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O surgimento do profetismo como

resposta às crises no ambiente


da Palestina do século I E.C.
The rise of prophesy in response to crises to 1st
century C.E. Palestine Environment
El surgimiento del profetismo como respuesta a las
crisis en el entorno de la Palestina del siglo I d.C.

Daniel Neves Stephen* * Mestre em Ciências da Religião pela


Universidade Metodista de São Paulo
Marcelo da Silva Carneiro** stephen.metodista@gmail.com

Submetido em: 26-2-2023


** Doutor em Ciências da Religião.
Aceito em: 8-6-2023
Universidade Metodista de São Paulo
marcelo.carneiro@metodista.br

RESUMO
A sociedade hodierna vem sofrendo diversas crises em seu contexto social, econômico,
político e religioso. Este cenário não é tão diferente da situação em que Jesus e seus
discípulos vivenciaram na Palestina do 1º século da era atual. Muitos movimentos sur-
giram como proposta para a resolução dos problemas e conflitos na sociedade daquele
tempo, inclusive com o emprego da violência. Na contramão desta atitude, o movimento
de Jesus, inspirado no profetismo antigo, surgiu com o objetivo de pacificar e ser uma
resposta frente aos dramas vivenciados pelo povo. Portanto, que relevância o movimento
profético de Jesus teve para a Palestina do 1º século? Este estudo procurará responder
esta questão e destacar a importância que os seguidores de Jesus têm na continuidade
desta missão outorgada pelo seu líder maior, Jesus de Nazaré.
Palavras-chave: Movimento de Jesus; Jesus histórico; profetismo; discipulado; Palestina.

ABSTRACT
Modern society has been suffering multiple crises in its social, economic, political and
religious context. This scenario is not so different from the situation Jesus and his disciples
experienced. Many movements emerged as a proposal for the resolution of problems and
conflicts in society at that time, including the use of violence. Opposing this attitude, the
Jesus movement, inspired by the ancient prophecy, arose with the aim of pacifying and
being a response to the conflicts experienced by the people. So what relevance did Jesus’
prophetic movement have on 1st century Palestine? This study will seek to answer this
question and highlight the importance that the followers of Jesus have in continuing this
mission bestowed by their greatest leader, Jesus of Nazareth.
Keywords: Movement of Jesus; Historical Jesus; prophetism; discipleship; Palestine.

RESUMEN
La sociedad actual ha sufrido varias crisis en su contexto social, económico, político y
religioso. Este escenario no es tan diferente de la situación en la que Jesús y sus discípulos
experimentaron en la Palestina del siglo 1 de la era actual. Muchos movimientos surgieron

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como una propuesta para la resolución de problemas y conflictos en la sociedad en ese
momento, incluido el uso de la violencia. En el opuesto a esta actitud, el movimiento
de Jesús, inspirado en la profecía antigua, surgió con el objetivo de pacificar y ser una
respuesta a los dramas vividos por la gente. Entonces, ¿qué relevancia tuvo el movimiento
profético de Jesús para la Palestina del siglo 1? Este estudio buscará responder a esta
pregunta y resaltar la importancia que los seguidores de Jesús tienen en continuar esta
misión otorgada por su más grande líder, Jesús de Nazaret.
Palabras clave: Movimiento de Jesús; Jesús histórico; profetismo; discipulado; Palestina.

Introdução

Estudar o tema do profetismo no Cristianismo Primitivo é de suma


importância para entender, de certa forma, a característica do movimento
de Jesus que surgiu como um movimento de renovação da religião judai-
ca. Este movimento, que se enquadra numa linha profética, teve como
inspiração outros movimentos proféticos contemporâneos a Jesus, assim
como a própria tradição dos antigos profetas de Israel registrada na Bí-
blia Hebraica. Por isso, para compreender o profetismo no Cristianismo
Primitivo é importante analisar como surgiu e se desenvolveu, no seio da
Palestina, o movimento profético de Jesus e de seus discípulos.
Dentro desta perspectiva, cabe também perguntar sobre a relevância
que o movimento profético de Jesus teve na sociedade palestinense do
1º século e que pode ter para a sociedade atual. As crises desencadeadas
por diversos fatores resultaram no aparecimento de diversos movimentos,
então qual seria a contribuição que o movimento de Jesus trouxe para a
sociedade de sua época? Portanto, o objetivo deste artigo é compreender
e destacar os elementos característicos do movimento profético de Jesus
que contribuíram de forma significativa no contexto da Palestina do 1º
século e que podem contribuir também para a sociedade em nossos dias.
Neste artigo será apresentado o ambiente contextual da Palestina du-
rante o surgimento do movimento de Jesus, levando em conta os aspectos
político, socioeconômico e religioso que contribuíram para o surgimento
de movimentos de resistência, especialmente os movimentos proféticos.
Também será analisada as origens do profetismo cristão que se desenvolveu
por meio do discipulado, iniciando na relação entre João Batista e Jesus
de Nazaré e logo em seguida entre Jesus de Nazaré e seus seguidores.

O ambiente da Palestina nos primórdios do 1º século E.C.

Para entender melhor os escritos bíblicos do cristianismo primitivo e


também os movimentos que dele surgiram é fundamental fazer uma análise
do ambiente histórico, situando o contexto social, econômico e político. Na

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Palestina do século I E.C.: Daniel Neves STEPHEN, Marcelo da Silva CARNEIRO
Palestina do 1º século da era vigente, permeava um ambiente hostil, com
diversos conflitos existentes entre a população e as autoridades religiosas e
políticas. Essas autoridades incluíam tantos aqueles dentre o próprio povo,
os religiosos da linha sacerdotal que exerciam papel de liderança política e
que estavam sujeitos ao império da época, quanto as próprias autoridades
romanas. Marcelo Carneiro afirma que a “chegada dos romanos à região
palestinense trouxe dor, ódio, medo, e ao mesmo tempo, esperança, fervor
religioso e busca dos valores tradicionais” (CARNEIRO, 2019, p. 19). Tal
cenário foi propício para o surgimento de movimentos dentre os quais se
destaca o movimento profético.

Contexto político

Em relação ao contexto político, o domínio romano sobre os judeus teve


início no ano 63 a.C. que culminou em expressões de opressão, violência e
morte de muitas pessoas, especialmente dos judeus mais pobres. Carneiro
sintetiza a chegada e o domínio romano na Palestina da seguinte forma:

Herodes Magno foi colocado no poder por designação direta do senado romano. Militar,
e com o apoio do exército romano, Herodes levou três anos para chegar efetivamente
no poder, em 37 a. C. Daí em diante governou com mão de ferro (...) Ele manteve a
estrutura social e o próprio sumo sacerdote como parte de seu regime. Construiu um
palácio modelo que se tornou ponto turístico para romanos e lugar de peregrinação
para os judeus da diáspora de cidades helênicas. (CARNEIRO, 2019, p. 25).

Um destaque na história de Herodes foi a realização da reforma do


Templo, com uma nova estrutura, até maior que a anterior, e num estilo
grego. Seu reinado teve o fim com a sua morte, por volta do ano 4 a.C.
Porém, a morte de Herodes não significou o fim da influência romana na
região. A Palestina sendo um território estratégico para potências domi-
nadoras, o império romano nomeou Pôncio Pilatos como governador da
Judeia e Caifás na condição de sumo sacerdote. Também foi permitido
que Herodes Antipas, filho de Herodes, a exercer seu reinado na Galileia
e Pereia. Além de um governador em Samaria, completando a influência
sobre toda a região (cf. CARNEIRO, 2019, p. 26).
Os romanos exerceram sua governança sobre a Palestina da mesma
forma que exerceram com diversos povos sob seu domínio. Todavia, para
manter a autonomia e o controle na Palestina, isentou os judeus de algumas
práticas contrárias as suas leis, como por exemplo o culto ao imperador (cf.
STAMBAUGH; BALCH, 1996, p. 21). Porém, isso não trouxe uma ava-

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liação favorável por parte dos judeus em relação aos seus conquistadores.
Os conflitos eram frequentes e os romanos tinham por características serem
implacáveis em relação a humilhação aos povos conquistados. Uma das
ações que corroboraram para isso foi a maneira de executar a crucificação.

Além de ser uma forma muito eficaz de causar terror, a crucificação era um modo
de humilhar absolutamente povos subjugados. Deixar os corpos na cruz como presa
para aves e animais e não sepultá-los era a forma mais requintada de desumanização.
(HORSLEY, 2004, p. 36).

Outra forma de humilhação está na prática de cobrar altas taxas de


tributos. Carneiro relata que “os tributos pagos a Roma eram pesados e co-
brados através de pessoas arregimentadas da população local” (CARNEIRO,
2019, p. 27). Os judeus denominados de publicanos tinham a tarefa de fazer
tal coleta. Para o regime romano, era crucial a arrecadação de impostos
sendo uma das principais receitas do império. Richard A. Horsley afirma
que “submetido, o povo era obrigado a entregar parte da produção aos seus
conquistadores superiores – ‘uma espécie de recompensa pela vitória e pu-
nição pela guerra’ (Cícero, Verr. 2.3.12)” (HORSLEY, 2004, p. 36).
Cabe destacar ainda que o domínio romano sobre os judeus em Israel
encontrou certa resistência e isto por um período considerado até longo. A
persistência judaica é destacada por Horsley que afirma que “os galileus
e os judeus sobressaiam aos demais povos subjugados por Roma por sua
resistência e revolta incessantes” (HORSLEY, 2004, p. 41). O império
romano foi implacável também na dominação de outros povos, mas os
judeus foram muito mais resistentes contra tal domínio, sobrevivendo aos
embates das forças romanas por quase dois séculos.

Contexto socioeconômico

Quanto a camada socioeconômica naquela época, segundo Henri Daniel-


-Rops, se resumia basicamente entre ricos e pobres. Ele afirma o seguinte:

destaca-se curiosamente o fato de que em ponto algum do Novo Testamento existe


qualquer referência a uma distinção entre o que chamaríamos de pessoas educadas e
simples, ou nobres e plebeus; mas, por outro lado, encontramos continuamente ricos
e pobres. (DANIEL-ROPS, 2008, p. 161).

Para Juan Mateos e Fernando Camacho, a sociedade palestinense


se subdividia em três camadas: a classe rica e poderosa, a classe média
e os pobres.

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À classe rica e poderosa pertenciam os príncipes e os membros da família real de
Herodes, assim como os altos dignatários da corte, além das famílias da aristocracia
sacerdotal e leiga, dos latifundiários, dos grandes comerciantes e dos cobradores de
impostos (...) A classe média, muito reduzida, existia praticamente só em Jerusalém,
já que suas fontes de renda procediam do templo e dos peregrinos. Era formada
pelos pequenos comerciantes, pelos artesãos proprietários de suas oficinas, pelos
donos de hospedarias e pelo baixo clero (...) À classe pobre, que constituía a imensa
maioria da população, pertenciam os assalariados, tanto operários como camponeses,
os pescadores, os inúmeros mendigos e, finalmente, os escravos. (MATEOS;
CAMACHO, 1992, p. 17).

É curioso que existe um número considerável de parábolas contadas


por Jesus que aborda o tema da riqueza como a parábola do rei e dos dois
devedores em Mt 18.23-35 e a história do filho pródigo (Lc 15.11-32) que
reflete uma economia de pequenos camponeses.
Para Richard A. Horsley e John S. Hanson (1995) a situação econômica
da Palestina no tempo de Jesus diferia dos grandes centros urbanos como na
Roma e na Grécia. Os judeus palestinos eram caracterizados por uma socie-
dade camponesa. Ou seja, os judeus gostavam de cultivar as terras férteis
que possuíam e esta era uma prática muito comum entre eles. No entanto,
o clima hostil entre ricos e pobres dificultava o desenvolvimento da região,
principalmente porque a exploração da classe camponesa era constante.

Os pobres produzem “excedentes” que são controlados pelos ricos, com a consequ-
ência de que se tornam quase inevitáveis os conflitos entre os dois grupos. Os ricos
e poderosos tendem a usar e abusar do seu poder de maneira prejudicial e injusta
para os camponeses. Os produtores rurais desenvolvem hostilidades e ressentimentos
que fazem com que os poderosos temam que os pobres se vinguem. (HORSLEY;
HANSON, 1995, p. 22).

Isso faz supor que a parábola proferida por Jesus sobre a vinha (Mc
12.1-9) sirva como exemplo sobre a tensão existente entre essas duas
classes naquela sociedade. E também tem o “sermão da planície” de Lucas
(Lc 6.20,24) que Jesus discursa profeticamente consolando os pobres e
condenando os ricos exploradores.
Além disso, o domínio romano na Palestina judaica trouxe sérios pre-
juízos, principalmente para a classe mais fraca. Um dos fatores que mais
causavam revoltas eram as altas taxas tributárias. “Para os camponeses
judeus, a dominação herodiana e romana geralmente significava pesada
tributação e, mais do que isso, uma séria ameaça para a sua existência,
visto que muitos foram expulsos das suas terras” (HORSLEY; HANSON,

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1995, p. 43). Todos esses conflitos traziam sérios problemas e instabilidade
social, econômica e política para a sociedade como um todo, sobretudo,
para a classe menos abastada.

Movimentos de resistências

Todo esse caos social, econômico e político não poderia resultar em


outra coisa a não ser em conflito. Manter a instabilidade na região não foi
tarefa fácil para os dominadores, especialmente porque foi bem caracte-
rístico dos judeus resistirem veementemente ao domínio romano e de seus
subordinados. Horsley destaca que “durante gerações, antes e depois do
ministério de Jesus, os povos da Galileia e da Judeia insurgiram-se com
repetidos protestos e rebeliões contra os romanos e os seus governantes
dependentes, os reis herodianos e os sumos sacerdotes de Jerusalém”
(HORSLEY, 2004, p. 41). Essas revoltas eram reações diante de um quadro
perpetrado por ações extremamente violentas por parte dos dominadores.
Carneiro afirma que

tanto os judeus da Galileia quanto os da Judeia sentiam a opressão com muita revolta
e desejo de mudar a situação. Movimentos de rebelião e insurreição eram comuns,
mas todos abafados com muita violência pelos romanos, o que tornava o povo te-
meroso e muitas vezes retraído. (CARNEIRO, 2019, p. 27-28).

A forma de garantir a “ordem” na Palestina possibilitou o surgimento


de diversos movimentos de resistência que deram sobrevida, por um perí-
odo relativamente extenso, a população judaica tanto na região da Judeia
quanto na Galileia.
Os movimentos de resistência que surgiram eram de dois tipos, se-
gundo Horsley (2004): de mestres escribais e de movimentos camponeses.
O primeiro mais intelectual, com pouca frequência e que envolvia uma
pequena parcela da população; o segundo mais popular, conseguiu levar
mais resistência, era mais frequente as suas ações e conseguia envolver mais
pessoas. Não à toa os movimentos promovidos pelos camponeses “represen-
taram uma ameaça muito mais séria à ordem imperial romana na Palestina
do que os protestos dos grupos escribais” (HORSLEY, 2004, p. 51).
Apesar de não ser tão frequente, os protestos que surgiram pelos mes-
tres escribais não deixou de ter a sua relevância. Principalmente, porque
a sua resistência era inspirada pela tradição israelita. Segundo Horsley, a
“resistência estava profundamente enraizada na aliança mosaica, funda-
mento da sociedade judaica” (HORSLEY, 2004, p. 46). A comunidade de

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Qumran, os fariseus, a “Quarta Filosofia” e os sicários eram grupos típicos
dessa vertente de resistência de mestres escribais.
Os movimentos de camponeses, por serem protestos mais populares,
sempre corriam o risco de “transformar-se numa insurreição popular geral”
(HORSLEY, 2004, p. 51). Esses movimentos tinham por característica se
inspirar na tradição israelita de resistência a opressão do dominador. Foram
vários tipos de movimentos de camponeses que surgiram neste período, mas
os mais destacados foram os movimentos populares messiânicos e proféticos.
Os movimentos populares messiânicos carregavam uma tradição an-
tiga onde a população reconhecia e “ungia” o seu rei dentre eles próprios.
A tradição que os sustentava era a que historicamente tinha Davi como
ícone, pois foi o povo que o reconheceu como seu messias (ungido), o seu
rei. “Esses movimentos messiânicos tinham dois objetivos interligados:
libertar-se do jugo herodiano e romano e restabelecer uma ordem socio-
econômica mais igualitária” (HORSLEY, 2004, p. 56). Os líderes desses
movimentos inspiravam-se na figura messiânica de Davi.
Os movimentos populares proféticos também contribuíram bastante
como movimento de resistência e protesto contra os descalabros do domí-
nio romano na Palestina e analisar esses movimentos é fundamental para
a compreensão sobre como surgiu o movimento profético de Jesus e seus
seguidores. Horsley e Hanson afirmam que “o frequente surgimento de
movimentos reais entre os camponeses, modelados segundo esse padrão, é
significativo para entender Jesus de Nazaré e seu movimento” (HORSLEY;
HANSON, 1995, p. 153).
Na Palestina do 1º século d.C., há registros de numerosas figuras
proféticas que apareceram entre o povo. Existiam dois tipos de profetas
populares que representavam antigas tradições: o “profeta oracular”, cuja
característica é a proclamação de juízo ou redenção; e o “profeta de ação”,
que liderava movimentos reacionários de libertação (cf. HORSLEY; HAN-
SON, 1995, p. 125). O primeiro se inspirava em figuras bíblicas como
Jeremias, Isaías, Oséias e o segundo inspiravam-se em figuras bíblicas
como Moisés, Elias, Eliseu. O próprio Jesus foi considerado um profeta
(Mc 6.15-16) e sua característica profética encontra sinais em ambas re-
presentações, estabelecendo uma relação dialética entre elas.
Esses movimentos proféticos inspiravam a população que ansiava
por uma libertação do jugo opressor de Roma. As ações desses grupos
conservavam a tradição israelita de independência, sobretudo, também,
alimentavam as esperanças de um dia serem livres da servidão e de reto-
marem o controle sobre sua terra.

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As origens do Profetismo Cristão

O movimento de Jesus de Nazaré e seus discípulos têm caracterís-


ticas de um movimento profético que surgiu com fins de renovação das
esperanças judaicas frente a crise social provocada por seus dominadores,
o império romano e as autoridades judaicas sujeitas a eles. O cristianismo
conservou, de certa forma, durante o 1º século d.C., seu ímpeto profético
através da mensagem de conversão ao reino de Deus. Tal proclamação era
bem característico em Jesus e que logo depois efetivou este legado a todos
os seus seguidores. Jesus é a principal referência para um cristianismo que
nasce com uma veia profética.

Jesus se apresenta como alguém que reage contra a ordem religiosa estabelecida.
Saiu, de fato, do judaísmo carismático, e veste o manto de profeta, proclama uma
mensagem (até mesmo subversiva) que incomoda as autoridades religiosas da sua
época, realiza milagres, cura os enfermos e anuncia a vinda iminente do Reino de
Deus. É “um profeta poderoso em obra e em palavra, diante de Deus e de todo o
povo”, dirão os discípulos de Emaús (cf. Lucas 24,19). (BONNEAU, 2003, p. 12-13).

Os discípulos de Jesus foram herdeiros desta vocação profética.


Justamente os discípulos, que acompanharam as atividades ministeriais
de Jesus, após sua morte, “fundaram uma comunidade que, animada pelo
mesmo Espírito, prosseguiu no caminho profético” (BONNEAU, 2003, p.
13). A comunidade de discípulos, os cristãos primitivos, via na figura de
Jesus a sua principal referência como profeta, além de toda construção
cristológica em volta de sua pessoa, e também João Batista era visto como
uma referência profética. Helmut Koester afirma que “a inclusão de ambas
as figuras nas tradições cristãs confirma que os cristãos se consideravam
os continuadores do propósito e da finalidade do ministério de Jesus e
que viam João Batista como o precursor de Jesus” (KOESTER, 2005,
p. 81). Ambas as figuras são modelos de inspiração para a comunidade
de discípulos que se viam herdeiros das atividades ministeriais deles. É
importante, para compreender melhor esse fenômeno profético no cristia-
nismo primitivo, analisar as origens desse cristianismo e de como ele foi
se desenvolvendo ao longo do 1º século d.C.

O movimento profético de João Batista

O movimento profético liderado por Jesus de Nazaré tem relação


direta com o movimento profético de João, o Batista, ao menos é o que

8 O surgimento do profetismo como resposta às crises no ambiente da


Palestina do século I E.C.: Daniel Neves STEPHEN, Marcelo da Silva CARNEIRO
testemunham os evangelhos. Segundo Paulo Nogueira, é “impossível falar
das origens do cristianismo e no movimento profético de Jesus sem fazer
referência a João Batista” (NOGUEIRA, 2020, p. 31). João Batista foi
considerado um profeta e teve grande prestígio neste ofício. Como afirma
Horsley e Hanson, “João foi indiscutivelmente um profeta (...) que tinha
muitas características semelhantes aos profetas bíblicos clássicos, espe-
cialmente Elias” (HORSLEY; HANSON, 1995, p. 156). Seu ministério
teve relação com o ministério de Jesus, pois os quatro evangelhos fazem
questão de relatar sobre sua vida e o início das atividades de Jesus a partir
do batismo ministrado por João no rio Jordão.
O movimento profético de João Batista fez parte dos movimentos
populares que insurgiram na Palestina do 1º século d. C. com o propósito
de promover uma renovação dentro do judaísmo. Para Gerd Theissen e
Annette Merz (2015), o movimento profético de João Batista consistia
numa terceira onda de oposição que surgiu nos anos 20 e que dirigiu sua
pregação condenatória não propriamente contra os romanos, mas contra as
autoridades submissas ao império, como os herodianos. Eles ainda relatam
que o “movimento de João Batista pertence a uma série de movimentos
de renovação no judaísmo, que em face do perigo de assimilação helenís-
tica pretendiam preservar e redefinir a identidade judaica” (THEISSEN;
MERZ, 2015, p. 164-65). Além disso, tanto o movimento de João Batista
como, posteriormente, o movimento de Jesus despertaram uma esperança
escatológica no povo.
O movimento profético de João Batista influenciou muitas pessoas em
Israel, como por exemplo as camadas mais pobres como os camponeses,
mas uma figura significativa que, muito provavelmente, teve parte neste
ministério foi Jesus de Nazaré. Muitos estudiosos importantes supõem que
João Batista poderia ser uma espécie de discipulador de Jesus. Horsley e
Hanson afirmam que João “foi considerado o predecessor e talvez até o
mentor de Jesus de Nazaré” (HORSLEY; HANSON, 1995, p. 164). No-
gueira acrescenta dizendo que “podemos conjecturar que Jesus teria sido
discípulo de João e que a tomada de consciência de seu papel profético e
messiânico se deu no batismo no Jordão (Mc 1,9-11)” (NOGUEIRA, 2020,
p. 31). Koester afirma que “Jesus ter sido discípulo de João e ser por ele
batizado dificilmente pode ser uma invenção cristã” (KOESTER, 2005, p.
82). Carneiro declara que o “fato de Jesus ter sido batizado por ele pode
ser um indicativo de que, em algum momento, Jesus ou foi seu discípulo,
ou o conhecia de perto” (CARNEIRO, 2019, p. 46). De uma coisa é certa,
a influência de João Batista no ministério de Jesus é notória e ratificado

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pelos evangelhos. Além disso, o texto de Mateus 11.7-11 demonstra que
Jesus tinha grande estima por João.

O movimento profético de Jesus de Nazaré

Jesus de Nazaré também foi considerado uma figura profética de


grande relevância e influência na Palestina e que liderou um movimento de
renovação dentro do judaísmo. Jesus até tinha características de um rabi,
pois ensinava e era cercado por discípulos. Mas, para Joachin Jeremias
“Jesus não tinha o pressuposto básico para ser escriba, ou seja, o estudo
teológico” (JEREMIAS, 2008, p. 134). Na verdade, o entendimento que se
tinha sobre Jesus era sua característica como um profeta carismático. Assim
o viram as multidões que o acompanhavam e também os seus discípulos.
Por outro lado, há quem questione sobre a identidade profética de Je-
sus. Koester, por exemplo, não concorda com essa afirmação. Segundo ele:

faltam alguns sinais típicos de uma missão profética. Não há uma única tradição que
relate o chamado de Jesus (a menos que se queira ver essa tradição no batismo de
Jesus como o descreve Mc 1,9-11). Não há visões, audições ou histórias de comis-
sionamento. As palavras de Jesus não são introduzidas com a fórmula: “Assim diz
o Senhor”. Nada é dito sobre Jesus tentando expressar sua missão profética em seu
comportamento externo ou em seu modo de vestir (como de fato está registrado a
respeito de João Batista, ver Mc 1,6). (KOESTER, 2005, p. 90).

Porém, os evangelhos relatam a perspectiva da população que consi-


derava Jesus um profeta. No Evangelho de Marcos 6.14-15, se dizia entre
o povo que Jesus era um profeta como João Batista, Elias ou alguns dos
profetas antigos. Da mesma forma, em Marcos 8.28, diante da pergunta
“quem os outros dizem que eu sou?” a resposta foi: “Uns dizem que é
João Batista; outros dizem que é Elias; e ainda outros dizem que é um
dos profetas” (BÍBLIA, 2018). Aune afirma que “a autenticidade, ou pelo
menos a antiguidade, das visões populares de Jesus preservadas em Mar-
cos 6.15 e 8.28 é apoiada tanto pela presença de um semitismo em ambos
os textos quanto pela falta geral de interesse de Marcos em retratar Jesus
como profeta” (AUNE, 1983, p. 154, tradução própria).
Em Mateus também temos alguns testemunhos de relato das pessoas
que reconheciam em Jesus o perfil de profeta. Em Mateus 21.10-11, o
evangelista narra a entrada de Jesus em Jerusalém, quando “a cidade se
alvoroçou” e perguntavam “quem é este?”. “E as multidões respondiam:
Este é o profeta Jesus, de Nazaré da Galileia!” (BÍBLIA, 2018). Da mesma
forma, em Mateus 21.46 o narrador relata que as autoridades religiosas

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Palestina do século I E.C.: Daniel Neves STEPHEN, Marcelo da Silva CARNEIRO
em Jerusalém temiam as multidões caso prendessem Jesus, “porque estas
o consideravam como profeta” (BÍBLIA, 2018).
Não tem como deixar de destacar também a relação e, de certa for-
ma, contribuição de João Batista e seu movimento no ministério de Jesus.
Como foi discutido anteriormente, a pesquisa sobre o Jesus histórico tem
identificado uma suposta relação de discipulado entre João Batista e Jesus de
Nazaré (cf. THEISSEN; MERZ, 2015, p. 228-34). Para Vidal (2009), Jesus
foi atraído pela pregação de João Batista no deserto e acabou se identificando
com a sua missão. Ao ser batizado por este, acabou fazendo parte do seu
círculo de discípulos. Vidal ainda acrescenta: “Esse testemunho histórico de
seu batismo implica, evidentemente, que Jesus acolheu a missão e o projeto
de João” (VIDAL, 2009, p. 58). Todavia, o projeto de João Batista foi tra-
gicamente interrompido pela sua morte intermediada por Herodes Antipas.
Jesus, então, passou a exercer uma nova missão, conforme o testemunho
de Marcos 1.14: “Depois de João ter sido preso, Jesus foi para a Galileia,
pregando o evangelho de Deus” (BÍBLIA, 2018). Segundo Vidal, “esse é o
dado histórico principal nesta questão: o final da missão de João significou
o começo da missão autônoma de Jesus” (VIDAL, 2009, p. 73).
Jesus de Nazaré ao assumir a autonomia de uma nova missão pro-
fética deixou o deserto e se dirigiu a região da Galileia onde transmitiu
uma mensagem do reino de Deus e sinais de curas entre o povo. Para
contribuir com a noção de que Jesus apesar de ter em João um mentor,
mas que assume um ministério independente, tem-se a informação de
Romano Penna que afirma:

O certo é que Jesus se distanciou de João (talvez depois de seu encarceramento?),


seja adotando um estilo de vida muito diferente, seja abandonando o deserto e
inserindo-se profundamente entre as pessoas, ou concentrando sua pregação não mais
controversamente em um iminente julgamento de Deus, mas no anúncio do reinado
de um Deus misericordioso. (PENNA, 2020, p. 33).

Nogueira acrescenta a essa discussão a informação de que “Jesus


é o fundador de um movimento profético na região rural da Galileia”
(NOGUEIRA, 2020, p. 35). Uma região permeada de conflitos devido
a exploração por parte das autoridades dominadoras. Nogueira conclui
declarando que “o contexto camponês galileu em que nasce e é criado
Jesus de Nazaré e seus seguidores é um contexto de extrema opressão e
miséria” (NOGUEIRA, 2020, p. 37). Por isso, a perspectiva sobre o reino
de Deus anunciada por Jesus renova a esperança da população explorada,
ou seja, dos mais pobres.

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É bem característico da vida e do ministério profético de Jesus a iti-
nerância. “Jesus representa um tipo de profetismo da estrada, do constante
viajar. Não à toa que seus ouvintes se compõem de pessoas marginaliza-
das” (NOGUEIRA, 2020, p. 39). Jesus juntamente com seus seguidores
não ficava de maneira fixa num determinado lugar. Seu objetivo era viajar
entre as cidades e povoados da região da Galileia levando a mensagem
do reino de Deus e ministrando curas e exorcismos dentre o povo. Além
disso, segundo Nogueira (2020), seu roteiro alcançou, surpreendentemente,
cidades pagãs gregas da região de Decápolis, como Cesareia de Felipe e
Gadara, assim como cidades cananeias como Tiro e Sidon. Segundo os
evangelhos sinóticos, Jesus só foi a Jerusalém na Páscoa, por ocasião de
sua prisão, sentença e morte. Assim Nogueira afirma:

Nela ele não faz milagres, apenas prega denunciando injustiças e convidando ao
arrependimento. Também é às portas de Jerusalém que ele profere o duro sermão
escatológico, em que anuncia a destruição do Templo e o final dos tempos. Jerusalém
aparece apenas como o palco da execução do profeta justo e do juízo no final dos
tempos. (NOGUEIRA, 2020, p. 39).

O período de atividades de Jesus na Galileia fez com que da multidão


que o seguia, fizesse discípulos que pudesse dar sustentabilidade ao movi-
mento e ao mesmo tempo continuidade com a missão. Nogueira afirma que

Jesus organiza seu grupo amplo de discípulos, os setenta e dois, em grupos de dois e
os envia como “mendigos” do reino. Eles deveriam viajar pelos sertões da Galileia,
e além, visitando aldeias, entrando nas casas, abençoando, curando enfermos, e
anunciando: “O Reino de Deus está próximo de vós!”. (NOGUEIRA, 2020, p. 40).

O movimento profético de Jesus se estabelece no interior da Palestina


e se estrutura através dos discípulos que abraçaram o projeto de seu mentor
e estavam dispostos a dar continuidade com a missão. Nem mesmo a morte
de Jesus foi capaz de pôr fim ao movimento iniciado por ele. Apesar do
abalo inicial com a notícia da morte, porém foi a notícia e a experiência de
ressurreição de Jesus que ressignificou o movimento através dos discípulos
que se reconheceram herdeiros da missão do mestre e profeta.

Movimento profético entre os discípulos de Jesus

O movimento profético de renovação de Israel organizado por Jesus


não terminou com sua morte, pelo contrário, a comunidade formada por
seus discípulos nasce diante dos acontecimentos da Páscoa. A morte e res-

12 O surgimento do profetismo como resposta às crises no ambiente da


Palestina do século I E.C.: Daniel Neves STEPHEN, Marcelo da Silva CARNEIRO
surreição de Jesus estabelece um novo parâmetro para os seus seguidores,
um marco fundante daqueles que se reconheciam testemunhas do Ressus-
citado e por meio desta fé se organizam como corpo, como comunidade.
É bom salientar que aqueles que aderiram ao projeto de Jesus e se
tornaram seus seguidores são pessoas que se organizaram em diferentes
esferas. Penna afirma que em “torno da figura de Jesus e por causa do
alvoroço causado por suas palavras e ações, três círculos concêntricos de
pessoas foram formados (...): a multidão, os discípulos, os Doze” (PENNA,
2020, p. 35). Para Theissen (2008), o movimento de Jesus era apoiado
por categorias de discipulado, onde um tipo de discípulo é denominado
de “carismáticos itinerantes dissidentes” e outro tipo de discípulo é deno-
minado de “simpatizantes”. De certa forma, os seguidores de Jesus eram
carismáticos assim como seu mestre.

As autoridades decisivas do incipiente cristianismo primitivo eram apóstolos, profetas


e discípulos migrantes que se deslocavam de um lugar para outro e que nesses lugares
puderam se apoiar em pequenos grupos de simpatizantes. (THEISSEN, 2008, p. 76).

Tanto os discípulos itinerantes quanto os simpatizantes tinham a sua


importância no movimento, principalmente, porque um sustentava o ou-
tro. Os itinerantes migravam de um lugar para o outro para disseminar a
mensagem, enquanto os simpatizantes eram aqueles que davam suporte,
acolhida e apoio aos itinerantes. Penna (2020) vai identificar nessas duas
categorias os discípulos que não fazem parte da multidão e nem são parte
dos Doze. São “aqueles”, segundo o Evangelho de Marcos 4.10, “que
estavam ao redor dele”.

Evidentemente, há um grupo de discípulos que não apenas se distinguem da multidão


de pessoas atraídas por Jesus, mas que também não se identificam simplesmente com
o grupo restrito dos Doze. Não dispomos dos nomes desse tipo de discípulos, mas
temos certeza de sua existência. Basta recordar, negativamente, a recusa de Jesus
contra endemoninhado de Gerasa que queria segui-lo (Mc 5,18-19) e, positivamente,
o convite incondicional que fez a quem desejasse enterrar primeiro o próprio pai (Lc
9, 59-60). Outro grupo consiste naqueles discípulos/amigos/supporters que apoiavam
Jesus simplesmente oferecendo-lhe comida ou a própria casa. Exemplos especiais
desse tipo são os irmãos Lázaro, Marta e Maria em Betânia (Jo 11,1-45; 12,1-8),
que o acolheram quando Ele estava de passagem pela Judeia. (PENNA, 2020, p. 38).

Dentre o grupo dos Doze estão aqueles que foram escolhidos particu-
larmente por Jesus. O número doze é simbólico a partir da tradição antiga
baseado nas doze tribos de Israel, que dentro da perspectiva do movimento
profético de Jesus se estabelece ao focar na renovação de Israel.

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Do ponto de vista de sua efetiva função, o propósito da instituição dos Doze está
bem indicado na passagem de Mc 3,14-15 e é duplo. Primeiro, Jesus os escolheu para
“estar com Ele” e, portanto, para compartilhar sua vida, aprendendo de perto suas
motivações e estilo. Segundo, para “enviá-los a pregar e expulsar os demônios” e,
em seguida, continuar seu anúncio a Israel e dedicar-se também à promoção humana
dos ouvintes. (PENNA, 2020, p. 40)

Os Doze também exerciam uma atividade ministerial itinerante seme-


lhantes aos demais discípulos carismáticos itinerantes que se ocupavam do
ofício de propagar a mensagem de Jesus. Para Theissen, esses discípulos
de Jesus “cabiam melhor no papel profético, tinham relativamente pouco
estudo (cf. At 4,13) e não podiam convencer como escribas” (THEISSEN,
2008, p. 87). Portanto, o profetismo cristão nasce concomitantemente ao
cristianismo, no período entre o ano 30 ao ano 65 d.C. (cf. BONNEAU,
2003, p. 19). É importante destacar que o profetismo cristão encontra suas
raízes no cristianismo judaico, através da comunidade de discípulos que
se estabeleceu primeiramente em Jerusalém, mas, também, tem suas raízes
no cristianismo helênico, por meio das comunidades paulinas.

Considerações finais

As crises desencadeadas por fatores sociais, econômicos, políticos e


religiosos na Palestina do 1º século permitiu a aparição e desenvolvimento
de diversos grupos e movimentos que tentaram trazer respostas aos dile-
mas vivenciados pela população que sofria. Muitos desses movimentos
encontraram no profetismo antigo a principal referência para a resolução
dos problemas surgidos e com isso se rebelavam contra o poder vigente.
O movimento de Jesus e de seus seguidores que também lançaram mão
do perfil profético para despontar no horizonte palestinense como sinal
de grande esperança não teve por característica o emprego da violência.
O movimento de Jesus foi pacífico e trouxe uma renovação para a fé
judaica através dos milagres como a cura de pessoas enfermas, especial-
mente das pessoas marginalizadas pela sociedade e pela religião, além da
mensagem de esperança e redenção de uma nova ordem chamada de Reino
de Deus, marcado pela justiça, paz, amor, alegria.
Jesus exerceu um ministério considerado messiânico e profético ten-
do como principal foco de sua missão a evangelização dos pobres. Além
disso, a propagação do Reino de Deus nos moldes proféticos demonstrou
de forma contundente o amor e a misericórdia de Deus, principalmente
para com as pessoas mais desfavorecidas e miseráveis da sociedade. Por

14 O surgimento do profetismo como resposta às crises no ambiente da


Palestina do século I E.C.: Daniel Neves STEPHEN, Marcelo da Silva CARNEIRO
isso, o movimento profético liderado por Jesus e tendo continuidade
com seus discípulos teve grande impacto para a sociedade palestina do
1º século, além de também atingir outras partes do mundo através da
multiplicação de seguidores.
Portanto, o tema abordado neste artigo tem sua importância devido
ele mostrar que a característica profética do movimento de Jesus conseguiu
de certa forma ser uma resposta positiva para os dramas vivenciados pela
população de sua época. Jesus de Nazaré e sua mensagem do Reino de
Deus continua sendo uma mensagem de esperança para as pessoas que
sofrem. E por isso, todo seguidor de Jesus precisa encontrar no seu mestre
a inspiração para dar continuidade a esta missão.

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