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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS


PROGRAMA DE PÓS­GRADUAÇÃO EM DIREITO

LUIZ FERNANDO ROSSETTI BORGES

A VIOLÊNCIA NO ARCO DO DESMATAMENTO DA AMAZÔNIA: CRIMES DOS


PODEROSOS E DANOS SOCIOAMBIENTAIS

FLORIANÓPOLIS
2021
LUIZ FERNANDO ROSSETTI BORGES

A VIOLÊNCIA NO ARCO DO DESMATAMENTO DA AMAZÔNIA: CRIMES DOS


PODEROSOS E DANOS SOCIOAMBIENTAIS

Dissertação submetida ao Programa de Pós­Graduação


em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina
para a obtenção do título de mestre em Direito.
Orientador: Prof. José Rubens Morato Leite, Dr.
Coorientadora: Prof.ª Marília De Nardin Budó, Dr.ª

FLORIANÓPOLIS
2021
Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor,
através do Programa de Geração Automática da Biblioteca Universitária da UFSC.
LUIZ FERNANDO ROSSETTI BORGES
A VIOLÊNCIA NO ARCO DO DESMATAMENTO DA AMAZÔNIA: CRIMES DOS
PODEROSOS E DANOS SOCIOAMBIENTAIS

O presente trabalho em nível de mestrado foi avaliado e aprovado por banca examinadora
composta pelos seguintes membros:

Prof. José Rubens Morato Leite, Dr.


Universidade Federal de Santa Catarina

Prof.ª Marília De Nardin Budó, Dr.ª


Universidade Federal de Santa Catarina

Prof.ª Vanessa Chiari Gonçalves, Dr.ª


Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Prof.ª Eliane Cristina Pinto Moreira, Dr.ª


Universidade Federal do Pará

Certificamos que esta é a versão original e final do trabalho de conclusão que foi
julgado adequado para obtenção do título de mestre em Direito.

____________________________
Coordenação do Programa de Pós­Graduação

____________________________
Prof. José Rubens Morato Leite, Dr.
Orientador(a)

Florianópolis, 2021
Esta Dissertação é dedicada ao
meu pai, Gentil, e à minha mãe, Cristina.

Dedico também à minha esposa, Manu.


AGRADECIMENTOS

À Emanuela Freitas de Valgas, minha esposa, por todo o amor, apoio, compreensão
e paciência durante esses anos, sem a qual esta Dissertação não seria possível. Obrigado por
me ouvir, pelas risadas e por partilhar a sua vida comigo.
Ao meio pai, Gentil Borges Neto, e à minha mãe, Cristina Rossetti Borges, por
sempre estarem juntos comigo, independentemente da distância, e por me apoiarem nos meus
sonhos. Pelo amor e afeto incondicionais e pelo incentivo e apoio permanentes
Às minhas irmãs, Maria Paula Rossetti Borges e Maria Eugênia Rossetti Borges, e
aos meus sobrinhos, Enzo Rossetti Borges Farina, Pedro Rossetti Borges Moreno e Enrico
Rossetti Borges Montebello, este último meu querido afilhado, e à minha tia Elvira Rossetti de
Araújo. Vocês são essenciais na minha vida.
Ao meu orientador, José Rubens Morato Leite, por ajudar a ampliar os meus
horizontes, por sua generosidade ao me dar tantas oportunidades e por confiar na minha
capacidade e no meu trabalho. Pelo engajamento e pela determinação na defesa de um mundo
melhor, o professor é uma inspiração.
À minha coorientadora, Marília de Nardin Budó, por me mostrar novas perspectivas
de estudo e por tanto confiar no meu potencial. Sua orientação foi fundamental para o
desenvolvimento desta Dissertação.
Aos meus amigos Humberto Filpi e Marcelo Mosmann, por juntos termos
caminhado e enfrentado diversas batalhas no mestrado da UFSC.
Ao meu amigo Marcos Rotta Pucci, por, mesmo não tendo o mesmo sobrenome, ser
meu irmão e companheiro de todas as horas.
À toda equipe do GPDA, por todas as discussões e troca de conhecimentos que muito
me engrandeceram. Deste valioso grupo, gostaria de nomear especificamente Valeriana
Broetto, Bruno Peixoto, Isabel Couto, Larissa Boratti, Fernanda Cavedon, José Irivaldo
Oliveira Silva e Melissa Melo.
Agradeço a todos os demais colegas e aos dedicados servidores e professores da
UFSC, em especial aos membros do OJE.
À Nequinha, ao Guinho e à Gaia, por serem do jeito que são e me encherem de amor
e energia nas horas mais importantes!
Reis do Agronegócio
Carlos Renno e Chico Cesar

Ó donos do agrobis, ó reis do agronegócio


Ó produtores de alimentos com veneno
Vocês que aumentam todo ano sua posse
E que poluem cada palmo de terreno

E que possuem cada qual um latifúndio


E que destratam e destroem o ambiente
De cada mente de vocês olhei no fundo
E vi o quanto cada um, no fundo, mente

[...] Vocês me dizem que o Brasil não desenvolve


Sem o agrebis feroz, desenvolvimentista
Mas até hoje, na verdade, nunca houve
Um desenvolvimento tão destrutivista

É o que diz aquele que vocês não ouvem


O cientista, essa voz, a da ciência
Tampouco a voz da consciência os comove
Vocês só ouvem algo por conveniência

Para vocês, que emitem montes de dióxido


Para vocês, que têm um gênio neurastênico
Pobre tem mais é que comer com agrotóxico
Povo tem mais é que comer, se tem transgênico

[...] Vocês se elegem e legislam, feito cínicos


Em causa própria ou de empresa coligada
O frigo, a multi de transgene e agentes químicos
Que bancam cada deputado da bancada
RESUMO

No contexto do Antropoceno, a exploração maciça de recursos primários no Sul Global por


corporações em associação com o Estado é compreendida como produtora de violência para a
natureza e para os seres humanos que nela vivem, porquanto são interdependentes, à vista de
uma característica interação e troca de energia. Sob o marco da Criminologia Verde e dos
Crimes dos Poderosos, verifica­se que corporações e Estado são responsáveis pela
vitimização de povos indígenas e tradicionais no Arco do Desmatamento da Amazônia.
Diante disso, esta Dissertação de Mestrado discute os processos econômicos, sociais e
jurídicos que levam aos danos sociais praticados na floresta – independentemente da sua
legalidade ou ilegalidade – por meio do método dedutivo, com procedimento monográfico e
com nível de pesquisa descritivo­explicativa, sendo marcante o caráter interdisciplinar. Não
obstante, utiliza­se da técnica de pesquisa bibliográfica, jurisprudencial e documental,
principalmente à vista da seleção sistemática de relatórios, estudos qualitativos, dados
estatísticos e reportagens jornalísticas. Questiona­se, assim, se a Criminologia pode contribuir
ou oferecer soluções para compreensão da destruição ambiental e das injustiças ambiental e
climática realizadas no Arco do Desmatamento amazônico praticadas pelo Estado em conluio
com corporações do agronegócio. A Criminologia possui um papel fundamental para análise
dos danos sociais e do processo de vitimização a partir do envolvimento da observação do
fenômeno por um viés relacional e interdependente entre ser humano e natureza.
Secundariamente, a prática de danos sociais e vitimização é viabilizada pelo desmantelamento
da proteção do meio ambiente e pela imunização penal dos latifundiários, entre outros
expedientes jurídico­políticos. O objetivo central é estudar a relação do ser humano/natureza
sob a abordagem do metabolismo social no cenário do Arco do Desmatamento Amazônico; e
o objetivo secundário é examinar os vínculos políticos e jurídicos entre as corporações e o
Estado, e seus efeitos em termos de danos sociais e vitimização. A análise da matéria é
realizada em dois capítulos de conteúdo. O primeiro capítulo traça um diagnóstico do
processo de degradação da Amazônia, compreendendo os interesses econômicos e
geopolíticos da ocupação dessa fronteira agrícola, e a atuação dos protagonistas que
promovem a violência e do processo de vitimização e a organização jurídica para ocupação do
território. Já o segundo trabalha com a tipologia galtunguiana de violência e com a abordagem
do metabolismo social para incorporar uma nova epistemologia da relação ética entre ser
humano e natureza, inclusive afetando a perspectiva de dano social. Nesse percurso, busca­se
elucidar os vínculos entre Estado e corporações, sobretudo a partir da atuação da bancada
ruralista no Congresso Nacional para manutenção da estrutura econômica e social desigual, a
imunização penal em relação aos danos sociais cometidos e o constante esforço para frustrar
medidas de efetivação de um Estado de Direito comprometido com a efetivação das normas
ambientais e com a redução dos impactos do Antropoceno.

Palavras­chave: Antropoceno. Arco do Desmatamento. Amazônia. Metabolismo Social.


Criminologia Verde. Crimes dos Poderosos. Ecocídio.
ABSTRACT

In the context of the Anthropocene, the massive exploitation of primary resources in the
Global South by corporations in association with the State is understood as a producer of
violence to nature and to the human beings who live there, as they are interdependent, in view
of a characteristic interaction and exchange of energy. Under the framework of Green
Criminology and Crimes of the Powerful, it is verified that corporations and the State are
responsible for the victimization of indigenous and traditional peoples in the Amazon Arc of
Deforestation. Therefore, this Master's Thesis discusses the economic, social and legal
processes that lead to social damages practiced in the forest ­ regardless of its legality or
illegality ­ through the deductive method, with a monographic procedure and with a
descriptive­explanatory research level, being marked the interdisciplinary character.
Nevertheless, the technique of bibliographic, jurisprudential and documental research is used,
especially in view of the systematic selection of reports, qualitative studies, statistical data and
newspaper reports. The question is, therefore, whether Criminology can contribute or offer
solutions for understanding the environmental destruction and the environmental and climatic
injustices carried out in the Amazonian Arc of Deforestation by the State in collusion with
agribusiness corporations. Criminology has a fundamental role in the analysis of social
damage and the process of victimization from the involvement of the observation of the
phenomenon through a relational and interdependent bias between human beings and nature.
Secondarily, the practice of social damage and victimization is made possible by the
dismantling of environmental protection and the penal immunization of landowners, among
other legal­political expedients. The central objective is to study the human/nature
relationship under the social metabolism approach in the setting of the Amazon Arc of
Deforestation; and the secondary objective is to examine the political and legal links between
corporations and the state, and their effects in terms of social harm and victimization. The
analysis of the subject matter in two content chapters. The first chapter traces a diagnosis of
the process of degradation of the Amazon, understanding the economic and geopolitical
interests of the occupation of this agricultural frontier, and the actions of the protagonists who
promote violence and the process of victimization and the legal organization for the
occupation of the territory. The second one works with the Galtunguian typology of violence
and with the social metabolism approach to incorporate a new epistemology of the ethical
relationship between human beings and nature, also affecting the perspective of social
damage. In this path, we seek to elucidate the links between state and corporations, especially
from the actions of the rural caucus in the National Congress to maintain the unequal
economic and social structure, the criminal immunization in relation to social damage
committed and the constant effort to frustrate measures to implement a rule of law committed
to the enforcement of environmental standards and reducing the impacts of the Anthropocene.

Keywords: Anthropocene. Arc of Deforestation. Amazon rainforest. Social Metabolism.


Green Criminology. Crimes of the Powerful. Ecocide.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Desmatamento na Amazônia Legal – PRODES (período 2008­2019) .................... 25


Figura 2: Queimadas na Amazônia Legal­ DETER (período 2016­2020) ............................. 25
Figura 3: Taxas de desmatamento na Amazônia Legal – PRODES (período 1988­2020) ...... 28
Figura 4: Emissões por município ­ toneladas (t) de CO2e (GWP­AR5) ­ ano­base 2018 – 20
maiores emissores do Brasil ................................................................................................. 31
Figura 5: Limites da Amazônia Legal................................................................................... 42
Figura 6: Rodovias na Amazônia brasileira .......................................................................... 44
Figura 7: Dados de incêndio da NASA VIIRS. Os alertas de queimadas pelo satélite VIIRS da
NASA foram sobrepostos às proximidades das 10 principais áreas de abastecimento dos
comerciantes de soja, em um raio de 25 km da localização de seus silos............................... 51
Figura 8: Vinculação entre desmatamento de propriedades rurais à agricultura e às
exportações .......................................................................................................................... 52
Figura 9: Visibilidade da origem do gado quanto à fazenda com desmatamento ilegal ao longo
da cadeia produtiva .............................................................................................................. 56
Figura 10: Dados de incêndio da NASA VIIRS. Os alertas de queimadas constatados pelo
satélite NASA VIIRS foram sobrepostos às zonas de compra potencial (IMAZON) dos
matadouros de cada empresa ................................................................................................ 58
Figura 11: Exploração madeireira e processo de lavagem de madeira ilegal ......................... 63
Figura 12: Taxas de incremento anual de desmatamento em terras indígenas – PRODES
(período 2008­2020) ............................................................................................................ 71
Figura 13: Taxas de incremento anual de desmatamento em unidades de conservação –
PRODES (período 2008­2020)............................................................................................. 77
Figura 14: Orçamento discricionário do IBAMA e do ICMBio para fiscalização e incêndios
florestais .............................................................................................................................. 97
Figura 15: Orçamento discricionário do IBAMA .................................................................. 98
Figura 16: Orçamento discricionário do ICMBio .................................................................. 99
Figura 17: AIA anotados pelo IBAMA no Brasil (período 2004­2020) ............................... 100
Figura 18: AIA anotados pelo IBAMA por Estados no Arco do Desmatamento (período 2004­
2020) ................................................................................................................................. 102
Figura 19: Incremento de desmatamento na unidade de conservação Jamanxim ................. 106
Figura 20: Características distintivas do Estado de Direito Ambiental – Primeiro Relatório
Environmental Rule of Law ................................................................................................ 160
LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Tipologia da violência ....................................................................................... 113


Quadro 2: Interação entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento .................... 119
LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Violência contra a ocupação e a posse – Estados da Amazônia Legal.................... 74


LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABAG Associação Brasileira do Agronegócio


ABIN Agência Brasileira de Inteligência
AIA Auto de Infração Ambiental
APA Área de Proteção Ambiental
APIB Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
BASA Banco da Amazônia
CAR Cadastro Ambiental Rural
CENSIPAM Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia
CGU Controladoria­Geral da União
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente
CONAVEG Comissão do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa
COVID­19 Doença por Coronavírus 2019
COSAG/FIESP Conselho Superior do Agronegócio da Federação das Indústrias do Estado de
São Paulo
CPI Comissão Parlamentar de Inquérito
DETER Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real
DOF Documento de Origem Florestal
FBMC Fórum Brasileiro de Mudança do Clima
FPA Frente Parlamentar da Agropecuária
FUNAI Fundação Nacional do Índio
GSI Gabinete de Segurança Institucional
GTA Guia de Trânsito Animal
ICMBio Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
iNDC Pretendida Contribuição Nacionalmente Determinada
INMET Instituto Nacional de Meteorologia
INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
ILC International Law Comission
IPCC Intergovernmental Panel on Climate Change
MAPA Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
MP Medida Provisória
MMA Ministério do Meio Ambiente
MPF Ministério Público Federal
NOx Óxidos de Nitrogênio
OEA Organização dos Estados Americanos
PAC Programa de Aceleração do Crescimento
PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PF Polícia Federal
PRODES Projeto de Monitoramento da Floresta Amazônica por Satélite
IPA Instituto Pensar Agropecuária
INTERPOL The International Criminal Police Organization
SINAFLOR Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais
SUDAM Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia
UNFCCC Convenção­Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima
GLOSSÁRIO DE CONCEITOS OPERACIONAIS

Este Glossário contém termos e expressões, os quais são conceitos chaves


formulados com diversas fontes bibliográficas, com o objetivo de facilitar o entendimento do
leitor para melhor compreensão deste trabalho.

Agronegócio: Matriz que integra diversos processos produtivos, industriais e de serviços, que
o define como a soma das operações de produção e distribuição de suprimentos, das
operações de produção nas unidades agrícolas, do armazenamento, processamento e
distribuição dos produtos agrícolas e itens produzidos a partir deles. O termo mostra uma
acepção da qual participam também os agentes que produzem e coordenam o fluxo dos
produtos, como os mercados, as entidades comerciais e as instituições financeiras. Trata­se de
um conjunto integrado de atividades econômicas, que vai desde a fabricação e o suprimento
de insumos, a formação de lavouras e a cria e recria de animais, passando pelo
processamento, o acondicionamento, o armazenamento, a logística e distribuição para o
consumo final dos produtos de origem agrícola, pecuária, de reflorestamento e aquicultura.
Nessa mesma visão sistemática do moderno negócio agrícola, estão também envolvidas as
formas de financiamento, as operações de seguro rural e contratos com as bolsas de
mercadorias e futuros, orientadas através de políticas públicas específicas (BURANELLO,
2017).

Amazônia: Trata de um bioma – o bioma Amazônia – que ocupa cerca de 49% do território
brasileiro. Estima­se que possui cerca de 20% da disponibilidade mundial de água e reservas
minerais, bem como um enorme estoque de biodiversidade de plantas e animais não humanos
(IBGE, 2021).

Amazônia Legal: É uma parte do território brasileiro que abrange 52 municípios de


Rondônia, 22 municípios do Acre, 62 do Amazonas, 15 de Roraima, 144 do Pará, 16 do
Amapá, 139 do Tocantins, 141 do Mato Grosso, bem como, por 181 Municípios do Estado do
Maranhão situados ao oeste do Meridiano 44º. Esta região foi estabelecida para efeitos de
planejamento e desenvolvimento social e econômico da região amazônica, de abrangência da
Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM), delimitada no artigo 2° da
Lei Complementar n. 124/2007. Possui área de 5.217.423 km², o que corresponde a 61% do
território brasileiro, abrigando todo o bioma Amazônia, além de conter 20% do bioma
Cerrado e parte do Pantanal mato­grossense. Apesar da grande extensão territorial, a região
conserva uma baixa densidade populacional, embora mantenha 55,9% da população indígena
brasileira (BRASIL, 2007); (OECO, 2014).

Antropoceno: O Antropoceno é um neologismo criado por Paul Crutzen (2002) para


identificar toda essa época durante a qual a humanidade impacta tão intensamente a Terra que
coloca em risco a sua própria sobrevivência, abalando o funcionamento do sistema climático
da Terra (STEFFEN et al. 2011)

Arco do Desmatamento: O Arco do Desmatamento é a área onde se concentra a maior parte


da perda florestal amazônica – não havendo uma distribuição homogênea do desmatamento –
“cujos limites se estendem do sudeste do estado do Maranhão, ao norte do Tocantins, sul do
Pará, norte de Mato Grosso, Rondônia, sul do Amazonas e sudeste do estado do Acre”
(FERREIRA et al., 2005). Se há 10 anos o Arco estava bem delimitado, hoje há uma forte
pressão para uso agropecuário avançando no sudoeste do Pará, no sul do Amazonas e no oeste
do Acre (ISA, 2019; MACEDO et al., 2012).

Bancada ruralista: Grupo de parlamentares ligados à agropecuária e no fortalecimento do


direito de propriedade, das estruturas de poder dos grandes proprietários e empresários do
setor e na conservação de posturas oligárquicas e clientelistas do setor. A bancada se
caracteriza pela articulação e pela construção de alianças, negociações e troca de favores,
sobretudo a seus próprios interesses setoriais, não fixando, entretanto, compromissos de
médio ou longo prazo, classificando­se por um grupo temporário de interesse particular,
embora com características lobistas e de grupo de pressão (BRUNO, 2015; 2017; VIGNA,
2001; SIMIONATTO et al., 2012).

Capitalismo: Sistema econômico que se identifica pela propriedade privada dos meios de
produção e da divisão de classe entre proprietários entre produtores; a instituição de um
mercado livre; e a dinâmica de acumulação do capital, que se orienta ao lucro (FRASER;
JAEGGI, 2020 p. 29). Essa perspectiva de reprodução social é primordialmente abastecida
por “combustíveis fósseis e à agricultura orientada ao lucro, alimentada por fertilizantes
químicos. Introduzindo uma ‘ruptura metabólica’, inaugurou o que cientistas chamam hoje de
Antropoceno, uma era geológica inteiramente nova em que a atividade humana tem impacto
decisivo nos ecossistemas e na atmosfera da Terra” (FRASER; JAEGGI, 2020 p. 53).

Corporação: Instituição criada para a mobilização, circulação e proteção do capital nas


recentes formações de Estado sócio­históricas, não obstante também ser entidade totalmente
artificial, cuja própria existência é garantida e mantida com auxílio do Estado por meio de
instituições e instrumentos jurídicos. O estabelecimento e o desenvolvimento da atividade
corporativa dependem, muitas vezes, da capacidade do Estado fazer guerra, em uma relação
de colaboração (TOMBS; WHYTE, 2015).

Criminologia Verde: É o “campo acadêmico inserido na criminologia e dedicado ao estudo


da construção social da criminalidade ambiental, dos danos socioambientais, dos processos de
vitimização ambiental e da justiça ambiental, através de perspectivas múltiplas (BUDÓ,
2020). Trata do estudo dos danos ambientais (que podem incorporar definições de crime mais
amplas do que aquelas estritamente legais); das leis ambientais (incluindo aplicação da lei,
processo e estudos de caso); e da regulamentação ambiental (sistemas legais que são
organizados para controlar, proteger e preservar espécies e ambientes, bem como para
controlar as consequências negativas de processos industriais). O marco teórico da
Criminologia Verde dedica­se ao estudo do dano social e ecológico e da injustiça ambiental
(ou vitimização), não estando limitado às definições legais (WHITE, 2013, p. 3).

Crime dos Poderosos: Conceito desenvolvido no âmbito da Criminologia que reconhece a


prática rotineira de atos ilícitos praticados por Estados, corporações e instituições financeiras,
realizadas sob diferentes formas de corrupção, extorsão e roubo institucionalizados, as quais
são normatizados por meio de políticas públicas ou por outros atos jurídico­políticos
(BARAK, 2017, p. 44).
Dano social: Amplo conceito que inclui os danos físicos, os danos econômico­financeiros, e
os danos à identidade cultural (HILLYARD, TOMBS, 2015).

Fronteira e front: Discute­se conceitualmente o que são fronteira e front. Esses termos
polissêmicos que reúnem diversos significados. Fronteira pode ser inicialmente definida como
“a outra face do espaço urbanizado; sua integração é a integração ao espaço urbanizado, e se
efetua através do urbano”. A fronteira pode se caracterizar por ser uma extensão da totalidade
nacional, em um espaço ainda não integrado ao espaço global, e um espaço de manobra das
forças sociais: “a virtualidade histórica contida em tão ampla escala geográfica, torna a
fronteira amazônica a região estratégica por excelência para o Estado que se empenha em sua
rápida estruturação e controle para integrá­la no espaço global, mas ao mesmo tempo faz
concessões aos diversos segmentos sociais e na dimensão ideológica manipula a preservação
da imagem do espaço alternativo. É por isso que a integração da fronteira amazônica “previu
a urbanização, seja através das várias políticas governamentais para integração do território,
seja da política urbana de polos de crescimento, seja de ‘urbanismo rural’, considerando
necessário, segundo o discurso oficial para atrair a população por oferecer condições de vida
similares às áreas de origem dos fluxos migratórios” (BECKER, 2015e, p. 352­355). Diante
dos estudos de Ariovaldo Umbelino de Oliveira e José de Souza Martins, fronteira e front
tratam de um lugar centrado no conflito, com a forma dominante da acumulação capitalista
sobre as outras formas de vida (TORRES et al., 2017, p. 11).

Geodireito: É uma resposta jurídica para regular abusos econômicos, tendo como objeto o
estudo da morfologia do território, buscando compreender a dinâmica das categorias
geográficas com base fenomenológica (fato geográfico e jurídico), axiológico (relações
geográficas e jurídicas) e instrumental (mapa, norma e infraestrutura de dados espaciais
enquanto resultante) (UGEDA, 2019).

Grilagem: Prática ilegal para regularização e legitimação de terras principalmente


pertencentes ao Estado (e por ele apoiado), as quais são comumente ocupadas por povos
tradicionais da floresta, e que possuem valor para fins de exploração agropecuária, estando
envolvida com atos violentos para desocupação e preparação para a exploração econômica.
Em outras palavras, “é um fenômeno que sofreu transformações significativas em seu modus
operandi ao longo do tempo, desde o método bastante rudimentar de falseamento de
documentos para dar­lhe aparência de ancianidade [...], a procedimentos sofisticados (às
vezes, nem tanto) de transcrição de imóveis rurais em registros imobiliários” (ASSOCIAÇÃO
DE ADVOGADOS DE TRABALHADORES RURAIS, 2017).

Lavagem de soja, gado e madeira: método utilizado por produtores e por corporações para
invisibilizar os danos socioambientais praticados ilicitamente, inserindo soja transgênica,
gado e madeira que foram ilicitamente produzidos junto à produção lícita.

Metabolismo social: Metabolismo social é um conceito histórico e socio­relacional, havendo


um esforço na análise das interações e das transformações na relação dialética entre natureza­
sociedade, refletindo não apenas uma dependência relacional do ser humano com a natureza,
mas também uma característica de pertencimento (FOSTER; CLARK, 2020, p. 75). Os
estudos econômicos relacionados ao metabolismo social tratam notadamente sobre o fluxo de
recursos e energia, relacionados à remoção de materiais da natureza e aos consequentes
impactos ambientais e, reflexamente, ao próprio ser humano (MARTÍNEZ­ALIER; JUSMET,
2013). Há um processo progressivo e acentuado chamado de ruptura metabólica, provocado
pelo modo de produção capitalista que, por característica, exige uma interação destrutiva com
a natureza e dos próprios corpos humanos (FOSTER, 2000; FOSTER; CLARK; 2020).

Populações, comunidades ou grupos indígenas: Utilizam­se os termos populações


indígenas (artigos 22 e 129, inciso V), comunidades indígenas (artigo 210, § 2°) ou grupos
indígenas (art. 231, § 5°), todos previstos na Constituição da República (BRASIL, 1988),
como sinônimos para se referirem à organização social composta por costumes, crenças e
tradições, vinculados a direitos originários a um território tradicional.

Povos ou comunidades tradicionais: O conceito legal de comunidade tradicional do artigo


2°, inciso IV, da Lei n. 13.123/2015 (BRASIL, 2015): “grupo culturalmente diferenciado que
se reconhece como tal, possui forma própria de organização social e ocupa e usa territórios e
recursos naturais como condição para a sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e
econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas geradas e transmitidas pela
tradição”.

Violência: A causa da diferença entre o potencial e o real, entre o que poderia ser e o que é,
ou seja, aquilo que impede a diminuição dessa distância entre o potencial e a realidade
(GALTUNG, 1969). Quaisquer ameaças ou efetivas lesões às necessidades básicas humanas,
que de alguma maneira reduzam o nível de satisfação das necessidades abaixo do
potencialmente possível (GALTUNG, 1990).

Violência cultural: Ofensas aos aspectos simbólicos da existência humana, como a cultura, a
religião, a ideologia, a linguagem, a arte, as ciências empíricas e as ciências formais, que
podem ser usadas para justificar ou legitimar a violência direta ou a violência estrutural
(GALTUNG, 1990).

Violência direta ou pessoal: É a violência que opera a olhos vistos, como por exemplo por
assassinatos, detenções, expulsões etc. (GALTUNG, 1969; GALTUNG, 1990).

Violência estrutural: Repressão das “necessidades reais e portanto dos direitos humanos no
seu conteúdo histórico­social” (BARATTA, 1993). “A violência estrutural se define como
encoberta por se tratar de um tipo de violência sistêmica” (CIIIP, 2002, p. 103). A violência
estrutural supõe oportunidades de vida diferenciadas entre os membros da sociedade,
principalmente o acesso aos benefícios do desenvolvimento, a distribuição dos recursos e a
capacidade de influenciar nas decisões sobre distribuição de recursos (CIIIP, 2002, p. 103).
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 15
2. OS DANOS SOCIAS, AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E OS RESPONSÁVEIS
PELA DESTRUIÇÃO ECOLÓGICA............................................................................... 20
2.1 O cenário dos danos no Arco do Desmatamento da Amazônia .................................. 21
2.1.1 Os danos na Amazônia e as mudanças climáticas ........................................................ 21
2.1.2 O compromisso brasileiro para mudança do clima e a Amazônia ................................. 31
2.1.3 A geopolítica da degradação no Arco do Desmatamento da Amazônia ........................ 34
2.1.4 O agronegócio no limiar do lícito com o ilícito ............................................................ 46
2.1.4.1 Monocultura de soja transgênica e o desmatamento na cadeia produtiva ................. 50
2.1.4.2 “Lavagem de gado”: invisibilização dos danos socioambientais na cadeia produtiva
da pecuária .......................................................................................................................... 55
2.1.4.3 “Lavagem de madeira” e crimes no desmonte do marco regulatório ........................ 61
2.1.5 Considerações a propósito do cenário dos danos no Arco do Desmatamento da
Amazônia............................................................................................................................. 68
2.2 Vítimas “invisíveis” dos danos sociais: danos às comunidades indígenas e
tradicionais, aos animais não humanos e a perda da biodiversidade na Amazônia ........ 68
2.2.1 O avanço da fronteira contra os territórios indígenas ................................................... 69
2.2.2 O avanço da fronteira contra as unidades de conservação ............................................ 74
2.2.3 Considerações quanto às vítimas “invisíveis” dos danos sociais................................... 78
2.3 A bancada ruralista: os representantes das corporações e do latifúndio contra a
estabilidade climática e o meio ambiente .......................................................................... 78
2.3.1 Conceitos e influências da bancada ruralista no Congresso Nacional ........................... 78
2.3.2 A bancada ruralista e a legislação sobre meio ambiente, registros públicos e
regularização fundiária: a união entre agronegócio e Estado ................................................. 85
2.3.2.1 Governo Lula ........................................................................................................... 90
2.3.2.2 Governo Dilma ......................................................................................................... 91
2.3.2.3 Governo Temer......................................................................................................... 92
2.3.2.4 Governo Bolsonaro .................................................................................................. 94
2.3.3 UC Jamanxim, a grilagem e os danos articulados pelo agronegócio ........................... 105
2.3.4 Considerações a propósito da bancada ruralista: os representantes das corporações e do
latifúndio contra a estabilidade climática e o meio ambiente .............................................. 108
2.4 Síntese conclusiva do capítulo .................................................................................... 108
3. A VIOLÊNCIA NO ARCO DO DESMATAMENTO DA AMAZÔNIA:
CRIMINOLOGIA VERDE E CRIMES PODEROSOS................................................. 110
3.1 Danos sociais e relação ser humano e natureza ......................................................... 111
3.1.1 As violências estrutural, cultural e direta: tipologia para a vitimização humana ......... 111
3.1.2 Metabolismo social e ruptura metabólica ................................................................... 123
3.1.2.1 Ser genérico ........................................................................................................... 132
3.1.2.2 Gaia ....................................................................................................................... 133
3.1.3 O dano social sob a perspectiva da Criminologia Verde e dos Crimes dos Poderosos. 138
3.1.3.1 Perspectivas gerais da Criminologia Verde ............................................................ 139
2.1.3.2 Corporações e capitalismo: lucros, externalização de danos e direitos humanos .... 142
2.1.3.3 A mudança de paradigma: a centralidade do dano ................................................. 144
2.1.3.4 Os crimes praticados pelo Estado e a imunização dos poderosos ........................... 149
3.1.4 Considerações quanto aos danos sociais e relação ser humano e natureza .................. 154
3.2 A relação do Estado de Direito com os danos sociais ................................................ 155
3.2.1 Estado de Direito e meio ambiente: da promoção ao meio ambiente equilibrado à
necessidade de metas ......................................................................................................... 155
3.2.2 Desestruturação do Estado e violência ....................................................................... 167
3.2.3 Considerações no que concerne à relação do Estado de Direito com os danos sociais 173
3.3 O Ecocídio e a Criminologia Verde ........................................................................... 174
3.3.1 Ecocídio: elementos para conceituação no campo da Criminologia Verde e dos Crimes
dos Poderosos .................................................................................................................... 174
3.3.2 Ecocídio no Arco de Desmatamento da Amazônia ..................................................... 183
3.3.3 Considerações quanto ao Ecocídio na Amazônia ....................................................... 188
3.4 Síntese conclusiva do capítulo .................................................................................... 189
4. CONCLUSÃO .............................................................................................................. 191
REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 196
15

1. INTRODUÇÃO

Esta Dissertação de Mestrado realiza uma análise crítica dos processos de


degradação no Arco do Desmatamento amazônico, com vistas à formação de um diagnóstico
para o enfrentamento do dano e do crime ambiental. Nesse passo, faz­se uma leitura crítica
sobre esses danos, os quais incidem social e ambientalmente nessa região. Ademais, tem­se a
pretensão de contribuir para os desafios ante o Antropoceno, haja vista a destruição de
ecossistemas e a injustiça ambiental e climática promovida pela humanidade, colaboração esta
que se faz de forma contextual, histórica e social sobre a realidade brasileira.
Em vista disso, e na busca da compreensão dos danos ecológicos e climáticos
decorrentes da forma como as relações econômicas e sociais são organizadas e se
desenvolvem no capitalismo, esta pesquisa se centra nos danos praticados no Arco do
Desmatamento da Amazônia que possuem vinculação com a exploração de produtos
primários para exportação por corporações, como a produção de carne bovina, soja e extração
de madeira.
O marco teórico é o da Criminologia Verde – notadamente com fundamento nas
ideias difundidas por Rob White, David Rodríguez Goyes e Michael J. Lynch –, que busca
fornecer novos elementos sociológicos para investigar as injustiças provocadas pelos
poderosos, convergindo na figura do dano – prejudicial a seres humanos, ambientes e animais
não humanos – e não na do crime. Isso porque este último é, não raro, definido pelos
poderosos (corporações e outros atores) em conluio com o Estado, o que justifica o enfoque
metodológico na figura do dano. Dessa forma, este pode ser estudado além das definições
legais do crime ambiental, que podem contornar questões importantes de poder social e de
interesses setoriais, bem como da vitimização desses danos.
Junto a este campo de estudo, será realizada a abordagem dos Crimes dos Poderosos,
com o fito de serem compreendidos os crimes praticados por esta classe que, do ponto de vista
político e econômico, provoca danos e vitimização. É nesse cenário que se pretende clarificar
a prática rotineira de atos ilícitos praticados por Estados, corporações e instituições
financeiras, realizados sob diferentes formas de corrupção, extorsão e roubo
institucionalizados, os quais são normatizados por meio de políticas públicas ou por outros
atos jurídico­políticos, com o objetivo de trazer as contribuições que esta vertente
criminológica pode fornecer à questão amazônica.
16

Assim, é investigada a imbricação entre corporações e Estado na prática dos danos


no Arco do Desmatamento da Amazônia, mormente a partir das formas pelas quais o Estado
facilita, incentiva e participa da exploração desta região, como pela edição de normas
jurídicas ou pelo uso do aparato repressivo; pela concessão de financiamentos ou pela
organização de projetos agropecuários; pela implantação de sofisticada infraestrutura para
produção agropecuária; ou até mesmo pela sua inação frente à violência privada.
Levando em consideração o contexto geopolítico de ocupação do espaço amazônico,
são trabalhados os discursos ideológicos, assim como os instrumentos jurídicos que foram e
continuam sendo utilizados para sua ocupação. Sob essa perspectiva, impõe­se analisar os
danos que o agronegócio provoca ao avançar sobre a Amazônia, os quais nem sempre são
percebidos como violência, mas tão somente são declarados de tal forma (quando muito) se
culminam em assassinatos diretos de integrantes dos povos que vivem na floresta e de seus
defensores.
Em vista disso, realiza­se um estudo metodológico e tipológico da violência,
principalmente a partir da teoria de J. Galtung. Nessa perspectiva, pretende­se compreender a
violência não apenas direta ou pessoal, que se diferencia por operar mais ostensivamente, ou
seja, por assassinatos, ameaças, prisões, repressões de todo tipo etc., mas também as
violências cultural e estrutural, que operam nos âmbitos existenciais do ser humano como
consequência do funcionamento do sistema social.
Embora violência seja um termo empregado usual e cotidianamente para designar
fenômenos ou atos contra seres humanos, é premente examinar se e como os danos à natureza
significam um tipo de violência específico ao ser humano. Nesse ponto, interessa a
abordagem do metabolismo social, que relaciona a troca material entre o ser humano e a
natureza, que gera interdependência mútua. Esta abordagem é introduzida à teoria social por
discutir necessidades, estilos de vidas e modos de produção. Daí a importância dessa
abordagem relacional que, em tese, poderá afastar o viés antropocêntrico da violência na
Amazônia, incorporando novos elementos para uma análise ecologizada.
Ademais, é necessário investigar os métodos e processos que as corporações do
agronegócio utilizam para continuar a degradar a Amazônia, bem como a participação
indispensável da bancada ruralista no Congresso Nacional, que trata de parlamentares ligados
a esse setor econômico aliançados com o propósito de defesa de direitos de propriedade,
ocultos em posturas oligárquicas e clientelistas da estrutura fundiária brasileira. Essa
abordagem sobreleva­se para compreender como esse grupo político age na confluência entre
17

seus interesses setoriais e o Estado, servindo­se de negociatas, trocas de favores e benefícios,


à mercê de seu apreciável poder de articulação.
Não se desconhece o impacto da exploração industrial de minérios na Amazônia, que
se desenvolve com algumas semelhanças em relação ao empreendimento agropecuário, tais
como participação estatal por intermédio de projetos agrominerais, incentivos fiscais, ações de
construção de infraestrutura, bem como a atuação de corporações multinacionais e
direcionamento dos minérios para o mercado externo. Entretanto, há diferenças fundamentais
no processo de ocupação do território e produção de danos na Amazônia, que afasta a análise
conjunta da exploração mineral com o agronegócio, principalmente por: (i) exigir menor
desmatamento; (ii) não depender de processos fundiários específicos para a sua consecução;
(iii) não atuar especificamente no Arco do Desmatamento, mas adentrar no espaço
amazônico; e (iv) não haver ligação inescusável com as mudanças climáticas.
A relevância desse estudo reside na análise metodológica e crítica sobre os danos na
Amazônia – buscando afastar explicações que são disseminadas pelos meios de comunicação
oficiais e pela mídia, que prejudicam a compreensão das causas e dos seus culpados –, de
modo a entender a complexidade do fenômeno criminológico e da violência contra seres
humanos e contra a natureza. Tem ainda relevo científico prático por se inserir nas discussões
que buscam uma resposta global à ameaça de mudanças do clima, afetado pela degradação da
Amazônia.
Importante mencionar que as ciências criminais foram o foco das atenções do autor
desta Dissertação até 2019, mas o afeiçoamento progressivo com as questões ambientais e
climáticas no decorrer do Curso de Mestrado foram fundamentais para incrementar e
transformar as perspectivas da pesquisa, que a partir de então se mobiliza ante uma inquietude
pessoal que busca abraçar os estudos mais atuais produzidos nos âmbitos do Direito
Ambiental e Ecológico e da Criminologia Verde.
A esta justificativa se acrescenta a possibilidade de se realizar uma crítica radical e
ao mesmo tempo reflexiva sobre a apropriação privada e estatal da Amazônia. Justifica­se
esse interesse, portanto, em desvelar as estruturas, os protagonistas, os benefícios que
provocam a violência, a desigualdade e os processos de vitimização.
Com base em tais premissas, apresenta­se o seguinte problema de pesquisa: pode o
estudo da Criminologia contribuir para os desafios ante o Antropoceno, diante da destruição
18

ambiental e das injustiças ambiental e climática realizadas no Arco do Desmatamento


amazônico e operadas pelo Estado em associação com corporações do agronegócio?
Como hipótese básica, entende­se que, no contexto do Antropoceno, a Criminologia
deve buscar compreender a prática dos danos sociais e do processo de vitimização no Arco do
Desmatamento da Amazônia mediante a incorporação de uma ética que compreenda a
interdependência entre ser humano e natureza, viabilizando a verificação da complexidade do
fenômeno com o alcance de vítimas humanas e não­humanas.
Como hipótese secundária, afirma­se que o desmantelamento da proteção do meio
ambiente e a imunização penal dos latifundiários, entre outros expedientes jurídico­políticos,
possibilitados pela bancada ruralista no Congresso Nacional, proporcionam a prática de danos
sociais e o processo de vitimização de ativistas ambientais e dos povos indígenas e
tradicionais.
Por seu turno, o objetivo central é estudar a relação do ser humano/natureza sob a
abordagem do metabolismo social no cenário do Arco do Desmatamento Amazônico, para
investigar e compreender a violência do ponto de vista estrutural, praticada por corporações e
pelo Estado.
Além disso, objetiva­se, secundariamente, examinar os vínculos políticos e jurídicos
entre as corporações e o Estado, especialmente à vista da atuação da bancada ruralista, e como
esses vínculos potencialmente resultam em danos no Arco do Desmatamento. Busca­se
analisar quais são os resultados dessa associação e como acarretam danos sociais e
vitimização a povos indígenas e tradicionais.
A pesquisa será produzida mediante o método dedutivo, com o procedimento
monográfico, com nível de pesquisa descritivo­explicativa, utilizando­se de seleção
sistemática de relatórios, estudos qualitativos, dados estatísticos e reportagens investigativas
já produzidas, de caráter interdisciplinar. Tendo em vista que este trabalho transita por
diversas áreas do conhecimento, indicando sua tendência interdisciplinar, foi elaborado um
Glossário de Conceitos Operacionais para auxiliar o leitor, o qual se encontra anteriormente
ao Sumário, como Elemento pré­textual desta Dissertação.
Por intermédio dessa metodologia e com tais objetivos, esta pesquisa subdivide­se
em dois capítulos de conteúdo.
O primeiro capítulo de conteúdo propõe apresentar o estado da arte do cenário dos
danos no Arco do Desmatamento na Amazônia, de forma tal a compreender as causas
econômico­políticas da ocupação do espaço; as motivações geopolíticas de avanço sobre o
19

território; a atuação do Estado e das corporações; e o processo de vitimização de populações


da floresta.
O segundo capítulo de conteúdo busca analisar criminologicamente as informações
coletadas sob uma perspectiva crítica, reflexiva, não antropocêntrica e ecologizada. Serão
realizados estudos: (i) tipológico da violência; e (ii) do dano social a partir do campo da
Criminologia Verde e dos Crimes dos Poderosos, inclusive com a abordagem do metabolismo
social; bem como (iii) da relação entre Estado e corporações no implemento do dano social no
Arco do Desmatamento; e (iv) do Ecocídio.
Por derradeiro, esclarece­se que o tema em análise concentra­se nas áreas do Direito
Ambiental, da Sociologia e da Criminologia, encontrando­se relacionado na linha de pesquisa
– Direitos Humanos e Sustentabilidade – do Programa de Pós­Graduação em Direito da
Universidade Federal de Santa Catarina.
20

2. OS DANOS SOCIAS, AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E OS RESPONSÁVEIS


PELA DESTRUIÇÃO ECOLÓGICA

Este capítulo é dedicado à investigação e à verificação minuciosas da hipótese


básica, porquanto são investigadas as condições estruturais e institucionais dos
comportamentos estatal­corporativos que provocam danos no Arco do Desmatamento da
Amazônia, coletando os elementos necessários para se entender a associação entre
corporações e Estado.
São envidados esforços, nesse sentido, no exame da estrutura social relacionada às
causas dos danos, da degradação, do desmatamento, da destruição e de toda forma que, de
algum modo, comprometa a satisfação das necessidades vitais humanas, mormente dos povos
indígenas e dos povos tradicionais, ou seja, daquelas populações que sofrem com a
diminuição da cobertura da vegetação e o perecimento de espécies animais e vegetais na
floresta Amazônica. Sob essa perspectiva, busca­se descortinar quem são os perpetradores dos
danos no Arco do Desmatamento da Amazônia, suas práticas, métodos e também como se
articulam com o Estado, visando a identificar a influência das corporações nas formas
jurídicas e políticas. Para esta hipótese básica, objetiva­se observar a atuação das corporações
e do Estado no conflituoso espaço amazônico.
A hipótese secundária é analisada por intermédio do estudo da atuação, discursos e
composição da bancada ruralista no Congresso Nacional, e como suas propostas legislativas
interferem na dinâmica da prática de danos contra os povos indígenas e tradicionais,
sobretudo na relação desses povos com o território. Para tanto, objetiva­se examinar os
vínculos dos ruralistas com as corporações do agronegócio, como esse setor é beneficiado
para a prática de danos e como os latifundiários são imunizados penalmente.
Para se cumprir o objetivo central, busca­se investigar a atuação das corporações e
do Estado em um enfoque estrutural – indicando as formas e os interesses econômicos e
geopolíticos – e os danos daí resultantes. Em relação ao objetivo secundário, este capítulo se
dedica a trabalhar os aspectos políticos e jurídicos que conformam a exploração da Amazônia,
notadamente para analisar os resultados dessa associação, desde os projetos agropecuários
gestados pela ditadura empresarial­militar até a análise da composição e das práticas da
bancada ruralista.
21

2.1 O cenário dos danos no Arco do Desmatamento da Amazônia

Este item propõe traçar um diagnóstico dos danos no Arco do Desmatamento da


Amazônia, suas causas, seus efeitos, assim como os respectivos responsáveis, desde os
enfoques econômico e histórico, que se entrelaçam com aspectos geopolíticos e legais.
Com efeito, pretende­se avaliar os danos praticados nesta região, que ocorrem
independentemente da legalidade da atividade corporativo­estatal, como também demonstrar
a parcela desses atos que ocorrem, supostamente, em conformidade com a lei.

2.1.1 Os danos na Amazônia e as mudanças climáticas

A Amazônia abrange um terço das florestas tropicais úmidas existentes no planeta,


abrigando uma grande diversidade de espécies animais e vegetais, o maior banco genético do
mundo e um quinto da disponibilidade de água potável (IBGE, 2015). Daí emerge seu papel­
chave na moderação dos níveis de dióxido de carbono, que é emitido em grandes quantidades
nas atividades humanas relacionadas com a queima de combustíveis fósseis e uma das
principais causas das mudanças climáticas (SCALOPPE et al., 2020, p. 7).
A floresta Amazônica está compreendida em seis países – Brasil, Peru, Bolívia,
Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana, Guiana Francesa 1 e Suriname –, sendo a maior parte
em território brasileiro. Ela se estende por mais de 3.000 quilômetros pela bacia do rio
Amazonas, desde a Cordilheira dos Andes, no oeste do subcontinente sul­americano, até
desembocadura desse rio no Oceano Atlântico (CORLETT; PRIMACK, 2011, p. 4/5).
Não obstante a suscetibilidade da região a causas naturais de alterações do
ecossistema, como os fenômenos meteorológicos El Niño e La Niña, podem ser listadas outras
causas ligadas diretamente às mudanças climáticas, como o desmatamento florestal para
transformação em sistemas agrícolas ou pastagens. Esses fatores estão diretamente
relacionados com o aumento da temperatura, a redução da evapotranspiração e a diminuição
da precipitação devido à alteração da vegetação (NOBRE, C. et al., 2007). Os autores indicam
que, ao mesmo tempo que a Amazônia sofre influências negativas das mudanças do clima, a

1
Guiana Francesa é um território ultramarino da França, não constituindo, portanto, um Estado soberano.
22

destruição da floresta também contribui categoricamente para essas mudanças (NOBRE, C. et


al., 2007).
O desmatamento da Amazônia possui inequívoca relação com as mudanças
climáticas em razão da emissão de gases estufa provocadas pela mudança do uso do solo. A
alteração no uso da terra, principalmente a conversão de florestas tropicais em terras
agrícolas, é uma fonte maciça de emissões de carbono e contribui substancialmente para o
aquecimento global (IPCC, 2019). Para o IPCC, há vínculo decisivo entre as mudanças
climáticas e o uso e a mudança do uso da terra. A terra degradada restringe o que pode ser
cultivado e a capacidade de retenção de carbono no solo, bem como a submete à
irreversibilidade da degradação (desertificação). Não obstante, a ação coordenada para o
enfrentamento das mudanças climáticas pode melhorar simultaneamente o cuidado da terra,
da segurança alimentar, da nutrição e do auxílio no combate à fome (IPCC, 2019).
A crescente demanda por commodities agrícolas, além disso, projeta­se como o
principal fator para o desmatamento florestal e para a consequente diminuição da capacidade
de sequestro de carbono, influenciando a capacidade das florestas tropicais na estabilização do
clima global (POPP et al., 2014).
Diante disso, o Antropoceno é uma categoria muito presente no debate sobre os
danos e queimadas na Amazônia e sua relação com o aquecimento global. Conquanto o
Antropoceno não seja formalmente reconhecido como uma nova era geológica, já há um
consenso científico quanto aos danos ecológicos causados pela humanidade e que,
considerando sua extensão e gravidade, são os responsáveis pelo aquecimento global (COOK
et al., 2016). Não bastasse o consenso científico, é possível que não especialistas observem as
inquietantes mudanças climáticas no noticiário diário pelo derretimento acelerado de geleiras,
desaparecimento de espécies vegetais e animais, inundações e intensificação de tempestades
em algumas regiões, períodos longos de estiagem em outras, ao mesmo tempo que os
relacionem com a degradação de ecossistemas florestais, marítimos e atmosféricos.
A transformação da floresta em pastagens e posterior cultivo de soja na região
amazônica interfere no ciclo do nitrogênio no solo, refletindo em uma perda profunda do
estoque do referido elemento ao longo do tempo. Sem embargo, as significativas perdas de
nitrogênio e aumento do nitrato podem afetar os corpos d’água adjacentes e a capacidade de
sua retenção em solos tropicais (FIGUEIRA, 2013).
A mudança da floresta tropical úmida em área de pastagem de gado tem graves
consequências nos ciclos biogeoquímicos do solo, bem como nas ligações entre os processos
23

do solo e nas concentrações de materiais dissolvidos e particulados, o que se reflete na


diminuição de diferentes formas de nitrogênio e fósforo no solo e na água, assim como em
impacto na biodiversidade (HAMILTON et al., 2016).
Além da emissão de carbono decorrente das queimadas, a carga de partículas de
aerossóis na atmosfera – que é mais um dos limites (ou fronteiras) planetários seguros2 para a
humanidade – é particularmente intensa na região Amazônica em virtude dessas emissões
(ARTAXO, 2014).
Há dados que explicam que “a Amazônia sustenta centenas de bilhões de árvores em
suas florestas. Vinte bilhões de toneladas de água por dia são transpiradas por todas as árvores
na bacia amazônica”, transferindo um enorme volume de água para a atmosfera (NOBRE, A.
D., 2014, p. 13).
Há uma significativa relação entre a transpiração das plantas com os efeitos físicos
na atmosfera, e a teoria da bomba biótica de umidade, em que os processos de transpiração e
condensação mudam a pressão e dinâmica da atmosfera, levando mais umidade do oceano
para o interior dos continentes. Isso explica os rios aéreos (ou voadores) e a importância das
florestas, especialmente da Amazônia, a qual é “a cabeceira dos mananciais aéreos da maior
parte das chuvas na América do Sul”, o que justifica, por exemplo, a detecção da origem da
água da cidade do Rio de Janeiro ser proveniente da Amazônia e não do oceano (NOBRE, A.
D., 2014, 17­19).
Há evidências de que a Amazônia esteja próxima de um ponto de inflexão, ou tipping
point, visualizando­se uma transição da floresta por pastagens, em um processo denominado
savanização. Temperatura e precipitação são variáveis comumente aplicadas para refletir os
pontos de inflexão, embora a diminuição da umidade, o aumento da estação seca e o aumento
da severidade da seca sejam mais determinantes para incêndios. Dentre outros fatores,
maiores taxas de desmatamento e a substituição da floresta por savana, que se soma à

2
Os limites planetários são valores determinados pelo ser humano da variável de controle definida a uma
distância “segura” de um nível perigoso (para processos sem limites conhecidos nas escalas continental a global)
ou de seu limite global, cuja determinação envolve julgamentos normativos de como as sociedades lidam com o
risco e a incerteza. Assim, questionou­se “quais são as pré­condições planetárias inegociáveis que a humanidade
precisa respeitar para evitar o risco de mudanças ambientais deletérias ou mesmo catastróficas em escalas
continentais a globais?”. Foram encontradas nove fronteiras planetárias, que envolvem (i) acidificação dos
oceanos; (ii) destruição do ozônio estratosférico; (iii) interferência com os ciclos globais de fósforo e nitrogênio;
(iv) taxa de perda da biodiversidade; (v) uso global de água doce; (vi) alteração no uso da terra; (vii)
carregamento de aerossol na atmosfera; (viii) poluição química; e (ix) mudança climática (ROCKSTRÖM et al,
2009).
24

diminuição da precipitação, já seriam suficientes para se chegar ao ponto de inflexão. Ao


longo do tempo, a diminuição da precipitação provoca uma maior quantidade de madeira
morta em pé, recrudescendo a perspectiva de incêndio e da facilidade de se “limpar” a floresta
mediante queima e exploração econômica (BUSH, 2020; LOVEJOY; NOBRE, C.; 2018;
LOVEJOY; NOBRE, C; 2019; NEPSTAD et al., 2008).
O desmatamento está relacionado com o surgimento de savanas principalmente nas
bordas leste e sul da Amazônia, podendo se estender às áreas central e sudoeste, porque essas
zonas estão naturalmente próximas da quantidade mínima de chuva necessária para a floresta
tropical prosperar (LOVEJOY; NOBRE, C.; 2019). Dentre as razões que conduzem à
savanização da floresta, estão as sinergias negativas com o aquecimento global impulsionado
pelo ser humano, que leva à redução das chuvas e ao aumento das temperaturas combinadas
com o uso extensivo do fogo (LOVEJOY; NOBRE, C.; 2019).
A Amazônia gera aproximadamente metade de sua chuva reciclando umidade
conforme as massas de ar se movem do Atlântico através da bacia Amazônica para o oeste.
Diante disso, o impacto de um desmatamento modesto mais proximamente dos Andes seria
menos dramático, porque o movimento ascendente geral das massas de ar nesta área induz
altos níveis de precipitação (LOVEJOY; NOBRE, C.; 2018).
Questiona­se onde, na Amazônia, estão os locais mais vulneráveis que podem
facilitar a chegada ao ponto de inflexão provocado pelo desmatamento, influenciando o ciclo
hidrológico. Indica­se que esses locais se tratam do centro, sul e leste da Amazônia, onde o
aumento do desmatamento está profundamente conexo à diminuição das chuvas, à secagem
da floresta e à maior vulnerabilidade ao fogo no ano subsequente (LOVEJOY; NOBRE, C.;
2018).
A imagem de satélite a seguir foi obtida na plataforma Portal Terrabrasilis do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), por meio do qual é possível acessar, dentre
outras, informações geográficas que apontam o incremento do desmatamento aferido pelo
Projeto de Monitoramento da Floresta Amazônica por Satélite (PRODES), mantido pela
mesma instituição. Este sistema de sensoriamento remoto orbital tem por objetivo realizar “o
inventário da perda de floresta primária a partir do uso de imagens de satélite e funciona como
fonte primária de informações para as políticas do governo federal de combate ao
desmatamento na região”, apresentando estimativas anuais da taxa de desmatamento a cada
ano na Amazônia Legal (FILPI; BORGES; MOSMANN, 2020, 451­453):
25

Figura 1: Desmatamento na Amazônia Legal – PRODES (período 2008­2019)

Legenda: Os pontos em amarelo no mapa representam a área desmatada acumulada (incremento) de


desmatamento no período
Fonte: INPE­ TERRABRASILIS (2020a)

Os pontos de desmatamento aferidos no mapa demonstram que a fronteira agrícola


pressiona as bordas sul e leste da Amazônia, as quais são apontadas como as mais vulneráveis
para o colapso do ecossistema mediante savanização, decorrentes de alterações na
precipitação e aumento de temperaturas. Esse front3 é também conhecido por Arco do
Desmatamento (FERREIRA et al., 2005; ISA, 2019; MACEDO et al., 2012; ALDRICH et
al., 2012; SANTOS, T. O. et al., 2017), onde se encontram os maiores índices de
desmatamento na Amazônia, representando cerca de 85% do registrado.
As queimadas são aferidas pelo Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo
Real (DETER), foi implantado em 2004 “para fiscalizar o desmatamento e a degradação na
Amazônia Legal Brasileira, o qual tem capacidade de emitir alertas diários referentes a
alterações na cobertura florestal superior a 3 hectares” (FILPI; BORGES; MOSMANN, 2020,
454).
Figura 2: Queimadas na Amazônia Legal­ DETER (período 2016­2020)

3
A expansão da fronteira territorial da agroindústria, nessa simbólica “marcha para o Oeste”, vitimiza não
apenas produtores familiares, mas uma série de grupos sociais e étnicos que sobrevivem da e na floresta, o que
será trabalhado no item 2.2.3 desta Dissertação.
26

Legenda: Os pontos em preto no mapa representam a área com avisos acumulados de queimada no período
Fonte: INPE­ TERRABRASILIS (2020b)

Conquanto o período de compilação da geoinformação das figuras 1 e 2 não sejam


exatamente coincidentes4, é possível constatar que os pontos geográficos de degradação em
muito correspondem, indicando o avanço a partir do sul e leste da Amazônia, formando o que
se chama de Arco do Desmatamento.
Com efeito, o INPE possui diversos sistemas em operação que fornecem informações
seguras sobre a perda de cobertura florestal na Amazônia Legal, que propiciam uma
atualização automática e quase em tempo real de mudança da área, tendo, ao final, um
mapeamento operacionalizado de mudanças em toda a floresta (HANSEN et al., 2008;
KINTISCH, 2007). Embora as metodologias sejam confiáveis, os sistemas à disposição do
INPE podem estar subestimando, em muito, o desmatamento na Amazônia. Isso se explica
pela área mínima mapeada pelo PRODES ser de 6,25 hectares (INPE, 2019), enquanto o
DETER identifica e mapeia os desmatamentos e demais alterações na cobertura florestal com
área mínima próxima a 3 hectares (INPE, 2019), conduzindo à não identificação dos
desmatamentos mediante corte raso em área inferior àquelas possíveis de ser reconhecidas
pelo sistema.

4
A sobreposição dos desmatamentos com as queimadas evidencia que se degrada no interior da Amazônia, em
possíveis fragmentações florestais.
27

No final de 2019, foi lançado o DETER Intenso, que integra imagens dos satélites
CBERS­4, Landsat 8, Sentinel 2 e imagens do sensor SAR a bordo do satélite Sentinel 1,
cujas imagens integradas permitem a detecção de alertas de queimadas maiores do que 1
hectare (INPE, 2021).
Mais recentemente, o país anunciou contrato com a empresa Planet Labs, por meio
da qual recebe novas imagens para sensoriamento remoto da Amazônia pelo satélite Planet. A
área mínima aferida pode chegar a 3 metros, sendo, portanto, mais precisa em comparação à
dos outros sistemas à disposição do INPE. Ademais, já há estudo que destaca resultados ainda
melhores quando se integram as imagens de satélite em múltiplas escalas para estender o
monitoramento, notadamente com o sensor Modis (WANG et al., 2020). As imagens do
satélite Planet já estão à disposição da Polícia Federal, à vista da sua utilização na operação
Akuanduba, quando foram apreendidos 131 mil metros cúbicos de madeira, o equivalente a
encher 6.243 caminhões (O GLOBO, 2020). Há a previsão de que a leitura das imagens seja
realizada pela Polícia Federal e não pelo INPE, havendo o questionamento sobre aquela
instituição possuir pessoal capacitado para operar plenamente esse tipo de serviço,
configurando módulos e relatórios de forma a atender às demandas, notadamente no combate
de ilícitos ambientais (OECO, 2020).
Pontua­se que a análise do desmatamento na Amazônia, como se observa, é
facilitado pela utilização de mapas, em uma composição entre Geografia e Direito. Para
Ugeda (2019), Direito é como e Geografia é onde, de forma que quando as duas áreas
dialogam e se miscigenam, relacionam­se em uma dimensão geojurídica ao mesmo tempo
instrumental e técnica. Com efeito, o geodireito desponta como uma significativa resposta
para planejamento e execução de políticas públicas a serem implantadas e reguladas pelo
Estado (UGEDA, 2019). Nesse último aspecto, é premente a introdução das premissas do
geodireito na atuação do poder de polícia ambiental do Estado, subsidiando­o “por
instrumentos sistêmicos, multidisciplinares, com o fortalecimento das instituições
fiscalizadoras, além da inclusão da sociedade na defesa do meio ambiente (LEITE et al,
2020).
Não obstante, há ainda um desmatamento “invisível” à fiscalização por
sensoriamento remoto, que é realizado mediante corte seletivo de árvores de alto valor
comercial, o que também degrada a Amazônia (FEARNSIDE, 2005; SATO et al., 2011). Por
haver uma série de espécies sem valor econômico, seja por sua constituição, seja por terem o
28

comércio proibido, como o mogno, não seria vantajoso o corte raso. Além disso, o “impacto
do corte de espécies de baixa densidade e comercialmente valiosas é, frequentemente,
subestimado”, alterando substancialmente o número de dias sem chuvas necessários para que
sejam atingidas condições inflamáveis em relação à floresta não explorada (FEARNSIDE,
2005). Diante desse problema, há um sistema específico mantido pelo INPE e pelo Serviço
Florestal Brasileiro (SFB), denominado DETEX, cuja metodologia busca indícios de
exploração seletiva de madeira. Entretanto, a detecção do corte seletivo de madeira é mais
complexa do que o monitoramento por corte raso, por envolver diferentes condições
fisionômico­estruturais, bem como a rápida sucessão florestal dificultar a identificação dessa
degradação (SATO et al., 2011). Diante dessa prática de corte seletivo, em que o
sensoriamento remoto possui graves limitações para detecção, os dados sobre desmatamento
amazônico se mostram abaixo de uma situação que, muito provavelmente, encontra­se mais
crítica.
Tendo em vista que a identificação de invasões de terras públicas e do desmatamento
na Amazônia dependem principalmente de imagens de satélite, há a subordinação desse
monitoramento às condições climáticas e à área total de desmatamento. Além disso, esses
crimes frequentemente ocorrem em áreas de florestas densas, que são de difícil acesso pela
polícia, sem contar a deficiência dos aparelhos repressivos do Estado nestes locais longínquos
(BARROSO; MELLO, 2021).
Houve diminuição da taxa de desmatamento de quase 30 mil quilômetros quadrados
em 2004 para 4.400 quilômetros quadrados em 2012, equivalentes a uma redução de 84%, o
que poderia fazer a comunidade ecologista internacional supor que o desmatamento estaria
controlado. No entanto, a partir de então houve um notável aumento anual em 29%
(FEARNSIDE, 2017). O gráfico da Figura 3 a seguir ilustra essas mudanças.

Figura 3: Taxas de desmatamento na Amazônia Legal – PRODES (período 1988­2020)


29

Taxas de desmatamento - Amazônia Legal


35,000.00

30,000.00

25,000.00

20,000.00 Estimativa

15,000.00

10,000.00

5,000.00

0.00
1991

2002

2010
1988
1989
1990

1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001

2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009

2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018
2019
2020
Fonte: INPE­ TERRABRASILIS, 2020c; INPE (2020d). Adaptado pelo autor

Uma iniciativa inédita do Observatório do Clima (2021a) fez o mapeamento das


emissões de carbono de todos os 5.570 municípios brasileiros, em toneladas brutas de gás
carbônico equivalente (CO₂e). O levantamento detalha as fontes das emissões nos setores de
agropecuária, transporte, energia, indústria, tratamento de ruídos e mudança de uso da terra e
florestas.
Segundo o referido estudo, a mudança do uso da terra, relacionada ao desmatamento
na Amazônia, bem como a agropecuária realizada na fronteira deste mesmo bioma são fatores
essenciais na compreensão do panorama das emissões de gases estufa no país. Ademais,
consta que há uma forte tendência de reversão na redução das emissões no Brasil que foi
verificada entre 2004 e 2010. A partir de então, houve um aumento em 28,2% na emissão de
gases estufa.
Podem ser separadas duas causas preponderantes na discussão sobre gases estufa,
quais sejam:
[...] o desmatamento, em especial na Amazônia, puxou o crescimento das emissões
no último ano. A quantidade de gases de efeito estufa lançada na atmosfera pelo
setor de mudança de uso da terra subiu 23% em 2019, atingindo 968 milhões de
tCO2 e – contra 788 milhões em 2018. As mudanças de uso da terra, puxadas pelo
desmatamento, seguem sendo as principais responsáveis por emissões no Brasil,
30

com 44% do total. Desde a PNMC, as emissões deste setor cresceram 64% no
Brasil, em que pese a meta, inscrita na lei, de reduzir o desmatamento na Amazônia
em 80% em 2020 comparado à média entre 1996 e 2005.
A agropecuária vem em segundo lugar, com 598,7 milhões de toneladas de CO2 e
em 2019, um aumento de 1,1% em relação às 592,3 milhões de toneladas emitidas
em 2018. As emissões diretas do setor, fortemente ligadas ao rebanho bovino,
representaram 28% do total de gases de efeito estufa do Brasil. Desde a
regulamentação da PNMC, em 2010, o setor de agropecuária viu um aumento de 7%
nas suas emissões, causado sobretudo pela expansão do rebanho (OBSERVATÓRIO
DO CLIMA, 2021a).

Dentre os 20 municípios que mais emitiram gases estufa no país, 17 estão localizados
na Amazônia Legal, nos estados do Pará, Rondônia, Amazonas e Mato Grosso. Em relação a
estes municípios, à exceção de Manaus/AM, que possui uma economia dinâmica, todos os
outros municípios destacados na Figura 4 a seguir estão situados no Arco do Desmatamento e
possuem a agropecuária como atividade predominante:
31

Figura 4: Emissões por município ­ toneladas (t) de CO2e (GWP­AR5) ­ ano­base 2018 – 20
maiores emissores do Brasil
Emissões por município - toneladas (t) de CO2e (GWP-AR5) - ano-base
2018 – 20 maiores emissores do Brasil
Sen. José Porfírio/PA
Aripuanã/MT
Paragominas/PA
Itaituba/PA
Manaus/AM
Apuí/AM
N. Aripuanã/AM
N. Progresso/PA
N. Mamoré/RO
Portel/PA
Serra/ES
Rio de JaneiroRJ
N. Repartimento/PA
Lábrea/AM
Colniza/MT
Pacajá/PA
São Paulo/SP
Porto Velho/RO
Altamira/PA
S. Félix do Xingu/PA

0 5000000 10000000 15000000 20000000 25000000 30000000 35000000


Agropecuária Transportes Edificícios
Saneamento Energia Elétrica Metalurgia
Cimento Outras industrias NA
Produção de combustíveis

Fonte: Observatório do Clima (2021a)

Esse levantamento demonstra o papel­chave dos danos provocados pelo agronegócio


no Arco do Desmatamento na Amazônia e a sua importância para o controle do aquecimento
global e, consequentemente, das mudanças climáticas.

2.1.2 O compromisso brasileiro para mudança do clima e a Amazônia


32

A conservação da Amazônia é ponto fundamental não apenas para a moderação do


clima nos planos local e regional, cumprindo­se os compromissos climáticos assumidos pelo
Brasil, mas também para a consecução como um todo do Acordo de Paris ­ firmado no âmbito
da 21ª reunião da Conferência das Partes da Convenção­Quadro das Nações Unidas sobre
Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), em Paris ­ na redução da temperatura
global no patamar esperado.
A UNFCCC foi projetada para declaradamente ser uma convenção­quadro, ou seja,
para que os acordos internacionais fossem elaborados com o tempo e conforme as evidências
científicas e a vontade política (DEPLEDGE, 2017, p. 28). Esta entidade internacional
destina­se, em seu fim último, a “evitar a interferência antropogênica perigosa no sistema
climático”5. A UNFCCC entrou em vigor em 1994 com o objetivo de prevenir a interferência
humana “perigosa” no sistema climático (UNFCCC, 1992)6, em um tal nível e de tal forma
que os ecossistemas se adaptem naturalmente às mudanças climáticas (UNFCCC, 1992)7.
A estrutura do Acordo de Paris é distinta do acordo climático antecessor, o Protocolo
de Quioto, que foi aprovado na 3ª reunião da Conferência das Partes (COP3) da UNFCCC, no
Japão, no ano de 1997. As cláusulas de revisão do Protocolo forneceram vias legais para um
próximo período de negociações, como em Doha, em 2012. Em Doha foi adotada uma
Emenda ao Protocolo de Quioto, definindo metas de emissão para as Partes do Anexo I para o
período 2013­2020, totalizando uma redução de 18% em emissões de gases estufa desse
grupo em relação aos níveis de 1990. É importante notar que o cumprimento do primeiro
período de compromisso do Protocolo (2008–2012) pelos países que permaneceram Partes
dele foi quase inteiramente completo. Embora o primeiro período de compromisso tenha
expirado e o segundo ainda não tenha entrado em vigor, o Protocolo de Quioto continua sendo
uma manifestação muito importante de liderança dos países desenvolvidos, conforme exigido
pela UNFCCC. Sem o Protocolo de Quioto original e, principalmente, sem a Emenda de

5
No original: “The ultimate objective of the Convention is to stabilize greenhouse gas concentrations ‘at a level
that would prevent dangerous anthropogenic (human induced) interference with the climate system.’ It states that
‘such a level should be achieved within a time­frame sufficient to allow ecosystems to adapt naturally to climate
change, to ensure that food production is not threatened, and to enable economic development to proceed in a
sustainable manner”.
6
No original: “The UNFCCC entered into force on 21 March 1994. Today, it has near­universal membership.
The 197 countries that have ratified the Convention are called Parties to the Convention. Preventing “dangerous”
human interference with the climate system is the ultimate aim of the UNFCCC” (UNFCCC, 1992).
7
No original: “The ultimate objective of the Convention is to stabilize greenhouse gas concentrations "at a level
that would prevent dangerous anthropogenic (human induced) interference with the climate system." It states
that "such a level should be achieved within a time­frame sufficient to allow ecosystems to adapt naturally to
climate change, to ensure that food production is not threatened, and to enable economic development to proceed
in a sustainable manner” (UNFCCC, 2021).
33

Doha, é improvável que as negociações do Acordo de Paris ­ ou de qualquer fortalecimento


dos compromissos dos países em desenvolvimento ­ tivessem começado (DEPLEDGE, 2017,
p. 32­35).
O Acordo de Paris foi elaborado durante a 21ª reunião da Conferência das Partes
(COP21) da Convenção­Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. O objetivo do
Acordo de Paris é limitar as emissões de gases de efeito estufa de forma que o aquecimento
global não ultrapasse 1,5°C (meta) ou 2,0°C (limite). A redução das futuras emissões de gases
de efeito estufa é baseada em promessas unilaterais formuladas pelos países membros da
UNFCCC, em uma Pretendida Contribuição Nacionalmente Determinada (iNDC, sigla em
inglês).
Nesse particular, o Brasil apresentou a sua iNDC, comprometendo­se a adotar uma
série de medidas para fortalecer a resposta global à ameaça de mudança do clima. No
primeiro compromisso assumido pelo Brasil para cumprir a meta de manter o aumento da
temperatura média global abaixo de 2°C em relação aos níveis pré­industriais estão as
preocupações com as florestas e a mudança do uso do solo. Não por outro motivo, o
documento reconhece a necessidade de serem envidados esforços no reflorestamento de 12
milhões de hectares de florestas e na restauração de 15 milhões de pastagens degradadas, em
investimentos em sistemas de monitoramento florestal, no manejo de áreas protegidas e no
aumento de resiliência por meio de programas de proteção e inclusão social (ITAMARATY,
2015).
Especificamente na Amazônia, o país se obrigou a fortalecer políticas e medidas com
vistas a alcançar o desmatamento ilegal zero até 2030 e a compensar emissões de gases de
efeito estufa provenientes da supressão legal da vegetação até o referido ano (ITAMARATY,
2015). O mesmo documento pontua que serão observadas as leis federais atinentes à matéria,
como o Código Florestal (BRASIL, 2012), que obriga a manutenção de 80% da cobertura de
vegetação nativa do imóvel rural localizado nas florestas da Amazônia Legal, além do
respeito às outras categorias de áreas protegidas.
Os compromissos do iNDC brasileiro como um todo foram considerados de baixa
ambição (SILVA; SANQUETA, 2017). Além disso, as estimativas de emissão de carbono
decorrentes das queimadas florestais estão, em muito, subestimadas, porquanto as abordagens
atuais avaliam as emissões com base em fatores estáticos ao longo do tempo e do espaço, ao
passo que as consequências de longo prazo dos incêndios florestais requerem uma
34

compreensão das emissões líquidas que respondam pela absorção pós­fogo de dióxido de
carbono. Ao se calcular as emissões provenientes de queimadas ao longo de 30 anos na
Amazônia, verifica­se que além da emissão imediata de gases estufa, a vegetação queimada e
em decomposição continua emitindo esses mesmos gases, resultando em aproximadamente
25% menos de biomassa na floresta. A iNDC brasileira não considera os incêndios florestais
como uma fonte significativa de emissão de gases estufa, embora provavelmente haja um
impacto substancial e de longo prazo no balanço líquido de carbono da Amazônia (SILVA et
al., 2020).
No mês de dezembro de 2020, foi apresentada uma segunda iNDC pelo governo
brasileiro, propondo novas metas para mitigação das mudanças climáticas. Dentre as metas
assumidas, e no que importa à Amazônia, estão: (i) eliminar o desmatamento em todos os seus
biomas até 2030; (ii) restaurar 14 milhões de hectares em áreas de reserva legal e áreas de
preservação permanente entre 2021 e 2030; (iii) recuperar 23 milhões de hectares de
pastagens degradadas entre 2021 e 2030; e (iv) aumentar em 2 milhões de hectares a área de
florestas plantadas no período entre 2021 e 2030 (G1, 2020; OBSERVATÓRIO DO CLIMA,
2020).
Pesquisadores do Observatório do Clima criticam essa segunda iNDC por prolongar
a meta de zerar as emissões dez anos a mais do que inicialmente se havia comprometido, não
obstante condicionar metas adicionais à liberação de valores previstos pelo Acordo de Paris,
como uma “tentativa de chantagem” a outros Estados (G1, 2020; OBSERVATÓRIO DO
CLIMA, 2020).
Além disso, observa­se que os danos socioambientais que atingem a Amazônia não
são uniformes, reclamando um olhar interdisciplinar e multidisciplinar para melhor
compreensão do fenômeno e suas consequências. Assim, a investigação metodológica dos
danos socioambientais na Amazônia é resultante não apenas da produção social, econômica,
ecológica, mas também da produção espacial do território, de matiz geopolítica e econômica.

2.1.3 A geopolítica da degradação no Arco do Desmatamento da Amazônia

A ampla abertura da fronteira amazônica para a exploração econômica da agricultura


foi possível devido à conjugação de esforços e a uma relação íntima e essencial entre
corporações e Estado. Esses esforços se materializaram de duas formas: (i) de um lado, o
Estado é essencial na geopolítica da Amazônia no que diz respeito ao fornecimento da
35

infraestrutura e do financiamento às corporações; bem como são essenciais os seus aparelhos


ideológicos (normas e formas jurídicas, política, informação, cultura etc.) e repressivos
(exército, polícias, tribunais, prisões etc.)8; (ii) de outro lado, o Estado se incumbiu da “tarefa
de conter as tensões sociais”, ou seja, da “implantação de projetos agropecuários, da
colonização e da expansão do agronegócio na fronteira” (OLIVEIRA, 2005, p. 72). Com
efeito, a “corrida” pelo controle da Amazônia se dá no plano geográfico e se baseia no
monopólio da propriedade privada do solo (e do subsolo), trazendo consigo o caráter
profundamente desigual da formação fundiária brasileira (OLIVEIRA, 2005, p. 68).
Essa frente surge definitivamente na segunda metade do século 20, com
características de uso intensivo e moderno na ocupação periférica, exigindo­se acréscimos
técnicos (irrigação, telecomunicações e transportes), semoventes (tratores e máquinas),
insumos do solo (sementes criadas para essas condições ambientais e fertilizantes),
informação (mapas, previsões de safra) e capital para responder à demanda (SANTOS, M.;
SILVEIRA, 2020, p. 130). Mais especificamente, esse front amazônico nasce tecnificado,
cientificizado e informacionalizado, porquanto difunde inovações em meio ao “vazio”, sendo
aberto por grandes empresas com a cooperação do Estado, o que explica a modernização, bem
como a “introdução maciça de maquinários e produtos químicos de firmas como Ford,
Massey Ferguson, Shell, Ciba­Geigy, Bayer, Dow­Chemical, Agroceres e Cargill” (SANTOS,
M.; SILVEIRA, 2020, p. 119).
Sob as orientações estratégicas e a liderança do governo estadunidense de Lyndon
Johnson, houve uma declaração conjunta de presidentes em encontro da Organização dos
Estados Americanos (OEA), no ano de 1967, para que fossem empenhados esforços: (i) na
melhora do sistema de crédito; (ii) no apoio à criação de indústrias de fertilizantes, pesticidas
e máquinas; e (iii) na promoção de avanços na logística e na infraestrutura para agropecuária
(POMPEIA, 2021, p. 93/94).
A geopolítica da expansão territorial da soja na Amazônia é visualizada na rápida
abertura de amplas fronteiras, a baixos custos e com baixa resistência social; na logística

8
Para Althusser (1985, p. 41­45) os aparelhos ideológicos de Estado não se confundem com os aparelhos
repressivos de Estado. Essa distinção se encontra na teoria marxista althusseriana de Estado, sendo, para o
referido autor, que “os Aparelhos Ideológicos de Estado funcionam de um modo massivamente prevalente pela
ideologia, embora funcionando secundariamente pela repressão, mesmo que no limite, mas apenas no limite, esta
seja bastante atenuada, dissimulada ou até simbólica (não há aparelho puramente simbólico)” (ALTHUSSER,
1985, p. 46/47). Em nota de rodapé, Althusser (1985, p. 44) ressalta: “o ‘direito’ pertence simultaneamente ao
Aparelho (repressivo) de Estado e ao sistema dos AIE” (Aparelhos Ideológicos de Estado).
36

produtiva­mercantil­financeira viabilizada pelo Estado; na integração entre produtores e


representantes governamentais; na mão de obra braçal, móvel e terceirizada, enquanto que a
mão de obra especializada é originada do Centro­Sul (BECKER, 2015c, p. 158­160).
Como dito, ao lado do Estado na exploração da Amazônia estão as corporações (ou
companhias transnacionais). Essas entidades privadas se caracterizam por suas:
[...] estruturas gigantescas de recursos humanos e materiais surgidas com o
crescimento econômico da etapa keynesiana, [as quais] foram os agentes sociais que,
nas condições de esgotamento do modelo anterior [o modelo fordista], optaram por
empreender uma renovação a fundo de seu capital fixo e de suas formas
organizativas para resolver a sua maneira a crise do sistema intervencionista.
Dispunham de grande poder econômico e social, e foram apoiadas politicamente por
governos de direita nos Estados Unidos, Japão, Reino Unido e Alemanha,
principalmente, isto é, pelos governos metropolitanos mais importantes (CAPELLA,
2002, p. 240).

As corporações ou empresas transnacionais se adaptam à terceira revolução


industrial (i) pela produção flexível e adaptativa às exigências técnicas, fiando­se em novas
máquinas, computadores e procedimentos; (ii) pelas novas organizações empresariais, em que
o capital não conhece pátria e desconhece fronteiras, e se compõem em conglomerados de
atividades e bens e serviços, mas o centro da decisão continua metropolitano,
majoritariamente; (iii) pela desmaterialização de certos mercados, como pela ascensão do
mercado financeiro em seu espírito puro, com a possibilidade de compra de bens futuros, por
exemplo, convertendo­se em uma espécie de cassino, e pela natureza imaterial da indústria
cultural; e (iv) pela mercantilização dos bens correspondentes à sociedade da informação
(CAPELLA, 2002, p. 241, p. 241/244)
Na verdade, deve­se ter em mente que as corporações são instituições criadas para
mobilizar grande quantidade de capital e protegê­lo, as quais também serão tutoradas pelo
Estado por meio de instrumentos jurídicos e políticos, executados por ações materiais e
ideológicas. Em outras palavras, a forma corporativa e o Estado estão, portanto,
intrinsecamente ligados, na medida em que, no capitalismo contemporâneo, um é condição de
existência do outro (TOMBS; WHITE, 2015, p. 80/81).
O espaço geopolítico amazônico é objeto de política econômica que facilita a
exploração capitalista dos recursos naturais direcionada, sobretudo, à satisfação dos interesses
privados capitalistas em contraposição às necessidades do ser humano:
Nas condições pioneiras da Amazônia, o Estado torna­se raquítico para a defesa do
cidadão e delega à violência privada, embora não expressamente, o arbítrio nas
relações entre os homens [...] Capitalismo selvagem, dir­se­á, que combina em sua
estrutura formas de exploração e de imposição que simultaneamente supõem o
Estado Leviatã (protetor, para os ricos) e a coerção privada para conter a emergência
37

de eventuais (e improváveis) primitivos rebeldes e para conter reações mais ou


menos organizadas que evidenciam aqui e ali o potencial da ação da massa dos
explorados (CARDOSO; MÜLLER, posição 94­96).

Nesse sentido, a acumulação do capital ocorre em um contexto geográfico que liga,


teoricamente, o processo de crescimento econômico com o entendimento explícito de uma
estrutura que emerge de relações espaciais (HARVEY, 2005, p. 41). Se é claro que “as
realidades da oferta e da demanda do cotidiano são estruturadas a fim de garantir uma taxa de
exploração consistente com as exigências da acumulação” (HARVEY, 2013, p. 227; MARX,
2017, p. 670), o sistema capitalista também buscará novas oportunidades de acumulação,
podendo ser elaborados quatro elementos ­ que, combinados ou não, expandem as
capacidades produtivas, renovam as condições de acumulação, não obstante provoquem
custos sociais e humanos trágicos ­, quais sejam: (i) penetração do capital em novas esferas,
reorganizando as atividades preexistentes (como na transformação da agricultura familiar e de
subsistência para a agricultura empresarial) e expandindo a produção e a diversificação da
divisão do trabalho; (ii) criação de novos desejos e necessidades; (iii) facilitação e estímulo
para o crescimento populacional, aumentando mão de obra e mercado consumidor; e (iv)
expansão geográfica para novas regiões, incrementando o comércio exterior, isto é,
exportando capital (HARVEY, 2005, p. 45/46).
Esse desenvolvimento nacional promovido pelo Estado com o objetivo de inserir o
país na lógica do capitalismo monopolista mundial, legou a Amazônia ao “grande capital
nacional mundializado, onde o Estado, através das estatais, e depois com a privatização,
realizou a soldagem dos interesses capitalistas monopolistas, quer em nível nacional ou
internacional” (OLIVEIRA, 2016, p. 177).
Afinal, as empresas buscam os limites de crescimento, mediante maior produtividade
do trabalho e do capital, o que também exige redefinições nas estratégias para maior controle
do mercado, como associações com outras empresas e grupos multinacionais (CASTRO,
2005). A articulação entre essas grandes empresas industriais e financeiras também provoca
reflexos nos padrões de consumo e da gestão da força de trabalho, mas também, em certos
países, da unificação dos mercados financeiro, cambial, de títulos e valores (CASTRO, 2005).
Castro (2005) explica que deve haver uma compreensão da dinâmica do
desmatamento que considere os princípios da racionalidade econômica e as estratégias de
caráter político dos agentes econômicos presentes em espaços diferenciados da Amazônia.
38

Nessa perspectiva, a autora sustenta que as causas do desmatamento (i) decorrem de fatores
multicausais e que dizem respeito à diferença entre a racionalidade dos atores e suas
estratégias; (ii) relacionam­se com a estrutura social e a capacidade de acumulação na
fronteira; (iii) associam­se com a forma como o país e a Amazônia inserem­se na economia
mundial; e (iv) vinculam­se aos arranjos políticos e à disponibilidade de recursos no território
(CASTRO, 2005).
Em escala mundial, o Brasil é uma fronteira em que podem ser explorados novos
recursos, sendo, pois, fundamental compreender que o modelo de desenvolvimento é induzido
do exterior (BECKER, 2015d, p. 237­241). Em escala nacional, busca­se operacionalizar
estrategicamente essa apropriação de recursos, ou seja, assegurar o monopólio da propriedade
privada da terra representada pelo latifúndio. É nesse contexto que o espaço amazônico vai se
valorizar pela extensão de terras não apropriadas e por sua posição geopolítica chave, interna
e externa, sendo não apenas uma fronteira agrícola nacional, mas transcendente em termos
mundiais (BECKER, 2015d, p. 237­241). De fato, a “Amazônia brasileira foi concebida, pelas
elites nacionais, como uma fronteira de recursos, na qual o capital poderia refazer seu ciclo de
acumulação com base nos novos estoques disponíveis” (CASTRO, 2005).
O aparecimento de latifúndios na Amazônia é recente, pouco anterior ao surgimento
de algumas empresas, como de mineração e de produção de alimentos (pecuária e soja), em
que uma política de incorporação nacional e doação de terras aos grandes capitalistas a partir
de 1967­1970 passou a integrar a região ao mercado, primeiro em âmbito local, depois em
âmbito nacional (CARDOSO; MÜLLER, 2008, posição 156).
Com ênfase nas vantagens da exportação e do interesse crescente de capitais
internacionais em investimentos industriais, mineradores e agroexportadores, a economia
amazônica se articula com o mercado internacional. Para tanto, o Estado brasileiro
“incorporou­se ao espaço produtivo capitalista internacional e cada uma de suas regiões, por
sua vez, sofreu os efeitos desta rearticulação, vindo a integrar­se ao mercado nacional e, por
intermédio deste, ao mercado mundial” (CARDOSO; MÜLLER, 2008, posição 165).
A integração efetiva da região se deu na ditadura empresarial e militar de 1964 a
1985, mediante projeto geopolítico gestado por segmentos da elite militar e civil, tomando o
Estado a iniciativa de um novo ciclo de devastação na Amazônia.
O Projeto Jari foi implantado na foz do rio Amazonas com o objetivo de produção
agropecuária (gado, arroz, cana de açúcar), celulose (extração e reflorestamento) e até mesmo
extração mineral (bauxita, manganês, ouro), contando com o capital de diversas corporações
39

norte­americanas (OLIVEIRA, 1995, p. 24­32; CARDOSO; MÜLLER, 2008, posição 2540).


Deflagrado no final da década de 1960, esse projeto não seria possível se não tivesse sido
favorecido com isenção de impostos e taxas de importação e com a permissão legislativa
sobre venda de terras a estrangeiros (BRASIL, 1969), em que a aquisição se submetia apenas
à aprovação do órgão competente, bem como à regularização fundiária de um gigantesco
território com titulações irregulares, incluindo­se terras “griladas”.
A parte que diz respeito ao projeto florestal envolvia o reflorestamento de 200.000
hectares e o plantio de 100 milhões de pés de Gmelina aeborea e do Pinus caribea, ou seja,
“queima­se uma floresta de milhões de anos para reflorestá­la com espécies alienígenas deste
nicho ecológico mundial”. Todas as commodities tinham como destino a exportação. Houve
denúncias sobre as péssimas condições de trabalho, inclusive trabalho escravo. No início dos
anos de 1980, o Estado, pelo governo empresarial­militar, organizou a aquisição do Projeto
Jari pelas nove principais instituições financeiras nacionais e outras 14 grandes empresas
brasileiras, assumindo o Banco do Brasil a responsabilidade pelo financiamento da dívida do
Projeto. Em contrapartida, o Estado comprometeu­se a realizar todas as obras de
infraestrutura necessárias para viabilizar o projeto, bem como regularizou 1,2 milhão de
hectares de terras, dado que, até então, grande parte dos empreendimentos do Projeto Jari
eram realizados em terras irregulares (OLIVEIRA, 1995, p. 24­32; CARDOSO; MÜLLER,
2008, posição 2540).
A Operação Amazônia (OLIVEIRA, 1995, p. 67­73) tratou de uma série de
empreendimentos e projetos agropecuários de capital nacional e internacional, inicialmente,
no Mato Grosso, tendo sido reportadas ações violentas contra posseiros e indígenas e
“legalização” de terras do Estado que foram griladas. Esse foi o projeto organizado pelo
Estado no governo empresarial­militar para implantar e expandir o agronegócio na Amazônia,
estabelecendo uma política de incentivos a grandes grupos econômicos nacionais e
internacionais no limite da Amazônia. No sul do Pará foi instituída uma holding de capital
nacional (Rio Dourado, Supergasbrás, Bradesco, Lion, BCN, Grupo Lunarcelli) e alemão
(Atlas, Volkswagen, Plambeck), envolvendo falsificação de títulos de terras, que permitia que
imóveis com registros já anulados pudessem ser regularizados e “recomprados” (OLIVEIRA,
1995, p. 67­69). No Mato Grosso, a implantação do projeto agropecuário de grupos paulistas
(Ometto, Aristo da Riva) e italiano (Liquifarm), em uma extensão de aproximadamente 700
mil hectares, foi responsável por ações violentas contra posseiros e indígenas (Suiá­missu,
40

Xavante) (OLIVEIRA, 1995, p. 70­73). Essa operação serviu­se da ideologia “integrar para
não integrar”, em que “integrar” significa “abrir caminhos, criar condições para a exploração
dos recursos naturais pelos grandes monopólios nacionais e multinacionais” (OLIVEIRA,
2005, p. 69­72). A Operação Amazônia é expressão de um projeto desenvolvimentista­
autoritário, que retira da cena política os movimentos sociais para centralizar no poder
executivo federal, associado e subordinado ao capital empresarial, as grandes decisões sobre o
futuro regional (MARQUES, G. S. 2019, p. 97).
Há um poder simbólico do capitalismo da “marcha da soja” em direção à Amazônia,
que reproduz o imaginário coletivo em torno do desenvolvimento social e econômico em
relação a essas áreas que são atingidas. Esse projeto geopolítico e econômico busca capturar o
“Oeste”, sugerindo elementos de unidade e integração nacional (SILVA, 2007, p. 286/287).
Dentre as estratégias para dar suporte ao projeto do Estado no referido período está a
criação do Banco da Amazônia (BASA) e da Superintendência de Desenvolvimento da
Amazônia (SUDAM), bem como da Zona Franca de Manaus.
Esse projeto geopolítico se apoiou em estratégias territoriais que implementaram a
ocupação regional, também chamado por Lefebvre de produção do espaço9, no qual o Estado
desenvolve uma tecnologia espacial e constrói uma malha técnica e política de redes e
conexões, capaz de controlar fluxos e estoques. Incluem­se nessas estratégias a rede
rodoviária transversal e regional, rede de telecomunicações, rede urbana e rede hidroelétrica
(BECKER, 2015a, p. 493­496).
Nessa ordem, o processo de acumulação capitalista se espraia por toda a extensão
territorial e busca absorver, submeter, reordenar e explorar toda a atividade econômica aos
desígnios de uma reprodução ampliada (GONÇALVES, 2005).
Os projetos agropecuários, em número e extensão, são demonstrados:
Analisando os projetos aprovados pela SUDAM até 31­12­72, ressalta que, de um
total de 502, 318 ꞏeram agropecuários, 167 industriais e 17 de serviços básicos. Os
projetos agropecuários são implantados por grandes empresas (grupos ou
indivíduos), com vistas basicamente à criação de gado, em grandes extensões de
terra ­ os 318 aprovados, cobriam 7.200 milhões de ha e continham 5 milhões de
cabeças de gado. Até 1972, a preferência era pelo norte de Mato Grosso, que
recebeu 184 dos 318 projetos, seguindo­se o Pará com 91 projetos e Goiás com 25.
A extensão das propriedades é imensa em Mato Grosso, onde os 184 Projetos
ocupam 5 milhões de ha, e maior em Goiás do que no Pará (91 Projetos do Pará
ocupam apenas 1.408.000 ha, enquanto que os 25 de Goiás incorporam 1.599.000

9
Lefebvre explica que o espaço (social) é produto (social), propondo, para tanto, uma teoria “que entende o
espaço como fundamentalmente atado à realidade social ­ do que se conclui que o espaço ‘em si mesmo’ jamais
pode servir como um ponto de partida epistemológico”. Por serem produtos sociais, espaço e tempo não são
universais, mas são “produzidos socialmente, só pode[ndo] ser compreendidos no contexto de uma sociedade
específica” (SCHMID, 2012).
41

ha). Paralelamente à implantação de projetos da SUDAM, efetua­se uma expansão


espontânea nas mesmas áreas (BECKER, 1974, p. 20).

A preferência pela atividade pecuária decorre da maior rentabilidade na ocupação de


grandes espaços sem grandes investimentos, valorizando­se o produto nos mercados
consumidores. Buscou­se também a ampliação das exportações e a perspectiva de acesso ao
Pacífico, além de ser um investimento contra a inflação da carne (BECKER, 1974, p. 20).
Nesse cenário, corporações estadunidenses e de outros países relacionadas à
agropecuária transferiram unidades industriais para o Brasil – a maioria delas obsoletas – em
razão de incentivos fiscais, frequentemente associadas a agentes nacionais (POMPEIA, 2021,
p. 94). De fato, por meio do BASA, foram concedidos incentivos fiscais, com um desconto de
50% do imposto de renda aos empreendimentos situados nas outras áreas mais desenvolvidas
e, após a aprovação do projeto pelo Estado, este passou a “constituir 75% do capital de uma
nova empresa, agropecuária ou industrial, na região amazônica. Tratava­se de uma doação, e
não de um empréstimo” (MARTINS, 2019, p. 75).
A produção do espaço é também analisada do ponto de vista normativo, uma vez que
“as representações do espaço assumem caráter normativo, influenciando ações normativas da
sociedade, na medida em que definem usos, presenças e discursos incentivados ou permitidos
em determinados lugares” (KONZEN, 2020).
Nesse período, a SUDAM demarca a Amazônia Legal, cujos limites se sobrepõe à
região norte, e determina que a faixa marginal de toda rodovia federal, na razão de 100
quilômetros, pertenceria à União, o que provocou a perda de 83 milhões de hectares do Pará
(66,5% desse estado) (BECKER, 2015a, p. 493­496).
A Amazônia Legal foi um instrumento criado para organizar essa ocupação, o qual
não se ajusta exatamente ao da floresta, mas designa um espaço geográfico para planejamento
político, econômico e social:
42

Figura 5: Limites da Amazônia Legal

Fonte: IBGE (2019a)

Diante da necessidade de sofisticada infraestrutura de logística para produção


agrícola moderna, as rodovias são um vetor importante para a ocupação antrópica e
consequente desmatamento, surgindo a participação fundamental do Estado.
Incluem­se, dentre os diversos fatores econômicos, institucionais, políticos e
demográficos que influenciam a degradação da Amazônia, a construção de rodovias oficiais, a
partir das quais há o acesso aos recursos naturais da Amazônia, bem como as rodovias não
oficiais que defluem das vias oficiais, constata­se não apenas desmatamentos, mas também
fragmentação florestal (PERZ et al., 2008). Nesse particular, não se exige a completa
transformação da área em pastagem para serem observados impactos na biodiversidade de
plantas e animais não humanonão humanos na Amazônia, o que também ocorre com a
fragmentação de habitats e bosques (PRIMACK; RODRIGUES, 2001, p. 95­97).
Isso quer dizer que a construção de rodovias é um fator determinante para o uso (e
modificação do uso) da terra, mas também para influenciar a desagregação de habitats,
alteração do fluxo e qualidade das águas e consequente vulnerabilidade ecológica, assim
como a deflagração de conflitos sociais, por meio da disputa de terras e pela ameaça de
43

ecossistemas dos quais os povos tradicionais dependem como meios de subsistência (PERZ et
al., 2008). Desse modo, não é possível dissociar os processos legais e formais de ocupação do
espaço que causam degradação ecológica, autorizados e/ou incentivados pelo Estado, dos
processos ilegais e informais, em razão de a ocupação moderna da Amazônia ocorrer
necessariamente orientada pela infraestrutura logística para o agronegócio, que também
proporciona a ocupação depredatória do espaço amazônico.
Nesse sentido, nas florestas tropicais, o desmatamento pode ocorrer por causas
diretas ou indiretas. Dentre as causas diretas, a combinação do agronegócio com a ampliação
da infraestrutura (logística) é o fenômeno econômico que mais se relaciona com o
desmatamento amazônico, em termos de frequência de ocorrência, transformando bosques em
pastos; e, com uma frequência menor, estão outros fatores ligados ao tipo de solo e fatores
climáticos (ROCHA, 2017, p. 41).
Concorrem para o desmatamento causas indiretas, como fatores econômicos,
políticos e institucionais, que se revelam nas políticas formais de créditos, subsídios e
concessões; bem como em políticas informais, apresentando­se sob a forma de corrupção,
falta de regulação, crescimento de coalização de grupos, clientelismo, interesses privados
influenciando regulações públicas e falta de governança. Há ainda o fator demográfico, o qual
se caracteriza pela migração de fazendeiros para áreas afetadas pelo desmatamento (ROCHA,
2017, p. 42).
Um outro fator que induz desmatamento, perda de ecossistemas e emissão de gases
estufa é a produção de energia hidrelétrica, que na Amazônia se notabilizou por duas grandes
usinas, a de Tucuruí/PA e a de Balbina/AM, e mais recentemente pela usina de Belo
Monte/PA, que exigem megabarragens. Nesses empreendimentos hidrelétricos, como em
qualquer reservatório, inundam­se florestas, incluídas matas ciliares, as quais têm papel
ecológico relevante, não obstante o desmatamento provocado pelos deslocados pelo
reservatório das barragens. Nesse ponto, diante do aumento da população pela presença da
obra, incluem­se o aumento da pecuária e outras atividades rurais na área. Há fortes impactos
sobre os povos indígenas, que perderam partes significativas de seus territórios, sendo causa
de conflitos sociais. Ademais, a instalação de empreendimentos hidrelétricos acarreta danos à
saúde de seres humanos e animais, haja vista a incidência endêmica de malária nas áreas onde
são construídas as barragens, por exemplo (FEARNSIDE, 2019, p. 8­18).
44

Essas enormes obras de infraestrutura energética estão marcadas por fazerem parte
de incorporação do território amazônico, seja para servir especificamente a projetos
extrativistas, como o beneficiamento de bauxita em alumínio e alumina da usina de Tucuruí
(PINTO, 2012), ou para abastecimento de energia elétrica para a cidade de Manaus, que nasce
desse processo de ocupação (FEARNSIDE, 2015).
Foi nessa conjuntura de integração regional da Amazônia que se incorporou o
território amazônico, estendendo­se a soberania, para o qual passaram a ser direcionados
excedentes demográficos nordestinos, implantando­se rodovias, como a Transamazônica (BR­
230), a rodovia Cuiabá­Santarém (BR­163) e a rodovia São Paulo­Cuiabá­Porto Velho (BR­
364) (BECKER, 2015d, p. 38­42). Essas rodovias vão, concomitantemente, criar a logística
do agronegócio e guiar o desmatamento amazônico:

Figura 6: Rodovias na Amazônia brasileira

Fonte: NETO (2019)


45

Deve­se ter em vista que “a política rodoviária posta em prática terá sido o maior
esforço já feito até hoje para penetrar, por terra, na selva” (CARDOSO; MÜLLER, 2008,
posição 2682). Efetivamente, as rodovias Cuiabá­Santarém e Transamazônica são as
infraestruturas que causam maior impacto no que diz respeito à penetração da selva
amazônica, principalmente por significar “uma série de problemas poucos advertidos
(problema do índio, da colonização, da exploração do trabalho, da ecologia amazônica, das
alternativas amazônicas)" (CARDOSO; MÜLLER, 2008, posição 2682). Os impactos
socioambientais da implantação da rodovia Cuiabá­Santarém desde a década de 1970 são
marcantes sobretudo por facilitar não apenas a cadeia produtiva agrícola e pecuária
relacionadas ao desmatamento autorizadas pelo Estado, mas também atividades ilegais. Há
uma movimentação de “grileiros” ao longo da rodovia Cuiabá­Santarém que, mesmo em
número pequeno, produzem grandes áreas de desmatamento (FEARNSIDE, 2008). Essa
rodovia não deveria ser finalizada e pavimentada até que fosse estabelecida uma governança
suficiente na fiscalização ambiental, sob pena de acelerar a migração de “grileiros” e o
consequente desmatamento. Ou seja, há uma lógica que pressupõe que a governança deveria
ser estabelecida antes da infraestrutura, ponderando­se os impactos socioambientais que a
decisão administrativa pode causar, caso contrário, a pressão de desmatamento seria
severamente aumentada (FEARNSIDE, 2007). Entretanto, os últimos 50 quilômetros sem
pavimentação dessa rodovia foram finalizados no início de 2020, a qual é tida como
“fundamental para o agronegócio da região, sendo uma importante via de transporte de grãos,
como soja e milho, do Estado do Mato Grosso até os portos do chamado Arco Norte, no Pará”
(AGÊNCIA PARÁ, 2020).
Atualmente, o empreendimento agroexportador brasileiro continua sendo executado
por poucas empresas, cuja magnitude e origem do capital as caracterizam como corporações.
Dentre as empresas com abrangente atuação na Amazônia, a Cargill e a Bunge, por exemplo,
estão entre as maiores empresas privadas dos Estados Unidos (MURPHY, 2019;
MACROTRENDS, 2020), e a JBS e a Marfrig são algumas das maiores empresas em solo
nacional (GLOBAL 200, 2019; B3, 2020a; B3, 2020b) 10.

10
A Cargill tem valor de mercado de U$ 113,5 bilhões (MURPHY, 2019), e o valor de mercado da Bunge é de
U$ 8,1 bilhões (MACROTRENDS, 2020). Já a empresa JBS possui valor de mercado de U$ 12,3 bilhões
(GLOBAL 200, 2019) ou R$ 51,5 bilhões (B3, 2020a) e Marfrig tem valor de mercado de R$ 9,7 bilhões (B3,
2020b).
46

2.1.4 O agronegócio no limiar do lícito com o ilícito

À vista de diversos mecanismos internos (compliance11, dentre outros) e externos


(fiscalização do Estado e compromissos internacionais, por exemplo) de controle do dano
ambiental, poder­se­ia supor que as corporações estivessem acima de qualquer suspeita
quanto à licitude de suas operações na Amazônia. Contudo, Martins (2019, p. 72/73) ressalta
a aparente contradição em “atividades, sobretudo as das novas fazendas de criação de gado,
na Amazônia, desenvolvidas por empresas modernas, algumas vinculadas a destacados grupos
econômicos internacionais” e o fato de “rotineiramente [recorrerem] à escravidão por dívida e
algumas de suas atividades”.
Parte­se também das frequentes notícias de trabalho escravo na região amazônica que
desde a década de 1970 são relatadas para sugerir uma reflexão crítica a respeito das relações
contraditórias na sociedade capitalista que, de um lado, afirma­se moderna, e de outro lado,
convive com a escravidão e a irracionalidade (MARTINS, 2019, p. 73).
A fronteira foi aberta na Amazônia no contexto da ditadura militar, da repressão e da
falta de liberdade política, em que as classes trabalhadoras do campo e da cidade eram
suspeitas de subversão política sempre que tentassem reagir às más condições de vida
(MARTINS, 2019, p. 76). Esse contexto criou um clima de extrema repressão aos
trabalhadores rurais, que se viam em situação adversa entre o fazendeiro e o Estado:
Num país em que o poder pessoal do grande proprietário rural é ainda hoje um poder
emblemático, um poder de vida e de morte, criou­se, assim, uma situação em que a
exploração do trabalho ficava acentuadamente na dependência do arbítrio do
fazendeiro ou de seus gerentes e capatazes. Na verdade, as instituições da justiça e
da polícia foram severamente debilitadas, quando não se tornaram coniventes com a
escravização de trabalhadores e com a expulsão de camponeses da terra, como é da
tradição em muitas e remotas regiões do país. A grande propriedade sempre foi
enclave sujeito a critérios próprios de direito, embora ilegais; lugar do reino do
arbítrio do senhor de terras, que se torna, por isso mesmo, ainda hoje, senhor de
consciências e de pessoas (MARTINS, 2019, p. 76/77).

A lógica que se visualiza nas relações de trabalho, apesar de a produção agrícola e


pecuária ser realizada principalmente por grandes empresas e corporações do setor, as quais
são ainda operadas com maquinário moderno e logística eficiente, é que recaem severas
dúvidas quanto à licitude de parte dessas operações. Mais do que isso, observa­se que a

11
O setor privado deve controlar a sua atividade, por exemplo, por meio do denominado compliance. A Lei
Anticorrupção (Lei n. 12.846/2013, BRASIL, 2013) incentivou no seu artigo 7o, inciso VIII, a criação de
“mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a
aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta”.
47

modernização ocorre com um processo contraditório de cometimento de crimes e prática de


danos.
No caso da soja, a logística na Amazônia é baseada principalmente em programas
governamentais, que geram conflitos e vulnerabilidades, tais como concentração fundiária e
de renda. Sobre este último ponto, assevera­se que há um corte monopolista do processo de
ocupação amazônico, principalmente da propriedade privada da terra (OLIVEIRA, 2005, p.
72). O conflito da expansão da agroindústria na Amazônia, como da soja, portanto, é
sobretudo sociopolítico e territorial:
Trata­se de dois espaços­tempo diferentes. De um lado o espaço­tempo das
corporações que, fundamentadas na associação entre logística e geopolítica,
expandem velozmente sua produção e suas redes de controle [...]. De outro lado, o
espaço­tempo dos produtores familiares, que não contam com meios técnicos e
financeiros, têm velocidade menor de mudança e visam, sobretudo, a manter suas
terras e identidades (BECKER, 2015c, p. 164/165).

A abertura da fronteira amazônica foi permeada de conflitos agrários, muito embora


houvesse a pretensão – ao menos retórica – do desenvolvimento econômico e social na região.
Com efeito, foram promovidas estratégias contraditórias e geradoras de escassez de terras,
prestigiando­se a expansão de grandes empreendimentos agropecuários em detrimento do
apoio aos mais pobres, aumentando­se o bem­estar e aliviando a pobreza. Dentre os recursos
utilizados está a construção de rodovias, empréstimos e subsídios diretos (SIMMONS, 2004).
Ao estudar o conflito e a violência na região amazônica, Simmons (2004) traz à
evidência estudos que relacionam escassez de terras e conflitos, que podem ocorrer em âmbito
interno ou transfronteiriço, notadamente quando grupos disputam recursos limitados. A
degradação ambiental é uma causa indireta de conflitos, por poderem levar ao agravamento de
condições socioambientais, o que decorre de uma “noção neomalthusiana de que o
crescimento populacional é a causa raiz dos problemas ambientais e, portanto, um ‘gatilho’
para reações violentas” (SIMMONS, 2004).
Os conflitos podem ocorrer mesmo em circunstâncias de abundância de recursos. As
commodities são atraentes para as elites governantes e, consequentemente, sua captura pode
desencadear conflitos entre e dentro do Estado pelo controle territorial (SIMMONS, 2004).
A fronteira possui como característica a luta pelos seus recursos (naturais),
notadamente porque não há um “vazio”, visto que as florestas que são apropriadas são
habitadas por populações consideradas, equivocadamente, atrasadas e primitivas (SILVA,
48

2007, p. 288). Ao contrário, o “vazio” ou “vazio demográfico” se confunde com o que foram
consideradas populações economicamente irrelevantes, quais sejam, os povos indígenas e as
populações tradicionais (TORRES et al., 2017, p. 56), tratando­se de uma “visão do
conquistador, que vê a região como uma terra de ninguém e sem ninguém, pronta para ser
ocupada e apropriada”, o que permite a negação do homem amazônico e sua cultura
(ARAGÓN, 2013, p. 54). Sobre a questão, a negação da existência dessas populações na
Amazônia pode ser inserida no contexto da negação ou da justificação das violências diretas
ou estruturais que invisibilizam as vítimas dos danos sociais provocados pelos agentes
poderosos, mais especificamente os Estados e empresas (BUDÓ, 2018, p. 350/351). Quer
dizer, o argumento de que há um “vazio” na Amazônia, de tal forma a desconsiderar as
populações indígenas e tradicionais, insere­se no cenário geopolítico de avanço econômico
sobre a floresta, que se resolveria pela “integração” desse espaço. Ao passo que o capital
busca se apropriar dos recursos naturais e terras amazônicas, desprezando as populações que
ali vivem, são produzidos conflitos sociais.
Assim sendo, essa fronteira tem uma dinâmica própria que, apesar de refletir a
sociedade em geral, apresenta conflitos e violências simbólicos que lhes são característicos
(SILVA, 2007, p. 285):
[...] a fronteira capitalista é um fenômeno não somente espacial e histórico, mas de
confrontação cultural e ideológica e de expansão econômica. No tocante à expansão
cultural, a fronteira contempla representações e práticas coletas de organização e
apreensão do mundo social. Essas representações são totalizantes e forjam interesses
de determinados grupos. De acordo com Chartier (1990, p. 17), as representações, as
representações não prescindem de estratégias e práticas que legitimam escolhas e
valores que se anunciam universais, mas não menos conflitantes. De certa forma,
apesar dos embates na fronteira agrícola capitalista, há uma adesão à violência
simbólica imposta pelo poder de alguns grupos sociais sobre territorialidades
constituídas, a que se refere Bourdieu (2003).

A fronteira capitalista, como tal, irá reproduzir formas jurídicas que lhes são
características, como a propriedade privada: “a propriedade privada da terra é um requisito à
consolidação da fronteira capitalista” o que, contudo, “na fronteira e na sociedade capitalista
em geral, reforça a desigualdade social”, provocando individualismo e conflitos (SILVA,
2007, p. 288).
A Transparency International publicou o estudo Global Corruption Report: Climate
Change (SWEENEY et al., 2011) afirmando que não são apenas Estados que possuem um
papel fundamental na governança e no desenvolvimento sustentável, mas que também atores
privados que conformam um sistema robusto nos níveis internacional, nacional, corporativo e
local. Diante das essenciais funções a serem desempenhadas frente ao desafio das mudanças
49

climáticas, o relatório descreve a preocupação dos riscos de corrupção em minar o sistema de


governança, sendo mais um fator de agravamento do problema. Ademais, há a compreensão
de que a qualidade da governança (climática) tem relação imediata com o grau em que o
desenvolvimento de políticas públicas e se as decisões são participativas, responsáveis,
transparentes, inclusivas, responsivas e respeitam o Estado de Direito, ajudando a determinar
também o tratamento contra a corrupção (SWEENEY et al., 2011).
Quanto às florestas, o relatório informa que os recursos florestais são muito
lucrativos, o que poderia ser um elemento importante do desenvolvimento econômico dos
países. No entanto, estão sujeitos à extração ilegal de madeira e à corrupção (SWEENEY et
al., 2011).
Em se tratando de violência estrutural que resulta em danos à natureza, como
explicado, aquela se dá de forma muito mais complexa. As corporações que exploram a soja
transgênica, a carne bovina e a madeira se aproveitam financeiramente de expedientes,
mecanismos, normas, “brechas”, para continuar a lucrar com o dano socioambiental.
Ao serem fornecidos matérias­primas e insumos ilícitos às corporações e adentrando
em suas cadeias produtivas, essas commodities serão comercializadas no mercado
internacional com um verniz de legalidade. De outro lado, coloca­se em xeque a legalidade da
cadeia produtiva das corporações, por não poder distinguir o que é proveniente de crime e o
que não é. O desmatamento continua a avançar sobre a Amazônia e é realizado por
corporações ou por suas fornecedoras, as quais utilizam de métodos sofisticados para
mascarar a sua origem ilícita.
Dá­se o nome de “lavagem” às práticas que escondem a origem ilícita dessas
commodities.
Whyte (2020, p. 99) esclarece que a complexidade legal e da produção provocam o
distanciamento das corporações da responsabilidade pelos danos sociais gerados, uma vez que
muitas vezes os impactos mais devastadores da atividade corporativa não são executados
diretamente pelas próprias corporações, mas por subsidiárias ou por outras empresas da cadeia
de fornecedores. Embora as empresas contratadas realizem um trabalho com especificações
altamente detalhadas, as corporações realizam um microgerenciamento da produção em um
nível de que normalmente só se esperaria encontrar dentro da sua própria estrutura
organizacional (WHYTE, 2020, p. 99/100). Em outras palavras, as corporações garantem uma
relação com sua cadeia de fornecedores como se empresas diversas fossem, embora, na
50

prática, tratem­se da mesma corporação (WHYTE, 2020, p. 100). O ponto importante é que as
corporações podem negar que possuem conhecimento sobre as práticas do que está abaixo na
cadeia de abastecimento, de forma que, formalmente, não seriam responsáveis pelas violações
de direitos e danos (WHYTE, 2020, p. 100).
É importante ressalvar que a análise da Criminologia Verde independe da legalidade
ou da ilegalidade dos danos praticados, mas se direciona aos danos efetivamente praticados ao
meio ambiente. Ainda assim, a demonstração de expedientes ilícitos do agronegócio, que atua
rotineiramente com expedientes ilegais e criminosos – utilizando­se até mesmo de violências
diretas contra pessoas, ameaças, homicídios, deslocamentos forçados, invasão de terras
públicas (como unidades de conservação e territórios indígenas) –, ajuda a desnudar a relação
com os danos sociais praticados e o conluio com o Estado na imunização de seus crimes.
A violência no Arco do Desmatamento, analisada do ponto de vista estrutural e
observando o metabolismo social entre os humanos e a natureza, ocorre sobretudo mediante
apropriação de terras de povos indígenas e comunidades tradicionais, o que será melhor
analisado no item 2.2.

2.1.4.1 Monocultura de soja transgênica e o desmatamento na cadeia produtiva

No ano de 2016, os traders (corporações) globais de soja se comprometeram a não


comercializarem ou financiarem soja transgênica produzida em áreas desmatadas no bioma
Amazônia, anunciando desde então estarem engajados no compromisso de não adquirirem de
fornecedores que tenham produzido em áreas recentemente desmatadas (OECO, 2016).
É o que se chama de “moratória da soja”, que reúne, por exemplo, Bunge e Cargill,
além de atores do setor associativo. Essa “moratória é resultado do reconhecimento de que o
desmatamento envolve custos reputacionais que ameaçam as próprias exportações brasileiras
e não é uma necessidade para a expansão do papel do Brasil nos mercados internacionais”
(ABRAMOVAY, 2019, p. 27).
Entretanto, a Chain Reaction Research, uma associação de analistas financeiros e de
crédito, banqueiros, investidores institucionais e corporações, focada em demonstrar o risco
financeiro do desmatamento, conduziu um estudo cruzando imagens satelitárias de incêndios
obtidos da Agência Espacial dos Estados Unidos (NASA, sigla em inglês) com a localização
dos silos de empresas de soja na Amazônia Legal em relação ao ano de 2019 (GARCIA et al.,
2020). Utilizando­se de um raio de 25 quilômetros do silo de soja para determinar a cadeia de
51

abastecimento e de suprimento, o estudo verificou que as queimadas no entorno da Bunge e


da Cargill são superiores à soma dos outros oito maiores produtores de soja do país:

Figura 7: Dados de incêndio da NASA VIIRS. Os alertas de queimadas pelo satélite VIIRS da
NASA foram sobrepostos às proximidades das 10 principais áreas de abastecimento dos
comerciantes de soja, em um raio de 25 km da localização de seus silos
Os 10 principais traders de soja com incêndios nas proximidades de
seus silos, 2019
30,000

25,000

20,000

15,000

10,000

5,000

0
Bunge Cargill ABC ADM LDC Amaggi Granol Cofco Multigrain Glencore
Industria e
Comercio

Fonte: GARCIA et al. (2020). Elaborado pelo autor

É importante ressaltar que o critério utilizado na pesquisa não conduz a uma relação
indubitável entre as queimadas e as corporações produtoras de soja, que vincula a
proximidade no raio de 25 quilômetros das instalações das corporações com um grande
potencial de compra. Ainda que se pudesse entender o critério adotado como arbitrário, a
Nestlé S/A, que declara objetivar a eliminação do desmatamento em sua cadeia de
abastecimento, deixou de adquirir soja da Cargill, depois que uma análise não conseguiu
rastrear as sementes oleaginosas de plantações específicas, levantando preocupações de que
eles tivessem sido produzidos em terras convertidas de florestas (WSJ, 2019).
Em outro recente estudo publicado na Science, são abordadas evidências que
interligam o desmatamento ilegal na Amazônia e no Cerrado, indicando que 2% das
propriedades nesses biomas são responsáveis por 62% de todo o desmatamento
potencialmente ilegal e que cerca de 20% das exportações de soja para a União Europeia (UE)
podem estar contaminados com desmatamento ilegal (RAJÃO et al., 2020). A metodologia
52

utilizada nesse estudo vai além das avaliações anteriores de rastreabilidade da cadeia de
fornecimento de soja, vinculando diretamente o desmatamento ilegal em propriedades rurais à
produção agrícola e exportação para países da UE. Nesse sentido, foram cruzados dados do
cadastro ambiental rural (CAR), da base de dados Trase12 e de guias de transporte animal
(GTA) resultando em um compilado de dados geoespaciais (RAJÃO et al., 2020). O
mapeamento e modelagem dos dados espaciais do estudo permitem revelar que houve 36 mil
propriedades com desmatamento ilegal na Amazônia, por não apresentarem sobras florestais
(ou seja, vegetação acima dos requisitos de conservação da reserva legal) e ensejar uma
licença para desmatamento (RAJÃO et al., 2020). Uma parte substancial desse desmatamento
ilegal está ligada a commodities, tal qual a soja transgênica na Amazônia, sendo o número de
propriedades que foi desmatada é bastante considerável desde 2008, das quais 91%
potencialmente ilegais, apesar de a “moratória da soja” impedir a comercialização da soja
cultivada em áreas desmatadas neste bioma (RAJÃO et al., 2020). Isso indica, segundo o
estudo, que mesmo os agricultores que cumprem a “moratória da soja” estão desmatando a
floresta para pastagem ou outras culturas dentro de suas propriedades, e, portanto, ainda estão
lucrando com o desmatamento (RAJÃO et al., 2020).
Apesar das incertezas relacionadas ao mapeamento e a modelagem de dados
geoespaciais, isso representa uma área de cerca de 3,7 milhões de hectares de soja de 17,2
milhões de hectares plantados nas propriedades do CAR durante a safra 2016­2017. Este
número representa um nível muito alto de soja potencialmente contaminada com
desmatamento ilegal, incluindo volumes consideráveis para a UE (RAJÃO et al., 2020).
Aproximadamente 41% das importações de soja da UE vêm do Brasil: 13,6 milhões de
toneladas métricas por ano, das quais 69% vêm desta região. Em suma, 18 a 22% de toda a
soja exportada da região para a UE está potencialmente contaminada. Ainda assim, o nível de
contaminação pode ultrapassar o limite superior de 22%, visto que a amostra do CAR cobre
apenas 80% da soja plantada na região (RAJÃO et al., 2020).

Figura 8: Vinculação entre desmatamento de propriedades rurais à agricultura e às


exportações

12
A Trase é uma parceria entre Instituto Ambiental de Estocolmo, Global Canopy, Instituto Florestal Europeu,
Vizzuality e outros parceiros, a qual produz um anuário que avalia de forma sistemática os padrões de
abastecimento de grandes empresas e países compradores, o risco de desmatamento associado às principais
empresas e mercados importadores que dominam as exportações brasileiras de soja e as ligações entre
compromissos de desmatamento e mudanças no uso do solo (TRASE, 2018).
53

Fonte: RAJÃO et al. (2020). Traduzido e adaptado pelo autor

A Amazon Watch e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil elaboraram um


relatório para esclarecer como o mercado financeiro dos Estados Unidos auxilia na destruição
da Amazônia e promove abusos contra povos indígenas, a partir do investimento de bilhões de
dólares em corporações associadas a desmatamento, roubo de terras protegidas (como terras
indígenas e unidades de conservação) para especulação (AMAZON WATCH; APIB, 2020, p.
5­11). Esses crimes, segundo esse relatório da Amazon Watch e APIB (2020, p. 4), são
praticados por atores internacionais poderosos e têm como cúmplices influentes interesses
econômicos nacionais e internacionais, nesse saque às florestas públicas e violência contra
povos tradicionais da floresta.
54

É importante mencionar que o relatório ressalta que os casos expostos não se


restringem ao agronegócio (Cargill, JBS, Cosan/Raízen), mas se estendem à mineração (Vale,
Anglo American, Belo Sun, Potássio do Brasil) e à produção de energia (Energisa Mato
Grosso, Bom Futuro Energia, Equatorial Energia Maranhão e Eletronorte). Essas corporações
foram financiadas por grandes instituições bancárias sediadas nos Estados Unidos,
contribuindo com mais de U$ 18 bilhões entre 2017 e 2020 (AMAZON WATCH; APIB,
2020, p. 5­11). A Cargill é um dos traders de soja mais expostos a risco de envolvimento à
degradação, posto ser a segunda maior corporação “que mais exportou o grão produzido nos
15 municípios com maior área de soja em fazendas associadas com desmatamento ilegal no
Mato Grosso” (AMAZON WATCH; APIB, 2020, p. 24). Em meio a disputas que ocorrem no
território indígena Munduruku 13, o qual é cercado por propriedades de soja, milho, sorgo e
fazendas de pecuária, os indígenas são alvo de ameaças constantes de fazendeiros e grileiros,
além da contaminação e assoreamento de igarapés (AMAZON WATCH; APIB, 2020, p. 24).
Recentemente, o fundo escandinavo de investimentos Danske Bank, o qual
administra cerca de €237 bilhões (R$ 1,37 trilhão), anunciou no início de fevereiro de 2021
que excluiu de seus fundos três gigantes globais que operam para o comércio internacional de
produtos agrícolas, Cargill, Bunge e ADM (FSP, 2021). O citado fundo de investimento
escandinavo afirmou que, malgrado as empresas tenham compromissos com políticas de
proteção ambiental, as referidas corporações que compram na região amazônica estão
expostas a contribuir com o desmatamento, não podendo permanecer com os traders em seus
fundos até que haja uma diminuição na taxa de desmatamento, no fortalecimento da agenda
política e na elaboração de planos de ação para proteger a Amazônia (FSP, 2021).
Sete grandes cadeias francesas de supermercados (Carrefour, Casino, Auchan, Lidl,
Système U, Mousquetaires e Leclerc) anunciaram que passaram a incorporar cláusulas de não
desmatamento vinculadas à soja aos contratos de seus fornecedores. Essa mudança teria
ocorrido tanto por um compromisso com o mercado, tanto para responder à demanda de seus

13
“Em setembro de 2018, em meio a pressões do MPF para que a Funai retomasse os estudos para delimitação
da TI Munduruku do Planalto Santareno, dez fazendeiros ligados ao Sindicato Rural de Santarém (Sirsan)
acionaram a Justiça por supostamente possuírem propriedades na área reivindicada pelos Munduruku. Tendo seu
pedido indeferido, e impedidos de interferir juridicamente no processo que exigia a condução de estudos da área
reivindicada pelos indígenas, o grupo passou a atuar politicamente para retardar o processo, que segue suspenso
devido às restrições impostas pela Covid­19. O grupo figura como potencial fornecedor de soja para a Cargill.
odos os produtores aqui da nossa região são cadastrados na Cargill’, segundo o próprio presidente do sindicato,
um dos autores da petição, o que sugere a possibilidade de a empresa ter entre os seus fornecedores fazendeiros
que atuam diretamente para inviabilizar a demarcação de Terras Indígenas na região” (AMAZON WATCH;
APIB, 2020, p. 24).
55

consumidores, mobilizados contra o desmatamento e favoráveis a ações concretas em relação


à proteção do meio ambiente (MONEYTIMES, 2020).
Como demonstrado, há graves denúncias de que os traders de soja transgênica que
operam na Amazônia o fazem com níveis preocupantes de contaminação de desmatamento
ilegal indireto, bem como com violação de direitos de povos indígenas e povos tradicionais
que vivem na floresta.

2.1.4.2 “Lavagem de gado”: invisibilização dos danos socioambientais na cadeia produtiva


da pecuária

Nas últimas décadas o mercado mundial vem impondo aos frigoríficos que atuam na
Amazônia Legal intervenções na cadeia de abastecimento para práticas mais sustentáveis,
tanto no âmbito ambiental quanto no âmbito social (SMITH, 2008).
Também no mercado interno, o Ministério Público Federal em Belém (PA) verificou,
no final da década de 2000, que as formas tradicionais de combate ao desmatamento, oriundas
do agronegócio, não eram efetivas, pois as multas eram cobradas de “laranjas” ou de
familiares dos fazendeiros, não obstante a existência de mais de 200 mil fazendas para
pecuária, o que inviabilizaria a tomada do compromisso e a fiscalização (PERGURIER;
BARRETO, 2019, p. 13/14). O plano foi voltar­se aos quatro maiores frigoríficos em atuação
na Amazônia: a JBS, a Bertin (mais tarde adquirida pela JBS), a Marfrig e a Minerva,
oferecendo­lhes o “TAC da Carne”14, mediante o qual estas corporações ascenderam a
fiscalizadores ambientais dos pecuaristas que usavam como fornecedores (PERGURIER;
BARRETO, 2019, p. 14­18). O direcionamento dos TACs a determinados frigoríficos se deu
em razão de estes representarem 93% de todo o gado abatido na Amazônia. Esse
compromisso perante o MPF teve bons resultados, apesar de possibilidades de fraudes e
“brechas”, como “lavagem” de gado que ocorre quando fazendas com desmatamento
repassam gado para fazendas sem desmatamento (PERGURIER; BARRETO, 2019). A
“lavagem” de gado ocorre quando fazendas com desmatamento repassam o gado para
fazendas dentro da lei que, por sua vez, repassam aos frigoríficos (PERGURIER; BARRETO,

14
Para Machado (2013, p. 431/432), TAC é abreviação de Termo de Ajustamento de Conduta, que poderá ser
tomado pelos órgãos públicos legitimados à propositura da ação civil pública, ajustando os infratores de
interesses sociais e individuais indisponíveis às obrigações legais, que terá eficácia de título executivo.
56

2019, p. 20). Os mecanismos de “lavagem” realizados pelos fazendeiros que fornecem o gado
deixam esses frigoríficos visíveis ao desmatamento em sua cadeia de fornecedores, os quais
também deixam de realizar qualquer controle sobre os fornecedores indiretos (BARRETO et
al., 2017). Quanto mais complexa é a cadeia produtiva, mais difícil se torna verificar se o
gado é proveniente de alguma fazenda onde tenha sido cometido um ilícito ambiental. O gado
possui três fases de produção – cria, recria e engorda ­, que podem ser realizadas na mesma
fazenda (ciclo completo) ou em fazendas diferentes (ciclo parcial) (PERGURIER;
BARRETO, 2019, p. 50).
Quanto maior for a quantidade de fazendas pelas quais o gado passe antes do abate,
menor será a visibilidade que o frigorífico possuirá de sua origem. Além disso, “as transações
de gado ao longo da cadeia podem ainda envolver outros caminhos como leilões, transações
entre produtores que utilizam o mesmo sistema, entre outros” (PROFOREST, 2017). Tudo
isso invisibiliza o rastreamento do gado oriundo de desmatamento para o frigorífico. Veja­se
no esquema:

Figura 9: Visibilidade da origem do gado quanto à fazenda com desmatamento ilegal ao longo
da cadeia produtiva
57

Fonte: Monitoramento Socioambiental da Pecuária no Brasil (PROFOREST, 2017)

Em um primeiro momento, os acordos com os grandes frigoríficos que assinaram


compromissos de zero desmatamento em suas cadeias de abastecimento indicaram uma
melhora nos índices de desmatamento (GIBBS et al., 2015), mas fatores como (i) o transporte
do gado de desmatamento para outros estados, longe da abrangência do TAC; (ii) a anistia aos
que degradaram a floresta; (iii) a redução de áreas protegidas pelo Código Florestal (BRASIL,
2012); e (iv) um impulso da produção pecuária em virtude da exportação para a China
(BARRETO et al., 2017), voltaram a pressionar por taxas maiores de desmatamento. Um
estudo de caso sobre a JBS em 2015 constatou que o monitoramento dos fornecedores diretos
era bem executado, mas a empresa não realizava o rastreamento dos fornecedores indiretos,
ou seja, aquelas fazendas que forneciam bezerros e novilhos para os seus fornecedores diretos
(PEGURIER; BARRETO, 2019).
Se a “lavagem” de gado é uma prática incontestavelmente ilícita, é importante notar
que a pecuária continuou a avançar sobre a floresta mediante procedimentos fraudulentos, o
que pode ser verificado por outras metodologias.
No mesmo estudo da Chain Reaction Research, no que concerne à carne bovina,
entre os frigoríficos, foi detectado que a JBS tem a maior exposição ao risco de obter produtos
de áreas provenientes de queimadas dentro de suas zonas potenciais de compra. A JBS e as
concorrentes Marfrig e Minerva são responsáveis por quase 60% do total de incêndios dentro
das zonas potenciais de compra dos dez primeiros matadouros, que, somados, alcançam
522.528 alertas de incêndio durante a temporada de incêndios em 2019, conforme o gráfico a
seguir:
58

Figura 10: Dados de incêndio da NASA VIIRS. Os alertas de queimadas constatados pelo
satélite NASA VIIRS foram sobrepostos às zonas de compra potencial (IMAZON) dos
matadouros de cada empresa
10 principais matadouros com incêndios em suas cadeias de
abastecimento
350,000
300,000
250,000
200,000
150,000
100,000
50,000
0

Fonte: GARCIA et al. (2020). Elaborado pelo autor

Tal qual na parte do estudo dedicada às corporações de soja transgênica, o critério


metodológico da pesquisa não fornece um vínculo indiscutível entre as queimadas e as
corporações da pecuária (matadouros) citadas na Figura 10, mas decorre de métricas que
indicam que fazendas infratoras sejam suas fornecedoras (GARCIA et al., 2020, p. 13).
Essas métricas foram obtidas a partir de metodologias criadas por pesquisadores do
IMAZON, instituição de pesquisa sem fins lucrativos que inicialmente mapeou os principais
frigoríficos em atuação na Amazônia Legal e inseriu a localização geográfica das plantas
frigoríficas, com suas estruturas de armazenamento (BARRETO et al., 2017). Em seguida,
com o fito de tomar conhecimento do raio máximo de compra de gado pelos frigoríficos,
foram consultados quarenta representantes de frigoríficos (31% dos frigoríficos ativos), sendo
que, quanto aos demais frigoríficos que se recusaram a informar sobre o distanciamento dos
fornecedores, foram realizadas estimativas médias regionais ou a partir de dados públicos
(BARRETO et al., 2017). O terceiro passo foi estimar as zonas potenciais de compra de gado,
projetando, em um primeiro momento, as distâncias máximas de compra, e depois, ajustando
essas zonas com a área efetiva de compra encontrada, o que podia variar de acordo com a
localização dos frigoríficos na logística existente (estradas oficiais, rios navegáveis e pastos)
(BARRETO et al., 2017). Ao final, cruzou­se no “mapa da zona potencial de compra de cada
59

um deles aos mapas das áreas embargadas pelo IBAMA (até novembro de 2016) com maior
somatória de áreas desmatadas recentemente (2014­2015) e em risco de desmatamento futuro
(2016­2018)” (BARRETO et al., 2017). Essas corporações foram ranqueadas conforme a
Figura 10.
Já o estudo de Rajão et al. (2020) mencionado, afirma que um número considerável
de cabeças de gado vem diretamente de propriedades com desmatamento potencialmente
ilegal. Além disso, cerca de 10% de todas as cabeças abatidas podem estar contaminadas com
desmatamento potencialmente ilegal de fornecedores indiretos, pois o gado passa de uma
propriedade para outra antes de ser abatido. Por exemplo, se de um lado as exportações de
carne bovina do Pará são insignificantes, há significativas relações comerciais entre esse
estado e Mato Grosso, que é uma fonte brasileira importante de fornecimento dessa
commodity para a UE (RAJÃO et al., 2020). Em análise do rastreamento do comércio de
propriedade de carne bovina entre os referidos estados no ano de 2017, conclui­se que cerca
de 7% da produção pode ter sido contaminada com desmatamento potencialmente ilegal,
incluindo fornecedores diretos e indiretos (RAJÃO et al., 2020). Este dado – comércio de bois
entre estados da federação, entre um estado com graves denúncias de desmatamento e um
outro estado com absoluta desnecessidade de importação desse produto agrícola – pode ser
um grave indicativo de lavagem de gado (RAJÃO et al., 2020).
Na produção pecuária, a JBS é acusada de diversas violações de direitos
socioambientais e por não realizar um controle adequado sobre a sua cadeia de fornecedores.
Dentre eles, um pecuarista, Jair Roberto Simionato, cria gado dentro do território indígena
Kayabi e posteriormente o fornece à JBS, acumulando quase R$ 20 milhões em multas
ambientais por desmatamentos na Amazônia (APUBLICA, 2020b).
O relatório da Amazon Watch e da APIB (2020, p. 26) informa que milhares de bois
têm sua origem omitida, também no processo denominado “lavagem de gado”, ocultando
desmatamento ilegal, violações cometidas dentro do território indígena e outras
irregularidades, vinculando­os à lei ao serem fornecidos para a JBS.
Em outra investigação realizada, JBS, Minerva e Marfrig adquiriram gado que foi
criado em duas fazendas situadas no interior de unidade de conservação, na fronteira de Mato
Grosso e Bolívia, as quais seriam pertencentes a um ex­ministro do governo Michel Temer,
Eliseu Padilha (2016­2018) (DE OLHO NOS RURALISTAS, 2020b). Consta que as fazendas
já possuíam um histórico de desmatamento ilegal, o que não impediu a aquisição da carne
60

bovina e posterior exportação para países da União Europeia e Ásia, misturando carne bovina
produzida legalmente com carne proveniente de crime ambiental (DE OLHO NOS
RURALISTAS, 2020b), demonstrando que as denúncias de “lavagem de gado” são bastante
reiteradas.
Uma outra recente investigação da Global Witness revela que, apenas no estado do
Pará, no período de três anos, as gigantes da carne bovina JBS, Marfrig e Minerva adquiriram
gado de 379 fazendas nas quais ocorreu desmatamento, equivalendo a pouco mais de 17 mil
hectares (GLOBAL WITNESS, 2020). O estudo demonstra que as três corporações
continuaram a comprar gado das fazendas com desmatamento ilegal durante muitos anos,
algumas, inclusive, acusadas de grilagem, uso ilegal de terras indígenas e até violência contra
povos indígenas. Munida com as guias de trânsito animal15, que mostram o movimento do
gado desde o nascimento até o abate, a ONG lança dúvidas sobre a veracidade de auditorias
que alegam que JBS, Marfrig e Minerva cumprem compromissos ambientais, eximindo­se sob
o argumento de que são obrigadas a seguir metodologias sobre as quais não têm controle
(GLOBAL WITNESS, 2020).
Diante dos estudos que são apresentados mais recentemente, as corporações Hennes
& Mauritz e Timberland afirmaram que não mais comprariam couro de produtores brasileiros,
até que fosse provado que seus rebanhos não eram criados ou alimentados em áreas
desmatadas; já o fundo de investimentos canadense Caisse de dépôt et placement du Québec
vendeu sua posição como acionista na JBS, haja vista considerar que esta não segue as boas
práticas do produtor de carne (WSJ, 2019). A instituição financeira francesa BNP Paribas
(2021) afirmou que deixará de financiar clientes que produzam ou comprem carne ou soja em
terras convertidas ou desmatadas após 2008, tanto na Amazônia como no Cerrado. Para todos
os seus clientes, essa instituição passará a exigir a partir de 2025 a total rastreabilidade da
carne bovina e da soja, incluídos os fornecedores indiretos.
Apesar do longo prazo para adaptação corporativa, chama a atenção que o
comunicado da referida instituição financeira considera que “a produção de carne bovina e
soja no Brasil acelera o desmatamento na Amazônia e no Cerrado. Seja legal ou ilegal, ela

15
As guias de trânsito animal (GTA) são dados disponíveis para consulta pública, no estado do Pará, no site da
Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará (ADEPARÁ), capazes de identificar os fornecedores de
gado de JBS, Marfrig e Minerva, objeto da pesquisa. A JBS afirmou não ser possível o monitoramento dos
fornecedores indiretos por não serem documentos públicos e serem de uso exclusivo do Ministério da
Agricultura.
61

põe em risco a integridade ecológica e o futuro desses dois biomas” 16 (BNP PARIBAS,
2021).
Por outro lado, uma vez que não solicitam informações detalhadas sobre as cadeias
produtivas das referidas corporações, 250 instituições financeiras, sendo 41% com sede nos
Estados Unidos e na União Europeia, como Deutsche Bank, Barclays, Santander, HSBC e
Morgan Stanley, viabilizaram R$ 9 bilhões em investimentos e empréstimos entre 2017 e
2019 (GLOBAL WITNESS, 2020).
Há uma busca pela limpeza da reputação corporativa, quando as empresas do ramo
negam atividades que envolvam pecuária em área de desmatamento. Por exemplo, em
comunicado à imprensa frente a denúncias, em setembro de 2020, a JBS informou que, ao
tempo que garante que 100% de seus fornecedores estão em conformidade com suas políticas
de compra responsável, de outro lado, anuncia um novo programa de monitoramento (JBS,
2020).

2.1.4.3 “Lavagem de madeira” e crimes no desmonte do marco regulatório

A indústria madeireira em florestas tropicais se caracteriza pela extração seletiva de


uma ou mais espécies de maior valor comercial (o que também considera a idade apropriada
para seu aproveitamento), tanto por meio de extração em áreas de manejo como exploração
florestal em desmatamentos autorizados; ou em situações não autorizadas, logo ilegais. Em
grande parte, essa indústria não está necessariamente associada com a agropecuária, mas com
ela coexiste, desvinculada do desmatamento orientado à formação de áreas para agricultura e
pastagens (MORETTI et al., 2020). Como mencionado no item 2.2.1 desta pesquisa, o corte
seletivo pode ser muito danoso ao bioma amazônico para conservação da sua biodiversidade e
para higidez de seu equilíbrio ecossistêmico (FEARNSIDE, 2005; SATO et al., 2011).
É necessário diferenciar, portanto, que o corte raso da vegetação, mediante queimada
ou outro método disponível, não tem relação com a indústria madeireira, uma vez que iriam
ser recolhidos cipós e outras de espécies de madeira sem valor econômico. A indústria
madeireira que atua legalmente na floresta amazônica tem sua atividade pautada na retirada de

16
No original: “Beef and soybean production in Brazil accelerates deforestation in the Amazon and the Cerrado.
Whether legal or illegal, it jeopardises the ecological integrity and future of these two biomes. Faced with this
degradation, there is an urgent need for all relevant stakeholders to prioritise land use strategies that integrate
zero deforestation, sustainable production and a positive social impact”.
62

determinadas espécies autorizadas, considerando cada ciclo de recuperação, conforme licença


ambiental que concede a autorização para o manejo florestal (EMBRAPA, 2020b).
No 14° Congresso das Nações Unidas sobre “Prevenção ao Crime e Justiça
Criminal”, ocorrido em março de 2021, o ministro Luís Roberto Barroso discorreu sobre os
crimes na Amazônia, sua prevenção e o desenvolvimento sustentável, e expôs a equivocada,
mas recorrente compreensão de que desmatamento é uma atividade econômica
exclusivamente antecedente à pecuária e à agricultura. Para o ministro,

Os principais crimes praticados na região incluem desmatamento, que é a principal


causa de derrubada da floresta é a formação de pastagens para criação de gado;
queimadas, que permitem uma rápida supressão da vegetação limpando áreas para
pecuária e agricultura; extração e comércio ilegal de madeira (cerca de 80% da
produção de madeira no Brasil é ilegal, e esta é a terceira causa de desmatamento);
mineração (ainda polui os rios); a grilagem de terras (BARROSO, 2021).

Conquanto a abordagem do dano socioambiental para a compreensão do impacto das


ações (e omissões) seja a mais adequada, existem acordos e documentos internacionais sobre
significado de mortes, lesões graves e leves, doenças, finanças e corrupção, o que contribui
para um entendimento e definição parcial para medir os danos (HILLYARD; TOMBS, 2007).
Um relatório do PNUMA e da INTERPOL (NELLEMANN et al., 2012) destaca
como os criminosos ambientais estão combinando métodos antiquados, como subornos, com
métodos de alta tecnologia, como invasão de computadores em sites do governo para obter
autorização de transporte de toras e outras licenças para executar a exploração madeireira. Um
dos maiores desafios no combate à extração ilegal de madeira é entender como a madeira é
ilegalmente extraída, adquirida, processada e distribuída nos mercados do país e de todo o
mundo. Um artifício comum de lavagem de madeira é misturar toras ilegalmente extraídas
com toras legais durante a operação florestal. Outro método usualmente utilizado por
madeireiras é indicar toras ilegais como provenientes de áreas de manejo legais e reais, sendo
comercializadas (NELLEMANN et al., 2012). O seguinte esquema elaborado pela
INTERPOL e pelo PNUMA demonstra alguns desses métodos utilizados pela indústria
madeireira na lavagem de madeira, em que, muito embora haja uma pequena área autorizada
para exploração florestal, o dano é multiplicado por artifícios criminosos:
63

Figura 11: Exploração madeireira e processo de lavagem de madeira ilegal

Fonte: NELLEMANN (2012, p. 46). Traduzido e adaptado pelo autor

Esse relatório aponta que o declínio da extração ilegal de madeira em meados dos
anos 2000 se atribui ao esforço de curto prazo para a aplicação da lei, mas há tendências de
longo prazo na extração ilegal de madeira e no comércio que mostram que a extração de
madeira ilegal persiste (NELLEMANN, 2012). Consta no relatório que o aparente declínio
64

mundial na extração ilegal de madeira se deve a operações de lavagem mais avançadas,


mascarando atividades criminosas, e não necessariamente devido ao declínio geral na
extração ilegal de madeira. Em alguns casos, madeireiros ilegais misturam madeira ilícita com
3 a 30 vezes a quantidade de madeira processada oficialmente (NELLEMANN, 2012, p. 7/8).
No Brasil, a exploração de recursos naturais é permitida mediante processo de
licenciamento ambiental, condicionando­se à área ao uso sustentável da unidade de manejo,
conforme a Lei n. 11.284/2006 (BRASIL), que se realiza, em se tratando de imóvel inserido
no bioma Amazônia, com plano de manejo 17 para que o interessado possa explorar planejada
e economicamente. No curso do licenciamento ambiental, o interessado também deverá
comprovar a preservação de 80% do imóvel para fins de manutenção da reserva legal, sem
prejuízo da aplicação das normas sobre áreas de preservação permanente (BRASIL, 2012).
Ao final do procedimento, com o licenciamento aprovado, “a respectiva autorização é
acompanhada de uma liberação de créditos florestais (contendo o volume e as respectivas
espécies existentes na área do projeto), de forma que o proprietário da área terá o
correspondente em uma ‘conta corrente’, junto ao órgão ambiental” (PERAZZONI, 2014, p.
79).
O sistema de gestão florestal, com a informação dos respectivos volumes e espécies,
informa (i) a realização da venda de produtos florestais condicionada à existência de créditos
na origem; e (ii) que os créditos passam a serem creditados na “conta” do destinatário, após
venda, transporte e efetiva aquisição (PERAZZONI, 2014, p. 80), sendo todas essas
informações necessárias à comprovação da regularidade dos produtos florestais perante o
IBAMA.
Os principais ilícitos relacionados à extração ilegal de madeira envolvem
organizações criminosas que se dedicam à extração da madeira, não raro infiltradas no Estado,
seja por ameaças ou por corrupção, que se utilizam de (i) produção de fraudes na concessão
de autorizações, de manejo florestal e em guias de transporte; (ii) disponibilização de créditos
florestais fictícios, referentes a áreas não documentadas, terras públicas ou áreas protegidas; e
(iii) falsificação de documentação para transporte, processamento e comercialização de
produtos florestais para serrarias e madeireiras (PERAZZONI, 2014, p. 84/85).
Uma reportagem da organização não governamental britânica Earthsigth (2021)
ilustra a lavagem de madeira em conluio com o Estado. Relata que em 2018 houve a maior

17
Poderá se tratar do Plano de Manejo Florestal Sustentável (PMFS), destinado a explorar florestas e formações
sucessoras sob o regime de manejo florestal sustentável; ou do Plano de Exploração Florestal (PEF), indicado
para a explorar florestas e formações sucessoras, mas para o uso alternativo do solo (BRASIL, 2006).
65

apreensão de madeira ilegal da história em São Paulo proveniente da Amazônia,


operacionalizada pelo IBAMA e pela Polícia Federal (PF), denominada Operação Pátio, com
o objetivo de combater um esquema de fraudes na homologação de depósitos de madeira
(“pátios”).
As fraudes ocorriam, segundo a reportagem, com a transferência de produtos
florestais entre pátios da mesma empresa, o que deveria ser acompanhado do documento
correspondente, o Documento de Origem Florestal (DOF), mas, ao não ser emitido com base
nos estoques, criavam­se créditos fictícios, o que possibilitava mascarar a madeira ilegal, em
mais uma prática de lavagem (EARTHSIGTH, 2021).
A reportagem alerta para o cancelamento da multa de R$ 482,3 milhões expedida
para uma subsidiária da empresa Indusparquet 18, que é a maior exportadora de pisos e decks
de madeira do Brasil, pelo Superintendente do IBAMA em São Paulo, Davi de Sousa Silva,
ex­policial sem experiência ambiental anterior 19. Para justificar o cancelamento da multa, o
Superintendente apontou “vícios” na investigação e na atuação dos agentes do IBAMA,
concordando com os argumentos da empresa de que toda a madeira objeto da multa tem
origem legal e de que a madeira fiscalizada estava licenciada. A empresa alegou que a
madeira fiscalizada pertenceria à sede e não à subsidiária, mesmo que isso comportasse
confissão de uma nova ilegalidade (EARTHSIGTH, 2021). Os EUA são o principal destino
dos produtos da Indusparquet, representando mais de 90% (49.600 toneladas) das vendas
mundiais da empresa (EARTHSIGTH, 2021).
Os danos decorrentes da “lavagem de madeira” descritos pela Earthsigth e outros
tantos não seriam possíveis sem a omissão do Estado ou, até mesmo, com a sua participação,
seja na omissão da fiscalização da atividade madeireira, seja no envolvimento de possíveis
casos de crimes contra a administração pública, como também pelo desmonte do marco
regulatório em favor de interesses privados.

18
Ainda durante o governo Michel Temer, o IBAMA havia confirmado uma outra multa de R$ 450 mil contra a
mesma empresa por ter mais de 10.700 m³ em créditos de madeira no sistema de controle eletrônico do órgão
federal, sem o correspondente em madeira no pátio, o que é ilegal pela legislação brasileira (EARTHSIGTH,
2021).
19
Um relatório técnico do TCU apontou uma “militarização” no IBAMA, porquanto foram indicados pelo
Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles oito militares em cargos estratégicos do órgão ambiental, sem que
fossem atendidas exigências básicas de qualificação. Segundo o TCU, os nomes não possuem formação ou
experiência profissional na área de fiscalização ou no campo ambiental de forma mais geral (METRÓPOLES,
2020).
66

Com efeito, os dois últimos anos foram marcados pela edição de diversas normas
administrativas concernentes à exploração madeireira na Amazônia, cujos danos
socioambientais colocam em risco a integridade ecológica da Amazônia, conduzindo aos
marcos centrais da Criminologia Verde e dos crimes dos poderosos.
A Polícia Federal deflagrou, em 19 de maio de 2021, a operação Akuanduba, que
trata de um esquema de facilitação para exportação de produtos florestais oriundo do Estado
do Pará, com fortes indícios de participação de autoridade com prerrogativa de foro no
Supremo Tribunal Federal, o ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles (BRASIL, 2021).
Segundo apurado na representação da autoridade policial, o referido ministro, o
presidente do IBAMA Eduardo Bim e outros agentes públicos vinculados à pasta aplicaram
um modus operandi ilícito para liberação de cargas do ramo de exportação de madeira
simbolizado na expressão “parecer, caneta”20, ou seja, na elaboração de pareceres por
servidores de confiança com a subsequente autorização em favor de empresas também
investigadas.
A operação Akuanduba também verificou que as empresas exportadoras de produtos
florestais influenciaram a emissão de normativas, como o Despacho n. 7036900/2020­GABIN
(IBAMA, 2020). Este despacho afasta a vigência da Instrução Normativa n. 15/2011, por
considerá­la implicitamente revogada, notadamente o seu artigo 10, que possibilita a inspeção
por amostragem de agentes do IBAMA, na medida em que as alterações do DOF e a
implantação do Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais
(SINAFLOR) já possibilitariam, a qualquer tempo, a fiscalização.
É de se destacar, também, a edição da Instrução Normativa IBAMA n. 7, de 21 de
fevereiro de 2020 (IBAMA, 2020), que retirou a exigência da fiscalização in loco da madeira
a ser exportada e sua correspondente documentação por agentes do órgão ambiental federal.
Desta forma, consolidou­se o entendimento de que os agentes do IBAMA possuiriam tão
somente um controle a posteriori da documentação emitida. Os agentes analisariam
mormente o DOF, no qual se encontram informações sobre a procedência da madeira,
constituindo licença obrigatória para transporte e para armazenamento.

20
Em reunião ministerial do dia 22 de abril de 2019, que foi tornada pública posteriormente por decisão do
ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, tomou­se conhecimento de declaração do ministro do
meio ambiente, Ricardo Salles, sobre “aproveitar” o período de calamidade pública de pandemia de COVID­19
para diminuir a proteção ambiental, “desburocratizando”: “Agora tem um monte de coisa que é só, parecer,
caneta, parecer, caneta. Sem parecer também não tem caneta, porque dar uma canetada sem parecer é cana”
(PODER360, 2020).
67

Há outros atos que, embora não mencionados na operação Akuanduba, merecem


destaque, como a anterior atribuição a despacho jurídico pelo presidente do IBAMA Eduardo
Fortunato Bim, entendendo pela “impossibilidade de responsabilização do comprador de
produto lastreado por DOF que posteriormente se constatou ser fraudulento sem que haja
demonstração de indícios da participação ou ciência quanto a ilicitude” (IBAMA, 2019). De
acordo com esse ato administrativo, os agentes do IBAMA não mais poderiam responsabilizar
as empresas adquirentes – principalmente aquelas empresas que realizam a exportação dos
produtos florestais – sem os indícios de participação ou ciência no crime ambiental
originalmente cometido pelas madeireiras.
Desde o ano de 2019, quando se tornou usual a revelação de dia e local da
fiscalização na Amazônia, inclusive no diário oficial da União, reforçam­se os indícios de que
o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e o IBAMA vêm assumindo práticas que inibem a
atuação dos agentes. (O ESTADO DE SÃO PAULO, 2019; O ESTADO DE SÃO PAULO,
2021).
Essas normas administrativas conjugadas não apontam para o aperfeiçoamento do
sistema de fiscalização e governança no tocante à atividade madeireira na Amazônia, mas, ao
contrário, indicam o embaraçamento das medidas de prevenção e de repressão ao combate ao
ilícito ambiental. Ao final das mudanças administrativas e regulamentares, percebe­se que se
traduzem como entraves à atuação dos agentes do IBAMA.
No plano da governança, por causas indiretas do desmatamento, atribui­se ao
relaxamento das medidas de prevenção e repressão, a possibilidade de regularização de terras
griladas e a falta de alternativas econômicas para os habitantes da região (BARROSO, 2021).
Como possíveis soluções para os problemas invocados, estariam a retomada das
ações de prevenção e de repressão, uma emenda constitucional que proibisse a grilagem de
terras e uma bioeconomia da floresta, que afastaria o modelo econômico implantado nos
últimos 50 anos. Este último aspecto estaria fundado na sustentabilidade, no conhecimento e
no planejamento estratégico para elaboração de produtos, pesquisa e novos materiais e
soluções energéticas, agregando potencialidades da biodiversidade amazônica, conhecimento
tradicional e novas tecnologias (BARROSO, 2021).
68

Para o ministro, também como possível solução, os mercados de consumo e os


investidores21 também poderiam exigir certificações para incentivar que os produtos
provenientes da Amazônia não estejam vinculados ao desmatamento ilegal (BARROSO,
2021).

2.1.5 Considerações a propósito do cenário dos danos no Arco do Desmatamento da


Amazônia

Neste item foi possível observar que os danos perpetrados na Amazônia, mais
especificamente em seu Arco do Desmatamento, colocam em risco o seu equilíbrio
ecossistêmico, não obstante a relevante contribuição ao agravamento às mudanças climáticas.
Como visto, a ocupação do espaço amazônico possui uma nítida simbiose estatal­
corporativa, com financiamentos diferenciados, investimentos em infraestrutura, parcerias e
incentivos de todo tipo, com a finalidade de “integrar” e “desenvolver” esta parcela do
território brasileiro, mas também gerar lucros às corporações do agronegócio.
Os danos ambientais e humanos praticados nessa fronteira, e os conflitos decorrentes,
são de conhecimento das corporações e do Estado, os quais são ocultados, mascarados,
“lavados”, para que não haja interrupção da ampliação do agronegócio, mormente produzidos
por corporações relacionadas à produção, beneficiamento e exportação de monocultura de
soja transgênica, gado bovino e madeira.
Com efeito, constatou­se que uma parte considerável da produção dessas corporações
encontra­se na ilegalidade, o que se oculta em longas e não fiscalizadas cadeias produtivas.

2.2 Vítimas “invisíveis” dos danos sociais: danos às comunidades indígenas e


tradicionais, aos animais não humanos e a perda da biodiversidade na Amazônia

Ao buscar novas áreas para produção, a fronteira produz contradições socioespaciais,


refletindo processos de exclusão social, reprodução ampliada do capital, inserção precária de
grupos sociais e difusão de valores culturais e ideológicos (SILVA, 2007, p. 285).

21
Desde a Lacey Act, as empresas estadunidenses estão proibidas de importar madeira ilegal de outro país,
sendo a gravidade das sanções dependente dos controles internos empresariais em verificar a origem legal de
seus produtos de madeira importados (EARTHSIGTH, 2021). A Lacey Act foi criada originalmente em 1900
com o objetivo de combater crimes ambientais. Em 2008, a lei foi emendada para proibir todo o comércio ilegal
de produtos florestais de dentro e fora dos Estados Unidos (WWF, 2014).
69

Em tal ponto de vista, a fronteira caracteriza uma situação dominada pela diferença e
pelo desencontro étnicos no espaço, exigindo uma compreensão de que esse espaço depende
do reconhecimento de dicotomias, permeada pelo relacionamento e o estranhamento entre os
sociologicamente conviventes: o “lado de lá” da fronteira, o das populações indígenas 22, e o
“lado de cá”, tido como “civilizado” (MARTINS, 2019, p. 24).
Diante desse panorama de conflito, é trabalhado neste item o processo de ocupação
da fronteira da Amazônia como fundamento para a vitimização dos povos indígenas e
tradicionais. Para tanto, pretende­se entender esse processo de vitimização, pesquisando­se
dados sobre violência e desmatamento em áreas protegidas e ocupadas por povos indígenas e
tradicionais.

2.2.1 O avanço da fronteira contra os territórios indígenas

Ao encontrar “novos” espaços e recursos, inaugura­se a disputa pela posse de terras


por meio da violência no campo, que é uma das maiores causas de morte no Brasil, vitimando
especialmente as populações indígenas, cujos direitos de posse dos territórios ancestrais lhes
são facultados (SCHWARCZ, 2019, p. 161/162).
Essa mais recente fronteira do capital, além de engendrar a crise ecológica, é pautada
pelo recrudescimento da violência e, para tanto, apropria­se de novos espaços e recursos,
empreendendo a destruição física daqueles que vivem sobre eles (COSTA, 2014).
Há uma progressiva admissão de uma pauta específica dos povos e comunidades
indígenas e tradicionais, que lutam pelo reconhecimento das terras tradicionalmente ocupadas,
vinculadas à afirmação da identidade, à autogestão e ao controle dos recursos naturais, bem
como atrelada a fatores étnicos (MOREIRA, 2017, p. 24/25). Há uma incompreensão em
relação ao tratamento do contexto espacial e jurídico de “terra” e não de “território”, ou seja,
de identidade e de fatores étnicos (MOREIRA, 2017, p. 27­29).
Efetivamente, o território, nesse sentido, é local de produção da cultura e saberes,
afastando­se de uma compreensão meramente fundiária. Tal conceito supera, assim, aquela
concepção tradicional vinculada à propriedade privada para abarcar espaços simbólicos de

22
[e das populações tradicionais]
70

identidade, produção e reprodução cultural, social e política, além de constituir um espaço de


resistência no contexto dos conflitos socioambientais (MOREIRA, 2017, p. 27­29).
Os povos e comunidades tradicionais e indígenas que vivem na floresta e utilizam de
seus recursos contribuem para o conceito de território, que é um “espaço de vida, natureza,
cultura, construção social e política e, também, espaço de resistência no contexto dos conflitos
socioambientais” (MOREIRA, 2017, p. 29). Além disso, o “território usado é o chão mais a
identidade. A identidade é o fundamento do trabalho; o lugar da resistência, das trocas
materiais e espirituais e do exercício da vida” (SANTOS, M., 2019, p. 14).
Explicita­se, assim, a existência de relações entre as questões ambientais e direitos
humanos, em uma “compreensão do conceito de natureza como resultado de uma construção
social na qual as ações que envolvem seres humanos e natureza são relações entre espécies
viventes” (MOREIRA, 2017, p. 27­29).
Nesse aspecto, o Primeiro Relatório Global Environmental Rule of Law da ONU
aponta as relações entre grilagem de terras (land grabbing) e violação de direitos indígenas
(KUMAR et al., 2019, p. 167).
O mencionado Relatório constatou que empresas e Estados obtiveram direitos sobre
grandes extensões de terras tradicionais e as converteram para agronegócio, mineração ou
operações madeireiras em grande escala, havendo diversos casos na Corte Interamericana de
Direitos Humanos em que Estados foram condenados por deslocamentos forçados de povos
indígenas (KUMAR et al., 2019, p. 167).
Os conflitos socioambientais na Amazônia são mormente pela posse da terra, que
aumentam progressivamente nesta que é a última fronteira econômica, dispondo de imensa
reserva florestal, recursos minerais e terras agriculturáveis. Essa terra é pertencente a dois
proprietários, o Estado de Amazonas e a União, que estão dispostos a ceder o mais rápido
possível os seus bens a particulares. Esse cenário é propício para grileiros e latifundiários,
estourando conflitos em grande parte dos municípios (CARVALHO, 2010, p. 47).
Na contramão do desenvolvimento dominante, são provocados danos por
“mercantilização e consumo dos recursos ambientais, base do conflito com o agro e
hidronegócio, degradação dos bosques ribeirinhos e dos manguezais são evidenciados no
mapa como indutores de injustiças ambientais, riscos à saúde coletiva e insegurança
alimentar” (LEROY; MEIRELLES, 2013, p. 117).
71

O cenário do incremento do desmatamento em áreas indígenas é ainda mais


acentuado daquele observado na Amazônia Legal como um todo (ver Figura 12), havendo
uma perda florestal ainda superior a 2008, em comparação a 201923:

Figura 12: Taxas de incremento anual de desmatamento em terras indígenas – PRODES


(período 2008­2020)
Incrementos de desmatamento - Amazônia Legal - Áreas Indígenas
600
Taxa anual não
consolidada
500

400
Áreas Km²

300

200

100

0
2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020

Fonte: INPE­ TERRABRASILIS (INPE, 2020d). Gráfico elaborado pelo autor

Esses dados demonstram que os povos indígenas se encontram em situação de


extrema vulnerabilidade, sendo seus territórios tradicionais, comparativamente, mais expostos
à ação do dano ambiental em relação às outras áreas.
O Primeiro Relatório Global Environmental Rule of Law da ONU coloca o Brasil
como o país onde mais foram assassinados defensores da natureza no mundo entre 2000 e
2015, com 527 mortes. Em seguida vem Honduras, com 129 assassinatos, Filipinas com 115,
Colômbia com 103, Peru com 73 e México com 47 (KUMAR et al., 2019, p. 174).
Em relatório publicado em 2017, a ONG britânica Global Witness aponta o Brasil
como o país, dentre os estudados, que mais vitimou defensores da terra e do meio ambiente no

23
As estimativas do sistema PRODES são realizadas de junho a junho de cada ano (Ano PRODES), o que
significa que os dados de 2020 não são consolidados de todo o período, devendo ser bastante superiores à tabela
em junho de 2021.
72

ano de 201724, incluindo os povos tradicionais da floresta. Foram 57 defensores mortos (o


pior ano já registrado em qualquer país), sendo o agronegócio o setor mais associado a
assassinatos. O relatório afirma que está em curso um corte orçamentário nas principais
agências governamentais para proteção de direitos humanos e meio ambiente, como do
INCRA e da FUNAI, conduzindo a uma maior vulnerabilidade de defensores. Além disso, há
um lobby do agronegócio que se opõe à demarcação de terras, os ruralistas, mediante
sabotagem da FUNAI e do INCRA (GLOBAL WITNESS, 2017).
O Relatório da ONU ressalta a importância dos referidos defensores ambientais 25 na
proteção de direitos ambientais substantivos, da terra, da água e da subsistência, bem como do
desenvolvimento sustentável (KUMAR et al., 2019, p. 170­180). Em razão desse ativismo,
ambiental e social, os defensores do meio ambiente estão sujeitos a ameaças e violência física,
como intimidação, assédio e assassinatos, que têm aumentado. De outro turno, o Relatório
reconhece que, não obstante os defensores não serem protegidos pelos Estados em todo o
mundo, com frequência os mesmos são criminalizados, mediante leis antiprotesto e
antiterrorismo (KUMAR et al., 2019, p. 170­180). Na América Latina, dentre os defensores
estão os povos indígenas, minorias étnicas e raciais e mulheres, cuja vulnerabilidade também
é explicada pela impunidade dos assassinatos (KUMAR et al., 2019, p. 170­173). Nesse
sentido, o Relatório denuncia que tanto Estados foram responsáveis pela estigmatização,
críticas, criminalização, ameaças e assassinatos de defensores da natureza, quanto indústrias
de mineração e extrativismo, agronegócio, represas hidrelétricas e direitos de água e
exploração madeireira (KUMAR et al., 2019, p. 172). Ao mesmo tempo, o documento
descreve os vínculos dos referidos protetores com a defesa de direitos relacionados ao meio
ambiente sob leis nacionais e tratados internacionais, havendo dados que relacionam o

24
“Um defensor da terra ou do meio ambiente é alguém que realiza ações pacíficas, voluntária ou
profissionalmente, para proteger os direitos ambientais ou fundiários. São muitas vezes pessoas comuns e que
talvez não se definam “defensoras”. Alguns são líderes indígenas ou camponeses que vivem em montanhas
afastadas ou florestas isoladas, protegendo suas terras ancestrais e meios de subsistência tradicionais de
empreendimentos de mineração, agronegócios em grande escala, barragens e hotéis de luxo. Outros são guardas
florestais, combatendo a caça ilegal e a extração ilegal de madeira. Eles também podem ser advogados,
jornalistas ou funcionários de ONGs trabalhando para expor abusos ambientais e apropriação de terras
(GLOBAL WITNESS, 2017, p. 12).
25
A ONU descreve os defensores ambientais como indivíduos e grupos que, em sua vida pessoal ou capacidade
profissional e de forma pacífica, esforçam­se para proteger e promover os direitos humanos relativos ao meio
ambiente, incluindo água, ar, terra, flora e fauna. Podem ser ativistas comunitários, donas de casa, guardas
florestais, servidores públicos, profissionais que trabalham em empresas para fazer cumprir as normas
ambientais e outros. O defensor do meio ambiente típico trabalha no contexto da exploração de recursos naturais
em grande escala, que ocorre dentro ou perto de comunidades locais e indígenas em áreas remotas (KUMAR et
al, 2019, p. 171).
73

atendimento às reivindicações dos povos indígenas a seus territórios ancestrais e a melhora do


manejo florestal, reduzindo­se o desmatamento (KUMAR et al., 2019, p. 173).
A Comissão Pastoral da Terra do Maranhão vem denunciando que a expansão das
fronteiras do capital no campo maranhense, mediante o agronegócio, causa impacto negativo
no modo de vida das comunidades tradicionais e povos indígenas em seus territórios de vida.
Os apontados agressores são agentes estatais e privados, como fazendeiros, servidores do
poder judiciário, madeireiros e produtores de soja (CPT, 2017, p. 59­61).
Dentre os resultados dessa expansão do capital estão “disputas territoriais, tensões,
conflitos e violência no campo com ameaças de morte, ataques brutais e assassinatos de
indígenas, quilombolas defensores de seus territórios e guardiães da natureza”, que se
realizam mediante a “legalização de grilagem” de terras, como a partir da Lei Estadual n.
2.979, de 17 de julho de 1969 (MARANHÃO, 1969), conhecida como “Lei de Terras
Sarney”, que viabilizou a grilagem no Estado e a intensificação de conflitos entre grileiros e
os denominados posseiros (CPT, 2017, p. 59­61).
Assim, é necessário refletir sobre a posição dúbia do Estado, ora implementador de
políticas que criam e acirram conflitos socioambientais, principalmente porque organiza um
modelo de desenvolvimento que alça empresas transnacionais como um dos principais atores
sociais e produtores da crise ambiental; ora o Estado se enfraquece e continua a receber uma
cota maior da responsabilidade para o tratamento dos problemas ambientais, colocando­se
como mediador dos conflitos e ao lado das populações atingidas (MOREIRA, 2017, p. 22­23).
A brutalidade do conflito na Amazônia, cujo “chão é tingido pelo sangue de
indígenas e de outros povos da floresta” (BRUM, 2019, p. 105), é ainda maior se comparada
aos números dos assassinatos. Os grileiros aprenderam com a execução de Dorothy Stang 26,
que ganhou atenção mundial, e passaram a ter cuidado para dificultar a relação dos
assassinatos com os crimes de conflito com a terra. A disseminação do medo, ou seja, a
eliminação da capacidade de resistir, tem sido a tática que os grileiros têm adotado (BRUM,
2019, p. 105­107).

26
Dorothy Stang foi uma missionária de origem estadunidense que atuava na região amazônica desde a década
de 1970, passando a manter intensos diálogos com lideranças camponesas, políticas e religiosas, buscando
soluções para os conflitos relacionados à posse e à exploração da terra. Sua atuação a favor dos interesses de
agricultores emigrados da região Nordeste sempre desagradou madeireiros e fazendeiros do município de
Anapu/PA, onde a missionária estabeleceu escolas e liderou pequenos produtores rurais (EBC, 2015).
74

Esses são alguns dados selecionados em relação à violência rural praticados por
grileiros e latifundiários:

Tabela 1: Violência contra a ocupação e a posse – Estados da Amazônia Legal


Tentativas Casas Bens
Famílias Famílias Ameaçadas Roças Pistola­
Ocorrências Famílias Área ou ameaça destruí Destruí Invasão
Expulsas despejadas de despejo destruídas gem
de expulsão das dos
AC 88 6809 1198216 160 1531 3260 7 10 186 948 1002
AM 52 11376 12867467 900 2343 525 201 47 1 307 8252
AP 43 1668 818418 49 198 165 41 80 80 896
PA 150 30043 13625373 104 333 4569 1104 25 282 303 1222 5922
RO 82 7042 28793446 864 2761 227 9 1 563 322 1488
RR 28 12530 12181739 5 97 300 8 5 125 120 7858
TO 45 2578 1409729 80 185 499 101 115 94 106 40 98
Fonte: BRUM, E. (2019, p. 115).

No que concerne à extração de madeira, as operações de extração ilegal também


envolvem, em alguns casos, assassinatos, violência e ameaças contra povos indígenas que
vivem da floresta (NELLEMANN, 2012, p. 7/8).

2.2.2 O avanço da fronteira contra as unidades de conservação

Não obstante a importância das áreas indígenas para proteção da biodiversidade


amazônica, decorrentes da resistência ativa e múltipla dos povos indígenas às invasões de
suas fronteiras para manutenção de seus territórios (LITTLE, 2003), é sobretudo a partir das
unidades de conservação que essa proteção é articulada. Nesse sentido, as áreas protegidas na
Amazônia se enquadram nas categorias de terras tradicionalmente ocupadas pelos povos
indígenas, nos termos do art. 231 da Constituição da República, e unidades de conservação
nas categorias proteção integral e uso sustentável, nos termos da Lei do SNUC (BRASIL,
2000a).
As unidades de conservação representam 18% do território brasileiro,
correspondendo a 152,4 milhões de hectares, das quais 73% estão localizadas no bioma
Amazônia, ou seja, 111 milhões de hectares, divididos nos grupos de proteção integral (37%)
e uso sustentável (63%) (ARAÚJO; BARRETO, 2015).
As unidades de conservação são uma conquista democrática que traz ao menos três
aspectos positivos: (i) fortalecem as comunidades de povos originários, contribuindo na
reparação da violência que foram vítimas; (ii) contribuem com a condição do país como
75

detentor da maior biodiversidade do planeta, podendo ser remunerado em consequência de


políticas globais, como o Fundo Amazônia27; e (iii) oferecem potencialidades de geração de
renda para manutenção de pessoas que deles dependem e para inovação tecnológica
(ABRAMOVAY, 2019, p. 54). Sobre o terceiro aspecto, as unidades de conservação não
podem ser vistas como espaços intocáveis a qualquer atividade econômica, porque, ao
contrário, uma das “condições da preservação de suas funções ecossistêmicas está no fato de
elas abrigarem populações tradicionais, ou seja, povos indígenas e comunidades ribeirinhas e
extrativistas cujas culturas materiais compatibilizam o uso da floresta e sua preservação
(ABRAMOVAY, 2019, p. 59). Esse ponto é indispensável para repensar a relação do ser
humano com a natureza amazônica, que se vinculam pelo trabalho produtivo, mas desde que
envolvam atividades sustentáveis.
A revolução técnico­científica confere (ou deveria conferir) novo valor à diversidade
de espécies amazônicas, as quais, embora descobertas pelos índios e pelas populações
tradicionais da floresta com finalidade de subsistência ou fins místicos, ganham importância
mercantil e industrial (BECKER, 2015b, p. 38­42). A diversidade biológica da Amazônia é
alçada como uma das mais ricas do mundo, capaz de, inclusive, gerar riqueza e inclusão
social sem destruir a natureza. No entanto, são três as barreiras que dificultam o
desenvolvimento sustentável desse patrimônio natural: (i) ausência de reconhecimento
científico­tecnológico necessário; (ii) iniciativa política da União e da região para
implementá­lo; (iii) carência de empreendedores nacionais e regionais interessados e capazes
de utilizá­lo em um novo patamar de tecnologia (BECKER, 2015b, p. 38­42).
As reservas extrativistas e reservas de desenvolvimento sustentável, ambas
categorias de unidades de conservação de uso sustentável 28, são importantes inovações na
Amazônia e podem ser uma estratégia ecossocial. Desta feita, o uso sustentável da
biodiversidade pode envolver meios ou modos de vida sustentáveis, que incorporem a coleta,
o beneficiamento e a comercialização de produtos da biodiversidade, gerando­se bem estar e
renda, tanto monetária como não monetária, como segurança alimentar (SAWYER, 2011, p.
370/371).

27
“O Fundo Amazônia tem por finalidade captar doações para investimentos não reembolsáveis em ações de
prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento, e de promoção da conservação e do uso sustentável da
Amazônia Legal. Também apoia o desenvolvimento de sistemas de monitoramento e controle do desmatamento
no restante do Brasil e em outros países tropicais”. Disponível em: http://www.fundoamazonia.gov.br/pt/home/
28
Ver: Lei n. 9.985, de 18 de julho de 2000 (BRASIL, 2000a), que institui o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação da Natureza e dá outras providências.
76

A criação de unidades de conservação com pouca ou nenhuma presença humana


pode implicar custos altos, além de penalizar aqueles que as conservam (SAWYER, 2011, p.
370/371). Assim, a estratégia de conservação da biodiversidade deve priorizar parcerias com
populações tradicionais e indígenas:

Há que se lembrar que os biomas ricos em biodiversidade também abrigam


variedade de comunidades indígenas, quilombolas, agroextrativistas e camponesas.
Essas comunidades têm conservado grandes áreas naturais por sucessivas gerações.
Seu impacto ambiental existe, mas é reduzido. Uma vez que lhes é vital manter a
floresta ou o cerrado em pé, para continuar como fonte de seu sustento, essas
populações podem atuar como vigilantes e guardiões. Suas paisagens complexas e
multifuncionais, ainda que parcialmente antropizadas, boas ainda que imperfeitas,
mantêm importantes funções ecológicas de biodiversidade, estoques de carbono e
ciclos hidrológicos, ao contrário das pastagens e monoculturas implantadas pelo
avanço desenfreado da fronteira agrícola. Assim, a agricultura familiar camponesa e
o agroextrativismo podem ser importantes aliados da conservação da natureza toda
com escala de paisagem, em milhões de quilômetros quadrados. O agronegócio pode
ser contido nas áreas já desmatadas, com maior produtividade e sustentabilidade
(menor erosão, poluição e emissão) (SAWYER, 2011, p. 371/372).

A região amazônica tem observado o surgimento, nas últimas décadas, “de múltiplas
formas associativas agrupadas por diferentes critérios ou segundo uma combinação entre eles,
tais como: raízes locais profundas; fatores político­organizativos; autodefinições coletivas;
consciência ambiental; e elementos distintivos de identidade coletiva”, tais como as
associações das quebradeiras de coco de babaçu, de quilombolas, indígenas, ribeirinhos e
pescadores, por exemplo, que correspondem a certas territorialidades onde se reproduzem
física e socialmente (ALMEIDA, 2004). Isso importa na incorporação de fatores étnicos e
culturais nos instrumentos (políticas ambientais e agrárias) na definição das modalidades das
unidades de conservação, sob pena de “incorrer no equívoco de reduzir a questão ambiental a
uma ação sem sujeito” (ALMEIDA, 2004).
Há de se buscar e de desafiar­se para um desenvolvimento sustentável amazônico,
substituindo­se o predominante modelo predatório de crescimento, que vem exigindo a
expansão contínua da fronteira agrícola com base na eliminação da floresta, para efetivamente
“melhorar a vida e ampliar as oportunidades para que as populações tradicionais possam
manter sua cultura e gerar renda por meio das atividades compatíveis com a preservação do
ambiente” (ABRAMOVAY, 2019, p. 64/65). Isso quer dizer que evitar a destruição das
unidades de conservação também é preservar a biodiversidade na Amazônia, mantendo­se a
floresta em pé na “luta contra as mudanças climáticas e para o desenvolvimento sustentável” e
reconhecendo “o papel estratégico das populações tradicionais e de suas atividades na
77

ocupação destas áreas”, por exercerem não apenas atividades econômicas e ecossistêmicas,
mas também por reproduzirem a riqueza cultural (ABRAMOVAY, 2019, p. 95/96).
A perda florestal nas unidades de conservação na Amazônia Legal, assim como foi
observado nas áreas indígenas, ultrapassa em muito o marco de 2008, demonstrando o vigor
que o incremento do desmatamento vem ganhando nos últimos anos 29.

Figura 13: Taxas de incremento anual de desmatamento em unidades de conservação –


PRODES (período 2008­2020)

Incremento de desmatamento - Amazônia Legal - Unidades de


Conservação
1200

1000

800
Áreas Km²

600
Taxa anual não
consolidada
400

200

0
2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020

Fonte: INPE – TERRABRASILIS (INPE, 2020e). Gráfico elaborado pelo autor

É importante notar, a partir dos dados apresentados, que os povos e comunidades


tradicionais se encontram gravemente ameaçados pelo aumento da degradação de seus
territórios, dos quais dependem. Seja por terem os seus modos de vida atacados – cuja
Amazônia em pé, com seus processos ecológicos íntegros são condições necessárias para

29
As estimativas do sistema PRODES são realizadas de junho a junho de cada ano (Ano PRODES), o que
significa que os dados de 2020 não são consolidados de todo o período, devendo ser bastante superiores à tabela
em junho de 2021.
78

continuarem existindo –, seja por serem atacados mediante violência direta, trata­se em
grande medida do mesmo fenômeno: o avanço da fronteira agrícola.
A fronteira se expande sobre áreas indígenas, unidades de conservação e terras
devolutas (todas de titularidade da União), porque há mecanismos que legitimam a
permanência de invasores.

2.2.3 Considerações quanto às vítimas “invisíveis” dos danos sociais

Os territórios indígenas e as unidades de conservação são áreas visadas pelo


agronegócio para expansão da produção extrativista, cujo desmatamento é mais acentuado se
comparado à Amazônia Legal como um todo. A vitimização dos povos indígenas e dos povos
tradicionais no Arco do Desmatamento da Amazônia não pode ser compreendida sem a
concepção de “território” – local onde se reproduzem econômica, social e culturalmente –,
que é desassociado do aspecto meramente fundiário do agronegócio. Importa ressaltar, de
outro turno, que é possível ponderar um aproveitamento racional dos recursos naturais
amazônicos, ao passo que os mesmos também sejam preservados.
Esses territórios também são locais de resistência e de vitimização, à vista dos
preocupantes dados sobre violência rural empreendidos por latifundiários e grileiros.

2.3 A bancada ruralista: os representantes das corporações e do latifúndio contra a


estabilidade climática e o meio ambiente

Neste item, faz­se a análise da composição, do perfil dos parlamentares, dos


discursos e da atuação da bancada ruralista no Congresso Nacional, que aparece na
intersecção entre o agronegócio e o Estado como um fator marcante na consecução de danos
na Amazônia.
O propósito, além disto, é apurar a interação entre o agronegócio e o Estado no
âmbito do Congresso Nacional no que diz respeito às tentativas de desregulamentação e
flexibilização de normas protetivas ao meio ambiente.

2.3.1 Conceitos e influências da bancada ruralista no Congresso Nacional


79

A bancada ruralista é constituída por um grupo de parlamentares ligados à


agropecuária, mobilizados “na busca de uma legislação que assegur[e], principalmente, os
direitos de propriedade” (FPA). O referido agrupamento surgiu informalmente na constituinte
de 1987 e, em 1994 foi oficialmente fundada, com ata subscrita por deputados e senadores,
sob a denominação de Frente Parlamentar da Agricultura, posteriormente renomeada, em
2008, Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) 30.
A FPA declara serem seus objetivos: (i) acompanhar a política oficial de
desenvolvimento da agropecuária nacional, manifestando­se quanto aos aspectos mais
importantes de sua aplicabilidade; (ii) promover debates, simpósios, seminários e outros
eventos pertinentes ao exame da política de desenvolvimento da agropecuária, divulgando
seus resultados; (iii) promover o intercâmbio com instituições semelhantes e parlamentos de
outros países, visando o aperfeiçoamento recíproco das respectivas políticas agropecuárias;
(iv) procurar, de modo contínuo, o aperfeiçoamento da legislação referente à agropecuária
nacional, influindo no processo legislativo a partir das comissões temáticas nas duas casas do
Congresso Nacional; (v) conhecer e auxiliar na divulgação de novos métodos e processos que
fomentem a agropecuária; (vi) apoiar as instituições interessadas no desenvolvimento da
agropecuária, junto a todos os Poderes, inclusive em questões orçamentárias nos casos das
entidades públicas; (vii) organizar a Agenda Legislativa da Agropecuária Brasileira; (viii)
manter canal de informações atualizadas com as entidades da cadeia produtiva do
agronegócio e os parlamentares sobre o andamento dos temas de interesse, discutidos nas
Comissões e nos Plenários do Congresso Nacional; (ix) consolidar o posicionamento da
cadeia produtiva do agronegócio quanto aos assuntos em tramitação no Congresso Nacional
(FPAa, 2020).
Muito embora tenha sido mais recentemente registrada na Câmara dos Deputados, ao
menos desde a década de 1980 há uma atuação orgânica de parlamentares em torno dos
interesses do agronegócio:

30
A Câmara dos Deputados regulamentou definitivamente a Frente Parlamentar da Agricultura mediante o Ato
de Mesa n. 69, de 10 de novembro de 2005, que “cria o registro de Frentes Parlamentares na Câmara dos
Deputados”, as bancadas temáticas. Sob as regras da Câmara dos Deputados, permitem­se entidades de cunho
associativo e integradas de forma suprapartidária, com o objetivo de promover o aprimoramento de determinado
setor da sociedade. Dentre elas, há as bancadas ou Frentes Feminina, Evangélica, Empresarial, Sindical,
Ruralista, da Saúde, da Educação e da Comunicação (sendo as duas primeiras informais) (SIMIONATTO;
COSTA, 2012).
80

A Bancada Ruralista é um dos grupos mais antigos e organizados do Congresso


Nacional, e vem alcançando grande sucesso em sua atuação em prol dos interesses
do agronegócio. Seu surgimento é fruto do debate travado nos anos de 1980 pelo
patronato rural brasileiro, em uma ofensiva ao velho e atrasado mundo agrário. A
modernização agrícola, com a instituição de novos padrões de produção no campo e
a introdução de avanços tecnológicos, em decorrência do casamento entre a
agricultura e a indústria, foi a base sobre a qual se edificou este pensamento
(SIMIONATTO et al., 2012).

Mais especificamente, os ruralistas (ou FPA, ou bancada ruralista) são uma


coalização de latifundiários, produtores de soja e outros atores da economia com um enorme
interesse em que projetos de “desenvolvimento” e de infraestrutura entrem na Amazônia, que
são estimulados por esses atores políticos, e com um poder em crescimento (FEARNSIDE,
2017). É possível também verificar certa variedade na identificação da profissão, sendo que
“representação nunca é exclusiva, mas partilhada. Geralmente, os deputados têm pelo menos
duas profissões. Por exemplo: empresário e agropecuarista; médico e agropecuarista;
agropecuarista e advogado; agropecuarista e comerciante, etc.” (VIGNA, 2001, p. 17).
Em cruzamento de registros de propriedade declarados no INCRA pelos próprios
parlamentares da bancada ruralista relativos ao ano de 2003, verificou­se que 42,38% dos seus
membros são titulares de grandes propriedades improdutivas, cuja soma corresponde a pouco
mais de 173 mil hectares, logo seguida das grandes propriedades produtivas, com 28,64% das
terras e representando 117.164 hectares. Na categoria de média propriedade rural, as
propriedades improdutivas também são em maior número em relação às produtivas, com áreas
de 12,88% (52 mil hectares) e 9,39% (38 mil hectares), respectivamente (COSTA, 2012, p.
234/235). Em outro levantamento realizado para os cargos de 2011, foram eleitos 211
parlamentares representantes para a bancada, dos quais 77% eram latifundiários, considerados
os imóveis com mais de 1 mil hectares, que somados alcançam 1,35 milhão de hectares,
equivalente a países como Montenegro, Bahamas e Timor Leste (CASTILHO, 2012, p.
27/28).
O crescimento da bancada é visível, sendo atualmente composta por 284
parlamentares (FPAb).
Diante dessa composição e atuação política, a bancada não se submete a regra ou a
fidelidade partidária, senão a seus próprios interesses setoriais, que se articulam em defesa de
interesses localizados, sem possuir compromissos de médio ou longo prazo. Em regra,
continua o autor, a bancada atua como grupo temporário público de interesse particular,
ainda que também possua características lobistas e de grupo de pressão (VIGNA, 2001, p. 13­
15).
81

A força política dos ruralistas reside na sua natureza suprapartidária, que se movem
sem as amarras da fidelidade partidária (BRUNO, 2015), podendo seus membros se unirem a
governistas e a oposicionistas (FLEISCHER, 2006), como por exemplo na aprovação do
Código Florestal (BRASIL, 2012), em que a “fragilidade momentânea do governo revelou um
poder que as bancadas tinham perdido em função das amarras impostas pela fidelidade
partidária” (CORREIO BRASILIENSE, 2011).
O discurso parlamentar centra­se: (i) na instituição de novos códigos de conduta, mas
conservando as posturas oligárquicas e clientelistas do setor; (ii) na renovação das estruturas
de poder dos grandes proprietários e empresários do setor; e (iii) no fortalecimento do direito
de propriedade, ocultando­se a problemática da questão agrária brasileira. Essa bancada se
caracteriza pelo seu poder de articulação, mobilização e construção de alianças com outras
bases/bancadas políticas, valendo­se de negociações, troca de favores e benefícios com outros
parlamentares para o fim que buscam (SIMIONATTO et al., 2012). Nesse sentido, a bancada
ruralista não se restringe à defesa do monopólio fundiário e dos temas relacionados à
agricultura e dos interesses corporativos do setor, uma vez que, desde sua criação, foi
contrária às pautas de ampliação de direitos sociais, melhoria de condições de trabalho e
questões relacionadas a valores (BRUNO, 2015).
A visão de mundo dos ruralistas não se resume à defesa intransigente da propriedade
da terra – perfazendo um emblema da união que supera disputas e neutraliza as diferenças, em
uma escala conservadora que encobre as exigências sociais da terra –, mas igualmente
apresenta marcas ideológicas e políticas profundas, que se ressignificam das tensões e dos
conflitos em torno do território como expressão da vida de um povo e da preservação do meio
ambiente. Não é por outro motivo que os adversários mais frequentes dessa bancada são
povos indígenas e populações tradicionais (BRUNO, 2017, p. 165). Percebe­se que essa visão
de mundo dos integrantes da bancada é marcada pela contradição entre um discurso de
modernização e técnica, em que o agronegócio globalizado competitivo está, ao mesmo
tempo, orientado por padrões de conduta conservadores por buscar se apropriar de territórios
indígenas, destruindo povos e a natureza (BRUNO, p. 2017, 166).
A FPA possui uma instituição que lhe presta suporte técnico e logístico, o Instituto
Pensar Agropecuária (IPA), cujas verbas lhe são direcionadas. Seus recursos são provenientes
de associações e grandes corporações e instituições financeiras: Bayer, Basf, BRF, JBS,
Syngenta, Bunge, Cargill, Banco do Brasil, Santander e Itaú BBA, Sicredi, B3 (antiga
82

Bovespa, bolsa de valores do Brasil) e o banco holandês Rabobank (DE OLHO NOS
RURALISTAS, 2019a), por exemplo, estabelecendo­se uma ligação bastante íntima entre esta
bancada e as grandes corporações e as instituições financeiras.
Conquanto se pudesse observar certa homogeneidade nos discursos, objetivos gerais
e formas de atuação dos parlamentares da bancada ruralista, Pompeia (2021, p. 266/267)
afirma que a representação do agronegócio se constitui, ao menos até o início da década de
2010, em uma série de núcleos políticos desarticulados, não havendo uma orquestração
política. Com efeito, não se identificava uma “unidade razoável de pleitos, narrativas para
defendê­los e estratégias para implementá­los, o que, certamente, implicava a diminuição da
eficácia política” (POMPEIA, 2021, p. 267). Pompeia (2021, p. 270) explica que a guinada na
influência dos ruralistas se dá com a aproximação de dois prestigiados setores durante o
processo eleitoral de 2010: a ABAG (Associação Brasileira do Agronegócio) e a
COSAG/FIESP (Conselho Superior do Agronegócio da Federação das Indústrias do Estado de
São Paulo), quando difundiram a ideia de que o agronegócio deveria ser tratado como
estratégia de Estado:

Com relação aos elementos da política agrícola, demandavam­se mais recursos para
crédito e seguro, aprimoramento de preços e defesa, além de reserva de orçamento
para pesquisa. Em relação a infraestrutura, solicitavam­se avanços em rodovias,
ferrovias, portos, hidrovias e dutovias. Na agenda comercial, requeriam­se novos
acordos bilaterais e entre blocos, além de revisões no Mercosul.

Havia duas ordens de proposições que diziam respeito às relações à agropecuária e


os segmentos “antes da porteira”. Ao mesmo tempo que se sugeria a liberação mais
rápida, pelo governo, de novos insumos agropecuários, bem como a revisão da
rotulagem dos produtos transgênicos, indicava­se, timidamente, incômodo com a
dependência em relação aos oligopólios a montante da agropecuária. Assim,
encorajavam­se ações estatais para o desenvolvimento nacional de cultivos mais
produtivos e resistentes, e para a criação de um programa destinado a aumentar a
produção nacional de fertilizantes e agrotóxicos (POMPEIA, 2021, p. 270).

Nesse mesmo período, a bancada ruralista propõe­se a se renovar, a ampliar­se e a


diversificar­se, quando buscam novos interesses e alianças para obter poder e influência:

A modernização da agricultura e as transformações da sociedade brasileira,


efetivadas nas últimas décadas, demandaram importantes mudanças na organização
e representação de interesses de grandes proprietários de terra, empresários rurais e
agroindustriais e na conformação de uma nova retórica de classe: há uma renovação,
ampliação e diversificação dos espaços de representação patronal rural e
agroindustrial; vemos o aparecimento de novos grupos e personagens políticos e
novos adversários “da classe”; assistimos também à diversificação e redefinição de
novos interesses, alianças e disputas internas pelo poder e pelo controle da
hegemonia. Entretanto as disputas, divergências e contradições nunca se radicalizam
porque eles têm clareza que a união acima das contradições e disputas é condição da
dominação e consequentemente de sua reprodução social e política. Enfim, um
83

patronato rural que desponta renovado e ampliado pelas políticas de incentivos


fiscais do governo militar, e fortalecido pelas políticas públicas dos governos
subsequentes (BRUNO, 2015).

A renovação e a diversificação da representação da bancada ruralista são marcadas,


por exemplo, pela busca de uma narrativa que oculta “as diferenças entre agronegócio e
agricultura familiar, referindo­se em seus pronunciamentos a uma categoria genérica de
‘produtores rurais’ com o claro propósito de apropriar­se de questões que incidiam,
particularmente, sobre as pequenas propriedades”, bem como apropriar­se da boa reputação
que a agricultura familiar desfrutava (MOURA et al, 2020).
Nesse cenário, emergiram (a) discursos contestatórios da demarcação de territórios
indígenas e de reconhecimento de territórios quilombolas, propondo­se a modificação de
marcos legais para se “proteger” o agronegócio da ameaça da desapropriação; e proposições
para (b) alteração de normas ambientais, sendo a mais marcante a mudança do Código
Florestal (BRASIL, 2012), de normas trabalhistas e da legislação agrária (POMPEIA, 2021, p.
272/273).
França et al. (2021) realizou análise empírica dos discursos legislativos da Câmara
dos Deputados na última década sobre as causas das mudanças climáticas, dos danos sociais e
de suas vítimas, sob o marco da Criminologia Verde e da literatura dos crimes dos poderosos.
No estudo, buscou­se compreender a recepção política das descobertas científicas acerca dos
impactos humanos, em especial da indústria agropecuária. O artigo parte do princípio de que a
criminologia crítica, de base marxiana, precisa estar focada não apenas no estudo dos
processos de criminalização, mas principalmente nas discussões sobre dano social e de
imunização de agentes poderosos – Estados, mercados e grandes corporações –, os quais são
responsáveis por condutas mais danosas e que resultam em um maior número de vítimas
(FRANÇA et al., 2021). Os referidos autores aduzem que os discursos políticos
parlamentares, quando mencionam o aquecimento global ou as mudanças climáticas, pouco
ressaltam a importância da atividade agropecuária na sua produção, e muito menos como
prevenir esses danos ou responsabilizar os seus agentes. Não obstante, em um pequeno
número dos discursos que reconhecem as mudanças climáticas, foram registradas
preocupações com as vítimas, maiormente vítimas étnicas (FRANÇA et al., 2021). Apesar de
o negacionismo sobre as mudanças climáticas ser absolutamente minoritário no Congresso
Nacional, mesmo os parlamentares que alertam sobre os riscos das mudanças climáticas “não
84

direcionam o debate acerca de possíveis rompimentos com o modelo de produção econômica


que o retroalimenta, tampouco aprofundam a relação desses impactos com a indústria da
agropecuária”. A partir das manifestações registradas, percebe­se que seus discursos
parlamentares “legitimam a consolidação da indústria agropecuária, a partir de argumentos
que ignoram a relação entre a agropecuária e o aquecimento global; quando reconhecem essas
relações danosas, afirmam ser a indústria fundamental para o desenvolvimento econômico do
país” (FRANÇA et al., 2021).
É esse Congresso Nacional, com a presença marcante dos ruralistas em sua
composição, que é incumbido da: (i) definição dos crimes, atribuindo­lhes o caráter criminal,
e a pena em termos qualitativos e quantitativos; (ii) seleção das pessoas que serão etiquetadas
como criminosos pelos órgãos do sistema de justiça; e (iii) da estigmatização como
criminosos, especialmente na prisão, daqueles que praticarem as condutas descritas como
crimes (ANDRADE, 1999, p. 26).
Diante da análise da composição da Congresso Nacional e do diagnóstico dos
discursos sobre mudanças climáticas e da ligação com o agronegócio, é bastante claro que os
estratos da sociedade que causam danos na Amazônia estão largamente protegidos de
responsabilização, quanto mais penal. Isso é assimilado quando se percebe que, na verdade, o
sistema penal é “constitutivo da própria construção social da criminalidade, que se revela
como uma realidade socialmente construída através do processo de criminalização seletivo
por ele acionado” (ANDRADE, 1999, p. 26).
Para a referida autora, os processos de criminalização e estigmatização estão
integrados em uma mecânica de controle social global, não sendo possível uma análise
individual, atomizada, revelando­se em um contexto de violência estrutural:

[...] os conceitos de sujeito e responsabilidade são conceitos chaves para a


compreensão de como o sistema penal constrói (legal, dogmática e ideologicamente)
o conceito e o universo da criminalidade. Considerando os indivíduos numa visão
atomizada, isto é, como variáveis independentes e não dependentes das situações, e a
responsabilidade penal, por via de consequência, como responsabilidade individual,
baseada no livre­arbítrio, o sistema penal constrói um conceito de criminalidade ou
violência criminal essencialmente vinculado à violência individual (esta concebida
com potencialidade para delinquir).
Desta forma, a violência de grupo e institucional são consideradas apenas em relação
a ações de pessoas individuais e não no contexto do conflito social que elas
expressam. A violência estrutural e, em sua maior parte, a violência internacional é
excluída do horizonte do conceito do crime, ficando assim imunizada a relação entre
a criminalidade e estas formas de violência (ANDRADE, 1999, p. 27).
85

Por não se (pretender) visualizar o cenário de violência estrutural, em resultado, a


intervenção do controle penal se dá nos efeitos e não nas causas da violência criminal, ou seja,
nos comportamentos que provocam os conflitos; essa intervenção incide em pessoas e não em
situações; e sua característica é reativa, e não preventiva (ANDRADE, 1999, p. 27). Por
corolário da seletividade ou da criminalização desigual, “grupos poderosos na sociedade
possuem a capacidade de impor ao sistema uma quase que total impunidade das próprias
condutas criminosas”, em uma lógica que o sistema subestima ou imuniza os danos
produzidos por esses grupos, embora com maior danosidade social (ANDRADE, 1999, p. 28).
Daí que se pode afirmar que a violência cultural aparece no discurso cientifico quando se
justifica a permanência de países como exportadores de matérias­primas, incentivando a
manutenção da violência estrutural que é característica da estrutura fundiária e econômica
para tal (BUDÓ, 2018, p. 350/351).
As ações da bancada ruralista demonstram, diante da análise de seus discursos e de
seus interesses setoriais, que há uma busca pela imunização através da garantia da não
responsabilização de empresários e corporações que lucram com a destruição da floresta
amazônica. À vista disso, é muito clara a influência dos poderosos na definição do que é
considerado crime em meio rural, principalmente às margens da Amazônia. O próximo item
cuidará mais detidamente dessa influência da bancada ruralista.

2.3.2 A bancada ruralista e a legislação sobre meio ambiente, registros públicos e


regularização fundiária: a união entre agronegócio e Estado

São verificados períodos de maior ou menor influência da bancada ruralista no


Congresso Nacional e na elaboração das políticas ambiental e fundiária para a Amazônia.
Forma­se uma coalizão no legislativo, em “uma espécie de acordo prévio, pelo qual
os partidos se dispõem a apoiar os projetos do Executivo, sob determinadas condições, a
serem negociadas no momento da discussão e votação de cada um”, havendo uma
dependência entre o Congresso e o Executivo (ABRANCHES, 2018, p. 77). Cria­se, por
corolário, uma “associação entre a dependência da governança ao apoio parlamentar e a
correlação entre sucesso eleitoral dos parlamentares e acesso a recursos e cargos
governamentais gera[ndo] poderosos incentivos ao toma­lá­dá­cá, ao clientelismo e à
patronagem” (ABRANCHES, 2018, p. 79).
86

A Câmara dos Deputados investigou a ocupação de terras públicas na região


amazônica na Comissão Parlamentar de Inquérito conhecida por CPI da Grilagem, com
relatório emitido em dezembro de 2001. O histórico inicial do relatório é revelador quanto à
abrangência da grilagem:

A grilagem de terras na Amazônia é tão notória quanto antiga. Última fronteira do


país, ainda pouco povoada, a Amazônia oferece espaços, distâncias e dificuldades de
comunicação que incentivara mais ilegalidades fundiárias de todo tipo. A
volubilidade das políticas governamentais para a região também exerceu papel
importante nesse sentido.

No Estado do Amazonas, estima­se que 55 milhões de hectares, de um total de 157


milhões, ou seja, cerca de um terço do território do Estado, está sendo grilado. No
Pará, cerca de 12 milhões de hectares já teriam sido grilados. Em nível nacional, a
grilagem deve ultrapassar, com facilidade, a soma de 100 milhões de hectares
(BRASIL, 2001a, p. 344).

O Relatório da CPI relata que as incongruências históricas do Estado quanto à


apropriação de enormes áreas da Amazônia Legal, pode ser mensurada: (i) pelas autorizações
para alienação de áreas acima do limite constitucional de 3 mil hectares, emitidas pelo Senado
Federal, somadas em 4 milhões de hectares no período de 1971 a 1987; (ii) pelo cancelamento
de imóveis com mais de 10 mil hectares, cujos cadastros eram irregulares com base em
portaria regulamentar do INCRA, com áreas somadas em 40 milhões de hectares; e (iii) pelas
informações do Cadastro da Secretaria da Receita Federal, mantido para fins de cálculo de
imposto imobiliário rural, que registra 130 milhões de hectares (BRASIL, 2001a, p. 345/346).
Diante da intensa atuação da bancada ruralista, dentro e fora do Congresso, o
agronegócio possui garantias de que os danos praticados pelo agronegócio no Arco do
Desmatamento estarão fora alcance do sistema de controle penal. Ao mesmo tempo, negam­se
a responsabilidade e os danos perpetrados pelo Estado na consecução do “desenvolvimento” e
da “integração” da Amazônia ao país, bem como se nega existirem vítimas em razão desses
objetivos.
Dito isso, a participação do Estado brasileiro não foi apenas conivente. A Amazônia
tornou­se um espaço para ampliação do agronegócio em solo brasileiro em razão de projetos
expansivos do capitalismo dependente e exportador brasileiro, organizado e financiado pelo
Estado brasileiro. Se o aspecto geopolítico dessa ocupação já foi abordado, a “legalização” da
grilagem foi muito presente.
Com efeito, foram utilizados no Arco do Desmatamento, nos últimos 50 anos, uma
série de instrumentos jurídicos para viabilizar que proprietários rurais e empresários do
87

agronegócio continuassem praticando suas atividades na Amazônia, independentemente da


integridade da floresta, da importância de sua biodiversidade e da necessidade de conservação
para fins imateriais. Para tanto, empregam­se institutos do direito civil, como o da posse, ou
expedientes diversos nos registros públicos. Ariovaldo Umbelino de Oliveira (1995, p. 83/84)
afirma que a grilagem “legalizada” foi um expediente comumente utilizado por corporações
no período mais violento do governo empresarial­militar, com o objetivo de implantar a
pecuária. Esse expediente consistia na obtenção de procurações passadas por pessoas que, às
vezes, não tinham conhecimento do que assinavam, mas que eram empregadas em
procedimentos de obtenção de terras devolutas em órgãos governamentais.
A grilagem ocorre normalmente com a participação de ofícios de registro
imobiliários, que registram áreas sobrepostas umas às outras, ou seja, fictícias, e normalmente
inscritas em nome de laranjas ou “fantasmas”. A esse respeito, as fraudes podem ocorrer nos
títulos, nos processos, na demarcação, na localização e no registro da seguinte forma:
(i) Fraudes nos títulos: “assinaturas, nomes, dizeres, datas e números falsificados;
referência a livros de cadastro inexistentes, canhotos rasurados e descoincidentes”
(MENDONÇA, 1980).
(ii) Fraudes nos processos:

Como os títulos são apenas a derradeira etapa de um processo aquisitivo, é óbvio


que não podem ser válidos se inválidas as etapas essenciais anteriores. Aparecem,
entretanto, títulos sem processo, ou processos sem formalidades insupríveis, como a
identificação do comprador, o pagamento do preço, os editais regularmente
publicados, as decisões concessivas (MENDONÇA, 1980).

(iii) Fraudes na demarcação:

[...] A conseqüência é que muita demarcação se fez na prancheta, sem qualquer


amarração no terreno, indicando linhas e azimutes imaginários que não
correspondem a marcos nem a picadas de espécie alguma [...]. Inexistem cadernetas
de campo e as plantas, memoriais descritivos e resumos para os títulos foram
mimeografados ou fotocopiados, preenchendo­se somente os claros para adaptá­los
a cada processo. E, além dessas fraudes de gabinete, também as houve no campo,
multiplicando­se léguas, alterando­se denominações de limites naturais, invadindo­
se terras devolutas ou propriedades de confiantes, esticando ou encolhendo linhas ao
livre arbítrio dos interessados (MENDONÇA, 1980).

(iv) Fraudes na localização:


88

[...] muitas terras se venderam que ninguém sabe onde ficam e muitas outras que
ficaram por cima de lotes anteriormente já vendidos. São os famosos 'títulos pluma'
ou 'pena', que estão à procura de um lugar onde cair. Se embaixo não há ninguém,
ali 'repousam' até aparecer o dono; e se este não aparece consolidam o domínio e a
posse, embora sem correspondência alguma com a descrição de seus documentos
(MENDONÇA, 1980).

(v) Fraudes no registro:

[...] O Decreto n. 4.857/39, que disciplinava os registros públicos até 76, quando
entrou em vigor a Lei n. 6.015/73, prescrevia que no livro 3 apenas seriam inscritos
os atos transmissivos da propriedade, enumerando a natureza e o objeto desses atos
(arts. 237 e 238). Nesse aspecto, a legislação atual nada inovou, salvo transferir o
registro das transmissões para o livro 2 e criar para cada imóvel uma folha própria,
com a matrícula inicial e as averbações posteriores (arts. 173 e segs). É certo que
tanto a lei antiga como a nova aceitam como documentos registráveis as ‘certidões
extraídas de processos’ (art. 237, d, do Decreto nº 4.857 e 222, da Lei nº 6.015). Tal
expressão não parece, contudo, abranger as certidões administrativas que, fornecidas
criminosamente, tantas vezes ensejaram transcrições fraudulentas. Porém, existem
no Código Civil dois dispositivos que, combinados àqueles, não raro legitimaram, na
aparência, a falsidade do registro. Trata­se dos arts. 137 e 138. O primeiro equipara
as certidões judiciais aos documentos em original. O segundo confere força idêntica
às certidões extraídas por oficial público de instrumentos lançados em suas notas.
Explica­se, então, o jogo que permitiu tantos registros sem título hábil. Bastava que
se obtivesse certidão administrativa de uma compra inexistente, majorada ou
deslocada, registrando­a previamente no Cartório de Títulos e Documentos, para
levar, em seguida a certidão deste registro a um serventuário do interior, desonesto
ou ignorante, e dele conseguir a transcrição no livro 3. Independente dessa manobra,
e sem qualquer astúcia, também se registraram no livro 3 talões de impostos, títulos
de posses não legitimadas, recibos de benfeitorias, documentos de pessoas falecidas
sem forma de testamento nem de inventário, licenças estaduais ou municipais de
exploração pecuária e transitória (MENDONÇA, 1980).

Além disso, a falta de um cadastro único, já que, ao contrário, há cadastros diversos


nos três entes da federação e desarticulados entre si, bem como a falta de correição nos ofícios
imobiliários são apontados como oportunidades para a fraude (BRASIL, 2001a, p. 349).
O relatório da CPI da Grilagem igualmente alça ações de usucapião 31 e de retificação
de imóveis como formas para consolidar “grilagens”. No ano de 2001, por exemplo, foram
cancelados 37 milhões de hectares de registros irregulares, dos quais 24 milhões de hectares
se originaram de sentenças judiciais.
Essa responsabilidade também deve se atribuir às correições cartoriais, em que a
“deficiência do processo de fiscalização dos cartórios na Amazônia é gritante. Há cartórios
envolvidos com grilagem que nunca passaram por correição” (BRASIL, 2001a, p. 364­370).

31
Asselin (1982, p. 21) relata que, em meados dos anos de 1960, no Maranhão, a grilagem se viabilizou pela
“indústria da usucapião”, por meio da atuação em diversas comarcas do juiz de direito José de Ribamar Fiquene,
a partir de escrituras falsas provenientes de um único cartório.
89

Se o ato de grilar terras já se constituiu de falsificações documentais rudimentares,


que utilizavam do próprio animal que origina o verbo da prática criminosa, dando um aspecto
envelhecido ao documento para posteriormente ser apresentado ao cartório (TORRES, 2018),
atualmente são utilizadas técnicas bastante sofisticadas para comprovar ilegalmente a posse
(BRASIL, 2001a, p. 348). As terras são ilegalmente transferidas do domínio público para o
domínio privado, como se sempre estivessem nesta órbita, por intermédio de inúmeros
métodos e procedimentos. Desde a abertura da frente amazônica, podem ser verificadas
múltiplas formas de grilagem. Mais recentemente, regularização fundiária é a nomenclatura
frequentemente utilizada para “legalizar” a grilagem pelos representantes do agronegócio no
Congresso Nacional, consolidando os danos ambientais e imunizando os seus perpetradores,
para que não sejam responsabilizados. Nas últimas décadas, a grilagem que mais se faz
sentida é a grilagem “legalizada”, que continua sendo um dos principais artifícios para
garantir a impunidade dos criminosos ambientais.
Como explicitado, a bancada ruralista imuniza a si e às corporações que executam
atividades no Arco do Desmatamento, seja invisibilizando os seus danos e as suas vítimas,
mediante discursos e projetos de lei, seja promovendo propostas e articulações que propõem
legalizar as terras que foram invadidas por grileiros.
Diante do forte vínculo entre a pistolagem (muitas vezes praticada por agentes do
Estado), o agronegócio e o Estado, que legaliza os crimes – haja vista as inúmeras leis que
tornam terras griladas em propriedades –, faz­se um paralelo com as milícias cariocas, para
transformar o conceito da grilagem:

Com a legalização do crime a legalização e a premiação dos criminosos, o grileiro


em breve já não precisará cooptar nenhum funcionário público. O crime vai se
convertendo em lei. Em muitos casos, também há fortes indícios de que as polícias
já cumprem o papel que tradicionalmente pertencia aos pistoleiros. Seguindo o
caminho das milícias cariocas, a grilagem na Amazônia vai deixando de ser um
poder paralelo com ramificações no Estado para se tornar o próprio Estado (BRUM,
2019, p. 133).

A prática pode ser resumida como: “você rouba do patrimônio público, destrói a
floresta amazônica e, um ano depois, vira latifundiário legalizado e vai gozar a vida como
‘cidadão de bem’” (BRUM, 2019, p. 113).
Como os propósitos do Estado e das corporações estão afinados, as externalidades de
caráter socioambiental geradas no Arco do Desmatamento por essas atividades lucrativas não
90

são tipificadas como crimes no Congresso Nacional. Embora essas externalidades


correspondam a danos socioambientais contra uma série de povos da floresta, a trabalhadores,
bem como a animais não humanos e a toda a biodiversidade, há inclusive inquestionável
repercussão no âmbito planetário e intergeracional. Para tal, “os maiores danos causados à
humanidade e ao meio ambiente são provocados pela ação concertada entre Estados e
Mercados, e, notadamente envolverem instituições detentoras dos poderes político e
econômico, permanecem de fora da categoria jurídica de ‘crime’” (BUDÓ, 2018, p. 345).
Em se tratando de uma violência que opera em âmbito estrutural, os danos
socioambientais praticados no Arco do Desmatamento pelo agronegócio possuem
peculiaridades.

2.3.2.1 Governo Lula

O período de 2007 a 2010 do governo Lula marca uma maior pressão e atuação da
bancada ruralista para regularização de áreas públicas na Amazônia Legal. Os ruralistas
possuem uma intensa atuação no Congresso Nacional, seja pressionando o poder executivo,
seja propondo projetos de lei que facilitam a consolidação de terras griladas ou mesmo
impulsionando a ocupação ilícita de novas terras. No passado recente, podem ser listadas
algumas leis (ou instrumento com força de lei, no caso das Medidas Provisórias) que
contribuíram para o aumento dos danos na Amazônia, particularmente no Arco do
Desmatamento. Durante o governo Lula, sob as denominações de regularização fundiária,
alienação de patrimônio e titulação de posseiros, por exemplo, o Estado passou a legitimar a
ocupação de terras griladas, principalmente, neste momento, sob a denominação de
regularização fundiária.
A expressão regularização fundiária se consolida no Estatuto da Cidade (Lei n.
10.257/2001, BRASIL, 2001b) e na Lei do Programa Minha Casa, Minha Vida (Lei n.
11.977/2009, BRASIL, 2009a), com o objetivo de garantia do direito social à moradia e do
pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade e do direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado. Todavia, observa­se uma utilização contínua deste instituto de
interesse coletivo e difuso, desvirtuando­o, principalmente em âmbito rural. Nesse sentido,
durante esse período as Medidas Provisórias n. 422/2008 e n. 458/2009 foram marcantes na
consolidação da grilagem. A Medida Provisória n. 422/2008, convertida na Lei n.
11.763/2008 (BRASIL, 2008), permitiu a regularização fundiária mediante alienação por
91

dispensa de licitação para os imóveis da União situados em zona rural, concedendo­se ao final
do procedimento o título de propriedade ao interessado. Na prática, foi permitida a
“legitimação de áreas com até 1.500 hectares griladas na Amazônia Legal” (OLIVEIRA,
2015).
A votação da MP n. 422/2008 no Congresso Nacional foi cercada de contradições,
pois, apesar da orientação dos partidos, houve dissidências tanto na base do governo Lula, em
que parte votou “não”, bem como da oposição, em razão de um segmento ter se posicionado
favoravelmente (VIGNA, 2000?). Explica­se que um segmento dos parlamentares governistas
alinhados à reforma agrária se posicionou contrariamente à MP, ao passo que uma fração da
oposição a apoiou, justamente aquela pertencente à bancada ruralista. Nesse particular, a
“proposição ao gosto e desejo da bancada ruralista” foi garantida pelos votos da oposição,
sobretudo pelo partido DEM, cujos parlamentares, em sua integralidade, votaram a favor da
Medida Provisória. O sentido dessa movimentação aparentemente contraditória entre os
partidos políticos, finaliza o autor, referindo­se esta “proposição de interesse dos que atuam
junto aos grandes proprietários de terras na Amazônia Legal, seriam eles os que deveriam
fazer maiores esforços para aprovação final da MP” (VIGNA, 2000?).
Como explicado no item anterior, a movimentação suprapartidária dos ruralistas, que
reconhecem a preponderância da atuação na defesa de interesses setoriais, principalmente de
seus próprios interesses privados, é de se compreender a votação de parte da oposição pela
aprovação da Medida Provisória.
Já a Medida Provisória n. 458/2009, convertida na Lei n. 11.952/2009 (BRASIL,
2009b), buscou “aumentar para 2.500 hectares as áreas passíveis de legitimação das terras
públicas griladas na Amazônia Legal o que não foi permitido pelo Congresso Nacional,
permanecendo os 1.500 hectares da Lei 11.763/2008” (OLIVEIRA, 2015). A Lei n.
11.952/2009 tinha o “objetivo de acelerar a regularização de ocupações informais em terras
públicas federais na Amazônia Legal”, para em seguida lançar “o programa Terra Legal para
implementar essa lei e beneficiar até 300 mil posseiros” (BRITO; BARRETO, 2011, p. 15).
Apesar da ambiciosa meta, pouco mais de duas centenas de títulos foram emitidos no primeiro
ano de Programa Terra Legal.

2.3.2.2 Governo Dilma


92

Não há novas aprovações de legislações sobre regularização fundiária em meio rural


durante o governo Dilma. Entretanto, durante o seu governo, houve o início da ascensão do
desmatamento, o que coincide com a promulgação do Novo Código Florestal (BRASIL,
2012), trazendo modificações que foram suficientes para iniciar uma fragilização da
legislação ambiental. Dentre as alterações operadas pelo Código Florestal estão: (i) a
possibilidade de redução da Reserva Legal de 80% para até 50% da área total do imóvel em
face da existência, superior à determinada extensão do Município ou Estado, de unidades de
conservação da natureza de domínio público e de terras indígenas homologadas (art. 12, § 4°);
e (ii) a anistia de desmatamento, nas chamadas situações rurais consolidadas (art. 68). Ambos
os dispositivos legais foram declarados constitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, em
controle concentrado de constitucionalidade (BRASIL, 2018).
De mais a mais, o Código Florestal (BRASIL, 2012) criou de um cadastro eletrônico,
obrigatório para todas as propriedades e posses rurais do país, denominado Cadastro
Ambiental Rural (CAR), integrando informações ambientais. Seu objetivo seria compor uma
base de dados para controlar, monitorar e realizar o planejamento ambiental e econômico e
combater o desmatamento. Moreira (2016) explica que esse instrumento tem origem em
experiências do Pará e do Mato Grosso, que estabeleceu exigências de apresentação
comprobatória de documentação de regularidade e outras condicionantes, para fins de
concessão de financiamentos públicos e privados, à vista de exigências do Banco Central.
Aproveitando­se dessa experiência, o Código Florestal internalizou esse instrumento,
mas, por ser ato meramente declaratório, passaria a dar igual tratamento, segundo Moreira
(2016), a proprietário, a possuidor e a grileiro, servindo mormente a este último:

O CAR jamais fora concebido como mecanismo fundiário, mas sim como
mecanismo de regularização ambiental. Todavia, sempre teve por pressuposto a
existência de uma propriedade ou posse válidas sobre as quais incidiria o cadastro.
Ocorre, porém, que na prática este pressuposto tem sido deixado de lado e com isto
o CAR passa paulatinamente a servir­se de instrumento para grilagem.

Segundo a autora, como o declarante do CAR deve apresentar documentos de posse


ou propriedade, presume­se que aquele que o possui é produtor ou proprietário, baseando­se
em documentos de posse frágeis, em um país que é pródigo em registros de imóveis
fraudulentos (MOREIRA, 2016).

2.3.2.3 Governo Temer


93

Já durante o governo Temer, foi aprovada a Lei n. 13.465/2017 (BRASIL, 2017),


convertida a partir da Medida Provisória n. 759/2016, dispõe sobre a regularização fundiária
rural e urbana, inclusive na Amazônia Legal, e institui mecanismos de alienação de imóveis
da União. Essa Lei voltou a ampliar a legitimação de terras griladas para 2.500 hectares na
Amazônia Legal, não tendo, desta vez, o óbice do Congresso Nacional, trazendo impactos no
esforço para reduzir a perda florestal da Amazônia. Para Brito et al., (2020), o referido
diploma normativo (i) concedeu anistia aos que ilegalmente ocuparam terras públicas rurais
até 2011 quanto ao crime de invasão de terras públicas32; e (ii) permitiu que grileiros
adquiram terras públicas abaixo dos preços de mercado do Estado, concedendo­lhes o título
de domínio da área, mediante a seguinte sequência criminosa: (ii.a) ocupação das terras
públicas e, em alguns casos, expulsão de povos indígenas ou comunidades tradicionais que
ocupam as áreas; (ii.b) desmatamento e plantio de capim para criação de gado, sinalizando o
uso da terra; e (ii.c) solicitação de título de terra como um reconhecimento formal de sua
ocupação.
Quando os grileiros ocupam áreas públicas após o prazo legal para outorga dos
direitos fundiários, eles procuram representantes no Congresso, geralmente da chamada
bancada ruralista, para exigir uma revisão jurídica para prorrogar esses prazos e descontos no
preço da terra (BRITO et al., 2020). Por exemplo, na lei anterior, os proprietários de terras
que ocupavam áreas públicas federais a partir de julho de 2004 poderiam requerer o título de
propriedade do Estado mediante o cumprimento de alguns requisitos, incluindo não possuir
outra propriedade rural. No entanto, o governo estendeu o prazo de 2004 para 2011 através da
Lei n. 13.465/2017 (BRITO et al., 2020). Os autores afirmam que o foco na privatização de
terras pode ter estimulado novas ocupações ilegais de terras, o que está associado ao
desmatamento e a conflitos (BRITO et al., 2020).
Essa política está em desacordo com um cenário que deveria alocar terras públicas no
bioma Amazônia para concessão de direitos fundiários para povos indígenas e comunidades
tradicionais, bem como a criação de unidades de conservação (BRITO et al., 2020). Em razão
de seu teor, o Instituto Socioambiental declarou que a aprovação da MP n. 759/2016 foi “uma
das principais bandeiras da bancada ruralista” (2017).

32
Lei n. 4.947/66 (BRASIL, 1966), fixa Normas de Direito Agrário, dispõe sobre o Sistema de Organização e
Funcionamento do Instituto Brasileiro de Reforma Agrária, e dá outras Providências.
Art. 20 ­ Invadir, com intenção de ocupá­las, terras da União, dos Estados e dos Municípios: Pena: Detenção de
6 meses a 3 anos.
94

Cerca de 80 organizações sociais subscreveram um manifesto contrário à Medida


Provisória n. 759/2016, asseverando, sinteticamente, dentre os argumentos, que ela (i) foi
formulada sem consulta das populações atingidas e de órgãos públicos; (ii) promove a
privatização em massa do patrimônio público em virtude do instrumento da legitimação
fundiária, por ato discricionário do poder executivo; e (iii) concede anistia a desmatadores e
grileiros, inclusive, “amplia prazo para ‘regularizar’ invasões e grilagens inclusive tolerando o
desmatamento como prova de ocupação”, bem como permite “a regularização em favor de
quem já é proprietário de outro imóvel e para ocupantes após 2004, sem cadeia possessória
contínua” (1º DEFENSORIA PÚBLICA ESPECIALIZADA EM ATENDIMENTO
FUNDIÁRIO DO ESTADO DO AMAZONAS et al., 2017).
Posteriormente à sua conversão em lei, o Partido dos Trabalhadores (2017) ajuizou a
Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5787 (pendente de julgamento no Supremo Tribunal
Federal), sustentando, além da inexistência dos requisitos formais de ausência de relevância e
urgência, violações materiais à CR, como nos artigos que tratam da função social da
propriedade urbana e rural, da política agrícola e da reforma agrária; bem como dos artigos
que cuidam da proteção ao meio ambiente e da conservação do patrimônio público. Na forma
como estruturada nessa nova Lei, a regularização fundiária pouco se associa com a promoção
da cidadania em meio rural, quando deveria viabilizar mecanismos de acesso à infraestrutura,
serviços e oportunidades vinculados a um território, para tão somente assegurar a titulação.
Nesse caso, a Lei se sujeita à dinâmica de mercado porque tende a promover concentração
fundiária e ocupação de novas áreas, notadamente pela indústria da grilagem (PT, 2017).
A referida Ação Direta de Inconstitucionalidade está pendente de julgamento no
Supremo Tribunal Federal.

2.3.2.4 Governo Bolsonaro

O governo Bolsonaro, iniciado em janeiro de 2019, é marco de um desmonte jamais


visto de políticas ambientais, retirada de mecanismos de transparência de órgãos públicos e
diminuição de participação da sociedade civil em instâncias.
As pautas da bancada ruralista no início do governo de Jair Bolsonaro eram claras no
sentido de promover o desmonte das políticas públicas de proteção do meio ambiente, que se
materializavam: (i) na retirada da obrigatoriedade de atividades do licenciamento ambiental;
(ii) na instituição do regime autodeclaratório no licenciamento ambiental; (iii) na retirada de
95

consulta prévia a populações atingidas por empreendimentos públicos e privados; (iv) na


transferência a municípios da decisão sobre o grau do rigor da licença ambiental; (v) na
flexibilização na aprovação do registro, fiscalização e controle de agrotóxicos; (vi) revisão às
normas do CONAMA quanto à disciplina das multas, com foco na conversão; (vii) na
“revisão da composição, competências e perfil dos conselheiros do CONAMA”, sem dar
detalhes (DE OLHO NOS RURALISTAS, 2019b).
A partir da ministra da agricultura Tereza Cristina, os ruralistas se instalaram no
governo e a bancada mais poderosa no Congresso estendeu “seus tentáculos ao Poder
Executivo” (DE OLHO NOS RURALISTAS, 2019b). Em um exemplo recente, há notícia de
que o governo fez troca de cargos em Superintendências Regionais do Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) para apoio em eleição da presidência da
Câmara dos Deputados (REVISTA GLOBO RURAL, 2021).
Ademais, a FPA declarou que as pautas da bancada são as mesmas do atual governo
(VALOR ECONÔMICO, 2021), sendo até mesmo responsável pela indicação da Ministra da
Agricultura (METRÓPOLES, 2021).
O Observatório do Clima (2021b), no estudo Passando a Boiada33, ressalta que
desde 2019 foi iniciado um movimento de eliminação de regulamentações, prejudicando a
governança ambiental constituída na Constituição da República, o que foi aprofundado no ano
de 2020. Segundo o estudo, o Governo Federal e diversos Ministérios atuaram para perseguir
servidores e fragilizar as salvaguardas ambientais no país. O estudo problematiza em torno de
quatro principais eixos. No primeiro, aborda a alteração da composição do CONAMA,
passando o Governo e o setor produtivo a deterem a maioria dos votos, em detrimento da
representação da sociedade civil, bem como a revogação de resoluções que diminuem a
proteção de manguezais e restingas, da área de preservação permanente relativa a
reservatórios artificiais e da dispensa de licenciamento para empreendimentos de irrigação.
No segundo, é trabalhada a extinção de órgãos colegiados, à vista de que “cerca de duas

33
Em reunião ministerial do dia 22 de abril de 2019, que foi tornada pública posteriormente por decisão do
Ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, tomou­se conhecimento de declaração do Ministro do
Meio Ambiente, Ricardo Salles, sobre “aproveitar” o período de calamidade pública de pandemia de COVID­19
para diminuir a proteção ambiental, “desburocratizando”: “Então pra isso precisa ter um esforço nosso aqui
enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de
COVID e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas. De IPHAN, de Ministério
da Agricultura, de Ministério de Meio Ambiente, de ministério disso, de ministério daquilo. Agora é hora de unir
esforços pra dar de baciada a simplificação de regulam... é de regulatório que nós precisamos, em todos os
aspectos” (MIGALHAS, 2020).
96

dezenas de comitês e conselhos do Ministério do Meio Ambiente foram extintos como parte
do ‘revogaço’ que fechou centenas de colegiados e reduziu a participação da sociedade civil
nas instâncias de governo”, e o aparelhamento daqueles órgãos que não foram extintos pelo
Governo e pelo setor privado. No terceiro, discorre­se sobre a criação do Conselho Nacional
da Amazônia Legal, sob a coordenação do Vice­Presidente da República Hamilton Mourão e
composto por outros 19 militares, sem a presença de representantes dos estados,
universidades, Fundação Nacional do Índio (FUNAI), povos indígenas, setor privado e da
sociedade civil34. No quarto, o estudo expõe acerca da censura, da intimidação e da
espionagem de jornalistas e da perda de transparência, que ocorrem por terem sido
encaminhados oficiais da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) para monitoramento de
organizações da sociedade civil na Conferência do Clima em Madri (COP25), em 2019, por
serem acusadas organizações não governamentais de cometerem crimes ambientais, inclusive
líderes indígenas35, por terem sido desautorizados órgãos como IBAMA e ICMBio a se
comunicarem com a imprensa, bem como a responderem tempestivamente nos prazos da Lei
de Acesso à Informação (BRASIL, 2011), e pelo lançamento de um novo site do MMA, que
foi ao ar sem a maior parte das informações, registros e dados históricos que eram
disponibilizados na página anterior.
Em outro levantamento dos atos normativos ambientais publicados no ano de 2020,
no contexto da pandemia de COVID­19 (CAWAMURA et al., 2020), constatou­se que há
quatro níveis de desestruturação da política ambiental federal desde o início da pandemia de
COVID­19.
Há um primeiro nível, que se dá no âmbito da desestruturação normativa, que se
realiza por atos exarados através da gestão do Ministério do Meio Ambiente, e visa ao
enfraquecimento do aparato administrativo de proteção ambiental, seja pela alta frequência de
normas que flexibilizam os mecanismos de proteção, seja pela abstenção na tomada de

34
O estudo afirma que o Conselho assumiu a responsabilidade pelo combate aos ilícitos ambientais na
Amazônia, mesmo sem orçamento, metas ou planejamento, não obstante os órgãos ambientais federais
continuarem sob a supervisão do Ministério do Meio Ambiente, ou seja, “Mourão reina, mas não governa”.
Consta no estudo que o Conselho propõe integrar o DETER e o PRODES, atualmente vinculados ao INPE, ao
CENSIPAN, que é um órgão vinculado ao Ministério da Defesa, bem como criar um “marco legal”, para limitar
a atuação de organizações não governamentais na Amazônia Legal, para permitir tão somente aquelas alinhadas
ao “interesse nacional”. IBAMA e ICMBio são referenciados pelo Conselho no sentido de uma eventual
“reestruturação” e “revisão doutrinária”.
35
O Ministro­Chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, publicou nas redes sociais
uma mensagem acusando a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), a líder indígena Sônia Guajajara
e o ator Leonardo Di Caprio de cometerem crimes lesa­pátria, pois seus objetivos seriam publicar fake news
contra o Brasil, imputar crimes contra o Presidente da República e apoiar campanhas de boicote contra produtos
brasileiros (CORREIO BRASILIENSE, 2020).
97

medidas para o enfrentamento da crise ecológica (CAWAMURA et al., 2020). O segundo


nível de desestruturação ocorre na seara dos órgãos de transparência e participação, mediante
diminuição ou exclusão da participação da sociedade civil em conselhos, falta de divulgação
de informações sobre áreas embargadas e proibição do atendimento à imprensa de órgãos
subordinados ao MMA (CAWAMURA et al., 2020). O orçamento é o terceiro plano de
desestruturação, o que se verifica pelos cortes de gastos em diferentes esferas dos órgãos
ambientais, especialmente pelo contingenciamento do orçamento de brigadistas em 2020 e
reduções na dotação orçamentária do IBAMA, do MMA e também do Instituto Chico Mendes
de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) (CAWAMURA et al., 2020). E, por fim, há
desestruturação fiscalizatória, cujo desmonte na fiscalização é estimulado pelas exonerações
com desvio de finalidade, prejudicando a continuidade de ações (CAWAMURA et al., 2020).
Em uma visível medida para desestruturação de fiscalização e transparência, o
governo Bolsonaro, no mês de julho de 2021, informou aos meios de comunicação que retirou
do INPE a competência para monitoramento e divulgação e a transferiu para o Instituto
Nacional de Meteorologia (INMET), subordinado ao Ministério da Agricultura (EL PAÍS,
2021).
Malgrado pudesse se conceber a ideia de que a diminuição do orçamento, em valores
absolutos, pudesse não refletir diretamente na fiscalização dos órgãos ambientais federais,
importa trazer o orçamento geral discricionário do IBAMA e do ICMBio, e o orçamento
discricionário desses órgãos especificamente para fiscalização e incêndios florestais.

Figura 14: Orçamento discricionário do IBAMA e do ICMBio para fiscalização e incêndios


florestais
98

Orçamento discricionário do IBAMA e do ICMBio para fiscalização e


incêndios florestais
250,000,000

200,000,000

150,000,000

100,000,000

50,000,000

0
2019 2020 2021

Fonte: Observatório do Clima (2021b) ­ SIOP acesso público36

Os recursos discricionários destinados ao ICMBio também estão sendo, ao longo do


tempo, limitados.

Figura 15: Orçamento discricionário do IBAMA


Orçamento discricionário do IBAMA
600,000,000

500,000,000

400,000,000

300,000,000

200,000,000

100,000,000

0
2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021

Autorizado Liquidado PLOA

Fonte: Observatório do Clima (2021b) ­ SIOP acesso público37

36
Valores atualizados pelo IPCA (Bacen ­ Calculadora do Cidadão), de dezembro de 2019 e novembro de 2020.
Considerou­se como efetivamente autorizado o valor correspondente à coluna “Dotação Atual” do SIOP. Não foi
considerada a ação orçamentária 21BS em 2019, porque não houve internalização no Ibama dos recursos
correspondentes. Foram levadas em conta as ações orçamentárias 214M, 214N, 214P e, no ano de 2020, também
a 21BS (recursos extra da Lava Jato direcionados ao Ibama pelo STF). No PLOA 2021, não foram computados
os recursos condicionados à aprovação legislativa, nos termos do inciso III do art. 167 da Constituição.
99

Figura 16: Orçamento discricionário do ICMBio


ORÇAMENTO DISCRICIONÁRIO DO ICMBio
450,000,000

400,000,000

350,000,000

300,000,000

250,000,000

200,000,000

150,000,000

100,000,000

50,000,000

0
2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021

Autorizado Liquidado PLOA

Fonte: Observatório do Clima (2021b) ­ SIOP acesso público38

Nos últimos dois anos é possível verificar, de forma clara, menor participação social
na tomada de decisão e no tocante às questões ambientais.
Em termos de transparência e participação social na gestão ambiental, os retrocessos
são visíveis, porquanto são desestruturados órgãos e são impostas normas que dificultam a
transparência e a participação social no processo decisório.
Em levantamento sobre o panorama de transparência e participação ambiental
realizado por pesquisadores das organizações não governamentais IMAFLORA, Instituto
Socioambiental e Artigo 19, foram verificadas (i) alterações nos protocolos de comunicação

37
Valores atualizados pelo IPCA (Bacen ­ Calculadora do Cidadão), considerando o mês de dezembro de cada
ano e o mês de novembro de 2020. Considerou­se como efetivamente autorizado o valor correspondente à coluna
“Dotação Atual” do SIOP. Não foi considerada a ação orçamentária 21BS em 2019 porque não houve
internalização no Ibama dos recursos correspondentes. No PLOA 2021, não foram considerados os recursos
condicionados à aprovação legislativa nos termos do inciso III do art. 167 da Constituição.
38
Valores atualizados pelo IPCA (Bacen ­ Calculadora do Cidadão), levando­se em consideração o mês de
dezembro de cada ano e o mês de novembro de 2020. Considerou­se como efetivamente autorizado o valor
correspondente à coluna “Dotação Atual” do SIOP. No PLOA 2021, não foram computados os recursos
condicionados à aprovação legislativa nos termos do inciso III do art. 167 da Constituição.
100

dos órgãos ambientais39; (ii) ameaças a servidores40; (iii) elevação do sigilo de documentos
públicos41; (iv) apagões em bases de dados ambientais; (v) deslegitimação de órgãos públicos
responsáveis pela produção de dados ambientais 42; (vi) extinção e alteração de composição de
órgãos colegiados43 (IMAFLORA et al., 2021).
Esses fatores, em conjunto, refletem na diminuição das autuações ambientais de
atividades.

Figura 17: AIA anotados pelo IBAMA no Brasil (período 2004­2020)

39
Foi imposto ao IBAMA, por meio da Portaria n. 560/2020, uma “lei da mordaça”, por meio da qual o contato
com a imprensa dos ocupantes de direção, chefia e assessoramento devem “reportar à Ascom [assessoria de
comunicação] qualquer contato estabelecido com a imprensa”. Desse modo, o levantamento conclui que essa
“centralização diminui a autonomia dos órgãos ambientais em serem transparentes”, interferindo na publicidade
e na publicidade e na transparência das informações e dados produzidos pela instituição. Já para o ICMBio, foi
imposta a Portaria n. 411/2020, que institui um Código de Conduta aos seus servidores, “vedando aos servidores
divulgar estudos, pareceres e pesquisas, ainda não tornados públicos, sem prévia autorização”. Desde 2019, a
Controladoria­Geral da União (CGU) mudou o seu entendimento para determinar o sigilo sobre os pareceres
jurídicos utilizados para subsidiar vetos e sanções da Presidência da República a projetos provenientes do
Congresso Nacional, o que indica o enfraquecimento da “transparência e [da] capacidade da sociedade civil de
avaliar os argumentos que embasam a tomada de decisão governamental, inclusive nas políticas ambientais”
(IMAFLORA et al, 2021).
40
Foram exonerados servidores do INPE após os dados sobre desmatamento desmentirem declarações do
governo. Dentre os principais casos, destacam­se Lubia Vinhas, coordenadora­geral de Observação da Terra do
INPE, a qual era responsável pela produção de dados pelos sistemas DETER e PRODES sobre desmatamento na
Amazônia (IMAFLORA et al, 2021).
41
Publicação do Decreto n. 9.690/2019 (BRASIL, 2019c), com o objetivo de aumentar “categorias de agentes
públicos habilitados a classificar documentos governamentais como sigilosos ou ultrassecretos. Essas
classificações, que colocam em sigilo documentos pelo período de cinco, 10 ou 25 anos, eram até então
prerrogativa restrita a funcionários de primeiro escalão. Com o decreto, seriam estendidas também aos servidores
de segundo escalão”. O Congresso Nacional aprovou Decreto Legislativo que sustaria a medida, mas, antes de
concluir a tramitação no legislativo houve revogação da controverso Decreto (IMAFLORA et al, 2021).
42
Ricardo Galvão também foi exonerado da presidência do INPE no ano de 2019 após a acusação do Presidente
da República, Jair Bolsonaro, acusar os dados da instituição de serem “mentirosos”, que demonstravam o
aumento do desmatamento na Amazônia. O Presidente da República afirmou “que antes de serem divulgados
publicamente, estes deveriam passar pelo seu conhecimento, o que fere diretamente os princípios da
transparência e da impessoalidade”. Não obstante, o próprio presidente o INPE foi desacreditado, aduzindo que
estaria “a serviço de alguma ONG”. Para o levantamento, “o descrédito na geração dos dados ambientais por
órgãos governamentais e o cerceamento da divulgação dessas informações são um risco para o conhecimento da
realidade ambiental do país e confunde e dificulta a atuação do monitoramento e controle social das ações do
governo em relação ao desmatamento e proteção ambiental” (EXAME, 2019; IMAFLORA et al, 2021).
43
Os Decretos n. 9.784/2019 (BRASIL, 2019d) e 9.759/2019 (BRASIL, 2019e) trouxe uma lista de órgãos
colegiados para serem extintos, como o Fórum Brasileiro de Mudança do Clima (FBMC), a Comissão do Plano
Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (CONAVEG). Além disso, o Decreto n. 9.806/2019 (BRASIL,
2019f) alterou a composição do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) de 96 para 23 integrantes,
sendo que, “com a mudança, o governo aumentou seu peso no conselho em 13%, enquanto os Estados perderam
7% e a sociedade civil, 6% da representação. Governo e setor produtivo passaram a ter a maioria dos votos”
(OBSERVATÓRIO DO CLIMA, 2021). Sobre a alteração da composição do CONAMA, o ministro Ricardo
Salles afirmou: “O CONAMA é ineficiente nos debates, prolixo nas suas discussões, com pouco fundamento
técnico e um prejuízo gigantesco à sociedade por sua morosidade e burocracia. Nós temos que reformular as
regras. Temos que combater o assembleísmo” (COLABORA, 2019).
101

Autos de Infração Ambiental - IBAMA - Brasil


40,000

35,000

30,000

25,000

20,000

15,000

10,000

5,000

0
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020

Fonte: IBAMA (2021). Gráfico elaborado pelo autor

Para exemplificar o arrefecimento da fiscalização do IBAMA no Arco do


Desmatamento, realizou­se uma consulta dos autos de infração ambiental (AIA) para o
mesmo período, em relação aos estados da federação. Principalmente a partir do ano de 2015,
verifica­se um contínuo esvaziamento da atividade dos fiscais:
102

Figura 18: AIA anotados pelo IBAMA por Estados no Arco do Desmatamento (período 2004­
2020)
Autos de Infração - IBAMA - Estados
3500

3000

2500

2000

1500

1000

500

0
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020

Pará Maranhão Mato Grosso Rondonia Acre Amazonas

Fonte: IBAMA (2021). Gráfico elaborado pelo autor

Em razão desses dados, entidades da sociedade civil de Santa Catarina e do Rio


Grande do Sul (IGENTES et al., 2020) ajuizaram ação de improbidade administrativa na
subseção judiciária federal de Florianópolis 44, registrada sob o n. 5011576­83.2020.4.04.7200,
em face do ministro Ricardo Salles e da União Federal. Foi também protocolada na subseção

44
Este autor, enquanto procurador das entidades autoras, é um dos subscritores da referida ação de improbidade
administrativa. Foi sustentado, em síntese, que os mesmos estariam agindo com violação à moralidade
administrativa, valendo­se da enfermidade e da fragilidade públicas da pandemia de COVID­19 para praticar
atos ímprobos e maculados com desvio de finalidade, seja por não proteger adequadamente o bem ambiental,
seja por não proceder com transparência e com vistas a viabilizar a participação da sociedade no trato das
questões ambientais.
Requereu­se (i) a condenação solidária dos réus no pagamento do dano moral coletivo em matéria ambiental, em
valor não inferior a R$ 20 milhões de reais; e (ii) ressarcimento integral dos danos, perda da função pública,
suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o poder público. Foi
requerida uma medida liminar de afastamento cautelar do ministro Ricardo Salles, fundado em elementos
probatórios que indicariam que o ministro utilizava a máquina pública para “controlar a conduta dos servidores e
até mesmo punir aqueles que valorosamente não atendem aos anseios e sentimentos pessoais do réu”, inclusive
utilizando­se de “intimidações e retaliações para defender interesses outros, de madeireiros garimpeiros e afins”.
Para comprovar as condutas intimidatórias do ministro, a petição inicial da ação colaciona excertos da sentença
condenatória na ação de improbidade n. 1023452­67.2017.8.26.0053, quando o mesmo era Secretário do Meio
Ambiente do Estado de São Paulo, bem como notícias que relatam ameaças e exonerações de servidores.
103

judiciária de Brasília45, autuada sob o n. 1037665­52.2020.4.01.3400 por procuradores da


república, ação de improbidade administrativa contra o Ministro Ricardo Salles (MPF, 2020).
A par da discussão sobre a legitimidade e competência 46, ambas as ações de
improbidade (ainda) não obtiveram decisão favorável quanto ao afastamento cautelar do
Ministro do Meio Ambiente. Atualmente, há recursos pendentes no Tribunal Regional Federal
da 4ª e 1ª Regiões, respectivamente, para decidir sobre os pontos preliminares e controversos
das referidas ações.
Além disso, foram aprovados registros de agrotóxicos em número recorde, cujo
processo de avaliação não foi interrompido durante a pandemia de COVID­19, por serem a
prevenção, controle e erradicação de pragas e doenças, bem como atividades de suporte e
disponibilização dos insumos necessários à cadeia produtiva, o que inclui agrotóxicos,
consideradas atividades essenciais (APUBLICA, 2020a).
As normas que tratam sobre conversão das multas foram, de fato, revisadas, por
intermédio do Decreto n. 9.760/2019 (BRASIL, 2019a), facilitando a conciliação, o desconto
em até 60% e o parcelamento da multa, e a forma de apresentação do projeto de serviço
ambiental.
A Medida Provisória n. 910/2019 (BRASIL, 2019b), também apelidada por “MP da
Grilagem”, promoveu profundas alterações em diversos diplomas legais.
O Sumário Executivo da MP (SENADO FEDERAL, 2019), elaborado pelo consultor
legislativo Roberto Almeida, aduz que (i) a alteração de maior magnitude se refere à
ampliação dos beneficiários da regularização, “que até então se encontrava restrita ao âmbito
da Amazônia Legal e que, com a edição dessa MPV, passou a ter abrangência nacional, em
45
A referida ação de improbidade foi ajuizada sob o argumento de que ministro Ricardo Salles desestruturou
dolosamente as estruturas de proteção do meio ambiente, nos âmbitos normativo, orçamentário e fiscalizatório,
bem como articulou a desestruturação dos órgãos de transparência e participação. À vista das práticas
mencionadas, foi indicada a violação dolosa dos deveres de honestidade, legalidade e lealdade às instituições, ou
seja, por atentar contra princípios da administração pública. Ao final, os representantes do ministério público
federal fundamentaram o pedido cautelar do ministro do meio ambiente com base (i) na plausibilidade do direito
invocado, comprovada pelos atos de desestruturação normativa, de órgãos, orçamentária e fiscalizatória; e (ii)
perigo de dano, consistente no “alarmante aumento do desmatamento, sobretudo na Floresta Amazônica” (MPF,
2020).
46
As ações de improbidade administrativa das subseções de Florianópolis e de Brasília são conexas, ou seja,
possuem os mesmos fundamentos de fato e de direito, o que exigiria o julgamento conjunto no juízo onde a
primeira ação foi distribuída. A ação de improbidade ajuizada na subseção de Florianópolis é anterior à ação
proposta na subseção de Brasília, mas os autores da primeira (associações) foram consideradas partes ilegítimas
para figurarem na parte ativa da ação, muito embora o ministério público federal em Florianópolis tenha
supervenientemente intervindo para também ingressar no polo ativo, o que supriria a discutível ilegitimidade.
Assim, prossegue­se a apuração da ação de improbidade em Brasília até que se decida, definitivamente, se há
legitimidade ativa daqueles que propuseram a ação em Florianópolis.
104

terras não só da União, como também do INCRA”; (ii) o público alvo foi ampliado para
incidir nas “terras ocupadas até 5 de maio de 2014, quando o texto até então vigente se referia
a ocupações até 22 de julho de 2008”; (iii) o limite de terras regularizáveis igualmente sofreu
incremento, “de quatro para quinze módulos fiscais, o limite de área de terras a serem
regularizadas, para que a averiguação dos requisitos possa ser feita por mera declaração do
ocupante”47; (iv) ampliou para 2.500 hectares o limite da área em relação as quais é permitida
a dispensa de licitação, antes limitada a 1.500 hectares; e, por fim, (v) dispensou as
assinaturas dos confrontantes, bastando a autodeclaração do interessado de que respeitou os
limites e confrontações.
A bancada ruralista pressionou o então Presidente da Câmara dos Deputados,
Rodrigo Maia, para que o mesmo colocasse em votação a MP n. 910/2019 e evitasse que a
medida perdesse a eficácia por transcurso do tempo. Para o deputado Zé Vitor, vice­líder do
PL e membro da FPA, "Estamos trabalhando forte para tentar votar ainda nessa semana. Nós
não queremos deixar ela caducar. Estamos falando com os líderes aqui para colocar para
votar. Estamos bem confiantes, é um processo político, e cabe algumas interpretações. Mas
sabemos a importância dessa pauta" (CONGRESSO EM FOCO, 2020). Sem consenso, a
medida não foi votada e perdeu a eficácia.
Os Projetos de Lei n. 490/07 (BRASIL, 2007) e n. 191/2000 (BRASIL, 2000) estão
em fase final de tramitação, os quais buscam permitir extrativas dentro de territórios
indígenas; a demarcação passaria a ser da competência do Congresso Nacional, e não mais do
Poder Executivo; e seria imposto um marco temporal sobre o direito das terras
tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas, bem como outras medidas. Mais
recentemente, há a tramitação do Projeto de Lei n. 2.633/20 (BRASIL, 2020). A bancada
segue buscando a aprovação de outras medidas, visando à regularização de imóveis na
Amazônia.
Segundo Moizés (2021, p. 95), diante dessas propostas legislativas, é possível
verificar que os ruralistas pretendem, ao mesmo tempo, reestruturar a legislação para legalizar
práticas atualmente consideradas ilegais, bem como flexibilizar outros comandos legislativos

47
O módulo fiscal é uma unidade de medida que varia de acordo com o município. Segundo o EMBRAPA, o
valor do módulo fiscal é fixado pelo INCRA levando em conta: “(a) o tipo de exploração predominante no
município (hortifrutigranjeira, cultura permanente, cultura temporária, pecuária ou florestal); (b) a renda obtida
no tipo de exploração predominante; (c) outras explorações existentes no município que, embora não
predominantes, sejam expressivas em função da renda ou da área utilizada; (d) o conceito de "propriedade
familiar". A dimensão de um módulo fiscal varia de acordo com o município onde está localizada a propriedade.
O valor do módulo fiscal no Brasil varia de 5 a 110 hectares”. O módulo fiscal em São Félix do Xingu, em pleno
Arco do Desmatamento, é de 75 hectares (EMBRAPA, 2021).
105

para continuar a desenvolver esse projeto. Seria nessa perspectiva de avanço sobre novos
territórios e, principalmente, na apropriação de recursos naturais, que haveria o
aprimoramento do agronegócio, atendendo­se às novas necessidades e demandas de expansão
do capitalismo. A bancada ruralista, portanto, atuaria no sentido de conferir segurança jurídica
ao agronegócio, concomitantemente a proposições de anistia de punições daqueles que já
ocupam ilegalmente territórios protegidos e terras devolutas (MOIZÉS, 2021, p. 95/96).
Uma proposta que se afirma poder contribuir para a conservação adequada do Arco
do Desmatamento seria uma reforma do arcabouço jurídico, proibindo, mediante emenda
constitucional, toda e qualquer regularização de invasão de áreas públicas que resulte em
danos ambientais, exceto para ocupações antigas e de baixa renda, retirando as possibilidades
de regularização profissional da grilagem de terras e limitando a antigas propriedades de
pessoas de baixa renda. Além disso, seriam necessárias ações judiciais destinadas a suprir
omissões inconstitucionais na demarcação de terras indígenas e unidades de conservação, bem
como o aprimoramento e melhor aplicação das leis de crimes ambientais (BARROSO;
MELLO, 2021).

2.3.3 UC Jamanxim, a grilagem e os danos articulados pelo agronegócio

Um caso exemplifica como a violência é operada pela grilagem: a situação da


Floresta Nacional Jamanxim, enquadrada na categoria de uso sustentável, e que foi criada às
margens da BR­163, nas proximidades do município de Novo Progresso, no sudoeste do Pará.
Trata­se de área criada no ano de 2006 e inequivocamente inserida no Arco do Desmatamento
(TORRES; BRANDFORD, 2017).
Para Pinheiro, (2011, p. 33), o contexto de criação da Floresta Nacional foi “servir de
freio ao desmatamento e a exploração predatória e insustentável que avançava na região [...]
sendo uma das regiões com maiores índices de desmatamento em toda a Amazônia
brasileira”.
Desde o início da criação da unidade de conservação, houve protesto dos produtores
rurais da região, como advertiu o presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Novo
Progresso, Agamenon Menezes: “Não quero, mas vamos derrubar essas árvores todinhas. A
gente conversa, eles não cumprem” (TORRES, BRANFORD, 2017; OECO, 2006).
106

Suas terras são cobiçadas justamente porque estão próximas à BR­163, sendo,
portanto, mais valorizadas (TORRES, BRANFORD, 2017).
A Floresta Nacional Jamanxim possui pretensos “donos” de terras dentro de seus
limites, sendo que “segundo dados do ICMBio, 67% das detenções de terras instalaram­se
depois da criação da UC, e 60% desses ocupantes não residiam ali” (TORRES, BRANFORD,
2017).
As reivindicações de terras, ademais, possuem dimensão média muito superior à
ocupação dos colonos da região, o que indica que se tratam de tentativas de apropriação ilegal
de grileiros (TORRES, BRANFORD, 2017). A Floresta Nacional Jamanxim “passou a
disputar as primeiras colocações na lista de UCs mais desmatadas da Amazônia, além de ser
palco de outros crimes violentos” (TORRES, BRANFORD, 2017). Trata­se da terceira
unidade de conservação com mais incrementos de desmatamento acumulado no país, desde
2008, com 834,69 quilômetros quadrados de perda florestal (INPE­TERRABRASILIS48):

Figura 19: Incremento de desmatamento na unidade de conservação Jamanxim


Incremento de desmatamento - Unidade de conservação Jamanxim -
Área Km²
140

120

100

80

60

40

20

0
2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020

Área Km²

Fonte: INPE­ TERRABRASILIS (2020f) 49

Utilizando­se de ferramentas de sensoriamento remoto, Pinheiro (2011, p. 72)


constatou que, de 1984 a 2010, a unidade de conservação Jamanxim teve 10% de sua área
convertida para outro tipo de uso. Diante disso, a autora verificou a urgência da preservação e

48
Disponível em: http://terrabrasilis.dpi.inpe.br/app/dashboard/deforestation/biomes/amazon/increments
49
Disponível em: http://terrabrasilis.dpi.inpe.br/app/dashboard/deforestation/biomes/amazon/increments
107

do uso dos recursos naturais da referida unidade de conservação, em razão da perda da


biodiversidade em grande escala, decorrente do “desmatamento atrelado às políticas de
crescimento econômico da região, tais como especulação de terra ao longo das estradas,
ocupação humana, aumento drástico da pecuária bovina, mineração, exploração madeireira e
agricultura familiar”.
Em 2016, o governo Temer assinou as Medidas Provisórias n. 756 (BRASIL, 2016a)
e n. 758 (BRASIL, 2016b), reduzindo os limites da Floresta Nacional e a requalificando para
Área de Proteção Ambiental (APA), a qual é uma modalidade de unidade de conservação
menos restritiva quanto ao uso dos seus recursos naturais, além de prescindir de zona de
amortecimento.
A aprovação das referidas medidas contou com o apoio e a articulação da bancada
ruralista no Congresso Nacional, em “aprovações relâmpago” que excluiu a participação da
sociedade e de estudiosos do tema (CARTA CAPITAL, 2017; AMAZÔNIA.ORG, 2017).
Torres e Branford (2017) mencionam que a pavimentação da BR­163 foi
complementada pelo “Plano BR­163 Sustentável” que, dentre as providências, previu a
criação de unidades de conservação como medida de proteção ambiental. O plano com o viés
sustentável, todavia, não foi implementado, mas logo inserido no Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC).
A implantação da unidade de conservação em 2006, ainda que apenas formalmente,
transformou em públicas as terras da unidade de conservação e as retirou do mercado da
grilagem, impossibilitando­as de serem tituladas em nome de grileiros. Todavia, a redução de
limites e a requalificação promoveu a escalada de conflitos, a corrida especulativa e a disputa
pela terra que agora seria “grilável”, haja vista que a nova categoria da unidade de
conservação não impediria, por si, a ocupação e o desmatamento (TORRES, BRANFORD,
2017).
A dinâmica fático­jurídica sobre a Floresta Nacional Jamanxim, agora APA
Jamanxim, é uma amostra de como o Estado e o agronegócio podem participar da prática de
danos no Arco do Desmatamento.
108

Sem serem contabilizadas as áreas que foram excluídas da unidade de conservação,


que legalmente poderão ser desmatadas nos termos do Código Florestal (BRASIL, 2012),
viabilizou­se infligir danos nos limites previstos no plano de manejo da APA 50.

2.3.4 Considerações a propósito da bancada ruralista: os representantes das corporações e do


latifúndio contra a estabilidade climática e o meio ambiente

Diante dos danos praticados pelas corporações que exploram a soja transgênica, a
carne bovina e a indústria madeireira no Arco do Desmatamento amazônico, os poderosos
demandam políticos e mecanismos legais para que não sejam atingidos pela norma penal.
Nessa perspectiva, apurou­se que a bancada ruralista exerce diversas funções no Congresso
Nacional que são imprescindíveis à manutenção da estrutura econômica desigual e excludente
das relações sociais, haja vista a defesa veemente da grande propriedade rural e a forte
atuação para fragilização de leis ambientais, de direitos sociais e de melhoria das condições de
trabalho.
À vista do funcionamento político e normativo do Estado brasileiro, observou­se que
a bancada ruralista no Congresso Nacional atua proximamente ao Poder Executivo, senão
imbricada a ele, visando a prosperar seus interesses setoriais e suas posturas oligárquicas, bem
como imunizar as corporações e latifundiários que representam.

2.4 Síntese conclusiva do capítulo

O primeiro item desde capítulo se prestou a uma ampla investigação dos danos
sociais e do processo de vitimização no Arco do Desmatamento, com o objetivo de iniciar a
verificação da hipótese básica apresentada.
Em seu início, compreendeu­se a relevância da floresta para a biodiversidade e para a
moderação do clima, nos níveis continental e global, bem como se indicou o desmatamento e
as queimadas na Amazônia geográfica e historicamente. Em seguida, situou­se o país perante
os acordos internacionais climáticos, notadamente o Acordo de Paris, e a importância da
Amazônia em relação aos compromissos assumidos para mitigar as mudanças climáticas.

50
Em consulta ao sítio virtual do ICMBio, consta tão somente o plano de manejo de 2006, referente à categoria
Floresta Nacional, não havendo ainda regulamento aprovado, em plano de manejo, quanto à utilização dos
recursos naturais da Área de Proteção Ambiental Jamanxim.
109

Com o fito de situar histórica e contextualmente a presença das corporações e do


Estado na Amazônia, investigou­se a ocupação deste front a partir dos projetos agropecuários
organizados pela ditadura empresarial­militar, dos seus financiamentos às corporações, da
implementação da infraestrutura para energia e para logística, assim como a entabulação
jurídica para organização do território, como regularizações de terras griladas.
Não obstante, foram examinados os métodos e os expedientes atualmente utilizados
pelas corporações do agronegócio para continuarem a se estender na fronteira, especialmente
formas de mascarar a origem ilícita de parte da produção, as medidas tomadas pelo Estado
frente a este problema e a percepção internacional diante do conhecimento dessas práticas.
Ulteriormente, buscou­se compreender a dinâmica dos danos praticados pelo
agronegócio a partir dos territórios indígenas e das unidades de conservação, sendo possível
observar um grave cenário de vitimização de povos indígenas, povos tradicionais e de
defensores da natureza. O território, cujo conceito abrange identidade e fatores étnicos, é
lugar de resistência, dados os conflitos socioambientais enunciados, e de trocas materiais e
espirituais.
Com o intuito de investigar a hipótese secundária quanto à associação do Estado com
corporações do agronegócio, abordaram­se a composição da bancada ruralista, seus discursos,
influências e as principais atuações no que concerne à Amazônia. Foi possível observar uma
forte atuação dos ruralistas na proposição de medidas para regularização de ocupações em
áreas de domínio da União (como territórios indígenas e unidades de conservação), bem como
para defender pautas perante o Poder Executivo que desarticulam políticas públicas de
proteção do meio ambiente.
Ao final do capítulo, apresentou­se o caso da UC Jamanxim, a qual envolve caso de
grilagem (e busca por regularização), articulação da bancada ruralista junto ao Poder
Executivo para requalificação da UC (Floresta Nacional para APA) para permanência das
ocupações ilegais e implantação de infraestrutura que acentua os danos.
110

3. A VIOLÊNCIA NO ARCO DO DESMATAMENTO DA AMAZÔNIA:


CRIMINOLOGIA VERDE E CRIMES PODEROSOS

A partir do diagnóstico elaborado no capítulo anterior, verificou­se que a atividade


econômica do agronegócio produz danos que são ambiental, social e economicamente
aferíveis no Arco do Desmatamento da Amazônia, inclusive além das fronteiras do continente
sul­americano, à vista das implicações climáticas e das consequências para os povos indígenas
e tradicionais, mas são imunes à responsabilidade.
Este capítulo é dedicado à leitura criminológica desses danos. Para cumprir esse
objetivo, é apresentada uma tipologia de violência, buscando abrir as fronteiras
epistemológicas do que se reconhece por criminoso, sob um repensar não antropocêntrico, por
meio da abordagem do metabolismo social.
Nessa perspectiva, trabalha­se, contextualmente, o campo de estudo da Criminologia
Verde para se compreender os danos praticados como violência e a relação das corporações
com o Estado na consecução desses danos.
Ainda na perspectiva de tolerância e de cumplicidade com a violência, é realizada
uma abordagem do dano do ponto de vista do Estado, bem como de sua desestruturação para
logro do lucro corporativo, para então ser trabalhada a questão do ecocídio como uma
proposta de responsabilização para os Estados e corporações que praticam danos no espaço
amazônico.
Partindo dos dados já levantados, a hipótese básica é verificada neste capítulo com a
pesquisa monográfica da abordagem do metabolismo social, para que se compreenda a
incorporação de uma nova relação ética entre ser humano e natureza para a Criminologia.
A hipótese secundária é trabalhada no marco teórico da Criminologia Verde e dos
Crimes dos Poderosos e a relação com a desestruturação do Estado (de Direito Ambiental e
Ecológico) para a consecução dos danos sociais pela bancada ruralista. Para tanto, busca­se
compreender como os expedientes realizados pelas corporações para efetivar os danos podem
ser teorizados e explicados pela teoria social, sobretudo na relação com o neoliberalismo.
Para se cumprir o objetivo central, faz­se a análise conceitual do metabolismo social,
em concordância com o conceito de ecocídio. Quanto ao objetivo secundário, é investigada,
no item 3.2, a forma pela qual se produzem danos sociais decorrentes das relações entre
corporações e Estado.
111

3.1 Danos sociais e relação ser humano e natureza

Neste item, propõe­se realizar uma análise da tipologia galtunguiana de violência,


com o objetivo último de estabelecer premissas de uma abordagem não antropocêntrica
quanto ao estudo das estruturas econômicas e instituições jurídicas que movem a destruição
no Arco do Desmatamento na Amazônia.
Nesse quadro, realiza­se a abordagem do metabolismo social para repensar a relação
do ser humano com a natureza, trazendo novos elementos para a ética ambiental e para a
Criminologia, de forma sistemática ao estudo tipológico da violência.
Ao final, é procedida à análise do campo de estudo da Criminologia Verde,
explorando o funcionamento e a dinâmica dos danos que prejudicam a humanidade, os
ecossistemas e animais não humanos, independentemente da sua licitude ou ilicitude.

3.1.1 As violências estrutural, cultural e direta: tipologia para a vitimização humana

Os termos violência e paz são utilizados em uma multiplicidade de situações e para


designar diferentes fenômenos, mas em nem todos os casos têm havido aplicação inequívoca
e rigor conceitual que pudesse evitar confusões, ambiguidades e imprecisões.
Para Galtung (1969), a paz é a ausência de violência, ou seja, a construção da paz
implica um movimento contrário a qualquer tipo de violência. Em igual proporção, os atos
violentos na sociedade afastam a convivência harmônica e o estado de paz.
A violência é definida pelo autor como quaisquer ameaças ou efetivas lesões “às
necessidades básicas humanas e, de uma maneira geral, à vida, reduzindo o nível real de
satisfação das necessidades abaixo do que é potencialmente possível” (GALTUNG, 1990)51.
Ou seja, Galtung (1969) considera que a violência “está presente quando o ser humano está
sendo influenciado de modo que suas realizações somáticas e mentais reais estão abaixo de
suas realizações potenciais. Essa declaração pode levar a mais problemas do que resolver” 52.
De uma parte, essa definição de violência de Galtung “tem a vantagem de abarcar um
amplo conjunto de aspectos a partir dos quais as pessoas estão (ou se veem) impossibilitadas

51
No original: “I see violence as avoidable insults to basic human needs, and more generally to life, lowering the
real level of needs satisfaction below what is potentially possible”.
52
No original: “As a point of departure, let us say that violence is present when human beings are being
influenced so that their actual somatic and mental realizations are below their potential realizations”.
112

de se realizar nos diferentes níveis de desenvolvimento de sua individualidade por causas


mais ou menos visíveis” (CIIIP, 2002, p. 24). De outra parte, a definição permite “caracterizar
diferentes tipos de violências e possui ainda uma vantagem adicional, isto é, a possibilidade
de escapar de uma concepção linear e unidimensional da paz” (CIIIP, 2002, p. 24).
Uma compreensão similar pode ser encontrada na obra marxiana, ainda que em
contextos teóricos e linguagens distintas, na qual se encontra o entendimento de que:

Ao desenvolvimento das forças produtivas na sociedade corresponde [...] uma


‘maneira humana’ de satisfação das necessidades; mas essa maneira humana é
obstruída pela tentativa permanente de se impor uma ‘maneira desumana’, ou seja,
aquela na qual a satisfação das necessidades de uns produz­se à custa da satisfação
das necessidades dos outros. (BARATTA, 1993).

Pode ser considerada violência, portanto, em um conceito ampliado, a causa da


diferença entre o potencial e o real, entre o que poderia ser e o que é, aquilo que impede a
diminuição dessa distância entre a potencialidade e a realidade (GALTUNG, 1969). A morte
de um ser humano por tuberculose no século XVIII dificilmente poderia ser conceituada, por
tais fundamentos, como decorrente de violência; mas se um ser humano morre de tuberculose
nos tempos atuais, apesar dos recursos médicos existentes, trata­se de violência (GALTUNG,
1969). Ou então, é igualmente considerada violência a ocorrência de mortes periódicas e
evitáveis, aferidas de acordo com o instrumental social e o desenvolvimento tecnocientífico,
relativas aos índices de mortalidade infantil que tornariam possível a sua diminuição (CIIIP,
2002, p. 104).
Em uma abordagem preliminar, são necessidades básicas a sobrevivência, o bem­
estar, a identidade e a liberdade, que podem ser violadas direta ou estruturalmente
(GALTUNG, 1990), conforme o seguinte quadro:
113

Quadro 1: Tipologia da violência

NECESSIDADES

Sobrevivência Bem­estar Identidade Liberdade

Exclusão
Mutilação/agressão53 Repressão55
Violência Ressocialização54
Assassinato Bloqueios Detenção55
Direta Cidadão
econômicos/Sanções53 Expulsão55
secundário54

Violência Penetração57 Marginalização58


Exploração A56 Exploração B56
Estrutural Segmentação57 Fragmentação58

Fonte: GALTUNG, 1990. Traduzido e adaptado pelo autor

Com supedâneo na contribuição galtunguiana, a violência estrutural e injustiça social


se equiparam de tal forma que a violência estrutural é “a repressão das necessidades reais e,
portanto, dos direitos humanos no seu conteúdo histórico­social” (BARATTA, 1993).
Em todas as suas formas, a violência ocorre com a repressão de necessidades básicas,
violação ou suspensão de direitos humanos, podendo haver a divisão em dois grupos
fundamentais de direitos humanos. O primeiro grupo diz respeito à vida, à integridade física,

53
Além da mutilação (agressão) física em si, incluem­se nessa categoria as ofensas às necessidades humanas
básicas, como atos que tenham uma cadeia causal longa como bloqueios e sanções econômicas (GALTUNG,
1990).
54
Envolve um duplo aspecto, a perda da identidade e da própria cultura e a ressocialização em uma outra cultura,
como a proibição e a imposição de línguas, o que acontece, muitas vezes, em cidadãos considerados secundários,
em que um grupo é submetido (não necessariamente uma minoria) são forçados a expressar a cultura dominante
e não a sua própria, pelo menos não no espaço público (GALTUNG, 1990).
55
A categoria repressão, detenção e expulsão aludem diretamente à Declaração Universal de Direitos Humanos,
de 1948 (GALTUNG, 1990).
56
“Os oprimidos podem, de fato, estar tão desfavorecidos que morrem (morrem de fome, definham com as
doenças) por causa disso: ‘Exploração A’. Ou podem ser deixados em caráter permanente, estado indesejado de
miséria, geralmente incluindo desnutrição e doenças: ‘Exploração B’” (GALTUNG, 1990).
57
A subcategoria “penetração” diz respeito à implantação pelo dominador de uma consciência parcial e
segmentada da realidade no oprimido, impedindo­o de lutar efetivamente contra essa violência estrutural
(GALTUNG, 1990).
58
Nas subcategorias marginalização e fragmentação, a violência estrutural relaciona­se com a marginalização,
mantendo os oprimidos de fora, combinando com a fragmentação, mantendo­os um longe dos outros
(GALTUNG, 1990).
114

às liberdades pessoal, de opinião, de expressão e de religião e aos direitos políticos. O


segundo grupo corresponde aos direitos econômicos sociais, como direito ao trabalho,
educação e outros (BARATTA, 1993).
“A violência estrutural se define como encoberta por se tratar de um tipo de violência
sistêmica” (CIIIP, 2002, p. 103), não sendo produto da ação violenta de um indivíduo, mas
consequência do sistema social que proporciona oportunidades em extrema desigualdade a
seus membros, não garantindo o mínimo para que realizem as potencialidades de vida a todos
(CIIIP, 2002, p. 103). A violência estrutural supõe oportunidades de vida diferenciadas entre
os membros da sociedade, principalmente o acesso aos benefícios do desenvolvimento, à
distribuição dos recursos e à capacidade de influenciar as decisões sobre distribuição de
recursos (CIIIP, 2002, p. 103).
A compreensão galtunguiana de violência, embora seja efetuada enquanto resultado
de uma construção estrutural, “como poder desigual e chance desiguais de vida, nem sempre
se mostra como tal” (BUDÓ, 2018, p. 342). Essa constatação decorre, para a autora, porque as
vítimas da violência estrutural não percebem sua própria condição, aparecendo de diferentes
maneiras, em violência pessoal ou direta, segundo uma seleção realizada culturalmente
(BUDÓ, 2018, p. 342).
Da violência estrutural, originam­se outras formas de violência, como a (i) violência
individual, quando o agente é um indivíduo; (ii) violência de grupo, em que o agente é um
grupo social, que, por sua vez, serve­se de indivíduos, como os grupos paramilitares; (iii)
violência institucional, na qual o agente é órgão do Estado, governo, exército ou polícia,
revestindo­se da forma legal ou não; e (iv) violência internacional, quando o agente é um
Estado e se dirige a um outro Estado ou a um povo (BARATTA, 1993).
Nesse sentido, a violência, além de física, atua no campo psicológico, em que os
seres humanos são impedidos ou dificultados em desenvolverem suas potencialidades. Se a
primeira categoria atua no corpo, a segunda categoria atua na alma; como acontece no plano
ideológico, o que inclui doutrinação e lavagem cerebral (GALTUNG, 1969). Enquanto a
violência pessoal é percebida a olhos vistos, a violência estrutural é silenciosa e pode ser vista
como da natureza das coisas (GALTUNG, 1969).
Há elementos para repensar a intencionalidade da violência como fundamento da
responsabilidade, que na ética judaico­cristã e na jurisprudência romana são centradas na
115

culpa (intenção), e não na consequência 59. Essa distinção ressalta o imperativo de haver a
preocupação não apenas com a violência direta, mas sobretudo com a violência estrutural,
caso contrário, “os sistemas éticos dirigidos contra a violência intencional facilmente deixarão
de capturar a violência estrutural em suas redes, e podem, portanto, pegar os pequenos e
deixar os peixes grandes soltos” (GALTUNG, 1969).
O equilíbrio ecológico é uma quinta categoria de necessidade básica que, além de
incorporar as outras quatro (sobrevivência, bem­estar, identidade, liberdade), também pode
significar ofensa às vidas biótica e abiótica. No que concerne a esta mais abrangente categoria
(equilíbrio ecológico), há a necessidade de um aprofundamento teórico para sua compreensão
como violência cultural, especialmente na relação ser humano e natureza (GALTUNG, 1990).
Os conflitos ocorrem entre gerações, através do tempo, diacronicamente, visto que
“cada geração tenta satisfazer suas próprias necessidades básicas”, interpondo­se no caminho
das gerações futuras por desconsiderá­las. O conflito intergeracional pode ser (i) econômico,
ao poluir e esgotar o meio ambiente; (ii) militar, ao estimular violência; (iii) político, por
conflitos não transformados e ações irreversíveis; e (iv) cultural, ao aceitar culturas que
provocam as consequências antes listadas (GALTUNG, 2006, p. 166­168).
No caso, o aumento da poluição, o esgotamento dos recursos e a marginalização de
culturas constituem problemas não resolvidos, empurrados às gerações futuras, havendo um
prognóstico de mais violência, à exceção das classes mais altas, que seguiriam protegidas
(GALTUNG, 2006, p. 167/168).
Há também aquelas ofensas aos aspectos simbólicos da existência humana, como a
cultura, a religião, a ideologia, a linguagem, a arte, as ciências empíricas e as ciências formais,
que podem ser usadas para justificar ou legitimar a violência direta ou a violência estrutural
(GALTUNG, 1990). Trata­se da violência cultural.

59
A culpa como fundamento da responsabilidade civil foi introduzida na maioria dos Códigos Civis ocidentais,
possuindo, de fato, duas fontes: (i) a cultura jurídica romana, que incorpora significados helênicos de
responsabilidade, mas agrega sobretudo elementos de boa­fé nas obrigações, sendo buscado, portanto, a intenção
subjetiva, bem como o princípio de não lesar outrem (neminem laedere), que também introduz a noção de culpa;
e (ii) a culpa e a moral cristã, que se desenvolvem com a cultura jurídica que recepciona, na Idade Média, o
direito romano, com a transposição normativa do corpus iuris de Justiniano, transformado por meio de glosas e
comentários medievais, conduzindo à formação da Escola do Direito Natural. Enquanto a “moral romana era
fundamentalmente a moral do justo, (aequitas, epicikia), a moral moderna, instaurada pela Escola do Direito
Natural será a moral da conduta humana, conduta a ser julgada através de um filtro específico o filtro do
julgamento de Deus (MARTINS­COSTA, 1991).
116

Os termos paz e violência se relacionam um ao outro de forma que paz possa ser
considerada ausência de violência (GALTUNG, 1969). Se o oposto da violência é a paz, o da
violência cultural é a paz cultural, que abarcaria aspectos de uma cultura que servem para
justificar e legitimar a paz direta e a paz estrutural. O estudo da violência cultural destaca que
tanto a violência direta como a violência estrutural se legitimam e se tornam aceitas pela
sociedade, sendo necessária, portanto, uma análise tipológica da violência (GALTUNG,
1990):

A violência cultural faz com que a violência direta e estrutural pareça, até mesmo
faça sentir, certa, ou pelo menos não errada. Assim como a ciência política é sobre
dois problemas ­ o uso do poder e a legitimação do uso do poder ­ os estudos de
violência são sobre dois problemas: o uso da violência e a legitimação desse uso
(GALTUNG, 1990).

O estudo da violência cultural pode ser realizado, por exemplo, através da análise do
discurso, por meio do qual pode se vislumbrar a sustentação da violência estrutural ao longo
do tempo, dos pensamentos e da cultura, sem a qual essa forma de violência permaneceria
oculta (BÖHM, 2018, p. 42­45).
A partir da concepção de violência cultural de Galtung (1969), insere­se o dano
provocado pelas atividades extrativistas – cujas terras são cobiçadas por interesses dos atores
privados que anseiam pela exploração dos minerais, da terra para uso agrícola ou mesmo para
especulação – como dano social (BÖHM, 2020). Trata­se do estudo de violências
“invisíveis”, que, ao contrário do homicídio, do roubo, não é percebida como violência e,
portanto, não é evitada, nem sancionada ou tampouco reparada como violência (BÖHM,
2018).
Isso quer dizer que os danos materiais a terras indígenas e tradicionais efetivam
reflexamente danos imateriais aos povos que vivem nesses locais, operando como uma
violência, ainda que não percebida como tal. Ao contrário, os atores privados e o Estado
justificam reiteradamente os atos praticados nessas terras, legais ou ilegais.
Budó (2017) trabalha o conluio das elites agrárias, políticas e econômicas, nacionais
e transnacionais, em termos mais atuais, para apontar a legitimação e a aceitação dos danos
praticado pelas corporações passando por campanhas como a realizada pela Rede Globo,
“agro é tech, agro é pop, agro é tudo” (GLOBO RURAL, 2017), como por propagandas
institucionais.
Diante do reiterado envolvimento de corporações com o crime ambiental, foi
cunhada a expressão greenwashing ou greenwash, que pode ser definida como a divulgação
117

seletiva de informações positivas sobre o desempenho ambiental ou social de uma empresa,


sem a divulgação completa de informações negativas sobre essas dimensões, de modo a criar
uma imagem corporativa excessivamente positiva (LYON; MAXWELL, 2011). As
corporações que querem ser vistas como éticas, mas têm muito a esconder, buscam lavar suas
reputações quanto às violações ambientais (greenwash) ou afirmam perante a ONU promover
práticas sustentáveis, nos âmbitos ambiental, trabalhista, dos direitos humanos e do combate à
corrupção, na chamada lavagem azul (bluewash) (LAUFER, 2006, p. 11/12).
Budó (2017) esclarece que são práticas de greenwash (ou greenwhasing) pelo
agronegócio a negação do atraso das relações sociais e produtivas no campo, apesar de ele
estar cotidiana e historicamente associado a práticas violentas contra trabalhadores, assim
como a “tentativa de expressar o elemento ‘modernização’ à descrição do ‘agro’, te[ndo]
claramente a intenção de exaltar o agronegócio, em um processo simbólico de legitimação a
permitir apoio popular às demandas da chamada ‘Frente Parlamentar da Agropecuária’.
Há um discurso liberal que foca em questões mais aparentes, manifestando­se de
forma vazia sobre responsabilidade corporativa, perdendo dados importantes sobre o
significado simbólico e os motivos por trás de algumas iniciativas éticas. Veja­se a indústria
do tabaco, que já se situou como penúltima em pesquisas de integridade, e atualmente as
lidera, levantando preocupações óbvias. Questiona­se se a ética empresarial, para algumas
corporações, seja pouco mais do que um esforço para expiar a culpa, comprando uma alma
corporativa. Essa limpeza de reputações se dá, por exemplo, mediante divulgações sociais
para legitimar o lugar das corporações na sociedade, alterando percepções, mudando
expectativas externas, encorajando e desencorajando novas regulamentações, em um
incontável uso instrumental de divulgações (LAUFER, 2006, p. 157­160). Daí que se faz
possível associar o greenwashing ou greenwash com a categoria da violência cultural, dentro
da tipologia galtunguiana (BUDÓ, 2017; ANDRADE, 1999).
É necessário considerar, para fins de caracterização da violência do ponto de vista
galtunguiano, que “as realidades da oferta e da demanda do cotidiano são estruturadas a fim
de garantir uma taxa de exploração consistente com as exigências da acumulação”
(HARVEY, 2013, p. 227; também: MARX, 2017, p. 670). A dinâmica de acumulação
ilimitada do capital é uma das características de definição do capitalismo, o qual “é peculiar
por ter uma direcionalidade ou um impulso sistêmico objetivo: a acumulação de capital”
(FRASIER; JAEGGI, 2020, p. 32).
118

Para Mandel (1973, p. 46/47), embora se enfatize a defesa da propriedade privada, o


capitalismo é um destruidor da propriedade privada por concentrá­la mediante um grande
número de expropriações. Enquanto esse sistema seja fundado na livre competição, é essa
mesma liberdade que produz concentração, a saber, o monopólio. Em consequência, o
monopólio, em certos ramos, tem relação com a expansão do capitalismo monopolista em
certos países, transformando alguns países em uma esfera de influência e campo de
investimento de capital (MANDEL, 1973, p. 46/47).
O conceito de dominação econômica (ou imperialismo) também é trabalhado como
uma violência que se expressa no aspecto estrutural entre duas sociedades. Um primeiro ponto
básico sobre interação entre países é a complementariedade, que se orienta de acordo com
vantagens comparativas, mas se seguirem um padrão de troca diferente entre manufaturados e
matérias primas, considera­se assimétrico (GALTUNG, 1981, p. 107). Ademais, a dominação
ou imperialismo se orienta para uma estrutura, sendo inviável a análise de um ator específico,
não se tratando da análise da perversidade de pessoas que fazem uso dessa estrutura
(GALTUNG, 1981, p. 113).
A interação entre dois Estados pode ser simétrica ou assimétrica, em termos do que
cada parte obtém dessa relação, ou seja, seus efeitos, principalmente se a assimetria for
cumulativa. É o que se denomina por efeitos inter­atores (GALTUNG, 1981, p. 113). São
descritos também os efeitos intra­atores como sendo aquelas consequências decorrentes das
interações entre dois Estados geradas dentro de cada qual (GALTUNG, 1981, p. 113).
As interações são estudadas a partir dos fluxos de matérias­primas (commodities),
bens processados, de capital, de serviços financeiros e toda série de bens e serviços que
possam “ser mensurados em pontos de entrada, alfândegas e em bancos nacionais, a menos
que assumam a forma de transferência interna em corporações multinacionais” (GALTUNG,
1981, p. 113). O mais importante, continua o autor, é a comparação dos benefícios da relação
inter­atores, devendo ser levados em consideração, para esse propósito, os efeitos intra­
atores.
Em se tratando da interação entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento,
a troca pode ocorrer – quando majoritariamente não é o caso – pelo comércio de, por
exemplo, petróleo cru, que é uma commodity não processada, e tratores, um bem altamente
industrializado. Nessa relação de comércio, há um efeito negativo intra­atores para ambos os
países, como o esgotamento do petróleo para um e a poluição para outro, por exemplo.
Repara­se, por importante, que os efeitos positivos para o país desenvolvido (aquele que
119

exportou tratores) serão mais relevantes (GALTUNG, 1981, p. 113). É necessário perquirir os
efeitos de empobrecimento e de enriquecimento que a exploração de determinada matéria­
prima causa na sociedade, principalmente levando em consideração os efeitos intra­atores,
que podem influenciar negativamente a economia e a política, em questões militares, sociais,
culturais e comunicacionais (GALTUNG, 1981, p. 115/116).
Para o autor, os países desenvolvidos possuem uma estrutura socioeconômica que
permite absorver, converter e redimensionar os efeitos negativos intra­ator com o máximo de
impacto benéfico, o que se denomina por efeito spin­off. O grau de processamento do bem
comercializado é a variável básica por trás desse efeito (GALTUNG, 1981, p. 115/116).
O fenômeno de dominação, com efeitos positivos e negativos, inter e intra­atores,
pode ser representado no seguinte esquema:

Quadro 2: Interação entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento

A (“país desenvolvido”)60 B (“país em desenvolvimento”)61

Efeitos Inter­
62
Efeitos Intra­Atores63 Efeitos Inter­Atores Efeitos Intra­Atores
Atores

Positivo Matérias­primas65
64
Spin­off Bens manufaturados Pouco ou nada 66
(dentro) (commodities)

Negativo Bens Poluição, Matérias primas Esgotamento,


(fora)67 manufaturados68 Exploração69 (commodities) Exploração70
Fonte: GALTUNG, 1981, p. 114. Traduzido e adaptado pelo autor

60
“A (‘developed’)” (GALTUNG, 1981, p. 114).
61
“B (‘developing’)” (GALTUNG, 1981, p. 114).
62
“Inter­actor effects” (GALTUNG, 1981, p. 114).
63
“Intra­actor effects” (GALTUNG, 1981, p. 114).
64
“Positive (in)” (GALTUNG, 1981, p. 114).
65
“Raw materials” (GALTUNG, 1981, p. 114).
66
“Little or nothing” (GALTUNG, 1981, p. 114).
67
“Negative (out)” (GALTUNG, 1981, p. 114).
68
“Manufactured goods” (GALTUNG, 1981, p. 114).
69
“Pollution, Explotation” (GALTUNG, 1981, p. 114).
70
“Depletion, Explotation” (GALTUNG, 1981, p. 114).
120

Um comércio em igualdade de condições ou simétrico, para o autor, pode ser


definido como aquele em que os efeitos inter­atores e intra­atores totais que revertem para as
partes são também iguais (GALTUNG, 1981, p. 117). Um ponto é muito claro para o autor: a
assimetria não pode ser corrigida apenas com a regulação de preços de matérias­primas, como
uma forma de compensar os efeitos intra­atores:

É claro que existem preços que poderiam, na superfície, compensar a lacuna nos
efeitos intra­atores, convertendo dinheiro em um desenvolvimento correspondente
das indústrias subsidiárias: a indústria da educação, a indústria do conhecimento, e
assim por diante. Muito disso é o que os países produtores de matéria­prima podem
fazer com o dinheiro que ganham. Mas isto não é o mesmo. É preciso ser forçado a
um certo padrão de desenvolvimento intra­atores para poder participar da interação
inter­atores, e muito mais para ser livre para tomar a decisão sem ter que fazê­lo,
sem ser forçado por toda a máquina social. É difícil ver como a psicologia da
autonomia pode ser comprada por dinheiro (GALTUNG, 1981, p. 117)71.

No que concerne à incorporação da América Latina ao sistema capitalista, tem­se a


sua formação nos três primeiros quartos do século XIX como produtora de matérias­primas e
como consumidora de parte da produção industrial europeia, notadamente da inglesa. No
último quarto do século XIX, a Alemanha e os Estados Unidos se projetam para o exterior,
sendo este último muitas vezes em choque com interesses político­econômico britânicos. Os
países onde o capitalismo apresentou certa infraestrutura econômica e concentração de
unidades produtivas, gerados pela prévia acumulação de capital, deram lugar ao surgimento
dos monopólios. A esses países, dá­se o nome de países centrais (MARINI, 2017, p. 47­49).
A divisão internacional do trabalho conduz ao predomínio da grande indústria,
concentrando a economia em sua função, principalmente estrangeira, e ao domínio
monopolista do mercado, em uma fase que se denomina de capitalismo monopolista. Não
obstante um processo de oligopolização ou de concorrência imperfeita, essa concentração se
dá também em âmbito financeiro por meio de holdings e por organizações financeiras que as
controlam no âmbito acionário. No caso do controle financeiro da economia brasileira, em
última análise, visualiza­se que a mesma está sob controle dos principais grupos econômicos,
inclusive com o controle da terra, com tendência de agudização da concentração (SANTOS,
T., 2018, p. 111­114). Há a compreensão de que os países capitalistas desenvolvidos e os

71
No original: “Of course, prices exist that could, on the surface, compensate for te gap in intra­actor effects,
converting money into a corresponding development of subsidiary industries: the education industry, the
knowledge industry, and so on. Much of this is what raw­material­producing countries can do with the money
they earn. But this is not the same. It is on thing to be forced into a certain pattern of intra­actor development in
order to be able to participate in the inter­actor interaction, quite another to be free to make the decision whitout
having to do it, whithout being forced by the entire social machinery. Ths, it is hard to see how the psychology
of autonomy can be bought for money”.
121

periféricos estruturam uma mesma unidade histórica, tornando possível o desenvolvimento de


uns e o atraso de outros (BAMBIRRA, 2019, p. 44).
Enquanto os países centrais estão associados ao mercado mundial de maneira
dinâmica, as principais atividades de exportação dos países dependentes estão sob o controle
de classes dominantes locais, sendo o excedente todo reinvestido nesse mesmo setor
econômico. Essa lógica econômica, com maior ou menor dependência, criou nos países
latino­americanos ao longo do século XIX e do início do século XX uma economia
especializada na produção de poucos bens primários (MARINI, 2017, p. 49­52). Trata­se de
uma estrutura econômica que se organiza como seção descentralizada do capitalismo
hegemônico, orientada para satisfazer a demanda externa (RAMOS, 1965, p. 79).
Há também na teoria social o modelo explicativo do Sul Global (e seu termo
complementar e que lhe opõe: o Norte Global), para incorporar novos sentidos e significados.
O Sul Global aparece com mais força na década de 1990, quando as mudanças
globais após a Queda do Muro de Berlim fazem perder a importância do termo “terceiro
mundo”, haja vista o também desaparecimento do “segundo mundo”. Nesse período, há um
impulso geral para a integração mundial e o esmaecimento da luta anti­imperialista. Apesar da
não exata correspondência geográfica, há um senso geral de que os países que compreendem
o Sul Global possuem os mesmos problemas e objetivos, sem negar que há diferenciação
entre os mesmos, inclusive em termos de desenvolvimento, endividamento etc.
(BRAVEBOY­WAGNER, 2009, p. 2/3).
A noção de Sul para Boaventura de Sousa Santos (2007; 2019, p. 17/18) possui uma
parcial correspondência com o sul geográfico, onde predominou o colonialismo histórico,
perfazendo danos que resultam desse passado, sobretudo no domínio do conhecimento, da
epistemologia:

A emergência do ordenamento da apropriação/violência só poderá ser enfrentada se


situarmos nossa perspectiva epistemológica na experiência social do outro lado da
linha, isto é, do Sul global, concebido como a metáfora do sofrimento humano
sistêmico e injusto provocado pelo capitalismo global e pelo colonialismo
(SANTOS, B., 2007).

As epistemologias do Sul importam na identificação e na valorização da dimensão


cognitiva das lutas de resistência de opressão e contra o conhecimento que legitima essa
122

opressão, referindo­se, assim, aos conhecimentos que surgem nesse contexto das lutas sociais
e políticas (SANTOS, B., 2019, p. 18).
A América Latina, como integrante do Sul Global, é marcada pelo extrativismo há
mais de 500 anos, que não deixou de existir mesmo com o fim da colonização, nem sequer
com a alternância entre governos progressistas e neoliberais, mais proximamente. Com a
globalização e a estruturação da economia­mundo, o sistema capitalista consolida a
acumulação primário­exportadora como um dos seus elementos fundacionais, orientada pela
demanda dos centros capitalistas (ACOSTA; BRAND, 2018, p. 35­38), causando vantagens
comparativas:

[...] algumas regiões se especializaram em extrair e produzir principalmente


matérias­primas, enquanto outras – sobre a base custos comparativos dinâmicos e
economias de escala crescentes – passaram a produzir manufaturas e concentraram,
desde então, capital e poder, assim como conhecimento científico e tecnológico,
inclusive utilizando­se dos recursos naturais de países que acabaram empobrecidos
devido justamente à maneira como foram inseridos no mercado mundial (ACOSTA;
BRAND, 2018, p. 38).

Destarte, não haveria um “extrativismo bom” e um “extrativismo ruim”, dado que o


extrativismo é “um conjunto de atividades de extração maciça de recursos primários para a
exportação, que, dentro do capitalismo, se torna fundamental no contexto da modalidade de
acumulação primário­exportadora” (ACOSTA; BRAND, 2018, p. 51). Isso torna possível
inter­relacionar o extrativismo com aspectos típicos do subdesenvolvimento, como
desigualdades na distribuição de riqueza, crescente empobrecimento da população, em
oposição à concentração de renda; má gestão do Estado e uma destacada arbitrariedade
burocrática (o autoritarismo é quase uma norma); escassos gastos em políticas sociais; entre
outros (ACOSTA; BRAND, 2018, p. 51­53).
O conceito de violência cultural delineado por Galtung é também ponto de partida
para investigar a violência estrutural e direta que se desenvolve a partir de relações
econômicas e socioambientais assimétricas entre países do Norte Global, com suas grandes
corporações, e os países do Sul Global, que propiciam recursos naturais em abundância. Em
tais relações, a falta de regulação e controle pode ser entendida como parte dessa violência
estrutural invisível; além disso, o dano produzido pode ser considerado criminoso. As
relações econômicas assimétricas, portanto, podem ser explicadas como relações comerciais
desviantes e criminosas nas quais corporações e países industrializados participam de uma
123

empresa conjunta de exploração, uma empresa que causa danos de grande magnitude
(BÖHM, 2020).
Nesse ponto, o crescimento histórico do capitalismo em âmbito global expande sua
produção – e consequentemente a poluição e a exploração de recursos naturais – com o fito de
promover o lucro corporativo. Em se tratando de trocas econômicas globais entre países do
Norte e Sul, percebe­se que as trocas econômicas são desiguais, principalmente à vista das
pegadas de extração e de consumo entre os mesmos, o que contribui para a fenda metabólica
(LYNCH, 2020), cujo conceito vai ser explorado a seguir.
A partir desse referencial teórico é que se compreende a exploração do agronegócio
no Arco do Desmatamento da Amazônia, tanto nos níveis ambiental, ecológico e climático,
como para as consequências nos seres humanos, diretas e indiretas.
Sem embargo da tipologia apresentada, há uma violência que opera no âmbito
relacional entre ser humano e natureza, o que é feito nas categorias de metabolismo social e
ruptura metabólica. Em outras palavras, as trocas econômicas globais (capitalistas) se
operacionalizam de tal forma desigual e destrutiva à natureza e ao ser humano, que também
interessam à criminologia.
Sob essa perspectiva, podem ser amealhados elementos para indicar como a
violência, que se realiza nas esferas estrutural, direta e cultural, interfere no metabolismo
social e provoca uma fenda no metabolismo dos seres humanos com a natureza.

3.1.2 Metabolismo social e ruptura metabólica

“A história do homem sobre a Terra é a história de uma ruptura progressiva entre o


homem e o entorno” (SANTOS, M., 2013, p. 17/18), que se acelera com o início da
mecanização e a tecnociência, aparecendo uma natureza artificializada na história humana. O
ser humano se torna um fator geológico, geomorfológico, climático, e a ação antrópica tem
efeitos continuados e cumulativos graças ao modelo de vida adotado pela humanidade. Dessa
maneira, o relacionamento entre ser humano e natureza adquire um caráter de hostilidade, de
contraposição, que se objetiva em uma dada base territorial (SANTOS, M., 2013, p. 17/18).
A reflexão de Milton Santos auxilia e refletir, de um lado, sobre os efeitos
catastróficos sobre o modelo de sociabilidade atualmente adotado pela humanidade,
atualmente na perspectiva do Antropoceno (CRUTZEN, 2002; STEFFEN et al., 2011;
124

HAMILTON, 2014), e de outro lado, na relação de violência e antagonismo do ser humano


com o meio ambiente.
O termo metabolismo foi introduzido por fisiologistas alemães para se referirem a
trocas materiais intracorporais, sendo logo empregado na noção de processo metabólico na
decomposição de tecidos72. No desenvolvimento da bioquímica, o metabolismo emerge como
um conceito­chave nas discussões científicas acerca da conservação e troca de energia e
posteriormente na abordagem da interação dos organismos com seus ambientes (FOSTER,
2000, p. 159/160).
Conquanto o conceito de metabolismo seja amplamente aplicado na biologia e na
bioquímica, há discussões quanto à sua utilização para além desses campos científicos. Trata­
se de um debate entre reducionismo versus holismo: as populações (ou seja, os membros
interconectados de uma espécie), as comunidades (o total de organismos vivos em um
ecossistema) ou os ecossistemas (os organismos e os fatores inorgânicos efetivos em um
habitat) possuem um grau de integração sistêmica comparável aos organismos individuais? A
teoria da evolução pode ser igualmente aplicada a populações, comunidades ou ecossistemas?
Por esses motivos que a utilização do termo metabolismo para um sistema composto por
inúmeros organismos poderia ser contestada na biologia (FISCHER­KOWALSKI, 1998).
De outro lado, indaga­se se existem nas comunidades bióticas controles, ciclos de
feedback mediados por informações ou mecanismos evolutivos trabalhando no nível de
sistemas como tal. Nesse particular, é amplamente aceito na biologia que comunidades
bióticas e ecossistemas tenham propriedades auto­organizadas que lhes permitam otimizar a
utilização de energia e nutrientes (FISCHER­KOWALSKI, 1998).
Nesses padrões, os seres humanos mantêm um metabolismo como qualquer outro
animal, extraindo sua energia de compostos orgânicos complexos (alimentos) que foram
(direta ou indiretamente) sintetizados pelas plantas a partir (principalmente) do ar e da água,
utilizando a energia do sol. A taxa metabólica dos seres humanos será aproximadamente
determinada pelo peso corporal e, de forma qualitativa, pela fisiologia. Para que os seres
humanos possam sobreviver e se reproduzir, eles devem ser capazes de sustentar seu
metabolismo, fazendo­o, por serem animais sociais, coletiva e cooperadamente (FISCHER­
KOWALSKI, 1998).

72
“Metabolismo é o conjunto de reações químicas realizadas pelas células dos seres vivos para sintetizar
substâncias complexas a partir de outras mais simples, ou para degradar complexas e obter simples” (GARCÍA;
CARRIL, 2009, tradução livre).
125

Foram Marx e Engels que aplicaram a ideia de metabolismo social à teoria social, os
quais estudaram o trabalho humano e a apropriação de substâncias naturais às necessidades
humanas; à troca de matéria entre ser humano e natureza, fundamentalmente. Essa noção
marxiana não era metafórica, mas implicava troca material que gera uma interdependência
mútua (FISCHER­KOWALSKI, 1998). Afirma­se que o conceito de metabolismo social é
capaz de conectar o corpo humano e suas necessidades, os estilos de vida e as diferenças entre
os modos de produção (FISCHER­KOWALSKI, 1997).
O metabolismo social é objeto de estudos econômicos sobre o fluxo de recursos
naturais ou energia, uma vez que são os seres humanos que extraem ou removem os materiais
da natureza, de tal forma que toda a utilização de recursos materiais pode causar impactos
ambientais significativos (MARTÍNEZ­ALIER; JUSMET, 2013).
A abordagem do metabolismo social de um sistema social significa olhar para sua
economia em termos de estoques e fluxos biofísicos, sendo o metabolismo o processo pelo
qual um organismo constrói e mantém suas estruturas por meio da troca de energia e materiais
com seu ambiente ao longo de sua vida. Os autores relacionam a economia em termos
biofísicos (fluxo de energia) em termos monetários, de modo a observar estoques e fluxos,
reciclagem, resíduos e emissões, e quão grandes são os fluxos que serão necessários para
manter os estoques da sociedade no futuro. Há ainda, continuam os autores, a vantagem
conceitual de recorrer às leis das ciências naturais para modelar as interrelações:
termodinâmica, a lei da conservação da matéria, relações técnicas entre massa e energia, mas
também relações biológicas e bioquímicas que permitem a determinação de processos
metabólicos de plantas, animais e humanos, ajudam a construir modelos causais para cruzar
observações, preencher lacunas de dados, encontrar interpretações alternativas plausíveis para
observações e responder, por exemplo, questões relativas a desenvolvimentos futuros
(FISCHER­KOWALSKI; HABERL, 2015, p. 100/101). Em consequência, essa construção
teórica tem a potência de preencher as lacunas entre ciências naturais tipicamente distantes,
como por exemplo climatologia, epidemiologia médica e hidrologia (FISCHER­KOWALSKI,
1997, p. 16­22).
Marx desenvolveu o conceito de metabolismo social, trazendo para a economia e
para a sociologia fenômenos descobertos no campo da conservação de energia, especialmente
pela descrição e conceito quanto ao metabolismo entre os organismos em termos de
termodinâmica (FOSTER, 2012).
126

Desse modo, “dentro do contexto da energia e dos materiais, atribui­se grande valor
às leis da termodinâmica, especialmente à segunda (a da entropia)” (MELO, 2017, p. 355),
sendo principalmente utilizado o conceito nas relações entre economia e natureza (LEFF,
2006, p. 175) em um cenário de mudanças climáticas, visto que:

Os limites do crescimento económico são estabelecidos pela lei­limite da entropia,


que rege os fenómenos da natureza e conduz o processo irreversível e inelutável da
degradação da matéria e da energia no universo. A Terra não escapa densa lei
universal; mas, nesse minúsculo ponto de nossa galáxia, tal processo é acelerado
pela imposição de uma racionalidade económica que incrementa e magnifica a
transformação da matéria e da energia de baixa entropia a estados de alta entropia,
cuja manifestação mais clara, na atualidade, é o aquecimento global do planeta
(LEFF, 2006, p. 176)

Nesse sentido, é importante pontuar que há uma “escassez crescente de recursos


naturais e de demanda cada vez mais significativa por energia, [tornando] a questão da
inevitabilidade das consequências da entropia [...] de suma importância” (MELO, 2017, p.
362)
O autor da obra Manuscritos Econômico­Filosóficos, de 1844, já percebia a relação
de interdependência física e mental entre natureza e ser humano:

O homem vive da natureza significa: a natureza é o seu corpo, com o qual ele tem de
ficar num processo contínuo para não morrer. Que a vida física e mental do homem
está interconectada com a natureza não tem outro sentido senão que a natureza está
interconectada consigo mesma, pois o homem é uma parte da natureza (MARX,
2010a, p. 84)

Em O Capital, de 1867, ao relacionar a grande indústria e a agricultura, explica­se


que o capitalismo aplicou um método de produção racional e tecnológico, com o uso de
maquinaria, retirando o camponês da terra, fazendo predominar a população urbana. Se de um
lado essa população urbana se torna cada vez mais uma força motriz da transformação social,
de outro lado, desvirtua­se o metabolismo entre o homem e a terra, “isto é, o retorno ao solo
daqueles elementos que lhe são constitutivos e foram consumidos pelo homem sob forma de
alimentos e vestimentas, retorno que é a eterna condição natural da fertilidade permanente do
solo” (MARX, 2017, 572­574).
Em consequência, destrói­se “tanto a saúde física dos trabalhadores urbanos como a
vida espiritual dos trabalhadores rurais” (MARX, 2017, p. 572/573). Marx percebe que a
destruição do metabolismo do homem com a terra e a destruição do próprio solo ocorre
naturalmente pelo capitalismo, significando que todo progresso na agricultura capitalista
127

significa “saquear não só o trabalhador, mas também o solo, pois cada progresso alcançado no
aumento da fertilidade do solo por certo período é ao mesmo tempo um progresso no
esgotamento das fontes duradouras dessa fertilidade” (MARX, 2017, p. 576). Percebe­se que
há sinais de preocupação das condições bioquímicas e energéticas que a produção capitalista
pode causar à natureza e ao ser humano.
Para entender essa crítica que surge da ecologia política, reconhece­se que o trabalho
e o processo de produção designam, em última análise, uma relação de metabolismo entre ser
humano e natureza, tendo em vista que uma definição primária de socialismo/comunismo para
Marx era uma sociedade em que os produtores associados pudessem governar o metabolismo
humano com a natureza de forma racional, utilizando o mínimo de energia possível,
incorporando concepções termodinâmicas no entendimento de economia e sociedade
(FOSTER, 2012). Assim, a produção de mercadorias mediada pelo trabalho, portanto, é a
forma pela qual se dá a interação metabólica entre ser humano e natureza.
Muito embora não sejam utilizados os termos “entropia” ou “termodinâmica” n’O
Capital, os quais seriam introduzidos na comunidade científica no final do século XIX (e,
portanto, à morte de seu autor), já se trabalhavam conceitos de energia, à vista da citação do
filósofo Lucrécio para evocar o princípio da conservação: “nil posse creari de nihilo” (do
nada não se pode criar nada) (BURKETT; FOSTER, 2006; MARX, 2013, p. 953).
De outro lado, recusa­se a abraçar o reducionismo relacionado à interdependência
entre ser humano e natureza que, embora não sejam independentes em questões de energia,
não podem ser reduzidos tão somente a ela (BURKETT; FOSTER, 2006).
É possível extrair dessas passagens um conceito de fenda ou ruptura na interação
metabólica entre o ser humano e a terra, em cuja contradição se desenvolve a indústria e a
agricultura em grande escala sob o capitalismo (FOSTER, 2000, p. 155).
Posteriormente a O Capital e ao falecimento de seu autor, na Dialética da Natureza,
mas tomando certamente por base a complexa interação da relação ser humano e natureza,
anteriormente já teorizada, Engels descreve consequências catastróficas do trabalho humano:

Não fiquemos demasiado lisonjeados com nossas vitórias humanas sobre a natureza.
Esta se vinga de nós por toda vitória desse tipo. Cada vitória até leva, num primeiro
momento, às consequências com que contávamos, mas, num segundo e terceiro
momentos, tem efeitos bem diferentes, imprevistos, que com demasiada frequência
anulam as primeiras consequências. As pessoas que acabaram com as florestas na
Mesopotâmia, na Grécia, na Ásia Menor e em outros lugares para obter terreno
cultivável nem sonhavam que estavam lançando a base para a atual desertificação
128

dessas terras, retirando delas, junto com as florestas, locais de acúmulo e reserva de
umidade. Quando consumiram na encosta dos Alpes os bosques de pinheiros que
eram cultivados com tanto cuidado na encosta norte, os italianos não desconfiaram
de que estivessem cortando pela raiz a produção de laticínios de sua região;
desconfiaram menos ainda de que, desse modo, estivessem drenando a água de suas
fontes montanhosas durante a maior parte do ano, para que, na época das chuvas,
pudessem derramar torrentes tanto mais caudalosas sobre a planície (ENGELS,
2020, p. 347/348).

Isso significa que o roubo ou destruição do solo não se limitou, naturalmente, apenas
à natureza externa, uma vez que humanos, como seres corpóreos, são também parte da
natureza. A expropriação da natureza na sociedade capitalista teve como contrapartida, na
análise marxiana, portanto, a expropriação da natureza corporal humana, sugerindo que o
roubo e a fenda no metabolismo da natureza também são uma ruptura no metabolismo
humano, que são visíveis nas muitas formas de trabalho escravo, nas condições de reprodução
social de família patriarcal, nos impactos físicos destrutivos e na perda dos poderes vitais dos
seres humanos (FOSTER; CLARK, 2020, p. 8).
O capitalismo provoca uma falha, ou ruptura metabólica (metabolic rift), no
processo de produção, dado que a expropriação da natureza é ao mesmo tempo a expropriação
dos próprios corpos humanos, resultando que a “ruptura ecológica é, portanto, também uma
ruptura corpórea, refletindo a interdependência do metabolismo social, que liga o ser humano
à natureza e à sua organização corpórea própria” (FOSTER; CLARK; 2020) 73.
O metabolismo do homem com a natureza somente pode ser entendido pela categoria
trabalho, segundo a qual o processo do trabalho é aquele no qual o homem, por suas próprias
ações, medeia, regula e controla o metabolismo entre ele e a natureza (MARX, 2017, p. 255).
O trabalho, em Marx, não é tão somente meio de vida ou uma forma de obtenção de recursos
para manter­se a si próprio e sua família, mas, ao contrário, é “uma condição de existência do
homem, independente de todas as formas sociais, eterna necessidade natural de mediação do
metabolismo entre homem e natureza e, portanto, da vida humana” (MARX, 2017, p. 120).
Há também variações climáticas globais não provocadas pelo ser humano, como
variações de atividades vulcânicas, variação da intensidade solar, variações da excentricidade
da órbita terrestre, os efeitos do El Niño e La Niña, por exemplo, sendo também “bem
documentados sobre as oscilações climáticas na Amazônia ocorridas durante as glaciações e
também de variações mais recentes da temperatura local” (NOBRE, C. et al., 2007). Para tais
tendências e contra tais efeitos há pouco a ser feito quando houver possibilidade de previsões

73
No original: “The ecological rift is thus also a corporeal rift, reflecting the interdependent character of the
social metabolism, which connects human beings with nature and their own corporeal organization”.
129

científicas (NOBRE, C. et al., 2007). Diante disso, o ser humano pode agir de forma – como
uma independência compulsória – a não afetar o equilíbrio ecológico dinâmico.
Nesse particular, a construção metodológica do metabolismo social oferece
perspectivas para uma teoria filosófica holística e interdisciplinar para a análise do problema
ambiental, sendo necessária uma explicação para o processo histórico por meio do qual se
separa (aliena­se) a existência humana dos condicionantes naturais para se reproduzir, e não
um esclarecimento para a unidade do ser humano com a natureza externa (FOLADORI,
2001).
O capitalismo supõe uma divisão entre o domínio natural, tido como fornecedor
gratuito e não produzido de matérias­primas disponíveis para apropriação, e o domínio
econômico, concebido como a esfera do valor, produzida por e para humanos. Esse
rompimento metabólico se relaciona com o Antropoceno e é explicado, sinteticamente:

O capitalismo separou brutalmente seres humanos desses últimos ritmos,


recrutando­os à manufatura industrial abastecida por combustíveis fósseis e à
agricultura orientada ao lucro, alimentada por fertilizantes químicos. Introduzindo
uma “ruptura metabólica”, inaugurou o que cientistas chamam hoje de
“Antropoceno”, uma era geológica inteiramente nova em que a atividade humana
tem impacto decisivo nos ecossistemas e na atmosfera da Terra. Na verdade, esse
termo é enganoso, uma vez que o principal culpado não é a “humanidade”, e sim o
capital. Os efeitos, todavia, são reais o suficiente. Após três séculos de predações do
capital, coroadas pelo ataque atual do neoliberalismo ao que restou dos bens
ecológicos comuns, as condições naturais para a acumulação se tornaram agora um
foco central da crise capitalista (FRASER; JAEGGI, 2020, p. 52/53).

Sugere­se, em tal concepção, que os últimos séculos seriam a “era do capital”, logo a
questão não seria o Antropoceno, mas o Capitaloceno. Em consequência, não se trataria
apenas da “era do homem”, pois o modo de produção capitalista possui relações mais
enraizadas entre acumulação, poder e natureza (MOORE, 2014).
Há uma contradição entre a natureza e a ecologia com o capital, além da exploração
da força de trabalho. A natureza é negada pela racionalidade econômica do capitalismo, que é
“externacionalizada” pelo capitalismo (LEFF, 2012, p. 105). Não por outro motivo, “o
capitalismo é intrinsecamente antiecológico”, em que, consequentemente, a “irrupção da crise
ambiental não apenas tornou consciente a [...] inconsciente contradição entre capital e
natureza, ao menos na visibilidade de seus custos ecológicos e de seus efeitos nos novos
enfoques teóricos da economia ambiental e ecológica e no ecomarxismo”. (LEFF, 2012,
105/106).
130

Luiz Marques (2018, p. 560­562) aduz a impossibilidade concreta de o capitalismo


ser sustentável, o que defende com base em três aspectos. Em primeiro, afirma­se que o
descolamento ou desassociação (decoupling74) poderia diminuir a pressão sobre ecossistemas
por produto, mas “não diminui em termos absolutos, já que o número de produtos não cessa
de aumentar em escala global”, à medida que o aumento da eficiência energética é anulado
pela expansão da produção; e não há economia circular ou “ecoeficiente”, visto que
“nenhuma economia, e tanto menos uma economia global prisioneira do paradigma da
expansão, pode furtar­se à segunda lei da termodinâmica”, notadamente o entendimento da
poluição em termos energéticos. Para se diminuir o impacto ambiental do capitalismo, haveria
a necessidade de redução da produção e de consumo de energia, o que é incompatível com
esse modelo que exige expansão global. Em segundo, aduz­se que “a escassez crescente de
recursos naturais redunda em agravamento do impacto ambiental da atividade econômica”.
Em terceiro, defende­se que não seria possível que as corporações internalizassem os custos
dos danos ambientais crescentes, pois o valor total gerado pela atividade é frequentemente
inferior ao valor econômico da natureza destruída pela atividade (MARQUES, L., 2018, p.
560­562).
O capitalismo cresce e se difunde geograficamente, mediado por trocas de
mercadorias e de dinheiro, pela formação do trabalho assalariado e pela acumulação
(primitiva), induzindo migrações de mão de obra e circulação do capital como um todo
(HARVEY, 2013, p. 526). Em termos dinâmicos, esse movimento temporal do capital é
destrutivo e se “revoluciona constantemente, derruba todas as barreiras que impedem o
desenvolvimento das forças produtivas, a ampliação das necessidades, a diversidade da
produção e a exploração e a troca das forças naturais e espirituais” (MARX, p. 442).
A título de exemplo, argumenta­se que a abordagem do metabolismo social é
importante para compreender e explicar as razões biofísicas da ocorrência da crise de
resíduos, na medida em que “a perspectiva sobre os fluxos de energia e materiais, mostra­se
uma importante ferramenta para a descrição, a análise e a compreensão dos problemas
ambientais e de sustentabilidade nos níveis micro e macro” (POPPE, 2018, p. 54)
Ademais, o metabolismo social é uma ferramenta conceitual apropriada para a
biofísica da economia e, portanto, a contribuição dos processos econômicos para o consumo e

74
O termo decoupling foi criado pelo PNUMA, em 2011, para se referir a inevitável necessidade de se
desacoplar/desassociar o crescimento econômico ao consumo de recursos naturais, priorizando, para tanto, a
produtividade (“fazer mais com menos”) mediante investimentos maciços em inovação tecnológica, financeira e
social (PNUMA, 2011).
131

esgotamento dos recursos naturais, cujo alcance é aumentado com a análise da economia
política e ecologia da extração, uso e disposição de recursos. As percepções do metabolismo
social e da ecologia política permitem estabelecer ligações entre o uso de material e energia
por atores sociais e os impactos ambientais experimentados por outros, muitas vezes em
locais geograficamente distantes, e compreender a resistência a esses efeitos, que muitas
vezes assumem a forma de conflitos socioambientais (MURADIAN et al., 2012).
A construção teórica do metabolismo social pode ser igualmente adequada para uma
abordagem sistêmica na proteção de processos ecológicos e de ecossistemas complexos. Em
caso prático, sugere­se a incorporação de aspectos de governança de fluxos energéticos para
atendimentos dos interesses humanos e não humanos envolvidos nos ecossistemas da Lagoa
da Conceição, em Florianópolis, Santa Catarina. Explica­se que:

Nesse sentido, uma abordagem sistêmica de governança e de proteção integral


representa o panorama ideal para a salvaguarda dos interesses de todos os seres e
ecossistemas envolvidos; ou seja, é necessário caminhar rumo a uma governança
moldada a partir da compreensão da interdependência dos sistemas social e natural
presentes no local. Para tanto, propõe­se a adoção da abordagem do metabolismo
social, conceito que engloba todos os fluxos de matéria e energia entre os sistemas
socioeconômico e ecológico, demonstrando que os sistemas sociais e econômicos
não podem ser tratados como sistemas fechados, já que trocam matéria e energia
com o ecossistema para manutenção das atividades humanas (POPE et al., 2021).

A crise ambiental é efeito do pensamento ocidental tal qual é construído, mais


precisamente, é uma crise civilizatória que se apresenta pelo limite do crescimento econômico
e populacional, pelo limite da pobreza e da desigualdade social. Essa crise também reflete a
“disjunção entre o ser e o ente”, abrindo caminho para a racionalidade científica e
instrumental, que produziu um mundo fragmentado e coisificado da natureza (LEFF, 2012, p.
288). Ademais, essa crise se expressa como “um questionamento da ontologia e da
epistemologia com as quais a civilização ocidental compreendeu o ser e as coisas; da ciência e
da razão tecnológica com as quais dominou a natureza e economicizou o mundo moderno”
(LEFF, 2012, p. 288).

O saber ambiental se distingue do pensamento da complexidade que concebeu a


complexidade como um processo de auto­organização da matéria, da qual emerge
uma consciência ecológica que viria completar e recompor o mundo fragmentado e
alienado, herdado dessa civilização em crise, através do pensamento sistêmico
(LEFF, 2012, p. 289).
132

O pensamento fragmentado é refletido na legislação e na governança, cujas


concepções insuficientes e equivocadas se convertem na consumação do dano ambiental
(MARCHESAN, 2019, p. 174/175). Desde a estruturação dos órgãos ambientais, é possível
verificar a inadequação para o enfrentamento da complexidade ambiental, incapaz de lidar
com eficiência para que se impeça a continuidade do dano (MARCHESAN, 2019, p. 174). A
visão fragmentada que promove a construção da legislação ambiental é incapaz de estabelecer
mecanismos coordenados e coerentes para superar os efeitos cumulativos do dano ambiental,
somente possível em uma abordagem sistêmica. Peca­se, ademais, pela inflação legislativa,
sendo às vezes tarefa árdua descobrir a norma vigente, mesmo em tempos de internet
(MARCHESAN, 2019, p. 175).
A concepção do metabolismo social se propõe ecossistêmica, envolvendo os planos
humano e não humano, tanto animal quanto não animais, inclusive se propondo a pensar as
consequências dessas interações. Nesse ponto, deve ser esclarecido que, “promovidas pela
abordagem ecossistêmica, oferecem ao direito uma oportunidade de internalizar uma visão de
mundo promotora da integridade dos ecossistemas, sem descurar da responsabilidade da
espécie humana frente aos cuidados do meio ambiente” (MARCHESAN, 2019, p. 180).

3.1.2.1 Ser genérico

Há na literatura outra interpretação relacional entre o ser humano e natureza, a


categoria do ser genérico, que se faz mais presente no que se compreende como o período da
juventude de Marx, também chamada de idealista. O ser genérico trata de uma discussão
filosófica com alto grau de abstração sobre a essência humana. Infere­se que a história do ser
humano é a da alienação e do estranhamento, ou seja, do afastamento do trabalhador com o
produto do seu trabalho e do próprio ato de produção, que se realiza sobretudo com o capital.
Em consequência, há o despojamento e a falta de identificação com o produto produzido
(KELLER, 2018). A noção do ser genérico trata da superação da alienação/estranhamento e
da “recuperação humana”, em um processo de “desalienação”, tornando­se um “homem total”
(ou ser genérico), de forma a retomar a sua relação consciente com seu gênero e natureza
(KELLER, 2018). Alguns autores, mais recentemente, buscam resgatar essa categoria
marxiana.
133

A partir da guinada paralela à metafísica, à hermenêutica e à fenomenologia de


Capra75, abrangendo uma compreensão sistêmica das diversas dimensões da realidade,
explica­se que a capacidade das potencialidades humanas de se autorrealizarem é dependente
e vinculada à comunidade biótica. Nessa perspectiva, recorre­se ao entendimento de ser
genérico, “cujas qualidades ainda não se realizaram por completo [ou seja], da qual a
humanidade tornou­se fundamentalmente alienada (tanto efetiva quanto potencialmente) por
meio do afastamento da ‘natureza’” (HARVEY, 2020, p. 200/201).
Afirma­se que, apesar do interesse de Marx no autodesenvolvimento e na
emancipação humanos para exercício de poderes criativos, a tradição marxista centrou­se no
empobrecimento da população, sendo certa a crítica dos ecologistas ao “produtivismo” 76
socialista, por reclamar dos socialistas o reexame da problemática (HARVEY, 2020, p. 235).
Nesse ponto, afirma­se que o capitalismo impõe categorias – propriedade privada,
relações de classe e trabalho assalariado, por exemplo – que separam o ser humano da
natureza, bem como de outros humanos. Dito isso, aduz­se que “‘respeitar’ a natureza
equivale a respeitar a nós mesmos. Envolver­se com a natureza e transformá­la significa
transformar a nós mesmos. Isso configura um lado da tese de Marx” (HARVEY, 2020, p.
235/236).
Tendo em vista o estranhamento do ser humano com a natureza, exige­se um novo
envolvimento que lhe permita a formação de uma consciência, dirigida à emancipação e à
autorrealização, tal qual formas emancipatórias de saber, como a ciência (HARVEY, 2020, p.
236).

3.1.2.2 Gaia

75
Ver: CAPRA, F. O tao da física: Uma análise dos paralelos entre a física moderna e misticismo oriental. Ed.
Cultrix, 2020; CAPRA, F. O ponto de mutação. Ed. Cultrix, 2006.
76
Conquanto o marxismo seja constantemente criticado porque possuiria uma perspectiva antiecológica, haja
vista as experiências de inspiração socialista no século 20, há que se fazer algumas distinções. Löwy (2014, p.
25) afirma que Marx e Engels são acusados pelos ecologistas de serem produtivistas. Para o autor brasileiro
radicado na França a acusação não é justificada, visto que “ninguém denunciou tanto quanto Marx a lógica
capitalista de produção pela produção, a acumulação de capital, de riquezas de mercarias como fim em si”. O
autor, de outro lado, demarca sua crítica ao fracasso do socialismo da União Soviética a partir do monopólio das
decisões a uma oligarquia de tecno­burocratas, a qual impôs limites e contradições ao planejamento burocrático
e não realmente democrático para possibilitar um planejamento ecossocialista (LÖWY, 2009).
134

A teoria de Gaia é uma forma de pensar a humanidade e a natureza como um todo


único, um ser vivo, auto­organizador que compreende toda a biosfera (ou parte viva) como
um sistema fisiológico dinâmico que mantém o planeta apto para a vida humana há mais de 3
bilhões de anos (LOVELOCK, 2006, p. 27­32).
A comparação da Terra como um ser vivo é um recurso expressivo, de gênero
metafórico, para explicar a teoria de Gaia:

Achei útil conceber a Terra como parecida com um animal, talvez porque minha
primeira experiência séria em ciência, como estudante de pós­graduação, foi em
fisiologia. Mas isso nunca passou de uma metáfora – uma aide pensée, que não deve
ser levada mais a sério do que o marinheiro que se refere a seu navio como uma
‘mulher’. Até recentemente, nenhum anima específico me vinha à mente, mas
sempre algo grande, como um elefante ou uma baleia. Há pouco tempo, ao me dar
conta do aquecimento global, pensei na Terra mais como um camelo. Os camelos,
ao contrário da maioria dos animais, regulam a temperatura corporal em dois estados
diferentes, mas estáveis. Durante o dia no deserto, quando faz um calor insuportável,
os camelos a regulam perto de 40°C, temperatura bem próxima daquela do ar para
não precisarem esfriar o corpo suando água preciosa. À noite o deserto é frio,
podendo até provocar geada. O camelo perderia muito calor se tentasse permanecer
em 40°C; assim, ele muda a regulação para uma temperatura mais adequada de
34°C, que é quente o bastante. Gaia, como o camelo, tem diversos estados estáveis,
de modo a poder acomodar­se ao ambiente interno e externo mutável (LOVELOCK,
2006, p. 28).

Extrai­se da teoria de Gaia a necessidade de desenvolvimento de um modelo ético


que compreenda a satisfação de necessidades vitais dos seres humanos, sem retornar a um tipo
de vida primitiva e que, a partir de uma reinterpretação do evolucionismo darwiniano, o
equilíbrio planetário será viável com a cooperação e reconhecimento de deveres éticos em
relação a todos os seres vivos, independentemente de sua complexidade enquanto organismo,
sem prejudicar a dignidade humana perante a natureza (GARCÍA RUIZ, 2017, p. 175/176)
Há críticas consistentes quanto à formulação da ideia de Gaia e à sua cientificidade,
censurando a caracterização da Terra como organismo vivo. Diz­se que a teoria de Gaia (i) é
de difícil testabilidade, se não for até mesmo intestável, o que é um dos critérios de
demarcação da ciência (DEANE­DRUMMOND, 1992; KIRCHNER, 1989); e (ii) há uma
intrincada compatibilidade com a teoria da evolução darwiniana, que enfatiza a importância
das populações individuais e da diversidade (DEANE­DRUMMOND, 1992).
Abre­se a possibilidade, todavia, de conceber a cientificidade da hipótese de Gaia de
acordo com uma teoria autopoiética, que concebe um sistema vivo (“o que é vida?”) como
uma unidade fechada no plano organizacional e aberta no plano estrutural, perfazendo uma
rede de componentes que (i) produzem a própria rede e produz seus próprios componentes; e
135

(ii) troca matéria e energia com outros sistemas que se acoplam àquela rede. Um sistema vivo,
nessa concepção, é uma máquina una que se organiza como uma rede de processos de
produção, transformação e destruição de componentes (LIMA­TAVARES et al., 2001).
A “teoria de Gaia olha para a vida de maneira sistêmica, reunindo geologia, micro­
biologia, química atmosférica e outras disciplinas cujos profissionais não estão acostumados a
se comunicarem uns com os outros” (CAPRA, 1996, p. 83).
Reconhece­se que “não é tão fácil pensar em Gaia como sendo viva”, mas, ainda
assim, adere ao entendimento da teoria de Gaia como um sistema autopoiético, na medida em
que “uma função de todos os componentes numa teia alimentar é a de transformar outros
componentes dentro da mesma teia”, em que os componentes de uma teia alimentar morrem,
são decompostos e repostos no próprio processo da rede, mas no sistema planetário em uma
escala de espaço e tempo muito maiores. O sistema autopoiético se confirmaria, segundo o
autor, com o argumento de que a teoria pressupõe a autogeração e a autoperpetuação:

O metabolismo planetário converte substâncias inorgânicas em matéria orgânica


viva, e novamente em solos, oceanos e ar. Todos os componentes da rede de Gaia,
incluindo aqueles de sua fronteira atmosférica, são produzidos por processos
internos à rede [...]. Finalmente, o sistema de Gaia é, evidentemente,
autoperpetuante. Os componentes dos oceanos, do solo e do ar, bem como todos os
organismos da biosfera, são continuamente repostos pelos processos planetários de
produção e de transformação. Então, parece que a probabilidade de Gaia ser uma
rede autopoiética é muito grande (CAPRA, 1996, p. 159/160).

Ao tempo que discutem sobre a aceitação científica da hipótese de Gaia, há que se


reconhecer que as evidências da teoria são fortes. Incomoda, em contrapartida, a dúvida
lançada sobre o modo como a ciência é dividida em um conjunto cômodo de disciplinas, de
maneira reducionista (LOVELOCK, 2010, p. 179).
O subcontinente sul­americano fornece concepções que podem ser estudadas, não
obstante a existência de outros sistemas éticos eventualmente existentes, como Pachamama,
por exemplo, havendo até mesmo um novo movimento constitucional relevante.
Sobre este último caso, emerge o constitucionalismo andino que possui como
expoente a Bolívia, com uma inclinação ambientalista que reconhece o meio ambiente
saudável, protegido e equilibrado como um direito dos humanos, além de se referir a “outros
seres vivos” detentores dos mesmos direitos, habilitando qualquer pessoa a exercer as ações
judiciais de proteção, “o que é a consequência inevitável do reconhecimento da própria
136

natureza como pessoa jurídica, conforme a invocação da Pachamama entendida na sua


dimensão cultural de Mãe Terra” (ZAFFARONI, 2017, p. 87).
Outra referência do constitucionalismo sul­americano é o caso do “Rio Atrato”,
decidido pela Suprema Corte Colombiana, a qual reconheceu que o mencionado curso
hídrico, na região Amazônica, seria considerado sujeito de direito, afastando­se de uma
posição tradicionalmente restritiva na aplicação de direitos constitucionais, para assegurar
direitos constitucionais a um meio ambiente, vida, saúde, nutrição e água saudáveis, inclusive
com repercussão intergeracional, inclusive por seus efeitos climáticos. Esse julgado, além
disso, realiza um progresso marcante na temática das mudanças climáticas, engajando o
discurso decolonial, em que o sistema capitalista separa a natureza da espécie humana
(COLÔMBIA, 2016; ALVARADO; RIVAS­RAMIREZ, 2018).
Como visto, os conceitos de metabolismo social e de ruptura metabólica (FISCHER­
KOWALSKI, 1997; FISCHER­KOWALSKI; HABERL, 2015; FOSTER, 2000; FOSTER;
CLARK; 2020) e a hipótese de Gaia (LOVELOCK, 2006; LOVELOCK 2010; LIMA­
TAVARES et al., 2001) são categorias que auxiliam na compreensão das relações (e dos
processos disruptivos) entre ser humano e natureza.
A ideia de metabolismo social e ruptura metabólica se associam com a construção
teórica do Antropoceno, que se define pela interferência ativa dos seres humanos em
processos que regem a evolução geológica do planeta (CRUTZEN, 2002; STEFFEN et al.,
2011; HAMILTON, 2014).
Na linguagem do Antropoceno também se discorre sobre a Grande Aceleração. Este
momento tem a revolução industrial na Inglaterra do século XIX o seu marco inicial, quando
se realiza a exploração dos combustíveis fósseis, permitindo a expansão e a aceleração das
atividades existentes. Essa mudança é mais clara a partir de 1945, quando a marca da
humanidade no meio ambiente global tem um acentuado aumento, como no salto
populacional, da atividade econômica atrelada ao petróleo (energia barata), da urbanização, da
mobilidade através do automóvel e do avião, emergindo uma economia global integrada e
construída sob princípios econômicos liberais, mas dependentes de parcerias entre governos,
indústrias e universidades. Mais e mais bens públicos foram convertidos em mercadorias e
colocados na economia de mercado, e o imperativo de crescimento rapidamente se tornou um
valor social fundamental que impulsionou as esferas socioeconômicas e políticas. Esse
período é denominado por cientistas como Grande Aceleração (STEFFEN et al., 2011;
HAMILTON, 2014).
137

Com base nesse conhecimento, a degradação ambiental associada ao Antropoceno é


de natureza antropogênica, relacionando­se à forma como o ser humano interage com a
natureza, que o faz por meio de sua organização social, que evolui com a história humana
(SORIANO, 2017).
Isso significa que a crise ambiental está intimamente ligada a uma organização
socioeconômica específica dos seres humanos, qual seja, o capitalismo, muito embora
também sejam documentados desastres ecológicos induzidos pelo ser humano em outras
formações sociais, que se diferenciam pela velocidade e magnitude com que ocorrem, pelo
caráter multifatorial e mecanismos de feedback da crise (SORIANO, 2017).
O pensamento marxiano pode lançar luzes para uma melhor compreensão do
Antropoceno e da crise ecológica e sobre sua relação com o capitalismo, especialmente
porque visa a compreender criticamente o modo de produção capitalista do ponto de vista de
sua totalidade, em que os humanos são uma parte inseparável da natureza, ao mesmo tempo
que ambos são mantidos como categorias em si (SORIANO, 2017).
Por importante, esses conceitos passam a ser estudados, principalmente, sob a ótica
da violência estrutural, abrangendo tanto a violência física e pessoal como a violência que
opera silenciosamente, por meio de fatores mentais até os fatores que trazem miséria,
desnutrição etc., mas, em todos os casos, elementos dificultadores ou impeditivos do
atingimento das plenas potencialidades humanas, o ser genérico. Como mencionado, o
desenvolvimento das plenas potencialidades humanas está intimamente relacionado tanto com
a não realização por completo das qualidades, em razão do afastamento da natureza (ser
genérico), como pela deterioração do corpo humano, em sua saúde e em seu espírito.
Ao se buscar entender, portanto, o relacionamento do ser humano com a natureza em
sua essência, em seus caracteres fundamentais, desde as suas necessidades naturais
(alimentar­se, vestir­se) às suas necessidades sociais (trabalhar, interagir com a natureza),
percebem­se os efeitos violentos que atingem o ser humano, não obstante a mesma violência
ser estendida à natureza.
O metabolismo social entre humanidade e natureza pode ser igualmente representado
na hipótese de Gaia, que a despeito da sua discutível cientificidade e de suas bases não
marxistas, auxiliam na compreensão da vida e de suas relações sistêmicas em um novo
modelo planetário, que obrigam um repensar dentro de uma referência autopoiética. Essa
teoria tem o potencial de chamar a atenção da linguagem de crise e de catástrofe do
138

Antropoceno, cujos efeitos despojam os seres humanos de suas almas – inclusive em termos
culturais, que são estreitamente vinculados ao mundo natural –, e a presença da humanidade
da Terra. A produção organizada no capitalismo que degrada a natureza também se expressa
na expropriação dos próprios corpos dos seres humanos, estabelecendo uma relação de
interdependência, ou seja, em uma ruptura do metabolismo.
Com razão, portanto, Galtung (1990), ao considerar uma quinta categoria de
violência que incorpora a natureza, de forma a considerar que afrontas a esse bem podem
impedir o pleno desenvolvimento das potencialidades humanas, nos planos material e
imaterial (sobrevivência, bem­estar, identidade, liberdade).
Há ainda diversas questões a serem dirimidas sobre essa quinta categoria,
principalmente à vista do viés antropocêntrico das quatro primeiras categorias (sobrevivência,
o bem­estar, a identidade e a liberdade). Ademais não há um posicionamento claro sobre a
ética ou sobre as bases econômicas para a referida categoria.
Diante da quinta categoria galtunguiana de violência que se opera contra a natureza e
da necessária abordagem complementar do metabolismo social, a questão da produção de
danos na Amazônia também pode ser analisada sob o prisma criminológico.
No atual contexto do capitalismo dependente brasileiro, algumas das respostas a
esses questionamentos serão exploradas, com base no arcabouço teórico da Criminologia
Verde e dos Crimes dos Poderosos, os danos praticados por corporações e pelo Estado na
fronteira agrícola que conforma o Arco do Desmatamento amazônico.
Diante da aquisição teórica do metabolismo social, tem­se o conhecimento de que os
danos contra a natureza também podem afetar o ser humano, em suas múltiplas
compreensões, e é sob tal entendimento que os danos ao meio ambiente devem ser
compreendidos.

3.1.3 O dano social sob a perspectiva da Criminologia Verde e dos Crimes dos Poderosos

A vitimização de povos indígenas e tradicionais no Arco do Desmatamento da


Amazônia é comumente analisada sob o prisma do crime, ou seja, conforme o enquadramento
político e legal existente no Código Penal e na legislação extravagante. Podem ser
depreendidos outros crimes cometidos nesse espaço amazônico, como usurpação de terras
públicas, crimes contra a fé pública corrupção e outros.
139

Entretanto, percebe­se que há perda progressiva da cobertura florestal, uma


diminuição importante da biodiversidade e da vultosa emissão de carbono na atmosfera que
ocorrem muitas vezes com a permissão do Estado, senão com a própria participação ou
incentivo. Daí que o conceito de crime, definido por este mesmo Estado, não é suficiente.
As noções de violência, com suas tipologias, bem como a teoria social do
metabolismo social e a degeneração na ruptura metabólica, podem ser agregadas ao conceito
de dano, que é central na discussão da Criminologia Verde.

3.1.3.1 Perspectivas gerais da Criminologia Verde

A Criminologia Verde foi proposta por Lynch (1990) há aproximadamente 30 anos


como um subcampo da criminologia, apesar de reconhecer que não se tratava de uma
perspectiva ou orientação inteiramente nova, dado que refletia tradições críticas existentes.
Posteriormente, foram agregados à agenda da Criminologia Verde estudos envolvendo Justiça
Ambiental e Ecológica (WHITE, 2013), abuso de animais (BERNIE, 1995), crimes contra o
meio ambiente e, mais recentemente, crimes transnacionais (WHITE, 2011).
É de se reconhecer que a Criminologia Verde floresceu em países anglófonos, o que
invariavelmente reflete uma cegueira epistemológica que os acadêmicos e acadêmicas
vivenciam na produção do conhecimento. Sobre cegueira epistemológica, Goyes et al. (2017)
se referem ao fenômeno comum na ciência relacionado à preferência consciente ou
inconsciente por acomodar apenas o que está de acordo com as configurações epistemológicas
e metodológicas existentes, deixando outras possibilidades e dados ignorados (GOYES et al.
2017).
A Criminologia Verde incorpora uma abordagem ecologicamente orientada dentro da
Criminologia, ou seja, “pontos de partida”, como (i) a influência de teorias do desvio, que se
preocupa com rotulagem e estigmatização, imbuindo pesquisadores de uma sensibilidade à
situação de “impotentes sem voz”, o que influenciou a pesquisa sobre questões sobre
especismo, tratamento de povos indígenas e injustiça ambiental; (ii) a incorporação da análise
marxista e da crítica criminológica dos crimes dos poderosos e da desigualdade dentro das
estruturas legais; (iii) o maior interesse pelas ciências naturais; e (iv) o crescimento do
ativismo político (GOYES et al., 2018; GOYES et al., 2017).
140

É importante ressaltar que, ao menos desde o final da década de 1960, há demandas


por respostas criminológicas (verdes) que ambicionavam descrever e analisar os danos,
especialmente buscando fornecer elementos sociológicos diante das injustiças provocadas por
poderosos. Identifica­se na década de 1970 que, a despeito da legislação ambiental – mesmo
não violada –, o dano continuou sendo permitido e produzido; enquanto que, na década de
1980, houve aquisições da Criminologia Crítica (ou marxista), desenvolvendo­se análises de
questões sociais que destacavam os crimes dos poderosos (ou crimes de poder) (GOYES et
al., 2017).
Atualmente, a Criminologia Verde fornece um guarda­chuva sob o qual se torna
possível teorizar e criticar, no âmbito criminal, acerca dos danos ambientais, visto não haver
consenso em diversos pontos. Neste campo teórico, há a compreensão, de forma abrangente,
de que (i) o dano ambiental é prejudicial a seres humanos, ambientes e animais não humanos,
independentemente da legalidade em si; e que (ii) danos ambientais são facilitados pelo
Estado, assim como por corporações e outros atores poderosos, na medida em que essas
instituições têm a capacidade tanto de definir o que é crime ambiental, praticar atos lesivos à
natureza, como também de permitir ou tolerar práticas prejudiciais a ela (WHITE, 2013).
De fato, uma premissa fundamental para a Criminologia Verde é que o crime
ambiental precisa ser definido e estudado em relação aos danos, e não apenas com base nas
definições legais. E há duas principais razões para isso, quais sejam, os danos ambientais
podem ser permitidos ou aceitos pela lei, bem como as definições estritamente legais de crime
contornam questões importantes de poder social e de interesses setoriais e a maneira pela qual
refletem nas definições legais (WHITE, 2018a).
Diante desse ponto de vista amplo, é possível definir a Criminologia Verde como
“campo acadêmico inserido na criminologia e dedicado ao estudo da construção social da
criminalidade ambiental, dos danos socioambientais, dos processos de vitimização ambiental
e da justiça ambiental, através de perspectivas múltiplas” (BUDÓ, 2020). O estudo dos danos
socioambientais, nessa perspectiva, exige a ampliação de fronteiras epistemológicas do crime,
para que se possam incorporar as condutas que sejam danosas ao bem­estar dos humanos, dos
animais e que possam colocar em risco a sobrevivência de ecossistemas (BUDÓ, 2020).
Em virtude da perspectiva mais abrangente de dano, são abertas novas possibilidades
e abordagens criminológicas, notadamente porque o estudo da Criminologia e da Justiça
Criminal “têm sido estudados a partir de uma visão centrada no ser humano e orientada para
concepções filosóficas de justiça relacionadas unicamente com as preocupações e valores
141

humanos” (LYNCH, LONG, STRETESKY, 2019, p. 129)77. Em outras palavras, a


Criminologia se limitou maiormente por uma perspectiva de Justiça de que deriva ou aplica­se
apenas para os seres humanos, exsurgindo um foco exageradamente antropocêntrico
(LYNCH, LONG, STRETESKY, 2019, p. 11).
Em um primeiro enfoque, a Criminologia Verde permite um novo repensar no plano
da relação do ser humano com a natureza, principalmente na crítica ao exacerbado
antropocentrismo, que reflete uma relação predatória decorrente do impulso lucrativo do
capitalismo (LYNCH, LONG, STRETESKY, 2019, p. 11). A crítica ao pensamento
antropocêntrico é um fator que influencia a agenda da Criminologia Verde, uma vez que a
criminalização reflete noções centradas no ser humano, como, por exemplo, o tratamento da
natureza como recurso para exploração humana (WHITE, 2013, p. 15­17).
Não obstante, as definições de risco e de dano são dependentes da capacidade dos
interesses seccionais de primeiro obter consenso sobre como interpretar o que está
acontecendo, e segundo assegurar medidas para generalizar e implementar ações contra o que
é considerado um comportamento prejudicial, principalmente através do Estado, razão pela
qual a maior parte dos danos serão considerados acidentais, não intencionais. Eventualmente,
sequer serão considerados danos (WHITE, 2013, p. 51­60).
Neste ponto, as corporações e os Estados definem o risco de forma a sustentar a
produção e o consumo baseados no lucro. Os Estados estão localizados no nexo estrutural do
antagonismo e reprodução de classe, razão pela qual não são independentes das relações de
poder e dos interesses seccionais de classe. Portanto, de um lado o exercício do poder estatal
geralmente reflete os interesses daqueles que têm capacidade de reunir recursos econômicos e
legais significativos; de outro lado, o Estado deve manter o mínimo de ordem pública, o que o
leva a exigir das corporações práticas sociais e ambientais, obviamente contra seu interesse
primário (WHITE, 2013, p. 51­60).
Sob essas novas bases paradigmáticas que buscam refletir sobre a relação ser
humano e natureza, a Criminologia Verde desponta como uma vertente criminológica que
pode ser relevante para discutir a justiça criminal relacionada a questões ambientais,
decorrente de um direcionamento do poder punitivo estatal – definindo, criando e aplicando a

77
No original: “Traditionally, within criminology and criminal justice, the analysis of justice, its scope, meaning
and content have been studied from a human­centered view oriented toward philosophical conceptions of justice
related solely to human concerns and values”.
142

lei penal – que reproduz desigualdades sociais e viola direitos humanos e não humanos
(BEIRNE, 2009; WYATT, 2016).

2.1.3.2 Corporações e capitalismo: lucros, externalização de danos e direitos humanos

As corporações são construídas historicamente e se consolidam no capitalismo


contemporâneo com o único propósito de maximizar lucros, em uma estrutura que gera
necessariamente “externalidades” sociais e ambientais que lhe são centrais em sua
conformação (TOMBS; WHYTE, 2015, p. 159­168). Por esse ângulo, a responsabilidade
social de todo sistema político e humano é a utilização dos recursos para aumentar lucros,
desde que se respeitem as regras do mercado (FRIEDMAN, 1970).
As corporações desconhecem que seus comportamentos afetam a organização
ecológica, posto que os danos ecológicos são externalizados ao se tornarem problemas sociais
do Estado. Essas corporações são beneficiadas por regulamentações fracas e um mercado
apenas aparentemente livre, dado que a externalização dos custos para o Estado facilita a
acumulação de setores privados. Em resumo, o referido dano é o custo de produção no
sistema do capitalismo moderno (LYNCH et al., 2013).
Essa capacidade das corporações em causar danos e crimes com relativa impunidade
também é sustentada pelo Estado e pelas leis que amparam a relação entre ambos. Trata de
uma relação não antagônica, mas simbiótica, em que, de um lado, as corporações não
poderiam existir sem uma grande demanda estatal, e de outro, o Estado cria as formas
jurídicas para a organização corporativa (TOMBS; WHYTE, 2015, p. 159­168).
A personalidade jurídica corporativa permite que executivos, proprietários e
acionistas externalizem suas responsabilidades pelos danos causados pela corporação.
Afirma­se que a responsabilidade limitada das corporações é a chave para entender o processo
para proteção de todos aqueles que poderiam ser responsabilizados ou perder ativos
financeiros. Como as corporações são tratadas separadamente das pessoas naturais, a sua
responsabilidade é limitada ao seu capital social, não atingindo executivos, proprietários e
acionistas. Essa mesma responsabilidade limitada induz que os ativos da corporação não
possam ser utilizados se executivos, proprietários e acionistas são responsabilizados
(WHYTE, 2020, p. 46).
Trata­se de uma arquitetura estrutural corporativa, estabelecida legal e internamente,
consubstanciando em uma “blindagem” ou “véu” que protege a empresa e os seus principais
143

investidores, diretores, proprietários e todos aqueles que lucram com os danos ambientais
(WHYTE, 2020, p. 46/47). Regra geral, as empresas não são obrigadas a pagar os custos dos
efeitos mais prejudiciais de suas atividades, não estando os danos de longo prazo sequer
previstos nos balanços corporativos, porque as corporações não entendem dever pelos custos
deles (TOMBS; WHYTE, 2015, p. 14­16). Esses custos não contabilizados são chamados de
externalidades da atividade produtiva, que podem abranger, por exemplo, acidentes e doenças
industriais, poluição ambiental e intoxicação alimentar. Essas externalidades são suportadas
social ou individualmente, neste último caso, atingindo os mais vulneráveis nos estratos
sociais (TOMBS; WHYTE, 2015, p. 14­16).
Saad­Diniz (2019, p. 162) diz que os danos sociais provocados pelas corporações
matam mais do que os homicidas convencionais, cuja violência corporativa (corporate
violence) é definida pelo dano e pelo risco imediato ao consumidor, aos empregados, ao
público em geral, podendo ser bastante perceptíveis nos campos da saúde, da segurança e do
dano ambiental, derivados de decisões provenientes de pessoas que ocupam alta hierarquia na
empresa. Apesar de comumente a gestão em cadeia atender, em regra, procedimentos estritos
e controlados, produzindo consciência do potencial lesivo e até mesmo fatal do que realiza, a
orientação pelo lucro a qualquer preço e a relação benefícios/danos turvam a percepção
pública sobre os processos de vitimização e violência corporativa, o que pode ser intencional
ou negligente por parte da corporação (SAAD­DINIZ, 2019, p. 162).
A atuação das corporações é tão impactante no meio social que a ONU emitiu, por
meio de seu Conselho de Direitos Humanos, os Guiding Principles on Business and Human
Rights, para exortar as pessoas jurídicas, independentemente de seu tamanho, setor, contexto
operacional e estrutura, a respeitarem os direitos humanos (ONU, 2012).
Segundo esse documento da ONU (2012), os Estados devem, relativamente aos
direitos humanos, (i) tomar medidas para aplicar as leis, exigindo que as empresas respeitem­
nos, e periodicamente avaliem as suas adequações às referidas leis; (ii) garantir que leis e
políticas que tratem da criação e operação contínua de empresas, como a legislação societária,
não restrinjam, mas permitam o seu respeito pelas empresas; (iii) fornecer orientação eficaz às
empresas sobre como respeitá­los em todas as suas operações; e (iv) encorajar, e quando
apropriado exigir, empresas a comunicarem como abordam seus impactos sobre eles.
144

2.1.3.3 A mudança de paradigma: a centralidade do dano

Como observado, a agenda da Criminologia Verde e dos Crimes dos Poderosos


voltou­se para o conceito de dano, mais especificamente para o dano social. Parte­se da
constatação de que o crime é produto da seleção de tipos penais, que desencadeia novos
processos de criminalização (HILLYARD, TOMBS, 2015). Assevera­se que (i) o “controle”
do crime é ineficaz, ou seja, o sistema de justiça é ineficaz para os fins a que se propõe, que se
baseia na prevenção especial e na prevenção geral e na ressocialização, por exemplo, não
obstante a ausência de justificativa lógica para o cálculo da pena de prisão; e (ii) a ideia de
crime dá legitimidade para a expansão da indústria do controle. Em conclusão, afirma­se que
o crime tem a função de manter as estruturas de poder em formas mais ou menos sutis, em
que se percebe que a criminologia desfruta de uma “relação íntima com os poderosos,
determinada em grande parte pela sua incapacidade de sujeitar a crítica a categoria de crime ­
e as agendas disciplinares estabelecidas por esta ­ que tem sido transmitida pelo Estado” e que
o sistema de justiça criminal será desta mesma forma conformado (HILLYARD, TOMBS,
2015).
Acrescenta­se que os criminólogos e criminólogas que discutem sobre os Crimes dos
Poderosos já haviam ampliado seu objeto de estudo ao refletirem sobre a seletividade do
sistema penal que imuniza os agentes que mais geram danos e riscos socioambientais, as
empresas e o Estado (BUDÓ, 2020). Diante disso, tem­se a abordagem do dano social, cujo
conceito abrange os danos aos seres humanos desde o nascimento até a morte (ao bem­estar
das pessoas), ou seja, as violações aos princípios de direitos humanos. Na busca para dar
precisão ao conceito de dano social, incluem­se os danos físicos, os danos econômico­
financeiros, e os danos à identidade cultural (HILLYARD, TOMBS, 2015).
Na mesma esteira, o dano social é discutido principalmente a partir da tipologia
galtunguiana de violência (estrutural, direta e cultural), para que se possa aferir a real
dimensão dos danos provocados pelas esferas “do público, do privado e de toda a gama de
cinzas que entre os dois extremos que se enquadram ao abrigo da globalização econômica,
formando equações verdadeiramente criminosas” (RIVERA BEIRAS, 2014). Na perspectiva
do dano social, abrem­se muitas possibilidades de investigação criminológica ao se trabalhar,
por exemplo, a violência estrutural que produz danos sociais.
Os trabalhos na criminologia crítica têm servido para aprofundar o conhecimento na
área, principalmente por meio do detalhamento meticuloso das atividades estatais e
145

corporativas que têm causado perdas econômicas significativas, lesões físicas e morte. Além
disso, a mudança do escopo revelou os danos estruturais que estão fora dos limites
disciplinares da criminologia, como pobreza, desnutrição e doenças evitáveis e assim por
diante, que são alcançados pela perspectiva do dano social (PEMBERTON, 2007).
Mais especificamente para tratar dos danos provocados ao meio ambiente, há
também a proposta conceitual de Lynch et al. (2013) do chamado crime verde, descrito como
“um comportamento que produz danos ecológicos [e que] promovem a desorganização da
natureza”, os quais “podem ser concretamente definidos por padrões científicos” 78. Em outras
palavras, para a “definição de crime verde detalhada acima, a desorganização ecológica é um
crime quando o comportamento em questão produz formas de desorganização que a natureza
não pode acomodar e que a ciência pode identificar como um dano” 79 (LYNCH et al., 2013).
Segundo Foster et al. (2011), o capitalismo tem a tendência de (i) desaceleração da
taxa geral de crescimento; (ii) proliferação de corporações multinacionais monopolísticas (ou
oligopolistas); e (iii) financeirização do capital internacional. Embora a primeira e a terceira
tendências tenham sido mais notadas após a crise de 2007/08, a internacionalização do capital
monopolista recebeu menor atenção, sendo a produção mundial cada vez mais dominada por
relativamente poucas empresas multinacionais capazes de exercer um considerável poder
monopolista, geralmente com sede nos Estados Unidos, União Europeia ou Japão (FOSTER
et al., 2011).
No entender de Foster et al. (2011), essas poucas empresas multinacionais entram em
uma “dialética de rivalidade e conluio”, sendo a competição frequentemente evitada e, quando
existente, reside na competição por posições de baixo custo, que continua sendo o resultado
final para os negócios, competição por recursos e mercados e diferenciação do produto
(FOSTER et al., 2011).

78
No original: “We posit that a green crime is a behaviour that produces unnecessary ecological harm—harms
that can be avoided by organizing production in different ways than are currently practised. Not only are these
green crimes unnecessary; they promote the disorganization of nature. Furthermore, the harm that is imposed on
the environment can be concretely defined by scientific standards”.
79
No original: “Employing our definition of green crime detailed above, ecological disorganization is a crime
when the behaviour in question produces forms of ecological disorganization that nature cannot accommodate
and which science can identify as a harm. In the modern capitalist world economy, it may be economically
beneficial to extract resources from countries with low wage rates, ship them to other low­wage­rate nations to
transform them into commodities and then ship them to other nations for consumption (Gereffi 1999). While this
behaviour is beneficial for capitalism in terms of expansion and profit, it is not beneficial for the environment.
The environmental impacts of the international capitalist economy include escalated carbon dioxide pollution (Li
and Hewitt 2008; Stretesky and Lynch 2009) and other hazardous pollutants (Matthews et al. 2001)”.
146

Em acordo, há um duplo movimento neoliberal que, de um lado, alimentou um


rápido crescimento de oportunidades de lucro e, de outro, restringiu medidas para mitigar o
impacto social das atividades lucrativas, sendo essencial para a produção de crimes
corporativos nas últimas quatro décadas. Embora se esperasse uma reestruturação do setor
corporativo em geral depois da crise financeira em 2007/08, o que se viu foi o oposto: a
consolidação da riqueza e da influência das corporações mais poderosas (TOMBS; WHYTE,
2015).
Ao se depararem com as práticas nocivas que as corporações e outros importantes
atores sociais provocam, mas não necessariamente previstas na legislação penal, criminólogas
e criminólogos tomaram emprestado contribuições de Edwin Sutherland sobre o “crime de
colarinho branco” para, a partir desse conceito, explicar que uma série de violações civis e
administrativas não são tipificadas como crime, já que uma classe poderosa possui influência
na definição de crimes, excluindo­se da possibilidade de tipificação como crime uma grande
quantidade de atividades realizadas pela classe do “colarinho branco” (FRIEDRICHS, 2015).
Já havia, em meados da metade do século XX, a construção teórica dos denominados
crimes de colarinho branco (white collar crimes), quando se indicou o envolvimento de
pessoas de classe socioeconômica elevada na prática criminosa, ou seja, de alta
respeitabilidade e status sociais, que mormente não eram selecionadas pela norma penal
(SUTHERLAND, 1983, p. 6/7). Explica­se que, mesmo quando selecionados pela norma
penal, os criminosos do colarinho branco ou da classe socioeconômica alta, que é política e
financeiramente mais rica, podem se livrar da prisão com maior facilidade do que as pessoas
que não têm esse poder, por poderem empregar advogados mais qualificados e até mesmo
influenciarem a administração da justiça. Em estudo do comportamento das setenta maiores
corporações norte­americanas na primeira metade do século XX, fundamenta­se o crime
cometido por representantes dessa classe social, relacionando­o comumente com a violação
da confiança, como por exemplo as manipulações financeiras ou no mercado de ações e
deturpação de venda de valores mobiliários (SUTHERLAND, 1983, p. 51). Sutherland se
baseava especificamente na teoria da associação diferencial, que considerava que “os valores
dominantes no seio do grupo ‘ensinam’ o delito”, em uma lógica de que o comportamento
criminoso é aprendido socialmente (SHECAIRA, 2014, p. 177).
A teoria das associações diferenciais de Sutherland se origina da análise de formas de
aprendizagem do comportamento criminoso e da dependência deste com associações
diferenciais que ele possui com outros indivíduos ou grupos (BARATTA, 2011, p. 71). A
147

tradição criminológica que associava o crime a fatores econômicos, psicopatológicos e


sociopatológicos não poderia explicar o crime de colarinho branco, o que conduzia a não
explicar crime algum. Em vista disso, diz­se que Sutherland eleva a importância dos
mecanismos de aprendizagem e diferenciação na formação do delinquente (BARATTA, 2011,
p. 72).
Todavia, é de se considerar que o conceito de crime de colarinho branco é
insuficiente, por haver uma ampla gama de infratores não poderosos que poderiam praticá­los,
como médicos, advogados e servidores públicos de baixo escalão, por exemplo. Desse modo,
passou­se a desenvolver, dentro do discurso criminológico, o campo de estudo dos Crimes dos
Poderosos, apresentando­se, a partir de uma abordagem marxista, para compreender a
importância do crime perpetrado por essa classe. Nesse quadro, é premente também ressaltar
que o conceito de Sutherland desconsidera a entidade mais poderosa: o Estado
(FRIEDRICHS, 2015).
Há arranjos políticos e econômicos que estruturalmente provocam danos e
vitimização, que são resultado de contradições da formação social capitalista, que, além de
serem previstas no âmbito normativo, são culturalmente aceitáveis. Trata­se dos crimes dos
poderosos que normalizaram a vitimização como “custos de fazer negócios” e “danos
colaterais” (BARAK, 2015). Malgrado a expressão “crime” esteja igualmente associada à
criminalidade de rua e violenta e aos crimes de colarinho branco, que cotidianamente são
divulgadas nos noticiários, é possível constatar uma maior seletividade e estigmatização dos
estratos inferiores da sociedade e uma imunização ao sistema penal dos estratos superiores,
que refletem estruturalmente uma legalidade estruturada para não operar em toda sua
extensão, realizando­se principalmente nas cifras ocultas (ANDRADE, 2015, p. 263­268).
Descreve­se o cenário de crimes institucionalizados no mercado financeiro que
precipitou a crise de 2008, a qual aconteceu com o auxílio da desregulamentação do setor, que
antes considerava determinadas práticas de transação de títulos criminosas, ao tempo que
outras leis buscavam proteger os consumidores e investidores. Entretanto, nenhuma das
entidades financeiras ou seus principais executivos foram responsabilizados, muito menos
foram estigmatizados como criminosos, permanecendo o cenário do business as usual
marcado pela justificação ou racionalizado pela necessidade de capitalizar a acumulação, de
elevar os interesses do Estado e de aumentar o bem­estar dos cidadãos (BARAK, 2015).
148

Há ainda uma ampla gama de crimes de poder que podem se praticados por entidades
públicas e privadas, violando direitos dos trabalhadores, das mulheres, crianças,
consumidores, mercados, sistemas políticos ou contra os interesses de equidade e
religiosidade, etnia e raça, gênero e sexualidade, tortura e genocídio, por exemplo, bem como
contra o meio ambiente, prejudicando o ar, a água e os alimentos. Esses crimes se tornam
globalizados por estarem associados sobretudo a corporações que muitas vezes abandonaram
os modelos tradicionais de negócio e emprego, com salários excessivamente baixos e
trabalhadores temporários, locais de trabalho não saudáveis, entre outros (BARAK, 2015).
Ao investigar a interação das corporações e do Estado, e perceber que “as concessões
estatais garantidas aos interesses organizacionais dos poderosos e à acumulação de capital
[ser] tão antiga quanto o próprio capitalismo”, argumenta­se ser necessária a superação do
conceito de crime para o de dano social, permitindo “à criminologia compreender o impacto
de ações que não alcançam a definição de proibidas, ilegais ou criminosas, mas que provocam
mais dor, sofrimento e mortes do que aquelas classicamente alçadas a essas condições”
(BUDÓ, 2016, p. 130).
É improtelável descortinar os discursos que justificam ou exculpam os danos. Na
busca desse objetivo, aponta­se especialmente para o dano social, não para a norma. Em
outros termos, intenta­se focar nos atos e nas consequências cometidos pelas corporações e
pelo Estado que causam esse dano. Para Böhm (2017), a pesquisa criminológica é usualmente
realizada sobre os crimes comuns, regulares e individuais, mas, ainda assim, pode oferecer
ferramentas para o estudo de violações às mais graves violações de direitos humanos, ou seja,
crimes internacionais (por exemplo: genocídio, crimes contra a humanidade, como torturas e
deslocamentos, forçados ou crimes de guerra). Esse enfoque criminológico é capaz de
incorporar as violações de direitos humanos em seus aspectos econômicos, sociais e culturais,
que se vinculam estreitamente com o conceito de dano social e violência estrutural (BÖHM,
2017). A análise criminológica dos crimes dos poderosos nesta área percebe que não há uma
clara separação entre o que é legal e o que é ilegal, o que é atividade empresarial e o que é
crime organizado, quem é ofensor e quem é testemunha, havendo uma verdadeira simbiose, o
que se visualiza desde os atores individuais das corporações até as corporações em si (BÖHM,
2017). Em se tratando de responsabilidade individual, a responsabilidade é de difícil
comprovação, ao passo que as corporações não são percebidas como criminosas, ou até
mesmo seus danos não são identificados como tais, daí exsurgindo que “somente um foco no
149

dano social causado (delito, violação de direitos humanos ou qualquer outra categoria e rótulo
que lhe seja dado) pode dar uma dimensão real da lesividade produzida” (BÖHM, 2017).
Nos países latino­americanos, há também um elemento frequente: a violência pelo
Estado e contra o Estado, bem como a violência praticada para proteção das corporações,
podendo se falar também em crimes estatal­corporativos, que se revelam pela “interação entre
atores políticos e empresariais e seus interesses, incluindo práticas de corrupção, favores
administrativos e judiciais ou licitações fraudulentas” (BÖHM, 2017). Daí que se
compreende, do ponto de vista criminológico, o quadro geral de prática de danos sociais no
Arco do Desmatamento da Amazônia, praticados em comum acordo entre o Estado e as
corporações do agronegócio, como violência e violação de direitos humanos, desde o ponto de
vista estrutural, até o cultural e o direto. Esse conluio entre Estado e corporações deve ocorrer
de tal forma que os danos sociais perpetrados continuam impunes, ainda que tipificados como
crimes. É o que se entende por imunização.

2.1.3.4 Os crimes praticados pelo Estado e a imunização dos poderosos

A criminologia não pode desconsiderar a vitimização em massa promovida pelo


Estado, especialmente em um tempo em que as técnicas de destruição e sua popularização
facilitam o cometimento de crimes massivos e indiscriminados contra a vida (ZAFFARONI,
2007).
Com o objetivo de analisar a perenidade ou permanência das corporações ao longo
do tempo, independentemente da gravidade de suas práticas, bem como as formas como o
direito imuniza os responsáveis por crimes massivos, toma­se o exemplo da I.G. Farben e das
corporações que as sucederam, após o fim da Segunda Guerra Mundial, bem como da
Volkswagen. Esta foi criada pelo Terceiro Reich durante a Segunda Guerra Mundial,
tornando­se a segunda maior fabricante de automóveis do mundo, tendo se beneficiado do
trabalho forçado de campos de concentração, o que constituiu aproximadamente 80% de seus
trabalhadores (WHYTE, 2020, 24). Consta, ademais, que a Volkswagen forneceu veículos
militares, partes de aeronaves, foguetes e outras armas, sendo que, em troca, os oficiais
nazistas da SS construíram e operavam em um campo especial nos arredores de sua principal
fábrica (MAZOWER, 2013, p. 377).
150

Já o conglomerado industrial I.G. Farben retirou quase metade de sua força de


trabalho, de quase 330 mil trabalhadores, de campos de concentração na Alemanha do
Terceiro Reich, dos quais 30 mil provinham de Auschwitz. Uma de suas subsidiárias,
inclusive, era responsável pelo fornecimento do Zyklon B, o gás que matou mais de um
milhão de pessoas no Holocausto (WHYTE, 2020, p. 25). Após o fim da Segunda Grande
Guerra, 23 dos diretores da I.G. Farben foram processados no Tribunal de Nuremberg, mas
apenas 13 foram condenados. Enquanto outras empresas tiveram seus bens confiscados e
foram dissolvidas, a mesma foi reestruturada e dividida em seis partes: AGFA, BASF, Bayer,
Chemische Fabrik Griesheim­Elektron, Chemische Fabrik Kalle & Co. AG, Chemische
Fabriken Weiler­ter Meer, Cassella e Hoechst AG (WHYTE, 2020, p. 25). A ideia era
“claramente, matar por meio do trabalho”, haja vista os mais de 25 mil judeus mortos em
razão das condições em apenas uma das fábricas da I. G. Farben (ARENDT, 2013, p. 79). É
necessário ressaltar também que, ao lado da I.G. Farben, “a Krupp Werke, e a Siemens­
Schuckert Werke abriram fábricas perto dos campos de extermínio de Auschwitz e de
Lublin”, porquanto havia uma profícua cooperação entre oficiais nazistas e empresários
(ARENDT, 2013, p. 79).
Não há dúvida quanto à importância das referidas empresas no desenvolvimento
nacional alemão no pós­guerra. Entretanto, é importante questionar o comportamento
corporativo depois da Segunda Guerra Mundial, principalmente no que concerne ao respeito
aos direitos humanos e, mais especificamente, à preservação da natureza. A Volkswagen, por
exemplo, esteve recentemente envolvida no escândalo “Dieselgate”, por ter intencional e
conscientemente manipulado o controle de emissão de seus veículos por meio de sistema de
software para falsificar os dados. Foram aproximadamente 9 milhões desses veículos que,
equipados com motor a diesel, ultrapassavam dezenas de vezes os limites de emissão
regulamentar tanto nos Estados Unidos quanto na União Europeia, principalmente de óxidos
de nitrogênio (NOx) (BLACKWELDER et al., 2016; OLDENKAMP et al., 2016).
É estimado que tenham sido emitidos pelos veículos com dispositivos fraudados da
Volkswagen cerca de 526 mil toneladas de NOx. Em consequência direta das emissões além
do limite permitido, segundo avaliam os autores, estão os danos associados à saúde humana,
como doenças respiratórias (bronquite, câncer de pulmão, entre outras) e ao agravamento de
doenças cardíacas (OLDENKAMP et al., 2016).
A Bayer é controladora de uma outra corporação, a Monsanto, que é a maior
produtora mundial do glifosato, patenteado para uso como herbicida com a marca Roundup. O
151

glifosato está relacionado a tumores renais, cujas evidências produzidas pela própria empresa
teriam sido acobertadas para se declarar, de forma contrária, em público, que ele não
apresentaria riscos (WHYTE, 2020, p. 18/19). Estão disseminados na literatura científica
estudos que indicam que o glifosato tem um grande número de efeitos pró­tumorigênicos em
sistemas biológicos, incluindo dano direto ao DNA, interrupção da homeostase da glicina,
entre outros. Há também fortes evidências epidemiológicas que apoiam correlações entre o
uso de glifosato em plantações a uma infinidade de cânceres, incluindo câncer de mama,
pâncreas, rim, tireoide, fígado, bexiga e leucemia mieloide (THONGPRAKAISANG et al.,
2013).
O modo de ação e a disseminação de glifosato no meio ambiente indicam que o
herbicida é responsável pelo desencadeamento de doenças crônicas comuns na sociedade;
efeitos de desregulação endócrino em células hepáticas; e danos neurológicos (NODARI;
HESS, 2020). Ademais, há uma vasta revisão bibliográfica sobre a exposição de glifosato
associada aos riscos aos animais e aos ecossistemas (NODARI; HESS, 2020). Podem ser
destacados os danos que os resíduos de glifosato causam às abelhas, por decorrência de
alterações nos seus metabolismos, provocando o decrescimento populacional, morte e não
reposição da rainha. Há também estudos sobre o impacto negativo que o glifosato acarreta a
uma série de organismos relevantes na cadeia alimentar aquática, bem como malformações
congênitas em animais aquáticos e terrestres (NODARI; HESS, 2020).
Em exemplo diverso, outra corporação que surgiu do espólio da I.G. Farben, a
BASF, desenvolveu posteriormente à Shell atividade industrial de produção de pesticidas na
cidade de Paulínia. Em auditoria, verificou­se que o pesticida contaminou ar, solo e água,
colocando em risco a saúde dos trabalhadores. Consta que 20 anos de “remediação ambiental
não foram capazes de tornar a área afetada novamente habitável o que, por si só, revela a
magnitude do desastre ambiental” (ALIAGA, 2016).
Esses casos ilustram como as corporações podem ser imunizadas de graves crimes e
ter suas imagens desassociadas deles, desde que com o auxílio de Estados. Ao invés de os
Estados buscarem garantir os direitos dos cidadãos, houve a tomada de decisão por políticas
de desumanização e destruição de milhares de seus habitantes, sendo todas essas atrocidades
do século XX invisíveis para a criminologia. Dentre os motivos que fizeram o pensamento
criminológico dominante, e em certo modo, também o crítico, descuidarem­se da violência
coletiva, estão (i) o fato de os criminólogos e criminólogas terem concentrado seus esforços
152

nos estudos do delito ordinário e não da criminalidade massiva e de grande dano social, até o
surgimento das lutas do movimento internacional dos direitos humanos como fator externo à
disciplina; (ii) a dependência da criminologia quanto à definições dos legisladores sobre o tipo
de comportamento ser ou não considerado delitivo; (iii) a aparente contradição metodológica
de se considerar a criminalidade cometida por agentes do Estado, haja vista os crimes
cometidos pelo Estado poderem ser vistos como uma contradição em termos; (iv) a
complexidade da investigação de genocídios e de graves violações de direitos humanos
(SARMIENTO et al., 2017).
Além disso, há outros elementos que buscam explicar o motivo pelo qual a
Criminologia não ter focado atenção para a violência que se produziu contra grandes
coletividades, como genocídios e outras atrocidades cometidas por Estados: (i) o direito penal
e sua dogmática cumpriram um papel obscuro para o regime nazista e para o Holocausto,
apesar de se pretenderem “neutros” ou “assépticos”; (ii) o estado de negação mental das
pessoas em relação à violência coletiva, sendo que os criminólogos e criminólogas se
comportam de igual forma; (iii) os crimes serem cometidos a milhares de quilômetros de
distância de onde se produz o pensamento criminológico, revelando muitas vezes um caráter
etnocêntrico e imperialista; e (iv) os principais crimes cometidos no século XX o foram por
Estados poderosos (Holocausto, guerras entre nações africanas, ditaduras latino­americanas),
sendo um cenário dominado por poderes criminais de grande magnitude e invisibilizados seus
efeitos do poder mundial e das políticas das relações internacionais (SARMIENTO et al.,
2017).
Como visto, o crime praticado pelo Estado “é um crime altamente organizado e
hierárquico, talvez a manifestação do verdadeiro crime organizado por excelência”, não se
tratando de uma suposta psicopatia, o que seria uma ideia ingênua e simplista80
(ZAFFARONI, 2007). Por outro lado, há a peculiaridade de que o Estado criminoso “quase
sempre se apresenta como um moralista e um verdadeiro líder moral” (ZAFFARONI, 2007) 81.

80
No original: “En alguna medida —muy limitada por cierto— sus agentes admiten excesos o consecuencias no
deseadas, aunque las consideran inevitables. Presentar al criminal de Estado como un sujeto que niega todos los
valores dominantes y no siente ninguna culpa ni vergüenza, lleva a la inverosímil y tranquilizadora imagen del
psicópata. El crimen de Estado es un delito altamente organizado y jerarquizado, quizá la manifestación de
criminalidad realmente organizada por excelencia. La pretensión de atribuirlo a una supuesta psicopatía es
demasiado absurda, pues ni siquiera los más firmes defensores de este discutido concepto psiquiátrico admiten
tan alta frecuencia social”.
81
No original: “El criminal de Estado casi siempre se presenta como un moralista y como un verdadero líder
moral”.
153

Nesse sentido, Zaffaroni (2007) utiliza do escólio de Sykes e Matza (1957) sobre
delinquência juvenil (ou melhor, atos infracionais, em linguagem mais contemporânea), para
fazer uma analogia com os crimes cometidos pelo Estado. Foi desenvolvida, assim, uma
abordagem notabilizada por buscar descobrir os processos psíquicos do comportamento do
delinquente. Compreende­se que os jovens não possuem valores antagônicos à sociedade,
mas, ao contrário, parecem comprometidos com valores convencionais (SYKES; MATZA,
1957). As normas sociais raramente possuem imperativos categóricos, mas são limitadas em
termos de lugar, pessoas e circunstâncias, ou seja, as normas de uma sociedade são permeadas
pela flexibilidade. De igual forma, os indivíduos podem buscar desaprovações da sociedade
com esses mesmos valores que estão alinhados a ela, ao mesmo tempo que também se
defendem de acusações, como pela legítima defesa, estado de necessidade e outras
justificações, ou seja, racionalizações (SYKES; MATZA, 1957). São desenvolvidas, nesse
quadrante, construções linguísticas úteis como justificação ou exculpação pessoal da conduta
criminosa, ou seja, mecanismos psíquicos que atuam nos processos de motivação, resolvendo
conflitos entre valores e normas pessoais e sociais relacionadas ao desvio da norma (CIRINO
DOS SANTOS, 2021, p. 202). Há um padrão de neutralização dos crimes praticados pelo
Estado, que decorre de uma seletividade do sistema penal. As aplicadas técnicas de
neutralização são (i) a negação de responsabilidade; (ii) a negação de lesão (ou dano); (iii) a
negação de vítima; (iv) a condenação dos “condenadores”; e (v) o apelo a valores mais altos.
Embora pensados na justificação psíquica pessoal, essas técnicas de neutralização podem ser
estendidas ao Estado, apesar de oferecer certas particularidades (SYKES; MATZA, 1957;
ZAFFARONI, 2007).
As técnicas de neutralização desenvolvidas por Sykes e Matza se apresentam
integrando­se e corrigindo a teoria das subculturas, em que a “aprendizagem, através da
diferenciação dos contratos sociais, é objeto da teoria de Sutherland” (BARATTA, 2011, p.
79). A teoria de Sykes e Matza indica que é por meio da aprendizagem das técnicas de
neutralização que o delinquente se torna tal, e não através da aprendizagem de valores ou
atitudes contrários à sociedade. Isso significa que essas técnicas frequentemente representam
um sistema de valores negativos que prevalecem sobre o sistema de valores dominante
(BARATTA, 2011, p. 82/83).Enquanto jovens utilizam técnicas de neutralização para
racionalizar o cometimento de crimes, muitas vezes contraditórias e improvisadas pelos
próprios protagonistas, o Estado o faz de forma elaborada e por teóricos especializados no
154

trabalho de fabricação dessas técnicas, dotados de um arsenal acadêmico importante


(ZAFFARONI, 2007). Isso quer dizer que a negação de um dano por um ou uma jovem tem
uma conotação muito diferente em relação a um Estado, ou então a afirmação de que não há
vítimas quanto aos atos de que tenha participado ou incentivado. Mesmo razões ou valores
como “integração nacional”, “integrar para não entregar”, por exemplo, que foram utilizados
por um grande período da ditadura para avançar sobre a Amazônia, ou até mesmo valores
como a defesa intransigente da propriedade, têm implicações.
Ainda que sejam construídas técnicas de neutralização quanto aos crimes perpetrados
pelo Estado, os quais poderiam “exculpar” a sua culpa, haja vista a sua racionalização
histórica, econômica e social, não se pode retirar a consciência sobre a realização dos danos e
das vítimas no Arco do Desmatamento da Amazônia.

3.1.4 Considerações quanto aos danos sociais e relação ser humano e natureza

Neste item, reconheceu­se que a violência deve ser compreendida não apenas como
do tipo direto ou pessoal, mas também como aquelas que operam estrutural e culturalmente, a
partir de cuja tipologia é possível sistematizar a violência cometida por Estados e por
corporações que atuam nos âmbitos econômicos, normativos e culturais. Diante do que foi
exposto, ademais, pode­se conceber que os danos ambientais ou até mesmo com repercussão
no clima se enquadram na tipologia de violência galtunguiana, desde que consideradas as
aquisições da abordagem do metabolismo social, que pressupõe uma interdependência
relacional de troca de matéria e energia entre natureza e ser humano. Entretanto, a própria
sociedade capitalista é organizada de tal forma que provoca uma ruptura metabólica,
porquanto produz e externaliza danos ao depender do lucro e de novos espaços para expansão
produtiva, os quais se tornam problemas sociais do Estado.
Foi realizado um levantamento bibliográfico do campo da Criminologia Verde e dos
Crimes dos Poderosos, por meio de cujo instrumental foi possível efetuar reflexões sobre a
prática de danos no Arco do Desmatamento como violência. Não obstante, outras
ponderações foram possíveis, como, por exemplo, a utilização da ideologia “integrar para não
entregar” como uma técnica de neutralização de crimes praticados pelo Estado (e pelas
corporações) na Amazônia.
Com efeito, os estudos do marco teórico proposto, nessa perspectiva centrada no
dano e não no crime – sem a seletividade penal já realizada pelo legislador sobre o que é e o
155

que não é crime –, são adequados para se visualizar que os danos sociais são praticados por
corporações e por Estados.

3.2 A relação do Estado de Direito com os danos sociais

Como visto, o Estado possui uma relação bastante próxima com a prática de danos,
senão com o cometimento de crimes. Por outro lado, é necessário ressalvar que a construção
jurídica do Estado de Direito, e as suas aquisições teóricas posteriores, são importantes
momentos para o direito ambiental e para a proteção do meio ambiente.
Busca­se averiguar, assim, a relação entre a prática de danos ambientais com o
Estado de Direito.

3.2.1 Estado de Direito e meio ambiente: da promoção ao meio ambiente equilibrado à


necessidade de metas

Estado de Direito é uma expressão polissêmica, mas há uma ideia geral que perpassa
os estudiosos e as estudiosas do tema de que todos estão sujeitos à lei, incluído o Estado,
restringindo o exercício arbitrário do poder (CULLINAN, 2013, p. 98). Caracteriza­se o
Estado de Direito como a forma político­estatal cuja atividade é determinada e limitada pelo
direito, de modo que o Estado de Não Direito é aquele que, pelo contrário, proclama­se
desvinculado de limites, nem mesmo ante a esfera de liberdade dos indivíduos. O autor
explica que o Estado de Não Direito implica (i) a decretação de leis arbitrárias, cruéis e
desumanas; (ii) a identificação do direito como “razão do Estado”, que se ilumina por um
“chefe”; e (iii) a aplicação desigual e injusta do direito (CANOTILHO, 1999, p. 4).
A ideia do Estado de Direito é uma expressão que foi designada como condição de
um sistema político­jurídico minimamente democratizado, ou seja, com garantias suficientes
para os destinatários de normas. O Estado de Direito que preenche os requisitos como tal – ao
contrário do domínio despótico – vai além da observância genérica de direitos humanos, de
valores superiores e do princípio da legalidade (CAPELLA, 2002, p. 147).
Nesse sentido, o conceito de Estado de Direito exige (i) o reconhecimento
constitucional de direitos que foram incorporados histórica e socialmente nas constituições,
em suas gerações de direitos fundamentais, como as sufrágio universal efetivo, os direitos de
156

liberdade individual ou o direito a não ser detido, o direito de manifestação, bem como o
direito ao meio ambiente; (ii) o império da lei como expressão da vontade popular, que traz,
primeiro, a superioridade das leis sobre qualquer outra norma, e segundo, a legitimação
democrática destas leis; (iii) a separação dos poderes do Estado, consistindo uma conquista
das revoluções burguesas em relação ao antigo regime, porquanto coloca as decisões dos
juízes fora da órbita de influência ou pressão do governo, por exemplo, e determina o
cumprimento das leis ao governo, impondo limites claro a este governo; (iv) a submissão à lei
aos poderes públicos, caso contrário não poderia se falar em Estado de Direito, mas
imunidade ou um sistema em que os tribunais pudessem se distanciar da obediência à lei; (v)
a uma penalidade restrita, sem tratos cruéis, inumanos nem vexatórios, por também motivos
históricos e cheios de juízo de valor (CAPELLA, 2002, p. 147­151). O Estado de Direito é
referido como um princípio de governança, em que a lei é o fator supremo na relação entre as
autoridades e o cidadão, bem como entre os cidadãos entre si, em conflitos particulares. Isso
significa que todas as pessoas, instituições e entidades, públicas e privadas, incluído o Estado,
são regidos pelas leis estabelecidas e devem prestar contas às instituições jurídicas82
(BUGGE, 2013, p. 6).
O Estado de Direito tem um ideal antropocêntrico por objetivar o cumprimento de
liberdade, segurança e integridade aos seres humanos não se preocupando ou sendo relevante,
nessa definição, a natureza como sujeito de direitos (BUGGE, 2013, p. 7). A crise ambiental
também deixa marcas no Estado e no Direito, que são desafiados a se transformar frente às
demandas e às consequências graves que essa crise provoca aos seres humanos, que
dependem de um meio ambiente sadio. Mais do que isso, a crise ambiental marca a passagem
para o Estado de Direito Ambiental, visto que “a intervenção estatal baseada na regulação
sancionatória clássica não vem sendo suficiente como mecanismo de proteção ao meio
ambiente (BELCHIOR, 2011, p. 117/118).
Nesse quadrante, o Estado ganha uma função promocional, ora para estimular
condutas ambientalmente desejáveis, ora para desestimular outras condutas que possam
colocar a humanidade em risco, em uma perspectiva de combate da crise ambiental
(BELCHIOR, 2011, p. 117/118).

82
No original: “The concept ‘rule of law’ encapsulates the highest values and functions of law and the legal
system in society: ‘rule of law is the role of law’. As such, rule of law can also be regarded as a primary social
value. In its broadest sense rule of law refers to the principle of governance where law is the supreme factor in
the relationship between the authorities and the citizen as well as between citizens with conlicting interests. It
means that all persons, institutions and entities, public and private, including the state itself, are governed by
established laws and accountable to legal institutions”.
157

Percebe­se que “a crise ambiental vivenciada pela modernidade traz consigo uma
nova dimensão de direitos fundamentais, a qual impõe ao Estado de Direito o desafio de
inserir entre as suas tarefas prioritárias a proteção do meio ambiente” (LEITE et al., 2010, p.
302).
Nesse sentido, as origens da noção de Estado de Direito Ambiental estão
relacionadas com o “entendimento de que o Estado­nação moderno não é suficiente para a
proteção do meio ambiente e que por meio dele é que os riscos ambientais levaram às
mudanças climáticas e à modificação da era geológica” (LEITE et al., 2017, p. 67). Ou seja, a
percepção sobre os riscos e impactos gerados pela crise ambiental – principalmente de ordem
existencial – busca incorporar o meio ambiente como objetivo das decisões, modificando a
teoria clássica do Estado­nação moderno (LEITE, 2017, p. 67).
A construção teórica do Estado de Direito Ambiental proclama a adoção de valores
biocêntricos, por compreender a essencialidade da proteção dos sistemas ecológicos para a
redução de riscos e para garantir a qualidade de vida, vinculando­se à conscientização do
valor intrínseco de sua utilidade ou da valoração humana atribuída (LEITE, 2017, p. 68).
Obriga, em um primeiro momento, “o Estado, em cooperação com outros Estados e cidadãos
ou grupos da sociedade civil, promover políticas públicas [...] pautadas pelas exigências da
sustentabilidade ecológica” e, em um segundo momento, “o dever de adopção de
comportamentos públicos e privados amigos do ambiente de forma a dar expressão concreta à
assumpção da responsabilidade dos poderes públicos perante as gerações futuras”
(CANOTILHO, 2009, p. 17).
O artigo 225 da Constituição da República estabelece uma norma básica para o
Estado de Direito Ambiental, por estabelecer o dever de proteção do bem ambiental ao Estado
e à coletividade para as presentes e futuras gerações (KRELL, 2017, p. 48). Esse dispositivo
legal impõe ao Estado a função de atuar a favor da sua efetivação, privilegiando os princípios
da cautela, da cooperação e da ponderação. De outro lado, o artigo 225 da CR demanda
deveres, partindo da dimensão coletiva do dispositivo legal, podendo a efetivação do direito
ser direcionada ao Estado e à coletividade (KRELL, 2017, p. 48).
Os dois verbos utilizados pelo legislador constituinte originário para fixar o dever e
não a opção na implantação do artigo 225 da CR83, quais sejam, impor e incumbir,

83
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, impondo­se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê­lo e
158

descortinando uma obrigação do Estado e não uma faculdade (BENJAMIN, 2003, p. 14­16).
Assim, o autor continua afirmando que o Estado não pode ser omisso, neutro ou imparcial
frente ao dano ambiental, mas deve, em oposição a isso, envidar esforços de regulação e de
implementação da lei constitucional (BENJAMIN, 2003).
Na implementação do artigo 225 da Constituição da República, deve­se buscar (i) a
efetividade das políticas públicas, alcançando os objetivos almejados pelo legislador; (ii) a
confiança dos cidadãos no sistema jurídico, ou seja, a sua credibilidade quanto à certeza de
que as violações serão seguidas de respostas de implementação previsíveis e proporcionais;
(iii) a equidade e a justiça, impelindo que devem ser respeitados os requisitos destes
princípios, mas a deficiência na implementação não pode significar benefício a quem violar a
lei, em detrimento daqueles que a cumprem; (iv) a eficiência econômica, com melhor
utilização dos recursos naturais disponíveis; (v) o desestímulo ou dissuasão a novas violações,
que se orientam a partir da “consciência que tenha da possibilidade de sofrer um
sancionamento, monetário ou não”, a partir de uma decisão de custo­benefício (BENJAMIN,
2003, p. 17­33).
Sob as premissas fáticas e jurídicas investigadas, assevera­se que “o Direito
ambiental e o dano ambiental/ecológico vieram para trazer novas indagações da sociedade,
pois exigem rupturas civilizatórias não apenas na sua juridicidade, mas também no âmbito
social da coletividade, e que, no final, protejam todos os seres vivos” (LEITE; AYALA, 2020,
p. 7).
A dimensão que o dano alcançou na hodiernidade faz parecer ser necessário
reformular a epistemologia jurídica, o Estado e a hermenêutica jurídica, reconhecendo a
demanda pela transformação emergencial do papel do Estado (LEITE; AYALA, 2020, p. 14).
Nesse quadro de crise e necessidade de ruptura, os autores sustentam que o direito ambiental
vigente possui um trato reducionista sobre a relação ser humano e natureza, resultando em um
viés compartimentalizado, fragmentado, economicista e antropocêntrico (LEITE; AYALA,
2020, p. 21/22).
A necessidade de mudança de paradigma emerge, mais recentemente, em
documentos jurídicos e políticos internacionais 84 que incluíram em seus conteúdos o respeito

preservá­lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao
Poder Público:
84
São referenciados pelos autores a Carta Mundial para a Natureza (1983); a Carta da Terra (2000) e a
Declaração Universal dos Direitos da Mãe Terra (2010). São também mencionadas as Constituições da Bolívia e
do Equador.
159

à natureza e aos direitos humanos; a responsabilidade dos humanos para consigo mesmos e
para as futuras gerações; direitos inerentes à natureza entre outros (LEITE; AYALA, 2020, p.
22/23).
Em termos hermenêuticos, as normas precisam ser interpretadas de forma a
concretizar o novo paradigma de Estado, podendo ser um instrumento importante para sua
efetivação, capaz de minimizar os impactos da crise ecológica em prol da prosperidade
(LEITE; AYALA, 2020, p. 51).
O Primeiro Relatório Global Environmental Rule of Law (KUMAR et al., 2019, p.
10­13) destaca os pontos do Estado de Direito Ambiental que lhe são característicos. A um,
esse Estado tem por objetivo garantir o cumprimento dos padrões, procedimentos e
abordagens definidos nas leis para garantir ar limpo, água limpa e um ambiente saudável,
sendo essencial para a saúde e o bem­estar para os humanos. A dois, o Estado de Direito
Ambiental é multidimensional, pois atravessa muitas formas de normas e leis, desde as
normas consuetudinárias até os padrões adotados voluntariamente por empresas, ou seja, de
governança. A três, diante da capacidade limitada do planeta de sustentar a vida com recursos
naturais esgotáveis e a tendência dos recursos de uso comum se esgotarem se não forem
administrados com cuidado, destaca­se a centralidade do Estado de Direito Ambiental na
prevenção da tragédia dos comuns85. A quatro, a extensão de direitos legais ou personalidade
jurídica aos recursos naturais é uma reflexão ética e moral associada ao sucesso ao Estado de
Direito Ambiental. A cinco, é particularmente importante ao Estado de Direito Ambiental o
reconhecimento da necessidade de fornecer ao público acesso à informação, participação
significativa na tomada de decisões e acesso à justiça e, se aplicável, obter consentimento
livre, prévio e informado, principalmente no caso de comunidades indígenas. A seis, o Estado
de Direito Ambiental deve enfrentar a gestão dos recursos e a saúde dos ecossistemas,
considerando que as decisões poderão afetar gerações no futuro. A sete, este Estado deve
levar em conta que decisões devem ser tomadas mesmo quando há decisões significativas.

85
Em 1968, Garret Hardin (1968) publicou na revista Science o artigo The Tragedy of the Commons,
denunciando a superexploração dos recursos naturais comuns, de forma insustentável, ao longo do tempo.
Ademais, o autor criticou os limites do pensamento tecnicista e à racionalidade individual.
160

Figura 20: Características distintivas do Estado de Direito Ambiental – Primeiro Relatório


Environmental Rule of Law

Fonte: KUMAR et al. (2019, p. 11). Traduzido e adaptado pelo autor.

Nessa linha, o Relatório (KUMAR et al., 2019, p. 4­7) indica que são constatadas
deficiências na implementação da legislação ambiental, as quais não se limitam aos países em
desenvolvimento. Consta que os países que mais obtiveram resultados na implementação da
legislação ambiental foram aqueles que demonstraram melhorar a governança dando mais
força às instituições, conduzindo à maior resiliência à corrupção. Ademais, esses mesmos
países que alcançaram resultados em termos ambientais foram aqueles que fortaleceram leis
que garantiram maior transparência, participação e viabilizaram o acesso à informação ao
público em geral, ao tempo que também conferiram poderes aos órgãos e agências de
fiscalização e mecanismos de acesso à justiça (KUMAR et al., 2019, p. 173).
Segundo o Relatório, a ausência de estruturas legais claras na proteção de direitos
tradicionais relacionados à terra dá ao Estado e a atores privados oportunidades para grilagem
e para expropriação, aumentando a probabilidade de conflito social e até violento devido à
incerteza sobre a posse da terra (KUMAR et al., 2019, p. 173).
161

Os direitos processuais são essenciais para os defensores do meio ambiente, assim


como os direitos fundamentais de reunião e liberdades de associação e liberdade de expressão,
frequentemente necessários ao exercício do ativismo e na obtenção de informações e de
projetos, organização e participação na tomada de decisões relativa a direitos e recursos
comunitários (KUMAR et al., 2019, p. 173). O engajamento dos defensores ambientais,
notadamente quanto ao direito à informação, à participação nas decisões, à consulta e ao
consentimento livre, prévio e informado são fundamentais para o Estado de Direito
Ambiental. No entanto, esses direitos humanos processuais dependem do acesso ao poder
judiciário, por meio de ações judiciais, para implementação do Estado de Direito Ambiental
(KUMAR et al., 2019, p. 173).
Mesmo com tratados internacionais sobre meio ambiente e o esverdeamento das
constituições, bem como a adoção de instrumentos econômicos e legais para mudanças de
atitudes, verifica­se que a degradação do ambiente continuou em uma tendência de alta
alarmante; não obstante a emergência de riscos globais inerentes ao Antropoceno, cujos
controles técnicos e jurídicos se mostram ineficazes (MELO et al., 2018, p. 19). Nesse mesmo
sentido, parte­se da constatação de que não foi revertida a tendência de degradação, incluindo
uma maior eficiência dos recursos e medidas de mitigação, malgrado os esforços para
diminuir a taxa ou extensão da mudança no quadro atual (BUGGE, 2013, p. 4).
Logo, é necessário dar maior prioridade à proteção ambiental como objetivo político
e limitar o crescimento econômico e o consumo, o que desafia o próprio paradigma de
crescimento econômico, como é conhecido, e a exploração e a destruição da natureza que ele
necessariamente acarreta (BUGGE, 2013, p. 5). Com base nesse arcabouço teórico, surge o
que se convencionou a chamar de Estado de Direito Ecológico.
Diante disso, esse modelo de Estado de Direito Ecológico que emerge no
Antropoceno “têm o dever de evitar consumos insustentáveis de recursos, respeitando os
direitos daqueles que não têm acesso a eles porque são muito caros, porque estão muito longe,
porque estão muito degradados ou porque, no momento em que querem consumi­los... já
estão extintos” (ARAGÃO, 2017, p. 31).
As obrigações atribuídas ao Estado – vinculadas aos limites planetários dentro do
espaço operacional seguro já referidos no item 2.1.1 – conformam um novo modelo, que se
vincula às efetivas repercussões no meio ambiente:
162

No Estado Ecológico de Direito do Antropoceno, a obrigação é de alcançar


resultados: resultados na prevenção eficaz de danos ambientais e de melhoria real da
qualidade do ambiente. Este ambicioso objetivo requer a adoção de todas as medidas
necessárias para produzir mudanças, respeitar prazos e atingir metas. Os critérios
para a escolha dos meios adequados para alcançar os objetivos são a
proporcionalidade ecológica com aceitabilidade social e a eficácia, isto é: a
capacidade de encontrar soluções cumprindo metas (ARAGÃO, 2017, p. 31).

Nesse ponto, afirma­se que “o Estado de Direito Ecológico passa a demandar do


Poder Público e dos particulares a adoção de deveres jurídicos mais rigorosos para o controle
destas variáveis e a consequente preservação da capacidade de resiliência do sistema
terrestre” (MELO et al., 2018, p. 21). Há dois aspectos iniciais do Estado de Direito
Ecológico:

O primeiro é a importância do Estado de Direito em geral como um pré­requisito


também para a gestão adequada da natureza e dos recursos naturais. Junto com
grupos sociais fracos, a natureza ­ o meio ambiente ­ é particularmente vulnerável à
falta de lei e a sistemas jurídicos e políticos mal desenvolvidos. Para simplificar: a
natureza precisa de boas leis e da implementação e aplicação fortes e imparciais das
leis (BUGGE, 2013, p. 7).

O Estado de Direito Ecológico exige uma ética que abranja o mundo não humano,
isto é, que considere os valores intrínsecos da natureza independentemente dos interesses
humanos. Ou seja, há uma diferença entre a natureza como valor em si mesma e a natureza
como meio de satisfação dos interesses e necessidades dos seres humanos, para os quais há a
necessidade de uma forte proteção legal (BUGGE, 2013, p. 8). Além disso, dentre os vértices
de abordagem, reconhece­se que a corrupção é um problema fundamental a ser enfrentado no
âmbito do Estado de Direito Ecológico. Desde subornos diretos e extorsões até “zonas
cinzentas” em que as decisões e ações são influenciadas pelo apoio político, relações pessoais,
clientelismo e serviços mútuos, a corrupção assume muitas formas (BUGGE, 2013, p. 20/21).
A corrupção no setor ambiental e no Estado estão mormente ligados à aplicação (law
enforcement86) e à fiscalização da lei ambiental, bem como ao licenciamento. Mais
recentemente, também tem havido uma preocupação crescente com o risco de corrupção
relacionado às medidas nacionais e internacionais de combate às mudanças climáticas
(BUGGE, 2013, p. 20/21). As causas fundamentais da corrupção na área ambiental podem
estar relacionadas com legislações inadequadas e decisões fracas, pouco claras ou
inexistentes, conferindo às autoridades amplo poder discricionário, o que, apesar de ser

86
Para Paulo Mendes (2018, p. 12), law enforcement diz respeito à aplicação efetiva do direito, haja vista
“nenhuma lei perfeita garante uma boa aplicação” e também que é “por isso que o conceito de aplicação efetiva
não é redundante”.
163

necessário, torna o sistema vulnerável a decisões tendenciosas e à corrupção. Não por outro
motivo que o respeito e o fortalecimento do Estado de Direito são fundamentais para o
combate à corrupção e ao clientelismo (BUGGE, 2013, p. 21). Essa nova matiz do Estado de
Direito também alcança os contornos da governança no âmbito ambiental.
Há razões sociais e econômicas que vão além das preocupações ecológicas que
justificam melhorias na governança. A corrupção relacionada a floresta – como subornos e
extorsão por funcionários de alto escalão, pagamentos com vistas a viabilizar concessões de
madeira, ou incentivos para sancionar mudanças no uso da terra e a mais sinistra de todas, a
erosão de instituições fora do setor e em toda a economia – poderia ser enfrentada com
medidas que melhorem a transparência e o acesso a informações. Falhas na governança e
redução na corrupção também estão associadas ao grau exequibilidade das normas, sendo
preferíveis abordagens imperfeitas e exequíveis a abordagens perfeitas, mas inatingíveis
(KISHOR; DAMANIA, 2007).
Em estudo da Transparência Internacional Brasil de agosto de 2021, é ressaltada a
necessidade de se aprofundar a política de dados abertos, como MapBiomas Alerta e o
Sistema de Monitoramento da Exploração Madeireira (SIMEX), do Imazon, para
monitoramento e combate ao crime ambiental, inclusive corrupção, visto que o “cruzamento,
a análise e a visualização de dados potencializam o monitoramento da qualidade ambiental e o
controle das ações e omissões de governos e do setor privado” (COLLAÇO et al, 2021). Há
também a iniciativa Amazônia Protege, do MPF, que identifica e instaura ações civis públicas
contra os responsáveis. No caso brasileiro, a extensão territorial do país, assim como “a
diversidade e a complexidade das cadeias produtivas a que podem estar associados, como nos
casos da madeira, do ouro e da carne”, são elementos que indicam o potencial do uso de dados
abertos, por meio dos quais poderiam ser visualizados tais ilícitos (COLLAÇO et al, 2021).
Ademais, o referido estudo da Transparência Internacional Brasil esclarece que o
combate à corrupção também depende da adoção de uma política estruturada de denúncia,
com canais seguros e medidas de incentivo, bem como proteção dos denunciantes de proteção
de meio ambiente, os chamados whistleblowers (COLLAÇO et al, 2021). A
institucionalização de uma política de incentivo e proteção de denunciantes de suspeitas de
ilícitos seria fundamental para o combate à corrupção ambiental, na medida em que são
“ativistas do campo socioambiental frequentemente fiscalizam e denunciam práticas como a
grilagem, o desmatamento ilegal e a extração ilegal de madeira e minério, além de outras
164

ações ilícitas muitas vezes realizadas por grupos criminosos e redes de corrupção”
(COLLAÇO et al, 2021).
Um último ponto a ser destacado do trabalho da Transparência Internacional Brasil
diz respeito à influência negativa que representantes do agronegócio exercer na governança
ambiental e climática, mediante lobby que pode se converter em influências para
“flexibilização de leis e regulações, bem como interferir no desenho e na implementação das
políticas públicas, no funcionamento das instituições, na distribuição do orçamento e na
criação de regimes tributários favoráveis às suas atividades” (COLLAÇO et al, 2021). Nesse
passo, haveria uma interferência indevida e desproporcional em decisões governamentais que
importam impactos (e danos) ambientais. Como resposta, os autores do estudo defendem que
o lobby poderia ser regulamentado, conferindo maior transparência e mecanismos para
controle social desta atividade, a exemplo de países da União Europeia e dos Estados Unidos.
Com efeito, os sistemas de governança nacional e internacional falharam (e
continuam falhando) em evitar que as atividades humanas deteriorem a integridade, saúde e
funcionamento dos ecossistemas naturais do planeta. O autor explica que no início do milênio
havia a consciência de especialistas sobre a suficiência de normas ambientais, mas elas não
eram aplicadas ou fiscalizadas (CULLINAN, 2013, p. 95/96).
As forças que produzem a destruição e os danos ambientais ganharam força, a
degradação acelerou e os impactos, que são cumulativos e sistêmicos, multiplicaram­se,
empurrando os ecossistemas para seus pontos de inflexão (tipping points). Em vista disso,
uma mudança incremental no direito ambiental não será viável, pois lenta, devendo ser
buscadas metas ousadas, um “salto quântico” na governança (CULLINAN, 2013, p. 96/97).
Coloca­se que, em um primeiro momento, é necessário ser questionado qual é o objetivo das
leis e do sistema jurídico, ou seja, qual é o propósito que se espera alcançar com eles. Isso
porque, mesmo ao se introduzir novas leis, justificando­as como benéficas ao interesse de
toda a sociedade, ao bem público e ao interesse nacional, na verdade pode­se estar diante de
benefícios a interesses de grupos específicos que fizeram lobby para sua aprovação
(CULLINAN, 2013, p. 99).
Os sistemas jurídicos contemporâneos em quase todos os países se concentram em
manter relações harmoniosas entre sujeitos jurídicos (humanos e pessoas jurídicas como o
Estado e corporações) e dispensam importância às relações entre esses sujeitos jurídicos e
outros atores que não sejam humanos. Uma das razões, para o autor, é tratar a natureza como
165

recurso e não como sujeito de direito (CULLINAN, 2013, p. 99/100). Em vista disso, conclui
que:

A atenção inadequada dada pelos sistemas de governança ao fomento de relações


mutuamente benéficas e, portanto, sustentáveis entre seres humanos e outros seres
que não os humanos é evidente na deterioração da integridade, saúde e
funcionamento das comunidades naturais que sustentam a vida na Terra [...] Talvez
o principal desafio que a humanidade enfrenta no século XXI seja como estabelecer
sistemas de governança eficazes em induzir as pessoas a buscarem o bem­estar,
melhorando em vez de minar a saúde dos sistemas ecológicos ­ um estado de direito
para a Natureza (CULLINAN, 2013, p. 99).

A observância do princípio da legalidade não indica, de outro turno, se há


funcionamento efetivo do direito, ou se o mesmo é ou não justo, exigindo o estudo do Estado
de Direito em novas nuances.
A proposta de reformulação jurídico­institucional, que emerge da falência do Estado
e da imprescindibilidade de ruptura, mostra­se definitivamente necessária diante das crises do
Antropoceno.
Examina­se o modelo mexicano de governança da água, cujas regras de distribuição
dos custos e benefícios (ambientais e econômicos) estão relacionadas com a apropriação do
bem ambiental pelo mercado. Diante do abastecimento insuficiente de água, os autores
estudam a governança top­down, instituída pelo Estado neoliberal e também a governança de
baixo ou comunitária. O metabolismo social é um contributo para as lutas dos povos
indígenas do México na construção de um modelo de justiça ambiental e austeridade, forjando
uma governança de baixo para cima, moldada por narrativas e práticas de povos indígenas,
haja vista a necessidade de deliberações coletivas que precediam a mudanças na distribuição
da água (FUENTE­CARRASCO et al., 2019). Dessa forma, esse modelo comunitário de
governança afirma a autonomia local em assuntos territoriais e políticos e desafia as estruturas
normativas impostas pelo Estado neoliberal, enfatizando novas ferramentas para a proteção da
comunidade e seu patrimônio. O metabolismo social se relaciona a três objetivos de política:
(i) governança local; (ii) redução da vulnerabilidade da água; e (iii) justiça social (FUENTE­
CARRASCO, 2019).
Os sistemas de governança são minados por grupos específicos e por lobistas que
interferem na construção do sistema jurídico e na governança ambiental. Mostra­se inevitável,
nesse sentido, aprofundar mais detidamente os pontos de cruzamento entre o agronegócio e o
166

Estado, ou seja, como ocorrem as influências na formulação de leis e de políticas públicas


(CULLINAN, 2013).
De fato, a partir da formulação teórica da economia política por Marx, expõe­se que
a “inserção metodológica da questão criminal na estrutura do modo de produção capitalista
corresponde à noção de que Direito e Estado não podem ser explicados por si mesmos, mas
pelas relações da vida material da sociedade civil” (CIRINO DOS SANTOS, 2018, p. 2). Por
esse ângulo, entende­se que as formas ideológicas, jurídicas e políticas de controle social são
produzidas pelas classes que dominam o poder material em cada época. O direito e o Estado,
como tais formas de controle social, assegurarão, consequentemente, a formação social
capitalista. Há uma unidade dialética entre as relações econômicas, as relações políticas e as
relações jurídicas. As relações econômicas tratam da compreensão da produção e da
circulação de mercadorias. Por sua vez, as relações políticas cuidam do poder dos
proprietários do capital e da força de trabalho. Já as relações jurídicas constituem
“instituição/garantia das relações de poder econômico [...] e de poder político [...] das classes
econômicas, sob a forma legal do direito” (CIRINO DOS SANTOS, 2018, p. 3).
Especificamente à forma jurídica, esta possui a função de ocultar as contradições de classe e
disfarçar o papel de discurso encobridor da forma jurídica, porquanto trata de uma ideologia
que mistifica a realidade unindo abstratamente as contradições sociais concretas (CIRINO
DOS SANTOS, 2018, p. 3).
Nesse contexto, a violência corporativa e o comportamento corporativo que causa
danos sociais devem ser incorporados na pesquisa da vulneração do Estado de Direito, dos
seus fundamentos que dão legitimidade à punição e à deterioração das instituições. Os danos e
os impactos às vítimas provocados pelas corporações são muito complexos de se mensurarem,
podendo causar distorção de normas sociais, ruptura de coesão social e toda uma alteração na
dinâmica social (SAAD­DINIZ, 2019, p. 167).
Diante dessa perspectiva, a representação do agronegócio no Congresso Nacional
estabelece uma ligação imediata entre o poder econômico e o poder político, permitindo que
os interesses das classes que dominam o setor agrário possam também interferir no sistema
jurídico e na governança ambiental. Como mencionado, observa­se a atuação lobista que
dificulta a implementação da legislação ambiental e do funcionamento da governança nessa
matéria, bem como da atuação específica para imunização de agentes poderosos (VIGNA,
2001; BRUNO, 2015; 2017; SIMIONATTO et al., 2012; DE OLHO NOS RURALISTAS,
2019a; ABRANCHES, 2018), o que interfere na implementação de um Estado de Direito
167

comprometido com o meio ambiente, notadamente que considere os danos e os impactos ao


meio ambiente e ao clima, bem como às vítimas humanas e não humanas.

3.2.2 Desestruturação do Estado e violência

Os interesses dos ruralistas se fazem quase que inteiramente representados no


governo federal, quando não se confundem com o ele próprio, transformando o Estado em seu
balcão de negócios87. Essa conclusão parte dos fatos concretos e da efetiva atuação dos
parlamentares que representam o agronegócio no Congresso Nacional, mas também
influenciando o Executivo, fundamentalmente direcionados a interesses privados e setoriais.
O Estado se revela como “um aparato necessário à reprodução capitalista,
assegurando a troca das mercadorias e a própria exploração da força de trabalho sob forma
assalariada” (MASCARO, 2015, p. 16). As formas e instituições jurídicas, como tais,
consolidam­se por meio do Estado, o qual possibilita a existência de mecanismos garantidores
da relação entre exploradores e explorados, tal qual a “garantia da mercadoria, da propriedade
privada e dos vínculos jurídicos de exploração que jungem o capital e o trabalho”
(MASCARO, 2015, p. 16/17). Afirma o autor que o Estado aparece na relação dinâmica entre
capital e trabalho como um terceiro, mas necessariamente como uma parte necessária à
reprodução capitalista, ou seja, não neutro (MASCARO, 2015, p. 17).
A corporação é o mecanismo pelo qual grande parte do capital flui no mundo, de
uma tal forma indiferente ao sofrimento humano e à degradação ambiental (WHYTE, 2020, p.
69). Em última análise, o objetivo principal das formas jurídicas que regulam a economia é
garantir que o capitalismo prospere, de tal forma que garanta um sistema estável e ininterrupto
de produção, distribuição e consumo (WHYTE, 2020, p. 114).
Nos Estados Unidos, nesse contexto, foi introduzida uma “política da não surpresa”,
proibindo visitas repentinas a instalações de corporações dos setores de energia, químico e
resíduos, sendo seus administradores avisados com antecedência, dando­lhes a chance de
encobrir quaisquer violações legais. Esse cenário é o de autorregulação corporativa, que agora
emerge predominante, em que os reguladores dependem cada vez mais das corporações para

87
Trata­se de uma referência à célebre passagem do Manifesto Comunista, de Marx e Engels (2010b, p. 42),
segundo os quais “o executivo do Estado moderno não é senão um comitê para gerir os negócios comuns de toda
a classe burguesa”.
168

fornecer informações voluntárias sobre sua própria conformidade. Ocorre que essas mesmas
empresas dificilmente fornecerão informações voluntárias sobre sua conformidade diária com
a legislação ambiental. Essa estratégia política, que lamenta a regulamentação como um
“fardo para os negócios”, promove a privatização dos serviços públicos, busca mais restrições
aos direitos dos trabalhadores e incentiva o retrocesso de toda uma série de limites impostos
às empresas, tornou­se conhecida como neoliberalismo (WHYTE, 2020, p. 130/131).
Há um poder estrutural que deriva da monopolização do capital, que se explica pela
dependência do Estado (i) em relação às decisões de investimento das corporações para que
sejam determinados produção, emprego e consumo; e (ii) sobre a produção, investimento e
acumulação das corporações para amealhar capital para financiar seus próprios programas
sociais e políticos (FARNSWORTH, 2006).
Há também um poder de agência, que se qualifica pela influência das corporações
sobre o Estado – e em relação a qual teóricos marxistas e da elite concordariam sobre a
importância dessa influência –, sendo a chave das corporações no domínio do Estado para o
poder do capital. Ao ocupar essas posições, as elites políticas e econômicas ajudam a
preservar certas ideias que reforçam o privilégio e, mais importante, suprimem a oposição aos
negócios que realizam e aos mercados livres. Além disso, sustenta o autor que as corporações,
em razão da posição onde se encontram, podem usar seu acesso a recursos financeiros para
influenciar diretamente o processo político, persuadindo diretamente o debate político
(FARNSWORTH, 2006). Em resultado, há evidências de que o poder corporativo aumentou
sob a globalização, muito embora não seja um poder constante, mas que está exposto ao
contexto institucional e econômico prevalecente (FARNSWORTH, 2006).
Essa dinâmica desigual ganha novos contornos no que ficou conhecido por
“Consenso de Washington”, que é definido pela neoliberalização econômica das economias
capitalistas como resposta a experimentos econômicos anteriores caóticos, mas que convergiu
a uma nova ortodoxia. Em resultado, a aplicação dessas soluções se desenvolve
frequentemente de forma parcial e assimétrica entre os Estados (HARVEY, 2012, p. 23).
A neoliberalização reorganiza o capitalismo mundial e restabelece condições de
acumulação do capital e de restauração do poder das elites econômicas (HARVEY, 2012, p.
27). Ressalta­se a importância dos métodos coercitivos do Estado neoliberal na manutenção
da relação desigual entre exploradores e explorados:

O rigor cientifico de sua economia neoclássica não é facilmente compatível com seu
compromisso político com ideais de liberdade individual, nem sua suposta
desconfiança com respeito a todo poder estatal o é com a necessidade de um Estado
169

forte e, se necessário, coercitivo, que defenda os direitos à propriedade privada, às


liberdades individuais e às liberdades de empreendimento (HARVEY, 2012, p. 30).

Nessa toada, relaciona­se a política punitiva com uma orientação de


desregulamentação econômica e de redução dos gastos com assistência social. A partir de
ensaios de Pierre Bourdieu, interpreta­se o Estado como espaço fragmentado de forças que
disputam a definição e a distribuição de bens públicos, o que denomina por campo
burocrático, e não como um conjunto monolítico e coordenado (WACQUANT, 2015). O
campo burocrático é formado por duas lutas intestinas, que, na formulação de Hobbes, é
composto (i) pela mão esquerda, que se materializa nos “gastos” ou desperdícios, ou seja, nas
funções sociais do Estado, como na educação, saúde, habitação, bem­estar social e proteção
trabalhista; (ii) e pela mão direita, que se dirige à disciplina econômica, incentivos fiscais,
“cortes no orçamento” e “desregulamentação” econômica (ou rerregulamentação em favor de
empresas) (WACQUANT, 2015). Entende­se, por conseguinte, que existe um “acoplamento
institucional da assistência pública com o encarceramento como ferramentas para administrar
os pobres insubordinados”, o qual “também pode ser entendido se prestarmos atenção às
semelhanças estruturais, funcionais e culturais entre o trabalho social e o regime prisional”
(WACQUANT, 2015).
A assistência social é transformada em controle punitivo e se relaciona com a
dominância da concepção economicista neoliberal, que impõe a visão do “mercado
autorregulador”. Essa lógica descreve o Estado como um obstáculo à eficiência ou como um
instrumento a serviço da promoção e da supremacia do capital (WACQUANT, 2012). É
importante destacar:

Na prática, os Estados só se afastam do modelo doutrinário do "governo pequeno"


para fomentar um clima propício de negócios em prol do empreendimento
capitalista, para salvaguardar instituições financeiras e reprimir a resistência popular
ao ímpeto neoliberal para com a "acumulação por espoliação" (WACQUANT,
2012).

Adotou­se na política estadunidense do início da década de 1980 (governo Reagan)


uma redução geral no alcance da regulamentação do meio ambiente, da indústria, dos locais
do trabalho, da assistência à saúde e das relações consumeristas. A desregulamentação
ocorreu por intermédio da nomeação de pessoas em posição­chave, favoráveis a essa política
(HARVEY, 2012, p. 61).
170

Nesse sentido, trabalhando este ensaio de Wacquant e outros, compreende­se que se


sucede um Estado de característica neoliberal que necessariamente “beneficia às classes mais
altas, inclusive por meio de favorecimentos em financiamentos, porém, reduz os programas de
assistência social na base da pirâmide, ou seja, com relação às populações mais pobres, para
quais resta, muitas vezes, o encarceramento” (HEINEN, 2020, p. 16).
O Estado neoliberal equivaleu, nos Estados Unidos, a um amplo redirecionamento de
verbas públicas a corporações, como a subsídios ao agronegócio e ao setor industrial­militar,
ao passo que houve um aumento da vigilância e do policiamento e, no caso estadunidense, do
encarceramento, indicando intenso controle social (HARVEY, 2011, p. 178). Enquanto que
nos países desenvolvidos o papel do Estado neoliberal ganha contornos de repressão limitada
a movimentos como “terrorismo” ou “tráfico de drogas”, em países subdesenvolvidos a
repressão atua com um misto de cooptação e marginalização, como o Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no Brasil, e os zapatistas, no México (HARVEY,
2011, p. 178).
Sobre essa questão, afirma­se que as pretensões de redução ao Estado mínimo se
vinculam, na verdade, com o seu fortalecimento em Estado policial, ignorando
“completamente a condição periférica do nosso capitalismo e a característica centrípeta da
central, mesmo em tempos de capitalismo produtivo, que levou à prisão de novo
desenvolvimento humano e, por isso, hoje temos os mais altos coeficientes Gini no planeta”
(ZAFFARONI, 2020, p. 69/70).
Afinal, os fundamentos da ideologia neoliberal estão em contradição com direitos
humanos, repudiando, por exemplo, a natureza inalienável de certos direitos pelo simples fato
de se ter nascido88, o que estaria em desacordo com a Declaração Universal dos Direitos
Humanos de 1948, e com a Declaração da Revolução Francesa 89, para atribuir a culpa pelo
subdesenvolvimento à rejeição da liberdade de mercado (ZAFFARONI, 2020, p. 68/69).

88
“É passatempo inconsequente apontar aquilo que deveria ser e não é porque contraria as leis inflexíveis do
universo real. Tais devaneios podem ser considerados inócuos enquanto permanecem como sonhos. Porém,
quando seus autores começam a ignorar a diferença entre fantasia e realidade, tornam­se os mais sérios
obstáculos aos esforços humanos no sentido de melhorar as condições externas de vida e bem­estar. A pior de
todas essas ilusões é a ideia de que a ‘natureza’ conferiu a cada indivíduo certos direitos. Segundo esta doutrina,
a natureza é generosa para com toda criança que nasce. Existe muito de tudo para todos. Consequentemente,
todos têm uma reivindicação justa e inalienável contra seus semelhantes e contra a sociedade: a de receber a
parcela total que a natureza lhe outorgou. As leis eternas da justiça natural e divina determinam que ninguém se
aproprie daquilo que, por direito, pertence a outrem. Os pobres são necessitados somente porque pessoas injustas
despojaram­nos do seu direito de herança. O papel da Igreja e das autoridades seculares é o de impedir essa
espoliação e fazer com que todos sejam prósperos” (MISES, 2010, p. 61/62).
89
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789.
171

Os governos Reagan e Thatcher possuíam uma leitura reacionária da modernidade,


por se contraporem à política de bem­estar social que transformou seus países no pós­guerra,
com o objetivo de desfazer arranjos sociais e atacar ortodoxias econômicas, reorganizando­se
em torno do mercado (neoliberalismo) e de disciplinas morais (neoconservadorismo)
(GARLAND, 2001, p. 98). Ao longo das décadas de 1980 e 1990, essa agenda dominou nos
Estados Unidos e no Reino Unido, invertendo as soluções do Estado de bem­estar social com
preocupação com igualdade social, seguridade social e justiça social, o neoliberalismo insistiu
no fundamentalismo de mercado e na fé inquestionável no valor da competição, da empresa e
incentivos, bem como nos efeitos salutares da desigualdade e da exposição ao risco
(GARLAND, 2001, p. 99). O endurecimento das divisões sociais foi o resultado mais
imediato. Houve um distanciamento social e econômico entre desempregados e trabalhadores,
brancos e negros, subúrbios ricos e cidades dilaceradas por conflitos, deixando para trás
muitas pessoas que não mais teriam acolhimento do Estado, ao contrário do setor privado, em
expansão (GARLAND, 2001, p. 102). A legitimação retórica para o desenvolvimento de uma
política de controle social mais rígida começa a se desenvolver em torno de condutas
associadas a classes baixas. Ao mesmo tempo, essas condutas passaram a ser vistas como
problema de disciplina, falta de autocontrole ou controle social, ou seja, que foram escolhas
racionais do indivíduo, o que mereceria mais controle, mais desincentivos e, se necessário,
segregar o setor perigoso da população (GARLAND, 2001, p. 102).
Flui dessas premissas que esse sistema econômico – capitalista, em sua fase
neoliberal – está baseado em formas jurídicas que viabilizam a exploração de trabalhadores
em benefício das classes mais altas, demandando, para tanto, políticas de encarceramento em
massa. Mas não só. Os danos sociais provocados no seio do neoliberalismo são também
ecológicos.
É importante examinar como o processo de consumo no mercado global, ajustado às
políticas neoliberais, opera de tal forma que o consumidor atua com ignorância, desconectado
das origens dos bens selecionados para compra e da violência com que os produziu. Assim
sendo, as pessoas adquirem bens no mercado de consumo globalizado e o processo de
produção acontece, mas há uma normalização, banalização ou despolitização quanto à
violência e sobre os danos sociais e ambientais que tais processos acarretam (COLLINS;
ROTHE, 2020, p. 20). O ideário neoliberal sobre individualização, autorresponsabilidade e
privatização se presta a mitigar o dever do Estado para com seus cidadãos, os quais seriam
172

responsáveis pela gestão do risco e incumbidos de consertar as calamidades provocadas pela


ausência do Estado neoliberal (COLLINS; ROTHE, 2020, p. 35/36). Com o objetivo de
debater a relação entre neoliberalismo, violência e danos ambientais e climáticos, os autores
trazem à tona as últimas administrações republicanas nos Estados Unidos (governos Bush e
Trump), que não apenas opuseram barreiras para políticas regulatórias visando ao combate
das mudanças climáticas. Não obstante, houve obstruções para quaisquer ações para mitigar
as mudanças no clima, à introdução de regulamentações e salvaguardas ambientais. Mais
especificamente no governo Trump, desconsiderou­se estudos sobre mudanças climáticas e
foram implementadas medidas para aumentar a produção da indústria do carvão mineral, que
é altamente poluidora (COLLINS; ROTHE, 2020, p. 113­117). Nessa perspectiva, na
reorganização econômica operada em âmbito global do chamado neoliberalismo, “o planeta
inteiro é dado àqueles que são mais capazes de explorá­lo” (RUGGIERO; SOUTH, 2013)90.
A construção da narrativa de que os indivíduos sozinhos podem resolver os
problemas ambientais e climáticos por meio de escolhas diárias sobre consumo é, em si, um
sintoma mais abrangente, que reflete o triunfo da visão de mundo neoliberal (COLLINS;
ROTHE, 2020, p. 120). Adverte­se, ainda, que as ações individuais e a autorresponsabilidade
estão inseridas no discurso hegemônico como ferramentas do neoliberalismo que nos
persuadem a enfrentar a mudança climática “gastando dinheiro” para aliviar culpa individual,
mas ignora os fatores estruturais que são os verdadeiros culpados (COLLINS; ROTHE, 2020,
p. 118/119). Apesar da necessidade de se reconhecer que o negacionismo climático não seja
exclusivo das políticas neoliberais e conservadores adotadas por esses governos
estadunidenses, há que se considerar o papel­chave desempenhado pelas corporações, que
atua mediante lobby e que lucra até mesmo quando há desastres climáticos (COLLINS;
ROTHE, 2020, p. 116­119).
Ao abordar as relações entre ciência (climática) e política, parte­se de três fenômenos
para se fazer um diagnóstico e um prognóstico políticos: o negacionismo climático; o
aumento violento das desigualdades; e a desregulamentação do Estado de Bem­Estar social
(LATOUR, 2020). O negacionismo climático é defendido mesmo diante das evidências
científicas por elites (menos esclarecidas ou obscurantistas) donas de muitos recursos e de
grandes interesses, marcadas pelos signos da propriedade privada, do monopólio de terras e da
exploração de territórios (LATOUR, 2020, p. 26). Essas elites estão “extremamente

90
No original: “Within the neoliberalism world‐view, the entire planet is given to those who are most capable of
exploiting it”.
173

empenhadas na proteção de sua imensa fortuna e na manutenção de seu bem­estar”, o que


inclui se livrarem dos fardos da solidariedade, o que explica a desregulação do Estado e a
explosão de desigualdades (LATOUR, 2020, p. 27­30). A negação – a negação fria, a mentira
– são visíveis no discurso populista, que se aproxima a abandonar de qualquer forma de
racionalidade. Acusa­se, nesse diapasão, as elites de “sua deplorável indiferença pela própria
ideia de verdade e, principalmente, com sua paixão pela identidade, pelo folclore, pelo
arcaísmo e pelas fronteiras – sem esquecer de sua condenável indiferença pelos fatos”
(LATOUR, 2020, p. 32/33). Continua o autor francês expondo a problemática do que entende
ser um “crime imperdoável”: a negação compulsiva das ciências do clima, o que leva as
pessoas a desconfiarem, investidos de desinformação, da mutação do clima, cuja solidez é
inquestionável (LATOUR, 2020, p. 34).
Exsurge também importância na discussão sobre queimadas na Amazônia e
populismo (digital), em uma lógica de negacionismo e desrespeito à produção metodológica
da ciência: “[...] uma das ferramentas que se retroalimenta no populismo digital é a
disseminação de fake news (desinformação), apresentadas tanto para promover o descrédito
de dados científicos quanto para deslegitimar instituições e políticas públicas, como as
ambientais” (FILPI; BORGES, MOSMANN, 2019).
Com efeito, Boldt e Krohling (2011) afirmam que há a adoção de práticas
sustentadas por um discurso baseado na irracionalidade totalitária e inspirado em políticas de
tolerância zero, no qual desponta “como essencial o papel desempenhado pelos meios de
comunicação de massa, capazes de legitimar a expansão punitiva”. Nesse cenário, há a
maximização do controle punitivo, com uma inflação legislativa de leis penais, ao passo que
se minimiza o tamanho do Estado de bem­estar, mas este não se torna fraco, na medida em
que há “o surgimento dos riscos e medos contemporâneos e o incremento do poder
policialesco destinado a conter os excedentes, criaram as condições ideais de irrupção do
discurso e das técnicas de guerra contra o crime e os criminosos” (BOLDT; KROHLING,
2011).

3.2.3 Considerações no que concerne à relação do Estado de Direito com os danos sociais

O estabelecimento de uma governança a partir das noções do Estado de Direito


Ambiental ou Ecológico – apesar das fundamentais diferenças teóricas – é instrumento
174

fundamental para a efetivação da norma ambiental e tem o potencial de reduzir os impactos


do Antropoceno.
Com efeito, foi possível extrair que a concretização das normas ambientais e da
proteção do meio ambiente pelo Estado possui íntima relação com a defesa dos direitos
humanos e de defensores da natureza.
Em oposição, a desestruturação desse Estado, dentro dos marcos do neoliberalismo,
retira os principais alicerces da proteção do meio ambiente para satisfação dos interesses das
corporações e proporciona, em igual medida, o recrudescimento do poder punitivo frente às
classes mais baixas.

3.3 O Ecocídio e a Criminologia Verde

Face o item 3.2 deste trabalho, constata­se a imprescindibilidade de fortalecimento


de um Estado que promova a defesa do meio ambiente, desde a previsão orçamentária para
consecução da fiscalização e de uma normatização que a viabilize, até o estabelecimento de
sistemas de governança que fomentem relações mutuamente benéficas e sustentáveis entre
seres humanos e sistemas ecológicos, sob pena de induzir a violência contra seres humanos.
Diante dos debates mundiais que demandam responsabilidades sobre aqueles que
destroem o meio ambiente, há o desenvolvimento de uma agenda para criminalização do
ecocídio como forma de conter a danosidade ambiental. Assim, será examinado o ecocídio
sob o marco teórico da Criminologia Verde e dos Crimes dos Poderosos, bem como sua
aderência com a abordagem do metabolismo social.

3.3.1 Ecocídio: elementos para conceituação no campo da Criminologia Verde e dos Crimes
dos Poderosos

Ecocídio é um neologismo que faz referência à destruição de um ambiente ou um


ecossistema em larga escala: trata da junção do elemento eco (do grego óikos: casa, ambiente,
corpo) com o sufixo cídio (do latim cidium/caedĕre: matar). O termo ecocídio surgiu no final
dos anos 1960 em resposta ao impacto da guerra no meio ambiente e, desde então, tem sido
usado em referência aos impactos negativos nos ambientes tanto em tempos de paz, bem
como em condições de guerra. Em relação à aplicação do conceito em período de paz, ele tem
sido usado para se referir a extensos danos ou destruição ou perda de ecossistemas de um
175

determinado território e inclui tanto danos naturais quanto antropogênicos. Mais


recentemente, o ecocídio vem sendo aplicado em escala global, à vista das consequências
planetárias, transformadoras e catastróficas das mudanças climáticas (WHITE, 2018a).
O caso mais marcante de ecocídio decorrente de guerra ocorreu entre 1961 e 1971,
quando as forças militares dos Estados Unidos pulverizaram milhões de galões de herbicidas
no Vietnã para desfolhar florestas para negar cobertura às tropas inimigas e tornar os alvos de
bombardeio mais visíveis. Esse herbicida foi utilizado em meio militar sob o nome “Agente
Laranja”, cujos efeitos maciçamente destrutivos se tornaram conhecidos por ecocídio, à vista
da destruição de ecossistemas inteiros dos quais seres humanos dependiam, bem como dos
danos que esse produto químico podia causar a seres humanos e a animais (ZIERLER, 2011,
p. 17). Daí que o ecocídio foi concebido como um crime que seria cometido fora de um
contexto de paz, sendo o referido neologismo citado por líderes mundiais na Conferência de
Estocolmo de 1972 para denunciar os crimes cometidos pelos Estados Unidos no Vietnã,
especialmente em relação à degradação ambiental e à poluição transfronteiriça (SHORT,
2016, p. 41).
Na ocasião, as investigações sobre o ecocídio na Guerra do Vietnã centravam­se na
destruição de florestas com herbicidas, bombas e escavadeiras de maneira massiva, e que
também foram um desastre para os habitantes locais, inclusive gerando refugiados (BJÖRK,
1972).
À vista da definição de violência e paz de Galtung (1969), há a convergência do
ecocídio como um crime contra a paz a partir do reconhecimento de que os recursos naturais
podem ser motivo para conflitos e guerras (HIGGINS, SHORT, SOUTH, 2013)
A proposta de ecocídio busca responsabilizar não apenas corporações, mas inclusive
Estados, os quais seriam obrigados a agir ante a ocorrência de danos em massa, destruição ou
colapso do ecossistema. Em decorrência disso, o ecocídio provocado por corporações – dentre
eles os tomadores de decisão, diretores ou aqueles que são responsáveis pelo financiamento
ou pelo investimento – e Estados se vincula à garantia de que qualquer prática comercial que
cause danos em massa, destruição ou perda de ecossistemas seja encerrada (HIGGINS,
SHORT, SOUTH, 2013).
A discussão do ecocídio parte da compreensão teórica e histórica de genocídio. Sob
esse viés, tem­se o exemplo paradigmático do Holocausto, quando em um momento inicial
havia uma compreensão restrita de genocídio de que o mesmo seria o assassinato em massa e
176

intencional de certos grupos sob a direção do Estado, o que poderia afastar a intenção de
eliminação exclusivamente cultural desses grupos. Entretanto, no decorrer do século XX,
formulou­se a definição de genocídio para incluir qualquer grupo, seja ele uma coletividade
política, econômica ou cultural, pela seleção daquele que o comete (SHORT, 2016, p. 13/14).
O conceito de genocídio foi formulado por Raphael Lemkin, um advogado judeu e
polonês, e abarcaria apenas a destruição de uma nação ou de um grupo étnico, cujo termo foi
cunhado a partir da palavra genos (do grego: raça, tribo) com o sufixo cídio (do latim
cidium/caedĕre: matar). Com esta palavra, pretendia­se significar um plano coordenado de
diferentes ações visando à destruição dos alicerces essenciais da vida dos grupos nacionais,
com o objetivo de aniquilar os próprios grupos (HOLOCAUST MEMORIUM MUSEUM,
2021).
Sob a sombra do Holocausto, as Nações Unidas aprovaram a Convenção para a
Prevenção e Punição do Crime de Genocídio, principalmente com base nas contribuições de
Lemkin (SHORT, 2016; HIGGINS, SHORT, SOUTH, 2013). Genocídio compreenderia
quaisquer atos cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional,
étnico, racial ou religioso, como tal: (i) matar membros do grupo; (ii) causar sérios danos
físicos ou mentais a membros do grupo; (iii) infligir deliberadamente ao grupo condições de
vida calculadas para provocar sua destruição física total ou parcial; (iv) impor medidas
destinadas a prevenir nascimentos dentro do grupo; ou (v) transferir crianças do grupo à força
para outro grupo (SHORT, 2016; HIGGINS, SHORT, SOUTH, 2013).
Ademais, há outras construções que definem o genocídio, ainda, como uma ação
intencional sustentada por um agente para destruir fisicamente uma coletividade direta ou
indiretamente, por meio da interdição da reprodução biológica e social dos membros do
grupo, sustentada independentemente da rendição ou ausência de ameaça oferecida pela
vítima. Ou seja, nessa definição há a necessidade de uma agressão física (SHORT, 2016, p.
15).
As agendas corporativas dos Estados frequentemente impõem a agricultura industrial
e a mineração, por exemplo, em terras indígenas, externalizando poluição, degradação e,
muitas vezes, destituindo os povos indígenas de suas terras. Essas atividades capitalistas não
consideram que são uma ameaça à sobrevivência desses povos, porquanto são destruídos
símbolos culturais e seus meios de subsistência (SHORT, 2016, p. 29/30), ou seja, os meios
pelos quais se reproduzem socialmente.
177

A história demonstra que os povos indígenas em todo o mundo sofreram processos


de colonização e recolonização, decorrendo a vitimização, haja vista a redução de suas
populações a tamanhos que, em alguns casos, torna difícil a recuperação (GOYES et al.,
2021).
O conceito de genocídio é importante para se compreender a lógica do colonialismo
que os povos indígenas sofreram, na medida em que é necessário ter a percepção de que a
violência não depende daquela que ocorre mais visivelmente, direta, mas incorpora ameaças
silenciosas às suas sobrevivências. Essa lógica colonialista é bem sucedida quando desarticula
inteiramente o sistema social, a estrutura cultural e as crenças culturais dos colonizados,
conduzindo, consequentemente, que a aplicação do conceito de genocídio contribui para se
compreender esses processos de destruição sociais e culturais para a dinâmica do crime, do
dano, da marginalização e do conflito social, em que atualmente vivem parte dos povos
indígenas em todo o mundo (GOYES et al., 2021).
A violência direta é apenas uma parte da violência que vitimou comunidades
indígenas e produziu a erosão de seus modos de vida, porque muitas das dinâmicas que
produzem o genocídio das comunidades indígenas e o silenciamento das ontologias
ambientais indígenas seriam invisíveis (GOYES et al., 2021). Ontologias ambientais seriam
aquelas representações do ambiente natural que lidam com sua forma e realidade e que
oferecem orientações sobre como viver e se relacionar com a natureza (GOYES et al., 2021).
Em se tratando de povos indígenas, a memória e a continuidade da cultura são cruciais e estão
no cerne dos crimes de genocídio e ecocídio (GOYES et al., 2021).
Dessa forma, considera­se que os povos indígenas, os quais têm uma conexão física,
cultural e espiritual com suas terras, são desapropriados à força e delas afastados,
invariavelmente experimentam “morte social” e, portanto, genocídio (SHORT, 2016, p. 36).
Há a relação histórica entre genocídio e ecocídio, que foram fundamentais para o
desenvolvimento do sistema capitalista mundial:

A disseminação do capitalismo foi influenciada por uma longa história de


cooperação entre estados e corporações que promoveu a retirada de recursos
ecológicos em nações menos desenvolvidas e promoveu o [ecocídio] histórico e
contemporâneo de povos nativos. Apesar das intervenções de grupos de direitos
humanos, corporações transnacionais continuar a extrair recursos dos territórios
indígenas e explorar os habitantes nativos (LYNCH; FEGADEL; LONG, 2021).
178

Logo, podem ser estabelecidos diversos nexos entre genocídio e ecocídio,


principalmente porque (i) a destruição ambiental pode ter um impacto genocida; (ii) o meio
ambiente pode ser visto como uma vítima do ecocídio da mesma forma que um grupo de
pessoas pode figurar como vítima no genocídio; e (iii) ambos podem exsurgir de
circunstâncias de guerra (SHORT, 2016, p. 40/41).
Diante desse conhecimento, durante a década de 1970, buscou­se incluir o ecocídio
no âmbito da Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio,
internalizada no direito brasileiro por meio do Decreto n. 30.822/52 (BRASIL, 1952), mas
não se obteve sucesso nas discussões em subcomissões formadas sobre o tema (SHORT,
2016, p. 42/43).
Consta que “concordar com a extensão de sua abrangência para situações como o
ecocídio (que teria uma distante conexão com o conceito de genocídio) seria prejudicial para a
efetividade da Convenção” (BORGES, 2013).
Na década de 1980, a criminalização da destruição ambiental no direito internacional
perseverou na International Law Comission das Nações Unidas (ILC), a qual havia sido
designada desde a Assembleia Geral de 1947 para formular os princípios do direito
internacional reconhecidos na carta do Tribunal de Nuremberg e em sua sentença e para
preparar um projeto de código de crimes contra a paz e a segurança da humanidade. Desta
forma, o ILC se engajou no debate para inclusão do ecocídio como crime contra a
humanidade (SHORT, 2016, p. 43; HIGGINS, SHORT, SOUTH, 2013).
As principais discussões pairaram sobre a inclusão do elemento doloso no crime de
ecocídio, ou seja, se seria necessário que o ato fosse intencional. A princípio, o crime de
ecocídio consubstanciaria aqueles “atos que causam sérios danos ao meio ambiente”, mas
críticas levaram à alteração da proposta para “atos que causam danos intencionais e graves ao
meio ambiente”. Em oposição à proposta, diversos Estados apontaram que o ecocídio em
tempos de paz é muitas vezes um crime sem intenção (dolo), pois ocorre como subproduto de
atividades industriais, por exemplo (SHORT, 2016, p. 44/45).
Ao final dos debates, o crime de ecocídio foi retirado das votações de forma
repentina e não foi definitivamente analisado. Por outro lado, essa Comissão teve o sucesso de
clarificar o ecocídio e preparar artigos para leis que se preocupariam com a responsabilidade
internacional para o dano ambiental transfronteiriço (SHORT, 2016, p. 47/48; HIGGINS,
SHORT, SOUTH, 2013).
179

Atualmente, pretende­se incluir o ecocídio como crime contra a paz no Tribunal


Penal Internacional, de tal forma que exigiria uma emenda ao Estatuto de Roma. A proposta
do ecocídio é formulada da seguinte forma: “Ecocídio é o dano à destruição ou perda do
ecossistema de um dado território, seja por ação humana ou por outros motivos, a tal ponto
que o desfrute pacífico pelos habitantes daquele território seja severamente diminuído”.
Assim, abrangeria o ecocídio de origem humana e natural, criando­se uma estrutural legal
para antecipá­lo, preveni­lo e proibi­lo, ou seja, obrigando os Estados a agir antes que
ocorram danos em massa, destruição ou colapso de ecossistemas, no chamado dever de
cuidado (HIGGINS, SHORT, SOUTH, 2013).
Nesse passo, há um movimento internacional denominado Stop Ecocide, promovido
pela organização não governamental global Stop Ecocide Foundation, a qual busca promover
ações para tornar o ecocídio um crime no Tribunal Penal Internacional. Com isto, almejam­se
mudanças na forma como as corporações se comportam, propiciando que investidores, bancos
e seguradoras evitem investimentos potencialmente ecocidas. Ademais, o ecocídio sinaliza o
fim da imunidade corporativa e o redirecionamento dos negócios e das finanças (STOP
ECOCIDE, 2021).
A busca pela tipificação do ecocídio em âmbito internacional influenciou a
criminalização desse tipo penal em legislações de poucos países, sendo o Vietnã o primeiro,
como consequência das experiências da longa guerra em seu país, e também na década de
1990, em países como Rússia, Cazaquistão, Belarus e Ucrânia (WHYTE, 2020, p. 5; SHORT,
2016, p. 48). Em 20 de julho de 2021, o parlamento francês, que é composto pelo senado e
pela assembleia, aprovou o “Projeto de Lei do Clima”, com o qual se busca uma robusta
redução das emissões de gases de efeito estufa até 2030 (LE MONDE, 2021), evidenciando a
tomada de medidas pelo governo francês, que inclui o crime de ecocídio.
Há também, no Brasil, uma nascente campanha nacional para criminalização do
ecocídio, a Pare Ecocídio Brasil, do qual este autor é integrante, que pretende discutir junto à
sociedade e ao Congresso Nacional uma nova proposta legislativa sobre o tema.
Segundo Parecer do GT Jurídico do Núcleo Articulador da Campanha Pare Ecocídio
Brasil, a criminalização do ecocídio pode “gerar maior conscientização por parte das
corporações para que estas ajam em sintonia com o princípio da precaução no sentido de
haver maior proteção da Natureza frente aos desafios dos grandes empreendimentos” (2021).
Em outras palavras, fundamenta­se a tipificação penal no sentido de redirecionamento dos
180

negócios para práticas sustentáveis e preservação da imagem corporativa frente à opinião


pública:

Assim, a expectativa é que, com a alteração do Tratado, as corporações redirecionem


suas práticas de modo a não causarem graves prejuízos ao meio ambiente. Isto
porque as empresas dependem da opinião pública e dos investidores, decorrendo que
nenhuma corporação deseja relacionar sua imagem com criminosos de guerra
(PARE ECOCÍDIO BRASIL, 2021).

Dessa forma, as mudanças climáticas também se tornam responsabilidade dos


Estados dentro do tema do ecocídio, visto que a emissão de carbono é provocada por
empresas, por aqueles que formulam as políticas públicas e por aqueles que as financiam,
tornando­se todos responsáveis pelos danos que os negócios praticados causarem ao meio
ambiente (HIGGINS, SHORT, SOUTH, 2013).
A Criminologia Verde, como em outros ramos da criminologia crítica, tem
apresentado dificuldades em apresentar propostas concretas para além do sistema de controle
penal, diante da sua deslegitimação e da oposição enfática à prisão (BUDÓ, 2020). Os
especialistas destas áreas, não raro, apresentam a pena ou o cárcere como a panaceia para os
problemas encontrados, inclusive com discursos populistas 91. Por outro lado, a criminalização
do ecocídio a partir do campo da Criminologia Verde proporciona incluir questões
fundamentais como poder social e interesses setoriais, que moldam o que se entende por
crime ambiental (WHITE, 2013; WHITE, 2018a). Além disso, uma outra aquisição
importante da Criminologia Verde é a premissa do estudo em relação aos danos e não a
definições legais, à vista da legalidade de uma parcela dos danos praticados pelas corporações
e pelo Estado, por serem considerados aceitáveis como consequência de uma dada atividade
econômica (WHITE, 2013).
Como todos esses processos (agro)industriais são financiados, produzidos e
distribuídos por corporações com fins lucrativos, há a necessidade de levar a sério as
consequências dos atos praticados por essas empresas na dinâmica das mudanças climáticas e
do ecocídio (WHYTE, 2020, p. 19/20). Tendo em vista que a forma corporativa garante a
reprodução da elite por todos os meios necessários, assevera­se que ecocídio e poder da elite,
portanto, são duas faces da mesma moeda (WHYTE, 2020, p. 65).

91
“Trata­se de um discurso político do inconsciente coletivo, que descansa sobre uma criminologia arcaica do
homem criminoso, o ‘outro estranho’ (criminologia do outro) (Garland, citado por Bombini: 2010, p. 42­43), e
que explora a insegurança pública (Kessler: 2011, p. 9 e ss.) como fundamento para a adoção de mais medidas
punitivas [...], facilitadas pelas representações sociais do infrator, ou seja, não é somente a lei que estabelece o
que é o crime, também as imagens que lhes são atribuídas socialmente (Frade: 2008, p. 39) (GOMES, 2013, p.
28).
181

Sob essa perspectiva, é possível considerar as mudanças climáticas no escopo do


ecocídio, visto que “o aquecimento global é gerado pelas atividades de governos, empresas e
indivíduos que dependem ou envolvem o bombeamento de gases de efeito estufa na
atmosfera”, de uma forma que é “fomentado pelo fracasso dos governos em regulamentar as
emissões de carbono, por exemplo, permitindo que as indústrias sujas continuem a fazer o que
fazem de melhor, que é continuar a lucrar com comportamentos irresponsáveis e destrutivos”
(WHITE, 2021).
Podem ser, assim, responsabilizados os criminosos do carbono (carbon criminals),
por ação ou inação, que se traduzem naqueles que possuem o poder, mas ocultam que as
mudanças climáticas de fato estão ocorrendo ou defendem que a política climática não deve
ter precedência sobre o ganho econômico imediato (WHITE, 2021).
Um outro nexo entre genocídio e ecocídio é a tendência culturalmente genocida do
capitalismo global e seu caminho de acumulação, não obstante a perda da vantagem
adaptativa em meio às mudanças climáticas. Nesse ponto, o capitalismo é o primeiro sistema
econômico da história da humanidade a produzir uma fenda metabólica que tem o potencial
não só de destruir ecossistemas locais, mas colocar em perigo a própria biosfera e
potencialmente induzir formas de genocídios ecológicos. Assim, as mudanças climáticas
antropogênicas são a expressão mais nítida da destruição da biosfera e o sintoma mais
devastador da fenda metabólica (CROOK, SHORT, 2014).
De mais a mais, há de se reconhecer os efeitos limitados da criminalização do
ecocídio.
O reconhecimento do ecocídio como crime contra a humanidade e a sua introdução
no plano normativo podem não trazer a efetividade pretendida, mesmo que esteja circunscrito
apenas às corporações e aos Estados:

Se por um lado a criação de um crime internacional poderia gerar a obrigação


relacionada à proteção ambiental, também não se pode perder de vista que essa
mesma obrigação somente faria sentido caso fosse observada pelas empresas e
governos, o que parece pouco provável quando se trata de direito penal ambiental e
menos ainda em meio a cenários de retrocessos decorrentes da ascensão de uma
visão de mundo que rejeita evidências científicas e o valor do meio ambiente
(BOLDT, 2020).
182

Em continuidade a este argumento, seria preferível incentivar a prevenção, a


conscientização e a prevenção no âmbito empresarial, incentivando novas práticas e valores
corporativos, do que a criminalização de um crime de ecocídio (BOLDT, 2020).
Nessa linha, Whyte (2020, p. 162/165) assevera que o ecocídio poderia representar
uma falsa esperança de que a comunidade agiria para iniciar a persecução criminal contra
investidores, acionistas e proprietários, à vista, por exemplo, de que tão somente africanos
foram processados no TPI em sua primeira década de funcionamento. Ademais, uma reforma
no direito penal internacional não quebraria a estrutura do direito corporativo (WHYTE,
2020, p. 162/165).
Sem embargo, as medidas preventivas de proteção do meio ambiente podem
concorrer paralelamente a responsabilizações penais, bem como a obrigação de reparar o
dano, nos termos do art. 225 da Constituição da República (BRASIL, 1988), além da
vinculação constitucional ao Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, porquanto
existem crimes cuja gravidade afetam a comunidade internacional, a paz, a segurança e o bem
estar da humanidade, os quais não devem ficar impunes e que sua repressão deve ser
assegurada por meio da cooperação internacional (BRASIL, 2002).
Dessa maneira, e com base no arcabouço fático e teórico exposto, podem ser
apontados os Estados e as corporações como os principais culpados pelo ecocídio que ocorre
em todo o mundo atualmente:

Uma característica chave que define o ecocídio perpetrado pelos poderosos é que
tais crimes envolvem atos ou omissões que são socialmente prejudiciais e
conduzidos por elites e/ou aqueles que detêm autoridade política e social
significativa nos setores ou domínios específicos de sua influência. Tais danos são
inseparáveis de quem tem o poder, de como o exerce e de quem, em última análise,
se beneficia das ações dos poderosos. Esses interesses sociais não apenas perpetuam
grandes danos, mas também obscurecem e mascaram a natureza da produção de
danos (WHITE, 2021, no prelo).

A definição do crime de ecocídio ainda é um campo aberto, notadamente à vista das


discussões em torno do conceito de dano, em relação ao qual se travam discussões éticas:

O ecocídio como um crime (potencial e amplo) pode ser conceituado de várias


maneiras. Por exemplo, podemos distinguir entre uma perspectiva que privilegia os
humanos e o bem­estar humano em suas definições de dano (um ponto de vista
antropocêntrico) e uma perspectiva que inclui o não humano em suas
conceitualizações (um ponto de vista ecocêntrico) (WHITE, 2021, no prelo).
183

No ponto de vista exposto nesta Dissertação, o dano social pode ser considerado pela
abordagem do metabolismo social, rejeitando os vieses estáticos do antropocentrismo ou do
biocentrismo para acolher vínculo relacional entre os dois sujeitos, haja vista o fluxo de
materiais e energia entre ambos.
O dano social ocorre em um dado tempo e espaço, razão pela qual o ecocídio merece
ser estudado histórica e socialmente, que neste trabalho é no Arco do Desmatamento da
Amazônia.

3.3.2 Ecocídio no Arco de Desmatamento da Amazônia

Os danos socioambientais têm sido tão agudos e extensos no Arco do Desmatamento


da Amazônia que passam a interessar às mais diversas áreas do conhecimento, da geologia à
ciência climática, da sociologia à economia, da ciência política à teoria do Estado. No caso
em apreço, interessa sobretudo à Criminologia, porquanto esses danos produzem violências
que afetam o metabolismo social existente.
A Amazônia está cada vez mais sob pressão da expansão agrícola relacionada à
crescente demanda do mercado por commodities agrícolas, como carne bovina e soja, bem
como desenvolvimento de infraestrutura, além da extração de madeira e da especulação
fundiária. Há crescentes interesses que impactam negativamente as terras e comunidades
indígenas, que constantemente estão sob pressão e ameaça de ocupação ilegal, pilhagem de
recursos naturais, degradação de ecossistemas, concentração de riquezas, insegurança e
violência. Tratam de violações de Estado, assim como de corporações, sobre territórios
indígenas com recursos naturais, havendo um choque entre as noções indígenas sobre a
natureza e a exploração e mercantilização capitalistas do espaço.
Há um amplo reconhecimento do direito a um meio ambiente saudável, que condena
a degradação ambiental, mas falha ao editar ou fazer cumprir as leis ambientais frente à
violação de vários direitos humanos (RAFTOPOULOS; MORLEY, 2020).
A demanda crescente por commodities garante que os recursos naturais venham a se
esgotar em um tempo antes do previsto, o que vai resultar em mais violações de direitos
humanos e violências às necessidades humanas básicas. Uma das contradições ecológicas
centrais do capitalismo é o aumento exponencial no fluxo de materiais e de energia
necessários para o crescimento dos limites naturais da produção. O capitalismo põe em
184

movimento um processo desenfreado de acumulação, que divide a natureza e aumenta o


rendimento material da produção a níveis cada vez mais ecologicamente insustentáveis,
perturbando o metabolismo social da civilização humana e levando a uma ruptura metabólica
entre o ser humano e a natureza (SHORT, 2016, p. 54­56).
Um dado é importante: não são somente as corporações que praticam danos sociais,
com os mais diversos efeitos, dado que os Estados são igualmente responsáveis pelos
mesmos, à vista dos mais diversos incentivos, elaboração de planejamentos, implantação de
infraestrutura, organização do território, regularização de terras etc. Quer dizer, o Estado
participa dos danos no Arco do Desmatamento, quanto não é coautor, ainda que por omissão.
O Estado tem sérias dificuldades para impor uma agenda ambientalista diante da
atuação da bancada ruralista, ou sequer tem esse interesse, o que diminui a amplitude das
atividades preventivas ambientais por seus próprios agentes. Em consequência, é impensável
cogitar a hipótese de que as corporações poderiam ser responsabilizadas criminalmente –
principalmente seus principais diretores –, muito menos o próprio Estado. Daí o interesse pela
criminalização do ecocídio, especialmente no âmbito internacional.
Entretanto, a proposta do ecocídio é limitada, pois criminalizar um estreito grupo de
diretores executivos não lidaria com as práticas que a lei mais geralmente convencionalizou
no capitalismo corporativo: a produção de plásticos, a produção da poluição em geral, a
matança relativamente irrestrita de trabalhadores, a destruição por atacado da Amazônia e
outras florestas tropicais, dentre outras práticas destrutivas. Isso quer dizer que o crime
estatal­corporativo precisa ser efetivamente enfrentado e o dano precisa ser evitado (TOMBS,
WHYTE, 2020).
Na verdade, percebe­se que as corporações são licenciadas para matar, embora
dentro dos limites definidos pelo Estado. Esses limites não são determinados do ponto de vista
da segurança pública ou mesmo da proteção do planeta; eles são determinados por um padrão
econômico. O Estado desempenha uma função bastante ampla que permite que as corporações
prosperem, podendo ser entendido até mesmo como sua força vital: é ele quem estabelece as
regras dos mercados de trabalho e de commodities; implanta as infraestruturas de transportes e
telecomunicações; organiza as relações diplomáticas para importação, exportação e
investimento. Em se tratando das políticas neoliberais, há o envolvimento de um enorme gasto
de tempo e energia (ou “intervenção”) para eliminar a regulamentação que protege a
sociedade, de forma que há, na verdade, um processo de re­regulamentação em torno das
corporações a favor de práticas ecocidas (WHYTE, 2020, p. 110/111).
185

Dito de outra forma, ainda que fosse possível a responsabilização dos diretores
executivos das corporações, os resultados seriam limitados diante das incontáveis
engrenagens que fazem o lucro girar e destruir a natureza, especialmente pelas políticas
econômicas adotadas conjuntamente entre os setores público e privado.
As corporações fornecem uma estrutura para investimento do capital, por meio da
qual é possível uma associação enorme de empresas e de operações associadas, que se
alimenta por um sistema financeiro, e é a partir dessa estrutura que as principais ameaças aos
ecossistemas são organizadas e implementadas (WHYTE, 2020, p. 116­118).
A título de exemplo estão as práticas do governo Bolsonaro, que está particularmente
interessado em não “intervir” para proteger a Amazônia (WHYTE, 2020, p. 113/114). Avalia­
se que, desde o início do governo Bolsonaro, em 2019, houve um contínuo retrocesso nos
compromissos internacionais do Estado brasileiro, enquanto que nas políticas internas houve
incentivo do aumento na atividade agrícola e exploração madeireira, bem como o aumento da
taxa de desmatamento e incêndios. O desmantelamento da regulação ambiental também se
insere nesse cenário de piora dos índices ambientais. Assim, já há entendimento de que tanto
o que aconteceu como o que atualmente ocorre na Amazônia poderiam se enquadrar na
proposta de ecocídio de Polly Higgins (RAFTOPOULOS; MORLEY, 2020). Nesse passo, a
desestruturação e a desregulamentação do Estado para a proteção do meio ambiente, bem
como a ausência de políticas públicas promocionais à defesa desse bem também se inseririam
na prática do ecocídio.
Com efeito, no mês de agosto de 2021, a Articulação dos Povos Indígenas (APIB,
2021) elaborou uma representação ao Ministério Público junto ao Tribunal Penal
Internacional (TPI), reunindo fatos e declarações que comprovariam o planejamento e a
implementação de uma política anti­indigenista explícita, sistemática e intencional liderada
pelo Presidente Jair Bolsonaro desde o primeiro dia de seu mandato presidencial. Essa
política, esclarece o documento, seria caracterizada pelo desmantelamento das estruturas
públicas que fornecem proteção ao meio ambiente e aos povos indígenas, as quais estariam
reformuladas e dirigidas como instrumentos de perseguição. Sob essas circunstâncias, o
desmantelamento da infraestrutura que sustenta os direitos indígenas, sociais e ambientais
trouxe consequências, como invasões, esbulho e posse indevida de terras indígenas,
desmatamento, incêndios criminosos e queimadas, garimpos ilegais e mineração industrial
nesses territórios (APIB, 2021). Descreve­se também que o Presidente da República encoraja
186

invasões e ocupações de territórios indígenas, notadamente sob o argumento da contribuiçao


econômica que essas atividades trariam, em contraste com o modo de vida classificado como
improdutivo, de modo que rejeitam os seus direitos fundamentais. Para tanto, o Presidente Jair
Bolsonaro trabalha para propor mudanças de lei que encoraja e facilita violações, como danos
a biomas, bem como deteriora modos de vida humanos e não humanos. Além disso, a
pandemia de COVID­19 também teria sido uma oportunidade para alcançar o propósito de
destruir os povos indígenas, principalmente com a adoção de uma deliberada estratégia de
produção de imunidade coletiva natural (imunidade de rebanho). Em tal contexto, requereu­se
a admissão da representação dos povos indígenas e a investigação pelo TPI por crime de
genocídio e crimes contra a humanidade, não obstante também conste na fundamentação o
pedido de se interpretar que os crimes praticados pelo Presidente Jair Bolsonaro, por
ocorrerem mediante destruição maciça do meio ambiente, sejam compreendidos como
ecocídio (APIB, 2021).
O relevo dessa representação é enfatizada por se tratar da primeira vez que os povos
indígenas, por seus advogados igualmente indígenas, dirigiram­se ao TPI para se defenderem
dos crimes contra a humanidade que testemunham (APIB, 2021).
Mesmo com o afastamento de Ricardo Salles do Ministério do Meio Ambiente,
porque teria atuado ilegalmente a favor de madeireiros no Pará (BBC, 2021), ou de eventual
desmantelamento de operações ambientais criminosas no Arco do Desmatamento, observa­se
que não há perspectiva de mudança de posturas frente ao dano:

O decreto que exonerou Ricardo Salles do comando do Meio Ambiente já nomeou


como ministro o então secretário da Amazônia e Serviços Ambientais, Joaquim
Álvaro Pereira Leite. Apoiado pelos ruralistas, assim como Salles, Leite foi
conselheiro da Sociedade Rural Brasileira (SRB) por 23 anos (CONGRESSO EM
FOCO, 2021).

Mudam­se as pessoas, mas não mudam os grupos representados e que indicam quem
vai determinar a política ambiental brasileira, no caso, a bancada ruralista, com sua visão de
“progresso” e “desenvolvimento” aplicada à Amazônia. Ainda que Ricardo Salles fosse
condenado por ecocídio – há muito já teria deixado a pasta e os danos à Amazônia teriam
progredido com o sucessor.
Ademais, as corporações são estruturadas de uma forma que protegem seus diretores,
no denominado véu corporativo. Por exemplo, a regularidade com que os bancos se envolvem
em atividades criminosas geram multas no valor de centenas de milhões de dólares (ou reais).
Práticas igualmente criminosas são rotineiras e normalizadas nos setores elétrico, de
187

alimentos e de construção civil, mas essas multas pouco têm impacto, à medida que as
mesmas são absorvidas pelas corporações. Ainda que as multas sejam aplicadas em valores
mais altos, no sentido de persuadir ou inibir a prática de novos ilícitos, seus efeitos são
questionáveis, dado que as corporações contam com especialistas para estimar as chances de
serem pegos e as consequências econômicas do negócio (WHYTE, 2020, p. 134­136).
A fase atual do capitalismo neoliberal, marcado pela desregulamentação e pela
mercantilização global, pode ser denominada por “globalização neoliberal”, que é dominada
por corporações que atuam em nível global e, por sua natureza, concentram um poder
enquanto protegem aqueles que detêm esse poder da responsabilidade pelas consequências de
seu uso. Muitas corporações possuem mais poder econômico do que a maioria dos Estados e
dominam os processos políticos de quase todos esses mesmos Estados onde atuam, de tal
forma que seu poder crescente, junto com sua falta de responsabilidade, representa uma séria
ameaça aos direitos econômicos e políticos básicos das pessoas em todos os lugares
(BROSWIMMER, 2002, p. 86­87).
As corporações são parte integrante do rolo compressor progressivamente ecocida,
por também silenciarem, banalizarem e legitimarem suas práticas danosas. Registre­se que a
natureza organizacional profundamente antidemocrática das corporações desempenha um
papel fundamental no curso de ação contemporâneo e na política do capitalismo global que
leva à beira do colapso social e ecológico (BROSWIMMER, 2002, p. 87).
Esse cenário no qual as corporações buscam prosperar é o do neoliberalismo global,
em que elas não buscam apenas lucros em mercados de baixos salários, mas também desejam
escapar de estruturas regulatórias mais rígidas do Norte Global, acelerando muito a destruição
dos ecossistemas e da biodiversidade no Sul Global. Além disso, o agronegócio do século
XXI optou para técnicas de manipulação sem precedentes de engenharia genética de
alimentos e desenvolvimento de novos fertilizantes sintéticos, pesticidas e herbicidas. Áreas
cada vez maiores da paisagem global são atraídas para o capitalismo do neoliberalismo
globalizado e corporativo, acelerando 500 anos de degradação ecológica e ecocídio
progressivo. Resumindo, a globalização neoliberal constitui a última e mais destrutiva fase da
industrialização global (BROSWIMMER, 2002, p. 87/88).
De outro turno, em uma perspectiva criminológica, a influência econômica e política
que as corporações exercem sobre o Estado é fundamental para a compreensão das posições
de privilégio que ocupam, no chamado poder de agência (FARNSWORTH, 2006).
188

Ao se mudar o foco da estrutura (modo de produção ou sistema) para a agência,


busca­se referir, na verdade, aos diretores executivos das corporações, às próprias corporações
e aos funcionários do Estado, avaliando­se especificamente às suas condutas, comissivas ou
omissivas, os quais podem, de fato, ter suas ações avaliadas em termos de intenção e
responsabilidade (WHITE, 2018a).
A estrutura – capitalista – é analisada em termos de sua dinâmica econômica, social
e cultural e pode ser desafiada por meio da transformação social e da revolução, mas que o
que “acontece aos agentes dentro de um sistema também tem um impacto final na estrutura do
sistema como um todo e, portanto, é importante por si só” (WHITE, 2018b, p. 111­113)92.
Para lidar com o dano social – e consequentemente com o ecocídio – o Estado deve
desempenhar um papel importante na regulamentação das atividades corporativas, rejeitando
critérios formalmente legais na avaliação da criminalidade e do dano: “é, portanto, do início
ao fim um processo político” (WHITE, 2018b, p. 115)93.
Por se tratar de um processo político, é um campo aberto à disputa contra o dano
corporativo, desde os conflitos sobre os impactos das condutas ou atividades (por exemplo, se
é prejudicial ou ofensivo), ou a participação do cidadão na limitação da atividade corporativa
(por exemplo, por meio de regulamentações, acesso público a informações etc.) (WHITE,
2018b, p. 115).
A criminalização do ecocídio, nesse sentido, representa um proceder político por
excelência, com o foco do poder de agência, que reflexamente pode pressionar o sistema
como um todo. No entanto, há que se compreender que o funcionamento ecocida do
capitalismo é insustentável por si só, podendo ser discutidos meios de utilização de recursos
naturais sem alcançar a ruptura metabólica.

3.3.3 Considerações quanto ao Ecocídio na Amazônia

A compreensão do ecocídio parte das discussões sobre o genocídio e a degradação


ambiental massiva em tempo de guerra. O conceito, não estático, evoluiu desde o Holocausto,
durante o século XX até os dias atuais, para eventual emenda ao Estatuto de Roma para
julgamento perante o Tribunal Penal Internacional. Além disso, discute­se sobre a
intencionalidade e sobre os contornos do texto legal para o ecocídio.

92
No original: “What happens to agents within a system also ultimately has an impact on the structure of the
system as a whole and so is important in its own right”.
93
No original: “It is therefore from beginning to end a political process”.
189

Os marcos da Criminologia Verde e os Crimes dos Poderosos conduzem as


corporações e os Estados ao centro das discussões do ecocídio e de sua eventual
criminalização, por serem os efetivos responsáveis pela degradação, especialmente em se
tratando de mudanças climáticas.
Nesse passo, o ecocídio poderia contribuir para retirar o véu corporativo que protege
os principais executivos das corporações, que é um empecilho para a responsabilização,
notadamente porque elas são estruturadas para se protegerem, jurídica e financeiramente, bem
como para salvaguardar seus diretores executivos.
Como visto, o ecocídio não é a panaceia, mas a responsabilização por ecocídio em
âmbito internacional, longe dos lobbies nacionais, pode ser uma iniciativa profícua para
reflexamente pressionar a totalidade do sistema. Longe de ser uma medida que poderia alterar
as estruturas do sistema capitalista que funciona voltado à expansão, ao lucro (com suas
externalidades suportadas individual e coletivamente) e à acumulação, o ecocídio
representaria uma medida política como poder de agência.
O ecocídio, por importante, exsurge como uma proposta não reducionista da
realidade, cuja conceituação está associada, historicamente, com a interdependência dos seres
humanos com os ecossistemas, então importando a abordagem do metabolismo social.

3.4 Síntese conclusiva do capítulo

Este capítulo se empenhou em analisar criminologicamente os danos sociais, os quais


puderam ser observados por um viés de violência, quando incorporadas novas epistemologias
e um repensar sobre a relação ética entre ser humano e natureza, o que foi possível mediante a
abordagem do metabolismo social.
Foram trabalhados conceitos no campo de estudo da Criminologia Verde e dos
Crimes dos Poderosos, buscando compreender os danos sociais para além da categoria do
crime, não obstante a associação das corporações e do Estado, na formação econômica
capitalista, para assegurarem os lucros para o setor privado e para externalizarem os prejuízos
(danos) para a coletividade. Todavia, os poderosos (inclusive o Estado) se mantêm imunes
frente à responsabilização – haja vista, por exemplo, o emprego de técnicas de neutralização –
, podendo ser amealhados exemplos históricos de corporações que, outrora contribuintes de
genocídios, hoje são ecocidas.
190

Posteriormente, foram estudadas as distintas noções de Estado de Direito Ambiental


e Ecológico, bem como as formas pelas quais as instituições que as asseguram são minadas,
seja por atuação permitida em lei, através da bancada ruralista, por exemplo, seja por métodos
ilegais, como a corrupção. Em continuidade, tratou­se da desestruturação do Estado que
ocorre em âmbito mais estrutural, sobretudo com a discussão dos efeitos do neoliberalismo no
aparato estatal, e a relação com violência, danos ambientais e climáticos. Nesse sentido,
traçaram­se conexões entre a satisfação dos interesses das corporações – como o aumento do
poder punitivo para as classes mais baixas e obstruções a regulações e salvaguardas
ambientais.
Ao final, estudou­se a proposta do ecocídio de forma conceitual, histórica e
contextualmente, com a finalidade de verificar como seria possível incorporar uma relação
interdependência entre ser humano e natureza, notadamente a partir da abordagem do
metabolismo social. Nesse sentido, o ecocídio foi trabalhado dentro do marco teórico da
Criminologia Verde.
191

4. CONCLUSÃO

À vista da investigação realizada nesta Dissertação de Mestrado, percebeu­se a


complexidade da análise dos processos de degradação no Arco do Desmatamento da
Amazônia, que impactam não apenas a floresta, mas também os povos indígenas e os povos
tradicionais. Estes se apropriam da natureza para as suas necessidades básicas (materiais e
imateriais), em uma noção de troca de matéria ser humano/natureza que gera
interdependência.
A Criminologia Verde e os Crimes dos Poderosos mostraram­se extremamente úteis
para a compreensão dos danos sociais e das injustiças ambiental e climática, porquanto a
centralidade no dano e o questionamento da noção de crime – que é produto da seleção de
tipos penais e desencadeia novos processos de criminalização – oportunizou indicar os
efetivos responsáveis pela degradação.
À luz deste modelo teórico, percebeu­se a pertinência da abordagem do metabolismo
social para investigar e compreender a violência pelo viés estrutural, uma vez que a alteração
do fluxo de recursos naturais e de energia – principalmente pela extração ou remoção da
natureza – traduz­se em impactos ambientais, ou, na linguagem da Criminologia Verde, danos
sociais.
No primeiro capítulo de conteúdo, observou­se que a abertura e a expansão da
fronteira agrícola na Amazônia são intrinsecamente violentas. Esse enorme empreendimento
agropecuário nas bordas da floresta não apenas é de absoluto conhecimento do Estado, mas é
por ele incentivado, dados os enormes investimentos necessários nesta região. Neste
particular, foi possível compreender que a força que move a destruição de ecossistemas
coloca o clima em crise, emana do sistema econômico em constante expansão e induz a
acumulação capitalista, o que frequentemente é provocado pelas corporações e pelo Estado,
em atenção tanto ao objetivo central quanto ao objetivo secundário. Desse movimento, foram
apresentados dados científicos de que o clima já está sendo severamente afetado, o que
acarreta danos imensuráveis nos planos físicos e metafísicos aos povos indígenas e
tradicionais, mas reflexamente interessa à toda humanidade.
Diante da bibliografia e dos documentos amealhados, o projeto capitalista
dependente brasileiro tem há décadas exigido o avanço sobre a Amazônia. O agronegócio
192

encontrou na Amazônia o espaço­tempo ideal para a exploração de monocultura de soja


transgênica, da pecuária bovina e do desenvolvimento da indústria madeireira.
Assim, este trabalho notou que a degradação provocada pela exploração econômica
de recursos naturais no Arco do Desmatamento não pode ser compreendida senão com a
participação decisiva das corporações, as quais encontraram neste espaço geográfico a
expansão da fronteira para produção agropecuária.
Diante disso, ainda no primeiro capítulo, verificou­se que os danos praticados no
Arco da Amazônia pelas corporações em associação com o Estado se encontram não apenas
em curso, mas em um acelerado processo de vitimização de povos que vivem nesta floresta.
Foi constatado um progressivo e acentuado avanço sobre territórios indígenas e unidades de
conservação, o que coloca em risco a sobrevivência de povos indígenas e tradicionais, haja
vista a sua vinculação com a natureza nos níveis material e imaterial para suas reproduções
sociais, provocando conflitos (assassinatos, expulsões, ameaças, disputas de terra etc.).
No final do primeiro capítulo de conteúdo, percebeu­se que esses danos que originam
o Antropoceno frequentemente não são vistos como crimes, ou pior, são até mesmo
legitimados pela lei.
Sob o campo de estudo da Criminologia Verde como marco teórico, analisaram­se a
atuação, a composição e a influência da bancada ruralista no Congresso Nacional, e
constatou­se que não são produzidos instrumentos que possam ser relevantes para o
tratamento das mudanças climáticas e para que a humanidade possa continuar a se
desenvolver e prosperar por futuras gerações.
Ao contrário, a pesquisa demonstrou os esforços da bancada ruralista (e também sua
atuação junto ao Poder Executivo) para viabilizar o agronegócio pelas corporações, seja
implantando a infraestrutura de transporte e de energia, seja estabelecendo normas jurídicas,
mediante entrega ou regularização de áreas no Arco do Desmatamento.
Nesse passo, foi possível verificar um processo geral de expropriação de terras
públicas para assegurar a exploração capitalista. Demonstrou­se que o Estado legalizou as
posses onde as corporações iriam executar suas atividades extrativas, repetidamente
realizando enormes legalizações de terras, mesmo com a presença de povos indígenas e
tradicionais.
Emerge também desse processo o labor da bancada ruralista, imunizando penalmente
os latifundiários e o agronegócio como um todo, bem como favorecendo a continuidade das
atividades produtivas. Nesse cenário, observou­se que parte considerável dos desmatamentos,
193

das plantações e das degradações praticados pelos latifundiários e pelo agronegócio são
entendidos por adequados à lei. Em outros termos, o que deveria ser crime é cometido
licitamente com licença ambiental. Daí o reconhecimento da pertinência do campo da
Criminologia Verde, que realiza abordagem a partir do dano social, independentemente de sua
legalidade.
O segundo capítulo de conteúdo teve, em seu início, uma análise da tipologia
galtunguiana de violência nas categorias estrutural, direta e cultural, de modo que se
compreendeu o próprio capitalismo como um produtor e reprodutor de violência no contexto
das relações desiguais e dependentes na periferia ou Sul Global.
Em continuidade ao raciocínio de J. Galtung, compreendeu­se que os danos
ambientais podem ser discutidos em termos de violência, sobretudo a partir da abordagem do
metabolismo social, porquanto esses danos diminuem o ser humano nas realizações potenciais
e nas necessidades básicas de sobrevivência. Percebeu­se que o conceito galtunguiano de
violência pode ser adequado para responder às preocupações e às exigências da destruição
ambiental e das mudanças climáticas que ocorrem no Arco do Desmatamento, especialmente
quando se considerou o dano ambiental como violência, mediado pela abordagem do
metabolismo social.
Posteriormente, apresentaram­se as perspectivas gerais da Criminologia Verde, bem
como as bases dos Crimes dos Poderosos, estabelecendo­se a figura central do dano social
para análise criminológica das práticas cometidas pelas corporações e pelo Estado.
Observou­se que as corporações lucram com a destruição do meio ambiente e as
externalidades são suportadas social ou individualmente, estabelecendo­se a violência pelo
viés estrutural, conforme objetivou­se demonstrar.
Tomando­se as contribuições de Sutherland sobre o “crime de colarinho branco”, a
partir do qual as violações da classe poderosa não são tipificadas como crimes, por
influenciarem nas suas definições, justificaram­se o enfoque criminológico e as formas de
manutenção de poder.
Verificou­se que os principais crimes de que a humanidade é vítima – aqui concebida
tanto em visão antropocêntrica como em uma visão não antropocêntrica – são cometidos pelos
atores sociais e econômicos mais poderosos: o Estado e as corporações. Com efeito, o poder
político e a influência nas decisões governamentais pelas corporações refletem que estas e o
Estado estão profundamente amalgamados.
194

Atestou­se, portanto, que a prática dos danos sociais e do processo de vitimização de


ativistas ambientais e dos povos indígenas e tradicionais pelo agronegócio possui uma íntima
relação com a bancada ruralista no Congresso Nacional, com sua atuação junto ao Poder
Executivo e com as suas propostas legislativas.
A partir dessas constatações é que se percebeu que a Criminologia pode contribuir
ante os desafios do Antropoceno, principalmente à vista da noção de violência que ultrapassa
o ser humano nessa relação dual e interdependente com a natureza.
Posteriormente, no segundo capítulo de conteúdo, observou­se que as noções do
Estado de Direito Ambiental e do Estado de Direito Ecológico, embora distintas, têm o
potencial de promover a proteção do meio ambiente, mas invariavelmente dependem do
fortalecimento do papel do Estado na proteção do meio ambiente, afastando as tendências
fragmentadas, economicistas e antropocêntricas.
Por outro lado, verificou­se que a desestruturação do Estado no neoliberalismo
global também se insere no maior espaço que as corporações têm para operar e explorar
outros Estados com menor regulação, em termos trabalhistas e ambientais, principalmente, ao
mesmo tempo que são minadas iniciativas para governança efetiva do meio ambiente. Assim,
o Estado se mantém dedicado, portanto, ao aumento da vigilância, do policiamento e do
encarceramento, conformando­se em protagonizar um Estado meramente policial no Sul
Global, comprometido com a continuidade da formação econômica e social capitalista, de
forma a se afastar da concretização das figuras do Estado de Direito Ambiental e Ecológico.
Ao final do caminho percorrido neste trabalho, discorreu­se sobre a conceituação do
ecocídio e sua relação histórica com o genocídio, bem como a evolução dos debates desde
meados do Século 20 até os dias atuais. Verificou­se também que as ideias de genocídio e de
ecocídio, apesar de não inteiramente coincidentes, dialogam, sendo incorporados novos
entendimentos quanto ao ecocídio.
Apesar de se ter reconhecido que a proposta de criminalização do ecocídio não opera
no âmbito estrutural – indicando­se a responsabilidade das corporações e dos Estados no
capitalismo global, que permaneceriam imunes à responsabilização penal –, verificou­se uma
possibilidade de pressionar, com foco no poder de agência, o sistema como um todo, em um
proceder político por excelência.
Ao final desta Dissertação de Mestrado, percebe­se que é indispensável contribuir
com o esforço global de contenção de danos sociais, que repercutem relacional e
complexamente para o ser humano, para o meio ambiente e para o clima. Ao se evitar uma
195

compreensão difusa sobre os protagonistas, responsáveis e vítimas, optou­se por distinguir os


criminosos do meio ambiente daqueles que resistem por uma outra realidade, para assegurar
um futuro para a humanidade e para a natureza.
196

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