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A Chuva

Temary nunca quis salvar o mundo, foi apenas um efeito colateral de sua tentativa de
salvar a si mesma.

Estava apreciando o nascer do sol no topo do monte Callium naquela manhã. A estrela
Gentil iluminava o mar e, nas proximidades da costa, acontecia o fenômeno da
bioluminescência multicolor. As águas brilhavam em dezenas de cores diferentes num degradê
multicolorido que se mesclava ao verde profundo do oceano. Após muitos anos no espaço,
envolvendo-se em tramas políticas, lidando com tecnologias de ponta e viajando entre
diferentes sistemas estelares, poder apreciar a beleza de um pôr do sol em meio a natureza
era um privilégio enorme, o qual ela jamais havia planejado. Algumas nuvens brancas
passavam por ali, com formas aleatórias, como em quase todos os planetas, enquanto o azul-
esverdeado do céu mescl — !

Um zunido percorreu sua mente. Uma transmissão telepática estava ocorrendo.


Durante os Seis anos que esteve em seu isolamento, ela ignorou todas as transmissões. Não
queria saber das notícias extra-solares, das batalhas da guerra, das mudanças políticas, das
novas políticas econômicas, dos novos refugiados que chegavam ao planeta, de nada que
pudesse lembrar..., mas ela sabia que dessa vez precisava ouvir. Na última vez que Gentil havia
se escondido no horizonte, ela pode ver os flashes. Não queria pensar nisso, queria acreditar
que não era verdade. Mas era. Colocou suas ondas mentais em ressonância com a mensagem
que chegava. E pode ouvir uma voz grave e apreensiva:

— ...cial! Atenção, notícia emergencial! Atenção, notícia emergencial! Foi confirmada a


aparição de uma frota de guerra dos Cruzados Divinos na órbita da Gentil. Uma estação
espacial de guerra, acompanhada de duas naves da classe Golias foram identificadas! Segundo
o comando de guerra, a previsão é que a órbita das tropas se encontre com a de nosso planeta
em 78 horas. Nossa frota já foi lançada e irá interceptar o inimigo em 50 horas. Devido à
possibilidade de naves de escolta estarem movendo-se descoladas da tropa e das possíveis
escaramuças, todos os voos em direção à Gentil foram cancelados! Repito, todos os voos em
direção à Gentil foram cancelados! O conselho da Confederação convoca todas as pessoas
saudáveis a se alistarem devido à iminência de uma invasão! Crianças, idosos e demais pessoas
incapazes de lutar devem se dirigir aos pontos de lançamento mais próximos onde naves VPL
estão sendo preparadas para uma evacuação de emergência! Repi...

Ela mudou a frequência de sua mente e cessou a ressonância, distanciando-se o


bastante para ignorar até mesmo o zumbido. Sabia que esse dia chegaria. Temia isso, mas
tinha certeza que era uma questão de tempo. E sabia que a batalha estava perdida. Um dos
dizeres dos Cruzados, auto intitulados Homens de Deus, era que “Deus não joga dados”. Eles
não faziam apostas. Não trariam a principal parte de sua frota para uma batalha que não
tinham certeza da vitória. E a vitória deles significa um tempo de escuridão. Afinal de contas o
inferno era uma invenção deles, tão necessária que eles mesmos o criavam em terra para os
seus inimigos.

Alguns anos atrás Temary teria perdido as esperanças. Talvez tivesse se jogado de
onde estava em direção ao mar, batido a cabeça nas pedras e morrido junto aquele belo lugar
que amava nesse momento. Não por um sentimento de pertencimento, apenas pela satisfação
que lhe dava. Porém, ela lutou muito tempo para ver sentido em continuar viva. Muitos
apoiaram e incentivaram essa luta. Foi doloroso para ela deixá-los, mas sabia que para essas
pessoas sua partida havia sido mais doída. Prometeu que voltaria um dia. Não sabia que jamais
cumpriria essa promessa, mas que salvaria suas vidas.

Ao invés de perder as esperanças, resolveu meditar. Esvaziar a mente como havia


aprendido através de uma sabedoria aprimorada há mais de doze mil anos, desde antes do
êxodo solar. Sentou-se na posição do lótus e fechou os olhos. Inspirou profundamente.
Expirou lentamente. Inspirou profundamente. Expirou lentamente. Focou em esvaziar sua
mente, ignorando os pensamentos. Todos os pensamentos. Apenas deixava-os passar. Por
algum tempo ela manteve-se assim, sentindo a luz gentil tocar sua pele, o vento úmido, os
sons da natureza, o cheiro de mar…

Quando abriu os olhos novamente, o fez com uma súbita compreensão.

Os Cruzados Divinos certamente haviam avaliado a capacidade de derrotar a frota da


confederação que estava indo em direção a eles. Isso estava dado. Mas os humanos não eram
a espécie mais desenvolvida a habitar aquele planeta. Isso também era um fato. E um fato
conhecido de Temary e desconhecido dos Homens de Deus.

Lentamente começou a descer o morro. Era uma caminhada relativamente longa, mas
certamente chegaria à base antes do anoitecer. Seus olhos geneticamente modificados
permitiam ver os tons vividos e brilhantes de rosa, azul e violeta emitidos pelas plantas
daquele lugar. Caso ainda tivesse os olhos de nascimento, a mata seria escura, plantas
variando entre preto, tonalidades escuras de cinza e marrom. Muito diferentes de seu planeta
natal, aqui as árvores eram altas, conectavam-se através de seus galhos ou raízes, muitas vezes
formando uma única rede de nutrientes, absorvendo quase toda a luz que Gentil enviava,
trocando seu código genético em uma complexa rede antes de disparar seus frutos e sementes
no ar como se fosse canhões. Alguns frutos encontravam-se no chão, com cascas tão duras
quanto metal e polpas doces e suculentas, bastando saber a maneira correta de abrir para se
deleitar. Alimentando-se dessas iguarias e bebendo água de pequenas fontes, Temary teve
uma caminhada tranquila até a praia, onde recolheu galhos caídos e fez uma fogueira. Usando
um atrator de peixes, pescou o suficiente para seu jantar e dormiu.

Sonhou. Pesadelos. Memórias. Acordou com as lágrimas ainda escorrendo, um pouco


antes do amanhecer e precisou lembrar, pois era impossível apagar o sofrimento. Ela havia
aprendido a conviver com ele, tornou-o parte de si, tornou-se mais forte através dele. Olhou
para seus braços. Eles tinham seu DNA, mas não eram os mesmos braços com os quais ela
havia nascido. Lembrou-se da dor de tê-los arrancados, das correntes que ficaram no lugar
deles, da tortura, do abuso, da escuridão, da fome, do frio, da humilhação. Agora eram apenas
palavras. Palavras tristes. Palavras dolorosas. Mas apenas palavras. Dez anos atrás eram sua
vida, tudo que existia era isso. Passou. Agora sua vida eram as belas cores que surgiriam no
mar em alguns instantes e a paz que viajar por aquele planeta exótico lhe trazia. Era isso que
ela queria preservar. Não aceitaria voltar àquele estado. Não aceitaria aquela dor novamente.

Esperou amanhecer para apreciar o nascer da Gentil mais uma vez, e, talvez pela
última vez, ver a bioluminescência multicolor. Estava enganada quanto a isso, ao menos.
Comeu alguns frutos, ajeitou seus pertences em sua bolsa e caminhou em direção ao mar.
Entrou na água e nadou até atravessar a arrebentação das ondas. Já dentro das águas, deixou-
se flutuar e conectou-se àquele ambiente. Espalhou sua mente por uma longa distância dentro
da água, enviando um chamado para as grandes criaturas marítimas que lá habitavam e não
tinham interesse nenhum em atacar seres alienígenas como ela. Por algum tempo ela boiou,
contemplando o céu. Ouviu novamente o zumbido indicando uma mensagem telepática. Era
realmente um momento de crise aguda, para enviarem tantas mensagens ao planeta inteiro,
uma atrás da outra. Dessa vez ela resolveu ignorar. Sabia que a situação não teria mudado
tanto naquele curto tempo entre um amanhecer e o outro. O tempo para os soldados e
citadinos passava em um ritmo diferente. Ela tinha ainda pelo menos mais dois amanheceres
pela frente, talvez um pouco mais. Voltou a focar sua mente em enviar sinais para as criaturas
do oceano. Pouco tempo depois, conseguiu resposta. Um Leviatã, uma criatura parecida com
uma serpente alada, com cerca de doze metros de comprimento e um ferrão estrelado
respondeu ao seu chamado. Temary enviou uma proposta: uma longa viagem, muito bonita, a
um lugar que ele não conhecia. Ela iria guia-lo e ele iria leva-los. Muitos seres nesse planeta
tinham uma consciência bastante desenvolvida, com formas estranhas e únicas de cultura
muitas vezes incompreensíveis para os humanos. Leviatãs gostavam de viajar, de conhecer, de
explorar. Eram criaturas solitárias a maior parte do tempo, mas gostavam de companhia por
curtos períodos. Talvez eles não soubessem que ela era uma alienígena, talvez já tivessem
compreendido isso pelo cheiro e cor estranha dos humanos. O que importava é que eles
gostavam da companhia desses seres pequenos, que não respiravam embaixo da água e
podiam comunicar-se através dos pensamentos.

Pouco tempo depois ela viu a sombra da criatura aproximando-se por baixo da água. O
leviatã subiu lentamente, flutuando por cima da água, apenas alguns metros de distância dela,
aproximando-se lentamente para não causar turbulência. Mais uma maravilha desse planeta.
Poder estar próximo de uma espécie de cobra gigantesca, com doze olhos prismáticos, que
flutuava por cima da água. A cabeça do leviatã era praticamente do tamanho de Temary. Ela
nadou até a criatura, que se abaixou até um pouco abaixo do nível da água, para que ela
pudesse subir. Temary montou nele, vendo seu ferrão brilhar logo atrás dela. Ela não tinha
medo. Confiava muito mais num leviatã do que em qualquer ser humano. Conectaram-se e a
mulher transmitiu através de imagens para onde ele devia ir. A serpente enorme ergueu-se a
um metro de altura do mar e a água atrás dela começou a ser empurrada, formando um rastro
que se erguia no seu flanco. Quanto mais rápido ela se movia, maior era a perturbação
causada. Nenhuma embarcação marítima dos humanos movia-se tão rápido quando a um
leviatã voando sobre os mares.

Algumas horas depois, chegaram até um dos lugares mais temidos pelos habitantes
daquele planeta. O continente não colonizável. Atemeria, lar dos atemas, uma espécie que
depois de quase dez mil anos de convívio, continuava sendo um completo mistério para a
humanidade. Por algum motivo tendiam a aglomerar-se nesse continente, apesar de muitos
espalharem-se pelo mundo, vivendo inclusive em meio às cidades humanas.

Temary não tinha medo. Sabia que as criaturas não iriam ataca-la. Manter a respiração
sob controle e deixar sua mente aberta, transparente, era tudo que ela precisava fazer.
Precisava que os habitantes daquele lugar pudessem vê-la profundamente. Entre os humanos
isso era muito arriscado. Um telepata minimamente habilidoso poderia paralisá-lo, enganá-lo,
criar um ilusão, tomar vantagem da situação para qualquer finalidade sórdida nas quais os
humanos eram especialistas. Mas não os atema. Passou ao lado de um riacho, apreciando as
pequenas formas de vida que ali nadavam. “Peixes”, ela pensou, apenas uma palavra genérica
para qualquer tipo de criatura que vivia exclusivamente sob a água. Classificar criaturas
alienígenas nunca fora o seu forte. Mas com a mente aberta da forma que estava, sabia que
sua presença era irrelevante. Ela seguiu o riacho, cercado por esparsas e enormes árvores
fluorescentes. Por fim, ela os encontrou.
Eram dezenas. Seres com corpos fluidos, semitransparentes com uma leve tonalidade
colorida que varia entre o roxo, o rosa e o amarelo, mudando de forma a cada instante. Alguns
imitam o formato de outras criaturas com corpos mais rígidos, enquanto alguns preferem
manter-se disformes. A necessidade de membros ou de uma forma física para essa espécie é
irrelevante, pois mantém-se flutuando o tempo todo e conseguem fazer com que qualquer
coisa ao seu redor levite com a mesma facilidade com que os humanos usam suas mãos.
Estavam apenas ali. Existindo.

Ela aproximou-se, sem cautela, sem medo, sem cuidado algum. Ninguém compreendia
essas criaturas e qualquer lógica instintiva que a humanidade desenvolveu em seu planeta
natal não se aplicava. Viu um atema em especial que chamou sua atenção. Uma esfera de mais
ou menos dois metros de diâmetro, flutuando a uns três palmos do chão. Ela estava circulando
ao redor de si mesma, na direção vertical. Linhas fluorescentes variando entre o vermelho
claro e o fúcsia circulavam no sentido oposto, em seu corpo branco quase translúcido. Temary
parou perto o bastante para encostar na criatura com seu braço. Sentou-se na posição da
lótus.

Inspirou profundamente. Expirou lentamente. Inspirou profundamente. Expirou


lentamente. Quando enfim sentiu sua mente vazia o bastante, começou o que tinha vindo
fazer ali:

Entrou em contato.

Ela procurou a frequência de ressonância daquele atema, encontrando suas ondas


cerebrais — se é que podia dar esse nome para uma criatura que não tinha propriamente um
cérebro — e colocou-se naquela mesma frequência. Enviou para a criatura o mais puro
sentimento de calma que ela possuía. Mentalizou a beleza do nascer da Gentil, das cores do
mar e da mata, do seu voo no leviatã. Belezas ainda iminentes em sua mente. Enviou essa
imagem. Enviou o seu amor por estar naquela terra.

E o atema respondeu.

Por mais preparado que uma pessoa esteja, ela jamais estará preparada para receber a
resposta de um atema.

Foi uma explosão. Um céu estrelado que de repente amanhece, chove, anoitece,
escuro, nublado, amanhece novamente, repete-se dezenas de vezes. A chuva batendo em seu
corpo, o granizo mudando o formato do seu corpo, a sensação de ser feito de água, de trocar
toda a água do seu corpo pela água da chuva. O sol que te evapora e você que absorve a água
da atmosfera para manter-se em equilíbrio, sempre tênue a barreira entre evaporar e tornar-
se pesado demais para voar. Atravessar o céu, dar a volta ao mundo durante vários dias e
noites, sem pousar, sem pensar, deixando de ser para apenas voar.

Mas Temary estava pronta. Sua mente vazia permitiu que os pensamentos apenas
passassem, sem tentar compreender, apenas sentindo. Compreender não era importante. Em
resposta ela enviou seus sentimentos, sua própria consciência do que era estar viva. Seu
coração batendo, sua mente sempre pensando, pensando, pensando, sua pele sentindo o ar
em volta de si, sua espinha arrepiando, sua língua, as roupas sobre o seu corpo, o coração
batendo, as veias pulsando, o peito subindo e descendo, seus braços e pernas se movendo, o
piscar dos olhos, um brilho que ofusca seus olhos, um cheiro acre que invade seu nariz, a
doçura de uma fruta, a fome com que acorda, o suor escorrendo quente após uma corrida, frio
em momentos de tensão. Ela não escolheu nada disso, apenas enviou tudo que passou por sua
cabeça enquanto meditava em frente aquele ser tão alienígena.

Silêncio. E então um sentimento familiar. Um ponto de contato. Curiosidade. O Atema


estava curioso. As cores que circulavam seu corpo tornaram-se mais vivas, mais brilhantes.
Temary também estava, e enviou de volta esse sentimento, passando para uma ressonância
que ia para além da frequência de onda dos seus pensamentos. Junto a isso, enviou imagens
da sociedade daquele planeta, na qual vivera por alguns anos. Transmitiu as conversas nas
ruas, os veículos flutuantes cheios de gente rindo, gente compartilhando a vida, pessoas
plantando, cozinhando, comendo juntos, dividindo o trabalho. Gente adoecendo, alguns se
curando, outros morrendo. Grandes aglomerações de pessoas assistindo ao teatro, gente
praticando esportes, gente indo à praça, gente indo à praia, nadando, gente namorando na
rua, gente indo embora, gente voltando, gente chorando com as chegadas e partidas, gente se
amando, gente se odiando. Todo tipo de gente, em todo tipo de situação. O que ela transmitiu
não era exclusivo daquele planeta. Era típico de todas as diferentes sociedades humanas por
quais ela passou. Não era coisa de [nome dos habitantes do planeta?], era coisa de gente.

O atema continuou brilhando mais intensamente. Ao mesmo tempo vários outros se


aproximaram, assumindo também o mesmo formato esférico, sendo distinguíveis apenas pelo
padrão de cores diferentes, com diferentes formatos e sentidos de circulação em seus corpos.
Temary continuou sua transmissão. Transmitiu sua sensação de voar pelo espaço, a confusão
que sentia ao circular uma estrela e de repente se teletransportar para o espaço vazio nas
extremidades de um sistema estelar diferente. A solidão que sentia ao viajar longos meses
próximo à velocidade da luz, sabendo que lá fora anos estavam passando. De olhar através das
câmeras da nave e não ter o conforto de um sol brilhando no horizonte, apenas uma infinidade
homogênea de estrelas, o medo de confiar apenas na matemática como guia. Refez a sua
trajetória até seu planeta natal. E então seus sentimentos de paz e tranquilidade começaram a
se abalar. Ela precisava mostrar aquilo. Se ela queria, de alguma forma convencê-los, se as
histórias do passado sobre a intervenção dos atema na única guerra mundial de [nome do
planeta] eram reais, ela não via outra forma se não mostrar aquilo. Não como uma
historiadora ou jornalista, mas como alguém que viveu os horrores daquela guerra na pele.
Literalmente.

Com sua mudança de humor, ela viu que a circulação harmônica das linhas de cores
em seus interlocutores mudou. Tornaram-se fluxos espiralados e mais escuros. Porém,
continuavam todos parados. “Olhando para mim” ela pensou, mas eles não tinham olhos.
Ninguém sabia se eles enxergavam, apesar de entenderem as imagens que lhes eram
enviadas.

A mente de Temary agora estava em meio às ruas movimentadas de [planeta natal


dela]. Grandes avenidas, cheias de veículos deslocando-se muito rápido. Os pedestres tinham
passagens subterrâneas ou aéreas, pois o trânsito não podia parar. Seu povo pensava que
havia reconstruído a antiga glória do planeta Terra e ido além. Não precisaram causar o fim do
mundo, extinguir toda a vida animal e vegetal, destruir a atmosfera e poluir todas as águas. Era
a segunda tentativa, e dessa vez tinham feito as coisas melhores do que na primeira. Mas após
dois mil anos de convivência pacífica com os outros planetas, após encontrar várias formas de
vida inteligente naquela parte da galáxia e nenhuma delas sequer ter sonhado com a ideia de
viajar pelo espaço, não podiam estar preparados para o que aconteceria. Ela lembrava-se bem
do fatídico dia. Estava checando a carga que iria levar para o planeta Aurora em um cargueiro
VPL, pensando em como estaria sua sobrinha recém nascida daqui a 6 anos, quando ela
voltaria, apesar de no referencial da nave a viagem durar apenas um ano – seis meses
acelerando, dois meses viajando e outros quatro meses desacelerando. Enquanto checava se
já haviam sido carregadas as três toneladas de silício, sentiu a terra tremer. Seu coração
acelerou. Uma voz incompreensível foi ouvida vinda dos céus. De repente outro tremor. Ela
correu para o lado de fora para ter a aterrorizante visão de uma nave gigantesca falando em
uma linguagem completamente alienígena e disparando contra os maiores prédios da cidade.

Logo surgiram as instruções de evacuação. Ela se alistou na milícia. Era uma boa
telepata desde então, apesar de não ter desenvolvido tanto as suas habilidades, preferindo
aprender o ofício das viagens interplanetárias. Os inimigos eram humanos, tanto Homo
Spatium como os [habitantes do planeta]. Dessa forma, podiam ser paralisados, atacados
mentalmente por um telepata devidamente equipado. Seu planeta não caiu sem uma boa
briga. Mas o bombardeio constante de armas cinéticas de destruição em massa lançadas de
uma nave da classe Golias não é algo que nenhum planeta estava preparado para suportar
naquele momento. Eles foram sorteados, foram os primeiros a serem atacados e
inevitavelmente os primeiros a cair.

Foi durante uma batalha de guerrilha que ela foi capturada. Os inimigos não queriam
destruir a cidade naquele momento. Estavam tomando-a de assalto. Sua tropa recebeu ordens
de evacuar os civis e defender posições estratégicas. Ela não fez nada de errado. Estava usando
um amplificador de sinais mentais, paralisando, assustando, desnorteando os grupos de
inimigos que se aproximavam. Mas eles haviam quebrado o tabu estabelecido pela
Confederação. Máquinas. Drones de guerra aproximaram-se e ela não podia fazer nada quanto
a eles. Um dos robôs, praticamente do tamanho dela, veio desviando dos tiros direto em sua
direção, assim como alguns outros o fizeram na direção de outros telepatas que também
estavam lá. Ele tinha quatro patas metálicas que foram usadas para abraça-la, prendendo-se
ao seu tronco. As patas metálicas tinham lâminas afiadas que atravessaram sua armadura,
rasgaram ligeiramente sua pele e a eletrocutaram até que desmaiasse.

Quando acordou estava nua, mãos e pés amarrados junto a dezenas de outras pessoas
na mesma situação. As cordas que os amarravam não passavam somente por seus membros,
mas por várias partes de seus corpos. Ela reconheceu várias pessoas. Companheiros de guerra.
Amigos. Desafetos. Gente de todo tipo. Gente amada. Gente odiada que passou a respeitar.
Todos em uma situação degradante e humilhante. Ela olhou em volta, vários homens, usando
coletes brancos e sujos de sangue andavam de um lado para o outro, olhando para os
prisioneiros. Ela tentou comunicar-se telepaticamente com um deles, e nesse momento
descobriu que os fios que a amarravam eram condutores, eletrocutando não somente a ela,
mas a todos os outros. Um dos homens riu e falou algo incompreensível, enquanto apontava
para sua própria cabeça e estremecia, fingindo levar um choque. Logo um deles chegou
arrastando consigo um refém, Markel, um dos chefes do governo de [planeta], também nu,
com os braços amarrados em suas costas. Deu um tapa nele e apontou com o dedo para sua
própria cabeça. Ficaram se olhando por alguns instantes e o refém falou:

— Eu sou um interprete. Estou em contato telepático com nosso inimigo. Ele quer se
apresentar. Eles estão em uma Cruzada, por isso, chamam-se os Cruzados Divinos. Eles querem
retomar o caminho da salvação, livrar a humanidade dos pecados cometidos por nós... por
todos que não seguem a mesma religião que eles. Nossa... “bruxaria” — falou com muito
desprezo esse termo arcaico e recebeu um forte tapa no ouvido, que o derrubou e deixou-o
sangrando. Seu carrasco levantou-o e ameaçou bater novamente, quando ele voltou a falar —
Nossa bruxaria deve ser punida para que possamos ir ao paraíso, para que a humanidade toda
possa transcender essa era de escuridão. A magia do desaparecimento e reaparecimento
místico, das forças infernais que movem as coisas com a mente e a invasão irrestrita de
mentes são expressões do demônio, e todos aqueles que reforçam essa prática estão trazendo
o inferno cada vez mais perto da terra. Como os Homens de Deus e seu senhor, o Rei-
Sacerdote, são misericordiosos, eles nos farão pagar por seus pecados em vida, para que
possamos ter o direito à vida eterna sem ser lançados diretamente no inferno. Por isso, todos
seremos levados ao purgatório, para pagar por nossos pecados e ter nossas almas purificadas
da influência demoníaca que nos dominou.

Temary notou que essas palavras estavam sendo gravadas por algum dispositivo
estranho que aquela civilização possuía. Somente mais tarde descobriria que estavam sendo
transmitidas em seu próprio planeta e somente depois descobriu que as palavras a seguir não
se aplicavam a quem estava ali presente, naquele lugar estranho, um chão metálico, com luzes
brancas artificiais, sem janelas, sem decorações. Algo como uma grande caixa de metal.

— Aqueles que decidirem colaborar com a construção do paraíso em terra, que


abandonarem suas práticas demoníacas, que obedecerem às ordens dadas pelo representante
de nosso senhor Rei-Sacerdote Javel, o Comandante Paladino Isiel, poderão pagar por seus
pecados com trabalho duro, diligência, disciplina, sacríficio, comedimento, levando uma vida
no extremo da modéstia, serão perdoados e aceitos por nosso Deus. — Em seguida, uma série
de regras foram passadas, regras que ela não entendia o porquê, regras sobre comer pouco,
vestir-se mal, dormir de forma desconfortável. Regras sobre a perda da dignidade enquanto
povo. Regras sobre abandonar sua cultura e tornar-se escravos. Tudo sob a desculpa de
redimir-se de pecados definidos por uma fé que não era sua.

Após a longa ladainha, Markel pareceu aterrorizado, balançou a cabeça em clara


negação à seja lá o que fosse que aquele homem estivesse sugerindo. O homem falou algo
incompreensível em um aparelho estranho e segundos depois um ruído ouviu-se do lado de
fora. Uma explosão. Após isso, ele deu um soco na boca do estômago do seu refém, que, em
lágrimas e desespero falou:

— Aqui, em frente a vocês, estão... — hesitou, viu o olhar ameaçador do seu carcereiro
e retomou a fala — estão hereges além da salvação. Não apenas abusaram dos poderes
concedidos pelo demônio, como usaram esses poderes para matar inúmeros Homens de Deus.
Infelizmente, no caso deles, não há salvação apenas pelo trabalho. Quem se rebela e mata em
nome do demônio só pode voltar à graça divina após passar pelo purgatório. Deus é
misericordioso, mas é justo. E a justiça só pode ser feita através da punição para os infiéis. —
em seguida ela sentiu os fios que a amarravam eletrocutando-a. Sentiu sua pele queimando,
seu corpo estrebuchando, até perder a consciência totalmente.

Acordou, ainda nua, com braços e pernas amarrados à uma cadeira metálica. Estava
em frente ao estranho aparelho de filmagem. Uma caixa, com uma lente e uma luz piscando
em seu fundo. Em cima dela, um forte cone de luz branca, deixando-a em evidência naquele
ambiente escuro. Uma máquina entrou na sala. Um robô humanoide, esguio e branco, com
uma cruz dourada pintada em seu peito, caminhou na direção dela carregando um capacete
cinzento, cheio de espinhos em seu interior. Colocou-se atrás dela, em frente ao aparelho de
filmagem e falou, com a voz de Markel:

— O pecado da telepatia será punido com a coroa de chumbo.


Ao terminar a frase, colocou o capacete na cabeça dela e começou a apertá-lo através
de algum mecanismo, fazendo os espinhos entrarem em sua pele, e depois em seu crânio. Ela
lembrava de cada centímetro daquela dor através de seu corpo. De cada gota de sangue que
escorreu. Sua cabeça ficou pesada demais para mantê-la erguida. Em seguida, entraram dois
dos Cruzados. Eles ficaram ali parados um pouco. Em seguida ergueram a cabeça dela pelo
queixo e apontaram para suas próprias cabeças. Ela tentou entrar em contato telepático com
eles, mas o chumbo impedia a transmissão de ondas mentais. Estava impedida de se
comunicar. Eles gargalharam, soltaram-na da cadeira e a arrastaram até a parede, onde
prenderam seus dois braços com ganchos parecidos com anzóis de pesca, fazendo-os
atrevessar seus antebraços. Ela desmaiou.

Para haver um paraíso, é necessário haver um inferno. Dessa forma, aqueles Homens
de Deus, em sua ânsia por criar o primeiro, materializaram o segundo. Destruíram a cidade
dela, dominaram seu povo, mataram seus líderes, tentaram apagar sua cultura, escravizaram
as pessoas que ela conhecia e, além disso, a torturaram. Essas memórias estavam
profundamente enraizadas. Eram uma mistura de dor, frio, medo, fome. Foi usada como
objeto sexual. Foi chicoteada, espancada e queimada. Alimentaram-na com um funil.
Deixaram-na jogada sobre seus próprios dejetos. Seus braços eventualmente gangrenaram e
eles os amputaram e cauterizaram, sem anestesia. Mantiveram-na acorrentada através do que
restou deles. Ela apenas esperava a morte, dia após dia. E a morte nunca veio.

Um dia, quem veio, foi a vida. Chegou na forma de várias explosões do lado de fora.
Depois na forma de guerreiros teletransportadores. Entraram nas celas, libertaram os
prisioneiros, colocaram-nos em naves e enviaram-nos para outro planeta. Mas a partir daí a
história de sua recuperação, essas imagens, não importavam mais para os atema. Quando
terminou de transmitir essas memórias, estava chorando. Ela passou tudo isso de olhos
fechados, em um único fôlego, e assustou-se quando abriu-os.

Os atema estavam mudando de forma. Alguns criaram espinhos, outros pseudópodes,


outros deles lançavam pequenas bolhas de seus corpos que flutuavam em volta de si mesmos
e voltavam. Os padrões de cores moviam-se rapidamente, em formas caóticas, irregulares. Ela
compreendeu a solidariedade. Compreendeu que até mesmo para aqueles seres o que havia
passado com ela era monstruoso. Talvez eles não compreendessem a cultura humana, o que
realmente significava tudo aquilo, as palavras ditas, mas eles sentiram o que ela sentiu. Talvez
os sentimentos deles fossem diferentes, talvez não tivessem sentimentos como os humanos,
mas havia algo em comum entre todos os seres vivos daquela parte da galáxia, inclusive entre
humanos e atemas.

Ela criou uma imagem mental baseando-se em suas memórias. Mostrou as naves do
Cruzados Divinos chegando ao [nome do planeta] e tudo se repetindo. Mostrou toda aquela
gente que vivia em harmonia sofrendo o mesmo que ela, sofrendo os horrores trazidos pela
guerra santa. E em seguida, fez o movimento que talvez fosse o mais arriscado de todos.
Tentou transmitir para aqueles seres um fragmento antigo da história daquele mundo, que ela
havia somente lido sobre. O episódio da única guerra mundial. Mostrou dois exércitos
imaginários lutando, humanos usando armas arcaicas, milhares deles, lutando, se matando. Ao
fundo, havia uma grande aglomeração de atema que aos poucos aumentava, fundindo-se,
tornando-se um único ser. Ao final da batalha, um dos exércitos foi vitorioso e começou a
passar pelo campo de batalha, levando prisioneiros para o seu acampamento, onde
começaram a mata-los e tortura-los. Em meio a isso, os exércitos imaginários começaram a se
confundir com os exércitos de sua memória. Toda guerra de conquista, santa ou não, era
apenas uma repetição. E então, ela imaginou o gigantesco atema girando, girando muito
rápido, ameaçadoramente e avançando sobre o que restou do exército. Ele começou a fazer
com que todas pessoas levitassem e girassem ao seu redor. Não somente as pessoas, como
todas as coisas. Era como um furacão furioso e consciente. Ela imaginou-os como um furacão.
Ele dirigiu-se até uma cidade, onde começou a destruir as construções e derrubar os corpos
que flutuavam e giravam ao seu redor sobre as ruas da cidade, fazendo-os explodir em sangue.
Nada restou da cidade, exceto escombros, sangues e vísceras. Essa era a visão dela sobre o
episódio histórico conhecido como a “chuva de sangue”.

Em seguida ela mostrou novamente as pessoas vivendo em paz, levando suas vidas
corriqueiras. Mostrou as pessoas do presente, cantando, lendo, dançando. E então, após todo
esse tempo, a criatura esférica voltou a comunicar-se com ela.

Outra explosão. Ela era uma, e então duas, três, dez, cem, mil. Mas continuava sendo
uma. Ela já foi outra coisa, teve outras formas, já teve a forma de um cone, de uma árvore, de
um leviatã, de um pássaro de três bicos, de um humanoide, de um cubo e de um furacão. Ela
viu a batalha ocorrendo, humanos matando-se, incompreensível, matando-se! E continuavam,
cada vez mais, cada vez mais, e quanto mais eles morriam, mais atema chegavam. Eles vinham
do céu, do subterrâneo, do fundo do mar, do meio das florestas, das montanhas, do passado,
do futuro, vinham. E mais estavam vindo. E sentiam algo que Temary pensou ser uma mistura
de agonia com raiva e vergonha. Algo engasgado nas gargantas que não tinham. E uniram-se,
uniram-se, uniram-se. Furiosos, avançaram sobre aquela doença que estava afetando os
humanos e eliminaram a doença da única forma possível. Da mesma forma que eliminavam a
doença entre si mesmos. Destruindo seu foco. Destruindo sua causa.

E então, ela sentiu um desejo e uma dúvida. Queria tornar-se uma com aquela criatura
esférica em sua frente. Mas queria mesmo? Não sabia o que isso significava. Não sabia sequer
se era possível. Ela tinha um corpo e talvez iria perdê-lo. Então lembrou-se do que significava
ter um corpo em um planeta dominado pelos Cruzados. E aceitou. Aceitou o desejo que não
era exatamente dela, nem exatamente das criaturas, mas havia acontecido. Ela expandiu sua
mente, procurando pelas transmissões telepáticas que atravessavam o mundo naquele
momento. Não seria possível suportar a mente daqueles seres sozinha. Teria que quebrar um
dos protocolos da telepatia em terras pacíficas, pois a paz havia acabado. Entrou em
ressonância e ouviu parte da transmissão:

— O conflito está prestes a começar! As últimas naves sairão do planeta em meia hora!
Atenção, todos que estiverem no planeta após a última partida deve estar pronto para a
batalha! Atenção...

E então começou. As criaturas começaram a se fundir, sistematicamente, tornando-se


uma enorme esfera. Quando já estavam muito maiores do que o leviatã, uma esfera de dez
metros de diâmetro, ela sentiu seu corpo sendo levitado e foi levada para dentro do corpo
daqueles seres. Sua mente entrou em ressonância não somente com um, mas com dezenas
daquelas criaturas. E então, para que não perdesse seu cérebro, para que não morresse com o
excesso de informação, invadiu a transmissão telepática que estava sendo enviada para todo o
planeta e passou a reenviar toda informação que vinha até sua mente, tendo apenas
vislumbres. Enquanto isso, dos céus, mais e mais atema juntavam-se àquela enorme esfera,
tornando-a cada vez maior.

Em todas as partes do mundo, duas coisas notáveis aconteceram para os humanos. A


primeira é que, qualquer atema nas proximidades se transformou em uma espécie de dardo e
saiu voando em uma velocidade incrível. Em segundo lugar, começaram a receber imagens
vívidas que interromperam qualquer outro pensamento que estivessem tendo naquele
momento.

Acordaram em meio a mata, conscientes de quem eram, de que eram muitas partes de
um só. Voaram, dividiram-se, uniram-se para dividir-se novamente, deixando de ser quem
eram antes completamente. Alimentaram-se dos microrganismos do ar, das plantas, dos
animais aquáticos e terrestres, absorveram a luz do sol e da lua, entraram na água para trocar
toda a água do seu corpo. Voaram, nadaram, rolaram. Ficaram sendo por longos períodos de
tempo, apenas sendo parte do inverno e do verão, esquentando no inverno, dissipando calor
no verão. Mataram a doença, o que incluía matar muitos deles mesmos. Sobrevoaram o
oceano e encontraram o lugar de sua origem, o lugar onde as formas eram mais confortáveis,
muitos ficaram lá, muitos viajaram para outros lugares antes de voltar. Então viram algo vindo
do espaço, seres estranhos, com corpos fixos, presos ao chão. Impressionaram-se, ficaram
próximos deles, aprenderam com eles, muitas vezes eles não entendiam a vida, tornavam-se
doença e precisavam ser destruídos. Resolveram tomar formas parecidas com esses seres,
imitar as formas que esses seres criavam com outras coisas fora de seus corpos, acompanhar
sua estranheza, apenas ser perto deles. Ser perto dos humanos era uma mistura de diversão,
curiosidade, medo. Era confuso. E interessante.

E então, após quase dez mil anos de convívio, todos os humanos que estavam naquele
planeta conseguiram entender mais sobre os atema do que qualquer estudioso jamais
conseguira decifrar. Dezenas de outras imagens continuaram passando pelas mentes das
pessoas, deixando-as impressionadas e sem compreender o que estava acontecendo.

Enquanto isso, mais e mais criaturas chegavam. A esfera começou a criar uma enorme
ponta. Temary viu as cores que moviam-se no corpo do atema girando em volta do seu próprio
corpo. E então, compreendeu e aceitou, deixando que entrassem nela através de todos os seus
poros. De alguma forma, ela conectou-se à fonte de pensamento, o equivalente ao sistema
nervoso das criaturas. Aos poucos sua consciência se expandiu. Se dissolveu. Ela começou a
ver cores nunca antes vistas. Começou a saber o que estava acontecendo em várias partes do
mundo ao mesmo tempo. Sabia a temperatura no fundo do oceano e a velocidade do vento de
forma intuitiva. Sabia o que aconteceria em dez segundos. Deixou de ser uma mulher. Tornou-
se parte de um todo, no qual era apenas uma pequena parte.

Por dois dias o processo continuou. Mais e mais atemas chegavam. As criaturas
fundiram-se em uma esfera de mais de cem metros de diâmetro, com uma ponta quilométrica.
Lentamente ela flutuou até o meio do oceano, levando mais meio dia para isso. Chegando lá,
começou a afundar, formando um enorme redemoinho, movendo uma quantidade enorme de
água consigo. Estava empurrando o oceano, sem deixar que a água acumulasse em cima de si,
fazendo da superfície do mar uma grande cama elástica. Esse processo demorou até que a
noite caísse. Ao redor do mundo, nas praias todas, as marés subiram, submergindo
construções à beira mar.

E então, quando não havia mais atema para se unir, quando haviam afundado o
bastante no mar, deixaram a pressão de retorno da água empurrarem-nos para cima,
lançando-se no espaço com a força de um oceano inteiro.

Choveu torrencialmente por uma semana em [nome do planeta]

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