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V ENCONTRO DE INTEGRAÇÃO UENP

IX Jornada de Iniciação Científica


V Seminário de Extensão e Cultura
V Encontro de Internacionalização
III Seminário de Ensino
II Encontro Anual de Extensão

O NORDESTE DOS VERSOS E DAS ARMAS: O CANGANÇO ENTRE A


MEMÓRIA E O ENSINO DE HISTÓRIA

Thiago de Oliveira Gomes (Bolsista Residência Pedagógica), Hadryann César


Rodrigues (Bolsista Residência Pedagógica), Taíse Ferreira da Conceição
Nishikawa (Orientadora), e-mail: taise@uenp.edu.br.
Universidade Estadual do Norte do Paraná/Centro de Ciências Humanas e da
Educação

Categoria: Ensino; Área: História; Sub-área: Ensino de História.

Palavras-chave: Cangaço, Ensino de História, Cordel.


.

Introdução

Este trabalho apresenta o desenvolvimento e os resultados de uma aula


realizada pelos estagiários do Programa Residência Pedagógica (Subprojeto
História) no 1º semestre de 2019. O estágio foi realizado na Escola Estadual
Anésio de Almeida Leite, situada no bairro Aeroporto, na cidade de Jacarezinho
(PR). A aula sobre o Cangaço foi realizada nos dias 4 e 18 de julho, nas turmas
3º A matutino e 3º B noturno. Com base nas observações do ambiente escolar,
na análise dos documentos da escola, na leitura do Projeto Político
Pedagógico, nos planos de ensino da professora regente da disciplina e as
informações contidas no site da Secretaria Estadual de Educação do Paraná
(SEED-PR), desenvolvemos a regência que conseguiu contribuir com o
reconhecimento da inserção histórica e social da escola na localidade. E a
partir disso, nossa temática se relacionou com a problemática da memória
social.
A seguir serão salientados os empregos materiais e metodológicos que
influenciaram o planejamento e a execução dessa aula de História, bem como
o plano de aula, a execução da mesma e as atividades produzidas pelos
discentes, esses três últimos como resultados. Além disso, colocamos em
pauta discussões sobre o ensino de história, o uso de fontes históricas na sala
de aula e a avaliação formativa no processo educacional. Por último
apresentaremos algumas conclusões de todo esse processo de observação,
planejamento, prática docente e reflexão.

Materiais e métodos

O processo de construção, realização e reflexão sobre uma aula de


história que será descrito nesse trabalho é fruto de um estágio realizado no
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primeiro semestre de 2019, como já salientamos. Partindo desse pressuposto,


Pimenta (2004) ressaltar que o estágio é um componente teórico da prática
docente, que embasa a observação, fundamentação e intervenção, para
alcançar à práxis e atingir a transformação da realidade. Portanto, entende-se o
estágio como uma atividade curricular teórica e prática, simultaneamente e
interdependente. Nesse contexto da práxis educativa, realizamos uma série de
constatações sobre as diversas faces da realidade que o Colégio Estadual
Anésio de Almeida Leite está inserido, com base em índices educacionais, na
nossa presença física no ambiente escolar e também por meio do P.P.P. da
escola. Assim, teorizamos a prática – como processo que antecede a
elaboração de uma aula de história – por meio dessas várias observações
empírico-documentais sobre a instituição de ensino mencionada.
Um dos nossos referenciais metodológicos foi José Carlos Libâneo no
que se refere ao planejamento da aula. O autor discorre sobre a importância do
planejamento escolar, destacando que o mesmo organiza a prática do ensino.
O planejamento escolar pode ser dividido em três etapas interdependentes: o
planejamento da escola, o planejamento de ensino e por último e não menos
importante o planejamento de aula. A primeira etapa consiste na “[...]
organização escolar, a contextualização social, econômica, política e cultural da
escola, a caracterização da clientela escolar, os objetivos educacionais gerais,
a estrutura curricular, diretrizes metodológicas gerais, o sistema de avaliação
do plano, a estrutura organizacional e administrativa.”. Libanêo destaca que é
necessário que os docentes tenham conhecimento dessa documentação para
o ofício da docência. Para o autor, o plano de ensino é o roteiro que gere todo o
processo de ensino da disciplina ministrada pelo professor num determinado
tempo (bimestral, trimestral, semestral, anual, por exemplo), com tópicos
discorridos sobre os objetivos, os temas, os resultados esperados e etc. A
última etapa, o plano de aula, consiste na particularização do plano de ensino,
ou seja, é um pedaço específico, uma continuidade dele, também com os
mesmos tópicos já mencionados, englobando um número de aulas e temáticas
definidas pelo professor (LIBANÊO, 1990, p. 221-245).
Para a construção de um plano de aula em todos os tópicos que
mencionamos no parágrafo anterior, é imprescindível que se discuta a relação
entre ensinar história e documentos. O conhecimento histórico escolar e o
conhecimento histórico acadêmico são distintos em suas naturezas, mas é
crível que ambos se conectam em vários momentos. Nesse sentido, os
documentos históricos, conforme Caimi (2008, p-129-150), são os materiais do
ofício do historiador, portanto, é razoável que sejam incorporados no cenário
educativo, para aproximar a ciência da educação, mas também para fugir de
práticas de memorização. Por fim, Caimi demonstra que existem
documentos/programas norteadores criados nas últimas décadas – os PCNs e
o PNLD – que abarcam parâmetros para utilização desse material em sala de
aula. Sobre os documentos históricos:
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Com atenção e perspicácia, podem ser observadas e colhidas


informações nos detalhes fatos, estéticas, conceitos, sentidos etc. É
possível pesquisar informações sobre o documento em fontes
externas (autoria, contexto da obra, estilo etc.) e confrontar eventos
históricos identificados na fonte estudada a eventos de outras épocas,
quanto a semelhanças e/ou diferenças e relações de continuidade
e/ou descontinuidade. Quando o professor considerar necessário,
pode ser feita a pesquisa da trajetória histórica de preservação,
conservação e difusão do documento. É importante que o trabalho
envolva observações, descrições, análises, pesquisas, relações e
interpretações e, no final, aconteça um momento de retorno ao
documento, para que os alunos comparem as novas informações – o
seu “novo olhar” – com suas apreensões iniciais e reflitam sobre
problemáticas históricas a ele relacionadas (BRASIL, 1998, p. 86-7
apud CAIMI, 2008, p. 142).

Sobre as características da aula de história, Rocha (2015, p. 84-5)


salienta que é preciso entende-la primeiramente como evento, pois é singular
em cada momento gerado por uma combinação de variáveis como
expectativas, temperamentos humanos, proximidade (ou não) do conhecimento
com a realidade latente e abordagens. Todos esses elementos citados estão
suscetíveis à relação mútua entre professor, aluno e conhecimento, que torna
cada dia de aula único. Mas a aula de história também pode ser entendida
como uma rotina, pois envolve uma série de tarefas explicativas, oralizadas e
avaliativas que comumente estão presentes no cotidiano escolar. Portanto,
Rocha ressalta que os docentes devem bem planejar a situação de ensino
junto aos discentes e se preparar para o imprevisível, pois “[...] as coisas (na
interação própria da aula) tendem a acontecer diferentemente do que
planejamos [...]” (ROCHA, 2015, p. 85).
Já encerrando, do ponto de vista material para a realização da aula,
utilizamos como fonte histórica trechos do cordel “Antonio Silvino: vida, crimes
e julgamento”, datado de 1930 e escrito por Francisco das Chagas Baptista.
Outros materiais foram empregados como folhas de sulfite (para impressão dos
trechos do cordel para os alunos) e data-show para exposição da aula
construída.

Resultados e Discussão

O planejamento de aula é um dos resultados deste trabalho. Ele foi


dividido nas seguintes etapas:

a) Conteúdo: O Cangaço e a República Velha (1889-1930)


b) Problemática: Banditismo social no Brasil: a memória do Cangaço no
Nordeste brasileiro
c) Objetivo: Interpretar e entender as diversas representações existentes
sobre o movimento cangaço por meio da literatura de cordel, bem como
suas intencionalidades. Por meio dessas narrativas, os discentes
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assumiriam seu papel de agentes da história, produzindo seus próprios


versos, fazendo uma releitura crítica de sua realidade local.
d) Fonte: Trechos do cordel escrito em 1930 por Francisco das Chagas
Baptista.
e) Procedimentos metodológicos (etapas da aula)

I – Identificação do documento: Será apresentado aos alunos o documento.


Os estagiários e alunos irão lê-los coletivamente Haverão questionamento
sobre o significado de alguns termos poucos usuais e sobre qual o sentido
geral da documentação. Após isso, será explicado que aquilo é um cordel,
o que consiste esse tipo de texto e qual a sua datação e autoria.

II – Contextualização: Momento de contextualização do documento,


momento que será abordado: a passagem da monarquia para república; a
transição do escravismo para mão de obra livre; as formas de dominação
política na república (Coronéis, voto de cabresto) e etc. Após isso, será
falado do contexto social do Nordeste e sobre o Cangaço

III – Comentário: Durante a contextualização, os estagiários irão voltar


constantemente ao documento, realizando conexões com o conteúdo da
aula.

f) Recursos didáticos: data-show e folhas de sulfite para impressão do cordel.


g) Atividade reflexiva

1) Com base na aula de hoje, escreva um cordel sobre um desses dois


temas:
a) A vida na cidade de Jacarezinho (PR).
b) A vida no Colégio Anésio de Almeida Leite.

No que
se

Figura 1 - Trechos selecionados do cordel de Francisco das Chagas Baptista.


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refere a execução da aula, é significativo que se saliente novamente que a


mesma foi aplicada em duas turmas do Ensino Médio do Colégio Estadual
Anésio de Almeida Leite, o 3º ano A e o 3º ano B. Nesse sentido da execução,
os resultados foram satisfatórios nas duas turmas, principalmente no momento
da atividade reflexiva. É no momento dessa atividade que se desagua o
objetivo central dessa aula. Ao todo, foram realizados 18 versos rimados por 24
alunos, alguns em dupla. Segue abaixo um dos versos produzidos pela turma:

As 6:30 A.M. me levanto


Logo logo já chego e bato o ponto
E já vamos fazer a oração
Dando quase 10:00 já começa a falação.

Todo mundo diz que o melhor mercado é o Kilão


Mas lá só escuto todo dia falação
Registrar eles não querem e os funcionário chora
E os estagiários eles querem logo mandar embora.

Mas todo dia ei de lutar


Porque esse emprego quero logo ficar
Nesse emprego sou refém
Tem seus problemas mas sempre quero ver bem.

Tem dias que todos há de sorrir


Por mais que tenha problemas dele não quero sair
Pois gosto muito de trabalhar
E lá eu sei que ei de ficar.

A partir disso, é imprescindível que reflitamos sobre o processo de


avaliação escolar. Existe uma ideia arcaica que ainda perdura nas instituições
de ensino sobre ela. Essa ideia tida como tradicional trata o processo avaliativo
como um meio classificatório, promotor do medo, do controle social e da
punição (FREITAS; DA COSTA; DE MIRANDA, 2014, p. 88).
Libanêo (1990, p. 195-220) nos mostra outra perspectiva mais
significativa e humanizada de como se deve encaminhar o processo de
avaliação escolar. Ele caracteriza a mesma como um diálogo bilateral: ela
avalia não só a parte discente, mas também a prática docente. É um meio para
compreender as potencialidades e percalços dos alunos, mas também uma
forma de observar os desacertos que foram praticados pelo próprio professor
no encaminhamento de suas aulas. José Carlos Libanêo discorre também
sobre a ideia de que a avaliação escolar tem três funções, a pedagógico-
didática (que verifica o atingimento dos objetivos), a diagnóstica (que avalia a
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situação prévia) e a controle (que avalia e qualifica os resultados finais),


portanto, são três etapas interdependentes.

Conclusões

Os processos de ensino e aprendizagem são complexos e demandam


uma visão que privilegie a investigação da situação social e cognitiva dos
alunos antes da prática docente e da avaliação escolar. É importante que se
promulgue um ensino que compreenda os discentes em suas potencialidades e
em suas dificuldades. Antes de refletir sobre como dar uma aula sobre o
Cangaço ou a República Velha, por exemplo, é necessário que nós,
professores em formação, reflitamos sobre por que dar aula sobre
determinados assuntos. Portanto, o ensino deve ser primeiramente emanado
de sentido e significado, para que possa transformar alunos em cidadãos
críticos, que desnaturalizem os problemas vigentes no mundo contemporâneo.

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer primeiramente a CAPES, por proporcionar as


bolsas do programa Residência Pedagógica, que ajudam os estudantes do
nível superior a cada vez mais aperfeiçoarem e permanecerem com seus
estudos. Agradecemos também a UENP por realizar o V Encontro de
Integração, é indispensável a realização de eventos como esse que pautam a
pesquisa, o ensino e a extensão, num contexto crítico de desmonte da
educação pública de da ciência brasileira.

Referências

BAPTISTA, Francisco das Chagas. Antônio Silvino: vida, crimes e


julgamento. São Paulo: Editora Prelúdio, 1930.
CAIMI, Flávia Eloisa. Fontes históricas na sala de aula: uma possibilidade de
produção de conhecimento histórico escolar? Anos 90, v. 15, n. 28, 2008.
FREITAS, Sirley Leite; DA COSTA, Michele Gomes Noé; DE MIRANDA, Flavine
Assis. Avaliação Educacional: formas de uso na prática pedagógica. Meta:
Avaliação, v. 6, n. 16, p. 85-98, 2014.
LIBANÊO, José Carlos. Avaliação escolar. In: LIBANÊO, José Carlos. Didática.
São Paulo: Editora Cortez, 1990, 195-220.
________. Planejamento escolar. In: LIBANÊO, José Carlos. Didática. São
Paulo: Editora Cortez, 1990, 221-247.
PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro Lucena. Estágio e docência.
São Paulo: Cortez, 2004.
ROCHA, Helenice Aparecida Bastos. Aula de história: evento, ideia e escrita.
História & Ensino, v. 21, n. 2, p. 83-103, 2015.

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