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TEXTO PARA CONSULTA


AVALIAÇÃO OBJETIVA A1 – 4º BIMESTRE
UNIDADE: DISCIPLINA: Iniciação PROFESSOR: Ana Paula da Cruz
DATA: 30/10/ 2023.
CENTRO teatral Ribeiro

Teatro e contracultura
No Brasil, nos anos 1950, o teatro esteve vinculado aos movimentos de contracultura
por seu teor de engajamento social e político e por se opor à maneira de fazer teatro com
repertório internacional. E, na década seguinte (1960), por se posicionar contra a ditadura civil
militar.
Nesse cenário, surgiram importantes grupos de teatro: o Teatro de Arena, o Centro
Popular de Cultura (CPC), o Grupo Opinião e o Teatro Oficina.
Em 1953, teve início a companhia paulistana Teatro de Arena que realizava suas
apresentações em espaços improvisados, na rua, em clubes, fábricas e salões. Nessa época, os
teatros eram espaços culturais luxuosos geralmente voltados para classes sociais com maior
poder aquisitivo. A população de baixa renda não costumava frequentar esses espaços. Ao
apresentar as peças em espaços como fábricas e salões comunitários, o Arena já mostrava uma
postura de contracultura. Para isso, uma das inovações propostas pelo grupo foi o palco em
formato de arena, pois era uma solução economicamente viável para que a peça poderia ser
apresentada.

Cena do Teatro Arena, na peça Eles não usam black-tie, com palco em formato de arena.
Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/evento397907/eles-nao-usam-black-tie

Vários artistas participaram do Arena, no entanto, alguns deles tiveram uma atuação
mais decisiva na companhia, como Gianfrancesco Guarnieri (1934-2006), Augusto Boal (1931-
2009), Oduvaldo Vianna Filho (1936 – 1974) e Milton Gonçalves (1933-).
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Guarnieri teve um importante papel na dramaturgia brasileira e do grupo Arena, com a


peça Eles não usam black-tie, de 1958. Ela narra o desentendimento entre pai e filho no contexto
de uma greve, representando personagens da classe trabalhadora. No enredo, Tião é um jovem
que quer se casar com a namorada, que está grávida. Seu pai é um líder sindical e está vinculado
à greve na fábrica em que ambos trabalham. Ao participar da greve, o pai é espancado e preso.
O filho, indiferente ao pai e aos colegas, fura a greve para atingir seus objetivos e cria um conflito
familiar. Ele responsabiliza, ainda, a militância do pai à miséria e sofrimento em que sua família
sempre viveu.
A temática foi inovadora e a peça inspirou a criação de seminários de dramaturgia, que
tinham por objetivo a produção de textos e a revelação de novos dramaturgos brasileiros, com
peças falando sobre o Brasil e sua realidade social.
Com o golpe civil-militar de 1964, no Brasil, o Teatro de Arena passou a criar estratégias
para driblar a censura, que proibiu as apresentações realistas que faziam parte de seu
repertório. A solução veio com a criação do musical Arena conta Zumbi (1965), escrito por
Guarnieri e Boal. Nesse contexto, Boal foi um dos integrantes que mais conduziu o
posicionamento político do grupo de artistas.

Inovações teatrais e engajamento


O musical Arena conta Zumbi conta a saga dos quilombolas, no Brasil Colônia, fala de
resistência e mostra como construir uma realidade mais justa e igualitária. O espetáculo ficou
dois anos em cartaz e foi sucesso de público. Essa peça foi um marco no teatro brasileiro por
apresentar um novo procedimento interpretativo: o sistema coringa.
Nessa nova proposta de interpretação, os atores podem exercer todos os papéis,
trocando-os entre si durante a apresentação. Esse sistema é chamado de coringa, em que um
personagem é onisciente e pode alterar, inverter e recolocar situações em cena, sempre que
sinta necessidade de alertar o público para algo significativo. Essa atitude mantém o público em
alerta e rompe a ilusão da cena, promovendo o distanciamento do público.
Além do palco em formato de arena e do novo procedimento interpretativo, o musical
Arena Conta Zumbi trouxe mais uma inovação. A dramaturgia apresentou diversos
protagonistas. Assim, pela primeira vez no teatro moderno brasileiro a história de Palmares foi
contada a partir do ponto de vista das pessoas que foram escravizadas e não vistos como
rebeldes, como se contava até então. Além dos personagens retratados não serem comuns no
teatro brasileiro, a peça apresentou forte apelo social e político.
Mais tarde, em 1967, a experiência foi repetida na peça Arena conta Tiradentes, que
mostrou Tiradentes como um mártir contra a opressão.
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Cena da peça Arena Conta Tiradentes, 1967, com Derly Marques. Acervo Idart/Centro Cultural São Paulo.
Disponível em: https://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra62843/arena-conta-tiradentes

Centro Popular de Cultura- CPC


Em 1961, durante as apresentações da peça Eles não usam black-tie, escrita por
Guarnieri, os atores Oduvaldo Vianna Filho e Milton Gonçalves se desligaram do Teatro Arena
e, no ano seguinte, participaram da criação do Centro Popular de Cultura (CPC), ligado à União
Nacional dos Estudantes (UNE), no Rio de Janeiro.
O CPC tinha o objetivo de criar e divulgar uma arte popular revolucionária e
compreensível para, reunindo artistas e intelectuais de diversas áreas, como teatro, música,
cinema, literatura e artes visuais, para defender o caráter coletivo e didático da arte e o
engajamento político dos artistas. Posicionava-se contra a arte alienada, feita apenas com o
intuito de diversão. Sua principal bandeira era a concepção de que fora da arte política não havia
arte popular.

Na época, o CPC apresentou peças teatrais em portas de fábricas, nas ruas, nas áreas
rurais, em um contexto de forte mobilização política e expansão das organizações de
trabalhadores, com temáticas sociais e políticas, semelhantes aos movimentos teatrais
populares que ocorriam na América Latina.
Apesar da forte atuação, em 1964, a atividade do CPC foi considerada ilegal e alguns de
seus integrantes se reuniram e fundaram, no Rio de Janeiro, o Grupo Opinião, com viés de
protesto e resistência.
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Grupo Opinião
O Grupo Opinião produziu o show musical Opinião, com a participação de Zé Kéti, João
do Vale e Nara Leão, que posteriormente foi substituída por Maria Bethânia, com direção de
Augusto Boal, do Teatro de Arena. A proposta fez sucesso rapidamente e serviu para reunir
artistas dispersos ligados aos movimentos de arte popular, o que se tornou o Grupo Opinião.
Aproveitando o impulso do show anterior, foi criada a peça Liberdade, liberdade, de
Millôr Fernandes e Flávio Rangel. Em 1966, o Opinião lançou a peça Se correr o bicho pega, se
ficar o bicho come, escrita por Ferreira Gullar e Oduvaldo Vianna Filho, baseada na cultura
nordestina, enfocando a luta de classes e a fraqueza ética de todas as partes envolvidas.
O Opinião privilegiou a arte popular com apresentações com compositores das escolas
de samba cariocas, influenciando não apenas a mudança de gosto do público, mas, também,
facilitando a disseminação da cultura negra e periférica nos grandes centros de divulgação
cultural, o que não acontecia até então.
O grupo funcionou como um coletivo de artistas que se posicionou contra a censura
imposta pela ditadura civil-miliar e implantou uma nova maneira de fazer arte, mostrando as
classes populares e suas condições de vida, que eram totalmente rejeitadas pelo teatro
tradicional.
A postura de contracultura do Teatro Oficina se firmou com a encenação da peça O rei
da vela, em 1967. O texto foi escrito por Oswald de Andrade, em 1933. Encenada em plena
revolução cultural e no limiar do AI-5 – o período mais rígido da ditadura militar, com censura
aos meios de comunicação, perseguição, tortura como prática dos agentes do governo e
assassinatos –, de 1968, a peça tornou-se símbolo da contracultura, com inspiração
antropofágica – inspirado no movimento criado por Oswald de Andrade que repensava a
dependência cultural do Brasil – e estética tropical.

Cena da montagem teatral O Rei da Vela, realizada pelo Teatro Oficina, em 1967. Disponível em
https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2017/09/1922559-hoje-e-mais-violento-que-em-1967-diz-ze-celso-
que-reencena-o-rei-da-vela.shtml
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Os artistas do Teatro Oficina acreditavam que essa obra de vanguarda oferecia os


elementos necessários para refletir sobre o momento cultural e histórico que o país vivia. E,
assim, encenou uma fábula de fabricante de velas e credor, retratando a condição de
subdesenvolvimento do Brasil, que vivia uma realidade autoritária. A peça teve cenário e
figurinos criados por Hélio Eichbauer e uma canção de Caetano Veloso. Ela se tornou referência
para diversos artistas e inspirou a formação do movimento tropicalista.
O Teatro Oficina é considerado uma das mais importantes companhias de teatro no
Brasil até a atualidade. Liderado por José Celso Martinez Corrêa, passou, desde sua criação, por
diversas transformações e atua até hoje sob a denominação de Oficina Usyna Uzona.

Augusto Boal
O diretor Augusto Boal (1931 – 2009) desenvolveu, na década de 1960, a metodologia
do Teatro do Oprimido que reúne técnicas, exercícios e jogos teatrais para refletir sobre
assuntos sociais e políticos e transformar a sociedade.
Boal seguiu inventando modos de fazer teatro político. Para ele, todo teatro – e toda
atividade humana – é político. Seu projeto era fazer o teatro deixar de ser “instrumento de
dominação” de um povo para se transformar em “arma de libertação”. Para isso, transformou
as formas como o teatro era feito até então. Um dos pontos mais importantes disso foi a
participação do público. Boal derrubou as barreiras entre artistas e espectadores, com o objetivo
de que o público se tornasse protagonista das transformações sociais.
O Teatro do Oprimido é aquele em que os meios de produção da arte estão nas mãos
do povo. Ele ganhou diversas formas, entre elas:
 teatro-jornal: transformando notícias em cenas teatrais;
 teatro-fórum: espectadores entram em cena para atuar e apresentar sua visão de
mundo;
 teatro invisível: acontece na vida urbana, sem aviso de que seja ficção;
 ações diretas: manifestações e protestos teatralizados com máscaras, canções,
coreografias etc.
O Teatro-Jornal surgiu como resposta à censura no início dos anos 1970, em que notícias
de jornal, sem propósito dramático, pode ser encenada mostrando o que está nas entrelinhas e
não ter sido noticiado.
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Referência bibliográfica
BERTHOLD, Margot. História mundial do teatro. São Paulo: Perspectiva, 2005.
CARLOSON, Marvin. Teorias do teatro. São Paulo: UNESP, 1997.
JAPIASSU, Ricardo. Metodologia do ensino de teatro. São Paulo: Papirus, 2001.
PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. Tradução: Guinsburg e Maria Lúcia Pereira. Editora
Perspectiva. 3º edição. São Paulo. 2008.

AUGUSTO Boal. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú
Cultural, 2019. Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra64120/augusto-
boal. Acesso em: 13 de mai. 2022.
BOAL, Augusto. 'O Sistema Coringa'. In: Arena Conta Tiradentes. São Paulo: Sagarana, 1967.
Republicado In: BOAL, Augusto. Teatro do oprimido e outras poéticas políticas. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1977.

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