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Fundamentos e

Metodologia da
Alfabetização e
Letramento
Profa. Débora Carias Alves
Profa. Valéria Becher Trentin

Indaial – 2021
2a Edição
Copyright © UNIASSELVI 2021

Elaboração:
Prof . Débora Carias Alves
a

Profa. Valéria Becher Trentin

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

A474f
Alves, Débora Carias

Fundamentos e metodologia da alfabetização e letramento. /


Débora Carias Alves; Valéria Becher Trentin – Indaial: UNIASSELVI, 2021.
218 p.; il.

ISBN 978-65-5663-932-1
ISBN Digital 978-65-5663-928-4
1. Alfabetização. - Brasil. I. Trentin, Valéria Becher. II. Centro
Universitário Leonardo da Vinci.
CDD 372

Impresso por:
Apresentação
Caro acadêmico, vivemos em um tempo em que a cada dia torna-se
mais evidente a relevância de uma educação de qualidade para que todos
os brasileiros tenham uma vida digna e condições para o pleno exercício da
cidadania. Isso implica em vencer com sucesso todas as etapas da Educação
Básica, o que depende, fundamentalmente, de um processo de alfabetização
bem realizado.

Em sua formação como pedagogo, você carrega a grande


responsabilidade de oferecer às crianças brasileiras e a todos aqueles que não
se alfabetizaram na idade própria, um ensino da língua escrita embasado em
fundamentos teóricos que atendam às necessidades formativas da sociedade
contemporânea. Estas necessidades imergem os sujeitos a todo tipo de
exposição a informações de várias fontes, ideologias, fakenews – numa
modernidade tão líquida, dinâmica e tecnológica, se a ação do alfabetizador
se pautar apenas no ensino técnico de decodificar e codificar os signos
alfabéticos ele, inevitavelmente, estará limitando seus alunos a uma vida à
margem da sociedade.

Hoje, a ação docente deve propiciar um domínio eficiente da


tecnologia de ler e escrever, que é a alfabetização no sentido mais claro da
palavra, mas, deve também conduzir os alunos a uma condição muito mais
profunda diante do lugar que a língua escrita ocupa nas sociedades letradas.
Isso implica em uma prática pedagógica que conduza ao letramento: usar
com desenvoltura a leitura e a escrita na vida social. É indispensável saber
ler, interpretar, criticar, escrever, argumentar, construir relações! Este livro
foi escrito para que você encontre o caminho para se tornar pedagogo com
as características descritas aqui.

Na Unidade 1 abordaremos um pouco sobre o surgimento da escrita


e adentraremos a história da alfabetização no Brasil, aprofundando nossa
compreensão dos métodos tradicionais de alfabetização que orientam o
trabalho didático do alfabetizador. Ao final, discutiremos sobre o persistente
problema do analfabetismo no país e problematizaremos o lugar do professor
alfabetizador nesse desafio.

Em seguida, na Unidade 2 aprenderemos sobre a interface da


alfabetização com a neurociência e a psicologia cognitiva. Entenderemos a
Teoria da Psicogênese da Língua Escrita, de Emília Ferreiro e Ana Teberosky
e elucidaremos o conceito de Letramento, a partir dos estudos de Magda
Becker Soares. Então, destacaremos o necessário trabalho de consciência
fonológica.
Por fim, na Unidade 3 estudaremos sobre a Base Nacional Comum
Curricular (BNCC) e como esse importante documento nacional aborda a
alfabetização para o país. Analisaremos o lugar da leitura e da escrita na
Educação Infantil e como a sistematização do ensino da língua escrita é
proposto para os anos iniciais do Ensino Fundamental.

Profa. Débora Carias Alves


Profa. Valéria Becher Trentin
NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novi-
dades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagra-
mação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui
para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilida-
de de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.

Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assun-
to em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.

Bons estudos!
LEMBRETE

Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela


um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro


que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você
terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complemen-
tares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


Sumário
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO.................... 1

TÓPICO 1 — LER E ESCREVER: SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLARIZAÇÃO................. 3


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................................... 3
2 A INVENÇÃO DA ESCRITA ............................................................................................................ 3
2.1 A INVENÇÃO DA ESCRITA......................................................................................................... 4
3 A HISTÓRIA DA ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL: DOS JESUÍTAS
AO FIM DO IMPÉRIO, O QUE SE SABE SOBRE ALFABETIZAÇÃO?.................................... 8
3.1 A ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL COLÔNIA........................................................................... 8
3.2 ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL IMPÉRIO................................................................................ 18
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 23
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 24

TÓPICO 2 — PANORAMA HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE


ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL REPUBLICANO................................................ 27
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 27
2 A ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL DE 1889 a 1930 – A VELHA REPÚBLICA....................... 27
2.1 OS MÉTODOS SINTÉTICOS....................................................................................................... 28
2.1.1 Método de Soletração ou Alfabético.................................................................................. 28
2.1.2 Método Silábico..................................................................................................................... 30
2.1.3 Método Fônico....................................................................................................................... 32
3 OS MÉTODOS ANÁLITICOS E O INÍCIO DAS DISCUSSÕES
METODOLÓGICAS NA REPÚBLICA.......................................................................................... 35
3.1 Método da Palavração................................................................................................................... 37
3.2 MÉTODO DA SENTENCIAÇÃO................................................................................................ 38
3.3 Método Global de Contos............................................................................................................. 40
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 46
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 47

TÓPICO 3 — A QUESTÃO DO ANALFABETISMO E A BUSCA POR SOLUÇÕES.............. 51


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 51
2 A PERSISTÊNCIA DO PROBLEMA DO ANALFABETISMO.................................................. 51
2.1 A DIMENSÃO SOCIOECONÔMICA DO ANALFABETISMO.............................................. 52
2.1.1 O analfabetismo na atualidade........................................................................................... 54
2.1.2 Políticas Públicas Nacionais para Alfabetização.............................................................. 57
2.2 PROFESSOR ALFABETIZADOR: ESTUDANTE, DOCENTE E PESQUISADOR.............. 60
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 63
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 68
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 69

REFERÊNCIAS....................................................................................................................................... 72
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS
COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS................................ 77
TÓPICO 1 — A LÍNGUA ESCRITA - PROCESSO COGNITIVO-CULTURAL....................... 79
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 79
2 ALFABETIZAÇÃO E A INTERFACE COM A NEUROPSICOLOGIA
E A NEUROCIÊNCIA COGNITIVA............................................................................................... 80
2.1 ALEXANDER LURIA E A PRÉ-HISTÓRIA DA ESCRITA...................................................... 82
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 90
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 91

TÓPICO 2 — TEORIA DA PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA......................................... 93


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 93
2 O DESENVOLVIMENTO PSICOLINGUÍSTICO DO ALFABETIZANDO .......................... 94
2.1 A FASE PRÉ-SILÁBICA................................................................................................................ 96
2.2 A FASE SILÁBICA......................................................................................................................... 98
2.3 A FASE SILÁBICO-ALFABÉTICA............................................................................................ 101
2.4 A FASE ALFABÉTICA................................................................................................................. 102
RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 107
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 108

TÓPICO 3 — ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO - PROCESSOS INDISSOCIÁVEIS.... 111


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 111
2 COMPREENDENDO O CONCEITO DE LETRAMENTO:
A FACETA SOCIAL E INTERATIVA DA ALFABETIZAÇÃO................................................ 112
3 A FACETA LINGUÍSTICA DA ALFABETIZAÇÃO: O
DESENVOLVIMENTO DA CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA................................................ 114
LEITURA COMPLEMENTAR 1........................................................................................................ 120
LEITURA COMPLEMENTAR 2........................................................................................................ 124
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 134
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 136

REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 138

UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A


ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL.............................. 141

TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?...... 143


1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 143
2 BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC) ............................................................ 143
3 A EDUCAÇÃO INFANTIL NA BNCC......................................................................................... 150
4 A LEITURA E ESCRITA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE REVELA A BNCC?.......... 163
RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 169
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 170

TÓPICO 2 — A BNCC E A ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS INICIAIS


DO ENSINO FUNDAMENTAL............................................................................... 173
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 173
2 ENSINO FUNDAMENTAL - ANOS INICIAIS.......................................................................... 173
3 ALFABETIZAÇÃO E OS ANOS INICIAIS NA BNCC............................................................. 174
3.1 A LINGUAGEM NA BNCC PARA ANOS INICIAIS............................................................. 177
4 MAS AFINAL O QUE A BNCC PROPÕE PARA A
ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS INICIAIS?........................................................................... 180
4.1 QUAIS TEXTOS USAR DURANTE A ALFABETIZAÇÃO INICIAL?................................. 183
4.2 OS CAMPOS DE ATUAÇÃO DEFINIDOS PELA BNCC...................................................... 184
4.3 COMO TRABALHAR AS QUATRO PRÁTICAS DE
LINGUAGEM PREVISTAS NA Bncc....................................................................................... 184
4.4 ALFABETIZAÇÃO E CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA: COMO TRABALHÁ-LAS?....... 186
4.5 COMO TRABALHAR NO MUNDO DIGITAL................................................................... 188
4.6 SUGESTÕES DE JOGOS DIGITAIS PARA ALFABETIZAÇÃO........................................... 189
RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 191
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 192

TÓPICO 3 — CULTURA DIGITAL NA BNCC E OS DESAFIOS


PARA A ALFABETIZAÇÃO..................................................................................... 195
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 195
2 CULTURA DIGITAL NA EDUCAÇÃO BÁSICA...................................................................... 195
3 NOVAS FORMAS DE ENSINAR E APRENDER
INTEGRADAS À CULTURA DIGITAL....................................................................................... 198
3.1 O QUE A BNCC MENCIONA SOBRE A CULTURA DIGITAL?......................................... 199
4 LETRAMENTO DIGITAL............................................................................................................... 204
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 206
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 213
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 214

REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 217
UNIDADE 1 —

LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA,


PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• refletir sobre o surgimento das sociedades letradas e a evolução dos có-


digos escritos;
• discutir sobre a história da alfabetização no Brasil e as implicações po-
líticas e econômicas que desenharam o contexto social e educacional
brasileiro;
• identificar os métodos tradicionais de alfabetização e suas possibilida-
des e fragilidades frente às exigências sociais do uso da língua;
• problematizar sobre a persistência do analfabetismo brasileiro e as múl-
tiplas dimensões que o sustenta;
• perceber as relações de poder que são construídas nas sociedades le-
tradas por meio da escrita e a urgência de seu aprendizado crítico para
superação das desigualdades sociais;
• destacar a boa qualidade formativa do professor alfabetizador como
uma das condições imprescindíveis para o sucesso da alfabetização e do
letramento dos cidadãos brasileiros.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – LER E ESCREVER: SOCIEDADE, CULTURA E


ESCOLARIZAÇÃO

TÓPICO 2 – PANORAMA HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE


ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL REPUBLICANO

TÓPICO 3 – A QUESTÃO DO ANALFABETISMO E A BUSCA POR


SOLUÇÕES

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

1
2
UNIDADE 1 TÓPICO 1 —

LER E ESCREVER: SOCIEDADE,


CULTURA E ESCOLARIZAÇÃO

1 INTRODUÇÃO
Neste Tópico 1 abordaremos que, ao contrário da oralidade, uma
habilidade natural e universal da humanidade e parte de seus atributos biológicos,
a capacidade de desenvolver a linguagem escrita é uma herança cultural das
sociedades letradas. Uma invenção da raça humana que requer um ensino
sistematizado e intencional.

A história da alfabetização no Brasil remota ao período da colonização,
atravessando contextos históricos diferentes, porém, sempre caracterizada por
embates econômicos, políticos, sociais e metodológicos que existem até hoje. A
intensa desigualdade econômica a qual o Brasil está submetido revelou-se tanto a
causa quanto a consequência da exclusão dos pobres à cultura letrada, tornando
tão permanente quanto sério o problema do analfabetismo brasileiro. Com a
universalização do ensino esse problema ficou ainda mais evidente.

A partir da década de 1990 diversas políticas públicas foram gestadas na


busca de superar o analfabetismo e tendo como foco a formação do professor
alfabetizador, reconhecendo-o como aquele que exerce um papel fundamental na
qualidade da alfabetização.

2 A INVENÇÃO DA ESCRITA
Ao longo dos milhares de anos de sua história, o homem tem criado
invenções que vêm transformando significativamente sua maneira de viver no
decorrer das eras. Contudo, nenhuma delas modificou mais sua forma de se
comunicar, de registrar e compartilhar conhecimento do que a invenção da escrita!

DICAS

Para conhecer sobre a história da escrita, acesse:


http://www.plataformadoletramento.org.br/em-revista/348/formacao-online-ead.html

3
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

2.1 A INVENÇÃO DA ESCRITA


A oralidade é uma habilidade biológica hereditária. Em todas as raças
e culturas, independente das condições geográficas, econômicas e sociais, a
linguagem verbal é uma característica da espécie humana. A linguagem escrita,
porém, não é uma capacidade universal da humanidade.

Embora existam estudos que caminham em sentido contrário a essa


compreensão, como aponta Soares (2016), há o entendimento quase unânime
da comunidade científica de que os sujeitos não aprendem a ler e escrever de
modo natural, como aprendem a falar. O que linguistas e psicólogos cognitivos
afirmam é que não há semelhança alguma entre ouvir e falar e ler e escrever. Para
Stanovich (2000), os que negam essa diferença

[...] ignoram os fatos óbvios de que todas as comunidades de seres


humanos desenvolveram línguas orais, mas só uma minoria dessa
línguas existe na foram escrita; que a fala é quase tão antiga quanto a
espécie humana, mas a língua escrita é uma invenção cultural recente
de apenas os últimos três ou quatro mil anos; que virtualmente todas
as crianças em ambientes normais desenvolvem facilmente a fala por
si mesmas, enquanto a maior parte das crianças necessita de instrução
explícita para a prender a ler, e um número significativo de crianças
enfrenta dificuldades, mesmo depois de intensos esforços por parte
de professores e pais (STANOVICH, 2000, p. 400 apud SOARES, 2016,
p. 43).

Estudos arqueológicos apontam que os primeiros registros escritos foram


encontrados na Mesopotâmia, e fazem parte do arcabouço histórico dos povos
Sumérios, datados por volta do ano 3.500 a.C.

IMAGEM 1 – SUMÉRIA, 4.500 A.C - 1.900 A.C

FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Sum%C3%A9ria>. Acesso em: 20 abr. 2021.

4
TÓPICO 1 — LER E ESCREVER: SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLARIZAÇÃO

Os povos sumérios também foram responsáveis pelas primeiras formas


políticas de organização das cidades-estados e do desenvolvimento do comércio.
Seus registros escritos rememoram aspectos da cultura, da religião, da política,
e da economia do período. A escrita suméria foi denominada como cuneiforme,
devido ao formato cônico dos elementos traçados em artefatos de argila.

IMAGEM 2 – ESCRITA SUMÉRIA

FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Sum%C3%A9ria>. Acesso em: 20 abr. 2021.

No decorrer da história, os grupos humanos construíram diversos sistemas


de escrita. O Egito Antigo utilizava a escrita hieroglífica, traçadas no papiro ou
nas paredes dos templos e pirâmides.

NTE
INTERESSA

Acadêmico, acesse a esse link e


vivencie a experiência de visitar
“a digitalização do Cemitério de
Menna, na antiga capital Luxor,
onde foram enterrados membros da
Décima Oitava Dinastia, a mesma de
Tutancâmon. É possível ver famosos
murais com hieróglifos.”
Disponível em: https://my.matterport.
com/show-mds?m=vLYoS66CWpk

5
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

O nosso sistema alfabético é somente um entre outros que existem. Na


atualidade, coexistem sistemas de escrita com símbolos em que representam
ideias, como o chinês, que representam os sons da fala, como o nosso.

NTE
INTERESSA

Para conhecer um pouco sobre esse interessante sistema de escrita tão


diferente da Língua Portuguesa, acesse o link abaixo.

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Lvo5sMqxIGo

O alfabeto, como o temos, é de origem greco-latina e que, por sua vez, foi
inspirado no alfabeto fenício. Os fenícios foram povos que habitaram a região
onde hoje localiza-se a Síria e o Líbano, no Oriente Médio. Os fenícios criaram
uma escrita consonantal, de 22 letras, que significou uma grande inovação,
pois com elas era possível se escrever todas as palavras. Mais tarde, os gregos
incorporaram as vogais ao alfabeto, mas, até hoje, a escrita hebraica e árabe usam
apenas consoantes.

IMAGEM 3 – EVOLUÇÃO DO ALFABETO

FONTE: <http://www.invivo.fiocruz.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=911&sid=7>. Acesso


em: 22 abr. 2021.

6
TÓPICO 1 — LER E ESCREVER: SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLARIZAÇÃO

Produto da criatividade humana, a escrita, bem como as tecnologias da


comunicação e da informação não param de evoluir e seu uso acontece sempre
pari passu à dinâmica cultura e social. Nas sociedades contemporâneas de escrita
alfabética elementos pictóricos mesclam-se às palavras ou até substituem a escrita,
no processo comunicativo cibernético.

IMAGEM 4 – CONVERSA DE WHATSAPP

FONTE: A autora (2021)

No que tange ao tema de estudos dessa disciplina, naturalmente que esse


novo modo de escrita em ambientes digitais ocupam um lugar no processo de
alfabetização, o que discutiremos à frente.

Pensando no contexto do surgimento da escrita e no lugar que essa


invenção ocupa nas sociedades letradas da atualidade, vê-se que, embora os
símbolos que a representam e a mídia que a comporta tenham se modificado e
evoluído no decorrer das eras, sua importância e uso permanecem inalterados:
a escrita sempre esteve atrelada a mecanismos interativos, sociais, econômicos e
culturais. Adiante, veremos como a apreensão da língua escrita se deu e ainda se
dá, na história do nosso país.

7
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

3 A HISTÓRIA DA ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL: DOS


JESUÍTAS AO FIM DO IMPÉRIO, O QUE SE SABE SOBRE
ALFABETIZAÇÃO?
Não somente agora, mas, especialmente no tempo presente, a qualidade
da educação brasileira tem sido ponto de debate entre professores, pesquisadores
do campo, representantes governamentais e de entidades sociais. O que torna o
tema tão complexo, são as múltiplas dimensões que o envolvem. Aspectos como a
formação humana, o processo de ensino e de aprendizagem, a formação e o fazer
docente, as interações pessoais e organizacionais da vida em sociedade, além das
perspectivas político-ideológicas subjascentes, colaboram para que a tratativa
das questões educacionais seja tão abstrusa.

Trabalhar pela melhoria da educação demanda que todas essas dimensões


sejam consideradas em suas particularidades e no modo como elas se articulam,
o que se constitui um grande desafio. Desafio esse, acadêmico, que tem como
ponto fundamental o processo de alfabetização para o progresso bem sucedido
nas demais etapas de escolarização.

Neste tópico, conheceremos um pouco sobre a história desse período


basilar da educação brasileira. Entretanto, devemos esclarecer que o princípio
da história da alfabetização funde-se às história da própria educação no Brasil,
durante o período colonial, que envolve a educação jesuítica e a reforma pombalina,
alcançando também, o período em que o imperador D. João VI veio morar no
Brasil (SILVA, 1988). Portanto, consideramos importante para compreender a
história da alfabetização percorrermos também esse tempo, pois ele nos fornece
elementos importantes para compreendermos o quanto os aspectos políticos e
ideológicos têm implicância direta na qualidade da educação e, naturalmente, na
baixa qualidade historicamente constituída da alfabetização.

3.1 A ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL COLÔNIA


O aprendizado da língua escrita no Brasil tem início no fim da primeira
metade do século XVI, quando o país ainda era colônia de Portugal. O estudo da
história desse contexto nos permite demarcar três momentos distintos da prática
pedagógica realizada no Brasil Colônia: a Pedagogia Jesuítica, as Aulas Régias e
a educação no Reino Unido do Brasil. Explanaremos a respeito desse tempo nos
pontos a seguir:

• A chegada dos Jesuítas no Brasil

De caráter missionário, a alfabetização e as primeiras buscas de se


organizar um processo educativo no país, tinham como objetivo a evangelização
dos índios e sua conversão à fé católica. O trabalho se iniciou com a chegada
da Companhia de Jesus, liderada pelo padre Inácio de Loyola, inaugurando o
período jesuítico.
8
TÓPICO 1 — LER E ESCREVER: SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLARIZAÇÃO

Naquele tempo, o governo, a política e a religião da Metrópole eram


instituições que se fundiam. Naturalmente, com vistas a consolidar seus fins
expansionistas e a reafirmação da fé católica, era fundamental que os habitantes
da colônia absorvessem a religião e a cultura de Portugal. "Portanto, é no
espírito da evangelização que se desenvolve em Portugal o sentido de educação
formal, que influencia substancialmente a formação da sociedade brasileira e o
desenvolvimento dos processos educativos" (PAIVA, 2015, p. 204). Assim, ao se
estabelecer a ordem jesuíta no país, foram sendo criadas ao longo do litoral, várias
escolas de ler e aprender, ou escolas de bê-a-ba. Em 1551, fundou-se no Brasil o
primeiro Colégio Jesuíta. Segundo Casimiro e Silveira (2012),

O método pedagógico utilizado pelos jesuítas foi desdobrado nas


práticas da catequese que, simultaneamente, instruíam as crianças
a ler, escrever e contar. Em boa parte das aldeias da costa, por onde
passavam, os padres inacianos estabeleciam “pequenos seminários”.
Eram as chamadas casas de be-a-bá, espaços onde ministravam às
crianças indígenas o ensino da doutrina e das primeiras letras. As casas
de be-a-bá eram estruturadas em espaços pequenos e nesse mesmo
lugar ocorria o ensino da fé e das letras (CASIMIRO; SILVEIRA, 2012,
p. 218).

“Em 1549, quando aqui chegaram, os jesuítas souberam aproximar-se dos


índios, conviver com eles, aprendendo a cultura, a língua e descobriram logo
como convertê-los. As aproximações incluíam mímicas, discursos emotivos, uso
de instrumentos musicais e presentes” (PAIVA, 2015, p. 205). É certo que essa
aproximação foi também marcada por certa coerção, em que os padres jesuítas
usavam da autoridade da colônia para a dominação indígena. Estrategicamente,
dentre as tribos, somente as crianças indígenas participavam das aulas,
consideradas tábulas rasas, onde é mais simples se imprimir o conhecimento.
Nesse período, crianças e jovens órfãos e marginalizados socialmente foram
trazidos de Portugal, para serem alfabetizados junto com os pequenos índios, e
assim, favorecer o processo de aculturação indígena.

Considerando sobre os materiais e métodos empregados, a fim de


instrumentalizar os padres, a Companhia de Jesus trouxe de Portugal a Cartilha
de João de Barros.

A cartinha de João de Barros é um compêndio onde se apresentam as


letras do alfabeto, silabário e textos em forma de orações cristãs. Vale
lembrar que esse se constitui como o primeiro material impresso para
o ensino da leitura, pois antes se ensinava por papéis manuscritos, e
que pretendia suplantar o método alfabético ou de soletração antiga,
caracterizado pelo estudo simultâneo de todas as letras (VIEIRA, 2017,
p. 55).

Araújo (2008), nos fornece interessantes ilustrações dos recursos utilizados


pelos padres inacianos:

9
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

FIGURA 5 – ALFABETO DA CARTILHA JOÃO DE BARROS

FONTE: Araújo (2008, p. 83-84)

Chamamos sua atenção para o modo como foi organizado o material de


alfabetização. A figura trazida por Araújo (2008) apresenta o alfabeto traçado em
letras no estilo gótico, associadas a uma imagem e ao substantivo que a nomeia,
herança do antigo método Alfabético ou Soletração, usados pelos gregos. O texto
é bastante representativo quanto ao pensamento pedagógico da época, em que
se entendia que a aprendizagem inicial da escrita era facilitada pela relação entre
letras, sílabas, imagens e palavras. Muito semelhante a materiais que ornamentam
as salas de aulas atuais, não acham?

Embora o trabalho fosse orientado por cartilhas, os padres inacianos,


aproximando-se de alguns aspectos do modo de viver dos índios, incorporaram
à sua didática elementos da natureza e de situações do cotidiano das crianças
nativas para viabilizar o processo de ensino. Nas palavras de Saviani (2011, p.
7), “os jesuítas tiveram que ajustar suas ideias educacionais, modificando-as
segundo as exigências dessas condições”. Assim, embora fortemente marcada por
uma raiz tradicional, advinda da escolástica, o lúdico se fez presente na prática
alfabetizadora jesuíta, abrindo portas para uma didática mais contextualizada à
realidade infantil (PAIVA, 2015). Jogos, brincadeiras e canções eram elementos
presentes na alfabetização e no estudo de outros conhecimentos como matemática,
retórica e teologia, sem, contudo, abordar conteúdo das ciências iluministas
que se espalhavam pela Europa. Mesmo não sendo o objetivo principal, mas
apenas um meio para o alcance de fins religiosos, o modelo educacional jesuíta
cresceu e se consolidou, defendendo ideais de formação humana, disciplina e
desenvolvimento das habilidades individuais (MACIEL; NETO, 2006).

10
TÓPICO 1 — LER E ESCREVER: SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLARIZAÇÃO

NOTA

Escolástica: corrente filosófica medieval que buscou conciliar a fé cristã


católica e a racionalidade, sobre a qual se construiu uma concepção de ensino. Possuía
como princípios a disciplina, a repetição, a memorização, a espiritualidade e a moralidade.

A Cartilha de João de Barros explicita sua escolha pelo trabalho com as


sílabas, contrapondo-se ao Método Alfabético ou de Soletração, que vigorava
desde a Antiguidade até a Idade Média (VIEIRA, 2017). Os jesuítas ensinavam as
crianças a unir as letras às vogais, formando as famílias silábicas. Observe:

FIGURA 6 – MÉTODO SILÁBICA NA CARTILHA DE JOÃO DE BARROS

FONTE: Araújo (2008, p.125)

A estrutura organizacional e educacional jesuítica já preconizava a


sistematização do ensino no Brasil, ressaltando a importância de um método para
alfabetizar. O sucesso do trabalho atraiu também os nobres, senhores de engenho,
que matriculavam seus filhos para, posteriormente, seguirem seus estudos em
Portugal.

Tal contexto resultou num grande fortalecimento do grupo jesuíta no


Brasil, que, por mais de dois séculos, se multiplicou no país com a abertura de
novos colégios e missões, atribuindo à Companhia, um importante poder político,
em detrimento das demais ordens religiosas que também se faziam presentes no

11
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

país, como os beneditinos, e franciscanos. Essa situação se tornou uma ameaça


à soberania de nobreza portuguesa, pois os jesuítas se posicionavam contra a
escravização dos ameríndios e até realizavam missas em tupi-guarani.

Em 1759, Portugal, na figura do Marquês de Pombal, expulsou os jesuítas


das terras brasileiras, confiscando os bens da Companhia. Esse fato logo tornou-
se um problema para a educação na colônia, uma vez que a profissão docente
era exercida pelos jesuítas, com destaque para os professores alfabetizadores. Foi
assim que a elite e os militares se inseriram na educação do Brasil.

• A instauração das aulas régias

Na metade do século XVIII, Sebastião José de Carvalho e Melo, primeiro-


ministro português, conde de Oeiras, conhecido como o Marquês de Pombal,
sabedor das fragilidades vivenciadas pela Metrópole naquele tempo, e com
ideias de governo diferentes das que eram administras por Portugal, identificou
no campo da educação, uma maneira de obter maior controle político na Colônia.

FIGURA 7 – MARQUÊS DE POMBAL

FONTE: <https://conhecimentocientifico.r7.com/marques-de-pombal/>. Acesso em: 25 abr. 2021.

A expulsão dos Jesuítas e de sua educação voltada para formação do


pensamento religioso, significou o início do ensino laico, enfraquecendo o
poderio do clero frente à nobreza. Uma forma de modernizar a Coroa e aproximá-
la das mudanças políticas, econômicas e culturais que já ocorriam na Europa,
por influência do Iluminismo. No entanto, implicou em grande perda no campo
educacional. Sendo assim, a educação voltava-se para os interesses econômicos
da elite administradora da colônia. Para Maciel e Neto (2006),

o grande empecilho para a concretização desses objetivos foi a falta


de homens capacitados para o ensino elementar e primário, ou seja,
havia, tanto na metrópole quanto na colônia, uma grande carência
de professores aptos ao exercício da função de ensinar. Frente a
esse contexto, pode-se afirmar que Pombal, ao expulsar os jesuítas e

12
TÓPICO 1 — LER E ESCREVER: SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLARIZAÇÃO

oficialmente assumir a responsabilidade pela instrução pública, não


pretendia apenas reformar o sistema e os métodos educacionais, mas
colocá-los a serviço dos interesses político do Estado (MACIEL; NETO
2006, p. 471).

NOTA

O Iluminismo se iniciou como um movimento cultural europeu do século XVII


e XVIII que buscava gerar mudanças políticas, econômicas e sociais na sociedade da época.
Para isso, os iluministas acreditavam na disseminação do conhecimento, como forma de
enaltecer a razão em detrimento do pensamento religioso.
Acesse: https://www.politize.com.br/iluminismo/

Nesse contexto, Marquês de Pombal atribuiu a responsabilidade docente


e gestora dos colégios aos nobres militares e aos representantes de outras ordens
católicas que estavam no Brasil. Era importante para o poderio da Metrópole
deter o domínio do sistema educacional. Representantes da Coroa Portuguesa
deram início ao modelo de aulas régias no Brasil. A esse respeito, Silva (2020)
evidencia que:

As aulas régias também serviram para estabelecer relações entre


as pessoas que faziam parte do quadro de funcionários dos órgãos
responsáveis pelo gerenciamento e controle da educação que foi
implementada pelo Estado na segunda metade do século XVIII,
estendendo também para os demais envolvidos, como os professores,
os alunos e seus responsáveis (SILVA, 2020, p. 73).

O autor nos leva à compreensão do modo como a educação brasileira


passou a ser regida pelo alto escalão do governo, iniciando assim, a história de
interesses políticos, econômicos e partidários que envolvem a escola brasileira
e que se alonga até os dias de hoje. As aulas régias, ministradas isoladamente
em ambientes independentes criados pelos mestres, favoreciam a construção de
relações sociais que visavam a ascensão social. "É notório ressaltar que a sociedade
do Antigo Regime era balizada na dependência interpessoal, sendo que as redes
clientelares eram utilizadas como estratégia para estruturar os diversos níveis de
relações sociais, estabelecendo relações de poder entre indivíduos e os grupos
sociais"(SILVA, 2020, p.122).

Não somente nesse tempo, coexistindo com as Cartilha de João de Barros,


mas especialmente após a saída dos jesuítas, foi amplamente difundida no Brasil
as Cartas do ABC.

[...] por volta dos anos de 1870, o professor preparava um ABC


manuscrito em folhas de papel que se manuseava com ‘pega-mão para
não sujar’. Em seguida à carta manuscrita do ABC, vinha o bê-a-bá,

13
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

que era o início de uma longa série de cartas de sílabas. Após estas,
vinham as cartas de nomes, e, por último, as cartas de fora. As cartas
de fora eram cedidas ao professor, por empréstimo, para exercitar os
alunos nas dificuldades das letras manuscritas; eram ofícios dirigidos
ao professor e alguns deles traziam a assinatura do Inspetor Geral
(BARBOSA, 1994, p. 58).

Acadêmicos, pensem sobre o quanto essa estrutura tem impactado a visão


metodológica e a ideologia por trás das políticas de alfabetização.

Frente a esse contexto, pode-se afirmar que Pombal, ao expulsar os


jesuítas e oficialmente assumir a responsabilidade pela instrução
pública, não pretendia apenas reformar o sistema e os métodos
educacionais, mas colocá-los a serviço dos interesses político do
Estado (MACIEL; NETO, 2006, p. 471).

O novo modelo educativo empregado, as chamadas Aulas Régias,


implicou numa grande mudança filosófica e nos fins da educação colonial. Embora
didaticamente alguns professores, formados pelos jesuítas, ainda mantivessem
traços didáticos dessa pedagogia, a formação política do Marquês e sua inclinação
aos ideais iluministas, reforçou a diferença na qualidade da educação oferecida
aos filhos das elites, em relação ao que era proposto aos ameríndios e filhos dos
pobres colonos. Além disso, "havia crianças e jovens que não eram nobres e
nem cidadãos, que estavam fora da escola e que não receberam essa herança, de
nobreza e de cidadania"(SILVA, 1998, p.59).

De acordo com a nova proposta, os mestres régios, que eram representantes


da Coroa e funcionários do governo, deveriam ensinar aos meninos índios e pobres
apenas a ler e a escrever em português e a fazer cálculos simples. Ressalta-se que
o número de crianças pobres atendidas era bem pequeno e foi progressivamente
tornam-se ainda menor. Essa formação visava atender apenas à necessidade de
mão de obra mais qualificada na Colônia, que caminhava para a modernização.
As meninas, que foram de certo modo alcançadas pela educação jesuíta, era
educadas em escolas próprias, tendo em vista o aprendizado de tarefas úteis ao
lar (PAIVA, 2015).

No que tange aos materiais e métodos empregados no processo de


alfabetização, sabe-se que os mestres se valiam das antigas cartilhas de alfabetização,
com ênfase na repetição e memorização para o aprendizado da língua escrita. A
pesquisa de SOUZA (2009), nos traz como modelo, o manual produzindo pelo
exímio calígrafo Manuel De Andrade de Figueiredo, material utilizado pela Nova
escola para aprender a ler, escrever e a contar, publicado em Portugal, em 1722, antes das
reformas pombalinas, mas que muito provavelmente foram trazidos para o Brasil,
no final do século XVIII. “A Nova escola para aprender a ler, escrever e contar,
da autoria de Andrade de Figueiredo é um sofisticado exemplar dos manuais de
caligrafia setecentistas. A obra segue os padrões organizacionais ou estruturais
comuns aos manuais de caligrafia correntes na época” (SOUZA, 2009, p. 44).

14
TÓPICO 1 — LER E ESCREVER: SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLARIZAÇÃO

FIGURA 7 – ORNATO CALIGRÁFICO DA ESCOLA NOVA

FONTE: Souza (2009, p. 51)

Pombal não conseguiu alcançar com sua nova proposta educacional, a


mesma organização e sucesso dos Jesuítas, sendo avaliada por Maciel e Neto
(2006), da seguinte maneira:

A reforma de ensino pombalina pode ser avaliada como sendo


bastante desastrosa para a Educação brasileira e, também, em certa
medida para a Educação em Portugal, pois destruiu uma organização
educacional já consolidada e com resultados, ainda que discutíveis
e contestáveis, e não implementou uma reforma que garantisse um
novo sistema educacional. Portanto, a crítica que se pode formular
nesse sentido, e que vale para nossos dias, refere-se à destruição de
uma proposta educacional em favor de outra, sem que esta tivesse
condições de realizar a sua consolidação (MACIEL; NETO, 2006, p.
475).

Articulando nosso estudo sobre as práticas alfabetizadoras no Brasil à


concepção de políticas públicas educacionais, é fundamental que você acadêmico,
note como a ideologia governista exerce influência na constituição da ação
política educacional. No bojo dessas análises, verifica-se a organização escolar
brasileira à serviço dos interesses da elite dominante da época. Aos pobres, e às
mulheres, conforme a ordem social da época, deveria ser oferecido o mínimo
de acesso à escolarização necessário para o trabalho. Já os filhos dos nobres
recebiam uma educação diferenciada, com currículo mais elaborado, constituído
de componentes das áreas das ciências humanas, das ciências da natureza e das
ciências exatas, fomentadas pelo movimento renascentista.

Após a morte do Marquês de Pombal, em 1782, a elite brasileira,


determinada a difundir o pensamento iluminista, continuou a buscar maneiras
de elevar a educação no país. No final do século XVIII, início do século XIX,

15
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

chegou ao Brasil as Cartilhas de João de Deus, um prelúdio dos Métodos


Analíticos, e o Método Lacaster, que viria a ser efetivamente implantado como
plano governamental, sob o reinado de D. Pedro I.

Num tempo em que a educação não era obrigatória, a nova estrutura


acabou por propiciar um afastamento dos pobres da escola, pela construção de
um ambiente excludente e de menor afinidade ao seu contexto de vida.

DICAS

Acadêmico, propomos uma literatura clássica e interessante. Memórias de um


sargento de milícias, de Antônio Manoel de Almeida, narra e descreve, em vários trechos,
cenas das aulas régias. Deleite-se na leitura!

• Alfabetização no Período Joanino

Após o fracasso das reformas pombalinas, com a chegada de D. João


VI no Brasil, em 1808, alguns investimentos passaram a ser feitos na educação
na colônia. O imperador tinha forte interesse pelas letras, as artes e as ciências
em geral. Logo viu-se que o Brasil não possuía uma estrutura educacional de
qualidade para oferecer aos filhos da nobreza (Silva, 1998). Observe, acadêmico,
que desde a saída dos jesuítas, os esforços que se fizeram em prol da educação no
país foram direcionados aos filhos das elites. Ainda que os investimentos jesuítas
na educação popular tenham sido com objetivos religiosos e não propriamente
educativos.

As circunstâncias políticas que fomentaram a vinda da Família Real para


o Brasil favoreceram novidades no plano do conhecimento. Instituições foram
criadas para atender e sustentar os interesses educativos da corte. A presença do
Rei na colônia fez com que livros pudessem ser impressos aqui, e no ano de sua
chegada foi criada a Imprensa Régia (LOPES, 2000). Com a Família Real, o acervo
da Biblioteca Nacional de Portugal foi embarcado para o Brasil, juntamente com

16
TÓPICO 1 — LER E ESCREVER: SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLARIZAÇÃO

os tesouros da Coroa. Em 1810, foi fundada a Biblioteca Pública no Rio de Janeiro.


Essa nova realidade, sem dúvida, enriqueceu o capital cultural da colônia, mas
não com extensão às camadas populares.

FIGURA 8 – PRÉDIO DA IMPRENSA RÉGIA

FONTE: <https://bit.ly/3meQtp0>. Acesso em: 25 abr. 2021.

FIGURA 9 – BIBLIOTECA NACIONAL

FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Biblioteca_Nacional_do_Brasil>. Acesso em: 25 abr. 2021

Além disso, a abertura dos portos às nações amigas permitiu a importação


de livros lidos na Europa desde o século XVII, quando os ideais iluministas
se expandiam no mundo ocidental. Literaturas de autores como John Locke,
Thomas Hobbes, George Berkeley e David Hume, trouxeram o empirismo para
o Brasil. O pensamento de que o conhecimento só era acessível por meio dos
sentidos ensaiou uma concepção de alfabetização que considerasse o ritmo
de aprendizagem da criança. Esse entendimento, porém, não se confirmou na
prática, sendo essa orientada pelo arcaísmo das metodologias já vivenciadas em
Portugal. E apesar de já existir impressa no país, as cartilhas de alfabetização
continuavam sendo trazidas da Metrópole.

Durante o Período Joanino, embora muitos professores tenham sido


trazidos de Portugal para cá, poucas escolas com classes de alfabetização foram
formadas. Delas participavam somente algumas crianças de famílias europeias
residentes nos centros urbanos. Silva (1998) denuncia que:
17
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

Neste período, apesar do aumento do número de professores


encarregado de ensinar a ler, escrever e contar e dos recursos para
a educação, os resultados não foram significativos, que se pode
atribuir a circunstâncias desfavoráveis e não à inércia e incúria dos
poderes público, reafirma Almeida. Ou seja, desde os inícios, somos
os culpados de nossa ignorância, barbárie, atraso (SILVA, 1998, p. 60).

Vê-se, portanto, que a educação para todos não foi assumida como
responsabilidade do governo nesse período.

3.2 ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL IMPÉRIO


Declarada a Independência, embora o governo ainda demonstrasse pouca
preocupação com as questões educacionais, em 1824 a primeira Constituição do
Brasil garantia como direito civil de todo cidadão brasileiro a instrução primária
gratuita. Não obstante o documento ser dirigido a todo cidadão brasileiro, numa
sociedade escravocrata, o acesso à alfabetização ainda era privilégio somente
daqueles que podiam pagar: descendentes de famílias abastadas, ou freiras e
padres, mantidos pelo Estado. Silva (1998), esclarece que

Em 1840, a população do pais era de 6.000.000 de habitantes, sendo que,


destes "2.500.000 (eram) indígenas e escravos, que não fornecem alunos
à população escolar; sobravam, pois, 3.500.000 pessoas livres"(:80)
[sic]. Quando, portanto, no texto, fala-se em povo, sociedade, classes
populares. está-se falando em pessoa livre. Analisando período
posterior, o de 1870-1875, o autor diz que "o recenseamento acusa
a existência de 23.087 indivíduos livres de 7 a 14 anos, em idade de
receber a instrução primária"(:l34) [sic]. Desses 23.087, 9.311 estavam
na escola. Logo, havia 13.776 fora da escola, isto é, 315 da população
livre (SILVA, 1998, p. 62).

Passados dez anos, D. Pedro I promulgou algumas alterações e adições


à Constituição Política do Império. O ato adicional de 1834 regia que cabia às
Assembleias das províncias legislar sobre a instrução pública e prover os
estabelecimentos próprios para promovê-la. Sendo assim, a responsabilidade da
oferta da educação primária e da gestão das escolas desse nível seria de cada
província. Nesse ínterim, foram criados também os cursos Normais, de nível
secundário, visando a formação de professores alfabetizadores, também sob
competência das províncias.

No que diz respeito aos recursos didáticos utilizados para alfabetizar, o


Método Lancaster, ou Método Mútuo, ganhou proeminência no Estado. Segundo
Vieira (2017),

Desenvolvido na Inglaterra no final do século XVIII, no apogeu do


processo da industrialização e urbanização, por Andrew Bell e Joseph
Lancaster, o método pretendia instruir uma grande quantidade de
alunos de uma só vez, acelerando o progresso dos alunos além de

18
TÓPICO 1 — LER E ESCREVER: SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLARIZAÇÃO

abreviar o trabalho do mestre e diminuir os custos com a educação. A


educação e a escolarização passam a ser alvo de expansão nas várias
províncias (VIEIRA, 2017, p. 80).

Esse foi o primeiro método educacional instituído de modo oficial no


Brasil, por D. Pedro I, em 15 de outubro de 1827. A proposta vinha ao encontro
dos ideais iluministas de modernização e crescimento da nação. Indo de encontro
ao método individual, em que embora os alunos estivessem agrupados em
um mesmo espaço, o professor ensinava e fazia intervenções com cada aluno
individualmente, o Método Lancaster não permitia a organização de turmas
homogêneas e o ensino coletivo, propiciando mais rapidez e eficiência.

FIGURA 10 – MÉTODO LANCASTER

FONTE: <https://bit.ly/3F7HbDL>. Acesso em: 25 abr. 2021

Essa nova estrutura representou certo avanço no campo educacional,


porém, a exclusão dos cidadãos marginalizados ganhou nova dimensão. Naquele
tempo, como ainda hoje, havia diferenciação do poderio econômico entre as
regiões do país. Com a descentralização do ensino, as províncias mais carentes
não podiam manter a mesma estrutura educacional que as outras. Enquanto
existiam províncias com bons resultados acadêmicos, o ensino em outras era
muito precário, o que acarretou em deperecimento. Escolas particulares foram
surgindo, reforçando a desigualdade social entre aqueles que podiam pagar para
serem alfabetizados e aqueles que continuariam excluídos.

Paralelamente à organização escolar de ensino mútuo, os materiais


orientados por métodos tradicionais, como o da soletração e o silábico,
trabalhados pelas cartilhas de João de Barros e as cartilhas ABC, sustentavam
o ensino. Entrementes, expandiu-se no Brasil o Método Castilho, criado pelo
português Antônio Feliciano de Castilho, com uma abordagem mais lúdica para
a alfabetização e em oposição ao caráter punitivo e exaustivo que ações escolares
tinham naquele tempo. Na análise de Vieira (2017), Castilho

19
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

Traz, na primeira lição, as vogais ilustradas o que também nos faz


rememorar a Cartinha de João de Barros que trazia o desenho colado
à letra como forma de auxiliar na memorização da referida letra.
O “novo” aqui consiste no esforço do autor em buscar estampas
destinadas a dar ideia da forma e do som da letra, associando-a a
uma história. Para a letra A, por exemplo, encontra-se associada
uma imagem de “um rapazito encostado a um tronco, bocejando o
som A, esforço metodológico para relacionar a grafia da letra ao som
correspondente (VIEIRA, 2017, p. 89).

Em sua pesquisa, a autora ilustra partes do material de Castilho:

FIGURA 11 – ENSINO DE VOGAL PELO MÉTODO CASTILHO

FONTE: Vieira (2017, p. 90)

Após o aprendizado das vogais, eram apresentadas as consoantes,


seguindo o mesmo modelo: mediado por uma pequena história, a criança era
conduzida ao aprendizado da grafia e da compreensão fonêmica da letra:

FIGURA 11 – ENSINO DE CONSOANTE PELO MÉTODO CASTILHO

FONTE: Vieira (2017, p. 91)

20
TÓPICO 1 — LER E ESCREVER: SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLARIZAÇÃO

Após a apresentação dos cartazes com as letras, a criança era conduzida à


formação de palavras e frases curtas, para então, ler pequenos textos. O método
Castilho incorporava também, ao final do estudo de cada letra, pequenas histórias
a fim de explorar melhor o fonema, por meio da ludicidade. Castilho destacava
também, a importância do conhecimento dos sinais de pontuação, para a escrita
e interpretação.

FIGURA 12 – CONTO DE CASTILHO, TRABALHANDO A LETRA F

FONTE: Vieira (2017, p. 92)

De 1840 a 1889, D. Pedro II assumiu o comando do país. Esse foi um


período marcado por muitos conflitos e manifestações políticas e sociais,
culminando na Proclamação da República. Esse também foi um tempo de
muitas ações antiescravistas, com a sanção de leis a favor dos negros, até que a
escravidão fosse abolida no país, em 1888. Esse contexto impulsionou a entrada
de imigrantes no Brasil, a fim de suprir a necessidade de mão de obra, o que gerou
um grande intercâmbio cultural. A diversidade de costumes, crenças e religiões se
amalgamou ao país já miscigenado, propiciando mudanças nas relações sociais.

A presença do Protestantismo no Brasil alcançou também o campo da


alfabetização. A crença na leitura da Bíblia como indispensável ao crescimento
espiritual de todo cristão provocou o surgimento de escolas que permitiram
a escolarização de alguns marginalizados socialmente. Assim, pessoas
pobres, brancas, mestiças, negras e índias, ainda que poucas, puderam ser
alfabetizadas.

21
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

Como se percebe, desde a chegada dos portugueses ao Brasil, até o império


de D. Pedro II, a alfabetização popular recebeu pouca atenção do governo.
Estivemos sempre imersos num jogo de interesses políticos e econômicos que
acabaram por construir um cenário em que o acesso à educação era permitido
somente aos nobres da sociedade. Apenas com a Proclamação da República, em
1889, é que o analfabetismo passa a ser considerado um problema para o governo.

Convidamos você, acadêmico, a continuar conosco essa viagem,


avançando no conhecimento dos métodos de alfabetização, pela história da
educação do Brasil!

22
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• A escrita é uma herança cultural das sociedades letradas, uma invenção da


raça humana que requer um ensino sistematizado e intencional.

• No decorrer da história os grupos humanos construíram diversos sistemas


de escrita.

• O alfabeto, como o temos, é de origem greco-latina, que, por sua vez, foi
inspirado no alfabeto fenício.

• A história da alfabetização no Brasil remota desde o período da colonização,


porém, sempre caracterizada por embates econômicos, políticos, sociais e
metodológicos que existem até hoje.

• O estudo da história desse contexto nos permite demarcar três momentos


distintos da prática pedagógica realizada no Brasil Colônia: a Pedagogia
Jesuítica, as Aulas Régias e a educação no Reino Unido do Brasil.

• A estrutura organizacional e educacional jesuítica já preconizava a


sistematização do ensino no Brasil, ressaltando a importância de um método
para alfabetizar;

• A expulsão dos Jesuítas e de sua educação voltada para formação do


pensamento religioso, significou o início do ensino laico, no entanto, implicou
em grande perda no campo educacional.

• As aulas régias, ministradas isoladamente em ambientes independentes


criados pelos mestres, favoreciam a construção de relações sociais que
visavam a ascensão social.

• No que tange aos materiais e métodos empregados no processo de


alfabetização, sabe-se que os mestres se valiam das antigas cartilhas de
alfabetização, com ênfase na repetição e memorização para o aprendizado da
língua escrita.

• As circunstâncias políticas que fomentaram a vinda da Família Real para o


Brasil favoreceram novidades no plano do conhecimento, o que enriqueceu
o capital cultural da colônia, mas não com extensão às camadas populares.

• Declarada a Independência, em 1824 a primeira Constituição do Brasil


garantia como direito civil de todo cidadão brasileiro a instrução primária
gratuita, contudo, numa sociedade escravocrata, o acesso à alfabetização
ainda era privilégio somente daqueles que podiam pagar.

23
AUTOATIVIDADE

1 Analise as imagens a seguir:

(1)

(2)

Podemos afirmar que a relação que se dá entre ambas se expressa:

a) ( ) Pelo caráter contínuo do uso da escrita que a imagem 2 tem com a


imagem 1, representando um retorno ao modo de escrita antigo em
substituição ao contemporâneo.
b) ( ) Por meio da mensagem que transmitem: ambas expressam sentimentos
por meio de figuras que remetem a um objeto conhecido.
c) ( ) Com o paradoxo linguístico estabelecido, uma vez que não se pode
chamar de escrita mensagens construídas por meio de desenhos.
d) ( ) Pela dinâmica história da escrita que as imagens representam,
demonstrando a evolução dos signos e o sentido semântico dos traços.

2 Em 1551, fundou-se no Brasil o primeiro Colégio Jesuíta. Segundo Casimiro


e Silveira (2012),
O método pedagógico utilizado pelos jesuítas foi desdobrado nas
práticas da catequese que, simultaneamente, instruíam as crianças
a ler, escrever e contar. Em boa parte das aldeias da costa, por
onde passavam, os padres inacianos estabeleciam “pequenos
seminários”. Eram as chamadas casas de be-a-bá, espaços onde
ministravam às crianças indígenas o ensino da doutrina e das
primeiras letras. As casas de be-a-bá eram estruturadas em
espaços pequenos e nesse mesmo lugar ocorria o ensino da fé e
das letras (CASIMIRO; SILVEIRA, 2012, p. 218).

A respeito da alfabetização no período colonial brasileiro, avalie as asserções


em verdadeiras ou falsas:
24
I- A expulsão dos jesuítas do Brasil significou um retrocesso da educação do
país, pois, embora o trabalho da Companhia tivesse forte cunho religioso
e político, ele ofereceu qualidade de escolarização, certo diálogo com a
diversidade e resistência aos princípios da nobreza.
II- As Reformas Pombalinas trouxeram novidades no plano didático da
alfabetização, tornando o ensino mais acessível aos marginalizados
socialmente, criando um contexto propício à democratização e à
universalização do ensino.
III- Os ideais iluministas, difundidos na Europa e defendidos pela elite
imperial brasileira, embora tenham fomentado um modelo econômico
com grandes desigualdades sociais, permitiu o acesso a toda sorte de
ciência e literatura.

Está correto o que afirma em:

a) ( ) I e III somente.
b) ( ) II somente.
c) ( ) II e III somente.
d) ( ) III somente.

3 Observe a foto da Biblioteca Nacional, fundada no Brasil em 1810:

A Biblioteca Nacional do Brasil, considerada pela UNESCO uma das dez


maiores bibliotecas nacionais do mundo, é também a maior biblioteca da
América Latina. O núcleo original de seu poderoso acervo, calculado hoje em
cerca de dez milhões de itens, é a antiga livraria de D. José organizada sob
a inspiração de Diogo Barbosa Machado, Abade de Santo Adrião de Sever,
para substituir a Livraria Real, cuja origem remontava às coleções de livros de
D. João I e de seu filho D. Duarte, e que foi consumida pelo incêndio que se
seguiu ao terremoto de Lisboa de 1º de novembro de 1755.

Fonte: https://www.bn.gov.br/sobre-bn/historico

Sobre o período acima rememorado, pode-se dizer que:

I- Significou m período de grande enriquecimento intelectual e cultural,


abrigando, o Brasil, um grande acervo de livros, textos históricos e
científicos. Além disso, passou-se a ser impressos no país jornais e livros.
25
Afirma-se também que

II- Cartilhas de alfabetização passaram a ser produzidas no Brasil, o que


favoreceu a popularização do ensino, reduzindo sistematicamente o
número de analfabetos brasileiros, principalmente entre negros e caboclos.

Assinale a alternativa que melhor interpreta o que foi dito nas proposições I
e II:

a) ( ) A proposição I é verdadeira, sendo a II uma sequência histórica


relevante.
b) ( ) A proposição II é falsa e não tem relação com o fato histórico trazido
pela primeira.
c) ( ) A proposição I é falsa e tornou a segunda inviável até os dias atuais.
d) ( ) A proposição II é parcialmente verdadeira e não tem ligação com o
contexto criado expresso na proposição I.

4 Contextualize e defina o Método Lancaster:

5 Disserte sobre como o contexto criado para a Proclamação da República


impactou na alfabetização.

26
UNIDADE 1 TÓPICO 2 —

PANORAMA HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE


ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL REPUBLICANO

1 INTRODUÇÃO
Atualmente, a questão sobre qual é melhor método para se alfabetizar
tem acalorado debates. Essa não é uma discussão atual, mas se intensiva à
medida em que as ações alfabetizadoras do país parecem não darem conta das
necessidades de aprendizagem das crianças. A oposição feita entre os métodos
sintáticos e analíticos, em que um é superado pelo outro, foi transpassada por um
entendimento equivocado surgido na década de 1990 de que não era necessário
método para se alfabetizar.

No bojo dessas considerações, entendemos que, conhecer a história da


alfabetização brasileira, dos métodos e dos resultados que têm sido alcançados,
permitirá a todo professor lançar luz à práxis pedagógica e construir sua didática
com uma intencionalidade clara.

Acadêmico, continue a leitura desse material pautando-se no seguinte


pensamento: "Se queres conhecer o passado, examina o presente que é o resultado;
se queres conhecer o futuro, examina o presente que é a causa." Confúcio.

2 A ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL DE 1889 a 1930 – A VELHA


REPÚBLICA
Com foi possível entrevermos pelos estudos passados, o ensino das
primeiras letras à população passou a ter maior atenção governamental e a ganhar
uma organização mais institucionalizada poucas décadas antes da Proclamação da
República, em 1889. Esse fato deve-se, em grande parte, pelo tipo de colonização
ocorrida no Brasil: com caráter de exploração e não de desenvolvimento. Os
investimentos mais sistematizados na alfabetização e a criação do sistema público
de ensino se fizeram presentes apenas quando eles passaram a importar para o
avanço econômico do país, sem, contudo, deixar de privilegiar a manutenção do
status quo social.

Diante dessa realidade, a alfabetização brasileira foi também, muito


fortemente, marcada por embates metodológicos. Debates no âmbito acadêmico
devem sempre ser encarados como oportunidade de aprofundamento das
pesquisas, tendo em vista que nenhum conhecimento científico é inacabado.
Chamamos a atenção para a distinção entre os termos embate e debate, dentro
27
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

do nosso contexto: um remete a choque de ideias, outro à problematização; um


torna-se sem proveito, outro produz crescimento; um tem fim ideológico, outro,
nas necessidades de aprendizagem dos estudantes. No primeiro período do Brasil
republicano, intelectuais e educadores iniciaram essa discussão que, ainda hoje,
no século XXI, não foi concluída.

Retomando um pouco as leituras que tivemos, é possível identificar nos


períodos históricos expostos que em 389 anos do ensino da língua escrita no Brasil,
foram aqui adentrados alguns métodos de alfabetização, chamados de Sintéticos,
por iniciarem o processo de aprendizagem das menores unidades textuais para
as maiores, ou "das partes para o todo", como comumente se diz: letra > sílaba
> palavra > frase > texto. Abordaremos nesse tópico mais pormenorizadamente,
os três tipos de métodos sintáticos, para então, fazermos um contraponto com os
métodos analíticos que se expandiram na República, no tópico seguinte.

2.1 OS MÉTODOS SINTÉTICOS

E
IMPORTANT

Acadêmico, é muito importante que você se exponha à compreensão dos


conhecimentos que compartilharemos agora como um pesquisador que explora diferentes
dimensões do objeto de estudo, a fim de alcançar seu objetivo final. Com a disciplina de
Fundamentos e Metodologias da Alfabetização e do Letramento temos por grande meta,
que você se forme um bom professor alfabetizador e não como um mero aplicador de
métodos sem uma intencionalidade pedagógica clara. Para tanto, estude sobre os métodos
de alfabetização não como receitas a serem aplicadas, mas analisando-os criticamente,
sabendo de antemão que, a ação docente antecede ao método e a necessidade de
aprendizagem do aluno inspira a ação docente!

2.1.1 Método de Soletração ou Alfabético


Originado na Grécia Antiga, chegou ao Brasil pelas Cartas do ABC, no
século VI. Ainda no século XX era muito usado. O Método João de Barros, preferido
pelos jesuítas, apresenta certos traços do Soletração. Incluído na categoria de
método sintético, ou seja, aqueles que parte das unidades menores para as maiores
unidades da língua - letras, sílabas, fonemas - o método de soletração é o mais
antigo dos métodos. Por meio dele, o aluno é conduzido a aprender os nomes das
letras e sua forma escrita. Posteriormente, a ordem alfabética é exaustivamente
trabalhada. Na sequência, o aluno é levado a unir as letras e a organizá-las em
diferentes posições a fim de que, memorizados esses arranjos, a criança possa
identificá-los em palavras, a partir da soletração.

28
TÓPICO 2 — PANORAMA HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL REPUBLICANO

Por esses termos, o professor ensina o aluno a soletrar as letras, associando-


as à sua representação visual e, por conseguinte, ao som que ela produz nas
palavras. O aspecto satisfatório desse método é que a identificação das letras é o
básico para aprender a ler e a escrever, porém, esse método mostra-se bastante
exaustivo e moroso, uma vez que para que a criança alcance o objetivo principal
do trabalho, ela passa por muitos processos desassociados do contexto da leitura,
e especialmente, do seu uso social.

Observe alguns materiais usados em muitas salas de aula inspirados no


método de soletração:

FIGURA 13 – MURAL DO ALFABETO

FONTE: <https://thecakeboutiquect.com/>. Acesso em: 3 maio 2021.

Ter sempre aos olhos a grafia correta das letras favorece o aprendizado
da criança, à medida em que ela pode consultá-lo sempre que tiver dúvidas.
No entanto, até a construção da base alfabética, ou seja, até que criança tenha
compreendido a relação grafo-fonêmica do sistema alfabético de escrita e
avançado em habilidades de leituras, a apresentação da letra cursiva pode não
ser tão positiva, uma vez que desfavorece a discriminação visual dos traçados.

FIGURA 14 – FORMAÇÃO DA SÍLABA PELO MÉTODO DE SOLETRAÇÃO

FONTE: <https://bit.ly/3oElV2X>. Acesso em: 3 maio 2021.

29
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

Veremos na próxima unidade que, enquanto a criança se alfabetiza


ela elabora hipóteses que se constituem em processos importantes para o
aprendizado da língua escrita. Nesses processos a consciência fonêmica (o som
que cada letra representa) é construída. O uso de materiais semelhantes à Figura
14 podem interferir no amadurecimento do alfabetizando diante da escrita, numa
perspectiva psicogenética, por isso, seu uso deve ser avaliado. Aprofundaremos
mais sobre a teoria psicogenética da língua escrita na Unidade 2.

2.1.2 Método Silábico


Esse método chegou ao Brasil por meio da Companhia de Jesus, conhecido
como Método João de Barros, o primeiro material impresso para alfabetização.

O objetivo funda-se na memorização e repetição de uma aprendizagem


prioritária da leitura tomando-a apenas como o ensino de uma técnica
de decifração de um elemento gráfico em um elemento sonoro, crença
de que ensinando a codificação e decodificação, a criança aprendia a
ler [...] (VIEIRA, 2017, p. 65).

O método silábico prioriza o ensino das sílabas, por considerá-la a


unidade principal da língua, uma vez que, ao falarmos, pronunciamos sílabas
e não letras isoladas. Na prática, o professor inicia apresentando as vogais e
formando os encontros vocálicos, por serem considerados mais fáceis. Avançando
na estratégia, começa-se o trabalho com as sílabas simples, formadas de uma
consoante e uma vogal, o padrão CV (consoante + vogal). Estas são chamadas
sílabas canônicas. Na perspectiva do método, o aprendizado ocorre das unidades
mais simples para as mais complexas. As sílabas simples são apresentadas por
meio de famílias silábicas (BA - BE - BI - BO - BU), seguindo a ordem alfabética,
para que então, a criança avance no aprendizado das chamadas "dificuldades",
sílabas não canônicas, de distintos padrões: VC - CCV - V - CVC.

Veja alguns materiais pautados no método silábico:

30
TÓPICO 2 — PANORAMA HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL REPUBLICANO

FIGURA 15 – CARTAZ UTILIZADO NO MÉTODO SILÁBICO

FONTE: <https://br.pinterest.com/pin/771171136181631004/>. Acesso em: 4 maio 2021.

Até 2009, as letras K, W e Y eram consideradas estrangeiras e não


incorporadas ao alfabeto brasileiro. A Imagem apresenta a sequência alfabética
antiga, em que essas letras eram apresentadas posteriormente.

31
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

FIGURA 16 – ATIVIDADE ELABORADA COM O MÉTODO SILÁBICO

FONTE: <https://bit.ly/3kYVmTy>. Acesso em: 4 maio 2021.

O grande problema desse método é a ênfase na memorização, na


reprodução e na construção de palavras e frases desassociadas do cotidiano.

2.1.3 Método Fônico


Em 1880, Hilário Ribeiro, gaúcho, professor da Escola Normal de Porto
Alegre, torna-se autor do primeiro material brasileiro de alfabetização, a Cartilha
Nacional, de abordagem fônica, baseada em estudos franceses e alemães, do
século XVIII. A publicação da Cartilha Nacional se deu no âmbito do final do
Império, a partir de um incentivo governamental a professores que produzissem
materiais de alfabetização que pudessem reduzir os custos com a importação de
recursos para subsidiar as aulas nas seriadas e numerosas classes organizadas em
conformidades com o Método Lancaster (MACIEL, 2003; VIEIRA, 2017).

O Método Fônico prediz que o ensino das primeiras letras deve-se iniciar
pelas vogais, partindo, então para as consoantes, privilegiando a compreensão
fonêmica, ou seja, o som que cada letra produz. Somente após diversos exercícios

32
TÓPICO 2 — PANORAMA HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL REPUBLICANO

a fim de consolidar a relação fonema/grafema, a criança passa à identificação


silábica e, posteriormente, para a leitura de palavras simples, principalmente que
explorem o mesmo fonema.

Diante da rapidez propiciada por essa escolha metodológica na aquisição


das habilidades de codificar e decodificar os símbolos alfabéticos, ou seja, da
capacidade técnica de ler e escrever, o Método Fônico foi considerado um grande
sucesso, sendo até hoje usado, estudado e defendido por muitos educadores.
Uma das maiores referências de materiais do método fônico é o livro Caminho
Suave, publicado no Brasil pela primeira vez em 1948 e excluído do Programa
Nacional do Livro Didático (PNLD), em 1996. A imagem a seguir, apresenta uma
das propostas contidas no livro:

FIGURA 17 – ATIVIDADE DO LIVRO CAMINHO SUAVE

FONTE: <https://bit.ly/3irzDlL>. Acesso em: 4 maio 2021.

A atividade ilustra o privilégio dado ao trabalho com a letra V e seu


fonema. Para isso, são usados recursos como uma imagem em que o nome se
inicia com esse fonema, um pequeno texto, lista de palavras e as cominações da
letra em questão com as vogais. Observe alguns exemplos de materiais baseados
no Método Fônico:

33
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

FIGURA 18 – ATIVIDADES BASEADAS NO MÉTODO FÔNICO

FONTE: <https://bit.ly/2Y21QYV>. Acesso em: 7 maio 2021.

Uma das principais críticas dirigidas a esse método de alfabetização refere-


se à impossibilidade de que um fonema que aparece na corrente da fala de forma
contextualizada seja pronunciado sem apoio de uma vogal. Além disso, na língua
portuguesa, há poucas relações biunívocas (termo a termo) entre letras e sons,
pois uma mesma letra pode representar diferentes sons, segundo sua posição,
e um mesmo som pode ser representado por diferentes letras, também segundo
sua posição. Assim, o sistema de escrita é uma representação complexa e suas
propriedades precisam ser compreendidas pelo aprendiz, por meio de diversas
abordagens e estratégias (FRADE; VAL; BREGUNCI, 2014, on-line).

Em contrapartida, um dos argumentos dos educadores que defendem o


uso do Método Fônico é o seu respaldo na Ciência Cognitiva da Leitura, uma área
de estudo que envolve conhecimentos dos campos da Psicologia Cognitiva, da
Neurociência Cognitiva e da Linguística. De acordo do Dehaene (2012), a eficácia
do Método Fônico se justifica pela sua compatibilidade com o modo como o cérebro
processa as aprendizagens relacionadas com a leitura e a escrita. Isso torna-se
possível em razão da reciclagem neuronal e do reconhecimento das invariâncias
das letras que se processam na região occipto-temporal do cérebro. No Brasil,
uma das proeminentes pesquisadoras desse método é a linguista Leonor Scliar-
Cabral, professora emérita da Universidade Federal de Santa Catarina.

34
TÓPICO 2 — PANORAMA HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL REPUBLICANO

TUROS
ESTUDOS FU

Acadêmico, retornaremos à discussão sobre o método fônico e a Psicologia


Cognitiva na próxima unidade. Entretanto, indicamos a leitura do artigo do professor
Dehaene (2013) a fim de elucidar alguns conceitos.
Acesse pelo link: https://bit.ly/2YhvOZs.

Caro acadêmico, neste subtópico expusemos os métodos sintéticos que


viabilizaram a alfabetização brasileira nos períodos colonial e imperial. Estes
métodos também se alongaram após a Proclamação da República, porém,
coexistindo com os Métodos Analíticos, que surgiram com o objetivo de superar as
deficiências dos anteriores diante das novas necessidades educacionais demandas
pela sociedade da época. A partir de agora, nos dedicaremos à apresentação
dos métodos agrupados como analíticos e consideraremos sobre as implicações
sociais e pedagógica fomentadas nesse contexto.

3 OS MÉTODOS ANÁLITICOS E O INÍCIO DAS DISCUSSÕES


METODOLÓGICAS NA REPÚBLICA
De acordo com a pesquisa de Melo e Pezzato (2019), a educação brasileira
no período da Velha República (1889 a 1930), alicerçada no pensamento positivista,
possuía um caráter utilitário, pragmático e racional. No campo da alfabetização,
o pensamento didático-pedagógico foi influenciado por teorias científicas
que ganharam maior destaque com a expansão dos ideais iluministas. Nesse
contexto, os métodos sintéticos começaram a ser considerados arcaicos e pouco
eficientes frente ao novo cenário econômico e social mundial no qual o Brasil
buscava se consolidar. Assim, os antigos métodos passaram a ser refutados por
muitos professores e progressivamente substituídos por outros mais modernos,
nomeados como analíticos. Neles, a leitura e a escrita eram trabalhados de forma
simultânea e o tempo de alfabetização era mais dinamizado em função disso.

Métodos Analíticos são a aqueles que norteiam o início do processo de


alfabetização partindo das maiores unidades da língua: palavras, frases ou textos.
Esses métodos privilegiam a compreensão do sentido textual, para então, envolver
o aluno no trabalho grafo-fonêmico da língua, ou seja, levá-lo-ão entendimento
do valor sonoro das sílabas e letras.

35
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

Segundo Carvalho (2005),

A fundamentação teórica desses métodos é a psicologia Gestalt ou


psicologia da forma: a crença segundo a qual a criança tem uma visão
sincrética (ou globalizada) da realidade, ou seja, tende a perceber o
todo, o conjunto, antes de captar os detalhes (CARVALHO, 2005, p.
32).

A primeira expressão do método analítico no Brasil ocorreu poucos


anos antes da mudança no modelo governamental, em 1876, com a publicação
da Cartilha João de Deus, conhecida também como Cartilha Maternal, pelo
professor de Língua Portuguesa e positivista militante Antônio da Silva Jardim.
Na República, o método ganhou maior destaque. Nas palavras de Vieira (2017),

[...] Silva Jardim considerava que a Cartilha Maternal seria um livro


capaz de romper com os métodos de marcha sintética até então
difundidos nas províncias, uma vez que se baseava nos princípios
da moderna linguística da época e defendia o ensino da leitura pela
palavra, portanto, um método de base científica, capaz de alavancar o
progresso social (VIEIRA, 2017, p. 97).

Em 1920, ocorreram no Brasil uma série de reformas educacionais que


visavam a consolidação do ideário republicano e que fomentaram o uso dos
métodos analíticos. "As reformas colocaram o aluno no centro do processo
de educação, defenderam a utilização de materiais concretos e jogos na sala de
aula" (MAGALHÃES, 2005, p. 7). O movimento educacional estava alinhado às
concepções pedagógicas da Escola Nova. " O escolanovismo preconizava a função
socializadora da escola, a centralidade do indivíduo no processo de aprendizagem,
a educação para a vida, o caráter científico da educação, com contribuições da
Psicologia, da Sociologia, dentre outras" (MAGALHÃES, 2005, p. 7).

E
IMPORTANT

Acadêmico, conhecer o Manifesto do Pioneiros da Educação Nova é


indispensável para compreender o pensamento pedagógico brasileiro, que se fortaleceu no
segundo período republicano e que mobiliza a luta pela qualidade e equidade na educação
na atualidade. Além de ser um privilégio e grande inspiração! Acesse ao link, leia e ilumine
suas convicções pedagógicas para a prática!
Documento disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/me4707.pdf

Os métodos analíticos são três: palavração, sentenciação e global de


contos, os quais conheceremos adiante.

36
TÓPICO 2 — PANORAMA HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL REPUBLICANO

3.1 Método da Palavração


O método analítico, proposto por João de Deus, era o da Palavração, em
que se considera a palavra como a principal expressão do processo comunicativo.
Nele, após conhecerem as vogais, sem as quais não é possível se escrever palavras
na Língua Portuguesa, pequenas unidades de sentido ditongais eram formadas e,
posteriormente, combinava-se vogais com consoantes, apresentadas por meio de
listas de palavras, como podem ser observadas nas imagens:

FIGURAS 19 E 20 – TRECHOS DA CARTILHA MATERNAL

FONTE: Vieira (2017, p. 99-100)

A atividade exemplificada abaixo foi construída com inspiração nesse


método. Nela, encontramos uma consoante combinada à vogais formando
palavras apresentadas em lista. A leitura acontece pela associação da escrita à
imagem. O objetivo é criar um repertório de palavras por memorização para
posterior construção de frases e textos.

37
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

FIGURA 21 – ATIVIDADE INSPIRADA NO MÉTODO PALAVRAÇÃO

FONTE: <https://bit.ly/3FkrsS6>. Acesso em: 11 maio 2021.

Uma vantagem que se verifica nesse método é o trabalho com mais


significado, uma vez que as palavras relacionadas às imagens têm sentido
completo. Entretanto, o professor precisa desenvolver estratégias a fim de que,
ao postergar o trabalho com sílabas e letras, a compreensão grafo-fonêmica não
fique prejudicada. É a partir dela que a criança poderá ler e escrever palavras com
autonomia, para além das listas estudadas.

3.2 MÉTODO DA SENTENCIAÇÃO


Sentenciação é o método analítico em que o professor inicia o trabalho de
alfabetização expondo o aluno ao contato direto com frases inteiras. Espera-se
que, partindo da oralidade da criança, por meio do registro de frases simples,
ela possa compreender o sentido daquele enunciado e memorizar a ordem das
palavras escritas. A partir de então, passa-se ao trabalho com palavras retiradas
dessas frases, para a organização de outras, sendo seguido pela análise silábica.

De acordo com Frade (2005), há poucos dados para se precisar o início do


trabalho com esse método no Brasil, carecendo de mais investigação. A imagem a
seguir tipifica uma atividade inspirada nos princípios desse método:

38
TÓPICO 2 — PANORAMA HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL REPUBLICANO

FIGURA 22 – ATIVIDADE INSPIRADA NO MÉTODO DA SENTENCIAÇÃO

FONTE: <https://br.pinterest.com/pin/639792690814992971/>. Acesso em: 11 maio 2021.

Esse tipo de atividade favorece a compreensão de sentido e a construção de


estratégias de leitura, fazendo relação da imagem às expressões da frase. Porém,
característico dos métodos analíticos, é um aspecto falho dessa abordagem: a
dificuldade de leitura e escrita de palavras e frases novas, pela deficiência no
trabalho com sílabas e letras, como evidencia Frade (2005):

Em linhas gerais, são elencadas duas vantagens: a de se trabalhar com


a frase, considerada, de acordo com as teorias gramaticais vigentes na
época, como a unidade mais completa da língua; e a de se enfatizar um
tipo de leitura que pode utilizar pistas do contexto para a compreensão.
Como desvantagem, aparece a mesma citada quanto ao método de
palavração: o perigo de se gastar muito tempo com a memorização
e de se dar pouca atenção à análise de palavras (FRADE, 2005, p. 34).

DICAS

Caro Acadêmico, explore o livro escrito pela professora Izabel Frade, da


Universidade Federal de Minas Gerais, publicado pelo Centro de Alfabetização, Leitura e
escrita (CEALE).
Disponível em: https://bit.ly/3miUHfm.

39
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

3.3 Método Global de Contos


O Método Global de Contos é o mais recente no grupo dos métodos
analíticos. No Brasil, esse método se expandiu muito no início do século XX.
Especialmente nos estados Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais; essa
abordagem foi bastante utilizada, tendo, até mesmo, sido oficializado em Minas
Gerais.

Para instrumentalizar o trabalho, foram publicados os chamados pré-livros,


com histórias já conhecidas pelas crianças ou outras, elaboradas para aquele fim.
Eram pequenos contos independentes ou que complementares, descortinando-se
de acordo com planejamento do professor. A prática pedagógica desse método
se pauta na familiarização do texto pela criança, sua exploração e compreensão,
para depois ele seja trabalho em partes menores, frase, palavra, sílaba, fonema,
enfatizando os aspectos linguísticos da alfabetização.

De acordo com Frade (2014), o método global foi desenvolvido com base
na teoria de Deroly, psicólogo e educador belga, para quem a aprendizagem
infantil se dava por meio de observações, associação de ideias e expressão do
pensamento. A autora também ressalta outro fundamento teórico para o método
global já mencionado, a Gestalt, a qual pressupõe que, partir de um objeto de
análise mais simples para o mais complexo significa abordar em primeira mão a
visão global dele. Essa perspectiva foi defendida pelo psicólogo suíço Claparède,
apontando que ao expor a criança ao texto, à palavra ou à frase, nos aproximamos
de sua forma natural de conceber o mundo e assim, o estudo das menores unidades
da língua – sílaba, letra, fonema – teria para ela maior significado. Observem que
essa interpretação se opõe o que pregam os métodos sintéticos.

Acadêmico, as imagens que se seguem exemplificam os primeiros


materiais impressos no Brasil que se pautam no Método Global de Contos:

FIGURAS 23 E 24 – CAPA E TRECHO DO LIVRO DE LILI

FONTE: <https://bit.ly/3ip5mE5>. Acesso em: 11 maio 2021.

40
TÓPICO 2 — PANORAMA HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL REPUBLICANO

NTE
INTERESSA

Acadêmico, recomendamos a navegação do blog do médico psiquiatra


Antônio Carlos de Oliveira Correia. Esse rico álbum digital rememora tempos de estudos
de sua mãe, dona Maria de Oliveira, que se formou professora em 1937, na Escola Normal
Francisco Campos. O blog traz narrativas e fotos que nos fazem viajar no tempo e
compreender de modo mais próprio o contexto que envolvia a formação docente naquele
período e a abordagem do Método Global, privilegiada na formação docente.

O blog está disponível em: https://bit.ly/3ip5mE5

Diante do Livro de Lili, Frade (2005) analisa que:

No Brasil, os métodos globais que foram descritos até o momento


apoiaram-se em materiais impressos para serem usados como livros didáticos
e não deixam de apresentar uma progressão em termos de sua apresentação e
análise. Os textos não apresentavam problemas de simplificação na escolha
das palavras, mas os autores procuravam contemplar os principais casos de
regularidade e irregularidade do sistema ortográfico do Português. No entanto,
mesmo defendendo a concepção de linguagem como um fenômeno global, os
textos dos livros ainda não manifestam a mesma linguagem presente em textos
autênticos, como o das histórias infantis. Reproduzimos, como exemplo, uma
lição de O livro de Lili, de Anita Fonseca, que apresenta a personagem com um
modelo de texto pouco usual, em que se observa certa desarticulação entre as
frases que o compõem (FRADE, 2005, p. 36).

Avançando um pouco mais da estrutura narrativa presente no Livro de


Lili, descrita na citação anterior, outro material didático que encontrou ampla
aceitação para o trabalho com esse método foi o livro de Lúcia Casassanta, As
Mais Belas Histórias.Observe sua capa eleia um de seus textos:

41
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

FIGURA 25 – CAPA DO LIVRO AS MAIS BELAS HISTÓRIAS

FONTE: <https://bit.ly/3mynVHl>. Acesso em: 12 maio 2021.

FIGURAS 26 E 27 – TRECHO DO LIVRO AS MAIS BELAS HISTÓRIAS

42
TÓPICO 2 — PANORAMA HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL REPUBLICANO

FONTE: <http://notempoquearrobaera15quilos.blogspot.com/2018/>. Acesso em: 12 maio 2021.

Neste material encontramos textos mais articulados, com narrativas


comuns ao universo infantil, o que evidencia uma grande vantagem dos métodos
globais: o uso da língua escrita com maior significado e de modo mais aproximado
do contexto da criança, ainda que sejam apenas histórias infantis. Nele, a "criança
tem acesso a uma significação, podendo 'ler' palavras, sentenças ou textos desde
a primeira lição, por reconhecimento global. Supõe-se que, assim, mantém-se o
interesse desde o início do processo de aprendizagem da leitura e da escrita"
(FRADE, 2005, p. 37).

Entretanto, mesmo com a busca de fundamento científico para a proposição


de métodos de alfabetização que se aproximem mais do desenvolvimento
cognitivo e do universo infantil, ainda não se obtém uma proposta que atenda a
todas as dimensões implicadas no processo de alfabetização. No caso do método
em exposição, focalizar no reconhecimento por meio da memorização global
favorece uma leitura mais rápida, e uma melhor compreensão textual, pois os
alunos não precisam se ater à decodificação das sílabas. Porém, esse aprendizado
traz consigo o desafio: como ampliar a leitura de palavras desconhecidas se ele
não aprenderem a decodificar? Como saber se a leitura ocorre de fato e não a
mera repetição de palavras já decoradas?

Essas e outras questões continuaram a fomentar pesquisas no campo da


alfabetização nos seguintes da República. Nesse ínterim, em 1932, um grupo de
pesquisadores e educadores publicaram o Manifesto dos Pioneiros da Educação
Nova. O movimento, liderado por Anísio Teixeira, defendia princípios como uma
escola pública, gratuita e democrática que oferecesse aos estudantes de todas as
classes sociais uma educação de qualidade, por meio de uma pedagogia crítica,
pragmática e que considerasse o desenvolvimento integral dos estudantes.

43
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

O ideal escolanovista ganhou força e conquistou espaços na política pública


brasileira, com ingerência também na formação dos professores alfabetizadores.
Contudo, o embate entre os métodos sintéticos e analíticos permaneceram,
permeado pelas tensões e conflitos de interesses políticos, econômicos e sociais
presentes na história da educação brasileira desde o período colonial. Em 1959,
houve a publicação do Manifesto dos Educadores Mais Uma Vez Convocados, segundo
documento escrito pela elite intelectual do país. Este contou também coma
assinatura de Paulo Freire, grande nome da pedagogia e da alfabetização do país.

Em 1963, o trabalho e ideias de Freire alcançaram grande destaque, com


o sucesso na alfabetização de adultos, cortadores de cana de Angicos, cidade do
Rio Grande do Norte. O Método Paulo Freire, como ficou conhecido, pode ser
associado aos métodos analíticos, uma vez que lança mão das palavras geradoras
como ponto de partida para o processo de alfabetização. Não obstante, há de
se destacar que restringir o pensamento de Paulo Freire a um método, ou ao
trabalho de Angicos, somente, implica numa visão limitada da sua vasta reflexão
educativa, vinculada à Pedagogia Crítica. Seus estudos e defesas continuam
atuais, pertinentes e indispensáveis à alfabetização às políticas educacionais
brasileiras.

NTE
INTERESSA

Acadêmico, no link indicado assista ao documentário comemorativo do


Centenário Paulo Freire, e rememore suas contribuições para a educação e proposta de
alfabetização no país:

https://www.youtube.com/watch?v=cKH8_4dXhUM

No período do governo militar no Brasil, o pensamento pedagógico


de Paulo Freire, Anísio Teixeira e tantos outros educadores e intelectuais foi
reprimido, sendo eles próprios perseguidos nesse tempo. Anos depois, com o
retorno ao governo democrático, a discussão iniciada com o Manifesto de 1932 e
reafirmada em 1959, foi retomada e se mostra necessária até os dias atuais.

No campo da alfabetização, na década de 1980, a educação e, mais


especificamente, a alfabetização brasileira, experimentou uma nova fase, com
o surgimento do termo Letramento, amplamente difundido pelas pesquisas de
Magda Becker Soares, professora emérita da Universidade Federal de Minas
Gerais. "Quanto à mudança na maneira de considerar o significado do acesso
à leitura e à escrita em nosso país - da mera aquisição da 'tecnologia' do ler e
do escrever à inserção nas práticas sociais de leitura e escrita, de que resultou
o aparecimento do termo letramento ao lado do termo alfabetização [...]"

44
TÓPICO 2 — PANORAMA HISTÓRICO DOS MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL REPUBLICANO

(SOARES, 2002, p. 21). A compreensão dessa faceta importante da alfabetização


tem se ramificado em muitas outras pesquisas e embasado estratégias didáticas.
Em 2016, buscando problematizar e elucidar diversas teorias e aspectos que se
circunscrevem à "Guerra dos Métodos de Alfabetização", Magda Soares lança
o livro Alfabetização: a questão dos métodos, em que defende que alfabetizar com
método é a questão de fato relevante e isso extrapola, e muito, a escolha de um
método convencional específico.

TUROS
ESTUDOS FU

Acadêmico, abordaremos mais profundamente o conceito de Letramento na


Unidade 2 deste livro. A menção que fazemos a ele agora apenas compõe a progressão
histórica iniciada, numa perspectiva diacrônica.

A discussão contemporânea ainda perpassa a questão dos métodos se


alonga a outros pontos, como a persistência do analfabetismo, a idade e tempo
ideais para que a criança se alfabetize, a formação e o lugar do professor. Esses e
outros aspectos serão expostos no próximo tópico desta Unidade.

45
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• A educação brasileira sempre esteve associada aos interesses políticos,


econômicos e sociais da elite dominante da época.

• Existem diferentes métodos para se alfabetizar e que nenhum é completo em


si mesmo.

• Os Métodos Sintéticos são: Soletração; Silábico; Fônico. Os Métodos Analíticos


são: Palavração; Sentenciação; Global de Contos

• Em 1963, o trabalho e ideias de Freire alcançaram grande destaque, com o


sucesso na alfabetização de adultos, cortadores de cana de Angicos, cidade
do Rio Grande do Norte. O Método Paulo Freire, como ficou conhecido, pode
ser associado aos métodos analíticos, uma vez que lança mão das palavras
geradoras como ponto de partida para o processo de alfabetização

• O alfabetizar deve conhecer todos os métodos e, de modo crítico e reflexivo,


desenvolver sua metodologia de modo a atender às necessidades de
aprendizagem dos seus alunos. Sendo assim, a grande questão é como se
alfabetiza e não com que método se alfabetiza.

46
AUTOATIVIDADE

1 A escrita é um produto histórico e cultural das sociedades letradas. Ao longo


dos anos, o processo comunicativo passou por diferentes transformações,
implicando nos meios e usos da língua escrita na dinâmica social. Analise
os elementos do seguinte texto:

A análise do texto nos permite inferir que:

a) ( ) Os recursos utilizados para se estabelecer a comunicação demonstram


atemporalidade da língua escrita.
b) ( ) Os elementos que participam da construção textual refletem o caráter
cultural e dinâmico da língua escrita.
c) ( ) Os elementos imagéticos do texto não influenciam no processo
comunicativo, podendo ser, eles todos, substituídos por palavras,
mantendo a mesma qualidade dos sentidos empregados.
d) ( ) A omissão de letras, o uso de onomatopeias e elementos não verbais
indicam um aprendizado precário da língua escrita, sendo inadequados
nessa situação de comunicação formal.

2 A história da alfabetização no Brasil tem início no século XVI, com a


chegada da Companhia de Jesus na colônia. As afirmativas relacionadas
versam sobre essa temática. Leia-as, considerando sobre a veracidade das
informações:

I- Os Jesuítas vieram ao Brasil fugidos de perseguições na Europa


e se dedicaram à alfabetização dos nativos a fim de promover o
desenvolvimento da colônia.
II- Não se usou, no Brasil, um material de alfabetização impresso e
sistematizado até o século XIX, quando D. Pedro II estimulou a produção
de cartilhas didáticas no país.
III- Com a Constituição de 1824 a responsabilidade da escolarização no país
passou às mãos do Governo, porém, não promoveu igualdade de acesso
e qualidade de ensino a todos os brasileiros.

47
IV- Somente após a Proclamação da República o analfabetismo passou a
ser visto como um problema, pois limitava o crescimento econômico e
industrial do país, existente em outras nações.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças III e IV estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Ao longo da história da educação brasileira, diferentes métodos para se


alfabetizar foram e ainda são aplicados. De acordo com os estudos sobre
esses métodos, classifique as sentenças em verdadeiras (V) ou falsas (F):

( ) O método silábico é o mais eficaz dentre todos, devendo ser lei no país
que os docentes apliquem suas estratégias ao ensinar a língua escrita.
( ) Os métodos sintéticos priorizam a aprendizagem técnica do ler e do
escrever, carecendo de mais recursos que contextualize a escrita ao
cotidiano do alfabetizando.
( ) Não há um método ideal para se ensinar a ler e a escrever, devendo o
professor ter um bom conhecimento teórico e metodológico, para então,
desenvolver sua ação didática.
( ) O analfabetismo no Brasil persiste em números preocupantes pois as
faculdades de pedagogia do país não ensinam, com eficiência, métodos
de alfabetização para os graduandos.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V - V- F - F.
b) ( ) F - V - V - F.
c) ( ) F - V - F - V.
d) ( ) V - F - F - V.

48
4 Os métodos de alfabetização mais conhecidos do Brasil são classificados em
dois grupos: Sintéticos e Analíticos. Analise a imagem, retirada da cartilha
Casinha Feliz, e responda às questões seguintes:

a) A imagem remete a qual método de alfabetização?

b) Esse método pertence ao grupo dos métodos sintéticos ou analíticos?

c) Aponte vantagens e uma desvantagens desse método:

5 Os métodos de alfabetização mais conhecidos do Brasil são classificados em


dois grupos: Sintéticos e Analíticos. Analise a imagem, página de O Livro de
Lili, de Anita Fonseca, e responda às questões seguintes:

a) A imagem remete a qual método de alfabetização?

b) Esse método pertence ao grupo dos métodos sintéticos ou analíticos?

c) Aponte vantagens e desvantagens desse método:

49
50
UNIDADE 1 TÓPICO 3 —

A QUESTÃO DO ANALFABETISMO E
A BUSCA POR SOLUÇÕES

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, neste tópico discutiremos um assunto de suma relevância: o
persistente problema do analfabetismo no Brasil. Falar sobre esse tema enquanto
você se forma é necessário pois, ao entrar em uma escola, ao assumir uma sala de
aula, para exercer sua profissão você se torna corresponsável por essa realidade.

As taxas do analfabetismo brasileiro, embora tenham diminuído


consideravelmente desde a Proclamação da República e, principalmente a partir
da década de 1990, com o fomento de várias políticas públicas que favorecem o
trabalho de alfabetização nas escolas, ainda são elevadas e parecemos estar longe
de atingir as metas do Plano Nacional da Educação (2014-2024) que versam sobre
essa questão.

As dimensões que envolvem a constituição e resistência do analfabetismo


no país são variadas e muito complexas, no entanto, há um fator que incide
fortemente sobre ele e que está ao alcance de cada um de nós, pedagogos e
alfabetizadores: a ação responsável sobre nossa formação e postura constante de
estudos.

Diante disso, acadêmico, estimulamos que prossiga com sua leitura


e reflexão sobre a necessidade de alfabetização no Brasil no que você poderá
oferecer aos estudantes que adentrarem a sua sala de aula.

2 A PERSISTÊNCIA DO PROBLEMA DO ANALFABETISMO


Para a concepção crítica, o analfabetismo nem é uma “chaga”, nem uma
“erva daninha” a ser erradicada, nem tampouco uma enfermidade,
mas uma das expressões concretas de uma realidade social injusta.
Não é um problema estritamente linguístico nem exclusivamente
pedagógico, metodológico, mas político, como a alfabetização através
da qual se pretende superá-lo. Proclamar sua neutralidade, ingênua ou
astutamente, não afeta em nada a sua politicidade intrínseca (FREIRE,
1981, p. 13).

Acadêmico, o analfabetismo é uma questão histórica brasileira que tem


privado a muitos de sua cidadania e igualdade de oportunidades. Freire (1981)
problematiza esse constructo social evidenciado as múltiplas facetas que o
envolve.
51
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

É fundamental que o professor alfabetizador se aproprie da natureza dos


aspectos que ajudam a sustentar a questão do analfabetismo no Brasil para que
seu trabalho didático seja amparado por teorias e metodologias válidas e sua ação
pedagógica esclarecida e responsável.

2.1 A DIMENSÃO SOCIOECONÔMICA DO ANALFABETISMO


Ao seguirmos com essa importante discussão, acadêmico, faz-se
necessário analisarmos dados de quando o número de analfabetos passou a ser
quantificado no país e as deliberações políticas, econômicas e educacionais que se
efetivaram a partir daí. A figura 27 é um recorte de dados obtidos pelo primeiro
censo brasileiro, datado de 1872:

NOTA

Acadêmico, a Figura 29 é cópia exata do documento registrado no site do


IBGE, ainda com a escrita do século XIX. Você observará a grafia antiga de algumas pala-
vras, como frequentão, remetendo ao tempo presente. Ou esclarecimento a respeito dos
dados é o denominado Município Neutro, o equivalente ao Distrito Federal, nos dias atuais.

FIGURA 29 – DADOS DO CENSO DE 1872 - RECORTE:NÍVEL DE INSTRUÇÃO DA POPULAÇÃO


LIVRE

FONTE: <https://biblioteca.ibge.gov.br/>. Acesso em: 14 jun. 2021.

52
TÓPICO 3 — A QUESTÃO DO ANALFABETISMO E A BUSCA POR SOLUÇÕES

A análise do primeiro levantamento censitário brasileiro dentre outras


abordagens, nos remete a uma primeira questão fundamental: o conceito de
ser alfabetizado. Ferraro (2011, p. 990) nos esclarece que "Anteriormente a
prática de levantamentos censitários periódicos, a assinatura do próprio nome
em documentos era utilizada como indicador de alfabetização, ao passo que a
assinatura com uma cruz era tida como indicador de analfabetismo”. No recorte
do censo destacado, observamos o contraponto existente entre "saber ler e
escrever" e "analfabeto". Isso demonstra que naquele período era considerada
alfabetizada, ou seja, sabia ler e escrever, a pessoa que assinava o próprio nome.

Outro dado importante de ser comentado, acadêmico, é o destaque que o


documento dá à pesquisa da população em idade escolar, meninos e meninas entre
seis a quinze anos. O censo traz um levantamento do quantitativo populacional
daqueles que frequentavam e que não frequentavam a escola, fazendo um
prognóstico nos níveis educacionais futuros da população. Retomando o que
estudamos no tópico anterior, você deve lembrar que até a Proclamação da
República, o analfabetismo brasileiro não era tido como um problema nacional.
Somente após a queda do Império é que esse fator passou a ser um entrave à
projeção do país na economia mundial. Em 1824, a primeira Constituição já
colocava a educação pública primária como dever governamental.

Necessário se faz ponderar que o título da Imagem 27 nos informa que os


dados do censo em questão são referentes à população livre. Ou seja, uma população
categórica e majoritariamente branca. Há de se considerar que naquela época,
1872, o país ainda vivenciava o regime escravista e embora em face de muitos
conflitos políticos, econômicos e sociais dessa ordem, a primeira lei antiescravista
havia sido sancionada muito recentemente, em 1871, a Lei do Ventre Livre.

Mediante os indicadores apontados, temos que, dos 4. 818.699 homens


livres recenseados, somente 1. 012. 097 sabia ler e escrever e das 4.100.973 mulheres
livres, apenas 550. 981eram consideradas alfabetizadas. Quanto aos dados
infanto-juvenis, dos 941.782 meninos em idade escolar, 155.651 frequentavam a
escola e das 960.672 meninas, apenas 165.098 estudavam.

A figura seguinte nos oferece dados concernentes à população escrava:

53
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

FIGURA 30 – DADOS DO CENSO DE 1872 - RECORTE: NÍVEL DE INSTRUÇÃO DA POPULAÇÃO


ESCRAVA

FONTE: <https://biblioteca.ibge.gov.br/>. Acesso em: 14 jun. 2021.

Uma leitura do documento em questão para além do recorte aqui


apresentado nos informa que o total populacional geral era de 9.930.478. Desse
total geral, 1.510. 806 de homens e mulheres eram escravos, sendo que somente
958 homens e 445 mulheres eram considerados escravos alfabetizados.

2.1.1 O analfabetismo na atualidade


Acadêmico, muitas análises de indicadores educacionais, econômicos
e sociais foram e ainda podem ser pesquisados a partir do levantamento que
estamos apontando a você. Naturalmente que não objetivamos nesse breve
estudo explorar todas as dimensões que historicamente ajudaram a construir
o quadro de analfabetismo do Brasil. Entretanto, queremos conduzi-lo à
reflexão da complexidade do nosso problema e levá-lo à compreensão de que
a o problema persistente do analfabetismo no país abarca questões de ordem
didático-pedagógica, mas também históricas, sociais e econômicas. A população
negra, mestiça e branca pobre sempre esteve à margem dos investimentos
governamentais e apesar das recentes políticas públicas assistencialistas e de ações
afirmativas, como o Bolsa Família, PROUNI e as Cotas Sociais, a desigualdade
social segue evidente.

54
TÓPICO 3 — A QUESTÃO DO ANALFABETISMO E A BUSCA POR SOLUÇÕES

Alves (2019a), em pesquisa que problematiza dados recentes sobre o


analfabetismo brasileiro aponta que "No Brasil, ao longo de quase sete décadas,
o termo alfabetizado deixou de designar aquele que é capaz de escrever próprio
nome, para identificar a pessoa capaz de ler e escrever um bilhete simples" (ALVES,
2019a, p. 1737). Essa mudança de definição se deu por influência da Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). Segundo
Soares (2002),

Conhecemos bem e há muito, o "estado ou condição de analfabeto",


que não é apenas o estado ou condição daquele que não dispões da
tecnologia do ler e do escrever: o analfabeto é aquele que não pode
exercer em toda a sua plenitude os seus direitos de cidadão, é aquele
que a sociedade marginaliza, é aquele que não tem acesso aos bens
culturais de sociedades letradas e mais que isso, grafocêntricas; porque
conhecemos bem, e há muito, esse "estado de analfabeto", sempre
nos foi necessária uma palavra designá-lo, a conhecida e corrente
analfabetismo (SOARES, 2002, p. 20, grifo da autora).

Não obstante a maior compreensão da condição do cidadão analfabeto


que a mudança de definição dos termos alfabetizado e analfabetismo trouxeram, as
palavras de Soares (2002) acentuam a sua persistência no Brasil. Como um tipo
de ramificação do analfabetismo, as pesquisas brasileiras têm trabalhado como o
conceito de alfabetismo/analfabetismo funcional, que tem a ver com o uso prático
da língua nas necessidades cotidianas. Em 1978, a UNESCO passou a considerar
esses termos e no Brasil, metas educacionais foram estipuladas para aumento dos
níveis de alfabetismo funcional de cada país, considerando as particularidades
do desenvolvimento socioeconômico destes, como a mencionada meta proposta
do PNE 2014-2024.

É fato que os índices de analfabetismo ainda são muito preocupantes,


contudo, desde 1940 ocorreram quedas consideráveis nesses indicadores, como
demonstra Alves (2019a)

Em um resgate histórico de dados dos censos brasileiros, vemos que,


considerando a população de jovens e adultos, em 1940, o índice
de analfabetismo no país atingia proporções de 64,9 por cento. Três
décadas à frente, essa taxa caiu para 33,6 por cento. Em 2000, o índice
diminuiu para 13,6 por cento (MORAIS, 2012). A redução considerável
dessas taxas deve-se principalmente à crescente universalização do
ensino, ocorrida entre essas décadas. Atualmente, conforme apontam
dados o Instituto Brasileiro de Pesquisa e Estatística (IBGE) o índice de
analfabetismo entre pessoas acima de 15 anos, caiu de 7,2 por cento em
2016, para 7,0 por cento no ano de 2017. Entretanto, o índice de 6,5 por
cento, proposto pelo PNE para 2015 ainda não foi alcançado (ALVES,
2019a, p. 1737).

O Plano Nacional da Educação (PNE 2014-2024), como a autora menciona,


estipula metas concernentes a alfabetização, porém, há pouco tempo do término
de sua vigência, parece que não conseguiremos alcançá-las em sua totalidade.

55
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

Enquanto a Meta 5 estabelece: alfabetizar todas as crianças, no máximo,


até o final do 3º (terceiro) ano do Ensino Fundamental, o Relatório do 3º Ciclo de
Monitoramento das Metas do Plano Nacional de Educação, 2020, demonstra que
numa escala de nível de proficiência que vai de 1 a 10,

Em relação à proficiência em Leitura, constata-se, em nível nacional,


que cerca de dois terços dos estudantes do 3º ano do ensino
fundamental se concentram nos níveis 2 e 3 da escala nas duas edições
da ANA (2014 e 2016), tendo havido ligeira melhora em 2016, expressa
pelo aumento de 2,0 p.p. no quantitativo de estudantes posicionados
no nível 4. Não obstante, cerca de 22% dos estudantes se encontram no
nível mais baixo da escala (nível 1) e mais de 50% dos estudantes se
concentram nos níveis 1 e 2 nas duas edições consideradas.
No que se refere à proficiência em Escrita, observa-se que o nível
4 da escala é o de maior concentração de estudantes para o Brasil
(aproximadamente 57%) nas duas edições da ANA. No nível 1, há
pouco mais de 10% dos estudantes. Entretanto, para as regiões Norte
e Nordeste, esse percentual é maior: passa de 20%, chegando a atingir,
em 2016, pouco mais de 30% para os estados do Amapá, Alagoas e
Sergipe. Para os estudantes matriculados em escolas da área rural, esse
percentual ficou em torno de 20% (BRASIL, 2020, p. 36-37, grifo nosso).

NOTA

Acadêmico, nível de proficiência diz respeito ao domínio de determinado co-


nhecimento apresentado por um indivíduo. No caso leitura e da escrita, o quanto o estu-
dante demonstra saber sobre tais habilidades.

Embora o não cumprimento da Meta 5 não diga respeito diretamente


à taxa de analfabetismo, ela incide sobre o problema, uma vez que contribui, a
médio e alongo para a diminuição do nível de alfabetismo funcional dos cidadãos
brasileiros.

Além disso, com relação a Meta 9 do PNE, que propõe elevar a taxa de
alfabetização da população com 15 anos ou mais para 93,5% até 2015 e, até o
final da vigência deste PNE, erradicar o analfabetismo absoluto e reduzir em 50%
a taxa de analfabetismo funcional também não possui um bom prognóstico de
cumprimento. Ainda de acordo com o Relatório do 3º Ciclo de Monitoramento
das Metas do Plano Nacional de Educação, 2020, embora a meta para 2015 tenha
sido atingida nas regiões sul, sudeste e centro-oeste do país, segundo a Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) 2019, a taxa
de analfabetismo absoluto dos cidadãos em idade igual ou superior a 15 anos
está estimada em 6,6% (11 milhões de analfabetos).

56
TÓPICO 3 — A QUESTÃO DO ANALFABETISMO E A BUSCA POR SOLUÇÕES

2.1.2 Políticas Públicas Nacionais para Alfabetização


As transformações na educação brasileira ocorridas no final do século
XX, refletiram consideravelmente no modo como o sistema de escolar da nação
passou a ser organizado tanto no que diz respeito a legislativas e pedagógicas.
Esse novo contexto, impulsionou o surgimento de políticas educacionais que
favoreceram a redução dos níveis de analfabetismo. Essas políticas possibilitaram
uma organização mais democrática do sistema de ensino, investimentos em
infraestrutura escolar, compra de materiais didáticos e, especialmente, formação
docente.

ATENCAO

Acadêmico, como pedagogo é indispensável que você conheça pelo menos


dois dos principais documentos que normatizam e regem o sistema educacional brasileiro.
São eles: Título VIII, Capítulo III, Seção I, artigos 205 ao 217, da Constituição Federal de 1988,
que versam sobre a Educação e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN),
Lei nº 9.394/1996. Você deve acessá-los e lê-los por meio dos links:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm

Dentre as políticas públicas nacionais que mais contribuíram para o


avanço no trabalho de alfabetização está o Pacto Nacional Para Alfabetização na
Idade Certa (PNAIC). Alves (2019b) explica que

Essa política, constituída como um pacto inter-federativo, teve como


eixo principal a formação continuada de professores alfabetizadores,
integrando a oferta de materiais didáticos e literários, ações de gestão
educacional e avaliação. Criada em 2012, pela portaria 867/2012, as
práticas do PNAIC começam a ser implementadas no ano seguinte,
tendo sido trabalhadas temáticas diferenciadas em cada ano em que
vigorou. Em 2013, a ênfase das formações foi a Língua Portuguesa;
2014 foi o ano da Matemática; em 2015, a formação contemplou os
temas Gestão Escolar, Currículo e a Criança no Ciclo de Alfabetização
e Interdisciplinaridade. Em 2016, feita uma análise dos resultados da
Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA), de 2013 e 2014, ofoco foi
dado à criança e suas necessidades de aprendizado, visando elevar o
nível de proficiência dos alunos (ALVES, 2019b, p. 18).

Em sua pesquisa, Alves (2019b) analisa o que os gestores da política


e os professores alfabetizadores da capital do estado de Minas Gerais pensam
sobre o Pacto e demonstra os consideráveis resultados no plano pedagógico que
essa política possibilitou. Embora não tão simples de serem aferidos por meio de

57
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

avaliações sistêmicas como a ANA ou o SAEB, os atores pedagógicos da política


relatam o aprofundamento teórico e metodológico que obtiveram pelas formações
oferecidas no PNAIC e o quanto isso resultou na qualidade da alfabetização e
do letramento das crianças dos primeiros anos do Ensino Fundamental. Não
obstante a isso, e contrariando a vontade dos alfabetizadores brasileiros o PNAIC
foi encerrado em 2017, após sofrer diversos cortes de investimento governamental
(ALVES, 2019b).

No que concerne ao objetivo de alcançar a meta de alfabetizar todas as


crianças até oito anos, sabemos que muito trabalho ainda precisa ser feito, visto o
percentual significativo de crianças que ainda avançam para o segundo ciclo do
Ensino Fundamental com grandes deficiências no aprendizado da língua escrita
em todo Brasil.

Em decorrência desse preocupante cenário, o governo atual iniciou sua


gestão em 2019 fundando a Secretaria de Alfabetização (SEALF), por meio do
Decreto 9.665, de dois de janeiro de 2019. Posteriormente, foi publicada a Política
Nacional de Alfabetização (PNA). Esse documento, embora expresse que

De fato, aprender as relações grafofonêmicas do código alfabético


da língua portuguesa não significa esgotar totalmente o processo
de aprendizagem de leitura e escrita, que inclui ainda a aquisição
de fluência oral, a ampliação do vocabulário, as estratégias de
compreensão de textos e outras habilidades e conhecimentos que
devem ser adquiridos e desenvolvidos ao longo dos anos iniciais do
ensino fundamental (BRASIL, 2019, p. 32).

A Política Nacional de Alfabetização apresenta fortes tendências de


retorno a um método sintético de alfabetização, o método fônico, apresentado
no texto da política como instrução fônica, para fins de solução das deficiências
em alfabetização. Além disso, aPNAdefende que o aluno deva primeiro ser
instrumentalizado no uso da língua escrita, para só posteriormente ser colocado
em contato com diversos tipos de textos e trabalhar na compreensão do uso
social deles. E mais, a cartilha considera que o trabalho segundo esse caminho
possibilitará que as crianças sejam alfabetizadas, ainda no 1º ano do Ensino
Fundamental, aos seis anos (BRASIL,2019).

ATENCAO

Acadêmico, quando a PNA preve alfabetização de alunos ainda no 1º ano do


Ensino Fundamental, é preciso que se pesquise sobre o que o documento coloca como
nível de leitura e escrita e compará-lo com o que o PNAIC propunha como direitos de
aprendizagem a serem alcançados em cada ano do primeiro ciclo do Ensino Fundamental.
Você pode conhecê-los no link: https://wp.ufpel.edu.br/obeducpacto/2016/03/622/

58
TÓPICO 3 — A QUESTÃO DO ANALFABETISMO E A BUSCA POR SOLUÇÕES

Acadêmico, em face do que brevemente esplanamos sobre essa duas


políticas, e do que você estudou no tópico anterior, você deve perceber que o PNAIC
e a PNA partem de pressupostos epistemológicos diverentes. Ainda é cedo para
se avaliar os impactos da nova política educacional no campo da alfabetização,
e os resultados do PNAIC foram investigados por inúmeras pesquisas tendo em
vista o tempo de vigância da política (DUARTE, 2013; ELEUTÉRIO, 2014; HOÇA,
2015; GIARDINI, 2016; BARROS, 2017; ALFERES; MAINARDES, 2018; ALVES
2019a; ALVES 2019b; MACHADO, 2019). O que se pode afirmar é que o Brasil
segue no caminho de fragmentação e sobreposição de políticas, o que, de acordo
com Saviani (2014), só enfraquece o sistema educacional brasileiro.

DICAS

Acadêmico, conheça a Política Nacional de Alfabetização por meio do link:


http://alfabetizacao.mec.gov.br/

As fragilidades desse tipo de contexto se relacionam às próprias condições


dea implementação das políticas. Primeiramente porque no país não há um
sistema nacional de educação, isso torna qualquer política pública passível de
filantropia, fragmentação e sobreposição a cada novo governo (SAVIANI, 2014).
Em segundo lugar, porque o modo como as políticas são escritas e gestadas não
considera a realidade da esfera micro da política e as necessidades formativas
do professorado de estar inserido em uma rede de formação em que as teorias,
práticas e desafios são constantemente e amplamente discutidos, verificados e
compartilhados entre os profissionais da educação básica esuperior (ALVES,
2019b).

Associação Brasileira de Alfabetização (ABALF), publicou uma carta


aberta expondo discussões promovidas no Congresso Brasileiro de Alfabetização
(CONBALF), realizado em agosto de 2019, sobre os problemas e avanços nas
práticas educacionais e políticas públicas para alfabetização no Brasil. Reunindo
pesquisadores e professores alfabetizadores de diversas partes do Brasil e de
outros países, foi debatida a temática “Qual alfabetização, para qual tempo?”. Na
carta, a ABALF ponderaque

O agravamento da crise política, social e econômica, juntamente com


as primeiras medidas tomadas pelo atual governo, vinculadas à recém-
criada Secretaria de Alfabetização do Ministério da Educação, são
fatores preocupantes que apontam para possíveis descontinuidades
de políticas públicas, fundamentais para a garantia da alfabetização
como um direito de todos, em especial nos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental e primeiro segmento da Educação de Jovens e Adultos.
Em face dessa realidade, a ABAlf reitera a necessidade do diálogo
com os agentes do MEC, pois é urgente dar continuidade ao que

59
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

se vem construindo ao longo da história da alfabetização neste


País, na perspectiva que ações, projetos e programas se constituam
em políticas de Estado, fazendo com que, dessa forma, não sofram
descontinuidades. E mais, reafirma-se o compromisso de assegurar que
a alfabetização seja prioridade compartilhada pelos governos federal,
estaduais e municipais, pela sociedade civil, pelas Universidades
públicas, por gestores/gestoras, por servidores/servidoras públicas
(ABALF, 2019, on-line).

Essedocumento enfatiza a tensão atual estabelecida entre a nova


proposta dos órgãos do Governo Federal, e a visão das Faculdades de Educação
e entes federados que assumiram a gestão da última política de alfabetização
desenvolvida. Perante essa realidade, acreditamos que o melhor caminho para
a construção de políticas mais eficazes seja abrir espaço para o debate e diálogo,
como a ABALF reitera. Ou seja, a reaproximação entre as IES que vêm participando
das políticas, o MEC, e os atuais pesquisadores que têm aportado a nova política
dealfabetização.

Outra ação pública de âmbito nacional que alcança a alfabetização


brasileira é a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) da Educação Infantil
e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, que foi homologada pelo ministro da
Educação, Mendonça Filho, em 20 de dezembro de 2017. O documento estabelece
aspectos do currículo brasileiro que devem ser estudados por todos os alunos do
país nos respectivos segmentos.

Por meio de competências gerais e específicas e habilidades a serem


desenvolvidas por intermédio dos diversos componentes obrigatórios do
currículo brasileiro, a BNCC expõe concepções teóricas e metodológicas e dialoga
com contexto social das escolas contemporâneas frente às novas realidades
advindas com o século XXI. Essa política e suas proposições para a alfabetização
serão pormenorizadamente analisadas na Unidade 3 deste livro.

Acadêmico, como você pode ver, o trabalho pela alfabetização de qualidade


no Brasil é multifacetada. Porém, não é possível negar que em uma sociedade
cada vez mais globalizada, com rápido acesso à informação e novas relações com
o conhecimento, as habilidades de ler e escrever assumiram um significado mais
amplo (FERREIRO, 2001; SOARES 2004,1998). Diante disso, passaremos agora a
discutir a parte desse complexo problema que nos compete: a formação e ação do
professor alfabetizador. Continue seus estudos com responsabilidade e atenção!

2.2 PROFESSOR ALFABETIZADOR: ESTUDANTE, DOCENTE


E PESQUISADOR
Ensinar inexiste sem aprender e vice-versa e foi aprendendo
socialmente que, historicamente, mulheres e homens descobriram
que era possível ensinar. Foi assim, socialmente aprendendo, que ao
longo dos tempos mulheres e homens perceberam que era possível –
depois, preciso – trabalhar maneiras, caminhos, métodos de ensinar.

60
TÓPICO 3 — A QUESTÃO DO ANALFABETISMO E A BUSCA POR SOLUÇÕES

Aprender precedeu ensinar ou, em outras palavras, ensinar se diluía


na experiência realmente fundante de aprender. Não temo dizer que
inexiste validade no ensino de que não resulta um aprendizado em
que o aprendiz não se tornou capaz de recriar ou de refazer o ensinado,
em que o ensinado que não foi apreendido não pode ser realmente
aprendido pelo aprendiz (FREIRE, 1996, on-line).

Acadêmico, as palavras de Paulo Freire, tanto poéticas quanto verdadeiras,


trazem uma lição sobre um saber indispensável à prática educativa: o professor
deve ser um contínuo estudante. A prática pedagógica que não é permeada de
constante aprendizado é limitada, é pobre de compreensão, é ultrapassada e
incorre no risco de submeter o educando a um processo de escolarização medíocre.
O professor que não estuda sempre não deve ensinar, assim como um médico que
não se atualiza não deve clinicar. Ambos estariam colocando seu expectador sob
risco.

Para Ferreira, Albuquerque e Leal, "A questão fundamental diz respeito


não apenas ao fato de ser necessário melhorar as práticas formativas, mas de
realizá-las de forma diferente. Essa é uma exigência da própria formação
profissional" (2007, p.15). Diante dessa compreensão, acadêmico, é fundamental
que você, ao se formar pedagogo, assuma o comportamento de estar sempre
buscando conhecer teorias que inspiram práticas pedagógicas diferenciadas, que
contribuam par ao sucesso do ensino e da aprendizagem.

Como alfabetizador, o diálogo e a troca de experiências constante entre e


colegas de profissão o permitirá encontrar caminhos para atender as necessidades
de aprendizagem de seus alunos, enquanto eles constroem hipóteses sobre o
sistema de escrita. Conhecer sobre didática e metodologia é fundamental para a
qualificação do professor alfabetizador, no entanto, ela deve ser problematizada,
discutida com a equipe pedagógica da escola, e aprofundada com autonomia
sobre sua própria formação continuada. Assim, a graduação é apenas o primeiro
degrau a ser pisado no degrau que o torna um bom professor. A formação docente
é condição sine qua non para seu próprio crescimento profissional Nóvoa (2005).
"[...] essa formação deve ser buscada com responsabilidade e autonomia docente,
além de ser promovida pela escola, por meio da compreensão de que esse é um
ambiente educativo também para a equipe pedagógica" (ALVES, 2019b, p. 63).

Nesta Unidade, ao estudar a história da alfabetização no Brasil você


percebeu que, ao longo da história, diferentes métodos foram empregados. Cada
um partindo de uma compreensão diferente sobre como seria mais eficaz ensinar
a leitura e a escrita à criança. Não obstante a isso, você refletiu também que,
apesar dos avanços, o analfabetismo continua sendo um problema a ser vencido.
Parte dessa realidade, acadêmico se explica pelo fato de muitos alfabetizadores
se sentirem inseguros ao desenvolverem seu trabalho e, por essa razão, acabam
por lançar mão de práticas mais tradicionais de ensino, que muitas vezes ignoram
o conhecimento cientifico que adquiriam na universidade, para reproduzirem
metodologias pelas quais eles próprios foram alfabetizados (ALVES, 2019b;
MORAIS 2012).

61
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

Nesse contexto, destacamos que ter um conhecimento teórico que orienta


a prática do professor alfabetizador é necessário para que ele tenha a compreensão
científica da aprendizagem do seu aluno, entretanto, é preciso que se reconheça
que somente preparo teórico do professor não conduz uma alfabetização de
sucesso. O saber fazer, caracterizado necessariamente pelo o que ensinar, como
ensinar, quando ensinar, o que, como, quando e por que avaliar, se constrói em
um ambiente de formação continuada, pela troca de experiência com demais
profissionais que compartilham dos mesmos desafios diários (FERREIRO, 2005;
TARDIF, 2000).

Na Unidade 2 estudaremos sobre como tem sido discutida a ação de


alfabetizar na atualidade. Veremos que não há melhores métodos e maneiras de
se alfabetizar, mas sim estratégias construídas com intenção pedagógica clara
(SOARES, 2016; 2004; MORAIS, 2012; MACIEL; BAPTISTA; MONTEIRO, 2009;
ALBUQUERQUE; MORAIS; FERREIRA, 2008). Esse fato torna a sua necessidade
de estar em constante aprendizado ainda mais evidente.

Acadêmico, a entrevista a seguir foi concedida por Magda Soares ao Portal


Desafios da Educação. Sua leitura promove uma conexão entre o que estudamos
até aqui com o que abordaremos na Unidade seguinte. Aproveite!

62
TÓPICO 3 — A QUESTÃO DO ANALFABETISMO E A BUSCA POR SOLUÇÕES

LEITURA COMPLEMENTAR

A alfabetização e o letramento no Brasil, segundo Magda Soares

Por REDAÇÃO, 22 de agosto de 2019

É impossível discutir com seriedade alfabetização e letramento sem


mencionar a educadora e pesquisadora Magda Soares. Professora titular emérita
da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG),
em 1990 Magda fundou nessa instituição o Centro de Alfabetização, Leitura e
Escrita (Ceale), do qual continua sendo pesquisadora atuante e diretora emérita.

Graduada em Letras, doutora e livre-docente em Educação, Magda Soares


tem uma extensa lista de obras publicadas, incluindo diversos livros didáticos de
língua portuguesa usados dos anos 1970 a 1990.

A professora Magda Becker Soares. Crédito: Glaucia Rodrigues/Revista Fapesp/divulgação/


Magda Soares.

Em 2017, recebeu um dos prêmios de maior prestígio do mercado editorial


brasileiro. Seu livro Alfabetização: a questão dos métodos (Editora Contexto) ficou em
primeiro lugar entre as obras de educação e pedagogia na 59ª edição do Prêmio
Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, e foi considerado o livro do ano na categoria
de não ficção.

Mesmo com uma agenda repleta de compromissos, a professora integrante


do conselho consultivo da Pátio Ensino Fundamental concedeu esta entrevista em
meados de 2018, na qual brinda o leitor com sua visão lúcida sobre os caminhos
e descaminhos da alfabetização e do letramento no Brasil. Publicada na edição n°
85 da Revista Pátio Ensino Fundamental, a entrevista é recuperada no Desafios
da Educação.

63
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

Em abril passado, vale lembrar, Soares também concedeu entrevista


ao portal onde abordou, entre outros assuntos, a polêmica envolvendo a nova
política de alfabetização (método fônico) e a tentativa de suspender o Saeb – o
Sistema de Avaliação da Educação Básica.

Avaliações nacionais e internacionais têm mostrado que os estudantes


brasileiros apresentam grande dificuldade para compreender e interpretar
textos. Como uma das principais pesquisadoras da área nas últimas décadas,
que perspectiva histórica a senhora poderia apresentar sobre esse fato? Uma
análise histórica dos resultados da alfabetização no Brasil em avaliações nacionais
e estaduais evidencia, desde as estatísticas de índices de aprovação e reprovação
dos anos 1960-1970 até as atuais avaliações com base em provas de larga escala,
um reiterado baixo nível de leitura e escrita na aprendizagem inicial da língua
escrita.

Os brasileiros estão mais alfabetizados, mas menos letrados? Em


primeiro lugar, não se pode pretender, penso, que os brasileiros estejam hoje
mais alfabetizados que antes, se se entender por alfabetização algo mais que
saber codificar e decodificar. Em segundo lugar, julgo muito difícil separar
alfabetização de letramento, no estágio atual das teorias da leitura e da escrita:
a alfabetização, segundo essas teorias, se desenvolve em contexto de letramento,
que dá sentido ao aprender a ler e escrever, portanto, ser alfabetizado supõe ter
também pelo menos algum nível de letramento. O que se pode dizer é que os
níveis de letramento, tal como os níveis de alfabetização, são ainda muito baixos
na população brasileira, como têm mostrado os resultados de pesquisas sobre
índices de alfabetismo (letramento).

Temos uma tendência a achar que há 30 ou 50 anos lia-se mais e melhor.


A senhora concorda com essa opinião? Para responder, seria preciso atribuir
objeto direto ao verbo ler: lia-se o quê? Talvez há 30, 50 anos se lesse mais e
melhor livros, revistas, jornais… atualmente, esses portadores de texto em papel
enfrentam a concorrência de portadores de texto em telas — TVs, computadores,
celulares, jogos digitais —, que também pedem leitura… se considerarmos a
multiplicação, nas últimas décadas, de textos, portanto, de propostas de leitura,
em numerosos contextos sociais, sob diferentes formas e suportes, talvez se possa
dizer que hoje se lê mais. Resta discutir se podemos lamentar que essas novas
propostas de leitura estejam afastando as pessoas da leitura no papel — o uso do
verbo “lamentar” revela um juízo de valor que eu faço, e muitos também fazem.

Os resultados recentes evidenciam que a escola está falhando em


ensinar crianças e jovens a ler. Na sua opinião, onde estamos errando? Enquanto
considerarmos que ensinar a ler é uma questão de “métodos” e de “atividades
de interpretação de textos”, continuaremos fracassando em alfabetizar e letrar
adequadamente nossas crianças. Em relação à alfabetização, entendida como
apropriação do sistema alfabético, prevalece a falsa suposição de que basta
adotar um método, entre os vários que são oferecidos. Na verdade, ensinar a ler
é processo muito complexo. Exige de quem ensina conhecimentos linguísticos e
psicológicos.

64
TÓPICO 3 — A QUESTÃO DO ANALFABETISMO E A BUSCA POR SOLUÇÕES

Por que é preciso ter esse conhecimento? Aprender a ler significa


apropriar-se de um objeto linguístico — a língua escrita — complexo e abstrato,
um sistema de representação convencional e em grande parte arbitrário, que
demanda de quem aprende operações cognitivas de diferentes naturezas, por
sua vez dependentes dos estágios de desenvolvimento do aluno. Por isso é que
ensinar a ler exige ter conhecimentos de natureza linguística sobre este objeto
de conhecimento, a língua escrita — por exemplo, conhecimentos de fonologia,
ortografia, das estruturas silábicas do português —, e conhecimentos de natureza
psicológica — por exemplo, da psicogênese da língua escrita, da psicologia
cognitiva, da psicologia do desenvolvimento.

Como a senhora analisa o impacto das políticas públicas em vigor


atualmente, como o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa
(PNAIC)? Pode-se dizer que a cada mudança de gestão em nível nacional ou
estadual novas políticas de atualização, aperfeiçoamento e formação continuada
de professores são implantadas. Embora sejam poucos os estudos e pesquisas
de avaliação dos resultados dessas políticas, talvez mesmo devido à sua
descontinuidade, o que não se pode negar é que as avaliações da aprendizagem
dos alunos vêm revelando que os resultados das políticas não têm correspondido
às expectativas de avanço na qualidade do ensino. Levanto algumas hipóteses
para a compreensão desse descompasso entre multiplicação de políticas de
formação e o pouco avanço na aprendizagem das crianças. Uma hipótese é o
conteúdo dos programas, que não têm, em geral, privilegiado o que mais falta
aos alfabetizadores e formadores de leitores.

Uma outra hipótese é que, em geral, as políticas de formação continuada


são estruturadas prevendo a reunião de diferentes professores em diferentes redes
de educação, de modo que a heterogeneidade dos contextos e das peculiaridades
do ensino em diferentes municípios equaliza o que é desigual, tornando difícil a
discussão de questões e dúvidas específicas.

Uma terceira hipótese (que pode ser vista como meio autoritária, mas
vou correr o risco…) é que os programas são quase sempre oferecidos à adesão
pelos municípios e, neles, à adesão de professores, o que torna os efeitos quase
individuais, o que seria corrigido se os programas fossem estruturados visando à
melhoria dos professores de conjuntos de escolas ou até de toda uma rede, não só
daqueles que aderissem ao programa, em geral por interesse pessoal. O critério
da adesão pressupõe que o avanço na qualidade da educação seja uma questão
de opção, quando esse avanço é uma responsabilidade social.

Ensinar a ler e escrever ainda é considerada atribuição apenas dos


professores de língua portuguesa. Como a senhora analisa isso? Aqui, julgo
necessário que se faça uma distinção. A aprendizagem inicial da língua escrita,
a alfabetização, o ensinar a ler e escrever, é atribuição de um profissional que
conheça, como disse, o processo linguístico e cognitivo de apropriação da língua
escrita por crianças no início de seu processo de escolarização, (o que considero
ser a pré-escola e os dois anos iniciais do ensino fundamental).

65
UNIDADE 1 — LÍNGUA ESCRITA: HISTÓRIA, PROBLEMA E INVESTIGAÇÃO

A seguir, no que se refere ao desenvolvimento da leitura, ao ler com


compreensão, sabendo interpretar, inferir, relacionar ideias em textos de
diferentes gêneros, entre outras habilidades leitoras, a atribuição, se é específica
do professor de português, é também de todos os outros professores, porque
todos eles trabalham intensamente com textos, e textos de gêneros específicos
de seu campo de conhecimento, portanto, textos cuja leitura, compreensão
e interpretação só eles têm plenas condições de orientar. Quanto a questões
ortográficas, de concordância, de regência, supõe-se que, como professores de
todas as áreas têm, ou devem ter, o domínio da variedade formal da língua escrita,
é também a eles que cabe orientar os alunos para o domínio dessa variedade.

Na cultura digital, a relação dos jovens com a escrita mudou. Que


impacto desse fato a senhora verifica em relação ao letramento? Na verdade,
há escritas digitais, no plural, porque são escritas com peculiaridades segundo
as possibilidades da tecnologia usada, do gênero, dos objetivos, dos destinatários
dos textos, escritas que têm características próprias que as diferenciam das escritas
em papel, e aqui de novo uso o plural, porque, tal como as escritas digitais,
estas também têm características próprias, segundo o gênero, os objetivos, os
destinatários do texto. Há ainda poucos estudos e pesquisas sobre a influência, ou
não, de características de escritas digitais sobre a escrita em usos convencionais.

O que ainda é dúvida, ou são hipóteses, é se os alunos têm transferido


para sua produção de texto nos gêneros da escrita em papel recursos da escrita
digital, como as abreviações, as alterações ortográficas, recursos visuais como os
emojis, os emoticons… De qualquer forma, a escola precisa hoje incluir no ensino
da língua escrita a reflexão sobre as diferenças entre escritas digitais e escritas no
papel, a importância de adequar seu texto às características do suporte que usa —
tela ou papel —, dos gêneros, dos objetivos e dos destinatários.

E quanto à leitura? Talvez se possa dizer que tem ocorrido um grande


impacto da cultura digital sobre a cultura do papel. Os jovens leem sem dificuldade
as escritas digitais. São eles mesmos que as criam… A leitura digital é mais fácil
e mais rápida, porque os textos devem ser, por natureza, breves (estou excluindo
a leitura de informações buscadas na internet, de livros, jornais, revistas em tela),
e isso vem criando uma certa impaciência dos jovens na leitura de textos mais
longos, que demandam mais tempo e mais reflexão, com evidentes implicações
para a formação de leitores atualmente.

Do que os professores precisam para conseguir melhorar o nível de


proficiência dos estudantes da educação básica em leitura? Os professores
deveriam receber uma formação que os habilitasse a orientar adequadamente a
aprendizagem dos alunos da educação básica. No caso do ensino da leitura e
da escrita, não basta conhecer sobre a língua, conhecer teorias de leitura e de
produção textual e teorias literárias, é preciso conhecer também como a criança
aprende a ler e a escrever, como se forma um leitor, um produtor de textos, como
desenvolver gosto pela leitura… Essa desconexão entre conhecer sobre o que se

66
TÓPICO 3 — A QUESTÃO DO ANALFABETISMO E A BUSCA POR SOLUÇÕES

vai ensinar e conhecer como se aprende o que se vai ensinar é particularmente


grave no caso da formação de professores para a educação infantil e as séries
iniciais do ensino fundamental na licenciatura em Pedagogia.

Elevar a qualidade de ensino depende de uma reformulação dos cursos


de formação de professores, embora não se possa negar que depende também
de vários fatores que nos têm faltado na área de educação: melhores condições
de infraestruturas escolares, de salários, de eliminação de discriminações de
natureza econômica e social características de sociedades hierarquizadas como
a nossa.

Que tipo de práticas e estratégias pedagógicas a senhora aponta como


sugestão para os educadores? Não são práticas, estratégias, métodos que se deve
sugerir aos educadores. Educar ou ensinar não podem nem devem ser ações
guiadas por prescrições, fórmulas, mas por conhecimento e compreensão de como
a criança ou o jovem aprendem aquilo que se ensina. Práticas e estratégias serão,
assim, decorrentes desse conhecimento e compreensão. Isso é que dá ao professor
condições de criar suas próprias práticas e estratégias, decidir ele mesmo como
ensinar aqueles a quem ensina, ou lhe dá condições de selecionar, entre práticas e
estratégias sugeridas por livros didáticos e paradidáticos, por colegas, e por tantas
outras fontes, aquelas que se fundamentem em conhecimento e compreensão dos
processos de aprendizagem daqueles a quem ensina.

FONTE: https://desafiosdaeducacao.grupoa.com.br/alfabetizacao-letramento/

67
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• O analfabetismo é um problema multifacetado, com raízes históricas e


culturais.

• Fatores econômicos e raciais estão fortemente relacionados a historicidade do


analfabetismo no Brasil.

• Nas últimas décadas políticas públicas foram gestadas no sentido de erradicar


o analfabetismo, entretanto, ainda não alcançamos esse objetivo.

• A formação inicial e continuada do professor alfabetizador tem muita


relevância no trabalho com a alfabetização.

• O docente que alfabetiza deve ser um contínuo estudante e compartilhar


experiências com os companheiros de trabalhos, na busca de melhor atender
às necessidades de aprendizagem dos alunos.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

68
AUTOATIVIDADE

1 Analise o gráfico:

O gráfico traz informações quanto ao alcance da Meta 9 do PNE 2014-2024:


elevar a taxa de alfabetização da população com 15 anos ou mais para 93,5%
até 2015 e, até o final da vigência deste PNE, erradicar o analfabetismo
absoluto e reduzir em 50% a taxa de analfabetismo funcional. Co relação aos
dados, avalie as afirmações em verdadeiras ou falsas:

I- Embora com índices desiguais entre as regiões, de modo geral, em 2015,


o Brasil já sinalizava atingir com tranquilidade a meta de alfabetização da
população de 15 anos ou mais de idade.
II- As regiões com maior probabilidade de reduzir mais rapidamente os
índices de analfabetismo funcional são sul, sudeste e centro-oeste.
III- O fator econômico tem muita força nos percentuais de analfabetismo do
Brasil, uma vez que as regiões mais pobres são onde o analfabetismo tem
maior índice.
IV- De 2012 a 2019 o Brasil viveu uma queda constante e ininterrupta de seus
percentuais de analfabetismo funcional.

A alternativa que apresenta avaliação correta das afirmações é:

a) ( ) V-V-V-F
b) ( ) F-V-V-V
c) ( ) V-F-V-F
d) ( ) F-F-V-V

2 Leia este trecho de uma matéria publicada no Jornal da USP, em 13/11/2020,


período de intensa propagação da Covid-19 no Brasil:

69
“EDUCAÇÃO BRASILEIRA PRECISA DE INVESTIMENTOS  

O analfabetismo funcional é um desafio que depende de políticas públicas


e recursos, conta o professor Rezende Pinto. Para ele, as afirmações sobre o
Brasil não precisar investir mais em educação são falácias, pois 'sempre falam
que o porcentual do PIB que o País gasta com a educação é o mesmo dos
países ricos. O que não dizem é que o PIB desses países é muito maior do que
o nosso e que os nossos desafios educacionais são muito maiores do que os
deles'.”

Sobre o contexto brasileiro que envolveu a produção da matéria, afirma-se


com verdade que:

a) ( ) O analfabetismo funcional é um problema recente no país, originado da


queda do PIB brasileiro, que desencadeou um investimento deficitário
na educação.
b) ( ) A pandemia da Covid-19 explicitou a necessidade de formação docente
para o uso das novas tecnologias na educação e reforçou a carência de
políticas públicas mais articuladas.
c) ( ) A necessidade de distanciamento social e o fechamento das escolas
brasileiras em 2020/2021 não deverá influenciar nos níveis de
analfabetismo do Brasil a longo prazo, pelo grande investimento nas
séries iniciais do Ensino Fundamental, a partir do PIB nacional.
d) ( ) Sucesso no trabalho de alfabetização nas escolas brasileiras não está
atrelado à promoção de políticas públicas de formação docente. Os
professores, responsáveis pela qualidade da educação, devem buscar
com autonomia, a continuidade e atualidade de seus conhecimentos.

3 Os dados dos estados brasileiros são referentes aos níveis de proficiência


em Língua Portuguesa das crianças do 5º ano do Ensino Fundamental.
Os estados estão organizados no menor para o maior aproveitamento, em
comparação com a média nacional do país:

PROPORÇÃO DE ALUNOS COM APRENDIZADO ADEQUADO NO BRASIL

70
Sobre os dados, afirma-se:

I- A maioria dos estados apresenta nível de aprendizado superior à média


nacional.
II- Aferir o nível de proficiência da Língua no 5º ano é relevante para o
trabalho de alfabetização, uma vez que são habilidades que se somam e se
aprofundam, e remetem ao nível de alfabetismo funcional da população.
III- Maranhão, Mato Grosso e Paraná são exemplos de estados com nível
de proficiência muito diferentes, o que implica no desenvolvimento de
políticas públicas também distintas em certos aspectos.
IV - Ceará é um estado nordestino que se destaca positivamente no aprendizado
da Língua Portuguesa.

É correto o que se afirma em:

a) ( ) I e IV.
b) ( ) II e III.
c) ( ) II e IV somente.
d) ( ) I e III somente.

4 Leia o texto:

O que mais se destaca no contexto da estratégia política não é que o PNAIC


tenha chegado ao fim, pois toda política tem seu ciclo (BALL, 1994). A grande
questão é que, mais uma vez, o Brasil vivencia a experiência de fragmentação
e sobreposição de políticas. As propostas atuais do MEC para a alfabetização
ignoram evidências empíricas, como as trazidas nessa pesquisa, bem como o
respaldo científico de que as proposições didáticas e pedagógicas que vinham
sendo desenvolvidas até agora são consistentes para produzir avanço na
alfabetização do Brasil e no melhoramento da qualidade da educação como
um todo. Não que elas não possam ser aprimoradas. Ao contrário, o PNAIC
é um exemplo de uma boa política pública que carecia de aperfeiçoamentos.
Contudo, consideramos que criar políticas desconsiderando todo o histórico
de trabalho realizado na educação pouco contribui para sanar as deficiências
no ensino doBrasil (ALVES, 2019b, p. 140).

Neste texto, a pesquisadora afirma que nenhuma política pública é permanente


e que o trabalho com a alfabetização no Brasil precisa acontecer com diálogo,
aperfeiçoamento e continuidade.

Transcreva do texto trechos que demonstram esse pensamento.

5 Disserte sobre a responsabilidade do docente alfabetizador para com a sua


prática de ensino.

71
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Acesso em: 7 maio 2021.

75
76
UNIDADE 2 —

A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO:
ASPECTOS COGNITIVOS,
PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender que embora ler e escrever sejam processos sistemáticos


e culturalmente construídos, há mecanismos neurobiológicos que
permitem tal aprendizado,

• entender que desenvolvimento das capacidades de leitura e escrita


não está relacionada somente a habilidades individuais, mas sim
condicionadas ao contexto social e educacional propício à alfabetização,

• saber sobre Alexander Luria, psicólogo e pai da neuropsicologia


moderna, discípulo e contemporâneo de Vygotsky.

• analisar os aspectos neuropsicosociais que envolvem a pré-história da


escrita, a partir dos estudos de Luria;

• reconhecer que a teoria de Luria, sobre a pré-história da escrita, e os


estudos de Emília Ferreiro que versam sobre a psicogênese da língua
escrita, possuem objetos de estudos distintos e ambos contribuem para
a compreensão docente sobre como a criança constrói sua relação com a
língua escrita e constrói hipóteses sobre ela;

• saber que as hipóteses que a criança elabora enquanto se alfabetiza não


devem ser vistas como erros, mas sim, rica demonstração de como ela
apreende o sistema de escrita alfabética;

• as fases de alfabetização, tal como propostas pela Psicogênese da


Língua Escrita, fornecem pistas para que o professor realize a mediação
da aprendizagem, e não se constituem em métodos para se alfabetizar.

• discernir que além de ser exposta a um processo de ensino sistematizado


dos aspectos linguísticos da alfabetização, é indispensável que
concomitantemente a esse processo, as ações pedagógicas também
valorizem o letramento.

77
• avaliar que o letramento é um processo que permeia todos os anos
de escolarização. Ele se amplia e se aprofunda de acordo com as
práticas sociais vivenciada pelos estudantes e se aprofunda com o
amadurecimento das funções cognitivas. Na verdade, ele acontece
durante toda a vida do sujeito e não é inerente apenas ao espaço escolar.

• compreender as dimensões linguísticas abarcadas na consciência


fonológica, como a relação fonema/grafema e formação silábica das
palavras, reconhecendo-os como importantes para que as crianças
avancem nas fases de alfabetização, como propõem Ferreiro e Teberosky
(1979).

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – A LÍNGUA ESCRITA - PROCESSO COGNITIVO-CULTURAL

TÓPICO 2 – TEORIA DA PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA, DE


FERREIRO E TEBEROSKY

TÓPICO 3 – ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO - PROCESSOS


INDISSOCIÁVEIS

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

78
UNIDADE 3 TÓPICO 1 —

A LÍNGUA ESCRITA - PROCESSO COGNITIVO-CULTURAL

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 1, abordaremos que, ao contrário da oralidade,
uma habilidade natural e universal da humanidade e parte de seus atributos
biológicos, a capacidade de desenvolver a linguagem escrita é uma herança
cultural das sociedades letradas. Uma invenção da raça humana que requer
um ensino sistematizado e intencional, que modifica as estruturas cerebrais e
com implicações sociais e econômicas. Embora ler e escrever sejam processos
sistemáticos e culturalmente construídos, há mecanismos neurobiológicos que
permitem tal aprendizado.

Alexander Luria, psicólogo e pai da neuropsicologia moderna, foi


discípulo e contemporâneo de Vygostky, juntos cunharam o termo pré-história da
escrita. A partir das pesquisas de Luria (2010; 2006;1998), compreendemos que o
pensamento humano se diferencia pela demonstração das funções superiores, que
se desenvolveram a partir da relação entre as estruturas cerebrais e a complexidades
das relações sociais. As funções psicológicas superiores são: controle consciente,
ação intencional e pensamento abstrato. Todas essas capacidades implicam no
aprendizado da língua escrita e de todo tipo de conhecimento. O cérebro se
modifica a medida em que aprendemos. À essa capacidade de modificação, Luria
denominou plasticidade cerebral.

Os estudos de Luria demonstram como a criança assume as funções da


escrita desempenhadas pelos adultos antes de se iniciar o processo de alfabetização,
no sentido exato da palavra. Luria organiza a pré-história da escrita basicamente
em duas fases: a pré-escrita ou escrita pré-instrumental, e a fase instrumental.
Compreendida na fase instrumental, a escrita pictórica deve ser valorizada e
estimulada pelo alfabetizador.

Avance conosco em seus estudos e aprenda mais sobre essa interessante


fase do desenvolvimento infantil!

79
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

DICAS

Caro acadêmico, para rememorar a história da escrita, estudada na primeira


unidade, acesse: https://bit.ly/3DcSdpu.

2 ALFABETIZAÇÃO E A INTERFACE COM A NEUROPSICOLOGIA


E A NEUROCIÊNCIA COGNITIVA
Considerando a inteligência, como a capacidade de resolver problemas
com algum proveito social (GARDNER, 1997), a ação da escola de transferir
conhecimentos estanques e separados por disciplinas torna-se obsoleto.
Habilidades de análise crítica, de fazer conexões entre conteúdos aprendidos
interdisciplinarmente, de forma contextualizada, torna-se uma estratégia eficiente
da educação para o século XXI (BIALIK, FADEL, TRILLING, 2015).

Neste cenário, a Neurociência Cognitiva ganha espaço. Herculano-Houzel


(2008) considera que explicar como a cognição e a consciência humana nascem da
atividade do cérebro é o objetivo mais ousado da neurociência. Corroborando
com esse pensamento, Bartoszeke (2014) afirma que o objetivo da neurociência
cognitiva é investigar e propor estratégias educativas que possam ter relevância
pedagógica. O cérebro é o órgão onde a aprendizagem ocorre. Temos nessa
premissa a relevância de que os profissionais da educação compreendam como
os processos cognitivos acontecem no cérebro, a fim de proporem estratégias de
aprendizagem significativas e eficientes para o desenvolvimento dos estudantes
(RATEY,2001). Nesse tópico, discutiremos a interface da neurociência com
linguagem escrita.

A oralidade é uma habilidade biológica hereditária. Em todas as raças


e culturas, independente das condições geográficas, econômicas e sociais, a
linguagem verbal é uma característica da espécie humana. A linguagem escrita,
porém, não é uma capacidade universal da humanidade.

Embora existam estudos que caminham em sentido contrário a essa


compreensão, como observa Soares (2016), há o entendimento quase unânime
da comunidade científica de que os sujeitos não aprendem a ler e escrever de
modo natural, como aprendem a falar. O que linguistas e psicólogos cognitivos
afirmam é que não há semelhança alguma entre ouvir e falar, e ler e escrever. Para
Stanovich (2000), os que negam essa diferença

[...] ignoram os fatos óbvios de que todas as comunidades de seres


humanos desenvolveram línguas orais, mas só uma minoria dessa
línguas existe na foram escrita; que a fala é quase tão antiga quanto a
espécie humana, mas a língua escrita é uma invenção cultural recente

80
TÓPICO 1 — A LÍNGUA ESCRITA - PROCESSO COGNITIVO-CULTURAL

de apenas os últimos três ou quatro mil anos; que virtualmente todas


as crianças em ambientes normais desenvolvem facilmente a fala por
si mesmas, enquanto a maior parte das crianças necessita de instrução
explícita para a prender a ler, e um número significativo de crianças
enfrenta dificuldades, mesmo depois de intensos esforços por parte
de professores e pais (STANOVICH, 2000, p. 400 apud SOARES, 2016,
p. 43).

Não obstante ser a escrita uma invenção da humanidade e o domínio


das habilidades de ler e escrever um processo aprendido sistemática e
intencionalmente, há uma relação entre essa aprendizagem e os mecanismos
neurobiológicos do cérebro. Essa é, então, uma relação possível entre a capacidade
de usar a língua escrita e os atributos biológicos e hereditários da espécie humana:
somos os únicos capazes de elaborar cultura. "Bilhões de neurônios armazenam e
processam dados em memórias especializadas, interconectadas e continuamente
reconstituídas, capazes de aprender as novas invenções produzidas pela cultura."
(SCLIAR-CABRAL, 2013, p. 278).

Assim, à medida em que o aprendiz é exposto ao aprendizado da língua


escrita, a plasticidade neuronal, que é a capacidade dos neurônios se reciclarem
mediante novas aprendizagens, modifica a estrutura cerebral. Dessa forma, as
mudanças que se processam nas redes neuronais são de natureza epigenéticas,
ou seja, acontecem por consequência da aprendizagem, não são biologicamente
natas.

De acordo com Lent (2010), ainda que se saiba que todo o cérebro
participa por interior do movimento de aprender, os centros corticais envolvidos
diretamente no processo de aprendizagem da leitura e da escrita são o lobo frontal,
em uma região que coincide com a área de Broca; a junção pariento-temporal,
parcialmente coincidindo com a área de Wernicke; a junção occipito-temporal,
como você pode identificar na figura a seguir:

FIGURA 1 – CENTRO CORTICAIS ENVOLVIDOS NA LEITURA

FONTE: <https://bit.ly/3uC5Rzy>. Acesso em: 5 maio 2021.

81
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

Os recursos de neuroimagem funcional têm contribuído para estudos


sobre o funcionamento cerebral em diferentes campos de pesquisa. A relação
da neurociência com a educação tem sem expandido e se consolidado no Brasil,
ampliando a formação docente (LENT, 2010; GUERRA, 2011; COSENZA;
SCLIAR-CABRAL, 2013; SOARES, 2016). É plausível considerarmos essa
interface positiva para o avanço da qualidade da educação, uma vez que sendo
os professores e pedagogos os profissionais diretamente responsáveis pelo
processo de aprendizagem, é bastante coerente que estes conheçam sobre como
esse mecanismo se processa dentro do órgão onde ela se constrói, não é mesmo?

É certo, portanto, dizer, que a escrita é uma criação social, uma produção
cultural, que, por meio da aprendizagem, altera os arranjos e conexões neuronais
face à sua programação psicobiológica, ao contrário da língua falada, marca
genética da humanidade. Existem sociedades em que a língua escrita se faz
presente e em outras não, embora a oralidade seja uma marca de todas elas. A
linguagem escrita, como criação cultural, é intencionalmente transmitida por
meio do ensino, dessa forma, para aprender a ler e escrever, faz-se necessário
que a criança esteja inserida em uma sociedade letrada. O desenvolvimento das
capacidades de leitura e escrita não está relacionado somente as habilidades
individuais, mas sim condicionadas ao contexto social e educacional propício à
alfabetização (ZORZI, 2003).

2.1 ALEXANDER LURIA E A PRÉ-HISTÓRIA DA ESCRITA


Alexander Luria foi um soviético, nascido em 1902. Contemporâneo
das duas grandes guerras, Luria desenvolveu seus estudos em parceira com
Vygotsky e Leontiev. Esses três intelectuais, impulsionados pela efervescência
dos estudos científicos e as ideias sociais daquele contexto, abriram caminho
para o desenvolvimento de um novo ramo dentro das pesquisas sobre a mente
humana: a psicologia histórico-cultural. Unindo conhecimentos da psiquiatria,
da psicologia, da biologia, da fonoaudiologia, da linguística e outras ciências,
Luria tornou-se pai da neuropsicologia moderna. Embasado nas pesquisas
sociointeracionistas de Vygotsky, ele aprofundou seus estudos sobre a gênese
e desenvolvimento linguístico e, junto com seu mentor, cunharam o termo pré-
história da escrita (SOARES, 2016).

De acordo com Luria (1992, 2010), o pensamento humano se diferencia


pela demonstração das funções superiores, que se desenvolveram a partir da
relação entre as estruturas cerebrais e a complexidades das relações sociais.
As funções psicológicas superiores são: controle consciente, ação intencional e
pensamento abstrato. É em decorrência dessas funções, acadêmico, que somos
capazes de rememorar fatos, criar e imaginar situações que nunca ocorreram,
planejar ações, e avaliar aspectos positivos e negativos de dada situação. Todas
essas capacidades implicam no aprendizado da língua escrita e de todo tipo de
conhecimento.

82
TÓPICO 1 — A LÍNGUA ESCRITA - PROCESSO COGNITIVO-CULTURAL

Para Luria (2010, 1992), à medida em que o indivíduo alcança determinada


capacidade em seu nível cognitivo, vai abandonando as capacidades básicas
adquiridas, por meio de um processo de amadurecimento cognitivo, para, então,
ir ampliando seus conhecimentos e capacidades. De acordo com o pensamento
socioconstrutivista defendido, essas capacidades são gradualmente ampliadas
por meio dos estímulos e interações sociais.

Vivendo em sociedade, o homem desenvolveu diferentes técnicas, que


permitiram melhorar sua qualidade de vida e se comunicar. A escrita, como vimos
no início da Unidade 1, é uma tecnologia criada pelo homem, a partir de uma
necessidade social comunicativa. Embora a ela não esteja presente em todas as
culturas, a capacidade cognitiva de ler e escrever é parte da estrutura cerebral de
todos os sujeitos, requerendo apenas o estímulo próprio para o seu despertamento.
Isso nos leva à compreensão demonstrada por Luria (2010), de que o cérebro
se modifica a medida em que aprendemos. À essa capacidade de modificação,
Luria denominou plasticidade cerebral. Plasticidade cerebral, então, significa que
as estruturas biológicas do cérebro não são fixas, nem preestabelecidas. Elas se
transformam ao logo da vida do indivíduo. Acada novo aprendizado, o cérebro
se transforma!

Assim como as atividades de respiração, digestão e outras desempenhadas


por nosso organismo são resultado de uma ação articulada de diferentes órgãos,
as funções psicológicas também são fruto de um complexo sistema de redes
neurais que operam em conjunto. Os neurônios de cada parte do cérebro possuem
funções específicas, mas trabalham articuladamente, como um todo. Os estudos
de Luria (1992), portanto, demonstram as bases biológicas do aprendizado.

Os estudos de Vygotsky e Luria sobre o desenvolvimento da linguagem


e mais especificamente, da linguagem escrita, nos ajudam a compreender
o pensamento infantil, face à interações sociais de leitura e escrita sob uma
perspectiva semiótica. Para Luria, "quando uma criança entra na escola, ela já
adquiriu um patrimônio de habilidades e que a habilitará a aprender a escrever
num tempo relativamente curto" (LURIA, 1998, p.147). "Tomemos como
ponto de partida o fato deque a aprendizagem da criança começa muito antes
da aprendizagem escolar. A aprendizagem escolar nunca parte do zero. Todo
aprendizado tem um a pré-história.", afirma Vygotsky (1988, p.109). Nesse
sentido, tais estudos dialogam com o pensamento de Soares (2004), Ausubel
(2002), Ferreiro (2001), Piaget (1975, 1974) e outros pesquisadores que versam
sobre o papel do conhecimento prévio no aprendizado.

De acordo com Ferreiro (1994, p.73), "Luria não trata de identificar


quais funções poderia cumprir a escrita do ponto de vista de um sujeito em
desenvolvimento, pelo contrário, trata de observar como a criança assume às
funções que um adulto atribui à escrita", um caráter funcionalista da tecnologia.
Vemos, então, que a influência das práticas sociais já se faz presentes no
desenvolvimento da linguagem escrita bem antes de se efetivarem os estudos
de alfabetização, no sentido linguistico da aprendizagem. A reflexão desse

83
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

aspecto dos estudos de Luria vai ao encontro do que Soares (2016) defende sobre
a relevância do letramento como faceta social e interacionista da alfabetização.
Para ilustrar esse pensamento, pense em uma criança que, mesmo sem saber ler e
escrever, manipula caderno e lápis e faz registros dizendo que está "estudando",
ao copiar o comportamento de irmãos mais velhos. Ou aquela que, pega uma
agenda e diz que vai anotar o aniversário de um coleguinha, ou uma lista de
compras, reproduzindo situações por ela vista dentro de casa. Nesse contexto,
considerando

[...] em que extensão o pedaço de papel, o lápis, e os rabiscos que


[a criança] fazia no papel deixaram de ser simples objetos que a
interessavam, brinquedos, por assim dizer, e tornaram-se um
instrumento, um meio para a tingir algum fim: recordar um certo
número de ideia que lhe foram apresentadas (LURIA, 1998, p. 147-148,
grifo nosso).

Luria descreveu dois estágios que podem ser observados quando a


criança desenvolve sua habilidade de escrever e as condições que lhe possibilitam
avançar nesses estágios até compreender o sistema alfabético de escrita: a pré-
escrita (ou pré-instrumental) e a instrumental. Embora suas observações tenham
ocorrido com crianças com certa deficiência intelectual, as inferências construídas
pelo psicólogo são pertinentemente associadas ao desenvolvimento das crianças
pequenas, como ele mesmo, em seus escritos, por vezes o faz (LURIA, 1998).

Na fase da pré-escrita, na tentativa de escrever, a criança produz rabiscos,


em ziguezague, imitando a escrita adulta. Porém, seus rabiscos não têm sentido
diante do que ela diz estar escrevendo. São rabiscos aleatórios, garatujas. Nessa
ação, "a criança toma sua forma externa e acredita ser capaz de escrever mesmo
antes de saber o que deve ser escrito” (LURIA, 2016, 150). Nesse momento, a
escrita não tem relação com a memória. Ela não escreve para lembrar o que
escreveu, a escrita é apenas uma imitação mecânica e cultural.

FIGURA 2 – EXEMPLO DE PRÉ-ESCRITA OU ESCRITA PRÉ-INSTRUMENTAL

FONTE: Luria (1988, p. 149)

84
TÓPICO 1 — A LÍNGUA ESCRITA - PROCESSO COGNITIVO-CULTURAL

Nessa imagem, Luria demonstrou os registros de uma criança de cinco


anos, sem experiência escolar, no início do século XX, quando lhe foi ditado "Os
ratos têm rabos compridos."

Entretanto, em dado momento, os registros da criança passam a ter relação


mnemônica e, embora com traçados ainda indiferenciados, de algum momento a
criança passa a associar o que pretende escrever, ao seu rabisco não diferenciado.
Ela faz associações com a posição do rabisco no papel (em um lado, ou no outro)
ou com a extensão do traço (pequeno para uma palavra, longo para uma frase).
Vê-se, então, que, mesmo ainda na fase da garatuja, a função de memória começa
a surgir. Segundo Luria,

Este é o primeiro rudimento do que mais tarde se transformará na


escrita, na criança. Nele, vemos pela primeira vez, os elementos
psicológicos de onde a escrita tirará a forma. A criança lembra-se
agora do material, associando-o a uma marca específica, em vez de
fazê-lo de forma puramente mecânica, [...] o precursor da verdadeira
escrita (LURIA, 1988, p. 156).

FIGURA 3 – EXEMPLO DE PRÉ-ESCRITA COM SIGNIFICADO

FONTE: Luria (1988, p. 158)

Nessa imagem, Luria demonstrou a escrita de uma criança de cinco


anos, também sem experiência escolar, mas que já passa a utilizar das funções
memorísticas na atividade de escrita, ainda que esta seja indiferenciada. Na
figura um, a criança "escreveu" vaca, na dois, "uma vaca tem quatro pernas e um
rabo.", na seguinte, "ontem à tarde choveu.", na quarta figura, " o lixo da chaminé
é preto" e, na última, "dê-me três velas".

Já na fase instrumental, Luria esclarece:

Após ter começado com uma escrita de brincadeira, não diferenciada,


diante de nossos próprios olhos, o sujeito descobriu a natureza
instrumental de tal escrita e elaborou seu próprio sistema demarcas
expressivas, por meio das quais foi capaz de transformar todo o
processo de recordação. A brincadeira transformou em escrita

85
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

elementar, e a escrita era, então, capaz de assimilar a experiência


representativa da criança. Tínhamos atingido o limiar da escrita
pictográfica (LURIA, 1988, p. 173).

Como vimos, na fase da pré-escrita, em que os registros são indiferenciados,


há uma insuficiência no que tange a função auxiliar da memória. No entanto a
criança já demonstra vivenciar situações da cultura escrita. Na fase instrumental,
ela passará, agora, a diferenciar os signos traçados e a relacioná-los ao que
busca registrar. Enquanto a criança amplia essa capacidade associativa, a escrita
torna-se um poderoso instrumento de extensão da memória. Aos poucos, vão
se estabilizando os rudimentos da capacidade de escrever. De acordo com
o pesquisador em estudo, "Linhas e rabiscos são substituídos por figuras e
imagens, e estas dão lugar a signos. Nesta sequência de acontecimentos está todo
o caminho do desenvolvimento da escrita, tanto na história da civilização como
no desenvolvimento da criança" (LURIA, 1998, 161).

Inicialmente, o primeiro passo no sentido da diferenciação dos registros


gráfico é ainda muito limitado e rudimentar. A medida em que a criança
aprofunda seu desenvolvimento da escrita imitativa o signo vai adquirindo
significado, nesse percurso, o desenho infantil assume um importante papel. Na
caracterização da função instrumental da escrita, Luria reconhece o dualismo do
estágio pictográfico: em dado contexto, a criança desenha livremente, brincando,
sem mediação ou qualquer intenção comunicativa. Já em circunstâncias dirigidas,
a criança pode lançar mão da capacidade criativa e sua habilidade de desenhar para
escrever pictograficamente. Nesse caso, o desenho torna-se uma representação da
linguagem escrita. E ainda que essa representação seja complexa para a criança
desenhar, ela traça partes pelo todo, de acordo com sua capacidade intelectual de
estabelecer relações. Nas palavras do pesquisador:

A fase pictográfica do desenvolvimento da escrita baseia-se na rica


experiência dos desenhos infantis, os quais, em si mesmos, não
precisam desempenhar a função de signos mediadores em qualquer
processo intelectual. Inicialmente o desenho é brincadeira, um
processo autocontido de representação; em seguida, o ato completo
pode ser usado como estratagema, um meio para o registro. Mas pelo
fato de a experiência direta do desenho ser tão rica, frequentemente
deixamos de obter, da criança, a fase pictográfica da escrita em sua
forma pura (LURIA, 1998, p. 174).

A imagem a seguir demonstra os registros de uma criança, na tentativa


de escrever "Há muitas estrelas no céu" e "Dois cachorros na rua". A criança
acrescenta elementos ao registro, para aludir à mensagem que quer transmitir:
introduz a janela, explicando que vê as estrelas através dela, um gato, e a grama,
que separa o céu da terra, onde ficam os animais.

86
TÓPICO 1 — A LÍNGUA ESCRITA - PROCESSO COGNITIVO-CULTURAL

FIGURA 4 – O DESENHO COMO REPRESENTAÇÃO INSTRUMENTAL DA ESCRITA

FONTE: Luria (1998, p. 178)

Dialogando com Gonçalves e Costa (2020),

[...] o desenho envolve imaginação, espontaneidade e significados


sociais que são refletidos no modo como a criança se expressa e se
comunica, externando seu contexto de vida e conhecimentos por
meio de seus registros artísticos. Nessa perspectiva, faz-se necessário
verificar se os professores estão atentos aos significados expostos
nos desenhos das crianças que possibilitam a expressão, por meio da
linguagem gráfica, de seus sentimentos, desejos e relações interpessoais
(GONÇALVES; COSTA, 2020, p. 141).

Compreendemos, então, que a pré-história da escrita deve ser valorizada


pelo alfabetizador tanto como demonstração do desenvolvimento cognitivo
dos educandos, diante do aprendizado da língua escrita, quanto em outras
dimensões subjetivas. Desenhando, a criança retrata situações de seu círculo de
convivência, e encontra espaço e meio de comunicar suas emoções, experiências
culturais e sociais. Costa (1996, p. 6) salienta que, “ao desenhar, a criança elabora
seu pensamento. Expressa sua visão do mundo e descobre o novo, através do já
conhecido e de suas criações. A alegria ou a tristeza são mostradas graficamente,
quando oralmente é mais difícil”.

Luria (1998) também reforça:

Antes que a criança tenha compreendido o sentido e o mecanismo


da escrita, já efetuou inúmeras tentativas para elaborar métodos
primitivos, e estes são, para ela, a pré-história de sua escrita. Mas
mesmo estes métodos não se desenvolvem de imediato: passam por
um certo número de tentativas e invenções, constituindo uma série
de estágios, com os quais deve familiarizar-se o educador que está
trabalhando com crianças em idade escolar, pois isto lhe será muito
útil (LURIA, 1998, p. 188).

87
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

Posto que a pré-escrita infantil ocupa um singular espaço na cultura escrita


da criança, a escola se constitui no espaço onde ela deverá se apropriar do sistema
alfabético da escrita. Para superaras fases pré-instrumental e instrumental, a
criança precisa construir uma relação de significância com os traços feitos por
ela, que passarão então, a rememorar o que se pretende escrever, rompendo os
limites da escrita pictográfica. Assim, o professor alfabetizador deve promover
atividades em que as crianças percebam a escrita presente no cotidiano e chamar
a atenção para o sentido da escrita nas situações. Dessa forma, desde a educação
infantil, a criança precisa ser estimulada a observar a presença da escrita na vida
social.

ATENCAO

Promova situações em que a criança possa desenhar. Livremente ou de modo


mediado. Estimule-a a nomear seus desenhos e a contar a "histórias" por eles representadas.

Construa na sala um cantinho de objetos em que a escrita é privilegiada, para ser parte das
brincadeiras dirigidas: celulares velhos, teclados de computador, livros, revistas, agendas,
folhetos de supermercado e outros. O professor pode criar situações de reflexão sobre a
escrita e atividades lúdicas nesse espaço diferenciado.

Solicite à família, que ao sair com a criança, chame sua a tenção para contextos, objetos
em que a escrita se faz presente: placas de trânsito, nomes de lojas, anúncios, cardápios,
endereços. A criança poderá compartilhar essas experiências na roda de conversa e registros
sobre as descobertas da turma podem ser feitos.

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TÓPICO 1 — A LÍNGUA ESCRITA - PROCESSO COGNITIVO-CULTURAL

Valorize a leitura literária de diferentes modos:


1. Permitindo que a criança realize pseudoleituras: leiam livros com e sem palavras, contando
a história usando a imaginação, mesmo sem saber ler de fato.
2. Valorizando, rotineiramente, momentos de contação de histórias pelo professor, usando
de boa entonação, fluência, emoção e explorando as ilustrações.
3. Incentivando a leitura em família, a escola pode enviar livros para casa desde os primeiros
dias de aula para que os pais ou responsáveis façam a leitura com as crianças, mesmo que
isso não seja uma prática comum na maioria das famílias, mas cabe à escola promover
essas situações.
4. Permitir que as crianças façam pseudoleituras umas para as outras, de modo lúdico e
amistoso.

Nesse entendimento, o professor deve valorizar e reconhecer toda ação da criança, no


sentido tentar ler e escrever. Verbalizar elogios construtivos, descrevendo o que a criança
tem feito de proveitoso, a fará se sentir notada e seu aprendizado, reconhecido.

Destacamos que essas ações devem se fazer presentes em todo o processo


de alfabetização da criança. Desde o momento em que ela vivencia a pré-escrita,
registrando apenas garatujas, e até mesmo quando ela vai avançando nas fases em
que se alfabetiza, de acordo com os estudos de Emília Ferreiro e Ana Teberosky,
que veremos mais adiante. Em cada momento do aprendizado, as sugestões que
trazemos aqui assumem uma dimensão diferenciada, mas destacamos que elas
são importantes e também têm seu lugar mesmo antes do aprendizado linguístico
da escrita, no tempo ao qual Luria denomina: a pré-história da escrita.

89
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Ouvir e falar, ler e escrever, embora sejam habilidades humanas, não há


semelhança alguma no modo como elas se desenvolvem.

• Embora ler e escrever sejam processos sistemáticos e culturalmente


construídos, há mecanismos neurobiológicos que permitem tal aprendizado.

• O desenvolvimento das capacidades de leitura e escrita não está relacionada


somente a habilidades individuais, mas sim condicionadas ao contexto social
e educacional propício à alfabetização.

• Alexander Luria, psicólogo e pai da neuropsicologia moderna, foi discípulo e


contemporâneo de Vygotsky. Juntos cunharam o termo pré-história da escrita.

• O pensamento humano se diferencia pela demonstração das funções


superiores, que se desenvolveram a partir da relação entre as estruturas
cerebrais e a complexidades das relações sociais.

• As funções psicológicas superiores são: controle consciente, ação intencional


e pensamento abstrato. Todas essas capacidades implicam no aprendizado da
língua escrita e de todo tipo de conhecimento.

• O cérebro se modifica à medida que aprendemos. À essa capacidade de


modificação, Luria denominou plasticidade cerebral.

• Os estudos de Luria demonstram como a criança assume as funções da escrita


desempenhadas pelos adultos antes de se iniciar o processo de alfabetização,
no sentido exato da palavra.

• Luria organiza a pré-história da escrita basicamente em duas fases: a pré-


escrita ou escrita pré-instrumental, e a fase instrumental.

• Compreendida na fase instrumental, a escrita pictórica deve ser valorizada e


estimulada pelo alfabetizador.

90
AUTOATIVIDADE

1 Herculano-Houzel (2008) considera explicar como a cognição e a consciência


humana nascem da atividade do cérebro é o objetivo mais ousado da
neurociência. Acerca desse campo de conhecimento e suas contribuições
para a educação, avaliei as assertivas com verdadeiras ou falsas:

( ) O cérebro é o órgão onde a aprendizagem ocorre.


( ) O que linguistas e psicólogos cognitivos afirmam é que há certa semelhança
ouvir e falar e ler e escrever.
( ) Há relação entre essa aprendizagem da língua escrita e os mecanismos
neurobiológicos do cérebro.
( ) O desenvolvimento das capacidades de leitura e escrita está relacionada
somente a habilidades individuais, não condicionadas ao contexto social
e educacional.

A avaliação correta se dá em:

a) ( ) V-F-V-F
b) ( ) F-V-V-F
c) ( ) V-F-F-V
d) ( ) F-V-V-V

2 Assim como as atividades de respiração, digestão e outras desempenhadas


por nosso organismo são resultado de uma ação articulada de diferentes
órgãos, as funções psicológicas também são fruto de um complexo sistema
de redes neurais que operam em conjunto. De acordo com o pensamento de
Luria, as funções psicológicas superiores são:

a) ( ) Controle consciente, ação intencional e pensamento abstrato.


b) ( ) Plasticidade neuronal, ação intencional e pensamento abstrato.
c) ( ) Controle consciente, ação pedagógica e pensamento objetivo.
d) ( ) Subconsciente, ação pedagógica e pensamento abstrato.

3 Luria (2010), demonstrou que o cérebro se modifica a medida em que


aprendemos. significa que as estruturas biológicas do cérebro não são fixas,
nem pré-estabelecidas. Elas se transformam ao longo da vida do indivíduo.
A cada novo aprendizado, o cérebro se transforma. A essa característica
cerebral Luria denominou:

a) ( ) Aprendizagem significativa
b) ( ) Plasticidade cerebral
c) ( ) Cognitividade
d) ( ) Função regenerativa

91
4 Os estudos de Vygostky e Luria sobre o desenvolvimento da linguagem e
mais especificamente, da linguagem escrita, nos ajudam a compreender o
pensamento infantil, face às interações sociais de leitura e escrita sob uma
perspectiva semiótica. De acordo com esses estudos, explique o conceito de
pré-história da escrita?

5 Luria descreveu dois estágios que podem ser observados quando a criança
desenvolve sua habilidade de escrever e as condições que a possibilitam
avançar nesses estágios, até compreender o sistema alfabético de escrita.
Identifique-os.

92
UNIDADE 2
TÓPICO 2 —

TEORIA DA PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA

1 INTRODUÇÃO
Trataremos agora do estudo de uma teoria que muito tem contribuído
para a compreensão de como o sujeito cognoscente avança em suas hipóteses de
escrita à medida que se alfabetiza. É bastante comum encontrarmos em livros e
textos acadêmicos em geral, a abordagem da Psicogênese da Língua Escrita unida
às discussões de métodos de alfabetização. No entanto, teóricos, pesquisadores e
especialistas em alfabetização consideram essa organização um tanto equivocada,
tendo em vista que Emília Ferreiro e Ana Teberosky, ao publicarem seu trabalho,
não propuseram um método, mas sim, ofertaram à comunidade acadêmica
e docente uma teoria escrita a partir de uma pesquisa científica no campo da
psicolinguística. Em face da grande validade da pesquisa, seus resultados têm
amparado a prática alfabetizadora de professores de diversos países.

Um campo de pesquisa que muito contribui para a compreensão de como


acontece a aprendizagem da língua escrita pelos alfabetizandos é a Psicologia
Cognitiva, tendo Emília Ferreiro e Ana Tereberosk como as pesquisadoras mais
estudadas, por meio da Teoria da Psicogênese da Língua Escrita. A partir do
entendimento de que é indispensável ao aluno participar da “cultura escrita”,
termo cunhado por Emília Ferreiro (1985), faz-se necessário oferecer aos
estudantes experiências com diferentes tipos e gêneros textuais, de modo que eles
efetivamente entendam a utilidade da leitura e da escrita no cotidiano e tenham
despertado o interesse por usá-la.

Contudo, para Ferreiro (1994; 1995; 2001) esse não é o único conhecimento
que o alfabetizador deve aplicar para mediar satisfatoriamente um efetivo
processo de aprendizagem da língua escrita. Também é fundamental que ele
conheça sobre como se constrói o processo de ler e escrever. Essa psicolinguista
argentina, discípula de Jean Piaget, aprofundou o conhecimento que se tinha
sobre a aquisição da leitura e da escrita, ao lançar, com Ana Teberosky, o livro
Psicogênese da Língua Escrita (1979), em que descrevem os estágios pelos quais as
crianças passam até compreender o sistema alfabético de escrita e o aprendizado
de ler e escrever.

93
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

2 O DESENVOLVIMENTO PSICOLINGUÍSTICO DO
ALFABETIZANDO
Ao comparar teorias de Emilia Ferreiro e Alexander Luria, percebemos
que as duas linhas de pesquisa têm objetos de estudos diferentes. Nos estudos
de Luria, a escrita tem função mnemônica e comunicativa. Considerando que
as crianças pequenas não conseguem ainda fazer uso da função comunicativa
da escrita, resta apenas à mnemônica e comunicativa, embasando nas teorias
vygotskyanas. Emília Ferreiro se propõe a investigar a relação da criança com
a escrita por outra abordagem. Esta pesquisadora, "Não caracteriza como uma
técnica, mas sim como um objeto, um modo particular de existência no contexto
sociocultural. Quer saber que tipo de objeto é a escrita para a criança em processo
de desenvolvimento" (FERREIRO, 1994, p. 73).

Discorrendo sobre as duas teorias, Azenha (1996) escreve que as práticas


de leitura e escrita, “não se iniciam na escola, nem se restringem a ela. A
existência de um percurso prévio à escolarização é o que define uma pré-história
em relação à aprendizagem escolar da escrita. Essa contribuição dos dois autores
é revolucionária em relação ao ensino da escrita [...]." (AZENHA,1996, p.19)
De acordo com esta autora, as diferenças entre os dois pesquisadores estariam
relacionadas aos pressupostos teóricos subjacentes as pesquisas. Os estudos de
Vygotsky obtiveram maior influência sobre a pesquisa de Luria e Piaget, no
trabalho de Ferreiro.

Segundo Ferreiro (2001), a escrita pode ser concebida de duas formas


diferentes: “a escrita pode ser considerada como uma representação da linguagem
ou como um código de transcrição gráfica das unidades sonoras” (1995, p. 10).
A autora afirma que a diferença essencial entre essas duas formas é que em se
tratando da codificação os elementos utilizados e as relações existentes entre os
mesmos já estão preestabelecidos. Já no caso da representação, a criança constrói
seu conhecimento a partir da sua concepção, nenhum dos dois aspectos estão
predeterminados.

No início da fase de alfabetização, as crianças encontram dificuldades em


assimilar os conceitos e normas do sistema alfabético. Sendo assim, elaboram um
novo sistema de escrita que vai ao encontro de sua capacidade de compreensão
enquanto caminham no processo de aquisição da linguagem escrita. A grande
questão enfrentada pelos alfabetizadores e que interfere no processo de
aprendizagem da criança é como explicar para a criança a diferença entre a fala
e a escrita. Isso exigirá do aluno a compreensão de que alguns elementos da
linguagem oral não são representados na escrita. Quando a criança escreve da
maneira que acredita ser o certo, ela está expressando sua concepção de linguagem
escrita que pode nortear a prática docente de forma a conduzir uma alfabetização
significativa para o aprendiz. O educador precisa aprender a interpretar essa
escrita representada pela criança ao contrário de pensar que ela aprende somente
quando submetida a um processo sistematizado de ensino.

94
TÓPICO 2 — TEORIA DA PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA

Em seus primeiros passos rumo ao aprendizado da língua escrita, as


crianças encontram dificuldades em assimilar os conceitos e normas do sistema
de escrita alfabético. Dessa maneira, eles mesmas elaboraram um "novo sistema
de escrita" que vai ao encontro de sua capacidade de compreensão, o que deve ser
visto como um caminho para o entendimento do sistema alfabético.

Retomando a questão do aprendizado da língua escrita não ser um


processo natural, dialogando com a Psicogênese da Língua Escrita, a professora
Magda Soares (2015, p. 45) escreve:

Assim, para Ferreiro (1992:29-32), coerentemente com a fundamentação


psicogenética de sua teoria, [...], o que não é natural no aprendizado
da língua escrita, e o distingue do aprendizado da língua oral, não é
fundamentalmente uma diferença entre os objetos de conhecimento
- língua oral ou língua escrita - mas são as "atividades sociais frente
à duas aprendizagens" (1992:29): enquanto os adultos respondem
com compreensão e entusiasmo às tentativas de expressão oral
da criança, aceitando-as como integrantes de um processo de
construção da aprendizagem da língua oral, reagem de maneira
oposta - particularmente os professores - às tentativas de leitura e
escrita, desqualificando-as e considerando-as como erros, não como
aproximações à escrita.

De fato, a grande questão enfrentada pelos professores alfabetizadores


e que incide sobre a alfabetização da criança é como explicá-la a distinção entre
falar e a escrever. Isso exigirá do aluno a compreensão de que alguns elementos
da linguagem oral não são representados na escrita, "não se aprende um fonema,
nem uma sílaba, nem uma palavra por vez, também a aprendizagem da língua
escrita não é um processo cumulativo simples, unidade por unidade, mas
organização, desestruturação e reestruturação contínua" (FERREIRO, 1992, p.31).

A criança, ao escrever da forma que acredita ser o certo, ela está


demonstrando sua concepção de escrita, o que oferece pistas valiosas que
podem orientar a prática docente de maneira a conduzi-la numa alfabetização
significativa. O alfabetizador deve educar o olhar a fim de aprender a interpretar
as hipóteses de escrita da criança.

Embora não seja o objeto de conhecimento das pesquisas de Emília Ferreiro,


a autora considera alguns períodos marcantes no processo de alfabetização. O
primeiro deles é a diferenciação entre o modo de representação icônico e não-
icônico, ou seja, a distinção entre desenhar e escrever (SOARES, 2016). O segundo,
a fonetização da escrita, que se inicia no período silábico e culmina no alfabético,
de acordo com o pensamento de Ferreiro (1995), se caracteriza pela necessidade
de realizar registros gráficos diferentes para representar coisa diferentes.

Seguindo-se a esse período, ocorre o entendimento de que “a quantidade


de letras com que se vai escrever uma palavra pode ter correspondência com
a quantidade de partes que se reconhece na emissão oral” (p.25). No período
alfabético a criança reconhece que cada som é representado por uma letra e que

95
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

uma combinação de letras forma sílabas, as quais são partes de uma palavra. A
construção de formas de diferenciação na escrita requer da criança um grande
esforço intelectual.

Considerando o erro como parte rica e significativa da aprendizagem


(SOARES, 2016; MORAIS, 2012; FERREIRO, 2001; 1995;1994; FERREIRO;
TEBEROSKY, 1979) tendo como base o estudo piagetiano do desenvolvimento
cognitivo, Ferreiro e Teberosky (1979) propõem, então, cinco fases pelas quais as
crianças passam ao aprender a ler e escrever. Descreveremos cada uma dessas
fases, amparadas por imagens que as exemplificam, retiradas da obra de Morais
(2012).

2.1 A FASE PRÉ-SILÁBICA


Nesse nível de desenvolvimento, "encontramos aquilo que no Brasil
Terezinha Nunes e Lúcia Browne Rego divulgaram como 'realismo nominal' (cf.
CARRAHER; REGO, 1981). Isso significa que ela ainda não compreendeu que
a escrita representa nome de dado objeto e não o objeto em si. Sendo assim, ao
pedirmos que ela escreva, por exemplo, a palavra casa, ela desenhará a forma
de uma casa, ou ainda, fará muitos rabiscos para escrever boi, que é um animal
grande, e poucos para escrever formiga, que é pequenina.

Ainda inserida no realismo nominal, enquanto amadurecem nas hipóteses


de escrita, a criança passa a registrar rabiscos e garatujas, grafando traços que
imitam a escrita com letras em imprensa ou cursiva. Depois, ao perceber os
símbolos que utilizamos, ela parte para a tentativa e registrar esses símbolos, ora
imitando números, ora buscando reproduzir grafias semelhantes as letras.

Outra característica interessante dessa fase, e que demonstra uma evolução


cognitiva da criança é que "As tentativas de diferenciar entre si as palavras que
escrevem, tal como acontece com as palavras que veem ao seu redor, faz as crianças
formularem dois tipos de hipóteses originais, nunca ensinadas pelo adulto, e que
cedo foram descritas por Ferreiro e Teberosky (1979): a hipótese de quantidade
mínima e da variedade" (MORAIS, 2012, p. 56). Sendo assim, a criança elabora a
compreensão de que para escrever palavras é preciso uma quantidade mínima de
letras e palavras diferentes precisam de certos símbolos diferentes.

96
TÓPICO 2 — TEORIA DA PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA

DICAS

Acadêmico, o vídeo a seguir ajudará a elucidar a compreensão da fase pré-


silábica e oferece dicas valiosas de como mediar aprendizagem da criança nesse nível.
Ele é parte de uma série de outros vídeos que também indicaremos aqui, produzidos no
contexto do Projeto Alfaletrar, conduzido pela professora Magda Soares, no município de
Lagoa Santa, em Minas Gerais.

Assista em: https://www.youtube.com/watch?v=iY6DaLo1seo

Em termos práticos, Coutinho (2005) deixa uma série de sugestões de


atividades pedagógicas que elucidam a ação do alfabetizador nesse momento.
Aproveite!

E
IMPORTANT

Sugestões práticas para mediação na fase pré-silábica:

O principal desafio para este nível é auxiliar os alunos a perceber que a escrita representa os
sons das falas, e não os objetos em si com suas características. Para tal, atividades de análise
fonológica, em que os alunos serão desafiados a perceber que palavras que começam
(aliteração) ou terminam com o mesmo som (rima) têm a tendência a ser escritas com o
mesmo grupo de sílabas ou letras. A exploração oral, mas, sobretudo, escrita de poemas,
trava-línguas, parlendas e outros textos que possibilitem a exploração de sons iniciais e
finais são bastante interessantes nesta fase.

O trabalho com palavras estáveis, como os nomes dos alunos da turma, também pode
auxiliar na percepção de que partes iguais se escrevem de forma semelhante, e partes
(sílabas ou letras) presentes no nome de um aluno também podem ser encontradas nos

97
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

nomes de outros colegas. Além das palavras estáveis, a exploração de textos conhecidos de
memória ajudará na construção da base alfabética, uma vez que, ao lerem textos de cor, as
crianças podem ajustar a pauta sonora à pauta escrita e, assim, podem perceber que eles
leem o que está grafado no papel (COUTINHO, 2005, p. 55).

Acadêmico, deixamos mais um vídeo para elucidar o seu trabalho com o aluno pré-
silábico em: https://www.youtube.com/watch?v=iY6DaLo1seo

Além, dessas dicas, a imagem é um ótimo exemplo de atividade a ser


trabalhada com a criança pré-silábica. Ela foi elaborada pela professora Janaína
Spolidório.

FIGURA 5 – EXEMPLO DE ATIVIDADE PARA A FASE PRÉ-SILÁBICA

FONTE: <https://bit.ly/2YhCoi4>. Acesso em: 5 maio 2021.

2.2 A FASE SILÁBICA


À medida em que avançam em seu nível de percepção, a criança começa
a fazer relação entre a fala e a escrita, notando que os pedacinhos das palavras
têm sons diferentes. Assim, constroem a hipótese de que esses sons, aos quais
denominamos sílabas, são representados por letras diferentes. A princípio, a
criança lança mão de uma letra aleatória para representar cada sílaba. Ela ainda
não faz relação do som da letra com o som da sílaba.
98
TÓPICO 2 — TEORIA DA PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA

Essa manifestação constitui-se um grande avanço sobre como a criança


concebe a escrita nessa fase. Fato interessante nesse momento do aprendizado é
que a criança, após escrever a palavra, em sua tentativa de lê-la, ao reconhecer
que "sobraram" letras em relação aos sons dos pedacinhos que falou, ela busca
apagá-los.

Tem sido comum entre os alfabetizadores a nomeação desse momento


característico da fase pré-silábica como sem valor sonoro, para diferenciá-la da
evolução que a criança demonstra ao passar a atribuir a letra correspondente ao
som da sílaba, para cada uma delas. Temos então a expressão pré-silábico com valor
sonoro. Esses dois subgrupos da fase pré-silábica são identificados por Morais
(2012), como quantitativo – silábico sem valor sonoro – e qualitativo – silábico
com valor sonoro.

FIGURA 6 – ESCRITA PRODUZIDA POR DIFERENTES CRIANÇAS COM HIPÓTESE PRÉ-SILÁBICA

FONTE: Morais (2012, p. 59)

DICAS

Acadêmico, o vídeo a seguir ajuda a elucidar a compreensão da fase silábica e


oferece dicas valiosas de como mediar aprendizagem da criança nesse nível. Eles compõem
a série vídeos produzidos no contexto do Projeto Alfaletrar, conduzido pela professora
Magda Soares, no município de Lagoa Santa, em Minas Gerais.

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=fjRIi0U13Bg

99
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

E
IMPORTANT

Sugestões práticas para mediação na fase silábica

Mais uma vez, na tentativa de auxiliar os alunos na reconstrução de suas hipóteses, é


importante que o professor possa organizarem sua rotina de trabalho atividades que levem
em conta a exploração dos conhecimentos que os alunos precisam desenvolver para
conseguir escrever de forma convencional.

As atividades devem ajudar os alunos a refletir que a sílaba não é a menor unidade de uma
palavra e que ela é constituída de partes menores (os fonemas). Como os alunos já são
capazes de estabelecer vinculação sonora, uma boa atividade para auxiliá-los pode ser o
trabalho com escrita espontânea ou também por meio de ditados autoditado, propondo
que os alunos interpretem seus escritos.

Atividades de ditado e autoditado podem e devem ser feitas, desde que o professor tenha
clareza de quais objetivos possui com cada uma delas. O ditado pode ser uma grande fonte
de exploração da escrita, se após a realização dele o professor problematiza as respostas dos
alunos pedindo a eles que pensem sobre a forma convencional da escrita ou remetendo-
lhes (em caso de dúvida) apalavras cuja forma lhes é conhecida, como, por exemplo, a lista
dos nomes dos colegas.

O trabalho com o nome próprio, nome dos colegas e outras palavras estáveis ainda deve
ser feito, mas os desafios deverão ser maiores e diferentes dos propostos para os alunos do
nível pré-silábico. Agora, pela lista de nomes presentes na sala de aula, o professor pode
propor que os alunos escrevam outras palavras que possuamos mesmos “pedacinhos” que
aparecem nos nomes de colegas da sala, ou mesmo, usar os nomes das crianças para
ajudar os alunos aperceber que as palavras possuem números diferentes de sílabas, e que as
sílabas, por sua vez, possuem números de letras diferentes. Por exemplo, o nome Henrique
possui 3 sílabas e 8 letras. A nomeada também possui 3 sílabas, mas apenas 4 letras, embora
ambos tenham a mesma quantidade de sílabas. Reflexões como esta ajudamos alunos a
perceber que, dentro das sílabas, existem partes ainda menores.

As atividades de cruzadinhas são interessantes para as crianças deste nível de escrita, que
tenderão a escrever uma letra para cada sílaba da palavra. Como na atividade os “quadrinhos”
devem ser preenchidos por cada letra, haverá sobra de quadradinhos, o que levará a criança
a rever sua escrita (COUTINHO, 2005, p. 59-60).

Acadêmico, deixamos mais um vídeo para elucidar o seu trabalho com o aluno silábico.

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=gA58AAj6Ths

Além dessas dicas, a imagem é um ótimo exemplo de atividade a ser


trabalhada com a criança silábica. Ela foi elaborada pela professora Janaína
Spolidório.

100
TÓPICO 2 — TEORIA DA PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA

FIGURA 7 – EXEMPLO DE ATIVIDADE PARA A FASE SILÁBICA

FONTE: <https://bit.ly/3Aa9oGk>. Acesso em: 5 maio 2021.

2.3 A FASE SILÁBICO-ALFABÉTICA


Avançando em suas hipóteses, a criança que está na fase silábico-alfabética
começa a notar que o som da sílaba, muitas vezes, não pode ser representado
somente por uma única letra. Nessa fase ele começa a compreender que a escrita
representa sons da fala (FERREIRO; TEBEROSKY, 1979). Ela começa então a refletir
sobre o valor sonoro de cada letra da sílaba. Esse entendimento é, realmente, um
aprendizado bastante complexo. Ela está aproximando-se da compreensão do
sistema de escrita alfabético.

Curioso notar que, na construção desse entendimento, muitas vezes ela faz
substituições de letras para formar as mesmas sílabas, seja em palavras diferentes
ou até mesmo na mesma palavra. Ferreiro (1985) denomina esse processo de
alternância grafofônica. Isso reflete um exercício cognitivo de enorme importância.
Requer uma reflexão metafonológica bem sofisticada.

Para Morais (2012),

é preciso ver a etapa silábico-alfabética não apenas como um 'período


de transição', mas como um período de grande aprendizado das
correspondências grafema-fonema. Quanto mais tal aprendizado
avança, mais curto é o 'processo de transição'. Por isso, costumamos
dizer que as crianças que atingem uma hipótese silábico alfabética já
estão, quase em sua totalidade, a 'salvo' do fracasso escolar que gera
analfabetismo (MORAIS, 2012, p. 63).
101
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

DICAS

Futuro(a) pedagogo(a), deixaremos para finalizar a sequência de vídeos do


Alfaletrar após apresentarmos a última fase, pois ele aborda ambas. Deixamos o convite
para que leia a obra Sistema de Escrita Alfabética, do professor Artur Gomes de Morais. As
dicas de atividades de mediação também serão apresentadas juntas.

2.4 A FASE ALFABÉTICA


De acordo com o pensamento de Ferreiro e Teberosky (1985),

A escrita alfabética constitui o final desta evolução. Ao chegar a este


nível, a criança já franqueou a “barreira do código”; compreendeu que cada um
dos caracteres da escrita corresponde a valores sonoros menores que a sílaba, e
realiza sistematicamente uma análise sonora dos fonemas das palavras que vai
escrever. Isso não quer dizer que todas as dificuldades tenham sido superadas:
a partir desse momento, a criança se defrontará com as dificuldades próprias
da ortografia, mas não terá problemas de escrita, no sentido estrito (FERREIRO;
TEBEROSKY, 1985, p. 213).

Isso quer dizer que, embora a criança tenha construído sua base alfabética
e assim, compreendido a lógica do sistema alfabético de escrita, ela ainda não
terminou sua jornada rumo à alfabetização plena. Para Morais (2012), a criança
alfabética

ao colocar uma letra para cada som, tal como pronuncia as palavras,
ela tende a pensar que seus problemas de escrita estão resolvidos. Esse
engano não pode atingir também os professores e elaboradores de
políticas de alfabetização. Sim, não podemos confundir "ter alcançado
uma hipótese alfabética de escrita" cm "estar alfabetizado". A passagem
da primeira condição à seguinte deverá ser, em nosso ponto de vista, o
resultado de um cuidadoso processo de ensino-aprendizagem, agora
não mais (ou principalmente) de aspectos conceituais do sistema
alfabético, mas, sim, das convenções som-grafia [...] (MORAIS, 2012,
p. 65).

Nesse momento, a ação do alfabetizador é tão importante quando nas


fases que o antecederam. Ao conseguir maior autonomia na escrita e fluência
na leitura, a criança deve ser ainda mais estimulada a ler, a atentar-se sobre
certas nuances da língua escrita, as quais chamamos de dificuldades ao exercício
metalinguístico. Nesse período, a atenção do docente às curiosidades levantadas
pela criança sobre a formação silábica que foge ao padrão consoante + vogal (CV),
que são as sílabas canônicas, fará com que ela avance a uma escrita ortográfica.

102
TÓPICO 2 — TEORIA DA PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA

Dialogando com os estudos de Piaget, ao se deparar com palavras


formadas por sílabas não canônicas (consoante + consoante + vogal (CCV),
consoante + vogal + vogal (CVV), vogal + consoante (VC)), e ainda com palavras
mais complexas, como as que apresentam SS, RR, Ç, por exemplo, a criança passa,
então, pelo processo de desequilibração frente ao conhecimento anteriormente
acomodado. O conflito cognitivo desse momento é precioso para o aprendizado.
Cabe ao alfabetizador sensibilidade para valorizar e problematizar as hipóteses
que ela continuar a elaborar sobre a língua, especialmente despertá-la no
momento próprio para isso, para as irregularidades da escrita, caso ela ainda não
as perceba.

Novamente, Morais (2012) ilustra essa rica fase, apresentado dois


momentos de escrita da criança, no início e final do ano letivo, em que se
encontrava nas fases pré-silábica e alfabética:

UNI

Acadêmico, o vídeo a seguir ajuda a elucidar a compreensão das fases


silábica-alfabética e alfabética e oferece dicas valiosas de como mediar aprendizagem da
criança nesse nível. Ele compõe a série vídeos produzidos no contexto do Projeto Alfaletrar,
conduzido pela professora Magda Soares, no município de Lagoa Santa, em Minas Gerais.

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=3I37X9PhqSo

103
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

E
IMPORTANT

Sugestões práticas para mediação na fase silábica-alfabética e alfabética

Consideramos importante refletirmos que é apenas quando os alunos se tornam alfabéticos


que o trabalho de reflexão ortográfica deve começar. O trabalho ortográfico deve ser
percebido como um trabalho de reflexão, e não como um trabalho de memorização (neste
artigo, não nos deteremos nessa questão, pois ela será mais profundamente discutida no
módulo específico de ortografia), e a exploração deverá incidir sobre a escrita convencional,
de forma a levar os alunos a perceber que embora a escrita represente a fala, esta não é
uma transcrição direta dela.

Também consideramos importante salientar que este é o momento adequado para se


iniciar um trabalho com o traçado de letra cursiva, visto que nesta hipótese, as crianças já
não apresentam tantas dificuldades em decidir quantas e quais letras usar para escrever as
palavras.

As sugestões de atividades para ser realizadas tanto com os silábico-alfabéticos quanto


com os alfabéticos podem estar relacionadas a objetivos voltados para garantir maior
fluência de leitura e maior consolidação das correspondências grafofônicas, como, por
exemplo, a realização de cruzadinhas. Nessas atividades, a existência de “quadrinhos” a
serem completados leva o aluno a pensar em todas as correspondências necessárias para
se escrever uma palavra e, logo, a perceber que as letras são as unidades menores dentro
de uma sílaba, bem como o auxilia na reflexão ortográfica.

O trabalho com os nomes próprios e palavras estáveis deve continuar (sobretudo para
os silábicos-alfabéticos), mas dessa vez como um suporte de apoio à escrita de novas
palavras e de reflexão sobre as regularidades da língua portuguesa, como, por exemplo,
os nomes Oto e Horácio que começam com o mesmo som inicial, mas por convenção,
são grafados de forma diferente. Reflexões sobre letras que assumem sons diferentes em
função da disposição que ocupam na palavra (como é o caso do S inicial e o do S entre
vogais) e sobre a existência de sons que necessitarão, em algumas situações, de um grupo
de letras para representá-lo (como o som do X na palavra CHUVA) precisam ser realizadas
sistematicamente (COUTINHO, 2005, p. 62-63).

Acadêmico, esses dois vídeos oferecem estratégias para o seu trabalho com o aluno
silábico-alfabético e alfabético:

(1) https://www.youtube.com/watch?v=rKyWu2Lnkpc
(2) https://www.youtube.com/watch?v=8f02C7Ja4tU

Além, dessas dicas, a imagem é um ótimo exemplo de atividade a ser


trabalhada com a criança silábica-alfabética ou alfabética:

104
TÓPICO 2 — TEORIA DA PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA

FIGURA 8 – EXEMPLO DE ATIVIDADE PARA AS FASES SILÁBICA-ALFABÉTICA E ALFABÉTICA

FONTE: <https://bit.ly/3BceQtM>. Acesso em: 6 maio 2021.

Opondo-se aos conceitos empiristas dos métodos tradicionais de


alfabetização, que colocavam o aprendizado da língua escrita apenas como
fruto de atividades de fixação que relacionavam fonemas e grafemas, Ferreiro
e Teberosky demonstraram que ao aprender a ler e escrever alfabeticamente a
criança tem suas próprias ideias sobre essa prática e formulam hipóteses sobre
ela. Refletindo sobre essa concepção, Teberosky e Colomer (2003) elucidaram que:

• As crianças, antes de poderem ler e escrever sozinhas e


convencionalmente, formulam uma série de idéias próprias
ou hipóteses, atribuindo aos símbolos da escrita alfabética
significados bastante distintos dos que lhes transmitem os adultos
que as alfabetizam;
• As hipóteses elaboradas pela criança seguem uma ordem de
evolução em que, a princípio, não se estabelece uma relação
entre as formas gráficas da escrita e os significantes das palavras
(hipótese pré-silábica). Em seguida a criança constrói hipóteses
de fonetização da escrita, inicialmente, relacionando os símbolos
gráficos às sílabas orais das palavras (hipótese silábica) e
finalmente compreende que as letras representam unidades
menores que as sílabas: os fonemas da língua (hipótese alfabética).
Entre esses dois momentos, haveria um período de transição
(hipótese silábico-alfabética) (COUTINHO, 2005, p. 47).

Acadêmico, ao longo desse tópico demonstramos que a Teoria da


Psicogênese da Língua Escrita, tal como proposta por Ferreiro e Teberosky, não
se traduz em um método de alfabetização, mas sim, em elucidações sobre como
105
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

o alfabetizando pensa enquanto aprende a ler e a escrever: as hipóteses que ele


constrói sobre o funcionamento do sistema de escrita alfabético. O modo de
pensar desse aluno, em cada etapa do seu amadurecimento cognitivo e linguístico,
se traduz em fases, nomeadas pelas autoras de pré-silábica, silábica, silábica-
alfabética e alfabética. A compreensão delas dá ao alfabetizador pistas sobre
como mediar a aprendizagem da criança, com ações pautadas por clara intenção
pedagógica. Assim, o modo de escrita da criança não deve ser considerado como
errado, se ela ainda não escreve alfabeticamente. O "suposto erro" é um aspecto
rico do desenvolvimento e elucida seu modo de compreensão.

Além da faceta linguística da alfabetização (SOARES, 2004; SOARES,


2016), Ferreiro (1995) também coloca como indispensável ao aluno participar da
“cultura escrita”. Isso significa possibilitar ao educando o contato com diversos
tipos de textos e ensiná-lo a refletir sobre o papel da escrita na sociedade enquanto
ele vivencia o processo de ler e escrever. Esse pensamento dialoga com os estudos
da professora Magda Becker Soares, acerca do "Letramento". Já pontuamos
sobre o letramento ao longo dos tópicos anteriores e vocês conheceram um
pouco mais sobre o pensamento dessa pesquisadora por meio dos vídeos que
permearam a discussão sobre as fases de alfabetização, no tópico em questão.
Agora, discutiremos um pouco mais sobre os estudos de Magda Soares. Realize
as autoatividades e prossiga em seus estudos!

106
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• A teoria de Luria, sobre a pré-história da escrita, e os estudos de Emília


Ferreiro que versam sobre a psicogênese da língua escrita, possuem objetos
de estudos distintos e ambos contribuem para a compreensão docente sobre
como a criança constrói sua relação com a língua escrita e constrói hipóteses
sobre ela.

• As hipóteses que a criança elabora enquanto se alfabetiza não devem ser vistas
como erros, mas sim, rica demonstração de como ela apreende o sistema de
escrita alfabética

• As fases de alfabetização, tal como propostas pela Psicogênese da Língua


Escrita, fornecem pistas para que o professor realize a mediação da
aprendizagem, e não se constituem em métodos para se alfabetizar.

• As fases de alfabetização, demonstradas pela criança enquanto conhece o


sistema de escrita alfabética são: pré-silábica, silábica, silábica-alfabética,
alfabética.

• Além de ser exposta a um processo de ensino sistematizado dos aspectos


linguístico da alfabetização, é indispensável que concomitantemente a esse
processo, as ações pedagógicas também valorizem o letramento.

107
AUTOATIVIDADE

1 Segundo Ferreiro (1992, p.31), "não se aprende um fonema, nem uma sílaba,
nem uma palavra por vez, também a aprendizagem da língua escrita não é
um processo cumulativo simples, unidade por unidade, mas organização,
desestruturação e reestruturação contínua". Sobre a teoria da psicogênese
da língua escrita afirma-se:

I- Constitui-se no método construtivista de alfabetização.


II- Resulta de pesquisas científica sobre os processos cognitivos vivenciados
pelo alfabetizando enquanto aprende a ler e a escrever.
III- A criança, ao escrever da forma que acredita ser o certo, ela está
demonstrando sua concepção de escrita, o que oferece pistas valiosas que
podem orientar a prática docente.
IV- A fonetização da escrita se inicia no período silábico e culmina no
alfabético.

Estão corretas as afirmações:

a) ( ) I e II.
b) ( ) II e III somente.
c) ( ) II, III e IV.
d) ( ) I, III e IV.

2 Considerando o erro como parte rica e significativa da aprendizagem, tendo


como base o estudo piagetiano do desenvolvimento cognitivo, Ferreiro e
Teberosky (1979) propõem cinco fases pelas quais as crianças passam ao
aprender a ler e a escrever. São fases vivenciadas pelo alfabetizando, na
sequência em que aparecem:

a) ( ) Pré-escrita; silábica; silábica-alfabética; alfabética.


b) ( ) Pré-silábica; silábica; escrita fonética; escrita alfabética.
c) ( ) Silábica; silábica-alfabética; alfabética; escrita instrumental.
d) ( ) Pré-silábica; silábica; silábica-alfabética; alfabética.

3 Na fase __________ a criança reconhece que cada som é representado por


uma letra e que uma combinação de letras forma sílabas, as quais são
partes de uma palavra. A construção de formas de diferenciação na escrita
requer da criança um grande esforço intelectual. O conceito que completa
corretamente a frase, de acordo com o pensamento de Ferreiro e Teberosky
(1979) é:

a) ( ) Pré-silábica
b) ( ) Silábica
c) ( ) Silábica-alfabética
d) ( ) Alfabética
108
4 Acerca de dos estudos de Alexander Luria e Emília Ferreiro, Azenha (1996,
p. 19) considera que " a existência de um percurso prévio à escolarização é o
que define uma pré-história em relação à aprendizagem escolar da escrita.
Essa contribuição dos dois autores é revolucionária em relação ao ensino
da escrita [...]". Diferencie os estudos dos dois autores dentro do tema
aprendizagem da língua escrita:

5 Explique porque Ferreiro considera a escrita como um sistema de


representação da linguagem e não um código gráfico:

109
110
UNIDADE 2
TÓPICO 3 —

ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO -
PROCESSOS INDISSOCIÁVEIS

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, ao longo dos milhares de anos de sua história o homem tem
criado invenções que vêm transformando significativamente sua maneira de
viver no decorrer das eras. Contudo, nenhuma delas modificou mais sua forma
de comunicar, de registrar e compartilhar conhecimento do que a invenção da
escrita.

Com a evolução dos códigos escritos e as transformações sociais, a escrita


assumiu uma centralidade nas relações estabelecidas nas sociedades letradas. Isso
trouxe implicações culturais e econômicas infundindo nos mecanismos sociais, que
acabaram por se constituir relações de poder, de dominação, de marginalização e
de discriminação. Sendo assim, seguindo o pensamento da pedagogia progressista
libertadora, tendo Paulo Freire como seu principal representante, compreende-se
que mais do que saber ler e escrever, é necessário que o aluno saiba fazer uso da
leitura e da escrita na sociedade, de modo a transformar as condições impostas
pela desigualdade social.

Defensora das ideias de Paulo Freire, na década de 1980, por meio das
pesquisas de Magda Becker Soares a comunidade acadêmica e docente brasileira
começou a debater o conceito de letramento e suas implicações no ensino e na
aprendizagem da língua escrita. Acadêmico, chamamos sua atenção para a
enorme riqueza e relevância dessa faceta da alfabetização, que abrange questões
sociais e interativas.

DICAS

Assista a discussão feita por Magda Soares, em julho de 2021, acerca do


pensamento de Paulo Freire e o diálogo de suas ideias com a concepção de letramento,
embora esse conceito ainda nem existisse quando esse educador trabalhou pela educação
brasileira.

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=8X3t2G9AjqI

111
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

2 COMPREENDENDO O CONCEITO DE LETRAMENTO: A


FACETA SOCIAL E INTERATIVA DA ALFABETIZAÇÃO
Magda Soares, professora emérita da Faculdade de Educação da UFMG e
fundadora do centro do centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (CEALE), trouxe
para os estudos de alfabetização no Brasil o conceito letramento. Atualmente, o
termo letramento já é bastante conhecido e difundido nas várias pesquisas de
alfabetização, problematizado na formação de professores e praticado por muitos
alfabetizadores do país.

A expressão se refere ao uso social da leitura e da escrita. Implícita nesse


conceito está a ideia de que o domínio e uso da língua escrita trazem
consequências sociais, culturais, políticas, econômicas, cognitivas
e linguísticas. O motivo da palavra letramento estar presente nas
discussões pedagógicas vem ao encontro das exigências da sociedade
contemporânea: a formação de um cidadão crítico e reflexivo, capaz de
atuar na sociedade de maneira articulada e consciente. A diversidade
cultural dentro das escolas e a convivência com a pluralidade de ideias
exigiram das instituições educativas brasileiras uma organização mais
flexível, com a oferta de ensino mais significativo para os educandos,
a fim de atender a essa nova configuração social (ALVES et al. 2007,
p.12).

Soares (2000) distingue alfabetização de letramento e defende a


coexistência dos dois. Para essa autora, a alfabetização, acontece nos primeiros
anos de escolarização e consiste em ensinar o aluno os aspectos linguísticos do
ler e o escrever. Já o letramento é o ato de usar a habilidade de escrever e ler nos
diferentes contextos sociais, de modo crítico e ativo.

A autora acredita que a criança começa a "letrar-se" a partir do momento


em que nasce numa sociedade letrada, ou seja, “este processo se estende por
todos os anos de escolaridade e, mais que isso, por toda a vida. O letramento é um
processo que permeia todos os anos de escolarização. Ele se amplia e se aprofunda
de acordo com as práticas sociais vivenciada pelos estudantes e se aprofunda com
o amadurecimento das funções cognitivas. Na verdade, ele não é inerente apenas
ao espaço escolar. Assim, o processo de escolarização é, fundamentalmente, um
processo de letramento” (p. 1). A autora defende ainda que a alfabetização, sem o
letramento é pouco produtiva:

A alfabetização, como processo de aquisição do sistema convencional


de uma escrita alfabética e ortográfica, foi, assim, de certa forma
obscurecida pelo letramento, porque este acabou por frequentemente
prevalecer sobre aquela, que, como consequência, perde sua
especificidade (SOARES, 2003, p. 1).

A alfabetização para acontecer de forma efetiva deve estar associada


ao letramento, pois este não possui significado sozinho. O alfabetizar-letrando
consiste tanto na aquisição das técnicas e construção do código da escrita como
as habilidades de como pegar num lápis, separar as sílabas no caderno, distribuir
de forma harmônica e organizada o conteúdo aprendido em sala de aula, como
também consiste em conhecer a função social que esta escrita proporciona.
112
TÓPICO 3 — ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO - PROCESSOS INDISSOCIÁVEIS

Alfabetização é o processo pelo qual se adquire o domínio de um


código e das habilidades de utilizá-lo para ler e escrever, ou seja: o
domínio da tecnologia – do conjunto de técnicas – para exercer a arte
e ciência da escrita. Ao exercício efetivo e competente da tecnologia
da escrita denomina-se Letramento que implica habilidades várias, tais
como: capacidade de ler ou escrever para atingir diferentes objetivos
(SOARES, 1998, p. 47).

Percebe-se que Magda Soares (1998) extrapola os aspectos técnicos e


instrumentais do ensino da língua e atribui um significativo valor à dimensão
qualitativa desse processo. Acredita-se que somente por meio desse trabalho
a qualidade de ensino chegará às camadas menos favorecidas da sociedade
e então se terá avanço no sistema educacional brasileiro. Soares (2003) ainda
enfatiza: “não só o processo de alfabetização, embora distinto e específico, altera-
se e reconfigura-se no quadro do conceito de letramento, como também este é
dependente daquele” (p.90). Apesar desse embate conceitual sobre a coexistência
dos termos alfabetização e letramento para definir o processo de aquisição
da leitura e da escrita, o que se sabe hoje é que a compreensão do que seja o
letramento tem reorientado o trabalho de muitos dos professores alfabetizadores.

Sobre alfabetização e letramento, Tfouni (1995, p. 20) comenta: “enquanto


a alfabetização se ocupa da aquisição da escrita por um indivíduo, ou grupos
de indivíduos, o letramento focaliza os aspectos sócio-históricos da aquisição
de uma sociedade". Essa compreensão destaca a dupla responsabilidade das
professoras alfabetizadoras. Algumas docentes já assimilaram que um processo
de alfabetização proveitoso não implica somente ensinar ao educando as técnicas
de decodificação e codificação dos signos alfabéticos, mas que é fundamental
levá-lo à compreensão da função social da leitura e da escrita e de como fazer uso
dessa tecnologia na sociedade.

O ideal, segundo Soares (1998, p. 47), é “alfabetizar letrando” ou seja,


ensinar o aluno a ler e a escrever contextualizando com as práticas sociais da
leitura e da escrita, buscando que este seja ao mesmo tempo, alfabetizado e
letrado. Tal relação pode ser comparada ao que Freire (1989) disse em relação ao
ato de ler:

Me parece indispensável, ao procurar falar de tal importância, dizer


algo do momento mesmo em que me preparava para aqui estar hoje;
dizer algo do processo em que me inseri enquanto ia escrevendo este
texto que agora leio, processo que envolvia uma compreensão crítica
do ato de ler, que não se esgota na decodificação pura da palavra escrita
ou da linguagem escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência
do mundo. A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que
a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da
leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente.
A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica
a percepção das relações entre o texto e o contexto (FREIRE, 1989, on-
line).

O esquema abaixo citado por Colello (2003) demonstra de forma clara a


prática de alfabetizar letrando:
113
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

FIGURA 9 – PRÁTICA DE ALFABETIZAR LETRANDO

FONTE: Coello (2003, p. 6)

Ensinar a criança a ler e a escrever sem, contudo, tornar essa prática


mecânica e separada de suas funções sociais é um trabalho que requer do docente
muito esforço e empenho. Essa prática espelha a compreensão de alfabetização
e letramento são processo indissociáveis, sendo o letramento, conforme SOARES
(2016), a representação das facetas sociais e interacionista da alfabetização.

DICAS

Indicamos que você assista a palestra dada pela professora Magda Soares,
no ano de 1997, quando o conceito de letramento começava a ser compreendido nas
universidades brasileiras. Você verá como esse movimento começou e desenvolverá uma
visão holística das implicações desse entendimento que se estende aos dias atuais de nossa
formação e alfabetização dos estudantes do país.

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=o-JTrrVgdlw

3 A FACETA LINGUÍSTICA DA ALFABETIZAÇÃO: O


DESENVOLVIMENTO DA CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA
A escrita representa visualmente os sons que formam a cadeia sonora da
fala. Compreender o sistema que nota as relações entre os fonemas e os grafemas
é o que Soares (2016; 2004) explicita como a faceta linguística da alfabetização. "Essa
capacidade de focalizar os sons da fala, dissociando-as de seu significado, e de
segmentar as palavras que as constituem caracteriza a consciência fonológica"
(SOARES, 2016, p. 166).

114
TÓPICO 3 — ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO - PROCESSOS INDISSOCIÁVEIS

NOTA

Atenção para esses conceitos, cuja compreensão torna-se fundamental


para o ensino da língua escrita:

Letras: os sinais gráficos da língua. Na Língua Portuguesa, o sinal (letra) h, isoladamente


não possui som.
Fonema: o som que cada letra representa; A unidade sonora da fala; Eles formam as
sílabas e podem ser vogais ou consoantes.
Grafema: a representação gráfica dos sons. Diferentes letras podem representar um
mesmo grafema, como exemplo, o "x" e o "ch".
Analise a palavra cachinhos - ela possui 9 letras, 7 fonemas, 7 grafemas.
Em outro exemplo, analise a palavra quisesse: ela possui 8 letras, 6 fonemas e 6 grafemas

Partindo da compreensão desses termos, "aprender a escrita alfabética


é, fundamentalmente, um processo de converter sons da fala em letras, ou
combinação de letras – escrita –, ou converter letras ou combinação de letras em
sons da fala – leitura." (SOARES, 2016, p. 46). Esse duplo processo de conversão,
sons em letras, letras em sons, é culturalmente construído. Além de Magda
Soares, pesquisadores como Morais (2012), Morais, Albuquerque e Leal (2005)
e Ferreiro (1985), qualificam o sistema de escrita alfabética como um sistema de
representação e um sistema notacional. Não como um código a ser decifrado.

O termo sistema de representação se explica porque, considerando que a


relação da criança com a escrita se inicia antes da escolarização formal, ela já
começa a representar, de forma inventada, a linguagem escrita, como vimos
também nos estudos de Alexander Luria.

Conceber a escrita alfabética como um sistema notacional significa que ela


é uma representação externa, um registro, feito a partir de um conjunto limitado
de elementos, de símbolos, cada um com sua forma, especificamente nomeado,
com significado, numa superfície material (MORAIS, 2012).

Em meados da década de 1990, nos Estados Unidos, iniciou-se a intensa
discussão a respeito sobre o ensino e a aprendizagem da escrita no ambiente
escolar. O contraponto se deu entre a visão holística (wholelanguage) do ensino,
e a concepção grafofônica (phonics). Esse debate foi semelhante ao ocorrido no
Brasil, na mesma época, quando o dualismo entre os métodos sintéticos e analíticos
foi acrescido da concepção construtivista. Sobre isso, Soares (2004) expõe:

O que é preciso reconhecer é que o antagonismo, que gera radicalismos, é


mais político que propriamente conceitual, pois é óbvio que tanto a wholelanguage,
nos Estados Unidos, quanto o chamado construtivismo, no Brasil, consideram a
aprendizagem das relações grafofônicas como parte integrante da aprendizagem

115
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

da língua escrita – ocorreria a alguém a possibilidade de se ter acesso à cultura


escrita sem a aprendizagem das relações entre o sistema fonológico e o sistema
alfabético? (SOARES, 2004, p. 14).

O questionamento da pesquisadora é muito pertinente para nosso tempo,


quando vivenciamos uma forte defesa do método fônico como sendo a solução
para os problemas de alfabetização no Brasil. Você deve se lembrar, acadêmico,
que, ao estudarmos os métodos históricos de alfabetização, na unidade 1,
compreendemos que cada método tem aspectos positivos e negativos no que tange
à contribuição que traz ao processo de aprendizagem da língua escrita. Portanto,
a grande questão não é o método aplicado pelo alfabetizador, de modo isolado,
mas a sua expertise profissional ao identificar a necessidade de aprendizagem da
criança e agir com uma intenção pedagógica clara ao mediar o processo. Nesse
sentido, observar as fases galgadas pelo alfabetizando enquanto constrói hipóteses
sobre o sistema de escrita, tal como Ferreiro e Teberosky (1979) demonstraram
na teoria da psicogênese da língua escrita, tem um valor singular. Entretanto,
para além do espaço escolar, a realidade socioeconômica e cultural constitui-se
dimensões com grande implicância do processo de alfabetização. Assim, deve
ter o cuidado para não incorremos no erro de conclusões tão simplistas quanto a
escolha de um método para se alfabetizar.

Sobre o contraponto vivenciado nos Estudos Unidos, no Brasil e também


em países europeus, pesquisas apontaram que a alfabetização é processo
abrangente e multifacetado do que apenas dominar um código grafofônico
(SOARES, 2004). O ensino sistematizado da língua escrita é indispensável para
que a criança se alfabetize, o que não exclui a faceta do letramento.

Dissociar alfabetização e letramento é um equívoco porque, no quadro das atuais


concepções psicológicas, linguísticas e psicolinguísticas de leitura e escrita, a entrada da
criança (e também do adulto analfabeto) no mundo da escrita ocorre simultaneamente
por esses dois processos: pela aquisição do sistema convencional de escrita – a alfabetização
– e pelo desenvolvimento de habilidades de uso desse sistema em atividades de leitura e
escrita, nas práticas sociais que envolvem a língua escrita – o letramento. Não são processos
independentes, mas interdependentes, e indissociáveis: a alfabetização desenvolve-se no
contexto de e por meio de práticas sociais de leitura e de escrita, isto é, através de atividades
de letramento, e este, por sua vez, só se pode desenvolver no contexto da e por meio da
aprendizagem das relações fonema-grafema, isto é, em dependência da alfabetização
(SOARES, 2004, p. 14).

Isso posto, ressaltamos as palavras de Soares (2016, p. 12, grifo da


autora): "em lugar de método de alfabetização, alfabetização com método". E nesse
caminho, o que se destaca como o caminho da compreensão do sistema de escrita
é o desenvolvimento da consciência fonológica, que se ramifica em consciência
silábica, consciência fonêmica, resultando na correspondência grafo-fonêmica.

116
TÓPICO 3 — ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO - PROCESSOS INDISSOCIÁVEIS

UNI

CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA

Autora: Thaïs Cristófaro Alves da Silva


Universidade Federal de Minas Gerais-UFMG / Faculdade de Letras

Consciência fonológica e consciência fonêmica são termos relacionados ao conheci-


mento que os falantes têm da organização da sonoridade. Podemos dizer que a sono-
ridade da fala é expressa nas palavras que pronunciamos. Toda palavra é formada por
sílabas, e as sílabas são formadas por sons. Uma pergunta importante para compreender
os conceitos de consciência fonológica e consciência fonêmica é: os falantes sabem, ou
têm consciência, sobre a organização da sonoridade? Há evidências de que os falantes
são, de fato, capazes de identificar sons individuais nas palavras e de que tal tarefa esteja
relacionada a treinamento específico de leitura e escrita na escola. A habilidade de identi-
ficar e manipular sons individuais é denominada consciência fonêmica. Ou seja, o falante
é capaz de identificar que a diferença entre as palavras faca e vaca está no som inicial que
é /f/ em faca e /v/ em vaca, bem como é capaz de identificar e manipular os demais sons
dessas palavras. Entretanto, além de identificar sons individuais, um falante é capaz de
separar palavras em sílabas, perceber o tamanho de uma palavra em relação a outra, iden-
tificar semelhanças sonoras entre palavras ou parte das palavras e é também capaz de seg-
mentar e manipular sílabas e sons (rimar ou substituir sons específicos). O conjunto dessas
habilidades é denominado consciência fonológica. Ou seja, o falante tem consciência de
que as palavras faca e vaca têm duas sílabas e de que a palavra lavada tem três sílabas. O
falante tem consciência de que todas as sílabas das palavras apresentadas são formadas
por (consoante + vogal) e de que na palavra vasta a primeira sílaba é formada por (con-
soante + vogal + consoante). O falante é capaz de identificar que as palavras faz e traz ri-
mam devido à sua porção final.

Podemos dizer que o conceito de consciência fonológica é mais abrangente do que o


de consciência fonêmica. Enquanto a consciência fonêmica diz respeito à habilidade de
conscientemente manipular sons individuais ou fonemas que compõem uma palavra,
a consciência fonológica diz respeito à habilidade de conscientemente manipular não
apenas os sons individuais, mas também as sílabas, as partes das sílabas (rimar) e as pa-
lavras. Vários estudos demonstraram a importância do desenvolvimento da consciência
fonológica para a aquisição da leitura e escrita e mostram que atrasos nesse processo de
aquisição estão relacionados a lacunas no desenvolvimento da consciência fonológica.
Portanto, o desenvolvimento da consciência fonológica favorece a generalização e a me-
morização das relações entre as letras e os sons.

FONTE: https://bit.ly/3lbDYvc.

Essa compreensão leva à criança a construção da correspondência grafo-


fonêmica:

117
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

E
IMPORTANT

CORRESPONDÊNCIA GRAFOFONÊMICA

Autor: Thaïs Cristófaro Alves da Silva


Universidade Federal de Minas Gerais-UFMG / Faculdade de Letras

Correspondência grafofonêmica ou correspondência grafofônica define as relações de


correspondência entre letras (grafemas) e sons. Os sons ocorrem na modalidade oral da
linguagem. As letras ocorrem na modalidade escrita da linguagem. Para decodificar o
texto escrito em sons, devem ser utilizadas as correspondências grafofonêmicas ou gra-
fofônicas. As correspondências letra-som podem ser de vários tipos. Algumas letras ou
sequências de letras sistematicamente correspondem a um único som. É o caso da letra
‘p’, que é sempre pronunciada como /p/ em, por exemplo, palavras como paz, capa, ou
o caso das letras ‘ss’, que correspondem sempre ao som /s/ como, por exemplo, nas pa-
lavras massa, osso. Mas, há casos em que uma letra corresponde a mais de um som. Por
exemplo, a letra ‘c’ tem o som de /s/ na palavra cena e tem o som de /k/ na palavra casa.
Nesse caso a ocorrência do som /s/ ou do som /k/ é previsível: a letra ‘c’ corresponderá ao
som /s/ quando for seguida de uma das letras ‘i,e’ e corresponderá ao som /k/ nos demais
casos. No caso da letra ‘c’ a correspondência grafofonêmica é previsível pelo contexto em
que a letra se encontra: nesse caso a vogal seguinte deve ser ‘i’ ou ‘e’. O contexto pode
também ser previsível pela ocorrência da letra em uma posição da palavra. Esse é o caso
da letra ‘l’ que tem o som de /u/ em final de sílaba em palavras como Brasil ou volta e que
tem o som de /l/ nos demais contextos. No caso da letra ‘l’, a correspondência grafofonê-
mica é previsível pela posição da letra na palavra.
Ocorrem casos em que uma letra não corresponde a qualquer som, como no caso da
letra ‘h’ que não é pronunciada em palavras como hoje, herói, hino. Há também casos em
que a correspondência grafofonêmica é imprevisível. É o caso da letra ‘x’ quando ocorre
entre vogais: caixa, próximo, táxi, exemplo. Na palavra caixa, o som de ‘x’ é /∫/, em próxi-
mo é /s/, em táxi é /ks/ e em exemplo é /z/. Ou seja, quando a letra ‘x’ ocorre entre vogais,
ela pode ser pronunciada como /∫, s, ks, z/. Contudo, se a letra ‘x’ ocorrer em um contexto
que não seja entre vogais, há previsibilidade da correspondência grafofonêmica: em início
de palavra, corresponde ao som de /∫/, como em xarope; em final de palavra, corresponde
aos sons /ks/, como em Rex; e antes de consoante, tem som de /s/, como em expirar.
É desejável que se domine o conteúdo básico das disciplinas Fonética e Fonologia para
compreender a natureza dos sons e suas distribuições, avaliando quais são as relações
estabelecidas entre grafemas e sons.

FONTE: https://bit.ly/3mj5MNo.

Acadêmico, como futuro alfabetizador, é muito importante que você


compreenda os conceitos aqui apresentados, reconhecendo-os como importantes
para que as crianças avancem nas fases de alfabetização, como propõem Ferreiro e
Teberosky (1979). Tal entendimento norteará sua prática pedagógica, tornando-a
esclarecida, pautada em estudos científicos que consideram a alfabetização
um processo complexo, com múltiplas dimensões, e que se materializa ações

118
TÓPICO 3 — ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO - PROCESSOS INDISSOCIÁVEIS

lúcidas. Isso tornará o espaço da sala de aula um ambiente alfabetizador


significativo e produtivo para a criança, capaz de minimizar, no que diz respeito
à responsabilidade da escola, os efeitos da desigualdade social no alfabetismo
brasileiro.

Nesta unidade propomos duas leituras complementares. Elas trazem uma


série se sugestões de atividades que você pode aplicar na sala de aula, no caminho
do desenvolvimento da consciência fonológica. Leia. Reflita. Pratique!

119
UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

LEITURA COMPLEMENTAR 1

COMO INTRODUZIR, NA SISTEMÁTICA DE ENSINO DA ESCRITA


ALFABÉTICA, ATIVIDADES QUE AJUDEM OS ALUNOS A AVANÇAREM
SUAS HABILIDADES DE REFLEXÃO FONOLÓGICA?

Artur Gomes de Morais


Tânia Maria Rios Leite

O texto abaixo, extraído de um registro da professora Rosângela Santos,


que regia uma turma de 29alunos na rede pública municipal de Recife, pode nos
ajudar a refletir sobre como, na escola, podemos promover a capacidade dos
alunos de refletir sobre as palavras como sequências sonoras.

A rima foi uma forma divertida e prazerosa que encontrei para trabalhar a
escrita, leitura e reflexão de palavras (som inicial/final/medial). Isto nos permitiu
criar e recriar textos, tais como o trabalho com o poema Perguntas e respostas
cretinas, de Elias José, em que produzimos, coletivamente, um outro poema,
baseado naquele, só que utilizando os nomes dos colegas da sala.

Primeiramente foi apresentado o texto para as crianças sem um cartaz.


Fizemos a leitura do mesmo e nos divertimos muito com o poema. Deixei o cartaz
afixado na sala e logo observei algumas crianças fazendo a pseudoleituras do
mesmo. Sugeri então à turma que pensassem em palavras que rimassem com
seu próprio nome e/ou dos colegas da sala. Fui escrevendo no quadro uma lista
de nomes e, à medida em que encontrávamos uma rima, escrevia junto do nome,
como por exemplo:

RAQUEL JAQUELINE
PASTEL BIQUINE

RITA TACIANA
FITA BANANA

Depois, levantei uma proposta: “Que tal criarmos um outro poema com
os nossos nomes?”. Todos concordaram. Então iniciei, escrevendo no quadro:
“Você conhece a Taciana?” Eles concluíram: “Aquela que comeu banana?”

Eles ditavam e eu escrevia no quadro, sempre buscando fazer a reflexão.


“Como eu escrevo a palavra banana?” “Com qual sílaba começa?”, “Termina
com que sílaba?”, “Qual é a sílaba do meio?”, “Com quantas letras eu escrevo a
palavra banana?”, “Quantas vezes eu abro a boca para falar banana?” “E que letra
eu vou botar primeiro?”.

120
TÓPICO 3 — ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO - PROCESSOS INDISSOCIÁVEIS

Eles achavam o máximo quando eu dizia que eles tinham que ensinar a
escrever as palavras. Eu pedia então que fossem me dizendo as letras com que eu
devia escrever aquelas palavras, que eles tinham descoberto como rimas de seus
nomes.

Não fiz isso com todas as palavras do texto, mas só com as que rimavam,
para que a atividade não ficasse cansativa e acabasse se tornando desestimulante.

Esta atividade foi muito prazerosa para a turma e até hoje eles brincam na
hora que faço a chamada.
...

Outras atividades semelhantes foram feitas quando trabalhei textos que


as crianças já sabiam de cor, tais como: cantigas de roda, parlendas, trava-línguas
e poemas. Percebi que eles tinham mais autonomia, mesmo aqueles que não
escreviam convencionalmente.

As atividades de completar os poemas, buscando as palavras que rimam; a


montagem de uma parlenda ou poema conhecido, em que as crianças montavam
o texto em dupla, ajudaram bastante a que avançassem na alfabetização. Vemos,
nesse relato, vários pontos de partida para nossa discussão sobre como promover,
na escola, o desenvolvimento das habilidades metafonológicas de nossos alunos.

Cabe observar, de início, que, numa mesma aula, a professora conciliou a


prática de leitura de um poema, produzido por um escritor de literatura infantil
que hoje é prestigiado em nosso país, com atividades voltadas à apropriação
do SEA. Depois de lerem e desfrutarem do poema em sua dimensão textual,
voltaram os olhos para algumas palavras do texto e refletiram muito sobre elas. É
importante ver, por outro lado, que a reescrita do poema constituiu uma prática
de produção textual que a turma viveu, tendo por referência um bom modelo do
gênero poema.

Como expressa em seu relato, ao enfocar as rimas, a mestra teve o cuidado


de não trabalhar com todas e quaisquer palavras do texto, mas só com aquelas
que mais se prestariam à tarefa que propunha à turma. Num contexto lúdico,
os alunos passaram então a pensar sobreas partes sonoras finais de seus nomes
próprios e, ao dizer palavras que com eles rimavam, Rosângela os registrava no
quadro com letra de imprensa.

Queremos enfatizar o papel fundamental desse primeiro registro escrito.


Ao verem pareadas palavras como TACIANA e BANANA, ou RITA e FITA, os
aprendizes, que estavam pensando sobre palavras que tinham sons parecidos
no final, beneficiavam-se da notação escrita para refletir sobre a relação entre
partes faladas e partes escritas no sistema de escrita alfabético. Além de se darem
conta de que palavras orais diferentes compartilham pedaços sonoros iguais,
eles podiam ver os pedaços semelhantes e diferentes em suas formas escritas.
Como defende Ferreiro (2003), acreditamos que o fato de a escrita transformar as

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UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

palavras orais em objetos, estáveis, opacos, para os quais podemos dirigir nossa
reflexão “sem que desapareçam”, é fator primordial para que possamos começar
a observar a dimensão sonora delas (tamanho, características sonoras etc.).

Na atividade há pouco descrita, a materialidade da notação escrita era


amplificada pelo fato de se estar usando letras de imprensa. Como uma letra
aparecia separada da outra, isso permitia aos aprendizes refletir mais sobre a
quantidade de unidades (letras), sua ordem, suas diferenças e semelhanças...
enquanto estavam pensando nos “pedaços sonoros”.

Esta reflexão é também potencializada quando usamos letras móveis: ao


montar e desmontar palavras, com cartelas que continham as letras do alfabeto,
os aprendizes vivem de forma ainda mais explícita uma série de propriedades do
sistema alfabético: a identidade das letras, sua ordem, as combinações e posições
que podem assumir, a quantidade de letras das palavras, entre outras.

Esse tipo de reflexão foi feito, de outra forma, quando a professora


Rosângela pedia aos alunos que fossem ditando (“lhe ensinando”) a escrever as
palavras. Se para responder àquele desafio os alunos eram chamados a observar
as propriedades do SEA que acabamos de mencionar, ela aproveitava a situação
para levá-los a refletir sobre várias características sonoras das palavras em pauta.
Assim, os alunos eram chamados a ver que os nomes próprios e suas rimas
tinham diferentes segmentos orais (sílabas), que ocupavam diferentes posições,
que palavras diferentes têm diferentes números de sílabas, que o número de
letras é maior que o de sílabas, etc.

É claro que, noutras aulas, tudo isso era feito com outras palavras que
não eram os nomes das crianças. Embora não tenha se alongado na parte final de
seu relato, a professora mencionou a realização de várias atividades semelhantes,
usando parlendas, cantigas de roda, trava-línguas, etc.

Na mesma linha de justificativas que vimos apresentando, cremos que


esses textos curtos se prestam especialmente para a promoção das habilidades
de reflexão fonológica dentro das situações de ensino voltadas à apropriação do
sistema alfabético. É pena que os livros didáticos e as práticas de sala de aula que
temos pesquisado (MORAIS, ALBUQUERQUE, FERREIRA; SILVA, 2005) nem
sempre tenham explorado mais adequadamente tais gêneros textuais para aquela
finalidade. Por que dizemos isso?

Por serem textos curtos, que as crianças facilmente memorizam ou já


sabem de cor, eles permitem focalizar a atenção na notação escrita, enquanto
se reflete sobre as palavras orais e seus segmentos. Desse modo, torna-se mais
evidente constatar que as palavras que se repetem, quando falamos a parlenda,
a cantiga de roda, etc., se escrevem de forma idêntica. Torna-se também mais
observável que as palavras que rimam tendem a ter letras finais idênticas. Ou
que as palavras que nos fazem “tropeçar” num trava-línguas tendem a ter sons e
letras semelhantes no começo ou no meio.

122
TÓPICO 3 — ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO - PROCESSOS INDISSOCIÁVEIS

Este é outro ponto que cabe acrescentar: a importância de refletir


com os alunos sobre palavras que são parecidas, porque têm sons idênticos
no começo (ou no meio), o que tecnicamente é chamado de aliteração. Para as
crianças brasileiras, tendem a ser mais perceptíveis as aliterações no começo de
palavras que em posição medial, ou mesmo que as rimas. Desse modo, parece
bastante útil “brincar” coma produção oral de palavras que começam com sons
semelhantes (ao mesmo tempo em que se vê suas formas escritas e se discutem
suas características).

Ao começarmos a comentar o relato da professora Rosângela, valorizamos


o fato de ela ter desenvolvido as atividades que envolvem reflexão metafonológica,
partindo de um texto real. Mas entendemos que nem sempre tem que ser assim.
Defendemos que é adequado e possível desafiar os alunos a refletir sobre
palavras não extraídas necessariamente de um texto, desde que elas sejam por
eles conhecidas e que o sentido da reflexão esteja voltado ao aprendizado das
propriedades do sistema alfabético.

Isso pode ser sempre feito de forma prazerosa, assumindo inclusive a


modalidade de jogos (a esse respeito ver o capítulo 6, nesta coletânea). Brincando
com dominós, jogo do mico ou outras variantes especialmente confeccionadas para
desenvolver a reflexão fonológica, nossos alunos poderão estar, simultaneamente,
classificando gravuras cujos nomes compartilham propriedades seja quanto à
semelhança sonora (porque rimam, porque começam parecido), seja quanto à
quantidade de sílabas ou letras

Concluindo...

Dissemos, no início deste capítulo, que, para alcançar hipóteses silábicas,


silábico-alfabéticas e alfabéticas de escrita, os aprendizes precisarão pensar
na sequência de partes sonoras das palavras (e não só em seus significados).
Concebendo que a escrita alfabética é uma invenção cultural e que a escola
pode ajudar o aluno a descobrir suas propriedades, defendemos um trabalho
pedagógico em que professore aluno participem sistematicamente de momentos
de reflexão fonológica. Se o desenvolvimento de habilidades metafonológicas é
uma condição para o aprendiz se apropriar do SEA, não vemos por que deixá-lo
viver, solitariamente, esse tipo de relação com as palavras.

FONTE: MORAIS, A. G; LEITE, T. M. R. Como introduzir, na sistemática de ensino da escrita alfa-


bética, atividades que ajudem os alunos a avançarem suas habilidades de reflexão fonológica?
In: MORAIS, A. G; ALBUQUERQUE, E. B. C; LEAL, T.F. Alfabetização: apropriação do sistema de
escrita alfabética. Belo Horizonte: Autêntica, 2005, p. 83-88.

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UNIDADE 2 — A CIÊNCIA DA ALFABETIZAÇÃO: ASPECTOS COGNITIVOS, PEDAGÓGICOS E SOCIOCULTURAIS

LEITURA COMPLEMENTAR 2

FAZENDO ACONTECER: O ENSINO DA ESCRITA ALFABÉTICA NA


ESCOLA

Telma Ferraz Leal


[...]
Situações didáticas em grande grupo

As situações em que o(a) professor(a) rege todo o grupo classe, realizando


uma única atividade, são variadas e podem ter múltiplas finalidades. Muitas
vezes, o(a) professor(a) quer que, naquele momento, todos os alunos desenvolvam
determinados conhecimentos ou capacidades. Por exemplo, ao realizar uma
atividade de revisão coletiva de um texto, ele(a) pode ter como objetivo didático
que os alunos desenvolvam atitudes de revisão; que desenvolvam estratégias
apropriadas, como a de voltar continuamente ao já escrito para dar continuidade
ao texto, planejando o trecho a seguir; que aprendam sobre características de
determinado gênero textual; que aprendam a pontuar um texto; que aprendam a
usar articuladores textuais, deixando os textos mais coesos; dentre outros.

Outras vezes, embora o(a) professor(a) esteja realizando uma atividade


única com o grande grupo, ele(a) tem clareza deque os alunos estão aprendendo
“coisas” diferentes naquela atividade. Por exemplo, quando temos um grupo
heterogêneo quanto aos conhecimentos sobre a escrita alfabética, as atividades
levam os alunos a apreender diferentes princípios do sistema, dependendo do
que eles já sabem e dos conflitos que estão vivenciando.

Uma atividade de reflexão fonológica pode, para alguns alunos, ajudá-los


a entender que a escrita tem propriedades do significante(palavra) e não do objeto
representado; para outros, pode servir para ajudá-los a superar dificuldades
ortográficas de trocas entre pares mínimos (p/b, t/d, f/v); para outros, pode servir
para que percebam que existe uma unidade sonora menor que a sílaba(fonema) e
que possam identificá-la; para outros, pode servir para ajudá-los a se apropriarem
de correspondências grafofônicas.

A professora Emilene do Carmo Silva, do Pré II, da Escola Isaac Pereira,


em Olinda-PE, mostrou-nos como realizou esse tipo de intervenção com seus 20
alunos de 5 e 6 anos.

Foi apresentada uma caixa fechada:

– O que é que tem dentro da caixa? (havia uma boneca) Cada aluno tentou
adivinhar e depois foi dito para cada um olhar e não dizer, nem mostrar para o
coleguinha. Depois, disseram e descreveram a boneca.

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A palavra BONECA foi escrita no quadro e foram feitas perguntas:

– Quantos pedacinhos a palavra BONECA tem? Conte com palmas.

Os alunos, então, tiveram que montar a palavra, juntando os pedacinhos


que estavam divididos em sílabas (fichinhas comas três sílabas). Depois, foi
solicitado que eles formassem novas palavras com os pedaços (BONÉ, BOCA).

Nessa atividade, a professora, mediante de um trabalho de decomposição


e composição de palavras, ajudou os alunos das hipóteses pré-silábicas a entender
que existem unidades menores que as palavras e que é preciso pensar sobre elas
para escrever. Os que estão entrando nos níveis silábicos pensam sobre a ordem
das sílabas como informação importante para o ajuste com a pauta sonora e
percebem que uma mesma sílaba pode estar em palavras diferentes, com uma
mesma grafia. Essa é também uma “descoberta” importante para os que estão nas
hipóteses iniciais. Para os silábico-alfabéticos, ajuda a ganhar maior fluência e a
adquirir maior repertório de correspondências grafofônicas.

As análises de pedaços ainda menores das palavras também podem


ajudar os alunos a realizar tais descobertas. Vamos analisar o planejamento de
aula da professora Cenilda Maria Novaes, da Escola Municipal Professor Isaac
Pereira, Pré-2, em Olinda-PE, que realizou atividades de reflexão fonológica em
grande grupo.

Ao selecionar palavras iniciadas com o mesmo fonema /b/, a professora


buscou levar os alunos dos níveis iniciais a entender que, para aprender a
escrever, devemos prestar atenção ao som, e não ao significado das palavras. Por
outro lado, para os que estão entendendo isso, mas não têm boa bagagem sobre
quais letras correspondem a quais fonemas, a atividade ajuda a sistematizar as
correspondências grafofônicas, nesse caso específico, entre b – /b/. Obviamente,
isso não pode ser realizado uma única vez, nem tampouco com apenas um tipo
de correspondência.

Cenilda queria, nessa atividade, fazer as crianças reconhecerem a que


unidade sonora (fonema) corresponde cada unidade gráfica (letra). A esse
respeito, Ferreiro (2002) diz que para chegar à compreensão da correspondência
fonográfica, é preciso realizar uma operação cognitiva de estabilização e igualação
das unidades. Ou seja, como nos explicam Teberosky e Ribera (2004, p. 66):

Desenvolver capacidades de delimitação de unidades gráficas implica


começar a compreender que o sistema alfabético de escrita funciona com base em
signos gráficos, ao mesmo tempo em que ajuda a compreender como esses signos
se relacionam com os sons. Desenvolver capacidades de segmentação sonora
necessária para o princípio de correspondência fonográfica implica segmentar as
unidades dentro de um contínuo, operação que não se desenvolve separadamente
da construção das unidades gráficas.

125
A compreensão desse princípio de igualação também é promovida quando
comparamos palavras que têm semelhanças sonoras e gráficas. Célia Ferreira de
Arruda mostra-nos como fez isso em uma turma de 24 alunos de quatro anos da
Escola Municipal Claudino Leal, em Olinda-PE.

Levei várias folhas de plantas diferentes (mamão, goiaba, abacate, pitanga,


acerola, carambola, caju, manga, laranja, limão, sapoti e romã). Falei e mostrei
cada folha. Pedi para que eles adivinhassem a que frutas correspondiam. Pedi
que eles identificassem as diferenças e semelhanças. Escrevi no quadro os nomes
das frutas e comparamos os sons iniciais e finais. Exemplo: carambola / caju;
mamão / limão; carambola / acerola; pitanga / manga. Depois, com a participação
de todos, escrevemos os nomes das frutas em papel ofício e colamos junto com as
folhas em cartolinas.

Essas comparações tanto podem ser feitas entre palavras que apresentam
semelhanças em uma ou mais sílabas, quanto entre as palavras que se diferenciam
por uma letra.

Nas atividades de comparação, em que as crianças comparam palavras


que se diferenciam por apenas uma letra (gato, mato, rato, jato, por exemplo),
o objetivo do(a) professor(a) pode ser fazer com que os alunos percebam que
mudando uma letra, mudamos a palavra e que tentem reconhecer que essa
unidade sonora corresponde a uma unidade gráfica. Essa atividade, com certeza,
pode ajudar bastante os alunos de níveis iniciais de escrita, assim como os alunos
da hipótese silábico-alfabética, que algumas vezes representam uma sílaba com
uma letra.

As atividades de sistematização das correspondências grafofônicas, em


que os alunos procuram palavras que iniciam com determinada letra ou sílaba,
também podem ajudar alunos de diferentes níveis de conhecimento. Um exemplo
interessante é a escrita de dicionário temático. Podemos propor, por exemplo,
fazer um dicionário de animais, de plantas, de alimentos. Podemos, em tais
projetos, ajudar os alunos a sistematizar quais são as letras do alfabeto e levá-los
a estabelecer as correspondências grafofônicas que estão em fase de consolidação.
Os alunos dos níveis iniciais de apropriação da escrita podem se beneficiar da
atividade, por entenderem, a partir dela, que utilizamos letras para escrever,
conhecendo-as e aprendendo a nomeá-las.

Como podemos ver, são muitas as possibilidades de atividades em grande


grupo, centradas no(a) professor(a). Essas atingem diferentes resultados, com
base em distintos objetivos didáticos. Ressaltamos, em todos esses exemplos, a
necessidade de que o(a) professor(a)saiba o que as atividades podem favorecer
e participem com os alunos, mediando as relações entre os alunos e o objeto de
aprendizagem – o97sistema alfabético, de maneira que eles em alguns momentos
possam estar aprendendo as mesmas coisas e, em outros, possam estar aprendendo
coisas diferentes, como exemplificamos acima.

126
Situações didáticas em pequenos grupos

As atividades em pequenos grupos são especialmente importantes,


por propiciarem, de modo mais íntimo, trocas de experiências entre os alunos,
levando-os a compartilhar saberes, a levantar questões e respostas que os
adultos escolarizados nem sempre se propõem. Nesse modo de organização,
podemos realizar atividades unificadas, ou seja, cada grupo trabalhando
independentemente, mas realizando a mesma tarefa; ou atividades diversificadas,
em que cada grupo tem uma tarefa a ser cumprida. Um exemplo de atividade em
pequenos grupos foi contado por Cenilda Maria Novaes, já citada.

A turma foi dividida em cinco grupos de quatro crianças. Cada grupo


recebeu uma cartela com as letras do nome de uma figura. Elas tinham que tentar
colocar as letras na ordem correta.

As crianças, em grupos, podem trocar informações e comparar diferentes


hipóteses. Se há crianças que já têm repertórios razoáveis de consoantes, e estão
começando a utilizar algumas delas, e outras crianças que estão utilizando vogais
mais frequentemente, podemos assistir a boas discussões, quando forem decidir
onde colocar as letras. Como as crianças já recebem as letras da palavra e são
orientadas a usar todas elas, é provável que as discussões ocorram. Propostas assim
são boas para as crianças que estão utilizando consistentemente ou algumas vezes
uma letra para cada sílaba (alunos em hipóteses silábicas e silábico-alfabéticas),
pois indicam que não é possível resolver a tarefa apoiando-se nessa hipótese,
e para as crianças do nível pré-silábico, para que percebam que a ordem das
letras é importante para a escrita das palavras e para que percebam que precisam
prestar atenção a pequenas partes da palavra para decidir que letras deve utilizar.
Para que elas percebam isso, é necessário que o(a) professor(a) esteja circulando
pela sala e fazendo perguntas que evidenciem tal princípio do sistema. Para os
alfabéticos, no entanto, a atividade, dependendo da palavra que for utilizada,
pode parecer muito fácil. Se usarmos, no entanto, palavras com sílabas complexas
(CH, LH, NH, BR, por exemplo), que muitas vezes são difíceis para eles, a tarefa
pode ser produtiva. Assim, estamos trabalhando em grupos com uma mesma
atividade (que pode ter variações nas palavras utilizadas), mas promovendo
aprendizagem de aspectos diferentes da escrita.

Nos momentos em que realizamos atividades diversificadas, podemos


dirigir mais diretamente a proposta a cada tipo de hipótese que existe em sala
de aula. Ou seja, podemos pensar em prioridades para cada grupo de alunos
e organizar três ou quatro tipos de proposta. A professora Niedja Marques de
Santana, da 1ª série da Escola Municipal Odette Pereira Carneiro, em Jaboatão
dos Guararapes-PE, descreveu atividades a ser feitas concomitantemente em sala
de aula:

127
1) Ditado cantado

Os alunos devem cantar a música (com a letra da música escrita em papel


e distribuída entre eles), buscando identificar as partes do escrito (procurar, no
texto, palavras ditadas pelo(a)professor(a) ou indicadas em uma ficha com as
gravuras). Eles devem conhecer a música.

2) Produção de listas de nomes próprios e títulos

Lista de nomes: os alunos devem escrever o nome de 10 amigos da classe


(podem escrever a partir de suas hipóteses ou podem consultar uma lista para
copiá-los); depois, devem separar o nome das meninas e dos meninos. Lista de
títulos de histórias: os alunos devem reconhecer as imagens correspondentes
às histórias (o(a) professor(a) deve entregar figuras com cenas das histórias) e
escrever, ao lado, o título de cada história. Eles devem compartilhar suas escritas
com os colegas.

Essas três atividades, realizadas em grupos, podem oferecer diversas


opções, atendendo a alunos com diferentes necessidades. A primeira opção (Ditado
cantado) é uma atividade de ajuste do sonoro ao escrito. Alunos que estejam
em hipóteses iniciais da escrita podem, colaborativamente, encontrar palavras
dentro do texto, aprendendo, com isso, que cada palavra é separada da outra com
espaçamento e que podemos usar pistas sonoras e suas correspondências com
unidades gráficas para identificar palavras. Por outro lado, é uma Boa estratégia
para familiarizar os alunos com as letras, já que, para discutirem grupo sobre onde
está a palavra, as crianças começam a usar uma metalinguagem (é essa, porque
começa com B!). Isso obviamente começa a acontecer quando o(a) professor(a)
indaga as crianças a esse respeito. Na ausência do(a) professor(a), haverá uma
tendência que essa estratégia se repita.

3) “Descubra quem está falando”

Entregar uma lista de trechos de textos (falas de personagens importantes


já conhecidas das crianças), como:

– Vovó, para que esta boca tão grande?


__________________________________________________
– Rapunzel, solte suas tranças.
____________________________________________________
– Espelho, espelho meu, fala e diz: Quem é mais bela do que eu?
____________________________________________________

Pedir que as crianças descubram de quem são as falas e escrever o nome


das personagens (e/ ou ler os nomes das personagens, em uma folha em anexo, e
colar no lugar certo). O(A) professor(a)pode, também, fazer a atividade usando
títulos de contos.

128
As atividades de familiarização com as letras são muito importantes para
as crianças que não apresentam bom repertório desses símbolos, não conseguem
nomeá-las ou escrevem com rabiscos ou letras mal definidas. O objetivo é o de
fazer com que elas percebam que são esses símbolos que usamos para escrever
e que comecem a reconhece-los. Essa era uma informação que Niedja queria
naquele momento veicular. Mas outro tipo de informação diferente desse, também
desejado pela professora, era o de que os alunos percebessem a vinculação decerta
letra a determinado valor sonoro. Os dois tipos de informação são descritos por
Teberosky e Ribera (2004, p. 66):

No caso das letras, pode-se oferecer à criança dois tipos de informação:


as letras como grafias, ou seja, como unidades gráficas exclusivamente, ou a
letra como grafema, unidade bilateral, constituída como signo composto por
significante e significado (GAK, 2001). A letra como grafia faz referência, por
exemplo, às diferentes figuras de uma mesma unidade do sistema (por exemplo,
– G, g, G, g); a letra como grafema faz referência à relação entre a grafia e o valor
fonêmico.

A segunda proposição descrita por Niedja – produção de listas de nomes


próprios e títulos – pode ser utilizada com crianças de diferentes níveis. Como é
solicitado que separem os nomes dos meninos e das meninas, pode-se favorecer
a aquisição de palavras estáveis.

Na atividade de construção/reconhecimento de palavras estáveis– os


nomes dos alunos ou títulos de contos –, Niedja tinha em mente ajudar os alunos
iniciantes a construir um repertório de palavras a ser “usadas” como pistas em
outras atividades em que são chamados a tentar ler e escrever diferentes palavras.
Gallart (2004, p. 46) atenta que: Partindo da aprendizagem de palavras próximas,
como os próprios nomes, os meninos e as meninas são capazes de incrementar
seu universo de palavras e sons a partir de letras e sons conhecidos. É necessário
que o menino ou a menina adquira consciência fonológica, e o pode fazer através
de construir palavras próximas, como o nome próprio ou os nomes de seus
familiares, identificando letras dessas palavras e os sons correspondentes. Ao
mesmo tempo em que se vão desenvolvendo nesse processo, são capazes de gerar
outras palavras, jogando com as letras, as sílabas e os sons, e dotando de sentido
com os demais a cada nova palavra gerada.

A última tarefa descrita por Niedja parece ser mais apropriada para alunos
da hipótese alfabética ou silábico-alfabética (se pensarmos nela sem a ação direta
do(a) professor(a)). Os alunos precisavam ler os trechos (falas dos personagens,
para identificar ou escrever os nomes desses personagens). Como eram histórias
diferentes e eles não tinham muitas pistas além das gráficas, ficava difícil (mas
não impossível) para alunos que não estivessem na hipótese alfabética.

Em todos esses tipos de situação, é muito importante decidir sobre os


agrupamentos, de modo a garantir que todos os alunos estejam pensando a
respeito do aspecto do sistema que é fundamental para eles naquele momento.
Assim, pode-se priorizar, nesses tipos de atividade voltadas para a apropriação

129
da escrita alfabética, que os alunos compartilhem a tarefa com colegas que
não deem prontas as respostas que eles estão precisando construir. Ou seja, é
fundamental que eles possam vivenciar o conflito e que tenham um problema
para resolver, junto com aqueles que, embora tenham conhecimentos diferentes
dos que eles tenham, não possuam, ainda, a resposta para o problema sobre o
qual eles precisam pensar.

Além de preocuparmo-nos com os agrupamentos, é de importância fulcral


que estejamos a postos para levantar questões pertinentes e disponibilizar as
informações necessárias para a realização das tarefas. Assim, acreditamos, como
Macedo e Mortimer (1999), que “o conhecimento não resulta da interação direta
do sujeito como objetos, pois essa interação é sempre mediada por instrumentos
materiais e simbólicos, entre os quais a linguagem adquire uma importância
especial”. Na escola, a principal voz que medeia a relação entre o aluno-aprendiz
e o objeto de conhecimento é a do(a)professor(a). Daí a necessidade de que ele(a)
seja um(a) interlocutor(a)atento(a) e consciente dos percursos que os alunos
fazem quando estão aprendendo e das necessidades do grupo.

Nas situações em pequenos grupos com atividade unificada, essa


mediação do(da) docente também se reveste de importância crucial. Nesses
casos, é necessário pensar em atividades em que todos os alunos estejam de
fato aprendendo e tenham possibilidade real de participação. Assim, ou se deve
colocar uma tarefa com o objetivo de refletir sobre o sistema alfabético, que ofereça
diferentes desafios a alunos que estejam em diferentes graus de conhecimento
sobre a escrita, de modo similar ao que exemplificamos quando falamos sobre
as atividades em grandes grupos, ou deve-se colocar tarefas com objetivos que
ultrapassam questões relativas à apropriação do sistema alfabético.

Um exemplo desse último tipo de situação citada é aquele em que os


alunos produzem textos em grupos para atender a determinada finalidade. Para
produzir um texto, temos clareza de que o registro é apenas uma das ações a ser
executadas. Muitas outras são fundamentais, quais sejam: geração e seleção do
conteúdo textual; organização dos modos como os conteúdos serão registrados;
textualização com decisões relativas aos aspectos coesivos, seleção vocabular,
entre outras. Nesses casos, os grupos podem ser bastante heterogêneos quanto ao
nível de conhecimento sobre a escrita alfabética. Via de regra, os alunos alfabéticos
são responsáveis pelo registro do texto, mas todos participam da sua elaboração,
aprendendo muito sobre os processos de planejamento e textualização. Essa
heterogeneidade quanto aos graus de conhecimentos sobre o sistema alfabético,
em atividades dessa natureza, garante que os alunos se vejam como iguais em
outros domínios da aprendizagem, fazem com que eles não se percebam como
“absolutamente” aquém dos que conhecem a escrita alfabética, como muitas
vezes ocorre. Nesses momentos, eles percebem que, em outros tipos de atividade,
eles podem assumir papéis muito relevantes e valorizados no âmbito escolar.
Gallart (2004, p. 51) salienta ainda que “ao trabalhar com grupos heterogêneos, é
facilitada a possibilidade de compartilhar conhecimentos e estratégias, utilizar a
diversidade como riqueza para as aprendizagens e fomentar atitudes solidárias
entre os meninos e as meninas”.

130
De modo similar ao que exemplificamos acima, podemos pensarem
atividades de compreensão de textos, em que alguns alunos que já estão mais
avançados na alfabetização leem para os colegas e juntos realizam as tarefas
propostas a partir da leitura.

Nos casos das atividades de produção de textos em grupos heterogêneos,


obviamente, os alunos dos níveis iniciais pouco se atêm à ação de registro do texto
nem pensam muito sobre as relações entre escrita e som, já que estão preocupados
com outros aspectos textuais que são também muito relevantes.

Se nosso objetivo é que os alunos dos níveis iniciais registrem o texto,


precisamos deixar que eles o tentem fazer, em um tempo diferente dos alfabéticos,
que farão tal tarefa com maior rapidez. Precisamos, nesses casos, separá-los dos
alfabéticos. Assim, a demanda do registro fará com que eles, além de pensar sobre
o conteúdo e sobre os processos de textualização, também tenham que pensar
sobre a natureza do sistema alfabético. Se quisermos diminuir essa demanda e
colocar a atenção deles mais voltada para a ação de grafar o texto, pensando nas
relações entre escrita e pauta sonora, podemos, também, sugerir que eles escrevam
textos que já sabem de cor, como músicas, poemas, parlendas, trava-línguas etc.

Situações didáticas em duplas

Os momentos em que os alunos estão trabalhando em grupos são


muito ricos por propiciarem trocas de informação e levantamento de conflitos
que são impulsionadores da aprendizagem. São muito eficientes também por
possibilitarem uma intervenção dos(as)professores(as) por um tempo mais
alongado em cada grupo, enfocando os aspectos que são importantes para os
alunos que estão realizando as tarefas. No entanto, nem sempre favorecem
os alunos mais tímidos, no sentido de levá-los a expor seu modo de pensar e
alevantar suas dúvidas.

Os trabalhos em dupla são especialmente eficazes nesse sentido. Os


alunos levantam hipóteses, discutem e argumentam sobre suas ideias de forma
mais intensa, sem que precisem disputar a fala com um grupo maior.

Nesses casos, a passagem do(a) professor(a) pelas duplas não ocorre com
tanta frequência quanto no momento em que estão em grupo. No entanto, quando
ele passa por uma dupla, tem mais condições de entender a lógica utilizada pelo
aluno e intervir de modo mais direto, ajudando-o a pensar sobre sua própria
hipótese.

Em duplas, podemos tanto realizar atividades em que os alunos precisem


refletir sobre a escrita alfabética, de preferência pareando os de modo a que um
não dê as respostas de imediato, quanto os pareando de modo que um tenha
domínio sobre o sistema alfabético e o outro esteja pensando em outros aspectos,
com orientações do(a)professor(a).

131
O relato da professora Maria Alice Viana da Silva, da Escola Municipal
Mário Covas, da Rede Municipal de Teresina-PI, exemplifica tal tipo de
organização da turma. No primeiro momento da aula foi colocado, como forma
de acolher os alunos, um CD com músicas folclóricas brasileiras: as cantigas de
roda. Enquanto isso, os alunos iam se acomodando. Após o momento de acolhida,
eu chamei a atenção dos alunos para as músicas que eles estavam ouvindo e que
dentre elas estavam aquelas selecionadas previamente pela turma numa lista de
dez cantigas de roda, que culminariam em um livro montado por eles ao final
do projeto. Isso era de conhecimento dos alunos. Após essa retomada, coloquei
a música “O cravo e a rosa” para eles ouvirem. Eles ouviram e cantaram até se
familiarizarem com a letra.

Passado o momento de ouvir e cantar, passamos para a leitura da música


em escrita fatiada do texto. Os alfabéticos receberam a música fatiada em palavras
e os não alfabéticos, em frases. A música fatiada era para eles sistematizarem
novamente toda a música. Os alunos já estavam previamente organizados em
duplas, pois a sala já ficava disposta para receber os alunos em duplas. Eram, ao
todo, 12 duplas, oito duplas de alunos alfabéticos e quatro duplas de alunos não
alfabéticos.

Maria Alice relata que já era acostumada a propor atividades em dupla.


No caso descrito, ela propôs uma atividade com uma variação (texto fragmentado
em palavras ou em frases). As duplas, assim, foram montadas com alunos que
tinham hipóteses de escrita parecidas, de modo a garantir, realmente, uma busca
conjunta para atender à exigência da tarefa.

Situações didáticas de trabalho individual

Com toda nossa preocupação em garantir ricas parcerias no processo de


aprendizagem, de garantir trocas de conhecimentos entre pares, de favorecer
interações sociais em sala de aula, acabamos, muitas vezes, desvalorizando as
situações de trabalho individual, que são também importantes no processo de
aprendizagem, seja para pensar sobre os conceitos e arrumar o que já sabemos
sobre algum tema, seja para tomarmos consciência de quais são as nossas lacunas.

É importante que aprendamos a refletir e a sistematizar nossos próprios


saberes e que aprendamos a coordenar sozinhos nossas ações e colocar à
disposição o que sabemos para resolver problemas. Por tais motivos, decidimos
conversar sobre essa modalidade de trabalho tão presente em sala de aula e no
nosso dia-a-dia. O fato de propormos um trabalho individual não implica que
estejamos desconsiderando a importância da interação em sala de aula, nem que
estejamos proibindo os alunos de realizar trocas ou de fazer perguntas ou mesmo
de levantar da cadeira para falar com o(a) professor(a).

Atividades como a do ditado mudo são excelentes propostas para que


os alunos mobilizem o que eles aprenderam para tentar “arrumara cabeça”.
Nesse momento, a passagem do(a) professor(a) pelas bancas, olhando como eles
estão escrevendo e conversando com eles individualmente, levando-os a usar

132
pistas para realizar a tarefa, pode ser preciosa para que os alunos ultrapassem
obstáculos e sintam o cuidado do(a) professor(a) para com eles. Muitas tarefas
individuais com os nomes das crianças também podem ser valiosas para levá-los
a construir suas primeiras palavras estáveis, assim como tarefas do livro didático,
acompanhadas pelos(as) professores(as).

A professora Roselma Monteiro, regente de uma turma de alfabetização,


da Escola Municipal Jaboatão dos Guararapes, em Jaboatão-PE, falou sobre as
atividades individuais em sala de aula. Cada criança recebeu uma cartela grande,
contendo quatro figuras matrizes (no topo de uma tabela) e doze cartelas pequenas
com figuras cujos nomes começavam ou terminavam com os das figuras matrizes.
O objetivo era a criança arrumar as cartelas pequenas de forma que numa mesma
fileira ficassem as figuras cujos nomes começavam ou terminavam de forma
semelhante à figura matriz.

Essa tarefa, principalmente para os alunos que ainda não tenham percebido
que nosso foco de atenção na atividade de escrita se volta para a pauta sonora e
não para os significados das palavras, é fundamental. Desenvolver a consciência
fonológica, como foi discutido por Artur Morais e Tânia Rios, é essencial para
ajudarmos as crianças no processo de alfabetização.

A leitura individual, em que os alunos tentam apreender um texto,


sozinhos, é também outro momento rico de desenvolvimento da habilidade de
leitura: tanto ajuda a desenvolver fluência de leitura quanto a desenvolver o
“gosto”, o prazer pelo ato de ler. A produção de texto individual é outra atividade
imprescindível em sala de aula, para ajudar o aluno a desenvolver a capacidade
de coordenar as ações de gerar o conteúdo, textualizar e registrar o texto.

Em suma, trabalhar sozinho também é uma modalidade de organização


das situações didáticas que tem sua importância. O que nos parece essencial é
distribuirmos os alunos em cada momento da sala de aula, de forma consciente,
com base nos objetivos didáticos claros. Variar essas formas de disposição é uma
das preocupações que devemos ter no processo pedagógico.

Por fim, gostaríamos de salientar que, em qualquer uma dessas


formas de organização das situações, o essencial é termos um(a)professor(a)
comprometido(a), que saiba olhar para os alunos e que saiba entender quais são
suas necessidades, planejando boas atividades e sabendo intervir de maneira
construtiva, problematizadora e esclarecedora.

FONTE: LEAL, T. V. Fazendo acontecer: o ensino da escrita alfabética na escola. In: MORAIS, A. G;
ALBUQUERQUE, E. B. C; LEAL, T. F. Alfabetização: apropriação do sistema de escrita alfabética.
Belo Horizonte: Autêntica, 2005, p. 92-108.

133
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Alfabetização e letramento são diferentes facetas que coexistem no


aprendizado da língua escrita.

• A alfabetização, acontece nos primeiros anos de escolarização e consiste em


ensinar o aluno os aspectos linguísticos do ler e o escrever.

• O letramento é o ato de usar a habilidade de escrever e ler nos diferentes


contextos sociais, de modo crítico e ativo.

• O letramento é um processo que permeia todos os anos de escolarização. Ele


se amplia e se aprofunda de acordo com as práticas sociais vivenciada pelos
estudantes e se aprofunda com o amadurecimento das funções cognitivas. Na
verdade, ele acontece durante toda a vida do sujeito e não é inerente apenas
ao espaço escolar.

• O letramento é a faceta social e interativa da alfabetização.

• A faceta linguística da alfabetização consiste no ensino sistematizado e


intencional dos atos de ler e escrever.

• Consciência fonológica é a capacidade de compreender o sistema de escrita


alfabética, por meio das relações entre fonemas e grafemas.

• Trabalhar os aspectos fonológicos da alfabetização é diferente de empregar o


método fônico.

• As dimensões linguísticas abarcadas na consciência fonológica, como o a


relação fonema/grafema e formação silábica das palavras, devem ser vistas
como importantes para que as crianças avancem nas fases de alfabetização,
como propõem Ferreiro e Teberosky (1979).

134
• Alfabetizar considerando tanto a faceta linguística quanto a social e a interativa
(letramento) tornará o espaço da sala de aula um ambiente alfabetizador
significativo e produtivo para a criança, capaz de minimizar, no que diz
respeito à responsabilidade da escola, os efeitos da desigualdade social no
alfabetismo brasileiro.

CHAMADA

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pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

135
AUTOATIVIDADE

1 Ensinar a criança a ler e a escrever, sem, contudo, tornar essa prática mecânica
e separada de suas funções sociais é um trabalho que requer do docente
muito esforço e empenho. Sobre a faceta linguística da alfabetização, todas
as afirmações são verdadeiras, exceto:

a) ( ) É imprescindível que o professor siga um método especifico de


alfabetização, sendo o fônico o mais adequado.
b) ( ) A escrita representa visualmente os sons que formam a cadeia sonora
da fala. Compreender o sistema que nota as relações entre os fonemas
e os grafemas é a faceta linguística da alfabetização.
c) ( ) O desenvolvimento da consciência fonológica é fundamental para um
bom processo de alfabetização.
d) ( ) Alfabetizar requer um método, um ensino sistematizado, com clara
intencionalidade pedagógica.

2 O desenvolvimento da consciência fonológica é muito importante e se


ramifica em consciência silábica, consciência fonêmica, resultando na
correspondência grafo-fonêmica. Indique o termo conceituado na frase: "É
o som que cada letra representa; A unidade sonora da fala; Eles formam as
sílabas e podem ser vogais ou consoantes".

a) ( ) Grafema
b) ( ) Letra
c) ( ) Fonema
d) ( ) Símbolo alfabético

3 O desenvolvimento da consciência fonológica é muito importante e se


ramifica em consciência silábica, consciência fonêmica, resultando na
correspondência grafo-fonêmica. Indique o termo conceituado na frase: "É
a representação gráfica dos sons. Diferentes letras podem representar um
mesmo grafema, como exemplo, o "x" e o "ch".

a) ( ) Grafema
b) ( ) Letra
c) ( ) Fonema
d) ( ) Símbolo alfabético

4 Segundo Soares (2016; 2004) a criança começa a "letrar-se" a partir do


momento em que nasce numa sociedade letrada, ou seja, “este processo se
estende por todos os anos de escolaridade e, mais que isso, por toda a vida.
Explique o conceito de letramento, esclarecendo porque ele se constitui nas
facetas social e interativa da alfabetização:

136
5 Para Soares (1998, p. 47), "Alfabetização é o processo pelo qual se adquire
[...] o domínio da tecnologia – do conjunto de técnicas – para exercer a arte
e ciência da escrita. Ao exercício efetivo e competente da tecnologia da
escrita denomina-se Letramento que implica habilidades várias, tais como:
capacidade de ler ou escrever para atingir diferentes objetivos". Diante
desse pensamento explique a expressão: alfabetizar-letrando.

137
REFERÊNCIAS
FERREIRO, E. Alfabetização e cultura escrita. Disponível em: http://novaesco-
la.abril.com.br/index.htm?ed/162_mai03/html/falamestre. Acesso em: 15 maio
2021.

FERREIRO, E. Reflexões sobre alfabetização. 24 ed. São Paulo, Cortez, 2001.

FERREIRO, E.; TEBEROSKY, A. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre:


Artes Médicas. 1979

FERREIRO, E. Reflexões sobre alfabetização. 24 ed. atual. São Paulo: Cortez,


1995.

FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 45


ed. São Paulo, Cortez, 1989.

HERCULANO-HOUZEL, S. Uma Breve História da Relação entre Cérebro e


Mente. In: LENT, R. (coord.). Neurociência da Mente e do Comportamento. Rio
de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. p. 1-17.

LENT, R. Cem bilhões de neurônios? Conceitos fundamentais de neurociência.


2 ed. São Paulo: Atheneu, 2010.

LURIA, A.R. A Construção da Mente. São Paulo: Ícone, 1992.

LURIA, A.R. Desenvolvimento Cognitivo. 6 ed. São Paulo: Ícone, 2010.

LURIA, A. R. Linguagem, Desenvolvimento e Aprendizagem. In: VYGOTSKY,


L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. O Desenvolvimento da Escrita na Crian-
ça.10 ed. São Paulo: Ícone, 2006.

MORAIS, A. G; ALBUQUERQUE, E. B. C; LEAL, T. F. Alfabetização: apropria-


ção do sistema de escrita alfabética. Belo Horizonte: Autêntica,2005.

MORAIS, A. G. de. Sistema de Escrita Alfabética. São Paulo: Editora Melhora-


mentos, 2012.

RATEY, J. J. O Cérebro: um guia para o usuário. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

RELVAS, M. P. Fundamentos biológicos da educação: despertando inteligên-


cias e afetividade no processo de aprendizagem. Rio de Janeiro: Wak, 2005

138
SOARES, M. B. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: autênti-
ca, 1998.

SOARES, M. B. Letramento e alfabetização: as muitas facetas. Revista Brasileira


de Educação. jan./fev./mar./abr., n. 25, 2004.

SOARES, M. B., M. B. Alfabetização: a ressignificação do conceito. Alfabetiza-


ção e Cidadania, n. 16, p. 9-17, jul., 2003.

SOARES, M. B. Alfabetização: a questão dos métodos. Belo Horizonte: Contex-


to, 2016.

139
140
UNIDADE 3 —

A BASE NACIONAL COMUM


CURRICULAR (BNCC), A
ALFABETIZAÇÃO E OS
DESAFIOS DA ERA DIGITAL

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender o que é a BNCC;

• conhecer as competências gerais da BNCC;

• refletir sobre as competências e habilidades na BNCC;

• analisar a alfabetização na Educação Infantil e Anos Iniciais de acordo


com a BNCC;

• compreender que as práticas de alfabetização têm relação direta com


concepção de língua/linguagem;

• identificar ações do professor como mediador nos processos de alfabe-


tização;

• empregar o conhecimento científico para adquirir novos conhecimentos


sobre a alfabetização na BNCC;

• analisar os diversos aspectos do letramento digital;

• aplicar os conhecimentos científicos de letramento articulados com a


prática pedagógica;

• analisar conceitos e práticas sobre letramento digital.

141
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ


A BNCC?
TÓPICO 2 – A BNCC E A ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS INICIAIS DO
ENSINO FUNDAMENTAL
TÓPICO 3 – CULTURA DIGITAL NA BNCC E OS DESAFIOS PARA A
ALFABETIZAÇÃO

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

142
UNIDADE 3 TÓPICO 1 —

ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO
INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico(a), certamente você já ouviu falar sobre a Base Nacional
Comum Curricular (BNCC), principalmente nas escolas, nos debates e reuniões,
na mídia e nas redes sociais em geral, mas você conhece e já estudou a BNCC?
Sabe como ela foi organizada? Quais são suas propostas de currículo para a
educação brasileira? É nesse viés que nos propomos discutir nesse tópico a
Educação Infantil na Base Nacional Comum Curricular – BNCC, possibilitando a
compreensão sobre o que a Base propõe para educação infantil.

Na Educação Infantil, a BNCC destaca as habilidades e as competências,


as quais incorporam-se aos objetivos de aprendizagem e desenvolvimento que
serão tratados especificamente neste tópico. Da mesma forma discorresse sobre
os direitos de aprendizagens, que segundo a BNCC são essenciais para que a
criança tenha condições de aprender e a se desenvolver, sendo eles: Conviver;
Brincar; Participar; Explorar; Expressar e Conhecer-se. Vale destacarmos que
essas discussões não são exatamente uma novidade, mas a Base trouxe à tona o
debate e uma série de dúvidas na cabeça dos professores, que terão que começar a
colocar o documento em prática. Afinal, que tipo de alfabetização a BNCC propõe
para a educação infantil?

Vamos mergulhar na Unidade 3 e descobrir respostas para nossos questiona-


mentos?

2 BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC)


Após o estudado nas Unidades 1 e 2 deste livro, consideramos importante
explanar sobre a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a qual vem sendo
discutida amplamente em todo o território nacional.

MAS O QUE É A BNCC?

143
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

FIGURA1 – BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR

FONTE: <https://bit.ly/3FaKDxy>. Acesso em: 20 set. 2021.

Você já ouviu falar em currículo?

O currículo, segundo Libâneo (2012), é o conjunto

de conteúdos cognitivos e simbólicos (saberes, competências,


representações, tendências, valores) transmitidos (de modo explícito
ou implícito) nas práticas pedagógicas e nas situações de escolarização,
isto é, tudo aquilo a que poderíamos chamar de dimensão cognitiva e
cultural da educação escolar (LIBÂNEO 2012, p. 489).

Libâneo (2012) ainda destaca que ao planejar o currículo, há necessidade


de se considerar alguns princípios, sendo eles:

a) Um currículo precisa ser democrático, isto é, garantir a todos uma


base cultural e científica comum e uma base comum de formação
moral e de práticas de cidadania (relativa a critérios de solidariedade
e justiça, à alteridade, à descoberta e respeito do outro, ao aprender a
viver junto etc.).

b) O currículo escolar representa o cruzamento de culturas,


constituindo espaço de síntese, uma vez que a cultura elaborada se
articula com os conhecimentos e experiências concretas dos alunos
em seu meio social e com a cultura dos meios de comunicação, da
cidade e de suas práticas sociais. Isso significa propiciar aos alunos
conhecimentos e experiências diversificadas, integrando no currículo
a variedade de culturas que perpassa a escola: a científica, a acadêmica,
expressa no currículo, a social, a dos alunos, a das mídias, a escolar
(organizacional). Trata-se de compreender a escola como lugar de
síntese entre a cultura formal, sistematizada, e a cultura experenciada
na família, na rua, na cidade, nas mídias e em outros contextos
culturais, o que implica formular coletivamente formas pedagógico-
didáticas de assegurar essa articulação.

c) O provimento da cultura escolar aos alunos e a constituição de


um espaço democrático na organização escolar devem incluir a
interculturalidade: o respeito e valorização da diversidade cultural e
das diferentes origens sociais dos alunos, o combate ao racismo e a
outros tipos de discriminação e preconceito. O currículo intercultural
é o que, com uma base comum de cultura geral para todos, acolhe
a diversidade e a experiência particular dos diferentes grupos de
alunos e propicia, na escola e nas salas de aula, um espaço de diálogo
e comunicação entre grupos sociais diversos. Um dos mais relevantes

144
TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

objetivos democráticos do ensino consiste em fazer da instituição


escolar um lugar em que todos possam experimentar sua própria
forma de realização e sucesso.

d) Por outro lado, trata-se não apenas de atender às necessidades e


expectativas da comunidade, de modo que se respeite a cultura local,
mas também pensar sobre valores, modos de vida e hábitos que
precisam ser modificados para a construção de um projeto civilizatório.
e) Currículo tem que condizer com a organização espacial da cidade
e com o modo pelo qual as pessoas de todos os segmentos sociais se
movem nela. Trata, portanto, da qualidade de vida possível, mediante
a análise dos elementos que demarcam a dinâmica da cidade:
produção, circulação, moradia.

f) Um bom currículo ajuda a fortalecer a identidade pessoal, a


subjetividade dos alunos. Trata não só de atender e favorecer a
diversidade ente o alunato, mas também de promover em cada aluno
competências distintas que os tornem mais plenos e autônomos
em seu desenvolvimento pessoal, o que, sem dúvida, pode facilitar
igualmente seu êxito profissional. g) A organização curricular
precisa prever tentativas de enriquecimento do currículo, pela
interdisciplinaridade, e de coordenação de disciplinas, por meio de
projetos comuns (LIBÂNEO, 2012, p. 492-493).

É neste contexto que emerge a Base Nacional Comum Curricular (BNCC),


a qual se constitui em um documento de caráter normativo que define o conjunto
orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem
desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica, de modo
a que tenham assegurados seus direitos de aprendizagem e desenvolvimento,
em conformidade com o que preconizapreceitua o Plano Nacional de Educação
(PNE) (BRASIL, 2018).

MAS COMO SURGIU A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC)?

A Constituição Federal de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases Lei 9394/96


reforçaram a exigência de uma base comum curricular de forma mais explícita.
Dessa forma, foram elaborados os PCNs em 1998 e as Diretrizes Curriculares
Nacionais em 2010, com intuito de atender às solicitações da legislação vigente.
Com o Plano Nacional de Educação 2014-2024 esse assunto ficou mais evidente,
vindo a ser concretizado no ano de 2017 com a aprovação da BNCC – Base Nacional
Comum Curricular para a Educação Infantil e Ensino Fundamental e no ano de
2018 a Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Médio (BRASIL, 2018).

Mediante esta exigência em 2014, com a elaboração do Plano Nacional de


Educação (2014-2024), o qual determina as diretrizes, estratégias e metas para as
políticas educacionais do decênio (dez anos), ocorreram as primeiras reuniões, as
quais serviram para debater sobre a BNCC. A partir destas discussões o Ministério
da Educação (MEC) institui a Portaria Nº 592, junto ao Conselho Nacional de
Educação (CONSED) e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação
(UNDIME), grupo este responsável pela primeira versão da BNCC (BRASIL, 2018).

145
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

A BNCC começou a ser estruturada no ano de 2015 e contou com a


contribuição de diversos autores do campo educacional e com a sociedade
brasileira, entre eles, os professores da educação básica, professores universitários
e profissionais da educação.

Com a homologação da Base Nacional Comum Curricular-BNCC, em


2017, os estados iniciaram um plano de trabalho com foco na pactuação entre as
redes de ensino, públicas e privada, com o objetivo de integrá-las na (re)elaboração
dos currículos, assegurando os direitos de aprendizagens e as competências
gerais contempladas na BNCC para a Educação Infantil e o Ensino Fundamental
e Ensino Médio. Assim, podemos compreender que a Base Nacional Comum
Curricular é uma exigência colocada para o sistema educacional brasileiro pela
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996; 2013), pelas
Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica (BRASIL, 2009) e
pelo Plano Nacional de Educação (BRASIL, 2014), e deve se constituir como um
avanço na construção da qualidade da educação.

Assim, a BNCC objetiva ser um referencial na elaboração e reformulação


dos currículos dos estados brasileiros, do Distrito Federal e dos municípios,
contribuindo com a transformação das propostas pedagógicas das redes públicas
e particulares, buscando integrar “ [...] a Política Nacional da Educação Básica
e vai contribuir para o alinhamento de outras políticas e ações, em âmbito
federal, estadual e municipal, referentes à formação de professores, à avaliação, à
elaboração de conteúdos educacionais e aos critérios para a oferta de infraestrutura
adequada para o pleno desenvolvimento da educação (BRASIL, 2018, p. 8).

Podemos inferir que a Base Nacional Comum Curricular é um documento


que expressa as exigências dadas pela Constituição Federal de 1988, pela LDB
9394/96 e acentuado no PNE 2014-2024. Nela estão contidas diretrizes para
elaboração de currículos escolares na tentativa de superar as fragmentações
históricas nos conteúdos ensinados nas diferentes etapas da educação básica.
Está pautada em dez competências gerais, as quais devem reger as três etapas
da educação básica, em que, alinhado ao fazer pedagógico escolar, os estudantes
possam construir seus conhecimentos e desenvolver suas habilidades voltadas
para atitudes e valores.

Destacamos ainda que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) torna-


se referência nacional para a formulação dos currículos dos sistemas e das redes
escolares dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e das propostas
pedagógicas das instituições escolares. Este documento integra, a política nacional
da Educação Básica e visa contribuir para o alinhamento de outras políticas e ações,
em âmbito federal, estadual e municipal, referentes à formação de professores, à
avaliação, à elaboração de conteúdos educacionais e aos critérios para a oferta de
infraestrutura adequada para o pleno desenvolvimento da educação (BRASIL,
2018).

146
TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

Mediante o exposto pelo documento, podemos compreender que a Base


Nacional Comum Curricular (BNCC) deverá nortear a formulação dos currículos
dos sistemas de ensino de todo o Brasil, indicando as habilidades e competências
a serem desenvolvidas pelos alunos ao longo da vida.

Na BNCC, competência é definida como a mobilização de


conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas,
cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas
complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo
do trabalho (BRASIL, 2018).

Vale destacarmos que na BNCC foram estipuladas dez competências


gerais para as etapas da Educação Básica, conforme consta na Figura 2.

FIGURA 2 – COMPETÊNCIAS GERAIS DA BNCC

FONTE: <https://bit.ly/3Fa6zcg>. Acesso em: 20 set. 2021.

No Quadro 1, poderemos visualizar as competências gerais da Base


Nacional Comum Curricular (BNCC), as quais foram anunciadas na Figura 2.

147
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

QUADRO 1 – COMPETÊNCIAS GERAIS DA BNCC

COMPETÊNCIAS GERAIS DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR


1. Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o
mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade,
continuar aprendendo e colaborar para a construção de uma sociedade justa,
democrática e inclusiva.
2. Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das
ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação
e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular
e resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos
conhecimentos das diferentes áreas
3. Valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às
mundiais, e também participar de práticas diversificadas da produção artístico-
cultural.
4. Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora, como Libras,
e escrita), corporal, visual, sonora e digital –, bem como conhecimentos das
linguagens artística, matemática e científica, para se expressar e partilhar
informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e
produzir sentidos que levem ao entendimento mútuo.
5. Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação
de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais
(incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações,
produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria
na vida pessoal e coletiva.
6. Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de
conhecimentos e experiências que lhe possibilitem entender as relações
próprias do mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da
cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência
crítica e responsabilidade.
7. Argumentar com base em fatos, dados e informações confiáveis, para
formular, negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns que
respeitem e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental e o
consumo responsável em âmbito local, regional e global, com posicionamento
ético em relação ao cuidado de si mesmo, dos outros e do planeta.
8. Conhecer-se, apreciar-se e cuidar de sua saúde física e emocional,
compreendendo-se na diversidade humana e reconhecendo suas emoções e as
dos outros, com autocrítica e capacidade para lidar com elas.
9. Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação,
fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos,
com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos
sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos
de qualquer natureza.
10. Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade,
resiliência e determinação, tomando decisões com base em princípios éticos,
democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.
FONTE: BRASIL (2018, p.9-10)

148
TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

Frente ao exposto no Quadro 1, o documento evidencia que “ao longo da


Educação Básica- na Educação Infantil, no Ensino Fundamental e no Ensino Médio,
os alunos devem desenvolver as dez competências gerais da Educação Básica,
que pretendem assegurar, como resultado do seu processo de aprendizagem e
desenvolvimento, uma formação humana integral que vise à construção de uma
sociedade justa, democrática e inclusiva” (BRASIL, 2018, p. 25).

Assim, destacamos que a BNCC em seu texto evidencia as competências


gerais; os fundamentos pedagógicos; as etapas da Educação Infantil, do Ensino
Fundamental e do Ensino Médio, proporcionando aos profissionais da educação
uma visão específica das competências que deverão ser adquiridas pelos alunos
no decorrer de sua trajetória escolar, conforme observa-se na Figura 3.

FIGURA 3 – COMPETÊNCIAS GERAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA

FONTE: Brasil (2018, p. 24)

Ao observarmos a Figura 3 podemos constatar que nas etapas da


Educação Básica encontra-se no eixo competências: os direitos de aprendizagem
e desenvolvimento, juntamente com os campos de experiências, os objetivos, de
aprendizagens e desenvolvimento.

A partir deste entendimento apresentaremos a estrutura geral da BNCC


para a 1ª etapa da Educação Básica, ou seja, a Educação Infantil.

149
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

3 A EDUCAÇÃO INFANTIL NA BNCC


A Educação Infantil no Brasil como direito social, como política pública
educativa, resultou de um intenso e longo processo de luta, no qual os movimentos
sociais, sobretudo os feministas, foram grandes protagonistas (CAMPOS;
BARBOSA, 2015, p. 354). Assim, até o início do século XX, a Educação Infantil era
considerada uma política assistencialista.

Com a Constituição Federal de 1988 a educação infantil passou a ser dever


do Estado e, com a promulgação da LDB 9394/96, passa a integrar as etapas da
educação básica. No entanto, a educação infantil torna-se obrigatória para crianças
de 4 e 5 anos no Brasil somente a partir da aprovação da Emenda Constitucional
nº 59 /2009.

Com relação ao currículo para a educação infantil, após a LDB 9394/96,


o MEC produziu em 2001, o RCNEI – Referencial Curricular Nacional para a
Educação Infantil, referente às creches, entidades equivalentes e pré-escolas.

O RCNEI é uma coleção de três volumes que contém orientações


curriculares para a Educação Infantil e faz parte dos PCNs – Parâmetros
Curriculares Nacionais, elaborados pelo MEC para todas as etapas da educação
básica.

No ano de 2009, com a participação de professores e pesquisadores da


área da Educação Infantil o MEC elaborou as DCNEI – Diretrizes Curriculares
Nacionais de Educação Infantil, as quais foram regulamentadas pela Resolução
CNE/CEB nº 5/2009. Nessa Resolução o currículo da Educação Infantil é
concebido como um conjunto de práticas articuladas com as experiências e os
saberes das crianças. Tais práticas são efetivadas por meio de relações sociais
que as crianças desde bem pequenas estabelecem com os professores e as outras
crianças (BRASIL, 2009).

A partir do exposto, podemos entender que a elaboração da BNCC para a


Educação Infantil não partiu do nada, ou seja, já existe uma história de currículo
produzida legalmente a partir da Constituição Federal de 1988.

Agora que aprendemos um pouco sobre a história das políticas


educacionais para a Educação Infantil no Brasil, iremos conhecer como a BNCC
inovou a Educação Infantil em território brasileiro.

Vamos lá?

150
TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

FIGURA 4 – EDUCAÇÃO INFANTIL

FONTE: <https://bit.ly/3zXiaax>. Acesso em: 20 set. 2021.

Na Educação Infantil, a BNCC traz os direitos de aprendizagem,


pautados nos eixos estruturantes (interações e brincadeira), os quais devem ser
assegurados mediante seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento, para
que as crianças tenham condições de aprender e se desenvolver (BRASIL, 2018).

Cabe salientar que na Educação Infantil encontramos os eixos estruturantes


que se apresentam como interações e brincadeiras, os quais, pela BNCC,
apresentam-se como direito às crianças nesta etapa de sua educação. Na Figura 5
apresentamos os seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento da criança na
Educação Infantil.

FIGURA 5 – DIREITOS DE APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO

FONTE: Brasil (2018, p. 25)

O Quadro 2 complementa e elucida as informações contidas na Figura 3


sobre os direitos de aprendizagem.

151
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

QUADRO 2 – DIREITOS DE APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO

com outras crianças e adultos, em pequenos e grandes grupos,


utilizando diferentes linguagens, ampliando o conhecimento
Conviver
de si e do outro, o respeito em relação à cultura e às diferenças
entre as pessoas.
cotidianamente de diversas formas, em diferentes espaços
e tempos, com diferentes parceiros (crianças e adultos),
ampliando e diversificando seu acesso a produções culturais,
Brincar
seus conhecimentos, sua imaginação, sua criatividade, suas
experiências emocionais, corporais, sensoriais, expressivas,
cognitivas, sociais e relacionais.
ativamente, com adultos e outras crianças, tanto do planejamento
da gestão da escola e das atividades propostas pelo educador
quanto da realização das atividades da vida cotidiana,
Participar
tais como a escolha das brincadeiras, dos materiais e dos
ambientes, desenvolvendo diferentes linguagens e elaborando
conhecimentos, decidindo e se posicionando.
movimentos, gestos, sons, formas, texturas, cores, palavras,
emoções, transformações, relacionamentos, histórias, objetos,
Explorar elementos da natureza, na escola e fora dela, ampliando seus
saberes sobre a cultura, em suas diversas modalidades – as
artes, a escrita, a ciência e a tecnologia.
como sujeito dialógico, criativo e sensível, suas necessidades,
Expressar emoções, sentimentos, dúvidas, hipóteses, descobertas,
opiniões, questionamentos por meio de diferentes linguagens.
e construir sua identidade pessoal, social e cultural, constituindo
uma imagem positiva de si e de seus grupos de pertencimento,
Conhecer-se nas diversas experiências de cuidados, interações, brincadeiras e
linguagens vivenciadas na instituição escolar e em seu contexto
familiar e comunitário
FONTE: Brasil (2018, p.38)

Ao encontro do anunciado na BNCC, cabe destacar PNE (2000), o qual


ressalta que

[...] a educação Infantil compreende a faixa etária de 0 a 6 anos, porém,


em nosso país há tratamento diferenciado entre as faixas etárias de 0 a 3 anos e
de 4 a 6 anos para a pré-escola; além disso as creches deverão adotar objetivos
educacionais, transformando-se em instituições de educação, segundo as
Diretrizes Curriculares Nacionais emanadas do Conselho Nacional de Educação.
Essa determinação segue a melhor pedagogia, pois é nessa idade, precisamente,
que os estímulos educativos têm maior poder de influência sobre a formação da
personalidade e o desenvolvimento da criança. Trata-se de um tempo que não
pode ser descurado ou mal orientado (BRASIL, 2000, p.15).

152
TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

Frente ao anunciado pelos documentos podemos inferir que a formação


da criança ocorre desde os primeiros momentos de sua vida. No entanto quando
a criança se insere na educação formal, os profissionais da educação devem
organizar-se determinando objetivos que auxiliem no desenvolvimento global da
criança, possibilitando uma sequência educativa de qualidade. Ou seja, a criança
em sua educação tem direitos que devem permear todos os níveis educacionais,
elevando-se de acordo com cada momento e faixa etária.

Entendemos que os direitos de aprendizagem evidenciados na BNCC


(2018) ressaltam o desenvolvimento de competências, as quais visam o
desenvolvimento cognitivo, físico e emocional da criança por meio de cinco
campos de experiências.

FIGURA 6 – CAMPOS DE EXPERIÊNCIAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

FONTE: Brasil (2018, p. 25)

Complementando a Figura 6, no Quadro 3 você poderá observar


atentamente os campos de experiência na Educação Infantil e seus significados.

153
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

QUADRO 3 – CAMPOS DE EXPERIÊNCIAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

É na interação com os pares e com adultos que as crianças vão


constituindo um modo próprio de agir, sentir e pensar e vão
descobrindo que existem outros modos de vida, pessoas diferentes, com
outros pontos de vista. Conforme vivem suas primeiras experiências
sociais (na família, na instituição escolar, na coletividade), constroem
percepções e questionamentos sobre si e sobre os outros, diferenciando-
se e, simultaneamente, identificando-se como seres individuais e sociais.
Ao mesmo tempo que participam de relações sociais e de cuidados
O eu, o pessoais, as crianças constroem sua autonomia e senso de autocuidado,
outro e o de reciprocidade e de interdependência com o meio.
nós Como a escola deve proceder: Por sua vez, na Educação Infantil, é
preciso criar oportunidades para que as crianças entrem em contato
com outros grupos sociais e culturais, outros modos de vida, diferentes
atitudes, técnicas e rituais de cuidados pessoais e do grupo, costumes,
celebrações e narrativas. Nessas experiências, elas podem ampliar o
modo de perceber a si mesmas e ao outro, valorizar sua identidade,
respeitar os outros e reconhecer as diferenças que nos constituem como
seres humanos.
Com o corpo (por meio dos sentidos, gestos, movimentos impulsivos
ou intencionais, coordenados ou espontâneos), as crianças, desde cedo,
exploram o mundo, o espaço e os objetos do seu entorno, estabelecem
relações, expressam-se, brincam e produzem conhecimentos sobre
si, sobre o outro, sobre o universo social e cultural, tornando-se,
progressivamente, conscientes dessa corporeidade. Por meio das
diferentes linguagens, como a música, a dança, o teatro, as brincadeiras
de faz de conta, elas se comunicam e se expressam no entrelaçamento
entre corpo, emoção e linguagem. As crianças conhecem e reconhecem
as sensações e funções de seu corpo e, com seus gestos e movimentos,
identificam suas potencialidades e seus limites, desenvolvendo, ao
Corpo, mesmo tempo, a consciência sobre o que é seguro e o que pode ser
gestos e um risco à sua integridade física. Na Educação Infantil, o corpo das
movimentos crianças ganha centralidade, pois ele é o partícipe privilegiado das
práticas pedagógicas de cuidado físico, orientadas para a emancipação
e a liberdade, e não para a submissão.
Como a escola deve proceder: A instituição escolar precisa promover
oportunidades ricas para que as crianças possam, sempre animadas
pelo espírito lúdico e na interação com seus pares, explorar e vivenciar
um amplo repertório de movimentos, gestos, olhares, sons e mímicas
com o corpo, para descobrir variados modos de ocupação e uso do
espaço com o corpo (tais como sentar com apoio, rastejar, engatinhar,
escorregar, caminhar apoiando-se em berços, mesas e cordas, saltar,
escalar, equilibrar-se, correr, dar cambalhotas, alongar-se etc.).

154
TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

Conviver com diferentes manifestações artísticas, culturais e científicas,


locais e universais, no cotidiano da instituição escolar, possibilita às
crianças, por meio de experiências diversificadas, vivenciar diversas
formas de expressão e linguagens, como as artes visuais (pintura,
modelagem, colagem, fotografa etc.), a música, o teatro, a dança e
o audiovisual, entre outras. Com base nessas experiências, elas se
expressam por várias linguagens, criando suas próprias produções
artísticas ou culturais, exercitando a autoria (coletiva e individual)
com sons, traços, gestos, danças, mímicas, encenações, canções,
Traços, desenhos, modelagens, manipulação de diversos materiais e de
sons, cores e recursos tecnológicos. Essas experiências contribuem para que, desde
formas muito pequenas, as crianças desenvolvam senso estético e crítico, o
conhecimento de si mesmas, dos outros e da realidade que as cerca.
Como a escola deve proceder: Portanto, a Educação Infantil precisa
promover a participação das crianças em tempos e espaços para a
produção, manifestação e apreciação artística, de modo a favorecer
o desenvolvimento da sensibilidade, da criatividade e da expressão
pessoal das crianças, permitindo que se apropriem e reconfigurem,
permanentemente, a cultura e potencializem suas singularidades, ao
ampliar repertórios e interpretar suas experiências e vivências artísticas.
Desde o nascimento, as crianças participam de situações comunicativas
cotidianas com as pessoas com as quais interagem. As primeiras formas
de interação do bebê são os movimentos do seu corpo, o olhar, a postura
corporal, o sorriso, o choro e outros recursos vocais, que ganham
sentido com a interpretação do outro. Progressivamente, as crianças
vão ampliando e enriquecendo seu vocabulário e demais recursos de
Escuta, fala, expressão e de compreensão, apropriando-se da língua materna – que
pensamento se torna, pouco a pouco, seu veículo privilegiado de interação.
e Como a escola deve proceder: Na Educação Infantil, é importante
imaginação promover experiências nas quais as crianças possam falar e ouvir,
potencializando sua participação na cultura oral, pois é na escuta de
histórias, na participação em conversas, nas descrições, nas narrativas
elaboradas individualmente ou em grupo e nas implicações com as
múltiplas linguagens que a criança se constitui ativamente como sujeito
singular e pertencente a um grupo social.
As crianças vivem inseridas em espaços e tempos de diferentes dimensões,
em um mundo constituído de fenômenos naturais e socioculturais.
Desde muito pequenas, elas procuram se situar em diversos espaços
(rua, bairro, cidade etc.) e tempos (dia e noite; hoje, ontem e amanhã
etc.). Demonstram também curiosidade sobre o mundo físico (seu
próprio corpo, os fenômenos atmosféricos, os tipos de materiais e as
possibilidades de sua manipulação etc.) e o mundo sociocultural (as
relações de parentesco e sociais entre as pessoas que conhece; como
vivem e em que trabalham essas pessoas; quais suas tradições e seus
Espaços, costumes; a diversidade entre elas etc.). Além disso, nessas experiências
tempos, e em muitas outras, as crianças também se deparam, frequentemente,
quantida- com conhecimentos matemáticos (contagem, ordenação, relações
des, relações entre quantidades, dimensões, medidas, comparação de pesos e de
e transfor- comprimentos, avaliação de distâncias, reconhecimento de formas
mações geométricas, conhecimento e reconhecimento de numerais cardinais e
ordinais etc.) que igualmente aguçam a curiosidade.
Como a escola deve proceder: Portanto, a Educação Infantil precisa
promover experiências nas quais as crianças possam fazer observações,
manipular objetos, investigar e explorar seu entorno, levantar hipóteses
e consultar fontes de informação para buscar respostas às suas
curiosidades e indagações. Assim, a instituição escolar está criando
oportunidades para que as crianças ampliem seus conhecimentos do
mundo físico e sociocultural e possam utilizá-los em seu cotidiano.

FONTE: Brasil (2018, p. 40-43)

155
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

Ao refletirmos sobre cada campo de experiência destacados na BNCC,


podemos compreender que estes determinam a construção do conhecimento pela
socialização, pelo conhecimento do corpo, pela utilização das formas, das cores;
com vivências significativas, buscando a construção do conhecimento por meio
de novas experiências.

Destacamos ainda que os campos de experiências visam possibilitar


as crianças a aprendizagem e o desenvolvimento. Assim, a escola, enquanto
espaço social e cultural, precisa possibilitar a criança avanços para estágios de
desenvolvimento ainda não trilhados, impulsionando-a a novos conhecimentos e
conquistas. Neste contexto, o processo de ensino deve partir do que a criança já
sabe, ensinando o que ainda não sabe, mas que é capaz de fazer com a ajuda de
outro, ou seja, a zona de desenvolvimento proximal.

Segundo Vygotsky (2007), a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP)

É a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma


determinar através da solução independente de problemas, e o nível
de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de
problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com
companheiros mais capazes (VIGOTSKY, 2007, p. 97).

O anunciado por Vygotsky (2007) pode ser observado na figura a seguir.

FIGURA 7 – ZONA DE DESENVOLVIMENTO PROXIMAL (ZDP)

FONTE: <https://bit.ly/3oleKMO>. Acesso em: 20 set. 2021.

Conforme exposto na Figura 7, podemos compreender que a Zona de


Desenvolvimento Proximal é caracterizada pela distância estabelecida entre os
níveis de desenvolvimento “real” e “potencial”. O nível de desenvolvimento real
indica o desenvolvimento já alcançado pela criança. O desenvolvimento potencial
é o conjunto de atividades que a criança realiza com a ajuda de alguém mais
experiente, que possa lhe dar orientações (TRENTIN, 2011).
156
TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

A distância entre esses níveis permite ao professor pontuar o nível


potencial apresentado pela criança e, então, reorganizar suas ações pedagógicas,
para que o aluno avance do nível potencial para o real.

No sentido apontado por Vygotsky (2007), a mediação é primordial na


educação escolar no que se refere à Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP),
pois é por meio dela que ocorre a transformação do processo interpessoal (social),
para o processo intrapessoal (individual), ou seja, o sujeito vivencia a atividade
no âmbito social, para, depois, internalizá-la, assim ocorrendo o processo de
aprendizagem e de desenvolvimento.

Neste processo de aprendizagem ressalta-se a importância dos campos de


experiência citados na BNCC, sendo eles divididos em três faixas etárias: 0 a 1 ano
e seis meses, considerados aqui como bebês; 1 ano e sete meses a 3 anos e onze
meses, considerados crianças bem pequenas; e de 4 anos a 5 anos e onze meses
de crianças pequenas (BRASIL, 2018). Compreende-se que essa divisão ocorre
porque cada faixa etária possui objetivos de aprendizagens diferenciados. Para
elucidar essa divisão destacamos na figura 8, os objetivos de aprendizagem do
eixo 4 do campo de experiência “Escuta, Fala, Pensamento e Imaginação”.

FIGURA 8 – OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM EIXO 4 CAMPO DE EXPERIÊNCIA: ESCUTA, FALA,


PENSAMENTO E IMAGINAÇÃO

157
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

FONTE: Brasil (2018, p. 49-50)

158
TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

Os objetivos de aprendizagem apresentados na Figura 8 ressaltam a


importância da experiência e como ela se modifica conforme a faixa etária da
criança.

No que concerne a experiência, vale destacar a Pedologia, ou seja, a


ciência que estuda não o meio e as regras que o constituem, mas sim, seu papel,
seu significado, sua participação e sua influência no desenvolvimento da criança.
Assim,

[...] a pedologia deverá saber encontrar a relação existente entre a


criança e o meio, a vivência da criança, isto é, de que forma ela toma
consciência e concebe, de como ela se relaciona afetivamente para
com certo acontecimento. Esse é o prisma que determina o papel e
a influência do meio no desenvolvimento do – digamos – caráter da
criança, do seu desenvolvimento psicológico (VYGOTSKY, 2010, p.
686).

Compreendemos que Vygotsky (2010) não destaca a percepção sobre


o meio, mas sobre a relação entre a criança e o meio, sobre o modo como ela
interpreta e produz sentidos sobre suas experiências no mundo, sendo que é neste
processo que as peculiaridades constitutivas da sua personalidade desempenham
papel principal.

Esse contexto que envolve a personalidade e o meio, o sujeito e a cultura


sãosão destacados por Vygotsky (2010) no conceito de perezhivanie, que, ao ser
traduzido se aproxima do conceito de vivência. Segundo Vygostky (2010),

A vivência de uma situação qualquer, a vivência de um componente


qualquer do meio determina qual influência essa situação ou esse meio
exercerá na criança. Dessa forma, não é esse ou aquele elemento tomado
independentemente da criança, mas, sim, o elemento interpretado pela
vivência da criança que pode determinar sua influência no decorrer de
seu desenvolvimento futuro (VYGOTSKY, 2010, p. 683-684).

Compreendemos que na vivência, estão presentes, como uma unidade


indivisível personalidade específica do sujeito e as particularidades da situação
experienciada, ou seja, a microgênese.

Assim, as vivências, no processo de aprendizagem, necessitam


organizarem-se para estimular o pensamento, proporcionando novos significados
para o uso da palavra (falada e escrita) “como meio para a formação de conceitos”
(VYGOTSKY, 2007, p. 51).

Sob esse ângulo, Vygotsky (2014, p.13) anuncia que “quanto mais o sujeito
ouvir e experimentar, quanto mais aprender e assimilar, quanto mais elementos da
realidade tiver a sua disposição na sua experiência, mais importante e produtiva
será sua atividade imaginativa.” Assim, considera-se a ampliação das vivências
uma condição essencial para a aprendizagem na educação infantil.

159
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

Neste contexto, que o qual envolve a importância das experiências,


evidenciamos o eixo 4, o campo de experiência: escuta, fala, pensamento e
imaginação, o qual evidencia-se na figura 8, ressaltam-se as experiências com
a linguagem oral, as quais ampliam as diversas formas sociais de comunicação
presentes na cultura humana, como as conversas, cantigas, brincadeiras de roda,
jogos cantados etc.

Há destaque, também neste o eixo 4 campo de experiência: escuta,


fala, pensamento e imaginação, às experiências com a leitura de histórias que
favoreçam aprendizagens relacionadas à leitura, ao comportamento leitor, à
imaginação e à representação e, ainda, à linguagem escrita, convidando a criança
a conhecer os detalhes do texto e das imagens e a ter contato com os personagens,
a perceber no seu corpo as emoções geradas pela história, a imaginar cenários,
construir novos desfechos etc.

Podemos inferir que o eixo 4 compreende as experiências com as práticas


cotidianas de uso da escrita, sempre em contextos significativos e plenos de
significados, promovendo imitação de atos escritos em situações de faz de conta,
bem como situações em que as crianças se arriscam a ler e a escrever de forma
espontânea, apoiadas pelo professor, que as engajam em reflexões que organizam
suas ideias sobre o sistema de escrita.

Assim destacamos que mesmo não tendo o nome alfabetização, o campo


da experiência nomeado “Escuta, Fala, Pensamento e Imaginação”, constitui
um arranjo curricular de experiências e saberes da criança voltados para essa
temática.

Destacamos que mesmo não tendo o nome alfabetização, o campo da


experiência nomeado “Escuta, Fala, Pensamento e Imaginação”, constitui um
arranjo curricular de experiências e saberes da criança voltados para essa temática.

Podemos inferir assim que o eixo 4 Campo de Experiência da BNCC é


aquele que valoriza a comunicação como potencializadora do desenvolvimento
infantil, sendo a dimensão que envolve a capacidade de se comunicar e expressar.
É o início do gosto pela leitura e escrita, da habilidade de contar e ouvir histórias.

Nesse período de aprendizagem na Educação Infantil, a BNCC destaca


como fundamental a exploração do falar e do ouvir por meio de situações e
exercícios interativos e lúdicos.

Sobre a alfabetização na Educação Infantil o documento traz alguns


pontos, sendo eles:

• A criança naturalmente manifesta curiosidade linguística acerca dos textos


escritos. Sozinha ela constitui a própria concepção de língua escrita, sendo
capaz de reconhecer a multiplicidade dos usos da escrita;

160
TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

• A partir dos conhecimentos e desejos manifestados pelas crianças, a imersão


na cultura da escrita deve ser iniciada;
• O contato precoce com a literatura colabora para o desenvolvimento do gosto
pela leitura e estímulo a criatividade;
• A familiaridade com texto escritos faz com que as crianças desenvolvam
hipóteses sobre o escrever. Na maioria das vezes, os pequenos conseguem
identificar a escrita como um sistema de representação da língua (BRASIL,
2018).

Nesse período de aprendizagem, a BNCC destaca como fundamental


o explorar do falar e do ouvir por meio de situações e exercícios interativos e
lúdicos.

Para você ampliar seu conhecimento sobre o eixo 4 “Escuta, Fala,


Pensamento e Imaginação” faça a leitura do texto abaixo retirado da BNCC:

UNI

CAMPO DE EXPERIÊNCIA: ESCUTA, FALA, PENSAMENTO E IMAGINAÇÃO

Desde o nascimento, as crianças participam de situações comunicativas cotidianas


com as pessoas com as quais interagem. As primeiras formas de interação do bebê são os
movimentos do seu corpo, o olhar, a postura corporal, o sorriso, o choro e outros recursos
vocais, que ganham sentido com a interpretação do outro.
Progressivamente, as crianças vão ampliando e enriquecendo seu vocabulário e
demais recursos de expressão e de compreensão, apropriando-se da língua materna – que
se torna, pouco a pouco, seu veículo privilegiado de interação.
Na Educação Infantil, é importante promover experiências nas quais as crianças
possam falar e ouvir, potencializando sua participação na cultura oral, pois é na escuta
de histórias, na participação em conversas, nas descrições, nas narrativas elaboradas
individualmente ou em grupo e nas implicações com as múltiplas linguagens que a criança
se constitui ativamente como sujeito singular e pertencente a um grupo social.
Desde cedo, a criança manifesta curiosidade com relação à cultura escrita: ao
ouvir e acompanhar a leitura de textos, ao observar os muitos textos que circulam no
contexto familiar, comunitário e escolar, ela vai construindo sua concepção de língua
escrita, reconhecendo diferentes usos sociais da escrita, dos gêneros, suportes e portadores.
Na Educação Infantil, a imersão na cultura escrita deve partir do que as crianças
conhecem e das curiosidades que deixam transparecer. As experiências com a literatura
infantil, propostas pelo educador, mediador entre os textos e as crianças, contribuem para
o desenvolvimento do gosto pela leitura, do estímulo à imaginação e da ampliação do
conhecimento de mundo.
Além disso, o contato com histórias, contos, fábulas, poemas, cordéis etc. propicia a
familiaridade com livros, com diferentes gêneros literários, a diferenciação entre ilustrações
e escrita, a aprendizagem da direção da escrita e as formas corretas de manipulação de
livros.

161
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

Nesse convívio com textos escritos, as crianças vão construindo hipóteses


sobre a escrita que se revelam, inicialmente, em rabiscos e garatujas e, à medida que vão
conhecendo letras, em escritas espontâneas, não convencionais, mas já indicativas da
compreensão da escrita como sistema de representação da língua.

Trecho extraído do documento Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018, p.42)

Mediante ao contexto anunciado na BNCC sobre a alfabetização na


Educação Infantil, emerge questionamentos:

UNI

COMO INICIAR O TRABALHO DE ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL?

VEJA ALGUMAS SUGESTÕES:

IDADE: Bebês (de 0 a 1 ano e 6 meses) e crianças bem pequenas (1 ano e 7 meses a 3 anos e 11 meses)

Trabalhamos práticas de leitura lúdica e musicalidade que sejam capazes de proporcionar


a curiosidade e a imaginação dos bebês. Percebendo que a turma do berçário é uma tur-
ma curiosa, resolvi confeccionar um livro de pano com algumas músicas de cantigas de
roda que normalmente cantamos em sala de aula. Esse livro tem imagens e objetos con-
cretos. As crianças pegam o livro conforme vamos cantando a música. A primeira página
do livro tem a imagem de uma parede feita de pano com um zíper, logo acima da parede
se pode ver o sol e uma nuvem. No zíper costuramos uma aranha de brinquedo. Os bebês
passam a pegar na aranha e subir e descer o zíper, de acordo com a música da “Dona
Aranha” que está sendo cantada. Em seguida, temos a música “Fui morar numa casinha”.
No livro, as casas são feitas de pano, com a portinha confeccionada com um plástico duro
reciclado. Os bebês acompanham a música e têm no livro o objeto concreto do que é
cantado na música: a princesa, a lagartixa, o morcego, as flores. As crianças participam da
aula cantada através do visual e do manuseio dos objetos, interagindo de forma espontâ-
nea. No livro, as páginas contêm várias músicas no mesmo estilo, todas com imagens e
materiais concretos e lúdicos.

Kiaria Cavalcante da Silva, CREI Stelina Nunes, João Pessoa (PB)

APRENDIZADOS

Juntamente com os bebês e as crianças bem pequenas formamos um círculo no chão,


todos sentados um de frente para os outros. Os bebês mostraram curiosidade em relação
ao livro cantado, com vontade de abrir e explorar esse objeto. No momento que abri o li-
vro e comecei a cantar mostrando as imagens e os materiais presentes, os bebês começa-
ram a tocar de acordo com as palavras da canção. As crianças bem pequenas observaram
e passaram a interagir espontaneamente.
Percebi que os bebês, além de desenvolver a percepção visual, também desenvolveram
a oralidade e a curiosidade em explorar as imagens e os materiais ali presentes, de forma
interacional e tendo iniciativa na exploração do livro.

162
TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

IDADE: Crianças bem pequenas (1 ano e 7 meses a 3 anos e 11 meses)

As crianças pequenas demonstram um encantamento pelo mundo natural com que


convivem e fazem parte, assim, vislumbrei o espaço externo aliado à natureza da escola
onde trabalho, como um laboratório de vivências e descobertas com o corpo através
dos diferentes sentidos, potencializando as aprendizagens das crianças de forma praze-
rosa e significativa, construindo assim suas identidades e manifestando suas culturas.

Acompanhei as crianças até o ambiente externo e cada criança escolheu dentre os ele-
mentos da natureza aquilo que mais encantou, socializamos na roda de conversa, cada
criança verbalizou o que e por que de ter escolhido aquele elemento da natureza, depois
contamos, classificamos, seriamos e ordenamos os elementos e no final as crianças pu-
deram exercer seu poder de criação e transformação tendo suas intervenções criativas,
atribuindo significados particulares aos elementos, os gravetos viraram microfones, vara
de pescar, espada, colher de pau, vassouras, bengalas, canetas.

Viviane Graciele de Araújo Valério, EMEI Alfredo Rodrigues, São Caetano do Sul (SP)

APRENDIZADOS

Foi possível observar a criança sendo protagonista no seu processo de aprendizagem.


Eles interagiram com os elementos da natureza, verbalizando suas experiências, usando
critérios para separar, classificar e ordenar. As crianças exercitaram seu poder de criação
e transformação na natureza, transformando árvores em cabanas, sementes em comidi-
nhas, folhas médias em pratinhos e folhas grandes em barcos.
Sugestões disponíveis em: https://bit.ly/3mqNZUm.

4 A LEITURA E ESCRITA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O


QUE REVELA A BNCC?
Silva e Pinto (2020) ao referirem-se a BNCC questionam alguns pontos:
como a leitura está expressa no atual documento para a Educação Infantil? A
concepção de leitura assumida na BNCC é a mesma de documentos anteriores?
Partindo de tais questionamentos, em um primeiro momento, é preciso lembrar
que os documentos oficiais publicados pelo MEC são de cunho legislativo.
Em outras palavras, os documentos respondem à legislação vigente do país,
procurando atender às reivindicações da sociedade civil organizada e dos órgãos
administrativos da federação, que executam as políticas (SILVA; PINTO, 2020).

As autoras destacam que a Constituição Federal Brasileira, deliberada


em 1988, representou um grande avanço à história da educação e aos direitos
das crianças. No artigo 205º, que trata da Educação, da Cultura e do Desporto,
a Constituição estabelece que a educação é um direito de todos os brasileiros,
sendo dever do Estado e da família, à promoção e o incentivo ao “pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988). A mesma Lei ainda assegura a
Educação Infantil gratuita em creches e pré-escolas até os cinco anos de idade.
Outra lei que regulamenta a educação é a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDBEN, Lei nº 9394/96) que incluiu a Educação Infantil como primeira

163
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

modalidade da educação básica. Esta lei colaborou e fez efervescer a discussão


sobre os princípios e fundamentos da educação para a primeira infância. Diante
dos dispositivos legais do Estado, o MEC encarrega-se de compor documentos
que orientem a Educação Infantil no âmbito nacional, uma vez que a LDB (1996)
enfatiza que “a União incumbir-se-á de [...] estabelecer, em colaboração com os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a
Educação Infantil [...] que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de
modo a assegurar formação básica comum” (BRASIL, 1996).

Por sua vez, as creches e pré-escolas deverão “no prazo de três anos, a contar
da publicação desta Lei, integrar-se ao respectivo sistema de ensino” (BRASIL,
1996). Considerando a LDBEN, a BNCC integra o rol de documentos oficiais para
a Educação Infantil. Esta estrutura-se em alguns conceitos que os precedentes
documentos já apresentavam, como por exemplo, o conceito de criança exposto
nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (DCNEI). Em ambos
os documentos a criança é tomada como:

sujeito histórico e de direitos, que, nas interações, relações e práticas


cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva,
brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta,
narra, questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade,
produzindo cultura (BRASIL, 2009).

Silva e Pinto (2020) ressaltam que a BNCC se assemelha às DCNEI ao se referir


aos eixos estruturantes de sua organização curricular: interações e brincadeiras.
Esses eixos compõem os direitos de aprendizagens e desenvolvimento das
crianças na BNCC. Os direitos de aprendizagem e desenvolvimento integram um
conjunto de fazeres – pessoais, sociais e naturais - que dão condições às crianças de
agirem ativamente sob os ambientes e vivências propostas. Os direitos descritos no
documento são arrolados como: conviver, brincar, participar, explorar, expressar
e conhecer-se. Destes seis direitos que estão estruturados nos eixos interações e
brincadeiras, a Base organiza o currículo para a Educação Infantil em cinco campos
de experiências, sendo eles: O eu, o outro e o nós; Corpo, gestos e movimentos;
Traços, sons, cores e formas; Escuta, fala, pensamento e imaginação e Espaços,
tempos, quantidades, relações e transformações. Estes campos são considerados
“um arranjo curricular que acolhe as situações e as experiências concretas da vida
cotidiana das crianças e seus saberes, entrelaçando-os aos conhecimentos que
fazem parte do patrimônio cultural” (BRASIL, 2018, p. 38). Dentre os campos de
experiência, a leitura está sob o campo: ‘Escuta, fala, pensamento e imaginação’,
que apresenta o seguinte conceito:

Desde cedo, a criança manifesta curiosidade com relação à cultura


escrita: ao ouvir e acompanhar a leitura de textos, ao observar
os muitos textos que circulam no contexto familiar, comunitário
e escolar, ela vai construindo sua concepção de língua escrita,
reconhecendo diferentes usos sociais da escrita, dos gêneros, suportes
e portadores. Na Educação Infantil, a imersão na cultura escrita deve
partir do que as crianças conhecem e das curiosidades que deixam
transparecer. As experiências com a literatura infantil, propostas pelo
educador, mediador entre os textos e as crianças, contribuem para o

164
TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

desenvolvimento do gosto pela leitura, do estímulo à imaginação e


da ampliação do conhecimento de mundo. Além disso, o contato com
histórias, contos, fábulas, poemas, cordéis etc. propicia a familiaridade
com livros, com diferentes gêneros literários, a diferenciação entre
ilustrações e escrita, a aprendizagem da direção da escrita e as formas
corretas de manipulação de livros. Nesse convívio com textos escritos,
as crianças vão construindo hipóteses sobre a escrita que se revelam,
inicialmente, em rabiscos e garatujas e, à medida que vão conhecendo
letras, em escritas espontâneas, não convencionais, mas já indicativas
da compreensão da escrita como sistema de representação da língua
(BRASIL, 2018, p. 40).

Silva e Pinto (2020) ressaltam que o conceito de leitura ao qual o atual


documento direciona o trabalho pedagógico apresenta a proposta do convívio
com diferentes textos, por meio do qual as crianças construirão sua própria
concepção da língua escrita. Neste documento, o educador é identificado como
o mediador da leitura e por esta mediação a criança estabelecerá saberes sobre a
leitura. O texto do documento se refere à importância dos rabiscos e garatujas,
mas não se volta à dinâmica da situação da prática leitora nem às possíveis
propostas de encaminhamentos para esses momentos de produção da criança.

A produção escrita é descrita no quadro Objetivos de aprendizagens e


desenvolvimento, ao qual destaca a escrita espontânea e a escrita estruturada pelo
educador, como escriba. O texto da BNCC expressa, de certa forma, a formação
leitora defendida por estudiosos consagrados da área de educação e que já
tematizaram a sua importância (embora não voltado a crianças especificamente),
como Freire (1989) e Silva (2003). Os autores compreendem a formação leitora na
construção de ideias sobre o texto, por meio de rodas de conversa, de debates, nas
interações entre todos os participantes, na leitura de mundo que o diálogo entre
professor e aluno (educador e criança) pode proporcionar. Essa experiência de
apropriação do texto é defendida pelos autores e citada na BNCC:

Progressivamente, as crianças vão ampliando e enriquecendo seu


vocabulário e demais recursos de expressão e de compreensão,
apropriando-se da língua materna – que se torna, pouco a pouco, seu
veículo privilegiado de interação. Na Educação Infantil, é importante
promover experiências nas quais as crianças possam falar e ouvir,
potencializando sua participação na cultura oral, pois é na escuta de
histórias, na participação em conversas, nas descrições, nas narrativas
elaboradas individualmente ou em grupo e nas implicações com as
múltiplas linguagens que a criança se constitui ativamente como
sujeito singular e pertencente a um grupo social (BRASIL, 2018, p. 40).

O documento ainda apresenta os Objetivos de aprendizagem e


desenvolvimento que correspondem às aproximações de habilidades que as
crianças devam alcançar, ao final da Educação Infantil. Conhecendo quais
são as habilidades finais, o educador tem a autonomia em planejar e propor
atividades que correspondam às práticas de leituras que envolvam o debate, a
discussão e o diálogo e, que por consequência irão corresponder às habilidades
esperadas na BNCC. No documento a autonomia do educador é expressa com
o termo intencionalidade educativa. Esta intencionalidade se refere às práticas

165
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

pedagógicas que o educador dispõe para planejar experiências que promovam


o desenvolvimento das crianças, cabendo a ele “refletir, selecionar, organizar,
planejar, mediar e monitorar o conjunto das práticas e interações, garantindo a
pluralidade de situações que promovam o desenvolvimento pleno das crianças”
(BRASIL, 2018, p. 37).

Assim compreendemos que para ler e escrever, os pequenos na Educação


Infantil não precisam dominar os códigos, que devem ser trabalhados mais
intensivamente apenas no início do Ensino Fundamental. É isso o que define a
BNCC, baseada nos diversos estudos sobre alfabetização conduzidos nas últimas
décadas. Por isso, a prática da escrita espontânea é fundamental: ao estimular
a turma a escrever da maneira como souber - mesmo que seja apenas criando
garatujas - e depois ler suas próprias produções, o contato com o mundo letrado
se intensifica.

Além disso, o convívio com diversos gêneros faz com que as crianças se
apropriem desses textos e sejam capazes de criar oralmente histórias que lembrem
seus livros literários favoritos ou ditar legendas informativas para seus desenhos
pareçam com as de revistas e livros científicos.

O professor pode atuar como o escriba da turma, registrando de maneira


visível as orientações passadas pela criançada. Esse é, inclusive, um dos objetivos
de aprendizagem e desenvolvimento presentes para a faixa etária dos 4 aos 5
anos e 11 meses. Essa atuação do professor reforça a ideia de que a criança já é
autora de textos, mesmo sem entender o sistema e a lógica por trás das palavras.

A professora Paula Sestari, do CEI Namir Alfredo Zattar, em Joinville,


Santa Catarina, acredita na ampliação do repertório das crianças com experiências
baseadas em situações reais. "Eu entendo a escrita e a leitura como parte do
cotidiano, da mesma forma que trabalhamos as demais linguagens, como a
fotografia, a música e a dança."

Uma das atividades feitas pela professora - eleita Educadora do Ano em


2014 - é a escrita de listas ditadas pelas crianças com base em perguntas geradoras
relacionadas ao universo dos pequenos. "Quais os materiais necessários para

166
TÓPICO 1 — ALFABETIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O QUE DIZ A BNCC?

brincar de detetive?" e "Quais são os animais que vivem no mar?" são algumas
das questões levantadas por ela, que registra em um cartaz as respostas. Em
seguida, vale incentivar que eles relacionem as letras das palavras com as letras
dos próprios nomes. "Eles olham o crachá e apontam o que têm em comum entre
os termos", explica.

As atividades de reconto também fazem parte da rotina. Juntas, as crianças


narram uma história já conhecida, como Chapeuzinho Vermelho, ou criam uma
nova. Enquanto isso, a professora estrutura e registra em cartaz, sempre com o
aval da garotada. "É dar forma para aquilo que eles estão dizendo", explica Paula.

Outra possibilidade é mudar o suporte, da cartolina para o computador.


Com isso, os pequenos observam a diferença no padrão de escrita (a caligrafia
e as tipografias do computador) e refletem sobre o destino da mensagem. Uma
alternativa é construir, com base no que eles dizem, um bilhete para as famílias.
Enquanto a turma dita a mensagem, a professora digita no computador. "Com
essa dinâmica, as crianças aprendem coisas como o sentido do texto no papel",
diz ela.

167
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

SUGESTÃO: TRABALHANDO A HABILIDADE

Recontar histórias ouvidas para produção de reconto escrito, tendo o


professor como escriba.

Como abordar

Recupere uma história conhecida da turma e sugira que as crianças a


recontem para que você registre em papel ou na lousa. Intervenha para que elas
recorram à linguagem típica do gênero escolhido

Sugestões disponíveis em: https://novaescola.org.br/conteudo/10044/ler-


e-escrever-do-proprio-jeito

168
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) se constitui em um documento


de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de
aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das
etapas e modalidades da Educação Básica, de modo a que tenham assegurados
seus direitos de aprendizagem e desenvolvimento, em conformidade com o
que preceitua o Plano Nacional de Educação- PNE.

• A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) deverá nortear a formulação dos


currículos dos sistemas de ensino de todo o Brasil, indicando as habilidades e
competências a serem desenvolvidas pelos alunos ao longo da vida.

• Na BNCC, competência é definida como a mobilização de conhecimentos


(conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e socioemocio-
nais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana,
do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho.

• Na Educação Infantil, a BNCC traz os direitos de aprendizagem, pautados


nos eixos estruturantes (interações e brincadeira), os quais devem ser
assegurados mediante seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento,
para que as crianças tenham condições de aprender e se desenvolver.

• No eixo 4 “campo de experiência: escuta, fala, pensamento e imaginação”,


evidencia-se as experiências com a linguagem oral, as quais ampliam as
diversas formas sociais de comunicação presentes na cultura humana, como
as conversas, cantigas, brincadeiras de roda, jogos cantados.

• Para ler e escrever, os pequenos na Educação Infantil não precisam dominar


plenamente os códigos, que devem ser trabalhados mais intensivamente
apenas no início do Ensino Fundamental. A prática da escrita espontânea é
fundamental: ao estimular a turma a escrever da maneira como souber - mesmo
que seja apenas criando garatujas - e depois ler suas próprias produções, o
contato com o mundo letrado se intensifica.

169
AUTOATIVIDADE

1 A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) deverá nortear a formulação


dos currículos dos sistemas de ensino de todo o Brasil, indicando as
habilidades e competências a serem desenvolvidas pelos alunos ao longo da
vida. Disserte sobre o que significa as competências e habilidades segundo
a BNCC.

2 De acordo coma Base Nacional Comum Curricular apresenta 10 Compe-


tências Gerais, indicando como elas devem evoluir da Educação Infantil até
o Ensino Médio. As Competências Gerais integram o capítulo introdutório
da BNCC e foram definidas a partir dos direitos éticos estéticos e políticos
assegurados pelas Diretrizes Curriculares Nacionais e dos conhecimentos,
habilidades, atitudes e valores essenciais para a vida no século XXI.

Os princípios são: Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de


informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética
nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar,
acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver
problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva.

Estes princípios se referem às competências abaixo:

a) ( ) Conhecimento.
b) ( ) Empatia e Cooperação.
c) ( ) Cultura Digital.
d) ( ) Autoconhecimento e Autocuidado.
e) ( ) Responsabilidade e Cidadania.

3 Na Educação Infantil, a BNCC traz os direitos de aprendizagem, pautados


nos eixos estruturantes (interações e brincadeira), os quais devem ser
assegurados mediante seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento,
para que as crianças tenham condições de aprender e se desenvolver. Quais
são os seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento na Educação
Infantil?

4 Segundo Vygotsky (2008), a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP)


é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma
determinar através da solução independente de problemas, e o nível de
desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas
sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais
capazes. Mediante esse contexto, podemos compreender que a Zona de
Desenvolvimento Proximal é caracterizada pela distância estabelecida entre
os níveis de desenvolvimento “real” e “potencial”. Com base no exposto,
classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

170
( ) O nível de desenvolvimento real indica o desenvolvimento já alcançado
pela criança.
( ) O nível de desenvolvimento potencial é o conjunto de atividades que a
criança realiza com a ajuda de alguém mais experiente, que possa lhe dar
orientações.
( ) A distância entre esses níveis permite ao professor pontuar o nível
potencial apresentado pela criança e, então, reorganizar suas ações
pedagógicas, para que o aluno avance do nível potencial para o real.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V - V - V.
b) ( ) V - F - V.
c) ( ) F - F - V.
d) ( ) V - V - F.

5 Aprendemos que a BNCC evidencia para a Educação Infantil direitos de


aprendizagem, os quais ressaltam o desenvolvimento de competências, as
quais visam o desenvolvimento cognitivo, físico e emocional da criança por
meio de cinco campos de experiências, dentre esses campos de experiência
destacamos “Escuta, fala, pensamento e imaginação”. Sobre o campo de
experiência “Escuta, fala, pensamento e imaginação” descreva segundo a
BNCC, como a escola deve proceder.

171
172
UNIDADE 3 TÓPICO 2 —

A BNCC E A ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS


INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

1 INTRODUÇÃO
Iniciamos este tópico com alguns questionamentos:
Quanto tempo é necessário para alfabetizar?
Qual a melhor maneira de ensinar a ler e a escrever?
O que significa, no fim das contas, estar alfabetizado?

Acadêmico(a), você sabia que esses foram alguns dos questionamentos


sobre alfabetização durante a tramitação da Base Nacional Comum Curricular
(BNCC). Assim, compreendemos que são muitas as dúvidas que rondam a cabeça
de professores no Brasil afora. E isso é natural, afinal, a alfabetização é um tema
complexo.

Mas você professor/alfabetizador, vai perceber durante a leitura desse


tópico que um dos pontos mais importantes para alfabetizar é propor práticas
educativas que explorem a linguagem, em especial a oral e a escrita, em situações
reais em que se fazem necessários seu uso, explorando também o universo lúdico.
Afinal, no desenvolvimento do processo de alfabetização, tudo é motivo para ler,
escrever, explorar e se expressar.

Vamos lá?

2 ENSINO FUNDAMENTAL - ANOS INICIAIS


Ao buscarmos na história acontecimentos que envolvem a escolarização,
descobrimos que no Brasil sua origem ocorreu a partir dos jesuítas, os quais
conduziram a educação por mais de duzentos anos. Os jesuítas ensinavam a ler
e a escrever, o que correspondia basicamente aos Anos Iniciais nos dias de hoje.

A partir deste contexto, podemos inferir que o Ensino Fundamental


no Brasil começa a desenhar sua história a partir da Lei Orgânica do ensino
primário, Decreto Lei nº 8.529/1946. Esse Decreto Lei classificou o ensino primário
fundamental em duas categorias: a) o ensino primário fundamental, destinado
às crianças de sete a doze anos; b) o ensino primário supletivo, destinado aos
adolescentes e adultos.

173
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

No entanto o Ensino Fundamental recebe nova nomenclatura na


Constituição Federal de 1988, tornando-se prioridade do Estado e do município a
sua oferta em regime de cooperação. Com a LDB 9394/96, o Ensino Fundamental
ganha visibilidade mais concreta quanto a sua direção (VEIGA; SILVA, 2018, p.
20). A LDB garante a duração de oito anos, a obrigatoriedade e a oferta gratuita
e especifica que os objetivos do Ensino Fundamental serão a formação básica do
cidadão, mediante o domínio da leitura e da escrita, artes e valores, conhecimento
e habilidades.

A Lei no 11.274/2006 alterou a LDB 9394/96 e ampliou o Ensino Fundamental


de 8 (oito) para 9 (nove) anos de duração. De acordo com a Resolução CNE/CEB
nº 3/2005, o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos possui duas fases: Anos Iniciais
com 5 (cinco) anos de duração e Anos Finais com 4 (quatro) anos de duração.

A Resolução CNE/CEB No7de 14 de dezembro de 2010 que fixa as


Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9 anos, reafirma
o normatizado pela LDB sobre a base nacional: “a base nacional comum e a parte
diversificada do currículo do Ensino Fundamental constituem um todo integrado
e não podem ser consideradas como dois blocos distintos”. Esse documento,
portanto, registra a importância de uma Base Comum, que deverá estar vinculada
a uma parte diversificada, em que as próprias redes de ensino possam agregar aos
currículos das escolas, conteúdos complementares, respeitando as características
das diferentes realidades regionais e locais de cada sociedade.

3 ALFABETIZAÇÃO E OS ANOS INICIAIS NA BNCC


Craveiro e Barbosa (2021) ressaltam que do ponto de vista dos teóricos da
educação, a alfabetização é compreendida como a etapa em que se inicia o processo
de apreensão dos conhecimentos da leitura e da escrita, ou seja, o ingresso no
mundo da escrita. Assim, constitui-se em um percurso longo e complexo, que se
dá na relação desenvolvida pelo professor compreendido como o mediador do
processo de aprendizagem.

As autoras ainda destacam que o Ensino Fundamental é concebido como


direito inalienável de todos os cidadãos, conforme dispõe a Constituição Federal
de 1988. E o que proporciona êxito nas aprendizagens formais escolares é uma
alfabetização de qualidade (CRAVEIRO; BARBOSA, 2021).

174
TÓPICO 2 — A BNCC E A ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

FIGURA 9 – ENSINO FUNDAMENTAL - ANOS INICIAIS

FONTE: <https://sae.digital/bncc-ensino-fundamental-anos-iniciais/>. Acesso em: 20 set. 2021.

No entanto, vale destacar que o alfabetizar na contemporaneidade traz,


em seu processo, resquícios da pedagogia tradicional, mecânica, rígida e elitista
da educação jesuítica, em que a alfabetização, resume-se em uma técnica na qual
o sujeito se torna um decodificador de textos e um escriba de poucas palavras
sem atingir a proficiência em sua própria língua (CRAVEIRO; BARBOSA, 2021).

A alfabetização necessita ser vista como um processo articulado com


o letramento, pois o ato de ler e escrever são fenômenos sociais, estruturados
coletivamente, os quais se complementam concomitantemente, tornando-se um
conhecimento transversal pois,

O domínio da linguagem escrita significa para a criança dominar


um sistema de signos simbólicos extremamente complexos. [...] o
domínio deste sistema complexo não pode realizar-se por uma via
exclusivamente mecânica, desde fora, por meio de uma simples
pronunciação, de uma aprendizagem artificial.
[...] O domínio da linguagem escrita é, na realidade, o resultado de
um largo desenvolvimento das funções psíquicas superiores do
comportamento infantil (VYGOTSKY, 2007, p. 184).

As funções psíquicas superiores referem-se a mecanismos de ação, como:


a capacidade de planejamento, a criatividade, a memória voluntária, a imaginação
e a deliberação sobre si e sobre os outros.

Assim, podemos compreender que signos são construídos social


e culturalmente, razão pela qual os processos de desenvolvimento e de
aprendizagem têm sua gênese na sociedade, como esclarecem Cole e Scribner
(2001):

Os sistemas de signos (a linguagem, a escrita, o sistema de números),


assim como o sistema de instrumentos, são criados pelas sociedades
ao longo do curso da história humana e mudam a forma social e o
nível de seu desenvolvimento cultural. Vygotsky acreditava que
a internalização dos sistemas de signos produzidos culturalmente

175
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

provoca transformações comportamentais e estabelece um elo entre


as formas iniciais e tardias do desenvolvimento individual (COLE;
SCRIBNER, 2001, p. 11).

A linguagem por sua vez é composta por signos. Sobre a linguagem, cabe
destacar que esta se caracteriza como um importante signo mediador, uma vez
que possibilita a organização do pensamento em categorias conceituais.

De acordo com Oliveira (2002), a linguagem é o sistema simbólico


mais utilizado pela humanidade. A linguagem sendo construída socialmente
e responsável pela mediação entre o sujeito e o meio, configura-se como um
princípio que representa a realidade.

Sobre a linguagem Luria (1986) destaca a importância desta e do


pensamento nos processos de elaboração dos conceitos, o que ocorre por meio
das relações que o indivíduo estabelece com o mundo, mediadas pelo adulto.

Assim, podemos compreender que a criança desde seu nascimento está


inserida em um grupo social repleto de ideias, valores e concepções. É desse
ponto de vista que Vygotsky defende que o ensino e a aprendizagem da leitura e
da escrita deve ser sistematizado, de modo que o aluno consiga atribuir sentido
ao que lê e ao que escreve pois,

[...] a escrita deve ter significado para as crianças, de que uma


necessidade intrínseca deve ser despertada nelas e a escrita deve ser
incorporada a uma tarefa necessária e relevante para a vida. Só então
poderemos estar certos de que ela se desenvolverá não como hábito de
mão e dedos, mas como uma forma nova e complexa de linguagem
[...] o que se deve fazer é ensinar às crianças a linguagem escrita, e não
apenas a escrita de letras (VYGOTSKY, 2007, p. 133-134).

Precisamos compreender que a criança traz consigo seus conhecimentos


prévios, que durante o percurso da vida educacional devem ser valorizados.
Enfatiza-se assim que o professor alfabetizador deve partir da realidade deste
aluno, de maneira que ele consiga atribuir sentido e significado ao que lhe é
proposto para manejo dos códigos gráficos linguísticos (CRAVEIRO; BARBOSA,
2021).

Vygotsky (2007) opõe-se ao ensino da escrita que se reduz ao traçado


de letras e, sílabas, palavras esvaziadas de significados, apontando o caráter
mecanicista desse comportamento externo tantas vezes repetido que se torna
um hábito psicofísico. Vygotsky (2007, p. 246) ainda destaca que a criança não
aprende algo por associações que se vinculam e são memorizadas, portanto
aprender a ler e a escrever “é mais do que um simples hábito mental; é um ato
real e complexo de pensamento [...]”. Escrever requer muito mais que habilidade
cognitiva e motora de registrar grafemas.

176
TÓPICO 2 — A BNCC E A ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Na aquisição da leitura e da escrita, o aluno amplia seus conhecimentos e


aprende a manejá-los, a ponto de poder conquistar a habilidade para agir de modo
crítico reflexivo e propositivo. É com base nessa concepção sobre a alfabetização
e a formação do leitor que passamos a dialogar com a BNCC, em se tratando dos
anos iniciais do Ensino Fundamental.

3.1 A LINGUAGEM NA BNCC PARA ANOS INICIAIS


A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) estabelece as competências
gerais da educação básica, aponta caminhos para o fazer pedagógico e indica os
campos de experiências e as áreas de aprendizagem. Neste momento, faremos
apenas um apanhado geral sobre a Etapa do Ensino Fundamental no que diz
respeito à área de linguagens.

UNI

A ÁREA DE LINGUAGENS

As atividades humanas realizam-se nas práticas sociais, mediadas por diferentes


linguagens: verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora
e, contemporaneamente, digital. Por meio dessas práticas, as pessoas interagem consigo
mesmas e com os outros, constituindo-se como sujeitos sociais. Nessas interações, estão
imbricados conhecimentos, atitudes e valores culturais, morais e éticos. Na BNCC, a área
de Linguagens é composta pelos seguintes componentes curriculares: Língua Portuguesa,
Arte, Educação Física e, no Ensino Fundamental – Anos Finais, Língua Inglesa. A finalidade
é possibilitar aos estudantes participar de práticas de linguagem diversificadas, que lhes
permitam ampliar suas capacidades expressivas em manifestações artísticas, corporais e
linguísticas, como também seus conhecimentos sobre essas linguagens, em continuidade
às experiências vividas na Educação Infantil. As linguagens, antes articuladas, passam a
ter status próprios de objetos de conhecimento escolar. O importante, assim, é que os
estudantes se apropriem das especificidades de cada linguagem, sem perder a visão
do todo no qual elas estão inseridas. Mais do que isso, é relevante que compreendam
que as linguagens são dinâmicas, e que todos participam desse processo de constante
transformação. No Ensino Fundamental – Anos Iniciais, os componentes curriculares
tematizam diversas práticas, considerando especialmente aquelas relativas às culturas
infantis tradicionais e contemporâneas. Nesse conjunto de práticas, nos dois primeiros
anos desse segmento, o processo de alfabetização deve ser o foco da ação pedagógica.
Afinal, aprender a ler e escrever oferece aos estudantes algo novo e surpreendente:
amplia suas possibilidades de construir conhecimentos nos diferentes componentes, por
sua inserção na cultura letrada, e de participar com maior autonomia e protagonismo
na vida social. Por sua vez, no Ensino Fundamental – Anos Finais, as aprendizagens, nos
componentes curriculares dessa área, ampliam as práticas de linguagem conquistadas
no Ensino Fundamental – Anos Iniciais, incluindo a aprendizagem de Língua Inglesa.
Nesse segmento, a diversificação dos contextos permite o aprofundamento de práticas
de linguagem artísticas, corporais e linguísticas que se constituem e constituem a vida
social. É importante considerar, também, o aprofundamento da reflexão crítica sobre os
conhecimentos dos componentes da área, dada a maior capacidade de abstração dos

177
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

estudantes. Essa dimensão analítica é proposta não como fim, mas como meio para a
compreensão dos modos de se expressar e de participar no mundo, constituindo práticas
mais sistematizadas de formulação de questionamentos, seleção, organização, análise
e apresentação de descobertas e conclusões. Considerando esses pressupostos, e em
articulação com as competências gerais da Educação Básica, a área de Linguagens deve
garantir aos alunos o desenvolvimento de competências específicas (BRASIL, 2018, p. 63-
64).

No final do fragmento, o documento afirma que a área da linguagem


deve garantir ao aluno o desenvolvimento de competências específicas. São
apresentadas como competências específicas para os anos iniciais.

UNI

COMPETÊNCIAS ESPECÍFICAS DE LINGUAGENS PARA O ENSINO


FUNDAMENTAL

1. Compreender as linguagens como construção humana, histórica, social e


cultural, de natureza dinâmica, reconhecendo-as e valorizando-as como formas de
significação da realidade e expressão de subjetividades e identidades sociais e culturais.
2. Conhecer e explorar diversas práticas de linguagem (artísticas, corporais e
linguísticas) em diferentes campos da atividade humana para continuar aprendendo,
ampliar suas possibilidades de participação na vida social e colaborar para a construção de
uma sociedade mais justa, democrática e inclusiva.
3. Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora, como Libras,
e escrita), corporal, visual, sonora e digital –, para se expressar e partilhar informações,
experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e produzir sentidos que levem
ao diálogo, à resolução de conflitos e à cooperação
4. Utilizar diferentes linguagens para defender pontos de vista que respeitem
o outro e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental e o consumo
responsável em âmbito local, regional e global, atuando criticamente frente a questões do
mundo contemporâneo.
5. Desenvolver o senso estético para reconhecer, fruir e respeitar as diversas
manifestações artísticas e culturais, das locais às mundiais, inclusive aquelas pertencentes
ao patrimônio cultural da humanidade, bem como participar de práticas diversificadas,
individuais e coletivas, da produção artístico- -cultural, com respeito à diversidade de
saberes, identidades e culturas.
6. Compreender e utilizar tecnologias digitais de informação e comunicação
de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as
escolares), para se comunicar por meio das diferentes linguagens e mídias, produzir
conhecimentos, resolver problemas e desenvolver projetos autorais e coletivos (BRASIL,
2018, p. 65).

De acordo com a BNCC (2018) nos dois primeiros anos do Ensino


Fundamental, a ação pedagógica deve ter como foco a alfabetização, a fim de
oferecer amplas oportunidades para que os alunos se apropriem do sistema de
escrita alfabética, associando as práticas diversas de letramento. Ao compreender
178
TÓPICO 2 — A BNCC E A ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

o conhecimento de mundo por meio de novos olhares, surgem as oportunidades


para a criança de aperfeiçoar a leitura e a escrita de modo mais relevante. Ao
longo do Ensino Fundamental - anos iniciais, o conhecimento ocorre por meio
das aprendizagens anteriores e pelas que ainda virão, ampliando a prática e a
experiência.

Assim, a BNCC (2018) preserva na alfabetização a continuidade entre o


desenvolvimento e a aprendizagem entre as duas etapas da Educação Básica.
Dessa forma, o Ensino Fundamental nos anos iniciais e nos anos finais são
compostos por quatro eixos, que são: oralidade, Análise Linguística/Semiótica,
Leitura/escuta e Produção de Textos.

• Na oralidade, será aprofundado o conhecimento e o uso da língua oral, as


características de interações discursivas e as estratégias de fala e escuta em
intercâmbios orais.
• Na Análise Linguística/Semiótica, sistematiza-se a alfabetização,
particularmente nos dois primeiros anos, e desenvolvem-se, ao longo dos três
anos seguintes, a observação das regularidades e a análise do funcionamento
da língua e de outras linguagens e seus efeitos nos discursos.
• Na Leitura/escuta, amplia-se o letramento, por meio da progressiva
incorporação de estratégias de leitura em textos de nível de complexidade
crescente.
• Na Produção de textos, proporcionaremos a formação do aluno para
incorporação de estratégias de produção de textos de diferentes gêneros
textuais (BRASIL, 2018, p. 89).

Os eixos apresentados relacionam-se com práticas de linguagem. Em


função disso, emerge a categoria organizadora, a qual se articula com as práticas,
sendo elas: os campos de atuação em que essas práticas se realizam. Na BNCC,
a organização das práticas de linguagem (leitura de textos, produção de textos,
oralidade e análise linguística/semiótica) por campos de atuação aponta para a
importância da contextualização do conhecimento escolar, para a ideia de que
essas práticas derivam de situações da vida social e, ao mesmo tempo, precisam
ser situadas em contextos significativos para os estudantes (BRASIL, 2018, p.84).
Assim, apresentam-se os campos de atuação na figura 10.

FIGURA 10 – CAMPOS DE ATUAÇÃO ENSINO FUNDAMENTAL

FONTE: Brasil (2018, p. 84)

179
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

A escolha por esses campos, de um conjunto maior, deu-se por se entender


que eles contemplam dimensões formativas importantes de uso da linguagem
na escola e fora dela e criam condições para uma formação para a atuação em
atividades do dia a dia, no espaço familiar e escolar, uma formação que contempla
a produção do conhecimento e a pesquisa; o exercício da cidadania, que envolve,
por exemplo, a condição de se inteirar dos fatos do mundo e opinar sobre eles,
de poder propor pautas de discussão e soluções de problemas, como forma de
vislumbrar formas de atuação na vida pública; uma formação estética, vinculada
à experiência de leitura e escrita do texto literário e à compreensão e produção de
textos artísticos multissemióticos (BRASIL, 2018).

Em resumo, podemos definir as capacidades/habilidades envolvidas na


alfabetização/ como sendo capacidades de (de)codificação, que envolvem:

• compreender diferenças entre escrita e outras formas gráficas (outros sistemas


de representação);
• dominar as convenções gráficas (letras maiúsculas e minúsculas, cursiva e
script);
• conhecer o alfabeto;
• compreender a natureza alfabética do nosso sistema de escrita;
• dominar as relações entre grafemas e fonemas;
• saber decodificar palavras e textos escritos;
• saber ler, reconhecendo globalmente as palavras;
• ampliar a sacada do olhar para porções maiores de texto que meras palavras,
desenvolvendo assim fluência e rapidez de leitura (fatiamento) (BRASIL,
2018, p. 93).

4 MAS AFINAL O QUE A BNCC PROPÕE PARA A


ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS INICIAIS?
Quanto tempo é necessário para alfabetizar? Qual a melhor maneira de
ensinar a ler e a escrever? O que significa, no fim das contas, estar alfabetizado?
Essas foram algumas das polêmicas sobre alfabetização levantadas durante a
tramitação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

Com o documento aprovado, essas questões foram apenas parcialmente


resolvidas. O documento mantém os principais pressupostos presentes em
diretrizes anteriores, como os Parâmetros Nacionais Curriculares (PCNs), mas
também incorpora mudanças. Oficialmente, a BNCC não traz direcionamentos
sobre as abordagens que devem ser adotadas, mas existe uma perspectiva que está
por trás da elaboração do texto: nela, o trabalho com algumas relações entre fala e
escrita é enfatizado. O documento justifica essa ênfase como um reconhecimento
de que a apropriação do sistema alfabético de escrita tem especificidades e
colocando-a como foco principal da ação pedagógica nos anos iniciais do Ensino
Fundamental. Abaixo, você vai conhecer as demais propostas conceituais do
documento.
180
TÓPICO 2 — A BNCC E A ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Linguagem como forma de interação

A BNCC assemelha-se aos PCNs quando assume a perspectiva


enunciativo-discursiva de linguagem, reconhecendo que ela é uma atividade
humana e faz parte de um processo de interação entre os sujeitos. A linguagem
materializa-se em práticas sociais, com objetivo e intenção. Por essa razão,
estabelece a centralidade no texto como unidade de trabalho e indica a
necessidade de sempre considerar a função social dos textos utilizados. Durante
a alfabetização, isso sinaliza para a importância de que os alunos trabalhem com
textos reais – e não exclusivamente criados para o trabalho escolar como “Ivo viu
a uva”.

O documento também aponta para uma continuidade do que é feito


na Educação Infantil, deixando mais claro que há uma ponte entre os dois
segmentos. É preciso compreender que ambos estão interligados, portanto, nos
anos iniciais do Fundamental será possível intensificar e estruturar as experiências
com a língua oral e escrita iniciadas na Educação Infantil.

Alfabetização explícita

A BNCC reconhece a especificidade da alfabetização e propõe a mescla


de duas linhas de ensino: a primeira indica para a centralidade do texto e para
o trabalho com as práticas sociais de leitura e escrita, a segunda soma a isso o
planejamento de atividades que permitam aos alunos refletirem sobre o sistema
de escrita alfabética (estudar, por exemplo, as relações entre sons e letras e
investigar com quantas e quais letras se escreve uma palavra e onde elas devem
estar posicionadas ou como se organizam as sílabas).

Ao assumir essa postura, o documento considera as contribuições


da perspectiva construtivista, principalmente os estudos sobre os processos
pelos quais as crianças passam para se apropriar da escrita. Mas, também, aponta
ser preciso um trabalho com a consciência fonológica e com conhecimento das
letras para ajudar a criança a evoluir em suas hipóteses de escrita.

Essa opção pela alfabetização explícita gerou muitas discussões e


resistências entre os especialistas durante a elaboração da BNCC, mas prevaleceu
o entendimento de que as crianças aprendem de diferentes maneiras e esta
pode ser uma opção para a parcela que não tem sido alfabetizada apenas pelas
propostas das diretrizes anteriores. Indicar a inclusão de atividades específicas
sobre notação alfabética não significa desprezar a imersão no texto e sua função
social nem estabelecer uma ordem de prioridade entre os dois trabalhos. Até
porque não basta dominar o sistema de escrita para estar alfabetizado. É preciso
também ser capaz de ler e escrever textos de diversos gêneros. Um processo que
o próprio documento indica ter continuidade a partir do 3º ano, quando a ênfase
é na ortografização.

181
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

Vale frisar que, ao contrário dos PCNs, que ofereciam ao professor


orientações didáticas e elementos para avaliação, a Base não trata dessas partes. O
documento concentra-se na proposição das competências e habilidades essenciais
que todos os alunos devem desenvolver a cada ano e etapa da Educação Básica,
ou seja, o foco está em “o que ensinar”. A construção do “como ensinar” virá nos
currículos, cuja revisão está a cargo de redes, escolas e docentes.

Alfabetização em dois anos

O ano de escolaridade limite para uma pessoa aprender a ler e escrever


foi uma das questões mais discutidas durante a elaboração da BNCC. O Pacto
Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (Pnaic), que é a diretriz anterior,
coloca como prazo-limite o 3º ano. A BNCC antecipou para o 2º ano e aponta que,
no 3º ano, o processo continua com mais foco na ortografia.

Muitas redes de ensino municipais e estaduais já atuam nesse for-


mato. Mas há aquelas que deverão aproveitar a revisão dos currículos para
fazer ajustes. De qualquer maneira, para dar conta de alfabetizar os alu-
nos ao fim do período indicado, torna-se fundamental, como a Base indi-
ca a articulação entre os currículos de Educação Infantil, nos quais a crian-
ça já estará imersa em experiências de leitura e escrita, com os dos anos
iniciais do Fundamental, quando se aprofunda e sistematiza o trabalho.

Campos de atuação como eixo estruturante

Novidades importantes trazidas pela BNCC, os campos de


atuação representam, na organização do documento, papel de eixo estruturante
tanto quanto as práticas de linguagem. Essa opção evidencia a proposta de
contextualizar a construção do conhecimento. A ideia de que as práticas de
linguagem estão na vida social e devem ser levadas à escola em situações reais em
que se fazem necessários os seus usos. Para os anos iniciais, são quatro campos:
vida cotidiana, artístico-literário, práticas de estudo e pesquisa e vida pública.

Destaque para o multiletramento

A ampliação no uso das tecnologias alterou as práticas de linguagem na


sociedade atual. A BNCC reflete isso ao dar ênfase ao ensino das especificidades
da leitura e da escrita em ambientes digitais, entre outros. Os gêneros clássicos
(conto, crônica, entrevista, notícia, tirinha, receita etc.) estão presentes no
documento, mas este abriu espaço também a novos gêneros (como chats, posts,
e-zines etc.) e a textos multissemióticos e multimidiáticos, que consideram, além
do escrito, imagens estáticas (fotos, pinturas, ilustrações, infográficos, desenho)
ou em movimento (vídeos, filmes etc.) e som (áudios, música) – componentes que
também atribuem significado à mensagem. Para os anos iniciais, cabe ao professor
contribuir para a construção desse multiletramento e qualificar as produções e
a utilização das ferramentas digitais, considerando também os aspectos éticos,
estéticos e políticos.

182
TÓPICO 2 — A BNCC E A ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

4.1 QUAIS TEXTOS USAR DURANTE A ALFABETIZAÇÃO


INICIAL?
Abordar produções reais - e não fabricadas exclusivamente para a escola
- é uma das recomendações da BNCC. Entenda quais escolher.

Para todo o Ensino Fundamental, a Base Nacional Comum Curricular


(BNCC) defende que o texto – escrito, oral ou multimídia – seja o elemento central
do trabalho. Essa defesa fica explícita na definição dos campos de atuação, uma
categorização que engloba os contextos em que as produções são feitas, mas sem
se limitar a gêneros específicos.

A escolha por dividir em campos de atuação é um convite para se deixar de


lado exercícios de repetição e textos que não existem para além da escola e adotar
a ideia de que as práticas de linguagem estão na vida social e devem ser levadas
à instituição de ensino em situações reais de uso. Essas situações podem ocorrer
de maneira espontânea ou por meio de enredos e simulações que espelhem o real.

No primeiro caso, a vivência na escola é determinante e o docente deve


perceber e aproveitar as oportunidades. Por exemplo: as crianças estão impedidas
de usar a quadra para Educação Física em horário específico, com o argumento de
que o barulho atrapalha uma das salas. Mas elas querem fazer um acordo. Toda
a prática que se segue pode ser espontânea ou proposta pelo professor e faria
parte do campo da vida pública. Os alunos podem realizar uma assembleia com
os outros estudantes, escrever uma carta para a Associação de Pais e Mestres
ou pedir o agendamento de uma reunião com a diretora. Nesse contexto, a
preparação das ações e a análise linguística (qual o tom da carta e do pedido de
reunião? Na hora da assembleia, qual o volume e a postura mais adequados? E na
conversa com a direção? Etc.) ocorrem em razão do uso. Valem também situações
mais simples: uma das crianças faz aniversário e as demais podem elaborar um
cartão para entregar a ela ou os estudantes escreverem bilhetes para um colega
que está doente em casa (ambos pertencentes ao campo da vida cotidiana).

A outra opção é criar um enredo que, de alguma maneira, leve a situação


social para dentro da sala. Por exemplo: convidar as crianças a prepararem
uma receita, a criarem um jogo, em que elas terão de debater e registrar o texto
instrucional com as regras, ou a brincarem de lanchonete e pedirem para escrever
o cardápio, entre várias possibilidades.

O importante é que o docente selecione gêneros para a oralidade e a escrita


que proporcionem aos alunos experiências diversificadas nos quatro campos,
lembrando que as fronteiras entre eles são tênues e, portanto, podem ocorrer
intersecções, com alguns gêneros sendo desenvolvidos por ângulos diferentes
conforme o campo. Também é essencial escolher conteúdos que representem
a diversidade cultural e linguística do Brasil e de outros países e permitam aos
estudantes ampliar o repertório, conhecer, interagir e valorizar o diferente.

183
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

Conheça abaixo cada um dos quatro campos de atuação que devem ser
contemplados durante a alfabetização inicial e como trabalhá-los.

4.2 OS CAMPOS DE ATUAÇÃO DEFINIDOS PELA BNCC


1. Vida Cotidiana: Refere-se à participação em situações de leitura e escrita
em que o contexto são atividades vivenciadas no dia a dia de crianças nos ambientes
domésticos e escolares. Os gêneros, nos anos iniciais, são mais simples e podem
incluir listas (de chamada, de ingredientes, de compras etc.), bilhetes, convites,
cartas, regras de jogos e brincadeiras, receitas, instruções de montagem etc.

2. Artístico-literário: Relativo a situações de leitura, fruição e produção


de textos literários e artísticos. Exemplos: contos, poemas e outros textos em
verso, poemas visuais, tirinhas, quadrinhos e fábulas, dentre outros. Especial
importância para os gêneros ligados a brincadeiras infantis, como lenga-lengas,
parlendas, cantigas de roda etc.

3. Estudo e pesquisa: Envolve situações de leitura e escrita que


proporcionem ao aluno conhecer textos expositivos e argumentativos, linguagens
e práticas relacionadas ao estudo, à pesquisa e à divulgação científica. Exemplos:
enunciados de tarefas escolares, diagramas, relatos de experimentos, entrevistas,
verbetes de enciclopédia infantil, enquetes, registros de experimentações e
infográficos.

4. Vida pública: Prever a participação em situações de leitura e escrita,


especialmente de textos das esferas jornalística, publicitária e reivindicatória,
contemplando temas que impactam a cidadania e o exercício de direitos. Exemplos:
fotolegendas, manchetes e lides em notícias, álbum de fotos digital noticioso,
slogans, anúncios publicitários e textos de campanhas de conscientização
destinados ao público infantil, cartazes informativos, avisos e folhetos, regras
e regulamentos que organizam a vida na comunidade escolar, comentários em
sites para crianças. Aqui, um plano de aula sobre foto-legenda.

4.3 COMO TRABALHAR AS QUATRO PRÁTICAS DE


LINGUAGEM PREVISTAS NA BNCC
Compreender a estrutura do documento, que prevê o desenvolvimento de
leitura, escrita, oralidade e semiótica, ajuda a planejar melhor as aulas.

Entender como a BNCC está organizada é essencial para compreender


o que ela propõe e, assim, conseguir utilizá-la como ferramenta de suporte ao
planejamento escolar. No caso de Língua Portuguesa, o documento divide as
práticas de linguagem em quatro categorias:

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TÓPICO 2 — A BNCC E A ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

- Leitura/escuta
- Escrita
- Oralidade
- Análise linguística/semiótica

Leitura/escuta (compartilhada e autônoma)

O objetivo é ampliar o letramento já iniciado na Educação Infantil e


na família, por meio da progressiva incorporação de estratégias de leitura,
compartilhada e autônoma, em textos de diferentes complexidades.

Vale lembrar que o documento considera a leitura para além do texto


escrito, incluindo imagens estáticas (foto, pintura, desenho, ilustração, infográfico
etc.) ou em movimento (filmes, vídeos etc.) e som (áudios e música), que circulam
em meios impressos ou digitais.

Escrita (compartilhada e autônoma)

O documento propõe construir o domínio progressivo da habilidade de


produzir textos em diferentes gêneros, sempre tendo em vista a interatividade e a
autoria. Nos primeiros anos, isso representa saber para que serve a escrita e como
ser capaz de começar a praticá-la. Para construir esse conhecimento, a indicação é
levar à sala de aula situações reais de uso da língua, para que as crianças tenham
bons motivos para escrever. Ainda que elas não estejam plenamente apropriadas
do sistema de escrita alfabética, o professor pode adotar estratégias. Uma delas é
simplesmente deixar que os alunos escrevam, de acordo com suas possibilidades,
ainda que de maneira não convencional. Ele também pode servir, inicialmente
como escriba para a turma e, em salas em que algumas crianças já escrevem
convencionalmente, elas podem servir de escriba para os colegas.

Nesse processo, o professor deve mostrar que a produção de um texto


envolve pensar nas respostas para quatro perguntas fundamentais: quem escreve,
qual é o objetivo, quem vai ler e onde será publicado. No começo, o próprio
docente deve apontar para os alunos esses pontos, até que, aos poucos, eles sejam
capazes de uma reflexão autônoma.

Para perceber, por exemplo, a importância de, na hora de escrever, pensar


no leitor, o professor pode sugerir que as crianças troquem entre si os textos que
fizeram para que colegas leiam e falem o que entenderam. Assim, primeiro elas
poderão observar o comportamento de um leitor real, o que irá ajudá-las a, depois,
pensar no leitor virtual de todo texto que forem produzir. Ao compreender o
contexto de produção, se tornarão capazes de perceber como essas definições
interferem na maneira como se escreve. E como, a depender do que querem, ou
precisam, dizer, há um gênero textual que ajuda no como fazer isso.

185
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

Oralidade

A inclusão desse eixo reforça que o oral também é objeto de estudo, algo
que já estava nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). O documento
reconhece que a aprendizagem das características discursivas e das estratégias de
fala e escuta ocorre por meio do uso, da interação com o outro. Nos anos iniciais, o
objetivo é aprofundar as experiências iniciadas na Educação Infantil e na família.
O professor deve promover discussões com intencionalidade para além da
tradicional roda de conversa. Pode ser uma exposição oral sobre um estudo que
estão fazendo ou a argumentação para definir uma regra de convivência. Neste
último caso, o docente pode formular questões, tais como: pode trazer espada
para a sala de aula no dia do brinquedo? Em todas as situações, as interações não
precisam ficar apenas entre aluno e professor. Dá para estimular as crianças a
escutar, prestar atenção e comentar o que o colega falou.

Análise linguística/semiótica (alfabetização)

Essa prática articula-se com as demais e indica explicitamente


a sistematização da alfabetização, com a proposta de reflexões sobre o sistema
de escrita alfabética e o funcionamento da língua e de outras linguagens.

Observação importante: as práticas de linguagem não são estanques.


Há articulações entre elas. Ao trabalhar uma produção de texto, é possível, por
exemplo, realizar entrevistas (oral) com registros (escrita), ler textos modelares
do mesmo gênero (leitura) e transformar a entrevista em texto escrito (análise
linguística).

A BNCC aponta também a necessidade de ensinar as especificidades de


cada prática de linguagem também nas mídias digitais. Neste caso, o professor
deve fazer um uso pedagógico da tecnologia e estimular a visão crítica dos alunos
sobre a utilização das ferramentas digitais, considerando também os aspectos
éticos, estéticos e políticos.

4.4 ALFABETIZAÇÃO E CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA:


COMO TRABALHÁ-LAS?
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) defende o trabalho com
a consciência fonológica. Veja como aliá-lo às práticas sociais de leitura e
escrita desafio que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) traz para o
professor é o de aprender a articular as diferentes facetas da apropriação da
língua escrita. Isso significa aliar o trabalho com as práticas sociais de leitura e
escrita com momentos de aprendizagem do sistema de escrita alfabética.

A centralidade do texto está indicada na Base. “É importante que fique


claro ao docente que texto não é pretexto para análise da língua, mas contexto,
pois pode favorecer a alfabetização, colaborando para a compreensão de
186
TÓPICO 2 — A BNCC E A ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

conteúdos linguísticos”, explica Liane Castro de Araújo, professora da Faculdade


de Educação da Universidade Federal da Bahia. Sendo assim, é preciso
ter intencionalidade na escolha. Essas opções serão mais ricas quanto maior o
repertório do professor quanto aos diversos gêneros textuais, especialmente a
literatura infantil, mas não exclusivamente.

Para isso, o docente pode considerar as culturas infantis tradicionais e


contemporâneas, as brincadeiras da tradição oral e as situações lúdicas. Ana
Lúcia gosta de levar parlendas, cantigas e trava línguas para a turma. “Com base
nesses textos, cujas finalidades são brincar com a língua, os alunos conseguem
refletir sobre o que se diz e o que se escreve e, ao criarem repertório, podem
elaborar novos textos inspirados naqueles que conheceram”, conta a professora.

Outra opção é utilizar jogos fonológicos. Um dos utilizados por Ana


Lúcia é um jogo de trincas, no qual são distribuídas várias imagens. A proposta é
reunir três em que as palavras que representam a imagem terminem com o mesmo
som, como gato, rato e mato. Primeiro, a professora divide a turma em grupos
para estimular a colaboração entre eles. Um dos critérios para definir quem irá
jogar com quem pode ser colocar uma criança que tenha maior familiaridade com
brincadeiras da tradição oral e, portanto, está mais acostumada a prestar atenção
na sonoridade das palavras, com outra que não tenha tanta, indica Liane.

Durante a atividade, Ana Lúcia reserva um tempo para as crianças


pensarem em como irão agrupar as trincas. Ela, então, percorre a sala e faz
intervenções apenas quando um grupo está com dificuldade. Em geral, a primeira
pergunta é: Qual o critério que vocês utilizaram para escolher as trincas? Às vezes,
os alunos se concentram na imagem e separam todos os animais, por exemplo.
Aí ela relembra que a ideia do jogo é prestar atenção no som das palavras, em
como elas terminam. É muito comum também eles privilegiarem as palavras
que começam com a mesma letra. Neste caso, ela pontua: Ótimo, mas desta vez
quero que pensem no final da palavra. E pode exemplificar: Aqui temos feijão e
macarrão, o que é parecido no som delas? Qual outra imagem também tem som
semelhante?

Não há regras para as intervenções, mas o professor deve dosar para


manter um equilíbrio entre a questão pedagógica e o lúdico. “Já vi docente que
interrompe toda hora para sistematizar questões trazidas na brincadeira. Não dá
para interferir sempre, pois se corre o risco de perder a característica de jogo. A
função lúdica tem de ser garantida”, explica Liane.

Depois que as crianças brincaram, Ana Lúcia propõe momentos de


reflexão incluindo a escrita para ampliar a possibilidade de análise já presente no
oral. “Se fizer só o jogo, ficarei apenas no campo fonológico. Mas, em geral, quero
que eles façam a ligação entre fonema e grafema, que compreendam o que cada
som representa”, explica. Para sistematizar o aprendizado, as estratégias podem
variar conforme a turma, o tempo disponível e o propósito. No caso do jogo de
trincas, podem ser: pedir para as crianças indicarem quais trincas elas agruparam,

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UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

perguntar como se escreve cada palavra e anotar no quadro; pegar o alfabeto


móvel e pedir para os grupos montarem as palavras na mesa; ter uma série de
tirinhas, já prontas, com as palavras utilizadas no jogo, convidar as crianças a
apontar onde estão aquelas correspondentes às imagens da trinca que ela formou
e colocar cada tira junto da imagem que ela representa, entre outras.

O importante é a conversa que ocorre durante esse processo. A professora


pode questionar: Vamos olhar essas três palavras que estão juntas, o que elas têm
de parecido? Essa começa com uma letra e essa com outra, mas o final é sempre
o mesmo? Que outras palavras vocês conhecem que também terminam com
essas letras? O objetivo é conduzir os alunos a refletir sobre a correspondência
entre o oral e o escrito e levá-los a reconhecer como surgem as rimas, além de
ampliar o vocabulário. “É um momento importante também para eu avaliar o
desenvolvimento da aprendizagem deles”, completa Ana.

Para Liane, essa é uma ótima maneira de explorar a dimensão sonora


da língua e apresentar as letras aos alunos. “Os jogos incidem sobre os aspectos
fonológicos e notacionais da língua. Portanto, a reflexão linguística não vem
como aquisição mecânica, uma vez que o jogo por si só é uma prática cultural e
serve como contexto para a análise da língua. Adultos jogam palavra cruzada,
forca, entre outros”, conclui a especialista.

4.5 COMO TRABALHAR NO MUNDO DIGITAL


Outro ponto que ganhou ênfase com a BNCC é a questão
dos multiletramentos. “Quando os professores leem que é preciso trabalhar textos
multissemióticos e multimodais, nos modos sonoros, verbais, visuais e a relação
deles com as novas tecnologias, podem ficar preocupados. Na verdade, isso pode
ser feito ao trazer para a alfabetização os textos comunicativos comuns do dia-a-
dia. Uma conversa no WhatsApp, aplicativo utilizado por muitas famílias, pode
ser uma oportunidade de aprendizagem, assim como áudios, vídeos e jogos, tão
presentes entre os estudantes”, exemplifica Isabel Cristina Frade, professora titular
e pesquisadora do Centro de Alfabetização e Escrita da Universidade Federal
de Minas Gerais (UFMG). Ela sugere que, na hora de planejar as atividades, os
docentes pensem em algumas questões: “Se as crianças já conseguem navegar e
localizar um vídeo, como a escola pode se aproveitar desse conhecimento e colocar
isso a favor da alfabetização e do uso da Língua Portuguesa? Que alfabetização
audiovisual é importante o aluno adquirir para ter uma visão crítica sobre as
mídias que permeiam sua vida?”

Para muitos educadores, há um desafio anterior: buscar formações


específicas para suprir um conhecimento que não foi adquirido em suas formações
iniciais. Foi o que ocorreu na Escola de Educação Integral Padre Quinha. “A
inserção nesse mundo virou uma preocupação para todos aqui”, conta Ana
Lúcia. Para se preparar, ela fez várias oficinas com a professora Cristiane Alves,

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TÓPICO 2 — A BNCC E A ALFABETIZAÇÃO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

do Sesi de Petrópolis, que há anos estuda como associar tecnologia e educação.


O objetivo era descobrir como fazer um uso pedagógico da tecnologia. “Eu não
queria apenas levar meus alunos para a sala de informática e propor atividades
isoladas”, explica Ana.

Em sala, Ana Lúcia desenvolveu várias propostas. Em uma delas,


começou com rodas de conversa, em que discutiu com os alunos a questão
da identidade. A ideia era levá-los a refletir sobre as diferenças e as semelhanças
entre eles. Depois, com um aplicativo, cada um criou um avatar com suas
características físicas: cor e formato do cabelo, cor dos olhos, da pele etc. Ana,
então, imprimiu esses desenhos em papel e pediu para as crianças escreverem
na folha as características utilizadas para montar o avatar. Ao lado dessas, o
convite foi para colocarem as características psicológicas: qualidades e defeitos
de cada um. Essa parte rendeu outro bate-papo sobre o fato de ser normal as
pessoas terem qualidades e defeitos. Para completar, foram gravados vídeos em
que cada criança se apresentava e falava, apoiadas no que tinham escrito, suas
características. Na edição, a professora acrescentou os avatares de cada estudante
e apresentou o resultado para as famílias. “Consegui trabalhar oralidade, escrita
e leitura, além de debater empatia e diversidade”, finaliza Ana Lúcia.

Para as instituições que não têm laboratórios de informática, acesso à


internet, entre outras limitações relacionadas à infraestrutura digital, Isabel dá
opções: “Imagens, pinturas, livros com formas diversas de leitura, diagramas,
ilustrações sofisticadas e infográficos podem ser apresentados à turma. Isso
porque um texto pode ser multissemiótico sem ser multimídia”, explica. A
proposta, então, é levar todo esse material para a sala de aula, ler, discutir, brincar
e produzir textos, sem perder de vista a intencionalidade e a clareza quanto aos
objetivos do trabalho.

4.6 SUGESTÕES DE JOGOS DIGITAIS PARA ALFABETIZAÇÃO


No processo de ensino, o período de alfabetização é marcado pelas
descobertas, um momento no qual o lúdico se faz muito presente. E é neste cenário
que os jogos digitais podem alavancar a aprendizagem das crianças, por trazer
interação, trabalhar com as hipóteses silábicas e contribuir com a leitura e escrita.

A fase do desenvolvimento de alfabetização através de jogos pode ser


considerada como uma incrível aventura para as crianças. Os estudantes entram
em um mundo mágico de imaginação que traz o único objetivo de ensinar, e a
melhor forma de promover o aprendizado é estimular a curiosidade das crianças.

Para trazer mais dinamismo ao aprendizado nessa fase tão rica da vida
escolar da criança, elaboramos algumas dicas para você usar em sala de aula.

Escola de Games (jogos on-line) <https://www.escolagames.com.br/>

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UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

Jogos interativos gratuitos para trabalhar com temas como arvores


genealógicas, lendas de folclore, datas comemorativas, algarismos romanos,
permitindo a gamificação presente no processo.

Ludo Primeiros Passos (jogo on-line) <https://bit.ly/3uCNcU6>

Desenvolvido pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia dos


Materiais em Nanotecnologia, do CNPq e o Centro Multidisciplinar para o
Desenvolvimento de Materiais Cerâmicos, da Fapesp, o jogo on-line permite
recursos interativos que auxiliam as crianças em diferentes níveis de alfabetização.
O jogo busca associar sons a imagens e conforme o jogador acerta, aumenta o
grau de dificuldade, completando sílabas ou palavras.

Jogos Arie (jogos on-line) <https://brincandocomarie.com.br/jogos/>

Jogos educativos gratuitos projetados especialmente para crianças.


Ensina de forma lúdica e a criança aprende brincando relacionando a palavras a
objetos, completando sequências, trabalhando com tabuada, adição, subtração e
multiplicação, além de trabalhar com temas atuais como a dengue.

Aulas Animadas (aplicativos e planos de aula) <https://bit.ly/3mmlaJ0>

Desenvolvida pelo Instituto Paramitas, a plataforma Aulas Animadas


reúne jogos e aplicativos de alfabetização para smartphones ou tablets. Para cada
um dos games, o site disponibiliza um material para download que apresenta
dicas e planos de aula para os professores trabalharem com cada um dos recursos
apresentados.

190
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• O Ensino Fundamental é concebido como direito inalienável de todos os


cidadãos, conforme dispõe a Constituição Federal de 1988. E o que proporciona
êxito nas aprendizagens formais escolares é uma alfabetização de qualidade.

• A alfabetização constitui-se em um percurso longo e complexo, que se dá


na relação desenvolvida pelo professor compreendido como o mediador do
processo de aprendizagem.

• A alfabetização necessita ser vista como um processo articulado com o


letramento, pois o ato de ler e escrever são fenômenos sociais, estruturados
coletivamente, os quais se complementam concomitantemente, tornando-se
um conhecimento transversal.

• A linguagem por sua vez é composta por signos. Sobre a linguagem, cabe
destacar que está se caracteriza como um importante signo mediador, uma
vez que possibilita a organização do pensamento em categorias conceituais.

• De acordo com a BNCC (2018) nos dois primeiros anos do Ensino Fundamental,
a ação pedagógica deve ter como foco a alfabetização, a fim de oferecer
amplas oportunidades para que os alunos se apropriem do sistema de escrita
alfabética, associando as práticas diversas de letramento.

• A BNCC (2018) preserva na alfabetização a continuidade entre o


desenvolvimento e a aprendizagem entre as duas etapas da Educação Básica.

• Na BNCC, a organização das práticas de linguagem (leitura de textos,


produção de textos, oralidade e análise linguística/semiótica) por campos
de atuação aponta para a importância da contextualização do conhecimento
escolar, para a ideia de que essas práticas derivam de situações da vida social
e, ao mesmo tempo, precisam ser situadas em contextos significativos para os
alunos.

191
AUTOATIVIDADE

1 A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) estabelece as competências


gerais da educação básica, apontando caminhos para o fazer pedagógico e
indica os campos de experiências e as áreas de aprendizagem. O documento
afirma que a área da linguagem deve garantir ao aluno o desenvolvimento
de competências específicas. Sobre as competências específicas na área da
linguagem, coloque V para verdadeiro e F para falso.

( ) Compreender as linguagens como construção humana, histórica, social e


cultural, de natureza dinâmica, reconhecendo-as e valorizando-as como
formas de significação da realidade e expressão de subjetividades e
identidades sociais e culturais;
( ) Utilizar diferentes linguagens para defender pontos de vista que respeitem
o outro e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental
e o consumo responsável em âmbito local, regional e global, atuando
criticamente frente a questões do mundo contemporâneo.
( ) Compreender e utilizar tecnologias digitais de informação e comunicação
de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais
(incluindo as escolares), para se comunicar por meio das diferentes
linguagens e mídias.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V - V - V.
b) ( ) V - F - V.
c) ( ) F - F - V.
d) ( ) V - V - F.

2 A BNCC (2018) preserva na alfabetização a continuidade entre o


desenvolvimento e a aprendizagem entre as duas etapas da Educação
Básica. Dessa forma, o Ensino Fundamental nos anos iniciais e nos
anos finais são compostos por quatro eixos, que são: Oralidade, Análise
Linguística/Semiótica, Leitura/escuta e Produção de Textos. Relacione os
eixos:

I- Oralidade
II- Análise Linguística/Semiótica
III- Leitura/escuta
IV- Produção de textos

( ) Proporcionaremos a formação do aluno para incorporação de estratégias


de produção de textos de diferentes gêneros textuais.

192
( ) Sistematiza-se a alfabetização, particularmente nos dois primeiros
anos, e desenvolvem-se, ao longo dos três anos seguintes, a observação
das regularidades e a análise do funcionamento da língua e de outras
linguagens e seus efeitos nos discursos.
( ) Será aprofundado o conhecimento e o uso da língua oral, as características
de interações discursivas e as estratégias de fala e escuta em intercâmbios
orais.
( ) Amplia-se o letramento, por meio da progressiva incorporação de
estratégias de leitura em textos de nível de complexidade crescente.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) IV - II - I - III.
b) ( ) I - II - III - IV.
c) ( ) III -II - I - IV.
d) ( ) II - III - IV - I.

3 Na BNCC, a organização das práticas de linguagem (leitura de textos,


produção de textos, oralidade e análise linguística/semiótica) por campos
de atuação aponta para a importância da contextualização do conhecimento
escolar, para a ideia de que essas práticas derivam de situações da vida
social e, ao mesmo tempo, precisam ser situadas em contextos significativos
para os estudantes. Sobre os campos de atuação nos Anos Iniciais relacione:

I- Vida Cotidiana
II- Artístico-literário
III- Estudo e pesquisa
IV- Vida pública

( ) Prevê a participação em situações de leitura e escrita, especialmente de


textos das esferas jornalística, publicitária e reivindicatória, contemplando
temas que impactam a cidadania e o exercício de direitos;
( ) Refere-se à participação em situações de leitura e escrita em que o
contexto são atividades vivenciadas no dia a dia de crianças nos ambientes
doméstico e escolar.
( ) Envolve situações de leitura e escrita que proporcionem ao aluno conhecer
textos expositivos e argumentativos, linguagens e práticas relacionadas
ao estudo, à pesquisa e à divulgação científica.
( ) Relativo a situações de leitura, fruição e produção de textos literários e
artísticos. Exemplos: contos, poemas e outros textos em verso, poemas
visuais, tirinhas, quadrinhos e fábulas, dentre outros.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) IV - I - III - II.
b) ( ) I - II - III - IV.
c) ( ) III - II - I - IV.
d) ( ) II - III - IV - I.
193
4 A alfabetização constitui-se em um percurso longo e complexo, que se dá
na relação desenvolvida pelo professor compreendido como o mediador
do processo de aprendizagem.
Assim, esta necessita ser vista como um processo articulado com o
letramento, pois o ato de ler e escrever são fenômenos sociais, estruturados
coletivamente, os quais se complementam concomitantemente, tornando-
se um conhecimento transversal. Mediante o anunciado a BNCC (2018)
define as capacidades/habilidades envolvidas na alfabetização como sendo
capacidades de (de)codificação. Disserte sobre capacidades/habilidades
que envolvem a alfabetização na BNCC.

5 As atividades humanas realizam-se nas práticas sociais, mediadas por


diferentes linguagens: verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e
escrita), corporal, visual, sonora e, contemporaneamente, digital. Por meio
dessas práticas, as pessoas interagem consigo mesmas e com os outros,
constituindo-se como sujeitos sociais. Neste contexto destacamos que na
BNCC, a área de Linguagens é composta pelos seguintes componentes
curriculares: Língua Portuguesa, Arte, Educação Física e, no Ensino
Fundamental – Anos Finais, Língua Inglesa. Mediante o exposto descreva
sobre o objetivo da área de linguagens na BNCC.

194
UNIDADE 3 TÓPICO 3 —

CULTURA DIGITAL NA BNCC E OS DESAFIOS


PARA A ALFABETIZAÇÃO

1 INTRODUÇÃO
A cultura digital tem promovido mudanças sociais significativas na
sociedade contemporânea. Em decorrência do avanço e da multiplicação das
tecnologias de informação e comunicação e do crescente acesso a elas pela maior
disponibilidade de computadores, telefones celulares, tablets e afins. Frente a este
contexto a BNCC destaca também o letramento digital, pois as novas práticas de
linguagem contemporâneas abrem um leque de novas possibilidades de acesso e
produção.

Acadêmico(a)! Nossas crianças, adolescentes e jovens acessam a internet e


são, ao mesmo tempo, consumidores e produtores de conteúdo. Essa nova geração
tem facilidade de apreender outras línguas e interesse em estudá-las e é muito
influenciada pela tecnologia. Essa geração denominada de “nativos digitais” ou
geração Z, ou seja, zarpam, zapeiam e navegam o tempo todo na internet e estão
constantemente conectados. Eles nasceram na era digital, começaram a aprender
na linguagem digital e não conheceram nada além de uma vida conectada a outro
e ao mundo dos bits.

Assim, além de discutirmos as questões éticas nesse novo campo, torna-se


necessário explorá-lo para alfabetizar nossos alunos.

Vamos lá?

2 CULTURA DIGITAL NA EDUCAÇÃO BÁSICA


Com o advento da internet, a partir de 1992, um novo paradigma começa
a surgir, potencializando a comunicação instantânea entre muitos e para muitos.
Essa comunicação gerada pela internet tem sobrepujado os outros meios de
comunicação de massa por seu poder interativo, de trocas de experiências e de
compartilhamento de resultados (MACHADO E KAMPFF, 2017).

Nativo digital

O termo foi criado pelo norte-americano Marc Prensky e faz referência aos
nascidos e crescidos com as tecnologias digitais presentes em sua vivência.

195
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

Segundo Castells (2002, p. 311), a internet “não é apenas uma tecnologia:


é o instrumento tecnológico e a forma organizativa que distribui o poder da
informação, a geração de conhecimentos e a capacidade de ligar-se em rede em
qualquer âmbito da atividade humana”.

De acordo Machado e Kampff (2017), a internet instaura uma nova


economia, novas formas de sociabilidade, participação social e intervenção
política. Sua importância é tamanha que deu início ao aparecimento de um novo
espaço, intitulado de ciberespaço, que possibilita que cada sujeito possa adicionar,
retirar, criar e modificar conteúdos dessa estrutura; disparar informações e não
somente receber, uma vez que o polo da emissão está liberado para coletivização
dos saberes, construção colaborativa de conhecimento e de sociabilidade (LEVY,
2010).

Segundo Lemos (2002, p. 131), esse lugar denominado ciberespaço é


definido como um “hipertexto mundial interativo, onde cada um pode adicionar,
retirar e modificar partes dessa estrutura temática, como um texto vivo, um
organismo auto-organizante”. Nasce não só da digitalização, da proliferação da
informática e suas interfaces, mas da interconexão mundial de computadores
proporcionada pela internet. É um ambiente de circulação de discussões plurais
(MACHADO; KAMPFF, 2017).

As múltiplas possibilidades de linguagem e de interação oferecem uma


velocidade acelerada de informações, potencializam o ambiente digital com uma
efervescência cultural e proporciona um contexto de novidades, de emergências.
Imersos nesse ciberespaço, percebe-se que houve alteração da nossa maneira de
pensar, de sentir, de agir no mundo, de nos relacionarmos, de nos comunicarmos
e de construir conhecimentos, em um processo tão intenso, que muitas vezes não
se percebem as mudanças que ocorrem a cada dia. A evolução tecnológica altera
os comportamentos das pessoas (MACHADO; KAMPFF, 2017).

Neste contexto as tecnologias de informação e comunicação (TIC) estão


profundamente articuladas com esses novos sentidos que atribuímos ao mundo
e acabam acelerando e produzindo intensas mudanças sociais, bem como
novas formas de conhecer. A Internet está diretamente imbricada com as atuais
transformações do mundo contemporâneo, por ter projetado esse novo espaço de
aprendizagens, pensamentos, gênero de saber e, portanto, de uma nova cultura,
denominada de cibercultura (LEVY, 2010).

A cibercultura apresenta como características básicas: a possibilidade


de hipertextualidade, de interatividade, bem como da virtualidade, da não
linearidade, multivocalidade, tempo real e simulação, provocando mudanças
intensas nos sentidos que as crianças e jovens brasileiros percebem, sentem e
agem em uma sociedade em que a informação e conhecimento constituem fontes
fundamentais de bem-estar e progresso, ampliando o conceito de “cultura digital”
(MACHADO; KAMPFF, 2017).

196
TÓPICO 3 — CULTURA DIGITAL NA BNCC E OS DESAFIOS PARA A ALFABETIZAÇÃO

Essa cultura digital, segundo Castells (2002), engloba habilidades para


comunicar coletivamente, em tempo real, no âmbito local até o global, inclusive
de forma descentralizada, gera uma grande expectativa no impacto significativo
dos resultados pedagógicos, contribuindo para melhorar a qualidade do processo
de ensino e de aprendizagem, a partir de um novo modo de interagir, de informar
e de produzir conhecimentos (MACHADO; KAMPFF, 2017).

Segundo Almeida e Valente (2015, p.59), nós enquanto professores


devemos preparar nossos alunos a viverem e desfrutarem da sociedade inserida
na cultura digital. Portanto, faz-se necessário auxiliá-lo no desenvolvimento
de três grandes dimensões: “cognitiva, envolvendo estratégias e processo de
aprendizado, criatividade e pensamento crítico; intrapessoal, relacionada com
a capacidade de lidar com as emoções e moldar comportamentos para atingir
objetivos; e interpessoal, envolvendo a habilidade de expressar ideias, interpretar,
dialogar e responder aos estímulos de outras pessoas”.

Nesse contexto, as escolas de Educação Básica, que participam e dialogam


com a cultura digital, assumem um papel decisivo na formação de estudantes,
pois podem oportunizar múltiplos espaços de aprendizagem, não somente
pela variedade de tecnologias e mídias disponíveis, mas especialmente pelas
possibilidades de encontros virtuais e de interação, potencializando a cooperação
e a produção colaborativa de conhecimento (MACHADO; KAMPFF, 2017).

Nas escolas, as transformações significativas precisam ocorrer pela


exigência de novas formas de ensinar e de aprender. A educação demandada
pela atual sociedade pressupõe sujeitos ativos, empreendedores, que sejam
protagonistas, interlocutores e participantes do processo, estudantes que tenham
sua visão própria sobre o mundo e que utilizem os recursos a sua disposição para
resolver problemas, tomar decisões e gerar novos conhecimentos (MACHADO;
KAMPFF, 2017).

É preciso deixar claro que não se trata de usar as tecnologias a qualquer custo
ou de qualquer jeito, “mas de acompanhar, consciente e deliberadamente, uma
mudança de civilização que questiona profundamente as formas institucionais,
as mentalidades e a cultura dos sistemas educacionais tradicionais e, sobretudo,
os papéis de professor e do aluno” (LEVY, 2010, p. 174).

Trata-se de reinventar a prática educativa por meio da cibercultura,


substituindo o velho padrão das hierarquias dogmáticas do saber por um princípio
dialógico cooperativo, que parte de todos para todos e promove a aprendizagem
coletiva.

197
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

3 NOVAS FORMAS DE ENSINAR E APRENDER INTEGRADAS


À CULTURA DIGITAL
A tecnologia faz parte da vida cotidiana de forma cada vez mais intensa.
Permitem a ampliação do conceito de sala de aula, de espaço e tempo, de acesso
à informação e de comunicação (MACHADO; KAMPFF, 2017).

Entre os desafios das instituições de ensino do mundo inteiro, segundo


Demo (2006), estão os de repensar seus modelos pedagógicos; como as pessoas
aprendem; como os recursos tecnológicos podem amplificar e aperfeiçoar o
processo de ensino e de aprendizagem; como motivar o aluno para entrar no jogo
da aprendizagem; como se tornar um professor mediador distante fisicamente
e, como utilizar as tecnologias para aprender, ascender social e culturalmente
(MACHADO; KAMPFF, 2017).

No entanto, sabe-se que a mera inserção do uso de novas tecnologias na


educação não implica a adoção de práticas pedagógicas inovadoras. As tecnologias
potencializam a relação conversacional, mas não são sozinhas conversacionais.
A forma como as tecnologias são utilizadas será um fator determinante para
a qualificação dos processos de ensino e de aprendizagem, que ocorrem em
diferentes espaços e tempos, respeitando o ritmo de cada estudante. Elas podem
ser recursos articuladores do desenvolvimento da colaboração e da autonomia
dos sujeitos aprendentes no processo de construção do conhecimento, já que não
basta ter habilidade para utilizar as tecnologias e acessar o volume de informações
disponíveis, é necessário desenvolver o senso crítico e a capacidade de selecionar
bem as informações, para que possam transformá-las em conhecimento
(MACHADO; KAMPFF, 2017).

A mediação docente por meio das tecnologias tem como o maior


desafio ultrapassar as práticas instrucionistas, caracterizadas por práticas
historicamente consolidadas diante de conteúdos lineares e atividades reativas.
Tais atitudes subutilizam as potencialidades no processo comunicacional da
web, principalmente quando pensamos a rede como elemento fortalecedor de
culturas e conhecimentos, não como mero dispositivo de obtenção de informação
(MACHADO; KAMPFF, 2017).

A falta de uma inclusão digital docente traz para o cenário da cibercultura


velhas práticas de mediação da aprendizagem, muitas vezes até obsoletas para
o presencial. É preciso formar professores para utilizar as tecnologias digitais
online como potencializadoras da docência e da aprendizagem na educação,
em que estudantes e professores interagem na mediação, visando à construção
cooperativa e colaborativa do conhecimento. Navegar pelo ciberespaço não se
limita à obtenção de dados, mas a estabelecer uma rede de conversação, que
provoque situações desafiadoras a partir de contextos da docência da educação
básica, que instiguem a apropriação, a reflexão e a utilização com criticidade das
tecnologias disponíveis e a pertinente aliança da teoria proposta com a prática
vivenciada (MACHADO; KAMPFF, 2017).
198
TÓPICO 3 — CULTURA DIGITAL NA BNCC E OS DESAFIOS PARA A ALFABETIZAÇÃO

Para potencializar aos estudantes as competências requeridas para viver a


cultura digital, a UNESCO (2008, p. 5) propõe que a formação de professores seja
baseada no desenvolvimento de competências em seis componentes do sistema
educacional – política e visão, currículo e avaliação, pedagogia, TIC, organização
e administração, desenvolvimento profissional – em três abordagens/níveis –
alfabetização em tecnologia, aprofundamento do conhecimento e criação de
conhecimentos (MACHADO; KAMPFF, 2017).

Com enfoque no desenvolvimento de competências docentes em TIC, a


abordagem transita de ferramentas básica, no nível de alfabetização tecnológica,
às ferramentas complexas, no nível de criação de conhecimento. No nível de
alfabetização tecnológica, o professor deve ter competências para pesquisar
e comunicar-se por meio de ferramentas virtuais, selecionando e produzindo
materiais para apoio às aulas e utilizando recursos digitais de gestão educacional,
como registros acadêmicos (MACHADO; KAMPFF, 2017).

No padrão de aprofundamento do conhecimento, o professor deve ter


competências para selecionar recursos digitais específicos para a sua disciplina,
tais como simuladores e visualizados de dados, além de ferramentas abertas
para trabalhos em grupos, com compartilhamento de informações e resolução
conjunta de problemas complexos. Na dimensão da construção de conhecimentos,
as competências docentes estão relacionadas à criação de possibilidades de
interação e produção de conhecimentos, com a utilização de ferramentas mais
abrangentes para dinamização de comunidades colaborativas e geradoras de
novos conhecimentos (MACHADO; KAMPFF, 2017).

Esses aspectos, no âmbito escolar, proporcionariam uma vivência digital


docente em diferentes níveis de conhecimento, visando influenciar os modos
de sentir, de pensar e de agir ao longo das práticas pedagógicas. É preciso
ressignificar as experiências no contexto educativo, pois as tecnologias estão
inseridas e integradas à vida e às práticas cotidianas (MACHADO; KAMPFF,
2017).

3.1 O QUE A BNCC MENCIONA SOBRE A CULTURA


DIGITAL?
A BNCC procura contemplar a cultura digital, diferentes linguagens e
diferentes letramentos, desde aqueles basicamente lineares, com baixo nível de
hipertextualidade, até aqueles que envolvem a hipermídia. Da mesma maneira,
imbricada à questão dos multiletramentos, essa proposta considera, como uma de
suas premissas, a diversidade cultural. Sem aderir a um raciocínio classificatório
reducionista, que desconsidera as hibridizações, apropriações e mesclas, é
importante contemplar o cânone, o marginal, o culto, o popular, a cultura de
massa, a cultura das mídias, a cultura digital, as culturas infantis e juvenis, de
forma a garantir uma ampliação de repertório e uma interação e trato com o
diferente (BRASIL, 2018, p.70).
199
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

Produção coletiva do conhecimento, ele se fundamenta na participação


de diferentes autores e de equipes interdisciplinares que realizam uma atividade
cooperativa. Fóruns de discussão, páginas pessoais, blogs são exemplos
de hipertextualidade.

Os Multiletramentos são práticas de ensino compostas pelos diversos


aspectos dos Letramentos, seja no âmbito da apreensão e da utilização social dos
textos (orais, escritos, visuais) seja pela compreensão da execução desses textos
nas suas multimodalidades e diversidade cultural.

Ainda em relação à diversidade cultural, cabe dizer que se estima que mais
de 250 línguas são faladas no país – indígenas, de imigração, de sinais, crioulas
e afro-brasileiras, além do português e de suas variedades. Esse patrimônio
cultural e linguístico é desconhecido por grande parte da população brasileira.
No Brasil com a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, oficializou-se também a
Língua Brasileira de Sinais (Libras), tornando possível, em âmbito nacional,
realizar discussões relacionadas à necessidade do respeito às particularidades
linguísticas da comunidade surda e do uso dessa língua nos ambientes escolares.
Assim, é relevante no espaço escolar conhecer e valorizar as realidades nacionais e
internacionais da diversidade linguística e analisar diferentes situações e atitudes
humanas implicadas nos usos linguísticos, como o preconceito linguístico. Por
outro lado, existem muitas línguas ameaçadas de extinção no país e no mundo,
o que nos chama a atenção para a correlação entre repertórios culturais e
linguísticos, pois o desaparecimento de uma língua impacta significativamente a
cultura (BRASIL, 2018).

A cultura digital perpassa todos os campos, fazendo surgir ou modificando


gêneros e práticas. Por essa razão, optou-se por um tratamento transversal da
cultura digital, bem como das TDIC, articulado a outras dimensões nas práticas
em que aparecem. De igual forma, procurou-se contemplar formas de expressão
das culturas juvenis, que estão mais evidentes nos campos artístico-literário e
jornalístico-midiático, e menos evidentes nos campos de atuação na vida pública
e das práticas de estudo e pesquisa, ainda que possam, nesse campo, ser objeto de
pesquisa e ainda que seja possível pensar em um vídeo-minuto para apresentar
resultados de pesquisa, slides de apresentação que simulem um game ou
em formatos de apresentação dados por um número mínimo de imagens que
condensam muitas ideias e relações, como acontece em muitas das formas de
expressão das culturas juvenis (BRASIL, 2018).

A preocupação com os impactos dessas transformações na sociedade


está expressa na BNCC e se explicita já nas competências gerais para a Educação
Básica. Diferentes dimensões que caracterizam a computação e as tecnologias
digitais são tematizadas, tanto no que diz respeito a conhecimentos e habilidades
quanto a atitudes e valores:

200
TÓPICO 3 — CULTURA DIGITAL NA BNCC E OS DESAFIOS PARA A ALFABETIZAÇÃO

• Pensamento computacional: envolve as capacidades de compreender,


analisar, definir, modelar, resolver, comparar e automatizar problemas e suas
soluções, de forma metódica e sistemática, por meio do desenvolvimento de
algoritmos.
• Mundo digital: envolve as aprendizagens relativas às formas de processar,
transmitir e distribuir a informação de maneira segura e confiável em
diferentes artefatos digitais – tanto físicos (computadores, celulares, tablets
etc.) como virtuais (internet, redes sociais e nuvens de dados, entre outros)
–, compreendendo a importância contemporânea de codificar, armazenar e
proteger a informação.
• Cultura digital: envolve aprendizagens voltadas a uma participação mais
consciente e democrática por meio das tecnologias digitais, o que supõe a
compreensão dos impactos da revolução digital e dos avanços do mundo
digital na sociedade contemporânea, a construção de uma atitude crítica, ética
e responsável em relação à multiplicidade de ofertas midiáticas e digitais, aos
usos possíveis das diferentes tecnologias e aos conteúdos por elas veiculados,
e, também, à fluência no uso da tecnologia digital para expressão de soluções
e manifestações culturais de forma contextualizada e crítica (BRASIL, 2018, p.
473-474).

Mediante o anunciado podemos destacar que a BNCC contempla a


cultura digital, diferentes linguagens e diferentes letramentos, desde aqueles
basicamente lineares, com baixo nível de hipertextualidade, até aqueles que
envolvem a hipermídia.

O que a BNCC diz:

Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação


de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais
(incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações,
produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria
na vida pessoal e coletiva. Essa competência reconhece o papel fundamental da
tecnologia e estabelece que o estudante deve dominar o universo digital, sendo
capaz, portanto, de fazer um uso qualificado e ético das diversas ferramentas
existentes e de compreender o pensamento computacional e os impactos da
tecnologia na vida das pessoas e da sociedade (BRASIL, 2018, p. 9).

Em articulação com as competências gerais, essas dimensões também


foram contempladas nos objetivos de aprendizagem e desenvolvimento da
Educação Infantil e nas competências específicas e habilidades dos diferentes
componentes curriculares do Ensino Fundamental, respeitadas as características
dessas etapas. No Ensino Médio, por sua vez, dada a intrínseca relação entre as
culturas juvenis e a cultura digital, torna-se imprescindível ampliar e aprofundar
as aprendizagens construídas nas etapas anteriores. Afinal, os jovens estão
dinamicamente inseridos na cultura digital, não somente como consumidores,
mas se engajando cada vez mais como protagonistas. Portanto, na BNCC dessa
etapa, o foco passa a estar no reconhecimento das potencialidades das tecnologias

201
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

digitais para a realização de uma série de atividades relacionadas a todas as


áreas do conhecimento, a diversas práticas sociais e ao mundo do trabalho. São
definidas competências e habilidades, nas diferentes áreas, que permitem aos
estudantes:

• buscar dados e informações de forma crítica nas diferentes mídias, inclusive


as sociais, analisando as vantagens do uso e da evolução da tecnologia na
sociedade atual, como também seus riscos potenciais;
• apropriar-se das linguagens da cultura digital, dos novos letramentos e dos
multiletramentos para explorar e produzir conteúdos em diversas mídias,
ampliando as possibilidades de acesso à ciência, à tecnologia, à cultura e ao
trabalho;
• usar diversas ferramentas de software e aplicativos para compreender e
produzir conteúdos em diversas mídias, simular fenômenos e processos das
diferentes áreas do conhecimento, e elaborar e explorar diversos registros de
representação matemática;
• utilizar, propor e/ou implementar soluções (processos e produtos) envolvendo
diferentes tecnologias, para identificar, analisar, modelar e solucionar
problemas complexos em diversas áreas da vida cotidiana, explorando de
forma efetiva o raciocínio lógico, o pensamento computacional, o espírito de
investigação e a criatividade (BRASIL, 2018, p. 474-475).

Ufa! Quanto conhecimento!

Vamos conhecer algumas ferramentas que podemos utilizar em sala de aula?

QUAIS FERRAMENTAS PODEM SER UTILIZADAS EM SALA DE


AULA?

A cultura digital é ampla e contempla diversidade advinda dos


multiletramentos que mescla diferentes mundos e culturas, que podem ser
originadas do impresso (mas com adaptações). É importante entender e
compreender as mudanças ocorridas com a web 2.0, que deram origens aos novos
gêneros do discurso e práticas de linguagens próprias da cultura digital.

O que é a Web 2.0?

O termo é utilizado para designar uma segunda geração de comunidades


e serviços oferecidos na internet, tendo como conceito a Web e através de
aplicativos baseados em redes sociais e tecnologia da informação.

A Web 2.0 (anos 90) oportunizou um novo tipo de experiência para o


usuário da internet, dando poder para qualquer pessoa produzir, publicar e
compartilhar conteúdos via internet. Criou-se, assim, uma comunicação “de mão
dupla”, com um maior potencial de participação, colaboração e interação através
da ampliação de uso das TICs. A Web 2.0 também é reconhecida pela criação das
redes sociais, dos MOOCs e da aprendizagem em rede.

202
TÓPICO 3 — CULTURA DIGITAL NA BNCC E OS DESAFIOS PARA A ALFABETIZAÇÃO

Os gêneros textuais passaram por transmutação ou reelaboração devido


às novas mídias e hipertextual, novas de forma de interação e reconfiguração do
papel do leitor, que também passa a ser produtor – o que amplia as possibilidades
de participação e interação com os multiletramentos.

Observe abaixo a mudança do gênero digital que é originada de um


gênero impresso:

Vivenciar esses gêneros na escola torna-se fundamental para desenvolver


uma compreensão ativa dos textos. A BNCC não contempla ferramenta digital,
mas, é possível utilizá-las (inclusive do celular).

Segue algumas sugestões que permitem gerar colaboração e interatividade


nas aulas:

UNI

Blogs: é um gênero textual digital veiculado na internet que serve como meio
de comunicação virtual. O termo é uma abreviação da palavra inglesa “weblog” que surge
da união dos vocábulos “web” (teia) e “log” (diário de bordo). Para trabalhar com este gêne-
ro é possível criar um especifico que contenham a multimodalidade, ao integrar foto, texto
e vídeo. Entre os programas se destacam o Wordpress, Tumblr, Blogger, todos gratuitos.

Meme/charge digital: o gênero atrai muitos os jovens, pela forma irreverente. O termo é
bastante conhecido e utilizado no "mundo da internet", referindo-se ao fenômeno de "vi-
ralização" de uma informação. Ou seja: qualquer vídeo, imagem, frase, ideia, música,
que se espalhe entre vários usuários rapidamente, alcançando muita popularidade e
pode ser criado a partir de ferramentas gratuitas e intuitivas como o Canvas e o meme
mania.

Vídeo-minuto: os alunos se identificam muito com este gênero, pela possibilidade de in-
ternalizar e oralizar acontecimentos. Além dos programas disponíveis como aplicativo de
celular, também é possível trabalhar no computador com o Windows moviemaker, que é
bem simples e intuitivo e possui ferramenta de edição.

Fanfic: é um gênero voltado para leitura e escrita de histórias. Para tornar mais prazeroso
o trabalho com fanfics, é possível usar o playfic, que é um site com uma programação
simples. Ele possibilita o desenvolvimento de habilidades de leitura e escrita, em que o
usuário pode criar sua narrativa e possibilitar que os leitores escolham o final da história.

Disponível em: https://bit.ly/2Yt9sEe.

203
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

Mediante as ferramentas apresentadas podemos mobilizar práticas


de cultura digital em diferentes linguagens, gêneros, mídias e ferramentas
digitais, tornando-se importante para expandir e produzir sentidos no processo
de compreensão e produção dos alunos. Ao refletir sobre o mundo e realizar
diferentes projetos autorais, o aluno participa ativamente da construção do
conhecimento.

4 LETRAMENTO DIGITAL
Acadêmico(a), você já ouviu falar no termo letramento digital? O
letramento digital na Educação está relacionado com o conhecimento necessário
para saber como usar os recursos tecnológicos e da escrita no meio digital e
participar de maneira crítica e ética das práticas sociais da cultura digital.

O conceito se trata da cultura nascida pela era digital, originária do


ciberespaço e da linguagem da internet que busca integrar a realidade com o
mundo virtual. No tema ganhou grande ênfase com a homologação da Base
Nacional Comum Curricular (BNCC), devido às mudanças advindas do avanço
tecnológico e do crescente acesso a elas pela facilidade de dispositivos como
computadores, telefones celulares, tablets e outros.

Neste contexto vale ressaltarmos que a partir da consolidação e do avanço


das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), percebeu-se que associado
a elas também ocorreu uma mudança gradativa nas ideias e nas práticas dos
modos de vida até então vivenciados pelo homem. Nessa mudança, modificaram-
se também as relações entre as pessoas. Por ser uma área ampla, focalizaremos
nas mudanças relacionadas à área da Educação. Emergindo assim, o letramento
digital, que pressupõe o bom uso de tecnologias e da internet não apenas para
lazer e entretenimento, mas principalmente para o aprendizado ativo.

Esse cenário impõe à escola desafios ao cumprimento do seu papel em


relação à formação das novas gerações, tornando-se assim importante que a
instituição escolar preserve seu compromisso de estimular a reflexão e a análise
aprofundada e contribua para o desenvolvimento, no aluno, de uma atitude
crítica em relação ao conteúdo e à multiplicidade de ofertas midiáticas e digitais
(COSCARELLI; RIBEIRO, 2011).

Desenvolver competências no contexto digital corresponde às habilidades


de uso estratégico daquilo que é aprendido, tornando-se capaz de gerar influência
no contexto cultural e social. Ou seja, é a capacidade de leitura e escrita adaptada
ao mundo moderno que vai além das palavras em si, pois os sujeitos devem ser
capazes de desenvolver habilidades funcionais que proporcionam implicações
práticas e relevantes utilizando os recursos tecnológicos e digitais (COSCARELLI;
RIBEIRO, 2011).

204
TÓPICO 3 — CULTURA DIGITAL NA BNCC E OS DESAFIOS PARA A ALFABETIZAÇÃO

De acordo Pereira (2005, p. 17), “precisamos dominar a tecnologia para


que, além de buscarmos a informação, sejamos capazes de extrair conhecimento”,
tornando-se capaz de lidar com todas as ferramentas e recursos que o universo
da World Wide Web (www) nos possibilita, o que demanda conhecimentos que
vão além do domínio da língua enquanto código. Nesse processo mais do que
somente “digitar” textos, precisamos saber “navegar” na rede, ou seja, entender
e perceber como os textos estão articulados e como eles “conversam” entre si e
como podemos chegar de um texto a outro sem perder os objetivos.

Neste contexto destacamos Xavier (2013) o qual relata que um sujeito


é letrado digitalmente está apto a desempenhar funções e executar ações que
envolvam artefatos eletrônicos e digitais. Entende-se, portanto, que o letrado
digital é a pessoa que lê, escreve e confronta criticamente o que assimila para
solidificar o que aprendeu. Não é uma capacidade passiva, mas tipicamente ativa.
O indivíduo não só aprende a usar a tecnologia e o meio digital, mas a utilizar
suas funções (COSCARELLI; RIBEIRO, 2011).

Ainda segundo o autor, o letrado digital além da leitura e da escrita de


palavras é capaz de ler códigos, sinais verbais e não verbais como imagens e
desenhos, pois é assim que as informações estão dispostas na internet e nas telas.
No entanto, para que os sujeitos desenvolvam tais habilidades, não podemos
esquecer a função primordial da escola que é de alfabetizar e letrar (COSCARELLI;
RIBEIRO, 2011).

Na mesma direção Xavier (2013, p. 2) ressalta que “a capacidade de


enxergar além dos limites do código, fazer relações com informações fora do
texto falado ou escrito e vinculá-las à sua realidade histórica, social e política são
características de um indivíduo letrado”.

Soares (2002) define letramento digital como certo estado ou condição que
adquirem os que se apropriam da nova tecnologia digital e exercem práticas de
leitura e de escrita na tela, diferentes do estado ou condição – do letramento – dos
que exercem práticas de leitura e de escrita no papel (SOARES, 2002, p. 151).

Agora que compreendemos alguns conceitos que envolvem o letramento


digital vamos aprofundar nosso conhecimento realizando a leitura do texto de
Santos (2019), o qual apresenta como título:

205
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

LEITURA COMPLEMENTAR

LETRAMENTO DIGITAL NA BNCC

A CULTURA DIGITAL NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM


DE LÍNGUA PORTUGUESA

O texto nos fará compreender que o letramento permeia o contexto


educacional direcionando um novo olhar para o processo de aquisição da leitura
e da escrita em diversos campos, configurando-se como uma prática socializante;
um processo de inclusão digital. As tecnologias digitais permeiam a maior parte
das práticas de leitura e escrita que se desenvolvem na atualidade e a escola deve e
precisa garantir espaços para o desenvolvimento dessas práticas. Em razão disso,
é imprescindível compreender o letramento a partir das mediações tecnológicas
no processo de ensino e aprendizagem de Língua Portuguesa.

VAMOS MERGULHAR NA LEITURA?

LETRAMENTO DIGITAL: UMA PRÁTICA SOCIALIZANTE

A definição de letramento, como se nota, em geral está associada a cultura


impressa. Designa uma prática que vai além do saber ler e escrever. Segundo
Soares (2003) apud (PEREIRA, 2007, p. 15), “letrar é mais que alfabetizar, é
ensinar a ler e escrever dentro de um contexto no qual a escrita e a leitura tenham
sentido e façam parte da vida das pessoas.” No caso do letramento digital não é
diferente, o mesmo também busca efetivar as práticas sociais que usam a leitura
e escrita, no entanto, por meios e modos diferentes, já que os textos contam com
os suportes digitais.

Com a emergência das novas tecnologias, especialmente com a


vulgarização da internet, a qual deixou de ser privilégio das grandes empresas e
tornou-se acessível para a maioria das pessoas, a leitura salta para a esfera digital.
Com o computador, tornou-se possível não apenas a leitura e pesquisa, mas a
comunicação síncrona entre duas pessoas distantes, a realização de cursos on-
line, momentos de lazer e muitas outras atividades (COSCARELLI; RIBEIRO,
2007, p. 8).

Segundo Coscarelli; Ribeiro, (2007, p. 10), letramento digital “é o nome


que damos então, à ampliação do leque de possibilidades de contato com a escrita
também em ambiente digital (tanto para ler quanto para escrever).” Para Frade
(2007, p. 60), o termo letramento digital, compreende tanto a apropriação de uma
tecnologia, quanto o exercício efetivo das práticas de escrita que circulam no
campo digital. Trata-se de uma prática socializante, uma vez que possibilita o uso
da tecnologia e absorção de conhecimentos múltiplos. Por isso, o acesso à essas
ferramentas e aos gêneros digitais não deve ser negado a nenhum indivíduo.

206
TÓPICO 3 — CULTURA DIGITAL NA BNCC E OS DESAFIOS PARA A ALFABETIZAÇÃO

Consoante João Thomas Pereira, o letramento digital precisa ir além do


aprender a acessar o computador e seus recursos. É preciso vivenciar a inclusão
digital, “processo em que uma pessoa ou grupo de pessoas passa a participar
dos usos e costumes de outro grupo, passando a ter os mesmos deveres dos já
participantes daquele grupo em que está se incluindo. (PEREIRA, 2007, p.15)

Em outras palavras:

[...] precisamos dominar a tecnologia da informação, estou me


referindo a computadores, softwares, internet, correio eletrônico,
serviços, etc., que vão muito além de aprender a digitar, conhecer o
significado de cada tecla do teclado ou usar um mouse. Precisamos
dominar a tecnologia para que, além de buscarmos a informação,
sejamos capazes de extrair conhecimento (PEREIRA, 2007, p.17).

Nessa medida, Pereira explica que a exclusão digital, também denominada


de analfabetismo digital, configura-se o grande desafio das escolas, educadores
e da sociedade civil (PEREIRA, 2007, p.13), visto que, para vivenciar esse novo
mundo letrado o aluno precisa aprender a manusear a tecnologia e, especialmente
a tê-la como meio de se interagir/comunicar com mundo, absolver e produzir
conhecimento.

GÊNEROS DIGITAIS: VELHAS FUNÇÕES, NOVOS SUPORTES

Como mencionado, as novas tecnologias da informação e comunicação


possibilitarem tanto uma nova forma de interação entre o leitor e texto, como
também o aparecimento de novos gêneros e formatos textuais. Tal como evidencia
Marcuschi (2002, p. 1), esses gêneros não são inéditos, mas já estão provocando
polêmicas no que tange à natureza e proporção de seu impacto na linguagem e
na vida social, pois competem, em importância, nas atividades comunicativas, ao
lado da imagem e do som.

Embora se caracterizem pela versatilidade, já que englobam


simultaneamente variadas formas de linguagem (imagem, texto, som), os gêneros
textuais digitais têm sua gênese em gêneros tradicionais ligados à escrita e
oralidade. Prova disso, é o gênero e-mail, serviço eletrônico que, essencialmente,
tem a mesma função de uma carta, todavia, tem a internet e não o papel como
suporte.

Hoje, com a emergência da internet e das redes sociais, percebe-se que os


gêneros e os suportes seguem se reconfigurando, o que explica o uso generalizado
do facebook, WhatsApp e Instagram, os quais além de possibilitarem a comunicação
em tempo real com pessoas diferentes e de diferentes lugares, promovem o
armazenamento e compartilhamento de dados e informações, bem como, de
conhecimentos.

Outro aspecto característico dos gêneros digitais repousa sobre a escrita.


Segundo Marcuschi (2002, p. 5), os mesmos são centrados na escrita, uma vez
que, dependem totalmente dela. Diante dessas inovações, nota-se que “as
207
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

escolas não devem, não podem e não querem ficar de fora desse novo mundo de
possibilidades” (COSCARELLI; RIBEIRO, 2007, p. 8), já que esses gêneros nos
propiciam uma “interação altamente participativa” (MARCUSCHI, 2002, p. 4).

Nessa perspectiva, afim de alcançar o letramento digital e para se tornar


um lugar “mais acessível e real” (COSCARELLI, 2007, p.40) três aspectos são
indispensáveis às escolas. Primeiro, o uso das tecnologias como instrumento
pedagógico; segundo, aprender sobre a leitura nas telas dos computadores; e,
por último, saber produzir esses gêneros emergentes.

O LETRAMENTO DIGITAL NA BNCC: DOS GÊNEROS IMPRESSOS


À CULTURA DIGITAL

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), prevista na Constituição de


1988, na LDB de 1996 e no Plano Nacional de Educação de 2014, trata-se de um
documento de cunho normativo que determina as competências essenciais que
todos os estudantes devem desenvolver ao longo da Educação Básica.

Mendonça Filho, ministro da educação, no prefácio da obra supracitada,


diz que a mesma trata-se de “um documento plural, contemporâneo, que
estabelece com clareza o conjunto de aprendizagens essenciais e indispensáveis a
que todos os estudantes, crianças, jovens e adultos, têm direito” (BRASIL, 2018, p.
5). Por isso, as escolas e instituições de ensino, públicas e privadas, devem tomar
o documento como referência durante a elaboração dos seus currículos e ações
pedagógicas.

Fugindo do caráter conteudista na BNCC, as aprendizagens devem


assegurar ao estudante o desenvolvimento de dez competências gerais, as
quais, na instância pedagógica, compreendem os direitos de aprendizagem e
desenvolvimento que visa a construção de conhecimentos, o desenvolvimento
de habilidades e a formação de atitudes e valores ao longo das três etapas da
Educação Básica, a saber, Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio
(BRASIL, 2018, p. 8).

Dentre as competências postuladas, a competência de número cinco


evidencia a atenção do documento para com as várias linguagens, especialmente
as relacionadas ao campo digital, como vemos a seguir:

5. Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação


e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas
diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar,
acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver
problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva
(BRASIL, 2018, p. 9).

Nota-se que ao inserir o estudo da linguagem digital no currículo


escolar, a BNCC prevê não apenas o uso das novas tecnologias da comunicação e
informação, mas o letramento digital, uma vez que, entende tanto a necessidade

208
TÓPICO 3 — CULTURA DIGITAL NA BNCC E OS DESAFIOS PARA A ALFABETIZAÇÃO

de saber manusear as tecnologias quanto a importância de fazer desse uso uma


prática social, isto é, uma forma de interagir com o outro e produzir conhecimentos
significativos no plano individual e coletivo.

Na BNCC, o Ensino Fundamental, está organizado em cinco áreas


do conhecimento (Linguagens, Matemática, Ciências da natureza, Ciências
humanas e Ensino Religioso), as quais, dialogam com os conhecimentos e saberes
dos diferentes componentes curriculares (BRASIL, 2010 apud BRASIL, 2018).
Segundo o documento, “cada área de conhecimento estabelece competências
específicas de área, cujo desenvolvimento deve ser promovido ao longo dos
nove anos”. (BRASIL, 2018, p. 28). Assim, para assegurar o desenvolvimento
destas, cada componente curricular apresenta um conjunto de habilidades. Estas
estão relacionadas a diferentes objetos de conhecimento (conteúdos, conceitos e
processos), os quais são organizados em unidades temáticas.

A BNCC do ensino Fundamental além de transmitir uma ideia de


continuidade, uma vez que as experiências vivenciadas na Educação Infantil
devem ser valorizadas na primeira fase do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano)
e, as aprendizagens construídas nesses anos iniciais devem ser desenvolvidas
e aprofundadas nos anos finais (6º ao 9º ano); reconhece que os estudantes,
especialmente os adolescentes, possuem singularidades e estão inseridos numa
cultura digital que se impõe como uma nova forma de se relacionar com o mundo.
Em razão disso, e, reconhecendo as significativas mudanças sociais provocadas
pela cultura digital, a BNCC comtempla o estudo dos gêneros digitais, afim de
assegurar o uso democrático e consciente dessas tecnologias.

No currículo de Língua Portuguesa, o estudo dos variados textos deve


proporcionar aos alunos experiências que contribuam para a ampliação dos
letramentos, possibilitando a participação significativa e crítica nas diversas
práticas sociais constituídas pela oralidade, pela escrita e por outras linguagens.
(BRASIL, 2018, p. 65)

Conforme a BNCC:

Não se trata de deixar de privilegiar o escrito/impresso nem de deixar


de considerar gêneros e práticas consagrados pela escola, tais como
notícia, reportagem, entrevista, artigo de opinião, charge, tirinha,
crônica, conto, verbete de enciclopédia, artigo de divulgação científica
etc., próprios do letramento da letra e do impresso, mas de contemplar
também os novos letramentos, essencialmente digitais (BRASIL, 2018,
p. 67).

Nesse viés, em Língua Portuguesa, do 1º ano ao 9º do Ensino Fundamental,


a abordagem do letramento digital, permeia todas as práticas de linguagem
(oralidade, leitura/escuta, produção escrita/multissemiótica, análise linguística/
semiótica), desenvolvendo-se de forma contextualizada. Além de se organizar em
eixos, os quais estão intrinsicamente relacionados com as práticas de linguagem
ora mencionadas, a BNCC organiza o currículo de Língua Portuguesa em campos
de atuação, espaços onde se dão as práticas de linguagem.
209
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

Segundo o documento, esse tipo de organização “aponta para importância


da contextualização do conhecimento escolar, para a ideia de que essas práticas
derivam de situações da vida social e, ao mesmo tempo, precisam ser situadas em
contextos significativos para os estudantes” (BRASIL, 2018, p. 82).

Esses campos de atuação se organizam em cinco categorias, são elas: Campo


da vida cotidiana, presente apenas nos anos iniciais do Ensino Fundamental;
Campo artístico-literário, Campo das práticas de estudo e pesquisa, Campo
jornalístico/midiático e Campo de atuação na vida pública.

Se na BNCC as competências e habilidades de um componente curricular


dialogam com as outras áreas de conhecimento, com os gêneros digitais não
poderia ser diferente. “A cultura digital perpassa todos os campos, fazendo surgir
ou modificando gêneros e práticas. Por essa razão, optou-se por um tratamento
transversal da cultura digital, bem como das TDIC, articulado a outras dimensões
nas práticas em que aparecem” (BRASIL, 2018, p. 83).

Assim, à guisa de conclusão, é importante salientar algumas habilidades


do currículo de Língua Portuguesa que concorrem para a promoção do letramento
digital no Ensino Fundamental.

Ao longo dos anos iniciais do Ensino Fundamental, espera-se que os


estudantes já conheçam e saibam usar os variados gêneros que circulam nos
campos de atuação, visto que, nos anos finais do Ensino Fundamental contempla
210
TÓPICO 3 — CULTURA DIGITAL NA BNCC E OS DESAFIOS PARA A ALFABETIZAÇÃO

somente o estudo aprofundado dos mesmos. Nessa etapa, privilegia-se os gêneros


que fazem parte da esfera pública, principalmente os do campo jornalístico-
midiático.

Considerações Finais

O letramento digital figura-se como prática socializante, uma vez que,


ultrapassa o simples ato de saber ler e digitar em um computador. Evidenciou-se,
que letramento digital compreende o ato de usar a leitura e a escrita digital como
formas de apreender e compartilhar conhecimentos significativos.

Como a escrita digital, vem se impondo na sociedade atual como uma


nova possibilidade de comunicação e produção, a escola não pôde se esquivar
dessa realidade. Por isso, destacou-se tanto a importância das tecnologias da
comunicação e informação e dos gêneros digitais, quanto as formulações da Base
Nacional Comum Curricular para o trato com a linguagem digital.

Desse modo, fica evidente que a BNCC além de privilegiar o estudo dessa
nova forma de linguagem, o qual organiza-se de forma híbrida, permeando todas
as áreas de conhecimento e anos escolares, prevê um estudo dos gêneros digitais
de forma contextualizada, já que as condições de produção desses gêneros não se
desvencilham das práticas que objetivam o letramento no campo digital

Fonte: https://www.anais.ueg.br/index.php/cepe/article/view/12360

Após a leitura do texto emerge um questionamento:

COMO LEVAR O LETRAMENTO DIGITAL PARA AS AULAS?

É importante trabalhar com o tema de maneira transversal e em várias


frentes, como a cidadania digital, mídias digitais, apropriação tecnológica,
especificidades das tecnologias digitais da informação, da comunicação e das
mídias.
Os estudantes refletem sobre diversos assuntos, ao mesmo tempo em que
se tornam produtores de conteúdo ao criar podcasts, blogs, e-books ou mesmo
realizar um curta-metragem.

A seguir, apresenta-se cinco pontos importantes que o professor deve


considerar ao organizar a aprendizagem com a turma.

Conheça as mídias digitais às quais os alunos têm acesso


Um passo importante é realizar um diagnóstico inicial para identificar
e conhecer os gostos dos estudantes e conferir quais mídias eles mais acessam.
Dessa forma, você poderá potencializar o trabalho em sala de aula de maneira
personalizada – considerando o conhecimento prévio dos estudantes ao trazer
interatividade e pertencimento às atividades desenvolvidas.

211
UNIDADE 3 — A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC), A ALFABETIZAÇÃO E OS DESAFIOS DA ERA DIGITAL

Planeje suas atividades e objetivos


O planejamento é essencial para qualquer atividade. Definir os objetivos
e qual ênfase você pretende dar a uma atividade para alcançar determinado
resultado deve ser pensado com cuidado. Você quer trabalhar respeito, ética,
apropriação tecnológica, mídias e linguagens digitais? O ponto de partida é
sempre a aprendizagem.

Abra espaço para o processo de criação


O processo criativo pode ser surpreendente. Propicie que os estudantes
vivenciem a autoria com atividades de pertencimento. Umas das possibilidades
é desenvolver em sala o remix, que permite trabalhar com algo existente,
transformando- em um conteúdo diferente, derivado do primeiro. Um exemplo é
um pot-pourri de uma música ou um meme.

Envolva diversos gêneros digitais nas atividades


Atualmente, o mundo digital oferece uma diversidade de gêneros que
fazem parte do universo dos estudantes e que circulam nas mídias – como fanfics,
vlogs, charges, vídeos-minuto –, que podem ser transformados e adaptados para
os conteúdos que estão sendo trabalhados em sala de aula.

Compartilhe sempre
Realize oficinas e feiras culturais, para que os alunos tenham oportunidade
de oralizar suas produções e trocar opiniões com outros estudantes. Outra
maneira de levar esse conteúdo a mais pessoas é compartilhar as produções em
eventos, como festivais de vídeos, plataformas como a plataforma digital do
Museu da Pessoa e realizar intercâmbios entre escolas e ou salas/séries diferentes.
Experiências como essas aguçam a criatividade e a inventividade e fazem com
que os estudantes vivenciem na prática a cultura digital.

212
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• A geração denominada de “nativos digitais” ou geração Z, ou seja, zarpam,


zapeiam e navegam o tempo todo na internet e estão constantemente
conectados. Eles nasceram na era digital, começaram a aprender na linguagem
digital e não conheceram nada além de uma vida conectada.

• A BNCC procura contemplar a cultura digital, diferentes linguagens e


diferentes letramentos, desde aqueles basicamente lineares, com baixo nível
de hipertextualidade, até aqueles que envolvem a hipermídia.

• A cultura digital envolve aprendizagens voltadas a uma participação mais


consciente e democrática por meio das tecnologias digitais, o que supõe a
compreensão dos impactos da revolução digital e dos avanços do mundo
digital na sociedade contemporânea, a construção de uma atitude crítica, ética
e responsável em relação à multiplicidade de ofertas midiáticas e digitais, aos
usos possíveis das diferentes tecnologias e aos conteúdos por elas veiculados,
e, também, à fluência no uso da tecnologia digital para expressão de soluções
e manifestações culturais de forma contextualizada e crítica.

• O letramento digital na Educação está relacionado com o conhecimento


necessário para saber como usar os recursos tecnológicos e da escrita no
meio digital e participar de maneira crítica e ética das práticas sociais
da cultura digital.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

213
AUTOATIVIDADE

1 A cultura digital perpassa todos os campos, fazendo surgir ou modificando


gêneros e práticas. Por essa razão, optou-se por um tratamento transversal
da cultura digital, bem como das TDIC, articulado a outras dimensões
nas práticas em que aparecem. A preocupação com os impactos dessas
transformações na sociedade está expressa na BNCC e se explicita já nas
competências gerais para a Educação Básica. As diferentes dimensões que
caracterizam a computação e as tecnologias digitais são tematizadas, tanto
no que diz respeito a conhecimentos e habilidades quanto a atitudes e
valores. Mediante o anunciado relacione:

I- Pensamento computacional
II- Mundo digital
III- Cultura digital

( ) envolve aprendizagens voltadas a uma participação mais consciente e


democrática por meio das tecnologias digitais, o que supõe a compreensão
dos impactos da revolução digital e dos avanços do mundo digital na
sociedade contemporânea, a construção de uma atitude crítica, ética e
responsável em relação à multiplicidade de ofertas midiáticas e digitais.
( ) envolve as capacidades de compreender, analisar, definir, modelar,
resolver, comparar e automatizar problemas e suas soluções, de forma
metódica e sistemática, por meio do desenvolvimento de algoritmos.
( ) envolve as aprendizagens relativas às formas de processar, transmitir
e distribuir a informação de maneira segura e confiável em diferentes
artefatos digitais – tanto físicos (computadores, celulares, tablets etc.)
como virtuais (internet, redes sociais e nuvens de dados, entre outros).

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) II - I - III.
b) ( ) I - II - III.
c) ( ) III - I - II.
d) ( ) II - III - I.

2 Por meio da imagem compreende-se que as tecnologias propiciam a


construção de saberes a partir da comunicabilidade com o mundo, no qual
não ocorrem limitações geográficas e culturais, mas sim a constante troca
de conhecimentos e experiências. Nesse contexto, os professores, segundo
Mattar (2011, p. 8), “precisam refletir sobre as metodologias adotadas”, pois
em sala de aula atualmente se identifica uma nova geração de alunos, os
quais são denominados como “nativos digitais”.

214
Sobre as características dos “nativos digitais”, analise as sentenças a seguir:

I- Nasceram e vivem com a tecnologia.


II- São conectados 24 horas por dia, curtindo mais os aparelhos inovadores
do que as "velhas metodologias de ensino".
III- Preferem lápis e papel, deixando de lado as tecnologias.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e III estão corretas.


b) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
d) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.

3 Cabe à escola incorporar a tecnologia nas suas práticas educativas. Essa


ferramenta possibilita que o aluno se desenvolva de forma científica.
Quanto aos processos de ensinar e aprender e o uso das tecnologias, assinale
a alternativa CORRETA:

a) ( ) As tecnologias devem ser incorporadas na educação como um simples


recurso didático.
b) ( ) Não há necessidade em inserir as tecnologias no contexto de sala
de aula, pois estas não melhoraram as questões metodológicas e
aprendizagem.
c) ( ) As tecnologias devem ser incorporadas como um novo mecanismo
para melhorar a qualidade do ensino.
d) ( ) Inserir a tecnologia na escola significa utilizar os computadores nas
salas de aula e deixar os alunos livres para pesquisar.

4 Na BNCC, as aprendizagens devem assegurar ao estudante o


desenvolvimento de dez competências gerais, as quais, na instância
pedagógica, compreendem os direitos de aprendizagem e desenvolvimento
que visa a construção de conhecimentos, o desenvolvimento de habilidades
e a formação de atitudes e valores ao longo das três etapas da Educação
Básica, a saber, Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio
(BRASIL, 2018, p. 8). Dentre as competências postuladas, a competência
de número cinco evidencia a atenção do documento para as várias
linguagens, especialmente as relacionadas ao campo digital. Disserte sobre
a competência da BNCC relacionada ao campo digital.
215
5 A cultura digital perpassa todos os campos, fazendo surgir ou modificando
gêneros e práticas. Por essa razão, optou-se por um tratamento transversal
da cultura digital, bem como das TDIC, articulado a outras dimensões nas
práticas em que aparecem. Mediante o anunciado descreva o que a BNCC
aponta sobre a cultura digital.

216
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cepção e habilidades. Disponível em: https://repositorio.pucgoias.edu.br/jspui/
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