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UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS

DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA AMBIENTAL

GRS137 – CONTROLE AMBIENTAL

Material didático

REO-02

Parte 2

Prof. Ronaldo Fia

Lavras
2020/II
1. TRATAMENTO SECUNDÁRIO

1.1. Introdução

O principal objetivo do tratamento secundário é a remoção da matéria orgânica. Esta se apresenta nas
seguintes formas:
- matéria orgânica dissolvida (DBO solúvel ou filtrada), a qual não é removida por processos
meramente físicos, como o de sedimentação, que ocorre no tratamento primário;
- matéria orgânica em suspensão (DBO suspensa ou particulada), a qual é em grande parte removida no
eventual tratamento primário, mas cujos sólidos de sedimentabilidade mais lenta persistem na massa líquida.

Vários processos de tratamento secundário são concebidos de forma a acelerar os mecanismos de


degradação que ocorrem naturalmente nos corpos receptores. Assim, a decomposição dos poluentes
orgânicos degradáveis é alcançada, em condições controladas, em intervalos de tempo menores do que nos
sistemas naturais.
A essência do tratamento secundário dos efluentes é a inclusão de uma etapa biológica. Enquanto nos
tratamentos preliminar e primário predominam mecanismos de ordem física, no tratamento secundário a
remoção da matéria orgânica é efetuada por reações bioquímicas, realizadas por micro-organismos.
Uma grande variedade de micro-organismos toma parte no processo: bactérias, protozoários, fungos e
outros. A base de todo o processo biológico é o contato efetivo entre esses organismos e o material orgânico
contido nos esgotos, de tal forma que esse possa ser utilizado como alimento pelos micro-organismos. Os
micro-organismos convertem a matéria orgânica em gás carbônico, água e material celular (crescimento e
reprodução dos micro-organismos). Em condições anaeróbias tem-se também a produção de metano. A
decomposição biológica do material orgânico requer a manutenção de condições ambientais favoráveis, como
temperatura, pH, tempo de contato (tempo de residência hidráulica) e outros e, em condições aeróbias,
oxigênio.
O tratamento secundário inclui as unidades do tratamento preliminar, mas pode ou não incluir as
unidades do tratamento primário. Existe uma grande variedade de métodos de tratamento em nível
secundário, sendo que os mais comuns são:
- Reatores anaeróbios e variantes
- Lagoas de estabilização e variantes
- Lodos ativados e variantes
- Reatores aeróbios com biofilmes
- Processos de disposição sobre o solo
1.2. Fundamentos da digestão anaeróbia
A digestão anaeróbia de compostos orgânicos é normalmente considerada um processo de dois estágios.
No primeiro estágio, um grupo de bactérias facultativas e anaeróbias, denominadas formadoras de ácidos ou
fermentativas, convertem por hidrólise e fermentação os compostos orgânicos complexos (como carboidratos,
proteínas e lipídios) em outros compostos (materiais orgânicos mais simples, principalmente ácidos voláteis).
No segundo estágio ocorre a conversão dos ácidos orgânicos, gás carbônico e hidrogênio em produtos finais
gasosos, o metano e o gás carbônico.
Embora o processo de digestão anaeróbia seja simplificadamente considerado como de duas fases, este
pode ser subdividido em quatro fases principais, como a Hidrólise, Acidogênese, Acetogênese e
Metanogênese.

Hidrólise
Uma vez que as bactérias não são capazes de assimilar a matéria orgânica particulada, a primeira fase no
processo de degradação anaeróbia consiste na hidrólise de materiais particulados complexos (polímeros), em
materiais dissolvidos mais simples (moléculas menores), os quais podem atravessar as paredes celulares das
bactérias fermentativas. Esta conversão de materiais particulados em materiais dissolvidos é conseguida
através da ação de exoenzimas excretadas pelas bactérias fermentativas hidrolíticas. Na anaerobiose, a
hidrólise dos polímeros usualmente ocorre de forma lenta, sendo vários os fatores que podem afetar o grau e a
taxa em que o substrato é hidrolisado:
- temperatura operacional do reator;
- tempo de residência do substrato no reator;
- composição do substrato (ex.: teores de lignina, carboidrato, proteína e gordura);
- tamanho das partículas;
- pH do meio;
- concentração de N-NH4+;
- concentração de produtos da hidrólise (ex.: ácidos graxos voláteis).

Acidogênese
Os produtos solúveis oriundos da fase de hidrólise são metabolizados no interior das células das
bactérias fermentativas, sendo convertidos em diversos compostos mais simples, os quais são então
excretados pelas células. Os compostos produzidos incluem ácidos graxos voláteis, álcoois, ácido lático, gás
carbônico, hidrogênio, amônia e sulfeto de hidrogênio, além de novas células bacterianas. Como os ácidos
graxos voláteis são o principal produto dos organismos fermentativos, estes são usualmente designados de
bactérias fermentativas acidogênicas.
A maioria das bactérias acidogênicas é anaeróbia estrita, mas cerca de 1% consiste de bactérias
facultativas que podem oxidar o substrato orgânico por via oxidativa. Isso é particularmente importante, uma
vez que as bactérias anaeróbias estritas são protegidas contra a exposição ao oxigênio eventualmente presente
no meio.

Acetogênese
As bactérias acetogênicas são responsáveis pela oxidação dos produtos gerados na fase acidogênica em
substrato apropriado para as bactérias metanogênicas. Dessa forma, as bactérias acetogênicas fazem parte de
um grupo metabólico intermediário, que produz substrato para as metanogênicas. Os produtos gerados pelas
bactérias acetogênicas são o hidrogênio, o dióxido de carbono e o acetato.
Durante a formação dos ácidos acético e propiônico, uma grande quantidade de hidrogênio é formada,
fazendo com que o valor do pH no meio aquoso decresça. Há, porém duas maneiras pelas quais o hidrogênio
é consumido no meio: i) através das bactérias metanogênicas, que utilizam hidrogênio e dióxido de carbono
para produzir metano; e ii) através da formação de ácidos orgânicos, tais como propiônico e butírico, ácidos
estes formados através da reação do hidrogênio com dióxido de carbono e ácido acético.

Metanogênese
A etapa final no processo global de degradação anaeróbia de compostos orgânicos em metano e dióxido
de carbono é efetuada pelas arqueas metanogênicas. As metanogênicas utilizam somente um limitado número
de substratos, compreendendo ácido acético, hidrogênio/dióxido de carbono, ácido fórmico, metanol,
metilaminas e monóxido de carbono. Em função de sua afinidade por substrato e magnitude de produção de
metano, as metanogênicas são divididas em dois grupos principais, que forma metano a partir de ácido
acético ou metanol, e o segundo que produz metano a partir de hidrogênio e dióxido de carbono.

Abaixo são apresentadas as principais vantagens e desvantagens dos sistemas anaeróbios.

1.2.1. Fatores que interferem na digestão anaeróbia

Temperatura
A degradação anaeróbia, dentro da faixa de temperatura mesofílica (25º a 45°C), tem sido amplamente
empregada nos sistemas em escala real, visto que a digestão anaeróbia termofílica (> 45°C) é de alto custo
(exceto quando a temperatura do efluente é naturalmente elevada). A digestão anaeróbia psicrofílica (< 20°C)
tem sido pouco utilizada, pois se acredita que essa não seja viável em decorrência da baixa atividade
microbiana sob condições de baixa temperatura. Embora sejam desejadas temperaturas mais elevadas para
que se obtenha maior desenvolvimento da flora microbiana, o mais importante é a manutenção de uma
temperatura uniforme dentro dos reatores, pois variações bruscas de temperatura podem provocar o
desequilíbrio entre as populações microbianas envolvidas, com consequente falha do processo.

pH, alcalinidade e ácidos voláteis


Estes três fatores estão intimamente relacionados, sendo de fundamental importância para a manutenção
do crescimento ótimo dos micro-organismos e dos processos de conversão nos sistemas anaeróbios.
As arqueas metanogênicas, principais responsáveis pela degradação do material orgânico contido nos
despejos, são mais sensíveis aos fatores ambientais e apresentam crescimento ótimo na faixa de pH entre 6,8
e 7,4. Já as bactérias produtoras de ácidos voláteis têm crescimento ótimo na faixa de pH entre 5 e 6.
Portanto, como a velocidade com que se processa a metanogênese é o fator limitante para que ocorra a
estabilização do material orgânico, o pH nos reatores anaeróbios deve ser mantido próximo ao neutro, para
impedir a predominância de bactérias produtoras de ácidos, o que poderia prejudicar todo o processo
bioquímico de transformação do material orgânico. A interação da alcalinidade com ácidos voláteis é
estabelecida pela capacidade da alcalinidade do sistema em neutralizar os ácidos gerados na digestão
anaeróbia e em tamponar o pH num eventual acúmulo de ácidos voláteis.

Nutrientes
O crescimento e a diversificação das populações microbianas em sistemas de tratamento relacionam-se
diretamente com a concentração de nutrientes, os quais fornecem material para síntese protoplasmática e
suprem a energia necessária para o crescimento celular.
O bom desempenho dos processos biológicos requer a disponibilidade de nutrientes essenciais para o
desenvolvimento microbiano, em proporções adequadas. Carbono, nitrogênio e fósforo são importantes
ingredientes para o crescimento da biomassa. Os requisitos nutricionais dos micro-organismos envolvidos em
processos anaeróbios são proporcionalmente menores, quando comparados aos requeridos em processos
aeróbios, pois a síntese celular envolvida nos primeiros é muito menor.

Toxicidade
As arqueas metanogênicas são particularmente sensíveis a uma grande variedade de constituintes tóxicos
presentes nos despejos agroindustriais. Os compostos tóxicos podem ter diferentes efeitos sobre os micro-
organismos, podendo ter ação bactericida, quando as bactérias não se adaptam a determinadas concentrações
do componente e morrem, ou bacteriostático, quando há retardo no desenvolvimento das mesmas, o que pode
ser alterado quando elas se adaptam às condições do meio.

1.2.2. Partida do sistema anaeróbio (start-up)


Período de partida é o tempo necessário para que os micro-organismos se adaptem as características
específicas da água residuária que está sendo tratada, de forma a se obter uma boa eficiência de remoção de
matéria orgânica, ou ainda, a partida de reatores anaeróbios pode ser definida como o período transiente
inicial, marcado por instabilidades operacionais. Basicamente, a partida pode ser conseguida de três formas
distintas:
 Utilizando-se lodo de inóculo adaptado a água residuária a ser tratada: A partida do sistema procede-se de
forma rápida e satisfatória, não havendo a necessidade de aclimatação do lodo;
 Utilizando-se lodo de inóculo não adaptado a água residuária a ser tratada: Nesse caso, a partida do
sistema passa por um período de aclimatação, incluindo uma fase de seleção microbiana;
 Sem a utilização do lodo de inóculo: Essa é considerada a forma mais desfavorável de proceder a partida
do sistema, uma vez que haverá a necessidade de se inocular o reator com os próprios micro-organismos
contidos na água residuária a ser tratatada. Como a concentração de micro-organismos no efluente é muito
pequena, o tempo demandado para a retenção e seleção de uma elevada massa microbiana pode ser bastante
prolongado (da ordem de 4 a 6 meses).

1.3. Filtro Anaeróbio


Filtros anaeróbios são tanques de forma cilíndrica (menores vazões) ou prismática de seção quadrada
(maiores vazões) com fundo perfurado (fundo falso), preenchidos com material inerte poroso que têm por
finalidade proporcionar tratamento anaeróbio complementar ao obtido em tanques sépticos.
O filtro anaeróbio é um dispositivo que faz parte da etapa de tratamento primário quando associado a
fossa séptica e da etapa de tratamento secundário quando antecede outras unidades de tratamento e utiliza o
método físico e biológico para remoção de poluente no tratamento de um efluente. É normalmente utilizado
em sistemas de tratamento de águas residuárias domésticas associados a um tanque séptico.
O sistema de tanques sépticos seguidos de filtros anaeróbios (também chamado de sistema fossa - filtro)
tem sido amplamente utilizado no meio rural e em comunidades de pequeno porte. O tanque séptico remove a
maior parte dos sólidos em suspensão, os quais sedimentam e sofrem o processo de digestão anaeróbia no
fundo do tanque. O filtro anaeróbio efetua uma remoção complementar de DBO.

No sistema de tratamento em filtros anaeróbios, a DBO é estabilizada anaerobiamente por bactérias


aderidas a um meio suporte, constituído por uma coluna de material inerte (geralmente brita nº 4),
acondicionada dentro do reator. O fluxo de líquido a ser tratado ocorre meio filtrante saturado e no sentido
ascendente, ou seja, a entrada é na parte inferior do filtro, e a saída na parte superior. Desta forma o filtro
trabalha afogado, ou seja, os espaços vazios são preenchidos com líquido e a carga de DBO aplicada por
unidade de volume é bastante elevada, o que garante condições anaeróbias e repercute na redução de volume
do reator - a unidade é fechada.
Dentre as vantagens apresentadas pelo sistema fossa-filtro anaeróbio é a boa adaptação aos diferentes
tipos e concentrações de águas residuárias e boa resistência às variações de carga. As principais desvantagens
são: a dificuldade em satisfazer padrões de lançamento muito restritivos, exigindo, dessa forma, a inclusão de
lagoa facultativa no sistema de tratamento, e o uso restrito para tratamento de águas residuárias contendo
baixas concentrações de sólidos em suspensão.
Por ser um sistema anaeróbio, sempre há o risco da geração de maus odores. No entanto, procedimentos
de projeto e operacionais podem contribuir para reduzir estes riscos.

1.4. Reator UASB (Upflow Anaerobic Sludge Blanket)
Os reatores anaeróbios de manta de lodo são também frequentemente denominados de Reatores
Anaeróbios de Fluxo Ascendente e Reatores Anaeróbios de Manta de Lodo (RAFA ou RALF).
Preferencialmente utiliza-se a sigla original: reatores UASB. Os reatores UASB constituem-se na principal
tendência atual de tratamento de esgotos no Brasil, seguidas de alguma forma de pós-tratamento ou
disposição direta no solo.
Nos reatores UASB, a biomassa cresce dispersa no meio, e não aderida a um meio suporte especialmente
incluído, como no caso dos filtros anaeróbios. A própria biomassa, ao crescer, pode formar pequenos
grânulos, correspondente à aglutinação de diversas espécies microbianas. Esses pequenos grânulos, por sua
vez, tendem a servir de meio suporte para outras bactérias. A granulação auxilia no aumento da eficiência do
sistema, mas não é fundamental para o funcionamento do reator, sendo mesmo difícil de ser alcançada no
tratamento de esgotos domésticos.
O líquido entra no fundo e se encontra com o leito de lodo, o que causa a adsorção de grande parte da
matéria orgânica pela biomassa. O fluxo do líquido é ascendente. Como resultado da atividade anaeróbia, são
formados gases (principalmente metano e gás carbônico), as bolhas dos quais apresentam também uma
tendência ascendente. De forma a reter a biomassa no sistema, impedindo que ela saia com o efluente, a parte
superior dos reatores de manta de lodo apresenta uma estrutura que possibilita as funções de separação e
acúmulo de gás e de separação e retomo dos sólidos (biomassa). Esta estrutura é denominada separador
trifásico, por separar o líquido, os sólidos e os gases. Sua forma é comumente de um tronco de pirâmide ou
cone invertido. O gás é coletado na parte superior, no compartimento de gases, de onde pode ser retirado para
ser aproveitamento (energia do metano) ou queimado diretamente.
Com a contínua entrada de alimento no reator, na forma de DBO, há um contínuo crescimento da
biomassa. Isto traz a necessidade de remoções periódicas de parte dessa biomassa (lodo), de forma a manter o
sistema em equilíbrio. No entanto, a produção de lodo nos reatores anaeróbios é bem baixa.
O risco da geração ou liberação de maus odores pode ser bastante minimizado através de um projeto
bem elaborado, tanto nos cálculos cinéticos, quanto nos aspectos hidráulicos. Uma característica do processo
é a limitação na eficiência de remoção da DBO, a qual situa-se, em média, em tomo de 70%, inferior,
portanto, à maioria dos outros processos. Isto não deve ser considerada uma desvantagem em si, mas uma
característica do processo. Resumindo, dentre, as vantagens que podem ser listadas no uso deste sistema
destacam-se os relativamente baixos requisitos de área; reduzido consumo de energia, baixa produção de lodo
e estabilização do lodo no próprio reator. Dentre as desvantagens cita-se o processo de tratamento tem
"partida" (start-up) geralmente lenta e é relativamente sensível às variações de carga no reator. É apresentada
abaixo uma análise comparativa das principais vantagens e desvantagens entre os reatores anaeróbios
discutidos anteriormente.
A seguir são apresentadas as possíveis soluções para eventuais problemas ocorridos durante a
operação de reatores anaeróbios.
1.5 Lagoas de estabilização e variantes
As seguintes variantes das lagoas de estabilização são descritas nesta seção:
- Lagoas anaeróbias
- Lagoas facultativas
- Lagoas aeradas facultativas
- Lagoas aeradas de mistura completa
- Lagoas de maturação
- Lagoas de polimento
1.5.1. Lagoa anaeróbia

As lagoas anaeróbias são projetadas sempre que possível, em associação com lagoas facultativas ou
aeradas mecanicamente. Têm a finalidade de oxidar compostos orgânicos complexos antes do tratamento nos
outros tipos de lagoas. As lagoas anaeróbias não dependem da ação fotossintética das algas, podendo ser
construídas com profundidade maiores do que outras lagoas, com variação de 2,0 a 5,0 metros, sendo
geralmente superiores a 4,5 m. No balanço entre o consumo e a produção de oxigênio, o consumo é
amplamente superior, predominam, portanto, condições anaeróbias.
A matéria orgânica depositada na parte inferior das lagoas passa pelas seguintes fases: liquefação e
gasificação. Durante a liquefação as bactérias acidogênicas (formadoras de ácidos) convertem carboidratos,
proteínas e gorduras em ácidos graxos por hidrólise. Isso muda a forma da matéria orgânica sem haver
redução de DBO. O material liquefeito através de difusão sobe para as camadas superiores. Na fase de
gasificação as bactérias estritamente anaeróbias (formadoras de metano) convertem carbono orgânico (C) em
gás carbônico (CO2) e metano (CH4). Dessa forma a DBO é removida. As bactérias anaeróbias têm uma taxa
metabólica e de reprodução mais lenta do que as bactérias aeróbias. Em assim sendo, para um período de
permanência de apenas 2 a 5 dias na lagoa anaeróbia, a decomposição da matéria orgânica é apenas parcial.
Mesmo assim, essa remoção da DBO, da ordem de 50 a 70%, apesar de insuficiente, representa uma grande
contribuição, aliviando sobremaneira a carga para as lagoas subseqüentes.
As condições básicas para existir atividade anaeróbia nas lagoas de estabilização são: não haver
oxigênio dissolvido (OD), exceto na zona limítrofe entre o liquido e a atmosfera, e a temperatura ser maior do
que 15ºC. Dessa forma, a remoção anaeróbia de DBO é mais provável em países de clima tropical com lagoas
relativamente profundas. As lagoas anaeróbias funcionam como um tanque séptico aberto e nelas estão
presentes os mesmos grupos de bactérias existentes nas fossas sépticas e reatores anaeróbios.
A grande vantagem das lagoas anaeróbias é poder oxidar altas cargas orgânicas com áreas bastante
reduzidas. A principal desvantagem é o odor produzido principalmente pela liberação de gás sulfídrico (H 2S),
quando o enxofre (S) estiver presente na água residuária.
Em lagoas anaeróbias o tempo de residência hidráulica para esgotos domésticos deve estar entre 3 e 6
dias e para águas residuárias agroindustriais entre 5 e 50 dias. A lagoa anaeróbia deve ter o fundo
impermeabilizado com geomembrana de PEAD (Polietileno de Alta Densidade), cuja espessura, geralmente é
de 0,5 mm.
Deve-se proceder a limpeza das lagoas (retirada do lodo) sempre que este atingir, aproximadamente,
a metade da altura útil da lagoa. O lodo removido deve ser enviado a um leito de secagem para posterior
encaminhamento a aterro sanitário ou uso agrícola.
Lagoa anaeróbia de fundo concretado.

1.5.2. Lagoa facultativa


Dentre os sistemas de lagoas de estabilização, o processo de tratamento em lagoas facultativa é o
mais simples, dependendo unicamente de fenômenos puramente naturais. A água residuária afluente entra
continuamente em uma extremidade da lagoa e sai continuamente na extremidade oposta. Ao longo desse
percurso, que demora vários dias, uma série de eventos contribui para a purificação dos esgotos. Parte da
matéria orgânica em suspensão (DBO particulada) tende a sedimentar, vindo a constituir o lodo de fundo.
Este lodo sofre o processo de decomposição por microrganismos anaeróbios, sendo convertido em gás
carbônico, metano e outros compostos. A fração inerte (não biodegradável) permanece na camada de fundo.
A matéria orgânica dissolvida (DBO solúvel), conjuntamente com a matéria orgânica em suspensão
de pequenas dimensões (DBO finamente particulada), não sedimenta, permanecendo dispersa na massa
líquida. A sua decomposição se dá através de bactérias facultativas, que têm a capacidade de sobreviver tanto
na presença quanto na ausência de oxigênio livre (daí a designação de facultativas, que define o próprio nome
da lagoa). Essas bactérias utilizam-se da matéria orgânica como fonte de energia, alcançada através da
respiração. Na respiração aeróbia, há a necessidade presença de oxigênio, o qual é suprido ao meio pela
fotossíntese realizada pelas algas. Há, assim, um perfeito equilíbrio entre o consumo e a produção de
oxigênio e gás carbônico. A simbiose entre as microalgas e bactérias é um fato. As algas produzem oxigênio
(O2) que é usado pelas bactérias heterotróficas, as quais produzem gás carbônico (CO2) que, por sua vez, é
usado pelas algas.
Esquema simplificado de uma lagoa facultativa.

Para a ocorrência da fotossíntese é necessária uma fonte de energia luminosa, neste caso representada
pelo sol. Por esta razão, locais com elevada radiação solar e baixa nebulosidade são bastante propícios à
implantação de lagoas facultativas. A fotossíntese, por depender da energia solar, é mais elevada próximo à
superfície. Profundidades típicas de lagoas facultativas são da ordem de 1,5 a 2,0 m. À medida que se
aprofunda na massa líquida, a penetração da luz é menor, o que ocasiona a predominância do consumo de
oxigênio (respiração) sobre a sua produção (fotossíntese), com a eventual ausência de oxigênio dissolvido a
partir de uma certa profundidade. Ademais, a fotossíntese só ocorre durante o dia, fazendo com que durante a
noite possa prevalecer a ausência de oxigênio. Devido a estes fatos, é essencial que as principais bactérias
responsáveis pela estabilização da matéria orgânica sejam facultativas, para poder sobreviver e proliferar,
tanto na presença, quanto na ausência de oxigênio. Nas lagoas facultativas que recebem esgoto bruto existe
uma fina camada de lodo no fundo das mesmas. A intensa digestão anaeróbia e produção de gás carbônico
(CO2) e metano (CH4) são responsáveis pela remoção de até 30% da DBO nas lagoas facultativas. A redução
de DBO das lagoas facultativas é da ordem de 70 a 90%.
O processo de lagoas facultativas é essencialmente natural, não necessitando de nenhum
equipamento. Por esta razão, a estabilização da matéria orgânica se processa em taxas mais lentas,
implicando na necessidade de um elevado período de detenção na lagoa (usualmente superior a 20 dias). A
fotossíntese, para que seja efetiva, necessita de uma elevada área de exposição para o melhor aproveitamento
da energia solar pelas algas, também implicando na necessidade de grandes unidades. Desta forma, a área
total requerida pelas lagoas facultativas é a maior dentre todos os processos de tratamento de águas
residuárias (excluindo-se os processos de disposição sobre o solo). Por outro lado, o fato de ser um processo
totalmente natural está associado maior simplicidade operacional, fator de fundamental importância em
países desenvolvimento.
A grande vantagem das lagoas facultativas é não produzir mau odor. Sua maior desvantagem é a
grande área que poderão ocupar. O arranjo típico de lagoas de estabilização para o tratamento de esgotos
domésticos, é o chamado sistema australiano. Consiste de 2 lagoas em série, sendo a primeira anaeróbia e a
segunda facultativa. A lagoa facultativa quando precedida de uma lagoa anaeróbia recebe uma carga de
apenas 30 a 50% da carga da água residuária bruta, podendo ter, portanto, dimensões bem menores. O
requisito de área total (lagoa anaeróbia + lagoa facultativa) é tal, que se obtém uma economia de área da
ordem de 1/3, comparado a uma lagoa facultativa única. Além disso, a eficiência do sistema australiano
também é maior. Porém, o arranjo ideal seria um sistema com 3 tipos de lagoas de estabilização em série:
anaeróbia, facultativa e de maturação (item 3.3.4.5). Com esse sistema é possível se obter também uma
grande redução de coliformes termotolerantes no efluente final.
A lagoa facultativa deve ter o fundo impermeabilizado com geomembrana de PEAD (Polietileno de
Alta Densidade), cuja espessura da geomembrana, geralmente é de 0,5 mm.
Deve-se proceder a limpeza das lagoas (retirada do lodo) periodicamente. O lodo removido deve ser
enviado a um leito de secagem para posterior encaminhamento a aterro sanitário ou uso agrícola.

Sistema de lagoa anaeróbia seguida por lagoa facultativa.

1.5.3. Lagoa aerada facultativa


Caso se deseje ter um sistema predominantemente aeróbio, e de dimensões ainda mais reduzidas,
pode-se utilizar a lagoa aerada facultativa. A principal diferença com relação à lagoa facultativa convencional
é quanto à forma de suprimento de oxigênio. Enquanto na lagoa facultativa o oxigênio é advindo
principalmente da fotossíntese, no caso da lagoa aerada facultativa o oxigênio é obtido através de
equipamentos denominados aeradores.
Os aeradores mecânicos mais comumente utilizados em lagoas aeradas são unidades de eixo vertical
que, ao rodarem em alta velocidade, causam um grande turbilhonamento na água. Este turbilhonamento
propicia a penetração do oxigênio atmosférico na massa líquida, onde ele se dissolve. Com isto, consegue-se
uma maior introdução de oxigênio, comparada à lagoa facultativa convencional, permitindo a que a
decomposição da matéria orgânica se dê mais rapidamente. Em decorrência, o tempo de detenção da água
residuária na lagoa pode ser menor (da ordem de 5 a 10 dias), ou seja, o requisito de área é bem inferior.
A lagoa é denominada facultativa pelo fato do nível de energia introduzido pelos aeradores ser
suficiente apenas para a oxigenação, mas não para manter os sólidos (bactérias e sólidos depositados no
fundo da lagoa) em suspensão na massa líquida. Desta forma, os sólidos tendem a sedimentar e constituir a
camada de lodo de fundo, a ser de composta anaerobiamente. Apenas a DBO solúvel e finamente particulada
permanece na massa líquida, vindo a sofrer decomposição aeróbia. A lagoa se comporta, portanto, como uma
lagoa facultativa convencional.

Aeradores de superfície.

Devido à introdução de mecanização, as lagoas aeradas são menos simples em termos de manutenção
e operação, comparadas com as lagoas facultativas convencionais. A redução dos requisitos de área é
conseguida, portanto, com uma certa elevação no nível de operação, além da introdução do consumo de
energia elétrica, que eleva o custo do processo.
A lagoa aerada facultativa deve ter o fundo impermeabilizado com geomembrana de PEAD
(Polietileno de Alta Densidade), cuja espessura da geomembrana, geralmente é de 0,5 mm ou ser construída
em concreto armado.
Deve-se proceder a limpeza da lagoa (retirada do lodo) periodicamente. O lodo removido deve ser
enviado a um leito de secagem para posterior encaminhamento a aterro sanitário ou uso agrícola.
Fluxograma típico de um sistema de lagoas aeradas facultativas.

1.5.4. Lagoa aerada de mistura completa


Uma forma de se reduzir ainda mais o volume da lagoa aerada é o de se aumentar o nível de aeração,
fazendo com que haja uma turbulência tal que, além de garantir a oxigenação, permita ainda que todos os
sólidos sejam mantidos em suspensão no meio líquido. A denominação mistura completa é, portanto, advinda
do alto grau de energia por unidade de volume, responsável pela total mistura dos constituintes em toda a
lagoa. Entre os sólidos mantidos em suspensão e em mistura completa se incluem, além da matéria orgânica
do esgoto bruto, também as bactérias (biomassa). Há, em decorrência, uma maior concentração de bactérias
no meio líquido, além de um maior contato matéria orgânica-bactérias. Com isto, a eficiência do sistema
aumenta bastante, permitindo a que o volume da lagoa aerada seja bastante reduzido. O tempo de detenção
típico na lagoa aerada é da ordem de 2 a 4 dias.
No entanto, apesar da elevada eficiência desta lagoa na remoção da matéria orgânica originalmente
presente nas águas residuárias, um novo problema passou a ser criado. A biomassa (lodo) permanece em
suspensão em todo o volume da lagoa, vindo, portanto, a sair com o efluente da lagoa. Esta biomassa é, em
última análise, também matéria orgânica, ainda que de uma forma diferente da DBO da água residuária bruta.
Esta nova matéria orgânica, caso fosse lançada no corpo receptor, iria exercer também uma demanda de
oxigênio, causando a deterioração da qualidade das águas.
É importante, portanto, que haja uma unidade a jusante, na qual os sólidos em suspensão
(predominantemente a biomassa) possam vir a sedimentar e ser separado do líquido (efluente final). Esta
unidade pode ser uma lagoa de decantação ou um sedimentador secundário (semelhante ao sedimentador
primário), com a finalidade principal de permitir a sedimentação e acúmulo dos sólidos.
Sistema de lagoas aeradas de mistura completa seguidas por unidades de decantação.

A lagoa de decantação ou sedimentador são dimensionados com um tempo de residência hidráulica


bem reduzido, em torno de 2 dias. Nestes, os sólidos vão para o fundo, onde são armazenados por um período
de alguns anos, após o qual são removidos.
A área requerida por este sistema de lagoas é a menor dentre os sistemas de lagoas. Os requisitos de
energia são similares aos demais sistemas de lagoas aeradas. No entanto, os aspectos relativos ao manuseio
do lodo podem ser mais complicados, devido ao fato de se ter um menor período de armazenagem na lagoa,
comparado com os outros sistemas. Caso a remoção de lodo seja periódica, tal ocorrerá numa freqüência
aproximada em torno de 2 a 5 anos. A remoção do lodo é uma tarefa laboriosa e cara.
A lagoa aerada de mistura completa deve ter o fundo impermeabilizado com geomembrana de PEAD
(Polietileno de Alta Densidade), cuja espessura da geomembrana, geralmente é de 0,5 mm ou ser construída
em concreto armado.
Abaixo é apresentada uma descrição sucinta dos principais sistemas de lagoas de estabilização.

Sistema Descrição
A DBO solúvel e finamente particulada é estabilizada aerobiamente por bactérias
dispersas no meio líquido, ao passo que a DBO suspensa tende a sedimentar, sendo
Lagoa facultativa
estabilizada anaerobiamente por bactérias no fundo da lagoa. O oxigênio requerido
pelas bactérias aeróbias é fornecido pelas algas através da fotossíntese.
A DBO é em torno de 50% estabilizada na lagoa anaeróbia (mais profunda e com
Lagoa anaeróbia –
menor volume), enquanto a DBO remanescente é removida na lagoa facultativa. O
lagoa facultativa
sistema ocupa uma área inferior ao de uma lagoa facultativa única.
Os mecanismos de remoção da DBO são similares aos de uma lagoa facultativa. No
Lagoa aerada entanto, o oxigênio é fornecido por aeradores mecânicos, ao invés de através da
facultativa fotossíntese. Como a lagoa é também facultativa, uma grande parte dos sólidos do
esgoto e da biomassa sedimenta sendo decomposta anaerobiamente no fundo.
A energia introduzida por unidade de volume da lagoa é elevada, o que faz com que
os sólidos (principalmente a biomassa) permaneçam dispersos no meio liquido, ou em
mistura completa. A decorrente maior concentração de bactérias no meio líquido
Lagoa aerada de
aumenta a eficiência do sistema na remoção da DBO, o que permite que a lagoa tenha
mistura completa –
um volume inferior ao de uma lagoa aerada facultativa. No entanto, o efluente contém
unidade de
elevados teores de sólidos (bactérias), que necessitam ser removidos antes do
decantação
lançamento no corpo receptor. A lagoa de decantação a jusante proporciona condições
para esta remoção. O lodo da lagoa de decantação deve ser removido em períodos de
poucos anos.
O objetivo principal da lagoa de maturação é a remoção de patogênicos. Nas lagoas
de maturação predominam condições ambientais adversas para os patogênicos, como
radiação ultravioleta, elevado pH, elevado OD, temperatura mais baixa que a do corpo
humano, falta de nutrientes e predaçao por outros organismos. As lagoas de
Lagoa de maturação
maturação constituem um pós-tratamento de processos que objetivem a remoção da
DBO, sendo usualmente projetadas como uma série de lagoas, ou como uma lagoa
única com divisões por chicanas. A eficiência na remoção de coliformes é bastante
elevada.
É apresentada abaixo uma análise comparativa das principais vantagens e desvantagens entre as
lagoas de tratamento discutidas anteriormente.
Eficiências típicas de remoção dos principais poluentes de interesse nos esgotos domésticos.
1.6. LODOS ATIVADOS

O sistema de lodos ativados é amplamente utilizado, a nível mundial, para o tratamento de despejos
domésticos e industriais, em situações em que é necessária uma elevada qualidade do efluente e reduzidos
requisitos de área. No entanto, o sistema de lodos ativados inclui um índice de mecanização superior ao de
outros sistemas de tratamento, implicando em uma operação mais sofisticada e em maiores consumos de energia
elétrica.
As seguintes unidades são parte integrante da etapa biológica do sistema de lodos ativados (fluxo do
líquido):
 Tanque de aeração (reator)
 Tanque de decantação (decantador secundário)
 Recirculação de lodo

Esquema simplificado das unidades do sistema de lodos ativados.

No reator ocorrem as reações bioquímicas de remoção da matéria orgânica e, em determinadas condições,


da matéria nitrogenada. A biomassa se utiliza do substrato presente no esgoto bruto para se desenvolver. No
decantador secundário ocorre a sedimentação dos sólidos (biomassa), permitindo a que o efluente final saia
clarificado. Os sólidos sedimentados no fundo do decantador secundário são recirculados para o reator,
aumentando a concentração de biomassa no mesmo, o que é responsável pela elevada eficiência do sistema.
A biomassa consegue ser facilmente separada no decantador secundário devido à sua propriedade de
flocular. Tal se deve ao fato das bactérias possuírem uma matriz gelatinosa, que permite a aglutinação das
bactérias e outros microrganismos, como protozoários. O floco possui maiores dimensões, o que facilita a
sedimentação.
Esquema de formação de um floco de lodo ativado por microrganismos.

Em virtude da recirculação do lodo, a concentração de sólidos em suspensão no tanque de aeração no


sistema de lodos ativados é mais de 10 vezes superior à de uma lagoa aerada de mistura completa, sem
recirculação. Nos sistemas de lodos ativados, o tempo de residência do líquido é bem baixo, da ordem de 6 a 8
horas no sistema de lodos ativados convencional, implicando em que o volume do tanque de aeração seja bem
reduzido. No entanto, devido à recirculação dos sólidos, estes permanecem no sistema por um tempo superior ao
do líquido. O tempo de retenção dos sólidos é denominado idade do lodo. É esta maior permanência dos sólidos
no sistema que garante a elevada eficiência dos sistemas de lodos ativados, já que a biomassa tem tempo
suficiente para metabolizar praticamente toda a matéria orgânica dos esgotos. Devido à sua importância, o
conceito de idade do lodo é amplamente discutido ao longo de todo o presente volume.
No tanque de aeração, devido à entrada contínua de alimento, na forma de DBO dos esgotos, os
microrganismos crescem e se reproduzem continuamente. Caso fosse permitido que a população dos mesmos
crescesse indefinidamente, eles tenderiam a atingir concentrações excessivas no tanque de aeração, dificultando
a transferência de oxigênio para todas as células. Ademais, o decantador secundário ficaria sobrecarregado, e os
sólidos não teriam mais condições de sedimentar satisfatoriamente, vindo a ser arrastados no efluente final,
deteriorando a sua qualidade. Para manter o sistema em equilíbrio, é necessário que se retire aproximadamente a
mesma quantidade de biomassa que é aumentada por reprodução. Este é, portanto, o lodo biológico excedente,
que pode ser extraído diretamente do reator ou da linha de recirculação.
No sistema de lodos ativados convencional, o lodo excedente deve sofrer tratamento adicional, na linha de
tratamento do lodo, usualmente compreendendo adensamento, digestão e desidratação. A digestão visa diminuir
a quantidade de matéria orgânica, que torna o lodo putrescível. No sistema de lodos ativados como pós-
tratamento de efluente de sistemas anaeróbios, como reatores UASB, pelo fato de grande parte da matéria

1
orgânica já ter sido removida na etapa anaeróbia, o crescimento da biomassa é menor (menor disponibilidade de
alimentos), ou seja, a produção de lodos é menor.

Sistema de lodos ativados implantados em ETEs.

O sistema de lodos ativados pode ser adaptado para incluir remoções biológicas de nitrogênio e fósforo,
atualmente praticadas de forma sistemática em diversos países. O presente texto enfoca em maior detalhe a
remoção de matéria carbonácea, representada como DBO ou DQO.
Com relação à remoção de coliformes e organismos patogênicos, devido aos reduzidos tempos de
residência nas unidades do sistema de lodos ativados, tem-se que a eficiência é baixa e usualmente insuficiente
para atender aos requisitos de qualidade dos corpos receptores. Esta baixa eficiência é típica também de outros
processos compactos de tratamento de esgotos. Caso necessário, o efluente deve ser submetido a uma etapa
posterior de desinfecção.
Deve-se destacar que os sistemas de lodos ativados podem ser integrados a outros sistemas de tratamento,
tais como filtros biológicos e reatores anaeróbios. Neste último caso, têm ganhado crescente importância
sistemas constituídos por reatores UASB seguidos por lodos ativados para remoção de nutrientes e remoção
adicional de DBO e SS. Os reatores UASB substituem os decantadores primários, efetuando a remoção de
grande parte da DBO e dos sólidos afluentes, permitindo um sistema de lodos ativados de menor porte, com
menor consumo de energia e com menor produção de lodo excedente.

Variantes do processo
Existem diversas variantes do processo de lodos ativados. O presente texto enfoca apenas as principais e
mais utilizadas. Dentro deste conceito, tem-se as seguintes visões dos sistemas de lodos ativados:
 Divisão quanto à idade do lodo:  Divisão quanto ao fluxo
- Lodos ativados convencional - Fluxo contínuo
- Aeração prolongada - Fluxo intermitente (batelada)

2
Os sistemas de lodos ativados podem ser classificados, em função da idade do lodo, em uma das seguintes
principais categorias:

Carga de DBO aplicada por unidade de Faixa de idade do


Idade do lodo Denominação usual
volume lodo
Reduzidíssima Altíssima Inferior a 3 dias Aeração modificada
Reduzida Alta 4 a 10 dias Convencional
Intermediária Intermediária 11 a 17 dias
Aeração Prolongada
Elevada Baixa 18 a 30 dias

1.6.1. Sistema de lodos ativados convencional (fluxo contínuo)


No sistema convencional, para se economizar energia para a aeração e reduzir o volume do reator
biológico, parte da matéria orgânica (em suspensão, sedimentável) dos esgotos é retirada antes do tanque de
aeração, por meio de um decantador primário. Assim, os sistemas de lodos ativados convencional têm, como
parte integrante, também o tratamento primário. Na figura, a parte de cima corresponde ao tratamento da fase
líquida (água residuária), ao passo que a parte de baixo exemplifica as etapas envolvidas no tratamento da fase
sólida (lodo).

Fluxograma típico do sistema de lodos ativados convencional.

No sistema convencional, a idade do lodo é usualmente da ordem de 4 a 10 dias, e o tempo de residência


hidráulica no reator, da ordem de 6 a 8 horas. Com esta idade do lodo, a biomassa retirada do sistema no lodo
excedente requer ainda uma etapa de estabilização no tratamento do lodo, por conter ainda um elevado teor de
matéria orgânica armazenada nas suas células. Esta estabilização ocorre nos digestores de lodo. De forma a
reduzir o volume dos digestores, o lodo é previamente submetido a uma etapa de adensamento, na qual é retirada
parte da umidade, diminuindo, em conseqüência, o volume de lodo a ser tratado.

3
1.6.2. Sistema de lodos ativados por aeração prolongada (fluxo contínuo)
Caso a biomassa (lodo) permaneça no sistema por um período mais longo, da ordem de 18 a 30 dias (daí o
nome aeração prolongada), recebendo a mesma carga de DBO do esgoto que o sistema convencional, haverá
menor disponibilidade de alimento para as bactérias. A quantidade de biomassa é maior que no sistema de lodos
ativados convencional, o volume do reator aeróbio é também maior, e o tempo de residência do líquido é em
torno de 16 a 24 horas. Portanto, há menos matéria orgânica por unidade de volume do tanque de aeração e
também por unidade de biomassa do reator. Em decorrência, as bactérias, para sobreviver, passam a utilizar nos
seus processos metabólicos a própria matéria orgânica biodegradável componente das suas células. Esta matéria
orgânica celular é convertida em gás carbônico e água, por meio da respiração. Isto corresponde a uma
estabilização da biomassa (lodo), ocorrendo no próprio tanque de aeração. Enquanto no sistema convencional a
estabilização do lodo é feita em separado (na etapa de tratamento de lodo), usualmente em ambiente anaeróbio,
na aeração prolongada ela é feita conjuntamente, no próprio reator, tendo-se, portanto, um ambiente aeróbio. O
consumo adicional de oxigênio para a estabilização de lodo é significativo e inclusive pode ser maior que o
consumo para metabolizar o material orgânico do afluente.
Já que não há necessidade de se estabilizar o lodo biológico excedente, procura-se evitar também, no
sistema de aeração prolongada, a geração de alguma outra forma de lodo, que venha a requerer posterior
estabilização. Deste modo, os sistemas de aeração prolongada usualmente não possuem decantadores primários,
para evitar a necessidade de se estabilizar o lodo primário. Com isto, obtém-se uma grande simplificação no
fluxograma do processo: não há decantadores primários nem unidades de digestão de lodo.

Fluxograma de um sistema de lodos ativados por aeração prolongada.

A conseqüência desta simplificação do sistema é o aumento do gasto com energia para aeração, já que o
lodo é estabilizado aerobiamente no tanque de aeração. Por outro lado, a reduzida disponibilidade de alimento e
a sua praticamente total assimilação fazem com que a aeração prolongada seja a variante do lodos ativados mais
eficiente na remoção de DBO.
Deve-se destacar, no entanto, que a eficiência de qualquer variante do processo de lodos ativados está
intimamente associada ao desempenho do decantador secundário. Caso haja perda de sólidos no efluente final,

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haverá uma grande deterioração na qualidade do efluente, independentemente do bom desempenho do tanque
de aeração na remoção da DBO.

1.6.3. Sistema de lodos ativados de fluxo intermitente (batelada)


Os sistemas de lodos ativados descritos nos itens 3.3.5.1 e 3.3.5.2 são de fluxo contínuo com relação ao
afluente, ou seja, o esgoto está sempre entrando e saindo do reator. Há, no entanto, uma variante do sistema, com
operação em fluxo intermitente.
O princípio do processo de lodos ativados com operação intermitente consiste na incorporação de todas as
unidades, processos e operações normalmente associados ao tratamento tradicional de lodos ativados, quais
sejam, decantação primária, oxidação biológica e decantação secundária, em um único tanque. Utilizando um
tanque único, esses processos e operações passam a ser simplesmente seqüências no tempo, e não unidades
separadas, como ocorre nos processos convencionais de fluxo contínuo. O processo de lodos ativados com fluxo
intermitente pode ser utilizado tanto na modalidade convencional quanto na de aeração prolongada, embora esta
seja mais comum, devido à sua maior simplicidade operacional. Na modalidade de aeração prolongada, o tanque
único passa a incorporar também a unidade de digestão (aeróbia) do lodo.

Fluxograma de um sistema de lodos ativados de fluxo intermitente.

No processo é utilizado apenas um reator, onde ocorrem todas as etapas do tratamento. Isso é conseguido
por meio do estabelecimento de ciclos de operação com durações definidas. A massa biológica permanece no
reator durante todos os ciclos, eliminando, dessa forma, a necessidade de decantadores separados. Os ciclos
normais de tratamento são:
- Enchimento (entrada da água residuária bruta, decantada ou anaeróbia no reator);
- Reação (aeração e/ou mistura da massa líquida contida no reator);
- Sedimentação (sedimentação e separação dos sólidos em suspensão da água residuária tratada);
- Descarte do efluente tratado (retirada da água residuária tratada do reator);

5
- Repouso (ajuste de ciclos e remoção do lodo excedente).
A duração usual de cada ciclo pode ser alterada em função das variações da carga afluente, dos objetivos
operacionais do tratamento e das características do esgoto e da biomassa no sistema.
Quando comparado aos sistemas de lodos ativados de fluxo contínuo, o fluxograma do processo é bastante
simplificado, devido à eliminação de diversas unidades.

Ciclos do processo de operação intermitente.

1.6.4. Lodos ativados como pós-tratamento de efluentes anaeróbios


Uma alternativa bastante promissora em regiões de clima quente, foco de várias pesquisas recentes e que
está principiando a ser implantada em escala real é a de lodos ativados convencional como pós-tratamento de
efluentes de reatores anaeróbios tipo UASB. Neste caso, ao invés de se ter o decantador primário, tem-se o reator
anaeróbio. O lodo aeróbio excedente gerado no sistema de lodos ativados, ainda não estabilizado, é enviado ao
reator UASB, onde sofre adensamento e digestão, juntamente com o lodo anaeróbio. Como esta vazão de retomo
do lodo aeróbio excedente é bem baixa, comparada com a vazão afluente, não há distúrbios operacionais
introduzidos no reator UASB. O tratamento do lodo é grandemente simplificado: não há necessidade de
adensadores e digestores, havendo apenas a etapa de desidratação. O lodo misto retirado do reator anaeróbio,

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digerido e com concentrações similares às de um lodo efluente de adensadores, possui ainda ótimas
características de desidratabilidade. Abaixo é apresentado o fluxograma desta configuração
As principais vantagens desta configuração, comparada com a concepção tradicional do sistema de lodos
ativados convencional, são:
- Redução na produção de lodo;
- Redução no consumo de energia;
- Redução no consumo de produtos químicos para desidratação;
- Menor número de unidades diferentes a serem implementadas;
- Menor necessidade de equipamentos;
- Maior simplicidade operacional.

Fluxograma de um sistema composto por reator UASB seguido de lodos ativados.

O volume total das unidades é similar ou um pouco inferior ao volume total das unidades do sistema de
lodos ativados convencional. A eficiência de remoção de DBO é similar à concepção tradicional de lodos
ativados convencional. Uma desvantagem é a menor capacitação para a remoção biológica de nutrientes (N e P).

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2. TRATAMENTO TERCIÁRIO

2.1 Desinfecção

Efluentes de sistemas de tratamento de esgotos sanitários ou dejetos animais, tanto aeróbios quanto
anaeróbios, geralmente ainda contêm relativamente grande quantidade de microrganismos patogênicos e,
portanto, necessitam passar por desinfecção para assegurar proteção à saúde pública. Os sistemas de tratamento
convencionais são projetados para remoção de matéria orgânica, sendo, portanto, pouco eficientes na remoção de
organismos patogênicos. Assim, os seus efluentes quase sempre requerem desinfecção para garantir segurança à
saúde pública.

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A seguir é apresentada a capacidade de diversas tecnologias de tratamento de águas residuárias em atingir
consistentemente os níveis indicados de qualidade do efluente em termos de coliformes fecais (termotolerantes)
e ovos de helmintos.

A importância relativa da desinfecção no tratamento de esgotos é evidenciada por meio da consideração


de que esta é a última barreira protetora para que os cursos d’água não recebam agentes patógenos, pois as
doenças infecciosas podem ser resultado dos diversos usos da água como o abastecimento público, banho,
criação de peixes e irrigação. O reuso dos efluentes, que a cada dia ganha mais força dentro da engenharia
sanitária, reforça a necessidade de desinfecção dos esgotos.
Do ponto de vista da engenharia sanitária, a desinfecção pode ser definida como a etapa responsável pela
redução das densidades de microrganismos de interesse até os limites estabelecidos pela legislação para os
diferentes tipos de usos da água. Para cada um desses usos aplicam-se critérios e padrões de qualidade, em que
não apenas as incidências e as concentrações máximas de organismos são consideradas, mas os próprios
organismos, grupos e tipos.
Verifica-se no Brasil que a legislação federal estabelece padrões microbiológicos para águas tratadas
destinadas a consumo público (padrões de potabilidade), padrões microbiológicos para águas brutas destinadas a

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diversos usos, como captação e tratamento para consumo, preservação da flora e da fauna, irrigação (padrões de
qualidade em geral ou padrões ambientais) e padrões microbiológicos para banho (padrões de balneabilidade).
A desinfecção de esgotos sanitários não visa à eliminação total de microrganismos (esterilização),
conforme ocorre na medicina e na indústria de alimentos. Desinfetar esgotos é uma prática que busca inativar
seletivamente espécies de organismos presentes no esgoto sanitário, em especial aquelas que ameaçam a saúde
humana, em consonância com os padrões de qualidade estabelecidos para diferentes situações. Os mecanismos
envolvidos na desinfecção dos organismos patogênicos podem ser reunidos em três grupos:

a) Destruição ou danificação da parede celular, do citoplasma ou do núcleo celular. O agente desinfetante atua
sobre os componentes dessas estruturas celulares, impedindo que desenvolvam suas funções elementares
adequadamente.
b) Alteração de importantes compostos envolvidos no catabolismo, como enzimas e seus substratos, alterando o
balanço de energia na célula.
c) Alteração nos processos de síntese e crescimento celular, mediante alteração de funções como a síntese de
proteínas, de ácidos nucléicos e coenzimas.

Os processos de desinfecção não são equivalentes. É necessário escolher aqueles mais apropriados, devido
a condições particulares (características e usos da água ou efluente e tipos de microrganismo a eliminar). Para
tanto, um desinfetante ou processo de desinfecção deve apresentar idealmente as seguintes características:
- não ser tóxico para o homem ou qualquer outro animal;
- ser tóxico em baixa concentração para os organismos-alvo;
- ser suficientemente solúvel em água;
- ser eficaz nas condições de temperatura e pH encontrados no meio líquido;
- ser de custo razoável em relação aos volumes de água ou efluente a desinfetar;
- não apresentar elevado risco aos operadores;
- permitir fácil medida e controle de sua concentração.

A desinfecção pode ser realizada por meio de processos artificiais ou naturais.


Tanto os processos artificiais como os naturais utilizam, isoladamente ou de forma combinada, agentes
físicos e químicos para inativar os organismos-alvo. No caso dos processos naturais, há, ainda, a concorrência de
agentes biológicos na inativação de patógenos. Entre os agentes físicos pode-se citar a transferência de calor
(aquecimento ou incineração), as radiações ionizantes, a radiação ultravioleta (UV) e a filtração em membranas.
O aquecimento é uma técnica reconhecidamente eficiente na desinfecção de águas, mas não encontra aplicação
prática no tratamento de esgotos, por ser extremamente antieconômica até mesmo em pequena escala. As
radiações ionizantes do tipo gama, também em função dos custos envolvidos, restringem-se a aplicações de
pequena escala.

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No tocante à radiação ultravioleta, suas aplicações experimentam aceitação crescente, tanto pela técnica de
solarização, que utiliza a luz solar para a potabilização de águas em pequena escala, quanto por reatores que
geram artificialmente a radiação ultravioleta. A filtração em membranas já integra o fluxograma de algumas
estações de tratamento de esgotos e experimenta crescente aplicação devido à redução de preço das membranas.
A desinfecção química é realizada pela aplicação de compostos do grupo fenólico, álcoois, halogênios e metais
pesados. Os agentes químicos mais utilizados na desinfecção de esgotos são: cloro, dióxido de cloro e ozônio.
Nos processos naturais, além dos agentes químicos e físicos naturalmente presentes, a ação de predação ou
competição de outros organismos resulta na inativação de patógenos.

Processos de desinfecção de esgotos sanitários.

2.1.1. Processos Naturais


O principal processo natural de desinfecção de esgotos é a utilização de lagoas de maturação. Outro
processo natural de desinfecção utilizado é a disposição controlada no solo, a qual vem desenvolvendo-se em
maior intensidade no Brasil nos últimos anos.

2.1.1.1. Lagoa de maturação


As lagoas de maturação possibilitam um polimento no efluente de qualquer dos sistemas de lagoas de
estabilização descritos anteriormente ou, em termos mais amplos, de qualquer sistema de tratamento de esgotos.
O principal objetivo das lagoas de maturação é o da remoção de organismos patogênicos, e não da remoção
adicional de DBO. As lagoas de maturação constituem-se numa alternativa bastante econômica à desinfecção do
efluente por métodos mais convencionais, como a cloração.
O ambiente ideal para os microrganismos patogênicos é o trato intestinal humano. Fora deste, quer na
rede de esgotos, no tratamento de esgotos, ou no corpo receptor, os organismos patogênicos tendem a morrer.

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Diversos fatores contribuem para tal, como temperatura, insolação, pH, escassez de alimento, organismos
predadores, competição, compostos tóxicos, entre outros. A lagoa de maturação é dimensionada de forma a fazer
uma utilização ótima de alguns destes mecanismos. Vários destes mecanismos se tomam mais efetivos com
menores profundidades da lagoa, o que justifica o fato de que as lagoas de maturação sejam mais rasas
(profundidades de 1,0 m ou menos), comparadas aos demais tipos de lagoas. Dentre os mecanismo associados à
profundidade da lagoa, pode-se citar:
- Radiação solar (radiação ultravioleta)
- Elevado pH (pH > 8,5) (remoção de CO2 pelas algas)
- Elevada concentração de OD (favorecendo uma comunidade aeróbia, mais eficiente na eliminação dos
coliformes, e reações de foto-oxidação)
As lagoas de maturação devem atingir elevadíssimas eficiências na remoção de coliformes (E > 99,9 a
99,999%), para que possam ser cumpridos padrões ou recomendações usuais para utilização direta do efluente
para fertirrigação, ou para a manutenção de diversos usos no corpo receptor. As lagoas de maturação usualmente
atingem ainda remoção total de ovos de helmintos.
De forma a maximizar a eficiência na remoção de coliformes, as lagoas de maturação são projetadas em
uma das duas seguintes configurações: (a) três ou quatro lagoas em série ou (b) lagoa única com chicanas.

Fluxograma típico de um sistema de lagoas de estabilização seguidas por lagoas de maturação em série.

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Sistema de lagoa de maturação com chicanas.

2.1.1.2. Disposição controlada no solo


A disposição controlada de efluentes secundários no solo resulta na remoção dos nutrientes, absorvidos
pelas plantas e incorporados ao solo; dos sólidos suspensos; e dos patógenos, que são inativados por ação de
raios ultravioleta, pela dessecação e pela ação dos predadores biológicos no solo. Trata-se de uma técnica de
pós-tratamento e reuso, visto que o mesmo fornece os nutrientes e a matéria orgânica para o conjunto solo-planta
e pode promover a recarga do aqüífero.
O bom desempenho de processos dessa natureza depende do tipo e das características do solo, bem como
da taxa e da freqüência de alimentação do processo. Os principais processos de disposição controlada no solo
foram apresentados no item 3.3.8 e serão discutidos em trabalhos apresentados durante a terceira etapa da
disciplina.

2.1.2. Processos artificiais químicos

2.1.2.1. Cloração
Nos últimos anos o cloro e seus derivados têm sido largamente empregados na desinfecção de efluentes
tratados (80% da desinfecção mundial). Entretanto, devido aos subprodutos formados pela combinação do cloro
com as substâncias orgânicas presentes nos efluentes, potencialmente carcinogênicas, mutagênicas e
teratogênicas, têm-se intensificado a pesquisa e testes piloto de desinfetantes alternativos mais seguros e tão
eficientes quanto àqueles clorados.
A cloração é uma tecnologia mundialmente conhecida, normalmente aplicada nas formas de cloro gasoso,
hipoclorito de sódio ou cálcio e outros compostos na forma líquida ou sólida.

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Uma vez em contato com as bactérias presentes no esgoto sanitário, o cloro induz uma série de eventos
associados à atividade da membrana celular, como alteração da permeabilidade, e modifica os ácidos nucléicos,
causando mutações. A inativação dos vírus ocorre por modificações nos ácidos nucléicos e na envoltória
protéica. O cloro não apresenta boa eficiência na remoção de protozoários, devido a seu maior tamanho, devendo
haver um processo auxiliar de filtração, a fim de removê-los.
O cloro e seus derivados apresentam alto poder oxidante e reagem com vários compostos presentes nos
esgotos. A demanda de cloro, calculada pela diferença entre a dose inicial e o residual de cloro, é proveniente
dessa variedade de reações nas quais o cloro é consumido por vários constituintes da água residuária e por
decomposição.
De modo simplificado, o cloro reage com a amônia para produzir uma série de compostos chamados
cloraminas e, eventualmente, oxida a amônia em gás nitrogênio (N2). O mecanismo de reação é complexo, e os
produtos variam com o pH, razão entre o cloro adicionado e a amônia presente e o tempo de contato. A
monocloramina (NH2Cl) e a dicloramina (NHCl2), denominadas cloro combinado, têm poder desinfetante,
apesar deste ser inferior ao dos produtos resultantes da dissociação de qualquer forma de cloro na água,
conhecidos como cloro livre (HOCl e OCl–). Das reações com os compostos orgânicos deve-se dar atenção
àquelas que ocorrem com o nitrogênio orgânico e com os compostos não nitrogenados que podem formar
trihalometanos (THM’s), compostos nocivos a várias formas de vida.
Os processos de desinfecção têm maior ou menor eficiência em função dos fatores que podem intervir
neles. As características físico-químicas do afluente a ser desinfetado exercem papel fundamental nas reações
desencadeadas desde o momento em que se adiciona o desinfetante, determinando os reais compostos que
realizam a desinfecção. Compostos redutores à base de enxofre e a presença de nitrogênio amoniacal diminuem
a eficiência da cloração. Os sólidos podem atuar como barreira, protegendo os agentes patogênicos da ação do
desinfetante.
Dentre os fatores intervenientes, a dosagem do desinfetante e o tempo de contato, bem como a
homogeneidade do desinfetante na mistura, são aqueles em que a intervenção externa pode propiciar aumento na
eficiência do processo.
Na desinfecção de esgotos com compostos de cloro, a concentração do desinfetante se altera com o tempo
e, particularmente durante os momentos iniciais da aplicação do cloro, passa por transformações rápidas, desde a
forma livre até as formas combinadas. Dessa forma, torna-se mais importante determinar a concentração de cloro
residual do que a de cloro aplicado. Outros aspectos relevantes e que interferem no processo de desinfecção são:
- presença de sólidos no efluente, uma vez que estes podem proteger os microrganismos da ação do
desinfetante. Infelizmente, poucos métodos encontram-se disponíveis para avaliar quantitativamente esse
fenômeno;
- pH do efluente, já que a inativação de microrganismos aumenta com o decréscimo do pH, tanto para
residuais de cloro livre como de cloro combinado;
- temperatura, uma vez que seu aumento também leva a taxa de inativação dos microrganismos.

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O impacto do cloro livre ou combinado em corpos d’água, resultante da desinfecção de efluentes, tem sido
controlado por padrões ambientais. Pelas regras da Resolução CONAMA nº 357 de 2005 (Classe II), o padrão
ambiental é de 0,01 mg L-1 de cloro livre ou combinado para proteção da vida aquática. A descloração com
compostos químicos pode ser realizada com: dióxido de enxofre, sulfito de sódio, sulfito de sódio, metabissulfito
de sódio e tiossulfato de sódio.. Para a descloração do cloro livre (Cl 2), pode-se, também, empregar carvão
ativado e peróxido de hidrogênio, com a vantagem de controlar odores.

2.1.2.2. Ozonização

O ozônio é um poderoso agente oxidante, muito efetivo na destruição de vírus, bactérias, protozoários e
outros parasitas, bem como na oxidação da matéria orgânica.
O ozônio age nos constituintes da membrana citoplasmática, nos sistemas enzimáticos e nos ácidos
nucléicos dos microrganismos. Nos vírus, o ozônio ataca tanto as proteínas da célula como os ácidos nucléicos.
A desinfecção de efluentes de tratamento de esgotos sanitários com ozônio vem despertando interesse,
devido à preocupação com a formação de organoclorados, toxicidade dos efluentes e o custo adicional da
decloração. A desinfecção com ozônio destaca-se pelos seguintes aspectos:
- rapidez da ação de desinfecção;
- elevada eficiência na inativação de microrganismos;
- baixa toxicidade encontrada nos efluentes ozonizados.
Sendo o ozônio um gás instável e de alto poder oxidante, essas características o tornam atrativo para a
desinfecção de esgotos domésticos. Sua instabilidade é uma característica desejável, pois não deixa residual
danoso ao meio ambiente. O alto poder oxidante é desejável porque diminui a concentração e o tempo
necessários para desinfecção. Sendo o tempo de contato e a concentração reduzidos, haverá economia na
construção e na operação das instalações. Outro benefício a considerar, devido ao alto poder oxidante, é que os
subprodutos orgânicos da ozonização de efluentes domésticos, tratados em nível secundário, geralmente
apresentam pouca ou nenhuma toxicidade em nível agudo. Há, ainda, a vantagem da redução de cor, que mesmo
nas dosagens relativamente baixas necessárias à desinfecção tem se mostrado efetiva.
O poder desinfetante do ozônio é cerca de dez vezes superior ao do cloro, para todos os tipos de
microrganismos. Ele é eficaz contra esporos e cistos que são as formas mais resistentes.
As principais características físico-químicas que influem no processo de desinfecção por ozônio são:
- Temperatura: a taxa de decaimento dos microrganismos aumenta com o aumento da temperatura do
líquido. A temperatura determina em parte a taxa de difusão do desinfetante através das membranas do
microrganismo e também sua taxa de reação com o substrato. No entanto, quando ocorre aumento de
temperatura, o ozônio torna-se menos solúvel e menos estável em água, embora a taxa de reação com o substrato
orgânico dos microrganismos aumente.
- Turbidez: os microrganismos geralmente aparecem em meio aquático agregados a partículas sólidas de
origem mineral ou orgânica que podem protegê-los do contato direto com o agente desinfetante. Ainda pode

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ocorrer de bactérias e vírus serem protegidos do desinfetante por serem ingeridos por nematóides ou outros
macroinvertebrados. Partículas de natureza mineral, de difícil oxidação, têm mostrado pouco efeito de inibição
sobre a taxa de decaimento dos microrganismos, ao passo que partículas orgânicas, mesmo em baixas
concentrações, têm sido bem mais efetivas em reduzir essa taxa.
- COT: a concentração de carbono orgânico total na fase líquida é um dos parâmetros mais importantes
para a determinação da concentração de ozônio a ser aplicada, uma vez que a matéria orgânica provoca o
consumo de oxidante.
- pH: a maioria dos dados disponíveis na literatura indica que a eficiência da desinfecção por ozônio é
pouco afetada na faixa de pH dos efluentes domésticos (entre 6 e 8). O efeito do pH está, provavelmente,
relacionado ao tipo de microrganismo-alvo, e não a uma influência relacionada à especiação do ozônio em água.

2.1.3. Processos artificiais físicos

2.1.3.1. Radiação ultravioleta

Recentemente, o emprego de radiação ultravioleta se estendem para diversos setores da atividade humana,
com particular interesse por sua ação germicida. No tratamento de esgotos sanitários, a radiação UV mostra-se
altamente competitiva com a cloração, nos casos em que a implantação de uma etapa adicional de descloração se
faz necessária. Esta última etapa tem por função o controle de subprodutos tóxicos de cloro nos efluentes
tratados, como os organoclorados (trihalometanos e outros), que não são gerados nos processos de desinfecção
UV.
O emprego da radiação UV é, portanto, uma importante alternativa à desinfecção química de águas
residuárias. Nenhum tipo de produto é adicionado à corrente líquida, resultando em processos simples, de baixo
custo e com pouca exigência de operação e manutenção.
Basicamente, a desinfecção com ultravioleta é conseguida pela exposição dos microrganismos presentes
nos esgotos à radiação emitida por lâmpadas ultravioleta. Essa exposição dos esgotos à radiação UV é feita em
canais ou em dutos sob pressão, denominados reatores fotoquímicos, foto-reatores ou simplesmente reatores UV.
A desinfecção por radiação UV baseia-se em alterações por fotólise do material genético (DNA, RNA)
dos organismos presentes no esgoto. As moléculas de DNA dos organismos a serem inativados absorvem
radiações com comprimento de onda entre 200 e 300 nm, em especial aquelas em torno de 260 nm, que alteram
sua composição e comprometem sua funcionalidade. A radiação UV atravessa a parede celular e é absorvida
pelos ácidos nucléicos e, em menor extensão, pelas proteínas e por outras moléculas biologicamente importantes.
A energia absorvida rompe as ligações não saturadas, principalmente as bases nitrogenadas pirimídicas.
As principais vantagens e desvantagens da aplicação da radiação ultravioleta na desinfecção de esgoto
são:

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O principal fator de interferência física no processo de desinfecção por radiação UV é a presença de
sólidos em suspensão. A agregação ou oclusão dos microrganismos na matéria particulada impede a penetração
da radiação ultravioleta, reduzindo a eficiência da inativação.

Efeitos da matéria particulada na desinfecção UV.

2.1.3.2. Filtração terciária

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O interesse na filtração terciária vem aumentando bastante nos últimos anos devido principalmente à
legislação sobre qualidade de água, que se torna cada vez mais restritiva. No Brasil, poucos sistemas desse tipo
estão instalados, possivelmente devido aos poucos estudos consistentes existentes sobre o assunto.
O objetivo da filtração terciária é remover partículas suspensas e coloidais do efluente secundário ou do
esgoto quimicamente tratado. Isso é conseguido pela passagem do esgoto através de um meio granular. À
medida que os sólidos vão sendo removidos e o filtro vai se tornando mais “entupido”, ele perde sua eficácia
devido à restrição da passagem da água ou pela perda de eficiência na remoção de sólidos suspensos. A limpeza
do leito sujo é realizada através da retro-lavagem, um processo onde a água passa em fluxo ascendente através
do leito e é descartada juntamente com os sólidos que se encontravam retidos, preparando o leito para o próximo
ciclo de filtração.
Os projetos de filtros granulares para esgoto basicamente seguiram os procedimentos desenvolvidos para o
tratamento de água potável. Entretanto, existem muitas diferenças entre a filtração de água potável e de esgoto.
Em geral, filtros de esgoto recebem partículas maiores, mais pesadas e de tamanhos mais variados, além de
cargas de sólidos mais irregulares. A filtração de esgoto é complexa e consiste de muitos processos físicos e
químicos.
Uma filtração de partículas coloidais eficiente geralmente requer uma desestabilização das mesmas,
acompanhada de coagulação e floculação. Isso permite a formação de partículas maiores que poderão ser
removidas por interceptação ou outros mecanismos. Portanto, os coagulantes serão eficientes auxiliares da
filtração se uma floculação adequada for promovida.
Podem ser utilizados como material filtrante a areais, carvão ativado entre outros.

2.1.2.3. Ultrafiltração

Os processos de separação por membranas, designadamente a ultrafiltração (UF), têm se tornado, nos
últimos anos, uma tecnologia cada vez mais atrativa como possível alternativa ao tratamento convencional
(cloração). Apesar das membranas de ultrafiltração terem uma malha maior relativamente a outros processos de
separação por membranas, como a osmose inversa, por exemplo, e desta forma menos eficientes na remoção de
moléculas dissolvidas de pequenas dimensões, a ultrafiltração é efetiva na remoção de partículas e de macro
moléculas. A filtração vai de 0,1 a 1  (1 x 10-6 m), a ultrafiltração de 20 a 50 Angstron (1 x 10-10 m) e a osmose
reversa de 1 a 20 Angstron.
Na ultrafiltração o elemento filtrante é uma membrana semipermeável, plana, tubular ou espiral. As
técnicas de membrana permitem a eliminação de efluentes líquidos, bem como a sua recuperação. A retenção por
ultrafiltração se efetiva a nível molecular. Só é possível se obter moléculas com peso molecular menor que um
certo valor (normalmente macromoléculas) , passando pelas membranas.
O tamanho das moléculas retidas depende da natureza das membranas, e, em certos casos e mesmo
possíveis associações moleculares entre os componentes do soluto. A ultrafiltração tem uma relação muito

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grande com a osmose inversa, pois ambas necessitam de agitação na interface fluido/membrana, limitando a
polarização do concentrado. Para tanto se observa que a recirculação do fluido tem elevada velocidade
Para que o ultrafiltro desempenhe satisfatoriamente funções, os cuidados com as membranas são
fundamentais. Quando a vazão de UF diminui abaixo de um certo nível deve-se efetuar uma operação de
lavagem da membrana. Tal operação é diferente para cada tipo de membrana, sendo, por isso, impossível se
descrever tal operação neste trabalho, e, no entanto possível citar algumas operações comuns como a lavagem
com UF, com água deionizada. e o uso de tensoativos. A sua conservação, assim como sua limpeza, difere muito
entre fabricantes e modelos, sendo, porém, importante citar que tais cuidados são fundamentais na durabilidade
das membranas, as quais são a parte mais importante do equipamento.
A filtração por membranas, comparada com os outros tratamentos, oferece uma série de vantagens:
(a) qualidade superior ao efluente tratado, através da remoção de macromoléculas, bactérias e vírus,
designadamente de microorganismos resistentes aos tratamentos químicos como cloração e ozonização;
(b) sistema mais compacto e modular, portanto facilmente adaptável às variações de qualidade e
quantidade efluente a tratar;
(c) fácil controle de operação e de manutenção;
(d) menor utilização de químicos que podem originar efeitos danosos à saúde pública;
No entanto, além destas vantagens, a aplicação da UF ao tratamento de efluentes está limitada devido ao
declínio do fluxo verificado ao longo do tempo (perda de carga), originando uma menor produção de efluente
tratado, maiores consumos de energia e necessidades freqüentes de limpeza das membranas com químicos.

A seguir segue as principais vantagens e desvantagens dos processos de desinfecção de esgotos


domésticos mais utilizados.

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2.2. Remoção de nutrientes (N e P)

A remoção de nitrogênio (N) e fósforo (P) pode ser um objetivo explícito do tratamento dos esgotos,
dependendo do impacto causado nos corpos receptores. No entanto, deve-se lembrar que nem sempre é desejada
a remoção destes constituintes: no caso da utilização do efluente tratado para fertirrigação, pode ser interessante
a preservação de N e P, os quais, em dosagens adequadas, são nutrientes para a cultura fertirrigada.
O presente item aborda, de forma sucinta, os processos mais comumente utilizados para a remoção de
nitrogênio e fósforo no tratamento de esgotos. São os seguintes os processos abordados:
- Remoção de N e P em lagoas de estabilização;
- Remoção de N e P em lodos ativados e reatores aeróbios com biofilmes;
- Remoção de N e P por processos físico-químicos;
- Remoção de N e P nos sistemas de disposição controlada no solo.

Não há consenso se a remoção de N e P é considerada um tratamento em nível terciário. Quando sua


remoção ocorre na etapa biológica do tratamento dos esgotos, usualmente se diz que o tratamento é secundário,
com remoção de N e/ou P. Quando há necessidade específica de uma etapa posterior, configura-se mais
claramente o nível terciário do tratamento.

Remoção de nitrogênio e fósforo em lagoas


Remoção de nitrogênio
Os principais mecanismos de remoção de nitrogênio em lagoas de estabilização são:
- volatilização da amônia;
- assimilação da amônia pelas algas;
- assimilação dos nitratos pelas algas;
- nitrificação – desnitrificação;
- sedimentação do nitrogênio orgânico particulado.
Destes mecanismos, o mais importante é o da volatilização da amônia, ou seja, desprendimento da amônia
para a atmosfera. No meio líquido, a amônia apresenta-se segundo a seguinte reação de equilíbrio:


NH3  H   NH 4

A amônia livre (NH3) é passível de volatilização, ao passo que a amônia ionizada não pode ser removida
por volatilização. Com a elevação do pH, o equilíbrio da reação se desloca para a esquerda, favorecendo a maior
presença de NH3. No pH em tomo da neutralidade, praticamente toda a amônia encontra-se na forma de NH4+.
No pH próximo a 9,5, aproximadamente 50% da amônia está na forma de NH3 e 50% na forma de NH4+. Em pH
superior a 11, praticamente toda a amônia está na forma de NH3.

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A fotossíntese que ocorre nas lagoas facultativas e, principalmente nas lagoas de maturação e de
polimento, contribui para a elevação do pH, por retirar do meio líquido o CO 2, ou seja, a acidez carbônica. Em
condições de elevada atividade fotossintética, o pH pode subir a valores superiores a 9,0, proporcionando
condições para a volatilização do NH3. Ademais, em condições de alta taxa de fotossíntese, a elevada produção
de algas contribui com o consumo direto de NH3 pelas algas.
O mecanismo da volatilização tende a ser mais importante em lagoas de maturação e de polimento as
quais, em função da sua reduzida profundidade, e conseqüente atividade fotossintética ao longo de toda a coluna
d'água, usualmente atingem valores de pH bastante elevados. Adicionalmente, nestas lagoas, o desprendimento
de bolhas de oxigênio da fase líquida supersaturada pode acelerar o desprendimento de NH3.
Os demais mecanismos de remoção de nitrogênio atuam simultaneamente, mas são considerados de menor
importância. A nitrificação é pouco representativa em lagoas facultativas e lagoas aeradas. Nas lagoas
anaeróbias, não há, naturalmente, nenhuma reação de oxidação da amônia, devido à ausência de oxigênio.

Remoção de fósforo
O fósforo presente nos esgotos é composto de fósforo orgânico e fosfatos, sendo que os últimos
representam a maioria. O principal mecanismo de remoção de fósforo em lagoas (principalmente de maturação e
de polimento) é a precipitação de fosfatos em condições de elevado pH. O fosfato pode precipitar-se na forma de
hidroxiapatita ou estruvita. Em lagoas especialmente rasas, a remoção de fósforo pode ser elevada, ao passo que
em lagoas facultativas e aeradas, a eficiência de remoção é mais baixa.

Remoção biológica de nitrogênio e fósforo em sistemas de lodos ativados e reatores aeróbios com biofilmes
Remoção de nitrogênio em sistemas de lodos ativados e reatores aeróbios com biofilmes
Os sistemas de lodos ativados e, em certas condições, os reatores aeróbios com biofilmes, são capazes de
produzir, sem alterações de processo, conversão satisfatória de amônia para nitrato (nitrificação). Neste caso, a
amônia é removida, mas o nitrogênio não, já que há apenas uma conversão da forma do nitrogênio. Em regiões
de clima quente, a nitrificação ocorre quase que sistematicamente no sistema de lodos ativados, a menos que
haja algum problema ambiental no tanque de aeração, como falta de oxigênio dissolvido, baixo pH, pouca
biomassa ou a presença de substâncias tóxicas ou inibidoras. Para que ocorra nitrificação em reatores aeróbios
com biofilmes, é necessário que eles sejam dimensionados com baixas cargas, compatíveis com a reprodução
mais lenta das bactérias nitrificantes. Este pode ser o caso dos filtros biológicos percoladores de baixa carga e
dos biofiltros aerados submersos.
A remoção biológica de nitrogênio é alcançada em condições de ausência de oxigênio, mas na presença de
nitratos (denominadas condições anóxicas). Nestas condições, um grupo de bactérias utiliza nitratos no seu
processo respiratório, convertendo-os a nitrogênio gasoso, que escapa na atmosfera. Este processo é denominado
desnitrificação. Para se alcançar a desnitrificação no sistema de lodos ativados e em certos reatores aeróbios com
biofilmes (ex: biofiltros aerados submersos), são necessárias ainda modificações no processo, incluindo a criação
de zonas anóxicas e possíveis recirculações internas.

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Em sistemas de lodos ativados onde ocorre a nitrificação é interessante que se realize também a
desnitrificação, praticada intencionalmente no reator. As razões estão normalmente associadas a aspectos
puramente operacionais, bem como à qualidade do efluente final:
(a) Economia de oxigênio (economia de energia na aeração). Em condições anóxicas, as bactérias facultativas
removem a DBO utilizando os nitratos nos seus processos respiratórios, conduzindo, portanto, a uma economia
de oxigênio ou, em outras palavras, de energia para aeração. Esta economia compensa, parcialmente, os gastos
energéticos com a nitrificação, que ocorre, obrigatoriamente, em condições aeróbias.
(b) Economia de alcalinidade (preservação da capacidade tampão). Durante a nitrificação, há geração de íons H+
e consumo de alcalinidade, o que pode conduzir a um abaixamento do pH no tanque de aeração. A
desnitrificação, por sua vez, consome H+ e gera alcalinidade, compensando, parcialmente, os mecanismos de
redução de pH que ocorrem na nitrificação.
(c) Operação do decantador secundário (evitar lodo ascendente). Caso a desnitrificação ocorra nas condições
anóxicas do decantador secundário, haverá a produção de pequenas bolhas de nitrogênio gasoso. Estas bolhas
tendem a se aderir aos flocos em sedimentação, arrastando-os para a superfície, causando perda de biomassa e
deterioração da qualidade do efluente final. Por este motivo, incentiva-se que a desnitrificação ocorra fora do
decantador secundário.
(d) Controle de nutrientes (eutrofização). A redução nos teores de nitrogênio no efluente final é importante
quando se faz o lançamento em corpos d' água sensíveis, sujeitos à eutrofização.
Deve-se destacar que sistemas de lodos ativados e biofiltros aerados submersos, atuando como pós-
tratamento de efluentes de reatores UASB, têm maior dificuldade em proporcionar a remoção biológica de
nitrogênio. A prévia remoção de grande parte da matéria orgânica no reator UASB faz com que haja menor
disponibilidade de alimento para as bactérias responsáveis pela desnitrificação.

Remoção biológica de fósforo em sistemas de lodos ativados


A remoção biológica de fósforo (desfosfatação) pode ser alcançada através de adaptações no fluxograma
do processo de lodos ativados em nível secundário. Para a remoção biológica de fósforo, é essencial a existência
de zonas anaeróbias e zonas aeróbias na linha de tratamento. A zona anaeróbia é considerada um seletor
biológico para os microrganismos acumuladores de fósforo. Esta zona propicia uma vantagem em termos de
competição para os organismos acumuladores de fósforo, já que eles podem assimilar o substrato nesta zona
antes de outros microrganismos, não armazenadores de fósforo. Desta forma, esta zona anaeróbia permite o
desenvolvimento ou seleção de uma grande população de organismos acumuladores de fósforo no sistema, os
quais absorvem apreciáveis quantidades de fósforo do meio líquido, bem superiores aos requisitos metabólicos
normais. Ao se remover o lodo biológico excedente, contendo também os organismos acumuladores de fósforo
ricos deste elemento, está removendo-se o fósforo do sistema.
Em decorrência da remoção de fósforo do meio líquido, os teores de P solúvel podem ser baixos. No
entanto, deve-se lembrar que a biomassa nos processos de remoção biológica de fósforo contém teores bastante
elevados de P, os quais foram retirados da massa líquida. Caso esta biomassa (sólidos em suspensão) saia em

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teores elevados no efluente final, ter-se-á, como conseqüência, teores também elevados de P particulado. Por
este motivo, é essencial que em sistemas com remoção biológica de fósforo, os teores de SS no efluente final
sejam bastante baixos. Caso se necessite de concentrações especialmente baixas de fósforo no efluente, pode
haver necessidade da complementação da remoção de sólidos por filtração ou flotação.

Remoção físico-química de nitrogênio e fósforo


A amônia pode ser removida por processos físico-químicos por meio da volatilização da amônia livre
(NH3), alcançada por meio da elevação do pH (ex: adição de cal), complementada por processos de transferência
de gases (ex: torres de aeração). No caso de esgotos domésticos, normalmente os processos físico-químicos
repercutem em custos operacionais mais elevados do que os associados à remoção biológica.
A remoção físico-química de fósforo pode ser alcançada por meio de:
(a) adição de agentes coagulantes (íons metálicos) ou alcalinizantes: precipitação do fósforo solúvel;
(b) filtração ou flotação (terciária) do efluente: remoção do fósforo presente nos sólidos em suspensão;
(c) combinação da adição de coagulantes ou alcalinizantes e da filtração ou flotação.
No tratamento dos esgotos domésticos, nos casos em que é desejada uma elevadíssima qualidade do
efluente final, os processos físico-químicos de remoção de nitrogênio e fósforo são utilizados de forma mais
eficaz para o polimento do efluente, após uma prévia remoção biológica de N e/ou P.

Remoção de nitrogênio e fósforo em sistemas de disposição controlada no solo


Os sistemas de disposição de esgotos no solo, contendo culturas irrigadas, proporcionam remoção de N e
P. A remoção de nutrientes ocorre pelas plantas, cujo desenvolvimento, naturalmente, depende de nitrogênio e
fósforo. Ao invés destes nutrientes serem supridos por formulações específicas de N:P:K de fertilizantes
sintéticos, eles são disponibilizados pelas águas residuárias.
No entanto, a aplicação destes nutrientes, principalmente nitrogênio, deve se dar levando em consideração
princípios da agronomia e preocupações em termos de saúde pública. Quantidades excessivas de nitrogênio, bem
como a salinidade dos esgotos, podem ser desfavoráveis para a cultura vegetal. A percolação de nitrogênio pelo
solo pode conduzir à contaminação do lençol freático. Aspectos sanitários (associados a organismos
patogênicos) dos trabalhadores rurais em contato com os esgotos, assim como da cultura fertirrigada
possivelmente disponibilizada para o mercado, têm de ser levados em consideração. Desde que os devidos
cuidados sejam tomados, esta é uma interessante prática para uma utilização produtiva dos esgotos.

3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHERNICHARO, C. A. L. Reatores anaeróbios. 2. ed. Belo Horizonte: Departamento de Engenharia Sanitária e


Ambiental (DESA/UFMG), 2007. 246 p. (Princípios do tratamento biológico de águas residuárias; v.5).

GOLÇALVES, R. F. (coord.). Desinfecção de efluentes sanitários. Rio de Janeiro: ABES, RiMa, 2003. 438p.
(Projeto PROSAB).

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MATOS, A. T. Manejo e tratamento de resíduos agroindustriais. Viçosa: Departamento de engenharia
Agrícola/Associação dos engenheiros Agrícolas de Minas Gerais (DEA/AEA-MG), 2004.120p. (Série Caderno
Didático, 31).

VON SPERLING. M. Introdução à qualidade das águas e ao tratamento de esgotos. 4.ed. Belo Horizonte:
Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental (DESA/UFMG), 2014. 452p. (Princípios do tratamento
biológico de águas residuárias; v.1).

VON SPERLING. M. Lagoas de estabilização. 2. ed. Belo Horizonte: Departamento de Engenharia Sanitária e
Ambiental (DESA/UFMG), 2006. 140p. (Princípios do tratamento biológico de águas residuárias; v.3).

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