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314 N OVA GRA M ÁTIC A DO P O RT U G U ÊS C O N TE M P O RÂ N E O

Na linguagem coloquial predomina, porém, a construção com as formas retas,


construção que se vai insinuando na linguagem literária:

Entre eu e tu,
Tão profundo é o contrato
Que não pode haver disputa.
(J. Régio, ED, 91.)

Entre eu e minha mãe existe o mar.


(Ribeiro Couto, PR, 365.)

3.“) Com a preposição até usam-se as formas oblíquas mim, ti, etc.:

Curvam-se, agarram a rede, erguem-na até si.


(R. Brandão, P, 154.)

Um grito do velho Zé Paulino chegou até mim.


(I. Lins do Rego, D, 255.)

Se, porém, até denota inclusão, e equivale a mesmo, também, inclusive, constrói-se
com a forma reta do pronome:

Pois é de pasmar, mas é verdade. E até eu já tive hoje quem me oferecesse


champanhe.
([. Régio, SM, 156.)

Até eu, que sou muito avesso a esses corre-corres, a esse espevitamento de
tomar o cheiro dos famanazes em trânsito, saí-me dos meus cuidados e fui
até o Ministério.
(M. Bandeira, AA, 341.)

F O RM AS ÁTO N AS

1. São formas próprias do o b ie t o d ir e t o o , a, os, as:

Eu avisei-o.
(B. Santareno, TPM, 20.)

Ele olhou-a, espantado.


(Ferreira de Castro, OC, 1,481.)
PR O N O M ES 315

Ângela dominava-os a todos, vencia-os.


(R. Pompeia, A, 222.)

É preciso acompanhá-las.
(Coelho Netto, OS, 1,45.)

2 . São formas próprias do o b ie t o i n d i r e t o : lhe, lhes:

O capitão lhe garantira que tudo fora um mal-entendido.


(M. Palmério, VC, 286.)

Soube inspirar-lhes confiança.


(B. Santareno, TPM, 84.)

3. Podem empregar-se como o b ie t o d ir e t o o u in d ir e t o : me, te, nos e vos.


a) o b ie t o d ir e t o :

Queres ouvir-me um instante, sensatamente?


(U. Tavares Rodrigues, PC, 153.)

Queria-te ver lá em cima.


(Luandino Vieira, ATM, 3.)

Vinde e contemplai-nos, que entardece.


(C. Meireles, OP, 318.)

Ninguém vos abandona, senhor.


(). Régio, ERS, 90.)

b) o b je t o in d ir e t o :

Chamava-me o seu alferes.


(Machado de Assis, OC, II, 234.)

— Ninguém te vai agradecer.


(Alves Redol, BSL, 355.)

Só a leitura dos grandes livros nos pode trazer a compensação das


misérias de certos homens de letras.
(A. R Schmidt, GB, 331.)

— Ouvis o que vos pergunto?


(J. Régio, ERS, 186.)
316 N OVA GRA M ÁTIC A DO P O RT U G U ÊS C O N TE M P O RÂ N E O

O p r o n o m e o b lí q u o á t o n o s u j e i t o d e u m i n f i n i t i v o

Se compararmos as duas frases:

Mandei que ele saísse...


Mandei-o sair.

verificamos que o objeto direto, exigido pela forma verbal mandei, é expresso:
a) na primeira, pela oração que ele saísse;
b) na segunda, pelo pronome seguido do infinitivo: o sair. E verificamos, tam-
bém, que o pronome o está para o infinitivo sair como o pronome ele para
a forma finita saísse, da qual é sujeito. Logo, na frase acima o pronome o
desempenha a função de sujeito do verbo sair.

Construções semelhantes admitem os pronomes me, te, nos, vos (e o reflexivo


se, que estudaremos à parte). Exemplo:

Deixe-me falar.
Mandam-te entrar.
Fez-nos sentar.

E m p r e g o e n f á t ic o d o p r o n o m e o b lí q u o á t o n o

1. Para dar realce ao objeto direto, costuma-se colocá-lo no início da frase e,


depois, repeti-lo com a forma pronominal o (a, os, as), como nestes passos:

Verdades, quem é que as quer?


(F. Pessoa, OP, 530.)

O meu avô, nunca o vi rezando.


(J. Lins do Rego, ME, 83.)

Note-se que, se o objeto direto for constituído de substantivos de gêneros di-


ferentes, o pronome que os resume deve ir para o masculino plural — os:

Se Paulo desejava mesmo escândalo e agitação, teve-os à vontade.


(M. Palmério, VC, 307.)

Salas e coração, habita-os a saudade!


(A. de Oliveira, P, III, 109.)
PR O N O M ES 317

2 . Também o pronome lhe (lhes) pode reiterar o objeto indireto colocado no


início da frase. Comparem-se os conhecidos provérbios:

Ao pobre não lhe prometas e ao rico não lhe faltes.


Ao médico e ao abade, fala-lhes sempre a verdade.

O p ro n o m e d e in t e r e ss e

Em frases como as seguintes:

Olhem-me para ela: é o espelho das donas de casa!


(A. Ribeiro, M, 101.)

Ânimo, Brás Cubas, não me sejas palerma.


(Machado de Assis, OC, 1,534.)

o pronome me não desempenha função sintática alguma. É apenas um recurso


expressivo de que se serve a pessoa que fala para mostrar que está vivamente
interessada no cumprimento da ordem emitida ou da exortação feita.
Este p r o n o m e d e i n t e r e s s e , também conhecido por d a t i v o é t i c o o u d e
p r o v e i t o , é de uso frequente na linguagem coloquial, mas não raro aparece na

pena de escritores.
Por vezes o seu valor se dilui num me expletivo, produzindo belos efeitos:

Desde menino me choro


E ainda não me achei fim!
(F. Pessoa, OP, 543.)

Quem pagará o enterro e as flores


Se eu me morrer de amores?
(V. de Morais, PCP, 333.)

P r o n o m e á t o n o c o m v a l o r p o ss e s s iv o

Os pronomes átonos que funcionam como objeto indireto (me, te, lhe, nos,
vos, lhes) podem ser usados com sentido possessivo, principalmente quando se
aplicam a partes do corpo de uma pessoa ou a objetos de seu uso particular:

Escutaste-lhe a voz? Viste-lhe o rosto?


Osculaste-lhe as plantas?
Tocaste-lhe os vestidos resplendentes?
(Fagundes Varela, PC, II, 272.)
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O barro que em quimeras modelaste


Quebrou-se-te nas mãos.
(C. Pessanha, C, 64.)

Duas lágrimas toldam-lhe a vista, um soluço prende-se-lhe no peito.


(O. Mendes, P, 166.)

P r o n o m e s c o m p le m e n t o s d e v e r b o s d e r e g ê n c ia d is t i n t a

Podemos empregar um só pronome como complemento de vários verbos


quando estes admitem a mesma regência, ou seja, quando o pronome em causa
desempenha idêntica função com referência a cada verbo.
Assim, a frase:

Só Roberto m e viu e cumprimentou.

está perfeita, porque os verbos ver e cumprimentar pedem objeto direto, que, no
caso, vem expresso pelo pronome me.
Se disséssemos, porém:

Só Roberto m e viu e deu as costas,

a frase não estaria bem construída, porque o me ficaria sendo, a um tempo,


objeto direto de ver e indireto de dar.
Nesse caso, é de boa norma repetirmos o pronome:

Só Roberto m e viu e m e deu as costas,

ainda que da construção abreviada se tenham servido alguns dos melhores


escritores da língua.6

O b se r v a ç ã o :
Ainda quando complemento de verbos que tenham a mesma regênda, o pronome
só deve ser omitido com o segundo verbo e seguintes se estiver proclítico ao primeiro
da série, como no exemplo citado:

6 Com razão, diz Mário Barreto que esta regra “não é artificial, e não a combate, nem destrói
a infração dela em certos casos, em que praticamente o autorizam os usos e modismos da
língua, como as locuções entrar e sair do carro, vão e vêm do campo, chegar ou sair de casa,
empregadas por muitos e bons escritores”. (Novíssimos estudos da língua portuguesa. 2.a
edição revista. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1924, p. 112-113, nota).
PR O N O M ES 319

Só Roberto m e viu e cumprimentou.

Vindo enclítico ao primeiro, convém repeti-lo com os demais. Dir-se-á, pois:

Viu-me e cumprimentou-me
ou
Viu-me e me cumprimentou (construção desusada em Portugal)
e não
Viu-me e cumprimentou

O que se disse do pronome enclítico aplica-se ao mesoclítico.


Assim:

Procurar-me-ão e encontrar-me-ão
ou
Procurar-me-ão e me encontrarão (desusada em Portugal)
e não
Procurar-me-ão e encontrarão

V a lo r e s e e m p re g o s d o p r o n o m e se

O pronome se emprega-se como:


a) o b j e t o d i r e t o (emprego mais comum):

Ao sentir aquela robustez nos braços, meu pai tranquilizou-se e


tranquilizou-o.
(G. Amado, HMI, 124.)

Viu-se ao espelho, cadavérico.


(U. Tavares Rodrigues, NR, 107.)

b) o b je t o in d ir e t o :

Sofia dera-se pressa em tomar-lhe o braço.


(Machado de Assis, OC, 1,656.)

Perguntava-se a si mesma Teresa se aquela horrorosa situação seria


um sonho.
(C. Castelo Branco, OS, 1,390.)

Emprego menos raro quando exprime a reciprocidade da ação:


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Os nossos olhos muito perto, imensos


No desespero desse abraço mudo,
Confessaram-se tudo!
(J. Régio, PDD, 83.)

Os estudantes passavam diante dos examinadores aglomerados,


chocando-se uns aos outros como gado saindo em redemoinho da
porta do curral.
(G. Amado, HMJ, 191.)

C) SUJEITODEUMINFINITIVO:

Virgüia deixou-se cair, no canapé, a rir.


(Machado de Assis, OC, 1,497.)

Moura Teles deixou-se conduzir passivamente.


(J. Paço d’Arcos, CVL, 607.)

d ) PR O N O M E a p a s s i v a d o r :

Ouve-se ainda o toque de rebate.


(B. Santareno, TPM, 121.)

Fez-se novo silêncio.


(Coelho Netto, 0 5 ,1,97.)

e) s ím b o l o d e (junto à 3.3 pessoa do singular


i N D E T ER M i N A Ç À O d o s u jeit o

de verbos intransitivos, ou de transitivos tomados intransitivamente):

Vive-se ao ar livre, come-se ao ar livre, dorme-se ao ar livre.


(R. Brandão, P, 165.)

Martelava-se, serrava-se, acepilhava-se.


(Coelho Netto, 0 5 ,1, 131.)

f) (para realçar, com verbos intransitivos, a espontaneidade


pal avra expl et iva
de uma atitude ou de um movimento do sujeito):

As estrelas dirão: — “Ai! nada somos,


Pois ela se morreu, silente e fria...”
(A. de Guimaraens, OC, 258.)
PR O N O M ES

Foi-se embora e à passagem, mascando o charuto, mediu Maria


Antônia de alto a baixo.
(J. Paço d’Arcos, CVL, 929.)

...Vão-se as situações, e eles com elas.


(A. Magalhães, OC, 798.)

g) p a r t e i n t e g r a n t e d e c e r t o s v e r b o s que geralmente exprimem sentimen-

to, ou mudança de estado: admirar-se, arrepender-se, atrever-se, indignar-se,


queixar-se; congelar-se, derreter-se, etc.

— Atreva-se. Atreva-se, e verá.


(M. Torga, NCM, 48.)

D. Adélia queixava-se baixinho.


(G. Ramos, A, 136.)

Leonel arrependeu-se da frase inútil e dura.


(J. Paço d ’Arcos, CVL, 846.)

O b se r v a ç õ e s:
1. a) No português antigo e médio usava-se normalmente a passiva pronominal
com agente expresso, como ilustra este passo camoniano:

Aqui se escreverão novas histórias


Por gentes estrangeiras que virão.
(Ltis., VII, 55.)

Na língua moderna evita-se tal prática. Daí soar-nos artificial uma construção
como a seguinte:

Este verbo, em nossa língua, nunca se usou pelos escritores vernáculos senão
como equivalente de amar.
(R. Barbosa, R, n.° 384.)

2. a) Em frases do tipo:

Vendem-se casas.
Compram-se móveis.

consideram-se casas e móveis os sujeitos das formas verbais vendem e compram, razão
por que na linguagem cuidada se evita deixar o verbo no singular.
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C o m b in a ç õ e s e c o n t r a ç õ e s d o s p r o n o m e s á t o n o s

Quando numa mesma oração ocorrem dois pronomes átonos, um objeto


direto e outro indireto, podem combinar-se, observadas as seguintes regras:
l.a) Me, te, nos, vos, lhe e lhes (formas de objeto indireto) juntam-se a o, a,
os, as (de objeto direto), dando:

mo = me + o ma = me + a m os = m e + os m as = m e + as
to = te + o ta = te + a to s = t e + os tas = te + as
lh o = lh e + o lh a = lh e + a lh os = lh e + os lh as = lh e + as
no -lo = n os + [l]o no-la = n os + [l]a n o -los = n os + [l]o s n o -las = n os + [l]a s
vo -lo = v o s + [l]o vo -la = v o s + [l]a vo -los = v o s + [l]o s v o -las = vos + [l]a s
lh o = lh es + o lh a = lh es + a lh os = lh e s + os lh as = lh e s + as

2. a) O pronome se associa-se a me, te, nos, vos, lhe, e lhes (e nunca a o, a, os,
as). Na escrita, as duas formas conservam a sua autonomia, quando antepostas
ao verbo, e ligam-se por hífen, quando lhe vêm pospostas:

O coração se me confrange...
(O. Mariano, TVP, 1,216.)

A aventura gorou-se-lhe aos primeiros passos.


(C. de Oliveira, AC, 155.)

3. a) As formas me, te, nos e vos, quando funcionam como objeto direto, ou
quando são parte integrante dos chamados verbos pronominais, não admitem
a posposição de outra forma pronominal átona. O objeto indireto assume em
tais casos a forma tônica preposicionada:

— Como me hei de livrar de ti?


(J. Régio, JA, 85.)

Quantas vezes, Amor, já te esqueci,


Para mais doidamente me lembrar,
Mais doidamente me lembrar de ti!
(F. Espanca, S, 71.)

O b se r v a ç õ e s:
l.a) As combinações lho, lha (equivalentes a lhes + o, lhes + a) e lhos, lhas (equi-
valentes a lhes + os, lhes + as) encontram sua explicação no fato de, na língua antiga,
PR O N O M ES 323

a forma lhe (sem -s) ser empregada tanto para o singular como para o plural. Ori-
ginariamente, eram, pois, contrações em tudo normais.
2.a) No Brasil, quase não se usam as combinações mo, to, lho, no-lo, vo-lo, etc. Da
língua corrente estão de todo banidas e, mesmo na linguagem literária, só aparecem
geralmente em escritores um tanto artificiais.

C o lo c a ç ã o d o s p r o n o m e s á t o n o s

1. Em relação ao verbo, o pronome átono pode estar:


a) E N C L íT ico, isto é , depois dele:

Calei-me.

b ) p r o c l í t i c o , is to é, a n te s d ele;

Eu me calei.

c) m e s o c Ut i c o , o u se ja , n o m e io d e le , c o lo c a ç ã o q u e só é p o s sív e l c o m f o r m a s
do FUTURO DO PRESENTE OU do FUTURO DO PRETÉRITO:

Calar-me-ei.
Calar-me-ia.

2. Sendo o pronome átono objeto direto ou indireto do verbo, a sua posição


lógica, normal, é a é n c l is e :

Agarraram-na conseguindo, a muito custo, arrastá-la do quarto.


(Coelho Netto, OS, 1,43.)

Na segunda-feira, ao ir ao Morenal, parecera-lhe sentir pelas costas


risinhos a escarnecê-la.
(Eça de Queirós, 0 , 1 , 124.)

Há, porém, casos em que, na língua culta, se evita ou se pode evitar essa
colocação, sendo por vezes conflitantes, no particular, a norma portuguesa
e a brasileira.
Procuraremos, assim, distinguir os casos de p r ô c u s e que representam a
norma geral do idioma dos que são optativos e, ambos, daqueles em que se
observa uma divergência de normas entre as variantes europeia e americana
da língua.
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R e g ra s g e r a is

Com um só verb o

1. Quando o verbo está no f u t u r o d o p r e s e n t e o u no f u t u r o do p r e t é r it o ,


dá-se tão somente a p r ô c l is e o u a m e s Oc l is e do pronome:

Eu me calarei.
Eu me calaria.
Calar-me-ei.
Calar-me-ia.

2. É , a in d a , p r e f e r id a a p r ô c l is e :
a) Nas orações que contêm uma palavra negativa {não, nunca, jamais, ninguém,
nada, etc.) quando entre ela e o verbo não há pausa:

— Não lhes dizia eu?


(M. de Sá-Carneiro, CF, 348.)

Nunca o vi tão sereno e obstinado.


(C. dos Anjos, M, 316.)

— Ninguém me disse que você estava passando mal!


(A. M. Machado, JT, 208.)

b) nas orações iniciadas com pronomes e advérbios interrogativos:

Quem me busca a e s ta h o r a ta rd ia ?
(M. Bandeira, PP, 1,406.)

— Por que te assustas de cada vez?


(J. Régio, JA, 98.)

Como a julgariam os pais se conhecessem a vida dela?


(U. Tavares Rodrigues, NR, 23.)

c) nas orações iniciadas por palavras exclamativas, bem como nas orações que
exprimem desejo (optativas):

Que o vento te leve os meus recados de saudade.


(F. Namora, RT, 89.)
PR O N O M ES 325

— Que Deus o abençoe!


(B. Santareno, TPM, 18.)

— Bons olhos o vejam! exclamou.


(Machado de Assis, OC, 1,483.)

d) nas orações subordinadas desenvolvidas, ainda quando a conjunção esteja


oculta:

Quando me deitei, à meia-noite, os preços estavam à altura do pes-


coço.
(C. Drummond de Andrade, BV, 20.)

— Prefiro que me desdenhem, que me torturem, a que me deixem só.


(U. Tavares Rodrigues, NR, 115.)

— Que é que desejas te mande do Rio?


(A. Peixoto, RC, 174.)

e) com o gerúndio regido da preposição em:

Em se ela anuviando, em a não vendo,


Já se me a luz de tudo anuviava.
(J. de Deus, CF, 205.)

— Em lhe cheirando a homem chulo é com ele.


(Machado de Assis, OC, 1,755.)

3. Não se dá a é n c l is e nem a p r õ c l is e com os p a r t i c í p i o s . Quando o p a r -


t i c Ip i o vem desacompanhado de auxiliar, usa-se sempre a forma oblíqua

regida de preposição.
Exemplo:

Dada a mim a explicação, saiu.

4. Com os in f in it iv o s soltos, mesmo quando modificados por negação, é lícita


a p r õ c l is e ou a é n c l is e , embora haja acentuada tendência para esta última
colocação pronominal:

E ah! que desejo de a tomar nos braços...


(O. Bilac, P, 72.)
326 N OVA GRA M ÁTIC A DO P O RT U G U ÊS C O N TE M P O R Â N E O

Canta-me cantigas para me embalar!


(Guerra Junqueiro, S, 118.)

Para não fitá-lo, deixei cair os olhos.


(Machado de Assis, OC, 1,807.)

Para assustá-lo, os soldados atiravam a esmo.


(C Drummond de Andrade, CA, 82.)

A ÊNCLISE é m e s m o d e r ig o r q u a n d o o p r o n o m e te m a f o r m a o ( p r in c i p a l-
m e n te n o f e m in in o a) e o in f i n i t i v o v e m r e g id o d a p r e p o s iç ã o a:

Se soubesse, não continuaria a lê-lo.


(R. Barbosa, EDS, 743.)

Logo os outros, Camponeses e Operários, começam a imitá-la.


(B. Santareno, TPM, 120.)

5. Pode-se dizer que, além dos casos examinados, a língua portuguesa tende à
PRóCLiSb pronominal:
a ) q u a n d o o v e rb o v e m a n te c e d id o d e c e rto s a d v é rb io s (bem, mal, ainda, já, sem-
pre, só, talvez, e tc.) o u e x p re ssõ e s a d v e rb ia is e n ã o h á p a u s a q u e o s se p a re :

Até a voz, dentro em pouco, já me parecia a mesma.


(Machado de Assis, OC, 1,858.)

Só depois se senta no chão a chorar.


(Alves Redol, MB, 255.)

Ao despertar, ainda as encontro lá, sempre se mexendo e discutindo.


(A. M. Machado, CJ, 174.)

Talvez Elisabeth se decidisse.


(Ferreira de Castro, OC, II, 261.)

Nas pernas me fiava eu.


(A. Ribeiro, M, 8 8 .)

b ) q u a n d o a o r a ç ã o , d is p o s ta e m o r d e m in v e rs a , se in ic ia p o r o b je to d ir e to o u
p re d ic a tiv o :

Tiram mais que na ceifa; isso te digo eu.


(Alves Redol, G, 108.)
PR O N O M ES

— A grande notícia te dou agora.


(E Namora, NM, 162.)

Razoável lhe parecia a solução proposta.

c) quando o sujeito da oração, anteposto ao verbo, contém o numeral ambos


ou algum dos pronomes indefinidos (todo, tudo, alguém, outro, qualquer,
etc.):

Ambos se sentiam humildes e embaraçados.


(R Namora, TJ, 293.)

Alguém lhe bate nas costas.


(A. M. Machado, JT, 208.)

Todos os barcos se perdem,


entre o passado e o futuro.
(C. Meireles, OP, 37.)

d) nas orações alternativas:

— Das duas uma: ou as faz ela ou as faço eu.


(Sttau Monteiro, APJ, 39.)

Maria, ora se atribulava, ora se abonançava.


(Ó. Ribas, EMT, 18.)

6. Observe-se por fim que, sempre que houver pausa entre um elemento capaz
de provocar a p r ó c u s e e o verbo, pode ocorrer a ê n c l is e :

Pouco depois, detiveram-se de novo.


(Ferreira de Castro, OC, 1,403.)

A ênclise é naturalmente obrigatória quando aquele elemento, contíguo ao


verbo, a ele não se refere, como neste exemplo:

— Sim, sim, disse ela desvairadamente, mas avisemos o cocheiro que


nos leve até a casa de Cristiano.
— Não, apeio-me aqui...
(Machado de Assis, OC, 1,690.)
328 N OVA GRA M ÁTIC A DO P O RT U G U ÊS C O N TE M P O RÂ N E O

O b se r v a ç ã o :
Costumam os escritores do idioma, principalmente os portugueses, inserir uma
ou mais palavras entre o pronome átono em próclise e o verbo, sendo mais comum
a intercalação da negativa não:

Era impossível que lhe não deixasse uma lembrança.


(Machado de Assis, OC, I, 563.)

Conformado pelas suas palavras, o tio calara-se, só para lhe não dar assen-
timento.
(Alves Redol, F, 310.)

Elá tanto tempo que o não via!


(Luandino Vieira, Cl, 64.)

Com um a lo cu çã o v erb a l

1. Nas l o c u ç õ e s v e r b a is em que o verbo principal está no in f in it iv o o u no


pode dar-se:
g e r ú n d io
1. °) Sempre a é n c l is e a o in f in itiv o o u a o g e r ú n d io :

O r o u p e ir o veio interromper-me.
(R. Pompeia,A,37.)

— Que poderá dizer-nos aquele rato de biblioteca?


(A. Ribeiro, AFPB, 215.)

Só quero preveni-lo contra as exagerações do Prólogo.


(A. de Quental, C, 314.)

Nós íamos seguindo; e, em tomo, imensa,


Ia desenrolando-se a paisagem.
(R. Correia, PCP, 304.)

2. °) A p r ó c l is e a o v e r b o a u x ilia r, q u a n d o o c o r r e m as c o n d iç õ e s e x ig id a s
p a r a a a n te p o s iç ã o d o p r o n o m e a u m s ó v e rb o , is to é:
a) quando a locução verbal vem precedida de palavra negativa, e entre elas não
há pausa:

Tempo que navegaremos


Não se pode calcular.
(C. Meireles, OP, 141.)
PR O N O M ES 329

Rita é minha irmã, não me ficaria querendo mal e acabaria rindo


também.
(Machado de Assis, OC, 1,1051.)

— Ninguém o havia de dizer.


(A. Ribeiro, M, 6 8 .)

Jamais me hão de chamar outro mais doce.


(F. Espanca, S, 49.)

b) nas orações iniciadas por pronomes ou advérbios interrogativos:

— Que mal me havia de fazer?


(M. Torga, NCM, 47.)

Que é que me podia acontecer?


(G. Ramos, A, 152.)

— Em que lhe posso ser útil, senhor Petra?


(A. Ribeiro, M, 268.)

Como te hei de receber em dia tão posterior?


(C. Meireles, OP, 406.)

c) nas orações iniciadas por palavras exclamativas, bem como nas orações que
exprimem desejo (optativas):

Como se vinha trabalhando mal!


Deus nos há de proteger!

d) nas orações subordinadas desenvolvidas, inclusive quando a conjunção está


oculta:

O sufrágio que me vai dar será para mim uma consagração.


(E. da Cunha, OC, II, 634.)

Ega subiu ao seu quarto, onde outro criado lhe estava preparando
o banho.
(Eça de Queirós, O, II, 329.)

Eram orações extraordinariamente tocantes, que N. lamenta não ter


guardado na memória, ou registrado à proporção que as ia ouvindo.
(A. F. Schmidt, F, 171.)
330 N OVA GRA M ÁTIC A DO P O RT U G U ÊS C O N TE M P O R Â N E O

Ao cabo de cinco dias, minha mãe amanheceu tão transtornada que


ordenou me mandassem buscar ao seminário.
(Machado de Assis, OC, 1,800.)

3.°) A ÊNCLiSE a o v e r b o a u x ilia r, q u a n d o n ã o se v e rific a m essas c o n d iç õ e s


q u e a c o n s e lh a m a p r ô c l is e :

Vão-me buscar, sem mastros e sem velas,


Noiva-menina, as doidas caravelas,
Ao ignoto País da minha infância...
(F. Espanca, S, 179.)

Ia-me esquecendo dela.


(G. Ramos, AOH , 40.)

A cidade ia-se perdendo à medida que o veleiro rumava para São


Pedro.
(B. Lopes da Silva, C, 207.)

2. Quando o verbo principal está no p a r t ic íp io , o pronome átono não pode


vir depois dele. Virá, então, p r o c l ít ic o o u e n c l ít ic o ao verbo auxiliar, de
acordo com as normas expostas para os verbos na forma simples:

— Tenho-o trazido sempre, só hoje é que o viste?


(M. J. de Carvalho, TM, 152.)

— Arrependa-se do que me disse, e tudo lhe será perdoado.


(Machado de Assis, OC, 1,645.)

Que se teria passado?


(Coelho Netto, OS, I, 1412.)

Queria mesmo dali adivinhar o que se tinha passado na noite da


sua ausência.
(Alves Redol, F, 195.)

A c o lo c a ç ã o d o s p r o n o m e s á to n o s n o B ra s il

A colocação dos pronomes átonos no Brasil, principalmente no colóquio


normal, difere da atual colocação portuguesa e encontra, em alguns casos, similar
na língua medieval e clássica.
PR O N O M ES

Podem-se considerar como características do português do Brasil e, também,


do português falado nas Repúblicas africanas:
a) a possibilidade de se iniciarem frases com tais pronomes, especialmente com
a forma me:

— Me desculpe se falei demais.


(É. Veríssimo, A, II, 487.)

Me arrepio todo...
(Luandino Vieira, NM, 138.)

b) a preferência pela próclise nas orações absolutas, principais e coordenadas


não iniciadas por palavra que exija ou aconselhe tal colocação:

— Se Vossa Reverendíssima me permite, eu me sento na rede.


(J. Montello, TSL, 176.)

O usineiro nos entregava o açúcar pelo preço do dia, pagava a co-


missão e armazenagem e nós especulávamos para as praças do Rio
e São Paulo.
(J. Lins do Rego, 17,251.)

— A sua prima Júlia, do Golungo, lhe mandou um cacho de bana-


nas.
(Luandino Vieira, NM, 54.)

c) a próclise ao verbo principal nas locuções verbais:

Será que o pai não ia se dar ao respeito?


(Autran Dourado, SA, 6 8 .)

— Não, não sabes e não posso te dizer mais, já não me ouves.


(Luandino Vieira, NM, 46.)

Outro teria se metido no meio do povo, teria terminado com aquela


miséria, sem sangue.
(J. Lins do Rego, U, 222.)

Tudo ia se escurecendo.
(J. Lins do Rego, [/, 338.)
332 N OVA GRA M ÁTIC A DO P O RT U G U ÊS C O N TE M P O R Â N E O

Justificando essa última colocação, escreve Martinz de Aguiar:


“Numa frase como ele vem-me ver, geral em Portugal, literária no Brasil, o
fator lógico deslocou o pronome me do verbo vem, para adjudicá-lo ao verbo ver,
por ser ele determinante, objeto direto, do segundo e, não, do primeiro. Isto é:
deixou a língua falada no Brasil de dizer vem-me ver (fator histórico por ser mera
continuação do esquema geral português), para dizer vem me-ver, que também
vigia na língua, ligando-se o pronome ao verbo que o rege (fator lógico). Esta
colocação de tal maneira se estabilizou, que pouco se diz vem ver-me e trouxe
consequências imprevistas:
1. a) Pôde-se juntar o pronome ao particípio procliticamente: Aqueles haviam
se-corrompido.
2. a) Pôde-se pôr o pronome depois dos futuros (do presente e do passado):
Poderá se-reduzir, poderia se-reduzir. Deixando de ligar-se aos futuros, para
unir-se ao infinitivo, deixou igualmente de interpor-se-lhes aos elementos
constitutivos.
3. a) Em frases como vamo-nos encontrar, deixando o pronome de pospor-se
à forma verbal pura, para antepor-se à nominal, deixou igualmente de deter-
minar a dissimilação das sílabas parafônicas, podendo-se então dizer vamos
nos-encontrar”.7

PRO N O MES POSSESSIV OS

PRO N O M ES PESSO AIS, PO SSESSIV O S E DEM O NSTRATIV OS

Estreitamente relacionados com os pronomes pessoais estão os p r o n o m e s


e OS DEMONSTRATIVOS.
po s s e s s iv o s
Os p r o n o m e s pe s s o a is , vimos, denotam as pessoas gramaticais; os outros
dois indicam algo determinado por elas:
a ) o s po s s e s s iv o s , o q u e lh e s c a b e o u p e r te n c e ;
b) os d e m o n s t r a t iv o s , o que delas se aproxima ou se distancia no espaço e no
tempo.

Podemos, assim, estabelecer estas correspondências prévias:

1 .a P ess o a 2 .a P ess o a 3 .a P ess o a

Pro n o m e p esso al eu ele


tu
Pro n o m e p o sse ssiv o m eu te u seu
Pro n o m e d e m o n stra tiv o este esse a q u e le

Notas de português de Filinto a Odorico. Rio de Janeiro, Simões, 1955, p. 409.

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