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“Carta de Pero
Vaz de
Caminha”
@profhenriquelandim
OBRA: “Carta de Pero Vaz de Caminha”
AUTOR: Pero Vaz de Caminha

ANO DE ESCRITURA: essa crônica foi escrita no século XVI.

GÊNERO LITERÁRIO: o texto é um representante narrativo bastante cultuado


pelos homens renascentistas do século XVI, isto é, a crônica histórica.

MOVIMENTO LITERÁRIO: A crônica está inerida em nosso Quinhentismo, pois


percebemos um princípio investigativo típico do homem renascentista que
observa e anota com muita curiosidade a fim de documentar e, sobretudo,
dominar. Dentro desse movimento, a carta está inserida na Literatura de
Informação.
INTRODUÇÃO:
A carta de Caminha ou “Carta a el-Rei Dom Manuel sobre o
achamento do Brasil” passou mais de dois séculos no Arquivo
Nacional da Torre do Tombo, em Lisboa. Só foi descoberta em
1773 por José de Seabra da Silva e publicada oficialmente pelo
historiador Juan Batista Munhoz. No Brasil, foi publicada pelo
padre Manuel Aires de Casal na obra “Corografia Brasílica”, em Imagem: Carta de Pero Vaz de
Caminha ao Rei D. Manoel / Public
1816. Domain.

A célebre Carta de Caminha inaugura, juntamente com a chegada da esquadra


portuguesa, uma nova etapa nas relações discursivas entre o velho e o novo
continente,
ALGUMAS MARCAS DA CRÔNICA:
Em termos temáticos e estruturais encontramos alguns aspectos
relevantes na “Carta do Achamento”:

Noção de Paraíso Edênico Metalinguagem

Espírito renascentista Literatura de Informação

Mito de fundação Etnocentrismo


NOÇÃO DE PARAÍSO EDÊNICO
De acordo com Alfredo Bosi, sobre o primeiro contato do europeu com a América,
podemos falar sem rebuços em “visão do paraíso como leitmotiv das descrições:
Eldorado, Éden recuperado, fonte da eterna juventude, mundo sem mal, volta à
Idade de Ouro” (1978, p. 19). Os primeiros europeus que se lançaram rumo à
América, segundo Maria Lucília Barbosa Seixas, pensavam encontrar no “novo”
continente a concretização do mito da Idade de Ouro. Seria uma espécie de
regresso à primeira Idade da Humanidade, a um mundo onde não haveria
propriedade nem autoridade, “e onde também se usufruía da abundância. A
nudez dos Índios fez com que os navegadores, missionários e colonos portugueses
remontassem à Idade de Ouro, ao pretenderem transportar para o futuro a idade
edênica” (SEIXAS, 2003, p. 21-22).
SE LIGA NO TRECHO:
E assim seguimos nosso caminho, por este mar de longo,
até que terça-feira das Oitavas de Páscoa, que foram 21 dias de
abril , topamos alguns sinais de terra, estando da dita Ilha —
segundo os pilotos diziam, obra de 660 ou 670 léguas — os quais
eram muita quantidade de ervas compridas, a que os mareantes
chamam Botelho, e assim mesmo outras a que dão o nome de
rabo-de-asno. E quarta-feira seguinte, pela manhã, topamos aves a
que chamam furabuchos.
Neste mesmo dia, a horas de véspera, houvemos vista de
terra! a saber, primeiramente de um grande monte, muito alto e Imagem: Carta de Pero Vaz de Caminha ao Rei D.
Manoel / Public Domain.
redondo; e de outras serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã,
com grandes arvoredos; ao qual monte alto o capitão pôs o nome
de o Monte Pascoal e à terra A Terra de Vera Cruz!

@profhenriquelandim
SE LIGA NO TRECHO:
[...]
Andamos por aí vendo o ribeiro, o qual é de muita água e muito boa. Ao longo dele há
muitas palmeiras, não muito altas; e muito bons palmitos. Colhemos e comemos muitos
deles.
Foi o Capitão com alguns de nós um pedaço por este arvoredo até um ribeiro grande, e de
muita água, que ao nosso parecer é o mesmo que vem ter à praia, em que nós tomamos
água. Ali descansamos um pedaço, bebendo e folgando, ao longo dele, entre esse arvoredo
que é tanto e tamanho e tão basto e de tanta qualidade de folhagem que não se pode
calcular. Há lá muitas palmeiras, de que colhemos muitos e bons palmitos.
[...]
Entre todos estes que hoje vieram não veio mais que uma mulher, moça, a qual esteve
sempre à missa, à qual deram um pano com que se cobrisse; e puseram-lho em volta dela.
Todavia, ao sentar-se, não se lembrava de o estender muito para se cobrir. Assim, Senhor, a
inocência desta gente é tal que a de Adão não seria maior — com respeito ao pudor.
MITO DE FUNDAÇÃO:
Vivemos na presença difusa de uma narrativa da origem. Essa narrativa, embora
elaborada no período da conquista, não cessa de se repetir porque opera como
nosso mito fundador. [...] Mito fundador porque, à maneira de toda a
“fondatio”, impõe um vínculo interno com o passado como origem, isto é, com
um passado que não cessa, que não permite o trabalho da diferença temporal e
que se conserva como permanente presente. Um mito fundador é aquele que
não cessa de encontrar novos meios para exprimir-se, novas linguagens, novos
valores e ideias, de tal modo que, quanto mais parece ser outra coisa, tanto
mais é a repetição de si mesmo (CHAUI, Marilena. O mito fundador do Brasil. Caderno Mais. Folha de São Paulo.
São Paulo, 26 de Março de 2000, p. 10)
METALINGUAGEM:
Caminha é o representante do homem que tem sua formação no imaginário
medieval, mas que se aproxima do humanismo e das pretensões objetivistas da
razão renascentista. Por conta disso, atribui-se isenção moral, objetividade e
análise científica apuradas. Pretende-se isento de condicionamentos, mas, na
verdade, Caminha não escapa do misticismo e da ambivalência. De posse dessa
formação transitória entre o velho e o moderno, julga com a visão social de uma
sociedade letrada, religiosa, conservadora e, ao mesmo tempo, lançada ao
desenvolvimento técnico e em sintonia com a visão dos estudos avançados dos
novos lugares “descobertos”.

@profhenriquelandim
SE LIGA NO TRECHO:
Posto que o Capitão-mor desta Vossa frota, e assim os outros capitães escrevam a Vossa
Alteza a notícia do achamento desta Vossa terra nova, que se agora nesta navegação
achou, não deixarei de também dar disso minha conta a Vossa Alteza, assim como eu
melhor puder, ainda que — para o bem contar e falar — o saiba pior que todos fazer!

Pereira da Silva / Museu Paulista / Public Domain.


Imagem: Desembarque de Pedro Álvares Cabral
em Porto Seguro em 1500, 19002 / Oscar
O ESPÍRITO RENASCENTISTA:
O homem renascentista procura lançar o seu domínio sobre todas as ordens
mundo sejam elas humanas ou naturais. Tudo é passível de uma articulação
racional e reflexiva sobre o objeto observado. Em nosso caso, aquilo que é
observado / estudo é a própria terra do Brasil dotada de uma geografia humana e
natural bastante exótica se comparada à cosmovisão do europeu que por aqui
chegou. No Brasil, tudo desperta bastante curiosidade de quem possui o poder da
palavra escrita. Dessa maneira, tudo deve ser compreendido e, sobretudo
registrado na crônica. Na “Carta do achamento”, o momento que os índios são
levados à presença de Vasco da Gama é o ponto alto desse espírito renascentista.
LITERATURA DE INFORMAÇÃO:
A “Carta do achamento” de Pero Vaz de Caminha está inserida dentro de um
movimento literário brasileiro nomeado de Quinhentismo. Esse movimento
literário possui duas vertentes, a Literatura dos Jesuítas e a Literatura de
Informação. A crônica de Caminha pode ser classificada como uma obra da
Literatura de Informação, pois ela apresenta um caráter descritivista a respeito
da geografia natural (terra) e humana (índios) do Brasil. Neste caso, temos
crônicas históricas (“documento” histórico marcado pelo olhar exótico)
escritas à Corte lusa.
ETNOCENTRISMO:
As atitudes de etnocentrismo e eurocentrismo fazem Caminha
recorrer a comparações constantes do que via com o que já conhecia
de seu próprio grupo cultural. Historicamente, os nativos foram de
Imagem: Carta de Pero Vaz de Caminha ao Rei
inocentes a monstros, de anjos a demônios, de pacíficos a selvagens D. Manoel / Public Domain.

canibais, nas idealizações dos colonizadores, estrangeiros e visitantes.


Caminha, por vezes, não se deixa vencer pelo espanto. Procurando
uma linguagem comparativa para amenizar o impacto da visão do
novo, com as referências cristalizadas em seu imaginário, procura ver
na cultura inusitada, resquícios da sua própria cultura. Os impactos se
sucedem, inclusive com a visão da exuberância da paisagem, da nudez
dos habitantes, não de sua existência, já pressupostamente sabida,
mas da nudez que os tornava, diferencialmente, distantes da
humanidade.
SE LIGA NO TRECHO:
Ao velho com quem o Capitão havia falado, deu-lhe uma carapuça vermelha. E com toda
a conversa que com ele houve, e com a carapuça que lhe deu tanto que se despediu e
começou a passar o rio, foi-se logo recatando. E não quis mais tornar do rio para aquém.
Os outros dois o Capitão teve nas naus, aos quais deu o que já ficou dito, nunca mais aqui
apareceram - fatos de que deduzo que é gente bestial e de pouco saber, e por isso tão
esquiva. Mas apesar de tudo isso andam bem curados, e muito limpos. E naquilo ainda
mais me convenço que são como aves, ou alimárias montezinhas, as quais o ar faz
melhores penas e melhor cabelo que às mansas, porque os seus corpos são tão limpos e
tão gordos e tão formosos que não pode ser mais! E isto me faz presumir que não tem
casas nem moradias em que se recolham; e o ar em que se criam os faz tais. Nós pelo
menos não vimos até agora nenhumas casas, nem coisa que se pareça com elas.
@profhenriquelandim
MERCANTILISMO:
RESUMINDO:
▪ Partida de Belém no dia 09 de Março (sábado). ▪ 26 de abril (segunda): os degredados
narram como são as casas dos índios.
▪ 21 de Abril (quarta): primeiro sinais de Terra.
▪ 27 de abril (terça): os lusos foram à terra
▪ 22 de Abril (quinta): Nicolau Coelho. pegar lenha.

▪ 23 de abril (sexta): 2 índios são levados à nau ▪ 28 de abril (quarta): organizam os barcos
(índio bebeu vinho e água, apresentaram para a partida.
papagaio, carneiro, galinha. Na ocasião ocorreu
episódio do colar de ouro e do castiça de prata) ▪ 29 de abril (quinta): em terra os lusos
beijam a cruz.
▪ 24 de abril (sábado): 2 degredados vão à terra.
▪ 01 de maio (sexta): pela manhã rezam com
▪ 25 de abril (domingo): ocorre uma missa em 70 índios.
uma ilha.
QUESTÃO 01
O culto a natureza, característica da literatura brasileira, tem sua origem nos textos da
Literatura de Informação. Assinale o fragmento da carta de Caminha que já revela a
mencionada característica:

a) “Viu um deles umas contas rosário, brancas; acenou que lhes dessem, folgou muito com
elas, e lanço-as ao pescoço.”
b) “Assim, quando o batel chegou a foz do rio, estavam ali dezoito ou vinte homens pardos
todos nus sem nenhuma roupa que lhes cobrisse suas vergonhas.”
c) Mas a terra em si é muito boa de ares, tão frios e temperados como os de Entre-Douro e
Minho, porque, neste tempo de agora, assim os achávamos como os de lá. Águas são muitas
e indefinidas. De tal maneira é graciosa e querendo aproveita-las, dar-se-à nela tudo por
bem das águas que tem.”
d) “Porém o melhor fruto, que dela se pode tirar, me parece que será salvar esta gente. E
esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza em ela deve lançar.”
e) “Mostrara-lhes um papagaio pardo que o Capitão traz consigo, tornaram-no logo na mão e
acenaram para a terra, como quem diz que os estavam ali.”
QUESTÃO 02
Avalie as produções culturais abaixo que remetem ao mesmo contexto histórico –
Descobrimento do Brasil – e faça o que é pedido:

TEXTO I
TEXTO II

“Eram pardos, todos nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas. Nas mãos
traziam arcos com suas setas. Vinham todos rijamente sobre o batel e Nicolau Coelho lhes
fez sinal que pousassem os arcos. E eles os pousaram.
Ali não pôde deles haver fala, nem entendimento de proveito, por o mar quebrar na
costa. Deu-lhes somente um barrete vermelho e uma carapuça de linho que levada na
cabeça e um sombreiro de penas de ave, compridas, com uma copazinha pequena de penas
vermelhas e pardas como de papagaio; e outro deu-lhe um ramal grande de continhas
brancas, miúdas, ‘que querem parecer de aljaveira as quais peças creio que o capitão manda
a Vossa Alteza, e com isto se volveu às naus por ser tarde e não poder haver deles mais fala,
por causa do mar’” (OLIVIERI, Antonio Carlos; VILLA, Marco Antonio. (Org). Cronistas do descobrimento. 3.ed. São Paulo, 2000, p. 20 - 21).
A leitura dos textos nos permite inferir que:

A) A pintura e o texto nos mostram o mesmo ponto de vista (olhar eurocêntrico) que
predominava no século XVI.
B) No texto I a inversão do observador, deslocado para o continente, ao contrário da ordem
estabelecida pelo discurso histórico oficial, produz um efeito crítico.
C) O texto II expressa a positiva troca de elementos culturais entre duas culturas que sempre
se respeitaram mutuamente.
D) O texto I é uma espécie de embrião da nossa Literatura (Quinhentismo), que nos revela
uma visão completamente ficcional sobre o “novo mundo”.
E) Os índios do texto I apresentam fortes recursos bélicos para defender o seu lugar de
origem.
QUESTÃO 03
ERRO DE PORTUGUÊS

Quando o português chegou


Debaixo de uma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!
Fosse uma manhã de Sol
O índio tinha despido
O português.
Oswald de Andrade. Poesias reunidas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.

O primitivismo observável no poema anterior, de Oswald de Andrade, caracteriza de forma marcante


a) o regionalismo do Nordeste.
b) o concretismo paulista.
c) a poesia Pau-Brasil.
d) o simbolismo pré-modernista.
e) o tropicalismo baiano.
Nesse site está a carta de Pero Vaz:

https://digitarq.arquivos.pt/details?id=4185836

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