Exílio, mobilidade e poder: Desde os mais remotos momentos da civilização
ocidental, com um olhar especial para o mediterrâneo, a política de cassação de direitos civis se mostra como uma prática recorrente. Contudo, mesmo que as políticas de exílio fossem, em um momento compreendidas como uma só coisa, o passar dos séculos e a mudança das instituições jurídicas romanas provaram a grande maleabilidade da aplicação do exílio. Em primeiro plano, é necessário estabelecer, talvez por limitação da linguagem, algumas diferenças semânticas entre as diferentes formas de exílios existentes ao longo da história de Roma. Existem três principais modalidades de exílio que são observados no Estado Romano em seus anos finais: relegatio, deportatio e in metallum. Ambas as modalidades compartilham características em comum, mas existem detalhes em sua aplicação que as tornam particulares. A relegatio, a forma de exílio mais recorrente durante o período republicano, se mostra como uma forma um pouco mais branda de exílio, tendo em vista que, a pena em questão, poderia ser temporária, além de que os bens pessoais do culpado eram apenas parcialmente confiscados. Por outro lado, a história romana nos mostra que a deportatio, na maioria da vezes, era de caráter mais agressivo e austero pois, por sua vez, era em todos os casos perpétua e confiscava todos os bens do indivíduo, tornando-o verdadeiramente apátrida. Existe, ainda, uma modalidade um pouco menos conhecida, denominada in metallum, no qual, o exílio, era acompanhado de uma punição laboral, tal como o trabalho compulsório em minas ou pedreiras. Tendo em vista a efetividade do exílio no meio político para a neutralização de indivíduos cujos bens e influência local eram seus maiores poderes, a utilização deste método punitivo como parte do jogo político romano se tornaria cada vez mais difundida. Com efeito, o que se extrai da análise da política de exílio ao longo da história, é que, ao contrário do senso comum, o exílio não se tratava de uma simples pena jurídica causada por infrações legais, mas, na prática, servia de ferramenta política de repressão da mobilidade imprescindível para o funcionamento do dominato. O exílio feminino no principado: Acredita-se que, por conta de ser um período político certamente mais estável do que nos séculos conseguintes, a motivação dos exílios femininos durante o principado tenha uma gama de motivações menos complexa e difícil de ser compreendida, em comparação com os casos da antiguidade tardia. A maioria dos casos relatados de exílio no período anterior ao dominato eram feitos pela relegatio, e estavam ligados ao adultério ou outras formas de infidelidade conjugal. Um dos exemplos mais notórios desses exílios por adultério (ou por um suposto adultério) é a de Júlia, filha de Otaviano Augusto, que no ano 2 d.C, sofreu a relegatio por conta de uma acusação vinda de seu esposo, e morreu exilada. São notados outros relevantes casos de exílio por adultério, especialmente visto nos primeiros imperadores, tais como o exílio de Agripina, esposa de Tibério, aparentemente causado por questões políticas, e o de Otaviana, esposa de Nero, que, após uma acusação de relação com um escravo, sofreu a relegatio. O exílio feminino no dominato: Não é de se esperar que, durante um período tão conturbado e politicamente instável quanto o dominato, a natureza dos processos de condenação ao exílio, especialmente para as mulheres, também tome uma forma distinta. Um dos mais notórios casos de exílio feminino referentes a esse período a serem estudados é o de Justina, esposa do imperador Valentiniano, já no século IV. Registros de historiadores como João Malalas, nos mostra como, claramente, houve uma mudança nas motivações dos exílios das esposas dos imperadores durante a antiguidade tardia. Seus relatos contam que, após a compra de uma propriedade subavaliada, o imperador Valentiniano, por uma razão ainda incerta, julga necessário colocá-la em exílio. Incontáveis especulações a respeito de exílios como o de Justina são feitas no meio acadêmico, contudo, é certo que, a partir desse momento, o estudo das condenações jurídicas relativas ao exílio se volta mais para o campo político do que para a esfera emocional/passional, como visto anteriormente. É especulado que talvez a história da propriedade avaliada seja apenas uma desculpa para um ato de preservação política do imperador, tendo em vista o quão influente e prestigiada a Augusta era no meio, porém, fato é que, de uma forma ou de outra, o exílio no dominato possui uma natureza distinta dos exílios no principado. O exílio de Gala Placídia: Assim como diversos outros casos de exílio contemporâneos às dinastias constantina e valentiniana, o notório e excepcional caso do exílio de Gala Placídia se mostra como um importantíssimo objeto de estudo para as relações de poder durante o dominato. Filha de Teodósio e Irmã do Imperador Honório, Placídia inicia sua vida com um verdadeiro espírito cosmopolita, ao viajar e mudar de residência frequentemente. Em sua juventude, chegou a se casar com Ataulfo, rei Visigodo que em poucos anos morreria, e, dessa forma, daria espaço para Constâncio III no casamento de Placídia. As particularidades desse caso pouco diferem do já conhecido instável jogo político de usurpação na antiguidade tardia e, sendo assim, após a morte de Constâncio, a confusa relação de Placídia com seu irmão Honório termina em seu exílio, após a descoberta de uma suposta conspiração que Gala tramava. A grande notoriedade do caso em questão, não reside puramente no complexo entendimento de sua motivação, mas, na verdade, nos efeitos políticos sociais que o exílio de Gala Placídia tivera em seu meio. Diferente das clássicas narrativas aos moldes do principado de exílio feminino ao longo da história de Roma, a relegatio de Placídia se destaca por ocupar um status gigante de mudança no cenário político na cidade onde foi exilada. Este caso revela a grande importância que a Augusta de fato tivera na conjuntura política do oriente/ocidente nos últimos anos do império romano. Os documentos para o estudo do exílio da imperatriz: As detalhadas histórias do cenário político romano durante os últimos anos de sua existência sobreviveram, quase que inteiramente, por meio de relatos e testemunhos de indivíduos que estiveram aos pés dos casos em questão. O peculiar caso do exílio de Gala Placídia e todo o drama que revolvia o jogo político entre Império Romano do Oriente e do Ocidente é, ainda hoje, perpetuado graças à contribuição de historiadores como Olimpiodoro de Tebas e Filostórgio. Um dos mais relevantes documentos necessários para a compreensão do exílio de Gala Placídia é atribuído ao próprio Olipiodoro, no qual é destacada a estranha relação pessoal de Placídia com seu irmão Honório, além de detalhes tangentes ao processo de mudança de cidade. É também relevante explicitar a contribuição de Filostórgio em sua História Eclesiástica, no qual são documentados inúmeros pontos importantes acerca da mudança de Gala do ocidente para o oriente, atentando para o seu trajeto e suas circunstâncias.
A burguesia deseja acima de tudo se tornar a nobreza, por conta disso ela se apossa de costumes tipicamente ligados à aristocracia, para assim conseguir alguma aprovação de classe e consequentemente poder sentar e