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O GÊNERO ROMANESCO: UM ALIADO NO SURGIMENTO

DO SER DA LINGUAGEM

Heloisa Helena Ribeiro de Miranda


heloisamiranda@hotmail.com

Resumo: O universo simbólico da linguagem constrói o universo da Arte, neste


universo o poético pode se manifestar em qualquer produção artística, para que ele se
manifeste, dependerá da forma como cada artista manuseia seu objeto de trabalho. O
artista precisa transcender a materialidade do objeto, decompor sua característica
comum e lhe atribuir uma nova significação. No caso da Literatura, o objeto de trabalho
é a palavra. Entretanto, não a palavra desgastada do cotidiano dotada
de referencialidade, mas a palavra-enigma, capaz de nos encaminhar para o nosso
próprio abismo; é nela que encontramos o poético, independente do gênero literário.
Esta palavra estilhaçada é que possibilita a personificação do ser da linguagem e a
autonomia da Literatura. Assim, para que possamos perceber este ser da linguagem que
surge autônomo, propomos no presente ensaio, uma discussão teórica a qual nos ajudará
a compreender esta autonomia, tendo como foco a evolução do gênero romanesco e a
concepção de Literatura foucaultiana.

Palavras-chaves: romance, ser da linguagem, literatura, Foucault

Abstract: El universo simbólico del lenguaje construye el universo del Arte, en este
universo el poético puede manifestarse en cualquiera producción artística, para que él
se manifieste, dependerá de la forma como cada artista utiliza su objeto de trabajo.
El artista necesita transcender la materialidad del objeto. En el caso de la Literatura, el
objeto de trabajo es la palabra. Pero, no la palabra agotada del cotidiano cargada de
referencialidad, sin embargo la palabra-enigma, capaz de encaminarnos para nuestro
abismo; es en ella que encontramos el poético, independiente del género literario. Esta
palabra astillada es que posibilita la personificación del ser del lenguaje y la autonomía
de la Literatura. Así, para que posemos percibir este ser del lenguaje que surge
autónomo, proponemos el presente en este presente ensayo, una discusión teórica la cual
nos ayudará a comprender esta autonomía, teniendo como foco la evolución del género
romanesco y la concepción de Literatura foucaultiana.

Palabras-llaves: romance, ser del lenguaje, literatura, Foucault

Iniciei minha graduação em Letras no ano 2001, pela Universidade Federal de


Mato Grosso – antigo campus do ICLMA – Instituto de Ciências e Letras do Médio
Araguaia, em Pontal do Araguaia. Lembro-me que no primeiro ano do curso tínhamos a
disciplina de Teoria Literária responsável por nos apresentar o que é a Literatura e nos
fornecer bases teóricas para sua compreensão. Recordo-me que de fato realizamos
vários estudos relacionados aos elementos estruturais do texto literário, não se
esquecendo de realizar a divisão em gêneros, mas me recordo que naquele ano, após
todos os estudos e leituras realizados, eu ainda não havia sido conquistada pela
Literatura.
A conquista só foi possível quase no final do ano seguinte, tendo como ponte A
valsa, de Casimiro de Abreu. Naquele ano, meu amigo Waldiney havia me pedido que o
ajudasse na apresentação de seu trabalho de Literatura Brasileira I, com uma análise
desse poema e em seguida uma fala de poesia. A fala, ela foi à responsável pelo meu
encontro com a Literatura, no instante da apresentação do texto de Casimiro tive a
sensação que não me pertencia, mas pertencia ao poema e ele a mim; este foi o primeiro
dos vários outros encontros que tive com a poesia durante a graduação.
Infelizmente essa experiência poética foi adormecida e as atividades
cotidianas passaram a habitar o espaço o qual havia pertencido a ela; eu não imaginava
que uma vez experienciado o poético ele retornaria, na realidade ele está dentro de cada
ser, adormecido, necessitamos de algo que desperte - o, suscite-o; e só agora, num curso
de pós-graduação, é que começo a compreender as transformações que passo quando
passo pelo poético.
Eu acreditava que o poético habitasse apenas o gênero lírico e que para encontrá-
lo eu precisaria apenas de um poema; na realidade o poético pode ser encontrado em
qualquer manifestação artística, e o fato de um texto ser escrito em versos não significa
que o poético possa ser encontrado nele. A poesia é a essência da Arte, é ela que define
se o que estamos apreciando é um objeto de arte ou apenas um artefato; para que ela se
manifeste, dependerá da forma como cada artista manuseia seu objeto de trabalho. O
artista precisa transcender a materialidade do objeto, decompor sua característica
comum e lhe atribuir uma nova significação.
No caso da Literatura, o objeto de trabalho é a palavra. Entretanto, não a palavra
desgastada do cotidiano dotada de referencialidade, mas a palavra-enigma capaz de nos
encaminhar para o nosso próprio abismo; é nela que encontramos o poético,
independente do gênero literário. Esta palavra estilhaçada é que possibilita a
personificação do ser da linguagem e a autonomia da Literatura. Assim, para que
possamos perceber este ser da linguagem que surge autônomo, propomos uma discussão
teórica a qual nos ajudará a compreender esta autonomia, tendo como foco a evolução
do gênero romanesco e a concepção de Literatura foucaultiana.
Segundo Michel Foucault, a Literatura seria uma invenção da modernidade, ou
seja, teria surgido no fim do século XVIII, início do XIX e já teria nascido morta, na
realidade não é da morte que o teórico trata, mas sim da consciência que a própria
literatura toma de si mesma, partindo do pressuposto que nela não há mais um sujeito
identificável, mas sim um ser da linguagem, uma vez que o “ser da linguagem é
pura exterioridade. Distanciando-se da certeza daquele que fala, a literatura volta-se
sobre si mesma, colocando em evidência seu próprio ser.” (LEVY, 2011, p. 58)
Tal consciência teria se manifestado efetivamente com Mallarmé e seu Un Coup
de des, a forma como o poeta trabalha a linguagem e passa a considerar a página em
branco como signo, leva-o a compreender que a Literatura ocuparia um lugar vazio,
possuindo como identidade apenas a linguagem; nesta concepção, desconsidera toda
produção anterior, por defender que antes o que é considerado literário está ligado à
forma de construção retórica dos textos.
Com esta visão, Foucault distingue três pontos: a linguagem, a obra e a
Literatura. Primeiro, a linguagem, a qual é percebida como sendo um acúmulo de
palavras na história e no próprio sistema da língua; esta linguagem utiliza tanto a forma
cotidiana e sufocada; bem como sua forma sublime na obra iluminada, possuindo o
poder de restituir o tempo e a si mesma. Em segundo, a obra, que seria o espaço de
construção de uma linguagem própria, sendo constituída por uma opacidade. Esta
opacidade é formada pelos efeitos criados pela própria linguagem e que, atualmente,
não reflete a realidade, fecha-se em si mesma. Assim, a Literatura não seria a
universalização de encontro de obras, mas o ponto de intersecção da relação entre a
linguagem e a obra, e desta com a linguagem.
A literatura não é o fato de uma linguagem transformar-se em obra,
nem o fato de uma obra ser fabricada como linguagem; a literatura é
um terceiro diferente da linguagem e da obra, exterior a linha reta
entre a obra e a linguagem, que, por isso desenha um espaço
vazio. (FOUCAULT apud MACHADO, 1999, p.145)

O espaço vazio ao qual se refere o autor, estaria relacionado ao universo da


representação construído pela Literatura. Agora, ela não pode ser mais considerada
apenas uma posição crítica, já que possui autonomia, compondo o eu-literário o qual
surge desintegrado. Deste modo, Foucault crê na diluição entre linguagem, obra e
Literatura.
Na antiguidade, as obras mantinham uma relação de verossimilhança, podiam
ser consideradas uma forma de percepção da realidade, uma vez que o sujeito ainda
possuía uma associação mais íntima com o real. Com a modernidade, tanto o sujeito
quanto a realidade foram fragmentados, e as obras literárias tornaram-se uma
representação da representação; não há mais uma realidade palpável. A Literatura seria
agora o lugar da representação do objeto representado, ou seja, do simulacro, da
transgressão e da morte.
Na literatura não há encontro absoluto entre a obra e a literatura. A
obra jamais encontra seu duplo finalmente dado. Por isso, ela é a
distância que há entre a linguagem e a literatura, uma espécie de
espaço de desdobramento. Esse espaço especular é o que poderia
chamar simulacro. (FOUCAULT apud MACHADO, 1999, p. 148)

Desta maneira, a obra com sua linguagem hermética a qual contempla a si


mesma, é considerada o duplo do vazio; é a construção de uma relação especular ao
nada a qual transgride a palavra, ocasionando a morte. O caminho percorrido pelo signo
é incerto, a palavra transgredida constrói a palavra-enigma, sua linha inconsútil não
fornece respostas, mas questionamentos, lançando a Literatura cada vez
mais ao “espaço vazio”, esse espaço seria formado pela intersecção entre o concreto e
abstrato do signo, compondo assim, a transgressão e a morte.
Foucault consegue analisar o caminho percorrido pela Literatura até a
conquista de sua autonomia, o que observamos nos estudos realizados na disciplina,
Teoria dos Gêneros Literários: romance, do Curso de Pós-Graduação em Estudos de
Linguagem da Universidade Federal de Mato Grosso, é que para os teóricos estudados o
romance se consolida no final do século XVIII e início do XIX, mesma data atribuída
por Foucault para o surgimento da Literatura.
O romance segundo Bakthin (2010), é o único gênero capaz de abarcar toda
complexidade humana, uma vez que está em constante transformação, é o gênero
inacabado o qual acompanha a historia e a representa. A forma de representação do
mundo é a chave para a compreensão do romance, para o estudioso
Georg Lukács (2000) na Era Clássica o homem conhece apenas as respostas, não faz
questionamentos, sendo assim, não existem enigmas, o mundo é um todo perfeito; a
alma humana não conhece nenhum abismo, ou seja, a divindade está próxima do
homem, e Ser e destino são análogos.
O mundo do sentido é palpável é abarcável com a vista, basta
encontrar nele o lócus destinado ao individual (...) o que é estranho
aos sentidos decorre somente da excessiva distância em relação ao
sentido. É um mundo homogêneo, e tampouco há separação entre
homem e mundo. (LUCKÁS, 2000, p. 29)
Esta não separação entre o homem e o mundo pode ser muito bem percebida na
obra de Cervantes. Considerada por Auerbach (2004) o primeiro romance da Era
Moderna, justamente por nos apresentar uma personagem com características
particulares a qual se afasta dos enredos rígidos epopéicos, Dom Quixote de La
Mancha traz a composição de um cavaleiro andante que luta pelos ideais clássicos e
que acredita na bondade humana.
Por estes ideais, está disposto a enfrentar, por mais que sejam fantasiosamente,
os maiores perigos. No entanto, devemos nos perguntar, sendo a obra de Cervantes uma
forma irônica de representação das novelas de cavalaria e da sociedade da época,
mesmo assim ela ainda contém esse cosmos harmônico? Ela o contém porque em
nenhum momento Dom Quixote duvida de seu destino, nele não encontramos um ser
abissal e vazio, ele está convicto de sua existência e não a questiona em nenhum
instante; sua realidade é palpável e seu futuro completamente certo.
Sabemos da grandiosidade do texto de Cervantes, mas para Foucault ele ainda
não pode ser considerado uma obra literária, e não podemos, por dois
motivos: primeiro o trabalho retórico do texto, principalmente nas falas da
personagem Dom Quixote, que busca por meio destas uma retórica sublime e o
modo de apresentação da realidade. Dom Quixote de La Mancha é constituído
por uma verossimilhança com o real, na concepção foucaultiana, a obra desdobrada
forja uma realidade, não busca apresentá-la como a obra de Cervantes, mas sim
representá-la, distanciando-se do real cria um duplo, ou seja, o simulacro.
Não é tão evidente que Dante, Cervantes ou Eurípedes sejam
literatura. Certamente, hoje fazem parte da literatura, pertencem a ela,
mas graças a uma relação que só a nós diz respeito. (...) Essa relação,
que constituía a literatura na época clássica, era apenas uma relação de
memória, de familiaridade, de saber, uma questão de
acolhida. (FOUCAULT apud MACHADO, 1999, p. 143-144)

Com a evolução da história, vai se constituindo um novo mundo que reflete na


composição de um novo sujeito. Distanciado do sagrado, ele vê agora seu cosmos não
como um todo perfeito, mas com fissuras que com o passar do tempo se tornarão
abismos em seu próprio eu. O ser, antes constituído pela coletividade, passa a ser
percebido em sua individualidade. Tenta-se convencê-lo de que ele é único e singular e
que por isso, deve ser valorizado como indivíduo, surge então o sujeito
problemático. Inventamos a produtividade do espírito: eis por que, para nós os
arquétipos perderam inapelavelmente sua obviedade objetiva e nosso pensamento trilha
um caminho infinito da aproximação jamais inteiramente concluída.
(KANT apud LUCKÁS, 2000, p. 30)
O sujeito agora está condenado ao dever-ser, ele é dono de seu destino, nunca se
conformando com a trivialidade do cotidiano, este novo sujeito o qual habita este
mundo fragmentado é que possibilita a consolidação do romance moderno e
a autonomia da Literatura. Para tanto, é necessário compreendermos a composição de
duas obras francesas: O Vermelho e o negro de Stendhal e O pai Goriot de Balzac,
textos que mostram claramente este duelo do sujeito e seu destino.
Em O vermelho e o negro Julien Sorel é filho de um humilde carpinteiro, nossa
personagem sonha com uma vida intensa e gloriosa, tendo como inspiração Napoleão
Bonaparte. Esta ambição desmedida e a inconformidade com sua realidade o levam a
conviver com a burguesia provinciana e com a aristocracia
parisiense. Entretanto, Julien Sorel quer modificar seu destino por méritos próprios,
convive com uma aristocracia falida e não se deixa infectar por sua podridão, já que está
convicto de seus valores, que na realidade são os valores burgueses divulgados pela
Revolução Francesa.
Neste sentido, Napoleão é o expoente maior, menino pobre que se torna, por
conquistas próprias, imperador da França, a personagem de Stendhal é motivada por
este ícone e assim, Julien se torna, segundo Luckás uma personagem problemática. Esta
personagem, inconformada com sua realidade, é a materialidade do sujeito moderno,
agora representado pelo romance. O indivíduo se transforma em matéria-prima na
composição romanesca, que passa a observar as particularidades do sujeito, seu
cotidiano e seus conflitos internos gerados pelo mundo exterior.
O romance busca descobrir e construir, pela forma a totalidade oculta da vida.
Para o teórico Ian Watt (1990), é esta forma que ele classifica de Realismo Formal que
possibilita a ascensão do romance, o modo de singularizar: o espaço, o tempo, o enredo
e a personagem, transformam-se na base desse romance moderno, o qual não busca
imitar a realidade com as epopeias, mas que traz uma nova forma de representar esta
realidade que não permite a manifestação da essência do sujeito.
O induvíduo fragmentado e conflituoso representado por Julien Sorel, passa
agora ao sujeito degradado Eugène de Rastignac, da obra O pai Goriot, de Balzac.
Como a personagem de Stendhal, Rastignac não se conforma com a vida que leva no
interior da França, e parte para Paris no intuito de estudar direito. No
entanto, Rastignac é evolvido pelos valores capitalistas burgueses, e busca sem
escrúpulos sua ascensão social. Julien também buscava esta ascensão, mas não à custa
de terceiros e sim por méritos. Rastignac, um indivíduo dissimulado e degradado pelos
valores do capitalismo, não se importa com os meios para alcançar seus objetivos, o que
lhe importa é alcançá-los.
A obra de Balzac é um exemplo claro de uma obra literária na
concepção foucaultiana, uma vez que Foucault considera a obra com um espaço de
transgressão. A personagem de Balzac transgride e distorce os valores burgueses, no
qual o indivíduo teria o direito de modificar seu destino buscando por si próprio esta
melhoria.
Na obra balzaquiana, Rastignac chega a ministro da justiça, ele vence, mas não
por mérito e sim à custa de mentiras, dissimulações e traições. Não há valores éticos
nesta personagem, há sim os valores do capital. O modo como Balzac opta em construir
seu romance nos possibilita observar que:
[...] quem poderá saber se a adequação do ato à essência do sujeito, o
único ponto de referência que restou, atinge realmente a substância,
uma vez que o sujeito se tornou uma aparência, um objeto para si
mesmo; uma vez que sua essencialidade mais própria e intrínseca lhe
é contraposta apenas como exigência infinita num céu imaginário
do dever-ser. (KANT apud LUCKÁS, 2000, p. 34)

É neste céu imaginário que se forma o ser da linguagem para Foucault, pois
considera que a Literatura é um distanciamento aberto no seu interior, uma distância
percorrida e jamais terminada, um tipo de linguagem que oscila sobre si mesma. Esta
oscilação permite ao signo uma órbita infinita, lexicalizando-se e deslexicalizando-se,
perpetuamente. É o fato de fechar sobre si que proporciona ao ser da linguagem, sua
autonomia, destituindo-o de qualquer funcionalidade.
Um exemplo fértil do ser da linguagem que compõe o espaço literário é a
obra brasileira, Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa. Neste romance
percebemos a ação do ser da linguagem que constrói: [...] Nas linhas mais gerais tem-se
o conto no meio do romance, assim como o diálogo dentro do monólogo, a personagem
dentro do narrador, o letrado dentro do jagunço, a mulher dentro do homem, o Diabo
dentro de Deus. (GALVÃO, 1972, p. 13)
A linguagem se transforma em objeto de si mesma, criando um duplo
clivo “[...] como na imagem da banda de Moebius que gera uma superfície num certo
sentido com dois lados: um que é exposto e um que é escondido.” (FINK, 1998, p.67)
Assim, temos a representação do objeto representado, o simulacro foucaultiano, que ora
se manifesta e ora se esconde, compondo esta ambiguidade que perpassa o romance.
A forma de construção da obra que faz uso de um diálogo-monólogo determina a
manifestação do ser da linguagem, pois todo o relato do velho jagunço se torna
convincente como linguagem a qual possui como elemento basilar o falar letrado do
sertanejo. Tal convencimento só é permitido, pois “[...] cada palavra real é de certo
modo uma transgressão da essência pura, branca, vazia e sagrada da literatura que faz de
toda obra não a realização da literatura, mas a ruptura, sua quebra, seu arrombamento.”
(FOUCAULT apud MACHADO, 1999, p. 146)
Este arrombamento compõe o espaço literário o qual não busca
nenhuma aproximidade com o real, mas sim estabelece uma relação especular com ele,
não uma afinidade de reflexão, no entanto, de refração. [...] A literatura – que não deve
ser compreendida nem como linguagem do homem, nem como a palavra de Deus, nem
como a linguagem da natureza, nem como a linguagem do coração ou do silêncio – é
uma linguagem transgressiva, mortal, repetitiva, reduplicada: a linguagem do próprio
livro. (FOUCAULT, apud MACHADO, 1999, p. 155)
Deste modo, a consolidação do romance coincide com o surgimento do ser da
linguagem que é a própria Literatura, o caminho percorrido pelo gênero até a sua
ascensão, constitui um dos fatores para a sua autonomia. A virilidade romanesca que na
modernidade transgride o signo, possibilita o manifestar de um outro universo, o
universo poético, isto é, a própria Arte. O romance como gênero em perpétua evolução,
transforma a trivialidade do cotidiano em matéria de poesia, conseguindo abarcar as
aflições do sujeito perdido de si mesmo e do mundo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AUERBACH, Erich. Mimesis. São Paulo: Perspectiva, 2004

BAKTHIN, Mikail. Questões de Literatura e de Estética: a Teoria do Romance. São


Paulo: Hucited Editora, 2010

FINK, Bruce. O sujeito lacaniano; entre a linguagem e o gozo. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 1998

GALVÃO, Walnice Nogueira. As formas do falso: um estudo sobre a ambiguidade


no Grande sertão: veredas. São Paulo: Perspectiva, 1972

LEVI, Tatiane. A experiência do fora: Blanchot, Foucault e Delize. Rio de Janeiro:


Civilização Brasileira, 2011

LUCKÁS, Georg. A teoria do romance: um ensaio histórico-filosófico sobre as formas


da grande épica. São Paulo: Editora 34, 2000

MACHADO, Roberto. Linguagem e literatura. In: Foucault e a literatura. Rio de


Janeiro, Jorge Zahar, 1999, p. 137-174

WATT, Ian. A ascensão do romance: estudos sobre Defoe, Richardson e Fielding.


Tradução Hildegard Fiest. São Paulo: Companhia das Letras, 1990

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