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A análise gramático-sintática na exegese bíblica

William Lacy Lane

A exegese bíblica, principalmente, desde a reforma


protestante do século XVI tem sido influenciada pelos
desenvolvimentos dos estudos linguísticos. A ênfase dos
reformadores na busca pelas fontes os levaram a fundamentar
sua exposição bíblica e teologia nos textos mais primitivos das
Escrituras e nessa tarefa foram influenciados pelos humanistas
e, consequentemente, romperam definitivamente com a
interpretação medieval cujo enfoque era principalmente
alegórico. O desenvolvimento de uma exegese gramático-
histórica pretendeu justamente dar valor ao significado das
palavras em suas formas e modo de linguagem como um texto
que em si comunica algo.1
Através dos últimos séculos o estudo linguístico e
literário continuou influenciando o estudo das línguas bíblicas
e a exegese bíblica. Nos séculos XVIII e XIX houve enorme
avanço no estudo da língua e várias gramáticas hebraicas e
gregas foram produzidas baseadas nos conhecimentos
linguísticos daquele contexto. Muitas traduções da Bíblia para
as línguas ocidentais, que ainda circulam em edições revisadas,
foram feitas no final do século XIX e início do século XX.
Essas traduções levaram em conta muitos dos conhecimentos
linguísticos da época.
Em função disso, até hoje parte da tarefa exegética de
um texto bíblico envolve uma análise gramatical que
tradicionalmente tem sido feita através de uma análise
morfológica de cada palavra do texto em estudo. A análise

1
Um breve esboço do interesse pelo estudo do hebraico bíblico é
apresentado por B. K. Waltke & M. O´Connor. Biblical Hebrew Syntax.
Winona Lake: Eisenbrauns, 1990, pp.34-43.
10

morfológica consiste na tarefa de dissecar a palavra hebraica,


aramaica ou grega de modo a identificar sua raiz e sua forma
gramatical. Então, uma palavra que seja identificada como um
verbo é em seguida classificada na sua forma verbal quanto ao
tempo, modo, pessoa, gênero e número. No hebraico, em
particular, essa análise é importante também para identificar os
prefixos e sufixos de uma palavra, pois além de desinências
próprias, os prefixos hebraicos podem ser identificados por
outros elementos gramaticais. Por exemplo, substantivos e
adjetivos hebraicos recebem como prefixos artigo definido,
preposições e conjunção.
Atualmente, há vasta literatura de referência em outras
línguas para auxiliar o estudante nessa tarefa, como os léxicos
analíticos e os programas de computador que apresentam a
análise morfológica completa. Em português para o NT já há
obras bastante úteis, contudo, não se tem ainda algo
semelhante para o AT. De todo modo, o estudante que tenha
acesso a uma obra analítica em inglês, não terá dificuldades de
entender a análise morfológica.
A análise morfológica, portanto, ainda que tenha sido
numa época uma análise trabalhosa e detalhada do texto, hoje
pode ser executada com relativa facilidade. Além disso, é
importante observar que a análise morfológica não oferece
todos os elementos para uma boa tradução do texto. Dá-se a
impressão que essa minuciosa análise garante uma tradução
correta e fidedigna do texto. Porém, essa noção é um equivoco.
Ou seja, é possível se fazer uma análise morfológica impecável
e cometer vários erros na tradução do texto. A isso atribui-se
uma ou mais das seguintes causas: a ênfase demasiada na
morfologia gerando uma tradução muito literal, a falta de
preocupação com a semântica e a desconsideração para com a
sintaxe da gramática e das orações.

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Basicamente a questão reflete uma mudança de


paradigma no estudo do texto. Enquanto, a análise morfológica
se preocupa com etimologia, isto é, origem da palavra e a
evolução de seu uso, e se fundamenta nos avanços da filologia,
gramáticas e léxicos mais recentes tem sido influenciados
pelos avanços da linguística e dado maior ênfase ao significado
(semântica) das palavras e seus usos nas combinações
(sintagmas) com outras palavras e frases conforme
apresentadas nos textos existentes.
O texto de Gn 12.4 é um bom exemplo para ilustrar o
problema. A segunda parte do versículo é traduzida por "Abrão
tinha setenta e cinco anos quando saiu de Harã" (NVI) que
corresponde à frase hebraica:

 



A análise morfológica dessa frase vai identificar as


seguintes palavras e sua classificação:

  conj. + nome próprio = e Abraão


 subst. masc. sing. no estado construto = filho de
 adj. numeral fem. sing. = cinco
 subst. fem. pl. = anos
 conj. + adj numeral fem. pl. = setenta
 subst. fem. sing. = ano
 prep. + inf. cstr de Qal + suf pron. 3 masc. sing. = em + sair
+ dele
 prep. + nome próprio = de Harã

Biblia Hebraica Stuttgartensia. Deutsche Bibelgesellschaft Stuttgart,


1990.

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Se a tradução do texto seguir literalmente esta análise,


ficaria: "e Abraão filho de cinco anos e setenta ano em seu sair
de Harã." Percebe-se aqui pelo menos quatro dificuldades
nessa tradução: 1) a expressão "filho de...anos," 2) a
discordância "setenta ano", 3) a expressão "em seu sair", e 4) a
sintaxe da oração.3
Quanto a primeira questão, a análise semântica da
palavra  constatará que este termo hebraico é usado para
"designar indivíduos de uma espécie, tipo, grupo, ofício,
caráter e idade."4 Neste sentido, a expressão "filho de..."
simplesmente significa "tinha tantos anos." Observe que para
se fazer a correta tradução não é suficiente apenas a análise
morfológica, é preciso também investigar a semântica da
palavra.
Quanto a discordância da expressão "setenta ano" e
também a construção "cinco anos e setenta ano", a sintaxe dos
numerais mostra que os substantivos modificados por uma
dezena é mantido no singular e os modificados por unidades
passam para o plural. Portanto, a expressão deve ser traduzida
por "setenta e cinco anos".
A expressão "em seu sair", pode ser traduzida por
"quando ele saiu". Isso se deve à sintaxe da preposição  que
prefixada ao infinitivo construto pode ser traduzida por
"quando" e à sintaxe do sufixo pronominal "dele" que no
infinitivo construto pode ter o sentido subjetivo, traduzido pelo
pronome pessoal (ele) ou objetivo, traduzido pelo pronome
oblíquo (o).

3
Ainda um outro problema é a sintaxe da conjunção waw que estabelece a
relação com a oração anterior.
4
Schökel, L. A. Dicionário Bíblico Hebreo-Español. Madrid: Editorial
Trotta, 1994. v. , 123.

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Finalmente, observa-se que no hebraico não existe um


verbo de ligação entre o sujeito "Abraão" e o predicativo
"setenta e cinco anos". Contudo, de acordo com a sintaxe das
orações hebraicas, descobre-se que um tipo de oração é a
oração não verbal onde encontra-se um sujeito e um
predicativo que no português precisa ser construída com um
verbo de ligação. Neste caso, o verbo "tinha".
Observa-se então que entre a análise morfológica e a
tradução do texto é preciso investigar a semântica das palavras
e fazer a análise sintática de elementos gramaticais e das
orações. Essa análise, no entanto, raramente se faz presente nos
trabalhos exegéticos apresentados nos seminários e
presbitérios.5 Na prática o aluno faz toda a análise morfológica
e depois traduz o texto comparando as diferentes versões em
língua portuguesa, ou seja, descarta todo o trabalho feito.
Muitas vezes, a “exegese” se resume a explorar uma forma
verbal específica ou o sentido de uma palavra. Aliás, muitos
pregadores que pretendem dar um embasamento exegético ao
seu sermão citando palavras no original, geralmente, não
conseguem passar de algum comentário morfológico do tipo,
“este verbo no hebraico está no piel que denota uma ação
intensiva, portanto, uma ação enfática...” Tais comentários
podem transparecer um conhecimento dos originais para um
público que nunca estudou as línguas originais e não tem
menor ideia do que sejam as formas verbais, no entanto, eles
refletem um conhecimento superficial da exegese bíblica.
O propósito deste artigo é mostrar a importância de se
investigar a sintaxe das palavras e orações numa análise

5
Na Igreja Presbiteriana do Brasil um candidato ao ministério pastoral
precisa submeter ao seu presbitério além de uma monografia, uma exegese
de uma passagem bíblica onde manifeste capacidade de manusear o texto
original.

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exegética de Ageu 1.5-8. A implicação disso para o estudo


exegético será dar maior ênfase aos aspectos sintáticos do texto
do que os morfológicos.6 É como dizer que a análise
morfológica representa um primeiro passo para o trabalho de
tradução que precisa ser seguido também de uma análise
sintática. É verdade que uma exegese envolve outras análises
como a semântica, a estrutura da unidade literária, análise
retórica e outras as quais não serão objeto de investigação no
presente artigo.
Para tal tarefa será preciso consultar não apenas
dicionários e léxicos, como também obras específicas sobre a
sintaxe hebraica. Em português há apenas duas, a obra de
Crabtree publicada há vários anos e já esgotada e a obra mais
recente de Carlos Oswaldo Pinto que serve de ótimo
referencial para essa análise.7 Também não deixa de ser uma
referência inigualável para um estudo mais apurado a obra de
Gesenius em inglês.8 O presente artigo fará referência a estas
duas últimas obras.

Análise de Texto

O texto de Ageu 1.5-89 é um bom exemplo da


complexidade do uso das formas verbais no hebraico. Nestes

6
Para uma discussão da importância da análise sintática cf. B. K. Waltke &
M. O´Connor, pp.49-53.
7
Pinto, C. O. C.. Fundamentos para exegese do Antigo Testamento. S.
Paulo: Editora Vida Nova, 1998.
8
Gesenius, W. & Kautzsch, E. Gesenius’ Hebrew Grammar. Editado e
Ampliado por E. Kautzsch. Trad. A. E. Cowley. 2 a edição, 20a impressão.
Oxford: Clarendon Press, 1990.
9
Há opiniões diferentes quanto à correta delimitação da perícope. Meyers
define Ag. 1.1-15 como a primeira unidade (C. L. Meyers & E. M. Meyers.
Haggai, Zechariah 1-8. The Anchor Bible, vol. 25B. New York:

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versículos há três aspectos específicos que exige uma análise


sintática cuidadosa para a correta tradução: a série de infinitos
absolutos seguido do perfeito no v.6, os três particípios do v. 6,
e o imperativo seguido do perfeito no v. 8.
O primeiro passo na análise sintática é a delimitação
das orações hebraicas.10 Isso não apenas facilita a referência
das orações mas serve de base para a análise do
relacionamento das orações (subordinação e coordenação) e,
consequentemente, a correta tradução. O critério usado para
essa delimitação é a constituição de uma oração sintática a qual
se define pela existência de um predicativo. Na prática isso
significa que cada forma verbal finita (perfeito, imperfeito,
imperativo) com seus complementos (sujeito, objeto, etc)
forma uma oração. Também constitui uma oração os verbos
infinitos (infinitivo absoluto, infinitivo construto e particípio)
em seu uso verbal e as orações não verbais que possuam um
predicativo.11 Deste modo o texto fica assim delimitado:

 5a
   b
  6a

Doubleday, 1987). Smith já entende que Ag 1.1-11 compõe uma unidade


(Smith, R. L. Micah-Malachi. Word Biblical Commentary, vol. 32. ed. D.
A. Hubbard. Waco: Word Books, Pub., 1984). Para finalidade deste artigo,
basta observar que a unidade aqui analisada consiste do oráculo que é
introduzido no v. 5 pela expressão, “Agora, assim diz o SENHOR dos
Exércitos...” e encerra com “diz o SENHOR” no v. 8.
10
Esse passo é descrito por Cássio M. Dias da Silva como segmentação
(Metodologia de Exegese Bíblica. S. Paulo: Edições Paulinas, 2000, pp. 84-
94).
11
No hebraico há orações que não usam verbos (pronome + predicativo),
mas que constituem uma oração completa e na tradução exigem um verbo
de ligação. Por exemplo a expressão 
 , literalmente, nâo
profeta eu, cujo sentido é eu não sou profeta.

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 b
 c
  d
 e
  f
 g
  h
  i
 j
 7a
   b
 8a
 b
 c
  d
  e
 f

Esse oráculo é introduzido por uma expressão que é


considerada a fórmula de introdução de oráculos 
(Assim diz o SENHOR, v. 5a). O v. 5b inicia com um
imperativo chamando o povo a uma reflexão sobre suas vidas.
A expressão literalmente é Colocai o vosso coração sobre os
vossos caminhos, cujo sentido pode ser Considerai os vossos
atos.12 O teor dessa reflexão é o que se segue a partir do v. 6.

Infinitos absolutos (v. 6)


O v. 6 possui doze verbos, três dos quais são particípios
que serão tratados mais adiante. O v. 6a é introduzido pelo

12
RC: Aplicai os vossos corações aos vossos caminhos; RA: Considerai o
vosso passado; NVI: Vejam onde os seus caminhos os levaram.

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verbo no perfeito ( ) seguido de um infinitivo absoluto


usado adverbialmente () .13 Em seguida há uma série de
infinitivos: v. 6b (), v. 6c (), v. 6d (,
construto), v. 6e () , v. 6f (, construto), v. 6g () e
v. 6h (, construto). O infinito, tanto o construto como o
absoluto, tem uma variedade de usos ou funções no hebraico.14
Como característica própria dos infinitivos, no hebraico eles
tem tanto uma função verbal quanto nominal. Quando usados
como verbo a noção de tempo é sempre dependente de uma
forma finita do verbo que estabelece se a ação tem aspecto
perfeito, imperfeito, imperativo, modal etc. Portanto, no caso
do v. 6, a análise morfológica, que certamente auxiliará na
identificação da forma verbal e da raiz da palavra, não dará,
contudo, subsídios suficientes para a correta tradução dos
infinitivos. O problema se agrava ainda quando se percebe que
nem todos os infinitivos tem a mesma função gramático-
sintática. Por exemplo, a simples análise morfológica sem a
investigação da sintaxe produziria uma tradução do v. 6abcd
puramente literal que é típica de tradução de textos
interlineares cuja preocupação é reproduzir o sentido da forma.
Seria algo como: Semeastes abundar e vir pouco, comer e não
há para saciar. Entretanto, uma análise exegética não se
contenta com uma tradução literal. Ela busca resgatar o sentido
das palavras no seu contexto tanto sintático como semântico e
literário.
Assim, é preciso definir a função dos verbos usados.
Conforme já mencionado, o infinitivo absoluto no v. 6a tem a
função adverbial podendo ser traduzido por muito. A definição
da função dos demais depende também de uma observação do

13
Pinto, p. 79.
14
Cf. Gesenius-Kautzsch, pp. 339-355.

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relacionamento das orações. Ainda que as orações 6b à 6h


sejam coordenadas à 6a, algumas são sindéticas (6b, 6d, 6f e
6h) e outras são assindéticas (6c, 6e e 6g). As orações 6b, 6d,
6f e 6h iniciam-se com a conjunção , e observa-se que, exceto
v. 6b, a forma verbal empregada é a do infinitivo construto. A
conjunção em todos estes casos pode ser traduzida no sentido
adversativo.15 As orações 6c, 6e e 6g não são introduzidas pela
conjunção e utiliza o infinitivo absoluto.
Baseado nesta observação, pode-se reagrupar as
orações sindéticas com as assindéticas e constatar que o verbo
perfeito do v. 6a é seguido de três ocorrências do infinitivo
absoluto conforme se pode visualizar abaixo:

 6ab
  cd
  ef
  gh

A coordenação das orações possibilita que se interprete


as ocorrências dos infinitivos absolutos no sentido verbal do
perfeito do v. 6a. Os infinitivos construtos de 6c, 6f e 6h, com
a preposição  denota finalidade. Portanto, a tradução destes
verbos devem seguir o sentido do perfeito:
6ab Semesastes muito, mas colhestes pouco,
6cd comestes, mas não para vos saciar,
6ef bebestes, mas não para vos satisfazer,
6gh vos agasalhastes, mas não para vos aquecerdes

15
O v. 6b poderia ser interpretado como o uso consecutivo. Mas não é
inteção do presente artigo analisar as funções da conjunção  (cf. Pinto, pp.
137-139).

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Uma morfológica precisa ser seguida de uma análise


mais ampla da relação das palavras na oração e das orações
entre si.

Particípios (v. 6i, 6j)


O outro caso típico é o uso do particípio. No v. 6i e 6j
há três ocorrências da forma do particípio sendo que as duas
primeiras são da mesma raiz e forma verbal, mas cada uma é
usada em um sentido diferente. Se o que o estudante se recorda
do particípio é o tipo de ação que este descreve, ação
duradoura, e explorar este sentido sem dar atenção à sintaxe, a
tradução do v. 6i e 6j será inadequada.
O primeiro caso (, v. 6i) é um particípio
masculino singular no hithpael que se encontra com dois
prefixos, o artigo definido e a conjunção . O fato de ter o
artigo definido já aponta para um uso nominal do verbo. Neste
caso, ele é usado no sentido substantivo: o assalariado.16 Não
apenas isso, mas toda a oração 6i funciona como sujeito da
oração 6j.
Já o próximo caso (, v. 6j) que é idêntico na
forma verbal, tem contudo uma função gramatical diferente.
Sua função é verbal e pode ser traduzido por recebe salário.
Por fim o último particípio (), que está na forma
passiva de qal, tem a função adjetiva modificando o
substantivo . Assim a oração  
pode ser traduzida por o assalariado recebe salário
para guarda numa bolsa furada.
A análise morfológica identificaria a existência de três
particípios, mas não iria longe o suficiente para analisar a
função do particípio na oração.

16
cf. Pinto, p. 85.

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Imperativo (v. 8)
O último caso a observar nestes versículos é a
sequência do imperativo e o perfeito (v. 8a e 8b) e imperativo e
imperfeito (v. 8c e 8de). Em ambos os casos uma análise
morfológica que não desenvolvesse para uma análisa da função
sintática do verbo no perfeito e no imperfeito e seu
relacionamento com os imperativos que os antecededem falha
na tradução correta do versículo.
O que se constata imediatamente é que as orações 8b,
8c, 8d e 8e são sindéticas. A oração 8f, além de ser assindética,
quebra a sequência das formas verbais, sugerindo assim ser
uma oração independente.
Observa-se também que o perfeito (8b) é seguido do
imperativo (8a). Neste caso, o perfeito tem o sentido do
imperativo. Assim a RA traduziu o perfeito: Subi ao monte,
trazei madeira. Mas esta sequência também pode ser traduzida
em um sentido consecutivo.17 A NVI corretamete traduziu
essas duas orações como Subam o monte para trazer
madeira...
 8a
 b

A oração 8c é também sindética, mas muda novamente


para a forma do imperativo e tem sido corretamente traduzida
por edificai a casa. Mas as orações que seguem (8d e 8e) são
orações sindéticas com a forma do imperfeito coortativo.
 c
  d
  e
 f

17
Gesenius-Kautzsch, p. 333.

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21

A RA traduziu essa parte do versículo como orações


independentes: ...e edificai a casa; dela me agradarei e serei
glorificado...
Essa sequência do imperativo seguido de um imperfeito
coortativo possibilita que se traduza o segundo como
consequência.18 Deste modo, essas orações podem ser
traduzidas como Edificai o templo (a casa) para que eu nela
tenha prazer e seja glorificado... Novamente, a NVI
corretamente traduz: Construam o templo para que eu me
alegre e nele seja glorificado...

Conclusão

Estes casos são apenas alguns exemplos de como um


trabalho exegético que busca extrair das línguas originais o
sentido próprio do texto bíblico não pode se resumir a uma
análise morfológica que não ofereça subsídios para uma
correta tradução e consequentemente uma correta compreensão
do texto e da mensagem bíblica.
A análise morfológica deve ser entendida como o
primeiro passo da análise gramático-sintática Como se pode
observar aqui, por mais correta que seja a análise morfológica,
esta carece de uma análise sintática para se chegar a correta
tradução do texto.

18
Gesenius-Kautzsch, p. 320.

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