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0121
RESUMO
CONTEXTO: A insónia é prevalente entre estudantes de enfermagem relacionando-se com diversos fatores, sobressaindo a complexidade
e exigências curriculares, sobretudo durante o ensino clínico.
OBJETIVO(S): Determinar a prevalência da insónia dos estudantes da ESSV em ensino clínico; Identificar as variáveis sociodemográficas
e académicas que interferem na insónia dos estudantes da ESSV durante o ensino clínico; Relacionar os estilos de vida, o sistema roulement,
os hábitos de sono e a fadiga crónica com a ocorrência a insónia.
METODOLOGIA: Estudo quantitativo, transversal, descritivo, e analítico-correlacional, realizado numa amostra não probabilística por
conveniência, constituída por 181 estudantes de enfermagem que já realizaram ensino clínico. Aplicou-se um questionário de caraterização
sociodemográfica, questionário de identificação dos estilos de vida dos estudantes e trabalho por turnos; questionário de Sono de Oviedo
(QSO); Índice da Qualidade do Sono de Pittsburgh (IQSP).
RESULTADOS: A insónia associou-se a estilos de vida pouco saudáveis, a estudantes mais velhos, do sexo feminino, residentes no meio
urbano, no 4º ano, a frequentar o 8º semestre, com estatuto trabalhador-estudante, que vivem sozinhos durante o estágio e os que já fizeram
sistema roulement. Das variáveis estudadas as que revelaram significância estatística são a idade, o semestre, a coabitação em tempo de
estágio, os hábitos tabágicos, o consumo de drogas, a presença de televisão/computador no quarto e o sistema roulement.
CONCLUSÃO: Tendo em conta que a prevalência da insónia foi de 22,1% pensamos ser útil dar continuidade a este estudo, com uma
amostra mais dilatada, de forma a não comprometer a validade externa, permitindo a extrapolação dos resultados à população dos estudantes
de enfermagem em ensino clínico.
PALAVRAS-CHAVE: Estudantes de enfermagem; Ensino clínico; Trabalho por turnos; Insónia
1
Mestre em Ciências Sociais; Doutor em Ciências de Enfermagem; Membro do CI&DETS e Professor Adjunto no Instituto Politécnico de Viseu,
agoncalvessv@hotmail.com 2 Mestre em Gestão e Economia da Saúde; Doutora em Ciências da Saúde; Membro do CI&DETS e Prof. Coordenadora no Instituto
Politécnico de Viseu, lcabral@essv.ipv.pt
2
Mestre em Ciências de Enfermagem; Doutor em Ciências da Educação; Membro CI&DETS e Prof. Coordenador no Instituto Politécnico de Viseu, dsilva.essv@gmail.com
3
Doutorada em Ciências da Educação; Professora Coordenadora no Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Saúde, Viseu, Portugal,
claudiachaves21@gmail.com 5 Mestre em Ciências de Enfermagem; Doutor em Saúde Mental; Membro do CI&DETS e Professor Coordenador no Instituto Politécnico de
Viseu, jduarte@essv.ipv.pt Citação: Gonçalves, A. Cabral, L., Silva, D., Chaves, C., e Duarte J. (2016). Insónia nos estudantes de enfermagem em ensino clínico. Revista
Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (Spe. 3), 73-78.
Ratanasiripong (2012), constatou que 33,3% dos e hipersónia segundo os critérios DSM-IV e CID10
estudantes deita-se entre as 00h e a 1h hora, o horário (García et al., 2000). A sua versão final é constituída por
de acordar varia entre 6 horas e as 7 horas e a maioria 15 itens, 13 agrupam-se em três escalas categoriais
(56,7%) demoram mais de 20 minutos para adormecer diagnósticas: satisfação subjectiva do sono (1item),
e 60% têm uma probabilidade elevada de adormecer insónia (9 itens), hipersónia (3 itens). Os dois itens
durante a tarde e ainda que os estudantes de restantes proporcionam informação adicional sobre a
enfermagem dormem menos de 8 horas, apresentando possível existência de parassónias e transtornos do tipo
um sono insuficiente e de baixa qualidade e os que orgânico e sobre o tipo e frequência do uso de qualquer
trabalham no período nocturno (ensinos clínicos) não tipo de ajuda para dormir (fármacos, chás, etc). Todos
dormem mais de 5 horas. os itens são respondidos mediante uma escala tipo
Lickert, excepto o primeiro item (satisfação com o
Os problemas de sono parecem ser comuns em
sono) em que a escala é medida por sete valores (de 1 a
estudantes universitários e os que trabalham à noite
7), em todos as outas escalas temos 5 valores (de 1 a 5)
estão mais expostos ao risco de sonolência durante o dia
que se referem à frequência, tempo e percentagens.
o que favorece a incidência de acidentes de trabalho,
ocorrência de lesões e erros (Bittencourt, Silva, Pires, O estudo psicométrico do Questionário de Sono de
Mello, & Tufik, 2008, cit. por Ferreira e Martino, 2011). Oviedo (QSO) revelou valores de alfa de Cronbach,
razoáveis, oscilando entre 0,686 e 0,760 com um alfa
METODOLOGIA global da escala de 0,730. O coeficiente de bipartição
método das metades ou de split half revela para a
Após revisão e análise de alguma literatura referente à primeira metade um valor de alfa de Cronbach
insónia em estudantes universitários, enunciamos as (α=0,581) e para a segunda um valor ligeiramente mais
seguintes questões de investigação: alto (α=0,622), classificados de razoáveis.
- Que variáveis sociodemográficas e académicas têm
repercussão na insónia dos estudantes de enfermagem? RESULTADOS
- Em que medida os estilos de vida e o sistema
As estatísticas relativas à idade revelam estudantes com
roulement (Trabalho por turnos), predispõem á
idades entre os 18 e os 42 anos, ao que corresponde uma
ocorrência de insónia?
idade média de 22,15 anos ±3,549 dp. Os estudantes do
Trata-se de um estudo quantitativo, transversal,
sexo masculino, apresentam 22,0% da totalidade da
analítico e descritivo-correlacional, numa amostra não
amostra, a idade mínima é de 18 anos e a máxima de 36
probabilística por conveniência constituída por alunos
anos. Para os estudantes do sexo feminino, com uma
da Escola Superior de Saúde de Viseu, que já realizaram
representatividade de 78,0%, a idade mínima é 18 anos
ensino clínico. De um total de 282 estudantes,
e a máxima 42 anos.
responderam ao questionário 211, isto é, 74,81% do
Os rapazes apresentam uma média de idades (M=22,45
inicialmente previsto, sendo excluídos 30 questionários
anos ±3,755 dp) ligeiramente superior á das raparigas
por se encontrarem mal preenchidos ou incompletos. O
(M=22,07 anos ±3,498 dp), sendo as diferenças entre os
que perfaz 181 estudantes na amostra final,
dois grupos estatisticamente significativas (p=.000). A
correspondendo a 64,18% da amostra total.
maioria dos estudantes do sexo masculino, situam-se na
Os instrumentos utilizados para medir as variáveis em
faixa etária dos 21 anos (25,0%), e os do sexo feminino
estudo, foram o Questionário de caracterização
na da faixa etária ≥ 22 anos (80,3%). A maioria dos
sociodemográfica; Questionário de identificação dos
estudantes do sexo masculino, frequentam o 2º ano/4º
semestre do curso de enfermagem, representando Sexo OM UMW p
32,6% da amostra, e os do sexo feminino encontram-se Masculino 90,16
no 4º ano/8º semestre (81,9%) (Tabela 1). 2786,500 .909
Feminino 91,24
Tabela 1 - Caracterização sociodemográfica da
Proveniência OM UMW p
amostra em função do sexo
Sexo Masculino Feminino Total Residuais Rural 88,75
3481,000 .434
Nº % Nº % Nº % Fem. Masc. Urbana 95,11
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Variáveis (40) (22,0) (141) (78,0) (181) (100,0)
De acordo com o teste de variância ANOVA, podemos
Grupo etário
verificar que são os estudantes com idade superior ou
≤ 20 12 22,2 42 77,8 54 29,8 0,0 0,0 igual a 22 anos que apresentaram mais insónia
21 14 25,0 42 75,0 56 30,9 0,6 -0,6
(M=18,88±.4,847dp), seguindo-se os que se situam na
faixa etária dos 21 anos (M=17,41±.5,001dp),
≥ 22 14 19,7 57 80,3 71 39,2 -0,6 0,6
resultando em diferenças estatisticamente significativas
Ano que frequentam
(p=.029). Os resultados mostram também que a média
de insónia mais elevada (M=18,77±.4,996 dp) é a dos
2º ano 14 32,6 29 67,4 43 23,8 1,9 -1,9
estudantes que frequentam o 4º ano, seguindo-se os que
3º ano 13 19,7 53 80,3 66 36,5 -0,6 0,6
estão no 3º ano (M=17,30±.5,434 dp), sem que tenha
4º ano 13 18,1 59 81,9 72 39,8 -1,1 1,1 resultado em diferenças estatisticamente significativas
Semestre (p=.059) (Tabela 3).
Tabela 3 - Análise de variância da insónia em função da idade
4º semestre 14 32,6 29 67,4 43 23,8 1,9 -1,9 Idade Média dp F p
5º semestre 12 28,6 30 71,4 42 23,2 1,2 -1,2 ≤20 anos 16,53 5,083
6º semestre 1 4,2 23 16,3 24 13,3 -2,3 2,3 21 anos 17,41 5,001 3,602 .029
7º semestre 8 24,2 25 75,8 33 18,2 0,3 -0,3 ≥ 22 anos 18,88 4,847
8º semestre 5 12,8 34 87,2 39 21,5 -1,6 1,6 Ano que Média dp F p
frequentam
Estatuto
trabalhadorestudante 2º ano 16,62 4,174
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sono, especialmente durante os ensinos clínicos Verificámos que o sexo, a idade, o ano que frequentam,
(Angelone et al., 2011).Os estudantes com estatuto de o semestre, coabitação em tempo de estágio resultaram
trabalhador estudante revelam mais insónias. Estudos em significância estatística. Nos estilos de vida, os
de (Hales, Gabbard, & Yudofsky, 2012) mostram dados estudantes que têm por hábito consumir bebidas
semelhantes. Os estudantes que vivem sozinhos durante alcoólicas, sair à noite, terem hábitos tabágicos,
o ensino clinico revelam mais insónias quando consumir drogas, não praticar desporto, possuírem
comparados com os que residem com familiares, talvez televisão/computador no seu quarto, são os que
e de acordo com Alves (2010), estes tenham melhores revelaram mais insónia.
condições de assistência e atenção no atendimento das
suas necessidades. Procurámos estudar em que medida IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA CLÍNICA
os estilos de vida, o sistema roulement e os hábitos de
sono predispõem á ocorrência de insónia, tendo-se Face a estes resultados, consideramos necessária uma
verificado que os estudantes que têm por hábito beber maior sensibilização dos estudantes, sobretudo os que
café, bebidas alcoólicas, com saídas nocturnas, têm se encontram em ensino clínico, para a prática de uma
hábitos tabágicos, consomem drogas, não praticam boa higiene do sono.
desporto, possuem televisão/computador no seu quarto,
são os revelaram mais insónias. Deste modo, podemos REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
inferir que os estilos de vida pouco saudáveis, conforme Alves, E. F. (2010). Qualidade de vida de estudantes de
salientam (Cardoso, Santos, & Berardinelli, 2009), enfermagem de uma faculdade privada. Revista
podem apresentar sintomas que variam desde Brasileira de Qualidade de Vida, 2(1), 23-30.
irritabilidade até à insónia, entre outras manifestações
mais severas. Os estudantes que referem já ter feito Ancoli-Israel, S., Bliwise, D., & Norgoard, J. (2011).
sistema roulement são os que apresentam níveis mais The effect of nocturia on sleep. Sleep Medicine
elevados de insónia, com diferenças estatisticamente Reviews, 15(2), 91-97. doi:
significativas entre o sistema roulement e as insónias. 10.1016/j.smrv.2010.03.002 Angelone A., Mattei, A.,
Estes resultados corroboram os de Ferreira et al., Sbarbati, F., DiOrio, F. (2011). Prevalence and
(2011), em que a irregularidade dos padrões de sono dos correlates for self-reported sleep problems among
estudantes de enfermagem, sujeitos ao sistema nursing students. Journal of Preventive Medicine and
roulement, resulta em menor qualidade do sono, e Hygiene, 52(4), 201-208. Acedido em
consequentemente em insónias, com possível privação http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22442926
crónica do sono, podendo limitar de forma significativa Araújo, C. L. O., Frazili, R. T. V., & Almeida, E. C.
a sua qualidade de vida. (2011). Influência do Sono nas Atividades Acadêmicas
dos Graduandos de Enfermagem que Trabalham na
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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, ESPECIAL 3 (ABR.,2016) | 78