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OMÓ AGBOULÁ

ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE RELIGIOSA E CULTURAL OMÓ AGBOULÁ


Fundada em 08 de setembro de 1973 – Itaparica BA
So
Terreiro tombado pelo IPHAN como Patrimônio Cultural Material e Imaterial Brasileiro
cieda un
de Egu ng

(Processo SEI 01502.001139_2015_77)

NOTA DE ESCLARECIMENTO

Prezada comunidade de Lesse Egungun e Lesse Orixá da nação brasileira,

Diante de uma série de questionamentos que recorrentemente passamos a receber nas


últimas semanas em relação a um dado card comemorativo de 62 anos de iniciação de
sacerdócio que será acompanhado de uma iniciação de Omoisan (Egungun), card esse
que circula nas redes sociais ligadas aos povos e comunidades de Terreiros, viemos
por meio dessa nota de esclarecimento apontar a posição do Ilê Agboulá, bem como da
rede de Terreiros de Egungun advindos da tradição da Ilha de Itaparica.

Como é amplamente sabido, o culto de Egungun cultuado no Brasil a partir da diáspora


africana no século XIX tem seus primórdios na Ilha de Itaparica. Nesse sentido, reside
na tradição desse território o berço dos mais importantes terreiros historicamente
conhecidos nesse culto e que tem suas ramificações espalhadas por todo o Brasil. Na
nossa tradição, assim como ocorre nas distintas tradições de cultos afro-brasileiros, o
processo de iniciação para o sacerdócio passa por rígidos processos iniciáticos onde o
neófito é submetido a avaliação criteriosa da comunidade até a sua maioridade e
posterior senhoridade.

No culto de Egungun esses critérios passam pela avaliação da conduta social do


iniciado, sua relação afetiva com o culto, seus laços de respeito e solidariedade para
com a família carnal e espiritual, enfim, uma série de elementos que reverberam na
avaliação comunitária e ancestral quanto ao merecimento desta dádiva. Essas são as
condições essenciais para a escolha do futuro Ojé que tem como processo inicial o rito
de introdução à condição de Omoisan.

Diante desse contexto, não nos parece salutar ou razoável o anuncio de uma iniciação
como presente à comunidade baiana, iniciação que o referido card sugere ser aberta a
inscrição de interessados (e curiosos) para tomar parte de um ato tão particular e
importante para uma comunidade de Egungun e toda rede de Terreiros parentes e
aderentes. Ademais, uma iniciação desse porte requer complexidades que exigem
profunda responsabilidade espiritual para com todos os envolvidos, algo que requer alto
nível de confiança e aptidão para o curso religioso.
OMÓ AGBOULÁ
ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE RELIGIOSA E CULTURAL OMÓ AGBOULÁ
Fundada em 08 de setembro de 1973 – Itaparica BA
So
Terreiro tombado pelo IPHAN como Patrimônio Cultural Material e Imaterial Brasileiro
cieda un
de Egu ng

(Processo SEI 01502.001139_2015_77)

O tratamento simplório oferecido pela comunicação do card muito nos deixa perplexos
e preocupados, não merecendo de nossa parte qualquer tipo de apoio ou guarida, razão
pela qual manifestamos nosso desconforto nessa nota. Estamos mantendo e
preservando a tradição de culto de Egungun, tal e conforme nos foi passado de geração
a geração pelos nossos antepassados desde o século XIX, enfrentando todas as formas
de adversidades, tais como, preconceitos, perseguições religiosas, racismo estrutural e
estruturante, bem como, toda sorte de desigualdades que permeiam os povos
afrodescendentes no Brasil.

O reconhecimento da importância cultural, religiosa e filosófica por parte do estado


brasileiro tem ocorrido por meio de muitos sacrifícios e reivindicações. Foi através da
militância política, do engajamento social e da luta cotidiana dos membros da tradição
Egungun da Ilha de Itaparica que hoje o Ilê Agboulá (Agboola) conseguiu que o Estado
brasileiro inserisse o culto de Egungun como um capítulo da narrativa nacional pela via
do instrumento do Tombamento nacional ocorrido pelo Instituto do Patrimônio Histórico
e Artístico Nacional no ano de 2017. Ademais, os Terreiros Asipá, Tuntun Olokotun, bem
como o Ilê Agboulá (Agboola) figuram como bens tombados e registrados pelo
patrimônio imaterial do Estado da Bahia, salvaguarda essa conferida pelo Instituto do
Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia - IPAC.

É de bom alvitre esclarecermos ainda que no dia 06 de janeiro desse ano, foi escolhido
Balbino Daniel de Paula-Alàgbá do Ilé Agboola como novo Alapini do Culto de Egungun
de todos os terreiros advindos da Tradição da Ilha de Itaparica sediados no Território
Brasileiro e eventuais casas que poderão vir a nascer dessa tradição em outros lugares
do mundo. Essa escolha se deu em substituição a Deoscoredes Maximiliano dos Santos
- Mestre Didi Asipá falecido em outubro de 2013.

Essa informação é importante porque, em que pese não sermos os “donos” do culto de
Egungun (e nem temos essa intenção, que fique bem claro!), somos, sim, legítimos
representantes e defensores desse culto no território brasileiro. Não reivindicamos aqui
qualquer tipo de exclusividade no culto, mas o respeito para com os ritos comunitários
que acreditamos e defendemos por mais de um século. Desse modo, é lícito o nosso
desconforto formulado nessa nota de esclarecimento.

Também nos causa estranheza o fato de constar no card a menção da condição de


Alàgbá Ojé Tundé pelo Oluwo, cargo esse ocupado no Brasil desde o ano de 2020 pelo
OMÓ AGBOULÁ
ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE RELIGIOSA E CULTURAL OMÓ AGBOULÁ
Fundada em 08 de setembro de 1973 – Itaparica BA
So
Terreiro tombado pelo IPHAN como Patrimônio Cultural Material e Imaterial Brasileiro
cieda un
de Egu ng

(Processo SEI 01502.001139_2015_77)

sacerdote Ojé Carlos Geraldo dos Santos, membro da família Daniel de Paula e Ogan
do Ilé Asé Opo Afonjá – BA, após a morte do Ojé Fernando Nascimento que era detentor
do título.

Diante dessa nota, recomendamos que o ilustre Oluwo reveja a intenção de prover uma
iniciação de Omoisan nos termos que anuncia. Outrossim, nos colocamos abertos ao
diálogo com essa e eventuais outras tradições do culto de Egungun que cheguem ao
nosso país, a fim de que de modo respeitoso possamos construir ambientes fraternos
de defesa e proteção ao culto de ancestrais no Brasil e no Mundo.

Balbino Daniel de Paula


Alapini Ipekun Oye

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