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Desenvolvimento

e Tecnologia

PIROTÉCNICOS E PIROMECANISMOS
(lª Parte)

Ubirajara da Silva Valença *

Este artigo é a tradução e adaptação de textos extraídos das publicações que


constam da Bibliografia citada no final.

INTRODUÇÃO
o dicionário define pirotecnia como "a arte de fazer ou de usar fogos de artifícios".
A pirotecnia mesmo sendo uma "velha arte" continua tendo grande importância militar.
Pirotecnia, a Arte do Fogo, da palavra grega pyr (fogo) e techne (uma arte) é uma
de três tecnologias intimamente ligadas; mais especificamente, a dos explosivos, a dos
propelentes e a dos pirotécnicos. As três não têm apenas a raiz físico-química comum;
também suas funções e finalidades se entrelaçam. Em suas manifestações típicas os
explosivos produzem altas velocidades de reação, liberando produtos gasosos; os
propelentes são, também, produtores de gases e de rápida reatividade, porém, mais
lentas que a dos explosivos; já as misturas pirotécnicas reagem, principalmente, a
velocidades visivelmente observáveis, com a formação de resíduos sólidos.
Em sua forma mais simples, os artifícios pirotécnicos consistem de um agente
oxidante e de um combustível, que produzem uma reação exotérmica, auto-sustentada,
quando aquecida à temperatura de iniciação.
Os primeiros artifícios pirotécnicos, feitos pelo homem, podem ter sido o resultado
de uma mistura acidental de Salitre (KN0 3 ) com Carvão (C) ou Alcatrão.

* General-de-Brigada Engenheiro Militar, Professor da Cadeira de Explosivos no IME.

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N a guerra moderna alguns usos impor- séculos, foi o uso como "navio de fogo" (uma
tantes para os artifícios pirotécnicos são: embarcação carregada com combustível e
como incendiários, fontes luminosas para explosivos abalroava e fazia explodir outros
rastreamento de mísseis, acessórios de aviões, navios ou construções) em batalhas navais.
mísseis e artefatos nucleares, para produzir Registros antigos mencionam os "navios de
sinais sonoros e para produzir sinais lumi- fogo" desde o século IV antes de Cristo
nosos ou fumaças. Altifícios iluminativos são, quando os marinheiros fenícios, de Tiro,
também, usados para fotografias; adap - usaram-no na batalha contra Alexandre - o
tações recentes incluem artifícios proje- Grande. Registros posteriores mostram
tados para atuação por sinais de rádio, diri- empregos dos "navios de fogo" pelos gregos
gidos para um míssil a milhares de quilô- contra os turcos, pelos cruzados em Acra e
metros da terra . pelos ingleses, já no século XVI, contra a
Almada espanhola.

HISTÓRIA ANTIGA
o FOGO GREGO
Misturas incendiárias e fumaças coloridas
foram usadas para a guerra, celebrações Um dos primeiros e mais bem-sucedidos
religiosas e entretenimento na Arábia, China, procedimentos da guerra química foi a
Egito, Grécia e Índia, há muito tempo atrás. mistura conhecida como Fogo Grego. O
Mesmo antes de 2000 a.c., histórias de guerra primeiro registro de seu uso data do século
na Índia mencionam misturas incendiárias, VII d.C . Essa mistura de enxofre, resina,
cortinas de fumaça e gases tóxicos. Mais tarde, cânfora e outras substâncias combustíveis
contra Alexandre - o Grande - (365-323 a.c.) desconhecidas, fundidas com salitre, era um
os defensores de uma cidade da Índia teriam poderoso artifício incendiário que, também,
sido capazes de "fazer trovejar e lançar raios produzia gases sufocantes. Ele foi usado de
das paredes". Naquela época, depósitos muitas diferentes maneiras.
naturais de salitre eram abundantes na Índia
e, provavelmente, serviram como a fonte deste
material para emprego em composições que PIROTECNIA CHINESA
tornaram essas demonstrações possíveis.
O conhecimento da pirotecnia viajou do Registros da pirotecnia chinesa remon-
Oriente até a Europa no começo da Era Cristã. tam ao século X. Foguetes e Velas Romanas
Os primeiros registros sobre exibições são mencionados em 969 d.e. e no século
pirotécnicas, na Europa, mencionam o Circo XIII foram empregadas fumaças coloridas
Romano durante o reinado de Augustus (27 a para sinalização, setas incendiárias e setas
14 a.c.). O uso romano dos pirotécnicos impulsionadas por foguetes . Outras armas
parece ter sido dedicado a exibições. chinesas, dessa época, incluem as "lanças
Um emprego militar dos pirotécnicos, que de fogo" arremessadas a cerca de 10
começou há muito tempo e persistiu por muitos metros.

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PÓLVORA NEGRA SÉCULOS XVIII E XIX


Acredita-se que o inventor de Pólvora Com a descoberta de Berthollet do
Negra tenha sido o filósofo inglês e frade Clorato de Potássio, em 1788, começava a
Roger Bacon. Em 1242 d.C. ele divulgou os Era Moderna na pirotecnia. O Clorato de
ingredientes da Pólvora Negra, defendendo- Potássio permitiu os efeitos das cores nos
se contra a acusação de feiticeiro. Embora pirotécnicos e a adição de Magnésio, em
Bacon conhecesse o poder explosivo da 1865, e de Alumínio, em 1894, nesses arti-
Pólvora Negra ele, aparentemente, não reco- fícios, aumentou, grandemente, a variedade
nheceu a possibilidade de seu uso para impul- dos efeitos atingidos.
sionar projéteis.
Os primeiros usos registrados das armas
de fogo e da Pólvora Negra, como propelente, COMEÇO DO SÉCULO XX
datam do inÍCio do século XlV. Registros da
Universidade de Ghent, na Bélgica, mostram Um impOltante desenvolvimento pirotéc-
que o primeiro canhão foi inventado por nico no início deste século, foi o projetil
Berthold Schwarz, em l3l3 , e os registros traçante. Os traçantes têm sido usados em
todos os tipos, porém seu desenvolvimento
comerciais indicam que canhões e pólvora
tem sido mais dedicado às munições das
foram exportados, de Ghent, para a Inglaterra,
armas portáteis, automáticas.
no ano seguinte.
Durante a Primeira Guerra Mundial, as
Quando a Pólvora Negra começou a ser
tropas em oposição, em trincheiras separadas
usada como propelente entre os séculos XIV
por reduzidas distâncias, regularmente em-
e XV a utilidade dos artifícios incendiários,
pregaram artifícios pirotécnicos. - Projéteis
então disponíveis, declinou. Por cau sa do
iluminativos foram usados como proteção
uso da Pólvora Negra, os exércitos
contra ataques de surpresa e artifícios
começaram a combater uns com os outros a
sinalizadores usados para pedir, ajustar ou
tais distâncias, limitando o uso do contato
parar o fogo de artilharia, para identificar a
ou dos artifícios incendiários de curtos posição de tropas amigas e inimigas e para
alcances. registrar emergências, em terra, no mar ou
no ar.
O uso de agentes químicos durante a
USOS DIVERSOS Primeira Guerra Mundial resultou na criação
de um Serviço de Guerra Química, em 1918,
o primeiro uso registrado de cortinas de nos Estados Unidos.
fumaça data de 1701 quando Carlos XII, da
Suécia, queimou palha úmida para produzir
fumaça que lhe desse cobertura para atravessar A SEGUNDA GUERRA
um rio. Em outras partes da Europa, na mesma MUNDIAL
época, artifícios pirotécnicos foram sendo
desenvolvidos em virtude de seus valores Com a entrada dos Estados Unidos na
para fins militares. guerra, diversos tipos de pirotécnicos, tais

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como os artifícios iluminativos, projéteis ciência que exige intensiva e extensiva


traçantes, fumígenos, observadores de tiros, pesquisas, básica e aplicada, para encontrar
incendiários e muitos tipos de artifícios de novas exigências militares e de espaço,
sinalização terrestres e aéreos, foram neces- convencionais e únicas.
sários em enormes quantidades. No fim da O estado de progresso, inicialmente
guerra os pirotécnicos permitiam comunica- modesto, foi modificado, consideravelmente,
ção visual, de noite ou de dia, entre aviões e quando as operações militares tornaram-se
tanques, tanques e artilharia, infantaria e mecanizadas com o desenvolvimento de
aviões e entre navios e a costa. tanques, bombm'deiros anti-aéreos, subma-
rinos, artilharia de longo alcance, porta-
aviões, outros veículos e armas, tudo asso-
PERÍODO PÓS-GUERRA ciado com a introdução de operações
combinadas.
Os fundos de pesquisa e desenvolvimento Para coordenar todas essas forças e pro-
sobre pirotécnicos foram reduzidos no pe- porcionar comunicação visual entre todos os
ríodo que se seguiu a Segunda Guerra Mun- participantes das operações de combate, de
dial. Contudo, avanços significativos foram noite ou de dia, o desenvolvimento da mu-
realizados, o que permitiu considerável aper- nição pirotécnica, para todas as finalidades,
feiçoamento dos mtifícios pirotécnicos sinali- foi absolutamente essencial. O uso crescente
zadores, fumígenos, incendiários e ilumina- de aviões, para finalidades de bombar-
ti vos, quando a Guerra da Coréia começou, deamento e observação, exigiu o uso de
no início da década de 50. artifícios iluminativos e instantâneos que
Nos Estados Unidos, a pesquisa e o podiam ser disparados de aviões, movendo-
desenvolvimento de pirotécnicos, nos dias se rapidamente, para iluminar o território
atuais, é sustentada por agências governa- inimigo, para fotografia e observação notur-
mentais. nas e também para localizar alvos para
bombardeamento.
Uma variedade de sinalizadores fumí-
INTRODUÇÃO À genos, marcadores, incendiários, cartuchos
PIROTECNIA MILITAR iluminativos, sinalizadores para terra e para
aviões, tiveram de ser desenvolvidos para
Resumo atender às novas exigências táticas. Novas
demandas de artifícios de sinalização
A moderna pirotecnia militar, como uma exigiram o desenvolvimento e o aperfei-
ampliação do "Fogo Grego" e da "Arte de çoamento de sinalizadores e de fumígenos
fazer fogos de artifício", tem progredido a coloridos.
tal extensão que os artifícios e sistemas Para a identificação de submarinos e
pirotécnicos, para as operações militares operações de resgate, tipo ar-mar, foram
ofensivas e defensivas, têm-se tornado indis- desenvolvidos sinalizadores flutuantes,
pensáveis. Ela se desenvolveu como uma operados por baterias ativadas pela água do

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mar, com grande durabilidade e estabilidade. utilizam de modernos métodos de análise


Muitos tipos de simuladores para treinamento instrumental.
de tropas terrestres ou marítimas foram
também desenvolvidos e tornaram-se uma
ajuda indispensável nessas operações. Significado
Com o advento da era espacial, os
artifícios pirotécnicos tornaram-se, também, A tradução literal de pirotécnico pode ser
de indesclitível importância. Eles são usados a de uma atuação de calor ou de explosão.
intensivamente para marcação e rastreamento Isto, naturalmente, está longe da realidade,
de foguetes e mísseis, para operações de porém pode ser notado que alguns tipos de
resgate e para finalidades especiais de contra- piromecanismos, contendo altos explosivos,
medidas. Para encontrar as exigências para são chamados de pirotécnicos. Uma distinção
essas aplicações tem sido necessário inves- clara entre pirotécnicos e piromecanismos é
tigar as reações pirotécnicas sob condições difícil. Os pirotécnicos, em sua maioria,
de baixa pressão, baixa temperatura, quan- podem ser considerados como "materiais
tidades muito reduzidas de oxigênio atmos- capazes de sofrer combustão quando corre-
férico, graus de confinamento variáveis e tamente iniciados para produzir um efeito
com tipos diferentes de sistemas de especial".
iniciação. Há três pontos a notar nessa definição:
Estudos básicos têm sido empreendidos primeiro, as composições devem queimar e
para atingir um entendimento fundamental não detonar; segundo, é importante considerar
sobre a pré-ignição, ignição e reações auto- a iniciação. Algumas composições são capa-
propagáveis dos ingredientes dos pirotéc- zes de detonar se muito confinadas ou
nicos. Algumas teorias têm sido desenvol- incorretamente iniciadas por um super-
vidas e usadas como guias para formulação estímulo. O terceiro ponto é o que distingue
de composições com exigências específicas os pirotécnicos de outros tipos de explosivos :
de velocidade de queima. Relações teóricas eles produzem efeitos especiais.
e empíricas foram desenvolvidas para prever
as velocidades de propagação em pirotéc-
nicos de queima lenta, como função do tama- Efeitos
nho das partículas e da composição. Equipa-
mentos, também, foram desenvolvidos para Os efeitos especiais produzidos por
avaliar a intensidade luminosa e as cores das pirotécnicos estão listados na tabela l. Todos
chamas dos pirotécnicos, a intensidade produzirão calor, embora para alguns usos a
luminosa e a duração das chamas, as cores produção de calor é o efeito a ser utilizado.
das nuvens de fumaça e o aperfeiçoamento A produção de luz pode ser parcialmente
dos pirotécnicos iluminativos. Os estudos de considerada como um efeito de calor, visto
laboratório incluem o uso de técnicas de que temperaturas elevadas são exigidas para
análise térmica, análises espectrofotomé- criar uma energia radiante; cortinas de
tricas e cromatográficas e outras que se fumaça e fumaças sinalizadoras também são

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dependentes de calor. A categoria rotulada 1) Características de rendimento


como "luz" deveria na realidade ser cha- a) Calor de reação (callg ou cal/cm3 ) -
mada de "radiação eletromagnética", visto Pode ser usada como um critério para a
que outros comprimentos de onda além seleção da combinação combustível-
daqueles do espectro visível são , também, aJudante.
relevantes. A radiação infravermelho é de b) Velocidade de queima (m/s, mJmin, sim)
grande importância na produção de - Aplicada para misturas consolidadas e
dissimuladores. medida como uma velocidade linear.

Efeito Exemplos

Calor Acendedores; Incendiários; Retardos; Produtores de metais; Aquecedores

Luz Iluminativos (períodos longos e curtos) Sinalizadores; Traçantes

Fumaça Sinalizadores; Cortinas

Som Sinalizadores; Distração

Tabela 1: Efeitos Priotécnicos Especiais

c) Intensidade (candeIa) - Produto visível


CARACTERÍSTICAS DOS
PIROTÉCNICOS ou iluminação, em candeIa.
d)Cor - A qualidade da cor de uma
A aplicabilidade de uma mistura pirotéc- chama pirotécnica é tomada como a razão da
intensidade luminosa aparente através de um
nica específica, para uma aplicação parti-
filtro colorido apropriado para a intensidade
cular, é governada por muitos "julgamentos".
luminosa total.
Considerações devem ser dadas não apenas
e) Visibilidade - Aplicada para artifícios
para o efeito final e para a produção desej ada,
de iluminação e de sinalização; medida em
mas, também, para o rendimento global, a
termos de brilho e de outras qualidades.
reprodutibilidade e para as características de
f) Eficiência - Relaciona o produto ao
processamento e estocagem. A detenninação
peso ou volume original; para iluminativos
analítica e precisa de vários parâmetros ou sinalizadores é expressa em candelas/
envolve exigências de pesquisa permanente segundos por grama ou por mililitro; para
para desenvolver métodos avaliativos do artifícios produtores de fumaça a eficiência
produto. é considerada como a percentagem dos
As características mais importantes para componentes químicos vaporizados pelo
os pirotécnicos, usados para fins militares, peso dos componentes químicos contidos,
são as citadas a seguir: originalmente, no artefato ou pelo peso total

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da munição, dependendo das exigências do 10 - Temperatura e pressão ambiente


avaliador. 11 - Método de iniciação
g) Cor e Volume de fumaça - Comparada 12 - Relação comprimento/diâmetro
a padrões existentes ou pela habilidade de 13 - Método e energia de disseminação
observadores para detectar e reconhecer as 14 - Geometria da carga de arreben-
distâncias estabelecidas, a cor e o "poder de tamento
escurecimento total" (TOP). 15 - Velocidade, aceleração e aerodinâ-
mica do artifício
2) Características gerais de funcio- A importância de um fator pode variar e
namento influenciar, consideravelmente, a aplicação
a) Iniciabilidade - A facilidade com que do pirotécnico. Fatores como o diâmetro
um pirotécnico se inicia é determinada por médio da partícula, superfície específica,
testes padrões que relacionam o tempo que o forma e distribuição afetarão a velocidade
artifício leva para iniciar. de queima da mistura pirotécnica. Modifi-
b) Higroscopicidade - É a facilidade com cações nas características gerais do formato
que uma composição absorve umidade a uma da chama e da supelfície de queima combinam
temperatura e umidade relativa selecionadas. para influenciar os itens geradores da chama.
c) Reações características - Fundamen- Em composições pirotécnicas para retardos,
talmente importantes são o calor de reação e a velocidade de queima é de fundamental
a velocidade de reação de um pirotécnico. importância e pode ser modificada por trocas
Para fazer uma composição consolidada nas percentagens e no tamanho das partículas
queimar, progressivamente, calor suficiente dos ingredientes, na incorporação de adi-
deve ser liberado e a velocidade de reação tivos, na variação da compactação, etc.
deve ser de intensidade suficiente para Misturas pirotécnicas do tipo fotoflash são
compensar as perdas de calor que ocorrem. influenciadas pelo método de iniciação, razão
Em adição ao calor de reação e a velocidade comprimento para o diâmetro, geometria da
de reação, as demais características apresen- carga de arrebentamento e o grau de
tadas pelos pirotécnicos são influenciadas por confinamento.
muitos outros fatores, a saber: Em adição, há muitos outros fatores para
1 - Granulação ou tamanho das partículas itens específicos que podem exercer di-
dos ingredientes versas influências sobre o rendimento dos
2 - Composição dos ingredientes pirotécnicos.
3 - Pureza dos ingredientes
4 - Superfície de queima
5 - Característica de transferência de COMPOSIÇÕES
calor
6 - Configuração e material de embalagem Componentes Básicos
7 - Pressão de carregamento
8 - Presença de umidade Na maioria dos casos as composições
9 - Grau de confinamento pirotécnicas consistem de um combustível e

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de um oxidante misturados com outros Várias Combinações


aditivos para dar o efeito especial exigido.
Materiais orgânicos, tais como o tetranitro- De forma diferente dos altos explosivos
carbazol (TNC) e a nitroguanidina, aparecem ou dos propelentes, onde apenas um pequeno
em algumas composições, porém isto é número de materiais distintos são usados,
relativamente raro. Também há materiais que para os pirotécnicos a faixa é extremamente
não queimam e ainda assim são considerados ampla, exigindo um cuidadoso acompanha-
como pirotécnicos. Muitas vezes é porque mento da composição. Os combustíveis são
eles produzem um efeito criado pelo verda- geralmente elementos pulverizados, metais ou
deiro pirotécnico. Por exemplo, o tetracloreto não metais, que, quando oxidados, liberam
de titânio (TiC14) reage com a umidade do ar elevadas energias. Uma seleção de combustí-
para formar uma cortina de fumaça; é uma veis é apresentada na tabela 2. Os oxidantes
hidrólise e não uma combustão. Os fósforos são, também, variados e podem ser conside-
vermelho e branco queimam em contato com rados como classes de sais cujos exemplos,
o ar para dar uma cortina de fumaça e isso é também, são encontrados na tabela 2. A
considerado um efeito pirotécnico; é um maioria é de fornecedores de oxigênio.
exemplo de uma composição de "apenas o Contudo, halocarbonos podem, também, atuar
combustível" . como agentes oxidantes no verdadeiro sentido

COMBUSTÍVEIS OXIDANTES
Metais:
Alunúnio (Al) Cloratos (KCl0 3)
Cromo (C r) Cromatos (BaCr04)
Feno (Fe) Dicromatos (K2Cr207)
Magnésio (Mg) Halocarbonos (C 2Cl 6, PTFE)
Manganês (Mn) Iodatos (AgI0 3)

Titânio (Ti) Nitratos (KN0 3)


Tungstênio (W) Óxidos (Ba02,Zno)
Zircônio (Zr) Percloratos (KCl04)

Não Metais:
Boro (B)
Carbono (C)
Silício (Si)
Enxofre (S)
Fósforo (P)
Tabela 2: Combustíveis e Oxidantes usados em Composições Pirotécnicas

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químico; o flúor é o oxidante químico mais reagir com o oxigênio ou com a umidade.
energético. Como parte da formulação há Eles, também, modificam a velocidade de
outros componentes que podem ser quase tão queima e o desempenho, além de reduzir a
importantes, para a composição final, quanto sensibilidade a certos estímulos, como por
o sistema combustível-oxidante. exemplo à fricção. Em alguns casos, eles
podem melhorar o desempenho, tais como nos
iluminativos.
Aglutinantes Na fabricação de qualquer composição
pirotécnica, na forma de um conjunto sólido,
Os aglutinantes fazem mais do que apenas tal como um bastão, o aglutinante pode,
consolidar uma composição. A tecnologia e simplesmente, ser adicionado na massa. É
a arte primitiva dos pirotécnicos confiam nas também, comum, inicialmente, revestirem-se
propriedades dos aglutinantes. A tabela 3 lista alguns constituintes, geralmente os pós
alguns aglutinantes, mostrando a diversidade metálicos, com uma substância de cobertura,
da escolha. Algumas das ceras, usadas há evaporando-se uma solução orgânica do
séculos, são ainda populares e naturais, na aglutinante sobre o pó, o qual, após a seca-
origem. Mais recentemente tem havido uma gem, é misturado com os outros ingredientes.
orientação para os polímeros manufaturados. Os aglutinantes industrializados são muitas
Essas resinas e bonachas podem ser mais vezes curados após a misturação para dar-
rigorosamente controladas quanto a qualidade lhes uma rígida estrutura polimérica de
e os fabricantes não são dependentes dos for- ligações cruzadas. Isto pode ocasionar ele-
necedores externos. vadas temperaturas durante a polime-
Os aglutinantes aumentam a coesão entre rização. Mesmo materiais naturais podem
as partículas, ajudando a consolidação. Não provocar aquecimento durante o uso. Tanto
obstante, uma função igualmente importante o verniz litográfico quanto o óleo de linha-
é a de cobrir e proteger os componentes reati- ça fervido oxidam-se no ar com evolução
vos, tais como os pós metálicos que podem de calor.

NATURAIS MANUFATURADOS

Parafina Baquelite
Cera de abelha Poliéster
Cera de carnaúba Borracha clorada
Cera chinesa Policloreto de vinila - PVC
Óleo de linhaça fervido Bonacha Thiokol
Verniz litográfico Resina epoxi
Goma laca
Tabela 3: Aglutinantes usados em Priotécnicos

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PROPRIEDADES DOS Impurezas


MATERIAIS
Outras reações menos esperadas podem
Problema de Degradação OCOlTer com os constituintes dos pirotécnicos.
Por exemplo, algumas cortinas de fumaça
Em geral, as composições pirotécnicas usam o óxido de zinco (ZnO) em suas
são bem mais susceptíveis à degradação formulações. Ele pode reagir com o dióxido
durante a estocagem do que outros materiais de carbono existente no ar atmosférico
explosivos. Isto não é surpresa, visto que formando carbonato de zinco (ZnC0 3) que
cerca de dois terços de todas as formulações pode modificar, drasticamente, as caracterís-
contêm metais finamente divididos, muitas ticas de queima da mistura fumígena. Tal
vezes com alta reatividade, tal como mag- impureza pode, também, estar no material
nésio. Estes metais têm a propriedade de estocado antes do preparo do pirotécnico; por
reagir com a umidade, particularmente, em isso, o controle de qualidade dos ingredientes
soluções salinas. é vital na preparação dos pirotécnicos. Não
é incomum para uma batelada de artifícios
pirotécnicos ter o seu desempenho fora da
Sais faixa de especificações devido a presença de
impurezas ou de reações que ocorrem durante
A maioria dos oxidantes são sais metá- a estocagem.
licos . Para compor o problema, estes sais
oxidantes podem ser bem higroscópicos e,
assim, atrair a umidade da atmosfera. Isto Reações Químicas
significa que o composto acabado deve ser
selado. Contudo, se a umidade já está pre- As possibilidades da ocorrência de
sente , por exemplo em invólucros de reações químicas são muitas e o resultado
papelão, então a reação do metal com a final pode ser apenas uma degradação do
água produz hidrogênio gasoso. Isto pode desempenho; pode ser até uma iniciação
pressurizar o artifício causando o apareci- espontânea. Não é normalmente recomendado
mento de uma pressão perigosa no invó- o uso de enxofre ou de fósforo em formu -
lucro, ou talvez quebrando a integridade do lação com um clorato como o sal oxidante,
selo hermético, permitindo que mais umi- porque, ambos combustíveis, podem formar
dade atmosférica entre. Todas essas coisas ácidos na presença de umidade e de oxi-
podem tornar o artifício não confiável. A gênio. O ácido então reage com o clorato
reação completa de um décimo de grama para formar ácido dórico, altamente
de água (uma gota) pode produzir 60ml de reativo e instável. Existem composições
hidrogênio. Isto enfatiza a importância das com c1oratos e enxofre, porém sempre
lacas e vernizes usados para cobrir e contêm um neutralizador do ácido tal como
proteger os pós metálicos. o carbonato de cálcio. Uma consideração

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judiciosa de quaisquer possíveis reações Alternativamente, mantendo constante as pro-


químicas indicará que composições são mais priedades de vários ingredientes, porém
seguras. alterando a razão de misturação, pode-se,
também modificar a facilidade à iniciação.
Essas modificações, além de alterarem a
Sensibilidade sensibilidade, terão um efeito significante
sobre o rendimento do pirotécnico.
Quando se trata de segurança de um explo-
sivo, é necessário considerar todas as varie-
dades de estímulos que afetam a sua sensi- FATORES QUE AFETAM O
bilidade. Em geral, os pirotécnicos são mistu- RENDIMENTO
ras de elementos ou compostos químicos
altamente reativos. O tamanho das partículas Constituintes
é geralmente muito pequeno - rnícrons ou
décimo de mícrons - e assim há uma grande Obviamente, o rendimento de qualquer
superfície para reação. Elas são, também, pirotécnico dependerá da escolha dos consti-
muitas vezes ponteagudas ou arenosas, sendo tuintes. O que está sob consideração aqui são
sais ou pós metálicos. Não é surpresa, por- os fatores que influenciam o rendimento após
tanto, que essas composições sejam, muitas os ingredientes básicos terem sido escolhidos.
vezes, bastante sensíveis a vários tipos de Como a queima de uma composição pirotéc-
energia mecânica aplicada. nica é de fato uma reação química, ocorrendo
Como generalização, os pirotécnicos são entre componentes, o primeiro fator a consi-
mais sensíveis à fricção, chama e descarga derar é a razão ou as proporções entre esses
elétrica e, talvez, de algum modo, em menor reagentes.
extensão à percussão. A presença de certos Pode ser dito que qualquer reação quími-
ingredientes, tal como o clorato de potássio, ca pode ser balanceada pela escolha da
servirá para indicar a sensibilidade da relação correta entre os reagentes, tal que
composição. Outros materiais são, também, todos os reagentes serão consumidos para dar
indicados para sensibilizar algum estímulo os produtos. A relação ideal ou correta dos
particular. Composições contendo zircônio reagentes é o que se chama de "mistura este-
são famosas por sua sensibilidade a centelha quiométrica" . Nesta relação, ou muito perto
e precauções contra efeitos estáticos devem dela, a composição terá o seu rendimento
ser tomadas durante a fabricação e armaze- máximo. Como estas reações são exotérmicas,
nagem. Desse modo, a sensibilidade do elas, também, atingirão a produção máxima
artifício é dependente do material usado na de calor e, ao mesmo tempo, uma velocidade
sua formulação. Outros fatores são também de queima mais rápida. Qualquer troca na
importantes: para uma dada composição, as composição que a afaste da estequiometria,
trocas no tamanho das partículas de um ou ou do combustível ou do oxidante, reduzirá a
mais ingredientes pode alterar tanto a sensi- produção de calor da reação. Isto afetará o
bilidade quanto a intimidade da mistura. rendimento global da composição.

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Em alguns casos este conceito se aplica tível é um não-metal, tal como carbono ou
de modo muito marcante, tal como para o enxofre.
sistema Si-Pb0 2 , onde a porcentagem este- Visto que a velocidade de queima tem um
quiométrica de silício fica em torno de 9% e valor máximo para uma dada porcentagem
o calor máximo é produzido com cerca de do combustível, então se o teor desse com-
10% de silício. Contudo, se o oxigênio at- bustível aumenta ou diminui, a velocidade de
mosférico pode ser considerado com reagente, queima será menor. Conseqüentemente, duas
tal como no sistema Mg-NaN0 3 , então o composições terão a mesma velocidade de
rendimento máximo esperado para mistura queima, como é mostrado na figura 1 e assim
pode ocorrer com porcentagens de magnésio a escolha deve ser feita. Logicamente seria
bem mais altas. Também, na tentativa de preferível escolher aquela com a mais alta
calcular a mistura ótima, pode ser bem difícil porcentagem de combustível, visto que ela
encontrar as reações químicas que ocorrem. seria provavelmente a mais fácil para
Isto porque, as reações químicas acima de misturar e obter homogeneidade. Também,
2000°C não são do tipo geralmente no lado rico em combustível da curva, a
consideradas pelos químicos. Os produtos inclinação é menos acentuada e assim ligeiras
mais estáveis, nas temperaturas normais, trocas na composição, causadas por uma
podem não se formar nesses extremos. Tem misturação incompleta, tem menos efeito
havido casos onde a razão estequiométrica sobre a velocidade de queima.
tem sido encontrada experimentalmente; a
composição tem produzido um máximo de
calor e a reação química racionalizada a Retardadores
partir desse fato.
A composição na qual pequenas modi-
ficações dos componentes teria menor efeito
Velocidade de Queima é aquela próxima ao topo da curva com a
mistura estequiométrica. Contudo, ela pode
Para os pirotécnicos, o fator mais impor- queimar muito rapidamente para o rendimento
tante que afeta o rendimento de uma compo- desejado. Um meio para que este rendimento
sição é a velocidade de queima. A máxima possa ser modificado, sem alterar a este-
velocidade é muitas vezes uma função da quiometria dos reagentes, é o de se adicionar
quantidade do combustível da mistura este- um material inerte. Isto é uma prática comum
quiométrica, particularmente se o combus- e é usual adicionarem-se materiais como a
tível é um pó metálico. Isto é devido ao argila, por exemplo o caolim, que faz baixar
aumento da transferência térmica, permi- a velocidade de queima.
tindo que a queima de uma camada rapida- Um outro tipo de aditivo usado para tornar
mente aqueça a camada seguinte, condu- mais lentas as composições, é o que se de-
zindo-a até a temperatura de ignição. A compõe endotermicamente, reduzindo o calor
troca é maior para os metais, a seguir para
os metalóides e é desprezível se o combus-
°
global produzido. exemplo comum deste
tipo de retardador é o Oxalato de Cálcio que

(~1Ii i Vol. XVII - NQ 1 - 1QQuadrimestre de 2000 67


PIROTÉCNICOS E PIROMECANISMOS (1ª parte)

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% de Magnésio

Figura 1: Velocidade de queima versus estequiometria

se decompõe em Óxido de Cálcio, Monóxido Tamanho da Partícula


de Carbono e Dióxido de Carbono. Ele é
geralmente adicionado como um Monohidrato Quando se está considerando os materiais
que acrescenta o efeito de resfriamento; veja para a fabricação de pirotécnicos, de grande
a equação abaixo: importância é o conhecimento da superfície
específica. Em termos gerais, a superfície
específica é a superfície do material dispo-
nível para a reação; é mais fácil a reação
Qualquer material adicionado à compo- ocorrer quando a superfície é grande. Assim,
sição, não diretamente envolvido com a quanto menor é o tamanho da partícula dos
reação combustível-oxidante, modificará a ingredientes, mais rápida é a reação. Pós
velocidade de queima. Isto inclui os agluti- metálicos são disponíveis em tamanhos
nantes e tem sido notado que a adição de micrométricos, muitas vezes chamados ultra-
diferentes aglutinantes, na mesma porcenta- finos. A faixa usual dos pós metálicos se
gem, para algumas composições, dá veloci- estende entre 5~ e 1000~ e eles são produ-
dades de queima muito diferentes. zidos soprando um gás comprimido através

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PIROTÉCNICOS E PIROMECANISMOS (1ª Parte)

do metal fundido, dando-se o nome de matelial naturalmente como em compostos não este-
atomizado. As partículas são muitas vezes quiométlicos, como o Óxido de Zinco, ou po-
aproximadamente esféricas, embora existam dem ser causados por impurezas. As impu-
em forma de flocos . O critério simples, usado rezas podem estar presentes por acidente ou
para definir superfície, não explica plena- podem ser introduzidas nos compostos por
mente a reatividade do material. um tratamento. Por exemplo, o Germânio
Os fabricantes de fogos de artifício muitas reage com o Trióxido de Molibdênio como é
vezes usam uma espécie de alumínio chamada mostrado na reação abaixo:
dark pyro por causa de suas boas proprie-
dades de reação; ele substitui o alumínio
atomizado, de partículas menores.
O que determina a superfície reativa, ou Mas, se o Germânio é tratado (dopado)
sítios, é muito mais complexo que as varia- com pequenas quantidades de Arsênico, a
ções simples da superfície para o volume do reatividade é consideravelmente aumentada.
matelial. A reatividade OCOITe a nível atômico Outro exemplo é o da reação do Clorato
ou molecular. Para os sólidos reagirem, como de Potássio dopado com Clorato de Cobre,
é muitas vezes exigido na química dos quando misturado com enxofre. Após a mis-
pirotécnicos, os átomos ou moléculas devem tura, ocorre uma reação espontânea durante
ser arrancados da superfície, e assim com o repouso .
menos forças atrativas, mantendo-os presos, O Clorato de Potássio não dopado, mes-
estarão mais disponíveis para a reação. Há, mo misturado ao enxofre, permanecerá esto-
também, uma ordem de forças de ligação a cado, por longo tempo, sem reagir. Deve ser
ser considerada para os diferentes tipos de ressaltado que essa mistura é extremamente
materiais. A mais forte ligação nos sólidos é sensível e não é aconselhável usar-se essa
encontrada em ligações covalentes, tal como combinação.
no silício. As ligações iônicas vêm a seguir,
abrangendo óxidos e sais metálicos. Estes são
seguidos pelas ligações metálicas, em metais CALOR E SUAS APLICAÇÕES
elementares e, finalmente, a ligação mais fraca
é encontrada em sólidos cristalinos ou Calor de Combustão
amorfos, existentes em moléculas discretas,
tais como as da sacarose ou do hexa- Todos os pirotécnicos produzem calor
cloroetano. quando queimam. Em muitos usos ou efeitos
especiais, esta produção de calor é a verda-
deira exigência. Como a maiolia das compo-
Micro Estrutura sições contêm um metal como combustível,
a plimeira consideração da produção de calor
A reatividade é altamente dependente da é a do calor de combustão dos metais. A
estrutura íntima dos componentes do sólido. tabela 4 dá uma amostra representativa dos
Quaisquer defeitos, dentro da estrutura iônica, calores de combustão de alguns metais e não-
provocam enfraquecimento e podem aumentar metais. Assim, alguns elementos são prodi-
a reatividade. Estes defeitos podem surgir giosos produtores de energia, enquanto outros

[íI' j Vol. XVII - Nº 1 - 1º Quadrimestre de 2000 69


PIROTÉCNICOS E PIROMECANISMOS (1ª parte)

têm um valor mais modesto. Nota-se, também, Também, a energia exigida para decom-
que a densidade desempenha um papel por os oxidantes é pequena para os nitratos,
importante quando são considerados volumes aproximadamente zero para os percloratos e
fixos dos materiais. para os cloratos algum calor é liberado.
Em bases volumétricas, o Tungstênio (W) Comumente é observada a produção de calor
é tão energético quanto o Alumínio (AI), en- superior a 8 kJ/g para essas misturas. Para
quanto que, tomando por base o peso, o Tungs- um dado combustível, os oxidantes oriundos
tênio é o mais inferior do dois . Os maiores de cloratos são geralmente mais sensíveis à
fornecedores de energia para composições iniciação do que aqueles contendo nitratos
são derivados de misturas de elementos, ou percloratos.

PRODUTO COM O PRODUTO COM O PRODUTO COM O


OXIGÊNIO ENXÔFRE SELÊNIO

METAIS
AI Al20 3 31 ,3 (84,5) Al 2S3 9,4 (25,4)
Mg MgO 24,8 (42,2) MgS 14,3 (24,3) MgSe 2,5 (4,25)
Ti Ti02 20,0 (89,8)
Zr Zr02 12,1(77,2)
Fe Fe304 7,5 (58,9) FeS 1,7 (13,4)
W W03 4,6 (89,2) WS 2 1,1 (20,3)

METALÓIDES
B B20 3 57,8 (70,8)
Si Si0 2 31,3 (62,5)

NÃOMErAlS
C CO2 32,7 (65 ,3)
P P4O lO 24,0 (43,7)
S S02 9,3 (18,6)
Tabela 4: Calores de Reações de Metais, Metalóides e não-Metais com o Oxigênio (calor de combustão),
enxôfre e selênio - kJ/g (kJ/cm 3 )

geralmente metais, com oxidantes em forma Reações Térmicas


de sais. Esses oxidantes são muitas vezes sais
metálicos de Nitratos , Cloratos ou Perclo- Outro grupo importante de oxidantes é o
ratos, têm elevado teor de oxigênio livre e dos óxidos metálicos. Esses oxidantes reagi-
baixa estabilidade; os elementos não tomam rão com metais produzindo as chamadas
parte nas reações de produção de energia. "reações térmicas". Um exemplo de tal
Os exemplos são os íons (Na+, K+, etc), o reação é a mostrada abaixo:
Nitrogênio ou o Cloro, todos com baixos
pesos atômicos. 2AI + Fe203 ~ A1 20 3 + 2Fe

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PIROTÉCNICOS E PIROMECANISMOS (1ª Parte)

Do ponto de vista termodinâmico, a ener- metais combustíveis. Por exemplo, uma das
gia produzida por este tipo de reação depende primeiras composições produtoras de fu-
somente dos calores de formação dos dois maça utilizou a reação entre o Zinco em pó
óxidos. Assim, o calor de reação (L1Hr) é a e o Tetrac1oreto de Carbono, na chamada
diferença entre o calor de formação do Al 20 3 "mistura Berger". Mais recentemente Mag-
e o calor de formação do Fe203 (L1H f Al 20 3 nésio e Politetrafluoretileno (PTFE) têm
- L1Hf Fe203)' Quanto maior o calor produ- funcionado como prodigiosos fornecedores
zido mais violenta é a reação. Como regra de energia usados em chamas dissimu-
geral, ocorrerá uma reação estável se a ladoras.
diferença entre os calores de formação dos
dois óxidos é de cerca de 120 kJ/mol. Se a
diferença é maior que 160kJ/mol a reação
tende a ser violenta, como a reação entre o PRIMEIRAS EXCITAÇÕES
AluITÚnio e o Dióxido de Chumbo. Por outro
lado, quando as diferenças são menores, a Exigências
reação torna-se lenta e provavelmente não se
completará. A tabela 5 mostra alguns calores Os artifícios pirotécnicos, geralmente,
(teóricos) produzidos de combinações metal/ consistem da composição principal prensada
óxido metálico. em um invólucro. No topo deste é adicio-
Embora não seja prático misturar metais nada uma camada de uma composição espe-
com o oxigênio elementar, também ocorre a cial; ela é projetada para receber o impulso
reação entre metais em pó e calcogêneos de um iniciador tal como um fusível elétrico.
(enxofre, selênio e telúrio). Essas reações tem Esta camada tem muitos nomes : primeiras
uma modesta produção de calor, embora o excitações, ignitor, escorva e mistura de
melhor oxidante (enxofre) junto com metais, partida.
produza muito calor ao reagir com o oxigênio Seu papel é o de atuar como reforçador
(ver tabela 4), do mesmo modo que o entre a baixa energia inicial produzida pelo
Alumínio que dá reações bem respeitáveis. iniciador e a composição principal que pode
A tabela 4, também, mostra os tipos de rendi-
mentos possíveis para algumas dessas combi-
°
ser difícil de iniciar. fusível elétrico, pro-
vavelmente, iniciará as composições menos
nações. Os halogêneos orgânicos são um outro comprimidas; contudo, os bastões prensados
grupo de oxidantes usados em reações com exigem, usualmente, uma mistura de partida.

METAL Pb0 2 Cuo Mo03


Ai 3,1 (21,3) 4,1 (21,0) 4,7 (18,4)
Ti 2,4 (18,1) 3,1 (17,8) 3,1 (14,4)
Mg 3,9 (16,8) 4,3 (16,5) 4,8 (14,2)
Mo 1,1 (2,3) 1,4 (8,8) 0,7 (3,9)
W 0,8 (8,6) 0,9 (1,9) 0,2 (0,5)

Tabela 5: Calor produzido (teórico) para algumas combinações metal/óxido metálido - kJ/g (kJ/cm 3)

(ill i VaI. XVII - Nº 1 - 1º Ouadrimestre de 2000 71


PIROTÉCNICOS E PIROMECANISMOS (1ª parte)

As exigências para as misturas de partida A pólvora negra sem enxofre é, também,


são, surpreendentemente, bastante rígidas. preparada quando a carga principal é
Elas devem ser facilmente iniciadas pelo incompatível com a presença de enxofre. Isto
iniciador e gerar uma grande quantidade de é de particular importância pm'a composições
calor, porém não muito rápida ou violenta. contendo magnésio que, sob contato prolon-
Uma reação violenta pode fazer com que a gado, reage com o enxofre prejudicando o
mistura de partida apague a superfície que artificio.
está sendo iniciada e cause a falha do arti-
fício. É vantajoso formarem-se alguns pro- b) Compostos orgânicos
dutos não voláteis, deixando pmtículas incan- Um segundo gmpo que é geralmente muito
descentes e assim transferindo o calor para a mais frio que a pólvora negra, é o formado
composição principal. Os constituintes da por compostos orgânicos mais um oxidante.
mistura de pmtida devem ser compatíveis com Um bom exemplo é o da composição 60/40
aqueles da cm'ga principal, visto que esses formada, nessa proporção, entre o nitrato de
ignitores serão prensados em forma de cama- potássio e a lactose, usada para iniciar
da ou assentados sobre a superfície da carga artifícios coloridos, onde ignições indese-
principal. Por exemplo, um ignitor contendo jáveis podem causar a queima da composição
enxofre não deverá ser usado com uma cm'ga principal e prejudicar o efeito desejado.
principal contendo clorato. Finalmente, a
composição do ignitor não deverá ser muito c) Produtores de escórias
sensível, mas deverá ter um rendimento O terceiro gmpo, com os produtos mais
comparado a relativa facilidade de iniciação quentes, é o conhecido como produtores de
do artifício principal. Isto é conseguido em escórias. São excelentes iniciadores e são
três tipos de compostos: empregados para produzir a iniciação em
situações difíceis como nas grandes altitudes
a) Pólvora negra e suas variações onde a pressão reduzida afeta as velocidades
Essas composições iniciam-se com muita de queima. Eles podem ser formulados de
facilidade e têm rendimentos apropriados, elementos combustíveis com sais oxidantes
produzindo gases quentes, pressão e ou de materiais termíticos, como o elemento
pmtículas incandescentes. Um modo simples combustível, com um óxido metálico. A
de empregar a pólvora negra é o de aglutiná- tabela 6 dá exemplos desse grupo de
la com celulose, produzindo uma composição iniciadores.
conhecida como Cambric.
COMPOSIÇÃO USO
BfKCIOJThiokol Escorvas em geral
BIKN0 3 Iniciação em altitudes elevadas
Mg/Ba02/C Iniciação de traçantes
Al/Si/KN03/Fe304/C Iniciação de fumígenos tipo HC
SilPb02/Cu20 Iniciação de fósforo
SilTilPb 30 4 Iniciação de retardos
Tabela 6: Produtores de escória

(Este artigo continua no próximo número da RMCT)

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