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UFF- UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA - PPGA

Disciplina: Antropologia Contemporânea

Professora: Delma Pessanha

Aluna: Dandara Santos

Ensaio – Cap. 1 Dramas sociais e metáforas rituais (Victor Turner)

É possível depreender que o ritual, e especificamente o simbolismo ritual, é o fio


condutor da obra de Victor Turner. No entanto no capítulo introdutório de “Dramas, campos e
metáforas” ([1974]) Turner define seus objetivos delimitados à explicação e demonstração da
construção de conceitos relevantes a sua produção intelectual, no capítulo que se apresenta o
autor discute tópicos importantes de seu campo de estudo as relações entre drama social,
análise processual, antiestrutura – e seus princípios internos communitas e liminaridade – e
estrutura, tudo isso para investigar como a semântica dos símbolos rituais instigam a ação
social. É um ponto de partida para o autor de que o símbolos culturais e rituais são a origem
da mudança social e não produto delas. Dessa forma todos os conceitos desenvolvidos ao
longo das páginas de argumentação lidas dão suporte teórico a seu estudo da semântica
simbólica.

Em relação às demonstrações a pesquisa etnográfica feita anteriormente através dos


trabalhos de campo na década de de 1950 com os Ndembu o abastece de muitas observações e
é fonte de dados para muitos de seus trabalhos posteriores e não é diferente nessa obra. A
pesquisa permite não só desenvolver o campo da observação da semântica dos signos rituais,
já que os Ndembu ritualizam o tempo todo a vida na aldeia, mas também permite a Turner o
diálogo com outros temas a partir desse material. Um exemplo é o próprio desenvolvimento
teórico sobre os conflitos, que será comentado mais adiante no ensaio.

Para iniciar o fio da sua argumentação Turner adentra a discussão das metáforas
observando e sinalizando o cuidado ao uso delas, para não promover ilusões, o autor inaugura
esse momento com crítica ao estrutural-funcionalismo e a Radcliffe-Brown que na definição
da estrutura social se vale de metáforas do campo das ciências da natureza em específico da
biologia. O estudo da estrutura e funções sociais é feito por Radcliffe-Brown através das
comparações e analogias de processos e estruturas oriundos das ciências naturais, ele acredita
inclusive que a antropologia social é um ramo das ciências da natureza. O autor em referência
ao estrutural funcionalismo afirmou que as estruturas sociais só podem ser observadas e
analisadas através de seu funcionamento, que são as atividades sociais, e dessa forma deriva-
se que as atividades sociais são o garantidor de continuidade e manutenção, já que exercem as
funções que contribuem a todo o sistema, isto é a estrutura (RADCLIFFE-BROWN,1973). O
contraponto tecido por Victor Turner é feito diante da crítica ao pensamento estrutural
funcionalista haver uma compreensão –através das estruturas - estática da sociedade, e
também em como a metáfora está sendo utilizada e não ao uso das mesmas, ele chama
atenção ao perigo do uso das metáforas ao gerar ilusões e enganos. Já que o uso das metáforas
compara, aproxima mundos e produz elaborações, que podem ser equivocadas ou não
funcionarem para um objetivo, e, dessa forma não se pretende negar esse recurso de
linguagem e de cognição, o próprio autor exalta sua potência visto que ele mesmo se vale da
linguagem metafórica para construir suas costuras intelectuais. Nesse momento, Turner vai
dialogar com Nisbet (1969) e com Black e Pepper através da afirmação que “Sistemas
filosóficos complexos podem nascer de premissas metafóricas”. Turner ao dialogar com
Audrey Richards (1939) na compreensão dos sentidos e usos da metáfora, se vale da
observação que a autora faz de que a metáfora é a construção interativa em que dois
pensamentos interagem, com Max Black (1962) define que é a interação de dois sistemas em
que há a definição de um subsidiário cujo o sistema de “implicações associadas” é aplicado ao
sujeito principal, assim interagem dois sistemas distintos.

A dinâmica social em Victor Turner é construída por instabilidades, crises, encontros,


forças políticas em assimetria, reintegrações assim o autor considera a dinâmica social como
uma unidade analítica e cria a sua metáfora para analisá-la, o drama social. Essa construção
teórica é influenciada pelo trabalho de Florian Znaniecki (1936) que aborda a relevância de
achar o “coeficiente humanístico” nas pesquisas sociológicas, Turner procura este princípio a
partir da sua pesquisa empírica com os Ndembu. O autor através de seu campo observa que a
sociedade Ndembu tem uma recorrência de eventos conflituosos nas relações sociais,e que
esses momentos fazem parte da dinâmica social, o conflito assim é apreendido como parte
inerente da organização social, como mecanismo social integrador, e potencial revelador de
aspectos fundamentais da sociedade. Estes eventos de conflito foram caracterizados por
Turner como dramas sociais , já que são situações que impelem a tomada de decisões de
rupturas sociais com ênfase na lealdade e na obrigação a natureza processual do drama
também é ressaltada pelo autor, os dramas sociais são unidades do processo social, são assim
tidas por representarem um série de eventos sociais e no pensamento de Victor Turner é
expressa pela formulação de uma ordem de como as fases ocorrem nesse sistema, ou de
acordo com a metáfora teatral acionada pelo autor os atos dos dramas sociais, já que cada uma
dessas etapas está associada a uma retórica específica.

As quatro fases do drama social se referem a (1) ruptura, um momento de estopim


simbólico, momento de confronto que representa uma violência dramática por uma
coletividade ou em nome de outros indivíduos, ou seja, não tem caráter egoísta; (2) crise, é a
expansão da ruptura, quando ela se define e se torna pública, é a constituição do drama
público, há a presença de características liminares entres as fases do processo social ; (3) ação
corretiva, o primeiro movimento para reaver e reestabelecer a estrutura abalada, atenção às
técnicas pragmáticas e simbólicas, a falha na correção reestabelece um cenário de crise (4)
reintegração, marcada por atos de reconhecimento e legitimação, de reconciliação ou
mudanças da estrutura do campo, de relações.

A investigação dos dramas sociais permite uma análise de momentos de etapas da


organização social, revelando uma visão processual da sociedade. Assim como Balandier, em
Antropologia Política (1967), que tem a pretensão de construção do projeto da antropologia
política, e nessa busca seus questionamentos o levam a compreensão da amplitude da
discussão do político, entende que relações políticas se fazem presente onde há relações de
assimetria, hierarquização, desigualdade, entre grupos e pessoas, ou seja, inserindo o
pensamento de Turner nesse diálogo seria onde tem estrutura. Em Balandier toda a discussão
está orientada na criação de um pensamento que possa apreender a dinâmica das estruturas e
das relações sociais que consideram os movimentos inerentes a todas as sociedades, em que
visava a criação da Teoria Dinamistas dos Sistemas. Turner leva a discussão além das
estruturas, para ele também é relevante desenvolver sobre a antiestrutura que se caracteriza
por estar associada a razões integradores de sistemas e subsistemas, a ideia é que a integração
ocorre por um fundamento comum. Nesse sentido, Turner argumenta a luz do princípio de
communitas, o situa pertencente ao campo da antiestrutura, que revela estruturas
relativamente indiferenciadas, se compara ao pajñã a força integradora, a maior unidade de
Suzuki (1967). Outro componente da antiestrutura é a liminaridade que é entendida como uma
fase intermediária dos ritos de passagem, a fase de mudança de status-social, como um
momento de condição de produção de metáforas-radicais. Já a estrutura, não situada em um
diametralmente oposto da antiestrutura, organiza as pessoas em distintos níveis, é o princípio
diferenciador, criador de assimetria e desigualdades. É importante ressaltar que antiestrutura e
estrutura não fundam dicotomias e antagonismos, ambas são partes integrantes de um todo,
um começa onde o outro termina, e a própria estrutura, como argumenta o autor, pode ser
considerada um artefato da antiestrutura já que um pressuposto a criação de uma estrutura
diferenciada é a não existência dessas distinções e racionalidades, o que caracteriza a
antiestrutura. Turner desenvolve ao longo de seu texto argumentos e conceitos que sustentam
a visão processual da sociedade, o processualismo ressalta a dinâmica dos processos sociais e
em seu trabalho desenvolve categorias e ideias que deem conta dos movimentos internos das
organizações sociais.

REFERÊNCIAS

BALANDIER, G.1969. Antropologia Política. São Paulo: DIFEL: EDUSP.

BLACK, Max. Models and metaphors: studies and language and philosophy. Itahaca,
Corner University Press, 1962
RICHARDS, Audrey. Land labour and diet in Northern Rodhesia. Oxford: Oxford
University Press, 1939.

PEPPER, Stephen C. World hyphotesis. Berkley: University of California Press, 1942.

SUZUKI, D. T. Interpretation of Zen Experience. In: MOORE, Charles 1967. The


japanese mind: essentials of japanese philosophy and culture. Honolulu, East- West
Press, 1967

ZNANIECKI, F. The method of sociology. Nova York: Farrar and Rinehart, 1936.

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