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O CONTEXTO DE SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA

Roberto Izoton
A Sociologia surge após o contexto de desenvolvimento do capitalismo e
desestruturação do modo de vida feudal. Sua intenção inicial era compreender
as crises sociais resultantes desse processo, bem como apontar soluções para
elas.
O feudalismo foi um sistema econômico, social, político e cultural que vigorou
na Europa entre os séculos V e X. A economia feudal era agrária e artesanal,
sendo a produção para subsistência dos feudos, já que o comércio deixou de se
desenvolver nesse período. Desse modo, a maior parte da população europeia
vivia nos campos.
A sociedade europeia de então era dividida em três estamentos tradicionais: o
clero, constituído pelos sacerdotes da Igreja Católica, a nobreza, formada pelos
proprietários de terras, a quem chamamos de senhores feudais, e os servos,
camada composta pelos trabalhadores desse sistema, que realizavam as
atividades agropecuárias e artesanais. Essa estratificação social tinha
fundamentação religiosa, por isso, o clero encontrava-se no topo da pirâmide
social estamental.
Na idade média, período em que vigorou o feudalismo, o poder era
descentralizado. Cada senhor feudal mandava dentro de seu próprio feudo. Até
existia a figura do rei, mas como ele não dispunha de um grande exército a sua
disposição, não conseguia exercer sua autoridade sobre os outros senhores
feudais, tornando-se soberano.
A propriedade das terras de um senhor feudal era passada após a sua morte ao
seu primeiro filho homem, o que chamamos de lei da primogenitura. O segundo
filho de um nobre costumava migrar para a Igreja Católica, onde alcançava a
posição de bispo e passava a administrar as terras possuídas pela igreja, que
também se constituía como uma grande senhora feudal. O terceiro filho deveria
se contentar com os rendimentos que lhes eram atribuídos pelo seu irmão mais
velho, ou conquistava terras para formar seu próprio feudo. Por fim, as
mulheres não tinham direito à propriedade. Caso um senhor feudal tivesse
apenas uma filha mulher, deveria casá-la com o filho de um nobre aliado, sendo
que este tornava-se o herdeiro de suas terras.
Ainda podemos apontar como traços culturais feudais a percepção do tempo
baseada nos movimentos da natureza (o nascer e o pôr do sol, as estações do
ano, as fases da lua etc.), visto que tais movimentos eram importantes para as
atividades econômicas do período em questão. Além disso, o casamento era
arranjado pelos pais dos noivos, segundo interesses econômicos ou políticos, e
vigorava a família extensa, arranjo por meio do qual todos os parentes
habitavam na mesma propriedade. Por fim, era corrente a representação da
criança como um adulto em miniatura, podendo exercer as mesmas tarefas que
um adulto.
A partir do século XI, um evento histórico contribuiu para o início da
desestruturação do sistema feudal. Foram as cruzadas, movimentos nos quais
exércitos europeus dirigiram-se a Israel com a declarada intenção de expulsar os
povos palestinos, praticantes do islamismo, da Terra Santa. As cruzadas, que
foram uma boa oportunidade para conquista de novas terras para aqueles que
não as possuíam, também colocou os europeus em contato com produtos que
não existiam no velho continente: as especiarias (cravo, canela, pimenta do
reino, orégano etc.) e a seda, dentre outros.
Daí em diante, alguns sujeitos passaram a levar aqueles produtos do oriente
com o intuito de vende-los na Europa. Vemos aí o renascimento do comércio e o
surgimento de uma nova classe social, a dos comerciantes, que também são
chamados de burguesia, por morarem em cidades muradas denominadas
burgos.
Como a base do comércio é a cidade, esta passou a ter mais importância na
Europa, atraindo muitas pessoas para lá. Outro fenômeno que impulsionou a
urbanização desse período foi a modernização da agricultura, com o
desenvolvimento de novas ferramentas e novas técnicas de cultivo, liberando
parte da mão de obra camponesa, que passou a migrar para as cidades.
A burguesia mercantil, ao passar com seus produtos pelos vários feudos nos
quais estava dividida a Europa, pagava pedágios e impostos para cada senhor
feudal, o que fazia com que seus lucros diminuíssem mais do que gostaria. Para
combater esse problema, os comerciantes se aliaram com os reis, financiando-os
e possibilitando-os a montar um exército nacional. Com isso, os reis puderam
impor sua autoridade aos demais nobres, vindo a governar sozinhos seus
territórios. Com isso, estabeleceram-se os Estados nacionais e a monarquia
absoluta, com a centralização do poder na mão dos reis. Em troca, a burguesia
demandava dos reis liberdade de comércio, sem contar que passaria a pagar
impostos para uma autoridade apenas.
O comércio possibilitou uma grande acumulação de capital na mão da
burguesia. Foi com esse capital acumulado que a burguesia fomentou o
desenvolvimento das máquinas a vapor que foram utilizadas para a montagem
das primeiras fábricas de roupas na Inglaterra e nos Países Baixos. Esse
movimento, iniciado no século XVIII, é o que chamamos de Revolução
Industrial.
Como as indústrias também eram instaladas nas cidades, houve mais atração da
população que vivia no campo, incrementando assim a urbanização europeia.
Um dos motivos para isso acontecer é a mudança da lógica da produção
agrícola, que passará a produzir mais algodão, que era utilizado como matéria
prima para as indústrias têxteis, liberando um contingente de camponeses que
trabalhavam com outros cultivos. Esses camponeses migraram para as cidades e
passaram a trabalhar nas fábricas, constituindo uma nova classe social, o
proletariado.
Com o tempo, a burguesia, que já tinha o poder econômico, exigiu também o
poder político. Inicialmente na Inglaterra, no movimento denominado
Revolução Gloriosa (1688 e 1689), ela se voltou contra o rei e tomou para si o
poder político, tornando-se assim a classe dominante, no lugar do clero e da
nobreza. Na França, com a Revolução Francesa (1789 a 1799), a burguesia
sepultou de uma vez as últimas estruturas do sistema feudal, como a divisão da
sociedade nos estamentos tradicionais e a dominação ideológica da Igreja
Católica.
Inicialmente, a aglomeração nas cidades ocasionou a falta de alimentos e as
precárias condições sanitárias e de higiene elevavam o índice de mortalidade na
Europa. Apenas depois de 1800, com a Revolução Industrial e a Revolução
Agrícola inglesas, a situação melhorou e a expectativa de vida aumentou. Além
das questões de saúde, o acúmulo de pessoas nas cidades provocou o aumento
da violência, pois nem todos eram absorvidos como trabalhadores das fábricas e
aqueles que não conseguiam empregos recorriam a criminalidade para
sobreviver.
As péssimas condições de trabalho, as elevadas jornadas e os baixos salários dos
operários no início da Revolução Industrial fizeram com que os pobres fossem
mais vulneráveis aos problemas sociais do período, como a fome, a violência e a
precariedade da saúde. Isso fez com que os trabalhadores dos países
industrializados se revoltassem por melhores condições de trabalho e de vida.
Essas revoltas, aliadas ao aumento dos índices de violência, preocuparam a
burguesia e fomentaram o desenvolvimento da Sociologia, que tinha como
objetivo entender o que provocava tais crises e propor soluções para elas.
Outras mudanças decorrentes da passagem do feudalismo para o capitalismo
foram a garantia da propriedade das mulheres, o fim do direito de
primogenitura, o surgimento do amor romântico, com o casamento por escolha
dos próprios parceiros, a ascensão da família nuclear (formada por pai, mãe e
filhos) e a consideração da infância e da adolescência como fases distintas da
vida das pessoas. Por fim, podemos citar a mudança na percepção do tempo, a
partir da compra da hora de trabalho por parte dos industriais.

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