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DECISÃO
Cuida-se de ordem de habeas corpus impetrada por Bernardo Fenelon, por Raíssa
Frida Isac e por Yasmin Brehmer Handar, em favor de Marcelo Augusto Xavier, em face de
decisão do Juízo da Vara Federal Cível e Criminal da Subseção Judiciária de Tabatinga/AM que
indeferiu pedido de trancamento de inquérito policial, pugnando seja, liminarmente, determinada
a suspensão das investigações pertinentes ao paciente nos autos do IPL n. 2022.0037654-
DPF/TBA/AM (cf. fl.14 – doc. n. 354524145).
É o relatório. Decido.
Assinado eletronicamente por: NEY DE BARROS BELLO FILHO - 27/11/2023 18:56:49 Num. 368681619 - Pág. 1
https://pje2g.trf1.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=23111414450867200000357212604
Número do documento: 23111414450867200000357212604
Inicialmente, pontuo que as questões sob exame não dizem respeito estritamente
ao direito de ir e vir do ora paciente, na medida em que não se discute a existência ou não de
fundamentos para prisão cautelar. Contudo, a jurisprudência pátria, capitaneada pela Suprema
Corte, já entendeu ser possível discutir, em sede de habeas corpus, questões desta natureza.
"A instauração de um inquérito policial contra pessoa determinada traz consigo inegável
constrangimento. Esse constrangimento, todavia, pode ser tido como legal, caso o fato
sob investigação seja formal e materialmente típico, cuide-se de crime cuja punibilidade
não esteja extinta, havendo indícios de envolvimento dessa pessoa na prática delituosa.
Em tais casos, deve a investigação prosseguir. Todavia, verificando-se que a
instauração do inquérito policial é manifestamente abusiva, o constrangimento
causado pelas investigações deve ser tido como ilegal, afigurando-se possível o
trancamento do inquérito policial, objeto de nosso estudo neste tópico.
(LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único. 4. ed. Salvador:
Ed. JusPodivm, 2016 - negrito nosso).
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e concomitante anunciado desmonte da estrutura do órgão nesse sentido, Indicio
MARCELO AUGUSTO XAVIER DA SILVA, CPF: 120.901.688-54, Delegado de Polícia
Federal, Matrícula: 16854, por afrronta aos comandos normativos dos art. 121, caput § 2º,
incisos I e IV; art. 121, caput e § 2º, incisos IV e V; e no art. 211, c/c com o art. 29, nos
termos do art. 18, inciso I, in fine: “assumiu o risco de produzi-lo”, todos do Código Penal.
(doc. n. 354524148)" (destaquei).
Ademais, cumpre destacar que, para fins de subsunção aos termos do art. 29 do
Código Penal, que trata acerca do concurso de pessoas, revela-se imprescindível o liame
subjetivo, que não se vislumbra minimamente no caso vertente.
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Número do documento: 23111414450867200000357212604
Acerca do referido pressuposto do concurso de agentes, leciona Cleber Masson:
Ante a irrefutável ausência de justa causa, mostra-se não apenas possível, mas até
mesmo necessária, a suspensão do curso do IPL n. 2022.0037654-DPF/TBA/AM, no que se
refere ao ora paciente, por caracterizar patente constrangimento ilegal. Nesse sentido, trilha a
mansa jurisprudência dos Tribunais Superiores:
(...). 2. O habeas corpus é via adequada ao trancamento da ação penal apenas em casos
excepcionais, de evidente atipicidade da conduta, extinção da punibilidade ou ausência de
justa causa. Foi demonstrada tal hipótese a partir da instauração de persecução
penal temerária. 3. Peça acusatória genérica que não observou todas as exigências
formais do art. 41 do Código de Processo Penal, uma vez não evidenciados os elementos
essenciais da figura típica do delito imputado ao paciente (homicídio qualificado), o que,
ao permitir o entendimento sobre os fatos atribuídos na denúncia, possibilitaria o pleno
exercício do direito de defesa. A denúncia é inepta notadamente pela ausência de
efetiva demonstração da participação do paciente na conduta alegadamente
criminosa. 4. A falta de indícios de autoria evidencia ausência de justa causa, condição
imprescindível para o recebimento da denúncia, o que revela excepcionalidade apta a
justificar o trancamento da ação penal ( CPP, art. 395, III). 5. Não se admite como justa
causa para a instauração da ação penal contra o paciente o simples fato de ser ele
“patrono de Escola de Samba”, empregador ou ex-empregador de um ou alguns dos
demais acusados, sem que estejam minimamente identificados o nexo de
causalidade entre a conduta a ele imputada e o dano causado e, ainda, o liame
subjetivo entre o autor e o fato supostamente criminoso, sob pena de indevida
aplicação da responsabilidade penal objetiva. 6. A ausência de apreciação, pela
autoridade policial responsável, de pedido, formulado pela defesa, de acesso ao
procedimento investigatório sinaliza evidente desrespeito às garantias constitucionais
fundamentais que permeiam o devido processo legal na esfera da persecução
Assinado eletronicamente por: NEY DE BARROS BELLO FILHO - 27/11/2023 18:56:49 Num. 368681619 - Pág. 4
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Número do documento: 23111414450867200000357212604
penal, quais sejam, a ampla defesa e o contraditório (CF, art. 5º, LV), bem assim
inobservância do enunciado vinculante n. 14 da Súmula. 7. A presença de ilegalidade
evidente autoriza a superação do consagrado entendimento jurisprudencial no que toca ao
óbice da supressão de instância. 8. Habes corpus não conhecido, mas ordem concedida
de ofício ( CPP, art. 654, § 2º).
Intimem-se. Cumpra-se.
Relator
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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 09 - DESEMBARGADOR FEDERAL NEY BELLO
Processo Judicial Eletrônico
DECISÃO
Assinado eletronicamente por: NEY DE BARROS BELLO FILHO - 19/12/2023 19:39:33 Num. 382177645 - Pág. 1
https://pje2g.trf1.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=23121816465916300000369862099
Número do documento: 23121816465916300000369862099
Aduzem que o referido indiciamento indireto decorre de aplicação de
responsabilidade penal objetiva, instituto rechaçado pelos Tribunais Superiores, com fulcro
apenas no cargo ocupado pelo paciente à época dos fatos (vice-presidência).
É o relatório. Decido.
Inicialmente, pontuo que as questões sob exame não dizem respeito estritamente
ao direito de ir e vir do ora paciente, na medida em que não se discute a existência ou não de
fundamentos para prisão cautelar. Contudo, a jurisprudência pátria, capitaneada pela Suprema
Corte, já entendeu ser possível discutir, em sede de habeas corpus, questões desta natureza.
"A instauração de um inquérito policial contra pessoa determinada traz consigo inegável
constrangimento. Esse constrangimento, todavia, pode ser tido como legal, caso o fato
sob investigação seja formal e materialmente típico, cuide-se de crime cuja punibilidade
não esteja extinta, havendo indícios de envolvimento dessa pessoa na prática delituosa.
Em tais casos, deve a investigação prosseguir. Todavia, verificando-se que a
instauração do inquérito policial é manifestamente abusiva, o constrangimento
causado pelas investigações deve ser tido como ilegal, afigurando-se possível o
trancamento do inquérito policial, objeto de nosso estudo neste tópico". (LIMA,
Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único. 4. ed. Salvador: Ed.
JusPodivm, 2016 - destaquei).
Assinado eletronicamente por: NEY DE BARROS BELLO FILHO - 19/12/2023 19:39:33 Num. 382177645 - Pág. 2
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Compulsando os autos, verifica-se que o ato formal de indiciamento restou
fundamentado nos seguintes termos:
Assinado eletronicamente por: NEY DE BARROS BELLO FILHO - 19/12/2023 19:39:33 Num. 382177645 - Pág. 3
https://pje2g.trf1.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=23121816465916300000369862099
Número do documento: 23121816465916300000369862099
causalidade, incidiu apenas em face do ora paciente, ocupante do cargo de Vice-Presidente da
FUNAI à época dos fatos, cargo este que – frise-se – não possui ingerência direta sobre a
atuação das forças de segurança pública. A relação causal, no caso sob exame, só se revelaria
possível diante da aplicação descuidada e leviana do chamado “regressus ad infinitum”,
desassociada de qualquer análise subjetiva.
Ademais, cumpre destacar que, para fins de subsunção aos termos do art. 29 do
Código Penal, que trata acerca do concurso de pessoas, revela-se imprescindível o liame
subjetivo, que não se vislumbra minimamente no caso vertente.
Ante a irrefutável ausência de justa causa, mostra-se não apenas possível, mas até
mesmo necessária, a suspensão do curso do IPL n. 2022.0037654-DPF/TBA/AM, no que se
refere ao ora paciente, por caracterizar patente constrangimento ilegal. Nesse sentido, trilha a
mansa jurisprudência dos Tribunais Superiores:
(...). 2. O habeas corpus é via adequada ao trancamento da ação penal apenas em casos
excepcionais, de evidente atipicidade da conduta, extinção da punibilidade ou ausência de
Assinado eletronicamente por: NEY DE BARROS BELLO FILHO - 19/12/2023 19:39:33 Num. 382177645 - Pág. 4
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Número do documento: 23121816465916300000369862099
justa causa. Foi demonstrada tal hipótese a partir da instauração de persecução
penal temerária. 3. Peça acusatória genérica que não observou todas as exigências
formais do art. 41 do Código de Processo Penal, uma vez não evidenciados os elementos
essenciais da figura típica do delito imputado ao paciente (homicídio qualificado), o que,
ao permitir o entendimento sobre os fatos atribuídos na denúncia, possibilitaria o pleno
exercício do direito de defesa. A denúncia é inepta notadamente pela ausência de
efetiva demonstração da participação do paciente na conduta alegadamente
criminosa. 4. A falta de indícios de autoria evidencia ausência de justa causa, condição
imprescindível para o recebimento da denúncia, o que revela excepcionalidade apta a
justificar o trancamento da ação penal ( CPP, art. 395, III). 5. Não se admite como justa
causa para a instauração da ação penal contra o paciente o simples fato de ser ele
“patrono de Escola de Samba”, empregador ou ex-empregador de um ou alguns dos
demais acusados, sem que estejam minimamente identificados o nexo de
causalidade entre a conduta a ele imputada e o dano causado e, ainda, o liame
subjetivo entre o autor e o fato supostamente criminoso, sob pena de indevida
aplicação da responsabilidade penal objetiva. 6. A ausência de apreciação, pela
autoridade policial responsável, de pedido, formulado pela defesa, de acesso ao
procedimento investigatório sinaliza evidente desrespeito às garantias constitucionais
fundamentais que permeiam o devido processo legal na esfera da persecução
penal, quais sejam, a ampla defesa e o contraditório (CF, art. 5º, LV), bem assim
inobservância do enunciado vinculante n. 14 da Súmula. 7. A presença de ilegalidade
evidente autoriza a superação do consagrado entendimento jurisprudencial no que toca ao
óbice da supressão de instância. 8. Habes corpus não conhecido, mas ordem concedida
de ofício ( CPP, art. 654, § 2º).
Assinado eletronicamente por: NEY DE BARROS BELLO FILHO - 19/12/2023 19:39:33 Num. 382177645 - Pág. 5
https://pje2g.trf1.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=23121816465916300000369862099
Número do documento: 23121816465916300000369862099
Em seguida, encaminhem-se os autos à Procuradoria Regional da República da 1ª.
Região.
Intimem-se. Cumpra-se.
Relator
Assinado eletronicamente por: NEY DE BARROS BELLO FILHO - 19/12/2023 19:39:33 Num. 382177645 - Pág. 6
https://pje2g.trf1.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=23121816465916300000369862099
Número do documento: 23121816465916300000369862099