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A Sociedade Romana Tardia: resumo e comentário

Danilo L. Delgado

O texto “A Sociedade Romana Tardia” é, de fato, um capítulo do livro “A


História Social de Roma”, organizado por Geza Alfoldy, historiador húngaro
formado pela Universidade de Budapeste, em seu país natal. No capítulo,
Alfoldy aborda o cenário da sociedade romana enquanto o Império caminhava
para o seu fim, tratando especialmente das situações observadas a partir da
crise do século III, quando, segundo o autor, as mudanças observadas nos
paradigmas sociais do Império Romano tornaram o Estado latino insustentável
em seus próprios meios.

Geza divide o capítulo em quatro seções, nas quais busca abordar


diversos aspectos da sociedade romana e como, porque e em qual escala eles
foram essenciais para o colapso final do Império Romano do Ocidente. Na
primeira parte do texto, Alfoldy trata das diversas classes sociais existentes em
todo o império e como elas foram modificadas de maneira a propiciar a
implosão do Estado ocidental, além de defender seu ponto de vista quanto à
gradualidade do processo que levou ao fim da dita Idade antiga e, portanto, ao
começo da era medieval. Em seu artigo, o historiador húngaro afirma que a
transição entre o período da antiguidade para o medieval foi característica por
seu caráter lento e gradual, sendo o fim do Império Romano não um marco
definitivo para se definir o fim da antiguidade, mas, sim, um ponto de não
retorno para a consolidação das novas práticas sociais, econômicas e políticas
observadas ao longo do medievalismo em sobreposição às obsoletas formas
de organização observadas ao longo das eras de ouro de gregos e romanos,
povos mais influentes na Europa ao longo de toda a Idade Antiga.

A partir disso, o autor passa a trazer à tona os fatores gerais da


sociedade romana a partir do terceiro século, tratando das mudanças
observadas na organização social e política do regime romano e como elas
afetaram todo o funcionamento da engrenagem estatal do império. Alfoldy,
inicialmente, afirma que a escassez de recursos essenciais para a população e
para a manutenção da governabilidade foram extremamente prejudiciais para o
Estado romano, uma vez que seu gigantesco aparelho fora projetado para
funcionar com uma enorme oferta patrimonial ao seu entorno. O escritor
prossegue afirmando que o aparelho estatal romano era um fim em si mesmo,
e as grandes falhas observadas em seu funcionamento desde a crise do
Século III não abriram margem para outra alternativa que não o colapso de
todo o Estado.

Posteriormente, Alfoldy aborda as características observadas nas


classes sociais romanas e como era possível perceber a queda da qualidade
de vida e do poder político de praticamente todos os habitantes do império. O
autor começa citando os cada vez mais constantes cercamentos de povos
bárbaros ao redor de cidades importantes do império, incluindo Roma. Além
disso, a maneira com que as ordens superiores e a cidadania perdem
importância na sociedade latina são, para o autor, um indício da formação de
classes dominantes cada vez mais restritas, mesmo dentro das camadas
superiores da pirâmide social romana, enquanto situações como a
hereditariedade da profissão aproximam cada vez mais todos os indivíduos
tidos como membros das classes inferiores, incluindo escravos, propiciando a
observação de uma classe cada vez mais homogênea. Exemplos dessas duas
situações são a transferência do prestígio de membros das ordens superiores
para os administradores do Estado e a criação de leis que praticamente
extinguiam o trabalho livre entre os pobres.

Mais à frente, o historiador aborda aspectos políticos de dentro do


próprio governo, como a forte elitização do senado e a queda do prestígio da
função senatorial, uma vez que se acentuavam as diferenças ideológicas e o
regionalismo entre seus praticantes comparando, ainda, a situação de Roma
com o senado do império do oriente, em Constantinopla. Alfoldy trata, ainda,
dos Curialis, médios proprietários de terra responsáveis pelo funcionamento do
Estado em esferas mínimas, como um bairro ou uma comunidade. O autor
afirma que, em situação quase punitiva, os Curialis eram responsáveis por
cobrar impostos e, muitas vezes, deixavam suas regiões em fuga da função.

Dessa forma, observa-se que as classes dominantes eram cada vez


mais diversificadas e conflitantes entre si, enquanto a base da pirâmide social
romana aumentava, paralelamente, suas condições de miséria e
homogeneidade, fomentando revoltas contra o Império e forçando ações
repressivas do exército romano. Apesar disso, o autor afirma que inexistia uma
classe revolucionária com objetivos reunidos, sendo os atos esporádicos e
desligados entre si.

Visto isso, pode se perceber uma clara visão do autor sobre os motivos
do fim do Império Romano do Ocidente e, portanto, da Idade Antiga. Para
Algolgy, o fim do império deu-se, essencialmente, pelo poder do Estado ser
baseado cada vez mais em uma camada social superior progressivamente
mais restrita, entrando em colapso para com toda a sociedade e provocando a
demanda incessante por novas formas de organização social, política e
econômica.

A partir da leitura do texto do Capítulo 7 do livro de Geza Alfoldy, pode-


se obter uma visão esclarecedora sobre os fatores que ocasionaram no fim do
Império Romano do Ocidente, tanto nas esferas política e, especialmente,
social da sociedade romana. O artigo de Alfoldy é extremamente completo
apesar de, em alguns momentos, se mostrar repetitivo e até controverso na
busca por um panorama que leva ao colapso do Estado latino. Pode-se, até,
afirmar que vem disso a mais marcante característica do capítulo: o autor não
busca construir um panorama social único que culmina no fim da antiguidade
clássica definida atualmente, mas, sim, elenca e explica minuciosamente
diversas características da sociedade romana tardia que tiveram influência no
processo de queda da monarquia imperial de Roma.

Cabe destacar, também, a enorme importância da afirmação de que o


fim da antiguidade não foi um instante imediato que se sucedeu do fim do
Império em 476, mas um longo processo ocorrido desde a crise do século III no
qual as características mais marcantes da organização social vigente no
período foram progressivamente substituídas por novas posturas típicas do que
foi caracterizado historicamente como Idade Média.
Dessa forma, observa-se que o texto é essencial para a compreensão
de como foi dado o fim do Império Romano do Ocidente e quais foram os
principais causadores temporais, estruturais e pessoais desse processo
histórico, além de trazer o real significado social que o império tinha entre as
populações romanas durante e antes do colapso do Estado Imperial de Roma.
ALFOLDY, G. A Sociedade Romana Tardia. In: _____. A História Social
de Roma. Lisboa: Presença, 2001. P. 200-233.

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