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Sombras de Lealdade

A movimentação era muito grande no pátio da fortaleza. Soldados corriam de um lado a outro
procurando por coisas que seriam difíceis estarem lá. Kobolds magos usavam suas parcas
habilidades para tentar localizar qualquer vestígio dos invasores. Era a primeira vez que a
Fortaleza das Cem Agulhas tinha sido invadida. O pior é que algo havia sido roubado e a
preocupação dos militares não repousava tanto sob o item em si, mas em como a mãe da
ninhada azul receberia esta informação. Eles tinham razão em estarem nervosos.
Uma linda elfa caminhava no pátio. Usava um peitoral azulado feito com algo que dava a
impressão de ser escamas de dragão perfeitamente ajustadas ao corpo dela. Ela encarou um
dos capitães. Seu cabelo prata e olhos azuis brilhantes deixavam o militar muito inquieto.
- Espero que tenha melhores notícias agora do que antes, caro Kranahak.
- Talvez, minha senora.
Ele disse abaixando os olhos conforme ela se aproximava.
- Deixe-me julgar isto.
- Claro. Encontramos quatro dos bandidos, senhora. Eles nos disseram que vieram em
seis. Dois deles restam desaparecidos.
- E o que roubaram, foi encontrado?
- Não, senhora. Está com os dois que conseguiram escapar.
A mulher deu um rosnado alto. O Capitão desviou o olhar esperando por algum tipo de
reprimenda. A mulher mostrou seus dentes pontiagudos para seu subordinado, mas antes que
pudesse realizar algum tipo de agressão, foi interrompida por uma outra pessoa.
- Quando eu soube não acreditei. Só depois que cheguei é que aceitei a verdade. Como
isto foi acontecer, Thareessa?
Questionou a mulher. Ela era ainda mais bonita que a elfa. Parecia humana vista ao longe, mas
possuía um par de chifres pontiagudos na cabeça. Suas pupilas azuis de brilho intenso
pareciam navegar na escuridão do restante dos olhos. Também vestia uma armadura coberta
de escamas. A diferença era que pareciam ser muito mais grossas do que as da outra elfa. O
capitão ajoelhou quando percebeu a presença da mulher.
- Mãe! Ainda estamos investigando para saber como eles entraram e… como saíram.
- Eu confiei a você todos os seus irmãos. Confiei a você minha ninhada, minha fortaleza,
meus homens, até mesmo a… E você deixou que invadissem?
- Eu honro o compromisso que a senhora me deu. Morreria no lugar de qualquer um
deles se fosse preciso.
- Não quero sua honra. Quero a sua obediência. Você fracassou Thareessa e isto vai ter
um custo muito alto para nós.
Disse a mulher demonstrando toda a sua frustração. A elfa mordia os lábios de raiva de si
mesma. O capitão interrompeu a discussão das duas mulheres.
- Senhora! Minha rainha! Temos visita.
Saindo das sombras vinha um homem. Ele tinha a pele escura como a noite. Seus olhos
brilhavam em vermelho intenso. Parecia um humano e vestia-se como um homem estrangeiro.
Na cabeça usava um grande turbante decorado com arcos de ferro dourados e pedras
preciosas. A jovem Thareessa caminhou na direção dele, mas foi impedida com apenas um
gesto de sua mãe.
- Achei que a recepção no ninho azul fosse melhor.
- Quando as visitas são bem-vindas, sempre são boas. No seu caso, meu desprezo é
quase uma recompensa.
Disparou as palavras como se fossem flechas em chamas na direção do visitante. Ele sorriu de
forma debochada.
- Seu rancor não lhe serve de nada, Thareec. Eu vim… ajudar… pelo que soube sua
casa foi violada. Quer dividir a preocupação?
- Não há nada aqui que possa lhe interessar, Estoracgos.
- Discordo. Tem batedores nos arredores, comoção dentro da fortaleza e quatro mortos.
Algo me diz que ainda não acabou.
Thareessa percebeu a inquietação de sua mãe. Chegou a balbuciar uma resposta, mas a
mulher deu uma resposta quase que imediatamente.
- Ainda não faz sentido a sua preocupação.
- Me preocupo com o fato de você estar escondendo coisas de seus irmãos, Thareec.
Detestaria ter que contar aos outros que você dá motivos para desconfiar de sua
lealdade.
- Lealdade? O que um chantagista como você sabe sobre lealdade? Está aqui por
interesse próprio.
- Eu não pedi para estar aqui. Estava muito bem em meu plano. Seu irmão me buscou.
- Thadderus tem medo da profecia. Acha que você tem algum valor contra o que ele
espera acontecer.
- Devo supor que não confia na decisão de seu irmão, Thareecgosa?
A mulher rugiu. Por um instante aumentou de tamanho. Garras eram visíveis nas pontas de
seus dedos. Parecia que um imenso trovão havia caído no meio da fortaleza. Todos os servos
olharam para a sua Rainha.
- É por causa desta lealdade que você não está retalhado, Estoracgos. Então, não abuse
da pouca sorte que tem. Você pode até se parecer com um de nós, mas é apenas uma
vaga ideia do nosso passado. Seus criadores refugiaram-se nas sombras eternas para
esconder a própria vergonha. Você não é um dragão de verdade. Apenas uma sombra.
O homem encarou a mulher. O sorriso irônico havia sumido e dado lugar para um ódio muito
contido.
- Eu vou embora. Já descobri o que precisava.
O homem deu as costas para a Rainha. Ele sumiu nas sombras da mesma forma com a qual
tinha chegado. Thareecgosa fez seus olhos trocarem de cor e observou ao seu redor. Quase
como se estivesse procurando algo, na verdade alguém, nas sombras. Como não encontrou
ninguém, permitiu-se um suspiro de alívio.
- Mãe, você acha que ele sabe sobre a relíquia?
- Com certeza ainda não, mas desconfia.
- O que faremos?
- Vamos encontrar antes dele ter a certeza que estava aqui. Chame todos os seus
contatos. Ladrões, guildas, mercenários, todos eles. Quero notícias dos desaparecidos
ainda hoje!
- E você, minha mãe? Para onde vai?
- Me certificar se meus irmãos ainda não sabem sobre a relíquia. Antes que seja tarde
demais...

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