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BANCA EXAMINADORA
Eu só vim aqui
Porque fui chamado
Meu capote de veludo
Meu chapéu dourado
Eu também tenho cavalo
Para andar montado.
A Barca – Eu só vim aqui (álbum: Baião de Princesas).
AGRADECIMENTOS
Agradeço à minha mãe Eusa, por estar sempre comigo e por todo o amor, aos meus tios Terto
e Lucineide pelo apoio, à minha vó Zulmira, ao carinho do meu irmão Edvaldo Filho, e meu
irmão Manoel, que peço compreensão pela ausência nos últimos anos, espero em breve
(re)construir o que o tempo nos retirou.
Não posso deixar de agradecer especialmente à Alice, Camila, Pedro e Potyguara, que me
deram incentivos e forças para seguir em frente e acreditar que tudo daria certo.
E aos amigos(as), Carol, Shyrleane, Hitalo, Keline, Érico, Marcos e Rebeka que durante todo
esse tempo mantiveram-se por perto, mesmo à distância.
Agradeço ao álbum Jambú e os Míticos Sons da Amazônia que tanto tocou enquanto escrevia
esse texto.
E claro, não posso esquecer da mini (minnie ou pepeta) pelo companheirismo fiel de sempre.
RESUMO
A pesquisa situa sobre educação quilombola, dando ênfase à observação das interações
pedagógicas entre arte, religião, crianças e educadores tradicionais. Para tanto, a proposta
apresenta o movimento das retomadas da educação quilombola, localizado na Baixada
Ocidental Maranhense no Quilombo Imbiral Cabeça-Branca. Naquela realidade, diferente do
que acontece em outras retomadas educacionais registradas pela literatura etnográfica,
educadores tradicionais, encantados do tambor-de-mina, e as divindades dos ritos da festa e da
religião, contribuem ao ensino territoriado valores éticos de um modo de vida. Diante disso,
indaga-se como o tambor-de-mina em diálogo com as questões ambientais do território,
conduzem as vivências didáticas experimentadas no cotidiano daquela realidade. E como são
significadas pelas crianças através de um conhecimento corporificado na prática. Tais
observações partem metodologicamente por uma “educação da atenção”, proposta por Tim
Ingold, e aprendizagens corporificadas e situadas na prática, proposta por Jean Lave.
Entretanto, percebe-se que o ensino territoriado naquela realidade educativa, é um projeto em
construção, que se faz necessário diálogos com uma interculturalidade crítica para a
valorização dos conhecimentos tradicionais na luta contra-hegemônica da educação e outros
contextos conflitivos ambientais do território. Para isso, a pesquisa propicia diálogos entre
Antropologia e Educação, Antropologia da Religião, e Ecologia Política.
This research lies in quilombola education, focusing on observing the pedagogic interactions
between art, religion, children and traditional educators. Therefore, the proposition presents
the movement of reclaiming the quilombola education on Western Maranhão at the Quilombo
of Imbiral Cabeça-Branca. In that reality, diverging from other educational reclaims registered
on ethnographic literature, traditional educators, tambor-de-mina enchantments, and the
deities of the party and religious rites, contributed to the territorialized teaching of ethical
values of a way of life. That said, it is put into question how the tambor-de-mina in
communion with the environmental questions of the territory, lead to the educational
experiences lived daily in that reality. And how they are signified by the children through a
knowledge embodied in practice. Such observations lead methodologically through an
“education of attention”, proposed by Tim Ingold, and learnings embodied and situated in
practice, proposed by Jean Lave. However, it is noted that the territorialized teaching in that
educational reality, is a project under development, where it is necessary to dialogue with a
critical interculturality for the appreciation of the traditional knowledges in a struggle for
counter-hegemonic education and other conflicting environmental contexts of the the
territory. For that, this research provides dialogues between Anthropology and Education,
Religious Anthropology, and Political Ecology.
FOTOGRAFIAS
Foto 1 – Pajé Luís.....................................................................................................................42
Foto 2 – Calha do Rio Turiaçu..................................................................................................42
Foto 5 – Os tambores...............................................................................................................76
DESENHOS
Desenho 1 – Festa de Tambor...................................................................................................68
Desenho 2 –
Roçado..................................................................................................................72
PLANTA
Planta 1 – Demonstrativo da estrutura física da escola.............................................................84
MAPAS
Mapa 1 – Localidade geográfica da Baixada Ocidental Maranhense.......................................43
Mapa 2 – Localidade do Território Quilombola Imbiral Cabeça-Branca.................................44
ÍNDICE DE TABELAS
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................12
1. QUILOMBOS E OS DIREITOS EDUCACIONAIS QUILOMBOLAS.......................24
1.1 Os desafios políticos-administrativos da educação diferenciada entre comunidades
Quilombolas.............................................................................................................................28
1.2 O movimento das retomadas da educação da Baixada Ocidental Maranhense:
educação territoriada..............................................................................................................33
1.2.1 Ser territoriado e a noção de corpo: debates epistêmicos........................................35
1.2.2 Conhecimento corporificado e situado na prática educativa...................................38
2. CARACTERÍSTICAS GERAIS DO CAMPO E FORMAÇÃO DA OCUPAÇÃO
HISTÓRICA DE IMBIRAL CABEÇA-BRANCA..............................................................43
2.1 educação quilombola de Imbiral Cabeça-Branca e suas particularidades..............53
2.1.1 O tambor-de-mina e a pajelança..............................................................................58
2.1.2 Vivências infantes: as crianças e a educação territoriada na prática........................63
3. ENSINO TERRITORIADO E ENSINO ESCOLARIZADO:
ATRAVESSAMENTOS.........................................................................................................77
3.1 A nova escola: por uma escola territoriada................................................................82
3.1.1 Interculturalidade crítica em defesa do território......................................................87
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................93
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................96
13
INTRODUÇÃO
Tomando como norte o pensar em educação, em seu sentido mais amplo, esta
pesquisa se insere no campo dialógico entre Antropologia e Educação. Nesse sentido, é
pensando em sistemas educativos ocidentais e não-ocidentais, que a antropologia torna-se
uma ferramenta essencial para compreensão de outros modos e experiências educacionais em
diferentes grupos étnicos e culturais.
Assim, o recorte desse estudo tem como essência saberes da diáspora africana –
conhecimentos resguardados em contextos de comunidades remanescentes quilombolas –, é
com esses grupos étnicos, de saberes “transladados” (SIMAS, 2018), que a experiência da
educação é, percebida antes de tudo, como uma “continuidade da vida” (INGOLD, 2020).
Entretanto, é inegável que diante das heranças do pensamento colonialista brasileiro, a
inferiorização dos descendentes africanos, evocam desafios a serem superados diante das
práticas políticas e educacionais.
Para Peregalli (2001) foi diante das fugas, das revoltas e as insurreições organizadas
pelos escravizados, que deram formações dos primeiros aquilombamentos “por todos os
cantos do território brasileiro” (p. 25), assim, diante dessas resistências, em busca de
autonomia e espaço – devido à impossibilidade de voltar para o continente africano –
adentravam às matas, e formavam os quilombos, dessa maneira, a pauta da terra, e de outros
modos de existências, fizeram-se de lutas políticas-organizadas para questões sociais.
14
A educação escolar quilombola foi uma conquista do povo negro que se concretizou
com as deliberações da Conferência Nacional de Educação (CONAE, 2010), e foi oficializado
por meio das Diretrizes Curriculares nacionais para Educação Escolar Quilombola. E
seguindo as orientações das Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais do âmbito da Educação
Básica, foi instituído que a educação “quilombola deve ser desenvolvida nas unidades
escolares dentro de suas terras” além disso, institui uma “pedagogia própria”.
Nesse sentido, as lutas por uma educação quilombola, é a temática que norteia e
justifica essa esta pesquisa, cujo intuito, é investigar e compreender como as próprias
sociedades tradicionais educam, sem grandes intervenções do poder público. Nesse caso,
intencionamos conhecer como os quilombos, aplicam na prática seus conhecimentos da
“etnoeducação”, e como essas experiências didáticas inauguram o “aprendizado
corporificado” ditas por Jean Lave e Eitenne Wenger, no aspecto dialógico com a luta por
seus territórios.
15
1
Localizada em Pedro do Rosário –Maranhão “Paraíso” é uma localidade semi-urbana próximo ao quilombo de
Imbiral Cabeça-Branca.
2
Luís Teixeira, 64 anos, é Pajé e Educador Tradicional do Território Quilombola Imbiral Cabeça-Branca, é
conhecido na região por Luís Lopes, ou Pai Lopes, o sobrenome “Lopes” é pertencente sua família paterna,
porém no seu registro de nascimento contém apenas o sobrenome “Teixeira” de sua mãe.
16
Contudo, cabe aqui um relato especial, pois a menção de duas comunidades nesse
introito, se dá pela fato da intenção inicial da pesquisa, ter tido como referência a reportagem
do Repórter Brasil: “Retomada: O quilombo que renasceu na escola” cedida pelo quilombo
de Nazaré – comunidade quilombola do município de Serrano do Estado do Maranhão,
precursores do modelo territoriado de ensino – entretanto, a pandemia SARS-CoV-2 (covid-
19), impactou o campo de pesquisa, e somente foi possível realizar na comunidade de Imbiral
Cabeça-Branca.
Apesar dos percalços trazidos pela pandemia de covid-19, e das manifestações com
fechamento de estradas, foi possível realizar a pesquisa de campo na comunidade. A mesma
foi realizada em duas etapas, a primeira visita foi realizada no ano de 2021 entre 18 (dezoito)
de setembro e 03(três) de outubro totalizando 16 (dezesseis) dias corridos em campo. Como já
foi citado, a primeira etapa ao campo foi bastante desafiadora por conta da pandemia, na
comunidade, o período escolar estava suspenso, por isso, necessitou de uma segunda visita ao
campo, com a rotina escolar normalizada na comunidade.
Nesse momento, tive à ação de ligar para os meus interlocutores avisando que não
seria possível chegar no mesmo dia e, mesmo diante disso, por telefone, o Pajé Luís,
encorajou-me seguir até o bloqueio, e dialogar com os Guajajaras. Mesmo desacreditando
sobre possibilidade de uma travessia, para minha surpresa com ajuda dos pensamentos do
6
Tese estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal – STF com o argumento da conjugação do verbo “ocupar”
referente ao artigo 231 da CF com a argumentação que “a favor da tese utiliza a conjugação do verbo “ocupar”
em tempo presente na Constituição Federal para defender que os indígenas só teriam direito às terras onde
estavam à época da promulgação do texto”. Publicado por Agenda Pública em 30 de agosto de 2021 encontrado
no site: casaum.org/
18
Pajé Luís, os caminhos me foram abertos, e atravessei para outro lado do bloqueio,
possibilitando a continuidade da viagem até a chegada ao campo.
7
Categoria nativa utilizada em Imbiral Cabeça-Branca para referenciar aqueles que batem tambor ou abatás
entre outros instrumentos percussivos.
19
Na comunidade a primeira escola foi fundada no final da década de 1980, por dois
educadores tradicionais Sebastiana Teixeira, 56 anos, possuinte do curso técnico-pedagógico
e o Pajé Luís Teixeira, de 64 anos, que nunca frequentou a escola formal-regular. Foi,
portanto, diante da necessidade de educar seus filhos e filhos de outros moradores da
comunidade, que estes educadores, dentro do contexto da territorialidade, optaram por uma
concepção de “educação alargada” (GUSMÃO, 2013) e organizaram uma pedagogia
quilombola própria, com intuito de preservar a cultura e a identidade étnica do território. Para
eles, atualmente a educação ensinada se chama territoriada, pois pressupõe um entendimento
de corpo, pessoa e suas inter-relações com a natureza culminando em uma organização
política de defesa do território.
Embora houvesse essa estrutura do barracão, que por sinal, foi levantada pelos
próprios educadores tradicionais comunitários, a falta de um prédio físico escolar, não foi
impedimento para que a pedagogia quilombola fosse aplicada nos ambientes extra-escolares,
transgredindo assim, os conceitos ocidentais sobre educação relacionado ao fato de “ir à
escola” (INGOLD, 2020, p.15).
Uma situação que encoraje e estimule um entrevistado [...] a contar uma história sobre
algum acontecimento importante de sua vida e do contexto social [...] sua ideia básica
é reconstruir acontecimentos sociais a partir da perspectiva dos informantes, tão
diretamente quanto possível (JOVCHELOVITCH; BAUER, 2008, p.93).
Para uma construção com afro-religiosidade e a educação, esse debate sobre o corpo
é difuso ao universo metafisico do tambor-de-mina, no que compreende-se a noção de pessoa
na dimensão ontológica, do compromisso com as entidades, pessoas e portanto ancestralidade.
Vale ressaltar que o uso de imagens e gravações de áudios das entrevistas foram
permitidos pelas lideranças comunitárias e consentidas pelas próprias pessoas que
participaram da pesquisa. No caso dos participantes menores de idade tiveram o
consentimento, livre e espontâneo direto dos pais ou responsáveis para participarem das
entrevistas e das dinâmicas fotográficas.
23
histórico narrado pelo Pajé Luís Teixeira, se dá por meio de habilidade orais de suas
narrativas, dando lugar ao aspecto histórico sobre a ocupação histórica de Imbiral Cabeça-
Branca.
CAPÍTULO 1
A luta por reconhecimento (HONNETH, 2009), dos quilombolas sobre suas questões
sociais, recai na dimensão das conquistas por direitos – desde o período da pós-abolição –
marcadas pelo anseio da emancipação diante de uma estrutura racista da sociedade brasileira.
No século XX, por exemplo, houve grandes movimentações de coletivos-políticos negros
organizados, a exemplo disso, no período dos anos de 1930 a Frente Negra Brasileira (FBN)
surge com essas questões enfatizando em suas pautas o acesso à educação, diante da grande
taxa do analfabetismo da população negra brasileira (MIRANDA; LOZANO, 2018, p.8).
Embora o movimento negro urbano não seja o foco da pesquisa, todavia é importante
ressaltar que no século XX, com o surgimento do Teatro Experimental Negro (TEN), na
década de 1940, as contribuições do TEN organizadas na apresentação do projeto “O
quilombo” (MIRANDA; LOZANO, 2018, p.9), colocou-se as questões afro-brasileiras nas
dimensões culturais, educacionais, étnicas e estéticas na estepe de novas epistemologias dos
debates políticos. O enfoque educacional, todavia, realçava os problemas sobre o
analfabetismo entre comunidades negras, e além disso, colocava questões sob uma proposta
de “educação pluricultural” (WALSH, 2008).
27
Para Carril (2017) na Constituição Federal de 1988 (CF/88), o engajamento por uma
educação diferenciada na configuração da pauta da terra, foi crucial para garantir os direitos
educacionais aos povos quilombolas, visto que, dado a titulação de seus territórios e suas
formas de uso comum da terra, aqueles remanescentes oriundos da escravidão ou fugitivos do
regime escravista – que por estratégia de sobrevivência em busca de liberdade, formaram vida
comunitária denominada de quilombos, e ou mocambos – trouxeram em debate contextos
educacionais, intrinsicamente vinculadas às questões da terra, da ancestralidade, identidade, e
memória (CARRIL, 2017, p.541).
[...] o processo é significativo para repensar a instituição escola tal como se apresenta
no sistema educacional, exigindo com isso, outros e novos princípios que redefinem o
papel da escola, como escola voltada para a diversidade social e cultural dos diferentes
grupos (GUSMÃO, 2020, p. 19).
30
Para Carril (2017), a educação formal não contempla as minorias em seus direitos,
nesse caso, o negro-quilombola, em grande medida, fica à margem do ambiente escolar-
formal, assim, “o espaço escolar reflete a sociedade e suas contradições, sendo palco de
conflitos e desigualdades múltiplas e sobreposta” (CARRIL, 2017, p.551). Nesse aspecto,
Gusmão (2011) reforça a ideia da escola do modo que conhecemos, como um “fracasso diante
da diversidade que a constitui” (GUSMÃO, 2011, p. 14). Entretanto, se a educação formal-
32
regular, têm suas falhas, a educação diferenciada se propõe como um projeto político-
pedagógico de reconhecimento étnico-cultural, multicultural e intercultural (SOARES, 2016,
p. 6-10).
O que cabe aqui nos indagar sobre algumas realidades, é se na prática escolar
quilombola, é em grande medida, uma educação diferenciada, ou se é uma reprodução da
educação formal em uma escola situada em território quilombola, ou melhor, quais os
desafios de uma implementação que de fato contemple suas especificidades culturais, os
saberes ancestrais e sua história. Para Grupione (2000), um dos fatores que implica
diretamente na eficácia de uma implementação diferenciada em comunidades tradicionais,
está na própria concepção das intuições do Estado, ao envolver estranhos na vida educacional
das comunidades tradicionais (GRUPIONE, 2000, p.274).
33
Diante de uma perspectiva decolonial, Campos et al. (2015), enfatiza que os povos
quilombolas são grupos que expõe o pensamento contra a colonialidade, ou seja, povos de
“resistência e enfretamento decoloniais” (CAMPOS et al. 2015 p. 37321). No campo da
educação diferenciada, a pedagogia decolonial marca rompimentos epistemológicos com a
colonialidade, principalmente naquilo que se refere aos “saberes tradicionais”, como uma
crítica ao pensamento ocidental, “não desqualificar nenhum saber, embora considerando
diferenças entre eles incluindo-os num repertório alargado de “ciências” ou de saberes
científicos” (PAIM, 2019, n.p)
Aí a gente começou a fazer a retomada do território. Mas a gente percebeu que não
era só o território que tinha que ser retomado, era também as pessoas. Porque o
território só seria retomado com a retomada das pessoas. E quem podia fazer isso era
só uma coisa: a educação, a educação quilombola, que é conhecimento de vida, mas
também é das “encatarias das minas”, que também foram retomadas, reaprendidas
no meio disso tudo. A gente criava uma “escola territoriada” de fato, entende!?
(Leidiane Quilombola, professora e liderança do movimento das retomadas da
educação da Baixada Ocidental Maranhense.11)
11
Fala cedida à jornalista Solange Azevedo, da revista Repórter Brasil, em ocasião da coleta das informações
para a produção da matéria “Retomada: o quilombo que renasceu na escola” (Azevedo, 2017). Material em vídeo
disponibilizado pelas lideranças do Território Quilombola Nazaré através das redes sociais.
36
de suas identidades, a educação torna-se uma aliada nos processos de retomada das pessoas e
seus territórios “retomadas pela educação”.
Dado isso, percebe-se que, para retomadas de seus territórios na luta política por
direitos, foi preciso, sobretudo, “retomar as pessoas”, através da educação, refletindo suas
identidades étnicas de pertencimento de grupo. Nesse contexto, insurge o conceito de
educação territoriada, diferindo-se dos conteúdos formais dos livros didáticos da
administração pública municipal. Assim, o que temos diante da educação territoriada, é a
experiência dos conhecimentos práticos locais vivenciados no território, e o uso de seus
recursos naturais, como parte dos conhecimentos didáticos do movimento de retomadas.
A gente quer uma coisa de qualidade ao nosso conhecimento, entendeu? Porque nós
sabemos de todo movimento daqui de dentro, nós queremos repassar para os que
estão vindo, porque se a gente deixar, vai ser daí pra pior, não vai ser uma coisa
avante, vai ser assim[...]daqui a pouco, se a gente deixar do jeito que estão indo, eles
não vão conhecer juçara, uma roça de mandioca, uma roça de arroz. Cada vez mais é
só destruição então não tá fácil, a nossa luta é disso, é de que a gente cada vez mais
leve avante a nossa situação. Os professores de fora, eles não conhecem a nossa
realidade, ai se é de ajudar, prejudica, se eu pudesse eu terminaria meus estudos
(fazer superior ou magistério) pra ajudar o mais rápido possível (Lilica, 32 anos,
Quilombola da comunidade Imbiral Cabeça-Branca, e funcionária da escola da
comunidade Imbiral Cabeça-Branca).
O que inspira esse debate epistêmico proposta pela educação territoriada, está
expressa na frase: “quem estuda território, estuda corpo, estuda pessoa”. Para uma
compreensão, dessa expressão na visão dos educadores quilombolas da Baixada Ocidental
Maranhense, a noção de “corpo”, “território”, e “pessoa”, são apresentadas como unidades
relacionais e continuas, possibilitando uma discussão epistemológica diante de uma
Antropologia da Territorialidade e uma Antropologia do Corpo (corporeidade).
No intuito de entender a relação particular que um grupo social mantém com seu
respectivo território, utilizo o conceito de cosmografia (Little 2001), definido como
os saberes ambientais, ideologias e identidades − coletivamente criados e
historicamente situados − que um grupo social utiliza para estabelecer e manter seu
território. A cosmografia de um grupo inclui seu regime de propriedade, os vínculos
afetivos que mantém com seu território específico, a história da sua ocupação
guardada na memória coletiva, o uso social que dá ao território e as formas de defesa
dele (cf. LITTLE, 2011, p.4).
12
René Descarte em o Discurso Sobre o Método de 1637.
13
O ser no sentido ontológico: o ser e o mundo, o ser e o que é no mundo, como um sentido unitário, “relação
homem-mundo que não é simplesmente a de dois seres exteriores um ao outro, mas a de um entrelaçamento
ontológico dotado de sentido” (cf. BARBOSA, 1998) in: A noção de ser no mundo em Heidegger e sua
aplicação na psicopatologia.
39
Diante dessa concepção comunitária que concebe a pessoa, tal valor é intrínseco para
concepção de território, ou melhor, de territorialidade – na qual é difundida na relação do
“corpo” e da “pessoa”. Isto porque a noção de território está implicada diretamente nas
condutas de uma territorialidade, ou seja, um grupo social que luta por suas identidades e seus
modos de uso comum (LITTLE, 2011, p.3; HAESBAER, 2020, p.76).
Desdobram-se assim desde os territórios do/no corpo, íntimo (a começar pelo ventre
materno), até o que podemos denominar territórios-mundo, a Terra como pluriverso
cultural-natural ou conjunto de mundos – e, consequentemente, de territorialidades –
aos quais estamos inexoravelmente atrelados. Tudo isso se desdobra hoje dentro
daquilo que se designa como pensamento decolonial, uma busca por pensar nosso
espaço e, de alguma forma, o próprio mundo, considerando as bases espaço-
temporais – a geohistória, enfim – em que estamos situados (HAESBAER, 2020,
p.76).
Para Haraway (1995), tal universalidade também é contestável, entre teorias, teses,
contra-teses e retóricas, porém, de certo modo, a ciência ocidental é um campo de poder
teorizado, com seus métodos científicos, e conceitos (HARAWAY, 1995, p.9). Dessa forma,
o cientista para o não-cientista, em grande medida, está diferenciado entre modos em que
operam suas atividades e aplicações de seus conhecimentos, se por um lado a ciência
ocidental padroniza seus métodos e seus conceitos se tornam universais, tal impressão, os
coloca como conhecimento dominante, e nesse sentido, Veinguer et al. (2020) o chama de
“violência simbólica e estrutural do pensamento hegemónico” (VEINGUER et al. 2020, p.89,
tradução minha).
CONJUNTO FOTOGRÁFICO I
CAPÍTULO 2
A presença dos construtos de barro (PENHA et al. 2018), foi notada nas estruturas
das casas dos habitantes de Imbiral Cabeça-Branca, cerca de 90% (noventa por cento) das
casas são feitas de taipa, com plantas em formatos quadrados ou retangulares e, cerca de 85 %
são cobertas por palha, e 15% por telha de barro, segundo as narrativas orais dos moradores,
esse tipo de cobertura por palha, permite uma circulação maior do ar. Para Pereira (2011) a
necessidade da palha nos assentamentos dos quilombos do Norte do Brasil, está
intrinsicamente relacionado ao ambiente natural úmido da floresta amazônica (PEREIRA,
2011, p.5).
48
Dessa forma, o esforço de compreensão dessas moradias, não devem ser lidas na
visão eurocêntrica como forma inferior ou “construções selvagens” e sim, naquilo que Russi
et al. (2019) enfoca nos seus estudos antropológicos sobre o sentido do habitar para cada
sociedade.
Nós vamos fazer o barracão de papai. Eu, e os meninos aqui. É rápido nós faz, porque
esse velho não adianta mais mexer, já caiu ali uma parede, então, tem a gente aqui pra
fazer de filho dele e tem nosso vizinho também que ajuda, a gente passa uns dias da
semana, os meninos aí bebem e conversam, e rápido tá terminado o serviço. Aí
quando alguém que ajudou aqui e precisar fazer uma casa, aí a gente vai lá e faz, ajuda
fazer, a gente sempre ajuda todo mundo. Aí quando é uma casa que tá velha, a gente
até muda, faz em outro lugar, se fosse de tijolo era mais difícil (Reinaldo Basé, 40
anos, Quilombola de Imbiral Cabeça-Branca).
ocupação foi uma necessidade para utilização de lousas, aulas expositivas com vídeos, e de
certo modo, para proteger as crianças do sol e da chuva, além de reunião escolares.
Narrativas etno-históricas
No acesso das memórias do Pajé Luís, o território que hoje se chama Quilombo
Imbiral Cabeça-Branca, é fruto das relações interculturais e interétnicas entre os indígenas e
quilombolas – Os indígenas já habitavam o local antes da chegada dos escravos refugiados da
fazenda de Santa Barbára – o aldeamento daquele local era chamado de Cabeça-Branca, essa
toponímia que ainda hoje existe no lugar é em referência à um encantado que aparecia se
encarregando da proteção do ambiente e das pessoas que ali habitavam. Segundo o Pajé Luís,
a toponímia “cabeça-branca” se deu em razão desse encantado que sempre aparecia em um
formato de uma cabeça arredonda sobre o Rio Turiaçu, com cabelos brancos, entre os igapós e
as dunas brancas do Rio Turiaçu.
15
Obra de Maria Raimunda Araújo (Mundinha Araújo), 3ª edição, 2014 publicado pela editora gráfica 360º - São
Luís, Maranhão. Livro aborda sobre a Insurreição em Viana – Maranhão, e a dispersão de negros fugidos pela
Baixada Maranhense, aquilombando-se “nas cabeceiras do rio bonito, braço do rio turi”, e formando o quilombo
de São Benedito do Céu.
16
A fazenda de Santa Barbara pertencente ao Barão do Turiaçu de onde os escravos se rebelaram e fundaram o
quilombo de São Benedito do Céu.
51
Pedro Celestino era filho de negro e índia Gamela, porque se juntava os negros e as
índias, e as índias com os negros [...] Então cada um era uma parte, um negro com
uma índia e uma índia com um negro. A família de meu pai eles eram Gamela, da
família da minha vó era tudo kapó, e ai faziam os casamentos[...] Esse meu avô
Antônio Lopes era filho de Pedro Celestino. E ai ele casou com minha vó[...] já
casaram aqui. O Manoel d’Villa era negro pai da minha avó, e a mãe dela ela nunca
me disse o nome, primeiro fugiu Pedro Celestino mas a mulher dele [...] ai eles
começaram se ajudar, ficaram correspondente. Ai se juntaram e se casaram os dois e
foram fazer família. Quando eles descobriram que os pretos estavam por aqui.
Notícias que os pretos iam pra Santa Barbara. Ai Raimundinha Araújo, que era a líder
dos negros de Viana, que foram os primeiros ataques dos portugueses foi em Santa
Barbara, que lá era a casa deles se consultar. Que é Viana, tudo nesse tempo era
Viana. E aqui o município de Pinheiro, os ataques daqui todo foram de Pinheiro e
Viana. E aqui São Benedito do Céu foi uma coisa criada por Pedro Celestino. Por quê
é São Benedito do Céu? Porque quando eles estavam aqui, eles estavam no céu,
porque ninguém achava eles (Luís Teixeira, 64 anos, Quilombola e Educador
Tradicional de Imbiral Cabeça-Branca).
[...]pode reparar que onde tinha moradia tinha um cocal [...] aí eles trocavam e traziam
pra cá, plantava os cocais. Quais eram as outras plantas/frutos que eles trocavam?
era batata, café, fumo dos índios, essa cafézada que tem aqui é dos negros, que os
negros plantavam nos sítios deles e traziam muda e plantavam (Luís Teixeira, 64
anos, Quilombola e Educador Tradicional de Imbiral Cabeça-Branca).
As casas dos quilombolas, eram tudo afastada uma das outras por dentro dessas matas,
que era pra dificultar para os inimigos, eram tudo escondido, tá vendo?! Isso era muito
importante, pois era uma inteligência deles dos quilombolas (Luís Teixeira, 64 anos,
Quilombola e Educador Tradicional de Imbiral Cabeça-Branca).
Nos relatos orais do Pajé Luís, a chegada dos fugitivos negros nas proximidades do
Cabeça-Branca, contou com a ajuda dos indígenas, que segundo ele: “os índios andavam pelas
margens do Rio Turiaçu à procura de alimentos e, se depararam com os negros caídos pelo
rio, com ferimentos pelo corpo, quase morrendo”. Foi nesse encontro extemporâneo que as
circunstâncias ocasionaram aos quilombolas, à receberem os cuidados e as trocas de
conhecimentos etnofarmacológicos17 (ELIZABETZKY, 1999), entre os dois grupos.
17
Conceito empregado para o conhecimento da medicina em sistemas de sociedades tradicionais, especialmente
nos conhecimentos de fármacos botânicos, ou seja remédios a partir dos vegetais. In: ELIZABETZBY, E., 1999
"Etnofarma-cologia como Ferramenta na Busca de Substâncias Ativas" in "Farmacognosia: da Planta ao
Medicamento", Simões, C. M. O et al., Organizadores, Editora de Universidade/UFSC, 1a Edição, Porto
Alegre/Florianópolis.
18
No maranhão no séc. XIX, a pajelança de origem indígena, também passou a ser encontrada nas populações
negras, para quebrar feitiços e curar enfermidades, sendo também acompanhada por sons percussivos de tambor
e danças, há também manifestações corporais em transe, do pajé ou curador (FERRETI, 2014, p.01).
53
Nos primeiros dias de julho de 1867, os lavradores de Viana viram os seus temores,
em relação a uma insurreição da escravatura, concretizarem-se, quando centenas de
pretos aquilombados saíram dos seus refúgios e ocuparam, simultaneamente, diversas
fazendas localizadas nos centros daquela comarca. Vinham os insurretos do quilombo
São Benedito do Céu, localizados “nas cabeceiras do Bonito, braço do turi, a três dias
e meio de viagem a pé de Viana (ARAUJO, 2014, p.41).
Nos registros históricos também são encontrados fatos episódicos dos insurretos do
quilombo de São Benedito Do Céu, que conseguiram chegar na fazenda de Santa Barbara e
impuseram, ao administrador a escrever uma carta as autoridades agraciando os escravizados
com a liberdade19. Ainda em 1867, diante do conflito travado na fazenda de Santa Barbara,
alguns insurretos foram aprisionados e forçando-os à servirem de guia até o quilombo.
Durante o fogo travado na fazenda Santa Bárbara entre os insurretos e a força legal,
foram aprisionados alguns quilombolas: Benedito, Vicente, Martiniano, Severino e
Feliciano Corta-Mato, dentre outros. No decorrer da devassa, estes escravos foram
inquiridos sobre o quilombo São Benedito do Céu, fornecendo, às autoridades,
informações precisas sobre a sua localização, população, organização política, social e
econômica (ARAUJO, 2014, p.71).
Após isso, a dispersão do quilombo São Benedito do Céu, deu início, quando a
presença de capitães-do-mato, adentraram ao território quilombola, entre diversas tentativas
de destruição do quilombo, o reforço militar aumentou aos redores dos quilombos do Turiaçu,
como o quilombo “Braço do Laranjal”, e “São Sebastião”, igualmente localizados na beira do
Rio Turiaçu, em distância de longas trilhas, dentro das matas, entre um quilombo e outro.
19
ARAUJO, Raimundo Inácio Souza. In: O reino do encruzo: práticas de pajelança e outras histórias do
município de Pinheiro - MA (1946-1988)
54
O historiador Flávio dos Santos Gomes (1997), afirma que em 1874 as comunidades
quilombolas formadas pelos fugitivos de São Benedito do Céu, como o Braço do Laranjal, e
São Sebastião, também foram alvo das tropas policiais, enviadas com objetivo de extingui-los.
Com isso, tais quilombos possuíam recursos tácticos, dentre elas, estratégias que: “apareciam
e desapareciam naquelas florestas”. Também, havia no centro do território “uma picada batida
por pretos”, dentro do antigo quilombo São Benedito do Céu:
Não satisfeita a tropa seguiu até o "lugar são Bennedito de Céo" — do antigo
mocambo atacado, destruído e abandonado — e nada encontrou, tendo o "mesmo
resultado". Próximo dali deparou-se com "uma picada batida por pretos". Esta
"picada" era extensa e fazia supor que os quilombolas ainda a utilizavam. Foi ela
seguida pelos "guias" daquela tropa que após investigarem revelaram que a mesma "ia
ter a beira do rio, no lugar Pedreiras. d'alli ao Capivary e a Bocca do Largo e Viana,
por onde se supõe serem os escravos fornecidos de viveres, armamento e
munição"(GOMES, 1997, p.359).
Esse território de cabeça-branca ele é grande tem 50 mil hectares de terra, cortada por
Bruno, que entregou pra eles pros negros, ele era o balizeiro, o balizeiro hoje é tipo
agrimensor. Sempre minha vó dizia que no tempo que o Bruno cortou aqui pros
negros, e ficaram aqui antes dos ataques [...] porque tinha um matador deles aqui, o
Negro Cosme (Luís Teixeira, 64 anos, Pajé, Quilombola e Educador Tradicional
de Imbiral Cabeça-Branca).
20
Ver. (cf. Araújo, 2014, p. 80-81) Bruno é citado como capitão que fazia parte do pelotão armado do quilombo
de São Benedito do Céu, chefiado por José Crioulo.
21
Ver. (cf. Araújo, 2014, p. 32) Negro Cosme chefe africano líder da resistência da Balaiada(1838-1841),
movimento anterior a Insurreição em Viana (1867), há indícios que também habitou o quilombo de São Benedito
do Céu ainda nas primeiras décadas de formação do quilombo.
55
[...] tinham um comerciante Joaquim, Manoel Joaquim, ele era comerciante, ele
comprava tudo que o pessoal tinha aqui, os brancos, e levavam no boi, embira, porque
aqui é chamado de imbiral? Por causa disso, aqui se tirava embira pra vender, era
aqui. O lugar que mais tinha embira branca, nesse lugar aqui. A gente vinha como
quem vai com safra, fazer safra. O quê que a gente faz? botava dentro d’água e botava
15 dias pra amolecer...ai vendia tudo pra eles...no quilo, arroz, farinha, mandioca, eles
trocavam... aqui não existia milho, quem trouxe milho pra cá, foi eu que trouxe,
depois de eu rapaz, já mais grandinho um pouco. Ai tudo que faziam aqui tinha que ter
uma troca, trazia pouquinho pra levar muito...ai nosso pai mandava a gente tirar folha
pra vender, folha de guarimã de cantã, pra embrulhar as coisas que de primeiro não
tinha saco, não tinha sacola, se comprava café, açúcar, embrulhado na folha, tudo a
gente tirava aqui, e têm muito. Então isso tudo são históricos da gente. São as histórias
nossa daqui. Esse era os de nós viver aqui. As folhas medonhas de grande, mas hoje
tem sacola. Era 12 carros que levava só de café. O comércio dele era grande só de
comprar dos negros, é histórico também, o Manoel Joaquim. Ele era comerciante?
Era, ele comprava as coisas do negro? compravam. Negociava pros brancos, porque
os portugueses era que tinha os armazéns (Luís Teixeira, 64 anos, Pajé, Quilombola
e Educador Tradicional de Imbiral Cabeça-Branca).
Embora Imbiral Cabeça-Branca seja uma comunidade de longa existência, foi em 1998,
com o protagonismo do pajé Luís Lopes (Luís Teixeira), e Sebastiana Teixeira – apresentadas
como lideranças organizadas nos aspectos do ativismo político da comunidade – fundaram a
Associação Moradores da Comunidade Quilombola Imbiral Cabeça-Branca (AMOAQui).
22
Insumo vegetal que serve como corda encontradas nos meios botânicos da comunidade de Imbiral Cabeça-
Branca.
56
Diante disso, tomo como primeiro uma afetação (FABIAN, 2013, p.64), e não uma
mera atividade de rotina prática de campo, encontrando-se diante dos olhos, as dimensões do
desflorestamento adentrado ao território quilombola de Imbiral Cabeça-Branca. Nesse
aspecto, o conhecimento situado é adquirido em “walkscapes”, diante da percepção
paisagísticas, caminhando no território, a ação é traduzida como uma “leitura e escrita do
território” (CARERI, 2002, p.51). Através disso, o debate do sagrado a das encantarias, são
ensinadas dialogicamente com a defesa do território e a defesa das “minas”, como uma
atribuição de “significado místico” coordenando o mapeamento do espaço ecológico e seus
significados.
uma prática comum, entre seus filhos, desde então, é notável o conhecimento adquirido diante
daquela pedagogia perpassada pelo pajé, sobre a “medicina do mato”.
Embora, na comunidade a presença da escola física – o novo prédio escolar (em fase
de acabamento) demandado pela prefeitura de Pedro do Rosário – está inserida dentro do
território: a experiência educacional, é marcada pelos valores de um modo de vida em
específico, no caso, o tambor-de-mina e suas encantarias, o que parecem conduzir os valores
éticos, tanto na vida comunitária, como também na pedagogia compartilhada entre os
educadores tradicionais – mães, mulheres, pajés, pescadores, lavradores, ‘abatazeiros’ do
tambor de mina – estão no conjunto participativo daquela educação chamada de territoriada.
minas” dentre elas: o morro, chamado de “oiteiro da onça”, as cabeceiras do Rio Turiaçu, o
Cabeça-Branca, e a vegetação nativa preservada nas margens das unidades habitacionais.
As cabeceiras são nesses alto, uma pessoa chama morro, outros chamam, quer dizer...
na minha língua eu chamo oiteiro, porque oiteiro é coisa alto, essa cabeceira são tudo
nesses oiteiro, e nesse oiteiro é onde tem as riquezas, nesses oiteiro, só um oiteiro
desse tem uma grota, são as minas, o peixe é mina, agua é mina, e os encantados
também são mina, então quando você mora na mina, tem o tambor-de-mina [...]todos
os rio que existe no mundo tem a mina deles, são as cabeceira que não seca, peixe é
mina, inseto também é mina, que mina pelo mundo pelo tempo, pela arvore pela
floresta, as folha da floresta se transmite muita coisa [...] (Luís Teixeira, 64 anos,
Pajé Quilombola e Educador Tradicional de Imbiral Cabeça-Branca).
Uma vez uma senhora estava com uma filha passando mal no hospital, ai eu disse:
“senhora, a senhora não acredita nesse negócio de pajé...de cuspida de banda por aí,”
aí ela disse assim: “se for pra minha filha ficar boa, eu acredito!”, ai eu disse assim:
“ah, pois bem aí numa rua, tem uma mulher que benze, tira sua filha daqui leva lá.” Ai
ela disse: “como eu faço? O médico não vai deixar”. Ai eu “ah, mas isso é fácil
demais, nós pula a janela (risos)”. Pois a menina estava era com quebrante, estava
verdinha. Ela ia morrer lá no hospital (Nilza Teixeira, 26 anos, Pajé, estagiária
docente, Quilombola da Comunidade de Imbiral Cabeça-Branca).
[...]eu acho que seja o seu Luís que repasse aqui, porque os professores de fora não
sabe, e alguns tem preconceito né, então eu acho bom é que seja o seu Luís pra
repassar as coisa daqui. Eu nasci em Santa Helena lá é quilombo também, e meu vô
era médico igual seu Luís, eu sempre cresci assim, respeitando os pais de santo
(Renata, 22 anos, aluna do EJA, Quilombola e moradora de Imbiral Cabeça-
Branca).
Pai sabe quando uma mulher está doente, quando está doente ele olha por dentro e ai
ele vê, ele sabe também quando a pessoa está acompanhada de algo ruim, e vem gente
de todo lugar atrás dele, mas se for pra fazer trabalho ruim que prejudique uma pessoa
ele não faz, ai esse pessoal que vem atrás de coisas ruins vão embora, mas já vi papai
curar gente que estava morrendo (Luís Filho, 30 anos, Quilombola e abatazeiro de
Tambor-de Mina).
Dentro da vida dos conhecimentos territoriais o saber das ervas parecem assumir
práticas multidisciplinares, desde o conhecimento no manejo da terra, da coleta e do
extrativismo; tais práticas levam as pautas das políticas ambientais preservacionistas geridas
pelos membros da comunidade quilombola. Na verdade, tais práticas são uni-relacionais da
terra à mina (encantados, práticas de cura e conhecimentos que convivem na vida
quilombola).
Tais características até então mencionadas nos trazem a concepção do que é o ensino
territoriado diante de uma reflexão do “o que é educação?” do ponto de vista de “redes e
estruturas sociais de transferência de saber de uma geração a outra” (BRANDÃO, p. 13,
2007). Tendo como particularidade os aspectos constituintes dos universos afro-religioso aos
aspectos ambientais, uni-relacionadas, ao aprendizado escolar.
aliança com a pajelança, na qual incorporam-se uma a outra diante das práticas religiosas
locais, devido à isso, como já foi citado, dentro das práticas religiosas de matriz africana, são
ressignificadas como pajelança dos negros, conhecida como “Cura do Pajé” (FERRETI,
2014, p.1).
Brasil. Já os Nagô é oriundo da cultura Iorubá onde se cultuam orixá e vodus, bastante presentes nas religiões
afro-Brasileiras. Tais culturas no território brasileiro se fundiram nas práticas religiosas, desta maneira,
dificultou o processo de distinção.
24
Comumente conhecido por Terecô, é um segmento afro-religioso Maranhense de origem rural, fortemente
encontrado nas matas dos cocais do Maranhão e em alguns pontos fronteiriços do Piauí. Diante disso, Centriny
(2017) “o terecô como uma vertente do tambor de mina, porque a estrutura é muito parecida, até porque os
Voduns do Terecô são chamados de Voduns da mata (CENTRINY, 2017).
62
tambor-da-mata ou terecô dentro dos terreiros de mina, estão destinados aos encantados que
se manifestam em meio as matas de suas florestas.
Durante as festas de Tambor de Mina, é comum que os toques de tambor sejam feitos
em três dias consecutivos, sendo os primeiros dois dias para Voduns e encerramento
da festa com o toque para as entidades presentes na Mata. Na história que segue o
Tambor de Mina no Maranhão, a casa das minas se manteve estruturada unicamente
nos cultos aos Voduns – conforme apresentamos – mas é a partir dela, por meio do
Vodum-Tóquem Toy Averekete que o Tambor da Mata segue sua trajetória
(FERRARA, 2020, p.78).
Ás vezes essa atração que temos com um rio, com água, essa necessidade é um
encantado que te chama, eu me sinto mal também quando estou longe daqui,
principalmente quando estou na cidade. Eu gosto de morar aqui porque se tu observar
aqui é um baixão e eu acho isso muito massa. Sempre que estou longe, aqui tem
encantaria forte, e me chamam de volta (Genivan, 21 anos, Quilombola e Estagiário
Docente da escola de Imbiral Cabeça-Branca).
[...]é aqui que atendo as pessoas, quando é pra fazer consulta, eu consulto nessa mesa
aqui ó. Quando vou trabalhar eu vou lá pra aquele barracão, porque é assim, uma
consulta que a gente faz com as pessoas, a gente não faz em qualquer lugar, é em um
ponto determinado, é um lugar de conversar com Deus. Fazer um benzimento, as
orações [...] Deus diz o que ele tá merecendo o que ele não tá, ai a pessoa[...]também
tem que aguardar, o que mais faz a pessoa ficar feliz com as coisas do pai de santo,
são eles ter a fé, porque se não tiver fé, nem adianta vir, porque sem fé ele não é
curado (Luís Teixeira, 64 anos, Pajé Quilombola e Educador Tradicional de
Imbiral Cabeça-Branca).
fertilidade. Diante dos relatos do Pajé Luís, ser de Oxum é uma “espécime” de diploma, na
qual, é um poderoso orixá ligados as proteções e as defesas, pela qual o Pajé exerce seus
conhecimentos de Pai de Santo, na qual, em um apelo, tais serviços nunca devem serem feitos
como moedas de trocas capitalizadas.
E essa criação minha que tenho, que recebi quando nasci, meu diploma de pai de
santo, eu ser oxum, graças ao nosso pai eterno e poderoso eu tenho feito muitas defesa
para as pessoas e ajudado muito as pessoas, sobre descarrego, pessoa muito
carregada[...]e eu peço pras pessoa, pros pai de santo, os orixás, e babalorixás num
fazer muita carestia para as pessoas, consulte conforme as pessoas, tem serviço
pesado, a gente sabe que tem serviço pesado, porque Deus faz milagre mas o capeta
tem força, ele é forte demais, então quando a gente vai na força a gente vence umas
coisas, mas quando a gente vai no milagre a gente vence mais, porque [...]a nossa,
nossa função[...]dos quilombo e dentro das aldeia, tem muito quilombo que não tem
pai de santo e tem muita aldeia que não tem pai de santo, e feliz do quilombo que tem
pai de santo e feliz da aldeia que tem pai de santo (Pajé Luís Teixeira, 64 anos,
Quilombola da comunidade de Imbiral Cabeça-Branca).
Ainda nos relatos orais da comunidade, alguns momentos festivos fazem parte do
calendário escolar, por exemplo: no mês de Junho as festividades juninas são organizadas
pedagogicamente pela escola da comunidade, tendo uma participação mais efetiva das
crianças na apresentação da quadrilha dos santos, e também a presença do bumba-meu-boi
maranhense são marcadas como centro da festividade junina comemoradas no dia de São
João, além disso, a presença dos tambores e das danças dão oportunidades para as crianças
serem introduzidas no aprendizado dos tambores, afirmada por Railton Teixeira, em suas
memórias:
Já participei de uma festa boa com cantoria nas festas das crianças já teve tambor, tem
criança dessa época que hoje tiveram oportunidade de aprender tocar tambor como eu
aprendi aos 10 anos de idade, e hoje eu quero ter a possibilidade de ensinar as crianças
a tocar tambor nas festas da escola porque a gente vê que as crianças gostam mais
quando tem música quando tem dança (Railton Teixeira, 19 anos, Quilombola,
abatazeiro de tambor-de-mina).
O boi é o primeiro batizado no terreiro de mina, onde vai receber a proteção das
entidades da encantaria. Muitos brincantes de Bumba-Meu-Boi são devotos e
iniciados do Tambor de Mina e participam do folguedo em respeito e em promessa de
suas entidades e guias espirituais. Só após a benção dos Voduns e Encantados é que o
Boi é novamente batizado na Igreja católica. Ainda, o Batismo significa o início de
um ciclo ritual que será repetido todos os anos (FERRARA, 2020, p. 86).
As toadas de tambores das festividade juninas de Imbiral não se difere das festas
populares da região da Baixada como um todo, as caracterizações comuns estão nas
ornamentações dos terreiros, com bandeiras coloridas e roupas confeccionadas com seda,
couro, e chita colorida, acessórios com missangas, e uso de penas, tendo como outro ponto
comum, a forte presença do consumo de bebidas alcoólicas entre os mestres brincantes, e nos
cantos populares da festividade narram a relação do bumba-meu-boi com o São João, vista
nos versos dos cânticos da música popular maranhense do Boi Pindaré:
Mesmo que na realidade local exista uma confluência entre variações de tambores,
há diferenciações entre as práticas do tambor-de-mina e o tambor-de-crioula. Na maioria das
vezes os toques do tambor-de-mina são exercidos dentro do barracão – nos rituais com
incorporações –, os abatazeiros do tambor tocam sentados com a utilização de dois tambores,
já os toques do tambor-de-crioula, não segue a mesma regra, os toques são executados
sempre com a presença de um terceiro tambor, podendo serem tocados em pé, e fora dos ritos
religiosos. Neste sentido, Sérgio Ferreti (2006) os difere da seguinte forma:
Podemos compreender que o tambor-de-mina por ser uma manifestação religiosa das
matas amazônicas do Maranhão, os seus rituais de curas e feitiços, pressupõe que a
pajenlança é um termo “genérico” designado a tudo que foge da medicina ocidental,
entretanto, na realidade estudada, não quer dizer que não tenha de surgido em trocas de
conhecimentos com os povos indígenas, como já foi citado, porém no contexto daquela
localidade maranhense tal particularidade das suas práticas difusas ao tambor-de-mina
oriunda das matrizes africanas (BARROS, 2019), a religiosidade se expande e oferece
conexões entre os seres encantados, a comunidade, os conhecimentos da natureza e a
ancestralidade, assim nesse contexto parece que o tambor-de-mina é um centro dos
conhecimentos e dos valores éticos e filosóficos, culturais e estéticas da comunidade.
66
Clarice Cohn (2000) ao estudar as crianças Xicrin diante de suas análises sobre a
infância na perspectiva antropológica, também possibilitou acompanhar em primeiro plano a
concepção de criança e seu papel na vida social (COHN, 2000), e as formas de aprendizagem
em realidades em que apreender o mundo está ligado a percepção e os sentidos corpóreos.
Desse modo a dedicação antropológica acerca da infância foi, de certa maneira, aprofundado
em diálogos com os estudos do campo da educação. Assim, este tópico evoca pensar a criança
sobre ela mesma diferentemente de teorizar sobre elas.
Para esta realidade, a noção de criança está sob a óptica da comunidade podendo se
diferir do Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) onde define: “a criança
67
como a pessoa até os 12 anos de idade incompletos”, porém, cada cultura e realidade
especifica tem sua concepção de infância (SOUSA, 2017, 226) Assim, a infância não deve ser
definida de modo generalizado para todas as sociedades. Na realidade especifica, a noção do
que é considerado criança está para além dos fatores cronológicos ou biológicos, e sim para os
modos culturais.
Para um melhor detalhamento, a diversidade etária das crianças, foram ideais para
compreender a dinâmica da educação territoriada e tarefas de acordo com as fases da
infância. Diante disso, resolvi categorizar em dois grupos de infância, crianças do “grupo A”
menores de três anos e as crianças do “grupo B” maiores de três anos. Entretanto, já nas
relações de gênero entre meninos e meninas, a distinção de papeis não seguiam um rigor
68
estereotipado, isto é, não foi observado uma separação objetiva nas vivências cotidianas entre
meninos e meninas.
Em termos de escolaridade as crianças do “grupo A”, todas elas estavam com suas
matrículas ativas na escola de Imbiral Cabeça-Branca, algumas ainda iniciando os estudos
escolares, no Maternal I e Maternal II. Já as outras, do “grupo B” estavam matriculadas no
Fundamenta I e Fundamental II.
Diante disso, a observação sobre aquelas crianças que tiveram contato com a rotina
escolar interrompida, também estão inseridas na rotina da educação territoriada. É diante
desse aspecto, que se faz crucial situar a criança e seus conhecimentos advindos de onde
69
Fazendo isso, recusando todas aquelas dicotonomias, os alunos chegariam mais perto
da criança e da compreensão de como ela vive: “ora, se a criança constitui um
momento numa dinâmica de conjunto, é impossível repartir a conduta infantil”. Não
cabem dualismos na construção de uma Psicologia da Criança; o filosofo nos convida
a buscar totalidades. Para ele, a criança vive um corpo “fenomênico e indiviso”. Ela
está “no social e no seu corpo, nos ois meios ao mesmo tempo sem nenhuma
dificuldade” (PONTY 1990, apud. MACHADO, 2010, p. 17).
Por tanto, cabe a reflexão para aquelas crianças diante das dinâmicas do aprendizado
da vida territorial, se tais experiências educativas exige também perguntar se um aprendizado
pelo corpo já referenciado pelo processo do movimento da retomadas da educação
quilombola, daquela realidade, repetem uma definição de “mimese” no aprendizado cultural
tradicional.
É diante disso, que o aspecto descritivo da rotina daquelas crianças redimensiona aos
questionamentos analíticos, entretanto, sem o caráter de teorizar sobre elas, mas refletir as
relações e contextos educacionais entre possibilidades epistemológicas onde o tambor-de-
mina é praticado, nos possibilitando “ler o mundo a partir das lógicas de saberes encantado
ritualizados pelos saberes e as suas performances” (SIMAS et. al, 2018, p. 42-.43).
[...]é porque a benção é mais perto, tá vendo? se tu leva uma pessoa que ele mora em
pinheiro pra ser padrinho e outro em Pedro do rosário, e é padrinho do seu filho, ele
passa 10 anos sem botar benção pro seu filho, e os irmão sendo padrinho dos irmão e
dos filho dos irmão a benção é toda hora. A importância da benção é quando a gente
dá a benção pra uma pessoa a gente tá falando já o nome de Deus. Então é assa
importância que eu dou para um filho[...] Já os pequenininhos é assim, eles vão se
entendendo já respeitando as pessoas...primeiro a gente vai dizendo, esse aqui é teu
tio, este aqui é teu padrinho, este aqui é tua madrinha. A criança miudinha, não sabe
quem é o padrinho dele, porque não foi ele que procurou, se os pais não disser, se não
incentivar ele, ele não toma a benção a ninguém, nem os pai. Porque tem milhares de
pessoas que não toma a benção aos pai. Isso é mais importante do que uma pessoa que
só sabe ler e não sabe lidar com as pessoas (Luís Teixeira, 64 anos, Quilombola e
Educador Tradicional de Imbiral Cabeça-Branca).
Nos relatos das crianças, para elas a prática da proteção na comunidade também é
perpassada pelo Pajé, como “benzenção”, diante das enfermidades que vão surgindo,
principalmente com o “quebrante”, a criança é envolvida nos processos de cura de seus
corpos, tal experiência diante dessa relação “Pajé-bezenção-criança” é, para Gomes e Pereira
(1989): “uma linguagem oro-gestual com a qual algumas pessoas – detentoras de poder
especial – controlam as forças que contrariam a vida harmoniosa do homem é garantir o
funcionamento da normalidade desejada e conter o mal” (GOMES et al, 1989, p.22 ).
Diante disso, outra criança envolvida na pesquisa, relata que tais práticas de cura são
ensinadas nos conteúdos didáticos da escola, tendo como o protagonismo didático da
educadora tradicional Sebastiana Teixeira em diálogo com os conhecimentos do ensino
territoriado. Diante do modo comparativo percebido no relato de Klebenilson, de 09 (nove)
anos, o ensino aplicado referente aos conhecimentos territoriais locais – da educação alargada
vivenciada na comunidade – quando são levados para dentro da escola, o aprendizado para ele
é facilitador para o entendimento da importância dos conhecimentos medicinais nativos.
A aula dela era melhor que dos outros professores, porque nas aulas de ciências ela
dava o caderno e ai ela também ensina, vai ensinando pra gente, por exemplo: tinha
uma aula que ela ensinava como se faz um chá, a gente anotava no caderno, um banho
ou um chá do que a gente quiser, de folha de lima, de casca de laranja, que é pra dor
de barriga, um banho pra pesadelo, e pra febre, a gente pega alfavaca, ou cidreira
também serve, e isso foi ensinado pela minha professora Dona Sebastiana, quando eu
preciso de um chá eu mesmo sei fazer, eu pego a laranja e guardo a casca, ai depois eu
coloco na água pra ferver (Klebenilson, 09 anos, Quilombola e estudante do ensino
fundamental II).
[...] a gente assim, dança o tambor, pega uma saia de chegar até os pés, enquanto tão
batendo o tambor a gente dança, conforme o batuque do tambor, eu danço desde os 10
anos, nas festas tem fogueira bastante, as vezes quando é noite cultural, chega as 6
(seis) horas a gente faz o ritual, janta e vai brincar boiada [...] a boiada é quase do
mesmo jeito, só que a dança é do mesmo jeito. Tem o canto. As que sei de có eu
canto: “quando eu tô de cabeceira, quando eu digo eu vou eu vou, eu vou para o
outro lado...” é assim, quando a gente tá no clima aparece as músicas e a gente não
sabe nem de onde vem [...]antes dessa nova escola, minha vó Sebastiana, ela fazia
assim essas brincadeira do tambor de mina na outra escola, a gente faz festa junina e
bate tambor, ai ela fala das origem dos negros, os direitos dos quilombolas, mas é só
ela que faz essas coisas, outros professores a gente fala eles nem sabem o que que é.
Eles não sabe nem as origens deles mesmos (Dielma, 13 anos, Quilombola,
estudante do fundamental II).
Desenho 1 - Desenho de Dielma (13 anos) na entrevista sobre os rituais religiosos ela optou por desenhar sua
festividade preferida “a festa de tambor” que também integra aos eventos da escola.
72
Outro ponto marcante sobre as festividades do tambor é que Dielson de 11 (onze) anos e
Klebenilson de 09 (nove) anos de idade também conduzem as festividades com seus
instrumentos percussivos – ambos demonstraram os ritmos das toadas que tocam nas culturais
da comunidade e nas festividades juninas da escola –, eles relatam que aprenderam tocar o
tambor médio25 desde os 5 (cinco) anos de idade, juntamente com seus tios e irmãos mais
velhos observando eles tocarem. Diante dos relatos, os meninos criam bastante expectativas
sobre possibilidades de estudarem seus instrumentos dentro dos conteúdos didáticos, tendo
em vista que seus primos, irmãos, e tios mais velhos, aprenderam a tocar e fabricar
artesanalmente seus instrumentos através dos ensinamentos perpassados pelo Pajé Luís
Teixeira.
Eu sei fazer, tocar o meião posso até fazer aqui na cadeira o que já sei tocar, aprendi
com meu pai e com os meninos aí, eu também queria tocar na escola, porque já faço
os ritmos quando tem festa na escola (Dielson, 11 anos, quilombola e estudante do
fundamental II).
Eu já sei tocar tambor também, eu toco o meião, sei fazer os ritmos, nas festas da
escola, eu sei ensinar tambor também do que já sei (Klebenilson, 09 anos,
quilombola e estudante do fundamenta II).
Nesse sentido, tais aspectos foram observados e vivenciados junto com elas – em
momentos da rotina do campo –, uma das crianças maiores do “grupo B”, durante uma trilha
percorrida para o Rio Turiaçu, demonstrou os conhecimento botânico e zoológicos – dois
elementos naturais que compõe o caminho – foram-me, apresentados por elas, mostrando-se
25
O tambor médio é popularmente conhecido como meião entre os membros da comunidade de Imbiral Cabeça-
Branca, tratando-se de um “membranofone com pele única e aberto” (Hornbostel; Sachs, 1914). Possuinte de
formato cilíndrico é feito por madeira, utilizada geralmente do árvore do mucá, a madeira dos instrumentos são
de árvores caídas e são reutilizadas, o couro de modo geral é do boi o fundo do instrumento é aberto, assim
segundo os relatos dos batezeiros do tambor o meião é sempre tocado em conjunto com o tambor grande, e o
crivador (de som mais agudo), ambos produzidos da mesma forma do meião, diferenciando nos tamanhos e na
intensidade do som.
73
assim, uma autonomia por parte das crianças sobre o conhecimento etnobôtanico do ensino
territoriado. Tal conhecimento que é guiando pelos saberes dos encantados do tambor-de-
mina, principalmente sobre a dimensão de cura das matas, são significados por elas, em
sentido de preservação dos biomas, como “morada das encantarias”.
O saber ritual constitui parcela significativa desse saber social prático, que insere as
instituições nos corpos e os habilita a orientar-se em um contexto social. Nos
processos miméticos, o indivíduo adquire as imagens, os esquemas e os movimentos
que lhe darão a capacidade de agir. Na medida em que são orientados para produções
históricas e culturais, cenas, arranjos, representações, os processos miméticos estão
entre os mecanismos mais importantes que garantem a passagem da cultura para a
geração seguinte (WULF, 2016, p.556).
do território percebido por elas, está intrinsicamente relacionado ao seu uso social e criativo,
ou seja, é através das brincadeiras que esse território geográfico adquire novos sentidos diante
de seu uso. Na rotina de campo, essa observação foi percebida acompanhando as crianças
maiores, na fabricação de brinquedos feitos com tabocas, por exemplo, uma espécie de
“espingarda” de brinquedo, utilizando tabocas extraídas dentro do território, porém, distante
de suas unidades habitacionais, alguns locais não muito frequentados pelos adultos.
Sobre minha participação guiada pelas crianças daquela realidade, muitas delas
chegavam de maneira animada e me contavam sobre suas rotinas, foi o caso de dois meninos
do grupo das crianças maiores; ir à roça antes do amanhecer, cuidar do cavalo, guiar canoas e
pescar, são atividades, que de certo modo, são tarefas que dividem junto com seus tutores
adultos – pais, mães e educadores do território –, além disso, um fato curioso, era os
acampamentos que faziam junto com os jovens e seus pais, mães e tios, nos arquipélagos do
Rio Turiaçu. As crianças de todos grupos, encaram essa atividade para além do lazer, mas
como uma maneira de se inserir diante de uma relação significativa com o mundo natural de
seu território.
O reconhecimento das diferentes habilidades das crianças frente aos adultos, assim
como também da autonomia e o potencial de decisão destas nos ajudam a pensar em
outra categoria de infância não mais universal, mas fundamentalmente relacional.
Nessa perspectiva, a infância é concebida como um campo de relações de diferentes
ordens, entre grupos etários e de gênero e também entre instituições (cf. RIFIOTIS et
al. 2021, p.10)
Nas vivências do roçado – roças que estão distribuídas pelo território – é frequentado
por toda a família, de acordo com cada unidade habitacional, homens mulheres e crianças
frequentam as roças, e distribuem as atividades em “limpar, roçar, e coletar”. A participação
das crianças tem importância para o aprendizado do manejo com a terra. Segundo os relatos
75
de Klebenilson (9 anos), ele frequenta as roças desde muito pequeno, ajuda a mãe no roçado
para o plantio da mandioca, segundo ele o roçado consiste em ajudar também o irmão mais
velho, limpando a terra, e juntar o mato, abrir a cova, de modo manual para a subsistência da
família e autoconsumo.
Desenho 2 – Desenho de Klebenilson (9 anos), na entrevista sobre roçado optou fazer um desenho representando
suas vivências na aprendizagem do plantio e da colheita na roça de mandioca.
anos – elas já escolhem o local para construir a própria casa, independentemente de ficarem
adultas ou casarem para sair da casa dos pais, em Imbiral esses fatores não são determinantes
para assumir uma moradia independente, por exemplo, ter a própria roça e fazer o próprio
almoço, são aspectos de uma educação que visa autonomia de seus habitantes.
Nesse sentido, tais observações foram feitas em diversos momentos, alguns deles, às
crianças maiores demonstraram conhecerem localidades do território pelos animais que
habitam determinados pontos daquele ambiente, como lagoas que não se costumam pescarem
ou nadarem por conta das sucuris que costumeiramente habitam naquele determinado ponto,
já nas trilhas do Rio Turiaçu, determinados horários são reconhecidos pelas “cantorias” dos
macacos ou “gritos” dos macacos, que são significados como sinal do escurecer do dia.
CONJUNTO FOTOGRÁFICO II
CAPÍTULO 3
situada não se desprende do mundo global, assim como “não há educação fora das sociedades
humanas e não há homens isolados” (FREIRE, 1979, p. 35).
Nos acessos memorialísticos, foi nessa época que a comunidade passou a reivindicar
uma escola que fosse reconhecida e regulamentada pelo município, entre o ano de 1989 até
1992, foram várias reivindicações ao poder municipal para implementação de uma Unidade
de Ensino dentro da comunidade, tendo como obstáculo a justificativa dada pela
administração pública, que se tratava de poucos alunos para construir uma escola na
comunidade. Ainda nessa época, Sebastiana procurou fazer o curso técnico de magistério, na
localidade de Pacas – situada nas regiões fronteiriças de Pinheiro e Pedro do Rosário –, pois
era uma das exigências do poder municipal.
[...] fiz o curso de pedagógico conclui meu magistério pra eu tá na sala de aula
corretamente, porque aqui não tinha ninguém para ensinar, primeiramente começou os
pais pagando, mas depois pedimos para os governantes e comecei a trabalhar pelo
município, pedíamos desde de 1989, mas sou passada no papel do município desde
1992 (Sebastiana, 56 anos, Educadora Tradicional e Quilombola de Imbiral
Cabeça-Branca).
Entretanto, nunca houve até então uma Unidade Educacional construída pela prefeitura dentro
do território, foi diante disso, que o Pajé Luís e Sebastiana levantaram um barraco de taipa
destinado à escola, embora houvesse esse barraco, era bastante comum o aprendizado
acontecerem nos espaços extra-escolares.
[...] Nos levantamos esse barraco porque a gente precisava de um local para usar um
quadro, guardar papel, eu e Luís a gente levantou um barracão que agora já não tem
mais, mas a gente levantou, a prefeitura nunca se interessou de fazer aqui na
comunidade, ai na época veio um também um professor pra ajudar e a gente até pintou
a escola tudo direitinho, mas era comum também, a gente dava aula ai pelos espaços
até debaixo de árvore também, também era bom! (Sebastiana, 56 anos, Educadora
Tradicional e Quilombola de Imbiral Cabeça-Branca).
Todavia, a gestão da escola nem sempre esteve “nas mãos” dos líderes comunitários,
por se tratar de uma escola regulamentada nos moldes de uma escola formal-regular, a
instituição que leva nome de “Unidade Escolar Boa Esperança”, foi dada pelos gestores
municipais. E muitos professores sempre foram impostos pelo poder municipal. Entretanto,
embora houvesse adversidades, há relatos de profissionais que priorizavam os conhecimentos
26
Em referência ao conceito de não-lugar de Marc Augé (1992) lugares não delimitados, mas sim em
movimentos, no caso a “escola” não se fixa como lugar, mas é uma constância em movimento dentro dos
espaços do território.
83
e suas narrativas orais do Pajé Luís nas aulas de história, por exemplo, era bastante comum
serem conduzidas pelo próprio Pajé.
Já nos relatos do Pajé Luís, tudo que ele ensinava na escola era o ensino territoriado,
o que recai aqui, um encontro de duas formas de ensino-e-aprendizagem em diálogos. Embora
esses relatos retratem o período anterior ao ano de 2012 – referente a data da instituição das
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Quilombola – os saberes locais
estiveram sempre como prioridade dentro das práticas pedagógicas de Sebastiana e do Pajé
Luís.
Antes da Lei 10.639/03 que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-
brasileira e africana, os conteúdos didáticos nos livros escolares, pouco mencionavam a
cultura dos povos tradicionais, principalmente referente aos povos quilombolas, nesse
período, os conflitos eram maiores, segundo os relatos colhidos, as crianças tinham mais
dificuldades no aprendizado com os conteúdos que eram passados pelos professores de fora
da realidade local.
Os professores de fora não sabiam trabalhar com as crianças daqui, aí os meninos não
lembrava desses assuntos dado na sala de aula, já Sebastiana sabia trabalhar de uma
forma que dava para as crianças aprenderem, eu via ela ensinando com as coisas
nossas daqui, uma aula de matemática contando quantos peixes é preciso pescar para
alimentar quatro a seis pessoas, e os meninos iriam saber responder muito mais do que
uma coisa jogada pelos professores que vinham pra cá dar aulas, outra coisa, que tinha
aqui era conflito com a merenda, a prefeitura mandava nescau, e a gente aqui brigava
84
porque esses menino são acostumado com fruta do pé, se a gente passar essas coisas
com muita açúcar dá é dor de barriga, então já teve muito conflito por causa disso,
porque eles queriam uma coisa e nós queríamos outra ( Lilica, 34 anos, Quilombola,
merendeira da escola de Imbiral Cabeça-Branca).
Em meio à isso, a educação que sempre fez parte daquelas vivências cotidianas do
território, parece sempre ter sobreposto como projeto maior de forma natural, como já
mencionado diante dos relatos, a comunidade sempre se identificou como quilombo, a escola
na comunidade começou em um espaço destinado as práticas locais afro-religiosas. Desse
modo, tal consciência, é compreendida como uma necessidade de uma reflexão crítica frente a
educação homogeneizante “para que se construa uma identidade positiva de seu povo”
(SOARES, p.214, 2022).
Durante esse período da pandemia teve muita destruição no território, a gente fica
muito triste, com esses tratores aí, dos fazendeiros, sabe por quê? Porque é assim,
quando destrói a natureza, destrói a gente também, porque a gente vive daqui, e vive
das coisas daqui, das águas, da floresta, dos nossos açaizais, nós fazemos parte de tudo
isso também, então esses tratores não tão tirando só árvores tão matando a gente
também. Essas crianças vão viver de quê, então a gente tem que ensinar e defender o
que é nosso, porque é nossa vida (Genivan, 21 anos, Quilombola e estagiário
docente na escola de Imbiral Cabeça Branca).
87
Nós estamos começando agora, do jeito que a gente sempre quis, antes tinha professor
de fora, agora estamos com todos os professores que são daqui de dentro da
comunidade. Nós entramos pra dentro da escola, porque não dá pra esperar pra
terminar. É ruim ainda. Por causa que o aluno tem que trazer sua própria água, a gente
tem que liberar mais cedo porque ainda não tem cantina pra fazer merenda na escola.
Mas esse ano nós já tivemos muito eventos bons, tivemos a semana dos povos
indígenas, nos citamos que nosso território também já teve aldeia, aprofundamos o
assunto, estamos usando vídeos em sala de aula também. Mas nós também vamos
expandir pra não ficar só em sala de aula, tem que conhecer o território (Sebastiana,
56 anos, Quilombola, Educadora tradicional de Imbiral Cabeça-Branca).
27
O funcionamento das classes em Imbiral Cabeça-Branca são organizadas na junção de várias séries diferentes
unidas na mesma sala de aula, por conta do número pequeno de alunos tal possibilidade é aplicável na realidade
da comunidade quilombola.
89
Um ponto crítico sobre ausência do ensino médio na comunidade, é que para concluir
os estudos, muitos estudantes quilombolas são impulsionados a deslocarem-se para fora do
território em busca de estudos na cidade de Pinheiro – Maranhão, segundo os relatos da
comunidade, a associação está empenhada para implementação do ensino médio dentro do
quilombo. A educadora Sebastiana, relata que muitos jovens procuram sair do quilombo para
concluir os estudos e voltam diferentes, há relatos de jovens que submeteram-se a ficar em
casas de família em troca de serviços doméstico objetivando concluírem seus estudos.
Outro ponto bastante criticado pelas lideranças comunitárias, é quando alguns jovens
ao terminam seus estudos se veem obrigados à venderem suas forças de trabalho às grandes
fazendas da região com pagamentos em formas de diárias, ou firmas da construção civil,
mineradoras, dentre outras atividades industriais, fora do Estado do Maranhão, é neste sentido
que a luta por uma melhor qualificação junto aos conhecimentos territoriais e suas
potencialidades, formam pontos que são refletidos, engajados diante de uma estrutura
dominante.
[...] estou estudando o magistério para trazer para dentro da nova escola os ensinos
locais, do próprio quilombo, sobre a ancestralidade a história que tem do povo daqui
(da época do antigo quilombo de são benedito do céu, das fugas dos escravos, dos
indígenas), e isso pra mim é muito fundamental, estou agora totalmente participando
aqui das aulas dentro do quilombo, porque as pessoas de fora que vem para dentro da
sala de aula nunca ensina o que o quilombo precisa, e por isso, quero passar o
conhecimento contra o racismo, contra o desmatamento, os encantados, que os alunos
tenham o conhecimento de como proteger e sobreviver dentro da natureza, defender o
território (Genivan, 21 anos, quilombola e estagiário docente na escola de Imbiral
Cabeça-Branca).
como atributos das sociedades e trabalha a diferença como fator enriquecedor e integrador”
(SILVA, 2006, p. 146).
Assim, os relatos dos comunitários, reúnem denúncias sobre a escassez nos produtos
naturais daquele ambiente, por este motivo, a comunidade busca através de uma educação
territoriada a recuperação ecológica do território, retomar os espaços de “encolhimento”.
Entretanto é importante ressaltar, que tal impacto na subsistência a comunidade têm sido
assistenciada pelo programa de doação de cestas básicas da Fundação Cultural Palmares
(FCP), além de estarem em processo de titulação pelo Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária (INCRA – MA), o que permitirá retomar grandes áreas que já foram
degradadas.
CONJUNTO
FOTOGRÁFICO III
Sebastiana e seu filho que cursa o ensino fundamental II na escola, demostrando as práticas os conhecimentos
territoriados.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
meio ambiente natural, assim nasce o conceito do ensino territoriado, que naquela realidade
investigada, pareceu fortalecer vínculos intrínsecos entre corpo, ambiente e território. Pois
diante das observações e dos enredos das vozes participativas, a pesquisa procurou investigar
como esse processo educacional acontece na prática e para isso, foi indispensável as vivências
e as observações e participações de campo.
Com isso, alguns desafios são postos e questionáveis na realidade de Imbiral Cabeça-
Branca. Com base no histórico da comunidade, parece que o desinteresse da administração
pública municipal em garantir todo o suporte adequado à escola da comunidade desde a
fundação, possibilitou que o modelo do ensino territoriado, ao longo do tempo, adquirisse o
protagonismo na comunidade e no ensino escolarizado. Porém, tal “desinteresse” do
município, não deve ser romantizada no âmbito do contexto educativo de Imbiral Cabeça-
Branca, pois, embora a educação também se dê nos espaços extra-escolares, o espaço físico
adequado não é dispensável naquela realidade. Tal demora da entrega da escola, têm
impactado na qualidade do funcionamento regular da escola, diante das queixas comuns estão:
(a.) energia elétrica principalmente para o EJA que necessita do turno noturno; (b.) portas e
98
janelas tanto para proteção das chuvas, quanto para proteger os livros do acervo da biblioteca;
(c.) falta de uma cantina e banheiros sanitários.
Para além disso, a formação dos professores é um ponto importante no debate, pois
em média, apenas 2% (dois por cento) dos professores atuantes na escola da comunidade tem
o curso superior na modalidade licenciatura, tal dificuldade de formação superior, está
relacionado com as distâncias das universidades aos territórios quilombolas, pela qual chama-
se atenção para uma necessidade do Estado em oferecer políticas públicas de ensino superior
próximos das comunidades, com diretrizes especificas da realidade dos quilombos, até mesmo
para uma futura implementação do ensino médio na comunidade. Entretanto, os profissionais
da educação, que foram entrevistados demonstraram uma atuação responsável ao modelo do
ensino territoriado, em uma dimensão crítica para uma formação consciente de aprendizagem
e defesa do território para manutenção da vida.
Por conta disso, considero que a pesquisa demonstra na prática o que é o ensino
territoriado diante das observações e dos relatos educacionais dos educadores. Todavia, é
necessária uma convivência mais aprofundada com o próprio tambor-de-mina, principalmente
nas vivências dos rituais festivos religiosos, e o acompanhamento regular das aulas na
comunidade observando como os encantados são abordados em meios as didáticas
educacionais.
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