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br/geopoleco-
gs0081-fev-2023-grad-ead/)
1. Introdução
Seja bem-vindo (a) ao estudo da disciplina de
que contribuirá, a partir das análises políticas e econômicas ocorridas no es-
paço geográ�co, para o entendimento das relações entre o território e poder.
De forma bem genérica, podemos a�rmar que a geogra�a econômica tem co-
mo objetivo a análise das inter-relações entre a estrutura econômica e a estru-
tura espacial, apresentando sempre uma dupla perspectiva, na qual, de um la-
do, as mudanças econômicas produzem alterações socioespaciais e, de outro,
o espaço sempre aparece como meio e condição para o desenvolvimento das
ações econômicas.
2. Informações da Disciplina
Ementa
A disciplina contribui para a formação pro�s-
sional do aluno no sentido de analisar como os processos políticos e econômi-
cos, em escala macro, in�uenciam a produção do espaço geográ�co. Para tan-
to, conceitua os agentes econômicos e seus comportamentos, assim como os
fatores de produção. Nesse sentido, analisa, também, os clássicos da
Economia Política, a questão do valor, acumulação capitalista e a regulação da
economia, buscando explicações do desenvolvimento econômico. A disciplina
aborda, ainda, a relação sociedade/natureza, os problemas na economia nacio-
nal, além de questões sobre a globalização econômica, os meios de produção
capitalista e sua in�uência na produção do espaço. No desenvolvimento polí-
tico, analisa os conceitos e controvérsias inerentes à Geopolítica, conceituan-
do as origens do pensamento geopolítico. Aborda o nascimento dos Estados
nacionais na era moderna, a industrialização e o imperialismo do século 20. A
disciplina trata, ainda, dos temas nova ordem mundial, globalização capitalis-
ta e relações internacionais, poderio bélico e geoestratégia, Geopolítica do tra-
balho, além da Geopolítica no Brasil.
Objetivos Especí�cos
• Analisar os preceitos clássicos que subsidiam as interpretações econômi-
cas.
• Investigar a in�uência do desenvolvimento econômico na produção do
espaço.
• Re�etir sobre a Geopolítica em suas características epistemológicas, bem
como suas particularidades enquanto teoria de ação.
• Perscrutar o desenvolvimento da ciência, sua in�uência nas questões
mundiais e os atores internacionais nas relações entre o território e o po-
der.
(https://md.claretiano.edu.br/geopoleco-
gs0081-fev-2023-grad-ead/)
Objetivos
• Conceituar os agentes econômicos e seus comportamentos, assim como
os fatores de produção.
• Analisar os clássicos da Economia Política e as questões de valor, acu-
mulação capitalista e regulação da economia, buscando explicações do
desenvolvimento econômico.
Conteúdos
• Agentes econômicos e seus comportamentos.
• Fatores de produção.
• Valor e acumulação capitalista.
Problematização
O que são agentes econômicos? E fatores da produção? Como se desenvolve o
pensamento da Economia Política clássica a partir de seus principais auto-
res? Como se analisa espaço e valor? Como a questão do valor in�uencia a
produção do espaço? Como se dá a valorização do espaço no ?
Qual a importância da teoria do valor para a compreensão da produção e va-
lorização do espaço geográ�co?
1. Introdução
Neste primeiro ciclo de aprendizagem, veremos os fatores da produção, a
Economia Política clássica e a questão do valor e sua interferência na produ-
ção do espaço.
Bons estudos!
Pode-se falar do espaço como condição e�caz e ativa da realização concreta dos
modos de produção e de seus momentos. Os objetos geográ�cos aparecem em loca-
lizações correspondendo aos objetivos da produção em um dado momento e, em
seguida, por sua própria presença, eles in�uenciam os momentos subsequentes da
produção.
Por isso, não há dúvidas de que cada vez mais o espaço geográ�co se impõe
como meio e condição básica aos processos econômicos e, inevitavelmente,
re�ete os sentidos e as formas de produção material e simbólica da sociedade.
Não há produção que não seja produção do espaço, que se dê sem o trabalho. Viver
para o homem é produzir espaço. Como o homem não vive sem trabalho, o proces-
so de vida é um processo de criação do espaço geográ�co. A forma de vida do ho-
mem é o processo de criação do espaço.
[...] a terra é o meio universal de trabalho, há uma unicidade orgânica entre o ho-
mem e a natureza. O ritmo do trabalho e da vida dos homens repete o ritmo da na-
tureza. O espaço geográ�co é o próprio espaço natural [...] a terra é a despensa pri-
mitiva e o arsenal primitivo. Trabalhando-a, tiram os homens o seu sustento e os
instrumentos de trabalhos novos. A natureza-terra é a condição da produção/repro-
dução das relações entre os homens.
O geógrafo brasileiro Carlos Walter Porto Gonçalves (1990, p. 25) esclarece que:
[...] a natureza é, em nossa sociedade, um objeto a ser dominado por um sujeito, o
homem, muito embora saibamos que nem todos os homens são proprietários da
natureza. Assim, são alguns poucos homens que dela verdadeiramente se apropri-
am. A grande maioria dos outros homens não passa, também, de objeto que pode
até ser descartado.
Além disso, o espaço mundial aos olhos das nações que primeiro realizaram a
revolução industrial torna-se o espaço da reprodução de capitais, portanto, ob-
jeto de uma disputa cada vez mais acirrada pelo controle de matérias-primas,
mão de obra e de territórios.
Tal sistema caracteriza-se pela produção em massa, uma vez que, somente
por meio dela, poder-se-ia reduzir os custos da produção e o preço de venda.
A oferta caracteriza-se como uma aspiração à venda, não podendo, dessa for-
ma, ser confundida com a venda efetiva.
Pode-se, então, a�rmar que a oferta está associada à produção, mais especi�-
camente à necessidade de produzir, que, para tanto, utiliza-se dos fatores de
produção. Esses, na acepção clássica, caracterizam-se como a Natureza ou os
recursos naturais, o capital e o trabalho.
Em primeiro lugar, porque o trabalho não se opera com uma atuação imediata so-
bre a matéria natural; diferentemente, ele exige instrumentos que, no seu desenvol-
vimento, vão cada vez mais se interpondo entre aqueles que o executam e a maté-
ria. Em segundo lugar, porque o trabalho não se realiza cumprindo determinações
genéticas; bem ao contrário, passa a exigir habilidades e conhecimentos que se ad-
quirem inicialmente por repetição e experimentação e que se transmitem median-
te aprendizado. Em terceiro lugar, porque o trabalho não atende a um elenco limita-
do e praticamente invariável de necessidades, nem as satisfaz sob formas �xas; se
é verdade que há um conjunto de necessidades que sempre deve ser atendido (ali-
mentação, proteção contra intempéries, reprodução biológica etc.), as formas desse
atendimento variam muitíssimo e, sobretudo, implicam o desenvolvimento, quase
sem limites, de novas necessidades (NETTO; BRAZ, 2008, p. 30-31).
Por esse motivo, devemos fazer uma apresentação das concepções clássicas
da economia política para que elas sejam visualizadas não somente sob pers-
pectivas e fundamentações teóricas, mas também sob in�uência de suas per-
cepções na alteração do espaço social, com base nas mudanças constantes no
sistema capitalista.
Para elaborar sua teoria, Adam Smith fez uma análise investigativa acerca
das causas da riqueza das nações, o que deu origem ao título de sua principal
obra Riqueza das nações. Essa tornou-o um dos mais importantes pensadores
liberais, passando a ser considerado o pai da Economia Política. Nela, Smith
teorizou a origem do valor, bem como a questão do preço do trabalho.
Para ele, o valor de uso estaria ligado à utilidade do bem em si, enquanto o va-
lor de troca estaria associado à capacidade de esse bem ser trocado por outros
no mercado.
Com base nessa concepção, Adam Smith desenvolveu sua teoria de divisão do
trabalho, apresentando que essa forma aumenta a produção e a produtividade.
Para tanto, a�rmou que a divisão do trabalho, visto que se especializa para
uma função, aumenta a produtividade de cada trabalhador. Essa divisão eli-
mina o tempo desperdiçado com a troca dos materiais necessários para co-
meçar uma nova função, tornando o trabalho mais efetivo.
Com efeito, Smith apontou que a divisão do trabalho, descrita por ele como ex-
tremamente bené�ca, não advém das faculdades intelectuais e sabedoria hu-
mana colocadas ao impulso de atingir a opulência, mas, sim, da tendência na-
tural do gênero humano para a troca, fato anterior à própria circulação de
bens.
Desse modo, de acordo com ele, a divisão do trabalho, fonte de riqueza das na-
ções, está intrinsecamente ligada ao tamanho do mercado e à disposição para
troca e, para tanto, surge a necessidade, na busca do desenvolvimento, de que
a sociedade institucionalize a troca entre seus agentes produtivos, fazendo
que essa sociedade torne-se mercantil.
O jogo do interesse pessoal, numa coletividade em que todos os indivíduos são mo-
tivados de maneira idêntica, leva à concorrência. Esta leva à produção dos bens de-
sejados pelo conjunto dos agentes econômicos, a preços aceitos pela maioria. Cada
indivíduo motivado pela busca de suas aspirações pessoais é incentivado a respon-
der à demanda dos outros, com o objetivo de extrair de sua atividade o maior bene-
fício possível. É o que Smith chama de "mão invisível, que guia os interesses e as
paixões individuais na direção mais favorável aos interesses de toda a sociedade"
(DROUIN, 2008, p. 21-22).
Quanto ao Estado, Smith entendeu que sua função consiste na defesa do terri-
tório e na manutenção dos princípios de justiça, ou seja, na proteção dos indi-
víduos em sociedade, bem como nas atividades econômicas sem iniciativa
privada, em razão de essas atividades não representarem lucratividade, desde
que sejam necessárias à população.
Além disso, a manutenção desse Estado deve ser feita por meio de um sistema
tributário que não penalize os setores produtivos.
Desse modo,
Malthus, que tinha consciência da imensa miséria e pobreza das massas inglesas,
que mantiveram famílias com 20 �lhos, dos quais somente 20% chegavam à idade
de 10 anos – o restante morria de fome ou doença –, prognosticou um futuro mais
pessimista em relação ao desenvolvimento populacional da Inglaterra, bem como
as conseqüências macroeconômicas e microeconômicas para a nação inglesa e
para o mundo (RASMUSSEN, 2006, p. 71).
[...] adotando meus postulados como certo, a�rmo que o poder de crescimento da
população é in�nitamente maior que o poder que tem a terra de produzir meios de
subsistência para o homem (MALTHUS, 1982, p. 282).
Para Drouin:
[...] o primeiro deles, o obstáculo destrutivo, resulta das desgraças que atingem as
populações, como as fomes, as epidemias e as guerras. O obstáculo preventivo, me-
nos doloroso, é denominado por Malthus de "coerção moral" (DROUIN, 2008, p.
58-59).
Além disso, o aumento da riqueza, que, nesse sentido, para Malthus, era fanta-
siosa, criaria um estímulo ao aumento da população.
No que tange à teoria do valor-trabalho, ele explica que uma parte do valor das
mercadorias apresentadas no mercado é fruto de dois fatores de produção: o
afazer humano, que por si só agrega valor, pois signi�ca a reprodução da força
de trabalho, e os bens de produção, ou seja, as ferramentas e as máquinas que
serão utilizadas pelo trabalhador no processo produtivo. Portanto, Ricardo ad-
mite que no valor das mercadorias esteja embutido o trabalho humano e suas
devidas técnicas utilizadas.
Ampliando a re�exão sobre essa teoria, ele revela que existe um grupo reser-
vado de produtos cujo valor não depende exclusivamente da quantidade de
afazeres necessários à sua produção, porém seu valor está materializado na
disposição de pessoas que queiram adquiri-los, ou seja, são bens considerados
"únicos".
Conforme Luchinger (2011), outra questão proposta por David Ricardo refere-se
à teoria do salário-lucro, em que o valor do trabalho humano depende dos pre-
ços dos meios de subsistência que permitam ao trabalhador reproduzir sua
força de trabalho, ou seja, quanto mais os preços dos mantimentos da alimen-
tação básica elevarem-se, maior deverá ser o salário dos trabalhadores, a �m
de que eles possam alimentar-se. Nesse momento, devem ser inclusas suas
famílias, pois eles necessitam de "energia" para dispor no trabalho, sendo "os
salários do mercado oscilantes a longo prazo, ao redor do centro de gravidade
dos salários de subsistência, que são os salários necessários para a manuten-
ção da vida".
Pensando nessa dinâmica, além de ser simpatizante com as ideias de Smith,
Ricardo destacou pontos favoráveis àquilo que seu amigo, Thomas Malthus,
tinha como concepção de mundo nesse momento histórico. Ambos são con-
cordantes que o desenvolvimento econômico é uma dualidade entre o cresci-
mento populacional e a expansão de alimentos.
Malthus, por exemplo, era um grande defensor da ideia de que a expansão de-
senfreada da taxa de natalidade desequilibraria a produção/distribuição dos
alimentos. Além dessa problemática, o controle da população faria com que o
salário do trabalhador se mantivesse em níveis mais elevados. Contudo, ainda
segundo Luchinger (2011), Ricardo também acreditava no controle da popula-
ção como um modo de manter os salários acima do mínimo da subsistência,
pois quanto maior é o número de trabalhadores, maior é a pressão sobre os sa-
lários.
Ao se referir a isso, Ricardo cunhou o termo salário natural, com o qual o trabalha-
dor deve poder �nanciar seu próprio sustento e o de sua família. No caso de uma
economia estagnada, a família tem dois ou três �lhos. Caso a economia cresça, o
salário natural será mais elevado para que a população de trabalhadores, corres-
pondente às necessidades da acumulação de capital, também possa crescer
(LUCHINGER, 2011, p. 48-49).
Ricardo explica que se o preço dos cereais britânicos é muito alto, torna-se neces-
sário importar cereais mais baratos pelas relações comerciais internacionais. Para
ele, reduzir os preços dos produtos de base – entende-se o trigo como uma excelen-
te matéria-prima – seja como for, tornar-se-ia numa redução nos salários, como já
explicitado. Todavia, ele explica que é preciso diminuir, e até eliminar, os direitos
protecionistas que impedem a importação de trigo na Grã-Bretanha (DROUIN, 2008,
p. 41).
Com efeito, ao haver grande protecionismo ao trigo inglês, na visão de David
Ricardo, cria-se um obstáculo à produção estrangeira. A ideia é a de que se de-
ve crer no livre-câmbio como um programa para o bem da nação como um to-
do e entre as nações. Num sistema liberal, cada país deve empreender seu ca-
pital do modo como julgar necessário. Em outras palavras, pode-se a�rmar
que existe uma perspectiva na qual o interesse individual conduz ao bem-
estar de toda a sociedade, chegando-se à melhor distribuição e à maior econo-
mia, unindo-se os interesses comuns entre os países. Entretanto, Ricardo
complementa:
Num sistema comercial perfeitamente livre, cada país naturalmente dedica seu ca-
pital e seu trabalho à atividade que lhe seja mais bené�ca. Essa busca de vantagem
individual está admiravelmente associada ao bem universal do conjunto dos paí-
ses. Estimulando a dedicação ao trabalho, recompensando a engenhosidade e pro-
piciando o uso mais e�caz das potencialidades proporcionadas pela natureza,
distribui-se o trabalho de modo mais e�ciente e mais econômico, enquanto, pelo
aumento geral do volume de produtos, difunde-se o benefício de modo geral e une-
se a sociedade universal de todas as nações do mundo civilizado por laços comuns
de interesse e de intercâmbio (RICARDO, 1982, p. 97).
Dessa forma, entendemos que, para ter uma maximização dos lucros, torna-se
necessário investir nas especi�cidades de cada país. Porém, estas mesmas es-
peci�cidades são determinadas por fatores importantes, por exemplo, a obten-
ção de algumas vantagens naturais, como clima, vegetação, solo e, também,
de vantagens arti�ciais, como tecnologias, ciência, entre outros.
Em suma, notamos que várias críticas foram direcionadas a David Ricardo por
outros autores, como no que concerne à teoria do livre-câmbio e à especi�ci-
dade de produção, em que as relações econômicas externas nem sempre re-
sultariam em crescimento e desenvolvimento econômico, além de desenvol-
ver uma ideia de troca desigual, principalmente entre países centrais e perifé-
ricos.
Hoje em dia, alguém como Ricardo coloca seu dinheiro em investimentos que apos-
tam na escassez de matérias-primas ou no envelhecimento das sociedades.
Ricardo não é espantosamente atual apenas nesse ponto. Suas declarações sobre a
estabilidade de uma moeda, o problema do endividamento do Estado ou a questão
de como surge o valor fazem parte do plano de aula de qualquer economista em
formação. A maneira e o método como ele desenvolveu sua teorias in�uenciam os
economistas até hoje. E quem procura por argumentos sobre os benefícios do co-
mércio internacional e da globalização do mundo, encontra os mais importantes
deles em David Ricardo (LUCHINGER, 2011, p. 44).
Todavia,
[...] as idéias nunca podem, por si mesmas, superar um determinado estado de coi-
sas: podem apenas superar as idéias desse estado de coisas. Idéias superam idéias
e não, automaticamente, situações materiais. "As idéias nunca podem realizar na-
da", assinalou Marx, "pois para a realização das idéias é preciso que os homens po-
nham em ação uma força prática" [...] o pensamento está ligado à prática, e é no uso
social que ele prova sua e�cácia, a sua qualidade (KONDER, 1999, p. 48).
Marx aprendeu com Hegel, pela leitura de seus livros, que na lógica formal a con-
tradição é sempre a manifestação de um defeito. Aprendeu, também, que a lógica
formal tem seus limites de validade e que nem todos os problemas da existência
humana estão sob a jurisdição da lógica formal. Na vida, a contradição não é mera
manifestação de um defeito, é uma realidade que não se pode suprimir.
Determinadas contradições surgem, outras desaparecem (são superadas), mas há
sempre algumas contradições pendentes de solução. [...] Hegel, todavia, com seu
método dialético, ensinou que os seres e as coisas existem em permanente mudan-
ça, entrosados uns com os outros, e que só é possível compreendê-los se desde o
início forem consideradas as suas ligações recíprocas (KONDER, 1999, p. 43-44).
O sistema social hegemônico que se estabeleceu torna-se uma tese que gera dentro
de si uma antítese. Do choque dialético entre esses dois pólos sobrevém uma nova
situação histórica, uma síntese, que ainda carrega em si elementos do velho (tese) e
do novo (antítese), que se instala, por sua vez, como tese novamente, dando curso
ao processo histórico. Essa de�nição �losó�ca levou Marx a uma concepção que
via nessa luta de opostos, que ele denominou luta de classes, o motor da História,
nos sucessivos embates entre modos de produção distintos, o �o condutor dos pro-
cessos de mudança social (FERREIRA, 2001, p. 55).
Marx não descobriu as classes e suas contradições, tal análise já havia sido
empreendida em seu tempo. Na verdade, ele desenvolveu a ideia de como as
classes sociais têm papel preponderante na evolução histórica das socieda-
des, uma vez que, para ele, como as classes sociais se de�niam pela proprieda-
de dos meios de produção, a luta delas tornar-se-ia o motor da História.
Veja o que pensa mais um autor a respeito desse assunto:
Marx, em sua obra O Dezoito Brumário de Louis Bonaparte (2003), de�niu di-
versas classes sociais, como burguesia, pequena burguesia, proletariado, e
também frações de classes, como burguesia �nanceira e burguesia industrial,
mas suas análises sempre se pautaram na questão de que as classes se vincu-
lariam aos meios de produção, mais especi�camente, à propriedade dos meios
de produção.
Outro conceito desenvolvido por Marx foi o de alienação, elaborado com base
nas leituras de Hegel, culminando com a análise das condições do proletaria-
do no capitalismo, uma vez que, nesse modelo de sociedade, ele perdeu a pos-
se de sua força de trabalho, porque ela se tornou mercadoria como qualquer
outra, sendo vendida no mercado na esteira da oferta e da procura, em sua
complexa variação.
No sistema atual, o trabalhador produz bens que não lhe pertencem e cujo destino,
depois de prontos, escapa ao seu controle. O trabalhador, assim, não pode se reco-
nhecer no produto do seu trabalho, não pode encarar aquilo que criou como fruto
da sua livre atividade criadora, pois se trata de uma coisa que para ele não terá uti-
lidade alguma. A criação (o produto), uma vez que não pertence ao criador (o operá-
rio), se apresenta diante dele como um ser estranho, uma coisa hostil, e não como
resultado normal da sua atividade e do seu poder de modi�car livremente a nature-
za (KONDER, 1999, p. 34).
Os regimes nos quais os meios sociais de produção são privados (em especial,
o capitalismo) levam os homens a serem transformados em meros meios de
produção na geração da riqueza particular. E, dessa forma, o trabalhador está
condicionado ao produto e a suas exigências (exigências do capitalismo relati-
vo ao mercado, mais especi�camente, na venda do produto), ao invés da cria-
ção livre do produtor. Assim, a superação da alienação estaria em torno da
abolição da propriedade privada e do trabalho estranhado.
Essa mais-valia é apropriada pelo capitalista que, dessa forma, toma para si
um valor gerado pelo trabalho empreendido pela classe proletária.
[...] Marx denominou este processo de exploração, uma vez que ele entendeu ser a
taxa da mais-valia a expressão concreta do grau de exploração a que os assalaria-
dos são submetidos em função da venda de sua força de trabalho. Esse conceito foi
elaborado com base em uma de�nição que �cou conhecida como teoria do valor,
que, grosso modo, entende por valor a quantidade de trabalho social incorporada a
uma mercadoria, esclarecendo que esse tipo de trabalho refere-se ao tempo neces-
sário a sua produção.
A mais-valia não deve ser confundida apenas com o lucro do capitalista. Marx
apontou que esse seria apenas uma parte da mais-valia. Em sua análise
econômica, ela abrangeria, também, o dinheiro que ele é obrigado a reservar
para o funcionamento e desenvolvimento de seu negócio, bem como qualquer
tipo de juros e rendas que a propriedade possa auferir.
Analise o trecho seguinte.
Uma coisa, porém, é certa: "toda mais-valia – seja qual for a forma especí�ca em
que ela se cristalize (lucros, juros, rendas etc.) – é sempre, substancialmente, a ma-
terialização de tempo do trabalho não pago".
A expectativa que Smith tinha com a fragmentação do trabalho era que pu-
desse haver melhor desempenho quanto à quantidade produzida, quando se
reduzissem as tarefas no tamanho e na complexidade, essas designadas a in-
divíduos dentro de um processo produtivo.
Logo, Drouin (2008) explica que Malthus subdividiu a classe operária em dois
subsetores: o exército ativo (os que trabalham) e o exército industrial de reser-
va (os desempregados). Essa população operária foi muito importante nos es-
tudos de Marx, que a colocou na lógica da exploração capitalista. Divergiu, as-
sim, das ideias de Malthus, quando a�rmou que a coerção moral poderia ser
um fator limitante do crescimento populacional.
Desse modo,
[...] Demos à nossa teoria o nome de "teoria geral" [...]. Com isso, quisemos apontar
que tínhamos em vista, sobretudo, o funcionamento do sistema econômico tomado
em seu conjunto, que tomávamos os rendimentos globais, os lucros globais, a pro-
dução global [...]. E cremos que se cometeu um grave erro ao estender para o siste-
ma tomado em conjunto conclusões que haviam sido corretamente estabelecidas
considerando apenas uma parte do sistema tomada isoladamente (KEYNES, 1936
apud DROUIN, 2008, p. 115-116).
A metáfora utilizada por ele sinaliza que, no curto prazo, variações no estoque de
moeda in�uenciam as expectativas do público e do sistema bancário em relação às
suas decisões de demanda por moeda e de expansão da oferta de crédito, respecti-
vamente, afetando, assim, o nível geral de preços.
Em relação à taxa de juros, Keynes rompeu com a visão clássica de que essa
regulava menos o mercado de capitais do que a oferta e a demanda de moeda
(as curvas de oferta e demanda são interdependentes). Para ele, a moeda atua-
va diretamente sobre a economia por meio das taxas de juros, que consistiam
em um prêmio pela renúncia à liquidez; e é determinada pela preferência à li-
quidez e pela quantidade de moeda em poder das autoridades monetárias.
No entanto, Keynes contestava veementemente essa teoria, pois, para ele, ha-
vendo diminuição dos salários, também haveria diminuição dos preços, inal-
teração dos lucros e de empregos. Em suma, o que move a teoria keneysiana
são os empregos e os investimentos das empresas, logo, diminuição de salário
e desemprego acarretam perda do poder aquisitivo e redução das despesas de
consumo.
Keynes defendeu a tese de que deve haver políticas econômicas que permitam
a volta ao pleno emprego, por meio de armas orçamentárias e monetárias que
ajudem a regulamentar a situação econômica. O Estado deve ampliar suas
funções e intervir na fase recessiva dos ciclos econômicos para evitar a des-
truição das instituições econômicas e manter o pleno emprego.
Dos estudos de Keynes, podemos concluir que seu objetivo era manter o cres-
cimento da demanda em igualdade com o aumento da capacidade produtiva
da economia, de forma a garantir o pleno emprego sem exageros para que não
houvesse in�ação.
Em resumo,
De maneira geral, podemos concluir que, anos após ter exposto suas teorias,
elas ainda servem de base para buscar reverter os grandes problemas econô-
micos ocorridos no mundo, como aconteceu na década de 1930, momento em
que o capitalismo se encontrava em crise.
Antes, porém, é preciso deixar claro que o fato de Marx se propor a uma visão
crítica aos clássicos da economia burguesa não signi�cava, para ele,
desmerecê-los. Ao contrário, eram constantes as a�rmações, explícitas ou su-
bentendidas, sobre a seriedade com que, segundo a visão marxiana, os seus
interlocutores tratavam daqueles pontos criticados, especialmente em se tra-
tando da relação trabalho, lucro e renda da terra.
Nesse período, acreditava-se que a nação que tivesse o maior volume de ouro
impunha o valor do peso/ouro, como foi o caso da Espanha. E, como o ouro era
a moeda que tinha o trânsito entre as nações, o comércio passou a ser visto
como o meio de maior ou menor enriquecimento. Dessa forma, países como a
Inglaterra e a França produziam mercadorias para vender aos países que ti-
vessem ouro su�ciente para comprá-las; a Espanha era um desses países
mais fortes.
De acordo com Marx (apud MORAES et al., 1987), além da categoria lucro, Petty
também fazia incursões teóricas para entender a verdadeira origem do valor,
ou seja, o trabalho dependido pelo trabalhador para produzir mercadorias.
Para Petty, a maneira correta de estabelecer o valor da moeda era estabelecer
o valor do trabalho e não da moeda em si. Mas, para tanto, o comércio, segun-
do ele, tinha de contar com o poder de Estado para estabelecer as regulações
nas transações comerciais entre as nações.
Numa visão oposta à dos �siocratas, Smith entende que só o trabalho incorpo-
rado ao produto, qualquer que ele seja, é capaz de gerar lucro, independente-
mente de seu tipo, ou seja, tanto no campo quanto na cidade, por meio da in-
dústria.
Mas, o que integraria esses três elementos? Para ele, o fundamento do valor na
produção burguesa, aquela produção na qual predomina o uso intensivo do ca-
pital, independentemente do uso da terra, dá-se por meio do tempo de traba-
lho. Assim, não basta se contentar em a�rmar que o lucro é resultado do traba-
lho no campo ou na cidade (indústria), mas é preciso estabelecer um pa-
râmetro único e válido para todas as situações em que o trabalho esteja em jo-
go, seja para o capitalista, seja para o trabalhador propriamente. A�nal, a que
trabalho estamos nos referindo?
Embora Marx elogie o avanço da visão teórica de Ricardo em relação aos seus
predecessores, também chama a atenção para o fato de esse economista dei-
xar de lado ou não se ter apercebido que o capital, ou capitalista, acaba por
lançar mão de uma visão de trabalho que favorece, antes de mais nada, o pró-
prio detentor do capital do que àquele que apenas detém a sua mão de obra, ou
seja, o próprio trabalhador. É o chamado "trabalho abstrato". O salário torna-se
a mediação, qual seja: a de atender às necessidades de reproduzir o "trabalho
abstrato", que recai numa outra categoria não menos abstrata: "o trabalhador".
O salário visa à reprodução das energias para se restabelecer a mercadoria
conhecida como "mão de obra" e, assim, essa mercadoria estar sempre à dis-
posição do capital e da produção no campo ou na cidade (mais na cidade do
que no campo).
Entende-se por capital constante aquele que empregou o dinheiro nos meios
de produção (matérias-primas, também entendidas como capital circulante, e
maquinarias, também entendidas como capital �xo). Essas duas modalidades
de capital constante (o circulante e o �xo) são depositários de "trabalho mor-
to", que será reavivado pelo valor-trabalho. Assim, em relação à segunda fra-
ção do capital (o variável), trata-se da massa de dinheiro que o capitalista in-
veste na compra de uma mercadoria especial: a força de trabalho, que, ao ser
consumida durante o processo de produção, acaba por dar vida ao "trabalho
morto", representado pelo capital constante. Desse modo, as duas modalidades
estão articuladas numa dependência intrínseca e inevitável (MARX, 1983).
Em relação ao capital, a força de trabalho é vista e tratada como mercadoria,
ou seja, como qualquer outra mercadoria, ela tem um preço. Esse preço será
determinado pelo tempo de trabalho socialmente necessário para a reprodu-
ção do trabalhador, o que será levado em conta para que os salários sejam de�-
nidos. Contudo, em relação a outras mercadorias, esta é a única que cria valor.
Não se trata de um valor qualquer, mas de um valor resultante da venda da
mercadoria produzida pelo trabalhador: o "mais-valor" ou o lucro, também re-
ferido como . Assim, Marx desvenda as chaves que podem levar à
compreensão do âmago da produção e reprodução capitalistas.
Cabe, aqui, uma observação: o termo "improdutivo" não deve ser tomado ao pé
da letra, no sentido de "algo imprestável". Ao contrário, seu consumo "impro-
dutivo" é condição da produção enquanto condição de reprodução do próprio
espaço. Tomemos como exemplo o consumo social do espaço urbano. Ele traz
consigo as contradições desse modo de produção. Se veri�carmos, por exem-
plo, os movimentos dos "sem teto" nas grandes metrópoles contemporâneas,
eles acabam por integrarem as chamadas "lutas sociais urbanas", que nada
mais são do que a expressão (espacial) da luta de classe. Em outras palavras, o
consumo "improdutivo" do espaço remete, na sua plena expressão, aos condi-
cionamentos da luta política de cada lugar ou localidade. Vejamos, a seguir, as
imbricações que incidem no desdobramento do espaço geográ�co entre o ru-
ral e o urbano.
7. Considerações
Chegamos ao �m deste primeiro ciclo, na qual pudemos observar as noções
introdutórias à Economia Política, evidenciando a questão dos fatores da pro-
dução, bem como o funcionamento da oferta e da procura.
Veri�camos, também, o pensamento clássico da Economia Política, estudando
as principais características das teorias formuladas por Adam Smith, Thomas
Malthus, Karl Marx e John Maynard Keynes, que buscaram, na sua época,
tanto analisar o momento vivido pelo sistema econômico quanto intervir em
seu funcionamento.
gs0081-fev-2023-grad-ead/)
Objetivos
• Examinar a relação entre sociedade e natureza e seus desdobramentos.
• Conceituar a teoria da regulação e o desenvolvimento dos meios de pro-
dução, analisando como esses processos alteram o espaço e, simultane-
amente, a sociedade.
Conteúdos
• Regulação da economia.
• Explicações do desenvolvimento econômico.
• Problemas na economia nacional.
• Questões sobre a globalização econômica.
Problematização
Como ocorre o desenvolvimento social em face da natureza? Como se dá a di-
cotomia homem versus natureza? Como ocorre a divisão do trabalho no capi-
talismo? Quais os conceitos apresentados pela teoria da regulação? Quais
seus efeitos no processo produtivo capitalista? No que consiste o tayloris-
mo/fordismo? Quais transformações ocorreram sob sua in�uência? Em qual
contexto se dá a transição do fordismo ao pós-fordismo? Como se caracteriza
o Estado neoliberal? No que consiste a acumulação �exível? Quais as con-
sequências para a produção do espaço geográ�co?
1. Introdução
Neste ciclo, buscaremos a compreensão das relações entre sociedade e natu-
reza. Também iremos investigar a teoria da regulação e o desenvolvimento
dos meios de produção e sua in�uência na produção do espaço. Esses temas,
por sua vez, trazem consigo, como veremos, conotações sobre a valorização do
espaço geográ�co.
Não há produção que não seja produção do espaço, que se dê sem o trabalho. Viver
para o homem, é produzir espaço. Como o homem não vive sem trabalho, o proces-
so de vida é um processo de criação do espaço geográ�co. A forma de vida do ho-
mem é o processo de criação do espaço. Por isso a Geogra�a estuda a ação do ho-
mem.
De acordo com Quaini (1979 apud MOREIRA, 1994, s.n.), "[...] Homem e natureza
formam uma unidade orgânica, uma identidade, nas sociedades naturais e
entes distintos e separados organicamente nas sociedades históricas."
Nas sociedades naturais, assim chamadas porque a terra é o meio universal de tra-
balho, há uma unicidade orgânica entre o homem e a natureza. O ritmo do trabalho
e da vida dos homens repete o ritmo da natureza. O espaço geográ�co é o próprio
espaço natural [...] a terra é a despensa primitiva e o arsenal primitivo.
Trabalhando-a, tiram os homens o seu sustento e os instrumentos de trabalhos no-
vos. A natureza-terra é a condição da produção/reprodução das relações entre os
homens.
3. A dicotomia homem/natureza
Nas sociedades capitalistas, o vínculo, a unicidade orgânica entre homem e
natureza, será rompido, e esse rompimento ocorrerá por meio da proletariza-
ção dos trabalhadores e da apropriação da natureza. O ritmo do trabalho e dos
homens não será mais o ritmo da natureza e, sim, o ritmo do capital. A relação
que se estabelecerá será uma relação de exterioridade, uma relação entre es-
tranhos, isto é, natureza e homem irão deparar-se como estranhos. O trabalho
que liberta o homem, na sociedade capitalista, o faz cativo. Mas como enten-
der a dicotomia homem/natureza?
5. Revolução industrial
A Revolução Industrial é um fenômeno que se desenvolve num processo de
grandes transformações não somente técnicas, mas, especial e fundamental-
mente, políticas, econômicas e sociais.
A jornada de trabalho, que o operário deverá enfrentar terá como características bá-
sicas a uniformidade, regularidade e a continuidade, devidamente vigiadas: tal fato
vai aumentar a intensidade do processo de trabalho requerida pela racionalidade e
e�ciência, contrariamente àquela desenvolvida no campo, onde o ritmo do trabalho
é dado pelas condições naturais.
Como foi dito anteriormente, a Revolução Industrial foi muito mais do que
uma revolução tecnológica:
Segundo Lipietz (1977), a divisão do trabalho social apresenta-se sob dois as-
pectos: uma divisão horizontal e uma divisão vertical. A divisão horizontal
refere-se à divisão entre os ramos de atividade, enquanto a divisão vertical diz
respeito àquela entre os grupos sociais, dominantes e dominados, havendo in-
teração entre divisão social e técnica do trabalho.
7. Teoria da regulação
A escola da regulação é uma corrente teórica que se desenvolveu na França,
com base nos conceitos elaborados por Michael Aglietta em sua obra
Regulations et crises du capitalisme (Regulação e crises do capitalismo), de
1976.
David Harvey (1998) de�ne com exatidão a escola da regulação ao a�rmar que:
[...] Seu argumento básico, que teve como pioneiro Aglietta (1979) e como proposito-
res Lipietz (1986), Boyer (1986a; 1986b) e outro, pode ser resumido em poucas pala-
vras. Um regime de acumulação "descreve a estabilização, por um longo período,
da alocação do produto líquido entre consumo e acumulação; ele implica alguma
correspondência entre a transformação tanto das condições de produção como das
condições de reprodução de assalariados". Um sistema particular de acumulação
pode existir porque "seu esquema de reprodução é coerente". O problema, no entan-
to, é fazer os comportamentos de todo tipo de indivíduos – capitalistas, trabalhado-
res, funcionários públicos, �nancistas e todas as outras espécies de agentes
político-econômicos – assumirem alguma modalidade de con�guração que mante-
nha o regime de acumulação funcionando. Tem de haver, portanto, "uma materiali-
zação do regime de acumulação, que toma a forma de normas, hábitos, leis, redes
de regulamentação etc. que garantam a unidade do processo, isto é, a consistência
apropriada entre comportamentos individuais e o esquema de reprodução. Esse
corpo de regras e processos sociais interiorizados tem o nome de modo de regula-
mentação" [...] (LIPIETZ, 1986 apud HARVEY, 1998, p. 117).
8. Taylorismo/fordismo
Ao longo dos séculos, o trabalho sempre esteve, mesmo que de diferentes for-
mas, associado à vida humana. Por meio dele, a sociedade impulsionou-se pa-
ra o desenvolvimento de forças produtivas, distinguindo o ser humano dos ou-
tros animais por conta de suas ações no processo de transformação da
Natureza.
De fato, o trabalho é uma categoria fundante do ser social, sendo ponto de par-
tida para o desenvolvimento das necessidades humanas, transformando o ho-
mem objetiva e subjetivamente.
Para tanto, são indicados quatro aspectos que mostram tal importância:
Por esses motivos – e talvez por mais alguns outros não explicitados –, pode-
mos compreender como o setor automobilístico foi importante para o desen-
volvimento do sistema capitalista no século 20.
Para analisarmos tal fato histórico, retornemos ao início do século 20, mais
enfaticamente ao contexto da produção cientí�ca de Taylor e ao pragmatismo
de Ford.
Frederick Winslouw Taylor (1856-1915) nasceu nos Estados Unidos da
América, no estado de Filadél�a. Iniciou sua carreira como aprendiz de mecâ-
nico, graduou-se em Engenharia, no Stevens Institute of Technology. Foi
engenheiro-chefe das fábricas de aço Midway e trabalhou em empresas que
adotaram seu sistema de racionalização da produção. Em 1906, foi eleito presi-
dente da Associação Americana de Engenheiros Mecânicos.
Em relação à ideologia taylorista, Moraes Neto (1991, p. 32- 33) indica-nos três
pontos que julga fundamentais:
Há, portanto, uma separação entre trabalho intelectual e trabalho manual, re-
servando o primeiro, exclusivamente, aos diretores e gerentes, enquanto o se-
gundo caberia aos trabalhadores, no chão da fábrica. "Caracteriza-se o taylo-
rismo, portanto, como controle do trabalho (pelo capital) através do controle
das decisões que são tomadas no curso do trabalho" (MORAES NETO, 1991, p.
33).
Com essa divisão, torna-se explícita a concepção de quem tem a função ma-
nual e a função intelectual, traçando as metas de quem executa, planeja e rea-
liza.
Observamos que não são somente as bases técnicas de produção que �cam à
mercê das determinações do capital. Tal ideia lança-se para dominar, de modo
subjetivo, o próprio trabalhador, fazendo com que este se transforme em uma
máquina.
Como não poderia deixar de ser, a indústria produz o grau máximo de cisão
entre o trabalho intelectual e o trabalho manual, empregando a ciência no pro-
cesso produtivo pela introdução da maquinaria. Entretanto:
Taylor tinha a convicção, e reiterava isso em diferentes momentos, de que ele havia
proporcionado uma transformação decisiva para a sociedade industrial, não ape-
nas com a criação de uma ciência do trabalho, mas a operacionalização de uma
verdadeira revolução nas relações entre capital e trabalho (SAUL, 2004, p. 18).
Para que seus preceitos pudessem ser colocados à prova, Henry Ford criou
uma revolução no sistema de produção de automóveis baseado nas ideias de
Taylor, caracterizando o sistema fordista-taylorista.
Tal sistema caracteriza-se pela produção em massa, uma vez que somente por
meio dela poderiam reduzir os custos da produção e o preço de venda dos veí-
culos.
Ainda caracteriza tal sistema produtivo grande número de empregos e conse-
quente achatamento de salários; racionalização de produção por meio da divi-
são de tarefas (fundado em Taylor), não sendo necessária especialização ou
treinamento especí�co, apenas força física e mental para um processo de pro-
dução constituído por trabalho repetitivo, obtendo, assim, a produção em mas-
sa. Nesse contexto, houve a necessidade de grandes galpões para estocagem.
Buscando a redução máxima dos gastos de produção, Ford teve a ideia de pa-
dronizar as peças; portanto, um mesmo componente era montado em um
mesmo modelo. Além disso, ele tomou a iniciativa de comprar as �rmas que
fabricavam peças. Desse modo, "[...] o empresário se atira à integração vertical,
ou seja, ao controle direto de um processo de produção, de cima a baixo"
(GOUNET, 1999, p. 19).
Promovendo enorme publicidade nos jornais, dez mil pessoas foram disputar
as cinco mil vagas postas à disposição em uma de suas fábricas. Apesar do
tumulto instalado, Ford conseguiu seu objetivo de contratar o número de mão
de obra necessário. Essa atitude tomada por Ford obviamente não chamara a
atenção dos trabalhadores por conta de um salário que pudesse fazer que
comprassem os carros que produzissem, pois a remuneração não seria su�ci-
ente, mas a ideia do empresário era diminuir a rotatividade dos trabalhadores,
economizando dinheiro no gasto de preparação e treinamento de mão de obra.
Entretanto, alguns autores, como Harvey (1998) e Kumar (1997), a�rmam que a
organização do trabalho difundida por Ford não passava de uma reestrutura-
ção daquilo que já se fazia no século 19. Contudo, o diferencial de Ford:
[...] era a sua visão, seu reconhecimento explícito de que produção de massa signi�-
cava consumo de massa, um novo sistema de reprodução da força de trabalho, uma
nova política de controle e gerência do trabalho, uma nova estética e uma nova psi-
cologia, em suma, um novo tipo de sociedade democrática, racionalizada, mo-
dernista e populista (HARVEY, 1998, p. 121).
[...] enviou um exército de assistentes sociais aos lares dos seus trabalhadores "pri-
vilegiados" (em larga medida imigrantes) para ter certeza de que o "novo homem"
da produção de massa tinha o tipo certo de probidade moral, de vida familiar e de
capacidade de consumo prudente (isto é, não alcoólico) e "racional", para responder
às necessidades e expectativas da corporação (HARVEY, 1998, p. 122).
Entretanto, tal modo de vida imposto pelo empresário com certeza não teria
vida longa, mas pôde servir como pressuposto para os problemas políticos, so-
ciais e psicológicos que o fordismo iria trazer.
Tal situação só foi resolvida após 1945. Nesse período pós-guerra, o fordismo
aliou-se à nova forma de ideologia estatal, conhecida como "Estado de bem-
estar social" ( ), que tinha como base econômica a doutrina key-
nesiana (keynesianismo). Com base nesse princípio, Fiori (1995) indicou qua-
tro considerações, as quais acreditava serem fundamentais para o sucesso da
implementação do Welfare State e para a sua relação com o fordismo:
Contudo, de modo geral, com esse novo modo de regulação estatal, podemos
notar um avanço nas melhorias de modernas corporações, o fortalecimento
de sindicatos, entre outros.
Dentre as mudanças ocasionadas pelo Estado de bem-estar social, destacam-
se:
O Estado, por sua vez, assumia uma variedade de obrigações. Na medida em que a
produção de massa, que envolvia pesados investimentos em capital �xo, requeria
condições de demanda relativamente estáveis para ser lucrativa, o Estado se esfor-
çava por controlar ciclos econômicos com uma combinação apropriada de políti-
cas �scais e monetárias no período pós-guerra. Essas políticas eram dirigidas para
áreas de investimento público – em setores como transporte, os equipamentos pú-
blicos etc. – vitais para o crescimento da produção e do consumo de massa e que
também garantiam um emprego relativamente pleno. Os governos também busca-
vam fornecer um forte complemento ao salário social com gastos de seguridade
social, assistência médica, educação, habitação etc. Além disso, o poder estatal era
exercido direta ou indiretamente sobre os acordos salariais e os direitos dos traba-
lhadores na produção (HARVEY, 1998, p. 129).
Alta, colari-
Baixa Variável Moderada
nho azul
Fragmentada Periódica
Fraca com
entre indústri- com movi- Estruturada e
facciosismo
as e categori- mentos de uni�cada
político
as massa
Outras diferenças são notórias no que tange aos padrões de gastos públicos, da
organização e da estrutura do Welfare State. Todavia, as organizações traba-
lhistas e os sindicatos também variavam, consideravelmente, de país para
país.
Como a demanda pela fabricação era menor no Japão, foi possível a produção
de modelos diversi�cados. Com todos esses aspectos, o sistema taylorista/for-
dista não atingiu, completamente, o Estado- japonês, ou seja, outro mo-
delo de sistema produtivo teve de ser desenvolvido para suprir as necessida-
des do Japão, modelo este que veremos mais adiante.
Além disso, de acordo com Harvey (1998, p. 135): "[...] toda tentativa de superar
esses problemas de rigidez encontrava a força aparentemente invencível do
poder profundamente entrincheirado da classe trabalhadora". Toda essa aus-
teridade do estado foi intensi�cando-se até o ponto em que os gastos públicos
saíram do controle, dando margem a sérios problemas �nanceiros. Diante dis-
so:
No �nal da década de 1970 e início dos anos 1980, a política e a vida social co-
meçaram a tomar um feitio de progresso. Uma nova maneira de organização
industrial começou a ser desenvolvida.
Talvez uma das maiores mudanças no trabalho, em geral, tenha sido o fato de
que os trabalhadores temiam a perda de estabilidade no emprego, ou seja, a re-
dução do emprego regular. Em detrimento a esse fato, cresceu, consideravel-
mente, o uso do trabalho em tempo parcial, temporário ou subcontratado.
Com efeito, surgiu, nas empresas, determinado grupo de pessoas que traba-
lham em tempo integral, com mais segurança no emprego, boas condições de
promoção e que devem atender às expectativas de ser trabalhador �exível,
adaptável e, se necessário, geogra�camente móvel. Nesse grupo, podemos
considerar administradores, publicitários e outros.
Individualista e
Consultores, ar- regida pelo merca-
Troca de bens e
Autônoma tesãos e setor do, antimonopólio
serviços
informal ou regulamenta-
ção estatal
Acordos internos,
Coletivos e coo-
Cooperativa intercâmbio exter- Negociação
perativas
no
Pequenas �r-
Parentesco baseado
Patriarcal mas familiares Paroquial
em idade e sexo
(exploradoras)
Comunidade base-
Grandes �rmas
Paternalismo co- ada em normas, em
domésticas (tra- Aparência e status
munitário costumes e na for-
balho duro)
ça
Possibilidade de
Sistemas corpo- Racionalidade, leal- ascensão funcio-
Paternalismo bu-
rativos e de ge- dade e antiguidade nal e competição
rocrático
rência estatal calculadas dentro das organi-
zações
Impérios hierar-
quicamente or- Relações de poder e
Barganhas, ga-
ganizados na troca de favores
Patrimonial nhos mútuos e lu-
produção, no co- (privilégio tradicio-
tas dinásticas
mércio ou nas nal)
�nanças
Compra e venda de
força de trabalho e Competição no
Empresa capita-
controle sobre o mercado, ação co-
Proletária lista e sistema
processo de traba- letiva, negociação
de fábricas.
lho e os meios de e luta de classes.
produção.
: adaptado de Deyo (1987) apud Harvey (1998).
Aliás, como não pode deixar de ser lembrado, essas novas e antigas formas de
organização do trabalho são usadas como estratégias de sobrevivência para os
desempregados ou pessoas que sofrem algum tipo de discriminação, como
imigrantes, negros ou, até mesmo, as mulheres.
Outro fator de elucidação para essa grande mudança no sistema produtivo foi
o fato de que, no sistema fordista, algumas empresas monopolizaram produ-
tos, tomando grande espaço no mercado mundial. Porém, na acumulação �e-
xível, a concorrência aumentou aceleradamente, fazendo que as empresas
buscassem alternativas para ocupar espaços no mercado. Assim, uma dessas
alternativas manifestou-se no grande número de fusões entre grandes empre-
sas. "As companhias norte-americanas gastaram 22 bilhões de dólares com-
prando umas às outras em 1977, mas, por volta de 1981, a cifra chegara a 82 bi-
lhões [...]" (HARVEY, 1998, p. 150).
Talvez um dos maiores trunfos de todas essas mudanças tenha sido o avanço
tecnológico, sobretudo no que tange ao acesso à informação, cada vez mais rá-
pida e precisa. Torna-se mercadoria muito valorizada, bem como seu controle,
por uma minoria de grandes corporações.
Um dos traços marcantes do atual período histórico é, pois, o papel verdadeiramen-
te despótico da informação. [...] Todavia, nas condições atuais, as técnicas da infor-
mação são principalmente utilizadas por um punhado de atores em função de seus
objetivos particulares. Essas técnicas da informação (por enquanto) são apropria-
das por alguns Estados e por algumas empresas, aprofundando assim os processos
de criação de desigualdades (SANTOS, 2003, p. 38).
Como disse Gramsci (1978, p. 381), com o fordismo, "[...] a superioridade vem da
fábrica".
Como aponta Filgueiras (2012), o neoliberalismo pode ser visto como ideologia
ou, ainda, como um conjunto de políticas econômico-sociais. Como ideologia,
in�uenciou o comportamento de indivíduos e grupos sociais, sendo reivindi-
cado por intelectuais e governantes; como conjunto de políticas, foi adotado
pela maioria dos atuais governos.
Nas palavras de Santos (2004, p. 176), "[...] quando se trata de defender esses
interesses, a economia de mercado é mandada às favas [...]".
Tais políticas permitiram criar uma atmosfera social favorável – por meio do
desemprego em massa – para que as empresas retomassem o controle sobre o
ritmo e a mobilidade do processo de trabalho (NETO, 1998).
O capital, portanto, posto sob o comando das políticas neoliberais, atinge uma
�exibilidade tal que o libera de todas as amarras e restrições para atingir o
máximo de acumulação possível.
Desregulamentação/rerregulamenta-
Regulamentação
ção.
Rigidez. Flexibilidade.
Divisão/individualização, negocia-
Negociação coletiva.
ções locais ou por empresa.
Descentralização e agudização da
Centralização. competição inter-
regional/interurbana.
Modernismo. Pós-modernismo.
Desse modo, cabe às ciências humana e social apresentar de forma clara a re-
alidade, podendo assim racionalizar o funcionamento da economia, bem co-
mo o próprio funcionamento da sociedade.
Concepção pós-moderna
O pós-modernismo contesta as a�rmações e fundamentações da modernida-
de.
Para tanto, busca apresentar o mundo como uma pluralidade em que espaço e
tempo se con�gurariam de modo heterogêneo, existindo mais diferenças e
contingências do que fenômenos semelhantes ou universais, denotando nova
perspectiva baseada em contextualidades, impossibilidade de determinações
e incertezas.
Alguns autores como Lyotard (2002) e Foucault (2004), que assumiram as con-
cepções teóricas pós-modernas, buscaram não apenas teorizar o atual estágio
de mudança político-econômico-social, mas também desenvolver novas cate-
gorias de análise e novas formas radicais de pensamento e discurso, na clara
tentativa de construir um "novo conhecimento".
[...] rejeita o Estado de bem-estar social, o qual alega constituir um grande avanço
na solidariedade social, pois o indivíduo abandona a responsabilidade por seu pró-
prio destino pessoal. Por força do Estado-nação e de seus muitos projetos de buro-
cratização, a individualidade tornou-se uma casca vazia. Um princípio central da
pós-modernidade de Lyotard é sua insistência na "diferença". Ela requer pluralismo
na escolha e ação individuais. A ética universalista elimina a legitimidade da dife-
rença individual e do pluralismo (SHINN, 2008, p. 51).
Para Lyotard (2002), a produção cientí�ca pode ser vista como "jogos de lin-
guagem", nos quais as regras não possuem legitimação em si mesmas, mas
são objetos de um contrato explícito ou não entre os jogadores, ainda que estes
não se inventem, em que sem tais regras não existe jogo, ou seja, é uma dispu-
ta na qual todo enunciado pode ser considerado como um lance.
Na mesma esteira, aponta que a legitimação do saber no mundo pós-moderno
abandona as metanarrativas e não pode se legitimar de outro lugar, senão de
sua prática de linguagem e de sua interação comunicacional. Deduz que a "di-
ferença" é intrinsecamente revolucionária, como único obstáculo insuperável
contra o qual se choca a hegemonia do gênero econômico. Conclui-se que, da-
da a diversidade dos variados jogos de linguagem, não há como abarcar tal
dissenso em um consenso ou em uma metanarrativa.
Dessa maneira:
O recurso aos grandes relatos está excluído; não seria o caso, portanto, de recorrer
nem à dialética do Espírito nem mesmo à emancipação da humanidade para a va-
lidação do discurso cienti�co pós-moderno. Mas [...] o "pequeno relato" continua a
ser a forma por excelência usada pela invenção imaginativa e antes de tudo pela
ciência. Por outro lado, o princípio do consenso como critério de validação também
parece insu�ciente (LYOTARD, 2002, p. 111).
Esse autor centra-se em desenvolver, por meio de uma forma radical de dis-
curso, novas categorias de pensamento que resultariam em novas formas de
conhecimento e de interpretação dos fenômenos.
Como a�rma Zygmunt Bauman (1998), tal como no caso dos signos repletos de
possibilidade enquanto permanecem livres de signi�cados, a essência da livre
escolha é o esforço para abolir a escolha.
Como salienta Ron Martin (1996), algumas mudanças nos processos econômi-
cos contemporâneos precisam ser consideradas, uma vez que:
Sem dúvida, uma das mudanças mais profundas é o advento de um novo "pa-
radigma tecno-econômico" baseado em informação [...] a segunda mudança
foi a aceleração na "terceirização" do desenvolvimento econômico [...] serviços
de setor privado, o produtor, o consumidor, o setor �nanceiro, o setor cultural e
de lazer e o pessoal, todos se expandiram ao mesmo tempo que a manufatura
estagnou ou, em muitos casos desindustrializou-se [...] um terceiro desenvol-
vimento signi�cativo é a tendência para o que tem sido chamado "hipercon-
sumismo" [...] que é simultaneamente mais individualizado, internacionaliza-
do e multidimensional [...] a quarta grande mudança é a da globalização
(MARTIN, 1996, p. 34).
Os eventos espaciais ocorridos nas localidades devem ser explicados com ba-
se nos termos de encaixe e interação de ambos. Desse modo, deve-se conside-
rar o local, em sua especi�cidade, atrelado com estruturas mais gerais, como
regional, nacional e mundial, com importância relativa às interações ocorri-
das nas diferentes espacialidades.
Neste momento, re�ita sobre sua aprendizagem, respondendo à questão a se-
guir.
11. Considerações
No decorrer deste ciclo, analisamos a relação homem-natureza nos diferentes
momentos históricos e discutimos a dicotomia homem-natureza e a sua rela-
ção com o desenvolvimento e a consolidação das relações capitalistas de pro-
dução.
gs0081-fev-2023-grad-ead/)
Objetivos
• Contextualizar a Geogra�a Política e a Geopolítica, enquanto concepção
teórica e prática do Estado Nacional moderno e contemporâneo.
• Apresentar e discutir os conceitos relacionados à Geogra�a Política e à
Geopolítica, bem como suas respectivas aplicações históricas.
• Analisar as principais teorias da Geopolítica Clássica.
Conteúdos
• Geopolítica: conceitos e controvérsias.
• Geopolítica Clássica.
Problematização
O que é Geopolítica? Quais as diferenças entre Geopolítica e Geogra�a
Política? Quais as diferenças e semelhanças entre as teorias geopolíticas dos
três primeiros importantes teóricos da Geopolítica (Mahan, Mackinder e
Haushofer)?
1. Introdução
Neste ciclo, apresentaremos a Geopolítica, a partir conceitos e controvérsias,
bem como as origens do pensamento geopolítico na Alemanha, nos Estados
Unidos e no Reino Unido, veri�cando como esses processos se imbricam nas
relações entre o território e o poder.
A Geopolítica é considerada uma ciência prática, uma técnica, uma arte, cujo
objetivo é a formulação de teorias e projetos estratégicos de ações voltadas pa-
ra as relações de poder entre os Estados e as conquistas territoriais. É uma
disciplina dinâmica que relaciona as estratégias políticas para a obtenção de
poder e controle de um território ou recurso. Alguns acadêmicos defendem
que é uma ciência aplicada, interdisciplinar, ideológica, multitemática e, por
ter sido muito utilizada nos períodos das Grandes Guerras Mundiais, �cou en-
tão estigmatizada após esses períodos.
Devido ao contexto de sua época, ele foi in�uenciado pelo sentimento nacio-
nalista germânico e pelo darwinismo social, tornando-se um defensor da polí-
tica expansionista de Otto von Bismark, o “chanceler de ferro”, para a consoli-
dação do território do Estado alemão.
Todas essas estratégias e ações dos povos para avançar, proteger ou controlar
seus espaços, poderíamos já considerar como princípios da Geopolítica.
Quando um povo consegue dominar um espaço, prevalecendo seus interesses,
então aquele passa a ser seu território de domínio.
Possivelmente, esses grupos podem disputar e/ou cooperar no uso dos recur-
sos ambientais necessários para a sobrevivência de seus indivíduos. Este é
um dos contextos, que se justi�ca a criação da unidade política-
administrativa visando à gestão dos recursos, pois cabe ao Estado, na �gura
dos governantes, deter o monopólio legítimo do controle social, no sentido de
evitar o con�ito civil e prover a administração do território.
Conceitualmente, pode-se de�nir Geogra�a Política como uma ciência cujo ob-
jetivo é defender os interesses dos Estados, especialmente, no processo de for-
mação, consolidação e expansão deste ator político, compreendendo o modo
pelo qual a Geogra�a e a Política são in�uenciadas reciprocamente.
A Geogra�a Política é de�nida como uma disciplina estática e teórica que es-
tuda as relações da política do Estado com o espaço geográ�co, notadamente o
território, com questões relacionadas à posição, condições das fronteiras, ca-
racterísticas geográ�cas naturais, administração territorial, dentre outras.
Por sua vez, a Geopolítica está relacionada com a formulação das teorias e
projetos estratégicos de ações voltados às relações de poder entre os Estados e
as conquistas territoriais. A Geopolítica é considerada mais próxima das ciên-
cias políticas aplicadas, interdisciplinar, utilitarista e belicosa, pois trata-se de
uma disciplina dinâmica que lida com estratégias políticas e a obtenção de
poder sobre algum território/recurso (COSTA, 2008).
A Geogra�a Política Clássica foi iniciada por Friedrich Ratzel (1897) até mea-
dos do século 20, período este em que a Geogra�a Política Clássica se subdivi-
diu em duas fases:
A primeira fase teve como objetivo propor teorias para justi�car o nascimento,
a consolidação e a expansão dos Estados Nacionais. Assim, as correntes ale-
mã, francesa, britânica e estadunidense apresentavam um discurso naciona-
lista com base no território. Houve ênfase na ordem mundial, em um contexto
de competição entre Estados-nações por maior in�uência econômica e terri-
torial, e nas relações entre poderio estatal e espaço. Tal fase teve forte identi�-
cação com a Geopolítica devido à presença dos grandes con�itos ocorridos no
período, como a Primeira e a Segunda Grande Guerras.
Tal período apresenta uma crítica direta à visão estadocêntrica, uma vez que o
Estado não conseguia prover o bem-estar social e, dessa forma, os outros ato-
res, como as empresas, ganharam espaços nas políticas nacionais e internaci-
onais.
A Geopolítica sofreu uma releitura com Yves Lacoste em 1976, expressa nas
publicações da revista Heródote. Tal releitura teve como pano de fundo as teo-
rias críticas de autores como Marx, Gramsci, Foucault, anarquistas e teóricos
da escola de Frankfurt.
Desse modo, a Geopolítica pode ser considerada, desde então, como um campo
de estudos interdisciplinares.
Segundo Costa (2008), foi Rudolf Kjéllen, que pioneiramente publicou o termo
“Geopolítica” em seus livros: As Grandes Potências (1905) e O Estado como for-
ma de vida (1916). Kjéllen, de origem sueca, estudioso da cultura germânica,
professor da Universidade de Gotemburgo e da Universidade de Upsala, ambas
localizadas na Suécia, a�rmava que a “Geopolítica é a ciência que concebe o
Estado como um organismo geográ�co ou como um fenômeno do espaço”
(1916 apud MAGNOLI, 1988, p. 12). Dessa forma, além de pioneiro no emprego
do termo “Geopolítica”, deixou explicitamente claras as vinculações entre
Geopolítica-Ciência-Estado.
O progresso signi�caria um maior uso dos recursos do meio, logo, uma relação
mais íntima com a natureza. Quanto maior o vínculo com o solo, tanto maior seria
para a sociedade a necessidade de manter sua posse. É por esta razão que a socie-
dade cria o Estado, nas palavras de Ratzel: ‘Quando a sociedade se organiza para
defender o território, transforma-se em Estado’. A análise das relações entre
Estado e o espaço foi um dos pontos privilegiados da Antropogeogra�a. Para
Ratzel, o território representa as condições de trabalho e existência de uma socie-
dade. A perda de território representa maior prova de decadência de uma socieda-
de. Por outro lado, o progresso implicaria a necessidade de aumentar o território,
logo, conquistar novas áreas. Justi�cando estas colocações, Ratzel elabora o con-
ceito de ‘espaço vital’; este representaria uma proporção de equilíbrio entre a po-
pulação de uma dada sociedade e os recursos disponíveis para suprir suas neces-
sidades, de�nindo assim suas potencialidades de progredir e suas premências ter-
ritoriais (MORAES apud MAGNOLI, 1996, p.14).
Ratzel, assim como muitos dos intelectuais de seu tempo, nos mais diversos
campos do conhecimento cientí�co e humano, foi devoto das teses determi-
nistas de origem biológica. Entre a segunda metade do século 19 e as primei-
ras décadas do século 20, as chamadas ciências naturais ganharam grande
aceitação no mundo cientí�co, sobretudo, a partir da divulgação dos estudos
do naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882) condensados em sua obra
inovadora, A origem das espécies, publicada em 1859. O darwinismo e suas
ideias de seleção, evolução e adaptação natural das espécies exercerão pro-
funda in�uência sobre outras áreas do saber, entre elas a Filoso�a, a
Sociologia, a e, claro, a Geogra�a.
[...] in�uenciado pelo organicismo de fundo biológico, concebia o Estado como ema-
nação natural da sociedade destinada à defesa do território. Ao formular suas “leis
da expansão espacial dos Estados” de�ne o progresso como crescimento territorial
(MAGNOLI, 1988, p. 13).
Se, por um lado, Ratzel, com seu Antropogeogra�a, foi precursor da Geogra�a
Humana, por outro, vai contribuir de forma decisiva para a formulação de
análises geopolíticas com outra obra, também, fundamental: trata-se de
Geogra�a Política publicada originalmente em 1897. Nesse livro, vai lançar
mão do “Lebensraum” – “espaço é poder” – um conceito fundamental dentro
da perspectiva teórica do campo de conhecimento da Geopolítica. Segundo o
pensador alemão, caberia ao Estado buscar um “equilíbrio entre a população
de determinada sociedade, seus recursos naturais e seu território potencial”
(MAGNOLI, 1988, p. 13). Em outras palavras,
Observe que novamente Ratzel faz a analogia entre Estado político e organis-
mo biológico para justi�car não só as necessidades de proteção do espaço, co-
mo também de expansão espacial como forma de garantir o suprimento de re-
cursos indispensáveis às necessidades da sociedade e, no caso especí�co, da
sociedade alemã. Neste contexto, justi�ca-se a anexação da região da Alsácia-
Lorena devido sua condição geográ�ca rica em recursos minerais.
A tese segundo a qual “espaço é poder”, preconizada por Ratzel, servirá para
justi�car não só o projeto de uni�cação territorial de Bismarck, como também
para subsidiar em termos estratégicos o projeto expansionista do III Reich, sob
o comando de Adolf Hitler, entre os anos de 1930 e 1940. O Lebensraum de
Ratzel seria retomado pelo líder nazista em seu Mein Kampf (em português
“Minha Luta”), publicado entre 1925/1926, que se tornaria uma espécie de “livro
sagrado do nazismo”.
Apesar de não ter sido o pioneiro, Friedrich Ratzel foi o grande responsável
por legitimar a importância do estudo da Geogra�a Política, por meio de sua
obra Politische Geographie (Geogra�a Política) de 1897.
A vida pessoal de Haushofer é uma síntese dos grandes dilemas vividos pelo
povo alemão entre o �nal do século 19 e a primeira metade do século 20. Desde
as guerras de uni�cação passando pelas duas grandes guerras mundiais, a
Alemanha parecia encarnar um “destino histórico” qual seja o de se transfor-
mar em uma nação poderosa e imperialista. Tal “destino” mergulhou o povo
alemão em uma das maiores tragédias da história do homem, que foi o holo-
causto de judeus. Pois é em meio a esse cenário que transcorreu toda a vida
de Haushofer, que aproximou o conhecimento Geopolítico da estratégia mili-
tar, sendo atribuída a ele a célebre de�nição: “[...] a Geopolítica deve ser e será a
consciência geográ�ca do Estado” (MAGNOLI, 1988, p. 12).
Diante do que vimos até aqui, podemos concluir que a Geopolítica nasceu atre-
lada à experiência histórica da Alemanha entre o �nal do século 19 e início do
século 20. O objeto central da investigação teórica da Geopolítica é o estudo da
relação entre espaço geográ�co e Estado, procurando explicar a ocupação do
espaço a partir das necessidades estratégicas do Estado, sejam essas necessi-
dades econômicas, políticas, militares, demográ�cas ou geográ�cas.
Concebe os oceanos e mares como um vasto espaço social e político com caracte-
rísticas próprias que os distinguem dos espaços terrestres, mas articulados a estes
pelos a estes pelos portos e vias de comunicação interiores. Chama a atenção pa-
ra o fato de que, apesar de esse ‘espaço marítimo’ permitir, em princípio, a circula-
ção em todas as direções, a história dos �uxos e a posição dos continentes e por-
tos de�nem as famosas trade routes, autênticas highways marítimas. [...] com o
desenvolvimento das vias terrestres, há a tendência a um estreitamento de rela-
ções entre os dois espaços, favorecendo o comércio mundial e a circulação em ge-
ral. Esta é uma das razões pelas quais a interdependência entre as marinhas mer-
cantes e de guerra tem aumentado, formando um único sistema durante os con�i-
tos (COSTA, 2008, p. 69-70).
Entre 1883 e 1913, Mahan produziu quatorze livros, todos tratando, de alguma
forma, da questão da superioridade naval. O contexto mais amplo em que pro-
duziu todo seu potencial intelectual é marcado pelos imperialismos das po-
tências europeias pela África e Ásia, movido pelo interesse de colônias que
pudessem abastecer as metrópoles do Velho Mundo de abundantes fontes de
matérias-primas para suas indústrias. Da mesma forma, agia o Japão no ex-
tremo Oriente, investindo contra o território de seus vizinhos, em seu projeto
expansionista buscando sua hegemonia imperialista na região. Assim, tam-
bém, atuavam estrategicamente os Estados Unidos na área do Novo Mundo.
[...] reelabora o conceito Área Pivô, �exibilizando os seus limites geográ�cos e pas-
sando a denominá-la heartland, terra-coração. Mackinder defende, nessa obra, a
idéia de que os fenômenos geopolíticos podem ser explicados a partir da luta trava-
da entre o heartland e os crescentes concêntricos que o circundam: ‘Quem domina-
da a Europa Oriental controla o Heartland; quem domina o Heartland controla a
World Island; quem domina a World Island controla o mundo (FONSECA; VLACH,
2003, p. 6).
Esse novo espaço geográ�co constitui para ele o que chama de “área pivô” da polí-
tica mundial. O “coração continental”, “área pivô” ou, em outras palavras, o
Império Russo e suas virtualidades, constituem o novo pólo de poder mundial que
não pode ser negligenciado. [...] (COSTA, 2008, p. 79-81).
6. Considerações
Neste ciclo, analisamos imbricações e distanciamentos entre Geopolítica e
Geogra�a Política, assim como as principais teorias da Geopolítica Clássica, as
quais alicerçaram o pensamento da ciência. Tais temáticas irão subsidiar e
fundamentar a discussão no próximo ciclo, sobre o surgimento de novas teori-
as Geopolíticas.
(https://md.claretiano.edu.br/geopoleco-
gs0081-fev-2023-grad-ead/)
Objetivo
• Apresentar os temas e as discussões relacionados às teorias geopolíti-
cas e às relações internacionais.
Conteúdos
• Novas Geopolíticas.
• Nova ordem mundial.
• A globalização capitalista e as relações internacionais.
Problematização
Como ocorreu a crise da Geopolítica Clássica? E quais são os temas emergen-
tes? Como tem se estabelecido a geopolítica da água? Quais são as interliga-
ções entre Geopolítica e globalização?
1. Introdução
Neste momento, exploraremos a crise da Geopolítica clássica e a emergência
de novos temas. Dentre esses novos temas, focaremos as possibilidades de
con�ito devido às questões econômicas, os choques culturais entre civiliza-
ções, o discurso da democracia liberal ocidental e suas implicações, bem co-
mo a geopolítica da água.
Nesse ponto, pode-se inferir que “a excessiva militarização das políticas exter-
nas” e a “negligência de outras ameaças ao bem-estar nacional” durante o pe-
ríodo da Guerra Fria, assim como os efeitos da globalização, �zeram com que a
insegurança global aumentasse, ao passo que novas contendas começaram a
ganhar cada vez mais destaque, como as questões ambientais, políticas,
econômicas e sociais, assim como os chamados “problemas sem passaporte”
(trá�co internacional de drogas e pessoas, terrorismo, AIDS, dentre outros), fa-
zendo com que o conceito de segurança humana fosse cada vez mais enfati-
zado, gerando a necessidade de ampliar/revisar o conceito de segurança mili-
tar.
Nesse contexto, pode-se observar uma maior interferência nos assuntos inter-
nos dos Estados em nome dos direitos humanos ou do sistema global, alteran-
do o conceito de soberania de�nido no Tratado de Westfália de 1648, que con-
templava o princípio da não intervenção e da integridade dos Estados
Nacionais.
No entanto, do ponto de vista geopolítico, essa ideia é duvidosa, pois, com ex-
ceção da União Europeia, que possui uma coesão político-diplomática concre-
ta, a maioria dos blocos é essencialmente formada por questões econômicas,
não tendo uma atuação conjunta como sujeitos em assuntos políticos e milita-
res.
No que se refere à globalização, Milton Santos (1997) aponta que seus proces-
sos ocorrem de formas e intensidades diferentes nas diversas partes do globo.
A evolução da ciência, tecnologia e informação, referida pelo geógrafo como
“meio técnico-cientí�co-informacional”,
Há diferentes versões para essa teoria, mas todas elas apostam na crise do
Estado-Nação, que deixaria de ser o ator principal no cenário internacional. O
conceito de potência, segundo essa teoria, também estaria ultrapassado e a
análise desse sistema global seria a chave para entender as relações de poder,
cujo alicerce estaria no sistema capitalista.
Autor de “The Modern World System” (2011), Wallerstein enfatiza os fatos his-
tóricos como determinantes para se entender a dinâmica do sistema interna-
cional, contrariando a posição realista das Relações Internacionais que se ba-
seiam na análise sistêmica e sua in�uência na história. Nesse sentido, o teóri-
co faz referência à ebulição social do ano 1968 como fator de grande in�uência
para as “revoluções” do século 21, como a recente chamada “Primavera dos
Povos Árabes”.
O sistema global, de acordo com essa teoria, é visto como algo extremamente
positivo e como a garantia da humanidade para um mundo próspero.
Para Paul Kennedy, em sua obra Ascensão e queda das grandes potências:
transformação econômica e con�ito militar de 1500 a 2000, o maior con�ito
gerado pela nova ordem mundial é o aumento das disparidades entre os paí-
ses do Norte em relação aos países do Sul, problema este causado pela “nova
revolução industrial”, com o aumento da produtividade e o desemprego em
massa, a explosão demográ�ca e os perigos para o meio ambiente.
Como exemplo, Kennedy (1989, p. 342) cita que a robótica da nova revolução
industrial é imprópria para os países do Sul, pois, com seu alto índice demo-
grá�co, há a necessidade de preservar empregos além da carência de capitais
necessários para essas inovações. Além disso, esses avanços na robótica tor-
nam a força de trabalho mais barata e desquali�cada, características típicas
de países periféricos.
Kennedy (1989, p. 418), acredita que é necessário regulamentar e dar mais con-
�abilidade ao sistema global, pois a globalização e o enfraquecimento do
Estado agravariam ainda mais as desigualdades e tornariam o mundo mais
instável. Portanto, seria necessário um investimento dos governos em melho-
ria na educação, pesquisa tecnológica, melhoria da posição das mulheres, es-
pecialmente nos países pobres, e em negociações internacionais mais demo-
cráticas e sensíveis à diminuição dessas desigualdades.
O teórico ainda pontua que uma civilização pode conter várias Nações-
Estados, como a ocidental, ou apenas uma, como o Japão e a China. Dentre as
civilizações, podem ocorrer ainda subdivisões, como as variantes europeia e
americana na ocidental, e a árabe, turca e malaia na islâmica. Mas todas as ci-
vilizações podem ascender, chegar no apogeu, declinar, fundir-se ou dividir-
se.
Huntington (1994, p.130) pontua que o con�ito na linha de cisão entre as civili-
zações ocidental e islâmica está ativo há 1.300 anos, notadamente desde o pe-
ríodo das Cruzadas. Com o �m da Segunda Guerra Mundial, o teórico aponta
que o Ocidente começou a recuar, com o desaparecimento de colônias, en-
quanto o fundamentalismo islâmico ascendia. A necessidade energética do
Ocidente e a alta dependência do Golfo Pérsico �zeram com que os países mu-
çulmanos se enriquecessem em dinheiro e armas. Quando os países de dife-
rentes civilizações entram em con�ito, os países de um mesmo grupo de civi-
lização tendem a buscar ajuda com outros países de mesma civilização. Isso
foi o que Huntington (1994, p. 129-130) chamou de “arregimentação civilizacio-
nal” e “síndrome dos países parentes”, na qual ocorre a “substituição da ideolo-
gia política e das considerações sobre equilíbrio de poder como base principal
para a cooperação e coalizão”, contrastando com a escola realista.
A democracia liberal ainda teria que lidar com duas questões: o fundamenta-
lismo religioso e o nacionalismo. O primeiro seria representado pela possibili-
dade do estabelecimento de um Estado teocrático e o segundo seria in�uenci-
ado por uma consciência étnica, mas não totalmente incompatível com os
preceitos democráticos liberais.
Tais princípios �zeram com que os Estados Unidos assumissem uma postura
intervencionista em países que julgavam não compartilhar desses pressupos-
tos e usassem a promoção da paz e defesa dos direitos humanos como forma
de legitimar sua ação intervencionista, rompendo com um dos postulados
westfalianos.
Vale relembrar que o período da Guerra Fria foi marcado pelo congelamento
do Conselho de Segurança, sendo que as intervenções da ONU nesse período
foram praticamente interrompidas devido à disputa das duas superpotências
que são, até os dias atuais, membros permanentes do Conselho de Segurança.
No entanto, com o �m do con�ito bipolar, a década de 1990 assistiu a um au-
mento tanto nos con�itos intraestatais como nas intervenções praticadas pela
Organização das Nações Unidas no intuito de reestabelecer a ordem por meio
dos preceitos democráticos e liberais, como foi discutido anteriormente.
Dessa forma, pode-se a�rmar que não há garantias quanto à continuidade dos
regimes democráticos. Além do mais, a ideia de que a democracia está se es-
palhando pelo mundo, apesar de ser considerada como parcialmente verda-
deira, pode ser discutida. O fato de eleições elegerem governantes que garan-
tam o livre mercado não pode ser considerado su�ciente para garantir a de-
mocracia. Tal situação se deve ao fato de que a cultura democrática, caracteri-
zada especialmente pelos valores igualitários, nem sempre se faz presente em
sociedades que aparentemente são baseadas em princípios democráticos.
6. Geopolítica da água
Os recursos hídricos são preponderantes para as discussões envolvendo po-
der, con�ito e cooperação nas Relações Internacionais. A disponibilidade e a
distribuição de tais recursos podem levar países e comunidades ao con�ito e
buscarem a satisfação de suas necessidades, uma vez que tais recursos são de
vital importância tanto para a manutenção da vida quanto para o funciona-
mento das sociedades em geral. Dessa forma, pode-se a�rmar que a disponibi-
lidade dos recursos hídricos in�uencia diretamente as possibilidades econô-
micas, políticas e sociais de um Estado. Nesse sentido, Raffestin (1993, p. 251)
aponta que:
Hoje o petróleo, amanhã o trigo. Quem sabe? Todos os recursos são ou podem ser
instrumentos de poder. Se é verdade que certos recursos – conforme a sua capaci-
dade de satisfazer as necessidades fundamentais – manifestam uma grande per-
manência no papel que podem desempenhar, eles não deixam de se ligar ao con-
texto sócio-econômico e sócio-político quanto à sua signi�cação como instrumento
de poder.
O contexto de escassez hídrica, seja esta física (quando ditada pela natureza)
ou econômica (quando não há recursos econômicos su�cientes para prover o
acesso digno aos recursos hídricos), vem sendo cada vez mais apontado por
estudiosos de Geogra�a, Relações Internacionais e Ciência Política como o
causador das guerras do século 21. Assim, algumas bacias hidrográ�cas no
mundo têm sido identi�cadas como potenciais fontes de con�ito, notadamen-
te devido à distribuição desigual dos recursos hídricos transfronteiriços que
são diretamente afetados pela divisão política dos Estados Nacionais.
Observe o mapa da Figura 2: 70% do planeta Terra é composto por água, e ape-
nas 2,5% desse total é considerado água doce. No entanto, apenas 0,26% desse
total é considerado como acessível em rios, lagos e aquíferos de fácil acesso.
Figura 2 A distribuição política da água.
Dessa forma, o acesso aos recursos hídricos pode ser considerado um fator de-
terminante para a chamada segurança ambiental, especialmente em casos de
escassez e/ou utilização destes por mais de uma nação, como os rios trans-
fronteiriços.
A água possui duas perspectivas que são diretamente ligadas à questão da se-
gurança ambiental: pode ser fonte de con�itos e ameaça à reprodução da vida.
Assim, pode-se considerar o acesso à água como uma temática intimamente
ligada à distribuição política desse recurso natural, uma vez que os cursos
d'água atravessam ou delimitam as fronteiras das nações soberanas,
evidenciando-se a relação entre território e poder, uma vez que tal distribuição
política é feita de forma desigual, fazendo com que certos Estados tenham
uma maior abundância hídrica que outros.
Ribeiro (2008, p. 13) faz referência a pontos importantes que tocam a questão
dos recursos hídricos, na qual
De acordo com o relatório Water for People, Water for Life (UNESCO & WWAP,
2003, p. 25, tradução nossa):
[...] A água deve ser analisada na perspectiva de sua distribuição política e não na
natural, porque o sistema interestatal atua com base na soberania, determinando
aos países o direito de de�nirem o uso dos seus recursos naturais, incluindo os hí-
dricos.
Sugerimos agora que você faça uma pausa na sua leitura e re�ita sobre sua
aprendizagem, realizando a questão a seguir.
7. Considerações
Diante dos debates apresentados ao longo deste ciclo, pode-se perceber que
novas e velhas temáticas estão permeando a Geopolítica na contemporanei-
dade, de modo que se evidenciam a importância da multiplicidade dos atores
(indivíduos, empresas, ONGs, OIs e Estados), os recursos fundamentais para o
desenvolvimento social e econômico atrelados diretamente ao território, e as
questões ideológicas e culturais, ampliando a complexidade das análises geo-
políticas e sendo de extrema importância na análise da realidade atual.
Nesse contexto, no próximo ciclo, investigaremos a questão do poder em algu-
mas de suas facetas, como o poderio militar, conseguindo assim formar os
subsídios necessários para analisar as relações entre o território e o poder.
(https://md.claretiano.edu.br/geopoleco-
gs0081-fev-2023-grad-ead/)
Objetivo
• Discutir as mudanças no poderio militar e na divisão internacional do
trabalho, e as rede�nições geoestratégicas, para, em seguida, estudar a
Geopolítica brasileira.
Conteúdos
• A renovação do poder militar.
• O papel da informação no século 21.
• Divisão internacional do trabalho e sua relação com o poder.
• Geopolítica brasileira.
Problematização
O que é poder? O que é poder militar? A guerra militar acabou? O que é
Geoestratégia? O que é a divisão internacional do trabalho? Qual sua relação
com a questão do poder? Como foi a construída a Geopolítica brasileira? Qual
sua in�uência no pensamento estratégico?
1. Introdução
O conceito de poder, de um ponto de vista mais geral, segundo o dicionário de
política Bobbio, Matteucci e Pasquino (2004, p. 933), é de�nido da seguinte for-
ma:
[...] Em seu signi�cado mais geral, a palavra designa a capacidade ou possi-
bilidade de agir, de produzir efeitos. Tanto pode ser referida a indivíduos e a grupos
humanos como a objetos ou a fenômenos naturais (como na expressão Poder calo-
rí�co, Poder de absorção).
2. O poder militar
Além disso, assista ao vídeo a seguir, que apresenta uma forma de determinar
o poder militar de uma nação. Fazendo um panorama histórico, o vídeo tam-
bém ajuda a explicitar, ao longo do tempo, como se alterou a forma desse po-
der.
3. A divisão internacional do trabalho e o po-
der
As transformações ocorridas com a Revolução Industrial concentraram o
nas nações industrializadas, evidenciando uma divisão internacional
do trabalho que alterou de forma intensa a Geopolítica mundial.
Neste tópico, vamos estudar como essa divisão do trabalho alterou a so-
ciedade, a economia e a geopolítica mundial, trazendo assim grandes al-
terações no espaço geográ�co. Para isso, faça a leitura dos
da obra Geogra�a Política e Geopolítica, de Silva e Silva
(2018), disponível na Biblioteca Virtual Pearson.
4. Geopolítica brasileira
Já familiarizados com a questão do poder e da divisão internacional do traba-
lho, podemos passa ao estudo da Geopolítica brasileira. Para isso, leia o artigo
"A Geopolítica brasileira e sua in�uência no pensamento estratégico nacio-
nal", de Wanderlei M. da Costa (2017). Segundo o autor, a Geopolítica no Brasil,
durante meio século - de 1930 a 1980 -, foi uma atividade praticamente exclu-
siva dos aparatos estatais e especialmente dos meios militares. Re�etiu, as-
sim, em grande medida, a hegemonia de pensamento que se instalou no país
no início da década de 1930, marcadamente direcionado para o fortalecimento
da centralidade do papel do Estado nacional nos projetos de desenvolvimento
em geral. Por isso, o pensamento geopolítico que se estruturou nesse contexto
e se desdobrou nas décadas seguintes foi capaz de inspirar as políticas do
Estado para a estruturação interna e, sobretudo, para a projeção externa nacio-
nal nos campos da política, estratégia, economia e cultura.
Para encerrarmos este tópico de estudos, assista ao vídeo a seguir que apre-
senta a percepção prática do �lósofo Luis Felipe Pondé, durante o Fórum
Internacional de Política, sobre a Geopolítica Brasileira.
5. Considerações
Chegamos ao �m do último ciclo, no qual analisamos a importante questão do
poder. Pudemos veri�car como o poder militar se constitui na nova ordem
mundial e engendra e in�uencia a produção do espaço geográ�co.
Com isso, pudemos veri�car como as relações de poder criaram uma divisão
internacional do trabalho que interfere em toda a dinâmica social mundial,
para, em seguida, investigarmos a Geopolítica brasileira a partir da perspecti-
va do poder, destacando sua in�uência no pensamento estratégico, e desta-
cando sua con�uência na alteração do território nacional.
6. Considerações �nais
Esperamos que a disciplina tenha contribuído
para que você, futuro docente, aproveite todas as potencialidades de seus alu-
nos, respeitando, também, as suas necessidades, fazendo com que eles olhem
o mundo em todas as suas dimensões, sintam-se valorizados e enxerguem a
autonomia do aprender a apreender.
Na mesma esteira, é essencial que você, como futuro docente de Geogra�a, te-
nha adquirido uma visão crítica sobre as relações dos Estados nacionais e so-
bre as negociações para que essas relações se estabeleçam da melhor forma
possível. Assim, é importante que você tenha entendido o papel da Geopolítica
para o estabelecimento e o direcionamento de um diálogo coerente entre os
Estados nacionais.