Você está na página 1de 2

150 anos depois ainda somos pela vida?

No dia 1 de Julho de 1867, foi publicada uma carta de lei que aboliu a pena de morte
em território nacional. Nesse dia, Portugal foi pioneiro na defesa dos direitos
humanos, consagrando o direito à vida e à dignidade da pessoa humana como um
corolário do estado de direito democrático e centro do nosso ordenamento jurídico.
Esse foi um marco histórico da civilização ocidental que instituiu a vida humana como
um direito fundamental inviolável.
Esta revolucionária medida Lusa acabou por se propagar até abranger todo o
continente Europeu. Assim, no dia 28 de Abril de 1983 foi celebrado, pelos 47 países
da grande Europa, o protocolo n.º 6 à Convenção Europeia dos Direitos do Homem, no
qual a pena de morte foi abolida e proibida em toda a Europa.
Celebrar o 150.º aniversário da data em que Portugal indicou ao mundo o caminho da
defesa dos direitos humanos deve ser um motivo de enorme orgulho para todos os
Portugueses. A abolição da pena de morte é expressão máxima da tolerância numa
sociedade. É uma demonstração de enorme confiança no próximo e no sistema de
justiça. É a crença de que todo e qualquer cidadão poderá corrigir-se e ser reintegrado
na comunidade, independentemente dos crimes que possa ter cometido. A abolição
da pena de morte, representa em si a oficialização da cultura do perdão.
Passados 150 anos desse feito cabe à sociedade portuguesa perguntar-se se tem
estado à altura desse feito bem como se tem sabido honrar este magnifico legado de
defesa dos direitos humanos. Infelizmente, parece-me que a resposta é
evidentemente negativa. Em 2007, a sociedade portuguesa celebrou os 140 anos da
abolição da pena de morte com uma medida que representa um gravíssimo retrocesso
civilizacional, onde a cultura da vida foi substituída por uma cultura de morte.
A legalização do aborto foi a pior forma possível de celebrar o marco histórico na
defesa da vida humana conquistado 140 anos antes. Se em 1867 Portugal foi pioneira
na defesa dos direitos humanos, em 2007 destacou-se precisamente pelos motivos
contrários. Em 1867, Portugal decidiu – e bem – que nem o maior criminoso deve ser
condenado à morte.
No entanto, em 2007 ao legalizar o aborto, permitiu que o ser mais frágil e indefeso da
sociedade o fosse. Note-se que a legalização do aborto é em todos os seus aspectos
bem mais injusta e atentatória dos direitos humanos do que a inaceitável pena de
morte. Nos países em que é permitida a pena de morte, existem normalmente dois
pressupostos para que esta seja aplicada. Primeiro, que tenha sido praticado um
crime. Segundo, que exista um processo penal que conduza a essa condenação. Ora,
no caso das pessoas vítimas de aborto podemos constatar que estas não só não
praticaram nenhum crime, como não tiveram direito a um processo justo e equitativo,
estando somente entregues ao arbítrio da sua progenitora.
Podemos por isso dizer que assim como a abolição da pena de morte é expressão da
tolerância da sociedade para com um criminoso, a legalização do aborto consiste numa
tremenda intolerância para com o direito a nascer. Desta forma, constatamos que a lei
do aborto vem colocar em causa a defesa dos direitos humanos assim como toda a
sustentabilidade do ordenamento jurídico nacional, que até esse dia apresentava
enorme coerência na defesa da vida humana e da sua dignidade como centro da nossa
sociedade.
Em 2017, ano em que se discute a legalização da eutanásia e se celebram os 150 anos
da abolição da pena de morte e os 10 da legalização do aborto, qual é o exemplo que a
sociedade portuguesa quer seguir? Passados 150 anos ainda somos pela vida? Esta é
uma pergunta a que todos somos chamados a responder. Em especial, os deputados à
Assembleia da República e o Presidente da República que irão definir a forma como a
sociedade portuguesa se posicionará quanto ao mais básico e elementar direito
humano, o direito à vida. Estarão os nossos representantes à altura do legado histórico
de Portugal na defesa dos direitos humanos?
in https://observador.pt/opiniao/150-anos-depois-ainda-somos-pela-vida

Você também pode gostar