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HISTÓRIA DAS

RELIGIÕES

Alexsandro Alves da Maia


Religiões orientais
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Identificar as principais bases teológicas das religiões existentes no


Oriente.
 Diferenciar aspectos culturais do confucionismo, do budismo e do
taoísmo.
 Caracterizar a influência das religiões orientais no Ocidente
contemporâneo.

Introdução
As religiões do Oriente representam um processo transcendental da huma-
nidade e se baseiam na crença de uma existência cíclica, em que a salvação
se dá por meio da responsabilização do próprio indivíduo, e não a partir da
decisão de uma entidade maior que está em constante vigilância diante
das ações terrenas. Seus dogmas e doutrinas são distintos em relação ao
que conhecemos da teologia ocidental; trata-se de religiões mais ligadas ao
contemplativo, à introspecção e ao processo evolutivo cíclico e dinâmico.
Conhecer aspectos tão divergentes de nossa realidade ocidental
nos proporciona a reflexão diante de nossas ações enquanto produtos
de uma cultura linear, regida pelo controle coletivo e pela aceleração
de uma vida cercada por metas e poucos momentos de introspecção.
A teologia oriental parte de preceitos éticos que definem a existência
humana como criadora de possibilidades para consolidar valores morais
necessários ao desenvolvimento dos seres humanos nas suas relações e
em sua organização social.
Por isso, neste capítulo, dedicado ao estudo das religiões orientais,
você vai ser apresentado a um contexto cultural de diferentes povos
orientais. Além disso, vai conhecer de forma objetiva as bases teológicas
das religiões orientais e as diferenças entre elas — especificamente, entre
o budismo, o taoísmo e o confucionismo —, e vai ver a influência que as
religiões do Oriente têm sobre a cultura do Ocidente.
2 Religiões orientais

1 As bases teológicas das religiões do Oriente


As religiões orientais surgem no extremo Oriente, no contexto de culturas e
povos milenares que preservam de maneira primordial suas “raízes” teológicas
ligadas a processos humanos de práticas expressas em uma cosmovisão da
realidade comum à história da humanidade.
O desenvolvimento teológico do Oriente se estabelece a partir de suas
civilizações orientais: China, Índia, Japão, países do Oriente Médio (Irã,
Iraque, Palestina, etc.), Tibete, entre outros. Essa gama de países orientais
possui uma grande bagagem histórico-cultural e, no seu contexto religioso,
são criadas práticas humanas que são próprias da evolução da humanidade.
Nesse sentido, ao falar sobre os estudos religiosos, Dalgalarrondo (2008, p.
16) destaca a complexidade que lhe é inerente:

A religião é seguramente, um objeto de investigação dos mais complexos


posto que, como fenômeno humano, é, a um só tempo, experiencial, psico-
lógico, sociológico, antropológico, histórico, político, teológico e filosófico.
Enfim, implica abordagens e dimensões várias e de distintas espécies da vida
coletiva e individual. Ela é, não se pode negar, fenômeno humano de decisiva
centralidade de complexidade incontornável.

Nessa perspectiva, a compreensão das manifestações teológicas orientais


tem, em sua representatividade simbólica, valores conduzidos pelas diferentes
formas de harmonia dos sujeitos, construídos em suas relações socioculturais
e dinamizados por conta de sua tradição histórica — o que define de forma
concreta como as pessoas inseridas em determinado contexto seguem um
dogma ou uma doutrina religiosa. Essa experiência não é privilégio ou ex-
clusividade de povos do Oriente, mas, sim, parte de como os seres humanos
se caracterizam em práticas específicas da própria humanidade.
A teologia se constitui em um movimento próprio, produzindo um conhe-
cimento característico e independente. Suas práticas doutrinárias e dogmas
expressam uma diversidade de elementos que fazem parte de uma cultura ou
povo e, no caso cultura das religiões orientais, refere-se a povos que possuem
similaridades, mas, também, diferenças pontuais, que demarcam espaços e
produzem sua história. De acordo com o dicionário de termos Significados
(TEOLOGIA, 2019, documento on-line):
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A teologia estuda as religiões num contexto histórico, pesquisando e interpre-


tando os fenômenos e as tradições religiosas, os textos sagrados, a doutrina,
o dogma e a moral e sua influência nas diversas áreas do conhecimento,
especialmente nas ciências humanas, como na Antropologia e na Sociologia.

Os livros sagrados também fazem parte da cultura oriental, como os Vedas,


livros sagrados do hinduísmo, a Torá, livro sagrado do judaísmo, o Alcorão,
escrituras sagradas do islamismo, entre outros; são documentos e fontes
históricas de povos do Oriente que preservam, de certa maneira, a identidade
cultural e religiosa dessa região.
As religiões orientais, além disso, diferem em relação à construção de
monoteísmos e de politeísmos. No monoteísmo, cultuar um único Deus esta-
belece uma ordem de normalidade moral e organização social, o que pode ser
de extrema importância para um povo no que se refere a cultura, sociedade,
economia e política. Conforme Lima e Dias (2011), nas religiões que têm na
sua base o monoteísmo, preservam-se em grande parte os dogmas doutrinários
inerentes a qualquer religião, seja oriental ou não. Já as religiões politeístas
do Oriente possuem uma diversidade de deuses que representam um grande
panteão mitológico, expressando uma forte ligação com os elementos da
natureza, como animais, plantas, fogo, água, ar, etc. Assim como no mono-
teísmo, o politeísmo também se relaciona com a organização social, cultural
e política das sociedades orientais. Sorj (2016, documento on-line), nesse
sentido, classifica o politeísmo antigo da seguinte forma:

A valorização do politeísmo antigo deve ser tomada no sentido metafórico, e


não como uma proposta de retorno ao passado, pois o politeísmo moderno se
sustenta em outro contexto sociocultural. O politeísmo antigo era produto de
um sistema de crenças que aceitava múltiplos deuses como parte da tradição, e
não em nome da liberdade e do pluralismo que sustentam a cultura ocidental.
Enquanto no politeísmo da Antiguidade a diversidade de valores e motivações
era atribuída a deuses diferentes, cada um representante de uma qualidade
particular, sendo as pessoas seus instrumentos, no politeísmo moderno, são
os indivíduos que assumem como seus os valores e paixões, e, portanto, são
responsáveis pelas suas ações.

O politeísmo, portanto, engloba em sua essência uma dinâmica de movi-


mento diferente da do monoteísmo, constituindo de maneira eficaz a busca
dos seres humanos por se conectar com o sagrado, por acreditar em algo ou
alguém superior — deus ou deuses sempre estiveram presentes na formação
da humanidade, sendo o elo entre o humano e o sagrado.
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Na Figura 1, a seguir, você vê duas deusas que fazem parte do hinduísmo,


religião politeísta que cultua diversas divindades.

Figura 1. Lakshmi, deusa do dinheiro e da riqueza, e Saraswati, deusa da sabedoria.


Fonte: Hinduísmo... ([201-?], documento on-line).

O sagrado é a personificação do transcendental; coloca-se, assim, por meio


da percepção contemplativa, a existência do real, em que diversas sensações que
constituem a visão sobre o mundo, bem como a forma pela qual se interpreta a
realidade. Dessa forma, a experiência com o sobrenatural, a relação com aquilo
que talvez não conseguimos expressar por palavras, mas podemos sentir, é o
que nos faz transcender do real para o espiritual, e vice-versa.
As religiões, então, são manifestações próprias do sagrado, de modo que
se pode, por meio delas, criar estudos dos fenômenos religiosos com base
na fenomenologia religiosa, uma área das ciências humanas que desenvolve
conhecimento epistemológico das religiões. O sagrado, o monoteísmo e o
politeísmo são alguns dos elementos constitutivos das religiões orientais, e a
fenomenologia das religiões é um viés científico que possibilita a compreensão
da realidade das religiões que o Oriente desenvolve. As bases teológicas são
formadas por meio de uma análise rigorosa, que envolve questões históricas e
culturais, além de outras possibilidades de análise epistemológica das religiões
orientais, como a filosofia e a sociologia.
Na história das religiões, Belloti (2011) afirma que a história é um viés
epistemológico que pode, a partir de diferentes fontes, direcionar os estudos
das religiões orientais, criando um referencial histórico que possa elucidar
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seus pontos fundamentais, como suas práticas ritualísticas, seus preceitos


dogmáticos e suas doutrinas. Com a história das religiões orientais, pode-se,
também, compreender a história desses povos e perceber como as religiões
fundamentam suas ações sociais e políticas.
Na sociologia das religiões, o estudo das sociedades por meio das religiões
se fundamenta nas doutrinas e nos dogmas que elas possuem. As sociedades,
então, são compreendidas pelas suas tradições religiosas, por seus hábitos
religiosos, seus costumes religiosos, suas práticas religiosas, etc. A sociologia,
assim como a história, contribui com métodos científicos como ferramentas
de análise e estudo das religiões orientais.
Já a antropologia se utiliza do método etnográfico, que trabalha com a
descrição fidedigna de como os seres humanos vivem. Com isso, a antropologia
das religiões, assim como a sociologia e a história, cria possibilidades de se
observar as experiências orientais, correlacionando-as com sua história, sua
cultura, seus rituais, sua política, sua cosmovisão, etc. O estudo antropológico
se inter-relaciona, portanto, com as diversas áreas de humanas — história,
sociologia, filosofia, etc. —, e essa inter-relação não é exclusividade da an-
tropologia, mas indica como as áreas conversam entre si.
Esse pequeno escopo sobre as bases teológicas das religiões orientais
mostra, então, como o Oriente, em suas características religiosas, pode ser
decifrado, considerando suas teologias monoteístas e politeístas e as possibi-
lidades de um olhar científico sobre elas.

2 O confucionismo, budismo e o taoísmo

Confucionismo
O confucionismo surgiu na China, no século VI a.C., fundado por Khoung-
-Fou-Tseu (551–479 a.C.), chamado pelos ocidentais de Confúcio (Figura 2).
Tido como sábio e filósofo, suas ideias transformaram os valores éticos e
sua identidade cultural, e sua influência em diversos países do leste asiático
promoveu avanços socioeconômicos em função da valorização da educação
e do conhecimento. Existem estudiosos que afirmam que o confucionismo é
um sistema filosófico-ético-moral, enquanto outros julgam ser uma religião.
De acordo com o dicionário virtual Significados (CONFUCIONISMO, 2016,
documento on-line):
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O confucionismo é um sistema ético, filosófico e religioso chinês, fundado


por Confúcio. Foi a doutrina oficial da China por mais de dois mil anos, até
o início do século XX. Não há igrejas ou organização em forma de clérigos,
portanto o confucionismo não se encaixa nas correntes religiosas como comu-
mente são conhecidas no ocidente. Também não há adoração de divindades
e não existe a noção de vida após a morte.

Confúcio era um grande sábio fundador de ensinamentos contidos em suas


obras literárias, nas quais estão contidas as bases religiosas e filosóficas do
confucionismo. Para compreender o confucionismo nesse contexto, adotaremos
a perspectiva da construção de uma manifestação religiosa. “Confúcio, na
verdade, foi um reformador, morreu sem saber o que suas ideias represen-
tariam para a China, mas elas foram de tal importância que se pode dizer
que foi uma espécie de religião estatal [...]” (SIMÕES; GOMES; GNERRE,
2011, documento on-line). Dessa forma, a relação do confucionismo com a
organização do Estado chinês estabelece preceitos de um senso moral e ético,
característico das religiões orientais, mas também de outras.

Figura 2. Estátua de Confúcio no Templo Confúcio em Xangai, China.


Fonte: Conheça... (2016, documento on-line).
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Existem, dentro do código de ética do confucionismo, cinco características de


senso moral ligadas a normas de condutas interpessoais: benevolência, justiça,
costumes próprios, conhecimento e integridade. Esses elementos formam um
conjunto de princípios incorporados à vida e ao modo de pensar do povo chinês:

O que se destaca na doutrina de Confúcio é a importância dada à ética dos


relacionamentos humanos, o interesse pelas questões sociais reais, exempli-
ficado no papel do indivíduo na sociedade e as regras básicas de conduta,
levando com isso a demonstrar que seu interesse por essas questões eram
maiores do que pelas questões religiosas e da metafísica [...] (SIMÕES; GO-
MES; GNERRE, 2011, documento on-line).

O confucionismo valoriza, além das relações humanas, o conhecimento,


o processo de ensino e aprendizagem, o processo pedagógico do sujeito — a
educação, portanto, é um dos alicerces da doutrina confucionista. Nesse
contexto, a bagagem que se adquire ao longo do processo educacional faz
com que os seres humanos possam se desenvolver em sua plenitude, preceito
que faz com que os povos que valorizam o conhecimento possam evoluir em
diferentes aspectos de sua vida social, econômica e política.

A premissa maior do ensinamento de Confúcio era a de instruir como se


enquadrar na Moral, além de repassar ao seu povo uma filosofia de como
viver bem em consonância aos valores do dever, da cortesia, sabedoria e
generosidade. E uma das ideias do sábio, talvez a mais importante, era a de
que os filhos deveriam honrar e respeitar os pais tanto na vida quanto após
a morte, acarretando, nesse encontro, o encorajamento da prática do culto
aos antepassados que, por sua vez, já integrava parte da Religião chinesa
(CAMPOS NETO, 2015, documento on-line).

A valorização dos ancestrais é a forma pela qual o povo chinês respeita seus
entes queridos, seus antepassados. Assim, os mais velhos são valorizados para
que se possa preservar a sabedoria que podem transmitir às futuras gerações
com o intuito de que assimilem esses ensinamentos e perpetuem a tradição
familiar de seu povo.

Budismo
Sidarta Gautama, conhecido como Buda, nasceu no século VII a.C., e era
herdeiro do trono indiano saquiano — sua vida de luxuria e glória real ante-
cede sua “iluminação” (“Buda” significa o despertado, o iluminado). As suas
experiências aos 29 anos, fora dos muros do palácio, com as enfermidades do
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mundo, a velhice humana e a efemeridade da vida, tocam-no a tal ponto que


decide assumir uma vida de renúncia à materialidade e aos prazeres da carne.
Dessa forma, coloca-se em busca da verdade e da iluminação de sua alma.

O Budismo apresenta uma série de peculiaridades em relação a outras religi-


ões. Ao contrário do Hinduísmo e do Judaísmo, por exemplo, o Budismo tem
origem num fundador, Sidarta Gautama, o Buda. Por outro lado, ao contrário
do Cristianismo e do Islã, esse fundador não representou uma encarnação
divina ou um mensageiro divino, mas, ao contrário, foi um ser humano que
expôs uma disciplina mental, desenvolvida e posta em prática com êxito por
ele próprio. Outro aspecto importante em relação ao Budismo é o fato de ser
uma religião não teísta, uma vez que rechaça a existência de um Deus ou
Criador supremo [...] (DINIZ, 2010, documento on-line).

O budismo não defende um “messias” salvador, mas, sim, uma figura


emblemática que se desenvolve a partir do autoconhecimento e do desapego
da vida material em uma atitude dirigida ao mundo. Chegar ao “nirvana” é
entrar em um estado de percepção de uma paz interior, a qual seria o equilíbrio
entre mente, corpo e universo. Esse estado se atinge pelas práticas de yoga,
dieta vegana e meditação.

A filosofia budista é guiada pelos ensinamentos de Buda, que conduzem o in-


divíduo a uma felicidade plena, através das práticas meditativas, do controle da
mente e da autoanálise de suas ações diárias. O budismo é reconhecido como uma
filosofia de vida, porque os ensinamentos de Buda são direcionados para a razão
e a análise individual de cada ser humano (BUDISMO, 2020, documento on-line).

Em relação a esse estado, dentro do budismo, também existe a lei do Karma,


que se baseia no processo de reencarnação, em que as boas ou más ações
reverberam em vidas futuras: no ciclo reencarnatório (roda de Samsara), nas
vidas passadas, se não se cumpriu um caminho de iluminação, reencarna-se
em outras quantas vidas forem necessárias para se atingir o nirvana. Essa ideia
de reencarnação, no entanto, já fazia parte da religião hinduísta:

Vários termos brâmanes foram empregados, mas com significados distintos. Ele
aceita a existência do renascimento por muitas vidas; o Samsâra, que resulta em
novas vidas dependendo do Karma, a lei moral de causa e efeito; juntamente com
a noção da unidade de todas as formas de vida; e o objetivo de autolibertação.
Todas essas noções encontravam-se presentes no Bramanismo praticado nos
dias de Siddhattha Gautama (Kharishnanda, 1988). Estes, no entanto, foram
incorporados com significados próprios (DINIZ, 2010, documento on-line).
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As bases hinduístas do budismo foram adaptadas e questionadas por Buda,


como no caso de sua crítica em relação à tradição dos Vedas e ao sistema de
castas — Buda acreditava que todos os seres humanos podiam encontrar a
iluminação. Assim, o budismo alcançou o interesse do Ocidente e passou a
ser praticado por milhões de adeptos espalhados pelo mundo.

Taoísmo
Lao-tzu ou Lao-tsé, fundador do taoísmo, viveu no século VI a.C. Não contamos
com muitos relatos históricos de sua vida, mas a doutrina do “Tao” representa,
em sua etimologia, estrada, caminho ou vereda. Esse preceito doutrinário se
edifica por meio da harmonia e do equilíbrio da consciência humana com a
sua natureza. “Todavia, Tao é muito mais do que a busca de um caminho a ser
seguido; é definido como a fonte de tudo que existe neste planeta. E ao seguir
o caminho escolhido, os taoistas aspiram à união com Tao; portanto, com as
forças da Natureza” (CAMPOS NETO, 2015, documento on-line).
O taoísmo, assim como o confucionismo, não se tornou uma religião
universal como o budismo, mas passou a fazer parte da cultura de distintos
povos asiáticos.
O equilíbrio entre a mente, o corpo e a natureza é um dos princípios
universais do taoísmo. Segundo Campos Neto (2015, documento on-line),
essa corrente possui duas características que a delineiam: “[...] o taoísmo
religioso, que resolve a busca do Tao e o culto das divindades; e o taoísmo
como completo modo de vida, o que inclui ideias tradicionais sobre a saúde,
por meio da meditação e de exercícios”. A partir desses dois ideários, tem-se
o taoísmo como uma prática religiosa, em que se relaciona a vivência humana
no cerne de suas ações com sua influência ao meio natural, assim como a
reciprocidade da interligação da natureza com o contexto humano, que traz
o equilíbrio entre o plano físico e o espiritual.
Temos dois escritos de grande importância para compreensão da religião
taoísta. Tao Te King foi um escrito político de Lao-tsé direcionado aos gover-
nantes, que, ao segui-lo, teriam a capacidade de governar com benevolência,
harmonia e verdade. Já o livro Tchuang-Tseu, de autor de mesmo nome, seria
um direcionamento para uma filosofia de vida que defende o equilíbrio e a
harmonia dirigidos às pessoas comuns.
Além disso, é fundamental, no taoísmo, os signos Yin Yang, que representam
o equilíbrio da dualidade entre os opostos. Segundo a tradição taoísta, trata-se
do equilíbrio do universo: Yin e Yang são complementares e um não existe
sem o outro. Por meio deles, tudo se harmoniza e entra em consonância com
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as leis universais da vida; com isso, seguir uma vida pregressa ao equilíbrio
seria equilibrar nossa consciência com base em atitudes virtuosas.
O taoísmo acredita que Yin e Yang, portanto, seriam energias que constituem
o equilíbrio do universo, opostas e complementares, e a essência de tudo que
existe na realidade. Dessa maneira, mesmo sendo opostas, atraem-se e criam
o princípio da dualidade, que expressa a divisão, e o princípio da unicidade,
que transmite a ideia de união. A representação dessas energias seria em forma
de um círculo, dividida formando dois extremos que podem ser definidos da
seguinte forma (Figura 3):

 Yin: energia passiva, o escuro, a noite, o frio. Está ligado às energias


femininas, ficando do lado esquerdo do círculo;
 Yang: movimento ativo, força masculina. Representa o dia, a luz do
universo e se encontra do lado direito, com cor branca.

Figura 3. Yin e Yang.


Fonte: O grande... ([2019], documento on-line).

Segundo o taoísmo, seres humanos que levaram uma vida de grandes realizações
ligadas a virtudes universais se tornam deuses imortais. Dessa forma, os taoístas rezam
para seus deuses pessoais seguindo seus exemplos de vida. Pode-se destacar, entre
outras divindades, “os três puros”, “a primordial celestial digna, “o tesouro celestial
digno” e o “caminho celestial digno”.
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3 As influências das religiões orientais


sobre o Ocidente
A cultura ocidental foi construída em uma base multicultural que nos distingue
do pensamento oriental e de sua influência mais introspectiva e de cosmovisão
cíclica. Enquanto o Ocidente se fortalece com a linearidade e a finitude, o
Oriente se nutre com a constância e com a transitoriedade dos elementos para
a manutenção da ordem terrena e espiritual. As religiões ocidentais partem
de princípios de conversão aos dogmas doutrinários, enquanto as religiões
orientais partem de uma vivência espiritual. Assim, muitas pessoas se con-
vertem para as religiões que o Ocidente oferece enquanto vivem as práticas
que o Oriente proporciona.
A base racionalista pragmática que a modernidade do Ocidente cria é
alicerçada pela visão de mundo capitalista-científica, contraponto ao mundo
natural-transcendental, situando a cultura ocidental nesse paradoxo com o
Oriente — esse processo tem passado por pontos de harmonização e contra-
dição e vem sendo chamado de “orientalizarão do Ocidente”. Segundo Eliade
(1999 apud CAES, 2009, documento on-line):

De fato, o problema que já se apresenta, e se apresentará com uma acuidade


cada vez mais dramática aos estudiosos da próxima geração, é o seguinte:
através de que meios recuperar tudo o que é ainda recuperável na história
espiritual da humanidade? E isso por duas razões: 1º) o homem ocidental
não poderá viver indefinidamente subtraído de uma parte importante de si
mesmo, a parte constituída por fragmentos de uma história espiritual cuja
significação e mensagem ele é incapaz de decifrar; 2º) mais cedo ou mais
tarde, o diálogo com os “outros” – representantes das culturas tradicionais,
asiáticas e “primitivas” – deverá ser iniciado não mais na linguagem empírica
e utilitária de hoje (capaz de atingir apenas realidades sociais, econômicas,
políticas, médicas, etc.), mas numa linguagem cultural, capaz de exprimir
realidades humanas e valores espirituais. Tal diálogo é inevitável, está inscrito
na fatalidade da História. Seria uma ingenuidade trágica acreditar que ele
pode prosseguir indefinidamente no nível mental em que ainda se encontra.

Compreender a desconstrução da cultura religiosa do Ocidente a partir


da retomada dos valores espiritualistas universais definidos como grandes
aportes teológicos se justifica pelo avanço dos valores materiais e da destrui-
ção da natureza em nome do capital, da ciência, da tecnologia e do progresso
da humanidade — itens que não passam de construções humanas para uma
vida ilusória e vazia de acordo com a cosmovisão oriental. Não cabe, assim,
uma definição de certo ou errado na forma de ver e de perceber a vida que
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se vive. O grande benefício da era digital é que as fronteiras culturais estão


sendo dissolvidas e que está acontecendo gradualmente uma interação entre as
diferentes formas de expressar e de cultuar a espiritualidade, seja ela coletiva
ou individual. Segundo Afiune (2018, documento on-line):

[...] o processo de orientalização é na verdade uma interação e integração


entre ambas visões. Seria um encontro entre Oriente e Ocidente no campo
das religiões, que tem influenciado o panorama religioso ocidental atual. O
autor defende que urge uma necessidade do homem ocidental de conhecer
as culturas orientais para romper com as suas tradições racionalistas, um
diálogo inevitável.

O Ocidente apresenta suas contradições, por meio de uma realidade objetiva


e pragmática, causando distorções sobre a existência da humana, valorizando a
materialidade e uma vida ligada ao consumo, com interesses que sustentam essa
lógica que dinamizou o contexto ocidental nos últimos séculos. Para superar
essas contradições na vida ocidental, o Oriente está contribuindo com suas
teologias oferecendo o resgate de uma autoconsciência coletiva, em que cada
um pense em si mesmo e em seus atos considerando a coletividade como um
todo. Assim, a prática da fraternidade entre os povos influencia no Ocidente um
revigorar de suas ideias de mundo, tendo o papel da cultura oriental como um
direcionamento do caminho que resgate e valorize a espiritualidade ocidental.
Ao buscar integrar as práticas religiosas orientais no Ocidente, Caes (2009)
define que existe uma diversidade de religiões orientais que são as mais
evidentes no mundo ocidental, como o budismo, o taoísmo, o hinduísmo,
que saíram do status de exóticas e curiosas para se tornarem parte da cultura
ocidental. Dessa forma, aculturam-se e criam suas raízes em meio ao precon-
ceito e à discriminação produzidos pela falta de conhecimento e valorização
das religiões orientais. Muitos têm como referência a ideia de que o Oriente
se constitui apenas por países asiáticos, um senso comum que olha para esses
povos de forma restritiva e fugaz.
A valorização das religiões orientais, graças ao natural processo de acultu-
ração, resgata culturas de povos antigos que seguem com suas tradições e seus
ritos por diversas gerações. Por meio do conhecimento, é possível entender
um pouco da diversidade cultural religiosa, assim como refletir sobre a prática
desses preceitos como forma de auxiliar a sociedade ocidental a adaptar seus
valores éticos e morais com o intuito de potencializar o senso coletivo e o
desenvolvimento interpessoal dos indivíduos.
Religiões orientais 13

Entretanto, da mesma forma, da contradição, surge um novo argumento


segundo o qual a orientalização instaura novas visões do mundo das religiões,
como reencarnação, meditação, um Deus universal, entre outras práticas e ritos
religiosos do Oriente. Acessando uma consciência religiosa que caracteriza o
Oriente, pode-se observar uma gama de valores sociais, culturais e religiosos
que o Ocidente desconhecia ou dos quais tinha uma vaga ideia, mas não com-
preendia. Assim, olhar para o Oriente com outros olhos ou com uma lente de
aumento possibilita a real troca cultural e a oportunidade de experienciar a
dinâmica menos acelerada, espiritualmente, das culturas ocidentais.
O Ocidente, por mais que se apresente de forma independente em sua
organização social e em suas tradições, sempre teve um contato com o Oriente
por meio da curiosidade promovida ao longo da história por diversos fatos
e personagens históricos, como, por exemplo, Marco Polo e as buscas por
uma rota marítima para as Índias. O interesse pelo Oriente, assim como por
outras culturas, sempre esteve envolto por questões de exploração, dominação
e imposição cultural, uma forma de globalização europeia no mundo. Dessa
maneira, os primeiros contatos com o Oriente seguem uma lógica de coloni-
zação e exploração em que as religiões sempre estiveram em segundo plano ou
simplesmente não recebiam importância. No entanto, na era contemporânea,
isso toma outro rumo, que, como se vê na reflexão de Caes (2009) sobre a
aculturação, toma o lugar da colonização, no sentido de resgatar o que o
Oriente oferece ao mundo, o que faz da orientalização do mundo ocidental
uma nova maneira de compreendê-lo e promover sua disseminação pelo
mundo por meio da religião.
O mundo moderno, em sua apresentação de uma vida ligada ao capitalismo
que cria a mercantilização de tudo que existe de forma material, ao colocar
a religião como mercadoria, contradiz-se com as religiões orientais, pois
seus preceitos transcendentais são alicerçados pela tradição de seus povos
e culturas. O Ocidente, ao criar o capital como forma de vida, combate essa
prática que valoriza a essência transcendental dos sujeitos, que os liberta da
vida material do capital.
Assim, as possibilidades que o Oriente cria para o mundo ocidental com
as suas religiões vão desde a mudança de hábitos alimentares, como uma
dieta vegana, até a valorização do silêncio por meio da meditação, pequenos
exemplos da incorporação de práticas religiosas orientais que se adaptaram
ao mundo ocidental.
14 Religiões orientais

O veganismo tem crescido gradativamente no mundo ocidental. Alimentar-se somente


de plantas e de nenhum alimento de origem animal tem a ver com considerar a
energia vital dos animais, pois as plantas se alimentam da luz solar — dessa maneira,
a alimentação é importante para a elevação espiritual das pessoas.

Pode-se concluir que as práticas religiosas do Oriente são diferentes das


do Ocidente, mas unificá-las pode ser benéfico para a cultura ocidental, que
necessita de um resgate histórico-ético-moral para o resplandecer de ideias
novas, de uma nova alvorada. Assim, a humanidade pode usufruir de harmo-
nia e felicidade em um mundo totalmente regenerado, em que as regras que
impedem a sua evolução sejam quebradas e extintas.

Acesse o canal no YouTube da Monja Coen, uma monja zen-budista brasileira de


ascendência portuguesa que promove a disseminação do budismo no Brasil.

AFIUNE, P. de S. Do Oriente ao Ocidente: a sociedade teosófica brasileira e o Neoesote-


rismo em Brasília. Revista Mosaico, v. 11, abr. 2018. Disponível em: http://seer.pucgoias.
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Religiões orientais 15

CAMPOS NETO, A. A. M. O confucionismo, Budismo, Taoismo e Cristianismo. O direito


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Leitura recomendada
MONJA COEN. Brasil: [S. n.], 2012. Disponível em: https://www.youtube.com/c/Monja-
Coen/about. Acesso em: 10 ago. 2020.
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