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OUTRAS PUBLICAÇONS DE GALIZA EDITORA

- Asociaçóm Sócio-Pedagógica Galega (AS-IIG), Orientaç6ns para a escrita do


noso idioma, 3' ediçóm, 1982, 68 pp_

- John BOWLBY, O vínculo moi-filho e a saúde mental, 1982, 94 pp_; promo-


vido pala AS-PG.

- Manuel Maria, Versos do lume e o vaga-lume, 1982, 64 pp.

- Ricardo Carvalho Calera, Da fala e da escrita, 1983.

REVISTAS:

- O Ensino, revista galega de S6cio-Pedagogia e Sócio-Lingüística, promovida


pola AS-PG.

- O Tempo e o Modo, revista nacionalista galega de política, economia e


ciéncias sociais.

Apartado 1.168
editora OURENSE (Galiza)
MÉTODO PRÁTICO
DE
LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

-
COPYRIGHT
© José Martinho Montero Santa lha
© GALIZA Editora

CAPA
Luis Esperanza

COLECÇÃO
Didáctica

PROMOCIONA
Associaçom Sócio-Pedagógica Galega
Apartado 1.102 - OURENSE

EDITA

editora

COMPOSIÇÃO E IMPRESSÃO
Barbosa & Xavier, Limitada, Artes Gráficas
Rua Gabriel Pereira de Castro, 31-C - BRAGA (Portugal)

ISBN 84-86129-04-4
José-Martinho Montero Santalha

MÉTODO PRÁTICO
DE
LÍNGUA GALEGO-PORTUGUESA

AS. PG

José - Martinho
M::i'J fERO S~NT/\LHA

Apartado 1.102
OURENSE
I _9 8 3
DEDICATORIA

- A meus pais, que me transmitiram o tesouro


da nossa língua.
- A Ricardo Carvalho Calero, Joan Corominas,
Ernesto Guerra da Cal, Manuel Rodrigues
Lapa, Genaro Marinhas deI Valle e Pilar
Vázquez Cuesta, mestres e amigos.
- Aos companheiros da AGAL (Associaçom Ga-
lega da Língua) , da AS-PG (Associaçom
Sócio-Pedagógica Galega), e das Irmanda-
des da Fala, em grande medida co-autores
deste livro.
- A todos os nenos que falam galego, com
esperança.
J.-M. M. S.

editora
PRóLOGO

Duas concepçons do galego

No momento presente existem duas concepçons a respeilO da


língua autóctona da Galiza: por umha parte, o reintegracionismo, que
defende a unidade lingüística do galego co idioma da área luso-
-brasileira, e, por outra, o desintegracionismo ou isolacionism.o, que
pretende fazer do galego umha língua independente do português.
A estas duas concepçons do nosso idioma correspondem logica-
mente duas normativas lingüísticas: a reintegracionista recupera a
tradiçom genuína do galego escrito, tal como nos aparece nos textos
medievais, ininterrompidamente conservada no substancial paios luso-
-brasileiros; a desintegracionista, palo contrário, adopta em geral a
normativa espanhola.

Selecçom de temas

Este livro pretende ser um método prático de aprendizage da


normativa reintegrada. Nom é umha gramática completa da nossa
língua, embora poda servir de complemento a calquer gramática galega.
Aqui abordam-se unicamente aqueles pontos que tenhem maior inci-
déncia na concepçom reintegracionista do idioma, nomeadamente os
que significam umha caracterizaçom diferenciadora frente à tendén-
cia contrária.

7
JOSlt-MARTINHO MONTERO SANTALHA

Finalidade prática

o presente manual tem ante todo umha finalidade prática: ten-


ciona ensinar a normativa reintegrada do galego, tanto no aspecto
que podemos chamar passivo (leitura de textos, assi galegos como
luso-b rasileiros) canto no activo (escritura).
As breves justificaçons de carácter teórico que precedem a cada
ponto ham de considerar-se, pois, supeditadas a essa finalidade prá-
tica: som simplesmente umha introduçom ou ambientaçom ao tema,
reduzida esquematicamente aos dados mais significativos. Essas il1for-
maçons teóricas estám pensadas para o público geral nom especia-
lizado, e, por isso mesmo, formuladas em tom mais bem elementar,
em linguage que quer ser comprensível para a gente comum. O leitor
interessado em ulteriores fundamel1taçons ou em matizaçons de
detalhe, deverá acudir a outras fontes .
Pola mesma razom, nom se incluem aqui razoamentos de índole
mais doutrinal: um manual prático nom podia converter-se numha
exposiçom de motivos. Aliás, podemos supor que, de regra, quem se
decide a aprender a normativa reintegrada estará já teoricamente
convencido do reintegracionismo. Este mêtodo vai destinado especial-
mente a essa gente já convencida, que deseja começar a exercer a
reintegraçom l1a sua prática do idioma, nomeadamente na prática
escrita. De resto, quem queira informar-se dos fundamentos doutri-
nais do reintegracionismo pode ler os livros de Ricardo Carvalho
Calero Problemas da língua galega (Sá da Costa Editora, Lisboa 1981)
e Da fala e da escrita (Galiza Editora, Ourense, a aparecer proxima-
mente), e de Manuel Rodrigues Lapa Estudos galego-portugueses
(Sá da Costa Editora, Lisboa 1979).

Pedagogia de progressom

No que di respeito à ordenaçom dos materiais escolhidos, inten-


tou-se, tanto na precedéncia dos temas como na distribuiçom dos
exercícios práticos, dosificar as dificuldades para tornar mais fácil
o aprendizado: avançar passo a passo, defrontando sucessivamente
os diversos graus de dificuldade do assunto, de forma progressiva.

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M:tTODO PRATICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

Nom obstante, consideramos mais natural que os textos exposi-


tivos fossem redactados desde o primeiro momento em normativa
reintegrada total. Assi, oferece-se já desde o começo a imagem exacta
e completa do galego reintegrado, tal como deve ser normal.
Por outra parte, ainda que se procura em cada caso centrar a
atençom do aluno no tema objecto de estudo, isolando-o ·doutros
pontos que poderiam interferir no aprendizado, pareceu tamêm razoá-
vel nom distorsionar de mais a imagem da língua restringindo-a
constantemente. Por isto, despois dos primeiros temas dam-se sempre
por supostos os pontos já estudados precedentemente. E atê alguns
pontos que nom apresentam dificuldade para a leitura (como os
acentos), aparecem esporadicamente antes de que chegue o momento
de serem tratados exprofesso.

Contrastar co espanhol

Tendo em conta que o reintegracionismo pretende fazer frente


à ameaçante castelhanizaçom da nossa língua, nom se podem evitar
as referências ao espanhol: referências contrastivas que tomem o
aluno consciente da diferença entre ambos idiomas. Em princípio,
claro está que o nosso idioma deveria estudar-se em si mesmo, sem
estar supeditado a calquer referência extrínseca; mas, na situaçom
de anormalidade lil1güística em que nos encontramos os galegos
- escolarizados obrigatoriamente em espanhol-, prescindir da rele-
rência diferencial ao castelhano equivaleria a silenciar ao aluno os
lugares de perigo em que a experiência mostra que mais facilmente
tenderá a cair.

Curso de reintegracionismo

Os temas vam estruturados no manual de tal maneira que poda


organizar-se sobre eles um breve curso de reintegracionismo, dumha
semana de duraçom (6 dias), em classes de hora e meia, conforme já
foi experimentado. Para isto, nas 5 primeiras classes trabalham-se
catro temas por dia, e a sexta dedica-se integramente ao tema 21.
A programaçom do curso ficaria, pois, assi: 1" classe: temas 1 a 4

9
JOS~MARTINH MONTERO SANTALHA

inclusive; 2': temas 5-8; 3': temas 9-12; 4' : 13-16; 5': 17-20; 6': tema 21 .
Em caso de dedicar ao curso duas semanas (12 classes), distribuem-se
dous temas por dia, sucessivamente, e o tema derradeiro ocupa as
duas últimas classes.

Sugeréncias práticas

Convém insistir na necessidade do exerC1CLO prático, e especial-


mente na leitura. No livro oferecem-se exercícios e textos abundantes
para este fim. Ao mesmo tempo, os textos literários podem servir
de base para outro género de actividades, como comentário literário
e lingüístico, etc.
Canto ao modo concreto de realizar os exercícios de leitura,
sugere-se que, se se trata dum grupo de persoas, nas listas de vocá-
bulos soltos leia cada aluno umha linha, e nos restantes textos umha
frase (de ponto a ponto).

o autor agradecerá todo tipo de correcçons ou sugeréncias a


calquer ponto deste livro.

Ferrol, outubro de 1982.

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L A grafia lh

1.1.: Por que Ih e nom li

• Em latim nom existia o som palatal que hoje se representa em


galego-português por Ih e em espanhol por II.

• Em espanhol, despois de vacilar entre diversos modos de repre-


sentar na escrita esse som, acabou adoptando-se a grafia II, porque
o LL latino (= L duplo) dera efectivamente II nesse iclioma;
p.e.: GALLUM gallo.
Pero em galego-português o LL latino deu I, de modo que
nom tinha sentido adoptar o II como grafia para o fonema palatal,
que tinha urnha origem diferente; p.e.: GALLUM galo.
Comparem-se os resultados castelhano e galego-português dos
seguintes vocábulos latinos: GALLUM gallo galo, CASTELLUM
castillo castelo, GRILLUM grillo grilo, CAPILLUM cabello cabelo,
CAEPULLAM cebolla cebola.

• Na nossa língua esse fonema procede mais freqüentemente do


grupo latino LI: FILIUM filho, CONSILIUM conselho, FOLIA
folha, ALIUM alho.
Como a grafia li já representava outros sons (I + i; por exem-
plo: ali), nom era adequada, pois provocava confusom .
Entom, dado que o i semi-consonántico se representou às vezes
por h (p.e.: sábha = sábia, hoje saiba, do verbo saber), adoptou-se
já desde o século XIII a grafia Ih, que começara a usar-se
em provençal.

• Como se vê, de nengum modo seria possível que na nossa língua


surgira de forma espontánea o uso de II como representaçom

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JOSÉ-MARTINHO MONTERO SANTALHA

gráfica do fonema palatal lateral; o emprego desta letra espanhola


em galego constitui umha mostra evidente de dependéncia orto-
gráfica injustificada.

1.2: Leitura de lh

• A leitura de lh nom apresenta dificuldade: o dígrafo lh substitui


a letra espanhola /l da normativa espanholizada, e, portanto,
equivale sempre a ela; leremos, pois, o nosso dígrafo co mesmo
valor fónico que na normativa desintegracionista tem essa letra
espanhola.
• Apesar de ser um ponto de tam fácil aprendizage, convém, no entanto,
exercitar a leitw-a - neste caso como em todos os que signifiquem umha
modificaçom da praxe precedente -. Os exercícios fortalecerám a memória
visual, e criarám o bábito necessário para que a leitura acabe convertendo-se
num acto reflexo, realizado case mecanicamente e sem necessidade dum
esforço consciente cada vez que se lê.
Convém ademais que, se é possivel, a leitura se faga em voz alta:
deste modo formará-se urnha ligaçom mental entre a memória auditiva do
som e a imagem visual do signo gráfico.

1.3: Exercícios para a leitura de lh

a) Vocábulos soltos.

filha colhes ramalho ilha lhes maravilhar colhendo migalhas concelho


folha olhar coelhos toalha agulhas trabalharás espantalho muralha alho
orvalhar espelho batalhas velho aconselhou aparelhos pantalha molhar
brilhará abelha escolherei milhar orelhas mulher botelha semelhante
melhor recolhes maravilhoso aconselhar amantilhar brilho bacalhau reco-
lhemos olhe mexilhons brilhar acolhia olhamos aconselhes trabalhando
semelhar falho brilhante carvalho olhar tolhido aconselhamos vermelho
olhos tolhidos brilha falhar valho barulhos tolher valhas estropa lho
trabalhades encalhou talhar emporcalhado agasalho atalhos murmulhos
falhastes esmigalhar infravermelho parelha milha malhar atrapalhado
espalhar escolho baralhando amuralhada trebelhar piolho orgulhosos
embotelhado humilhar molhar antolhos mergulhar.

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MÉTODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

b) Frases com um só caso de lho

Seu filho vive fora da Galiza. Brilha o mar baixo o sol do meio-dia.
A mulher chorou a perda do home. A ria de Vigo é maravilhosa. Hai
certo barulho na rua. O rapaz quedou tolhido. No meu país hai pouco
trabalho. O bacalhau está algo caro neste momento. A velha dorme
sempre na casa. Escolhe o teu regalo agora mesmo. Esta noite come-
remos coelho. O músico tivo vários falhos aquela tarde. Pouco trabalhas
este ano. ~ difícil modificar o aparelho burocrático do estado. Parece
que este ano hai boa venda de alhos. A parelha de pombas saiu do
monte. O milho vai grande.

c) Frases variadas.

O turista visita a velha muralha da cidade. O rapaz olha para a


pantalha. Está colhendo flores no campo. Hai muitos espantalhos nas
leiras. Trabalharei todo o sábado próximo. Aquel dia colhemos vários
coelhos. A nena rompeu o espelho da sala. O pai debuxou os olhos da
filha. A rua está molhada porque orvalhou. Tua mai aconselha que se
trabalhe. Seu filho vai recolher o milho. Aquela estre la brilha muito.
O teu amigo trabalha mais que as abelhas. Se orvalha, deixa-o. Encontrei
várias mulheres pola estrada . Meu irmao trabalha no concelho. Esti-
vemos toda a tarde na ilha; é maravilhosa. Aquilo foi como encontrar
agulhas no palheiro. Maravilhou-se de todo o que viu. Deu·lhes só as
migalhas da sua comida. O pai conta aos seus filhos muitas histórias
velhas. A toalha está ao lado do espelho. Aquela velha está enferma.
A mulher chegou tarde. O pobre velho perdeu todas as batalhas da sua
vida. Castelhanos de Castela. As verdes canas do milho.

1.4: Escritura de lh

• A escritura de lh nom provoca maiores problemas: por corres-


ponder de modo regular e constante ao fonema que representa,
nom suscita casos de dúvida ortográfica. Como norma prática,
tendo em conta a alfabetizaçom castelhana dos galegos (e tomando
mesmo como referéncia a normativa galega espanholizada, mais
comum nos últimos tempos), podemos formular esta regra simple:
em vez de /l, sempre lho É norma universal, sem excepçons.

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JOS:S:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

• Tamém aqui tem importáncia realizar efectivamente os exercícios:


criam o hábito da nova escrita.
Conviria mesmo que, de ser possível, a escrita se fixesse ao ditado,
a fim de que se estabeleça a conexom mental entre a audiçom do fonema
e o movimento gráfico da Mao, que assi acabará sendo um acto reflexo.

I.S: Exercícios para a escritura de lh

o filho está agora na casa. Fora, na rua, hai duas mulheres.


O home vai algo velho. Aquela ilha era verde. Este concelho é pequeno.
Quero seguir o teu conselho. Das duas casas escolherei a mais nova.
O velho espera vencer a sua última batalha. Este ano terás que
trabalhar mais. A outra caixa era semelhante a esta. Falarei dos
seus trabalhos e dos seus dias.

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2. A grafia nh

2.1: Por que nh e nom fi

• O caso de nhln é paralelo ao de [h/II, pois em realidade a letra


espanhola n é originariamen te urnha abreviatura de nn.

• Tampouco existia em latim o fonema hoje representado grafica-


mente por nhln.

• Em espanhol adoptou-se a grafia nn (abreviada normalmente ii),


porque o NN latino dera nesta língua o fonema n.
Pera no nosso idioma o resultado foi outro : o NN latino
deu n, de maneira que nom havia razam para adoptar nn ou n
como grafia daquel som, pois tal som tinha em galego-português
origem diferente.
Comparem-se os resultados castelhano e galego-português das
seguintes palavras latinas: ANNUM aiio ano, CANNAM caiia cana,
CAPANNAM cabana cabana.

• Em galego-português esse fonema procede com freqüéncia do


grupo latino NI; por exemplo: SENIOREM senhor, SOMNIUM
sonho.
Palas mesmas razons que vimos a respeito de Ih, adoptou-se
a grafia nh para representá-lo.

• Advirta-se que a letra espanhola 11 tem umha feitura um tanto estranha


(urnha «consoante com acento»), e de feito é desconhecida nas demais
linguas.

15
.rOSt·MARTINHQ MQNTERO SANTALHA

2.2: Leitura de nh

• Tampouco a leitura de nh oferece dificuldade: equivale sempre


à letra espanhola fi da normativa desintegracionista, e co mesmo
valor fónico dessa letra leremos o nosso dígrafo.
Convém, porém, exercitar a letra, se possível em voz alta.

2.3: Exerciclos para a leitura de nh

a) Vocábulos soltos.

aranha anho toucinho pergaminhos montanhas senhor sonhando calca·


nhar lenha aninhar acompanhado andorinhas gadanha sonhos vinho
testemunha ra inha ninho ganharemos morrinha empenhar galinhas padri·
nho minha Corunha espinhas unha rebanho caminho lenha caminhando
cedinho tenho venhas sobrinhos tinha Minho tamanho amanhecia conhe·
cer reconhecemos amanhece pouquinho amanhar carinho conhecendo
amanhecer punhos tristonho banhar·se apanhou acompanharei linho
paxarinhos setemesinho conhecimento enfarinhar ganharás baixinho
pedigonho desenhos banhemos desemaranhado mezquinhos caminhare·
mos conhecíades sonhei banhos apanhará Carinho hortinha pinheiros
moinho gaitinha pequeninhos caminhará adivinho medonho sonhemos
risonhos testemunhar daninho focinhos.

b) Frases com um só caso de nh.

A aranha corre pola parede. Naqueles países chove pouquinho .


O vinho vai indo acabado. Caminharemos ao anoitecer. Naquel monte
hai muitos pinheiros. Fai falta outro caldeiro de maior tamanho. Temos
que traer mais lenha para o inverno. Cando venhas, podes traer a nena.
As andorinhas chegam coa primavera. Di que sabe adivinhar o futuro .
Tenho pouca saúde desde neno. Cando chove, parece que amanhece
mais tarde. O corvo está no seu ninho. Meu padrinho morou uns anos
no Brasil. O neno sonhou que era astronauta. A cade la só quer comer
ovos de galinha.

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MtTODQ PRÁTICO DE LtNGUA GALEGO·PQRTUGUESA

c) Frases variadas.

Minha terra , minha terra, terra onde me eu criei. Na montanha


hai muita lenha. Os sonhos do neninho. Vai na Corunha. Viveu sonhando.
Hai galinhas no caminho. Chamou os sobrinhos antes de morrer. Ergue·se
todos os dias mui cedinho. Caminho, caminho longo, caminho da minha
vida. A andorinha revoa no ar. Aquel senhor nunca bebe vinho. Meu
pai quer sair sempre acompanhado . Tinha a casa dos pais. Hortinha
que quero tanto . Como chove miudinho, como miudinho chove! Ai,
minha pobre casinha! Paxarinhos piadores, casinha do meu contento.
Gaitinha, gaita galega. Doces galeguinhos ares, qUitadoirinhos de penas.
O rebanho caminha pola montanha. Conheces Mondonhedo? Amanhecia
pouquinho a pouco. Era mui medonho. Acompanhou-nos cheio de cari-
nho. Sairemos cedinho. Os pinheiros da beira do Minho. No ninho dos
paxarinhos hai espinhas. Venho de Pinheiros. Caminharemos risonhos
no meio das dificuldades. Este senhor di que adivinha o porvir. Tenho
pouco conhecimento do problema.
Pinhares que move o vento. Moinhos dos castanhares. Amorinhas
das silveiras. Arinhos. arinhos, ares, arinhos da minha Terra; arinhos,
arinhos, ares, arinhos, levai-me a ela! Era da montanha, onde tinha a
sua pobre casinha. Se sodes mezquinhos, ganharedes menos. No monte
hai animais daninhos.

2.4: Escritura de nh

• Dado que, igual que sucedia com lh, o dígrafo nh corresponde de


modo constante ao fonema palatal nasal que representa, nom hai
dificuldades com respeito ao seu uso na escrita. Portanto, podemos
formular urnha regra semelhante à de lh: em vez de fi, usa-
remos sempre nh.

2.5: Exercícios para a escritura de nh

Al1tes de nada quero banhar o neno. Nós conhecemos mal a cidade.


A galil1ha está outra vez na eira. Agora hai pouco cultivo de linho
no país. O caminho antigo é lon go de mais. Este senhor di que ainda

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JOSl!:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

é cedo. O sonho do pai fora realmente bonito. Meu padrinho morreu


hai anos na Corunha. Tenho aqui a tua última carta. O marinheiro
cultiva a horta da sua casinha. O poeta foi ver o amanhecer na
montanha.

2.6: Exercícios para a leitura de lh e nh conjuntamente

Caminhamos durante várias horas pola muralha. O velho tinha ainda


folgas para bailar. Queria visitar a filha e o sobrinho na Corunha.
Encontrei esta botelha no caminho velho . O seu filho conhece mal o
rio Minho. Venha visitar as ilhas comigo. O padrinho falou-lhes carinho-
samente. Podes acompanhar-me ao concelho esta manhá? O seu olhar
é algo tristonho. O pai reconheceu o cadáver da filha. Palo atalho
caminha-se melhor. Tenho qeu trabalhar toda a semana. A pobre velha
vinha caminhando desde Carvalho . Era o melhor anho de todo o
rebanho. Minha irmá trabalha no Carvalhinho.

2.7: Exercícios para a escrita de lh e nh conjuntamente

O teu amigo colheu o outro caminho. Tenho eu o velho documento.


A minha filha vive na cidade desde hai semanas. Este pinheiro vai
velho. O coelho corre velozmente palo caminho. De inverno trabalha
o vento nas montanhas do deserto. Esta toalha é algo pequena para
o banho. A velha deu ainda outros conselhos aos sobrinhos.

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3. A grafia -m final de vocábulo

3.1: Por que -m e nom -n

• A nasalidade final de palavra pronuncia-se em galego-português


de modo diferente a como se fai em espanhol: em espanhol é
normalmente alveolar (isto é: a língua coloca-se nos alvéolos), ao
passo que no nosso idioma é predominantemente velar (a língua
coloca-se no véu do paladar, na parte traseira da boca).
Assi, soam diferentemente num idioma e noutro as palavras
en/em, ou con/com, ou un/um. Um castelhano pronuncia, por
exemplo, un amor como unantor, e en Ares como Henares; mas
um galego distigue em Ares de Henares.

-n f1.naL castelhano Nasalidade final galega


( alveolar) (velar)

19
JOSt·MARTINHO MONTERO SANTALHA
- -- - - - -

• A grafia com -m final foi urnha característica própria do galego-


-português frente ao espanhol desde os primeiros escritos me-
dievais.
Na época moderna, podem citar-se como mostras do uso de
-m final Sarmiento (que nas suas «CopIas» galegas usa bebim,
bem, bom, comim, fum, quixem, serem, tem, vim, etc.) e Pintos
(que em «A gaita galega», escreve além, bem, um).

3.2: Leitura de -m final

• O -m final representa a nasalidade final de palavra tal como


de feito a pronunciamos os galegos na nossa fala normal. Nom
se trata, pois, de pronunciar diferentemente a como o vínhamos
fazendo; é este um critério que, de resto, se há de aplicar a toda
a ortografia reintegrada: deve-se ler pronunciando tal como se fala.
No caso de -m final, pois, nom se trata de articular m (bila-
cial; isto é, fechando os lábios) em vez da nasalidade final galega .
Na leitura pronunciaremos exactamente igual a como se vinha
pronunciando até agora a letra -n final da normativa espanholi-
zada: varia a grafia, mas a pronúncia segue sendo a mesma.

3.3: Exercícios para a leitura de -m

a) Vocábulos soltos.

em vaivem bem falam algum umm temerom tamém comerám ordem


souberom partem fum alguém tam desdém latim nengum partam trem
boletim temem estariam couberom sem mim bom partim serám tivem
cem um vim forom temerom som nem comum porém andam unem
matusalém botim atum bombom irám dirám temim quem estivem ama-
riam derom levarám louvarom terem cumprem folgam diriam farám
fariam perdem falarom podiam querem poderám com valem vam ouviam
pedirám forem moram integrariam instruírem inflarom doam cansem fun-
dirám filmarom reúnem sentiam detectarom eram designarám cobrem
cubram chegarem cercarom cederiam causam sentem tardam perdom
teimam tornem vestem vistam vertiam voltarem vivem.

20
M~TOD PRATICO DE LtNGUA GALEGO·PORTUGUESA

b) Frases com um só caso de ·m.

Tamém chegou o pai. Nom faledes mal deles. Bem sei o que queres.
Ninguém sabe aonde foi. A carta está escrita em italiano. O médico
viveu algum tempo na vila. Onde andam os teus amigos? Serám agora
as seis da tarde. O trem chegou cheio de estudantes . Perderom outra
vez o partido. A vaca tem fame. Poucos deles cumprem a lei. Trouxo
algo para mim o carteiro? Ouvim que te querias ir daqui. Os poetas
cantam a beleza. o amor e a liberdade . Nom sabemos aonde ir.

c) Frases variadas.

Eles estám mui bem. Tamém falam italiano. Sempre chega alguém
tarde. O boletim tem boa cara. Cuidade o bem comum. Um momento
temim pala sua vida. Esta tarde saiu algum trem. Comunico·che a
ordem de saída. Marcharám sem nada . Este é um mal mui comum aqui.
Na escola editaram um boletim informativo. Contam que foi a mai quem
o matou. Estivem todo o dia na casa . Chegou a ordem de partirmos.
Algum home saiu. Os alunos sabem muito. Tamém me dixo que nom
queria ir. Nom podem estar quietos nunca. Hai um neno à porta . Aqueles
amigos teus som pouco simpáticos. Eu som galego. Todo isto é para
mim? Ninguém soubo dar-nos notícias dela. Bem está que che falem.
Os seus habitantes comem muito pam e pouca carne. Aquelas amigas
falam sem parar. Concederom-che o seu perdom. Elas chegaram mui
cedo . O primeiro dia alguns nenos choram ao verem-se sem amai.
Suspenderam-me em latim . O trem vem sempre cheio de estudantes.
Estou tam cansado! Vestem com elegánc ia.

3.4: Escritura de -m

• Escreve-se -m sempre em vez de -11 final como última letra


de calquer vocábulo. Tampouco neste assunto surgem dificul-
dades ortográficas, pois trata-se dumha norma regular e constante,
de alcance universal .
• Tenha-se em conta unicamente que esta norma gráfica se
refere s6 ao caso em que -111 se encontra em posiçom final de
vocábulo; ou seja: cando -m é a última letra da palavra. Em caso

21
JOSJ!:-MARTINHO MONTERQ SANTALHA

contrário, já nom tem aplicaçom a norma; por exemplo, na


formaçom dos plurais, que, como se sabe, acrescentam um -s ao
singular.
Assi, escreveremos jardim ou razom ou algum, com -m, por
ser esta a última letra da palavra; pero nom já nos respectivos
plurais, porque a derradeira letra do vocábulo é agora -s (jardins,
razons, alguns).
• Entre os casos mais significativos do uso de -m final podemos
sinalar dous: as formas verbais de 3a persoa de plura.l (p.e.: comem, foram,
estarám), e os substantivos terminados em -om (p.e.: razom, coraçom,
naçom).

3.5: Exercícios para a escrita de -m

Os rios correm para o mar. No barco chegaram uns nenos. Nom


quero que cales mais. Cando se cansem, será tarde. Quem me dera
restar ali! Bem sei que, se queres, podes vir. Os pequenos ouviam
o rumor remoto do mar. Podes ir tamém sem mim. Falou tam bem
que pareceu convencer a todos.

3_6: Exercícios para a leitura de lb, nb e -m conjuntamente

Os teus sobrinhos colheram um ladrom na casa. Ainda que nom


venhas manhá, nom importa. O pai dixo que esta vez chegariam cedi-
nho. Tinham grandes aros de metal nas orelhas. Quero sonhar para
a minha pátria um futuro brilhante. O velho nom sabia trabalhar sem
cantar. Estes dias estám malhando o trigo. Poucas persoas conhecem
agora os velhos caminhos da aldeia. Nom quero mais vinho embote-
Ihado. Chovia miudinho. e molharam-se sem se darem conta. Nom hai
atalho sem trabalho. Ouviam-se alguns murmulhos entre o público.
Nesta pequena praia é onde se banham os turistas e os velhos.

3.7: Exercícios para a escritura de lh, nb e .,m conjuntamente

Polo caminho correm dous coelhos. Nom quero mais o teu con-
selho, que me foi daninho. Tenho que colher um pouco de leite.

22
MilTODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

Este pam é de milho. Aqueles espelhos valem pouco. Os velhos nom


queriam beber vinho. Alguém tem que recolher o botim da batalha.
Os filhos vam na montanha. Tamém lhe derom um golpe num olho.
Na montanha vivem ainda alguns coelhos.

3.8: Texto literário

o:Carvalh1nho torto".
por Eduardo Pondal

Fllho cativo da gándara. Batido do frio vento,


pobre carvalhinho torto: sem abrigo e sem conforto.
aquel que naceu pobrinho desvalido e sem arrimo ... ,
mais lhe valera vir morto. pobrinho carvalho torto!

23
JOSt:-MARTINHO MONTERO SANTALHA
-------------------

Extensotu geográfica do nosso idio-ma

1 Ga.llza. e Portuga.l (lncluldas as ilhas dos Ac.:ares, 2, e da


Madeira, 3), 4 Cabo-Verde, 6 Guiné-Bissau, 6 Brasil, 7 São-Tomé-
-e-Príncipe, 8 Angola, 9 Mot;amblque.

24
4. A grafia mh

4.1: Por que mh

o A grafia mh representa a nasalidade velar intervocálica em


posiçom medial (do mesmo modo que -m a representa em posiçom
final, como vimos).
o Ocorre somente em três palavras: umha e os seus compostos
algumha e nengumha, cos seus respectivos plurais. (Naturalmente,
tamém ocorre nas contracçons em que entra algurnha dessas
formas: dumha, nalgumhas, etc.).
o Em lugar de mh nom se pode usar nh, pois ]a vimos (pár-
rafo 2.2) que esta segunda grafia tem outro valor: o correspon-
dente à letra espanhola ii.
o Tanto a grafia mh como a pronúncia velar som exclusivas
da área galega; os luso-brasileiros pronunciam e escrevem m
bilabial: uma, alguma, nenhuma.
• Esta grafia mh foi já usada e defendida po r Sarmiento no século XVIII
c por Pintos no XIX (que escreviam wn-ha, algum-ha, cum hifem desne-
cessário, do que actualmente prescindimos) .

4.2: Leitura de rnh

o Leremos -l11h- coa mesma pronúncia da nossa fala habitual;


na maior parte da Galiza corresponde, como dixemos, a umha
consoante nasal velar (ver debuxo no párrafo 3.1).
Nom se pronuncie, pois, 111 bilabial (embora, neste caso, essa
seja efectivamente a pronúncia normativa da área luso-brasileira).

25
JOSt:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

• Os exercícios sobre este dígrafo limitam-se, como é lógico,


aos três únicos vocábulos em que aparece_

4_3: Exercícios para a leitura de mb

a) Vocábulos soltos_

umha algumha nengumha dumhas dalgumha nengumhas nalgumhas umhas


dalgumha numhas nalgumha numha algumhas dumha.

b) Frases com um s6 caso de mh.

Era umha pequena cidade. Vou visitar umhas amigas . Choveu toda
umha semana. Nengumha nena quer ir à aldeia. Algumhas tardes fai
vento . Nengumha mai quer mal aos seus nenos . Era umha noite de
inverno. Chegara numha tarde de primavera .

c) Frases variadas.

Visitei algumhas casas dumha aldeia meio abandonada. Nalgumhas


leiras hai umha cancela. Nengumha aluna quixo estudar este tema.
A sua vida foi umha luz que nunca se apagará. Alguns dias chega
algumha, pero os mais deles nengumha.

4_4: Escritura de mb

• A escrita de mh nom oferece dificuldade, pois trata-se, mais


umba vez, dumha grafia fonológi ca. Isto é: o dígrafo -mh- corres-
ponde de modo regular e constante à nasalidade velar intervocálica
em posiçom medial de vocábulo.
De resto, o feito de aparecer só em três vocábulos facilita
ainda mais, se cab e, a aprendízage do seu uso .

4_5: Exercícios para a escrita de mb

O neno está numha cidade enorme. Na sala hai algumhas flores.


A artista recitou umhas poesias de Rosalia. Nengumha vez o dixo mal.
Hai umha luz na rua. Temos que abrir algumha porta de saída
neste problema.

26
Ml!:TODO PRATICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

4_6: Exercícios para a leitura de lb, oh, -m e mb conjuntamente

O senhor aquel nom parece tam velho como é_ Numha tarde de


inverno chegarom uns senhores de fora . Um rebanho de ovelhas subia
polo monte. Polos caminhos do lugar correm os nenos detrás das
galinhas. As suas filhas chegarom mui tarde aquel dia. Pola noite
venhem alguns amigos, e falamos até tarde. Os ladrons repartirom o
botim entre todos. Som cousas da minha mulher! Colherom muito
atum, pero nom o dam vendido. Cando ela venha , será ai nda bem
cedo . Temim pola sua vida, mas agora está bem. A mulher nom quer
que deixe os filhos sós na casa. É bem fácil perderem-se por entre
tantos caminhos . Quem che dixo que nom tínhamos mais nada que falar?
No caminho hai umha botelha rota. O cam nom quer apanhar as
migalhas de pam . Ainda ani nham as pombas na casa velha. Algumhas
galinhas ponhem ovos grandes. Nom sei como poderemos amanhar
isto agora. Era umha formosa noite de luar na época da primavera.
Se me deram a escolher, eu nom sei que escolheria. O carteiro trouxo
um postal para ti.
Chamam-lhe .A marquesinha., e os seus peinhos vam sempre nus.
Vai à fonte, depelica patacas, e chamam-lhe . A marquesinha· . Nom
foi à escola por nom ter chambra que pôr, e chamam-lhe .A marque-
sinha ... Sua mai é pobre e trabalha na casa do marquês. E ainda lhe
chamam .A marquesinha •.
A lua é como umha velhinha de brancos cabelos, de rugas de ouro
e de olhinhos cegos. Ergue-se do seu leito nas ondas do mar e caminha
pola escuridade do céu às apalpadelas. Anda polo mundo sem ver
aonde vai, pois as estrelinhas levam-na da mao. Abriga-se envolvendo-se
em névoas, pois, como vai velha, tem-se de cuidar. E cando na alta
noite brua o temporal, a lua tapa-se entre as trevas, a tremer. logo,
cando o mau tempo vai amainando, amostra de novo a sua face e
espalha o luar.
O fogueteiro chama-se Silvestre e é f ilho dum senhor qu e foi
conhecido polo nome de .. Faísca •. Aprendeu em Sam Martinho do Vale
o ofício de fogueteiro com um parente da mai. Nom usa dos apelidos
paternos porque tem vergonha de seu pai , que era ladrom . Do pai
aprove itou somente a ve lha casa que agora habita coa sua mu lher.

27
JOS~-MARTINHQ MQNTERQ SANTALHA
------------------
Era um home habilidoso, e os seus foguetes tinham fama pala comarca.
Corria-lhe bem a vida e tinha casado com umha mulher dura e traba-
lhadora. Um dia um aprendiz, por descuido, deixou pegar o lume num
feixe de bombas, estando ambos ausentes. Cando Silvestre e a mulher
voltaram, encontraram catro paredes denegridas e o interior da casa
a fumegar, cheio da brilhante claridade da lua. A velha casinha ardera
e o pobre aprendiz morrera ca rbonizado.
Os pinheiros fa lam co rumor das suas altas copas baixo o plácido
luar. O fogar de Breogám, confim dos verdes castras, é a Galiza.
Breogám foi um mítico caudilho dos celtas. Os bons galegos entendem
a voz dos pinheiros e atendem com arroubo o seu rouco som. S6 os
ignorantes e duros nom os entendem. Som chegados os tempos que
os bardos das idades antigas anunciaram. As suas vagas ánsias terám
cumprido fim.
Vale mais o que significa umha vaca que o que simboliza um leom.
A vaca esqueceu-se dos cornos e dá-nos o seu trabalho, o seu leite,
a sua carne, o seu coiro, e a carne e o coiro dos seus filhos. Nom nos
pode dar mais . O cam será o amparo dos ricos, que defende a proprie-
dade do amo e ladra aos pobres que vam palas caminhos. Em troca,
a vaca é o amparo dos pobres.
Cando a luinha aparece, e o sol nos mares se esconde, todo é
siléncio nos campos, toda na ribeira dorme. As veigas quedam sem
persoas, e os montes sem ovelhinhas, e a fonte sem rosas vivas, e
as árvores sem cantores. O vento move os pinheiros e levanta umha
voz triste. As campanas tocam em sons de morte. As estrelinhas pálidas
brilham timidamente. Que hora tam triste aquela em que o sol se
esconde!

4.7: Exercícios para a escrita de lh, oh, -m e rnh conjuntamente

Aqueles senhores trabalham nwnha fdbrica. Vale mais wnha vaca


que um anho. Os marinheiros falam Ita tabeYl1a. O camil1ho é [ol1go
e vai ao lado dumha muralha velha. Os pastores contam as ovelhas
do rebanho. Nas montanhas da ilha amanhece mais cedo. Os filhos
foram recolher o dinheiro ao banco. Dixo que o seu pac/rinho o
humilhara algumha vez. O velho ItOm pode trabalhar. Temi", pala
vida do teu filho. Perderam o caminho mais dumha vez. Os teus

28
lUTODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

amigos estdm fora da Corunha esta semana. Esta mulher nom sabe
perdoar. Estivem umha vez em Mondonhedo. Fai falta recolhermos
algwnha lenha mais. Apareceu o escritor acompanhado dum cam
de grande tamanho.

4,8: Repasso: exercícios de leitura

co lher trabalho filhos velha concelhos aconselhando orelha tolher olhos

O velho trabalha muitas horas. Se chove, molhas-te. A filha da


mulher vai na vila. Aconselho-che que trabalhes mais. Parece que fala
cos olhos. Aquel espelho está molhado. Olha por onde andas. Escolho
esta botelha. O seu filho é mui orgu lhoso.

montanha sonhar galinha senhora aranhas caminhando lenha pinheiro


banhar

A minha casa está pertinho daqui. Manhá espero chegar cedinho.


Conheces a minha irmá? Amanheceu-nos palo caminho. O sobrinho
sonha coa carta. Tenho vários paxarinhos na sala . Era miudinho desde
mui neno. Aquel senhor apanhou o dinheiro da mesa.

bem algum cantam com falaram um cem foram som nem estivem
quem bom chorarám

Os nenos cantam mui bem. Tivem algum medo. Eram um cento de


gaivotas palo menos. Nem falam nem deixam falar. Procura que nom
se cansem tam cedo. Estiveram todo um dia sem sair da casa . Nom
sei se darám com ela. Todos eles vivem em Ourense. Deixa algum
peixe bom para mim tamém .

umha algumha nengumha umhas algumhas nengumhas dumhas dalgu-


mha numha dumha

Umha boa tarde desapareceu. Algumhas semanas antes chegara


outro barco. Visitei umhas casas, pero nengumha era nova.

29
JOM·MARTINHO MONTERO SANTALHA

o pequeno pastor contou as ovelhas do seu rebanho ao voltar


para a casa e achou a faltar umha. Era noite fechada e tinha medo de
voltar ao monte. Na montanha aparecera o cadáver dum estudante,
muitos anos antes. O rapaz chora encolhido, a um canto do curral,
pola ovelha que se lhe perdera . O amo brada e o bom do rapaz tirita
de medo. Olha bem: vai agora mesmo em procura da ovelha. Se a nom
trouxeres, nom me venhas mais para a casa, que che arranco os
fígados pola boca. O amo, furioso, deu-lhe ademais dous fortes pontapés .
Entom o pastor saiu caminho da serra, cheio de medo. O moinheiro
vinha cantando polo caminho velho. Tés medo de andar de noite,
meninho? Tenho, si, senhor, tenho medo. Pois espera aí que venho
eu e vou contigo. Acompanharei-te aonde for preciso. O moinheiro
conhecia bem o amo do pastor. Nom tenhas medo, que os que morrem
nom fam mal a ninguém. O moinheiro vai conversando co pastor polo
caminho pedregoso. Os vagalumes fosforeiam entre os silvedos.
A mulher chama-se Narcisa e ganhou fama de ladra entre os habi-
tantes da comarca. Os mais queixosos dela som os que outrora lhe
colherom as flores da beleza. Narcisa sai-lhes nas concavidades dos
caminhos escuros , e aboca-Ihes à cara umha pistola de dous canos.
Temiam-na porque vinha disposta a vender cara a vida. Os senhores
da freguesia tinham ordem de a capturarem, mas nom se atreviam .
O velho poeta nom gosta das rosinhas brancas nem das vermelhas .
Venera desde neno as florinhas ténues da montanha, que sorriem,
com medo, entre espinhas. Nas noites em que orvalha, o céu agasalha
com diamantes as florinhas do campo. Estas flores pequeninhas som
como um prezado tesouro. Porque as florinhas bravas das montanhas
som de ouro velho. Minha mal trouxo algumhas f lores amarelinhas .
Que a mentira nom se imponha cos seus berros sobre o siléncio
dos que nom podem falar. Muitos séculos de história tenhem influído
na mentalidade dos galegos, nos de onte e nos de agora, velhos ou novos.

30
MSlTODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO·PORTUGUESA

4_9: Texto literário

«No ninho novo do vento»,


por Alvaro Cunqueiro

No ninho novo do vento Tem ares de flor recente,


hai umha pomba dourada; cousas de recém-casada;
meu amigo, lneu amigo,
quem pudera namorá-la! quem pudera namorá-la!
Canta ao luar e ao amencer Tamém tem sombra de sombra
em flauta de verde olivo; e andar primeiro de tio;
quem pudera namorá-la, quem pudera namorá-Ia,
meu amigo! meu amigo!

OBSERV AÇONS. Amencer é um dialeclalismo: a forma correcla é ama-


nhecer. O olivo é castelhanismo: o correspondente vocábulo galego-português
como nome de árvore é a oliveira.

31
JOSt-MARTINHO MONTERO SANTALHA

Território continental europeu do idioma galego-português.

32
5. Acentuaçom das palavras terminadas em ditongo crecente
(p.e.: séria)

5.1: Por que acentuar séria, etc.

• Em espanhol acentuam·se as palavras sería, día, continúo e


similares (e igualmente cando terminam em ·s: serías, dias, conti·
núas, etc.) .
Acentuando esse tipo de palavras, nom é preciso acentuar,
por exemplo, seria (igual que feria, etc.) ou continua (igual que
estalua, etc.) e vocábulos do mesmo tipo.
Resulta assi o seguinte sistema de acentuaçom gráfica: seria·
-seria, continúa-continua, continúo-continuo, etc.
• Em troca, em português (e parcialmente tamém em catalám)
segue-se o critério oposto: levam acento gráfico as palavras arriba
citadas na segunda série e nom as da primeira.
Portanto o sistema de acentuaçom é inverso ao espanhol:
seria-séria, continua-contínua, continuo-contínuo, continuas-contí-
nuas, etc.
• Calquer sistema de acentuaçom tem algo de convencional,
como em certa medida o tem todo o sistema ortográfico. De modo
que calquer desses dous sistemas poderia ser válido para o
nosso caso.
• Porém, o reintegracionismo propugna a adopçom do sistema
luso·brasileiro de acentuaçom e o abandono do espanhol, por
várias razons:

33
JOS~-MARTINH MONTERO SANTALHA

ante todo, para manter a unidade gráfica em todo o possível


coas outras duas áreas do nosso idioma (portuguesa e bra-
sileira) ;
pera, ademais, porque o sistema dos luso-brasileiros responde
melhor à índole do idioma, como vamos ver.

5.2: Os encontros vocálicas

• Os encontros de duas vogais numha mesma palavra podem


formar ditongo ou hiato:
ditongo, se as vogais constituem urnha única sílaba; por exemplo:
animais (pronunciado a-ui-mais), falei (ta-lei), cantou (can-
tou), etc.;
- hiato, se as vogais formam parte de sílabas distintas; por
exemplo: miúdo (pronunciado mi-u-do), sair (sa-ir) , etc.
Nos ditongos, urnha das vogais é o núcleo ou centro da sílaba:
normalmente as vogais a, e, o. As outras duas vogais (i, u) consti-
tuem a margem da sílaba (e chamam-se por isso semivogais ou
semiconsoantes). Em caso de aparecer i e u formando ditongo
entre si, o núcleo silábico está constituído em galego pala que
se encontra em primeiro lugar, calquer que ela seja; por exemplo:
muito, partiu.
• Ora, hai dous tipos de ditongos: crecentes e decrecentes:
crecentes: cando o núcleo silábico está em segundo lugar:
hiato, ódio;
decrecentes: cando o núcleo silábico está em primeiro lugar:
outro, eiras, falou, vai.
• Pois bem: a nossa língua caracteriza-se por possuir muitos
ditongos decrecentes (ou, ei) . E, palo contrário, mostra certa ten-
déncia a evitar os ditongos crecentes, convertendo-os em hiatos .
Assi se explica o feito de que na escrita galega apareçam por vezes
formas como língoa (em vez da correcta língua), cámbeo (em vez
de cámbio), rabear (em vez de rabiar), etc.

34
M~TOD PRATICO DE L1NGUA GALEGO-PORTUGUESA

Ou seja, que na nossa língua os ditongos decrecentes som


estáveis : nunca deixam de ser ditongos. Em troca, os crecentes
som inestáveis, pois tendem freqüentemente a ser pronunciados
como hiatos.
• Em espanhol dá-se a tendéncia inversa: manifesta-se, por urnha
parte, urnha aversom histórica aos ditongos decrecentes (os diton-
gos decrecentes etimológicos ou históricos acabaram por mono-
tangar-se; comparem-se, por exemplo, as formas galegas touro,
amou, eira, cantei coas correspondentes espanholas toro, amó, era,
canté), e, por outra parte, umha preferéncia palas ditongos cre-
centes, constatável nos feitos de que historicamente se criaram
novos ditongos crecentes a partir de vogais simples (comparem-se
as formas galegas terra, porta coas correspondentes castelhanas
tierra, puerta), e de que ainda modernamente o idioma espanhol
tende a converter em ditongos crecentes alguns hiatos ou ditongos
decrecentes (por exemplo, as palavras ruido, cuidar, descuido som
pronunciadas hoje com ditongo e com acento tónico no segundo
elemento vocálico).
• Esta é a razom pala que, na alternativa entre acentuar sena
ou seria, resulta aconselhável acentuar séria e nom seria (= se-ri-a),
pois este sistema de acentuaçom deixa aberta a possibilidade de
pronunciar os encontros vocálicas do primeiro caso e similares
como ditongos crecentes ou como hiatos.
As palavras afectadas tratam-se, portanto, como se fossem
esdrúxulas: água igual que mágoa, pária igual que área, etc.
Por outra parte, neste sistema os vocábulos do tipo dia,
lua, etc. som tratados como vocábulos graves normais, tal como
em realidade som, os quais nom devem levar acento gráfico:
dia como mina, lua como lupa, etc.

5.3: Exercícios de leitura

a) Vocábulos soltos.

eficácia perspicácia audácia falácias ineficácia farmácias contumác ia


pertinácia imundícia malícia delícias milícias carícias perícia notícias
imperícia abundância infáncia redundáncia concordáncia, extravagáncia

35
JOSt::':MARTINHO MONTERO SANTALHA

elegáncia arrogáncia ambuláncias petuláncia repugnáncia discrepáncias


protuberáncia exuberáncia preponderáncia toleráncia intoleráncia distán-
cias Ignoráncia importáncia substáncia circunstáncia observáncia inércia
argúcias astúcia minúcias comédia enciclopédia perfídia insídias paródia
custódia prosódia rapsódia concórdia discórdias dálias sandálias repre-
sália camélias família magnólias tertúlia infámia calúnias cópias diária
ordinárias sanguinária culinária várias matérias bactérias escória chi-
cória glória memórias divisória dedicatória escapatória oratória fúria
moratória vitória histórias pátria penúria ánsias autópsia controvérsias
modéstia angústia moléstias acéquia relíquias parróquia
récua áscua águas frágua légua línguas míngua estátuas perpétua mútuas
árdua ambígua contínua contígua
espécie imundície superfície série planícies barbárie intempérie
ténue bilíngüe ténues monolíngües
láb io sábio tíbios anfíbio cámbio micróbio advérbio subúrbio provérbios
distúrbios palácio cartapácio exercícios desperdício malefício benefício
edifício sacrifícios orifício ofício vitalício suplícios comícios início
precipício propício hospício auspíc io alimentício armistício interstício
vício cálcio siléncio anúncios ócio bócio negócios sócios comércios
divórcio rádio estádio médio remédio tédio homicídio suicídio subsídio
presídio incéndio vilipéndio compéndio índio latifúndio episódio custódio
prelúdio repúdio epitáfio idílios utensílios exílio auxílio símios exímio
uránio alumínio matrimónio património demónio escárnio contubérnio
infortúnio princípio ópio telescópio município precário solidário parti-
dários sóbrio calendário ideário diário mercenários veterinário equilí-
brio ministério cemitério irrisório provisório quilovátio vóltio obséquio
colóquio óbvio prévio alívio dilúvio
inócuo resíduos árduo ambíguo contíguo exíguos supérfluo contínuo
fátuos mútuo perpétuos inócuos

b) Frases variadas e textos.

o condutor actuou com audácia verdadeiramente temerária . Os alu-


nos sentem angústia ante o exame. Durante os últimos anos receb eu
numerosos benefícios daqueles latifúndios. O atleta perdeu a vida num
acidente irrisório. As glórias do país devem ficar na memória dos seus
filhos. O pai conseguiu estabelecer a concórdia entre os irmaos. O mé-
dico descobriu-lhe umha grave caréncia de cálcio. Os seus negócios

36
M..t;TODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

vam mui mal ultimamente. Era um rapaz sério no seu trato, e sóbrio
na comida. Nom comprendo por que lhe tenhem tanto ódio no ministério.
Todos cantos sabiam algo da história da vila em que eu nacim,
repousam agora deibaixo da terra. A senhora Sinforosa era umha
velhinha que tinha o ofício de recadeira . Era honrada, ou parecia sê-lo,
pois vivia do seu crédito de mulher de bem.
Era umha rua num porto do norte. As tabernas estám cheias de
marinheiros e botam polas suas portas o bafo quente dos borrachos.
Dous marinheiros que nom se conhecem falam entre si em línguas
diferentes. Prometem-se amizade, cada um no seu falar. Ambos entram
numha taberna servida por um home gordo. Querem perder o sentido
bebendo, para serem mais amigos. Quem sabe se despois de bem
borrachos poderám entender-se! Um dos marinheiros pom-se a cantar.
«Lanchinha que vás em vela, levas panos e refaixos para a minha
Manuela ». O outro marinheiro arregala os olhos e bota-se tamém a
cantar. Os dous marinheiros eram galegos. O taberneiro, gordo como
um flamengo de casta, viu sair os dous marinheiros da taberna , e pola
sua face vermelha escorregarom duas bágoas. Tamém el era galego.
O primeiro, o idioma dos pais , o idioma em que cantarom reis
e trovadores nos séculos da Idade Média. O idioma é o filho maior da
pátria galega, que nola conservou e conserva ainda agora como um
dom. O galego é o formoso Idioma que do outro lado do rio Minho é
língua oficial. A língua galego·portuguesa serve a muitos milhons de
homes em vários continentes. O galego·português tem umha literatura
representada por nomes gloriosos, desde hai oito séculos. Este antigo
e formoso idioma é o que nos dá direito à terra em que fomos nados.
Nunca pagaremos sufici entemente aos irmaos portugueses que
tenham feito do galego um idioma nacional. Mais afortunado que outras
línguas do mundo , nom morrerá , E até no outro lado do mar , no imenso
Brasil, ouvirá-se sempre a língua que nós falamos.

5.4: Escritura

• Nom se confunda o tipo de palavras afectadas por esta norma


de acentuaçom (caracterizadas por ser a sua última sílaba um
encontro vocálico que pode pronunciar-se como ditongo crecente
ou como hiato) coas palavras que terminam em vogal sim pie mas

37
JOSt-MARTINHQ MONTERO SANTALHA

tenhem ditongo tónico na penúl tima sílaba (p.e.: ouro, tesouro,


moura, cousa, saiba, caibas, queiram, eiras, causa, coiro, etc.);
neste segundo caso trata-se de vocábulos graves normais, que,
conforme as normas de acentuaçom já clássicas, nom devem levar
acento gráfico.

5.5: Exercícios de escritura

A superfície é redonda. Celebraremos a tua vitória. Nom me


agradou nada aquela comédia. A minha família está fora esta semana.
Di algum advérbio de lugar. O italiano é a língua da Itália. Parece
que a sua morte nom foi um suicídio. Esta sociedade cultural tem
mais de mil sócios. O pobre home nom tinha ofício nem benefício.
Fai várias cópias para todos nós. O meu município comprende sete
parróquias. Nom te podes quedar em siléncio toda a vida.

38
6. Vocábulos que nom precisam acento gráfico
(p.e.: alegria, ali, perdom)

6.1: Aforrar acentos

• O sistema de acenluaçom gráfica inspira-se nos dous critérios


seguintes: claridade e economia.
Claridade: que calquer palavra escrita poda ser pronunciada
correctamente sem possibilidade de dúvida no que di respeito à
tonicidade silábica.
Economia gráfica: que se use o menor número possível de
acentos gráficos.
Em virtude da aplicaçom destes dous critérios, a grandíssima
maioria de palavras da língua nom precisam de acento gráfico.
Entre estas incluem-se muitas que segundo as leis ortográficas do
espanhol o levariam. Eis seguidamente alguns casos mais im-
portantes.
a) Já vimos que se acentuam graficamente vocábulos como séria,
sérias, contínua, contínuas, etc.
Por conseguinte, nom necessitam acento gráfico seria,
serias (nas quais a sílaba tónica é ri), continua, continuas (nas
quais a sílaba tónica é nu), e similares: ria, dia, alegria, teorias;
lua, sua, constitua, habituas, situam, etc.
Todos estes vocábulos som tratados, pois como vocábulos
graves normais: ria como rima, sua como suba, etc.
Dado que entre estas terminaçons encontram-se algurnhas
desinéncias verbais (p.e.: temia, unias, cantaria ... ), este tipo
de palavras é mais freqüente no idioma que o da outra série;
is to quer dizer que neste sistema se usam menos acentos
gráficos.

39
JOSJõ:·MARTINBO MONTERO SANTALHA

b) Tampouco precisam acento gráfico as palavras agudas cuja


sílaba tónica está constituída polas vogais i ou u; por exemplo:
ali, aqui, assi, anis, latim; tabu, obus, comum, alguns.
A razom é o critério de economia gráfica: as palavras graves
terminadas em sílaba com vogal i ou u som poucas e menos
freqüentes: grátis, táxi. Melhor, pois, ter que acentuar estas, que
som menos, e nom as outras.

c) Tampouco precisam acento gráfico as palavras agudas termi·


nadas em -om (nem o seu plural, terminado em -ons): perdom
perdons, bombom bombons, razom razons ...
Pertencem a este grupo as numerosas palavras formadas cos
sufixos -çom, -som, -xom, dos que falaremos mais adiante; por
exemplo: cançom cançons, prisom prisons, reflexom reflexons.
Adverténcia: apesar de existir palavras graves com essa
mesma terrninaçom -om (a saber: a 6' persoa do pretérito
perfeito de todos os verbos: falarom, temeram, partirom), nom
hai possibilidade de confusom mais que em casos mui excep-
cionais, cujo sentido se deduz facilmente do contexto (por
exemplo: tubaram, do verbo tubar, e tubaram = castelhano
«tiburón»).

d) Igualmente, nom levam acento gráfico os advérbios formados


coa terminaçom -mente; assi, dificilmente, facilmente, habil-
mente, historicamente, rapidamente ,seriamente, solidariamente,
apesar de que os adjectivos sobre os que se formarom si
devem acentuar-se (difícil, fácil, hábil, histórica, rápida, séria,
solidária) .

e) Nom levam tampouco acento os pronomes demonstrativos


(este, esta, estes, estas, isto; esse, essa, esses, essas, isso; aquel
ou aquele, aquela, aqueles, aquelas, aquilo); por exemplo: é este,
leva esta, colheu aquela.

f) Tampouco se acentuam os interrogativos-exclamativos (cal,


canto, que, quem, cando, como, onde); por exemplo: cal querias?,
canto vale?, que me contas?, quem o trouxo?, cando chegará?,
como te chamas?, onde vive?, canto che queria!, nom sabes
quem foi?, di-me como estás.

40
Mt:TODO PRÁTICO DE L1NGUA GALEGO-PORTUGUESA

6.2: Exercícios de leitura

a) Hiato com primeira vogal tónica em palavras graves

supremacia profecia dia abadia ousadia estadia rebeldia meio-dia melo-


dias cobardia picardia ga lhardia telegrafia radiotelegrafia coreografia
cal igrafia bibliografia autobiografias pornografia etnografia tipografia
topografia orografia fotografias cartografia filosofia porfia companhias
regalia anomalias valia tropelias melancolia economia fisionomia agro-
nomia astronomia gastronomia autonomia policromia anatomia cidadania
ufania vilania manias megalomania sobe rania tirania serrania capitania
afonia telefonia polifonia sinfonia eufonia agonia felonia pulmonia harmo-
nias pneumonia ironias monotonia invernia filantropia utop ias espias
rias tabacaria velhacaria pescadaria camaradaria gradaria pradaria
romaria hospedaria chancelaria drogaria enfermaria mouraria leprosaria
gritaria crias bruxaria alegrias sangria fria sabedoria teoria fantasma-
goria tia alegorias categoria melhoria maioria minoria senhoria calorias
estrias mestria demasia fantasia apostasia poesia cortesia descortesia
freguesia burguesia teimosia tias crestomatia apatia antipatia simpatias
carestia psicopatia homeopatia garantia valentia dinastia fidalguia oli-
garquias anarquia vias monarquia
perd ia perdias perdiam ia ias iam temia unias partiam lias sabiam
valiam ardia lambias abatiam combatias bebia acaecia mereciam carecias
cedia tremia tremias concediam fedia sucedia enchias venciam padecia
parecias apareciam fendias ofendiam prendias entendiam exercias queria
erguiam soerguias vertia fervia cometias atreviam remexia sofriam
sofrias colhia devolvias recolhias escolhiam rompiam comias escondias
torciam movias chovia promoviam acud ia bulias pediam sorria com-
partias partiam cobrias subiam acudia resumias uniam cuspias discutiam
nutrias aburrias daria darias dariam cantaria falarias deixariam queixa-
rias chegariam arderias perderiam irias temeriam cederia cometeria
entenderia colherias levariam fenderiam quedaria cansarias estaria esta-
riam ganharias amariam bulirias partiria cobririam acudirias pediriam
choveria moverias sorriria deixarias semelharia filtraria instariam
pintarias
rocio regadio baldiO tardios fio desafio impio rios tio feitio plantio
estio navios esguio bravio extravio atavios desvio

41
JOSt:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

lua meia-lua pua rua sua tua ruas nua crua capicua suas tuas luas grua
conclua concluas concluam substituas actuas atribua construam atenua
acentua continuas continuam desvirtuas evacuam exceptua habituam
suam suas usufrutua destitua exc luas imbua incluas influam instruas
restitua recluam conceitua arrecuam

Choraria todo o dia. No estio chegam muitos navios ao porto.


Brilha a lua e cai rocio. Acudiria sem agardar mais nada. Perderia-se
num desvio do caminho. Ia pola rua cando chovia . Teu tio tem pulmonia .
Quero que Incluas aqui tamém o seu nome. Algumhas terras estám
baldias, mas outras som regadios .

b) i, u em sílaba final tónica

ali aqui si anis latim parti-los uni-Ias pedi -Ia cobri-l os comparti-Ias
tabu obus comum algum nengum alguns comuns nenguns

Aqui nom se vende anis. Ainda podes pedi-Ias o sábado . Este


tema é tabu aqui. O sentido comum é o menos comum dos sentidos.
Si, penso chegar ali. A casa foi destruída por um obus. Estudei dous
cursos de latim. Queremos ouvi-lo outra vez. Alguns homes discutiam
acaloradamente. Nengum outro partido político vos defenderá melhor.
Nesta zona isto é um mal mui comum . Nom soubo abri-Ia. Paris é a
capital do estado francês. Esta manhá o autobus veu mais tarde .

c) -om, -ons tónicas

perdom pantalom bombom razom sazom semitom mexilhom longueirom


medalhom bretom chorom ladrom fanfarrom toleirom valentom entom
narigom paredom patacom pavilhom perdigom pelotom rebentom uniom
reu niom
perdons bretons ladrons reunions razons mexilhons perdigons

Esta vez nom tendes razom . Onte chegou um grupo de bretons


à vila. Entrarom-Ihe na casa os ladrons. As peras estám agora na sua
sazom. E entom foi-se. Os mexilhons estám baratos. Sempre foi algo
fanfarrom . Comprei bombons para os nenos. Temos que celebrar umha
reuniom para tratar sobre todo isto. Trabalhade pola uniom dos gal eg os .

42
M.t:TODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

d) Advérbios em -mente

politicamente lingüisticamente somente barbaramente reciprocamente


docilmente horrivelmente propriamente fisicamente literariamente tera-
peuticamente favoravelmente quim ica mente ordinariamente debilmente
arquitectonicamente romanticamente cortesmente candid amente unica-
mente perfidamente seriamente facilmente rapidamente artisticamente
sobriamente
Politicamente nom é oportuno . O rapaz seguia docilmente os conse-
lhos do pai. Estou esgotado fisicamente , mas nom psiquicamente.
Os detidos forom barbaramente torturados. A novela premiada é litera-
riamente irrelevante . Somente agora sei de que se trata. Na praia
aparece esporadicamente algumha gaivota perdida. Refusou cortesmente
o honor que lhe ofereciam . Terapeuticamente nom resulta aconselhável.
Di ser um poeta quimicamente puro .

e) Demonstrativos

Este nom sabe o que quer. Nom, isto nom pode continuar. Com
esta nom podes ir. Esta ou aquela, igual me dá. Aquel é algo maior
que este. Aquilo foi tremendo . Se levas esta, eu colherei aquela.
Insinuas algo com isto? Parece que estes querem roubar-nos o ar que
respiramos. Aqueles som os que busco.

f) Interrogativos.exclamativos

Onde andas? Nom acertas quem mo dixo. Canto custa isto? Os


nenos nom sabem que inventar para nom ir. Que queres? Donde
vinhas onte? Cantos anos tem? Como me dói! A como som as peras?
Observou como eles discutiam. Canto é todo? Nom sabemos de que
se trata . Canto lhe devo? A que hora podo vo ltar? Ainda nom me
dixeche cantos anos tés. Como se chamam estas flores? Aonde iremos?
Cal é o desporto que arrasta mais público? Que magnífica vista! Qu e
fam aqui estes nenos? Nom sei como resistem . Por que grita agora o
público? Pergunta-lhe canto custa . Que paz se experimenta aqui! Nom
pudem saber onde o encontrara. Onde fica o estádio?

43
JOS1!:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

6.3: Exercícios de escritura

Aquilo sucedia mui raramente. Nom lhe quer conceder o seu


perdom. Ali hai pouco que ver. A lua brilha tenuemente sobre o mar.
Se chegas ali, dirá-che que si. Para alguns a ortografia é como wn
tabu. Dixo-lhes que estudara vários cursos de latim. Chovia somente
na primavera. Este vocábulo nom ;e acentua. Era umha noite fria
e sem lua. Aqui tés wnha boa razom para comparti-lo. Comia sempre
em frio . I sto nom tem sentido. Continua trabalhando como até aqui.
Canto che pediu? Unicamente os pais podiam entrar. Som somente
duas . Na reuniom nom se falou sobre isto. Que che diga este canto
durou a festa. Eu iria, mas nom me convidarom. Temia perder a
saúde outra vez.

6.4: Texto literário

«A um batido, outro batido»,


por Rosalia Castro

A wn batido, outro batido;


a wnha dor, outra dolar:
trás dum olvido, outro olvido;
trás dum amor, outro amor.
E ao fim de fadiga tanta
e de tam diversa sorte,
a velhez que nos espanta
ou o repousar da morte.

Rosalta Castro

OBSERVAÇOM. Dolor é castelhanismo; a forma galega correcta é a dor,


tal como de feito a emprega Rosalia no mesmo verso. Poderia regularizar-se
lingüisticamente o texto evitando a sinalefa entre a e umha: «a urnha dor,
outra dor».

44
7. Os dous valores fónicos do x

7.1: A letra x

• A letra x (xis) tem na Galiza dous distintos valores fónicos,


segundo os casos:
1) valor do fonema fricativo palatal xordo Isl , que se en-
contra principalmente em vocábulos de origem patrimonial: baixo,
caixa, deixar, eixo, seixo .. .
2) valor de I ksl (polo menos na pronúncia mais cuidada);
aparece em vocábulos de origem erudita: exame, existir, sexto,
sexo, texto, ex-ministro ...
Em pronúncia descuidada ou espontánea, este segundo tipo
de x pronuncia-se freqüentemente como simple Is/, em vez de
/ks/, sobretodo cando vai seguido de consoante. Assi, a palavra
contexto pode ouvir-s~ prinunciada Icontésto/ , em vez de Icon-
téksto/ , que é a pronúncia mais correcta.
• Em posiçom inicial de palavra a letra x tem sempre valor
fónico palatal 18/; p.e.: xadrez, xarope, xenófobo, xerocópia, xisto.
Advirta-se, por conseguinte, que hai palavras (nomeadamente vocábulos
cultos de origem grega) nas que o x inicial tem pronúncia diferente em
espanhol e em galego-português: em espanhol vale /ks/, na nossa língua
/s/; p.e.: xenófobo, xerocópia, xerografia, xilófago.
• Cando O X está em posiçom silabicamente implosiva (ou seja,
em fim de sílaba), tem sempre o valor Iks/; a saber, cando vai
seguido de consoante (p.e.: exceder, excelente, exterior, sexto,
texto) ou em fim de palavra (p.e.: bórax, clímax, sílex, tórax; e no
prefixo ex- co sentido de «anteriormente»: ex-aluno, ex-ministral
ex-presidente).

45
JO S ~-MARTI N H O MONTERO SANTALHA

Repare-se, a este respeito, em que, cü ferentemente ao que sucede na


ortografia espanhola ac tual, nas seguintes palavras usa-se s e nom x :
escavar, escusar, esperto, esplanada. es premer (pera exprimir 'expressar') ,
esquisito, es tender (es tendido; pera extenso, ext ensom, vocábulos de origem
erudita), estrangeiro, estranho (est ranhar) , estrema (estre mar 'separar',
Estremadura, es tremenho), justapo r (justaposiçom, justaposto), misto (mis-
tura, misturar). Esta grafia com s deve-se ao carácter normalmente patri-
monial desses vocábulos; em geral, fo i o espanhol o que, por cultismo,
modificou nestes casos a sua própria grafia histórica com s (modificaçom
que, porém, nom aplicou a todos os casos semelhan tes; p.e.: escaso,
escurrir, esforzar, espantar, es tremecer, es trujar, meslizo, siesta).

7.2: Exercícios de leitura

a) Vocábulos 801108.

1) Isl
baixos deixará eixos peixe abaixo cai xas fai xa queixar·se bruxa feixe
debaixo freixo Freixeiro seixos Seixo roxo buxo dei xou queixei·me deixa·
rom peixes paixom apaixonar-se dixo xadrez xarope xaque·mate dei xache
quixerom compaixom apaixonado trouxo fixemos puxar fixar enxaqueca
apaixonadamente dixeche trouxestes trouxerom

2) /ksl
nexo tóxico exacto próximo exacerbar exaltado sexo ortodoxo examinar
léxico sexual óxido axioma ex·aluno ex-ministros oxidar axila axiomático
convexos heterodoxo exasperante excedente éxitos paroxismo proxima·
mente toxicidade toxina lexicografia reflexivo flexibilidade flexível
flexionar exímio exílio oxítono axilar exceléncia axial

b) Frases e textos variados

Nunca deixes os teus companheiros . 10 capaz de debuxar aconte·


cimentos futuros. As tropas tiverom vinte baixas. Falou·lhe apaixonada·
mente. Despois disto, o ministro deixou a sala da reuniom. O rapaz
ainda coxeia algo. Era um home baixo de estatura . Em Freixeiro deveu
de haver freixos nalgum tempo. Arde·lhe o eixo, carvalheira! Chama-se
baixo Amazonas a parte do rio mais próxima da foz. Apareceu no

46
MtTODQ PRATICO DE LíNGU A GALEGO-PORTUGUESA

horizonte um baixel pirata. O presidente enviou umha embaixada aos


aliados. Cinco quilómetros mais adiante tendes que deixar a estrada
principal. No outono todos os comércios fam rebaixas. Debuxa·me um
retrato da minha mulher.
Dixo que nom sabia nada. O coxim é umha pequena almofada sobre
a que se pode um sentar. O cavalo coxeia de um pé. Bruxelas é a capital
do estado belga .Esta música deixa no espírito umha ponta de saudade.
A portaria deste prédio fica alá em baixo . Este eixo é pouco forte.
Canto de baixo na coral polifónica. Itália retirou o seu embaixador
no país. Deixou-nos o exemplo da sua entrega. A couve·de·bruxelas é
umha variedade de couve pouco cultivada na Galiza. - Fiquei coa perna
dorida". di xo ela entrando na casa e coxeando. Debuxa·se na sua cara
umha certa inquietude. A pedido do cantor, a pianista baixou o acom·
panhamento. Estuda com auténtica paixom.
O velho ainda quer deixar a mulher. O mandarim seguia sentado
sobre um coxim roxo . Em tipografia chama·se coluna coxa a que sai
menor que as outras. Deixemos agora este ponto da questom. Você
é algo baixo para chegar ali. Aqui é a residéncia do embaixador do
Brasil. Está coxo desde neno. Falei·lhe e deixei-no alegre . Anda tam por
baixo que, se cair, é capaz de nom se levantar. As folhas das couves·
-de·bruxelas constituem pequenos repolos. A vereda baixa ao vale.
Queixa·se de contínuas enxaquecas. Colhe algum dos ramos baixos
da árvore. O seu trabalho dei xa muito ainda que melhorar. Aqui todo
o mundo coxeia de algo. Deixe os seus devaneios bobos . Fixo como um
debuxo da sua futura novela. A mulher baixou o olhar à terra.
Deixam que nos quei xemos! Ela dixo que cho trouxera onte pola
manhá. O éxito fi xo·o um pouco orgulhoso . Sentia umha paixom exaltada
por aquela mulher. Rompeu-lhe o eixo. Fixerom umha reuniom de ex·
·alunos. Trouxemo-Ia desde Freixeiro. A caixa está debaixo da mesa.
A mulher aqu ela traía um fei xe de varas . Vivia numha casinha baixa,
pintada de branco . Durante o fim de semana deixarom o filho em casa
dos t ios . Seu pai regalou-lhe umha caixa que el mesmo fixera de
madeira de buxo.
O peixe é a prata do mar feita carne. Cada peixe tem a substáncia
do seu mar. O peixe do Mediterráneo sabe a carne civilizada e deca-
dente. O pei xe do Atlántico sabe a sal de vida. O peixe galego trai na
sua carne as melhores riquezas do mar. Canto custa criar um quilo
de carne de vaca! Em troca, a carne de peixe cria·se sem cuidados

47
JOSe-MARTINHO MONTERO SANTALHA

nem gastos. Dantes, a pesca era um trabalho nobre . O Fisterra galego


fixo-se para pescar. A Espanha que morre de carne de porco reviverá
pala carne de peixe galego. O dia que Galiza for dos galegos, os
marinheiros viverám na fartura.
A reforma da ortografia fará da fala galega, agora isolada e pobre,
umha língua universal, de valor internaciona l e instrumento de cultura.
A ortografia galega auténtica capacitará a todos os galegos para lerem
os textos luso-brasile iros, que agora nom sabem ler. O galego nom é
umha língua irmá do português senom umha forma do português, como
o andaluz do espanhol. O galego tem-se que escrever, pois, como
português. Viver no seu seio é viver no mundo; é viver sendo nós
mesmos.

7.3: Emprego do x com valor palatal

• Como mais adiante veremos (párrafo 15.1), o fonema palatal


/s/ nom só se representa graficamente por meio da letra x, mas
tamém por g e j (p.e.: fugir, jeito). A este respeito, dado que as
palavras que se escrevem com x constituem um grupo reduzido,
convém fazer um esforço por retê-Ias na memória, a fim de que
logo resulte mais fácil aprender o uso ortográfico de g e j.
Com este objecto, oferecemos aqui em ordem alfabética umha
lista relativamente completa dos vocábulos em que o fonema
palatal /s/ se representa por x. Normalmente indicamos só as
raízes; deve subentender-se que todas as palavras que pertencem
à mesma família léxica - das que por vezes damos entre parên-
teses algum exemplo de mais freqüente uso - se ham de escrever
igualmente com x; por exemplo: queixa, queixar-se, queixoso,
queixume, etc.
Escrevem-se com x: Alexandre (Alexandria), ameixa «fruta»
(Ameixenda); baixel, baixela, baixo (baixar, abaixo, debaixo, rebai-
xar, etc.), bruxa (bruxaria), Bruxelas, buxo; caixa, circunflexo,
complexo (acomplexar) , coxim, coxo (coxear, coxeira), crucifixo,
cuxo «bezerro»; de buxo (debuxar), deixar; eixo, embaixada (em-
baixador), enxagar ou enxaguar, enxame (enxamear), enxaqueca,
enxebre (enxebrismo), enxerga, enxergar, enxerto (enxertar), enxo-
fre, enxotar (ou axotar ou axocar ou xotar), enxoval, enxugar

48
MtTODO PRATICO DEl LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

(enxuito), enxurro (ou xurro), executar, exemplo (exemplar, etc.),


exercer (exercício, exercitar, etc.), exército; faixa, feixe, fixo (fixar),
fluxo (influxo, refluxo), freixo (Freixeiro), frouxo (afrouxar); graxa;
lagartixa, lixa (lixar), lixo (lixoso), Luxembw'go, luxo; madeixa,
marraxo, mexer (remexer), mexilhom; oxalá; paixom (apaixonado,
compaixom, etc.), paradoxo (paradoxal), páxaro (melhor que pa-
xaro) , peixe, perixel, perplexo (perplexidade), pêxego (ou melhor
pêssego), prefixo, puxar (empuxar, empuxom); queixa (queixar-se,
queixume, etc.), queixo «mandíbula, mento»; reflexo (reflexar) ,
reixa, rouxinol, roxo; saxom (anglo-saxom) , seixo (Seixas), sufixo;
teixo (Teixeiro, Teixido); xabom (enxaboar), xadrez, xarope, xastre,
Xavier, xebrar, Xerez, xeringa, xíbaro, xílgaro, Ximênez, xis, xisto,
xota «baile», xordo, xurdir (rexurdir, rexurdimento) .
ADVERTeNCIA. Nalgumhas palavras eruditas da lista precedente, o
x tem na área luso-.brasileira um valor fónico diferente de /~; esta é,
porém, em todas elas, a pronúncia mais comum actualmente na Galiza.

• Grafam-se igualmente com x os 5 perfeitos fortes seguintes,


em todas as suas formas: de dizer dixem, de fazer fixem, de pôr
puxem, de querer quixem, e de traer trouxemo
Tenhem x em todas as persoas tanto esses perfeitos (p.e., de
dizer: 1 dixem, 2 dixeche ou dixeste, 3 dixo, 4 dixemos, 5 dixestes,
6 dixerom) como os outros três tempos verbais que constituem
o chamado grupo do perfeito, a saber: o mais-que-perfeito (p.e.:
dixera), e o imperfeito e futuro do subjuntivo (p .e.: dixesse, dixer).
Como é lógico, levam igualmente x os compostos desses
verbos, suposto naturalmente que sigam a conjugaçom irregular
dos primitivos (p.e.: de predizer predixo, de refazer refixo, de
compor compuxo).
• Observe-se, pois, que nom sempre na ortografia reintegrada ou histórico-.
-etimológica o x com valor palatal se deve substituir por g ou j; esta
adverténcia afecta a alguns topónimos galegos, barbaramente pseudocas-
telhanizados em g ou j; p.e.: de ameixa Ameixenda, de freixo Freixeiro
ou Freixo, de seixo Seixo ou Seixas ou Seixiclal, de teixo Teixeira ou
Teixida, etc.

49

JOSt-MARTINHO MONTERO SANTALHA

7.4: Exercícios de escritura

o escritor tivo que deixar a sua pdtria. O pintor debuxou a ria.


Na Galiza nom hai nengumha embaixada. Escondeu a carta debaixo
da revista. O leom nom queria deixar a sua presa. A porta é algo
baixa. O ladram nom deixará que o apanhem. Aquel senhor ensina
debuxo num instituto da cidade. O rio está baixo estes dias. O farma-
céutico fala sempre em voz baixa. Nom podo deixar de obrar deste
modo. O caminho baixa até a vila. Na casa tinham ainda baixela de
auTO. O teu amigo deu-se de baixa no partido. Sua irmá deixou o
emprego. Ainda que nom se falem, continuam a viver baixo o mesmo
teito. O pobre home deixou a vida no intento. Deixemos por agora
este negócio. A velha escondera o dinheiro debaixo da cama.
8. Os signos de interrogaçom e exclamaçom

8.1: Uso em fim de frase

• De regra, na nossa língua os signos de interrogaçom e excla-


maçom usam-se somente em fim de frase; p.e.: onde estás?, que
grande é!
Esta é tamém a praxe normal das demais línguas, excepto
do espanhol: somente neste idioma se usam sistematicamente os
signos iniciais (coa sua forma invertida: l j); em catalám empre-
gam-se só de modo excepcional. Nos restantes idiomas existem
unicamente as formas finais de ditos signos.

• Porém, na Galiza tolera-se em certos casos o uso dos signos de interro-


gaçom e exclamaçom tamém no começo da frase (naturalmente, coa forma
correspondente, isto é, invertida: lj); a saber, cando a presença do signo
poda contribuir a tornar mais perceptível, desde o seu início, o carácter
interrogativo ou exclamativo da expressam, nomeadamente em frases
longas, ou cando resulte oportuno precisar exactamente em que lugar do
discurso começa a existir tal carácter.
Na prática, poucas vezes resulta ambigüidade para o leitor no início
das frases afectadas; elementos gramaticais de natureza diversa ou a
mesma pontuaçom bastam para indicar o carácter interrogativo ou excla-
mativo da expressam. Compare-se, por exemplo, a frase asseverativa
A terra é redonda coa interrogativa A terra, é redonda?; no segundo caso,
a vírgula (que sinala urnha depressom da entoaçom, acompanhada normal-
mente por umha pausa) é suficiente para alertar ao leitor sobre o carácter
interrogativo da frase.
De resto, nom sempre é fácil indicar exactamente onde começa o
carácter interrogativo ou exclamativo durnha expressam.
Em calquer caso, o uso destes signos iniciais é sempre facultativo,
nunca obrigatório.
JOSt:-MARTINHO MONTERO SANTALHA
- -- - - -

8.2: Exercícios de leitura

a) Frases interrogativas

Quem era? Por onde andávades? A quem lhe deche o recado?


Sabes se chegará esta tarde? Nom me poderia falar um pouquinho?
Como era? Quem sodes vós? Desde cando estás aqui? Aonde dis que
vás? Deixas-me um martelo? Chegará a tempo? E ainda queres segu ir
aqui? A humanidade. será capaz de sobreviver à era atóm ica? Por que
nom mo diria ant es? Nom me compram sardinhas? Cal queres?: esta
ou aquela? Por que és tam egoísta?

b) Frases exclamativas

Quem me dera poder ir contigo! Nom hai direito! Desperta do


teu sono. fogar de Breogám! Que formosa rapaza! E ainda tés cara
para pedir-me mais! Quem pudera! Deixa-me. imbécil! Meu bem!. meu
rei! Vinde todos aqui! Galegos. sede fortes! Chegou papá! Ai . minha
cabecinha! Nom me venhas com lérias!

c) Textos variados

Galiza deve considerar a língua de Portugal e do Brasil como o


galego nacionalizado e modernizado.
O príncipe dormia no seu novo berce. A sua ama ficara imóvel
no siléncio e na treva. Mas brados de alarme de repente atroarom o
palácio. Os pátios soarom co bater das armas. Desgrenhada . a rainha
invadiu a cámara. entre as aias. gritando palo seu filho. O príncipe
sorria. num sonho que lhe iluminava a face entre os seus cabelos de
ouro. A mai deixou-se cair sobre o berce. com um suspiro. como cai
um corpo morto.
Guiando a fila das éguas palas caminhos estreitos da serra. subia
o velho fidalgo à sua casa. Com que delícia se sentou na relva . coas
pernas abertas! Seu irmao trouxera-lhe três garrafas de vinho . A tarde
descia. pensativa e doce. com nuves cor-de-rosa. As éguas fartas dor-
mem. co focinho pendido. Para além. na vereda antiga. um bando de
corvos revoa sobre os pinheiros altos. E umha fonte canta o seu cantar
cristalino. sem nunca cansar-se. Ergueu à luz a garrafa de vinho. O vinho

52
M~TOD PRATICO DE LfNGUA GALEGO-PORTUGUESA

tinha umha cor velha e quente. A sombra era densa entre os troncos.
Sonhou coa velha casa convertida num palácio coberto de telha nova.
com altas chamas na lareira em noites de neve.

8.3: Exercícios de escritura

Onde trabalhas este curso? Cando chegou? Cantos filhos tem?


Como me dói! Nom me contes contos! Aonde pensades ir este fim
de semana? Nenos. calade um pouquinho! Canto lhe queria! Com
quem vinheche? Irmaos. em pé! Que home extraordinário! Por que
nom fala claro? Viva Galiza! Nom tem direito a isto! Como foi?

8.4: Texto literário

.De balde ... »,


por Rosalia Castro

Cando me ponham o hábito


-se é que o Jevo-,
cando me metam na caixa
-se é que a tenho-,
cando o responso me cantem
- se hai com que pagar aos cregos - I

e cando dentro da cova ...


Que aJnda me leve sam Pedro
se só ao pensá-lo Dom rio
com urnha risa dos denbos!:
que enterrar, ham de enterrar-me
anque Dom lhes dêm dinheiro!

53
IIII
{I I I I 9.\1'90 orlen lal

dialectos transmontanos
e .lIo - mlnhotos
dialectos baillo - minhotos-
·durlt'nses - belró.s

.,' : .
.... Dial ectos
por tu guest'S
j--
- -
dIalectos do cenlro -
·IHor",!
ct'nlro· __ d l ;!,lectos do Cl!'nlro -
me r d iOn.1IS L- - -Intenor t' do sul

/
lim!H~ dto região s u bdca(eClal
com caraclerislicas pecul!a rf'S
bem di feren Ci adas

ClassUlcacom dos dil;lleclos da. II ngua galego-portugesa no conti nent e europeu


(segundo LindJey Cinlra) .
9. O traço de uniom cos pronomes enclíticos

9.1: Por que usar o traço

• Urnha característica do galego-português frente a outras lín-


guas románicas é a maior freqüéncia com que os pronomes
átonos se colocam despois do verbo de que dependem, e nom antes.
Comparem-se, por exemplo, as seguintes formas galegas coas
correspondentes castelhanas: falou-m e = me habló, foi-se = se fu e,
deu-cho = te lo dio, lavamo-nos = nos lavamos, falas-lhe = le
hablas_
• Estes pronomes som átonos, isto é, nom tenhem acento tónico
próprio: dependem fonicamente do verbo, e, a efeitos de tonici-
dade, estám intimamente unidos a el.
Pero, ao mesmo tempo, verbo e pronome seguem constituindo
unidades lingüisticas claramente distintas, e assi os percebe o
sentimento idiomático de calquer falante. A melhor prova disto
reside no feito de que em determinadas circunstáncias o pronome
vai antes do verbo e nom despois (por exemplo: falas-me sempre,
pero : sempre me falas).
• Para separar (ou unir!) o verbo e o pronome enclítico usa-se
o traço de uniom, tamém chamado «hiJem».
O uso do hifem cos pronomes enclíticos apresenta várias
vantages práticas:
a) Evita ter que constituir palavras longas (por exemplo:
cansarom-se-nos) .
b) Deste modo, fai mais clara a escrita e a leitura, pois
distingue visualmente as distintas partes da frase.

55
JOSt:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

c) Conseguintemente, aforra acentos: ao escrever sem hifem


todas essas formas, resultam com freqüéncia palavras esdrú;mlas,
que devem levar acento gráfico; assi, os anti-reintegrarionistas
tenhem que acentuar cansáronsenos, falástesme, co qual se au-
menta o uso obrigatório dos acentos.
d) Evita na escrita algurnhas anfibologias de carácter homo-
gráfico: além de numerosos exemplos esporádicos (por exemplo:
danos j dá-nos, verme / ver-me, termas / ter-mas, termos / ter-mos,
ternos / ter-nos, valo / vá-lo, catarse / catar-se, dígamo / diga-mo),
dam-se algurnhas possíveis confusons de modo constante com for-
mas verbais (p .e.: contáramos / contara-mos, levássemos / levas-
se-mos).
• O hifem usa-se para casos de pronomes enclíticos tamêm noutras
línguas (como no catalám e no francês).

9.2: O emprego do hlfem

o O uso do hifem fai mais fácil a escrita, e portanto comporta


menos dificuldades ortográficas que prescindir deI. Porém, cumpre
exercitar o seu emprego, para formar o hábito gráfico. A este res-
peito formulamos seguidamente algumhas observaçons que podem
resultar úteis.
o Na grande maioria dos casos man tenhem-se imodificadas am-
bas palavras (verbo e pronome); simplemente unem-se mediante
o hifem; p.e.: deixo-a, lavo-me, unem-se.
o Dam-se modificaçons como conseqüéncia da uniom de ambas
palavras somente nos casos seguintes:
a) Modificaçom só na forma verbal (-mos -nos = mo-nos) . As
formas verbais de 1" persoa de plural (que tenhem sempre a termi-
naçom -mos) perdem o -5 final cando vam seguidas polo pronome
enclítico da mesma persoa nos (quer reflexivo, quer recíproco);
p .e.: lavamo-nos, miramo-nos. Tenha-se em conta que esta elimi-
naçom do -5 final sucede só cando segue nos, nom cando o
pronome é vos (p.e.: levamos-vos, lavaremos-vos, déramos-vos), e só
na 1" persoa de plural, nom na 2" (p.e.: buscades-nos, temere-
des-nos).

56
Mt:TODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

b) Modificaçom só no pronome (ditongo - o = dit. -no; -m


- o = -mono). O pronome de objecto directo de 3" persoa (o, a,
os, as), cando enclítico a formas verbais terminadas em ditongo
ou em consoante nasal ,toma um n- inicial, convertendo-se assi
em no, na, nos, nas; p .e.: an'lou-no, deixam-na.
Deste modo, a forma masculina plural desse pronome (nos) vem a
confundir-se co pronome de 4a persoa (p.e., amou-nos pode significar
'a nós' ou 'a eles', isto é, 'nos amou' ou 'os amou'; deixam-nos 'a nós' ou
'a eles'; 'nos deixam' ou 'os deixam'); somente o contexto pode aclarar cal
desses dous sentidos possíveis corresponderá em cada caso.

c) Modificaçom em ambas palavras: verbo e pronome (-r - o


= -lo; -5 - o = -lo). Cando o pronome de objecto directo de 3" per-
soa (o, a, os, as) se une em ênclise a formas verbais terminadas
em -r ou -5, as formas verbais perdem esta consoante final, e o
pronome toma um 1-, convertendo-se assi em lo, la, los, las; p.e.:
buscá-lo, busca-lo.
• Há de prestar-se atençom para nom confundir certas formas prono-
minais e certas terminaçons verbais idênticas a elas; assi, a terminaçom
-mos de formas verbais de 4n persoa coa contracçom pronominal idéntica
mos (p.e.; deixarmos e deixar-mos), as terminaçons -cite e -te da 2a persoa
do pretérito perfeito cos pronomes de objecto indirecto e directo respecti-
vamente de 2a persoa (p.e.: deixache e deixa-che, ou deixaste e deixas-te,
em ambos casos com diferente tonicidade silábica), a terminaçom -se da
ln e 3a persoas do imperfeito de subjuntivo co pronome reflexivo se
(p.e.: queixasse e queixa-se, com tonicidade diferente).
Tenha-se em conta tamém que, ao juntar-se verbo e pronome, podem
resultar curiosas repetiçons de sons ou de sílabas; p.e.: amontoo-o, perdoo-o,
mne-me, teme-me, tamas-mas, sacha-cha, ate-te, colho-lho, tala-la. Normal-
mente, a língua culta tende a evitar tais repetiçons por motivos de eufonia
ou de estilística; mas, caso de aparecerem, o uso do Mem, como se vê, fai
mais transparente na escrita a separaçom dos diversos elementos da frase.

o Tamém se usa o hifem nas combinaçons pronominais no-lo


(no-Ia, no-los, no-Ias), vo-lo (vo-la, vo-los, vo-las), lhe-lo (lhe-la,
lhe-los, lhe-las) , e nas contracçons do advérbio eis coas formas
pronominais de complemento directo (eis-me, eis-te, ei-lo, ei-la,
eis-nos, eis-vos, ei-los, ei-las) .
o A efeitos de acentuaçom gráfica, o hifem considera-se límite
de palavra; em conseqüéncia, as formas verbais devem submeter-se
às regras gerais de acentuaçom, como se fossem vocábulos inde-

57
JOSe-MARTINHO MONTERO SANTALHA

pendentes dos pronomes que as acompanham ; p .e. : ama-las,


amá-las, colherei-nos, colherá-vos, deixa-lho.
• Cando o hifem coincide co fim da linha, cumpre começar a
linha seguinte por hifem; por exemplo: falou-l -me.

9.3: Exercícios de leitura

a) Formas sem modificaçons

perdoa-me mira-me deixa-nos amo-te dou-che empresto-che pido-che


queixo-me sinto-me sento-me prepara-me senta-te diga-lhe bota-lhos leva-o
busca-as quita-o fala-nos ama-vos conta-lhes queixam-se cansas-me vai-te
contam-me vendeu-mo roubarám-mo deixa-ma levou-ma emprestache-ma
falou-se irám-se saberá-se deixade-nos falas-lhe canta-nos morreu-vos
ide-vos buscam-vos perdim-vos pido-vos vam-se lavam-se levo-o deixe-os
mete-as verá-o di-mo deixas-mo contache-mos mandastes-mos pedia-mos
pediu-cho darám-chos une-os tenho-cha digo-lhes enviaram-lhos mandei-
-lho dá-lho quitas-lhos co lheu-lhos levei-lhos vim-vos falou-vos mostra-
ram-no-Ia deixa-no-Ia contará-no-lo emprestou-no-los.

b) Formas com modiflcaçons

1) mo-nos: vamo-nos sentemo-nos unamo-nos cansamo-nos dei xe-


mo-nos lavemo-nos marchemo-nos cuidaremo-nos aburrimo-nos sentá-
vamo-nos cansaremo-nos comportemo-nos .

2) no, na, nos, nas:


ditongo: colheu-no deixou-na fai -nas amarei-na trai-no temeu-no
comeu-nas partiu-na curou-nas furou-no seguiu-na viu-nos perdeu-no
perdeu-nos uniu-no uniu-nos uniu-na uniu-nas
nasal: partem-nas deixarám-nas uniram-nas dam-no fam -nas colhem-
-no levam-nas escuitam-na sonhem-no sinalarom-na buscarám-nas louva-
ram -no porám-no buscaram-na levam-na levam-nas levam-nos partem-nos

3) lo, la, los, las:


-r : levá-lo deixá-los perdoá-los buscá-los sinalá-Ias louvá-lo honrá-los
ce lebrá-lo cerrá-los cercá-los botá-los narrá-Ia atropelá-lo normalizá- lo

58
M:e;TODO PRATICO DEl LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

razoá-Ia indicá-Ias fabricá-los dá-los tapá-Ias pará-lo prepará-Ias repará-


-Ias tolerá-Ias quitá-lo perdê-lo temê-lo metê-los vendê-Ias uni-lo parti-Ia
os: leva-lo deixade-Ios queremo-Ia perde-los odiade-Ios busca-los
sina laste-Io tirará-Ias colherede-Ia vende-los perde-Ias une-Ias unirá-Ias
leva-los sinale-Ios sinalade-Io honrade-Ias celebrade-Io cansade-Ios mi-
rade-Ias superade-Ias quitaste-lo contade-Io.

c) Frases

Di-me aonde pensas ir esta tarde. Desde ali v ia-se bem toda a
cidade. Sua mai conta-me muitas histórias formosas . Meu irmao acon-
se lha-me que trabalhe só cinco horas diárias . Se chove. podes deixá-lo
aqui mesmo. Os visitantes maravilham-se da beleza desta terra. O velho
deu-lhes um pequeno obséquio aos turistas. Comunico-che que nos
vamos manhá pala manhá. Nom hai ninguém que poda dar-nos mais
notícias . Nom para de contar-lhes histórias da sua infáncia. Concede-
ram-lhe vários dias de descanso. Avisaram-me de que amanhecera.
Cando o velho marinheiro volte às suas ilhas. suspenderám-no em
latim e matemáticas. Nom é difici I perderem-se no meio do deserto.
Se chove tanto. molharás-te todo . Amanheceu-lhes cando iam che-
gando ao mar. Acompanharemos-te até as cinco da tarde . O secretário
chama-se Luís e tem má fama em todo o concelho. Saiu-lhes ao encontro
no meio do bosque . Tinham-lhe medo todos os nenos porque corria
muito. Viu-me chegar no autobus e veu correndo dar-me umha aperta.
Deixade-Ios aqui e ides-vos para a casa. Nom podo botá-los daqui a
couces . Tem medo de perdê-lo.

9.4: Exercícios de escritura

Vamo-nos canto antes. Conta-nos o que vos fixerom. Ide-vos a


outra parte! Quero levá-los eu mesmo. Pido-vos que nom lardedes.
Nom será fácil botá-los dali. O vinho e o tabaco acabaram-lhe coa
saúde. Perdim-nos no caminho de valIa. A mai falou-lhe com carinho.
Vem-se os marinheiros_ No il1vemo o sol pom-se cedo. Di-me como
le chamas. Nom fum capaz de uni-los. Colheu-no pala mao. Leva-os
antes das oilo da tarde. Eslá bem, pero tendes que m elhorá-lo. O aci-
dente deixou-no coxo da pema esquerda. Diga-me onde tenho que
quedar. Aqui pode-se comprar pam.

59
........
)\.~ . ·· ).{··:····':···/;'i. . . .".
,, ,

....~,-" _.' - , . ,- ..'


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'

J;-'
A fr onteira entre 1"1 e / b/ : o norte d e Portugal e a Galiza
desconhecem o fonema / v/.
10. As letras b e v: o seu uso

10.1: V intervocálico

• Hai umha diferença notável entre a ortografia espanhola, por


urnha parte, e a ortografia galego-portuguesa (e a doutras línguas
románicas, como o catalám e o italiano), por outra, no uso de
b e v, especialmente em posiçom intervocálica.
Comparar, por exemplo: espanhol cantaba = galego-português,
catalám e italiano cantava.
• Porém, o resultado originário foi tamém em espanhol nesses
casos v, e nom b: B intervocálico latino deu v (p.e.: CANTABAS
cantavas, AMABAS amavas).
Coa letra v representava-se um fonema fricativo, normalmente
lábio-dental sonoro jvj (como existe ainda hoje em francês: p.e.:
vie; e tamém noutras línguas).
Em case toda a área lingüística espanhola esse fonema acabou
confundindo-se co fonema jbj durante o século XVI.
Tendo em conta esta nova situaçom fonética, a Academia
espanhola modificou em 1726 a ortografia, abandonando a escrita
tradicional e retomando a grafia latina.
• Tamém na Galiza, na Catalunha e no norte de Portugal se
deu a mesma confusom num único fonema jb/.
Em troca, no centro e sul de Portugal e em todo o Brasil
(como tamém em partes da área lingüística catalá) conserva-se
ainda a parelha de fonemas jbj e jv/ perfeitamente distintos;
por exemplo, nom se confunde basto com vasto.
• Para que a ortografia fosse perfeitamente ajeitada à pronún-
cia galega neste caso, deveríamos usar só um único signo, já que

61
JOSt-MARTINHO MONTERO SANTALHA

temos um único fonema: sobraria urnha das letras b ou v. (E assi


fam efectivamente os bascos, que usam só b e escrevem, por
exemplo, ebangelio).
Pero claro está que este critério foneticista seria válido
somente se o galego fosse urnha língua independente do luso·
-brasileiro. E, efectivamente, é contraditório que os que querem
fazer do galego umha língua independente mantenham as duas
letras; em realidade o que fam é adoptar simplemente o uso
espanhol.

10.2: Leitura e escritura de b e v

• Polo que se refere à leitura, nom apresenta dificuldades:


tanto b como v tenhem na Galiza o mesmo valor fónico Ubj
bilabial).
• Eis alguns casos mais freqüentes do uso de v:
1) nas terminaçons do imperfeito de indicativo dos verbos
da primeira conjugaçom: cantava, cantavas, cantava, cantáva1nos,
cantávades, cantavam;
2) nos vocábulos formados co sufixo -vel (= castelhano -ble):
amável, visível, agradável;
3) nos verbos haver, dever e escrever, com todas as suas
formas afectadas.
• Repare-se em que, apesar de que o sufixo -vel se escreve com v, outros
sufixos relacionados etimologicamente com -veZ pero de índole mais erudita,
conservam o b latino; assi, -belecer (estabelecer, pera estável), -bilidade
(amabilidade, pero amável), -bilismo (possibilismo, pero possível), -bilíssimo
(agradabilissimo, pera agradável), -bilhar (flexibilibar, pero flexível).

• Poucos mais som os vocábulos que devem escrever-se com v


contrariamente ao uso ortográfico espanhol. Oferecemos a seguir
umha lista relativamente completa das raízes afectadas, incluindo
entre parênteses algum vocábulo mais usado da mesma família
léxica.
Escrevem-se com v, e nom com b : advogado (advogar), alga-
ravia, alva (alvo, alvorada, alvarinho, Vi/alva), alvitre (alvitrar),
alvoroço, alvoro to (alvorotar), árvore, avô (avoa), avondo (avondar

62
MtTODO PRATICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

«bastar»); caravela, carvalho, carvom, cavalo, ceive ou ceivo (cei-


var), cevar (cevo), Cristovo ou Cristóvao; dívida, dúvida (duvidar);
escarvm', escova, Estevo ou Estêvão (Estêvez), estorvar (estorvo);
fevreiro; governo (governar, governamental), gravar; herva; laverca,
livre (livrar), livro (livraria); névoa (nevoeiro), nuve; orvalho (orva-
lhar, orvalhada); palavra, pavilhom, polvo 'molusco', povo (povoar,
A Póvoa), provar (prova, aprovar, comprovar); resvalar, ruivo;
saraiva (saraivar), seiva, sorva, sorver (absorver), sovar (assova-
lhar) , sovela; tovo, travar, trave, treva, trevo; varrer, várzea ou
varja, vermelho, verniz (envernizar), vogar (voga), vulto (avultar).
• Observe-se que, contrariamente ao que sucede na ortografia espanhola,
em galego-português pode a letra v aparecer tamém ante r: fevreiro, livre,
livro, palavra.

• Escrevem-se com b: bágoa, bale iro ' (baleirar), basco, beira,


borboleta, conceber, perceber, rebentar, receber, ribeira (Ribeiro).
• Para evitar embaraçosas interferências lingüísticas, os conhecedores
da língua francesa haverám de ter em conta que o uso galego-português de
b e v nom coincide sempre co uso francês . Embora nalguns casos ambos
usos sejam idénticos (p. e.: avoir = haver, devoir = dever, livre = livro,
preuve = prova), noutros muitos discrepam: algurnhas vezes o francês
conserva, por cultismo, a grafia latina b onde o galego-português apresenta
a evoluçom popular v (p.e.: agréable = agradável, libre = livre); outras
vezes, mais freqüentemente, em palavras patrimoniais, o francês converteu
em v um -P- latino, que na nossa língua deu normalmente -b- (p.e.: avril =
= abril, concevoir = conceber, couvrir = cobrir, oeuvre = obra, ouvrir =
= abrir, pauvre = pobre, recevoir = receber, savoir = saber, travail = tra-
balho).

10.3: Exercícios de leitura

a) Imperfeitos

dava sinalava perdoava sonhava quedava chorava lavava honrava duvi-


dava tiravas ceavas perguntavas ganhavas levavas chegavas ficavas
olhavas estávamos ce lebrávamos causávamos preparávamos dávamos
andávamos cerrávamos casávades nadávades atrancávades freávades
berrávades botávades cercávades deixavam chantavam bruavam atrope·
lavam votavam contavam choravam nadavam

63
JO S ~-MARTINHO MONTERO SANTALHA

nevava quedávamos louvavas botavam nadávamos tiravam levavam


ceava narrava perdoavam sinalava andávades sonhavas cortávamos ber-
ravas chegavam cerrava multavam navegavas mudavam borrávamos
tornavam virava
Teu pai cantava mui mal. Onde estavas cando te chamávamos?
Umha gaivota voava, voava_ Os outros nenos pegavam-lhe, mas el nunca
chorava. Estava eu esperando o auto bus cando se ouviu soar umha
gaita. Sempre o deixavam só cando se aproximava algumha dificuldade.
Estimava muito os seus companheiros de infáncia. Por que choravas
onte? Vós antes nunca nos tratávades tam mal. Canto lhe gostava a
música! Luitava sem desfalecer até conseguir os seus propósitos . Se o
obrigavam, trabalhava com menos cuidado.

b) -vel

aplicável impecável verificável explicável falsificável criticável imper-


turbável praticável domesticável formidável inolvidável recomendável
Foi umha tarde mui agradável. O teu filho apresentou-me um pro-
blema insolúvel. Todo o tempo se mantivo imóvel. Era um temível
inimigo do povo humilde. Este medicamento nom é solúvel em água.
Para elas foi um dia inesquecível.

c) haver
havemos havia havendo houvera haverá haveríamos houveche houvo
havedes houvéramos haverei houveres havido haverám houvemos haver-
des haverem havermos haverás haveríades haverias houverom havíades
haviam houverdes houveram houvem houvestes haveres haveremos
haveredes havias havíamos houveras houvérades
Nom pode haver muito vinho. Havemos de falar com eles. Houvo
alguns que desconfiarom. Havia muito que nom vinhera . Ela havia de
vir, pero nom aapreceu . Houvera de morrer naquel acidente. Havedes
de vir manhá? Havíamos de ir onte, mas nom pudemos. Cando have-
redes de trabalhar em sérío? Disto nom pode haver nengumha dúvida.

d) dever
devo deves deve devemos devedes deveis devem devia devias devíamos
devíades deviam devim deveche deveu devemos devestes deverom devera

64
MilTODO PRÁ'J.'ICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

deveras devêramos devêrades deveram deverei deverás deverá deve-


remos deve redes devereis deverám deva devas devamos devades devais
devam deveres devermos deveredes deveremos deverdes deverem deve-
rias deveria deveríamos deveríades deveriam devendo devido
Deves-me cem pesetas. Nom queria faltar nunca ao seu dever.
Deveu de chegar onte pola manhá. Deviam proibir semelhante cousa .
Devedes falar com eles. Devem de ser as catro da tarde. Devo de ter
algo de febre. Deves estudar agora e nom pola noite. Deve de ser muí
tarde. Devias deíxar de fumar: é perigoso para a saúde. Os estudantes
devem estudar . Nom pudo vir porque devia muíto dínheiro. Devo partir
para Africa dentro de pouco. Deve ao seu mestre todo o seu saber.
Nom vinherom: devem de estar mui cansadas. Deveu de chover pouco
esta manhá. Deve duas mil pesetas ao irmao.

e) escrever

escrevo escreves escreve escrevemos escrevedes escreveis escrevem


escrevia escrevias escrevia escrevíamos escrevíades escreviam escre-
vim escreveche escreveu escrevemos escrevestes escreverom es-
crevera escreveras escrevêramos escrevêrades escreveram escreverei
escreverás escreverá escreveremos escreve redes escreverám escreva
escrevas escrevamos escrevades escrevais escrevam escrevesse escre-
vesses escrevêssemos escrevêssedes escrevessem escreveres escrever-
mos escreverdes escreverem escreveria escreverias escreveríamos
escreveríades escreveriam escrevendo escrevede escrevei
Os nenos aprendem a escrever na escola. Escreveu-me minha irmá
desde Santiago. Cando escrevas, conta-nos algo daí. Escrevia com
letras grandes e redondas. A viúva escreveu ao irmao. Mandou-lhe
que escreva com lápiz. Agora quer escrever de política. Na época
medieval escrevia-se sobre pergaminho. A velha nom sabia escrever,
e o filho tivo que escrever por ela.
Podes escrever sobre esta mesa de madeira. Tomou um papel e
escreveu algumhas palavras . No seu belo poema escreve a história
dum amor e dumha paixom. O novelista escreveu mais de cem obras.
O marinheiro escreve excelentemente a sua língua. Goethe escreveu
as -Afinidades electivas» cando tinha perto de setenta anos de idade.
Andava a escrever com um pau carbonizado o seu nome nas pedras.

65
JOSt:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

Raro dia deixava de escrever algumhas linhas à família. Escreve habi-


tualmente em diversas revistas. Escreveu todos os dias a várias persoas .
As duas meninhas escreviam-se diariamente.

f) Outras palavras

árvore carvalho carvalheira dúvida duvidar povo póvoa povoar estorvo


estorvar orvalho orvalhar orvalhada herva vulto avultar cavalo governo
governar governamental sorver absorver avô avoa advogado ruivo sovar
resvalar cevar cevada gravar alva alvorada livre livro livraria palavra
varrer travar saraivar aprovar nuve trave treva comprovar provar
,Um cavalo trotava na noite polo caminho antigo. A dúvida ofende.
Regalamos-lhe um livro de fotografia . Os manifestantes gritavam: a
luita continua, o governo para a rua! Iremos manhá a Vilalva. Nunca
duvidei da sua capacidade. Saiu a lebre do seu tovo. O mês de fevreiro
é o mais curto. O cam anda ceivo. Cumpre fixar na memória a orto-
grafia das palavras. Cada palavra tem a sua própria história. Por exem-
plo, os verbos -dever. e -escrever - escrevem-se com uvê; pero -con-
ceber. e -perceber» escrevem-se com bê . Ninguém concebia a dor
daquel home, ordinariamente insensível. Percebeu o desgosto do seu
interlocutor.

g) Exercícios variados

A árvore é o símbolo do senhorio espiritual de Galiza. A árvore


é um encanto dos olhos, pola sua formosura. IÔ umha alegria dos
ouvidos, porque nela cantam os páxaros. IÔ um arrolador do espírito,
porque nas suas ramas conta contos o vento . A árvore dá-nos a fruta:
o derradeiro bem que nos quedou do paraíso perdido. A árvore pede-lhe
água ao céu para que a terra tenha sangue , vida e bonitura. A árvore
dá-nos a sombra fresca no verao e a quentura garimosa no inverno.
A árvore dá-nos as traves, o sobrado e as portas da casa. Dá-nos a
cama, o armário da roupa e a artesa do pam. Dá-nos o papel barato que
nos trai cada dia as novas do que sucede no mundo. Vale mais umha
Terra com árvores nos montes que um Estado com ouro nos Bancos .
A calvície dos montes galegos é umha terrível denúncia contra o
Estado unitário. As árvores som as minas galegas que nós saberemos
explotar cando os ga legos governemos Galiza, A riqueza forestal será

66
METono PRATICO DE LtNGUA GALEGO -PORTUGUESA

o património da pátria galega e o melhor aforro da colectividade.


Na Galiza dam-se as melhores árvores. O dia que saibamos o que vale
umha árvore, aquel dia nom precisaremos emigrar.

Os três irmaos viviam num lugar que se chamava Medranhos, no


meio da alta serra. Eram os fidalgos mais pobres e mais remendados
de todo o reino. O vento da serra levara a telha do seu velho palácio.
Desde havia tempo, na vasta lareira do palácio nom esta lava lume nem
fervia o pote. Ao escurecer devoravam só umha côdea de pam negro,
esfregada com alho. Despois, sem candeia nem outra luz, através do
pátio, fendendo a neve, iam dormir à corte, para aproveitar o calor das
três éguas, esfaimadas como eles. E a miséria tornara estes senhores
mais bravios que lobos.
Numha silenciosa manhá de domingo, na primavera , andavam os
três na mata a apanhar cogumelos entre os carvalhos, encanto as
três éguas pastavam a relva nova de abril. Naquela manhá os três irmaos
de Medranhos encontrarom, por trás duns espinheiros, numha cova de
rocha , um velho cofre de ferro . Resguardado pola rocha e polos mator-
rais, o cofre conservava as suas três chaves nas suas três fechaduras.
Fora tinha um letreiro em letras árabes e dentro estava cheio de ouro .
No terror e esplendor do encontro, os três senhores ficarom mais
lívidos do que círios. Despois, mergulhando furiosamente as maos no
ouro, estalarom a rir, num riso tam largo que as folhas tenras das
árvores tremiam. Mas de novo recuarom e bruscamente se encararom
entre si, desconfiando uns dos outros . Dous deles até apalpavam nos
cintos os cabos das grandes facas.
Entom o terceiro, que era gordo e ruivo e o mais avisado , decidiu
como um árbitro que o tesouro pertencia aos três, e entre eles se
repartiria, exactamente, pesando-se o ouro. Mas como poderiam carre-
gar para Medranhos, para os cimos da serra, aquel cofre tam cheio?
Nem convinha saírem da mata co seu bem antes de cerrar a escuri-
dade. Por isso el entendia que um deles devia trotar para a vila, a
comprar três sacos de coiro, para carregar o tesouro. E ademais , três
medidas de cevada, três quilos de carne e três botelhas de vinho.
Vinho e carne eram para eles que nom comiam desde a véspera ; a
cevada era para as éguas. Despois disto, ensacariam o ouro nos
sacos e subiriam para Medranhos, senhores e cavalgaduras, na escuri-
dade da noite sem lua.

67
.JOS1±:-MARTINHO },{ONTERO SANTALltA

Bem tramado! - gritou um dos outros dous, home mais alto que •
um pinheiro, de longa guedelha e com umha barba que lhe caía desde I

os olhos raiados de sangue até à fivela do cinturom . Mas o outro nom


se arredava do cofre, enrugado e desconfiado. Por fim, brutalmente
dixo: o cofre tem três chaves; eu quero fechar a minha fechadura e
levar a minha chave. A cada dono do ouro correspondia umha das
chaves que o gardavam. E cada um em siléncio, agachado ante o
cofre, cerrou a sua fechadura.

10,4: Exercícios de escritura

Escreveu aquel livro durante o mês de fevreiro . Ninguém o


concebia tam notável governante como veu a revelar-se despois. Apesar
de escrever tam bem, nom é ainda famosa. O cavalo estava cansado.
Sentou-se sobre a herva verde do prado. O que mais lhes gostava era
escrever nas paredes. Apesar do seu estado de fraqueza, procurava
perceber o que estava sucedendo. Orvalhou algo durante a noite.
Escreveu desde América despois de sete meses. Venho da Póvoa do
Caraminhal. Havia umha nuve vermelha sobre o mar. Esta árvore
deve de ser um carvalho. Somos um povo oprimido. Nom é fácil,
pero provaremos. Meu pai nom me deixa escrever a lápiz. Cando com-
provou o funcionamento do motor, deixou de duvidar. O volume do
televisor estava tam alto que o rapaz nom escuitava as palavras da
maio Desde a altura percebeu a espiral de fume que saía dentre o
arvoredo. O advogado ganhava um salário miserável.

10.5: Texto literário


.Cando era tempo de inverno»,
por Rosalia Castro

Cando era tempo de inverno,


pensava em onde estarias;
cando era tempo de sol,
pensava em onde andarias.
Agora ... tam soio penso,
meu bem', se me olvidarlas!

OBSERVAÇOM. Saio é variante dialectal da forma normativa só. neste


caso com valor adverbial: 'somente'.

68

I

11. O sufixo -veZ e o seu plural -veis

11.1: -vel, nom -ble

• o sufixo latino -BILIS deu como resultado em espanhol -ble,


e em galego-português -vel: amável, visível, solúvel (= amable,
visible, soluble) .
Como já dixemos, este sufixo é um dos casos mais freqüentes
em que o -B- intervocálico do latim deu -v- na nossa língua.
• Este sufixo -vel forma o seu plural segundo a norma geral
dos nomes terminados em -el; isto é, mudando o -1 em -is: agra-
dável agradáveis, visível visíveis, solúvel solúveis (como papel
papeis, níquel níqueis, etc.).

11.2: Exercícios de leitura

a) Vocábulos soltos

entranhável insaciável sociável negociável irremediável variável amável


conciliável invariável viável inabalável inviolável inconsolável domável
inflamável comparável execrável tolerável venerável recuperável insu-
perável admirável favorável impenetrável curável durável censurável
incansável responsável indubitável respeitável inesgotável notável de-
testável estável lavável improvável
inconcebível invencível atendível infalível punível incrível irreconhe-
cível apetecível inesquecível inconfundível presumível indefinível prefe-
rível sofrível terrível horrível visível imprevisível invisível sensível
fusível factível incontrovertível comestível irresistível combustível
discutível inservível flexível
indelével móvel imóvel automóvel solúvel insolúvel

69
JOSlÕ'!·MARTINHO MONTERO SANTALHA

agradáve is formidáveis afáveis infatigáveis sociáveis conciliáveis variá-


veis amáveis invariáveis viáveis invioláveis domáveis abomináveis
imperdoáveis culpáveis veneráveis inumeráveis admiráveis favoráveis
responsáveis notáveis estáveis inconsoláveis detestáveis
terríveis horríveis apetecíveis invencíveis infalíveis puníveis incríveis
horríveis visíveis invisíveis sensíveis fusíveis comestíveis flexíveis
sofríveis insofríveis
indeléveis móvei~ imóveis automóveis solúveis insolúveis

b) Frases

Teu avô era umha persoa mui agradáve l. O tempo será variável
toda esta semana. Na cidade hai umha sala de teatro estável. A estrela
polar nom era visível aquela noite. No meio dos maiores perigos
mantém-se imperturbável. O ditador foi sempre implacável cos seus
adversários . Todo isto nom é verificável. Os ministros andam sempre
impecavelmente vest idos . Calquer documento pode resultar falsificável.
Neste caso concreto nom é aplicável tal norma. t mui explicável todo
canto sucedeu ali. O lobo nom é um anima l facilmente domesticável.
Apesar de todo , foi sempre um rapaz formid ável. Aquela conversa
resultou-nos mui desagradável desde o princípio. O rapaz quer comprar
umha navalha inox idável. Aquela foi para mim umha tarde inolvidável.
Nom é recomendável esperar muitos dias. O teu amigo tem um
carácter mui mudável.
Choveu esta noite de modo inapreci ável. Dei xou no seu discípulo
um sinal indeléve l. Som uns tipos formidáveis. Nom é solúvel em água .
Eram claramente visíveis as duas lanchas no meio do mar.

11.3: Exercícios de escritura

Este neno tem sempre um apetito insaciável. Algumhas catás-


tro fes naturais som imprevisíveis. Parece ser que tem um mal incurá-
vel. O teu conselho resultou-me de ines timável valor. Havia ali esta-
cionados vários automóveis. Pretende ser sempre infalível nas suas
opinions. Inum eráveis admiradores do cantante acudiram aquela noite
ao seu recital no estádio. Alguns cogumelos som comestíveis, pera
outros nom. Os restos acabam convertendo-se em material combus-
tível. Esta velhinha é umha inesgotável fonte de histórias, lendas e

70
MJõ':TODO PRATICO DE LfNGUA GALEGO-PORTUGUESA

contos. O problema nom é insolúvel, ainda que o parece. Nom se trata


de buscar culpáveis, mas de evitar que o caso se repita. O tempo será
variável este fim de semana. Deves ser sempre responsável dos
teus actos.

11.4: Texto literário

«Cantigas populares»
Namorei-me dumba nena
porque ela cantava bem;
agora morro de (ame:
o cantar nom me mantém.
Nom busques noiva na feira,
e menos na romaria;
busca as rapazas na casa,
vestidas de cada dia.
Eu nom sei o que me deche
que Dom te podo olvidar:
de dia no pensamento
e de noite no sonhar.
Se queres que brilhe a lua,
fecha os olhos, meu amor,
que mentres os lés abertos
a lua pensa que bai sol.
O carinho que cbe tenho
e mais o que che hei de ter
cabem na casca dum ovo
e há de quedar sem encher.
Até a foUhlllha de nUlho
sabe tamém picardla:
garda o orvalho da noite
para beber polo dia.
Teu amor é como o vento,
que vai de aqui para alá;
o meu querer é umha pedra,
que onde a ponhem está.
Nom haJ como ser pobrlnho
pra saber o que é um escano
e o que valem dous carvons
e umha cunquinha de caldo.
Ninguém a bailar me chama
e afogo entre suspirinhos:
de que me serve ser guapa
se Dom mo dim os mocinhos!

11
...... .::/....1' .......

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Ll1T~ do l~rHÓft o IInqul!."co


gltl.go · POI Ivguios

I',onlt;'. ""., ' dl"".. 1 no . !'! !.", t~. m . n l


d. fr i( lIllv. i.

..... r'~ /01

Fronteiras d os traços fonéticos mais ca.racterls tlcos (segund o L lndl ey Cln l ra ).


12. A letra h

12.1: Em posiçom inicial e final

• A letra h (agá) somente se usa em começo ou fim de vocábulo,


e nom em posiçom interior (excepto, claro está, cando forma parte
dos dígrafos ch, lh, mh, nh); assi, hora, ah, coerente.
• Em posiçom inicial usa·se de acordo coa etimologia; p.e.: haver,
home, hora. Escrevem·se com h- inicial: harmonia (harmónico,
harmonizar, etc.), harpa, Helena, hendecassílabo, Henrique, hirto.
Quiçá seja preferível grafarmos herva e hucha, em conformidade
coa etimologia, embora os luso-brasileiros escrevam erva e ucha,
sem o h etimológico.
• Tenha-se em conta que o espanhol usa h inicial (e medial) em casos
que, se justificados por outros capítulos, nom correspondem a umha grafia
etimológica (por exemplo, ante ie, ue: hueco, huérfano, hueso, huevo,
aldehuela, cacahuete).
Na nossa língua escreveremos, pois, sem h· os seguintes vocábulos:
achar, até, encher, ermida, ermo, inchar (inchaço), irmao (irmá, imandade),
ombro, oco, arfo ou órfao, OSSO, ovo.

• Em posiçom final de vocábulo a letra h somente aparece


nalgumhas interjeiçons; p.e.: ah!, oh!

12.2: Em Interior de palavra

• Em interior de palavra nom se usa a letra h; p.e.: aí, aZeooZ,


coibir.
Cando umha palavra iniciada por h entra, como elemento
nom inicial, a formar parte dum vocábulo composto, perde o

73
.rOS~·MARTINH MONTERO SANTALHA

seu h-; p.e.: habitado pero desabitado, honra pero desonra, humano
pera inumano.
A este respeito cumpre advertir que dous elementos vocabu-
lares separados por meio de hifem consideram-se independentes
a efeitos ortográficos. Conseguintemente, as palavras iniciadas por
h- conservam esta letra cando entram a formar parte de compostos
se o h vai precedido de hifem, pois neste caso considera-se como h
inicial; p.e.: anti-higiénico, sobre-humano.
• Esta norma que elimina o h medial, fai desaparecer urnha
dificuldade ortográfica, e facilita portanto a aprendizage e o
exercício da escrita.
• Deve considerar-se errónea a pronúncia velar, em galego, do n anterior
a um h etimológico (conservado na normativa espanholizada) em vocábulos
cultos que entrarom desde o espanhol escrito. Nestes casos o leitor galego,
dada a existéncia, no seu fonetismo nativo, durnha nasal velar intervo-
cálica (em umha: ver párrafo 4.1), tende, mesmo lendo em espanhol, a
interpretar esse fI como marca durnha fronteira silábica que realmente
nom existe: segundo a estru tura fonética do idioma, a silabaçom de
inhábil nom pode ser diferente da de inútil, por exemplo. Portanto, nom
pode buscar-se neste assunto umha justificaçom para conservar o h medial.

12.3: Exercícios de leitura

a) Vocábulos soltos

reabilitar alcool inerente niili smo transumáncia outrora anarmónico aí


aderir veículo anelar baía coerente exa lar co ibir embora exumar adesivo
ane lante apreender veicu lar exibi r agora exaustivo deserdar exibicio-
nismo desabitado exortar desonesto transumante lobisome inósp ito
coab itar exausto desonra desabituar desora inábi l inibir desonrar reaver
proibir desuman izar inumano

b) Frases variadas

Neste momento entra umha lancha na baía. Que las aí? Sentia
dor no ombro esquerdo. Os pobres nenos ficarom órfaos . Nom se acha
este livro em nengumha biblioteca. O vinho tem pouco alcoo l. Havia
festa na ermida . Chegas sempre a desora. Nom hai razom para coibi-

74
~TOD PRÁTICO DE L1NGUA GALEGO-PORTUGUESA

res-te . Comprei um novo ades ivo. Todos os veícu los devem circular
pa la dire ita. Teu irmao nom é coerente. Tanto falou que lhe pareceu
encher-se de razom. Inchou-lhe o pé. Esta parede soa a oco. Proíbe-se
estac ionar aí ca lquer tipo de veículo. Cumpre evitar que o so l desidrate
a pele. Admiro a sua coerénc ia desde hai tempo . O pai deserdou o
filho mais novo. Até querem subastar este ermo! Baía é umha cidade
do Brasil. Despois dalguns anos o grande filósofo loi reabilitado. Sen-
te-se coibido diante dos estranhos. No tronco oco do velho castinheiro
havia um ninho.

«Fomos, somos e seremos!»

Galegos sempre nós fomos,


galegos fomos e somos:
fomos e somos galegos.
Porque somos o que fomos,
para sermos o que somos,
sempre galegos seremos.
Fomos e somos galegos:
fomos, somos e seremos!
(J.-M. M. S.)

12.4: Exercícios de escritura

Podes comer um ovo cada dia. Despois de tanto trabalho ficou


exausto. Trai-me um pouco de alcool da farmácia . Aquel é um lugar
verdadeiramente inóspito. Todos os veículos serám vendidos em su-
basta pública. A casa é tam velha que se fai inabitável. Algum dia
cumprirám-se todos os seus anelos. A rapaza sentiu-se coibida. Expli-
cou-nos todo de forma exaustiva. Logo exalou um profundo suspiro e
caiu no chao. Está proibido fumar. A cidade foi construída numha
formosa baía. Adiro-me à sua protesta. A vida nas cidades modernas
torna-se algo inumana. Agora terám que exumar o cadáver. Foi umha
desonra para toda a parróquia.

75
Três prosistas galegos de fensores do relnlegraclonismo lingUlstico galego-português: Vi queira
(1886-1924), A Vilar Ponte (1881-1936) e Castelao U886-1950). (Debuxos de 81ro).
13. O acento circunflexo Cê, ô)

13.1: Vogais abertas e fechadas

• Cando as vogais e e o aparecem em posiçom tónica, podem


ser abertas ou fechadas. Chamam·se as si porque, ao pronunciá-las,
a língua forma na boca um canal mais amplo nas abertas que
nas fechadas.
Desta maneira, existem no sistema fonético galego-português
sete vogais: a, e aberto, e fechado, i, o aberto, o fechado, e u.
Algurnhas palavras distinguem-se entre si unicamente por esta
diferença no grau de abertura dessas duas vogais. Assi: este, com
e tónico aberto, é o nome do ponto cardeal, mentres este, com
e tónico fechado, é o demonstrativo; pé (parte do corpo) com e
aberto, e pê (nome da letra p) com e fechado; fora (advérbio
de lugar) com o aberto, e fora (dos verbos ser ou ir) com o fechado.
Como se vê, esta diferença é de importáncia capital na estru-
tura do idioma. Nisto se distingue o vocalismo da nossa lingua
do da língua espanhola (que é, aliás, a única língua románica
que tem só cinco vogais).

77
JOS~-MARTINH MONTERO SANTALHA

Sistema vocálico galego-português

1. o c.trlÓnguloJo daa 2. Promí'11.cia da 3-4. e aberto.


t)ogat8. t)ogal a

• •

5-6. e fechado

9. o aberto. 10. o fechado. 11, u.

13.2: Uso do acento cirlllll1fIexo

• Dado que o alfabeto latino nom dispam mais que de cinco


letras para representar as vogais, o feito de existirem no nosso
idioma sete sons vocálicas suscita um problema de grafia: como

78
M~TOD PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

representar na escrita a diferença fónica entre os dous graus


de abertura das vogais e e o?
Ainda que seria útil para a pronúncia indicar sempre o grau
de abertura vocálica, isto somente seria possível à custa de usar
gram cantidade de acentos gráficos.
De feito, optou-se por umha soluçam intermédia: sinala-se
unicamente naqueles casos em que, conforme as regras gerais de
acentuaçom, hai que usar acento gráfico. Para isto empregam-se
dous acentos diferentes, segundo a vogal seja aberta ou fechada.
Para indicar vogal aberta usa-se o acento agudo ('l: é, ó;
por exemplo: café, dominó. (O acento agudo é, ademais, o único
que se uma normalmente para indicar a tonicidade silábica das
outras três vogais, que nom tenhem diferentes graus de abertura:
á, í, ú; por exemplo: rápido, líquido, música) .
Para a vogal fechada usa-se o acento circunflexo (' ): ê, ô;
por exemplo : pê, fôramos . O acento circunflexo só se usa, portanto,
sobre e ou o fechados (isto na Galiza, pois na área luso-brasileira
tamém se usa por vezes sobre a vogal a).

13.3: Exercícios de leitura

a) Vocábulos soltos

bê cê dê pê quê tê uvê mercê você crê vê prevê lê relê lêvedo


cortês montês montanhês pedrês descortês freguês burguês marquês
mês três santiaguês português corunhês luguês Cortês Garcês Inês
berlinês irlandês
temê-Ia perdê-los metê-los sabê-los querê-Ia conhecê-los
temêramos temêrades corrêramos corrêrades morrêramos morrêrades
crês lês vês prevês relês dês
acô alô sôfrego lôbrego serôdio côdea avô
fôramos fôrades compô-los dispô-los pôr contrapô-los

b) Frases

Nom se prevê nengumha novidade para este mês. No meio da


noite nom se vê nada. Temos que sabê-lo antes do domingo próximo.

79
JOSt:-MARTINHO MONTERO SANTALHA
------------------------------------------- -----
Sua irmã tinha um noivo mui cortês e educado. Se vos descuidades,
podedes perdê-Ia. Teu irmao leva umha vida de marquês. O galego é
umha variedade de português, como tamém o brasileiro. Onte à tarde
chegarom três homes a pé. Bem quixera sabê-lo! Meu pai era luguês ;
por isto foi conhecido na vila polo nome de -O luguês •. Se corrêrades
mais, teríamos chegado a tempo. Crês que caberemos os três? Nom
se deve confundir o bê co uvê. Muitos alunos estudam irlandês ou
algumha outra língua céltica. Nom me dês mais a lata! Galego, portu-
guês e brasileiro som umha mesma língua. O mês que vem poderedes
conhecê-los. Nom deves ser descortês com ela.
Se chego alô, será sábado ou domingo da semana que vem. Era
umha noite lôbrega, sem um raio de claridade. Tinha umha ferida no
lado esquerdo, a três centímetros do nariz, e nom pudo pôr-se em
caminho. O pobre somente tinha umha côdea de pam para comer
aquela noite. Se fôramos todos tam avisados como el era! Os sonetos
som um capítulo serôdio na obra deste grande poeta lírico. Vem acô,
que che quero contar um conto!

13,4: Escritura

• Entre os casos mais freqüentes em que deve usar-se o acento


circunflexo podemos citar os seguintes:
a) Os nomes gentílicos acabados em -ês; por exemplo: albanês,
berlinês, corunhês, escocês, holandês, inglês, irlandês, japonês,
leonês, luguês, pontevedrês, português, santiaguês, viguês; igual-
mente outros vocábulos de formaçom semelhante; p.e.: burguês,
cortês, descortês, freguês, marquês, mês, montanhês, montês,
pedrês, três. No feminino e no plural, estas palavras, como é
lógico, perdem o seu acento (como sucede tamém em castelhano);
p.e.: português, mas portuguesa, portugueses.
b) A forma verbal pôr (variante concorrente de ponher), que
mediante o circunflexo se distingue ortograficamente da preposi-
çom por. Nom levam acento, em troca, os seus compostos, dado
que nom existem palavras homógrafas das que seja preciso dis-
tingui-los; p.e.: compor, contrapor, dispor, repor.
c) Os infinitivos da segunda conjugaçom seguidos do pro-
nome enclítico de objecto directo de 3&persoa (do qual se sepa-

80
Mt:TODQ PRATICO DE L1NGUA GALEGO-PORTUGUESA

ram, como já vimos no párrafo 9.1, por meio dum hifem); p.e.:
temê-lo, colhê-la, perdê-los, querê-las; e igualmente, na mesma
circunstáncia, o verbo pôr e os seus compostos: pô-los, compô-los,
dispô-lo.
d) As persoas primeira e segunda de plural do mais-que-
-perfeito e do imperfeito de subjuntivo dos verbos da segunda
conjugaçom; p.e. : perdêramos, perdêrades, perdêssemos, perdês-
sedes; e igualmente as mesmas formas do verbo ser (e ir): fôramos,
fôrades, fôssemos, fôssedes.
e) Os nomes dalgurnhas letras: b bê, c cê, d dê, g gê, P pê,
q quê, t tê, v uvê (pero e é).

13.5: Exercícios de escritura

Aquel senhor é mui cortês. Cumpre reconhecê-lo humildemente.


Hai mais de um ano que morreu o avô. O alcaIde santiaguês, em Por-
tugal .Crês que chegaremos a tempo? Podemos dividir a história da
literatura galega em três períodos. Vós fôrades alô antes qeu eles.
E melhor metê-los aqui. Se batêramos mais forte, teria caído a
parede. Hai de pôr todo isto em ordem. Virá tamém um amigo meu
português. Este mês estudo inglês. Eram três irmás solteiras. Nom
podes perdê-los outra vez.

81

2>;'0 - it_

Cnn-alho Calero, fil ólogo e crltlco literãrio (além de poeta, romancista e aUlor t ealral).
expu xo e fundamentou com rigor as I'RZons da reintegracom lingUlstlcn galego-portuguesa.
14. O acento grave: à, às

14.1: à, às

o O acento grave usa-se somente na contracçom da preposiçom


a coas formas femininas do artigo definido : à, às; por exemplo:
chegou à casa, falou às amigas.
O acento sinala graficamente nesses casos a diferença entre
as contracçons e as formas normais do artigo: a - à, as - às.
o Por que se usa o acento grave e nom o agudo? Porque,
mentres o acento agudo indica sílaba tónica, esses dous vocábulos
tendem a ser átonos : unem-se acentualmente à palavra seguinte
(isto é: som proclíticos).
Ora, como se trata só de duas palavras e o uso dum terceiro
tipo de acento somente para duas palavras nom é mui rendável
(ainda sendo palavras freqüentes na lingua, como de feito som),
e tendo em conta ademais que nom é claro o feito de que essas
formas sejam realmente átonas, nom se pode declarar condenável
prescindir do acento grave e usar no seu lugar o agudo: á, ás;
p.e.: chegou á casa, falou ás amigas.
Contodo, o uso do acento grave parece preferível e melhor
fundado , e por isso o usamos aqui sistematicamente.
• Na área luso-brasileira usa-se o acento grave ademais noutro caso:
nas contracçons da preposiçorn a coas formas do demonstrativo aquele:
àquele, àquela, àqueles·, àquelas, àquilo_
Pero, dado que na prática nom hai diferença de pronúncia entre essas
formas contractas e as formas nom contractas, nom parece imprescindível
reflexarmos na escrita tais contracçons_ De feito, na Galiza nom se venhem
usando; escrevem-se somente as formas Dom contractas (sem nengum
acento, claro está): a aquel, a aquela, a aqueles, a aquelas, a aquilo.

83
JOSl!:-MARTINHO MONTERO SANTALHA
- - - - --

14.2: Exercícios de leitura

Virá às cinco da tarde . A marquesinha vai à fonte todas as manhás.


A lua caminha pola escuridade do céu às apalpadelas. A nena nom
pudo ir à escola. porque nom tinha chambra que pôr. O rei morrera
na batalha, à beira dum grande rio. O idioma dá-nos direito à terra em
que fomos nados. Seu tio vivia num castelo, à maneira dum lobo que
espera a sua presa . O velho fidalgo subia à sua casa palas caminhos
da serra.
Comprou um cam à filha? Tenho à senhora por persoa de bem.
O mestre ensina a gramática às suas alunas. Onte à noite encontrei a
teu irmao na rua. Vamos umha partida às cartas. A mulher estava à
porta da casa. A tarde trabalho num escritório. A Marinha é a terra
situada à beira-mar. Nom costumo sair à noite. A ladra abocava-Ihes
à cara umha pistola de dous canos. O velho ergueu à luz a garrafa de
vinho. O marinheiro voltou às suas ilhas. A nena ficou à porta. Pediu
à mulher que viu ali, um pouco de pam.

14.3: Uso de à

• Com respeito ao uso das contracçons à, às cumpre ter em


conta que na nossa língua é mais freqüente do que em castelhano.
Em locuçons adverbiais formadas coa preposiçom a seguida
de nomes femínínos em singular, o nosso idioma tende a usar a
forma contracta de preposiçom e artigo (à) onde o espanhol usa
simplemente a preposiçom sem artigo (a) . Comparem-se, por exem-
plo, as seguíntes locuçons em espanhol e em galego-português:

a imilación de à imitaçom de
a fuerza de à força de
a semejanza de à semelhança de
a medida que à medida que

Em galego-português o uso da contracçom nestes casos evita


urnha eventual dúvida acerca de se se trata da preposiçom a ou
do artigo femíníno singular, confusom esta que nom é possível
em castelhano por ser la a forma do artigo feminino.

84
M:tTODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

o mesmo uso da contracçom se mantém cando o substantivo


está em plural, apesar de que neste caso já nom hai possibilidade
de confusom entre a preposiçom a e o artigo feminino (as);
compare-se novamente:

a oscuras às escuras
a escondidas às escondidas
a ciegas às cegas
a veces às vezes

14.4: Exercícios de escritura

Chegarei às três da manhá. Ia à vila todas as semanas. Nom se


pode andar às cegas pala vida. Gosta-lhe vestir à moda. Indica-lhes o
lugar à medida que vaiam chegando. Nom quer que o fagas às escon-
didas. Fai as cousas um pouco à antiga. Este rapaz anda sempre
à toa. Caminharam às escuras durante vários minutos. Entre, sente-se
e ponha-se à vontade. Onte foi à aldeia dos pais. Voltou à terra onde
nacera. Está todos os dias sentado ali à porta. Este livro nom está
ainda à venda. Botou-se à terra imediatamente. Di à mestra que manhá
nom podes ir. Fixo umha saída à beira do mar. O resultado está
bem à vista. Dixo-mo à vista de todos. Que lhe diria à mai? Subiu
à montanha cos seus amigos o domingo último.

85
JOS:t-MARTINHO MONTERO SANTALHA

Na Galiza e no norte de Portugal conserva-se o fonema a(rlcado lê/,


que se representa graficamente por eh. (cl~OTar) .

86
15. Uso gráfico de g ante e ou i, e de j

15.1: Por que ge, gi e i

• Já falamos (no apartado 7) do fonema fricativo palatal xordo


/§/, que se representa graficamente por meio da letra x nalgu-
mhas palavras; por exemplo: caixa, exemplo, deixar.
Pois bem: noutras palavras este mesmo fonema galego repre-
senta-se por meio das letras g (diante de e ou i) ou j.
Temos, pois, três letras diferentes para representar um único
fonema.
• Esta era a ortografia histórica do galego, usada em todos os
textos medievais e conservada ainda por numerosos escritores
modernos (por exemplo: Pintos, Murguia, La Iglésia, Valhadares,
Pondal, Viqueira, Risco, Noriega, Bouça-Brei, etc.).
Na época medieval, coas letras g (ante e, i) e j representava-se
um fonema distinto do actual: o fonema fricativo palatal sonoro
li/o Na área luso-brasileira este fonema sonoro conservou-se;
pera na Galiza despareceu, despois do século XVI, confundindo-se
co xordo.
• Apesar de que desde o ponto de vista fonológico seria mais
adequado usar urnha só letra, e nom três, para representar este
fonema, a adopçom de tal ortografia equivaleria a pagar um preço
elevado de mais: por um lado, significaria urnha ruptura coa nossa
própria história idiomática, e, por outro, separaria-nos grafica-
mente dos luso-brasileiros (de modo inecessário, pois apesar de
todo a diferença fonética é mini ma, imperceptível para a maioria
dos falantes galegos). Portanto, isolaria a nossa língua nas suas
duas dimensons: diacrónica e sincrónica.

87
JOS:f·MARTINHO MONTERO SANTALRA

13

12. ". 13. IS! ( p . e. x em cab;a)

• Nas suas primeiras indicaçons de normativa ortográfica, em


1909, a Academia Galega estabeleceu o uso etimológico-histórico
de g e j, e com esta grafia está feito o seu dicionário (inacabado).
• Dentro da normativa galega desintegracionista resulta incoerente que
se mantenha a grafia gu, com U, em casos como guerra, águia, já que em
tal normativa nom existe umha grafia ge, gi: umha mostra clara da
dependéncia ortográfica com respeito ao espanhol que inspira a essa
tendéncia lingüística.
Naturalmente, o reintegracionismo mantém a grafia gu, pero agora
já por necessidade interna do sistema ortográfico galego.

15,2: Leitura de ge, gi e de j

• Polo que se refere à leitura, nom supom maior problema : as


letr as g (ante e ou i) e j leremo-las co mesmo valor fónico que
o x de caixa; por exemplo: fugir, gear, janeiro, hoje, to jo.

15.3: Exercícios de leitura

a) Vocábulos soltos

gear geada gelatina gemer gemido género génese genial genro gente
gentil gentinha geografia geral gerente germe germinal gerúndio gesta
gesto gigante gigantesco girar gitano
jamais janeiro jantar jantou jardim jarra jeito j eitoso Joám Joaquim
já jogar joguei jogou jogaram jogador jornal jornalista jornaleiro José

88
M:tJTODQ PRATICO DE LINGUA GALEGO-PORTUGUESA

jota jovem jubilar-se júbilo jubileu juízo julho Júlia Juliana junco junho
junqueira junta juntar jurar jurídico justo juventude jovial jogavam
juntarom-se Jordánia Jesus julgar justificar
longe gentes ruge-ruge efígie progénie auge
hoje laje traje ultraje
origem imagem virgem margem origens alienígena indígena rígido lití-
gio prestígio prodígios vestígios mágico tragédia ágil frágil naufrágio
sufrágio egrégio colégios privilégio Oiógenes alógeno lógica antropo-
lógico urgir biológico climatológico cronológica demagógico etimoló-
gicos patológica geológico fingir surgir dirigir exigir.
igreja peleja cerveja inveja beijo desejar desejo queijo Tejo esponja
ajuda cujo suja viajar arranjar beijar festejar gotejar invej ar pelejar
pestanejar branquejar cacarejar

b) Frases variadas

Os teus amigos festejam hoje o éxito de Joám. Desejo que viajes


hoje mesmo, e, a poder ser, em trem . Aquel jovem dedica-se a estudos
geológicos . A neve branqueja sobre o cu me da montanha , alá longe.
O egrégio visitante viaja hoje num pequeno barco palo rio Tejo.
Tanta inveja neste colégio dá nojo. A jovem fingiu sair, pero ficou à
porta . A viúva estava afligida pensando nos seus três filhos , tam novi-
nhos. O presidente dirigiu-lhes a palavra em tom algo demagógi co.
Convém arranjarmos a máquina antes de nada. Creio que era bom de
mais : transigia com todos os ultrajes que lhe infligiam os indígenas.
Viajou por longe da sua terra antes de conseguir este prestígio que
hoje tem.
Di o refrám : -Janeiro, geadeiro .; porque no mês de janeiro hai
muitas noites geada. A Junta é o governo da Galiza. O jovem era um
jornalista japonês. Juntarom-se para jogar umha partida às cartas.
Janeiro é o primeiro mês do ano ; outros meses som junho e julho.
Sua mai trabalha de jornaleira na casa do marquês. A geada é orvalho
conge lado. Sentia as maos geladas, apesar de levá-Ias nos bolsos do
pantalom. Se el chegou a ser gente , deve-o a si mesmo. Nos meses
de junho e julho som os dias longos. O vento gelou-lhe o corpo.
Seu pai mandou congelar o vinho. A gelatina é umha proteína que
se prepara industrialmente para uso culinário. Serei eleito cos votos
da minha gente.

89
JOM-MARTINHO MONTERO SANTALHA

Despois do mês de junho vem o mês de julho. Ao ver o lobo, co


seu olhar de gelo, o gigante ficou gélido de medo. Durante a noite
o vento geme pavorosos cantos nas árvores do jardim . O governo pro-
curava generalizar no país novos costumes . A gente do meu bairro
nom parece gostar muito de flores . Lástima que o jovem seja tam dado
ao jogo! Fala com jeito, rapaz! Este vestido nom ajusta bem. Espero
que, ao chegares, já me aches pronta .
Hoje é joves, ou seja, quinta-feira. Nom mui longe , um cavalo
branco, ajaezado, esperava-a. Este jovem vivia num palácio ajardinado.
Nom lhes será difícil ajuntarem toda a freguesia contra nós. O jardi-
neiro quer comprar um jersei de raias. Tem jeito, neninho , nom andes
gritando pola rua! O velho avaro nom se cansa de ajuntar dinheiro.
Suba por esta rua e alá em riba encontrará umha grande avenida
ajardinada. O jornalista foi ao espelho do salom e ajeitou a gravata.
Os nenos jogavam-lhe pedras desde a ponte do trem.
O jantar está já preparado. Cumpre ajuizarmos a verdadeira impor-
táncia deste acontecimento. O repouso ajuda a curar a gripe. Entrou
o Joaquim à sala; e cando a ocasiom se ajeitou, foi sentar-se ao lado
de Júlia . Já chegam os convidados, já vai principiar a festa . Deste jeito
nom podemos continuar. Os pilotos de carreiras automovilísticas jogam
a vida constantemente. Tinha umha horta ajardinada.
Despois de muito luitar, ajeitou um emprego fixo para o filho.
O general queixa-se de que ninguém lhe ajuda. O gerente, co rosto
contraído e a boca torta, pede à mulher que lh e ajude a conseguir
um sítio melhor. Ao parecer, o ladrom morreu num ajuste de contas.
Cumpre pôr-se a trabalhar desde já. Que é o que vocês tenhem para
jantar hoje? Cando o dia de Santiago cai em domingo, é ano santo
jacobeu. Busca quem lhes ajeite umha entrevista co ministro.
Várias persoas que viram o accidente correrom para se informar
e, se for preciso, para ajudar. Ninguém sabia histórias mais bonitas que
a velha Joana, nem tinha mai s jeito para as contar. Convém-che tomar
umha sopinha ligeira. A minha mulher gosta de estar à janela horas
inteiras. Já que me ajudache, vou-che regalar umha joia. As autoridades
ainda nom ajuizarom os danos da catástrofe. Encontrarom no jardim
um jovem levemente ferido . Desde já lhe agradecemos todo o que
fixer por nós. Os homes em sociedade som como as pedras numha
abóbada: resistem e ajudam-se simultaneamente. Jamais se viu cousa
semelhante!

90
'M~TOD PRÁTICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA
- -- - - --

Lembro-me daquel jornaleiro que se jogou do sétimo andar hai


vários anos porque nom podia manter os filhos . Se andas sem jeito
por aí, nom poderemos ajudar-che. Nom creio que isto seja verdade,
mas até poderíamos admitir que seja. O meu filho ajunta se los de
correios. O gitano ajuntou duas cadeiras, improvisando umha cama.
Aquela rapariga gentil tinha um corpinho jeitoso. Coloca estas flores
em água numha jarra. Esta cidade nom tem jardim zoológico. isto nom
tem jeito! Viche o jornal de hoje? A fortuna fi xo-me de carácter frio,
mas já nom me jacto disto. O generoso doutor chegou aos noventa
janeiros com plena lucid ez. O jovem mirou-na por tanto tempo e de
tal jeito, que ela sentiu-se incomodada.
Nom ajuntarei palavras para encarecer os méritos do poeta. O comer-
ciante ajustou o empregado por três meses somente. Joám tinha o jeito
grave dos que amadurecem cedo de mais. O genro jurou que nom
lhe perdoaria. Gasto o mais do tempo em cultivar o jardim da minha
casa ou em ler.

15,4: Escritura de ge, gi e de j

a) Um aprendizado fácil

• O emprego, por causas históricas, de três letras diferentes


(x, g e j) para represen tar um único fonema da fala galega actual
(a saber, o fonema /~), torna necessária umha aprendizage que
nos familiarize coa distribuiçom ortográfica dos três signos.
À primeira vista, pode parecer esta umha tarefa difícil. Mas,
cando se observa mais de cerca a situaçom, comprova-se ser muito
mais fácil do que ero princípio parecia. E isto, devido aos dous
factores seguintes:
1) A freqüéncia do fonema /s/ na língua é baixa: 0,90 %
(isto é: de cada cem fonemas que aparecem na cadeia do discurso
dum falante galego, somente um é / s/) .
2) Todos os galegos (polo menos os adultos) fomos escola-
rizados em espanhol, e conhecemos assi o uso ortográfico das
letras g e j neste icUoma. Pois b em: o emprego de ambas l etras
na nossa língua coincide co castelhano, salvo poucas excepçons
que logo veremos,

91
JOS~MARTINH MONTERO SANTALHA

b) Esquema distributivo

• o X e o j podem usar-se ante calquer das vogais; por exemplo:


caixa, peixe, remexido, deixou, queixume; jamais, hoje, anjinho,
jogar, ajuda_
Palo contrário, o g somente se usa, com este valor fónico,
ante e ou i; por exemplo: gente, fugir_ Ante as restantes vogais
(a, o, u) ou ante consoante, o g tem, como se sabe, um valor fónico
diferente (a saber: Ig/); por exemplo: gato, agora, agudo, glória,
agradecer_
• Em esquema, pois, o uso das três letras que representam o
fonema Is/ é o seguinte:

a e o u

~. ~ '~
x xi xu
j Ja Je ji JO ju
g - ge gi -

c) lndlcaçons práticas

• Com vistas à aprendizage da escrita, podemos seguir estas indi-


caçons de índole prática_
1) ja, jo, ju

Convém aprender antes de nada os vocábulos que se escrevem


com X, porque som poucos: dado que se trata dumha lista redu-
zida, resulta fácil reter na memória visual a sua grafia despois
dum atento exercício de leitura.
Os vocábulos (ou as raízes) de mais freqüente uso que se
escrevem com X vimo-los já no apartado 7.3. Tenha-se em conta
que todos os vocábulos dumha mesma raiz mantenhem essa grafia
com x: aprendida a grafia dumha palavra, conhece-se já a de toda
a sua família léxica; p.e.: baixo, baixar, debaixo, rebaixa, etc.
Despois de conhecida a lista de vocábulos que se escrevem
com x palatal, já sabemos que calquer outro vocábulo em que

92
Mt:TODO PRÁTICO DE LíNGUA GALEO~PRTUS
- - - -_'. -= -'.:~=

apareça o fonema Is/ ante a, o, u se escreverá com j, pois o g


nom se usa ante essas vogais.
• Indicamos seguidamente alguns casos freqüentes em que apa-
rece j ante a, o, u:
a) Os verbos que tenhem j no infinitivo, conservam esta letra
em toda a conjugaçom; p.e. de viajar: 1 viajo, 1 viaje, 2 viajes, etc.
b) Escreve-se com j o sufixo verbal -jar (e, conseguintemente,
toda a conjugaçom desses verbos); p.e.: bracejar, festejar, gotejar,
invejar, latejar, pelejar, pestanejar.
c) Os verbos com infinitivo em -ger ou em -gir mudam o g
em jante terminaçons começadas por a ou por o; p. e.: proteger:
1 protejo, 1 proteja, 2 protejas etc.; de dirigir: 1 dirijo, 1 dirija,
2 dirijas etc.
d) Escrevem-se igualmente com j as seguintes formas fre-
qüentes de verbos irregulares: de estar: 1 esteja, 2 estejas etc.;
de haver: 1 haja, 2 hajas etc.; de ser: 1 seja, 2 sejas etc.; de ver:
1 vejo, 1 veja, 2 vejas etc.
• Com respeito ao espanhol. pode observar-se, por umha parte, que hai
alguns vocábulos galego-portugueses com j que em castelhano nom entram
dentro deste capítulo, por terem forma diferente; p.e.: ajudar, beijo (beijar),
cornija, estojo, inveja, já, mejar, seja, vejo.
Mas, por outra parte, a maioria dos vocábulos coincidem graficamente
neste ponto em ambas línguas (excepçom feita, claro está, dos vocábulos
com x vistos no párrafo 7.3); p.e.: alojar, forja, jamais, jardim, jarro,
jogar, joia, joves, julho, junho, juntar, nojo, protejo, viajo.

2) g e j ante e ou i

• Despois de aprendido o uso de x, e o de j ante a, 0, u,


podem-nos surgir dúvidas entre usar g ou j ante e ou i.
• Para os escolarizados em espanhol, pode prestar-lhes utilidade
aqui o seu conhecimento da ortografia castelhana (e, em medida
similar, o de calquer outra lingua románica, p.e. o francês; e até
umha lingua nom latina como o inglês, que tem abundante léxico
románico ou greco-Iatino); e isto porque, despois de apartados
os vocábulos escritos em galego-português com x, o uso de g e j
coiocide substancialmente co dessas outras línguas.
Vejam-se as seguintes palavras galego-portuguesas como mostra
de coincidéncia gráfica neste ponto entre espanhol e galego-

93
JOSt:-MARTlNHO MONTERO SANTALRA

-português: gente, ágil, agente, regéncia, vigente, mágico, geologia,


mitológico, imagem, margem, virgem, origem, original, lógica, fingir,
exigir, objecto, legislativo, sujeito, genial, gigante, homogéneo,
género etc.
• Hai certos casos, porém, em que o conhecimento da ortografia
espanhola nom nos ajuda. Como som poucos e facilmente reduzí-
veis a certas pautas, deveremos esforçar-nos por retê-los visual-
mente na memória. Podemos distribuí-los em dous tipos: 1) vocá-
bulos galego-portugueses que nom apresentam em espanhol esta
circunstáncia de usar g ou j; 2) vocábulos que neste ponto apre-
sentam nas duas línguas um uso ortográfico oposto (que sempre
consiste em que o espanhol usa j mentres o galego-português
emprega g).
• Pertencem ao primeiro tipo:
a) Palavras galego-portuguesas que nom existem em espanhol
(polo menos nom existem no uso comum actual); as mais impor-
tantes som: aginha, jeira, jeito, longe, mungir, tigela; e igualmente
os seus derivados: ajeitar, jeitoso, etc.
b) Palavras que em espanhol nom tenhem g nem j, porque
neste idioma a evoluçom histórica foi diferente da galego-portu-
guesa; eis os vocábulos principais desta índole (entre parênteses
indicam-se as palavras espanholas correspondentes, para que se
poda fazer a confrontaçom): abjecto (abyecto), argila (arcilla) ,
esparger ou espargir (esparcir) , frigir (freír), fugir (huir) , geada
(helada) , gema (yema), gengiva (enda) , genro (yerno) , gesta (hi-
niesta), hoje (hoy), injectar (inyectar), jejum (ayuno), jungir (uncir),
projecto (proyecto), singelo (senci/lo) , trajecto (trayecto); igual-
mente os demais vocábulos da mesma família léxica; p.e.: gear,
gelo, gelado, injecçom, jejuar, projecçom, projectar, anteprojecto,
projéctil, singeleza, trajectória.

• Pertencem ao segundo tipo :


a) Todos os vocábulos formados co sufixo de origem galo-
-románica -age, que em espanhol se escreve actualmente com j
(-aje); por exemplo: homenage, linguage, mensage, paisage, viage;
e igualmente os seus derivados (p.e. forrageiro, homenagear, men-
sageiro, paisagismo, passageiro, viageiro). O galego-português man-

94
MtTODO PRÁTICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

tém neste caso a grafia de procedéncia; em espanhol mudou-se


em tempos modernos, seguramente por influxo do sufixo vernáculo
-ajo, procedente do latim -ACULUM.
b) Os vocábulos de origem árabe: as palavras de procedéncia
arábica nunca levam j ante e ou i em galego-português (mentres
que em espanhol normalmente escrevem-se hoje com j): alfange,
alforge, algibe, beringela, ginete, girafa; igualmente os seus deri-
vados (p.e.: algibeira).
c) Outras poucas palavras; as mais importantes som: estran-
geiro, gerigonça, gíria, herege, monge, ogiva, relógio; e igualmente
os seus derivados: ogival, relogeiro.
• Se o leitor puxer atençom nos vocábulos que acabamos de
citar, poucos casos de dúvida se lhe apresentarám. Pero se tal
circunstáncia chegar a dar-se, já se sabe que o remédio mais prático
ante urnha dúvida ortográfica, na oossa língua como em calquer
outra, é a consulta do dicionário (português).

3) Parelhas homófonas

• Observe-se que, embora sejam homófonas, distinguem-se grafi-


camente as seguintes parelhas de vocábulos:
ameixa 'fruta' ameija (ou amêijoa) 'molusco'
cuxo 'bezerro' cujo 'de quem ,de que', relativo
queixo 'mandíbula' queijo 'leite fermentado'
xota 'baile' jota 'letra: j'

15.5: Exercícios de escritura

Chegará a ser um génio da música. Tinha o hábito de generalizar


os feitos particulares. Por debaixo da porta, entra um frio no inverno,
que gela. O viageiro ficou gélido de medo. Era umha voz de mulher,
quente e lánguida, gemendo cantos tristes. Que género de conversa é
esta? A obra deste poeta é verdadeiramente genial. Havia mui pouca
gente no cine. Galiza está sofrendo um genocídio lingüístico e cultural.
Nom é fácil viver com el: tem um génio mui difícil. Nesta rua hai
todo género de casas. Ajuda-me um pouquinho, por favor! Na fronteira

95
JOst·MARTlNHO 'MONTERO SANTALHA

francesa havia vários gendarmes. O pobre anho nom gemeu umha


queixa cando o mataram. Gelarom·se-lhe os pés, gelarom-se-lhe as
maos. Nom concordo com tal género de vida. Mostrou umha atitude
generosa. Nom insistirei em como na génese de toda a arte se pode
descobrir umha certa vontade de fugir deste mundo difícil. Você tivo
umha ideia genial. Dante é um poeta de génio.
O filho do rei ficou desamparado no meio de tantos inimigos da
sua frágil vida. O seu tio, irmao bastal'do do rei, era home depravado
e bravio, que desejava só a realeza por causa dos seus tesouros.
Antes de anoitecer, a rainha vinha beijar o principinho. A aia que
cuidava o neno pensava na sua fragilidade e .n a larga infáncia que lhe
quedava por viver.
A velhinha aquela morreu durante o mês de janeiro dum gélido
inverno. A casa onde vivo está rodeada de pinhais gementes. O médico
está mui cansado: nom quer ver mais gente hoje. O género humano
pode desaparecer em calquer momento. O pobre velho gemia a perda
dalgum ser querido. Genealogista é aquel que se dedica a estudos
genealógicos ou é especializado em genealogias.

15.6: Textos literários

1) -o galo,.,
por Luís Amado Carvalho

Abre-lhe as portas ao dia


coa chave do teu cantar!,
que Já na fonte da lua
está lavada a manhá.

Bota-lhe o teu aturujo o campo cheio de frio


à, paisage desde o vaI!, busca wn anaco de sol;
que o gram balbo das estrelas acende-lhe umha fogueira
cairá serôdio no mar. co lume da tua voz!

96
M~TOD PRATICO DE LíNGUA GALEGO·PORTUGUESA

2) .As flores»
por Castelao

Um dia de Nadai, olhando wnha paisage que imitava um Naclmento,


precatei-me de que hai mais formosura nas Horinhas dos campos que nas
flores de jardim. As Horinhas ventureiras que nacem nos campos parecem
criadas polo Bosco ou por BreugheI o Velho, mentres que as flores foulen-
tas de jardim semelham os encoiros manteigosos de Rubens. Desde entom
eu quixem ser wn venturelro das letras.

Cestelao

3) .Laverqulnha.,
por Noriega Varela

Laverqulnha que te axotas,


das degaradas gaivotas
ouvindo o selvage berro,
musa que a marinha estranhas,
olha as azuis montanhas
desde as praias do desterro!

97
,
JOS~-MARTINH MONTERO SANTALHA

Esquece o mar, lembra o gado


miúdo, e o regalado
viver, as tumbadas festas!,
e as cantigas dos pastores,
que fam guimaldas coas flores
amarelinhas das gestas.

OBSERVAÇOM. O trema ou diérese ( .. ) sobre o i de azuis indica que neste


caso essa vogal forma hiato co u que precede, e nom ditongo como sucede
obrigatoriamente na pronúncia normal da palavra; esta licença poética, pala
que se transforma em hiato um ditongo da lingua comum por causa da
métrica do verso. chama-se justamente «diérese».

98
16. USO da letra z

16.1: z ante e, i

• Em espanhol usa-se a letra z somente ante as vogais a, o, u


(cazar, zorra, azul) ou em posiçom final de silaba (conozco, diez);
ante as vogais e ou i usa-se somente c (hacer, producir).
Conservam-se, no entanto, alguns casos em que nom se obedece
esta regra : eczema, zigzag e zigzaguear, zinc, zeta ou zeda, nazi,
Nueva Zelanda e neozelm,dés, Ezequiel, enzima ('substáncia quí-
mica: fermento', para distinguir esta palavra do advérbio encima),
zipizape, zenit (tamém cenit) , zéjel, Ezequías, zepelín, Zeus, zelo ta,
azimut, Zenón, zebra (tamém cebra), zimógeno, Zebedeo .. .
• Na nossa língua conserva-se o uso da letra z tamém ante as
vogais e ou i: fazer, produzir.
Esta era a grafia medieval, conservada ininterrompidamente
até hoje na área luso-brasileira. Mantém-se esta grafia para salva-
gardar a unidade do idioma, tanto na sua dimensom diacrónica
ou histórica como sincrónica ou actual.
• Tamém em castelhano se usou a letra z ante e e i regular-
mente até o ano 1726, em que a Academia espanhola adoptou
a praxe ortográfica agora vigente; anteriormente a essa data escre-
via-se, por exemplo, hazer, vezino, luzir.

• Na época medieval esta letra representava um som que era


aproximadamente como /ds/; assi fazer pronunciava-se, mais ou
menos, /fadser/. O mesmo sucedia em espanhol.

99
JOSlt·MARTINHO MONTERO SANTALHAo _ _ __

16.2: Leitura de ze, zi

• Polo que se refere à leitura, este uso ortográfico num supom


maior dificuldade: leremos a letra z sempre co mesmo valor
fónico, tanto que vaia ante e ou i como ante a, o, u ou em fim de
sílaba; por exemplo, rapazes, concretize, reduzindo.

• Duas fundamentalmente som, como se sabe, as pronúncias que


correspondem a esta grafia (e igualmente a c/ç: ver párrafo 17.2)
na fala galega actual: o fonema /8/ nas zonas central e oriental
da Galiza (área de ceceio), e /s/ na zona atlántica (área de sesseio) .
Ambas pronúncias devem considerar-se perfeitamente legítimas.

A f ronteira do sesselo.

100
_ _ _ __ _M t T ODO PRATI CO DE LíNGUA GALEGO·PORTUGUESA
:..:.::..:

16.3: Exercícios de leitura

a) Vocábulos soltos

eficazes perspicazes suspicazes audazes sagazes fugazes tenazes capa-


zes pazes verazes capatazes luzes cruzes estupidezes vezes raízes
aprendizes perdizes felizes codornizes narizes velozes nozes ferozes
vozes
atenaze localizem fiscalize escandalizem flnalizedes centralizemos go-
zem neutralizem capitalizei actualizedes sonorizes
fazer fazemos fazedes fazia fazendo fazeres fazias fazíamos fazerdes
dizer dizendo dizemos dizia dizerdes dizedes dizermos dizíades dizerem
desfazer afazer satisfazer refazer bendizer desdizer maldizer predizer
cozer escozer recozer prazer comprazer jazer
vazio doze dúzia dezembro treze zero onze catorze quinze canzinho
panzinho deduzir conduzir aduzir induzir introduzir produzir reduzir
seduzir traduzir reproduzir luzir reluzir

b) Frases e textos

Estes rapazes som pouco eficazes. Aquela aldeia chama-se Vila


de Cruzes. Ouviam-se aS vozes dos nenos que brincavam na praia.
Ambos países fixerom as pazes entre si. Leva treze anos conduzindo
este camiom . Este orador nom di mais que estupidezes. Que dizedes
vós a todo isto? Vimo-lo várias vezes comprando nozes no mercado .
É preciso que concretizedes mais. Os cavalos andaluzes som mais
velozes. Quixo vir conhecer aqui as SUaS antigas raízes . Cozeu umha
dúzia de ovos. Por aqui nom hai avestruzes , pero si perdizes e codornizes.
Os peixes som animais mui vorazes.

«EgoismoJt

Tenho um canzlnho amigo


que é amigo meu somente.
E só é bom comigo,
e ladra à demais gente;

101
JO~-MARTINH MONTERO SANTALHA

e sempre que eu Ute digo,


ensina-lhes o dente.
De todos é inimigo
o cam amigo meu,
e afagos nom consente:
só fai o que quero eu.
(J.-M. M. S.)

16.4: Escritura de ze, zi

• Indicamos a seguir alguns casos mais freqüentes do uso de z


ante e ou i.
a) Os nomes (tanto substantivos como adjectivos) que em
singular terminam em z, conservam esta letra no plural, que fica
assi terminando em -zes; p.e.: cruz cruzes, feliz felizes, luz, luzes,
paz pazes, rapaz rapazes, vez vezes, voz vozes.
b) Os verbos cujo infinitivo termina em -zar conservam o z
em toda a sua conjugaçom, portanto tamém nas desinéncias come-
çadas por e (a saber: nas seis persoas do presente de subjuntivo,
e na I' persoa de singular do perfeito); p.e., de cruzar: 1 cruze,
2 cruzes, 3 cruze, 4 cruzemos, 5 cruzedes ou cruzeis, 6 cruzem, 1
cruzei. Entre os verbos afectados por esta particularidade, desta-
cam, por constituir um grupo numeroso, os formados mediante o
sufixo culto -izar; p.e.: modernizar, personalizar, realizar, simpa-
tizar, suavizar. Nom devem confundir-se com estes verbos, alguns
outros que estám formados sobre substantivos e nom mediante o
sufixo -izar; assi: analisar (de análise), cobiçar (de cobiça), espre-
guiçar (de preguiça), justiçar (de justiça), ouriçar (de ouriço),
paralisar (de parálise).
c) Os verbos cozer, dizer, fazer, jazer e prazer e os seus com-
postos tenbem z em todas as formas pertinentes; p.e. : cozia, dize-
mos, fazendo, desfazermos.
d) Os verbos terminados em -uzir tenhem z em toda a con-
jugaçom. Os princiapis som: abduzir, aduzir, conduzir, deduzir,
induzir, introduzir, produzir, reconduzir, reduzir, reproduzir, se-
duzir, traduzir, luzir, desluzir, reluzir, transluzir, tremeluzir.
e) E z o infixo que se usa especialmente com certos diminu-
tivos; p .e.: canzinho, coraçonzinho, maizinha, paizinho, pobrezinha.

102
M~TOD PRÁTICO DE L1NGUA GALEGO-PORTUGUESA

• Outras palavras de uso freqüente que se escrevem com Z ante


e, i som: armazém (armazenar, etc.), azedo (azedar), azeite, bezerro,
bronze (bronzear), catorze, cozinha (COzinhar), dezembro, dizimar,
donzel (donzela), doze 'número 12', dúzia, lazer, mezinha (mezi-
nheiro), onze, quinze, renzilha, treze, vazio (vaziar), vizinho, zebra,
Zelándia (zelandês), zelo (zelar), zero, zimbrar, zinco 'metal', zurzir.

• Em geral, os vocábulos com z conservam esta letra nos seus


derivados, mas nom em formaçons léxicas ou sufixais de índole
mais erudita; assi: juiz juízes mas judicial; -cidade (feroz ferozes,
pera ferocidade), -císsimo (tenaz tenazes, pera tenacíssimo), -citar
(capaz capazes, pera capacitar).

• Observe-se a distinçom gráfica das seguintes parelhas de vocá-


zulos, homófonos na pronúncia comum galega:

aceitar 'receber' azeitar 'botar azeite'


cinco 'número 5' zinco 'metal'
doce 'açucarado' doze 'número 12'
raçom 'parte' razom 'causa'

16.5: Exercícios de escritura

Nom podo dizer nada. Vem-se luzes no mar. Quero que suavizes
o teu carácter. Sentiu-se seduzido pala perso/lalidade daquel home.
Eu tenho um canzinho e você tem dous. Minha mai, minha maizinha,
como minha mai nengumha, que me quentou acarinha co calorzinho
da sua. Algumhas estrelas tremeluzem no firmamento. Nom seredes
capazes de fazê-lo. Hai que cozer estas patacas. Eram catorze rapazes,
todos vizinhos de Lugo. Comerom vários dias azeite tóxico. No mês
de dezembro costuma fazer frio. Esta botelha está completamente
vazia. V árias bezerros estám enfermos e nom comem. Dizia escuitar
vozes doutro mundo. Viviam felizes comendo perdizes. Cruzei várias
vezes a fronteira

103
JOS~·MARTINH MONTERO SANTALHA

16.6: Texto literário

«Foguete»,
por Amado Carvalho

Sobe o foguete às alturas Como pedradas os tira


fazendo sega de estrelas: o labrego fogueteiro,
dourado outono de cachos!, escachando com estrondo
colheita de luzes secas! o vidro do alto céu.

Beira do rio, os telhados


em.purrarnrse a çolher canas,
e com medo de rapazes
engurripam as espaldas.

No queipo do vaI caíram Alô, no longe da ria,


já serôdios, os luzelros, o aIdeao vento mareiro,
como os ázios de alvarinho botando escumas de foulas,
nas vendimas de setembro. arremeda ao fogueteiro.

104
17. A cedilha (ç)

17.1: ça, ço, çu

• Acabamos de ver que a letra z pode aparecer ante calquer


vogal: za, ze, zi, zo, zu (p.e.: dureza, fazer, dizia, realizo, azul).
Num certo paralelismo com esse uso da letra z encontra-se
o uso de c. Hai aqui, porém, umha particularidade: para manter
ante todas as vogais o mesmo valor fónico, a letra c ante a, o, u
toma a forma de ç (cedilha), pois o c normal já tem nesses casos
outro valor (casa, comer, acusar) .
Por isso, a cedilha somente se usa ante as vogais a, o, u: ça ço
çu; por exemplo, cabeça, começo, cabeçudo.
• Essa era a grafia medieval, conservada ininterrompidamente
até hoje polos luso-brasileiros.
A razam que obriga a manter ainda agora esta ortografia é
a unidade do idioma, tanto diacrónica canto sincrónica.
• Tamém em espanhol se usou a cedilha até 1726, em que a
Academia decidiu abandonar este signo, substituindo-o por z; assi,
palavras como coraçón ou çumo passarom a escrever-se corazón e
zumo, como agora se fai .
• Na época medieval c e ç representavam um som Its/: assi,
cabeça pronunciava-se Icabetsa/. Igual sucedia em espanhol.
• Conservam o uso da cedilha tamém o catalám e o francês.
• Na época modema usarom a cedilha vários escritores galegos;
entre eles Rosalia (que escreveu, por exemplo, começar, es-
paço, etc.).

105
JOSÉ-MARTINHO MONTERO SANTALHA

17.2: Leitura de ç

• Polo que se refere à leitura, o uso da cedilha nom apresenta


dificuldade: leremo-la co mesmo valor fónico que tem a letra c
ante e ou i: pareço como parecer, caçar c?mo cacei, etc.
• Do mesmo modo que com referéncia à letra z, hai na fala
galega actual duas pronúncias em correspondéncia a c/ç: a ses-
seante (fs/) e a ceceante (fO/).
Como já ficou dito (párrafo 16.2), calquer de ambas pronún-
cias é plenamente legítima.

17.3: Exercícios de leitura

a) Vocábulos soltos

caçar caça bocaça ameaça ameaçar maçá raça desgraça praça taça
traça peça cabeça cobiça hortaliça justiça injustiça preguiça quiçá suíço
dançar tardança mudança semelhança confiança aliança lança ensinanças
lembrança esperanças segurança matança doença crença moço moça
força louça pedaço espinhaço laço paço braços abraço abraçar começar
começo tropeçar março tropeço preço pegadiço quebradiço encontradiço
movediço beiços carriço feitiço castiço postiço descalço lenço pescoço
reforço esforços abraçou ameaçando calçar alcançar avançar dançamos
começou tropeçando aguçar

b) Frases variadas

Os seus senhores iam de çapatos novos todos os meses . O mestre


ameaçou-nos com deixar-nos sem exames até o mês de março. Gos-
tam-me as maçás . Os nazis exaltavam a raça. Vai de caça na montanha .
Sucedeu umha desgraça na família . Na praça reunirom-se vários milheiros
de manifestantes . Doi-me algo a cabeça.
A esta máquina deve de faltar-lhe algumha peça. Fixo aquilo por
cobiça. No jardim cultiva flores pero tamém hortaliças. Nom me fam
justiça! Sinto preguiça de escrever cartas. De mim se mofarom , ven-
deu-me a justiça. Entom si, entom cumpriu-se a justiça. Quiçá venha
manhá. Esti vo traba lhando como emigrante em Suíça. Puxera toda a

106
lIIUTODO PRATICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

confiança nos seus amigos. Comprou umha figurinha que dizia: • Lem-
brança de Portugal.. Padece do coraçom. Pouco despois começou a
chover. Abraçou-na e beijou-na como de costume . Hai ameaça de
tempestade .
Tivo que tomar a justiça pola mao. Agradeço-che que nom vaias.
As águas calmas do rio abraçavam a ilha. Chama-se .abraçadeira. umha
peça de ferro usada como reforço em certos casos. A velha árvore
ameaçava cair. O rapaz avança pouco nos estudos. O ladrom abalançou-se
sobre o condutor . Esforça-se por conseguir um bom resultado.

17,4: Escritura da cedilha

• Entre outros casos, escrevem-se com cedilha vários sufixos e


terminaçons de freqüente uso:
a) -aça, -aço, -iça, -iço (p.e.: ameaça, caça, graça, praça, raça;
braço, espaço, espinhaço, pedaço; cobiça, justiça, preguiça; feitiço,
movediço, quebradiço); pero prazo, juízo.
b) -ança, -ença (p .e.: esperança, mudança, semelhança; crença,
diferença, doença, licença, presença, sentença).
c) -çom (p.e.: coraçom, naçom); trataremos deste sufixo no
apartado 19.
• Os verbos cujo infinitivo termina em -cer mantenhem c ou ç
em toda a conjugaçom (c ante e, i; ç ante a, o); p.e., de padecer:
padeço, padeça.

17,5: Exercícios de escritura

A noite ameaçava chuva. Estendeu-lhe os braços, para abraçá-la


e beijá-la como de costume. Os seus peinhos andavam sempre des-
calços. Agradeço-che de coraçom o que fixeche por mim. Abraçou
a causa do país adoptivo como se tivera nacido ali. O home avançou
para ela ameaçante. Temos que começar palo princípio. Desde hai
três meses adelgaçou mais de vinte quilos. A velha árvore ameaçava
cair. Ainda nom se sabe bem em que consiste a sua doença. Pouco
a pouco desafeiçoou-se dela. Encabeça a lista de candidatos ao COI1-

107
JOS:t-MARTINBO MONTERO SANTALHA

celho. A ameaça do pai nom surtiu O efeito desejado. Já começam a


florecer as mimosas. Quiçá cheguemos ainda a tempo. Fixerom-nos
umlta grave injustiça. Hai ameaça de tempestade. Os pescadores, já
fora das águas jurisdicionais, lançarom as redes ao mar. Sacou o
revólver para ameaçar o ladrom. Agradeço a Deus nom teres partido.
O capitám explicou-me que só por motivos graves abraçara aquel
ofício. No mês de março começa a primavera. Ameaçou-no de bater-lhe,
e até de o matar.

17.6: Textos literários

t) .Alguns dlm: 'MJnha terra!'",


por Rosalia Castro

Alguns dim: .Minha terra!»;


dim outros: ({Meu carinho!.;
e este: .Minhas lembranças!»;
e aquel: «Oh meus amJgos!lO.
Todos suspiram, todos,
por algum bem perdido.
Eu só Dom digo nada,
eu 56 nunca suspiro.
que o meu corpo de terra
e o meu cansado esp'rito.
aonde quer que eu vaia
vam comigo.

2) «A marquesinhalt.
por Castelao

Chamam-lhe .A marqueslnhalt. e os seus pe1nhos jamais se calçaram.


Vai à fonte, depelica patacas, e chamam-lhe «A marquesinha».
Nom foi à escola por nom ter chambra que pôr, e chamaJn·lhe
«A marquesinha».
Nom provou mais lambetadas que wnha pedra de açúcar, e chamam-
-lhe «A marquesinha».
A sua mal é tam pobre que trabaUta de Jomaleira na casa do Marquês.
E ainda lhe chamam «A marqucsinha»!

108
MéTODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

3) .Caminho longo»,
por Ramom Cabanilhas

Caminho. caminho longo. Caminho, caminho longo ...


caminho da minha vida, A chuva, a neve e as silvas
escuro e triste de noite, encherom..me de frlage,
e triste e escuro de dia ... , cobrim~e de feridas .. .i
caminho longo caminho longo
da minha vida. da minha vida!
Vereda, vereda torta, Vereda, vereda fonda,
em duras lajes aberta, de fontes tristes, sem águai
arrodeada de tojos, sem carvalhos que dem sombra,
quebrada palas lameiras . .. , nem choças que dem pousada ... ,
vereda torta, vereda fonda,
ti aonde me levas? ti cando acabas?!

Ra1Uom Cnbnnllha.s

109
JOS1l:-MARTINHO MONTERQ SANTALHA

A parte centro-oriental da Galiza possui o fonema tntcrdental 181. representado graficamente


por z (fazer, Galiza) ou por ce, c' e C (cedo, cabeca) .

110
18. A grafia -ss-

18.1: ·ss· intervocálico

o Em posiçom intervocálica nom só se usa a letra s sim pIe,


senom tamém o ·ss- (s duplo) .
Este -ss- aparece, pois, somente entre vogais no interior da
palavra.
o O uso gráfico de -ss-, que era o comum na época medieval,
responde a razons histórico-etimológicas; e, no caso dos luso-
-brasileiros, ainda a razons fonológicas.
o Tamém o espanhol conservou o uso de -ss- até o ano 1763,
em que a Academia o suprimiu, substituindo-o por s simple. Hoje
usa-se somente em casos mui excepcionais, como dossier, cassette,
passo ta ...
Conserva-se ainda em diversas linguas, nom sempre por moti-
vos fonológicos (catalám, francês, italiano, inglês, alemám ... ).
o Na época medieval as grafias -s- e -ss- representavam dous
fonemas distintos : respectivamente sonoro Izl e xordo Is/.
Na Galiza o fonema sonoro desapareceu a partir do século XVI,
pero conserva-se na área luso-brasileira.

18.2: Leitura de -ss-

o Para a leitura nom suscita dificuldade: leremos o -ss- duplo


com idéntico valor fónico que o -s- simple; por exemplo, nosso,
essa, assi, cantasses.

111
JOSt;-MARTINHO MONTERO SANTALHA

18.3: Exercícios de leitura

a) Vocábulos soltos

esse essa esses essas isso massa remessa promessa classe interesse
nosso nossa nossos nossas fracasso escasso passo passar processo
retrocesso sucessos excesso regresso progressos ingresso congresso
ossos compromisso vosso vossa vossos vossas amassar fracassar pas-
sar repassar cessar confessar professar interessar regressar ingressar
atravessar sucessor professor agressor emissora professoras
grandíssimo pequeníssima altíssima longuíssima pouquíssimo
cantasse cantassem temesse temesses temêssemos temessem partisse
unisses soubesse quixesses trouxesse falássedes perdêssedes que i-
masses deixasse mirassem olhasse perdessem

b) Frases variadas

polo caminho passa um carro. Esse neno nom sabe o que fai. Aquilo
foi um fracasso total. Despois de dar dous ou três passos caiu como
morta. Que passa agora? Esse é da mesma classe. Nom foi capaz de
manter a sua promessa. A professora de inglês sabe falar tamém russo.
Nom os quero desses, quero-os doutra classe. Espero que o meu
sucessor o faga melhor que eu. Estivem escuitando umha emissora
portuguesa.
Para chegarmos alá teremos que atravessar todo o país. Se o sou-
besse antes! Nom pudo ingressar este ano na universidade. Vivia numha
casa altíssima. Se nos deixasses sós um pouquinho ! A vossa língua
é formosíssima. Romperom-Ihe vários ossos do corpo.
A nossa casa está na outra rua. Essa pobre mulher nom fai mais
que tossir. O professor explicou hoje na classe -o processo - o O nosso
regresso será manhá. Se o visses, nom o conhecerias já. Nom quer
cumprir o seu compromisso. Essas promessas hai que mantê-Ias sempre.
Era um bicho pequeníssimo. Caminhava por umha rua longu íssima.
Ali havia pouquíssimo que fazer. Esse rapaz é listíssimo já desde
mui neno .

112
M:E:TODO PRÁTICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

18.4: Escritura de -ss-

• Sinalamos seguidamente alguns casos freqüentes de osso:


a) o sufixo de superlativo -íssimo; por exemplo: altíssimo,
longuíssima.
b) os possessivos nosso e vosso nas suas diversas formas
(nosso, nossa, nossos, nossas; vosso, vossa, vossos, vossas).
c) o demonstrativo de 2' persoa (esse) nas suas variaçons
(esse, essa, esses, essas, isso) e nas contracçons (desse, dessa etc.;
nesse etc.; essoutro, essoutra etc.; dessoutro etc.; nessoutro etc.).
d) todas as formas verbais do imperfeito de subjuntivo;
p.e.: amasse, temesses, partissem, fosse.
e) os vocábulos compostos em que o s inicial durnha pala-
vra simple vem a ficar em posiçom intervocálica; p.e.: de sair
sobressair, de sanha assanhar, de seguro assegurar, de sentir pres-
sentir, de sócio associar, de suposto pressuposto.
• O -ss- mantém-se em todos os vocábulos dumha mesma famí-
lia léxica; p.e.: passo, passar, repassar, traspassar, compasso, acom-
passar, passage, passado, etc.
O número de raízes em que aparece -ss- é reduzido, de modo
que a aprendizage do seu uso nom resulta excessivamente difícil.
Aliás, algum que outro erro ortográfico neste ponto nom terá grande
importáncia; importate é, em troca, a assunçom do elemento -ss-
como tal como parte integrante do nosso sistema gráfico.
• Naturalmente, podem aparecer dous esses duplos nurnha mesma pala-
vra; por exemplo: assassinar, assessor, escassíssimo, passasse.
• Distinguem-se graficamente: pressa 'apressuramento' e presa,
de prender; acesso, de aceder, e aceso, de acender.
• Cando o esse duplo coincide no fim da linha, separam-se
ambas letras: um s fica no fim e o outro passa ao começo da linha
seguinte; p.e.: pas-/ sado.

18.5: Exercícios de escritura

Esse nom é . Vim um lobo grandíssimo. A nossa casa é pequena.


Tês que cumprir os teus compromissos. Parece um fóssil, de tam velho

113
12
JOS1:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

que vai. Atravessou a rua a toda pressa. Sentiu profundamente o


fracasso do filho. O professor era mui estimado polos alunos. A assis-
téncia foi sempre mui escassa. Quero o chocolate espesso. Os pi"heiros
te•• hem um som bem acompassado. Ressoava nas paredes o ruído seco
dos seus passos. Nom podem passar por aqui. Tivo como um pres-
sentimento de que venceria. De "ada lhes valeu associarem-se. O seu
razoamento parte de pressupostos falsos ou i"demonstrados. Todos
os passageiros devem coruervar o bilhete. Fixo caso omisso de todo
canto lhe dixerom. Quero expressar-vos sinceramente a minha solida-
riedade. Aonde pensas chegar com isso? Ago ra nom podo, que tenho
muita pressa. O vento nom cessa de bater as portas. ante foi ingres-
sado num sanatório da capital.
E"contrarom ossos dum a"imal na cova. Conserva manuscritos
antiquíssimos. Se fosses mais rápido, nom che passaria isso. Foi um
colosso da música. Agora veremos se mantém a sua promessa do ano
passado. Deixa todo o trabalho ao seu sucessor.

18.6: Textos literários

1) cA desgraça»,
por Rosalia Castro

Que passa ao redor de mim?


Que me passa que eu nom sei?
Tenho medo dumha cousa
que vive e que nom se vê.
Tenho medo à desgraça traidora
que vem, e que nunca se sabe onde vem.

Z) «Num porto do norte.,


por Castelao

Umba tua num porto lonjano do norte. As tabernas estám acoguladas


de marinheiros e botam polas suas portas o bafo quente dos borrachos.
Gentes de todas as castas do mundo, cantigas a gorja rachada, músicas
de planoIas chocas, muito fedor a sebo ...
Um marinheiro que fala francês tropeça cwn marinheiro que fala
inglês. Os dous fam·se promessas de grande amizade, cada um no seu falar.

114
Mt.:TODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO·PORTUGUESA

E sem entender-se caminham juntos, colhidos do braço, servindo-se mutua-


mente de pontais.
O marinheiro que fala francês e mais o marinheiro que fala inglês
entram nurnha taberna servida por um home gordo. Querem perder o
sentido juntos, para serem mais amigos. Quem sabe se despois de bem
borrachos poderám entender-se!
E cando O marinho que fala inglês já nom rege co seu corpo, começa
a cantar:
«Lanchinha que vás ent vela,
levas panos e refaixos
para a minha Manuela •.

o marinheiro que fala francês arregala os olhos, abraça·se ao compa-


nheiro, e começa tamém a cantar:

cl.anchinha que vás em vela,


levas ~ e refalxos
para a minha Manuela.
A-Iu-hu-hu!l.

Os dous marinheiros eram galegos.


O taberneiro, gordo cama um flamengo de casta, viu sair os dous
marinheiros da taberna, e poIa sua face vermelha escorregaram as bágoas.
E despols dlxo para si num lafdo saudoso:

«Lanchinha que vás em velaI»

Tamém o taberneiro era galego.

3) «Ai ... 1»,


por Curros Henriquez

- Como foi? .. - Eu topava·me fora


cando as negras bexigas lhe deromj
polo arame sua mai avisou·me
e eu vim·me correndo.
Coitadinho! Sentindo os meus passos
revolveu cara a mim. os seus olhos.
Nom me viu ... e chorou ... ai!, já os tinha
cegulnhos de todo.
Nom me acordo que tempo me estivem
sobre o berce de dor debruçado;
5ólo sei que me ergulm co meu neno
sem vida nos braços.

115
JOS"S:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

Borboleta de alinhas dOW"3das


que te pousas no berce baleiro:
pois por el me perguntas, Já sabes
que foi do meu neno.

OBSERVAÇONS. «As negras bexigas. é a varíola. , Palo ara me. : palo telé-
grafo. Sólo é um castelhanismo: em galego deve dizer-se só ou somente.
O poema foi composto com ocasiom da morte dum filho.

Manuel Curros Henrlqucz

4) cA vaca»,
por Cas telao

A vaca é o símbolo da paz.


Vale mais o que significa umha vaca que o que simboliza um leom
rampante. Já o dixo um dos nossos economistas: «A árvore genealógica
dumha vaca de leite é mais útil que a árvore genealógica dum aristocrata».
A vaca esqueceu-se dos cornos e dá-nos o seu trabalho, o seu leite,
a sua carne, o seu coiro, e a carne e o coiro dos seus filhos. Nom nos
pode dar mais.

116
M~TOD PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

o cam será o amparo dos ricos, que defende a propriedade do amo e


ladra aos pobres que vam polos caminhos. Em troca a vaca é o amparo
dos pobres Uvres.
Os concursos de vacas leiteiras valem mais que os «concursos de
beleza».
A nossa vaca tem o pesebre em Galiza e os tetos em Madrid. E o que
Dom lhe dá de comer a urnha vaca nom tem direito a mungi-la.
As senhoritas que choram pola morte dum cam ridiculo nom C0111-
prendem a dor dumha família labrega cando lhe morre umha vaca.
Se nom fosse polo leite das vacas a piolheira das cidades morreria-se
desnutrida. A vaca é a ama de cria da humanidade.
O dia que nós emitamos papel-moeda nom estamparemos nel o retrato
dos políticos, nem dos sábios, nem dos artistas; estapari'amos, somente, a
figura dumha vaca, como símbolo da nossa eco'n omia humanamente
distribuída.
O dia que Galiza seja umba comunidade cooperativa ergueremos wn
gram monumento cumha vaca em bronze dourado.
Tamém hai raças de vacas, e a melhor é a nossa.
O dia que saibamos o que vale umha vaca, Galiza quedará redimida.

5) «Negra sombra»,
por Rosalia Castro

Cando penso que te foche,


negra sombra que me assolnbras,
ao pé dos meus cabeçais
tomas fazendo-me mofa.
Cando hnaglno que és ida,
no mesmo sol te me amostras,
e és a estrela que brilha,
e és o vento que zoa.
Se cantam, és ti que cantas;
se choram, és ti que choras;
e és o murmúrio do rio
e és a noite e és a aurora
Em todo estás e ti és todo
pra mim, e em mim mesma moras,
nem me abandonarás nunca,
sombra que sempre me assombras.

117
Rosalia Castro (1837-1885) é a figura. roais relevante '(Ia literatura galega contemporânea.
19. Os sufixos -çom, -som, -xom

19.1: Sem i

• Os sufixos latinos -ClONEM, -TIONEM, -SIONEM e -XIONEM


perderam o i em galego-português e resultaram -çom, -som, -xom;
por exemplo: cançom, naçom, divisom, reflexom.
(Somente se conserva o i em ocasiom, plural ocasions).
• Em troca, os derivados daqueles sufixos, que som palavras
dum nível mais culto e foram tornados do latim, mantenhem o i.
Assi ternos naçom, pera nacional; reflexom, pera reflexionar; rela-
çom, pera relacionar; etc.
• As formas sem i daqueles sufixos som as autenticamente
galegas.
Eram constantes nos textos da época medieval. Por exemplo,
nas traduçons galegas de textos castelhanos, o texto galego tem
sistematicamente -çom mentres o texto castelhano apresenta cons-
tantemente -ción.
As formas galegas seguiam vivas no século passado: Rosalia
ainda escreve cançom, traiçom, etc. No hino galego Pondal di «a
nossa voz pregoa / a redençom da boa / naçom de Breogám».
Apesar de que na fala popular som comuns hoje as formas
castelhanas com i, ainda ficam restos das formas galegas na fala
dalgurnhas zonas.
• Já vimos que estas palavras Dom precisam acento gráfico, nem em
singular nem em plural : cançom, cançons, divisam, divisans, flexom, flexons.
• Para a escrita advirta-se que, excepto razom e sazom, todos
os demais vocábulos afectados escrevem-se com ç e nom com z:
revoluçom, naçom ... Lembre-se a diferença gráfica entre raçom
'parte' e razom 'causa'.

119
JOSt-MARTINHO MONTERO SANTALHA

19,2: Exercícios de leitura

a) Vocábulos soltos

introduçom erupçom adopçom emoçom ovaçom importaçom votaçom


documentaçom acusaçom estaçom conversaçom figuraçom invençom
precauçom extinçom opçom interrupçom neutralizaçom sensaçom elei·
çom apariçom ediçom adquisiçom exposiçom cotizaçom competiçom
porçom proporçom resoluçom reproduçom alocuçom devoluçom cançom
sançom abstençom intençom construçom reacçom selecçom condiçom
ambiçom funçom colonizaçom devoluçom
eleiçons instruçons conversaçons estaçons votaçons sensaçons opçons
precauçons emoçons resoluçons revoluçons
divisom invasom persuasom irrisom prisom evasom adesom coesom
lesom decisom precisom colisom tel evisom previ som emulsom propul-
som expu lsom expansom ascensom dimensom pensom propensom
tensom explosom versom diversom incursom sucessom ag ressom pres-
som depressom impressom
dimensons tensons explosons decisons previsons divisons ilusons
f1exom conexom reflexo m infl exom f1exons reflexons

b) Frases

Só conheço a primeira ediçom desse livro. Em proporçom nom som


poucos. No ano seguinte realizou-se a invasom do país. O programa
de televisom desta noite foi interessante . O seu filho fixo umha
reproduçom exacta do debuxo. Nas eleiçons passadas deu·se umha alta
porcentage de abstençom. Nom era essa a minha intençom cando o
dixem. Começarom onte as conversaçons sobre os problemas pes-
queiros. Com grande emoçom quixo dar-nos a conhecer as suas inven-
çons nesse campo. Já che ouvim outras vezes algumhas reflexons
sobre estes assuntos . Hai varios anos houvo umha revoluçom na pe-
quena ilha. O mar produzia·lhe sempre umha emoçom profunda , em
calquer estaçom. Nessas condiçons nom poderá vir.

c) Texto

Um tipo de acidentes que podem ocorrer na casa, e a que por


vezes é necessário prestar um socorro imediato, som as queimaduras.

120
Mt:TODO PRATICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

Queimaduras som as lesons produzidas no organismo pola acçom do


calor. As lesons produzidas por outros agentes, e a que a gente chama
normalmente queimaduras, tenhem outros nomes técnicos mais exactos.
Assi, as que som produzidas polos ácidos chamam·se causticaçons.
Umha queimadura pode ser superficial ou profunda, conforme a
espessura dos tecidos at ing idos. A gravidade dumha queimadura, na
maioria dos casos, depende mais da sua extensom que da sua profun·
didade. Assi, é mais grave umha queimadura superficial que atinja
o sessenta por cem da superfície do corpo, do que a carbonizaçom
completa, por exemplo, dum pé, que representa o seis por cem da
superfície corporal, ou mesmo dumha perna, que representa o treze
por cem dessa superfície. Desde que se actue cirurgicamente num
espaço de tempo mínimo, as carbonizaçons indicadas nom implicam
a morte. Mas se umha queimadura, mesmo superficial, atingir o sessenta
por cem da superfíc ie do corpo, entom a morte é case inevitável.
A electricidade, ao atravessar o corpo humano, pode determinar
queimaduras na pele . A passage da corrente determina com freqü éncia
fenómenos neuro·musculares, que vam desde um simple abalo sem
conseqüéncias de maior até à electrocussom com morte súbita real
ou com morte aparente . Cando as perturbaçons som ligeiras, basta põr
a vítima em repouso, deitada, e administrar·lhe um calmante. Mas se
o estado de excitaçom ou de confusom se prolonga é preciso chamar
o médico.
Onde o socorro é exigido imediatamente é na electrocussom . Por
efeito da desca rg a eléctrica o indivíduo fica em morte aparente, e se
nom for socorrido nos primeiros segundos pode esta morte aparente
transformar·se em morte real. O primeiro socorro a prestar a um elec-
trocutado é cortar ou mandar cortar a corrente no cond utor a que ficou
agarrado. Encanto isto nom for feito, nom se lhe deve tocar, pois
corre·se o perigo de ser tamém vítima da electricidade.
Umha vez que o indivíduo se liberte do condutor, deverá imediata·
mente verificar·se o estado das funçons respiratória e circul atória. Em
geral fica em síncope: nom respira, nom tem pulso carotídeo e apresenta
a pupila dilatada. Sem perda de tempo, fará·se·lhe a massage cardíaca
combinada coa respiraçom boca·a·boca . É este o único socorro a prestar,
e é t amém, inúmeras vezes, o suficiente para sa lvar umha vida. Entre·
tanto chamará-se umha ambul ánc ia, informando do que se t rata, pois é
de máx im a conveniéncia que ela traga um equ ipam ento provisório de

121
JOS:t-MARTINHO MONTERO SANTALHA

reanimaçom. A massage e a respiraçom artificial nom serám interrom-


pidas até o enfermo ser entregado nas maos do médico. Continuará
portanto na própria ambuláncia, em todo o percurso até ao posto
de reanimaçom.

19.3: Exercícios de escritura

Chamam-se causticaçons as lesons causadas por agentes químicos


actuando sobre a pele ou as mucosas. A gente tamém lhes chama,
impropriamente, queimaduras. Nas causticaçons, porém, nom está
e1n causa a calar, mas si as vialentas reacço.ns entre a matéria argá-
nica e o produto lesivo. A gravidade destas lesons varia coa natureza
do produto, co tempo de contacto, coa regiom e coa sua extensom.
Os produtos que mais freqüentemente produzem causticaçons sérias
som os ácidos fortes, mais ou menos concentrados. O socorro a prestar
deve ser imediato. Toda a roupa impregnada palo cáustico deve ser
retirada imediatamente, pois de contrário ficará a actuar como um
corrosivo que tende a alastrar pala difusom do cáustico.

19.4: Textos literários

1) «Hino galego» (<<Os pinheiros»),


por Eduardo Pandal

,Que dim os rumorosos Os bons e generosos


na costa verdecente, a nossa voz entendeJll.
ao raio transparente e com arroubo atendem
do plácido luar?; o nosso rouco som;
,que dim as altas copas mas só os ignorantes
de escuro arume harpado e férldos e duros,
co seu bem compassado imbéceis e escuros
monótono fungar? nom os entendem, nom.
« - Do teu verdor cingido Os tempos som chegados
e de benignos astros, dos bardos das idades,
confim dos verdes castros que as vossas vaguidades
e valoroso cham, cumprido fim terám;
Dom dês a esquecimento pois, ondequer, gigante
da injúria o rudo encono; a nossa voz pregoa
desperta do teu sono, a redençom da boa
fogar de Breogám! naçom de Breogám».

122
M:tTODO PRÁTICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

Eduardo Ponda.!

2) «Galiza, naçom",
'Por Castelao

Galiza, pois, conta com todos os atributos históricos-naturais que


caracterizam às verdadeiras nacionalidades; pero falta-lhe algo mui impor-
tante para ser perfeita: falta-lhe a independéncia política, o governo
próprio, que toda sociedade humana necessita.
Que Galiza nom é umha naçom por nom ser um Estado independente
e soberano? Se tal defeito nos fosse imputado por espanhois, nós senti-
riamo-nos incitados ao separatismo; pero em verdade só aspiramos a umha
autonomia integral, dentro da livre federaçom de todos os povos peninsu-
lares. Galiza nom necessita mais, pero nom pode confar~se com menos.

3) «As Horinhas dos tojos»,


por Noriega Varela

Nem rosinhas brancas nem craveis roxos,


eu venero as Horinhas dos tojos!
Dos toJais as ténues Horinhas,
que sornem, a medo, entre espinhas.

123
JOS:t-MARTINHO MONTERO SANTALHA

Entre espinhas que o céu agasalha


com diamantes, as noites que orvalha.
Oh, do erm.o o prezado tesouro!:
as florinhas dos tojos som de ouro.
De ouro velho som, mai, as florinhas
dos bravos tojais, das devoçons minhas! .. .

4) «Língua franca galaico-portuguesa»,


por Rafael Dieste

«UInha verba galega no meio do português é como umha pingota de


água deitada numba cunca de água; o mesmo vem a suceder cumba verba
portuguesa no meio do galego. ( ... ) Existe entre o galego e mais o portu-
guês taro estreita afinidade que canto mais português é o português, e
mais galego o galego, mais venhem a se assemelharem. ( ... ) Galego e portu-
guês canto mais se enxebrlzam, mais se achegam, o mesmo na sintaxe
que no léxico. Pois bem, por que Dom há de ser a inversa tamém certa?
Nós cremos que o é até certo ponto. Arrecadando-se um ao outro os dous
enxebrizamr.se. ( ... ) Assi quiçá chegássemos ao conquerimento dumha língua
franca galaico-portuguesa que servisse a todas as necessidades de expres·
som, sendo, doutra banda, mui respeitosa cos modos vernáculos cando
convinhesse».

5) «Madrigal à cidade de Santiago)),


por Federico Garcia Lorca

Chove em Santiago,
meu doce amor.
Camélia branca do ar,
brilha entrevecido o sol.
Chove em Santiago
na noite escura.
Hervas de prata e de sonho
cobrem a baleira lua.
Olha a chuva pola rua,
laia de pedra e cristal.
Olha no vento esvaído
sombra e cinza do teu mar.
Sombra e cinza do teu mar,
Santiago, longe do sol;
água da manhá antiga
treme no meu coraçom.

124
20. O uso gráfico de qu-

20.1: Ou· com u pronunciado

• Tanto em espanhol como em galego·português a letra q (que


na nossa língua se chama 'quê', nom 'qu') vai sempre seguida
de u; ou seja: qu.
Ora, na actual ortografia espanhola esse " é sempre mudo;
isto é, nom representa nengum som. E só se usa ante e ou i (querer,
quitar); nos demais casos usa·se c (jrecuente, inicuo). (Hai, porém,
algumha excepçom rara: q"órum, quasar ... ).
• Na nossa língua, palo contrário, conserva·se o uso de qu
nom só cando a letra u é muda ante e ou i, senom tamém cando
esse u é pronunciado; por exemplo: freqüente, seqüestrar.
E pode usar-se Dom só ante e ou i senam tamém ante a ou o;
p.e.: aquático, iníquo.
A letra u representa nesta situaçom o primeiro elemento dum
ditongo crecente (ua, ue, uo): iníqua, eloqüente, quórum.
• A razam deste uso gráfico é fundamentalmente etimológica:
usa·se qu nos casos em que assi se escrevia em latim.
• Tamém em espanhol se conservou a grafia qu nestes casos
até o ano 1815; até esta data escrevia·se, por exemplo, quatro,
qual, quanto, eloqüente.
• Som poucas as palavras em que aparece este qu com u pro.
nunciado; estám praticamente todas incluídas na lista dos seguintes
exercícios.

• Em canto à leitura, nom oferece maiores problemas: leremos


a letra q nestes casos co mesmo valor fónico que sempre tem, isto

125
JOS~·M.ARTINH MONTERO SANTALHA

ê /k/; ou seja,leremos qua, quo, qüe, qüi co valor fónico /kwa, kwo,
kwe, kwif (portanto, como se fossem cua, cuo, cue, cui).
• Hai um reduzido grupo de palavras que apresentam na Galiza
de hoje duas variantes: na área norte e ocidental perdeu-se o /w/,
mentres que na oriental e meridional se conserva.
De acordo com esta situaçom da língua oral, admitem-se na
escrita as duas formas correspondentes: c- ou qu-.
Trata-se dos vocábulos seguintes: qual ou cal, quando ou
cando, quanto ou canto, quase ou case, quatro ou catro.
• Co trema (.. ) sobre o u em qüe, qüi indica-se que esse u é
pronunciado, paralelamente ao que sucede em güe, güi (p.e.:
lingüístico, ungüento).

20.2: Exercícios de leitura

a) Palavras soltas

loquaz loquazmente sequaz seqüela sequencia seqüestro seqüestrar


sequoia équo equador equaçom Equador equánime equanimidade equa-
torial equatoriano eqüestre conseqüente inconseqüente conseqüência
inconseqüéncia
delinqüente dei inqüéncia freqüéncia subseqüente freqüente infreqüente
eloqüente eloqüéncia ubíquo obl íquo iníquo longínquo propínquo
adequar adequado adequaçom antiquar antiquado antiqualha antiquário
antiquariato cinqüenta cinqüentom cinqüentenário aquaforte aquarela
aquário aquartelar quartel aquático aqüeduto aquoso aqüicultura
quadro quadrado quadrúpede quadrilátero quadrante quadriculado qua-
drilha qualidade qualificado quantia quantificar quantioso quantitativo
quarenta quarentena quarentom quarto quarteto quaternário quatriénio
qüestom qüestionar qüestionário quorum quota quotidiano

b) Frases

Temos que dar-lhe umha resposta adequada. O locutor é loquaz


de mais. Vem aqui com muita freqüéncia , quase todas as semanas.
Toda a sua vida foi bastante inconseqüente no seu comportamento.

126
M~TOD PRATICO DE LtNGUA GALEGO.PORTUGUESA

Nom se sabe ainda quem o seqüestrou. Celebrarom o passo do equador


cantando. Ouve-se o rumor longínquo do mar. Esta máquina está algo
antiquada. Chegarom das Américas quarenta ou cinqüenta parentes
do pai. Mandou-nos dous quadros seus por correio. Chegará a ser um
técnico qualificado . Ignoro a quantia dessa compra. Despoi s dum qua-
triénio de estudos, tivo que abandonar a carreira. Ser ou nom ser,
essa é a qüestom. Falhei duas perguntas do qüestionário. Devedes
prever as conseqüéncias dessa decisom. A gente admirava a elo-
qüéncia do orador.

20.3: Exercícios de escritura

Na cidade conserva-se ainda um aqüeduto romano. Tés que traçar


umha linha oblíqua. Isto pode suceder, pero nom é freqüente. Dim que
houvo um novo seqüestro. No aquário da cidade hai alguns peixes
que procedem da zona equatorial. O quadro clínico do enfermo é
sumamente grave. Tivo que passar toda a tarde no quartel. O presi-
dente equatoriano chegará manhá a Paris. E melhor deixar este aSSU/1to
em quarentena por algum tempo. A mai quase enlouqueceu coa alegria.
A quarta parte da matéria foi já revista. Tardarei um quarto de hora,
pouco mais ou menos. Na assembleia de onte nom houvo quórum.
Meu primo quedou de quarto no concurso. Passados os dias da festa,
a vida da aldeia voltava à sua monotonia quotidiana. Este é já o
quarto livro que ela publica. Estás um pouquinho antiquado. Organi-
zam um debate sobre a delinqüéncia juvenil. Nom sejades outra vez
inconseqüentes! A lua encontra-se agora em quarto crecente. O pintor
fixo umha exposiçom de aquarelas. Convém buscarmos o momento
adequado. Nom suportava tal loquacidade. Foi vítima dumha manobra
iníqua. O quarto minguante é a fase da lua entre a lua cheia e a
lua nova.

127
JOS~-MARTINB MONTERO SANTALHA

20.4: Textos literários

1) «Rosa de cem folhas»,


por Rosalia Castro

Mas vê que .0 meu coraçom


é umha rosa de cem folhas,
e é cada folha umha pena
que vive apegada noutra.
Quitas umha, quitas duas,
penas me quedam de sobra,
hoje dez, manhá quarenta,
desfolha que te desfolha .. .
O coraçom me arrancaras
desque as arrancaras todas!

2) «O pinheiro devoto»,
por Castelao

Anoitecia. A silueta negra dum pinho debuxava-se no azul escuro do


céu. Todos sabedes que na primavera os pinhos botam milheiros de vetas,
colhendo assi o aspecto de candeeiros gigantes. Cantas vezes sentbnos
desejos de acender as velas dos pinhos! Pois bem: perto do meu pinho
acertou a passar o Vlático aldeao (o crego, dous rapazes, catro mulherinhas
que vam r ezando) e, oh ntilagre!, o irmao pinho, sentindo o momcuto reU-
gioso e em homenage à sagrada Forma, acendeu as suas velas, que esti-
verom acesas mentres o Viático nom se perdeu na revolta do caminho.

3) «o pôr do 501»,
por Rosalia Castro

Cando a luinha aparece


e o sol nos mares se esconde,
todo é sUéncio nos campos,
todo na ribeira dorme.
Quedam as veigas sem gente,
sem ovelhinbas os montes,
a fonte sem rosas vivas,
as árvores sem cantores.
Medroso, o vento que passa
os pinhos gigantes move,

128
MtTODO PRÁTICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

e à voz que levanta, triste,


outra mais triste responde:
som as campanas que tocam,
que tocam em sons de morte,
e ao coraçom diIn: «No' olvides
os que para sempre dormem».
Que triste, que hora tam triste
aquela em que o sol se esconde,
em que as estrelinhas pálidas
timidamente relozem!

OBSERVAÇONS. No' é forma apocopada do advérbio nom; a autora realizou


aqui a eliminaçom da consoante finaL por licença poética, provocada por
exigéncias métricas: deste modo no' pode fonnar sinalefa (ou crase) coa primeira
silaba da palavra seguinte olvides. (Este é um dos poucos casos - todos
eles de carácter excepcional como o presente - em que se admite o uso
do apóstrofo; portanto, na língua normal Dom se emprega o apóstrofo).
Relozem é forma popular, aqui imposta ademais poja fima; normativamente
é preferível reluzem.

4) 010 sapinho.,
por Victoriano Taiho

A noite botou-lhe a chave


à porta da luz. O agro
é um ninho sUandelro
de acougos e de recatos.
No 0010 morno das branhas
reza, dorm.ente, um rosário
de murmulhos e soluços
a verba moI dum regato;
e o sapinho, bom flautista,
canta o milagre do orvalho
em plngotas de assobio
dum doce cristal opaco.
T1ngu11elam feveImenle
Ienes chocalhlnhos cándidos
dumba bavença misteriosa
que caminha a longes pastos.

129
9
JOSt:-MARTINHO MONTERO SANTALHA
-~

5) . 0 sol da Uberdade ..,


por Manuel·António

Cando o sol lostreguele trás a alta montaDa,


colhe a fouce secreta e bota um forte atrujo
que se escuite na aldeia e na cidá' 10njana,
onde a servil lnfámla seu negro trono puxo.
Cando o sol alumie luminoso e radiante,
marcha ergueito e disposto pola rota esquecida.
Podes fazer, se queres, a tua alma gigante.
Podes achar, se luitas, o que vaI mais que a vida.
Cando, logo na tarde, voe a outro horizonte,
de joelhos recebe, desde o cume do monte,
a postreira ralola que revoe no vaI;
e garda no teu peito o ralo derradeiro,
e jura, como um velho e andante cavaleiro,
defendê-lo até a morte, como um Santo Graal.

OBSERVAÇONS. Montana é um hiperenxebrismo; a forma correcta é


montanha. Cidá' é forma vulgar apocopada de cidade.
21. Leitura galega de textos luso·brasileiros

21.1 : Generalidades

I) Preámbulo

• O reintegracionjsmo lingüístico gaIego-português tem, por


as si dizer, um objectivo com duas caras:
1) que os Iuso-brasileiros podam ler, como próprias, as
nossas publicaçons;
2) que os galegos podamos ler, como nossas, as publica·
çons luso·brasileiras.
O requisito fundamental para ambas finalidades é que a
ortografia dessas duas áreas do idioma (galega por um lado
e Iuso·brasileira por outro) seja substancialmente comum.
• Urnha ortografia «substancialmente comum» quer dizer
duas cousas:
1) que a maior parte dos elementos ortográficos serám
idênticos em ambas as áreas; e
2) que, apesar dessa substancial identidade, haverá na
ortografia de cada área alguns elementos peculiares (isto é,
que nom se dam na outra área).
Vimos até aqui cal é a ortografia a usar na Galiza: esse é
o modo como escreveremos os galegos. Agora vamos ver as
peculiaridades lingüísticas da área luso-brasileira, nom para
usarmo·las nós e escrever como eles, senom para conhecê·las
e podermos assi ler sem dificuldade as suas publicaçons .
JOS~-MARTINH MONTERO SANTALHA

NA BEIRA DO MINHO
O rapaz: - E logo os da beira
de alá som mais
estrangeiros que os
de Madrid?
(Nom se soubo o que lhe res-
pondeu o velho).
(Desenho de Castelao)

2) Princípio fundamental: pronúncia galega

• A reintegraçom lingüística galego-portuguesa nom afecta à


nossa fonética. Quer dizer: os galegos continuaremos a falar
como hoje falamos.
Portanto, o princípio fundamental à hora de lermos textos
luso-brasileiros será o seguinte: devemos conservar o fonetismo
galego. Nom se trata, pois, de que a nossa pronúncia intente
imitar a dos luso-brasileiros. Ao contrário: leremos os textos
luso-brasileiros coa pronúncia galega actual, coa pronúncia
da fala culta normal de todos os dias.
3) tndice de peculiaridades luso-brasUelras

• Estudaremos sucessivamente as distintas peculiaridades da


língua escrita luso-brasileira; em esquema som as seguintes :
1) peculiaridades ortográficas:
= uso do acento circunflexo sobre a (por exemplo
câmara, ânimo);
= uso do til (p.e. coração, não);

132
MtTODO PRATICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

2) peculiaridades morfológicas (p.e. uma, dois, temO;


3) outras particularidades (p.e. fome, pessoa, homem).

21.2: Peculiaridades ortográficas

1) Uso do acento circwúlexo sobre a: â

• Já vimos que o acento circunflexo se usa sobre as vogais


e ou o para indicar que som fechadas: ê, ô.
Em termos gerais isto aplica-se tanto à Galiza como à área
luso-brasileira.
Porém, tamém aqui hai casos de divergência entre ambas áreas;
por exemplo, na terminaçom éncia (Galiza -éncia, área Luso-brasileira
-ência: G ciéncia=L ciência). Na Galiza a pronúncia do e nestes casos tende
a ser aberta, e por isto se escreve normalmente acento agudo, e Dom
circunflexo como na área luso-brasileira onde esse e se pronuncia
fechado. De todos modos, a pronúncia do e dessa terminaçom nom
parece ser coincidente em todas as zonas da Galiza, nem sequer nos
diversos falantes durnha mesma zona. De resto, tamém hai casos em
que Brasil e Portugal divergem no uso do acento circunflexo sobre e
ou o (p.e.: P anémico = B anêmico).
Na leitura de textos luso-brasileiros, pronunciaremos estas pala-
vras como o fazemos na nossa fala normal.

• Ora, na área luso-brasileira usa-se o acento circunflexo


tamém sobre a vogal a tónica em contacto com consoante
nasal seguinte. Nesta posiçom os brasileiros sempre, e os por-
tugueses nom sempre pero si em muitos casos, pronunciam
fechado o a tónico (isto é: dam-lhe um som intermédio entre
a e e aberto). Exemplos (de Portugal): câmara, ânimo, âmbar,
romântico.
Mas na pronúncia comum da Galiza nom hai a tónico
fechado, e por isto nom usamos acento circunflexo sobre a
vogal a.
Na leitura de textos luso-brasileiros pronunciaremos esse
â como um a tónico normal da nossa fala, portanto como se o
seu acento fosse o agudo; assi, leremos a palavra luso-brasileira
câmara como se estivesse escrita câmara com acento agudo .

133
JOS~-MARTINH MONTERO SANTALHA

Exercícios de leitura

a) ê
ausência cadência clencia clemência decência prudência tendências
urgência vlgencia agênc ia advertênc ia aparência coerência ascen-
dência competências conferência consistência existência influência
negligência paciência preferência residência transferência virulência
violência adolescência circunferência coincidência experiência incon-
gruência intransigência obediência insuficiência silêncio.

Pouca prudência. Muita urgência. A violência da adolescência fran-


cesa. O silêncio da residência. As competências da ciência actual.

b) â

câmara recâmara antecâmara Gâmbia câmbio recâmbio funâmbulo preâm-


bulos sonâmbu los diâmetro infâmia dinâmica cerâmica aerodinâmica
balsâmico andâmio pirâmide abundância alternância infância tolerância
distâncias constância ignorânc ia repugnância vigilância substâncias es-
cândalo vândalos alfândega Finlândia Islândia cândido glândula ânfora
ângulo rectângulo triângulo cânhamo mecânica botânica britânico orgâ-
nico tirânico pânico equânime pusilânime unânime ânimo desânimo
magnânimo urânio Mediterrâneo subterrâneo cântico Atlântico romântico
semântico.

Os preâmbulos do escândalo. A vigi lância do Mediterrâneo. A igno-


rância dos vândalos. Finlândia é um país frio . Islândia está no meio
do Atlântico norte. Os triângulos da pirâmide. Um voto unânime. O ânimo
da infância.
O filho chegou durante a ausência do pai. Caminhava com muita
elegância. Os resíduos orgânicos. Era um jovem pusilânime. Conheço
bem a mecânica do assunto. O barco transportava urânio. A cons-
tância no trabalho.
A circunferência, o rectângulo, o triângulo e a pirâmide. Um moço
sem experiência da vida. O diâmetro da circunferênc ia . Diversas subs-
tâncias venenosas. Venceu a sua ignorância com trabalho e estudo.
A infância é a aurora da ex istência . A infância é um mimo da
natureza, idade da cândida inocência, de ignorância feliz.

134
M~TOD PRATICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

Era sempre rigoroso e às vezes cruel na sua exigência. Já chegou


a ambulância. Viu um túnel subterrâneo dentro da mesma casa. Con-
fessou a sua infâmia. Trabalhava como funâmbulo num circo.
Cumpre termos mais tolerância . Estudam Botânica. Era um senhor
algo tirânico. ,Um poeta romântico. Abundância de frutos. A antecâ-
mara da imortalidade. Que tenha constância sempre.
Aquilo infundiu-nos ânimo. Foi sempre magnânimo. Sinto certa
repugnância por isto. De linha aerodinâmica . Grandes distâncias no
deserto. Alguns cânticos infantis.

2) Uso do tU

(Abreviaturas: G = Galiza; L = área luso-brasileira).

• Na área luso-brasileira usa-se o til n


sobre a ou sobre o
(ã, õ); aparece fundamentalmente na terminaçom -ão e nas
suas variaçons de feminino e de plural; por exemplo : irmão,
irmã, irmãos, irmãs; capitão, capitães; sermão, serntões.
O til representa a nasalidade final de palavra, de modo
que na pronúncia luso-brasileira vem a equivaler aproximada-
mente a -m final; assi, irmão pronuncia-se ali como se estivesse
escrito irmáom, e innãos pronuncia-se como se fosse irmáons
(aproximadamente) .
Ora, na Galiza a situaçom é diferente, como vamos ver.
Distinguiremos, por umha parte, a terminaçom -ão, que é o
caso mais complicado, e, por outra, todas as demais termi-
naçons com til, que apresentam menor dificuldade.

a) a tennlnaçom -ão:

• (História do assunto).

Na terminaçom luso-brasileira actual -ão vinherom a confundir-se


três diferentes terminaçons da língua antiga. Por exemplo, os três
substantivos irmão, cão e sermão, que hoje na L terminam os três em
-ão, tinham na época medieval terminaçons distintas: eram irmão,
cam e sermom.
Em troca, no plural dos nomes que em singular terminam em -ão,
a área luso-brasileira conserva ainda hoje distintas as três terminaçons;

135
JOSi1:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

assi, OS plurais dos três substantivos citados tenhem terminaçom dife-


rente: irmãos, cães, sermões.
Pois bem: na Galiza permanece o estado da língua antiga, de modo
que as três terminaçons mantenhem-se distintas tamém em singular;
irmao, cam, sermom. (A única diferença com respeito à língua medieval
é que agora na G nom se emprega o til em nengum caso: hoje escre-
vemos irmao, irmd, irmaos, etc., sem til).

• (Leitura) .
Vemos, pois, que à actual grafia luso·brasileira -ão corres-
pondem na G três pronúncias (e três grafias), segundo os
casos: -ao, -am, e -om.

Eis urnha perspectiva esquemática do assunto:


Por exemplo:

L-ãO=G{::: -om
irmão
cão
sermão
= G
irmao
cam
{ sermom

Conseguintemente, ao ler na G textos luso-brasileiros será


preciso que o leitor realize a adaptaçom da grafia luso-brasi-
leira -ão à fonética galega: ao encontrar-nos na leitura com
um -ão, deveremos pronunciar a terminaçom galega que cor-
responda ao caso, escolhendo, das três possibilidades, aquela
seguida pola nossa fonética nesse vocábulo. Tal escolha resulta
fácil de realizar despois dum pequeno exercício de habituaçom.

• (Exemplos) .
Vejamos alguns exemplos mais freqüentes das três ter-
minaçons:
1) L -ão = G -a.o: a este grupo pertence um número reduzido
de palavras; as mais importantes som: irmão, mão, são, vão,
cristão, ancião, aldeão;
2) L -ão = G -am: pertencem a este grupo:
o advérbio tão (= G tam) e os adjectivos apocopados (de
santo e grande) são e grão (= G sam, gram);

136
lJUTODO PRATICO DE LlNGUA GALEGO-PORTUGUESA

um reduzido número de nomes comuns; eis os mais fre·


qüentes: cão, capelão, capitão, pão, sultão;
alguns nomes próprios : geográficos (Afganistão, Irão, Pa·
quistão, Sudão ... ) e persoais (Adão, Abraão, João ...);
as formas verbais de 6" persoa com terminaçom -ão
tónica, que pertencem a dous tempos: 1) ao presente de
indicativo, só nos catro verbos seguintes: dar dão, esta.r
estão, haver hão, ir vão (exceptua·se são, de ser, que se lê
som); 2) ao futuro de indicativo de todos os verbos:
falarão, temerão, unirão, serão, terão, haverão, irão .. .

3) L -ão = G -om: a este grupo pertencem a maioria das


palavras terminadas na L em -ão; concretamente:
as palavras formadas mediante os sufixos -ção (imitação,
edição, devoção, revolução .. .), -são (divisão, prisão, ex-
plosão, expressão ...) e -xão (reflexão, conexão .. .);
- o limitado número de vocábulos formados mediante o
sufixo -dão: certidão, escuridão, escravidão, exactidão,
gratidão, multidão; na G tal sufixo seria hoje -dom, pero
nom se usa modernamente, tendo sido substituído por
outros equivalentes como -tude, -dade, etc.: gratitude,
multitude;
os aumentativos ou depreciativos formados mediante o
sufixo -ão (ou similares): fogão, portão, encontrão, esti-
rão, valentão ... ;
os advérbios não e então (= G nom, entom);
- alguns nomes próprios: geográficos (Aragão, Japão, Sai-
gão ... ) e persoais (Salomão, Sansão, Simão .. .);
muitos outros vocábulos: canhão, limão, milhão, pulmão,
região, etc.

b) as demais tenninaçons com til (·ã, -ãos, -ãs, ·ães, --ões):

• As terminaçons -ã, -ãos, -ãs correspondem às variaçons de


feminino e/ou plural do primeiro grupo de palavras termi-
nadas (em masculino singular) em -ão (p .e.: irmão, irmã, irmãos,
irmãs). Parece preferível pronunciá-las como se nom existisse
o til (é dizer, desnasalizando a terminaçom); assi desnasalizadas

137
JOS:t-MARTINHO MONTERO SANTALHA

resultam idénticas às correspondentes terminaçons do galego


comum. Exemplos: irmãos, irmã, lã, sãos, vãs.
• As terminaçons -ães, -ões correspondem ao plural dos gru-
pos segundo e terceiro, respectivamente, de nomes terminados
(em masculino singular) em -ão (p.e.: capitão capitães; limão
limões). Parece preferível pronunciá-las acomodando-as às cor-
respondentes formas galegas mais comuns; isto é: /ans/ e /ôns/.
Exemplos: capitães, cães, pães, capelães; pulmões, sermões,
corações. Tamém é perfeitamente admissível a pronúncia
/áens/ e /ôens/.

Exercícios de leitura

a) Vocábulos soltos

1) L -ão = G -ao

1) irmão mão ancião aldeão são vão cristão artesão Romão vilão
loução anão serão coirmão malsão grão cortesão castelão.

2) L -ão = G -am
2) tão, são Paulo, grão senhor
cão capelão pão faisão sultão açafrão refrão sacristão falgazão maçapão
caimão catalão gavião capitão
Milão Jordão Indostão Afganistão Amsterdão Irão lucatão Michigão
Orão Teerão Perpinhão Ruão Tetuão Sião Turquestão
Abderramão Beltrão Damião Roldão João Adão Abraão
estão hão dão vão
cantarão amarão dirão farão porão comerão virão verão darão estarão
ficarão deverão escreverão esquecerão caminharão aprenderão cairão
terão serão partirão ouvirão contarão

3) L -ão = G -om
3) precaução invenção unção extinção devoção emoção opção adopção
erupção interrupção porção porporção alucoção reprodução introdução
resolução devolução revolução instrução construção intenção abstenção
sanção canção direcção selecção reacção divinização condição ambição

138
M~TOD PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

função colonização eleição aparição adquisição edição cotização expo-


sição competição superstição figuração conversação estação acusação
documentação votação importação ovação neutralização sensação.
irrisão prisão divisão invasão persuasão evasão adesão coesão lesão
decisão precisão colisão televisão previsão emulsão propulsão expulsão
expansão ascensão dimensão pensão propensão tensão explosão versão
diversão conversão incursão sucessão agressão pressão depressão im-
pressão opressão missão ilusão discussão difusão confusão alusão
conclusão.
flexão irreflexão conexão reflexão inflexão.
valentão encontrão estirão fogão toleirão portão; não então
Japão Aragão Saigão Cantão Leão Lução
Simeão Salomão Sansão Simão
botão limão perdão sifão canhão comunhão legião rebelião opinião
pelotão religião aguilhão milhão embrião anfitrião região melão reunião
ocasião avião pulmão sermão ladrão desunião

4) L = G

lã irmã cristãs são vã sãs artesã vi lãos irmãos anãos cortesã castelãos

5) L -ães = G -ans
pães capitães cães refrães sacristães folgazães caimães catalães faisães
sultães capelães

6) L -ões = G -ons

instruções eleições adições superstições conversações estações vota-


ções sensações precauções devoções emoções opções porções propor-
ções resoluções revoluções
divisões decisões precisões colisões previsões dimensões tensões
explosões pretensões diversões impressões
reflexões conexões
encontrões estirões valentões portões
botões perdões canhões limões pulmões milhões legiões melões ser-
mões ladrões pelotões regiões

139
JOS:t-MARTINHO MONTERO SANTALHA

b) Frases e textos

Outros acidentes que podem ocorrer em casa são as queimaduras .


Múltiplas intoxicações possíveis. Lesões causadas por acção da electri-
cidade. Queimaduras são as lesões produzidas no organismo por acção
do calor. Os raios infravermelhos são radiações caloríficas. A gravi-
dade depende mais da sua extensão que da sua profundidade. As car-
bonizações indicadas não implicam a morte. Se a queimadura atingir
sessenta por cem da superfície do corpo, então a morte é fatal nor-
malmente.
Se o estado de excitação ou de confusão se prolonga é preciso
chamar o médico. Onde o socorro é exigido imediatamente é na electro-
cussão. Se não for socorrido nos primeiros segundos pode a morte
aparente transformar-se em morte real. Se isto não for feito, não se
deve tocar. Deverá imediatamente verificar-se o estado das funções
respiratória e circulatória. O indivíduo fica em síncope, não respira, não
tem pulso. E então que legitimamente se fala de electrocussão. E da
máxima conveniência que a ambulância traga um equipamento provisório
de reanimação. A respiração artificial não será interrompida até ao
posto de reanimação.
São chamadas causticações as lesões causadas por agentes quí-
micos. Nas causticações não está em causa o calor. Os produtos
que mais freqüentemente produzem causticações sérias são os ácidos
fortes, mais ou menos concentrados.
Não é de afastar a hipótese dum afogamento em casa, na banheira
por exemplo. O tratamento fundamental consiste em aplicar a respiração
artificial. Não vale a pena perder tempo noutras atenções.
Um guarda da rainh a Isabe l era um espião confesso da URSS. Passou
regularmente informações aos russos. Um negro sul-africano foi conde-
nado à morte por traição. Um crime político que não envolve homicídio.
Outro recebeu sentença de treze anos de prisão. O apartheid é alta
traição, nunca cairemos de joelhos. O réu tinha ligações com um movi-
mento ilegal. Fora treinado na Uni ão Soviética.
O Vietnam rejeitou a resolução aprovada nas Nações Unidas. A apro-
vação desta resolução é outra decisão errónea que prejudicará o
prestígio desta organização internacional.

140
M1lTODO PRATICO DE L1NGUA GALEGO-PORTUGUESA

Segundo informações da agência Angop, o ministério dos negoclos


estrangeiros angolano acusou a Africa do Sul de planear a guerra contra
Angola e os povos da Africa Austral.
A Holanda foi exortada a aceitar as armas nucleares não obstante
o forte sentimento antinuclear no país. A reunião, de três dias de
duração, visa abrir caminho para a decisão de modernizar as forças
nucleares. A proposta prevê a instalação de mísseis.
A Inglaterra está a empregar milhões de libras na produção dum
novo torpedo, leve e sofisticado.
O rei Dom Sebastião começou a governar aos catorze anos. Radi-
cou-se nele a convicção de que Portugal seria o salvador da cristandade
ameaçada e ele o instrumento dessa salvação. Não passou do projecto,
porque um temporal destruiu os navios, concentrados no rio Tejo.
Mais tarde embarcou furtivamente para o norte de Africa para fazer
a guerra aos mouros, deixando instruções no reino para que toda a
gente se lhe fosse reunir. O pretexto para a grande expedição surgiu
anos mais tarde. O sultão da Turquia ia dominar todo o norte de
Africa. Recusando-se a ouvir os conselhos dos capitães experimen-
tados nas guerras de Africa, afastou-se da costa. O sebastianismo é
um fenómeno de superstição colectiva. As suas origens são anteriores
à morte de Dom Sebastião. O rei Dom João terceiro dera a vila de
Trancoso a um seu irmão mais novo. Mas os lavradores não permitiram
que o infante tomasse conta da vila.

21.3: ~eculiards morfológicas

1) Princípio geral: «pronúncia ortográfica»

• Com respeito às variantes mórficas exclusivas da L (ou


seja: as formas inexistentes na língua padrom da G), parece
preferível, em princípio, lê-las coa pronúncia galega que corres-
ponde à sua grafia (<<pronúncia ortográfica»), sem ter em conta
o feito de que tais formas nom se usam na G.
Este parece o critério mais fácil na prática; mas claro
está que desde o ponto de vista teórico nengumha objecçom
se pode opor a que o leitor galego realize, se assi o preferir,
a «galeguizaçom» da forma.

141
JOS~·MARTINH MONTERO SANTALHA

Por exemplo : mais nonnal e mais fácil é que leiamos neh~lma


(com Inhl e com Im/), apesar de que esta é urnha forma peculiar da L;
mas nengum inconveniente se seguiria de pronunciar nengumha, que
é a forma comum galega correspondente.

2) Lista de peculiaridades da L

• Eis urnha lista das principais peculiaridades da L no campo


morfológico :
a) a contracçom da preposiçom por co artigo definido: pelo,
pela, pelos, pelas (= G palo, pala, palas, palas);
b) as formas femininas do artigo indefinido: uma, umas
(= G umha, umhas) , e as suas contracçons;
c) os seguintes numerais cardinais: uma (= G umha), dois
(= G dous) , quatro (= G catro) , dezoito (= G dezaoito),
duzentos -as (= G douscentos, duascentas). trezentos -as
(=G trescentos, -as), quatrocentos -as (= G catrocentos -as);
d) te, forma de complemento indirecto átono do pronome de
2' persoa (= G che), e as suas contracçons to, ta, tos, tas
(= G cho, cha, chos, chas);
e) ele e aquele (= Gel, aquel);
f) formas do pronome enclítico de 3' persoa sem nasal, coas
seguintes formas verbais:
- terminadas em ditongo tónico; p_e_ falou-a, uniu-o (= G
falou-na, uniu-no);
- l' persoa do perfeito das conjugaçons 2' e 3': temi-o,
uni-as (= G temim-no, unim-nas);
- l' persoa dos pretéritos fortes; p.e.: eu trouxe-os (= G eu
trouxem-nos);
g) contracçom da preposiçom a cos demonstrativos de 3' per-
soa: àquele, àquela, àqueles, àquelas, àquilo; àqueloutro, etc.
(= G a aquel, a aquela, etc.);
h) o relativo e interrogativo-exclamatico quanto -a -os -as
(= G canto -a -os -as), e o interrogativo-exclamativo qual
quais (= G cal cais);

142
~ _ _ __ ~ M = " = T -=: OD PRATICO DE LíNGUA GALEGO·PORTUGUESA

i) o indefinido nenhum nenhuma nenhuns nehumas (= G


nengum nengumha nenguns nengumhas);
j) alguma algumas (= G algumha algumhas), e as suas con-
tracçons;
I) o indefinido qualquer quaisquer (= G calquer caisquer);
m) o indefinido invariável tudo (= G todo), e os seus com-
postos contudo e sobretudo (= G contado, sobretodo);

n) a terminaçom oram na 6' persoa do perfeito; p .e.: amaram


(= Gamaram);

o) futuro e condicional com pronome objecto mesoclítico;


p.e.: queixar-se-á, levá-lo-ias (= G queixará-se, levaria-lo);

p) terminaçom -i, sem nasal final, na l' persoa dos perfeitos


da 2' e 3' conjugaçons (= G -im); p.e_: uni, temi (= G unim,
temim);

q) várias formas de verbos irregulares; p.e.: 3 há impersoal


(= G hai); 1 fui (pronunciado /úi/ = G fum); 1 tive (= G
tivem), 3 teve (= G tivo); 1 estive (= G estivem), 3 esteve
(= G estivo); 1 faço (= G fago) , 1 fiz (= G fixem), 3 fez
(pronunciado /ê/ = G fixo); 1 perco (= G perda), 1 perca
(= G perda); 1 posso (= G podo), 1 pude (= G pudem), 3
pôde (= G pudo), 1 possa (= G poda); 2 pões (= G pós),
3 põe (= G pom), 6 põem (= G pom ou ponhem), 1 pus
(= G puxem), 3 pôs (= G puxo); 1 quis (= G quixem),
3 quis (= G quixo); 1 meço (= G mido), 1 meça (= G mida);
1 peço (= G pido), 1 peça (= G pida); 3 veio (= G veu),
4 viemos (= G vinhemos), 1 viera (= G vinhera);

r) os advérbios assim (= G assi), sim (= G si), também ( = G


tamém), apenas (= G 'somente') amanhã (= G manhá) ,
ontem, anteontem (= G ante, anteonte), depois (= G des-
pois), cá (= G acá, acô), lá (= G alá, alô), nenhures (= G
nengures);
s) a interjeiçom vocativa ó (= G oh, ah).

143
JOS~-MARTINH MONTERO SANTALHA

Exercícios de leitura

ADVERTÉNCIA. Só as palavras impressas em distinto tipo de


letra som peculiares da L no aspecto morfológico; nom se sinalam,
pois, as que apresentam peculiaridades de índole ortográfica (-ão, etc.).
Se parecer oportuno, despois de ler primeiro cada frase com «leitura
ortográfica» das palavras sinaladas, pode seguidamente volver a ler-se
pronunciando em lugar da palavra afectada a correspondente forma
galega.

L pelo etc. = G polo etc. (ver apartado a)

o velho ia pelo caminho. A mulher foi abandonada pelos seus


filhos. Esta lesão foi causada pela electricidade. Queimaduras são as
lesões produzidas pela acção do calor. O corrosivo tende a alastrar
pela difusão do cáustico. Os irmãos foram condenados à morte pelo
estupro de várias mulheres. A resolução foi aprovada pela Assembleia
Geral da ONU. O novo torpedo será construído pela firma Marconi.
As lesões produzidas pelos ácidos ou pelos álcalis chamam-se caus-
ticações. A incursão castelhana foi ali contida pelas tropas portuguesas.
O infante não acatou a justiça mandada fazer pelo rei. Esse texto é
considerado um dos pontos mais altos atingido pela prosa medieval.
O cabo atirava pela porta fora um desgraçado de camisa despedaçada
e a escorrer sangue. Meditamos na irradiação da nossa língua pelo
vasto mundo. Só aqui nos interessam, pela rapidez com que é preciso
agir, intoxicações exógenas. Durante meses, o país foi assolado pelas
tropas do infante.
Os falantes da nossa língua andam hoje pela cifra aproximada de
cento e cinqüenta milhões. O emigrante é bem conhecido pelas suas
qualidades de trabalho e pela sua atitude moral. A rainha invadiu a
câmara, entre as aias, gritando pelo seu filho .

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'MÉTODO PRATICO DE L1NGUA GALEGO-PORTUGUESA

L uma, umas = G umha [ver apartado b)

ADVERTÉNCIA. No caso de uma, umas e alguma, algumas, a expe-


r iência demonstra que o leitor galego tende espontaneamente a pro-
nunciar estas formas luso-brasiJeiras coa nasalidade velar própria das
formas comuns galegas : umha, etc. Nom hai nengurnha objecçom contra
esta leitura galega dos escritos luso-brasileiros.

Voltava agora, com toda uma existência de exilado atrás de si.


Um dos seus cavaleiros apareceu e anunciou a amarga nova de uma
batalha perdida. Procurar fazer uma língua literária que não conduza
finalmente ao português, representa uma teimosia e uma insensatez.
Uma voz cavernosa gritou-lhe atrás das costas. Com uma ternura maior
o apertava então nos braços. Arquejante, numa posta de sangue, ainda
arranjara forças para recalcitrar. Um exército do rei de Marrocos ini-
ciou uma invasão por terras cristãs.
Sentia uma ânsia obscura que os anos tornavam cada vez mais
premente. Dona Inês foi degolada numa ocasião em que o infante
estava ausente. Estalou em Castela uma revolta dos grandes senhores
contra o rei. Afonso de Albuquerque era uma espécie de irmão adop-
tivo de Inês de Castro. Você tem cada uma ... ! Todos à uma se erguem
das suas mesas para rodear e cumprimentar o noivo. Uma filha do
rei Afonso IV (= quarto) estava casada com o rei de Castela. Inês
de Castro fazia parte de uma família poderosa de fidalgos galegos.
A casa .está entre umas árvores. A rádio de Hanoi, numa emissão
captada em Bangkok, citou um comunicado do ministério vietnamita
dos Negócios Estrangeiros. Os visitantes chegaram no domingo à Jor-
dânia para uma visita particular.
Uma queimadura pode ser superficial ou profunda. A reunião visa
abrir caminho para uma decisão colectiva. Uma incursão castelhana foi
até junto da cidade do Porto. Uma pistola metralhadora foi a arma
utilizada para assassinar o ex-primeiro-ministro. Talvez contasse, desse
modo, desarmar uma eventual intervenção portuguesa. O pretexto para
uma grande expedição guerreira surgiu algo mais tarde. Uma perna
representa treze por cem da superfície corporal. Isto justifica a refe-
rência especial, mesmo numa exposição elementar como a que este
livro constitui. Queria uma aliança portuguesa com os rebeldes. Então
deve-se aplicar uma pomada anti-séptica.

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10
JOS~-MARTINH MONTERO SANTALHA

o ministério dos negócios estrangeiros angolano acusou a Africa


do Sul de planear uma guerra contra Angola. Essas queimaduras não
requerem outro cuidado que não seja a aplicação de uma pomada.
Uma tentativa desajeitada pode determinar uma ulceração séria. Con-
vém deitar no olho uma ou duas gotas de colírio. Uma vez que o indi-
víduo se liberte do condutor, deverá verificar-se o estado das funções
respiratória e circulatória . A gravidade de uma queimadura depende
mais da sua extensão que da sua profundidade. Uma outra persoa
retirará o corpo estranho com a ponta de um lenço. A extracção destes
objectos deve fazer-se com uma pinça. Uma queimadura superficial
pode atingir sessenta por cem da superfície do corpo . Deve tomar o
medicamento uma ou duas vezes por semana.

L dois = G dous (v. apartado c):

Chegam agora dois rapazes a correr. Dois sais podem produz ir


causticações. Um dos dois irmãos viu a sentença suspensa por dois
anos. A reunião do grupo de Planeamento nuclear deve durar dois dias.
Dois episódios guerreiros marcam o reinado de Dom Afonso IV
(=quarto). Os dois exércitos travam batalha nas margens do rio Salada.
Dois anos mais tarde embarcou furtivamente para o norte de Africa.
«Duas» é o feminino de «dois». Tenho dois livros para ti. Segundo
é o que entre dois ocupa o último lugar. A explicação é fácil se consi-
derarmos dois factores.

l há = G hai (v. apartado q):

Há duas situações imediatas em que é preciso pensar. O presi-


dente vis itou Jerusalém há três anos. Na carta há alusões directas ao
irmão. Há todo o empenho em atrair para o nosso seio a cultura em
que mergulham as nossas mais profundas raízes. Há no meu ser crepús-
culos e auroras. Há muito tempo que não o vejo. Na rua há muita gente.

l tudo = G todo (v. apartado m):

Tudo isto se insere num quadro mais vasto. Tudo ali me parecia
triste . Queria ver tudo o que ali havia . Fa lamos de tudo, menos de
política. Tudo o que existe é imaculado e é santo. Tudo foi em vão!
O conhecimento da língua é tudo. Tudo o que vive e ri e canta e chora,

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M~TOD PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

tudo foi feito com o mesmo lodo e purificado com a mesma aurora.
A mudança no tom dizia tudo.
As vozes não subiam do tom médio e, contudo, ouviam-se bem.
Contudo, não se poderá fazer.
Isto pode suceder sobretudo nos indivíduos excitáveis . As queima·
duras podem determinar fenómenos gerais graves, sobretudo o choque .
As tropas estavam formadas sobretudo de nobres portugueses e gale·
gos. A cura de alguns dos seus males pode estar em nós, sobretudo
no tocante ao problema da língua. A rainha chorou sobretudo o pai
que deixava o filhinho desamparado.

l nenhum etc. =G nengum etc. (v. apartado i):

O seu cavalo era melhor que nenhum outro e ganhou a corrida.


Em nenhuma se está melhor. Nenhuma audácia pode transpor as mura-
lhas da cidadela. No rio nenhuma canoa, nenhum sinal de vida aparecia .
~ poeta ,mas de nenhum valor. Serviço nenhum a bela moça refugava.
Nenhures se estará melhor do que aqui.

l alguma, algumas = G algumha, algumhas (v. apartado j) :

Alguma daquelas obras foi retirada da biblioteca. Muitas vezes


encontro a sua lembrança em alguma esquina da cidade. Algumas
mulheres choravam. Em parte alguma vejo dias lindos como estes do
Alentejo. Alguma razão terá para agir como agiu . Vigie bem este
rapaz, senão logo prepara alguma. Tem havido vacilações e alguma
resistência. Algumas vezes não sabe como sair.

l também = G tamém (v. apartado r):

Consideraremos também alguns pequenos acidentes. O público


também chama queimaduras a outras lesões. Então corre·se o perigo
de ser também vitimado. No atentado morreu também um motorista .
O médico também pode agir fora de casa. Havia também ligação com
a família Albuquerque. Este socorro é também suficiente para salvar
a vida do paciente. Um aventureiro italiano acabou também a aventura
na forca . Também Fernando Pessoa era de origem galega. O vulgo
também lhes chama, impropriamente , queimaduras.

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JOS~-MARTINH MONTERO SANTALHA

L assim = G assi (v. apartado r):


Assim, a que imadura superficial pode ser grave . A conjuntiva do
olho fica assim esticada. São assim chamadas as lesões causadas
por agentes químicos. Não proceda assim com seu amigo . Foram
premiados Manuel, Luís , Roberto, e assim os demais alunos que alcan-
çaram nota superior a oito. A casa estava assim de gente . Curta é a
vida; assim, saibamos vivê-Ia! Assim como ela, outros caíram no erro.
Assim como assim, é o melhor tratado sobre o assunto .
~ certo, sim. Afinal deu o seu sim. Sim, o rapaz de que você fala
meteu-se em dificuldades . Neste caso não está em causa o calor, mas
sim as reacções entre a matéria orgánica e o produto lesivo.

L quanto etc. = G canto etc. (v. apartado h):


Quantos somos, afinal? Quanto dinheiro tem você? Quanto quer?
Num ai ela perde a noção de quanto a cerca. Quanto sofrem os pobres!
Quanto andou o rapaz! Bem sabe quanto eles trabalham. Quanto à
profundidade. classificam-se as queimaduras em seis graus.
Enquanto o transporte não vem, proceda-se com cautela. Enquanto
isto não for feito, não se lhe deve tocar.

21.4: Outras peculiaridades

• Parece igualmente mais prático aplicar o mesmo princípio da


«pronúncia ortográfica» (isto ê: ler as palavras coa pronúncia
galega que corresponde à sua grafia) a calquer outro feito lingüís-
tico em que L diverge de G.
Isto parece lógico ante todo nas divergências que se apre·
sentam em vocábulos do nivel culto, pois neste caso, dada a
imposiçom histórica da cultura espanhola sobre Galiza, mais
que de diferenças entre galego e português trata-se de diferenças
entre português e espanhol. Eis algurnhas divergências desta
natureza:
- no vocalismo átono; p.e. : feminino, corrigir, desenho, rigo-
roso, resumo;

148
MtTODO PRÁTICO DE LlNGUA GALEGO-PORTUGUEEA

na tonicidade silábica; p.e.: democracia, herói, regime, e


formas rizotónicas dos verbos em -iar (eu anuncio);
- na adaptaçom de estrangeirismos; p.e.: film e, clube, iogurte,
boicote.

• Por funcionalidade prática parece aconselhável aplicar o


mesmo princípio da «pronúncia ortográfica » tamêm na leitura
daquelas divergências luso-brasileiras em que a variante galega
pode considerar-se legítima e portanto manter-se na língua nor-
mativa da Galíza. Eis alguns casos desta índole:

- no vocalismo átono; p.e.: fum o (= G fume), berço (= G


berce);
- no vocalísmo tónico; p.e.: fome (= G fam e);
- no consonantismo; p.e.: pessoa, pessoal (= G persoa, per-
soa!);
- L/s/ = G / s/ ; p. e. pássaro (= G páxaro) , surdo (=G
xordo);
- L -m = G /0/ ; p .e.: assim, sim (= G assi, si), ontem, nuvem,
homem (= G onte, nuve, home), e o sufixo -{a)gem, p.e.
viagem (= G viage);
- no tratamento do grupo latino -SC-; p.e.: nascer (= G nacer),
crescer (= G crecer); cena, céptico (= G escena, escéptico);
- L u = G ui; p.e. luta, lutar, escutar, truta (= G luita, luitar,
escuitar, truita);
- divergências entre s e c, ç ou z; p.e. sapato (=G çapato),
cabisbaixo ( = G cabizbaixo); fu zil (= G fusil);
- L /kw/ = G /k/; p.e.: qual, quando, quanto, quase, quatro.

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JOS~-MARTINH MONTERO SANT ALHA

21.5: Textos luso-brasileiros para ler

1) «As queimaduras«, por R. da Fonseca

De O médico em casa,
de Ramiro da Fonseca
(Editorial Verbo, Lisboa).

OUTROS ACIDENTES

Outros acidentes que podem ocorrer em casa, e a que por vezes


é necessário prestar um socorro imediato, são as queimaduras, as
causticações, as lesões causadas pela electricidade (queimaduras e
electrocussão), as múltiplas intoxicações possíveis, e até os afoga-
mentos (não é excepcional que uma criança se afogue numa banheira,
ou mesmo um adulto, quer acidental, quer voluntariamente). Consi-
deraremos também alguns pequenos acidentes, que nem por serem
pequenos deixam às vezes de ser muito graves, como sejam os corpos
estranhos introduzidos nas vias respiratórias, no tubo digestivo, nos
ouvidos, no nariz ou nos olhos; as agulhas, espinhos ou lascas de
madeira introduzidos na pele.

§ 1- Queimaduras

Queimaduras são as lesões produzidas no organismo pela acção


do calor. As lesões produzidas por outros agentes, e a que o público
também chama queimaduras, têm outros nomes : as que são produ-
zidas pelos ácidos ou pelos álcalis chamam-se causticações, as produ-
zidas pelo frio chamam-se congelações, as produzidas pelas radiações
ionizantes têm nomes particulares conforme as suas características
(eritema, flictena) e as produzidas pelos raios infravermelhos, como as
produzidas pela electricidade, têm na realidade por causa o calor (trans-
formação da energia eléctrica calorífica; e os raios infravermelhos
são radiações caloríficas).

Uma queimadura pode ser superficial ou profunda, conforme a


espessura dos tecidos atingidos. E a gravidade de uma queimadura,

150
MéTODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

na maioria dos casos, depende mais da sua extensão que da sua


profundidade. Assim, é mais grave uma queimadura superficial que
atinja 60 % da superfície do corpo, do que a carbonização completa,
por exemplo de um pé, que representa 6 % da superfície corporal,
ou mesmo de uma perna, que representa 13 % dessa superfície. Desde
que se actue cirurgicamente num espaço de tempo mínimo, as carbo-
nizações indicadas não implicam a morte, o que não sucede se uma
queimadura superficial atingir 60 % da superfície do corpo: então a
morte é quase fatal.

Quanto à profundidade, classificam-se as queimaduras em seis


graus:
Queimadura do 1." grau - é atingida apenas a camada superfi-
cial da epiderme;
Queimadura do 2." grau - é atingida toda a espessura da epiderme;
Queimadura do 3." grau - é atingida a epiderme e a derme;
Queimadura do 4." grau - a destruição inclui o tecido celular
subcutâneo;
Queimadura do 5." grau - os músculos são atingidos.
Queimadura do 6." grau - são atingidos os ossos.
Os sintomas de uma queimadura do L" grau são a cor averme-
lhada da pele com sensação de calor, ardor e prurido. Nas do 2." grau
aparecem flictenas (bolhas), o ardor é mais intenso e em geral deter-
mina intensas perturbações nervosas, sobretudo nos indivíduos exci-
táveis. Nos outros graus de queimadura os sintomas variam com a
zona atingida, com a extensão e a profundidade das lesões; mas há
duas situações imediatas em que é preciso pensar: a dor pode ser
tão intensa que provoque um estado de choque muito grave, e o
choque pode instalar-se mesmo sem dor muito intensa. como é
possível nas grandes queimaduras .

Queimaduras de 1." e 2." graus

As queimaduras do 1." grau não requerem outro cuidado que


não seja a aplicação de uma pomada ou creme anestésico para suavizar
a dor. Se esta for muito intensa ou a vítima estiver muito enervada
e impaciente, sobretudo crianças, pode administrar-se um supositório
analgésico.

151
JOSl!:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

As do 2.' grau, em que se formam flictenas mais ou menos


extensas, precisam de ser protegidas contra a possibilidade de infec-
ções . Além do tratamento geral contra a dor indicado para as do
L' grau, deve a zona queimada ser pincelada ou pulverizada com
mercurocromo, e sobre ela aplicado um penso de gaze impregnado
de gordura.
Substituir o penso todos os dias e quando tiverem cessado os
fenómenos inflamatórios deverão cortar-se as películas das bolhas,
lavar, desinfectar com mercurocromo e aplicar uma pomada anti-
-séptica.
Advertência: se uma queimadura do 2.' grau atingir a extensão
correspondente a 5 Ofo da superfície do corpo é necessário chamar o
médico ou levar o doente a um hospital. Em certos indivíduos uma
tal queimadura pode determinar um choque, e neste caso deverão
prestar-se-lhe os primeiros socorros adequados.

Queimaduras graves

Entram nesta categoria as queimaduras do 2.' grau extensas,


com mais de 5 Ofo da superfície do corpo , e as queimaduras dos
graus 3.' a 6.' , seja qual for a sua extensão.
Só ao médico compete tratar estas queimaduras, que além das
lesões locais podem determinar fenómenos gerais muito graves, sobre-
tudo o choque. O ferido deve portanto ser levado ao hospital com
a máxima urgência, e enquanto o transporte não vem proceda-se de
acordo com a situação, pensando no choque sempre possível (v. trata-
mento de choque, pág. 23) .

§ 2- Lesões pela electricidade

Electrocussão

A electricidade, ao atravessar o corpo humano, pode determinar


queimaduras na pele (no ponto de entrada e no ponto de saída da
corrente), mas desprovidas de sinais inflamatórios e indolores (as
marcas eléctricas), outras com todas as características das queima-
duras de todos os graus (até à carbonização completa) e que serão
tratadas como queimaduras.

152
M~TOD PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

Mas a passagem da corrente, com ou sem lesões cutâneas (marcas


ou queimaduras) , determina com frequência fenómenos neuromus-
culares que vão desde um simples abalo sem consequências de maior
até à electrocussão com morte súbita real ou com morte aparente .
Quando as perturbações são ligeiras (<<assombramento» passa-
geiro, palidez ou rubor, alterações do pulso e da respiração, tremores,
espasmos, etc., não muito acentuados e pouco duradoiros), basta pôr
a vítima em repouso, deitada, e administrar-lhe um calmante (água
de flores de laranjeira, passiflora) . Mas se o estado de excitação ou
de confusão se prolonga é preciso chamar o médico.
Onde o socorro é exigido imediatamente é na electrocussão. Por
efeito da descarga eléctrica o indivíduo fica em morte aparente, e
se não for socorrido nos primeiros segundos pode esta morte aparente
transformar-se em morte real.

2) .Notícias breves» .

Do semanário Expresso, de Lisboa


(17 de novembro de 1979)

SEMANA INTERNACIONAL

Espião em Londres

Sir Anthony Blunt, ex-guarda dos Quadros da rainha Isabel, era


um espião confesso da URSS - anunciou no Parlamento, a primeiro-
-ministro, Margaret Thatcher.
O espião ajudou os diplomatas britânicos, Donald Maclean e
Guy Burgess, a fugir para a União Soviética, em 1951. Quando traba-
Ulava para os Serviços Secretos Britânicos, passou regularmente infor-
mações aos russos - relatou a senhora Thatcher a uma Câmara dos
Comuns abismada.
«Quando era professor na Universidade de Cambridge, serviu
de detector de jovens talentos para os soviéticos» - acrescentou.
O Palácio de Buckingham anunciou simultaneamente que Sir An-
thony havia sido despojado dos seus títulos nobiliárquicos.

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JOS~-MARTINH MONTERO SANTALHA

Nacionalista condenado à morte na Africa do Sul

James David Mange, um negro sul-africano de 24 anos, foi conde-


nado à morte por traição, anteontem, e 11 outros receberam sentenças
de 13 a 18 anos de prisão. Foi a primeira pena de morte pronunciada
na Mrica do Sul, desde a II Guerra Mundial, por um crime político
que não envolve homicídio.
O juiz Hefer declarou que o réu tinha ligações com o ilegalizado
Congresso Nacional Africano (ANC). Disse que havia numerosas provas
contra Mange, que fora treinado na União Soviética e planeava um
ataque a um posto de polícia e a um edifício da Justiça na pro-
víncia do Cabo.
Quando principiou a audiência, os réus que entraram na sala a
cantar, ergueram cartazes em que se lia : «o apartheid é um crime
contra a humanidade, o apartheid é alta traição, nunca cairemos
de joelhos».

Israel devolve monte Sinai

Israel devolveu, na quínta-feira, o monte Sinai ao Egipto num


gesto comemorativo da visita de Anwar Sadat, a Jerusalém, há dois
anos, o que permitirá a Sadat manter a sua promessa de orar na
montanha por ocasião do aniversário, na segunda-feira.
A área da Península do Sinai, englobando o Monte, aceite por
Judeus, Cristãos e Muçulmanos e Sadat como o local da revelação
bíblica dos 10 Mandamentos a Moisés, só devia ser entregue dentro
de 2 meses, no âmbito do Tratado de Paz Israelo-Egípcio de Março
passado .

China: os «Lordes playboys»

Dois irmãos gémeos, alcunhados os «Lordes Playboys», foram


condenados à morte, na quarta-feira, pelo estupro de 106 mulheres,
tendo um deles, Xiong Ziping, de 27 anos, sido executado imediata-
mente, depois de um tribunal de Hangzhou, no sul, ter rejeitado o
seu recurso. Entretanto, o irmão, Siong Beiping, viu a sentença

154
~TOD PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

suspensa por dois anos . Seis outros membros do bando foram conde-
nados a penas que oscilam entre 3 a 15 anos.
Os gémeos têm sido descritos nos órgãos de informação como
filhos do Senhor da província de Cheijiang, sendo voz corrente entre
os diplomatas que se trata de um general do Exército. Na semana
passada, o «Diário do Povo» disse que se serviram da posição do pai
e da sua casa separada, dotada de jardíns próprios, para levar a cabo
as suas actividades criminosas. Segundo o «Diário do Povo», o bando
violou e «assaltou indecentemente» 106 jovens, entre as quais, intelec-
tuais, operárias e estudantes, que atraíam com o pretexto de ver um
filme ou organizar uma sessão de música.

Vietnam rejeita resolução da ONU

o Vietnam rejeitou a resolução aprovada, na quarta-feira, nas


Nações Unidas, pedindo a retirada de todas as forças estrangeiras
do Kampuchea.
A rádio de Hanoi, numa emissão captada em Bangkok, citou um
comunicado do Ministério vietnamita dos Negócios Estrangeiros, que
dizia que «a aprovação desta resolução é outra decisão errónea
que prejudicará mais do que beneficiará o prestígio desta organi-
zação internacional».
A resolução, aprovada pela Assembleia Geral da ONU, por 91 votos
contra 21, pede a retirada imediata de todas as forças estrangeiras do
Kampuchea e o termo de todas as hostilidades naquele país.

Montoneros reivindicam assassínio

Os guerrilheiros montoneros reivindicaram a responsabilidade no


assassínio do financeiro argentino Francisco Soldati, no centro de
Buenos Aires, na terça-feira.
No atentado morreram também três montoneros e o motorista,
agente da polícia, de Soldati.

/55
JOS:t::-MARTINHO MONTERO SANTALHA

Angola acusa Africa do Sul

Segundo informações da agência Angop, o Ministério dos Negó-


cios Estrangeiros angolano acusou a Africa do Sul de planear uma
guerra contra Angola e os povos da Africa Austra l. Acrescenta ainda
que as potências imperialistas encorajaram a África do Sul a atacar
Angola e outros Estados africanos da Linha da Frente. Desafiando
a comunidade internacional inteira, acentuou a Angop, e confiante na
cumplicidade de seus aliados, o ministro dos Negócios Estrangeiros
sul-africano Pik Botha, ameaçou os países da Linha da Frente com
represálias ainda maiores na próxima semana.

NATO debate armas nucleares na Europa

Os ministros da Defesa da NATO debateram, na terça-feira, em


Haia, os planos para instalar novas armas nucleares na Europa Oci-
dental. Fontes diplomáticas declararam que a Holanda fora exortada
a aceitar as armas não obstante o forte sentimento antinuclear no país.
A reunião de 2 dias do grupo de Planeamento Nuclear, a decorrer
num quartel fortemente guardado, visa abrir caminho para uma
decisão colectiva da Aliança, de modernizar as suas forças nucleares,
em Bruxelas, em meados de Dezembro.
As propostas da NATO prevêem a instalação de 572 mísseis ame-
ricanos «Pershing-2» e «cruise» na R.F.A., Itália, Inglaterra, Bélgica
e Holanda.
A NATO pretende as novas armas, capazes de atingirem a URSS,
para contrabalançar cerca de 100 mísseis soviéticos «SS-20» e bom-
bardeiros Tupolev-26 «Backfire », que afirma estarem actualmente a
ser instalados.

«Skorpion» foi a pistola que matou Moro

Uma pistola metralhadora «Skorpion », descoberta durante uma


rusga a um esconderijo de guerrilheiros, foi a arma utilizada para
assassinar o ex-primeiro-ministro Aldo Moro, em Maio de 1978, segundo
declararam peritos balísticos.

156
M1i!TODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

Juan Carlos na Jordânia

o Rei Juan Carlos da Espanha e a Rainha Sofia chegaram no


domingo a Aman para uma visita particular à Jordânia.

«The Times » reaparece

«The Times», o mais antigo jornal da Inglaterra reapareceu na


segunda-feira, depois de ter terminado a suspensão da sua publi-
cação em consequência de uma disputa laboral que o silenciou há
quase um ano.
Antes da disputa, o «Times» tinha uma tiragem de cerca de
300 mil exemplares, tendo reaparecido com 400.000.

Preso em Moscovo o filho de Korchnoi

Foi preso, em Moscovo, o filho do xadrezista desertor soviético


Victor Korchnoi, após um ano de clandestinidade a fim de evitar
cumprir o serviço militar, anunciou no passado dia 14 a sua mãe.
Tendo pedido para se juntar ao pai, no Ocidente, Igor Korchnoi
receou as consequências do serviço nas Forças Armadas, que normal-
mente proíbem os ex-recrutas de emigrarem durante vários anos,
com o fundamento de que tiveram acesso a segredos militares.

Londres: novo torpedo

O Secretário de Estado da Defesa, Lord Strathcona, disse em


conferência de Imprensa que a Inglaterra está a empregar 200 milhões
de libras na produção de um novo torpedo, leve e sofisticado, capaz
de procurar e destruir qualquer submarino soviético, que possa vir
a ser construído nos próximos 20 anos.
O novo torpedo, chamado «S ting Rau», será construído pela
firma Marconi.
«Podemos esperar encontrar submarinos soviéticos em todos os
pontos do Atlântico Norte. Destruí-los requer uma arma sofisticada»,
acrescentou o secretário de Estado.

157
JOS:l:-MARTINHO MONTIDRO SANTALHA

3) Eça de Queirós (1845-1900), .A aia·.

A AIA

Era uma vez um rei, moço e valente, senhor de um reino abun-


dante em cidades e searas, que partira a batalhar por terras distantes,
deixando solitária e triste a sua rainha e um filhinho, que ainda vivia
no seu berço, dentro das suas faixas.
A lua cheia que o vira marchar, levado no seu sonho de conquista
e de fama, começava a minguar - quando um dos seus cavaleiros
apareceu, com as armas rotas, negro do sangue seco e do pó dos
caminhos, trazendo a amarga nova de uma batalha perdida e da
morte do rei, trespassado por sete lanças entre a flor da sua nobreza,
à beira de um grande rio.
A rainha chorou magnificamente o rei. Chorou ainda desolada-
mente o esposo, que era formoso e alegre. Mas, sobretudo, chora
ansiosamente o pai que assim deixava o filhinho desamparado, no
meio de tantos inimigos da sua frágil vida e do reino que seria seu,
sem um braço que o defendesse, forte pela força e forte pelo amor.
Desses inimigos, o mais temeroso era o seu tio, irmão bastardo
do rei, homem depravado e bravio, consumido de cobiças grosseiras,
desejando só a realeza por causa dos seus tesouros e que havia anos
vivia num castelo sobre os montes, com uma horda de rebeldes,
à maneira de um lobo que, entre a sua atalaia, espera a presa. Ai!
a presa agora era aquela criancinha, rei de mama, senhor de tantas
provincias e que dormia no seu berço com o seu guizo de ouro
fechado na mão!
Ao lado dele, outro menino dormia noutro berço. Mas este era
um escravozinho, filho da bela e robusta escrava que amamentava
o príncipe. Ambos tinham nascido na mesma noite de Verão. O mesmo
seio os criava. Quando a rainha, antes de adormecer, vinha beijar
o principezinho, que tinha o cabelo louro e fino, beijava também
por amor dele o escravozinho, que tinha o cabelo negro e crespo.
Os olhos de ambos reluziam como pedras preciosas. Somente o berço
de um era magnífico e de marfim en ti'e brocados - e o berço do

158
M:l:TODO PRATICO DE L1NGUA GALEGO-PORTUGUESA

outro pobre e de verga. A leal escrava, porém, a ambos cercava de


carinho igual, porque se um era o seu filho - o outro seria o seu rei.
Nascida naquela casa real, ela tinha a paixão, a religião dos seus
senhores. Nenhum pranto correra mais sentidamente do que o seu
pelo rei morto à beira do grande rio. Pertencia, porém, a uma raça
que acredita que a vida da Terra se continua no Céu. O rei seu amo,
decerto, já estaria agora reinando outro reino, para além das nuvens,
abundante também em searas e cidades. O seu cavalo de batalha, as
suas armas, os seus pajens tinham subido com ele às alturas. Os seus
vassalos, que fossem morrendo, prontamente iriam nesse reino celeste
retomar em torno dele a sua vassalagem. E ela um dia, por seu
turno, remontaria num raio de luz a habitar o palácio do seu senhor,
e a fiar de novo o linho das suas túnicas, e a acender de novo a
caçoleta dos seus perfumes; seria no Céu como fora na Terra, e
feliz na sua servidão.
Todavia, também ela tremia pelo seu principezinho! Quantas
vezes, com ele pendurado do peito, pensava na sua fragilidade, na
sua larga infância, nos anos lentos que correriam antes que ele fosse
ao menos do tamanho de uma espada, e naquele tio cruel, de face
mais escura que a noite e coração mais escuro que a face, faminto
do trono e espreitando de cima do seu rochedo, entre os alfanges da
sua horda! Pobre principezinho de sua alma! Com uma ternura maior
o apertava então nos braços. Mas se o seu filho chalrava ao lado-
era para ele que os seus braços corriam com um ardor mais feliz.
Esse, na sua indigência, nada tinha a recear da vida. Desgraças,
assaltos da sorte má nunca o poderiam deixar mais despido das
glórias e bens do mundo do que já estava ali no seu berço, sob o
pedaço de linho branco que resguardava a sua nudez. A existência,
na verdade, era para ele mais preciosa e digna de ser conservada
que a do seu principe, porque nenhum dos duros cuidados com que
ela enegrece a alma dos senhores roçaria sequer a sua alma livre
e simples de escravo. E, como se o amasse mais por aquela humildade
ditosa, cobria o seu corpinho gordo de beijos pesados e devoradores
- dos beijos que ela fazia ligeiros sobre as mãos do seu príncipe.
No entanto, um grande temor enchia o palácio, onde agora
reinava uma mulher entre mulheres. O bastardo, o homem de rapina
que errava no cimo das serras, descera à planície com a sua horda,
e já através de casais e aldeias felizes ia deixando um sulco de

159
JOSlt·MARTINHO MONTERO SANTALHA

matança e ruínas . As portas da cidade tinham sido seguras com


cadeias mais fortes. Nas atalaias ardiam lumes mais altos. Mas à
defesa faltava disciplina viril. Uma roca não governa como uma
espada. Toda a nobreza fiel perecera na grande batalha. E a rainha
desventurosa apenas sabia correr a cada instante ao berço do seu
filhinho e chorar sobre ele a sua fraqueza de viúva . Só a ama leal
parecia segura - como se os braços em que estreitava o seu príncipe
fossem muralhas de uma cidadela que nenhuma audácia pode transpor.
Ora uma noite, noite de silêncio e de escuridão, indo ela a
adormecer, já despida, no seu catre, entre os seus dois meninos,
adivinhar, mais que sentir, um curto rumor de ferro e de briga, longe,
à entrada dos vergéis reais. Embrulhada à pressa num pano, atirando
os cabelos para trás, escutou ansiosamente. Na terra areada, entre
os jasmineiros, corriam passos pesados e rudes. Depois houve um
gemido, um corpo tombando molemente sobre lajes, como um fardo.
Descerrou violentamente a cortina. E além, ao fundo da galeria, avistou
homens, um clarão de lanternas, brilhos de armas... Num relance
tudo compreendeu - o palácio surpreendido, o bastardo cruel vindo
roubar, matar o seu príncipe! Então, rapidamente, sem uma vacilação,
uma dúvida, arrebatou o príncipe do seu berço de marfim, atirou-o
para o pobre berço de verga - e tirando o seu filho do berço servil,
entre beijos desesperados, deitou-o no berço real, que cobriu com
um brocado.
Bruscamente um homem enorme, de face flamejante, com um
manto negro sobre a cota de malha, surgiu à porta da câmara, entre
outros, que erguiam lanternas. OlllOu - correu ao berço de marfim
onde os brocados luziam, arrancou a criança, como se arranca uma
bolsa de ouro e, abafando os seus gritos no manto, abalou furio-
samente.
O príncipe dormia no seu novo berço. A ama ficara imóvel
no silêncio e na treva.
Mas brados de alarme de repente atroaram o palácio. Pelas
vidraças perpassou o longo flamejar das tochas. Os pátios ressoavam
com o bater das armas. E desgrenhada, quase nua, a rainha invadiu
a câmara, entre as aias, gritando pelo seu filho. Ao avistar o berço de
marfim, com as roupas desmanchadas, vazio, caiu sobre as lajes,
num choro, despedaçada. Então calada, muito lenta, muito pálida,
a ama descobriu o pobre berço de verga ... O príncipe lá estava,

160
M~TOD PRÁTICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

quieto, adormecido, num sonho que o fazia sorrir, lhe iluminava


toda a face entre os seus cabelos de ouro. A mãe caiu sobre o berço,
com um suspiro, como cai um corpo morto.
E nesse instante um novo clamor abalou a galeria de mármore.
Era o capitão das guardas , a sua gente fiel. Nos seus clamores havia,
porém, mais tristeza que triunfo. O bastardo morrera! Colhido, ao
fugir, entre o palácio e a cidadela, esmagado pela forte legião de
archeiros, sucumbira, ele e vinte da sua horda. O seu corpo lá ficara,
com flechas no flanco, numa poça de sangue. Mas ai! dor sem
nome! O corpozinho tenro do príncipe lá ficara também, envolto
num manto, já frio, roxo ainda das mãos ferozes que o tinham
esganado! ... Assim tumultuosamente lançavam a nova cruel os homens
de armas - quando a rainha, deslumbrada, com lágrimas entre risos,
ergueu nos braços, para lho mostrar, o príncipe que despertara.
Foi um espanto, uma aclamação. Quem o salvara? Quem? ...
Lá estava junto do berço de marfim vazio, muda e hirta, aquela que
o salvara! Serva sublimemente leal! Fora ela que, para conservar a
vida ao seu príncipe, mandara à morte o seu filho .. . Então, só então,
a mãe ditosa, emergindo da sua alegria extática, abraçou apaixona-
damente a mãe dolorosa, e a beijou, e lhe chamou irmã do seu cora-
ção ... E de entre aquela multidão que se apertava na galeria veio
uma nova, ardente aclamação, com súplicas de que fosse recompen-
sada, magnificamente, a serva admirável que salvara O rei e o reino .
Mas como? Que bolsas de ouro podem pagar um filho? Então
um velho de casta nobre lembrou que ela fosse levada ao tesouro real
e escolhesse de entre essas riquezas, que eram as maiores da 1ndia,
todas as que o seu desejo apetecesse .. .
A rainha tomou a mão da serva. E, sem que a sua face de
mármore perdesse a rigidez, com um andar de morta, como num
sonho, ela foi assim conduzida para a câmara dos tesouros . Senhores,
aias, homens de armas, seguiam num respeito tão comovido que
apenas se ouvia o roçar das sandálias nas lajes. As espessas portas
do tesouro rolaram lentamente. E, quando um servo destrancou as
janelas, a luz da madrugada, já clara e rósea, entrando pelos gradea-
mentos de ferro , acendeu um maravilhoso e faiscante incêndio de ouro
e pedrarias! Do chão de rocha até às sombrias abóbadas, por toda a
câmara, reluziam, cintilavam, refulgiam os escudos de ouro, as armas
marchetadas , os montões de diamantes, as pilhas de moedas, os longos

161
11
JOSlt-MARTINHO MONTElRO SANTALHA

fios de pérolas, todas as riquezas daquele reino, acumuladas por cem


reis durante vinte séculos. Um longo «Ah!», lento e maravilhado,
passou por sobre a turba que emudecera. Depois houve um silêncio,
ansioso. E no meio da câmara, envolta na refulgência preciosa, a ama
não se movia ... Apenas os seus olhos, brilhantes e secos, se tinham
erguido para aquele céu que, além das grades, se tingia de rosa e de
ouro . Era lá, nesse céu fresco de madrugada, que estava agora o seu
menino. Estava lá, e já o Sol se erguia, e era tarde, e o seu menino
chorava decerto, e procurava o seu peito! ... Então a ama sorriu e
estendeu a mão. Todos seguiam, sem respirar, aquele lento mover
da sua mão aberta. Que jóia maravilhosa, que fio de diamantes, que
punhado de rubis, ia ela escolher?
A ama estendia a mão - e sobre um escabelo ao lado, entre um
molho de armas, agarrou um punhal. Era um punhal de um velho rei,
todo cravejado de esmeraldas e que valia uma província.
Agarrara o punhal e, com ele apertado fortemente na mão, apon-
tando para o céu, onde subiam os primeiros raios do Sol, encarou
a rainha, a multidão, e gritou:
- Salvei o meu príncipe - e agora vou dar de mamar ao
meu filho!
E cravou o punhal no coração.

4) -Língua portuguesa», por Rodrigues Lapa

Dos Estudos galego-portugueses


de Manuel Rodrigues Lapa
(Sá da Costa Editora, Lisboa 1979).

UNGUA PORTUGUESA:
A QUANTIDADE E A QUALIDADE

Sempre que meditamos na irradiação pelo vasto mundo da nossa


civilização e da nossa língua, que lhe fez companhia, pensamos o
acontecimento em termos numéricos. E encontramo-nos a dizer:
- quantos somos, afinal? Porque a quantidade conta muito, sempre
contou, mormente nesta época de hegemonismo desenfreado; mas
sem o tempero superior da qualidade, que lhe imprime a verdadeira
força, de pouco servirá.

162
M~TOD PRA.TICO DE LINGUA GALEGO-PORTUGUESA

A contagem dos indivíduos que falam a nossa língua sempre se


tem revelado insuficiente e contraditória, andando hoje pela cifra
aproximada de 120 a 150 milhões. A explicação desse desequilíbrio é
fácil, se considerarmos dois factores: o fenómeno da emigração, que
torna as estimativas difíceis e flutuantes; e a existência em África
de milhões de pessoas que só em teoria falam o português, servindo-se
geralmente de dialectos regionais . De qualquer modo, para esse total,
qualquer que ele seja, contribui enormemente o peso da população
brasileira, em acréscimo demográfico explosivo: hoje cerca de 120
milhões. Para o ano de 2000 teremos qualquer coisa próxima de
200 milhões de brasileiros. É já uma bonita conta, mas cabe muito
à vontade naquele imenso território que suportaria muito mais do
que isso: tem riqueza potencial para mais de 500 milhões.
Um caso muito curioso convém aqui assinalar: quando se faz o
cômputo dos lusofalantes, nunca se considera para o efeito o nome
da Galiza, nossa vizinha. Além de revelar a mais supina ignorância
do facto em si, dado que o galego não é mais do que uma forma algo
arcaizante do português, ou do galego-português, como quisermos,
faz ainda com que as contas nos saiam erradas. Com efeito, rouba
ao resultado final cerca de 5 milhões de indivíduos: os galegos sedia-
dos na Galiza e outros tantos em países da emigração. E aqui também
conta não apenas a quantidade, mas ainda mais o valor da qualidade.
É sobejamente conhecido o alto apreço em que são tidos em todo o
mundo os emigrantes galegos e portugueses, pelas suas qualidades
de trabalho e pelo seu nível moral. Aos galegos temo-los aqui desde
há séculos, incorporados à nossa população, aos nossos costumes e à
nossa língua, que é a mesma, mas sem perder o carácter que os
distingue. O francês Carrere, quando visitou Lisboa, nos fins do
século XVIII, traçou dessa figura um retrato magnífico, de força
calma e dignidade moral, dentro de uma sociedade em crise, em que
o trabalho, as virtudes tradicionais, representavam uma degradação
intolerável.
Dir-se-á: mas o galego não tem boa fama na Peninsula Ibérica,
nem mesmo no Brasil, onde, para achincalhar um português, lhe
chamam galego. Isso induz a crer que muitas vezes o galego foi um
simples meio para vilipendiar o português, confirmando nos provo-
cadores a consciência que tinham da irmandade dos dois homens de
aquém e de além-Minho. De qualquer maneira, há que denunciar e

163
JOSt;-MARTINHO MONTERO SANTALHA

desfazer esse labéu infame que, se não deixou vestígios no nosso


carácter, imprimiu contudo ao psiquismo dos galegos certo recalque
mórbido de inferioridade.
Por mais estranho que pareça, foi Camões, de origem galega e
númen inspirador deste jornal, quem ajudou a robustecer a lenda
maldita do galego, num passo do seu poema (canto IV, est. 10), posto
na boca de Vasco da Gama, quando conta ao rei de Melinde a história
de Portugal. Às gentes armadas que acorriam de todas as partes de
Espanha e foram desbarataads em Aljubarrota, somaram-se os Galegos,
que o Gama qualifica de «sórdidos galegos, duro bando». Alguns dos
nossos irmãos da Galiza mostraram-se ofendidos pelo injurioso epíteto,
que um deles, Martin Sarmiento, notável polígrafo do século XVIII,
nunca perdoou ao nos o poeta, pois vinha juntar-se às agressões injus-
tas que os Galegos recebiam dos Castelhanos. Mas o qualiticativo
sórdidos, como já procurámos demonstrar, terá alí um sentido moral
(miserável, indecente), traduzindo a repugnância de Camões ao ver
galegos combaterem contra os seus irmãos de aquém-Minho, que se
defendiam dos Castelhanos numa luta de vida ou de morte.
Mas ou seja assim, ou seja que o «português» Camões se visse
naquele preciso lance na obrigação de vituperar os seus irmãos gale-
gos, isso era apenas um exemplo daquela «fraternidade agressiva»,
que desune por vezes os melhores amigos. A expressão vem a propó-
sito, por ser de um grande poeta português também de origem galega,
Fernando Pessoa. Isso não obsta a que tenhamos freio na língua
e procuremos compreender os melindres dos nossos irmãos do outro
lado da fronteira, os quais uma longa diuturnidade de insultos e
injustiças revoltantes tornou naturalmente suspicazes.
Há todo o empenho em atrair para o nos o seio uma língua e uma
cultura em que mergulham as nossas mais profundas raízes. Trata-se
de uma obra de reintegração que deverá ser empreendida com imenso
tacto, sem demasiada pressa nem demora sobeja, procurando con-
vencer os nossos amigos transminhotos de que a cura de alguns dos
seus males pode estar em nós, sobretudo no tocante ao problema
da língua, que é de todos o mal maior.
Estão sendo feitas tentativas para achegar o mais possível o
galego ao português, na feitura de uma língua literária que propria-
mente lhe falta, agora mais do que nunca, por estar para breve o
estatuto da autonomia regional. Tem havido vacilações e alguma resis-

164
M~TOD PRÁTICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

tência, aliás de esperar, pois o problema vê-se melhor de fora que


de dentro. É o significado de um curto mas substancial artigo do
Prof. Carballo Calero, «Murguía contra Valera», publicado no último
número da revista Grial, órgão prestigioso do actual pensamento
galego. Por ele se deixa ver a razão que assistia a Juan Valera, escritor
espanhol estudioso da cultura portuguesa, quando afirmava esta coisa
que todos sentem e poucos têm a coragem de dizer: que o português
dos livros é, ou deve ser, a forma literária do galego. E é por isso
mesmo que procurar fazer uma língua literária que não conduza
finalmente ao português, representa uma teimosia e uma insensatez.
Ora a teimosia é própria do galego; mas insensato é que ele não é,
de modo nenhum.
Estamos, pois, perante um grande acontecimento histórico: o
acesso à nossa comunidade línguística de mais alguns milhões de
indivíduos. A quantidade não é por aí além; mas a qualidade, posso
garantir que é de primeira ordem.
[Publicado no jornal Comunidade, em 10 de Junho de 1977.]

Rodrigues Lo.pa
(debuxo de Slro)

165
JOS:t-MARTINHO MONTERO SANTALHA

5) Miguel Torga, .A confissão-

De Novos contos da montanha,


de Miguel Torga
(Coimbra 1977, 7.' ed.)

A CONFISSÃO

Sentia ainda o cinturão do sargento a cortar-lhe a carne. A moci-


dade de Fontela, amontoada no posto da guarda, em Freixeda, ia
sendo interrogada assim.
- Outro! - ordenava a voz sinistra lá de dentro.
E enquanto o cabo Silvino atirava pela porta fora um desgraçado
de camisa despedaçada e a escorrer sangue, recebia guia de marcha
novo bombo para a festa.
-Tu.
-Tu.
-Tu.
- E agora nós ...
Retesou a vontade. Já só faltava ele, e a própria mudança no
tom e nos termos da intimação dizia tudo.
Preso logo a seguir ao crime, negara redondamente que fosse o
criminoso. E o inquiridor recorria ao seu processo habitual nos
casos complicados : juntava os suspeitos e os insuspeitos no mesmo
redil, e levava-os a eito. A verdade acabava por sair do látego, ou
confessada ou denunciada.
Entrou calmamente e tentou provar mais uma vez a sua inocên-
cia. Brigara, realmente, na noite de Reis com o Armindo, de quem,
como toda a gente podia testemunhar, era amigo. Andavam na
paródia, beberam muitos quartilhos e, às tantas, por dez réis de coisa
nenhuma, pegaram-se. Dera, levara, mas em luta aberta e leal. No fim
da zaragata, bem apalpados ambos, seguira cada qual o seu caminho,
e do fundo da rua é que ouvira gritar aqui deI-rei.
- Confessa. Confessa, que é melhor ...
- Já lhe disse que não fui eu!
- Queres provar da marmelada, está visto. Pois seja feita a
tua vontade.

166
JOS:t-MARTINHO MONTERO SANTALHA

Olhou fixamente o fatinário antes do primeiro golpe. Sabia que


as aparências o comprometiam e que caira nas mãos do Diabo.
Todos, aberta ou encobertamente, o consideravam o autor do crime.
A própria vítima o apontara à justiça.
- Ah! Bernardo, que me mataste! - gemera o Armindo, ao sen-
tir-se trespassado pelas costas.
E a Júlia Garrido, que já estava na cama e ouvira a acusação,
acrescentava que, sem pôr as mãos nos Evangelhos, ia jurar ter
reconhecido o vulto dele a esgueirar-se pelo quelho, quando, alar-
mada, correu à janela.
Com provas de tal natureza, ninguém duvidava da sua culpa.
E muito menos o sargento, que só por táctica armara aquela comédia.
Até no simples facto de o guardar para remate do arraial mostrava
claramente o jogo. Tentava atemorizá-lo pondo-lhe diante dos olhos
o sudário prévio do que se ia passar. Mas um homem é um homem,
e quem não deve não teme. Altivamente estremou os campos.
- Faça como entender, na certeza de que está muito enganado
se cuida que me obriga a ser o que não sou.
- Talvez mudes de opinião daqui a nada. Ora vamos lá .. .
O azorrague zuniu, e nem se queria lembrar do tempo que
durara aquele malhar sem tino. Os últimos golpes já quase os não
sentira, de tal modo ardia todo numa dor viva. Por sinal que foi
durante a pancadaria que teve o pressentimento do que se passara.
De repente, como que iluminado por dentro, viu o Reinaldo apagado
na escuridão a assistir à bulha, seguir o Armindo depois da refrega,
e aproveitar a ocasião para o esfaquear à falsa-fé quando o desgra-
çado virava a esquina da casa. Despeitado por se ver preterido
por ele no coração da Silvana, vingava-se a coberto de qualquer
perigo. Se tinha havido barulho antes da morte, nada mais natural
do que pensar num desforço traiçoeiro do adversário de há pouco ...
O vozeirão do sargento quebrou-lhe o fio à meada.
- Então? Chega, ou queres mais?
Arquejante, numa posta de sangue, ainda arranjara forças para
recalci trar.
- Nem que me corte aos bocados! Nego e torno a negar.
O carrasco abaixou o chicote e chamou o ajudante.
- Solta os ou tros e põe este de salmoura. Amanhã continuamos.
Estendido nas lajes da prisão, com a roupa colada ao corpo

167
Ml!:TODO PRÁTICO DE LtNGUA GALEGO· PORTUGUESA

retalhado, malucou naquela miséria. Por todos os lados que a enca-


rasse, ia dar sempre ao mesmo. Ninguém o acreditaria, dissesse o que
dissesse. Infelizmente, a verdade, no seu caso, não tinha demons-
tração. Teimar em proclamá-la? De que valia? Surdo, o sargento não
a podia ouvir. E o sargento era Freixeda e o resto do mundo. Lançar
o nome do Reinaldo na fogueira? Talvez outros o fizessem. Ele é que
nunca. Nem tinha a certeza, nem era denunciante. Portanto, só havia
um recurso: fugir.
E fugira, realmente, nessa mesma noite, coisa que não passara
sequer pela cabeça do sargento. Tanto assim que nem sentinela
mandara pôr à porta da velha cadeia concelhia onde agora o guar-
dava sozinho. Embora a saber que escapulindo-se confirmava para
o resto da vida a acusação que lhe faziam, às tantas da manhã,
com a energia, a paciência e a arte de que apenas se é capaz nas
horas apertadas, ala que se faz tarde.
Passou por casa, mudou de roupa, pediu dinheiro emprestado,
e antes de o sol nascer atravessou a fronteira.
Voltava agora, decorrido meio século, velho, pobre, amargurado,
com toda uma existência de exilado atrás de si, e dorido ainda dos
golpes injustos que recebera. A que vinha? Rever a terra da criação,
rezar duas ave-marias na sepultura dos pais, e calar uma ânsia
obscura de resgate que os anos tornavam cada vez mais premente.
Não anunciara a chegada nem mesmo à única irmã que lhe
restava. Vinha como um fantasma sorrateiro apropriar-se da reali-
dade de que fora espoliado.
Passageiro anónimo da camioneta da carreira, apenas ela o alijou
no largo, ficou-se pasmado a olhar o fontanário, o cruzeiro, o rego de
água que atravessava a povoação, e o casario que a tarde mortiça
tomava sonolento. E apeteceu-lhe chorar. O que ele fora, e o que
ele era agora! Naquela terra sonhara e confiara. E daquela terra
o expulsara a maldade de alguém que, sem remorsos, ali pudera
continuar no aconchego das coisas familiares. Cinquenta anos de vida
errante, com o labéu dum assassinato a roê-lo. Aonde chegava, chegava
a sombra do homicida que não era. Até nos olhos dos que não
conheciam a história do crime lia sempre a negra acusação. O tempo
acabara por lhe delir na própria lembrança a imagem vislumbrada
do possível criminoso. Nítido na sua consciência e na do mundo,
apenas um nome infamado: o seu.

168
JOSl!:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

- Oh! Bernardo! - gritou-lhe uma voz cavernosa atrás das costas.


Voltou-se. Era o padre Artur, seu companheiro de meninice,
ainda seminarista na altura do crime. Sempre a pastorear freguesias
longinquas, fora finahnente encarregado do rebanho nativo .
- Oh! Artur! - correspondeu num alvoroço, esquecido de dis-
tâncias e conveniências.
Caíram nos braços um do outro, num irresistível impulso fraterno.
- Ainda bem que voltaste! Ia-te escrever hoje. Até pedi a direc-
ção a tua irmã. Tinhas-lhe dito que vinhas?
- Não valia a pena ...
- Então vai ter com ela, e amanhã falamos . É que o Reinaldo
morreu esta manhã. Ouvi-o ontem de confissão ... Eu sempre acre-
ditei na tua inocência, rapaz!
Melancolicamente, pegou na mala e deu alguns passos em direc-
ção à casa paterna. Mas logo adiante parou, depôs o carrego e mudou
de rumo.
No cimo da rua principal desandou à esquerda, atravessou vários
quinteiros, subiu as escadas do Reinaldo e entrou.
O ambiente era lúgubre. Havia lágrimas e luto em todos os olhos.
Rompeu por entre a multidão que se acotovelava, sem ninguém
o reconhecer.
- Quem é? - perguntavam.
-Não sei.
O cadáver jazia ainda sobre a cama, já vestido, à espera do caixão.
A passos lentos aproximou-se e fitou durante alguns momentos
a figura hirta e mirrada do defunto. De repente, num ímpeto, deitou-
-lhe as mãos às abas do casaco, ergueu-o e rouquejou, fora de si:
- Estás morto, é o que te vale. Mas mesmo assim não vais
deste mundo sem duas bofetadas na cara, covarde!
E deu-lhas .

169
M:eTODQ PRATICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

6) - Inês de Castro., po r Jos é Hermano Sa raiva

Da História concisa de Portugal,


de José Hermano Saraiva
(Publicações Europa-América j

Lisboa 1979).

o DRAMA DE IN~S DE CASTRO

Dois episódios guerreiros marcam o reinado de D. Afonso IV;


a eles se deve o cognome de o Bravo que o monarca mereceu da
da posteridade.
O primeiro é o da guerra com Castela (1336-1338). As causas
ligam-se à política de casamentos, forma então muito usada entre as
monarquias peninsulares de fazer alianças e blocos políticos. Uma
filha de Afonso IV estava casada com o rei de Castela e foi por ele
abandonada e tratada vexatoriamente. Por outro lado, o rei de Por-
tugal ajustou o casamento do príncipe herdeiro, D. Pedro, com a filha
de um grande de Espanha, que era um dos chefes dos nobres
feudais que se opunham ao rei. Este não permitiu que a filha do
inimigo viesse para Portugal. Tudo isto se insere no quadro mais
vasto das lutas pelo equilíbrio político peninsular, que preenche o
século XIV. A guerra, além das costumadas devastações de fronteira
e de uma incursão castelhana que foi até junto do Porto e ali foi
contida pelas tropas portuguesas, incluiu grandes operações navais,
que terminaram pela destruição da frota portuguesa junto do cabo
de S. Vicente, no Algarve. Já na guerra de D. Dinis contra Castela,
e mais tarde nas de D. Fernando, houve combates navais de certa
envergadura e devastação dos portos espanhóis pelos navios portu-
gueses o que talvez reflicta concorrências comerciais. A paz veio a ser
negociada por intervenção do papa e não trouxe vantagens significa-
tivas a nenhuma das partes.
Em 1340, um exército do rei de Marrocos passou à Península e,
junto com as forças do rei de Granada, iniciou uma invasão por terras
cristãs. O rei de Castela pediu o auxílio do de Portugal e os dois
exércitos travaram com o invasor uma batalha nas margens do rio
Salado e obtiveram uma grande vitória . Foi esta a última ameaça

170
JOS:t:-MARTINHQ MQNTERO SANTALHA

grave de reconquista sarracena. A batalha foi descrita por um escritor


português desconhecido, que parece ter estado presente nela; esse
texto é considerado um dos pontos mais altos atingido pela prosa
medieval portuguesa.
E. no reinado de D. Afonso IV que se situa o episódio da morte
de Inês de Castro. O facto, apesar da sua secundária importáncia
política, teve uma repercussão emocional tão duradoura e tão pro-
funda que justifica a referência especial, mesmo numa exposição
elementar como a que este livro constitui.
Inês de Castro fazia parte de uma família muito poderosa de
fidalgos galegos e descendia, por via bastarda, do rei Sancho IV de
Castela. Havia também qualquer ligação com a família Albuquerque.
Afonso Sanches, o bastardo de D. Dinis que D. Afonso IV odiou de
morte e por causa do qual o País mergulhou em guerra civil, casou
com a dona do castelo de Albuquerque. A esta dona chamava Inês
de Castro mãe, porque foi ela quem a criou.
Em 1350 estalou em Castela uma revolta dos grandes senhores
contra o rei Pedro I. O chefe da revolta era precisamente João Afonso
de Albuquerque, filho de Afonso Sanches e, portanto, uma espécie
de irmão adoptivo de Inês de Castro. Este usou certamente a sua
influência sobre Inês para envolver o infante D. Pedro, que com
ela vivia maritalmente, nas guerras civis castelhanas.
João das Regras, nos seus famosos discursos das Cortes de Coim-
bra, revelou que D. Afonso IV, três anos antes da morte de D. Inês
(portanto em 1351), escreveu ao arcebispo de Braga, que se encon-
trava então na corte do papa, para que convencesse o sumo pontífice
a não conceder as dispensas necessárias para o casamento de D. Pedro
com D. Inês . Ora nessa carta há uma alusão directa às manobras de
João Afonso de Albuquerque: « .. . alguns que são parentes do infante
no 2.' grau do parentesco, ao de presente cometem não lícita coisa
com ela.» Coisa não lícita significa coisa proibida; cometer com quer
dizer propor através de. E parentesco em 2.' grau era então consi-
derado o existente entre João Afonso de Albuquerque e o infante
D. Pedro, que eram filhos de irmãos .
Um outro indício da importância decisiva que Inês de Castro
tinha em toda essa intriga política é o casamento do rei de Castela,
em 1354, com a irmã dela, Joana de Castro. Talvez contasse, desse
modo, desarmar uma eventual intervenção portuguesa, chamando os

171
JOSt';-MARTINHO MONTERQ SANTALHA

Castros para o seu partido. No mesmo dia do casamento, o rei


repudiou a consorte, por ter recebido a notícia de que Albuquerque
organizara nova liga de nobres contra ele, da qual faziam parte dois
irmãos bastardos do próprio rei (um deles era Henrique de Trastâ-
mara, que mais tarde assumiu a chefia da rebelião e matou Pedro, o
Cru, sucedendo-lhe no trono). O repúdio de Joana de Castro agravou
a situação. Os irmãos dela utilizaram o território português para
hostilizar Pedro, o Cru. Nesse mesmo ano de 1354, João Afonso de
Albuquerque insistiu no plano de uma aliança portuguesa com os
rebeldes: mandou a Portugal um irmão de Inês de Castro propor
ao infante D. Pedro que reclamasse para si a coroa de Castela,
visto ser neto do rei Sancho IV (a mãe de D. Pedro, rainha D. Beatriz,
era filha de Sancho IV). D. Pedro estava disposto a aceitar e só a
terminante proibição de D. Afonso IV evitou o nosso envolvimento
na guerra civil castelhana.
Foi para o impedir que D. Afonso IV decidiu a morte de D. Inês
de Castro, que foi degolada em 7 de Janeiro de 1355, nos paços de
Santa Clara, em Coimbra, numa ocasião em que o infante estava
ausente. Este não acatou a justiça mandada fazer pelo rei e decla-
rou-se em revolta. Durante meses, o País foi assolado pelas tropas
do infante, formadas sobretudo de nobres portugueses e galegos (entre
estes últimos, os Castros). Chegaram a cercar o Porto durante duas
semanas, cobiçosos das riquezas dos moradores. Estes defenderam-se
colmatando as brechas das muralhas com os pendões das naus que
estavam ancoradas no Douro. O estranho pormenor, revelado pelo
Livro de Linhagens do Conde D. Pedro, parece mostrar a adesão das
forças populares à causa do rei.
O conflito terminou por uma reconciliação: «E vendo os povos
de Portugal os estragos da terra disseram que se conviessem, se não
que os não podiam sofrer.» Esta passagem de Acenheiro (que traba-
lhou sobre papéis anteriores) parece indicar a exigência das forças
populares no sentido do restabelecimento da paz.
Apesar de todos os perdões solenemente jurados, D. Pedro, logo
que subiu ao trono, conseguiu que o rei de Castela lhe entregasse os
conselheiros de D. Afonso IV que tinham decidido a morte de Inês
e fê-los executar com rigor atroz, que impressionou os contemporâ-
neos. Em 1360 anunciou formalmente que chegara a casar secreta-
mente com Inês de Castro e, pela mesma ocasião, mandou construir

172
MI;:TODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

os monumentais túmulos de Alcobaça, que são os mais notáveis exem-


plares de arte tumular existentes em Portugal. Logo que ficou con-
cluído o que se destinava a Inês de Castro, realizou-se a trasladação
desde Coimbra.
Estes factos - o desvario amoroso do infante, o conflito com
o rei, a imolação de Inês à razão política, a solidariedade de uma
grande parte da nobreza, a guerra civil, a ferocidade da vingança,
a pompa da trasladação, a própria grandeza e valor artístico dos
túmulos - fizeram nascer uma lenda de origem provavelmente eru-
dita, mas que não tardou a passar às camadas populares. Nessa lenda
incluíam-se pormenores sem qualquer fundamento, como o da coroa-
ção e do beija-mão do cadáver. Ficaram célebres a peça de António
Ferreira A Castro e sobretudo as comovidas estrofes d'Os Lusíadas,
que contribuíram muito para a popularização e internacionalização
do episódio. Só em língua italiana foram recenseados, no início deste
século, cento e vinte e seis composições musicais ou baléticas sobre
o tema. Da literatura passou ao cinema e às artes plásticas e deixou
profunda marca no teatro de origem popular.

173
APÉNDICE

Textos literários galegos

ADVERT~NCI. Todos os textos foram normativizados nos aspectos orto-


gráfico e morfológico; respeitou-se, em troca, o léxico.

1) uOs teus olhos»,


por Curros Henríquez

Tem a sereia o canto, Buscam os pito-reis


e a serpe o alento i pra fazer ninho
o lago tem a onda, a herva santa que Dace
Deus tem o inferno. beira dos rios.
Ti tés avondo Eu busco s610
CD que tés escondido umha mirada meiga
nesses teus olhos. desses teus olhos.

o trono dos monarcas, Cando se pom a lua


do sábio os triunfos, trás dos penedos,
a glória do poeta, choram as estrelinhas
o ouro do mundo: todas do céu;
dera isso todo tamém eu choro
por só umha mirada cando nom me alumiam
desses teus olhos. esses teus olhos.

OBSERVAÇOM. S610 é castelhanismo por só.

2) «o negrinho
Panchito»,
por Castelao

Chegou das Américas um home rico e trouxo consigo um negrinho cubano,


como quem trai umha mona, um papagaio, wn fonógrafo . ..

175
JOSJ1:-MARTINHO MONTERO SANTALHA

o negrinho foi medrando na aldeia, onde aprendeu a falar com enxebreza,


a pontear moinbeiras, a botar aturujos abrouxadores.

Um dia morreu o home rico e Panchito trocou de amo para ganhar o pam.
Co tempo fixo-se moço comprido, sem mais chatas que a sua cor.. Ainda que
era negro como o pote, tinha graça avondo para ,fazer~s querer de todos.
Endomingado, com um craveI enriba da orelha e umha pola de malva na cha-
queta, parecia talmente um moço das festas.

Umha noite de estrelas xurdiu no seu magim a ideia de sair polo mlU1do
à cata de riquezas. Tamém PancWto sentiu, como todos os moços da aldeia, os
anseios de emigrar. E umha manhá de muita tristura gaveou polas escaleiras
dum transatIántico.

Panchito ia caminb.o da Havana e os seus olhos molhados e brilhantes escul-


cavam no m.ar as terras deixadas pola popa.
Numha rua da Havana o negro Panchito tropeçou cum bome da sua aldeia
e confessou-lhe saloucando:
- «Ai!, eu Dom me afago nesta terra de tanto sol; eu nom me afago com
esta gente. Eu morro!»
Panchito retornou à aldeia. Chegou pobre e endével; pero trouxo muita
fartura no coraçom. Tamém trouxo um sombreiro de palha e mais um traje
branco ...

3) «A brêtema»,
por Noriega Varela

A brêtema, tu sabes?, é ceguinha:


os pinheirais pouco a pouco explora,
e anda sempre descalça, e, se se espinha,
sangrar, nom sangra, pero chorar, chora.
Chora copiosamente a pobrezinha!:
como chorou Jesus, cal chora a aurora;
e em maos do sol é cada lagrlminha
derramada, umha estrela brilhadora .
Lagrlminhas preciosas! Recolhê-Ias
mil vezes se me ocorre, pra com elas
fazer ... (se já nom sonho, que eu faria?).
Umha sarta me pedes? Lograrei·na,
como um rei a quixera pra umha reina,
como nunca se viu na joiaria.

OBSERVAÇONS. O soneto está dedicado polo poeta à sua filha nena.


Pra é variante popular e poética de para, forma normativa para a língua culta.
Reina é castelhanismo; o vocábulo galego correspondente é rainha.

176
MJ;:TODO PRATICO DE LíNGUA GALEGO·PORTUGUESA

4) «Castelhanos de Castela»,
por Rosalia Castro

Castelhanos de Castela,
tratade bem aos galegos:
cando varo, varo como rosas;
cando vem, vem como negros! .

Permita Deus, castelhanos,


castelhanos que aborreço,
que antes os galegos morram
que ir a pedir-vos sustento.
Pois tam mau coraçom tendes,
secos filhos do deserto,
que se amargo paro vos ganham,
dades-lho envolto em veneno.
Alô vam, mal-pecadinhos,
todos de esperanças cheios,
e volvem, ai!, sem ventura,
com um caudal de desprezos.
Vam pobres e tornam pobres,
varo saos e tornam enfermos,
que anque eles som como rosas,
tratade-Ios como a negros.
Castelhanos de Castela,
tendes coraçom de aceiro,
alma como as penas dura,
e sem estranhas o peito!

5) «Peito de Lobo)),
por Castelao

Ainda eu era estudante cando se criou no meu magim a ideia de fazer um


cabeçudo, e como na mocidade todo semelha ledo e fazedeiro, busquei o tipo
mais laido da vila para que todos os vizinhos escachassem de rlsa, sem fazer·me
cargo da minha falha de caridade.
TrabaJ;hel de fiI1J1le para rematar a obra, que já era soada, polo meu
crédito de manhoso, e já figurava em letras de molde no programa de festas.
E chegou o dia. Na praça nom colhia umha agulha. No adro da igreja um
rapaz toco portava um feixe de foguetes debaixo do braço, e o fogueteiro
soprava na mecha, agardando a primeira badalada das doze.
De súpito tangerom os sinos, estalarom os foguetes e umha «bem afinada
banda» rompeu a tocar. A cousa já nom Unha remédio. Saiu o meu cabeçudo

177
12·a
JOSe-MARTINHO MONTERO SANTALHA

e DO mesmo intre a gente escachou a rir, como fazia nas comédias dos
tltiriteiros.
- ~ Peito de Lobo! ~ Peito de Lobo!.
E eotom mun curnmcho da praça xurdlrODl chios ferintes de mulheres que
Dom davam atafegado wn omeio que chegou a mim como um tremer de terra.
Era Peito de Lobo que queria esnaquizr~o: ao cabeçudo e mais a mim.
Co medo que papei nom pudem gorenté\r o carneiro da festa. A cousa
nom era para menos. Peito de Lobo nunca quixo ponher-Ihes Mao aos filhos por
medo de romper-lhes os ossos, e contam que umha vez, querendo botar wn
barco ao mar, afundiu-Ihe o costal co lombo. Era m.uito home para mim, que
já me sentia desfrangulhado nas suas poutas de ferro.
No remate da comida, e cando minha mal começava a dar graças a Deus
por tanto bem como DOS dera, velai aparece diante de mim a mulher de
Peito de Lobo.
- «Pois ... eu venho-lhe dizer que se garde do meu home! Você é o pecado,
senhor! Eu já lhe perguntei: «Pero ti, home, onde te puxeche para que te
tirasse tam bem?» E o pobre Dom fal mais que dizer: «As espulhas hei-DIas dar
eu a e1!. Porque, mire, senhor, o que mais o magoou foi que lhe imitasse as
espulhas do nariz».
Aquela tarde limpei de espulhas o nariz do cabeçudo. Peito de Lobo, preso
na casa pola sua mulher e polo medo de matar um home, acochou-se cedinho,
olhando desde o leito como os foguetes de luzes tingiam de prata, ouro, verde
e rosa as paredes encaleadas, escuitando o som esvaído da música e o estourar
dos fogos. E canso de bulir no leito, quedou·se como um santo.
Passarom meses e um bom dia atopei-me com Peito de Lobo no peirao da
ribeira. Em canto puxo os olhos em mim virou-se de costas e chantou a
mJrada no mar. E julgando que já nom queria comer-me os angominhos, arris-
quei-me a falar-lhe. E despois dumha léria raposeira quedamos amigos.
No segundo ano, Peito de Lobo apanhou tal carpanta de anis escarc.hado
que bailou co cabeçudo da praça, e dava-lhe bicos e apertas, e chamava-lhe::
«meu Innaozinho».
No terceiro ano, saiu o cabeçudo com espulhas no nariz, cousa que fixem
por mandado do mesmo Peito de Lobo.
Desde entom o meu amigo considerou-se um pouco imortalizado.
Fugirom os anos e fugirom as sardinhas para os jeiteiros. Peito de Lobo
envelheceu de tempo e de fame. As festas vinherom a menos, como os quinhons
dos marinheiros; mas o cabeçudo ainda saía, wn pouco estragado polos tratos
ruins que lhe dava o sacristám.
Fai dous anos, estava um forasteiro olhando o cabeçudo, com esse olhar
dos que vam às festas e Dom se divertem, cando Peito de Lobo achegou-se a el,
passenJnhamente, e dando-Ihe co côvado deitou quedinho na sua orelha:
- «Fixe--se no cabeçudo e repare em mim: o cabuço som eu».
Como se nacesse destinado a ser umha cabeça grande de cartom, Peito de
Lobo olhava no cabeçudo a sua forteza passada, a sua esvaída popularidade.

178
M-':TODO PRATICO DE LíNGUA GALEGO-PORTUGUESA

o cabeçudo Dom volveu a sair. O sacristám puxo enriba da cabeça de cartom


o tumbo dos defuntos, e coa humidade do inverno aplacou-se e quedou esma-
gada. Peito de Lobo tampouco volveu a sair. Um «ar de felesia. deixou-no toUleito,
e cumpre dizer-vos que lhe deu o mal DO mesmo intre em que o cabeçudo foi
vencido polo tumbo ...
O ano delTadelro passei diante da casa de Peito de Lobo. Que tristura me
deu! Estava no balcom, sentado, semelhante a um monifate de fan-apos, encos-
tado no corpo vivo da sua companheira. De passada saudei-no com agarlmo.
Peito de Lobo mirou-me com olhos de peixe podre, e a sua mulher dixo-me com
bágoas nos olhos:
- «Alá se foi o cabeçudo, senhor!»

6) «Um adeus a Mariquinha»,


por Curros Henríquez

Como ti vás pra longe Di~lhes que pra os seus lares


e eu vou pra velho, tomem aginha:
um. adeus, Mariqulnha, que sem eles Dom querem
mandar-che quero, pintar as vinhas,
que a morte é o dianho regar os regos,
e anda rondando as telhas madurar as castanhas
do meu telhado. nos castinheiros.

Cando deixes as costas Di-lhes que nom hai Terra


da nossa Terra, melhor que a nossa,
nem luz nem poesia mais ridentes paisages,
quedará nela. mais frescas sombras,
Cando te vaias, mais puros céus,
vai-se contigo o anjo nem lua mais luzente
da minha garda. no firmamento.

Pombinha mensageira Di-lhes que suas obrigas


de branca pluma, aqui os esperam,
faJa·lhe aos enrlgrados e, se onde elas nom morrem,
da pátria sua. que se condenam! ...
DI·lhes, mimosa, E agora voa,
que deles apartada pombinha, e que te guie.
Galiza chora. nossa Senhora.

179
JOSI!:·MARTINHO M ONTERO SANTALHA

7) (tIlhas dos m.ares arábigos»,


'p or Alvaro Cunqueiro

Gutor, Babarom e Taprobana som três ilhas que nom hai, e estám entre
Bengala e ilha Java.
Gutor nunca se viu, e nom se sabe quem a batizou, pero a oitenta léguas
de Cambetum hai que dar umha virada a SE para passá.la, e os que se riem
de nós os senhores pilotos de Arábia por fazer esta reveréncia, nom se precatam.
de que Dom haverá ilha, pero hai o Dome e o erre em que remata é rasgueado,
e poderá Dom chocar um coa ilha, pero pode perder-se contra o nome, que
esse ninguém o nega.
Babarom é umha ilha que está escondida. Escondeu-se de seu, numba baía
bengali, por jogar co primeiro piloto dos aráblgos, Sidi Abdalá Altanabi, e caiu
o seu escondite na saída dum rio mui herveiro, e medrarom arredor da ilha
hedras e junqueiras, até cingi·la de todo, e agora está ali presa e nom pode
volver ao seu assento. Bastariam dez homes com foucinhos umha manhá para
ceivá-Ia, pero ninguém ousa, que baixando a ilha a Malaca, faria reverter o mar
e muitas vilas que agora hai ficariam sob as águas. Pero isso si, a Babarom
tamém se lhe respeita o seu sítio no mar, e cada sete anos, para interromper
a possessom, os plIotos temos que ensaiar que chegMIlos a Babarom e trafi-
camos. Fai·se urnha feira no mar e tiram-se foguetes.
Taprobana nom é que propriamente nom a haja; o que passa é que é nave-
gante, e hoje está aqui e manhá acolá, e se vás coa tua nau e ela está fora do
seu sítio do mapa, aparta-se e tam aginha as mais das vezes que nem se chega
a ver, agás que seja noite, que dá luzes; nom incomoda nada no mar a ilha
Taprobana. Pero se vás coa tua nau e te metes onde diz o mapa que cai, vem
ela e pom-se no seu acougo, e entom embarrancas, e tenhem-se dado casos que
naus já iam tam metidas no assento de Taprobana , e a ilha nom as vira porque,
ponho por caso, havia brêtema de cedo, que vindo Taprobana a assentar-se
rapidamente ao precatar-se, aparecerom no cwne dos montes, ou na praça dumba
vila, ou numba arrozeira, e entom o rei de Taprobana queda-se com todo o que
leva a nau e manda açoutar o pUoto. Assi que hai que navegar entre Columbo
e Malaca como se a ilha Taprobana estivesse no seu cum farol aceso.

8) «Cada esp'rito é um paxaro prisioneiro»,


por Eduardo Pandal

Cada esp'rito é wn paxaro prisioneiro


que canta a sua prisom, e saudoso
recorda o seu fogar, o seu rueiro
e o seu bosque nativo e silencioso;
cada home é um triste viageiro,
da dura e longa ruta pesaroso;

180
Ml!:TODO PRATICO DE LtNGUA GALEGO·PORTUGUESA

um átomo que Inqieto forcejeia


por quebrantar a bárbara cadeia.
Muito sua e suporta, e cal paciente
e xíbaro camelo que marchando
vai do Saara o areal ardente,
a sua grave carga suportando,
el vai, e vai suando impaciente
nom sei que vagas cousas recordando:
el vai sonhando 'CUDlha fonte pura
que calme a sua sede áspera· e dura.

9) «A sinha Sinforosa»,
por Cas telaa

Todos cantos sabiam algo da história da vila em que eu nacim, já repou-


sam debaixo dos terrons.
Asinha Sinforosa era umba velhinha que todos os dias passava o mar,
porque era mandadeira de ofício, como já fora sua mai e sua avoa e quiçá todas
as suas devanceiras, desde que os da banda de aeá tiverom comércio cos
da banda de alá. Era honrada, ou parecia sê-Io, pois vivia do seu crédito de
mulher de bem. Engaioleira e faladora com todos, tinha sempre para a gente
fidalga um cravei na sua boca chuchada.
A sbtha Sinforosa sabia todas as tragédias do mar naquela travessia.
Nos dias de tempo ruim, cando funga o vento nas cordas e os saIs·e iros
varrem a coberta do barco, asinha Sinforosa metia-se em si e rezava pola
sua alma.
Nos dias mainos asinha Sinforosa rezava polos afogados. O barco ia
andando cara a banda de alá, e a mandadeira ia rezando sempre:
- «Um pai-nosso polo Joám de Codesso, que morreu afogado um dia da
Candelária».
- (tUmba salve por dona Rosário Fajardo, que se botou a afogar na ponta
da Falcoeira».
- «Um pai-nosso, umha salve e umha ave-a:naria polas catro filhas do BeIu-
rico que morrerom de volta do mercado».
_ «U.mha. salve por Ramom Colhaço, que o levou um congro e nunca mais
apareceu».
Assi seguia rezando, rezando sempre, por todos cantos morrerom naquel
caminho do mar. A velha mandadeira gardava na memória os nomes dos afo..
gados e as datas das tragédias.
Um dia reparei que asinha Sinforosa rezou «por um rapazinho que morreu
em Tronco», e perguntei-lhe:
- «Quem foi o rapazinho que morreu em Tronco, sinha Sinforosa?»

181
JOSÊ-MARTINHO MONTERO SANTALHA

E ela respondeu-me:
- «Nom o sei, meu amantinhoj esse afogado !110m é do meu tempo, pois
Já rezava por el a defunta de minha avoa, que no céu esteja».
Asinha Sinforosa morreu já, e de tantas tragédias nom quedam mais que
três ou catro cruzes de madeira chantadas nas pedras da beiramar. A velha
mandadeira levou ao Além a história de todos os afogados da vila em que
eu nacim.
Umha vez que atravessei o mar, sentim dentro do meu peito o balelro de
tanto esquecbnento, e em nome de todos os afogados preguei:
- «Um paio'n osso pola sinha Slnforosa».

OBSERVAÇONS. Sinha é variante popular de senhora, usada só como


tratamento de cortesia ou reverência imediatamente antes dum nome. Preguei,
de pregar 'rezar, orar, rogar', é vocábulo arcaizante; existe tamém outro pregar
co significado de 'predicar'.

10) d..éllas ao teu ouvido.,


por Ferrnim Bouça-Brei

o pomarlnho da noite quer frutificar estrelas;


o tanger desta cantiga é o sinal para ace:ndê--las ...
- ai, meu amor!-
... é o sinal para acendê-las.
Agarda-nos na ribeira, ~b o descordo do mar,
no seio dos cons, o leito de hervinhas de namorar ...
- ai, meu amor! -
... de hervinhas de namorar.
As nove ondas do sonho espreitam co seu engado
pra enguedelhar a toleira desta noite de noivado,.
- ai, meu amor!-
... desta noite de noivado.
Assi, ao fontegal da esp'rança, antes de que saJa o dia,
Iremos enguedelhados catar a flor da 'á gua fria ...
- ai, meu amor!-
... catar a flor da água fria.
Ao além!, que no pomarlnho madurecem os luzelros;
nossos dous coraçons bailam tolos nos ledos torreiros
- ai, meu amor! - .
No lavradio das ondas alveia a flor do luar,
lámpada para o teu leito de hervinhas de namorar
- ai, meu amor! - .
Se algum mau fado nos fere, axotaremos o mal
a bicos, oh caraminha dum virgem caraminhal ...
- ai, meu amor!-
... dum virgem caranúnhal.

182
Mg;TODO PRATICO DE L1NGUA GALEGO-PORTUGUESA

11)
por Amado Carvalho

A lua é velhhlha, Envolveita em névoas


de brancos cabelos, há-se de abrigar,
de rugas de ouro pois como vai velha
e de oIhinhos cegos. tem-se que cuidar.
Ergue-se do leito Cando na alta noite
das foulas do mar broa o temporal,
palpando os espaços a lua entre as trevas
para caminhar. tapa-se a tremar.
Anda polo mundo E, assi que o mau tempo
sem ver aonde vai, amainando vai,
pois as estrellnhas assoma a fadana
levam-na da mao. e espalha o luar.

OBSERVAÇOM. Tremar é vocábu lo algo castelhanizado; a forma galega


é tremer.

12) «No mar havia um afogado»,


por Castelao

No mar havia wn afogado e a vila marinheira ensumira-se no siJéncio


e na tristura.
Amainara o vento, acougara o mar, triwúara o sol no céu. E a vila nom
acordava nem queneia, como se ainda fosse noite, como se as gentes mario
nheiras refusassem as regallas de Deus. A luz do dia embaçada polas angústias
da tragédia .
No mar encalmado iam e vinham os barcos em procura do corpo de Ramo~
Na igreja da vila umba mulher e um rapazinhO choravam diante do Cristo
milagreiro.
Assi decorreram oito dias no slléncio e na tristura.
E umha manhá atracou ao pelrao da ribeira o barco que portava o corpo
de Ramom.
A vila chorou de jeito arrepiante, e com mostras de fonda dor soterrarom
no adro da igreja o corpo do afogado.
E cando Ramom ficou na companha de todos os mortos da freguesia, a
vila alentou forte, reviveu com esperança, e as gentes volverom a cantar no
seu trabalho quotidiano.
A terra nom quer perder o corpo que nos empresta e os marinheiros tamém
obedecem os seus mandados, porque tamém som de terra. Se assi nom fosse, que
melhor leito para um rnarinheil'o que o fondo do mar!

183
JOSt=;-MARTINHO MONTERO SANTALHA

13) drmaos galegos!»,


por Ramom Cabacilhas

Irmaos!, lrmaos galegos!: Ergamo-nos sem medo!


desde OrtegaI ao MInho Que o lume da tojeira
a folha do foucinho envolva na fogueira
fagamos rebrllhar! o paço senhorial!
Que veja a vila podre, Já o fato de caciques,
coveira da canalha, ladrons e hereges, fuge
à aldeia que trabalha ao redentor empuxe
disposta pra lultar. da alma regional.
Antes de ser escravos, Antes de ser escravos,
lrmaos!, irmaos galegos!, irmaos!, imtaos galegos!,
que corra o sangue a regos que cOITa o sangue a regos
desde a montanha ao mar! desde a montanha ao valI

OBSERVAÇOM. Fuge é forma casteLhanizante, imposta aqui pola rima;


o correcto é foge.

184
íNDICE

PROLOGO . ... 7

1. A GRAFIA lh II
1.1: Por que lh e nom II li
1.2: Leitura de IIz 12
1.3: Exercícios para a leitura de lh 12
1.4: Escritura de lh I3
1.5: Exercícios para a escri lUTa de lh 14

2. A GRAFIA nh ... 15
2.1: Por que nh e nom n 15
2.2: Lei tUTa de nh ... 16
2.3: Exercícios para a leitura de nl1 16
2.4: Escritura de nl1 ... 17
2.5: Exercícios para a escritura de nh 17
2.6: Exercícios para a leitura de ll1 e nh conjuntamente 18
2.7: Exercícios para a escrita de lh e nl1 conjuntamente 18

3. A GRAFIA -ln FINAL DE VOCÁBULO 19


3.1 : Por que -m e nom ~n ... 19
3.2: Leitura de -m final 20
3.3: Exercícios para a leitura de -ln ... 20
3.4: Escritura de -m 21
3.5: Exercícios para a escrita de -ln ... 22
3.6: Exercícios para a leitura de lh, nh e -m conjuntamente 22
3.7: Exercícios para a escrita de lh, nlz e -ln conjuntamente 22
3.8: Texto literário: «Carvalhinbo torto», por Eduardo Pondal ... 23

4. A GRAFIA -mh- 25
4.1: Por que mh 25
4.2: Leitura de mh 25

185
JOSt: ~M.ART INHO MONTERO SANTALHA

4.3: Exercícios para a leitura de mh 26


4.4: Escritura de mh 26
4.5: Exercícios para a escrita de mh 26
4.6: Exercícios para a leitura de lh, mh, ·m e mh conjuntamente ... 27
4.7 : Exercícios para a escrita de lh, nh, -m e mh conjuntamente 28
4.8: Repasso: exercícios de leitura ... ... ... ... ... 29
4.9: Texto literário: «No ninho novo do vento», por Alvaro Cunqueiro 31

5. ACENTUAÇOM DAS PALAVRAS TERMINADAS EM DITONGO CRE-


CENTE (p.e.: séria) 33

5.1: Por que acentuar séria, etc. 33


5.2: Os encontros vocálicos 34
5.3: Exercícios de leitura 35
5.4: Escritura ... . .. 37
5.5: Exercícios de escritura 38

6. VOCABULOS QUE NOM PRECISAM ACENTO GRAFICO (p.e.:


alegria, ali, perdom) 39

6.1: Aforrar acentos 39


6.2: Exercícios de leitura 41
6.3: Exercícios de escritura. 44
6.4: Texto literário: «A um batido, outro batido», por Rosalia Castro 44

7. OS DOUS VALORES FÓNICOS DO x 45

7.1: A letra x ... ... 45


7.2: Exercícios de lei tura 46
7.3: Emprego do x com valor palatal 47
7.4: Exercícios de escritura 50

8. OS SIGNOS DE INTERROGAÇOM E EXCLAMAÇOM 51

8.1: Uso em fim de frase 51


8.2: Exercícios de leitura ... 52
8.3 : Exercícios de escritura 53
8.4: Texto literário: «De balde ... », por Rosalia Castro 53

9. O TRAÇO DE UNIOM COS PRONOMES ENCLlTICOS 55

9.1: Por que usar o traço ... 55


9.2: O emprego do hifem 56
9.3: Exercícios de leitura 58
9.4: Exercícios de escritura. 59

186
!.UTODO PRÁTICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

10. AS LETRAS b E v: O SEU USO 61


10.1 : v intervocálico 61
10.2: Leitura e escri tura de b e v 62
10.3: Exercícios de leitura ... 63
10.4: Exercícios de escritura 68
10.5: Texto literário: «Cando era tempo de inverno», por Rosalia
Castro ... 68

II. O SUFIXO -vel E O SEU PLURAL -veis 69


11.1: -vel, nom -ble 69
11.2: Exercícios de leitura ... 69
11.3: Exercícios de escritura 70
11.4: Texto literário: «Cantigas populares» 71

12. A LETRA h 73
12.1: Em posiçom inicial e final 73
12.2: Em interior de palavra 73
12.3 : Exercícios de lei tura ... 74
12.4 : Exercícios de escritura 75

13. O ACENTO CIRCUNFLEXO (ê, ô) 77


13.1: Vogais abertas e fechadas 77
13.2: Uso do acento circunflexo 78
13.3: Exercícios de leitura ... 79
13.4: Escritura . ... . .. 80
13.5: Exercícios de escritura 81

14. O ACENTO GRAVE: à, às 83


14.1 : à, às 83
14.2: Exercícios de leitura ... 84
14.3: Uso de à ... 84
14.4: Exercícios de escritura 85

15. USO GRAFICO DE g ANTE e OU i, E DE i 87


15.1: Por que ge, gi, e i 87
15.2: Leitura de ge, gi, e de i 88
15.3: Exercícios de leitura . 88
15.4: Escritura de ge, gi e de i 91
15.5: Exercícios de escritura 95
15.6: Textos literários: 1) «O gaio •. por Luís Amado Carvalho; 2) «As
flores», por Castelao; 3) «Laverquinha», por Noriega Varela 96

187
JO~-M.ARTINH MONTERO SANTALHA

16. USO DA LETRA z 99


16.1: z ante e, i 99
16.2: Leitura de ze, zi 100
16.3 : Exercícios de leitura ... 101
16.4: Escritura de ze, zi 102
16.5: Exercícios de escritura 103
16.6: Texto literário: «O foguete», por Amado Carvalho ... 104

17. A CEDILHA (ç) 105


17.1: ça, ço, çu 105
17.2: Leitura de ç 106
17.3: Exercícios de leitura .. . 106
17.4: Escritura da cedilha .. . 107
17.s: Exercícios de escri tura 107
17.6: Textos literários: 1) «Alguns dim: 'Minlla terral '», por Rosalia
Castro; 2) «A marquesinhaD, por Castelao; 3) «Caminho
longo», por Ramom Cabanilhas ... ... ... ... . .. 108

18. A GRAFIA ·ss- ... . .. 111


18.1: -$S- intervocálico 111
18.2: Leitura de -ss- 111
18.3: Exercícios de leitura ... 112
18.4: Escritura de -5S- ... . .. 113
18.5: Exercícios de escritura 113
18.6: Textos literários: 1) «A desgraça», por Rosalia Castro; 2) «Num
porto do norte», por Castelao; 3) «Ai ... !», por Curros
Henríquez; 4) «A vaca». por Castelao; 5) «Negra sombra ».
por Rosalia Castro ... ... o o' o" ••• ••• • o o 114

19. OS SUFIXOS -çom, -som, -xom ... 119


19.1: Sem i 119
19.2: Exercícios de leitura o" 120
19.3: Exercícios de escritura 122
19.4: Textos literários: 1) «Hino galego» (<<Os pinheiros»), por
Eduardo Pondal; 2) «Galiza , naçom», por Castelao; 3) «As
florinhas dos tojos». por Noriega Varela; 4) «Língua franca
galaico-portuguesa», por Rafael Dieste; 5) «Madrigal à
cidade de Santiago», por Federico Garcia Lorca ... 122

• 20. O USO GRAFICO DE qu- ... 125


20.1: Qu- com u pronunciado 125
20.2 : Exercícios de leitura . 126

188
MJ;:TODO PRÁTICO DE LtNGUA GALEGO-PORTUGUESA

20.3: Exercícios de escritura ... ... ... ... ... ... . .. 127
20.4: Textos Literários: 1) «Rosa de cem folhas», por Rosalia Castro;
2) «O pinheiro devoto», por Castelao; 3) «O pôr do sol»,
por Rosalia Castro; 4) «o sapinho», por Victoriano Taibo;
5) .0 sol da liberdade. , por Manuel-António 128

21. LEITURA GALEGA DE TEXTOS LUSO-BRASILEIROS 131


21.1: Generalidades . 131
I) Preámbulo 131
2) Princípio fundamental: pronúncia galega 132
3) 1ndice de peculiaridades luso·brasileiras ... 132

21.2: Peculiaridades ortográficas 133


1) Uso do acento circunflexo sobre a: â 133
Exercícios de leitura 134
2) Uso do til ... ... ... .. . 135
a) a terminaçom -ão .. . 135
b) as demais terminaçons com til (-ã, -ãos, -ãs,
-ães, -ões) 137
Exercícios de leitura 138
21.3: Peculiaridades morfológicas ... 141
I) Princípio geral: «pronúncia ortográfica» 141
2') Lista de peculiaridades da área luso-brasileira 142
Exercícios de leitura 144
21.4: Outras peculiaridades. 148
21.5 : Textos luso-brasileiros para ler: 150
1) «As queimaduras», por R. da Fonseca 150
2) «Noticias breves» ... ... . .. 153
3) Eça de Queirós, A aia ... ... ... ... 158
4) «Lingua portuguesa», por Rodrigues Lapa 162
5) Miguel Torga, A confissão ... ... 166
6) «Inês de Castro», por José Rennano Saraiva 170

APE.NDICE: TEXTOS LITERARIOS GALEGOS 175

1) «Os teus olhos», por Curros Henríquez 175


2) «O negrinho Panchito», por Castelao 175
3) «A brê tema», por Noriega Varela ... 176
4) «Castelhanos de Castela», por Rosalia Castro 177
5) . Peito de Lobo. , por Castelao... ... 177
6) «Um adeus a Mariquinha», por Curros Henríquez 179

189
JOS:2-MARTINHO MONTERO SANTALHA

7) «Ilhas dos mares arábigos», por Alvaro Cunqueiro UsO


8) _Cada esp'rito é um paxaro prisioneiro., por Eduardo
Pondal ... 180
9) .A sinha Sinforosa., por Caslelao ... 181
10) «l..élias ao teu ouvido», por Fermim Bouça-Brei 182
11) .Lua., por Amado Carvalho ... 183
12) .No mar havia um afogado., por Castelao 183
13) drmaos galegos!., por Ramom Cabanilhas 11!4

190
Esta obra, Método Prático de Língua Galego-Portuguesa,
foi composta1 impressa e brochada
fias Oficinas Gráficas de
Barbosa & Xavier, Lda. - Braga (Portugal).
Iniciada a composiçom aos 15 de Abril de 1983,
acabou de imprimir-se aos 23 de Agosto do mesmo ano.

Na execuçom gráfica deste livro colaborarom:


na compos;çom, Adelino Neves Rodrigues;
na paginaçom. Manuel Moreira;
na impressom, António da Silva Ferreira; e
na encadernaçom, José de Araújo.

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