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IFRJ – Campus Duque de Caxias

Aula de Língua portuguesa


Professora: Monique Inocencio
Turma: MSI 321
Atividade de Interpretação de Texto (Texto Narrativo)

Curioso, a decepção prolongou-se ao livro de


O Coração Roubado Amicis, verdadeira vitrina de qualidades morais dos
(Marcos Rey) alunos de uma classe de escola primária. A história
de um ano letivo coroado de belos gestos. Quem
sabe o autor não conhecesse a fundo seus próprios
Eu cursava o último ano do primário e como já
personagens. Um ingênuo como a nossa professora.
estava com o diplominha garantido, meu pai me deu
Esqueci-o.
um presente muito cobiçado: O coração, famoso
livro do escritor italiano Edmondo de Amicis, best- Passados muitos anos reconheci o retrato de Plínio
seller mundial do gênero infanto-juvenil. Na página num jornal. Advogado, fazia rápida carreira na
de abertura lá estava a dedicatória do velho, com sua Justiça. Recebia cumprimentos. Brrr. Magistrado de
inconfundível caligrafia esparramada. Como todos futuro o tal que furtara meu presente de fim de ano!
os garotos da época, apaixonei-me por aquela obra- Que toldara muito cedo minha crença na
prima e tanto que levava ao grupo escolar da Barra humanidade! Decidi falar a verdade. Caso alguém se
Funda para reler trechos no recreio. referisse a ele, o que passou a acontecer, eu garantia
que se tratava de um ladrão. Se roubava já no curso
Justamente no último dia de aula, o das despedidas,
primário, imaginem agora... Sempre que o rumo de
depois da festinha de formatura, voltei para a classe
uma conversa levava às grandes decepções, aos
a fim de reunir meus cadernos e objetos escolares,
enganos de falsas amizades, eu contava, a quem
antes do adeus. Mas onde estava O coração? Onde?
quisesse ouvir, o episódio do embusteiro do Grupo
Desaparecera. Tremendo choque. Algum colega na
Escolar Conselheiro Antônio Prado, em breve
certa o furtara. Não teria coragem de aparecer em
desembargador ou secretário da Justiça.
casa sem ele. Ia informar à diretoria quando,
passando pelas carteiras, vi a lombada do livro, bem  Não piche assim o homem  advertiu-me
escondido sob uma pasta escolar. Mas... era lá que minha mulher.
se sentava o Plínio, não era? Plínio, o primeiro da  Por que não? É um ladrão!
classe em aplicação e comportamento, o exemplo  Mas quando pegou seu livro era criança.
para todos nós. Inclusive o mais limpinho, o mais  O menino é o pai do homem  rebatia
penteadinho, o mais tudo. Confesso, hesitei. vigorosamente.
Desmascarar um ídolo? Podia ser até que não Plínio fixara-se como um marco para mim. Toda
acreditassem em mim. Muitos invejavam o Plínio. vez que o procedimento de alguém me surpreendia,
Peguei o exemplar e o guardei em minha pasta. a face oculta de uma pessoa era revelada, lembrava-
Caladão. Sem revelar a ninguém o acontecido. me irremediavelmente dele. Limpinho. Penteadinho.
Lembro do abraço que Plínio me deu à saída. E com a mão de gato se apoderando de meu livro.
Parecia estar segurando as lágrimas. Balbuciou Certa vez tomaram sua defesa:  Plínio, um
algumas palavras emocionadas. Mal pude retribuir, ladrão? Calúnia! Retire-se da minha presença!
meus abraços se recusavam a apertar o cínico. Quando o desembargador Plínio já estava
Chegando em casa minha mãe estranhou que eu aposentado, mudei-me para meu endereço atual.
não estivesse muito feliz. Já preocupado com o Durante a mudança alguns livros despencaram de
ginásio? Não, eu amargava minha primeira uma estante improvisada. Um deles O coração, de
decepção. Afinal, Plínio era um colega que Amicis. Saudades. Havia quantos anos não o abria?
devíamos imitar pela vida afora, como costumava Quarenta ou mais? Lembrei a dedicatória de meu
dizer a professora. Seria mais difícil sobreviver sem falecido pai. Ele tinha boa letra. Procurei-a na
o seu exemplo. Por outro lado, considerava se não página de rosto. Não a encontrei. Teria a tinta se
errara em não delatá-lo. “Vocês estão todos apagado? Na página seguinte havia uma dedicatória.
enganados, e a senhora também, sobre o caráter do Mas não reconheci a caligrafia paterna.
Plínio. Ele roubou meu livro. E depois ainda foi me “Ao meu querido filho Plínio, com todo amor e a
abraçar...” carinho de seu pai.”
1. Pode-se dizer que não houve erro de avaliação e concreto  o livro  deixa de ter valor na
em: narrativa.revela, num primeiro momento, uma
(a) “...vi a lombada do livro, bem escondido sob significação mais concreta  o livro , e, num
uma pasta escolar.” nível mais profundo de interpretação, o próprio
(b) “...meus braços se recusavam a abraçar o sentimento do narrador.
cínico.” (c) é apenas uma indicação inicial do autor,
(c) “Vocês estão todos enganados, e a senhora mostrando uma possibilidade interpretativa que
também, sobre o caráter do Plínio.” o texto nega ao a seu final.
(d) “Magistrado de futuro o tal que furtara meu (d) esclarece antecipadamente que, somente após a
presente de fim de ano.” concretização do roubo de um objeto, é que
(e) “Plínio, o primeiro da classe em aplicação e teremos a complicação do enredo da narrativa.
comportamento,...”
6. “Na página de abertura lá estava a dedicatória do
2. O mal-entendido presente no texto originou-se velho,...”
porque: A maneira com que o narrador se refere ao pai
(a) O narrador, na época, era uma criança. denota:
(b) O narrador não considerou a possibilidade de (a) desprezo. (b) respeito. (c) carinho.
existência de um outro livro. (d) formalidade. (e) desrespeito.
(c) Jamais se poderia pensar que Plínio pudesse
roubar o livro. 7. “Não, eu amargava minha primeira decepção.”
(d) O narrador roubou o livro de Plínio. Assinale a alternativa que apresenta um termo com
(e) O único livro encontrado estava escondido. sentido equivalente ao sublinhado acima, sem alterar
o sentido da frase.
3. O que justificaria o fato de o narrador ter pensado (a) aguentava (b) sofria (c) debatia-me
em roubo seria: (d) expressava (e) magoava
(a) ter levado um tremendo choque.
(b) o livro estar escondido entre os pertences de seu 8. “Que toldara muito cedo minha crença na
colega. humanidade!”
(c) o livro ser muito cobiçado pelos garotos da Segundo o texto, em relação à humanidade, a
época. passagem acima deixa clara a ideia de:
(d) o livro ter sumido justo no último dia de aula. (a) otimismo. (b) fé. (c) cinismo.
(e) a dúvida em relação ao caráter de Plínio. (d) pessimismo. (e) ateísmo.

4. “Curioso, a decepção prolongou-se ao livro de 9. “ O menino é o pai do homem  rebatia


Amicis,...” O narrador diz isso porque: vigorosamente.”
(a) queria esquecer o que aconteceu, por isso não Com isso, o narrador quis dizer:
pegou mais o livro. (a) exatamente o que diz o provérbio “filho de
(b) fora Plínio quem, segundo ele, pegara o livro. peixe, peixinho é”.
(c) acreditava que Amicis equivocara-se no (b) que o filho será no futuro o que foi o pai.
julgamento moral de seus personagens. (c) que as aparências enganam, como no caso de
(d) o livro era uma “verdadeira vitrina de Plínio.
qualidades morais”. (d) que a criança revela e essência do que será o
(e) com o passar do tempo, foi deixando de adulto no futuro.
acreditar no autor do livro. (e) que Plínio é como os personagens do livro de
Amicis.
5. O título de um texto deve ser a expressão
sintética do tema a ser tratado. Com relação ao texto 10. Pelo desfecho da crônica, pressupõe-se que:
de referência, pode-se dizer que o título: (a) o narrador não perdoou Plínio.
(a) nos remete exclusivamente ao nome do livro, (b) a dedicatória do pai do narrador alterou-se com
objeto que se torna o centro de toda a tensão o tempo.
criada na narrativa. (c) alguém escreveu outra dedicatória no livro.
(b) indica algo que adquire significado figurado no (d) o narrador percebeu que se equivocara.
contexto, enquanto o seu sentido mais imediato (e) a relação entre Plínio e o narrador se refez.

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