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Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Centro de Educação e Humanidades


Instituto de Letras

Raphael Alves de Oliveira

Formações inovadoras com des- no X/Twitter: descrição e análise pela


Morfologia Cognitiva

Rio de Janeiro
2023
Raphael Alves de Oliveira

Formações inovadoras com des- no X/Twitter: descrição e análise pela Morfologia


Cognitiva

Dissertação apresentada, como requisito parcial


para obtenção do título de Mestre, ao Programa
de Pós-graduação em Letras, da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração:
Estudos de Língua.

Orientadora: Profª. Dra. Naira de Almeida Velozo


Coorientador: Prof. Dr. Natival Almeida Simões Neto

Rio de Janeiro
2023
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/BIBLIOTECA CEH/B

Solicitar a elaboração da ficha catalográfica na


Biblioteca CEH-B

Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta tese
(dissertação), desde que citada a fonte.

__________________________________________ ___________________
Assinatura Data
Raphael Alves de Oliveira

Formações inovadoras com des- no X/Twitter: descrição e análise pela Morfologia


Cognitiva

Dissertação apresentada, como requisito parcial


para obtenção do título de Mestre, ao Programa
de Pós-graduação em Letras, da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro. Área de concentração:
Estudos de Língua.

Aprovada em 20 de dezembro de 2023.


Banca Examinadora:

_____________________________________________
Prof.ª Dra. Naira de Almeida Velozo (Orientadora)
Instituto de Letras - UERJ

_____________________________________________
Prof. Dr. Natival Almeida Simões Neto (Coorientador)
Universidade Estadual de Feira de Santana

_____________________________________________
Prof.ª Dra. Julia Scamparini Ferreira
Instituto de Letras - UERJ

_____________________________________________
Prof. Dr. João Carlos Tavares da Silva
Centro de Educação à Distância do Estado do Rio de Janeiro

Rio de Janeiro
2023
DEDICATÓRIA

À minha mãe, com amor.


AGRADECIMENTOS

Certa vez ouvi de um colega de graduação que escrever agradecimentos em textos


acadêmicos é tão piegas quanto escrever uma carta de amor e que ninguém, tirando a sua
orientadora e a banca de defesa lê essa “seção”. Concordo com esse pensar, no entanto, opto
por fazê-lo mesmo assim. Durante o mestrado, entendi que o processo de pesquisa é árduo,
por vezes solitário – principalmente se você estudar morfologia e cognição –, e que requer
uma dose significativa de resiliência e dedicação constante. Nesse processo, ter a companhia
de amigos é algo vital para preservar a sanidade e saúde mental. Sem desmerecer o meu
comprometimento individual, pois quero “agradecer a mim mesmo por não ter desistido” (by
Anitta), reconheço que a conclusão deste trabalho foi viabilizada por contribuições tanto
diretas quanto indiretas.
A DEUS por me sustentar, guiar e proteger durante esses trinta e poucos anos.
À minha mãe, por ser a minha principal incentivadora. Obrigado pelo colo, carinho e
ajuda, mesmo sem entender o que eu pesquiso na realidade.
Aos meus irmãos, Letícia e Rodrigo, por muitas vezes financiarem livros e passagens
para que eu pudesse conseguir concluir a graduação. Obrigado por me incentivarem sempre.
Amo vocês.
À Thamiris Halasz por ter aguentado os meus estresses, as minhas reclamações e as
minhas angústias. Sinto muito por ter sido chato. Prometo que, no doutorado, serei um amigo
legal!
À Naira Velozo, por ter sido mais que uma orientadora. Nossas mensagens, em
diversos momentos, me acalmaram. Obrigado por não medir esforços para me ver crescer
academicamente. Obrigado pela sua amizade, incentivo e paciência.
Ao meu coorientador Natival Almeida Simões Neto, pela orientação, assistência,
paciência e amizade.
Aos Profs. Drs. João Tavares (CEDERJ) e Júlia Scamparini (UERJ) que, com muita
atenção, se dispuseram a ler o meu trabalho e realizaram ótimas observações. Obrigado pelo
incentivo, assistência, colaboração e disponibilidade na qualificação e na defesa desta
dissertação.
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.
“Tudo são sentidos, na linguagem e na mente.”
Augusto Soares, 2006
RESUMO

OLIVEIRA, Raphael Alves de. Formações inovadoras com des- no X/Twitter: descrição e
análise pela Morfologia Cognitiva. 2023. 112 f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Instituto
de Letras, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2023.

Este trabalho tem como objetivo investigar e descrever as operações cognitivas acionadas por
novas criações lexicais com des-+ base verbal no infinitivo a partir de análise e descrição do
comportamento semântico desse prefixo em novas palavras, tendo como foco as formações de
base verbal no infinitivo em textos veiculados à plataforma X/Twitter, como desabraçar,
desver, dessorrir entre outros. As diferentes pesquisas, no âmbito da morfologia derivacional
(Silva; Mioto, 2009, Medeiros, 2010; Rio-Torto, 2019), que analisam o prefixo, estabelecem
critérios que, em princípio, serviriam como filtros para más formações, classificando essas
palavras como agramaticais/inaceitáveis. Para Silva e Mioto (2009), o prefixo des- não se
pode combinar com verbos que não marquem processos ou que marquem processos
irreversíveis, entendendo como agramaticais exemplos como: desmorrer, deschegar,
deslavar, desdesejar entre outros. Medeiros (2010), por sua vez, afirma que o prefixo des- não
denota reversão de processo, mas sim negação ou inversão de um estado decorrente de um
processo, portanto, espera-se não encontrar construções com esse prefixo em nomes de
eventos como trabalho, dança e pulo, por entender que esses nomes denotam funções
incompatíveis com as propriedades de seleção semântica do prefixo des-. Já Rio-Torto (2019)
argumenta que esse prefixo repele verbos que denotem i) situações estativas (estar, existir), ii)
processos (chover, correr, dormir, nadar, nevar, saltar), iii) eventos pontuais (matar, morrer)
e iv) valor extrativo circunfixados em es- (desesbravejar, desesverdear). No entanto, em redes
sociais e na língua em uso, de modo geral, é comum se encontrarem todas essas formações
consideradas agramaticais por Silva e Mioto (2009), Medeiros (2010) e Rio-Torto (2019).
Considerando o córpus formado por 97 tuítes contextualizados, retirados manualmente do
X/Twitter através da #des- e des- na seção de busca dessa rede social ou a partir da leitura de
discussões em geral na mesma rede, sem utilização da ferramenta de busca, espero evidenciar
o sentido prototípico ativado pela construção des-+base verbal no infinitivo. Para esse
percurso analítico, utilizo como suporte teórico-metodológico, os pressupostos da Linguística
Cognitiva (LC), mais especificamente, do modelo de Morfologia Cognitiva (MC) postulado
por Hamawand (2011). Este modelo argumenta que as construções morfológicas devem ser
explicadas por meio das operações cognitivas: categorização, configuração e
conceitualização. Portanto, considerando que a MC envolve o exame das relações semânticas
entre as subpartes na formação de uma palavra (Hamawand, 2011), nossa intenção é aplicar
essa estrutura analítica em nossa pesquisa e, por meio de uma análise comparativa, avaliar
suas limitações, adequações à análise pretendida, além de delinear possíveis expansões dessa
abordagem.

Palavras-chave: prefixo des-; morfologia cognitiva; formações inovadoras; categorização;


configuração; interpretação.
RÉSUMÉ

OLIVEIRA, Raphael Alves de. Formations innovantes avec 'des-' sur X/Twitter : description
et analyse par la Morphologie Cognitive. 2023. 112 f. Dissertação (Mestrado em Letras) –
Instituto de Letras, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2023.

L'objectif de ce travail est d'étudier et de décrire les opérations cognitives déclenchées par de
nouvelles créations lexicales avec la base verbale des-+ à l'infinitif en analysant et en
décrivant le comportement sémantique de ce préfixe dans de nouveaux mots, en se
concentrant sur les formations de bases verbales à l'infinitif dans des textes publiés sur la
plateforme X/Twitter, tels que desabraçar, desver, desorrir et d'autres. Les différentes
recherches dans le domaine de la morphologie dérivationnelle (Silva ; Mioto, 2009, Medeiros,
2010 ; Rio-Torto, 2019), qui analysent le préfixe, établissent des critères qui, en principe,
serviraient de filtres pour les mauvaises formations, classant ces mots comme
agrammaticaux/inacceptables. Pour Silva et Mioto (2009), le préfixe « des- » ne peut pas se
combiner avec des verbes qui ne marquent pas de processus ou qui marquent des processus
irréversibles, considérant comme agrammaticaux des exemples tels que: «desmorrer»,
«deschegar », « deslavar », « desdesejar », entre autres. Medeiros (2010), pour sa part, affirme
que le préfixe « des- » ne signifie pas la réversion d'un processus, mais plutôt la négation ou
l'inversion d'un état découlant d'un processus. Par conséquent, on ne s'attend pas à trouver des
constructions avec ce préfixe dans des noms d'événements tels que le travail, la danse et le
saut, car ils désignent des fonctions incompatibles avec les propriétés de sélection sémantique
du préfixe « des- ». Quant à Rio-Torto (2019), elle argumente que ce préfixe rejette les verbes
qui dénotent i) des situations statiques (ser, existir), ii) des processus (chover,correr,
dormir,nadar, nevar, saltar), iii) des événements ponctuels (matar,morrer) et iv) des valeurs
extractives circonfixées en « es- » (desesbravejar, desesverdear). Cependant, sur les réseaux
sociaux et dans la langue en usage, il est courant de trouver toutes ces formations considérées
comme agrammaticales par Silva et Mioto (2009), Medeiros (2010) et Rio-Torto (2019). En
considérant le corpus composé de 97 tweets contextualisées, extraites manuellement de
X/Twitter via le hashtag #des- et des- dans la section de recherche de ce réseau social, ou à
partir de la lecture de discussions en général sur ce même réseau sans utiliser l'outil de
recherche, j'espère mettre en évidence le sens prototype activé par la construction « des- » +
base verbale à l'infinitif. Pour ce parcours analytique, j'utilise comme support théorique et
méthodologique les présupposés de la Linguistique Cognitive (LC), plus spécifiquement le
modèle de la Morfologia Cognitiva (MC) postulé par Hamawand (2011). Ce modèle soutient
que les constructions morphologiques doivent être expliquées par le biais des opérations
cognitives : catégorisation, configuration et conceptualisation. Ainsi, considérant que la MC
implique l'examen des relations sémantiques entre les sous-parties dans la formation d'un mot
(Hamawand, 2011), notre intention est d'appliquer cette structure analytique à notre recherche
et, par le biais d'une analyse comparative, d'évaluer ses limites, son adéquation à l'analyse
envisagée, ainsi que de tracer d'éventuelles extensions de cette approche.

Mot-clés: Préfixe des-; morphologie cognitive; formations innovantes; categorization;


configuration; interprétation
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 1 – Restrições de Silva e Mioto (2009) encontradas no X/Twitter


............................................................................................................. 16
Figura 1 – Esquema proposto por Medeiros (2009) .............................................
17

Quadro 2 – Restrições de Medeiros (2010) encontradas no X/Twitter ................ 18

Quadro 3 – Restrições com des- segundo Rio-Torto (2019) ................................. 19

Restrições de produção do prefixo des- de acordo com a categoria


Quadro 4 – 20
de base para Rio-Torto (2019) ........................................................

Quadro 5 – Restrições de Rio-Torto (2019) encontradas no X/Twitter ............... 21

Extensões de significado dos prefixos de-, dis- e ex- conforme


Quadro 6- 24
Romanelli (1964) ................................................................................
Esquemas semânticos geral e específico com base em
Quadro 7- 25
Dolinski(1993) ....................................................................................

Quadro 8- Teores semânticos do prefixo des- ..................................................... 28

Quadro 9- Raízes com semântica não compatível com des- ................................ 34

Quadro 10- Restrições morfossemânticas .............................................................. 35

Quadro 11- Contraexemplos de Medeiros (2010) .................................................. 36

Figura 2- Rede semântica do prefixo negativo de- ............................................. 44

Figura 3- Rede semântica do prefixo negativo dis- ............................................ 45

Quadro 12- Domínios evocados pelos prefixos de- e dis- do inglês ...................... 47

Quadro 13- Distinções semânticas do prefixo negativo dis- do inglês................... 48

Quadro 14- Domínios cognitivos conforme Sweetser (1990) ............................... 56

Figura 4 - Relação de subordinação entre EM .................................................... 59

Figura 5 - Conceptualização do exemplo de Achilles e a tartaruga .................... 61

Tabela 1 - Percentuais de construções com des- ................................................. 66

Gráfico 1 - Distribuição percentual das FCs conforme a categoria de base ......... 74


Gráfico 2- Distribuição das FIs conforme a categoria de base ............................ 74

Gráfico 3- Distribuição das FIs de base verbal ................................................... 75

Gráfico 4 - Distribuição das conjugações das FIs no infinitivo ........................... 76

Figura 6 - Trecho da tabela de reunião do córpus ............................................... 77

Quadro 15- EM contrafactual de reversão de uma ação/acontecimento ............... 80

Quadro 16- EM contrafactual de reversão de evento............................................ 88

Quadro 17 - EM contrafactual de reversão de estado.............................................. 89

Quadro 18- EM hipotético de reversão................................................................... 90

Quadro 19- EM de conteúdo .................................................................................. 91

Resultado das operações cognitivas acionadas pelas FIs com des- de


Quadro 20- 92
base verbal no infinitivo .....................................................................
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

DUP Dicionário de Usos do Português do Brasil

FCs Formações Convencionais

FIs Formações Inovadoras

GH Gramática Histórica

LC Linguística Cognitiva

MC Morfologia Cognitiva

MD Morfologia Distribuída

NEG Negação

PB Português Brasileiro

PBL1 Português Brasileiro Língua 1

SD Sequência Discursiva
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................... 15

1 REVISITANDO O PREFIXO DES- .......................................................... 15

1.1 O prefixo des- e o debate da seleção categorial ......................................... 15

1.2 Diferentes perspectivas sobre o desenvolvimento histórico de des-.......... 21

1.3 Notas sobre o desenvolvimento morfossemântico de des- ........................ 25

1.3.1 A análise de Dolinski (1993) .......................................................................... 25

1.3.2 A análise de Bidarra e Schneider (2009) ........................................................ 28

1.3.3 A análise de Oliveira (2009) .......................................................................... 32

1.4 Considerações do capítulo ........................................................................... 35

2 SUPORTE TEÓRICO................................................................................ 38

2.1 O modelo de Hamawand (2011) .................................................................. 38

2.1.1 Aplicação das operações cognitivas em Hamawand (2011) .......................... 43

2.1.1.2 Categorização ................................................................................................. 43

2.1.1.3 Configuração .................................................................................................. 47

2.1.1.4 Conceitualização ............................................................................................ 48

2.2 Discussão e proposta de análise................................................................... 53

3 PERCURSOS METODOLÓGICOS .......................................................... 66

3.1 Natureza da pesquisa ................................................................................... 66

3.2 Objetivos de pesquisa e hipótese ................................................................. 67

3.3 O início de tudo: uma perspectiva cartográfica ........................................ 68

3.4 O X/Twitter: mídia digital ........................................................................... 70

3.4 Procedimentos metodológicos de coleta, categorização e seleção de


dados.............................................................................................................. 72
3.4.1 Distribuição do córpus ................................................................................. 73

3.6 Procedimentos de organização e análise teórico-metodológica do


córpus ........................................................................................................... 76

4 ANÁLISE DOS DADOS.............................................................................. 79

Descrição das operações cognitivas das FIs de base verbal no


4.1 79
infinitivo.........................................................................................................

4.1.1 Construções que evocam EM contrafactuais.................................................. 79

4.1.2 Construções que evocam EM hipotéticos ................................................... 90

4.1.3 Construções que evocam EM de conteúdo .................................................. 91

4.2 Resultados gerais ....................................................................................... 92

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................... 95

REFERÊNCIAS ........................................................................................... 99

ANEXO A – Córpus da pesquisa ................................................................. 105

ANEXO B – Córpus da pesquisa .................................................................. 113


15

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objetivo investigar e descrever as operações cognitivas


acionadas por novas criações lexicais com des-+ base verbal no infinitivo a partir de análise e
descrição do comportamento semântico desse prefixo em novas palavras, tendo como foco as
formações de base verbal no infinitivo em textos veiculados na plataforma X/Twitter, como
desabraçar, desver, dessorrir entre outros.
As diferentes pesquisas, no âmbito da morfologia derivacional (Silva; Mioto, 2009,
Medeiros, 2010; Rio-Torto, 2019), que analisam o prefixo des-, estabelecem critérios que, em
princípio, serviriam como filtros para más formações, classificando essas palavras como
agramaticais/irregulares. De modo a permitir uma melhor compreensão dos temas e conceitos
que circundam este trabalho, façamos um breve apanhado de questões relacionadas ao
fenômeno da derivação prefixal.
Para Silva e Mioto (2009), o prefixo des- não se pode combinar com verbos que não
marquem processos ou que marquem processos irreversíveis, entendendo como agramaticais
exemplos como: desmorrer, deschegar, deslavar, desdesejar entre outros. Medeiros (2010),
por sua vez, afirma que o prefixo des- não denota reversão de processo, mas sim negação ou
inversão de um estado decorrente de um processo, portanto, espera-se não encontrar
construções com esse prefixo em nomes de eventos como trabalho, dança e pulo, por
entender que esses nomes denotam funções incompatíveis com as propriedades de seleção
semântica do prefixo des-. Já Rio-Torto (2019) argumenta que esse prefixo repele verbos que
denotem i) situações estativas (estar, existir), ii) processos (chover, correr, dormir, nadar,
nevar, saltar), iii) eventos pontuais (matar, morrer) e iv) valor extrativo circunfixados em es-
(desesbravejar, desesverdear)1.
No entanto, em ambientes virtuais, como o X/Twitter, nos deparamos com todos os
exemplos com des-2 considerados não viáveis por Silva e Mioto (2009), Medeiros (2010) e
Rio-Torto (2019). Vejamos as sequências discursivas (SDs) abaixo:

1
De acordo com Valente et al. (2009) “circunfixação é o mecanismo do tipo não-concatenativo, que pressupõe
não a anexação de um prefixo e um sufixo simultaneamente, mas a existência de um circunfixo, um morfema
descontínuo que se separa pela intercalação da base: (i) eN-caro-ecer (encarecer); (ii) a-podrecer (apodrecer). Em
(i., ii.), teríamos os circunfixos ‘eN...ecer’ e ‘a...ecer’ que se separam para que as bases caro e podre possam ser
inseridas em seu interior. Dessa forma, a semântica do processo de formação de palavras estaria, segundo essa
proposta, no circunfixo como um todo (e não somente no prefixo ou no sufixo isoladamente)” (Valente et al.
2009, p. 4).”
2
Ver mais no Anexo A.
16

SD 1: “Odeio acreditar em karma pq eu desejo as coisa ruim pras pessoas e daí tenho q
desdesejar se não teoricamente volta em dobro pra mim” (Anexo A: item/construção 28-
Postado em: 15.04.20, grifo meu)

SD 2: “Desde que falaram que a Billie Eilish se veste igual o Ribamar do Sai de Baixo eu
nunca mais consegui desver” (Anexo A: item/construção: 94- Postado: 25-03- 23, grifo meu)

SD 3: “hoje li que gin tem gosto de perfume no pescoço e agora, tomando gin, não consigo
dessentir” (Anexo A: item/ construção: 84-Postado em: 15.03.23, grifo meu)

Considerando as pesquisas já realizadas, o intuito deste trabalho é trazer contribuições


para a descrição e a análise do processo de formação de palavras prefixais na atual sincronia,
mais especificamente, daquelas constituídas pelo prefixo des- adjunto a bases verbais no
infinitivo, na perspectiva da Linguística Cognitiva. Pretendemos observar e identificar as
possíveis recorrências do comportamento dessas construções e compará-lo com o descrito
pela literatura morfológica e pelas gramáticas históricas e normativas, para, a partir dessa
análise, descrever os mecanismos cognitivos acionados na criação de palavras com o prefixo
des- considerada inovadoras. Tendo em vista que “o significado de uma expressão reside na
mente do falante, que a linguagem representa a forma como o falante interpreta uma situação
e que muito da linguagem pode ser descrito como codificação de diferentes conceituações de
experiência” (Hamawand, 2021, p. 243), defendemos que o prefixo des- pode ser anexado a
bases não previstas pela literatura morfológica, ainda que haja um padrão morfológico e
semântico básico.
No âmbito desta pesquisa, consideramos a hipótese que as construções consideradas
irregulares na literatura morfológica (chamaremos de formações inovadoras) podem ser
consideradas aceitáveis em função de seu significado de reversão já ter sido internalizado
como uma construção, o esquema [des- + base verbal] REVERSÃO, o que faz dele
compreensível/ acessível.
O córpus deste trabalho é constituído de 97 tuítes (tweets, no original) selecionados e
coletados manualmente na plataforma X/Twitter. A escolha dessa plataforma se deu pelo fato
de que a coleta, a produção e a disseminação de informações foram profundamente
transformadas pelo advento das tecnologias digitais. Essa recente realidade põe nas mãos do
usuário da rede X/Twitter – através do tuíte – “o poder de transmitir e apropriar-se da
17

informação nunca antes ocorrida na história” (Alves, 2011, p. 103). Soma-se ainda o fato de
essa plataforma possibilitar a produção de um córpus robusto.
No que concerne aos tuítes utilizados nesta pesquisa, os mesmos foram replicados tal
qual apareceram no X/Twitter. Modificamos apenas alguns espaçamentos a fim de facilitar a
leitura sem, com isso, comprometer a estrutura das enunciações. Nossos grifos destacam as
construções que aparecerão em nossos eixos analíticos. Além disso, manteremos preservada
as identidades dos usuários das postagens dessa pesquisa. Assim, os sujeitos-tuiteiros (aqueles
que realizam as postagens na plataforma digital) serão identificados como Usuários 1, 2, 3
seguindo uma sequência numérica das postagens que serão apresentadas, seguidos da sua
localização no Anexo A deste trabalho.
A base teórica adotada para a análise dos dados segue os pressupostos da Linguística
Cognitiva (LC), mais especificamente, do modelo de Morfologia Cognitiva (MC) postulado
por Hamawand (2011). Este modelo argumenta que as construções devem ser explicadas por
meio das operações cognitivas: categorização, configuração e conceitualização. Portanto,
considerando que a MC envolve o exame das relações semânticas entre as subpartes na
formação de uma palavra (Hamawand, 2011), nossa intenção é aplicar essa estrutura analítica
em nossa pesquisa e, por meio de uma análise comparativa, avaliar suas limitações,
adequações à análise pretendida, além de delinear possíveis expansões dessa abordagem.
Além deste capítulo introdutório, este trabalho se divide da seguinte forma: o próximo
capítulo, intitulado “Revisitando o prefixo des-”, destaca algumas das discussões já levantadas
sobre esse prefixo, bem como este trabalho se insere em relação aos outros. O capítulo
chamado “Suporte teórico”, apresenta o modelo da Morfologia Cognitiva de Hamawand
(2011) sob quais perspectivas analiso o meu objeto. No capítulo “Caminhos metodológicos”,
descrevo o córpus da pesquisa e as escolhas metodológicas para este estudo. O capítulo
“Análise dos dados” aborda as trajetórias percorridas na pesquisa, explorando a interseção
desse caminho com a abordagem de Hamawand (2011) e as limitações da pesquisa. Por fim,
no capítulo “Considerações finais”, encerro esta dissertação apresentando a síntese dos
objetivos deste estudo e dos resultados obtidos, bem como os objetivos futuros da pesquisa.
18

1 REVISITANDO O PREFIXO DES-

Neste capítulo, percorreremos o seguinte trajeto: (i) abordaremos algumas observações


referentes à discussão dos prefixos na língua portuguesa e o debate sobre a seleção categorial,
com foco especialmente no prefixo "des-" (1.1); em seguida, (ii) discorreremos sobre algumas
questões fundamentais relacionadas à evolução histórica do prefixo "des-", explorando
diversas perspectivas (1.2); por fim, (iii) apresentaremos uma análise de alguns estudos que
investigam o desenvolvimento morfossemântico desse prefixo, sob diferentes prismas (1.3).

1.1- O prefixo des- e o debate da seleção categorial

Segundo Rocha (2008, p. 147) “a derivação prefixal é um processo de criação lexical


que consiste na formação de uma nova palavra através do acréscimo de um prefixo a uma
base já existente”3. Considerada como “o parente pobre dos processos de análise de formação
de palavras”4 (AMIOT, 1997, p. 24, tradução nossa), especialmente quando comparada à
prolífera produção de estudos sobre derivação sufixal, a derivação prefixal consiste em um
assunto polêmico, uma vez que não há um consenso entre os pesquisadores tanto acerca da
sua classificação quanto dos critérios de seleção categorial.
Para Silva e Mioto (2009, p. 2), os prefixos – à semelhança dos sufixos – selecionam
rigidamente a base com a qual se associam. Esse processo evitaria a ambiguidade estrutural
das formações, pois, se não adotarmos uma seleção rígida, algumas palavras teriam três
derivações possíveis, como é o caso da palavra desmobilização5:

(1) a) [N[ V[ Ades -mobil] iza] ção] - base adjetival


b) [N [V des [A mobil]iza]] ção] - base verbal
c) [N des [V [A mobil+ iza] ção]] - base nominal

3
Rocha (2008, p.148) apresenta ainda as seguintes características dos prefixos: i) é uma sequência fônica
recorrente; ii) não é uma base; iii) coloca-se à esquerda de uma base; iv) tem como objetivo formar novas
palavras, ou seja, a presença do prefixo caracteriza uma palavra derivada; v) apresenta uma identidade fonética,
uma identidade semântica e uma identidade funcional e vi) é sempre uma forma presa.
4
No original:“le parent pauvre des processus d’analyse de la formations des mots”.
5
Sistematização de Medeiros (2010, p. 100)
19

Na posse desses esquemas em (1), Silva e Mioto defendem que o prefixo des-, por
possuir uma semântica de reversão de ação, teria como exemplificação correta da formação da
palavra desmobilização a opção (b). Contudo, como o prefixo des- também é produtivo com
bases adjetivais, a opção (a) também seria aceita. Tendo em vista esses aspectos, para validar
a hipótese de seleção rígida e lidar com as construções como “desnecessário”, “desleal”,
“desumano”, “deselegante”, “desigual”, os autores propõem a existência de um prefixo
homônimo que se une a bases adjetivais. Além de se associar a bases diferentes, esse prefixo
apresenta significado distinto.
De acordo com os autores (2009), nos casos em que os verbos não indicam processos,
haveria uma incompatibilidade semântica entre o aspecto da base e o do prefixo,
diferentemente dos que marcam processos, uma vez que “traduzem a compatibilidade
semântica entre os dois morfemas da palavra.” (Silva; Mioto, 2009, p. 20). Portanto,
neologismos como desmorrer, deschegar, deslavar, desdesejar, desnadar e dessonhar seriam
irregulares (Silva; Mioto, 2009, p. 20). Contudo, na plataforma X/Twitter, encontramos todos
esses exemplos considerados irregulares. Observemos

Quadro 1- Restrições de Silva e Mioto (2009) encontradas no X/Twitter


Construção Contextos de produção
desmorrer “desfalecer: desmorrer ou voltar dos mortos” (Anexo A: item/ construção 62- Postado: 18-
05-23, grifo meu)
deschegar “dizem que quando é o tempo de ser mamãe todas as crianças riem pra gente, aparece
grávida de tudo que é lado e etc. ta acontecendo comigo então se chegou meu tempo ele
pode deschegar” (Anexo A: item/ construção 15- Postado: 05.07.23, grifo meu)
deslavar “minha mãe lava a louça uma vez e faz tanta bagunça que da vontade de pedir pra ela
deslavar” (Anexo A: item/construção 56- Postado: 30.10.20, grifo meu)
desnadar “se vc não nada, não tente desnadar quem quer nadar” (Anexo A: item/construção 63-
Postado: 12.04.17, grifo meu)
dessonhar “sonhei com uma versão +18 de cinderella que se passava em um navio ancorado em um
porto e meu deus como é que faz para dessonhar algo?” (Anexo A: item/construção 88-
Postado: 13.02.21, grifo meu)
Fonte: O autor, 2023.

Medeiros (2010), por sua vez, com base no arcabouço teórico da Morfologia
Distribuída (MD), defende que o prefixo des- não realiza uma seleção categorial, contrariando
a proposta de Silva e Mioto (2009), mas uma “seleção de natureza semântica, modificando
somente verbos cujos significados envolvam um elemento com interpretação estativa”
(Medeiros, 2010, p. 96) como por exemplo, desenterrar. Nas palavras do autor (2010, p. 97),
20

o verbo desenterrar pressupõe um estado, enterrado, inteiramente coberto por terra, sob o
solo, estado alvo de um possível evento de enterrar. Ao final do evento de desenterrar, o que
estava sob o solo não mais permanece em tal estado, atinge o estado não-enterrado, ou não
mais inteiramente coberto por terra. Nessa diretriz, o autor adota a seguinte representação
semântica para o nó sintático exponencial de des-:

(2) [[NEG]] = λf<s,t>λs.[¬ f(s)] (Medeiros, 2010, p. 110)

Nessa sistematização, o morfema [NEG] se associa/ modifica um argumento de


eventualidade estativa (de ordem (SS,𝑡))6 “independentemente de sua classe morfológica ou
categoria gramatical” (Medeiros, 2010, p.110). Com base nisso, a função semântica do
prefixo des- retornaria o conjunto de estados caracterizados pela negação do estado denotado
pela base. Em (3) temos um exemplo de onde o prefixo des- é anexado na estrutura (2), no
caso de “descolar os papéis”: para o autor o prefixo (função NEG) combina-se com a raiz
(√P) e não com o vP.

Figura 1: esquema proposto por Medeiros (2010)

Fonte: extraído de Medeiros (2010, p.110)

Desse modo, o autor rechaça a hipótese de Silva e Mioto (2009), afirmando que o
prefixo des- “não denota reversão de processo, mas nega ou inverte um estado que pode
decorrer de um processo”, por exemplo, descolar, que não pressupõe que algo tenha sido
colado ou se tenha colado” (Medeiros, 2010, p. 98). Sendo assim, o prefixo des- não pode ser

6
Medeiros (2010,2016) entende que “o prefixo des- tem a seguinte definição recursiva: [[NEG]] des-:=
λf.λs’.[~f(s)]. Ou seja, o prefixo toma um estado s e devolve o estado não-s. As propriedades de seleção
semântica do prefixo forçam uma leitura em que o sintagma raiz em (30) tenha a seguinte denotação: λs.R(s,
[[DP]]), onde [[DP]] é a denotação do DP complemento do verbo (uma entidade), s é uma variável
(davidsoniana) de estado e R traz o conteúdo lexical da raiz.” (Medeiros,2016, p.18). Assumindo o aporte
teórico da MD, o autor defende que “podemos pensar que em Forma Lógica o sintagma raiz recebe a denotação
(digamos, puramente estrutural) acima, λs.R(s, [[DP]]), por conta das propriedades de seleção do prefixo ou do
verbalizador; na interface conceitual, a lista 3 (Enciclopédia) fornece o conteúdo de R.” (Medeiros,2016, p.18).
Para uma discussão mais específica, ver mais em Borer (2005).
21

licenciado a verbos que denotam atividade; mesmo quando há um ponto final para uma
determinada ação, não o aceitam, como: *descorrer (um quilômetro), *destrabalhar (até o dia
raiar), *desdançar (a valsa), *despular, *desgritar, * desfalar (as palavras mágicas) entre
outros, pois não envolvem, não de maneira evidente, uma mudança de estado do seu
participante (agente).
No tocante às raízes adjetivais7, Medeiros constata que, por terem função de unir uma
entidade a um estado de valor-verdade, aceitam a prefixação com des-: “alguns nomes de
estado, em particular muitos nomes de estados psicológicos (afeto, amor, esperança, alento,
ânimo, estímulo, temor, etc.), também aceitam a prefixação” (Medeiros, 2010, p.116). Além
disso, o autor chama a atenção de que formações com des- de base adjetival e nominal não
pressupõem estado denotado pela raiz. Conforme essa proposta, isso reforça a ideia de que a
pressuposição não é algo associado ao prefixo, mas sim aos verbos aos quais se adjungem.
Diferente do proposto por Silva e Mioto (2009), que interpretam a adjunção à base
adjetival como um caso de homonímia, Medeiros (2010) alega que esse morfema seleciona
estados e não se detém a categorias morfossintáticas, visto que pode ocorrer com verbos,
adjetivos e nomes. A partir dessa perspectiva, o autor afirma que “conhecendo as denotações
semânticas destas classes de palavras e as estruturas de evento associadas aos verbos,
compreendemos a distribuição do prefixo des-, e chegamos à sua denotação: uma denotação
única, que evita a multiplicação de entradas lexicais para o prefixo” (Medeiros, 2010, p. 118).
Entretanto, apesar dessas postulações de Medeiros, é comum encontrarmos na
plataforma X/Twitter construções com des- com verbos que denotam atividade, mesmo
quando há um ponto final para uma determinada ação. Detemo-nos aos exemplos citados no
estudo de Medeiros (2010) produzidos na plataforma8:

Quadro 2: Restrições de Medeiros (2010) encontradas no X/Twitter com des-


Construção Contextos de produção
descorrer “eu juro que se eu pudesse descorrer, eu descorreria a são silvestre pq até hoje as minhas pernas
doem SER FITNESS NÃO É COMIGO. Esse lance de fazer as coisas para agradar o boy só nos
fodem, meninas” (Anexo A: item/construção 24- Postado: 02.01.23)
desdançar “Queria desdançar todas as vezes que tocou Jaque Patomba nas buatchy.” (Anexo A: item/
construção 56- Postado: 01.02.21)
desfalar “obrigada a quem inventou o modo cancelar mensagem, o sentimento de desfalar é muito bom”
(Usuário 11 – Anexo A: item/construção 62- Postado: 31.03.23, grifo meu)
desgritar “Sobre aquele carinha lá que gritou INDEPENDÊNCIA OU MORTE.... tem jeito de desgritar?

7
Medeiros (2010, p. 115) ressalta que não pretende, nesse estudo, analisar com mais pormenor as possíveis
incompatibilidades de certos adjetivos com o prefixo analisado, mas apenas mostrar que a proposta apresentada
pode ocorrer com essa classe de palavras.
8
Exemplos já citados por outros autores, não serão incluídos nos próximos quadros.
22

“(Anexo A: item/ construção 69- Postado: 27.04.21, grifo meu)


despular “Se eu pudesse despular as cercas que eu pulei” (Anexo A: item/ construção: 94- Postado:
17.03.21, grifo meu)
destrabalhar “mdssss essa semana eu trabalhei mtttttttttt gostaria de destrabalhar” (Usuário10 – Anexo A:
item/construção: 119- Postado: 26.01.23, grifo meu)
Fonte: O autor,2023.

Para Rio-Torto (2019, p. 98), o prefixo des- pode ser combinado com bases verbais,
adjetivais e, em menor caso, bases nominais. Quando anexado a cada categoria, pode denotar
valores semânticos distintos, como mostra o quadro (4):

Quadro 3: Restrições com des-


Prefixo Des- + Base Valores Exemplos
Semânticos
reversão desacelerar, desalavancar, desatar, descoser, desregular
extração desdentar, desflorestar, desmatar, desmembrar, desnatar, desossar,
Verbal destapar, destronar
negação desaprovar “não aprovar”, desconfiar: “não confiar”; desconseguir
(português de Angola, de Moçambique): “não conseguir”;
desconhecer “não conhecer”; desobedecer: “não obedecer”
Adjetival negação desleal “não leal”; desatento “não/pouco atento”; desconforme “não
conforme”, descortês “não cortês”, desmedroso “não medroso”.
Nominal privação desamor “ausência de amor”, desatenção “ausência de atenção, não
atenção”; descomissão “ausência de comissão”
Fonte: extraído e adaptado de Rio-Torto (2019, p.98-99)

Segundo Rio-Torto (2019, p. 99), para que o formativo des- seja anexado a bases
verbais e adjetivais, é necessário que essas bases atendam a um requisito semântico: serem
suscetíveis de reversão e/ou negação. A autora ainda pontua que:

(i) O prefixo des- com valor reversão, expresso no esquema


[NÃO[CAUSAR][(X)]]], compatibiliza com bases verbais cujo sentido
implique a ocorrência de uma ação prévia de sentido contrário
(armar>desarmar; arrumar>desarrumar). Nesse caso, de uso mais prototípico,
os verbos expressam uma situação de sentido contrário ao denotado pela base
verbal. Isso explica por que os verbos desabotoados, desaparelhado,
desautorizado, entre outros, sejam entendidos prototipicamente como
reversativo e não como negativos, como “não abotoado”, “não aparelhado”,
“não autorizado”.
23

(ii) A premissa acima não é ativada quando o prefixo des- tem valor negativo,
expresso no esquema [CAUSAR [NÃO][(X)]]], por exemplo, desobeceder
não implica que se tenha obedecido antes.

Partindo dessas pressuposições, Rio-Torto (2019, p.100-102) defende que (i) des-
verbo possui valor reversativo e seleciona predicados télicos (descoser, desintoxicar,
desmontar) e atélicos com valor negativo como desagradar, desconfiar; (ii) des-adjetivo, com
valor negativo, apenas se funcionarem como predicados de indivíduo (desleal, desonesto),
combinando preferencialmente com adjetivos qualificativos e deverbais (descartável,
desmontável); e por fim a autora cita que (iii) o prefixo des- está presente em sentido eventivo
(desarrumação, desfiliação), em propriedades/estado (desatenção, desconformidade),
sentimento (desamizade, desamor) e atitude (descaso, despropósito). Nesse último caso, de
formação nominal, há situações em que o sentido pode denotar tanto reversão quanto negação,
como demonstrado:

O nome de disco de 2012 da fadista portuguesa Ana Moura no qual se intenda


descontruir o fado, o derivado apresenta um valor a um tempo negativo de reversão,
de um hipotético evento latente prévio (construir fado/ desconstruir fado). O mesmo
se aplica a despalavra, derivado criado pelo poeta Manoel de Barros (“Agora só
espero a despalavra: a palavra nascida para o canto- desde os pássaros. /A palavra
sem pronúncia, ágrafa” (M. de Barros, Retrato do artista quando coisa. Rio de
Janeiro: Record, 2002, p.53), a desherói, a deslimites, a desutilidades, também da
autoria do mesmo poeta. (Rio-Torto,2019, p.102)

No tocante às restrições, Rio-Torto argumenta que o prefixo des- repele a adjunção de


acordo com certas categorias de base. O quadro (5) apresenta de forma detalhada as
afirmações da autora. Vejamos:

Quadro 4: Restrições de produção do prefixo des- de acordo com a categoria de base


Base Restrições Exemplos
Verbal Situações estativas estar, existir
processos chover, correr, dormir, nadar, nevar, saltar
Eventos pontuais matar, morrer
Valor extrativo circunfixados em es- * desesbravejar, *desesverdear
Adjetival Propriedade não reversível * descru, *desmorto
Nominal Objetos ou materiais tangíveis água, cadeira, cabeça, livro, mesa.
Fonte: Extraído e adaptado de Rio-Torto (2019)
24

Apesar dessas postulações, assim como os Silva e Mioto (2009) e Medeiros (2010),
conseguimos encontrar a maior parte dos exemplos considerados por Rio-Torto como não
aceitáveis na plataforma X/Twitter. Vejamos:

Quadro 5: Restrições de Rio-Torto (2019) encontradas no X/Twitter


Construções Contextos de Produção
deschover “O que os bolsonaristas não sabem é que você pode comprar a sua própria antena HAARP na
Shoppe configurar ao contrário das outras e fazer deschover nos acampamentos. Isso o
WhatsApp não mostra.” (Anexo A: item/construção 20- Postado em: 26.03.23, grifo meu)
desdormir “no momento só queria desdormir o que dormi de tarde pois uma da manhã e tô pronto pra
correr cinco maratona” (Anexo A: item/ construção 32- Postado em: 19.02.18, grifo meu)
desestar “Eu to apaixonadaaAA
Só quero desestar” (Anexo A: item/ construção 42- Postado em: 25.02.20, grifo meu)
desesverdear “to que nem um cachorro faminto olhando o cacho de banana desesverdear. Quero fazer meu
doce de banana” (Anexo A: item/construção:43- Postado em: 29.03.23)
desexistir “as vezes bate uma vontade de desexistir por um tempo” (Anexo A: item/construção 44- Postado
em: 24.02.23, grifo meu)
desnevar “poxa vida alemanha, não adianta nada nevar pela tarde e desnevar tudo à noite. eu já tava até
animadinha.” (Anexo A: item/construção 85- Postado em: 16.12.11, grifo meu)
Fonte: o autor,2023.

Frente ao exposto, no que concerne à postulação de uma seleção categorial rígida do


formativo des- quando adjungido a uma base verbal, temos como objetivo específico verificar
a viabilidade desses argumentos propostos por Silva e Mioto (2009), Medeiros (2010) e Rio-
Torto (2019) no córpus selecionado para este trabalho. De imediato, podemos dizer que, com
base em 140 formações, tais proposições não se mostram pertinentes devido à circulação
reiterada desses dados no X/Twitter. Na seção de análise, mostraremos como isso ocorre à luz
da morfologia cognitiva.

1.2.- Diferentes perspectivas sobre o desenvolvimento histórico de des-

Segundo Dolinski (1993, p.32), “a origem do prefixo des- é controversa”. Tal


afirmação se deve ao fato de o percurso etimológico desse formativo apresentar três possíveis
origens: (i) configuração vernacular do latim DE-; (ii) junção de duas preposições latinas, de-
e ex-; (iii) e/ou do prefixo latino dis- (Rio-Torto, 2019, p. 98). Na tentativa de entender a
origem desse prefixo, recorremos a estudiosos da língua portuguesa (Said Ali, 1921; Nunes,
1945; Coutinho, 1973; Camara Jr., 1979; Barreto, 1986; Viaro, 2013; Carvalho, 2016; Santos,
2020) que tentam apontar uma origem desse afixo.
25

Coutinho (1973) pressupõe que o prefixo des- tem origem na junção [de- + ex],
possuindo o valor semântico de separação, afastamento, ação contrária, intensidade, negação,
podendo também ser expletivo. Além disso, conforme o autor, dis- advém de “dis-, di- <dis-
“que significa dualidade, divisão entre as partes, separação, movimento, afastamento,
cessação, negação, falta e intensidade.” (Coutinho, 1973, p. 177). Já para Camara Jr. (1979, p.
229), o prefixo des- é o resultado das preposições de + ex. Contudo, o autor ressalva que
existe uma certa confusão com o prefixo latino dis-, que indica separação.
Contrariando essas visões, Said Ali (1921, p. 198) afirma que a origem da forma des-
como a combinação de- + ex é posta em dúvida por bons investigadores. Por esse motivo,
Said Ali (1964) considera que o prefixo des- não procede das junções das preposições latinas
de + ex, mas da romanização do dis-. Além disso, ressalta que:

A alteração phonetica veio acompanhada da sensível differenciação semantica,


desenvolvendo-se fortemente o sentido negativo que se começava a observar em
latim dispar, dissimilis, e outros vocábulos, apagando-se ao mesmo tempo o sentido
de separação ou divisão proprio do prefixo latino. (Said Ali, op. cit., p. 27)

Adotando essa perspectiva, Cunha (2011[1982] p.201) assume que o prefixo des- é
uma evolução do dis-. O mesmo posicionamento pode ser visto em Rio-Torto (2013, p.357),
que sustenta que o prefixo des- tem origem no latino dis-. Contudo, a autora ressalta que o
prefixo des- é a atual configuração produtiva no português.
Em contrapartida, Nunes (1945) postula que há duas possibilidades da formação do
prefixo des-: “(...) tanto pode resultar de dis-, como da junção das duas preposições, de- e ex-
(...)”. Segundo Carvalho (2016), o prefixo des-, provavelmente, vem do latim dis-, mas
ressalta que existe a possibilidade de ele ter originado da aglutinação de- + ex. Nessa diretriz,
Barreto (1986[1944]) alega que o prefixo des- tanto pode ser o resultado de dis- como da
junção das preposições de- e ex-:

Se des é a forma vulgar do prefixo dis (e em italiano não há des, mas sim e sempre
dis: disunire, disapprovare, disamore), e se disé o mesmo prefixo latino dis, de igual
origem que bis, ou seja, o mesmo que originou o numeral duo, dois; se é assim é DIS
com as formas DIS (dispor), DES (desigual), DI (divertir) significa originalmente
duplicidade como dissecar (cortar em dois), disjungir (separar duas coisas juntas),
depois separação ou diversidade de partes como dispor, divertir e finalmente
oposição, como desleal, desamável, desaplicado. (Barreto, 1986[1944], p. 48)
26

No que diz respeito à sua semântica, Barreto (1980, p. 59 apud Viana, 1904, p. 80)
tece a seguinte observação:

O preficso des- é o verdadeiro indicador popular da negação ou privação da idea,


expressa pelo vocábulo a que se antepõe. É conhecida a forma trivial desinfeliz,
originada pela incapacidade que tem o povo indouto de atribuir ao preficso latino in-
aquella faculdade modificativa do sentido, que êle dá a des-

Neira (1976, p. 132), ao reconstruir a diversidade de funções do prefixo des- no


galego-português, alega que não basta se limitar em estabelecer a verdadeira origem do étimo,
mas que convém levar em consideração as suas relações em um sistema de oposição, uma vez
que, de acordo com o autor, esse é o sistema adotado nas línguas românicas 9. Tendo essa
perspectiva, Santos (2020) busca delinear a origem e o desenvolvimento histórico de des-10.
Para isso, a autora abarca os morfemas de origem latina (de-, dis- e ex-) englobando essa
pesquisa em galego, espanhol, catalão, francês, italiano e romeno. Como resultado, Santos
(2020, p. 183) constata que o afixo des- “constrói-se de forma quase simbiótica em relação
aos prefixos mencionados acima, já que todos parecem ter contribuído para o seu surgimento,
desenvolvimento e para a expansão de seus valores semânticos”. No entanto, a autora afirma
que essa resposta não é conclusiva, uma vez que se faz necessário “pesquisar os valores
semânticos de “des-”, contrastando com as informações de datação para averiguar de que
forma e em que medida esses afixos contribuíram e influenciaram em seu desenvolvimento
morfossemântico” (Santos, 2020, p. 183).
A forma como Santos (2020) compreende a constituição do significado do prefixo,
leva-nos a estabelecer uma relação entre a sua proposta e a que orienta esse trabalho, uma vez
que a autora identifica uma rede de sentidos que seria responsável pelos distintos significados
de des-. Respeitando a complexidade teórica, a interpretação do comportamento semântico do
prefixo remete-nos ao conceito de domínio cognitivo, pois, de acordo com a Linguística
Cognitiva (Croft; Cruse, 2004), esse é uma estrutura conceptual complexa que inclui uma
ampla rede de conceitos simbolizados por diferentes expressões linguísticas. Como veremos
na seção de análise, só é possível entender o significado de um prefixo se ele estiver dentro de

9
Neira (1976, p.312) “Enlo que sigue, trataremos de reconstruir elproceso que condujo a la diversidade de
funciones que pose hoyel prefixo /des-/ enlalenguagallego-portuguesa. No basta para ellolimitarse a indagar
elverdadero étimo latino, que unos relacionancon /dis-/ y otros com lacombinación /de-/ + /ex-/ /eks-
/.Convieneademástenerencuentalosmedios que elhablante latino utilizaba para un sistema de oposiciones que
enloesencial se ha continuado enlaslenguas românicas”.
10
Para Santos (2020, p.168) “No caso do prefixo “de-”, não se encontram dificuldades em postular a sua origem,
que surge a partir da preposição díctica homônima de uso prepositivo e pospositivo”.
27

um determinado domínio cognitivo: de-, dis- e ex- partilhariam um mesmo domínio cognitivo,
disso decorrendo a fusão de significado do formativo des-.
No que concerne aos significados, na busca de verificar as instanciações semânticas
dos prefixos de-, dis- e ex, detemo-nos, numa perspectiva etimológica, detemo-nos ao estudo
de Romanelli (1964, p. 5), que tem como objetivo principal realizar um “estudo metódico e
exauriente dos prefixos latinos e de seu papel na composição de palavras”. Dessa forma,
podemos sistematizar os sentidos, dos prefixos acima, do seguinte modo11:

Quadro 6: Extensões de significado dos prefixos de-, dis- e ex- conforme Romanelli (1964)
Prefixo Extensões de significado
de- a) movimento de cima para baixo,descida, queda; ( decurro “descer correndo, correr descendo,
precipitar-se”, decutio “ fazer cair sacudindo, fazer cair, deitar abaixo”, defigo “ enfiar, enterrar, fizar
do alto para abaixo”
b) afastamento, separação, repulsa, aversão; (decedo “ir-se embora, retirar-se”, demoveo “afastar,
desviar de deslocar, remover”, deprecor “afastar por meio de súplicas, pedir que não faça mal, pedir,
suplicar, afastar, desviar”)
c) diminuição, redução, desgaste; ( decresco “ decrescer, diminuir, tornar-se menor”, deductio “ ação
de tirar, diminuição, dedução”, detero “gastar pelo atrito ou pelo uso, gastar, tirar esfregando,
diminuir”
d) privação, negação, antonímia; dearmo “desarmar, roubar, subtrair”, debeo “ dever dinheiro ou
qualquer outro objeto, ser devedor’’, despero “desesperar, perder as esperanças”
e) acabamento, consumação; debello “terminar a guerra com a vitória, debelar, vencer”, dedoleo
“deixar de se aflingir, pôr termo à sua dor”, defungor “satisfazer completamente, desempenhar-se
completamente, cumprir inteiramente”
f) intensidade; deamo“gostar muito, amar”, delasso “cansar demasiadamente, fatigar muito, esgotar”,
delitigo “exceder em palavras, altercar”
g) sentido zero (esvaziamento de conteúdo semântico) dealbo “debalbar, branquear, cair”, deambulo
“deambular, passear, dar um passeio”, derelinquo “abandonar, desamparar”
dis- a) separação, disjunção, afastamento; diffindo “arrombar, separar, fender, dividir”, digredior “afastar-
se, retirar-se, ir-se embora”, dimoveo “afastar, separar, dividir, desviar”
b) diversidade de direção, dispersão; dido “distribuir, repartir, espalhar,”, diduco “levar, conduzir
para diversas partes, separar, dispersar”, differeo “levar de um lado e ouro, levar para diferentes partes,
dispersar”
c)negação, antonímia; diffamo “difamar, desacreditar”, difficilis “difícil, penoso, custoso”, diffido
“não se fiar em, desconfiar, não confiar em”
d) intensidade, reforço de sentido; dillapido “juncar ou cobrir de pedras”, discupio “desejar
ardentemenre”, disperdo “perder completamente, destruir, arruinar”
e) ordem, arranjo, disposição: dirigo “conduzir em diversas direções, dirigir, alinhar, dispor,
ordenar”, dispenso “pagar, distribuir, administrar, dispor, ordenar”, disponho “dispor, pôr em vários
lugares, pôr em ordem, regular, ordenar”
ex- a) movimento de dentro pra fora, saída, extração: edo “dar à luz, dar a lume, fazer sair, publicar”,
educo “levar para fora, fazer sair, tirar de”, effodio “tirar cavando, desenterrar, extrair”
b) elevação, ascensão; emineo “destacar-se em saliência, estar saliente, elevar-se”, emolior “levantar
um peso, elevar-se”, enitor “fazer esforços para sair, fazer esforços para sair, fazer esforços para se
elevar, para subir”

11
Selecionamos, para esse quadro, apenas os três primeiros exemplos de cada extensão de significado
apresentado por Romanelli (1964).
28

c) ausência, privação (especialmente em adjetivos e verbos denominativos): effrenus “desenfreado,


sem freio”, donde effreno “tirar o freio, desenfrear”, donde elinguo “cortar ou arrancar a língua a
alguém”
d) mudança de estado, passagem de um a outro estado: eduro “endurecer”, effervesco “esquentar,
entrar em ebulição”, evilesco “tornar-se vil, perder todo o valor”
e) acabamento (aqui o prevérbio marca o processo chegando ao seu termo): efficio “acabar de fazer,
fazer completamente, acabar, efetuar”, expleo “encher inteiramente, dar os últimos retoques”,
exsorbeo “engolir, beber inteiramente”
f) aumento, reforço, intensidade; ebullio “deixar sair borbulhões, fever muito”, exaugeo “aumentar
consideravelmente, acrescentar, fortificar”, exstimulo “picar com força, aguilhoar fortemente”
g) sentido zero (esvaziamento de conteúdo semântico): effercio “encher, fartar”, ementior “mentir,
dizer falsidades, caluniar”, evito “evitar, fugir de, escapar de”
Fonte: extraído e adaptado de Romanelli (1964)

1.3- Notas sobre o desenvolvimento morfossemântico de des-

Vejamos alguns estudos que apresentam um panorama de diferentes abordagens


morfossemânticas do formativo des-.

1.3.1- A análise de Dolinski (1993)

Para Dolinski (1993), dentre os prefixos negativos, o des- é o mais produtivo entre os
falantes do PB. Conforme o autor, isso pode ser explicado devido à “sua acepção imediata
pelo usuário, por sua variação funcional, e porque está pouco sujeito a restrições” (Dolinski,
1993, p. 141). Em seu estudo, o autor chama a atenção para analisar o significado do prefixo
considerando o contexto em que está inserido. Desse modo, partindo de um córpus coletado
de jornais, tendo como principal foco as palavras não dicionarizadas no Aurélio 12, na época de
sua análise, o Dolinski sistematiza, com exemplos, os seguintes traços semânticos do
formativo des-. Vejamos:

Quadro 7: Esquemas semânticos geral e específico com base em Dolinski (1993)


Esquema semântico Esquema semântico Exemplos
geral específico
- ação contrária desabotoar desarrumar, desatar, descoser , desdizer,
- ideia contrária desembaraçar, desembrulhar ,desenrugar
- ato contrário desenterrar, desentupir desfazer, desimpedir,
- ideia contrária ao radical desmalufar., desmentir; destrabar,
- volta a uma situação desunir,desburocratização descolonização, entre
outros

12
Embora tenha sinalizado que as palavras foram extraídas de jornais, Dolinski (1993) não sistematiza,
minunciosamente, como essa extração foi realizada.
29

Reversão - ato contrário ao ato expresso


pelo verbo-base ou verbo-
primitivo

Obs: A frequência é maior nos


derivados de bases verbais ou
abstratos verbais terminados
em -ização ou -mento
Falta de / ausência - falta do que é denotado na desabastecimento, desabrigo, desacordo, desamor,
(privativo) base desamparo, desarmonia, desconfiança, desconforo,
- privação desculpa, desequilíbrio, desonra, desvontade(
- causativo de privação também má vontade) entre outros.
Negação - Indicacor popular de Desagradável, desatualizado, desconfiar,
negação ou privação da ideia desconhecer, desconsiderar, descortês, desleal,
expressa pelo vocábulo a que desobediencia, desocupar, deonesto,
se antepõe” (Said Ali desumano(negação a conotação, desprotegifo
1964,p.115) entre outros.
- negação de uma qualidade
- negação de uma ideia
- negação expressa pelo
radical
- idéia de negação
Cessação - de um ato Deabusar, desempatar, desencanto, desengano,
- de um estado desiludir, desilusão, desinfelicidade, deslembrar,
- de uma situação desmamar, desprezar, destemor
Afastamento, - separação ( Cunha, Descascar, desfolhar, desgastar,despedaçar,
separação 1970,p.44; Lima,1972,p.176) despetalar, desterrar, descaroçar, desfigurar
- ablação
-mudanda de aspecto
estilístico/expressivo - coisa mal feita, depreciação - desacatar, desajudar, desburocracia,
(ruim, mau, mal) - ironia descompanheiro, desgoverno, desprefeito,
- opacidade desquerer, desservir, destratar
- motivação estilística - desexplicar
- desgosto
-desconvite, desprefeito
positivo (pleonástico, - reforço, redundância, - desfrear, desnudar, desinfeliz, desinquieto,
intendificador) reiteração, intensificação, desgastar, desnudez
aumento, reforçamento -desaliviar
(BARRETO, 1980,p.56) -destremecer, desdeixar, desrasgar
- sentido positivo ou
pleonástico
- valor semântico neutro para
frisar o significante por
robustecimento
Fonte: extraído e adaptado de Dolinski (1993)

Ainda, segundo o autor, há diversos exemplos com des- em que a carga semântica do
prefixo des- não é compreensível; em outras palavras, não corresponde exatamente à soma
das unidades que a compõe13. Nesses casos, conforme Dolinski (1993, p.11-12), “[...] há falta

13
Como exemplo, Dolinski (1993, p.62, grifos do autor) apresenta os seguintes exemplos: “desgosto não è
'falta’, 'ausência de gosto ou ‘não-gosto'. Chamamos; estas formações; de opacas. Desgosto ê palavra complexa
opaca a despeito ele no AURELIO constar que desgosto ë 'falta' „ 'ausência de gosto’. Na verdade, o significado
30

de significação, como em alevantar, cujo a- afixado à base verbal foge à característica do


prefixo como elemento significativo. Também há neutralidade de significado quando o des- é
reforçativo, como em desinfeliz e desinquieto.” (Dolinski, 1993, p.11-12)”. Tal observação
confirma, como pontua Lopes (2013, p.264), “a natureza multifacética dos processos de
formação de palavras, cuja riqueza também se reflete na complexidade e heterogeneidade que
apresentam”.
No que diz respeito às características e condições de produtividade, Dolinski (1993,
p.33-34) afirma que o prefixo des- pode ser anexado a bases nominais (substantivos, adjetivos
e advérbios) e a bases verbais. Ainda, pontua que:

(i) o prefixo des- se adjunge, preferencialmente, a bases dinâmicas; não sofre


restrições a verbos e substantivos que denotem ação. Contudo, nesses casos,
expressam afastamento, separação, volta a uma situação, como por exemplo:
despertar, descontração, despolarizar.
(ii) com menor produtividade, o prefixo des- pode ser anexado a bases estáticas, que
por razões estilísticas e desobediência à restrição de produtividade (não citadas), o
formativo des- + base estática manifesta sentidos de desapreço, como: desprefeito,
descritério, desinformação
(iii) pode ser afixado a adjetivo estático produzindo negação da base ou simplesmente
não: desútil, desumano, desnatural
(iv) anexado a bases verbais, produzindo em sua maioria, sentido de reversão:
desfazer, despregar
(v) não é produtivo em bases substantivas puras, ou seja, àquelas que não sofrem
processo de sufixação. Mostrando-se mais produtivas em bases substantivas
quando estão sufixadas com:- mento/ -ção.

No caso das formações neológicas, chamadas neste trabalho de não-dicionarizadas,


Dolinski (1993, p.66) faz a seguinte ressalva:

Convém também notar que as formações estranhas que violam as restrições, que
provocam espanto, que fogem à norma, mas que não se constituem desvios, são
formações anormais e a elas não se pode atribuir o conceito de certo ou errado. A

não se mostra tão transparente e o uso nos; diz que desgosto è 'pesar', 'mágoa', 'tristeza', 'descontentamento'. Na
mesma situação encontram -se: “descaso ", "desavença ","desencanto”, desgraça",” desculpa”
31

atribuição errônea às funções anormais se deve à atitude prescritiva que atribuímos à


expressão vocabular em detrimento à atitude descritivista.
Desde que a mensagem não se torne incompreensível, a aceitação de unidades
estilísticas e anormais deve ser passiva.

1.3.2- A análise de Bidarra e Schneider (2009)

Schneider (2009, p.79) defende que, devido à sua carga semântica pré-determinada, os
prefixos selecionam a raiz com a qual se combinam. Partindo dessa premissa, ao observar o
comportamento semântico do prefixo des-, Schneider e Bidarra (2009) argumentam que esse
formativo possui uma polissemia altamente acentuada. Assim, com base em um córpus de
língua escrita14, os autores apresentam alguns teores semânticos para o prefixo des-, a ver:

Quadro 8: Teores semânticos do prefixo des-


Teores semânticos Palavras analisadas
1. Negatividade desinformação, despersonalização
2. Positividade desobrigado, descobrimento, descansem
3. Ação contrária desembolsar, desmontada, desaceleração
4. Aumento, intensidade desgastados
5. Separação desatrelada, descolamento
6. Transformação desfigurado, degelo
7. Destruição desmatamento
8. Falta de harmonia desequilíbrio, desproporção, descontrole
Fonte: extraído de Scheiner e Bidarra (2009, p.74)

Para os autores, dentre todas as acepções observadas, o teor mais prototípico é o de


negação, pois:
Na maioria das vezes em que o prefixo aparece, a função é trazer para o plano da
palavra derivada algo que deixa de estar presente no significado da palavra-base.
Essa negação se dá tanto em contextos em que a base da palavra é representada por
um elemento nominal (substantivo ou adjetivo) quanto naqueles em que é
representada por um elemento verbal. (SCHNEIDER; BIDARRA, 2009, p.74-75)

Dentre os exemplos apresentados por Schneider e Bidarra (2009, p.75), temos o


substantivo desinformação extraído do seguinte contexto: “A censura pode resultar em
rumores e desinformação nas ruas. (Observatório da Imprensa, 01/01/2008)”. Nesse
contexto, o substantivo expressa um estado de quem possui pouca ou nenhuma informação
sobre determinado assunto, ou, uma informação errônea propositalmente, o que “certamente
se revela um dano ou prejuízo e, por isso, o des- imprime um sentido negativo, de perda, à
palavra à qual se coliga” (Schneider; Bidarra, 2009, p. 75)

14
Os autores coletaram o seu córpus da versão online do jornal “Observatório da Imprensa”.
32

O segundo teor semântico listado é o da positividade. Para Schneider e Bidarra (2009,


p. 76):
Um dos princípios da Lógica é o fato de que, ao se negar algo com semântica
negativa, no caso específico a partir do morfema des-, por natureza, o resultado
passa a ser positivo, ou seja, a negação simplesmente troca o valor de verdade da
base da palavra a partir do morfema negativo. Se o teor semântico da base da
palavra é negativo, de imediato, com a incorporação do des-, assume um sentido
positivo, de ganho. Portanto, podemos dizer que o processo de junção do prefixo
des- não imprime a ele unicamente um caráter de negatividade, já que tem a função,
por excelência, de negar algo; mas, pelo processo de derivação prefixal, ou seja, des-
+ base negativa, tem-se um resultado positivo.

Como ilustrações dessa análise, os autores apresentam as formações desobrigado e


descansem dentro dos seguintes contextos. Vejamos:

(i) Naturalmente, nas críticas ao ex-presidente foram usados dois pesos e duas
medidas, pois do presidente Lula tudo que se perdoa nessas questões, como se ele
fosse o único brasileiro desobrigado de se submeter à norma culta, podendo falar
como puder ou quiser. (Observatório da Imprensa, 27/11/2007)
(ii) E espero que lá meus ossos descansem até se fundirem com a terra.
(Observatório da Imprensa, 15/01/2008) (Schneider; Bidarra, 2009, p.77)

Por meio desses exemplos, os autores destacam também que o contexto em que tais
formações são utilizadas podem ter uma semântica de positividade quanto de negatividade,
variando de acordo com a perspectiva dos participantes envolvidos na situação:

Sugerimos o exemplo “quis descansar no momento do árduo trabalho...”. Embora


descansar seja fundamental para a saúde do ser humano, há momentos considerados
apropriados para esse ato. No fragmento citado, provavelmente a hora escolhida para
o descanso não foi apropriada e, portanto, em uma das possíveis análises, podemos
sugerir que descansar, nesse contexto, implica em prejuízo. (Schneider; Bidarra,
2009, p. 77)

Ainda, consoante os autores (2009), ao destacar esses exemplos, é possível identificar


várias interpretações para o mesmo termo, sem que isso invalide ou apague o sentido positivo
das formações derivadas do prefixo des-. Essa possibilidade reforça o caráter polissêmico e de
produtividade lexical desse formativo.
Em relação ao terceiro teor semântico “ação contrária”, Schneider e Bidarra (2009, p.
78) o caracterizam como “ação transeunte, diferente, oposta ou imanente em relação ao
sentido expresso pela base da palavra”. Como exemplos, os autores destacam:
33

(1) Mas os preços desse conversor na faixa de 500 reais, no mínimo, significam que
o consumidor terá de desembolsar quase o valor de desembolsar dois
televisores atuais de 16 polegadas para melhorar a sua recepção. (Observatório
da Imprensa, 04/12/2007)
(2) O assunto é nosso – nos porões de uma das naus que trouxe a Corte, a Medusa,
veio uma prensa desmontada e, graças a isso, chegamos à era Gutenberg.
(Observatório da Imprensa, 04/12/2007)
(3) Segundo ela, a imprensa inventa e depois exige que se desminta o que
inventou. ta (Observatório da Imprensa, 27/11/2007) (Scheneider; Bidarra, p.78)

Conforme a análise dos autores, a palavra desembolsar (1) demonstra que há uma
possibilidade de inversão na ação previamente realizada. Já nas duas outras formações:
desmontar e desmentir, indicam uma ação que demandaria certo nível de precisão ou
qualificação.
Quanto ao teor “aumento ou intensidade”, os autores recorrem, dentre vários
exemplos, à formação desdobrar para afirmar o valor reforçativo que o prefixo des- pode
fornecer para a sua base. Vejamos:

(2) Mais tarde, foi substituído pelo espanhol zaguero, depois adaptado para o
português zagueiro, desdobrado em quarto-zagueiro desdobrado e zagueiro-central.
(Observatório da Imprensa, 22/01/2008)

Segundo os autores, a formação desdobrar, no excerto acima, expressa um reforço


dado à base, pois não duplicou apenas a posição do zagueiro, mas também
reforçou/aumentou/intensificou o seu papel dentro de campo. Contudo, ao Scheneider e
Bidarra chamarem a atenção para observar o contexto em que tais formações estão inseridas,
visto que elas são fundamentais para identificação do teor semântico que elas expressam, pois,
ao pensar na frase Tereza desdobrou a toalha, o item lexical desdobrou denotaria uma “ação
contrária” e não um reforço.
No tocante a “separação”, após observarem diversos contextos, os autores estabelecem
duas variantes para esse significado: 1º ideia de separação de estruturas físicas (concreto),
como em descolar; e 2º noção mais abstrata, como em desatrelar, como demonstram os
excertos abaixo.

(1) Um exemplo desse “descolamento” são os resultados de uma pesquisa mundial


sobre liberdade de imprensa divulgada no início de dezembro. (Observatório da
Imprensa, 01/01/2008)
(2) Não é possível mais conceber a TV ou qualquer outra produção de mídia
desatrelada da educação e da promoção da cultura desatrelada (Observatório da
Imprensa, 04/12/2007)
34

No que diz respeito à transformação, temos os itens lexicais desfigurado e degelo15


que apresentam uma ideia de transformação ou alteração estrutural no contexto em que estão
inseridos. O primeiro, apresenta algo que se altera, deforma; o segundo, denota uma
substância alterada quimicamente.

(1) Alguns com três pernas, com rostos e corpos desfigurados, com membros
desproporcionais etc., para a diversão própria e de seus convivas. (Observatório da
Imprensa, 08/01/2008)
(2) As revistas coloridas alarmam-se com o degelo das calotas polares e a sorte dos
ursinhos brancos. (Observatório da Imprensa, 15/05/2008) (Scheneider; Bidarra,
p.81)

Por último, os autores apresentam o teor semântico “falta de harmonia” que é expresso
através dos itens lexicais desequilíbrio, desproporção e descontrole. Observemos os excertos
a seguir:
(1) Na retaguarda, nas equipes técnicas e de produção, também se repete o
desequilíbrio observado na tela. desequilíbrio (Observatório da Imprensa,
17/12/2007)
(2) A desproporção entre conteúdo e publicidade verifica - desproporção se
também em outros veículos de comunicação de massa. (Observatório da Imprensa,
04/12/2007)
(3) O DVD intitulado Tropa de Elite 3, que se acha há muito tempo nas ruas do Rio,
poderia ser noticiado apenas como sintoma de dois fatos sociais maiores, para os
quais só agora o poder público parece estar acordando: (1) o agravamento da
violência urbana pela progressiva falta de controle sobre o tráfico de drogas e os
assaltos; (2) a transformação desse descontrole em espetáculo. (Observatório da
Imprensa, 15/01/2008) (SCHENEIDER; BIDARRA, p. 81)

Para os autores, nos excertos acima é possível notar que o teor semântico dominante é
a falta de harmonia. Com isso, argumentam que:

Embora seja uma categoria negativa, ela enfatiza, além da negatividade, outro viés
semântico a que podemos nos remeter. Desse modo, ressalta-se a importância do
surgimento dos significados assumidos pela junção do prefixo, pois o vocábulo
assume um teor semântico movido pela junção do elemento prefixal adicionado à
base. (Scheneider; Bidarra, p. 82)

Desse modo, ao observarem o prefixo dentro dos contextos, os autores argumentam


que o objetivo central do seu estudo foi o de explorar a produtividade lexical desse formativo,
tendo como foco a polissemia. Assim, Schneider e Bidarra defendem que o prefixo des- é
altamente produtivo, se levar em conta os processos polissêmicos que o envolvem. Embora

15
Segundo Schneider e Bidarra (2009, p. 81) “considera-se o prefixo de- como um processo de alomorfia do
morfema des- devido a uma acomodação fonética”.
35

não abordem os dados não dicionarizados, o posicionamento semelhante aos dos autores
poderá ser observado na seção de análise deste trabalho.

1.3.3- Análise de Oliveira (2009)

Oliveira (2009, p. 235), à luz do arcabouço teórico da morfologia distribuída (MD),


defende que “os prefixos selecionam a base com a qual se combinam e a seleção envolve
tanto a categoria como certas características semânticas da base.”. Tomando como córpus
dados extraídos do Dicionário Aurélio Eletrônico (2004), do Dicionário Houaiss Eletrônico
da Língua Portuguesa (2009) e de algumas informações de dicionários etimológicos, a autora
(2009, p. 129-130) sustenta que o prefixo des- é fundamentalmente verbal e muito produtivo
quando é adjungido a verbos que possuem traços semânticos que permitem que a ação ou o
estado seja desfeito, como nos casos: desenterrar, desacelerar, desfazer, descarregar,
desorganizar, desacatar, descasar, etc. Adicionalmente, a autora postula que o prefixo des- se
anexa, de modo mais comum, a verbos que possuem dois argumentos e, em casos mais raros,
a verbos que contenham apenas um argumento (o externo), como em acompanhar, andar e
aparecer. Neste estudo, ao realizar uma análise semântica do prefixo des- anexado às raízes
das formas verbais, Oliveira (2009, p. 130) postula que ele se associa a:

a) verbos que denotam estados, ou estados psicológicos ou mentais, resultando em


derivações como desencantar, desgostar, desinteressar, desencorajar etc.
b) verbos que denotam (modos de) atividade, produzindo desapear, descolar,
desenterrar, desembarcar, desabastecer, etc.
c) verbos que denotam processos, tais como desgastar, desvalorizar, desestatizar,
descentralizar, desacostumar, etc.
d) verbos que denotam eventos de criação, destruição e de tema incremental, produzindo
desamarrotar, desossar, desabotoar, etc.

Ao realizar essa divisão, em quatro classes, Oliveira analisa o prefixo des- no que
concerne às configurações morfossintáticas e às representações estrutural e sintática das
estruturas de cada verbo, com base no arcabouço teórico da MD 16. Além disso, a autora

16
Este trabalho não tem como objetivo esmiuçar os detalhes do comportamento desse prefixo à luz da MD,
apenas informar, de modo geral, as classificações de produtividade e as restrições desenvolvidas nessa
abordagem teórica. Todavia, para um maior aprofundamento, ver mais em Oliveira (2009)
36

postula que formações derivadas de base verbal costumam denotar eventualidades de


mudança de estado, uma vez que o escopo de des- recai sobre o DP17 argumento interno do
verbo. Nessas eventualidades, segundo a autora, observa-se “pressuposto de que uma ação foi
praticada ou uma situação foi estabelecida anteriormente para então ser levada a efeito uma
ação/situação contrária, que é denotada pelo morfema des-” (Oliveira, 2009, p. 120).
No que diz respeito à classe dos nomes, Oliveira (2009, p. 129-131) sustenta que o
prefixo des- se associa a um número muito restrito de substantivos primitivos abstratos,
resultando em um substantivo abstrato que expressa “ausência ou falta de X”, em que X
representa o substantivo abstrato. Ainda, as raízes das formações nominais a que esse prefixo
se associa denotam nomeação/designação, resultando em itens lexicais como desamor,
desânimo, desatenção entre outros. Além disso, des- também pode ser anexado a nomes
deverbais sufixados em -dade (descomplementariedade), -ção (desaceleração), --ança
(dessemelhança), -ez (despolidez), morfema zero (desajuste) e -mento (desligamento),
acrescentando-lhe, nesses casos, o sentido de “oposição/contrário de”. Por fim, a autora
pontua que os nomes internos às derivações seriam raízes que denotam nomeação e/ou
designação (Oliveira, 2009, p. 131).
Sobre as raízes adjetivais, Oliveira (2009, p. 129-130) afirma que des-, de modo
análogo aos substantivos, se associam a um pequeno número de adjetivos primitivos, os quais
expressam estados ou propriedades, o que resulta nos itens desleal, descontente, desonroso,
desordeiro, desfavorável, entre outros. Para esses casos, a autora argumenta que o prefixo
des- acrescenta a essas bases o sentido de “negação/ contrário de”, o que resulta em
formações adjetivais que expressam o sentido de “que não é X”, em que X é o adjetivo.
Ainda, des- se adjunge a adjetivos deverbais sufixados em –(a)do (desajeitado, desconfiado),
-nte (desestimulante) ou – vel (desagradável), agregando-lhes o sentido de
[“oposição/contrário de”], em que X é o adjetivo deverbal. Isto posto, a autora assevera que as
raízes das bases adjetivais, a que des- se anexa, são raízes em que expressam estados ou
propriedades e “as formações derivadas podem denotar eventualidades atributivas ou
predicativas, ou eventualidades de mudança de estado.” (Oliveira, 2009, p. 131)
Como sistematização da sua argumentação acerca da categorização e subcategorização
do comportamento do prefixo des-, Oliveira (2009, p.131) postula que:

17
DP (DeterminerPhrase) pode ser traduzido para Sintagma Determinante.
37

Em suma, des- tem traços semânticos subespecificados: aos verbos, adiciona o


sentido de [“oposição/contrário de”]; aos nomes [“ausência, falta de”] e aos
adjetivos, o sentido de [“negação/contrário de”].

Quanto às raízes com semântica não compatível com o traço semântico de des-,
Oliveira (2009, p.128) defende que:

Quadro 9: Raízes com semântica não compatível com des-


Restrições semânticas
Categoria exemplo justificativa
Adjetivos desjustificável, descompreensível, O morfema -vel acrescenta a base um sentido de
deverbais despalpável [“possibilidade”]
derivados com –
vel
Verbos estativos desparecer, destornar-se, desficar, Os estados que os verbos denotam não admitem a
desestar, noção [“opção/contrário de”]
Certos verbos desacabar, desmorrer, desnascer, Esses verbos trazem no seu conteúdo semântico a
télicos desabrir, desdeitar, desdesmaiar, noção de um evento com um ponto final natural
desiniciar, deslevantar, desmatar, ou culminação, isto é, a ação que expressam
dessuicidar-se, desquebrar, denota um processo concluso e permanentemente
desdestruir, desderreter, em seus efeitos, portanto, incompatível com a
desassassinar, desabrir, dessecar, ideia de [“oposição/contrário de”] acrescentada
desesculpir, desentalhar, etc pelo prefixo às formações verbais.
Certos verbos deschover, desmastigar, dessorrir, Esses verbos indicam eventos que não tendem a
atélicos desberrar, deschorar, desgritar, um fim necessário, isto é, uma vez iniciados,
desnadar, desolhar, desnevar, podem continuar indefinidamente, o que justifica
destrovejar, descorrer, desempurrar, a não-aceitação da ideia de [“oposição/ação
despular, etc contrária”] emprestada pelo prefixo quando em
formações verbais.
Verbos destossir, desespirrar,desroncar, Esses verbos descrevem eventos instantâneos e
semelfactivos desrir etc pontuais, que não envolvem uma mudança de
estado.
Verbos desemagrecer, desadoecer, Esses verbos indicam processos, o que justifica a
incoativos desengordar, desendurecer, incompatibilidade entre os traços das raízes e do
desmolecer, entre outros. prefixo.
com exceção para: desenraivecer,
desentristecer e desflorescer.
Verbos em desfriccionar, desvarrer, desesfregar,
contato com deslimpar, deslustrar, desescover etc.
superfícies
Fonte: Extraído e adaptado de Oliveira (2009, p.128)
38

Quanto às restrições morfossemânticas, a autora (2009, p.129) defende que:

Quadro 10: Restrições morfossemânticas


Restrições morfossemânticas
categorias exemplos justificativa
Substantivos concretos desalimento, desvoo,
desparede
Substantivos coletivos desconstelação, Essas formações não admitem a
descardume, despovo ideia de [“ausência/falta de”]
Substantivos compostos desguarda-chuva, desfolha-
de-santana etc
Adjetivos sufixados em -esco ou -al despitoresco, desdantesco, Essas formações não admitem a
desgigantesco, desconjugal, ideia de [“contrário de/ação
desracional, desboiada, contrária”]
desgeopolítico.
Fonte: extraído e adaptado de Oliveira (2009, p.129)

1.4- Considerações do capítulo

Diante do exposto, consideramos que os trabalhos de Silva e Mioto (2009), Oliveira


(2009), Medeiros (2010) e Rio-Torto (2019) realizam inadequações em suas análises no que
tange ao prefixo des-.
Silva e Mioto (2009) defendem a palavra *desmóvel, que corresponde à formalização
(1a) não seria considerada gramatical. Para os autores, esta forma deveria ser possível dada a
pressuposição de que há um prefixo des-/ADJ com uma semântica negativa. No entanto,
conforme aponta Quadros (2021), o problema dessa análise reside em:

[...] assumir uma semântica de simples negação para des-/A, o que funciona bem em
casos como desnecessário, visto que este adjetivo significa justamente ‘não
necessário’. Contudo, essa análise gera uma semântica incorreta nos casos em que a
prefixação com des- dá origem a uma oposição contrária. Assim, desagradável não
denota simplesmente ‘não agradável’. Significa algo pior; e, de fato, um indivíduo
pode ser descrito como não desagradável e, simultaneamente, não agradável, sem
que haja uma contradição.

No que concerne à análise de Medeiros (2009), o autor defende a semântica de des-


como negação de uma propriedade ou estado. Particularmente quando tais análises buscam
proporcionar uma análise transcategorial para esse prefixo, pois carecem de um mecanismo
que explique como os significados variados que emergem em diferentes categorias são
derivados a partir do núcleo semântico sugerido ([[NEG]] = λf<s,t>λs.[¬ f(s)] (Medeiros, 2010,
p. 110)). Contudo, podemos pontuar alguns problemas:
39

(i) Uma questão empírica claramente visível nessa abordagem é que ela resulta no fato de
que verbos que recebem o prefixo des- seriam todos considerados télicos, levando a
um estado resultante que corresponderia à negação do estado base. Contudo, não é
difícil encontrar contraexemplos, com o verbo descongelar. Não seria claro como o
modelo de Medeiros se aplicaria na sentença: “acham que a frozen descongelou um
pouco?????” (Usuário 20- Anexo B: item/construção 3- Postado: 01-04-21).
(ii) Outra questão empírica que surge com essa análise é a previsão de que o prefixo des-
não poderia ser adicionado a substantivos que não expressam estados. No entanto, isso
é contraposto por exemplos como desabusivo, desprefeito, desgoverno, desbabaca,
desdança entre outros. Vejamos:

Quadro 11: Contraexemplos de Medeiros (2010)


Construção Sequências Discursivas
desabusivo De acordo com os meus cálculos o próximo relacionamento atóxico e desabusivo que se
findará em breve será o da Meghan Markle com o Príncipe Harry. (Usuário 21- Anexo B:
item/ construção 1- Postado em: 29-04-20, grifo meu).
desprefeito “Esse desprefeito de São Gonçalo RJ gastou bilhões do dinheiro da privatização da
CEDAE e de algumas parcelas dos royalties do petróleo em obras vagabundas e sem
planejamento urbano sente como maquiagem, sem reorganizar a estrutura urbana da
cidade, está aí o caos instaurado...” (Usuário 22- Anexo B: item/ construção 6- Postado
em: 13-02-23, grifo meu)
desgoverno “Quem vai notificar o Vírus e suas variantes de que o desgoverno decreto a
despandemia?” (Usuário 23- Anexo B: item/ construção 5- Postado em: 18.04.22, grifo
meu)
desbabaca “será que tem como alguém se tornar: desbabaca?” (Usuário 24- Anexo B: item/
construção 2- Postado em 22.12.22, grifo meu)
desdança “acho que vou começar a fazer a desdança da chuva!” (Usuário 25- Anexo B: item/
construção 4- Postado em: 12.04.11, grifo meu)
Fonte: o autor, 2023.

Os mesmos problemas empíricos de Medeiros (2010) podem ser observados em


Oliveira (2009). Embora a autora assuma a possibilidade de verbos atélicos e estativos, é
possível ver, nas redes sociais, exemplos considerados não compatíveis por Oliveira. Ainda,
conforme a sua análise, os substantivos formados com o prefixo "des-" nunca adquirirão um
sentido de reversão, não importando o contexto em que são usados, uma vez que a Regra de
Formação de Palavras (RFP) que foi estabelecida não considera essa interpretação possível.
Contudo, como aponta Pereira (2020, p. 22), “como explicar, então, casos como “a
desmontagem de automóveis é trabalhosa”? Seria viável interpretar “desmontagem”, neste
contexto, apenas como “o contrário de montar”?”. Já para Rio-Torto (2019) a sua inadequação
consiste em desconsiderar a variedade do português brasileiro (PB) e suas explicações
metafóricas.
40

Isto posto, neste trabalho assumimos os passos de Dolinski (1993) ao considerar que
as formações prefixais com des- que fogem à regularidade das prescrições gramaticais não
devem ser consideradas irregulares e muito menos tratadas como desvios. Antes, o critério de
julgabilidade dessas formações deve ser a transparência semântica. Se uma formação
consegue ser depreendida com ou sem contexto, essa deve ser considerada aceita, pois
defendemos que a utilização das distintas estratégias de formação de palavras é tão natural
que o falante quase não se dá conta de que várias palavras “não estavam disponíveis para o
uso e foram formadas por nós mesmos, exatamente na hora em que a necessidade apareceu”
(Basílio, 1987, p. 5).
41

2 SUPORTE TEÓRICO

Neste capítulo, descrevo os principais conceitos que sustentam esta pesquisa. Nas
próximas subseções, apresento o modelo de Hamawand (2011), que serve de inspiração para
esta dissertação, avalio a aplicabilidade, identifico as possíveis limitações e proponho um
percurso teórico-metodológico para analisar e descrever as operações cognitivas ativadas
pelas formações inovadoras com o prefixo “des-” de base verbal no infinitivo.

2.1 Morfologia Cognitiva: a proposta de Hamawand (2011)

A análise proposta neste trabalho fundamenta-se nos pressupostos teóricos da


Morfologia Cognitiva (MC) de Hamawand (2011). Nessa abordagem, baseada nas
proposições da Gramática Cognitiva de Langacker (1987, 1991) e na Linguística de Corpus,
os processos cognitivos são estudados por meio da formação de palavras. Em outros termos, a
MC é o estudo das relações semânticas entre as subpartes da composição de uma palavra. Por
exemplo, aplicando esse conceito aos nossos dados, podemos dizer que as subpartes des- +
dançar e des- + ver são elementos morfossemânticos que são integrados para formar as
construções desdançar e desver. Isso só é possível, pois uma palavra é vista como “uma rede
inter-relacionada por princípios semânticos e afetada por determinantes de valência, onde as
subpartes servem para motivar facetas selecionadas de seu significado (Hamawand, 2011, p.
253, tradução nossa)”3.
Cabe ressaltar que, segundo Hamawand (2011, p. 19), valência “é a capacidade de
combinação de duas estruturas. Um determinante significativo reside na compatibilidade
fonológica e semântica entre as subpartes de uma expressão. É a correspondência entre a
forma de uma expressão morfológica e seu significado.”4 E faceta é definida como

uma parte de um domínio que está associada a um conceito específico. Cada faceta é
expressa por uma forma apropriada de linguagem. Um domínio compreende um
conjunto de itens linguísticos ligados de tal forma que, para compreender o
significado de qualquer item, é necessário primeiro identificar o conhecimento que
ele evoca e, em segundo lugar, relacioná-lo à faceta específica dentro dele.”5
(Hamawand, 2011, p. 46, tradução nossa).
42

Por exemplo, ao realizar um estudo sobre os sufixos -linge -ette, no inglês, Hamawand
(2011, p. 266) afirma que esses sufixos estão agrupados no domínio de 'diminuição'. Todavia,
cada um representa uma faceta distinta, uma vez que o sufixo -lingé usado para descrever
pessoas, animais ou plantas, como em princeling (principezinho) e o –ette é usado para
descrever lugares ou obras de literatura, como em kitchenette (cozinha pequena).
O modelo de Hamawand (2011) não abandona as terminologias adotadas das
formações morfológicas como: morfema, forma livre, forma presa e os processos de
derivação e composição. Além disso, como veremos na análise dos mecanismos cognitivos,
lança mão de diversos conceitos como os critérios de composicionalidade, correspondência,
dependência, determinância e constituência aproximando-se do que é aventado em outras
propostas de análise morfológica. O que muda, parafraseando Saussure (2016, p. 39), é a
perspectiva de análise das construções morfológicas, que busca respostas sob a ótica
cognitivista.
A MC se estrutura nos pressupostos teóricos da Linguística Cognitiva (doravante, LC)
e tem como objetivo fornecer respostas ou levantar hipóteses que permitam explicar certas
estruturas morfológicas utilizadas pelos falantes. Para Hamawand (2011, p. 15-16), a adoção
da LC, deve-se ao fato dessa abordagem teórica:
a) focar na linguagem como um instrumento de organização, processamento e
transmissão de informações e considera que as estruturas da linguagem estão a serviço dessa
função;
b) explicar a criação, o aprendizado e o uso da linguagem por referência a conceitos
formados na mente do/dos falante(s), uma vez que procura estabelecer padrões/ descrições
dos padrões linguísticos através de operações mentais produzidas na mente do falante;
c) ter como importância central o significado, que é corporificado na experiência
humana e explicado através da cognição. Acrescenta-se o fato de que não há uma fronteira
entre habilidades linguísticas e cognitivas, por um lado, e significado linguístico e
conhecimento geral, por outro.
Com base nessas postulações, Hamawand (2011, p. 11) defende que o léxico é uma
rede de unidades morfológicas associadas pelos falantes segundo os princípios cognitivos.
Para o autor, a morfologia é definida como “um ramo da linguística que estuda as relações
entre forma-significado, ou seja, entre unidades lexicais e sua disposição na formação de
palavras”7. E dentro dessa proposição, a palavra é vista numa perspectiva saussuriana, ou
seja, “unidade simbólica que é combinação de som e significado” 8. Para embasar a sua
43

argumentação, Hamawand cita como exemplo a palavra CAR (carro em inglês) que possui
dois aspectos que não podem ser separados: a imagem sonora /ka:/ e o conceito [CAR].
Ao buscar analisar os dados e os problemas morfológicos existentes em abordagens
tradicionais, Hamawand (2011) sistematiza a Morfologia Cognitiva através das seguintes
estruturas:
(1) pressupostos cognitivos: simbolismo, convencionalidade, criatividade,
autenticidade e semanticidade;
(2) mecanismos cognitivos: (i) integração: correspondência, dependência,
determinância e constituência; (ii) interpretação: composicionalidade e analisabilidade;
(3) operações cognitivas: categorização, configuração e interpretação.

Em (1), Hamawand (2011, p. 17-29) defende que: a) as construções morfológicas são


um pareamento de forma-significado. Segundo o autor (2011), um símbolo é composto por
algo visível (forma) que por associação representa algo invisível (significado); b) as unidades
morfológicas são de natureza convencional, uma vez que está de acordo com a aceitabilidade
de determinada comunidade de fala; c) são criativas, porque os usuários de uma língua são
capazes de criar novas expressões a partir de uma expressão já convencional ou interpretar
uma mesma situação de modos diferentes; d) são autênticas, visto que as construções se
manifestam em situações reais de comunicação; e, por fim, e) a semanticidade representa a
capacidade das construções morfológicas serem capazes de transmitir significado através de
símbolos.
Já em (2), Hamawand (2011, p. 30-41) considera que o resultado de uma
construção se deve aos seguintes mecanismos cognitivos: integração e interpretação. O
primeiro corresponde à combinação/integração de subestruturas morfológicas em uma
determinada sequência linear. Esse processo é afetado por quatro determinantes:

(i) correspondência: é a compatibilidade entre subestruturas que permite a


formação de uma palavra. Isto é, se essas subestruturas tiverem alguns
elementos em comum nos níveis semântico e fonológico, elas constituem
uma nova formação. Exemplo: a união dos itens fonológicos des- e colorir
elaboram a palavra descolorir. O prefixo des- requer uma entidade que
complete seu significado, quando adicionado a colorir, o prefixo evoca a
relação de reversão para a base verbal. Como resultado o verbo descolorir
refere-se a uma ação reversa. Essa relação entre essas subestruturas pode ser
44

entendida em termos de um trajeto esquemático e um marco. O prefixo des-


elabora o trajeto, enquanto o verbo colorir elabora o marco;

(ii) dependência: uma das subestruturas se qualifica como autônoma (A) e a outra
dependente (D). Na formação de deslamber, o prefixo é a forma dependente, uma vez
que o seu significa precisa de uma estrutura para atualizar o seu sentido. Já o verbo
lamber é autônomo, embora, da mesma maneira que o prefixo precise de uma
construção, contudo, mais complexa para instanciar o seu significado. As duas
unidades linguísticas funcionam como gatilho para acionar uma matriz de operações
conceptuais.
(ii) determinação: corresponde à ideia de que, na formação de uma palavra, uma
subestrutura empresta o seu perfil a toda a construção. Exemplo: na palavra
desmontada, o prefixo des- empresta o sentido de reversão quando é anexado à
palavra montada, imprimindo ao verbo um novo sentido.
(iii) constituência: diz respeito à ordem em que as subestruturas são integradas para formar
uma unidade significativa, por exemplo: desgovernador forma uma unidade
significativa, ao contrário de governadordes*9, ou seja, a coesão interna. O segundo
mecanismo, a interpretação, corresponde ao pareamento forma-significado. Esse
processo é governado pela (a) composicionalidade: refere-se ao processo de inferir o
significado de uma construção através da junção de suas subestruturas. Essa
característica é essencial para a construção e compreensão de novas expressões. Ela é
subdividida em composicionalidade total: o valor semântico de uma construção é
computável a partir dos valores de seus constituintes imediatos. Exemplo: desfazer é o
ato de reverter uma ação; e composicionalidade parcial, o significado de uma
expressão é determinado tanto pela contribuição semântica de seus componentes
quanto pelo conhecimento pragmático por trás do que é realmente simbolizado. Por
exemplo, o significado desumano em “O tratamento foi desumano” não é dado apenas
pelos significados dos seus constituintes morfológicos, base e prefixo, mas também
pelo seu significado biossocial, ou seja, procedimento cruel, sem as qualidades de
bondade e piedade por qual passou uma pessoa. E (b) anasabilidade é a habilidade de
reconhecer as contribuições da forma-significado das palavras. A anasabilidade pode
ser total ou parcial. No primeiro caso, o falante reconhece as unidades mínimas da
construção, como em des + danç+ar = desdançar. Enquanto no segundo, o falante
identifica as subestruturas morfológicas, mas não é capaz de atribuir significado à
45

construção na sua totalidade. Exemplo: “desbolsar”, conseguimos analisar a forma


des+ bols+ar, mas não o seu significado. “Ela é parcial, quando é
fonologicamente/morfologicamente analisável, mas semanticamente não. Exemplo:
“desbolsar”, conseguimos analisar a forma des+bols+ar, mas não o seu significado.”

E, por último, (3) as operações cognitivas18, que dizem respeito aos processos que os
falantes de uma determinada língua realizam, de modo inconsciente, para produzir e
interpretar as produções morfológicas. São as seguintes, de acordo com Hamawand (2008;
2011):

(i) categorização: corresponde ao ato mental de agrupar os numerosos sentidos de um


item morfológico em uma categoria. Considerando a categoria como uma rede dos
sentidos, os itens morfológicos são estruturados em termos de protótipo e periferia.
Ao analisar o prefixo “de-” em inglês, Hamawand (2011) constata que esse prefixo
tem os seguintes sentidos prototípicos: reversão (decipher, decode), remoção (defog,
defrost) e privação (deface, dehydrate) e sentidos periféricos: redução (debase,
degrade), análise (decode, descontruct), saída (debus, detrain) e cancelamento
(deselect, decommission);
(ii) configuração: corresponde ao processo de agrupar diferentes itens morfológicos em
um domínio, no qual cada um representa uma faceta diferente e um papel específico
na linguagem, uma vez que uma unidade linguística é caracterizada em termos da
estrutura de conhecimentos que ela ativa. Hamawand (2011) assegura que o prefixo
de- em inglês ativa os domínios da privação (The new proposal is meant to debase the
currency); remoção (They degreased the engine) e reversão (Can you decipher the
writing on this envelope?);19
(iii) conceptualização ou construal: corresponde ao ato de conceber e expressar uma
situação de maneiras diferentes. É a habilidade de um falante interpretar uma situação
de maneiras alternativas e usar diferentes unidades linguísticas (unidade morfológica)
para expressá-la. De acordo com a teoria conceptualista, o significado de um
enunciado não está vinculado à sua condição de verdade. Em vez disso, deve ser
identificada com a conceptualização simbolizada pelo enunciado. Significados são

18
No capítulo 4, as operações cognitivas serão detalhadas com o intuito de demonstrar, com maior elucidação, as
sistematizações analíticas de Hamawand (2011) e suas aplicabilidades em nosso trabalho.
19
Para chegar a esse resultado, Hamawand (2009, 2011) compara diversos prefixos negativos em inglês. Para
uma discussão mais profunda, ver mais em Hamawand (2009).
46

entidades em um espaço mental, que pode ser tanto objetivo, referindo-se a coisas que
realmente existem no mundo, quanto não objetivo, referindo-se a coisas que não se
relacionam com coisas do mundo real. Portanto, vincular enunciados a situações ou
características observáveis não é suficiente para contrapor diferenças semânticas. A
distinção pauta-se na interpretação dada pelo falante à situação descrita. Construal é
então uma questão de como uma situação é conceituada e como ela é codificada
linguisticamente.

2.1.1- Aplicação das operações cognitivas em Hamawand (2011)

2.1.1.2- Categorização

No âmbito da morfologia, Hamawand (2009, 2011, 2016) argumenta que um afixo,


seja um prefixo ou um sufixo, é constituído por uma categoria complexa que incorpora
diversos sentidos organizados de maneira interconectada, resultando em uma rede semântica.
Os significados são estruturados em torno de um núcleo central e prototípico. O sentido
central (prototípico) é aquele que se destaca inicialmente ao pensar no afixo, ocorre com
maior frequência e representa a base mais fundamental em termos de esclarecer os outros
significados. Os demais sentidos variam ao longo de um espectro, desde aqueles menos
prototípicos até os mais periféricos, organizados em relação à sua distância do sentido central.
Segundo Hamawand, os significados mais periféricos possuem uma conexão menos direta
com o sentido prototípico em comparação com os menos periféricos. As fronteiras entre os
significados dentro da rede são altamente difusas, resultando em sobreposições significativas
entre eles (HAMAWAND, 2016, p. 135).
Com base nessas proposições, Hamawand (2009, 2011) formula as seguintes redes
semânticas para os prefixos de- e dis- no inglês20:

i) Prefixo de- no inglês:

Apresentamos a seguir modelo de rede semântica do prefixo negativo de- em inglês

20
Em Hamawand (2009, 2011) são analisados os prefixos a(n)-, de-, dis-, in-, non-, un- entre outros, os quais são
caracterizados, segundo o autor, como negativos do inglês. Neste trabalho, apresentamos as redes semânticas dos
prefixos de- e dis-, que se alinham mais à semântica do prefixo des- do PB.
47

conforme Hamawand (2009, 2011)21:

Figura 2: Rede semântica do prefixo negativo de-

Fonte: extraído de Hamawand (2009, p. 65)

Conforme destacado por Hamawand (2011, p. 70-71), o prefixo “de-” no inglês,


conforme ilustrado na figura 1, ativa prioritariamente o sentido de reversão, manifestando-se
em três padrões semânticos predominantes:

a) Reverter a ação descrita pela raiz22- esse sentido é observado quando raízes nominais
são abstratas. Ex: “to decontrol” (desregular) significa liberar algo de restrições.
Ainda, em outros casos, o prefixo “de-” pode ser adjungido a verbos derivados de
nomes através dos sufixos -ate (de-escalate/desescalar), -ify (declassify/desclassificar)
e -ise (demilitarize/desmitalizar) entre outros;
b) Remover a coisa descrita pela raiz23- esse sentido é observado quando as raízes
nominais são concretas. Ex: “to debug” (debugar) que denota remover defeitos de
determinado dispositivo, sistema ou plano. Outros verbos, “degas”(desgaseificar),
“de-ice”(descongelar), “demist”(desembaraçar) e assim por diante;
c) Privar da coisa descrita pela raiz 24- esse sentido se manifesta quando as nominais são
abstratas. Ex: “to deform” significa privar algo de sua forma natural ou estragar a sua
aparência. Outros verbos são: “decolour (descolorir)”, “deface (desfigurar/ danificar
a aparência)”.

21
De acordo com Hamawand (2009, p. 65), a seta sólida representa o sentido prototípico do prefixo “de-”,
enquanto as setas tracejadas representam as extensões semânticas.
22
No original: ‘reversing the action described by the root’.
23
No original: ‘removing the thing described by the root’.
24
No original: ‘depriving of the thing described by the root’.
48

No que concerne aos sentidos periféricos, o prefixo “de-” ocorre em quatro padrões
semânticos:
a) Reduzir a coisa descrita pela raiz25- esse sentido aparece quando as raízes
nominais são abstratas, implicando em uma ação não física. Ex: “to debase”
consiste em depreciar;
b) Analisar a coisa descrita pela raiz26- esse sentido se manifesta quando ele é
adjungido a raízes nominais abstratas, implicando uma ação. Ex: “to decode”
consiste em decodificar algo, mais especificamente, algo escrito em código;
c) Sair do veículo descrito pela raiz27 – esse sentido é observado quando as raízes
nominais são concretas. Ex.: “to debus” é descer do ônibus. Outros verbos
incluem “detrain” desembarcar de um trem entre outros.
d) Cancelar a coisa descrita pela raiz28 – esse sentido é constatado quando as raízes
verbais são transitivas. Ex.: “to decouple” é cancelar duas coisas.

ii) Prefixo dis- no inglês

Apresentamos s seguir o modelo de rede semântica do prefixo negativo dis- em inglês


conforme Hamawand (2009, 2011)29:

25
No original: ‘reducing the thing described by the root’.
26
No original: ‘analysing the thing described in the root’.
27
No original: ‘getting off the vehicle described by the root’.
28
No original: ‘cancelling the thing described in the root’.
29
De acordo com Hamawand (2009, p. 65) a seta sólida representa o sentido prototípico do prefixo “de-”,
enquanto as setas tracejadas representam as extensões semânticas.
49

Figuras 3: Rede semântica do prefixo negativo dis-

Fonte: extraído de Hamawand (2009, p.66)

De acordo com a análise de Hamawand (2009, p. 65), o prefixo dis- é de origem latina
e pode, em certas construções, ser grafado como dys- em contextos médicos, como dysentery.
Para o autor, assim como os outros prefixos negativos, como na figura (2), o prefixo dis- é
adjungido a uma ampla seleção de radicais e possui como sentido mais evidente o da
distinção. Além disso, apresenta as seguintes nuances semânticas:

i) Para as nuances semânticas dos sentidos mais prototípicos, temos:

a) o oposto da qualidade significada pela raiz30- esse sentido emerge quando as bases
adjetivas são graduáveis, como: disobedient (desobediente) é o posto de obediente.
Outros exemplos são: disingenuous (dissimulado), disobliging (desatencioso),
dispassionate (desapaixonado), disreputable (desonroso), dissimilar entre outros.
b) não disposição a realizar a ação significada pela raiz31- esse sentido se manifesta
quando ele é anexado a raízes verbais (in)transitivas, como: disbelieve é não estar
disposto a acreditar em algo ou alguém. Outros exemplos são: disapprove
(desaprovar), dislike (não gostar), displease(desagradar), disremember (esquecer),
distrust (desconfiar).

30
No original: ‘the converse of the quality signified by the root’
31
No original: ‘unwilling to do the action signified by the root’
50

ii) Para as nuances semânticas dos sentidos periféricos, temos:

a) Inverter a ação expressa pela raiz32: esse sentido surge quando as raízes verbais são
intransitivas, como “to discharge” que consiste em liberar alguém de um dever ou
obrigação. Outros exemplos são: “disempower” (desempoderar), “disengage”
(desvincular), “disentangle” (desembaraçar) entre outros.
b) Livrar-se da coisa significada pela raiz33: esse sentido emerge quando as raízes
verbais são (in)transitivas, como: “to dispossess” é privar alguém de uma propriedade.
Outros exemplos são: “disenfranchise” (privar do direito de voto), “displace”
(deslocar), “disqualify” (desqualificar).
c) Ausência da coisa significa pela raiz34: esse sentido é observado quando as raízes
nominais são abstratas, como: “disbelief” significa falta de crença. Outros exemplos
são: “discomfort” (desconforto), “discourtesy” (falta de cortesia), “disharmony”
(desarmonia), “disobedience” (desobediência), “disrespect” (desrespeito).

2.1.1.3- Configuração

Hamawand (2011, p. 84-101) investiga a maneira como os significados dos prefixos


podem ser explicados em relação aos domínios cognitivos aos quais estão vinculados. Para o
autor (2009, 2011), cada domínio representa um contexto fundamental de conhecimento no
qual os significados particulares dos prefixos são discerníveis. Dentro desse contexto, são
estabelecidas diversas relações entre os prefixos, definidas em termos de papéis semânticos
minimamente distintos. Cada prefixo destaca um aspecto específico do domínio, claramente
diferenciando-se dos demais. Nessa perspectiva, um aspecto refere-se a uma porção do
domínio associada a um conceito específico, descrevendo assim uma experiência humana
única. Para Hamawand, os prefixos apresentam sentidos inter-relacionados, de modo que
compreender um prefixo requer uma compreensão da estrutura do domínio ao qual está
ligado, bem como dos outros prefixos com os quais interage. A intenção, ao recorrer a essa
teoria, consiste em evidenciar que os prefixos não existem isoladamente na mente do falante,
mas contribuem para a formação de domínios estruturados. Para Hamawand (2011, p.101),

32
No original: ‘turning around the action signified by the root’.
33
No original: ‘ridding of the thing signified by the root’.
34
No original: ‘lacking the thing signified by the root’.
51

esses domínios delineiam os sentidos específicos dos prefixos e atribuem a eles papéis
definidos na linguagem.
Com base nessas premissas, o quadro 12 resume os domínios evocados pelos prefixos
negativos de- e dis- no inglês, conforme Hamawand (2009, p. 101).

Quadro 12: domínios evocados pelos prefixos de- e dis- do inglês


Domínios Facetas Prefixos Sentidos Exemplos
Distinção contrariedade dis- Avaliar a atitude de pessoas disobliging
Privação Lugares/coisas de- Privar um lugar ou coisa de algo dispoil
Pessoas dis- Provocar a falta em alguém dishonour
Remoção Lugares/coisas de remover algo de um lugar ou coisa defog
Pessoas dis- livrar alguém de algo disposses
Reversão Lugares/coisas de- reverter um lugar ou coisa à sua natureza original desegregate
Pessoas dis- Inverter/mudar a posição de alguém displace
Fonte: extraído e adaptado de Hamawand (2011, p. 101-102)

2.1.1.4- Conceitualização

Hamawand (2011, p. 108) argumenta que os prefixos, tanto positivos quanto


negativos, possuem a capacidade de se ligar à mesma raiz, criando assim um par de palavras
semanticamente distintas. Para o autor (2011), a escolha de anexar um prefixo específico à
raiz de uma palavra não está limitada apenas ao conteúdo conceitual, mas também à
interpretação e codificação desse significado. Ainda, segundo Hamawand (2009, 2011 e
2021), uma dimensão crucial da conceitualização é a perspectiva, que se refere ao ponto de
vista imposto em uma cena, variando conforme a intenção do falante ou as demandas do
discurso. A raiz, a qual o prefixo de anexa, abarca um conteúdo conceitual com diversos
significados, e cada termo derivado do par de palavras representa uma experiência única do
falante, moldando sua forma morfológica por meio de um prefixo específico. Como resultado,
“a palavra derivada possui um significado distinto, com o qual o prefixo anexado contribui.”
(Hamawand, 2011, p. 108, tradução nossa)35.
Quanto à aplicação dessa abordagem no âmbito da derivação prefixal, detemo-nos à
análise de Hamawand (2011) acerca do prefixo dis- em inglês. Vejamos o quadro X36:

35
No original: “The derived word has its own distinct meaning, which is contributed partly by the attached
prefix.”
36
Para uma análise mais detalhada dos prefixos negativos dentro dessa abordagem, ver mais em Hamawand
(2009, 2011)
52

Quadro 13: Distinções semânticas do prefixo negativo dis- do inglês37

Prefixos Negativos
Distinções semânticas Representações
Descriptive (descritivo) vs. evaluative (avaliativo) non-/a- vs. dis-/un-/ in-
unfavourable (desfavorável) vs. disapproving (desaprovador) dis- vs. un-
Action (ação) vs. state (estado) dis- vs. un-
Fonte: extraído e adaptado de Hamawand (2011, p.119)

Para elucidar essas distinções, consideremos os tópicos a seguir:

i) Descriptive (descritivo) vs. evaluative (avaliativo)

Quando associados a raízes adjetivais comuns, os prefixos non-, a-, dis-, un- e in-
formam conjuntos de adjetivos com conotação negativa. Em particular, eles evocam o
domínio da distinção, mas representam elementos variados, como38:

Os prefixos non- e a- são descritivos, fornecendo uma descrição de como alguém ou


algo é. Non- significa 'diferente da qualidade descrita pela raiz'. A- significa
'divergente da qualidade mencionada pela raiz'. Eles têm uma tonalidade
distintamente imparcial, desencadeando, assim, uma descrição objetiva. Nessa
função, as palavras que derivam deles adquirem interpretações contraditórias. Por
outro lado, os prefixos dis-, un- e in- são avaliativos, julgando o que alguém ou algo
é. Dis- significa 'o oposto da qualidade indicada pela raiz'. Un- significa 'a antítese
do que é especificado pela raiz'. In- significa 'o oposto da propriedade expressa pela
raiz'. Eles têm um sabor parcial, gerando assim uma avaliação subjetiva. Nessa
função, as palavras que derivam deles adquirem interpretações contrárias. Dis-
representa o grau mais baixo de contrariedade. É desfavorável em caráter. No meio
está un-, que é desaprovador em caráter. No grau mais alto de contrariedade está in-,
que é crítico em caráter. (Hamawand, 2011, p. 109, tradução nossa)

37
Cabe ressaltar que Hamawand (2009, 2011) não realiza uma análise comparativa dos prefixos de- e dis- do
inglês.
38
No original: “The prefixes non- and a- are descriptive, giving an account of what someone or something is
like. Non- means ‘different from the quality described by the root’. A- means ‘divergent from the quality referred
to by the root’. They are distinctly impartial in tone, and so trigger an objective description. In this function, the
words they derive acquire contradictory readings. By contrast, the prefixes dis-, un- and in- are evaluative,
judging what someone or something is. Dis- means ‘the converse of the quality signified by the root’. Un- means
‘the antithesis of what is specified by the root’. In- means ‘the opposite of the property expressed by the root’.
They are partial in flavour, and so produce a subjective evaluation. In this function, the words they derive
acquire contrary readings. Dis- represents the lowest degree of contrariety. It is unfavourable in character. In
the middle is un-, which is disapproving in character. At the highest degree of contrariety is in-, which is critical
in character.”
53

Para embasar essa análise, Hamawand (2011, p.109) utiliza o seguinte par de
exemplos:

(1) non-professional vs. unprofessional (não-profissional vs. não profissional)

a. The company provides training for the non-professional staff. (A empresa oferece
treinamento para a equipe não-profissional)

b. She was found guilty of unprofessional conduct by the court. (Ela foi considerada
culpada de conduta não-profissional pelo tribunal)

De acordo com Hamawand (2011, p.109), os dois adjetivos em 1 (non-professional e


unprofessional) derivam da mesma base adjetival “professional” que denota algo relacionado
a uma profissão. Contudo, como ressalta autor, cada construção apresenta uma
conceitualização distinta. Na instância (1a), o adjetivo "non-professional" sugere a falta de
treinamento em uma profissão específica. A equipe não profissional é composta por membros
que não possuem formação profissional. "Non-professional" se ajusta a termos que se referem
a indivíduos que trabalham com X. No contexto de (1b), o adjetivo "unprofessional" indica
estar abaixo ou em desacordo com os padrões esperados em uma profissão específica. Para
Hamawand (2011), comportamento não profissional denota uma conduta que não atende ao
padrão esperado em uma profissão específica. A construção "Unprofessional" é aplicada a
formações que se referem a comportamento, conduta, postura, maneira, prática, entre outras.
Dentre essas duas construções, esta última precedida por “un-" possui uma conotação mais
negativa. Enquanto uma equipe “non-professional” ainda pode ser competente em seu campo,
uma equipe não-profissional é caracterizada por alguma ausência de competência.

ii) unfavourable (desfavorável) vs. disapproving (desaprovador)

Quando aplicados a raízes adjetivais comuns, os prefixos dis- e un- criam conjuntos de
adjetivos com uma carga semântica negativa. Especificamente, eles introduzem ao domínio da
54

distinção, embora representem nuances sutis de significado, como explica Hamawand (2011,
p. 110, tradução nossa)39:

O prefixo dis- descreve uma entidade como sendo desfavorável, o que significa
contrário aos interesses de alguém. Ele representa 'o oposto da qualidade indicada
pela raiz'. Demonstra uma distinção em grau médio, ou seja, situado no meio da
escala de contraste. Chama a atenção apenas para a informação necessária na
contrastação. O prefixo un- descreve uma entidade como sendo desaprovadora, o
que significa não disposta a aceitar, participar ou concordar com algo. Representa 'a
antítese do que é especificado pela raiz'. Demonstra uma distinção acima do grau
médio, ou seja, situado entre o meio e o topo na escala de contraste. Joga luz sobre
parte da informação na contrastação. Uma pesquisa dos dados mostra que palavras
negadas pelos prefixos co-ocorrem com diferentes colocações. Palavras que
começam com dis- geralmente colocalizam com substantivos referentes a pessoas ou
suas ações, enquanto palavras que começam com un- geralmente colocalizam com
substantivos referentes a pessoas ou coisas.

Para fundamentar essa análise, Hamawand (2011, p. 110) emprega como ilustração o
seguinte par de exemplos:

(2) disinterested vs. uninterested (desinteressado vs. desinteressado)

a. They need the help of some disinterested observers. (Eles precisam da ajuda de alguns
observadores desinteressados.)
b. They are completely uninterested in such questions. (Eles estão completamente
desinteressados em tais questões)

As construções em (2) têm sua origem na base adjetival "interested", que expressa o
desejo de dedicar atenção a algo e explorá-lo mais profundamente. Contudo, para Hamawand
(2011, p. 110) cada adjetivo revela uma interpretação distinta, desempenhando assim funções
específicas na linguagem. Em (1a), a construção "disinterested" denota 'imparcialidade'. Por
exemplo: Um observador desinteressado (disinterested) é alguém isento de viés ou interesse
próprio. "Disinterested" se anexa a palavras que se referem a pessoas, como assessor,
observador, investigador, participante, pesquisador, ou ações como argumento, julgamento,
39
No original: “The prefix dis- describes an entity as being unfavourable, which means opposed to one’s
interests. It means ‘the converse of the quality signified by the root’. It shows distinction in medial degree, that
is, situated in or towards the middle on the scale of contrast. It draws attention to only the necessary information
in the contrast. The prefix un- describes an entity as being dis- approving, which means unwilling to accept,
engage in or agree to something. It means ‘the antithesis of what is specified by the root’. It shows distinction
above medial degree, that is, situated between the middle and the top on the scale of contrast. It sheds light on
some of the information in the contrast. A research of the data shows that words negated by the prefixes co-
occur with different collocations. Words beginning with dis- collocate mostly with nouns referring to people or
their acts, whereas words beginning with un- collocate mostly with nouns referring to people or things.”
55

pesquisa, bolsa, especulação, entre outras. No caso de (1b), o adjetivo "uninterested" expressa
'indiferença', como: Pessoas desinteressadas (uninterested) são aquelas que não demonstram
interesse em algo ou simplesmente ignoram. Para o autor (2011, p. 110), "uninterested"
combina com palavras que se referem a pessoas, como child (criança), lady (senhora), mother
(mãe), public (público), student (estudante), ou coisas como conversa, game (jogo), idea
(ideia), problem (problema), question (pergunta), e assim por diante. Entre os dois adjetivos,
apenas "disinterested" pode coocorrer com termos positivos, como em "Ele é desinteressado
(disinterested) e honrado em sua vida pública".

iii) Action (ação) vs. state (estado)

Para Hamawand (2011, p. 114) os prefixos dis- e un- podem se associar a raízes
nominais comuns. Eles agem como antônimos no domínio da privação. No entanto, cada
prefixo possui uma função específica na linguagem:

O prefixo dis- diz respeito à ação, ao processo de realizar algo com um propósito
específico. Significa 'faltar a coisa indicada pela raiz'. Ele destaca a ação
implicitamente indicada pela raiz. O prefixo un- trata do estado, a condição que
existe em um momento específico. Significa 'desprovido do que é especificado pela
raiz'. Ele destaca o estado implicitamente indicado pela raiz. Em essência, dis- é
menos forte do que un- na expressão da negação. Uma análise dos dados mostra que
palavras negadas pelos prefixos seguem padrões diferentes de colocação. Palavras
prefixadas com dis- tendem a se adjungir com expressões de desaprovação de
declarações ou de surpresa com eventos. Em contraste, palavras prefixadas com un-
tendem a se colocalizar com expressões de falta de confiança em um sistema ou de
ceticismo em relação a uma doutrina (Hamawand, 2011, p. 114, tradução nossa)40

A fim de embasar essa análise, Hamawand (2011, p. 114) faz uso do seguinte par de
exemplos como ilustração:

(3) disbelief vs. unbelief (descrença vs. incredulidade)


a. They listened in disbelief to the extraordinary story. (Eles ouviram incrédulos a
história extraordinária)

40
No original: “The prefix dis- concerns action, the process of doing something for a particular purpose. It
means ‘lacking the thing signified by the root’. It picks out the action that is implied by the root. The prefix un-
concerns state, the condition of being that exists at a particular time. It means ‘bereft of what is specified by the
root’. It picks out the state that is implied by the root. In essence, dis- is less powerful than un- in expressing
negation. An analysis of the data shows that words negated by the prefixes pattern with different collocations.
Words prefixed by dis- tend to collocate with expressions of disapproval of statements, or of surprise at events.
By contrast, words prefixed by un- tend to collocate with expressions of lack of faith in a system or of scepticism
of a doctrine.”
56

b. The essence of unbelief lies in departing from God. (A essência da


incredulidade reside em afastar-se de Deus)

Os dois substantivos em (3) originam-se da base nominal "belief", que expressa 'o
sentimento de certeza de que algo existe ou é verdadeiro'. Apesar disso, segundo Hamawand
(2011, p. 11), cada substantivo representa uma concepção diferente e, portanto, desempenha
uma função específica na comunicação. No primeiro contexto (3a), o termo "disbelief" denota
‘ausência de crença'. Nesse contexto, a falta de crença implica na recusa em aceitar a
veracidade ou realidade de um relato/ história. A construção "disbelief" é associada a
expressões que indicam surpresa ou choque, tais como pedir/respirar/engasgar/rir/ouvir/ entre
outros. Já em (3b), o termo "unbelief", por sua vez, expressa a 'ausência de fé'. Nessa
sentença, segundo Hamawand (2011), a falta de fé implica relutância em acreditar na
veracidade de uma fé ou religião. A palavra "unbelief" é colocada em conjunto com
expressões que denotam atitude ou princípio, “como encher o coração com..., manifestar um
forte/fraco, em revelar o/em, e assim por diante” (Hamawand, 2011, p. 114). Para o autor, a
“comprovação dessa interpretação é evidenciada pelo fato de que em um contexto em que a
religião é o foco, somente o uso de "unbelief" é permitido” (Hamawand, 2011, p. 114,
tradução nossa)41.
Grosso modo, consoante Hamawand (2009, 2011), o terceiro eixo de análise
morfológica se concentra na interpretação das construções, abordando pares de palavras que
compartilham raízes similares, mas apresentam diferentes prefixos. Dentro dessa perspectiva,
conforme Hamawand (2009, p. 164) palavras negadas por prefixos não são consideradas
sinônimas, mesmo quando há uma relação morfológica. O contraste se manifesta na
conceitualização de como o usuário da língua concebe e expressa determinada circunstâncias.
Segundo o autor (2009), mesmo quando pares de palavras negativas têm bases em comum, as
suas diferenças semânticas tornam-se evidentes na conceitualização aplicada pelo falante.
Nessa fase, depreender o significado de determinada construção implica em considerar o
papel do falante em sua formação. Além disso, considerando o seu córpus de analise,
Hamawand defende que é crucial compreender que essas duas palavras são realizadas
morfologicamente de maneira diferente devido ao prefixo negativo que codifica a concepção
pretendida.

41
No original: “Evidence for this interpretation is provided by the fact that in a context where religion is in focus
only the use of unbelief is permissible”
57

2.2- Discussão e proposta de análise

Segundo Hamawand (2011, p. 257) a morfologia opera simbolicamente ao estabelecer


relações entre a forma das palavras e seus significados. Para o autor, os estudos morfológicos
desempenham um papel crucial na linguagem, visto que investigam as formações de novas
palavras e analisam os princípios que fundamentam as estruturas morfológicas. Em seu
estudo, Hamawand (2011) argumenta que há uma estreita relação entre a estrutura e o
significado de uma unidade morfológica, em que as formas são influenciadas por princípios
semânticos, resultando em uma correspondência direta entre a estrutura do significado e a
estrutura morfológica. Dentro desse contexto, o autor defende que as expressões morfológicas
são o resultado de operações cognitivas, que descrevem as capacidades mentais ou funções
cerebrais envolvidas na criação e interpretação dessas expressões, tais como categorização,
configuração e interpretação.
Como mencionado na Introdução, neste trabalho tomamos como aporte teórico-
metodológico a tríade de operações cognitivas proposta por Hamawand (2011) para analisar e
descrever as FIs com o prefixo “des-”. Contudo, frente ao exposto (subseção 2.1) é crucial
destacar algumas lacunas nesta proposta de Hamawand:

i) A proposta de Hamawand (2011) origina-se de uma investigação dos dados em


pares. Segundo o autor, o propósito dessa abordagem é destacar a conexão de um
significado distinto associado a cada palavra formada por um prefixo de negação.
Para esclarecer esses significados, são usadas expressões específicas relacionadas
aos pares, como: "hypermarket" vs. "supermarket" e "non-professional" vs.
"unprofessional". Por essa razão, o autor não se concentra em demonstrar como a
formalização das operações cognitivas poderia ser aplicada à análise de um único
prefixo.
ii) Apesar de afirmar utilizar a Linguística de Corpus em sua análise, Hamawand
(2009, 2011) não se dedica a descrever a coleta e análise de seu córpus, limitando-
se a mencionar que seus dados foram extraídos dos dicionários de língua inglesa
COBUILD (2001)42, LDOCE (2003)43 e OALD (2005)44. Além disso, o autor não
estabelece critérios detalhados que justifiquem suas definições sobre quais

42
COBUILD English Dictionary. 1998. Glasgow: HarperCollins Publishers.
43
LDOCE. 2003. Longman Dictionary of Contemporary English. Harlow:Longman
44
OALD. 2005. Oxford Advanced Learner’s Dictionary. Oxford: Oxford University Press.
58

sentidos são prototípicos e periféricos de suas análises. Com isso, fundamenta-se


exclusivamente em sua interpretação pessoal da rede semântica.
iii) Hamawand (2011), em seu percurso analítico, observa as operações cognitivas de
modo estanque. Em primeiro lugar, é feita a categorização da unidade prefixal;
posteriormente, são analisados os domínios cognitivos de vários prefixos que
pertencem a uma mesma categoria semântica, como: negativos e, numa terceira
fase, interpretam-se como os prefixos desempenham um papel crucial na decisão
sobre qual afixo usar em determinado contexto45.

Reconhecendo que operações cognitivas são inerentes à linguagem e, por


consequência, às diferentes formas nas quais se manifesta, do nível morfológico ao nível
sintático, ensejamos, com base na tríade cognitiva (categorização, configuração e
conceitualização) da MC de Hamawand (2011), evidenciar o sentido prototípico ativado pela
construção des-+base verbal no infinitivo em diferentes situações de comunicação,
especialmente aqueles observados no X/Twitter, a fim de identificar “as relações entre um
falante (ou ouvinte) e a situação que ele conceitualiza e descreve” (Langacker, 1987, p. 487).
Para tanto, propomos as seguintes modificações:

a) categorização

No que tange à categorização, Para Croft e Cruse (2004, p. 107), o ato de categorizar
constitui uma das atividades cognitivas mais básicas do ser humano 46. Esse processo é tão
rotineiro que, na maioria das vezes, os indivíduos não identificam conscientemente as
estruturas a partir das quais organizam a realidade e interagem com o mundo. Em termos
técnicos, a categorização “implica a apreensão de uma entidade individual específica ou de
algum aspecto concreto da experiência como um caso particular de outra coisa, concebida de
maneira mais abstrata e que inclui, da mesma forma, outras instâncias reais ou potenciais.”
(Croft; Cruse, 2004, p. 107)47.
De acordo com Lakoff (1987), a categorização ocorre em todos os níveis, tanto para
objetos concretos quanto para entidades abstratas. As categorias são organizadas com base nas

45
É importante salientar que Hamawand utiliza essa abordagem tanto para a derivação prefixal quanto para a
análise dos compostos. Para uma análise mais detalhada dessas aplicações, ver mais em Hamawand (2011).
46
No original:“El acto de la categorización constituye uma de las actividades cognitivas humanas más básicas”
47
No original: “La categorización implica la aprehensión de una determinada entidad individual o de algún
aspecto concredo de la experiencia en tanto caso particular de otra cosa, que se concibe de un modo más
abstracto y que abarca, asimismo, otras instanciaciones reales o potenciales”
59

características gerais das entidades que compreendem funções, propriedades, relação entre
variações e semelhanças, entre outros dos mais diversos critérios. Em virtude disso, o
agrupamento das formações em categorias tem como função aliviar a sobrecarga da nossa
capacidade de armazenamento e processamento de informações (Ferrari, 2011, p. 32). Dessa
forma, nosso sistema cognitivo pode operar de maneira eficiente, conforme expresso por
Rosch (1978, p. 2, tradução nossa) para “fornecer informações máximas com o mínimo de
esforço cognitivo”48.
Em Hamawand (2011), o autor estabelece sua rede semântica considerando as bases
verbais em que esses prefixos estão adjungidos, sem considerar o contexto de uso. Neste
estudo, ao considerarmos as novas formações com des- não aceitáveis pela literatura
morfológica (Silva; Mioto, 2009; Medeiros, 2010; Rio-Torto, 2019), defendemos a
necessidade de analisar os contextos em que foram extraídas para estabelecer a categoria
semântica principal do córpus desta pesquisa. Isso decorre do fato de entendermos que:

(...) as línguas não podem ser explicadas apenas por mecanismos formais
autossuficientes. Ao contrário, é fundamental levar em consideração os processos de
pensamento subjacentes à utilização de estruturas linguísticas e sua adequação aos
contextos reais nos quais essas estruturas são construídas (Martelotta; Palomanes,
2013, p. 179).

Desse modo, esperamos identificar o sentido nuclear ativado por essas construções.

b) Configuração

A abordagem da configuração de Hamawand (2011) em nosso trabalho para descrição


das distinções semânticas dos domínios e facetas não é viável para os objetivos deste trabalho,
uma vez que analisamos apenas o prefixo des- no contexto específico de formações
inovadoras com base verbal no infinitivo. Todavia, a teoria em si é relevante para a análise
dos domínios cognitivos de maneira mais abrangente.
Contudo, para esta abordagem, adotamos, neste trabalho, a proposta de Sweetser
(1990, p. 20-21), a qual sustenta que nossa experiência e conhecimento do mundo influenciam
a compreensão da linguagem e do pensamento, impactando, assim, nossa expressão. No

48
No original: “provide maximum information with the least cognitive effor”
60

âmbito de seu estudo, a autora identifica três possibilidades para a moldagem de nossas
expressões linguísticas, cada uma direcionando-se a um domínio específico49:

Quadro 14: Domínios cognitivos conforme Sweetser (1990)


Domínios Caracterização Exemplos (Sweetser, 1990, p.61-73)
conteúdo possui relação com o mundo físico John may go. (John pode ir.)
epistêmico possui relação com o mundo mental John may be there. (John pode estar lá.)
conversacional possui relação com os atos de fala, ordem, May I ask you Where you are going? (Posso
pedido etc te perguntar para onde você está indo?)
Fonte: o autor, 2023, adaptado de Sweetser, 1990.

Considerando o quadro acima, de acordo com Sweetser (1990), na sentença "John may
go", o falante expressa uma "obrigação, permissão ou habilidade no mundo real" (Sweetser,
1990, p.49), indicando que John tinha permissão para ir, e assim "may" está associado ao
domínio de conteúdo. No caso de "John may be there", o falante deduz a "necessidade,
probabilidade ou possibilidade" (Sweetser, 1990, p. 49) do evento, concluindo que John
poderia estar lá. Nesse contexto, "may" denota a episteme da declaração, caracterizando o
domínio epistêmico. Por fim, em "May I ask you where you are going?", é possível inferir que
o falante não está solicitando permissão, mas sim exigindo que o ouvinte o informe sobre seu
destino. Assim, a força ilocucionária dessa sentença “may” é direcional, o que, para Sweetser
(1990, p.73), expressa o domínio conversacional, ou seja, o ato de fala.
De modo geral, segundo Sweetser (1990), esses domínios não são independentes, mas
estão interligados pelo nosso sistema cognitivo, e essa conexão é estabelecida por meio da
metáfora, conforme postula a autora:

Utilizando a ideia de estruturação metafórica sistemática de um domínio (por


exemplo, o domínio epistêmico) em termos de outro (por exemplo, o domínio
sociofísico), a semântica cognitiva pode estar bem equipada para avançar na área
obscura da mudança de significado, assim como na área da estrutura semântica
sincrônica (Sweetser, 1990, p. 21, tradução nossa)50.

49
Para maiores detalhes, ver mais em Sweetser (1990).
50
No original: “Using the idea of systematic metaphorical structuring of one domain (e.g. the epistemic domain)
in terms of another (e.g. the sociophysical domain), cognitive semantics may well be equipped to make headway
in the murky area of meaning-change, as well as in the area of synchronic semantic structure (Sweetser,
1990:21).”
61

Adotando essa visão de estruturação metafórica mútua de domínios, Sweetser afirma


que os caminhos da mudança semântica são multidirecionais. Eles podem seguir de um
domínio fonte (concreto) para um domínio alvo (abstrato), ou em outra direção; do domínio
externo (sociofísico) para o domínio interno (emocional, psicológico). No contexto de verbos
de percepção, escolhidos por Sweetser para análise, essas correspondências metafóricas
ocorrem entre o vocabulário da percepção física (domínio fonte externo) e o vocabulário do eu
interno e das sensações (domínio alvo interno). A autora (1990) estabelece as seguintes
correlações relacionadas aos caminhos de mudança semântica no caso de verbos de
percepção51: Visão > Conhecimento; Audição > Atenção > Obedecer; Paladar > preferências/
desgosto; Toque > Sentimentos; Olfato > Sentimentos agradáveis e desagradáveis.
Sweetser (1990, p. 39) argumenta que, neste exemplo, a percepção visual não está
apenas ligada à experiência ou percepção geral, mas também às capacidades mentais
abrangentes. A metáfora entre visão e intelecto é altamente produtiva no inglês moderno. Vale
notar que, assim como um objeto físico pode ser opaco ou transparente, um argumento ou
proposição pode ser claro, opaco, transparente, confuso ou obscuro para nossa visão mental.
Conforme a autora (1990, p. 45), tais metáforas conceituais de grande escala são de extrema
importância tanto para análises semânticas sincrônicas quanto diacrônicas. Dessa forma, por
meio de uma investigação histórica dos caminhos de mudança semântica, é possível
esclarecer conexões semânticas sincrônicas entre diferentes domínios lexicais.
Grosso modo, os domínios conceptuais são bases estáveis de conhecimento que
quando recrutados nos discursos fundamentam os espaços mentais.
Os espaços mentais (EM) são estruturas cognitivas em constante alteração, formadas
dinamicamente durante o discurso e armazenadas na memória de curso prazo dos falantes.
Consoante Ferrari (2011, p. 109):

espaços são domínios conceptuais que contêm representações parciais de entidades e


relações em um cenário percebido, imaginado ou lembrado. Assim, o espaço que
ancora o discurso na situação comunicativa imediata (falante, ouvinte(s), lugar e
momento da enunciação) é a BASE. A partir da BASE, outros espaços são
normalmente criados para alocar informações que extrapolam o contexto imediato:
falamos de passado e do futuro, de lugares distantes, de hipóteses, de arte e literatura
e também de cenários que só existem em nossa imaginação.

Portanto, os espaços contêm elementos que podem ser direcionados para a criação de
novos espaços. Consequentemente, cada novo espaço aberto herda a estrutura do espaço
anterior. De acordo com Ferrari (2009), no exemplo "No ano que vem, Maria vai viajar para
51
Ver mais em Sweetser (1990).
62

Londres", o sintagma "no ano que vem" estabelece um espaço temporal a partir do espaço
base (B), considerado a âncora discursiva. Dentro de (B), o elemento "Maria" é projetado no
espaço temporal (T). Este espaço futuro (T), por sua vez, introduz um novo elemento,
"Londres", ao mesmo tempo que herda os elementos e a estrutura do espaço anterior. Assim,
no espaço (T), a relação de "viajar" é estabelecida entre o sujeito "Maria", herdado de (B), e o
local "Londres".
Os EM gerados dessa forma são classificados parcialmente por uma relação
hierárquica. Por exemplo, um novo espaço (M)', é sempre estabelecido em conexão com um
espaço existente M que está em destaque. Portanto, (M) é denominado o espaço "pai" de (M)',
e a relação hierárquica é ilustrada por uma linha tracejada, conforme visto na figura 4:

Figura 4: Relação de subordinação entre EM

Fonte: extraído de Velozo (2015, p. 30)

Na concepção discursiva, como destaca Velozo (2015, p. 30-31), os espaços


desenvolvidos são organizados de forma parcialmente estruturada. Em um estágio específico
do discurso, um desses espaços atua como a base para o processo cognitivo, enquanto outro,
possivelmente o mesmo, se destaca como o foco central. A construção do próximo estágio
pode ser iniciada em relação ao espaço base ou ao espaço foco. Consequentemente, à medida
que novos espaços são moldados, os pontos de vista e focos dos participantes do discurso se
ajustam, embora o espaço base permaneça acessível em qualquer ponto da construção da rede
de espaços mentais, possivelmente servindo como ponto de partida para outra construção.
Ainda, conforme pontua Velozo (2015, p. 30):

Os espaços mentais são internamente estruturados por frames e modelos cognitivos e


externamente ligados por conectores, que relacionam elementos e, mais comumente,
estruturas através dos espaços. Além disso, novos elementos podem ser adicionados
a um espaço por expressões linguísticas ou por condições pragmáticas.
63

No que diz respeito às expressões linguísticas, Fauconnier (1997) postula que elas não
representam ou codificam as construções complexas necessárias para que o ato comunicativo
ocorra. Para autor, as expressões são instruções para construir configurações cognitivas
estruturadas e interconectadas, que se desenvolvem à medida que o discurso acontece.

Uma expressão linguística não possui um significado em si mesma; ao invés disso,


ela possui um potencial de significado, e é somente dentro de um discurso completo
e em contexto que o significado será de fato produzido. O desenrolar do discurso
traz à tona construções cognitivas complexas. Elas incluem o estabelecimento de
domínios internamente estruturados conectados entre si por conectores; isso é
realizado com base em pistas linguísticas, contextuais e situacionais. Pistas
gramaticais, embora cruciais para o processo de construção, por si só são
insuficientes para determiná-lo." (Fauconnier, 1997, p. 37-38, tradução nossa)52.

Isto posto, entende-se que as expressões linguísticas transmitem informações para a


construções de EM que, por sua vez, envolve uma multiplicidade de funções, como defende
Faucounnier (1997, xxiii apud Azevedo, 2006, p. 33-34):

- informação referente a quais novos espaços estão sendo estabelecidos, tipicamente


expressa por meio dos construtores de espaço;
- dicas de que espaço está em foco no momento, qual é sua conexão com a base, e
quão acessível está; essa informação é tipicamente expressa por meio de tempos e
modos gramaticais;
- descrições que introduzem novos elementos (e possivelmente suas contrapartes)
aos espaços;
-descrições ou anáforas ou nomes que identifiquem elementos existentes (e
possivelmente suas contrapartes);
- informação sintática que tipicamente estabelece esquemas de nível geral e frames;
-informação lexical que conecta elementos dos espaços mentais aos frames e
modelos cognitivos do conhecimento prévio; essa informação estrutura os espaços
internamente, beneficiando-se dos esquemas prévios pré-estruturados disponíveis.
Tais esquemas podem, no entanto, ser alterados ou elaborados dentro das
construções em andamento;
- marcações de pressuposição que permitem algo da estrutura ser propagado
instantaneamente através da configuração de espaço;
- informação retórica e pragmática, transmitida por palavras como even, but,
already, que tipicamente sinalizam escalas implícitas para raciocínio e
argumentação.

52
No original: “A language expression does not have a meaning in itself; rather, it has a meaning potential, and
it is only within a complete discourse and in context that meaning will be actually be produced. The unfolding of
discourse brings into play complex cognitive constructions. They include the setting up of internally structured
domains linked to each other by connectors; this is effected on the basis of linguistic, contextual and situational
clues. Grammatical clues, although crucial to the building process, are in themselves insufficient to determine
it.”
64

Nessa abordagem, para que os participantes da interação discursiva consigam navegar


pelo intricado conjunto de EM e utilizem a segmentação das informações para fazer
inferências apropriadas, três conceitos dinâmicos são essenciais: BASE, um espaço que serve
como ponto inicial para construir a rede, ao qual é sempre possível retornar; PONTO DE
VISTA, um espaço que é usado para acessar e estruturar outros espaços ou construí-los; e
FOCO, um espaço estruturado no momento presente, no qual a atenção está concentrada.
Contudo, como ressalta Velozo (2015, p. 31), é importante considerar que BASE, PONTO DE
VISTA e FOCO não precisam ser claramente distintos e, muitas vezes, não o são. Logo, é
possível “observar o mesmo espaço atuando como ponto de vista e foco, ou base e foco, ou
base e ponto de vista, ou todos os três.” (Velozo, 2015, p. 31).
Com o intuito de elucidar como a rede de EM é construída durante a progressão do
discurso, consideremos o seguinte exemplo de Fauconnier (1997) acerca do conector but
(mas) no contexto: “Achilles vê uma tartaruga. Ele a persegue. Ele acha que a tartaruga é
lenta e que pode pegá-la. Mas ela é rápida. Se a tartaruga fosse lenta, Achilles a pegaria.
Talvez a tartaruga seja, na verdade, uma lebre.” (Fauconnier, 1997, p. 44).53
Para representação do processo cognitivo dessa declaração, enfatizando o poder dos
espaços bases e a dependência das redes de EM dentro desses quadros bases, Fauconnier
(1997, p. 48) delineia o seguinte contexto acera do exemplo de Achilles e a tartaruga.
Vejamos:

53
No original: “Achilles sees a tortoise. He chases it. He thinks that the tortoise is slow and that he will catch it.
But it is fast. If the tortoise had been slow, Achilles would have caught it. Maybe the tortoise is really a hare”.
65

Figura 5: Conceptualização do exemplo Achilles e a tartaruga

Fonte: extraído e adaptado de Fauconnier (1997, p. 48)

Como mostrado na figura (5), B é o espaço-base onde são introduzidos os elementos a


(Achilles) e b (tartaruga). Esse espaço contém também as informações a vê b e a persegue b.
O verbo “pensar”, nesse contexto, estabelece o espaço da crença M, no qual o elemento b é
projetado da característica lento b”. Com base nas informações deste domínio, surge o espaço
futuro W onde a” apanha b”. Não obstante, o conector “mas (but)” no texto é o responsável
por romper todo o padrão previamente estabelecido, levando a leitura de volta ao espaço-base
B, adicionando a informação de que b é rápido. A partir, novamente, deste espaço é
instaurado o espaço hipotético H, por meio do uso de um construtor contrafactual, no qual a1
apanha b1, no espaço hipotético contrafactual [lenta b1]. Nesse caso, o modo condicional (se)
é um sinal gramatical de que o espaço contrafactual está em foco da sentença. Por fim, de
volta ao espaço-base B, o elemento b serve como gatilho para a projeção b2 como sendo uma
lebre no espaço de possibilidade P, acionado pelo advérbio modal “talvez”.
66

Consequentemente, com base na figura 5, observa-se que uma frase na linguagem


natural é cognitivamente intrincada, pois abrange informações e estabelece diretrizes para
todos esses variados níveis. Assim, o tipo de significado que emerge no momento depende da
configuração do espaço mental que é formado pelo discurso anterior, ao qual a sentença atual
se refere54.
Na esteira dessas postulações, com o objetivo de analisar e descrever as operações
cognitivas ativadas pelas formações inovadoras com des-, tomaremos como proposta analítica
dois procedimentos. Em um primeiro momento, tomando como referência Sweetser (1990),
procuramos identificar os domínios cognitivos prototípicos evocados por essas formações
inovadoras nos contextos em que são empregadas, ou seja, em seus contextos reais de uso.
Posteriormente, utilizando o conceito de espaços mentais, buscamos evidenciar quais espaços
mentais gerais os contextos dessa pesquisa evocam. Para tanto, pretendemos determinar se
essas construções, de maneira geral, ativam espaços factuais, contrafactuais ou hipotéticos.
Consoante Qin (2013), para compreender e identificar o sentido contrafactual, se faz
crucial formular a seguinte questão: “como as pessoas identificam se o significado de uma
condição é verdadeiro ou falso?” (Qin, 2013, p. 755, tradução nossa)55. Segundo Lewins
(1973, p. 94), as condições de verdade são examinadas por meio da semântica dos mundos
possíveis. Para o autor, a contrafactualidade é descrita como uma declaração que descreve
como os eventos se desenrolam em outras realidades possíveis que seguem as mesmas leis
naturais.
Para além de uma abordagem lógico-semântica, a LC, através da teoria dos EM, busca
entender como esse espaço é estruturado. Segundo Fauconnier (1994, p. 109, tradução
nossa)56, “[t]radicionalmente, contrafactualidades como ‘Se os homens tivessem asas, eles
voariam’ são vistas como casos de argumentos possivelmente válidos de premissas que são
falsas na realidade.” Para o autor, o contrafactual “constrói uma situação imaginária que
difere da real em uma circunstância fundamental, expressa na parte antecedente (A, prótase)
da construção Se A, então B.” (Fauconnier, 1996, p. 58, tradução nossa)57. Desse modo,
acionar um espaço mental contrafactual consiste em formular suposições a respeito de um
universo alternativo que difere do mundo real. Dessa forma, segundo Fauconnier (1994), a
54
É importante ressaltar que a teoria dos Espaços mentais não consiste em uma representação fixa, imutável.
Pelo contrário, ela se torna mais elaborada à medida que o discurso se desenrola dentro desse modelo.
55
“In understanding and indicating the meaning of counterfactuality, a question must be asked in advance: how
do human beings determine whether the meaning of a condition is true or false?”
56
No original: “Traditionally, counterfactuals like ‘If men had wings, they would fly’ are viewed as cases of
possibly valid reasoning from premises that are false in actuality”
57
No original: “[…] a counterfactual sets up an imaginary situation which differs from the actual one in one
fundamental respect, expressed in the antecedent part (A, the protasis) of the if A then B construciton.”
67

criação desse EM contrafactual opera da seguinte maneira: um espaço M1 é considerado


incompatível com outro espaço M2 quando uma relação explicitamente definida em M1 não é
cumprida pelos elementos correspondentes de M2. Consequentemente, surge um conflito entre
M1 e M2 devido à existência dessa incompatibilidade. Em outras palavras, a
contrafactualidade “apresenta um espaço sendo configurado contradizendo diretamente uma
realidade que é conhecida e que não pode ser alterada” (Dancygier; Sweetser, 2005, p. 76,
tradução nossa)58.
No que tange aos espaços factuais e hipotéticos, entendemos que ambos representam
dois domínios distintos na cognição humana. O espaço mental factual é onde armazenamos e
processamos informações correspondentes à realidade observável e vivenciada (Hengeveld;
Mackenzie, 2008), ou seja, verdadeiros em relação ao mundo real. Aqui, organizamos nossas
experiências, memórias e conhecimentos atuais, permitindo-nos compreender o mundo como
ele é. Em contraste, o espaço mental hipotético ou não-factual é o repositório das
possibilidades imaginadas, dos "e se" e das conjecturas sobre realidades alternativas. Neste
espaço, exploramos cenários imaginários, teorizamos sobre alternativas não vivenciadas e
desenvolvemos ideias baseadas em suposições.
Por fim, dado os objetivos do nosso trabalho, acreditamos que o mapeamento dos
domínios conceptuais e dos espaços mentais gerais das formações inovadoras com des-
podem fornecer evidências de como esse prefixo se comporta na atual sincronia do PB.

c) Conceitualização

Como mencionado anteriormente, Hamawand (2021) destaca a natureza multifacetada do


fenômeno da interpretação (ou conceitualização), que envolve diversas dimensões. Essas
dimensões refletem as habilidades cognitivas fundamentais dos seres humanos e abarcam os
aspectos experienciais do significado. Partindo da ideia de que a interpretação se trata da
"relação entre um falante (ou ouvinte) e uma situação que ele conceitua e retrata" (Langacker,
1987, p. 487, tradução nossa)59, Hamawand argumenta que, ao descrever uma situação, o
falante seleciona uma dimensão específica entre várias alternativas disponíveis para estruturar
o conteúdo. Ainda, o autor (2021) destaca que várias dimensões de interpretação podem estar

58
No original: “It presents the space being set up as directly contradiciting a reality that is known and cannot be
changed.”
59
No original: “the relationship between a speaker (or hearer) and a situation that he conceptualises and
portrays”.
68

envolvidas no significado de uma única expressão linguística. Isso ocorre porque o falante
possui a capacidade de interpretar uma situação de várias maneiras distintas.
Quando se trata da aplicação dessa formulação para a derivação prefixal, Hamawand
(2011, p. 108) argumenta que os prefixos, tanto positivos quanto negativos, possuem a
capacidade de se ligar à mesma raiz, criando assim um par de palavras semanticamente
distintas. Para o autor (2011), a escolha de anexar um prefixo específico à raiz de uma palavra
não está limitada apenas ao conteúdo conceitual, mas também à interpretação e codificação
desse significado. Ainda, segundo Hamawand (2009, 2011 e 2021), uma dimensão crucial da
conceitualização é a perspectiva, que se refere ao ponto de vista imposto em uma cena,
variando conforme a intenção do falante ou as demandas do discurso. A raiz, a qual o prefixo
se anexa, abarca um conteúdo conceitual com diversos significados, e cada termo derivado do
par de palavras representa uma experiência única do falante, moldando sua forma morfológica
por meio de um prefixo específico. Como resultado, “a palavra derivada possui um
significado distinto, com o qual o prefixo anexado contribui.” (Hamawand, 2011, p. 108,
tradução nossa)60.
Neste trabalho, a abordagem conceitual proposta por Hamawand (2011)61 não se
alinha ao escopo do nosso estudo. Isso se deve ao foco exclusivo de nossa análise nas
construções com o prefixo "des-", sem realizar uma comparação entre diferentes prefixos
anexados à mesma raiz, como evidenciado na comparação entre "emigrar" e "imigrar". Além
disso, não abordamos a comparação da conceitualização das construções convencionais com o
prefixo "des-", ou seja, as formações reconhecidas pela literatura morfológica, como um
método para avaliar as nuances na perspectiva conceitual. Adicionalmente, uma limitação em
nossa coleta de dados (capítulo 3) foi a coleta de apenas uma sequência discursiva para cada
construção.
Considerando que “diferentes falantes de um mesmo idioma podem possuir estruturas
mentais diversas sem pressupor uma análise única 'correta'” (Hudson, 2018, p. 87) e
reconhecendo que os “tempos e modos verbais não estabelecem espaços, mas podem dar
pistas sobre os espaços aos quais as proposições estão se referindo” (Scamparini, 2006, p. 20),
nossa proposta é analisar as projeções temporais (passado, presente e futuro) ativadas pelas
construções selecionadas neste estudo, no contexto em que são empregadas. Dessa forma,

60
No original: “The derived word has its own distinct meaning, which is contributed partly by the attached
prefix.”
61
Ver subseção 2.1.1.4
69

tomando como base a seleção de dados dessa pesquisa, buscamos os espaços temporais mais
prototípicos que o prefixo des- pode assumir.
No capítulo “Caminhos metodológicos”, apresentam-se os procedimentos teórico-
metodológicos que serão adotados/ aplicados para análise do nosso córpus.
70

3 PERCURSOS METODOLÓGICOS

Neste capítulo, abordo os métodos utilizados para analisar as construções inovadoras


de base verbal no infinitivo. Para tal propósito, delineio o seguinte percurso: começo por
definir a natureza da pesquisa (3.1); em seguida, exploro a perspectiva cartográfica como
ponto de partida (3.2); também examino a plataforma X/Twitter e sua relevância como mídia
digital (3.3); posteriormente, detalho os procedimentos de coleta de dados (3.4); apresento a
distribuição do córpus conforme a categoria de sua base (3.5), por último, descrevo os
objetivos e perguntas de pesquisa (3.6).

3.1 A natureza da pesquisa

De acordo com Denzin e Lincoln (2006), na década de 1990, surgiu uma fase pós-
moderna e pós-estrutural na pesquisa qualitativa, marcada por diversas maneiras de retratar o
"outro". Nesse período, o foco estava em observar o "outro" em seu ambiente natural e
compreender os fenômenos conforme as interpretações atribuídas pelas pessoas (Denzin;
Lincoln, 2006). Atualmente, a pesquisa qualitativa abraça a interdisciplinaridade entre as
ciências humanas e sociais, buscando extrair significados do diálogo entre pesquisadores e
objetos de estudo dentro de um contexto (Chizzotti, 2003).
Essa abordagem considera a relação entre o pesquisador e o objeto, junto com as
circunstâncias que moldam a investigação, concentrando-se na formação da experiência social
com uma análise minuciosa da realidade. Portanto, entende-se que a pesquisa qualitativa
engloba os cenários experienciais, nos quais se entrelaçam crenças, ações e culturas (Denzin;
Lincoln, 2006).
Essa perspectiva está em sintonia com os princípios fundamentais da LC, que
fundamentam este estudo, concebendo a linguagem como pensamento e significado
(Geeraerts, 2006). Reconhecendo que o significado é perspectivado, dinâmico e se manifesta
na linguagem, entende-se que ele se constrói por meio do uso e das experiências humanas.
Esse processo envolve o conhecimento do mundo, que está interligado com outras habilidades
cognitivas, como a categorização e a integração de conceitos (Ferrari, 2014).
71

Isto posto, considero esta investigação de natureza dedutiva e qualitativa, visto que o
processo de produção e análise dos dados envolve a minha participação. Parto da premissa
que o próprio objeto não é dado a priori, mas sim ao longo da pesquisa é que ele vai sendo
construído (Rettich, 2018, p. 87). Nesse ponto, para Passos e Barros (2015, p. 30)62:

Defender que toda pesquisa é intervenção exige do cartógrafo um mergulho no


plano da experiência, lá onde conhecer e fazer se tornam inseparáveis, impedindo
qualquer pretensão à neutralidade ou mesmo suposição de um sujeito e de um objeto
cognoscentes prévios à relação que os liga.

Assim, com base nessa perspectiva, como caminho metodológico da minha


dissertação, partirei do meu ponto de vista sobre os dados, uma vez que compreendi que não
terei como me distanciar do córpus que produzi, não tenho como estar imune nesse processo
(Passos; Eirado, 2015, p. 129)63.
Dentro dessa linha de raciocínio, este estudo tem uma natureza descritiva, já que seu
propósito é detalhar como os dados são constituídos e o seu papel no contexto social em que
são utilizados. Adotamos uma abordagem dedutiva, de natureza qualiquantiativa, para analisar
o comportamento dos dados.

3.2 Objetivos de pesquisa e hipótese

Conforme mencionado na introdução, este trabalho tem como objetivo analisar e


descrever o comportamento morfossemântico do prefixo des- em formações consideradas
inovadoras de base verbal no infinitivo. Soma-se ainda:
a) apresentar uma visão ampla do comportamento morfossemântico das FIs de base
verbal no infinitivo na atual sincronia do PB;
b) mapear operações cognitivas ativadas por essas construções em seu contexto real
de uso e evidenciar o sentido prototípico ativado pelas construções do nosso
córpus.
c) verificar a aplicabilidade da reformulação da proposta teórica-metodológica de
Hamawand (2011) em nosso córpus.

62
Pista 1: A cartografia como método de pesquisa-intervenção (Pistas do Método da Cartografia - Vol. I).
63
Pista 6: Cartografia como dissolução do ponto de vista do observador (Pistas do Método da Cartografia - Vol.
I).
72

No âmbito desta pesquisa, consideramos a hipótese que as construções consideradas


irregulares na literatura morfológica (chamaremos de formações inovadoras) podem ser
consideradas aceitáveis em função de seu significado de reversão já ter sido internalizado
como uma construção, o esquema [des- + base verbal] REVERSÃO, o que faz dele
compreensível/ acessível.

3.3- O início de tudo: uma perspectiva cartográfica

De acordo com Passos e Barros (2009, p. 17), a cartografia é um “método de pesquisa-


intervenção que pressupõe uma orientação do trabalho do pesquisador que não se faz de modo
prescritivo, por regras já prontas, nem com objetivos previamente estabelecidos”; ela está
ligada ao “acompanhamento de processos inventivos e de produção de subjetividades”
(Kastrup; Barros, 2009, p. 56), à transversalidade, à implicação e à “dissolução do ponto de
vista do observador” (Passos; Eirado, 2009, p. 109)
Nessa direção,

O caminho do cartógrafo se faz ao se caminhar, ao seguir e acompanhar os percursos e as


implicações nos processos de produção e conexão de redes e rizomas. Foi no curso da
caminhada e do caminho que se buscou traçar pistas que pudessem descrever,
problematizar, discutir e, sobretudo, coletivizar a experiência e os sentidos produzidos
pelo(a) cartógrafo(fia) (Guedes, 2014, p. 26)

Partindo dessas premissas, permito-me relatar o meu “caminhar cambaleante e


cambiante” (Scherer; Grisc, 2022, p. 4). Para realizar esse processo, valendo-me da
experimentação cartográfica, necessito da dissolução do ponto de vista do observador. Neste
momento de escrita reflexiva sobre si, recorro ao conceito de transversalidade, visto que,
nesta subseção, não tenho a preocupação de escrever esse relato em primeira pessoa ou
terceira pessoa do discurso, mas sim relatar as observações desse pesquisador que está
emergindo dentre elas. Nesse viés:

a posição paradoxal do cartógrafo corresponde à possibilidade de habitar a experiência sem


estar amarrado a nenhum ponto de vista e, por isso, sua tarefa principal é dissolver o ponto
de vista do observador sem, no entanto, anular a observação (Passos; Eirado, 2009, p. 13).

Em maio de 2018, após concluir o bacharelado em Letras – Português/Francês na


UERJ, decidi realizar uma pausa para descansar da graduação e refletir sobre qual caminho
deveria traçar no mestrado. Já havia decidido, por meio de escolhas pessoais, que pesquisaria
73

algo envolvendo morfologia e LC, mas não havia definido o meu objeto de estudo. Ora
pensava em estudar processos composicionais de formação de palavras, ora analisar derivação
sufixal. Entretanto, estava sempre sensível às formações de palavras produzidas pelos
usuários da língua, mas sem estar concentrado/focado em encontrar algo específico ou
urgente.
Do ponto de vista cartográfico, esse processo de atenção flutuante 64, conforme Freud
(1912, 1969 apud Kastrup, 2009), não consiste em “dirigir a atenção para algo específico”,
mas manter a atenção “uniformemente suspensa”. A respeito dessa função para Freud, como
explica Kastrup (2009, p. 35-36)65:

a atenção consciente, voluntária e concentrada, é o grande obstáculo à descoberta. Por outro


lado, recomenda a utilização de uma atenção onde a seleção se encontra inicialmente
suspensa, cuja definição é ‘prestar igual atenção a tudo’. Essa atenção aberta, sem
focalização específica, permite a captação não apenas dos elementos que formam um texto
coerente e à disposição da consciência do analista, mas também do material ‘desconexo e
em desordem caótica’

Nessa diretriz, Kastrup (2009, p. 42) compara a atenção do cartógrafo a uma antena
parabólica, pois ele “realiza uma exploração assistemática do terreno, com movimentos mais
ou menos aleatórios de passe e repasse, sem grande preocupação com possíveis redundâncias.
Tudo caminha até que a atenção, numa atitude de ativa receptividade, é tocada por algo.” 66.
Assim, nesse processo, notei um aumento das novas formações com des- nas redes sociais
(X/Twitter, Instagram/ WhatsApp, Facebook entre outras) das FIs com des-, como desver,
descoronar, desvacinar, desbolsonarizar e fiquei interessado em analisar esse formativo.
Com isso em mente, realizei um levantamento bibliográfico sobre como o prefixo des-
é analisado do ponto de vista da gramática histórica (GH) e da literatura morfológica, como
apresentado na subseção 1.3. Em seguida, comecei a procurar na seção de busca lexical do
X/Twitter os exemplos que Silva; Mioto (2009), Medeiros (2010) e Oliveira (2004, 2008)
apresentavam nas restrições morfossemânticas do formativo des-. Ao posso que encontrava
mais de uma construção nessa rede social, surgiu a seguinte questão: se os usuários das redes

64
Conforme Kastrup (2007, p. 16, grifo meu) “a atenção flutuante é a regra técnica que, do lado do analista,
corresponde à regra de associação livre da parte do analisando, permitindo a comunicação de inconsciente a
inconsciente (Laplanche; Pontalis, 1976). O uso da atenção flutuante significa que, durante a sessão, a atenção
do analista fica aparentemente adormecida, até que subitamente emerge no discurso do analisando a fala
inusitada do inconsciente.”
65
Pista 2: O Funcionamento do trabalho do cartógrafo (Pistas do Método da Cartografia - Vol. I).
66
Pista 2: O Funcionamento do trabalho do cartógrafo (Pistas do Método da Cartografia - Vol. I).
74

sociais estavam produzindo essas formações com des-, por que ignorar essas informações e
caracterizá-las como não viáveis?67
Assim, partindo do pressuposto de que “diferentes falantes de um mesmo idioma
podem ter diferentes estruturas mentais não supondo que haja uma única análise `correta´
(Hudson, 2018, p. 87) e que a utilização das distintas estratégias de formação de palavras é tão
natural que o falante quase não se dá conta de que várias palavras “não estavam disponíveis
para o uso e foram formadas por nós mesmos, exatamente na hora em que a necessidade
apareceu” (Basílio, 1987, p. 5), decidi realizar o levantamento dessas formações. Contudo,
tendo em mente que diferentes mídias digitais possuem padrões comunicacionais distintos,
decidi concentrar a minha pesquisa em uma das plataformas digitais mais acessíveis do ponto
de vista interacional: o X/Twitter.

3.4- O X/Twitter: observações sobre a plataforma

O termo mídia, tradicionalmente, pode ser definido como “o conjunto dos meios de
comunicação” (Erbolato, 1985). Historicamente, esse conceito faz referências à televisão,
rádios, veículos impressos, entre outros; ou seja, ao grupo “responsável por fazer circular
informações a um grande número de pessoas” (Carneiro, 2019, p. 195). Contudo, atualmente,
essa palavra pode ser entendida como “todo suporte de difusão da informação que constitui
um meio intermediário de expressão capaz de transmitir mensagens” (Daroda, 2012, p. 84).
Tal acepção, mais profunda, se deve à revolução tecnológica – o advento da Internet - que
permitiu a formação de outros espaços de comunicação, as chamadas mídias digitais 68, como
por exemplo, o X/Twitter.
Fundado em 2006 por Jack Dorsey, Evan Williams, Noah Glass e Biz Stone, o
X/Twitter, pode ser definido como um serviço de rede social colaborativa e de informação on-
line. Em termos de funcionamento, é uma plataforma de microblogging69que permite a
publicação de mensagens curtas - os chamados “tuítes” (tweets, no original) - além de

67
Um questionamento possível, após a leitura dos estudos de Oliveira (2009), Silva e Mioto (2009), Medeiros
(2010) consiste que à época em que tais trabalhos foram feitos, muito provavelmente essas formações não
existiam, logo eram definidas como agramaticais. Contudo, os estudos de Dolinski (1993) e Santos (2016) já
apresentavam formações consideradas não aceitáveis por esses autores em uso corrente na língua.
68
Consoante Daroda (2012, p. 84), “O termo mídia digital pode ser definido como o conjunto de veículos e
aparelhos de comunicação baseados em tecnologias digitais, ou seja, que permitem a comunicação digital, entre
eles, o computador, o celular, mídias interativas, etc”.
69
De acordo com Zago (2008, p. 70), “Em uma definição sucinta, uma ferramenta de microblogging seria uma
mistura de blog com rede social e mensagens instantâneas”.
75

diversas outras funcionalidades (resposta, retweet (retuíte), hashtags, entre outros) que
possibilitam a interação dos usuários adeptos à plataforma de forma instantânea e dinâmica.
Devido a essas funções de criação, o Twitter/X se tornou um importante lugar de circulação e
disseminação de discursos, visto que o dia-a-dia de diversos sujeitos passou a ser
compartilhado na rede social com o objetivo de relatar experiências pessoais, trocar e divulgar
informações, estabelecer ou não laços afetivos e tecer seus posicionamentos políticos
(Moreira; Romão, 2011).
Para Murthy (2013), o Twitter (atual plataforma X) surgiu como uma das mais
acessíveis plataformas sociais, haja vista que ela se beneficia da necessidade humana de
organização social e dos avanços tecnológicos que propiciam a facilidade comunicacional
entre os seus usuários, independentemente de restrições. A sua estrutura simples e ao mesmo
tempo robusta tem encorajado milhões de pessoas em todo mundo a usá-lo. Tal fato
aumentou, de modo exponencial, a capacidade dos sujeitos-tuiteiros de se envolverem em
conversas não limitadas pela classe social, pelo espaço físico do mundo e/ou do tempo. Essa
possibilidade o configura como uma das principais ferramentas de ‘disseminação social’ de
informações on-line (Rieder; Smyrnaios, 2012).
Com isso, face à invisibilidade que a mídia tradicional pode criar, o X/Twitter
possibilita que o usuário dessa rede digital tenha certa visibilidade em produzir, procurar e
selecionar dados/informações sem passar por filtros jornalísticos e midiáticos que seguem
certas orientações editoriais e ideológicas. Contudo, cabe ressaltar que, há muito tempo,
existem cartas de leitores ou trocas telefônicas entre a mídia e seus "usuários-consumidores"
(Moreira; Romão, 2011, p. 82). Todavia, as mídias digitais, como o X/Twitter, facilitaram o
ato de se expressar, o que tornou muito mais difícil para qualquer empresa de mídia
tradicional direcionar a opinião de algum usuário da Internet, visto que ele pode comentar
sobre algo “sem a necessidade ou expectativa de resposta” (Shirakashi, 2007 apud Lemos,
2008, p. 2)
Fato é que a coleta, a produção e a disseminação de informações foram profundamente
transformadas pelo advento das tecnologias digitais. Essa recente realidade, também chamada
de “autocomunicação de massas” (Castells, 2009, p. 88), põe nas mãos dos usuários do
X/Twitter - através do tuíte - “o poder de transmitir e apropriar-se da informação de maneira
nunca antes ocorrida na história” (Alves, 2011, p. 103). Contudo, é importante pontuar que o
digital:
76

produz um novo tipo de relação entre o sujeito e o social, uma nova relação das
práticas políticas e discursivas que não são da ordem da banalidade. É preciso
compreendê-las para além do utilitário dos sistemas aplicativos que facilitam a vida,
a circulação dos dizeres e armazenamento das memórias (Dias, 2018, p. 170).

No que concerne ao discurso digital, pautamo-nos na reflexão proposta por Dias (2018,
2019), que argumenta em favor de uma reflexão em função de sua circulação, antes mesmo da
análise de sua constituição ou formulação. Segundo a autora, a circulação é vista como o
“ângulo de entrada” para a compreensão dos processos de produção discursiva, já que entende
que:
[...] é pela circulação (compartilhamento, viralização, comentários, postagens,
hashtags, memes, links...) que o digital se formula e se constitui. De outro modo,
diríamos que o discurso digital se formula ao circular. E isso faz diferença na
produção de sentidos. Um sentido que se produz no efêmero, no agora. E essa
mudança na ordem não quer estabelecer uma relação de anterioridade de um
momento em relação ao outro, mas de perspectiva. É esse modo de existência dos
discursos que se impõe ao pensarmos sua constituição (Dias, 2018, p. 29).

Sobre os elementos que compõe o tuíte, Paveau (2021, p. 370) argumenta que o tuíte
não se limita aos aspectos linguísticos, visto que ele explora diversas outras categorias como
tecnolinguageiras, icônicas e tecnográficas, por exemplo:

i) foto de perfil;
ii) nome ou pseudônimo do usuário;
iii) data do tuíte, relativa ou absoluta;
iv) lista de operações possíveis representadas por ícones (responder, retuitar, curtir) e,
v) botão com seta para mais opções (copiar link, incorporar tuíte, bloquear entre outros).

Frente ao exposto, entendo que o tuíte “se tornou uma unidade de informação [...]
muito comum, conhecida e reconhecida”, já pertencente “ao repertório discursivo geral das
nossas sociedades” (Paveau, 2021, p. 382), se consolidando, portanto, como um modo eficaz
de produção e reprodução “político-ideológica do discurso” (Dias, 2018, p. 28). Por essa
razão, os dados dessa pesquisa foram extraídos apenas dessa mídia digital.
Abaixo, apresento os procedimentos utilizados para a coleta dos dados desta pesquisa.
77

3.4- Procedimentos metodológicos de coleta, categorização e seleção de dados

A coleta do córpus aconteceu entre os dias 17 de janeiro de 2021 a 01 de junho de


2023. Esse levantamento ocorreu de três maneiras: uma sem sistematicidade e as outras duas
orientadas. A primeira coleta aconteceu de modo espontâneo à medida que o pesquisador
interagia com a própria mídia digital ao acompanhar as conversas em geral. As outras duas
ocorreram de forma sistemática e realizadas através da ferramenta de busca lexical
disponibilizada pelo X/Twitter. Nessa fase, realizaram-se os seguintes procedimentos:

i) um levantamento de todas as formações consideradas não aceitáveis ou


agramaticais por Silva e Mioto (2009) e Medeiros (2010); e
ii) digitaram-se as palavras-chave: “des-” ou “#des-”.

Cabe ressaltar que, conforme as postagens apareciam/ eram apresentadas na seção de


busca, selecionaram-se:

i) construções realizadas entre os dias 21 de março de 2006 (data de inauguração


do X/Twitter) a 01 de junho de 2023;
ii) construções em que o contexto e/ou definição pudessem ser inferidos sem o
auxílio de imagem e/ou vídeo;
iii) construções que não fossem coletadas como anteriormente, por exemplo: se a
formação desver já tivesse sido selecionada, esse dado não seria coletado
novamente; nessa fase, não se intentou em selecionar mais construções
repetidas para verificar a sua frequência ou se elas possuíam o mesmo sentido
em contextos diversos.

Ademais, para classificar se determinada construção pertenceria ao grupo das


formações convencionais ou formações inovadoras, tomou-se como critério a inserção dessas
construções no Dicionário de Usos do Português do Brasil (DUP) de Borba (2002).

3.4.1 Distribuição do Córpus


78

Os dados produzidos para essa pesquisa podem ser quantificados da seguinte forma:
386 se enquadram dentro do que chamamos de convencionais (regulares) e 363 de inovadoras
(irregulares). Classificando conforme a categoria da sua base, em termos percentuais, temos:

Tabela 1: Percentuais de construções com des-


Formações convencionais com des- Formações inovadoras com des-
Base verbal Base adjetival Base nominal Base verbal Base adjetival Base nominal
65.8% (254) 17.9% (69) 16.3% (63) 75% (294) 15% (57) 10% (41)
Total: 100% (386) Total: 100%
Fonte: o autor,2023.

Transformando os percentuais da Tabela 1 em gráficos, obtemos:

a) formações convencionais com des-

GRÁFICO 1: Distribuição percentual das FCs conforme a categoria de base

Fonte: o autor, 2023.


79

b) Formações convencionais com des-

GRÁFICO 2: Distribuição das FIs conforme a categoria de base

Fonte: O autor, 2023

Com base nesses percentuais, observamos que ambas as formações prefixais com des-
(FCs e FIs) apresentam uma distribuição similar em suas categorias, com alta produtividade
da base verbal, o que sugere que as FIs seguem o mesmo padrão das FCs em sua produção.
Como já mencionado, o objetivo deste trabalho consiste em analisar as FIs com des-+
base verbal no infinitivo. Assim, considerando que des- + base verbal compreende 75% das
FIs, subclassificamos as construções verbais em dois grupos: os terminados por infinitivo (1º,
2º e 3º conjugação) e os que possuem outras formas verbais. Neste último, não se intentou
subclassificar conforme a sua forma nominal (particípio e gerúndio) ou o seu aspecto. Assim,
obtemos o gráfico (3):
80

GRÁFICO 3: Distribuição das Formais nominais das FIs verbais

Fonte: O autor, 2023.

A representação gráfica 3 evidencia que das 294 construções com des- + base verbal,
ou seja, 75% das FIs possuem as seguintes divisões: 24.7% (97 construções) corresponde a
formas verbais no infinitivo, 50,3% (197 construções) de formas verbais não subcategorizadas
e 25% compostas por outras bases (nominais e adjetivais). No tocante às formações
inovadoras de base verbal no infinitivo, objeto de análise desta pesquisa, a primeira
conjugação destaca-se em 57 (21.9%) instanciações, seguida pela segunda conjugação com 23
(6.1%) ocorrências e a terceira conjugação com 17 (4.3%) casos, como mostra o gráfico 4.

GRÁFICO 4: Distribuição das conjugações das FIs no infinitivo

Fonte: O autor, 2023.


81

3.6- Procedimentos de organização e análise teórica-metodológica do córpus

Os dados selecionados para esta pesquisa foram transferidos para uma planilha de
Word, em que mais cinco informações foram acrescentadas: a construção morfológica, a data
da postagem do tuíte, a sequência discursiva com link da postagem e a data em que a coleta
dessa construção foi realizada, conforme pode ser observado na figura 6:

Figura 6- Trecho da tabela de reunião do córpus

Fonte: O autor, 2023.


82

Com base nessa organização do córpus (figura 6), foi possível realizar uma análise
qualitativo-interpretativa, em que pudemos analisar construção por construção, a fim de
estabelecer critérios e aplicações metodológicas dos dados. Como mencionado, embora
tenhamos derivado nossa abordagem metodológica de Hamawand (2011), neste trabalho,
realizamos certas modificações (conforme descrito na seção 2.2). Assim, inicialmente, o
aspecto que mais nos chamou a atenção foi o espaço mental (factual, contrafactual ou
hipotético) no qual tais construções foram utilizadas pelos sujeitos-tuiteiros. Desse modo,
decidimos organizar o nosso córpus seguindo os EM acionados pelas construções inovadoras.
Além disso, para atingir os propósitos desta pesquisa (seção 3.5), entendemos que não
seria apropriado analisar e descrever as operações cognitivas (seção 2.2) do nosso córpus de
modo isolado, como proposto por Hamawand (2011). Essa concepção baseia-se no
entendimento de que os falantes empregam todas essas operações simultaneamente na
produção e compreensão dos discursos. Dessa maneira, após classificar os nossos dados
conforme os EM acionados, propomos analisar cada SD buscando identificar: i) o sentido
prototípico geral de cada construção, ii) o domínio cognitivo (conteúdo e/ou epistêmico) e a
iii) perspectiva temporal (passado, presente e futuro) evocada pela FI.
No próximo capítulo (4), demonstra-se a análise realizada nesta pesquisa com base
nessa proposta de abordagem teórico-metodológica.
83

4 ANÁLISE DOS DADOS

Nesta seção, descrevem-se as operações cognitivas acionadas pelas FIs de base verbal
no infinitivo (4.1), a partir da reformulação da proposta da Morfologia Cognitiva de
Hamawand (2011), apresentada na subseção (2.2). Posteriormente, apresentam-se os
resultados gerais (4.2) dessa proposta teórico-metodológica e propõe-se uma rede esquemática
para as FIs com des- inspirada no modelo de Hamawand (2011).

4.1 Descrição das operações cognitivas das FIs de base verbal no infinitivo

Nesta subseção (4.1), apresento e descrevo as operações cognitivas (categorização e


projeção temporal da cena) e as estruturas cognitivas (domínios e EM) presentes no córpus.
Para tanto, organizo os dados conforme os espaços mentais (EM) que eles evocam:
contrafactuais, factuais e hipotéticos70. Em seguida, apresento em forma de quadros as
operações cognitivas (categorização, domínio cognitivo e projeção temporal) da seguinte
maneira: a) construção morfológica, b) sequência discursiva, c) sentido nuclear da construção
na SD, d) domínio cognitivo (conteúdo e/ou epistêmico) e, por fim, e) a projeção temporal
(passado, presente ou futuro) da cena evocada pela construção.

4.1.1 Construções que evocam EM contrafactuais

Considerando que a contrafactualidade “apresenta um espaço sendo configurado


contradizendo diretamente uma realidade que é conhecida e que não pode ser alterada”
(Dancygier; Sweetser, 2005, p. 76, tradução nossa)71, após uma análise qualitativo-
interpretativa, classificamos as FIs com des- que ativam EM contrafactual considerando as

70
Ver seção 2.2.
71
No original: “It presents the space being set up as directly contradiciting a reality that is known and cannot be
changed”.
84

seguintes características: i) desejo de reversão de uma ação, ii) desejo de reversão de evento e
iii) desejo de reversão de um estado. Vejamos:

4.1.1.1- EM contrafactual denotando reversão de uma ação/acontecimento

Observemos as SDs do quadro 15:

Quadro 15- EM denotando reversão de uma ação/acontecimento


Construção Sequência Discursiva Sentido Domínio Projeção
prototípico temporal da
cena
Desabrir 01 Tem umas nude que da vontade de Reversão Epistêmico Desejo de
desabrir né?! reversão de
uma ação/
acontecimento
passado

desacionar 02 Eu sinto SDS de algumas pessoas, fazer Reversão Epistêmico Desejo de


o que? Pessoas especiais conseguem reversão de
acionar isto em nós, + eu gostaria de uma ação/
desacionar! :p acontecimento
passado
desadoecer 03 Vou fazer ela desadoecer no tapa kkkk Reversão Epistêmico Desejo de
reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desadquirir 04 eu gostaria de desadiquirir a Reversão Epistêmico Desejo de
consciencia de classe pq ta atrasando reversão de
demais a minha vida eu preciso de uma ação/
dinheiro pra procedimento estético acontecimento
passado
desassistir 05 uma série que eu queria Reversão Epistêmico Desejo de
DESASSISTIR só pra assistir de novo reversão de
com a sensação de primeira vez uma ação/
acontecimento
me: THIS IS US!!!!!!!!! Mds passado

desbater 06 Não tem como desbater a neurose já Reversão Epistêmico Desejo de


batida 🤷‍♀️ reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desbeber 07 Como faço pra desbeber oq eu bebi Reversão Epistêmico Desejo de
ontem? reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desbeijar 08 tem como desbeijar alguém? Reversão Epistêmico Desejo de
reversão de
uma ação/
85

acontecimento
passado
desberrar 09 "silhueta parecendo uma interrogação" Reversão Epistêmico Desejo de
KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK reversão de
KKKKK o berro que eu dei ngm pode uma ação/
desberrar ' vsf, cêis são o cão, nmrl acontecimento
passado

desbrincar 10 Brinquei uns dias de ser low profile e Reversão Epistêmico Desejo de
agora não sei mais desbrincar. reversão de
Principalmente porque minhas aulas uma ação/
retornarão na próxima segunda, e acontecimento
minha vontade de existir no mundo passado
exterior só diminui. Porém, confesso
que até senti saudades de estar no meio
caótico da minha universidade.
deschegar 11 dizem que quando é o tempo de ser Reversão Epistêmico Desejo de
mamãe todas as crianças riem pra reversão de
gente, aparece grávida de tudo que é uma ação/
lado e etc. ta acontecendo comigo então acontecimento
se chegou meu tempo ele pode passado
deschegar” (Usuário 5 - Postado:
05.07.23, grifo meu)
deschorar 12 Tem lágrimas que eu desejava Reversão Epistêmico Desejo de
deschorar reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
deschover 13 Como faz pa dar replay no fds, e Reversão Epistêmico Desejo de
deschover ele? reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
deschutar 14 Tem como deschutar o balde ? Reversão Epistêmico Desejo de
reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desclicar 15 Primeira vez q cliquei p ouvir algo da Reversão Epistêmico Desejo de
MC Pipokinha. E queria desclicar reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
descomentar 16 Odeio quando comento no status de Reversão Epistêmico Desejo de
alguém aí todo mundo começa a reversão de
comentar e chega milhares de uma ação/
notificações acontecimento
Vontade de descomentar passado

descomer 17 detesto gastar com comida ruim af da Reversão Epistêmico Desejo de


vontade de descomer e levar de volta reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
descomprar 18 Abri a fatura do cartão desse mês e deu Reversão Epistêmico Desejo de
vontade de descomprar tudo reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
descomunicar 19 Vou me descomunicar dos grupos que Reversão Epistêmico Desejo de
86

estão desviando meu foco reversão de


https://x.com/RamonTaranto/status/150 uma ação/
5374855130136577?s=20 acontecimento
passado
descorrer 20 “eu juro que se eu pudesse descorrer, Reversão Epistêmico Desejo de
eu descorreria a são silvestre pq até reversão de
hoje as minha pernas doem SER uma ação/
FITNESS NÃO É COMIGO. Esse acontecimento
lance de fazer as coisas para agradar o passado
boy só nos fodem, meninas” (Usuário 9
- Postado: 02.01.23)

desdançar 21 “Queria desdançar todas as vezes que Reversão Epistêmico Desejo de


tocou Jaque Patomba nas buatchy.” reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desdar 22 desver não, mas desdar, taí um poder q Reversão Epistêmico Desejo de
eu queria ter reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desdeitar 23 hoje eu fiquei tanto tempo deitada que Reversão Epistêmico Desejo de
já não consigo desdeitar mais reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desdeixar 24 Gente, quem deixou que São Paulo Reversão Epistêmico Desejo de
viesse pro RJ? Já pode desdeixar, dois reversão de
meses de chuva, tô a base de anti uma ação/
ferrugem.😨😓 acontecimento
passado
desdesistir 25 Vontade de desdesistir do que eu tinha Reversão Epistêmico Desejo de
desistido na semana passada. reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desdizer 26 As vezes queria desdizer umas dizidas Reversão Epistêmico Desejo de
que disse reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desdormir 27 “no momento só queria desdormir o Reversão Epistêmico Desejo de
que dormi de tarde pois uma da manhã reversão de
e tô pronto pra correr cinco maratona” uma ação/
acontecimento
passado
desengolir 28 Nada como uma discussão para Reversão Epistêmico Desejo de
realinhar os chakras dos sapos que eu reversão de
precisava desengolir. uma ação/
acontecimento
passado
desengordar 29 gostaria de pedir a todos agr uma Reversão Epistêmico Desejo de
oraçao praq eu consiga desengordar reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desentrar 30 Entrei em tanta coisa esse semestre e Reversão Epistêmico Desejo de
agora não tem como desentrar reversão de
uma ação/
87

acontecimento
passado
deserrar 31 O maior erro da minha vida, me tornar Reversão Epistêmico Desejo de
noivo de uma determinada mulher em reversão de
2002. Errei e não dá para deserrar; uma ação/
mas pelo menos dá para aprender. Não acontecimento
me vinguei, não retaliei. Simples, jugo passado
desigual. Falcão, "Vida de corno".
desescovar 32 Escovei o dente mas vou desescovar e Reversão Epistêmico Desejo de
tomar uma cerveja, depois escovo de reversão de
novo uma ação/
acontecimento
passado
desesfregar 33 Parar de me responder é facin quero ver Reversão Epistêmico Desejo de
desesfregar os peito na minha cara reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desespirrar 34 Tem uma galera que fala uns "saúde" Reversão Epistêmico Desejo de
tão chato que tenho vontade de reversão de
desespirrar. uma ação/
acontecimento
passado

desfalar 35 “obrigada a quem inventou o modo Reversão Epistêmico Desejo de


cancelar mensagem, o sentimento de reversão de
desfalar é muito bom” uma ação/
acontecimento
passado
desficar 36 Comigo é do jeito certo. Gostou? Tmj Reversão Epistêmico Desejo de
Não gostou? Pode ficar com raiva, reversão de
espernear, por mim tmj tb mas ai tu tem uma ação/
dois trabalhos: ficar brabo e desficar. acontecimento
Podem falar a vontade que falam mal passado
de mim pelas costas, isso é o mais
normal por aqui. Não fujo de como sou
pra agradar ngm.

desfingir 37 Agora que o show acabou, a gente já Reversão Desejo de


pode desfingir que curte futebol reversão de
americano e ir dormir #SuperBowl50 uma ação/
#SB50 acontecimento
passado
desfoder 38 como desfoder a costa depois de passar Reversão Epistêmico Desejo de
o dia todo sentada reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desfofocar 39 hoje minha mae me deu um tapão por Reversão Epistêmico Desejo de
fazer fofoca pro meu pai sobre o irmão reversão de
dela que é diacono. quem manda trair a uma ação/
esposa e ser da igreja? Enfim, só queria acontecimento
desfofocar pq esse tapa doeu e ainda passado
ela tá bolada cmg hehehe

desfumar 40 gostaria de desfumar o cigarro que Reversão Epistêmico Desejo de


fumei desgraça reversão de
uma ação/
acontecimento
88

passado
desfurar 41 tem como desfurar a orelha??? Reversão Epistêmico Desejo de
reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desganhar 42 Meu presente de natal foi desganhar Reversão Epistêmico Desejo de
uma folga. Quero desganhar isso. reversão de
Preciso de folga uma ação/
acontecimento
passado
desgripar 43 Gente, como faz pra desgripar??? Tem Reversão Epistêmico Desejo de
1 mês q to sentindo cheiro de nada logo reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desgritar 44 queria desgritar os grito que dei no Reversão Epistêmico Desejo de
show de Diomedes reversão de
https://x.com/Littlepedr0/status/120307 uma ação/
6336711032833?s=20 acontecimento
passado
deslamber 45 queria tanto deslamber certas pessoas Reversão Epistêmico Desejo de
reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
deslavar 46 “minha mãe lava a louça uma vez e faz Reversão Epistêmico Desejo de
tanta bagunça que da vontade de pedir reversão de
pra ela deslavar” (Usuário 6 - Postado: uma ação/
30.10.20, grifo meu) acontecimento
passado
desler 47 queria desler a corte de chamas Reversão Epistêmico Desejo de
prateadas só pra ler de novo e sentir reversão de
tudo de novo.............. saudades uma ação/
acontecimento
passado
deslimpar 48 tentando deslimpar minha imagem Reversão Epistêmico Desejo de
reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desmastigar 49 não tem como vcs desmastigar essas Reversão Epistêmico Desejo de
orelha não, gente? #UFCSPnoCombate reversão de
#ufc #ufcsp uma ação/
acontecimento
passado
desmorrer 50 Sera q dá pra tia may desmorrer em 11 Reversão Epistêmico Desejo de
minutos ? Tadinho do meu spiderman reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desnadar 51 hoje nadei na maior piscina do Brasil Reversão Epistêmico Desejo de
no resort Brasil Beach Home tô tão reversão de
cansado q se eu pudesse desnadar eu uma ação/
desnadaria. e olha q sou atleta acontecimento
passado
desnamorar 52 como faz pra desnamorar alguém? Reversão Epistêmico Desejo de
reversão de
uma ação/
acontecimento
89

passado
desnotar 53 notei algo como q faço pra desnotar Reversão Epistêmico Desejo de
agr to triste quero chorar reversão de
uma ação/
acontecimento
passado

desolhar 54 Cara, cada coisa que olho e que queria Reversão Epistêmico Desejo de
desolhar mds reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
despagar 55 tem como DESPAGAR uma Reversão Epistêmico Desejo de
fatura?????? eu paguei sem querer eu reversão de
preciso na vdd continuar devendo uma ação/
acontecimento
passado
desperder 56 Quero desperder o voo. Poxa, queria Reversão Epistêmico Desejo de
ver o meu mozão hoje reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desprovar 56 Provei comida japonesa e quero Reversão Epistêmico Desejo de
desprovar reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
despular 57 Se eu pudesse despular as cercas que Reversão Epistêmico Desejo de
eu pulei reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
despuxar 58 esqueci q tava braba c meu irmão e Reversão Epistêmico Desejo de
puxei papo c ele af agora n tem como reversão de
despuxar uma ação/
acontecimento
passado
desquebrar 59 Juro gente vô desabafar aqui agora... Reversão Epistêmico Desejo de
Eu quebrei o coração do pobi de um reversão de
menino a uns mêses atrás ..e agora eu uma ação/
precisava dele acontecimento
Será que da tempo de desquebrar??? passado
Eu falei "EU NÃO QUERO
NINGUÉM """
E AGORA EU QUEROOO

desquestionar 60 Meu crush apareceu e me fez Reversão Epistêmico Desejo de


questionar algumas coisas que não reversão de
deveriam ser questionadas então eu vou uma ação/
desquestionar acontecimento
passado
desrabiscar 61 alguem me fala como faço pra Reversão Epistêmico Desejo de
desrabiscar a cara do tardelli do post reversão de
da copa do brasil? uma ação/
acontecimento
passado
desrasgar 62 Me emocionei e rasguei todo meu Reversão Epistêmico Desejo de
plano de estudo. Me arrependo, será reversão de
que dá pra "desrasgar"? uma ação/
90

acontecimento
passado
desrir 63 como faz pra desrir de uma Reversão Epistêmico Desejo de
mensagem? reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desriscar 64 Como desriscar os óculos q vc acabou Reversão Epistêmico Desejo de
de riscar Google pesquisar reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desroer 65 Ta doendo os dedo cara, como faz pra Reversão Epistêmico Desejo de
desroer reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desroncar 66 Me bloquear em tudo é fácil, quero ver Reversão Epistêmico Desejo de
desroncar no meu ouvido enquanto reversão de
dormia uma ação/
acontecimento
passado
desroubar 67 kkkkkkk queria desroubar uns beijos Reversão Epistêmico Desejo de
que roubei reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
dessabotar 68 Tentei me dessabotar mas n teve jeito Reversão Epistêmico Desejo de
descobri que nunca foi sabotagem reversão de
sempre foi obrigação demais uma ação/
acontecimento
passado
destelefonar 69 "nao da para destelefonar?? se nao eu Reversão Epistêmico Desejo de
destelefonava para ele!" reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
destirar 70 tirei um tarot aqui que sinceramente Reversão Epistêmico Desejo de
queria destirar reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
destossir 71 P1: mano que tosse dos infernos Reversão Epistêmico Desejo de
P2: simm, tb n aguento queria reversão de
destossir tudo que tossi aaaa uma ação/
acontecimento
passado
destrabalhar 72 mdssss essa semana eu trabalhei Reversão Epistêmico Desejo de
mtttttttttt gostaria de destrabalhar reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
destransar 73 DO Q ADIANTA VOCÊ SE Reversão Epistêmico Desejo de
ARREPENDER, E NÃO reversão de
CONSEGUIR DESTRANSAR? uma ação/
acontecimento
passado
desvacinar 74 Sou vacinada mas queria Reversão Epistêmico Desejo de
desvacinar...pode? reversão de
uma ação/
91

acontecimento
passado
desvarrer 75 Quem varreu meu pé, pode vindo Reversão Epistêmico Desejo de
desvarrer pra ontem reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
desvotar 76 Votei errado tem como desvotar? Reversão Epistêmico Desejo de
reversão de
uma ação/
acontecimento
passado
Fonte: o autor, 2023

Como pode ser observado nas SDs do quadro 15, o falante constrói a cena como
contrafactual por meio das FIs que evocam um desejo de reversão no nível epistêmico, visto
que essas ações/acontecimentos não são possíveis de reversão no EM factual, seja por uma
atividade (física ou não) praticada por um sujeito agente que se arrepende desta ação (ex.:
SDs 48, 73 e 75) quanto por uma ação/acontecimento que foge do seu controle (SD13),
vejamos:

SD48: “queria desler a corte de chamas prateadas só pra ler de novo e sentir tudo de
novo.............. saudades” (Usuário 7 – Anexo A: item/construção 82- Postado: 12.04.17,
grifo meu)

SD73: “tirei um tarot aqui que sinceramente queria destirar” (Usuário 7 – Anexo A:
item/construção 82- Postado: 12.04.17, grifo meu)

SD75: “mdssss essa semana eu trabalhei mtttttttttt gostaria de destrabalhar” (Usuário 7 –


Anexo A: item/construção 82- Postado: 12.04.17, grifo meu)

SD13: “Como faz pa dar replay no fds, e deschover ele?” (Usuário 7 – Anexo A:
item/construção 82- Postado: 12.04.17, grifo meu)
92

4.1.1.2- EM contrafactual denotando reversão de evento

Vejamos as SDs do quadro 16:

Quadro 16 - EM contrafactual de reversão de evento


Construção Sequência Discursiva Sentido Domínio Projeção
prototípico temporal da
cena
desachar 01 - achei o seu twitter Reversão Epistêmico Desejo de
- então vc vai desachar agora reversão de
um evento
passado
desacontecer 02 como faz o desacontecer alguns Reversão Epistêmico Desejo de
acontecimentos??? reversão de
um evento
passado
desnascer 03 Não cuspindo no mundo que eu Reversão Epistêmico Desejo de
nasci, mais se eu pudesse reversão de
desnascer eu desnascia um evento
passado
Desouvir 04 Queria poder desouvir algumas Reversão Epistêmico Desejo de
coisas reversão de
um evento
passado
dessaber 05 saber ser sozinho é libertador... Reversão Epistêmico Desejo de
o problema é conseguir “dessaber” reversão de
depois um evento
passado
dessentir 06 hoje li que gin tem gosto de Reversão Epistêmico Desejo de
perfume no pescoço e agora, reversão de
tomando gin, não consigo dessentir um evento
passado
dessonhar 07 “sonhei com uma versão +18 de Reversão Epistêmico Desejo de
cinderella que se passava em um reversão de
navio ancorado em um porto e meu um evento
deus como é que faz para passado
dessonhar algo?”
desver 08 dá vontade de desver certas coisas Reversão Epistêmico Desejo de
reversão de
um evento
passado
desviver 09 queria poder desviver certas fases Reversão Epistêmico Desejo de
da vida, foi muita humilhação reversão de
um evento
passado
Fonte:O autor, 2023.

Nas SDs (01- 10), as FIs desencadeiam um anseio de reverter um evento ou situação
passada que estava além do controle dos sujeitos-tuiteiros no domínio da crença (epistêmico)
e que projetam um EM contrafactual. Os sujeitos-tuiteiros, produtores dessas construções,
experimentaram/ vivenciaram eventos que os impactaram e que estavam fora de seu controle,
93

como: SD1 “ desachar” (reverter o evento de alguém ter achado o seu perfil no X/twitter),
SD2 “desacontecer” (reverter situações que aconteceram no passado”), SD3: “desnascer”
(reverter o nascimento), SD4: “desouvir” (reverter a situação de ouvir alguma coisa que não
lhe agradou), SD5: “dessaber” (reverter a situação de saber o que é viver sozinho), SD6:
“dessentir” (reverter o evento de ter lido que perfume tem gosto de gin”), SD7: “dessonhar”
(reverter o evento/situação de ter tido um sonho erótico”), SD8: “desver” (reverter o evento de
ter visto certas situações) e SD9 “desviver” (reverter certas situações vivenciadas)

4.1.1.3- EM contrafactual denotando reversão de estado

Observemos as SDs do quadro 17:

Quadro 17: EM contrafactual de reversão de estado


Construção Sequência Discursiva Sentido Domínio Projeção
prototípico temporal da
cena
desdesejar 01 “Odeio acreditar em karma pq eu Reversão Epistêmico Desejo de
desejo as coisas ruins pras pessoas reversão de
e daí tenho q desdesejar se não um estado
teoricamente volta em dobro pra passado
mim”
Desestar 02 “Eu to apaixonadaaAA Reversão Epistêmico Desejo de
Só quero desestar reversão de
um estado
passado
desexistir 03 as vezes bate uma vontade de Reversão Epistêmico Desejo de
desexistir por um tempo reversão de
um estado
passado
desquerer 04 Eu queria saber te esquecer,eu Reversão Epistêmico Desejo de
queria saber desquerer reversão de
um estado
passado
Fonte: O autor, 2023.

O EM contrafactual reversão de estado das SDs (1-5) é ativado pelo desejo de reversão
de propriedades expressas pelas FIs, como SD1: "desdesejar (coisas ruins)", SD2: "desestar
(apaixonada)", SD3: “desexistir” (reverter a existência por um determinado tempo) e SD4:
“desquerer” (reverter o sentimento/o estado de querer). Em todas essas sequências, o prefixo
"des-" é empregado para enfatizar a vontade do indivíduo de reverter um estado, situação ou
condição no domínio epistêmico.
94

4.1.2- Construções que evocam EM hipotéticos

Como já mencionado, o espaço mental hipotético, ou não-factual, é onde guardamos


as possibilidades imaginadas, os "e se" e as conjecturas sobre realidades alternativas. Aqui,
exploramos cenários imaginários, especulamos sobre alternativas que não foram vivenciadas e
desenvolvemos ideias fundamentadas em suposições. Com base nessas proposições, vejamos
o quadro 18:

Quadro 18: EM hipotético de reversão


Construção Sequência Discursiva Sentido Domínio Projeção
prototípico temporal da
cena
desabraçar 01 eu no tt: só queria alguém p dormir Reversão conteúdo Reversão de
agarradinho uma ação no
eu tendo alguém p dormir agarradinho: futuro ou
vamo desabraçar agr e cada um virar pro possível de ser
seu lado pq não consigo de mexer realizada no
dormindo grudado futuro

desrodar 02 Tô sentindo meu quadril (ou vértebra da Reversão conteúdo Reversão de


lombar) rodado, estalando, e não tenho 1 experiência
centavo pra pedir pra alguém “desrodar” possível de
🥲 acontecer no
futuro
desnoivar 03 Pode noivar, desnoivar, casar ou separar. Reversão Conteúdo Reversão de
Sabemos que sempre seremos unidos uma ação/
apesar de tudo! acontecimento
futuro
desdesmaiar 04 eu: mãe eu vou desmaiar Reversão Conteúdo Reversão de
minha mãe: 3 trabalhos... desmaiar, uma ação/
desdesmaiar e levantar acontecimento
aushauhsuahsuahshaushaush' futuro
Fonte: O autor, 2023.

Nas SDs acima, as FIs “desabraçar” (SD1), “desrodar” (SD2), “desnoivar” (SD3) e
“desdemaiar” (SD4) sugerem cenários mentais hipotéticos que são viáveis de ocorrer. Por
exemplo, na SD1, a ação de "desabraçar" seria uma possibilidade se alguém estivesse
dormindo junto; na SD2, em caso de possuir dinheiro, a ação de "desrodar" seria factível. Na
SD3, "desnoivar", ou seja, cessar um noivado, é algo que poderia acontecer. Por fim, na SD4,
"desdesmaiar" representa a recuperação da consciência em relação a algo experimentado.
95

4.1.3- Construções que evocam EM factual

Como já mencionado, o espaço mental factual é o local onde armazenamos e


processamos informações que se alinham com a realidade observável e experimentada
(Hengeveld; Mackenzie, 2008). Ou seja, são informações verdadeiras em relação ao mundo
real. Este é o local onde organizamos nossas experiências, memórias e conhecimentos atuais,
o que nos possibilita compreender o mundo tal como é. Considerando o córpus dessa
pesquisa, podemos observar o espaço mental factual sendo ativado nas seguintes SDs:

Quadro 19: construções que evocam EM de conteúdo


Construção Sequência Discursiva Sentido Domínio Projeção
prototípico temporal da cena
desbanir 01 Detalhe fui banida ano passado e Reversão conteúdo Reversão de um
só consegui desbanir meu canal acontecimento
porque entrei na justiça, porém passado
demorou 7 fucking meses.
Mas fé rapaziada não é uma porra
dessa que vai me desanimar,
vamo pra luta porra
desesverdear 02 “to que nem um cachorro faminto Reversão conteúdo Reversão
olhando o cacho de banana contínua presente-
desesverdear. Quero fazer meu futuro
doce de banana”
desviciar 03 desviciar do twitter é uma Reversão conteúdo Reversão de um
sensação.. diferente vício no passado
desesconder 04 Acabei de lembrar que hoje é Reversão conteúdo Reversão de uma
aniversário do meu irmão. Vou ação no passado
DESesconder a primeira
temporada de Prison Break que
vou dar de presente huaeuae

Fonte: O autor, 2023.

Nas amostras de dados do quadro 19, as construções "desbanir" (SD1), "desesverdear"


(SD2), "desviciar" (SD3) e "desesconder" (SD4) sugerem situações que, nos contextos em que
foram produzidas, poderiam ocorrer no mundo real (factual), seja uma reversão de algo
experimentado ou realizado no passado (SD1, SD3 e SD4) ou uma reversão em andamento do
presente para o futuro (SD2). O prefixo des-, nessas SDs, reforçam o sentido expresso pela
base verbal.
96

4.2- Resultados gerais

No que concerne à aplicabilidade da reformulação da proposta teórico-metodológica


de Hamawand (2011) em nosso córpus, é possível afirmar que essa abordagem se mostrou
adequada para os objetivos desta pesquisa, que consiste em analisar e descrever o
comportamento morfossemântico do prefixo "des-" em FIs de base verbal no infinitivo.
Assim, com o intuito de verificar as operações cognitivas acionadas pelo prefixo des- na atual
sincronia do PB, encontramos os seguintes resultados no quadro 20:

Quadro 20: Resultado das operações cognitivas das FIs prefixais com des-
Espaço Mental Percentual das Categorização Domínio Projeção temporal
ocorrências Cognitivo

Contrafactual Reversão de 78% Reversão Epistêmico Desejo de reversão de


ação/ ação/acontecimento
acontecimento passado
Reversão de 9% Reversão Epistêmico Desejo de reversão de
evento evento passado
Reversão de 4% Reversão Epistêmico Desejo de reversão de
estado estado passado
Hipotético 4% Reversão Conteúdo Desejo de reversão de
uma ação possível no
futuro
Conteúdo 4% Reversão Conteúdo Reversão de uma
ação/acontecimento no
passado
Reversão contínua
presente-futuro
Total: 100% dos dados
Fonte: O autor, 2023.

De acordo com Soares da Silva (2010, p. 35):

Existem dois modelos de rede semasiológica: a rede radial, introduzida por Lakoff, e
a rede esquemática, desenvolvida por Langacker. Ambos permitem a identificação
da estrutura baseada em protótipos e das relações metafóricas e metonímicas que
ligam os diversos sentidos, mas o modelo radial focaliza a radialidade da estrutura,
ao passo que o modelo esquemático introduz a dimensão hierárquica da
esquematicidade. O modelo de rede radial descreve a estrutura da categoria na forma
de um centro prototípico do qual emanam diversos sentidos mais ou menos
próximos desse centro. O modelo de rede esquemática acrescenta ao modelo radial a
dimensão taxionómica pela qual se passa do nível mais específico ao nível mais
geral e abstrato. Desta forma, o modelo da rede esquemática combina protótipos e
esquemas.

Na estrutura triádica composta por ESQUEMA-PROTÓTIPO-EXTENSÃO (figuras 2


e 3), o Esquema representa a mais alta forma de abstração em relação aos membros
97

individuais de uma categoria. A criação de hierarquias entre a Instanciação e o Esquema


ocorre por meio dos processos de Generalização e Especialização, dependendo do nível de
detalhe ou especificidade que a Instância pode herdar ou desenvolver a partir do seu Esquema.
As relações horizontais se relacionam à capacidade de expansão categorial a partir de um eixo
prototípico, utilizando metáforas e metonímias.
Na esteira dessas proposições, é importante destacar que, ao formular uma rede
esquemática de sentidos prototípicos e periféricos, dentro de uma perspectiva morfológica, é
essencial realizar uma análise histórico-semântica do comportamento do prefixo vinculado a
essa base. Contudo, é crucial mencionar que uma limitação deste estudo está na falta de uma
análise diacrônica do comportamento semântico deste prefixo. Por esse motivo, propomos
uma rede esquemática das operações cognitivas acionadas pelas FIs com des- com base nos
sentidos prototípicos e periféricos acionados, tendo em vista o número de ocorrências do
quadro 20. Desse modo, temos:

Figura 7: rede esquemática das FIs de base verbal no infinitivo

Fonte: O autor, 2023.

No esquema representado na figura 7, as formações inovadoras de base verbal no


infinitivo partem da semântica geral de reversão, que pode ser representada por [des- + base
verbal] REVERSÃO. Em termos de número de ocorrências, o sentido prototípico associado ao
98

prefixo “des-” evoca, em nosso córpus, três contextos epistêmicos: a reversão de


ação/acontecimento, reversão de evento e reversão de estado, que estão interligadas pelo
espaço mental contrafactual dessas sequências discursivas. Como acepções de sentidos
periféricos, temos o domínio de conteúdo, que estruturam dois EM: i) o EM de reversão
hipotética de evento ou ação futura; e o ii) o EM de reversão de conteúdo de um evento
passado ou de um presente contínuo. Contudo, é importante ressaltar que estudos com um
córpus mais extenso podem apresentar resultados variados sobre a prototipicidade dos
sentidos evocados por esse prefixo.
99

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho, buscou-se evidenciar o sentido prototípico ativado pela construção


des-+base verbal no infinitivo consideradas agramaticais/ inaceitáveis pela literatura
morfológica (Silva; Mioto, 2009; Medeiros, 2010; Rio-Torto, 2019), como "destrabalhar",
"desver", "descorrer", "desesverdear" encontradas na plataforma X/Twitter. Para tanto,
considerando um córpus formado de 100 construções, objetivou-se investigar e descrever as
operações cognitivas acionadas por essas construções com base na proposta de Morfologia
Cognitiva de Hamawand (2011). Segundo Hamawand (2011), as construções morfológicas
devem ser explicadas por meio das operações cognitivas de categorização, configuração e
conceitualização, fornecendo assim uma abordagem teórica mais abrangente para
compreender diversos fenômenos morfossemânticos da língua.
No capítulo "Revisitando o prefixo des-", exploramos diversas considerações,
abordando: i) o debate sobre a seleção categorial do prefixo "des-", conforme discutido nos
estudos de Silva e Mioto (2009), Medeiros (2010) e Rio-Torto (2010); ii) diferentes
perspectivas relacionadas ao desenvolvimento histórico de "des-"; e iii) o desenvolvimento
morfossemântico específico do prefixo "des-". Quanto ao item (i), adotamos a postura de
Dolinski (1993), que sustenta que as formações prefixais com "des-" que não seguem as
prescrições gramaticais convencionais não devem ser consideradas irregulares ou desvios. Em
relação ao item (ii), mesmo que a literatura não tenha chegado a um consenso sobre a origem
de "des-", a questão básica que subjaz a essa discussão está no fato de que só é possível
entender o significado de um prefixo por ele estar dentro de um determinado domínio
cognitivo: de-, dis- e ex- partilhariam um mesmo domínio cognitivo, disso decorrendo a fusão
de significados, em que des- incorporou os valores das demais formas prefixais. Por fim, no
item (iii), examinamos o comportamento morfossemântico de "des-" para aprofundar nossa
compreensão sobre o funcionamento desse prefixo.
No capítulo “Suporte teórico”, apresentamos e conceituamos o modelo de abordagem
da Morfologia Cognitiva (MC) de Hamawand (2011). Nessa proposta, a MC é entendida
como um ramo da Linguística que estuda os aspectos cognitivos das formações de palavras,
por meio de três áreas fundamentais: categorização, configuração e conceitualização.
A proposta de Hamawand (2011) se origina de uma análise de dados em pares, como
exemplificado na análise dos dados "decouple vs. uncouple". No entanto, o autor se restringe
à descrição e análise desses dados, deixando de desenvolver aspectos que não são
100

contemplados na análise. Por exemplo, embora Hamawand aborde a sinonímia, ele não se
aprofunda nas redes polissêmicas. Quanto à metodologia, o autor afirma que seu trabalho está
fundamentado na Semântica Cognitiva e na Linguística de Córpus. Apesar de extrair dados
exclusivamente do British National Corpus, Hamawand apenas menciona que a Linguística
de Córpus fornece ferramentas para uma maior elaboração de descrições das estruturas
morfológicas do uso diário da linguagem. Por fim, apesar de formalizar uma tríade de análise
das operações cognitivas para observar estruturas morfológicas, Hamawand não demonstra de
maneira satisfatória a aplicação da última operação cognitiva, o Construal, como evidenciado
em seus trabalhos (Hamawand, 2009, 2011).
Com isso, entendendo que as operações cognitivas podem fornecer insights sobre o
comportamento morfossemântico das construções de modo geral, apresentamos modificações
com base na tríade: categorização, configuração e interpretação. Nesse estudo, observamos
as FIs nos contextos em que foram produzidas. Para esse percurso analítico, lançamos mão
dos conceitos de categorização, domínio cognitivo, espaços mentais e projeção temporal da
cena (passado, presente e futuro) de cada sequência discursiva.
Em “Percursos metodológicos”, após organizar o córpus desta pesquisa em uma
planilha de Word, contendo a construção morfológica, a data da postagem do tuíte, a
sequência discursiva com link da postagem e a data em que a coleta dessa construção foi
realizada, foi possível realizar uma análise qualitativo-interpretativa, em que pudemos
analisar construção por construção, a fim de estabelecer critérios e aplicações metodológicas
dos dados. Assim, optou-se por organizar as SDs conforme o EM (contrafactual, conteúdo e
hipotético) ativado pela construção. Em um segundo momento, procurou-se analisar cada SD
buscando identificar: i) o sentido prototípico geral de cada construção, ii) o domínio cognitivo
(conteúdo e/ou epistêmico) e a iii) perspectiva temporal (passado, presente e futuro) evocada
pela FI.
Em “Análise dos dados”, com na reformulação da proposta teórica-metodológica de
Hamawand (2011), encontramos os seguintes resultados:

i) 89% das construções selecionadas para esta pesquisa ativam o domínio


epistêmico, por meio do EM contrafactual. Sendo distribuídos em: 76%
acionam a reversão de uma ação, 9% acionam a reversão de um evento e 4%,
reversão de um estado. Em todas essas SDs, o sujeito-tuiteiro expressa o desejo
de reversão de uma ação/acontecimento/evento ou estado no passado.
101

ii) 4% das construções acionam o domínio de conteúdo por meio do EM


hipotético. Em todas as SDs, o sujeito-tuiteiro expressa um desejo de reversão
possível de acontecer em um futuro próximo ou possível.
iii) 4% das construções ativam o domínio de conteúdo por meio do EM de
conteúdo. Nas SDs analisadas, o sujeito-tuiteiro expressa uma reversão de uma
ação/evento passado e/ou um reversão de um presente contínuo.

No tocante às restrições morfossemânticas, ao comparar o córpus dessa pesquisa com


as postulações de restrição do prefixo des- presentes nos estudos de Silva e Mioto (2009),
Oliveira (2009), Medeiros (2010) e Rio-Torto (2019), observamos que o prefixo des- se
adjunge a:

(i) verbos que indicam processos, como desmorrer, deschegar, deslavar,


desdesejar, desnadar e dessonhar, o que vai de encontro às proposições de
Silva e Mioto (2009);
(ii) verbos estativos (destornar), certos verbos télicos (desacabar, desmorrer),
certos verbos atélicos (deschover, desolhar), verbos semelfactivos (destossir,
desespirrar), verbos incoativos (desadoecer, desengordar), verbos em contatos
de superfície (desvarrer, deslimpar), o que contraria as postulações de Oliveira
(2009);
(iii) verbos que expressam atividades, mesmo quando há um encerramento para
uma ação específica, como descorrer, destrabalhar, desdançar, despular,
desgritar, desfalar, indo assim contra os estudos de Medeiros (2010);
(iv) verbos de denotam situações estativas (desestar, desexistir), processos
(deschover, descorrer, desdormir, desnevar, dessaltar), eventos pontuais
(desmatar, desmorrer) e verbo com valor extrativo circunfixados em es-
(desesverdear), contradizendo as pesquisas de Rio- Torto (2019).

Frente ao exposto, defendemos que as FIs devem ser consideradas aceitáveis em


função de seu significado de reversão já ter sido internalizado como uma construção, o
esquema [des- + base verbal] REVERSÃO, o que faz dele compreensível/ acessível. Todavia,
espera-se em estudos futuros:
102

i) Elaborar um teste de interpretação para examinar as sutilezas semânticas


desencadeadas pelo prefixo "des-", visto que, em nossos dados, foi evidente que os
usuários ativaram os contextos mentais contrafactuais relacionados à reversão de ação,
evento e estado.
ii) Desenvolver um teste de avaliação para investigar se as novas construções com o
prefixo "des-" são formações esporádicas ou se são aceitas pelos falantes.
iii) Elaborar testes de leitura autônoma para determinar se o tempo de leitura das novas
construções é mais ou menos exigente do que o das construções convencionais.
iv) Realizar uma comparação entre as FCs de base verbal, adjetival e nominal e as FIs de
base verbal, adjetival e nominal para estabelecer diferenças e semelhanças entre as
construções.

Tais projeções visam a responder às seguintes questões iniciais:

i) Como operações cognitivas, como metáfora, metonímia e ativações de domínios


cognitivos, são ativadas nas FIs com o prefixo des- na atual sincronia do PB?
ii) O comportamento semântico das FIs de bases adjetival e nominal possui as mesmas
características das FCs com os mesmos padrões? O sentido de reversão é prototípico
nessas formações?
iii) Os falantes de PBL1 percebem/estranham, durante a leitura, as FIs? No caso de não
percepção/estranhamento, os participantes têm o mesmo tempo de leitura das FCs e
FIs? O tempo de leitura das FIs é mais custoso para os sujeitos participantes?
iv) A partir de qual faixa etária a aceitabilidade das FIs se estabiliza e a partir de qual
faixa a não aceitabilidade é fixada?
v) Qual modelo de rede semântica é capaz de dar conta da polissemia das FCs e FIs?
vi) A aceitabilidade das FIs diminuirá se houver desvios de características pragmáticas/
semânticas do slot X ou do uso como um todo?

Com base nessas respostas, esperamos mapear as operações cognitivas ativadas pelas
FCs e FIs do prefixo des- e trazer mais empirismo para essa proposta analítica.
103

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108

ANEXO A- Córpus da pesquisa

Item/ Construção Publicação Contextos de produção Data da


coleta
1. desabraçar 27.07.20 eu no tt: só queria alguém p dormir agarradinho 26.03.23
eu tendo alguém p dormir agarradinho: vamo
desabraçar agr e cada um virar pro seu lado pq
não consigo de mexer dormindo grudado
https://twitter.com/natallyhp/status/1287592271
311966208?s=20

2. desabrir 21.04.20 Tem umas nude que da vontade de desabrir né?! 26.03.23
https://twitter.com/ra_ros/status/125262421600
6033410?s=20
3. desacabar 22.10.20 webamizade muito querida quando o mundo 26.03.23
desacabar vou te convidar pra rolê presencial
https://twitter.com/tobiaseurosama/status/13415
69571099127809?s=20
4. desachar 09.09.15 - achei o seu twitter 26.03.23
- então vc vai desachar agora
https://twitter.com/JuninhoClemente/status/641
776351905730560?s=20
5. desacontecer 26.05.18 como faz o desacontecer alguns 26.03.23
acontecimentos???
https://twitter.com/_annajuliax/status/10004061
11768498177?s=20
6. desadoecer 06.03.11 Adoeci. Vou tentar desadoecer até amanhã. 26.03.23
https://twitter.com/laisdidier/status/4456491962
6117120?s=20
7. desadquirir 02.04.18 eu gostaria de desadiquirir a consciencia de 26.03.23
classe pq ta atrasando demais a minha vida eu
preciso de dinheiro pra procedimento estético
https://twitter.com/pauller_/status/98089965146
4433664?s=20
8. desassistir 05.12.22 uma série que vc queria DESASSISTIR só pra 26.03.23
assistir de novo com a sensação de primeira vez

me: THIS IS US!!!!!!!!! Mds


https://twitter.com/pretademaiss/status/1599876
136968007681?s=20
9. desbanir 17.03.23 tinder eu fui banida por usar quando era menor 26.03.23
de idade agr q tenho 19 vcs podem me desbanir?
😭
https://twitter.com/camih_oliveira_/status/16368
80518355533825?s=20
10. desbater 14.03.23 Não tem como desbater a neurose já batida 🤷‍♀️ 26.03.23
https://twitter.com/gabrielaogatinh/status/16357
07276865437699?s=20
11. desbeber 13.06.21 Como faço pra desbeber oq eu bebi ontem? 26.03.23
https://twitter.com/GeandersonTuli1/status/1404
005856958689284?s=20
12. desbeijar 26.03.23 tem como desbeijar alguém? 26.03.23
https://twitter.com/NatiRigatto/status/16400127
16499673090?s=20
13. desberrar 18.03.23 "silhueta parecendo uma interrogação" 26.03.23
KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK
K o berro que eu dei ngm pode desberrar 🗣️ '
vsf, cêis são o cão, nmrl
109

https://twitter.com/yaahmuniz/status/163697147
3779712001?s=20
14. desbrincar 15.01.23 Brinquei uns dias de ser low profile e agora não 26.03.23
sei mais desbrincar. Principalmente porque
minhas aulas retornarão na próxima segunda, e
minha vontade de existir no mundo exterior só
diminui. Porém, confesso que até senti saudades
de estar no meio caótico da minha universidade.
https://twitter.com/TonApolinario/status/161468
4684562087938?s=20
15. deschegar 05.07.23 “dizem que quando é o tempo de ser mamãe 03.08.23
todas as crianças riem pra gente, aparece
grávida de tudo que é lado e etc. ta acontecendo
comigo então se chegou meu tempo ele pode
deschegar” (Usuário 5 - Postado: 05.07.23,
grifo meu)
https://twitter.com/Thayzita_F/status/16766665
96733886465?
16. deschorar 3.03.23 Tem lágrimas que eu desejava deschorar 26.03.23
https://twitter.com/driemeier_dani/status/16216
71399759773696?s=20
17. deschover 01.12.22 26.03.23
Como faz pa dar replay no fds, e deschover ele?
https://twitter.com/wellgustt/status/1598457134
777352194?s=20
18. deschutar 30.11.23 Se eu chutar o balde n vai ter ninguém q faça eu 26.03.23
deschutar
https://twitter.com/QuirinoDebora_/status/1597
941856285118464?s=20
19. desclicar 08.01.23 Tinha que ter como "desclicar" naqueles 26.03.23
balõeszinhos de interação do Instagram, pq eu
quase cliquei num que ia dar muita merda se eu
clicasse
https://twitter.com/VendruscoloLuiz/status/1612
057731195895815?s=20
20. descomentar 20.04.17 alguém fala pra mariah descomentar a 26.03.23
publicação, eu não quero aceitar que ela acertou
https://twitter.com/pfvrdias/status/85516468325
4472705?s=20
21. descomer 23.03.23 Como pode eu ter acabado descomer e 5 min 26.03.23
depois eu tá com fome de novo
https://twitter.com/diiimultiverse/status/163907
7741550088192?s=20
22. descomprar 04.01.22 Abri a fatura do cartão desse mês e deu vontade 26.03.23
de descomprar tudo
https://twitter.com/ricademarre/status/14784497
53449017347?s=20
23. descorrer 02.01.23 “eu juro que se eu pudesse descorrer, eu 03.08.23
descorreria a são silvestre pq até hoje as minha
pernas doem SER FITNESS NÃO É COMIGO.
Esse lance de fazer as coisas para agradar o boy
só nos fodem, meninas”
24. desdançar 01.02.21 “Queria desdançar todas as vezes que tocou 26.03.23
Jaque Patomba nas buatchy.”
25. desdar 05.10.21 desver não, mas desdar, taí um poder q eu 26.03.23
queria ter
https://twitter.com/adebadeba/status/142331680
2659135492?s=20
26. desdeitar 30.04.21 hoje eu fiquei tanto tempo deitada que já não 26.03.23
consigo desdeitar mais
110

https://twitter.com/melovivieu/status/13883156
45788528640?s=20
27. desdeixar 12.11.21 Gente, quem deixou que São Paulo viesse pro 26.03.23
RJ? Já pode desdeixar, dois meses de chuva, tô
a base de anti ferrugem.😨😓
https://twitter.com/Aleemanuel1/status/1459138
152539602948?s=20
28. desdesejar 15.04.20 “Odeio acreditar em karma pq eu desejo as 26.03.23
coisa ruim pras pessoas e daí tenho q
desdesejar se não teoricamente volta em dobro
pra mim”
https://Twitter/X.com/yorran_com_h/status/1
673141158493450241?>.
29. desdesistir 26.07.20 Desisto de vc 26.03.23
Só não manda mensagem pra eu desdesistir pfvr
https://twitter.com/gu4morim/status/128748803
6654260226?s=20
30. desdesmaiar 01.02.13 eu: mãe eu vou desmaiar
minha mãe: 3 trabalhos... desmaiar, desdesmaiar
e levantar aushauhsuahsuahshaushaush'
https://twitter.com/taiguti97/status/2973538302
51757569?s=20

31. desdormir 19.02.18 “no momento só queria desdormir o que dormi 03.08.23
de tarde pois uma da manhã e tô pronto pra
correr cinco maratona”
32. desengolir 21.11.22 Nada como uma discussão para realinhar os 26.03.23
chakras dos sapos que eu precisava desengolir.
https://twitter.com/RaissaCamara7/status/15948
04441496301568?s=20
33. desengordar 26.02.23 o processo de desengordar é uma vida, ja pra 26.03.23
engordar é 2 segundos
https://twitter.com/011_murilyn/status/1629968
614823456769?s=20
34. desentrar 26.10.10 irá, meu twitter desbugou ! KKKKKKKKKKK' 26.03.23
amém, tive que entrar e desentrar ! KKKKKKK
am ?
https://twitter.com/caiobseduction/status/190930
39490277376?s=20
35. deserrar 23.01.23 O maior erro da minha vida, me tornar noivo de 26.03.23
uma determinada mulher em 2002. Errei e não
dá para deserrar; mas pelo menos dá para
aprender. Não me vinguei, não retaliei. Simples,
jugo desigual. Falcão, "Vida de corno".
https://twitter.com/lrzaine/status/161740733186
7807744?s=20
36. desesconder 21.02.10 Acabei de lembrar que hoje é aniversário do 26.03.23
meu irmão. Vou DESesconder a primeira
temporada de Prison Break que vou dar de
presente huaeuae
https://twitter.com/iagosalest/status/9433422066
?s=20
37. desescovar 01.10.2020 Escovei o dente mas vou desescovar e tomar
uma cerveja, depois escovo de novo
https://twitter.com/vanessa_rubio/status/131150
9329850306560?s=20

38. desesfregar 11.12.20 Parar de me responder é facin quero ver


desesfregar os peito na minha cara
111

https://twitter.com/LouisVuittonn_/status/13374
51618770558977?s=20

39. desespirrar 20.12.16 Tem uma galera que fala uns "saúde" tão chato
que tenho vontade de desespirrar.
https://twitter.com/marianarausch/status/811251
059872169984?s=20

40. desestar 25.02.20 “Eu to apaixonadaaAA


Só quero desestar”
https://twitter.com/raul_le_/status/16352449833
46429954?s=20

41. desesverdear 05.10.21 “to que nem um cachorro faminto olhando o 26.03.23
cacho de banana desesverdear. Quero fazer
meu doce de banana”
42. desexistir 24.02.23 as vezes bate uma vontade de desexistir por um 26.03.23
tempo
https://twitter.com/_sad1996/status/1628999013
121892354?s=20
43. desfalar 04.08.23 “obrigada a quem inventou o modo cancelar 26.03.23
mensagem, o sentimento de desfalar é muito
bom”
<https://Twitter.com/ms_tai2m/status/12323232
26308632576?s=20>.
44. desficar 28.02.23 Comigo é do jeito certo. Gostou? Tmj Não 26.03.23
gostou? Pode ficar com raiva, espernear, por
mim tmj tb mas ai tu tem dois trabalhos: ficar
brabo e desficar. Podem falar a vontade que
falam mal de mim pelas costas, isso é o mais
normal por aqui. Não fujo de como sou pra
agradar ngm.
https://twitter.com/PedroLepper/status/1630698
997785526272?s=20
45. desfingir 08.02.16 Agora que o show acabou, a gente já pode 26.03.23
desfingir que curte futebol americano e ir
dormir #SuperBowl50 #SB50
https://twitter.com/desaplaudidos/status/696519
894016401409?s=20
46. desfoder 28.02.23 como desfoder a costa depois de passar o dia 26.03.23
todo sentada
https://twitter.com/0101stayc/status/163070388
0945188864?s=20
47. desfofocar 23.02.23 estou servida até demais de fofoca, tem coisa q 26.03.23
eu queria desfofoca
https://twitter.com/cianaluz/status/16289124347
13882624?s=20
48. desfumar 18.11.22 gostaria de desfumar o cigarro que fumei 26.03.23
desgraça
https://twitter.com/julhamrm/status/1593754047
961513985?s=20
49. desfurar 11.02.23 tem como desfurar a orelha??? 26.03.23
https://twitter.com/cvbzfa/status/162459223685
4771713?s=20
50. desganhar 21.12.22 Meu presente de natal foi desganhar uma folga 26.03.23
https://twitter.com/4drianoo/status/1605622094
472957952?s=20
51. desgripar 21.02.23 gripei mas tenho que desgripar logo 26.03.23
https://twitter.com/Camposs_gi/status/16281782
67084652544?s=20
112

52. desgritar 27.04.21 Sobre aquele carinha lá 26.03.23


que gritou
INDEPENDÊNCIA OU MORTE....
tem jeito de desgritar?
https://twitter.com/mineiro1brasil/status/138702
7644181528579?s=20
53. deslamber 23.02.23 Virar a cara pode, quero ver deslamber o q 26.03.23
lambeu, faz o reverse ai 😂😂😂
https://twitter.com/anabeatriz_330/status/16285
93095863328768?s=20
54. deslavar 30.10.20 “minha mãe lava a louça uma vez e faz tanta 03.08.23
bagunça que da vontade de pedir pra ela
deslavar” (Usuário 6 - Postado: 30.10.20, grifo
meu)
55. desler 02.03.23 queria desler a corte de chamas prateadas só pra 26.03.23
ler de novo e sentir tudo de novo..............
saudades
https://twitter.com/justblooming/status/1631435
345429397504?s=20
56. deslimpar 14.01.20 tentando deslimpar minha imagem 26.03.23
https://twitter.com/bangz1nha/status/121711101
6200380416?s=20
57. desmastigar 20.11.16 não tem como vcs desmastigar essas orelha não, 26.03.23
gente? #UFCSPnoCombate #ufc #ufcsp
https://twitter.com/lorenamesmo_/status/800193
931644379138?s=20
58. desmorar 29.03.23 Usuário 1: morar em Chapecó resolveria 80% 27.03.23
dos meus problemas

Usuário 2: desmorar em Chapecó resolveria


80% dos meus
59. desmorrer 18-05-23 “desfalecer: desmorrer ou voltar dos mortos” 26.03.23
h<https://twitter.com/Gueicy_/status/165931601
5988195330?>.
60. desnadar 12.04.17 “se vc não nada, não tente desnadar quem quer 26.03.23
nadar”
https://Twitter.com/bakajoohyun/status/132229
5254729576454?
61. desnamorar 22.02.23 como faz pra desnamorar alguém? 26.03.23
https://twitter.com/vitoria_krahl/status/1628421
728367005698?s=20
62. desnascer 12.03.23 Eu sinto muito por você. A gente não tem 26.03.23
como desnascer então temos que ser a melhor
versão de nós. E principalmente não podemos
nos comparar. Espero que fique tudo bem com
vc
https://twitter.com/madeinbajor/status/16350654
55634436097?s=20
63. desnoivar 10.11.10 Pode noivar,desnoivar,casar ou separar. 26.03.23
Sabemos que sempre seremos unidos apesar de
tudo!
https://twitter.com/kamillaMaarques/status/2534
568619937792?s=20
64. desnotar 02.08.20 uma vez que você nota que eu sou meio vesga 26.03.23
você não pode mais desnotar
https://twitter.com/jojordino/status/1290096179
632472070?s=20
65. desolhar 17.03.23 Cara, cada coisa que olho e que queria desolhar 26.03.23
mds
https://x.com/ummajujuba_/status/97741459295
113

0407168?s=20

66. desouvir 26.03.23 Queria poder desouvir algumas coisas 26.03.23


https://twitter.com/goldengirlbruna/status/16400
94282248867840?s=20
67. despagar 10.06.22 tem como DESPAGAR uma fatura?????? eu 26.03.23
paguei sem querer eu preciso na vdd continuar
devendo
https://twitter.com/canokov/status/15353850525
98751232?s=20
68. desperder 15.02.23 Não importa o quanto o time caia o Corinthians 26.03.23
nunca vai desperder a estreia deles na arena
nova
https://twitter.com/Jcgbrandao/status/16258289
32409864194?s=20
69. desprovar 22.08.22 Provei comida japonesa e quero desprovar. 26.03.23
https://twitter.com/carapanarana/status/1561755
164846981123?s=20
70. despular 01.02.21 Se eu pudesse despular as cercas que eu pulei 04.08.23
<https://Twitter.com/mineiro1brasil/status/1387
027644181528579?>.
71. despuxar 23.08.18 esqueci q tava braba c meu irmão e puxei papo c 26.03.23
ele af agora n tem como despuxar
https://twitter.com/bea_brazz/status/101064180
2460893185?s=20
72. desquebrar 23.02.23 Juro gente vô desabafar aqui agora... 26.03.23
Eu quebrei o coração do pobi de um menino a
uns mêses atrás ..e agora eu precisava dele
Será que da tempo de desquebrar???
Eu falei "EU NÃO QUERO NINGUÉM """
E AGORA EU QUEROOO
https://twitter.com/Lu_favsss/status/162890346
0102889472?s=20
73. desquestionar 05.10.22 Ficam uns questionamentos que não sei se vale 26.03.23
desquestionar
https://twitter.com/dearcliche/status/157783031
0011719680?s=20
74. desrabiscar 30.03.18 se você não rabisca, nao venha me desrabiscar 26.03.23
quando eu estiver rabiscando
https://twitter.com/ouroher/status/97972723381
5334912?s=20
75. desrasgar 09.07.22 Me emocionei e rasguei todo meu plano de 26.03.23
estudo. Me arrependo, será que dá pra
"desrasgar"?
https://twitter.com/alinee_1989/status/15457851
45688576000?s=20
76. desrir 17.03.23 como faz pra desrir de uma mensagem? 26.03.23
https://twitter.com/paganini07x/status/16369174
64834383873?s=20
77. desriscar 04.12.21 Como desriscar os óculos q vc acabou de riscar 26.03.23
Google pesquisar
https://twitter.com/lttommo23/status/146729239
9332474884?s=20
78. desrodar 23.10.22 Tô sentindo meu quadril (ou vértebra da 26.03.23
lombar) rodado, estalando, e não tenho 1
centavo pra pedir pra alguém “desrodar” 🥲
https://twitter.com/duartegess/status/158428520
3673264128?s=20
79. desroer 17.11.15 Ta doendo os dedo cara, como faz pra desroer 26.03.23
https://twitter.com/acotiar/status/666691899189
114

800960?s=20

80. desroncar 12.12.21 Me bloquear em tudo é fácil, quero ver


desroncar no meu ouvido enquanto dormia
https://twitter.com/Ninhonico1/status/14701217
85291063296?s=20

81. desroubar 14.03.23 kkkkkkk queria desroubar uns beijos que roubei 26.03.23
https://twitter.com/apolinariojsne/status/163564
3375314432003?s=20
82. dessaber 23.03.23 saber ser sozinho é libertador... 26.03.23
o problema é conseguir “dessaber” depois.
https://twitter.com/m4rtinszz/status/1639095283
060715521?s=20
83. dessabotar 19.11.21 Tentei me dessabotar mas n teve jeito descobri 26.03.23
que nunca foi sabotagem sempre foi obrigação
demais
https://twitter.com/cebejinha/status/1461758291
449683971?s=20
84. dessentir 15.03.23 hoje li que gin tem gosto de perfume no pescoço 26.03.23
e agora, tomando gin, não consigo dessentir
https://twitter.com/pierovcnz/status/1636174512
902361089?s=20
85. dessonhar 13.02.21 “sonhei com uma versão +18 de cinderella que 26.03.23
se passava em um navio ancorado em um porto
e meu deus como é que faz para dessonhar
algo?”
https://Twitter.com/eremitadosertao/status/1360
623736018198531?>.
86. destatuar 20.01.23 primeira ordem q o richarlison vai receber 26.03.23
depois do nosso casamento eh marcar um
destatuador p destatuar esta coisa horrorosa
https://twitter.com/ketinthesky/status/16166131
25410766855?s=20
87. destelefonar 27.07.14 "nao da para destelefonar?? se nao eu 26.03.23
destelefonava para ele!"
https://twitter.com/Loony_Weasley/status/4935
20578159316992?s=20
88. destirar 17.03.23 tirei um tarot aqui que sinceramente queria 26.03.23
destirar
https://twitter.com/ArthurMalala9/status/163658
2401760542720?s=20
89. destossir 06.10.22 P1: mano que tosse dos infernos 26.03.23
P2: simm, tb n aguento queria destossir tudo
que tossi aaaa
https://twitter.com/scottinho_a/status/15782162
70415151105?s=20

90. destrabalhar 26.01.23 mdssss essa semana eu trabalhei mtttttttttt 26.03.23


gostaria de destrabalhar
https://twitter.com/marykittyyyyyyy/status/1618
550529592012800?s=20
91. destransar 18.03.23 DO Q ADIANTA VOCÊ SE ARREPENDER, 26.03.23
E NÃO CONSEGUIR DESTRANSAR ?
🤣😏
https://twitter.com/vi2467/status/163716681861
4706178?s=20
92. desvacinar 15.01.23 Imagine que quase 100% da população mundial 26.03.23
foi alvo de vacinas experimentais e, agora,
começam a surgir relatos de efeitos colaterais,
115

de médio prazo, graves. Mas tem um


probleminha: não dá para desvacinar as pessoas!
Agora e esperar e ter sorte para não morrer
https://twitter.com/Marcosssocial/status/161447
3424117579777?s=20
93. desvarrer 05.03.23 Quem varreu meu pé, pode vindo desvarrer pra 26.03.23
ontem
https://twitter.com/murilo_stg/status/163222799
1357906945?s=20
94. desver 25.03.23 Desde que falaram que a Billie Eilish se veste 26.03.23
igual o Ribamar do Sai de Baixo eu nunca mais
consegui desver.
https://twitter.com/thiago_p/status/1639608204
765143040?s=20
95. desviciar 19.03.23 Sabe quando eu vou desviciar desse teu beijo? 26.03.23
Dia 31 de fevereiroooo
https://twitter.com/joaogomescantor/status/1637
301339171553280?s=20
96. desviver 25.03.23 Queria desviver hoje 26.03.23
https://twitter.com/lamentapi/status/1639728618
275209216?s=20
97. desvotar 26.03.23 E o pior tem um trecho merda que se a edição 26.03.23
colocar amanhã, a Amanda a única que tava
mais resistente, vai sair como se tivesse
encabeçando a ida da Domi. Estressante viu.
Quem votou na Larissa faça o favor de desvotar.
https://twitter.com/suzzycomenta/status/163986
7225191456770?s=20
116

ANEXO B- Córpus da pesquisa

Item/ Construção Publicado em: Contextos de produção Data da


coleta
1. desabusivo 29.04.20 De acordo com os meus cálculos o próximo 07.10.23
relacionamento atóxico e desabusivo que se
findará em breve será o da Meghan Markle com
o Príncipe Harry
https://x.com/JessicaoLacra/status/12556915153
90840835?s=20
2. desbabaca 27.12.22 Será que tem como alguém se tornar: 07.10.23
desbabaca?
https://x.com/dudantonacio/status/16079167972
93985792?s=20
3. descongelou 01.04.21 Acham que a frozen descongelou um 07.10.23
pouco?????
https://x.com/imjhenx/status/137749493644303
1552?s=20
4. desdança 12.04.11 Acho que vou começar a fazer a desdança da 07.10.23
chuva
https://x.com/DaniNoMundo/status/5782403953
5788032?s=20

5. desgoverno 18.04.22 Quem vai notificar o Vírus e suas variantes de 07.10.23


que o desgoverno decreto a despandemia?
https://x.com/ESCSpinola/status/151599338643
9819270?s=20

6. desprefeito 13.02.23 Esse desprefeito de São Gonçalo RJ gastou 07.10.23


bilhões do dinheiro da privatização da CEDAE
e de algumas parcelas dos royalties do petróleo
em obras vagabundas e sem planejamento
urbano sente como maquiagem, sem reorganizar
a estrutura urbana da cidade, está aí o caos
instaurado
https://x.com/robaina_moises/status/162532680
1722519553?s=20

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