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DIDÁTICA DO ENSINO

DE LÍNGUAS

Autoria: Nadia Studzinski Estima de Castro

1ª Edição
Indaial - 2021

UNIASSELVI-PÓS
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Prof. Hermínio Kloch

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol

Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD:


Carlos Fabiano Fistarol
Ilana Gunilda Gerber Cavichioli
Jairo Martins
Jóice Gadotti Consatti
Marcio Kisner
Norberto Siegel
Julia dos Santos
Ariana Monique Dalri
Marcelo Bucci

Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Copyright © UNIASSELVI 2021


Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
UNIASSELVI – Indaial.
C355d

Castro, Nadia Studzinski Estima de

Didática do ensino de línguas. / Nadia Studzinski Estima de Castro.


– Indaial: UNIASSELVI, 2021.

117 p.; il.

ISBN 978-65-5646-321-6
ISBN Digital 978-65-5646-320-9

1. Ensino de línguas. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da


Vinci.

CDD 370

Impresso por:
Sumário

APRESENTAÇÃO.............................................................................5

CAPÍTULO 1
Didática do Ensino de Línguas: Fundamentações
Teórica e Prática........................................................................... 7

CAPÍTULO 2
Pressupostos Pedagógicos para o Ensino de
Língua Materna............................................................................ 41

CAPÍTULO 3
Métodos e Abordagens para o Ensino de Língua
Estrangeira.................................................................................. 81
APRESENTAÇÃO
Olá, acadêmico da pós-graduação! Seja muito bem-vindo!

Neste livro, o objetivo é construir uma trajetória de aprendizagens a respeito


dos temas diretamente relacionados com a Didática do ensino de línguas.
Portanto, você é convidado a construir conhecimento acerca das fundamentações
teórica e prática de livros e de materiais didáticos para o ensino da língua; dos
pressupostos pedagógicos para o ensino das línguas materna e estrangeira,
a partir das teorias da linguagem e das propostas dos Parâmetros Curriculares
Nacionais; dos métodos e das abordagens para o ensino da língua estrangeira; e
da especificidade da avaliação no ensino de LE.

A partir da orientação de leitura, desejamos que você compreenda que o


conhecimento é construído por uma dinâmica baseada no diálogo. Assim, questione
sempre, pois questionar é importante para a construção do saber. Dessa forma,
queremos que, ao fim dos estudos deste livro, a sua busca pelo saber não finalize
aqui. Continue fazendo leituras para ampliar os seus conhecimentos, certo?!
Lembre-se de que a proposição de questões motiva a busca por soluções para
os problemas do cotidiano. Desafiamo-nos como profissionais e aperfeiçoamos a
nossa prática docente, uma vez que a Didática é a prática e a ação é pautada no
conhecimento teórico.

Este livro está dividido em três capítulos, com o intuito de ampliar os seus
saberes acerca do campo da Didática na formação de professores para uma
atuação embasada em teoria, esta, sempre, relacionada com a prática docente. É
um campo amplo, portanto, a delimitação do tema é necessária. Assim, a divisão
desta leitura acontece da seguinte forma: primeiramente, Didática do ensino de
línguas: fundamentações teórica e prática; em segundo plano, pressupostos
pedagógicos para o ensino da língua materna; e, por fim, métodos e abordagens
para o ensino da língua estrangeira.

No primeiro capítulo, iniciaremos os nossos estudos a respeito da Didática do


ensino de línguas com as fundamentações teórica e prática referentes ao campo
da Didática. O objetivo, desta etapa inicial, é ampliar os seus saberes a partir
de um panorama e de uma contextualização histórica da Didática para o ensino
das línguas, acrescentando conhecimentos da teoria e da prática referentes a
livros e a materiais didáticos no contexto do ensino de línguas. Da mesma forma,
é importante que você reconheça o significado da Didática para a sua atuação
profissional.
A partir desta proposta de estudo, você estará habilitado para reconhecer a
trajetória de consolidação histórica do campo e para ampliar os saberes da teoria
e da prática em Didática do Ensino de Línguas. Neste primeiro capítulo, também,
retomaremos algumas normativas vigentes, tendo, como base, a legislação atual
e os documentos norteadores da educação no contexto do Brasil.

Bons estudos!
C APÍTULO 1
DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

A partir da perspectiva do saber-fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

• Saber o panorama e a contextualização histórica da Didática para o ensino de


línguas, com a ampliação dos conhecimentos de teoria e de prática de livros e
de materiais didáticos no contexto do ensino de línguas.
• Reconhecer a trajetória da consolidação histórica do campo para ampliar os
saberes da teoria e da prática em Didática do Ensino de Línguas.
Didática do Ensino de Línguas

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Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
O mundo da sala de aula apresenta uma complexidade observada por
diferentes filósofos, psicólogos, historiadores, sociólogos, economistas etc. Desde
a Antiguidade, busca-se entender o processo de ensino, a formação dos sujeitos e
de que forma essa dinâmica acontece. Estudos filosóficos mais antigos indicavam
uma formação mais passiva para os sujeitos envolvidos nos processos de ensino
e de aprendizagem. Com o passar do tempo, com os avanços investigativos, e
com um olhar mais apurado, possibilita-se a consolidação, então, da pedagogia
como campo de estudo. Passa-se a perceber que os seres humanos são ativos
nos processos de ensino e de aprendizagem.

A mestra (o mestre) e a professora (o professor) desempenham o papel


de intermediadores, de facilitadores do processo. Assim, a educação é uma
ação pautada no mundo que cerca os seres humanos, no entendimento
dessas dinâmicas sociais, econômicas, políticas, culturais, interculturais etc.
Entretanto, então, de que forma organizar as dinâmicas da sala de aula com
esse entendimento? Que disciplina/campo busca investigar práticas produtivas
para a sala de aula, tendo, como base, essa visão de ensino? Esse é o desafio
investigativo da Didática. Como um dos ramos da pedagogia, o seu objeto de
estudo está no entendimento do processo de ensino e do estudo ativo. Essa
abordagem, portanto, gera impactos nas políticas educacionais, na elaboração de
materiais didáticos etc.

Na complexa dinâmica, considere, para a sua prática docente, as dimensões


envolvidas no processo didático: ensinar, aprender, pesquisar e avaliar. Lembre-se
de que a Didática é uma disciplina de natureza pedagógica, considerada aplicada,
mantendo as suas orientações para fins educativos e estando comprometida com
as questões da docência, mas, sobretudo, com os interesses e as expectativas
dos alunos. A Didática desenha um espaço de investigação considerado, portanto,
teórico-prático, com o objetivo-fim de compreender as múltiplas dimensões da
docência, percebida como ensino em ação.

Boa leitura!

2 DIDÁTICA: ESTUDOS INICIAIS


Para iniciar este processo de aprendizagem, começaremos com alguns
questionamentos: em que conjunto de conhecimentos podemos situar (aproximar)
a Didática? Conseguiu pensar em algo? Se você pensou na Pedagogia, acertou,
pois, a Didática, podemos dizer, é um dos ramos de estudo dessa grande área.

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Didática do Ensino de Línguas

De acordo com Libâneo (1990, p. 15), há uma “subordinação do processo


didático a finalidades educacionais”, ou seja, à Didática, impõe-se o desafio de
esquematizar o conhecimento das técnicas relacionadas com os processos de
ensino e de aprendizagem.

A Didática se faz presente na prática de todo professor, pois


está relacionada com as estratégias utilizadas em sala de aula; a
formação docente, considerando teoria e prática; as metodologias;
a elaboração de atividades diversas, com objetivos e finalidades
determinadas etc. Ou seja, trata-se de uma análise ampla, de
diferentes fatores, de tal forma que oriente a ação educativa para o
alcance dos melhores resultados.

Saiba que, nesse contexto, não podemos limitar a Didática ao espaço da


sala de aula, pois o processo de ensino (objeto de estudo da Didática) acontece,
também, fora dela. De acordo com Libâneo (1990, p. 15), “o trabalho docente é
uma das modalidades específicas da prática educativa mais ampla que ocorre na
sociedade”, portanto, a formação humana é algo amplo, que considera o conjunto
de processos educativos e de ensino que, em certa medida, são exigências da
vida em sociedade, ou seja, na interação com os outros e com o mundo, isso
ocorre na sala de aula e fora dela. Assim, todo espaço é um lugar potencial de
formação para os sujeitos.

1 - Desafiamos você a pensar em ações docentes com objetivo


formativo que podem ser conduzidas em espaços não tradicionais
de ensino. Pense em lugares, interações e possibilidades de
atividade/interação que possam ensinar, considerando o ensino
da língua materna e da língua estrangeira. Pensou? Agora,
esquematize as suas ideias em uma nuvem de ideias. Em
seguida, apresente, para os seus colegas, as suas anotações,
e escute as propostas dos outros alunos da turma. É possível
estabelecer um diálogo entre essas ideias e novas sugestões
podem ser propostas em conjunto. O objetivo é construir o
conhecimento de forma conjunta.

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Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

Para tanto, surge a Pedagogia, como a ciência que se dedica a investigar


a teoria e a prática da educação em relação aos vínculos que estabelece com a
prática social, de forma global. A Didática, por sua vez, é a disciplina que “estuda
os objetivos, os conteúdos, os meios e as condições do processo de ensino, tendo
em vista finalidades educacionais, que são sempre sociais” (LIBÂNEO, 1990, p.
16). A Didática se fundamenta na Pedagogia, e, dessa forma, é considerada uma
disciplina pedagógica.

Educação Não Escolar como Campo de Práticas Pedagógicas


José Leonardo Rolim de Lima Severo

O texto apresenta considerações acerca do conceito de


Educação Não Escolar (ENE), e, a partir delas, estabelece
contribuições críticas ao debate que envolve o reconhecimento
e o fortalecimento dos processos educativos que se inserem
nesse âmbito, sob o entendimento da Pedagogia como ciência
da educação capaz de imprimir sentidos pedagógicos nesses
processos. Admitindo a existência de dimensões formativas
intrínsecas a diferentes relações e processos sociais influenciados
por uma nova racionalidade educativa contemporânea, discutem-se
as perspectivas da sociedade pedagógica e da aprendizagem ao
longo da vida, o lugar da ENE quanto às categorias descritivas do
fenômeno educacional e os aspectos que a configuram como cenário
de práticas pedagógicas fundadas pela práxis da Pedagogia.

Palavras-chave: Educação Não Escolar. Pedagogia. Práticas


pedagógicas. Educação não formal.

Acesse https://www.scielo.br/pdf/rbeped/v96n244/2176-6681-
rbeped-96-244-00561.pdf.

Para esta etapa inicial da leitura, é importante reforçar que, ao estudar a


educação nos aspectos sociais, políticos, econômicos e psicológicos, a Pedagogia
faz uso de contribuições de outras ciências, como da filosofia, história, sociologia,
psicologia etc. Consequentemente, esses estudos convergem na Didática, uma
vez que ela “reúne, no seu campo de conhecimentos, objetivos e modos de ação
pedagógica na escola” (LIBÂNEO, 1990, p. 16) e fora dela.

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Didática do Ensino de Línguas

Para não se confundir, lembre-se de que a Pedagogia é uma ciência


da e para a educação. Logo, estuda a educação, a instrução e o ensino. A
Didática, como um ramo da pedagogia (como filosofia da educação, sociologia
da educação, psicologia da educação etc.), investiga os fundamentos, as
condições e os modos de realização do processo educativo. Conforme explica
Libâneo (1990, p. 26), à Didática, “cabe converter objetivos sociais, políticos e
pedagógicos em objetivos de ensino, selecionar métodos e conteúdos em função
desses objetivos, estabelecer os vínculos entre ensino e aprendizagem, tendo
em vista o desenvolvimento das capacidades” individuais dos alunos. Para
o autor, a Didática está diretamente relacionada com a Teoria de Educação, a
Teoria da Organização Escolar, e, de uma forma muito especial, com a Teoria do
Conhecimento ea Psicologia de Educação.

Teoria do Conhecimento, você já ouviu algo a respeito ou


já leu sobre? Apresentamos uma pequena reflexão: A Teoria do
Conhecimento se caracteriza como disciplina filosófica independente
apenas na Idade Moderna, tendo o nome de John Locke considerado
como o seu fundador, o qual, na sua obra intitulada de An Essay
Concerning Human Understanding (tradução, em português,
para Ensaio Acerca do Entendimento Humano), trata, de modo
sistemático, das questões referentes à origem, à essência e à
certeza do conhecimento humano. Ficou curioso? Quer saber
mais a respeito dessa teoria? Indicamos a leitura do livro Teoria do
Conhecimento, de Johanees Hessen.

A Didática se dedica à teoria geral do ensino, portanto, metodologias


específicas, as quais integram o campo da Didática, ocupam-se de conteúdos
e de métodos específicos de cada matéria (por exemplo, Didática do Ensino de
Línguas) e da relação que se estabelece com fins educativos. Isso quer dizer que a
Didática, na sua relação com a Pedagogia, “generaliza processos e procedimentos
que são obtidos na investigação de matérias específicas, das ciências que dão
embasamento ao ensino e à aprendizagem e das situações concretas da prática
docente” (LIBÂNEO, 1990, p. 25). A Didática está relacionada com a formação
docente, considerando a dimensão técnico-prática. Libâneo (1990) explica que
a Didática se caracteriza como a mediação entre as bases teórico-científicas da

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Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

educação escolar e a prática docente. Portanto, opera como uma ponte entre o “o
que” e o “como” do processo pedagógico de ensino.

A Didática, resumidamente, é a responsável por descrever e por explicar os


nexos, as ligações e as relações entre os processo de ensino e de aprendizagem,
investigar os fatores determinantes dos processos citados anteriormente, indicar
os princípios, as condições e os meios de direcionamento do ensino, sempre
tendo a aprendizagem como finalidade, considerando o que há de comum entre
todas as disciplinas e as especificidades em didáticas específicas.

1 - Qual é a relação entre Pedagogia e Didática? Por que a


Didática é considerada como o eixo de formação profissional?

Nesta etapa da leitura, você já está habilitado para entender o espaço


que a Didática ocupa como disciplina independente, mesmo que diretamente
relacionada (ramo da Pedagogia) e fazendo uso dos saberes teóricos de outras
disciplinas (Teoria da Educação, Filosofia da Educação etc.).

Qual foi o percurso histórico da consolidação da Didática ao longo do tempo?


A seguir, contextualizaremos, historicamente, a disciplina, e conheceremos alguns
nomes importantes, os quais contribuíram para a construção dos princípios da
Didática. Vamos lá!

3 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA
A Didática está relacionada com a prática do professor em sala de aula, certo?
Sim! Essas práticas são fundamentais para a efetiva construção do conhecimento.
Como arte de ensinar tudo para todos, considerando as necessidades individuais
de todo estudante, o termo didática (do grego, didaktiké) foi utilizado, pela primeira
vez, por Ratke (1629) e por Comenius (1967), conforme Fereira et al. (2018). A
partir de Comenius, a Didática foi conquistando espaço como disciplina.

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Didática do Ensino de Línguas

FIGURA 1 – WOLFGANG RATKE

FONTE: <http://lapedagogiadels-xvii.blogspot.com/2018/11/aspectos-
que-surgen-en-la-pedagogia_7.html>. Acesso em: 24 abr. 2021.

FIGURA 2 – TRATADO DA ARTE UNIVERSAL DE ENSINAR TUDO A TODOS

FONTE: A autora
“Nós ousamos prometer uma Didática Magna, isto é, um método universal de
ensinar tudo a todos” (COMENIUS, 2011, p. 131).

Na obra Didática Magna, Comenius escreveu a respeito da prática do


ensinar-aprender, indicando ter descoberto um método eficaz para se chegar
à aprendizagem de todos. O autor defendeu um método de ensinar, de modo

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Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

certo, para obter resultados, sem que isso fosse cansativo para educandos e
educadores, pelo contrário, esse processo pudesse ser acompanhado de grande
alegria, mas de forma sólida e não superficial, conduzindo todos à cultura, aos
bons costumes e à piedade mais profunda.

Outro nome importante para a consolidação histórica da Didática foi


Rousseau (século XVIII). De acordo com Fereira et al. (2018), Rousseau
apresentou um conhecimento revolucionário para a Didática, pois declarou uma
definição importante para o conceito infância. Dessa forma, surgiu como um
autor que conferia continuidade para os pensamentos formulados pelos autores
anteriores, com uma formulação que fez o campo avançar, pois se tratava da
condição do ser criança.

FIGURA 3 – JEAN JACQUES ROUSSEAU (PINTURA


DE MAURICE QUENTIN DE LA TOUR)

FONTE: <https://www.infoescola.com/filosofia/jean-jacques-
rousseau/>. Acesso em: 24 abr. 2021.

Para você compreender a importância dessa mudança de perspectiva em


relação ao entendimento acerca da condição do ser criança, considere que, da
Antiguidade até o século XIX, predominava o pensamento de que, na prática
escolar, a aprendizagem acontecia de forma passiva e receptiva. “Aprender era
quase, exclusivamente, memorizar” (HAYDT, 2006, p. 14). Assim, a compreensão
ativa, a ação, a compreensão não desempenhava um papel ativo. O aluno/a
criança era alguém que precisava moldado. Aprender um ofício ou a ler e a
escrever era ensinado da mesma forma. Repetição e exercícios eram utilizados
para o processo de ensino. O sistema de perguntas e de respostas foi utilizado, e,
os conhecimentos repassados reduzidos. Conforme explica Haydt (2006, p. 15):

Este era o chamado método catequético, cuja origem remonta,


pelo menos, na cultura ocidental, aos antigos gregos. A palavra

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Didática do Ensino de Línguas

catecismo provém do termo grego katechein, que significa


“fazer eco". Esse método era usado por todas as disciplinas
e consistia na apresentação, pelo professor, de perguntas
acompanhadas das respostas já prontas.

Esse ensino mecânico foi sendo questionado e se passou a buscar (por


filósofos e educadores) uma forma de ensino “mais estimulante e adaptada aos
interesses dos alunos e às reais condições de aprendizagem” (HAYDT, 2006, p.
15). Nesse processo de descoberta, filósofos e educadores passaram a formular
teorias que tentavam explicar de que forma (de que formas) as pessoas eram
capazes de aprender e de assimilar o mundo. Essas teorias do conhecimento
foram sendo acompanhadas pela formulação de princípios didáticos.

Em 1762, Jean-Jacques Rousseau publicou Emilio ou Da


Educação. Este tratado, de uma total novidade para a época,
encontrou grande sucesso, revolucionou a Pedagogia, e serviu de
ponto de partida para as teorias de todos os grandes educadores dos
séculos XIX e XX. Trata-se de um romance pedagógico que conta
a educação de um órfão nobre e rico, Emilio, do nascimento até o
casamento.

Fiel a seu princípio, segundo o qual o homem nasce naturalmente


bom, Rousseau estima que é preciso partir dos instintos naturais da
criança para desenvolvê-los. A educação negativa (essa que propõe
o filósofo), na qual o papel do preceptor (professor) é, sobretudo, o
de preservar a criança, deveria substituir a educação positiva, que
forma a inteligência prematura e impensadamente. O ciclo completo
da nova educação comporta quatro períodos:

1. O primeiro período vai de 0 a 5 (zero a cinco) anos, correspondendo a


uma vida puramente física, apta a fortificar o corpo sem forçá-lo; período
espontâneo e orientado graças, notadamente, ao aleitamento materno.
2. O segundo período vai de 5 aos 12 (cinco a doze) anos, e é aquele
no qual a criança desenvolve o corpo e o caráter no contato com as
realidades naturais, sem intervenção ativa do preceptor.
3. O preceptor intervém, mais diretamente, no terceiro período, que
vai de 12 a 15 (doze a quinze) anos, período no qual o jovem inicia,
essencialmente, pela experiência, à geografia e à física, ao mesmo
tempo em que aprende uma profissão manual ou ofício.
4. Dos 15 aos 20 (quinze aos vinte) anos, compreende-se o quarto período,
no qual o homem floresce para as vidas moral, religiosa e social.

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Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

Este é, pois, o modelo básico de educação, proposto por


Rousseau, para substituir a educação tradicional que, em nome da
civilização e do progresso, obriga os homens a desenvolverem, na
criança, a formação apenas do intelecto, em detrimento da educação
física, do caráter moral e da natureza própria de cada indivíduo.

FONTE: <https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/a-educacao-no-
emilio-rousseau.htm>. Acesso em: 24 abr. 2021.

Nesse processo de desenvolvimento do conhecimento, retomamos


alguns pensadores e contribuições para a consolidação histórica da Didática.
Primeiramente, Sócrates (século V a.C.), que defendia que o saber não é algo a
ser transmitido por um mestre para um discípulo. Para Sócrates, o conhecimento
é uma descoberta feita pelo aprendiz, na relação com os desafios e os
conhecimentos apresentados, o sujeito vai aprendendo. É um processo e parte
da interação. Conhecer, portanto, é ação. Essa ação acontece no interior dos
indivíduos. Entretanto, então, qual seria a função do educador (do mestre)? Para
Sócrates, o mestre desempenha o papel de auxiliar os discípulos para que estes
descubram, autonomamente, a verdade.

As contribuições de Comenius (1592-1670), já citado anteriormente nesta


leitura, evidenciam que “o objetivo da educação é ajudar o homem a atingir essa
finalidade transcendente e cósmica (a felicidade), desenvolvendo o domínio de
si mesmo através do conhecimento de si próprio e de todas as coisas” (HAYDT,
2006, p. 16, grifo da autora).

Comenius

Didática Magna (1632)

Princípios defendidos:

1. Apresentar o objeto ou a ideia diretamente, fazendo demonstração,


pois o aluno aprende através dos sentidos, principalmente, vendo
e tocando.
2. Mostrar a utilidade específica do conhecimento transmitido e a
aplicação na vida diária.

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Didática do Ensino de Línguas

3. Fazer referência à natureza e à origem dos fenômenos estudados,


isto é, às causas.
4. Explicar, primeiramente, os princípios gerais, e, “só depois, os
detalhes”.
5. Passar para o assunto ou tópico seguinte do conteúdo apenas
quando o aluno tiver compreendido o anterior (HAYDT, 2006).

Além dos pensadores citados até aqui, há, ainda, Heinrich Pestalozzi (1746-
1827). Pestalozzi defendia, nos seus escritos, a doutrina considerada naturalista
(principalmente, nos parâmetros do Naturalismo Pedagógico de Rousseau).

Para ampliar os seus saberes, leia Naturalismo Pedagógico de


Rousseau.

O século XVIII teve, como um dos seus pontos marcantes, o


aparecimento do Naturalismo Pedagógico, concepção educativa
que vê, na natureza, o fim e o método de ensino; a natureza é, pois,
considerada como realidade suprema, da qual emanam toda a lei e
toda a ciência. O líder desse movimento foi Rousseau, que propôs a
fé na natureza, em substituição à lei da razão.

Leia mais em http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/


arquivos_destaque/9gdcolYckPSfb41_2013-6-27-16-59-32.pdf.

Nessa linha de pensamento, Pestalozzi defendia que o ser humano nasce


bom e o caráter é formado pelo contexto/ambiente em que está inserido. Portanto,
o ambiente de aprendizagem deve se aproximar dos reais contextos/condições
naturais para que os sujeitos possam se desenvolver de forma contextualizada.
Uma formação voltada para a positividade. Assim, a transformação do todo
acontece pela educação, que tem, como finalidade, “o desenvolvimento natural,
progressivo e harmonioso de todas as faculdades e aptidões do ser humano”
(HAYDT, 2006, p. 17).

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Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

FIGURA 4 – JOHANN HEINRICH PESTALOZZI

FONTE: <http://grandesnomesnahistoriadaeducacao.blogspot.
com/p/jo.html>. Acesso em: 24 abr. 2021.

Considerando, então, que toda criança deveria ter acesso à educação,


Pestalozzi semeou sementes da Pedagogia e da Didática, pois, de forma direta,
defendia que a educação deve respeitar o desenvolvimento infantil. Para isso,
são necessários os desenvolvimentos físico, intelectual e moral, e isso só ocorre
pela vivência e pela experiência, as quais devem ser apresentadas de forma
gradual, e de acordo com o desenvolvimento de cada um, para o pleno exercício
das capacidades. Nessa concepção, respeitar a individualidade do aluno é
fundamental, e o objetivo deve estar centrado no desenvolvimento de habilidades
e de técnicas para a ação social.

Mais dois nomes precisam ser citados para o entendimento do


desenvolvimento histórico da Didática e das influências sofridas pelo campo:
John Frederick Herbart (1776-1841) e John Dewey (1859-1952). O primeiro
deles, influenciado diretamente por Pestalozzi, formulou princípios educacionais
“fundamentados na ideia da unidade do desenvolvimento e da vida mental”
(HAYDT, 2006, p. 20). Ou seja, o ser humano é uma unidade e o desenvolvimento
acontece

[...] em torno da noção de função assimiladora, que ele


denominou de apercepção. A apercepção é a assimilação de
novas ideias através da experiência e da relação com as ideias
ou conceitos já, anteriormente, formados (HAYDT, 2006, p. 20).
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Didática do Ensino de Línguas

FIGURA 5 – JOHN FREDERICK HERBART

FONTE: <https://novaescola.org.br/conteudo/1775/herbart-o-organizador-
da-pedagogia-como-ciencia>. Acesso em: 24 abr. 2021.

Assim, duas fontes contribuem para desenvolver e integrar as representações


mentais: o contato com a natureza, por meio da experiência; e o contato com a
sociedade, por meio do contato social. Herbert, então, formula,

[...] de modo claro e explícito, uma teoria do interesse. Ele


afirmava que o interesse não era apenas um meio para garantir
a atenção do aluno durante a aula, mas uma forma de assegurar
que as novas ideias ou representações fossem assimiladas e
integradas, organicamente, àquelas já existentes, formando
uma nova base de conduta (HAYDT, 2006, p. 21).

Por último, surgia Dewey, que apresentou as concepções do homem e da


vida dele e fundamentou a Pedagogia. Para ele, a ação precede o conhecimento e
o pensamento e é inerente ao ser humano. Nessa concepção, a teoria é entendida
como resultado da prática. Isso significa que o ensino e a mobilização do
conhecimento estão, necessariamente, relacionados com a ação, com a prática e
com a experiência. Da mesma forma, o ser humano é um ser social, e são as suas
necessidades sociais que norteiam a sua ação, portanto, o trabalho cooperativo
é necessário para a vida em coletividade e para a satisfação das necessidades
sociais, logo, para o desenvolvimento humano. Para Dewey, é fundamental
associar as vidas humana, social e cooperação. Todos esses elementos devem
ser observados, e, logicamente, pela educação escolar. Conforme destaca Haydt
(2006, p. 22), Dewey salientou “a importância social do trabalho e valorizou o
trabalho manual. Afirmou que a escola deve se tornar uma verdadeira comunidade
de trabalho, em vez de um lugar isolado, onde se aprendem lições sem ligação
com a vida”.

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Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

FIGURA 6 – JOHN DEWEY

FONTE: <https://www.udesc.br/ceart/noticia/udesc_ceart_oferece_grupo_
de_estudos_e_leituras_sobre_john_dewey>. Acesso em: 24 abr. 2021.

Contudo, você pode estar se perguntando: qual a relação/influência desses


escritos, desses autores/filósofos e dessas reflexões para a Didática?

Os pressupostos indicam algo fundamental para a construção da Didática,


pois evidenciam que educar é algo muito mais amplo do que ensinar. Ensino é a
orientação para a aprendizagem, e a educação se refere ao processo da formação
humana. Portanto, a Didática se consolida como uma das áreas específicas da
Pedagogia, e faz a construção do pensamento em relação à teoria e à prática
da instrução e do ensino, considerando a efetividade de práticas educativas
centradas nas vivências, nas experiências e na relação com os diferentes
contextos, valorizando a aprendizagem individual dos sujeitos.

As reflexões vão evoluindo e se tornando mais complexas até o entendimento


de que o objetivo da educação por competências está no pleno desenvolvimento
das pessoas. Isso apenas é possível com a aproximação entre teoria e prática e,
mais ainda, com o esclarecimento de ações pedagógicas que valorizem a prática
contextualizada. À Didática, portanto, cabe o desafio de refletir a respeito dos
princípios gerais e específicos, de acordo com cada disciplina e as possibilidades.
A Didática é ação de ensinar a partir da relação entre as pessoas, e, destas, com
espaços sociais e públicos. De acordo com Libâneo (1990, p. 26):

A Didática é o principal ramo de estudos da Pedagogia.


Investiga os fundamentos, condições e modos de realização
da instrução e do ensino. Segundo essa ideia, a ela, cabe
converter objetivos sociopolíticos e pedagógicos em objetivos
de ensino, selecionar conteúdos e métodos em função desses

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Didática do Ensino de Línguas

objetivos, estabelecendo os vínculos entre o ensino e a


aprendizagem.

Dessa forma, entendemos que a Didática, desde a origem até o momento


atual, busca estudar e entender o próprio objeto de estudo, que transforma
objetos de saber em objetos de ensino. Assim, desde o início do século XX, ela
é uma disciplina obrigatória nos currículos dos cursos de Licenciatura no Brasil.

A partir desse entendimento, passaremos, na próxima seção, a refletir a


respeito dos materiais didáticos. Estes são parte importante da transformação de
objetos de saber em objetos de ensino, pois são instrumentos de ação e fazem a
intermediação entre a informação e os sujeitos.

1 - Nesta seção de leitura proposta para você, a educação em


um contexto de mais ação (e menos passivo) foi algo tratado com
mais evidência, ou seja, as mudanças nos princípios do processo
de formação do ser humano passaram do inatismo (passividade
do sujeito nos processos de ensino e de aprendizagem) para
algo pautado na ação, no social, na interação etc. Dessa forma,
elabore um pequeno parágrafo para explicar de que forma
propostas de trabalho para a sala de aula podem (e devem) ser
planejadas para que a dinâmica considere o protagonismo do
aluno no processo formativo.

Ação para formação pressupõe atividades que estejam relacionadas com o


mundo do trabalho, com debates políticos atuais, com entendimentos econômico
e social multifacetados, assim, mobiliza-se o conhecimento do aluno para a
cidadania e para a ação social. É o formar da vida para a escola e da escola para
a vida.

22
Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

4 TEORIA E PRÁTICA DE LIVROS


E MATERIAIS DIDÁTICOS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA

O que você imagina quando pensa em material didático? Quais são as


imagens mentais que você formula? Livros, folhas de atividades, mapas, vídeos,
podcast, jogos, objetos interativos de aprendizagem, filmes, documentários,
realidade virtual etc.? Se você pensou nessas opções e em tantas outras, você
está certo. O material didático, nas suas diferentes formas de apresentação,
de acordo com o meio de divulgação, pode ser conceituado como um “produto
pedagógico utilizado na educação” (BANDEIRA, 2009, p. 14). Portanto, todo e
qualquer material que tenha finalidade didática (mobilizar conhecimento para o
ensino) deve ser considerado material didático. O que pode variar é o suporte ou
o uso da mídia.

Os materiais didáticos podem ser classificados em impressos, audiovisuais e


tecnológicos (considerando o uso de novas tecnologias).

FIGURA 7 – MATERIAL DIDÁTICO E SUPORTE

FONTE: Bandeira (2009, p. 15)

O material impresso, desempenhando papel de material didático, pode


ser livro, mapa, cartilha, figura etc. Amplamente aceito por todos (professores e
alunos), é a forma clássica de material didático. É de fácil manuseio e “pode ser
utilizado em todas as etapas e modalidades da educação. O aluno e o professor
podem consultá-lo fora da sala de aula, pois o material impresso não requer
equipamento ou recurso tecnológico para a utilização” (BANDEIRA, 2009, p. 17).

23
Didática do Ensino de Línguas

FIGURA 8 – LIVRO DIDÁTICO IMPRESSO

FONTE: <https://www.angra.rj.gov.br/noticia.asp?vid_
noticia=53802&indexsigla=imp>. Acesso em: 11 abr. 2021.

FIGURA 9 – MAPA IMPRESSO

FONTE: <https://segredosdomundo.r7.com/mapa-do-mundo-63-versoes-
que-voce-nao-aprende-na-escola/>. Acesso em: 11 abr. 2021.

Atualmente, muitos materiais, até então, apenas impressos, podem ser


encontrados em formato digital, como e-books, mapas interativos, cartilhas
em PDF etc. Evidentemente que o uso desses materiais exige computadores,
projetores e internet, o que não é uma possibilidade para todas as escolas
brasileiras. O contexto deve ser investigado para que os recursos didáticos
possam ser utilizados de forma adequada, lembre-se disso!

Mesmo um material impresso precisa do estudo do contexto, pois o sucesso


do uso de determinado material, em um determinado contexto, não garante amplo
uso; em outros espaços, o material pode não ser adequado. Pense nisso!

24
Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

O material didático possibilita a construção de uma infinidade de


projetos de aula. Com os recursos digitais, instrumentos tradicionais
(como um mapa impresso) podem ser abordados, didaticamente,
de formas diversas. Observe que interessante a dica a seguir para
utilizar com os seus alunos:

Mapa do mundo, 63 versões que você não aprende na escola

O mapa do mundo tem várias versões, que vão muito além


daquela que você conheceu e estudou na escola. Conheça algumas
das várias.

1. Mapa animado do clima da Terra.


2. Mapa da vegetação mundial.
3. Mapa Mundi da Pangeia, levando em consideração a divisão política atual.

Você sabe o que é a Pangeia? A Pangeia, segundo alguns


especialistas, teria sido um único continente que teria existido
há milhares de anos, antes de se fragmentar e criar vários outros
continentes. Esse é um mapa do mundo, levado em consideração a
divisão política atual na Pangeia.

5. Mapa com as bandeiras de cada país.


6. Mapa colorido, de acordo com os países mais visitados do mundo.
8. Mapa das linhas aéreas mundiais.
Etc.

Para saber mais, acesse https://segredosdomundo.r7.com/


mapa-do-mundo-63-versoes-que-voce-nao-aprende-na-escola/.

Consideraremos, agora, os materiais digitais. Estes dependem de


programação/edição com o uso de ferramentas específicas (desde as mais
simples até as mais complexas), disponibilizados por meio de programas
específicos. Dominar a linguagem de programação (mesmo que apenas as mais
simples), as ferramentas de edição etc. é importante para a elaboração desse tipo
de material, caso você tenha interesse na elaboração de materiais tecnológicos
mais complexos.

25
Didática do Ensino de Línguas

Pense, por exemplo, na elaboração de uma apresentação com o uso do


Canva, ou, até mesmo, do PowerPoint. São editores de materiais que exigem,
do autor, domínio de edição. No Canva, por exemplo, é possível criar pequenos
vídeos educativos com integração de imagem e som, certo?! Resumindo, dos
mais simples aos mais complexos, os materiais digitais utilizam a tecnologia
como suporte para a interação. Temos, como exemplos de materiais didáticos
vinculados por meio digital, simuladores, jogos, vídeos, animações, e-books
interativos, textos com hiperlinks, ambientes virtuais de aprendizagem etc.
Conhecer as possibilidades dessas ferramentas é importante para a construção
de materiais didáticos variados. Pense nisso!

FIGURA 10 – INGLÊS NA REDE

FONTE: <https://idiomas.gcfglobal.org/pt/curso/ingles/a1/
cumprimentos-em-ingles/>. Acesso em: 11 abr. 2021.

De acordo com os Referenciais para Educação (BRASIL, 2007, p. 11):

Os ambientes virtuais de aprendizagem são programas


que permitem o armazenamento, a administração e a
disponibilização de conteúdos no formato Web. Destacam-se:
aulas virtuais, objetos de aprendizagem, simuladores, fóruns,
salas de bate-papo, conexões a materiais externos, atividades
interativas, tarefas virtuais (webquest), modeladores,
animações, e textos colaborativos (wiki).

Dessa forma, saiba que todo material didático de suporte digital deve
ser elaborado a partir da exploração das potencialidades oferecidas pela
tecnologia digital. Para essa ação, equipes colaborativas e multidisciplinares
são fundamentais. Profissionais com conhecimento de programação, design, UX
(experiência do usuário) etc., quando trabalham em conjunto, podem construir

26
Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

diferentes materiais didáticos para usos específicos de ampla divulgação. Além


da construção do material, são fundamentais a manutenção e a verificação da
utilização efetiva do material proposto. Por exemplo, cursos elaborados para
salas de aula virtual precisam ser construídos e testados para que possam operar
de forma efetiva. A adaptação contínua é importante para potencializar os usos
dos materiais didáticos.

Outra questão importante acerca dos materiais didáticos está na classificação


em estruturados e granulares. Você já ouviu/leu a respeito dessa diferença?

Os materiais definidos como estruturados são aqueles que, no processo


de produção, consideram a sustentação e a organização de uma proposta,
previamente elaborada, de ensino e de aprendizagem. Nessa construção, o
material é sistemático para atender à proposta de ensino e de aprendizagem. Há
uma organização dos conteúdos para que o processo seja efetivo. Coleções, por
exemplo, representam materiais estruturados. Têm-se conteúdos curriculares,
atividades pedagógicas e suporte ao professor, tudo isso de forma estruturada.
Esses materiais acompanham e conferem suporte ao educador. De acordo com
Louzano et al. (2014), o material didático estruturado:

• Garante os conteúdos mínimos para todos os alunos.


• Garante maior cobertura do conteúdo.
• Estimula o professor a ampliar o tempo de planejamento.
• Aumenta a economia de tempo de trabalho do professor.
• Diminui o uso da lousa pelo professor.

Os materiais granulares, por sua vez, dão conta de algum aspecto dos
processos de ensino e de aprendizagem. Representam, conforme o nome
enuncia, pequenas estruturas que, ao serem combinadas, podem formar uma
estrutura mais ampla de material didático, formando, por exemplo, objetos de
aprendizagem, módulos e cursos.

Os materiais didáticos podem ser tipificados em próprios e adaptados.


Nessa classificação, consideram-se a autoria e o propósito da composição do
material. Materiais próprios podem ser elaborados, por educadores, de forma
individual ou em conjunto. Por exemplo, as equipes de Língua Portuguesa, de
Literatura e de Língua Estrangeira se reúnem e organizam a produção de um
e-book para ser utilizado de forma conjunta (multidisciplinar), pelos professores
das três disciplinas. Cada um dos educadores contribui com textos, atividades e
conteúdos autorais, de forma que a aprendizagem seja integrada. Esse material,
com fim didático, é reunido, e configura um e-book que pode ser utilizado com
recursos digitais e de apoio aos processos de ensino e de aprendizagem em um
contexto específico, podendo, após a primeira experiência de aplicabilidade, ser

27
Didática do Ensino de Línguas

reutilizado, conforme a usabilidade. Quanto mais for definida a contextualização


utilizada, menores são as chances de reuso do material.

Materiais próprios também podem ser encomendados por instituições


de ensino ou por órgãos governamentais, além de ser ofertados por editoras
específicas. O processo de elaboração é direcionado e atende a pré-requisitos
específicos: temática, público-alvo, conteúdo específico, atividades específicas
etc. Os objetivos são delineados previamente, e a produção autoral é direcionada
para os usos restrito e específico.

Os materiais adaptados são aqueles produzidos por um autor (ou um grupo


de autores), o qual permite a adaptação do material por terceiros. Por exemplo,
Jonas é professor de espanhol e atua em três escolas. Ele produz, em conjunto
com outros professores de uma das escolas na qual atua, uma cartilha para o
ensino de inglês, voltada para o quarto ciclo do Ensino Fundamental, e precisa
utilizar esse mesmo material em outra escola, mas dois dos textos já estão
defasados e ele pretende buscar outros, adaptando o material. Desta forma, esse
material é classificado como adaptado.

1 - Imagine, após a indicação da leitura de diferentes mapas,


um planejamento para as suas aulas de ensino de línguas. O
que você poderia propor, utilizando um dos tipos de mapas
disponíveis?

O uso de cada tipo de material é de escolha dos professores, e de acordo


com o planejamento pedagógico da equipe. O importante é combinar diferentes
materiais para um trabalho produtivo na sala de aula e para além dela.

Agora, refletiremos, mais diretamente, a respeito dos materiais didáticos para


o ensino de línguas, os quais devem estar alinhados com Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs), Parâmetros Curriculares Nacionais – Ensino Médio (PCNEM)
e Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

28
Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

Para a sua formação, é importante que você conheça os PCNs


e a BNCC. Para este momento, indicamos algumas leituras
específicas:

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros


Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do Ensino
Fundamental: língua estrangeira. Secretaria de Educação
Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998.

PCN Ensino Médio


Parte II – Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

BNCC: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_
EF_110518_versaofinal_site.pdf.

De acordo com os documentos citados, os materiais didáticos de língua


portuguesa e de língua estrangeira devem estar orientados para o multiletramento
e as participações crítica, reflexiva e criativa na sociedade.

Essa consideração dos novos e multiletramentos, e das práticas da cultura


digital no currículo, não contribui somente para que uma participação mais efetiva
e crítica, nas práticas contemporâneas de linguagem, por parte dos estudantes,
possa ter lugar, mas permite, também, que se possa ter em mente mais do que
um “usuário da língua/das linguagens”, na direção do que alguns autores vão
denominar de designer: alguém que toma algo que já existe (inclusive, textos
escritos), mescla, remixa, transforma, redistribui, produzindo novos sentidos,
processo que alguns autores associam à criatividade. Parte do sentido de
criatividade em circulação, nos dias atuais (“economias criativas”, “cidades
criativas” etc.), tem algum tipo de relação com esses fenômenos de reciclagem,
mistura, apropriação e redistribuição.

No processo de construção de materiais didáticos, essa orientação deve ser


sempre observada. Por exemplo, na disciplina de Língua Portuguesa, o professor
deve valorizar todas as vozes possíveis, o que é possível com a seleção de textos
canônicos e textos ditos “periféricos” (fora do cânone). Autores não recorrentes,
em manuais de Literatura, por exemplo, podem conquistar espaço na sala de
aula, a partir da atuação do professor na construção dos planos de aula.

29
Didática do Ensino de Línguas

Na elaboração de materiais autorais ou adaptados, o educador pode


contemplar a cultura digital, as diferentes linguagens e os diferentes letramentos
(desde os mais lineares, com baixo nível de hipertextualidade, até aqueles que
incluem hipermídia). Como premissa da BNCC, tem-se a diversidade cultural,
e ela se faz presente nas hibridizações, apropriações e mesclas. É importante
contemplar o cânone, o marginal, o culto, o popular, a cultura de massa, a cultura
das mídias, a cultura digital, as culturas infantis e juvenis, de forma a garantir uma
ampliação de repertório e uma interação e trato com o diferente.

Existem eixos norteadores de língua portuguesa, os quais correspondem


a práticas de linguagem e que devem ser considerados nos momentos de
elaboração de materiais didáticos, como oralidade, leitura/escuta, produção
(escrita multissemiótica), e análise linguística/semiótica. Esse último eixo
considera conhecimentos linguísticos em relação ao sistema de escrita, ao
sistema de língua e à norma padrão, ao texto, ao discurso e aos modos de
organização.

O professor deve apresentar, nos projetos de aula (seleção de materiais),


diferentes gêneros textuais, de acordo com cada etapa de ensino. Para o ensino
de línguas, é preciso considerar a gramática das línguas sempre de forma
contextualizada (práticas linguísticas). Nessa abordagem, necessita, o professor,
escutar e conferir espaço para diferentes vozes, as quais apresentam escritas e
opiniões múltiplas.

As redes sociais, por exemplo, podem ser utilizadas em sala de aula, e as


múltiplas formas de expressão conseguem ser pauta de debate. O Instagram,
por exemplo, é uma rede que usa a imagem como forma de expressão; o
Twitter, por sua vez, faz uso da escrita para manifestação de pensamentos e
compartilhamento de ideias e de opiniões. Todas as possibilidades podem ser
estudadas em sala de aula, pois são práticas de linguagem atuais, observadas
com criticidade.

Para o ensino de língua estrangeira, os preceitos são os mesmos listados


para a Língua Portuguesa, considerando que, na segunda língua, a dimensão
intercultural também é citada como eixo norteador. Observe:

A aprendizagem de língua estrangeira contribui para o


processo educacional como um todo, indo muito além da
aquisição de um conjunto de habilidades linguísticas. Leva a
uma nova percepção da natureza da linguagem, aumenta a
compreensão de como a linguagem funciona e desenvolve
maior consciência do funcionamento da própria língua materna.
Ao mesmo tempo, ao promover uma apreciação dos costumes
e dos valores de outras culturas, contribui para desenvolver a
percepção da própria cultura por meio da compreensão da (s)

30
Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

cultura (s) estrangeira (s). O desenvolvimento da habilidade de


entender/dizer o que outras pessoas, em outros países, diriam
em determinadas situações, leva, portanto, à compreensão das
culturas estrangeiras e da cultura materna. Essa compreensão
intercultural promove, ainda, a aceitação das diferenças nas
maneiras de expressão e de comportamento (BRASIL, 1998,
p. 37).

Dessa forma, há explícita relação entre língua materna e língua estrangeira


no processo de aprendizagem, uma vez que “o processo sociointeracional, de
construir conhecimento linguístico e aprender a usá-lo, já foi percorrido pelo aluno
no desafio de aprender a sua língua materna” (BRASIL, 1998, p. 28). Agora, com
a inserção da aprendizagem da língua estrangeira, o aluno é desafiado a:

• Aumentar o conhecimento a respeito da linguagem que constrói sobre a


língua materna, por meio de comparações com a língua estrangeira em
vários níveis.
• Possibilitar o envolvimento nos processos de construir significados nessa
língua, como um ser discursivo no uso de uma língua estrangeira.

Com a leitura feita até esta etapa, você percebe que o processo de ensino,
considerando a prática, e pautado nas diretrizes vigentes, busca, com a inserção
da aprendizagem de uma língua estrangeira (língua inglesa, por exemplo), a
criação de novas formas de engajamento e de participação dos alunos em um
mundo social cada vez mais globalizado e plural, no qual as fronteiras entre países
e interesses pessoais, locais, regionais, nacionais e transnacionais estão cada vez
mais difusas e contraditórias. Assim, o estudo da língua inglesa pode possibilitar,
a todos, o acesso aos saberes linguísticos necessários para o engajamento e a
participação, contribuindo para o agenciamento crítico dos estudantes e para o
exercício da cidadania ativa, além de ampliar as possibilidades de interação e
de mobilidade, abrindo novos percursos de construção de conhecimentos e de
continuidade dos estudos. É esse caráter formativo que inscreve a aprendizagem
de inglês em uma perspectiva de educação linguística, consciente e crítica, na
qual as dimensões pedagógicas e políticas estão intrinsecamente ligadas.

Assim, pensando na elaboração de materiais didáticos para o ensino de


línguas, a preparação deve ser eficiente para o propósito de ensino-aprendizagem,
de forma que compreenda a língua como uma habilidade sociointeracional
e discursiva, mas, também, como fato histórico e, sobretudo, um espaço de
produção de sentidos.

Para a seleção e a elaboração de materiais didáticos, é imprescindível


selecionar, além de elaborar espaços de interação entre pessoas e entre pessoas
e sociedade, considerando as diversas práticas sociais, as quais são inerentes a

31
Didática do Ensino de Línguas

qualquer esfera da atividade humana, e que, nas quais, naturalmente, as pessoas


são envolvidas, direta ou indiretamente. Essas interações acontecem por meio de
enunciados, os quais se materializam pela língua (escrita ou falada). O professor
deve, portanto, considerar que cada situação comunicativa apresenta sequências
de enunciados estáveis: os gêneros discursivos.

Gêneros do discurso
Roxane Rojo

Instituição: Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP/


Instituto de Estudos da Linguagem-IEL

Vivendo a vida com os textos, isto é, atuando e nos comunicando


nos diferentes campos/esferas de atividade, pelos quais circulamos
no nosso cotidiano – em casa, no trabalho, estudando, informando-
nos por meio do jornalismo, consumindo, apreciando e fruindo obras
de arte, divertindo-nos –, enunciamos e materializamos nossos textos
orais, escritos e multimodais. Os gêneros de discurso nos servem
nesses momentos, pois são as formas de dizer mais ou menos
estáveis da nossa sociedade. Todos os cidadãos sabem o que são
e reconhecem notícias, anúncios, bulas de remédio, cheques,
livros didáticos, bilhetes etc.

Esses gêneros discursivos são nossos conhecidos e são


reconhecidos pela forma de composição dos textos a eles
pertencentes e pelos temas e funções que viabilizam o estilo de
linguagem. Os textos pertencentes a um gênero possibilitam os
discursos de um campo ou de uma esfera social. Por exemplo, as
notícias, os editoriais e os comentários fazem circular os discursos e
as posições das mídias jornalísticas. Esses três elementos – forma
composicional, tema e estilo – não são dissociáveis uns dos outros:
os temas de um texto ou de um enunciado se realizam somente a
partir de um certo estilo e de uma forma de composição específica.

O tema é mais do que, meramente, o conteúdo, o assunto ou


o tópico principal de um texto (ou conteúdo temático). O tema é o
conteúdo enfocado com base em uma apreciação de valor, na
avaliação, no acento valorativo que o locutor (falante ou autor) dá.
É o elemento mais importante do texto ou do enunciado: um texto
é todo construído (composto e estilizado) para fazer ecoar um tema

32
Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

irrepetível em outras circunstâncias. O tema é o sentido de um


dado texto/discurso tomado como um todo, “único e irrepetível”,
justamente, porque se encontra viabilizado pela apreciação de valor
do locutor no momento da produção. É pelo tema que a ideologia
circula.

A forma de composição e o estilo do texto vêm a serviço


de fazer ecoar o tema daquele texto. O estilo são as escolhas
linguísticas que fazemos para dizer o que queremos dizer (“vontade
enunciativa”), para gerar o sentido desejado. Essas escolhas
podem ser de léxico (vocabulário), estrutura frasal (sintaxe), registro
linguístico (formal/informal, gírias) etc. Todos os aspectos da
gramática estão envolvidos. O que é a forma de composição? Ela é,
pois, a organização e o acabamento do todo do enunciado, do texto
como um todo. Está relacionada ao que a teoria textual chama de
“estrutura” do texto, à progressão temática, à coerência e à coesão
do texto.

Seria muito interessante, para o desenvolvimento dos


letramentos, que a escola tratasse dos textos orais, escritos e
multimodais, para a compreensão e a produção, como exemplares
de gêneros discursivos, dando prioridade máxima aos temas que
fazem ecoar por meio dos processos estilísticos e da composição
[...].

FONTE: <http://www.ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/glossarioceale/
verbetes/generos-do-discurso>. Acesso em: 11 abr. 2021.

Sendo papel, da educação, o de preparar os sujeitos para a atuação social,


torna-se fundamental que, nas disciplinas de Língua Portuguesa e Língua
Estrangeira, construam-se propostas de trabalho com uma grande variedade
de gêneros do discurso. Apropriado dos diferentes gêneros, a aluno amplia o
repertório de enunciados.

O domínio da Língua Estrangeira, portanto, possibilita a ampliação da


possibilidade de ação no mundo por meio do discurso, além do que a língua
materna oferece. “Da mesma forma que o ensino da língua materna, o ensino da
língua estrangeira incorpora a questão de como as pessoas agem na sociedade
por meio da palavra, construindo o mundo social, a si mesmas e os outros a
sua volta” (BRASIL, 1998, p. 43). Assim, os temas devem ser transversais, em

33
Didática do Ensino de Línguas

práticas discursivas, que consideram outras dinâmicas sociais e culturais. Por


exemplo, para o ensino de Língua Inglesa, o professor pode desenvolver uma
reflexão a respeito das variantes da língua falada, de acordo com o contexto.
A Língua Inglesa é falada em todo o mundo de forma uniforme? Essa temática
pode ser trabalhada em sala de aula. O mesmo, inclusive, para a língua materna
(considerando a Língua Portuguesa): é falada de forma uniforme no Brasil? A
questão da variação linguística possibilita a construção de conhecimento das
práticas discursivas e pode fazer parte de propostas didáticas. Questionamentos,
como os citados, podem ser utilizados para a mobilização e a construção do
conhecimento.

De acordo com os PCNs (BRASIL, 1998), é uma experiência de grande valor


educacional (o ensino da língua estrangeira), posto que fornece os meios para
os aprendizes se distanciarem de temas ao examiná-los por meio de discursos
construídos em outros contextos sociais, de modo a poderem pensar neles,
criticamente, no meio social em que vivem.

Na prática, como conduzir esse trabalho em sala de aula? Dica de


procedimento pedagógico: a linguagem, como prática social, considera escolhas
de quem escreve ou fala no processo de construção de significados e na relação
com outras pessoas, em contextos culturais, históricos e institucionais específicos,
logo, para a prática em sala de aula, submeta textos orais ou escritos com sete
perguntas: quem escreveu/falou, sobre o que, para quem, para que, quando, de
que forma e onde? (BRASIL, 1998).

As respostas para as perguntas podem conduzir a dinâmicas reflexivas


acerca de temáticas mais amplas, como o respeito à ética nas relações cotidianas,
no trabalho e no meio político brasileiro; a preocupação com a saúde; a garantia
de que todo cidadão brasileiro tenha direito ao trabalho; a consciência dos
perigos de uma sociedade que privilegia o consumo em detrimento das relações
entre as pessoas; o respeito aos direitos humanos (aqui, incluídos os culturais e
os linguísticos); a preservação do meio ambiente etc. Questões que podem ser
trabalhadas na aproximação entre Brasil e mundo, entre língua materna e língua
estrangeira.

Em todos os processos didáticos, considere os objetivos delineados nos


PCNs (BRASIL, 1998):

• Compreender a cidadania como participação social e política, assim


como exercício de direitos e de deveres políticos, civis e sociais,
adotando, no dia a dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio
às injustiças, respeitando o outro e exigindo, para si, o mesmo respeito.
• Posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes

34
Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

situações sociais, utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e


de tomar decisões coletivas.
• Conhecer características fundamentais do Brasil nas dimensões sociais,
materiais e culturais, como meio para construir, progressivamente,
a noção de identidades nacional e pessoal, além do sentimento de
pertinência ao país.
• Conhecer e valorizar a pluralidade do patrimônio sociocultural brasileiro
e aspectos socioculturais de outros povos e nações, posicionando-
se contra qualquer discriminação baseada em diferenças culturais, de
classe social, de crenças, de sexo, de etnia ou outras características
individuais e sociais.
• Perceber-se integrante, dependente e agente transformador do ambiente,
identificando elementos e interações, contribuindo, ativamente, para a
melhoria do meio ambiente.
• Desenvolver o conhecimento ajustado de si mesmo e o sentimento de
confiança nas capacidades afetiva, física, cognitiva, ética, estética, de
inter-relação pessoal e de inserção social, para agir com perseverança
na busca do conhecimento e no exercício da cidadania.
• Conhecer o próprio corpo e dele cuidar, valorizando e adotando hábitos
saudáveis, como um dos aspectos básicos da qualidade de vida, e
agindo, com responsabilidade, em relação à própria saúde e à saúde
coletiva.
• Utilizar as diferentes linguagens, verbal, musical, matemática, gráfica,
plástica e corporal, como meios para produzir, expressar e comunicar
ideias, interpretar e usufruir das produções culturais em contextos
públicos e privados, atendendo a diferentes intenções e situações de
comunicação.
• Saber utilizar diferentes fontes de informação e recursos tecnológicos
para adquirir e construir conhecimentos.
• Questionar a realidade, formulando-se problemas e tratando de resolvê-
los, utilizando, para isso, o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, a
capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e verificando
a adequação.

Os PCNs apresentam, na segunda parte, um capítulo destinado a orientações


didáticas. Nesse espaço, são delineados os seguintes elementos:

• Habilidades comunicativas.
• Compreensão.
• Compreensão escrita.
• Orientações didáticas para o ensino de compreensão escrita (Pré-leitura,
Leitura e Pós-leitura).
• Compreensão oral

35
Didática do Ensino de Línguas

• Orientações didáticas para o ensino da compreensão oral.


• Produção.
• Produção escrita.
• Produção oral.
• Orientações didáticas para o ensino da produção escrita e da produção
oral.
• Orientações para uma avaliação formativa.

O objetivo desta parte é apresentar reflexões acerca dos procedimentos


didáticos voltados para o desenvolvimento de habilidades comunicativas. Caso a
escola tenha disponibilidade de revistas, jornais, TVs, livros, gravadores de vídeo
e de áudio, computadores, internet etc., é possível utilizar tais recursos para
importar o mundo estrangeiro, e o espaço do mundo, fora da sala de aula, para
o interior. Tarefas podem ser elaboradas de forma a estabelecer vínculos do que
se faz na sala de aula e do que, efetivamente, acontece no mundo exterior a ela
(as pessoas estão, no dia a dia, envolvidas na construção social do significado).
Ainda, há possibilidades, que existem fora da sala de aula, para continuar a
aprender uma língua estrangeira (BRASIL, 1998).

Para a elaboração e a seleção de materiais didáticos, é importante ter


consciência do impacto da tecnologia da informática na sociedade, no ensino e
na aprendizagem, além da valorização da noção de tarefa.

Para esse primeiro item, destacam, os PCNs (1998, p. 87):

É inegável que aumenta, cada vez mais, a possibilidade de


acesso às redes de informação do tipo internet, e as exigências
do mundo do trabalho passam a incluir o domínio do uso
dessas redes. O conhecimento de língua estrangeira é crucial
para se poder participar ativamente dessa sociedade em que,
tudo indica, a informatização passa a ter um papel cada vez
maior.

O professor pode ter o apoio de softwares específicos para o ensino da


língua estrangeira, mas é imprescindível a análise crítica desses materiais para
a certificação, da parte do docente, de que não sejam meras reproduções de um
tipo de instrução programada popular nas décadas de 60 e 70 (BRASIL, 1998).

A instrução programada se baseava em uma prática instrucional


individualizada que consistia em uma série de exercícios linguísticos, exigindo
a resposta certa do aluno, de forma mecânica, como condição para que
prosseguisse na aprendizagem.

36
Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

Para escapar do formato exposto, o professor, no processo de ensino de


línguas, pode apresentar experiências de aprendizagem que estejam relacionadas
com metas ou atividades mais específicas, que são realizadas por meio do uso da
linguagem e da ação, com acionamento de diferentes conjuntos de enunciados.
Essas relações podem aproximar o contexto do mundo real com a dinâmica da
sala de aula, ou seja, situações simuladas que oferecem experimentação de
situações reais. Por exemplo: quais são os enunciados mais presentes em uma
reunião de negócios? E em uma reunião familiar? São os mesmos? Quais são os
grupos de enunciados que se fazem presentes em cada um desses contextos?
E na escrita de um artigo científico? O discurso construído é o mesmo? Como
essas questões operam no contexto do ensino de línguas?

FIGURA 11 – COMPETÊNCIAS E HABILIDADES

37
Didática do Ensino de Línguas

FONTE: Brasil (2000, p. 14-15)

Essas dinâmicas podem se estabelecer em relação à produção e à


compreensão, considerando diferentes níveis de conhecimento sistêmico e de
profundidade de compreensão que são acionados. Imagine que uma determinada
tarefa solicite, como resposta, uma representação gráfica, uma tabela, uma
planilha, um roteiro ou o preenchimento de um formulário. Você percebe que há
relações de produção e de compreensão distintas e que desafiam o aluno para ir
além da dinâmica perguntas-respostas. Pense nisso para a construção/seleção
de materiais didáticos.

Busque, sempre, o engajamento do aluno nas suas propostas didáticas,


tendo, como objetivo, a aprendizagem ativa. Tenha objetivos previamente
delimitados e busque os alcançar com as atividades propostas. Procure manter
o foco no significado e na relevância da atividade para o aluno. As tarefas, assim,
integrando as dimensões interacional, linguística e cognitiva da aprendizagem das
línguas, funcionam como experiências construtoras da aprendizagem.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Nesta parte inicial do livro, buscamos compreender o conceito de Didática
a partir de informações relacionadas com a definição do termo e a construção
histórica. Nesse processo de consolidação, como disciplina independente, mas
sendo um ramo da Pedagogia, você passa a entender que o objeto de investigação
está relacionado com a ação de ensinar, ou seja, de construir um embasamento
teórico acerca da ação de ensino, na busca por práticas, em sala de aula, que
valorizem os múltiplos letramentos, e que se tenha uma proximidade de vivências
de situações reais. Tudo isso norteado pelo princípio de uma formação cidadã.

38
Capítulo 1 DIDÁTICA DO ENSINO DE LÍNGUAS:
FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA E PRÁTICA

Ao conhecer a trajetória de consolidação histórica do campo, você amplia os


seus saberes a respeito da teoria e da prática em Didática do Ensino de Línguas,
e modifica a sua ação como docente. Você está habilitado para elaborar, adaptar
e selecionar materiais didáticos ao reconhecer as possibilidades existentes, os
usos que podemos fazer dos diferentes materiais e dos recursos empregados.
Da mesma forma, você pode reforçar a sua leitura de textos normativos (PCNs
e BNCC), os quais servem como norteadores dos processos educativos. O
principal objetivo desta leitura foi apresentar algumas orientações didáticas, para
o processo de ensino de línguas, que valorizem as habilidades comunicativas.

Acreditamos que expor o leitor aos princípios adjacentes dos documentos


é necessário para o envolvimento no processo de reflexão a respeito do
trabalho que se realiza em sala de aula. A intenção é mobilizar o pensamento no
alinhamento da ação do professor com os parâmetros e os princípios construídos
para a educação brasileira, os quais não precisam ser aplicados diretamente e de
forma plena. Podem, na verdade, ser questionados, criticados e adaptados, da
melhor forma possível, para que a ação educativa seja efetiva em cada contexto.

Por fim, em todos os sentidos, entende-se o ensino como prática social


concreta, complexa e desafiadora. A Didática, então, é a teoria da docência.
Portanto, é ensinar, aprender, pesquisar, avaliar. Essas dimensões se integram e
se complementam, e o ensino apenas ocorre na relação com as três dimensões.

REFERÊNCIAS
BANDEIRA, D. Materiais didáticos. Curitiba: IESDE, 2009.

BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Referenciais para elaboração de


material didático para EaD no ensino profissional e tecnológico. Brasília:
Ministério da Educação e Cultura, 2007.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio – Parte II:


Linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília: MEC/SEF, 2000.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares


Nacionais: terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental: língua estrangeira.
Brasília: MEC/SEF, 1998.

COMENIUS, I. A. Didática magna. São Paulo: Fundação Calouste Gulbenkian,


2001.

FEREIRA, V. et al. Didática. Porto Alegre: Sagah, 2018.

39
Didática do Ensino de Línguas

HAYDT, R. C. C. Curso de didática geral. São Paulo: Ática, 2006.

LIBÂNEO, J. C. Didática. São Paulo: Cortez, 1990.

LOUZANO, P. et al. Sistemas estruturados de ensino e redes municipais do


Estado de São Paulo. São Paulo: Fundação Lemann, 2014.

40
C APÍTULO 2
PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

A partir da perspectiva do saber-fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

• Saber os pressupostos pedagógicos, as teorias da linguagem, os PCNs e todas


as abordagens centradas no ensino de línguas.
• Identificar as teorias da linguagem e as especificidades de cada uma e as
relações com a construção dos PCNs para uma atuação docente diferenciada.
Didática do Ensino de Línguas

42
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Este capítulo apresentará, como proposta de reflexão, as teorias da
linguagem e os Parâmetros Curriculares Nacionais, os PCNs. A partir da
perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes objetivos de
aprendizagem, relacionados ao saber: conhecer os pressupostos pedagógicos,
as teorias da linguagem, os PCNs e todas as abordagens centradas no ensino de
línguas; e identificar as teorias da linguagem e as especificidades de cada uma e
as relações com a construção dos PCNs para uma atuação docente diferenciada.

Na primeira seção desta leitura, construiremos conhecimentos das três


teorias da linguagem. Com relação às teorias, iniciaremos pelo inatismo, depois,
ampliaremos para as informações a respeito do empirismo, e finalizaremos com a
teoria interacionista.

O objetivo desta primeira etapa de reflexão é reconhecer as diferentes


correntes de pensamento do processo de aquisição da linguagem para o
entendimento da influência das escolhas de abordagem no contexto da escola
e no contexto de atuação, uma vez que, de acordo com a teoria que embasa
as práticas docentes, professores, alunos e a produção e a seleção de materiais
didáticos são influenciados no processo de formação.

O próprio processo de seleção, produção e adaptação de materiais didáticos


sofre um impacto direto dessas decisões de abordagem. Com o passar do
tempo, as teorias evoluíram e se modificaram, ampliando o entendimento acerca
do processo de aquisição do conhecimento, de um processo empirista para um
inatista, até alcançar a compreensão da interação como fator de relevância.

Os parâmetros curriculares, portanto, refletem a respeito dessas teorias e


das influências delas para a elaboração de propostas didáticas que mobilizem,
de forma efetiva, o conhecimento, valorizem as formas de expressão (diversidade
cultural) e capacitem os sujeitos para uma atuação cidadã.

Boa leitura!

43
Didática do Ensino de Línguas

2 TEORIAS DA LINGUAGEM:
INATISMO, EMPIRISMO E
INTERACIONISMO
A linguagem, como um sistema simbólico tipicamente humano, apresenta
organização e estruturas profundas. Para a aquisição de diferentes processos
e procedimentos, são postos em ação. Dessa forma, independentemente da
língua a ser utilizada, a organização da linguagem em estruturas profundas é
compartilhada por todas. Esse conjunto constitui os universais linguísticos.

Nesse contexto, diferentes teorias apresentam análises e abordagens


singulares para o funcionamento da linguagem. Portanto, conheceremos, nesta
etapa da leitura, as teorias pedagógicas com um estudo a respeito do inatismo,
do empirismo e do interacionismo. Visualizaremos as principais características de
cada uma delas nas próximas linhas.

2.1 TEORIA INATISTA DO


CONHECIMENTO
Neste primeiro tópico, o desafio será identificar as principais características
da teoria inatista do conhecimento, para ampliar os seus saberes acerca desse
campo e da teoria específica. Vamos lá!

Essa corrente de pensamento (de hipótese de aquisição da linguagem)


faz parte de um conjunto de tentativas para entender e explicar de que forma
se adquire uma determinada língua. Diferentes pesquisadores buscam respostas
para uma pergunta central: como, efetivamente, ocorre o processo de aquisição
da linguagem? A compreensão do processo possibilita, dentre tantas práticas,
ampliar o processo de formação dos sujeitos, de acordo com as necessidades
específicas de cada um. Conhecer esse processo é importante para todos os
profissionais envolvidos no processo de formação. Com este conhecimento,
podem atuar, didaticamente, de forma mais embasada, a partir da seleção de
materiais didáticos e de práticas para a sala de aula que estejam de acordo com
as teorias escolhidas por eles.

Nesse exercício de conhecimento, inúmeras áreas e pesquisas se dedicam


a desenhar hipóteses acerca do processo de aquisição de conhecimento.
Mais diretamente, “pesquisas em aquisição de linguagem, campo de estudos

44
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

multidisciplinar, que congrega, além da linguística, domínios, como a psicologia


cognitiva e a psicolinguística” (CARNEIRO, 2010, p. 57), dedicam-se a esses
estudos: ao entendimento crítico do processo de aquisição do conhecimento.

Com o passar do tempo e o aprofundamento das pesquisas, diferentes


correntes teóricas criaram hipóteses que englobam o campo de forma distinta.
Cada uma delas apresentou pressupostos teóricos e filosóficos diferenciados.
Algumas, por exemplo, indicam que o aprendiz desempenha um papel passivo
no processo de aquisição da linguagem, outras citam o oposto: a interação social
entre sujeitos (ativos) é fundamental para a aquisição da linguagem. Iniciaremos
os nossos estudos a respeito das teorias de aquisição da linguagem.

Dentre essas teorias investigativas, surge a corrente inatista, oriunda da


linha gerativa de abordagem da gramática.

O que é gramática gerativa?


Lorenzo Vitral (UFMG)

A teoria linguística, chamada de Gramática Gerativa, tem sido


desenvolvida por Noam Chomsky, e muitos outros pesquisadores,
desde 1957. Trata-se de uma teoria que se ocupa das línguas e
da linguagem. Há, entretanto, várias maneiras para se estudar as
línguas e a linguagem. O que existe, na verdade, são homens que
falam em uma sociedade que se organiza através da linguagem.
Chamemos isso de mundo das aparências, das coisas que existem
concretamente. Para tornar inteligível esse mundo das aparências, o
espírito humano constrói modelos abstratos, teorias, que levam em
conta, normalmente, apenas partes desse mundo. Quero dizer que
cada modelo abstrato, cada teoria escolhe um aspecto da linguagem
para estudar e que não existe um modelo bem-sucedido que
contemple todo o fenômeno da linguagem. Essa observação é válida
em outras áreas do conhecimento, como na física, por exemplo.
O que se faz, então, é privilegiar um aspecto da linguagem, o dos
sons, por exemplo, o significado desses sons, as modificações da
língua, geográfica ou historicamente. Pode-se, também, estudar a
conversação, o texto etc.

Ao tomar um desses aspectos da linguagem como tema de


pesquisa, já se faz um primeiro trabalho de abstração. Ora, a
linguagem tem lugar de maneira global, inteira, e é no interior do

45
Didática do Ensino de Línguas

fragmento da linguagem escolhido que o pesquisador elabora o


objeto de estudo.

A Gramática Gerativa se ocupa, privilegiadamente, com a


sintaxe das línguas, mas não é, a sintaxe das línguas, o objeto de
estudo. A sintaxe das línguas é apenas um meio para se descrever
uma entidade teórica chamada de Gramática Universal. Esse é o
objeto de estudo da Gramática Gerativa.

A Gramática Universal pode ser definida, inicialmente, como os


aspectos sintáticos que são comuns a todas as línguas do mundo.

Supõe-se, então, que, apesar da variação que existe entre as


línguas, isto é, apesar das línguas serem diferentes (por exemplo,
o fato de o objeto direto 70 aparecer antes do verbo em japonês, e
depois do verbo em português), existiria uma gramática subjacente
a todas elas. Essa gramática seria composta de 1) mecanismos que
permitiriam colocar em relação termos da língua, formando níveis de
representação associados com a interpretação do significado dos
sons; e 2) um conjunto de princípios que restringiria as possibilidades
de combinação desses. Essa gramática conteria, também, certos
parâmetros, que determinariam as dimensões de variação das
gramáticas das línguas. Essa gramática só permitiria, também, a
ocorrência de frases bem-formadas de uma língua.

A dicotomia frase bem-formada/mal-formada não se confunde


com a oposição frase correta/incorreta da gramática tradicional: a
frase incorreta pode ser uma frase bem-formada. Embora a gramática
só permita a ocorrência de frases bem-formadas, o linguista lida,
também, com frases mal-formadas. O linguista trabalha, na verdade,
no limite, entre as frases bem-formadas e as mal-formadas. É, nesse
limite, para usar uma metáfora, entre o mundo da gramaticalidade e
o mundo da agramaticalidade, que se pode identificar os princípios
da Gramática Universal. Nesse sentido, vale a brincadeira, segundo
a qual o gerativista não gosta da língua. A análise da língua, que é
extensa, é só um pretexto para se estabelecer a Gramática Universal.

As ideias redefiniram a natureza da linguagem e da teoria


linguística. Diferentemente do estruturalismo, que edifica a teoria
a partir de uma pergunta acerca da gênese da significação, a
gramática gerativa propõe que o que é essencial à linguagem é a
recursividade, isto é, o fato de, com elementos finitos, ser possível
gerar frases infinitamente. Frases em número infinito, mas não todo

46
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

tipo de frase. A questão que se coloca é saber o que faz com que
uma frase seja uma frase de uma língua. Conclui-se, assim, que
existem princípios que filtram as frases mal-formadas [...].

Para continuar a leitura, acesse http://www.periodicos.


letras.ufmg.br/index.php/anais_lingua_portuguesa/article/
viewFile/8045/6961

Para a teoria inatista, conforme destaca Langacker (1977 apud CARNEIRO,


2010), o ser humano é dotado de uma predisposição inata específica para a
aquisição da linguagem. Assim, a teoria inatista delimita (CARNEIRO, 2010, p.
57):

[...] um módulo cognitivo autônomo para a linguagem,


independentemente de fatores externos de ordem social,
cultural, ou, mesmo, histórica. Recorrendo a noções, como
à da gramática universal, tal perspectiva defende que os
aspectos biológicos exercem papel determinante no processo
de aquisição.

De acordo com a autora, essa teoria, então, tem origens em meados da


década de 50, com os estudos de Noam Chomsky, em publicações, como As
Estruturas da Sintaxe (1957), Aspectos da Teoria Sintática (1965) e Linguística
Cartesiana (1966). Elaborou a respeito da gramática gerativa em contraponto à
visão empirista.

Avram Noam Chomsky

Quando o naturalista inglês Charles Darwin observou os seres


vivos, e, entre eles, percebeu nexos e continuidades, combinando
as ideias de evolução e de seleção natural, o mundo nunca mais
foi o mesmo, porque a nossa compreensão acerca da vida mudou.
Do linguista e pensador americano Avram Noam Chomsky, pode-se
dizer o mesmo. Autor de mais de 70 livros traduzidos para mais de
dez línguas, ele revolucionou a área científica, a exemplo de Darwin.

47
Didática do Ensino de Línguas

Chomsky mudou o objeto de estudo da linguística. Como


tinha acontecido um século antes, no domínio da natureza bruta,
na ciência da linguagem, pouca gente tinha ousado alguma teoria
unificadora, e ele o fez.

Acesse para conhecer um pouco mais a respeito do autor:


https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/270445/mod_resource/
content/1/Fischer%20%282003%29.pdf.

De acordo com as proposições de Chomsky (1983; 2005), existia uma


insuficiência nas explicações dos empiristas. Para ele, o conhecimento linguístico
da criança não pode ser delimitado em esquemas de aprendizado baseados em
estímulo-resposta. Indica a existência de uma estrutura subjacente que poderia
explicar por que uma criança de dois anos consegue produzir e compreender
frases que não tenham sido ditas por outros e ouvidas por elas. Assim, “a ideia de
um dispositivo linguístico inato constitui o próprio cerne da hipótese chomskyana
da aquisição da linguagem” (CARNEIRO, 2010, p. 58).

Saiba que pensar nessa concepção inatista significa refletir a respeito de


algo que busca se fundamentar em uma teoria pedagógica que está baseada nos
princípios das filosofias racionalista e idealista (FERREIRA et al., 2018).

O racionalismo foi uma corrente filosófica muito importante


da Modernidade. Como concepção de conhecimento filosófico, o
racionalismo começou a tomar corpo durante o Renascentismo, mas
as primeiras origens podem remontar à filosofia grega, com as teses
idealistas platônicas e a concepção do princípio da causalidade.

O racionalismo tem, como principal objetivo, teorizar o


modo de conhecer dos seres humanos, não aceitando qualquer
elemento empírico como fonte do conhecimento verdadeiro. Para
os racionalistas, todas as ideias que temos têm origem na pura
racionalidade, o que impõe, também, uma concepção inatista, isto
é, de que as ideias têm origens inatas no ser humano, nascendo

48
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

conosco no nosso intelecto e sendo usadas e descobertas pelas


pessoas que fazem o melhor uso da razão. São considerados
filósofos racionalistas Descartes, Spinoza e Leibniz.

FONTE: Adaptado de Porfírio (s.d.)

A aquisição da linguagem, para Chomsky (1983; 2005), nessa perspectiva


inatista, está diretamente relacionada com a própria herança genética do ser
humano. A linguagem, portanto, é entendida como uma dotação biológica, e
poderia ser comparada com outros aspectos do desenvolvimento humano. Isso
significa que o ser humano foi programado para falar. Para ele, o ambiente e as
experiências são elementos secundários nesse processo. O desenvolvimento e a
aquisição da linguagem são inatos aos seres humanos. Nessa perspectiva:

A aquisição da linguagem, por sua vez, é concebida em termos


de maturação ou de crescimento, implicando na distinção
de diferentes estágios da faculdade mental da linguagem.
Chomsky alude a um estado inicial dessa faculdade, que
sofreria um processo de maturação, passando por uma
sequência de estados a partir das experiências do indivíduo,
até atingir um estado estável (CARNEIRO, 2010, p. 59).

O estágio inicial compreenderia, exatamente, a chamada Gramática


Universal (GU), ou, ainda, o Dispositivo de Aquisição da Linguagem (DAL),
que consiste em um conjunto de princípios gerais e propriedades sintáticas,
fonológicas e semânticas, uma matriz biológica que faculta o desenvolvimento
de todas as línguas naturais possíveis. O estado estável corresponderia, por
outro lado, à gramática de uma língua particular, que se desenvolve na mente
do falante, a partir da exposição deste aos dados da sua língua(input linguístico).
Segundo a perspectiva chomskyana, a experiência, ou seja, a exposição da
criança à fala dos outros desempenharia o papel de mero gatilho, que acionaria a
gramática universal (CARNEIRO, 2010).

49
Didática do Ensino de Línguas

Os dois estágios de desenvolvimento da linguagem são


denominados de pré–linguístico e linguístico. No primeiro, o choro
é a forma de comunicação do bebê, o qual contém uma diversidade
de expressões emocionais. Aos poucos, as pessoas que estão em
contato direto com o bebê passam a entender os significados de cada
tipo de choro. Além disso, a criança, aos poucos, inicia a emissão de
sons guturais (arrulhos). Por volta dos 6-10 meses (podendo variar,
conforme o desenvolvimento de cada criança), começa a emitir
balbucios com a repetição de sons consonantais e vocálicos a partir
da repetição do que ela escuta. Assim, em cada período, a criança
vai desenvolvendo a linguagem até alcançar a fase linguística.

Com a maturação do aparelho fonador e da aprendizagem até


essa etapa, as primeiras palavras começam a ser ditas. Isso ocorre
por volta dos dois anos. De acordo com Oliveira, Rocha e Elane
(2008, p. 3), “a partir daqui, acontece uma “explosão de nomes”, e o
vocabulário cresce muito. Aos dois anos, espera-se que as crianças
sejam capazes de utilizar um vocabulário de mais de cem palavras”.

Seria, portanto, a gramática universal que explicaria a rapidez e a facilidade


com que aprendemos uma dada língua (a qual estamos expostos – língua
materna). Mesmo na sua complexidade, aprendemos, com facilidade, essa
língua, ou seja, seria a gramática universal que explicaria esse processo de
aprendizagem. Isso significa, para Chomsky, que o sistema neural apresenta a
estrutura necessária para qualquer sistema linguístico, sendo que o desafio da
criança, exposta a uma determinada língua, estaria na ação de aprender os
detalhes que diferenciam uma língua da outra.

1 - Nesta etapa da leitura, você se apropriou dos saberes das


etapas de desenvolvimento da linguagem. Considerando o
desenvolvimento dos bebês (até, aproximadamente, os 12
meses), que atividades didáticas poderiam ser propostas para
contribuir com o desenvolvimento da linguagem? Justifique a sua
proposta didática.

50
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

Agora, a respeito da teoria inatista, quando aplicada ao campo da educação,


tende-se a considerar uma perspectiva imóvel e resignada (movimento do
conhecimento: de dentro para fora), ou seja, entende-se que as diferenças
e as dificuldades não são superadas, uma vez que o meio não interfere no
desenvolvimento do sujeito. Você se lembra de que Chomsky postula que
a faculdade da linguagem é exclusiva da nossa espécie e está inscrita na
própria herança genética do ser humano? E que a influência do ambiente ou
da experiência seria secundária, nesse caso, em comparação com a herança
genética?

Alinhada a esse pensamento, a teoria inatista, indo além do campo do


desenvolvimento da linguagem, e conferindo ênfase ao que é inato aos sujeitos,
isentaria, em certa parte, a atuação docente, pois os resultados obtidos com a
aprendizagem são de responsabilidade exclusiva do aluno.

O papel docente e das atividades didáticas seria o de facilitar a manifestação


da essência do aluno, partindo do pressuposto de que, quanto menor for a
interferência, maior será a espontaneidade e a criatividade do estudante.

O modelo inatista ainda se faz presente nas práticas


pedagógicas no contexto escolar? Pense nessa questão!

O modelo inatista
Claudio A. Dalbosco

Penso que a definição mais simples que podemos dar da


postura inatista é aquela que defende que o sujeito já traz pronta,
na sua bagagem hereditária, a estrutura conceitual necessária
para compreender o mundo, ou seja, o modelo standard do inatismo
se baseia na tese de que as ideias nascem com o sujeito, residindo
no seu interior e, portanto, são anteriores à experiência. Dificilmente,
encontraríamos, hoje em dia, um epistemólogo ou um pedagogo
que defendesse esse modelo. No entanto, como influenciou,
decisivamente, muitas formas de pedagogia tradicional, e ainda se
encontra mesclado em teorias educacionais contemporâneas, faz-se
necessário investigá-lo na sua origem.
[...]

Temos aí, portanto, uma noção de conhecimento como algo que


já está contido na alma, previamente, antes de qualquer experiência,

51
Didática do Ensino de Línguas

competindo, ao mestre, por meio da arte da interrogação, fazer o


conhecimento brotar de dentro do educando. As pressuposições,
aqui, são claras: (a) a separação entre dois mundos; (b) a imortalidade
da alma; (c) o conhecimento e a aprendizagem como recordação;
(d) a existência de uma verdade absoluta, que independe do lugar
e do tempo e; (e) o trabalho do mestre como um agente que faz o
conhecimento brotar de dentro do educando.

O resultado disso, do ponto de vista pedagógico, considerando a


perspectiva do educando (aluno), é que ele é conduzido, do começo
ao fim, como Sócrates fez com o escravo, a responder perguntas
que o mestre lhe impõe, sem poder formular as suas próprias
perguntas, ou, mesmo, mudar a rota do diálogo. Destaca-se,
aí, um papel de total subserviência do educando em relação ao
educador. Além disso, a relação pedagógica entre educador e
educando se movimenta no âmbito conceitual e conteudístico, no
qual já há uma verdade definida de antemão, competindo, ao aluno,
recordá-la, desde que se mantenha, fielmente, no caminho retilíneo
de questionamento preestabelecido pelo mestre.

FONTE: <https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/faced/article/
download/11640/8032/>. Acesso em: 11 abr. 2021.

Para fechar essa reflexão a respeito da teoria inatista, considere que


essa concepção acaba por fundamentar pedagogias espontaneístas que não
valorizam, adequadamente, a capacidade intelectual dos sujeitos, pois o sucesso
está diretamente relacionado com o desempenho, o dom, a maturidade e/ou a
aptidão (REGO, 1996).

Emílio ou da Educação, de Jean-Jacques Rousseau.

52
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

2.2 TEORIA EMPIRISTA


Diferente da posição inatista, proposta por Chomsky, a teoria empirista do
desenvolvimento da linguagem, proposta por Skinner, tem as bases pautadas
na cientificidade e na objetividade, tendo os comportamentos observáveis como
matéria das proposições. A aprendizagem é entendida como “um processo
caracterizado por esquemas de condicionamento, segundo o círculo de estímulo
resposta-reforço, sendo, terminantemente, rechaçada qualquer explicação de
ordem mentalista” (CARNEIRO, 2010, p. 58).

Obra de Skinner Vai Além


Autora: Maria Amélia Matos – USP – Departamento de Psicologia
Origem: JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO, DE 25/08/90.

[...] É um behaviorista na medida em que propõe que o objeto de estudo


da Psicologia deva ser o comportamento, e é um radical na medida em que
nega, ao psiquismo, a função de causa do comportamento, embora não negue
a possibilidade de, através de um estudo da linguagem do sujeito, estudar os
estados internos, como pensamento e sentimentos.

Skinner, enquanto um analista do comportamento, propõe um programa de


pesquisa para que a Psicologia possa desvendar o objeto de estudo. Com esse
programa, trabalham os seguidores, muitos dos quais desconhecem a filosofia.
A primeira proposta clara para esse programa só surgiu em 1938, com a obra
The Behavior of Organisms: An Experimental Analysis, enquanto a filosofia, que
já vinha sendo posta em prática desde 1931, só encontrou igual explicitação em
1945, no artigo The Operacional Analysis of Psychological Terms (que, aliás,
expressa uma postura antioperacionalista). Posteriormente, essa explicitação foi
traduzida (para enorme escândalo dos próprios bahavioristas) em Science and
Human Behavior, e, finalmente, entendida, em 1974, com About Behaviorism.

Skinner vê a Psicologia como uma ciência biológica (embora seja avesso ao


reducionismo fisiológico), que estuda o comportamento dos organismos dentro
de coordenadas espaço-temporais e da interação com o ambiente. Na verdade,
propõe o estudo da interação comportamento-ambiente, posto, na unidade
de análise, a relação resposta-consequência (e não a resposta isolada), cujos
termos são classes funcionais, e não entidades estruturais. Ao contrário do que
muitos julgam, não é uma Psicologia voltada nem para o ambiente nem para o
organismo, mas para o estudo das contingências que contatam os dois, e para

53
Didática do Ensino de Línguas

os efeitos desse contato com os modos de agir e de proceder dos organismos.


Para Skinner, o comportamento tem lugar nos mundos físico e social, fora do
organismo (ou melhor, somente aquelas interações que, por aí, têm lugar, por
se constituírem em eventos observáveis, são, legitimamente, objetos de estudo).
Quando uma pessoa descreve pensamentos, sentimentos ou suposições,
tudo isso é comportamento. Entender os pensamentos e os sentimentos de
uma pessoa é conhecer as condições a partir das quais ela expressa esses
sentimentos e pensamentos, além das relações funcionais entre essas condições
e aquelas expressões.

Skinner não rejeita que possam ocorrer fenômenos em outras esferas


e níveis nos organismos (ao contrário do que afirmam alguns críticos), mas
defende que, se o comportamento vai, de fato, explicar ou ser explicado por
tais fenômenos, então, os métodos de coleta e de interpretação desses dados
devem estar no mesmo nível dos princípios básicos das ciências naturais, que
é o nível do comportamento. Como já dissemos, Skinner não nega a existência
de estados internos, e o fato de que esses eventos se situem dentro dos
organismos e não possam ser observados, senão pelo próprio sujeito, não põe
em discussão a existência. A objetividade ou a concordância de observadores
externos não é critério de realidade, nem critério para a escolha de um objeto de
estudo. A restrição existente diz respeito ao acesso (para o qual bastaria um único
observador), diz respeito à relação sujeito-fenômeno x observador-fenômeno.
Nesse sentido, o behaviorista não discute se o relato (em um estudo de relatos
verbais de estados internos, por exemplo) é ou não real, ele é. O behaviorista
discute por que o sujeito seleciona falar desse evento, e não de outros. Essa
escolha é observável e pode se constituir, legitimamente, no seu objeto de estudo
(aliás, nessas escolhas e determinantes, incide grande parte da ação terapêutica).
Por outro lado, estados subjetivos não têm status causal no behaviorismo radical.

A palavra reforçamento, fortemente identificada com essa proposta, refere-


se, de fato, a um tipo de contingência, comportamento-ambiente muito importante:
“o comportamento é afetado pelas suas consequências”. Tão importante que
foi reificada por behaviorista e por críticos apressados, e virou “explicação” e/
ou “causa” do comportamento, virou, até mesmo, uma “teoria”. O behaviorismo
radical “explica” o comportamento – se é que essa palavra deve ser usada –,
especificando as condições nas quais o comportamento ocorre. O reforçamento
seria uma das formas de selecionar comportamentos (isto é, de alterar a força,
a variedade e a variabilidade dos comportamentos). Essa “modificabilidade”
e a “variabilização” do comportamento seriam, elas próprias, produtos de uma
seleção, dada a adaptabilidade dessas características e o valor de sobrevivência.
Aqui, revelam-se as influências de Darwin e de Spencer, e o cunho, decididamente,
biológico, que se imprime à palavra “comportamento”.

54
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

A expressão “seleção pelas consequências” é mais do que isso, ela, de fato,


resume o modelo proposto por B.F. Skinner, para o estudo do comportamento.
Para ele, não só as características anatômicas e fisiológicas, mas, também,
as comportamentais, passam por sucessivos crivos de uma seleção baseada
nos contatos dos organismos vivos com o ambiente. Todo ser vivo evolui e se
transforma continuamente (razão porque, certa vez, indagado, disse: “estudo
o movimento dos organismos”). Mais importante, tais transformações são
direcionadas pelas consequências que tais contatos produzem. Por força
desses contatos, o organismo muda o ambiente em que vive e é, por sua vez,
modificado pelas mudanças que produziu. Para Skinner, o comportamento (e
fazer ciência é um comportamento) está sempre em construção e reconstrução
(donde a ênfase em estudos na área da aprendizagem), sob a influência de
contingências filogenéticas (atuando no nível das espécies), de contingências
ontogenéticas (atuando no nível dos repertórios comportamentais individuais), e
de contingências culturais (atuando no nível das práticas grupais).

A vida, definida como uma molécula que se produz e que, ao se reproduzir,


é modificada, isto é, é selecionada, com características, pelo meio (ou, mais
propriamente, pelas mudanças que é capaz de produzir no meio), representa
o primeiro exemplo de transformação ou seleção pelas consequências: na
filogênese, a modificação ocorre na reserva genética da espécie, transmitida pelos
indivíduos que, consequentemente, sobrevivem. Em nível comportamental, esses
indivíduos se tornam sensíveis a diferentes tipos e/ou a níveis de estimulação,
e apresentam posturas típicas, sequências reflexas etc. O segundo exemplo
de seleção pela consequência ocorre na ontogênese. É melhor entendido se
opusermos dois tipos de comportamento: o comportamento reflexo, controlado
por mecanismos descritos por Pavlov, e desencadeado por mudanças ambientais;
e o comportamento operante, controlado por mecanismos que Skinner e os
seguidores dele estudam, e que não é desencadeado por mudanças ambientais,
pelo contrário, é afetado pelas mudanças que opera sobre o ambiente. Dito
de outro modo, o comportamento operante se repete, e, a cada repetição, é
modificado, enquanto classe, pelas consequências que a ocorrência produz no
ambiente.

Na evolução cultural, terceiro nível da seleção por consequenciação, no


modelo skinneriano, a modificação ocorre naqueles dois primeiros níveis, porém,
via planejamento de grupo. O grupo adota e implementa comportamentos
exibidos por determinados indivíduos (comportamentos esses que se revelam
úteis na solução de problemas), e dissemina esses comportamentos entre os
demais indivíduos, garantindo, assim, a sobrevivência do grupo. Para Skinner,
as práticas culturais representam casos especiais de aplicação do conceito
de comportamento operante, quando diz, “é o efeito sobre o grupo, não as
consequências reforçadoras para membros individuais, que é responsável pela
evolução da cultura”.
55
Didática do Ensino de Línguas

O teste desse modelo, sucintamente, descrito aqui, é o programa de trabalho


do analista do comportamento. Ele o realiza a partir de uma unidade que, no
momento, é descrita como possuindo três termos: o comportamento, o contexto
ambiental antecedente e o consequente. Tal programa tem produzido descrições
quantitativas que analisam a interdependência entre o conjunto de variáveis do
organismo e o conjunto de variáveis do ambiente. A análise experimental do
comportamento já demonstrou que essas relações não precisam ser imediatas,
que podem ser expressas em termos relativos, e que, provavelmente, incluem
muito mais que três termos.

A abordagem do analista comportamental ao objeto de estudo implica


em uma sofisticada metodologia de sujeito único, isto é, de sujeito com o seu
próprio controle (descrita, em 1865, por Claude Bernard, e extrapolada, em
1960, por Murray Sidman, para o estudo do comportamento dos organismos).
Os procedimentos laboratoriais envolvem técnicas elaboradas, como modelagem
de resposta e de estímulo, esvanecimento, escurecimento, esquemas,
encadeamento etc. A linguagem inclui uma série de conceitos descritivos, como
reforçamento, e as variantes: primário, secundário, positivo e negativo. Ainda,
punição, controle de estímulos, classes de respostas, equivalência, operantes, lei
da igualação etc. Essa metodologia, essas técnicas e esses conceitos explicitam
o comportamento nas relações com o ambiente, de uma forma tão evidente,
regular e sistemática, que fazem por prescindir, da estatística, como medida do
resultado, e, do acordo entre observadores, como critério de verdade, mas o
analista do comportamento não prescinde da replicabilidade. Ele concorda com
a auto-observação, o autoconhecimento e aceita relatos na primeira pessoa,
porém, questiona a natureza do que está sendo observado, conhecido e relatado.

FONTE: <http://www.cemp.com.br/novo/corpo.asp?id=13&cod=137&tipo=9>.
Acesso em: 11 abr. 2021.

Para os empiristas, os comportamentos seriam adquiridos mediante


a produção de respostas para determinados estímulos do meio. A imitação
desempenhava papel dominante. Quando as respostas corretas eram emitidas
pelo aprendiz, recebia reforços positivos. Os erros, por sua vez, eram sinalizados
de forma oposta, para que fossem minimizados, até serem eliminados das
respostas dos aprendizes.

56
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

Nesse contexto, a linguagem era, igualmente, considerada um


comportamento a ser aprendido por estímulos e respostas. Para Skinner (1978, p.
16), o comportamento verbal poderia ser definido como “aquele comportamento
reforçado pela mediação de outras pessoas”.

No vídeo a seguir, conheça um pouco mais das origens do


behaviorismo: https://www.youtube.com/watch?v=VW7_24SwG7M.

Isso permite afirmar que a teoria empirista, como corrente filosófica, reafirma
que as vivências e as experiências dos seres humanos são os elementos
responsáveis pela construção das aprendizagens. As ideias, para os empiristas,
têm origem na percepção e no contato com os objetos do conhecimento, sendo
que esse contato apenas é possível por meio dos sentidos.

Todo conhecimento é resultado de uma determinada experiência a qual os


sujeitos são submetidos, ou seja, consequência dos nossos sentidos em relação a
essas experiências. De acordo com Ferreira et al. (2018, p. 28), “nesse aspecto, a
experiência estabelece o valor, a origem e os limites do conhecimento”.

O nome do filósofo John Locke é citado como o principal teórico da corrente


empirista. Ele defendeu que a “mente humana é uma ‘folha em branco’, em
que são gravadas as impressões externas à medida que temos as nossas
experiências” (FERREIRA et al., 2018, p. 28). Considere essa informação para
a prática docente e para a elaboração de materiais didáticos. Nesse contexto,
a quanto mais experiências for submetido o estudante, mais impressões ele
formará. Por exemplo, considerando a variedade vocabular e de usos possíveis
da linguagem, de acordo com os diferentes contextos (acadêmico, jornalístico,
poético, formal, informal etc.), imagine que quanto mais contato e experiências
o estudante tiver, mais conhecimento ele formará com os diferentes gêneros
textuais e os contextos de uso.

57
Didática do Ensino de Línguas

A concepção empirista, cujo principal filósofo foi o inglês John


Locke (1632-1704), tem, como um dos grandes marcos, a teoria
Ensaios sobre o Entendimento Humano, lançado em 1690.

[...]

Para o empirismo, não é o fator genético que determina a


aprendizagem, mas as experiências vividas ao longo da vida
determinam o aprendizado. O ser humano constrói o conhecimento
através dos cinco sentidos, nasce sem qualquer “carga” que já
determine o destino, a posição social, a crença, a trajetória ou o nível
de conhecimento, faz uma crítica a Descartes, e, na sua obra Ensaios
sobre o Entendimento Humano, busca responder, principalmente, a
como a mente funciona.

FONTE: Silva (2017, p. 16)

FIGURA 1 – JOHN LOCKE

FONTE: <https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/historia-hoje/
historia-manuscrito-de-john-locke-que-discute-tolerancia-religiosa-e-
encontrado-em-faculdade.phtml>. Acesso em: 11 abr. 2021.

Nessa corrente de pensamento, no entanto, não existiriam ideias natas


e um conhecimento universal. Impressões externas são gravadas de acordo
com experiências. Dessa forma, evidencia-se como uma corrente oposta
ao racionalismo da corrente inatista. Para os empiristas, todo o processo de
desenvolvimento do conhecimento, “do saber e do agir se dá pela experiência,
pelas vivências e pela tentativa e erro” (FERREIRA et al., 2018, p. 28).

58
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

O empirismo é a posição filosófica que aceita a experiência


como base para a análise da natureza, procurando rejeitar as
doutrinas dogmáticas. Usado, pela primeira vez, pela Escola
Empírica, uma escola de praticantes da medicina na antiga Grécia,
o termo empirismo deriva da palavra grega empeiría (ἐμπειρία), que
designa conhecimento ou habilidade obtida por meio da prática,
sendo, também, a origem, da palavra “experiência”, por intermédio
do termo latino “experientia”.

[...]

Os principais filósofos do empirismo britânico foram John Locke,


George Berkeley e David Hume.

FONTE: <https://www.infoescola.com/filosofia/empirismo/>. Acesso


em: 11 abr. 2021.

Para finalizar, considere, então, que, para essa teoria da aprendizagem, o


conhecimento está na realidade exterior, e é absorvido pelos sentidos dos sujeitos
a partir das experiências (movimento do conhecimento: de fora para dentro). Para
a educação, o professor é aquele que detém o saber, e o ensino é conduzido
pela imitação, repetição e cópia. Mesmo distantes no tempo, práticas inatistas
e empiristas seguem fazendo parte do contexto educacional. Por exemplo, com
atividades de repetição e de cópia, o empirismo, ainda, pode estar presente na
sala de aula.

2.3 TEORIA INTERACIONISTA


Agora, vamos para a terceira corrente de teoria do conhecimento. Trataremos
da corrente interacionista. Conforme o nome enuncia, defende a ideia de que
os fatores orgânico e ambiental são fundamentais para o desenvolvimento do
sujeito, considerando, inclusive, os aspectos objetivos e subjetivos desse sujeito
(FERREIRA et al., 2018).

Para os interacionistas, como Jean Piaget (1896-1980) e Lev Vygotsky (1896-


1934), sendo, esses dois, os principais representantes do campo, a concepção do
conhecimento está relacionada com a interação. O conhecimento é construído

59
Didática do Ensino de Línguas

pela interação que os sujeitos estabelecem com o meio externo, sendo histórico,
físico e social.

FIGURA 2 – JEAN PIAGET

FONTE: <https://www.ufrgs.br/psicoeduc/imagens/fotos_piaget/
piaget-idoso1.gif>. Acesso em: 11 abr. 2021.

FIGURA 3 – LEV VYGOTSKY

FONTE: <https://educador.brasilescola.uol.com.br/pedagogia/lev-
vygotsky-alguns-seus-conceitos.htm>. Acesso em: 11 abr. 2021.

Dessa forma, você percebe que o conhecimento não é entendido como algo
inato. Não é interno e não vem com o ser humano, com o nascimento. Também,
não vem do contexto externo construído a partir das percepções sensoriais,

60
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

contrapondo, portanto, empiristas e inatistas. Para os interacionistas, o homem


interage e modifica os elementos que o rodeiam.

Nessas diferentes interações, o conhecimento pode ser construído. Conforme


explica Silva (2017, p. 18), “uma criança, por exemplo, constrói as características
de agir, pensar, sentir e a visão de mundo, através da interação com outras
crianças e adultos, e esses processos duram a vida toda. O ser humano, de
acordo com essa teoria, está em constante aprendizagem”.

Nessa corrente de pensamento, Piaget (1896-1980) defende que o


desenvolvimento da criança acontece por diferentes estágios. Isso significa que,
pela experiência, em cada situação nova que é apresentada para a criança,
há o aprendizado. Quando a criança identifica que algo é novo, ocorre certa
instabilidade com os conhecimentos que ela já possui. Nesse movimento, então,
ocorrem a assimilação e a acomodação de novas aprendizagens. Portanto, no
contato com o mundo, a criança aprende (teoria construtivista).

FIGURA 4 – EXPLANAÇÃO

61
Didática do Ensino de Línguas

FONTE: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/3259298/mod_
resource/content/1/aula.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2021.

Piaget apresentou diferentes fases para os seus estudos. De forma resumida,


entre os anos 20 e 30, ele se concentrou em investigar “a evolução ontogenética
e os processos mentais, além do conceito construtivista” (SILVA, 2017, p. 19).
Posteriormente, entre as décadas de 40 e 50, dedicou os estudos à compreensão

[...] dos mecanismos funcionais da adaptação dos processos


mentais, sendo que a estrutura da mente passa a ser
compreendida como um processo de reorganização contínua,
através da interação com o meio ambiente, passando do
primeiro momento, das funções puramente biológicas, para os
processos de adaptação ao ambiente (SILVA, 2017, p. 19).

62
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

Ontogenia

Ontogênese é o nome dado ao processo de formação de um


ser vivo. Descreve a transformação de uma semente em árvore
ou o surgimento de uma pessoa a partir de um óvulo fecundado.
Inicialmente, o conceito de ontogênese era usado para descrever
as mudanças de forma durante o desenvolvimento de um ser
vivo. Mencionava a formação da espinha vertebral, do coração,
o aparecimento dos dedos, o crescimento do cabelo, e todas as
mudanças que ocorrem antes do nascimento, mas o processo de
ontogênese continua após o nascimento. O corpo cresce, atingimos
a maturidade sexual, paramos de crescer, e, finalmente, começamos
a envelhecer. São as etapas inevitáveis da nossa ontogênese.

A ontogênese se caracteriza por uma sequência de eventos que


ocorre de maneira precisa e semelhante em todos os seres vivos
de uma espécie. Ela é determinada por nossos genes e modulada
pelo meio ambiente. Todas as crianças crescem, mas, se bem
alimentadas, crescem mais rápido.

Aos poucos, os cientistas descobriram que um número


crescente de características que desenvolvemos em alguma fase
da nossa vida faz parte da nossa ontogenia. Hoje, sabemos que
nascemos com a capacidade de fazer adições e subtrações de
pequenos números (até três ou quatro). Sabemos que parte da
nossa capacidade de julgamento moral, de convivência social, de
comunicação, por meio de expressões faciais, e inúmeras outras
características comportamentais também fazem parte do nosso
processo ontogenético.

FONTE: Adaptado de Reinach (2013)

Para ampliar os seus estudos a respeito de Piaget e das


teorias da evolução orgânica, desenvolva a leitura do artigo de
autoria de Argus Vasconcelos de Almeida e Jorge Tarcísio da Rocha
Falcão, disponível em https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0102-79722008000300022.

63
Didática do Ensino de Línguas

Vygotsky (1896-1934), por sua vez, seguiu defendendo a questão da interação


no processo de aprendizagem, mas tratou dos contextos sociais, históricos
e culturais nesse processo. Para Lev Seminovitch Vygotsky, o ser humano
transforma a natureza, mas, também, sofre consequências com essa interação.
Nessa percepção, elabora o conceito de zona de desenvolvimento proximal: “a
distância entre o nível de desenvolvimento real e o nível de desenvolvimento
potencial, ou seja, a distância entre aquilo que ainda não sei, mas que saberei”
(SILVA, 2017, p. 19).

Derivada do racionalismo, a teoria teve origem no início do século XX. A


especificidade está, em comparação com as outras teorias, em considerar todas
as dimensões do ser humano. Portanto, a aprendizagem está concentrada no
aluno, e o professor desempenha o papel de orientador. A grande mudança dessa
teoria está em perceber o erro como etapa de aprendizagem. O erro passa a ser
entendido como parte da construção dos saberes.

O professor construtivista não acredita no ensino, no seu sentido


convencional ou tradicional, pois não acredita que um conhecimento (conteúdo)
e uma condição prévia de conhecimento (estrutura) possam transitar, por força do
ensino, da cabeça do professor para a cabeça do aluno. Não acredita na tese de
que a mente do aluno é tabula rasa, isto é, que o aluno, frente a um conhecimento
novo, seja totalmente ignorante e tenha de aprender tudo da estaca zero, não
importando o estágio de desenvolvimento em que se encontre. Ele acredita
que tudo o que o aluno construiu, até hoje, na sua vida, serve de patamar para
continuar a construir, e que alguma porta se abrirá para o novo conhecimento – é
só questão de descobri-la; ele descobre isso por construção. Professor e aluno se
determinam mutuamente.

Essa visão de processos de ensino e de aprendizagem entende a escola


como um espaço de trocas e de construção conjunta. O desafio da escola,
portanto, é oferecer um espaço harmônico para que uma diversidade de trocas
possa acontecer, mobilizando a construção efetiva de conhecimentos e de
habilidades mais diversas.

1 - Considerando a abordagem interacionista de desenvolvimento


da aprendizagem, pense nos espaços da escola e da sala de
aula, e, a partir das suas experiências (no papel de aluno e/ou
no papel de docente), desenvolva um breve relato das formas de
aplicação dessa abordagem (na prática).

64
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

Defende que a estrutura da linguagem é, em grande parte,


especificada biologicamente (nativista).

Skinner afirma que a linguagem é aprendida, inteiramente, por


meio de experiência (empirista).

Piaget consegue chegar mais perto de uma compreensão do


desenvolvimento da linguagem que atenda melhor a uma realidade
observada. Segundo ele, o biológico e as interações com o mundo social
são importantes para o desenvolvimento da linguagem (interacionista).

Vygotsky segue defendendo a questão da interação no processo


de aprendizagem, mas trata dos contextos sociais, históricos e
culturais nesse processo.

FONTE: Adaptado de Oliveira, Rocha e Elane (2008)

Para o fechamento desta seção, observe, a seguir, um quadro, que


organizará, de forma resumida, os elementos do inatismo, do empirismo e do
interacionismo.

QUADRO 1 – ELEMENTOS DO INATISMO, DO EMPIRISMO E DO INTERACIONISMO


Inatismo Empirismo Interacionismo
Princípios racionais com Conhecimento está na real- Conhecimentos pela
o nascimento idade exterior experiência
Ideias inatas Conhecimento absorvido O ambiente também in-
pelos sentidos das pessoas fluencia na constituição
das características hu-
manas
Seres humanos não são Seres humanos são como Respostas a estímulos
tábulas rasas folhas em branco externos - interações
Geneticamente, traz Os sentidos são os re- Interação do ser humano
qualidades e capaci- sponsáveis por preencher com a cultura, o contexto
dades essas folhas etc.
Movimento do conheci- Movimento do conhecimen- Movimento do conheci-
mento: dentro para fora to: fora para dentro mento: interação; o ser
humano não é ativo no
processo de formação

65
Didática do Ensino de Línguas

O educador interfere um Práticas que se tornam Construção coletiva do


pouco hábitos; o professor detém conhecimento
o saber
FONTE: A autora

3 PARÂMETROS CURRICULARES
NACIONAIS
Nesta etapa da leitura, após conhecermos algumas das teorias da
aprendizagem, refletiremos a respeito dos pressupostos pedagógicos para o
ensino das línguas materna e estrangeira, a partir das teorias da linguagem e
das propostas dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Considere que esse
conhecimento influencia, diretamente, na produção e na seleção de materiais
didáticos para o ensino de línguas, e na prática docente (tendo em vista a relação
entre professor e aluno, aluno e aluno, aluno e escola, aluno e mundo etc.), a
partir do entendimento da aplicação das teorias da linguagem nas construções
didáticas do professor. Por exemplo, considerar, para o ensino, a sociointeração
como teoria que fundamenta a prática docente, significa que as atividades
propostas para o estudo das línguas devem considerar situações contextualizadas
de interação. Pense nisso!

Vimos, até aqui, que, para Chomsky, não há mecanicidade na linguagem,


conforme defendia Skinner. Segundo Chomsky, o desenvolvimento da linguagem
e a aquisição, dentro da teoria gerativista, “se dão por dois processos: o DAL,
feito através de frases e da fala, e o input dos adultos, o que gera a informação.
O input linguístico corresponde às experiências que a criança absorve em contato
com o meio social” (RESENDE, 2000, p. 4).

Já na teoria construtivista de Piaget, com o interacionismo, há interação,


acomodação e assimilação, ou seja, para essa abordagem, a aquisição da
linguagem ocorre por meio de diferentes processos (cognitivismo construtivo):
assimilação, acumulação, fixação ou sedimentação do conhecimento. A partir
das trocas (em diferentes estágios, como sensório-motor, pré-operatório,
operatório-concreto e operatório-formal), a criança aprende, e acontece a troca de
conhecimento entre o ambiente e os seres humanos.

Vygotsky, por sua vez, com a visão sociointeracionista da aquisição da


linguagem, defende que a criança aprende de forma interativa com o meio social,
a partir das trocas comunicativas. Por esse motivo, a teoria proposta por Vygotsky
é denominada de sociointeracionista.

66
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

Para a continuação dessa reflexão, saiba que as teorias que embasam


a aquisição da linguagem são: empirista, behaviorista (comportamental), inatista
(gerativa) e construtiva. Agora, refletiremos a respeito do que está presente nos
Parâmetros Curriculares Nacionais, considerando o ensino das línguas.

Elaborados pelo Governo Federal, os Parâmetros Curriculares Nacionais


(PCNs), têm, como objetivo, nortear, de certa forma, os agentes envolvidos na
educação (diretores, professores, supervisores etc.), por meio de reflexões que
busquem contribuir com o trabalho docente. Com os PCNs, almeja-se, para
as redes pública e privada de ensino, a garantia, aos educandos, do direito de
usufruírem dos conhecimentos básicos e necessários para o exercício pleno da
cidadania. De acordo com as especificidades de cada contexto, os PCNs devem
ser adaptados, portanto, não são obrigatórios, mas são norteadores do processo
de educação.

Os PCNs estão divididos da seguinte forma:

• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais do 1º ao 5º ano.


• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais do 6º ao 9º ano.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Língua Portuguesa.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Matemática.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Ciências Naturais.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Geografia.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - História.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Arte.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Educação Física.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Língua Estrangeira.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Tema Transversal Ética.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Tema Transversal Plurali-
dade Cultural.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Tema Transversal Meio Am-
biente.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Tema Transversal Saúde.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Tema Orientação Sexual.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Linguagens, Códigos e suas
Tecnologias.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Ciências Humanas e suas
Tecnologias.
• PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais - Ciências Naturais, Matemáti-
ca e suas Tecnologias.

67
Didática do Ensino de Línguas

Para esta leitura (Didática do ensino de línguas), é preciso focar em alguns


desses títulos: Introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL,
1997a), Língua Portuguesa (BRASIL, 1997b), Terceiro e Quarto Ciclos do Ensino
Fundamental Língua Estrangeira (BRASIL, 1998) e PCN - Ensino Médio –
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias (BRASIL, 2000).

No documento de apresentação dos parâmetros, destaca-se o tratamento


conferido aos conteúdos curriculares. Para os PCNs, “ao invés de um ensino no
qual o conteúdo seja visto como fim em si mesmo, o que se propõe é um ensino
para que o conteúdo seja visto como meio para que os alunos desenvolvam as
capacidades que lhes permitam produzir e usufruir dos bens culturais, sociais e
econômicos” (BRASIL, 1997a, p. 48).

A função atribuída aos conteúdos, no contexto escolar, e o tratamento


conferido a eles, são centrais, pois, por meio deles, os propósitos da escola são
operacionalizados, ou seja, manifestados em ações pedagógicas. Observe:

O projeto educacional expresso nos Parâmetros Curriculares


Nacionais demanda uma reflexão acerca da seleção de
conteúdos, e exige uma ressignificação, em que a noção de
conteúdo escolar se amplia para além de fatos e conceitos,
passando a incluir procedimentos, valores, normas e atitudes.
Ao tomar, como objeto de aprendizagem escolar, conteúdos
de diferentes naturezas, reafirma-se a responsabilidade da
escola com a formação ampla do aluno e a necessidade de
intervenções conscientes e planejadas nessa direção. Nesse
documento, os conteúdos são abordados em três grandes
categorias: conteúdos conceituais, que envolvem fatos e
princípios; conteúdos procedimentais e conteúdos atitudinais,
que envolvem a abordagem de valores, normas e atitudes
(BRASIL, 1997a, p. 51).

Na perspectiva dos PCNs, os conteúdos são abordados em três dimensões


distintas. Esse entendimento impacta diretamente na seleção e na elaboração/
adaptação de materiais didáticos e propostas didáticas para a sala de aula,
modificando a atuação do professor. Observe, a seguir, as especificidades de
cada grupo de conteúdos:

68
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

QUADRO 2 – CATEGORIAS DE CONTEÚDOS

1. Conteúdos • É feita a construção ativa das capacidades intelec-


conceituais tuais para operar com símbolos, ideias, imagens
e representações que permitem organizar a reali-
dade.
• A aprendizagem de conceitos se dá por aproxi-
mações sucessivas.
• A aprendizagem de conceitos permite organizar a
realidade, mas isso só é possível a partir da apren-
dizagem de conteúdos referentes a fatos (nomes,
imagens, representações), que ocorre, em um pri-
meiro momento, de maneira eminentemente mne-
mônica.
2. Conteúdos • Os procedimentos expressam um saber fazer, que
procedi- envolve tomar decisões e realizar uma série de
mentais ações, de forma ordenada e não aleatória, para
atingir uma meta.
• Os conteúdos procedimentais sempre estão pre-
sentes nos projetos de ensino, pois uma pesquisa,
um experimento, um resumo, uma maquete são
proposições de ações presentes nas salas de aula.
• É preciso analisar os conteúdos referentes a
procedimentos não do ponto de vista de uma
aprendizagem mecânica, mas a partir do propósito
fundamental da educação, que é fazer com que os
alunos construam instrumentos para analisar, por
si mesmos, os resultados que obtêm e os proces-
sos que colocam em ação para atingir as metas a
que se propõem.
• Ao ensinar procedimentos, também se ensina um
certo modo de pensar e de produzir o conhecimen-
to.
3. Conteúdos • Permeiam todo o conhecimento escolar.
atitudinais • A escola é um contexto socializador, gerador de
atitudes relativas ao conhecimento, ao professor,
aos colegas, às disciplinas, às tarefas e à socie-
dade.
• É imprescindível adotar uma posição crítica em
relação aos valores que a escola transmite, ex-
plícita e implicitamente, mediante as atitudes cotid-
ianas.
• Para a aprendizagem de atitudes, é necessária
uma prática constante, coerente e sistemática, em
que valores e atitudes almejados sejam expressos
no relacionamento entre as pessoas e na escolha
dos assuntos a serem tratados.
• Além das questões de ordem emocional, tem rele-
vância, no aprendizado dos conteúdos atitudinais,
o fato de cada aluno pertencer a um grupo social,
com os próprios valores e atitudes.

FONTE: Adaptado de Brasil (1997a)


69
Didática do Ensino de Línguas

A escola, portanto, e as práticas pedagógicas, estão diretamente relacionadas


com a constituição da cidadania, sendo possível a partir de uma construção
coletiva e permanente que valorize todas as formas de cultura e de expressão.
Aprender e ensinar, construir e interagir são elementos primordiais no espaço da
escola. Nessa perspectiva, a relação entre escola e questões sociais é essencial,
da mesma forma que a vinculação com valores democráticos na seleção de
conteúdos e na própria organização escolar.

1 - De acordo com os PCNs, é fundamental a valorização


da pluralidade cultural no espaço da escola, uma vez que
compreender a cidadania como participações social e política,
assim como exercício de direitos e de deveres políticos, civis
e sociais, adotando, no cotidiano, atitudes de solidariedade,
cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo,
para si, o mesmo respeito, é básico. Dessa forma, indique uma
proposta didática que valorize esse objetivo l proposto pelos
PCNs, considerando o ensino das línguas.

A Pedagogia, por muito tempo, manteve-se focada no processo de ensino


do professor, como aquele que valoriza o conhecimento. O ensino, então, ganha
autonomia em relação à aprendizagem, criando métodos próprios, com os
processos de aprendizagem em segundo plano. Atualmente, faz-se emergente,
de acordo com os PCNs, ressignificar a unidade existente entre aprendizagem e
ensino, pois, sem ela, o ensino não se realiza. Dessa forma, para os PCNs:

A busca de um marco explicativo, que permita essa


ressignificação, além da criação de novos instrumentos
de análise, planejamento e condução da ação educativa
na escola, tem se situado, atualmente, para muitos dos
teóricos da educação, dentro da perspectiva construtivista.
A perspectiva construtivista, na educação, é configurada por
uma série de princípios explicativos do desenvolvimento e da
aprendizagem humana que se complementam, integrando um
conjunto orientado a analisar, a compreender e a explicar os
processos escolares de ensino e de aprendizagem (BRASIL,
1997a, p. 36).

Ainda, conforme detalha o documento, essa configuração do marco


explicativo construtivista se deu a partir das influências da psicologia genética, da

70
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

teoria sociointeracionista e das explicações da atividade significativa. As tentativas


para conceituar as várias dimensões envolvidas no processo de formação dos
sujeitos (considerando o contexto escolar) trazem inegáveis contribuições à teoria
e à prática educativas. Assim,

[...] todas essas contribuições se referem ao reconhecimento


da importância da atividade mental construtiva nos processos
de aquisição de conhecimento. Daí o termo construtivismo,
denominando essa convergência. Assim, o conhecimento não
é visto como algo situado fora do indivíduo, a ser adquirido por
meio da cópia do real, tampouco, como algo que o indivíduo
constrói, independentemente da realidade exterior, dos demais
indivíduos e das próprias capacidades pessoais. É, antes
de mais nada, uma construção histórica e social, na qual
interferem fatores das ordens cultural e psicológica (BRASIL,
1997a, p. 36-37).

Nessa perspectiva construtivista, a atividade, para a construção do


conhecimento, está relacionada com a interpretação da realidade e a construção
do significado. Ao mesmo tempo, possibilita-se a elaboração de novas
possibilidades de ação. O desafio, por meio da intervenção pedagógica, é o
de promover a realização de aprendizagens com a interpretação da realidade
e a construção de significado. Diante da exposição a diferentes problemas, o
educando deve ser desafiado a formular hipóteses para a solução dos desafios.
Então,

Se a aprendizagem for uma experiência de sucesso, o aluno


constrói uma representação de si mesmo como alguém capaz.
Se, ao contrário, for uma experiência de fracasso, o ato de
aprender tende a se transformar em ameaça, e a ousadia
necessária se transforma em medo, para o qual a defesa
possível é a manifestação de desinteresse (BRASIL, 1997a,
p. 38).

Conclui-se que, nessa proposta, o ensino deve potencializar a aprendizagem.


Para tanto, observaremos os PCNs de Língua Portuguesa (LP), para
compreendermos as sugestões didáticas para essa disciplina (BRASIL, 1997).

Para ampliar a leitura dos PCNs, acesse o link a seguir e


leia, na íntegra, as propostas iniciais do documento: PCN (volume
1 – introdução aos PCNs): http://portal.mec.gov.br/conaes-
comissao-nacional-de-avaliacao-da-educacao-superior/195-
secretarias-112877938/seb-educacao-basica-2007048997/12598-
publicacoes-sp-265002211.

71
Didática do Ensino de Línguas

Em determinada etapa dos parâmetros de Língua Portuguesa (BRASIL,


1997), encontramos o detalhamento dos blocos de conteúdo e de tratamento
didático. O documento apresenta alguns princípios e orientações para o trabalho
didático com os conteúdos, tendo, como motivação, o atendimento aos objetivos
propostos. A primeira ideia necessária que o educador deve ter é que a própria
definição de conteúdo já é uma questão didática que tem relação direta com os
objetivos. O movimento metodológico para a compreensão de conteúdo está
pautado na noção de ação-reflexão-ação. Assim, progressivamente, busca-se
que a reflexão incorpore as atividades linguísticas de forma que o aluno esteja
habilitado para monitorar o processo com eficácia. Para o trabalho com a língua
oral, por exemplo, deve, o professor e a escola, oferecerem um ambiente que
respeite e acolha a voz de todos. A noção de erro precisa ser ultrapassada para
que o aluno tenha confiança e se expresse, podendo manifestar o que pensa e o
que sente (BRASIL, 1997).

Uma leitura interessante a respeito da diversidade linguística e


da importância da valorização de todas as formas de expressão é a
do livro Preconceito Linguístico, de autoria de Marcos Bagno.

À escola, portanto, cabe construir uma reflexão acerca dos usos da língua,
de acordo com as diferentes situações comunicativas (pressupostos da teoria
sociointeracionista). Para o ensino de LP, por exemplo, considere a reflexão da
linguagem em instâncias públicas e privadas, de forma a abarcar as diferentes
formas de manifestação para que o aluno tenha domínio das variações da língua
(grau de formalidade) e das exigências dos diferentes contextos, possibilitando
que ele se aproprie dos usos da LP. Esse trabalho, em sala de aula, considera
atividades sistemáticas de fala, de escuta e de reflexão da língua.

Dica para trabalho em sala de aula:

O Teatro Mágico – Zaluzejo: https://www.youtube.com/


watch?v=PWykmQ1oe90.

72
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

Temática do projeto de aula – “Combatendo o preconceito linguístico”.

Proposta:

1) Converse com os alunos a respeito da diversidade linguística e


da adequação aos contextos.
2) Apresente o vídeo do Teatro Mágico.
3) Após o vídeo, converse, novamente, com a turma, e questione as
noções de erro, de regionalismo, de cultura, de diversidade da LP
no Brasil e de outros lugares em que a LP é língua oficial; trate
das peculiaridades.
4) Reflita, com os alunos, se eles já vivenciaram ou presenciaram
situações nas quais alguém foi repreendido ou discriminado pelo
jeito de falar.
5) Sintetize todas as ideias propostas.
6) Proponha a escrita da redação que envolva língua e cultura.

Atividades como essa e outras, de produção e de interpretação, devem


considerar uma variedade de textos orais que convide o aluno a observar os
diferentes usos da LP, possibilitando a reflexão a respeito dos recursos oferecidos
pela língua para que os objetivos comunicativos pretendidos sejam alcançados.
Para os PCNs de LP, as propostas podem contemplar (BRASIL, 1997):

• Atividades em grupo que envolvam o planejamento e a realização de


pesquisas e requeiram a definição de temas, a tomada de decisões de
encaminhamentos, a divisão de tarefas, a apresentação de resultados.
• Atividades de resolução de problemas que exijam estimativa de
resultados possíveis, verbalização, comparação e confronto de
procedimentos empregados.
• Atividades que apresentem produção oral de planejamento de um texto,
de elaboração, propriamente, e de análise da qualidade.
• Atividades dos mais variados tipos, mas que tenham, sempre, sentido
de comunicação, de fato: exposição oral de temas estudados apenas
por quem expõe; descrição do funcionamento de aparelhos e de
equipamentos em situações nas quais isso se faça necessário; narração
de acontecimentos e de fatos conhecidos apenas por quem narra etc.
Esse tipo de tarefa requer preparação prévia, considerando o nível de
conhecimento do interlocutor, e, se feito em grupo, a coordenação da
fala própria com as dos colegas, dois procedimentos complexos que,
raramente, são aprendidos sem ajuda.

Da mesma forma, deve acontecer o tratamento didático da escrita e da leitura.


É fundamental trabalhar com a diversidade de textos e a combinação entre eles.

73
Didática do Ensino de Línguas

Informar-se, pesquisar, escrever, rever, revisar e reescrever os próprios textos


são importantes para “formar cidadãos capazes de compreender os diferentes
textos com os quais se defrontam” (BRASIL, 1998).

Com relação à implementação da Língua Estrangeira (LE) no Ensino


Fundamental (BRASIL, 1998), os parâmetros explicam que existe uma justificativa
social para essa prática: uma pequena parcela da população brasileira tem as
oportunidades de conhecer e de utilizar uma LE. No entanto, o estudo de uma LE
contribui para o desenvolvimento integral do letramento do aluno (BRASIL, 1998).
Oportunizar o acesso à LE é importante para o conhecimento do mundo.

Para os PCNs de LE, a natureza da linguagem é sociointeracional, sendo,


todo significado, construído de forma dialógica (entre os participantes do discurso).
Portanto, o ensino e a aprendizagem de uma LE contribuem com o aumento do
conhecimento acerca de uma linguagem na língua materna, em comparação com
a LE em diferentes níveis, o que possibilita que o aluno se envolva no processo
de construir significado na língua (BRASIL, 1998).

As percepções modernas da aprendizagem de LE se constituem


influenciadas, sobretudo, por três diferentes abordagens: behaviorista, cognitivista
e interacional (vistas anteriormente, nesta leitura). Refletiremos a respeito delas
em relação ao ensino da LE.

QUADRO 3 – ABORDAGENS
A visão behaviorista • A aprendizagem é compreendida como
um processo de adquirir novos hábitos
linguísticos no uso da língua estrangei-
ra.
• Há a automatização desses novos hábi-
tos, usando uma rotina que envolva ES-
TÍMULO, a exposição do aluno ao item
lexical, à estrutura sintática etc. a serem
aprendidos, fornecidos pelo professor;
RESPOSTA do aluno; REFORÇO, a
partir do qual o professor avalia a res-
posta do aluno.
• Ocorre o uso de metodologias que en-
fatizam exercícios de repetição e de
substituição.
• Os erros têm que ser imediatamente
eliminados ou corrigidos, para que não
afetem o processo de aprendizagem.
• É uma Pedagogia corretiva.

74
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

A visão cognitivista • Desloca-se o foco do ensino para o alu-


no ou para as estratégias que ele utiliza
na construção da aprendizagem da Lín-
gua Estrangeira.
• A mente humana está, cognitivamente,
apta para a aprendizagem de línguas.
• Ao ser exposto à língua estrangeira, o
aluno, com base no que sabe das re-
gras da língua materna, elabora hipóte-
ses a respeito da nova língua e as testa
no ato comunicativo, em sala de aula ou
fora dela.
• Os erros são considerados como evi-
dência de que a aprendizagem está em
desenvolvimento, ou seja, são hipóteses
elaboradas pelo aluno no esforço cogni-
tivo de aprender a Língua Estrangeira.
• Os erros fazem parte do processo de
aprendizagem.
• Há um contínuo entre a língua materna
e a Língua Estrangeira.
• Há a estratégia do aluno de criar hipó-
teses a respeito da Língua Estrangeira
que está aprendendo, com base no con-
hecimento que tem da língua materna: a
estratégia de transferência linguística.
A visão (socio)interacional • O foco é a interação entre o professor e
o aluno e entre os alunos.
• Aprender é uma forma de estar no mun-
do social com alguém, em um contexto
histórico, cultural, institucional.
• Os processos cognitivos são gerados
por meio da interação entre um aluno e
um participante de uma prática social,
que é um parceiro mais competente,
para resolver tarefas de construção de
significado/conhecimento com as quais
esses participantes se deparem.
• O participante mais competente pode
ser entendido como um parceiro adulto
em relação a uma criança, um professor
em relação a um aluno, ou um aluno em
relação a um colega da turma.

• Na aprendizagem da Língua Estrangei-


ra, os enunciados do parceiro mais
competente ajudam na construção
do significado, e, portanto, auxiliam a
própria aprendizagem do uso da língua.
FONTE: Adaptado de Brasil (1997a)

75
Didática do Ensino de Línguas

Observa-se que, na visão behaviorista, o foco está no professor e no ensino;


já na visão cognitivista, passa a centrar no aluno e na aprendizagem; para, na
visão sociointeracionista, adentrar na interação entre os sujeitos.

Construir propostas pedagógicas com esse entendimento teórico desafia


os professores a formularem materiais e propostas que estejam baseados,
sobretudo, em situações de interação que valorizem os mais diversos contextos,
considerando o ensino e a aprendizagem da LE.

Proposta didática

1) Gênero textual – sinopse de filme.


2) Trabalhar com sinopses na LP e reconhecer os elementos que a integram
(título do filme, diretor, elenco, ano de produção, tempo de duração,
gênero do filme, detalhes da trama etc.).
3) Trabalhar com sinopses na LE e orientar a busca pelas informações que
integram esse tipo de texto para duplo conhecimento: gênero textual e
produção em LE.

FIGURA 5 – SINOPSE DE FILME

FONTE: <https://br.freepik.com/vetores-gratis/colecao-de-tira-de-filme-vetorial-
3d_1131924.htm#page=1&query=filme&position=2>. Acesso em: 11 abr. 2021.

76
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

Para finalizar esta seção de estudos, os PCNs do Ensino Médio (BRASIL,


2000), seguindo a mesma lógica metodológica proposta para o Ensino
Fundamental, destacam que a LE assume um importante papel de integração de
saberes em um mundo globalizado. No Ensino Médio, deve-se dar continuidade
às propostas anteriores, de forma a ampliar a atuação dos sujeitos no mundo.
Não mais entendida como disciplina isolada, a LE está inserida em uma área, e
deve ser trabalhada em um contexto interdisciplinar. Além de capacitar o aluno
para a compreensão e para a produção de enunciados em um novo idioma,
deve propiciar, ao estudante, a possibilidade de atingir um nível de competência
linguística, o qual seja capaz de possibilitar o acesso às mais variadas informações,
ao mesmo tempo em que contribui para a formação, para uma atuação cidadã,
lendo e interpretando os fatos nacionais e internacionais para a compreensão do
mundo que o cerca.

A seguir, analise, com atenção, as competências a serem desenvolvidas na


LE (BRASIL, 2000):

• Saber distinguir entre as variantes linguísticas.


• Escolher o registro adequado à situação na qual se processa a
comunicação.
• Escolher o vocábulo que melhor reflita a ideia que se pretenda comunicar.
• Compreender de que forma determinada expressão pode ser interpretada
em razão de aspectos sociais e/ou culturais.
• Compreender em que medida os enunciados refletem as formas de ser,
pensar, agir e sentir de quem os produz.
• Utilizar os mecanismos de coerência e de coesão na produção em
Língua Estrangeira (oral e/ou escrita). Todos os textos referentes à
produção e à recepção, em qualquer idioma, regem-se por princípios
gerais de coerência e de coesão e, por isso, somos capazes de entender
e de sermos entendidos.
• Utilizar as estratégias verbais e não verbais para compensar
falhas na comunicação (como o fato de não ser capaz de recordar,
momentaneamente, uma forma gramatical ou lexical), para favorecer
a efetiva comunicação e alcançar o efeito pretendido (falar mais
lentamente, ou enfatizando certas palavras, de maneira proposital, para
obter determinados efeitos retóricos, por exemplo).

Todos esses elementos estão inter-relacionados e devem ser trabalhados,


de forma conjunta, nas propostas pedagógicas. Para um adequado domínio
da capacidade comunicativa, é necessário o desenvolvimento de todas essas
competências. Além da competência gramatical na LE, é fundamental o domínio
da competência sociolinguística, da competência discursiva e da competência

77
Didática do Ensino de Línguas

estratégica. O grande objetivo é a ampliação dos horizontes culturais. Refletir a


respeito da cultura estrangeira também é pensar na cultura nacional. Atente-se!

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
A partir desta leitura, buscou-se ampliar os conhecimentos acerca dos
pressupostos pedagógicos para o ensino das línguas materna e estrangeira,
a partir das teorias da linguagem e dos Parâmetros Curriculares Nacionais.
Com esses saberes ampliados, e, a partir da perspectiva do saber-fazer,
desenvolveram-se os objetivos de aprendizagem relacionados, primeiramente,
com o saber: pressupostos pedagógicos, teorias da linguagem e PCNs, algumas
abordagens centradas no ensino de línguas; e com o fazer: teorias da linguagem,
especificidades de cada uma e relações com a construção dos PCNs para uma
atuação docente diferenciada.

Para a prática docente, o reconhecimento das teorias de aquisição da


linguagem é fundamental para entendimento dos processos envolvidos, e que
são mobilizados, de acordo com a abordagem metodológica (ou a combinação
delas), para uma atuação em sala de aula que mobilize os conhecimentos e as
habilidades dos alunos, de forma a respeitar as diferentes formas de aprender de
cada um. Assim, ao longo desta seção, você desenvolveu a leitura das seguintes
teorias da linguagem: inatismo, behaviorismo, empirismo e interacionismo.
De acordo com cada teoria da aprendizagem, surgem diferentes formas de
entendimento do processo de aquisição da linguagem. A partir das proposições
feitas, o movimento do conhecimento pode ocorrer de dentro para fora, de fora
para dentro, ou, mais desenvolvido ainda, na interação entre os sujeitos e com o
meio.

O objetivo foi conhecer as teorias de aprendizagem e as relações delas com


os Parâmetros Curriculares Nacionais, voltados para o ensino de línguas, para
que você pudesse entender um pouco mais a respeito de algumas das bases
teóricas que influenciaram na produção dos parâmetros e que, de forma direta,
interferem na forma de atuação docente.

Para a sua prática docente, desafie-se a observar de que forma você elabora/
seleciona materiais didáticos direcionados para o ensino e a aprendizagem de
línguas. É importante, sempre que possível, considerar materiais didáticos e
planejamentos de aula que valorizem a interação, a diversidade cultural, os
diferentes contextos e os usos da linguagem, tendo, como objetivo, a formação
para a cidadania.

78
Capítulo 2 PRESSUPOSTOS PEDAGÓGICOS PARA
O ENSINO DE LÍNGUA MATERNA

REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino
Médio. Brasília: MEC/SEF, 2000.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares


Nacionais: terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental: língua estrangeira.
Brasília: MEC/SEF, 1998.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares


Nacionais: introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC/
SEF, 1997a.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares


Nacionais: língua portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1997b.

CARNEIRO, P. L. A hipótese inatista de aquisição da linguagem em


perspectiva: aspectos realçados e encobertos. 2010. Disponível em: https://
periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/dclv/article/view/4759/4669. Acesso em: 11 abr.
2021.

CHOMSKY, N. Novos horizontes no estudo da linguagem e da mente. São


Paulo: UNESP, 2005.

CHOMSKY, N. Teorias da linguagem, teorias da aprendizagem: o debate


entre Jean Piaget & Noam Chomsky. São Paulo: Cultrix, 1983.

FERREIRA, V. de S. et al. Didática. Porto Alegres: SAGAH, 2018.

OLIVEIRA, J. de S.; ROCHA, E.; ELANE, C. As fases do desenvolvimento


da linguagem escrita. 2008. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/
index.php/soletras/article/download/4884/3609. Acesso em: 24 abr. 2021.

PORFÍRIO, F. Racionalismo. s.d. Disponível em: https://mundoeducacao.uol.


com.br/filosofia/racionalismo.htm. Acesso em: 24 abr. 2021.

REGO, T. C. R. A indisciplina e o processo educativo: uma análise na perspectiva


vygostskyana. In: AQUINO, J. G. Indisciplina na escola. São Paulo: Summus,
1996.

REINACH, F. A ontogênese e o aprender. 2013. Disponível em: http://www.abc.


org.br/2013/04/12/a-ontogenese-e-o-aprender/. Acesso em: 24 abr. 2021.

79
Didática do Ensino de Línguas

RESENDE, T. M. A teoria da linguagem em Platão. Revista Eletrônica


Μετανόια, São João del-Rei, v. 1, n. 2, p. 37-44, 2000.

SILVA, J. P. M. da. Psicologia da aprendizagem. 1. ed. Santa Maria: UAB,


2017.

SKINNER, B. F. O comportamento verbal. São Paulo: Cultrix/EDUSP, 1978.

VITRAL, L. O que é gramática gerativa? 2015. Disponível em: http://www.


periodicos.letras.ufmg.br/index.php/anais_lingua_portuguesa/article/view/8045.
Acesso em: 24 abr. 2021.

80
C APÍTULO 3
MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

A partir da perspectiva do saber-fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

• Conhecer os métodos e as abordagens possíveis para o ensino de LE e a


avaliação do ensino de LE para além da teoria.
• Identificar os métodos e as abordagens para o ensino de LE e o reconhecimento
das possibilidades mais amplas de avaliação.
Didática do Ensino de Línguas

82
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Neste capítulo, você será convidado a refletir a respeito das duas temáticas
a seguir: os métodos e as abordagens para o ensino de LE, e as possibilidades
de avaliação no ensino de LE. Com a primeira seção, há o objetivo de conhecer
os métodos que foram se consolidando ao longo do tempo, e, de certa forma,
foram se modificando e demonstrando que a combinação entre eles sinalizava
uma abordagem produtiva para o trabalho docente.

Conheceremos as seguintes abordagens: Gramática e Tradução (AGT),


Método Direto, Método da Leitura e Método Audiolingual. Em seguida, abarcaremos
um período de transição e outros métodos considerados pouco convencionais,
como a sugestologia, de Lozanov; o Método de Curran (aprendizagem por
aconselhamento); o Método silencioso, de Gattegno; o Método de Asher (resposta
física total); a Abordagem Natural; e a Abordagem Comunicativa. Esse último
método será tratado com um pouco mais de atenção, pois tem sido muito eficiente
para os processos de ensino e de aprendizagem de LE, principalmente, quando
combinado com outros métodos.

Na seção seguinte, identificaremos diferentes formas de avaliação e os usos


eficientes para a gestão do processo educativo. Apropriar-se dessas informações
possibilita uma ação embasada no conhecimento teórico e na análise de
resultados para que melhores estratégias educacionais possam ser delineadas.

Boa leitura!

2 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA


O ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA
Ao longo desta seção, você estudará as metodologias do trabalho docente,
a partir do conhecimento de opções metodológicas que podem ser incorporadas
ao ambiente escolar. Ainda, neste momento de reflexão, você construirá
conhecimento acerca da relação entre metodologias e usos de diferentes recursos
para o ensino da Língua Estrangeira (LE). Lembre-se de que, nesse contexto,
busca-se o entendimento mais amplo das metodologias de ensino-aprendizagem
e das aproximações com o campo da Didática. Considere, portanto, que as
metodologias de ensino não devem ser entendidas como técnicas de ensino, mas
embasadas em pressupostos didáticos, políticos e pedagógicos, que devem ser
explicitados em toda proposta pedagógica.

83
Didática do Ensino de Línguas

Etimologicamente, a palavra metodologia tem origem grega, advém


de methodos, que significa meta (objetivo, finalidade), e hodos (caminho,
intermediação), ou seja, caminho para se atingir um objetivo. Por sua vez, logia
quer dizer conhecimento, estudo. Portanto, entende-se que metodologia significa
o estudo dos métodos, dos caminhos a percorrer, tendo em vista o alcance de
uma meta, objetivo ou finalidade (MANFREDI, 1993).

A concepção mais geral de metodologia do ensino, entendida


como um conjunto de princípios e/ou diretrizes acoplado a uma
estratégia técnico-operacional, serve como matriz geral, a partir da
qual diferentes professores e/ou formadores podem produzir e criar
ordenações diferenciadas, as quais chamaremos de métodos de
ensino. O método de ensino-aprendizagem (menos abrangente) é
a adaptação e a reelaboração da concepção de metodologia (mais
abrangente) em contextos e práticas educativas particulares e
específicas.

FONTE: Adaptado de Manfredi (1993)

A metodologia está relacionada com a prática docente e os desafios de


adaptação e de reelaboração das escolhas metodológicas, de acordo com as
práticas educativas particulares e específicas, as quais estabelecem uma reação
direta com o contexto. Por esse motivo, estuda-se a metodologia, também, no
contexto da Didática, uma vez que esta se dedica ao pensamento e à produção de
conhecimento de práticas pedagógicas, tendo, como objetivo central, os processos
de ensino e de aprendizagem. Conforme detalha Candau (2014), toda proposta
didática e, por consequência, toda metodologia de ensino utilizada, apresenta, de
forma implícita ou explícita, uma concepção de ensino-aprendizagem.

Para o campo da Didática, há uma centralização em temas, como processos


de ensino e de aprendizagem, objetivos políticos e pedagógicos de educação
no contexto escolar, currículo escolar, metodologias e métodos de ensino e de
aprendizagem, planejamento, uso e formas de aplicação de recursos e processos
de avaliação. Portanto, pode-se perceber que debates acerca da metodologia
de ensino estabelecem proximidade com o campo de estudos da Didática. Para
a Didática, além das definições técnicas de métodos, investigam-se diferentes
teorias e diversas abordagens pedagógicas (conforme visto nos capítulos

84
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

anteriores). É assim que as metodologias de ensino se desenham, pois estão


relacionadas com a abordagem didática selecionada pelo docente/pela escolha/
pelo planejamento curricular.

Conforme explica Candau (2014), nesse âmbito, tem-se o envolvimento de


três dimensões, humana, técnica e político-social, que são essenciais e estão
inter-relacionadas, as quais, ao se selecionar uma forma didática ou ao se praticar
determinada metodologia, são acionadas de forma singular.

A metodologia utilizada, portanto, aciona uma primeira dimensão relacionada


com os aspectos humano e individual. Ainda, subjetivo, relacionado, também,
com os processos de ensino e de aprendizagem. Queremos dizer que há o
acionamento de componentes afetivos e de aspectos particulares, os quais se
manifestam, de forma singular, em cada educando. Isso gera diferentes formas
de aprender, logo, diferentes formas de ensinar. Para uma ação coerente, faz-
se importante conhecer o público com o qual determinada metodologia (ou
determinadas metodologias) é utilizada, no sentido de ampliar os vínculos com os
sujeitos para a identificação de singularidades, dificuldades e potencialidades do
contexto, as quais são diferentes, conforme o público e o contexto.

A segunda dimensão citada, a técnica, considera aquelas ações que podem


ser consideradas intencionais e planejadas, portanto, envolvem o conhecimento
técnico da área, de forma a selecionar estratégias e recursos específicos para
a promoção da aprendizagem. Isso é possível de forma mais efetiva, a partir do
conhecimento da dimensão humana, ou seja, dos conhecimentos prévios obtidos
dos sujeitos envolvidos nos processos de ensino e de aprendizagem. Da mesma
forma, essas estratégias podem ser desenhadas a partir do conhecimento dos
objetivos educativos envolvidos no processo (terceira dimensão: político-social).
Nessa etapa, situam-se, mais diretamente, as metodologias de ensino, pois se
busca encontrar os mais adequados caminhos, recursos e formas de ensino.

Para se distanciar do tecnicismo, é preciso não decidir apenas de


forma técnica (segunda dimensão). Lembre-se de considerar a inter-
relação das dimensões na seleção de metodologias e de técnicas,
afastando-se do entendimento de método como algo instrumental.

85
Didática do Ensino de Línguas

A terceira dimensão a ser considerada na inter-relação com as outras duas


está relacionada com os elementos político-sociais dos processos de ensino e de
aprendizagem. Considera que os processos de ensinar e de aprender também
estão situados em contextos políticos, sociais e culturais singulares, e isso
deve estar presente em toda prática pedagógica. Portanto, não há neutralidade,
e toda prática pedagógica, na qual se situam didáticas e metodologias de
ensino, apresenta intencionalidades, objetivos e formação cidadã dos sujeitos
envolvidos no processo. Considerar metodologias significa clareza de objetivos
e conhecimento explícito do que se deseja construir com os educandos, para a
formação ampla da cidadania e para uma atuação em diferentes contextos.

Toda a reflexão possibilita inferir que não é cabível apenas uma metodologia
de ensino como capaz de ser eficaz para todos os sujeitos. Existe a complexidade
na inter-relação das dimensões, portanto, a seleção de diferentes metodologias
(combinação delas) pode ser mais eficaz para o sucesso dos processos de ensino
e de aprendizagem. Para a prática docente e para a seleção de metodologias,
estratégias e atividades adequadas, é preciso que diferentes perguntas sejam
respondidas (LIBÂNEO, 2012):

• Quem são os sujeitos envolvidos nos processos de ensino e de


aprendizagem?
• Em que contextos estão inseridos?
• Quais são os objetivos de formação?
• Que habilidades e conhecimentos pretendem ser desenvolvidos com o
grupo (aonde queremos chegar)?
• Quais são os recursos disponíveis?

FIGURA 1 – PERGUNTAS PARA REFLETIR

FONTE: <https://br.freepik.com/vetores-gratis/um-monte-de-gente-
fazendo-perguntas_13404902.htm>. Acesso em: 11 abr. 2021.

86
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

Ao responder, previamente, essas perguntas, tem-se um roteiro de


pensamento para a organização da prática. Assim, podem, professores, gestores
e pedagogos, selecionar combinações de metodologias para o ensino de LE, por
exemplo, que sejam mais eficazes quando combinadas, e não apenas aplicadas
de forma única, individual e uniforme. Esse processo de reflexão prévia amplia a
organização do trabalho docente.

Para Libâneo (2012), a metodologia de ensino é um espaço de estudo de


métodos, conhecimentos teórico-metodológicos que estão relacionados com
concepções pedagógicas e teorias de aprendizagem, que podem ser entendidas,
de forma geral, considerando métodos tradicionais, métodos ativos, método de
resolução de problemas etc., ou de forma específica, com procedimentos de
ensino e de estudo de disciplinas do currículo, como alfabetização, história, língua
estrangeira etc., ou setores da educação escolar ou extraescolar, o que inclui a
educação de adultos, a educação sindical etc. Portanto, a metodologia de ensino
pode fazer referência, de forma mais ampla, ao momento que trata da forma que
educadores estabelecem a relação entre alunos e objetos do conhecimento,
ou, de maneira mais específica, das formas mais particulares de condução dos
processos de ensinar e de aprender, de acordo com segmentos ou áreas.

De forma mais ampla ou mais limitada, fica evidente que as metodologias


de ensino apresentam, de certa forma, a orientação filosófica fundada em
concepções de homem, de mundo, de sociedade, de história, de existência, de
educação e outros aspectos. Isso reforça que elas estão inseridas em contextos,
na relação que se estabelece com determinadas culturas, em concepções da
Pedagogia, em escolas e na sociedade. A prática pedagógica apresenta múltiplos
dilemas, portanto, uma única metodologia não é suficiente para resultados
positivos nos processos de ensino e de aprendizagem. Assim, faz-se importante,
nessa etapa, mapear as tendências pedagógico-didáticas presentes para
entender as abordagens metodológicas que podem permeá-las, ou seja, quais
são as abordagens? Quais são as características? Quem são os autores?

87
Didática do Ensino de Línguas

QUADRO 1 – ABORDAGENS METODOLÓGICAS - PEDAGOGIA TRADICIONAL


Pedagogia tradicional • Johann Friedrich Herbart (1776-1841).
• Didática como disciplina normativa.
• Métodos de ensino centrados no professor.
• Professor responsável pela transmissão do
conhecimento.
• Alunos com tarefas de recebimento e de as-
similação de conteúdos.
• Disciplinas escolares com maior grau de rele-
vância.
• Alunos com postura mais receptiva.
• Métodos mais utilizados = aulas expositivas,
apresentação oral dos conteúdos referentes
às disciplinas.

FONTE: A autora

Convidamos você a desenvolver a leitura do artigo Herbart e


o Neo-humanismo: Contribuições e Perspectivas para a Educação
Contemporânea, publicado por Ana Beatriz Machado de Freitas. A
autora faz uma reflexão acerca das contribuições de Johann Herbart
para a história da educação e discute a relevância de elementos da
sua filosofia, que se apresentam, ainda, significativos na educação
contemporânea.

Boa leitura!

[...] Como os contemporâneos e predecessores, e como


ocorre nos idiomas latim e alemão, Herbart distinguia educação de
instrução: “A educação se preocupa em formar o caráter e aprimorar
o ser humano. A instrução veicula uma representação do mundo,
transmite conhecimentos novos, aperfeiçoa aptidões preexistentes
e faz despontar capacidades úteis” (HILGENHEGER, 2003, p.
2). Ele defendia, contudo, a congruência entre ambas: a instrução
educativa deveria estar a serviço da formação do caráter. Para tal,
faria-se necessário o fortalecimento da vontade, entendida como
força intelectual, atenção e disciplina voltada a interesses múltiplos.
Assim, o professor “deve preparar o menino não só para desejar tais
objetivos, mas para ter a capacidade de atingi-los” (EBY, 1962, p.
411).

88
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

O desenvolvimento da multiplicidade de interesses não adviria,


como na concepção naturalista, de um desabrochar espontâneo
da natureza do aprendiz, mas da atuação psicológica do mestre na
vontade, na persistência e no discernimento. Nessa perspectiva,
Herbart procurou compreender, mediante conhecimentos da
Psicologia da época, os processos mentais relacionados à aquisição
de conhecimento [...].

Nessa lógica, o professor lidaria com as ideias, com as


representações mentais, e teria, como tarefa, trazê-las à consciência,
na instrução educativa, para sistematizá-las e “elevá-las”, ou seja,
proporcionar a passagem do senso comum ao conhecimento
científico.

A contribuição mais conhecida foi o estabelecimento de uma


estrutura metodológica da instrução por meio de cinco passos
consecutivos: preparação, apresentação, associação, generalização
(ou sistema) e aplicação (ou método).

FONTE: Freitas (2013, p. 67)

QUADRO 2 – ABORDAGENS METODOLÓGICAS - CONTINUAÇÃO


Pedagogia renovada • Dewey (1859-1952) é o principal representante,
ou escolanovista dentre muitos outros autores.
• Teorias de aprendizagem de Piaget (1896-
1980) e Vygotsky (1896-1934) são importantes
referências.
• Há a Escola Nova – Anísio Teixeira.
• O aluno é o sujeito da aprendizagem, logo, ati-
vo no processo.
• O aluno aprende melhor quando constrói, de
forma conjunta, o conhecimento.
• Surge o conhecimento por descobertas pos-
síveis na interação com o objeto de conheci-
mento e com o meio.
• Professor é o mediador; professor como orien-
tador das experiências de aprendizagem.
• Existem metodologias ativas.
• Apresentam-se métodos e estratégias = pesqui-
sa, projetos, experimentos, trabalho em grupos,
estudos dirigidos etc.

89
Didática do Ensino de Línguas

Pedagogia libertadora • Há menos destaque para as disciplinas esco-


lares.
• Ocorre a redução da preocupação com a estru-
turação de metodologias.
• Indica-se uma distância mais acentuada de
materiais didáticos prescritivos.
• Observa-se a ênfase em temas sociais e reali-
dades locais.
• Surgem práticas pedagógicas que analisam
esses temas para a compreensão e a transfor-
mação.
Pedagogia tecnicista • Tem registro, no Brasil, de 1950 a 1980.
• É marcada por orientações políticas e ideológi-
cas.
• Há regime militar vigente.
• Apresenta a teoria behaviorista (comportamen-
talista).
• Surge a Didática instrumental/tecnicista.
• Ocorre acentuados controle e disciplina do pro-
cesso.
• Marcam presença métodos e técnicas = aval-
iação e testes.
Pedagogia históri- • Colabora para a superação das desigualdades.
co-crítica ou Pedago-
• O ensino e a aprendizagem escolar são impor-
gia crítico social dos tantes para a participação em lutas sociais.
conteúdos • Há grande interesse na Didática e na metodolo-
gia.
• Em certo ponto, surge uma dose ideal entre
Pedagogia tradicional e escolanovista – diálogo
e contribuição entre/de ambas.
• O aluno é o protagonista.
• O professor tem papel fundamental no proces-
so de construção do conhecimento.
• Marcam presença métodos e estratégias =
pesquisa, atividades multidisciplinares e multi-
culturais, projetos etc.
FONTE: A autora

Consideradas como mais progressistas, a Pedagogia Libertadora e


a Pedagogia Crítico-Social ganharam força, no Brasil, na década de 80. A
preocupação com a redução das diferenças sociais foi imperativo de ambas.
Nessa perspectiva, a educação precisava contribuir para a transformação social.
A educação popular ganhou mais força naquele momento. Paulo Freire é a mais
importante referência dessas abordagens pedagógicas e das metodologias de
ensino.

90
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

Paulo Freire nasceu em Recife, no dia 19 de setembro de


1921. Ao longo da trajetória, tornou-se um dos mais importantes
pensadores do século XX. Devido à prática político-pedagógica
libertadora, considerada subversiva, no período da ditadura (1964-
1985), viveu exilado por 16 anos (1964-1980).

Sempre defendeu que o objetivo da escola é ensinar o aluno a


“ler o mundo para poder transformá-lo”. Para ele, os educadores (as)
devem levar os alunos a conhecerem os conteúdos, mas não como
verdade absoluta. Dizia que ninguém ensina nada a ninguém, mas
as pessoas também não aprendem sozinhas.

“Os homens se educam entre si mediados pelo mundo”,


ressaltava. Isso implica em um dos seus princípios fundamentais: o
de que o aluno, alfabetizado ou não, chega, na escola, levando uma
cultura que não é melhor nem pior do que a do professor, ou seja, em
sala de aula, os dois lados aprendem juntos, um com o outro, e, para
isso, é necessário que as relações sejam afetivas e democráticas,
garantindo, a todos, a possibilidade de se expressarem.

Para ampliar os seus conhecimentos a respeito de Paulo Freire,


indicamos algumas obras do autor:

1. A Importância do Ato de Ler.


2. A Propósito de uma Administração.
3. Ação Cultural para a Liberdade.
4. Cartas a Guiné-Bissau.
5. Educação como Prática da Liberdade.
6. Educadores de Rua, uma Abordagem Crítica – Alternativas de Atendimento
aos Meninos de Rua.
7. Extensão ou Comunicação.
8. Medo e Ousadia.
9. Pedagogia da Autonomia.
10. Pedagogia da Esperança.
11. Pedagogia da Indignação.
12. Pedagogia: Diálogo e Conflito.
13. Pedagogia do Oprimido.

91
Didática do Ensino de Línguas

14. Política e Educação.


15. Por uma Pedagogia da Pergunta.
16. Professora Sim, Tia Não.
17. Carta de Paulo Freire aos Professores.

Leia mais a respeito dele em https://guiadoestudante.abril.


com.br/estudo/quem-foi-paulo-freire-e-por-que-ele-e-tao-amado-e-
odiado/.

Portanto, nesta etapa da reflexão, percebe-se que, de acordo


com a teoria pedagógica de aprendizagem mais evidente no
contexto, configuram-se desenhos metodológicos específicos
(escolhas metodológicas específicas), os quais são desdobrados em usos de
métodos e de técnicas específicos.

Para o processo do ensino de línguas, a escolha de abordagens, de métodos


e de técnicas é fundamental para o sucesso dos processos de ensino e de
aprendizagem. Lembre-se de que a abordagem estabelece uma ligação com
teorias da linguagem e processos de ensino e de aprendizagem de uma língua. O
método, por sua vez, está relacionado com o conjunto de procedimentos que são
utilizados/selecionados para a apresentação da linguagem.

Observamos, anteriormente, as escolhas pedagógicas, pois o método


é direcionado, de acordo com as escolhas pedagógicas, as didáticas e de
abordagem. A técnica, então, envolve os recursos e as atividades pedagógicas,
de acordo com o método escolhido. Perceba que, para o efetivo processo de
aprendizagem, esses elementos devem estar alinhados: abordagem, método
e técnica. Pense nisso! Por exemplo, em uma abordagem baseada em uma
pedagogia libertadora, propor perguntas e respostas em avaliações, com base
em certo e em errado, de forma descontextualizada (mais presente na abordagem
tecnicista), pode gerar um resultado não tão positivo; atividades de leitura de
textos diversos, de culturas e de vozes podem ser mais produtivas, alinhando,
coerentemente, a abordagem, o método e a técnica.

Quais são os métodos existentes para o ensino de LE?

92
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

O problema da terminologia, de acordo com Leffa (2016):

Para descrever os diferentes métodos pelos quais se pode


aprender uma língua estrangeira, precisa-se de uma terminologia
adequada. Devido à grande abrangência com que se usava o termo
“método” no passado, desde a fundamentação teórica, que sustenta
o próprio método, até a elaboração de normas para a criação de
um determinado curso, foi preciso subdividi-lo em abordagem
(“approach”, em inglês) e método, propriamente dito.

Abordagem é o termo mais abrangente e engloba os


pressupostos teóricos acerca da língua e da aprendizagem. As
abordagens variam na medida em que variam esses pressupostos. O
pressuposto, por exemplo, de que a língua é uma resposta automática
a um estímulo, e de que a aprendizagem se dá pela automatização
dessa resposta, gera uma determinada abordagem para o ensino
de línguas, diferente da abordagem gerada pela crença de que a
língua é uma atividade cognitiva e de que a aprendizagem se dá pela
internalização das regras que geram essa atividade.

O método tem uma abrangência mais restrita, por poder estar


contido dentro de uma abordagem. Não trata dos pressupostos
teóricos da aprendizagem de línguas, mas de normas de aplicação
dos pressupostos. O método, por exemplo, pode envolver regras
para seleção, ordenação e apresentação dos itens linguísticos, além
de normas de avaliação para a elaboração de um determinado curso.

FONTE: Leffa (2016, p. 21-22)

São eles:

• A Abordagem da Gramática e da Tradução (AGT).


• A Abordagem Direta (tradicionalmente, "Método Direto").
• Abordagem para a Leitura (tradicionalmente, "Método da Leitura").
• Abordagem Audiolingual.

As abordagens anteriores são consideradas as mais recorrentes. Após o


surgimento e o desenvolvimento delas, surgiram outros métodos:

93
Didática do Ensino de Línguas

• Sugestologia de Lozanov.
• Método de Curran - Aprendizagem por Aconselhamento.
• Método Silencioso de Gattegno.
• Método de Asher - Resposta Física Total.
• Abordagem Natural.
• Abordagem Comunicativa.

FIGURA 2 – MÉTODOS PARA ENSINO DE LE

FONTE: <https://br.freepik.com/vetores-gratis/pessoas-usando-aplicativo-de-traducao-
online_9650656.htm#page=1&query=translate&position=0>. Acesso em: 11 abr. 2021.

A Abordagem da Gramática e da Tradução (AGT), segundo Leffa (2016),


representa a metodologia de ensino de LE com mais tempo de uso, ao mesmo
tempo em que é o método que mais tem recebido críticas. O surgimento está
relacionado com os interesses pelas culturas grega e latina, desde a época do
Renascimento. A AGT “consiste no ensino da segunda língua pela primeira”
(LEFFA, 2016, p. 23), ou seja, toda informação necessária para a construção das
frases, para o entendimento de um texto, acontece pela língua materna do aluno.
Três passos são essenciais: (a) memorização prévia de uma lista de palavras;
(b) conhecimento das regras necessárias para juntar essas palavras em frases;
e (c) exercícios de tradução e versão (tema). Isso significa que a abordagem é
dedutiva, e se parte, sempre, da regra para o exemplo.

Perceba que a ênfase está na forma escrita da LE. Pronúncia e entonação


não são enfatizadas nesse método. Leituras de textos clássicos e canonizados
são ponto central. Na sala de aula, tem-se a presença do livro-texto, no qual o
domínio da terminologia lexical é o que mais se exige de professores e de alunos.
Conhecer as regras do idioma é a centralidade desse método.

94
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

Conforme explica Leffa (2016, p. 24), “o objetivo final da AGT é – ou era – levar
o aluno a apreciar a cultura e a literatura da L2. Na consecução desse objetivo,
acreditava-se que ele acabava adquirindo um conhecimento mais profundo dp
próprio idioma, desenvolvendo inteligência e capacidade de raciocínio”. L2 é a
forma como o autor faz referência à LE (segunda língua).

1 - Considerando a AGT e os pressupostos dela, indique uma


atividade didática que esteja contemplada nesse método.

O Método Direto, ou Abordagem Direta, entende que a aprendizagem da LE


acontece pela própria LE. Portanto, a língua materna não deve estar presente em
sala de aula. Conforme explica Leffa (2016), está centrada na língua estrangeira,
dessa forma, a língua materna deve ser evitada nos contextos de sala de aula e
de seleção/elaboração/desenvolvimento de materiais didáticos a serem utilizados.
A tradução deve ser esquecida e as explicações precisam recorrer a sinônimos,
gestos e imagens (gravuras, desenhos etc.). O objetivo é motivar o aluno a
“pensar na língua” (LEFFA, 2016, p. 24), evitando acionar a língua materna para o
entendimento da estrangeira. Nessa abordagem, a ênfase, então, está na língua
oral, mas a escrita é utilizada, porém, com menos ênfase (quando comparamos
AD com AGT). Quais materiais didáticos são mais adequados? Diálogos
situacionais (simulação de situações do cotidiano) são os mais utilizados, com
trechos curtos de leitura, os quais servem como base para atividades de oralidade
e de compreensão escrita.

De acordo com Leffa (2016, p. 25), “a integração das quatro habilidades


(na sequência, ouvir, falar, ler e escrever) é usada, pela primeira vez, no ensino
de línguas”. Nessa metodologia, o professor considera, na seleção/adaptação/
elaboração de materiais didáticos, a exposição do aluno aos fatos da língua, para,
depois, trabalhar com a sistematização dela. Exercícios de oralidade devem ser
construídos com essa intenção. Simulação de diálogos, que tratam de assuntos
variados e relacionados com a vida diária, tem o intuito de “tornar viva a língua
usada na sala de aula” (LEFFA, 2016, p. 26).

A gramática e os aspectos culturais da LE são ensinados de forma indutiva.


Exposto aos fatos da língua, o aluno, mais tarde, chega à sistematização.

95
Didática do Ensino de Línguas

Exercícios orais precedem os escritos. O ditado não deve mais ser utilizado e a
técnica da repetição se faz presente para o aprendizado automático da língua.

A Metodologia da Leitura, ou “Método da Leitura”, é outra opção. Nessa


abordagem, a partir da análise de campo, passa a se considerar que o
desenvolvimento da língua oral (AD) não é o objetivo principal do ensino de línguas
nas escolas. Portanto, deve-se centrar o trabalho na cultura e na literatura. O
conhecimento prático se mantém como foco, ou seja, o ideal é uma combinação
entre a abordagem da tradução com a Abordagem Direta. Conforme detalha Leffa
(2016, p. 27):

Para isso, propõe-se uma combinação da Abordagem da


Tradução com a Abordagem Direta; da primeira, adotava-se
a ênfase na língua escrita com a reformulação das regras de
gramática, fixando-se, no essencial, para a compreensão; da
AD, adotava-se o princípio de que o aluno deveria ser exposto,
diretamente, à língua.

Desenvolver o vocabulário é essencial, então, o trabalho com a leitura


também é. Materiais didáticos que focam no desenvolvimento da leitura e na
ampliação do vocabulário fazem parte dessa abordagem. Exercícios escritos,
com questões relacionadas com texto, são importantes para a AL (Abordagem da
Leitura). A gramática é necessária para o entendimento e a produção textual, mas
não é o foco. A aprendizagem dela acontece com a leitura. Busca-se, com esse
método, a criação de espaços de leitura dentro e fora da sala de aula.

A gramática fica restrita à necessidade de compreensão da leitura.


Enfatizam-se aspectos morfofonológicos e construções sintáticas mais comuns.
Transformação de frases é o exercício mais comum para a aprendizagem da
gramática de LE.

A Abordagem Audiolingual (AAL) tem surgimento no período da Segunda


Guerra Mundial, pois o exército americano precisou contar o apoio de falantes
fluentes de várias línguas estrangeiras. A solução para capacitar essas pessoas,
e de forma rápida, foi encontrada nesse método: as turmas eram reduzidas,
linguistas e informantes nativos foram contratados e os momentos de formação
aconteciam com até nove horas por dia, durante um período que variava entre
seis e nove meses. O método alcançou significativo sucesso, e foi adotado pelas
universidades e escolas secundárias. Com a participação de linguistas nesses
projetos, o ensino de LE adquiriu, então, status de ciência. Com o tempo, o
método foi sendo refinado e ficou conhecido como Abordagem Audiolingual.

As premissas que sustentam o método são as seguintes: “a língua é fala


e não escrita; a língua é um conjunto de hábitos; ensine a língua não sobre

96
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

a língua; a língua é o que os falantes nativos dizem, não o que alguém acha
que eles deveriam dizer; e as línguas são diferentes” (LEFFA, 2016, p. 30-33).
Assim, tem-se reestabelecida a ênfase na língua oral. Portanto, ensinar leitura
não representava, para esse método, ensinar a LE, pois a escrita era como uma
“fotografia mal feita da fala” (LEFFA, 2016, p. 30). Essa corrente de pensamento
gerou implicações pedagógicas: o aluno, primeiramente, deve ouvir e falar, para,
depois, ler e escrever, o que acontece com a língua materna (aprendemos a
escrever muito tempo depois de já sabermos falar).

Para a AAL, o aluno deve ser exposto à língua escrita apenas depois que os
padrões da língua oral já se apresentam automatizados. Para essa abordagem,
a apresentação precoce à escrita prejudica, em certo grau, a pronúncia. Então,
o diálogo deve estar mais presente no espaço de formação. O laboratório de
línguas, com a apresentação de gravações de falantes nativos da LE, possibilita
o desenvolvimento da pronúncia ideal, por este motivo, audiovisual. Experimentar
situações de diálogo, ouvindo ou vendo, está no centro desse método.

Para conferir suporte teórico, em termos de aprendizagem, para o método,


visita-se o behaviorismo de Skinner (língua é um conjunto de hábitos), uma
vez que, para essa teoria, a língua é entendida como um hábito condicionado
adquirido por meio de um processo mecânico de estímulo-resposta. Respostas
certas, emitidas pelos alunos, devem ser imediatamente reforçadas pelo
professor. A aprendizagem é gradual para minimizar os erros. Pela repetição, as
estruturas básicas da língua devem ser praticadas até serem automatizadas.

1 - Até este momento, você conheceu o Método Audiolingual, o


Método de Leitura, o Método Direto e o Método da Gramática
e da Tradução. Pare um pouco e pense, criticamente, neles.
Considere as suas experiências com o ensino e a aprendizagem
de LE. Quais foram as suas vivências no papel de estudante de
línguas? Você consegue reconhecer a presença desses métodos
no seu processo de formação? Quais métodos você reconhece
que foram mais significativos para a aprendizagem da língua?

97
Didática do Ensino de Línguas

A premissa que tratava do ensino da língua, e não sobre a língua, reforçava


o aprendizado pela prática, e não por meio de explicações de regras. A gramática
era ensinada de forma indutiva. Inclusive, a premissa de que a língua era o que
os falantes nativos diziam, não o que alguém achava que eles precisavam dizer,
reforçava que a gramática normativa, muitas vezes, apontou, como errado, algo
que, sistematicamente, era utilizado pelos falantes da LE. Dessa forma, no lugar
de erro, utilizavam-se, mais enfaticamente, as noções de aceitável e de não
aceitável. “Se os falantes cultos do inglês, por exemplo, usavam, em situações
informais, a expressão it’s me, em vez do prescrito it’s I, o professor deveria
ensinar, nos diálogos, a forma it’s me” (LEFFA, 2016, p. 31).

Esse método, mesmo recebendo algumas críticas, dominou o ensino de


línguas até o início da década de 1970. Conforme destaca Leffa (2016, p. 31),
“Bloomfield, no campo da linguística, Skinner, no da Psicologia, Nida, Fries e
Lado, no da Metodologia, são alguns dos grandes nomes do movimento”.

A crítica se manteve, e o método também, mas algumas alternativas


emergiram no contexto de ensino da LE, consideradas pouco convencionais:
Sugestologia de Lozanov; Método de Curran, Aprendizagem por Aconselhamento;
Método Silencioso de Gattegno; Método de Asher, Resposta Física Total;
Abordagem Natural; e Abordagem Comunicativa. A seguir, conheceremos um
pouco mais a respeito desses métodos.

QUADRO 3 – MÉTODOS DE ENSINO DE LE


Sugestologia • Surgem fatores psicológicos da aprendizagem.
de Lozanov • Fatores psicológicos da aprendizagem devem ser fa-
vorecidos até pelo ambiente físico.
• A sala deve ser confortável para proporcionar o ambiente
mais agradável possível.
• Para reduzir a ansiedade e a inibição, os alunos podem
receber pseudônimos e adquirir uma nova personali-
dade.
• O desenvolvimento maciço do vocabulário é o aspecto
linguístico mais enfatizado.
• As quatro habilidades são ensinadas ao mesmo tempo,
principalmente, através de longos diálogos, lidos pelo
professor, com constantes variações de entonação.

98
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

Método de • É um método de aprendizagem centrado no aluno.


Curran • Há o uso de técnicas de terapia de grupo para o ensino
de línguas.
• Os alunos são colocados em círculos, confrontando-se,
enquanto o professor circula pelo lado de fora. Quando
alguém deseja dizer alguma coisa, o professor se aprox-
ima e traduz em voz baixa, na língua estrangeira, a frase
do aluno.
• O aluno, usando um gravador, repete, em voz alta, a
frase traduzida pelo professor.
• No fim da sessão, a gravação com todas as frases dos
alunos é reproduzida e transcrita para comentários e
observações, incluindo reações pessoais dos alunos ao
processo de aprendizagem da língua. Com o tempo, os
alunos começam a criar frases, diretamente, na segunda
língua, e podem assumir o papel do professor do lado de
fora do círculo.
Método Si- • O ensino da língua é feito por meio de pequenos bastões
lencioso de coloridos, que o professor usa para criar as mais difer-
entes situações de aprendizagem, com gráficos, tam-
Gattegno bém, coloridos, para o ensino da pronúncia. A segunda
língua é adquirida à medida que o aluno vai manipulando
os bastões e consultando o gráfico.
• O professor permanece calado a maior parte do tempo.
Método de • O ensino da segunda língua é feito através de coman-
Asher dos emitidos pelo professor e executados pelo aluno.
No começo, esses comandos são simples (exemplo:
“levante-se”, “sente-se”), mas se tornam mais complexos
à medida que se avança no curso (ex.: “Carlos, vá ao
quadro e desenhe uma cadeira com o giz amarelo, uma
mesa com o giz branco e um armário com o giz vermel-
ho”).
• A premissa fundamental do método é a de que se apren-
de melhor uma língua depois de ouvi-la e de entendê-la.
• A prática oral, por parte do aluno, só começa mais tarde,
quando ele estiver interessado em falar.
Abordagem • Busca aplicar, na sala de aula, a teoria de Stephen
Natural Krashen, conhecida como Modelo do Monitor, ou Modelo
do Input.
• Desenvolve a aquisição da língua (uso inconsciente das
regras gramaticais) em vez da aprendizagem (uso con-
sciente).
• Há uma premissa básica: o aluno deve receber um input
linguístico, quase totalmente, compreensível, de modo a
ampliar a compreensão da língua.
• A fala deve surgir naturalmente, sem pressão do profes-
sor.

99
Didática do Ensino de Línguas

Abordagem • É muito recorrente na Europa.


Comunicativa • Linguistas mantinham a tradição dos estudos semânticos
e sociolinguísticos.
• Ocorria a ênfase nos estudos do discurso.
• Não havia apenas a análise do texto – oral ou escrito –,
mas, também, as circunstâncias a partir das quais o tex-
to era produzido e interpretado.
• A língua era analisada como um conjunto de eventos
comunicativos.
• Essa nova visão da língua, aliada a um grande interesse
pelo ensino, que não existia na escola gerativotransfor-
macional, veio preencher o enorme vazio deixado pelo
declínio do audiolinguismo.
• Nascia, dessa nova união, com grande impacto para o
ensino de línguas, a Abordagem Comunicativa (AC).

FONTE: Adaptado de Leffa (2016)

Cabe reforçar que a Abordagem Comunicativa (AC) retoma o fato de que um


grande número de expoentes linguísticos pode desempenhar a mesma função,
ou seja, as palavras não têm significado imediato (registro no dicionário), mas
adquirem valores específicos relativos ao contexto em que são usadas. Pense,
por exemplo, no ensino de Língua Portuguesa como LE. Agora, pense em uma
palavra que está registrada nos dicionários, mas que o uso dela é variável e
depende do contexto (regionalismo). O significado imediato é o do dicionário, mas,
essa mesma palavra, de acordo com o contexto, pode adquirir valor específico.
Por isso, essa abordagem mantém enfoque comunicativo: não apenas a análise
do texto – oral ou escrito –, mas, também, as circunstâncias a partir das quais o
texto é produzido e interpretado. A língua passa a ser analisada como um conjunto
de eventos comunicativos. Conforme detalha Leffa (2016, p. 1):

O uso de linguagem apropriada, adequada à situação em


que ocorre o ato da fala e ao papel desempenhado pelos
participantes, é uma grande preocupação na Abordagem
Comunicativa. Os diálogos artificiais, elaborados para
apresentarem pontos gramaticais, são rejeitados. A ênfase
da aprendizagem não está na forma linguística, mas na
comunicação. As formas linguísticas são ensinadas apenas
quando necessárias, para desenvolver a competência
comunicativa, e podem ter mais ou menos importância do que
outros aspectos do evento comunicativo. O desenvolvimento
de uma competência estratégica – saber como usar a língua
para se comunicar – pode ser tão ou mais importante do que a
competência gramatical.

Para a seleção e a elaboração de materiais didáticos, essa abordagem


destaca o uso de diálogos autênticos, com personagens em situações reais de
uso da língua. Os textos escritos devem ser amplos, envolvendo livros, artigos
de revista, jornais (notícias, manchetes, fotos com legendas, propagandas,

100
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

anúncios de classificados etc.), cartas, formulários, contas, catálogos, rótulos,


cardápios, cartazes, instruções, mapas, programas, bilhetes, contratos, cartões,
listas telefônicas etc., todo tipo de texto ao qual o falante nativo está exposto
diariamente. A aprendizagem é centrada no aluno, e o professor retoma o papel
de orientador.

Para ampliar os seus conhecimentos a respeito da educação,


da tecnologia e do conhecimento, indicamos a leitura do seguinte
livro: ALMEIDA, M. E. B. de. Educação, projetos, tecnologia e
conhecimento. São Paulo: PROEM, 2002

Por fim, considere a pluralidade de métodos, as especificidades de cada


um e o impacto na produção e na seleção de materiais didáticos para ensino da
LE, mas pense, sempre, na importância da análise do contexto e dos sujeitos
envolvidos, pois um método pode funcionar muito bem em determinado espaço,
mas não ser tão efetivo em outro. Essa análise é um desafio do docente, tendo,
como objetivo, o alcance dos objetivos no processo de ensino da LE.

1 - Agora que você refletiu a respeito dos diferentes métodos


de ensino de LE, há um desafio. A seguir, apresentaremos uma
proposta de atividade que corresponderá aos pressupostos de
um determinado método. Observe:

Montagem mostrando o uso da ilustração para a transmissão do


significado e alguns exercícios característicos da abordagem. Note o
uso exclusivo da L2 (LEFFA, 2016).

101
Didática do Ensino de Línguas

LA CHAMBRE

Le garçon est dans la chambre. – Voilà la porte. Voilà la fenêtre.


Voilà la porte et la fenêtre. – Voilà le plafond, le mur et le plancher. –
Voici la table, la lampe et la chaise. – Voici l’encrier, le papier buvard
et le plumier. – L’encrier est ici, la fenêtre est là, la maison est là-bas.
– Le cahier est dans le sac de classe.

Que método de ensino de LE faz uso desse tipo de estruturação


de atividade?

102
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

3 AVALIAÇÃO NO ENSINO DE LE
FIGURA 3 – AVALIAÇÃO E ENSINO DE LE

FONTE: <https://br.freepik.com/vetores-gratis/ilustracao-do-conceito-de-exames_9233873.
htm#page=1&query=avalia%C3%A7%C3%A3o&position=1>. Acesso em: 11 abr. 2021.

Com o objetivo de tratar da especificidade da avaliação no ensino de


LE, esta seção final se propõe a refletir a respeito dos diferentes tipos de
avaliação, identificando a função da avaliação para os processos de ensino e de
aprendizagem, de forma a relacionar concepção didática e escolha do processo
avaliativo.

Até o momento, percebe-se que as escolhas feitas pela escola e pelos


docentes, do método a ser utilizado (ou dos métodos a serem utilizados), devem
gerar resultados diversos. O mesmo ocorre com o modo de avaliação, pois este
influencia nas concepções e nos resultados da educação. Para poder selecionar
as formas de avaliação mais adequadas ao contexto, o primeiro passo é conhecer
as possibilidades existentes. Assim, quais são os tipos de avaliação existentes?

A avaliação é uma ação ampla que abrange o cotidiano do fazer pedagógico,


e cuja energia faz pulsar o planejamento, a proposta pedagógica e a relação
entre todos os elementos da ação educativa. Em outras interpretações, pode
estar relacionada à realização de provas e de exames que geram notas/
menções avaliativas que são necessárias para o avanço do aluno nas etapas
da escolarização. Essa última interpretação está diretamente relacionada com a
bagagem histórica do ensino tradicional.

No modelo considerado tradicional, os alunos são avaliados com rigidez


e muita inflexibilidade. Imperam-se modelos nos quais o quantitativo é mais
valorizado do que os resultados qualitativos. Com o foco no resultado, o processo
não é valorizado, e os momentos significativos do processo de aprendizagem
ficam sem receber a devida atenção.
103
Didática do Ensino de Línguas

Com relação aos estudos acerca da avaliação, o nome do estudioso


estadunidense Ralph Tyler é muito referenciado. O pesquisador considera, nos
estudos dele, a avaliação como ação avaliativa a partir da qual se tem um meio
de comparar resultados e desempenhos em relação a objetivos que devem ser
alcançados.

Ralph Winfred Tyler e suas contribuições para o campo da


avaliação

O educador americano Ralph Winfred Tyler (1902-1994) foi um


pensador de grande importância para a educação, principalmente, no
que concerne à avaliação e ao desenvolvimento do currículo. Antes
de Tyler, a avaliação era vista apenas como uma questão técnica,
para a medição dos resultados das aprendizagens que serviam,
sempre, para a comparação com outros grupos de alunos. Era muito
forte a influência da psicometria e da docimologia, que focavam nas
medições e nos testes.

Com Tyler, a avaliação começa a contemplar uma descrição


de até que ponto os alunos atingem os objetivos definidos. A
quantificação passou a ser um dos meios a serviço da avaliação em
vez de um fim em si mesmo.

Na introdução da obra Princípios Básicos do Currículo e Ensino


(1949), Tyler identifica quatro questões fundamentais que devem ser
respondidas quando se deve desenvolver quaisquer currículos ou
planos educacionais, quais sejam:

1. Que objetivos educacionais deve, a escola, procurar atingir?


2. Que experiências educacionais podem ser oferecidas, que tenham
probabilidade de alcançar os propósitos?
3. Como organizar, eficientemente, essas experiências educacionais?
4. Como podemos ter certeza de que esses objetivos estão sendo
alcançados? (TYLER, 1976)

Para ampliar os seus conhecimentos, acesse e confira o artigo na


íntegra: http://www.repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/39704/1/2013_
eve_rslsaraiva.pdf.

104
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

Como parte determinante dos processos de ensino e de aprendizagem, a


avaliação deve envolver a ação de observar a complexidade de fatores que estão
envolvidos nesses processos; inclusive, o da prática docente. Todo processo
avaliativo tem início com o planejamento de objetivos de aprendizagem e com a
exigência de construção de meios adequados para que se coletem evidências de
que os resultados sejam alcançados. Depois dessa etapa, os resultados podem
ser interpretados.

É importante reforçar que, em contextos mais atuais, busca-se um


afastamento da interpretação da avaliação aplicada no método tradicional,
ou seja, atrelada a provas, trabalhos e testes, com os objetivos de disciplinar,
controlar e medir. Com os avanços dos estudos acerca da avaliação, passa-se a
entender que, para esse tipo de interpretação de avaliação, geram-se ansiedade,
insegurança e medo pelos sentimentos de controle e de caráter punitivo das
avaliações. A dicotomia sucesso e insucesso estava mais evidente na forma
tradicional de avaliação.

A visão passa ser ultrapassada a partir do entendimento de que a avaliação


tem duas direções: desempenho dos alunos e análise dos resultados do trabalho
docente. Essa última considera o aprimoramento e a transformação do trabalho
docente para resultados mais próximos dos objetivos traçados no planejamento
dos objetivos educacionais. A avaliação deve ocorrer de modo contínuo,
sistemático, compreensivo, comparativo, cumulativo, informativo e global.

A avaliação envolve aspectos reflexivos e autoavaliativos, observando os


alunos e os professores, ambos como protagonistas nos processos de ensino
e de aprendizagem. O sucesso da prática docente também está relacionado
com a habilidade de garantir evidências produtivas de avaliação que motivem o
desenvolvimento dos alunos e o aperfeiçoamento do seu trabalho.

O docente precisa conhecer as especificidades das avaliações para utilizá-las


de forma eficiente e articular os planejamentos de aula e de avaliação, de acordo
com essas propriedades. A avaliação diagnóstica, considerada inicial, conforme
o nome enuncia, faz parte da etapa inicial da abordagem de um determinado
conteúdo, é o início de um ciclo ao longo do ano escolar. Essa avaliação inicial
possibilita a coleta de informações dos conhecimentos prévios dos alunos
para o entendimento do estágio de conhecimento que o grupo está e aonde se
objetiva chegar (objetivos de aprendizagem). Essa análise avaliativa inicial é um
momento dialético que possibilita um avanço mais contextualizado do processo
de formação. Confere-se mais autonomia para os sujeitos, ao permitir observar
diferentes processos evolutivos para cada um e conduzir o trabalho docente com

105
Didática do Ensino de Línguas

mais embasamento no contexto dos alunos. A realidade do aluno é valorizada.


Estratégias singulares podem ser traçadas, de acordo com os resultados da
avaliação inicial.

Conhecer o aluno, a sua bagagem cognitiva e/ou as suas habilidades;


identificar possíveis dificuldades de aprendizagem; verificar o que o aluno
aprendeu ou não aprendeu, identificando causas da não aprendizagem;
caracterizar o aluno quanto a interesses ou a necessidades; replanejar o trabalho.

A avaliação diagnóstica inicial tem, como objetivo, o ajuste dos


conhecimentos aos programas curriculares e ao desempenho dos alunos (e vice-
versa). O propósito é alinhar todos esses elementos para os melhores resultados.
Inadequações podem ser reduzidas nessa etapa, por exemplo, determinado
conteúdo é abordado com alta complexidade e os alunos demonstram
dificuldade no processo de aprendizagem, pois conhecimentos prévios não foram
desenvolvidos. Como solucionar essa questão? Alinhando objetivos, novamente,
e incluindo conhecimentos prévios, que são necessários para a construção de
conhecimentos mais complexos.

Exemplo prático

Por exemplo, para o ensino de LE: considere o ensino dos


tempos verbais em Língua Francesa. O professor tem, como objetivo,
trabalhar o passé composé. O docente faz a explicação, conduz
diversos exercícios e estrutura uma avaliação, mas o resultado da
turma não se evidencia com satisfação. Identifica-se a dificuldade
na solução das questões propostas. O que pode ter acontecido?
O docente não realizou uma avalição diagnóstica que identificasse
os conhecimentos prévios, necessários para o entendimento de
um tempo verbal composto? Como resultado, os alunos tiveram
dificuldades na avaliação proposta pelo professor. Como resolver
essa questão? Alinhando, novamente, os objetivos, e, antes de
detalhar o passé composé, faz-se necessário retomar o que são os
verbos auxiliares (être e avoir). Ainda, como se configuram os verbos
no particípio passado. Em seguida, com esses conhecimentos
construídos/reforçados com os alunos, outros objetivos educacionais
podem ser trabalhados.

106
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

Perceba que, no exemplo anterior, a avaliação diagnóstica (que pode ser


um diálogo com os alunos) possibilita o ajuste do planejamento docente para
o desenvolvimento coerente dos conhecimentos propostos. Com essa ação,
o docente ensina por meio de um programa que tem conexão com o contexto,
adequado ao contexto. Esse movimento é necessário para o sucesso nos
processos de ensino e de aprendizagem. Um programa proposto não pode ser
rígido e inalterável se a busca está na formação efetiva para a atuação social.
Alterações podem e devem ser propostas nos programas curriculares, pois o
diagnóstico, por si só, não faz sentido se não servir para modificar propostas
e ações pedagógicas que tenham impacto nos processos de ensino e de
aprendizagem.

A autocompreensão necessária para o entendimento da avaliação diagnóstica


se faz presente para que os envolvidos promovam reflexões acerca dos objetivos.
Realizá-la com os alunos permite que o sistema de ensino verifique se está
atingindo os objetivos; para o professor, a probabilidade de verificar a atuação,
visando à melhora da qualidade do trabalho; e, para o aluno, a descoberta do
nível de aprendizagem (em que etapa se encontra e aonde se deseja chegar), os
avanços e as limitações. Para a família, auxilia no entendimento de não rotular,
de não menosprezar os filhos quando existem dificuldades de aprendizagem ou
dificuldades na obtenção dos resultados.

Depois da avaliação diagnóstica, passamos para a próxima etapa, que se


configura com a implementação de ações e de outros tipos de avaliação. Surge,
então, a avaliação formativa, ou contínua. Esse tipo de avaliação tem, como
objetivo, oportunizar, para o professor, o acompanhamento de como está se
efetivando a aprendizagem, de quais acertos se evidenciam, dificuldades que
mais ocorrem, e assim por diante. A direção segue sendo a de buscar informações
para que a ação contemple, de forma completa, os objetivos propostos. Esse tipo
de avaliação contribui para o levantamento de informações que são relevantes
para a regulamentação dos processos de ensino e de aprendizagem, de forma
a ser contributivo para a garantia da qualidade de ensino. Esse entendimento de
avaliação transcende o conceito tradicional de avaliação com caráter quantitativo,
punitivo, corretivo, e, até certo ponto, excludente, o qual tende a enfatizar, apenas,
sucesso e insucesso.

A avaliação formativa (contínua) busca orientar o aluno em relação ao


processo escolar, identificar as dificuldades com o objetivo de auxiliar na
progressão, encontrando as dificuldades, as estratégias para o avanço nos
estudos. Dessa forma, essa avaliação se opõe à avaliação somativa, que funciona
como um balanço (parcial ou total) do conjunto de aprendizagens.

A avaliação contínua funciona como uma forma de retorno para professores

107
Didática do Ensino de Línguas

e alunos. Para os professores, serve como um registro dos efeitos que são
gerados com as propostas e as ações pedagógicas. Ações posteriores podem
ser direcionadas, tendo, como base, os resultados. O aluno, por sua vez, pode
observar, criticamente, o próprio desempenho, as facilidades e as dificuldades,
com o intuito de buscar, sempre, superar-se em cada etapa, de acordo com o
ritmo de aprendizagem.

O terceiro tipo de avaliação é denominado de final, ou somativa. Conforme


o nome enuncia, faz-se presente na etapa de finalização de ciclos avaliativos,
ou seja, no término de processos de ensino e de aprendizagem. Tem-se um
diagnóstico do desempenho final dos alunos, portanto, reúne um somatório de
diversos instrumentos avaliativos anteriores. Nesta etapa, os resultados anteriores
são analisados, somados e indicam o resultado final alcançado pelo aluno, seja
em um bimestre, trimestre, semestre ou ano no qual projetos, provas, trabalhos
etc. são desenvolvidos. Todos esses resultados são reunidos, o que gera uma
avaliação final, a qual refletem o desempenho do aluno no período e o alcance
(em que grau) dos objetivos propostos.

O nome remete à dinâmica, que é somativa. Com um caráter de alto controle,


ela é final, abrange uma variedade de conteúdos, não permite avaliação com
profundidade de aspectos/conteúdos mais pontuais, e pode ser mais excludente.
Assim, indica-se ser mais efetivo, o trabalho, com o conjunto de avaliações, para
que os resultados sejam cruzados e uma visão mais ampla do desenvolvimento
do aluno possa ser construída com singularidade/subjetividade, uma vez que cada
sujeito percorre uma trajetória formativa única. Os objetivos podem ser iguais
para todos (delineados no planejamento/currículo escolar), mas a trajetória, até
o ponto de chegada (alcance dos objetivos educacionais), é singular, e deve ser
valorizada e respeitada pelos docentes. O objetivo geral é assegurar um processo
formativo de qualidade para todos.

Depois de conhecer os tipos de avaliação, a seguir, você identificará as


principais concepções de avaliação ao longo da história educacional brasileira:

QUADRO 4 – AS GERAÇÕES DOS PROCESSOS AVALIATIVOS

Primeira geração • Avaliação = mensurar.


• Elaboração de testes.
1920 - 1930 • Instrumentos para verificação do rendimento
escolar.
Segunda geração • Entendimento do processo avaliativo.
• Sucesso, ou não, no sistema avaliativo.
1930 - 1950 • Geração “descritiva”.

108
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

Terceira geração • Aumento das críticas em relação aos processos


de avaliação – limitações dos processos anteri-
1960 - 1970 ores.
• Importância da definição de objetivos.
• Embate entre quem planeja a avaliação e quem
executa.
Quarta geração • Negociação e consenso.
• Avaliação construtiva.
1980 - 1990 • Rejeição da abordagem de controle.
• Processo hermenêutico-dialético.
• Interação.
• Construção de conceitos.
FONTE: Adaptado de Ferreira et al. (2018)

A função da avaliação, portanto, foi se modificando, conforme o entendimento


a respeito desse processo foi sendo modificado ao longo das gerações de
avaliação. Conforme descrito em leis e normativas, que orientam a educação no
Brasil, surgiu, por exemplo, a Resolução CNE/CEB, nº 4, de 13 de julho de 2010,
que orienta o seguinte:

Art. 46. A avaliação no ambiente educacional compreende 3


(três) dimensões básicas:

I - avaliação da aprendizagem;
II - avaliações institucionais interna e externa;
III - avaliação de redes de Educação Básica.

Observe o detalhamento proposto para cada avaliação:

109
Didática do Ensino de Línguas

QUADRO 5 – AVALIAÇÃO
Avaliação da Art. 47. A avaliação da aprendizagem se baseia na concepção
aprendizagem de educação que norteia a relação professor-estudante-con-
hecimento-vida em movimento, devendo ser um ato reflexo de
reconstrução da prática pedagógica avaliativa, premissa bási-
ca e fundamental para se questionar o educar, transformando
a mudança em ato, acima de tudo, político.

§ 1º A validade da avaliação, na função diagnóstica, liga-se à


aprendizagem, possibilitando o aprendiz a recriar, a refazer o
que aprendeu, criar, propor, e, nesse contexto, aponta para
uma avaliação global, que vai além do aspecto quantitativo,
porque identifica o desenvolvimento da autonomia do estu-
dante, que é, indissociavelmente, ético, social, intelectual.

§ 2º Em nível operacional, a avaliação da aprendizagem tem,


como referência, o conjunto de conhecimentos, habilidades,
atitudes, valores e emoções que os sujeitos do processo ed-
ucativo projetam, para si, de modo integrado e articulado com
aqueles princípios definidos para a Educação Básica, redi-
mensionados para cada uma das etapas [...].

§ 3º A avaliação, na Educação Infantil, é realizada mediante


acompanhamento e registro do desenvolvimento da criança,
sem o objetivo de promoção, mesmo em se tratando de aces-
so ao Ensino Fundamental.

§ 4º A avaliação da aprendizagem, no Ensino Fundamental


e no Ensino Médio, de caráter formativo, predominando so-
bre o quantitativo e o classificatório, adota uma estratégia de
progressos individual e contínuo que favorece o crescimen-
to do educando, preservando a qualidade necessária para a
formação escolar, sendo organizada, de acordo com regras
comuns a essas duas etapas.

110
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

Avaliações insti- Art. 52. A avaliação institucional interna deve ser prevista no
tucionais interna projeto político-pedagógico e detalhada no plano de gestão,
e externa realizada anualmente, levando em consideração as orien-
tações contidas na regulamentação vigente, para rever o con-
junto de objetivos e de metas a serem concretizados, mediante
a ação dos diversos segmentos da comunidade educativa, o
que pressupõe a delimitação de indicadores compatíveis com
a missão da escola, além de clareza quanto ao que seja qual-
idade social da aprendizagem e da escola.
Avaliação de Art. 53. A avaliação de redes de Educação Básica ocorre pe-
redes de Edu- riodicamente, é realizada por órgãos externos à escola e en-
cação Básica globa os resultados da avaliação institucional, sendo que os
resultados dessa avaliação sinalizam, para a sociedade, se a
escola apresenta qualidade suficiente para continuar funciona-
ndo como está.

FONTE: A autora

Observe que o descrito em lei (dentre outras normativas existentes) busca,


cada vez mais, configurar a avaliação com função mediadora de construção de
conhecimentos escolares e gestão da aprendizagem. No processo de elaboração
de avaliação para LE, considere todas essas referências para a apresentação de
processos avaliativos que tenham a seguinte função: fazer a gestão mais eficiente
dos processos de ensino e de aprendizagem, unindo as análises quantitativa e
qualitativa para o diagnóstico.

Conferir função classificatória é tornar a avaliação estática, e, em muitas


situações, padronizada, para avaliar processos que são singulares, dependendo
de cada sujeito. Isso restringe o processo de desenvolvimento dos alunos.
A avaliação, para essa leitura, portanto, busca a análise crítica das realidades
educacionais, os avanços, as descobertas de desafios, a identificação de
fragilidades e as dimensões que podem ser alcançadas. A avaliação em LE tem
muito potencial de contribuição para os processos de ensino e de aprendizagem,
se assim forem percebidos. Pense nisso!

Com relação à avaliação em LE, considerando os métodos apresentados


anteriormente, reflita que, em uma visão clássica de educação, ou seja, com
o paradigma gramática-tradução, que dominou o ensino de línguas da metade
do século XIX até a metade do século XX, a avaliação se restringe a exames
escritos, não sendo exigido nenhum raciocínio ou questionamento crítico em um
nível mais abstrato. Este tipo de avaliação arbitrária, que julga a competência de

111
Didática do Ensino de Línguas

um aluno em relação a outro do mesmo grupo, comparando-os, transformou-se


no principal requisito para passar em exames escritos formais (LUCENA, 2004).

A partir da metade do século XX, nos anos 40, houve o reforço do Método
Áudio-Oral e Audiovisual (Audiolingual). Esse método tinha, como foco, a
comunicação, mas, da mesma forma, permanece a imitação do falante nativo.
O aluno pouco elabora os enunciados, sendo que os diálogos são exercícios
de repetição de estruturas e jogos gramaticais, considerados úteis na formação
de hábitos em LE. Nessa perspectiva de ensino-aprendizagem, o contexto é
negligenciado, e o aluno não é considerado um ser social e crítico, que interage
com o meio, mas um ser que repete modelos, mecanicamente, e interage
com os outros somente a partir da iniciativa de uma das partes envolvidas no
processo, ou seja, o professor. Ainda, segundo essa perspectiva, professores e
alunos devem perseguir os objetivos – consequentemente, comuns – de maneira
responsável, contudo, indiferentes às individualidades (LUCENA, 2004). Para a
avaliação, significa presença de testes de língua, os quais objetivam avaliar o
aluno em relação ao domínio em diferentes áreas do sistema linguístico, como
discriminação de fonemas, conhecimento gramatical e vocabulário (LUCENA,
2004).

Além dos testes objetivos, para avaliar o domínio de LE, também são
aplicadas avaliações comportamentais. Espera-se que o aluno alcance um padrão
definido em critérios preestabelecidos, e, nesse aspecto, decidir a respeito da
escolha, sem arbitrariedade, consiste em um problema (LUCENA, 2004). Ainda,
para utilizar, em algumas escolas brasileiras, essa forma de avaliação, precisa
se ter cuidado, pois pressuporia um modelo idealizado, distorcendo a pluralidade
e a valorização das diferenças. Boletins e fichas de avaliação são instrumentos
desse tipo de avaliação, e passam, se assim construídos, a sofrer críticas,
pois são simplistas e reducionistas. Pouco constroem informações acerca do
desempenho individual dos alunos, uma vez que, já entendemos, que as formas
de desenvolvimento são singulares, e esse tipo de avaliação reducionista não é o
mais adequado, se não for combinado com outras formas de avaliação.

Por volta dos anos 60, houve um avanço nos paradigmas educacionais e
o estudante passou a receber um papel mais ativo no processo de formação.
A psicologia cognitivista aparece como uma reação contra o behaviorismo e a
Pedagogia de línguas passou a considerar o professor um facilitador, o qual
deve propiciar, aos alunos, um ambiente favorável, no qual possam aprender
por meio de experiências significativas, e não mais com o simples instrutor de
regras, que estabelece objetivos que devem ser alcançados sem questionamento
e criatividade (LUCENA, 2004). A Abordagem Comunicativa de ensino de línguas
ganha espaço, e a língua em uso conquista o espaço da sala de aula: linguagem

112
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

na forma exata que é usada na comunicação efetiva. Portanto, trabalhar com


a língua em uso, considerando os diferentes contextos nos quais é utilizada, é
importante para os processos de ensino e de avaliação de competências e de
habilidades. Atividades, e posteriores avaliações, devem envolver situações de
negociação, ou seja, de interação entre sujeitos, sendo que o aluno necessita
ser o responsável pela aprendizagem. Ainda, os estilos individuais devem ser
respeitados, a aprendizagem decorre da experiência, e o aluno precisa ser visto
como um ser social, com necessidades intelectuais e emocionais, cuja liberdade
é mais importante do que a ordem social (LUCENA, 2004).

Para a avalição, nessa abordagem, tem-se uma forma mais global, a partir da
qual se valorizam os usos e as habilidades do uso de LE em limites contextuais.
A avaliação busca conduzir o aluno a um processo de reflexão acerca do próprio
processo de aprendizagem, e a promover a capacidade de autoavaliação. Para o
aluno, é importante que o docente entregue um relatório descritivo do processo e
do produto do aprendizado (análise qualitativa do processo).

Por fim, em uma abordagem mais atual, têm-se a interação e a Abordagem


Comunicativa como mais evidentes. Nessa perspectiva, o ensino comunicativo
prioriza aprendizagens colaborativas e cooperativas. Para isso, as tarefas e
as avaliações são estruturadas com base em objetivos definidos. A interação,
para a aprendizagem de LE, é importante, e atividades em relação ao mundo
real (valorizando as diferentes culturas de falantes da LE) são básicas. Exercitar
a criatividade e ampliar o conhecimento de mundo, pelo domínio da LE, são
pressupostos desse método. A avaliação, portanto, é um processo, que deve
ser construído com o aluno. A avaliação é processual e autêntica, sendo que os
procedimentos e os critérios precisam ser conhecidos por alunos e por docentes.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Chegamos ao momento de finalização da proposta de leitura, mas tenha
em mente que não significa a conclusão, pelo contrário, as propostas, aqui
apresentadas, devem servir de ponto de partida para mais leitura, mais pesquisa
e mais reflexão. Essas análises objetivam contribuir com a sua prática docente,
pois as informações cobrem os diferentes métodos e as formas de avaliação,
possibilitando que você construa propostas pedagógicas pautadas na reflexão
teórica, mas que, ao serem analisadas por você, sejam levadas para a prática, de
forma efetiva.

Entendemos que o uso da combinação de diferentes métodos sinaliza ser


o mais eficiente para os processos de ensino e de aprendizagem de LE. Em
toda essa ação, buscam-se a valorização das subjetividades dos educandos e

113
Didática do Ensino de Línguas

o respeito à diferença. A abordagem mais recente, a comunicativa, sinaliza, com


ênfase, nos próprios pressupostos, essa dinâmica, pois está centrada na língua
em uso, e busca, pela colaboração e cooperação, a construção do conhecimento
em LE. A avaliação, da mesma forma, reforça a importância do compartilhamento,
entre professores e alunos, do processo de formação, para que ambos possam
contribuir e os resultados mais significativos sejam alcançados por todos.

Para reflexão final, considere a importância do distanciamento do


entendimento de avaliação como instrumento de controle. A avaliação deve ser
entendida como um instrumento de informação a partir do qual objetivos são
redefinidos, práticas são revistas e o envolvimento discente pode ser observado.
No diálogo com o aluno, constrói-se o conhecimento e se amplia a possibilidade
de atuação do estudante no mundo globalizado. Ele passa a conhecer culturas
diferentes pela LE e amplia os espaços, os quais pode ocupar no mundo, em
contextos internacionais.

Lembre-se de, sempre, considerar a avaliação como prática social, e o


acesso à LE como forma de contribuição para um mundo mais igual.

O contexto atual de ensino de línguas e as políticas de avaliação


contemporâneas

Em um contexto pós-moderno, linguistas aplicados e


pesquisadores da área de ensino de línguas se alimentam de princípios
da teoria sociointeracionista, dos postulados do construtivismo,
resgatam e inserem a Pedagogia de ensino de línguas na Pedagogia
de Paulo Freire e dos escritos de sociólogos, como Pierre Bourdieu.
Nessa perspectiva crítica, questões da sala de aula devem ser
relacionadas às questões sociais, políticas e culturais. Essa nova
perspectiva educacional traz à tona questões pouco discutidas na
área da Linguística Aplicada ao Ensino de Línguas, como a avaliação.
Ainda que o reflexo, nas salas de aulas, seja tímido, o debate começa
a ganhar espaço, em congressos e em fóruns da área, com um novo
significado, buscando entendimentos e implicações sociais e políticas
em contextos históricos específicos. Começam a surgir trabalhos e
pesquisas que contemplam aspectos, até então, não muito discutidos,
como poder, linguagem como prática social, identidade, cidadania, e
outros temas que visam ao aprimoramento do ensino e defendem a
ideia de que o conhecimento a respeito da linguagem pode e deve
ser posto a serviço do bem-estar geral e da melhoria das nossas

114
Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

condições do dia a dia (PENNYCOOK, 2001). Nessa nova perspectiva,


a “linguagem não é, simplesmente, um meio de expressão ou de
comunicação, mas uma prática que constrói e é construída pelas
maneiras pelas quais os aprendizes da língua se entendem, pelo meio
social, pelas histórias e pelas possibilidades para o futuro” (NORTON;
TOOHEY, 2004, p. 1).

Sob esse viés, na avaliação, teóricos e pesquisadores buscam


estabelecer princípios democráticos e questionar instrumentos,
conteúdos e metodologias usadas em provas e em exames, trazendo
à tona questões pertinentes acerca da cultura e das finalidades
das práticas avaliativas na escola (c.f. NORTON; TOOHEY, 2004;
SHOHAMY, 2004, no exterior; SCARAMUCCI, 1999; 2000; GIMENEZ,
1999; ROLIM, 1998, no Brasil).

Pennycook (2001), ao destacar que o movimento da Linguística


Aplicada Crítica pode provocar mudanças nesse campo tão resistente,
como o da avaliação, ressalta as proposições de Shohamy, cuja
postura é a de que “o ato de avaliar não é neutro. Ao contrário, ele
é um produto e um agente de agendas culturais, sociais, políticas
educacionais e ideológicas que moldam a vida dos participantes,
indivíduos, professores e alunos” (SHOHAMY apud PENNYCOOK,
2001, p. 40). Elana Shohamy é, sem dúvida, uma das vozes mais
atuantes em defesa de práticas avaliativas democráticas, que levem
em consideração o fato de que alguns tipos de testes privilegiam a
língua e a cultura de grupos dominantes em detrimento de uma
maioria. A autora, que discute, especialmente, as práticas avaliativas
em Israel, onde, segundo ela, testes são usados como ferramenta
de dominação para perpetuar o conhecimento dos judeus sobre os
árabes, destaca alguns princípios que devem ser seguidos. Assim,
para transformá-la em uma prática menos excludente e massificadora,
a avaliação deve (a) incluir o conhecimento de vários grupos em
testes; (b) fazer com que todos os envolvidos tenham um papel
ativo, de forma que a administração dos testes seja feita com quem é
avaliado; (c) limitar o uso de avaliações como ferramenta de poder; (d)
proteger os direitos dos avaliados em relação aos avaliadores; e (e)
fazer com que as pessoas que usam a avaliação como ferramenta de
poder assumam a responsabilidade pelas consequências desse tipo
de prática (SHOHAMY, 2004).

Ao apontar os princípios e refletir a respeito dos aspectos que


devem ser defendidos no domínio daquilo que ela chama de Critical
Language Testing (CLT), Shohamy argumenta que todo tipo de

115
Didática do Ensino de Línguas

testagem é político, e critica a forma positivista de medidas, usada


sem levar em conta os contextos político, social e cultural. Defende,
também, que princípios democráticos devem ser aplicados nas
práticas avaliativas, especialmente, em sociedades multiculturais,
para que grupos minoritários não tenham que assimilar a cultura
da sociedade majoritária. Nesse aspecto, ela chama atenção para
o fato de que a avaliação, na língua estrangeira, pode servir como
instrumento usado para perpetuar o conhecimento dos grupos de
poder. Essa questão, também, é discutida por Norton e Stein (1995),
os quais destacam que as pessoas a serem avaliadas são favorecidas
no caso de pertencerem a uma mesma cultura, raça e gênero dos
elaboradores das avaliações, já que partilham os mesmos contextos,
social, político e cultural.

No Brasil, Scaramucci oferece relevantes contribuições ao


investigar e discutir a forma com a qual os vestibulares se tornam
instrumentos que direcionam o ensino e definem “conteúdos e
capacidades indesejáveis” (SCARAMUCCI, 1999, p. 7). A autora
tem desenvolvido estudos a respeito do efeito retroativo de testes,
focalizando, especialmente, o ensino de inglês na escola pública
brasileira, e apresentando discussões para um melhor entendimento
do conceito de proficiência em LE (SCARAMUCCI, 2000). A
partir dos estudos e das reflexões, a autora destaca que há uma
assimetria entre a maneira como o conteúdo é apresentado na sala
de aula, geralmente, a partir de abordagens tradicionais, e o nível de
compreensão exigido em exames vestibulares de língua estrangeira
(inglês), como o da Unicamp. O efeito retroativo de avaliações, como
o vestibular, também é uma preocupação de Gimenez (1999), que
tem desenvolvido trabalhos no sentido de investigar e de analisar
vestibulares de algumas universidades brasileiras, com o objetivo de
verificar a influência dessas avaliações no ensino de línguas. A autora
conclui que esse efeito será sempre mediado pela percepção dos
professores e dos alunos, em relação à possibilidade de sucesso nos
exames. Essas investigações e críticas ao modo como as avaliações
vêm sendo implementadas e impostas a toda uma sociedade,
levantam a importante discussão acerca da valorização da avaliação
como prática social voltada à formação, e não à seletividade e ao
controle dos alunos.

FONTE: Adaptado de Lucena (2004)

Acesse e confira o artigo na íntegra em http://www.leffa.pro.br/


tela4/Textos/Textos/Anais/CBLA_VII/pdf/051_lucena.pdf.

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Capítulo 3 MÉTODOS E ABORDAGENS PARA O
ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

REFERÊNCIAS
BRASIL. Resolução n° 4, de 13 de julho de 2010. Define Diretrizes Curriculares
Nacionais Gerais para a Educação Básica. Disponível em: http://portal.mec.gov.
br/dmdocuments/rceb004_10.pdf. Acesso em: 9 jun. 2021.

CANDAU, V. M. A Didática em questão. Petrópolis: Vozes, 2014.

FERREIRA, V. de S. et al. Didática. Porto Alegre: Sagah, 2018.

FREITAS, A. B. M. de. Herbart e o neo-humanismo: contribuições e


perspectivas para a educação contemporânea. 2013. Disponível em: http://seer.
pucgoias.edu.br/index.php/educativa/article/viewFile/65-78/1694. Acesso em: 24
abr. 2021.

LEFFA, V. J. Língua estrangeira. Ensino e aprendizagem. Pelotas: EDUCAT,


2016.

LIBANEO, J. C. Didática. São Paulo: Cortez, 2012.

LUCENA, M. I. P. Avaliação no ensino de línguas e contemporaneidade: em


busca de uma re-significação. 2004.

MANFREDI, S. M. Metodologia do ensino - Diferentes concepções. 1993.


Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/1974332/mod_resource/
content/1/METODOLOGIA-DO-ENSINO-diferentes-concep%C3%A7%C3%B5es.
pdf. Acesso em: 24 abr. 2021.

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