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GEOGRAFIA

ECONÔMICA

Mait Bertollo
Geografias econômica
e industrial
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Descrever as principais teorias da geografia econômica.


 Reconhecer os principais conceitos da geografia industrial.
 Relacionar a geografia econômica e a geografia industrial.

Introdução
As teorias da geografia econômica e da geografia industrial ajudam a
compreender como o espaço geográfico se transforma de acordo com
o tipo de produção realizado por determinados tipos de indústrias. A
maneira como ocorrem os fluxos de mercadorias ou como se comportam
o mercado de trabalho e os consumidores são exemplos de como o
espaço geográfico pode ser alterado. A geografia econômica, portanto,
estuda o espaço geográfico, como ele é transformado e como transforma
a economia. Além disso, dedica-se a entender como o pensamento e
as ideias da geografia se transformaram ao longo do tempo, condicio-
nados pelas conjunturas políticas e socioeconômicas de cada período.
Desse modo, a geografia econômica e a geografia industrial derivam
da geografia, que é a ciência que analisa e compreende o espaço como
instância social, isto é, a relação entre o ser humano e o espaço.
Neste capítulo, você vai estudar as teorias fundamentais da geografia
econômica e da geografia industrial e relacioná-las, conhecendo os ele-
mentos de produção e comercialização associados a indústria, consumo,
fluxo de capitais, bens e localização, que resultam em vários tipos de
arranjos espaciais das atividades econômicas em escala local, regional
e global.
2 Geografias econômica e industrial

Principais teorias da geografia econômica


A geografia econômica é uma subdivisão dos estudos da geografia humana.
Esse ramo se dedica à compreensão dos fenômenos relacionados à economia
e que tratam da localização de unidades produtivas e de agentes produtivos
ou consumidores — distribuição e fluxos de mercadorias e trabalhadores,
por exemplo — e dos fixos, como indústrias e infraestrutura. Dessa forma,
é possível compreender como se estabelecem os arranjos das atividades eco-
nômicas tendo o espaço como instância social. A análise se faz observando
o espaço: onde ocorrem os fenômenos, quais são os agentes influenciados e
que influenciam a diversidade de condições econômicas sobre as escalas local,
regional, nacional e global.
As atividades econômicas de uma determinada região podem inclusive
ser influenciadas por condições climáticas ou geológicas, determinadas por
fenômenos naturais. Nessas situações, as consequências podem ser a disponi-
bilidade ou não de recursos naturais, que impactam nas condições de trabalho
e produtividade, custo de transporte e condições de uso do solo. Também há
atuação de fatores políticos, sociais e culturais afetando decisões e resultados
na economia, como geração de emprego e níveis de consumo e produção.
A geografia econômica tem ainda como abordagem critérios de espaço e
movimento, como a distância que determinada mercadoria deve percorrer até
chegar ao seu destino, os locais de prospecção e transformação de matérias-
-primas, os acessos a rodovias e portos marítimos para escoar a produção e
as variáveis espaciais que afetam as condições econômicas do lugar que está
sendo estudado. Dessa forma, a geografia econômica trata da distribuição e da
estruturação de atividades econômicas e produtivas no espaço cuja abordagem
está ligada à história da estruturação econômica e à análise das relações envol-
vidas da escala micro à escala macro, relacionando o local à dinâmica global.
O espaço geográfico é resultado do desenvolvimento das forças produ-
tivas, das relações de produção e das necessidades de circulação e distribui-
ção (SANTOS, 1996). As regiões e os lugares devem ser funcionais para o
desenvolvimento econômico e social do país. A urbanização, por exemplo,
é resultado dos processos históricos determinados como a localização de
empresas, indústrias, infraestruturas e mão de obra.
A urbanização, a industrialização e os processos sociais, elementos cor-
respondentes aos processos econômicos, aliados aos progressos tecnológicos,
moldam o espaço de acordo com os sistemas técnicos incorporados. A cada
período, esses sistemas dão lugar a outros que produzirão uma nova organização
do espaço. Esse processo é reconstruído constantemente. Os sistemas de fluxo
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também são elementos que desempenham importante papel na organização


espacial em relação à economia. Os fluxos perpassam as redes geográficas,
que podem ser entendidas por um sistema interconectado de pontos e ligações
entre as diferentes partes de uma cidade, de um país ou do planeta. As redes
geográficas também permitem a circulação de elementos econômicos, como
capitais por meio de sites e aplicativos bancários e informações, como é o
caso da internet e de pessoas, em eventos de migração.
Os fluxos econômicos ocorrem quando há deslocamento de capitais, cor-
porações, mercadorias, bens e investimentos. No caso dos capitais, há uma
grande quantidade de dinheiro que circula em todo o mundo na forma de bits em
computadores e smartphones todos os dias de forma ininterrupta, sendo que a
maior parte de todo esse capital não está mais na forma de dinheiro impresso.
Muitos autores consideram o período atual a era da sociedade informacional,
destacando Milton Santos, Manuel Castells e David Harvey. A expansão dos
meios de comunicação e as possibilidades produzidas em um planeta interligado
permitem a difusão de ideias, discursos e culturas por meio de fluxos de infor-
mações pela televisão e principalmente pela internet. Esses sistemas técnicos
geram um grande acúmulo de dados e informações sobre inúmeros elementos,
acontecimentos, agentes e pessoas. Cabe ressaltar também o crescimento do
fluxo de pessoas em níveis nacional e internacional, por meio do turismo e da
migração. Esse último tipo de fluxo se intensifica por razões humanitárias,
políticas, sociais, econômicas e por causa de guerras. Os fluxos são uma
forma de estruturação do espaço e da sociedade em razão de redes globais
que permitem interações informacionais, culturais, econômicas e políticas.
Os fluxos, principalmente os financeiros quando abordada a economia,
podem ser interpretados por meio dos chamados circuito inferior e circuito
superior da economia (SANTOS, 1979). Os fluxos inerentes ao circuito su-
perior são constituídos pelos negócios bancários, pelas trocas comerciais e
pela indústria de exportação, bem como pela indústria urbana moderna. O
ramo dos serviços mais sofisticados como comércio atacadista e transporte
também fazem parte desse circuito. Já no circuito inferior, as formas de fa-
bricação não fazem uso intensivo de capital; é composto por serviços menos
modernos, abastecidos pelo comércio em pequena escala. Ambos os sistemas
são considerados no estudo da organização da economia para compreendê-la
em âmbito espacial.
Tanto as atividades do circuito inferior quanto as do superior organizam o
espaço e coexistem. Nesse contexto, o Estado promove ou não tais atividades
econômicas, sendo um intermediário entre os agentes e as realidades nacionais.
4 Geografias econômica e industrial

Além disso, todos os agentes são condicionados pelas conjunturas históricas


e políticas de cada período.
Para uma análise espacial dos aspectos econômicos, é importante co-
nhecer a história da geografia econômica moderna. Seu desenvolvimento
é caracterizado pela organização de informações sobre distintas regiões do
globo a partir de 1950, considerando debates sobre o método e categorias da
geografia, conjuntamente com outras ciências e ponderando sobre a realidade
socioeconômica. Há inúmeras contribuições de geógrafos brasileiros que
trataram aspectos gerais e elaboraram estudos no campo, como Milton Santos,
Armando Corrêa da Silva, Silva Selingardi Sampaio, Miguel Angelo Campos
Ribeiro, além de textos e artigos publicados no Brasil por Paul Claval, geógrafo
francês também reconhecido no campo da geografia econômica.
A estruturação da geografia econômica ocorreu no fim do século XIX.
As origens da geografia econômica moderna têm como expoente Karl Sapper
(1866–1945), geógrafo econômico alemão cujo principal trabalho, “Economic
Geography”, foi publicado na Encyclopaedia of the social sciences em 1967, é
considerado uma referência. O geógrafo brasileiro Armando Corrêa da Silva
traduziu e publicou no Brasil A geografia econômica segundo Karl Sapper
(SILVA, 1970).
Sapper ressaltou que a geografia econômica surgiu no século XIX com a
necessidade de comerciantes e produtores que, ao carecer de conhecimento
sobre as potencialidades econômicas de outros países, colaboraram na prepa-
ração de vários relatórios comerciais para a criação da geografia econômica.
Em virtude da demanda da indústria de obter matérias-primas e conseguir
novos mercados para seus produtos, houve uma movimentação de conselhos
econômicos e câmaras de comércio para investigar aspectos econômicos além
da fronteira nacional. Anteriormente a discussões teóricas sobre geografia
econômica e abordagens de produção, comércio e consumo, ocorreram obser-
vações do âmbito econômico em todas as regiões do globo, causando interesse
pelas potencialidades econômicas. Os relatórios sobre essas potencialidades
tornaram-se os primeiros trabalhos de geografia econômica.
O geógrafo Wilhelm Götz publicou, em 1882, um planejamento para or-
ganizar campos de geografia econômica, quando o termo foi empregado pela
primeira vez, e se preocupava com a natureza das regiões e sua influência
sobre a produção e movimento dos bens. Havia, assim, uma relação entre a
geografia física e geografia econômica, a influência do homem sobre o meio.
Silva (1970) afirmava que a geografia econômica moderna relacionava a
atividade econômica humana a uma área com os recursos naturais.
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Para Alfred Hettner (1859–1941), a geografia econômica é um ramo da


geografia que se relaciona com as potencialidades econômicas e com as relações
entre os vários países e lugares. O geógrafo Alfred Rühl (1882–1935) desenvol-
veu a ideia de que essa é uma disciplina que se localiza entre a geografia e as
ciências econômicas com a distribuição geográfica do trabalho e as diferenças
na qualidade e na quantidade da produção, do comércio e do consumo de
vários territórios.
A geografia econômica se consolidou no início do século XX pelo acúmulo
de informações do âmbito econômico entre países, suas condições físicas e
recursos naturais, objetivando a ampliação de mercados. Também cresceram
as pesquisas sobre agricultura, relatórios comerciais produzidos em casas de
negócios e pelas influências dos fundamentos da geografia humana. Para esse
desenvolvimento, foram utilizados aspectos da economia, como a concepção
do homem como ser econômico e a influência homem-meio. A origem da
geografia econômica foi marcada pelos trabalhos de Karl Sapper promovendo
sub-ramos, como a geografia da indústria/industrial.
Em consequência de profundas transformações políticas, econômicas e
sociais após 1920, a ciência geográfica adotou um caráter mais aplicado para
analisar e interpretar questões de fundo econômico. Entre as décadas de 1940
e 1960, a renovação da geografia se baseou na chamada perspectiva teorética-
quantitativa, com uma abordagem sistêmica, e na teoria da localização de
atividades econômicas, concretizando a questão da indústria e, por conseguinte,
a geografia da indústria/industrial. Depois da década de 1960, despontou a
abordagem marxista.
Essa abordagem é constituída por um conjunto de ideias da filosofia,
economia, políticas e sociais elaborada por Karl Marx (1818–1883) — filó-
sofo, sociólogo, historiador, economista e jornalista — e Friedrich Engels
(1820–1895) — empresário industrial e filósofo. Teve origem em 1848 e, até
hoje, influenciam todas as áreas do saber. Basicamente, aborda o trabalho como
conceito fundamental da sociedade; toda a história da humanidade sucederia
pela relação entre os proprietários dos meios de produção e os trabalhadores
que realizam a tarefa de produzir os bens. Logo, na teoria marxista, a luta
das classes sociais é o que impulsiona as transformações na história, e a pro-
dução de bens materiais condiciona a vida social, intelectual e política. Além
disso, também foram estudadas as relações e instituições que moderavam as
sociedades, como o governo e a propriedade privada.
Mais recentemente, os estudos econômicos passaram a focar as transfor-
mações contemporâneas relacionadas a inovações tecnológicas da indústria
(como o sistema de produção flexível); o advento da economia da informação,
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da comunicação e do conhecimento (ramos que consideram a informação como


mercadoria necessária às atividades econômicas no sistema capitalista); e a
consolidação da globalização (CLAVAL, 2012).

A geografia teorético-quantitativa, que predominou durante as décadas de 1960


e 1970, baseou-se na formulação matemática dos raciocínios e métodos ligados ao
espaço. O espaço era considerado fixo, hierarquizado e funcional. Nesse ponto de
vista, a natureza estaria em uma lógica sistêmica, funcionando de forma homogênea.
O entendimento de sua organização é dado por padrões matemáticos, estatísticos
e geométricos, aplicando probabilidades. O emprego dessas ideias era subordinado
a uma lógica desenvolvimentista, isto é, o desenvolvimento era tratado como uma
necessidade para o equilíbrio espacial. O espaço era tido como uma forma homogê-
nea, principalmente no âmbito econômicos. Dessa forma, as contradições sociais e
econômicas eram desprezadas para a defesa de um desenvolvimento geral.

Posteriormente ao predomínio da geografia teorético-quantitativa, a geo-


grafia econômica desenvolveu como fundamento a ideia de ciência crítica
da escola de sociologia de Frankfurt. Essa vertente se baseava em estudos
sobre a dominação dada pela indústria cultural, cujos estudos analisavam a
massificação do conhecimento, da arte e da cultura e considerava a ciência e
a técnica como portadores de ideologia.
Em seguida, foram elaboradas as chamadas perspectivas alternativas, com
abordagem economicista. Nesse caso, partia-se do pressuposto de que as con-
dições econômicas são essenciais e decisivas para a vida individual e social,
fundamentais para explicar todos os acontecimentos da vida humana e social.
Além disso, tinham como base também a economia política marxista, que
tratava de três problemas: qual é o modo de construir os conceitos a serem
utilizados; como estabelecer relações entre eles; e qual a relação entre essa
construção conceitual e a realidade objetiva e como explicá-la. As ideias foram
baseadas em O capital: uma crítica da economia política, de Karl Marx.. Nessa
obra, Karl Marx faz uma análise da acumulação de mercadorias, da teoria do
valor-trabalho, em que o valor de uma mercadoria se dá pelo tempo de trabalho
socialmente necessário nela investido. Marx também desenvolveu teorias sobre o
chamado valor de uso, baseado na utilidade das mercadorias e no valor de troca,
que é equivalente ao seu preço de mercado e tempo de trabalho (MARX, 2011).
Geografias econômica e industrial 7

No fim do século XX e início do século XXI, as pesquisas nesse âmbito


tratavam dos fenômenos econômicos ligados às tecnologias da informação
e comunicação, dos circuitos espaciais produtivos e do regime flexível re-
lativo à globalização, que é o modo de produção cuja fabricação de bens
ocorre segundo a demanda, para que não haja acumulação desnecessária de
produtos e matérias-primas (CASTILLO, 2010). Dessa maneira, as pesquisas
em geografia econômica abordavam temas dos variados tipos de indústria,
dos serviços, das aglomerações ou dispersões produtivas, de perspectivas de
competição e cooperação, além das influências do consumo na vida econômica
e mudanças culturais contemporâneas dadas pela intensificação do processo
de globalização. Essas mudanças culturais ocorreram pela influência global
padronizante nas culturas locais, relacionadas ao tipo de alimentação, vestuário,
músicas, idiomas, filmes. Esse tipo de influência se mesclou à cultura que já
existia anteriormente.

Principais conceitos da geografia industrial


Com as implicações da crise de 1929, houve uma demanda por entender os
problemas objetivos enfrentados pela sociedade. Nesse contexto, houve um mo-
vimento de renovação na geografia, que originou uma abordagem econômico-
social nas décadas de 1930 e 1940, com enfoque na utilização e na ocupação
do território para fins mercadológicos. A interpretação do desempenho dos
mercados, de eventos políticos e das crises econômicas resultou em discussões
sobre subdesenvolvimento, problemas econômicos, sociedades industriais e
gêneros de vida. Quando essas discussões começaram a ampliar, desenvolveu-se
também a ideia de indivíduo como produtor-consumidor (BARROS, 1993).
A partir da década de 1930, os Estados começaram a intervir com mais ên-
fase nos contextos econômicos. A geografia seguiu na direção do fortalecimento
da presença do Estado, que precisou de estratégias para a organização do espaço
e da população. Esses, inclusive, passaram a ser temas relevantes no âmbito
das políticas nacionais. Ao oferecer conhecimento necessário para utilização
dos recursos, essa nova orientação foi denominada geografia aplicada, e
houve a necessidade de organização racional do mundo. Os geógrafos, assim,
elaboraram trabalhos de planejamento em diversos países (SANTOS, 1959).
O ramo que trata da localização industrial, da distribuição espacial das
atividades econômicas, do planejamento regional e de áreas industriais é a
geografia industrial. Após a década de 1950, o fator localização abarcou a
renovação da disciplina. Foram realizadas pesquisas sobre teoria, métodos
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e técnicas de mensuração da atividade industrial, pois é um fenômeno que


transforma o espaço terrestre, especialmente o urbano. Enquanto a geografia
econômica aborda o estudo da localização das atividades econômicas com-
binada à produção e ao consumo de bens e serviços, a geografia industrial
investiga a indústria de transformação e processamento de materiais em
produtos que servirão a novos fins e diferentes necessidades. A finalidade da
geografia industrial é a interpretação de diferentes padrões de distribuição,
da escala local à global, e a análise dos processos de implementação desses
padrões, bem como a instalação da estrutura técnica e financeira das indústrias
e suas relações com o meio ambiente.
A localização ideal da indústrias se dá sob duas diretrizes econômicas: o
custo mínimo para se instalar e se manter em um determinado lugar com o
menor gasto possível e a área de mercado, que pode facilitar, por exemplo, o
recebimento de matérias-primas e escoar a produção mais facilmente se estiver
localizada próximo de um porto ou rodovia. Para qualquer atividade, busca-
-se delimitar a melhor localização para seus fluxos perto de infraestruturas,
os fixos, para facilitar o fluxo de produção. São também aplicados modelos
econômicos para questões de localização industrial e métodos quantitativos.
Para medir magnitude e intensidade da atividade industrial são utilizados
critérios de número de estabelecimentos, número de empregos e valor acres-
centado pela transformação industrial.
Os trabalhos de geografia da indústria no Brasil abordam as estruturas
industriais e seu impacto na modificação da paisagem, influenciados pelos
trabalhos dos geógrafos franceses. Até a década de 1970, as pesquisas não
tinham influências da economia e da estatística, com exceção dos trabalhos
de Pedro Geiger, em 1963, e de Beatriz M. S. Pontes, já em 1974. Isso ocorria
porque os dados eram insuficientes por ainda não existir um tipo organização
censitária mais eficiente. Além disso, havia a necessidade de pesquisar dire-
tamente nas indústrias para obter fontes quantitativas atualizadas e entender
o processo e os fluxos industriais. Os trabalhos comumente abordavam uma
única cidade ou um bairro industrial.
Com o desenvolvimento das pesquisas, a atividade industrial começou a
ser tratada como um setor moderno e fundamental em qualquer economia,
além de promover transformações na paisagem e estruturar o espaço na escala
local e global, influenciando toda a população.
Outro fenômeno importante pesquisado no começo da década de 1950, pelo
geógrafo Torsten Hägerstrand, foi a concentração industrial e a implementação
de distritos industriais, um dos instrumentos para desenvolver o setor e
organizar o espaço. Os primeiros distritos industriais surgiram na Inglaterra
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na década de 1930, para solucionar a depressão econômica em certas áreas,


industrializando e atraindo investidores. Nos países desenvolvidos, os distritos
industriais descentralizavam as indústrias concentradas em grandes cidades e
áreas metropolitanas. Nos países subdesenvolvidos, surgiram como impulso
para a industrialização. O termo distrito industrial era usado para designar
formas de aglomeração industrial planejada. Especificamente no Brasil, o
termo industrial é usado para cidade, centro e distrito, para caracterizar áreas
reservadas ao uso industrial. Na Figura 1, é possível observar a distribuição
das indústrias no Brasil que se aglomeram principalmente nas áreas urbanas
promovendo transformações espaciais, econômicas, sociais e políticas, ana-
lisada sob a ótica da geografia econômica e industrial.

Figura 1. Distribuição espacial da indústria e as transformações espaciais promovidas.


Fonte: IBGE (2016, documento on-line).
10 Geografias econômica e industrial

Na década de 1970, as metrópoles já tinham custos de vida e de mão de obra mais


altos. Além disso, havia problemas ligados ao escoamento das mercadorias em virtude
do trânsito e da falta de infraestruturas, por exemplo. O custo mais elevado para fazer
instalações também foi um motivo da queda nos novos investimentos nas metrópoles
nesse ramo industrial. Isso acarretou a transferência das unidades para áreas mais
convenientes, como os distritos industriais, e também para cidades nas adjacências
da metrópole com custos mais vantajosos para as indústrias.

A primeira abordagem de distrito industrial procedeu do trabalho de Alfred


Weber, que tratava da localização industrial pelo ponto de vista da empresa,
considerando gastos mínimos de transporte, mão de obra e de aglomeração.
August Lösch produziu uma teoria de localização considerando a demanda
como principal variável, referente às áreas de mercado. Melvin Greenhut buscou
transpor o modelo de áreas de mercado mobilizando a teoria locacional para
um raciocínio probabilístico. Outro pesquisador importante foi Walter Isard,
que, ao abordar a teoria dos custos mínimos, pesquisava a organização das
variáveis que atuam sobre o fator aglomeração.
Os geógrafos que pesquisavam a geografia das indústrias estudavam meios
e métodos empregados pelas formas dos diversos tamanhos e localizações de
acordo com as trocas externas e internas a seu meio ambiente. Além disso,
esses meios e métodos eram identificados por conflitos de interesses, conhe-
cimento e controle de seu meio ambiente e comportamento (CARVALHO;
VELOSO FILHO, 2017).
Os temas industriais urbanos na literatura geográfica brasileira estão
sob vários enfoques e escalas, partindo de estudos no âmbito regional, como
localização, fluxos de mercadorias e áreas de influência. Em uma escala de
cidades e regiões metropolitanas, há estudos referentes a padrões de localização
e fluxos de matérias-primas e mercados. Há trabalhos importantes de E. Faissol,
M. V. Galvão, M. Santos e P. Geiger, que avançaram em estudos urbano e
regionais, bem como em atividade industrial relacionada a migrações.
Geografias econômica e industrial 11

Relações entre geografia econômica e geografia


industrial
De acordo com Claval (2005), de 1930 a 1970, a atividade de descrição di-
minuiu, e a geografia se tornou uma disciplina aplicável, utilizando modelos
explicativos. Nos anos 1950 e 1960, a chamada nova geografia começou a
utilizar a teoria da localização derivada da teoria dos lugares centrais,
que interpretava a hierarquia das cidades e a formação de regiões polariza-
das (CHRISTALLER, 1966). Os geógrafos analisavam o desenvolvimento
econômico considerando a relevância da informação na vida econômica e a
natureza da economia das cidades e sua função nas relações sociais e espaciais.
Na década de 1960, as pesquisas realizadas dentro da linha da geografia
econômica abordavam a localização das atividades agrícolas e industriais.
Assim, surgiu a divisão dos espaços urbanos para funções produtivas e resi-
denciais, fomentando a teoria das migrações humanas. A geografia econômica
passou a tratar das problemáticas habitacionais, segregações urbanas e também
das atividades ligadas ao turismo.
A partir de 1970, um novo contexto econômico possibilitou novas discussões
teóricas na economia utilizando noções do papel do consumo e dimensões
culturais. Nesse período, a vida econômica se transformou em virtude dos novos
sistemas de transportes rápidos e do desenvolvimento das telecomunicações,
que transformou também o espaço mundial. A intensificação dessas transfor-
mações deu início ao termo globalização. A contemporaneidade foi marcada
pela rapidez nos fluxos de transferências de informação e capitais e, no contexto
intelectual, as ciências sociais assumiram um caráter mais crítico.
Entre as décadas de 1970 e 1980, foi desenvolvida na geografia econômica
uma nova teoria sobre as relações econômicas, incluindo espaço e lugares com
propriedades diferenciadas, não mais homogêneas, representadas pelas ideias
de Paul Krugman. Desse modo, o espaço econômico e os lugares passaram a
ter uma análise mais complexa.
O marxismo assumiu outro enfoque, tendo em vista que economistas e
geógrafos buscaram reintroduzir o espaço na teoria marxista. Os primeiros
estudos foram realizados por David Harvey no livro The limits to capital (Os
limites do capital, no Brasil), de 1982, e pelo economista francês Maurice
Aglietta, que trata da transição entre o modo de produção fordista e pós-fordista.
Geógrafos, como Allen Scott, e economistas, como Robert Boyer, utilizaram
os trabalhos sobre a economia das empresas.
Quando comparamos o modo de produção fordista ao mundo atual, os
custos de transferência e o fluxo das informações por meio dos mercados
12 Geografias econômica e industrial

eram altos e menos fluidos. As grandes empresas sempre tiveram vantagens


sobre as empresas pequenas e médias, pois podiam arcar com os altos custos
para assegurar a transferência à longa distância das informações. Por meio
das novas tecnologias de transporte e de telecomunicações, a transferência
de informações pelos mercados se tornou mais econômica. Surgiu, então, a
fase da flexibilidade, do regime de acumulação flexível. Nessa fase, surgiu
no Japão um modelo de produção de mercadorias, o Toyotismo, para uma
maior flexibilização na fabricação de produtos, adequando-se à demanda,
com menor estoque. Além disso, as indústrias começaram a diversificar os
tipos de produtos fabricados com a facilitação da automatização de fases da
produção, o que exigiu uma força de trabalho mais qualificada e que exercesse
mais de uma função.
As pesquisas ligadas à geografia econômica na sociedade de consumo, a
concepção dos bens e os modos de consumi-los tiveram um papel central na
dinâmica econômica. Nesse contexto, os trabalhos com abordagem cultural
se desenvolveram, e o papel do consumo contemporâneo originou a geografia
econômica cultural. Esse ramo estuda a influência da cultura na esfera do
consumo, além de analisar os circuitos econômicos ligados à cultura e à
metropolização.
No fim do século XX, as pesquisas geográficas englobaram questões de
mobilidade, ligadas à migração e globalização, desenvolvimento do comércio
global e dos oligopólios, de empresas multinacionais principalmente. As
relações entre a geografia econômica e industrial ocorreram nesses pontos,
além de questões de metropolização, hierarquias urbanas e o papel das grandes
cidades e dos lugares, em uma relação interescalar.
A geografia econômica atual se estruturou por meio de várias abordagens,
considerando a economia da informação e da comunicação, a economia do
conhecimento e dos distritos industriais, que são exemplos dessa convergência
entre geografia econômica e industrial. A origem da geografia econômica
e seu desenvolvimento teórico-metodológico foram marcados por vários
contextos econômico-sociais que determinaram mudanças e reestruturações
e impulsionaram a geografia como ciência, a entender a realidade por meio
de uma ótica espacial. A partir de 1950, transformações dadas por situações
internas à disciplina, conjunturas externas políticas e econômicas e relações
com outras disciplinas, principalmente com a economia, conectaram-se à
realidade socioeconômica da época, motivando assim debates e revisões
metodológicas.
A geografia econômica se consolidou no começo do século XX pela acu-
mulação de informações econômicas de países e cidades, com mais dados
Geografias econômica e industrial 13

sobre aspectos físicos, pelo desenvolvimento de pesquisas sobre agricultura,


por meio de relatórios comerciais e pelos fundamentos da geografia humana.
A geografia econômica foi fundamentada, então, nos aspectos da economia,
na concepção do ser humano como ser econômico e na influência do espaço
geográfico na vida do indivíduo e no coletivo.
Por isso, ao tratar do período atual sob a ótica da geografia econômica
e industrial, é importante considerar a globalização como expansão da
informação com as técnicas financeiras, possibilitando que os operadores
financeiros possam funcionar todo o tempo e em todos os lugares. Esses
agentes demandam um estudo, pois têm à sua disposição, no presente, um
meio geográfico eficiente para a transmissão de informações, bens e ativos
financeiros simultaneamente e ininterruptamente, como mostra a Figura 2,
com toneladas de materiais e produtos circulando pelo mundo em navios,
pelos mares, ilustrando o comércio globalizado.

Figura 2. Mapa interativo do comércio global por navios, 2016.


Fonte: [Shipmap] (2012, documento on-line).

O aumento do poder dos atores financeiros pode ser identificado em função


de outros elementos centrais da economia contemporânea. As grandes em-
presas têm seus próprios setores financeiros, mesmo que sua atividade-fim
não seja financeira, como aquelas ligadas ao agronegócio, às indústrias, às
empresas de comércio e serviços. Dessa forma, por meio dessas novas bases
técnicas e políticas que ofereceram novos suportes à circulação do dinheiro
(SANTOS, 1996), ocorreu também uma ampla e profunda monetarização da
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vida cotidiana e houve um acirramento da concentração de riqueza. Além


disso, os elementos produtivos mais modernos foram concentrados em pontos
específicos do planeta, com aumento da desigualdade do poder econômico e
político das nações. Tais questões podem ser debatidas, conhecidas e pesqui-
sadas por meio da geografia e suas subdivisões, como a geografia econômica
e a geografia industrial.

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Geografias econômica e industrial 15

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SANTOS, M. O espaço dividido: os dois circuitos da economia urbana nos países sub-
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[SHIPMAP]. [S. l.: s. n.], 2012. Disponível em: https://www.shipmap.org/. Acesso em: 3
nov. 2019.
SILVA, A. C. da. A geografia econômica segundo Karl Sapper. São Paulo: Instituto de
Geografia, 1970.

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