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VIAGENS DE ESTUDO E A PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO HISTÓRICO

ESCOLAR: UMA PROPOSTA DE PROJETO PARA A ELABORAÇÃO DE MATERIAL


DIDÁTICO

Talita Fontes Miranda1

Resumo:

O presente trabalho trata de uma proposta de projeto para a elaboração de material didático
(BANDEIRA, 1994; BITTENCOURT, 2004). É parte de uma pesquisa em desenvolvimento no
Programa de Pós-graduação em História da África, da Diáspora e dos Povos Indígenas da
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB sobre o uso de viagens de estudo como
metodologia para o ensino de História na Educação Básica. Esta pesquisa prevê a elaboração
de material didático. Nesta comunicação apresentaremos um projeto que propõe a elaboração
de um livro para o professor e outro para o aluno. No livro do professor, apresentamos uma
análise das viagens de estudo enquanto instrumentos de pesquisa e de produção de
conhecimento histórico escolar. O livro do aluno é um diário de bordo com instruções básicas
sobre como proceder em uma viagem de estudo. Propomos que estes livros devam ser utilizados
como material que vai ser propulsor para a produção de outros materiais, tais como texto,
desenhos, exposições fotográficas, blog, etc., fruto da pesquisa que os estudantes fizerem, e que
poderão ser usados posteriormente pelo professor para abordar a temática escolhida com outros
estudantes.

Palavras-Chaves: Viagens de estudo. Conhecimento histórico escolar. Material didático.

Introdução

O ensino de História deve ser encarado pelo professor da Educação Básica como um
conjunto de práticas pedagógicas e processos de mediação da produção do conhecimento
histórico escolar, protagonizado pelos estudantes. Acredito que esse conhecimento histórico
produzido pelos estudantes da Educação Básica é parte de uma cultura escolar de produção de
conhecimentos tão importantes quanto aqueles oriundos da produção acadêmica. Partindo desta
compreensão, o professor pode se utilizar de vários dispositivos metodológicos para o ensino
de história e possibilitar que os estudantes tenham instrumentos importantes que os auxiliem na
produção do próprio conhecimento histórico. Defendo o uso de viagens de estudos como uma
importante metodologia para o ensino de História. Além disso, pode ainda ser usada como
estratégia a produção de materiais didáticos com base nas atividades desenvolvidas durante as
aulas e materiais produzidos pelos estudantes ao colocar em prática tais metodologias.

Nesse sentido, nesta comunicação apresentaremos um projeto de elaboração de um livro


para o professor e outro para o aluno, partindo de uma atividade que prevê o uso de viagens de
estudo como metodologia para o ensino de História na Educação Básica. Esta fala está dividida
em três partes. Na primeira, trato das viagens de estudo, na segunda, conhecimento histórico
escolar e a última, apresento o referido projeto no contexto da pesquisa que desenvolvo no
mestrado.

Viagens de estudo como metodologia para o ensino de história

O ato de viajar com intencionalidades pedagógicas não é novo. Em diversos momentos


da história da humanidade, utilizou-se das viagens como forma de aprender sobre as coisas
distantes, a cultura, história, geografia, arte, modos de vida etc.

As viagens podem ser pensadas dentro de uma atividade enquanto dispositivo


metodológico para o estudo de diversos conteúdos, temas, e sobre diversas perspectivas. Aqui
pensamos na viagem de estudo enquanto uma atividade planejada, com objetivos claros e que
acontece como uma etapa de uma atividade de pesquisa que tem início e fim em sala de aula.

Trata-se de uma atividade planejada e com intencionalidade, pois compreendo que para
a realização da mesma é preciso pensar nos conteúdos e temáticas a serem abordados, quais
locais serão visitados e qual dinâmica será utilizada para a realização da mesma. Isso requer
uma preparação cuidadosa e preocupada com a viabilidade da realização da mesma,
identificando as um conjunto de elementos que podem favorecer ao desenvolvimento de tal
atividade que devem ser pensados previamente a elaboração do projeto.

É fundamental que os estudantes estejam envolvidos na atividade, para isso é preciso


que os mesmos já tenham tido algum contato com os conteúdos e os temas a serem trabalhados
ao longo da viagem, para que possam assim explorar ao máximo a experiência da viagem. Além
disso, é muito importante que nesse processo de envolvimento os estudantes compreendem a
natureza da atividade, especialmente a viagem. Pois trata-se de uma viagem de estudos,
diferente de viagens que podem ser realizadas na escola tais como excursão, passeio etc. Isso
evita que os estudantes fiquem empolgados com a viagem em si, focados apenas na
possibilidade de conhecer ou visitar um determinado lugar e entusiasmados com a diversão que
a viagem proporciona. Portanto, é fundamental que o estudante compreenda que se trata de uma
atividade de pesquisa que tem como o principal objeto seja o estudo e não a diversão, embora
uma coisa não impossibilite a outra. Eles podem se divertir durante a atividade, mas focados na
coleta de informação e em seguir um roteiro, um conjunto de procedimentos referentes aos
objetivos da viagem.

E por se tratar de uma atividade de pesquisa, podemos considerar que o primeiro


momento da sala de aula é o primeiro contato com a temática, no qual o estudante vai se
familiarizar com o tema. Ainda em sala de aula, os estudantes devem ser orientados pelo(a)
professor(a) sobre a metodologia e ética na pesquisa, para que os estudantes possam não só
perceber a vivência da viagem como um momento de coleta de dados, mas também saibam
como realizar os registros da viagem de forma ética de modo que os mesmos possam utiliza-
los no retorno a sala de aula como fonte de pesquisa. Naturalmente isso deve se dar dentro de
um processo em que não se espera dos estudantes uma desenvoltura na coleta dos dados
enquanto pesquisadores nos moldes e com os mesmos rigores acadêmicos. A utilização de
instrumentos de pesquisa pelos estudantes deve se dar no nível compatível a sua formação.

No retorno a escola os estudantes e o(a) professor(a) devem retomar o contato com as


fontes usadas antes da viagem e fazer uma segunda análise dos conteúdos e da temática
trabalhada acrescentando os elementos descobertos na viagem para que a partir das observações
feitas e da análise dos registros da viagem, tanto os estudantes quanto os professores possam
juntos construir um material que sintetize o resultado da pesquisa. Este resultado pode ser
apresentado nos mais diversos formatos como uma dramatização, uma composição ou paródia
de música, um cordel, uma coluna no jornal da escola, um seminário, em fim, no formato que
for mais conveniente e adequado para o contexto que os sujeitos estão inseridos.

Por se tratar de uma construção coletiva é preciso que os objetivos estejam claros para
todos os envolvidos no processo, para que assim todos tenham condições de contribuir
efetivamente com o mesmo e não mude o foco da atividade. Espera-se com esse tipo de
atividade que os estudantes passem por experiências significativas e que de fato sirvam de base
para a produção do conhecimento histórico escolar.

Conhecimento histórico escolar

Ao utilizar os termos conhecimento histórico escolar estou pensando em um conjunto


de práticas que ocorrem na Educação Básica que são específicas e que diferem das pesquisas
acadêmicas. Com isso, entendo o ensino de história como produção de conhecimento histórico
e não como uma mera transposição didática dos conhecimentos produzidos na universidade.

Neste sentido, é que se afirma ter o conhecimento histórico escolar uma


natureza própria e uma especificidade, tendo em vista sua relação orgânica
com a educação e construção da autonomia dos sujeitos no contexto da
democracia social. (SCHMIDT, 2005, p. 42)

Por compreender a escola como espaço de produção do conhecimento, me propus no


curso do mestrado profissional em História da África da Diáspora e dos Povos Indígenas a
desenvolver um material para os professores e um para os estudantes, que tem como um
elemento norteador a compreensão que os estudantes e professores da educação básica são
produtores de conhecimento, me reportando aqui especificamente do ensino de história. Para
isso, utilizo a viagem de estudo enquanto dispositivo metodológico que impulsionara a
produção de conhecimento histórico no âmbito escolar. Compreendendo que:

Ensinar história requer um diálogo permanente com diferentes saberes,


produzidos em diferentes níveis e espaços. Requer do professor interações
sobre a natureza, a origem e o lugar ocupado por esses diferentes saberes,
que norteiam e asseguram sua prática em sala de aula. Os saberes que
dialogam no interior do processo educativo, em sala de aula, são
provenientes de diversas fontes. São os saberes das disciplinas, os
curriculares, os profissionais e os saberes da experiência – os saberes da
vivência dos alunos, da mídia, dos espaços de trabalho e lazer, dos espaços
religiosos e muitos outros. Enfim, todos esses saberes, mediados pela ação
dos sujeitos (aluno e professor), são reconstruídos e constituem os
chamados saberes escolares. (TARDIF, LESSARD e LAHAYE Apud
FONSECA, 2013 p.118)

Fonseca aborda o conhecimento escolar construído por meio do diálogo com os saberes,
compreendo que proporcionar momentos de contato com outros espaços de produção de saberes
e conhecimentos (formais ou informais) seja uma forma de manter esse diálogo. Por isso
proponho que o mesmo se dê por meio da realização de viagens de estudo.

Na viagem de estudo devemos proporcionar o contato com ações de homens e mulheres


na sociedade ao longo do tempo, sendo papel do(a) professor(a) de história o chamar atenção
para a relação presente e passado das ações observadas e ou experienciados. De modo que
professor(a) e estudante possam em dialogo analisar a e experiência e juntos construírem
conhecimento histórico escolar.

Para isso é importante que os sujeitos (professor(a) e estudante) envolvidos no processo


saibam do que se trata e tenham clareza dos seus objetivos. Como estamos nos referindo ao
ensino de história, é importante que os envolvidos no processo de ensino e aprendizagem
compreendam o que é História e quais são os seus objetivos enquanto área do conhecimento
especifica, para que apropriados desses objetivos possam produzir conhecimentos significados.
Fonseca, com base em Thompson nos diz que:

O objeto da história é reconstituir, explicar e compreender seu objetivo.


(Thompson, 1987, p. 57). Logo, o objeto do conhecimento histórico é o real
em movimento, as ações de homens e mulheres em sociedade, ou seja, a
experiência humana. Sendo esse movimento contraditório, evidencia
manifestações contraditórias.

O real chega até nós professores, pesquisadores, alunos, por meio de


evidencias (incompletas, parciais): registros, documentos, manifestações,
objetos, obras de arte, vestígios diversos etc. Do diálogo mediado pelo
professor entre as concepções teóricas, os outros saberes e as múltiplas
evidências, nasce o produto dessa operação: o conhecimento histórico –
provisório, incompleto, seletivo e limitado. O conhecimento histórico, afirma
Thompson (1987, p. 58), ajuda-nos a conhecer quem somos, por que estamos
aqui, que possibilidades humanas se manifestam, e tudo quanto podemos
saber sobre a lógica e as formas de processo social. Assim, a lógica fundante
da produção do saber histórico em sala de aula é a explicitação do real.
(FONSECA, 2013, p. 119)
De modo que nós professoras e professores de História, devemos utilizar as demandas
do cotidiano como elemento de pesquisa e problematização, e destas produzirmos o saber
histórico em sala de aula. Tornando o processo de aprendizagem mais interessante, pois a
mesma passa a ser discutida a partir de elementos familiares e a História ali ensinada é também
construída junto com os estudantes.

Pois assim há um processo de interação dos estudantes entre si, entre professores e
estudantes, as vivências e os conhecimentos construídos fora da escola, possibilitando a
construção coletiva de conhecimentos na escola.

Para isso estou desenvolvendo no mestrado um material que acredito poder colaborar
para a propagação de atividades como essa na educação básica. O qual é composto por um livro
para o(a) professor(a) e um diário de bordo para os estudantes.

O projeto:

Livro para o(a) professor(a)

No livro do professor, apresentamos uma análise das viagens de estudo enquanto


instrumentos de pesquisa e de produção de conhecimento histórico escolar. Partindo da
experiência da realização de uma viagem de estudo onde trabalhamos a temática identidade em
uma visita a um terreiro de candombe e uma reserva indígena.

Livro para o estudante.

O livro do estudante é um diário de bordo com instruções básicas sobre como proceder
em uma viagem de estudo. Onde o estudante terá folhas pautadas e em branco para fazer os
seus registros ao longo da viagem.

Esses livros devam ser utilizados: como material propulsor para a produção de outros
materiais, tais como texto, desenhos, exposições fotográficas, blog, etc., fruto da pesquisa que
os estudantes fizerem, e que poderão ser usados posteriormente pelo professor para abordar a
temática escolhida com outros estudantes.

Considerações finais
Tendo em vista a compreensão da importância de utilizar a viagem de estudos enquanto
dispositivo metodológico para o ensino de história, apresentei uma proposta de elaboração de
livros para o professor e para o estudante como resultado do desenvolvendo uma atividade de
pesquisa. Tal proposta parte do entendimento da escola como espaço de produção de
conhecimento e o estudante enquanto sujeitos protagonistas da produção do próprio
conhecimento.

Referência

BANDEIRA, 1994; BANDEIRA, D. “Material didático: conceito, classificação geral e


aspectos da elaboração”. In: CIFFONE, H. (Org.). Curso de Materiais didáticos para
smartphone e tablet. Curitiba, IESDE, 2009, p. 13-33. Disponível em:
http://www2.videolivraria.com.br/pdfs/24136.pdf. Acesso em: 28/08/ 2018.
BITTENCOURT, Circe. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2004.
FONSECA, Selva Guimarães. Didática e prática de ensino de História. Campinas: Papirus.
2013.
SCHMIDT, Maria Auxiliadora. O saber escolar e o conhecimento histórico. Disponível em:
www.uel.br/revistas/uel/index.php/histensino/article/download/11836/10402. Acesso dia:
27/08/2018.

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Mestranda do Programa de Pós-graduação em História da África, da Diáspora e dos Povos Indígenas
da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB. Orientanda do professor Dr. Sérgio
Armando Guerra Filho.

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