeira equação cúbica


da matemática chinesa. Os antigos chineses resolviam problemas algébricos
com a ajuda de varetas de cálculo, pois não possuíam álgebra literal. Depois
dessas varetas de cálculo, os chineses começaram a utilizar o ábaco (Figura 1).
Enquanto alguns estudiosos atribuem a invenção do ábaco aos chineses,
outros atribuem à cultura mesopotâmica. Entretanto, foram os chineses que
aperfeiçoaram esse instrumento, na dinastia de Sung, e o popularizaram na
dinastia Ming. O ábaco é utilizado até hoje (ARAGÃO, 2009).

No livro I-King, também chamado de livro das permutações e conside-


rado a mais antiga obra chinesa, é encontrado o mais antigo exemplo
de quadrado mágico, que consiste em uma tabela quadrada, com números, em
que a soma de cada coluna, de cada linha e das duas diagonais são iguais.
Matemáticas chinesa, hindu e árabe 3

Figura 1. Ábaco.
Fonte: Cardoso (2014, documento on-line).

Por volta de 1500 a.C., o sistema de numeração utilizado era o decimal.


Como não havia o símbolo zero, deixava-se um espaço vazio na representação
de um número com varetas. Assim, para representar o número 302, utilizavam-
-se três espaços. Em cada espaço, um símbolo com as varetas representava
cada número. O espaço do meio ficava vazio, pois era o zero.

O sistema de numeração chinês era baseado em figuras abstratas,


muito parecido com a forma egípcia. Ao longo do tempo, a simbologia
foi se alterando até chegar na forma que conhecemos hoje. Para saber mais,
assista ao vídeo “Sistema de numeração chinês — Contagem — Exercícios”,
do canal Prof. Marconi Santos (2020), no YouTube.

Os chineses também usavam o triângulo aritmético para determinar as


raízes quadradas, cúbicas, entre outras. Esse triângulo aritmético resolvia os
coeficientes binomiais. No quarto livro de Jiuzhang Suanshu, escrito em torno
de 100 a.C., é ensinado o procedimento para o cálculo de raízes quadradas
e cúbicas.
4 Matemáticas chinesa, hindu e árabe

Com o passar do tempo, houve uma evolução na matemática chinesa. Logo


após o declínio da matemática grega, ela tornou-se uma das mais prósperas e
criativas. Podemos tomar como exemplos a criação do sistema de numeração
decimal posicional e o cálculo com os números negativos, que não existiam
ou, simplesmente, não eram aceitos pelos matemáticos. Outros exemplos são
o valor mais próximo do π e a criação de métodos para encontrar soluções
numéricas de equações algébricas (BOYER; MERZBACH, 2018).
Hoje, o conceito de matrizes é aplicado em muitos métodos utilizados
para se encontrar a solução de sistemas lineares. Tais métodos matriciais já
eram utilizados na matemática chinesa para esse mesmo fim. Eles também
usavam a regra de três, as frações decimais, a regra da falsa posição dupla e
a interpolação. A geometria descritiva que utilizamos hoje foi desenvolvida
pelos chineses (ZANARDINI, 2017). Muitos escritos e trabalhos da matemática
chinesa foram perdidos ao longo tempo, mas sabemos que eles contribuíram
muito para a matemática atual.

No sítio arqueológico de Xiao Dun, em Henan, na China, foram en-


contrados ossos, carapaças e cascos de tartarugas que continham
inscrições que indicavam a presença de um sistema decimal multiplicativo. Eles
tinham símbolos distintos para os dígitos de 1 a 10 e símbolos adicionais para
as potências de 10. Nas formas escritas, os dígitos eram da esquerda para a
direita ou de baixo para cima e multiplicados pelo seu sucessor.

Matemática dos hindus e dos árabes


Nesta seção, apresentaremos como se deu o desenvolvimento da matemática
pelos hindus e pelos árabes. Veremos suas contribuições e algumas das obras
mais importantes da época.

Matemática desenvolvida pelos indianos


Pouco se sabe sobre a matemática da Índia. Assim como aconteceu com a
chinesa, grande parte da produção matemática indiana se perdeu ao longo
do tempo e há falta de registros autênticos. Provavelmente, ela teve seu
início por volta de 2000 a.C. Na época, os registros eram feitos em folhas
Matemáticas chinesa, hindu e árabe 5

de palmeiras. Alguns não estavam escritos em sânscrito, dialeto indo-árico


antigo do norte da Índia, e nem se conhecia a autoria. Tudo isso contribuiu
para a perda dos registros (ARAGÃO, 2009).

A civilização indiana é muito antiga. Escavações arqueológicas em


Mohenjo Daro, no atual Paquistão, mostraram a presença de uma
civilização antiga e muito desenvolvida que viveu durante a época da construção
das pirâmides. Foram encontradas ruínas que mostravam perfeição em enge-
nharia. Contudo, não foram achados documentos escritos que comprovassem
a existência dessa civilização nesse período (ROMÃO, 2013).

Podemos dizer que a contribuição mais marcante da Índia para a mate-


mática foi o sistema de numeração, decimal e posicional, em que se utilizam
nove símbolos e um símbolo especial para o zero. A referência mais antiga ao
sistema de numeração hindu é encontrada em um texto no ano de 662 d.C.,
do bispo sírio Severus Sebokt. Os hindus uniram em seu sistema de numeração
a base decimal, a notação posicional, o uso do zero e uma notação para cada
um dos dez numerais. Todos esses elementos já eram utilizados por outros
povos, mas foram os hindus que usaram todos eles em conjunto. Quando esse
sistema de numeração migrou para o ocidente, houve uma modificação na
forma de desenhar os símbolos feita pelos árabes (MOL, 2013).
Após a invasão ariana, em torno de 1500 a.C., a matemática indiana co-
meçou a evoluir, e problemas mais complexos passaram a ser resolvidos.
Há registros sobre a matemática indiana, que datam do século VI a.C., nos
Sulvasutras, livros religiosos que mostram o uso de cordas em medidas de
altares, conhecido como regra das cordas. O uso de numeração na base dez
já era utilizado nesses livros. O primeiro trabalho astronômico importante,
chamado de O conhecimento do sol, foi escrito em 400 d.C. No século VI,
o astrônomo Varahamihira desenvolveu uma obra que continha elementos
da trigonometria hindu antiga e uma tábua de senos (MOL, 2013).
Dentre os matemáticos hindus mais importantes, podemos destacar
Ariabatiia (autor do livro Ariabatiia, de astronomia), Brahmagupta (autor do
livro de astronomia O sistema Brahma revisado, de 628 d.C.), Mahavira (que
escreveu sobre matemática elementar em torno de 850 d.C.) e Bhaskara (autor
de O diadema de um sistema astronômico, em 1150 d.C.).
6 Matemáticas chinesa, hindu e árabe

Vale ressaltar que muitos atribuem a Bhaskara a descoberta da fórmula


para a solução da equação do segundo grau do tipo ax2 + bx + c = 0, dada por:

Contudo, está errado. Esse processo de resolução da equação do segundo


grau já era conhecido pelo matemático hindu Sridhara pelo menos 100 anos
antes de Bhaskara. Nessa época, não se utilizava fórmulas para a resolução
de problemas. A obra mais importante de Bhaskara foi Lilavati, no qual são
encontrados problemas de aritmética, geometria plana e análise combinatória
(ZANARDINI, 2017).
Como nessa época os hindus já trabalhavam com números inteiros, racio-
nais, negativos e irracionais, sabiam que as equações do segundo grau que
têm raízes reais apresentam duas raízes iguais ou distintas. Essas equações
eram resolvidas usando o método do complemento do quadrado. Eles também
sabiam resolver equações indeterminadas, em que buscavam encontrar todas
as soluções possíveis para os problemas existentes.
Com relação à geometria, baseavam-se na experiência e na observação,
a relacionando a problemas de mensuração. Assim, é possível afirmar que a
geometria hindu era empírica. Os conceitos de trigonometria eram aplicados
à astronomia e, basicamente, tinham mais afinidade com a aritmética do que
com a geometria.

Matemática desenvolvida pelos árabes


As tribos nômades da península arábica foram unificadas pelo profeta Maomé
(570 d.C.–632 d.C.), que fundou um estado baseado na fé islâmica. Seus suces-
sores, os califas, expandiram seus domínios em territórios que se estendiam
da Índia à Península Ibérica, passando pelo Oriente Médio e pelo norte da
África. Em vários países que conquistaram, eles encontraram civilizações
mais avançadas, assimilando a cultura e os padrões intelectuais locais. Com o
tempo, criaram uma civilização com cultura própria. Assim, a ciência passou a
ocupar um lugar de destaque, e as cidades se transformaram em importantes
centros de saber científico (MOL, 2013).
Matemáticas chinesa, hindu e árabe 7

Os árabes incorporaram inúmeros saberes dos gregos e hindus aos


seus trabalhos. Além disso, traduziram para o árabe vários trabalhos
de medicina, astronomia e matemática. Assim, foi possível para intelectuais
europeus traduzirem posteriormente para o latim e outras línguas, o que evitou
perdas que poderiam ter acontecido ao longo da Baixa Idade Média.

A matemática árabe tem como base a matemática da Grécia clássica


e grande influência da matemática do oriente, principalmente da Índia.
Os árabes relacionaram o rigor grego às visões práticas babilônicas e hindus
e, depois, introduziram elementos originais que deram uma nova vida a
matemática (MOL, 2013).
De acordo com (MOL, 2013), o califa Abu Jafar al-Mansur (714‒775), que
construiu a cidade de Bagdá para substituir Damasco como capital da porção
oriental do Império Árabe, era um homem interessado em filosofia e ciência.
Na biblioteca de seu palácio, ele se ocupou de traduzir para o árabe textos
persas, hindus e gregos. A Casa da Sabedoria (Bait al-Hikma), como ficaria
conhecida essa biblioteca, evoluiu para uma instituição de ensino e pesquisa,
sendo um dos mais importantes centros de produção científica entre os
séculos IX e XIII.
Um grande estudioso dessa academia foi o matemático Muhammad ibn
Musa al-Khwarizmi (780‒850), autor de duas obras que influenciaram decisi-
vamente na matemática. A primeira delas é o tratado de aritmética intitulado
Livro da adição e da subtração segundo o cálculo dos indianos. Nele, são
abordados temas como o sistema de numeração decimal posicional hindu e
as operações feitas nesse sistema. O sistema de numeração que utilizamos
hoje são de origem hindu, mas os árabes foram os responsáveis pela sua
divulgação. Muhammad ibn Musa al-Khwarizmi escreveu também O livro da
restauração e do balanceamento, cujo título em árabe é Kitãb al-jabar wa’l
muqabala. Foi a palavra al-jabar do título que deu origem à palavra álgebra.
A palavra algoritmo teve origem em seu próprio nome, al-Khawarizmi.
Um exemplo da álgebra retórica de al-Khwarizmi é:

Um quadrado é igual a cinco raízes. A raiz do quadrado então é 5,


e 25 forma o seu quadrado que, é claro, é igual a 5 de suas raízes.
8 Matemáticas chinesa, hindu e árabe

O texto apresenta a equação x2 = 5 · x e sua raiz x = 5. Ainda, diz que x2 =


25. Outro caso é:

Um quadrado e dez raízes são iguais a 39 unidades.

A frase faz referência à equação x2 + 10x = 39. Al-Khwarizmi também reduziu


as equações de segundo grau a seis tipos canônicos; veja a seguir.

„„ Quadrado igual a uma raiz:

ax2 = bx

„„ Quadrado igual a um número:

ax2 = c

„„ Raiz igual a um número:

bx = c

„„ Quadrado e raiz igual a um número:

ax2 + bx = c

„„ Quadrado e número igual a uma raiz:

ax2 + c = bx

„„ Raiz e número igual a um quadrado:

bx + c = ax2

A obra de al-Kwarizmi teve continuidade no trabalho de Abu-Kamil


(850‒930), matemático de origem egípcia. Seus cálculos algébricos tiveram um
nível elevado de abstração e ele utilizava várias identidades algébricas, como:
Matemáticas chinesa, hindu e árabe 9

A matemática árabe também teve papel importante na astronomia, com


análises matemáticas e geométricas muito relevantes. Por exemplo, a hipó-
tese de que a Terra gira em torno do Sol foi sugerida pelo matemático árabe
Al Biruni cinco séculos antes de Nicolau Copérnico ter feito essa afirmação
(ZANARDINI, 2017).
No século VIII, os árabes passaram a dominar a tecnologia chinesa de
fabricação do papel, supostamente adquirida de prisioneiros de guerra chi-
neses. Em comparação com o pergaminho, o papel era um suporte barato,
leve, resistente e fácil de transportar. Seu uso se espalhou rapidamente e,
em poucas décadas, várias cidades árabes produziam papel. O papel ajudou
na formação e na disseminação de uma cultura da escrita e do livro nas
cidades árabes, que passaram a contar com mercados de livros e grandes
bibliotecas (MOL, 2013).
Muitas das técnicas de resolução de problemas que foram desenvolvidas
pelos hindus e incorporadas pelos árabes foram levadas para a Europa Ociden-
tal. Assim, após algumas modificações e contribuições, temos a matemática
que conhecemos hoje.

Sistema indo-arábico
Um dos maiores passos da história da matemática talvez seja a adoção da
representação de qualquer número usando dez símbolos de 0 a 9. Como vimos,
a origem desse sistema decimal posicional foi na Índia, passando por Bagdá
e chegando ao matemático árabe Al Khwarizmi, que estabeleceu, no século
IX, seu uso e importância. Porém, esse sistema e as técnicas de cálculo só
foram definitivamente admitidos em torno de 1250, após a publicação do livro
Algorismus vulgaris, de Scrobosco, que teve como base Khwarizmi e Fibonacci.
Leonardo de Bonaccio, ou Leonardo de Pisa, ou Fibonacci (1180‒1240),
era filho de mercador e teve a chance de viajar pelos países mediterrâneos a
negócios da família. Sempre se interessou pela ciência e teve a oportunidade
de aprender a calcular pelo sistema indiano em suas viagens pela África
islâmica. Regressando para a Itália, escreveu o livro Liber Abaci, no qual
falou da aritmética e da álgebra que havia conhecido. O livro de Fibonacci e a
tradução latina do sistema indo-arábico foram os grandes responsáveis pela
introdução desse sistema decimal posicional na Europa cristã.
10 Matemáticas chinesa, hindu e árabe

De acordo com Mol (2013), a aceitação do sistema indo-arábico pela popu-


lação foi lenta. No início, os algarismos arábicos na Europa cristã encontraram
forte resistência. Eles não foram aceitos por muitos calculadores medievais,
que acreditavam que os símbolos indo-arábicos eram signos diabólicos, e
os árabes, cúmplices de Satanás. Além disso, a Igreja Católica não aceitava
a superioridade de elementos vindos de outras culturas. Os números roma-
nos e os cálculos com ábacos continuaram a ser usados por vários séculos.
Foi em torno do século XIV que o sistema indo-arábico começou a ser utilizado
como na atualidade (ARAGÃO, 2009).

Técnica para a sala de aula de matemática


A matemática é uma ciência em constante evolução. É possível notar a sua
importância e o seu desenvolvimento em cada período da história, o que ajuda
a construir uma aprendizagem mais sólida. Muitos professores da educação
básica utilizam a história da matemática para sustentar uma ou outra teoria.
Nesta seção, será apresentada uma técnica chinesa para a multiplicação que
pode ser usada em sala de aula.
Na China Antiga, usavam-se varetas para resolver problemas e representar
números. Assim, o número 143 era representado por uma vareta na primeira
posição, quatro varetas na segunda posição e três varetas na terceira posição,
alinhadas na horizontal, da esquerda para a direita, conforme a Figura 2.

1 4 3

Figura 2. Representação horizontal


do número 143.
Matemáticas chinesa, hindu e árabe 11

Também podemos representar o mesmo número alinhando as varetas na


vertical, de cima para baixo, conforme a Figura 3.

Figura 3. Representação
vertical do número 143.

Para multiplicar dois números quaisquer, os chineses colocavam as varetas


sobrepostas, nas posições horizontal e vertical, representando o multiplicador
e o multiplicando. Tomemos como exemplo a multiplicação de dois números:
12 × 13. Assim, as varetas ficavam como na Figura 4.

1 2 1 2
1 1

3 3

Figura 4. Representação dos números 12 e 13 e do produto


12 × 13.
12 Matemáticas chinesa, hindu e árabe

Agora, conforme a Figura 5, determinamos os pontos de interseção entre


as varetas, seguindo as diagonais, começando da direita para a esquerda.

1 2

6 pontos de interseção

Figura 5. Interseção entre as varetas


na primeira diagonal.

Observe que temos 6 pontos de interseção entre as varetas em relação a


essa diagonal. Então, traçamos a segunda diagonal e contamos o número de
interseções entre as varetas. Veja a Figura 6.

1 2

3
6 pontos de interseção
5 pontos de interseção

Figura 6. Interseção entre as varetas na


segunda diagonal.

Assim, contamos 5 pontos de interseção entre as varetas em relação à


segunda diagonal. Agora, traçamos a terceira diagonal, como na Figura 7.
Matemáticas chinesa, hindu e árabe 13

3
6 pontos de interseção
5 pontos de interseção
1 ponto de interseção

Figura 7. Interseção entre as varetas na terceira


diagonal.

Temos apenas 1 ponto de interseção entre as varetas em relação à terceira


diagonal.
Se em cada contagem um conjunto de pontos atingir ou ultrapassar a con-
tagem das dezenas, o algarismo das dezenas deve ser adicionado à contagem
dos pontos da diagonal imediatamente a sua esquerda. O valor da multipli-
cação é dado pelo número que se obtém ao final de todas as contagens, lido
da esquerda para a direita. Nesse exemplo, os números que obtivemos entre
os cruzamentos das varetas, da esquerda para a direita, foram 1, 5 e 6. Como
nenhum deles ultrapassa a contagem da dezena, o resultado do produto é 156.
Faremos outro exemplo: 325 × 346. Veja, na Figura 8, como fica a repre-
sentação com varetas.

3 2 5

Figura 8. Representação do pro-


duto 325 × 346 por meio de varetas.
14 Matemáticas chinesa, hindu e árabe

Como fizemos antes, agora devemos traçar as diagonais e contar o número


de interseções entre as varetas, conforme a Figura 9.

3 2 5

9 4

18 6

41
32 30

Figura 9. Número de interseções entre


as varetas.

Os números encontrados, da esquerda para a direita, foram:

9  18  41  32  30

O número de interseção entre as varetas na primeira diagonal é 30. Como


o valor é maior que uma dezena, o algarismo da dezena é adicionado ao
número de interseções da diagonal à esquerda:

9  18  41  32 + 3  0
9   18   41 35 0

O número da segunda diagonal (35) também é maior que uma dezena, então
repetimos o processo, ou seja, tiramos o algarismo da dezena e adicionamos
ao número da próxima diagonal à esquerda:

9 18 41 + 3 5 0
9 18 44 5 0
Matemáticas chinesa, hindu e árabe 15

O número da terceira diagonal (44) também é maior que uma dezena,


então fazemos o mesmo:

9 18 + 4 4 5 0
9 22 4 5 0

O número da quarta diagonal (22) é igualmente maior que uma dezena,


então repetimos o processo:

9+2 2 4 5 0
11 2 4 5 0

Por último, o número da quinta diagonal (11) também é maior que uma
dezena, então mais uma vez tiramos o algarismo da dezena e adicionamos
ao número da próxima diagonal à esquerda:

0+1 1 2 4 5 0
1 1 2 4 5 0

Desta forma, o valor do produto é obtido com a sequência de números


encontrado 112450, ou seja:

325 × 346 = 112450

Com essa técnica, os alunos da educação básica conseguirão resolver


multiplicações com números pequenos ou grandes sem muita dificuldade,
pois ela consiste basicamente em contar os números de interseções das
varetas. Com o passar do tempo e com algum treino, o aluno vai perceber
que essa técnica possui aspectos que se assemelham muito à multiplicação
que usamos normalmente.

Referências
ARAGÃO, M. J. História da matemática. Rio de Janeiro: Interciência, 2009.
BOYER, C. B.; MERZBACH, U. C. História da matemática. São Paulo: Blucher, 2018.
CARDOSO, M. Ábaco. 2014. Disponível em: https://www.trabalhosescolares.net/abaco/.
Acesso em: 17 fev. 2021.
MOL, R. S. Introdução a história da matemática. Belo Horizonte: CAED/UFMG, 2013.
ZANARDINI, R. A. D. Um breve olhar sobre a história da matemática. Curitiba: InterSa-
beres, 2017.
16 Matemáticas chinesa, hindu e árabe

Leituras recomendadas
ROMÃO, F. Matemática védica no ensino das quatro operações. 2013. 145 f. Dissertação
(Mestrado em Ensino de Ciências Naturais e Matemática) — Universidade Federal do
Rio Grande do Norte, Natal, 2013. Disponível em: https://repositorio.ufrn.br/bits-
tream/123456789/16092/1/FreudR_DISSERT.pdf. Acesso em: 17 fev. 2021.
SANTOS, M. Sistema de numeração chinês: contagem, exercícios. [S. l.: s. n.], 2020.
1 vídeo (29 min). Publicado pelo canal Prof. Marconi Santos. Disponível em: https://
www.youtube.com/watch?v=qtpj7PhII7Y. Acesso em: 17 fev. 2021.

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HISTÓRIA DA
MATEMÁTICA
Matemática na
Idade Média e no
Renascimento
Maria Elenice dos Santos

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Descrever a matemática desenvolvida na Idade Média.


>> Explicar a matemática desenvolvida no Renascimento.
>> Demonstrar técnicas da matemática da Idade Média ou do Renascimento
na sala de aula de matemática.

Introdução
Ao longo da história, o homem sempre buscou formas de simplificar suas tarefas
diárias, utilizando diversos meios para isso. Muitas ciências, portanto, têm a
incumbência de facilitar grande parte das atividades cotidianas do homem em
sociedade, como as ciências físicas e matemáticas. A necessidade de contar per-
mitiu ao homem uma evolução na matemática, que vem aprimorando essa técnica
e criando outras formas de utilizar conceitos matemáticos aplicados a situações
do dia a dia. Assim, a história da matemática é permeada de situações nas quais
conceitos matemáticos foram descobertos e aperfeiçoados no sentido de satis-
fazer às necessidades do homem, seja na Idade Média ou em tempos modernos.
2 Matemática na Idade Média e no Renascimento

Neste capítulo, explicaremos como se deu o desenvolvimento da matemática


durante a Idade Média e na época do Renascimento. A história da matemática é
dividida em fases devido a fatos históricos. Aqui, veremos que essa história sofreu
grande influência de cinco povos (egípcios, gregos, chineses, hindus e árabes),
os quais, muitas vezes, discutiram os mesmos conceitos matemáticos de formas
diferentes, produzindo avanços na forma de se pensar a matemática.

Desenvolvimento da matemática
na Idade Média
Atualmente, as ideias no campo da matemática encontram-se bastante evolu-
ídas e amparadas por altas tecnologias; porém, suas origens estão baseadas
em ideais e noções primitivas, relacionadas aos conceitos de número, de
grandeza e de forma. A história da matemática constitui uma área de estudo
capaz de explorar as diversas práticas matemáticas existentes ao longo da
história, desde suas origens, passando pela Idade Média e pelo Renascimento,
até chegar à matemática moderna (ARAGÃO, 2009). Nesse caminhar, muitas
descobertas foram realizadas e grandes nomes fizeram história nesse setor da
ciência, que, sem dúvidas, trata-se de um dos mais importantes e de grande
contribuição para o avanço científico (BOYER; MERZBACH, 1996).
Do ponto de vista histórico, a Idade Média é delimitada com base em mar-
cos históricos bem definidos, pois teve seu início a partir da queda de Roma,
no ano de 476, e seu término ligado à queda de Constantinopla, no ano de
1436 (BOYER; MERZBACH, 1996). Essa foi uma época da história rica em acon-
tecimentos marcantes da história humana, mas, na história da Matemática,
não houve um grande desenvolvimento de conceitos e de ideias como ocorreu
mais adiante, na época do Renascimento, por exemplo (ARAGÃO, 2009). Ainda
assim, alguns matemáticos e cientistas famosos da época fizeram história
e grandes contribuições para o desenvolvimento de conceitos e teorias da
matemática (MEDINA, 2013). Ressalta-se, aqui, que os grandes acontecimentos
da história ligados à matemática ocorreram na Europa, mas, ainda assim,
muitos historiadores fazem menção ao desenvolvimento matemático da Era
Medieval, relatando a contribuição dos povos chineses, hindus e árabes, além
dos europeus (BOYER; MERZBACH, 1996).
Matemática na Idade Média e no Renascimento 3

A matemática da Idade Média dividida entre


dois povos: Bizantinos e Romanos
Com destaque na Europa, cita-se a contribuição na história da matemática
de dois povos: os Bizantinos, cuja língua oficial era o grego, e os Romanos,
cuja língua oficial era o latim. O desenvolvimento da matemática com base
nos conhecimentos do povo Bizantino promoveu uma busca dos conceitos
relacionados à matemática da época dos gregos, resgatando muitas das
teorias que a impulsionaram nessa época (BOYER; MERZBACH, 1996).
O desenvolvimento da matemática na Idade Média pelo povo Bizantino
foi inspirado em muitos matemáticos de tempos passados. Dos povos que
fizeram história, podem ser citados Eutócio, Simplício, Isidoro de Mileto, An-
têmio de Tales, John Filoponus, etc. (BOYER; MERZBACH, 1996; MEDINA, 2013).
Filoponus, sobretudo, fez grandes contribuições à evolução da matemática
por questionar as Leis aristotélicas do movimento e a probabilidade da não
existência do vácuo. Além disso, como contribuição para a ciência, não para
a matemática, especificamente, Filoponus construiu a ideia do princípio da
inércia, afirmando que corpos em movimento continuariam em movimento
(ARAGÃO, 2009). Filoponus também teve trabalhos de matemática aplicada,
sendo que uma de suas obras cita a aplicação da matemática no desen-
volvimento de um astrolábio (BOYER; MERZBACH, 1996). A maioria de seus
desenvolvimentos na matemática era com base na matemática elementar.

Destaca-se que, na época do Império Bizantino, esforços dos cien-


tistas e matemáticos eram empreendidos no intuito de preservar ao
máximo tudo o que já havia sido descoberto e estudado na Antiguidade, usando
conceitos e teorias preexistentes como base para desenvolvimentos futuros da
matemática (MEDINA, 2013).

Na mesma linha de atuação de Filoponus, o matemático Georgios Pachy-


meres também desenvolveu a matemática e procurou preservar os conceitos
da Antiguidade, dando continuidade ao progresso na área com o cuidado de
manter conceitos antigos e fundamentais (BOYER; MERZBACH, 1996). Pachy-
meres atuou na aritmética, assim como o matemático Maxymos Planudes,
que escreveu sobre o tema numeração. Ambos também estudaram grandes
matemáticos da Antiguidade e comentaram obras de grande relevância, como
o livro Aritmética, de Diofante (BOYER; MERZBACH, 1996).
4 Matemática na Idade Média e no Renascimento

Além das muitas produções no campo da matemática, a Idade das Trevas


(como também é chamada a Idade Média), produziu uma grande gama de
materiais traduzidos de outras épocas; daí o fato de essa época ser retratada
na história como “O século da tradução” (BOYER; MERZBACH, 1996). Falando
especificamente da história da matemática, muitas obras da área foram
traduzidas e disseminadas para diversas partes do mundo, sendo que o livro
Elementos, de Euclides, foi um dos primeiros a serem traduzidos, seguido de
outros livros das mais diversas áreas e de igual notoriedade (MEDINA, 2013).
Retratando-se a história com base em seu desenvolvimento por parte
dos romanos, na época da Idade Média, já havia uma linha de divisão entre
os cientistas e matemáticos de cunho religiosos e aqueles vinculados às
universidades (ARAGÃO, 2009). A história retrata uma série de desavenças e
rivalidades entre as duas classes, o que acabou por prejudicar o desenvolvi-
mento de alguns conceitos e teorias da matemática. No entanto, ainda assim,
muitos avanços ocorreram. Destacam-se, nessa época, alguns matemáticos
conhecidos, sendo que um dos nomes de referência era Leonardo de Pisa,
mais conhecido como Fibonacci (BOYER; MERZBACH, 1996).
Da época da Idade Média, Fibonacci foi um dos matemáticos mais conheci-
dos e renomados. Além de ser famoso pela criação da “sequência de Fibonacci”,
sua obra Liber Abaci também é famosa na história, retratando métodos e
problemas algébricos e utilizando numerais indo-arábicos (ARAGÃO, 2009).
A referida obra é bem contextualizada com a época e sua linguagem bem
adaptada aos conceitos desenvolvidos até então, não sendo, por exemplo,
uma obra a ser discutida na época moderna, por exemplo (BOYER; MERZBACH,
1996). A sequência de Fibonacci, quando criada, trouxe notório avanço e grande
estímulo à matemática, pois Fibonacci a demonstrou geométrica e algebrica-
mente, provando ser essa uma relação entre números, cujo número seguinte
se tratava da soma de dois outros anteriores, e que sua versão geométrica
constituía uma forma espiralada, representando os valores da série elevados
ao quadrado (MEDINA, 2013; BOYER; MERZBACH, 1996).

Dos muitos problemas apresentados no livro Liber Abaci, de Leo-


nardo Fibonacci, os problemas envolvendo o desenvolvimento de
sequências é um dos mais famosos, pois são capazes de apresentar e definir
sequências numéricas, procurando relacionar com situações-problema de apli-
cações práticas, definir sequências crescentes e apresentar propriedades e
teoremas sobre sequências numéricas.
Matemática na Idade Média e no Renascimento 5

A problemática a ser solucionada é intitulada “sucessão de Fibonacci” e


embasa-se na seguinte situação: um homem colocou um par de coelhos (um
macho e uma fêmea) em um local cercado por muros. Sabendo-se que o casal de
animais deverá copular, deseja-se conhecer quantos pares de coelhos poderão
ser gerados a partir desse par no intervalo de um ano se, supostamente, todo
mês cada par dará à luz a um novo par, os quais serão sempre férteis a partir
do segundo mês.

Resolução: a solução desse problema deverá levar em consideração a forma como


os animais se desenvolvem e os intervalos de tempo a partir dos quais estarão
prontos para procriar. Conforme relatou o enunciado, devemos considerar o
coelho pronto para procriação após dois meses de seu nascimento.
Para melhor visualizar a questão e utilizar as ideias de Fibonacci para solu-
cionar o problema da sucessão de Fibonacci, veja a Figura 1.

Figura 1. Distribuição de coelhos que se desenvolvem a partir da


sucessão de Fibonacci.
Fonte: Adaptada de Universidade de Lisboa ([20--?]).

Para melhor explicar a distribuição de coelhos, pode-se fazê-los com base


na sequência de Fibonacci, dada como:

0 1 1 2 3 5 8 13 21 34 55 89 144 ....

Ao comparamos as informações da sequência de Fibonacci com as informações


mostradas na Figura 1, vemos que a distribuição da série é satisfeita. Assim, ao
utilizarmos o conceito de que a soma de dois números anteriores corresponde
ao valor seguinte, considerando-se o intervalo de dois meses após o nascimento,
o número de coelhos no 12º mês será de 144, como aparece na série.
6 Matemática na Idade Média e no Renascimento

Nesta seção, vimos que a Idade Média um período de grande importância


na história, valorizando as obras da matemática e resgatando conceitos já
desenvolvidos na Antiguidade. Embora, do ponto de vista histórico, tenha
sido uma época de grandes desafios e pouca produção de ciência e de co-
nhecimento, muitos trabalhos desse período tiveram grande notoriedade e
foram fundamentais para o progresso que observado mais adiante, na época
do Renascimento e em épocas futuras. Aqui, vimos a relevância de grandes
nomes da época, como Leonardo Fibonacci, Filoponus e muitos outros, que
nem sempre são citados diretamente, mas que fizeram importantes contri-
buições para o avanço da história da matemática.

Desenvolvimento da matemática
no Renascimento
O período que compreendeu o Renascimento iniciou-se no final do século
XIII, indo até meados do século XVII (BOYER; MERZBACH, 1996). Esse foi um
período de descobertas e de valorização da cultura da Antiguidade Clássica,
uma vez que essas produziram mudanças na direção de um ideal humanista
e naturalista (EVES, 2004).
Diferentemente do que se passou na Idade Média, no Renascimento,
o enfoque para a matemática se deu de forma mais aplicada, considerando-se
os avanços da época. De forma gradativa, percebeu-se um aumento no número
de trabalhos matemáticos por volta do século XV (EVES, 2004). O período do
Renascimento trouxe alguns marcos importantes da história, como a queda
de Constantinopla, um grande tumulto acerca das grandes navegações e a
possibilidade de difusão de grandes obras, uma vez que se tornou possível
imprimi-las (BOYER; MERZBACH, 1996).

Desenvolvimento da matemática no Humanismo


A queda de Constantinopla foi um marco cronológico na história e no mundo
da política (BOYER; MERZBACH, 1996). Ao longo da história, existem relatos
de manuscritos que desapareceram, causando perda de parte da história
da matemática, especificamente alguns tratados gregos (EVES, 2004). Além
disso, na Europa Ocidental e por volta de 1447, relatou-se a experiência de
ter o primeiro livro totalmente impresso, o que ocasionou um aumento sig-
nificativo de obras circulando, sendo que muitas eram obras da matemática
(BOYER; MERZBACH, 1996). Ressalta-se, aqui, uma das características fortes
Matemática na Idade Média e no Renascimento 7

da matemática na época do Renascimento: utilizar conceitos da área para


produzir uma matemática mais aplicada a campos como arte, mecânica,
cartografia, óptica, contabilidade, etc. (EVES, 204).

Um dos fatores interessantes dessa época é que, apesar de haver


crescimento em diversas áreas, com um forte movimento voltado
para a arte e a ciência antiga, o desenvolvimento científico acabou encontrando
grande resistência por parte da Igreja Católica, o que visivelmente atrasou o
progresso dos conceitos da matemática em diversos setores da sociedade (EVES,
2004; BOYER; MERZBACH, 1996). A história ressalta que muitas teorias não foram
publicadas, uma vez que os cientistas e estudiosos temiam sofrer penalidades
por parte dos membros de destaque da Igreja. Na época que o Renascimento
apareceu, a Igreja Católica era mentora do desenvolvimento do saber (BOYER;
MERZBACH, 1996).

O desenvolvimento da matemática, durante o Renascimento, contribuiu


muito para o movimento renascentista, pois as ideias inovadoras de teorias
matemáticas favoreceram a rejeição ao misticismo medieval. A isso, soma-
-se o acesso à educação de muitas pessoas que não estavam diretamente
envolvidas com a matemática, devido à criação de muitas universidades
(BOYER; MERZBACH, 1996; EVES, 2004). Com esse grande leque de variedades,
de ideias diferentes daquelas pregadas pela Igreja, a perspectiva de que se
tornara necessário conhecer os fatos existentes começou a ganhar força.
É sabido que o Renascimento teve início na Itália, a partir da queda de
Constantinopla. Nesse processo, muitos escritos pertencentes à Grécia re-
tornaram a seu berço (BOYER; MERZBACH, 1996). O Renascimento é tido como
o começo do racionalismo do homem, e muitos filósofos e estudiosos mate-
máticos de renome podem ser citados nessa época de evolução da história
da matemática (EVES, 2004).
Um dos matemáticos mais conhecidos da referida época foi Johann Müller,
também conhecido como Regiomontanus. Sua obra máxima, intitulada de
Triangulis omnimodis, trata-se de uma exposição sistemática dos métodos
utilizados para solucionar problemas envolvendo triângulos (EVES, 2004).
Essa foi uma época marcante na história da matemática, visto o fato de que
a álgebra e a trigonometria se desenvolveram bastante. Além de Regiomon-
tanus, o matemático Luca di Borgo, também conhecido como Luca Pacioli,
fez sua contribuição à história, produzindo a obra Summa de arithmetica,
8 Matemática na Idade Média e no Renascimento

geometrica, proportioni et proportionalita, rica em um desenvolvimento


matemático mais rebuscado (BOYER; MERZBACH, 1996). Tratou-se, de fato,
de um trabalho notável nas áreas da aritmética, da álgebra, da geometria
euclidiana elementar e da contabilidade.
Além dos referidos nomes, existem outros de igual importância, como o de
Nicolau Copérnico e o de Leonardo da Vinci, um matemático da Renascença
que se envolveu na teoria da perspectiva (EVES, 2004).
No desenvolvimento da história da matemática no Renascimento, Nico-
lau Copérnico foi um renomado matemático e astrônomo polonês (pai da
astronomia moderna), responsável pela ideia do heliocentrismo (STEWART,
2014; BOYER; MERZBACH, 1996). Uma vez que já existiam universidades para
lecionar matemática na época, Copérnico foi um dos que ingressaram em
uma universidade para aprender medicina, direito, astronomia e matemática.
Ao longo de sua vida, realizou observações feitas por instrumentos de sua
própria confecção, utilizando conceitos matemáticos para isso (EVES, 204).
Copérnico, por seu brilhantismo na astronomia, escreveu um livro intitulado
Pequeno comentário sobre as hipóteses de constituição do movimento celeste.
As teorias de Copérnico foram fundamentais para os estudos de cientistas
como Johannes Kepler e Galileu Galilei (BOYER; MERZBACH, 1996).
Já Leonardo da Vinci, outro nome de grande notoriedade na história,
fez grandes contribuições à área da matemática. Portador de um olhar de
pesquisador incansável e com grande talento para a experimentação, muito
pouco se conhece de sua vida profissional, mas seus feitos, no século XV,
revolucionaram a história da matemática (EVES, 204). Além de seu talento
para a matemática, os feitos de Leonardo da Vinci também são conhecidos
na arte, devida a suas pinturas (BOYER; MERZBACH, 1996). Embora não tenha
frequentado a universidade, da Vinci teve grande êxito em áreas como geologia,
botânica, anatomia, astronomia, matemática, hidráulica, engenharia, música,
poesia, pintura e arquitetura. Seu interesse era vasto, deixando mais de 6 mil
páginas contendo escritos de suas áreas de interesse, sendo a matemática
uma delas (STEWART, 2014).
Leonardo da Vinci sempre mostrou grande apreço pelo desenvolvimento
da matemática na época dos gregos, tanto que, em seus apontamentos,
foram encontrados os dizeres: “Que não entre ninguém que seja um laico
em geometria”. Tal escrito se encontrava à porta da academia fundada por
Platão. Isso deixa clara a importância que o tema possuía na vida de Leonardo
da Vinci, sendo a matemática estruturante em muitas das áreas em que ele
desenvolveu seus conhecimentos (EVES, 2004).
Matemática na Idade Média e no Renascimento 9

Um dos pontos de discussão que coube a Leonardo da Vinci foi a divisão


áurea, muito conhecida e já utilizada na Grécia Antiga. Uma representação
de divisão áurea pode ser observada na Figura 2. Trata-se de uma fórmula
matemática que, ao dividir o espaço, tem o poder de dividi-lo em formas
agradáveis aos olhos, respeitando-se medidas numéricas preestabelecidas
(STEWART, 2014). Existem muitos objetos no mundo que obedecem a tal divisão,
mostrando harmonia em sua representação (EVES, 2004). Um dos exemplos
mais notáveis de uso da matemática pode ser visto na pintura A Monalisa,
de da Vinci, que usou a matemática e a influência luminosa para dar uma
perspectiva aérea na referida pintura.

Figura 2. Representação da divisão áurea


na figura geométrica de um triângulo.
Fonte: Secretaria da Educação de São Paulo
([20--?], documento on-line).

Após a época do Renascimento, a história da matemática contou com uma


transformação até adentrar a matemática moderna, que utilizou conceitos
mais atuais para produzir uma matemática mais aplicada aos problemas
diários do homem.
10 Matemática na Idade Média e no Renascimento

Nesta seção, vimos os avanços realizados no período do Renascimento.


Sobretudo, vimos que muitos dos conceitos matemáticos aqui relatados são
oriundos da Era Medieval e foram aprimorados no período do Renascimento.
Além disso, explicamos que a história da matemática esbarrou em entraves,
como desavenças com a Igreja Católica e a perda de documentos que teriam
sido fundamentais para seu avanço. A seguir, veremos quais técnicas da
matemática relativas à Idade Média e ao Renascimento são utilizadas até
hoje em sala de aula.

A matemática no Renascimento:
técnicas de uso em sala de aula
Após o grande desenvolvimento da matemática na Idade Média, alguns fatos
históricos e políticos intimidaram o processo de criação de teorias e conceitos
matemáticos. Somente na época do Renascimento, datado do fim do século
XIII até meados do século XVII, é que houve uma mudança no pensamento,
pautada em ideias humanistas e naturalistas, permitindo que o desenvolvi-
mento da matemática tomasse novos rumos e continuasse a mostrar grandes
avanços, mas de forma aplicada aos avanços da época (SMOLE; MUNIZ, 2013;
EVES, 2004). Durante o período do Renascimento, houve um sensível aumento
da produção de trabalhos matemáticos de grande relevância até os dias de
hoje, e o desafio, atualmente, é transpor, para o ensino, toda a produção
de ideias e de conceitos advindos não só da época do Renascimento, mas
também de outras épocas (BOYER; MERZBACH, 1996).
Após a queda de Constantinopla, um marco histórico importante, a ma-
temática aplicada passou a ser empregada em áreas como artes, mecânica,
cartografia, contabilidade, ótica, etc. Alguns exemplos incluem (POSAMENTIER;
KRULIK, 2014; EVES, 2004):

„„ a resolução de equações cúbicas e quadráticas, de Lodovico Ferrari


e Niccolò Tartaglia;
„„ o uso de medidas, de Nicholas de Cusa;
„„ noções fundamentais na resolução de triângulos, além da aplicação
da álgebra à geometria, de Regiomontanus;
„„ as publicações no campo da álgebra, de Lucca Pacioli;
„„ estudos de aritmética, álgebra e geometria, de Leonardo da Vinci;
„„ estudos de aritmética e soluções algébricas, como as cúbicas irredu-
tíveis e números complexos, de Cardano;
Matemática na Idade Média e no Renascimento 11

„„ soluções da equação quártica, de Luigi Ferrari;


„„ estudos de trigonometria, de Nicolau Copérnico;
„„ o conceito de números imaginários, de Bombelli.

As formas de ensino da matemática em sala de aula


A matemática como ciência a ser ensinada em sala de aula pode ter duas
divisões bem estabelecidas (BOYER; MERZBACH, 1996):

1. o ensino do desenvolvimento do raciocínio matemático;


2. o ensino da história da matemática em uma linha do tempo.

Ambos podem ser desenvolvidos nos vários níveis de aprendizado (en-


sino fundamental, médio e nível superior); porém, um aprofundamento dos
conhecimentos da história da matemática ocorre especificamente em cursos
de nível superior, quando se trata das correntes filosóficas da matemática
(perspectiva e história), da cultura matemática, dos fundamentos da mate-
mática, da forma como a matemática é apresentada, do papel da matemática
em todas as etapas da história, etc. (POSAMENTIER; KRULIK, 2014).
Especificamente, o ensino da matemática até a época do Renascimento
pode englobar as origens primitivas da matemática, os conceitos matemáticos
no Egito, na Mesopotâmia e na Jônia, a escola pitagórica, a Idade Heroica,
a idade de Platão e Aristóteles, os conceitos matemáticos na época de Euclides
de Alexandria e Arquimedes, o ressurgimento e o declínio da matemática
grega, a matemática na visão dos chineses, dos hindus e dos árabes, e a
matemática na Europa na Idade Média e durante o Renascimento (EVES, 2004).

Práticas pedagógicas do ensino da matemática


do Renascimento em sala de aula
Uma das formas de integrar o aluno com os conceitos da matemática é utilizar a
história da matemática em sala de aula, no processo de ensino-aprendizagem,
contextualizando o aluno a cada conceito matemático apresentado. Uma das
vertentes de uso da história da matemática em sala de aula é usá-la para
promover atividades de integração da matemática com as demais discipli-
nas, como por exemplo, uma interdisciplinaridade entre as disciplinas de
matemática e história (SMOLE; MUNIZ, 2013).
12 Matemática na Idade Média e no Renascimento

Uma prática pedagógica que pode exemplificar essa situação é a contex-


tualização da matemática ao longo da história (POSAMENTIER; KRULIK, 2014).
Como exemplo, toma-se a época do Renascimento, utilizando conceitos ma-
temáticos importantes ocorridos nesse período e mostrando sua importância
no âmbito da história. Essa é uma prática que visa ao crescimento intelectual
e cultural do aluno (SMOLE; MUNIZ, 2013). Estudar a história da matemática
proporciona, ao aluno, uma visão mais ampla e contextualizada, mostrando
a relevância de cada conceito matemático na evolução dos tempos e quais
foram seus impactos na ciência na época de seu surgimento e nos dias atuais.
Ao estudar as correntes científicas que influenciaram a época do Renasci-
mento, a matemática é um dos temas de destaque (BOYER; MERZBACH, 1996).
Para exemplificar uma situação didática em que se utilize uma abordagem
histórica, veremos os impactos das ideias de um matemático de renome do
Renascimento, Nicolau Copérnico, ao apresentar ao mundo suas ideias sobre
trigonometria (BOYER; MERZBACH, 1996). A trigonometria consiste no estudo
das relações que existem entre os lados e os ângulos de figuras geométricas
como os triângulos. A abrangência de sua aplicação permitiu um avanço na
compreensão de conceitos matemáticos: Copérnico promoveu grande evolução
da trigonometria ao aplicá-la ao estudo das órbitas celestes (POSAMENTIER;
KRULIK, 2014).
Nesse exemplo, o papel da história da matemática é fundamental.
As ideias sobre a disposição dos astros no céu foi um estudo envolvendo
muitos conflitos entre cientistas e religiosos, de forma que história da ma-
temática ajuda o aluno a contextualizar melhor o assunto, pois explica as
circunstâncias por trás da teoria (BOYER; MERZBACH, 1996). Portanto, o estudo
se baseia tanto em informações históricas quanto em informações do ponto
de vista da matemática, na construção das ideias de trigonometria de Nicolau
Copérnico, que possibilitou comprovar a disposição dos astros celestes e
produzir avanços no pensamento da época.
A época do Renascimento foi, de fato, enriquecedora na produção de
ideais que revolucionaram a história da matemática, sendo Copérnico ape-
nas um dos muitos matemáticos que contribuíram para o avanço da ciência
matemática (EVES, 2004). A história da matemática como ferramenta didática
dá suporte à disseminação das teorias e das ideias da matemática e permite
a contextualização dessa rica produção de ideias ao longo da história da
humanidade (BOYER; MERZBACH, 1996).
Matemática na Idade Média e no Renascimento 13

Ao longo da história, os conhecimentos matemáticos foram sendo


cada vez mais aprofundados e, por consequência, houve uma evolução
dos conceitos da área. Na época da Idade Média, esses conceitos evoluíram muito,
permitindo que, durante Renascimento, um aprofundamento deles ocorresse,
além da criação de novos conceitos matemáticos. Com base na história da ma-
temática durante o período do Renascimento, cite dois conceitos fundamentais
que foram criados nessa época.

Resolução: no período do Renascimento, também chamado de Humanismo,


muitos conceitos matemáticos foram desenvolvidos e aprimorados, muitos
deles oriundos da Era Medieval. Ressaltam-se, aqui, dois conceitos de grande
notoriedade: a criação da geometria analítica, pelo matemático René Descartes,
em meados do século XVII, e a criação dos logaritmos, por John Napier, datada
da mesma época.

Neste capítulo, fizemos uma descrição da história da matemática com


base na época histórica da Idade Média e do Renascimento, apontando os
fatos relevantes na matemática e contextualizando-os com a época histórica.
Além disso, foram descritas as principais ideias de grandes matemáticos e
cientistas que impactaram a história e que até hoje fomentam avanços na
área. Por fim, demonstramos como aplicar o conhecimento matemático da
época do Renascimento em sala de aula utilizando conceitos-chave do período
e contextualizando-os segundo a perspectiva histórica como uma forma de
produzir a interdisciplinaridade da matemática com outras disciplinas.

Referências
ARAGÃO, M. J. História da matemática. Rio de Janeiro: Interciência, 2009.
BOYER, C. B.; MERZBACH, U. C. História da matemática. 2. ed. São Paulo: Blucher, 1996.
EVES, H. W. Introdução à história da matemática. Campinas: Unicamp, 2004.
MEDINA, M. B. Os grandes matemáticos. São Paulo: MBOOKS. 2013.
POSAMENTIER, A. S.; KRULIK, S. A arte de motivar os estudantes do ensino médio para
a matemática. Porto Alegre: AMGH, 2014.
SECRETARIA DA EDUCAÇÃO DE SÃO PAULO. Grandezas e medidas: triângulo áureo.
[20--?]. Disponível em: http://www.matematica.seed.pr.gov.br/modules/galeria/uplo
ads/4/943triaguloaureo.3.jpg. Acesso em: 15 fev. 2021.
SMOLE, K. S.; MUNIZ, C. A. A matemática em sala de aula: reflexões e propostas para
os anos iniciais do ensino fundamental. Porto Alegre: Penso, 2013.
14 Matemática na Idade Média e no Renascimento

STEWART, I. Os maiores problemas matemáticos de todos os tempos. Rio de Janeiro:


Zahar, 2014.
UNIVERSIDADE DE LISBOA. Sucessão de Fibonacci. [20--?]). Disponível em: http://www.
educ.fc.ul.pt/icm/icm99/icm41/suc-fib.htm. Acesso em: 15 fev. 2021.

Leitura recomendada
MENDES, M. J. F. Possibilidades de exploração da história da ciência na formação do
professor de matemática: mobilizando saberes a partir da obra de Nicolau Copérnico
“De Revolutionibus Orbium Coelestium”. 2010. 193 f. Tese (Doutorado em Educação)
— Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010.

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HISTÓRIA DA
MATEMÁTICA
Matemática nos
séculos XV e XVI
Maria Elenice dos Santos

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Descrever o prelúdio à matemática moderna.


>> Explicar a matemática desenvolvida no início da Idade Moderna.
>> Demonstrar técnicas da matemática dos séculos XV e XVI na sala de aula
de matemática.

Introdução
A história da matemática possui algumas subdivisões que retratam todo seu
desenvolvimento ao longo da história. É notório que, ao longo dos tempos,
as teorias e os conceitos fundamentais vêm sendo aprimorados, e muito do que
se conhece hoje já foi vastamente estudado, tendo a contribuição de muitos
pensadores e matemáticos de renome. A Idade Moderna constitui uma fase rica na
evolução de conceitos, teorias e teoremas da matemática, tendo sido representada
por grandes gênios da história da matemática.
Neste capítulo, você verá quais foram os matemáticos que contribuíram para o
avanço da matemática, muitas vezes resgatando conceitos e teorias da antiguidade
e promovendo, a partir destes, novas formas de pensamento e novas soluções
para problemas enfrentados nesta época.
2 Matemática nos séculos XV e XVI

Prelúdio à matemática moderna


Anterior à Idade Moderna descreve-se o prelúdio à matemática moderna,
uma época marcada por transições entre o Renascimento e a Idade Moderna,
no seu auge. Neste intervalo e considerando-se os fatos ocorridos na história
da matemática, muitos dos documentos e obras matemáticas da antiguidade
haviam sido resgatados, permitindo, assim, uma continuidade no fluxo de
produções e avanços neste campo (BOYER; MERRZBACH, 1996). Além das
contribuições antigas, essa época pode contar com uma rica produção de
muitos matemáticos renomados que se destacaram na fase transicional da
época da renascença para a era moderna (STEWART, 2014).
No desenvolvimento da matemática pós-renascimento, podem-se citar
nomes de personalidades como Galileu Galilei, Bonaventura Cavalieri, Henry
Briggs, Thomas Harriot, Willian Oughtred, Simon Stevin, John Napier, Johann
Kepler, François Viète e outros (BOYER; MERRZBACH, 1996; MEDINA, 2013).
Uma forma de disseminação de conceitos e teorias matemáticas se deu a
partir de centros de estudos e universidades. Foi uma prática advinda desde
a época dos gregos, mas que permitiu, nessa transição, um aumento na divul-
gação de conteúdos científicos e teóricos (EVES, 2004; STEWART, 2014). Muitos
matemáticos e estudiosos da época promoveram estudos significativos sobre
conceitos matemáticos. Após adentrar a fase moderna, grandes nomes foram
destaque, sendo os séculos XV e XVI os mais ricos na produção de conceitos
da matemática (ARAGÃO, 2009; BOYER; MERRZBACH, 1996).

François Viète e Thomas Harriot no desenvolvimento


da matemática
O matemático François Viète é citado como uma figura lendária na história
da matemática, e sua contribuição no desenvolvimento de conceitos e teo-
rias é notável nas áreas de aritmética, álgebra, trigonometria, geometria e
outras igualmente relevantes (MEDINA, 2013). Sua contribuição está contida
em obras como Canon-mathematicas (EVES, 2004). O desenvolvimento das
ideias de Viète, sobretudo na álgebra, permitiu a esse grande matemático uma
aproximação com o que se chamaram ideias modernas, e ele foi o pioneiro
na classificação de incógnitas e parâmetros conhecidos na álgebra (ARAGÃO,
2009; BOYER; MERRZBACH, 1996).
Uma das falhas cometidas por Viète foi a de utilizar-se de algumas no-
menclaturas de épocas mais antigas para apresentar algumas de suas ideias.
Dessa forma, alguns desenvolvimentos ficaram limitados, podendo avançar
Matemática nos séculos XV e XVI 3

apenas a partir do estudo de outros matemáticos, que se mostraram mais


visionários e mais alinhados com os termos da era moderna (STEWART, 2014).
Viète também se fez presente no desenvolvimento de raciocínios sobre reso-
lução de cúbicas e quadráticas, descobrindo soluções e formas de encontrar
as raízes desconhecidas dessas funções a partir de relações entre raízes e
coeficientes (EVES, 2004).
Já Thomas Harriot fez progressos sobre os mesmos temas estudados por
Viète em razão de ter uma diferente visão do assunto, também desenvolvendo
raciocínios na álgebra sobre raízes e coeficientes, porém, utilizando-se de
simbolismo para representá-los, o que Viète não fez (ARAGÃO, 2009).

John Napier, Henry Briggs e Stevin:


teorias e conceitos matemáticos
Das diversas áreas da matemática, foi no desenvolvimento da invenção dos
logaritmos que John Napier e Henry Briggs deram sua maior contribuição,
permitindo avanços significativos desses conceitos. A obra de Napier não
é trivial, porém, o conceito de logaritmo foi explicado, ao longo da história,
com base na progressão de potências crescentes (ARAGÃO, 2009; EVES, 2004).
Um dos pontos de relevância sobre os estudos de Napier é que, como não
possuía o conhecimento do conceito de base de sistemas logaritmos, como
o sabemos hoje em dia, ele desenvolveu sua pesquisa com base em termos
geométricos; no entanto, sua definição geométrica concordava com a descrição
numérica que se tem hoje (BOYER; MERRZBACH, 1996).
Briggs publicou obras envolvendo cálculos de logaritmos, ampliou a tabela
de logaritmos já existente e calculou logaritmos naturais (MEDINA, 2013).
No âmbito da história, esse conceito da matemática foi muito bem aceito e
promoveu grandes avanços devido à sua aplicação em alguns setores, como na
computação dos astrônomos por parte de Johann Kepler, também matemático
e astrônomo (EVES, 2004).
Na Idade Moderna, o confronto de ideias da antiguidade e com as novas
instigou o crescimento de novos conceitos de ciências como a matemática
e a física, pois tendências variadas e conflitantes surgiram ao se promover
uma redescoberta de antigos clássicos da antiguidade e o desenvolvimento
de novos conceitos matemáticos teóricos aplicados a situações mais práticas
da vida em sociedade (ARAGÃO, 2009; STEWART, 2014). Nesse contexto, Stevin
deu sua contribuição no desenvolvimento da matemática ao estudar frações
decimais, e, embora tenha utilizado de notação mais antiga, uma notação mais
moderna surgindo nesta época permitiu-lhe fazer avanços consideráveis.
4 Matemática nos séculos XV e XVI

Stevin também desenvolveu estudos sobre números imaginários e notações


algébricas, baseando-se em estudos como os de Bombelli e Oresme (BOYER;
MERRZBACH, 1996).

Galileu Galilei, Johannes Kepler e


Boaventura Cavalieri: desenvolvimento
e evolução dos conceitos matemáticos
Tanto Galileu Galilei como Johannes Kepler são lembrados na história por suas
habilidades no desenvolvimento da ciência; no entanto, existem relatos na
história de suas contribuições na matemática, sendo ambos representantes
do desenvolvimento dos conceitos e das teorias matemáticas da era Moderna
(EVES, 2004).
Galileu Galilei, cientista italiano, é lembrado na história por sua vasta
contribuição em muitos âmbitos da ciência, como seus estudos sobre a
ciência natural (física), e pela invenção e comercialização de um compasso
geométrico, revolucionário para a época (ARAGÃO, 2009; BOYER; MERRZBACH,
1996). Além do tratado sobre o compasso geométrico, contribuiu com muitos
dos desenvolvimentos de raciocínio lógico, os quais podem ser verificados
nas suas obras de física e astronomia (BOYER; MERRZBACH, 1996). Galileu
desenvolveu o número “pi”, com base em expressões numéricas que também
foram estudados por Viète. Galileu também desenvolveu a análise infinitesimal
que, futuramente, serviu de base na criação do cálculo por Isaac Newton e
Leibnitz (ARAGÃO, 2009; MEDINA, 2013). Em muitos dos seus estudos, Galileu
contou com a colaboração de seu aluno Cavalieri, que, envolvido nos muitos
estudos do mestre, propôs soluções para muitos dos problemas matemáticos
presentes na vida e obra de Galileu (BOYER; MERRZBACH, 1996; EVES, 2004).
Johannes Kepler, com formação em física e astronomia, valeu-se da mate-
mática para aplicá-la na astronomia, no estudo das órbitas elípticas. Buscando
solucionar questões envolvendo as cônicas (elipse, parábola, hipérbole e a
circunferência), Kepler utilizou-se do chamado princípio da continuidade,
um conceito também, mais tarde, desenvolvido no cálculo (ARAGÃO, 2009).
A matemática foi fundamental na elaboração das leis de Kepler, pois com-
provou matematicamente que as órbitas dos planetas comportavam-se de
forma elíptica (BOYER; MERRZBACH, 1996).
Matemática nos séculos XV e XVI 5

Para ver uma abordagem das três leis de Kepler e como este mate-
mático de renome utilizou-se de conceitos matemáticos no estudo
das cônicas em uma abordagem de elipses para provar sua lei das órbitas,
busque pela obra Fundamentos de física: óptica e física moderna, de Halliday,
Resnick e Walker (2018).

A intensa produção de obras da física de Galileu e Kepler foi um dos


motivos de avanço de conceitos da matemática, pois tanto Galileu quanto
Kepler estavam envolvidos em grandes temas da física naquela época e ne-
cessitavam de fundamentação matemática para provar suas ideias. Embora
não tenham sido completados, muitos dos desenvolvimentos matemáticos
de Galileu serviram de base para futuros matemáticos desenvolverem-nos
por completo, como foi o caso do estudo da curva, no qual Galileu não obteve
êxito de imediato, mas cujas investigações serviram de base para os estudos
de Torricelli (BOYER; MERRZBACH, 1996).
Nesta seção, você viu que a transição entre a época da renascença e a
Idade Moderna deu-se com a participação em massa de muitos matemáticos
de renome e com o desenvolvimento de grandes conceitos que levaram a
matemática a tornar-se uma das ciências mais estudadas ao longo da história.
A influência de nomes como Viète, Napier, Galileu Galilei e Johannes Kepler
deixa claro que a Idade Moderna foi uma das mais ricas na produção de
conteúdos representativos da matemática, pois muitos deles deram base
às descobertas de matemáticos que transcenderam sua época, como René
Descartes, Isaac Newton, Evangelista Torricelli, Blaise Pascal e outros.

A matemática desenvolvida no início


da idade moderna
A história retrata que a Idade Moderna compreendeu o período de 1453 até
o ano de 1789, com base em fatos históricos marcantes marcando o início
da era Moderna, como a tomada de Constantinopla, e seu fim, no início da
Revolução Francesa (BOYER; MERRZBACH, 1996). Não se devem descartar os
fatos históricos na história da matemática, pois muitos deles acabaram por
influenciar o desenvolvimento dos conceitos e teorias da matemática (BOYER;
MERRZBACH, 1996). O início da Idade Moderna foi marcado por muitas pro-
duções matemáticas que causaram grandes transformações nas formas de
6 Matemática nos séculos XV e XVI

pensamento e desenvolvimento de conceitos aplicados nessa área (ARAGÃO,


2009).
A Idade Moderna é bem representada por seis nomes da época, uma vez
que seus estudos foram de grande representatividade e promoveram avanços
significativos dos conceitos matemáticos. São eles: René Descartes, Pierre
de Fermat, Giles Persone de Roberval, Girad Desargues, Evangelista Torricelli
e Blaise Pascal.

A época de Fermat e Descartes na história


da matemática
A história da matemática apresenta uma riqueza na quantidade de conceitos
e teorias desenvolvidas e que são fundamentais para explicar muitos dos
fenômenos que conhecemos até os dias de hoje em muitas áreas do conhe-
cimento (BOYER; MERRZBACH, 1996). A Idade Moderna é marcada na história
por seus grandes pensadores, cientistas e matemáticos. Destacam-se aqui
figuras principais da era Moderna, como René Descartes e Pierre de Fermat
(ARAGÃO, 2009).
Tanto Descartes quanto Fermat envolveram-se no desenvolvimento da
geometria analítica e, na área da matemática, esta foi a maior contribuição
de Descartes (BOYER; MERRZBACH, 1996). A obra La géometrie é de autoria
de Descartes, na qual ele explica detalhadamente, em linguagem minuciosa,
os conceitos e fundamentos envolvendo a geometria analítica. Descartes
preocupou-se com a descrição geométrica, traduzindo operações algébricas
em linguagem geométrica (ARAGÃO, 2009). Nesta obra, também é possí-
vel verificar como Descartes desenvolveu uma transformação de cálculos
aritméticos em conceitos geométricos e como a multiplicação, a divisão e a
extração de raízes quadradas podiam ser efetuadas geometricamente (BOYER;
MERRZBACH, 1996). Este foi um passo grande na matemática, promovendo
uma revolução na forma de pensar e também possibilitando aplicações mais
abrangentes desses conceitos.
Os fundamentos geométricos estudados por Descartes e apresentados
na sua obra máxima da matemática abrangeram o estudo de curvas e cô-
nicas e normais e retas tangentes com base em construções geométricas,
conceitos estes que fazem Descartes er lembrado até os dias de hoje (BOYER;
MERRZBACH, 1996). A Figura 1 retrata René Descartes e Pierre de Fermat, ma-
temáticos contemporâneos, que promoveram, independentemente, avanços
consideráveis sobre geometria analítica.
Matemática nos séculos XV e XVI 7

a b

Figura 1. Fotografia de (a) René Descartes e (b) Pierre Fermat, matemáticos contemporâneos
da Idade Moderna.
Fonte: (a) (CONHEÇA..., 2020, documento on-line) e (b) Fernandes (2010, documento on-line).

A contribuição de Pierre Fermat também se deu no avanço da geometria


analítica, resgatando os conceitos já desenvolvidos na antiguidade e promo-
vendo sua evolução (ARAGÃO, 2009). Por exemplo, Fermat aprofundou seus
estudos sobre as obras de Apolônio, que tratava de planos e também sobre
a coleção matemática de Papus. Fermat descreveu suas ideias no tratado que
chamou de Ad locus planos e sólidos isagoge, no qual demonstrou todo seu
vasto conhecimento dos conceitos de geometria analítica, assim como fizera
Descartes (BOYER; MERRZBACH, 1996; ROONEY, 2012). Fermat representou a
geometria analítica em dimensão superior, desenvolvendo os conceitos de
diferenciação e integração; no entanto, sua obra que contém eses relatos,
intitulada A introdução aos lugares, não foi publicada em vida, o que concedeu
apenas a Descartes o título de inventor da geometria analítica (ROONEY, 2012).

Giles Persone de Roberval, Evangelista Torricelli,


Girad Desargues e Blaise Pascal:
desenvolvimentos matemáticos na Idade Moderna
O matemático Giles Persone de Roberval, um dos poucos a exercer as fun-
ções de matemático profissionalmente, ao longo da história destacou-se no
desenvolvimento de um método de indivisíveis, no estudo do cicloide e no
estudo de áreas de arcos de curvas. Além disso, demonstrou como traçar
retas tangentes às curvas, assim como também o fizeram Descartes e Fermat.
8 Matemática nos séculos XV e XVI

Roberval também estudou o conceito de volumes em sólidos de revolução


(ARAGÃO, 2009; BOYER; MERRZBACH, 1996).
Sobre Evangelista Torricelli, a história retrata que ele também se dedicou
ao estudo do cicloide e publicou seus aprofundamentos ao tema no livro
De parabole (ARAGÃO, 2009). Esse tema gerou muitas controvérsias na época,
pois Torricelli foi acusado de plágio, embora, de fato, os estudos publicados
sejam de sua autoria; no entanto, eram temas similares àqueles desenvolvidos
por Fermat (ROONEY, 2012). A Figura 2 mostra o movimento cicloide, tema que
trouxe bastante evolução no desenvolvimento de conceitos para explicar o
movimento de um corpo que produz esse movimento (BOYER; MERRZBACH,
1996).

Figura 2. Representação de um cicloide em desenvolvimento.


Fonte: Barros (2020, documento on-line).

Torricelli foi um matemático notável do seu tempo e deu muitas con-


tribuições em diversos temas da matemática, como já foi citado, além de
ter também contribuído em muitos assuntos relacionados à física (BOYER;
MERRZBACH, 1996).
Girard Desargues também estudou as cônicas, a interação entre cones e
planos, e promoveu avanços de grande notoriedade na área da geometria
projetiva. No entanto, embora seus estudos sejam de destaque e impacto na
evolução da matemática, não foram aceitos na época, embora hoje o sejam
(BOYER; MERRZBACH, 1996; ROONEY, 2012).
Pascal é retratado na história como um prodígio na matemática. Seus
estudos também abordaram o estudo das cônicas, um tema em alta na época
e que deu grandes contribuições no avanço da matemática ao longo da his-
tória (ARAGÃO, 2009). Em seu livro Essay pour les coniques, Pascal descreveu
o comportamento das cônicas; depois, utilizou-se da geometria projetiva,
Matemática nos séculos XV e XVI 9

já descrita por seus contemporâneos, e escreveu a Obra completa sobre côni-


cas, uma continuação de seu primeiro livro (ROONEY, 2012) (BOYER; MERRZBACH,
1996). Pascal também se dedicou ao estudo dos conceitos de probabilidade
e, assim como muitos matemáticos aqui citados, desenvolveu, conceitos de
grande relevância ao estudar o cicloide e a integração de funções trigono-
métricas (BOYER; MERRZBACH, 1996).
Nesta seção, foi apresentado um panorama de como se deu o desenvol-
vimento da matemática no início da Idade Moderna e quais foram as desco-
bertas e os estudos relacionados a este tema e que produziram mudanças
significativas na forma de pensar. As contribuições de Descartes, Fermat,
Roberval, Torricelli, Desargues e Pascal foram de grande impacto nesta época
e até hoje o são, sendo esses conceitos e teorias ainda utilizados para explicar
muitos dos conceitos de que a matemática trata.

Técnicas da matemática dos séculos XV e


XVI aplicadas à sala de aula
As ciências como a física e a matemática geralmente apresentam duas linhas
bastante diferentes, sendo que a primeira mostra uma preocupação em relatar
os conceitos históricos da sua história, contextualizando sobre quais foram
os cientistas, estudiosos, filósofos, físicos e matemáticos que produziram
todo o vasto conhecimento de ambas as ciências (ARAGÃO, 2009; BOYER;
MERRZBACH, 1996). Por outro lado, uma segunda linha tem suas preocupações
voltadas para a educação e as formas de ensinar em sala de aula, buscando
abordagens efetivas e que procurem instigar a docência dessas ciências.
A transmissão de conceitos da matemática em sala de aula sempre foi um
tema de grandes discussões, pois trata-se de uma disciplina fundamental em
todos os níveis de educação, mas que se depara constantemente com formas
não muito efetivas de atingir os objetivos finais no ensino, uma vez que nem
sempre o aluno alcança o nível de compreensão estabelecido pelo plano
curricular da referida disciplina (BOYER; MERRZBACH, 1996; SMOLE; MUNIZ, 2013).
Como já foi descrito, a história da matemática passou por muitas fases
ao longo dos tempos, e nessa linha de tempo, tudo o que conhecemos de
conceitos, teorias, teoremas e tratados da matemática teve sua construção
passando pelo crivo de muitos pensadores e matemáticos (ARAGÃO, 2009;
BOYER; MERRZBACH, 1996). Assuntos relativos à matemática que hoje têm suas
bases muito sólidas e bem fundamentadas muitas vezes foram construídos
gradativamente ao longo de muitos anos, e isso se aplica aos temas como
10 Matemática nos séculos XV e XVI

aritmética, álgebra, geometria, trigonometria, estatística e cálculo diferencial


e integral (EVES, 2004; BOYER; MERRZBACH, 1996).

O ensino da matemática em sala de aula e


as técnicas utilizadas
O ensino de aritmética em sala de aula vem desde a época dos gregos, ou
até de muito antes, pois desde que o homem aprendeu a contar, tornou-se
fundamental aprender operações matemáticas, a princípio para utilizá-las em
situações de sua vida cotidiana e, depois, como base à criação de conceitos
mais profundos da matemática (BOYER; MERRZBACH, 1996; SMOLE; MUNIZ,
2013). Em sala de aula, esses conceitos são trabalhados com estudantes desde
o início da sua formação, ou seja, desde sua alfabetização. Outros conceitos,
como álgebra, geometria, trigonometria, estatística, etc., são subsequentes à
aritmética, uma vez que necessitam dela para o seu desenvolvimento (EVES,
2004).
Ao longo dos tempos, o ensino veio sofrendo transformações, pois na
época de grandes filósofos e pensadores gregos, por exemplo, muitos ti-
nham o livre pensamento e a apreciação do saber (BOYER; MERRZBACH, 1996).
A partir da revolução industrial, a necessidade de ensino em massa produziu
salas de aula no formato que chamamos de tradicional (carteiras dispostas
umas atrás das outras), sendo que o aluno não tinha muita participação no
seu processo de aprendizagem (ARAGÃO, 2009). Hoje, o quadro que se pinta
na educação vem sofrendo mudanças e permitindo ao aluno ser mais ativo
no seu processo de ensino e aprendizagem (BOYER; MERRZBACH, 1996).
Retratando as técnicas de ensino do início da Idade Moderna, as formas de
se ensinar os conceitos de matemática sempre foram muito teóricas, embora
alguns conceitos pudessem ter o apoio de representações geométricas e
gráficas (BOYER; MERRZBACH, 1996; SMOLE; MUNIZ, 2013). O ensino da matemá-
tica pode contar com técnicas como o uso de jogos lúdicos ou de elementos
visuais no desenvolvimento de seus conceitos (POSAMENTIER; KRULIK, 2014).
Um exemplo da inserção de situações lúdicas é mostrado na Figura 3, onde
se vê o conhecimento da matemática sendo construído a partir de objetos
cujas formas permitem o desenvolvimento de vários conceitos matemáticos,
sobretudo de geometria e trigonometria.
Matemática nos séculos XV e XVI 11

Figura 3. Uso de figuras geométricas no processo de aprendizagem.


Fonte: Marciano (2020, documento on-line).

Outro recurso que também é utilizado na matemática é o uso de gráficos


para ilustração de resultados. Essa técnica foi aplicada e — e ainda é, até os
dias de hoje —na matemática e em diversas outras áreas como ferramenta
gráfica para a visualização de resultados de pesquisas, empresas, etc (BOYER;
MERRZBACH, 1996).
Outra técnica utilizada em sala de aula e que sempre mostrou grande
efetividade foi a experimentação (EVES, 2004). Conceitos matemáticos apli-
cados a algumas áreas do conhecimento, como a física, sempre se mostraram
uma forma de aplicar conhecimentos adquiridos (BOYER; MERRZBACH, 1996).
A Figura 4 mostra uma forma de aplicação da matemática na obtenção de
informações a partir da experimentação.
A disciplina história da matemática que é ensinada em sala de aula nos
mostra a relevância de todo o desenvolvimento matemático ao longo da
história (ARAGÃO, 2009; BOYER; MERRZBACH, 1996). Muitas técnicas e recursos
didático-pedagógicos hoje utilizados em sala de aula estão pautados nas
técnicas utilizadas já nos séculos XV e XVI, como o uso de recursos visuais
para demonstração de fundamentos teóricos, ou mesmo o recurso da ex-
perimentação, quando os conceitos matemáticos são aplicados em outros
contextos, como a física, química, etc. (BOYER; MERRZBACH, 1996; EVES, 2004).
12 Matemática nos séculos XV e XVI

Figura 4. Uso da matemática para comprovação de


conceitos da Física.
Fonte: Vieira (2015, documento on-line).

Exemplo
Um dos desenvolvimentos matemáticos do início da Idade Moderna foi o
estudo do matemático François Viète sobre o número “pi”. Na matemática,
o número π constitui uma proporção numérica definida a partir da relação
entre o perímetro de uma circunferência e o seu diâmetro. Viète utilizou-se
das formalizações de Arquimedes sobre o número π para aplicar nos seus
cálculos sobre séries infinitas. Os estudos de Viète permitiram calcular o
valor de π com base na equação que segue, usando o método dos limites.
Matemática nos séculos XV e XVI 13

Muitas aplicações envolvendo o número π foram possíveis uma vez que


seu valor foi calculado. Assim, demonstre três informações básicas sobre a
circunferência utilizando o número π: o perímetro de sua circunferência, a área
do círculo dessa circunferência e o volume da esfera que tal circunferência
encerra (Figura 5).

Figura 5. Informações de diâme-


tro e raio de uma circunferência.
Fonte: 123 Calculei (2020, docu-
mento on-line).

Resolução

Com base nos conceitos desenvolvidos por François Viète e sua definição
para o número π, as informações pedidas serão obtidas a partir da Figura 5,
utilizando-se das informações de raio e diâmetro dadas.
Perímetro da circunferência
A equação para o cálculo do perímetro C de uma circunferência será dada
por:

C = 2πR

Área do círculo da circunferência


A equação para o cálculo da área “A” do círculo de uma circunferência
será dada por:

A = πR2
14 Matemática nos séculos XV e XVI

Volume do círculo da circunferência


A equação para o cálculo do volume “V” do círculo de uma circunferência
será dada por:

4 3
=
3

Verifica-se, então, que os objetivos pretendidos neste capítulo foram


atingidos, uma vez que a fase do início da Idade Moderna foi discutida, evi-
denciando os pontos de maior relevância do que se chamou “prelúdio à
matemática moderna” e, assim, mostrando quais foram os matemáticos que
contribuíram para o progresso de conceitos e teorias matemáticas desta fase,
bem como quais foram esses conceitos.

Referências
123 CALCULEI. Calculadora do círculo. 2020. Disponível em: https://www.123calculei.
com/Circulo/. Acesso em: 12 fev. 2021.
ARAGÃO, M. J. História da matemática. Rio de Janeiro: Interciência, 2009.
BARROS, L. Conheça mais sobre a braquistócrona. 2020. Disponível em: http://blogs.
unama.br/noticias/matematica/conheca-mais-sobre-braquistocrona. Acesso em:
12 fev. 2021.
BOYER, C. B.; MERRZBACH, U. C. História da matemática. São Paulo: Blucher, 1996.
CONHEÇA René Descartes (1596 - 1650). 2020. Disponível em: https://sites.google.com/
site/embuscapsicologia/a-historia-da-psicologia/conheca-rene-descartes-1596---1650.
Acesso em: 12 fev. 2021.
EVES, H. Introdução à história da matemática. Campinas: UNICAMP, 2004.
FERNANDES, M. Pierre Fermat. 2010. Disponível em: http://moniquefernandes15.blogspot.
com/2010/11/pierre-fermat.html. Acesso em: 12 fev. 2021.
MARCIANO, E. Plano de aula sobre formas geométricas: educação infantil. 2020. Disponí-
vel em: https://escolaeducacao.com.br/plano-de-aula-formas-geometricas-educacao-
-infantil/. Acesso em: 12 fev. 2021.
MEDINA, M. B. Os grandes matemáticos. São Paulo: M. Books, 2013.
POSAMENTIER, A. S.; KRULIK, S. A arte de motivar os estudantes do ensino médio para
a matemática. Porto Alegre: AMGH, 2014.
ROONEY, A. A história da matemática. São Paulo: M. Books, 2017.
SMOLE, K. S.; MUNIZ, C. A. A matemática em sala de aula: reflexões e propostas para
os anos iniciais do ensino fundamental. Porto Alegre: Penso, 2013.
STEWART, I. Os maiores problemas matemáticos de todos os tempos. Rio de Janeiro:
Zahar, 2014.
Matemática nos séculos XV e XVI 15

VIEIRA, A. O que a Torre de Pisa e o levantamento de peso têm em comum? 2015. Dis-
ponível em: https://descomplica.com.br/artigo/torre-de-pisa-e-levantamento-de-
-peso-tem-algo-em-comum-o-equilibrio-estatico-desvenda-esse-misterio/4FR/.
Acesso em: 12 fev. 2021.

Leitura recomendada
HALLIDAY, D.; RESNICK, J.; WALKER, J. Fundamentos de física: óptica e física moderna.
10. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2018. v. 4.

Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos


testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da
publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas
páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores
declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou
integralidade das informações referidas em tais links.
HISTÓRIA DA
MATEMÁTICA
Desenvolvimento do
cálculo diferencial
e infinitesimal
Alex Rodrigo dos Santos Sousa

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Analisar o cálculo diferencial e integral nas perspectivas de Newton e Leibniz.


>> Identificar as contribuições de Newton e Leibniz no desenvolvimento do
cálculo diferencial e integral ensinado atualmente.
>> Demonstrar técnicas do cálculo de Newton e Leibniz na sala de aula de
Matemática.

Introdução
O desenvolvimento do cálculo diferencial e integral provocou um grande impacto na
matemática e na ciência de forma geral. Com essa ferramenta, uma grande classe
de problemas foi solucionada e novos resultados importantes na matemática
surgiram como sua consequência.
Grandes personagens da matemática foram responsáveis pela descoberta e
evolução do cálculo diferencial e integral. Alguns deles são bastante populares
até por descobertas em outras áreas, como Isaac Newton. Conhecer a história
desses personagens e como eles desenvolveram esses importantes conceitos trará
uma compreensão plena da essência do cálculo, além de auxiliar o professor da
educação básica a ter uma visão mais ampla dos conteúdos a serem trabalhados
em sala de aula com seus alunos.
2 Desenvolvimento do cálculo diferencial e infinitesimal

Neste capítulo, você vai estudar o desenvolvimento do cálculo com base


na história de seus dois principais autores, Isaac Newton e Gottfried Leibniz.
As semelhanças e diferenças em seus estudos que resultaram na estrutura e na
generalização do cálculo, assim como as suas influências na prática e no ensino
dessa importante área da matemática também serão abordadas.

O desenvolvimento do cálculo
O surgimento do cálculo ou cálculo infinitesimal como entendemos hoje
ocorreu por meio de dois problemas importantes na matemática e na física
dos séculos XVI e XVII, de acordo com Boyer e Merzbach (2012). O primeiro
estava relacionado à obtenção da taxa de variação instantânea de uma
quantidade em um dado instante, ou, em termos geométricos, a obtenção
da reta tangente a uma curva em um dado ponto. Este problema levou ao
desenvolvimento do cálculo diferencial. Já o segundo problema se preocupava
com o que era chamado de quadratura, ou cálculo de áreas sob uma dada
curva, e levou ao desenvolvimento do cálculo integral. Esses problemas estão
ilustrados nas Figuras 1 e 2.
Diversos matemáticos contribuíram para o desenvolvimento do cálculo,
mas dois personagens foram de destacada importância por terem realizados
trabalhos independentes que fundamentaram a área: Isaac Newton e Gottfried
Wilhelm Leibniz.

Figura 1. O problema de obter a reta tangente a uma curva motivou o de-


senvolvimento do cálculo diferencial.
Desenvolvimento do cálculo diferencial e infinitesimal 3

Figura 2. O problema de obter a área sob uma curva (qua-


dratura) motivou o desenvolvimento do cálculo integral.

O cálculo por Isaac Newton


O britânico Sir Isaac Newton (1642–1727) foi um dos mais conhecidos e in-
fluentes matemáticos e físicos de todos os tempos. Ocupou a cadeira de
Matemática do Trinity College e na Universidade de Cambridge, e suas con-
tribuições na Física, desde as leis da mecânica, a teoria das cores até a teoria
da gravitação universal, revolucionaram a área e serviram como alicerces de
muitos desenvolvimentos nos séculos seguintes, a ponto de a física clássica
ser muitas vezes denominada física newtoniana.
Na matemática, entre outras contribuições, Newton desenvolveu a análise
das séries infinitas, que impactaram no seu estudo sobre fluxões (taxas de
variação) posteriormente. Foi fortemente influenciado pelo seu mentor,
Isaac Barrow (1630–1677), e pela obra de John Wallis (1616–1703), Arithmetica
infinitorum. Na época, as séries infinitas eram consideradas ferramentas de
aproximação de funções. Newton descobriu que a análise e a álgebra neces-
sárias para lidar com séries infinitas eram as mesmas de séries finitas, e a
noção de convergência de uma série infinita permitiu que tais séries deixassem
de ser utilizadas apenas como ferramentas de aproximação.
Uma série infinita convergente pode ser vista como uma soma de uma
quantidade infinita de números que progridem de acordo com um padrão
matemático definido. Esta soma, à medida que mais termos são adicionados,
se aproxima de um certo valor, de modo que se esse processo de adicionar
termos for realizado infinitamente, a soma tornar-se-á igual a esse dado
valor. A noção fundamental desse processo é de limites, que estruturam o
cálculo diferencial e integral.
4 Desenvolvimento do cálculo diferencial e infinitesimal

1. Uma série infinita convergente


1
Considere a progressão geométrica com termos =  , n =
2
1, 2, 3…. A soma dos termos dessa sequência constitui uma série infinita con-
vergente, uma vez que:


1
   = 1 < ∞.
2
=1

De fato, toda série infinita cujos termos constituem uma progressão geo-
métrica de razão 0 < q < 1 é convergente.

2. Uma série divergente


Quando uma série não é convergente, dizemos que ela é divergente. Como
exemplo, temos a série infinita:


1
 =∞
=1

Logo, é divergente.
A análise de séries infinitas e a expansão de funções em séries infinitas
foram desenvolvidas por Newton, sendo fundamentais para seus avanços no
cálculo diferencial e integral.

Newton fez uso de seus avanços em séries infinitas no estudo de sua prin-
cipal contribuição para a matemática, o cálculo. A taxa de variação instantânea
de uma quantidade, denominada fluxo na época de Newton, pode ser vista
como variações dessa quantidade em intervalos muito pequenos de tempo,
chamados de infinitésimos. Asim, por exemplo, se temos um carro em movi-
mento retilíneo que percorre 80 km em uma hora, sua taxa de variação média
ou velocidade média é de 80 km/h. O problema de obter a taxa de variação
instantânea consiste em responder qual a variação da distância percorrida
pelo carro em um intervalo suficientemente pequeno de tempo, aproximando-
-se cada vez mais de zero. Esse problema foi solucionado por Newton por
meio de seu método de fluxões, hoje chamado de cálculo infinitesimal.
Desenvolvimento do cálculo diferencial e infinitesimal 5

O método de fluxões de Newton pode ser visto em detalhes em


Boyer e Merzbach (2012).

Quanto à questão da quadratura ou área sob curvas, Newton descobriu


que se tratava de um problema matematicamente inverso ao problema das
tangentes ou taxas instantâneas, o que atualmente equivale a dizer que o
processo de diferenciação e o de integração são operações matemáticas
inversas. Esse importante resultado consiste no teorema fundamental do
cálculo. Com essa descoberta, Newton não apenas descobre como solucionar
os problemas da tangente e da quadratura, mas os associa e oferece um
método geral a ser aplicado.

O termo “fluxão”, utilizado por Newton em seu desenvolvimento do


cálculo infinitesimal, é o que hoje chamamos de “derivada”.

O cálculo por Gottfried Leibniz


De forma independente aos avanços de Newton, o alemão Gottfried Wilhelm
Leibniz (1646–1716) chegou aos mesmos resultados acerca dos problemas
da tangente e da área sob uma curva, incluindo o teorema fundamental
do cálculo. Leibniz era um erudito, detentor de conhecimento universal,
já que era formado em filosofia, teologia, direito e matemática. Devido à sua
carreira diplomática na Alemanha, viajava muito; em uma dessas viagens,
em Paris, teve contato com matemáticos importantes, como Christiaan Huy-
gens (1629-1695), que por meio de recomendações de leituras imergiu Leibniz
em temas de destaque na matemática, como as séries infinitas. Em pouco
tempo, Leibniz chegou à formulação do que chamou de cálculo diferencial
e integral, expressão usada até hoje. Estabelece notações mais simples e
aplicáveis que as de Newton, como dx para diferencial e ∫ dx para integral.
Ao contrário de Newton, Leibniz gostava de publicar seus resultados,
o que causou controvérsia na época sobre quem descobriu primeiro o cálculo
infinitesimal, inclusive com acusação de Newton sobre plágio de Leibniz,
6 Desenvolvimento do cálculo diferencial e infinitesimal

como está descrito em Bardi (2008). Acredita-se que Newton descobriu o


método cerca de dez anos antes do que Leibniz, mas este fez seus avanços
de forma independente do primeiro. No entanto, enquanto Newton reservava
suas descobertas a manuscritos e cartas que circulavam restritamente entre
amigos, Leibniz publicava seus resultados, como na revista científica que ele
mesmo contribuiu para criar, intitulada Acta eruditorum. Em relação à Newton,
a primeira publicação que menciona o cálculo ocorre apenas em sua famosa
obra Philosophiae naturalis principia mathematica, ou Princípia, de 1687,
embora suas descobertas do cálculo remontem ao período de 1665–1666.
Newton apresentava seus resultados apenas para amigos em cartas ou ma-
nuscritos, como De analysi per aequationes numero terminorum infinitas,
de 1669, Methodus fluxionum et serierum infinitorum, de 1671, e De quadratura
curvarum, de 1676. Para mais detalhes sobre os avanços matemáticos de
Newton e Leibniz, procure pelos estudos de Boyer e Merzbach (2012) e Flood
e Wilson (2013).

Embora Newton e Leibniz sejam considerados os inventores do cálculo


diferencial e integral, diversos matemáticos fizeram contribuições
importantes à área, como a família Bernoulli, Leonhard Euler, L’Hospital, entre
outros, como pode ser visto em Rooney (2012).

Influências de Newton e Leibniz


no ensino do cálculo
Ao estudar cálculo diferencial e integral atualmente, pode-se observar as
influências de Newton e Leibniz em diversos aspectos, a começar pelas no-
tações utilizadas. Como já mencionado, as notações dx para diferencial,
assim como ∫ dx para integrais, foram estabelecidas por Leibniz. Além disso,
o matemático alemão publicou em seu artigo na revista Acta eruditorum
(Figura 3) algumas das regras de diferenciação que constituem as tabelas
de derivadas utilizadas atualmente, como por exemplo:

„„ se a é constante, da = 0;
„„ dx = 1;
„„ d (y + z) = dy + dz;
„„ d (yz) = ydz + zdy.
Desenvolvimento do cálculo diferencial e infinitesimal 7

Figura 3. Artigos de Leibniz publicados no Acta eruditorum.


Fonte: Tavora (2020, documento on-line).

Essas e outras regras permitiram à Leibniz derivar diversos tipos de fun-


ções, como as polinomiais, as exponenciais ou as composições destas, por
exemplo, o que conferiu generalidade à solução do problema das tangentes
(Figura 4). Além disso, propôs o anulamento da derivada, isto é, f’(x) = 0, para
obtenção de pontos críticos de uma função f(x).

Figura 4. Uma função com dois pontos ótimos locais, um de máximo e um


de mínimo. Observe que as retas tangentes à função nesses pontos são
horizontais, isto é, paralelas ao eixo x.
8 Desenvolvimento do cálculo diferencial e infinitesimal

Já Newton abordou os problemas da tangente e da quadratura sob olhar


físico, relacionando os problemas à cinemática e à dinâmica. Por exemplo,
a posição de um objeto correspondia ao fluente e suas velocidades eram as
fluxões. Essa abordagem física é utilizada até hoje nos primeiros contatos com
o cálculo diferencial e integral. Além disso, deve ser destacada a utilização
das séries infinitas por Newton, que conferiu uma forma de lidar com funções
mais complicadas por meio de expansão em séries.
Por fim, o teorema fundamental do cálculo, que tanto Newton quanto Lei-
bniz alcançaram com maestria, pode ser visto como um dos grandes legados
para o ensino do cálculo. De fato, o teorema fundamental do cálculo enuncia
que se uma função f: [a, b] → ℝ é contínua e F é tal que:

( ) = ( ) ,

então ′( ) = ( ), ∀ ∈ [ , ], isto é,

( ) = ( ).

A compreensão da relação de inversão entre as operações de derivadas e


integrais é um dos mais importantes resultados da área, uma vez que diversos
problemas matemáticos passam a ser resolvidos com a aplicação do teorema.
Para mais detalhes históricos sobre os avanços de Newton e Leibniz no cálculo,
ver Bardi (2008), e para detalhes técnicos, ver Stewart (2013).

A derivada também é aplicada para detectar pontos de mudança na


curvatura (concavidade) de uma função. Esses pontos são chamados
de pontos de inflexão de uma função (Figura 5).
Desenvolvimento do cálculo diferencial e infinitesimal 9

Figura 5. Gráfico de uma função com seu ponto de inflexão destacado


em verde. Observe que neste ponto há mudança de concavidade
da curva.

Contexto histórico do cálculo na


sala de aula
As motivações para o estudo do cálculo diferencial e integral, em muitas situa-
ções, são semelhantes às que levaram ao desenvolvimento da metodologia há
séculos. O interesse no cálculo diferencial para cálculo de taxas instantâneas
aparece em problemas físicos, biológicos, econômicos, estatísticos, entre
outras áreas. O mesmo acontece para o estudo do cálculo integral, motivado
pelo cálculo de áreas.
Apesar da importante presença de recursos computacionais atualmente,
com diversas implementações de ferramentas de cálculo que facilitaram
aplicações e práticas, o olhar teórico e a interpretação dos elementos do
cálculo desenvolvidos por Newton e Leibniz são fundamentais para uma
completa compreensão da metodologia.
Como já mencionado na seção anterior, Newton utilizou da abordagem
física para chegar aos importantes resultados em cálculo diferencial, como
no estudo do movimento. Essa abordagem é aplicada nos dias de hoje para
trazer um cenário cotidiano para quem está com seus primeiros contatos
na disciplina, uma vez que o impacto do cálculo é extremamente evidente
10 Desenvolvimento do cálculo diferencial e infinitesimal

na cinemática. Na física do ensino médio, modelos de movimento retilíneo


e uniforme (MRU) e retilíneo uniformemente variado (MRUV) são estudados.
Neles, estuda-se o movimento sob a suposição de que a velocidade é constante
no MRU ou varia com uma aceleração constante no MRUV. Quando ambas as
taxas variam no decorrer do tempo, os modelos estabelecidos não descrevem
o movimento na sua realidade. Nesse caso, a aplicação de derivadas torna-se
uma importante saída para modelar tais movimentos. Dessa forma, fica bas-
tante evidente o impacto da ferramenta do cálculo diferencial nesse contexto,
que foi utilizado como ponto de partida pelo próprio Newton no século XVII.
Já Leibniz enfatiza a relação entre derivadas e integrais com diferenças e
somas. A derivada é a razão de infinitésimos, isto é, variações ou diferenças
muito pequenas de uma certa variável. Por outro lado, a integral pode ser
vista como uma soma das partes infinitesimais que, no limite, resulta na área
inteira dessas partes. Essa visão da integral é fundamental para a compreen-
são de sua definição e dos papéis da soma e do limite nesse procedimento.
Portanto, apesar dos diversos avanços tecnológicos alcançados ao longo
dos últimos séculos e dos diversos novos desafios matemáticos que surgiram
com eles, o cálculo permanece como uma importante ferramenta matemática
em diversas áreas, e as ideias de Newton e Leibniz estão sempre presentes
tanto nos usos da metodologia como no seu ensino em sala de aula.

É possível deduzir as fórmulas de velocidade e aceleração do MRU


e MRUV por meio de derivadas. Vejamos:

1. (MRU) Considere a função posição de um objeto pontual em movimento


retilíneo e uniforme (MRU):

S(t) = S 0 + vt,

em que S 0 é a posição inicial, v é a velocidade constante e t é o tempo. Observe


que:

S' (t) = v,

isto é, a derivada da função posição do objeto é igual à sua velocidade, que


nesse modelo é constante.
Desenvolvimento do cálculo diferencial e infinitesimal 11

2. (MRUV) Considere agora a função posição de um objeto em movimento


retilíneo uniformemente variado (MRUV)

²
( )= 0 + 0 + ,
2

em que v0 é a velocidade inicial e a é a aceleração constante. Sendo assim,


temos que

′(
2
)= 0 + = 0 + = ( )
2

ou seja, a partir da função posição, obtemos a fórmula da função velocidade


por meio da primeira derivada de S(t). Além disso,

S'' (t) = v' (t) = a,

isto é, a segunda derivada da função posição é a aceleração do objeto, que


neste modelo é constante.

Considere um móvel em movimento retilíneo cuja posição S é de-


terminada em função do tempo t pelo modelo:

S(t) = 7t 3.

Assim, sua velocidade é dada pela derivada da função posição,

v(t) = S' (t) = 21t²,

e sua aceleração é dada pela derivada da função velocidade ou segunda derivada


da função posição

a(t) = v' (t) = S'' (t) = 42t.

Observe que tanto velocidade quanto aceleração variam ao longo do tempo,


o que difere dos modelos de movimentos estudados no ensino médio, como
MRU e MRUV.
12 Desenvolvimento do cálculo diferencial e infinitesimal

Assim como em diversos conteúdos da física, fórmulas importantes da


matemática também podem ser obtidas por derivação. O exemplo a seguir
mostra como o vértice do gráfico de uma função quadrática pode ser calculado
por meio de derivada.

Considere uma função quadrática genérica:

y = ax 2 + bx + c,

a ≠ 0. Vamos deduzir as fórmulas do vértice (x v, y v) da parábola que descreve


graficamente a função dada. Note que o vértice é um ponto ótimo (máximo ou
mínimo) do gráfico. Obtendo a derivada da função, temos que:

y' = 2ax + b

Para obter o ponto ótimo, fazemos:



=0⇒2 + =0⇒ = ,
2


que é a fórmula da abscissa do vértice, isto é, = .
2

A ordenada pode ser obtida substituindo a expressão da abscissa na função


genérica,

− 2 − ² 2 2
−2 2+4 − 2
+4 ∆
=   +  + = − + = = ⇒ =−
2 2 4 ² 2 4 4 4


em que ∆ = b2 – 4ac. Assim, obtemos a fórmula da ordenada do vértice, =− .
4

Os exemplos anteriores ilustram bem a presença do cálculo em tópicos


de matemática e física que são ensinados na educação básica. Outras situ-
ações em diversas áreas podem ser citadas, como o estudo da velocidade
de reações químicas ou a taxa de variação do volume de um gás em química,
ou a taxa de infecção de uma doença contagiosa na biologia, e assim por
diante. Esses exemplos apresentam a importância e o alcance das ideias de
Desenvolvimento do cálculo diferencial e infinitesimal 13

Newton e Leibniz no século XVII que culminaram na consolidação do cálculo


diferencial e integral como ferramental matemático fundamental nas mais
diversas áreas do conhecimento.

Referências
BARDI, J. S. A guerra do cálculo. Rio de Janeiro: Record, 2008.
BOYER, C. B.; MERZBACH, U. C. História da matemática. São Paulo: Blucher, 2012.
FLOOD, R.; WILSON, R. Os grandes matemáticos. São Paulo: M. Books, 2013.
ROONEY, A. A história da matemática. São Paulo: M. Books, 2012.
STEWART, J. Cálculo. São Paulo: Cengage Learning, 2013. v. 1.
TAVORA, M. The calculus according to Leibniz. 2020. Disponível em: https://towardsda-
tascience.com/the-calculus-according-to-leibniz-5ee1e485a5a2. Acesso em: 5 fev. 2021.

Leitura recomendada
SILVA, W. M. A descoberta do cálculo sob as perspectivas de Newton e Leibniz. 2015.
Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização em Matemática) – Programa de Pós-
-Graduação em Matemática, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte,
2015. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/BUOS-A44GV3/1/
monografia_warley.pdf. Acesso em: 5 fev. 2021.

Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos


testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da
publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas
páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores
declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou
integralidade das informações referidas em tais links.
HISTÓRIA DA
MATEMÁTICA
Matemática nos
séculos XVII a XIX
Alex Rodrigo dos Santos Sousa

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Descrever a era Bernoulli e a de Euler.


>> Identificar as contribuições dos matemáticos da Revolução Francesa e do
século XIX.
>> Demonstrar técnicas da matemática dos séculos XVII a XIX na sala de aula
de Matemática.

Introdução
A matemática evoluiu em diversos aspectos entre os séculos XVII e XIX. Novos
conceitos foram introduzidos e desenvolvidos nas mais diversas áreas, como
teoria dos números, cálculo diferencial e integral, geometria, teoria das proba-
bilidades, entre outras e novas formas de pensar propostas, com aumento do
rigor e do formalismo nas demonstrações e divulgações do raciocínio matemático.
Para alcançar esses novos patamares matemáticos, diversos personagens foram
marcantes. Grandes matemáticos espalhados por toda a Europa contribuíram
para um dos períodos mais produtivos da matemática.
Neste capítulo, você vai estudar alguns dos principais avanços da matemática
entre os séculos XVII e XIX, além de conhecer os principais personagens desses
avanços e como os conceitos por eles introduzidos se fazem presentes até os dias
atuais no ensino da matemática.
2 Matemática nos séculos XVII a XIX

As eras Bernoulli e Euler


Os séculos XVII e XVIII estão marcados pelo estabelecimento de duas eras na
história da matemática: a era da família Bernoulli, com início no século XVII,
e de Leonhard Euler, no século XVIII. Podemos entende-las como eras devido
às vastas contribuições e avanços dos Bernoulli e de Euler em diversas áreas
da matemática, que são ensinadas e aplicadas até os dias de hoje.
O cenário da matemática no século XVII era efervescente, devido ao
desenvolvimento do cálculo diferencial e integral por Isaac Newton e Got-
tfried Leibniz e pela melhor compreensão de alguns processos envolvendo
o infinito, como as séries infinitas e o limite. Além disso, os avanços eram
descentralizados geograficamente, isto é, encontramos ao longo desse
período matemáticos influentes em diversos países europeus, como França,
Alemanha, Inglaterra, Suíça e Holanda. Mais do que isso, a grande maio-
ria desses pensadores estava em constante comunicação. Esse contexto
favoreceu o surgimento das importantes eras dos Bernoulli e de Euler, e
por que não dizer o estabelecimento do que chamamos de era moderna
da matemática.

A família Bernoulli
A família Bernoulli ficou conhecida por possuir diversos matemáticos renoma-
dos e influentes. De fato, cerca de 12 membros da família tiveram contribuições
significativas na matemática ou em áreas correlatas, como a física. A família
se estabeleceu na Basiléia, Suíça, em 1576, após fugir dos Países Baixos devido
a perseguições religiosas (BOYER; MERZBACH, 2018).
Na primeira geração de matemáticos da família, estão os irmãos Jacques
Bernoulli (1654–1705) e Jean Bernoulli (1667–1748). O mais velho, Jacques,
mergulhou no estudo do cálculo infinitesimal por meio da leitura de artigos
de Leibniz, além de obras dos ingleses Isaac Barrow (1630–1677) e John Wallis
(1616–1703). Devemos a ele o termo “integral” na linguagem do cálculo, termo
que sugeriu a Leibniz e que foi adotado pelo alemão. Após certo tempo,
Jacques Bernoulli já estava contribuindo para o cálculo com publicações na
Acta eruditorum, a revista matemática que Leibniz ajudou a fundar e na qual
publicava frequentemente.
Apesar de seu interesse pelo cálculo infinitesimal e por séries infinitas,
Jacques Bernoulli obteve avanços em diversas áreas. Uma desigualdade
importante na matemática, conhecida como desigualdade de Bernoulli, foi
desenvolvida por ele:
Matemática nos séculos XVII a XIX 3

Vamos analisar a desigualdade de Bernoulli para o caso particular em


que n = 2, isto é:

Observe que essa desigualdade em particular pode ser verificada expan-


dindo-se o termo do lado esquerdo da desigualdade (quadrado da soma), ou seja:

uma vez que .


O gráfico exibido na Figura 1 mostra a desigualdade de Bernoulli
para n = 3. Observe que a curva está acima da curva
.

Figura 1. Curvas que mostram a desigualdade de Bernoulli graficamente para n = 3.

Além de diversas publicações no Acta eruditorum, Jacques Bernoulli


escreveu um influente tratado, o Ars conjectandi (A arte de conjecturar)
(Figura 2), que foi publicado postumamente em 1713 e que aborda problemas
de contagem envolvendo permutações e combinações e principalmente
problemas relacionados à teoria das probabilidades.
4 Matemática nos séculos XVII a XIX

Figura 2. Capa da obra Ars conjectandi, publicado em 1713 por Jacques Bernoulli.
Fonte: Internacional... (2013, documento on-line).

Nessa obra aparece um importante teorema da área, chamado de lei


dos grandes números, que enuncia que, se um evento com probabilidade de
ocorrência p ocorre m vezes em uma sequência de n experimentos, então:

Isto é, a probabilidade da frequência relativa de ocorrências deste evento


tornar-se arbitrariamente próxima da probabilidade p à medida que o número
de experimentos aumenta tende a 1, ou seja, 100%.

A tabela a seguir apresenta uma simulação computacional de


uma sequência de n lançamentos de uma moeda honesta, isto
é, a probabilidade de sair a face cara é p = 0,5 = 50% em cada lançamento.
Em cada sequência, a quantidade m de faces cara é obtida e a frequência
relativa FR = m/n é calculada.

Sequência n m FR = m/n

1 10 8 0,8

2 100 51 0,51

(Continua)
Matemática nos séculos XVII a XIX 5

(Continuação)

Sequência n m FR = m/n

3 1.000 484 0,484

4 10.000 5.019 0,5019

5 100.000 49.986 0,49986

6 1.000.000 499.604 0,499604

Observe como a frequência relativa do evento “face cara” já fica muito


próxima de p = 0,5 para uma sequência de n = 100 lançamentos. Esse resultado
é um exemplo clássico da lei dos grandes números na versão apresentada por
Jacques Bernoulli.

Na área de equações diferenciais, Jacques Bernoulli, em parceria com


seu irmão Jean e com Leibniz, contribuiu para o desenvolvimento da hoje
conhecida equação de Bernoulli:

onde p(x) e g(x) e são funções quaisquer de x. A solução proposta para essa
equação consiste na transformação v = y1-n. A equação obtida ao substituir tal
transformação na equação diferencial original é linear, e portanto, passível
de solução pelo método do fator integrante, por exemplo.

Equações diferenciais são equações que envolvem funções desco-


nhecidas e suas derivadas. A resolução de uma equação diferencial
consiste basicamente em obter tais funções ou classes de funções que satisfazem
a equação dada.

O irmão de Jacques, Jean Bernoulli, também obteve resultados impor-


tantes na matemática. Escreveu livros didáticos sobre cálculo diferencial
e integral e, enquanto esteve em Paris, ensinou esse então novo ramo da
matemática para um marquês, que possuía grande interesse pela área, o
marquês de L’Hospital (1661–1704). Além dos ensinamentos, Jean Bernoulli
6 Matemática nos séculos XVII a XIX

enviava ao marquês artigos e descobertas recentes da matemática. Numa


dessas descobertas feitas por Jean Bernoulli está a conhecida regra de
L’Hospital, extremamente utilizada no cálculo diferencial. Se f(x) e g(x) são
diferenciáveis em x = a e f(a) = g(a) = 0, então:

caso o limite do lado direito da equação exista. Logo, a regra de L’Hospital é


amplamente aplicada em problemas envolvendo indeterminações no cálculo
de limites. Essa regra foi colocada por L’Hospital em seu livro Analyse des
infinement petit, publicado em 1696 e considerado o primeiro livro didático
impresso de cálculo diferencial.
Os filhos de Jean Bernoulli, Nicholas (1695–1726), Daniel (1700–1782)
e Jean II (1710–1790) também se tornaram professores de matemática,
com destaque para Daniel Bernoulli, que fez importantes avanços em
hidrodinâmica (princípio de Bernoulli), na teoria das probabilidades,
entre outras áreas, quando professor da Academia de Ciências de São
Petersburgo, na Rússia.

Mais detalhes técnicos sobre a regra de L’Hospital, e também sobre


cálculo diferencial em geral, consulte Stewart (2017).

Leonhard Euler
Considerado um dos matemáticos mais produtivos da história, com mais de
500 artigos publicados em diversas áreas, o suíço Leonhard Euler (1707–1783)
(Figura 3) influenciou gerações com o desenvolvimento e a fundamentação
da análise matemática. Sua obra Introductio in analysin infinitorum, de 1748,
é considerada a fonte inicial dos fundamentos da análise e proporcionou o
avanço da área posteriormente por outros matemáticos.
Matemática nos séculos XVII a XIX 7

Figura 3. Leonhard Euler.


Fonte: About... ([2021?], documento on-line)/CC BY-NC-SA 4.0).

Euler estudou com Jean Bernoulli e fez grandes amizades com seus filhos
Nicholas e, principalmente, Daniel. Tinha imensa habilidade em outras áreas
do saber, como medicina, línguas, astronomia e teologia. Tais conhecimen-
tos permitiram sua entrada na cadeira de medicina da Academia de São
Petersburgo, na Rússia, onde os irmãos Nicholas e Daniel Bernoulli estavam
trabalhando, porém como professores de matemática. Certo tempo depois,
Euler conseguiu transferência para a cadeira de filosofia natural da academia.
Construiu grande reputação na instituição e em toda a Europa, onde ganhou
diversas premiações acadêmicas. Fez parte da Academia de Berlim a convite
de Frederico, o Grande, onde ficou por 25 anos, até retornar à Rússia. Mesmo
com graves problemas de visão, que o levaram à completa cegueira, Euler
permaneceu produzindo e pesquisando até sua morte, em 1783 (FLOOD;
WILSON, 2013).
A influência de Euler já é evidente com as notações matemáticas defi-
nidas por ele e utilizadas até os dias de hoje. Para citar alguns exemplos, a
utilização da letra grega ∑ para representar somatórios, a notação f(x) para
funções da variável x, a aplicação de letras maiúsculas para ângulos internos
8 Matemática nos séculos XVII a XIX

de um triângulo e minúsculas para seus lados, além da letra i para unidade


imaginária de um número complexo. Por fim, a definição da letra e para a
base dos logaritmos naturais, constante conhecida como número de Euler.
Com essas notações, pode-se estabelecer a famosa identidade de Euler:

que relaciona alguns dos números mais importantes da matemática, como


0, 1 e π, e ainda apresenta todo um leque de operações básicas, incluindo
soma, potenciação, multiplicação e igualdade.
Como já mencionado, uma das principais contribuições de Euler
foi a fundamentação da análise matemática, que estuda processos e
metodologias associados ao infinito, como o comportamento de se-
quências, limites de funções, convergência de séries infinitas, entre
outros. De fato, com o avanço da análise, diversos resultados oriundos
do cálculo diferencial e integral foram formalmente demonstrados com
ferramentas da análise.
A família Bernoulli e Leonhard Euler foram os personagens principais de
uma era na matemática. Entretanto, diversos matemáticos importantes foram
contemporâneos dos Bernoulli e de Euler, responsáveis por grandes avanços
em áreas como cálculo diferencial e integral, análise matemática e teoria
dos números. Nesse âmbito, podemos destacar Colin Maclaurin (1698–1746),
Brook Taylor (1683–1731) e Michel Rolle (1652–1719) com importantes trabalhos
no cálculo, Gabriel Cramer (1704–1752) e Jean Le Rond D’Alembert (1717–1783)
na álgebra e Alexis Clairaut (1713–1765) nas equações diferenciais (BOYER;
MERZBACH, 2018; ROONEY, 2017).

A matemática na Revolução Francesa


e no século XIX
O período da Revolução Francesa, no final do século XVIII, trouxe vários grupos
de matemáticos responsáveis por avanços em diversas áreas, principalmente
na própria França. Matemáticos como Lagrange, Laplace, Legendre, entre
outros, são personalidades tanto na matemática quanto, alguns deles, na
revolução em si. Nesse período, os matemáticos começam a propor maior
rigor e formalidade no pensamento matemático, o que se solidificou princi-
palmente no século seguinte.
Matemática nos séculos XVII a XIX 9

Joseph-Louis Lagrange (1736–1813), italiano, mas com ascendência francesa,


contribuiu significativamente para o cálculo diferencial e integral. Formulou
o teorema do valor médio, que enuncia que, se uma função f é contínua em
e diferenciável em , então existe tal que:

Além disso, Lagrange propôs a utilização dos atualmente conhecidos


multiplicadores de Lagrange para obtenção de máximos e mínimos de fun-
ções com restrições em seu domínio, além de ter sido o autor do método
da variação de parâmetro na resolução de equações diferenciais lineares
não homogêneas. Ficou conhecido pela elegância de seus métodos, além da
preocupação com o rigor analítico de suas proposições. Assim como Lagrange,
o francês Adrien-Marie Legendre (1752–1833) foi importante no cálculo, por
meio de estudos em equações diferenciais, integrais elípticas e na escrita do
tratado Exercices du calcul integral, produzido entre 1811–1819, com grande
impacto na análise matemática. O formalismo e o rigor matemático defendidos
por Lagrange também são encontrados em Legendre, cuja obra Éléments
de géometrie, de 1794, ficou famosa pela clareza e pelo rigor aplicados nos
conceitos abordados (BOYER; MERZBACH, 2018).
O século XVIII foi marcante pelos primeiros desenvolvimentos na teoria
das probabilidades, com participações fundamentais dos franceses Abraham
De Moivre (1667–1754) e Pierre-Simon Laplace (1749–1827) (Figura 4). O primeiro
foi o autor da influente obra Doctrine of chances, de 1718, com abordagem em
diversos problemas probabilísticos envolvendo jogos de dados e retiradas
de bolas em urnas, além de estabelecer uma teoria para permutações e
combinações. Segundo Boyer e Merzbach (2018), foi o primeiro a trabalhar
com a expressão da curva gaussiana ou distribuição normal:

que também fora estudada por Laplace e utilizada por Gauss na sua teoria
dos erros. Laplace, inclusive, foi o autor de diversos artigos na área de teoria
das probabilidades. Reuniu seus resultados na obra Théorie analytique des
probabilités, de 1812, considerada clássica na área. Por fim, escreveu Essai
philosophique des probabilités, de 1814, em que considera toda a teoria
desenvolvida sobre a área até então, além de introduzir o assunto para o
público leigo.
10 Matemática nos séculos XVII a XIX

Figura 4. Pierre-Simon Laplace.


Fonte: Pierre... ([2021?], documento on-line).

A matemática do século XIX evoluiu tanto em aspectos técnicos — com


o surgimento de novos conceitos, como geometria não euclidiana, espaços
n-dimensionais e álgebras não comutativas — quanto em aspectos filo-
sóficos, em que o rigor lógico-dedutivo passava a ter papel central nas
demonstrações dos resultados. A matemática pura recebeu mais atenção,
com maiores incentivos à pesquisa e à divulgação. Foi esse o século que
testemunhou o auge de Gauss, considerado o principal matemático do
período.
Carl Friedrich Gauss (1777–1855) nasceu na Alemanha e desde criança
já demonstrava habilidades com a matemática. Pesquisas importantes
na geometria, na álgebra e na teoria dos números foram conduzidas, com
resultados de destaques obtidos por Gauss ainda jovem. Apresentou de-
monstrações do teorema fundamental da álgebra, que afirma que uma
equação de grau n possui exatamente n raízes (reais ou complexas). Desco-
briu o famoso método dos mínimos quadrados, fundamental na estatística,
por ser um método de otimização que visa obter a melhor aproximação
ou, em linguagem estatística, melhor ajuste, considerando a minimização
da soma dos quadrados das distâncias entre o ajuste e as observações
(ROONEY, 2017).
Matemática nos séculos XVII a XIX 11

Vejamos um exemplo com registros de vendas de certo produto.


Uma reta de regressão é o ajuste obtido aos dados pelo critério
de mínimos quadrados desenvolvido por Gauss. Se y i são as observações em
x i, i = 1, ..., n, então os coeficientes α e β da reta de regressão
da reta de regressão são obtidos minimizando a quantidade:

A Figura 5 apresenta um exemplo de uma reta de regressão ajustada a um


conjunto de pontos.

Figura 5. Exemplo de reta de regressão.

Para mais detalhes sobre métodos de mínimos quadrados em esta-


tística, consulte Montgomery, Peck e Vining (2012).
12 Matemática nos séculos XVII a XIX

Em teoria dos números, Gauss publicou a influente obra Disquisitiones


arithmeticae (Figura 6), publicada em 1801, em que reuniu diversos avanços
na área obtidos por matemáticos como Euler, Lagrange e Legendre, além de
resultados alcançados por ele mesmo.

Figura 6. Capa de Disquisitiones arithmeticae, de Gauss, publicada em 1801.


Fonte: Gauss (1801, documento on-line).

Em teoria de probabilidades, Gauss aplicou a curva hoje conhecida como


curva gaussiana ou distribuição normal, apresentada na Figura 7, para modelar
erros de medição em dados astronômicos. Postulou que a frequência dos
erros distribuía-se simetricamente ao redor de zero, que era o valor modal.
A expressão analítica da curva gaussiana já fora estudada por De Moivre
e Laplace, mas sua aplicação por Gauss no âmbito da teoria dos erros foi
fundamental para seu desenvolvimento e popularidade.
Matemática nos séculos XVII a XIX 13

Figura 7. Distribuição normal, ou curva gaussiana.

Apesar do destacado papel de Gauss na matemática do século XIX, diversos


matemáticos devem ser mencionados por suas importantes contribuições
no período. Augustin-Louis Cauchy (1789–1857), por exemplo, estabeleceu
o termo “determinante” e realizou diversos trabalhos sobre o assunto, que
hoje é essencial em estudos sobre matrizes. Entre outras contribuições,
generalizou de certa forma o teorema do valor médio no cálculo, em que, se f
e g satisfazem as condições mencionadas anteriormente quando introduzido
o teorema, então:

O prussiano Carl Cristov Jacobi (1804–1851), o norueguês Niels Henrik Abel


(1802–1829) e o francês Évariste Galois (1811–1832), apesar do pouco período
em que viveram (Galois, por exemplo, faleceu em um duelo aos 20 anos), foram
responsáveis por avanços na teoria dos números, no cálculo diferencial e
integral, na álgebra, entre outras (BOYER; MERZBACH, 2018).

Influências em sala de aula


Os avanços realizados em todas as áreas da matemática entre os séculos
XVII e XIX estão presentes atualmente nas salas de aula, a começar pelas
14 Matemática nos séculos XVII a XIX

notações, muitas delas introduzidas por Euler no século XVIII para funções
matemáticas, para a unidade imaginária e para a base do logaritmo natural,
por exemplo. As ferramentas de cálculo, amplamente estudadas naquele
período, podem ser vistas em diversos assuntos. Ao abordar esses conceitos
em sala de aula, o professor pode fazer conexões com o contexto histórico e
com os matemáticos que os desenvolveram. O exemplo a seguir interpreta o
teorema do valor médio em termos de retas secantes e tangentes.

Interpretação do teorema do valor médio


A partir do teorema do valor médio, temos que:

Note que o lado esquerdo da equação representa o coeficiente angular


da reta secante ao gráfico da função de f que passa pelos pontos (a, f(a)) e (b,
f(b)). O teorema diz que existe um ponto (c, f(c)) cuja reta tangente ao gráfico
neste ponto possui o mesmo coeficiente angular que o da reta secante em
(a, f(a)) e (b, f(b)), isto é, as retas secantes em (a, f(a)) e (b, f(b)) e tangente em
(c, f(c)) são paralelas.
Para ilustrar, considere a função:

Vamos considerar também a = 1 e b = 6. É fácil verificar que a função


é contínua e diferenciável em [1, 6]. Pelo teorema do valor médio, existe
tal que:

Esse valor c pode ser encontrado sabendo-se que f’(x) = 2x – 5. Assim:

A Figura 8 apresenta o gráfico de f com as retas secante em


e , em vermelho, e tangente em ,
em verde. Observe que as retas são paralelas, com coeficiente angular igual
a 2 pelo teorema do valor médio.
Matemática nos séculos XVII a XIX 15

Figura 8. Gráfico de f com as retas secante e tangente.

Conceitos trabalhados no ensino básico, como matrizes, determinantes e


equações também apresentam fortes influências dos trabalhos dos matemá-
ticos dos séculos XVII a XIX. Os exemplos a seguir ilustram estas influências.

Os determinantes foram desenvolvidos por matemáticos importantes


dos séculos XVIII e XIX, como Laplace, Lagrange e Cauchy, inclusive
com aplicações na geometria. Considere um triângulo cujos vértices são os
pares ordenados (1, 2), (3, 8) e (–1, –5). Lagrange estabeleceu a famosa fórmula
de cálculo da área A do triângulo fazendo:

onde:

isto é, a primeira coluna de M são os valores da abscissa, a segunda coluna são


as ordenadas e a terceira é preenchida com 1. Ao calcular o determinante de M,
temos que det(M) = –2 . Logo:
16 Matemática nos séculos XVII a XIX

Diversos matemáticos estudaram como demonstrar o teorema fun-


damental da álgebra, e Gauss foi um deles. Esse teorema tem grande
impacto no estudo de equações, uma vez que expande a ideia de raízes de uma
equação para os números complexos. Considere a equação quadrática:

x2 + 1 = 0

De fato, a equação dada não possui raízes reais. Porém, o teorema funda-
mental da álgebra garante que tal equação possui duas raízes, por ser de grau
igual a 2. Nesse caso, as duas raízes são complexas, isto é:

onde é a unidade imaginária. Note que se um número complexo é raiz


de uma equação, seu conjugado também o é.

Por fim, o incentivo ao rigor matemático em demonstrações e raciocínios


também é fruto do período histórico estudado nesta seção.
Com os exemplos examinados, fica evidente que a matemática ensinada e
aplicada atualmente é resultado de séculos de árduas pesquisas, experimentos
e pensamentos desenvolvidos por diversos matemáticos em várias partes do
mundo. Além disso, seus conceitos são desenvolvidos e aperfeiçoados gradu-
almente, assim como ocorre na ciência de forma geral. Entender o contexto
histórico do pensamento de um dado conceito matemático é fundamental
para sua completa compreensão.

Referências
ABOUT Project Euler. In: PROJECTEULER.NET. [S. l.], [2021?]. Disponível em: https://
projecteuler.net/about. Acesso em: 22 fev. 2021.
BOYER, C. B.; MERZBACH, U. C. História da matemática. São Paulo: Blucher, 2018.
FLOOD, R.; WILSON, R. A história dos grandes matemáticos: as descobertas e a pro-
pagação do conhecimento através das vidas dos grandes matemáticos. São Paulo:
MBooks, 2013.
GAUSS, C. F. Disquisitiones arithmeticae. In: SMITHSONIAN Libraries. New York, 1801.
Disponível em: https://archive.org/details/disquisitionesa00gaus. Acesso em: 22
fev. 2021.
INTERNACIONAL CONFERENCE ARS CONJECTANDI, 2013. Basel: Swiss Statistical Society,
2013. Disponível em: http://www.statoo.ch/bernoulli13/. Acesso em: 22 fev. 2021.
MONTGOMERY, D.; PECK, E.; VINING, G. Introduction to linear regression analysis. Ho-
boken: Wiley, 2012.
Matemática nos séculos XVII a XIX 17

PIERRE Simon. Matemáticos famosos. In: PROFESSOR Cardy. [S. l.], [2021?]. Disponível
em: http://www.profcardy.com/matematicos/index.php?c=Fran%C3%A7a. Acesso em:
22 fev. 2021.
ROONEY, A. A história da matemática. São Paulo: MBooks, 2017.
STEWART, J. Cálculo. 8. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2017. v. 1.

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HISTÓRIA DA
MATEMÁTICA
Desenvolvimento
da matemática
no século XX
Celso Pessanha Machado

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Descrever a matemática da virada do século XIX para o século XX.


>> Identificar as contribuições dos matemáticos do século XX.
>> Demonstrar técnicas da matemática do século XX na sala de aula de ma-
temática.

Introdução
Após uma autêntica revolução no século XIX, um novo período se abriu para a
matemática, conduzido pelas inúmeras contribuições anteriores, que levaram à
formatação de uma lista de problemas que nortearam as pesquisas matemáticas,
como um desafio permanente às mentes dedicadas ao estudo dessa ciência.
Neste capítulo, você vai encontrar uma descrição das contribuições mate-
máticas ao longo do século XX, passando pela constatação de que há questões
matemáticas não demonstráveis. Também estudará a construção teórica da lógica
que possibilitou o desenvolvimento dos computadores, e ainda verá um novo tipo
de geometria, a geometria fractal. Por fim, conhecerá uma aplicação da matemática
do século XX que pode ser utilizada na educação básica.
2 Desenvolvimento da matemática no século XX

A matemática entre os séculos XIX e XX


O século XIX foi bastante fértil para a matemática, com desenvolvimento de
ideias muito originais, fundamentando novos campos de pesquisa em várias
seções da disciplina. Historicamente, o final do século foi marcado pela guerra
franco-prussiana, um evento que redundou na anexação da Alsácia-Lorena
pela Prússia, na unificação da Alemanha, na estipulação de um pesado pa-
gamento de indenização pela França e na ocupação de territórios franceses
por forças alemãs, com a manutenção de um processo de enfrentamento que
levou às duas guerras mundiais já no século XX (CONSTANT, 2020). No campo
da matemática, vamos conhecer as atividades da virada daquele século,
examinando a trajetória de dois gênios: Jules Henri Poincaré e David Hilbert.

Jules Henri Poincaré


Poincaré nasceu em Nancy, França, em 1854, filho de um médico que lecionava na
faculdade de medicina da cidade. Formou-se em engenharia, partindo em seguida
para o doutorado em matemática, abrindo as portas para a docência, lecionando
probabilidade, mecânica celeste, análise e astronomia (HENRI..., [2021a?]).
Seus trabalhos iniciais foram dedicados à teoria das equações diferenciais
(criou um método geral de resolução), à teoria geral das funções analíticas
de uma ou duas variáveis, bem como a mecânica analítica, mecânica celeste,
álgebra e teoria dos números e teoria das funções fuchsianas, que permitem
expressar as soluções de qualquer equação diferencial linear por meio co-
eficientes algébricos e, concomitantemente, resolver o problema da unifor-
mização das funções algébricas (HENRI..., [2021b?]). Além disso, o matemático
estabeleceu a existência das funções kleinianas e iniciou o ramo de estudo
conhecido como topologia algébrica, descobrindo em uma pesquisa sobre
o sistema solar a influência das condições iniciais, tornando-se pioneiro da
teoria do caos. Poincaré morreu em 17 de julho de 1912.

Conjectura de Poincaré
A conjectura de Poincaré, datada de 1904, afirma que qualquer variedade
tridimensional fechada é topologicamente equivalente à esfera S3, que é uma
generalização de uma esfera comum para uma dimensão superior. Segundo
Hosch (2013), o próprio Poincaré mais tarde generalizou sua conjectura para
qualquer dimensão, afirmando que a n-esfera é o único espaço n-dimensional
limitado que não contém buracos, implicando que, para n = 3 voltamos à
conjectura original.
Desenvolvimento da matemática no século XX 3

Segundo Mackenzie (2006), para n = 2 a prova ocorreu no século XIX. Mais


tarde, em 1961, Stephen Smale provou que a conjectura é verdadeira para
n ≥ 5, e em 1983 Michael Freedman mostrou que é verdadeira para n = 4.
Finalmente, o matemático russo Grigori Perelman provou que a conjectura de
Poincaré é verdadeira para n = 3. Os três matemáticos foram agraciados com
a medalha Fields, recusada por Perelman, que também recusou um prêmio
de um milhão de dólares pela prova.

Para saber mais sobre a conjectura de Poincaré em detalhes, consulte


Viana ([20-?]).

David Hilbert
David Hilbert foi um matemático alemão, nascido numa cidade famosa por sua
ligação com a história da matemática devido às suas pontes, Königsberg, em
23 de janeiro de 1862, e morreu em outra cidade que deve muito de sua fama
aos grandes mestres da ciência que passaram por sua universidade, como
Carl Friedrich Gauss, Felix Klein, e o próprio Hilbert. Estamos nos referindo
à Göttingen, onde David morreu em 14 de fevereiro de 1943 (UNIVERSITÄTS-
GESCHICHTE..., [2021?]).
Em 1895, Hilbert foi trabalhar em Göttingen, lecionando teoria algébrica
dos números, noções básicas de geometria, análise, física teórica e noções
básicas de matemática. Em 1900, apresentou 23 problemas no Congresso
Internacional de Matemáticos de Paris, os quais nortearam muitas buscas
durante os séculos XX e XXI. Como exemplo, podemos citar o 8º problema,
que é a hipótese de Riemann (DAVID..., [2021?]).
Entre vários trabalhos produzidos por Hilbert, destacam-se a teoria in-
variante, a criação de um método direto para provar teoremas de finitude
(fundamentais para a álgebra moderna), o teorema da irredutibilidade de
Hilbert, investigações sobre a representação de polinômios definidos como
somas de quadrados, a solução das equações de 9º grau por funções algé-
bricas de quatro variáveis, a teoria dos campos de números algébricos, a
axiomatização da álgebra e da topologia, o resgate do princípio de Dirichlet,
o reconhecimento da importância do que hoje é denominado de espaço de
Hilbert e uma prova da conjectura de Waring (DAVID..., [2021?]).
David Hilbert propôs uma curva fractal que preenche o espaço, derivada
da curva de Peano, denominada curva de Hilbert, exibida na Figura 1.
4 Desenvolvimento da matemática no século XX

Figura 1. Curva de Hilbert.


Fonte: Fiedorowicz (2005, documento on-line).

Para saber quais são e do que tratam os 23 problemas de Hilbert,


consulte Gaspareti (2014).

Estavam lançadas as bases para o novo século, novos tempos de des-


cobertas, que seriam muito influenciadas pelo Congresso de Matemáticos
de Paris de 1900, onde Hilbert lançou seus problemas que foram fonte de
inspiração e meta de pesquisa para diversos matemáticos por todo o globo.

Matemáticos de destaque no século XX


Analisar a matemática do século XX não é tarefa simples, pois a proximidade
dos anos ainda nos leva a ter várias dúvidas sobre as principais descobertas. É
possível que nas próximas décadas (ou séculos) possa haver uma opinião discor-
dante da nossa, até porque novos avanços podem surgir na ciência em virtude de
descobertas recentes e aplicações que sequer imaginamos que possam existir.
Nossa lista de pesquisadores inclui Alan Turing, Kurt Gödel e Benoit Mandelbrot.

Kurt Gödel
Gödel nasceu na Áustria em 1906, e tinha o apelido familiar de “senhor por quê”,
pela curiosidade que o levava a perguntar sobre diferentes assuntos. Quando
Desenvolvimento da matemática no século XX 5

entrou na Universidade de Viena, aos 18 anos, já tinha tanto conhecimento sobre


matemática que os cursos regulares nada podiam oferecer como acréscimo,
e seu se interesse ficou concentrado na lógica matemática (QUEM..., 2018).
Antes de Gödel, havia uma opinião recorrente entre os matemáticos de
que os problemas da área seriam cedo ou tarde resolvidos, até mesmo os que
constavam na lista de 23 problemas que Hilbert apresentou no Congresso
de Matemática em 1900. Em 1930, Kurt Gödel anunciou ter provado que era
impossível demonstrar todas as verdades de uma teoria, e que sempre ha-
veria afirmações verdadeiras que não seriam passíveis de demonstração a
partir de axiomas propostos — esse é o primeiro teorema da incompletude
de Gödel (PIÑEIRO, 2017).
Quando os nazistas assumiram o poder na Alemanha, em 1933, a situação
ficou difícil para todos os judeus, inclusive para grandes cientistas, como
Einstein e Gödel. Em 1938, Gödel teve negado uma solicitação para um cargo
remunerado na Universidade de Viena e passou a temer ser recrutado pelo
exército nazista, resolvendo fugir com sua esposa. Eles atravessaram a União
Soviética pela ferrovia transiberiana e pegaram um navio para San Francisco,
nos Estados Unidos, indo em seguida se estabelecer em Princeton, onde Gödel
morreu em 1978 (KURT, c2021).

Alan Turing
Segundo Hodges (1995), Alan Mathison Turing nasceu em 23 de junho de 1912,
e desde a infância mostrava sinais de muita inteligência, tendo oportunidade
de estudar na Sherborne School, escola de prestígio de Londres, formando-se
em matemática na Universidade de Cambridge em 1931.
Em 1935, Turing começou a se dedicar a uma questão sobre a capacidade
de decisão, conhecida pelo termo alemão Entscheidungsproblem (problema de
decisão), que pergunta se poderia haver, ao menos em princípio, um método
ou processo definido capaz de decidir se qualquer afirmação matemática é
ou não demonstrável? Para responder essa pergunta, se fazia necessário que
houvesse uma definição de método, que deveria ser precisa e convincente.
Turing forneceu a resposta expressando-a em termos de uma máquina teórica
capaz de realizar certas operações elementares precisamente definidas sobre
símbolos em fita de papel, criando o conceito chamado máquina de Turing,
base da teoria da computação (HODGGES, 1995).
Com o advento da Segunda Guerra Mundial, Turing foi convocado pela
forças britânicas para trabalhar em Bletchley Park, local onde equipes bus-
cavam descobrir os códigos utilizados pelas forças do Eixo (Alemanha, Itália
6 Desenvolvimento da matemática no século XX

e Japão). Os nazistas utilizavam uma máquina chamada Enigma (Figura 2)


para transmitir mensagens para suas tropas, e a primeira quebra do código
operacional do dispositivo aconteceu em 23 de janeiro de 1940, quando a
equipe formada por Alan Turing, John Jeffreys e Peter Twinn descobriu a
chave usada pelo Exército Alemão, iniciando uma sequência que descobriu
a chave usada pela força aérea alemã e posteriormente os sistemas italiano
e japonês (BLETCHLEY PARK, [2021?]).

Figura 2. Enigma, máquina de criptografia usada pelo regime nazista.


Fonte: Reinhold (2019, documento on-line).

De acordo com Mlodinow (2005), pode-se estimar que a quebra do có-


digo da Enigma abreviou a possível duração da Segunda Guerra Mundial
em dois anos. Como morreram aproximadamente 12 milhões de pessoas
por ano durante a guerra, esse trabalho talvez tenha poupou cerca de 24
milhões de vidas.
Apesar de seu heroísmo em seu brilhante esforço de guerra, Alan Turing
(Figura 3) viria a ter um destino trágico: por ser homossexual, que era um crime
na Inglaterra da época, foi forçado a um tratamento de castração química.
Aos 42 anos, Turing se suicidou, ingerindo uma maçã injetada com cianureto,
em 7 de junho de 1954.
Desenvolvimento da matemática no século XX 7

Figura 3. Placa na entrada do bangalô utilizado por Alan Turing (bem à direita na placa),
situada atualmente no Bletchley Park Museum.

As máquinas podem pensar?


Essa é a pergunta que abre o artigo “Computing machinery and intelligence”,
de Turing (1950), cuja primeira parte se chama “The Imitation Game”, o jogo da
imitação. Você já deve ter ouvido falar nessa expressão, que dá título ao filme
homônimo que retrata a vida do matemático. O artigo prossegue propondo
que se troque a pergunta por um jogo, denominado jogo da imitação, que
funciona assim: temos três jogadores, um homem (A), uma mulher (B) e um
interrogador (C), que homem ou mulher. C fica em uma sala sem ver A e B, que
estão em outra. C conhece os dois por códigos X e Y. A não quer ajudar C. B
quer ajudar C. Objetivo do jogo: C deve identificar quem é o homem e quem
é a mulher no final do jogo, do seguinte modo: X é A e Y é B ou X é B e Y é A.
As respostas são datilografadas e as perguntas podem ser do tipo “qual
é o comprimento do seu cabelo?” (TURING, 1950), e os interlocutores A e B
devem dar as respostas de acordo com seu objetivo (ajudar ou não C). A partir
desse cenário, Turing estende ainda mais o potencial do jogo, se perguntando
o que aconteceria se A for substituído por uma máquina? Conseguiria enganar
o interrogador por quanto tempo? Levaria mais tempo para ser descoberto
que um ser humano? E conseguiria enganar C em algum interrogatório?
No artigo, Turing supõe que haverá um dia em que as máquinas terão
capacidade para “[...] jogar o jogo da imitação tão bem que um interrogador
médio não terá mais de 70% de chance de fazer a identificação correta após
8 Desenvolvimento da matemática no século XX

cinco minutos de interrogatório” (TURING, 1950, p. 442, tradução nossa).


Na sequência, apresenta nove objeções à sua ideia, desconstruindo todas
elas: a teológica, “cabeça na areia”, matemática, argumento da consciência,
argumentos de várias deficiências, objeção de Lady Lovelace, argumento
de continuidade no sistema nervoso, argumento da informalidade de com-
portamento e argumento da percepção extrassensorial. O artigo de Turing
é a base para julgar se uma máquina pensa ou não ainda nos nossos dias.

“Cabeça na areia” (head in the sand), é uma expressão da língua inglesa


usada para denotar uma situação em que não se deseja refletir sobre
um problema desagradável, enterrando a cabeça no chão, por assim dizer.

Benoît Mandelbrot
Mandelbrot (1924–2010) nasceu em Varsóvia, na Polônia, mas durante a infância
sua família, devido a dificuldades financeiras, emigrou para a França. Após a
invasão alemã de 1939, instalaram-se em Tulle, pois eram judeus e essa era
uma zona francesa desocupada, um pouco mais segura, rumando mais tarde
para Paris em 1944, onde Benoit pôde cursar a École Polytechnique, indo para
o Massachusetts Institute of Technology (MIT) no período 1953–1954, para
o pós-doutorado. Em 1958, foi trabalhar na IBM, em um estágio de verão, e
permaneceu por 35 anos na empresa, enquanto, em paralelo, dava aulas na
Universidade de Yale (BENOÎT..., c2021).
Mandelbrot ganhou fama trabalhando e divulgando a geometria fractal,
que mostrava graficamente uma série de estruturas matemáticas que estu-
dou, especialmente as variações econômicas caóticas e repentinas que se
revelavam serem mais frequentes do que era previsto. Ele lecionou até 2004,
quando encerrou sua carreira como professor emérito em Yale, morrendo
em 2010 em Cambridge.

Quanto mede o litoral da Grã-Bretanha?


Para ilustrar o que são fractais, muitas vezes Mandelbrot (1998) utilizava como
exemplo o litoral da Grã-Bretanha, perguntando qual é o comprimento total
da costa da ilha. Em seguida, ele propunha medir o litoral com uma régua
imaginária com a medida de 200 milhas (cerca de 320 km), sendo preciso
utilizar oito delas para completar a mensuração, totalizando 1.600 milhas
(cerca de 2.500 km). Diminuindo a graduação de nossa régua para 25 milhas
Desenvolvimento da matemática no século XX 9

(40 km) cada uma, utilizaríamos 102 segmentos para a medição, encontrando
um comprimento final de 2250 milhas (cerca de 3.600 km). Se obtivermos
mapas locais e continuarmos a medir o litoral, o comprimento total segue
aumentando, pois conforme nos aproximamos, mais detalhes surgem. Isso
acontece porque o litoral é um fractal e sua dimensão não é um número
inteiro, e sim uma fração, estando entre 0 e 1.

Cálculo da dimensão fractal


De acordo com Assis et al. (2008), o cálculo da dimensão fractal é feito com
uso de logaritmos, em geral, para fractais construídos recursivamente, a
partir de c cópias de si próprios. Redefinidos por um fator 1/f, teremos que
a dimensão (d) é:

Como exemplo, podemos tentar calcular a dimensão da curva de Koch,


exibida na Figura 4.

Figura 4. Curva de Koch.


Fonte: SCHMIDTKE (2003, documento on-line).
10 Desenvolvimento da matemática no século XX

Observe que a curva é construída a partir de um segmento de reta que


é dividido em três partes iguais, sendo retirado o segmento do meio, que é
substituído por um triângulo equilátero que tem sua base retirada. A figura
passa por um processo de iteração, com a repetição da regra n vezes, multi-
plicando-se os segmentos por 4/3, em que três segmentos são substituídos
por 4 de igual comprimento, indo para um limite definido por Mandelbrot
como infinito interno (ASSIS et al., 2008). Aplicando a fórmula anterior para
o cálculo da dimensão d e fazendo as substituições, temos que:

Muita gente que acessa seu notebook, usa seu smartphone, assiste a um
vídeo em algum canal da web talvez nem imagine a capacidade intelectual, o
talento, a imaginação e a criatividade de matemáticos como Benoît Mandel-
brot e Alan Turing, que deram os passos teóricos que possibilitaram avanços
tecnológicos definidores da nossa sociedade, cujos hábitos e cultura estão
imersos no virtual. Esse já um fato por si só com peso considerável para
admirarmos a matemática produzida no século XX, e pensar no que ainda
pode nos surpreender nos anos que vem por aí.

A matemática do século XX na sala de aula


É possível abordar conceitos de matemática do século XX em sala de aula na
educação básica, ou devemos, nesse nível do ensino, nos ater à matemática
desenvolvida até o século XIX? Alguns autores supõem que é possível mostrar um
pouco da matemática do século XX em sala de aula, inclusive porque Artur Avila,
brasileiro ganhador da Medalha Fields em 2014, dedicou-se bastante às pesquisas
sobre sistemas dinâmicos, e seu exemplo pode servir como incentivo à população
estudantil brasileira, especialmente os mais jovens, para o estudo da matemática.
Morais (2014) defende em sua dissertação de mestrado a possibilidade
de utilização em sala de aula das descobertas matemáticas mais recentes,
destacando os sistemas dinâmicos não lineares, a teoria do caos e os frac-
tais, argumentando que esses temas aparecem sistematicamente na mídia,
propondo uma transposição didática em conjunto com algumas propostas de
aplicações em sala de aula na educação básica. Já Machado, Giraffa e Lahm
(2011) relatam a experiência de propor um grupo de aulas para o 9º ano do
ensino fundamental, em que é utilizado o aplicativo Google Earth para busca
de imagens das geometrias euclidiana e fractal sobre a superfície da Terra. A
dinâmica das aulas foi organizada em diversas etapas, começando por uma
Desenvolvimento da matemática no século XX 11

produção textual, depois revisão de conceitos, buscas de informações na web,


aula expositiva sobre geometria fractal, identificação, seleção e salvamento de
imagens que apresentassem as duas geometrias, apresentação de trabalhos
mostrando as conclusões e, para finalizar, uma segunda produção textual.
Os textos serviram para dois objetivos: o primeiro era verificar os conhe-
cimentos prévios dos alunos sobre a geometria em geral e o segundo era
realizar uma avaliação do conhecimento construído durante a jornada de
estudos. A revisão dos conceitos é uma tarefa sempre necessária no ensino
de matemática, pois, como o conhecimento matemático progride em cima
das bases já estabelecidas e provadas formalmente, não compreender um
tema pode ter consequências negativas na trajetória escolar. Nesse caso,
o importante era conhecer os axiomas e as figuras planas, com ênfase no
conceito dimensional, para poder haver compreensão das ideias de dimensão
fracionária, que embasam o estudo dos fractais.
No experimento relatado, e em outros similares executados pelos autores
do artigo, é comum os alunos se depararem com informações na internet
sobre Edward Lorenz e o efeito-borboleta, tema muito explorado pela mídia,
inclusive sendo mote para inúmeros filmes. Em virtude dessa disponibilidade
de informações, sugere-se que o professor se prepare estudando o tema em
detalhes de antemão, para poder conversar com sua turma. Imagens com asas,
por exemplo, são comuns na geração de fractais, como ilustra a Figura 5, que
mostra um atrator fractal do tipo Lorenz.

Figura 5. Fractal gerado em computador, usando a ferramenta on-line Chaoscope.


12 Desenvolvimento da matemática no século XX

A turma, nessa etapa, tem algumas informações sobre fractais e caos,


pois mesmo que possuísse pouca ou nenhuma informação sobre tais temas,
agora já captou algo via busca na internet, facilitando a exposição da teoria.
No grupo de aulas em questão, foi apresentado o modelo de construção da
curva de Koch, que já vimos nesse capítulo, mas sem menção aos logaritmos.
Caso as aulas sejam adaptadas para o 3º ano do ensino médio, quando se
retorna ao tema da geometria euclidiana (com axiomas e geometria espacial),
é possível apresentar o cálculo com logaritmos, aproveitando para revisar o
assunto com uma aplicação interessante.
No experimento de Machado, Giraffa e Lahm (2011), a aula seguinte foi
realizada como projeto de pesquisa no laboratório de informática da escola.
Todavia, a evolução técnica dos smartphones e dos aplicativos permite a
realização do mesmo trabalho em sala de aula, caso haja um Wi-Fi eficiente
à disposição da turma e um número suficiente de aparelhos celulares com
os alunos. Nessa fase, a ideia é procurar imagens de satélite que apresentem
figuras geométricas e figuras fractais, como telhados, recortes de litoral, etc.
A etapa final do projeto consiste na apresentação das imagens selecio-
nadas pelos alunos e pela confecção do texto final, a partir do qual será
avaliada a aprendizagem.
A matemática apaixona pelas ideias que contém, e sua história é um desen-
rolar de fatos incríveis, de descobertas, de trabalho árduo e contínuo, executado
ao longo de gerações. Nessa última sessão, apresentamos uma sugestão de
aproximação da fronteira das pesquisas em matemática com a educação bá-
sica, pois é na sala de aula das escolas públicas e privadas que estão agora os
futuros indivíduos que levarão adiante essa história, dependendo de nós para
apresentar um vasto mundo formado por números, teorias e demonstrações.

Referências
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