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Prática Pedagógica
Interdisciplinar:
Teoria Literária
Profª. Drª. Bruna Carolina de Almeida Salles
Profª. Drª. Karla Menezes Lopes Niels
PRÁTICA PEDAGÓGICA
INTERDISCIPLINAR:
TEORIA LITERÁRIA -
TOMO I
1
FACULDADE ÚNICA EDITORIAL
Este livro ou parte dele não podem ser reproduzidos por qualquer meio sem Autoriza-
ção escrita do Editor.
Ficha catalográfica elaborada pela bibliotecária Melina Lacerda Vaz CRB – 6/2920.
1
PRÁTICA PEDAGÓGICA
INTERDISCIPLINAR: TEORIA
LITERÁRIA - TOMO I
1° edição
Ipatinga, MG
Faculdade Única
2021
2
LEGENDA DE
Ícones
Com o intuito de facilitar o seu estudo e uma melhor compreensão do
conteúdo aplicado ao longo do livro didático, você irá encontrar ícones
ao lado dos textos. Eles são para chamar a sua atenção para determinado
trecho do conteúdo, cada um com uma função específica, mostradas a
seguir:
FIQUE ATENTO
São os conceitos, definições ou afirmações importantes
aos quais você precisa ficar atento.
VAMOS PENSAR?
Espaço para reflexão sobre questões citadas em cada unidade,
associando-os a suas ações.
FIXANDO O CONTEÚDO
Atividades de multipla escolha para ajudar na fixação dos
conteúdos abordados no livro.
GLOSSÁRIO
Apresentação dos significados de um determinado termo ou
palavras mostradas no decorrer do livro.
4
SUMÁRIO O QUE É TEORIA?
UNIDADE 1
1.1 Introdução .........................................................................................................................................................................................8
1.2 Do senso comum ao conceito ............................................................................................................................................8
1.3 Estudos literários antes da teoria .....................................................................................................................................11
1.4 Nasce a teoria ...............................................................................................................................................................................12
FIXANDO O CONTEÚDO ..............................................................................................................................................................16
UNIDADE 2
MAS, O QUE É LITERATURA?
2.1 Introdução .....................................................................................................................................................................................20
2.2 “Em busca do Santo Graal” ou por um conceito de literatura .................................................................20
2.3 Das características da literatura ou da literariedade ......................................................................................22
2.4 Das muitas funções da literatura .................................................................................................................................24
FIXANDO O CONTEÚDO .............................................................................................................................................................27
UNIDADE 3
A ARTE IMITA A VIDA?
3.1 Introdução .....................................................................................................................................................................................34
3.2 Platão e o mito da caverna ...............................................................................................................................................34
3.3 As formas e o mito da caverna .......................................................................................................................................34
3.4 A mimeses platônica .............................................................................................................................................................36
FIXANDO O CONTEÚDO..............................................................................................................................................................38
UNIDADE 4
LITERATURA: A ARTE DAS PAIXÕES?
4.1 Introdução .....................................................................................................................................................................................43
4.2 Da poética aristotélica e outras poéticas ................................................................................................................43
4.3 Das paixões humans à catarse ......................................................................................................................................45
FIXANDO O CONTEÚDO ............................................................................................................................................................48
UNIDADE 5
PERIODIZAÇÃO LITERÁRIA E FORMAÇÃO DO CÂNONE
5.1 Introdução .....................................................................................................................................................................................54
5.2 Por uma história da história .............................................................................................................................................54
5.3 Como se contrói um cânone?...........................................................................................................................................56
5.4 Todo cânone precisa de revisão? ..................................................................................................................................56
FIXANDO O CONTEÚDO .............................................................................................................................................................59
UNIDADE 6
DE NOVO, A TEORIA: CONCORRENTES
6.1 Introdução .....................................................................................................................................................................................65
6.2 Formalismo russo e estruturalismo ............................................................................................................................65
6.3 New Cristicism e New Historicism ...............................................................................................................................67
6.4 Teoria do efeito estético e Teoria da interpretação ..........................................................................................68
6.5 “De se fazer muitos livros não há fim” ou das muitas teorias ....................................................................71
FIXANDO O CONTEÚDO .............................................................................................................................................................73
5
UNIDADE 1
Na unidade I, falaremos sobre o que é a Teoria da Literatura, sua origem, trajetória
e fundamentos. Antes distinguiremos senso comum de conceito e juízo de valor,
CONFIRA NO LIVRO
UNIDADE 2
Na unidade II, abordaremos uma questão que é bastante complexa para os Estudos
Literários e, por conseguinte, para a Teoria da Literatura, a saber, a definição de seu
objeto, a Literatura: O que é Literatura?
UNIDADE 3
Na Unidade III, discorreremos sobre os conceitos de mimeses e verossimilhança
- conceitos essenciais para a Teoria da Literatura e para os Estudos Literários -, a
partir da República, de Platão e do mito da caverna.
UNIDADE 4
Na Unidade IV, consideraremos a visão de Aristóteles, e de outros autores, a respeito
dos conceitos de mimeses e de verossimilhança. Falaremos também sobre os
conceitos de peripécia e catarse, conceitos também imprescindíveis.
UNIDADE 5
Na unidade V, adentraremos o terreno da historiografia literária, ao falarmos sobre
a periodização da literatura, sobre a formação das escolas literárias e sobre as
escolhas que possibilitam a formação de um cânone literário.
UNIDADE 6
Na unidade VI, fechamos o ciclo desta disciplina, ao retornar à abordagem histórica
dessa iniciada na Unidade 01, a fim de comentar as principais correntes teóricas da
Teoria da Literatura.
6
01
O QUE É TEORIA? UNIDADE
7
1.1 INTRODUÇÃO
8
Figura 1: Immanuel Kant
Disponível em: https://bit.ly/3wVnGK6. Acesso em: 09 abr. 2021.
De fato, o senso comum é aquilo que nos permite apreender o real através de um
conhecimento historicamente compartilhado, mas quando começamos a refletir sobre o
real (ou parte dele), como o surgimento do universo, ou o início da vida, por exemplo, co-
meçamos formular ideias, isto é, teorias e conceitos que validem ou modifiquem nosso
conhecimento de mundo.
Portanto, é a reflexão sobre um objeto que nos permite formular teorias sobre ele e,
por conseguinte, engendrar conceitos a seu respeito. Dentro desse contexto, o conceito
aparece como resultado de um esforço que produz ideias, valores e conhecimentos par-
tindo de uma perspectiva formal, objetiva, institucionalizada e metódica, resultado de um
trabalho que deriva em um aprendizado que, no que lhe concerne, advém de uma obser-
vação analítica sobre o real, para além do que o senso comum oferece, que questiona e
problematiza as ideias concebidas usualmente pelo senso comum. Logo, podemos afir-
mar que o conceito é um modo de retorno ao que nos é apresentado, ao que está diante
de nós e nos provoca a assimilá-lo.
Com isso, entendemos que senso comum e conceito são termos que, utilizados em
determinados momentos, podem expressar uma objeção entre ideias adquiridas acritica-
mente e ideias que são resultado de um pensamento crítico. Entretanto, quando refleti-
mos analítica e criticamente sobre a expressão senso comum, também podemos evoluir
para um conceito de senso comum. Da mesma maneira, o senso comum pode ser confir-
mado pelo conceito ou até servir de base primária para a produção do conceito.
Sobre a relação entre o senso comum e os conceitos gerados pela teoria é pertinente
trazer a lume o que afirmou Compagnon (1999, p. 17-18)a respeito:
Os paradigmas não morrem nunca, juntam-se uns aos
outros, coexistem mais ou menos pacificamente e jo-
gam indefinidamente com as noções – noções que per-
tencem à linguagem popular [...]. É sempre pertinente
parir das noções populares que a teoria quis anular, as
mesmas que voltaram quando a teoria se enfraqueceu,
a fim de não só de rever as respostas opositivas que ela
9
propôs, mas também tentar compreender porque essas
respostas não resolveram de uma vez por todas as velhas
perguntas.
FIQUE ATENTO
Senso significa faculdade de julgar, de sentir, de apreciar; de perceber, isto é, emitir julga-
mentos, juízos. Portanto, senso comum é um sentimento (ou juízo) partilhado pelos indivídu-
os de uma dada sociedade. Já o juízo de gosto, segundo Kant, é “uma representação intuitiva
singular referida ao sentimento de prazer” (KANT, p. 340) ao qual podemos conferir um valor
positivo ou negativo, daí a expressão juízo de valor.
FIQUE ATENTO
“O juízo estético, de caráter reflexionante, relaciona a faculdade da imaginação [...] ao modo
de disposição do ânimo do sujeito diante do qual o objeto se apresenta. Ou seja, o juízo esté-
tico não se refere em absoluto ao objeto, nem mediata, nem imediatamente; mas, sim, à dis-
posição de ânimo do sujeito. É somente a partir dessa primeira determinação que é possível
afirmar o caráter desinteressado do juízo estético, pois o seu fundamento de determinação
reside puramente no modo como as faculdades de conhecimento do sujeito funcionam dian-
te de certos objetos quando tidos como belos” (BAPTISTA, 2010).
VAMOS PENSAR?
Se teorizar é uma maneira de pensar e refletir sobre um objeto de forma a gerar conceitos so-
bre ele, a Teria da Literatura, assim como as outras disciplinas que se ocupam do fazer literá-
rio, implica em uma forma de pensar a produção literária. Há, no entanto, duas maneiras nas
quais podemos pensar sobre um objeto; uma de forma prescritiva e normativa; e outra de des-
critiva e reflexiva. Pense agora nas práticas literárias que conhece e pense em que situações
o crítico e/ou o teórico de literatura pode apresentar uma atitude normativa ou uma atitude
descritiva. A crítica jornalística, é descritiva ou normativa? O resumo que você lê na contra-
capa ou na orelha de um livro que deseja comprar, é descritivo ou normativo? Por fim, pense,
uma aula de literatura deve ser descritiva ou normativa ou conjugar ambas as modalidades?
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1.3 ESTUDOS LITERÁRIOS ANTES DA TEORIA
Antes de haver a escrita, já havia a Literatura. Desde sempre o homem não apenas
narra seus feitos, derrotas e vitórias, como fabula sobre aquilo que o real não dá conta. De
imagens rupestres à contação de histórias ao redor da fogueira, a Literatura acompanha a
humanidade e sua necessidade de criar e recriar o real. Se há um objeto, então, há como
teorizá-lo. Será, então, a Teoria tão antiga quanto o seu objeto?
A resposta é não. Se a necessidade de fabulação humana remonta a tempos imemo-
riais, a necessidade de estudar os produtos desta fabulação é deveras recente. Mas ainda
assim, não tão recente quanto é a Teoria da Literatura.
Quando falamos em cultura literatura ocidental sempre retroagimos a Grécia antiga.
Da mesma maneira, ao falarmos sobre estudos literários, é preciso retroagir à Antiguidade
Clássica, aos estudos da Retórica (mais tarde na Idade Média sob o nome Eloquência) e
da Poética, disciplinas que até o século XIX ocuparam-se, digamos, dos estudos literários.
A primeira promovia uma profunda reflexão sobre a linguagem; a segunda, origina-se em
obras que podemos chamar fundadoras como a Poética, de Aristóteles, a Ars poetica, de
Horácio, e o Sobre o sublime, de Longino, e preocupava-se sobremaneira com da arte li-
terária, em que predominavam, conforme pontua Souza (2018, p. 18)uma “atitude norma-
tiva” frente ao texto literário, isto é, “que diz como a literatura deve ser e como precisa ser
julgada”.
Do Século I a.C. até século XV d.C, os estudos da Poética aparecem amalgamados
aos estudos da Retórica, como se uma disciplina tivesse absorvido a outra. Será apenas
no século XV que dando origem às artes poéticas do Classicismo europeu moderno, ela
ressurge, mas por pouco tempo, pois cederá lugar para outra disciplina no século XVIII, a
Estética; esta menos normativa que a Poética e mais descritiva, marcada portanto pela
sensibilidade, pelo gosto e pela fruição. Cumpre ressaltar que a despeito dos momentos
de aparente ausência da Poética, essa nos legou conceitos e noções chave para os estudos
literários e para a Teoria da Literatura .
A partir do século XVIII, com o Iluminismo, surgem novas formas de se ver e entender
o mundo. Com isso mudam-se as relações sociais, assim como as relações com a ciência
e com as artes. Nesse momento, no que diz respeito à Literatura, a Europa verá nascer e
crescer um sistema literário com o surgimento do gênero romance, cujo sucesso suplanta
o épico, bem como de um mercado livreiro. Esse sistema engendra então o surgimento de
um novo fazer ligado às artes literárias, a crítica literária. Um fazer que se ligara sobretudo
aos novos meios de comunicação, como o jornal, e o surgimento dos salões e dos cafés
(sobretudo na França), que influirão sobre uma nova ideia de literatura e fazer literário.
Cabe lembrar que antes deste momento, em especial na Idade Média, os textos literários
eram aqueles destinados a uma atuação performática (ZUMTHOR, 1997), o que se distancia
pragmaticamente da ideia de circulação e recepção de texto que há nesse momento.
Desse cadinho emerge então a discussão que é possível se verificar em Descartes e
depois em Kant sobre razão e sensibilidade. Nesse respeito, a filosofia kantiana se tornará
crucial para os Estudos Literários (e, por conseguinte, para Teoria da Literatura ainda a nas-
cer), ao estabelecer a diferenciação entre o conhecimento racional e o estético. No que diz
respeito ao belo, o juízo desse não seria aquele que passa pela razão, mas pela sensibilida-
de. Para ele se o gosto é particular e subjetivo não haveria como determinar o que é ou não
literário, o que é ou não poético.
11
FIQUE ATENTO
A filosofia kantiniana é decisiva no século XVII, pois foi um divisor de águas ao estabelecer
condições para a diferenciação entre o conhecimento racional e o estético, este último rela-
cionado às Artes.
12
prática literária) é imperativo trazer a lume um comentário de Souza (2018, p. 32):
A crítica dita científica, no século XIX, buscou apoios con-
ceituais na história, na sociologia, na psicologia, ao passo
que, no século XX, aproximou-se da linguística, da antro-
pologia, da psicanálise. Por outro lado, institucionalizou-
-se na universidade, enquanto sua vertente conhecida
como impressionismo (ou crítica impressionista) elegeu
jornais e revistas como espaço para suas manifestações.
A crítica literária, por seu turno, no âmbito acadêmico,
passou a ser empregada no século XX ora para designar
o estudo analítico dos textos específicos (no sentido, pois,
de análise literária), ora como sinônimo de teoria da lite-
ratura, neste último caso, ao que parece, por influência de
sua acepção usual em língua inglesa.
13
cado acerca da Teoria da Literatura, pois passa-se a compreendê-la como “a disciplina que
trata das questões literárias em geral” (SOUZA, 2018, p. 24)que abarcaria todas as outras
sob suas asas. Entendimento que segundo Souza, desconhece a “especificidade histórica
da teoria da literatura quanto das demais disciplinas” (SOUZA, 2018, p. 25) que se ocupam
do literário. A Teoria, portanto, seria a disciplina que se ocupa sobremaneira com a investi-
gação dos princípios gerais, científicos e filosóficos, da literatura enquanto área do conhe-
cimento, isto é, enquanto ciência.
FIQUE ATENTO
Teoria da Literatura é tanto uma área do conhecimento quanto uma disciplina universitária,
que compõe os chamados Estudos Literários. Surge e se estabelece como disciplina em me-
ados do século XX com a publicação do manual homônimo de Warren e Wellek. No Brasil, a
área integrará o curso de Letras apenas na década de 1960, na Universidade de São Paulo,
por iniciativa de Antonio Candido.
GLOSSÁRIO
Conceito: Resultado de um processo de estudo analítico e metodológico acerca de um objeto.
A criação de um conceito requer, portanto, um estudo científico acerca do objeto estudado.
Crítica: Do grego krinein, significa diferenciar, realçar, julgar. Tecer uma crítica, portanto, se-
ria emitir um juízo de valor sobre algo. Nesse respeito, a crítica literária ocupa-se em julgar
as obras literárias sincronicamente tomando por base seu contexto de produção, sobretudo,
quando se trata de uma crítica não acadêmica, como a jornalista.
Estética: Disciplina que surge com a publicação homônima inacabada de Alexander Gottlieb
Baumgarten (1714-1762). Essa representava um estudo epistemológico sobre a ciência das
sensações ou o conhecimento do mundo sensível.
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Juízo de gosto (ou valor): Julgamento que se emite a partir de percepções individuais sobre
determinado objeto que não passaria pela razão, mas pela sensibilidade.
Retórica: Disciplina da Antiguidade Clássica que se ocupou do estudo das técnicas de orató-
ria. Com o passar do tempo, a retórica também de ocuparia da linguagem escrita, tanto que
nos legou o que hoje chamamos de figuras de linguagem.
Senso Comum: Conjuntos de ideias e valores acerca do real partilhados por indivíduos de
dada sociedade sem a necessária comprovação científica dos fatos.
Teoria: Conjunto de ideias ou conceitos que pretendem explicar fatos ou objetos e embasam
uma ciência.
Teoria da Literatura: Disciplina moderna que se ocupa do estudo não apenas do texto literá-
rio autorreferente, mas das diversas teorias que servem ao seu estudo.
Teoria Literária: Noção que se distingue da disciplina Teoria da Literatura. O texto literário
pode ser estudado por diversos vieses, isto é, por teorias, por exemplo, teoria pós-colonial, te-
oria decolonial, teoria marxista, teoria queer etc.
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FIXANDO O CONTEÚDO
1. (Enade 2014)
Não sendo um meio de conhecimento ou informação, a literatura expeliu de seu âmbito o jornalismo,
a história, a filosofia. Para a poética neoclássica, os gêneros literários eram todas as manifestações
da atividade intelectual, possuíam um sentido amplo e sua classificação era exaustiva. Mas, a
duras penas, a literatura libertou-se das outras atividades. E isso depois que a ciência estética,
a partir do Século XVIII, se desenvolveu, passando pela polêmica romântica acerca dos gêneros
literários e pelas restrições de Croce. Em nosso tempo, as teorias poéticas, não aceitando, embora,
o negativismo croceano, tampouco se deixaram reverter à tradição neoclássica. Repelem, pois, o
sentido lato, amplo, reduzindo os gêneros literários àqueles de cunho estritamente literário, isto é,
os gêneros narrativos da ficção e epopeia, os gêneros dramáticos, líricos e ensaísticos, fechando
a porta a tudo o mais que não seja produto da imaginação e vise objetivos de conhecimento,
investigação, informação, análise.
COUTINHO, A. Notas de teoria literária. Rio de Janeiro: Vozes, 2008, p.92 (adaptado).
A partir da relação entre crítica literária e literatura estabelecida no texto acima, avalie as
afirmações a seguir:
a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) I e III, apenas.
d) II e III, apenas.
e) I, II e III.
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c) conjunto de ideias e valores compartilhados por uma parcela de membros de uma
comunidade acriticamente.
d) conjunto de ideias e valores compartilhados por uma parcela de membros de uma
comunidade criticamente.
e) conjunto de ideias e valores compartilhados pelos membros de uma comunidade sem
aprofundamento crítico e/ou teórico.
a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) I e III, apenas.
d) II e III, apenas.
e) I, II e III.
4. Eis o grande problema a ser solucionado pela Theory tal como formulado logo no
início do livro por Wellek e Warren [...] avulta bem entendido, em vista de certo imperativo
enunciado de antemão pelos autores: o da cientificidade ou racionalidade no estudo da
literatura. Sim, pois se a atividade literária em si mesma “é criadora, uma arte”, ponderam
os autores, o estudo literário, por sua vez, “se não precisamente uma ciência, é uma espécie
de conhecimento ou saber”.
ARAÚJO, N. Teoria da Literatura e história da crítica: momentos decisivos. Rio de Janeiro: Eduerj, 2020.
Segundo Wellek e Warren, não o autor não é um gênio, no sentido atribuído pelos
românticos. Nesse respeito, a linguagem poética surge
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c) da cópia consciente de modelos autorais de outras épocas.
d) de seguir preceitos normativos de modelos autorais do passado.
e) da paródia e do pastiche dos modelos autorais de sua época.
6. O estudo de um texto literário pode ser dar a partir de diferentes abordagens, histórica,
sociológica, antropológica, psicanalítica etc. Que abordagens teriam sido combatidas pelos
estudos literários dos primeiros anos do século XX?
18
02
UNIDADE
MAS, O QUE É LITERATURA?
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2.1 INTRODUÇÃO
Se perguntarmos a alguém na rua, ou mesmo a um estudante do ensino fundamen-
tal ou médio o que é Literatura, ou, ainda, se fizermos uma rápida pesquisa em um site de
buscas, acharemos respostas das mais diversas, mas nenhuma que responda satisfatoria-
mente a essa questão. Uns dirão que são romances, contos, poemas – somenos exemplos
de textos literários; outros tratar-se de uma forma de entretenimento – uma das funções
da Literatura; ainda outros que é simplesmente uma disciplina estudada na escola. De fato,
há diversas opiniões no senso comum para a pergunta “o que é Literatura?”, mas nenhuma
que responda assertivamente à questão.
Como vimos na Unidade I, para Roberto Acízelo de Souza, a Literatura, sem uma
teoria que a balize, se torna algo óbvio. Se a Literatura é algo mais que do que romances,
contos, poemas que servem ao entretenimento e ao estudo, o que ela vem a ser então? A
resposta a essa pergunta, por mais simples que possa parecer, é assaz complexa (ao menos
para aqueles que se dedicam ao estudo dela!). Mas, digamos que seja possível alcançar
uma resposta satisfatória. Essa ainda levantaria muitas outras questões:
A fim de responder não apenas o que é Literatura, mas também às demais questões
que se desdobram desta primeira, nesta Unidade, abordaremos as dificuldades da defini-
ção do que é Literatura; apresentaremos (e discutiremos) a visão de alguns teóricos e; por
fim, discorreremos sobre algumas das funções dela.
Vamos lá?
20
gumas outras obras reconhecidas como Literatura.
Ao que parece, para Culler, nem sempre aquilo que se denomina como Literatura
parece sê-lo e vice e versa. Exemplo disso é o fato de hoje lermos a Carta de Achamento do
Brasil de Pero Vaz de Caminha como Literatura, quando originalmente não foi escrito com
a finalidade de sê-lo.
De fato, o conceito de literatura remete a retomada crítica do que é literatura pelo
senso comum, assim como uma revisão histórica que perpassa sua conceituação dada
pelas diferentes culturas desde a invenção da escrita até a atualidade. Por exemplo, muito
do que hoje chamamos de “literatura”, na Idade Média (ou mesmo antes) deveria ser mais
propriamente denominado de performance, uma vez que manuscritos eram escritos ape-
nas para serem executados (ZUMTHOR, 1993). Sendo assim, faz-se mister retrocedermos
até a origem do termo que queremos conceituar.
A palavra Literatura, não apenas em língua portuguesa, mas em língua igualmen-
te românicas como o francês, o espanhol, o italiano; como não românicas como inglês e
alemão, origina-se do latim LITTERAE. O mesmo termo latino daria origem em português
à palavra letra, estabelecendo assim uma estreita relação com o código escrito da língua.
Sendo assim, poderíamos considerar como sendo Literatura todo e qualquer texto escrito?
Como um conjunto do que se produziu em termos de cultura letrada?
De fato, antes do século XIX, tinha-se por literatura “as inscrições, a escritura, a erudi-
ção, o conhecimento das letras” (COMPAGNON, 1999, p. 30). Ainda hoje, de acordo com o
significado da palavra, podemos entender o termo literatura como um coletivo de textos
escritos, a exemplo, da literatura médica (tudo que se escreveu sobre medicina), da litera-
tura de engenharia (tudo o que se escreveu sobre engenharia), da literatura matemática
(tudo o que se escreveu sobre matemática) etc.
Mas o que queremos aqui é definir o que é Literatura enquanto instituição e área do
conhecimento, tal qual os contornos que ganhou durante e após o Romantismo. Sobre tal
ponto, Eagleton (1997, p. 21-22) dirá que:
Alguns textos nascem literários, outros atingem a condi-
ção de literários, e a outro tal condição é imposta. [...] A
Literatura não existe da mesma maneira que os insetos,
e os juízos de valor que a constituem são historicamente
variáveis, mas que esses juízos têm, eles próprios, uma es-
treita relação com as ideologias sociais.
Já Souza (2014, p. 14 ) defenderá que: “[...] a literatura é um produto cultural que surge
com a própria civilização ocidental, pelo fato de que textos literários figuram entre os indí-
cios mais remotos da existência histórica da civilização “.
O que podemos compreender dos pontos de vista de Eagleton e de Souza? Se a
Literatura é um produto cultural, é preciso entender primeiro o que é cultura e como a
Literatura é um produto seu. Segundo Terry Eagleton, em A ideia de Cultura, definir e con-
ceituar a cultura é uma atividade tão complexa como definir e conceituar literatura: “es-
tamos presos, no momento, entre uma noção de cultura debilitantemente ampla e outra
desconfortavelmente rígida” (EAGLETON, 1997, p. 52).
Mas, para nós, no entanto, interessa saber qual a ideia de cultura parece ter sido ado-
tada por Souza (2014)ao afirmar que a literatura é um produto cultural que emerge junto
com a civilização ocidental. Fiquemos, portanto, com uma definição apontada pelo mes-
mo Eagleton (1997, p. 58)
21
De maneira alternativa, pode-se tentar definir cultu-
ra funcionalmente em vez de substantivamente, como
tudo o que for supérfluo com relação às exigências ma-
teriais de uma sociedade. Segundo essa teoria, a comida
não é cultural, mas tomates secos são; o trabalho não é
cultural, mas usar trabalhos ferrados ao trabalhar é. Na
maioria dos climas, usar roupas é uma questão de neces-
sidade física, mas que tipos de roupas se usa não é .
Em suma, cultura seria tudo aquilo que o homem não precisa para sua sobrevivência
física, mas que é essencial para o seu desenvolvimento e sobretudo para a vida em socie-
dade, isto é, práticas simbólicas que vão desde a língua a vestimenta de uma comunidade.
Nesse sentido, a literatura como parte de um fazer social, torna-se um produto cultural,
isto é, uma arte e uma prática social solidamente incorporada e, como tal, carrega a ideo-
logia da época e da sociedade que a produziu. Isto, portanto, significa dizer que o conceito
de literatura varia de acordo com a comunidade e o tempo em que se insere. Com isso,
voltamos à citação de Culler: o que hoje entendemos como literário, não era no passado;
e, talvez, aquilo que viermos a compreender no futuro não será o que entendemos ser no
presente.
Podemos definir a Literatura, então, a partir da diferenciação do que é ou não texto lite-
rário para determinada época e sociedade. Mas a despeito disso, é ainda imperativo nos
perguntarmos: haveria uma “essência” da Literatura? Algo que a caracterizasse definitiva-
mente como tal assim como uma mesa é e será sempre uma mesa?
Segundo Eagleton (1997) não. Para ele não há no texto literário algo que seja único e ex-
clusivo desse tipo de texto. Seria o uso social que se faz dele, o que definiria a sua natureza
literária. Antes de Eagleton, no entanto, um grupo de estudiosos da Literatura, que ficou
conhecido como “Formalistas Russos”, defenderam que o texto literário apresentaria tra-
ços e formas que o caracterizaria como imanentemente literário. Para esses estudiosos,
a arte literária, assim como qualquer arte, apresentaria características próprias que nos
fariam reconhecê-la como tal, assim como quem assiste ao Lago dos Cisnes sabe estar
diante de uma apresentação de balé, ou se ouve a uma execução de Mozart, sabe que está
a ouvir uma ópera.
A esses traços, denominaram “Literalidade”, isto é, usos específicos da linguagem encon-
trados em textos de natureza literária. Vejamos, então, alguns desses que, em tese, carac-
terizariam o texto literário:
22
coloca em 1º plano a própria linguagem (CULLER, 1999). Se o pintor usa tela
e pincel para criar a sua obra, o escritor usa papel e palavras para criar a sua
obra. A linguagem é sua matéria-prima. Da mesma forma, como um artista
plástico trabalha as cores e as texturas de forma a criar significados únicos
para sua obra, assim o faz o escritor com as escolhas de termos nos eixos sin-
tagmáticos e paradigmáticos, trabalha os elementos de formar a criar múlti-
plos significados para sua obra. Sendo assim, ele vai selecionar e organizar as
palavras de forma a passar mais do que uma simples informação ao seu re-
ceptor. Uma seleção muito mais criteriosa do que a que fazemos em nossos
atos de fala cotidianos, ao conversamos com colegas, familiares, ou mesmo
ao escrever um e-mail ou ao escrever uma dissertação.
2. A relação entre a forma e o conteúdo - A contribuição que cada elemento
escolhido pelo autor traz para a construção do todo, a saber, o ritmo, a so-
noridade, a rima, as repetições, aliterações, metáforas, metonímias, etc. Em
outras palavras, como que o tema (ou assunto) tratado se relaciona com a
forma escolhida, se um soneto, uma ode, um hacai, um conto, uma crônica,
um romance.
3. A plurissignificação – O texto literário ao fazer um uso bastante específico
dos termos da língua, confere a essa uma significação múltipla, para além do
sentindo dicionarizados dos termos. Você já aprendeu que a língua pode ser
usada em seu sentido denotativa, isto é, em seu sentido primeiro, concreto,
dicionarizado; e em seu sentido conotativo, isto é, para além do seu significa-
do primeiro, o sentido figurado, metafórico. É sobretudo esse uso da língua
por parte da literatura que a permite ter múltiplos significados. O semiologis-
ta Umberto Eco, no livro Opera aperta, defendeu que a literatura é uma obra
de arte que está aberta às inferências do leitor. Da mesma maneira, o filósofo
francês Jean-Paul Sartre, em O que é Literatura?, assim como o professor e
crítico literário alemão Wolfgang Iser, dirá que toda obra literária apresenta
vazios e lacunas que devem ser preenchidas pelo leitor, tal qual coautor da
obra. Obviamente, cada leitor um preencherá as lacunas de acordo com o
seu reportório cultural, conforme postulado por Jauss (1994).
4. Ficcionalidade – “As obras literárias se referem a indivíduos imaginários e
não históricos. [...] A ficcionalidade da literatura separa a linguagem de outros
contextos nos quais ela poderia ser usada e deixa a relação da obra com o
mundo aberta à interpretação” (CULLER, 1999, p. 33) justamente por primar
pela linguagem conotativa e, com isso, ampliar suas significações, como vi-
mos no ponto 3. Nesse processo, recria-se, problematiza-se o real permitindo
ao leitor refletir sobre o mundo em que vive, o que nos leva diretamente ao
ponto 5.
5. Construção intertextual ou autorreflexiva – toda obra de arte existe e signi-
fica a partir das relações que estabelece com o seu meio. A literatura é uma
manifestação artística que, reflete e problematiza o seu meio, isto é, a socie-
dade em que vivemos. E, isso sempre se dá pela releitura que cada texto faz
do repertório cultural, literário e não literário, desta mesma sociedade.
6. Função estética da linguagem - literatura vista como objeto estético que
“exorta os leitores a considerar a interrelação entre forma e conteúdo” e des-
pertar-lhe emoções prazerosas, através do contato com essa. Da mesma ma-
23
neira que podemos nos emocionar com uma música ou sentir medo com
um filme de terror, o texto literário pode proporcionar a mesma experiência.
FIQUE ATENTO
Literatura pode ser definida como a arte da linguagem que integra as práticas culturais de
uma dada sociedade. Como toda arte, configura-se como uma representação do real, ge-
ralmente de cunho ficcional, que pode ser mais ou menos verossímil, isto é, pode estar mais
próxima ou mais afastada da percepção de realidade do leitor.
Bosi (2006) argumenta que a Literatura não tem função pragmática na sociedade,
apesar de ser uma prática social solidamente incorporada. Por outro lado, o teórico da Li-
teratura Tzvetan Todorov (2009) afirma, em Literatura em Perigo, que a Literatura amplia
nosso universo, incita-nos a imaginar outras maneiras de concebê-lo e organizá-lo. Quem
já não ouviu a máxima, “Quem lê, viaja”?
Da mesma maneira, Candido (2017)em “Direito à Literatura”, afirma que a Litera-
tura tem o poder de confirmar e negar, de propor e denunciar, de apoiar e combater e,
com isso, fornecer-nos todas as “possibilidades de vivermos dialeticamente os problemas”
(CANDIDO, 2017, p. 177)de nossa época, e, por isso, deveria ser entendida como um “direito
inalienável”de todo e qualquer ser humano.
Sendo assim, que funções, além das expostas por Todorov e Candido, podemos atri-
buir à Literatura? O Italiano Umberto Eco, em Sobre a Literatura, aponta alguns que co-
mentamos a seguir:
1. “A língua mantém em exercício, antes de tudo, a língua como patrimônio coletivo” (ECO,
2002, p. 10)
2. “A prática literária mantém em exercício também a nossa língua individual” (ECO, 2002,
p. 11)
3. “As obras literárias nos convidam à liberdade de interpretação, pois propõem um dis-
curso com muitos planos de leitura e nos colocam diante das ambiguidades e da lin-
guagem da vida” (ECO, 2002, p. 12)
4. “O mundo da literatura é tal que nos inspira confiança de que algumas proposições não
podem ser postas em dúvida; que ele nos oferece, portanto, um modelo tanto quanto
se quiser, de verdade (ECO, 2002, p. 14)
5. “A função dos contos ‘imodificáveis’ [isto é, a Literatura] é precisamente esta: contra
qualquer desejo de mudar o destino, eles nos fazem tocar com a impossibilidade de
mudá-lo [...]. Creio que esta educação ao Fado e à morte é uma das funções principais
da literatura” (ECO, 2002, p. 21)
Muitas são as funções da literatura. Impossível seria comentar todas neste livro. Mas
é fato que concordamos com Umberto Eco que “a educação ao Fado e À morte” (ECO,
2002, p. 21) é uma de suas principais funções. Na Unidade quatro, você verá como esta fun-
ção foi considerada já na Grécia Antiga por Aristóteles.
24
VAMOS PENSAR?
Como podemos pensar a literatura como uma prática social que ultrapassa os muros da es-
cola? Para refletir sobre as questões citadas, associando-as à suas ações, seja no ambiente
profissional ou cotidiano, pense em práticas literárias que tem o potencial de garantir ao cida-
dão e ao leitor o “Direito à Literatura” (CANDIDO, 2017). Na sua cidade, no seu estado, enfim, no
Brasil, o direito e o acesso à Literatura têm sido respeitados? Se sim, esse tem ocorrido e que
forma? Somente através da escola ou por ações que ultrapassam os seus muros?
Para entender a Literatura como uma manifestação artística, leia o texto “Arte
como procedimento”, do formalista russo Chkovski (1914), disponibilizado pela
Universidade de São Paulo: https://bit.ly/3zSiXLh. Acesso em: 29 maio 2021
Veja também o editorial da Revista Letras, v. 25, n. 51, dez. 2015, da Universidade
Federal de Santa Maria, intitulado “Literatura, cultura e outras artes: percursos
críticos, interpretativos e metodológico”, de Tavares e Steil (2015) disponível em:
https://bit.ly/3xMbBqI. Acesso em: 21 maio 2021
Para saber mais sobre as muitas funções da Literatura, leia o livro “Literatura
para quê?” de Compagnon (2010). Se desejar poderá ler a resenha do título em:
https://bit.ly/3zX3d9A. Acesso em: 29 maio 2021
Para saber mais da Literatura como um direito de todo e qualquer ser humano,
leia na íntegra o texto de Antonio Candido “O direito à Literatura”, disponibiliza-
do pela USP em: https://bit.ly/3zrYs74 . Acesso: 29 maio 2021
GLOSSÁRIO
Arte: Manifestação humana com objetivo estético, isto é, de propiciar prazeres e emoções ao
observador.
Cultura: O conjunto da língua, dos hábitos e costumes e das manifestações artísticas de de-
terminado povo ou comunidade constituem sua cultura. É chamada de alta cultura aquela
produzida e consumida pela elite social da comunidade e cultura popular a que se produz e
se consome pelas massas populares.
Literatura: Forma de manifestação artística ficcional que utiliza a linguagem verbal e mista
como matéria prima e que integra as práticas culturais de uma dada sociedade
25
Literatura comparada: Também conhecido por comparatismo, trata-se do estudo que
visa comparar duas ou mais literaturas nacionais ou mesmo diferentes obras literárias de
mesma língua e origem.
Literatura feminina: Literatura escrita por autoras mulheres, muitas das vezes, mas não
via de regra, abordando temas afins ao feminismo.
Literatura marginal: O termo marginal aparece nas décadas de 1970 e 1980. Designava
um tipo de literatura surgente naqueles anos que afrontava o cânone ao romper com os
modelos estéticos e culturais ora vigentes. O termo também fora usado para qualificar o
trabalho de escritores que, contrários às regras impostas pelo mercado editorial, partem
para a produção e venda independente de sua obra. Ainda, no cenário contemporâneo o
termo qualifica a produção literária de autores oriundos das periferias e que tematizam
em sua literatura problemas de ordem social destas periferias como o crime, a violência, as
drogas e a miséria.
Literatura mundo ou world literature: Ideia que se contrapõe à ideia de literatura nacio-
nal. Essa relacionasse com a circulação de texto literários pelo mundo.
Literatura nacional: A ideia ou conceito de literatura nacional surge e ganha força com
o movimento romântico, quando a expressão da cultura nacional foi bastante valorizada.
Nesse sentido, literatura nacional diz respeito a literatura produzida na língua e por cida-
dão nascidos/residentes em determinado estado-nação. Daí termos Literatura Brasileira,
Literatura Portuguesa, Literatura Moçambicana, Literatura Americana, Literatura France-
sa etc.
Literatura oral – Narrativas que constituem a cultura de um povo ou comunidade que são
transmitidas oralmente de geração em geração, às vezes, compiladas como no caso dos
contos compilados pelos irmãos Grimm ou das lendas catalogadas por Câmara Cascudo.
26
FIXANDO O CONTEÚDO
1. Considera-se obra literária somente o escrito que se distingue pela beleza da forma
e a excelência do conteúdo. Será tanto mais apreciada quanto maior o seu poder de
sugerir, de tocar a nossa sensibilidade, de empolgar o nosso espírito.
2. As obras literárias de alcance universal têm, geralmente, menos valor que as de caráter
estritamente nacional ou regional.
3. Todo escritor tem seu estilo próprio, pessoal, isto é, sua expressão reveste uma forma
característica, pela qual se manifestam seus impulsos emotivos, sua sensibilidade e a
feição peculiar de seu espírito, afirmando que o estilo é o espelho em que se reflete a
alma do escritor, a tela em que se projeta a personalidade do artista.
27
se a linguagem é aquilo que nos capacita dizer o que dizemos, seu dizer não se dá sobre
um vazio semântico, o que ele diz é ideológico, e sua capacidade de dizer manifesta a
linguagem.
e) Segundo Eco, a Literatura não tem função na sociedade, portanto, não tem serventia
pragmática para além da estética.
3. (Enade 2014)
Texto 1
Ainda quando se defende a existência de “uma escrituralidade literária”, herdeira, em certo sentido,
do conceito de “literariedade”, utilizado pelos formalistas russos, a questão da especificidade do
discurso literário esbarra em entraves complicados e quase sempre obriga o estudioso a trilhar
caminhos que podem desviá-lo do seu objeto de análise. Isso explica, por exemplo, a possibilidade
de haver excelentes teóricos da literatura que sejam incapazes de ser leitores “desarmados” de
literatura; que possam deixar de lado a teoria e “entrar no texto”, confundir-se com personagens
que transitam no palco literário. Se, de fato, parece ser problemático definir literatura pelo que
ela é – e sua existência está comprovada por uma tradição e pela multiplicidade de obras que
mantêm viva essa tradição –, talvez seja mais prudente concordar com a existência de um “estatuto
do literário” que, por vezes, se vale de critérios externos ao texto mais do que de uma observação
minuciosa de sua produção.
Disponível em: <http://www.pucminas.br>. Acesso em: 28 jul. 2014 (adaptado).
Texto 2: Desencanto
A partir dos textos citados, assinale a opção que apresenta a relação entre a especificidade
da linguagem literária e a crítica literária.
a) A partir de leituras críticas do poema de Manual Bandeira, é possível fruí-lo melhor, pois
a crítica literária não deixa nada descoberto.
b) Os critérios de classificação propostos pela crítica e pelos teóricos da literatura permitem
ao leitor uma fruição mais prazerosa do poema de Manuel Bandeira.
c) Para facilitar a leitura e permitir fruição estética mais intensa ao leitor, os críticos literários
mostram a morfologia do texto e as armadilhas que constituem a sua estrutura.
d) A crítica literária, por não apontar caminhos precisos do processo de leitura do texto, é
ineficaz para a fruição e interpretação do poema de Manuel Bandeira.
e) Para que possa fruir esteticamente o poema de Manuel Bandeira, é necessário que o
leitor articule sua experiência de mundo com seus conhecimentos sobre a literatura.
28
4. (Enade 2011) Nos textos comuns, não literários, o autor seleciona e combina as palavras
geralmente pela sua significação. Na elaboração do texto literário, ocorre uma outra
operação, tão importante quanto a primeira: a seleção e a combinação de palavras se
fazem muitas vezes por parentesco sonoro. Por isso se diz que o discurso literário é um
discurso específico, em que a seleção e a combinação das palavras se fazem não apenas
pela significação, mas também por outros critérios, um dos quais, o sonoro. Como resultado,
o texto literário adquire certo grau de tensão ou ambiguidade, produzindo mais de um
sentido. Daí a plurissignificação do texto literário.
GOLDSTEIN, N. Versos, sons, ritmos. 5. ed. São Paulo: Ática, 1988, p. 5.
a) I e II.
b) I e III.
c) II e IV.
d) I, III e IV.
e) II, III e IV.
Texto 1
29
Texto 2
A própria produção literária atual encaminha-se na direção de uma fusão com vários
segmentos culturais, de que a chamada cultura de massa, tradicionalmente discutida em sua
diferença negativa, constitui tão somente um dos aspectos de negociação em bases renovadas. A
defesa exclusiva da literatura clássica e da herança nacional, um casamento expresso e legitimado
pela construção e manutenção de repertórios recheados de um saber cultural canônico, no entanto,
parece tão problemática quanto a sua rejeição global. Hoje circulam e prevalecem formas culturais
mistas, e até os textos canônicos são relidos como pontos de cruzamento de discursos amplos, que
transcendem as fronteiras tradicionais da esfera do literário e do horizonte de pertença a espaços
nacionais linguística e geograficamente circunscritos.
5. (Enade 2014) Assinale a opção que melhor expressa as ideias desenvolvidas no texto 2.
a) b) c)
d) e)
I. A Literatura, como toda arte, é uma transfiguração do real, é a realidade cultural recriada.
II. A literatura apropria-se de valores de diversos segmentos culturais, estabelece fusão
entre eles e reelabora-os, por meio da língua, em formas estéticas.
III. A fusão estabelecida entre literatura e cultura tem por princípio apenas os valores
culturais canônicos.
IV. A literatura canônica está inserida em formas culturais mistas que transcendem a esfera
do tradicional.
a) I e II.
30
b) I e III.
c) III e IV.
d) I, II e IV.
e) II, III e IV.
7. (Enade 2014) Considerando a imagem e a citação, pode-se afirmar que a relação entre
manifestações literárias contemporâneas e cultura :
De fato, antes procurava‐se mostrar que o valor e o significado de uma obra dependiam de ela
exprimir ou não certo aspecto da realidade, e que este aspecto constituía o que ela tinha de
essencial. Depois, chegou‐se à posição oposta, procurando‐se mostrar que a matéria de uma obra
é secundária, e que a sua importância deriva das operações formais postas em jogo, conferindo‐lhe
uma peculiaridade que a torna de fato independente de quaisquer condicionamentos, sobretudo
social, considerado inoperante como elemento de compreensão. Hoje sabemos que a integridade
da obra não permite adotar nenhuma dessas visões dissociadas; e que só a podemos entender
fundindo texto e contexto numa interpretação dialeticamente íntegra, em que tanto o velho ponto
de vista que explicava pelos fatores externos, quanto o outro, norteado pela convicção de que a
estrutura é virtualmente independente, se combinam como momentos necessários do processo
interpretativo. Sabemos, ainda, que o externo (no caso, o social) importa, não como causa, nem
como significado, mas como elemento que desempenha um certo papel na constituição da
estrutura, tornando‐se, portanto, interno.
Antonio Candido. Crítica e sociologia. In: Literatura e sociedade. Rio de Janeiro: Ouro sobre azul, 2010, p. 13 e 14.
31
considera o trabalho estético de internalização dos dados externos na estrutura da obra.
e) O texto defende a ideia de que a corrente crítica que privilegia a centralidade da matéria
social na obra de arte está ultrapassada e deve ser substituída pela perspectiva crítica
atenta aos jogos de linguagem.
32
03
UNIDADE
A ARTE IMITA A VIDA?
33
3.1 INTRODUÇÃO
Vimos no capítulo anterior que o conceito de Literatura é algo complexo, difuso e his-
toricamente marcado, variando a ideia do que venha a ser ou não texto literário de acordo
com a época, a cultura e a ideologia social na qual se insere (EAGLETON, 1997).
No entanto, é imperativo retroceder às poéticas clássicas, isto é, aos gregos antigos,
para compreender o(s) conceito(s) modernos de Literatura e da disciplina Teoria da Lite-
ratura. Por isso, neste capítulo, falaremos sobre o conceito de mimeses na filosofia e na
Grécia antiga, sobretudo, em Platão, discutindo a importância de sua visão para os estudos
literários que o sucederam.
Vamos lá!
Certamente você já ouviu a máxima: “a arte imita a vida e a vida imita a arte”. De fato,
a arte parte do que lhe fornece o real a fim de trabalhar e retrabalhar este mesmo real,
conferindo-lhe novos significados. Grosso modo, através das mais diversas manifestações
artísticas o homem consegue melhor compreender a si, à sociedade e ao mundo que o
cerceia.
Platão, no entanto, via essa imitação de uma maneira negativa. Tanto que no diálogo
A República, bane a Literatura de sua cidade ideal por endenter que ela era nociva para a
paideia, a educação grega que envolvia trabalhar corpo e mente, e a aletheia, a verdade
filosófica.
A primeira obra platônica a tratar de um tema diretamente ligado à Literatura é o
diálogo Ion, mas é n’ A República que Platão vai engendrar duas teorias que embasam seu
pensamento, a Teoria das Formas e o Mito das Cavernas, ambas complementares para en-
tendermos o porquê Platão considera a Literatura como um fazer negativo. Argumentação
contra a arte e a Literatura
O diálogo é dividido em dez livros. Destacamos aqui os que interessam sobremanei-
ra ao nosso estudo. No livro I, Platão introduz o seu conceito de justiça e ética; no livro II,
inicia sua argumentação contra a literatura através de uma crítica pedagógica e teológica
contra essa, crítica que dá continuidade no Livro III ao abordar a constituição da cidade-es-
tado ideal. No livro VII, apresenta a Alegoria ou Mito da Caverna e, por fim, no Livro X, for-
mula sua crítica à mimeses e, por conseguinte, conclui que a literatura não pode ter espaço
na cidade-estado ideal.
34
Figura 2: Mito da Caverna
Disponível em: https://bit.ly/3y2SmcP. Acesso em: 28 maio 2021.
Ele pede a Glauco que imagine uma caverna na qual prisioneiro viveram a vida toda
sem jamais conhecer o mundo fora dela. Tudo que viam do mundo exterior era apenas
sombras dos objetos, animais e pessoas que se projetavam em uma parede à sua frente,
como pode se verificar na imagem acima. Essas sombras significavam todo o conheci-
mento de mundo desses homens.
As sombras, como é sabido, distorcem a forma dos objetos de acordo com a posição
e projeção da luz. Portanto, o conhecimento do mundo que esses homens tinham era
distorcido assim como as sombras projetadas na parece. No entanto, na sequência de sua
argumentação, afirma que aqueles prisioneiros, não tendo contato com o mundo exterior,
criam ser o que viam a verdade (ou ao menos a sua verdade), tanto que afirma que se um
deles saísse e retornasse contando o que vira no mundo exterior seria taxado de mentiroso.
Paralelamente, a caverna representaria o mundo material, sensitivo e físico, em contrapon-
to ao mundo exterior que representaria o mundo inteligível ou das ideias.
Externo - espírito Caverna - corpo
Ideia – forma matéria
Inteligível sensitivo
Real aparente
Universal particular
Eterno Efêmero
Essência objeto
Quadro 1: Forma versus sombra
Fonte: Elaborado pela Autora (2021)
A ideia de essência e essencial é que ordenaria a noção particulares das coisas, isto
é, sua imagem ou objeto. Sendo assim, Platão entendia que as artes, por serem somenos
simulacro da verdade, dificultariam o processo de ascensão ao mundo inteligível, pois por
serem aparências das formas presentes no mundo ideal, enganariam o receptor.
35
A obra de Paviani (2008) “Platão & a Educação” também abrange o papel da
literatura na educação e está disponível em: https://bit.ly/35Novsq. Acesso em:
28 maio 2021
Para saber mais sobre “A república”, de Platão, leia o primeiro capítulo da obra
de Tavares e Noyama (2017) intitulada “Textos clássicos da filosofia antiga: uma
introdução a Platão e Aristóteles”, disponível em: https://bit.ly/3h1BcVR. Acesso
em: 28 maio 2021.
Se de dentro da caverna só se viam as sombras das formas, aquele que as via tinha
apenas uma vaga noção do mundo ideal. Desse modo, aquele que fabrica um objeto ba-
seado não na forma, mas na ideia daquele objeto, fabrica uma cópia. Por sua vez, se um
pintor pinta aquilo que foi fabricado estará produzindo uma cópia da cópia, portanto, afas-
tando-se três vezes do real, isto é, a forma etérea das coisas.
Conforme salienta Benedito Nunes, em Platão:
[...] o artista imita por deficiência de conhecimentos. Se
fosse verdadeiramente sábio, não trocaria a realidade
pela aparência. Sua práxis, supérflua, é apenas um jogo,
uma atividade gratuita, que nada tem de séria, e que
pode, contudo, aumentando a sedução equívoca da ma-
téria sobre a sensibilidade, enredar a alma na trama de
falsos sentimentos e emoções, facilmente suscitados
pela Música e pela Poesia. Reencontramos o duplo senti-
do da mimese assinalado no capítulo 4: as composições
poéticas e musicais sugestionam o ouvinte, induzindo-o
a experimentar os estados de alma a que se associam.
Em linguagem moderna, diríamos que elas expressam e
comunicam estados afetivos (NUNES, 1999, p. 19).
36
dúvida empaticamente com o conteúdo do que ele está
dizendo. E, por conseguinte, também quando Platão pa-
rece confundir os gêneros épico e dramático, o que está
dizendo é que qualquer enunciado poetizado deve ser
planejado e recitado de maneira tal que se transforme
numa espécie de drama dentro da alma tanto do recita-
dor quanto, consequentemente, do público. Essa espé-
cie de drama, essa maneira de reviver a experiência na
memória em vez de analisá-la e compreendê-la, constitui
para ele “o inimigo” [a ser combatido] (HAVERLOCK, 1996,
p. 61).
FIQUE ATENTO
Para Platão as artes e, por conseguinte, a literatura, é somenos uma cópia três vezes afasta-
da da realidade, isto é, das formas ideais. Por se apenas um simulacro da verdade, não teria
espaço em sua república ideal, assim como o artista, mero criador de aparências.
VAMOS PENSAR?
Para Platão, a Literatura seria nefasta porque impediria que o homem conhecesse a verdade,
essa que só se teria acesso pela filosofia. No entanto, pense sobre o tudo o que já leu e apren-
deu sobre Literatura e reflita: o texto Literário, ao repensar o real por outros prismas, permite-
-nos refletir sobre a nossa realidade desconstruindo e reconstruindo o que acreditávamos ser
verdade?
GLOSSÁRIO
Aletheia – palavra grega que designava a relação entre verdade e razão. Grosso modo, a ver-
dade filosófica pertencente ao mundo inteligível.
Mimeses: Noção grega que entende a arte como uma forma de representação da realidade.
Mundo inteligível: O mundo das ideias, aquele que só se atinge através do pensamento filosó-
fico. O conhecimento por esse propiciado, portanto, é aquele que se atinge pela razão.
Mundo Sensitivo: Conhecimento que se atinge através da percepção sensitiva, sem funda-
mento no pensamento ou na razão, por isso, próprio das artes.
Paideia - Sistema de educação grego que incluía visava preparar o homem para o exercício
de seu papel na pólis (cidade). Era uma educação completa que trabalhava desde ginástica,
a artes, retórica e matemática.
37
FIXANDO O CONTEÚDO
1. (Enade 2008)
E dir-se-á o mesmo do justo e do injusto, do bom e do mau e de todas as ideias: cada uma, de per
si, é uma, mas, devido ao fato de aparecerem em combinação com ações, corpos, e umas com as
outras, cada uma delas se manifesta em toda a parte e aparenta ser múltipla.
Platão, República V. 476a. Fundação Calouste Gulbenkian.
2. (Enade 2005) – Que responda esse honrado homem que não acredita que algo seja
belo em si, nem exista nenhuma ideia de um belo em si, sempre idêntica a si mesma, mas
que reconhece muitas coisas belas – esse amante dos espetáculos – que não aceita que lhe
digam que o belo é um só, e o justo, e do mesmo modo as outras realidades. Ora, dentre
estas coisas, diremos que, das muitas que são belas, acaso haverá alguma que não pareça
feia? E das justas, uma que não pareça injusta? E, das santas, uma que não pareça ímpia?
– Não, é forçoso que as mesmas coisas pareçam belas e feias, tal como as outras de que
falas.
Platão. República. (com adaptações).
PORQUE
38
educação ou pedagogia para a verdade. Sobre o Mito da Caverna e o conceito de verdade
em Platão, assinale a alternativa INCORRETA.
a) A relação entre paideia e aletheia é proposta pelo mito com a analogia entre os olhos do
corpo e os olhos do espírito quando passam da obscuridade à luz: assim como os primeiros
ficam ofuscados pela luminosidade do Sol, também o espírito sofre um ofuscamento no
primeiro contato com a luz da ideia do Bem, que ilumina o mundo das ideias.
b) Platão abandonou o antigo conceito de verdade, isto é, a evidência como adequação
entre a ideia e o intelecto, o inteligível e a inteligência, obtida apenas pelas operações da
própria alma e o substituiu por aquele em que o próprio ser se manifesta no mundo e ao
mundo.
c) A trajetória realizada pelo prisioneiro é a descrição da essência do homem (um ser dotado
de corpo e alma) e sua destinação verdadeira (o conhecimento intelectual das ideias). Essa
destinação é seu destino: o homem está destinado à razão e à verdade.
d) O Mito da Caverna preserva o antigo sentido da aletheia como não esquecimento e
não ocultamento da realidade, pois aletheia é o que é arrancado do esquecimento e do
ocultamento da realidade, fazendo-se visível para o espírito, embora invisível para o corpo.
e) É uma alegoria retirada de “A República” de Platão, que fala sobre o conhecimento
verdadeiro e o governo político.
4. (IF-RR – 2015) - Acaso não existem três formas de cama? Uma que é a forma natural, e
da qual diremos, segundo entendo, que Deus a confeccionou. Ou que outro Ser poderia
fazê-lo? - Nenhum outro, imagino. - Outra, a que executou o marceneiro. - Outra, feita pelo
pintor. Ou não? - Sim. - Logo, pintor, marceneiro, Deus, esses três seres presidem aos tipos
de cama.
PLATÃO. A república. São Paulo: Martin Claret, 2000: 295. (adaptado)
5. (Colégio Pedro II – 2016 - adaptado) – Então, tomemos dessas pluralidades a que quiseres;
a seguinte, por exemplo, se estiveres de acordo: leitos há muitos, e também mesas. – Como
não? – Porém para todos esses móveis só há duas ideias: a ideia do leito e a ideia da mesa.
– Certo. – Costumamos, também, dizer que os obreiros desses móveis têm em mira a ideia
segundo a qual um deles apronta leitos e outros as mesas de que nos servimos, e assim
para tudo o mais. Porém a ideia em si mesma, o obreiro não fabrica. Como o poderia?
(PLATÃO. A República – livro X. In: MARÇAL, Jairo (org.). Antologia de textos filosóficos.
Curitiba: SEED, 2009. p. 553)
39
a) a crítica à imitação como afastamento da verdade em três graus.
b) um caso tipificado de contemplação das formas pela experiência.
c) o reconhecimento da forma de leito e de cadeira por reminiscência.
d) uma explicação do uno e do múltiplo pressupondo a teoria das ideias.
e) Um elogio à imitação como forma exemplar de contemplação do real.
6. (Colégio Pedro II – 2016 -adaptado) A arte de imitar está muito afastada da verdade,
sendo que por isso mesmo dá a impressão de poder fazer tudo, por só atingir parte mínima
de cada coisa, simples simulacro. O pintor, digamos, é capaz de pintar um sapateiro, um
carpinteiro ou qualquer outro artesão, sem conhecer absolutamente nada das respectivas
profissões. No entanto, se for bom pintor, com o retrato de um carpinteiro, mostrado de
longe, conseguirá enganar pelo menos crianças ou pessoas simples e levá-las a imaginar
que se trata de um carpinteiro de verdade.
(PLATÃO. A República (Livro X). In: MARÇAL, Jairo (org.). Antologia de textos filosóficos.
Curitiba: SEED, 2009. p. 558.)
Sobre a relação entre arte e verdade, assinale a alternativa correta, segundo o pensamento
platônico.
a) As obras de arte estão distanciadas três graus da realidade, e, por isso, estão muito
distantes da representação da verdade.
b) Não poderíamos nos aproximar da verdade por meio das obras de arte, uma vez que elas
apresentam somente uma representação das ideias.
c) Existe um valor positivo da arte imitativa, mas no âmbito da cidade ela era corrosiva, pois,
em relação à verdade, desloca a atenção que a política necessitava.
d) As obras de arte são necessárias para uma aproximação da verdade, mas apenas no
âmbito privado, negando dessa forma, sua função na cidade e, portanto, deveriam ser
excluídas.
e) A arte imitativa é positiva porque permite ao fruidor através da mimese escapar do real
e vivenciar experiências que jamais vivenciaria se não fosse pela arte.
7. Por isto, Wolfgang Iser reconhece a necessidade da literatura neste efeito de perspectiva,
vale dizer, na sua propriedade de obrigar o leitor, ao identificar-se com um personagem,
ou com o narrador, a olhar-se, e ao mundo por um ângulo novo, por um ângulo inusitado
– por uma nova perspectiva. As consequências estéticas, psicológicas e éticas desta
perspectivação podem ser radicais, obrigando-nos não só a compreendermos que a
realidade, em última instância, nos é inacessível – só temos acesso, no máximo, à sua
sombra. A realidade nos é inacessível porque ela engloba tudo o que existe e todas as
perspectivas possíveis.
(BERNARDO, Gustavo. O conceito de Literatura. In: JOBIM, José Luís (Org.)
Introdução aos termos Literários. Rio de Janeiro: Eduerj, 1999).
Ao dizer que a realidade nos é inacessível, que apenas acessamos a sua sombra, Gustavo
Bernardo refere-se
40
c) à teoria da contingência platônica.
d) ao mito grego de Narciso.
e) à ideia de peripécia e catarse.
I. Que aquele que conhece o mundo apenas através das sombras das formas, não chegou
a conhecer a verdade das coisas.
II. Que aquele que vê o mundo apenas através das sombras das formas, vê que as formas
correspondem aos objetos.
III. A literatura, como toda arte, é uma sombra distante três vezes da forma ideal.
a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) I e II, apenas.
d) II e III, apenas.
e) I, II e III.
41
04
LITERATURA: A ARTE DAS UNIDADE
PAIXÕES?
42
4.1 INTRODUÇÃO
Figura 3: Aristóteles
Disponível em: https://bit.ly/3zRfz3d. Acesso em: 28 maio 2021.
Ao conceito de mimesis, conforme proposto pelo discípulo de Platão, se coaduna ao
conceito de verossimilhança. Para o filósofo a arte poética, ou seja, a Literatura, não preci-
saria copiar fidedignamente o real, conforme postulava Platão (daí, ele condená-la por não
se corresponder a verdade), mas deveria assemelhar-se com a realidade que se pretendia.
Mas o que seria algo verossímil? Antes de discutirmos o conceito, desmembremos a pala-
vra. Vero, do latim verus, significa verdadeiro (tanto que a palavra verdade em italiano é jus-
tamente vero!); Símil, do latim símile, significa semelhante. Então, grosso modo, podemos
afirmar que algo verossímil seria algo semelhante ao verdadeiro.
[...] é preciso, quanto ao caráter dos personagens, como
também no arranjo das ações, procurar o necessário ou
o provável, de forma a que alguém de certa qualidade
diga ou faça coisas de certa qualidade necessariamente
ou provavelmente. É evidente, então, que os desenlaces
43
dos enredos devem decorrer do próprio enredo, e não do
artifício da mêchanê [...]. Mas se deve fazer uso da mêcha-
nê no que diz respeito ao que se passa fora de cena, seja
o que ocorreu antes dos incidentes mostrados, que não
é possível ao homem saber, seja o que ocorreu antes dos
incidentes mostrados, que não é possível ao homem sa-
ber, seja o que é posterior e que necessita de uma predi-
ção e de um anúncio, pois aos deuses concedemos tudo
verem (ARISTÓTELES, 2006, p. 91-93).
Mesmo que o discurso da literatura não seja verdadeiro como desejava Platão, é ne-
cessário que seja provável, que tenha um pé calcado no real para que expectador ou leitor
possa identificar-se com aquilo que assiste ou lê. Se o receptor não se identifica, a poesis
não consegue cumprir com a sua função essencial (sobre a qual falaremos no próximo tó-
pico).
Sendo assim, a arte literária não é apenas uma reprodução do mundo em que vi-
vemos, mas uma representação desse. A Literatura, portanto, teria a capacidade de pela
mimesis recriar acontecimentos, situações, criando outras possibilidades de existência no
mundo (lembremos que Aristóteles atém-se sobremaneira à épica e a tragédia). Devido
a essa capacidade do literário, seu discurso estaria mais próximo do discurso filosófico do
que o discurso histórico que tem o dever de apresentar as coisas como ocorreram e não
como poderiam ter ocorrido.
Luiz Costa Lima, partindo das considerações de Friedrich Shelegel sobre a mímeses,
dirá que essa “tem uma relação paradoxal com a verdade” (LIMA, 2000, p. 63). No texto,
Lima fala sobre a obra Kaftiniana que, como é sabido, exploras temáticas irreais, fantásticas
, guardando, portanto, pouca semelhança com a verdade, isto é o real, mas ainda assim, ao
guardar alguma “semelhança com o que a sociedade” toma por verdadeiro, é verossímil e,
portanto, mimética. O que torna o efeito de verossimilhança “inseparável tanto da produ-
ção quanto da recepção” (LIMA, 2000, p. 64).
O poeta romano Horácio, em consonância com o princípio aristotélico, defenderá ser
a arte literária, assim como a pintura, como uma arte de imitação reprodutiva. Horácio, no
entanto, em sua arte poética atem-se à um gênero literário que teria sido pouco considera-
do por Aristóteles, a lírica, a qual também considera produto fruto desta mesma atividade
mimética.
Na verdade, não apenas Horácio, como outros latinos, traduziram mímeses como
imitatio (que literalmente significa imitação), mas com o tempo a ideia latina de criação
literária será entendida para além da mimetização (ou imitação) da natureza e dos costu-
mes humanos, como se verifica em outro autor latino, Quintiliano, para entende-la como
imitação de modelos autorais anteriores, isto é, como aemulatio (emulação).
Já em Aristóteles verificamos uma normatização do fazer literário; o como se deve
fazer ou o como deve ser a obra literária de qualidade para que suscite as emoções que
deve suscitar. Nos latinos isso refletirá a ideia de que se um poeta foi bem-sucedido usando
determinadas técnicas, o caminho para o sucesso dos que haverão de vir é, obviamente,
copiá-lo. Mas não era um puro e simples plágio como podemos equivocadamente sermos
levados a pensar, mas uma emulação daquele autor considerado como autorictas (auto-
ridade) no gênero. Mas qual a diferença entre imitar e emular algo ou alguém? Vejamos o
esclarecimento dado por João Cezar de Castro Rocha:
44
[...] a prática da emulação implica uma ideia particular
de sistema literário, privilegiando o ato de leitura como
gesto eminentemente inventivo. Afinal, partindo-se da
imitação de um modelo considerado autoridade num de-
terminado gênero, busca-se emular esse modelo, produ-
zindo uma diferença em relação a ele (ROCHA, 2013, p. 12).
45
[...] inventamos horrores para nos ajudar a suportar horro-
res verdadeiros. Contando com a infinita criatividade do
ser humano, nos apoderamos dos elementos mais polê-
micos e destrutivos e tentamos transformá-los em ferra-
mentas – para desmantelar estes mesmos elementos. O
temo catarse é tão antigo quanto o drama na Grécia [...],
mas, mesmo assim, ele tem seu uso [...] (KING, 2007, p. 24).
FIQUE ATENTO
VAMOS PENSAR?
Quando se diz que a ARTE é REPRESENTAÇÃO, qual o sentido está em jogo? Qual o sentido
está posto na poética aristotélica? Trata-se apenas da representação do ator em cena? A re-
presentação em Aristóteles é muito mais ampla do que aquela que se faz no palco. Seja o ator
do drama encenado, seja o expectador ou o leitor da obra, todos esses sujeitos colocam-se no
lugar de um outro, a personagem, vivenciando as dores e as paixões desses, efeito criado pela
obra literária.
46
BUSQUE POR MAIS
Para saber mais sobre a Poética de Aristóteles, leia o capítulo quatro do livro
“Textos clássicos da filosofia antiga: uma introdução a Platão e Aristóteles” de
Tavares e Noyama (2017) que está disponível através do link: https://bit.ly/2TVj-
F9Z. Acesso em: 28 maio. 2021.
Para conhecer mais sobre a tragédia grega, assista à encenação de Édipo Rei,
de Sófocles, pela Oficina de Teatro Capitão Gancho, encenada no Museu de
Aveiro, em Portugal. Disponível em: https://bit.ly/3gOKwNS. Acesso em: 28 maio.
2021.
GLOSSÁRIO
Catarse: Processo de purificação do espírito humano e de expurgação de suas emoções, al-
cançado pela vivência de experiências de outrem através da representação artística.
Comédia: Gênero teatral grego que encenava menor que satiriza as fraquezas humanas.
Epopeia: Poema narrativo em versos que canta os feitos do herói histórico ou lendário.
Mimesis: Noção grega que entende a arte como uma forma de representação da realidade.
Peripécia: Evento que, ao alterar o curso dos acontecimentos, conduz o herói a sair do estado
de desconhecimento para o de reconhecimento e, levando-o, por fim, ao evento patético ou
catastrófico.
Tragédia: Gênero teatral grego que encenava as peripécias e catástrofes de homens de moral
superior.
Verossimilhança interna: Trata-se da coerência interna da narrativa que pressupõe uma lógi-
ca na ocorrência e sucessão dos acontecimentos narrados.
47
FIXANDO O CONTEÚDO
1. (Prefeitura de Cujubim - RO 2018) Em teoria literária, usa-se o termo CATARSIS. Este
termo, um tanto técnico, tem sua origem:
a) na mescla de mistério e magia desde sua criação. Penetrou na cultura dos povos
primitivos e descobriu-se como gênero de experiências extravagantes na contemplação
do belo.
b) na época de Aristóteles, termo empregado por um médico, significando purgação e, se
usado por um discurso religioso, representava expiação ou purificação.
c) em tratados papais, expressão usada para caracterizar homem confuso e apreensivo
com as transformações do mundo. Platão, na alegoria da Caverna, utilizou-a pela primeira
vez na história da literatura.
d) no Termo filosófico cunhado por Aristóteles em A República e agregado aos ofícios
literários para designar que a arte replica o mundo, no qual está tudo contido e faz sentido.
A expressão Catarsis se configurou como exercício de expurgação e purificação.
e) na expressão Hebraica adaptada por Aristóteles em Filosofia prática.
48
diversos elogios da imitação como ato de criação e costuma dizer que boa parte da obra
de Shakespeare vem da recriação de histórias mais antigas.
Recontar uma história alheia, para o cordelista e para o dramaturgo popular, é torná-
la sua, porque existe na cultura popular a noção de que a história, uma vez contada, torna-
se patrimônio universal e transfere-se para o domínio público. Autoral é apenas a forma
textual dada à história por cada um que a reescreve.
É célebre a escultura de Laocoonte, em que estão representados pai e filhos envolvidos por
serpentes. Nela está tematizada a dor de um pai que vê os filhos serem devorados. O crítico alemão
Lessing sentiu-se intrigado pela seguinte questão: como entender que a personagem principal
do grupo representado mal abra a boca, apesar de sofrer de modo tão intenso? Para explicar a
composição moderada da dor, assinala:
“É que as leis da escultura impõem a figuração da dor de modo totalmente diverso do da
poesia. A escultura e a pintura não podem representar senão um único momento de uma ação; é
preciso então escolher o momento mais fecundo; ora, só é fecundo aquilo que deixa campo livre à
imaginação; não é preciso, pois, escolher o momento do paroxismo [o momento mais intenso], mas
o que o precede ou segue.”
49
4. (Enade 2005) O que se pode deduzir corretamente do texto acerca da representação
artística?
A Barata
ABERTO O ENVELOPE, SUSTO: a barata dentro dele, imóvel, expectante, sobre o cartão!
Quem foi que teve ideia dessa brincadeira repulsiva! E como conseguiu que passasse pelo
Correio sem esmagar a barata? Por que ela está viva, vivinha da silva & santos. Não se mexe é
de sabida.
-Joga fora essa imundice! Ou antes, não jogue...
Esta é uma barata de lei, com cerca de 150 anos de existência. Criação verista de Debret,
sua reprodução na capa do convite para a exposição de inéditos do artista é de tal modo
convincente que engana qualquer um.
[..]
Barata ao vivo é nojenta, chinele-se a bicha. Barata pintada é arte. Maçã na casa de frutas, ferra-
se o dente ou açucara-se em torta, vita brevis, re não se fala mais nisso! A maça de Cézanne,
mas para que a maça? As cebolas de Cézanne, e mais a garrafa de rouge, o copo com vinho
pela metade, a rolha, a faca, a toalha embolada, em Nature morte aux Oignos, refutam o
princípio de destruição inevitável das formas, pelo menos enquanto o quadro existir.
Ideias velhas, barata nova. Debret foi mais documentarista do que criador, mas nem por isso
sua barata é menos criação. Porque Debret pegou do bicho imundo e disse:
-Agora vou te dar vida longa, maior que a minha, vou te representar. Representar é ser outra
vez, e mais. Tudo quanto posso fazer por mim, e por nós, é fazer-te e fazer-me. Representando-
me, e aos objetos e cenas a que assisto (coroação, fira, inseto), asseguro a tudo a mais valia de
uma vida suplementar, que se chama vida das figuras, das aparências, que são mais do que
as essências, pois estas se evolam, e a aquelas persistem. Entendeste?
[...] -Pensando melhor, a essência está na aparência, que nos propicia o conhecimento imediato
do cosmo. O resto é imaginação ou confirmação. Ês habitante vil de um planeta confuso, que
adotou padrões de classificação baseados em nada. Vil por quê? Por que assim te rotularam?
Que achas das criaturas que te rotulam, ó barata minha?
[...] Sei que a representação é completa e fiel, tão fiel, tão vera, que a representação de
representação, no convite, fez uma senhorita jogas fora o papel e envelope, e correr para lavar
as mãos:
50
-Ui, que horror! Uma baratona.
-Calma, ela é pintada.
-E daí? Pareceu mais real que uma verdadeira!
O maior elogio a Debret, que já ouvi.
(ANDRADE, Carlos Drummond de. Barata. In: Poesia e Prosa. Rio de Janeiro.
Ed. Nova Aguilar, 1983. P. 1438-1439).
Aristóteles defende a mímeses não como uma cópia imperfeita do real como fizera Paltão,
mas como uma representação de uma realidade. Como o conto de Drummond ratifica
esta ideia?
Se você busca debates sadios, opiniões ponderadas e críticas construtivas, não entre nos comentários
de notícias e posts na Internet. Os itens acima são coisa rara no meio do mais puro “ódio.com”.
“É um canal de escape emocional 24 horas no ar. Se a emoção é forte, eu descarrego um caminhão
de sentimentos nos comentários”, afirma Andréa Jotta, pesquisadora do Núcleo de Pesquisa em
Psicologia em Informática da PUC-SP. “O problema é que a Internet deixa aquilo eterno. Você pode
mudar de opinião, mas aquilo fica registrado e pode te prejudicar no futuro”, completa.
Dez anos atrás se popularizou o conceito de “Web 2.0”, e os sites noticiosos abriram espaço para os
internautas opinarem sobre as reportagens. A ideia original era tornar os portais de notícia “uma
rua de mão dupla”. Na prática, o espaço virou um congestionamento de palavrões, ameaças e
preconceitos.
“A tecnologia da internet fez explodir a demanda social da catarse. As opiniões são sempre radicais,
explosivas”, opina o psicólogo Jacob Pinheiro Goldberg. “A lógica binária da internet estimula a
visão maniqueísta do mundo: ou você é contra ou a favor. A sutileza não é o traço essencial da
internet”, argumenta.
A interatividade acabou gerando duas crias indesejadas: os “trolls” e os “haters”. O primeiro é um
polemista que se diverte com a repercussão de suas “troladas”, gíria para opiniões descabidas e
zombeteiras só publicadas para gerar revolta nos outros internautas.
Já os “haters” são acusadores que distribuem sua fúria contra times, partidos, religiões, raças,
gêneros, opções sexuais, gostos musicais e o que tiver em pauta.
51
c) a importância se disponibilizar uma forma de as pessoas aprenderem a lidar com o
estresse.
d) polêmicas geradas pelas crias da internet, os “trolls” e os “haters”.
e) a oportunidade dada aos comentaristas de internet de expressarem suas opiniões.
a) I e II.
b) II e III.
c) II.
d) I e III.
e) I.
“(…) a imitação da realidade, ou melhor, sua representação (...) supõe a existência de dois objetos
– o modelo e o objeto criado –, que mantém entre si uma relação complexa de similitude e de
dessemelhança.”
a) Poética.
b) Mímeses.
c) Metafísica.
d) Verossimilhança.
e) Catarse.
52
05
PERIODIZAÇÃO LITERÁRIA E UNIDADE
FORMAÇÃO DO CÂNONE
53
5.1 INTRODUÇÃO
Vimos na Unidade I que no século XVIII, com o Iluminismo, surgiram novas formas de
se ver e entender o mundo, o que propiciou uma mudança das relações sociais e com isso
a forma de produção e circulação da literatura. Consequentemente, mudou-se também a
maneira como o estudioso passa a se relacionar com o texto literário dando origem à críti-
ca impressionista e à historiografia. Será sobre esta última que falaremos nesta unidade.
Vamos lá!
54
No caso da cultura brasileira, quando se fala em história
literária nas escolas, parece que a referências básica são
os chamados “períodos literários” (ou melhor, “estilos de
época”, como se costuma designá-los). Estes são mostra-
dos com frequência como entidades auto-evidentes, evi-
tando-se na maior parte das vezes todos os problemas
teóricos que a sua construção conceitual abriga (JOBIM,
2003, p. 126).
No entanto, é preciso que o estudo da história da literatura seja mais do que apenas
uma catalogação de obras literárias do passado ou uma lista de características de época
que os alunos do ensino médio decoram a fim de passar nas provas. O que, apesar de um
problema atual, tem raiz no próprio surgimento dos estudos historiográficos.
Vale lembrar ainda que este momento, no qual emerge a historiografia literária, é
também o momento da crítica impressionista de Anatole France e do biografismo de bio-
grafismo de Sainte-Beuve, o que condicionou parcialidade na formação do cânone na me-
dida em que crítico e historiador selecionavam as obras que comporiam seus florilégios e
parnasos, não apenas a partir de um horizonte de expectativas do presente, mas também
a partir de seus juízos de valor, mesmo que entendendo como ciência buscasse impar-
cialidade (SOUZA, 2014). Um bom exercício para verificar essas características é ler com-
parativamente o História da literatura brasileira, de 1888, de Silvio Romero, e o História da
literatura brasileira, de 2011, de Carlos Nejar.
Por isso, os estudos historiográficos e os historicismos precisam e têm se preocupa-
do cada vez mais com a “re-significação da herança anterior” (JOBIM, 2003, p. 121), ou seja,
com a compreensão de que sentido tinha aquela atividade, aquele texto para determinado
autor (ou autores), em determinado tempo e sociedade, cuidando assim para que se evite
o erro do anacronismo – atribuição de conceitos do presente a obras do passado. Mas, ain-
da assim, ciente de que é difícil olhar para o passado sem alguma medida de contamina-
ção do presente. No caso do exemplo citado acima de Dom Casmurro, devido ao romance
abordar temas universais, que ainda hoje refletem a nossa sociedade, é preciso pensar
concomitantemente tanto no ontem como no hoje.
Falaremos mais sobre as perspectivas dessa nova história na Unidade 6 quando abor-
daremos o new historicism.
55
FIQUE ATENTO
O estudioso de literatura, seja o historiador, seja o teórico precisa sempre estar atento para
não analisar uma obra literária a partir do horizonte de seu presente. O que o passado pro-
duziu de horizonte para si próprio, como também para o presente, precisa estar na reflexão
do historiador ou teórico da literatura.
VAMOS PENSAR?
Júlia Lopes de Almeida foi uma autora oitocentista brasileira bastante produtiva. Publicou en-
tre romances, novelas, contos, peças teatrais etc, mais de trinta título. Apesar de ter participa-
do da idealização da Academia Brasileira de Letras (ABL) e de seu ter estado na primeira lista
dos imortais que a fundariam, seu nome fora excluído. Da mesma maneira, durante muitos
anos seu nome também esteve apagado das historiografias literárias, bem como dos livros
didáticos. Vamos pensar, quais seriam os motivos que ocasionaram essa exclusão da autora
da Academia e do cânone?
56
literários que dão início à disciplina Literatura Brasileira. Seu argumento seria que somen-
te durante o Arcadismo é que teríamos tido um sistema de circulação literária. O livro de
Campos, opõe-se à argumentação de Candido, defendendo que já no período anterior,
mesmo que timidamente, já havia um sistema literário posto no Brasil colônia.
Anos mais tarde, em 2017, Júlio França publica o artigo “O sequestro do gótico no
Brasil” , no qual argumenta que no Brasil, diferentemente do que tradicionalmente a his-
toriografia tem mostrado, tivemos um profícuo movimento romântico de estética gótica
e que esta estética permanece latente até a contemporaneidade. Semelhantemente, eu
escrivei um artigo intitulado “O sequestro do fantástico na literatura brasileira” , no qual
discuto a formação de nosso cânone literário, ainda no século XIX, que teria optou por não
incluir (ou desmerecer) um fazer literário que, assim como o gótico, acontecia marginal-
mente ao movimento romântico nacionalista marcado pela “cor local”, isto é, a literatura
fantástica.
O fato é que, como dissemos, a formação do cânone implica em escolhas subjetivas,
políticas e, às vezes, motivadas por uma visão anacrônica do crítico. Por isso, se em algum
momento um gênero ou autor foi considerado menor e excluído do cânone; noutro poderá
ser visto como autor universal e incluído. É o que vimos ocorrer, no caso brasileiro com as
autoras Emília Freitas e Júlia Lopes de Almeida, por exemplo. Assim, como a própria forma
de ler o cânone é modificada com o passar dos anos. A construção de um cânone de uma
literatura nacional ou mundial é algo que está sempre me constante construção e revisão.
57
GLOSSÁRIO
Anacronismo: equívoco gerado ao se aplicar conceitos e perspectivas do presente para discu-
tir e problematizar eventos do passado.
Historiografia literária: ramo dos estudos literários que surge entre o século XVIII e século XIX,
como o objetivo de inventariar (e recontar) o passado literário e cultural de povos. Por isso,
mantêm estreita relação com os procedimentos adotados pela História.
Parnaso: assim como o florilégio é uma antologia. Ex. Parnaso Brasileiro, de Januário da
Cunha Barbosa.
Vanguarda: Literatura ou arte que se pretende inovadora , e por isso, rompe com as estéticas
vigentes. Ao início do Modernismo o mundo observou o surgimento de movimentos vanguar-
distas nas artes como o futurismo, o dadaísmo, o expressionismo, o surrealismo.
58
FIXANDO O CONTEÚDO
1. Sobre a historiografia literária, é correto afirmar:
a) trata-se de uma corrente dos estudos literários que se preocupa em estudar a literatura
em perspectiva histórica.
b) trata-se de uma corrente dos estudos literários que se preocupa em estudar a cronologia
das narrativas.
c) trata-se de uma corrente dos estudos literários que se preocupa estudas apenas obras
contemporâneas
d) trata-se de uma corrente dos estudos literários que se preocupa em estudar a literatura
textualmente.
e) trata-se de uma corrente dos estudos literários que se preocupa em estudar a obra
literária segundo seu engajamento social.
2. (Enade 2011)
Para estudar a história literária brasileira, em vez de um critério político, deve-se adotar uma filosofia
estética compreendendo-a como um valor literário. Para tal, a periodização correspondente é de
natureza estilística, isto é, em lugar da divisão em períodos cronológicos ou políticos, a ordenação
por estilos.
Nas sequências, está destacado um trecho da obra História Concisa da Literatura Brasileira,
de Alfredo Bosi. Avalie se tanto o autor quanto o estilo literário indicados correspondem ao
que Bosi trata no respectivo trecho.
I. “Não se trata, aqui, de fechar os olhos aos evidentes defeitos de fatura que mancham
a prosa do romancista: repetições abusivas, incerteza na concepção de protagonistas,
uso convencional da linguagem...; trata-se de compreender o nexo de intenção e forma
que os seus romances lograram estabelecer quando atingiram o social médio pelo
psicológico médio (...)” Érico Veríssimo. Pré-Modernismo.
II. “Sempre se salva, no foro íntimo, a dignidade última dos protagonistas, e se redimem as
transações vis repondo de pé herói e heroína. Daí os enredos valerem como documento
apenas indireto de um estado de coisas, no caso, o tomar corpo de uma estética
burguesa e ‘realista’ das conveniências durante o Segundo Império” José de Alencar.
Romantismo.
III. “Teve mão de artista bastante leve para não se perder nos determinismos de raça ou
de sangue que presidiriam aos enredos e estofariam as digressões dos naturalistas de
estreita observância [...]” Adolfo Caminha. Naturalismo.
IV. “O seu equilíbrio não era o gotheano – dos fortes e dos felizes, destinados a compor hinos
de glória à natureza e ao tempo; mas o dos homens que, sensíveis à mesquinhez humana
e à sorte precária do indivíduo, aceitam por fim uma e outra como herança inalienável,
e fazem delas alimento de sua reflexão cotidiana” Machado de Assis. Realismo.
59
São corretas apenas as correspondências feitas em
a) I e II.
b) I e III.
c) II e IV.
d) I, III e IV.
e) II, III e IV.
3. (Enade 2011)
Texto I
[...] na leitura — e essa é a primeira reflexão que quero fazer — de qualquer obra literária, de qualquer
texto que tenha por base a intensificação de valores — daquilo que chamamos de uma ou outra
maneira aproximada de valores literários —, existe sempre, como dizia o grande crítico canadense
recentemente falecido, Northrop Frye, a necessidade de conhecimento de duas linguagens.
Segundo ele, na leitura de qualquer poema, “é preciso conhecer duas linguagens: a língua em que
o poeta está escrevendo e a linguagem da própria poesia”. [...] a literatura nunca é apenas literatura;
o que lemos como literatura é sempre mais — é História, Psicologia, Sociologia. Há sempre mais
que literatura na literatura. No entanto, esses elementos ou níveis de representação da realidade
são dados na literatura pela literatura, pela eficácia da linguagem literária.
(BARBOSA, J. A. Literatura nunca é apenas literatura. In: Seminário linguagem e linguagens: a fala,
a escrita, a imagem. Disponível em: Acesso em: 16 ago. 2011 (com adaptações).
Texto II
Fatores linguísticos, culturais, ideológicos, por exemplo, contribuem para modular a relação do leitor
com o texto, num arco extenso que pode ir desde a rejeição ou incompreensão mais absoluta até
a adesão incondicional. Também conta a familiaridade que o leitor tem com o gênero literário, que
igualmente pode regular o grau de exigência e de ingenuidade, de afastamento ou aproximação.
60
reflexões acerca das relações que o texto estabelece com outras áreas do conhecimento e
com outros códigos e linguagens.
4. “O ‘conteúdo’ de um período literário é o sentido formado tanto por aquilo que o período
significa para acultura em que foi constituído [...] quanto por aquilo que ele significa para a
cultura que se apropria dele, gerando uma unidade de sentido para o que evoca, revisa e/
ou cria” (JOBIM, 2003, p. 127).
a) O que o passado produziu de horizonte para o futuro precisa estar presente na reflexão
do historiador e do teórico.
b) O que o presente produziu de horizonte para si próprio precisa estar presente na reflexão
do historiador e do teórico.
c) O que o passado produziu de horizonte para si próprio precisa estar ausente na reflexão
do historiador e do teórico.
d) O que o passado produziu de horizonte para si próprio precisa estar presente na reflexão
do historiador e do teórico
e) O que o presente produziu de horizonte para o passado não precisa estar presente na
reflexão do historiador e do teórico.
a) a crítica oitocentista ao ser pessoal e arbitrária fará uma seleção parcial do cânone em
que não leva necessariamente em conta o valor estético das obras, mas juízos de valores
pessoais, além de questões político-sociais daquele tempo.
b) a crítica impressionista, apesar de pessoal e arbitrária, conseguia manter a neutralidade
requerida a qualquer ciência, a fim de compor o cânone com imparcialidade.
c) os estudos historiográficos oitocentistas continuaram tomando por base os estudos de
retórica e poética, preocupando-se com como um texto seguia ou não as regras do gênero.
d) a historiografia oitocentista, apesar de influenciada pelo critica impressionista e pelo
biografismo, procurava seguir os preceitos das poéticas clássicas.
e) tanto a crítica impressionista quanto a biografista preocupavam-se com a personalidade
do autor, mas sem esquecer-se das questões formais do texto, seu principal interesse.
61
II. uma obra menor será sempre menor, nunca comporá o cânone.
III. O horizonte de expectativas do passado é importante para a compreensão da obra
literária.
IV. são excluídos do cânone apenas obras consideradas best sellers.
a) Apenas I.
b) I e IV.
c) II, III e IV.
d) II e IV.
e) I e III.
7. (UNICENTRO-2019 -adaptado)
O lançamento da obra Quarto de despejo, em 1960, fez de Carolina de Jesus o maior sucesso
editorial da história da literatura brasileira, com cerca de um milhão de cópias vendidas. A autora
deixou registrado o seguinte depoimento:
“Enquanto escrevo vou pensando que resido num castelo cor de ouro que reluz na luz do
sol. Que as janelas são de prata e as luzes de brilhantes. Que a minha vista circula no jardim e eu
contemplo as flores de todas as qualidades.”(1976).
8. Leia o trecho abaixo de Ferdinand Wolf, em O Brasil Literário, umas das primeiras
historiografias da Literatura Brasileira:
Macário e Noite na taverna, em prosa e que têm por heróis verdadeiras caricaturas meias Fausto,
meio Don Juan, delirando como loucos, e expondo aos olhos um cinismo aborrecido. Suas
expressões são a um tempo de uma sentimentalidade procurada e de uma rudeza de mau gosto,
a dicção é amaneirada. [...] são na verdade aberrações de espírito, sem maturidade, transviado por
leituras sem escolha e agitado por uma ambição enferma [...]
(WOLF, Ferdinand. O Brasil literário. São Paulo: Companhia Nacional, 1955, p. 317 [1863]).
62
a) pautou-se nas pelas qualidades formais e estruturais das obras que demonstraram
serem “de uma rudeza e mau gosto”.
b) pautou-se não nas qualidades estéticas das obras, mas no juízo de gosto do historiador,
influenciado pela biografia do autor.
c) pautou-se no fato de sua obra em prosa demonstrar exacerbado nacionalismo, o que
não era bem visto à época.
d) pautou-se pelo fato de seus personagens serem caricaturas, o que esteticamente não
vai bem à uma obra literária digna do cânone.
e) pautou-se no fato de o drama Macário e os contos de Noite na taverna não seguirem os
preceitos da Poética de Aristóteles.
63
06
DE NOVO, A TEORIA: UNIDADE
CORRENTES
64
6.1 INTRODUÇÃO
No capítulo I falamos sobre estudos acerca do texto literário que antecederam o sur-
gimento da disciplina Teoria da Literatura, como as poéticas clássicas que estudamos nos
capítulos 3 e 4 ou como a historiografia que vimos no capítulo 5. Agora falaremos sobre
outros estudos, ou correntes teóricas, que interessam aos Estudos Literários, e por conse-
guinte, à Teoria da Literatura.
O movimento nasce ligado a duas áreas de estudos que podemos dizer serem cir-
cunvizinhas, a linguística e a poética procurando estabelecer um ponto de equilíbrio en-
tre as duas áreas. Tendo como um de seus principais expoentes o morfologista russo V.
Chklosvski (porque seus estudos tornaram-se basilares para a Teoria, assim como os de
Jakobson para a Linguística ou de Propp para os estudos do maravilhoso e do fantástico),
nos interessa aqui comentar suas ideias sobre os procedimentos linguísticos formais que
levam a construção do texto literário tal qual objeto artístico. Em “A arte como procedi-
mento”, Chklosvski defende a tese de que a linguagem literária seria um desvio de nossa
linguagem cotidiana. Por não abordar o cotidiano, a arte literária não pode partir de sim-
ples imagens do real que mimetiza. Daí sua contundente crítica ao teórico Potebnia para
quem a arte, especialmente a poesia, seria uma maneira de permitir ao homem “pensar
por imagens” (CHKLOVSKI, 1978, p. 39).
É evidente que a arte literária, ao fazer uso da conotação, isto é, do sentido figurado
das palavras, produz uma série de imagens que permitem ao leitor, quando confrontado
com o texto literários, recompor o quadro ficcional construído pelo autor.
No entanto, Chklosvski defende que a imagens não deveriam ser construídas como
forma de facilitação do conhecimento e entendimento, como no caso das parábolas bíbli-
cas, não como uma forma de singularização da linguagem, que desautomatize o processo
de leitura e produza um efeito de estranhamento no leitor quando confrontado com a
65
singularidade. É o caso que observamos, por exemplo, no realismo mágico de Jorge Luís
Borges e Gabriel Garcia Marques ou nos romances de Saramago.
FIQUE ATENTO
Estranhamento é efeito estético que uma determinada obra literária causa ao leitor na me-
dida que o distancia da linguagem coloquial e corriqueira e permite-lhe ver o mundo por
um prisma singular que só lhe é possibilitado pela obra literária, na medida que o desafia ao
propor-lhe a revisão de seu conhecimento de mundo.
VAMOS PENSAR?
A partir da argumentação de V. Choklovist que vê a imagem poética como aquela que pre-
tende promover um desautomatização da percepção do leitor durante o processo de leitura,
provocando o que chama de estranhamento, pense nos textos literários que já leu em como, e
em que medida, estes procuram causar um estranhamento através, seja do uso de imagens
poéticas como metáforas, metonímias e outras figuras de linguagem, seja por quebrar a ex-
pectativa lógica da narrativa. Por exemplo, quando lemos em Camões que que o amor “é um
contentamento descontente, / é dor que desatina sem doer”, o paradoxo instaurado nos causa
estranhamento, assim como ler as memórias de um defunto narradas por ele mesmo como
ocorre nas Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis.
66
“discurso literário na medida em que possamos falar do verbo em geral, e inversamente”
(TODOROV, 1971, p. 22).
Não interessava, no entanto, ao crítico estudar as singularidades de uma única e
específica obra literária, mas a criação de uma poética que explicitasse a estrutura e o fun-
cionamento do discurso literário, como uma espécie de gramática descritiva do literário.
Como postula Roland Barthes, em Introdução à Análise estrutural da narrativa, bastava o
conhecimento de algumas obras literárias para observar as regras gerais que regeriam as
demais, assim como faz o antropólogo ao observar alguns membros de uma comunidade
para descrevê-la.
A poética estrutural, ao não considerar valores extrínsecos à obra literária, como a
vida do autor ou o contexto histórico-social no qual a obra talvez se insira, e cuidar exclusi-
vamente da estrutura das obras, isto é, de sua construção verbal, não soluciona o problema
surgente lá em Kant ainda no século, isto é, o “valor artístico, pois a caracterização do dis-
curso literário ou a descrição estrutural de uma obra não explicam a razão de sua beleza”
(TEIXEIRA, 1998, p. 37). Cumpre ressaltar, no entanto, que a despeito das muitas críticas que
recebera o estruturalismo ao longo dos anos, é fato incontestável que tal corrente nos le-
gou preceitos, conceitos e postulados se “incorporaram definitivamente no próprio modo
de ser do pensamento contemporâneo” (TEXEIRA, 1998, p. 34), a exemplo dos pontos de
vista narrativos e da ordem temporal narrativa.
Com isso em mente, a nova crítica, a partir dos ensaios “Intentional fallacy” “Affecti-
ve fallacy”, de William K. Wimsatt e Monroe Beardsley, se orientará pelas noções por eles
cunhadas homônimas aos títulos do ensaio – em português falácia intencional e falácia
afetiva ou emotiva –, no sentido de rechaçar a ideia (falaciosa como denuncia o adjetivo
fallacy) de que, na análise do texto literário, seja necessário recuperar as intenções do autor
ou de que o estudioso deve-se preocupar-se com as emoções provocadas pelo texto literá-
67
rio, pois estes seriam aspectos que não caberiam à crítica literária, mas à historiografia no
primeiro caso e à psicologia no segundo.
O segundo, como o nome nos denuncia significa um retorno aos estudos historio-
gráficos, formulando uma nova história. Assim como o New cristisism surge nos Estados
Unidos da América, mas como uma oposição ao estruturalismo e ao próprio nem cristi-
cism, através dos estudos de Stephen Greenblat.
Greenblat, a partir dos estudos de Michel Foucaut e de Jacques Derrida, ambos tam-
bém críticos ao pensamento estruturalista, entenderá a literatura como uma estrutura que
nos permite “ler o espírito de uma época” (TEXEIRA, 1998, p. 32). Desse modo, seria impos-
sível o seu estudo sem diálogo “com a historicidade do texto e a textualidade da história”
(TEXEIRA, 1998, p. 32).
No entanto, sua proposta de retorno ao estudo do literário que considere os contex-
tos históricos de composição e circulação pretende se colocar como um meio termo entre
o que eram os estudos historiográficos oitocentista, a crítica marxista e os estudos estrutu-
ralistas. Assim, a obra literária não é nem reflexo do contexto histórico social como preco-
nizava o velho historicismo, nem pretexto para a leitura politizada da obra como postulava
a crítica marxista e muito menos um conjunto de estruturas linguísticas sem função social
como queriam os estruturalistas.
“A primeira grande diferença entre o historicismo tradicional consiste na incorpora-
ção da ideia de história com discurso: a história não é fato, mas registro dele. [...] Para que o
fato se converta em histórica é preciso primeiro assumir a condição de discurso” (TEXEIRA,
1998, p. 33) e esse discurso também é refletido no literário. Por isso, o estudo da obra lite-
rária, bem como de outras manifestações culturais ajudariam na recomposição da episte-
me de uma época, isto é, na maneira como os diversos discursos se articularam a fim de
promover “uma visão crítica da história” (TEXEIRA, 1998, p. 34). Mas isso só seria possível se
o historiador ou crítico mantiver algum distanciamento para evitar a emissão de juízos de
valor contaminados pelo seu tempo.
68
Ainda, Barthes questiona a visão romântica do autor como um gênio criador. Para
ele o escritor será sempre o imitador de um gesto ou de uma palavra anteriores a ele, pois
o ato de produção de discursos é sempre um ato dialógico, isto é, um ato que pressupõe
um movimento de retomada a outros textos, a outros discursos. Sendo assim, as intenções
do autor, sua biografia ou mesmo o contexto em que viveu e produziu deixam de ter im-
portância para a interpretação da obra literária. Uma vez publicado, o livro passaria a ser
livre, aguardando que o leitor lhe imputasse os sentidos cabíveis. Noutras palavras, morre
o autor e nasce o leitor.
Inseridos, portanto, nesse contexto de valorização da leitura e da livre interpretação,
muitas teorias foram então articuladas visando às questões receptivas da obra literária, tais
como a estética da recepção de Hans Rober Jauss (1994) e a teoria do efeito estético de
Wolfgang Iser (1996). Estudos que ao se voltarem para o receptor da obra literária, colocam
a seu cargo o papel fundamental da (re)construção do sentido do texto, mas sem incorrer
nas tentativas de recuperar as “intenções do autor”. Entretanto, cumpre ressaltar que:
[...] as posições de Jauss e Iser não são, nem nunca foram,
totalmente homólogas, [apesar de dialógicas]. Ao passo
que Jauss está interessado na recepção da obra, na ma-
neira como ela é (ou deveria ser) recebida, Iser concen-
tra-se no efeito (Wirkung) que causa, o que vale dizer,
na ponte que se estabelece entre um texto possuidor de
tais propriedades — o texto literário, com sua ênfase nos
vazios, dotado pois de um horizonte aberto — e o leitor”
(LIMA, 1979, p. 25).
Isso significa dizer que para Jauss importa como a obra é recebida pelo público leitor
e como o repertório de expectativas, ou seja, o conhecimento de mundo e leituras ante-
riores, desse público influi nesta recepção e na reconstrução dos sentidos do texto. Já para
Iser importa quais os efeitos (no sentido propriamente aristotélico) a obra literária inflige
no leitor quando desta reconstrução.
Outro autor cujo o pensamento se coaduna ao de Jauss e Iser, é do francês Jean-Paul
Sartre, para quem o leitor será sempre coautor do texto que lê. O texto, sem o movimento
de leitura de um leitor real, não passaria de rabiscos num papel, pois “ler implica prever,
esperar, prever o fim da frase, a frase seguinte, a outra página [...]” (SARTRE,1989, p. 35), num
processo contínuo de coprodução autor-leitor.
Uma das premissas teóricas de Iser reafirma esse aspecto fenomenológico da leitu-
ra, com o conceito de “leitor implícito”, leitor que só existe na medida em que o texto deter-
mina a sua existência através das estruturas imanentes. Apesar de não ter existência real,
pressupõe uma leitura real:
As perspectivas do texto visam certamente a um ponto
comum de referências e assumem assim o caráter de ins-
truções; o ponto comum de referências, no entanto, não
é dado enquanto tal e deve por isso ser imaginado. É nes-
se ponto que o papel do leitor, delineado na estrutura do
texto, ganha seu caráter efetivo [...]. O sentido do texto é
apenas imaginável, pois ele não é dado explicitamente [...]
(ISER, 1996, p. 75).
69
Assim como Sartre, Iser admite a participação do leitor na (re)construção do sentido
da obra através da leitura, mas como ato estruturado dentro do texto. Uma perspectiva pa-
recida a que surge posteriormente na obra do semiologista italiano Umberto Eco, a partir
de sua obra Obra Aberta (1961) e que se desenvolve em textos posteriores. A Obra citada
tratava-se de um estudo de estética que tocava nas questões receptivas e interpretativas
de uma obra literária e que entende que o texto literário também depende das interven-
ções do leitor. O ensaio aborda, portanto, a dialética entre a problemática da liberdade de
interpretação, a que Eco chamaria e superinterpretação, e a extrema fidelidade ao texto tal
qual queria formalismo russo, o estruturalismo e o New Cristicism desejavam. A propósito
disso, é válido citarmos o comentário de Sandra Cavicchioli que prefaciou a obra:
Para Eco, portanto, todo texto literário é uma “máquina pobre” (ECO, 1994, p. 3 – tra-
duzido pela Autora) que sobrevive da valorização do sentido que o leitor pode (e deve) ali
introduzir, contando sempre, portanto, com o conhecimento de mundo seus leitores para
atualizá-lo. Por ser “pobre”, toda narrativa é muito lacunar, como já defendia o alemão Iser,
e, quanto mais lacunas apresentar, maiores serão os riscos de interpretações absurdas,
como parece ocorrer em romances de cunho psicológico. Por exemplo, seria como ler Per-
to do coração selvagem, de Clarice Lispector adequando-o única e exclusivamente aos
seus ideais políticos, sociais ou psicológicos, como se o romance falasse não para o leitor ,
mas sobre o leitor. Ou, ainda, ler O processo, de Kafka, como um romance policial; o que
apesar de viável, textualmente não surtiria os mesmos efeitos do que lê-lo como uma nar-
rativa fantástica, do absurdo.
Outro exemplo desse movimento de participação do leitor na (re)construção do
texto, são as narrativas vanguardistas, que, ao diferentemente das reais-naturalistas, não
procuram identificar e instruir seu leitor, mas são construídas de modo a frustrá-lo e sur-
preendê-lo, causando um estranhamento ainda maior do que o de outros textos literários,
exigindo do leitor um trabalho maior no processo interpretativo. Preencher tais lacunas, ou
“vazios”, se usarmos o termo de Iser, portanto, não significa construir outro texto diverso do
inicial, mas aceitar o jogo de reconstrução de sentidos proposto. Entretanto, tal afirmação
reitera o pressuposto de que o texto precisa de um leitor para concretizá-lo.
Nesse sentido, o leitor é condição indispensável para a capacidade concreta da co-
municação do texto e da sua potencialidade criativa:
Em um texto narrativo, o leitor é forçado a cada momen-
to a fazer uma escolha. Além, esta obrigação de escolha
se manifesta através do nível de qualquer enunciado,
pelo menos a cada ocorrência de um verbo transitivo.
Enquanto o falante está prestes a terminar a frase, nós,
mesmo que inconscientemente, fazemos uma aposta,
antecipamos a sua escolha, ou nos sentimos angustiados
em querer saber qual escolha ele fará (ECO, 1994, p. 7, tra-
duzido pela Autora).
70
O leitor empírico por ser um leitor real, de carne e osso como todos nós, ao contrário
do leitor que Eco chama por modelo, não é compromissado com o texto, e por isso nele
imprime os mais diversos sentidos segundo o seu desejo, às vezes, sentidos não necessa-
riamente vinculados ao texto. O leitor modelo (ou ideal em termos formalistas), por seu
turno, não é um leitor real; é na verdade uma criação do próprio texto, um efeito de suas
estruturas narrativas.
Para Eco, trata-se, portanto, de “un lettore-tipo che il testo non solo prevede come
collaboradore, ma anche cerca di creare” (ECO, 1994, p. 11). Em outras palavras, o leitor mo-
delo seria aquele que se questiona sobre como o texto precisa ser lido e busca a resposta
ao seguir as pistas que o próprio texto, na figura do que Eco chama de autor modelo, isto
é, as estratégias narrativas e as marcas próprias do gênero. É possível que esse leitor faça
conexões extratextuais, mas jamais sem calçar-se no textual e cotextual, sob o risco de in-
correr em uma superinterpretação, isto é, em afirmar algo que o texto não diz.
Uma proposta de leitor que em muito se assemelha ao leitor implícito proposto por
Wolfgang Iser. Mas no caso do teórico alemão, mesmo que entenda tal leitura implícita
como parte da estrutura narrativa imanente ao texto, admite, assim como Sartre, a ocor-
rência de uma leitura real que se dá como ato estruturado fora do texto. Grosso modo,
para o alemão , o leitor é aquele que condiciona o texto imputando-lhe sentido; para ita-
liano, no entanto, o texto, melhor dizendo, suas estratégias narrativas, condicionam o leitor
na recuperação dos sentidos possíveis. Com isso, é possível entendermos que toda leitura
é empírica, no sentido proposto por Iser, e a leitura modelo, conforme proposta por Eco,
como uma idealização teórica que precisa ser buscada não pelo leitor comum, mas pelo
estudioso do texto literário.
71
BUSQUE POR MAIS
Para saber mais sobre as diversas correntes teóricas para a investigação do dis-
curso literário, consulte o livro da professora e pesquisadora Maria Antonieta
Jordão de Oliveira Borba, “Tópicos de teoria: para a investigação do discurso
literário”. No título, a autora fala sobre as principais correntes críticas e aborda
em detalhes as contribuições da linguística e da psicanálise para a teoria da
literatura e as teorias do efeito estético da interpretação.
Para saber mais sobre as correntes teóricas que aqui comentamos e outras mais, veja o arti-
go “As novas correntes da crítica Literária” de Luiz Carlos Moreira da Rocha e Carlos César de
Carvalho Marques disponível em: https://bit.ly/3i6A1Gq. Acesso em: 29 jun. 2021.
GLOSSÁRIO
Estranhamento: Conceito cunhado pelo formalista russo V. Chokovski que preconiza que o
texto literário deve produzir imagens poéticas que provoquem um efeito de desautomatiza-
ção ou desfamiliarização em relação à linguagem cotidiana.
Leitor implícito: Conceito de leitor/leitura cunhado pelos estruturalistas. Trata-se do leitor que
seria engendrado pelas estruturas narrativas do texto.
Leitor ideal: Trata-se de um leitor que, assim como o leitor implícito, leria a texto seguindo as
pistas que as estruturas narrativas lhe deixam, isto é, aquele cuja leitura cola à do leitor implí-
cito do texto.
Leitor empírico: Trata-se do leitor real, de carne e osso, aquele a que efetivamente lê ou lerá a
obra literária.
Episteme: Conceito grego reformulado mais tarde por Michel Foucault. Para o filósofo a epis-
teme é o conjunto de discursos promovidos pelo as diversas manifestações sociais e culturais
de uma determinada época que permitiriam recompor a história de um povo.
72
FIXANDO O CONTEÚDO
1. (CESPE / CEBRASPE - 2018 - IFF - Professor - Letras/Espanhol)
a) a estilística.
b) o formalismo russo.
c) o new criticism.
d) o estruturalismo.
e) a crítica marxista.
Texto 2
Desencanto
Eu faço versos como quem chora
De desalento... de desencanto...Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.
Meu verso é sangue. Volúpia ardente... Tristeza esparsa... remorso vão...
73
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.
E nestes versos de angústia rouca,
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca. Eu faço versos como quem morre.
(BANDEIRA, M. A cinza das horas. 1917).
A partir dos textos citados, assinale a opção que apresenta a relação entre a especificidade
da linguagem literária e a crítica literária.
a) A partir de leituras críticas do poema de Manual Bandeira, é possível fruí-lo melhor, pois
a crítica literária não deixa nada descoberto.
b) Os critérios de classificação propostos pela crítica e pelos teóricos da literatura permitem
ao leitor uma fruição mais prazerosa do poema de Manuel Bandeira.
c) Para facilitar a leitura e permitir fruição estética mais intensa ao leitor, os críticos literários
mostram a morfologia do texto e as armadilhas que constituem a sua estrutura.
d) A crítica literária, por não apontar caminhos precisos do processo de leitura do texto, é
ineficaz para a fruição e interpretação do poema de Manuel Bandeira.
e) Para que possa fruir esteticamente o poema de Manuel Bandeira, é necessário que o
leitor articule sua experiência de mundo com seus conhecimentos sobre a literatura.
Em Gonçalves Dias, sentimos que o espírito pesa as palavras, em Castro Alves, que as palavras
arrastam o espírito na sua força incontida. Situado não apenas cronologicamente entre ambos,
Álvares de Azevedo é um misto dos dois processos. Na melhor parte de sua obra, as palavras se
ordenam com medida, indicando que a emoção logrou realizar-se pelo encontro da expressão justa.
Infelizmente, porém, (...) se na sua obra propriamente lírica existe não raro uma serena contenção,
a que lhe deu fama e definiu a sua maneira própria se caracteriza pela tendência à digressão e à
prodigalidade verbal, que o tornaram, com o passar do tempo, o poeta desacreditado de nossos
dias.
(Formação da literatura brasileira: momentos decisivos)
I. a crítica implica uma valoração, resultante das relações que o crítico estabelece entre os
elementos constitutivos da obra analisada e a série literária.
II. em cada situação específica, a crítica incide na análise independente de um dos três
aspectos do fenômeno literário: ou o produtor, ou a obra, ou o público.
III. é tarefa do crítico prescrever leituras que, ao suprirem certas necessidades do ser
humano, atendam às expectativas do público.
a) I.
b) II.
c) III.
74
d) I e II.
e) II e III.
4. (Enade 2005)
O universo (que outros chamam a Biblioteca) compõe-se de um número indefinido, e
talvez infinito, de galerias hexagonais, com vastos poços de ventilação no centro, cercados por
balaustradas baixíssimas. (...) A Biblioteca existe ad eterno. Dessa verdade, cujo corolário imediato
é a eternidade futura do mundo, nenhuma mente razoável pode duvidar. (...) Em alguma estante
de algum hexágono (raciocinaram os homens) deve existir um livro que seja a cifra e o compêndio
perfeito de todos os demais: algum bibliotecário o consultou e é análogo a um deus.
(Jorge Luís Borges, “A biblioteca de Babel”, Ficções)
“... a partir de Flaubert e Baudelaire, instala-se nas letras o senso da “vacuidade do ideal”; emerge a
tradição moderna como literatura crítica.
75
das imagens corriqueiras. A obra de arte literária deve libertar-se do automatismo do
reconhecimento para provocar um estranhamento através da singularização da imagem
poética. Ciente disso, assinale a alternativa em que verifica uma imagem poética:
O texto a seguir é um trecho de uma entrevista concedida por Janet M. Paterson à revista
Aletria.
Aletria — Vários críticos, tais como Lacan, Derrida, Levinas, Deleuze, Lévi-Strauss, Bhabha
e Spivak, têm discutido a questão da alteridade e as implicações das teorizações baseadas nas
percepções do outro. Quais são as bases teóricas de sua pesquisa sobre figurações da alteridade?
Janet M. Paterson — O trabalho do sociossemioticista francês Eric Landowski forneceu o
arcabouço conceitual de meu livro. Em Présences de l’Autre: essais de socio-sémiotique, Landowski
estuda casos reais de alteridade em Paris, tais como os moradores de rua ou os artistas da região do
Centre Pompidou. Isso lhe permitiu elaborar uma metodologia extremamente requintada e precisa
que me pareceu muito útil. Mencionarei alguns de seus principais conceitos: a distinção entre
diferença e alteridade (distinção que permite a Landowski conceituar alteridade); a necessidade
de um grupo de referência (um grupo social dominante) para a existência de qualquer forma de
alteridade; e a complexidade dos vários tipos de relações estabelecidas com o outro. Acima de
tudo, eu era continuamente lembrada de que na literatura, assim como na sociedade, a alteridade
é sempre uma construção.
a) contexto da pós-modernidade.
b) âmbito das vanguardas históricas.
c) período da belle époque.
d) contexto da crítica marxista.
e) contexto pré-romântico.
8. O estruturalismo foi um movimento crítico que teve nos nomes de Roland Barthes e
Tzvetan Todorov seus maiores expoentes. Para tal corrente crítica, o estudo do discurso
literário deveria centrar-se:
a) na biografia autor.
b) no contexto histórico.
c) nas estruturas narrativas.
d) nas idiossincrasias do leitor.
e) na estrutura da psique humana.
76
2
PRÁTICA PEDAGÓGICA
INTERDISCIPLINAR: TEORIA
LITERÁRIA - TOMO II
GÊNEROS LITERÁRIOS
10
1.1 INTRODUÇÃO
Afinal, por que classificamos as obras literárias? Um ponto de vista que ilustra
a importância dos estudos discursivos e, no interior deles, a necessária distinção dos
gêneros é o expresso por Fernando Paixão:
A evolução histórica e política da sociedade [...] acabou
dando à linguagem as mesmas rígidas características
que se verificam nas relações de trabalho. Divisões.
Especializações, manipulações, etc. E a linguagem, do
mesmo modo que a vida, passou a ser governada por
11
regras e leis. Proibições e limites. (PAIXÃO, 1984, p. 16).
VAMOS PENSAR?
Embora seja própria dos estudos literários, a teoria dos gêneros não se limita às Letras. Sen-
do muito importante no processo de letramento e alfabetização de modo geral, ela tam-
bém é utilizada por outras áreas do conhecimento. Você consegue citar ao menos uma
delas? Uma dica: todas lidam de alguma forma com a produção escrita.
Como toda teoria, a conceituação dos gêneros literários segue alguns preceitos
orientadores e, através deles, ela visa promover a delimitação de um conjunto de textos
que compõe o que podemos imaginar como um acervo de textos artísticos, ou seja,
que possuem um caráter estético de seleção, organização e tratamento da matéria
que os compõem. Em teoria literária, portanto, tomamos como pressuposto que o que
diferencia o objeto de estudo da literatura é o tratamento estético dado à linguagem.
Dessa maneira, a classificação dos textos literários em gêneros específicos tem
como princípio básico promover a identificação de “mecanismos de estruturação
semelhantes” (SOARES, 2007, p. 7). Sendo assim, o que nos interessa observar é o modo
pelo qual o texto se organiza estruturalmente para construir significado.
Devemos ter em perspectiva, no entanto, que a classificação dos gêneros encerra
certos problemas que o estudante de literatura deve reconhecer: em primeiro lugar, nem
toda obra literária, sobretudo em se tratando das modernas, se encaixam em normas
e definições preconcebidas; em segundo, que após o romantismo não se pode falar
em gêneros puros; e, em terceiro, que a palavra gênero redunda em certa imprecisão
terminológica nos estudos literários, ao servir tanto para identificar uma divisão tripartida
(lírico, narrativo e dramático), como para designar, no interior dessa tripartição, as
formas literárias que dela resultam, falando-se em gênero romance, gênero comédia
ou gênero ode. Acerca desse aspecto, Yves Stalloni pondera que: “[...] parece ser muito
difícil, para a literatura, chegar a um consenso sobre uma teoria coerente dos gêneros
baseada em definições rigorosas e em delimitações precisas. [...].” (STALLONI, 2007, p.
16).
Tendo em vista essas três questões que levantam problemas de definição no
âmbito dos gêneros, devemos levar em consideração que os critérios de classificação,
embora sejam válidos, sobretudo do ponto de vista estrutural, não são incontestáveis
no processo de apreciação crítica de uma obra.
13
Portanto, a análise da sistematização formal do texto literário nos permite agrupá-
lo em uma categoria ou, de maneira oposta, situar a distância que ele estabelece em
relação a essa categoria, quando dela divergir. De qualquer forma, de uma maneira
geral, é preciso conhecer as diretrizes que orientam a classificação dos gêneros literários,
pois elas nos possibilitam estabelecer parâmetros de análise para o estudo do texto de
feições artísticas.
1.3.1 Grécia
FIQUE ATENTO
Os ditirambos são composições poéticas que eram entoadas e apresentadas na tradição
grega ao som de instrumentos (como tambores, liras e flautas), um coro e um corifeu (can-
tor principal). Seus temas eram voltados para os afetos, a paixão, a admiração, a exaltação
do amor e outros motivos sentimentais que ensejavam o culto a Baco. Essa era uma forma
artística devotada à expressão sob um viés individual (na acepção da cosmovisão grega).
Ao ditirambo, no entanto, conforme Platão (no diálogo 398 b, p. 154), caberia apenas
“o estilo moderado” em sua exposição, não podendo ele sair dos modelos previamente
instituídos para tal, de modo a não correr-se o risco de desvirtuar, pelo divertimento
focado no indivíduo (na acepção antiga, por oposição ao coletivo), a edificação da
pólis.
A teoria platônica dos gêneros preestabeleceu, portanto, que para cada forma
havia um modo de se fazer a arte. Entretanto, Platão soergueu seus argumentos com
base na função moralizante que cada gênero desempenhava na vida da pólis e, sendo
assim, em sua hierarquização, acabou por reduzir a importância da poesia.
Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.), que fora discípulo de Platão, por sua vez, discordando
da formulação proposta por seu mestre, constrói uma segunda conceituação para os
gêneros, deixando de lado o critério moralizante e orientando-se pelo viés estético, isto
é, pela organização formal da obra e seus elementos intrínsecos.
Em sua Poética, ele retoma o conceito de mimesis, dotando-o de um caráter
engenhoso pelo qual se processa o trabalho de transposição da realidade empírica
para a realidade artística. Nesse processo, a teoria aristotélica formula diferentes meios,
objetos e modos para identificar a constituição da obra artística.
Embora não nos tenha chegado a segunda parte da Poética, os critérios gerais
nela elaborados permitem conceber parâmetros de análise para a organização estética
de uma obra a partir de três elementos:
14
MEIOS referem-se ao ritmo, ao tipo de linguagem utilizada e à harmonia formal da
obra;
OBJETOS referem-se aos tipos retratados, isto é, seres superiores (ou de elevada psique,
em cujas virtudes e ações se concentram as transformações do mundo), seres
equivalentes ao homem comum e seres piores (portadores de vícios e más
condutas);
MODOS eferem-se ao processo como a mimesis é desenvolvida, isto é, pelo modo nar-
rativo e pelo dramático (ação / encenação).
Quadro 1 : organização estética de uma obra a partir de três elementos
Fonte: Elaborado pelo autor com base em ARISTÓTELES (2008).
1.3.2 Roma
Já em Roma, na Carta aos Pisões, ao tratar da poesia dramática, Horácio (65 a.C.
– 8 a.C.) preceitua a regra da perfeita conformidade entre tema, tom, ritmo e métrica.
Na conceituação horaciana, a rigidez formal é enfatizada como método de criação
para os poetas que tinham intenção de obter algum reconhecimento por suas obras,
não sendo admitido trabalho artístico que não obedecesse aos parâmetros formais
estabelecidos em torno dos princípios da ordem e do arranjo.
Embora tenham importantes diferenças de abordagens, essas linhas de
conceituação dos gêneros literários sintetizam, sobretudo, dois pontos fundamentais: 1)
os gêneros possuem configurações normativas que devem ser respeitadas; 2) possuem
também funções sociais que permitem à literatura funcionar como uma espécie de
15
“ferramenta” social, moral, política e ética.
Assim, o panorama dos gêneros literários e suas formas de classificação na
Antiguidade pode ser assim compreendido:
Na antiguidade, impõem se como principais formas lite-
rárias a epopeia, a tragédia e a comédia, além de moda-
lidades que se absorveriam no conceito de gênero lírico,
como ditirambo, a ode, o hino, o epigrama, a égloga. A
reflexão sobre os gêneros, por sua vez, tende a fixar três
princípios: normatividade (cada gênero tem suas regras
de composição); hierarquia (há gêneros tidos como su-
periores – por exemplo, a tragédia – e outros considera-
dos inferiores – por exemplo, a comédia); pureza (não se
admite em princípio a possibilidade de uma obra com-
binar elementos de gêneros diversos). (SOUZA, 1999, p.
12).
Quanto aos estilos, obras como Ilíada, Odisseia e Eneida constituem os mais
importantes paradigmas formais para os estudos filológicos. Assim, no século XII,
conforme GUIRRAUD (1970), o filósofo João de Garlândia faz uma importante contribuição
aos estudos estilísticos ao arquitetar a “Roda de Virgílio” (Rota Vergilii) para categorizar
os estilos da poesia de Virgílio a partir das suas três principais obras (Eneida, Geórgicas
e Bucólicas) em um raio de três aros concêntricos, havendo, para cada um deles,
um grupo de elementos unificados com estilo, ambiente, instrumentos, alimentos e
personagens característicos.
FIQUE ATENTO
Não devemos confundir gêneros literários com movimentos literários. Os gêneros são for-
mas que se constituem como diretrizes para a produção de obras literárias, e são identi-
ficados mediante caracteres estruturais que a compõem. Além disso, cada gênero possui
constantes ou marcas de conteúdo segundo as quais podemos identificar uma obra e as-
sociá-la à tradição literária, por exemplo, do romance, da poesia bucólica etc. Os movi-
mentos, por sua vez, são responsáveis por elencar um conjunto de características próprias
de um determinado período sócio-histórico que servem de orientação à composição das
obras. A relação entre gêneros e movimentos literários se configura na medida em que
cada época, isto é, cada movimento artístico, seleciona características específicas a serem
incorporadas pelos gêneros, moldando-os, assim, ao gosto artístico em voga.
Dessa formulação resulta uma das principais linhas interpretativas dos gêneros,
dado que ela se baseia na acomodação das formas às funções que a sociedade a
elas atribui, de modo que em determinadas condições sociais e históricas predominam
gêneros que correspondem às necessidades manifestadas por dada sociedade. Assim,
a análise e a classificação dos gêneros hoje são mais marcadas pela averiguação de
suas marcas predominantes em dado período, com a observação de certas constantes
de forma e conteúdo, do que pelos critérios de normatividade, pureza e hierarquia.
Partindo da interpenetração entre sujeito, sociedade, tempo histórico e discurso e
corroborando para a instituição de conceitos de análise modernos para apreciação dos
gêneros, em Estética da criação verbal (2011), Mikhail Bakhtin estabelece como princípio
de distinção dos gêneros a partir de “atos de linguagem” que configuram os diferentes
tipos de discursos no âmbito da sociabilidade humana:
[...] As mudanças históricas dos estilos de linguagem
estão indissoluvelmente ligadas às mudanças dos gê-
neros do discurso. A linguagem literária é um sistema
dinâmico e complexo de estilos de linguagem; o peso
específico desses estilos e sua inter-relação no sistema
da linguagem literária estão em mudança permanente.
A linguagem da literatura, cuja composição é integrada
pelos estilos da linguagem não literária, é um sistema
ainda mais complexo e organizado em outras bases.
para entender a complexa dinâmica histórica desses sis-
temas, para passar da descrição simples (e superficial na
maioria dos casos) dos estilos que estão presentes e se
alternando para a explicação histórica dessas mudanças
faz-se necessário uma elaboração especial da história
dos gêneros discursivos (tanto primários quanto secun-
dários), que refletem de modo mais imediato, preciso e
flexível as mudanças que transcorrem na vida social. Os
enunciados e seus tipos, isto é, os gêneros discursivos,
são correias de Transmissão entre a história da socieda-
de e a história da linguagem. nenhum fenômeno novo
(fonético, léxico, gramatical) pode integrar o sistema da
língua sem ter percorrido um complexo e longo cami-
nho de experimentação e elaboração dos gêneros e es-
tilos. (BAKHTIN, 2011, p. 267-268).
20
Na perspectiva bakhtiniana, a linguagem literária, que caracteriza os diferentes
estilos no âmbito dos gêneros literários, se baseia em uma formulação mais complexa
e, portanto, de segunda instância em relação a outros gêneros discursivos de uso
cotidiano, uma vez que trata-se de uma reelaboração de estilos de linguagem não
literários (BAKHTIN, 2011, p. 263-264). Dessa forma, há que se considerar, no processo de
apreensão das formas literárias, a profunda interpenetração entre sujeito, sociedade,
tempo histórico e discurso, sendo que no universo discursivo, os “gêneros primários”
(utilizados na comunicação da vida real) estarão reformulados nos “gêneros
secundários” (mais complexos), que derivam de uma organização mais criteriosa dos
usos e sentidos linguísticos.
O que permanece como primado da teoria clássica é que os gêneros literários são
conceitos que se referem às formas de arte que se manifestam pela expressão linguística,
e se configuram a partir de uma unidade formal que é responsável por tornar uma obra
um objeto estético.
O conto “Uns braços”, de Machado de Assis, foi escrito em 1895 e narra o despertar
da paixão de Inácio, um menino de 15 anos, por D. Severina, uma senhora mais velha
e casada. A paixão do menino por D. Severina desperta nela um outro olhar sobre si
mesma, mediante a comparação que surge entre o desinteresse manifestado pelo
marido e o sentimento demonstrado pelo jovem Inácio. A questão do adultério surge
como uma ideia oposta à idealização feminina, aos valores e à moralidade burguesa
da sociedade carioca do fim do século XIX.
Quanto ao ritmo, embora haja certas combinações que se harmonizam
sonoramente, não se pode identificar, como na poesia, os intervalos nos quais esses
sons se processam, de modo que, “o ritmo existente não é especialmente relevante,
limitando-se praticamente a conservar o ritmo espontâneo que a linguagem verbal
possui mesmo em seus empregos fora da literatura.”. (SOUZA, 1999, p. 41).
23
Observa-se a condução da narrativa por uma voz que não expressa, como ocorre
na poesia, seus sentimentos de maneira direta. O narrador, como é chamada a voz
que constrói a perspectiva pela qual se configura a narração na prosa, se posiciona de
maneira diversa do eu poético, uma vez que, sua intenção é contar fatos, acontecimentos
ou situações que permitam a construção de um enredo, por isso, ele tende a proceder
de maneira mais clara e objetiva do que o poeta na construção de figurações.
Essa classificação admite uma subclassificação que será mais detalhada nas
próximas unidades. Por hora, podemos apenas predefinir que ao domínio do lírico
pertencem a elegia, a écloga, a sátira, a ode; o epitalâmio, o soneto e o haicai, por
exemplo; a epopeia, o romance, a novela, o conto e a fábula pertencem ao domínio
narrativo; e a tragédia, a comédia, a tragicomédia, o auto e a farsa, ao domínio do
dramático.
Em linhas gerais, os aspectos mais relevantes a se considerar na conceituação
desses gêneros pelo critério histórico são: o gênero lírico caracteriza-se por um ponto
de vista subjetivo e uma linguagem marcada pela conotação e pela emotividade. O
gênero narrativo (ou épico) apresenta um narrador que conta uma história situada
em um tempo e um espaço. E o gênero dramático consiste em uma forma híbrida, pois
pode ser, além de escrito ou recitado, também encenado, sendo predominantemente
marcado pelo diálogo entre as personagens ou pelo monólogo (quando apresenta
apenas uma personagem).
Desse ponto de vista, pressupõe-se uma variação valorativa dos subgêneros que
se classificam no interior dessa tríade de acordo com os valores e as necessidades
expressivas de cada sociedade. É assim que se interpreta, por exemplo, a epopeia como
forma mitológica expressiva do heroísmo de um povo, a novela de cavalaria como
expressiva da sociedade medieval e sua progressiva transformação em romance,
forma narrativa mais representativa das sociedades modernas e contemporâneas. Nas
próximas unidades, veremos como esses aspectos são apresentados na construção
das obras literárias e os conceitos que se consolidaram como marcas expressivas de
cada um desses gêneros.
26
GLOSSÁRIO
Épico – refere-se a uma técnica narrativa (epopeia) da Antiguidade que se exprimia me-
diante a narração de feitos grandiosos ligados ao passado pátrio.
Lírico – refere-se à poesia lírica, manifestação artística dotada de ritmo e voltada para a
expressão da subjetividade.
Grotesco – (do italiano grotta = caverna, gruta) palavra usada para se referir aos desenhos
que os antigos faziam nas paredes das grutas, passando a nomear a pintura que a imitava.
Na literatura, é o feio, o disforme, o extravagante, o desarmônico.
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FIXANDO O CONTEÚDO
1. Ano: 2018 Banca: FUNDATEC Órgão: Prefeitura de Bom Jesus – RS Prova: FUNDATEC –
2018 – Prefeitura de Bom Jesus – RS – Professor – Língua Portuguesa
2. Ano: 2018 Banca: AOCP Órgão: Prefeitura de Feira de Santana – BA Prova: AOCP –
2018 – Prefeitura de Feira de Santana – BA – Professor – Língua Portuguesa
a) romance.
b) novela.
c) conto.
d) comédia.
e) crônica.
Sobre gêneros literários, marque (V) verdadeiro ou (F) falso e assinale a alternativa
correta:
A) V – V – V – V – V.
B) F – V – V – V – F.
C) V – V – V – V – F.
D) F – V – V – V – V.
E) V – F – F – F – V.
5. Ano: 2020 Banca: INSTITUTO AOCP Órgão: Prefeitura de Betim – MG Prova: INSTITUTO
AOCP – 2020 – Prefeitura de Betim – MG – Professor – Português
A) Melodrama.
B) Auto.
C) Farsa.
D) Cantiga.
E) Tragicomédia.
Referência Bibliográfica:
ANDRADE, Carlos Drummond. Claro Enigma. 13ª ed. Rio de Janeiro: Record, 1998.
7. De acordo com SOARES (2007), o gênero lírico se configura por meio de uma
individualidade (eu lírico / eu poético / sujeito poético) que se exprime pela
combinação entre construção de sentido e efeitos sonoros. Isso porque, em sua
gênese:
a) Trata-se do prefácio escrito ao livro Os miseráveis, em que Victor Hugo rompe com a
representação de temas mitológicos para tratar dos pobres.
b) Trata-se do prefácio escrito a Cromwell, que discute as misturas de estilos como
princípio da composição literária moderna.
c) Trata-se do prefácio escrito ao livro As contemplações, que trata da natureza do
objeto literário.
d) Trata-se do prefácio escrito ao livro A lenda dos séculos, em que Victor Hugo discorre
sobre a importância de adequar os gêneros literários, considerando a sua evolução
histórica.
e) Trata-se do prefácio ao livro Os orientais, em que Victor Hugo questiona o estilo
clássico herdado do Ocidente.
FORMAS LÍRICAS
34
2.1 INTRODUÇÃO
Esta unidade tem como principal objetivo traçar uma caracterização das formas
líricas de poesia a partir de sua estrutura e configurações temática e estilística, de modo
a possibilitar a identificação de um texto poético, bem como oferecer subsídios para
sua análise e interpretação.
FIQUE ATENTO
Dada a imprecisão terminológica que cerca o gênero lírico, cabe fazermos um adendo
quanto ao emprego de termos que muitas vezes aparecem como sinônimos ou correlatos
em textos de análise poética:
Poesia – é um gênero literário, que se distingue da prosa pela presença marcante do ele-
mento ritmo;
Poema – é toda composição literária pertencente ao gênero da poesia;
Verso – é o “...período rítmico que se agrupa em séries numa composição poética.” (Cunha,
1970, p. 156), ou, por outras palavras, é cada linha do poema. (SOUZA, 1999, p. 36).
Por isso, a poesia é uma expressão daquilo que sentimos em relação às coisas,
às pessoas ou aos acontecimentos. Assim, é com base no critério da subjetividade que
podemos conceituar a lírica, pois de acordo com Yves Stalloni:
[...] o poeta abandona o domínio da imitação da reali-
dade em troca daquele da introspecção individual. Essa
tendência literária que negligencia a atitude de tomar
o mundo como modelo, que ignora as expectativas do
auditório, que parece traduzir, de maneira incontrolada,
a interioridade do criador e reproduzir uma fala que ele
dirige a si mesmo, corresponde àquilo que será chama-
do de lirismo. (STALLONI, 2007, p. 135).
Portanto, temos que nas formas líricas, o poeta procede de modo a projetar
uma linguagem voltada para si mesmo, com o intuito de ressignificar o domínio da
sensibilidade humana, utilizando-se da máxima potencialidade expressiva das palavras.
É nesse sentido que Alfredo Bosi afirma que o poeta é um “doador” de sentidos.
38
De maneira ilustrativa, Fernando Paixão faz uma diferenciação acerca da forma
específica de como a poesia faz uso da linguagem:
Envolvido pela paixão, pela alegria ou pela tristeza, o po-
eta pode conceber as imagens mais alucinadas: que um
guarda-roupa voa pela janela ou que uma fogueira está
contida dentro da mão, etc. O que importa para ele não
é a veracidade ou a verdade dos fatos, importa sim que
esteja escrevendo aquilo que sente, em palavras que
transmitam a sua visão de mundo, seja ela qual for, e
mostrando seu combate com a vida.
E como a matéria-prima do poeta é em primeiro lugar
seu sentimento, ele procura arranjar as palavras no po-
ema do modo como seu sentimento exige, a fim de
transmitir toda a sua experiência. ao contrário na lin-
guagem de uso prático, onde as palavras são emprega-
das a partir do significado comum a todas as pessoas, a
característica marcante da poesia é a de recriar o signifi-
cado das palavras, colocando as num contexto diferente
do normal.
[...] Essa capacidade de revelar nova substância dentro
de palavras já gastas e surradas é que constitui a maior
riqueza da poesia [...]. (PAIXÃO, 1984, p.14-15).
Os aspectos rítmicos que geram musicalidade, por sua vez, contribuem para
condensar as sensações transmitidas pelo texto poético, atuando na construção de
uma comoção por parte do leitor:
Exemplo:
40
Verso: Quando os teus olhos fecharem (do poema “Canção elegíaca”, do poeta
recifense Joaquim Cardozo)
Separação das sílabas métricas: Quan / do os / teus / o / lhos / fe / cha / rem
1 2 3 4 5 6 7
RIMAS OCORRÊNCIA
Pobres entre palavras de mesma classe gramatical
(ex.: cantado/amado)
entre palavras de diferente classe gramatical
Ricas (ex.: figura/pura)
Exemplo de aliteração:
Exemplo de assonância:
Se desmorono ou se edifico,
permaneço ou me desfaço
– não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
E agora, José?
A festa acabou
A luz apagou
O povo sumiu
A noite esfriou
E agora, José?
E agora, você?
Você que é sem nome
Que zomba dos outros
Você que faz versos
Que ama, protesta?
E agora, José?
Está sem mulher
Está sem discurso
Está sem carinho
Já não pode beber
Já não pode fumar
Cuspir já não pode
A noite esfriou
O dia não veio
O bonde não veio
O riso não veio
Não veio a utopia
E tudo acabou
E tudo fugiu
E tudo mofou
E agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra
Seu instante de febre
Sua gula e jejum
Sua biblioteca
Sua lavra de ouro
Seu terno de vidro
Sua incoerência
Seu ódio, e agora?
Com a chave na mão
Quer abrir a porta
Não existe porta
Quer morrer no mar
43
Mas o mar secou
Quer ir para Minas
Minas não há mais
José, e agora?
Se você gritasse
Se você gemesse
Se você tocasse
A valsa vienense
Se você dormisse
Se você cansasse
Se você morresse
Mas você não morre
Você é duro, José!
Sozinho no escuro
Qual bicho-do-mato
Sem teogonia
Sem parede nua
Para se encostar
Sem cavalo preto
Que fuja a galope
Você marcha, José!
José, para onde?
Verso branco
Exemplo:
[...]
Serás lido, Uraguai. Cubra os meus olhos
Embora um dia a escura noite eterna.
Tu vive e goza a luz serena e pura.
Vai aos bosques de Arcádia: e não receies
Chegar desconhecido àquela areia.
Ali de fresco entre as sombrias murtas
Urna triste a Mireo não todo encerra.
Leva de estranho céu, sobre ela espalha
Co’a peregrina mão bárbaras flores.
E busca o sucessor, que te encaminhe
Ao teu lugar, que há muito que te espera.
45
(Trecho do canto quinto de O Uraguai, de Basílio da Gama)
Verso livre
O verso livre, por sua vez, se caracteriza pela liberdade métrica, isto é, “quando
os versos obedecem às regras métricas de verificação ou acentuação, mas não
apresentam rimas” (GOLDSTEIN, 2006, p. 49). Dessa forma, não segue, como o verso
branco, nenhum critério de combinação de rimas. A disposição do poema de versos
livres segue mais o ritmo e o fluxo de palavras propostos pelo poeta do que uma rigidez
formal, sendo essa uma forma considerada tipicamente modernista. Nesse tipo, “cada
verso pode ter tamanho diferente a sílaba acentuada não é fixa, variando conforme a
leitura que se fizer” (GOLDSTEIN, 2006, p. 49), o que gera imprevisibilidade, dando maior
liberdade ao poeta.
Exemplo:
Poema em prosa
VAMOS PENSAR?
Se a marca distintiva mais evidente da lírica é sua configuração em versos, qual outro cri-
tério de identificação podemos eleger diante de seu formato em prosa?
Exemplo:
Desse ponto de vista, devemos compreender que existem diretrizes para a análise
do texto lírico ou poético, mas que o gênero não se esgota em formatos estanques;
ao contrário, ele flerta com os outros gêneros como se buscasse conter algo que,
obedecendo a um impulso espontâneo e primitivo, como a lei da gravidade, promove
um retorno à poesia, já que, para retomar a conceituação de Octavio Paz: “Deixar o
pensamento em liberdade, divagar, é regressar ao ritmo”. (PAZ, 1984, p. 82-83). Portanto,
quando a prosa perde o seu caráter racional e analítico, ela se deixa retornar ao estado
poético da linguagem que reflete menos a razão do que os sentimentos e as emoções.
Daí as fronteiras da forma serem hoje mais pontes do que limites entre os gêneros.
Lírica e sociedade
Por conta dos elementos que, como vimos, fizeram da lírica uma expressão, a
priori, voltada aos sentimentalismos e à vida interior, os traços que tradicionalmente
a caracterizam como forma literária estão ligados à presença de um eu lírico (ou eu
poético) que condensa uma visão de mundo, sendo responsável por sintetizar, no tempo
poético, os seus impulsos interiores. A lírica moderna, no entanto, inclui uma visão social
mais reflexiva que abrange essencialmente a materialidade que rodeia o eu lírico e que
se processa em contraste com imaterialidade (intimismo, emoção) que vigorou como
uma de suas características primordiais. De acordo com Angélica Soares:
Léxico
Sintático
No nível sintático estuda se o modo pelo qual o poeta organiza sua seleção lexical
para construir relações de sentido. São elementos considerados na análise poética em
nível sintático: a pontuação, a caracterização de períodos (curto ou longos), os recursos
recorrentes (como combinações entre verbos do mesmo tipo do mesmo modo e tempo,
associações entre substantivos e adjetivos, presença de locuções, preposições etc.); as
construções paralelísticas, isto é, a repetição de estruturas para formar uma unidade
maior.
A repetição no encadeamento sintático do poema pode resultar em anáfora,
criando efeitos sonoros que costuram os elementos lexicais de modo a potencializar o
seu sentido.
Também no plano sintático analisa se o processo de encadeamento ou, em
francês, enjambement que consiste em uma “construção sintática especial que liga
um verso ao seguinte, para completar o seu sentido”. (GOLDSTEIN, 2006, p. 92).
É preciso dizer que o encadeamento/enjambement é um fenômeno
especificamente sintático da poesia, que cria um efeito de transbordamento de um
verso para outro. Nesse sentido:
O enjambement, ou encadeamento, é um recurso que
deve ser analisado cuidadosamente, já que surge [da]
tensão relativa a som, sintaxe e sentido. Geralmente,
seu efeito pode ser associado ao de outros recursos em-
pregados nos mesmos versos ou em versos próximos.
(GOLDSTEIN, 2006, p. 93).
Semântico
49
Toda a organização do poema visa o aspecto semântico, por isso, devemos seguir
os pressupostos de que tudo no poema se orienta para a produção de sentido, desde o
som, o ritmo, a organização das estrofes, a seleção lexical, a ordenação sintática até as
figuras que se consolidam nesse nível.
O estudo das figuras no poema se dá pela análise das combinações, de
aproximações e distanciamentos entre termos lexicais que passam pela ordenação
sintática segundo os critérios do poeta. Desse modo, podemos presumir que a linguagem
poética se configura a partir de “operações semânticas”, uma vez que, segundo Antonio
Candido:
[...] No trabalho criador, o poeta (1) usa palavras na acep-
ção corrente; (2) usa palavras dotadas de uma acepção
diversa da corrente, mas que aceita por um grupo; (3)
usa palavras dotadas de uma acepção que ele cria, e
que pode ou não tornar-se convencional. Em qualquer
dos casos, está efetuando uma operação semântica pe-
culiar – que é arranjar as palavras de maneira que o seu
significado apresente ao auditor, ou leitor, um supersig-
nificado, próprio ao conjunto do poema, e que consti-
tui o seu significado geral. as palavras ou combinações
de palavras usadas podem ser signos normais, figuras,
imagens, metáforas, alegorias, símbolos [...]. (CANDIDO,
2006, p. 103).
Chegamos ao ponto de dizer que, enquanto unidade, o poema é uma trama cujo
sentido resulta da união de sua estrutura rítmica à sua estrutura semântica. As figuras
ou imagens poéticas resultam, portanto, dessa coerência expressiva que é construída
pela poeta.
Figuratividades
Puseram Medinaceli
bem na estrada de Castela
como no alto de um portão
se põe um leão de pedra.
Agora, Medinaceli
é cidade que se esvai:
mais desse por esta estrada
do que esta estrada lhe traz.
Canção do Exílio
Cesura: pausa que decorre de uma transposição de um termo de um verso para outro.
Escansão: processo de decomposição dos versos em sílabas métricas para analisar sua
estrutura formal.
Metonímia: figura que se baseia em um aspecto para promover uma representação global
(a parte pelo todo).
Rima: compreende a semelhança entre os sons e pode ser interna (quando ocorre no interior
do mesmo verso) ou externa (quando ocorre nos finais dos versos); pode ser consoante
(quando ocorre entre vogais e consoantes) ou toantes (quando ocorre apenas nas vogais
tônicas); pode ser classificada como “pobre”, “rica”, “rara” ou “preciosa”, conforme a extensão
dos sons que rimam ou a categoria gramatical das palavras combinadas; e, ainda, quanto à
disposição formal, podem ser alternadas, emparelhadas, interpoladas ou misturadas.
Sinédoque: figura de linguagem que emprega um termo pelo outro, em uma relação de
compreensão.
Verso: trata-se de uma linha de um poema, com ritmo específico, diferente do de uma
linha de prosa. Quando o verso segue as regras da métrica clássica, chama-se verso regular.
Quando não obedece a elas, chama-se livre.
58
FIXANDO O CONTEÚDO
(https://www.pensador.com/sonetosdeviniciusdemoraes/)
Analise o poema a seguir, escrito por Luís de Camões, para responder às próximas
questões.
Considere as opções a seguir e marque a que indica o gênero literário que melhor
corresponde ao texto selecionado.
a) Crônica urbana.
b) Poesia lírica.
c) Romance histórico.
d) Sátira política.
e) Drama moderno.
REZENDE, Marcos. Ariano Suassuna - Quem foi temperar o choro e acabou salgando o
pranto... 2016. (4 min:11s). Disponível em https://www.youtube.com (Texto transcrito a
partir de declamação feita por Ariano Suassuna).
A voz que fala no poema (eu lírico) questiona a existência de Deus. Entretanto, o leitor
desse poema – independente do credo que professe – deve lê-lo como:
a) Soneto.
b) Elegia.
c) Trovas.
d) Cantigas satíricas.
e) Romance lírico.
(Luís de Camões)
O poema de Camões se classifica como:
a) V – V – V – V.
b) V – V – V – F.
c) V – F – F – F.
62
d) F – F – V – V.
e) F – V – F – V.
[...]
Tanto os esforços em subir concentra,
Em tantas zonas de Prodígios entra.
O trecho do poema de Cruz e Sousa pode ser classificado quanto às suas estrofes:
Esta unidade tem como principal intuito traçar uma caracterização geral das
formas narrativas a partir de suas estruturas de composição, suas temáticas e seus
estilos, de maneira a sintetizar conceitos que permitam a identificação de um texto
literário de caráter narrativo, bem como seus princípios de análise e interpretação. Em
seguida, de maneira sucinta, perpassa por conceituações acerca da epopeia e do
romance enquanto formas narrativas caracterizadas por serem longas.
De acordo com os estudos de narratologia desenvolvidos por Gérard Genette,
as narrativas possuem formas e princípios de composição comuns, que podemos
conceber como níveis globais de organização que funcionam como mecanismos
internos. A narrativa nasce da necessidade de contar. Assim, ela advém da memória e
sua transmissão se dá pela narração.
Narração
A epopeia
Em Ilíada, temos uma narrativa dividida em 24 cantos nos quais distribuem-se 15.693
versos que se concentram em eventos históricos e míticos da guerra de Troia:
Canta-me a Cólera – ó deusa! – funesta de Aquiles Peli-
da,causa que foi de os Aquivos sofrerem trabalhos sem
conta e de baixarem para o Hades as almas de heróis
numerosose esclarecidos, ficando eles próprios aos cães
atirados e como pasto das aves. Cumpriu-se de Zeus o
desígnio desde o princípio em que os dois, em discórdia,
ficaram cindidos, o de Atreu filho, senhor de guerreiros,
e Aquiles divino.Qual dentre os deuses eternos foi causa
de que eles brigassem?
[...]
(HOMERO, 2015A, p. 55).
67
A ação e os acontecimentos narrados incidem, sobretudo, em Aquiles, de modo
que esse personagem se converte, por esse motivo, em herói da obra. O desenrolar
dos eventos envolve a relação mítica dos homens com as divindades, dependendo
destas o destino do herói, assim como do povo, o que exprime a cosmovisão cultural da
antiguidade clássica.
A Odisseia, por sua vez, em perfeita simetria formal com a Ilíada, possui também
24 cantos, mas, um número menor de versos: 12.000, e narra os eventos da guerra de
Troia pela perspectiva de Odisseu (ou Ulisses, de acordo com algumas traduções) e,
consecutivamente, o seu retorno para casa. Finalizada a guerra narrada na Ilíada, outra
aventura épica se inicia: o retorno dos guerreiros para seus lares. Depois de dez anos
lutando em Troia, Odisseu passaria ainda mais dezessete em sua viagem de volta para
que, por fim, pudesse regressar a Ítaca:
“[...]
Sim, seu destino funesto o levou no navio escavado
para essa Troia infeliz, cujo nome dizer não consigo”
Disse-lhe, então, em resposta Odisseu, o guerreiro soler-
te: Ó venerável esposa do herói Odisseu Laercíada,
não mais se nuble teu belo semblante, nem tanto te
aflijas por teu marido, conquanto não possa censura fa-
zer-te. Toda mulher chora a perda, em verdade, do es-
poso legítimo de menor fama, de quem teve filhos em
laço afetivo. Mas Odisseu, dizem todos, um deus imortal
parecia. Cessa, porém, de chorar, e concede atenção ao
que digo. Hei de falar-te conforme a verdade, sem nada
esconder-te. Já tive, certo, notícia da volta do herói Odis-
seu, que se acha perto, na terra fecunda dos homens
Tesprotos, ainda com vida, e conduz para casa precio-
sos tesouros, que em toda parte angariou. Mas a nau
de costado escavado e os companheiros queridos, per-
deu-os no mar cor de vinho, ao se afastar da Trinácria.
Indignado contra eles se achava Zeus e Hiperiônio, por
terem deste último as vacas matado. Todos a Morte en-
contraram no meio das ondas furiosas. Ele, porém, pre-
so à quilha, jogado se viu contra a praia da região dos
Feácios, que são descendentes dos deuses. Estes o hon-
raram de jeito, qual fosse ele próprio um dos deuses, e
o cumularam com muitos presentes, dispostos, ainda,
a repatriá-lo sem dano. Há bem tempo pudera Odisseu
já ter voltado; mas no imo do peito julgou preferível por
muitas terras viajar, angariando riquezas sem conta, de
tal maneira ultrapassa Odisseu na inventiva de astúcias
os homens todos; nenhum dos mortais rivaliza com ele.
[...]
(HOMERO, 2015B, p. 318-319).
CANTO I
1
As armas e o barões assinalados,
Que da ocidental praia lusitana,
Por mares nunca de antes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana.
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;
2
E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis, que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando;
E aqueles, que por obras valerosas
Se vão da lei da morte libertando;
Cantando espalharei por toda parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.
3
Cessem do sábio Grego e do Troiano
69
As navegações grandes que fizeram;
Cale-se de Alexandro e de Trajano
A fama das vitórias que tiveram;
Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram:
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
Que outro valor mais alto se alevanta.
FIQUE ATENTO
A narrativa épica se construía, de acordo com o modelo clássico, em versos, por isso, tam-
bém recebe a designação de “poema épico”. Na acepção antiga, a palavra “poesia” é em-
pregada na acepção hoje atribuída ao termo “literatura”. Portanto, o termo “poesia épica”
se refere a um gênero narrativo, e não lírico.
Dessa forma, não existem mais obras puramente épicas, como os exemplos
citados, mas pode ocorrer a incorporação de elementos épicos por parte de obras
modernas e contemporâneas, seguindo a tendência vigorante desde o Romantismo de
mistura de estilos.
71
A seguir, veremos outra forma narrativa em prosa: o romance.
O romance
Muitas são as teses que buscam conceituar o nascimento do romance tal como
o compreendemos hoje. Ian Watt (2010), por exemplo, vai dizer que o romance nasce na
Inglaterra no século XVIII com Daniel Defoe, Samuel Richardson e Henry Fielding; por sua
vez, Mikhail Bakhtin (2010) afirma que o gênero passou por um longo amadurecimento
para se constituir como expressão linguística de uma realidade concreta, de modo que a
própria construção da linguagem do romance expressa uma cosmovisão. Esse modelo
de narrativa, assim concebido, nasce nos séculos XVI e XVII com François Rabelais,
escritor francês, e Miguel de Cervantes, escritor espanhol.
A divergência entre esses autores se explica, de uma maneira geral, pelos critérios
por eles adotados. Ian Watt vai considerar a representação do individualismo como
72
a pedra de toque do romance, ao passo que Mikhail Bakhtin erige sua tese levando
em consideração a representação do popular por meio de uma linguagem que
constrói a especificidade do discurso romanesco. Pela abrangência que representa, a
conceituação deste autor tem sido mais amplamente adotada nos estudos literários
do gênero, ainda que a leitura de Watt levante argumentos significativos quanto às
obras eleitas para conceituar o nascimento do gênero.
De acordo com Yves Stalloni (2007), cinco pontos são responsáveis pela
caracterização da estética do romance:
– Escrita em prosa: embora a literatura moderna tenha abolido as fronteiras entre
prosa e poesia, o discurso romanesco se constrói predominantemente por meio da
prosa.
– O lugar da ficção: o romance se associa ao princípio da ficção em que há uma
relativização da verdade a partir de uma mistura entre “real” e “inventado”.
– A ilusão da realidade: um dos princípios mais caros ao romance é a
verossimilhança, pela qual ele se propõe a “reproduzir o mundo real e acontecimentos
plausíveis.” (STALLONI, 2007, p. 98). Daí o realismo ser defendido por alguns teóricos,
como Georg Lukács, por exemplo, como mais que um princípio estético, um princípio
estrutural do gênero.
– A introdução de personagens: ainda que as tendências modernas e
contemporâneas promovam a dissolução de certas categorias estruturais do romance,
falando-se, por vezes, na “morte da personagem”, ainda assim, elas constituem uma
dimensão estrutural imprescindível para a configuração do romance, uma vez que,
sem personagem não há ações e acontecimentos, sem ações e acontecimentos não
enredo e sem enredo, por sua vez, não há história.
– A descrição: o discurso romanesco evoca o meio como parte importante da
caracterização e da representação moral, social e psicológica das personagens. Sendo
assim, opera-se, em decorrência dessa necessidade representativa, a recorrência a
técnicas descritivas que se projetam por meio da narração. De acordo com Yves Stalloni:
Originalmente, a descrição está ausente do gênero nar-
rativo, que consiste essencialmente em contar aconteci-
mentos. Hoje, ainda, muitos concordam em reconhecer
à descrição apenas um lugar secundário. Entretanto ela
impôs-se progressivamente como meio para autenti-
car a narrativa (pela introdução do “efeito de real”), para
embelezar (pela utilização expressiva dos elementos
exteriores). a tradição realista do século XIX vai impor o
procedimento descritivo como uma maneira de preen-
cher o melhor possível a missão mimética da arte [...].
(STALLONI, 2007, p. 99).
FIQUE ATENTO
As origens do romance no Brasil, conforme a conceituação de Antonio Candido, em For-
mação da literatura brasileira, perfazem o movimento romântico (século XIX) e se desen-
volveram como um importante instrumento de expressão da identidade nacional. O Mo-
dernismo, porém, é visto como o ponto mais alto da produção romanesca brasileira, tanto
pela importância que essa forma literária assume, sobretudo na segunda fase, quanto pelo
tratamento dado a ela pelos romancistas da primeira metade do século XX.
Enredo
Também denominado de trama ou intriga, o enredo resulta da ação dos
personagens, a partir de uma ordenação especial feita pelo discurso narrativo. Os
formalistas russos conceituaram o enredo a partir de dois critérios: os acontecimentos
(fábula) e o modo especial como são ordenados no texto narrativo (trama/enredo). Em
distinções equivalentes, o estruturalista Tzvetan Todorov denomina a fábula de história
e a trama/enredo de discurso; outro estruturalista, Maurice-Jean Lefebvre, por sua vez,
conceitua essa distinção através dos denominadores: narração e diegese.
Essas distinções servem, no plano analítico, para diferenciar certas estruturas
que compõem a narrativa, não devendo ser tomadas como categóricas. Tampouco
devemos concebê-las, em termos dualísticos, como relativas, respectivamente,
“realidade” e “ficção”, uma vez que, sendo o romance uma reelaboração da realidade
e, portanto, uma ficção, os acontecimentos podem logo de começo serem por si só
ficcionais.
De maneira sintética, essas duas dimensões se associam na medida em que
a trama liga os acontecimentos por um fio temático que une os “elementos mínimos
da obra” (denominados de “motivos” (SOARES, 2007, p. 43)) de maneira a construir um
sentido que se configura como uma unidade maior do texto.
75
Basicamente, existem dois esquemas diegéticos para o romance. Até o século
XIX predominou uma estrutura fechada, isto é, um esquema diegético fixo e claramente
delimitado por início, meio e fim, assim divididos, de acordo com SOARES, (2004, p. 45):
A partir do século XIX foram se tornando cada vez mais comuns os chamados
romances abertos, em que o esquema diegético não segue um padrão formal, tampouco
há uma perfeita delimitação entre início, meio e fim, sendo, por vezes, mesmo suprimido
o desfecho da narrativa, de modo a parecer que a obra ficou inconclusa, um recurso
que sugere uma continuidade ao invés de um desenlace.
Exemplo do primeiro esquema diegético é Senhora, de José de Alencar; ao passo
que Dom Casmurro, de Machado de Assis pode ser situado no segundo esquema pelas
lacunas propositais que cria na narrativa. Vejamos mais de perto como se configuram
esses esquemas:
Foi depois de passados os seis meses de luto, que Au-
rélia apareceu na sociedade. Tinha-se ela ensaiado para
seu papel. Desde o primeiro momento em que apresen-
tou-se nos salões, firmou neles seu império, e tomou
posse dessa turba avassalada, cujo destino é bajular as
reputações que se impõem.
Encontramo-la deslumbrando a multidão com sua be-
leza, e açulando a fome do ouro nos cavalheiros do lans-
quenete matrimonial. Regozijava-se em arrastar após si,
rojando-os pelo pó, e fustigando-os com o sarcasmo, a
esses sócios e êmulos de Fernando Seixas, ansiosos de
venderem-se como ele, ainda que por maior preço.
Por isso os tinha reduzido à mercadoria ou traste, fazen-
do-lhes a cotação, como se usava outrora com os lotes
de escravos.
Aquele marido de maior preço a que ela se referia não
era outro senão seu antigo amante, que a desprezara
por ser pobre.
No meio desta acrimônia que lhe inspirava a sociedade,
não perdera porém Aurélia de todo a crença na nobreza
d’alma, sabia respeitá-la onde quer que a descobria.
Assim, quando algum homem honesto, sinceramente
seduzido pelos dotes de sua pessoa, e não pelo brilho
da riqueza, lhe fazia a corte, ela portava-se com ele de
modo inteiramente diverso. Acolhia-o com afabilidade
e distinção; mas aproveitava o primeiro momento para
desvanecer-lhe toda a esperança.
Só com os caçadores de dotes era loureira, se tal nome
pode-se aplicar ao constante ludíbrio e humilhação a
que submetia seus apaixonados.
76
O romance Senhora, de José de Alencar foi escrito no século XIX e está associado
ao movimento romântico. Do ponto de vista estrutural, segue uma divisão bem
delimitada em quatro partes que recebem denominações do romancista: “O preço”,
“Quitação”, “Posse” e “Resgate”. O tema do livro é o casamento por interesse, que leva
Fernando Seixas a se casar com Aurélia Camargo, uma moça que fora pobre (e que
Fernando conhecera ainda pobre) até ficar órfã e receber uma herança paterna.
Tendo-a renegado por não possuir dote, o rapaz descobre que Aurélia, já em outras
condições, havia-o “comprado” como marido.
Trata-se de um romance urbano, ambientado na cidade do Rio de Janeiro na
segunda metade do século XIX. Podemos pressupor pela divisão feita pelo romancista
quanto às partes que compõem a obra um esquema que segue o modelo de romance
fechado, com início (“O preço”), em que o romancista busca expor os valores da
sociedade burguesa fluminense; a complicação (“Quitação”) em que a personagem
principal (Aurélia) é enleada em acontecimentos que serão decisivos para o modo como
se configurará a sua relação com Fernando; o clímax (“Posse”), em que a “compra” do
marido ganha contornos problemáticos mediante os sentimentos que existem entre
eles; e, por fim, o epílogo (“Resgate”), em que se dá a reconciliação do casal pela via
amorosa.
Em Dom Casmurro, por sua vez, a diegese segue outra ordenação:
Capitu não hesitou em jurar, e até lhe vi as faces verme-
lhas de prazer. Jurou duas vezes e uma terceira:
- Ainda que você case com outra, cumprirei o meu jura-
mento, não casando nunca.
- Que eu case com outra?
- Tudo pode ser, Bentinho. você pode achar outra moça
que lhe queira, apaixonar-se por Ela e casar. quem sou
eu para você lembrar-se de mim nessa ocasião?
- Mas eu também juro! Juro, Capitu, juro por Deus nosso
senhor que só me casarei com você. Basta isto?
- Devia bastar, disse ela; eu não me atrevo a pedir mais.
Sim, você jura... Mas juremos por outro modo; juremos
que nos havemos de casar um com o outro, haja o que
houver.
Compreendeis a diferença; era mais que a eleição do
cônjuge, era a afirmação do matrimônio. A cabeça da
minha amiga sabia pensar claro e depressa. Realmente,
a fórmula anterior era limitada, apenas exclusiva. Podí-
amos acabar solteirões, como o sol e a lua, sem mentir
ao Juramento do poço. Esta fórmula era melhor, e tinha
a vantagem de me fortalecer o coração contra a inves-
tidura eclesiástica. Juramos pela segunda fórmula, e fi-
camos tão felizes que todo o receio de perigo desapare-
ceu. Éramos religiosos, tínhamos o céu por testemunha.
Eu nem já temia o seminário.
- Se teimar em muito, irei; mas faço de conta que é um
colégio qualquer; não tomo ordens.
Capitu temia a nossa separação, mas acabou aceitan-
do este alvitre, que era o melhor. Não afligíamos minha
77
mãe, e o tempo correria até o ponto em que o casamen-
to pudesse fazer-se. ao contrário, de qualquer resistên-
cia ao seminário confirmaria a denúncia de José Dias.
Esta reflexão não foi minha, mas dela.
Tendo por tema também a relação amorosa e conjugal, no caso, que se configura
entre Bentinho e Capitu, o romance se desenvolve como um grande fluxo de consciência
(narrador homodiegético) em que Bentinho, já velho, rememora sua paixão de infância
e os infortúnios que teve que suportar para casar-se com Capitu. Por conta desse
caráter rememorativo, o enredo do romance é repleto de digressões que se configuram
pelo distanciamento do narrador em relação aos fatos e pela construção em si de uma
direção única para a narrativa: convencer o leitor de que Capitu o traíra.
Publicado em 1899, o romance machadiano se filia ao movimento realista do
final do século XIX que, ao contrário do Romantismo, preocupava-se em representar
um anti-idealismo amoroso, focalizando questões como o adultério e a dúvida sobre
o amor. Enquanto narrador, Bentinho parece se preocupar menos com a história que
conta do que em procurar em Capitu, em suas ações e comportamentos, elementos
que corroborem a sua tese do adultério cometido por ela com seu amigo Escobar.
Os capítulos não seguem, assim, uma linearidade formal com início, meio e
fim, tal como a que se verifica em Senhora. Em Dom Casmurro predomina o fator da
imprevisibilidade narrativa e seu desfecho, ou antes, antidesfecho, não é uma resolução,
mas um convite à reflexão.
Enquanto elemento da composição da obra, o enredo está intrinsecamente ligado
às personagens e àquele que conta a história: o narrador.
Personagens e narrador
– personagens principais
– personagens secundárias
– personagens planas
– personagens redondas
Essa distinção faz-se necessária no estudo da narrativa, uma vez que, depende
dela a caracterização do ponto de vista adotado.
Tempo
Espaço
Ponto de vista
GLOSSÁRIO
Dialogismo – conceito pelo qual se pressupõe a construção de um discurso em diálogo
com outros.
FIXANDO O CONTEÚDO
2. (Adaptada) Ano: 2021 Banca: AMEOSC Órgão: Prefeitura de Santa Helena - SC Prova:
AMEOSC - 2021 - Prefeitura de Santa Helena - SC - Professor com Licenciatura Plena
em Língua Port. e Estrangeira (Espanhol) - Edital nº 06
(__) O gênero épico é um texto literário que apresenta aventuras heroicas e eloquentes
baseadas na história cultural dos povos, o narrador épico pode construir a narrativa
tanto em versos (chama-se versos épicos) quanto em prosa (denominada de narrativa
épica).
(__) A logicidade, a racionalidade e a objetividade são o tripé textual que o narrador
épico utiliza para dar o tom grandioso na narrativa épica, mas o tom grandioso se
descaracteriza justamente pela presença de elementos místicos e aventuras fantásticas,
baseados em mitos como a mitologia grega, em razão disso, existe a presença de
deuses, semideuses, heróis e figuras fantasiosas que interferem negativamente para
atrapalhar o desenrolar dos acontecimentos.
(__) O gênero lírico se refere ao tipo de texto literário onde predomina a expressão de
sentimentos e emoções subjetivas do sujeito lírico – o eu lírico. São maioritariamente
escritos em verso, sendo textos breves por não apresentarem enredo, mas sim a
exteriorização do mundo interior do eu lírico.
(__) Dentre os subgêneros líricos, temos: Ode: poema lírico de exaltação, entusiasmo
e alegria, Elegia: poema lírico melancólico sobre a morte e a tristeza, Idílio: poema lírico
sobre a vida pastoril e bucólica.
Após análise, assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA dos itens
acima, de cima para baixo:
a) V, V, V, V.
b) F, V, V, F.
c) V, F, V, V.
d) F, F, V, F.
e) F, V, F, V.
84
3. (Adaptada) Ano: 2019 Banca: Instituto Consulplan Órgão: FASEH Prova: Instituto
Consulplan - 2019 - FASEH - Vestibular de Medicina
a) 1, 2, 3, 4.
b) 2, 3, 4, 1.
c) 3, 4, 2, 1.
d) 1, 4, 3, 2.
e) 4, 3, 2, 1.
O poema épico é um dos mais antigos dos gêneros literários. Foi largamente elaborado
na Antiguidade greco-latina tendo sido também produzido em momentos posteriores,
a partir do modelo dos poemas homéricos, a Ilíada e a Odisseia, e do poema épico
latino A Eneida, de Virgílio. Esse gênero tem como principal objetivo exaltar os feitos dos
heróis de um povo, preservando a sua memória e revela que:
6. Ano: 2021; Banca: Fundação Getúlio Vargas - FGV;Prova: FGV - Prefeitura de Paulínia
- Cirurgião Dentista - 2021
“Uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho Novo, encontrei no trem da Central
um rapaz aqui do bairro, que eu conheço de vista e de chapéu. Cumprimentou-me,
sentou-se ao pé de mim, falou da Lua e dos ministros, e acabou recitando-me versos.
A viagem era curta, e os versos pode ser que não fossem inteiramente maus. Sucedeu,
porém, que, como eu estava cansado, fechei os olhos três ou quatro vezes; tanto bastou
para que ele interrompesse a leitura e metesse os versos no bolso.”
Esse é o início do romance Dom Casmurro; é correto afirmar, sobre esse texto, que se
trata de texto:
7. Ano: 2022; Banca: IFPA; Prova: IFPA - IFPA - Professor de Ensino Básico, Técnico e
Tecnológico - Área: Letras - Língua Portuguesa - 2022
“Uma noite, trabalhava eu no silêncio do meu gabinete, quando fui procurado por uma
velhinha, toda engelhada e trêmula, que me disse em voz misteriosa ter uma carta para
mim.
— De quem? perguntei.
— De um moço que está na casa de Detenção.
— De um preso?! Como se chama ele?
— V. S. vai ficar sabendo pelo que vem nesse papel. Tenha a bondade de ler.”
Esse é o início de um romance de Aluísio Azevedo; sobre o narrador desse pequeno texto
pode-se afirmar que:
A novela
Enquanto forma narrativa, a novela apresenta, basicamente, os mesmos
elementos estruturais do romance. Entretanto, essa forma literária se diferencia do
romance, essencialmente, em função de dois aspectos básicos: a sua economia
estrutural (reduzia em relação àquele) e, em consequência desta, a sua menor extensão.
O ponto chave da redução estrutural da novela em relação ao romance se dá no
recorte realizado pelo novelista. De acordo com Soares (2007):
Têm aparecido como mais apropriadas à novela as situ-
ações humanas excepcionais que, não sendo apresen-
tadas como um flash (o que constituiria um conto), se
desenvolvem como um corte na vida das personagens,
corte este explorado pelo narrador em intensidade, ao
contrário do romance, que se estende por um longo pe-
ríodo ou até por uma vida inteira. (SOARES, 2007, p. 55-
56).
O conto
Se o romance pode abarcar toda uma vida e a novela elege desta apenas os
acontecimentos mais importantes, o conto se detém sobre um episódio emoldurável,
sendo, por esse critério, a forma narrativa mais breve.
De acordo com Soares (2007):
Quanto mais concentrado, mais se caracteriza como
arte de sugestão, resultante de rigoroso trabalho de se-
leção e de harmonização dos elementos selecionados e
de ênfase no essencial. Embora possuindo os mesmos
componentes do romance (...), o conto elimina as análi-
ses minuciosas, complicações no enredo e delimita for-
temente o tempo e o espaço. (SOARES, 2007, p. 54).
De acordo com Nádia Batella Gotlib (1990), o conto nasce como um gênero
votado à necessidade do homem de contar (oralmente) e vai sendo incorporado
pelas sociedades que possuem cultura escrita de maneira gradativa, transpondo-se
as narrativas orais para a escrita e, por esse motivo, esse gênero pode ser concebido
a partir de uma importante relação com o desenvolvimento das sociedades, pois à
medida que as sociedades se organizam de maneira mais complexa, o conto também
ganha maior complexidade.
Conforme conceitua Yves Stalloni, desde o século XVIII, o conto:
91
[...] em sua acepção literária, especializou-se no senti-
do de “relato de fatos, de acontecimentos imaginários,
destinados a distrair” (Robert). Mesmo que, como vimos,
seu campo de aplicação tenha podido variar ao sabor
das épocas e que autores do século XIX tenham rejeita-
do o critério de inverossimilhança. (STALLONI, 2007, p.
120).
Esse modo de percepção do contista guia o processo narrativo pelo qual o conto se
configura, de modo que o efeito de naturalidade resulta de um processo de elaboração
estética bastante depurada por parte do autor.
Em grande parte dos contos desse escritor francês, há um trabalho de narração que
parte de um acontecimento casual, comum e cotidiano que culmina em um desfecho
desorientador ou desconcertante para o leitor. O contista busca, assim, ressignificar a
percepção do leitor, anestesiada pela vida comum e pelo individualismo frenético.
Anton Tchecov (1860 – 1904), outro contista e conceituador do conto, ressalta
duas principais características importantes: a unidade de efeito e a contenção, já que
todo conto se submete ao princípio da brevidade. O grande mérito da conceituação de
Tchecov, de acordo com Gotlib (1990), é o fato de ele:
avançar no sentido de libertar o conto de um de seus
fundamentos mais sólidos: o do acontecimento. E, neste
aspecto, afasta-se do conto de acontecimento extraor-
dinário, tal como o conto de Poe. E afasta-se também do
conto de simples acontecimento, tal como o conjunto
de contos de Guy de Maupassant. (GOTLIB, 1990, p. 46).
A partir da obra de James Joyce, surge, por sua vez, o conceito de epifania:
VAMOS PENSAR?
Analise os conceitos de unidade de efeito (de Edgar Allan Poe) e de epifania (de James Joy-
ce) e estabeleça as suas semelhanças e diferenças quanto ao que se propõem alcançar
na estrutura do conto.
97
Por fim, outros dois contistas que oferecem conceituações ao conto são Júlio
Cortázar (1914 – 1984) e Ricardo Piglia (1941 – 2017), ambos argentinos. Cortázar (2006), ao
conceituar a brevidade do conto, utiliza-se da comparação entre cinema e fotografia, de
modo que o cinema se associaria, em termos de extensão, ao romance e a fotografia, ao
conto. Nesse sentido, a fotografia e o conto se configuram por um paradoxo: constituem-
se em “unidades fechadas” e “fragmentárias” que, no entanto, apontam para fora, para
um todo (do qual fazem parte, do qual são fragmentos), de modo que os limites aos
quais estão submetidos devem constituir a direção da amplitude que podem alcançar.
Na conceituação de Cortázar (2006), o princípio da forma contística é o da
seleção, e não da acumulação (princípio do romance), e essa economia, quando bem
orientada, consegue produzir um efeito sobre o leitor. Buscando evidenciar esse efeito,
ainda considerando as nuances que caracterizam o conto em face do romance, ele
compara o método do contista ao do boxista: no combate entre um texto apaixonante
e o leitor, o romance ganha por pontos (ou seja, cumulativamente), enquanto o conto
deve ganhar por nocaute.
Para além de lançar luz sobre a sua própria forma de escrever contos, Cortázar
chama a atenção para a transformação sistemática pela qual o gênero passa no século
XX, de modo que a forma narrativa pela qual se estrutura, em uma acepção clássica
(início, meio e fim de um acontecimento) vai perdendo rigidez para ganhar nuances
mais elaboradas que levam em conta o dado implícito, isto é, uma “ordem mais secreta
e menos comunicável”, o não dito, o subentendido. E, nesse sentido, o conto acaba por
se aproximar da poesia, sobretudo, por conciliar síntese formal (baseada na economia
de palavras) a um sentido que lhe é subjacente, sugestivo e mais oculto. Nas palavras
de Cortázar, esse processo de aperfeiçoamento do conto moderno o torna: “tão secreto
e voltado para si mesmo, caracol de linguagem, irmão misterioso da poesia em outra
dimensão do tempo literário.” (CORTÁZAR, 2006, p. 149).
Portanto, para o crítico, o conto se caracteriza como “uma síntese viva ao mesmo
tempo que uma vida sintetizada.” (CORTÁZAR, 2006, p. 150). E o princípio da síntese
é o mais estrutural de todos, uma vez que, “o contista sabe que não pode proceder
acumulativamente, verticalmente, seja para cima ou para baixo do espaço literário”.
(CORTÁZAR, 2006, p. 152). Sendo assim, se o conto se aproxima da fotografia, espaço e
tempo (elementos primordiais de uma narrativa) devem passar por um processo de
condensação de “alta pressão” que elimina tudo o que não for essencial para que se
consiga o efeito de “abertura” para fora de sua limitação. Assim:
Um conto é significativo quando quebra seus próprios
limites com essa explosão de energia espiritual que ilu-
mina bruscamente algo que vai muito além da pequena
e às vezes miserável história que conta [...]. (CORTÁZAR,
2006, p. 153).
FIQUE ATENTO
Entre os contos maravilhosos mais famosos encontram-se os contos dos irmãos Grimm.
Jacob Ludwig Karl Grimm e Wilhelm Karl Grimm compuseram os famosos contos de fada
que foram adaptados pela Disney para a televisão, como “Branca de neve”, “Chapeuzinho
vermelho”, “A Bela Adormecida”, “Rapunzel”, “João e Maria”, entre outros. Esses contos ainda
exercem forte inspiração nas obras destinadas ao público infantil, tanto as literárias quanto
as cinematográficas e, mais recentemente, as feitas pelas plataformas de streaming.
A fábula é outra forma literária que se configura a partir de uma narrativa breve.
Segundo Yves Stalloni, o termo:
3. (Adaptada) Ano: 2021 Banca: AMEOSC Órgão: Prefeitura de Guarujá do Sul - SC Prova:
AMEOSC - 2021 - Prefeitura de Guarujá do Sul - SC - Professor - Português - Edital 01
Gênero literário é expressão utilizada nas diferentes formas de arte, para denominar um
conjunto de obras que apresentam características semelhantes de forma e conteúdo.
Sobre os "Gêneros Literários " marque a afirmação INCORRETA.
(ASSIS, Machado de, “A cartomante”. Machado de Assis: contos e crônicas. Rio de Janeiro:
Malê, 2019).
Os gêneros textuais reúnem diversos tipos de textos, sendo classificados conforme suas
características em relação à linguagem e ao conteúdo. O Texto Narrativo é um tipo de
texto que apresenta um enredo com tempo, espaço, personagens e um narrador. Sua
estrutura é dividida em apresentação, desenvolvimento, clímax e desfecho.
São gêneros dessa tipologia, EXCETO:
a) Romance
b) Novela
c) Crônica
d) Reportagem
e) Lendas
“Uma raposa faminta, ao ver cachos de uvas suspensos em uma parreira, quis pegá-
los, mas não conseguiu. Então, afastou-se dela, dizendo: “Estão verdes””.
Este texto é um exemplo de um dos gêneros da Literatura Infantil, marque a alternativa
que o identifica:
a) Fábulas.
b) Crônicas.
c) Contos.
d) Lendas.
e) Novelas.
A RAPOSA E AS UVAS
O gênero dramático, embora também constitua, por fim, uma espécie de narrativa,
não se configura como as formas vistas anteriormente. Isso porque, ele se caracteriza
por ser um gênero híbrido, pois é composto, a partir de critérios formais, textualmente
falando. No plano da realização, no entanto, ele se destina, sobretudo, à representação
cênica, isto é, ao espetáculo.
Outra diferença substancial em relação às formas narrativas é que, no gênero
dramático, as personagens se apresentam sem a intermediação constante do narrador,
já que o enredo teatral é composto majoritariamente por diálogos e/ou monólogos.
De acordo com Stalloni (2007, p. 41-46), podemos discernir entre o texto narrativo e o
texto teatral a partir de alguns critérios:
FIQUE ATENTO
“Originalmente, no teatro grego, as didascálias eram destinadas aos intérpretes. No teatro
moderno, em que falamos de indicações cênicas, trata-se dos textos que não se desti-
nam a ser pronunciados no palco, mas que ajudam o leitor a compreender e a imaginar a
ação e as personagens. Esses textos são igualmente úteis ao diretor e aos atores durante
os ensaios, mesmo que eles não os respeitem. Distinguimos as indicações que concernem
apenas a condução da narrativa (...) daquelas que seriam estritamente cênicas.”. (RYN-
GAERT, 1996, p. 44).
Por assim ser, esse gênero se configura, essencialmente, pela relação entre
texto e “teatralidade”. De um lado, temos o texto teatral configurado a partir de meios
específicos: sequências compostas por diálogos.
Do ponto de vista de sua estrutura interna, o texto teatral apresenta-se por meio
de uma exposição que visa deflagrar um conflito, um enredo que conduz esse conflito
em certo sentido, as peripécias que o cercam e um desfecho ou desenlace.
A relação entre a configuração textual e a teatralidade, isto é, o caráter
eminentemente representativo do gênero, é resumida em duas dimensões que lhe são
inerentes, de acordo com o autor:
– um lugar particular sobre o qual se põe em ação uma
fala sustentada por efeitos e uma “representação” e que
se opõe a um outro lugar (o theatron, lugar em que fica
o público), do qual se vê a ação;
– um texto dramático especialmente carregado de situ-
ações conflitantes transponíveis por vias visuais e sono-
ras de forma a tornar-se “espetáculo” e a produzir efeitos
sobre o público.
(STALLONI, 2007, p. 48).
5.1.1 Tragédia
Figura 2: Palco-carroça
Fonte: Disponível em: https://shre.ink/Imtd. Acesso em: 23 jan. 2023
5.1.2 Comédia
FIQUE ATENTO
Os ritos dionisíacos eram regados a vinho. Na mitologia, a embriaguez era considerada
uma forma de descontrole das emoções e liberação da hybris (personificação da impru-
dência, da violência, das paixões incontroláveis etc.), o que culminava em uma transfor-
mação comportamental caracterizada pelos excessos. Desse processo de transformação
pela embriaguez resultaria a conversão dos atores em outras pessoas. Daí haver uma
vertente dos estudos clássicos que associa o surgimento do teatro aos cultos dionisíacos.
A outra vertente aponta o surgimento do teatro grego como resultado de uma reelabora-
ção da poesia épica (recitação/declamação) para um processo mais complexo em que
o cantor torna-se um ator. As duas vertentes interpretativas, entretanto, não se anulam,
podendo ser vistas como complementares.
O Vaudeville, por sua vez, popularizou-se na França a partir do século XVIII como
um tipo de comédia leve que misturava canções, dança e balé e evoluiu para uma
espécie de ópera-cômica e foi sendo aprimorada até transformar-se em uma comédia
de intriga mais complexa formada por um encadeamento de “quiproquós” (STALLONI,
2007, p. 62) e cuja evolução culminou na “comédia de boulevard”.
Outro subgênero teatral é o Teatro de Revista, originário da França (século
118
XVIII) assim como o Vaudeville, que levava para o palco personagens inspiradas nas
personalidades que estavam em evidência nos noticiários. Era uma espécie de teatro
de retrospectiva que passava a limpo os acontecimentos que marcaram a vida social
francesa. Na segunda metade do século XIX, esse subgênero se popularizou também em
Portugal e no Brasil. Na década de 1920 teve especial importância nos salões cariocas.
Eram peças baseadas no humorismo, com diálogos, músicas e coreografias.
5.1.3 Auto
119
A ação dramática do auto é composta de atos ligados a temas religiosos e era
destinada à representação das escrituras sagradas. Esse tipo de teatro foi amplamente
utilizado na difusão do Cristianismo e faz parte de um conjunto mais amplo denominado
de dramas litúrgicos. Na definição de Souza (2007), o auto:
equivaleria a um ato que viesse a integrar um espetácu-
lo maior e completo, daí o nome auto. Os mistérios são
peças teatrais, cujos temas são retirados das sagradas
escrituras para transmitir ao povo, de forma acessível e
concreta, a história da religião, os dogmas e os artigos
da fé. Nas moralidades, os temas histórico-concretos
dos mistérios são substituídos por argumentos abstra-
to-típicos, que mostram o conflito do homem, em face
do Bem e do Mal. (SOUZA, 2007, p. 58).
FIQUE ATENTO
Os dramas litúrgicos são modalidades teatrais destinadas aos temas religiosos e são
subdivididos em: milagres (encenação de intervenções divinas), mistérios (encenação
de episódios da vida dos santos), moralidades (encenação de episódios exemplares dos
conflitos humanos entre os vícios e as virtudes) e autos (episódios relacionados a celebra-
ções de datas festivas, vida e morte).
5.1.4 Drama
O drama se caracteriza por ser uma modalidade moderna que abole as fronteiras
clássicas entre tragédia e comédia (construídas a partir de princípios opostos) para
criar-se por meio das nuances produzidas pela mistura entre o sublime o grotesco. No
drama estes elementos não se opõem. Ao contrário, eles são formas de representação
que produzem contrastes e chamam a atenção para determinados aspectos da vida
moderna.
A conceituação do drama considera as condições de seu desenvolvimento
histórico e o subdivide em três formas principais. De acordo com Yves Stalloni (2007, p.
64-72):
– Drama simbolista (século XIX – XX): essa vertente tem por inspiração o
movimento poético do Simbolismo, orientado para um trabalho de depurada elaboração
linguística (à maneira dos poetas do movimento), para o caráter abstrato do diálogo,
para recursos ligados ao universo onírico, ao misterioso e ao maravilhoso; marcado por
uma ação limitada (dada a ênfase no aspecto reflexivo) e caracterizado por uma forte
relação com a música e a musicalidade.
FIQUE ATENTO
O estudo das formas dramáticas no âmbito das Letras se refere à apreensão do texto
como objeto de estudo; ao passo que a encenação é estudada no âmbito do Teatro e das
Artes cênicas.
GLOSSÁRIO
CATÁRSE – (kátharsis) efeito que a tragédia devia suscitar nos espectadores de modo a le-
vá-los a um estado de purificação.
DIDASCÁLIAS (ou rubricas) – Anotações feitas pelo autor do texto que determinam ações
e intenções, posicionamento e movimentação em cena, até mesmo detalhes do cenário.
FIXANDO O CONTEÚDO
1. Acerca do gênero dramático assinale a alternativa INCORRETA:
3. Ano: 2021; Banca: Fundação Getúlio Vargas – FGV Prova: FGV – Prefeitura de Paulínia
– Professor de Educação Básica – Área Artes – 2021
O modelo do teatro como o conhecemos hoje, no Ocidente, vem da Grécia Antiga, onde
o teatro desempenhava um importante papel. Primeiramente religioso, nas celebrações
ao deus Dionísio, de onde ele nasceu, e, mais tarde, assumindo uma importante função
social e cívica.
4. (Adaptada) Ano: 2021 Banca: AMEOSC - Associação dos Municípios do Extremo Oeste
de Santa Catarina – AMEOSC Prova: AMEOSC – Prefeitura de Palma Sola – Professor –
130
Área: Artes – 2021
O gênero dramático, também conhecido como gênero teatral, é criado para ser
representado nos palcos. Esse gênero apresenta diversas características padrões, entre
elas:
Crônica
Por assim ser, o cronista trabalha de maneira similar ao contista, com a concisão
aliada, por sua vez, à urgência do ritmo acelerado, que culmina em uma elaboração
circunstancial e limitada para proporcionar um enquadramento de leitura que tem
como alvo o leitor moderno.
A tradição da crônica na literatura brasileira é bastante forte. A crônica esteve
entre os gêneros mais praticados pelos viajantes portugueses e está entre os primeiros
registros escritos que se tem sobre o Brasil. Em fins do século XVIII, ela se torna um
campo de atividade para a sobrevivência do escritor brasileiro. Machado de Assis foi
um dos grandes cronistas de folhetim. Além dele, Cecília Meireles, Rubem Braga, Nelson
Rodrigues, Paulo Mendes de Campos, Fernando Sabino, Clarice Lispector, Carlos Heitor
Cony, Carlos Drummond de Andrade, Vinicius de Moraes, Luís Fernando Veríssimo e
Antonio Prata.
O exemplo abaixo é uma crônica de L. Fernando Veríssimo publicada no jornal O Estadão:
A Menina
Ensaio
Há ensaios que, pela sua forma refinada quanto à elaboração formal, são
considerados mais literários do que não literários. E, por outro lado, há ensaios que
assumem maior força crítica e racional, preocupando-se com uma organização
138
mais identificada à lógica científica do que à literária. Esses são os chamados ensaios
acadêmicos, que constituem estudos críticos sobre os objetos que elegem como alvo
de observação, exposição e argumentação. O ensaio é, portanto, considerado um
gênero mais dissertativo, expositivo e argumentativo do que narrativo, embora possa, a
critério do autor, lançar mão de recursos narrativos em função de sua intenção e força
expositiva. E é esse aspecto que, em geral, o aproxima da literatura.
Da pureza à experimentação
Ao longo das unidades que compõem este livro, você pode apreender os aspectos
que nos permitem distinguir os diferentes gêneros literários e os critérios usados para
tanto; também pode perceber que, embora os gêneros tenham suas características
distintivas, tornou-se comum que a prática da literatura por diferentes sociedades (no
caso aqui em questão, ocidentais) promovesse combinações que redundaram em
uma maior possibilidade de identidades para o texto literário, o que implica em uma
problemática para a classificação da literatura, sobretudo, contemporânea, exigindo
dos estudiosos mais atenção e perspicácia analíticas.
VAMOS PENSAR?
Com o surgimento de muitos subgêneros literários na contemporaneidade, sobretudo, de-
vido ao advento tecnológico, que modificou a nossa relação com o texto e a leitura de um
modo geral, como podemos pensar a função da teoria dos gêneros nesse contexto?
2. Ano: 2021 Banca: Fundação Carlos Chagas – FCC Prova: FCC – TJ SC -Assistente
Social – 2021
A palavra crônica é conhecida e designa um gênero de texto. Vem por vezes acompanhada
de adjetivo: política, esportiva, social, policial etc. Se vier desacompanhada de qualquer
qualificativo, é porque ela serve a um cronista não especializado, um escritor de
linguagem cativante que pode falar de qualquer coisa que desperte o interesse do
leitor. Não há jornal ou revista que dispense esse tipo de cronista. Que função terá essa
modalidade de crônica, livre que está para abordar não importa o que seja?
Quando, ao ler um jornal, nos detemos nela, é porque sabemos que a mão do escritor,
com leveza de estilo, com algum humor, com um mínimo de sabedoria e perspicácia,
nos conduzirá por um texto que nos poupa da gravidade dos grandes assuntos da
141
política ou da economia e chamará nossa atenção para algum assunto que, não sendo
manchete, diz respeito à nossa vida pequenina, ao nosso cotidiano, aos nossos hábitos,
aos nossos valores mais íntimos. Uma crônica pode falar de uma dor de dente, de um
incidente na praia, de um caso de amor, de uma viagem, de um momento de tédio ou
até mesmo da falta de assunto. O importante é que o cronista faça de seu texto um
objeto hipnótico, do qual não se consegue tirar os olhos. Para isso, há que haver talento.
Entre nós, pontifica até hoje o nome do cronista Rubem Braga (1913-1990). É uma
unanimidade: todos o consideram o maior de todos, o mestre do gênero. De fato, Rubem
Braga cumpriu com excelência o alcance de um cronista: deu-nos poesia, reflexão,
análise, lucidez, ironia, humor − tudo numa linguagem de exemplar clareza e densidade
subjetiva. A crônica de Rubem Braga cumpriu à perfeição o papel fundamental desse
gênero literário pouco homenageado. Nas palavras do crítico Antonio Candido, uma
crônica “pega o miúdo da vida e mostra nele uma grandeza, uma beleza ou uma
singularidade insuspeitadas. Isto acontece porque ela não tem a pretensão de durar,
uma vez que é filha do jornal e da era da máquina, onde tudo acaba tão depressa”. O
crítico não tem dúvida em considerar que as boas crônicas, “por serem leves e acessíveis
talvez comuniquem, mais do que poderia fazer um estudo intencional, a visão humana
do homem na sua vida de todo dia”. Não é pouca coisa. Vida longa aos bons cronistas.
(Jeremias Salustiano, inédito)
No primeiro parágrafo do texto, informa-se que a crônica
Texto II
A crônica não é um “gênero maior”. Não se imagina uma literatura feita de grandes
cronistas, que lhe dessem o brilho universal dos grandes romancistas, dramaturgos e
poetas. Nem se pensaria em atribuir o Prêmio Nobel a um cronista, por melhor que fosse.
Portanto, parece mesmo que a crônica é um gênero menor.
“Graças a Deus”, – seria o caso de dizer, porque sendo assim ela fica perto de nós. E para
muitos pode servir de caminho não apenas para a vida, que ela serve de perto, mas
para a literatura... Por meio dos assuntos da composição aparentemente solta, do ar
de coisa sem necessidade que costuma assumir, ela se ajusta à sensibilidade de todo
dia. Principalmente porque elabora uma linguagem que fala de perto ao nosso modo
de ser mais natural. Na sua despretensão, humaniza; e esta humanização lhe permite,
como compensação sorrateira, recuperar com a outra mão uma certa profundidade
de significado e um certo acabamento de forma, que de repente podem fazer dela uma
inesperada embora discreta candidata à perfeição.
(CANDIDO, Antonio. Para gostar de ler: crônicas. São Paulo: Ática, 1980.)
Da relação dos dois textos, é correto afirmar que:
A crônica jornalística é um texto escrito com uma linguagem simples com a intenção de
aproximar o leitor do autor do texto. É correto afirmar que a crônica:
afirmar:
a) Trata-se de uma crônica por apresentar linguagem simples e relatar um fato do
cotidiano em tom de humor.
b) Trata-se de uma pequena novela, tendo em vista a existência de personagens e o
caráter humorístico.
c) Trata-se de um ensaio por evidenciar uma pesquisa científica que seria feita com
frases de caminhão.
d) Trata-se de um conto, uma vez que narra uma história fictícia com personagens
reais.
e) Trata-se de um relatório, pois lista uma sequência de frases de para-choques de
caminhão.
144
6. Ano: 2020 Banca: Fundação para o Vestibular da Universidade Estadual Paulista –
VUNESP Prova: VUNESP – FITO – Auxiliar de Administração – Área: Apoio Administrativo
– 2020
8. Ano: 2017 Banca: FCM Órgão: IF Baiano Prova: FCM – 2017 – IF Baiano – Engenharia
Química
UNIDADE 1 UNIDADE 2
QUESTÃO 1 A QUESTÃO 1 E
QUESTÃO 2 E QUESTÃO 2 A
QUESTÃO 3 C QUESTÃO 3 E
QUESTÃO 4 D QUESTÃO 4 B
QUESTÃO 5 A QUESTÃO 5 B
QUESTÃO 6 B QUESTÃO 6 D
QUESTÃO 7 A QUESTÃO 7 D
QUESTÃO 8 E QUESTÃO 8 D
UNIDADE 3 UNIDADE 4
QUESTÃO 1 A QUESTÃO 1 B
QUESTÃO 2 C QUESTÃO 2 A
QUESTÃO 3 B QUESTÃO 3 E
QUESTÃO 4 C QUESTÃO 4 B
QUESTÃO 5 D QUESTÃO 5 D
QUESTÃO 6 A QUESTÃO 6 A
QUESTÃO 7 A QUESTÃO 7 A
QUESTÃO 8 C QUESTÃO 8 B
UNIDADE 5 UNIDADE 6
QUESTÃO 1 A QUESTÃO 1 E
QUESTÃO 2 C QUESTÃO 2 E
QUESTÃO 3 E QUESTÃO 3 A
QUESTÃO 4 D QUESTÃO 4 E
QUESTÃO 5 A QUESTÃO 5 C
QUESTÃO 6 E QUESTÃO 6 B
QUESTÃO 7 D QUESTÃO 7 A
QUESTÃO 8 B QUESTÃO 8 C
77
146
RESPOSTAS DO FIXANDO O CONTEÚDO
UNIDADE 7 UNIDADE 8
QUESTÃO 1 B QUESTÃO 1 B
QUESTÃO 2 D QUESTÃO 2 E
QUESTÃO 3 B QUESTÃO 3 B
QUESTÃO 4 A QUESTÃO 4 B
QUESTÃO 5 D QUESTÃO 5 E
QUESTÃO 6 A QUESTÃO 6 A
QUESTÃO 7 C QUESTÃO 7 B
QUESTÃO 8 B QUESTÃO 8 B
UNIDADE 9 UNIDADE 10
QUESTÃO 1 A QUESTÃO 1 A
QUESTÃO 2 C QUESTÃO 2 E
QUESTÃO 3 D QUESTÃO 3 C
QUESTÃO 4 C QUESTÃO 4 D
QUESTÃO 5 B QUESTÃO 5 D
QUESTÃO 6 A QUESTÃO 6 D
QUESTÃO 7 E QUESTÃO 7 A
QUESTÃO 8 A QUESTÃO 8 D
UNIDADE 11 UNIDADE 12
QUESTÃO 1 E QUESTÃO 1 C
QUESTÃO 2 B QUESTÃO 2 E
QUESTÃO 3 E QUESTÃO 3 A
QUESTÃO 4 C QUESTÃO 4 D
QUESTÃO 5 C QUESTÃO 5 A
QUESTÃO 6 C QUESTÃO 6 E
QUESTÃO 7 D QUESTÃO 7 B
QUESTÃO 8 D QUESTÃO 8 A
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