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MODERNA
Introdução
Durante o século XVI, a monarquia inglesa se fortaleceu, mesmo que
envolvida em conflitos religiosos e nos dilemas enfrentados com a
existência do parlamento. Contudo, no século XVII, os confrontos entre
o rei e as câmaras legislativas se tornaram constantes, explicitando
divergências na condução da economia mercantilista (que não atendia
os anseios da burguesia) e da política (o autoritarismo e a falta de re-
presentatividade dos proletários, que buscaram apoio no parlamento).
Esse processo deu início a uma Guerra Civil, em 1640, e a uma sucessão
de eventos que culminaria com a Revolução Gloriosa de 1688, que
marcou o fim do Absolutismo inglês e permitiu o desenvolvimento da
chamada Revolução Industrial.
Neste capítulo, você vai aprender de que forma o crescimento do
poder da burguesia inglesa se relaciona com o enfraquecimento do po-
der do rei. Para isso, verá as diferentes fases do processo revolucionário
inglês e suas principais características, assim como as especificidades
e os projetos de cada uma das dinastias envolvidas nos conflitos do
século XVII.
2 A era das revoluções inglesas
2 As revoluções inglesas
As revoluções inglesas podem ser compreendidas como um conjunto de
acontecimentos resultantes do conflito entre certas estruturas feudais ainda
vigentes na Inglaterra e as forças do capitalismo em expansão. Essa abordagem
permite compreender o caso inglês como a primeira revolução burguesa da
Europa Ocidental, antecipando em 150 anos a Revolução Francesa no sentido
da superação do Absolutismo e da criação de condições para o desenvolvi-
mento industrial. Além disso, as revoluções inglesas permitiram aos homens
de propriedade a conquista e o usufruto da liberdade civil e política, então
asseguradas como direitos pelos próprios indivíduos.
De acordo com Hill (1984), é possível compreender as revoluções inglesas como revo-
luções burguesas, mesmo que não tenham sido revoluções feitas ou conscientemente
desejadas pela burguesia. Durante a Guerra Civil, parte da burguesia, especialmente
os ricos comerciantes, apoiou o Rei Carlos I, enquanto os demais burgueses, que não
se beneficiavam com monopólios e privilégios, desejavam mudanças, mas temiam a
vontade revolucionária dos estratos mais baixos da sociedade.
Hill (1984) afirma que houve na Inglaterra uma união entre a burguesia e a
maioria dos proprietários rurais, que compreendiam as vantagens de uma produção
agrícola voltada para o mercado. Essa aliança possibilitou o controle das propostas
mais radicais, que impulsionavam a revolução para além dos desejos dos mais
moderados. O resultado foi a configuração de um Estado que aboliu as institui-
ções que impediam o desenvolvimento do capitalismo, rompendo com heranças
feudais (HILL, 1984).
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Além desses dois grupos, surgiram outros, como os levellers (os “nivelado-
res”) e os diggers (ou “cavadores”). Os “niveladores” foram assim intitulados
por seus adversários políticos porque queriam “nivelar todos os homens por
baixo”. Eram republicanos, defendiam a igualdade de todos perante a lei, a
liberdade de culto, o fim dos dízimos cobrados pela Igreja e a extinção dos
monopólios comerciais. Além disso, defendiam que a Câmara dos Comuns
deveria assumir o poder no lugar do rei e que a Câmara dos Lordes deveria ser
dissolvida. Já os “cavadores” eram muito mais radicais: defendiam a reforma
agrária, fazendo com que as terras pertencentes à Igreja, ao governo e aos
grandes proprietários fossem entregues aos pobres para serem cultivadas.
De acordo com Hill (1995, p. 121), esses grupos “eram formados por homens
e mulheres pobres, sem sofisticação ou educação e, talvez por isso, raramente
suas opiniões foram consideradas a sério. Porém muitas de suas exigências,
tradicionalmente descartadas como fantasias impraticáveis, aproximam-se
A era das revoluções inglesas 5
Houve duas revoluções nos anos 1640, talvez mais, mas as duas em que estou
pensando eram: a revolução política, que foi bem sucedida, que se estabeleceu
e que na verdade removeu o poder da rei e o transferiu para o Parlamento, que,
por sua vez, representava os mercadores e a pequena nobreza da Inglaterra.
Esta revolução durou algum tempo, com seus altos e baixos, e foi finalmente
confirmada em 1688 quando a Inglaterra se tornou um país no qual o rei era
relativamente sem importância e o Parlamento soberano na política. A segunda
revolução, que falhou, foi a revolução radical a favor de mudanças sociais em
grande escala, e pela democratização da Inglaterra. O Parlamento representava
as classes proprietárias: apenas os homens que tivessem alguma propriedade
tinham direito de voto, e nenhuma mulher, obviamente. As pessoas comuns
não participavam diretamente na eleição dos membros do Parlamento e menos
ainda das decisões políticas (HILL, 1995, p. 113).
Além desses legados listados por Stone (2016), podemos citar que a Revo-
lução Gloriosa, como um último episódio das revoluções inglesas, significou o
fim do Absolutismo da Inglaterra. A monarquia constitucional e parlamentarista
que se seguiu ao processo revolucionário traduzia uma limitação do poder real
pelo poder legislativo. A partir do término dos conflitos, a aliança econômica
entre a burguesia das grandes cidades e a nobreza latifundiária se consolidou,
porque ambos os grupos econômicos tinham interesses no incipiente processo
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aliança com a burguesia, ansiosa pelo fim das tantas guerras prejudiciais ao
desenvolvimento de seus negócios, o que, posteriormente, levaria Henrique
VIII ao poder (HILL, 1984).
A dinastia Tudor se manteve no poder até 1603, quando morreu a rainha
Elisabeth I, o maior nome do Absolutismo inglês. A dinastia dos Tudors, que
governava a Inglaterra no século XVI, exerceu o chamado Absolutismo de
fato, sem a oposição da burguesia, pois realizava uma série de ações admi-
nistrativas que correspondiam aos anseios burgueses, como centralização do
poder com garantia de ordem social, unificação das moedas, dos pesos e das
tarifas alfandegárias, permissão da atividade dos corsários. Nesse período,
a Igreja Anglicana dava ênfase no conteúdo puritano (pela compatibilidade
com a ideologia burguesa) (HILL, 1984).
De acordo com D’Avila (2017, p. 304):
Quando a dinastia Stuart subiu ao trino em 1603, recebeu como herança da dinas-
tia anterior, Tudor (1485-1603) um Estado que, embora tivesse acompanhado o
processo de centralização e fortalecimento do poder monárquico que se verificou
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Você sabe como se constituiu o parlamento na Inglaterra e como se deu seu for-
talecimento ao longo dos séculos? O historiador Modesto Florenzano nos ajuda a
compreender a história dessa instituição. De acordo com o autor, ainda que durante
a Idade Média a Inglaterra possuísse um poder monárquico relativamente forte e
centralizado, organizou-se uma “assembleia de vassalos, que logo se transformaria
numa instituição coletiva e unificada da classe dirigente feudal da ilha — o parlamento”
(FLORENZANO, 1981, p. 81). O objetivo dessa assembleia era votar e aprovar, em caráter
extraordinário, medidas econômicas e/ou políticas para a monarquia. O que distingue
essa instituição inglesa das congêneres existentes na Europa Ocidental (os Estados
Gerais na França e as Cortes na Espanha, por exemplo), é que:
por sua vez, no intuito de preservar seus poderes políticos, buscou alianças
com a aristocracia tradicional católica, o que se deu por meio da religião, com
uma aproximação da religião oficial do Estado, o anglicanismo, com preceitos
do catolicismo (FLORENZANO, 1981).
Nesse sentido, é importante assinalar que, comparativamente com o desenvol-
vimento das monarquias absolutistas na Europa Ocidental, o Absolutismo inglês
fracassava por sua faceta “reacionária e bloqueadora das novas forças econômicas
e sociais” (FLORENZANO, 1981, p. 95). A existência das especificidades estru-
turais inglesas e de uma burguesia já constituída fez com que se deflagrassem os
sérios confrontos entre o rei e o parlamento, que geraram as revoluções inglesas.
Leituras recomendadas
ARRUDA, J. J. A. A. Perspectivas da Revolução Inglesa. Revista Brasileira de História, São
Paulo, n. 7, p. 121-131, 1984.
HILL, C. O mundo de ponta-cabeça: ideias radicais durante a revolução inglesa de 1640.
São Paulo: Companhia das Letras, 1987.
HILL, C. Origens intelectuais da Revolução Inglesa. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
HOBSBAWM, E. J. Da Revolução Industrial Inglesa ao Imperialismo. Rio de Janeiro: Fo-
rense, 2014.
LIMA, V. C. “Impresso para ser vendido Crown em Pape’s Head Alley”: Hannah Allen, Livewell
Chapman e a disseminação de panfletos radicais religiosos durante a Revolução Inglesa
(1646- 1665). 2016. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal de São
Paulo, Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, São Paulo, 2016.
RUDÉ, G. A multidão na história: estudo dos movimentos populares na França e na
Inglaterra, 1730-1848. Rio de Janeiro: Campus, 1991.
STONE, L. Causas da Revolução Inglesa. Bauru: Edusc, 2000.
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