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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

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Maria Salete Bessa Jorge
Indara Cavalcante Bezerra
Ilse Maria Tigre Arruda Leitão

PESQUISAS EM SAÚDE NO
CONTEXTO DO CUIDADO, REDES DE
ATENÇÃO, FLUXOS E AVALIAÇÃO:
multiplicidade de olhares

1a Edição
Fortaleza - CE
2017
PESQUISAS EM SAÚDE NO CONTEXTO DO CUIDADO, REDES DE
ATENÇÃO, FLUXOS E AVALIAÇÃO: multiplicidade de olhares
© 2017 Copyright by Maria Salete Bessa Jorge, Indara Cavalcante Bezerra e Ilse Maria Tigre
Arruda Leitão

Impresso no Brasil / Printed in Brazil


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Diagramação e Capa
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Revisão de Texto
Lorna Etiene Castelo Branco Reis

Ficha Catalográfica
Lúcia Oliveira CRB - 3/304
B557p Bessa, Maria Salete

Pesquisas em saúde no contexto do cuidado, redes de atenção,


fluxos e avaliação: multiplicidade de olhares / Maria Salete Bessa,
Jorge Indara Cavalcante Bezerra, Ilse Maria Tigre Arruda Leitão.
- Fortaleza: EdUECE, 2017.

503 p. : il.
ISBN: 978-85-7826-585-4

1.Pesquisa em saúde. 2. Atenção em saúde. 3. Informação - Saúde.


I. Bezerra, Jorge Indara Cavalcante. II. Leitão, Ilse Maria Tigre Arruda.

CDD: 610
Prefácio

O presente estudo foi construído com o intuito de


contribuir para a discussão sobre o cuidado em saúde bem
como nortear as práticas cotidianas nos serviços. Desse
modo, ao longo do livro, os autores buscaram articular os
seus objetos de estudo com as práticas, fomentando uma
integração entre saber e fazer.
Além disso, os autores apresentam suas discussões a
partir de um olhar ampliado sobre o usuário dos serviços
em saúde, abrangendo também as experiências desses su-
jeitos que buscam o cuidado, afastando-se assim de uma
compreensão reduzida desse usuário. Desse modo, com-
preende-se que esse cuidado deve ser ofertado a um sujeito
integrado.
Para uma compreensão ampla do usuário do serviço
em saúde, faz-se necessário uma multiplicidade de olhares
sobre o fenômeno do cuidado em saúde, desse modo ao lon-
go do livro é perceptível essa diversidade na abordagem dos
problemas em saúde bem como nas discussões que norteiam
o cuidado.
Desse modo, o leitor ao debruçar-se sobre o livro, com-
preenderá a importância da interdisciplinaridade no campo
da saúde, uma vez que o fenômeno é bastante complexo e,
portanto, necessita do compartilhamento e articulação de
diferentes saberes e práticas.
Nesse sentido, os capítulos abordam temas importan-
tes. Na parte 1 do livro, os autores abordam a rede de aten-
ção em saúde, bem como as instituições e os serviços. Nesse
primeiro momento, são discutidos os processos de trabalho
em saúde bem como aspectos institucionais na perspectiva
na integralidade do cuidado.
Na segunda parte, o cuidado aos sujeitos com doen-
ças crônicas. Os autores norteiam como esse cuidado pode
ser realizado no âmbito da oferta de um cuidado integrado,
para tal são abordadas questões relacionadas à adesão ao
tratamento bem com a qualidade de sono de pessoas com
doenças crônicas.
A terceira parte convida o leitor a refletir sobre ques-
tões relevantes no âmbito da saúde. Desse modo, são abor-
dados em assuntos como o avanço da AIDS entre os jovens,
aspectos relacionados ao envelhecimento, uma discussão
sobre aborto, questões relacionadas a avaliação e economia
em saúde.
Desse modo, o livro ao reunir um vasto material com
diferentes discussões que perpassam o cuidado integrado
oferece ao leitor um olhar mais ampliado sobre os fenôme-
nos que envolvem o cuidado em saúde.
SUMÁRIO

Introdução | 11
Indara Cavalcante Bezerra
Maria Salete Bessa Jorge
Ilse Maria Tigre de Arruda Leitão

PARTE I
ESPAÇOS DE SAÚDE: UM OLHAR SOBRE A REDE, AS INS-
TITUIÇÕES E OS SERVIÇOS.

Capítulo 1 | 17
AS REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE E SUAS INTERFACES:
processos de trabalho, atenção primária à saúde e produção do cui-
dado integral.
Carlos Bruno Silveira
Maria Salete Bessa Jorge
Ilse Maria Tigre de Arruda Leitão

Capítulo 2 | 45
A CONSTRUÇÃO DA REDE DE URGÊNCIA E EMERGÊN-
CIA NO CONTEXTO DO ESTADO DO CEARÁ: um caminho
para a ampliação da integralidade.
Antonia Alizandra Gomes dos Santos Rodrigues
Maria Salete Bessa Jorge

Capítulo 3 | 61
PROCESSO DE TRABALHO, CORRESPONSABILIZAÇÃO E
CULTURA ORGANIZACIONAL DO NASF: uma discussão para
superar de desafios.
Fernando Virgílio Albuquerque de Oliveira
Maria Salete Bessa Jorge

Capítulo 4 | 81
VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL: abordagens, conceitos e refle-
xões
Ana Paula Cavalcante Ramalho Brilhante
Maria Salete Bessa Jorge
Capítulo 5 | 116
AMBIÊNCIA COMO FATOR ESTRUTURANTE PARA HU-
MANIZAÇÃO NA EMERGÊNCIA HOSPITALAR
Richel Bruno Oliveira Castelo Branco
José Jackson Coelho Sampaio

Capítulo 6 | 143
DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL E A UTILIZAÇÃO DOS SISTE-
MAS DE INFORMAÇÕES GEOGRÁFICAS EM SAÚDE
Radmila Alves Alencar Viana
Francisco José Maia Pinto

PARTE II
DOENÇAS CRÔNICAS: OS DESAFIOS DO CUIDADO EM
SAÚDE.

Capítulo 7 | 171
DETERMINANTES DA DOENÇA RENAL CRÔNICA: uma
revisão integrativa.
Luana Rodrigues Sarmentu
Larissa Alves Alexandre Moliterno
Lívia Cristina Barros Barreto
Paula Frassinetti Castelo Branco Camurça Fernandes

Capítulo 8 | 189
CONTRIBUIÇÕES CIENTÍFICAS BRASILEIRAS NA QUALI-
DADE DE SONO EM PACIENTES COM DOENÇA RENAL
CRONICA: uma revisão integrativa.
Edyla M. P. F. Camelo
Paula Frassinetti Camurça Castelo Branco

Capítulo 9 | 204
PREVALÊNCIA DE DOENÇA RENAL CRÔNICA EM PA-
CIENTES HIPERTENSOS E/OU DIABÉTICOS EM UMA
UNIDADE DE ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NUMA CA-
PITAL DO NORDESTE BRASILEIRO.
Larissa Alves Alexandre Moliterno
Paula Frassineti Castelo Branco Camurça Fernandes
Capítulo 10 | 234
QUESTIONÁRIOS VALIDADOS PARA MENSURAÇÃO DA
ADESÃO AO TRATAMENTO DA INSUFICIÊNCIA CARDÍA-
CA: uma revisão integrativa
Dafne Lopes Salles
Thereza Maria Magalhães Moreira

Capítulo 11 | 249
O AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE E SUA CONTRI-
BUIÇÃO NA PROMOÇÃO DO AUTOCUIDADO JUNTO A
PACIENTES COM DIABETES MELLITUS TIPO 2
Joyce O. Matos
Lucimar B. Barbosa
Andrea Caprara

Capítulo 12 | 267
A abordagem teatral de augusto boal na
atenção psicossocial: poéticas e políticas do teatro do
oprimido na saúde.
Emanuella C. Joca
Maria Rocineide F. da Silva

PARTE III.
ESTUDOS DIVERSOS NO CONTEXTO DA SAÚDE: UM
CONVITE À REFLEXÃO

Capítulo 13 | 299
POR QUE A AIDS AVANÇA ENTRE OS JOVENS? Provocações
para uma pesquisa.
Diego da Silva Medeiros
Maria Salete Bessa Jorge

Capítulo 14 | 325
ASPECTOS DO ENVELHECIMENTO E A RELAÇÃO COM A
SÍNDROME DA FRAGILIDADE.
Cíntia Lira Borges Pedrosa
José Wellington de Oliveira
Capítulo 15 | 359
ABORTOS INSEGUROS: uma análise da produção científica no Brasil.
Katherine Jerônimo Lima
Francisco Jose Maia Pinto
Ana Carolina Oliveira e Silva;
Fátima Café Ribeiro dos Santos
Fiama Kecia Silveira Téofilo
Glaucilândia Pereira Nunes

Capítulo 16 | 385
O DESAFIO DA REPRESENTATIVIDADE NOS CONSE-
LHOS DE SAÚDE: um estudo de revisão integrativa da literatura
Jamine Borges Morais
Maria Salete Bessa Jorge
Indara Cavalcante Bezerra

Capítulo 17 | 406
CUSTOS, IMPACTO E AVALIAÇÃO ECONOMICA DA DEN-
GUE: uma revisão integrativa.
Sonia Samara Fonseca de Morais
Marcelo Gurgel Carlos da Silva

Capítulo 18 | 429
INDICADORES DE MORTALIDADE INFANTIL.
Ana Carolina Oliveira e Silva
Daniella Barbosa Campos
Katherine Jerônimo Lima
Ana Valeska Siebra e Silva

Capítulo 19 | 459
CUIDADOS E SAÚDE PRIMÁRIOS: governança e inovação em
saúde em portugal
Pedro L Ferreira
Vítor Raposo
Patrícia Ferreira Antunes

Pósfacio | 493

AUTORES COLABORADORES | 495


INTRODUÇÃO

A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA SAÚDE


COLETIVA: um campo em ebulição

Maria Salete Bessa Jorge


Indara Cavalcante Bezerra
Ilse Maria Tigre Arruda Leitão

Os envolvidos com o processo de ensino e aprendi-


zagem na pós-graduação devem assumir o compromisso
de pesquisar objetos coerentes, demandados pelo enfren-
tamento da realidade social cotidiana e cujos resultados e
se ‘voltem’ para a sociedade de forma responsável, ética e
eficiente, em prol da melhoria do coletivo.
Desafios da sociedade contemporânea e da sociedade
brasileira, em especial, têm demandado maior aprofunda-
mento do conhecimento sobre a importância das pesquisas
em saúde coletiva para desenvolvimento de politicas publi-
cas e sobre como sinergias entre políticas econômicas e sa-
nitária podem configurar estratégias exitosas para o alcance
de resultados positivos nas ações de saúde.
Comprometidas com este propósito, as organizadoras
deste livro, apresentam por meio de 18 capítulos, pesquisas
recentes realizadas pelos discentes do Programa de Pós-
Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Estadual
do Ceará (PPSAC-UECE) e conduzidas em parceria com

11
o Grupo de Pesquisa Saúde Mental, Família, Práticas de
Saúde e Enfermagem (GRUPSFE), também vinculado à
UECE e cuja experiência em pesquisas vem sendo acumu-
lada ao longo de vários anos, comprovada pela extensa pro-
dução científica em conceituados periódicos pertencentes às
áreas de saúde mental, saúde coletiva e enfermagem.
As multiplicidades a que os autores se reportam ultra-
passam a visão superficial que se poderia ter acerca do coti-
diano da produção científica da Saúde Coletiva. Os textos
são críticos, bem escritos e abordam objetos essenciais.
O livro está dividido em três partes, no intuito de
agrupar assuntos afins em temáticas mais gerais. A primeira
parte aborda “Espaços de Saúde: Um Olhar sobre a Rede,
as Instituições e os Serviços”, a qual aborda uma discussão
teórica sobre as redes de atenção saúde suas interfaces com
a Atenção Primária à Saúde, com os Núcleos de Atenção
à Saúde da Família (NASF), com as redes de Urgência e
Emergência e a rede Hospitalar, além de avançar para te-
máticas como Sistemas de Informação na saúde e Violência
Institucional com ênfase nas e tensões que permeiam a cul-
tura organizacional e práticas institucionalizantes dos servi-
ços. Nesse sentido, buca-se a noção de Rede Viva como modo
de produção das conexões existenciais de indivíduos e coletivos,
em diferentes contextos, que opera como agenciador dos encontros
entre os vários que pertencem ao mundo do trabalho em saúde e
dispara a atualização das relações de poder no campo do agir em
saúde [...] (MERHY et al., 2014).
A segunda parte traz reflexões sobre “Doenças Crôni-
cas: Os Desafios do Cuidado Em Saúde”, partindo do pres-
suposto de que o cuidado deve fazer sentido para as pessoas,

12
tornando-se imprescindível a aproximação de saberes profissio-
nais e populares para um diálogo em busca de um cuidado satis-
fatório (BUDÓ, 2016). Nesse sentido circulam objetos de
pesquisas relacionados às doenças crônicas renais, cardíacas,
diabetes e o sofrimento mental, diante de uma perspecitva
de enfrentamento e cuidado contínuo acerca desses agravos.
Nos “Estudos Diversos no Contexto da Saúde: Um
Convite À Reflexão” entram em cena na terceira e der-
radeira parte do livro com capítulos que versam temáticas
desafiadoras, polêmicas e recorrentes no campo da saúde,
como o aumento da infecção por HIV na população jovem,
o aborto, o impacto da dengue, a mortalidade infantil, o
desafio do controle social e da fragilidade relacionada ao
envelhecimento da população que está cada vez mais idosa.
Seguno De Sousa Porto (2014), o desafio epistêmico exige a
crítica e superação dos aspectos descontextualizadores, reducio-
nistase despolitizantes do conhecimento construído a partir do
paradigma hegemônico no campo da saúde e que para ques-
tionar esse paradigma devemos nos aproximar de abordagens
emancipatórias […] que identicam a necessidade premente de
questionarmos as fronteiras entre o conhecimento cientíco e o sa-
ber dos povos e comunidades vulnerabilizados.
O PPSAC tem orientado suas atividades para a for-
mação em Saúde Coletiva, a partir do desenvolvimento
de pesquisas e integração entre atividades e demandas re-
gionais, mantendo a perspectiva da produção universal do
conhecimento. Os aspectos mais centrais referentes à sua
consolidação envolvem desde o processo seletivo dos alunos
à atuação dos egressos, além da estruturação e organização
do programa quanto a integração da graduação e pós-gra-

13
duação, ao processo de qualificação docente e de formação
e intercâmbio dos discentes (parceria com outros programas
nacionais e internacionais).
Os projetos, teses e dissertações do PPSAC têm seu
resultados disseminados através da publicação artigos, livros
e eventos científicos de grande importância na comunidade,
à exemplo da presente obra, voltados para subsidiar a for-
mação em saúde coletiva e transformar as práticas desenvol-
vidas nos serviços.
A discussão sobre o uso dos resultados das pesquisas
em saúde configura-se como dimensão explicativa para di-
ferentes graus de desenvolvimento das organizações e im-
plementação de assistência à saúde de qualidade, dado que
as provocações e seus achados e desenvolvimento de tecno-
logias e inovações podem gerar diferenciações no modelo
de gestão e ocasionar processos de mudança social.
Trata-se, pois, de uma leitura rica para gestores, pes-
quisadores, docente, discentes e profissionais de saúde,
onde a análise crítica dos pesquisadores sobre os fenômenos
estudados, traduzem a possibilidade de repensar o ‘fazer’ em
saúde.
Com efeito, os conteúdos aludidos nesta coletânea
ebulem em novos conhecimentos que trazem à tona refle-
xões substanciais sobre temáticas recorrentes enfrentadas
no universo empírico, fundamentadas nas pesquisas desen-
volvidas pelos discentes e seus professores. Os pressupostos
das investigações incidem sobre uma realidade complexa
que envolve instituições, pessoas, desafios, retrocessos e
avanços vivenciados no campo da saúde.

14
No tracejar da leitura, busca-se compartilhar elemen-
tos significativos desvelados pelas pesquisas e que podem
fomentar a evolução de processos sociais emancipatórios e
transformadores da realidade.

Referências
BUDÓ, Maria de Lourdes Denardin. Cuidado sociocultural na
cronicidade: em busca de um cuidado que faça sentido. 2016.
DE SOUZA PORTO, Marcelo Firpo; FERREIRA DA RO-
CHA, Diogo; FINAMORE, Renan. Saúde coletiva, território e
conflitos ambientais: bases para um enfoque socioambiental críti-
co. Ciência & Saúde Coletiva, v. 19, n. 10, 2014.
MERHY, Emerson Elias et al. Redes Vivas: multiplicidades gi-
rando as existências, sinais da rua. Implicações para a produção do
cuidado e a produção do conhecimento em saúde. Divul Saúde
Debate, v. 52, p. 153-64, 2014.

15
PARTE I

ESPAÇOS DE SAÚDE: UM
OLHAR SOBRE A REDE, AS
INSTITUIÇÕES E OS SERVIÇOS

16
CAPÍTULO 1

AS REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE E SUAS


INTERFACES: processos de trabalho, atenção
primária à saúde e produção do cuidado integral

Carlos Bruno Silveira


Maria Salete Bessa Jorge
Ilse Maria Tigre de Arruda Leitão

INTRODUÇÃO

Os serviços públicos de saúde no Brasil ainda se carac-


terizam pela fragmentação e descontinuidade da atenção,
decorrente de uma frágil articulação dos gestores do Sistema
Único de Saúde (SUS), a gerência da ponta dos serviços e as
práticas clínicas desenvolvidas por diferentes profissionais.
Daí surge à necessidade de se construir um sistema integral
e articulado entre si, que supra as necessidades individuais e
subjetivas de cada indivíduo ou coletividade.
Assim, leva-se em consideração o conceito das Redes
de Atenção à Saúde (RAS), que são arranjos organizati-
vos de ações e serviços de saúde, de diferentes densidades
tecnológicas, que integradas por meio de sistemas de apoio
técnico, logístico e de gestão, buscam garantir a integralida-
de do cuidado (BRASIL, 2010).

17
O funcionamento e a consolidação do SUS apoiam-se
no entendimento de que os serviços de saúde devem estar
organizados a partir de uma rede de cuidados articulada,
com fluxos conhecidos e regulados, cujo objetivo é acolher
as necessidades sentidas por usuários, gestores e sociedade,
definidas por critérios epidemiológicos, econômicos e cul-
turais (STARFIELD, 2010).
Nesse contexto, a Atenção Primária à Saúde (APS) é
reconhecidamente um componente-chave. Esse reconhe-
cimento fundamenta-se nas evidências de seu impacto na
saúde e no desenvolvimento da população nos países que a
adotaram como base para seus sistemas de saúde: melhores
indicadores de saúde, maior eficiência no fluxo dos usuários
dentro do sistema, tratamento mais efetivo de condições
crônicas, maior eficiência do cuidado, maior utilização de
práticas preventivas, maior satisfação dos usuários e dimi-
nuição das iniquidades sobre o acesso aos serviços e o estado
geral de saúde (OPAS, 2011).
No cenário nacional, em 2012, o papel da APS na or-
denação das RAS foi fortalecido pela Política Nacional da
Atenção Básica. “A nova política articula a APS com impor-
tantes iniciativas do SUS, como a ampliação das ações interseto-
riais e de promoção da saúde ”. A APS deve ser o contato pre-
ferencial dos usuários, a principal porta de entrada e centro
de comunicação da RAS (BRASIL, 2012, p. 32).
Na organização dos serviços da APS no Brasil, utiliza-
se da Estratégia Saúde da Família (ESF), que prioriza ações
de promoção, proteção e recuperação da saúde, de forma
integral e contínua.

18
A ESF propõe que a atenção à saúde se centre na fa-
mília, entendida e percebida a partir de seu ambiente físico e
social, o que leva os profissionais de saúde a entrar em contato
com as condições de vida e saúde das populações, permitin-
do-lhes uma compreensão ampliada do processo saúde-doen-
ça e da necessidade de intervenções que vão além das práticas
curativas. Para tanto, os profissionais que nela atuam deverão
dispor de um arsenal de recursos tecnológicos bastante diver-
sificados e complexos (OLIVEIRA; PEREIRA, 2013).
Almeja-se, portanto, um modelo assistencial que esteja
orientado para a integralidade e às necessidades ampliadas
de saúde, em sintonia com os princípios do SUS e que supe-
re os problemas decorrentes da hegemonia do paradigma da
biomedicina. Esse é um dos grandes desafios do sistema de
saúde brasileiro na atualidade (FERTONANI et al. 2015).
Em convergência a este aspecto, o estudo das redes nos
serviços de saúde se tornou uma das discussões mais desa-
fiantes dos tempos atuais. Em primeiro lugar por que é prio-
ridade do Ministério da Saúde a organização dos serviços em
redes, tendo lançado as redes prioritárias para sua constru-
ção, que estão em pleno processo de efetivação. Em segundo
lugar, pela complexidade que o tema alcança, ao supormos
que o trabalhador tem altos graus de liberdade no exercício
do seu trabalho e, portanto, está apto a realizar as redes com
altos graus de singularidade, diferenciando em muito do que
foi prescrito pela normatização oficial (FRANCO, 2015).
Desta forma, tem-se como objetivo realizar revisão in-
tegrativa do tema das Redes de Atenção à Saúde com foco
nos seus processos de trabalho, sua relação com a atenção
primária à saúde e a produção do cuidado integral.

19
A pesquisa foi realizada utilizando-se das bases de da-
dos disponíveis na Biblioteca Virtual em Saúde, no período
de agosto de 2016 a janeiro de 2017, através do entrecruza-
mento das palavras chaves: Redes de Atenção à Saúde; Aten-
ção Primária à Saúde; Estratégia Saúde da Família; Atenção
Psicossocial; Processos de Trabalho e Cuidado Integral.
Os artigos encontrados foram analisados na íntegra e
organizados conforme as categorias a seguir: Enlaces en-
tre atenção primária à saúde, estratégia saúde da família e
atenção psicossocial; A rede de atenção à saúde e a (des)
organização dos processos de trabalho e Relevâncias para
produção do cuidado integral.
As temáticas produzidas, estão destacadas abaixo:

Temática 1- Enlaces entre atenção primária à


saúde, estratégia saúde da família e atenção
psicossocial.

A fim de esclarecer sobre o tema que será estudado,


elencamos o conceito que Starfield (2002) estabeleceu sobre
APS e que é referência na literatura nacional e internacional:
A atenção primária é o nível de
um sistema de serviço de saúde
que oferece a entrada no sistema
para todas as novas necessidades e
problemas, fornece atenção sobre
a pessoa (não direcionada para
a enfermidade) no decorrer do
tempo, fornece atenção para to-
das as condições, exceto as muito
incomuns ou raras, e coordena ou
integra a atenção fornecida em al-

20
gum outro lugar ou por terceiros.
Assim, é definida como um con-
junto de funções que, combinadas,
são exclusivas da atenção primária
(STARFIELD, 2002, p. 28).

Esse conceito foi criado com base na Declaração de


Alma-Ata, em 1978, quando naquele período, a APS foi
definida como:
Atenção essencial à saúde baseada
em tecnologia e métodos práticos,
cientificamente comprovados e
socialmente aceitáveis, tornados
universalmente acessíveis a indi-
víduos e famílias na comunidade
por meios aceitáveis para eles e a
um custo que tanto a comunidade
como o país possa arcar em cada
estágio de seu desenvolvimento,
em espírito de autoconfiança e
autodeterminação. É parte inte-
gral do sistema de saúde do país,
do qual é função central, sendo o
enfoque principal do desenvolvi-
mento social e econômico global
da comunidade. É o primeiro ní-
vel de contato dos indivíduos, da
família e da comunidade com o
sistema nacional de saúde, levando
a atenção à saúde o mais próximo
possível do local onde as pessoas
vivem e trabalham, constituindo o
primeiro elemento de um proces-
so de atenção continuada à saúde
(OMS, 1978, pp. 1).

21
Desta forma, a APS aborda os problemas mais comuns
na comunidade, oferecendo serviços de prevenção, cura e
reabilitação para maximizar a saúde e o bem-estar. Ela in-
tegra a atenção quando há mais de um problema de saúde
e lida com o contexto no qual a doença existe e influencia a
resposta das pessoas a seus problemas de saúde. É a atenção
que organiza e racionaliza o uso de todos os recursos, tanto
básicos como especializados, direcionados para a promoção,
manutenção e melhora da saúde (STARFIELD, 2002).
Assim, umas das características mais relevantes da
APS é que ela também compartilha características com ou-
tros níveis dos sistemas de saúde, como: responsabilidade
pelo acesso, qualidade e custos; atenção à prevenção, bem
como ao tratamento e à reabilitação e trabalho em equi-
pe. A atenção primária não é um conjunto de tarefas ou
atividades clínicas exclusivas; virtualmente, todos os tipos
de atividades clínicas (como diagnóstico, prevenção, exa-
mes e várias estratégias para o monitoramento clínico) são
características de todos os níveis de atenção. Em vez disso,
a atenção primária é uma abordagem que forma a base e
determina o trabalho de todos os outros níveis dos sistemas
de saúde (STARFIELD, 2002).
Diante disso, o Brasil vem passando por um importan-
te processo de reforma na APS. Desde o final da década de
1990, a ESF foi assumida pelo governo brasileiro como pro-
posta de reorganização do modelo de atenção em saúde com
base na implementação de uma APS fortalecida em seus
atributos de porta de entrada preferencial, longitudinalida-
de, integralidade, centralidade na família, enfoque comuni-
tário e participação social (ALMEIDA; SANTOS, 2015).

22
Nesse contexto, a tendência de fragmentar a clínica
nos diferentes níveis do sistema de saúde, fez com que vá-
rios esforços tenham sido realizados pelo governo federal
para estimular a qualidade dos serviços de saúde e garantir o
acesso dos usuários. A ESF é uma das propostas do Minis-
tério da Saúde (MS) para a reorganização da APS, podendo
ser considerada uma alternativa de ação para o alcance dos
objetivos de universalização, equidade e integralidade.
Considera-se ainda que o Pacto pela Saúde em sua
dimensão “Pela Vida”, resultado de uma ampla discussão
entre policy-makers e stakehorlders dos SUS, assume a ESF
como prioritária para o fortalecimento da APS cujo alcan-
ce depende, em parte, da qualificação de seus trabalhado-
res e gestores, dos processos de monitoramento e avaliação
permanente, e da organização e da atenção em redes in-
terdependentes e colaborativas entre os pequenos, médios
e grandes municípios em territórios regionais (BRASIL,
2006).
Para alguns especialistas, como Mendes (2013), a ex-
pansão da APS e sua tradução na ESF foram à opção estra-
tégica mais coerente feita no sistema de saúde brasileiro ao
longo de toda sua história. A razão disso está nas evidências
que se produziram, nos âmbitos internacional e nacional,
sobre a APS em geral e sobre a ESF em particular.
No Brasil, a ESF procura ser flexível às singularida-
des dos cenários concretos e alargar as potencialidades dos
seus diferentes trabalhadores de saúde, buscando, sempre
que possível, diminuir a dependência de ações individuais
médicas e expandir o enfoque comunitário (ALMEIDA;
SANTOS, 2015).

23
Mendes (2013) faz referência ainda a vários estudos
que demonstram a operacionalização da APS por meio da
ESF como exitosa e superior aos modelos tradicionais de
estruturação da APS. As evidências indicam que a ESF in-
fluencia positivamente no acesso e na utilização dos serviços
e teve impacto na saúde dos brasileiros: reduziu a mortali-
dade infantil e a mortalidade de menores de cinco anos; teve
impacto na morbidade; aumentou a satisfação das pessoas
com a atenção recebida; teve uma nítida orientação para os
mais pobres; melhorou o desempenho do SUS; influiu po-
sitivamente em outras políticas públicas como educação e
trabalho; e contribuiu para incrementar o interesse interna-
cional pela APS.
Almeida e Santos (2015) também corroboram com
essa prerrogativa e alegam que as mudanças no perfil epi-
demiológico com predomínio das doenças crônicas, a reco-
nhecida fragmentação na prestação do cuidado em saúde,
a busca de maior satisfação do usuário e pressões para o
desenvolvimento de medidas que produzam relações mais
custo-efetivas ao interior dos sistemas de saúde, tornaram
ainda mais premente a busca de estratégias que promovam
melhor coordenação da APS.
Com isso, cabe destacar que, tanto a ESF quanto a
incansável luta de estruturação da Atenção Psicossocial,
passam por importantes transformações conceituais e ope-
racionais, reorientando o foco no modelo de saúde hospita-
locêntrico, para um outro, descentralizado e que integra os
diversos serviços de saúde.
Ressalta-se assim, algumas singularidades da trajetória
da reforma da atenção em saúde mental quando a compa-

24
ramos com a implantação de outras políticas do SUS. Pois
além de incorporar as diretrizes gerais do SUS, realizou,
ao mesmo tempo, uma reforma da reforma. Ou seja, junto
com a expansão da cobertura, realizou-se uma reforma do
paradigma teórico psiquiátrico tradicional que levou a reali-
zar uma extensão do cuidado valendo-se de um modelo de
atenção inovador (CAMPOS, 2008).
Desta forma, diante da articulação entre o processo as-
sistencial da ESF e as ações de saúde mental, algumas trans-
formações ocorrem neste formato de atendimento. O usuário,
por exemplo, se mantém privilegiando a consulta especializa-
da por um lado, mas reconhecendo a importância da escuta,
por outro. Já os profissionais reconhecem que as práticas são
processuais por serem modificadas com as experiências vivi-
das no matriciamento a cada dia (PINTO et al. 2012).
Assim, a nova política de saúde mental, além da univer-
salização da atenção, cuidou de construir um novo paradigma
de conhecimento. Uma evidência dessa singularidade foi o
nome modelo de atenção em saúde mental do SUS e que vem
resultando na criação e implementação de novos arranjos or-
ganizacionais, como são os Centros de Atenção Psicossocial,
as Residências terapêuticas, etc (AMARANTE, 2010).
De início, foi muito forte a perspectiva centrada na de-
terminação do processo saúde e doença. A crítica à biome-
dicina e ao conceito tradicional de saúde e doença também
foi muito forte no movimento. Entretanto, ao organiza-
rem-se os novos serviços (CAPS, centros de convivência,
etc.) os profissionais foram obrigados a se socorrer de seus
conceitos e modos de fazer clínica ou reabilitação tradicio-
nal (CAMPOS, 2008).

25
Em relação às práticas voltadas para saúde mental na
APS, as atividades tendem a ser mais transversais. O enfo-
que dado aos problemas psíquicos deve permear as demais
abordagens programadas para cada grupo populacional, si-
tuação de risco ou vulnerabilidade. Na rotina das equipes
da ESF, este trabalho é realizado com dinâmicas em sala de
espera, nas discussões coletivas e no diálogo individual em
cada atendimento (PINTO et al. 2012).
No entanto, é importante destacar que a integração
permite a resolução de casos na APS, porém evidencia ou-
tros que necessitam de atenção especializada. O não reco-
nhecimento dessa necessidade traz à tona a insatisfação dos
generalistas. Para eles, a descentralização da saúde mental
por meio do apoio matricial fechou a porta de acesso ao
CAPS. Assim, pode-se depreender que há tensionamentos
e rupturas na articulação em rede, sobretudo no que con-
cerne ao encaminhamento de pessoas ao CAPS. Já os pro-
fissionais do CAPS não aceitam a referência direta de um
profissional da ESF, sob a justificativa de que existe o apoio
matricial, sendo necessária a intercessão do apoiador. Em
última análise, esses tensionamentos configuram disputas
de poder e protagonismo (HIRDES, 2015).
Pondera-se então que os campos de interação da saúde
mental e da APS, mediante o entrosamento de especialistas
e generalistas, podem promover novas relações, interações
e práticas profissionais. Poderão, também, promover um
novo paradigma de saúde pública, que incorpore efetiva-
mente a noção da integralidade do cuidado (HIRDES,
2015). Como também podem promover novos conflitos e
outros novos problemas emergirem.

26
Temática 2- A rede de atenção à saúde e a (des)
organização dos processos de trabalho

Para iniciar este tema é importante pensar nas mudan-


ças possíveis em relação ao plano de organização do SUS, es-
pecialmente por meio de sua organização em redes de aten-
ção à saúde e do fortalecimento da APS por meio da ESF.
Um dos maiores empecilhos, porém, é que impera nos
serviços de saúde um saber técnico-científico que nega o
saber popular, as subjetividades, seja nos encontros indivi-
duais ou coletivos, levando o sujeito a não questionar. Em
tais circunstâncias, toda e qualquer forma de conhecimento
dos sujeitos usuários do SUS é menosprezada, assim apenas
tem validade o que está posto, a técnica, o científico. Há
uma grande dificuldade entre os trabalhadores no sentido de
mobilizar e incentivar a população, para juntos pensarem e
construírem a saúde (SORATTO; WITT; FARIA, 2010).
Esse é um grande desafio, mas que não será fácil de ser
superado porque têm profundas raízes econômicas, políti-
cas e culturais que a sustenta. A resposta a esse desafio está
em restabelecer a coerência entre a situação de saúde e a for-
ma de organização do sistema de saúde, acelerando as mu-
danças necessárias que levem à conformação de um sistema
integrado que opere de forma contínua e proativa e que seja
capaz de responder, com eficiência, efetividade, qualidade
e de modo equilibrado às condições agudas e crônicas. Ou
seja, o SUS deve ser estruturado pela RAS, coordenadas
pela APS (MENDES, 2013).
Na concepção de Franco (2015), as redes são algo in-
forme, às vezes invisível, que opera por fluxos, e por isto
mesmo tem uma leveza quase sonora, porque acontece sem-

27
pre entre os que se propõem as conexões, ao encontro. Isto
significa que a rede não se forma no polo de uma equipe ou
outra, mas na relação, por isto a perspectiva de que acontece
no entre é central para compreendermos o quanto é valiosa
esta ideia de conexão (FRANCO, 2015).
A proposta de organização em redes de atenção à
saúde foi incorporada na legislação do SUS pelo Decreto
7.508/2011 que regulamentou a Lei Orgânica da Saúde e tem
constituído uma prioridade de diversos governos nos âmbitos
nacional, estadual e municipal. Porém, ainda falta garantir
maior legitimidade a este importante fato com implantação
de estratégia e ferramentas eficazes ao contexto utilizado.
A APS deveria então, ordenar a entrada do usuário no
sistema de saúde, identificando demandas e necessidades
(individuais e coletivas), devendo a atenção ser coordenada
e articulada em rede para proporcionar um cuidado inte-
gral. Nesse sentido, é parte da rede de saúde proposta pelo
SUS, conectando serviços, saberes e práticas, compondo os
espaços territoriais e respectivas populações. Os pontos de
conexão devidamente caracterizados pelo fazer cotidiano,
envolvem a oferta e demanda de serviços de saúde; o fluxo
do atendimento que define a entrada e saída do usuário no
sistema; e o sistema de governança operado pelos dirigentes
do SUS (ASSIS, 2015).
As redes de atenção à saúde são a resposta adequada
à situação de saúde vigente em nosso país e implicam or-
ganizar, de forma integrada, sob coordenação da APS, os
pontos de atenção ambulatoriais e hospitalares secundários
e terciários, os sistemas de apoio (sistema de assistência
farmacêutica, sistema de apoio diagnóstico e terapêutico e

28
sistema de informação), os sistemas logísticos (sistema de
regulação da atenção, registro eletrônico em saúde e sistema
de transporte em saúde) e o sistema de governança (MEN-
DES, 2013).
Vale ainda dizer que o problema do SUS está numa
situação de saúde que combina transição epidemiológica
e nutricional acelerada e tripla carga de doença, com forte
predomínio relativo de condições crônicas, e uma resposta
social estruturada num sistema de atenção à saúde que é
fragmentado, que opera de forma episódica e reativa e que
se volta, principalmente, para a atenção às condições agu-
das e às agudizações das condições crônicas. O sistema de
saúde fragmentado que praticamos não é capaz de respon-
der socialmente, com efetividade, eficiência e qualidade, à
situação de saúde vigente (MENDES, 2013).
Nesse sentido, para que as redes de atenção à saúde fun-
cionem efetivamente, necessitam da colaboração e ativa par-
ticipação de componentes chaves em sua organização: o fator
humano e o desenvolvimento do seu processo de trabalho.
O trabalho é a categoria fundamental que nos permi-
te compreender os processos produtivos, o cuidado, a ca-
pacidade em produzir autonomia no usuário sobre os seus
modos de andar a vida. E é pela sua atividade que os tra-
balhadores produzem as redes, trabalho mediado pelas tec-
nologias de cuidado e os agenciamentos que atravessam o
próprio trabalhador, aquilo que ativa sua vontade em cuidar
e o põe em movimento (FRANCO, 2015).
É necessário visualizar o trabalho como um espaço de
construção de sujeitos e de subjetividades, um ambiente
que tem pessoas, sujeitos, coletivos de sujeitos, que inven-

29
tam mundos e se inventam e, sobretudo, produzem saúde
(BRASIL, 2010).
Falar em redes nos serviços de saúde é pensar os trabalha-
dores e usuários em ação, seus atos de fala, uns com os outros,
a escuta, os gestos e, sobretudo, a vontade. As redes começam
onde há desejo ou vontade de cuidar (FRANCO, 2015).
Neste cenário, do trabalho, ocorrem disputas entre in-
teresses de diferentes sujeitos. Assim, para construção de
um novo modelo assistencial com potencial para romper
com o paradigma da biomedicina, é necessário considerar
dois principais aspectos: o cotidiano das práticas assisten-
ciais e as necessidades de saúde dos usuários. As diferentes
contribuições teóricas sobre o tema em estudo conduzem ao
entendimento de que é, a arena de interesses, construídos
no cotidiano dos serviços de saúde, que define o desenho
assistencial (FERTONANI et al. 2015).
E aí se deve levar em consideração a formação de pro-
fissionais de saúde, que quando desvinculada da realidade
das condições de vida e saúde da população, resulta em falta
de preparo para lidar com pacientes com distintas caracte-
rísticas socioculturais, o que constitui um obstáculo ao al-
cance da longitudinalidade pessoal na ESF (OLIVEIRA;
PEREIRA, 2013).
Conforme o conhecimento se acumula, os profissio-
nais tendem a, cada vez mais, se subespecializar para lidar
com o volume de novas informações e administrá-lo. Por-
tanto, em quase todos os países, vemos as profissões da área
de saúde ficarem mais fragmentadas, com um crescente
estreitamento de interesses e competências e um enfoque
sobre enfermidades ou tipos de enfermidades específicas

30
em vez de sobre a saúde geral das pessoas e comunidades
(STARFIELD, 2002).
Como exemplo, a consulta médica, que ainda é uma
prática requisitada na gestão das demandas como única
resolução. Para usuários e familiares, o atendimento mé-
dico significa um caminho para melhoria de sua condição
de saúde. Consoante evidenciado, o cuidado operado no
cotidiano da ESF se revela nas medidas prescritivas, pro-
cedimentos de controle e intervenções programáticas do
processo saúde-doença, tais práticas incorporam ainda uma
resistência para o atendimento de pessoas com problemas
psíquicos (PINTO et al. 2012).
O Brasil precisa, de fato, enfrentar os desafios da for-
mação profissional e da distribuição das informações nos ter-
ritórios, porém, pode fazer movimentos mais contundentes
e contra-hegemônicos ao ampliar e fortalecer as atribuições
clínicas de profissionais como enfermeiros, expandir equipes
de saúde bucal, equipes de apoio matricial, incorporação de
terapias complementares para que o cuidado nos territórios
seja menos centrado nas doenças e com menor dependência
do ato médico (ALMEIDA; SANTOS, 2015).
Se um trabalhador não reconhece que todos os conhe-
cimentos dos membros da equipe são válidos e importantes
para produzir o cuidado e que, a resolubilidade ótima, e a
integralidade, só se produzem com base nessa multiplicida-
de, ele não vai conseguir se conectar com outros colegas da
equipe, por que vai enxergar sempre uma relação hierárqui-
ca entre os mesmos (FRANCO, 2015).
Nesta reflexão, entende-se que o trabalho em saúde é
produzido por meio do encontro entre duas pessoas onde se

31
estabelece um jogo de expectativas e produções que criam
espaços de escutas, falas, empatias e interpretações. Desta
forma, os saberes e modos de operar atos de saúde que valo-
rizam o campo relacional são imprescindíveis para a conso-
lidação de um modelo de saúde em que o usuário é o centro
da atenção com grande estímulo de sua autonomia, confor-
me denominam Franco (2006), Franco e Merhry (2005) e
Merhy (2006; 2007).
O trabalho é, portanto, um lugar de criação, invenção
e, ao mesmo tempo, um território vivo com múltiplas dis-
putas no modo de produzir saúde. Por isso, a necessidade
de implementar a práxis (ação-reflexão-ação) nos locais de
trabalho para a troca e o cruzamento com os saberes das
diversas profissões (BRASIL, 2010).
O trabalho vivo deve residir principalmente nas rela-
ções que são estabelecidas no ato de cuidar. É o momento de
se pensar o projeto terapêutico singular, com base na escuta
e na responsabilização com o cuidado. O foco do trabalho
vivo deve ser as relações estabelecidas no ato de cuidar que
são: o vínculo, a escuta, a comunicação e a responsabilização
com o cuidado. Os equipamentos e o conhecimento estrutu-
rado devem ser utilizados a partir desta relação e não o con-
trário como tem sido na maioria dos casos (BRASIL, 2010).
Importante destacar também que embora haja altos
graus de liberdade sobre seu próprio processo de trabalho,
o trabalhador sofre também a tensão de linhas de regulação
sobre sua atividade cotidiana. A exigência de produtividade
no trabalho, medida sobre o volume de procedimentos, o
controle de agendas limitando um trabalho do tipo “porta
aberta”, a regulação do acesso através da estratificação da

32
população por problemas de saúde, são alguns exemplos de
que há linhas de força de natureza taylorista tensionando
para a configuração de um processo de trabalho centrado
nas normas de funcionamento dos serviços. A regulação do
trabalho convive neste caso com espaços de liberdade, ha-
vendo assim permanentemente uma tensão entre liberdade
e captura no processo produtivo do cuidado. É nesse meio
que o trabalhador se movimenta em uma micropolítica de
alta complexidade, em que muitos arranjos são feitos e des-
feitos, que favorecem ou não certos tipos de cuidado aos
usuários, mas é sempre uma arena de disputas de projetos,
mediada pelas tecnologias de trabalho, intencionalidades,
e a singularidade de cada encontro entre o trabalhador e
usuário (FRANCO, 2015).
O encontro entre um usuário, portador de uma dada
necessidade de saúde, com um trabalhador, portador de um
dado arsenal de saberes específicos e práticas, envolve um
encontro de situações não necessariamente equivalentes.
Um, ao “carregar” a representação de um dado “problema”
como “problema de saúde / necessidade de saúde”, procura
obter neste encontro, no mínimo, uma relação de compro-
misso que tenha como base a “sinceridade”, a “responsabi-
lização” e a “confiança na intervenção, como uma possível
solução”; o outro, também está procurando nesta relação
algumas coisas, também tem necessidades, mas esta pro-
cura não necessariamente tem algo a ver com o que o outro
espera (MERHY, 2006).
Lidar com subjetividades que operam na produção do
mundo em que se encontram, é algo de alta dificuldade,
pois o trabalhador é desafiado a cada encontro, a cada sin-

33
gularidade manifestada no usuário que ele se propõe a cui-
dar (FRANCO, 2015).
Percebe-se aí a necessidade de um movimento sanitário
brasileiro comum e a reinvenção da aliança entre trabalhado-
res, gestores e usuários. É necessário religar a técnica e a po-
lítica pela via dos movimentos sociais e da participação po-
pular. Os espaços do controle social são destaques de lugares
que precisam ser desburocratizados, tornando-se ambientes
de formação e educação do SUS (CAMPOS et al. 2016).
É preciso que os profissionais de saúde compreendam
que atuar na ESF é muito mais do que tratar doentes. As-
sistir o sujeito ou, nesse caso, a família envolta por seu do-
micílio e comunidade, na lógica dos princípios norteadores
do SUS, significa também se apropriar de outras visões de
mundo, e nessas novas visões da realidade local, com a pos-
sibilidade de atuação profissional voltada para tecnologias
leve do cuidado (MORAIS, 2015).

Temática 3- Relevâncias para produção do cui-


dado integral

Levando em consideração que a extrema fragmentação


da atenção e a (des)responsabilização clínica são caracte-
rísticas do modo de organizar o trabalho, faz-se necessário
pensar em como esse cuidado está sendo produzido e que
meios estão sendo implementados para a concretização de
um cuidado integral e resolutivo.
De acordo com Cecílio (2011), a produção do cuidado
em saúde é o provimento ou a disponibilização de tecnolo-
gias de saúde, de acordo com as necessidades singulares de

34
cada pessoa, em diferentes momentos de sua vida, visando
seu bem estar, segurança e autonomia para seguir com uma
vida produtiva e feliz. Deve realizar-se em múltiplas dimen-
sões que, imanentes entre si, apresentam, todas e cada uma
delas, uma especificidade que pode ser conhecida para fins
de reflexão, pesquisa e intervenção.
O ato de cuidar é sempre singular, depende do traba-
lhador e usuário, especialmente do encontro entre ambos e
sua espetacular capacidade de produção intercessora, de se
produzirem nos afetos mútuos como dinâmica deste encon-
tro, mediadas pelos agenciamentos que cada um traz sobre
o significado do que é cuidar (FRANCO, 2015).
Portanto, produzir cuidado significa aproximar-se do
outro e valorizar as necessidades das pessoas que demandam
atenção. Trata-se, portanto, de encontros conectados por
diálogo entre o cuidador e quem recebe o cuidado. É preci-
so aliar a agenda política da regionalização com a produção
do cuidado no cotidiano da APS, implicando responsabili-
dade e compromisso das equipes de saúde (ASSIS, 2015).
Convém ressaltar que, segundo Almeida e Santos
(2015), as contribuições de Franco (2015) e Assis (2015)
convergem ao ressaltarem que a produção do cuidado im-
plica, necessariamente, aproximar-se do outro, valorizando
as necessidades das pessoas que demandam a atenção por
meio de encontros conectados por diálogo entre o cuida-
dor e quem recebe o cuidado. Para Tanto, sublinham que
a produção do cuidado requer dispositivos como acesso,
acolhimento, vínculo e resolubilidade, no sentido da busca
contínua pela atenção integral e de qualidade.

35
No que se refere à rede de atenção à saúde do SUS, a
produção do cuidado recorre à hegemônica prática assisten-
cial fundamentada na operacionalização de procedimentos
de cunho biologizante, quase sempre voltados para a cura
ou a reabilitação. Dessa forma, o modelo de atenção ba-
seado na promoção da saúde, preconizado na formulação
das políticas públicas, contrasta com a realidade vivenciada
no cotidiano das relações terapêuticas (PINTO et al. 2012).
Sendo assim, justifica-se a necessidade da atenção
coordenada, porque é cada vez maior o número de pessoas
que sofrem de mais de uma doença e recebem cuidados de
saúde por trabalhadores de diferentes especialidades. Ne-
cessidades de saúde que são bastante complexas e em ge-
ral não são adequadamente tratadas por sistemas de saúde
caracterizados pela especialização e orientação profissional
isolada. A inadequação pode resultar não só em necessi-
dades não atendidas, como também em tratamentos des-
necessários, duplicidade de ações e medicalização excessiva
(OLIVEIRA; PEREIRA, 2013).
Merhy (2012) faz uma provocação sobre as tensões no
SUS, que pode ser análoga à produção do cuidado em ato.
Ou seja, o encontro entre profissional de saúde e usuário do
serviço precisa provocar uma posição de troca e de conexões,
buscando um entendimento mútuo, valorizando o outro
como alguém que é “produtor em si de modos de vida”. A ri-
queza destas conexões existenciais orienta a produção da vida
que é fundamental para a construção do cuidado em saúde.
Inegavelmente, muitas pessoas estão ausentes dos ser-
viços, por diversos motivos que impedem sua entrada. Ca-
racterizam a demanda reprimida pelo sistema. Para tanto, a

36
atenção integral mobiliza a equipe para uma aproximação
intersubjetiva, observando questões e condições da dimensão
psicossocial, tanto nos aspectos socioeconômicos como tam-
bém na condição clínica que facilitem o acesso e efetivem a
resolução de queixas e necessidades (PINTO et al. 2012).
Publicações do Ministério da Saúde descrevem a in-
tegralidade como um princípio que pode ser contemplado
por meio de um modelo assistencial organizado de forma
hierarquizada e descentralizada, com sistemas formais de
referência e contrarreferência, cuja garantia da integração
dos recursos de infraestrutura é fundamental. A atenção in-
tegral depende de uma rede articulada de tal forma que os
problemas apresentados pelos indivíduos possam ser abor-
dados em todos os níveis de assistência necessários para a
sua resolução e que o acesso a estes diferentes níveis seja
harmonioso e ágil (OLIVEIRA; PEREIRA, 2013).
À medida que todos assumem a responsabilidade para
a melhoria das condições de vida, seja individual ou coletiva,
os resultados são alcançados de modo mais resolutivo. Os fa-
miliares e usuários dispõem de iniciativas mútuas juntamente
com a equipe que favorecem a assistência integral e o acesso
ao serviço de saúde. No entanto, o envolvimento comparti-
lhado exige a efetiva participação do usuário em seu processo
de restabelecimento do equilíbrio. É no território onde a po-
pulação efetiva seu cuidado e, por isso, os dispositivos assis-
tenciais do SUS devem se articular com tais instituições para
compor pactos de atuação integrada (PINTO et al. 2012).
As redes se formam por imperativo do próprio trabalho,
em que não há autossuficiência de nenhum saber e fazer, é
necessário produzir conexões entre os próprios trabalhadores

37
para que se produza o cuidado. Os trabalhadores conversam
entre si todo o tempo de trabalho, e é nos atos de fala que
vão produzindo as ações do cotidiano, o cuidado vai fluindo
como produto do esforço de cada um (FRANCO, 2015).
No contexto das práticas assistenciais, faz-se perti-
nente a existência de ações intersetoriais voltadas para as
necessidades e problemas de saúde, bem como de práticas
de vigilância para o monitoramento da situação de saúde
e tomada de decisão descentralizada. Logo, ressaltamos a
importância da articulação e integração entre os níveis de
promoção, prevenção e recuperação para os agravos priori-
zados no âmbito local, com direcionalidade e consistência
entre ações realizadas e problemas abordados. Além disso,
devemos lembrar que as práticas desenvolvidas na aborda-
gem integral à saúde devem estar também dirigidas para
cada encontro específico dos sujeitos com a equipe dos ser-
viços de saúde (ARREAZA; MORAES, 2010).
O sentido ou dimensão da integralidade é a aborda-
gem integral do indivíduo e da família, relacionada a um
valor a ser sustentado e defendido nas práticas dos profis-
sionais de saúde, ou seja, um valor que se expressa na for-
ma como os profissionais respondem aos que os procuram
(STARFIELD, 2012).
A integralidade do cuidado depende da redefinição de
práticas, de modo a criar vínculo, acolhimento e autono-
mia, o que valoriza as subjetividades inerentes ao trabalho
em saúde e às necessidades singulares dos sujeitos, como
pontos de partida para qualquer intervenção, construindo
a possibilidade do cuidado centrado no usuário. Exercer a

38
integralidade passa pela necessidade de repensar práticas e
conformações dos serviços públicos de saúde, ainda hoje
caracterizados pela descontinuidade assistencial (OLIVEI-
RA; PEREIRA, 2013).
Sendo assim, não há um juízo de valor sobre as redes
ou ato de cuidar, não existe um “a priori ”, pois as redes e
o cuidado vão se produzindo no encontro. Podem assumir
características diferentes em uma mesma equipe, por exem-
plo os agenciamentos, que põem o trabalhador em movi-
mento para o cuidado, pode ser na direção de produzir o
acolhimento ou um cuidado biomédico, suas características
só vão ficar claras quando houver o cuidado, o ato de cuidar
se consumar (FRANCO, 2015).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A literatura reconhece a APS, assumidamente por


meio da ESF, como ordenadora da rede e porta de entrada
dos serviços de saúde, e a RAS propriamente, como recurso
necessário para a concretização do cuidado integral, com
suas peculiaridades e singularidades. Além disso, influen-
cia positivamente no acesso, na utilização dos serviços e no
impacto significativo na saúde confirmado por indicadores.
A Atenção Psicossocial ganha papel de destaque no
cenário atual por sua incansável luta por melhorias e com
seus benefícios refletidos também na ESF, valendo-se de
um modelo de atenção inovador, com atividades mais trans-
versais e propondo um novo paradigma do conhecimento,
voltado para a multidisciplinaridade.

39
No cenário de transição epidemiológica e econômi-
ca em que o país se encontra, o cuidado é fragmentado e
necessita de capacitação profissional. Com isso, destaca-se
que os processos de trabalho devem acontecer em espaços
mais democráticos, interdisciplinares, multiprofissionais,
onde ocorra à construção de sujeitos e de subjetividades,
individuais e coletivas, deve ser trabalho vivo.
A rede ainda se faz por relações incipientes entre os
trabalhadores do sistema e seus serviços, na maioria das ve-
zes formada por laços informais, arranjos frequentemente
improvisados, emergenciais, frágeis, difíceis de serem su-
perados pelos traços econômicos, políticos e culturais en-
volvidos. E que não conseguem suprir as necessidades dos
usuários no sistema.
O cuidado integral que se almeja ainda está distante de
ser alcançado, pois depende intimamente do encontro de
quem presta e de quem recebe o cuidado naquele momento,
é produzido em ato. Implica importar-se com o outro e res-
ponsabilizar-se por ele. Todos precisam ser corresponsáveis
e desempenhar seus papeis de protagonistas na melhoria
das condições de vida, de modo a criar vínculo, acolhimento
e autonomia centrada no indivíduo e na família.
Diante do exposto, entende-se que a complexidade do
tema proposto e a multiplicidade de fatores, atores e sujei-
tos envolvidos em tal processo são inegáveis, deste modo,
sugere-se que mais pesquisas sejam realizadas nesse contex-
to, afim de que novas reflexões e estratégias sejam efetivadas
para um cuidado mais integral, equânime e de qualidade.

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44
CAPÍTULO 2

A CONSTRUÇÃO DA REDE DE URGÊNCIA E


EMERGÊNCIA NO CONTEXTO DO ESTADO
DO CEARÁ: um caminho para a ampliação da
integralidade

Antonia Alizandra Gomes dos Santos Rodrigues


Maria Salete Bessa Jorge

INTRODUÇÃO

O comprometimento social com a melhoria do aten-


dimento de urgências e emergências proposto pelo sistema
de saúde do Brasil enfrenta desafios decorrentes do enve-
lhecimento da população, aumento da morbidade de causas
externas, crescente incorporação tecnológica e aumento da
demanda por serviços de saúde.
Nesse sentido em 2003, o Ministério da Saúde insti-
tuiu a Política Nacional de Atenção às Urgências (PNAU)
com o objetivo de garantir a universalidade, a equidade e a
integralidade no atendimento às urgências. A PNAU foi
reformulada em 2011, com a instituição da Rede de Aten-
ção às Urgências (RAU) no Sistema Único de Saúde (SUS),
com a finalidade de articular e integrar todos os equipamen-
tos de saúde.

45
A Rede de Atenção à Saúde (RAS) é definida como
arranjos organizativos de ações e serviços de saúde, de di-
ferentes densidades tecnológicas, que, integrados por meio
de sistemas de apoio técnico, logístico e de gestão, buscam
garantir a integralidade do cuidado (BRASIL, 2010). Ca-
racterizam-se pela formação de relações horizontais entre
os pontos de atenção, sendo a atenção primária à saúde o
centro de comunicação.
Entre as redes de atenção prioritárias do Ministério
da Saúde, a Rede de Atenção às Urgências foi constituída
considerando que o atendimento aos usuários com quadros
agudos deve ser prestado por todas as portas de entrada dos
serviços de saúde do SUS, possibilitando a resolução inte-
gral da demanda ou transferindo-a, responsavelmente, para
um serviço de maior complexidade, dentro de um sistema
hierarquizado e regulado, organizado em redes regionais de
atenção às urgências enquanto elos de uma rede de manu-
tenção da vida em níveis crescentes de complexidade e res-
ponsabilidade (BRASIL, 2011).
Dessa forma, espera-se que a população acometida por
agravos agudos seja acolhida em qualquer nível de atenção
do sistema de saúde, de modo que tanto a atenção primária
quanto os serviços especializados estejam preparados para
o acolhimento e encaminhamento de pacientes para os de-
mais níveis de atenção, quando esgotarem-se as possibilida-
des de complexidade de cada serviço.
No entanto, passados mais de dez anos da instituição
da PNAU, evidências sugerem que os esforços para sua im-
plementação ainda não foram suficientes para resolver um
grande contingente de problemas na saúde, como a super-

46
lotação dos serviços e atendimento de condições sensíveis à
atenção primária (IBAÑEZ, 2013).
Desse modo,o estado do Ceará vem propondo a es-
truturação da rede de urgência e emergência a partir da
construção de planos de ação regionais,com o objetivo de
desenvolver e implantar um modelo de Atenção às Urgên-
cias e Emergências que atenda, de fato, às necessidades da
população e dessa forma superar o modelo fragmentado das
ações e serviços de saúde e qualificação do cuidado.
Nesta perspectiva, este capítulo apresenta uma reflexão
sobre processo de implantação da rede de urgência e emer-
gência no estado do ceará.

Processo de Construção da Rede de Urgência e


Emergência no Ceará

O Estado do Ceará trabalha com uma organização do


sistema de saúde cujas bases foram definidas em 1998 através
do documento: Diretrizes de Reorganização da Atenção e
dos Serviços do Sistema Único de Saúde do Estado do Ceará.
O sistema é composto por micro e macrorregiões como es-
tratégias para o atendimento a atenção secundária e terciária.
Mendes (2009), sem falar explicitamente das RASs,
mencionou movimentos imprescindíveis à sua concretiza-
ção sob a forma de uma reengenharia do sistema de atenção
à saúde. A Secretaria Estadual de Saúde do Ceará (2000)
relatou uma experiência pioneira de constituição de siste-
mas microrregionais de saúde que tinha como objetivo in-
tegrar o sistema público e superar as fragilidades da frag-
mentação determinada pelo processo de municipalização.

47
A proposta da Rede de Atenção às Urgências do Es-
tado do Ceará foi atualizada com base nas orientações nor-
mativas preconizadas pelo Ministério da Saúde por meio da
Portaria Nº 1600 de 07 de julho de 2011 que reformula a
Política Nacional de Atenção às Urgências e institui a Rede
de Atenção às Urgências no Sistema Único de Saúde (SUS).
Portanto, a proposta da Rede de Atenção às Urgências
se configura pelos componentes: promoção, prevenção e vi-
gilância à saúde, atenção básica, Serviço de Atendimento
Móvel de Urgência (SAMU 192) e suas Centrais de Re-
gulação Médica, Sala de Estabilização, Força Nacional de
Saúde do SUS, Unidades de Pronto Atendimento (UPA
24h) e o conjunto de serviços 24 horas, hospitalar e Atenção
Domiciliar.
Para organização da Rede de Atenção as Urgências no
Ceará (RAU), a secretaria de saúde do estado elaborou um
Plano de Ação Estadual, que foi implementado a partir de
reuniões da área técnica do Núcleo de Atenção à Urgência
e Emergência da Secretaria da Saúde do Estado juntamente
com apoiadores do Ministério da Saúde, Colegiados Regio-
nais e do Grupo Condutor da Rede de Atenção às Urgên-
cias do Ceará, constituído pelo Comitê Executivo da Secre-
taria da Saúde do Estado do Ceará, com representações da
Secretaria Municipal da Saúde de Fortaleza e do Conselho
das Secretarias Municipais de Saúde do Ceará - COSEMS
– CE (CEARÁ, 2012).
No entanto, observou-se a necessidade de instituir um
grupo operacional da RAU – CE, composto pela equipe do
Núcleo de Atenção à Urgência e Emergência, acrescido das
seguintes representações: Representante do Conselho das

48
Secretarias Municipais de Saúde – COSEMS/CE, repre-
sentante da Coordenadoria de Promoção e Proteção à Saú-
de – COPROM, representante da Coordenadoria de Polí-
ticas e Atenção à Saúde –COPAS, representante do Núcleo
de Atenção Especializada – NUESP/COPAS, represen-
tante do Núcleo de Atenção Básica – NUAP/COPAS,
representante da Coordenadoria das Células Regionais de
Saúde – CORES, representante da Superintendência de
Apoio à Gestão da Rede de Unidades de Saúde – SRU,
representante da Coordenadoria de Regulação, Controle,
Avaliação e Auditoria – CORAC (CEARÁ, 2012).
Sabe-se que os serviços de urgência e a emergência,
são um dos mais significativos desafios em saúde pública
no Brasil, têm demandado importantes iniciativas por par-
te das três esferas de governo, visando à organização dessa
atenção, baseada nos princípios da universalidade, eqüida-
de, qualidade, eficácia e humanização.
O Estado do Ceará em consonância com o Ministério
da Saúde e sob a ótica de formulação da Rede de Atenção
às Urgências, há anos vem desenvolvendo ações visando a
organização da assistência na área, que se revelaram ainda
insuficientes para atender às expectativas e necessidades da
população.
As recentes portarias ministeriais - marco institucional
da priorização do Ministério da Saúde para a urgência e
emergência - proporcionaram as diretrizes e ferramentas de
reordenamento da Rede de Atenção à Saúde para dar conta
do desafio de atender às Urgências do Estado do Ceará e
pressupõem a necessidade de se estabelecer desenho com-
patível com a realidade atual.

49
Regionalização e Organização de Serviços

Segundo dados da população estimada do IBGE de


2015, a população total residente no Estado do Ceará é de
8.904.459 habitantes. Seguindo os princípios do SUS, como
a integralidade, universalidade, equidade bem como a regio-
nalização, o Estado do Ceará está representado por 22 re-
giões de saúde compreendidos em 5 macrorregiões de saúde.

Tabela 1– Composição das Regiões de Saúde e a população de abrangência


Fortaleza 4.642.285 habitantes
Sobral 1.625.273 habitantes
Cariri 1.462.418 habitantes
Sertão Central 637.257 habitantes
Litoral Leste/Jaguaribe 537.226 habitantes
População do Estado: 8.904.459 habitantes

Esta divisão foi baseada na análise do fluxo de pacientes


no final de década de 90. Desde 2002 o estado co-financia
pólos regionais para atendimento de emergência, de nível se-
cundário 24h nas áreas de: clínica médica, cirurgia geral, trau-
matologia, gineco-obstetrícia e pediatria, incluindo neonato-
logia. De 2003 a 2006, estes polos foram fortalecidos com a
expansão do financiamento e acompanhamento sistemático.
A rede de assistência à saúde no Ceará, além de cres-
cer no interior e na capital, trouxe inovações na oferta de
serviços. Desde 2007 o estado vem ampliando de modo sig-
nificativo os investimentos, através da implantação das Po-
liclínicas e Centros Especializados de Odontologia – CEO
em todas as regiões.

50
Para ampliação da Rede de Atenção às Urgências foi
investido na construção de hospitais regionais de nível ter-
ciário em cada uma das macrorregiões de saúde, a saber:
Hospital Geral de Fortaleza, em Fortaleza; Hospital Re-
gional do Cariri, no Cariri; Hospital Regional Norte, em
Sobral; Hospital Regional do Sertão Central, na cidade de
Quixeramobim e o hospital do Litoral Leste / Jaguaribe
está em processo de implantação (CEARÁ, 2016).

Regiões prioritárias

O estado do Ceará, através do grupo condutor das re-


des, e referendado na CIB estadual optou por fazer a pro-
posta de implantação da RUE para todo o estado. O enten-
dimento é que:
a) O SUS, sendo universal e igualitário, toda a população do
estado deve ser beneficiada;
b) Todas as redes, para assegurar a integralidade, têm que
garantir a referência terciária que somente é encontrada no
estado em um dos pólos macrorregionais (Fortaleza, Sobral
e Cariri); Há uma 4ª macrorregião aprovada mas ainda será
construído o hospital regional;
c) Mesmo havendo concentração de serviços especializa-
dos nos pólos macrorregionais, o entendimento é que não
é possível estruturá-los sem organizar as outras regiões que
para eles encaminham pacientes.
A Promoção, Prevenção e Vigilância à Saúde consti-
tuem um dos componentes de grande importância dentro
da Rede de Atenção às Urgências –RAU, com o objetivo
de fomentar ações de saúde e educação permanente para

51
a vigilância e prevenção das violências e acidentes, das le-
sões e mortes no trânsito e das doenças crônicas não trans-
missíveis, como também das transmissíveis, além de ações
intersetoriais, de participação e mobilização da sociedade
visando à promoção da saúde, prevenção de agravos e vigi-
lância à saúde, como consta na Portaria GM nº 1.600, de 7
de julho de 2011.
Neste sentido tem sido proposto Implantar/imple-
mentar o Projeto Vida no trânsito(DETRAN); capacitar
os profissionais de saúde direcionando as ações de urgên-
cia e emergência no nível hospitalar e atenção primária de
saúde, priorizando classificação de risco, ATLS (Advanced
Trauma Life Support), TO, AVC, IAM, pediatria; promo-
ver campanhas educativas em mídias quanto à prevenção e
promoção a saúde; implantar ações e protocolos de seguran-
ça ao paciente; implementar ações de educação permanente
nas escolas visando a promoção, prevenção e vigilância à
saúde direcionadas as situações de urgência e emergência;
implantar o Comitê da Região Macro Fortaleza Ampliada;
implantar Fóruns da Macrorregião Fortaleza Ampliada da
Rede de Urgência e Emergência (CEARÁ, 2016).
Em relação ao componente da Atenção Básica em
Saúde conforme Portaria nº 1600, de 7de julho de 2011/
MS/GM, tem por objetivo, a implantação do acesso, forta-
lecimento do vínculo e responsabilização e o primeiro cui-
dado às urgências e emergências.
Nessa perspectiva destaca-se ações prioritárias na linha
do cuidado, que podem ter impacto na Rede de Urgência e
Emergência (RUE) (CEARÁ, 2016):

52
· Atendimento de pequenas emergências, tais como:
febre, crise hipertensiva leve, crise de asma leve, nas Unida-
des de Observação, de modo a garantir o encaminhamento
correto e, consequentemente, complicações futuras.
· Retaguarda para seguimento dos pacientes nas Uni-
dades de Pronto Atendimento – UPA, portas hospitalares e
pacientes internados.
· Ações promocionais, preventivas, curativas e reabili-
tadoras, bem como acompanhamento ao pacientes diabé-
tico para que não desenvolvam doenças cardiovasculares,
nefropatias, AVC e IAM, Imunização, cuidado com Idoso,
prevenção da dengue.
· Acompanhamento aos portadores de doenças crônicas
(diabetes, hipertensão, etc.), objetivando reduzir as agudiza-
ções na busca por serviço de Pronto Atendimento, além de
reduzir complicações severas mencionados anteriormente.
- Incentivar o processo de planificação da Atenção Pri-
mária da Saúde, fortalecendo como porta de entrada
da Rede de Atenção à Saúde;
- Incentivar a implantação / implementação da classi-
ficação de risco e Telessaúde nas UBS;
- Fortalecer o fluxo de referência e contra - referência
nas unidades de atenção à saúde;
- Incentivar adequação das estruturas físicas das Uni-
dades Básicas de Saúde;
- Estimular ampliação da cobertura das equipes de
saúde da família;
- Investir em adequação, custeio, qualificação e educa-
ção permanente as Unidades Básicas de Saúde;

53
O SAMU, no Estado do Ceará tem como premissa
chegar ao paciente vítima de algum agravo à sua saúde seja
de natureza traumática, clínica, cirúrgica, obstétrica, psi-
quiátrica, e pediátricas, que possa levar a sofrimento, seque-
las ou mesmo à morte. Esse serviço deve garantir ao pacien-
te/vítima o atendimento e/ou transporte adequado para um
serviço de saúde devidamente hierarquizado e integrado ao
SUS. E tem como proposta:
• Garantir maior resolutividade no tempo resposta
para atendimento oportuno da equipe do SAMU;
• Implantar de acordo com os indicadores uma equi-
pe do SAMU, suporte básico de vida contemplan-
do os municípios da Macro Fortaleza Ampliada;
• Fortalecer a integração do SAMU com a Rede de
Urgência e Emergência;
• Incentivar adequação do projeto arquitetônico
mínimo das bases do SAMU;
• Promover a Integração entre os sistemas de regu-
lação assistencial do SAMU e UNISUS WEB;
• Monitorar os municípios quanto a estruturação
do seu transporte inter-hospitalar para garantia
do deslocamento de seus pacientes de média com-
plexidade em tempo oportuno e forma adequada;
• Retroalimentação dos hospitais aos municípios,
CRESUS, NUAEM quanto as condições de
transporte do paciente.
O projeto Reestruturação do Sistema de Atendimento
Móvel de Urgência SAMU, por pólos, no Estado do Ceará,
foi aprovado pela CIB/CE em 16 de dezembro de 2004.

54
As Unidades de Pronto Atendimento – UPAs 24h são
estruturas de complexidade intermediária entre as Unidades
Básicas de Saúde e as portas de urgências hospitalares; onde
em conjunto com estas compõe uma rede organizada de
Atenção às Urgências. O objetivo das Unidades de Pronto
Atendimento é diminuir as filas nos pronto socorros dos
hospitais, evitando que casos que possam ser resolvidos nas
UPAS, ou unidades básicas de saúde, sejam encaminhados
para as unidades hospitalares (BRASIL, 2013).
As UPAs funcionam 24 horas por dia, sete dias por se-
mana, e podem resolver grande parte das urgências e emer-
gências clínicas de adultos e crianças, com acolhimento e
classificação de risco em todas as unidades em conformidade
com a Política Nacional de Atenção às Urgências. A estra-
tégia de atendimento está diretamente relacionada ao traba-
lho do Serviço Atendimento Móvel de Urgência - SAMU
que conforme o quadro clinico tanto pode trazer pessoas
para as UPA, como removê-las para hospitais e assim or-
ganiza o fluxo de atendimento e encaminha o paciente ao
serviço de saúde adequado à situação (BRASIL, 2014).
As UPAs podem ser de três portes, I, II e III, con-
forme a população a ser coberta. Conforme o porte, varia
o número de médicos, respectivamente 2, 4 e 6 e, portanto
o número de consultórios e de leitos de observação. Assim
também variam o número de enfermeiros, auxiliares e de-
mais profissionais, além da área física e obviamente o cus-
to de funcionamento de cada unidade conforme seu porte
(BRASIL, 2014).
As Unidades de Pronto Atendimento – UPA 24 hrs,
iniciaram suas atividades desde 2011. As UPAs que tem

55
como proponente o Estado são: Maranguape, Caucaia,
Eusébio (Aquiraz), Canindé, São Gonçalo do Amarante
(Paracuru e Paraipaba), Horizonte ( Pacajus), São Bene-
dito (Guaraciaba do Norte), Aracoiaba (Baturité), Aracati,
Quixadá, Russas, Juazeiro do Norte, Iguatu, Itapipoca, Ji-
joca de Jericoacoara, Crateús, Pentecoste e Itapajé. E as que
tem como proponente o município que já estão em funcio-
namento são: Baturité, Camocim, Granja, Fortaleza (Jan-
gurussu), Fortaleza (Cristo Redentor), Fortaleza (Itaperi),
Fortaleza (Vila Velha), Fortaleza (Bom Jardim). Tem ainda
19 UPAs em processo de construção (CEARÁ, 2016).
Em 2015, foi construído em parceria com as regionais
de saúde, coordenadores das UPAs, SESA-CE, um instru-
mento piloto de monitoramento das Unidades de Pronto
Atendimento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em face do problema da fragmentação dos modelos


assistenciais, a integração dos serviços de saúde aparece
como atributo inerente às reformas das políticas públicas
fundamentadas na Atenção Primária da Saúde (APS). Teo-
ricamente, integração significa coordenação e cooperação
entre provedores dos serviços assistenciais para a criação de
um autêntico sistema de saúde, mas, na prática, isso ainda
não se realizou na maioria dos estados brasileiros.
No entanto, para Hartz e Contandriopoulos (2004)
o conceito de integralidade remete, portanto, obrigatoria-
mente, ao de integração de serviços por meio de redes as-
sistenciais, reconhecendo a interdependência dos atores e

56
organizações, em face da constatação de que nenhuma delas
dispõe da totalidade dos recursos e competências necessá-
rios para a solução dos problemas de saúde de uma popula-
ção em seus diversos ciclos de vida.
Percebe-se a partir dos planos de ação analisados, que
o estado do Ceará caminha para promover a integração dos
diversos serviços que compõe a rede de urgência e emergên-
cia, mesmo com alguns desafios ainda a ser superados, como
a porta de entrada na atenção primária ineficiente levando
os usuários a buscar outros itinerários “porta-aberta”, como
por exemplo as UPAs e hospitais. O que tem inviabilizado
uma assistência de qualidade nestas instituições.
Considerando, portanto, a relevância da inserção da
rede de urgência e emergência no Sistema Único de Saúde
(SUS) estadual, a necessidade de qualificação dos processos
e instrumentos de gestão desse novo dispositivo, a necessi-
dade de compreensão acerca de suas fortalezas e fragilidades
e sua significância na organização do subsistema em que se
constitui a rede de urgência e emergência, a prioridade do
tema na agenda pública da gestão em saúde no Estado do
Ceará e, a possibilidade que os estudos de avaliação de po-
líticas, programas e serviços apresentam de ampliar a capa-
cidade de gestores em tomar decisões com maior eficiência,
torna-se oportuno realizar estudos avaliativos na perspecti-
va de contribuir para o aperfeiçoamento da intervenção e a
melhoria da qualidade dos serviços ofertados.

57
Bibliografia Básica
BRASIL. Ministério da Saúde. Lei n º 8.080, de 19 de setembro
de 1990. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Bra-
sília, DF, 20 set. 1990.
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Diário Oficial da União 2003; 06 out.
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e institui a Rede de Atenção às Urgências no Sistema Único de
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do SUS e aprova as Diretrizes Operacionais do referido Pacto.
Brasilia, Diário Oficial da União, 2006a; nº 39, seção 1, 23fev.
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de Pronto Atendimento - UPA. Diário Oficial da União 2008;
03 dez.
_______. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 4.279, de
30/12/2010. Estabelece diretrizes para a organização da Rede de
Atenção à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
DOU de 31/12/2010, Seção I, p. 88.
_______. Ministério da Saúde. Portaria GM Nº 342 de 04 de mar-
ço de 2013. Redefine as diretrizes para implantação do Compo-
nente Unidade de Pronto Atendimento (UPA 24h) e do conjunto
de serviços de urgência 24 (vinte e quatro) horas não hospitala-
res da Rede de Atenção às Urgências e Emergências (RUE), em
conformidade com a Política Nacional de Atenção às Urgências, e
dispõe sobre incentivo financeiro de investimento para novas UPA

58
24h (UPA Nova) e UPA 24h ampliadas (UPA Ampliada) e res-
pectivo incentivo financeiro de custeio mensal.
_______. Ministério da Saúde. Portaria GM Nº 104 de 15 de ja-
neiro de 2014. Altera a Portaria nº 342/GM/MS, de 4 março de
2013, que redefine as diretrizes para implantação do Componente
Unidade de Pronto Atendimento (UPA 24h) e do conjunto de
serviços de urgência 24 (vinte e quatro) horas não hospitalares da
Rede de Atenção às Urgências e Emergências (RUE), em confor-
midade com a Política Nacional de Atenção às Urgências, e dispõe
sobre incentivo financeiro de investimento para novas UPA 24h
(UPA Nova) e UPA 24h ampliadas (UPA Ampliada) e respectivo
incentivo financeiro de custeio mensal.
CEARÁ. Secretaria de Saúde. Governo do estado. Plano de ação
estadual da rede de atenção às urgências do estado do ceará. For-
taleza, 2012.
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59
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em: <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/painel/painel.php?cod-
mun=230730#>. Acesso em: 28 outubro 2016.

60
CAPÍTULO 3

PROCESSO DE TRABALHO,
CORRESPONSABILIZAÇÃO E CULTURA
ORGANIZACIONAL DO NASF: uma discussão para
superar de desafios

Fernando Virgílio Albuquerque de Oliveira


Maria Salete Bessa Jorge

INTRODUÇÃO

O conteúdo deste capítulo é oriundo de um projeto de


dissertação de mestrado que visa elaborar as bases de uma
tecnologia para auxiliar as atividades dos profissionais do
Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) do município
de Fortaleza, Ceará.
A implicação para a escolha do tema se deu devido a
importância das equipes de apoio para a atenção primária
à saúde (APS) de qualidade com a promoção do cuidado
integral. A APS deve funcionar como centro regulador do
cuidado nas redes de atenção à saúde, resolvendo os prin-
cipais problemas de saúde em perspectiva tanto coletiva
quanto individual e organizando o fluxo dos usuários den-
tro das redes em sistema de referência e contrarreferência
(BRASIL, 2012).

61
O apoio realizado pelo NASF faz-se importante por
solucionar demandas de cuidado de forma multidisciplinar
e com integralidade, onde profissionais de áreas distintas
trabalham articulados com as equipes da APS promovendo
saúde e bem-estar coletivo para as populações adscritas de
suas unidades (BRASIL, 2014).
No entanto, sabe-se que a atenção básica como um
todo do município de Fortaleza enfrenta problemas e a
conjuntura do NASF na capital cearense apresenta mui-
tos desafios. Pouco quantitativo de profissionais atuantes
diante do porte do município, dificuldade operacional de
articulação entre equipes de apoio e equipes de referência,
grande volume de demanda reprimida, dentre outros fato-
res fragilizam a execução do apoio matricial e desempenho
do NASF dentro do que é sua função.
Dessa forma, este capítulo foi elaborado a partir de
uma revisão narrativa de literatura com o objetivo de fun-
damentar o projeto de dissertação do qual ele se origina e
trazer uma discussão sobre aspectos importantes a serem
abordados nesse contexto como NASF, processo de traba-
lho e cultura organizacional.

Aproximando-se do tema: Atenção primária à


Saúde (APS)

Os avanços tecnológicos do último século vêm acom-


panhados de uma tendência à valoração da atenção espe-
cializada, do diagnóstico e da tecnologia dura (PRIETO;
ZARATE; FUENTES, 2013). Nesse contexto, tem-se por
definição que tecnologias duras são aquelas relacionadas a
equipamentos e instrumentos tecnológicos; as leve-duras

62
são caracterizadas por saberes estruturados como a clínica e
a epidemiologia; e as leves estão implicadas com a produção
das relações entre os sujeitos (MERHY, 2000).
Esse tipo de perspectiva de produção de saúde conso-
me recursos de forma incessante e promove uma cultura de
busca e cobranças por tecnologias duras e dispendiosas tanto
por parte dos usuários/pacientes quanto por parte dos profis-
sionais de saúde (PRIETO; ZARATE; FUENTES, 2013).
Ao passo que a atenção básica se encontra no centro
organizacional das redes de atenção à saúde para solucionar
as principais situações individuais e coletivas com recursos
menos onerosos do que aqueles da atenção especializada.
Está presente nesse processo a busca pelo cuidado integral
com a promoção da autonomia dos sujeitos. Além disso,
as ações em saúde que ocorrem nesse nível assistencial são
realizadas a partir de promoção de saúde, prevenção de
doenças e agravos, redução de danos e manutenção da saú-
de (BRASIL, 2012).
Nesse contexto, o manejo de forma integralizada das ne-
cessidades básicas das comunidades exige a implementação de
sistemas de saúde com mais equidade, integralidade eficiência
e justiça. Para uma APS forte deve-se buscar o prestígio e de
suas equipes, com um número de profissionais adequados e
remuneração justa, organização de processos e serviços ade-
quada, e uma relação bem estabelecida com outros níveis de
atenção (PRIETO; ZARATE; FUENTES, 2013).
Dessa forma, o desenvolvimento da Atenção Primária
em Saúde (APS) dever ser feito de forma descentralizada,
no mais alto grau de capilaridade, onde as pessoas estão no
centro das ações e o mais próximo possível das suas equipes.

63
O usuário deve ter a APS como contato de preferência ao
surgir alguma demanda, sendo ela a porta de entrada para o
sistema único e o centro de comunicação da Rede de Aten-
ção à Saúde (BRASIL, 2012).
O paciente ou usuário na atenção primária apresen-
ta um perfil diferenciado dos outros níveis de atenção ao
passo que trazem para as equipes de saúde características
clinicas diversificadas, com afecções pouco definidas e di-
ferenciadas. Dessas formas, a APS e suas equipes devem
ter a capacidade de atender aos problemas mais frequentes
de sua população adscrita, com um olhar mais generalista e
buscando observar o contexto em que aquele problema está
inserido e suas nuances, em detrimento do diagnóstico da
doença em si (PRIETO; ZARATE; FUENTES, 2013).
Na atenção especializada, por sua vez, isso não acon-
tece, e quando médicos desse nível são alocados dentro da
APS, como ocorre em experiências do sistema sanitário pe-
ruano, por exemplo, acabam por somar algumas fragilidades
à eficiência do funcionamento da atenção básica, devendo-
se estimular a inserção de profissionais com formação para
atuar nessa área (PRIETO; ZARATE; FUENTES, 2013).
Segundo Starfield (2008), os sistemas de saúde preci-
sam cumprir requisitos essenciais: (1) otimizar a saúde das
populações contemplando os saberes relacionados às causas
das enfermidades, seu enfrentamento e a promoção da saú-
de para as comunidades; (2) minimizar as desigualdades de
acesso entre grupos populacionais.
Nesse contexto, a Organização Mundial da Saúde
(OMS) adotou os princípios constituintes básicos para a
atenção primária à saúde contidas na Carta de Lubliana,

64
que tem como prerrogativas para os sistemas de saúde: (1)
sua direção centrada na dignidade humana, equidade, soli-
dariedade e ética profissional; (2) seu direcionamento para
promoção da saúde; (4) centro nas pessoas, trazendo para
essas a possibilidade de influenciar os serviços e assumir uma
corresponsabilização; (5) foco na qualidade e na relação cus-
to-efetividade; (6) financiamento sustentável que promova
uma cobertura universal e acesso com equidade; (7) olhar
voltado para a atenção primária (STARFIELD, 2008).
Deste modo, o Ministério da saúde preconiza que a
atenção básica deve ter um território adscrito utilizado com
a finalidade de promover um planejamento de ações seto-
riais e intersetoriais de forma descentralizada. Deve, ainda,
possibilitar um acesso universal com a promoção do vínculo
com os usuários adscritos bem como a corresponsabilização
da atenção voltada às suas necessidades de saúde. (BRA-
SIL, 2012).
No entanto, problemas na APS como altas demandas
de atendimento por usuários podem alterar a organização
interna das equipes com o estabelecimento de critérios para
o atendimento de determinados usuários a partir de suas
necessidades, o que promove uma fragilização da vincula-
ção e corresponsabilização e a não resolução dos principais
problemas de saúde na atenção básica.

Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF)

O NASF foi criado em 2008 através da portaria Nº


154 do Ministério da Saúde com o objetivo de estender as
ações desempenhadas no âmbito da APS e aprimorar sua

65
resolubilidade ao apoiar as equipes da ESF. A partir de sua
criação, profissionais de diversas áreas atuam de forma inte-
grada à ESF compartilhando práticas e saberes na busca por
um cuidado integral aos usuários (BRASIL, 2008).
As equipes do NASF apoiam os profissionais da ESF
e equipes da atenção básica de populações específicas como
consultórios na rua e equipes ribeirinhas e fluviais. Seu tra-
balho busca auxiliar nas soluções de problemas clínicos e
sanitários e agregar práticas para ampliação do rol de ofertas
da atenção básica (BRASIL, 2014).
Quando se fala em apoio do NASF, fala-se no apoio
matricial que é o aporte teórico-metodológico da atuação
dessas equipes (BRASIL, 2014). O apoio matricial faz par-
te do aporte teórico da atuação do NASF e tem por finali-
dade realizar um suporte especializado e interativo junto às
equipes de saúde da família (ESF) e suas populações ads-
critas. O apoio matricial fornece também para as equipes
de referência com que trabalham em conjunto o aporte pe-
dagógico para lidar com problemas específicos (CUNHA;
CAMPOS, 2011).
Alguns aspectos essenciais da realização do apoio ma-
tricial envolvem corresponsabilização e compartilhamento
de dificuldades com a equipe de referência. As ações, nessa
perspectiva, são potentes para o resgate das relações exis-
tentes entre os diferentes componentes das redes de saúde e
estimulam um diálogo constante entre as equipes para que
o cuidado integral e resolutivo seja realizado (PRESTES
ET AL., 2011).
Nessa perspectiva da atuação do NASF como núcleo
para apoio matricial, fala-se, também, no conceito de clínica

66
ampliada. Nesse conceito, tem-se o cuidado e a assistência
sendo prestada de forma a quebrar paradigmas puramente
biomédicos e cartesianos tendo por finalidade a efetivação
de um cuidado integral. Dessa forma, os profissionais de-
vem atuar tendo o sujeito como protagonista de seu próprio
processo saúde doença, com a criação de vínculos e corres-
ponsabilização entre profissionais e usuários e entre profis-
sionais de categorias diferentes (BRASIL, 2006).
No entanto, para a aplicação desse conceito na práti-
ca, é necessária uma força que leve mudanças essenciais na
atuação dos profissionais de saúde envolvidos. Dessa forma,
para que haja a reforma em nível assistencial é preciso antes
de tudo uma reforma de pensamento dos atores desse pro-
cesso (SUNDFELD, 2010).
A atuação do NASF também gira em torno também
da organização de uma assistência especializada e indivi-
dualizada aos usuários de forma articulada com a APS. No
entanto, equipes que tem suas ações centradas somente na
atenção especializada apresentam desempenho de função
inadequado e precisam desenvolver espaços de implemen-
tação de suporte técnico-pedagógico com a finalidade de
viabilizar o matriciamento, que fica prejudicado nesses ca-
sos (TESSER, 2016).
O NASF pode desempenhar a função de matricia-
mento ao participar de atividades como: reuniões das equi-
pes de referência; reuniões gerais das unidades básicas de
saúde; ações de prevenção e promoção de saúde desenvol-
vidas ou não pelas equipes da ESF; ações de apoio institu-
cional. Esta última atividade é uma possibilidade de ação do
NASF e um desafio. O apoio institucional amplia o escopo

67
da função de apoio do NASF e pode melhorar os proble-
mas dados por decisões gestoras verticalizadas, já que nesse
caso os profissionais estariam participando ativamente delas
e em proximidade direta com a gestão (MOURA; LUZIO,
2014).
A realização do apoio matricial apresenta alguns de-
safios na ordem da organização de processos de trabalho e
articulação entre as equipes, dada a complexidade presente
no estabelecimento das relações entre os profissionais. Uma
estratégia apontada como potente é a criação de agendas de
trabalho conjuntas a partir do matriciamento com a fina-
lidade de estender a capacidade de cuidado e impulsionar
a integralidade. Outra estratégia fundamental é a articula-
ção em redes com incentivo a contratação de profissionais
que acompanhem a implementação do apoio, elaboração de
projetos terapêuticos em conjunto entre as equipes, adequa-
ção de arranjos organizacionais para operacionalização do
trabalho, referência e contrarreferência de casos complexos
entre unidade básica e serviços de atenção secundária e ter-
ciária (HIRDES; SILVA, 2014).
Um entrave para o apoio matricial e desempenho ade-
quado das funções do NASF vem da formação desses pro-
fissionais. Durante a graduação, eles são formatados em sua
maioria para desempenhar suas profissões de forma técnica
e clinico-curativa. Quando eles atuam no NASF se depa-
ram com uma realidade de atenção diferente das quais estão
acostumados. Muitos não compreendem a verdadeira fun-
ção do NASF e apresentam dificuldade de encarar o apoio
matricial além do apoio clínico às equipes da ESF (FREI-
RE, PICHELLI, 2013).

68
As equipes de apoio são formadas no intuito de con-
tribuir para frear a propensão à fragmentação do cuidado
e desresponsabilização assistencial. À vista disso, deve-se
pensar, para sua implementação adequada, em uma refor-
ma organizacional que busque uma organização democráti-
ca com valorização dos trabalhadores e em harmonia com a
eficácia clínica (CUNHA; CAMPOS, 2011).
Tem-se aqui um desafio importante na atuação do
NASF. Como já mencionado, a organização dos serviços
não está em prol das ações dessas equipes. Muitas vezes,
tem-se um número reduzido de equipes de NASF devendo
atuar em mais de uma unidade e numa população adscrita
que gera uma demanda inviável.
Além disso, a articulação entre as equipes pode ficar
prejudicada. Por exemplo, muitas vezes o médico ou enfer-
meiro de uma equipe específica pode precisar articular-se
diretamente com algum profissional do NASF que não está
presente em sua unidade no dia e horário em que atuam,
dificultando o contato entre esses profissionais.
Outro problema é a alta demanda enfrentada pelas
equipes. Se os profissionais tiverem uma população adscrita
muito grande para cobrir, dificilmente terão tempo dispo-
nível em sua rotina de trabalho para fazer rodas de conversa
de clínica ampliada e discussão de projeto terapêutico sin-
gular, por exemplo.

Questões oportunas na problemática da atua-


ção do NASF: processo de trabalho, correspon-
sabilização e cultura organizacional

69
Protocolos constituem-se como dispositivos impor-
tantes para a organização do processo de trabalho das equi-
pes. Essa ferramenta é desenvolvida a partir do surgimento
de necessidades e demandas específicas de trabalhadores
e gestores. Sua criação pode possibilitar a visibilidade do
trabalho do NASF bem como a promoção de pactuações
referentes ao acesso e a garantia de ações de cada catego-
ria profissional em um contexto de atuação coletiva. Fluxos
organizativos são estabelecidos nesses casos para auxiliar os
profissionais, devendo-se permitir sua autonomia para con-
siderar o que seguir exatamente ou não a depender de cada
situação e consideração técnica (ALVES; SOUZA, 2014).
Os indivíduos que produzem saúde realizam um exer-
cício com suas capacidades normativas e os valores que
orientam sua prática dentro do contexto das instituições em
que estão inseridos. Para isso, precisa-se ter em mente que
os sujeitos apresentam uma normatividade interna que não
pode ser reduzida e limitada pela normatividade externa
com suas regras, muitas vezes rígidas, que podem reduzir
criatividades e inventividades (GUIZARDI, 2012).
Dessa forma, fala-se na autonomia que deve ser dada
aos trabalhadores de saúde para que se possa exigir sua cor-
responsabilização nas ações desenvolvidas pelos serviços
em que estão inseridos. São tratados como importantes e
desafiadoras nesse contexto a descentralização da tomada
de decisão e a inserção de valores de envolvimento pessoal
para que esses sujeitos assumam um lugar de coautores dos
processos de gestão (GUIZARDI, 2012).
A democratização das instituições públicas com a for-
mação de cidadãos críticos e que participem politicamente

70
desse processo é fundamental no âmbito das relações entre
Estado e sociedade. Nesse contexto, o SUS traz modelos
importantes para o desempenho das organizações: coges-
tão e conselhos de saúde. No cenário do controle social,
os conselhos de saúde assumem lugar significativo, sendo
um oportuno exemplo de proposta de cogestão (FRANCO;
HERNAEZ, 2013).
Tem-se nesse contexto a presença dos conceitos de ca-
pital social, que engloba as relações dentro da sociedade que
envolvem organização social de redes relacionais, normas,
pactuações e confiança para uma coordenação e cooperação
com a finalidade de promover benefícios mútuos. No âmbi-
to da racionalidade administrativa, observar o capital social
é considerado um desafio. Isso porque as instituições pú-
blicas precisam ter ferramentas gerenciais bem estruturadas
para que seja possível que grupos sociais tenham a capacida-
de de fazerem com que apareçam os resultados da mobiliza-
ção e participação social. (FRANCO; HERNAEZ, 2013).
Experiências brasileiras demonstram algumas fragi-
lidades no que se refere à direcionalidade do processo de
planejamento regional, onde tem-se agendas ainda frag-
mentadas. Em contrapartida, essas experiências apresentam
como ponto importante para o êxito a ampla participação
dos gestores dentro da regionalização, onde os mecanismos
criados para comunicação entre eles podem ser potentes
(BRETAS-JÚNIOR; SHIMIZU, 2015).
Diante da complexidade dos serviços de saúde com
múltiplos profissionais de formações variadas, como tem-se
nas relações entre ESF e NASF, tem-se como importante a
valorização dos recursos humanos desses serviços, com cada

71
profissional como agente individual dentro de sua organi-
zação sem perder a ligação com os demais e com liberdade
para agir e inovar (LEONE ET AL., 2014).
Nesse contexto, fala-se na cultura organizacional já
mencionada neste capítulo, que tem influência direta no
modelo de gestão adotado por uma instituição por ser um
elemento que direciona as ações dos gestores, além de in-
fluenciar também na possibilidade de mudanças (GARCIA
ET AL., 2015).
Vários são os cursos de formação ofertados pelo Esta-
do e por instituições de ensino superior com a finalidade de
melhorar a atuação do NASF e fortalecer a sua implantação
na atenção básica.
Nesse contexto, a formação em gestão para os profis-
sionais constitui-se como uma estratégia relevante para o
desenvolvimento de lideranças visando sanar necessidades
de usuários dos serviços. No entanto, não basta oferecer a
formação para os profissionais, estes precisam ter espaço no
serviço para propor mudanças, atitudes e valores, tendo-se
assim a potencialização de sua formação e sua aplicabilidade
(LEONE ET AL., 2014).
Os modelos tradicionais de cultura organizacional hie-
rárquico propiciam um espaço dentro do serviço de saúde
com valores e práticas voltados para a competitividade e in-
dividualismo entre os trabalhadores, com a desvalorização
destes enquanto profissionais, além de processos de traba-
lho rígidos e controlados. Isso fragmenta o cuidado ao pa-
ciente contrapondo os modelos de integralidade da atenção
amplamente preconizados atualmente e que configuram a
atuação do NASF (CARVALHO ET AL., 2013).

72
Reformas desses modelos tradicionais vem sendo
apontadas como necessárias para a melhoria das relações de
trabalho dos profissionais e da própria assistência aos usuá-
rios. O que se preconiza é a gestão que envolve gestão com-
partilhada, trabalho em equipe, valorização de necessidades
individuais tanto dos trabalhadores quanto dos usuários,
humanização presente nas relações interpessoais, cuidado
realizado de forma integral e multidisciplinar e a compreen-
são do recurso humano como ator importante dentro das
ações em saúde (CARVALHO ET AL., 2013).
O gestor pode ter a sensibilidade de identificar fra-
gilidades em processos de trabalho e de gestão e propor
mudanças. No entanto, suas proposições precisam ser apro-
vadas e pactuadas formal ou informalmente pela cultura or-
ganizacional, que é estabelecida ao longo da história da ins-
tituição e por instancias maiores e superiores. À vista disso,
faz-se necessária uma ligação direta e aberta dos gestores
com os atores que estão na ponta dos serviços (GARCIA
ET AL., 2015).
Assim sendo, decisões verticalizadas ocorridas por par-
te da gestão da APS e do NASF que mudam os processos
de trabalho sem pactuações e diálogos entre gestão e equipe
são prejudiciais para o funcionamento dos serviços da aten-
ção básica e o fluxo dos usuários dentro das redes de atenção
à saúde.
Para que reformas ocorram, é preciso quebrar algu-
mas questões institucionalizadas. Faz-se necessário voltar
o olhar para modificações nos valores compartilhados entre
os indivíduos que formam as culturas de organização. Esse
procedimento deve partir de gestores e coordenadores, que

73
devem permitir espaços de integração dos profissionais da
ponta nos processos decisórios e trazer para a gestão do ser-
viço as necessidades individuais e coletivas dos trabalhado-
res (CARVALHO ET AL., 2013).
A gestão organizacional é uma importante aliada no
contexto do desempenho de organizações na saúde, e vários
autores buscam desenvolver ferramentas e modelos teóricos
para tal, como o denominado Competing Values Framework
(CVF). Esse modelo teórico classifica as organizações se-
gundo quatro categorias de culturas organizacionais (LEO-
NE ET AL., 2014):
1. Cultura de clã: apresenta semelhanças com uma
organização familiar, onde está presente o foco interno, a
flexibilidade das ações e políticas gestoras. Busca-se criar
um espaço onde haja trabalho em equipe, envolvimento
de pessoal, compromisso com os trabalhadores envolvidos,
com as organizações mantendo-se coesas através dos laços
formados entre as pessoas e priorizando-se trabalho em
grupo e consensos.
2. Cultura hierárquica: apresenta os atributos clássicos
da burocracia, com a promoção de um espaço de trabalho
formal e bem definido estruturalmente, com políticas e re-
gras voltadas para a coesão da organização.
3. Cultura adocrática: seria uma organização voltada
para o oposto da burocracia, com espaço para inovações,
pouca formalização de processos, tendo as iniciativas pio-
neiras como importantes veículos para o sucesso.
4. Cultura de mercado: apresenta uma organização
voltada para o ambiente externo, incluindo clientes, forne-

74
cedores, licenças e afins, em detrimento do interno. Tem
como principal objetivo o alcance de resultados com lucros
e boa competitividade com o desenvolvimento de um bom
posicionamento externo.
Protocolos gerenciadores utilizados pelo NASF nos
municípios, são protocolos e diretrizes preconizadas pelos
cadernos da atenção básica advindos do ministério da saú-
de, cabendo, de fato, a reflexão acerca da sua eficácia diante
das peculiaridades locais.
No que se refere aos processos de vínculo e corres-
ponsabilização, tem-se o usuário da atenção primária e do
NASF como um ator importante e que deve ser encarado
como protagonista e sujeito ativo na resolução de seus pro-
blemas. Esses conceitos são abordados por Merhy, Feuer-
wcker e Gomes (2010) quando reconhecem o usuário como
esse agente ativo na sua produção de saúde e no encontro
com os profissionais da saúde ocupando um lugar diferente
do hegemônico de usuário objeto passivo das práticas assis-
tenciais instituídas.
Dessa forma, os usuários são sujeitos produtores de
suas próprias redes vivas e os trabalhadores estão como ato-
res que transpassam essas redes. Nesse contexto, a produção
dos homens inseridos no mundo é composta por política,
sendo essa macro e micropolítica. Na dimensão da micro-
política, os territórios existenciais dos sujeitos são fabricados
e ocorrem os processos de subjetivação sendo cada sujeito
atravessado de maneira, velocidade, tempo e agenciamento
diferentes (FEUERWECKER, 2014).
De acordo com Merhy et al. (2014), ao abordar-se mi-
cropolítica, aborda-se os lugares onde os preceitos institu-

75
cionalizados são furados, fala-se nas redes informais onde
os processos também são constituídos e vão além do que
está predito. Outro aspecto relevante é o dos processos de
encontros entre os atores e as relações de poder estabeleci-
das nesses encontros, com produção de vida em conexões
existenciais e multiplicidades de agenciamentos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) afir-


ma que a APS deve coordenar a integralidade em seus vá-
rios aspectos e enfatiza a relevância da equipe multiprofis-
sional e interdisciplinar com alto grau de articulação entre
os profissionais (BRASIL, 2012).
No entanto, sabe-se que muitas vezes a organização
dos serviços pode dificultar esse processo de articulação e
trabalho multiprofissional e interdisciplinar. Quando os
profissionais das equipes apresentam números elevados de
atendimentos de demandas espontâneas, dificulta-se a dis-
ponibilidade de um período dentro da jornada de trabalho
para discussão de casos ou práticas de clínica ampliada.
Ademais, quando cada profissional obedece ao seu próprio
regime de plantão na unidade, os profissionais da mesma
microárea podem não coexistir na UAPS no mesmo horário.
Perante o exposto, pode-se apontar a importância da
APS para o Sistema Único de Saúde, posto que esse nível
de atenção funciona como porta de entrada e deve organizar
todo o fluxo dos usuários dentro da rede como já discutido.
Políticas, diretrizes, portarias e outros documentos ofi-
ciais são criados para fundamentar a atuação e organização

76
da APS e são postos para serem praticados por gestores e
equipes. No entanto, deve-se levar em consideração que as
decisões não podem ser tomadas de forma verticalizada e
observando-se apenas um contexto generalista, principal-
mente ao atentar-se para as dimensões continentais do Bra-
sil e heterogeneidade entre os estados e regiões em tantos
âmbitos (cultural, social, econômico, ambiental, etc).
Cada equipe de APS trabalha junto a populações es-
pecíficas. Apesar de poder-se observar semelhanças entre
todas elas ao longo do brasil e ser importante a padroniza-
ção de processos de trabalho, cada uma terá suas próprias
questões que farão com que emerjam situações particulares.
Além disso, as unidades apresentam sua própria cultura or-
ganizacional que deve ser levada em consideração no mo-
mento em que se estabelecem mudanças.
A elaboração de tecnologias para auxiliar o processo de
trabalho do NASF pode ser relevante ao contribuir em me-
lhorar a realidade das atividades das equipes. No entanto,
deve-se ter em mente nesse processo de construção todo o
contexto real de atuação das equipes em questão entenden-
do suas complexidades e nós críticos de seus processos, com
todo o desenvolvimento da ferramenta centrado em quem
irá utilizá-la (profissionais e gestores) e observando-se a
cultura organizacional e ambiente em que ela será inserida.

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80
CAPÍTULO 4

VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL: abordagens,


conceitos e reflexões

Ana Paula Cavalcante Ramalho Brilhante


Maria Salete Bessa Jorge

INTRODUÇÃO

Discutir violência institucional torna-se necessário re-


visitar o fenômeno violência e suas consequências na saú-
de. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) a
violência é reconhecida como: “O uso intencional de força
física ou poder, real ou em ameaça contra si próprio, contra
outra pessoa ou contra um grupo ou uma comunidade, que
resulte ou tenha grande possibilidade de resultar em lesão,
morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou
privação” (KRUG et al, 2002).
A violência apresenta-se historicamente na sociedade,
possuindo raízes macroestruturais e segundo Dahlberg &
Krug (2006), pode ser evitada, com redução de suas conse-
quências, da mesma forma que a saúde pública conseguiu
prevenir e reduzir, em todo o mundo, as complicações rela-
cionadas à gravidez, aos ferimentos em locais de trabalho, às
doenças contagiosas e enfermidades causadas por alimentos
e água contaminados.

81
A violência vista na ótica da estrutura das instituições,
e paralelamente considerando a história da saúde, apresen-
ta-se tão perversa quanto qualquer outra forma de violência.
Esse fenômeno é frequente no sistema de saúde brasileiro e
ocorre devido a deficiência dos serviços de saúde, precariza-
ção do trabalho, insuficiência de trabalhadores de saúde nas
instituições, subfinanciamento na saúde para atender as ne-
cessidades da população, estruturas físicas inadequadas para
garantir uma atenção humanizada, recursos materiais insu-
ficientes e ou inexistente, e outros. Todo esse cenário leva
situações complexas no cotidiano do usuário e do trabalha-
dor, gerando conflitos com os usuários, desgaste e estresse.
Nesse sentido, essas situações geram violação dos direitos à
saúde conforme a Constituição Federal de 1988 do Brasil.
Percebe-se que o não acesso à educação, saúde, tra-
balho e outros direitos fundamentais à sua sobrevivência
configura em uma violência, seja institucional e ou estrutu-
ral. Nesse sentido, o sujeito que comete violência é antes de
tudo violentado por um sistema capitalista, desigual, exclu-
dente, assim como por uma Estado elitista.
A questão ética já vem sendo discutida com relação à
violência, e entender e compreender a violência é impres-
cindível para assumir uma atitude consequente e efetiva na
tarefa de controlar ou erradicar a violência. Torna-se neces-
sário entender a violência como comportamento humano,
suas causas e suas origens. Portanto, a Psicanálise, a Antro-
pologia, a Sociologia, a História e a Economia são funda-
mentais para atuar no rompimento do complexo mapa da
violência (LANA & FERRIANIM, 2009).

82
Ao discutir violência, Soares e Carneiro (1996) res-
gatam conceitos da Marx e Engels, e destacam a condição
sócio histórica da violência, considerando os fatores sociais,
econômicos e políticos, no tocante da luta de classes do ca-
pitalismo, como determinantes da violência, de forma es-
trutural. Para Lolis (2004, p. 11), verifica-se que a violência
surge no contexto identificada a diferentes causas, que vão
desde a desigualdade social e as suas diferentes manifes-
tações vinculadas a fatores econômicos, políticos, sociais,
históricos, culturais, ético-morais, psicológicos, biológicos,
jurídicos e à mídia. Conjunto de causas aparece entrelaçado
como uma rede, são transversais aos discursos e apresentam
uma historicidade.
A classificação da violência segundo Dahlberg & Krug
(2006), está dividida em três categorias: violência autoin-
fligida - resulta de comportamento suicida e autoagressão,
violência interpessoal- que aborda dois tipos: a violência de
família e de parceiros íntimos, e a violência na comunidade,
a qual geralmente ocorre fora dos lares. A violência coletiva,
inclui a violência social, política e econômica. Nossa refle-
xão será principalmente em relação a violência interpessoal,
especificamente a violência institucional presente nos ser-
viços de saúde, no que se refere a deficiência no acesso ao
serviço especializado.
O debate sobre a violência institucional nos seus aspec-
tos teóricos e práticos, ainda é pouco presente nos diferentes
segmentos da sociedade, tanto para usuários quanto para os
trabalhadores de saúde, sejam eles públicos ou privados. A
proposta / aposta ética-estética-política é um projeto de so-
ciedade baseada na equidade, em que o acesso a serviços de

83
saúde com humanização e qualidade reflete a garantia da ci-
dadania numa sociedade democrática (RATTNER, 2009).
Percebe-se que a discussão sobre violência relacionada
a garantia de direito, ainda é mais deficiente se for compa-
rado a outros tipos de violência. Por exemplo, os maus tra-
tos vivenciados pelos usuários nos serviços de saúde têm se
configurado como violência institucional. Apesar de ser um
fenômeno que atinge a população, em especial os que não
conhecem seus direitos ainda são bastante escassos os dados
estatísticos e estudos voltados para a violência institucional
principalmente em relação a violação dos direitos. Essa rea-
lidade pode ser atribuída a naturalização e invisibilidade da
violência institucional (MARTINEZ- SALGADO, 2012).
O debate em torno da violência institucional ainda é
pouco divulgado e discutido. Esse assunto começou a ser
ampliado especialmente a partir de três conjuntos de nor-
mas de grande importância para a sociedade brasileira: a
Reforma Sanitária Brasileira; a Política Nacional de Hu-
manização e o Código de Defesa do Consumidor (TAVA-
RES, 2013). A implantação da Política de Humanização
da Assistência Hospitalar e a Política de Humanização do
Parto e Nascimento são exemplos de respostas à insatis-
fação dos usuários com um tratamento denunciado como
desrespeitoso, violento e uso indiscriminado de tecnologias
que resultam em altas taxas de cesarianas e dor iatrogênica
(AGUIAR et al, 2013). Nesse sentido, Deslandes (2004,
p.9) refere que, “resgatar a humanidade do atendimento,
numa primeira aproximação, é ir contra a violência, já que
esta representa a antítese do diálogo, a negação do ‘outro’
em sua humanidade”.

84
Por fim, discutiremos ainda, direitos humanos, violên-
cia estrutural e simbólica. Minayo (2006) além dos tipos
classificados pela Organização Mundial de Saúde acrescen-
ta a violência estrutural, que se refere aos processos sociais,
políticos e econômicos que reproduzem a fome, a miséria
e as desigualdades sociais, de gênero e etnia. Refere que é
difícil de ser quantificada, pois ocorre sem a consciência
explícita dos sujeitos, perpetua-se nos processos sócio his-
tóricos, naturaliza-se na cultura e gera privilégios e formas
de dominação. Nesse sentido refletir sobre a violência insti-
tucional nos serviços de saúde traz também a reflexão sobre
a violência estrutural.

Violência e a saúde: desafios atuais

A violência é um fenômeno sociohistórico e acom-


panha toda a experiência da humanidade. Portanto, ela
transforma-se em problema para a área da saúde, pois afeta
a saúde individual e coletiva e exige, para sua prevenção e
tratamento, formulação de políticas específicas e organiza-
ção de práticas e de serviços peculiares ao setor (MINAYO,
2006).
Percebe-se que toda reflexão teórico-metodológica so-
bre esse fenômeno, traz à tona a complexidade, polissemia e
controvérsia do objeto, pois a violência existe de diferentes
tipos, envolve variados sujeitos, coletividades, instituições e
tem uma relação política, econômica e cultural.
A violência, nem sempre traz ao indivíduo vitimizado
sofrimento ou morte, mas impõe um peso substancial em
indivíduos, famílias, comunidades e sistemas de saúde em

85
todo o mundo podendo resultar tanto em problemas físicos,
psicológicos e sociais, que podem ser imediatos ou durar por
anos após o ato abusivo. Portanto, essa definição é ampla,
pois a violência se associa a intencionalidade do ato, inde-
pendentemente do que vier a ocorrer, resultando em uma
relação de poder desigual (DAHLBERG & KRUG, 2006).
Nesse sentido, a violência é caracterizada como fenô-
meno de causalidade complexa e multifatorial, podendo ser
definida como ações realizadas por um ou mais indivíduos e
que ocasionam danos físicos ou psicológicos a si próprio ou
a outros (REICHENHEIM et al, 2011).
A alta incidência da violência, tanto em nível nacional
quanto mundial, e seu impacto na vida das pessoas e co-
letividades fizeram com que esta questão se transformasse
numa prioridade da saúde pública mundial, pois pela sua
complexidade envolve a conscientização e a participação
efetiva de toda a sociedade (MINAYO, 2010). Este aspec-
to se reflete nos serviços de saúde, constituindo-se desafios
para os profissionais de saúde quando são convocados a
darem mais atenção ao tema da violência, fenômeno social
crescente e indicador da instalação de uma “sociedade de
risco” (DANTAS- BERGER & GIFFIN, 2011).
A “institucionalização do conflito” é a fórmula conven-
cional para es conjurar a violência da política, uma solução
que remonta ao pensamento de Maquiavel, no século XVI.
No entanto, as próprias instituições podem ser percebidas
como vetores da violência (estrutural ou sistêmica) contra
determinados grupos sociais (MIGUEL, 2015). Para o au-
tor (2015), longe de serem neutras, elas codificam padrões
de dominação.

86
Segundo Miguel (2015), a violência permanece sendo
o coração oculto da política. No entanto, a relação entre
uma e outra é pouco explorada na maior parte da reflexão
acadêmica, permanecendo como um fato desagradável so-
bre o qual é melhor não pensar.
Estudos tem revelado que a violência é vista como um
grande problema social que atinge toda a sociedade, pre-
judicando principalmente crianças, adolescentes, mulheres,
homens e idosos; sendo responsável pelo adoecimento, mu-
tilações e mortes causadas por ações realizadas por indiví-
duos ou grupos, provocando danos físicos, emocionais e/ou
espirituais a eles próprios ou a outros; além de gerar des-
pesas para os serviços públicos (SCHRAIBER et al, 2012;
BRASIL, 2009).
Nas últimas décadas houve um crescimento signifi-
cativo desse fenômeno no Brasil, representando a terceira
causa de morte na população geral. A violência urbana foi a
principal responsável pela morte dos brasileiros de 1 até 39
anos de idade. No histórico de 30 anos, o Brasil passou de
11,7 homicídios em 100 mil habitantes em 1980 para 26,2
em 2010, configurando um aumento real de 124% no pe-
ríodo ou 2,7% ao ano. Em relação aos acidentes de trânsito,
no período de 2000 a 2010, o número de mortes passou
de 28.995 para 40.989 nas vias públicas, o que representou
um aumento de 41,4% em 10 anos (BRASIL, 2008; WAI-
SELFISZ, 2011; WAISELFISZ, 2012b).
Para Reichenheim e colaboradores (2011), além dos
determinantes sociais, o uso indevido de álcool, as drogas
ilícitas e a disponibilidade de arma de fogo têm sido as-
sociadas à ocorrência de parte da violência no Brasil. Esse

87
agravante faz parte da grande maioria dos territórios atendi-
dos pela Estratégia Saúde da Família, com presença no co-
tidiano dos profissionais de saúde levando-os a situações de
angústia, medo, interferência no processo de trabalho das
equipes, em especial no que se refere a realização de visitas
domiciliárias, organização de grupos e outros.
Nessa perspectiva, a violência possui múltiplos fatores,
complexos e correlacionados com determinantes sociais e
econômicos como o desemprego, baixa escolaridade, con-
centração de renda, exclusão social, entre outros, além de
aspectos relacionados aos comportamentos e cultura, como
o machismo, o racismo e a homofobia (BRASIL, 2008).
Portanto, diante de sua complexidade, exige maior in-
tegração de esforços, ações intersetoriais, interdisciplinares
e multidisciplinares, maior organização e participação da
sociedade civil, com envolvimento efetivo das comunida-
des que militam por direitos, cidadania e atendimento dos
serviços de saúde, de forma integral e humanizada (BRI-
LHANTE, 2009).
Dados internacionais de 84 países do mundo aponta-
ram o Brasil ocupando o 7º lugar em relação às taxas de
homicídio feminino. No período de 1980 a 2010 foram as-
sassinadas no país mais de 92 mil mulheres. 43,7 mil só na
última década, representando um aumento de 230%, com
destaque para um leve decréscimo em 2007 que correspon-
deu ao primeiro ano de vigência efetiva da Lei nº 11.340 de
2006, conhecida como Lei Maria da Penha. No entanto, os
homicídios voltaram a crescer rapidamente até o ano 2010,
sendo que 41% dos casos aconteceram na residência (WAI-
SELFISZ, 2012a).

88
Pesquisa realizada pelo Ministério da Justiça (MJ) e
Fórum Brasileiro de Segurança Pública, envolvendo 266
municípios com mais de 100 mil habitantes, no ano 2009,
confirma que, embora esteja espalhada por todo o País, a
violência vem crescendo no Norte e Nordeste. Esse é um
reflexo de indicadores sociais baixos, poucos recursos para
aplicação em sistemas de segurança pública e poucas políti-
cas preventivas (BRASIL, 2010).
O Estado do Ceará apresenta a maior taxa da região,
46,9. Foram escolhidos os municípios com a situação mais
agravada: Caucaia (65,8), Fortaleza (72,7), Juazeiro do
Norte (53,1), Maracanaú (73,7) e Sobral (52,1). Situação
parecida pode ser observada em Sergipe, com taxa de 45,0; e
foram escolhidos para o Pacto a capital Aracaju, que possui
a taxa de 42,0, e o município de Nossa Senhora do Socorro,
com 61,2 (BRASIL, 2015).
Ainda para o Ministério da Justiça (2015) as taxas de
homicídios de mulheres, idosos e crianças por 100 mil ha-
bitantes indicam casos altos de violência doméstica e de um
tipo de homicídio específico, que ocorre dentro das relações
de poder da esfera familiar. Locais com altas taxas desse
tipo de homicídio precisam de um investimento maior de
intervenção nas relações violentas perpetradas no ambiente
doméstico.
O Governo do Estado lançou o programa “Pacto por
um Ceará Pacífico” no ano de 2015, em parceria com 11 li-
nhas de ações intersetoriais, em áreas como Justiça, empre-
go e renda, saúde, entre outros. O bairro Vicente Pinzon,
no município de Fortaleza foi instituído como o primeiro
território de atuação, sendo o projeto-piloto para 2015. A

89
iniciativa abrange programas, projetos e ações voltadas para
a prevenção da violência e redução da criminalidade. O ob-
jetivo do programa é construir uma cultura de paz em todo
o território cearense, opera a partir de políticas públicas
interinstitucionais de prevenção social e segurança pública
(CEARÁ, 2015).
Na sociedade contemporânea, as estruturas sociais, os
processos políticos perversos e as políticas de governo sem
equidade geram inequidades que correspondem à injustiça
social, pois são advindas de desigualdades relacionadas com
renda, educação e classe social. Desse modo, algumas dessas
desigualdades, constituem iniquidades ao gerarem indigna-
ção e mobilização social, posto que além de injustas, são iní-
quas e, portanto, moralmente inaceitáveis, a exemplo de um
óbito infantil por desnutrição, uma negação de cuidado por
razões mercantilistas ou uma mutilação decorrente de violên-
cia racial ou de gênero (ALMEIDA-FILHO; PAIM, 2014).
O relatório final da Comissão Nacional sobre Deter-
minantes Sociais da Saúde (CNDSS) lançado em 2008
propõe a melhoria das condições de vida dos grupos vulne-
ráveis, o conhecimento e acompanhamento das tendências
das iniquidades em saúde e o enfrentamento da desigual
distribuição de poder, dinheiro e recursos para a atenção à
saúde (FILHO; BUSS; ESPERIDIÃO, 2014).
Por tratar-se de uma discussão complexa e conflitante,
vários estudiosos, em diversos tempos, tentaram explicar o
fenômeno da violência, referindo que não há uma teoria, ou
definição única para a violência, considerando sua comple-
xidade e características peculiares nos diferentes momen-
tos da sociedade. Chauí (2006), refere por exemplo que as

90
várias culturas e sociedade não definiram nem definem a
violência da mesma forma. Ao contrário, dão-lhe conteú-
dos diferentes, segundo os tempos e lugares. Sendo assim,
o que uma sociedade ou cultura julga violenta pode não ser
avaliada por outra da mesma forma.

Violência institucional e às Políticas de Saúde

O conceito de instituição definido por Lourau, baseou-


se em Hegel e Castoriadis, onde o primeiro fundamenta a
noção dialética a partir da concepção de um movimento de
afirmação/negação e negação da negação (HEGEL,1980);
e Castoriadis (1982) refere que cada instituição social é en-
tendida como resultado de um movimento dialético contí-
nuo entre instituído/ instituinte (LOURAU, 2014).
Nesse sentido, instituição é definida como “uma nor-
ma universal, ou considerada como tal, quer se trate de
casamento ou da educação, quer da medicina, do traba-
lho assalariado, do lucro, do crédito, chama-se instituição”
(LOURAU, 2014). Para o autor ainda, são também insti-
tuições: constituir uma família, casar-se, fundar uma asso-
ciação, começar um negócio, etc. Ou seja “formas sociais
visíveis dotadas de uma organização jurídica e/ou material”:
escola, empresa, etc.
Para o autor (2014) as instituições não podem ser sim-
plesmente aceitas como meios de superação da expressão
violenta do conflito porque elas não são externas a este con-
flito. Elas nascem do conflito e agem sobre o conflito, via
de regra privilegiando, com seus vieses, os interesses domi-
nantes e contribuindo para anular, marginalizar ou moderar

91
as reivindicações de mudança. Elas reforçam as interdições
e assimetrias que definem a violência estrutural.
Discutiremos a seguir a violência existentes nas insti-
tuições de saúde a partir da violação dos direitos do sujeito,
garantidos na Constituição Federal de 1988, que reconhece
a saúde como um direito social fundamental.
A violência institucional conforme Ventura (2009)
está presente quando ocorrer o desrespeito ao direito de
não discriminação, de uma assistência efetiva e resolutiva,
de acesso a todos os recursos disponibilizados pelo Sistema
de saúde, portanto presença de violação de normas éticas e
legais de direitos humanos. Nesse sentido, pode ser incluída
a falta de acesso, maus tratos em virtude das relações de
poderes desiguais entre usuários e profissionais com pre-
sença de violência física, psicológica. Ressalta-se também a
violência vivenciada pelos trabalhadores de saúde, situação
frequente nos serviços de saúde, porém subnotificada.
Portanto, esse tipo de violência ocorre nas instituições
públicas, locais onde deveriam ser garantidos atenção hu-
manizada, resolutiva e responsável. Exemplo de violência
institucional comum na saúde é a não garantia de acesso a
mulher com gestação de risco a atenção especializada em
muitos municípios brasileiros. Tal fato pode ser atribuído
a uma naturalização e invisibilidade da violência institu-
cional. Essa situação é muito pouco difundida nos diversos
segmentos da sociedade, tanto dos usuários quanto dos pro-
fissionais das distintas áreas dos serviços, sejam eles públi-
cos ou privados (MARTÍNEZ-SALGADO, 2012).
Estudos revelam que ao ocorrer violência institucional
por exemplo contra as mulheres gestantes em maternidades,

92
observa-se um rompimento no compromisso da Declaração
Universal dos Direitos Humanos, em seu artigo XXV, o
qual garante cuidados e assistência especiais a maternidade
e a infância (ABUJAMRA; BAHIA, 2009).
Nesse sentido, a violência institucional na saúde re-
flete a precariedade dos recursos materiais e humanos, a
descontinuidade da atenção nas diferentes redes de atenção
à saúde, a deficiência na garantia da atenção integral, hu-
manizada e resolutiva, principalmente nos casos de encami-
nhamentos realizados pela rede de atenção primária à saúde
a atenção especializada, ao acesso a exames de média e alta
complexidade.
Ressalta-se aqui, os avanços do sistema de saúde brasi-
leiro, entretanto continua como grandes desafios a garantia
de seus princípios, ou seja, a integralidade da atenção, a uni-
versalidade e a equidade. A população brasileira cada vez
mais tem se emponderado dos seus direitos e procurado a
justiça ou outros órgãos para que sejam reconhecidos seus
direitos conforme Constituição Federal de 1988, e outras
legislações como a lei 8080/90 do Sistema único de Saúde,
Estatuto da Criança e do Adolescente, Estatuto do Idoso,
Lei Maria da Penha e outras.
A partir da Constituição Federal de 1988 à saúde passa
a ser um direito fundamental, e com legislação brasileira
inúmeras declarações internacionais de direitos humanos
foram criadas. Percebe-se, portanto, o quanto o Brasil
avançou nas suas legislações, entretanto, torna-se necessário
de forma permanente a luta por esses direitos da população
e da sociedade civil organizada, já que as legislações por si
só não têm conseguido garantir o que já é de direito.

93
Percebe-se a invisibilidade desse fenômeno nos servi-
ços de saúde, em todas as redes de atenção, em especial a
atenção especializada, pois a deficiência no acesso é natura-
lizada banalizada, seja pelo usuário, trabalhador e gestor no
contexto do cuidado. Embora o sistema de saúde brasilei-
ro esteja organizado na perspectiva da Atenção Primária à
Saúde - APS como coordenação do cuidado, ainda persiste
a deficiência em relação a referência, contrarreferência.
Na saúde da mulher por exemplo, o Ministério da
Saúde implantou no ano de 2011 a Rede Cegonha, que
tem como base os princípios do SUS, de modo a garantir
a universalidade, a equidade e a integralidade da atenção à
saúde. Dessa forma, a Rede Cegonha organiza-se de modo
a assegurar o acesso, o acolhimento e a resolutividade, por
meio de um modelo de atenção voltado ao pré-natal, parto e
nascimento, puerpério e sistema logístico, que inclui trans-
porte sanitário e regulação (BRASIL, 2011a).
Portanto, traz a organização dos serviços no acesso a
gestante as diferentes redes de atenção, seja durante o pré-
natal, parto e puerpério, assim como a atenção a criança. No
pré-natal os serviços de saúde necessitam vincular a gestante
a uma unidade de referência com garantia de atenção in-
tegral. Entretanto, a deficiência nesse encaminhamento, e
a não integração das redes de atenção dificultam a garantia
da atenção integral, situação complexa presente no cotidiano
das mulheres em gestação, dos familiares, profissionais de
saúde, em especial da Estratégia Saúde da Família e gestores.
Qualquer país tem como princípio definir explicita-
mente o financiamento em saúde a partir do conceito de
saúde integral. Na sua inexistência, o exercício da subjetivi-

94
dade poderá fazer com que as demandas de saúde sejam in-
finitas e representem não só o que é necessário (MEDICI,
2010). Diante dessa situação, os governos têm vivenciado
situação complexas em relação a judicialização na saúde.
A judicialização da saúde muitas vezes, é mais um
obstáculo para o acesso equitativo por permitir que pessoas
adentrem os serviços de saúde sem observar as suas portas
de entrada e o seu acesso regulado, com a atenção primária
como coordenadora do cuidado, portanto, principal porta
de entrada no sistema. Uma medida liminar pode garantir
ações e serviços que nem sempre são ou serão incorporadas
no padrão de integralidade destinado a toda a população
ante seu custo-efetividade ou outra questão técnico-sanitá-
ria, ferindo assim a universalidade do acesso (SANTOS &
ANDRADE, 2012).
Para os autores (2012) o direito à saúde necessita, ain-
da, de resposta quanto ao que cabe nesse direito. O cidadão
precisa participar da definição das políticas de saúde imbuí-
do do seu dever de solidariedade social no sentido de se op-
tar por escolhas justas de modo a permitir a universalidade
do seu acesso de forma igualitária.
Entretanto, ainda se presencia situações de peregrina-
ções da população por diversos serviços na busca pelo aten-
dimento e a longa espera são características do sistema de
saúde brasileiro que, por serem tão arraigadas na cultura,
não são muitas vezes reconhecidas como violência. Muitas
vezes, médicos, administradores, funcionários da institui-
ção e os próprios pacientes aceitam que “pacientes devam
esperar pelo seu atendimento” (LEAPE et al,. 2012).

95
Autores referem que no Brasil, os elevados tempos de
espera para marcação de consultas, exames especializados
e cirurgias constituem a maior causa de insatisfação referi-
da pelos usuários do Sistema único de Saúde (CONASS,
2003; GIOVANELLA et al,. 2009).
Estudo realizado no ano de 2009 em diferentes cida-
des da Espanha revelou problemas de espera no Sistema de
Saúde (CONILL et al,. 2011). No ano de 2003 foi criado a
Lei 16/2003, de Coesão e Qualidade do SNS, com objetivo
de estabelecer um catálogo de prestações comuns, com de-
finição de garantias de tempos máximos. A partir de março
de 2004 (Decreto 96), foram garantidos tempos máximos
de 60 dias para primeira consulta com especialista e de 30
para realização de procedimento diagnóstico solicitado pelo
médico de familia y comunidade (MFyC) ou especialista.
Quando o tempo máximo é superado, o usuário pode soli-
citar atendimento no setor privado (CONILL et al,. 2011).
Nesse sentido, observa-se que a fila de espera, defi-
ciência no acesso, está presente nos diferentes sistemas de
saúde do mundo, entretanto estratégias importantes são
desenvolvidas para o enfrentamento do fenômeno. Pos-
teriormente serão abordados outros tipos de violência nos
serviços de saúde, como a violência simbólica e estrutural.
Avanços importantes ocorreram ao longo desses anos
com a implantação e implementação de diferentes políticas
públicas no nosso país, entretanto, ainda é necessária maior
redução da desigualdade social, como a geração de empre-
go, acesso a saúde, educação, moradia e outros para que efe-
tivamente sejam garantidos os direitos do cidadão brasilei-
ro. Portanto, a questão do enfrentamento a esse problema é

96
complexa e desafiadora diante de um cenário capitalista que
estamos inseridos.
A violência institucional, será trazida nessa discussão,
à luz da deficiência no acesso aos serviços de saúde, e quanto
às relações de poder entre profissionais e pacientes, e pro-
fissionais de diferentes redes de atenção segundo os autores,
Bourdier, Arent e Foucault.
Para Arendt (2009), o poder surge a partir da ação e
da fala de um grupo e, portanto, é um fim em si mesmo,
existe “entre” os homens e não como um bem material, um
atributo ou instrumento para se chegar ao fim.
O poder é uma forma de ação sobre a ação dos outros
e se exerce por meio das relações. Percebe-se teoricamente
uma distinção, pois, o conceito de poder de Arendt reflete
sobre o poder da medicina e a sustentação de sua autori-
dade sobre os sujeitos, e o conceito foucaultiano contribui
na compreensão “como” esse poder se exerce nas relações
cotidianas (FOUCAULT, 1995).
Segundo Foucaut (2004), os problemas ligados as
questões de poder, tem sido um dos principais entraves aos
projetos de desenvolvimento da humanidade, sendo este
problema, parte do cotidiano do trabalho, nas relações entre
os técnicos, entre técnicos e a comunidade ou até mesmo,
dentro da própria comunidade.
Nesse sentido, a violência institucional tem por con-
ceito a prática exercida nos/pelos próprios serviços públicos,
por ação ou omissão, podendo incluir desde a dimensão
mais ampla da falta de acesso, forma como o usuário é tra-
tado, à má qualidade dos serviços.

97
Pesquisa realizada sobre violência institucional em
maternidades públicas de São Paulo revelou que as gestan-
tes e parturientes reconhecem práticas discriminatórias e
tratamentos grosseiros, pelos profissionais da saúde, e que
essas experiências ocorrem de maneira frequente, revelando
uma banalização desta violência (AGUIAR et al. 2011).
As instituições de saúde, frequentemente, adotam vá-
rias formas de opressão de maneira sinérgica, reproduzindo
comportamentos e rotinas discriminatórias sem que consi-
gam reconhecer nessas rotinas seu conteúdo opressor (DI-
NIZ, 2006). Para Mello e colaboradores (2008) a violência
institucional é um fenômeno decorrente das relações de
poder assimétricas e geradoras de desigualdades, presentes
na sociedade contemporânea e incorporadas à cultura das
relações sociais estabelecida em algumas instituições, sejam
elas públicas ou privadas.
A partir da implantação do Sistema único de Saúde
no Brasil, mudanças importantes foram realizadas no que
se refere a garantia de acesso a população a atenção integral
e com qualidade, entretanto, ainda nos deparamos com di-
ferentes fragilidades nesse sistema, em especial no que se
refere ao financiamento da saúde.
O acesso pode ser entendido como o uso dos serviços
em tempo adequado para a obtenção do melhor resultado
possível (TRAVASSOS & CASTRO, 2008), sendo, por-
tanto, o tempo ou o conceito de oportunidade essencial para
a avaliação da qualidade.
Percebe-se ainda, a existência de uma atenção dispen-
sada a população de forma fragmentada, não humanizada
e com grandes dificuldades de articulação e diálogos entre

98
as redes de atenção. Diante dessa situação, o usuário viven-
cia a violência institucional sem mesmo percebê-la, embora
em alguns momentos tenha apresentado revolta, angústia,
sofrimento e vitimizado o trabalhador de saúde por toda
a condição apresentada. Portanto, a violência institucional
também é vivenciada pelos trabalhadores de saúde, seja vi-
timizados pelos usuários, acompanhantes, pelos gestores,
pelos próprios colegas de trabalho.
A Política Nacional de Atenção Básica em seus funda-
mentos e diretrizes determina que devam ser estabelecidos
os mecanismos que assegurem acessibilidade e acolhimento
pressupondo que o serviço de saúde deve estar organizado
para acolher, escutar e oferecer uma resposta positiva para
resolver a grande maioria dos problemas de saúde da popu-
lação e/ou de minorar danos e sofrimentos desta, mesmo
que demande a oferta de outros serviços da rede de atenção.
Deste modo, o acolhimento, a vinculação, a responsabili-
zação e a resolutividade são fundamentais para efetivar a
atenção básica como porta de entrada preferencial (BRA-
SIL, 2011).
No ano de 2004, o governo federal implantou a Políti-
ca Nacional de Humanização, a qual é orientada por prin-
cípios e diretrizes, também possui uma promessa de efetivar
não só transformações no modo de fazer, mas também de
uma implicação subjetiva de transformar a própria realida-
de, de novas criações e até mesmo possíveis inovações nas
práticas de saúde.
A percepção que se tem em relação as políticas públi-
cas implantadas no Brasil é de avanços, porém algumas po-
líticas ainda estão deficientes, pois não conseguem garantir

99
e atender de forma integral dos que dela necessitam, uma
vez que sair do que está nas legislações, nos decretos e se
efetivarem, ainda existem lacunas a serem enfrentadas pelos
governos e pela sociedade.
O Sistema Único de Saúde - SUS está assentada em
três pilares: rede (integração dos serviços interfederativos, re-
gionalização (região de saúde) e hierarquização (níveis de com-
plexidade dos serviços). Estes pilares conforme dispõem o
art. 198 da CF, sustentam o modelo de atenção à saúde
no nosso país (SANTOS & ANDRADE, 2011). Para a
Organização Pan-Americana e a Organização Mundial de
Saúde, os sistemas de saúde sob a forma de redes integradas
constitui uma estratégia para garantir atenção integral, efe-
tiva e eficaz às populações assistidas, com a possibilidade de
construção de vínculos de cooperação e solidariedade entre
as equipes e os níveis de gestão do sistema de saúde (WHO,
2008; OPS, 2005).
Portanto, a violência institucional é banalizada e invisí-
vel por todos, inclusive pela sociedade. O caráter violento do
aparelho estatal, é percebido diretamente pelos mais pobres,
pelos moradores das periferias e pelos negros. O Estado,
diante desses grupos, manifesta-se sobretudo por meio de
seu aparelho coercitivo – que pode faltar, quando se trata de
protegê-los, mas está sempre presente, quando é para repri-
mi-los. A violência organizada do Estado, que é produzida
e sancionada institucionalmente, age no sentido de reprimir
formas cotidianas de conflito, produzidas pela concentração
de poder político e econômico (MIGUEL, 2015).
Para o autor (2015), as instituições e as práticas sociais
continuarão regulando o acesso a bens simbólicos e mate-

100
riais, ou seja, vedando o acesso de alguns que eventualmente
desejariam obtê-los. E como enfrentar a questão relativa às
reações violentas (abertas) à violência (estrutural) de uma so-
ciedade injusta? Não é razoável apenas inverter a positividade
passar a glorificar automaticamente a violência dos domina-
dos (por ser “dos dominados”), da mesma forma como ela é,
em geral, automaticamente condenada (por ser “violência”).
O dilema que caracteriza a relação entre política e violência
precisa ser mantido como dilema. Não existe uma posição
normativa absoluta, muito menos uma solução prática.
Entretanto, os determinantes macroestruturais são
predominantes. O Estado é apresentado como o principal
agente da violência que se origina na desigualdade social.
Nesse sentido, a violência estrutural está presente no co-
tidiano da população, mas passa despercebida e invisível,
mesmo ao tornar-se geradora de muitas outras violências,
ainda não é pouco discutida.

Direitos Humanos, Violência Estrutural e Sim-


bólica

Refletir sobre direitos humanos, nos remete a uma


discussão sobre a história da humanidade, a necessidade de
desnaturalizar algumas acepções hodiernas dos institutos do
direito, pensar em uma sociedade justa, livre de qualquer
tipo de violência, com garantia ao exercício de cidadania.
As relações entre direito e saúde apresentam grandes
desafios para o futuro dos sistemas de saúde, não só no
Brasil, mas em grande parte do mundo. Dado que o setor
saúde necessita de permanente regulação para resolver im-

101
perfeições de mercado, o poder judiciário passa a ser, por
excelência, o campo de aplicação para a solução de conflitos
entre as necessidades e direitos instituídos e as instituições
públicas e privadas de saúde (MEDICI, 2010).
O ser humano passa a ser considerado em sua igual-
dade essencial pela primeira vez na História a partir do pe-
ríodo axial, onde passa a ser dotado de liberdade e razão,
não obstante as múltiplas diferenças de sexo, raça, religião
ou costumes sociais. (COMPARATO, 2011). Para o autor
(2011) a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão
já nasce com um objetivo universalizante. Além disso, ela
é um movimento político que tende ao futuro e representa
uma tentativa de mudança radical das condições de vida em
sociedade. Nessa perspectiva, a preocupação com os direitos
do homem passa a ocupar um lugar de destaque para os Es-
tados, ou seja, juntamente com o processo de normatização
do Direito aparece a preocupação com a afirmação norma-
tiva dos direitos fundamentais, consagrados pelas Consti-
tuições e pelos tratados internacionais, culminando, a partir
da segunda metade do século XX, com o chamado Direito
Internacional dos Direitos Humanos (DIDH).
A Violência simbólica consiste na imposição de signi-
ficações como sendo legítimas, ocultando ou dissimulando
o fato de que os significados são arbitrariamente seleciona-
dos, a fim de que, por este processo de ocultação ou dissi-
mulação, seja conquistada a cumplicidade dos dominados,
isto é, dos destinatários da violência simbólica (BOUR-
DIER, 2008).
Esse tipo de violência se institui por intermédio da
adesão que o dominado não pode deixar de conceder ao do-

102
minante (e, portanto, à dominação), quando ele não dispõe,
para pensá-la e para se pensar, ou melhor, para pensar sua
relação com ele, mais que de instrumentos de conhecimento
que ambos têm em comum e que, não sendo mais que a for-
ma incorporada da relação de dominação, fazem esta relação
ser vista como natural; [...] resultam da incorporação de clas-
sificações, assim naturalizadas, de que seu ser social é pro-
duto. (BOURDIEU, 1999, p. 46-7). E a manutenção desta
força “invisível” se dá por um processo cultural de assimila-
ção dos mecanismos de dominação que vai efetivando uma
dissimulação das estratégias da violência simbólica. E mais: o
dominado, embora revoltado, não consegue, em estado iso-
lado, opor-se a esta dominação, restando-lhe aceitá-la.
Em relação a violência estrutural, para Silva (2009), ela
consiste na imposição de regras, valores e normas, de forma
que estas pareçam naturais e necessárias ao desenvolvimen-
to da sociedade capitalista e ao progresso. Esta violência
envolve tanto a caráter econômico – da estrutura, quando o
ideológico – superestrutura, uma vez que a ação violenta se
dá no plano material, mas que se utiliza da ideologia para
legitimá-la socialmente e torná-la imperceptível.
Portanto, a violência estrutural traz a violação direitos
humanos, torna a população permanentemente em situa-
ção de vulnerabilidade, pois sua presença está nas diferentes
formas de manutenção das desigualdades sociais, culturais,
de gênero, etárias e étnicas que produzem a miséria, a fome
e as várias formas de submissão e exploração de umas pes-
soas pelas outras.
O conceito de vulnerabilidade trazido por Ayres
(2010) refere a sua aplicação aos desafios contemporâneos

103
da saúde, e neste caso específico ao da violência, conside-
rando que este tem origem na necessidade de agir, ou seja,
intervir sobre o problema; propõe-se a constituir saberes
mediadores entre diferentes áreas do conhecimento, entre a
teoria e a ação; tem seu interesse central na busca de sínteses
que consistem na capacidade de identificar a singularidade
de certos eventos para agir sobre eles; busca a compreen-
são e interpretação, em virtude de a violência tratar-se de
problema de saúde vinculado a comportamentos humanos,
aspectos sociais, culturais e subjetivos, além de vislumbrar a
politicidade, a intersubjetividade e a construção de respostas
frente ao fenômeno da violência.
É necessário entender que a violência sistêmica e es-
trutural é em si mesma violência, na medida em que impede
formas de ação e acesso a bens e espaços, por meio da coer-
ção física ou da ameaça de seu uso. A violência estrutural
é camuflada por sua conformidade às regras; é naturalizada
por sua presença permanente na tessitura das relações so-
ciais; é invisibilizada porque, ao contrário da violência aber-
ta, não aparece como uma ruptura da normalidade (MI-
GUEL, 2015).
Para o autor (2015), a violência estrutural tem bene-
ficiários, mas não tem necessariamente perpetradores par-
ticularizáveis. Assim, não há como discutir a relação entre
violência e política sem introduzir a violência estrutural,
que, como será discutido adiante, muitas vezes está incor-
porada nas próprias instituições que devem prevenir a vio-
lência aberta.
Portanto, esse fenômeno é um componente perma-
nente da política, afirmação que pode ser entendida de três

104
formas complementares. Em primeiro lugar, os constrangi-
mentos que ela impõe afetam diferentemente os diferentes
grupos sociais, distribuindo de forma muito desigual os re-
cursos necessários para a ação política. Em segundo lugar,
é o poder político que mobiliza as forças da ordem, que si-
multaneamente buscam impedir a violência aberta e evitar
a oposição à violência estrutural. Por fim, os mecanismos
que geram tal violência são – a despeito do que gostaria
Hannah Arendt – uma das questões centrais da luta política
(MIGUEL, 2015).
Percebe-se que a violência estrutural tem relação com
diferentes tipos de violência. Na violência doméstica, por
exemplo, Guerra (2008), refere essa relação, pois, ocorre
entre classes sociais influenciadas pelo modo de produção
das sociedades desiguais, esta apresenta outros determinan-
tes, que não são apenas os estruturais, em virtude da sua
natureza interpessoal, de aspecto intersubjetivo podendo,
portanto, manifestar-se em qualquer classe social.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao pensarmos as políticas de saúde existentes em nos-


so país, nos remete aos avanços ocorridos, assim como aos
desafios ainda a serem enfrentados, pois nos deparamos
com um sistema de saúde fragmentado, e muitas vezes ex-
cludentes.
A superação da violência institucional envolve questões
de lutas da sociedade civil organizada, docentes, discentes,
trabalhadores de saúde e usuários na defesa e garantia do

105
que já é garantido por lei, “o direito a saúde”. Percebe-se a
necessidade cada vez mais da existência de discussão com a
população quanto o seu empoderamento para que de fato
os direitos presentes na Constituição Federal de 1988 não
sejam violados.
Torna-se necessário a não naturalização, banalização
de qualquer tipo de violência, em especial da violência insti-
tucional, necessitando de forma permanente a realização de
diálogo entre os trabalhadores de saúde, usuários e gestores,
no sentido de implicá-los, construírem de forma coletiva
estratégias e caminhos na busca da garantia da integralidade
da atenção, com equidade, de forma resolutiva e humani-
zada. Torna-se necessário, portanto, romper com barrei-
ras que possam existir seja em relação a hierarquias, assim
como concepção de direitos humanos.
Quanto a violência institucional existente nos serviços
de saúde, torna-se necessário que as instituições de saúde
invistam em diálogos mais frequentes com a comunidade e
com os trabalhadores, no intuito de amenizar os conflitos e
cultivar uma cultura de paz, com fortalecimento de vínculos,
solidariedade e responsabilização de usuários, trabalhadores
de saúde e gestores no enfrentamento do problema. Nesse
sentido, é fundamental que se tenha real conhecimento da
situação de violência vivenciada pelo trabalhador a partir de
sensibilização da importância da notificação, de modo que
se possa conhecer o perfil epidemiológico do serviço de saú-
de e traçar estratégias para sua prevenção.
As instituições de saúde precisam repensarem como
enfrentar esse fenômeno, assim como fortalecer os víncu-
los com a população dos diferentes territórios no intuito de

106
amenizar os conflitos e cultivar uma cultura de paz. Impor-
tante ainda, que seja identificado as necessidades da popu-
lação e desenvolver planejamento em saúde compartilhado
e de forma coletiva.
Portanto, torna-se desafiador o enfrentamento da vio-
lência institucional pela população e sociedade civil organi-
zada, pois apesar das lutas ocorridas ao longo da implanta-
ção do Sistema Único de Saúde- SUS, ainda muito se tem
a fazer para que o sistema brasileiro possa atender todos os
cidadãos, sem discriminação, de forma integral, universal,
gratuito e igualitário.
Nesse sentido, a participação da população e socieda-
de civil organizada necessita fortalecer as lutas mobilização
para impedir que os direitos conquistados sejam violados, e
propor alternativas que venham superar essas desigualdades
impostas pelo capitalismo sustentadoras da nossa sociedade
e que interfere no direito à saúde. Assim, torna-se imperio-
so exigir das três esferas de governos, que cumpra com o seu
papel constitucional de garantir o acesso ao direito à saúde
conforme a Constituição Federal de 1988, não permitindo,
diferenciação de classes, pois tem aumentado cada vez mais
as desigualdades sociais existentes no nosso País.

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CAPÍTULO 5

AMBIÊNCIA COMO FATOR ESTRUTURANTE


PARA HUMANIZAÇÃO NA EMERGÊNCIA
HOSPITALAR

Richel Bruno Oliveira Castelo Branco


José Jackson Coelho Sampaio

INTRODUÇÃO

A literatura, sobre a temática e as políticas públicas de


assistência e gestão da saúde atualmente praticadas, abor-
da a relevância da humanização como um novo modelo de
cuidado e de gestão na saúde, destaque para as práticas hos-
pitalares. Um marco é o lançamento da Política Nacional
de Humanização da Atenção e da Gestão em Saúde-PNH
(BRASIL, 2004) que amplia o conceito de ambiente para
ambiência, por entender que não existe ambiente físico iso-
lado das práticas desenvolvidas e das culturas relacionais
envolvidas no cuidado.
Observa-se que houve um progresso da tecnologia
dura ou maquínica, referente aos equipamentos, materiais
médico-hospitalares, sistemas informatizados, prescrição e
prontuário eletrônicos, digitalização de imagens. O avan-
ço destas técnicas proporcionou resultados muito positivos

116
para os profissionais de saúde e para os usuários, também
gerou impacto na cultura das organizações de saúde, nos
costumes, nas tradições e, portanto, na maneira específica
de se trabalhar.
Devido à não criação anterior de políticas que implan-
tassem a humanização no ambiente hospitalar, durante este
período de ascensão tecnológica, o atendimento, de manei-
ra acolhedora e humanizada ficou distante da necessidade
da pessoa enferma, ou seja, a assistência médico-hospitalar
foi se tornando impessoal e repetitiva, pelo pouco investi-
mento nas tecnologias leves. Este comportamento, além de
impactar na assistência prestada ao usuário, afetou outros
elementos dentro da instituição, comprometendo alguns
dos seus processos, de maneira muito característica (GO-
DOI, 2004).

UMA APROXIMAÇÃO SOBRE A HISTÓRIA DOS


HOSPITAIS.

Nesse contexto, as organizações de saúde buscam


inovar na oferta de seus serviços, impondo-se a criação de
outros que agreguem às organizações benefícios e diferen-
ciais, pois o usuário, cliente e cidadão, torna-se mais e mais
exigente.
Segundo Deslandes (2002), o termo humanização é
empregado como uma forma de assistência que valoriza a
qualidade do cuidado ao usuário, respeita seus direitos, suaa
subjetividade e incorpora dimensões culturais. Implica tam-
bém na democratização das relações que envolvem o aten-
dimento, a busca de uma comunicação mais habilidosa e

117
fluida, o reconhecimento entrecruzado das expectativas dos
próprios profissionais e as dos usuários, todos sujeitos do
processo terapêutico.
Para uma melhor compreensão de toda essa mudan-
ça, faz-se necessário entender primeiro o hospital em seus
conceitos e práticas. Para tanto, observe-se que o hospital é
uma organização de saúde que tem na sua origem a prática
da assistência aos enfermos, o que lhe confere o caráter hu-
manístico, a ser preservado, na atualidade como no futuro
(MARINHO; MAC-ALLISTER, 2006).
Segundo a Organização Mundial de Saúde-OMS,
hospital é parte integrante de um sistema coordenado de
saúde, cuja função é dispensar à comunidade completa as-
sistência à saúde preventiva e curativa, incluindo serviços
extensivos à família, em seu domicílio e em centros de for-
mação, para os que trabalham no campo da saúde e para as
pesquisas biopsicossociais (FRANCO, 1985).
Apesar de os hospitais, em suas características gerais,
serem semelhantes entre si, alguns apresentam singularida-
des marcantes. Podem diferenciar-se quanto às caracterís-
ticas de propriedade (público federal, estadual e municipal,
privado lucrativo, privado filantrópico etc), quanto à finali-
dade principal (assistencial geral, assistencial especializado,
de ensino, de pesquisa etc), quanto ao nível de assistência
dentro de um sistema ou rede (secundário, terciário ou qua-
ternário), quanto à complexidade (baixa, média, alta etc) ou
quanto ao acesso (eletivo direto, eletivo de referência, pron-
to atendimento, emergência, urgência etc).
A presente pesquisa foca a ambiência como fator de
humanização na urgência/emergência. Torna-se necessário,

118
portanto, compreender tais características, com destaque
para a lógica voltada à urgência/emergência.
A partir da década de 1950, os serviços de emergência
assumiram relevância, especialmente nos Estados Unidos,
devido ao aumento do número de vítimas de “causas ex-
ternas”, sobretudo as associadas aos acidentes de trânsito
e, também, ao desenvolvimento de técnicas cirúrgicas e de
atendimento aos grandes traumas decorrentes da experiên-
cia acumulada nas Guerras da Coréia e do Vietnã (PO-
WERS, 1973).
As unidades de urgência são serviços existentes em
hospitais de médio e grande porte, os quais recebem pa-
cientes em situações de urgência e emergência, graves ou
potencialmente graves, que necessitam de recursos tecno-
lógicos e humanos especializados para o seu atendimento e
restabelecimento (CALIL; PARANHOS, 2007).
Deslandes (2002) refere que, historicamente, a emer-
gência sempre constituiu “a porta de entrada” ao Sistema de
Saúde. Observa-se atualmente, nas emergências, o aumen-
to do fluxo de atendimentos. A superlotação é ocasiona-
da devido à busca incessante dos usuários, por esse tipo de
atendimento, de modo justificado ou não. Esse problema é
decorrente do desejo da população por maior resolutividade
para seus problemas, em decorrência, entre outros motivos,
da precária montagem dos níveis primário e secundário de
atenção. A ida à emergência, mesmo com motivação ina-
dequada, resultará, no mínimo, numa avaliação de saúde,
com realização de exames diagnósticos, ainda que represen-
te uma solução paliativa para a sua necessidade e superlote
o serviço.

119
Dentro da estrutura hospitalar, em decorrência da di-
nâmica do serviço, a unidade de urgência pode ser conside-
rada um dos ambientes de maior sofrimento psíquico, para
todos os atores envolvidos, destaque-se o trabalhador, pois
funciona 24 horas ininterruptas, caracterizando-se como
um local de livre acesso a usuários e acompanhantes para
solução dos problemas graves de saúde que os afligem, com
real ou suposto risco de morte.
Os esforços dos profissionais da saúde em atender essa
demanda contínua, aliados às condições de trabalho que,
em sua maioria, não são adequadas, repercutem diretamen-
te na saúde dos trabalhadores, principalmente quando re-
metem às condições impostas pela organização.
Quanto ao processo de trabalho em urgência, a espe-
cificidade do objeto de trabalho consiste em pacientes com
alto grau de complexidade, portadores de patologias clini-
camente graves, com risco iminente de morte, e de pacien-
tes com leve a moderados graus que não conseguem aten-
dimento na rede de atenção primária (PALÁCIOS, 2000).
Em 2002, o Ministério da Saúde-MS institui o Re-
gulamento Técnico dos Sistemas Estadual de Urgência e
Emergência, pela Portaria 2.048, estabelecendo princípios,
diretrizes, normas de funcionamento, classificação e crité-
rios para a habilitação dos serviços que compõem os Planos
Estaduais de Atendimento às Urgências e Emergências.
Esta mesma portaria definiu os componentes dos serviços
da atenção às urgências e emergências: pré-hospitalar fixo,
pré-hospitalar móvel, hospitalar, e pós-hospitalar (BRA-
SIL, 2003).

120
– Componente pré-hospitalar fixo: as Unidades Bá-
sicas de Saúde-UBS e Equipes de Saúde da Família-ESF,
Agentes Comunitários de Saúde-ACS, ambulatórios es-
pecializados, serviços de diagnóstico e terapias e Unidades
Não Hospitalares de Atendimento às Urgências;
– Componente pré-hospitalar móvel: Serviço de As-
sistência Municipal de Urgência-SAMU e outros serviços
associados de salvamento e resgate, sob regulação médica;
– Componente hospitalar: portas hospitalares de aten-
ção às urgências das unidades hospitalares gerais e de re-
ferência, leitos de retaguarda, de longa permanência e de
terapia semi-intensiva e intensiva;
– Componente pós-hospitalar: modalidades de aten-
ção domiciliar, hospitais-dia e projetos de reabilitação inte-
gral e com base comunitária.
O regulamento ainda institui a Central de Regulação
Médica-CRM, o transporte inter-hospitalar e a criação de
núcleos de educação em urgência, com o objetivo de capa-
citar pessoal da área. Recomenda, também, o emprego do
acolhimento, seja na dimensão ampla do processo de cui-
dado ou como triagem classificatória de risco, e sugere a
integração de várias centrais médicas de regulação de fluxos
de urgências, leitos hospitalares, de marcação de exames e
consultas, assim como com outras instituições como as po-
lícias militares e a defesa civil.
Em 2003, o MS instituiu, pela Portaria 1.863, a Po-
lítica Nacional de Atenção às Urgências-PNAU, composta
pelos sistemas estaduais, regionais e municipais. Prevê-se,
também, a instalação e operação das centrais de regulação,

121
capacitação e educação continuada das equipes de saúde
em todos os âmbitos da atenção e orientação federal, se-
gundo os princípios de humanização da atenção (BRASIL,
2003b).
Por meio da Portaria 2.072 (BRASIL, 2006) foi insti-
tuído o Comitê Gestor Nacional de Atenção às Urgências-
CGNAU, composto por representantes das diversas secre-
tarias e departamentos do ministério, conselhos, agências
reguladoras, instituições, associações médicas e outros minis-
térios, com papeis de elaboração, assessoramento, proposição,
articulação, avaliação de diretrizes e ações relativas à PNAU.
Como ferramenta para o alcance estratégico do cuida-
do humanizado, em 2004 surge a PNH, constituindo uma
nova fronteira de expansão e de qualificação do Sistema
Único de Saúde-SUS. Esse plano consolida uma política
ministerial bastante singular, se comparada a outras do se-
tor, pois se destina a pensar a dimensão da qualidade, na
perspectiva do desenvolvimento integrado das habilidades
relacionais, comunicacionais, políticas e técnicas, nas práti-
cas de saúde (BRASIL, 2004).
Ressalte-se que as atividades atribuídas à hospitalidade
são fatores relevantes para a humanização, pois beneficiam
o usuário com um acolhimento digno. O ser humano preci-
sa do que é humano, ou seja, de atenção e acolhimento, que
o profissional de saúde deve expressar no atendimento ofer-
tado. Contudo, o ambiente também comunica acolhimen-
to, por esta razão a ambiência é um assunto bem discutido
atualmente, pois se acredita que esta nova tática/dispositivo
é adequada, irreversível e indispensável para o bem-estar
dos usuários, acompanhantes, visitantes e funcionários.

122
OBJETIVO

Tendo em vista a relevância da temática, o objetivo do


presente estudo foi compreender as práticas de ambiência,
como tática de humanização, em emergência hospitalar.

MÉTODOS

O presente estudo trata-se de uma revisão narrativa de


literatura realizada através de busca na Biblioteca Virtual
em Saúde (BVS). Esse portal foi escolhido por possuir um
acervo considerável para coleta de dados, com 17 bases de
dados em saúde albergadas, como LILACS, IBECS, ME-
DLINE, Biblioteca Cochrane, SciELO, ADOLEC, BBO,
BDENF, CidSaúde, DESASTRES, HISA, HOMEOIN-
DEX, LEYES, MEDCARIB, REPIDISCA.
Foi realizada a coleta de dados no mês de outubro de
2016, com dois pesquisadores, do tipo cego, visando resul-
tados similares. No processo de busca, foram empregados
os seguintes descritores isolados e combinados: ambiência,
humanização, política nacional de humanização.
Foram incluídos estudos que abordassem a temática da
ambiência hospitalar como um fator promotor de humani-
zação para os usuários de atendimentos hospitalares, em ar-
tigos completos, teses e dissertações, nos idiomas português
e inglês, publicados no período de 2010 a 2016. Foram ex-
cluídos aqueles que possuíssem em seus resumos temáticas
que não estivessem dentro do escopo do presente estudo.

123
RESULTADO E DISCUSSÃO.
AMBIÊNCIA HOSPITALAR

O indivíduo, em seu meio de habitação, desenvolve


suas ações em conformidade com a cultura e estrutura do
ambiente, seja ele para o trabalho, lazer ou mesmo para
tratar de sua saúde. O ambiente comporta em si a subje-
tividade de pessoas, que expressam as suas necessidades,
sentimentos, desejos e expectativas e nele recebe estímulos
e responde a eles de maneira positiva ou negativa, ocorren-
do uma apropriação do espaço em que o usuário traz em
si a vontade de modificar e humanizar. Humanizar estes
espaços significa adequá-los aos que se utilizam dele (VAS-
CONCELOS, 2004).
O ambiente é um espaço social em que se estabelecem
estruturas de relações entre os seres e o ambiente físico-so-
cial com características humanas e do próprio espaço de tra-
balho. Este pode resultar em efeitos saudáveis ou insalubres,
dependendo dos indivíduos e do próprio posicionamento
do ambiente físico (CEZAR-VAZ, MUCCILO BAIS-
CH, SOARES, WEIS, COSTA & SOARES, 2007).
Ressalta-se que o ambiente hospitalar tem influência
sobre a saúde do usuário, bem como dos profissionais, pois
os trabalhadores enxergam na maioria das vezes, o hospital,
como um ambiente enrijecido, estressante.
A estrutura atual dos ambientes hospitalares, muitas
vezes, não favorece o cuidado aos profissionais, tornando-se
um local de emoções negativas, sentimentos depressivos e
de estresse (OLINISKI & LACERDA, 2006).

124
Vasconcelos (2004) ressalta que o hospital é um am-
biente frio, sem vida, com cheiro de éter, aparelhos ba-
rulhentos, macas circulando, pessoas conversando e, na
maioria das vezes, é mal iluminado, com colorações que
não proporcionam bem-estar, causam irritação, frustração
e mau humor. Há também a presença de cheiros desagra-
dáveis como dos produtos utilizados na limpeza ou desin-
fecção de materiais. As formas, as texturas são geralmente,
de uma maneira monótona e distante. Este ambiente pode
proporcionar estresse e agravos psíquicos, pois é neste lo-
cal que se formam relações de trabalho, as demandas e as
capacidades de enfrentamento frente às atividades que o
indivíduo exerce.
Contudo, no ambiente existem componentes que
atuam como modificadores e qualificadores do espaço, esti-
mulando a percepção física e, quando aplicados com equi-
líbrio e harmonia, integrando espaço, equilíbrio, conforto,
lógica organizacional, redução das hierarquias, sentimentos
de pertinência e satisfação, além das culturas e crenças dos
atores envolvidos, criam a ambiência necessária para a sig-
nificativa contribuição ao processo de produção de saúde.
Conforme o MS (BRASIL, 2006), o ambiente é com-
posto, pelos seguintes elementos:
Luz – a iluminação, seja natural ou artificial, é carac-
terizada pela incidência, quantidade e qualidade. Além de
necessária para a realização de atividades, contribui para a
composição de uma ambiente aconchegante quando ex-
ploramos os desenhos e sombras que proporcionam. A
iluminação artificial pode ser trabalhada em sua disposição
garantindo privacidade aos usuários com focos individuais

125
nas enfermarias, facilitando as atividades dos trabalhadores
e também a dos pacientes. A iluminação natural deve ser
garantida a todos os ambientes que permitirem, lembrando
sempre que todos têm direito às noções de tempo – dia e
noite, chuva ou sol.
Cheiro – devem-se considerar os odores que podem
compor o ambiente, interferindo ou não no bem-estar das
pessoas;
Som – pode-se propor a utilização de música ambiente
em alguns espaços como enfermarias e esperas. Em outro
âmbito, é importante considerar também a proteção acús-
tica que garanta a privacidade e o controle dos ruídos cau-
sadores de stress;
Sinestesia – diz respeito à percepção do espaço por
meio dos movimentos, assim como das superfícies e tex-
turas;
Arte – como meio de inter-relação e expressão das sen-
sações, emoções e experiências humanas.
Cor – as cores podem ser um recurso útil uma vez que
nossa reação a elas é profunda e intuitiva. As cores estimu-
lam nossos sentidos e podem nos encorajar ao relaxamento,
ao trabalho, ao divertimento ou ao movimento. Podem nos
fazer sentir mais calor ou frio, alegria ou tristeza. Utilizando
cores que ajudam a refletir ou absorver luz, podemos com-
pensar sua falta ou minimizar seu excesso.
Tratamento das áreas externas – este se faz necessá-
rio já que, além de porta de entrada, se constitui lugares de
espera, de encontro ou de descanso de trabalhadores, am-
biente de estar de usuários e de seus acompanhantes. Jardins

126
e áreas com bancos podem se tornar lugar de encontro e re-
laxamento. Nas urgências/emergências há menor uso desta
dimensão, mas nos hospitais gerais e nos serviços psiquiá-
tricos elas são fundamentais.
Privacidade e individualidade – a privacidade diz res-
peito à proteção da intimidade do usuário, muitas vezes
pode ser garantida com uso de divisórias ou com cortinas
e elementos móveis que permitam ao mesmo tempo in-
tegração e privacidade, facilitando o processo de trabalho,
aumentando a interação da equipe e ao mesmo tempo pos-
sibilitando atendimento personalizado. Individualidade re-
fere-se ao entendimento de que cada paciente é diferente do
outro, veio de um cotidiano e espaço social específico.
Confortabilidade – também pressupõe possibilitar
acesso dos usuários a bebedouros e às instalações sanitárias,
devidamente higienizadas e adaptadas aos portadores de
deficiências, de maneira em que o processo de produção de
saúde favoreça aos usuários e trabalhadores a construção de
um espaço que faça referência ao seu mundo, bem como no
cuidado prestado a saúde.
Arquitetura – fundamental no que diz respeito às cir-
culações, ao conforto, à beleza e à individualidade, quando
se propõe a criar ambientes que ofereçam ao usuário es-
paço para seus pertences, para acolher sua rede social e à
preservação da individualidade. Os elementos supracitados
surgem a partir de uma lógica organizacional (MOTTA,
2001) identificada nos processos de trabalho, cujas falhas
originam deficiências e descontinuidades. Os problemas
determinam influência negativa na organização dos proces-
sos corporativos provocando uma ação contraproducente

127
nos produtos e serviços, estimulando uma diminuição ou
redução no nível de consistência dos resultados. Esta teoria
tem como princípio orientador a otimização dos processos
organizacionais, pois, qualquer problema verificado em um
determinado processo de negócio pode ser considerado um
efeito negativo, proporcionando, como consequência, um
rebaixamento no nível de consistência dos resultados. Os
principais fatores organizacionais podem ser classificados
do seguinte modo: de método, recursos tecnológicos; de
material, recursos materiais disponíveis; de ambiente, local
de trabalho; de pessoal, os trabalhadores; de equipamentos,
instrumentos de produção; de meio informacional, dados e
redes; de medida, regulação de processos e procedimentos.
Redução das hierarquias - Em uma visão contempo-
rânea da administração a redução dos níveis hierárquicos
diminui a burocracia e visa à melhoria da comunicação.
Além dessa melhoria a redução dos níveis hierárquicos gera
uma maior autonomia na tomada de decisão e resolução
de problemas. A autonomia na teoria é mais fácil do que
na prática, uma vez que delegar maior autonomia requer
maior confiança no potencial da equipe e adequado treina-
mento. A aplicação da redução dos níveis hierárquicos exi-
ge cuidado com o comportamento dos gestores perante os
funcionários. Cabendo a eles compreender que a partir do
momento que o funcionário tem maior autonomia ele não
pode ter sua autoridade quebrada durante um procedimen-
to. Os benefícios adventos da redução de hierarquia podem
ser sentidos tanto internamente quanto externamente à or-
ganização. No ambiente interno há uma melhora no clima
organizacional e a equipe se mostra mais proativa, ao ver

128
suas opiniões sendo ouvidas e analisadas. Para o ambiente
externo o acesso a demandas é menos burocrático e de re-
solutividade mais rápida para os casos a serem resolvidos.
Sentimentos de pertinência e satisfação - A satisfação
no trabalho é fenômeno amplamente estudado e esse in-
teresse decorre da influência que a organização pode exer-
cer sobre o trabalhador, afetando sua saúde física e mental,
atitudes, comportamento profissional e social, tanto com
repercussões para a vida pessoal e familiar e organizacio-
nal (CURA, 1994; LOCKE, 1976; PÉREZ-RAMOS,
1980; ZALEWSKA 1999a, 1999b). Apesar de relevante
e freqüentemente mencionada, a relação entre satisfação no
trabalho e saúde tem sido insuficientemente pesquisada e
aplicada (MARTINEZ, 2002). O ambiente psicossocial
no trabalho engloba a organização do trabalho e as relações
sociais de trabalho. Fatores psicossociais no trabalho são
aqueles que se referem à interação entre e no meio ambien-
te de trabalho, conteúdo do trabalho, condições organiza-
cionais e habilidades do trabalhador, necessidades, cultura,
causas extra-trabalho, pessoais que podem, por meio de
percepções e experiências, influenciar a saúde, o desempe-
nho e a satisfação no trabalho (OIT, 1984).
A ambiência, ao incluir o processo de trabalho, preten-
de mudá-lo, uma vez que está intrinsecamente relacionada
à postura e conforto, mas também a dignidade e direitos.
Sabe-se que ao entrar em ambiente de trabalho em saú-
de, tanto usuários como trabalhadores, arriscam-se a deixar
fora tudo que é relativo ao seu mundo, perdendo as referên-
cias sobre cotidiano, cultura e desejos.

129
Ressalte-se que o hospital favorece o adoecimento dos
que trabalham nele, pois se dá importância maior para a
cura do paciente com medicamentos e assistência especia-
lizada, mas se esquece que a equipe de multiprofissionais
também necessita de atenção para o cuidado com sua saúde
(NEUMANN, 2007). Por outro lado, entende-se a am-
biência da emergência do hospital como espaço físico de
relações interpessoais, profissionais e social, que deve pro-
porcionar um local acolhedor.
A instituição é responsável por fornecer uma gestão
de pessoal que contemple a saúde do trabalhador em sua
totalidade, enfatizando a qualidade de vida e o cuidado
dos cuidadores, no contexto existencial e do trabalho que
proporcione um ambiente onde os valores morais e éticos
favoreçam a dignidade, respeito e solidariedade entre os
profissionais (OLINISKI & LACERDA, 2006).
A discussão sobre a estrutura hospitalar mostra, ao lon-
go dos séculos, desde as concepções de Florence Nightin-
gale, os aspectos de funcionalidade de 18 setores básicos,
banheiros, disposição de mobiliário, dimensionamento de
ambientes, iluminação natural, ventilação, entre outros.
Atualmente a ideia de ambiente terapêutico, estruturas
mais ornamentadas e formuladas estão sendo discutidas
a fim de tornar o hospital um ambiente que produza nos
usuários uma sensação de bem-estar e conforto (VIANNA,
BRUZSTYN & SANTOS, 2008).
Entende-se que se faz necessário mudar as práticas de
saúde, para que os princípios do SUS sejam obedecidos.
Isso significa que a regulação e a normatização da arqui-
tetura de Estabelecimentos de Assistência a Saúde - EAS,

130
feitas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária - AN-
VISA, precisam extrapolar a visão sanitarista e de vigilância
e ampliar seu foco para além do controle de risco, a exemplo
do que ocorre com a RDC-50, seu principal instrumento
normativo (LIMEIRA, 2006).
Nesse contexto, a arquitetura hospitalar precisa evoluir
com as tendências do sistema e transformar-se em arqui-
tetura de atenção a saúde. Para tanto, Silva e Figueiredo
(2011) delimitam alguns aspectos que precisam ser traba-
lhados:Transformação das instalações;Melhoria das áreas
de atendimento; e Incorporação dos serviços hoteleiros.
Conclui-se que promover um ambiente agradável e
confortável exige uma série de adaptações ou mudanças.
Figueira, Inoue e Lamha Neto (2008) ressaltam alguns
elementos que contribuem para a mudança favorável da
ambiência:Controle do barulho ou ruído; Qualidade do ar;
Conforto térmico; Privacidade; Iluminação; Comunicação;
Vista da natureza; Cores; Texturas; e Acomodação para os
familiares.
A concepção de ambientes traduz bem-estar e segu-
rança em suas diversas formas, no que se entende a mor-
fologia, que trabalha a dimensão, forma e volume que con-
figura e cria espaços, tendo plena relação com a sinestesia,
que diz respeito a percepção do espaço por meio dos movi-
mentos e da arte como instrumento da inter-relação e ex-
pressão das sensações humanas, sem invadir a privacidade
e a individualidade da intimidade do usuário. Destaca-se
que é possível inovar com toda criatividade admissível, sem
interromper no trabalho assistencial da equipe multiprofis-
sional para não atrapalhar no tratamento do usuário.

131
A partir dos aspectos supracitados, entende-se que
dessa maneira o ambiente hospitalar deixará de ser caracte-
rizado como um local de dor e sofrimento, pois engenhei-
ros, arquitetos, gestores e trabalhadores estão cada vez mais
avançando na busca pela melhor qualidade, investindo em
criatividade, inovação e tecnologia, favorecendo contenta-
mento e encantamento aos pacientes.
Essa transformação se dá pela preocupação da gestão
do hospital com a pessoa humana, que necessita de um aten-
dimento humanizado. A preocupação com o bem-estar das
pessoas no ambiente hospitalar deve ser a intenção maior.
Trabalhar a ambiência tem como mérito desenvolver
de maneira eficiente a humanização, tendo como foco o be-
nefício psicológico e emocional, ou seja, atender às necessi-
dades subjetivas dos usuários e dessa maneira desmistificar a
imagem negativa de alguns fatores, que afetam a satisfação
dos mesmos.
No contexto da saúde, se percebe que as discussões
sobre melhorias ganharam forças a partir de 1924, quando
nos Estados Unidos da América, o Colégio Americano de
Cirurgiões instituiu padrões de avaliação que visavam ga-
rantir a qualidade da assistência, relacionada aos procedi-
mentos médicos e ao processo de trabalho dos profissionais.
Apesar de importante, essa iniciativa era restrita, pois igno-
rava aspectos importantes da qualidade como: a estrutura
disponível e os resultados observados no paciente. No Bra-
sil, é provável que o primeiro trabalho desenvolvido para
melhorar a qualidade dos serviços hospitalares tenha sido à
utilização da Ficha de Inquérito Hospitalar, proposta pelo
médico Odair Pedroso, em 1935, a qual especificava como

132
deveria ser a organização de uma instituição hospitalar na-
quela época (MATZUDA AND JÚNIOR, 2011)
Na atualidade, dentre os modelos adotados para a
melhoria da qualidade nos hospitais brasileiros, o sistema
de Gestão pela Qualidade Total-GQT ou simplesmente
Gestão pela Qualidade, tem se apresentado como um mo-
delo eficaz. O referido sistema que se originou a partir da
Segunda Guerra Mundial, foi utilizado primeiramente na
indústria de bens manufaturados no Japão e, por volta de
1987, a sua implantação se iniciou nas instituições de saú-
de nos Estados Unidos da América. Em termos gerais, o
objetivo da GQT é obter maior produtividade e satisfação
das pessoas, por meio da padronização; da participação dos
usuários e trabalhadores; do trabalho em equipe e do estí-
mulo à criatividade (MONACO e GUIMARÃES, 2000).
A qualidade de vida no ambiente de trabalho visa fa-
cilitar e satisfazer as necessidades do trabalhador, ao desen-
volver suas atividades na organização, por meio de ações
para o desenvolvimento pessoal e profissional. A adminis-
tração pública deve buscar permanentemente uma melhor
Qualidade de Vida no Trabalho-QVT promovendo ações
para o desenvolvimento pessoal e profissional de seus ser-
vidores. Para tanto, as instituições públicas devem desen-
volver e implantar programas específicos que envolvam o
grau de satisfação da pessoa com o ambiente de trabalho,
melhoramento das condições ambientais gerais, promoção
da saúde e segurança, integração social e desenvolvimento
das capacidades humanas, entre outros fatores.
O QVT visa facilitar e satisfazer as necessidades do
trabalhador ao desenvolver suas atividades na organização

133
tendo como ideia básica o fato de que as pessoas são mais
produtivas quanto mais satisfeitas e envolvidas com o pró-
prio trabalho. Portanto, a ideia principal é a conciliação dos
interesses dos indivíduos e das organizações, ou seja, ao
melhorar a satisfação do trabalhador dentro de seu contex-
to laboral, melhora-se consequentemente a produtividade
(MONACO e GUIMARÃES, 2000).
Também, faz-se necessário analisar, de forma sistemáti-
ca, a satisfação dos servidores, pois, nesse processo de autoco-
nhecimento, as sondagens de opinião interna são uma impor-
tante ferramenta para detectar a percepção dos funcionários
sobre os fatores intervenientes na qualidade de vida e na or-
ganização do trabalho. Para que ocorra a melhor qualidade
no atendimento em saúde é fundamental que os serviços dis-
ponham de recursos físicos, humanos e materiais adequados
e valorize o vínculo afetivo como elo na relação usuário-tra-
balhador. Quando se discute a estrutura para dar suporte ao
atendimento de qualidade, de imediato se pensa em táticas,
por exemplo, para organizar as filas de espera, principalmente
no segmento relacionado à recepção do usuário.
Algumas peculiaridades, seguindo as áreas de atendi-
mento com Classificação de Risco. Para a organização das
funções, facilidade de atendimento e acolhimento, o espaço
identificado e dividido por cores torna-se uma ferramenta
eficiente, podendo ser caracterizado por dois eixos: o ver-
melho da emergência e o azul do pronto atendimento, con-
forme abaixo (MS, 2004):
Área Vermelha - nesta área está a sala de emergên-
cia onde muitas vezes a ambiência não é considerada, uma
vez que se pretende o atendimento à alta complexidade e a

134
tecnologia é colocada como único elemento que compõe o
espaço. Porém, questões de cor, cheiro, luz, são importantes
principalmente para o trabalhador que vivencia este espa-
ço sob grande estresse. Devem ser considerados, também,
próximos à emergência espaços de apoio – estar e copa –
para os trabalhadores. Boxes especiais para procedimentos
invasivos ou para atendimento de crianças também podem
constituir ferramenta importante para otimização de recur-
sos tecnológicos, melhoria do padrão de assepsia e para evi-
tar situações constrangedoras e traumáticas.
Área Amarela e Área Verde do Eixo Vermelho - são
compostas por sala de retaguarda (para pacientes já estabili-
zados, porém críticos ou semicríticos) e sala de observação,
respectivamente. Em ambas as áreas observa-se a necessi-
dade da aplicação equilibrada e harmônica das cores, cuida-
do de tratamento com a iluminação artificial, proporcionar
a iluminação natural, prever cuidadosamente mobiliários,
poltronas para acompanhantes, cortinas ou divisórias, posto
de enfermagem que possibilite a visão de todos os leitos,
pontos de som e TV e trabalhar o aroma.
Área Azul - Aí estão os espaços de espera, acolhimen-
to e atendimento administrativo. Esta área deverá ser ampla
e confortável, integrada ao entorno, ligando interior e exte-
rior, onde todos os componentes já citados sejam exaltados.
Constitui-se de uma área central focada no acolhimento
que objetiva a escuta das necessidades dos usuários, a orien-
tação de fluxos e a priorização do atendimento de acordo
com o grau de complexidade.
Área Amarela do Eixo Azul - área de assistência, apoio
e procedimentos do pronto atendimento que deve ressaltar

135
o acompanhante presente, o respeito à individualidade e as
necessidades do paciente, com fluxos claros, informação e
sinalização. Com isso, é importante lembrar que não se pre-
tende criar normas nem estabelecer parâmetros, são apenas
algumas colocações que podem ser adaptadas, repensadas e
recriadas de acordo com as peculiaridades de cada hospital,
as diferentes demandas e o poder de criação do arquiteto.
Para humanizar o ambiente, o Ministério da Saúde
inclui a ambiência hospitalar, que abrange tanto o espaço
físico como o social, profissional e de relações, que deve ser
acolhedor, humano e resolutivo. O espaço deve oferecer ao
sujeito produtor de saúde conforto e individualidade, envol-
vendo a cor, cheiro, som, iluminação e forma, abrangendo
as necessidades do usuário, do trabalhador e da comunida-
de. Este deve facilitar a produção do cuidado e da recupera-
ção de quem utiliza esse espaço (BRASIL, 2004).
Os pacientes e a equipe de trabalho hospitalar estão
acostumadas com ambientes brancos, frios e distantes, não
havendo a ideia de algo diferente (VASCONCELOS,
2004). O ambiente branco, monocromático não é recomen-
dado, pois causa muito cansaço visual e tende a provocar
distração nos profissionais que nele atuam (MARTINS,
2004).
A sensação de bem-estar humana geralmente é cau-
sada por um ambiente que promova um grau moderado de
estimulação positiva. Som alto, iluminação intensa, cores
vibrantes causam estresse. Já se a estimulação dos mesmos
aspectos for muito baixa pode causar depressão ou senti-
mentos ruins em quem convive neste tipo de ambiente
(VASCONCELOS, 2004).

136
A arquitetura da emergência do hospital deve propor-
cionar conforto e funcionalidade para o trabalhador para
que o trabalho aconteça de forma simplificada e satisfatória
(VASCONCELOS, 2004).
Na humanização se faz necessário o entendimento do
conceito de ser humano. Assim, a consciência de quem uti-
liza um espaço é peça fundamental para definir o modo e as
características que o mesmo deve possuir. Quando se co-
nhecem as necessidades de um indivíduo, é possível propor-
cionar um ambiente que supra e supere as suas necessidades
(VASCONCELOS, 2004).

Considerações Finais

A relevância desta pesquisa decorre do fato de a am-


biência adequada ser uma preocupação atual para a huma-
nização no ambiente hospitalar, do que decorre a necessi-
dade de maior volume e profundidade crítica dos estudos.
O hospital deixou de ser visto como um local frio e
impessoal, a partir da compreensão das necessidades de
inovação em seus serviços e das relações interpessoais entre
profissional-profissional e profissional-usuário. Observou-
se que o público tinha necessidade de um ambiente hospi-
taleiro, como estratégia de transformação dos seus serviços
e instalações, a fim de propiciar um ambiente menos des-
gastante aos seus usuários.
Então, possivelmente, pode se constituir um novo
campo de possibilidades: tanto para o aumento da qualida-
de da assistência quanto para uma nova ordem relacional.
Portanto, a fundamentação teórico-prática, neste campo,
necessita, ainda, de exploração e investimento.

137
A questão central é analisada por meio de uma relação
entre ambiência hospitalar e o conceito de humanização.
Verificando os indicadores ambientais que poderiam ser
inseridos na humanização hospitalar e os efeitos do proces-
so de inserção de um novo modelo de ambiência, para sua
humanização.
A boa qualidade dos serviços é um complemento ao
tratamento médico e hospitaleiro. Um ambiente hospitalar
com serviços de excelência comunica melhor o seu objetivo,
que é propiciar um local humanizado, onde o usuário não se
sinta constrangido, mas com sua dignidade respeitada dian-
te das suas enfermidades.
Conclui-se então, que a política de humanização sur-
giu através da necessidade de oferecer uma melhor hospi-
talidade aos seus usuários e equipe multiprofissional, uma
vez que as atividades atribuídas à hospitalidade são fatores
relevantes à humanização, pois beneficiam com um acolhi-
mento digno. Para tanto, para sua implantação é necessário
a criatividade e comprometimento do Gestor Hospitalar,
assim como de todos os envolvidos nesse processo, para
desta maneira se obter a satisfação do seu público.

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142
CAPÍTULO 6

DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL E A UTILIZAÇÃO DOS


SISTEMAS DE INFORMAÇÕES GEOGRÁFICAS EM
SAÚDE

Radmila Alves Alencar Viana


Francisco José Maia Pinto

INTRODUÇÃO

O processo de urbanização em alguns países como o


Brasil e os demais da América Latina construíram padrões
desiguais de distribuição ao acesso, recursos e serviços ur-
banos, gerando, em nossa sociedade, disparidades e restri-
ções em alguns serviços de saúde, repercutindo, portanto,
sobre o padrão de distribuição das doenças no tecido urbano
(JOHANSE; CARMO; ALVES, 2016).
As desigualdades sociais sofrem forte influência nas
desigualdades em saúde, uma vez que contribuem negati-
vamente para demora do diagnóstico, abandono e insucesso
do tratamento. O acesso aos serviços varia de região para
outra, fazendo com que os riscos de adoecer, o prognósti-
co ou desfecho também sofram variações. Isso se deve não
somente a organização e a qualidade dos serviços, mas tam-
bém a distribuição desigual de recursos e tecnologias em

143
saúde, resultando iniquidades sociais que afeta, direta e in-
diretamente na presença de agravos e doenças (YAMURA
et al., 2015).
O Brasil é o décimo país mais desigual do mundo em
termos de distribuição de renda, e mesmo ocorrendo nas
últimas décadas algumas alterações na economia, resultan-
do em melhorias, como a diminuição da mortalidade por
algumas doenças, o aumento da expectativa de vida, entre
outras mudanças, ainda persistem doenças e agravos asso-
ciados a precárias condições de vida, gerando, dessa forma,
importantes diferenças na distribuição da morbimortalida-
de, tanto entre os estados brasileiros quanto dentro de um
mesmo estado, necessitando assim de modelos de vigilância
que envolvam o contexto social (PIUVEZAM et al., 2015;
HOLANDA et al., 2015; NASCIMENTO; RODRI-
GUES-JUNIOR; RODRIGUES, 2015)
A baixa escolaridade, por exemplo, em alguns pacien-
tes pode influenciar negativamente na aquisição de infor-
mações, visto que o grau de instrução favorece um maior
entendimento e apreensão dos conhecimentos sobre adoe-
cer, prevenção e qualidade de vida, aumentando a vulnera-
bilidade dessas pessoas e funcionando como um marcador
de precárias condições de vida (PINTO et al., 2015).
Dessa forma, alguns territórios considerados com con-
dições de vida precárias teriam um maior risco de eventos
adversos a saúde do que outros. Podendo ser solucionado,
muitas vezes, com a forte presença de uma Atenção Pri-
mária a Saúde (APS), uma vez que a mesma tem um papel
determinante na proteção social e na equidade, ofertando
serviços organizados em razão de uma demanda quantitati-

144
va e qualitativa, oferecendo aos territórios com menos opor-
tunidades sociais APS forte, abrangente e com capacidade
de promover a gestão setorial para a ampliação do acesso
(YAMAMURA et al., 2016).
Portanto estudar e analisar como algumas doenças
estão distribuídas espacialmente, juntamente com a dis-
tribuição espacial da pobreza e da vulnerabilidade social é
um importante fator a ser considerado em políticas públicas
a fim de reduzir as desigualdades socioterritoriais e as ini-
quidades em saúde que podem ser encontradas em algumas
áreas (HOLANDA et al., 2015).
Acredita-se que a implementação de políticas e inter-
venções em saúde que atuem sobre os determinantes sociais
pode ser a solução para a redução das iniquidades, uma vez
que, no mundo, pessoas socialmente desfavorecidas adoe-
cem e morrem com maior frequência do que aquelas que
pertencem a grupos mais privilegiados socialmente. Existe
evidências de que a maior parte dos problemas em saúde
são atribuídos às condições sócio-econômicas de pessoas ou
grupo de pessoas (ALZATE-GRANADOS et al., 2012).
Dessa forma, com o advento de novas teorias em
saúde, dentre elas a ecológica, com enfoque na multicau-
salidade, reforça-se a importância da utilização de novos
procedimentos e técnicas que encontrem no espaço a cau-
salidade das doenças, visto que a doença é uma manifes-
tação individual e a situação de saúde, uma manifestação
do lugar. Os lugares são, assim resultados de um acúmulo
de situações históricas, ambientais e sociais que promovem
condições particulares para a produção de agravos e doenças
(CAVALCANTE et al., 2013).

145
Portanto a utilização das geotecnologias vem trazendo
grande contribuição para o mapeamento das ocorrências de
casos de doenças e caracterização epidemiológicas de ende-
mias, sendo o uso dessas metodologias a que melhor destaca
a influência do espaço/ ambiente e condições sociais nos
padrões de transmissão de doenças a fim de adotar medidas
para a prevenção e controle desses agravos em saúde (SIL-
VA et al., 2015).

MÉTODOLOGIA

O presente capítulo trata-se de uma revisão integrativa


da literatura (MENDES; SILVEIRA; GALVAO, 2008),
onde realizou-se um levantamento da produção acadêmica
através do portal da Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), de-
dicadas ao tema da distribuição espacial e sua utilização no
campo da saúde no Brasil e no mundo, publicados em revis-
tas científicas indexadas nas bases LILACS e MEDLINE,
entre o período de 2012 a 2017. Foram utilizadas como
descritores os termos: “distribuição espacial” AND “sistema
de informação geográfica” AND “saúde”, todo os termos
foram anteriormente consultados no DECS.
Com o auxílio de filtros específicos disponíveis nas
ferramentas de busca da BVS, optou-se como critérios de
inclusão somente as produções em artigo científico, com
texto completo, disponíveis nos idiomas inglês, português e
espanhol. Ao consultar os artigos de acordo com os critérios
de inclusão foram encontrados 128 resultados, sendo 117
em inglês, 6 em espanhol e 5 em Português. Destes, 109
estavam disponíveis na base MEDLINE e 19 na LILACS.

146
Ao analisar quais os estudos realmente abordavam a
temática foram encontrados 88 resultados, destes dois em
duplicidade e uma revisão de literatura. Sendo posterior-
mente avaliado os títulos e apenas 31 estavam relacionados
ao tema. Estes, então, tiveram seus resumos consultados e
posterior leitura na íntegra, porém, 7 não tinham relação
com tema, sendo descartados na etapa de leitura dos resu-
mos e, portanto, apenas 24 artigos tiveram leitura integral,
uma vez, que abordavam o tema (Quadro 1).

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Após a leitura integral dos artigos, optou-se por uti-


lizar no quadro-resumo, a referência de cada estudo, bem
como o objetivo, principal foco do nosso trabalho, a fim de
conhecer como são utilizadas as ferramentas dos sistemas
de informações geográficas no campo da saúde, a metodo-
logia, o software utilizado e a conclusão do estudo, descritos
no quadro abaixo.

147
Quadro 1 – Distribuição dos artigos de acordo com a referência, objetivo, metodologia, software utilizado e conclusão, 2017
Referência Objetivo Metodologia Software utilizado Conclusão
1. HERNANDEZ-VAS- Descrever e fornecer uma Estudo ecoló- QGIS v2.10.1 O estudo mostrou considerável
QUEZ, Akram et al. Dis- representação geoespacial dos gico, explora- (OSGeo, Beaverton, variabilidade geográfica e padrões espa-
tribución espacial de los índices de acidentes fatais, tório OR, EUA) ciais comuns
accidentes y enfermedades ocorrências e doenças ocu- em indicadores regionais de acidente e
relacionados con el trabajo pacionais perigosas no Peru, doenças profissionais que podem servir
en el Perú, 2012-2014. Rev. com ênfase nas atividades para orientar o desenvolvimento de estu-
perú. med. exp. salud econômicas que oferecem o dos para explicar a variabilidade encon-
publica, Lima, v.33, n.1, maior número de doenças trada e, portanto, concentrar intervenções
jan 2016. profissionais. futuras ou ações a nível regional, com o
objetivo de proteger a saúde e segurança
dos trabalhadores das diferentes regiões
do Peru.
2. YAMAMURA, Mellina Caracterizar as diferenças do Estudo ecoló- Software TerraView A ocorrência de casos de óbitos, tanto
et al. Epidemiological perfil clínico e epidemioló- gico. 4.2.2, considerando o como causa básica quanto associada,
characteristics of cases of gico dos casos de óbitos que mapa digital de seg- esteve concentrada em áreas com nível

148
death from tuberculosis and tiveram a tuberculose como mento de logradouros socioeconômico inferior e intermediário.
vulnerable territories. Rev. causa básica e causa associada StreetBase(r) em pro-
Latino-Am. Enfermagem, e analisar a distribuição es- jeção UTM/WGS84,
Ribeirão Preto, v.23, n.5, pacial dos casos de óbito por disponibilizado na
p.910-918, Out. 2015. tuberculose nos territórios de extensão Shapefile, os
Ribeirão Preto, SP. mapas temáticos da
distribuição da densi-
dade dos óbitos foram
gerados no softwa-
re ArcGIS 10.2.
3. OEXLE, Nathalie et Examinar a associação entre a Estudo trans- Não especificado Não houve evidência de associação entre
al. Neighborhood fast disponibilidade de fast-food versal a disponibilidade de fast-food nos bairros
food availability and fast de bairro e o seu consumo (percebida ou baseada em SIG) e o con-
food consumption. Appe- semanal, independente das sumo semanal nesta amostra estudada.
tite, [s.l.], v. 92, p.227-232, características sociodemográ-
set. 2015. Elsevier BV. ficas e ambientais, utilizando
medidas subjetivas e objetivas
do ambiente de fast-food.
Referência Objetivo Metodologia Software utilizado Conclusão
4. ALMEIDA, Milena Identificar padrões espaciais Estudo ecoló- Terra View 4.2.1 de Os resultados observaram que a taxa de
Cristina Silva; GOMES, da distribuição da mortali- gico e explora- acesso público e desen- mortalidade neonatal precoce é o maior
Camila Moraes Santos; dade neonatal total, precoce tório realizado volvido pelo Instituto componente da taxa de mortalidade
NASCIMENTO, Luiz e tardia no Estado de São em microrre- Nacional de Pesquisas neonatal e que recém-nascidos de re-
Fernando Costa. Spatial Paulo. giões do estado Espaciais (INPE) giões com condições socioeconômicas
analysis of neonatal mortal- de São Paulo. desfavoráveis apresentam maior risco de
ity in the state of São Paulo, morte neonatal. Tais estudos indicam que
2006-2010. Rev. paul. pe- a qualidade da atenção oferecida pelos
diatr., São Paulo, v.32, n.4, serviços de saúde tem que melhorar nas
p.374-380, Dez. 2014. regiões mais pobres do Estado, mas, nas
regiões mais favorecidas, é necessário que
o serviço acessível prestado seja efetivo.
5. ABBOTT, Gavin et al. Examinar até que ponto as Ecológico. ArcView V.3.3. O ambiente do bairro residencial pode
Explaining educational características do ambiente ajudar a explicar padrões socioeconô-
disparities in adiposity: The construído por vizinhança micos de sobrepeso e obesidade em

149
role of neighborhood envi- explicam a associação entre mulheres australianas. Estes resultados
ronments. Obesity, [s.l.], v. adiposidade e qualificações proporcionam mais apoio para considerar
22, n. 11, p.2413-2419, 11 educacionais em mulheres o ambiente construído em iniciativas de
ago. 2014. Wiley-Blackwell. australianas. prevenção da obesidade, sugerindo um
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Felício da Silva; NASCI- para cesarianas por microrre- ecológico e ciais de cesarianas (I = 0,58 e p < 0,01)
MENTO, Luiz Fernando gião do Estado de São Paulo. exploratório nas microrregiões ao norte e noroeste do
C. Spatial distribution of com dados de Estado, além de Guaratinguetá. Identifi-
C-sections within the state nascidos vivos cou-se microrregiões com alta prioridade
of São Paulo. Rev. Assoc. entre 2003 e de intervenção e as taxas de cesarianas
Med. Bras., São Paulo, v.60, 2007 de 63 estiveram correlacionadas significativa-
n.5, p.419-423, Out. 2014. microrregiões mente com as taxas de alta escolaridade
do Estado de materna e número de consultas.
São Paulo.
Referência Objetivo Metodologia Software utilizado Conclusão
7. MAIA, Helena Fraga et Descrever a distribuição Estudo explo- Sistema de Posiciona- Casos de TCE formaram aglomerados,
al. Distribución espacial de espacial dos casos de Trau- ratório. mento Global (GPS) tanto em relação ao local de residência
los casos de traumatismos matismo Crânio Encefálico Garmin® eTrex Legend como de ocorrência. Identificou-se aglo-
craneoencefálicos atendidos (TCE) tratado em um hos- HCx, software Cri- merados em áreas remotas de atenção à
en unidades de referencia pital da região metropolitana meStat® 3.2 e mapas urgência e os lugares onde a reabilitação
en Salvador, Bahía, Brasil. de Salvador, Bahia, Brasil. temáticos desenvol- multidisciplinar é oferecido, de modo que
SALUD COLECTIVA, vidos no programa a distribuição espacial dos serviços de
Buenos Aires, v.10, n.2, ArcView 3.2. saúde, em relação aos locais de ocorrência
p.213-224, mai 2014. de TCE revela desigualdades.
8. NASCIMENTO, Luiz Identificar padrões espaciais Estudo TerraView 4.2.1. Os coeficientes de Moran (I) foram sig-
Fernando Costa; ALMEI- da distribuição da mortalida- ecológico e nificativos (valor p<0,05) para a taxa de
DA, Milena Cristina da de neonatal nas microrregiões exploratório, mortalidade neonatal total I=0,11 e para
Silva; GOMES, Camila de do estado de São Paulo e documental. taxa de mortalidade por causas evitáveis
Moraes Santos. Causas evi- verificar o papel das causas I=0,19, sendo que os óbitos neonatais se
táveis e mortalidade neo- concentraram na região sudoeste e no
evitáveis na composição desse

150
natal nas microrregiões do Vale do Paraíba. Conclui-se que se as
estado de São Paulo. Rev. indicador de saúde. causas evitáveis fossem abolidas, haveria
Bras. Ginecol. Obstet, Rio uma redução significativa da taxa média
de Janeiro, v.36, n.7, p.303- de mortalidade neonatal total, de 8,42
309, Jul 2014. para 2,23 óbitos/1.000 nascidos vivos,
representando uma queda de 73%.
9. KAO, Dennis et al. Explora a acessibilidade Estudo explo- O software ArcGIS A presença de instalações de tratamento
Spatial accessibility of drug espacial de instalações de ratório. 10.0 (ESRI, 2011a) foi em regime ambulatório pode influenciar
treatment facilities and the tratamento ambulatorial de usado para gerenciar os o risco do consumo futuro de heroína
effects on locus of control, drogas e a associação poten- dados espaciais, geoco- e comportamentos de compra entre os
drug use, and service use cial com resultados relaciona- dificar os participantes americanos mexicanos.
among heroin-inject- e instalações, e cons-
ing Mexican American dos à abuso de drogas entre truir a acessibilidade de
men. International Journal os consumidores de heroína. medidas espaciais.
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Referência Objetivo Metodologia Software utilizado Conclusão
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al. Distance to emergency aos serviços de atendimento documental. (Quantum GIS Deve- proximidade aos serviços de entrega e
obstetric services and early obstétrico e neonatal de lopment Team 2012). maior nível de cuidados estavam asso-
neonatal mortality in Ethi- emergência sobre a morta- ciados com menor mortalidade neonatal
opia. Tropical Medicine & lidade neonatal precoce na precoce na Etiópia rural, após o controle
International Health, [s.l.], Etiópia rural e verificar se de outros determinantes proximais e
v. 19, n. 7, p.780-790, 22 a proximidade aos serviços socioeconômicos importantes. A distân-
abr. 2014. Wiley-Blackwell. contribui para as desigual- cia para os serviços foi um importante
http://dx.doi.org/10.1111/ dades socioeconômicas na determinante da desigualdade geral na
tmi.12323. mortalidade neonatal precoce. mortalidade neonatal precoce, juntamen-
te com a riqueza dos agregados familia-
res, características dos recém-nascidos e
o estatuto de autonomia das mulheres.
Entretanto, a distância para os serviços
pouco contribuiu para explicar a desi-
gualdade socioeconômica na mortalidade

151
neonatal precoce.
11. RESTREPO, Angela Identificar os clusters de Ecológico, Os conjuntos de dados Este estudo sugere que a dengue está
Cadavid; BAKER, Peter; dengue no país e visualizar os documental. espaciais foram im- espacialmente agrupada em áreas locali-
CLEMENTS, Archie C.a.. padrões suavizados de risco portados para o pacote zadas na parte oriental e central do país.
National spatial and tem- de dengue. O estudo também de software Quantum Em todos os modelos examinados, a pre-
poral patterns of notified objetivou determinar se fato- GIS, versão 1.8.0, cipitação foi um importante preditor da
dengue cases, Colombia res ambientais locais, como ‘Lisboa’ (Quantum transmissão da dengue. Estes resultados
2007-2010. Tropical temperatura, precipitação e GIS Development dão alguma indicação do impacto poten-
Medicine & International elevação, estão associados à Team 2012). Os valores cial que os fatores ambientais podem ter
Health, [s.l.], v. 19, n. 7, distribuição e dinâmica da médios espaciais de sobre a alta incidência de dengue no país.
p.863-871, 27 maio 2014. doença. temperatura, precipi-
Wiley-Blackwell. http://dx. tação e elevação foram
doi.org/10.1111/tmi.12325. calculados no SIG de
cada município para
definir parâmetros em
modelos estatísticos
subsequentes.
Referência Objetivo Metodologia Software utilizado Conclusão
12. BARBOSA, A.D. et Analisar a frequência e distri- Estudo epi- Utilizou-se a base Não houve associação entre as áreas de
al. Distribuição espacial buição espacial dos acidentes demiológico geográfica EndGeo, o maior incidência de escorpionismo e as
de acidentes escorpiônicos escorpiônicos em Belo Ho- observacional, aplicativo de mapea- áreas de maior risco à saúde classificadas
em Belo Horizonte, Minas rizonte, entre 2005 e 2009, retrospectivo. mento MapInfo versão pelo IVS. Conclui-se que há necessidade
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Bras. Med. Vet. Zootec., risco classificadas pelo Índice Hotspot Detective e do agravo e que o mapeamento dos casos
Belo Horizonte, v.66, n.3, de Vulnerabilidade à Saúde SatScan. é uma ferramenta relevante capaz de em-
p.721-730, Jun 2014. (IVS), um índice socioeconô- basar o direcionamento das ações educa-
mico regional composto. tivas de controle para as áreas prioritárias
de Belo Horizonte.
13. BARCELLOS, Chris- Avaliar o risco de homicídios Estudo Do- Não especificado. A presença do tráfico armado em zonas
tovam; ZALUAR, Alba. em favelas do Rio de Janeiro, cumental. estratégicas da cidade aumenta as taxas
Homicídios e disputas considerando as disputas ter- Empregou-se de mortalidade por violência e promove
territoriais nas favelas do ritoriais em curso na cidade. métodos e a “ecologia do perigo” no entorno de
Rio de Janeiro. Rev. Saúde conceitos da favelas.
Pública, São Paulo, v.48, geografia e
n.1, p.94-102, Fev 2014. etnografia, com

152
as abordagens
de observação
participante,
entrevistas e
análise de da-
dos secundários
de saúde.
14. STOPKA, Thomas J. Identificar as regiões geo- Documental. ArcGIS versão 10.1 Os resultados ajudaram a informar ao
et al. Use of Spatial Epi- gráficas macro e micro-nível (Esri, Redlands, CA). programa as decisões de financiamento,
demiology and Hot Spot da Califórnia que contêm incluindo a abertura de novos centros e
Analysis to Target Women grupos de Programa Especial ofereceram uma nova abordagem para
Eligible for Prenatal Wom- de Nutrição Suplementar direcionar os serviços de saúde pública.
en, Infants, and Children para Mulheres, Lactentes
Services. American Journal e Crianças-elegíveis não
Of Public Health, [s.l.], v. participantes.
104, n. 1, p.183-189, fev.
2014. American Public
Health Association.
Referência Objetivo Metodologia Software utilizado Conclusão
15. BESSA JUNIOR, Determinar a localização Trata-se de Utilizou-se um apa- O SIG mostrou-se passível de uso e um
Francisco Narcísio et al. espacial dos novos casos de um estudo relho receptor GPS instrumento útil na vigilância epide-
Spatial distribution of dengue, diagnosticados no descritivo do (Garmin 76), o progra- miológica. A visualização da endemia
dengue disease in munic- período entre 2001 e 2007, tipo ecológico, ma Arcview GIS 3.2 e elucidou dúvidas quanto à localização
ipality of Mossoró, Rio na zona urbana do município realizado na o aplicativo ArcMap. real dos casos, revelando que a doença
Grande do Norte, using the de Mossoró.
Geographic Information área urbana do está concentrada em áreas mais periféri-
System. Rev. bras. epide- município. cas, onde reside a população com baixo
miol., São Paulo, v.16, n.3, padrão socioeconômico, conforme as
p.603-610, Set. 2013. constatações feitas em campo.

16. MARTINS, Eunice Analisar as desigualdades so- Trata-se de Utilizou-se os softwa- A elevação das taxas de mortalidade
Francisca et al. Perinatal ciais constatadas na distribui- estudo eco- res Epi Info, versão 10. perinatal mostrou relação direta com o
mortality and socio-spatial ção da mortalidade perinatal lógico com aumento do risco da área e inversa, com a

153
O software MapInfo
inequalities. Rev. Latino em Belo Horizonte. base nos dados para a elaboração dos elevação da escolaridade da mãe. Houve
-Am. Enfermagem, Ribei- de mortes mapas temáticos. interação entre essas variáveis, sendo que
rão Preto, v.21, n.5, p.1062- perinatais, de a baixa escolaridade materna aumenta
1070, Out. 2013. residentes em o risco de morte perinatal em todas as
Belo Horizon- áreas. Observou-se, também, que mortes
te, ocorridas por causas evitáveis, como asfixia/hipóxia,
no período de mais relacionadas à qualidade da assis-
2003 a 2007. tência ao pré-natal e ao parto, registraram
maiores taxas nas áreas de maior vulnera-
bilidade social. Assim, é importante en-
tender os determinantes da mortalidade
perinatal para além dos fatores biológicos
clássicos, incluindo o contexto social e
ambiental nesse processo.
Referência Objetivo Metodologia Software utilizado Conclusão
17. BUMAN, Matthew P. Desenvolver e avaliar a Estudo de Não especificado. Esta ferramenta serve para complementar
et al. The Stanford Healthy utilidade de uma ferramenta Intervenção. outras avaliações e auxiliar os tomadores
Neighborhood Discovery participativa computadoriza- de decisão em processos de construção de
Tool. American Journal Of da baseada em tablets, proje- consenso para mudanças ambientais.
Preventive Medicine, [s.l.], tada para envolver os idosos
v. 44, n. 4, p.41-47, abr. na identificação de elementos
2013. Elsevier BV. da vizinhança que afetam as
oportunidades de vida ativa.
18 NASCIMENTO, Luiz Identificar o padrão de dis- Estudo epide- Efetuou-se a análise A maior ocorrência de nascimentos com
Fernando C.; COSTA, tribuição espacial de recém- miológico do espacial pelo progra- baixo peso nos setores mais periféricos
Thais Moreira; ZOLL- nascidos com baixo peso no tipo ecológico e ma Terra View. pode se relacionar ao fato de esses setores
NER, Maria Stella A. da município de Taubaté, São exploratório. possivelmente abrigarem pessoas com

154
C. Spatial distribution of Paulo. menores rendimentos salariais. Visto
low birthweight infants in
Taubaté, São Paulo, Bra- que o baixo peso ao nascer associa-se às
zil. Rev. paul. pediatr., São famílias com renda mensal inferior a três
Paulo, v.31, n.4, p.466-472, salários mínimos e à baixa escolaridade
Dez 2013. materna, a qual pode ser um marcador
socioeconômico. Nesta linha, os setores
mais centrais, que possivelmente abrigam
pessoas com melhor nível de escolaridade
e, consequentemente, com melhores con-
dições socioeconômicas, tiveram menor
ocorrência desse desfecho.
Referência Objetivo Metodologia Software utilizado Conclusão
19 LIAN, Min; Investigar a influência da Estudo de ArcGIS (Versão 9.3.1, Várias medidas baseadas em SIG de
STRUTHERS, James; distribuição geográfica do Caso. ESRI inc., Redlands, acesso a instalações de mamografia
SCHOOTMAN, Mario. serviço de mamografia no uso CA). existem e não são idênticas em princípio
Comparing GIS-Based e no estágio do diagnóstico e sua associação com o risco de câncer de
Measures in Access to de câncer de mama. Com- mama em estágio tardio. Apenas as duas
Mammography and Their parou-se três métodos (nove medidas usando o método 2SFCA com
Validity in Predicting medidas baseadas em SIG) ponderação 6-timezone foram associadas
Neighborhood Risk of na avaliação do acesso às com maior probabilidade de câncer de
Late-Stage Breast Can- instalações de mamografia no mama em estágio tardio. Essas medidas
cer. Plos One, [s.l.], v. 7, grupo de bloqueio de nível na incorporam barreiras de viagens e con-
n. 8, 28 ago. 2012. Public região de St. Louis. corrência de serviços. Estudos podem
Library of Science (PLoS). observar diferentes resultados dependen-

155
do da medida de acessibilidade utilizada.
20. GARCÍA-PÉREZ, Explora o impacto de variá- Estudo Ecoló- Não especificado. Os resultados mostram o agrupamento
Hilda; ÁLVAREZ-HER- veis ​​contextuais no nível de gico. de áreas de alta mortalidade infantil e
NÁNDEZ, Gerardo; vizinhança em um marcador alguma associação com fatores ambien-
DENMAN, Catalina, de saúde na cidade de Her- tais construídos em Hermosillo. Apoiam
LARA-VALENCIA, Fran- mosillo, México e discute a a necessidade de reconectar a saúde
cisco; HARLOW, Siobán importância da colaboração pública e o planejamento urbano como
D, Neighborhood socio-en- entre planejadores e profis- forma de criar ambientes mais saudáveis
vironmental vulnerability sionais de saúde para mini- nas cidades mexicanas.
and infant mortality in mizar o efeito negativo de
Hermosillo, Sonora Salud fatores contextuais na saúde
Pública de México, 2012, 54 urbana.
( Jul-Ago)
Referência Objetivo Metodologia Software utilizado Conclusão
21. MESSER, Lynne C.; Avaliar a consistência de as- Ecológico. ArcGIS. As incivilidades altas foram associadas
VINIKOOR-IMLER, Lisa sociações entre características com o aumento do tabagismo, ganho de
C.; LARAIA, Barbara A.. de vizinhança, comportamen- peso inadequado e hipertensão induzida
Conceptualizing neighbor- tos e resultados relacionados pela gestação, enquanto que a walkability
hood space: Consistency à gravidez em quatro limites foi associada à diminuição do tabagismo
de bairro aninhados utili- e Hipertensão induzida pela gravidez
and variation of associ- zando modelos de logística para mulheres brancas em todas as
ations for neighborhood multinível de inclinação fixa definições de bairro. Para as mulheres
factors and pregnancy de declive fixo de raça. afro-americanas, altas incivilidades esta-
health across multiple vam associadas ao aumento do tabagismo
neighborhood units. Health e ganho de peso gestacional inadequado.
& Place, [s.l.], v. 18, n. 4, As associações com atributos de vizi-
p.805-813, jul. 2012. El- nhança eram semelhantes em tamanho
sevier BV. http://dx.doi. de efeito em todas as geografias, mas
org/10.1016/j.health- menos precisas à medida que os bairros
se tornavam menores.
place.2012.03.012.

156
22. STOPKA, T. J. et al. Determinar fatores demo- Delineamento ArcGIS, version 10; Nas análises multivariadas, a idade, a
Demographic, Risk, and gráficos, comportamentais e transversal. ESRI, Redlands, raça, a freqüência de injeção, o tipo de
Spatial Factors Associated espaciais associados à compra California. droga injetada e a fonte de fornecimento
With Over-the-Count- de seringas entre os usuários de seringas foram associadas indepen-
er Syringe Purchase de drogas injetáveis em San dentemente com compras de seringas.
Francisco, Califórnia. Notavelmente, a prevalência de compra
Among Injection Drug de seringas foi 53% mais baixa entre
Users. American Journal os usuários de drogas internas afro-a-
Of Epidemiology, [s.l.], v. mericanas e maior entre os injetores de
176, n. 1, p.14-23, 4 maio metanfetamina. Dois bairros com altas
2012. Oxford University densidades de usuários tinham acesso
Press (OUP). http://dx.doi. limitado a seringas de balcão. O aumento
org/10.1093/aje/kwr492. do acesso às seringas de balcão poderia
potencialmente prevenir as doenças in-
fecciosas transmitidas pelo sangue entre
os usuários de drogas injetáveis.
Referência Objetivo Metodologia Software utilizado Conclusão
23. BISSONNETTE, Esta pesquisa examina o Estudo eco- Todas as análises de A acessibilidade potencial é reduzida para
Laura et al. Neighbour- acesso de bairro aos cuidados lógico GIS foram realizadas as minorias linguísticas, bem como para
hoods and potential access de saúde primários na cidade usando o software as populações de imigrantes recentes. Os
to health care: The role of de Mississauga, Ontário, ArcGIS 9.3 resultados da pesquisa reforçam a impor-
spatial and aspatial fac- Canadá. tância de se focar nas variações intra-ur-
banas no acesso ao cuidado e demons-
tors. Health & Place, [s.l.], tram a utilidade de uma nova abordagem
v. 18, n. 4, p.841-853, jul. para o estudo dos impactos do bairro que
2012. Elsevier BV. http://dx- melhor representa variações espaciais no
.doi.org/10.1016/j.health- acesso e demanda da saúde.
place.2012.03.007.
24. BRANTLEY, Mary D. Descrever por proximidade Ecológico. ArcGIS version 9.3 Esta análise geoespacial descreve o estado
et al. Mapping US Pediatric geográfica até que ponto a atual dos recursos pediátricos do hospital

157
Hospitals and Subspecialty população pediátrica dos de cuidados críticos e fornece uma visão
Critical Care for Public Estados Unidos (de 0 a 17 visual e analítica das lacunas existentes
Health Preparedness anos) tem acesso a pediatras e na cobertura hospitalar pediátrica local.
and Disaster Response, outros serviços especializados Também destaca o uso do mapeamento
2008. Disaster Medicine de cuidados intensivos, e des- dasimétrico como ferramenta para o
And Public Health Pre- tacar as diferenças regionais planejamento da preparação para a saúde
paredness, [s.l.], v. 6, n. na distribuição populacional pública.
02, p.117-125, jun. 2012. e crítica de recursos para o
Cambridge University Press planejamento da preparação
(CUP). e utilização durante um
desastre de saúde pública em
massa.
O estudo do geoprocessamento ou também conhecido
como georreferenciamento tem grande utilidade no setor
saúde, sendo aplicado em diferentes contextos da saúde pú-
blica. A maioria dos estudos disponíveis sobre o tema, como
vistos acima, abordam questões como a incidência de doen-
ças e agravos e sua distribuição no espaço, que muitas vezes
tem correlações com as regiões ou áreas que possuem bai-
xas condições socioeconômicas (JOHANSEN; CARMO;
ALVES, 2016; BESSA JUNIOR et al., 2013), constatando
que a doença está distribuída principalmente entre a popu-
lação mais precária, ou seja, entre os bairros que apresentam
carência social (PERUHYPE et al., 2014; ARAUJO et al.,
2013).
O que demonstra a necessidade de políticas e estraté-
gias direcionadas para as condições de saneamento básico,
prevenção primária, acesso à educação, entre outras melho-
rias do espaço e vida urbana, buscando reduzir dessa forma
a vulnerabilidade social entre os espaços (INAGAKI et al.,
2014; BIDINOTTO; SIMONETTI; BOCCHI, 2016).
Apesar da maioria dos estudos, vistos acima, associa-
rem algumas doenças a padrões espacialmente desfavorá-
veis, outros utilizaram as técnicas de geoprocessamento para
diferentes fins, como para identificar a capacidade de tra-
tamento hospitalar a fim de analisar a capacidade máxima
e a procura de serviços em saúde em caso de internações
em massa, bem como avaliar programas de saúde pública
(FREITAS et al., 2016). Demonstrando, assim, como as
técnicas e análises espaciais podem ser importantes ferra-
mentas tanto para a epidemiologia e vigilância em saúde
como para gestão e tomada de decisão.

158
Sabe-se que o Sistema de Informação Geográfica
(SIG) é uma combinação de recursos de mapeamento com-
putacional com ferramentas adicionais de gerenciamento
e análise de base de dados utilizado, amplamente, em vá-
rios setores, como ciência ambiental, planejamento urbano,
aplicações agrícolas, entre outros. A saúde pública é uma
das áreas de foco, onde o SIG tem sido bastante utilizado
para áreas de pesquisa e prática, como vigilância epidemio-
lógica e monitoramento, sendo sua utilização estendida por
mais de um século, evoluindo desde aplicações de simples
mapas a análises complexas de geoestatística (MANOLIT-
ZAS et al., 2016).
O que difere dos demais Sistemas de Informações e de
todos os programas de análise estatística é sua capacidade
de analisar dados complexos e sua apresentação visual de
dados espaciais, sendo a opção por esta tecnologia a me-
lhor maneira de ter eficiência operacional, permitindo uma
boa administração das informações estratégicas, tanto para
minimizar custos como para agilizar no processo decisório.
Assim, a vantagem do uso dessas tecnologias é que os ma-
pas fornecem uma nova dimensão à análise de dados, o que
ajuda a visualizar padrões e relações de questões em saúde
pública, tornando muitas dúvidas melhor entendidas com
o uso das técnicas de geoprocessamento (OLAYA, 2012).
Dessa forma, a abordagem espacial, através de softwares
especializados, possibilita a integração de dados demográ-
ficos, econômicos e ambientais, através do inter-relaciona-
mento de informações de diversos bancos de dados. Sendo
aplicabilidade dos SIGs de grande utilidade para controle e
monitoramento de doenças, bem como auxilia na avaliação

159
de algumas medidas de controle empregadas, fornecendo
informações atualizadas da real situação epidemiologia do
espaço geográfico (SILVA et al., 2015).
Após o georreferenciamento das informações em es-
tudo, ou seja, da localização do evento estudado a partir da
latitude e longitude, outras diversas técnicas realizam a aná-
lise exploratória desses dados espaciais, sendo uma delas e a
mais conhecida o método de Kernel, método utilizado para
mapear e estimar a intensidade de distribuição dos pontos
no espaço através da estatística não paramétrica (BARBO-
SA et al., 2014).
Uma outra análise bastante utilizada em dados espa-
ciais é o cálculo do Índice Global de Moran que detecta a
existência de autocorrelação espacial. Esse índice conside-
ra as diferenças entre os valores em cada região e a média
global do atributo observado. Os valores do índice variam
entre -1 e +1, de maneira que valores próximos de zero
indicam ausência de correlação espacial, valores próximos
de 1 sugerem correlação direta ou autocorrelação espacial
positiva, onde os valores das variáveis de uma área tendem
a ser sememelhantes aos das áreas vizinhas e valores próxi-
mos de -1 indicam um padrão de autocorrelação negativa,
indicando que valores não semelhantes tendem a se juntar
(ALVES et al, 2016; TAVARES et al., 2016).
A dependência espacial é um conceito essencial para
o entendimento do arranjo espacial, sendo a autocorrelação
espacial a mensuração dessa dependência, tratando-se de
um conceito estatístico de correlação utilizado para medir
o quanto é dependente o atributo de uma variável estudada
e sua localização. A estatística I de Moran é utilizado como

160
teste para verificar a presença de “cluster” espacial, para de-
tectar o padrão de “cluster”, sendo um coeficiente ponderado
que situa valores entre -1 e +1 (BRASIL, 2015).
Observou-se, a partir das publicações encontradas, que
os Sistemas de Informações Geográficas (SIG) foram prio-
ritariamente utilizadas para resolver questões como:
1. Organização de dados: armazenamento de dados
e sua análise por meio de mapas digitais;
2. Visualização de dados: podendo ser selacionados
as informações desejados de acordo com o con-
texto estudado;
3. Produção de mapas temáticos: de acordo com o
objetivo de cada estudo analisado;
4. Análise espacial: representada pela utilização de
um conjunto de técnicas estatísticas que combi-
nam os níveis de informações (camadas ou filtros),
a fim de encontrar padrões ou estabelecer relações
a partir do cruzamento dos dados;
5. Previsão: uma vez que tem a possibilidade de al-
terar os parâmetros para avaliar como os eventos,
naturais ou não, poderia ocorrer se as condições
fossem diferentes;
6. Monitoramento;
7. Avaliação de políticas e estratégias em saúde;
8. Alocação de recuros e/ou serviços de saúde, entre
outros.
A partir da leitura dos artigos, pode-se perceber que os
SIGs permitiram, de um modo geral, um melhor entenden-
to em relação a distribuição de morbimortalidade de alguns

161
eventos em saúde, bem como o estudo de diversas caracte-
rísticas acerca dos serviços de saúde, das medidas de preven-
ção, controle e das diferentes regiões geográficas de um país.
Assim o crescente uso dos SIGs se configuram em
ferramentas essenciais para a melhoria da compreensão
da epidemiologia, podendo representar um fator potencial
para a superação dos desafios logísticos e regionais, uma vez
que possibilita identificar fatores ambientais e sociológicos
locais que determinam áreas de alto risco, além de analisar
as relações entre esses fatores de risco e a ocorrência e dis-
tribuição da doença (DUNCOMBE et al., 2012). Forne-
cendo aos políticos e gestores uma base para importantes
programas de saúde pública e tomadas de decisões finan-
ceiras, auxiliando na avaliação da cobertura e a amplitude
dos serviços em determinadas áreas, facilitando o direciona-
mento da saúde pública, sendo, portanto, uma ferramenta
que deveria ser utilizada na prática atual dos serviços em
saúde (STOPKA, et al., 2014).

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169
PARTE II

DOENÇAS CRÔNICAS: OS
DESAFIOS DO CUIDADO
EM SAÚDE.

170
CAPÍTULO 7

DETERMINANTES DA DOENÇA RENAL CRÔNICA:


UMA REVISÃO INTEGRATIVA.

Luana Rodrigues Sarmentu


Larissa Alves Alexandre Moliterno
Lívia Cristina Barros Barreto
Paula Frassinetti Castelo Branco Camurça Fernandes

1 INTRODUÇÃO

A doença renal crônica (DRC) é uma enfermidade


complexa, com impacto significante na qualidade de vida,
longevidade, uso de recursos médicos e gastos em saúde pú-
blica. É definida pela elevação persistente e irreversível da
creatinina sérica, além de ser uma síndrome que resulta da
destruição progressiva e irreversível dos néfrons, indepen-
dentemente da causa. Ocorre como resultado de uma série
de doenças que comprometem os rins levando a atrofia total
dos mesmos (DRUKKER, 1989; DIEGOLI et al., 2015).
Observa-se que um número significante de pacientes
que iniciam tratamento dialítico possui como diagnóstico
a DRC de causa “desconhecida” ou “indeterminada”. Na
Europa, o percentual de pacientes com causa desconhecida
foi 17,1%, no ano de 2013; nos Estados Unidos da Amé-
rica (EUA), 3,2%; no Reino Unido, de 16,1%; no Brasil,

171
20% somando outras causas (11%) com causas indefinidas
(9%). Os dados brasileiros não são acurados, tendo em vista
que possuem a taxa de resposta baixa (ERA-EDTA, 2015;
SBN, 2015; USRDS, 2013).
A DRC assumiu, nos últimos anos, o status de pro-
blema de saúde pública devido à elevação de sua prevalência
entre a população mundial e ao seu impacto na morbimor-
talidade dos indivíduos acometidos. Em sua fase mais avan-
çada, os rins não conseguem manter a homeostase necessá-
ria para a sobrevivência, que passa a depender de uma das
modalidades de terapia de substituição renal: a diálise e/ou
o transplante renal (PINHO; SILVA; PIERIN, 2015).
O diagnóstico da doença é sindrômico, possui múlti-
plas causas e múltiplos fatores de prognóstico. Trata-se de
uma doença de curso prolongado, insidioso e que, na maior
parte do tempo de sua evolução, é assintomática. Muitos
fatores estão associados tanto à etiologia quanto à progres-
são para perda de função renal. Os sintomas só ocorrem em
uma fase avançada da doença, quando a chance de inter-
venções terapêuticas é pequena ou nula, resultando em um
diagnóstico tardio da doença. Ademais a este fato, ocorre a
apresentação tardia dos pacientes para os serviços nefroló-
gicos, geralmente já em fase avançada da doença renal (PE-
RES et al., 2010; BRASIL, 2014).
Este capítulo aborda os determinantes da DRC, bem
como o contexto desta importante enfermidade através de
dados atuais da literatura.
Realizou-se, portanto, uma revisão integrativa a partir
dos descritores doença renal crônica, saúde pública, estu-
dos de validação. Utilizou-se o acervo do portal de perió-

172
dicos da Capes nos diversos idiomas. Filtrou-se o resultado
para o intervalo de tempo entre 2011 a 2016. Encontrou-se
427.092 artigos utilizando como descritor somente doença
renal crônica. Dispondo do recurso de busca avançada, so-
mando o descritor estudos de validação, encontrou-se ape-
nas 27 artigos. Selecionou-se os principais artigos a partir
da leitura criteriosa do título e resumo.
Esta revisão é parte da dissertação “Validação das cau-
sas de doença renal crônica terminal no município de For-
taleza - CE”. As principais causas encontradas foram inde-
terminada (35%), diabetes mellitus (26%), DRPA (6,2%),
falência do enxerto renal (6,2%). A prevalência de hiperten-
são primária como causa de doença renal crônica terminal
(DRCT) foi de 3,8%. Os resultados na íntegra foram sub-
metidos para publicação (SARMENTO, 2016).
Existe uma lacuna na literatura de trabalhos que confir-
mem as causas reais de DRCT, sendo isto considerado um
desafio. Estudos concordam que os dados podem advir de
fontes cujas informações podem não ser totalmente confiá-
veis, pois a validação das causas registradas de DRCT é, mui-
tas vezes, negligenciada e não realizada (CHERCHIGLIA
et al., 2010; NOGUEIRA et al., 2011; SESSO et al., 2014).

2 DADOS EPIDEMIOLÓGICOS DA DRC

Os dados publicados na literatura referentes a DRC


tem como base os registros nacionais e internacionais de
pacientes em tratamento dialítico.
Na Europa, foram apurados no censo de 2015 sendo
estes referentes ao ano de 2013. O órgão representante, Eu-

173
ropean Renal Association – European Dialysisand Transplant
Association (ERA-EDTA) (2015), informa que o diabetes
mellitus é a causa de falência renal com maior incidência na
Europa, (22,4%) de forma geral para o ano de 2013, segui-
do por causa desconhecida (17,1%), causas variadas (17,1%)
e hipertensão (15,2%). As causas de maior incidência na
faixa etária abaixo de 65 anos no mesmo ano foi diabetes
mellitus (22,2%), causas variadas (17,1%), glomerulone-
frite/esclerose (16,6%) e causa indeterminada (14,3%). A
modalidade de tratamento mais incidente foi hemodiálise
para quase a totalidade dos casos (79,2%), seguido da diálise
peritoneal (15,0%) e transplante renal (5,7%).
De acordo com o Global Kidney Disease, a prevalência
estimada de indivíduos com diferentes graus de disfunção
renal (estágios de 1 a 5) em muitos países, varia de 8 a 16%,
o que representa um enorme contingente de pessoas que
potencialmente necessitarão de terapia renal substitutiva, se
apresentarem progressão de sua DRC para fases finais (VI-
VEKANAND et al., 2013).
Conforme o United States Renal Data System - US-
DRS (2015), a referência norte-americana nos registros de
diálise, em sua última edição, o diagnóstico primário mais
comum eram as glomerulonefrites até antes de 1997 para
casos (pacientes) incidentes de DRCT dos EUA. No en-
tanto, após 1997, o número de pacientes que iniciaram te-
rapia dialítica tendo como causa o diabetes excederam as de
glomerulonefrite (casos incidentes). As prevalências de dia-
betes e hipertensão como diagnósticos primários da DRCT
vêm aumentando consideravelmente. O diabetes ultrapas-
sou as glomerulonefrites a partir de 2011 e tornou-se a cau-

174
sa primária mais comum, quando foi levado em conta os
dados de prevalência.
A confiabilidade da causa primária da DRCT não tem
sido bem estabelecida. A validação da causa da doença renal
terminal permanece um desafio pelo fato de a causalidade
não poder ser definitivamente determinada ou especificada
para todos os pacientes, com base em julgamento clínico ou
testes diagnósticos; e também pelo fato de muitos pacientes
chegarem a insuficiência renal terminal, sem benefício de
cuidados nefrológicos prévios (USRDS, 2015).
Segundo o Registro Latino Americano de Diálise e
Transplante, a prevalência de TRS em latino-americanos
aumentou de 119 pessoas por milhão de população (pmp)
no ano de 1991 para 660 pmp em 2010 (hemodiálise 392
pmp, diálise peritoneal 129 pmp e transplante renal 105
pmp). As maiores taxas de prevalência foram relatadas em
Porto Rico (1355 pmp). A Argentina, o México, o Uru-
guai e o Chile registraram taxas entre 777 e 1.136 pmp, res-
pectivamente; e a taxa apresentada para o Brasil foi de 599
pmp. No entanto, se especificar a modalidade de terapia
para transplante renal funcionante, o Brasil apresenta pre-
valência de 131,8 pmp, com 25.728 pacientes transplanta-
dos renais. Este relatório envolveu 20 países cuja população
representa 99% da América Latina. O diabetes foi a prin-
cipal causa de DRC em TRS. A maior incidência de DM
como causa de DRC foi registrada em Porto Rico (66,8%),
México (61,8%) e Colômbia (42,5%); e a menor foi obser-
vada em Cuba (26,2%) e no Uruguai (23,2%) (PECOITS
FILHO et al., 2015).

175
Segundo Peres et al. (2010), as principais causas de
DRC em países asiáticos como Irã, Índia e Japão são: hiper-
tensão arterial, glomerulonefrite crônica e diabetes mellitus.
No registro da Austrália e Nova-Zelândia, Australian and
New Zealand Dialysis and Transplantation Registry (ANZ-
DATA), nos últimos anos, o diabetes tornou-se a principal
causa de DRCT, principalmente pelo aumento na incidên-
cia do diabetes tipo 2.
No Brasil, a Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN)
publica os dados do censo brasileiro de diálise anualmente.
Formulários são enviados a todas as unidades de diálise exis-
tentes no Brasil e a taxa de resposta varia em cada ano. A es-
timativa ocorre levando em conta os números esperados nos
centros que não responderam ao inquérito, conforme sua
localização regional. Nas unidades que não responderam ao
censo, é atribuído um número médio de pacientes esperado
na região e o total computado nas estimativas. Esses dados
têm limitações, tendo em vista que depende da taxa de res-
posta das unidades ao censo, a participação é voluntária e os
dados não são validados (SESSO et al., 2014).
As clínicas de diálise são responsáveis pelo envio dos
dados referentes aos pacientes em tratamento dialítico à Se-
cretaria Municipal de Saúde (SMS). Dentre as informações
fornecidas, está o diagnóstico da doença que levou o pacien-
te a necessitar da realização de hemodiálise. As Secretarias
de Saúde não exigem a informação da doença de base, tam-
pouco o Ministério da Saúde. Os pacientes, em sua grande
maioria, são classificados com insuficiência renal crônica,
que é o diagnóstico sindrômico final na evolução da DRC.

176
Em 2013, o programa ativo para tratamento dialítico
crônico cursava em 658 unidades, nas quais 334 (50,8%)
responderam ao questionário e tiveram seus dados analisa-
dos. Em 2014, de 715 unidades registradas com programa
crônico ativo, apenas 312 (43,6%) responderam ao for-
mulário do censo 2014. Em 2015, de 726 unidades ativas
com programa crônico, 294 (40,5%) responderam ao censo
(SBN, 2014; SESSO et al., 2014; SBN, 2015).
Conforme dados do censo de 2006, o número de pa-
cientes em diálise era de 70.872 (383 pmp). Estimava-se ter
sido gasto R$ 1,9 bilhões no tratamento de pacientes em
diálise crônica e com transplante renal, sendo que o Sistema
Único de Saúde (SUS) subsidiou cerca de 90% dos trata-
mentos de substituição renal (SESSO; GORDAN, 2007).
Os dados atuais da SBN informam que o número de
unidades de diálise vem crescendo no país ao longo dos
anos, apresentando um perfil de rede privada e em segundo
lugar a filantrópica, sendo em sua maioria credenciadas ao
SUS e em ambientes hospitalares. Cerca de 15% dos pa-
cientes em diálise fazem tratamento utilizando medicinas
de grupo e/ou seguros de saúde particulares, e 85% fazem
diálise subsidiados pelo SUS. A diálise concentra-se em
ampla faixa etária, de 20 a 64 anos (64,9%), mais frequente
(58%) em pessoas do sexo masculino (SBN, 2015).
A estimativa de pacientes em fila de espera por trans-
plante renal diminuiu em 3.633 pessoas de 2014 para 2015.
A taxa de incidência anual estimada de pacientes em diálise
permaneceu igual nos dois anos (180 pmp). A estimativa
de novos pacientes em diálise cresce ao longo dos anos e
observa-se que houve aumento de 5.686 pessoas de 2013

177
para 2014 e 2.205 pessoas de 2014 para 2015. Quanto ao
número anual estimado de óbitos em pacientes em diálise,
em 2014 foi de 21.281 pessoas e em 2015 foi de 20.573
pessoas (SBN, 2014; SBN, 2015).
No Nordeste, existem 129 unidades ativas cadastra-
das, apenas 52 responderam o censo. Um quantitativo de
9.590 pessoas (56,18 pmp). O Sul e o Sudeste concentram
a maioria das unidades ativas do país. A região está abaixo
da média de resposta do país ao censo e a taxa de incidên-
cia anual estimada de pacientes em diálise é de 114 pmp
(SBN, 2014).
De acordo com inquéritos realizados em 1996/97,
as principais doenças reportadas como causa de DRCT
em pacientes incidentes, isto é, iniciando terapia renal de
substituição, foram hipertensão arterial (24%), glomerulo-
nefrite (24%) e diabetes mellitus (17%). Entretanto, estes
dados são antigos e devem ser atualizados por inquéritos
mais recentes; bem como, a validade desses diagnósticos
deve ser comprovada (SESSO; GORDAN, 2007).
Em 2014, o censo brasileiro apontou que o diagnós-
tico de base mais frequente foi hipertensão arterial (35%),
seguido de diabetes (29%), glomerulonefrites (11%), 25%
somando outras causas e causas indefinidas. No censo de
2015, as causas de DRCT referidas são as do ano anterior
(SBN, 2014).
As estimativas anuais devem ser interpretadas com
cautela devido à variável porcentagem de resposta dos cen-
tros, pois se faz de forma voluntária; e falta validação das
respostas enviadas (SESSO et al., 2014).

178
Dados da Secretaria Municipal de Saúde de Fortaleza,
referentes ao ano de 2015, mostram que o diagnóstico pri-
mário não é informado em quase totalidade (97,07%) dos
registros municipais de procedimentos em nefrologia, pois
não é uma informação obrigatória, conforme exposto ante-
riormente.
Pouco se sabe sobre a prevalência, a morbidade e a
mortalidade da doença renal crônica em estágios iniciais no
Brasil (PINHO; SILVA; PIERIN, 2015).
O SUS é responsável pelo financiamento de 85,8% dos
pacientes em TRS e tem dado expressiva mostra de satu-
ração e dificuldades em atender os indivíduos com DRC
terminal, a um custo estimado em 2008 de 200 milhões de
reais (ALMEIDA et al., 2015).
A Base de Dados Nacional (Registro Brasileiro de
Diálise baseado no Censo da Sociedade Brasileira de Ne-
frologia ou banco de dados do DATASUS) em TRS propi-
cia a utilização dos dados administrativos e análises apura-
das. No entanto, o propósito deste sistema é o faturamento
e a cobrança ao SUS e não a pesquisa, o que resulta em
algumas informações incompletas, inconsistentes e inexis-
tentes. Tais características limitam as inferências (CHER-
CHIGLIA et al., 2010).
O crescimento da população com DRC tem implica-
ções substanciais para as políticas públicas de saúde, sobre-
tudo pelo custo elevado dos pacientes em TRS, com 85%
a 95% dessa terapêutica subsidiada pelo Sistema Único de
Saúde (SUS) (CHERCHIGLIA et al., 2010).

179
3 FATORES DE RISCO PARA DRC

Os fatores de risco para desenvolvimento de insufi-


ciência renal podem ser caracterizados como iniciadores e/
ou promotores da falência renal. Iniciadores são todas as
injúrias físicas, químicas e imunológicas, responsáveis pelo
início do dano renal. Os fatores promotores têm influência
no curso e eventual progressão da insuficiência renal inicial
para insuficiência renal crônica terminal. Como exemplos de
fatores promotores de progressão da doença renal podem-se
citar: a hipertensão sistêmica, a hipertensão glomerular, a
proteinúria, a hiperlipidemia, a ingesta de proteína, a in-
gesta de fosfato, a coagulação intraglomerular, os agentes
nefrotóxicos, a nefrite intersticial, o uso de analgésicos. A
identificação dos fatores promotores pode sugerir interven-
ções preventivas que retardarão a perda de função renal em
pacientes que já possuem algum grau de insuficiência renal
(EVANS; TAAL, 2011).
A obesidade e o envelhecimento populacional consti-
tuem importantes fatores de risco para DRC (VIVEKA-
NAND et al., 2013).
Inúmeras doenças renais primárias e doenças sistêmi-
cas podem cursar com perda crônica da função renal. Para
Almeida et al. (2015), as causas de DRC são múltiplas, po-
rém, a hipertensão arterial e o diabetes mellitus tipo 2 são,
há décadas, as mais comuns.
A causa mais frequente de envolvimento renal em uma
doença sistêmica é o diabetes mellitus, de acordo com da-
dos norte-americanos. A insuficiência renal em pacientes
diabéticos tipo 1, com início da doença há mais de 5 anos,

180
associado à hipertensão e retinopatia, é altamente sugestivo
de nefropatia diabética. Em pacientes diabéticos tipo 2, o
comprometimento renal pode ocorrer tão frequentemente
quanto no diabetes tipo 1 com mesmo tempo de duração da
doença. Há ainda a possibilidade de que o diabetes mellitus
venha a adquirir no futuro próximo maior importância na
etiologia e na comorbidade da DRC no Brasil (PINHO;
SILVA; PIERIN, 2015).
A doença renal é fortemente associada à hipertensão.
Por um lado, sabe- se que doença renal causa hipertensão.
Por outro, também é amplamente conhecido o fato deque a
hipertensão pode levar a doença dos rins bem como agravar
a disfunção renal. Assim, a hipertensão pode assumir tanto
o papel de causa de base como o de complicação da doença
(SIVIERO et al., 2013).
Além dessas patologias supracitadas, as quais podem
conduzir à DRC, conhecidas como doenças de base, des-
tacam-se ainda: as glomerulonefrites, as doenças renais
policísticas (DRP), a pielonefrite crônica, outras nefrites
intersticiais crônicas, etiologia desconhecida, as vasculites,
o lúpus eritematoso sistêmico (LES), as doenças congênitas
ou hereditárias, as doenças neoplásicas, a uropatia obstru-
tiva, o uso de drogas e toxinas nefrotóxicas (SIVIERO et
al., 2013).
As glomerulonefrites são causas persistentes de nefro-
patia crônica, ocupando posição de destaque quanto a causa
de base de DRC no Brasil ao longo dos anos. Podem se ma-
nifestar com hematúria, síndrome nefrótica e/ou hiperten-
são (CHERCHIGLIA et al., 2010; SESSO et al., 2014).
Dentre as DRP, sobretudo as hereditárias, destacam-se: a

181
Doença Renal Policística Autossômica Dominante (DR-
PAD) e a Doença Renal Policística Autossômica Recessiva
(DRPAR). A DRPAD, também conhecida como doença
renal policística do adulto (DRPA) é mais frequente. A fa-
lência renal se manifesta entre a terceira a quinta década de
vida e a história familiar é positiva cerca de 75% dos casos
(MALHEIROS, 2012).
Os critérios diagnósticos não são mutuamente exclusi-
vos e os limites entre as várias doenças não são claramente
estabelecidos. Não é raro, um mesmo paciente apresentar
de mais de uma patologia que possa ter cursado com perda
da função renal.
Neste contexto, o paciente pode necessitar de trata-
mento dialítico de urgência, sem que medidas de controle
possam ser realizadas, no início da doença, para retardar o
seu avanço, ou possibilitar que o paciente seja preparado
para a realização da TRS – diálise e/ou transplante renal.
Por conseguinte, a maioria dos pacientes passa a ser acom-
panhada.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Até pouco tempo, a atenção à DRC no Brasil se res-


tringia quase que exclusivamente ao estágio em que o pa-
ciente já necessita da terapia de substituição renal, apesar de
se saber que a evolução da DRC depende do atendimento
ofertado, muito antes da ocorrência da falência funcional
renal (GIPSON et al., 2011).
A prevenção da DRC é tratar e controlar os fatores
de risco modificáveis: diabetes, hipertensão, dislipidemia,

182
obesidade, doença cardiovascular e tabagismo, cujo controle
e tratamento devem estar de acordo com as normatizações e
orientações do Ministério da Saúde (SBN, 2014).
A prevalência estimada para o Brasil é que 11 a 22
milhões de habitantes adultos apresentem algum grau de
disfunção renal, com cerca de 200 milhões de habitantes
e 70% de população adulta. Número impossível de ser tra-
tado por especialistas, denotando a imperiosa necessidade
de programas epidemiológicos específicos e informação ao
médico generalista sobre meios de tratamentos preventivos
de progressão da DRC (IBGE, 2014; DRAIBE, 2014).
A vigilância em saúde tem por objetivo a observação e
análise permanente da situação de saúde da população, arti-
culando-se em um conjunto de ações destinadas a controlar
determinantes, riscos e danos à saúde de populações que
vivem em determinados territórios, garantindo a integrali-
dade da atenção, o que inclui tanto a abordagem individual
como coletiva dos problemas de saúde. Seus componen-
tes são: a vigilância epidemiológica (controle das doenças
transmissíveis e das doenças e agravos não transmissíveis);
a vigilância da situação de saúde, vigilância ambiental em
saúde, vigilância da saúde do trabalhador e a vigilância sa-
nitária (BRASIL, 2009).
A vigilância epidemiológica é um “conjunto de ações
que proporciona o conhecimento, a detecção ou prevenção
de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicio-
nantes da saúde individual ou coletiva, com a finalidade de
recomendar e adotar as medidas de prevenção e controle das
doenças ou agravos” (BRASIL, 1990).

183
O propósito da vigilância epidemiológica é fornecer
orientação técnica permanente para os profissionais de saú-
de, que têm a responsabilidade de decidir sobre a execução
de ações de controle de doenças e agravos, tornando dispo-
níveis, para esse fim, informações atualizadas sobre a ocor-
rência dessas doenças e agravos, bem como dos fatores que
a condicionam, numa área geográfica ou população definida
(BRASIL, 2009).
Estudos que têm por objetivo pesquisar a epidemio-
logia da DRCT são úteis para a distribuição de recursos na
área da saúde, subsidiando decisões para melhorar a assis-
tência aos pacientes e atuando em estratégias preventivas
para a doença.

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188
CAPÍTULO 8

CONTRIBUIÇÕES CIENTÍFICAS BRASILEIRAS


NA QUALIDADE DE SONO EM PACIENTES
COM DOENÇA RENAL CRONICA: uma revisão
integrativa.

Edyla M. P. F. Camelo
Paula Frassinetti Camurça Castelo Branco

1 INTRODUÇÃO

O sono corresponde á uma função biológica principal


na consolidação da memória, na visão, na regulação da tem-
peratura corporal, na conservação e restauração da energia,
além da restauração do metabolismo energético do cérebro.
Por ser responsável por tais funções tão importantes, per-
turbações do sono podem ocasionar alterações significativas
no funcionamento físico, ocupacional, cognitivo e social do
indivíduo, além de afetar a qualidade de vida (BITTEN-
COURT et al., 2005; MULLER; GUIMARÃES, 2007;
SOUZA et al., 2007).
As causas mais comuns de detrimento do sono são a
restrição e sua fragmentação. A restrição pode ser decor-
rência da demanda de trabalho, responsabilidade familiar,
uso de fármacos, fatores pessoais e estilo de vida. A frag-

189
mentação resulta em um sono de quantidade e qualidade
inadequadas, sendo resultado de condições biológicas e/
ou fatores ambientais que o interrompem (TOGEIRO;
SMITH, 2005).
Uma qualidade ruim do sono pode acarretar prejuízos
no cotidiano das pessoas afetadas, como alteração negativa
no desempenho nos estudos, transtornos nas relações so-
ciais e familiares, sonolência excessiva diurna, dor crônica.
Além de uma forte associação entre distúrbios do sono e
morte (CHELLAPPA; ARAUJO, 2007; FERRO; IDE;
STREIT, 2008; JANSEN et al., 20007; PANDI-PERU-
MAL et al., 2002).
Em pacientes com diagnóstico de Doença Renal Crô-
nica (DRC), a alteração do sono encontra-se presente em
cerca de 40% a 80%, com uma prevalência maior em relação
à população geral (JUNG et al., 2010).
Há um grande aumento de indivíduos diagnosticados
com DRC, tal a patologia ocasiona impacto negativo sobre
o sono, como já estabelecido na literatura, porém há neces-
sidade de produções mais profundas a fim de identificar fa-
tores modificáveis com o objetivo de traçar um tratamento
para redução desta alteração para evitar afecções secundá-
rias ao mesmo. O presente estudo tem o objetivo de iden-
tificar as contribuições científicas brasileiras no que tange
a qualidade de sono e pacientes com doença renal crônica.

2 METODOLOGIA

Trata-se de um estudo bibliográfico, cuja trajetória


metodológica percorrida apóia-se nas leituras exploratória e

190
seletiva do material de pesquisa, bem como em sua revisão
integrativa-narrativa (SANTOS; PIMENTA; NOBRE,
2007; MENDES et al., 2008) que foi realizado através da
busca sistemática de estudos publicados sobre o tema Qua-
lidade de sono e DRC em bases de dados eletrônicas.
Na elaboração da presente revisão integrativa, as se-
guintes etapas foram percorridas: Estabelecimento da hi-
pótese e objetivos da revisão integrativa; Estabelecimento
de critérios de inclusão e exclusão de artigos (seleção da
amostra); Definição das informações à serem extraídas dos
artigos selecionados; Análise dos resultados; Discussão e
apresentação dos resultados; Apresentação da revisão. Para
guiar a revisão integrativa, formulou-se a seguinte questão:
Quais as produções científicas realizadas no Brasil sobre a
qualidade de sono e pacientes com DRC?
Os dados foram coletados no período de fevereiro de
2017, através dos descritores “qualidade de sono”, “doença
renal crônica” e “Brasil” nas línguas portuguesa e inglesa
de forma combinada. As buscas foram estreitadas por data
de publicação, de 2007 até 2017. Foram consultadas as se-
guintes plataformas de pesquisa: Biblioteca Virtual em Saú-
de (BVS), que abriga artigos das bases LILACS, IBECS,
MEDLINE, Cochrane e SciELO; Portal Periódicos CA-
PES; PubMed; ScienceDirect.
Ocorreu classificação dos mesmos em potencialmente
relevantes ou não relevantes pela leitura do título e resumo.
Os quatro critérios utilizados na seleção dos artigos inclui-
ram (1) estudos de revisão ou experimentais que abordem
o tema de estudo; (2) realizados em humanos, (3) dispo-
nibilizados na íntegra, (4) nos idiomas português, inglês e

191
espanhol. Os artigos que se enquadraram nestes critérios
foram considerados potencialmente relevantes.
Após o levantamento bibliográfico, realizou-se a lei-
tura exploratória do material encontrado. Com essa leitu-
ra, ponderou-se obter uma visão global do material, con-
siderando-o de interesse ou não à pesquisa. Em seguida,
efetuou-se leitura seletiva, a qual permitiu determinar qual
material bibliográfico é de interesse desta pesquisa.
Finalmente, foram delimitados os textos a serem in-
terpretados que abordam a temática em questão. A partir
desse momento, os artigos foram colocados em ordem cro-
nológica, sendo feitos: o reconhecimento com enfoque nos
seguintes aspectos que compunha uma “ficha bibliográfica”:
dados de identificação do artigo - título, nome do periódi-
co, volume, número e ano de publicação.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na figura 1, apresenta o fluxograma seguido diante da


realização da leitura dos dados encontrados através da pes-
quisa. Dos 33 estudos localizados, na presente revisão inte-
grativa, analisou-se 11 artigos que atenderam aos critérios
de inclusão previamente estabelecidos e, a seguir, apresen-
tar-se-á um panorama geral dos artigos avaliados. Dentre
os artigos incluídos na revisão integrativa, 1 em português,
10 em inglês.

192
Figura 1 – Fluxograma

Fonte: Elaboração da autora.

O Quadro 1 apresenta a categorização dos artigos re-


cuperados quanto ao ano de publicação, título, autores, fon-
te e base virtual, sendo que, para melhor organização, cada
um deles foi identificado com um número.
As publicações dos estudos ocorreram em revistas mé-
dicas (3), revista da área da saúde geral (2), em revistas de
nefrologia (2), em revistas de psiquiatria (1) e em fisiote-
rapia (1). Quanto ao tipo de delineamento de pesquisa, 5
eram estudos transversais, 2 revisões, 1 ensaio clínico ran-
domizado e 1 estudo longitudinal.
Os estudos tiveram publicações entre 2007 a 2016. O
período de maior publicação foi em 2010 com 2 artigos,
sendo predominante na base virtual Pubmed e de língua
inglesa.

193
Quadro 1. Categorização dos artigos recuperados quanto ao ano de publicação, título, autores, fonte e base virtual (n=9).
FONTE E BASE
Nº ANO TÍTULO AUTORES
VIRTUAL
Sleep disturbances in patients on Maintenance hemodialysis: role of Dialysis
1 2007 BASTOS, J. P. C., et al. Pubmed
shift
Cognitive–behavioral group therapy is an effective treatment for major depres-
2 2009 DUARTE, P. S., et al. Pubmed
sion in hemodialysis patients
LUCCHETTI, G;
3 2010 Espiritualidade no paciente em diálise: o nefrologista deve abordar ALMEIDA, L. G. C. Pubmed
GRANERO, A. L.
Depressed mood and poor quality of life in male patients with chronic renal
4 2010 GARCIA, T. W., et al. Pubmed
failure undergoing hemodialysis

194
Health-Related Quality of Life of Patients Recieving Hemodialysis and Peri-
5 2011 ABREU, M. M., et al. Pubmed
toneal Dialysis in São Paulo, Brazil: A Longitudinal Study
Assessment of the psychological burden associated with pruritus in hemodialy- LOPES, G. B.
6 2012 BVS
sis patients using the kidney disease quality of life short form
7 2013 Depression in hemodialysis patients: the role of dialysis shift TELES, F., et al. Pubmed
Relationship between mental health and spiritual wellbeing among hemodialy- MARTÍNEZ, B.B.;
8 2014 BVS
sis patients: a correlation study CUSTÓDIO, R. P.
A systematic review of sleep disorders in patients with chronic kidney disease
9 2016 FONSECA, N.T., et al. Pubmed
undergoing hemodialysis

Fonte: Elaboração da autora.


No Quadro 02 é apresentada a síntese dos artigos con-
siderando os objetivos, resultados e conclusão, além da lo-
calidade do estudo.
O estado de humor depressivo está correlacionado com
alterações no sono (GARCIA et al., 2010). O que corrobo-
ra com o estudo realizado Teles e colaboradores (2014), que
a privação do sono pode influenciar a maior incidência de
depressão naqueles que frequentam o turno da manhã da
diálise (TELES et al., 2014).
Na revisão de literatura realizada por Lucchetti, Al-
meida e Granero (2010), tem como resultados que aqueles
que exercitavam suas crenças pessoais de forma mais cons-
tante possuíam menos disfunção diurna, e aqueles que tra-
ziam crenças espirituais mais fortes possuíam mais distúr-
bios do sono. Tal resultado se distancia com o estudo que
Martínez e Custodio (2014) realizaram, pois notaram que o
bem-estar espiritual foi um forte preditor de saúde mental
global, bem como estresse psicológico, distúrbios do sono e
queixas psicossomáticas.
Em relação à hemodiálise, observa-se uma forte rela-
ção entre distúrbios de sono, com maior tempo que realizam
a HD e a temperatura do dialisado (BASTOS et al., 2007;
MARTÍNEZ; CUSTODIO, 2014). Assim corroborando
com estudos internacionais que a má qualidade do sono é
mais comum nos pacientes portadores de DRC submetidos
a HD do que fazem diálise peritoneal (DP) (AGARWAL;
LIGHT, 2011; MAVANUR; SANDERS; UNRUH,
2010; THEOFILOU et al., 2011; TURKMEN et al., 2012).
A revisão sistemática realizada por Fonseca e colabo-
radores (2016) verificou-se uma alta prevalência de Pertur-

195
bação periódica do movimento dos membros, Síndrome das
Pernas Inquietas e Apneia obstrutiva do sono que afetam a
qualidade do sono, que por sua vez, prejudicou a qualidade
de vida desses pacientes, levando ao aumento da morbidade
e mortalidade, corroborando com os achados de Bastos e
colaboradores (2007) que a má qualidade de sono está fre-
quentemente relacionada com a Síndrome das Pernas In-
quietas.
No ensaio clínico realizado por Duarte e colaboradores
(2009), foi identificado após o período de intervenção (Te-
rapia Comportamental de Grupo- TCG), em comparação
com o grupo controle, o grupo que realizou a TCG apre-
sentou uma melhora significativa nas dimensões do fardo da
doença renal, da qualidade da interação social, do sono, da
saúde geral e do componente mental.
Em um estudo longitudinal realizado com pacientes
que realizavam HD e DP, notou-se que com ao passar de
12 meses, o grupo de HD apresentou maior melhora no
sono, suporte social e estado de saúde e piorou no estado
cognitivo comparado ao grupo de pessoas que faziam DP
(ABREU et al., 2011).
Há associações de prurido com itens da escala do sono.
Pacientes com pior prurido foram progressivamente mais
propensos a acordar durante a noite e ter dificuldade para
adormecer novamente, não obtendo a quantidade de sono
que eles precisam ou têm problemas para ficar acordado du-
rante o dia (LOPES et al., 2012).
Os distúrbios de sono podem contribuir para a doença
cardiovascular e serem responsáveis pela substancial mor-
bidade e mortalidade encontrada nesta população (MA-

196
VANUR; SANDERS; UNRUH, 2010). Tais distúrbios
podem representar um novo fator de risco para a progressão
da DRC (TUREK; RICARDO; LASH, 2012).
Estudos prospectivos adicionais sobre a influência do
deslocamento de diálise em anormalidades do sono e em
outros dados clínicos são esperados (BASTOS et al., 2007).
Assim, é muito importante que os profissionais de
saúde reconheçam os sinais e sintomas dos distúrbios do
sono na população de pacientes com DRC, tanto para um
diagnóstico preciso como para uma abordagem terapêutica
adequada (FONSECA et al., 2016).

197
Quadro 2. Síntese dos artigos recuperados (n=9).
Tipo
objetivo do lOCAL DO
Nº de es- Resultado Conclusão
estudo ESTUDO
tudo
1 Investigar a influência do Estudo A má qualidade do sono foi encontrada em 75% dos casos O sono de baixa qualidade, sono ex- Fortaleza/CE
turno da diálise na quali- transversal e foi associado com síndrome de pernas inquietas e com cessivo diurno e síndrome de pernas
dade do sono e alterações ronco. Independentemente do turno de diálise, má quali- inquietas não estavam relacionados Universidade
do sono em pacientes com dade de sono, sono excessivo diurno e síndrome de pernas com o turno de diálise. Federal do
DRCT. inquietas não foram diferentes entre os pacientes. Ceará
2 Avaliar a eficácia da terapia Ensaio O grupo de intervenção apresentou melhorias significa- Concluímos que a terapia de grupo São Paulo/ São
cognitivo-comportamental Clínico tivas, em relação ao grupo controle, nos escores médios cognitivo-comportamental é um Paulo
em pacientes com hemo- Rando- da escala global do Inventário de Depressão de Beck, tratamento eficaz da depressão em
diálise crônica diagnosti- miado escores do MINI e nas dimensões de qualidade de vida pacientes em hemodiálise crônica. Universidade
cada com depressão maior que incluíam o fardo da doença renal, sono, qualidade da Federal de São
pela Mini International interação social, saúde geral, eo sumário de componentes Paulo
Neuropsychiatric Interview. mentais.

198
3 Avaliar a relação da Revisão da Relação entre maior espiritualidade e maior religiosidade A espiritualidade e a religiosidade São Paulo/ São
espiritualidade, religiosi- literatura com melhor qualidade de vida, menor prevalência de de- possuem um papel importante para Paulo
dade e saúde em pacientes pressão, maior suporte social, mais satisfação com a vida o paciente em diálise. Mostra-se
em diálise. e mais satisfação com o tratamento médico provido pelo relacionada com pontos impor-
nefrologista. Da mesma forma, verificou-se que pacientes tantes na própria relação médico-
dialíticos que possuíam menor espiritualidade solicitavam paciente, na qualidade de vida e
mais tratamentos para estímulo de vida (intubação oro- enfrentamento à doença, devendo
traqueal, por exemplo) e que a espiritualidade foi fator de ser considerada pelos profissionais
enfrentamento (coping) para os familiares dos pacientes que assistem a esse tipo de paciente.
em diálise.
4 Avaliar o humor e a quali- Estudo Observou-se em 32 (68,1%) pacientes a presença de de- O estado de humor apresentou Distrito Fede-
dade de vida em pacientes transversal pressão. Encontraram correlação negativa significativa correlação negativa com diversos es- ral/Brasília
homens em hemodiálise, entre os resultados obtidos na escala de Hamilton e os cores de qualidade de vida avaliados
bem como correlacionar as seguintes parâmetros: lista de sintomas e problemas, qua- pelo Kidney Disease Quality of Life
oscilações de humor com lidade da interação social e sono. Entre os domínios ge- Questionnaire, sugerindo possível
os diferentes domínios do néricos, o estado de humor apresenta correlação negativa influência do estado de humor na
questionário de qualidade significativa com a saúde geral, o bem-estar emocional, a qualidade de vida dos pacientes re-
de vida. função social e a energia/fadiga. nais em hemodiálise.
Tipo
objetivo do lOCAL DO
Nº de es- Resultado Conclusão
estudo ESTUDO
tudo
5 Avaliar a qualidade de vida Estudo O grupo PD era mais velho e um número maior tinha Os resultados fornecem evidências São Paulo/ São
em pacientes submetidos Longitu- diabetes. Os pacientes com DP apresentaram consisten- de que os pacientes com DP e HD Paulo
a hemodiálise (HD) ou dinal temente maiores pontuações do que os pacientes com têm qualidade de vida equivalente
diálise peritoneal (DP) em HD em todos os três períodos de medição para satisfação em vários domínios, embora a pri-
São Paulo, Brasil. do paciente, encorajamento / apoio do pessoa, e carga de meira tenha melhorado em alguns
doença renal. O grupo HD apresentou uma percentagem domínios da qualidade de vida,
maior de doentes que melhoraram clinicamente desde apesar de ser mais idosa e ter mais
o início do estudo até 12 meses em comparação com os comorbidades.
pacientes com DP para a qualidade do sono, apoio social,
encorajamento / apoio do pessoal e saúde geral.
6 Avaliar se os sintomas da Estudo A prevalência de prurido grave foi de 19,4%. Prurido gra- Este estudo mostra fortes associa- Salvador/ Bahia
depressão, o mau sono e a transversal ve foi associado com a má qualidade do sono, maior pro- ções de Prurido grave com sintomas
pele seca explicam a asso- babilidade de incômodo da pele seca e maior pontuação de depressão mais elevados, Sono e
ciação entre o prurido e a sintomas de depressão. pele seca aborrecem os pacientes. Os
carga da doença renal em resultados suportam uma atenção

199
pacientes com hemodiálise especial aos pacientes com prurido
de manutenção. que muitas vezes enfrentam alto
fardo psicológico.
7 Avaliar a influência do tur- Estudo Depressão e sonolência diurna excessiva de dia foram ob- A depressão está associada com Não identi-
no de diálise na frequên- transversal servadas em 42,7% e 49% dos pacientes, respectivamente. deslocamento de diálise, níveis ficado
cia de depressão em uma Quando comparadas as variáveis entre os três turnos de mais elevados de fósforo e níveis
população de pacientes diálise, não houve diferenças na idade, idade de diálise, sta- mais baixos de hemoglobina. Os
submetidos à hemodiálise. tus de emprego, sonolência diurna excessiva, níveis de he- resultados realçam a necessidade de
Além disso, foram avalia- moglobina, fósforo ou albumina. Os pacientes no turno da estudos randomizados para deter-
dos os principais desfechos manhã eram mais propensos a viver em áreas rurais, em- minar se esta associação ocorre por
relacionados aos sintomas bora os pacientes nas áreas rurais não tivessem uma maior acaso ou se os distúrbios do ritmo
e manejo da depressão prevalência de depressão. Os pacientes com depressão ti- circadiano podem desempenhar um
e identificados possíveis nham maior probabilidade de serem dialisados durante o papel.
marcadores bioquímicos turno da manhã. Os fatores de risco independentes para a
de depressão nesta popu- depressão foram idade, níveis mais baixos de hemoglobina
lação específica. e fósforo e diálise durante o turno da manhã. O risco de
hospitalização de pacientes depressivos foi 4,5 vezes maior
que o dos pacientes não depressivos.
Tipo
objetivo do lOCAL DO
Nº de es- Resultado Conclusão
estudo ESTUDO
tudo
8 Avaliar a relação entre Estudo Uma correlação significativa foi encontrada entre saúde A má saúde mental foi associada Pouso Alegre,
saúde mental e bem-estar transversal mental e bem-estar espiritual. O bem-estar espiritual foi com menor bem-estar espiritual. Minas Gerais
espiritual entre pacientes o maior preditor de saúde mental, sofrimento psíquico, Isso tem implicações para a presta-
com HD. distúrbios do sono e queixas psicossomáticas. ção de cuidados paliativos a pacien-
tes com hd.
9 Avaliar a evidência dispo- Revisão Foram encontrados 1126 artigos que atendiam aos crité- Nesta revisão sistemática, observou- -
nível sobre distúrbios do sistemá- rios de inclusão. Os artigos foram excluídos se não estavam se uma alta prevalência de distúrbios
sono em pacientes com tica em inglês, os pacientes não se submeteram a HD, ou os es- do sono em pacientes com doença
doença renal terminal sub- tudos não foram cross-sectional ou ensaios clínicos. Após renal terminal, incluindo a respira-
metidos a hemodiálise. a leitura do texto completo, outros 300 estudos foram ex- ção com distúrbios do sono.
cluídos por não utilizar polissonografia. Os restantes 18
estudos com doentes com drc sujeitos a HD incluíram 8 Esse conhecimento pode possibili-
tar aos profissionais de saúde elabo-

200
ensaios clínicos e 10 estudos transversais. Esta revisão sis-
temática seguiu os critérios descritos na declaração prisma. rar novas estratégias de diagnóstico
e tratamento desses pacientes, a fim
de reduzir a morbidade e a morta-
lidade e melhorar sua qualidade de
vida.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observa-se uma reduzida produção científica brasi-


leira sobre tal temática, em comparação com a produção
internacional. É de suma importância que pesquisadores
brasileiros tenham interesse neste assunto, pois é notável
que a baixa qualidade de sono repercuta negativamente na
saúde geral e assim na qualidade de vida desses indivíduos.
Estudos mais aprofundados devem ser realizados a fim
de identificarem fatores de risco na população em questão,
para ser feito diagnóstico precoce e traçar um plano de tra-
tamento, a fim de reduzir a morbimortalidade, além dos
custos em hospitalização.

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203
CAPÍTULO 9

PREVALÊNCIA DE DOENÇA RENAL CRÔNICA EM


PACIENTES HIPERTENSOS E/OU DIABÉTICOS
EM UMA UNIDADE DE ATENÇÃO PRIMÁRIA
À SAÚDE NUMA CAPITAL DO NORDESTE
BRASILEIRO.

Larissa Alves Alexandre Moliterno


Paula Frassineti Castelo Branco Camurça Fernandes

INTRODUÇÃO

1.1. Definição

A Doença Renal Crônica (DRC) é atualmente um


problema de saúde pública devido à sua crescente incidência
e ao alto custo da terapia de substituição renal (TRS). Afeta
5 a 10% da população mundial e sua incidência no Brasil
tem aumentado, devido ao número crescente de pacientes
diagnosticados, principalmente os portadores de diabetes
mellitus, hipertensão arterial, bem como pelo aumento da
longevidade da população (BASTOS, KIRSZTAJN, 2011;
ECKARDT et al., 2013) referência da dissertação. Calcu-
la-se que 13% da população apresenta DRC (HAAN et al.,
2013).

204
No contexto brasileiro os números também não são
animadores. Segundo o Censo Brasileiro de Diálise (2014)
havia 112.004 pacientes em diálise no país e que a estima-
tiva das taxas de prevalência e a incidência foram de 552 e
180 por milhão na população, respectivamente, vala ressal-
tar, que esses valores foram uma estimativa feita até julho
desse ano (SESSO et al., 2016).
Entende-se por DRC a lesão do parênquima renal
(com função renal normal) e/ou a diminuição funcional re-
nal presentes por um período igual ou superior a três meses,
sendo proposto a partir de então a definição por estagiamen-
to da doença (tabela 1). Assumiu-se tal definição a partir
dos critérios estabelecidos pela National Kidney Foundation
Americana (NKF), em seu documento Kidney Disease Out-
comes Quality Initiative (K/DOQI). Os critérios são: Lesão
presente por um período igual ou superior a três meses, de-
finida por anormalidades estruturais ou funcionais do rim,
com ou sem diminuição da Filtração Glomerular (FG),
evidenciada por anormalidades histopatológicas ou de mar-
cadores de lesão renal, incluindo alterações sanguíneas ou
urinárias, ou ainda de exames de imagem; e FG <60 mL/
min/1,73 m2 por um período igual ou superior a três meses
com ou sem lesão renal (BASTOS, 2010; BRASIL, 2014a).

1.2. Estadiamento da DRC

A doença renal é uma doença progressiva, com piora


da função ao longo dos anos. O diagnóstico e estadiamen-
to da DRC baseiam-se na documentação da diminuição da
taxa de filtração glomerular (TFG) e lesão do parênquima.

205
Com o objetivo de facilitar o diagnóstico preciso pelos
clínicos gerais, principalmente para os profissionais do nível
primário de saúde, um grupo de especialistas publicou um
artigo (VASSALOTTI et al., 2016) baseado nas diretrizes
e recomendações dadas pelo KDIGO (2013). Nesse, apre-
sentou-se uma nova forma de classificar e estadiar a DRC
com base tanto na TFG quanto na quantificação da albu-
minúria para uma avaliação prognóstica mais precisa (qua-
dro 1). A partir desse quadro, meramente didático, o pro-
fissional poderá visualizar o estadiamento em que o doente
renal se encontra, para então decidir ou não encaminhá-lo
ao especialista.
A cor verde pode refletir DRC com TFG normal e
relação albumina/creatinina apenas na presença de outros
marcadores de danos nos rins, tais como imagens mostran-
do doença renal policística ou anormalidades de biópsia re-
nal, com medições de acompanhamento anualmente.
Esses são apenas parâmetros gerais com base na opi-
nião dos especialistas e devem levar em conta as condições e
comorbidades subjacentes ao estado da doença, bem como
a probabilidade de impactar uma mudança no manejo de
qualquer paciente individualmente.

206
Quadro 1 – Classificação da DRC: a partir da TFG e Albuminúria
CLASSIFICAÇÃO DA DRC:
Albuminúria
a partir da TFG e Albuminúria
A2
A1
Levemente A3
TFG Normal leve-
moderada- Severamente
< 30 mente aumen-
mente aumen- aumentada
30-299 tada
tada
≥ 300
Se presente Referenciar
Normal ou Referenciar 1
Estágio I ≥90 tratar os fatores 2 vezes ao
Aumentada vez ao ano
de risco ano
Se presente Referenciar
Levemente Referenciar 1
Estágio II 60-89 tratar os fatores 2 vezes ao
diminuída vez ao ano
de risco ano
Leve a mode- Referenciar
Estágio Referenciar 1 Referenciar 2
rada-mente 45-59 3 vezes ao
IIIA vez ao ano vezes ao ano
diminuída ano
Moderada a Referenciar
Estágio Referenciar 2 Referenciar 3
severamente 30-44 3 vezes ao
IIIB vezes ao ano vezes ao ano
diminuída ano
Referenciar
Estágio Severamente Referenciar 3 Referenciar 3
15-29 4 vezes ao
IV diminuída vezes ao ano vezes ao ano
ano
Referenciar
Referenciar 4 Referenciar 4
Estágio V Falência Renal <15 4 vezes ao
vezes ao ano vezes ao ano
ano

Fonte: Adaptado por Vassalotti et al, 2016.

De acordo com as Diretrizes Clínicas para o Cuidado


ao paciente com Doença Renal Crônica (2014), o cuida-
do clínico no controle dos fatores de progressão da DRC
deve ser sempre intensificado, de acordo com a evolução
da DRC:

207
Estágio I: pacientes com função renal normal, ainda
assintomáticos, mas a detecção de microalbuminúria per-
mite a identificação precoce da DRC, sendo o método
mais sensível. Para tratamento dos fatores de risco deve ser
realizado o controle da glicemia, hipertensão arterial, disli-
pidemia, obesidade, doenças cardiovasculares, tabagismo e
adequação do estilo de vida.
Estágio II: mesmo os pacientes permanecendo assin-
tomáticos, já se encontram algumas alterações no ritmo de
filtração glomerular (60 a 89 ml/min/1,73m²) e elevações
leves no nível de creatinina sérica podem ser detectadas.
Nessa fase também se faz importante o tratamento dos fa-
tores de risco existentes.
Nos estágios III e IV os pacientes se tornam sintomá-
ticos progressivamente com a evolução da doença, ocorren-
do progressiva perda da função renal e aumento do nível de
creatinina sérica. Nessa fase o comprometimento se torna
sistêmico, atingindo todos os sistemas humanos, desde o
renal, urinário, cardíaco até o osteomuscular.
Estágio III: subdividido em IIIA e IIIB.
IIIA - Deve-se avaliar e tratar as complicações. Os pa-
cientes devem intensificar tratamento dos fatores de risco
para desenvolver a DRC e doença cardiovascular. As pri-
meiras complicações da doença começam a se desenvolver
(anemia, osteodistrofia).
IIIB - Tratar complicações já existentes. É nesse mo-
mento que o paciente deve ser encaminhado para o especia-
lista/nefrologista para um tratamento mais especializado e
iniciar discussões sobre as opções para possíveis futuras ne-

208
cessidades de terapia de substituição renal (VASSALOTTI
et al., 2016; KDIGO, 2013).
Por fim, nos estágios mais graves da doença, IV e V,
os pacientes apresentam situações de emergência que levam
muitas vezes esses indivíduos a uma piora abrupta da função
renal, levando-os à diálise ou ao transplante e, quando não
há sucesso na terapia renal substitutiva (TRS), o paciente
vai ao óbito.
Estágio IV: os primeiros sintomas começam a apare-
cer e as análises laboratoriais evidenciam várias alterações:
níveis elevados de fósforo e hormônio paratireoide (PTH),
anemia estabelecida, pH sanguíneo baixo, elevação do po-
tássio, emagrecimento e sinais de desnutrição, piora da
hipertensão, enfraquecimento ósseo, aumento do risco de
doenças cardíacas, diminuição da libido, redução do apetite,
cansaço etc.
Estágio V: O rim já não desempenha funções básicas.
Os pacientes começam a sentir alguns sintomas da doença
renal, entre estes a uremia. O início da TRS está indicado
e o acompanhamento desses indivíduos em procedimento
dialítico é realizado nas unidades de atenção especializa-
das em doença renal crônica. Um importante fator para
retardar o aparecimento e/ou complicações provocadas por
essa doença é a implementação de medidas reno-proteto-
ras (BASTOS; KIRSZTAJN, 2011).
Deve-se indicar terapia renal substitutiva (TRS) para
pacientes com TFG inferior a 10 mL/min/1,73m². Em pa-
cientes diabéticos e com idade inferior à 18 anos, pode-se
indicar o início da TRS quando a TFG for menor do que 15
mL/min/1,73m². Em todas essas situações, deve-se respei-

209
tar a condição clínica e alteração laboratorial do paciente.
A escolha do método de TRS deve levar em consideração a
escolha do paciente, bem como a condição clínica, de acor-
do com avaliação da equipe multiprofissional, sendo as mo-
dalidades disponíveis: a hemodiálise, a diálise peritoneal e o
transplante renal (BRASIL, 2014a).
A importância clínica da instituição da classificação
em estágios de DRC consiste na uniformização da lingua-
gem entre os profissionais que lidam com a doença na prá-
tica clínica (BRASIL, 2014a). Segundo Bastos & Kirsztajn
(2011), o tratamento ideal da DRC é baseado em três pi-
lares de apoio:
1. Diagnóstico precoce: alterações funcionais, prin-
cipalmente através da TFG, são importante com-
ponente no diagnóstico e classificação da DRC.
2. Encaminhamento imediato para tratamento ne-
frológico: possibilita a educação pré-diálise.
3. Implementação de medidas para preservar a fun-
ção renal: retardam ou interrompem a progressão
para os estágios mais avançados da doença, assim
como diminuem morbidade e mortalidade ini-
ciais.
De acordo com as Diretrizes Clínicas para o Cuidado
ao paciente com Doença Renal Crônica (2014), a preven-
ção é feita inicialmente através do conhecimento do seu
grau de função renal, da detecção e controle da hiperten-
são arterial e Diabetes, a manutenção do peso ideal através
de uma dieta saudável e a prática de exercícios físicos, uma
adequada ingesta de água (30ml/kg), o cuidado com o uso

210
abusivo de medicamentos por conta própria sobretudo os
antiinflamatórios, abandono do tabagismo, cujo controle e
tratamento devem estar de acordo com as normatizações e
orientações do Ministério da Saúde.

1.3. Fatores de risco

As causas mais importantes para a DRC são resultan-


tes das doenças cardiovasculares tais como a hipertensão ar-
terial sistêmica (HAS), o diabetes mellitus (DM), a história
familiar de DRC e o envelhecimento, deste modo, torna-se
importante a sua prevenção e tratamento precoce (BRA-
SIL, 2012).
Conhecer essas duas condições, suas manifestações
clínicas e suas comorbidades são de fundamental importân-
cia para o planejamento de intervenções. Primeiramente a
hipertensão arterial sistêmica (HAS) que é definida como
o aumento dos níveis pressóricos arteriais acima da média
considerada normal. Esta alteração decorre do aumento na
contratilidade da camada muscular lisa que forma a parede
da artéria. Em termos gerais, pode-se definir a hipertensão
como as medidas acima de 140mmHg para pressão sistólica
e acima de 90mmHg para a pressão diastólica. Podendo ser
primária ou secundária a outras causas, como consequên-
cia de um estreitamento de parte da artéria, tumores nas
glândulas supra-renais e compressão do parênquima renal
(SBH, 2016).
Os dados epidemiológicos da HAS demonstram que
ela acomete mais homens que mulheres. Quanto à etnia,
a raça mais prevalente é a negra (CHOR et al., 2015). Há

211
uma associação direta e linear entre o envelhecimento e a
prevalência da HAS. Segundo a Diretriz Brasileira de HAS
(SBH, 2014) essa doença acomete um em cada três adultos,
estimando-se que 30% da população brasileira apresente
esse quadro, chegando a mais de 50% na população com
mais de 60 anos. Além disso, a HAS é responsável por 40%
dos infartos, 80% dos derrames e 25% dos casos de insufi-
ciência renal terminal.
Além de estar intimamente relacionada à função renal,
aparecendo tanto como causa, quanto como consequência
da doença, a prevalência da hipertensão, determinada por
ocasião da detecção da doença renal, aumenta progressiva-
mente à medida que a função renal vai se deteriorando, de
tal forma que, na fase terminal ou dialítica do agravo renal,
a quase totalidade dos nefropatas é hipertensa (KAPLAN,
2002; BORTOLOTTO, 2008).
A HAS causa dano renal por dois processos fisiopato-
lógicos: isquemia e barotrauma. Graças ao mecanismo de
autorregulação dos capilares glomerulares, os glomérulos
conseguem se proteger do barotrauma e consequente pro-
teinúria. Contudo, com a evolução da doença hipertensiva,
começa a ocorrer nefroesclerose devido à isquemia, com
consequente perda de néfrons. Com o avançar das perdas,
faz-se necessária a vasodilatação das arteríolas aferentes
a fim de manter a TFG, o que aumenta a transmissão da
pressão arterial para os capilares glomerulares, podendo ge-
rar barotrauma glomerular e consequente proteinúria e glo-
meruloesclerose (BIDANI,GRIFFIN, EPSTEIN, 2012).
Enquanto que a Diabetes Mellitus (DM), envolve um
grupo de doenças metabólicas que se caracterizam pela hi-

212
perglicemia, que pode ser oriunda de anormalidades na se-
creção de insulina, na sua ação ou em ambas. A doença está
associada a complicações em vários órgãos do organismo,
como coração e rins (ADA, 2008).
Segundo o Instituto Nacional de Saúde e Excelência
Clínica (NICE) recomenda atualmente todas as pessoas
com diabetes na Inglaterra e no País de Gales estejam com
seus exames renais, incluindo os testes para albuminúria em
dia com o intutito de minimizar custos para a atenção pri-
mária (NICE, 2008; NEW et al., 2007).
De acordo com a Sociedade Brasileira de Diabetes,
em 2013, o número de brasileiros acometidos pela doença
chegava a, aproximadamente, 12 milhões, sendo a grande
porcentagem ligada ao sedentarismo e à dieta inadequada.
Sabe-se que os fatores de risco correspondentes a menor
porcentagem são os genéticos (SARTORELLI, FRAN-
CO, 2003; IDF, 2014).
Os dois tipos de diabetes são o DM tipo I e DM tipo
II. No primeiro, as células beta do pâncreas são danifica-
das, geralmente, por um processo autoimune. No segundo,
ocorre alteração na ação ou secreção da insulina, sendo res-
ponsável por cerca de 90% dos casos (GROSS et al., 2002).
O diagnóstico do diabetes pode ser detectado por meio
de exames mais minuciosos, além da taxa de glicemia e da
HA1C (hemoglobina glicada). Nesse conjunto, encon-
tram-se marcadores de auto-imunidade e a avaliação da re-
serva pancreática de insulina através da medida do peptídeo
C e da fase rápida de secreção de insulina. Essas opções
servem de base para a explicação da origem da doença, as-
sim como detectar o tipo de diabetes (GROSS, 2002). Na

213
doença em questão, a glicemia em jejum é ≥ 126 mg/dl;
a HA1C, ≥ 6,5% e a glicemia pós-prandial, ≥ 200 mg/dl
(MAGALHÃES, 2012).
A doença renal associada ao diabetes ocorre no contex-
to de hipertensão arterial como condição subjacente, como
afirma MCGOVERN et al. (2013) ao dizer em seu estudo
que quase todas as pessoas que tinham DM e DRC pos-
suíam HAS, comparados com indivíduos que apresentava
apenas hipertensão sem a doença renal crônica. Os mes-
mos autores afirmam também que a prevalência da DRC
em níveis mais avançados é crescente em indivíduos com
hipertensão e diabetes.
Essa síndrome leva a uma série de alterações nas estru-
turas renais, nefropatia diabética, e que colaboram no pro-
cesso da DRC. A hipertrofia glomerular, o espessamento da
membrana basal glomerular e expansão mesangial acelular
culminam na glomeruloesclerose, que marca o processo de
lesão renal permanente. Sendo um dos fatores de maior rele-
vância nesse processo, a glicosilação das proteínas, resultante
de um processo de hiperglicemia crônica, pode fazê-las se
acumularem nos tecidos devido à capacidade de ligação com
colágeno, levando a lesões teciduais (BAKRIS, 2013).
Frente a esses importantes fatores de risco para in-
júria renal, é preciso utilizar marcadores que a detectem
precocemente. A elevação dos níveis séricos de creatinina
e a presença de proteinúria no exame de urina tipo I são os
melhores preditores para a doença renal, sendo este último
o indicador mais sensível, mas que pode falhar na detecção
de estados precoces de DRC (CROOK et al., 2002).
A excreção de albumina na urina apresenta-se como

214
importante marcador precoce de lesão renal, especialmente
na presença de DM, HAS e doença glomerular. Não é ne-
cessário sua aferição em uma amostra de urina coletada em
24 horas para quantificar de forma precisa o nível de excre-
ção, podendo ser usado a nível de “screening” as amostras
de urina de preferência matinal, sendo realizado a análise
com o disptick específico para albumina ou a relação albu-
mina/creatinina na amostra (K/DOQI, 2002).
A importância da excreção da albumina está princi-
palmente nos pacientes com fatores de risco, em especial a
DM, sendo recomendada a pesquisa deste marcador mes-
mo quando não houver detecção de proteinúria pelo exame
de urina tipo I, sendo então uma ferramenta importante
para a detecção precoce da DRC e seu tratamento (LEVEY
et al., 2003).
Diante de duas doenças de alta prevalência na popu-
lação brasileira como a DM e HAS, que trazem implica-
ções severas de forma insidiosa, em particular a nível renal,
torna-se importante o cuidado e a avaliação precoce desses
fatores de risco nesse grupo de pacientes, especialmente ao
nível da atenção primária no SUS, a qual seria responsável
por identificar precocemente a injúria renal e iniciar os seus
cuidados, a fim de evitar o crescimento cada vez maior do
número de pacientes portadores de DRC.
No início da década passada, estimava-se que haveria
cerca de dois milhões de pessoas em TRS em todo o mundo
em 2010, sendo que esse número tem aumentado de forma
expressiva nos países em desenvolvimento. Aproximada-
mente 90% dos casos diagnosticados de DRCT ao redor
do mundo são provenientes dos países em desenvolvimento.

215
A taxa de prevalência de pacientes em TRS é de 1.000 pa-
cientes por milhão de pessoa (pmp) em países da Europa,
no Chile e Uruguai, e de 1.750 pacientes pmp nos EUA
(XUE, 2001; SARAN et al., 2014).
De acordo com dados do Censo Brasileiro de Diálise
referente a julho de 2013, a situação dos centros de diálise
e dos pacientes em tratamento dialítico de manutenção no
Brasil, está cadastrada na Sociedade Brasileira de Nefrolo-
gia (SBN) 703 unidades de diálise no país, sendo 658 uni-
dades ativas com programa crônico, porém destas apenas
334 (50,8%) responderam o formulário, no total de 50.961
pacientes. Foi estimado um total de 100.397 pacientes em
tratamento dialítico por ano. A maior porcentagem (84%)
em diálise realizava o tratamento através do Sistema Único
de Saúde. A taxa de prevalência de tratamento dialítico foi
de 499 pacientes por milhão da população. 90,8% dos pa-
cientes em diálise crônica faziam tratamento por hemodiá-
lise e 9,2% por diálise peritoneal, sendo que, desta, a diálise
peritoneal automatizada (DPA) era a modalidade predomi-
nante. O maior percentual de pacientes em diálise (62,6%)
tem idade entre 19 a 64 anos e 58% dos pacientes eram do
sexo masculino.
O acometimento renal pelo diabetes responde por
40% dos casos incidentes de diálise nos Estados Unidos, e
no Brasil compete com a hipertensão, acometendo 30% dos
pacientes que iniciam tratamento dialítico. Estes pacientes
sofrem um risco adicional de morte de 20% no primeiro ano
de diálise, principalmente por causas cardiovasculares. Em
outras palavras, cerca de 30% dos pacientes com diabetes
desenvolvem nefropatia diabética, especialmente em asso-

216
ciação com hipertensão. A DRC é um importante deter-
minante de desfechos adversos em pacientes hipertensos e
diabéticos, sendo atualmente considerada um dos mais sig-
nificativos fatores não tradicionais de risco cardiovascular.
O conhecimento do impacto dos fatores de risco na
doença renal crônica dá subsídio para ações de prevenção da
doença e promoção da saúde daqueles que já convivem com
a mesma, evitando o seu agravamento. A partir de então,
se torna possível implementar medidas preventivas com a
finalidade de diminuição de casos de DRC em todo país.
O objetivo deste capítulo é estimar a prevalência de
DRC nas pessoas com hipertensão e/ou diabetes em uma
unidade de atenção primária de saúde (UAPS) em uma ca-
pital do Nordeste brasileiro.

2. Metodologia

Tratou-se de um estudo do tipo transversal analíti-


co com abordagem quantitativa. O presente estudo é um
recorte de uma pesquisa maior intitulada “Acometimento
Renal em pacientes diabéticos e/ou hipertensos no âmbito
da Atenção Primária de Saúde”. O cenário do estudo foi
uma Unidade de Atenção Primária de Saúde (UAPS) per-
tencente ao município de Fortaleza, Ceará, Brasil. A popu-
lação do estudo foi os pacientes hipertensos e/ou diabéticos
que estavam em atendimento na unidade durante a coleta
de dados. A amostra foi por conveniência e cálculo amostral
para população infinita, pois não foi identificado claramen-
te pela gestão da unidade o total de pacientes hipertensos e/

217
ou diabéticos cadastrados. A partir do cálculo o tamanho da
amostra totalizou 196 hipertensos e/ou diabéticos. Acres-
centou-se a esse número 7% para eventuais incompletudes
ou perdas de dados, totalizando 210.
A coleta de dados foi realizada a partir de fontes primá-
rias através de um questionário semiestruturado contendo
informações sociodemográficas e clínicas e posteriormen-
te foram utilizadas, também, fontes secundárias por meio
dos prontuários eletrônicos dos pacientes com objetivo de
verificar resultados laboratoriais importantes para o diag-
nóstico de DRC. Tais como creatinina sérica, para o cálculo
da taxa de filtração glomerular (TFG) a partir da fórmula
CKD-EPI, o exame de excreção urinária de albumina para
avaliar presença de microalbuminúria/proteinúria como o
objetivo de diagnóstica e estratificar a DRC, assim como o
sumário de urina para identificar e estratificar algum grau
de insuficiência renal.
A análise de dados foi realizada pelo pacote estatístico
SPSS versão 20.0. Foram calculadas as medidas estatísticas
descritivas a partir de médias e desvio padrão das variáveis
quantitativas, assim como suas frequências absolutas e per-
centuais. Após, foi utilizada a estatística analítica bivariada
no entrecruzamento das diversas variáveis, com utilização
dos testes estatísticos conforme tipo de variável. O estu-
do seguiu todos os preceitos ético-legais sendo aprovado
por um Comitê de Ética da Pesquisa sob protocolo de n.º
119997/2015.

218
3. Resultados

A maioria dos participantes era do sexo feminino, com


média de idade de 60,03 ± 10 anos, (entre 26 e 85 anos).
Questionados a respeito da renda pessoal, a maioria respon-
deu que recebia mais que um salário mínimo (81,9%), ao
passo que aproximadamente metade (49,0%) afirma ter fre-
quentado apenas o ensino fundamental incompleto, quando
indagados a respeito da escolaridade.
A etiologia mais prevalente nos pacientes do estudo foi
a HAS - 199 (94%), seguida do DM - 107 (52,4%), com 94
(44,9%) dos entrevistados referindo ser portador das duas
condições.
Em relação às variáveis laboratoriais, percebe-se, so-
bretudo, marcadores a serem considerados no planejamento
de políticas públicas. Questionados a respeito da realização
de exames, os pacientes afirmaram que era prática comum
na unidade, mas quando arguidos sobre exames como crea-
tinina sérica, sumário de urina, excreção urinária de albumi-
na e HbA1, as respostas não foram satisfatórios. A tabela 1
sumariza a análise univariada das características sociodemo-
gráficas, clínicas e laboratoriais desses pacientes.

219
Tabela 1 – Análise univariada das características sociodemográficas, clínicas e la-
boratoriais dos pacientes diabéticos e/ou hipertensos atendidos na UAPS Dom
Aloísio Lorscheider, Fortaleza (CE), Brasil, 2016
Características f* f(%)** Dp***
Sexo
Feminino 154 73,3%
Masculino 56 26,7%
Idade
< 60 anos 94 44,8% ± 10 anos
≥ 60 anos 116 55,2%
Escolaridade
Ensino Fundamento Incompleto 103 49%
Ensino Fundamental Completo 50 23,8%
Ensino Médio Incompleto 11 5,2%
Ensino Médio Completo 41 5,2%
Ensino Superior Incompleto 4 1,9%
Ensino Superior Completo 1 0,5%
Renda
< 1 Salário Mínimo 38 18,1%
≥ 1 Salário Mínimo 172 81,9%
Pressão Arterial
Ótima 37 7,6%
Normal 48 22,9%
HAS I 69 32,9%
HAS II 32 15,2%
HASIII 24 11,4%
Glicemia
Normal 74 35,2%
Pré-DM 53 24,2%
DM 83 39,5%
IMC
Baixo peso (< 18,5) 1 0,5%
Normal (18,5 - 24,99) 51 24,3%
Sobrepeso (25-29,99) 85 40,5%

220
Características f* f(%)** Dp***
Obesidade (≥30) 73 34,8%
ICQ
Baixo 11 5,2%
Moderado 36 17,1%
Alto 57 27,1%
Muito Alto 106 50,5%
BRA***
Sim 121 57,6%
Não 88 41,9%
Não sabe informar 1 0,5%
IECA****
Sim 91 43,3%
Não 118 56,2%
Não sabe informar 1 0,5%
Anti-hipertensivos
Sim 164 78,1%
Não 45 21,4%
Não sabe informar 1 0,5%
Hipoglicemiantes
Sim 97 46,2%
Não 112 53,3%
Não sabe informar 1 0,5%
Excreção Urinária de Albumina
Sim 38 18,1%
Não 172 81,9%
HbA1*****
Sim 102 48,6%
Não 108 51,4%
Creatinina sérica
Sim 173 82,3%
Não 9 4,3%
Não sabe info rmar 26 12,4%
Sumário de urina

221
Características f* f(%)** Dp***
Sim 188 89,5%
-+Não 8 3,8%
Não sabe informar 14 6,7%
Total 210 100%
f*: Frequência absoluta; f(%)**: Frequência percentual; Dp**: Desvio Padrão; BRA***: Bloqueadores
de Receptores da Angiontensina; IECA****: Inibidores da Enzima Conversora de Angiotensina;
HbA1*****: Hemoglobina Glicada.

Quanto ao estadiamento da doença, observou-se a


predominância dos indivíduos em estágio I (46,2%). Se-
gundo os achados, 15 (8,58%) dos pacientes apresentavam
o clearance de creatinina < 60ml/min, sendo considerados
doentes renais crônicos e, desses 15 pacientes, 6 (3,43%)
estavam em estágio IIIB da doença, onde a referência ao
nefrologista é indicada. Entretanto, quando questionados
sobre encaminhamento ao especialista, nenhum paciente
referiu ter sido encaminhado.

4. Discussão

No presente estudo, foram mensuradas características


clínicas por meio de dados primários e secundários com o
objetivo de estimar a prevalência de DRC nos indivíduos
que participaram do estudo. Tratou-se de um primeiro pas-
so na busca de entender o porquê de ainda haver muitos
pacientes renais crônicos subnotificados, sendo “percebi-
dos” apenas quando já estão nos estágios mais avançados
(quatro e cinco) da doença. Sendo assim, muitos necessitam
de TRS, alguns atendidos de urgência pelo nível terciário,
ou, quando não, vão a óbito sem sequer receber tratamento
adequado no tempo hábil.

222
O aumento das taxas de prevalência e incidência da
DRC na população é resultante tanto do envelhecimento
populacional como do aumento da prevalência de doenças
como diabetes, hipertensão arterial e outras doenças cardio-
vasculares (BASTOS; KIRSZTAJN, 2011). Os resultados
encontrados neste estudo confirmam esse fato, evidencian-
do presença de DRC em idosos e que supõe ser secundária
a HAS e/ou DM, visto que não foi realizada uma validação
de causas para confirmação (FERNANDES et al., 2000),
tal como em outros identificados na literatura (BOINI et
al., 2011; GOEIJ et al., 2011; KDIGO, 2013; PEREIRA
et al., 2016; SBN, 2011b; SUTTORP et al., 2013).
Quando traçado o perfil da população do estudo, ob-
servou-se que a predominância (62,8%) dos participantes só
frequentou até o ensino fundamental e 84,8% dos entrevis-
tados possuía uma renda per capita de até três salários mí-
nimos, permitindo inferir sobre um perfil sociodemográfico
para os renais crônicos mais presente nas camadas sociais
desfavorecidas, visto que outros estudos nacionais e inter-
nacionais apresentam resultados semelhantes (BASTOS;
KIRSZTAJN, 2011; FRASER et al., 2015).
Quando avaliados dados antropométricos e o estilo
de vida dos participantes do estudo foi percebido que os
resultados se assemelharam com outros estudos tanto inter-
nacionais como nacionais (FRASER et al., 2015; SCHER-
PBIER-DE HAAN et al., 2013; FRANÇA et al., 2010).
No presente estudo foi observado que os pacientes apresen-
tavam o índice de massa corporal acima dos níveis normais
– prevalência de 75% da amostra estava com sobrepeso ou
obesidade.

223
Entretanto no que diz respeito aos hábitos de fumar
(7,6%) e ingerir bebidas alcoólicas (14,8%) os pacientes
apresentaram porcentagens consideravelmente inferiores
quando comparados com participantes de outros estudos
(FRASER et al., 2015; SCHERPBIER-DE HAAN et al.,
2013; FRANÇA et al., 2010). Esse fato pode ser atribuído
a dois motivos: um houve subnotificação de informações ve-
rídicas por parte dos participantes ou porque a promoção de
saúde e a prevenção de doenças relacionadas ao tabagismo
e etilismo estão sendo tanto bem desenvolvidas pelos pro-
fissionais da saúde como bem incorporadas pelos usuários.
No entanto, na medida da ICQ constatou-se um per-
centual de 50,5% de risco muito alto para doenças cardio-
vasculares, dado esse que se assemelha aos de França et al.
(2010), que ao avaliarem a filtração glomerular em pacien-
tes hipertensos atendidos na atenção básica perceberam que
o ICQ estava alterado (muito alto) em 75,8% da amostra.
Durante a coleta de dados, foi percebido o desconhe-
cimento sobre a doença pelos pacientes. Quando questio-
nados a respeito da doença renal, associavam-na apenas à
litíase renal. Dado semelhante foi relatado pelo Ministério
da Saúde (2014), que estimou que 70% dos doentes renais
crônicos em estágio pré-dialítico desconhecem possuir a
doença.
Sabe-se que o ótimo manejo dos doentes renais crôni-
cos está embasado nos pilares do diagnóstico precoce, enca-
minhamento ao nefrologista e a implementação de medidas
renoprotetoras (BASTOS; KIRSZTAJN, 2011; BRASIL,
2014). Essas medidas constituem a essência do tratamento
pré-dialítico, destacando-se a adesão medicamentosa e o

224
acompanhamento dos parâmetros laboratoriais (BAGAT-
TINI, 2011; BASTOS; KIRSZTJAN, 2011; MEDEI-
ROS, SÁ, 2011; PEREIRA et al., 2016).
No tocante às medidas reno-protetoras, os achados do
estudo mostraram que 97,1% dos pacientes responderam
afirmativamente quanto ao uso contínuo dos medicamentos
orientados pelo médico. A respeito das classes de drogas, a
porcentagem foi quase homogênea – 43,3% (IECA), 57,6%
(BRA) –, que são as classes de drogas que os estudiosos
mais recomendam (KDIGO, 2013; VASSALOTTI et al.,
2016; SBN, 2011; BASTOS; KIRSZTJAN, 2011). Toda-
via, mais da metade (78,1%) dos pacientes disse fazer uso
de outras drogas anti-hipertensivas, o que permitiu inferir
que os pacientes apresentavam HAS severa ou não contro-
lada, já que muitos deles usavam três classes de medicação
anti-hipertensiva.
Algumas dificuldades foram encontradas no tocante
ao diagnóstico da DRC. Visto que é sabido que, para tal,
faz-se necessário ter em mãos dados, como a TFG por meio
do clearance de creatinina. Essa informação estava incom-
pleta em 37 dos pacientes do referente estudo, permitindo
inferir que há subnotificação de diagnóstico e estadiamento.
Dificuldades semelhantes também foram encontradas em
outro estudo (OLIVEIRA JUNIOR; FORMIGA; ALE-
XANDRE, 2014; PENA et al, 2012).
Outro dado preocupante em relação à avaliação do
perfil laboratorial foi a respeito do exame de excreção uri-
nária de albumina, exame esse primordial para verificar a
presença/ausência de albuminúria, importante marcador de
lesão renal (VASSALOTTI et al., 2016; KDIGO, 2012;

225
BASTOS; KIRSZTAJN, 2011). E nos participantes do
estudo, quase que a totalidade (81,9%) não teve esse exame
solicitado pelo profissional médico.
O mais preocupante desses fatos é que são aspectos
comuns da realidade brasileira, principalmente ao nível pri-
mário de atenção (BASTOS; BREGMAN; KIRSZTA-
JN, 2010; BASTOS; KIRSZTAJN, 2011; TRAVAGIM,
2012; PINHO, SILVA, PIERIN, 2015). Apesar de alguns
desses estudos terem como cenário o nível terciário de aten-
ção à saúde, os autores afirmam que parte desses pacientes
encontrava-se nesse nível de atenção devido à falha no diag-
nóstico da doença, que não foi precoce.
Segundo a definição e estadiamento de DRC (KDO-
QI, 2002; KDIGO, 2013; NKF, 2003) foi encontrado
no presente estudo uma prevalência igual a 8,57%, sendo
5,14% e 3,43% no estágio IIIA e IIIB, respectivamente. Es-
ses achados assemelham-se com os resultados de uma meta
-análise recente (HILL et al., 2016) que objetivou estimar a
prevalência global em todos os estágios da DRC.
Quanto à referência ao nefrologista, nenhum dos par-
ticipantes do presente estudo foi encaminhado ao especia-
lista, mesmo sendo necessário em 3,43% dos doentes renais
crônicos (KDIGO, 2013; VASSALOTTI et al., 2016).
Esse dado reforça a hipótese de que há uma lacuna de
conhecimento quanto ao manejo do doente renal crônico
pelos profissionais de saúde, principalmente os do nível pri-
mário de saúde. Ademais é importante determinar a dife-
rença potencial entre as recomendações de diretrizes e atual
prática de cuidados com doente renal crônico.

226
5. Conclusão

Os pacientes diabéticos e/ou hipertensos apresentaram


doença renal crônica nos estágios I, II, IIIA e IIIB. Houve
subnotificação da doença e/ou estadiamento devido à falta
de informações cruciais para o diagnóstico.
Nos pacientes que tiveram função renal avaliada en-
controu-se que a maioria ainda estava nos estágios iniciais
de DRC. Vale salientar que é nesse momento que ações
preventivas e de promoção à saúde devem ser intensificadas
com o objetivo de redução de danos, buscando prevenir e
protelar a progressão da doença para o estágio dialítico, pe-
ríodo em que a terapêutica deve ser mais robusta e onerosa
tanto para os pacientes como para o governo, pois o perfil
dos doentes renais é caracterizado por pessoas que usam,
predominantemente, o sistema público de saúde.

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(12):2753-8. 2001.

233
CAPÍTULO 10

QUESTIONÁRIOS VALIDADOS PARA


MENSURAÇÃO DA ADESÃO AO TRATAMENTO
DA INSUFICIÊNCIA CARDÍACA: uma revisão
integrativa

Dafne Lopes Salles


Thereza Maria Magalhães Moreira

1 INTRODUÇÃO

A Insuficiência Cardíaca (IC) é uma síndrome clínica


complexa de caráter sistêmico, definida como disfunção car-
díaca que ocasiona inadequado suprimento sanguíneo para
atender as necessidades metabólicas tissulares, na presença
de retorno venoso normal, ou fazê-lo somente com elevada
pressão de enchimento. As alterações hemodinâmicas co-
mumente encontradas na IC envolvem resposta inadequada
do débito cardíaco e elevações das pressões pulmonar e ve-
nosa sistêmica (BOCHI et al., 2012).
Nos Estados Unidos, IC afeta mais de 5 milhões de
pessoas e surgem cerca de 550 mil casos novos anualmente,
sendo estimado que a sua incidência seja de 10/1000 pes-
soas após os 65 anos de idade. No Brasil, e no resto do
mundo, são consistentes as evidências sobre a elevada taxa

234
de admissões hospitalares e visitas às emergências por inter-
corrências clínicas associadas à doença. Entre os pacientes
com mais de 70 anos admitidos, 60% são readmitidos em
90 dias (BOCHI et al., 2012).
É reconhecida como o maior e mais crescente proble-
ma de saúde pública em todo o mundo (JURGENS et al.,
2015). No Brasil, representa a principal causa de internação
de pacientes no Sistema Único de Saúde (SUS), a partir dos
65 anos, além de ser responsável por altos custos (PEREI-
RA; SCHUTZ, 2012).
A Insuficiência cardíaca, resultante de diversas etio-
logias, geralmente é o estágio final da maioria das doen-
ças cardíacas. Trata-se de um problema crescente de saúde
pública, podendo causar limitações na vida dos pacientes
e acarretar redução na qualidade de vida. A adesão ao tra-
tamento deve ser realizada pelos pacientes com IC para a
prevenção de complicações e a promoção da saúde. Apesar
do diagnóstico precoce, emprego de vasta terapêutica medi-
camentosa e de ações educativas para mudanças do estilo de
vida, observa-se que se trata de uma doença de difícil con-
trole e que a manutenção da compensação é insatisfatória,
evidenciando a problemática da baixa adesão ao tratamento
(DBICC, 2012).
Metanálise realizada por Khazanie e Allen (2016) afir-
ma que a não-adesão ao tratamento permanece altamente
prevalente e está relacionada com resultados adversos. Por
exemplo, um ano após os pacientes terem saído da interna-
ção, menos de 50% deles segue a prescrição medicamentosa,
mesmo quando essas medicações são oferecidas pelo SUS.

235
A Organização Mundial da Saúde (2003) declarou
que a melhora da adesão pode ter um impacto maior sobre
a saúde da população, do que a melhora em tratamentos
médicos específicos. Os cinco problemas principais relacio-
nados à adesão ao tratamento são: relação com o sistema
de saúde, nível socioeconômico, condição médica, presença
de cuidador e terapia medicamentosa. Particularmente, em
pacientes com Insuficiência Cardíaca, onde várias classes
de medicamentos são importantes para se obter melhores
resultados, torna-se comum o esquecimento e o não segui-
mento das orientações prescritas (KHAZANIE, ALLEN.,
2016).
A adesão é o grau de coincidência entre o comporta-
mento do usuário e a prescrição dos profissionais de saúde,
que envolve medidas farmacológicas e comportamentais,
sendo que todos os envolvidos no processo são responsá-
veis pelo tratamento (WORLD HEATH ORGANIZA-
TION, 2003). Segundo a OMS, a baixa adesão é um pro-
blema mundial de magnitude impressionante. A adesão ao
tratamento de longo prazo em países desenvolvidos é em
torno de 50%. Em países em desenvolvimento, as taxas são
ainda menores (WHO, 2003).
Os benefícios da adesão ao tratamento se estendem aos
pacientes, às famílias, aos sistemas de saúde e às economias
dos países. O paciente passa a ter sua condição controlada,
podendo, na maioria das vezes, manter uma vida normal e
economicamente ativa. O sistema de saúde economiza com
a redução de internações emergenciais e intervenções cirúr-
gicas e a economia ganha com o aumento da produtividade.

236
A adesão é um fenômeno multidimensional determi-
nado pela conjugação de cinco grupos de fatores, denomina-
dos de “dimensões”: sistema de saúde, doença, tratamento,
paciente e fatores relacionados ao cuidador (WHO, 2003).
Existem várias estratégias para avaliar a adesão ao
tratamento da Insuficiência Cardíaca, no entanto, não há
consenso sobre um padrão ouro. Os métodos podem ser in-
diretos como contagem de comprimidos, relatório do usuá-
rio, opinião do profissional de saúde, resposta clínica; ou
diretos, dosagem em líquidos corporais do princípio ativo,
metabólito (SOUZA, 2008).
Dessa forma, ao utilizarmos instrumentos válidos para
medir a adesão, estaremos lançando mão de resultados fide-
dignos que beneficiarão gestores e equipes de saúde como
subsídios no estabelecimento de melhorias no serviço, fa-
vorecendo o aumento da adesão. O objetivo desse estudo
foi analisar, na produção científica da saúde coletiva, quais
questionários estão sendo utilizados para avaliar a adesão ao
tratamento da insuficiência cardíaca.

MÉTODO

Esta pesquisa foi realizada a partir de uma revisão


integrativa da literatura, que tem como base, a análise de
material, ressaltando a organização e a interpretação no
atendimento do objetivo da investigação (MENDES, SIL-
VEIRA, GALVÃO, 2008).
A revisão integrativa inclui a análise de pesquisas rele-
vantes que dão suporte para a tomada de decisão, possibi-

237
litando a síntese do estado do conhecimento de um deter-
minado assunto, além de apontar lacunas no conhecimento
que precisam ser preenchidas com a realização de novos
estudos (MENDES, SILVEIRA, GALVÃO, 2008).
A presente revisão integrativa cumpriu rigorosamente
seis etapas: seleção da questão norteadora; definição das ca-
racterísticas das pesquisas primárias da amostra; seleção das
pesquisas que compuseram a amostra da revisão; análise dos
achados dos artigos da revisão; interpretação dos resultados,
o que proporcionou a análise crítica dos achados.
A pergunta norteadora da busca foi: quais questioná-
rios, que passaram pelo processo de validação, estão sendo
utilizados para mensurar a adesão ao tratamento da insufi-
ciência cardíaca?
Foi realizada uma busca pareada nas bases de dados
LILACS, MEDLINE, SCIELO, WEB OF SCIENCE
E PUBMED. Foram utilizados os descritores Heart Failu-
re, questionnaires, validation studies, adherence e patient
compliance, de acordo com a terminologia DeCs da Biblio-
teca Virtual de Saúde (BVS). As buscas foram sistemati-
zadas por meio da utilização dos operadores boleanos com
o seguinte esquema:” heart failure” AND “questionnaires”,
“heart failure” AND “validation studies”, nas buscas sub-
sequentes substituímos apenas o último descritor, contem-
plando todos os descritores. Os critérios de inclusão foram:
artigos disponíveis na íntegra, empíricos; língua inglesa,
portuguesa ou espanhola; e que explicitassem variáveis rela-
cionadas a adesão ao tratamento da Insuficiência Cardíaca.
Foram excluídos os estudos de caso e as revisões de litera-
tura.

238
O período selecionado para a seleção dos artigos foi de
2006 a 2016. A coleta ocorreu nos meses de agosto, setem-
bro e outubro de 2016. Dessa forma, foram selecionados
dez questionários.
Neste estudo foi utilizado o instrumento PRISMA
(Prefered Reporting Items for Systematic Reviewand Me-
ta-Analyses) para a busca e seleção dos estudos, confor-
me Figura 1. O referido diagrama destina-se a orientar o
desenvolvimento de protocolos de revisões sistemáticas e
meta-análises, cabendo sua utilização no estudo para aferir
adequação e facilitar a análise dos dados para publicação
(SHAMSEER et al., 2015).

Figura 1: Fluxograma de seleção dos estudos, Fortaleza- Ceará, 2016.

239
As variáveis selecionadas para análise foram sujeitos,
amostra, ano, adesão aos instrumentos de avaliação da ade-
são ao tratamento. Os estudos foram avaliados criticamente
em detalhes, buscando soluções para resultados diferentes.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O quadro 1 demonstra os questionários encontrados


na presente revisão integrativa. Todos os questionários
apresentam aspectos da adesão ao tratamento da insuficiên-
cia cardíaca.

Quadro 1: Instrumentos de medida da adesão ao tratamento da Insuficiência cardía-


ca. Fortaleza, Ceará-Brasil, 2016.
Autor Título do Questionário Código
Questionário de Conhecimento para pa- IA1
Bonin et al. (2014)
cientes com Insuficiência Cardíaca
Almeida, Souza, Questionário de restrição do sódio na dieta IA2
Rabelo (2011)
Europen Heart Failure Self-Care Behavior IA3
Feijó et al. (2012)
Scale
Nave-Leal, Pais Kansas City Cardiomiopathy (KCCQ) IA4
Ribeiro (2010)
Minnesota Living with Heart Failure Ques- IA5
Carvalho et al. (2009)
tionnaire
Fini, Cruz (2010) Dutche Fatigue IA6
Ungari (2007); Morisky Green-Levine IA7
Mendoza-parra; Me- Escala de conductas em salud IA8
rino; Barriga, (2009).
Ferreira, Ferreira, EQ-5D IA9
Pereira (2013)
Ulbrich et al., 2013 SF-36 IA10

240
O questionário de Conhecimento para pacientes com
Insuficiência Cardíaca possui 19 itens, cada qual dividido
em dez áreas de importância para a educação do paciente.
Os itens foram divididos de acordo com o conteúdo pro-
posto em fisiopatologia da síndrome, conceito da síndrome,
fatores de risco, sinais e sintomas, hábitos de vida, diagnós-
tico, medicamentos, tratamento, autocuidado e exercício fí-
sico. Cada questão apresentava quatro alternativas de múl-
tipla escolha, sendo uma resposta correta; uma incompleta;
uma errada e uma não sei (BONIN, et al., 2014).
O questionário de Restrição do Sódio na Dieta
(DSRQ) tem como objetivo identificar fatores que afe-
tam a adesão à restrição dietética de sódio para pacientes
com IC. É composto por alternativas relacionadas com as
barreiras e atitudes/crenças em seguir uma dieta pobre em
sódio. Criado para refletir a teoria do comportamento dese-
jado, é dividido em três subescalas: 1) atitude em relação ao
comportamento; 2)norma subjetiva e 3)controle compor-
tamental percebido. A subescala de atitude apresenta seis
itens que avaliam as crenças do paciente sobre os resultados
da realização do comportamento, com escore variando de
6 a 30. Na escala de norma subjetiva, composta por três
itens, se avalia se é importante a aprovação ou reprovação
de outros para a realização do comportamento, com escore
variando de 3 a 15. Já na etapa de controle comportamental,
composta por sete itens, se avalia a capacidade do paciente
de identificar facilitadores e barreiras referentes ao compor-
tamento; nessa escala o escore é invertido e varia de 7 a 35
(ALMEIDA, SOUZA, RABELO, 2011).
Na Europa, um grupo de pesquisadores desenvolveu e
validou o instrumento denominado European Heart Failure

241
Self-care Behavior Scale (EHFScBS), que consiste de 12 ques-
tões referentes ao autocuidado, incluindo a verificação diária
do peso, a restrição de sal e líquidos, a prática de atividade
física e a busca por ajuda pela equipe de saúde, quando sur-
gem os sinais de descompensação. O desenvolvimento desse
instrumento foi baseado nos pressupostos teóricos da Teoria
do Autocuidado de Orem. A primeira versão da escala foi
desenvolvida em holandês e traduzida para o inglês e o sueco.
Dos 20 itens do instrumento original, todos foram reavalia-
dos, e aqueles com pontuações inferiores foram retirados. A
versão final do instrumento com doze itens, desenvolvido em
inglês, foi traduzido e retrotraduzido para o sueco e, após,
para o holandês. A mesma metodologia foi adotada para a
utilização em outras línguas (FEIJÓ, et al., 2012).
A escala de vida Kansas City Cardiomiopathy (KCCQ)
avalia o impacto do tratamento de situações crônicas como
a ICC, este instrumento é específico para doentes hospita-
lizados, possui 23 itens e quantifica a função física: sintomas
(frequência, gravidade e mudanças recentes), auto-eficácia,
conhecimento e qualidade de vida (NAVE-LEAL, PAIS
-RIBEIRO, 2008).
O Minnesota Living with Heart Failure Questionnaire
(MLHFQ) é uma importante ferramenta de avaliação da
qualidade de vida em pacientes com insuficiência cardía-
ca. É composto por 21 questões relativas a limitações que
frequentemente estão associadas com o quanto a insuficiên-
cia cardíaca impede os pacientes de viverem como gosta-
riam. Deve-se considerar o último mês para responder aos
questionamentos. A escala de respostas para cada questão
varia de 0 (não) a 5 (demais), onde o 0 representa sem li-

242
mitações e o 5, limitação máxima. Essas questões envolvem
uma dimensão física (de 1 a 7, 12 e 13) que estão altamen-
te inter-relacionadas com dispnéia e fadiga, uma dimensão
emocional (de 17 a 21) e outras questões (de número 8, 9,
10, 11, 14, 15 e 16) que, somadas às dimensões anterio-
res, formam o escore total. Esse subgrupo de questões, por
não possuir um padrão usual de respostas, não foi agrupado
como uma dimensão separada no questionário. O MLH-
FQ foi desenvolvido especificamente para insuficiência car-
díaca, o que o torna mais próximo à realidade desse tipo de
paciente (CARVALHO, et al., 2009).
O questionário Dutche Fatigue foi desenvolvido con-
forme a definição de fadiga do NANDA-I com pacientes
com Insuficiência Cardíaca. É uma escala de auto-relata,
com 9 itens do tipo Lykert com 5 pontos (1-5) (FINI,
CRUZ, 2010).
O Teste de Morisky-Green-Levine é usado para me-
dir a adesão ao tratamento da insuficiência cardíaca , apesar
de não ter sido criado especificamente para a IC. A teoria
fundamental desta medida abrange que o uso inadequa-
do de medicamentos ocorre em uma ou todas as seguin-
tes formas: esquecimento, falta de cuidado, interromper o
medicamento quando sentir-se melhor ou interromper o
medicamento quando sentir-se pior. Assim, a primeira ver-
são deste instrumento e que é usada na grande maioria dos
estudos consta de quatro perguntas: 1. “Você alguma vez
se esquece de tomar seu remédio? ”; 2. ” Você, às vezes, é
descuidado para tomar seu remédio? ”; 3. “Quando você se
sente melhor, às vezes, você para de tomar seus remédios?”;
4. “Às vezes, se você se sente pior, quando toma o remédio,

243
você para de tomá-lo?”. Os usuários com hipertensão que
responderem afirmativamente a alguma destas questões são
considerados como não-aderentes (MORISKY; GREEN;
LEVINE, 1986; UNGARI, 2007).
Este instrumento foi reformulado, de modo que a nova
versão (ainda não validada em português) ficou com oito
perguntas: 1. Você às vezes se esquece de tomar os seus
comprimidos de pressão alta? 2. Ao longo das últimas duas
semanas, houve algum dia você que não tomou seu medi-
camento para sua pressão arterial alta? 3. Você já parou de
tomar a sua medicação sem consultar o seu médico, porque
você se sentiu pior quando você tomou? 4. Quando você
viaja ou sai de casa, às vezes você se esquece de levar seus
medicamentos? 5. Você tomou seu remédio para pressão
arterial alta ontem? 6. Quando você sente que a sua pressão
arterial está controlada, às vezes você para de tomar o seu
medicamento? 7. Tomar todos os dias a medicação é um
verdadeiro transtorno para algumas pessoas. Você já se sen-
tiu incomodado por estar aderindo a seu plano de tratamen-
to? 8. Quantas vezes você tem dificuldade em lembrar de
tomar todos os seus medicamentos para o seu tratamento?
(MORISKY et al., 2008).
A Escala de conductas em salud tem um formato Likert de
cinco alternativas de respostas, que permite alcançar um má-
ximo de 100 pontos, e conta com uma quinta subescala, que
indaga sobre o hábito de fumar e se estende ao âmbito laboral
(MENDOZA-PARRA; MERINO; BARRIGA, 2009).
EQ-5D é um instrumento genérico de medição da
qualidade de vida relacionada com a saúde (QdVRS) que
permite gerar um índice representando o valor do estado

244
de saúde de um indivíduo. É baseado num sistema classifi-
cativo que descreve a saúde em cinco dimensões: mobilida-
de, cuidados pessoais, atividades habituais, dor/mal-estar e
ansiedade/depressão. Cada uma destas dimensões tem três
níveis de gravidade associados, correspondendo a sem pro-
blemas (nível 1), alguns problemas (nível 2) e problemas
extremos (nível 3) vividos ou sentidos pelo indivíduo. As-
sim sendo, este sistema permite descrever um total de 243
estados de saúde distintos.
O questionário SF-36 avalia a qualidade de vida de
pacientes com IC, apesar de não ter sido criado especifi-
camente para a Insuficiência Cardíaca (LAGUARDIA, et
al. 2013).
Com base nos instrumentos selecionados, verifica-se
que ainda são escassas tais tecnologias diante da magnitude
apresentada pela adesão ao tratamento. Nesse caso, suge-
re-se que novos instrumentos sejam desenvolvidos para que
haja maior possibilidade de intervenção nos diversos aspec-
tos que envolvem essa condição crônica aqui discutida.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A mensuração da adesão ao tratamento da insuficiên-


cia cardíaca é um tema relevante para a saúde global e brasi-
leira. No entanto, embora existam diferentes instrumentos
que podem ser utilizados para medir a adesão ao tratamento
da insuficiência cardíaca, não há um instrumento que abor-
de todos os domínios da adesão. Dessa forma, percebe-se
que os instrumentos atuais não dão conta de apreender o fe-
nômeno em sua integralidade. Assim, a criação de um ins-

245
trumento de mensuração da adesão ao tratamento da insufi-
ciência cardíaca, a partir da metodologia PROMIS (Patient
Reported Outcomes Measures), contribuiria para diminuir a
lacuna de conhecimento sobre o fenômeno, favorecendo
sua identificação e ações de saúde que visem aumentar a
adesão ao tratamento da IC.

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248
CAPÍTULO 11

O AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE E


SUA CONTRIBUIÇÃO NA PROMOÇÃO DO
AUTOCUIDADO JUNTO A PACIENTES COM
DIABETES MELLITUS TIPO 2

Joyce O. Matos
Lucimar B. Barbosa
Andrea Caprara

INTRODUÇÃO

O Diabetes Mellitus é classificado pela Sociedade Bra-


sileira de Diabetes como uma síndrome de etiologia múl-
tipla, caracterizada por apresentar um alto nível de glicose
no sangue. Isso acontece porque o corpo do diabético, mais
precisamente o pâncreas, não produz insulina ou produz em
quantidade insatisfatória, comprometendo a ação metabólica
desse hormônio sobre a glicose contida nos alimentos inge-
ridos ou sintetizada pelo próprio organismo, comprometen-
do a eficácia desse indivíduo em manter a glicose em nível
normal, desencadeando um quadro de excesso de glicose no
sangue, chamado de hiperglicemia (SOLLITARI, 2014).
A Sociedade Brasileira de Diabetes publicou, em
2015, uma estimativa de que a população mundial com
Diabetes esteja atualmente em torno de 387 milhões e pre-

249
vê um aumento substancial até 2035. No Brasil, em 2014,
foi identificada uma prevalência de 11,9 milhões de pessoas
com diabetes entre as idades de 20 a 79 anos. Sendo uma
preocupação cada vez maior a nível mundial, tendo em vista
o aumento exponencial dos casos (SBD, 2014).
Em 2011, o Ministério da Saúde, a partir de pesqui-
sa realizada pela Vigilância de Fatores de Risco e Proteção
para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico, apontou
Fortaleza como a capital brasileira com a maior proporção
de diabéticos, atingindo um percentual de 7,3% da popu-
lação (BRASIL, 2011). Em 2013, o Brasil ficou na quar-
ta posição da lista de países com maior número de pessoas
com diagnóstico de Diabetes, somando cerca de 12 milhões
de indivíduos (SOLLITARI, 2014).
Há em maior prevalência em duas das classificações de
Diabetes Mellitus, as chamadas Tipo 1 e Tipo 2. A grande
diferença entre elas consiste em que as pessoas diagnostica-
das com o Tipo 1 não produzem a insulina ou produzem em
pouca quantidade, já as pessoas diagnosticadas com o Tipo
2 produzem o hormônio, mas seu organismo cria uma resis-
tência orgânica a esta insulina, dessa forma, não metaboliza
o excesso de glicose no sangue (SBD, 2014).
Segundo Sollitari 2014, a forma de maior prevalência
em um aspecto global, é o Diabetes Mellitus Tipo 2, sendo
responsável por 90% dos casos diagnosticados. A autora
contribui ainda descrevendo os 3 critérios atualmente utili-
zados para diagnósticos, a partir dos níveis glicêmicos, acei-
tos pela American Diabetes Association (ADA), Organiza-
ção Mundial da Saúde (OMS) e pela Sociedade Brasileira
de Diabetes.

250
São elas:
• Glicemia casual maior que 200mg/dL somada à
presença de sintomas clássicos.
• Glicemia de jejum igual ou maior que 126mg/dL
• Glicemia maior ou igual a 200mg/dL após duas
horas de sobrecarga com 75g de glicose.
Pessoas acima de 45 anos devem estar mais alertas
aos cuidados contra a doença. Os fatores de risco para o
desenvolvimento do Diabetes Mellitus Tipo 2 podem ser
genéticos, porém a maior parte dos fatores cientificamente
conhecidos são de cunho comportamental. Sedentarismo,
hábitos alimentares pouco saudáveis, uso abusivo de bebi-
das alcóolicas e tabagismo são possíveis desencadeadores
e mantenedores do quadro de Diabetes Mellitus Tipo 2
(SBD, 2014 e FERREIRA, M.C. ET AL, 2014).
De acordo com Taddeo, et al. 2012 e Sollitari, 2014
ao descreverem os cuidados para conviver com a doença de
forma controlada, os pesquisadores revelam a necessidade
de modificar comportamentos habituais, tais como mudan-
ças no padrão alimentar, adesão a atividades físicas e com-
prometimento com o uso de medicamentos. Além dessas
mudanças, há de se atentar para os cuidados contra outras
complicações, as mais comuns são a nefropatia, neuropatia,
cardiopatia, retinopatia e o pé diabético.
Neste artigo objetivou-se verificar a discussão no am-
biente científico quanto a contribuição dos Agentes Comu-
nitários de Saúde no Autocuidado Apoiado junto a pacien-
tes com Diabetes Mellitus Tipo 2.

251
METODOLOGIA

Fez-se uso da revisão integrativa, selecionada por pos-


sibilitar a sumarização das pesquisas já concluídas e obter
conclusões a partir do tema de interesse. Para tanto, uti-
liza-se padrões de rigor, clareza e replicação utilizados em
estudos primários, apesar dos métodos para a condução das
revisões integrativas serem variáveis, existe padrões a serem
seguidos, como na operacionalização desta revisão, se se-
guiram as seguintes etapas: seleção das questões temáticas,
estabelecimento de critérios para a seleção da amostra, re-
presentação das características da pesquisa original, análise
dos dados, interpretação dos resultados e apresentação da
revisão. Para essa revisão utilizamos leitura sistemática de
alguns estudos a fim de definir as categorias necessárias ao
aprofundamento e discussão da temática.
Partiu-se da seguinte questão norteadora: Nos últimos
06 anos, como alguns estudos realizados contemplam a con-
tribuição do agente comunitário de saúde na promoção do
autocuidado junto a pacientes com Diabetes Mellitus Tipo
2? Após o questionamento, realizou-se uma busca nas bases
de dados do sítio da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS)
— BIREME: LILACS (Literatura Latino-Americano e
do Caribe, em Ciências da Saúde) e SCIELO (Scientific
Eletronic Library Online), utilizando os Descritores espe-
cíficos das Ciências da Saúde (DECS), como: diabetes mel-
litus tipo 2, autocuidado apoiado e agente comunitário de
saúde, assim como foram acrescentados outros artigos fora
da análise, para contribuir à título de comparação.

252
Os critérios de inclusão dos artigos selecionados fo-
ram: estudos de delineamento descritivo, quantitativo e
qualitativo, quase experimental e experimental, que foram
publicados entre os anos de 2010 à 2016 nos idiomas portu-
guês, inglês e espanhol, com textos completos disponíveis.
Excluindo todos os artigos que não contemplavam os crité-
rios propostos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A pesquisa nas bases de dados recuperou 13 artigos,


em relação ao delineamento dos estudos analisados, foram
encontrados estudos não experimentais e experimentais,
distribuídos em descritivos sendo 01 de análise documental,
01 ensaio clínico randomizado, 01 ensaio controlado não
randomizado, 01 estudo de caso, 01 estudo descritivo, 01
estudo epistemológico, 03 estudos observacionais analíticos,
01 estudo observacional, analítico e transversal e 03 revisões
integrativas. Após a seleção dos artigos, seguiram-se para
sumarização em quadro, dispondo de sua síntese, nome da
pesquisa, nome dos autores, objetivos ou resultados e suas
conclusões. A apresentação dos resultados e discussão foi
realizada de maneira descritiva em que se possibilita a ava-
liação da aplicabilidade da revisão integrativa elaborada ao
leitor, cumprindo com a metodologia escolhida.

253
Quadro 01. Apresentação da síntese dos artigos analisados.
Artigo Autores Objetivos do Estudo Discussões ou Resultados
A visita domiciliária reali- LIMA, Ariane Netto Descrever a percepção dos O artigo apresenta resultados de
zada pelo agente comuni- de; SILVA, Lucia; usuários quanto à visita satisfação e sentimentos de gratidão
tário de saúde sob a ótica BOUSSO, Regina domiciliária realizada pelo por parte dos usuários, demonstrando
de adultos e idosos. Szylit. agente comunitário de a importância do vínculo como fator
saúde. de contribuição para a promoção do
Autocuidado e aderência aos trata-
mentos.
O contexto da formação BARROS, Daniela Conhecer e descrever o Apresenta resoluções a favor da ati-
dos agentes comunitários França de. Et al. processo da formação dos vidade laboral do ACS, percebendo
de saúde no Brasil. agentes comunitários de a sua importância para o desenvol-
saúde. vimento de um atendimento mais
aproximado e eficaz a população.

254
Vislumbrando a rede LANZONI, Gabriela Compreender o signifi- Apresentou adequação e reconhe-
complexa de relações e Marcelino de Melo; cado da rede de relações cimento do elo entre comunidade e
intervenções do agente MEIRELLES, Betina e interações de Agentes Unidade Local de Saúde, a partir do
comunitário de saúde. Homer Schilindwein. Comunitários de Saúde trabalho do Agente Comunitário de
(ACS). Saúde e confirmou a importância da
construção de laços afetivos para o
fortalecimento da adesão aos trata-
mentos.
Satisfações e insatisfações BRAND, Cátia Inácia; Investigar fatores de sa- A contribuição da socialização do
no trabalho do agente ANTUNES, Raquel tisfação e insatisfação de saber foi apresentada com uma gran-
comunitário de saúde. Martins; FONTANA, Agentes Comunitários de de satisfação no trabalho como ACS,
Rosane Teresinha. Saúde a respeito da sua o que demostra interesse dos usuários
atividade profissional. em implicarem-se mais com suas
questões de saúde.
Acolhimento e vínculo FONSECA, G. P. et al. Analisar as publicações O artigo apresenta a compreensão
no processo de fazer dos científicas brasileiras da do quanto é complexo o fazer do
agentes comunitários de área da saúde acerca do agente comunitário de saúde (ACS),
saúde: Revisão Integrativa. acolhimento e vínculo es- evidenciando o acolhimento e vínculo
tabelecidos pelo ACS du- como ações essenciais no seu trabalho
rante seu trabalho. educativo e humanizado.
Cuidado e Empodera- LOPES, Andréia Apa- Análise de literatura a cer- Revela a necessidade de reparos na
mento: a construção do recida Ferreira. ca do empoderamento do abordagem utilizada pelos profissio-
sujeito responsável por sua paciente Diabético, consi- nais, para uma contribuição real do
saúde na experiência do derando a postura dos pro- empoderamento do paciente, utilizan-
diabetes. fissionais de saúde. do para a promoção do autocuidado
uma postura acolhedora e de parceria.
Acesso, prática educati- TADDEO, P. S. Et al. Analisar as percepções dos Resultados configuram a importância

255
va e Empoderamento de pacientes com doenças do estabelecimento de vínculo e a
pacientes com doenças crônicas, ao que se refere confiabilidade entre usuário e profis-
crônicas. às intervenções de promo- sional de saúde, sendo indicado pelos
ção do Empoderamento participantes como fator importante
realizadas na Estratégia de para a motivação na continuidade
saúde da Família. dos seus tratamentos e realização do
autocuidado.
Redução da mobilidade Ferreira, M.C. et al. Avaliar se há relação en- A pesquisa conclui que a mobilidade
funcional e da capacida- tre capacidade cognitiva e funcional e o desempenho cognitivo
de cognitiva no diabetes mobilidade funcional em podem estar diretamente ligados a
mellitus tipo 2. pacientes com diabetes qualidade do tratamento quanto ao
mellitus tipo 2. controle da glicemia, sugerindo gran-
de importância do autocuidado dos
pacientes a respeito dessas condições.
Avaliação da efetividade COSTA, E.F. ET AL Avaliar a efetividade das A pesquisa aponta um número
da promoção da atividade ações promovidas por significativo em relação à percepção
física por agentes comuni- Agentes Comunitários de da motivação para a implementação
tários de saúde em visitas Saúde na promoção do de rotinas de atividades físicas após as
domiciliares Autocuidado referente a intervenções educativas realizadas pe-
atividade física. los Agentes Comunitários de Saúde.

Elementos que influen- LIMA, S.A.V. ET AL. Analisar os elementos que O estudo possibilitou listar as maiores
ciam o acesso à atenção profissionais e usuários dificuldade e facilidades inerentes
primária na perspectiva acreditam que influenciam ao acesso aos serviços disponíveis na
dos profissionais e dos o acesso aos serviços de saúde pública. É importante destacar

256
usuários de uma rede atenção primária. que foi relatado que a atuação dos
de serviços de saúde do Agentes Comunitários de Saúde foi
Recife. apontado como um facilitador do
acesso ao sistema de saúde, sendo
capaz de agilizar muitas necessidades
dos usuários.
Estratégias de autocuida- MORAIS, H. C. C. Analisar estudo científicos É percebido que a promoção do
do apoiado para pacientes et al. que versam a respeito das autocuidado é uma ferramenta
com acidente vascular ce- estratégias de promoção de fundamental para a melhoria da saúde
rebral: revisão integrativa. autocuidado apoiado. e qualidade de vida da população,
além de ser uma das estratégias mais
baratas a serem implementadas na
condição de assistência à saúde.
Programa de autocuidado Lorena, S.B. e Sobrinho, Descrever o programa Foi possível observar aderência ao
físico apoiado: proposta J. E. L. desenvolvido para promo- programa por parte dos pacientes,
de educação popular em ver o autocuidado físico percebendo o interesse na discussão
saúde para pacientes com apoiado em paciente com e conhecimento das suas condições
fibromialgia. fibromialgia. de saúde, além da intercessão entre
usuários e profissionais de saúde.
Afetividade e seus sentidos Moura. R. F. S. de; Silva. Busca refletir sobre o papel As conclusões desse estudo versam
no trabalho do agente co- C.R.C. do afeto no cotidiano do a respeito da afetividade e amizade
munitário de saúde. trabalho do ACS. que de forma subjetiva favorece o
fazer cotidiano do Agente Comuni-
tário de saúde em relação aos colegas
profissionais e aos pacientes acompa-

257
nhados.
Compreendendo-se a cronicidade do Diabetes Melli-
tus Tipo 2 que traz ao sujeito diagnosticado a necessidade
de implementar novos comportamentos na sua rotina diá-
ria, destaca-se a importância da dieta balanceada e da ade-
são à prática de atividades físicas como elementos funda-
mentais para o alcance do controle glicêmico (TADDEO
PS ET AL, 2012).
Além de condições físicas, também é pertinente ressal-
tar a atenção às questões de condições cognitivas do pacien-
te em que Ferreira, et.al. 2014 aponta a necessidade de que
programas de saúde desenvolvam estratégias de promoção
do autocuidado junto aos pacientes e aos familiares em re-
lação a sinais de incapacidade cognitiva e motora, capaci-
tando profissionais da saúde a realizarem essas intervenções
educativas.
Percebendo isso, é fundamental a colocação de Men-
des, 2012, quanto à importância da promoção do autocuida-
do, numa perspectiva de motivar o paciente para o fazer por
si mesmo, compreendendo que os cuidados com a doença
estão diretamente ligados as possibilidades de melhorar sua
qualidade de vida.
Estudos de Ferreira, et al. 2014 apontam que a dimi-
nuição da mobilidade funcional e o mau desempenho cog-
nitivo nos pacientes diabéticos podem estar diretamente li-
gados a consequências do mau controle glicêmico, além de
outros aspectos inerentes a doença. Dessa forma, Costa et al,
2015 apresentam discussões que concluem que exercícios são
fundamentais para a melhora da mobilidade física, além de
contribuir para o controle adequado da glicemia. Os autores
apresentam em seus resultados que 74% das pessoas que re-

258
ceberam intervenções educativa, realizadas pelos agentes co-
munitários de saúde, a respeito dos benefícios dos exercícios
físicos, sentiram-se motivadas a praticar atividade física ou a
procurar participar de programas de atividade física.
Antes da criação do Sistema Único de Saúde (SUS), a
forma de conseguir atendimento médico estava necessaria-
mente entrelaçada à contribuição do indivíduo com a pre-
vidência social. Dessa forma, o acesso à saúde pública foi,
por muito tempo, limitado a alguns grupos da sociedade,
restando aos menos favorecidos valerem-se dos cuidados
nas casas e sistemas filantrópicos (FONSECA, G.P. ET
AL, 2013).
O Sistema Único de Saúde (SUS) foi planejado e ins-
tituído no Brasil na ocasião da implantação da Constituição
da República Federativa do Brasil de 1988, na qual prevê
no capítulo II, sessão II, que é dever do Estado e direito
do cidadão brasileiro o acesso à saúde de forma integral,
universal e gratuita (BARROS, 2010).
O SUS pode ser compreendido como um marco his-
tórico da nova compreensão de saúde por parte do Estado.
A grande mudança se dá pela transformação da visão re-
ducionista de que saúde é ausência de doença em que as
ações sempre foram pautadas na remediação e busca da
cura de enfermidades, para uma visão sistêmica acerca do
ser humano, considerando importante, para a manutenção
da sua saúde, aspectos para além da ausência de doenças,
entendendo que a promoção e prevenção das doenças está
diretamente ligado a curva ascendente para uma população
mais saudável e mais produtiva (LIMA; SILVA e BOUS-
SO, 2010).

259
Entretanto, é importante mencionar o que Lima,
S.A.V. et al, 2015 verificou em estudo realizado com profis-
sionais atuantes em unidade Básica de Saúde de Recife, que
uma barreira na eficácia do sistema de saúde diz respeito
ao quanto a política interfere no andamento dos progra-
mas de intervenção e promoção de saúde, visto a quantida-
de de mudanças de condutas e resoluções entre uma gestão
e outra, além do pouco investimento para a demanda das
necessidades, contando com número reduzido de profissio-
nais em relação a quantidade de usuários. Nesse contexto,
percebe-se que ainda há muita melhora a ser implantada no
sistema de saúde pública.
O programa de Agentes Comunitários de Saúde foi
implantado em 1991, portanto é anterior ao Programa de
Saúde da Família (PSF) que surgiu em 1994, hoje chamado
de Estratégia de Saúde da Família (ESF), sua criação foi
fruto do desejo de consolidar ainda mais o novo modelo de
atenção à saúde, o SUS, considerando o trabalho dos agen-
tes como estratégico para o estabelecimento de vínculos en-
tre a rede de saúde e a comunidade assistida (FONSECA,
G. P. ET AL, 2013).
A expectativa do plano de Estratégia de saúde da fa-
mília é que os Agentes Comunitários de Saúde tenham
acesso direto aos pacientes, sendo um multiplicador das
informações de cuidados com a saúde, além de levar e tra-
zer informações sobre esses pacientes ao posto de saúde,
agilizar as marcações de consultas, assim como orientar os
usuários quanto aos serviços que devem procurar e de que
forma proceder quanto as suas necessidades (BARROS
2010; BRAND, ANTUNES; FONTANA, 2010; LIMA,
S.A.V. et al, 2015).

260
Várias pesquisas apontam que as especificações do
perfil do Agente Comunitário de Saúde, quanto a ser um
morador da comunidade, utilizar-se das mesmas condições
de assistência, sofrer com as necessidades da comunidade,
contribuem para que o agente torne-se uma referência de
ajuda para essa comunidade pelo vínculo direto que cons-
trói naturalmente entre comunidade e unidade de saúde,
ocupando um espaço de mediador e parceiro dos usuários
na busca por conseguir assistência necessária (LANZONI;
MEIRELLES, 2010; BRAND; ANTUNES; FONTA-
NA, 2010; MOTA; DAVID, 2010).
O que se espera da Equipe de Saúde da Família é que
seja atuante de tal forma que substitua o modelo biomé-
dico, no qual a cuidado com a saúde está centrado em um
único profissional. De acordo com Brand, Antunes e Fon-
tana, 2010, a Política Nacional de Atenção Básica aposta
que cabe ao Agente Comunitário de Saúde, que realize o
levantamento das principais necessidades no que tange aos
aspectos da saúde, além de contribuir com a comunidade
em busca de melhorias para a qualidade de vida individual
e coletiva.
Pesquisas que versam sobre o contexto do trabalho dos
Agentes comunitários de Saúde entendem esse profissional
como o maior poder de vínculo percebido entre paciente e
unidade básica de saúde, sobretudo pela proximidade con-
quistada, sendo recebido dentro das residências dos pacien-
tes, estando diretamente aproximados do cotidiano e estilo
de vida desses sujeitos. Esse aspecto viabiliza de forma dire-
ta a ampla busca por facilitar e promover o autocuidado de
pacientes com doenças crônicas, no caso, o Diabetes Mel-

261
litus Tipo 2, pois o autocuidado é um componente valioso
para o desenvolvimento dos fatores que formam a linha de
vida de um indivíduo e promovem bem-estar físico e psico-
lógico (FONSECA, G. P. ET AL, 2013).
Moura e Silva, 2015, trazem em seu estudo aspectos
referentes à afetividade e à subjetividade que envolvem o
cotidiano do trabalho do Agente Comunitário de Saúde.
Os autores contribuem com os aspectos de vínculos no que
tange as relações dos profissionais com outros profissionais
e com os pacientes assistidos, revelando a boa convivência
como algo fundamental para a qualidade do serviço e ade-
são aos tratamentos.
Taddeo, et al. 2012 aponta que o sistema de saúde
pública ocupa-se da remediação de doenças agudas mais
do que do tratamento de doenças crônicas, o que contribui
para a desinformação e a falta de preparo dos usuários en-
fermos para a condição de estabelecer o autocuidado.
Mendes, 2012, ainda colabora afirmando que as condi-
ções de doenças agudas tem as suas características pautadas
em rápido tratamento e não necessidade de continuidade
dos cuidados, porém as doenças crônicas são caracterizadas
pelo estabelecimento de mudanças na rotina alimentar, me-
dicamentosa e aderência de atividades corporais regulares.
Para que a melhoria do cuidado aos pacientes com cro-
nicidades, como o Diabetes Mellitus tipo 2, seja alcançada,
é necessário que haja uma mobilização dos recursos comu-
nitários a serem usados com mais eficácia pelas instituições
de assistência à saúde em conjunto com a comunidade (TA-
DDEO, P.S. et al., 2012).

262
A educação em saúde é um aspecto determinante para
a promoção do autocuidado, além de ser um forte instru-
mento de vínculo entre pacientes e profissionais de saúde,
visto que, ao passo que os profissionais se esforçam na cria-
ção e aplicação de atividades com foco no empoderamento
dos pacientes em relação ao conhecimento da sua própria
condição, estão dando passos importantes na promoção
do autocuidado (LORENA, S.B. e SOBRINHO, J.E.L.,
2015).
Lopes, 2015, colabora com Mendes, 2011, e Taddeo,
et al., 2012, ao diferenciar o contexto da obediência versus
o empoderamento, colocando que os dois comportamentos
devem ser diferenciados, pois a aderência aos tratamentos
por obediência está vinculada ao posicionamento passivo
do paciente, enquanto o empoderamento está diretamente
associado a compreensão e aderência, resultantes de uma
educação em saúde que incorpora uma postura ativa e pau-
tada em decisões assertivas a respeito da própria saúde do
paciente.
De acordo com Morais, H.C.C. et al.. 2015, o auto-
cuidado é baseado em uma metodologia para ser utiliza-
da com pacientes tabagistas, desenvolvida pelo Instituto
Nacional de Câncer, em 1989, com o passar do tempo, a
sua aplicabilidade foi ganhando espaço no enfretamento de
outras condições de saúde. Os autores ainda contribuem
apontando a promoção do autocuidado como estratégia de
enfretamento com o melhor custo-benefício implementado
no Sistema Público de Saúde.
A definição de Autocuidado Apoiado está pautada em
uma orientação educacional sistemática, na qual está dire-

263
tamente ligada a uma relação estabelecida entre profissio-
nais e pacientes que estimulam o aprendizado quanto ao
gerenciamento dos seus problemas de saúde, considerando
as questões referentes ao conhecimento de sua condição, os
tipos de tratamentos disponíveis e possibilidade de tomar
decisões em relação a sua própria saúde como uma postura
que sugere autogerenciamento a partir de comportamentos
pró-ativos e conscientes a respeito de seu próprio tratamen-
to (MENDES, 2011).
Verificou-se que estudos apontam fortemente para a
compreensão de que o estabelecimento de uma relação de
parceria entre profissionais de saúde e pacientes com doen-
ças crônicas, como o Diabetes Mellitus, contribui para o
envolvimento destes com seus planos de tratamentos, além
disso, apontam os agentes comunitários de saúde como os
profissionais com maior possibilidade de construção de vín-
culos e apoio a promoção do autocuidado.

CONCLUSÕES

Os artigos complementam-se na reconstrução da his-


tória do atendimento da atenção primária, na assistência
aos pacientes com Diabetes Mellitus tipo 2 e na criação e
atribuições dos Agentes Comunitários de Saúde, além de
estarem em concordância quanto aos conceitos de Autocui-
dado Apoiado, contribuindo com a visão cada vez mais for-
te quanto à necessidade de aproximação e estabelecimento
de vínculo entre Agente Comunitário de Saúde e pacientes,
apontando para maior adesão aos tratamentos e uma pos-

264
tura mais assertiva e adequada dos pacientes com Diabetes
Mellitus Tipo 2 a respeito da sua responsabilização com sua
própria condição de saúde e melhora da qualidade de vida.
Estudos apontam fortemente para a compreensão de
que o estabelecimento de uma relação de parceria entre pro-
fissionais de saúde e pacientes com doenças crônicas, como
o Diabetes Mellitus, contribui para o envolvimento desses
com seus planos de tratamentos, além disso, apontam os
agentes comunitários de saúde como os profissionais com
maior possibilidade de construção de vínculos e apoio a
promoção do autocuidado.

Bibliografia Básica
BRAND, C.I.; ANTUNES, R.M.; FONTANA, R.T. Satisfações
e insatisfações no trabalho do agente comunitário de saúde. Cogi-
tare enferm, Jan/Mar; 15 (1): 40-7, 2010.
DE BARROS, D.F. et al. O contexto da formação dos agentes
comunitários de saúde no Brasil. 2010.
FONSECA, G.P.; LIMA, S.B.S.; PARCIANELLO, Márcio Kist;
BISOGNO, Silvana Bastos Cogo; RITTER, Francisco; BADKE,
Márcio Rossato. Acolhimento e vínculo no processo de fazer dos
agentes comunitários de saúde: Revisão Integrativa. Rev. Saúde
(Santa Maria), Santa Maria, v. 39, n. 2, p. 09-22, Jul./Dez.2013
LANZONI, G.M.M.; MEIRELLES, B.H.S. Vislumbrando
a rede complexa de relações e interações do agente comunitário
de saúde. Rev Rene [Internet]. 2010 [cited 2011 Jan 14]; 11 (2):
140-51.

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realizada pelo agente comunitário de saúde sob a ótica de adultos e
idosos. Saúde soc [online], v. 19, n. 4, pp. 889-897, 2010.
LOPES, A.A.F. Cuidado e Empoderamento: a construção do su-
jeito responsável por sua saúde na experiência do diabetes. Saúde
Soc. São Paulo, v. 24, n. 2, p. 486-500, 2015.
MENDES, EV. O cuidado das condições crônicas na atenção pri-
mária à saúde: o imperativo da consolidação da estratégia da saúde
da família. Organização Pan-Americana da Saúde, 2012.
MENDES, E.V. As redes de atenção à saúde. / Eugênio Vilaça
Mendes. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 549
p.: il, 2011.
MOTA, R.R.A.; DAVID, H.M.S.L. A crescente escolarização
do Agente Comunitário de Saúde: uma Indução do Processo de
trabalho?. Trab. Educ. Saúde, Rio de Janeiro, v. 8 n. 2, p. 229-248,
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SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES. Diretrizes da
Sociedade Brasileira de Diabetes: 2013-2014. Organização José
Egidio Paulo de Oliveira, Sérgio Vencio. – São Paulo: AC Farma-
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de um método em atenção primária. 2014. Tese de Doutorado.
Universidade de São Paulo. Disponível em: < http://www.teses.
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Acesso em: 10 nov. 2016.
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Ciência e Saúde Coletiva, 17(11):2923-2930, 2012.

266
CAPÍTULO 12

A abordagem teatral de augusto boal


na atenção psicossocial: poéticas e políticas
do teatro do oprimido na saúde.

Emanuella C. Joca
Maria Rocineide F. da Silva

INTRODUÇÃO

“teatro é necessariamente político,


porque política são todas as ativi-
dades do homem, e o teatro é uma
delas.” (BOAL, 2009, p. 11)

O Teatro do Oprimido constitui uma metodologia


teatral desenvolvida por Augusto Boal, teatrólogo brasileiro
com naturalidade carioca que sistematizou uma proposta
artística política, utilizando o diálogo cênico como forma
de problematizar as relações sociais opressivas. Buscando
compreender o Teatro do Oprimido como atividade cultu-
ral proposta pela Política Nacional de Saúde Mental Brasi-
leira que esse artigo apresentará experiências com essa abor-
dagem teatral no campo da saúde, bem como fundamentos
históricos e teóricos acerca da proposta.

267
A partir de algumas experiências no campo da psiquia-
tria na década de 1980, na Europa, Boal (2002) escreve suas
reflexões acerca dessas vivências e apresenta seu método de
teatro terapêutico. No Brasil foi à década de 1990 quan-
do ocorreram às primeiras proposições em contextos hos-
pitalares manicomiais. Nos anos 2000, quando ocorreu a
efetivação da Política Nacional de Saúde Mental brasileira,
o Ministério da Saúde apóia o Centro de Teatro do Opri-
mido do Rio de Janeiro (CTO-RJ) a formar trabalhadores
da atenção primária e dos Centros de Atenção Psicossocial
(CAPS) no uso dessa metodologia, fortalecendo entre ou-
tras coisas pontos de redes de atenção distintos e que se
potencializam pelo encontro a partir da linha de cuidado,
sempre singular de usuários (BRASIL, 2007, 2011).
Como centro difusor da abordagem de Augusto Boal
o CTO-RJ realizou formação em Teatro do Oprimido em
diferentes campos de conhecimento e práticas sociais, bem
como diversos locais do Brasil e exterior (Metaxis, 2007,
2008, 2010). O apoio dos ministérios da saúde, cultura e
educação do Brasil foram incentivadores das ações de mul-
tiplicação dessa abordagem teatral.
Com a Constituição Federal, de 1988, a chamada
Constituição Cidadã foram promulgadas as Leis Orgâni-
cas de Saúde 8.080 e 8.142. Em meio a essa conjuntura
de transformações sociais e políticas um campo alternati-
vo à psiquiatria clássica estava se fortalecendo no país. A
luta pela Reforma Psiquiátrica buscava estruturar um novo
modo de relação/cuidado com a loucura, modificando o
foco da doença para a saúde mental. O Modo Psicossocial
foi o caminho da política brasileira, redirecionando o mo-
delo hospitalocêntrico para o comunitário.

268
A Saúde Mental conforme Lancetti e Amarante (2015)
é uma área de conhecimento e campo de atuação complexo,
com atravessamentos de ordem ideológica, política, social e
cultural. Pontuam três sentidos a esse campo: origens his-
tóricas da psiquiatria (com as hospedarias e o alienismo de
Pinel); a Reforma Psiquiátrica (críticas e reformulações a
partir da II Grande Guerra Mundial); e a dimensão revo-
lucionária (o termo propõe uma mudança paradigmática do
foco na doença, em que a pessoa é colocada na condição
de assujeitado, para a saúde em que o sujeito é visto na sua
totalidade).
Em 2001 o cenário brasileiro para o campo da psiquia-
tria recebe contornos legais para mudanças. Nesse momen-
to é promulgada a Lei da Reforma Psiquiátrica Brasileira
Lei Federal nº 10.216, após muitas lutas de trabalhadores
da saúde mental, usuários, familiares e sociedade civil. Con-
forme Amarante & Torre (2001) as experiências pioneiras
em serviços substitutivos foram utilizadas como referencia
para as subseqüentes portarias ministeriais.
O Teatro do Oprimido estava apresentando experiên-
cias no campo da psiquiatria no Brasil desde 1994, quando
dois “curingas” do Centro de Teatro do Oprimido do Rio
de Janeiro (CTO-RJ) realizaram um trabalho no Hospital
Psiquiátrico Dom Pedro II. Conforme Felix (2010) nesse
período Augusto Boal cumpria o mandato de vereador no
Rio de Janeiro e havia sistematizado a vertente do Teatro
-Legislativo, que auxiliou na criação da lei de atendimento
geriátrico obrigatório nas unidades de Saúde Pública no
Rio de Janeiro. Essa lei foi constituída com um grupo de
mulheres de terceira idade que eram acompanhadas sema-

269
nalmente pela psicologia do Hospital Psiquiátrico Dom
Pedro II, Engenho de Dentro, Rio de Janeiro. Esse foi um
dos primeiros grupos de Teatro do Oprimido no Brasil em
interseção com a saúde mental, ou ainda nesse momento,
na psiquiatria.
No final da década de 1990 que o grupo mais anti-
go de Teatro do Oprimido, nesse campo se iniciou, o Pi-
rei na Cenna que, atualmente, está com quase vinte anos
de existência e decorre do Hospital Psiquiátrico Jurujuba.
Conforme Amarante e Lima (2008) o grupo é formado por
usuários, familiares e simpatizantes da Luta Antimanico-
mial. Tem trabalhado com prevenção, assistência e direitos
humanos em temas relacionados à DST/AIDS na saúde
mental bem como o estigma e o preconceito vivido por pes-
soas marginalizadas socialmente.
Esse grupo foi contemplado pelo Prêmio Cultural
Loucos pela Diversidade 2009 – Edição Austregésilo Carrano.
Conforme Edital N° 001, de 20 de maio de 2009 foi uma
iniciativa do Ministério da Cultura e Ministério da Saúde,
consistindo em uma das ações encaminhadas a partir da Ofi-
cina Loucos pela Diversidade – Oficina Nacional de Indicação de
Políticas Públicas Culturais para Pessoas em Sofrimento Mental
e em Situações de Risco Social de 2007, decorrente da parce-
ria interministerial para construção da Política Nacional
Loucos pela Diversidade. O grupo Liberarte de inserção da
metodologia do Teatro do Oprimido no Hospital de Custó-
dia e Tratamento Psiquiátrico Heitor Carrilho também foi
outro contemplado e ambos são de iniciativa do CTO-RJ.
Pode-se perceber que essas experiências ocorreram
com usuários, ainda, de hospitais psiquiátricos. Conforme

270
Brasil (2004) é a partir de 2001 que a Política Nacional de
Saúde Mental é reestruturada com vistas à atenção psicos-
social e as ações começam a se expandir para os Centros de
Atenção Psicossocial, a estratégia ministerial para o cuidado
com base comunitária. Foi, portanto, no início da implan-
tação/expansão da rede CAPS por volta de 2004 que o Mi-
nistério da Saúde incentivou o CTO-RJ a capacitar traba-
lhadores da atenção primária e da rede CAPS em São Paulo
e Rio de Janeiro, tendo sido expandido posteriormente para
outros municípios. (BRASIL, 2007, 2011).
Paulo Delgado, o propositor da Lei da Reforma Psi-
quiátrica, foi um incentivador dessa parceria, pois foi em
sua gestão como coordenador Nacional de Saúde Mental
do Ministério da Saúde que o CTO-RJ recebeu apoio para
a implementação do projeto Teatro do Oprimido na Saú-
de Mental. Em nota na revista Metaxis, dedicada à Saúde
Mental, Delgado (2010) falou do desafio da Reforma Psi-
quiátrica na reorientação do modelo assistencial, pontuan-
do que “(...) o aprofundamento teórico e prático da clínica
da atenção psicossocial são desafios e responsabilidades da
política de saúde mental, mas também de muitos autores.”
(p.14). E colocou o trabalho do CTO-RJ como qualificador
do cuidado nos CAPS, sendo a parceria com esta organi-
zação fundamental para a Reforma Psiquiátrica Brasileira,
porque o Teatro do Oprimido seria um instrumento de
construção de possibilidades de cuidado e de vida para as
pessoas.
Portanto, esse artigo apresentará o Teatro do Opri-
mido e como ele tem se configurado como um recurso ar-
tístico pedagógico e cultural presente nas políticas de saú-

271
de pública de base comunitária no Brasil. Para tanto, será
apresentado a trajetória do teatrólogo brasileiro Augusto
Boal e o desenvolvimento da abordagem teatral bem como
uma análise das experiências dessa metodologia na saúde.
A metodologia utilizada neste estudo se caracteriza como
revisão da literatura do tipo narrativa, na qual se utilizou,
principalmente, a obra do criador da proposta teatral dentre
outros materiais que se mostrou relevante para os objetivos
deste artigo.

Trajetória de vida de Augusto Boal

Augusto Boal (1931-2009) escreveu sua autobiografia


intitulada Hamlet e o filho do padeiro – memórias imaginadas
publicada pela editora nos anos 2000, em referencia a sua
trajetória no teatro e suas origens. Como filho de imigrantes
portugueses, o teatrólogo nasceu em 1931 na então capital
do Brasil. Cresceu em meio a contradições sociais de um
país assolado por desigualdades e foi testemunha de mui-
tas cenas de violência nas ruas cariocas do bairro da Penha,
onde viveu com a família. Apesar do entorno ser marcado
pela pobreza, não teve grandes problemas financeiros, pois
seu pai era comerciante.
Conforme Boal (2000) foi aos 18 anos que ingressou
na faculdade de Química Industrial e se manteve, a duras
penas, para realizar o desejo do pai de ter um filho doutor.
Participou do Diretório Acadêmico como diretor cultural e,
nesse período, conheceu Nelson Rodrigues, ao convidá-lo
para uma palestra que, apesar do fracasso de público, rendeu

272
uma amizade com o dramaturgo. Freqüentou como ouvinte
as aulas do Serviço Nacional de Teatro (SNT), ministradas
por Luiza Barreto Leite e Sadi Cabral que falavam sobre
profissionalização do ator e acerca do método de Stanis-
lavski.
No retorno ao Brasil, através de Nelson Rodrigues,
conseguiu trabalhar junto a Carlos Drummond de Andra-
de, na época, editor de revista sobre romances policiais,
como a X-9. Boal (2000) afirmou que essa experiência o
inspirou a escrever uma novela sobre o golpe de Estado na
Argentina, intitulada A deliciosa e sangrenta aventura de Jane
Spitfire, espiã e mulher sensual.
Em 1956, foi convidado para dirigir o Teatro de Are-
na, de São Paulo, e iniciou seus trabalhos com jovens atores,
utilizando o método de Stanislavski, através de laboratórios
de interpretação.
Nos anos seguintes, Boal (2002) participou de ativida-
des culturais importantes para a história do país. Organizou
junto com Gianfrancesco Guarnieri e colegas os cursos e
seminários de dramaturgia. Foi professor da Escola de Arte
Dramática de São Paulo por muitos anos. No final da déca-
da 1950 iniciou os projetos nacionalistas que tiveram gran-
de repercussão como: Arena conta Zumbi, com Guarnieri e
Edu Lobo, espetáculo apresentado em outros países; Arena
conta Tiradentes, com estréia em Ouro Preto e música de
Sidney Miller, Gilberto Gil e Caetano Veloso; e Arena conta
Bolívar com música e texto de Theo de Barros.
No início da década de 1960 influenciado pelas lutas
por direitos e pela superação das desigualdades sociais, pe-
las opressões vivenciadas nas grandes cidades e na região

273
nordeste com as secas e as cercas, iniciou o que chamou
de busca pelo povo e, como em outras companhias mundo
afora, viajou para longe (no caso, para o Nordeste) com o
espetáculo Gente como a gente, de Roberto Freire. Também
escreveu e montou a Revolução na América do Sul que situou
como sua primeira peça importante e que tinha como idéia-
chave, conscientizar o povo.
Nessas viagens ao Nordeste, Boal (2000) destacou a
experiência que influenciou em suas reflexões e formula-
ções. No espetáculo montado para ser apresentado em uma
comunidade rural, sua companhia exortava os camponeses a
enfrentarem os latifundiários; porém, ao serem convidados
por Virgílio (um camponês) a se juntarem na batalha real,
Boal percebeu a incoerência da “conscientização”.
Outra experiência marcante para a construção do Tea-
tro do Oprimido foi o Seminário de Dramaturgia no Sindi-
cato dos Metalúrgicos de Santo André. Realizado a pedido
do Centro Popular de Cultura (CPC) da União Nacional
dos Estudantes, em 1961. Boal (2000) montou oficinas de
teatro e na apresentação do espetáculo que retratava uma
situação real vivida pelos participantes houve uma invasão
do palco por espectadores que saíram da situação de passivi-
dade, característica do teatro tradicional e tomaram seus pa-
péis reais na cena teatral, construindo novos diálogos acerca
daquela situação.
Conforme Sábato Magaldi (1984) o Teatro de Arena
foi um dos protagonistas na construção de um teatro bra-
sileiro. Boal esteve junto nessa trajetória que passou por
momentos diferentes e significativos como: o realismo; o
desenvolvimento de uma dramaturgia brasileira; a nacio-

274
nalização dos clássicos, cujo objetivo se caracterizava por
utilizar obras clássicas como, por exemplo, Mandrágora, de
Maquiavel, e através das metáforas existentes nestes textos,
falar da situação política no Brasil; os musicais, no forma-
to de “Arena conta...”; e o sistema coringa, este termo será
usado posteriormente por Boal para definir o diretor de
Teatro do Oprimido ou o condutor do Teatro-Fórum.
Os musicais foram desenvolvidos após a instauração da
Ditadura Militar-Civil. E Segundo Boal (2000) apesar da
censura, encontrou no bar Zicartola um espaço de encon-
tro com artistas e intelectuais. Criou a idéia do espetáculo
Opinião, que reuniu no palco, Nara Leão, Zé Keti e João do
Vale, com direção musical de Dori Caymmi. Ao ensaiar e
encenar o Arena conta Tiradentes ele também sistematizou
o sistema coringa, no qual nenhum ator teria propriedade
por personagem. Todas essas experiências vão alimentar a
sistematização de seu método de teatro.
Apesar da repressão e do recrudescimento da ditadu-
ra com o Ato institucional nº 5, que restringia ainda mais
os direitos políticos e civis na sociedade brasileira, Augusto
Boal estruturou a primeira ramificação do Teatro do Opri-
mido, o Teatro Jornal.
Em 1970 Boal é preso pela ditadura, sendo liberado
após alguns meses para acompanhar o grupo Arena em uma
apresentação fora do país, tendo sido “aconselhado” a não
retornar, pois seria morto se fosse capturado novamente.
Ele foi convidado para participar do projeto de alfabeti-
zação integral no Peru baseado na metodologia de Paulo
Freire, onde trabalhou a vertente do Teatro-Imagem. A par-
tir de uma intervenção na cidade de Chaclacayo em que

275
foi apresentada uma cena na qual a platéia era convidada a
sugerir soluções para o conflito apresentado, uma senhora
que assistia ao espetáculo não aceitava como os atores repre-
sentavam a sua proposta e Boal convidou-a a tomar o lugar
da protagonista e mostrar como faria se fosse ela a estar
naquele conflito. Ela interpretou a si mesma ao interpretar
o personagem.
Na segunda metade da década de 1970 e após um tem-
po de exílio na Argentina e Portugal foi convidado a lecio-
nar o Teatro do Oprimido na Sorbonne, Paris. Seu trabalho
foi ganhando grande repercussão mundial, levando o latino
do teatro político a diversos países, onde pode apresentar e
difundir melhor suas técnicas e teorias.
Com o reconhecimento mundial de seu trabalho Boal
(2000) decidiu retornar ao Brasil anos depois da chamada
abertura política. Estabeleceu residência no Rio de Janeiro
e montou junto a artistas populares o Centro de Teatro do
Oprimido no Rio de Janeiro (CTO-RJ). Esse grupo foi dis-
seminando em diversos espaços, cidades e países o Teatro
do Oprimido.
O teatrólogo continuou ampliando seu sistema e, a
partir da experiência de ter sido vereador na capital cario-
ca, eleito em 1992, desenvolveu o Teatro Legislativo, outro
método que buscava a participação social nas construções
das leis. Criou o Teatro como arte marcial trabalhando com
pessoas condenadas à prisão, e, por fim, escreveu a Estética
do Oprimido, publicado postumamente.
Augusto Boal faleceu no dia 02 de Maio de 2009,
aos 78 anos e deixou um legado que o reconhece como um
dos maiores teatrólogos da América Latina. O sistema que

276
construiu possui seguidores em mais de 70 países, que bus-
cam efetivar o objetivo do autor de “humanizar a Humani-
dade”.

Mas... no que consiste o Teatro do Oprimido?

Boal (2002) definiu sua proposta como um sistema


de exercícios físicos, jogos estéticos, técnicas de imagem e
improvisações especiais, que tem por objetivo resgatar, de-
senvolver e redimensionar a vocação humana de ser teatro,
tornando a atividade teatral um instrumento eficaz na com-
preensão e na busca de soluções para problemas sociais e in-
terpessoais. O Teatro do Oprimido busca a transformação
social por meio da arte, restituindo-se a capacidade humana
de expressar-se ao fazê-la.
Utilizando a metáfora da árvore Boal (2009) faz uma
analogia para apresentar suas formulações, a qual alicerça-
da na filosofia crítica, na história, na economia, na multi-
plicação, na política, na solidariedade e na ética nutre sua
copa pela palavra, pela imagem e pelo som. Jogando com
exercícios desmecanizadores, fortalece seu tronco espesso,
ramificado ao centro com o Teatro Imagem e o Teatro-
fórum, crescendo com o Teatro Jornal, o Teatro Invisível,
o Arco-Íris do desejo, o Teatro Legislativo e Ações diretas,
florescendo a transformação social realizada por cidadãos
ativos.
O grande núcleo do Teatro do Oprimido é o Teatro
Fórum, no qual um grupo de atores ou não atores monta
uma cena vivida por um dos participantes, na qual o conflito

277
principal é o foco e em que existe um opressor e um oprimi-
do que disputam. Porém, o oprimido buscando conseguir
seu objetivo vivencia limites e diante dessa cena os spect-ato-
res são convidados a representar o oprimido e propor novas
alternativas para conseguir seu objetivo.
O carioca disse “O nordeste me alertou; Santo André
me mostrou o problema e Chaclacayo a solução” (BOAL,
2000, p.197). Esses três momentos na trajetória do autor
foram fundamentais para os desdobramentos de seu mé-
todo.
Em seu último ensaio, Boal (2009) amadureceu teori-
camente o TO, colocando-o como um modelo ético-estéti-
co ligado ao ideal dos direitos humanos; citou os caminhos
que o Teatro do Oprimido como metodologia da Estética
do Oprimido estaria construindo e dedicou um capítulo à
Saúde Mental. O objetivo seria o de estimular o saudável do
ser humano, de estruturar imagens da sociedade e dar-lhes
significados. Para o autor, saúde é a capacidade de cada um
de transformar as potencialidades de seu corpo e mente.
Boal (2009) apresentou sua teoria acerca da produção
artística, acreditando que existe certo distanciamento de
quem produz a arte e a consciência de estar se fazendo arte.
Colocou o conceito de formas delirantes da arte, que consiste
em uma adjetivação para a criação artística. No entanto, ao
se reportar ao sofrimento psíquico, utilizou o termo delírio
patológico para abordar a produção em que o sujeito é pouco
capaz de controlar o seu delírio. Diante dessa premissa das
formas delirantes da arte e do delírio patológico, seria função
do curinga, quando trabalha o TO na saúde mental o de
fortalecer os vínculos dos usuários com o real.

278
Se o enfermo conseguir criar como
artista, transformando seu delírio
em produto visível, audível e pal-
pável - pintura, dança, escultura,
música, poesia, cinema ou cena
teatral -, poderá ver-se a si mesmo,
pois se verá refletido em sua arte.
Sujeito da sua criação, recriando-
se a se mesmo ao criar a sua obra
(BOAL, 2009, p. 229)

Essa é a hipótese boaliana de que ao produzir arte esse


produtor torna-se sujeito de criação de si no mundo, es-
truturando-se e construindo significados acerca de si e suas
relações, autor de sua própria história. A busca seria a de
que pessoas em sofrimento psíquico criassem elos entre a
alucinação e o real, ambos expressando-se em visões esté-
ticas. Seria uma expansão da percepção através de meios
estéticos, em que os participantes exercitam sua capacidade
criadora dentro de limites sociais consensuais, em um en-
saio para a vida real.
Nesse ensaio de ser, o usuário da política de saúde
mental pode teatralizar seus conflitos individuais e coleti-
vamente construir alternativas para a realidade opressora.
“A alegria do oprimido, quando consciente, é terapêutica
porque é expansiva, a tristeza é refratária.” (BOAL, 2009,
p. 241) Ainda na compreensão do autor, o ser humano é
essencialmente teatro e expansividade, a sociedade na sua
configuração política, econômica e social é que seria a limi-
tadora das possibilidades humanas.
Boal construiu um sistema de intervenção social atra-
vés da arte que se pretende potencializador do humano.

279
Era um esteta que compreendia a produção artística como
instrumento de enfrentamento das relações opressivas, que
ocorrem principalmente no emaranhado das contradições
sociais, conseqüentes de um sistema baseado no lucro e na
exploração do trabalho. Através do diálogo mediado pelo
teatro buscava-se o fortalecimento das classes exploradas
e nesse sentido o Teatro do Oprimido é associado a con-
cepções teóricas e práticas como as de Paulo Freire, que
construiu a Pedagogia do Oprimido e a do autor latino-ame-
ricano Alfredo Moffatt, que escreveu Psicoterapia do Opri-
mido, onde evidencia alternativas à psiquiatria clássica na
Argentina. Tais formulações objetivam a transformação de
povos fortemente marcados pelo colonialismo e imperialis-
mo, além de serem experiências forjadas em meio a ditadu-
ras políticas e nas circunstâncias de ampliação das injustiças
sociais.

O Teatro do Oprimido e suas intersecções saúde

Menções ao Teatro do Oprimido como prática promo-


tora de saúde foi encontrada em algumas fontes. No Centro
Cultural do Ministério da Saúde no catálogo da mostra Me-
mória da Loucura encontra-se o vídeo Fronteiras da mente,
da saúde e da expressão: a palavra e o palco, que apresenta o
Teatro como um instrumento potente para expressão.
O projeto Formação em cidadania para a saúde: temas
fundamentais da Reforma Sanitária do Centro Brasileiro de
Estudos de Saúde (CEBES) abordou o tema Diversidade
cultural e saúde. Nele Amarante e Costa (2012) falam acerca

280
das propostas inovadoras de arte-cultura no campo da saúde
mental. O Teatro do Oprimido é citado como uma dessas
ações que propõem uma visão crítica sobre a questão da lou-
cura, da discriminação e violência.
Em publicação do Ministério da Saúde, Caderno Hu-
manizaSUS, volume cinco, Almeida e Duarte (2015) re-
latam como o município de Guarulhos assumiu o Teatro
do Oprimido como uma estratégia de cuidado em Saúde
Mental e que as intervenções com a proposta ocorrem des-
de 2006 quando o município estabeleceu parceria com o
CTO-RJ e o Ministério da Saúde. Conforme as autoras o
objetivo com o uso da abordagem boaliana é de estimular o
protagonismo dos participantes para que a partir do diálo-
go teatral construam alternativas de transformação de suas
realidades.
Na coordenação geral do projeto Teatro do Oprimido
na Saúde Mental está Geo Brito que esteve ao lado de Boal
desde o início da fundação do CTO-RJ. Conforme Brito
(2010) o objetivo do projeto consiste em capacitar profis-
sionais para serem multiplicadores do Teatro do Oprimido
e utilizá-lo como instrumento de facilitação do enfrenta-
mento de conflitos entre práticas manicomiais e antimani-
comiais.
Portanto, tais fontes referem-se ao Teatro do Oprimi-
do como: instrumento que estimula a expressividade; pro-
posta inovadora que possibilita uma visão crítica da loucura,
de sua discriminação e violência; política municipal facilita-
dora da participação social; estratégia de cuidado da atenção
psicossocial; e abordagem que propõe o diálogo entre práti-
cas manicomiais e antimanicomiais.

281
Um processo de revisão de literatura foi realizado em
bases de dados buscando sistematizar os artigos disponíveis
em periódicos científicos e que envolvem uma discussão so-
bre o Teatro do Oprimido no campo da saúde.
Nessa revisão foi realizado um levantamento em dois
bancos de dados: Biblioteca Virtual da Saúde Brasil – BVS
-Brasil e o Portal de Periódicos da Capes. Foram utilizados
os seguintes termos em busca por assunto simples: “Teatro
do Oprimido”; “Theatre of the oppressed”; “Augusto Boal”.
No Portal de Periódicos da CAPES a busca foi refinada
em busca avançada com “Theatre of the oppressed” and
“Health”, “Augusto Boal” and “health”.
O material pesquisado teve como corte de inclusão os
trabalhos que abordam o campo da saúde. No percurso des-
ta revisão foram encontrados trinta e dois (32) artigos que
tiveram seus resumos analisados ficando dezessete (17) para
leitura integral. Destes 02 (dois) foram retirados de imedia-
to por tratar-se de uma dissertação e de uma apresentação
teórica do método teatral de Boal. Restando assim (quinze)
15 textos que foram classificados em cinco categorias, con-
forme quadro abaixo com respectivas referências:

282
Quadro 1 – Revisão de Banco de periódicos científicos que apresentam trabalhos
com Teatro do Oprimido
(continua)
Número Categoria Referência
1 Uso do Teatro do Oprimido 1 - PROCTOR, K. et al., 2008
para formação de profissio- 2 - BRETT-MACLEAN, P., YIU, V.,
nais de saúde FAROOQ, A., 2012
3- GUPTA, S. et al. 2013
2 O Teatro do Oprimido como 1- SANTIAGO, L. E., 2000;
instrumento facilitador de 2 – SULLIVAN, J. et. al 2003;
educação em saúde 3 - SULLIVAN, J. et. al 2008;
4 - GAZZINELLI, M. F. et al., 2012;
3 O Teatro do Oprimido com 1 - WARNER, L. , 2008;
função terapêutica e de refle- 2 - ALVES, I.; GONTIJO, D.
xão crítica T.; ALVES, H. C., 2013;
3 - PENIDO, M. A. et al, 2014
4 O Teatro do Oprimido na 1 - SILVA, J. S. da et al., 2011;
Política de Saúde Mental 2 - SANTOS, É. S. dos; JOCA, E. C.;
Brasileira SOUZA, Â. M. A., 2016.
5 O Teatro do Oprimido como 1 - FERNANDES, A. M. D.; JOCA,
ferramenta de pesquisa E. C., 2011;
2 - CAMPOS, F. N.; PANÚNCIO
-PINTO, M. P.; SAEKI, T., 2014;
3 - OLIVEIRA, É. C. S. & ARAÚJO,
M. de F., 2014
Fonte: Elaborado pelas autoras

Os estudos encontrados nos periódicos científicos de-


monstram que desde os anos 2000 essa abordagem teatral
esta sendo estudada na sua intersecção com o campo da
saúde. A primeira categoria foi intitulada como 1- Uso do
Teatro do Oprimido para formação de profissionais de saúde e
é composta por três artigos. Eles se referem ao Teatro do
Oprimido como ferramenta de intervenção educacional para
profissionais e estudantes da saúde. Gupta et al. (2013) re-
latam a experiência de propor essa metodologia teatral para
discutir questões humanitárias na Universidade de Ciências

283
Médicas de Nova Deli, na Índia. Os autores afirmam que
seu uso desenvolveu a capacidade crítica na formação médi-
ca e favoreceu a humanização dos estudantes. Na Austrália
Proctor et al. (2008) abordam o uso do Teatro do Oprimido
para trabalhar questões de opressão e capacitar terapeutas
familiares na prevenção de suicídios. Nos Estados Unidos,
Brett-Maclean, Yiu e Farooq, (2012) utilizaram a vertente
do Teatro-fórum para a formação de médicos e dentistas.
Usaram as técnicas para discutir as questões vivenciadas pe-
los trabalhadores em suas atividades profissionais.
Na categoria número 2 - O Teatro do Oprimido como
instrumento facilitador de educação em saúde foi agrupado
quatro artigos, os quais dois (02) referem-se a estudos do
mesmo grupo em um espaço de cinco anos entre as duas
publicações. Sullivan et. al (2003) em um primeiro texto
traz um relato em que apresenta o grupo de investigação
da Universidade do Texas que compõem o Institute of
Environmental Health Sciences Center e como o Teatro do
Oprimido é utilizado junto a comunidade para atividades
de educação ambiental. Refere as intervenções no sudoeste
do Texas onde as comunidades têm sofrido com o acome-
timento de doenças decorrentes das mudanças ambientais,
sociais e econômicas causados com a implantação de petro-
químicas na região. Cinco anos depois pode-se encontrar
outro trabalho de Sullivan et al (2008) dando continuidade
as atividades que abordou no texto anterior. O foco dessa
publicação trata das questões de justiça ambiental e a polui-
ção existente nas comunidades.
O artigo de Grazzinelli et. al. (2012) refere-se a um
trabalho em que utiliza o Teatro do Oprimido como re-

284
curso pedagógico para orientar as crianças e jovens sobre o
que seria uma pesquisa e o Termo de Consentimento Li-
vre e Esclarecido (TCLE). O grupo compunha uma equi-
pe que objetivava testar uma vacina contra ancilostomíase.
O estudo usou o Teatro do Oprimido para esclarecer as
questões da pesquisa e observou sua eficácia em favorecer
a compreensão sobre a pesquisa e em amenizar o equívo-
co terapêutico, identificado neste estudo e em investigação
anterior na região. O objetivo foi reduzir o equívoco tera-
pêutico, que leva a superestimar os benefícios e ignorar os
riscos da pesquisa.
Santiago (2000) fala do trabalho de educação em saúde
que desenvolveu no Chile através do que chamou de Modelo
do Teatro da Vida, no qual integra o Teatro do Oprimido de
Boal, o Teatro Pobre de Grotowaski, a Educação para a Paz
de Beristain e Cascón, e a educação popular de Paulo Freire.
Discuti o uso desse modelo com pessoas com HIV e jovens.
A categoria 3- o Teatro do Oprimido com função terapêu-
tica e de reflexão crítica consiste em três trabalhos. Warner
(2008) apresenta um espetáculo de Teatro do Oprimido
tipo fórum de um grupo londrino que tem apresentado para
pessoas em situação de rua, problematizando o transtorno
mental e o abuso social das pessoas nessa condição. Alves,
Gontijo e Alves (2013) apresentam uma intervenção com
jovens em vulnerabilidade social. São profissionais da Tera-
pia Ocupacional que apresentam uma pesquisa que tinha o
objetivo descrever e analisar a utilização do teatro do opri-
mido como recurso terapêutico ocupacional junto a jovens
em situação de vulnerabilidade social no processo de cons-
cientização e protagonismo juvenil.

285
Penido et. al, (2014) relatam uma pesquisa em que
adaptaram as técnicas do Teatro do Oprimido ao trata-
mento da Terapia Congnitiva-Comportamental para a
terapêutica de fobia social. A pesquisa trabalhou com dois
grupos de pacientes acometidos por fobia social, sendo que
um recebeu as técnicas do teatro, o chamado grupo-expe-
rimental e outro constituiu no grupo-controle. Através da
manipulação das técnicas da abordagem teatral realizaram
a psicoeducação, o treinamento em habilidades sociais, a
reestruturação cognitiva e a exposição ao vivo. A equipe de
pesquisa identificou resultados significativos para sintomas
de ansiedade e depressão no grupo experimental.
Na análise dos trabalhos situados na quarta categoria
que se referem ao objeto desta pesquisa, qual seja, o Teatro
do Oprimido na Política de Saúde Mental brasileira verifi-
cou-se que ambos coadunam com as fontes acima referidas
quando colocam o esta abordagem teatral como instru-
mento facilitador da participação social e da expressivida-
de dos sujeitos, estimulando a autonomia e que constitui
uma estratégia que está em consonância com a Reforma
Psiquiátrica Brasileira e a luta antimanicomial. Silva et. al.
(2011) realizaram uma pesquisa qualitativa com usuários da
atenção psicossocial que participavam de grupos de Teatro
do Oprimido e verificaram uma função psicoterápica, que
favorece a expressividade, a inserção social pelo trabalho
e pelo estudo. Santos, Joca e Souza (2016) relatam a ex-
periência de um projeto de Teatro do Oprimido na rede
psicossocial do município de Fortaleza, discutindo a abor-
dagem teatral como ferramenta que favorece a autonomia e
participação dos usuários da saúde mental.

286
Finalmente a Categoria 5- O Teatro do Oprimido como
ferramenta de pesquisa apresenta alguns artigos que utiliza
essa abordagem como ferramenta de pesquisa e todos ca-
racterizam-se como estudos do campo da psicologia. Fer-
nandes e Joca (2011) utilizam como dispositivo de pesquisa
-intervenção dentro da perspectiva da Análise Institucional.
Oliveira e Araújo (2014) utilizaram o teatro fórum como
ferramenta de pesquisa-participante e Campos, Panúncio
-Pinto e Saeki (2014) discutem a potência do Teatro do
Oprimido como construtor de dados em psicologia social.
Essa investigação buscou demonstrar como diversos
autores estão utilizando e pensando a abordagem do Teatro
do Oprimido, especificamente no campo da saúde. Reve-
lando, dessa forma, uma diversidade de possibilidades que
passa por instrumento de educação em saúde, de formação
crítica de profissionais, como ferramenta de cuidado e re-
flexão crítica, bem como dispositivo de pesquisa social que
favorece a participação com a construção de espaços dialó-
gicos e dados de pesquisa.

Considerações Finais

Este artigo percorreu uma trajetória no intuito de


compreender a abordagem teatral que está presente nas po-
líticas de saúde brasileira, em principal, naquelas de caráter
comunitário. Foi possível constatar que alguns estudiosos
têm apresentado suas experiências e achados em suas apro-
ximações acadêmicas com o Teatro do Oprimido.

287
Como o Teatro do Oprimido é utilizado por vários
profissionais no Brasil e conforme Toscano (2010) o pro-
jeto nacional, financiado pelo Mnistério da Saúde formou
diversos trabalhadores da saúde como artistas, agentes co-
munitários de saúde, auxiliares administrativos, teatrólogos,
sociólogos, psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros, an-
tropólogos, auxiliares de enfermagem, arte-terapeutas, te-
rapeutas ocupacionais, educadores e fonoaudiólogos é im-
portante que fundamentos teóricos sejam produzidos para
auxiliar a práxis com tal perspectiva.
Nesse sentido, este artigo buscou contribuir para maior
compreensão acerca desta proposta teatral que conforme es-
boçado anteriormente possui grande amplitude de possibili-
dades. No entanto, apesar da diversidades de atrizes e atores
sociais que entraram em contato com essa metodologia tea-
tral, através da revisão em banco de dados observa-se uma
escassez em trabalhos no campo da política de saúde mental
ou da atenção primária quando apenas dois artigos que tra-
tam desta proposta de intervenção cultural na Política Na-
cional de Saúde Mental sendo um com mais de cinco anos.
Esse artigo situa o criador e a obra que tem sido pos-
ta como uma das iniciativas de intervenção cultural para
a atenção psicossocial. No ano de 2017 Augusto Boal foi
homenageado no carnaval de rua do Rio de Janeiro e con-
forme o Jornal do Brasil o Ponto de Cultura Coletivo Car-
navalesco Tá Pirando, Pirado, Pirou!, conhecido como Blo-
co do Pinel, prestou homenagem ao criador do Teatro do
Oprimido e foi uma sugestão de um familiar de usuário da
rede de saúde mental que participa do Grupo de Teatro do
Oprimido Pirei na Cenna.

288
Portanto, este texto, busca contribuir para que atrizes e
atores sociais possam fundamentar suas ações com o Teatro
do Oprimido, na realização de ações educativas-terapêuti-
cas subsidiando trabalhadores e pesquisadores das Políticas
Públicas em curso, principalmente, na dimensão sociocul-
tural do paradigma Psicossocial.

GLOSSÁRIO PARA O CAPÍTULO 12

Em O Século dos Manicômios de Issaias Pessotti pode-


se encontrar um estudo acerca da perspectiva e pratica de
Philippe Pinel, que conforme o autor (1996) foi um médico
francês influente que estava no movimento para transfor-
mações dos asilos em manicômios com o intuito do trata-
mento doença mental e não apenas para retirar do convívio
social como na perspectiva asilar.
Na cidade de São Paulo em 1987 foi criado o primeiro
Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) chamado Professor
Dias da Rocha Cerqueira e em Santos foi criado o Núcleo
de Atenção Psicossocial (NAPS). As duas propostas colo-
cam a atenção psicossocial como caminho, mas Amarante
& Torre (2001) afirmaram existirem nuances. O CAPS foi
criado em meio as transformações no sistema de saúde no
Brasil, na passagem de um modelo privatista para organiza-
ção estatal. Estariam apoiados no modelo dos Estados Uni-
dos e nas idéias de transformação cultural do movimento
italiano. Seria a doença mental pensada no âmbito da saúde
coletiva, considerando os contextos macro e micro social,

289
históricos, do trabalho e das famílias. Portanto, um tipo de
serviço entre os ambulatórios e os hospitais psiquiátricos. O
NAPS data de 1989 e foi fundamentado na perspectiva de
Franco Basaglia que preconizava uma transformação social,
objetivando substituir totalmente o modo manicomial na
assistência e na sociedade, nesse sentido rompendo efetiva-
mente com as bases teórico-prática da psiquiatria clássica.
Conforme Sanctum (2009) curinga é um termo do
Teatro do Oprimido utilizado para designar uma pessoa/
artista que ministra cursos e oficinas, dirige espetáculos e
atua como mestre de cerimônia nas sessões de Teatro-Fó-
rum, sendo um interlocutor entre a peça e a platéia. Deriva
das primeiras experiências de Augusto Boal no Teatro de
Arena quando experimentava o que chamou sistema corin-
ga, no qual cada ator poderia ser qualquer personagem, não
havia propriedade sobre os papeis.
Conforme relato do autor, em entrevista cedida a Joan
Abellan, em 1998, no Rio de Janeiro, para a confecção do
livro Boal conta Boal, editado pelo Institut Del Teatre de la
Diputació de Barcelona, lançado em 2001, suas memórias
foram escritas por causa da insistência de sua editora inglesa
Talia Rodgers. Essas são as imagens de sua vida que estão
em sua memória, de seus familiares e amigos, com quem
dialogou para a escrita da referida obra. Essa autobiogra-
fia foi utilizada como fonte para a maioria das informações
desta sessão.
Eram Gianfrancesco Guarnieri, Oduvaldo Viana Fi-
lho, Vera Gertel, Flávio Migliaccio, Milton Gonçalves,
conforme afirmou Boal (2004) em entrevista publicada em
Teatro de Arena- uma estética de resistência, de Izaías Almada.

290
As informações acerca dos trabalhos com o teatro de
Arena e suas formulações teóricas e práticas nesse período
pode ser aprofundadas em diversos textos, cito em ordem
cronológica algumas publicação: 1978, Dionysos – Especial:
Teatro de Arena; 1984, Um palco brasileiro – o Arena de São
Paulo, de Sábato Magaldi; 1996, O mito e o Herói no moderno
teatro brasileiro, de Anatol Rosenfeld; 2000, Hamlet e o Filho
do Padeiro de Augusto Boal; 2001, Boal conta Boal, de Joan
Abellan; e 2004, Teatro de Arena – uma estética de resistência,
de Izaías Almada.
Em Um Palco brasileiro – O Arena de São Paulo, de
1984, Sábato Magaldi afirmou que as motivações que es-
timularam a construção desse sistema não foram apenas
estéticas e políticas, teriam sido também econômicas e de
espaço, pois o Arena tinha um palco pequeno, onde cabiam
poucos atores. Fato também ressaltado por Boal (2001)
quando em entrevista para Joan Abellan.
1
Acerca da experiência de ser preso pela ditadura mi-
litar brasileira Boal escreveu dois livros: Milagre no Brasil
e Torquemada. E foi um ativista que denunciou as torturas
e assassinatos que os presos políticos no Brasil estavam vi-
vendo.
spect-atores – Termo cunhado pelo autor para caracte-
rizar a situação ativa do espectador no Teatro do Oprimido,
o qual busca estimular a participação de todos na cena, seja
efetivamente propondo alternativas para o conflito encena-
do, seja pensando como poderia proceder em tal situação.

291
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297
PARTE III.

ESTUDOS DIVERSOS NO
CONTEXTO DA SAÚDE: UM
CONVITE À REFLEXÃO

298
CAPITULO 13

POR QUE A AIDS AVANÇA ENTRE OS JOVENS?


PROVOCAÇÕES PARA UMA PESQUISA

Diego da Silva Medeiros


Maria Salete Bessa Jorge

INTRODUÇÃO

O número de notificações da infecção de HIV/aids en-


tre o público jovem, mais precisamente o masculino, na fai-
xa etária de 15 a 24 anos, tem aumentado sistematicamente
na última década. O fenômeno requer um olhar acurado
para compreender as linhas ativas no território existencial
dos sujeitos que estão implicados nas infecções crescentes
entre os jovens.
A compreensão, portanto, dos atuais cenários da epi-
demia de aids é multifacetada, complexa e conectada a uma
multiplicidade de sujeitos, a saber, os próprios jovens, os
familiares, amigos e profissionais de saúde. A singularidade
de cada caso pode apontar a presença de outros sujeitos que
também atuam nestes territórios existenciais, haja vista a
produção ininterrupta de redes vivas.
Importa compreender que a rede
viva não se institui, ela vem e vai,
aparece e desaparece, tem um

299
movimento intenso e ilimitado,
operando sempre para a produção
do cuidado por conexões e fluxos
entre trabalhadores, usuários, ter-
ritórios existenciais, pessoas da co-
munidade, afetos em movimento,
etc. Há uma propulsão de práticas
socioafetivas nas relações de cui-
dado que dão formação às redes
vivas (FRANCO, 2016, p.401).

As redes destes jovens, bem como dos outros sujeitos


que estão em relação com eles, vai se constituindo como
produção ininterrupta com novas relações a cada momento.
Importa esclarecer que um sujeito é atravessado por uma
série de afetos, em outras palavras, constitui um agencia-
mento de coisas que o faz à medida que ele vai entrando em
relação, vai encontrando outros corpos. Assim, nas ocasiões
que nos referirmos ao termo “sujeito” afirmamos algo que
não é essencialista, mas produção viva. Mais adiante pensa-
remos este conceito a luz de autores da filosofia da diferença
e da sociologia.
O diagnóstico reagente para HIV/aids é um elemen-
to que afeta os corpos tanto dos jovens como dos sujeitos
que estão em relação com eles. Os corpos que nos referimos
não é o organismo como máquina, mas um corpo vibrátil
(ROLNIK, 1989), um corpo sensível que se afeta com o
encontro. Uma série de afetos atua sobre os corpos que se
transformam com os encontros e linhas que vão tecendo no
seu território existencial.
A aids, assim, ainda traz em seu bojo a referência à
sexualidade suja devido o estigma colado às práticas ho-

300
moeróticas e homoafetivas. A ideia de iminência da mor-
te, pois, trata-se de uma doença incurável para a referência
biomédica. A descoberta da sorologia reagente para HIV
é marcada por este lugar comum em que a aids ainda está
imersa.
Por outro lado, o avanço da tecnologia de controle
do vírus por meio dos antirretrovirais, tanto no tratamento
como na diminuição da capacidade infecciosa do vírus, tem
movimentado o campo da aids, principalmente a pujança da
indústria farmacêutica. Esta tecnologia, mesmo alvissareira
em alguns pontos, pode contribuir para um controle dos
corpos, para a submissão dos corpos, consequentemente da
vida, ao protocolo biomédico, à norma de um cuidado pro-
tocolar configurando uma perspectiva de medicalização da
vida.
O cenário político também compõe as linhas do cam-
po da aids. A emergência da onda conservadora pautada
em elementos religiosos dogmáticos e fundamentalistas,
alimentando discursos de ódio ao que destoa de uma lógica
heteronormativa, tem influência na condução das políticas
públicas que lidam com o território da aids. Campanhas
censuradas, assassinatos de pessoas LGBT, retirada de di-
reitos das minorias, todas estas práticas impactam na res-
posta brasileira à epidemia de aids.
Uma estratégia para perceber as conexões que se en-
gendram no território existencial destes sujeitos é a Análise
de Redes Sociais (ARS), articulada com a discussão de in-
teração social e redes da Sociologia e com as ferramentas
conceituais da Filosofia da Diferença. A vida é toda arti-
culada em redes, em relações com pessoas e coisas. Estão

301
articulações dão pistas de como uma vida se inventa a partir
do diagnóstico reagente para o HIV/aids e como as pessoas
que convivem lidam com esta informação. A partir disso,
outras articulações vão sendo cunhadas, conexões, apoios,
mas também descontínuos, fossos, obstáculos, violências,
estigma. Como estas linhas estão articuladas?
Pensar o incremento das infecções de HIV/aids entre
adolescentes e jovens requer a construção de um problema.
O problema é o que movimenta a pesquisa, que faz pensar
e produzir saberes porque, efetivamente, mobiliza os cor-
pos sensíveis do pesquisador para se encharcar do território
(ULPIANO, 2016).
Este capítulo é um convite à pesquisa, à produção de
saberes. Seu estatuto é embrionário de pesquisa, fomenta
a composição de um problema de pesquisa que mobilize a
comunidade acadêmica a produzir saberes com estes jovens,
com estes familiares, com as minorias, com a formação e
assistência no campo da saúde. Não há resultados claros e
receitas mirabolantes de como potencializar a prevenção,
diagnóstico e tratamento, mas provocações que sirvam de
ferramentas para pensar as singularizações deste fenômeno
de avanço da epidemia de HIV/aids entre jovens do sexo
masculino.
O material utilizado para a confecção deste capítulo foi
uma revisão da produção acadêmica de redes sociais, ado-
lescentes e jovens, HIV/aids, dados epidemiológicos, arti-
culados às ferramentas conceituais de autores da Sociologia,
da Análise de Redes Sociais e da Filosofia da Diferença.

302
AIDS E JOVENS NA CONTEMPORANEIDADE

A epidemia de aids é conhecida pela sua dinamicidade


e complexidade. As características desta epidemia variam
de região para região no globo terrestre. A quarta década
da aids traz alguns desafios para as análises sociológicas e de
saúde coletiva. A tecnologia no campo da aids teve avanços
significativos, no diagnóstico e no tratamento medicamen-
toso fomentando grande vivacidade à discussão no campo e
esperança às pessoas que vivem com HIV/aids.
A aids possui claros elementos sociais que ultrapas-
sam a mera caracterização biomédica de um evento viral.
Este agravo, ainda hoje, é profundamente marcado pelo
estigma, preconceito e discriminação que torna complexo
o enfrentamento da epidemia requerendo um olhar amplia-
do. Atualmente a epidemia de aids se apresenta distinta do
início dos anos oitenta e esta atualização estabelecerá con-
versações entre pesquisadores de várias tradições científicas,
movimentos sociais, profissionais de saúde e pessoas que
vivem e convivem com HIV/aids.
Segundo dados mundiais do Programa Conjunto
das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS) (2016),
atualmente, estima-se que 36 milhões de pessoas vivam
com HIV/aids, destes, a América Latina possui aproxima-
damente 02 milhões de casos. O Brasil apresenta o maior
número de casos na América Latina com aproximadamen-
te 842.270 notificações entre os anos de 1980 a junho de
2016 segundo Boletim Epidemiológico publicado anual-
mente pelo Departamento de IST1/Aids e Hepatites Virais
(DIAHV) do Ministério da Saúde (BRASIL, 2016).
1 A sigla IST se refere às infecções sexualmente transmissíveis e foi adotada recentemente substi-
tuindo a sigla DST que correspondia às doenças sexualmente transmissíveis.

303
No estado do Ceará, de 1983 a junho de 2016 foram
notificados 16.790 casos de aids. Os homens concentram o
maior número de casos. Dentre os homens, observa-se au-
mento de casos de aids entre os homossexuais, passando de
24,8% (128/515) em 2007 para 30,4% (206/677) em 2015
(CEARÁ, 2016). O município de Fortaleza não dispõe de
publicação anual de Boletim Epidemiológico de HIV/aids,
os dados podem ser observados no banco de dados ofertado
pelo DIAHV em endereço eletrônico (http://svs.aids.gov.
br/aids/). Entre os anos de 1980 a 2015, Fortaleza notificou
11.540 indivíduos com aids, são 8.208 homens e 3.331 mu-
lheres. Segundo categoria de exposição, em Fortaleza, entre
os anos de 2003 a 2015, somados os homossexuais e os bis-
sexuais perfazem 23,2%, enquanto os heterossexuais 18,6%
dos infectados com o vírus HIV, há uma grande quantidade
de ignorados, 58,1% (BRASIL, 2015).
A epidemia apresenta sinais de concentração em grupos
populacionais específicos. O DIAHV alinhado à Organiza-
ção Mundial de Saúde (OMS) nomeia de populações chaves
(key populations) aqueles que apresentam maior risco de in-
fecção pelo HIV, tais como homens que fazem sexo com ho-
mens (HSH2), usuários de drogas, pessoas privadas de liber-
dade, trabalhadores do sexo e transgêneros (WHO, 2014).
No Brasil (2014), segundo Boletim Epidemiológico,
os HSH possuem uma taxa de prevalência de 10,5% e os
jovens HSH de 17 a 21 anos de 1,2%, em contrapartida, a
população geral de homens possui 0,7% e de homens jovens
de 17 a 21 anos de 0,1%. Observa-se concentração signifi-
2 O termo HSH é oriundo de denominação inglesa men who have sex with men (MSM) para de-
finir homens gays e bissexuais e aqueles com práticas homoeróticas e identidade heterossexual
(BRIGNOL et al, 2015).

304
cativa de infecções entre os HSH, considerando que a tava
de prevalência entre trabalhadores do sexo é de 4,9%, pes-
soas usuárias de droga em geral de 5,9% e usuários de crack
de 5%. Estes dados ilustram a vulnerabilidade à infecção
do HIV/aids de setores historicamente marginalizados so-
cialmente que estão submetidos cotidianamente ao estigma
social, preconceito e discriminação.
Entre os homens jovens da faixa etária de 15 a 24 anos,
a taxas de detecção apresentam aumento significativo.
Entre os homens, nos últimos dez
anos, observa-se um aumento da
taxa de detecção, principalmente
entre aqueles com 15 a 19 anos, 20
a 24 anos e 60 anos e mais. Desta-
ca-se o aumento em jovens de 15
a 24 anos, sendo que de 2006 para
2015 a taxa entre aqueles com 15
a 19 anos mais que triplicou (de
2,4 para 6,9 casos/100 mil hab.)
e, entre os de 20 a 24, dobrou (de
15,9 para 33,1 casos/100 mil hab.)
(BRASIL, 2016, p. 12).

Os dados oficiais apontam para o incremento da in-


fecção de HIV/aids entre os jovens de 15 a 24 anos, supe-
rior, inclusive, as outras faixas etárias. Este recorte etário se
enquadra no segmento de adolescentes e jovens (adolescents
and youth) da Organização das Nações Unidas (ONU) para
fins estatísticos e políticos (EISENSTEIN, 2005).
O UNICEF, seguindo esta orientação epidemiológi-
ca, lançou no ano de 2013, em parceria com a Secretaria
Municipal de Saúde de Fortaleza (SMS) e outras entidades,

305
o Projeto Fique Sabendo Jovem que objetiva possibilitar o
acesso dos jovens de 15 a 24 anos, prioritariamente lésbicas,
gays, bissexuais, travestis e transgêneros (LGBT), a suas so-
rologias de HIV e outras IST, além de trabalhos de preven-
ção e retenção nos serviços especializados (UNICEF, 2013).
Há características comportamentais que expõem os
adolescentes e jovens à vulnerabilidades em relação à infec-
ção pelo vírus HIV e outras IST: início da vida sexual an-
tes dos 15 anos, relações sexuais com indivíduos do mesmo
sexo proporcionalmente maior entre adolescentes e jovens,
maior frequência de múltiplos parceiros no último ano, uso
irregular do preservativo (mesmo este público utilizando
mais preservativos em relação aos adultos), utilização de
drogas ilícitas, baixo acesso à testagem anti-HIV entre os
homens (BRASIL, 2011b, 2013).
Segundo o Boletim Epidemiológico, a chance de um
jovem homossexual estar infectado pelo HIV é 13 vezes
maior em relação aos jovens em geral (BRASIL, 2011).
Há um esforço de análise que tenta explicar a tendência
do recrudescimento da epidemia de aids nesta população
e a pesquisa fomentará o debate buscando compreender as
redes sociais destes adolescentes e jovens que vivem com
HIV/aids.
Com efeito, diante do cenário exposto, convém acom-
panhar a construção e o funcionamento das redes sociais de
adolescentes e jovens HSH, compreendidos entre a faixa
etária de 15 a 24 anos, com diagnóstico reagente para HIV
atendidos nos Serviços de Atendimento Especializado em
HIV/aids (SAE) da cidade de Fortaleza.

306
Este fenômeno recente requer a compreensão de como
os adolescentes e jovens HSH na faixa etária de 15 a 24 anos
produzem suas redes sociais com as interações que engen-
dram no seu território existencial a partir do conhecimen-
to da sorologia reagente para o HIV. Quais as influências
destas redes sociais na invenção de suas vidas? Esta questão
fomenta conversações com os dados epidemiológicos ofi-
ciais no sentindo de compreender o fenômeno do recrudes-
cimento da epidemia de HIV/aids entre os adolescentes e
jovens na realidade do município de Fortaleza.

VIDAS QUE ARTICULAM REDES

O Brasil vive uma turbulência política e econômica


que ressoa na política de IST, Aids e Hepatites Virais. Há,
todavia, associada à crise, debilidade da agenda dos direi-
tos humanos sob a influência de um conservadorismo mo-
ral que já se anunciava anos atrás na formação de políticas
públicas. Houve censuras, por exemplo, capitaneadas pelo
parlamento brasileiro do “kit contra a homofobia” nas es-
colas, campanha de prevenção das prostitutas e campanha
para jovens gays no carnaval (CORRÊA, 2016; SEFF-
NER; PARKER, 2016).
A resposta brasileira à epidemia aids foi reconhecida
internacionalmente pelo envolvimento direto das popula-
ções mais diretamente afetadas pela epidemia na condu-
ção das políticas públicas sob os auspícios do debate dos
direitos humanos. Atualmente, o investimento do DIAHV
é concentrado na ordem biomédica difundida internacio-

307
nalmente com a palavra de ordem “testar e tratar”, ou seja,
disseminar o diagnóstico e oferecer o tratamento com os
medicamentos antirretrovirais, desvitalizando as investi-
das de prevenção horizontais junto às populações chave.
(CORRÊA, 2016; SEFFNER; PARKER, 2016; GRAN-
GEIRO; CASTANHEIRA ; NEMES, 2015) .
Adotar o discurso que justifica o avanço da epidemia
de aids entre os adolescentes e jovens somente com o ar-
gumento que os mesmos não dispõem de informações so-
bre prevenção ou uso correto do preservativo não atende à
complexidade do fenômeno. A persistência de preconceitos
e discriminações associada ao discurso hegemônico da hete-
ronormatividade pode contribuir para a ausência de cuida-
do adequado aos jovens homossexuais nos serviços de saúde
(CUNHA; GOMES, 2016).
Os adolescentes e jovens HSH associam alguns sen-
tidos quando se reportam às IST e aids: a sensação que o
uso do preservativo pode diminuir a sensibilidade e con-
sequentemente o prazer; a parada para colocar o preserva-
tivo dificulta a ereção e é preciso dar mostras de potência
sexual; os homens seriam mais descontrolados sexualmen-
te, são caçadores e precisam ser viris; as primeiras relações
sexuais são mais propícias a não utilização pela postura
submissa, o medo de perder o parceiro e o momento de
prazer; os conhecidos e parceiros fixos são mais confiáveis,
a confiança dispensa o uso do preservativo e pode ser uma
prova de amor; as redes sociais virtuais e sites de relacio-
namentos proporcionam facilidades de encontros sexuais
para sexo sem compromisso e geralmente sem preservativo
(CUNHA; GOMES, 2016).

308
O acesso aos serviços de saúde destes adolescentes e jo-
vens HSH é atravessado por uma série de elementos que fa-
cilitam ou obstruem o cuidado formal nos serviços de saúde,
tais como, o medo de contrair aids conduz os adolescentes e
jovens HSH para realizar os testes diagnósticos geralmente
após as relações sexuais sem preservativo; a questão do si-
gilo sobre a sexualidade, medo de sofrer discriminação por
ser homossexual; preconceito por parte dos profissionais
quanto a prática do sexo anal; alguns profissionais de saúde
atendem os homossexuais reproduzindo a lógica heteronor-
mativa; adolescentes e jovens declaram que para ser bem
atendidos precisam esconder a homossexualidade; para o
padrão hegemônico heterossexual a revelação de uma iden-
tidade gay pode causar constrangimento, receio de serem
tratados fora da norma vigente, expostos e incompreendi-
dos (CUNHA; GOMES, 2016).
Os sujeitos, adolescentes e jovens HSH vivendo com
HIV/aids, profissionais de saúde e familiares não estão en-
redados em identidades fixas de fácil observação e reprodu-
ção. Cada pessoa está inserida em uma rede complexa de
materialidade e socialidades (SPINK, 2015).
No caso da médica, se fazem pre-
sentes as vozes de outros profis-
sionais da equipe, de gestores, de
antigos professores, de livros, de
sites da internet onde buscamos
novos conteúdos sobre doenças e
tratamentos, de laboratórios que
farão e/ou analisarão material
biológico, de máquinas e mais má-
quinas. A capacidade de resposta

309
dessa profissional depende de suas
experiências passadas, de sua for-
mação, de regulações e protocolos,
de incentivos ou da falta deles, de
apoio profissional e pessoal e das
materialidades que embasam sua
prática (SPINK, 2015, p. 118).

Por outro lado,


Também a paciente não está só:
amigos, familiares que acompa-
nham seu estado de saúde ou sua
doença, as vicissitudes do trans-
porte que a levará para casa, a
possibilidade de acesso a exames
e tantas outras “vozes” humanas
e não humanas (sim, as máquinas
“falam”, mesmo que por meio de
seus porta-vozes!). Porém essa
“relação” depende ainda de como
são posicionados os pacientes
(SPINK, 2015, p. 118).

Uma pesquisa futura deve identificar estas forças que


constituem os sujeitos, são agenciadas, e quando enunciadas
são sempre coletivas, são agenciamentos coletivos de enun-
ciação (DELEUZE; GUATTARI, 2015). As práticas de
cuidado, então, são singulares, estão inscritas nas relações.
“Não existe voz pura, ela é sempre determinada por um sis-
tema (familial social etc) e codificada por uma recepção”
(CERTEAU, 2001).
Foucault (2016) afirma que o campo da medicina, es-
tendido a outras áreas da saúde, está enredado da relação de
saber e poder que incide sobre o corpo, como um processo

310
disciplinador, e sobre a população, como regulamentação.
A norma é o elemento que vai circular entre a disciplina dos
corpos e a regulamentação das populações. Assim, há uma
norma que atua sobre os corpos e populações e que o desvio
causa desconforto. A epidemia de aids e as formas de lidar
com ela estão inscritas numa norma que atua sobre todos
os sujeitos envolvidos nesta pesquisa: adolescentes e jovens
HSH, profissionais de saúde, familiares, amigos.
O controle, agora, não precisa de confinamento ou de
moldar os corpos para se tornarem dóceis, ele se exerce a céu
aberto, com instrumentos sutis. “Os indivíduos tornaram-
se “dividuais”, divisíveis, e as massas, tornaram-se amostras,
dados, mercados ou bancos” (DELEUZE, 2004, p.222).
Estamos controlados pelo marketing, pelas senhas, pelo
curto prazo, pela velocidade, os sujeitos não param, estão
endividados. Deleuze aponta um novo cenário de controle
que nos posiciona sem saída, mesmo sem confinamento. O
disciplinamento, a regulação e o controle coexistem na so-
ciedade contemporânea.
No campo do cuidado relativo à aids, os adolescentes e
jovens HSH são, por vezes, a medição de suas cargas virais
e das células TCD4 (indicadores de replicação do vírus e
de competência do sistema imunológico), ou o registro de
retirada de medicamentos, procedimentos fomentados pelo
saber poder que engendra a disciplina, a norma e o controle
deste corpos e populações. Exemplos de saber e poder estão
presentes na pesquisa clínica em saúde e na epidemiologia.
Para Certeau (2001) procedimentos populares que es-
tão nas ações cotidianas jogam com os mecanismos de con-
trole e disciplina, são tecnologias mudas que se engendram

311
em táticas e astúcias e vão golpeando, caçando sem auto-
rização, para, a partir destas práticas, inventar suas vidas.
Tais procedimentos são minúsculos e se inserem no âmbito
de uma micropolítica que se movimenta na prática, no mo-
vimento e no deslocamento das forças moleculares (DE-
LEUZE; PARNET, 1998). Adolescentes e jovens HSH
e profissionais de saúde utilizam deste recurso na produção
do cuidado.
A vivência da homossexualidade associada à sorolo-
gia reagente para o HIV desloca o sentido da vida, mar-
cada, por exemplo, pela heteronormatividade e sexualidade
conservadora como norma social. Os adolescentes e jovens
HSH, nas palavras de Certeau (2001) vão praticando o es-
paço, inventando e buscando potencializar suas vidas, em
cruzamentos de móveis e lançando mão da astúcia, já que
não podem sempre acessar os lugares estabelecidos que pos-
suem um próprio e um modelo. Estes jovens, assim, vão
produzindo seu território existencial e este território é cons-
tituído de uma rede.
Simmel (2006) afirma que a interação entre indivíduos
é a própria sociedade, e aquela é condicionada por impulsos
ou busca de certas finalidades. Instintos, interesses, ajuda,
jogo, impulsionam o indivíduo ao convívio com o outro,
exercendo efeitos e sofrendo efeitos. A sociação, então, é a
forma como os indivíduos exercem seus interesses para com
o outro por meio de uma unidade que se realizam e formam
a base da sociedade humana.
A afirmação de Simmel coaduna com a ideia de uma
teoria das redes que a pesquisa busca se fundamentar, é na
interação segundo os interesses dos indivíduos que se re-

312
lacionam que caracterizam uma sociedade. O conceito de
sociação, todavia, fundamenta uma rede de interações que
possuem objetivos comuns marcados pelo desejo dos seus
constituintes de se influenciarem. A teoria das redes, como
arquitetura de pesquisa, pode lançar mão do conceito sim-
meliano de sociação para pensar as redes de apoio dos jovens
HSH que vivem com HIV/aids, ao se indagar: quais os inte-
resses, as motivações dos sujeitos nesta rede social de apoio?
Elias (2008) contesta a ideia de um indivíduo conce-
bido estaticamente e o posiciona no entrelaçamento inces-
sante e irredutível, assumindo a forma que lhe é específica
dentro e através de relações com os outros. Complementa,
ainda, que esta rede só é compreensível em termos da ma-
neira como os indivíduos se ligam, de sua relação recíproca.
Compreender, pois, o fenômeno do recrudescimento
da epidemia de aids entre adolescentes e jovens HSH de
15 a 24 anos na realidade brasileira requer que analisemos
as redes as quais eles estão inseridos e atuantes, praticando
seus espaços e inventando suas vidas. Elementos de ordem
micro (cotidianos, moleculares), como de ordem macro
(política nacional de aids, dispensação de medicamentos,
normas regulamentadoras), todos entrelaçados, darão pistas
para a compreensão do fenômeno.
As redes humanas com muitas unidades originam uma
ordem que não pode ser estudada pelas unidades indivi-
dualmente. As redes existem antes dos indivíduos, ele ajuda
a formá-las nas relações que de forma ininterrupta tece e
destece as ligações.
A norma que tratava Foucault (2016) em seu conceito
de biopoder, biopolítica, é construída nas relações e pode

313
estabelecer conexão com o conceito de ordem de Elias. A
norma não é construída de forma asséptica ou de um ar-
roubo metafísico, ela se constitui no tensionamento, nos
encontros, nas relações de forças que se engendram nas re-
lações, diria, também, nas redes humanas. Foucault (2004)
refere-se ao saber que domina um histórico de luta, os sabe-
res desqualificados (subordinados a norma ou a ordem) das
pessoas jaz na memória dos combates.
Estes saberes que são subordinados à ordem emergem
no estudo das redes, principalmente quando lidamos com
sujeitos ordinários que inscrevem no próprio corpo as in-
sígnias de uma vida com HIV/aids e uma sexualidade que
destoa da heteronormativa. As redes, mesmo as de apoio,
não são brandas e estáticas, mas tecem e destecem as re-
lações de saber e poder que os sujeitos emaranhados vão
engendrando.
Deleuze e Guattari (2004) apresentam o conceito de
rizoma, um mapa com linhas entrelaçadas sem começo e
nem fim, sempre aberto a novas conexões que são tecidas de
forma ininterrupta, sem ser justificado por nenhum modelo
estrutural ou gerativo, modificado constantemente e que,
um acontecimento microscópico, pode estremecer o equi-
líbrio do poder local. Para os autores, a vida se engendra
desta forma, sem conseguir submeter os sujeitos, que estão
sempre em transformação, atravessados por devires. O con-
ceito de rizoma será uma ferramenta importante de análise
para compreender os processos de subjetivação dos ado-
lescentes e jovens HSH, objeto disparador desta pesquisa,
bem como, dos profissionais de saúde, familiares, amigos,
entre outros.

314
“A pessoa individual não é um começo e suas relações
com as outras não têm origens primevas” (ELIAS, 2008,
p.35), esta afirmação vem corroborar com o conceito de ri-
zoma de Deleuze e Guattari. Elias (2008) ainda acrescenta
que são os entrelaçamentos incessantes e sem começo que
constroem a forma que chamamos de ser humano indivi-
dual, mediante interação com os outros e um fluxo contínuo
de necessidades, desejos, numa alternância de dar e receber.
A interação social, em relações ininterruptas, vão pro-
duzindo, sempre, novas formações, “novas regras, mas nun-
ca é de um só golpe, numa frase ou numa criação, mas em
‘tijolos’, com a sobrevivência, o deslocamento, a reativação
de antigos elementos (não seguimos uma linha reta e se-
rializada de progresso) que subsistem sob as novas regras”
(DELEUZE, 2006, p.32).
Segundo Elias (2008), falta-nos modelos conceituais
que tornem compreensíveis como um grande número de
indivíduos forma uma “sociedade” e como sucede as mo-
dificações de maneiras específicas, sem pretensão ou pla-
nejamento por qualquer dos indivíduos que a compõem. A
Análise das Redes Sociais (ARS) é uma estratégia de visibi-
lizar estas interações sociais e compreender o funcionamen-
to da dinâmica destas redes,
O conceito de redes, polissêmico, é utilizado por di-
versas correntes de pensamento tanto no campo das ciências
sociais como de outras tradições de conhecimento. A con-
fecção e estudo de redes para a compreensão dos problemas
sociológicos remontam aos anos 30 do século XX. No en-
tanto, a aparição do conceito de rede social (social network)
como ferramenta para analisar a estruturação e interação

315
dos pescadores de uma pequena comunidade está referen-
dada na produção do antropólogo britânico John Barnes.
Para o autor a vida social estava estruturada em teias de re-
lações entre os pontos (nós). (FIALHO, 2015).
A rede é composta de “nós”, que são os elementos da
rede, identificados pelas relações que possuem com o “ego”.
Os “laços” são as relações entre os “nós” da rede e podem
adquirir uma multiplicidade de características. As redes
egocentradas (egocentric network) tem o “ego”, um sujeito,
como disparador das relações da rede social, ele que informa
os laços constitutivos da rede. Para operacionalizar, a aná-
lise de redes sociais sintetiza-se em algumas questões, tais
como: Quem? O quê? Como? – Quem faz parte das redes?
Quais os conteúdos dos fluxos das redes? Quais as normas
que regulam sua ação? (PORTUGAL, 2007).
Granovetter (1972, 1982) cria os conceitos de laços
fortes e laços fracos. Laços fortes são aquelas relações mais
próximas, geralmente no âmbito familiar, são relações com
alto nível de credibilidade e influência, são relações antigas,
intensidade emocional e intimidade, comumente partici-
pam de um mesmo círculo social. Os laços fracos são laços
mais fluidos, permitem estabelecer pontes com distintos
grupos sociais, estes laços são responsáveis pelas inovações,
permite o trânsito num tecido social.
Nas ARS o conceito de capital social é caro, principal-
mente quando o sociólogo Coleman (1988, 1990) localizou
o capital social na relação entre as pessoas, não podendo
ser um atributo meramente individual. O capital social é
produtivo, permitindo que se realize algumas ações que sem
ele não seria possível. Para Bourdieu (2008) o capital social

316
é um conjunto de recursos que estão associados a uma rede
durável de relações com interconhecimento e de inter-reco-
nhecimento. Um indivíduo possui tanto mais capital social
quanto a extensão de uma rede de relações que ele pode
mobilizar e do volume do capital que está associado aos seus
contatos. Assim, as redes de relações não são um dado natu-
ral, ou mesmo um dado social, mas um trabalho constante
de instauração e de manutenção para aferir vantagens ma-
teriais ou simbólicas.
Robert Putnam (2000), herdeiro de Coleman, posi-
ciona o capital social presente nas relações, mas sublinha
uma dimensão normativa. O capital social é produzido pe-
las redes sociais, normas de confiança e reciprocidade. As
instituições mais simples e cotidianas possuem capital social
e a associação a elas pode aumentar o capital social dos in-
divíduos. “Assim, se para Bourdieu e Coleman a questão é
‘o que minha rede de relações pode fazer por mim?’, para
Putnam é ‘em que medida todos podemos nos beneficiar
de uma rede social ampla com normas e confianças associa-
das?’” (PORTUGAL, 2007, p.19).
As redes de apoio social estão relacionadas aos aspectos
qualitativos e comportamentais das relações sociais, com-
preendidos em quatro tipos: apoio emocional, que envolve
expressões de amor e afeição; apoio instrumental ou mate-
rial que se refere aos auxílios concretos como provimento de
necessidades materiais em geral, ajuda para trabalhos prá-
ticos; apoio de informação que compreende informações,
aconselhamentos, sugestões, orientações; interação social
positiva que diz respeito à disponibilidade de pessoas com
quem se divertir e relaxar (DUE et al, 1999).

317
Em artigo recentemente publicado, os resultados
apontaram que as principais fontes de suporte para as pes-
soas vivendo com HIV/aids foram familiares e amigos que
não residem com a pessoa; o medo do estigma e preconcei-
to esconde a condição sorológica; o suporte do profissional
de saúde interfere na adesão ao tratamento; rede social de
apoio permite a redução de estigma e discriminação de-
corrente da doença; o suporte melhora o auto cuidado, a
qualidade de vida e afastam sentimentos de incapacidade.
De uma maneira geral as pessoas vivendo com HIV/aids
possuem suporte social disponível e satisfatório (PEDRO-
SA et al., 2016).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dados referentes ao crescimento da epidemia de


aids entre os adolescentes e jovens estão visíveis, saltam aos
olhos. Esta visibilidade certamente fará avançar as pesqui-
sas sobre este segmento populacional. A complexidade dos
territórios em que os sujeitos estão diretamente envolvidos
pela epidemia de HIV/aids fomenta uma multiplicidade de
métodos e ferramentas para produzir saberes que estejam
implicados à problemática.
A observância dos protocolos de cuidado e a quantifi-
cação destas vidas por si só não são capazes de aprofundar
a temática que requer articular as redes sociais (vivas) que
estes jovens vivendo com HIV/aids tecem e, ainda, dos pro-
fissionais de saúde, familiares e amigos. Para a construção
dessas redes sociais é preciso vivenciar o cotidiano comum

318
destes sujeitos e compreender os processos de subjetivação
para, a partir deste material, produzido coletivamente, pro-
por estratégias de construção de políticas públicas, afinadas
com a vida ordinária de cada sujeito entranhado neste ter-
ritório vivo.
As pistas para uma futura pesquisa são: a) mapear a
rede de apoio social dos jovens HSH de 15 a 24 anos que
vivem com HIV/aids; b) conhecer os tipos de apoio presta-
dos pelos membros praticantes dessa rede aos pacientes em
tratamento nos SAE; c) analisar as relações que os usuários
do serviço estabelecem com os profissionais de saúde, seus
familiares e demais cuidadores; d) identificar as relações de
força e os processos de subjetivação dos sujeitos componen-
tes das redes sociais de apoio.
Estas pistas, no entanto, não se referem a uma prescri-
ção. A temática é complexa e articula uma multiplicidade
de elementos. As pesquisas podem se orientar pela trans-
diciplinaridade, sorver o que for potente das diversas tradi-
ções do conhecimento. A Saúde Coletiva, a Sociologia e a
Filosofia da Diferença possuem ferramentas que podem nos
ajudar a pensar o fenômeno do recrudescimento da epide-
mia de HIV/aids entre adolescentes e jovens e esta é nossa
provocação para disparar processos que escapem do proces-
so normalizador e de medicalização.

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324
CAPÍTULO 14

ASPECTOS DO ENVELHECIMENTO E A RELAÇÃO


COM A SÍNDROME DA FRAGILIDADE.

Cíntia Lira Borges Pedrosa


José Wellington de Oliveira

INTRODUÇÃO

O fenômeno do envelhecimento atinge os países de-


senvolvidos e em desenvolvimento em âmbito mundial. As-
sim, envelhecer não é mais um privilégio, mas uma realida-
de vivenciada e em constante modificação, principalmente
no que tange as questões relacionadas à saúde pública. Nes-
se prisma, estudiosos e outros profissionais dessa área tem
reunido esforços para debater e enfrentar esse novo desafio.
Dados estatísticos tem mostrado que a proporção de
pessoas com 60 anos ou mais aumentou de 8% (200 mi-
lhões) em 1950 para 11% (760 milhões) em 2011, podendo
chegar em 22% (2 bilhões) em 2050. Entre 2010 e 2050, a
população total terá um aumento de 2 bilhões, enquanto
que a população idosa aumentará em 1,3 bilhão (WORLD
ECONOMIC FORUM, 2012). Isso denota um cresci-
mento acelerado e progressivo, o qual merece atenção da
comunidade geriátrica, gerontológica, da sociedade civil e
do Estado.

325
O Brasil, não diferente de outros países, passa por uma
transição de sua estrutura demográfica e epidemiológica.
Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), uma criança nascida no ano de 1960 alcançaria vi-
ver em média 48 anos. Em meio século, esse valor sofreu um
acréscimo de 25,4 anos, atingindo 73,4 anos em 2010. Além
disso, o número médio de filhos de uma mulher no ano de
1960 era de 6,3 filhos, passando para 1,9 filho em 2010 e
2011 (IBGE, 2012; IBGE, 2012a). Essa mudança de perfil
demográfico marca um declínio dos níveis de mortalidade,
de fecundidade e o aumento da expectativa de vida.
A partir da Pesquisa Nacional por Amostra de Domi-
cílios (PNAD) realizada em 2011, a população brasileira
era constituída de 195.243.000 pessoas, destas 23.536.000
eram idosos, o que correspondia a uma taxa 12,1% (IBGE,
2011). Em 2012, os idosos passaram a representar 12,6%
da população do país (IBGE, 2013). Destaca-se que o índi-
ce de envelhecimento é calculado pela razão entre o grupo
de idosos (idade igual ou superior a 60 anos) e o grupo de
jovens menores de 15 anos, sendo a população considerada
envelhecida quando a razão é maior que 1, ou seja, quan-
do o número de jovens for menor que o de idosos (IBGE,
2010; MOREIRA, 1998). O cálculo do índice de envelhe-
cimento, em 2012, (porcentagem de idosos: 12,6% / por-
centagem de jovens <15 anos: 22,9%) (IBGE, 2013), re-
sulta em 0,55%, o que ainda não caracteriza o país como
envelhecido, apesar do rápido crescimento desse contingen-
te populacional.
Em 2050, o Brasil terá, aproximadamente, 30% de sua
população constituída de pessoas com idade igual ou maior

326
de 60 anos, superando o crescimento de países como os Es-
tados Unidos da América e a Índia (WORLD ECONO-
MIC FORUM, 2012). Destaca-se que enquanto um país
desenvolvido como a França demorou mais de um século
para aumentar a proporção de idosos de 7% para 14%, o
Brasil, a China e a Tailândia conseguiram em cerca de 20
anos (WHO, 2012).
Concomitantemente a esta transição demográfica, es-
tão as mudanças epidemiológicas relacionadas ao aumen-
to da prevalência das doenças crônicas degenerativas não
transmissíveis, responsáveis pelas mortes precoces, que são,
principalmente, as doenças cardíacas isquêmicas e cerebro-
vasculares e a doença pulmonar obstrutiva crônica, além das
doenças geradoras de incapacidades na velhice, relacionadas
à diminuição da visão ou cegueira, às demências, à hipoa-
cusia, às osteoartrites, à depressão, entre outros (WHO,
2012).
Várias definições têm sido elaboradas acerca do en-
velhecimento. A Organização Mundial de Saúde (OMS),
por exemplo, define como sendo um processo fisiológico
que começa na concepção e ocasiona mudanças, caracterís-
ticas para a espécie humana, durante todo o ciclo da vida,
com consequências múltiplas e distintas para cada indivíduo
(OMS, 1974). Além disso, pode ser compreendido como
um processo natural, que em condições normais, fisiológi-
cas, é chamado de senescência, e na presença de doenças,
acidentes e estresse emocional, é denominado senilidade
e requer assistência (BRASIL, 2010). Algumas condições
anormais contribuem para o estado de senilidade e favore-
cem o comprometimento da autonomia e independência da

327
pessoa idosa. Entre elas, estão as incapacidades, os declínios
na capacidade e no desempenho funcional, as quedas e as
internações frequentes, a institucionalização, os déficits cog-
nitivos, a depressão e, consequentemente, as fragilidades.
Todas as adversidades citadas corroboram para o au-
mento da demanda por serviços de saúde exigindo mais
competência e habilidades dos profissionais, como tam-
bém mais organização e especialidades para atender esse
contingente que está em constante crescimento. No entan-
to, muitos países emergentes, como o Brasil, Chile, Tai-
lândia, México, China, entre outros, não estão preparados
para atender essa nova mudança.
Todavia, a preocupação, em escala mundial, volta-se
para uma síndrome que atinge a população idosa em largo
espectro, a síndrome da fragilidade. Esse distúrbio comple-
xo apresenta riscos elevados para desfechos clínicos diversos,
tais como: dependência, institucionalização, quedas, piora
do quadro de doenças crônicas, doenças agudas, hospitali-
zação, lenta ou ausente recuperação de um quadro clínico
e morte; aspectos estes que caracterizam os idosos frágeis
(BERGMAN et al., 2004; FABRICIO-WEHBE, 2008;
KARUNANANTHAN et al., 2009; FRIED et al., 2010).
A literatura sobre fragilidade está cada vez mais abran-
gente em âmbito mundial. O alerta deve ser feito para o
aumento das produções brasileiras, uma vez que, em 2050,
o Brasil terá 64 milhões de pessoas idosas (UNITED NA-
TIONS, 2009) e, consequentemente, maior probabilidade
destas desenvolverem fragilidades, bem como o sistema de
saúde, do nível primário ao terciário, não está preparado

328
para lidar com este fenômeno. Assegurar assistência ao
idoso frágil requer planejamento em saúde, políticas pú-
blicas e uma equipe multi e interdisciplinar.
A identificação dessa síndrome tem sido aprimorada
pela elaboração de instrumentos que incluem aspectos e fa-
tores de risco associados à fragilidade. No Brasil, os estudos
têm sido realizados detectando a fragilidade por meio do
fenótipo apresentado por Fried et al. (2001), como no es-
tudo da REDE FIBRA (Fragilidade em Idosos Brasileiros)
e SABE (Saúde, bem-estar e envelhecimento), e por in-
termédio da escala de fragilidade de Edmonton (EFE) que
já foi traduzida, adaptada e validada para o Brasil por Fa-
bricio-Whebe (2008). Mais recentemente pelos instrumen-
tos Tilburg Frailty Indicator (TFI) (SANTIAGO, 2012),
Kihon Checklist (SAMPAIO et al., 2013) e Groningen
Frailty Indicator (GFI) (BORGES, 2013).
Assim sendo, a aplicação de uma escala para detecção
de fragilidades pode contribuir para postergar os danos da
velhice e da síndrome, possibilitando melhor assistência em
saúde, qualidade de vida, envelhecimento ativo e elaboração
de políticas públicas específicas para idosos frágeis ou em
estado de fragilização.

DESENVOLVIMENTO

O desenvolvimento desse trabalho está dividido em


dois tópicos que abordam questões relacionadas aos fatores
físicos, sociais, psicológicos e emocionais que envolvem a
síndrome da fragilidade e as intervenções na área da saúde.

329
Fatores associados a atividades de vida diária e
problemas de saúde em idosos frágeis

Discutir esses fatores é pensar em incapacidades e de-


ficiências que podem gerar resultados negativos em saúde,
como comorbidades, internações frequentes e prolongadas,
complicações iatrogênicas, declínio funcional e institucio-
nalização (BRASIL, 2010; FRIED et al., 2001; FABRI-
CIO-WHEBE, 2008; DRUBBEL et al., 2013; ROCK-
WOOD et al., 1994; ANDELA et al., 2010).
No contexto de problemas de saúde, é necessário rela-
cionar comorbidades, a qual se constitui de fator crucial que
acompanhado da fragilidade contribui para maiores índi-
ces de mortalidade. De maneira geral, a maioria dos idosos
frágeis possui alguma comorbidade (WILHELM-LEEN
et al., 2013; FRIED et al., 2001; MURAD; KITZMAN,
2012; WEISS, 2011; HILMER et al., 2009).
Porém, não é regra que ambas estejam correlacionadas
(WEISS, 2011); é certo que são manifestações clínicas de
dois processos distintos relacionados ao envelhecimento,
estando associadas com a diminuição de reservas fisiológi-
cas e com o acúmulo de processos patológicos (MURAD;
KITZMAN, 2012). A fragilidade é menos prevalente do
que a comorbidade (WEISS, 2011), no entanto, quando
se sobrepõem levam ao comprometimento da qualidade
de vida e do estado funcional, resultando em incapacida-
de, hospitalização, institucionalização e, eventualmente, a
morte (MURAD; KITZMAN, 2012). A prevalência de
doenças crônicas é o dobro em mulheres mais velhas e frá-
geis (WEISS, 2011), e os idosos frágeis portadores de mais

330
de uma comorbidade tem maior risco de mortalidade (WI-
LHELM-LEEN et al., 2013).
Atenta-se para quanto mais precoce for a prevenção,
com exames de rotina e consultas anuais para checar as
condições de saúde, bem como assumir um estilo de vida
saudável desde criança e jovem, mais eficaz será o controle
e a identificação dos fatores de risco ao longo do curso de
vida e, mais provavelmente, será evitado ou postergado o
surgimento de comorbidades e fragilidades.
Para o controle dessas afecções crônicas, muitas vezes,
é necessário o uso intensivo de medicamentos. O organismo
ao envelhecer padece de inúmeras alterações morfológicas e
funcionais que afetam vários sistemas. Uma das consequên-
cias desse processo são as modificações na farmacodinâmica
e farmacocinética, o que gera ajustes na posologia e dosa-
gem dos fármacos, além do monitoramento contínuo das
dosagens séricas e seus metabólitos, enzimas, entre outros
(OLIVEIRA, 2008).
Existem muitas evidências que identificam forte rela-
ção entre o consumo de medicamentos e a fragilidade entre
idosos. Os estudos se referem, principalmente, ao consumo
exacerbado de medicamentos, ou polifarmácia, por idosos
severamente mais frágeis (FOCHAT et al., 2011; OLI-
VEIRA et al., 2009; VIEIRA et al., 2013; HILMER et
al., 2009).
Em um estudo realizado na Holanda, em dois hospi-
tais nas enfermarias de traumatologia, pneumologia e reu-
matologia, nas clínicas de cuidados intensivos e cirúrgicos e
no centro geriátrico, identificou-se que a fragilidade variou

331
conforme a situação e o diagnóstico clínico, sendo mais pre-
valente em ordem crescente no centro geriátrico (100%),
na clínica de medicina interna (80%), na clínica cirúrgica
(70%), na enfermaria de pneumologia/reumatologia (70%)
e traumatologia (50%) (ANDELA et al., 2010). Destaca-se
que nas alas de traumatologia, reumatologia/pneumologia e
ala cirúrgica a ingestão de quatro ou mais tipos diferentes
de medicamentos foi positiva para a maior parte dos ido-
sos frágeis (ANDELA et al., 2010), denotando a tendência
do uso exacerbado de medicamentos na faixa etária idosa,
principalmente, quando na presença de condições agudas e
crônicas em saúde.
Do contrário, a subprescrição, que consiste na omis-
são da terapia farmacológica indicada para o tratamento ou
prevenção de uma doença ou condição, tem se tornado cada
vez mais comum (CHERUHINI et al., 2012). Esta é mar-
cada pelo medo de prescrever determinadas medicações,
pela prática da subdose ou da prescrição de quantidades
inferiores de medicamentos, acarretando danos e até mes-
mo a morte do idoso por falhas. Isso se deve à maior sus-
ceptibilidade dos idosos apresentarem reações adversas com
flutuações dos níveis séricos das drogas quando comparados
com pacientes mais jovens, tornando-se difícil a prática de
prescrever (CHERUHINI et al., 2012). Supõe-se que isso
decorre da falta de atualização, conhecimento e experiência
clínica de alguns profissionais médicos na área.
Exemplo de subprescrição ocorreu em um estudo, nos
Estados Unidos, com idosos frágeis portadores de fibrila-
ção atrial sem valvulopatia, onde se analisou a utilização da
terapia de antiagregação com ácido acetilsalicílico em com-

332
paração com terapia de anticoagulação com varfarina e a
prevenção de desfechos isquêmicos (GAGE et al., 2000).
Foi constatado que somente 57% (327) dos pacientes fo-
ram beneficiados com a terapia de anticoagulação, o res-
tante não recebeu tal terapia, evidenciando a subutilização
da droga ao medo empírico do aumento da frequência de
eventos hemorrágicos, o que poderia ser catastrófico nesta
população. No entanto, é sabido que existem critérios bem
definidos para terapia de anticoagulação e que os benefícios
são extraordinários. Nesse mesmo estudo, foi confirmada
a redução do risco relativo para acidente vascular cerebral,
acidente isquêmico transitório e infarto agudo do miocár-
dio em 24% dos pacientes que receberam varfarina e em
5% dos que receberam ácido acetilsalicílico (GAGE et al.,
2000). Mais uma vez, corrobora-se que tanto a subprescri-
ção quanto a polifarmácia facilitam a presença de desfechos
desfavoráveis nesta população.
De toda forma, a abordagem de fármacos para evi-
tar danos da fragilidade tem se estendido com a finalidade
de ampliar o tratamento e a recuperação de idosos frágeis.
Assim, múltiplas medicações podem ser necessárias em
muitas ocasiões, no entanto, a farmacoterapia precisa ser
supervisionada no intuito de controlar eventos adversos,
redundâncias terapêuticas, interações medicamentosas, ia-
trogenias, internações e gastos desnecessários (OLIVEIRA
et al., 2009).
A supervisão precisa ser redobrada no caso da fragi-
lidade, pois uma terapia com diuréticos em idosos frágeis,
por exemplo, pode gerar facilmente incontinência urinária,
desequilíbrio eletrolítico, progressão da disfunção renal, de-

333
lirium e quedas; assim como a terapia com vasodilatadores
pode ocasionar mais facilmente a hipotensão ortostática
(WILHELM-LEEN et al., 2013).
Por outro lado, os tratamentos disponíveis para fragili-
dade que utilizam antagonistas do TNF-ɑ (fator de necrose
tumoral-alfa), como um agente antirreumático, podem re-
duzir efetivamente os sintomas sistêmicos de artrite reuma-
toide, semelhantes aos observados na fragilidade, incluindo
fraqueza e fadiga (CRISCIONE; CLAIR, 2002).
A utilização de reposição hormonal, por exemplo, pode
ser uma intervenção para melhorar massa muscular, força e
circulação, apesar de não ter eficácia testada e, somente, ser
prescrita quando na presença de deficiências clínicas (KO,
2011). Vários estudos têm demonstrado que a reposição
com testosterona, também, pode causar a hipertrofia mus-
cular e aumentar massa magra e resistência (SATTLER et
al., 2009), porém exerce efeitos negativos associados a hi-
pertrofia da próstata e hiperlipidemia (KO, 2011).
Além disso, sabe-se que a reposição de vitamina D
tem efeito protetor sobre a massa óssea, aumenta a força e a
função muscular, evitando quedas e fraturas de quadril (SA-
RAIVA et al., 2007; BISCHOFF-FERRARI et al., 2009),
entretanto não há eficácia no âmbito da fragilidade. Ape-
sar disso, um estudo realizado nos Estados Unidos, com
idosos com idade >60 anos, concluiu que as concentrações
de vitamina D eram bem menores em participantes frágeis
do que nos pré-frágeis e não frágeis. Os idosos com baixas
concentrações da vitamina apresentavam 1,97% de chance
de serem frágeis e 1,57% de serem pré-frágeis. O estudo
mostrou, também, que os idosos não frágeis com baixos ní-

334
veis de Vitamina D tinham 1,25% mais chances de morte
(SMIT et al., 2012).
Do mesmo modo, a administração de GH (hormônio
do crescimento) para idosos com níveis baixos de IGF-1
(fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1) aumenta
a massa muscular e a densidade mineral óssea, porém ainda
tem efeito desconhecido no que diz respeito à fragilidade
(SAVINE; SONKSEN, 2000).
Uma das características definidoras da síndrome é a
perda de peso não intencional, principalmente, após os 70
anos de idade (FRIED et al., 2001; XUE, 2011; FABRI-
CIO-WEHBE, 2008). Entretanto, estudos recentes tem
classificado a obesidade associada à deficiência e a compo-
nentes que aceleram fatores inflamatórios e possuem baixa
capacidade antioxidante (HUBBARD et al., 2010).
O cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC > 29 kg/
m2), e a medida da circunferência abdominal (102cm para
homens/ 88cm para mulheres), mesmo para aqueles idosos
com baixo peso, mas que apresentam obesidade central, são
importantes marcadores da presença de fragilidade e cri-
tério para a síndrome metabólica, favorecendo desfechos
clínicos cardiovasculares. Isso remete a viabilidade de dietas
e exercícios para idosos frágeis e não frágeis. Assim, tanto a
desnutrição quanto a obesidade devem ser vistas como po-
tenciais marcadores ou sinais de fragilidade (TOPINKO-
VÁ, 2008).
A partir dos 50 anos de idade, ocorre um declínio pro-
gressivo do nível de força e perda muscular, caracterizando
a sarcopenia (CORNEL, 2012). Somado a isto, o resultado
do modo de vida do indivíduo quando mais jovem, marcado

335
por sedentarismo e inadequados hábitos alimentares, pode
acarretar baixo desempenho funcional, fraqueza (XUE,
2011), incapacidades, deficiências e fragilidades.
A causa da fragilidade em idosos não depende, somen-
te, da idade biológica (SCHUURMANS et al., 2004), mas
de mudanças associadas a doenças neuromusculares, en-
dócrinas e de fatores inflamatórios que podem contribuir,
de forma independente da idade, para a vulnerabilidade e
negativos resultados de saúde em idosos (KO, 2011). Essas
mudanças estão intimamente associadas a hábitos de vida
de risco que aceleram o desgaste físico e o surgimento pre-
coce de comorbidades, cooperando para pior qualidade de
vida na velhice.
Todavia, a literatura científica sobre intervenções em
idosos frágeis, refere que o treinamento físico regular me-
lhora a força muscular, a capacidade aeróbica, o equilí-
brio, a mobilidade e reduz quedas em idosos (CHIN et al.,
1999), além de melhoria no desempenho das atividades de
vida diária, adiamento de deficiências (LIU; FIELDING,
2011) e reduções de mediadores inflamatórios (NICKLAS;
BRINKLEY, 2009). Portanto, a atividade física ou o exercí-
cio regular podem ser propostos como estratégia preventiva
para fragilidade e seus efeitos adversos, exercendo duas fun-
ções principais: aumento do consumo máximo de oxigênio
e aumento da massa muscular (LIU; FIELDING, 2011).
Uma revisão sistemática que avaliou 23 tipos diferentes
de programas de treinamento físico para idosos encontrou
que 14 desses estudos demonstraram um efeito benéfico do
exercício sobre o desempenho funcional em idosos propen-
sos à fragilidade, porém 5 estudos não mostraram um bene-

336
fício significativo de exercício em uma população altamente
frágil, sugerindo que o grau de fragilidade pode influen-
ciar na eficácia dos programas de exercícios (CHIN et al.,
1999). Logo, o treinamento físico melhora o desempenho
funcional, a qualidade de vida, a saúde emocional e previne
quedas em pacientes frágeis; embora as evidências sugiram
que um planejamento de exercícios para idosos mais frágeis
e gravemente debilitados pode ser limitado (KO, 2011).
A suplementação protéico-energética, sobretudo, em
idosos frágeis com situação socioeconômica baixa, também,
pode reduzir a progressão do declínio funcional, podendo
proporcionar aumento da capacidade fisiológica e do de-
sempenho funcional (KIM; LEE, 2012). Apesar disso, os
pacientes frágeis podem ter acesso limitado a alimentos
saudáveis, ao acompanhamento médico, principalmen-
te, nos países em desenvolvimento; bem como são menos
propensos a aderir a dietas e ao tratamento medicamento-
so, reduzindo a gestão de determinadas comorbidades, e,
consequentemente, propiciando o avanço da gravidade da
fragilidade (WILHELM-LEEN et al., 2013).
Outro aspecto importante que tem relação significa-
tiva com a fragilidade é a acuidade visual diminuída. Na
velhice, ocorre a diminuição dos números de sensores pro-
prioceptivos nos músculos oculares, menos luz é transmi-
tida à retina, surge a presbiopia, a perda do campo visual,
a alteração da visão periférica, diminuindo as sensações de
posição e corpo no espaço (ALFIERI; MORAES, 2008),
propiciando a perda do equilíbrio e da coordenação e em
quedas. Nos idosos frágeis a perda da visão corresponde ao
declínio funcional, dependência e perda de autonomia. A

337
detecção precoce por meio de encaminhamentos para con-
sultas oftalmológicas e o uso de lentes corretivas, pode re-
duzir esses efeitos adversos.
Inúmeras são as estratégias de aplicação para redução
de danos em idosos portadores de acuidade visual diminuí-
da, entre elas pode-se citar a adaptação ao ambiente como
forma de minimizar o declínio da capacidade e desempenho
funcional e a ocorrência de quedas. Um estudo realizado na
China comprovou que a deficiência visual não era o princi-
pal fator para piora da qualidade de vida, mas sim a adap-
tação psicossocial e ambiental (WANG; CHAN, 2009).
Portanto, adaptações realizadas no ambiente, como a aco-
modação de gêneros alimentícios e objetos de uso diário em
locais de fácil acesso, a ausência de escadas e banquinhos, a
orientação para reorganização do ambiente interno com o
consentimento do idoso e da família, a iluminação adequa-
da, a colocação de corrimãos bilaterais para apoio, a retirada
de tapetes, a colocação de pisos antiderrapantes e barras de
apoio nos banheiros, o uso de banheiras, o banho de assen-
to, quando na presença da instabilidade postural (BRASIL,
2010), o suporte da família e do cuidador, a fortificação da
relação com os vizinhos e a rede de apoio local, são medidas
que beneficiam a adaptação do idoso a nova condição do
déficit visual e ao ambiente.
A acuidade auditiva diminuída e a sua influência sobre
as atividades de vida diária do idoso, é outra variável depen-
dente de fragilidade (NOGUEIRA et al., 2012) e de baixo
desempenho funcional (VERAS et al., 2007). A perda da
audição está relacionada à percepção comprometida de sons
de alta, média e baixa intensidade, levando a uma reduzi-

338
da compreensão dos vários sons do meio ambiente (NO-
GUEIRA et al., 2012). É comum na velhice a presbiacusia,
classificada como a perda progressiva da capacidade de di-
ferenciar sons de alta frequência (BRASIL, 2010). Essas
alterações podem gerar sentimentos de ansiedade, angústia,
instabilidade, isolamento social e depressão (MILLS, 2003;
NOGUEIRA et al., 2012).
O uso de órteses e técnicas de reabilitação podem so-
lucionar parcialmente o problema de déficits auditivos na-
queles indivíduos que se beneficiarem com a terapia. Entre-
tanto, muitos não têm acesso a esse tipo de tecnologia e não
fazem uso, seja pelo preconceito, alto custo, dificuldade de
lidar com os controles e pelo pequeno benefício em locais
ruidosos (MILLS, 2003).
Déficit cognitivo e fragilidade caminham lado a lado
como mostrado em muitos estudos (FERREIRA, 2011;
JACOBS et al., 2011; AVILA-FUNES et al., 2009; BI-
LOTTAAB et al., 2012; NERI et al., 2013). O déficit cog-
nitivo pode manifestar-se durante a velhice com início e
progressões inerentes a cada individuo, relacionando-se às
perdas biológicas nesse período (FERREIRA, 2011). Estu-
dos afirmam que a cognição evolui conforme o aumento da
idade (FERREIRA, 2011), e está diretamente relacionado
à fragilidade (HILMER et al., 2009). Além disso, os in-
divíduos frágeis com comprometimento cognitivo apresen-
tam maiores taxas de mortalidade (JACOBS et al., 2011;
AVILA-FUNES et al., 2009).
As principais causas de declínio cognitivo são as de-
mências. Um estudo com 109 idosos diagnosticados com
a Doença de Alzheirmer (DA), na Itália, confirmou que os

339
mais frágeis possuíam mais comorbidades, níveis mais ele-
vados de declínio cognitivo, dependência para as atividades
de vida diária; e que a idade avançada e o declínio cogniti-
vo isoladamente aumentam a ocorrência da síndrome (BI-
LOTTAAB et al., 2012).
Sabe-se que a DA e a fragilidade partilham algumas
etiologias comuns, preveem resultados semelhantes e têm
muitas características clínicas que se sobrepõem. Por exem-
plo, a fragilidade torna-se mais comum com o aumento da
idade assim como na DA. Biomarcadores como intolerân-
cia à glicose, aumento de Proteína C Reativa e baixos níveis
de Vitamina D também são vistos nas duas afecções. Assim,
infere-se que a fragilidade e DA são vias finais comuns re-
sultantes de exposições cumulativas ao longo de vários anos
a fatores adversos, muitos deles compartilhados (SAMP-
SON et al., 2012).
Diversos são os instrumentos tecnológicos para ras-
treamento cognitivo em idosos. Um deles é o Mini Mental
(MEEM). Inúmeras pesquisas que envolvem a síndrome o
utilizaram como referência para a validade de constructo de
escalas de fragilidade, comprovando a relação do declínio
cognitivo e da fragilidade (MACUCO et al., 2012; JA-
COBS et al., 2011; AVILA-FUNES et al., 2009).
A prova ou teste de fluência verbal também fornece
dados acerca da capacidade cognitiva do indivíduo idoso.
Esse teste prevê o armazenamento do sistema de memória
semântica, da habilidade de recuperar a informação guarda-
da na memória e do processamento das funções executivas,
especialmente, aquelas associadas a capacidade de organi-
zar o pensamento e as estratégias utilizadas para a busca

340
de palavras (BRUCKI et al., 1997; RODRIGUES; YA-
MASHITA; CHIAPPETTA, 2008). A velocidade psico-
motora é outro fator cognitivo importante no exercício da
fluência. Pessoas com lentificação do raciocínio podem não
obter bom desempenho na prova, sem que, no entanto, haja
prejuízo no processo de resgate léxico e semântico (RO-
DRIGUES; YAMASHITA; CHIAPPETTA, 2008).
Outro método de rastreio cognitivo seria o Teste do
Relógio, que está presente na Escala de Fragilidade de Ed-
monton (EFE), como medida para o domínio cognitivo. É
um teste neuropsicológico, com ênfase na detecção de de-
mências; é de fácil aplicação e demanda pouco tempo para
execução (ATALAIA-SILVA; LOURENÇO, 2008). No
Brasil, porém, dificuldade foi notada para sua aplicação
no estudo de Fabricio-Wehbe (2008) com idosos frágeis
e não frágeis, em Ribeirão Preto. Observou-se que a apli-
cação obteve uma alta sensibilidade e baixa especificidade,
ou seja, exigiu no mínimo conhecimento dos números, po-
rém, na realidade brasileira, o índice de escolaridade dos
idosos é deficitário, o que resulta no baixo desempenho do
teste (FABRICIO-WEHBE et al., 2009). Outra pesqui-
sa verificou que o teste é confiável, porém não válido para
rastreio de demência em idosos com quatro ou menos anos
de escolaridade formal (LOURENÇO et al., 2008), justifi-
cando, mais uma vez, a cautela na aplicabilidade desse teste
no Brasil.
É importante citar que a escolaridade no caso do Bra-
sil, influencia no declínio da cognição dos idosos pesqui-
sados, uma vez que é marcada por baixos níveis educacio-
nais. Para se ter uma ideia no país, a maior incidência de

341
analfabetismo está presente na região Nordeste (17,4%),
entre homens com idade acima de 65 anos (27,2%) (IBGE,
2013). Os resultados confirmam a insuficiência da educação
nessa região, principalmente, para as pessoas com mais de
55 anos de idade, apontando para o progressivo aumento
da população idosa analfabeta a qual não teve facilidade de
acesso enquanto jovens, e, na velhice, adquirem obstácu-
los e limitações que impedem a continuação do processo
de aprendizado nas escolas, como barreiras físicas, mentais,
comorbidades e falta de estímulo.
É relevante notar, diante da escolaridade dos idosos
brasileiros, que o processo de tradução e adaptação trans-
cultural de escalas envolve questões relacionadas à cultura
local e ao dinamismo da população, tendo que se levar em
consideração cada aspecto associado à regionalidade. Outro
ponto é verificar detalhes do local de origem da escala e pre-
vê se o desfecho terá validade em outro contexto. No caso
da educação, por exemplo, observar se em uma população
com baixa escolaridade, a aplicação da escala poderá gerar
resultados falsos positivos, e, em outra, com alto nível de
escolaridade, resultados falsos negativos.
No Brasil, o crescente aumento de idosos incapaci-
tados e fragilizados é um importante fator de risco para a
institucionalização (CREUTZBERG et al., 2007). Essa
realidade é também vivenciada em outros países. Em uma
pesquisa na Austrália, por exemplo, 94% dos idosos que mo-
ravam em lares para idosos (“nursing homes”) eram frágeis,
bem como, na Holanda, 77¨% dos idosos frágeis residiam
em instituições, enquanto 46% na comunidade (PETERS
et al., 2012). Esses dados fortalecem a institucionalização

342
como desfecho clínico da fragilidade (FRIED et al., 2001;
FABRICIO-WEHBE, 2008; BERGMAN et al., 2004;
BORGES et al., 2013a), reforçando a ideia de que os ido-
sos institucionalizados estão mais propensos à fragilidade
do que os idosos da comunidade
Seja qual for o ambiente de assistência ao idoso a in-
tenção é evitar baixa autoestima e estimular a independên-
cia. No caso dos idosos frágeis, é possível evitar todos esses
sentimentos negativos identificando precocemente a sín-
drome de uma maneira adequada, direta e prática para guiar
estratégias de cuidado por toda a equipe multiprofissional.
Nos fatores atividade de vida diária e problemas de
saúde, pode-se determinar prioridades de atendimento par-
tindo de um plano de cuidados que inclua estratégias pre-
ventivas, serviços de apoio e gestão de medicamentos, enca-
minhamentos e trabalho multiprofissional para melhora do
equilíbrio, da marcha, da resistência, da força e do exercício,
avaliação da desnutrição, reconhecimento e gestão da de-
pressão, avaliação da dor, do quadro de imunizações, pre-
venção de quedas e lesões, controle e segurança ambiental.
Dessa forma, é premente a necessidade de interven-
ções eficazes em saúde pública com idosos residentes da
comunidade e institucionalizados, promovendo indepen-
dência para as atividades de vida diária, prevenção de inca-
pacidades, manutenção da qualidade de vida, redução dos
custos em saúde, evitando cuidados institucionais e hospi-
talizações, de maneira multifatorial e multidisciplinar. É
interessante detectar e classificar os idosos aparentemente
vulneráveis para o controle preventivo e substancial da sín-
drome. Isso pode ser feito aplicando mais de uma escala de

343
fragilidade para uma triagem mais criteriosa e adequada, e
uma avaliação clínica ampla, após triagem preliminar, re-
duzindo resultados falsos positivos para a síndrome (DA-
NIELS et al., 2012).

O funcionamento psicossocial e a relação com a


síndrome da fragilidade

Inicialmente, a fragilidade era abordada, exclusiva-


mente, considerando os aspectos físicos (FRIED et al.,
2001), posteriormente, vários estudos surgiram explorando,
cada vez mais, os fatores sociais e psicológicos, encontran-
do correlações íntimas entre esses domínios e a fragilidade,
concedendo um caráter multidimensional e multicomplexo
à síndrome (BERGMAN et al., 2007; DE WITTE et al.,
2013; GOBBENS et al., 2012).
Nota-se que o aspecto físico, apesar de possuir alta
sensibilidade e especificidade para fragilidade, não é sufi-
ciente para predizer a magnitude dos agravos causados à
saúde do idoso. Além disso, é preciso identificar aspectos
sociais e psicológicos que podem causar alterações humor
e na interação social. Isso pode ser fortalecido pelas evi-
dências na literatura quanto à interrelação entre fragilida-
de, depressão e baixa qualidade de vida, o que compromete
as relações com a sociedade e contribui para desequilíbrios
psicológicos e emocionais (KIELY; CUPPLES; LIPSITZ,
2009; MEZUK et al., 2013).
Nesse contexto, a família e o suporte informal de
redes sociais de apoio são fundamentais quando a pessoa

344
idosa torna-se doente e funcionalmente dependente, sen-
do cruciais para o bem-estar dos idosos, particularmente
para aqueles com médio e alto nível de dependência; se esse
suporte não existir, a perda da capacidade funcional pode
significar institucionalização e dependência dos sistemas
formais de apoio (DUARTE et al., 2010).
O apoio social pode ser definido como a existência
ou a quantidade de relações sociais ou a existência de um
tipo de relação em particular, como: casamento, amizade
ou grupos; além disso, pode ser apontado como estrutura
das relações sociais de uma pessoa e, outras vezes, denota o
conteúdo funcional das relações, tal como o grau em que as
relações envolvem afeto ou preocupação emocional, ajuda
instrumental ou tangível ou apoio informacional (ALMEI-
DA et al., 2007).
Várias hipóteses podem ser levantadas no que diz res-
peito à forma pela qual o apoio social favoreceria e influen-
ciaria o estado de saúde do indivíduo (ALMEIDA et al.,
2007), por exemplo: se o apoio social for inadequado pode
ocorrer uma diminuição na saúde e bem-estar, um aumento
das morbidades, dos problemas psicológicos e do número
de mortalidades (BRASIL, 2010).
A Constituição Federal de 1988, a Política Nacional
do Idoso e o Estatuto do idoso, enfatizam que a família é
a principal responsável pelo cuidado do idoso, no entanto a
mudança no padrão dos arranjos familiares e na nupcialida-
de, a entrada constante de mulheres no mercado de traba-
lho, a instabilidade das relações conjugais (CAMARANO,
2007). Além disso, as perdas, as limitações físicas, as in-
capacidades, as dependências físicas e cognitivas próprias

345
da velhice, a sobrecarga de cuidados por parte da família e
a falta de recursos econômicos geram conflitos dentro da
família a qual, muitas vezes, abre mão do idoso e resolve
institucionalizá-lo (SILVA et al., 2009).
O distanciamento entre o idoso e sua família torna-
se muito maior quando este faz parte de uma instituição
de longa permanência, ainda mais quando a própria família
o rejeita. A institucionalização provém de fatores que su-
gerem abandono familiar, exclusão e isolamento social, su-
cateamento progressivo do sistema de saúde, característica
moderna de valorização da razão e do lucro em detrimento
do humano (SILVA et al, 2011). Porém, se a instituição
possuir um ambiente coberto de amor, paz, solidariedade e
cuidar devidamente da saúde e do emocional do idoso, ela
passa a ser um local de acolhimento, possibilitando benefí-
cios para a vida deste.
Destaca-se que os idosos mais afetados pela síndrome
são os solteiros e viúvos (OLIVEIRA et al., 2013; VIEIRA
et al., 2013). A situação conjugal do idoso se aproxima da rea-
lidade da fragilidade já que a falta de um companheiro pode
propiciar tristeza e solidão na velhice (ALVES, 2007), senti-
mentos que estão intimamente relacionados com a síndrome.
Estudo do Serviço Social do Comércio (SESC) relata
que as esposas são apontadas como as que mais dão atenção
aos seus maridos, ainda reforça que o casamento e os filhos
são a garantia que se tem na velhice (ALVES, 2007). Sem
esse apoio intergeracional os sintomas depressivos e de tris-
teza podem piorar ainda mais.
Velhice é uma palavra que assusta muitas pessoas se-
jam elas adultas ou propriamente idosas. Chegar nessa fase,

346
para muitos, é um martírio, uma fase quase sem vida, sem
perspectivas e esperanças. Alguns pensam que ficar “velho” é
ser abandonado, é ficar sem suporte, sem auxílio da família e
dos amigos, é sentir-se inútil, é ficar feio e lento, entrar em
depressão e morrer. Três palavras estão diretamente relacio-
nadas com estes preconceitos e mitos gerados dentro da so-
ciedade e pelo próprio idoso: gerontofobia (atitude extrema-
mente negativa e repugnante da velhice), ageísmo (atitude
discriminatória com base na idade do individuo) e infantili-
zação (atitude também discriminativa que é gerada quando
os idosos perdem sua autonomia e ficam bastante dependen-
tes) (BERGER; MAILLOUX-POIRIER, 1995).
Por conseguinte, a autopercepção boa de saúde e ní-
veis altos de resiliência da pessoa idosa proporcionam uma
maior capacidade de enfrentamento e facilidade de adapta-
ção a nova condição de vida.
A percepção de saúde é uma importante ferramenta
para o auxílio do diagnóstico de fragilidade; a autoavaliação
dos idosos sobre sua saúde contribui para o profissional co-
nhecer melhor o idoso, dar início ao diálogo e à escuta tera-
pêutica, por meio da qual poderá identificar as necessidades
e realizar intervenções. Por exemplo, muitas vezes, o idoso
ser portador de doença crônica ou fazer uso de medicamen-
tos não o faz perceber-se como um ser doente, no entanto
não conviver com a família ou com os amigos, não ter con-
dições financeiras ou lazer reduz bastante sua qualidade de
vida (PASKULIN et al., 2010).
A fragilidade exerce impacto direto sobre a vida dos
idosos, familiares, cuidadores e sociedade (BERGMAN et
al., 2007), portanto oferecer apoio incondicional e incluir

347
o idoso na sociedade são medidas que o fariam sentir mais
protegido, seguro e capaz de recorrer a diversas opções de
suporte para suas necessidades, melhorando sua condição de
vida e minimizando sentimentos de tristeza, solidão e iso-
lamento social, determinantes da síndrome da fragilidade.
Dessa forma, os profissionais de saúde devem estar
atentos para sinais de isolamento social e depressão, e, pos-
sivelmente, fragilidades, atuando para favorecer o enfrenta-
mento de situações de estresse que exercem impacto direto
na saúde mental, elaborando estratégias para minimizar
sentimentos de baixa autoestima, insatisfação, depressão,
estresse e outros efeitos negativos.

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358
CAPÍTULO 15

ABORTOS INSEGUROS: uma análise da produção


científica no Brasil.

Katherine Jerônimo Lima


Francisco Jose Maia Pinto
Ana Carolina Oliveira e Silva;
Fátima Café Ribeiro dos Santos
Fiama Kecia Silveira Téofilo
Glaucilândia Pereira Nunes

INTRODUÇÃO

O abortamento é definido como a interrupção da


gestação ocorrida antes da 22ª semana tendo o concepto
peso inferior a 500g. É classificado como espontâneo (natural),
quando há perda involuntária da gestação; ou provocado,
quando ocorre a interrupção da gestação por uma interven-
ção externa e intencional (BRASIL, 2011; BRASIL, 2012).
No Brasil, a partir da década de 70, o aborto é proble-
matizado como fator social. Iniciaram-se estudos e discus-
sões sobre sua elevada incidência, e prática clandestina rela-
cionada à pobreza (BORSARI et al, 2012; PIMENTEL &
VILELLA; 2012).
O aborto é um importante tema de discussão no cam-
po da Saúde Coletiva. É considerado grave problema de

359
saúde pública, pois representa uma importante causa de
mortalidade materna, além de suas complicações gerarem
impactos na saúde da mulher e encargos financeiros nos
serviços de saúde.
A legislação brasileira considera crime, o aborto pro-
vocado, no entanto, as mulheres interrompem uma gravidez
indesejada por meios clandestinos. Sua ilegalidade promove
a prática de abortamentos inseguros, que na maioria dos
casos, são realizados em ambientes impróprios e por pes-
soas sem habilidades necessárias, o que pode levar a sérias
consequências à saúde da mulher (DINIZ & MEDEI-
ROS, 2012; CARVALHO & PAES, 2014; ADESSE et
al, 2015; ROMIO et al, 2015). Abrange uma série de fato-
res, dentre eles: aspectos sociais, econômicos, psicológicos e
legais (DINIZ & MEDEIROS 2012; ANJOS et al, 2013;
ADESSE et al, 2015).
Souza e colaboradores (2014) citam que abortamen-
to induzido pode ser resultado de uma gestação indeseja-
da, causada por falhas das ações de planejamento familiar,
ausência de acompanhamento contínuo de profissionais de
saúde, e falta da possibilidade de opção pelo método ou pelo
medicamento mais apropriado e eficaz.
É dito inseguro, quando não cumpre as diretrizes reco-
mendadas pela Organização Mundial de Saúde. Neste caso,
pode ocorrer de dois modos: sem complicações e com com-
plicações (leves, moderadas ou graves) (OWLABI, 2014;
SEDGH et al, 2016). Em especial, os abortos inseguros com
complicações, ocasionam consequências que afetam tanto
em nível de saúde pública quanto nos direitos sexuais e re-
produtivos das mulheres (MENEZES & AQUINO, 2009).

360
A ocorrência do aborto inseguro abrange uma serie de
fatores que vão desde os aspectos sociais, econômicos, psi-
cológicos e legais (DINIZ & MEDEIROS 2012; ANJOS
et al, 2013; ADESSE et al.., 2015).
Segundo Santos; Andreoni; Silva (2012), o acesso à
realização de abortos seguros e aos métodos de contracep-
ção adequados à necessidade da mulher, proporcionarádi-
minuição do número de abortos inseguros.
Em face do contexto apresentado, observa-se que a
interrupção de uma gravidez indesejada expõe a mulher às
práticas inseguras do aborto, e consequentemente danos à
sua saúde. Estudos sobre abortamento revelam questões
importantes sobre a saúde reprodutiva da mulher, sobretu-
do os abortos inseguros, devido às implicações advindas de
sua prática e, de impactos sociais, econômicos e de saúde.
O presente estudo teve como objetivo, analisar as pro-
duções científicas sobre abortamentos inseguros no Brasil.

MÉTODOS

O estudo baseia-se no método de levantamento bi-


bliográfico da literatura, visando à identificação de pesqui-
sas publicadas e realizadas nacionalmente, nos últimos oito
anos (2008 a 2016).
Procedeu-se a busca ativa dos artigos, com utilização
dos termos “aborto inseguro”, “aborto induzido”, “aborto
ilegal”, “aborto provocado” e “abortamento”, por meio da
internet nas seguintes bases de dados: Literatura da Améri-
ca Latina e Caribe (LILACS), Scientific Electronic Library
Online (SciELO) e da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS).

361
Foram excluídos estudos que se referissem aos abortos pre-
vistos por lei, ou a interrupção da gravidez de fetos anen-
cefálicos e os temas correlatos, como também aqueles com
referência a abortos espontâneos. Além do mais, não foram
incluídas teses, dissertações e monografias, bem como
artigos não acessíveis em texto completo.
Foram encontradas 148 publicações, e selecionadas 52
artigos para apresentação do panorama dos estudos sobre
abortos inseguros no país, pois com a eliminação das du-
plicatas, chegou-se a 98. Com leitura dos resumos, foram
excluídos 46 trabalhos não correlatos com a temática.
A análise dos artigos foi categorizada pelos seguin-
tes eixos perfil sociodemográfico e econômico; magnitude
do aborto no Brasil; métodos abortivos; repercussões e os
danos emocionais; e a ilegalidade do aborto no Brasil. A
discussão e aprofundamento se deram por meio de incor-
poração de referências complementares que constava na bi-
bliografia examinada.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Após análise dos estudos, percebeu-se que o aborto in-


seguro foi pesquisado em diversos contextos. Observou-se
que mais da metade dos artigos 55,8% (n=29) apresentou
como tipo de estudo, o método quantitativo, enquanto a
metodologia qualitativa esteve presente em 33% (n=17),
proporção de revisões 5,5% (n=3) e artigos de opinião con-
sistiram em 5,5% (n=3).

362
Em relação às mulheres foram observados empecilhos
envolvendo relativos aos abortamentos induzidos, isto, por
ser uma prática ilegal no Brasil. Elas apresentaram alguma
dificuldade ao relatarem sobre a interrupção de uma gesta-
ção não desejada. A saída encontrada para resolver esta di-
ficuldade foi o exame de diferentes metodologias, que serão
vistas a seguir, a fim de serem obtidos os dados.
Destacou-se a pesquisa “Itinerários e métodos do
aborto ilegal em cinco capitais brasileiras” dos autores Di-
niz e Medeiros (2012). Os autores utilizaram em sua me-
todologia, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE) oral, pois justificaram que a concordância da parti-
cipação da pesquisa e a gravação da entrevista poderiam im-
plicar em problemas legais e éticos na condução do estudo,
já que as entrevistadas havia autoprovocado o aborto, sen-
do, portanto, considerado crime. Além disso, foi fornecida
ajuda de custo de R$ 30,00 para cada entrevistada, como
auxílio de deslocamento ao local da entrevista, pois havia
recusa de entrevista em domicilio preferindo local que lhes
garantissem privacidade.
Devido à dificuldade no relato das mulheres, tanto na
participação das entrevistas quanto no preenchimento dos
questionários envolvendo perguntas diretas sobre a indução
do aborto, foram necessários muitos estudos por meio da
metodologia indireta, usando-se dados secundários. Como
destaque, neste aspecto, foram os estudos de Adesse, Mon-
teiro e Levin (2008); Melo, Souza e Figueroa (2011); Melo
et al. (2014) e Monteiro, Adesse e Drezett (2015).
Os referidos estudos utilizaram dados secundários so-
bre abortamentos do Sistema de Informações Hospitalares

363
do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS), com a popula-
ção alvo composta por mulheres de 10 a 49 anos de idade.
Empregaram a metodologia de investigação do Instituto
Alan Guttmacher (ALAN GUTMACHER INSTITUE,
1994), que trata de estudo feito sobre o aborto, na América
Latina (1994), para estimar o número de abortos induzi-
do, fundamentado na seguinte fórmula: Número de aborto
induzidos = número de internamentos por abortamento*
(5) * (1,125) * (0,75). A equação baseia-se no fato, de que,
Brasil, 20% das mulheres que induziram o aborto tiveram
complicações necessitando de hospitalização (uma interna-
ção para cada cinco abortos). Utilizou-se a proporção de
12,5%, como fator de correção referente aos subregistros
(internações realizadas fora do SUS); e redução de 25% de
abortos por causas espontâneas (MONTEIRO; ADESSE;
DREZZET, 2015).
Sobre a produção de artigos com a temática, a Revista
Ciência e Cultura, no ano de 2012 apresentou edição sobre
abortamento em seu volume 64, número 2 e um conjunto
de artigos com as discussões acerca do tema Aborto, sob o
prisma da saúde pública. De modo semelhante, a Revista
Ciência e Saúde Coletiva expos uma edição especial com
o tema “Aborto, mulheres e saúde”, através do volume 17,
número 7, em 2012. Vale ressaltar, que o ano pesquisado
coincide com o favorecimento do direito à mulher no que
se refere à escolha de interrupção ou não da gestação, em
casos de anencefalia. Este benefício foi concedido através da
votação pelo Supremo Tribunal Federal, nos dias 11 e 12 de
abril de 2012 (ANDRADE, 2012).

364
Quem são estas mulheres: perfil sociodemográ-
fico e econômico

As investigações nacionais apontaram que predomi-


nantemente as mulheres jovens, na faixa etária de 20 a 29
anos realizaram práticas de abortamento (FUSCO; AN-
DREONI; SILVA, 2008; NADER et al., 2008; CECAT-
TI et al, 2010; DINIZ & MEDEIROS, 2010; PEREIRA
et al, 2012; BORSARI et al., 2013; SOUZA et al., 2014;
DINIZ; MEDEIROS; MADEIRO, 2017).
No entanto, observa-se que em relação à idade, algu-
mas pesquisas não apresentaram uma distribuição uniforme
das mulheres entrevistas, o que ocasionou aparentemente
uma subestimação na proporção dos dados. (SILVA; AN-
DREONI, 2012; SOUZA et al., 2014).
Outro ponto a se destacar, são os diversos estudos rea-
lizados com enfoque abortamentos e adolescência (COR-
REIA et al., 2009; CHAVES et al., 2010; CORREIA et
al., 2011; CHAVES et al., 2012; SILVA; ANDREONI,
2012a; NUNES; MADEIRO; DINIZ, 2013).
Estudo realizado em cinco capitais brasileiras apresentou
maior prevalência de abortos provocados em jovens com ida-
de menor que 19 anos, apontando que a prática do primeiro
aborto se inicia nesta faixa etária (DINIZ & MEDEIROS,
2012). Nota-se que é expressivo o número de abortos provo-
cados em adolescentes com gestação não planejada. As mu-
lheres mais jovens são mais vulneráveis à realização de aborto
ilegal, pois são sujeitas às relações afetivas instáveis, relações
sexuais desprotegidas, condição financeira incerta e baixa es-
colaridade (DINIZ & MEDEIROS, 2012; NUNES; MA-
DEIRO; DINIZ, 2013; CARVALHO & PAES, 2014)

365
No que se refere à escolaridade, os estudos apontaram
associação com o nível de estudos e abortos inseguros. Ob-
servou-se que na maioria das pesquisas, houve maior propor-
ção de mulheres que interrompeu a gestação, apresentando
poucos anos de estudo. As pesquisas também mostraram
uma maior frequência de mulheres afrodescendentes, par-
das e negras que induziram o abortamento (FUSCO; AN-
DREONI; SILVA, 2008; NADER et al., 2008; CECAT-
TI et al., 2010; DINIZ; MEDEIROS, 2010; PEREIRA
et al., 2012; BORSARI et al., 2013; SOUZA et al., 2014;
DINIZ; MEDEIROS; MADEIRO, 2017).
Sobre as condições econômicas, os estudos demons-
tram que mulheres com baixa renda, ou com dependência
financeira dos pais ou do conjugue, apresentaram maiores
chances de realizarem aborto inseguro (CECATTI et al.,
2010; FUSCO; SILVA; ANDREONI, 2012; PEREIRA
et al., 2012; BORSARI et al., 2013; ; SOUZA et al., 2014).
Segundo Cecatti e colaboradores (2010), mulheres
que vivenciam baixas condições socioeconômicas apresen-
tam dificuldades para ter acesso às informações e métodos
contraceptivos adequados; assim, recorrem ao abortamento
inseguro, como um método de planejamento familiar.
Deve-se destacar que existe um ponto importante
acerca dos abortamentos provocados, que é a desigualda-
de social ao acesso ao abortamento seguro. Diante de uma
gravidez indesejada, mulheres com maior rendimento,
pequena parcela, custeia a realização do aborto em clínica
privada. Neste local, o procedimento é realizado de forma
eficaz e com segurança (SILVEIRA; MCCALLUM; ME-
NEZES, 2016). No entanto, aquelas que não se enquadram

366
nesse perfil, a maioria, recorreram a uma diversidade de téc-
nicas inseguras (DINIZ & MEDEIROS, 2012; DINIZ;
OLIVEIRA; LANSKY, 2012).
Os estudos indicaram que a situação conjugal influen-
cia para interrupção ou não da gestação (NADER et al.,
2008; CECATTI et al., 2010; FUSCO; SILVA; AN-
DREONI, 2012; SOUZA et al., 2014). A mulher estar
casada ou ter uma união estável é um fator de proteção para
indução do aborto (NADER et al, 2008). Diante de uma
gravidez não desejada, a mulher solteira ou sem nenhum
companheiro com vínculo afetivo, apresenta quatro vezes
mais chances de provocar o abortamento. A mulher solteira
possui relações afetivas mais instáveis, consequentemente
utiliza com menos frequência métodos contraceptivos efi-
cazes, assim, se predispõe a uma gestação indesejada ou não
planejada (SILVA; ANDREONI, 2012).

Magnitude do aborto no Brasil

Em 2009, as autoras Menezes e Aquino em seu es-


tudo, descreveram o escasso número de pesquisas sobre o
tema aborto de abrangência nacional, havendo muitos estu-
dos de natureza local.
Em 2010, os pesquisadores Diniz e Medeiros publica-
ram a Pesquisa Nacional de Aborto (PNA). O estudo foi
realizado por amostragem aleatória nos domicílios de mulhe-
res urbanas em território brasileiro. A pesquisa apontou que
15% das mulheres entrevistadas relataram ter realizado aborto
alguma vez na vida: os resultados também revelaram que uma
a cada cinco mulheres brasileiras haviam realizado o aborto.

367
A PNA é novamente realizada no ano de 2016, a qual
mostra que a prática do aborto é um acontecimento fre-
quente e persistente que atinge mulheres de todas as classes
sociais, etnias e níveis educacionais. Os resultados apresen-
tados mostram-se próximos ao da pesquisa realizada em
2010. A proporção de mulheres que responderam que já
tinha realizado abortamento alguma vez na vida foi de 13%,
e que, novamente, os resultados apontaram que uma em
cada cinco mulheres já realizaram pelo menos, um aborto.
O estudo cita que as regiões Norte/Centro-Oeste e Nor-
deste, mostraram maiores taxas de abortamento com 15%
e 18%, respectivamente. Os resultados apontaram que 48%
das mulheres necessitaram de internamento para finalizar o
aborto (DINIZ; MEDEIROS; MADEIRO, 2017).
Vale ressaltar que a Pesquisa Nacional de Aborto
(PNA) é o único estudo de âmbito nacional que apresentou
as estimativas de aborto, baseando-se em técnicas diretas, ou
seja, não dependem de parâmetro para determinar a ocor-
rência deste evento. Porém, a pesquisa não abrange mulhe-
res analfabetas e das áreas rurais (DINIZ & MEDEIROS,
2010; DINIZ; MEDEIROS; MADEIRO, 2017).
No Brasil, não se sabe o real número de abortos. Mui-
tos estudos utilizam informações do Sistema de Internações
Hospitalares (SIH). No entanto, este sistema de informa-
ção somente retrata mulheres com complicações abortivas
que buscaram atendimentos nos hospitais públicos. Perce-
be-se assim, a dificuldade da exposição dos reais números
sobre abortamentos e abortos inseguros.
Segundo Monteiro, Adesse e Drezett (2015) ocorrên-
cia estimada de internações de mulheres de 10 a 49 anos

368
com gestação finalizada em aborto na rede pública de saúde
do SUS, no ano de 2013, foi de 205.075.
Melo e colaboradores (2014), apontaram que o coe-
ficiente médio anual de aborto inseguro constitui em 17
abortos/1.000 Mulheres em Idade Fértil (MIF) e a razão
de abortos inseguros foi de 33,2 abortos por 100 nascidos
vivos. Destacaram também, que as regiões brasileiras Nor-
te (20,2 por 1.000 MIF) e Nordeste (21,6 por 1000 MIF)
apresentaram maiores índices.
A morbidade devido ao aborto vem declinando no país
nos últimos anos (DINIZ & CASTRO, 2011; DINIZ &
MADEIRO, 2012; DINIZ & MEDEIROS; 2012; MA-
DEIRO & DINIZ; 2015). Segundo Silva e colaboradores
(2010), a frequência de mulheres internadas em hospitais
públicos para o tratamento de complicações abortivas caiu
para 28%. Tal conjuntura está relacionada à difusão e ex-
pansão do uso não hospitalar do misopostol pelas mulhe-
res que desejam interromper sua gestação, pois o uso desta
medicação diminui os riscos de complicações e a exposição
às clinicas de práticas médicas ilegais (SILVA et al., 2010;
ARILHA, 2012; MADEIRO & DINIZ, 2015).

Métodos Abortivos

Ao decidir-se provocar o aborto, a mulher realiza uma


trajetória clandestina e insegura, que se inicia com uso de
chás, aquisição de medicamentos ilegais e/ou uso técnica
invasiva (SOUZA et al., 2010).
No que se refere aos métodos abortivos, há o uso de
chás de ervas, como: arruda, buxinha, folha de laranja, pi-

369
menta-do-reino, maconha e boldo. Sobre os métodos in-
vasivos utilizam-se agulhas de tricô, ou sonda intra-uterina
e manobras de evacuação em clinicas clandestinas (SILVA
et al., 2010; DINIZ & MEDEIROS, 2012; MADEIRO
& DINIZ, 2015). Vale destacar que mulheres que mencio-
naram o uso sondas uterinas têm o menor nível educacio-
nal e de renda, como também, são aquelas que apresentam
maiores complicações abortivas (SILVA et al., 2010; MA-
DEIRO & DINIZ, 2015).
No entanto, os estudos apontaram que o principal mé-
todo para induzir o abortamento é o uso intravaginal e oral
de misoprostol, adquirido clandestinamente (SOUZA et al.,
2010; SILVA et al., 2010; DINIZ & MEDEIROS, 2012; DI-
NIZ & MADEIRO, 2012; MADEIRO & DINIZ, 2015).
O misoprostol inseriu-se no Brasil a partir da década
de 80, vendido como Cytotec, para uso de tratamento de
úlceras gástricas. Dentre suas propriedades farmacológicas,
observou-se a semelhança a prostaglandina, que é um ocitó-
cito utilizado na indução de contrações e dilatação do colo
uterino. Desta forma, passou a ser comercializado como
medicamento abortivo (CORRÊA; MASTRELLA, 2012;
SOUZA & FUSCO, 2016; ADESSE et al., 2015).
Diante do amplo uso do misoprostol e a ilegalidade
do aborto no Brasil, o Ministério da Saúde adotou medidas
para restringir o acesso com método abortivo, com uso per-
mitido somente em estabelecimentos hospitalares (COR-
RÊA; MASTRELLA, 2012; DINIZ & MEDEIROS,
2012). No entanto, pode ser adquirido em farmácias ou no
mercado clandestino (DINIZ & MADEIRO 2012; MA-
DEIRO & DINIZ, 2015).

370
Devido à ilegalidade da comercialização do Cytotec,
não há garantia de procedência ou segurança desta medicação,
facilitando assim, a falsificação, fracionamento das doses ou
repasse do remédio sem o princípio ativo. Somando-se a
isso, os fornecedores prescrevem erroneamente as doses e
a periocidade da medicação, o que conduz a mulher finali-
zar o aborto em hospitais públicos, devido a complicações
hemorrágicas e infecções. Contudo, o medo da penalização
legal, faz com muitas mulheres não informem aos profis-
sionais de saúde a indução do aborto (SOUZA et al, 2010;
DINIZ; CASTRO; 2011; DINIZ & MADEIRO, 2012;
DINIZ & MEDEIROS; 2012).

Repercussões e os danos emocionais

A gestação indesejada torna-se opressiva. Pode levar a


mulher a diversos significados e reflexões sobre sua identi-
dade, relação com o pai da criança e, sobretudo os planos de
vida. Ao provocar o aborto, a mulher desencadeia diversos
aspectos emocionais, pois tem de lidar com os sentimentos
opostos de inicio e fim, vida e morte (BENUTE et al., 2009).
As consequências advindas com a interrupção da gravi-
dez, além de físicas, também são psicológicas. As mulheres
que provocam aborto são permeadas por sentimentos de cul-
pa e arrependimento, o que pode gerar traumas e graves im-
plicações a saúde mental destas (DOMINGOS et al., 2013).
No que se referem às emoções vivenciadas pelas mu-
lheres que induzem o abortamento, os estudos apontaram
sentimentos ambíguos, que vão desde culpa, medo, inse-

371
gurança, vergonha, tristeza e sentimento de perda, a sensa-
ção de alívio, tranquilidade e indiferença (BENUTE et al.,
2009; NOMURA et al., 2011; HEILBORN et al., 2012;
LEAL, 2012; CARNEIRO; IRIART; MENEZES, 2013;
DOMINGOS et al., 2013; CARVALHO & PAES, 2014;
COUTO et al., 2015; MCCALLUM; MENEZES; REIS,
2016). Vale ressaltar, que um estudo realizado em duas ca-
pitais brasileiras, demonstrou que as mulheres que inter-
romperam a gravidez apresentam maior probabilidade de
depressão (NOMURA et al., 2011).
Segundo Carvalho e Paes (2014), os sentimentos ne-
gativos que advém da indução do aborto, como tristeza e
culpa, estão condicionados a ideia de matar uma criança,
fato este que a sociedade julga como crime. Já os sentimen-
tos de bem-estar, estão relacionados ao alcance do objetivo
pretendido que é a finalização de uma gestação indeseja-
da. A ausência de arrependimentos se dá pela concepção
da mulher de que ela exerça o direito sobre o seu corpo, e
assim, interrompa a gravidez não almejada.
Mulheres quando recorrem à prática do aborto indu-
zido são singulares e vinculadas ao contexto social no qual
ela está inserida, principalmente quando se encontram em
circunstâncias de violência. Nos últimos anos houve uma
preocupação de realização de pesquisas relacionadas ao
tema aborto e violência (DINIZ et al., 2011; PILECCO;
KNAUTH; VIGO, 2011; SOUZA & DINIZ, 2011;
GOMES et al., 2012; COUTO et al., 2015).
No estudo de Couto e colaboradores (2015) apontou
que o cotidiano de mulheres que autoprovocaram o abor-
tamento foi permeado pela violência doméstica, desde a

372
infância e adolescência, bem como o abandono e rejeição
de familiares. A violência conjugal, tanto do companhei-
ro atual e também com anteriores, influencia na decisão de
abortar. A descoberta da gravidez gera mudanças das rela-
ções afetivas por parte dos companheiros, causando prin-
cipalmente o abandono, e ao mesmo tempo, estes podem
promover atos violentos desde manipulação afetiva, priva-
ção de liberdade e lesões corporais no período gestacional,
levando à mulher a decidir pelo aborto (DINIZ et al.; 2011;
SOUZA & DINIZ, 2011).
Vale destacar, que existem outros sofrimentos viven-
ciados, que é observado pela experiência de mulheres que
necessitaram de internamento hospitalar para finalizar a
interrupção da gestação. Dois artigos enfocaram sobre a
assistência ao abortamento em hospitais. Citam a existên-
cia de discriminação contra as mulheres que abortam, indo
desde atuação do profissional, estrutura e a organização
do serviço para este tipo de atendimento (CARNEIRO;
IRIART; MENEZES; 2013; MCCLAUM; MENEZES;
REIS, 2016).
Estudo realizado em três capitais do Brasil sobre a
qualidade da atenção às mulheres admitidas por aborto em
hospitais do Sistema Único de Saúde, tendo como referên-
cia as normas do Ministério da Saúde e o grau de satisfação
das usuárias, apontou um baixo apoio social e má avaliação
da qualidade técnica. Também, apresentou a crítica situa-
ção na continuidade do cuidado, após alta hospitalar, onde
não há agendamento de consultas de retorno para revisão,
bem como a ausência de orientações sobre risco de gravi-
dez e planejamento familiar. Esta pesquisa concluiu que o

373
contexto apresentado da atenção ao abortamento está muito
longe de estar dentro dos padrões propostos pelas normas
nacionais e internacionais (AQUINO et al., 2012).
Assim, percebe-se que o sofrimento emocional viven-
ciado pelas mulheres que recorrem às práticas inseguras e
clandestinas do aborto, é bastante doloroso, uma vez que
é vivido de forma solitária e considerado crime no Brasil.
Somado a isso, existe um “não cuidado”, ou seja, ausên-
cia de humanização pelos serviços de saúde na atenção ao
abortamento, ampliando ainda mais o sofrimento destas.
Desta forma, a criminalização do aborto autoprovocado
não intervém somente na vida da mulher, como também,
na produção de pesquisas e análise da situação dos abortos
inseguros no país (CARNEIRO; IRIART; MENEZES;
2013; ROMIO et al., 2015).

A ilegalidade do aborto no Brasil

O abortamento está relacionado há diversas discussões


como um problema ético. Gera-se uma polêmica em tor-
no de qual obrigação ética determina o direito ao aborto
e quem são os titulares desse direito ou dever (WIESE &
SALDANHA, 2014).
O aborto provocado no Brasil foi considerado pelas
elites dominantes e juntamente com a Igreja Católica um
desregramento moral. Diante de tal posicionamento e a
crescente incidência, surgiu-se uma legislação para proibi-
ção de seu ato (BORSARI et al., 2012).

374
Desde a criação do Código Penal Brasileiro em 1940,
até o presente momento, é crime a interrupção voluntária
da gravidez, quando induzido pela própria gestante (au-
toaborto) ou terceiros, sendo enquadrado nos artigos 124
ao 127, com punição de um a três anos de prisão. Salvo em
casos em que seja imprescindível para salvar a vida da mu-
lher, gravidez resultante de estupro e fetos com anomalias
congênitas sem chance de sobrevivência extrauterina (arti-
go 128, I e II) (FERNANDES et al.; 2012; HEILBORN,
2012; WIESE & SALDANHA, 2014).
Diante da clandestinidade da realização do aborto, re-
flete-se que a criminalização e as leis restritivas não levam
à eliminação ou redução de abortos provocados, porém in-
citam as mulheres a recorrerem às práticas inseguras, que
podem proporcionam maiores riscos à saúde, esterilidade
ou a mortalidade materna (FERNANDES et al., 2012).
Apesar da legislação vigente sobre sua proibição, em
2012, houve ampliação da indução legal do aborto. O Su-
perior Tribunal de Justiça concedeu autorização para in-
terromper casos de gestação com anomalias fetais graves
e incompatíveis com a vida extrauterina, após diagnóstico
médico. Nos casos de anencefalia, existe o entendimento
que não há crime contra a vida, pois o feto não sobrevive ao
parto (FERNANDES et al., 2012).
Observa-se que a criminalidade da prática do aborto,
iguala as mulheres das diversas camadas sociais, econômi-
cas e escolares, que recorreram à interrupção voluntária da
gravidez, pois sonegam-lhes o direito à saúde e proporcio-
nam-lhes consequências físicas, psíquicas e sociais (FREI-
RE, 2012).

375
Diante da constância e frequência dos casos, aponta-
dos pelos estudos aqui discutidos, trazem a reflexão e in-
terrogações sobre a legislação brasileira vigente, pois esta
é deficiente na prevenção dos abortos. Há necessidade de
discutir a posição do Estado frente ao controle e decisão do
corpo da mulher, uma vez que seu dever é garantir os direi-
tos sexuais e reprodutivos das mulheres brasileiras de forma
autônoma e igualitária.

Considerações Finais

Percebeu-se que a prática do abortamento envolve di-


versas repressões sociais, uma vez que o aborto é cercado
de aspectos de cunho moral e legal. Diante desta situação,
muitas mulheres se omitem de relatar sobre o aborto pro-
vocado. Negligenciam sua real situação, pelo receio de se-
rem julgadas ou presas, devido à ilegalidade desta prática
no Brasil.
Perante a esse contexto, observa-se a dificuldade de
investigações sobre o tema aborto inseguro, pois há ne-
cessidade de cuidados metodológicos específicos, que não
acarretem nenhum tipo de prejuízo, dano ou transtorno a
estas mulheres que clandestinamente interromperam sua
gestação.
Resultados encontrados na literatura nacional citam a
necessidade de avaliação do acesso e efetividade dos serviços
de saúde sexual e reprodutiva, uma vez que as mulheres de-
vem ser beneficiárias de métodos adequados e informações
sobre a evitabilidade de uma gravidez indesejada. Há ainda,

376
a necessidade de discussão e planejamento de gestores, pro-
fissionais de saúde e outros que estejam envolvidos na rede
de atenção a saúde da mulher, sobre a redução de danos
ocasionados pelas práticas inseguras do aborto.

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384
CAPÍTULO 16

O DESAFIO DA REPRESENTATIVIDADE NOS


CONSELHOS DE SAÚDE: um estudo de revisão
integrativa da literatura

Jamine Borges Morais


Maria Salete Bessa Jorge
Indara Cavalcante Bezerra

INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988 foi o marco de parti-


cipação democrática dos atores sociais na luta por melhores
condições de saúde, sendo resultante do movimento de Re-
forma Sanitária e da VIII Conferência Nacional de Saúde
(CNS) realizada no ano de 1986. Importante resultado des-
se debate constitui-se na inscrição na Carta Magna da “saú-
de como direito de todos e dever do estado” e consequente ho-
mologação na sanção das Leis nº 8.080 e 8.142, incluindo
no arcabouço filosófico do Sistema Único de Saúde (SUS) a
participação e o controle social.
A participação e o controle social em saúde, dentre os
princípios do SUS, destacam-se como de grande relevância
social e política, pois se constituem na garantia, pelo menos
legal, de que a população participará do processo de formu-

385
lação e controle das políticas públicas de saúde, coibindo o
mau uso dos recursos, melhorando o desempenho das po-
líticas e conferindo legitimidade aos governos (CARVA-
LHO, 2014).
O processo de redemocratização vivenciado no país a
partir da década de setenta, possibilitou o estabelecimen-
to de dispositivos legais do Sistema Único de Saúde que
instituem, em cada esfera de governo, instâncias colegiadas
como os conselhos e as conferências de saúde.
Os Conselhos de saúde são instituídos pela Lei 8.142
que define a competência desta instancia participativa: estes
são órgãos colegiados, permanentes e deliberativos do SUS,
que têm entre suas atribuições a atuação direta na formu-
lação e proposição de estratégias, bem como o controle da
execução das políticas de saúde, inclusive em seus aspectos
econômicos e financeiros. No processo de criação e refor-
mulação dos conselhos, o poder executivo, respeitando os
princípios da democracia, deve garantir a paridade de repre-
sentação do segmento dos usuários em relação aos demais
segmentos, destacando que todos os representantes no con-
selho devem ser indicados por seus pares de acordo com sua
organização ou fóruns realizados de forma independente
(BRASIL, 1990, 2003).
No contexto sociopolítico brasileiro, a partir da insti-
tuição do SUS, a saúde passa a emergir como uma questão
de cidadania, e a participação política na gestão do sistema
se torna uma condição sine qua non para o seu exercício.
Diante dessa realidade, os conselhos de saúde se tornam
um importante elemento para a participação da sociedade
na tomada de decisão, e também um mecanismo estratégico

386
para a garantia da democratização do poder decisório, ao
lado da universalidade e da equidade no SUS. (COTTA et
al, 2011).
A criação dos conselhos de saúde como instância ins-
titucionalizada de participação social, sem dúvida, significa
uma conquista da sociedade civil em busca da construção de
uma perspectiva mais democrática em saúde.
Desde esta perspectiva, vale salientar que os conselhos
de saúde se constituem como novos espaços públicos pro-
piciados pela reestruturação do Estado, obtida pelas forças
políticas com base no pressuposto de que a participação da
sociedade deva ser acolhida pelo Estado como forma de
controle social e interferência na definição e desempenho
das políticas públicas. Assim, com a criação dos conselhos,
o controle social assume lugar estratégico na definição e
execução das políticas de saúde no Brasil.
No entanto, a efetividade destes conselhos tem sido
condicionada por inúmeros fatores, desde a capacidade de
formulação e negociação de propostas, até o grau de auto-
nomia dos atores que o constituem. O que se constata é que
foram desconcentradas responsabilidades e não democra-
tizado o poder (KLEBA et al, 2010; COTTA et al, 2011.
MARTINS et al, 2013).
Diante o contexto apresentado, acredita-se que desve-
lar o conhecimento produzido na temática da participação
e do controle social em saúde poderá abrir caminhos para
que se possa avaliar alguns nós teóricos e práticos que vem
impedindo o avanço do SUS e a consolidação dos conselhos
de saúde como instancias deliberativas.

387
Tendo como bases essas premissas, este estudo tem
por objetivo analisar a representatividade dos conselhos de
saúde a partir da produção científica brasileira.

MÉTODO

O presente estudo consiste numa revisão integrativa


da literatura. Essa modalidade de revisão proporciona uma
nova construção a partir do conhecimento pré-existente so-
bre o tema investigado, a partir de uma busca sistemática e
ordenada. Tem, portanto, a finalidade de reunir e sintetizar
resultados de pesquisas, contribuindo para o aprofunda-
mento do objeto de pesquisa, revelando os limites e as pos-
sibilidades. (MENDES, SILVEIRA, GALVÃO, 2008;
SOUZA, SILVA, CARVALHO, 2010).
A revisão integrativa compreende de cinco etapas: 1)
estabelecimento do problema, ou seja, definição do tema da
revisão em forma de questão ou hipótese primária; 2) sele-
ção da amostra (após definição dos critérios de inclusão);
3) caracterização dos artigos (definição das características
ou das informações a serem coletadas dos artigos, por meio
de critérios claros, norteados por instrumentos); 4) análise
dos resultados (identificando similaridades e conflitos); e 5)
apresentação e discussão dos achados (SOUZA, SILVA,
CARVALHO, 2010).
A busca eletrônica foi realizada no período de junho de
2015, na base de dado: Lilacs (Literatura Latino-americana
e do Caribe em Ciências da Saúde). Foram selecionados
artigos, publicados nos últimos seis anos (2010 a 2015), nos
idiomas inglês e português. Para a prospecção dos estudos,

388
foram utilizados os descritores de forma combinada por
meio dos operadores booleanos (AND e OR): participação
social OR controle social AND Sistema Único de Saúde. O
termo “controle social” até a finalização da coleta dos dados
ainda não estava contido nos Descritores em Ciências da
Saúde (DeCS) da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), con-
tudo sua utilização tornou-se necessária para a coleta dos
artigos.
A coleta dos dados ocorreu em junho de 2015 e foi
realizada através de busca online de artigos que respondes-
sem a seguinte questão: Como se dá a representatividade
nos Conselhos de Saúde?
Como critérios de inclusão para a seleção da amostra
estabeleceram-se: artigos publicados no período de 2010 a
2015, nos idiomas inglês e português e que estivessem dis-
poníveis na íntegra. A opção por este período de publicação
justifica-se pela expressividade da produção brasileira sobre
o tema durante o referido período. Foram excluídos artigos
de reflexão, revisões sistemática e integrativa, dissertações,
teses, editoriais de jornais sem caráter científico. Aqueles
duplicados foram considerados somente uma vez.
O cruzamento dos termos resultou num total de 78 ar-
tigos. Após aplicação dos critérios e o refinamento da busca
a partir da leitura dos artigos pré-selecionados, a amostra
restringiu-se a 11 artigos.

389
RESULTADOS
Nome dos
Nº autores/ Ano Periódico Título Objetivo Principais resultados
de publicação
1 Bispo Junior; Cadernos Legitimidade da Analisar a representativi- O estudo evidencia um conjunto de problemas
Gerschman, de saúde representação em dade e a representação de referentes à representatividade no CES/BA. São
2015 pública instâncias de par- interesses no CES/BA. discutidas as peculiaridades da representação nas
ticipação social: o instâncias de participação social e as dimensões que
caso do Conselho conferem legitimidade aos representantes.
Estadual de Saúde
da Bahia, Brasil
2 Sipioni; Silva, Saúde em Democracia e saúde: Analisar a representação Apesar de alguns discursos demonstrarem dis-
2015 Debate a prestação de contas da sociedade no Conselho tanciamento entre ambos, outros indicam grande
como legitimadora Municipal de Saúde de proximidade, o que revela certa legitimidade da ati-
da representação no Vitória (ES) a partir da vidade participativa nestas instâncias. É necessário
Conselho Municipal prestação de contas dos aprofundar esse debate para que se possa ampliar as

390
de Saúde de Vitória representantes. possibilidades de um melhor entendimento sobre a
(ES) representação em instâncias participativas.
3 Kleba; Zampi- Saúde e Processo decisório Analisar a incorporação A implementação das decisões depende de di-
ro; Comerlat- sociedade e impacto na gestão de deliberações do Con- ferentes órgãos ou de outras esferas de governo,
to, 2015 de políticas públi- selho Municipal da Saúde não apenas da competência dos conselheiros para
cas: desafios de um em Chapecó/SC. formular ou defender suas propostas, ou ainda do
Conselho Municipal interesse, compromisso ou engajamento do gestor
de Saúde municipal. O pouco tempo disponível para o debate
nas reuniões do Conselho resulta muitas vezes em
decisões que desconsideram fatores importantes,
como a capacidade instalada, recursos disponíveis e
previsões para a manutenção das atividades incor-
poradas. O impacto da participação social sobre as
políticas públicas na área da saúde requer qualifi-
cação do processo decisório, prevendo os múltiplos
fatores, de caráter técnico e também político,
envolvidos em sua implementação.
Nome dos
Nº autores/ Ano Periódico Título Objetivo Principais resultados
de publicação
4 Muller Neto; Cadernos Discursos sobre o Analisar os discursos Os discursos encontrados refletem um consenso
Artmann, de saúde papel e a represen- dos participantes sobre sobre a importância da conferência municipal de
2014 pública tatividade de confe- o papel e a representa- saúde, mesmo no caso daqueles que questionam
rências municipais tividade de conferências a efetividade de suas decisões no planejamento e
de saúde municipais de saúde. na gestão. Observaram-se discursos resultantes de
interpretações de tradições teóricas distintas.
5 Oliveira; Ciência Controle social no Descrever e analisar a Verifica-se que a instituição política Conselho
Ianni; Dallari, e Saúde SUS: discurso, ação dinâmica da participação Municipal de Saúde, reflexivamente, aciona diver-
2013 Coletiva e reação social, a partir das re- sos mecanismos para aprimorar seus modos de ação
presentações sociais dos e organização e, também, o comprometimento dos
Conselheiros Municipais atores para com esse fórum.

391
de Saúde de Belo Hori-
zonte sobre os sentidos do
controle social.
6 Martins et al, Saúde em Conhecimento dos Aferir o grau de conhe- Os resultados demonstram grande desinformação
2013. Debate usuários, trabalha- cimento dos usuários, dos usuários, dos novos conselheiros e da maioria
dores da saúde e trabalhadores e gestores dos trabalhadores, em contraste com os gestores e
gestores sobre conse- de saúde, bem como dos os conselheiros com mais tempo no cargo
lheiros e Conselhos representantes desses
de Saúde segmentos no Conselho
Municipal de Saúde do
Município de Colombo,
localizado no Estado do
Paraná.
Nome dos
Nº autores/ Ano Periódico Título Objetivo Principais resultados
de publicação
7 Coelho, 2012 Saúde e Construindo a Reflexões sobre a busca e As ações de construir a cidadania e formar sujeitos
sociedade participação social o exercício da participação coletivos são tomadas como fundamentos para a
no SUS: um cons- social no Sistema Único conquista de espaços democráticos e de direitos
tante repensar em de Saúde (SUS), com- sociais. No ambiente dos espaços institucionais de
busca de equidade e preendendo seu conceito participação, foram destacados elementos necessá-
transformação como as diferentes ações rios para consolidar e efetivar a participação popu-
dos grupos sociais que lar, como a relação entre os atores e a comunicação
influenciam a formulação, para a socializar as informações e conhecimentos
execução, fiscalização e em saúde.
avaliação das políticas
públicas.
8 Cotta et al, Physis O controle social Analisar a experiência do O que se verificou foi um grande desconhecimento
2011 em cena: refletindo controle social, via Con- sobre as bases legais e ideológicas da participação
sobre a participação selho de Saúde - CS, em social em saúde, gerando assim uma forte influência

392
popular no contexto um município de pequeno dos gestores locais na dinâmica e no funcionamen-
dos Conselhos de porte. to do CS, principalmente na determinação de seus
Saúde. membros, impedindo, dessa forma, que esse seja um
espaço concreto para que os usuários se apropriem
da forma institucional e política do conselho.
9 Cotta et al, Physis Controle social no Capacitar os Conselheiros Como resultado, foi possível identificar alguns
2010 Sistema Único de Municipais de Saúde desafios para o exercício do controle social, como a
Saúde: subsídios do município de Viço- importância da participação ativa e da necessidade
para construção de sa-MG, visando a sensi- de buscar informações e trocar experiências. Des-
competências dos bilizá-los para o exercício tarte, destaca-se que a participação dos conselheiros
conselheiros de pleno e consciente de seu de saúde em oficinas de capacitação aparece como
saúde. papel no controle social, uma possibilidade de superação das dificuldades de
possibilitando assim a implementação das conquistas legais, ao sensibilizar
construção de um sistema estes atores sociais para transpor a posição de meros
de saúde mais justo e expectadores passivos em protagonistas na constru-
igualitário. ção de um sistema de saúde universal e equitativo.
Nome dos
Nº autores/ Ano Periódico Título Objetivo Principais resultados
de publicação
10 Cotta, Cazal, Ciência Conselho Municipal Analisar o formato Dos 34 membros entrevistados (77,2% dos mem-
Martins, 2010 e Saúde de Saúde: (re)pen- institucional do CMS de bros do CMS), 44,2% afirmaram que as decisões
Coletiva sando a lacuna entre Viçosa (MG), abordando tomadas no CMS não são informadas à população
o formato institu- sua estrutura e dinâmica e 35,3% não repassam as informações sobre as
cional e o espaço de de funcionamento, regras propostas e discussões tomadas no CMS para
participação social. de composição e compe- discussão e deliberação por seus pares. Pela análise
tências. documental, constatou-se que a composição do
CMS de Viçosa, na gestão estudada, não está de
acordo com a distribuição prevista pela legislação
federal. Os resultados sugerem a existência de
problemas relacionados à representação, limitando a
participação social no conselho.

393
11 Kleba et al, Ciência O papel dos con- Analisar a efetividade do A análise das informações revela sobrecarga de
2010 e Saúde selhos gestores de controle social a partir do atribuições burocráticas, restringindo o debate
Coletiva políticas públicas: estudo sobre atribuições político inerente ao papel dos conselheiros. Além
um debate dos Conselhos Munici- disso, questionamos a legitimidade de suas atribui-
a partir das práticas pais da Assistência Social, ções, considerando as condições objetivas de sua
em Conselhos Mu- dos Direitos da Criança participação: o caráter voluntário, não profissional,
nicipais de Chapecó e do Adolescente, da não remunerado; o tempo restrito dos encontros;
(SC) Educação e da Saúde no a falta de estrutura física e operacional qualificada
município de Chapecó e autônoma, entre outras. Os conselhos gestores
(SC). são espaços de exercício de cidadania, o que requer
maior atuação na criação e no fortalecimento de
canais e processos de diálogo com diferentes atores
sociais, constituindo elos na rede de parcerias em
prol do enfrentamento dos problemas sociais da ci-
dade e da construção de condições favoráveis à vida.
A partir da questão da pesquisa, os estudos foram
agrupados, de forma a permitir uma maior apresentação
com os objetos trabalhados em cada um deles e seus respec-
tivos resultados. Dessa forma, os estudos analisados foram
categorizados e aqueles que apresentavam em seus achados
os desafios da representação nos Conselhos de Saúde foram
selecionados para a discussão neste capítulo.

DISCUSSÃO

A democracia representativa e suas instituições políti-


cas tradicionais, como o parlamento e os partidos políticos,
têm sido percebidas como insuficientes para garantir a de-
mocracia em sociedades complexas, com uma crescente so-
ciedade civil. Consequentemente, a crise desse modelo vem
gerando movimentos em várias partes do mundo, inclusive
no Brasil, que o contestam ou afirmam sua insuficiência.
Apontamos para a necessidade de combinar a democracia
representativa dos modernos com mecanismos de democra-
cia direta dos antigos, ou seja, a democracia participativa,
onde o cidadão não delega poderes aos seus representantes,
mas participa, diretamente, da tomada de decisões (SAN-
TOS; AVRITZER, 2002)
Como consequência da pressão exercida pela popula-
ção durante a ditadura militar teve-se um aumento subs-
tancial da participação popular nas decisões relativas à vida
pública, resultado disso foi a criação de instituições parti-
cipativas. Assim os conselhos gestores e as conferências de
saúde, instituídos legalmente formam a base da participação

394
da sociedade civil nas decisões relativas às políticas públicas
brasileiras.
A multiplicação de espaços de participação conduziu
à transformação da representação política, o que fez trans-
bordar, parcialmente, às fronteiras das eleições. A sociedade
civil, ainda que de forma não exclusiva, assume a responsa-
bilidade de direcionar e exercer o controle das funções exe-
cutivas, especificamente em determinadas áreas de políticas
sociais. Atores societários passam a desempenhar funções
de representação política, mesmo que não tenham sido elei-
tos pela maioria da população para este fim. Assim, são es-
tabelecidos novos formatos e meios de representação, como
os exercidos pelos conselhos de saúde.
Contudo, os estudos revelam uma série de obstáculos à
representação nos conselhos de saúde, dentre eles o proces-
so de escolha dos representantes, a distorção na representa-
ção e a frágil relação entre representantes e representados.
O estudo realizado por Bispo Junior e Gerschman
(2015) no Conselho Estadual de Saúde da Bahia, revela
a escolha dos representantes como desafio à legitimidade
dos conselhos de saúde. Na pesquisa os autores identificam
três métodos de escolha dos representantes: o presidente da
entidade assume naturalmente a representação no conse-
lho; a escolha do representante é feita pelo corpo dirigen-
te da entidade; a escolha é feita por eleição em assembleia
ou reunião do corpo de filiados da entidade. Este último,
embora possa parecer o critério mais democrático e natural
para escolha da representação, segundo os autores, poucas
foram as entidades que publicizaram entre os seus membros
o processo de eleição para representante.

395
A pouco transparência nos critérios de escolha dos
representantes, evidenciada nos estudos converge com os
achados de Labra (2010) que embora em seu estudo tam-
bém tenha observado um cenário de representação difusa,
com a escolha de representantes por múltiplos métodos,
a autora sugere que, para a maioria dos casos, não são as
comunidades que escolhem seus representantes, mas as cú-
pulas dirigentes que designam seus indicados no conselho.
Para a autora, as associações da sociedade civil muitas vezes
replicam em seu interior os mesmos traços autoritários e
excludentes ainda prevalentes na sociedade brasileira, cons-
tituindo-se em instâncias pouco democráticas.
Como observado no estudo de Cotta, Cazal e Martins
(2010), 52,9% dos conselheiros relataram ter sido indicados
por seus pares para comporem o Conselho Municipal de
Saúde de Viçosa-MG. Realidade semelhante foi encontra-
da por Morita, Guimarães e Di Muzio (2006) no município
de Bertioga-SP, onde a maioria dos entrevistados ingressou
no conselho por indicação das suas entidades de classe, não
considerando a necessidade de eleição. Este mesmo estudo
concluiu que, ao invés de seguir um processo mais trans-
parente e democrático, a eleição dos conselheiros acaba se
transformando possivelmente num instrumento de mani-
pulação política.
Como estratégia de superação da realidade posta, cabe
aqui, apresentar a reação do Conselho Municipal de Saúde
de Belo Horizonte aos problemas relacionados a escolha
dos seus representante. De acordo com o artigo de Oliveira,
Ianni e Dallari (2013), a cada dois anos o referido conselho
passa por um processo de renovação de seus 72 membros,

396
entre efetivos e suplentes. Nesse sentido é publicado um
chamamento público visando sua renovação, neste cha-
mamento são convidadas as diversas entidades associativas
para participarem do processo de escolha dos conselheiros
municipais para o período de 2010/2012. Esse processo foi
conduzido por meio de uma comissão eleitoral, paritaria-
mente constituída e eleita em plenário. Essa iniciativa foi
publicada em um jornal de grande circulação de Belo Ho-
rizonte e, também, veiculada no Jornal do Ônibus – veí-
culo de comunicação da prefeitura que divulga mensagens
de interesse público, sem cunho político ou comercial, para
aproximadamente 1,5 milhão de pessoas/dia (OLIVEIRA;
IANNI; DALLARI, 2013).
A construção de um processo eleitoral robusto é um me-
canismo fundamental no sentido de se legitimar a representa-
ção. Entretanto, esse mecanismo precisa ser complementado
por outro que estimule a participação da diversidade de sujei-
tos existente na sociedade. Essa participação só será possível
quando a sociedade, em sua diversidade, tiver o aporte de co-
nhecimentos que promovam não só a sua efetiva participa-
ção, mas, principalmente, o gosto em participar, questão esta
também levantada nos artigos de Bispo Junior e Gerschman
(2015); Sipioni e Silva (2015); Kleba, Zampirom e Comerlat-
to (2015); Cotta, Cazal e Martins (2010); Kleba et al (2010)
Outro desafio à representativida encontrados nos ar-
tigos diz respeito a quem se representa, ou seja, a que ou
quais interesses os representantes estão articulados. Acredi-
ta-se que três possíveis interesses podem estar envolvidos: o
interesse pessoal, o interesse da entidade a que representam
e o interesse da coletividade.

397
Tal condição foi discutida no artigo de Bispo Junior e
Gerschman (2015), quando os autores identificam uma vela-
da disputa entre alguns representantes sociais, com o propó-
sito de conseguir inserir na discussão do conselho os assun-
tos relativos à sua categoria. O autor identificou ainda que
os que mais tencionaram na defesa de sua pauta específica
foram os trabalhadores em saúde e os representantes de pa-
tologias, sugerindo, portanto, que os representantes busca-
vam assegurar os interesses das entidades a que pertenciam.
Nesta mesma perspectiva Sipioni e Silva (2015) obti-
veram resultados convergentes. As análises dos discursos
revelaram uma visão mais focada de representação em que
se assume o papel do representante como aquele que re-
presenta a vontade da entidade, algumas falas presentes no
artigo também mostraram que esse ideal de representação
política ocorre não somente nos representantes, mas naque-
les que são representados.
Em estudo realizado por Cotta et al (2011), os autores
constataram que 40,6% (n= 13) dos conselheiros não sa-
biam informar qual categoria representavam, 31,3% (n=10)
relataram ser apenas suplentes ou titulares, e apenas 28,1%
(n= 9) sabiam relatar corretamente qual categoria represen-
tavam, sendo que, entre estes últimos, todos eram repre-
sentantes do governo. Os autores observaram que a ine-
xistência, no conselho, de membros que realmente sejam
representantes do interesse da população usuária do sistema
sanitário, uma vez que, segundo os autores, todos os con-
selheiros entrevistados foram indicados pelo gestor local e,
além disso, segundo a pesquisa, muitos apresentavam com
ele algum tipo de ligação política ou empregatícia.

398
Essa grande influência das forças políticas locais pode
ser identificada como um fator de impedimento do proces-
so de modernização da sociedade e de superação das for-
mas mais arcaicas de poder. O que observamos no artigo
de Cotta et al (2011) também ocorre em vários locais do
Brasil, nos quais temos uma convivência pacífica entre as
forças patrimoniais, clientelistas (herdadas do colonialis-
mo) e burocráticas, que, já cristalizadas na sociedade, geram
uma grande resistência às possibilidades de superação e de
mudança da realidade política, impedindo dessa forma, a
instalação de novos modelos e estruturas que visem ao for-
talecimento da sociedade civil e à construção de uma rea-
lidade democrática. O pouco comprometimento das elites
políticas brasileiras com a democracia, e o desencanto da
população com a possibilidade concreta de efetivação de-
mocrática podem acarretar numa situação de preservação e
continuísmo desse tipo de regime autoritário.
Em contradição às pesquisas acima citadas, Mul-
ler Neto e Artman (2014) na discussão dos seus achados
identificaram que a noção de representação das diferentes
identidades, ou seja, a noção de que o representante deve re-
presentar interesses amplos que impliquem na melhoria da
saúde da população, aparece com ênfase nos discursos dos
sujeitos coletivos, o que demonstra a importância atribuída
pelos sujeitos sociais à noção de coletividade, em detrimento
à interesses individuais ou da entidade a qual representam.
Vale ressaltar que esses três tipos de representação de
interesses não são excludentes entre si. A análise dos arti-
gos demonstrou que, muitas vezes, os representantes não
mantêm apenas um desses três níveis de interesse. Ou seja,

399
o mesmo representante, a depender da conjuntura e da cor-
relação de forças estabelecida, pode se posicionar motiva-
do por interesses pessoais, das entidades ou em defesa da
coletividade na busca pela ampliação do nível de saúde da
população, a diferença está na maior ou menor propensão à
uma ou outra forma de interesse. Mesmo que alguns conse-
lheiros demonstrem maior inclinação para posicionamentos
individuais ou corporativos, isto não significa que ajam mo-
tivados apenas por estes tipos de interesses. Como afirma
Coelho (2012, p.148), “é natural que um conselheiro leve as
reivindicações de seus pares, mas estas não podem ser mais im-
portantes que as do conjunto”. O que se faz necessário é que
interesses individuais e corporativos não prevaleçam sempre
aos interesses de ampliação da saúde e fortalecimento do
Sistema único de Saúde.
O principal desafio à representação apontado por Si-
pione e Silva (2015) refere-se à fragilidade de comunicação
entre os representantes e os representados. Os autores iden-
tificam uma postura de autonomia do representante perante
a entidade representada, de acordo com a análise feita dos
discursos há subestimação da opinião dos seus membros
da entidade e entendimento de que sua experiência como
conselheiro lhe dá respaldo para tal autonomia conferindo
subsídios para afirmar que a cultura política tradicional, que
sugere a existência do político profissional, ainda alicerça
a atuação desses novos representantes. Ao mesmo tempo,
reafirma que falta a eles uma qualificação técnica e política
capaz de subsidiar sua participação.
Segundo Sipioni e Silva (2015) muitos representan-
tes participam das plenárias do conselho sem consultar suas

400
bases, ou seja, a entidade que representam, falando em seu
nome e não em nome do coletivo, o que caracteriza o inte-
resse individual, e muito menos compartilham as decisões
tomadas nas plenárias com seus pares. A baixa represen-
tatividade das lideranças revela-se, portanto, um elemento
essencial para a compreensão da fragilidade dos conselhos.
Convergindo com este achado, Cotta, Cazal e Martins
(2010) em estudo realizado no Conselho Municipal de
Saúde de Viçosa-MG desvelaram que, 35,3% dos entrevis-
tados não discutiam com seus pares as questões tratadas nas
reuniões do conselho e muito menos transmitem as infor-
mações e/ou decisões para seus pares.
Esse distanciamento entre representantes e represen-
tados foi encontrado também em outros estudos. Guizard e
Pinheiro (2006) problematizaram a concretização da repre-
sentatividade, referindo nos seus resultados que a maioria
dos conselheiros disse “sentir-se presença individual, e não
institucional, no conselho”.
Cabe lembrar que o compromisso entre representan-
tes e representados deve acontecer tanto na articulação da
entidade/base com seus representantes como também entre
os próprios membros da base representada. Sendo assim, se
a base está desarticulada ou se seus membros não possuem
união para reivindicar atitudes específicas de seu represen-
tante, este se tornará cada vez mais autônomo e indepen-
dente para tomar decisões.
Diante os desafios à representatividade até agora apre-
sentados, o conhecimento emerge como principal ferra-
menta para a superação dos obstáculos supracitados. Em
seu estudo Martins et al (2013) observaram que a maior

401
parte dos conselheiros representantes de segmentos dos
usuários e trabalhadores de saúde não consegue ter uma boa
noção de questões como o orçamento da saúde e, desta for-
ma, qualquer ideia ou proposta apresentada pelo segmento
dos gestores é, em geral, aceita sem questionamentos. As-
sim, verifica-se que “ter acesso à informação sem apropriar-se
de seu significado, sentido e contexto empobrece o potencial de uso
da informação nas discussões sobre as políticas de saúde” (CAR-
VALHO, 2014, p. 49).
O conhecimento contribui para a tomada de decisões,
sem ele não há como a população organizada exercer o seu
papel de fiscalizadora e avaliadora dos serviços, e conse-
quentemente de conseguir a melhoria real de sua saúde. Por
isso a comunicação está relacionada ao poder, e sua apro-
priação pelas camadas populares é um importante instru-
mento de luta contra a hegemonia, retirando a população
do papel de refém do saber técnico (COTTA et al., 2010).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não obstante ao fato dos estudos aqui discutidos de-


monstrem que os conselhos apresentam dificuldades nos
aspectos organizativos e deliberativos, Côrtes (2009) des-
taca que esses fóruns se constituem em importantes instru-
mentos da democracia deliberativa e participativa. Segundo
Escorel e Moreira (2012), os conselhos – como espaço de
poder, de conflito e de negociação – representam a possibi-
lidade de a população interferir nas ações governamentais.
Nesse contexto, essas instâncias podem contribuir para o

402
esmaecimento do clientelismo e do fisiologismo tradicio-
nais, além de possibilitar o desenvolvimento do aprendiza-
do do exercício do poder político, resultando, por sua vez,
no fortalecimento do Sistema Único de Saúde.

Bibliografia Básica
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403
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405
CAPÍTULO 17

CUSTOS, IMPACTO E AVALIAÇÃO ECONOMICA


DA DENGUE: uma revisão integrativa.

Sonia Samara Fonseca de Morais


Marcelo Gurgel Carlos da Silva

INTRODUÇÃO

A dengue é uma doença infecciosa viral de transmis-


são vetorial (Aedes aegypti) que traz na sua dinâmica de
disseminação elementos de dimensões biológicas, condutas
ecológicas, políticas e econômicas, o que a caracteriza como
um problema complexo e exige um enfoque sistêmico para
seu controle. Essa enfermidade é causada por um arboví-
rus da família Flaviviridae com quatro tipos imunológicos:
DENV1-4. Uma vez instalada a infecção, cada sorotipo
proporciona imunidade permanente específica e imunidade
cruzada por curto prazo, desaparecendo em média após seis
meses (TIMERMAN et al., 2009; FUNASA, 2012).
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), no
período de 2000-2004, a média anual global foi de 925.896
casos, quase o dobro do número de casos (479.848) ocor-
ridos no período de 1990-1999. Em 2001, um recorde de
69 países relataram infestação de dengue à OMS e, em

406
2002, somente a região das Américas informou mais de 1
milhão de casos (GUZMAN; KOURI, 2002; GUBLER,
2004). Entre 2005-2006, foram descritos supostos surtos
de dengue no Paquistão, Arábia Saudita, Iêmen, Sudão e
Madagascar, e um grande surto de dengue envolvendo mais
de 17.000 casos em ilhas de Cabo Verde em 2009 (WHO
2006, 2009; FRANCO et al., 2010).
Estimativas da Organização Mundial de Saúde
(OMS) indicam que a incidência global da dengue aumen-
tou 30 vezes ao longo dos últimos 50 anos. São estimados
50-100 milhões de casos anualmente em mais de 100 países
endêmicos, colocando quase metade da população do mun-
do em risco (GUBLER, 2002).
Atualmente os países asiáticos e latino-americanos são
os mais afetados e a dengue grave se tornou uma das princi-
pais causas de hospitalização entre crianças e adultos dessas
regiões (WHO, 2011). É importante definir as caracterís-
ticas das epidemias em diferentes regiões e sub-regiões de-
vido à variação da epidemiologia da dengue. Há um predo-
mínio de Dengue Clássica nas Américas, em adultos jovens,
diferindo do Sudeste Asiático, onde a Febre Hemorrágica
da Dengue predomina em lactentes e crianças (HARRIS et
al., 2000; HUNG et al., 2005; HALSTEAD, 2006; OOI;
GOH; GLUBER, 2006; GUILARDE et al., 2008; SAN
MARTIN et al., 2010).
No Brasil, a primeira epidemia de dengue ocorreu em
1982 em Roraima, com isolamento de DEN-1 e DEN-4,
e registro de onze mil pessoas infectadas. No Rio de Janei-
ro, em 1986, veio uma segunda epidemia com uma força
de transmissão viral tão intensa que mais de um milhão de

407
pessoas foram infectados pelo DEN-1 (NOGUEIRA et
al., 1999; PONTES et al., 2000; SCHATZMAYR, 2001;
SILVA JR. et al., 2002). A dengue se tornou endêmica no
Brasil, intercalando-se epidemias, geralmente associadas à
introdução de novos sorotipos, em áreas anteriormente in-
denes (BRASIL, 2009).
No Brasil, a taxa de incidência da dengue ficou em
206,65 por 100 mil habitantes, no período de 1999 a 2010,
de acordo com disponibilidade temporal do banco de da-
dos do Sistema de Agravos de Notificação (SINAN)/Mi-
nistério da Saúde. As regiões Norte e Nordeste obtiveram,
somadas, 490,92 casos/100 mil habitantes para o mesmo
período. Entretanto, através dos dados Tabnet – Indicado-
res de Morbidade – a taxa de incidência de casos de dengue
no Brasil e Ceará, em 2010, chega a 514,09 e 214,98 por
100mil habitantes, respectivamente.
A estratégia atual de intervenção desenvolvida des-
de 2002 por meio do Programa Nacional de Controle da
Dengue (PNCD) orienta-se a partir de três fundamentos:
a) Programa de caráter permanente; b) gestão e execução
do programa realizada pelos municípios e integração com
as ações básicas de saúde; c) gestão integrada dos vários
componentes do programa. O município gere e executa o
PNCD com apoio dos estados e do Ministério da Saúde
quando necessário, cabendo ao nível federal a maior parte
do financiamento (FIGUEIRÓ et al., 2010).
O crescimento das epidemias, a elevação dos custos
empregados com a prevenção, assistência médica aos pa-
cientes, os prejuízos oriundos das incapacidades temporá-
rias ou permanentes e das mortes prematuras em conse-

408
quência da infecção exercem uma influencia negativa sobre
o processo de crescimento dos países em desenvolvimento,
principalmente a América Latina, compreendendo o Brasil
(BANCO MUNDIAL, 1993; MELTZER et al., 1998;
LOPEZ et al., 2006)
Estimar o custo de intervenções em saúde é um impor-
tante componente de avaliação e aprimoramento da execu-
ção dos sistemas de saúde que estão envolvidos (JOHNS;
BALTUSSEN, R.; HUTUBESSY, 2003). Os custos em
saúde podem ser categorizados em custos diretos relaciona-
dos à saúde, custos diretos não relacionados à saúde, custos
associados à perda de produtividade resultante de morbi-
dade e mortalidade prematura e, finalmente, os custos in-
tangíveis (PIOLA; VIANA, 2002; EDEJER et al., 2003;
DRUMMOND et al., 2005).
A necessidade de estudos sobre custos de programas
é estimar os custos de uma intervenção de saúde, incluin-
do intervenções clínicas, preventivas e políticas públicas de
saúde. Independente do tipo de intervenção, os métodos
envolvem a contextualização da análise de custos, a elabora-
ção de um inventário de custos, a quantificação dos custos e
o cálculo de medidas de custo finais. Para determinar custos
de programas, os custos para recursos usados para prover
tratamentos de saúde são geralmente categorizados como
custos de capital e custos recorrentes (DRUMMOND et
al., 2005).
A estratégia de custeio para se conhecer e mensurar os
custos de programas de controle da dengue, no Brasil, não
estão definidas. É importante ressaltar que a maioria das
estimativas de custo relacionadas à dengue refere-se apenas

409
às epidemias. No Brasil pouco se sabe sobre os impactos
socioeconômicos das endemias (HAYD et al., 2009). Não
existem estimativas disponíveis do impacto econômico da
dengue no período endêmico (MELTZER et al., 1998).
Para tanto, o objetivo do presente estudo foi revisar
a literatura sobre trabalhos publicados nacionais e interna-
cionais que abordassem sobre custos, avaliação e impacto
econômico da dengue.

MATERIAL E MÉTODO

Trata-se de um estudo do tipo revisão integrativa da


literatura que consiste na construção de uma análise ampla
da literatura, com o propósito de obter um profundo enten-
dimento de um determinado fenômeno baseando-se em es-
tudos anteriores contribuindo para discussões sobre dengue,
assim como reflexões sobre a realização de futuros estudos
(MENDES, SILVEIRA E GALVÃO, 2008).
O levantamento bibliográfico foi realizado por meio
de consulta na base de dados (Medline, SciELO, Lilacs-
BVS) – durante o mês de março de 2017. Para a busca foi
utilizado o Descritor em Ciências da Saúde (DeCS) “im-
pacto econômico da dengue (10); Custos com dengue (10);
avaliação em econômica da dengue (6)” a partir do qual fo-
ram encontrados 26 artigos indexados.
Realizado filtro dessa amostra após leitura os resumos
de cada um dos trabalhos encontrados e aplicar os seguintes
critérios de inclusão: artigos em português inglês e espa-
nhol, publicados em português, inglês e espanhol, e que a

410
população e amostra do estudo abordassem conteúdos, rela-
cionados a custo com dengue, impacto econômico da den-
gue e avaliação econômica da dengue. Tendo sido excluídos
artigos que não correspondiam aos critérios do estudo e que
não estavam disponíveis por completo por haver a necessi-
dade de compra do artigo para visualiza-los na integra.
Após a aplicação desses critérios de inclusão a amos-
tra final deste trabalho ficou constituída de 13 artigos. Para
agrupamento e posterior análise desses artigos foi elaborada
um quadro, a qual incluiu ano, autores, revista do trabalho,
país, titulo, objetivo do estudo e descritores utilizados.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A presente revisão analisou um total de 13 artigos


publicados em português, inglês e espanhol encontrados
com os descritores correspondendo ao número de artigos
encontrados de acordo com o quadro 1. Foram encontrados
artigos com pesquisas realizadas nos seguintes países: Ar-
gentina, Porto Rico, Brasil, Venezuela e Cuba.

Quadro 1 - Artigos selecionados e incluídos na pesquisa

DESCRITORES NÚMERO DE ARTIGOS

Impacto econômico da dengue 06

Custos da dengue 04

Avaliação econômica da dengue 03

411
No quadro 1.1, descreve os estudos encontrados sobre
impacto econômico da dengue e suas características defini-
dos como:
Na pesquisa realizada na Argentina, publicada na re-
vista de Saúde Coletiva, em espanhol, que teve como ob-
jetivo estimar a carga econômica dos casos notificados de
dengue durante a epidemia na Argentina em 2009.
Entre os custos, os custos médicos considerados neces-
sários para o tratamento das pessoas afetadas e os custos de
oportunidade para aqueles que pararam de trabalhar ou es-
tudar por causa da doença. Os resultados permitem estimar
entre 26 a 40 milhões de pesos argentinos (6 a 9 milhões de
dólares) como o custo global dos casos registrados. As re-
giões do norte da Argentina deu a mais alta carga da doença
econômica (mais de 90% da carga total). Para todas as re-
giões, o custo social de um caso de dengue representa mais
de 40% da renda pessoal mensal líquido médio (TARRA-
GONA, S. et al, 2012).
Estudo realizado em Porto Rico apresenta como resul-
tados as mulheres consideraram a dengue importante por
causa de seu impacto econômico, emocional e de saúde, e
elas estavam preocupadas com mais frequência do que os
homens sobre a remoção de lixo e eliminação de água. Os
participantes com diagnóstico prévio de dengue estavam
mais preocupados com o risco da doença, tinham mais co-
nhecimento sobre a dengue e sua prevenção e recomenda-
vam o uso de repelentes com mais frequência do que seus
homólogos sem um diagnóstico prévio de dengue. (PÉ-
REZ-GUERRA CL, 2009)

412
No estudo que analisa o programa de controle da den-
gue na América Latina foram definidos os principais fato-
res de risco para a ocorrência de dengue na região. Embo-
ra exista pouca informação sobre o impacto econômico da
dengue na região em termos de carga de doenças, a perda
estimada associada à doença é da mesma ordem de grande-
za que a tuberculose, as doenças sexualmente transmissíveis
(excluindo o HIV / AIDS), a doença de Chagas, a leishma-
niose, Ou helmintos intestinais. Os dados sobre custo-efi-
cácia e análise custo-benefício dos programas de controle
da dengue na América Latina são escassos; No entanto, o
custo por AVAD evitado pelos programas de controle du-
rante os períodos endêmicos parece baixo, em comparação
com outras doenças transmitidas por mosquitos como a
febre amarela, a leishmaniose ou a malária. Além disso, a
relação custo-benefício dos programas de controle provou
ser positiva (TORRES, J.R.; CASTRO, J.,2007).
Estudo realizado na Venezuela, apresenta como obje-
tivo, determinar os custos diretos e indiretos dos cuidados
médicos prestados aos casos de dengue e febre hemorrágica
da dengue / síndrome de choque da dengue (FHD / SCD)
entre 1997 e 2003 no Estado de Zulia, Venezuela. Duran-
te o período do estudo, 33,857 casos de dengue e FHD /
SCD foram vistos. Destes, 30.251 (89,35%) casos de den-
gue foram e 3606 (10,65%) casos de dengue hemorrágica
foram/DSS. Seis casos de FHD / SCD morreram (taxa de
letalidade: 0,2 por 100 casos de FHD/SCD). Foram dire-
to custa US $ 474 251,70; destes custos, US $ 132 042.30
foram gastos em cuidados médicos de emergência e US
$ 342 209,40 sobre os custos hospitalares de casos / DSS

413
DHF. Foram indiretos custa US $ 873 825,84 e compreen-
deu 64,8% das despesas totais (US $ 1 348 077,54) ligados
a esta doença Durante os anos de estudo.( AÑEZ G, BAL-
ZA R, VALERO N, LARREAL Y,2003).
Em Cuba, forma diagnosticados 3 012 casos, confir-
mados sorologicamente, em uma epidemia produzida pelo
sorotipo 2 do vírus da dengue no município de Santiago de
de Cuba da República de Cuba; 205 se classificaram como
casos de febre hemorrágica de dengue (FHD) e 12 óbitos.
Foram estimados impactos econômicos ocorridos durante a
epidemia da dengue neste município e analise de custos por
hospitalização e controle terapêutico do pacientes, controle
de vetores e vigilância laboratorial. Um custo total de US $
10.251.539, dos quais 76% foram utilizados no controle de
vetores e 18% em custos hospitalares foram estimados a re-
lação custo-benefício dos programas de prevenção e contro-
le discutido, comparando-os com os custos necessários para
controlar epidemiologista (VALDÉS G L, MIZHRAHI
JV, GUZMÁN MG, 2002).

414
Quadro 1.1 – Estudos encontrados na literatura sobre impacto econômico da dengue e suas características: autor, periódico, ano de publicação,
país, titulo, objetivo e descritores.
AUTOR
TITULO DO AR-
PERIODICO PAÍS OBJETIVO DESCRITORES
TIGO
ANO DE PUBLICAÇÃO
TARRAGONA S, MONTEVER- Argentina Dengue en la Argentina: El presente estudio estima la carga Dengue; Costo de Enfer-
DE M, MARCHIONI S, CAPO- un análisis económico económica de los casos notificados medad; Argentina
RALE J, PEREIRO AC, PALA- del de dengue durante la epidemia ar-
CIOS JM impacto de la epidemia gentina de 2009
de 2009
Salud Colectiva, Buenos Aires, v. 8,
n.2, p.151-162, 2012.
PÉREZ-GUERRA CL, ZIE- San Juan, Community beliefs and This study explored differences found Dengue; health educa-
LINSKI-GUTIERREZ E, VAR- Puerto Rico practices about dengue in interviews conducted in 2001 in tion; vector control; Puer-
GAS-TORRES D, CLARK GG in Puerto Rico attitudes toward to Rico

415
dengue and its prevention by respon-
Rev Panam Salud Publica/Pan Am J dents’ gender and whether they had a
Public Health v. 25, n3, p. 218-226, prior dengue infection.
2009.
TORRES JR, CASTRO J Brasil The health and economic Analysis of dengue control programs Dengue; Risk Factors;
impact of dengue in in Latin American Health Care Costs
Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, Latin America
23 Sup 1:S23-S31, 2007.
AÑEZ G, BALZA R, VALERO N, Venezuela Impacto económico del Determinar los costos directos e Dengue; fiebre dengue
LARREAL Y dengue y del dengue he- indirectos asociados con la atención hemorrágica; costo de en-
morrágico en el Estado de los casos fermedad; Venezuela
Rev Panam Salud Publica; v. 19, n.5, de Zulia, Venezuela, de dengue y de dengue hemorrágico
p. 314–320, 2006. 1997–2003 o síndrome de choque por dengue
(DH/SCD) entre los
años 1997 y 2003 en el Estado de
Zulia, Venezuela
AUTOR
TITULO DO AR-
PERIODICO PAÍS OBJETIVO DESCRITORES
TIGO
ANO DE PUBLICAÇÃO
VALDÉS G L, MIZHRAHI JV, Cuba Impacto económico de la En este trabajo se presenta un Dengue/epidemiolo-
GUZMÁN MG epidemia de dengue 2 en análisis de los gia; dengue/prevención
Santiago de Cuba, 1997 gastos incurridos en el control de la & controle; costos de la
REV CUBANA MED TROP; v. 54, epidemia de atencion en salud; analises
n.3, p. 220-227, 2002. dengue de 1997 de Santiago de de costo beneficio
Cuba
VASCONCELOS PFC et al. Brasil Inquérito soro-epide- Os objetivos do inquérito Dengue. Epidemia;
miológico na Ilha de São foram os seguintes: Inquérito soro epidemio-
Revista da Sociedade Brasileira de Luis durante 1) conhecer a prevalência lógico Aleatório;
Medicina Tropical v. 32, n.2, p.171- epidemia de dengue no da epidemia nos municípios afeta-
179, 1999. Maranhão dos; 2) estimar o número de infec-

416
ções causadas pelo vírus dengue;
3) avaliar a distribuição dos casos
por
sexo e faixa etária na população alvo
do estudo;
e 4) estratificar a ocorrência de casos
entre as diferentes classes socioeco-
nômicas e graus de instrução.
No quadro 1.2, descreve estudos com resultados sobre
custos da dengue e características relacionadas como:
Neste estudo de revisão é encontrado como resultados
que diversas tecnologias têm sido desenvolvidas como alter-
nativas no controle do Aedes aegypti, utilizando-se diferen-
tes mecanismos de ação – como monitoramento seletivo da
infestação, medidas sociais, dispersão de inseticidas, novos
agentes de controle biológico e técnicas moleculares para
controle populacional dos mosquitos –, considerando-se
também a combinação entre elas. As tecnologias em desen-
volvimento demandam avaliação da eficácia, viabilidade e
custos para implementação como estratégias complemen-
tares às ações já preconizadas pelo Programa Nacional de
Controle da Dengue (ZARA ALSA et al., 2016).
Na pesquisa realizada no Rio de Janeiro propõe-se es-
timar o custo representado pelos casos de dengue atribuídos
ao desastre de 2011, em Nova Friburgo (RJ). Verificou-se
que ocorreram 1.356 casos suspeitos de dengue, dos quais
937 foram confirmados. O custo total da doença pode ter
variado, no mínimo, entre R$ 66 mil e R$ 499 mil, no ce-
nário de menor valor de salário, sendo que cerca de 70%
desse custo ocorreu entre os casos confirmados (PEREIRA
CAR et al, 2014).

417
Quadro 1.2 – Estudos encontrados na literatura sobre custos da dengue e suas características: autor, periódico, ano de publicação, país, titulo,
objetivo e descritores.
AUTOR
PERIODICO PAÍS TITULO DO ARTIGO OBJETIVO DESCRITORES
ANO DE PUBLICAÇÃO
ZARA ALSA et al Brasil Estratégias de controle do Descrever as principais estratégias de Aedes; Insetos Vetores;
Aedes aegypti: uma revisão controle do Aedes aegypti, com ênfase Controle de Vetores; Con-
Epidemiol. Serv. Saude, Brasília, v. nas inovações tecnológicas promissoras trole de Mosquitos; Lite-
25 n. 2, p.391-404, 2016. para utilização no Brasil. ratura de Revisão como
Assunto

PEREIRA CAR et al Brasil Avaliação econômica dos Estimar o custo representado pelos ca- Avaliação de desastres,
casos de Dengue sos de dengue atribuí- Custos da
Ciência & Saúde Coletiva, v. 19, atribuídos ao desastre de dos ao desastre de 2011, em Nova Fri- doença, Custos de cuida-

418
n.9, p. 3693-3704, 2014. 2011 em Nova Friburgo burgo (RJ) dos de saúde
(RJ), Brasil
SILVEIRA JÚNIOR JC Brasil Pontos e linhas, pontes e O objetivo desta tese é a estruturação Vigilância epidemioló-
retalhos: as de um modelo de uso integrado de gica; controle de vetores;
Tese (Doutorado em Saúde Pú- experiências de implanta- geotecnologias abertas, em particular os sistemas de informação
blica). Centro de Pesquisa Aggeu ção de tecnologias no do- bancos de dados geográficos e sistemas geográfica; tecnologia de
Magalhães, Fundação mínio geográfico na de informações geográficas com o uso sensoriamento remoto;
Oswaldo Cruz, Recife, 2010. vigilância vetorial para a auxiliar de imagens de sensoriamento dengue - prevenção &
dengue, em remoto controle; aedes; distribui-
Recife e Santa Cruz do Ca- e dados de GPS ção espacial da população
pibaribe - PE
RESENDE MC, SILVA IM, EI- Brasil Avaliação da operaciona- Avaliar a capacidade dos agentes de Armadilha para mosquito;
RAS AE lidade da armadilha Mos- saúde para identificar corretamente os vigilância; Aedes aegypti
quiTRAP mosquitos capturados pela Mosqui-
Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, v. no monitoramento de Ae- TRAP e comparar o tempo gasto na
19, n. 4, p. 329-338, 2010 des aegypti pesquisa larvária, ovitrampa e Mosqui-
TRAP
No quadro 1.3, descreve estudos com resultados sobre
avaliação econômica da dengue e características relaciona-
das como:
Os gastos públicos do setor de saúde no Brasil incluem
aqueles efetuados pelo Sistema Único de Saúde (SUS),
destinados ao equacionamento da doença. O custo de uma
doença pode incluir tanto as despesas do sistema de saúde
com o tratamento do agravo, quanto às despesas ou os pre-
juízos incorridos pela sociedade, como os dias de trabalho
perdidos devido à doença ou os potenciais anos de vida per-
didos devido ao agravo. Dessa forma, agregando-se as par-
celas do sistema de saúde e da sociedade, têm-se uma apro-
ximação do custo real da doença, ou seja, do seu custo total.
Esse custo total é chamado também de custo social. Mas
vale lembrar que o custo social, neste sentido, não se refere
apenas às parcelas da sociedade, mas sim ao custo total, in-
clusive do sistema de saúde (PEREIRA CAR et al, 2014)..
Na pesquisa realizada no Rio de Janeiro, descreve nos
resultados que foram gastos pelo Sistema de Saúde com o
tratamento dos casos suspeitos, seja em ambiente ambulato-
rial ou hospitalar, o valor de R$ 58.341,97, sem considerar
gastos com exames diagnósticos. Deste total, R$ 45.791,97
é referente ao gasto com casos suspeitos tratados em am-
biente hospitalar, e R$ 12.550,00 se refere àqueles tratados
em ambulatório. Do montante utilizado para tratamento
hospitalar da dengue, R$ 34.622,58 (75,61%) foi o gasto
incorrido entre os casos que receberam confirmação diag-
nóstica. Os R$ 11.169,39 restantes (24,39%) foram gastos
com os casos hospitalares inicialmente suspeitos, mas que
depois foram descartados (PEREIRA CAR et al, 2014).

419
Conhecendo-se o impacto financeiro de uma doença
é mais fácil avaliar o custo-benefício de projetos e progra-
mas voltados à sua redução. A medida da carga financeira e
social de uma doença é uma informação que pode ser útil,
para que a gestão em saúde e ambiente possa decidir onde
e como aplicar seus recursos, e que justifica a necessidade
de investimento e fortalecimento do setor de Vigilância em
Saúde, que é fundamental para o controle de surtos e mini-
mização dos efeitos de desastres sobre a saúde (PEREIRA
CAR et al, 2014).

420
Quadro 1.3 – Estudos encontrados na literatura sobre avaliação econômica da dengue e suas características: autor, periódico, ano de
publicação, país, titulo, objetivo e descritores.
AUTOR
PERIODICO TITULO DO
PAÍS OBJETIVO DESCRITORES
ANO DE PUBLICA- ARTIGO
ÇÃO
FIGUEIRÓ AC, Brasil Usos e influência da Sistematizar os usos e influência do Avaliação em Saú-
HARTZ Z, SAMICO I, avaliação em saúde processo e resultados de duas avaliações de; Dengue; Pla-
CESSE EAP em dois estudos sobre sobre o Programa Nacional de Controle nos e Programas
o Programa Nacional da Dengue, para tomada de decisão de de Saúde
Cad. Saúde Pública, Rio de Controle da Den- gestores e profissionais envolvidos
de Janeiro, v. 28, n.11, gue
p.2095-2105, 2012

421
VILAS BOAS, V. A. et al Brasil Triagem sorológica e Verificar a soropositividade dos pacien- Dengue; Aedes ae-
influência do conhe- tes do ambulatório de especialidades do gypti;
J Bras Patol Med Lab, v. cimento sobre a den- Sistema Único de Saúde (SUS) para Região do Grande
47 , n. 2, p. 129-136, abril gue em pacientes do anticorpos antidengue, relacionando os ABC
2011 ambulatório de espe- resultados com os dados sociodemográ-
cialidades do SUS fcos
ELLIS BR, WILCOX BA Brasil The ecological di- The aim of this paper is to explore the Dengue; Chagas
mensions of vector ecological dimension of vector-borne Disease; Commu-
Cad. Saúde Pública, -borne disease resear- diseases and to provide further clarity nicable Diseases;
Rio de Janeiro, 25 Sup ch and control about the role of “ecological thinking” in Ecological Studies;
1:S155-S167, 2009 the development and implementation of Ecosystem
vector control activities (i.e. ecosystem
approaches to vector-borne diseases)
Considerações Finais

Através dos estudos encontrados podemos perceber o


quão frágil é o baixo índice de publicações relacionadas aos
descritores pesquisados, sendo estes eixos interligados de
temática moderna e atual, quando citamos a necessidade de
mais estudos direcionados a: Custos com dengue; Impacto
econômico da dengue e Avaliação econômica da dengue.
Nesses estudos é possível identificar a diversidade de
abordagens que se pode explorar e sua importância quanto
as informações divulgadas diante dessas pesquisas, para que
haja melhorias na gestão, quando se trata de reduzir custos
e ou gastos quando há planejamento econômico a fim de
reduzir a prevalência de uma determinada doença, como a
dengue por exemplo, que vem causando danos da socieda-
de, bem como despesas e prejuízos.
O enfrentamento dessa doença está relacionado ao
processo de urbanização, a resíduos sólidos, saneamento bá-
sico e a ausência de participação da sociedade como forma
de conscientização como medida preventiva, uma vez que a
dengue surge nos grandes centros, tendo grande relação ao
meio ambiente onde se desenvolve o mosquito.
São necessários mais pesquisas e informações que pos-
sam contribuir para que haja de forma objetiva elaboração
de planejamentos e metas a fim de fundamentar tomadas de
decisão nos programas já existentes de combate a dengue e
redução de custos e danos a sociedade, fortalecendo a eficá-
cia no que se refere a avaliação e economia da saúde.

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428
CAPÍTULO 18

INDICADORES DE MORTALIDADE INFANTIL

Ana Carolina Oliveira e Silva


Daniella Barbosa Campos
Katherine Jerônimo Lima
Ana Valeska Siebra e Silva

INTRODUÇÃO

Os indicadores de mortalidade possuem como finali-


dade principal a análise do nível de saúde da população e
auxílio na elaboração de medidas preventivas e de controle
com o intuito de melhorar as condições sanitárias da co-
munidade (MOTA; KERR, 2012). Assim, a Mortalidade
Infantil (MI) é um indicador que possibilita a análise e
identificação dos déficits assistenciais existentes e favorece
a reorientação dos serviços de modo a evitar novas ocor-
rências (BRASIL, 2011). Esse indicador corresponde ao
óbito entre os menores de um ano de idade. Esse evento
possui duas subdivisões principais: mortalidade infantil
neonatal, que compreende o período entre 0 e 27 dias de
vida, e pós- neonatal (28 – 364 dias de vida) (FRIAS;
NAVARRO, 2013).
No Brasil, o índice de óbito infantil tem passado por
decréscimo significativo desde a década de 80, passando

429
de 69,1 óbitos por 1000 nascidos vivos em 1980, para 15,0
óbitos por 1000 nascidos vivos em 2013 (IBGE, 2014). A
queda nos índices de MI está associada, principalmente, a
redução dos óbitos no período pós-neonatal que apresen-
tam maior sensibilidade às condições sociais, econômicas
e ambientais (LIMA; PORDEUS; ROUQUAYROL,
2013). Em contrapartida, o óbito neonatal assumiu a posi-
ção de principal contribuinte para os índices de MI.
Brasil (2009), destaca que embora a redução desse coe-
ficiente tenha sido significativa, ele ainda representa um sé-
rio problema de saúde pública. Esse fato fica mais evidente
quando se compara os índices brasileiros com os de outros
países da América Latina, como o Chile, deixando claro
que o declínio não é compatível com o nível de desenvolvi-
mento do país (IBGE, 2013).
Relacionadas a fatores biológicos, sociais, culturais e
de déficits na assistência à saúde, uma importante parcela
dessas mortes poderiam ser evitadas através do acesso aos
serviços de saúde em tempo adequado e de uma assistência
qualificada (BRASIL, 2009).
A existência de mortes por causas evitáveis é um sinal
de alerta sobre as condições de como o cuidado está sen-
do prestado, de acordo, com a colocação de Rutstein et al
(1976) pioneiros no debate sobre essa temática, que afir-
mam e listam uma série de condições em que não deveria
ocorrer o óbito, caso houvesse o acesso da população a uma
assistência médica efetiva.
A partir dos estudos de Rutstein et al em 1976, foram
realizados outras pesquisas com o enfoque sobre a evitabi-

430
lidade do óbito, e outras listas foram criadas e atualizadas
ao longo dos anos. No Brasil, coordenado pelo Ministério
da Saúde e com o auxílio de diversos colaboradores, foi ela-
borada a “Lista Brasileira de Mortes Evitáveis” (LBME), a
partir de uma vasta revisão de literatura (BRASIL, 2017).
A LBME, foi dividida em duas categorias, população
com idade inferior a cinco anos, e aqueles entre cinco e se-
tenta e quatro anos. A primeira lista considera que o óbito
pode ser reduzido por: I- ações de imunização; II- adequa-
da atenção à mulher na gestação; III- adequada atenção à
mulher no parto; IV- adequada atenção ao recém-nascido;
V- ações de diagnóstico e tratamento adequado; e VI- ações
de promoção à saúde vinculadas a ações de atenção (BRA-
SIL, 2017).
A partir desse contexto, nota-se que há possibilidade
de intervir sobre aspectos que atuam como determinantes
do óbito infantil. Para tanto, é fundamental o conheci-
mento dos fatores envolvidos nesse processo, por meio de
pesquisas e da veiculação dos resultados dessas. Portanto,
a necessidade de melhor compreensão dos fatores modifi-
cáveis que estão associados ao óbito infantil, com vistas a
sua redução, é o que justifica a realização deste estudo de
revisão.

OBJETIVO
Descrever, com base na literatura científica, as evidências
existentes acerca da evitabilidade do óbito infantil no Brasil.

431
METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, que


de acordo com Soares et al (2014) é uma revisão de litera-
tura realizada com alto rigor metodológico e que permite a
síntese de estudos de diferentes metodologias, possibilitan-
do assim, o estudo aprofundado de um determinado tema.
A construção desta revisão seguiu as sei etapas propos-
tas por Mendes, Silveira e Galvão (2008), que estão descri-
tas a seguir: I- identificação do tema e seleção da hipótese
ou questão de pesquisa; II- estabelecimento de critérios
para inclusão e exclusão de estudos/ amostragem ou busca
na literatura; III- definição das informações a serem extraí-
das dos estudos selecionados/ categorização dos estudos;
IV- avaliação dos estudos incluídos na revisão integrativa;
V- interpretação dos resultados; VI- apresentação da revi-
são/síntese do conhecimento.
Inicialmente, foi delimitado o tema sobre o qual iria
ser realizada a pesquisa e a partir disso foi elaborada a ques-
tão norteadora do estudo acerca do assunto “evitabilidade
do óbito infantil”. Questionou-se: O que se tem escrito
sobre a evitabilidade do óbito em menores de um ano de
idade, no Brasil, nos últimos dez anos (2006-2016)?
O segundo passo foi determinar quais seriam os crité-
rios para a inclusão e exclusão das publicações, sendo assim
definidos como critérios de inclusão: publicações disponí-
veis na íntegra, que tivessem como país de afiliação o Brasil,
fossem artigos revisados por pares, com ano de publicação
entre 2006 e 2016, e estivessem escritos em português, in-
glês ou espanhol. Ficaram estabelecidos como critérios de

432
exclusão: publicações que se repetissem entre as bases de
dados consultadas, estudos que abordassem a evitabilidade
do óbito perinatal ou em maiores de um ano de vida, publi-
cações que não adotassem a evitabilidade do óbito infantil
como tema central do estudo, artigos de revisão, relatos de
casos, editoriais, dissertações, teses, resumos, livros ou ca-
pítulos de livros.
A busca dos artigos foi realizada por três revisores, se-
guindo a seguinte estratégia:
• Identificação das publicações através da Biblioteca
Virtual em Saúde (BVS) nas bases de dados, Lite-
ratura Latino-Americana e do Caribe em Ciências
da Saúde (LILACS), Medical Literature Analysis
and Retrieval Sistem on-line (MEDLINE) e Base
de Dados em Enfermagem (BDENF).
• Para o cruzamento dos termos, foi selecionado o
descritor “Mortalidade Infantil” através do siste-
ma Descritores em Ciências da Saúde (DeCs); e
foram utilizadas as palavras- chave: “causas evitá-
veis”, “evit$” e “óbito infantil”.
Ao final, foram selecionados para compor a amostra
deste estudo, 19 artigos. O detalhamento do processo de
seleção das publicações está descrito na figura 1:

433
Figura 1: Fluxograma da seleção dos artigos com base nos critérios de inclusão.
Fortaleza – Ce, Brasil, 2017.

Fonte: Elaborado pelas autoras (2017).

Ao todo foram selecionados após a aplicação dos crité-


rios de inclusão, 96 artigos. A partir desse resultado foram
aplicados os critérios de exclusão. Do total de artigos se-
lecionados, após a leitura criteriosa do título e resumo, 43
foram excluídos por se repetirem entre as bases de dados; 04
por serem artigos de revisão ou relatos de caso; e 30 porque
abordaram a evitabilidade do óbito perinatal ou em maiores
de um ano de vida, ou não detalharam a temática. Assim, a
amostra final desta revisão foi composta por 19artigos.

434
O terceiro passo consistiu em determinar quais as in-
formações deveriam ser extraídas dos estudos selecionados,
sendo elas: identificação do estudo, descritores utilizados,
objetivo, tipo de estudo, local e amostra da pesquisa, fonte
dos dados, os principais resultados encontrados, e o nível
de evidência do estudo de acordo com o modelo exposto no
estudo de Souza, Silva e Carvalho (2010).
No passo seguinte, foram preenchidos, a partir da lei-
tura na íntegra dos artigos, os quadros de informação sobre
os estudos e realizou-se a análise crítica deles. Nesse senti-
do, no quinto passo foi realizada a interpretação e discussão
dos resultados encontrados, gerando assim, as considera-
ções para a prática e as sugestões de realização de outras
pesquisas que busquem preencher as lacunas identificadas
na revisão.
O sexto passo, por sua vez, contemplou a construção
de um documento que descrevesse de maneira detalhada a
metodologia utilizada e os principais resultados encontra-
dos a partir da revisão integrativa da literatura.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Foram analisados 19 artigos que se enquadraram nos


critérios de inclusão desta revisão, eles serão apresentados
de maneira resumida nos quadros 1 e 2. Do total de artigos
da amostra final, 5 (26,3%) foram publicados em 2014, 4
(21,1%) em 2013, 3 (15,78%) em 2012 e 2008, 2 (10,5%)
em 2010, e 1 (5,3%) em 2011 e 2015. Entre os descritores
dos artigos selecionados, os que mais se repetiram foram

435
“Mortalidade Infantil”, que foi descritor em 14 artigos; e
“Causas de Morte”, citado em 7 artigos.
Dos artigos analisados, 15 (78,9%) apresentaram ca-
racterísticas descritivas e nível de evidência 4 (estudos des-
critivos ou qualitativos); 02 artigos Coorte, 1 Caso controle
e 1 estudo Ecológico analítico, apresentaram nível de evi-
dência 3 (estudos quase-experimentais).
Com relação a fonte de dados dos estudos analisa-
dos, 89,4% (17) utilizaram dados secundários, predomi-
nantemente do Sistema de Informação sobre Mortalidade
(SIM) e do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos
(SINASC), também foram utilizadas as fichas de investi-
gação do óbito infantil, documentos específicos do local de
pesquisa ou elaborados pelo autor. Os dados primários cor-
responderam a 5,3% (1) do total de artigos. O uso de dados
primários e secundários foi observado em 5,3% da amostra,
ou seja, 1 artigo.

436
Quadro 1: Distribuição dos artigos inclusos na revisão, de acordo com a identificação, descritores, objetivo e tipo de estudo. Fortaleza – Ce,
Brasil, 2017.

IDENTIFICAÇÃO DO ES- TIPO DE


DESCRITORES OBJETIVO
TUDO ESTUDO
Santos et al., 2014a. Mortalidade Infantil; Avaliar se houve mudança no coeficiente
Óbitos infantis evitáveis nas Causas de Morte; de mortalidade infantil evitável e compa-
coortes de nascimentos de Pelotas, Estudos de Coortes. rar seus determinantes entre as crianças Coorte
Rio Grande do Sul, Brasil, de 1993 das coortes de nascimentos de Pelotas de
e 2004. 1993 e 2004.
Lisboa et al., 2015. Mortalidade Infantil; Descrever a evolução da mortalidade in-
Mortalidade infantil: principais Causas de Morte; fantil evitável na região Centro do estado Estudo
causas evitáveis na região Centro Acesso aos Serviços de Saúde; de Minas Gerais, Brasil, no período 1999- descritivo
de Minas Gerais, 1999-2011. Epidemiologia descritiva. 2011.

437
Nascimento; Almeida; Gomes, Mortalidade infantil; Causas de Identificar padrões espaciais da distribui-
2014. morte; Sistemas de informação ção da mortalidade neonatal nas micror-
Ecológico e
Causas evitáveis e mortalidade geográfica; Análise espacial; regiões do estado de São Paulo e verificar
exploratório
neonatal nas microrregiões do es- Saúde materno-infantil. o papel das causas evitáveis na composição
tado de São Paulo. desse indicador de saúde.
Menezes et al., 2014. Mortalidade infantil; Analisar os óbitos de menores de um ano
Classificação das mortes infantis Causas de morte; residentes em Belo Horizonte, segundo
Estudo
em Belo Horizonte: utilização da Sistema Único de Saúde. critérios de evitabilidade propostos na
descritivo
lista atualizada de causas de mortes Atualização da Lista de Causas de Mor-
retrospectivo
evitáveis por intervenções do Siste- tes Evitáveis por Intervenção do Sistema
ma Único de Saúde do Brasil. Único de Saúde.
Nascimento et al., 2014. Mortalidade Infantil; Estatís- Descrever a ocorrência da mortalidade in-
Mortalidade infantil por causas ticas Vitais; Sistemas de In- fantil em Recife (PE) entre 2000 e 2009, Estudo
evitáveis em uma cidade do Nor- formação; Saúde Materno-In- segundo causas evitáveis. descritivo
deste do Brasil. fantil.
Quadro 1: Distribuição dos artigos inclusos na revisão, de acordo com a identificação, descritores, objetivo e tipo de
estudo. Fortaleza – Ce, Brasil, 2017.
TIPO DE
IDENTIFICAÇÃO DO ESTUDO DESCRITORES OBJETIVO
ESTUDO
Santos et al., 2014b. Mortalidade infantil; Comparar a mortalidade infantil evitá-
Mortes infantis evitáveis por inter- Causas de morte; vel em duas coortes de nascidos vivos,
Estudo ex-
venções do Sistema Único de Saúde: Avaliação de serviços nos biênios 2000/2001 e 2007/2008, por
ploratório e
comparação de duas coortes de nasci- de saúde. meio da Lista Brasileira de Causas de
comparativo
mentos. Mortes Evitáveis por Intervenções do
Sistema Único de Saúde.
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Mortalidade infantil e classificação de Avaliação em Saúde; a evitabilidade dos óbitos de crianças me- avaliativa,
evitabilidade:pesquisando municípios Atenção Primária à nores de um ano dos municípios da 15ª descritiva

438
da 15 regional de saúde Paraná. Saúde; Evitabilidade. Regional de Saúde. exploratória.
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Mortalidade infantil neonatal: estudo talidade Infantil; Causas em Cuiabá, estado de Mato Grosso, Bra- Estudo
das causas evitáveis em Cuiabá, Mato de Morte; Epidemiolo- sil, em 2007. descritivo
Grosso, 2007. gia Descritiva.
Silva et al., 2013. Mortalidade Neonatal; Verificar a validade e confiabilidade da
Validade, confiabilidade e evitabilida- Causa Básica de Morte; causa básica dos óbitos neonatais e a
de da causa básica dos óbitos neona- Validade dos Testes. magnitude dos óbitos por causas evitá-
tais ocorridos em unidade de cuidados veis de recém-nascidos internados em Estudo
intensivos da Rede Norte-Nordeste de unidade de cuidados intensivos de uma transversal
Saúde Perinatal. maternidade participante da RENOS-
PE, em Teresina, Piauí, Brasil, de julho a
dezembro de 2007.
TIPO DE
IDENTIFICAÇÃO DO ESTUDO DESCRITORES OBJETIVO
ESTUDO
Daripa et al., 2013. Recém-nascido; Comparar o perfil epidemiológico dos
Asfixia perinatal associada à mortali- Asfixia neonatal; óbitos neonatais precoces evitáveis as-
dade neonatal precoce: estudo popula- Mortalidade neonatal sociados à asfixia perinatal conforme a Coorte po-
cional dos óbitos evitáveis. precoce; região de ocorrência do óbito no Estado pulacional
Síndrome de aspiração de São Paulo.
de mecônio.
Brandão; Godeiro; Monteiro, 2012. Mortalidade neonatal; Discutir as causas de óbitos neonatais re-
Estudo epi-
Assistência de enfermagem no pré-na- Prevenção; duzíveis por adequada atenção à mulher
demiológico,
tal e evitabilidade de óbitos neonatais. Assistência pré-natal; na gestação, em Natal, no Rio Grande do
descritivo
Enfermagem. Norte, no período de 2008 a 2010, rela-
e retrospec-
cionando-as à assistência de enfermagem
tivo.
prestada durante o pré-natal.

439
Continua...
Quadro 1: Distribuição dos artigos inclusos na revisão, de acordo com a identificação, descritores, objetivo e tipo de
estudo. Fortaleza – Ce, Brasil, 2017.
TIPO DE
IDENTIFICAÇÃO DO ESTUDO DESCRITORES OBJETIVO
ESTUDO
Freitas; Gonçalves; Ribeiro, 2012. Coeficiente de mortali- Analisar a evolução dos indicadores da
Mortalidade infantil, segundo critérios dade infantil; mortalidade infantil, segundo seus com-
Estudo
de evitabilidade e componentes Viçosa Mortalidade infantil ponentes e por causas evitáveis, no mu-
ecológico e
MG, 1998-2010 por risco específico; nicípio de Viçosa, Minas Gerais, compa-
descritivo de
Mortalidade neonatal; rando-os com o Estado de Minas Gerais
séries tem-
Mortalidade neonatal e o Brasil.
porais.
precoce.
TIPO DE
IDENTIFICAÇÃO DO ESTUDO DESCRITORES OBJETIVO
ESTUDO
Silva et al., 2012. Mortalidade Infantil; Avaliar a evitabilidade dos óbitos infan-
Mortalidade infantil na cidade de Pe- Qualidade, Acesso e tis em Pelotas, no período 2005-2008, e
lotas, estado do Rio Grande do Sul, Avaliação da Assistência comparar resultados da auditoria de óbi- Estudo
Brasil, no período 2005-2008: uso da à Saúde; to pós-investigação com dados do Siste- descritivo
investigação de óbitos na análise das Avaliação de Serviços ma de Informações sobre Mortalidade
causas evitáveis. de Saúde. (SIM).
Rocha et al., 2011. Saúde da criança; Descrever o perfil epidemiológico da Estudo
Mortalidade neonatal e evitabilidade: mortalidade neonatal; mortalidade neonatal, sob a perspectiva descritivo de
uma análise do perfil epidemiológico. sistemas de informação; da evitabilidade, em Recife-PE, 1999- corte trans-
estatísticas vitais. 2009. versal
Batista et al., 2010. Epidemiologia dos Avaliar uma série histórica (1997-2006)
Evolução da mortalidade infantil por serviços de saúde; Mor- do Coefi- ciente de Mortalidade In- Estudo eco-

440
causas evitáveis: série histórica 1997- talidade Infantil; fantil (CMI) segundo causas evitáveis lógico, do
2006, Distrito Federal Estudos de séries tem- (CMIev), mal definidas (CMImd) e não tipo séries
porais. claramente evitáveis (CMIne) no Distri- temporais.
to Federal (DF).
Malta et al., 2010. Mortalidade Infantil; Analisar a tendência de causas de mor-
Estudo
Mortes evitáveis em menores de um Causas de Morte; Ava- tes evitáveis em menores de um ano, de
ecológico
liação de Serviços de
ano, Brasil, 1997 a 2006: contribuições idade, ocorridos no Brasil e regiões, no
utilizando
para a avaliação de desempenho do Saúde; período de 1997 a 2006.
série tem-
Sistema Único de Saúde. Sistema Único de
poral.
Saúde.
Gastaud; Honer; Cunha, 2008. Mortalidade Infantil; Caracterizar o perfil epidemiológico da
Mortalidade infantil e evitabilidade Saúde Materno-Infan- mortalidade infantil em 16 municípios Estudo re-
em Mato Grosso do Sul, Brasil, 2000 til; Vigilância Epide- de Mato Grosso do Sul, Brasil, e avaliar trospectivo
a 2002. miológica seu grau de evitabilidade.
TIPO DE
IDENTIFICAÇÃO DO ESTUDO DESCRITORES OBJETIVO
ESTUDO
Continua...

Quadro 1: Distribuição dos artigos inclusos na revisão, de acordo com a identificação, descritores, objetivo e tipo de
estudo. Fortaleza – Ce, Brasil, 2017.
TIPO DE
IDENTIFICAÇÃO DO ESTUDO DESCRITORES OBJETIVO
ESTUDO
Boing; Boing, 2008. Mortalidade Infantil; Coe- Testar as associações entre a
Mortalidade infantil por causas evitá- ficiente de Mortalidade mortalidade infantil por cau-
veis no Brasil: um estudo ecológico no Infantil; sas evitáveis no Brasil com Estudo ecológi-

441
período 2000-2002. Serviço de Saúde; indicadores socio-econômicos co, analítico.
Fatores Socioeconômicos. e de serviços e investimentos
em saúde.
Jobim; Aerts, 2008. Mortalidade Infantil; Fatores Investigar a associação entre
Mortalidade infantil evitável e fatores Epidemiológicos; Condições as categorias óbitos evitáveis
associados em Porto Alegre, Rio Gran- Sociais. e não-evitáveis e as variáveis
Estudo de casos
de do Sul, Brasil, 2000-2003. sociodemográficas, reprodu-
e controles
tivas maternas e relacionadas
às condições de nascimento
da criança.
Fonte: Coletado pelas autoras (2017).
Conclusão.
Quadro 2: Distribuição dos artigos inclusos na revisão, de acordo com a referência, fonte de dados, principais resultados
e nível de evidência. Fortaleza – Ce, Brasil, 2017.
FONTE NÍVEL DE
REFERÊN- AMOSTRA E LOCAL
DOS PRINCIPAIS RESULTADOS EVIDÊN-
CIA DA PESQUISA
DADOS CIA
Todos os óbitos infantis Na coorte de 1993, houve 5.249 nascidos vivos e 111 óbitos in-
ocorridos no período de 1º fantis; na de 2004, 4.231 nascidos vivos e 82 óbitos infantis. O
de janeiro do ano da coor- Primária/ coeficiente de mortalidade infantil evitável foi 15, 2:1.000 nascidos
Santos et al.,
te (1993 e 2004) a 31 de Secundária vivos em 1993 e 15,4 em 2004. Os coeficientes de mortalidades 3
2014a.
dezembro do ano seguinte neonatal e pós-neonatal evitáveis foram, respectivamente, 11,2 e
(1994 e 2005). Em Pelotas, 4,0 em 1993 e 10,9 e 4,5 em 2004.
Rio Grande do Sul.
Óbitos e nascidos vivos, A TMI por causas evitáveis diminuiu de 14,5 para 7,7/1000 nas-

442
notificados pelos sistemas cidos vivos no período (decréscimo de 46,9%), com maior redução
de informações sobre no subgrupo ‘Ações de Promoção à Saúde’ (69,2%) e menor no
mortalidade subgrupo ‘Atenção à Mulher na Gestação’ (17,1%); em 2009-2011,
Lisboa et al., (SIM) e sobre nascidos vi- SIM; entretanto, 65% dos óbitos infantis ainda foram classificados como
4
2015. vos (Sinasc) do Ministério SINASC evitáveis.
da Saúde, referentes aos
residentes na Região Am-
pliada de Saúde Centro de
Minas Gerais.
Quadro 2: Distribuição dos artigos inclusos na revisão, de acordo com a referência, fonte de dados, principais resultados e nível de evidên-
cia. Fortaleza – Ce, Brasil, 2017.
FONTE NÍVEL DE
REFERÊN- AMOSTRA E LOCAL
DOS PRINCIPAIS RESULTADOS EVIDÊN-
CIA DA PESQUISA
DADOS CIA
Taxa de mortalidade neonatal total foi 8,42/1.000 nascidos vivos e
a taxa de mortalidade neonatal por causas evitáveis de 6,19/1.000
Dados sobre mortalidade
nascidos vivos. Os coeficientes de Moran (I) para essas taxas foram
neonatal e nascidos vivos
significativos (valor p<0,05) — para a taxa de mortalidade neo-
obtidos do DATASUS
Nascimento; natal total I=0,11 e para taxa de mortalidade por causas evitáveis
relativos ao período com- DATA-
Almeida; Go- I=0,19 —, e os óbitos neonatais se concentraram na região sudoes- 4
preendido entre os anos SUS
mes, 2014. te e no Vale do Paraíba. Se as causas evitáveis fossem abolidas,
2007 e 2011 para o estado
haveria uma redução significativa da taxa média de mortalidade
de São Paulo segundo mi-
neonatal total, de 8,42 para 2,23 óbitos/1.000 nascidos vivos, re-
crorregiões.

443
presentando uma queda de 73%.

O coeficiente de mortalidade infantil apresentou decréscimo de


(18,7%) no período. Dentre as causas evitáveis, observou-se que as
Óbitos ocorridos entre taxas declinaram nos subgrupos: reduzíveis por ações adequadas de
2006 e 2011 em menores diagnóstico e tratamento (38,8%) e reduzíveis por adequada aten-
Menezes et al., SIM;
de um ano, residentes de ção ao feto e ao recém - nascido (30,6%). Os subgrupos reduzíveis 4
2014. SINASC
Belo Horizonte, Minas por adequadas atenção à mulher na gestação e ações de promoção
Gerais. a saúde, vinculadas às ações de atenção cresceram (17,1% e 22,7%),
respectivamente.

Foi observado decréscimo no coeficiente de mortalidade infantil


Óbitos infantis de mães de 20,4 para 12,1 por 1.000 nascidos vivos. Do total de 3.743 óbi-
Nascimento et residentes na cidade do SIM; tos registrados, 2.861 (76,4%) foram classificados como evitáveis.
4
al., 2014. Recife ocorridos entre SINASC Destacaram-se os óbitos reduzíveis por adequada atenção à mu-
2000 e 2009. lher na gestação.
Continua...
Quadro 2: Distribuição dos artigos inclusos na revisão, de acordo com a referência, fonte de dados, principais resultados e nível de evidên-
cia. Fortaleza – Ce, Brasil, 2017.
FONTE NÍVEL DE
REFERÊN- AMOSTRA E LOCAL
DOS PRINCIPAIS RESULTADOS EVIDÊN-
CIA DA PESQUISA
DADOS CIA
As proporções de óbitos evitáveis foram de 71,6% em 2000/2001
e de 65,5% em 2007/2008. A taxa de mortalidade evitável por
atenção à mulher na gestação predominou nos dois biênios, com
SIM;
incremento de 16,7%. Houve declínio das taxas de mortalidade
Óbitos infantis das coortes SINASC;
evitável pelas demais causas. A análise
Santos et al., de nascidos vivos (NV) de ficha de
de correspondência mostrou, em 2000/2001, um perfil de mor- 4
2014b. dois biênios nos anos 2000, investi-
tes representado principalmente por causas evitáveis por atenção
em Londrina, Paraná. gação do
à mulher no parto e por adequada promoção/atenção à saúde,

444
óbito.
enquanto que, em 2007/2008, por causas evitáveis por adequada
atenção à mulher na gestação, especialmente entre os nascidos com
baixo peso, e não claramente evitáveis entre os com peso adequado.
Dos 74 óbitos investigados, 51 (69%) foram neonatais e 23 (31%)
pós-neonatais, com destaque para os municípios com menos de
20 mil habitantes, onde a mortalidade neonatal ocorreu em maior
percentual com 82%. Quanto à evitabilidade dos óbitos, 82%,
Registros
Foram investigados 74 poderiam ser evitados, com percentual maior nos municípios aci-
do comitê
Fernandes, óbitos de crianças no ano ma de 50 mil habitantes. As causas de morte encontradas foram
de preven-
Vieira, Scochi, de 2008, em 15 municípios relacionadas ao período perinatal e as malformações congênitas. 4
ção do óbi-
2013. da 15a Regional de Saúde Segundo as medidas de evitabilidade, em 30 (40,5%) dos óbitos
to infantil
do Estado do Paraná. assim classificados, as mais encontradas foram às relacionadas com
e fetal.
atenção à mulher na gestação. As medidas mais indicadas pelo co-
mitê foram as de promoção de saúde e prevenção primária,
84(34%) das recomendações, com destaque para ações de educação
em saúde, avaliação do risco gestacional e planejamento familiar.
Continua...
Quadro 2: Distribuição dos artigos inclusos na revisão, de acordo com a referência, fonte de dados, principais resultados e nível de evidên-
cia. Fortaleza – Ce, Brasil, 2017.
FONTE NÍVEL DE
REFERÊN- AMOSTRA E LOCAL
DOS PRINCIPAIS RESULTADOS EVIDÊN-
CIA DA PESQUISA
DADOS CIA
Foram estudados 79 óbitos; a taxa de mortalidade infantil neonatal
79 nascidos vivos (NV) foi de 8,7/1.000 nascidos vivos (NV); o maior número de mortes
que, entre 1º de janeiro ocorreu no período neonatal precoce (6,8/1000 NV); as principais
Lourenço;
de 2007 e 27 de janeiro de causas foram prematuridade (n=21), septicemia do recém-nasci-
Brunken; DO; DNV 4
2008, foram a óbito dentro do (n=14), anencefalia (n=14) e síndrome da angústia respiratória
Luppi, 2013.
do período neonatal, em (n=12); entre os 65 óbitos considerados evitáveis, 35 foram por
Cuiabá-MT. inadequada assistência à mulher na gestação e no parto e 30 por
inadequada atenção ao recém-nascido.
Quando comparadas as causas de óbitos entre RENOSPE e pron-
A amostra foi de 53 óbi- tuários, o kappa foi de 47,6% para causas maternas e 73,9% para

445
tos neonatais contidos no Fonte pri- malformações congênitas, sensibilidade de 95% e 83,3%, e VPP de
Silva et al., banco de dados da RE- mária, com 88,9% e 85,7%, respectivamente. O percentual de óbitos evitáveis
4
2013. NOSPE e ocorridos em formulário na RENOSPE foi elevado, sendo por adequada atenção à mulher
maternidade de Teresina, próprio. na gestação em 72% dos casos. As causas classificadas como mal-
Piauí, Brasil. formações congênitas foram válidas, e os óbitos evitáveis apontam
para necessidade do controle da gravidez.
No triênio, 1,71 mortes por 1.000 nascidos vivos estavam associa-
das à asfixia perinatal, correspondendo a 22% dos óbitos neonatais
precoces. Dos 2.873 óbitos evitáveis, 761 (27%) ocorreram em São
Paulo, capital; 640 (22%), na região metropolitana da capital; e
2.873 óbitos evitáveis até
1.472 (51%), no interior do estado. Nas duas primeiras regiões
seis dias de vida associados
predominaram as mortes em hospitais públicos, recém-nascidos
Daripa et al., à asfixia perinatal ocorridos
DO; DNV com idade gestacional inferior a 37 semanas e peso abaixo de 3
2013. entre janeiro de 2001 e de-
2500g. No interior, os óbitos foram mais frequentes em entidades
zembro de 2003, no estado
beneficentes, recém-nascidos a termo e com peso superior a 2500g.
de São Paulo.
A maioria dos bebês nasceu durante o dia no município de resi-
dência materna e evoluiu para óbito no hospital de nascimento até
24 horas após o parto. A síndrome de aspiração de mecônio esteve
presente em 18% dos óbitos.
Continua...

Quadro 2: Distribuição dos artigos inclusos na revisão, de acordo com a referência, fonte de dados, principais resultados e nível de evidên-
cia. Fortaleza – Ce, Brasil, 2017.
AMOSTRA E LOCAL DA FONTE DOS NÍVEL DE
REFERÊNCIA PRINCIPAIS RESULTADOS
PESQUISA DADOS EVIDÊNCIA
Óbitos reduzíveis por adequada Do total de 344 óbitos neonatais
atenção à mulher na gestação, 78(22,6%) foram classificados como
Brandão; Godeiro; de acordo com lista de causas de reduzíveis por adequada atenção à
SIM; SINASC 4
Monteiro, 2012. mortes evitáveis por intervenções do mulher na gestação. Os dados apon-
SUS proposta em 2007. Natal, Rio tam uma progressiva queda nos anos
Grande do Norte. estudados.
Apesar de um declínio ao longo dos
anos do coeficiente de mortalidade
infantil, mantém-se um predomínio
Dados secundários relativos à mor-
do componente neonatal à custa dos
talidade infantil, segundo grupos de

446
Freitas; Gonçalves; óbitos neonatais precoces, sem redução
causas e componentes, no municí- SIM; SINASC 4
Ribeiro, 2012. das causas evitáveis (ou reduzíveis) de
pio de Viçosa, no período de 1998
óbitos nos períodos neonatal e pós-
a 2010.
neonatal, as quais vêm mantendo-se
em percentuais superiores às causas de
óbitos não evitáveis ou mal definidas.
Segundo informação das auditorias,
Todos os óbitos infantis de filhos Formulários de 43,6% dos óbitos eram redutíveis por
de mulheres residentes na cidade de investigação dos adequada atenção à mulher na gestação
Silva et al., 2012. 4
Pelotas-RS, ocorridos no período de óbitos infantil e e segundo os dados do SIM, 41,9% dos
2005 a 2008. fetal óbitos eram redutíveis por adequada
atenção ao recém-nascido.
Quadro 2: Distribuição dos artigos inclusos na revisão, de acordo com a referência, fonte de dados, principais resultados e nível de evidên-
cia. Fortaleza – Ce, Brasil, 2017.
Coeficiente de mortalidade neonatal
foi de 10,99 por mil NV. Quanto aos
dados maternos, identificou-se ida-
de média de 24 anos e escolaridade
<8 anos. Verificou-se que 63,46% das
Óbitos neonatais (0 a 27 dias de vida)
mães tiveram <6 consultas de pré-natal.
Rocha et al., 2011. de residentes na cidade do Recife SIM; SINASC 4
A maioria dos óbitos ocorreu no pe-
ocorridos entre 1999 e 2009.
ríodo neonatal precoce, apresentavam
baixo peso ao nascer e prematuridade.
As afecções perinatais foram a princi-
pal causa de óbito. Cerca de 80% dos
óbitos foram considerados evitáveis.

447
As causas evitáveis e as causas mal de-
finidas apresentaram significativa redu-
ção (p < 0,001). As causas reduzíveis de
Óbitos de menores de um ano de ida- mortalidade apresentaram redução de
Malta et al., 2010. de, ocorridos no Brasil e regiões, no SIM; SINASC 37%. A mortalidade por causas reduzí- 4
período de 1997 a 2006. veis por adequada atenção ao parto de-
clinou em 27,7%; adequada atenção ao
recém-nascido, 42,5%; e por adequada
atenção à gestação cresceu 28,3%.
Continua...
Quadro 2: Distribuição dos artigos inclusos na revisão, de acordo com a referência, fonte de dados, principais resultados e nível de evidên-
cia. Fortaleza – Ce, Brasil, 2017.
AMOSTRA E
FONTE DOS NÍVEL DE
REFERÊNCIA LOCAL DA PRINCIPAIS RESULTADOS
DADOS EVIDÊNCIA
PESQUISA
O CMI caiu 27% entre 1997 (17,6/1000NV) e 2006 (12,8/1000
NV), em consequência de reduções de 5% no CMIne e de 37%
no CMIev [12,7/1000 NV em 1997 e 8,06/1000 NV em 2006],
como detalhado a seguir: o CMIev por ações de imunoprevenção
caiu 100% (de 0,06 a 0,00/1000 NV), por ações de promoção
Óbitos infantis à saúde vinculadas a ações de atenção em saúde caiu 69% (de
ocorridos entre 1,92 a 0,60/1000 NV), por adequada atenção à mulher no parto
Batista et al., 2010 SIM; SINASC 4
1997 e 2006, no caiu 62% (de 2,05 a 0,78/1000 NV), por ações de diagnóstico
Distrito Federal. e tratamento adequados caiu 51% (de 1,64 a 0,80/1000 NV)

448
e por adequada atenção ao recém-nascido caiu 39% (de 6,32 a
3,85/1000 NV). Por outro lado, o CMIev por adequada atenção
à mulher na gestação teve um incremento de 189%, de 0,7/1000
NV em 1997 para 2,04/1000 NV em 2006. O CMImd perma-
neceu baixo (<0,5/1000 NV) durante todo o período de análise.
Dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) re-
velaram óbitos por causas perinatais em 54,3% dos 1.537 casos;
anomalias congênitas em 14,9%; doenças infecciosas e parasi-
1.537 óbitos
tárias em 9,4% e doenças do aparelho respiratório em 7%. As
infantis em 16
Gastaud; Honer; mortes evitáveis e reduzíveis perfizeram 73,1%, na maior parte
municípios sulma- SIM 4
Cunha, 2008. (69,5%) decorrendo de inadequada atenção à mulher na gesta-
to-grossenses em
ção e parto e ao recém-nascido. Outras causas relacionaram-se
2000-2002.
à imunoprevenção (0,7%), ações de diagnóstico e tratamento
(10,4%) e promoção à saúde (11,2%). As mortes por causas não
claramente evitáveis totalizaram 24,3%.
Quadro 2: Distribuição dos artigos inclusos na revisão, de acordo com a referência, fonte de dados, principais resultados e nível de evidên-
cia. Fortaleza – Ce, Brasil, 2017.
296 municípios bra- Os municípios que compuseram os quartis com maior mortali-
sileiros que apresen- dade infantil por causas evitáveis apresentaram também menor
Boing; Boing, taram no censo do Fonte secun- Índice de Desenvolvimento Humano Municipal, Produto In-
4
2008. ano 2000 população dária terno Bruto per capita, pessoas que vivem em domicílios com
superior a 80 mil banheiro e água encanada, despesa total com saúde por habitante
habitantes. e médicos por mil habitantes; e maior coeficiente de Gini.
SIM; SI- As variáveis sexo, idade materna, número de filhos nascidos vi-
1.139 casos de óbi- NASC; Pro- vos, tipo de gravidez, local de nascimento e Apgar no 5o minuto
tos infantis, ocor- grama de não se associaram aos óbitos evitáveis. No entanto, a escolaridade
Jobim; Aerts, ridos entre 2000 e materna ≤ 3 anos; mãe sem companheiro ou com filhos nascidos
3
2008. 2003, na população Vigilância da mortos; ter malformação congênita; cesariana; idade gestacional
residente em Porto Morbimorta- entre 22 e 36 semanas; peso inferior a 2.500g e ter menos de seis
Alegre. lidade (PRÁ- dias de vida apresentaram associação significativa com os óbitos
VIVER) evitáveis.

449
Fonte: Fonte: Coletado pelas autoras (2017).
Conclusão.
Os óbitos infantis por causas evitáveis tem apresentado
uma redução dos seus índices. Contudo, ainda são respon-
sáveis por mais da metade das mortes em menores de um
ano de vida, perfazendo uma média de 60 a 80% desses óbi-
tos (LISBOA et al., 2015; NASCIMENTO et al., 2014;
SANTOS et al., 2014b; FERNANDES; VIEIRA; SCO-
CHI, 2013; ROCHA et al., 2011; GASTAUD; HONER;
CUNHA, 2008). Os dados expostos no estudo de Areco,
Konstantyner e Taddei (2016) evidenciam que a mortalida-
de por causas evitáveis predominam no país desde 1996, e
apresentam tendência decrescente desde então, porém essa
redução ainda é pouco expressiva.
Entre as categorias de evitabilidade do óbito infantil,
a reduzível por adequada atenção à mulher na gestação foi
a que apresentou os índices mais altos, enquanto as outras
causas apresentaram declínio mais significativo. As causas
reduzíveis por ação de imunoprevenção foi a categoria que
apresentou os índices mais satisfatórios. As causas relacio-
nadas a atenção à gestação, parto e ao recém-nascido mere-
cem especial atenção, focando principalmente na gestação,
em virtude dos incrementos significativos que essa categoria
vem apresentando (LISBOA et al., 2015; MENEZES et
al., 2014; NASCIMENTO et al., 2014; SANTOS et al.,
2014b; FERNANDES; VIEIRA; SCOCHI, 2013; LOU-
RENÇO; BRUNKEN; LUPPI, 2013; SILVA et al., 2013;
BRANDÃO; GODEIRO; MONTEIRO, 2012; SILVA
et al., 2012; BATISTA et al., 2010; MALTA et al., 2010;
GASTAUD; HONER; CUNHA, 2008). Nesse contexto,
um estudo de revisão, realizado por Figueiredo et al. (2012),
ficou evidente que o pré-natal é um fator de forte influência

450
sobre a mortalidade infantil. Os autores ainda ressaltam a
necessidade de avaliar não só os aspectos quantitativos da
assistência pré-natal, mas também e principalmente, a sua
qualidade.
Em virtude da realidade apresentada, foram recomen-
dadas ações de promoção de saúde, prevenção primária e
de controle da gravidez (FERNANDES; VIEIRA; SCO-
CHI, 2013; SILVA et al., 2013).
Outro aspecto importante encontrado, foi a associação
dos óbitos evitáveis com aspectos socioeconômicos, como o
índice de desenvolvimento humano, produto interno bru-
to per capita, condições do domicílio, despesas com saúde,
quantidade de médicos por habitantes (BOING; BOING,
2008). Os óbitos evitáveis também estiveram associados a
baixos níveis de escolaridade materna (<3 anos), mãe sem
companheiro, com filhos nascidos mortos, malformação
congênita, cesariana, idade gestacional entre 22 e 36 sema-
nas, peso menor que 2.500g, idade inferior a 6 dias de vida
(JOBIM; AERTS, 2008).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o objetivo de descrever, com base na literatura


científica, as evidências existentes acerca da evitabilidade do
óbito infantil no Brasil, esta revisão integrativa evidenciou a
necessidade de desenvolvimento de ações que atuem sobre
a assistência à gestação, ao parto e ao recém-nascido, com o
intuito de qualificar essa assistência e reduzir os índices de
mortalidade infantil por causas evitáveis.

451
Nessa perspectiva, recomenda-se o desenvolvimento
de pesquisas que proporcionem melhores níveis de evidên-
cia e que enfatizem os aspectos que mais contribuem para
os altos índices de óbitos evitáveis, fundamentando assim,
a prática.

Bibliografia Básica
ARECO, K. C.; KONSTANTYNER, T.; TADDEI, J. A. A. C.
Tendência secular da mortalidade infantil, componentes etários e
evitabilidade no Estado de São Paulo --- 1996 a 2012. Rev Paul
Pediatr. v. 34, n. 3, pp.:263-70, 2016.
BATISTA, R. V. et al. Evolução da mortalidade infantil por causas
evitáveis: série histórica 1997-2006, Distrito Federal. Com. Ciên-
cias Saúde. v. 21, n. 3, pp.:201-10, 2010.
BOING, A. F.; BOING, A. C. Mortalidade infantil por causas
evitáveis no Brasil: um estudo ecológico no período 2000-2002.
Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 24, n. 2, pp.:447-55, 2008.
BRANDÃO, I. C. A.; GODEIRO, A. L. S.; MONTEIRO, A.
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tos neonatais. Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, v. 20, (esp1),
pp.:596-602, 2012.
BRASIL. Ministério da Saúde. Óbitos por causas evitáveis - 0 a 4
anos. Notas Técnicas. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/
sim/Obitos_Evitaveis_0_a_4_anos.pdf Acesso em: 24 de fev. de 2017.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde.
Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. Atenção
à saúde do Rcém-nascido: guia para os profissionais de saúde. –
Brasília: Ministério da Saúde, 2011.

452
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde.
Secretaria de Atenção à Saúde. Manual de vigilância do óbito
infantil e fetal e do Comitê de Prevenção do Óbito Infantil e
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456
Capítulo 19

CUIDADOS E SAÚDE PRIMÁRIOS: governança e


inovação em saúde em portugal

Pedro L Ferreira
Vítor Raposo
Patrícia Ferreira Antunes

Introdução

A reforma dos cuidados de saúde primários em Portu-


gal, iniciada em 2006, preconizou uma mudança organiza-
cional desenvolvida a partir da linha da frente da prestação
de cuidados de saúde. A Missão para os Cuidados de Saúde
Primários apresentou-a como uma reforma com um grande
enfoque na inovação organizacional com o intuito de cria-
ção de novos contextos favoráveis à mudança de comporta-
mentos, onde a efetividade da liderança foi considerada a
chave para o sucesso.
Esta profunda mudança incidiu no modelo de gover-
nação, fortemente influenciado pelos princípios da gover-
nação clínica, e na reorganização dos centros de saúde no
novo modelo de Agrupamentos de Centros de Saúde, ten-
do sido caracterizada por uma desagregação dos centros de
saúde em unidades funcionais mais flexíveis e autónomas.

457
Neste capítulo iremos inicialmente abordar os concei-
tos de governança e de inovação em saúde, após o que fare-
mos um breve percurso pelos cuidados de saúde primários
em Portugal. Por fim, ilustraremos este capítulo com dois
exemplos de boa governança e de inovação em cuidados de
saúde primários: a monitorização da satisfação dos utiliza-
dores e a contratualização com as unidades de saúde.

GOVERNANÇA EM SAÚDE

Os sistemas de saúde desempenham um papel de ex-


trema importância na melhoria da saúde e, por isso, a go-
vernança em saúde (health governance) tem vindo a assumir
um papel cada vez mais predominante no desenvolvimen-
to dos sistemas de saúde e nas reformas implementadas
(Kickbusch, 2002; Kickbusch & Gleicher, 2012; WHO,
1998a, 2002a). A governança em saúde é importante, por-
que os sistemas de saúde são complexos, são sensíveis ao
domínio das comunidades e dos indivíduos, estão molda-
dos aos ambientes sociais, económicos e culturais onde se
integram, são orientados por valores e constituem sistemas
extremamente específicos em termos de produto, processos
e estruturas (Raposo, 2007).
A governança (governance) pode ser definida como o
conjunto de ações e de meios adotados por uma sociedade
para promover a ação coletiva e para lançar soluções também
coletivas na procura de objetivos comuns (Dodgson, Lee, &
Drager, 2002). Surge como um termo muito geral que englo-
ba as diversas modalidades que os seres humanos, quer como

458
indivíduos quer como grupos, adotam para se organizarem
de forma a atingir determinados objetivos. Tal organização
requer acordos e consensos num vasto conjunto de assuntos
incluindo o tipo de associação nas relações cooperativas, as
obrigações e as responsabilidades dos membros, a tomada
de decisões, as formas de comunicação, mobilização e dis-
tribuição de recursos, a fixação ou clarificação da disputa, e
as regras formais ou informais relativas a todos estes pontos.
A boa governança é vista pelas organizações interna-
cionais de desenvolvimento como uma condição necessária
para o desenvolvimento económico (World Bank, 1992,
1994, 1997, 2003), social e humano sustentado (UNDP,
1997a, 1997b, 2004). Trata-se de uma instância da gover-
nança, onde os recursos e os problemas são geridos de for-
ma efetiva e eficiente, como resposta às necessidades mais
críticas da sociedade. São reconhecidos como princípios
universais da boa governança: a participação, a orientação
para consensos, a visão estratégica, a resposta, a efetividade
e a eficiência, a prestação de contas e a responsabilização,
a transparência, a equidade e o primado da lei (Grahan,
Amos, & Plumptre, 2003; UNDP, 1997a, 1997b).
A governança em saúde diz respeito às ações e aos
meios adotados por uma sociedade para se organizar com
vista à promoção e à proteção da saúde da sua população
(Dodgson et al., 2002). A boa governança em saúde tem
vindo a assumir um papel cada vez mais predominante no
desenvolvimento dos sistemas de saúde, na promoção e
melhoria do seu desempenho e na efetividade das reformas
implementadas (Kickbusch, 2002; Kickbusch & Gleicher,
2012; WHO, 1998a, 2002a).

459
Desta forma, a boa governança em saúde é uma ins-
tância da governança em saúde, onde os recursos e os
problemas são geridos de forma efetiva e eficiente, como
resposta às necessidades mais críticas da sociedade, nomea-
damente à promoção e à proteção da saúde da sua popula-
ção. Assim, para além dos princípios já identificados para
a boa governança em geral (Grahan et al., 2003; UNDP,
1997a, 1997b), a boa governança em saúde envolve todos
os potenciais interessados na formulação e implementação
de políticas de saúde (WHO, 1998a), coloca os utilizado-
res, mais do que os prestadores de cuidados, no centro dos
sistemas de saúde (WHO, 1998a, 1998b, 1998c), e atribui
ao Ministro da Saúde o papel fundamental de supervisão,
salvaguarda e tutela (stewardship) na defesa do interesse pú-
blico (WHO, 2000).
Apesar de não existir oficialmente um enquadramen-
to que permita avaliar a boa governança em saúde, podem
ser utilizados alguns enquadramentos existentes, nomeada-
mente: os domínios associados ao conceito de provedoria
(stewardship) da Organização Mundial da Saúde - OMS
(WHO, 2000); as funções essenciais da saúde pública da
Organização Pan-americana da Saúde - PAHO (WHO,
2002b, 2003); as dimensões da boa governança do Ban-
co Mundial (Kaufmann, Kraay, & Zoido-Lobatón, 1999;
World Bank, 2003); os princípios de boa governança do
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento -
PNUD (Grahan et al., 2003; UNDP, 1997a, 1997b); os
indicadores de boa governança da World Governance Asses-
sment – WGA (Court, Hyden, & Mease, 2002); as carac-
terísticas institucionais dos sistemas de saúde da Organi-

460
zação para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
- OCDE (Joumard, André, & Nicq, 2010; Paris, Devaux,
& Wei, 2010); os indicadores de boa governança em saú-
de da United States Agency for International Development -
USAID (Brinkerhoff & Bossert, 2008), ou a proposta de
Siddiqi et al. (2009) que considera três níveis de avaliação
distintos – nacional, formulação de políticas de saúde, e im-
plementação de políticas – com base nos princípios da boa
governnça.
A utilização do conceito de governança em saúde não
se esgota, no entanto, no nível macro dos sistemas de saúde.
Segundo Raposo (2007), ao nível das organizações presta-
doras de cuidados de saúde o conceito tem vindo também
a ser utilizado de forma recorrente, embora mais orientado
para as questões relativas à prática clínica – governança clí-
nica (clinical governance) – e para as questões assentes nas
relações e nos equilíbrios estabelecidos entre os órgãos de
governo das organizações – governança integrada (integra-
ted governance) e governança hospitalar (hospital governance)
recolhendo, adotando e adaptando princípios da governan-
ça empresarial (corporate governance).
A governança clínica é um sistema com o objetivo de
melhorar os padrões da prática clínica, baseado numa série
de processos (prática baseada na evidência, monitorização
clínica, auditoria, gestão do risco, envolvimento dos doen-
tes) para melhorar a qualidade e assegurar que os profis-
sionais prestam contas e se responsabilizam pelos atos da
sua prática clínica (Department of Health, 1998; Goodman,
1998; Scally & Donaldson, 1998; Starey, 2003). A gover-
nança clínica tem sido utilizada como uma aproximação

461
integrada para a melhoria contínua da qualidade na prática
clínica (Scally & Donaldson, 1998) assente em diversas ca-
racterísticas: formação, auditoria clínica, efetividade clínica,
investigação e desenvolvimento, abertura e gestão do risco.
Por seu turno, a governança integrada (integrated go-
vernance) é definida como um conjunto de sistemas e pro-
cessos através dos quais as organizações de saúde conduzem,
dirigem e controlam as suas funções de modo a atingir os
objetivos organizacionais, a segurança e a qualidade dos ser-
viços, bem como para reportar aos doentes, à comunidade
em geral e aos restantes parceiros organizacionais (Deighan,
Cullen, & Moore, 2004). Esta aproximação à governan-
ça das organizações de saúde pretende fundir numa mes-
ma plataforma as questões relacionadas com a governança
clínica (centrada nas práticas clínicas), com a governança
empresarial (centrada nas relações e nos equilíbrios entre
os órgãos de governo das organizações), com a governança
de investigação (centrada nas práticas de investigação e de-
senvolvimento), com a governança da informação (centrada
nos processos de acesso à informação como suporte à toma-
da de decisão), e com a governança financeira.
A governança hospitalar é uma instância particular da
governança integrada – aplicada em organizações hospita-
lares – e diz respeito ao conjunto complexo de verificações e
equilíbrios que determinam a tomada de decisão dos órgãos
de governo do hospital; pode ser definida como o processo
de conduzir o funcionamento global e o desempenho efe-
tivo de um hospital, através da definição da sua missão, da
fixação de objetivos, e do suporte e monitorização da sua
realização a nível operacional (Eeckloo, Herck, Hulle, &

462
Vleugels, 2004). A governança hospitalar permite assim
uma aproximação integrada de suporte e supervisão de to-
das as atividades do hospital incluindo o desempenho clí-
nico.

INOVAÇÃO EM SAÚDE

A inovação significa ter uma ideia nova ou, por vezes,


aplicar as ideias de outras pessoas em novidades ou de uma
nova forma (Sarkar, 2014), implicando dois elementos fun-
damentais: a criatividade e ideias novas. No entanto, é mais
do que ter ideias, sendo necessário que a ideia seja implemen-
tada e tenha um impacto positivo; no fundo, o desafio está
em fazer com que a inovação se transforme numa ideia que
é implementada com sucesso. Nesta ótica, a OECD (2005)
considera a inovação como sendo a implementação de um
produto (bem ou serviço) novo ou significativamente melho-
rado, um processo novo, um método de marketing novo, ou
um método organizacional novo nas práticas de negócios, na
organização do local de trabalho ou nas relações externas.
As tipologias de inovação são diversas. Por exemplo,
utilizando a mesma fonte, a inovação pode ser caracteriza-
da por objeto de inovação (produto, processo, marketing,
organizacional), por novidades de resultados (radical, ins-
trumental, disruptiva), por fonte de inovação (inovação e
desenvolvimento, não por investigação e desenvolvimento),
por inovação estratégica (fechada, aberta, disruptiva, sus-
tentável), e por origem ou suporte (top down/bottom-up).
Ao longo do tempo, vários manuais têm procurado olhar

463
para a inovação de diferentes formas e perspetivas no sen-
tido de compreender o papel da inovação na sociedade e
as diferentes formas de avaliar o seu impacto (Albornoz &
Mata, 2009; Jaramillo, Lugones, & Salazar, 2001; OECD,
1990, 1995, 2002, 2009, 2012; Red Iberoamericana de In-
dicadores de Ciencia y Tecnología, 2007).
A inovação tem vindo a assumir um papel preponde-
rante dentro do sector público e alguns autores, como por
exemplo Mazzucato (2011), defendem o importante papel
do Estado neste processo, procurando contrariar a ideia de
um Estado que apenas tem o papel de regular um sector
privado extremamente dinâmico, defendendo que muitos
dos avanços tecnológicos mais importantes foram resulta-
do de uma ação mais ambiciosa do Estado. No entanto,
não existe uma definição estabelecida de inovação no sector
público (ISP), considerando-se que a emergência de alguns
elementos comuns a projetos de investigação nacionais e
internacionais e os trabalhos de investigação que estudam a
inovação no sector púbico podem trazer contributos para a
ISP (Daglio, Gerson, & Kitchen, 2015).
A ISP significa novas ideias que funcionam na criação
de valor público, que podem significar novas formas de or-
ganizar, recompensar ou comunicar, inovações em políticas
públicas ou inovações em serviços – algumas podem mes-
mo ser radicais, como por exemplo a criação de um Serviço
Nacional de Saúde (Mulgan, 2007). A ISP envolve criar,
desenvolver e implementar ideias práticas que permitam al-
cançar um benefício público; essas ideias têm de ser, pelo
menos em parte, novas (mais do que melhorias), têm de
ser implementadas, e têm de ser úteis (Mulgan, 2014). A

464
inovação dentro do sector público pode passar por um novo
serviço ou um serviço significativamente melhorado, um
método de comunicação, um processo ou método organi-
zacional que compreenda novas formas de atingir objetivos
e com aplicabilidade (Eurobarometer, 2011). Segundo Paul
e Per (2008), podemos falar de inovação de serviços (intro-
dução de um novo serviço ou uma melhoria da qualidade de
um serviço já existente), inovação na prestação de serviços
(formas novas ou modificadas de fornecimento de serviços
públicos) ou inovação administrativa e organizacional (mu-
danças nas estruturas organizacionais e rotinas). As fontes
de inovação no ISP podem ser diversas: os próprios funcio-
nários públicos (ou em outro qualquer regime contratual),
os parceiros externos, os parceiros internos e, com um papel
preponderante, os cidadãos (Eggers & Sing, 2009).
Na saúde a inovação possui um papel preponderante
na resposta às necessidades e expectativas dos cidadãos. Tal
como na ISP, a inovação em saúde pode ter diferentes in-
terpretações. O Health Innovation Group, ligado à da OMS,
considera que a inovação em saúde é desenvolver e imple-
mentar políticas, sistemas, produtos e tecnologias de saúde
novos ou melhorados, e serviços e métodos de distribuição
que melhorem a saúde das pessoas (WHO, 2017). Por seu
turno, o Copenhagen Health Innovation considera que a ino-
vação em saúde se relaciona com a fusão de conhecimento,
desenvolvimento e oportunidades tecnológicas com a práti-
ca, a fim de criar melhor bem-estar e qualidade de vida para
doentes e cidadãos (Copenhagen Health Innovation, 2017).
Num contexto de cobertura universal da saúde e dos
objetivos de desenvolvimento sustentável, o Health Innova-

465
tion Group considera que a inovação em saúde compreende:
(i) desenvolver e implementar políticas, sistemas, produtos
e tecnologias de saúde novos ou melhorados, assim como
serviços e métodos de prestação que melhorem a saúde das
pessoas; (ii) responder às necessidades não satisfeitas, empre-
gando novas formas de pensar e trabalhando com foco espe-
cial nas necessidades das populações vulneráveis; (iii) agregar
valor sob a forma de melhor eficiência, eficácia, qualidade,
segurança e/ou acessibilidade; (iv) pode ser preventiva, pro-
motora, terapêutica, de reabilitação e/ou de assistência.
Por seu turno, num contexto de formação e educação o
Copenhagen Health Innovation centra a inovação na corres-
pondência entre as necessidades do sector social e da saú-
de, através de programas de estudos orientados para: (i) a
identificação de necessidades e desafios no sector social e de
saúde; (ii) o desenvolvimento de ideias para soluções e pro-
jetos interdisciplinares inovadores; (iii) o teste de ideias em
colaboração próxima com a prática (organizações, serviços
de saúde, instituições); (iv) a análise de soluções e a criação
de condições básicas para as decisões e a sua implementa-
ção; e (v) o apoio à implementação.

EVOLUÇÃO DOS CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁ-


RIOS EM PORTUGAL

É reconhecido o papel dos serviços prestadores de cui-


dados de saúde na satisfação das necessidades e das expecta-
tivas dos seus utilizadores, quer no que respeita aos aspetos
técnicos dos cuidados quer aos interpessoais (Campbell et
al., 2000; Donabedian, 1988). Neste contexto, os cuidados

466
de saúde primários (CSP) pretendem afirmar-se como a
primeira e a principal forma de contacto dos cidadãos com
o sistema de saúde. Isso é assumido pela reforma dos cuida-
dos primários em curso, constatada que foi a necessidade de
uma profunda mudança organizacional.
Os primeiros centros de saúde tiveram origem na re-
forma do sistema de saúde e da assistência delineada por
Gonçalves Ferreira, Arnaldo Sampaio e Baltazar Rebelo de
Sousa em 1971, sendo Portugal um dos primeiros países
europeus a adotar uma abordagem integrada para os CSP,
criando uma rede de centros de saúde abrangendo a genera-
lidade do país (Pisco, 2011). Contudo, essa situação só foi
operacionalizada após a criação do Serviço Nacional de Saú-
de (SNS) em 1979 e de uma alteração substancial da política
em Portugal. É possível definir quatro períodos marcantes
na evolução e no desenvolvimento dos CSP em Portugal.
Os denominados centros de saúde de primeira gera-
ção incluíam atividades como a vacinação, a vigilância de
saúde da mulher, da grávida e da criança, saúde escolar e
ambiental, entre outras, ou seja, os cuidados eram centrados
essencialmente na prevenção da doença e coexistiam com a
rede de postos dos Serviços Médico-Sociais das Caixas de
Previdência, que se dedicava à prestação de cuidados em
situação de doença (OPSS, 2008). Em 1982 é criada a car-
reira médica de clínica geral que permitiu a colocação defi-
nitiva, em cerca de 3 anos, de mais de cinco mil médicos de
família em todo o país (Ministério da Saúde, 2012).
Os centros de saúde de segunda geração criados atra-
vés do Despacho Normativo n.º 87/83, de 22 de abril, re-
sultaram da integração dos centros de saúde de primeira ge-

467
ração com a extensa rede dos postos médicos dos Serviços
Médico-Sociais das Caixas de Previdência, em 1982-1983.
Desta integração resultaram cerca de 370 centros de saúde
integrados, englobando mais de 2.000 extensões de saúde.
No entanto, o excesso de normativismo e a relação distante
das sub-regiões e das Administrações Regionais de Saúde
(ARS), levaram à desmotivação dos profissionais e à difi-
culdade em dar respostas às necessidades de saúde da popu-
lação (OPSS, 2008).
Entre 1995 e 1996 foi então proposta uma mudança
radical na lógica de organização e de funcionamento dos
CSP em Portugal. Devido ao modelo desajustado de or-
ganização por grupos profissionais separados e da gestão
burocrática dos centros de saúde, surgiram novas iniciativas
experimentais e projetos-piloto. O projeto “Alfa” que sur-
giu em 1996 na Região de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo,
foi a primeira experiência que pretendeu proporcionar algu-
ma autonomia no seio do SNS, tendo como contrapartida
a melhoria no acesso e na qualidade (Ministério da Saúde,
2004). Dois anos depois, em 1998, pelo Decreto-Lei (DL)
n.º 117/98, de 5 de maio, foi criado o Regime Remunerató-
rio Experimental (RRE) dos médicos de Clínica Geral, as-
sente no princípio de que a remuneração estaria dependente
da quantidade e da qualidade do desempenho.
Em 1999, com a publicação do DL n.º 157/99, de 10
de maio, que estabeleceu o regime de criação, organização
e funcionamento dos centros de saúde, foi consagrada uma
matriz organizativa dos centros de saúde com base em uni-
dades de saúde familiar (USF), os denominados centros de
saúde de terceira geração.

468
Em 2005, através do DL n.º 88/2005, de 3 de junho,
reiniciou-se a reforma do CSP e foi criada a Missão para os
CSP, tendo sido esta a responsável pela elaboração e imple-
mentação das medidas que tinham como principal objetivo
centrar o SNS nos CSP, através da reorganização dos centros
de saúde, melhorando a acessibilidade aos cuidados, a quali-
dade e a sua continuidade, assim como a eficiência, e aumen-
tar a satisfação de profissionais e utilizadores. Para tal, seguiu-
se uma série de princípios dos quais se destacam: a orientação
para a comunidade; a flexibilidade organizativa e de gestão;
a desburocratização; o trabalho em equipa; a autonomia e a
responsabilização; a melhoria contínua da qualidade; a con-
tratualização e a avaliação (Biscaia & Amorim, 2013).
Antes da atual reforma dos centros de saúde, estes es-
tavam organizados em cinco ARS, 18 Sub-regiões de Saú-
de e 363 centros de saúde. Em 2008 procedeu-se a uma
profunda reestruturação (DL n.º 28/2008, 22 de fevereiro,
republicado pelo DL n.º 137/2013, de 7 de outubro), sen-
do os centros de saúde extintos como unidades prestadoras
de cuidados de saúde. A junção de vários centros de saúde
deu lugar em 2009 aos Agrupamentos de Centros de Saúde
(ACeS), que segundo este DL, são considerados serviços
de saúde com autonomia administrativa, embora sujeitos ao
poder de direção da respetiva ARS e cuja missão é garantir
a prestação de CSP à população de uma determinada área
geográfica, mantendo os princípios de equidade e de soli-
dariedade.
Estes agrupamentos são constituídos por várias unida-
des funcionais que se complementam. A figura 1 ilustra a
estrutura orgânica de um ACeS.

469
Figura 1 – Estrutura de um ACeS

ECLCCI – Equipa Coordenadora Local de Cuidados Continuados Integrados


UCC - Unidade de Cuidados na Comunidade
UCSP - Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados
URAP - Unidade de Recursos Assistenciais Partilhados
USF - Unidade de Saúde Familiar
USP - Unidade de Saúde Pública

São vários os aspetos distintos que definem os ACeS.


Estas estruturas são responsáveis pela gestão de unidades
funcionais simplificadas e flexíveis: as Unidades de Saúde
Familiar (USF), as Unidades de Cuidados de Saúde Perso-
nalizados (UCSP), as Unidades de Cuidados na Comuni-
dade (UCC), a Unidade de Saúde Pública (USP) e a Uni-
dade de Recursos Assistenciais Partilhados (URAP). Estas
unidades funcionais são constituídas por pequenas equipas
multiprofissionais, com autonomia organizacional, funcio-
nal e técnica, sujeitas a um mecanismo de contratualização
interna que envolve a definição de objetivos em diversas
áreas (acessibilidade, desempenho assistencial, efetividade,
eficiência e qualidade).

470
Os ACeS dispõem ainda de órgãos de administração e
fiscalização, a saber, o Diretor Executivo, o Conselho Exe-
cutivo, o Conselho Clínico e de Saúde (DL n.º 243/2012,
de 27 de novembro) e o Conselho da Comunidade. Sob a
dependência do Diretor Executivo funcionam ainda, como
serviços de apoio, a Unidade de Apoio à Gestão e o Gabi-
nete do Cidadão. Estes órgãos e serviços possibilitam a to-
mada de decisão a nível local e a implementação de soluções
adaptadas aos recursos existentes. Por outro lado, abrem ca-
minho à concretização de sistemas de liderança com maior
proximidade e de governação clínica e técnica e à criação de
mecanismos de representação e de participação da comuni-
dade e dos cidadãos.
Esta agregação visa permitir decisões mais céleres e
próximas das equipas multiprofissionais e das comunidades,
que são quem protagoniza verdadeiramente os CSP.

DOIS EXEMPLOS DE BOA GOVERNANÇA E INO-


VAÇÃO EM SAÚDE

De seguida serão apresentados dois exemplos de boa


governança e de inovação em cuidados de saúde primários:
a monitorização da satisfação dos utilizadores e a contra-
tualização.

Satisfação dos utilizadores


Já em 2001 o Observatório Português dos Sistemas
de Saúde destacava o papel dos cidadãos enquanto contri-
buintes e utilizadores e enfatizava a necessidade de se alterar

471
consideravelmente a sua relação com o sistema de saúde.
Lembrava, então, alguns direitos que, a serem exercidos,
permitem situar o cidadão no centro do sistema. Entre eles
importa mencionar o direito à informação, encarada como
um instrumento de democratização do sistema de saúde,
a par com o financiamento, a organização e a gestão dos
serviços de saúde (OPSS, 2011).
Por isso, a avaliação da satisfação dos usuários é hoje
em dia reconhecida como um valor a adicionar a outras me-
didas de resultado como o estado de saúde ou a qualida-
de de vida (Debono & Travaglia, 2009; Grol et al., 2000).
Os dados de satisfação dos utilizadores são normalmen-
te usados para duas finalidades. Em primeiro lugar, para
avaliar os cuidados prestados e, além disso, para prever os
seus comportamentos enquanto «consumidores», nomeada-
mente sabendo se recomendam as unidades de saúde que
normalmente frequentam ou se voltariam, se necessário, às
mesmas unidades (Ware et al., 1977).
Esta necessidade de informação passa também pelo
conceito de transparência – um dos critérios mínimos de boa
governança de qualquer sistema de saúde – e pelo conceito
de participação que engloba, por outro lado, a possibilidade
de reclamação, o direito de ser ouvido face à opinião que tem
sobre o sistema de saúde ou o impacto da sua experiência
com esse sistema. Passa também pela capacidade de ser en-
volvido nas tomadas de decisão a vários níveis do sistema,
desde o nível da prestação direta de cuidados, ao nível do pla-
neamento, da definição de prioridades e da decisão política.
De entre os modelos conceptuais existentes que reco-
nhecem a utilidade da avaliação da satisfação destaca-se,

472
logo à partida, o Modelo de Donabedian “Estrutura, pro-
cesso e resultados”, em que a satisfação dos utilizadores é
reconhecida como parte integrante da medição de resulta-
dos em saúde, a par da melhoria do estado de saúde e da
qualidade de vida dos indivíduos (Donabedian, 1980).
Também no Modelo de Excelência da European Fou-
ndation for Quality Management (EFQM) os processos
organizacionais e de gestão são meios para a obtenção de
resultados, incluindo não só os resultados de desempenho,
mas também a satisfação dos utilizadores, dos profissionais
e o impacto da prestação de cuidados na sociedade.
Por outro lado, mais recentemente, Porter apresentou
a sua cadeia de causalidade de valor, segundo a qual a medi-
ção do valor dos cuidados prestados para uma determinada
condição de saúde ou população de doentes começa com
os resultados em saúde, comparados com os custos totais
de obtenção no ciclo completo de cuidados (Porter, 2010).
E aí, a satisfação dos doentes, com questionários a serem
regularmente implementados nas organizações de saúde,
constitui um passo na direção correta para a medição do
valor. Este autor chama, no entanto ainda, à atenção para o
facto de muitas vezes a satisfação dos doentes incidir apenas
no processo de cuidados (hospitalidade, amenidades, sim-
patia e outros aspetos da experiência do serviço), devendo
também incluir perguntas que representem o conceito de
melhoria de valor. Medir a satisfação pode ser um bom veí-
culo para a medição da adesão e, principalmente, do estado
de saúde apercebido pelos doentes.
Por fim, a um nível mais sistémico, o modelo Health
System Performance Assessment (HSPA) da OMS define as

473
funções que qualquer sistema de saúde deve desempenhar,
os objetivos intermédios e os objetivos finais que deverão ser
atingidos por um qualquer sistema de saúde (WHO, 2003).
O objetivo principal é, obviamente, melhorar a saúde, a ra-
zão de ser de qualquer sistema de saúde. Sendo o sistema de
saúde pago pela sociedade, um outro objetivo é financeiro,
isto é, a justiça na contribuição financeira e a proteção social
e financeira dos cidadãos. O terceiro objetivo é um objetivo
social que mede a resposta dos sistemas às legítimas espec-
tativas dos cidadãos. E é aqui, de novo, que enquadramos a
satisfação dos doentes.
Em Portugal, todo este processo de medição da satis-
fação começou já há mais de 30 anos, mais concretamente,
em 1994 quando um grupo de investigadores europeus li-
derados por Richard Grol, do Centro para a Investigação
para a Qualidade de Cuidados (WOK) da Faculdade de
Ciências Médicas da Universidade de Nijmegen, Holan-
da, se candidatou a verbas europeias, inseridas no Programa
Biomed da União Europeia, com o objetivo de criar um
instrumento de medição para avaliar a satisfação dos utili-
zadores dos CSP. Foram oito os países que iniciaram juntos
esta caminhada: Alemanha, Dinamarca, Holanda, Israel,
Noruega, Portugal, Reino Unido e Suécia. Terminado este
projeto em 1999, o questionário Europep estava comple-
tamente validado em 15 línguas e tinha o reconhecimen-
to da WONCA - World Organization of National Colleges,
Academies and Academic Associations of General Practitioners/
Family Physicians (Ferreira, 1999).
Este questionário tem sido validado em vários contex-
tos internacionais da medicina geral e familiar (Grol et al.

474
1999, Hearnshaw et al., 2002), sendo de realçar em Por-
tugal, logo em 2000, a primeira aplicação aos utilizadores
de todos os 86 centros de saúde de Lisboa e Vale do Tejo.
Foram então recebidas 3.969 respostas, correspondendo a
40,5% de taxa de respostas. Depois, no ano seguinte, ex-
pandiu-se o estudo aos utilizadores de 194 centros de saúde
(54% do universo), num total de 4.714 indivíduos. Nessa
altura o convite foi feito aos coordenadores das então Sub
-regiões de Saúde e o erro de amostragem foi de ±1,4%.
De seguida, um estudo enquadrado num projeto do
Instituto da Qualidade em Saúde (IQS) e subsidiado pelo
Programa Saúde XXI abarcou todos os 365 centros de saú-
de existentes à época. Obtiveram-se 11.166 respostas repre-
sentativas da população por género, grupo etário e sub-re-
gião (Ferreira, 2001, Ferreira et al., 2001, 2005).
Quando surgiram as primeiras USF, foi decidido fazer
nova avaliação da satisfação dos utilizadores destas unida-
des, ideia imediatamente apoiada pela Missão dos Cui-
dados de Saúde Primários. Tratou-se de um censo de um
dia realizado em fevereiro de 2009 aos utilizadores das 146
USF constituídas até novembro de 2008. Foram recebidas
12.713 respostas, correspondendo a uma taxa final de res-
postas de 75,8% e a um erro máximo, para um intervalo de
confiança de 95% e um valor de probabilidade de 50%, de
0,4% (Ferreira et al., 2010).
Mais recentemente, realizou-se um outro estudo com
todas as 393 USF e uma amostra de 51 UCSP (31% do
total das UCSP) em funcionamento em 31 de dezembro de
2013, perfazendo um total de 444 unidades funcionais de
prestação de CSP.

475
O questionário utilizado nestes estudos foi desenha-
do com base na versão portuguesa do questionário europeu
Europep, testada e validada em Portugal e desenvolvida
pelo Centro de Estudos e Investigação em Saúde da Uni-
versidade de Coimbra (CEISUC). Conforme apresentado
na figura 2, mede essencialmente quatro dimensões: (i) cui-
dados médicos; (ii) cuidados não médicos; (iii) organização
dos cuidados; e (iv) qualidade das instalações. Nos cuidados
médicos são abordadas ambas as componentes, interpes-
soais e técnicas, dos médicos de família e na dimensão refe-
rente aos cuidados não médicos são abordados os cuidados
de enfermagem e a atenção prestada pelos secretários clíni-
cos. Por fim, na organização dos cuidados são analisadas a
acessibilidade e os serviços prestados em geral.
Este estudo pressupõe, assim, o seguinte modelo con-
ceptual de análise:

Figura 2 – Modelo conceptual

476
Relativamente aos resultados deste último estudo,
tem-se forçosamente de começar por referir a enorme taxa
de resposta que este estudo teve: 89,3% para as USF e 90,1%
para as UCSP. Em termos sociodemográficos, 66,1% dos
respondentes eram mulheres, a média etária atingiu os 48,5
anos, com respondentes dos 16 aos 99 anos. De salientar
que 37% tinham uma escolaridade inferior ou igual ao 2.º
ciclo do ensino básico. Relativamente à experiência com a
unidade de saúde, para 5,7% este era o seu primeiro contac-
to e os restantes tinham tido essencialmente uma a quatro
visitas anteriores.
Face aos indicadores de satisfação, em especial ao indi-
cador CEISUC de satisfação, verificou-se um valor médio
de 77,8% com uma distribuição francamente enviesada para
a esquerda. Foi também evidenciada uma maior satisfação
dos utilizadores em relação aos cuidados e à atenção presta-
dos por médicos, enfermeiros e secretários clínicos. De uma
maneira geral, as mulheres apresentaram uma satisfação
ligeiramente menor do que a dos homens, o mesmo acon-
tecendo aos jovens face aos mais idosos. Por outro lado,
as pessoas com menos habilitações literárias foram as que
apresentaram melhores índices de satisfação. Foi reconfor-
tante ver-se que a maior experiência de utilização faz com
que os utilizadores fiquem cada vez mais surpreendidos po-
sitivamente, em especial com os médicos de família e com
os cuidados de enfermagem.
As USF apresentaram, de uma forma sistemática,
maior satisfação face às UCSP. Por outro lado, a dimensão
da unidade exerce também uma certa influência na satisfação
dos utilizadores. Estes parecem penalizar as unidades muito
grandes, com mais de 12 médicos de família. Por muito que

477
indicadores de eficiência possam dizer o contrário, deste es-
tudo resulta que os cuidados de proximidade, como é o caso
dos cuidados primários necessitam de reduzir a sensação que
os utilizadores, principalmente os mais velhos e mais frágeis,
têm de se perderem em organizações grandes.
Por fim, partindo do pressuposto que é desejável uma
uniformidade na satisfação, independentemente das regiões
em que os cuidados são prestados, constatou-se, infeliz-
mente sem surpresa, uma grande disparidade dos valores
dos índices de satisfação analisados neste estudo a nível
continental por regiões de saúde e, dentro de cada uma de-
las, por ACeS.

Contratualização com unidades de atenção primária


Uma outra decisão importante com o aparecimento dos
ACeS foi a mudanças no processo de contratualização que
até então que era feito entre as ARS e as USF, e passou a ser
feito diretamente entre as USF e os ACeS, desde 2010, sen-
do esses princípios de contratualização aplicados às outras
unidades funcionais, que ainda se continuam a implementar.
Os ACeS são entidades sujeitas a um processo negocial
de objetivos, designado por contratualização externa. Este
processo, implementado desde 2010, operacionaliza-se em
três fases: negociação, monitorização/acompanhamento e
avaliação. No que concerne ao período de negociação, este
inicia-se com a submissão do Plano de Desempenho do
ACeS no Sistema de Informação para Contratualização e
Acompanhamento. Este documento estratégico, de carác-
ter anual visa a caracterização dos ACeS relativamente a
linhas estratégicas, plano de atividades, plano de formação,

478
mapa de equipamentos, mapa de recursos humanos, indica-
dores de desempenho, plano de investimentos e orçamento
-económico e a definição das suas prioridades assistenciais
em função dos recursos humanos, materiais e financeiros
colocados à sua disposição. Segue-se a concretização do
processo negocial de indicadores de desempenho, oficiali-
zado através da assinatura do Contrato-Programa.
Até ao final de 2016, os 20 indicadores negociados no
processo de contratualização externa encontravam-se orga-
nizados em três eixos – nacional, regional e local – com dis-
tintos pesos relativos associados (respetivamente, 75%, 17%
e 8%). Destes 20 indicadores, 14 eram comuns a todos os
ACeS do país (eixo nacional), quatro eram escolhidos pelas
ARS respetivas (eixo regional) e dois (eixo local) pelo pró-
prio ACeS, de acordo com as necessidades locais em saúde
diagnosticadas.
O Quadro 1 apresenta o conjunto de indicadores do
eixo nacional, comum a todos os ACeS do país, e os res-
petivos pesos relativos, negociados em 2016 no processo de
contratualização externa.

Quadro 1 – Contratualização Externa: Indicadores do eixo nacional (75%)


Acesso Indicador
5,0% Taxa de utilização global de consultas médicas nos últimos 3 anos
4,0% Taxa de consultas de enfermagem no domicílio por 1.000 inscritos
Proporção de embalagens de medicamentos prescritos, que são ge-
6,0%
néricos
Proporção de inscritos com idade ≥14 anos, com quantificação de
4,0%
hábitos tabágicos nos últimos 3 anos
Proporção de consultas médicas presenciais que deram origem a
6,0%
pelo menos uma codificação ICPC-2

479
Acesso Indicador
Taxa de internamentos por doença cerebrovascular, entre residentes
3,0%
com menos de 65 anos (por 10.000)
Índice de acompanhamento adequado na área do planeamento
6,0%
familiar nas mulheres em idade fértil
1,5% Proporção de recém-nascidos de termo, de baixo peso
Proporção de jovens com 14 anos com consulta médica de vigilân-
2,5% cia realizada no intervalo [11; 14[ anos e Plano Nacional de Vaci-
nação totalmente cumprido até ao 14.º aniversário
Incidência de amputações major de membro inferior em utentes
3,0%
com diabetes, entre utentes residentes (por 10.000)
Proporção de inscritos com idade ≥ 65 anos, a quem não foram
4,0% prescritos ansiolíticos, nem sedativos, nem hipnóticos, no período
em análise
6,0% Percentagem de utilizadores satisfeitos e muito satisfeitos
Despesa média de medicamentos faturados, por utente utilizador
16,0%
(baseado no preço de venda ao público)
Despesa média de meios complementares de diagnóstico e terapêu-
8,0% tica faturados, por utente utilizador do Serviço Nacional de Saúde
(baseado no preço convencionado)
Fonte: Termos de Referência para contratualização nos cuidados de saúde primários em 2016

No que concerne à contratualização interna efetuada


com as USF e UCSP e, não obstante esta ter sofrido alguma
evolução ao longo dos últimos anos, o processo em 2016
foi semelhante ao da contratualização externa, seguindo a
mesma sequenciação de etapas: negociação, monitorização/
acompanhamento e avaliação.
Na sequência da publicação da Portaria n.º 377-
A/2013, de 30 de dezembro, e do Despacho n.º 3823/2016,
de 15 de março, foram contratualizados com cada USF e
UCSP 22 indicadores institucionais distribuídos por três ei-
xos, a saber, o eixo nacional, que integra 12 indicadores co-
muns a todas as USF e UCSP do país, o eixo regional, onde

480
figuram quatro indicadores selecionados por cada ARS e o
eixo local, específico para cada unidade com incidência na
área de acesso e/ou desempenho assistencial, onde são se-
lecionados dois indicadores pelos ACeS e propostos quatro
indicadores pela USF/UCSP.
Assim, no ano de 2016, os indicadores institucionais
do eixo nacional comuns a todas as USF e UCSP do país
foram os constantes no Quadro 2.

Quadro 2 – Contratualização Interna: Indicadores institucionais para USF/


UCSP (62,5%)
Tipo Peso Indicador
Acesso 4,5% Taxa de utilização global de consultas médicas nos últimos
3 anos
3,0% Taxa de consultas de enfermagem no domicílio por 1.000
inscritos
Desempenho 4,5% Índice de acompanhamento adequado em saúde materna
Assistencial 5,0% Índice de acompanhamento adequado na área do
planeamento familiar nas mulheres em idade fértil
6,0% Índice de acompanhamento adequado em saúde infantil, no
1.º ano de vida
2,0% Proporção de utentes com idade igual ou superior a 65 anos,
a quem não foram prescritos ansiolíticos, nem sedativos,
nem hipnóticos, no período em análise
2,5% Proporção de utentes com idade igual ou superior a 14 anos,
com quantificação dos hábitos tabágicos nos últimos 3 anos
3,0% Proporção de utentes com hipertensão arterial, com idade
inferior a 65 anos, com pressão arterial inferior a 150/90
mmHg
3,0% Proporção de utentes com diabetes, com o último registo de
HgbA1c inferior ou igual a 8,0 %
Satisfação 6,0% Satisfação de utilizadores de unidades funcionais
Eficiência 16,0% Despesa média de medicamentos prescritos por utente utili-
zador (baseado no preço de venda ao público)
8,0% Despesa média de meios complementares de diagnóstico
e terapêutica prescritos, por utente utilizador (baseado no
preço convencionado)
Fonte: Termos de Referência para contratualização nos cuidados de saúde primários em 2016

481
Quanto às UCC, o documento “Termos de Referência
para contratualização nos cuidados de saúde primários em
2016”, previu a contratualização de uma matriz de 15 indi-
cadores nacionais.
Neste âmbito, no ano de 2016, os indicadores que in-
tegraram o processo de contratualização com as UCC fo-
ram os seguintes:

Quadro 3 - Contratualização Interna 2016: indicadores para UCC


Tipo Indicador
Acesso Proporção de utentes com contacto pela equipa multiprofissional
nas primeiras 48h
Número médio de visitas domiciliárias por qualquer elemento da
equipa, por utente, por mês de internamento
D e s e m p e n h o Proporção de visitas domiciliárias de enfermagem efetuadas no
Assistencial período de fim-de-semana ou em dias de feriado
Proporção de turmas abrangidas pelo Programa Nacional de Saúde
Escolar
Proporção de crianças e jovens com Necessidades de Saúde Espe-
ciais que foram alvo de intervenção de enfermagem no âmbito da
saúde escolar
Proporção de utentes com alta da Equipa de Cuidados Continua-
dos Integrados com objetivos atingidos
Taxa de efetividade na prevenção de úlceras de pressão
Taxa de resolução (cicatrização) de úlceras de pressão
Taxa de resolução (cicatrização) de úlceras de pressão
Taxa de resolução da ineficácia/compromisso na Gestão do Regime
Terapêutico
Proporção de utentes com ganhos expressos no controlo da inten-
sidade da dor
Proporção de utentes com melhoria no nível de “dependência no
autocuidado”
Proporção de utentes com internamento hospitalar durante a inte-
gração na Equipa de Cuidados Continuados Integrados
Taxa de ocupação da Equipa de Cuidados Continuados Integrados
Tempo médio de permanência em Equipa de Cuidados Continua-
dos Integrados

482
Já no que respeita à contratualização interna com as
USP e URAP, não foi implementado até ao momento um
processo normalizado que sirva de padrão para aplicação
nacional. Os processos de contratualização que ocorreram
com estas unidades funcionais foram sempre de carácter ex-
perimental e de âmbito regional.
No início de 2016, assistiu-se a um relançamento da
reforma dos CSP tendo por objetivo a expansão e melhoria
da capacidade da rede deste tipo de cuidados com vista a
um aumento da qualidade e da efetividade da primeira linha
de resposta do SNS. O primeiro aspeto visível deste relan-
çamento foi a criação de um grupo de coordenação nacio-
nal para a reforma do SNS na área dos CSP (Despacho n.º
200/2016, de 7 de janeiro). Este grupo definiu, como uma
das suas estratégias, o desenvolvimento de um novo modelo
de contratualização para aplicação no ano de 2017, com vista
à implementação de um processo de avaliação de desempe-
nho multidimensional, centrado na pessoa, focado nos re-
sultados e orientado pelo processo de cuidados. Na medida
em que 2017 constitui um ano de transição entre modelos
de contratualização, o novo modelo encontra-se ainda em
fase preparatória e de implementação incipiente, não sendo
possível facultar uma explicação detalhada do seu conteúdo.

CONCLUSÃO

Neste capítulo abordaram-se os conceitos de go-


vernança e de inovação em cuidados de saúde primários,
assim como um novo e inovador modelo de governança.
Após uma breve visita às fases mais relevantes da reforma

483
dos CSP em Portugal, apresentaram-se dois exemplos de
boa governança e de inovação em saúde com os objetivos
de tornar os cuidados de saúde mais próximos do cidadão,
respondendo às suas necessidades, mais eficientes quer do
ponto de vista da gestão quer da utilização de recursos, e
melhorar a qualidade dos cuidados de saúde prestados. O
primeiro foi a avaliação da satisfação que se pode constituir
como um instrumento de governação (Ferreira et al., 2017);
o segundo exemplo descreveu a adoção da contratualização
que é inovação quer na relação entre diferentes esferas da
saúde e os prestadores, mas também na forma de satisfazer
as necessidades em saúde determinadas e responder às ne-
cessidades dos utilizadores.

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492
Pósfacio

Através da leitura dos 19 capítulos desta obra, é possível


mergulhar em trabalhos sérios e profundos, preparados por
alunos e professores do Programa de Pós-Graduação em
Saúde Coletiva que possuem reconhecimento, competên-
cia e qualificação. Os sujeitos envolvidos com o processo de
educação e aquisição de conhecimento nos cursos de pós-
graduação tem o compromisso ético na realização pesquisas
que envolvam realidade social cotidiana promovendo a fim
de proporcionar a melhoria da coletividade. A introdução
desta obra é um guia claro de sua magnitude e relevância no
contexto do aprendizado. Os temas abordados nesta pro-
dução acadêmica apresentam, de forma clara, três eixos de
compreensão. Os capítulos que compõem o primeiro eixo
proporcionam um aprofundamento dos conhecimentos
acerca dos espaços de saúde. Enquanto os capítulos do se-
gundo eixo abordam as doenças crônicas e seus desafios do
cuidado em saúde. O último eixo aborda temas relaciona-
dos aos aspectos do envelhecimento, abortos, contaminação
por HIV, indicadores de mortalidade infantil, cuidados pri-
mários, dengue. A produção de conhecimentos pela acade-
mia alcança a tão buscada e difícil articulação da pesquisa
científica com a intervenção social na saúde coletiva. O Pro-
grama de Pós-graduação em Saúde Coletiva – PPSAC da
Universidade Estadual do Ceará – UECE constitui fomen-
to de seara neste panorama. A coordenação de aperfeiçoa-
mento de pessoal de nível superior (CAPES), o Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

493
(CNPq) e a Fundação de Amparo à Pesquisa (FUNCAP)
são colaboradores na produção deste mérito. Esta obra foi
elaborada para contribuir com a formação de profissionais
de saúde, professores, pesquisadores, políticos, estudantes.
E que todos possam desfrutar de uma excelente leitura.

Cybelle Façanha Barreto Medeiros Linard

494
AUTORES COLABORADORES

ANA CAROLINA OLIVEIRA E SILVA


Enfermeira. Mestranda em Saúde Coletiva pela Universidade Es-
tadual do Ceará. Atuou como Docente do Instituto de Assistência
Social (IASOCIAL) e como Preceptora de Estágio Curricular do
Curso de Graduação em Enfermagem na Disciplina de Processo
de Cuidar em Saúde do Idoso, pela Faculdade Metropolitana da
Grande Fortaleza

ANA PAULA CAVALCANTE RAMALHO BRILHANTE


Enfermeira. Doutoranda em Saúde Coletiva pelo Programa de
Pós-Graduação em Saúde Coletiva PPSAC/UECE. Mestre em
Saúde Coletiva (UFC). Especialista em Saúde Pública e na Aten-
ção Básica (UEPA). Membro do Grupo de Pesquisa Saúde Men-
tal, Família e Práticas de Saúde e Enfermagem do Programa de
Pós-graduação em Saúde Coletiva (GRUPSFE) da UECE.

ANA VALESKA SIEBRA E SILVA


Doutora em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo - USP,
Mestre em Saúde Pública pela Universidade Federal do Ceará
(2002). Atualmente é professor adjunto da Universidade Estadual
do Ceará. , atuando principalmente nos seguintes temas: Epide-
miologia da saúde da criança, Saúde do recém nascido, da criança
e do adolescente, perinatologia, mortalidade perinatal, saúde da fa-
mília, qualidade e avaliação nos serviços de saúde, cuidado clínico
de enfermagem em terapia intravenosa. Professora do programa de
Mestrado Acadêmico em Saúde Pública da Universidade Estadual
do Ceará (UECE) e Mestrado Profissional em Saúde da Criança
e do Adolescente (UECE). Tutora do PET Vigilância à Saúde -
CCS/UECE.

495
ANDREA CAPRARA
MD, PhD, Professor Adjunto, Departamento de Saúde Pública
da Universidade Estadual do Ceará/UECE. Centro de Ciências
da Saúde.

ANTONIA ALIZANDRA GOMES DOS SANTOS RO-


DRIGUES
Enfermeira. Mestre e doutoranda em Saúde Coletiva do Progra-
ma de Pós-Graduação em Saúde Coletiva - PPSAC da UECE.

CARLOS BRUNO SILVEIRA


Enfermeiro. Mestrando em Saúde Coletiva no Programa de Pós
Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Estadual do Cea-
rá. Membro do Grupo de Pesquisa, Saúde Mental, Família, Práti-
cas de Saúde e Enfermagem – GRUPSFE.

CÍNTIA LIRA BORGES PEDROSA


Enfermeira. Especialista em enfermagem pediátrica e neonatolo-
gia.Mestre emCuidado Clinicos em enfermagem e saúde. Douto-
randa do Programa Pós Graduação em Saúde Coletiva-PPSAC.

DAFNE LOPES SALLES


Enfermeira.Graduação pela Universidade Estadual do Cea-
rá (UECE). Mestranda do Programa de Saúde Coletiva-Ue-
ce. Membro do grupo de pesquisa Epidemiologia, Cuidado em
Cronicidades e Enfermagem- GRUPECCE. Tem interesse nas
áreas de Saúde Pública/Saúde Coletiva, Epidemiologia descritiva,
analítica e social/crítica, Bioestatística, Metodologia da Pesquisa e
Saúde do Adulto/Idoso.

DANIELLA BARBOSA CAMPOS


Mestranda em Saúde Coletiva pela Universidade Estadual do
Ceará. Cursando especialização em Enfermagem e terapia inten-

496
siva na UNIFOR. Trabalhou no Hospital Otoclínica na Unidade
de Terapia Intensiva. Graduação em Enfermagem pela Universi-
dade de Fortaleza. Atuou no Programa de Educação pelo Trabalho
para a Saúde - PET-Saúde do grupo SOS - EMERGÊNCIA , no
período de 2013-2015. Programa de bolsas de Iniciação Científica
- FUNCAP, vigente de março de 2013 a agosto de 2014, foi Mo-
nitora Acadêmica da disciplina Metodologia do Trabalho Cientí-
fico . Atuou como Pesquisadora Bolsista CNPq, vigente durante
outubro de 2011 a dezembro de 2012, no subprojeto: Planejamen-
to familiar: educar para promover saúde, integrado ao Projeto de
Pesquisa Promoção da saúde da mulher no contexto da atenção
básica, tendo como orientadora Raimunda Magalhães da Silva.

DIEGO DA SILVA MEDEIROS


Sociólogo. Doutorando em Sociologia pela Universidade Estadual
do Ceará. Especialista em Saúde Pública pela Universidade Esta-
dual do Ceará. Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Es-
tadual do Ceará. Membro do Grupo de Pesquisa, Saúde Mental,
Família, Práticas de Saúde e Enfermagem – GRUPSFE.

EDYLA MARIA PORTO DE FREITAS CAMELO


Fisioterapeuta .Mestranda do do Programa de Pós Graduação em
Saúde Coletiva, da Universidade Estadual do Ceará.

EMANUELLA CAJADO JOCA


Psicóloga. Residencia Multiprofissional em saúde . Especialista em
psicodrama.Mestranda do Programa de Pós Graduação em Saúde
Coletiva, da Universidade Estadual do Ceará.

FÁTIMA CAFÉ RIBEIRO DOS SANTOS


Nutricionista, formada pela Universidade Federal da Bahia (2010).
Atualmente Mestranda do Programa de Pós Graduação em Saú-
de Coletiva, da Universidade Estadual do Ceará. Especialista em

497
Alimentação e Nutrição pela Escola Nacional de Saúde Pública
Sergio Arouca ENSP / FIOCRUZ (2016). Possui Pós Graduada
em Caráter de Residência Multiprofissional em Saúde da Família ,
pela Escola de Formação em Saúde da Família Visconde de Sabóia
(2014). Atuando principalmente nos seguintes temas: Promoção
da Saúde, atividades coletivas e de grupos, atendimentos indivi-
duais e compartilhados, educação nutricional, programas de ali-
mentação e nutrição, educação permanente, apoio matricial e edu-
cação popular em Saúde, organização do serviço, direito humano à
alimentação adequada, segurança alimentar, extensão universitária
em comunidade, vivência em comunidade e movimento estudantil.

FERNANDO VIRGÍLIO ALBUQUERQUE DE OLIVEIRA


Fisioterapeuta. Mestrando em Saúde Coletiva no Programa de
Pós Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Estadual do
Ceará.

FIAMA KERCIA SILVEIRA TEÓFILO


Enfermeira. Mestranda em Saúde Coletiva no Programa de Pós
Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Estadual do Cea-
rá. Especialista em Enfermagem Pediátrica e Neonatal. Membro
do Grupo de Pesquisa, Saúde Mental, Família, Práticas de Saúde e
Enfermagem – GRUPSFE.

FRANCISCO JOSÉ MAIA PINTO


Estatistico. Pos-Doutor em Saude Coletiva - Universidade de Sao
Paulo (USP). Docente do Programa de Pos-Graduacao em Saude
Coletiva (Mestrado) da Universidade Estadual do Ceara (UECE).

GLAUCILÂNDIA PEREIRA NUNES


Enfermeira. Mestranda em Saúde Coletiva no Programa de Pós
Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Estadual do Ceará.

498
ILSE MARIA TIGRE DE ARRUDA LEITÃO
Enfermeira. Doutora em Saúde Coletiva pelo Programa de Pós-
Graduação em Saúde Coletiva associação ampla entre a Universida-
de Estadual do Ceará/ Universidade Federal do Ceará/ Universida-
de de Fortaleza. Docente do Curso de Graduação em Enfermagem,
do Programa de Pós Graduação em Saúde Coletiva e do Mestrado
Profissional em Gestão em Saúde. Líder do grupo de pesquisa:
Gestão, segurança e processos de trabalho em saúde e enfermagem.

INDARA CAVALCANTE BEZERRA


Farmacêutica. Doutora em Saúde Coletiva pelo Programa de
Pós-Graduação em Saúde Coletiva associação ampla entre a Uni-
versidade Estadual do Ceará/ Universidade Federal do Ceará/
Universidade de Fortaleza. Pós-doutoranda no Programa de Pós
Graduação em Saúde Coletiva da Universidade de Fortaleza.

JAMINE BORGES DE MORAIS


Enfermeira. Mestre e doutoranda em Saúde Coletiva do Progra-
ma de Pós-Graduação em Saúde Coletiva - PPSAC da UECE.
Membro do Grupo de Pesquisa, Saúde Mental, Família, Práticas
de Saúde e Enfermagem – GRUPSFE.

JOSÉ JACKSON COELHO SAMPAIO


Medico Psiquiatra. Doutorado em Medicina Preventiva pela Fa-
culdade de Medicina de Ribeirao Preto da Universidade de São
Paulo. Professor Titular em Saude Publica da UECE. Docente do
Programa de Pos-graduacao em Saude Coletiva da UECE. Lider
do Grupo de Pesquisa Vida e Trabalho.

JOYCE OLIVEIRA MATOS


Psicologa. Especialista em transtornos alimentares e obesidade.
Mestranda do Programa de Pós Graduação em Saúde Coletiva, da
Universidade Estadual do Ceará.

499
JOSÉ WELLINGTON DE OLIVEIRA
Médico Sanitarista. Doutor em Science Tropical Public Health
(Harvard University, USA). Professor Adjunto de Epidemiologia
da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Docente do Progra-
ma de Pós-graduação em Saúde Coletiva PPSAC/UECE.

KATHERINE JERÔNIMO LIMA


Enfermeira. Especialista em Epidemiologia e em Saúde Coletiva.
Mestranda do Programa de Pós Graduação em Saúde Coletiva, da
Universidade Estadual do Ceará.

LARISSA ALVES ALEXANDRE MOLITERNO


Fisioterapeuta Mestre em Saúde Coletiva pelo Programa de Pós
Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Estadual do Cea-
rá (2017). . Membra do Grupo de Pesquisa Epidemiologia, Cui-
dado em Cronicidade e Enfermagem-GRUPECCE vinculado à
UECE e tem interesse nas áreas de Saúde Pública/Saúde Coleti-
va, Doença Renal Crônica, Hipertensão, Diabetes, Epidemiologia
descritiva e analítica, Metodologia da Pesquisa e Saúde.

LÍVIA CRISTINA BARROS BARRETO


Enfermeira. Tem experiência na área de Enfermagem, com ênfase
em Enfermagem em Nefrologia. Mestranda em Saúde Coletiva
pela Universidade Estadual do Ceará-UECE.

LUANA RODRIGUES SARMENTU


Possui graduação em Enfermagem pela Universidade Federal do
Ceará (2011) e mestrado em Saúde Coletiva (Epidemiologia) pela
Universidade Estadual do Ceará (2016). Tem experiência na área
de Saúde Coletiva, com ênfase em Saúde Pública.

500
LUCIMAR BÓH BARBOSA
Fisioterapeuta.Especialista em fisioterapia Traumato-ortopédica.
Mestre em Saúde Coletiva, pelo Programa de Pós Graduação em
Saúde Coletiva, da Universidade Estadual do Ceará Universidade
Estadual do Ceará.

MARCELO GURGEL CARLOS DA SILVA


Médico epidemiologista do Instituto do Câncer. Mestre em Saú-
de Pública pela Universidade de São Paulo (1982). Doutor em
Saúde Pública pela Universidade de Paulo (1990). Pós-Doutor em
Economia da Saúde pela Universidade de Barcelona. Docente Ad-
junto do Curso de Medicina, do Programa de Pós-Graduação no
Mestrado e Doutorado em Saúde Coletiva da Universidade Esta-
dual do Ceará - UECE. Membro titular da Academia Cearense
de Medicina e da Academia Brasileira de Médicos Escritores, e
membro honorário da Academia Cearense de Farmácia e da Aca-
demia Cearense de Ciências.

MARIA ROCINEIDE FERREIRA DA SILVA


Enfermeira. Líder do Grupo de Pesquisa Políticas, Saberes e Prá-
ticas em Enfermagem e Saúde Coletiva/CNPq. Coordenadora
GT Educação Popular e Saúde da ABRASCO; Coordenadora
Regional Nordeste 1; Docente do Programa de Pós Graduação
em Saúde Coletiva Regional Nordeste 1 Rede Unida. Doutorada
em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Ceará, Brasil.

MARIA SALETE BESSA JORGE


Enfermeira. Doutora e mestre em Enfermagem e pós-doutora
em Saúde Coletiva. Professora titular na Universidade Estadual
do Ceará. Bolsista de produtividade em pesquisa 1B/CNPq. Líder
do Grupo de Pesquisa em Saúde Mental, Família e Enfermagem.

501
PAULA FRASSINETTI CASTELO BRANCO CAMURÇA
FERNANDES
Médica. Mestre em Epidemiologia. Doutora em Medicina In-
terna e Terapêutica pela Universidade Federal de São Paulo e
Universidade de Londres (1999). Fellow da Fundação Rockfel-
ler-INCLEN (1994-1995). Fellow da Sociedade Internacional de
Nefrologia (Guy´s Hospital Londres, 1996-1997). Atualmente é
médica da Universidade Federal do Ceará-Preceptora da Residên-
cia Médica em Nefrologia e Chefe do Serviço do Sistema Uri-
nário do Hospital Universitário Walter Cantídio-UFC (Unidade
de Transplante Renal, Nefrologia, Hemodiálise e Urologia). Pro-
fessora Adjunta Doutora do Curso de Medicina da Universidade
Estadual do Ceará (UECE), Docente do Programa de Pós Gra-
duação em Saúde Coletiva/PPSAC-UECE, Docente do Mestra-
do Profissional em Transplantes (UECE).

PATRÍCIA FERREIRA ANTUNES


Economista, doutoranda da Faculdade de Economia da Universi-
dade de Coimbra.

PEDRO LOPES FERREIRA


Economista, professor da Faculdade de Economia da Universida-
de de Coimbra e pesquisador do Centro de Estudos e Investiga-
ção em Saúde da Universidade de Coimbra.

RADMILA ALVES ALENCAR VIANA


Mestranda em Saúde Coletiva pela Universidade Estadual do
Ceará-PPSAC. Graduada em Fisioterapia pela Universidade de
Fortaleza (2013). Especialista em Saúde Pública pela Universida-
de Estadual do Ceará e Especialista em Saúde da Mulher e da
Criança pela Residência Multiprofissional da Maternidade Es-
cola Assis Chateaubriand (UFC) com atuação em Unidades de
Terapia Intensiva Neonatal e Pediátrica, Unidade de Terapia In-

502
tensiva Adulta (UTI Materna), Ambulatório de Uroginecologia,
Enfermaria Ginecológica e Obstétrica, Estimulação Precoce, Pós
operatório de cirurgias de mamas e educação em saúde no Projeto
Intermast e Climain. Realiza palestras sobre Fisioterapia e Gesta-
ção, Saúde da Mulher e da Criança.

RICHEL BRUNO OLIVEIRA CASTELO BRANCO


Graduado em Gestao hospitalar.Especialista em gestão de proje-
tos e psicopedagogia. Mestranda em Saúde Coletiva pela Univer-
sidade Estadual do Ceará-PPSAC.

SÔNIA SAMARA FONSECA DE MORAIS


Enfermeira. Especialista em Gestão e Assistência em Saúde da
Família. Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Estadual
do Ceará (UECE). Doutorando do Programa de Pós –Graduação
em Saúde Coletiva- UECE.

THEREZA MARIA MAGALHÃES MOREIRA


Enfermeira. Advogada. Bolsista de Produtividade em Pesquisa do
CNPq-nivel 1D. Pos-Doutora em Saude Publica pela Universida-
de de Sao Paulo (USP). Mestre e Doutora em Enfermagem pela
Universidade Federal do Ceara (UFC). Adjunto da Universidade
Estadual do Ceara (UECE). Docente da Pos-Graduacao (Mestra-
do e Doutorado) da UECE nos Programas: 1) Cuidados Clinicos
em Enfermagem e Saude; e 2) Saude Coletiva. Lider do Grupo de
Pesquisa Epidemiologia, Cuidado em Cronicidade e Enfermagem
(GRUPECCE-CNPq). Consultora de varios periodicos.

VÍTOR RAPOSO
Economista, professor da Faculdade de Economia da Universida-
de de Coimbra e pesquisador do Centro de Estudos e Investiga-
ção em Saúde da Universidade de Coimbra.

503
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