Patrícios versus Plebeus: Sabe-se que os eternos conflitos entre patrícios e
plebeus, que durariam até os últimos dias de Roma, tem suas origens nos mais arcaicos momentos da cidade. No entanto, o que se tem certeza é que, o boom civilizacional que a República romana presenciou, foi um catalizador ainda maior para os atritos entre essas classes, tendo em vista a crescente disparidade de oportunidades econômicas advindas com o expansionismo republicano. De um lado, os patrícios, alegadamente descendentes da elite senatorial e dos fundadores de Roma, imediatamente ocuparam os mais importantes magistérios assim que foi instituída a República. Eram, também, detentores do mais valioso bem em toda a Roma, as terras. Dessa forma, com a progressiva demanda agrária por parte da população, e com a constante necessidade de recursos para a guerra, foi inevitável a acentuação dos privilégios que os patrícios possuíam. Por outro lado, os plebeus, o grosso da população, frente à evidente desvantagem política que caíram sobre eles, tiveram que lutar incansavelmente por uma participação mais justa na política, e alguma forma de fazerem seus interesses serem ouvidos. Sendo assim, gradualmente pôde ser visto um avanço com relação à participação popular na política, como por exemplo: a criação das instituições plebeias no século V a.C, garantindo a criação do magistério dos “tribunos da plebe”, que representavam os anseios do povo frente ao senado, tendo poder de veto contra legislações patrícias; a assembleia da plebe, que buscava ouvir e conciliar as opiniões das diferentes classes dentro da própria plebe e resolver os conflitos internos; a criação da “Lei das doze tábuas”, consolidando por escrito as leis já promulgadas; a criação das leis Canuleia e Hortênsia, que possibilitavam o casamento entre patrícios e plebeus, além da legalização de plebiscitos populares realizados em assembleia; e, por fim, a aceitação da participação dos plebeus em todos os magistérios, incluindo o de senador e altos cargos sacerdotais. Ao fim do século IV a.C, já se julgava que havia uma maior igualdade de participação política entre os cidadãos, independentes de sua classe, além do fato que, neste momento, todo o conjunto de leis aprovadas já representava o que se pode chamar de Constituição Romana. (CORASSIN pg. 21 a 24) As instituições republicanas: O traumático período monárquico, associado com atos perversos de tirania e despotismo, serviu de lição para a criação de um novo modelo político que respeitasse integralmente a “libertas” do povo romano. Dessa maneira, a fundação da República se preocupou em organizar instituições governamentais que tivessem um limite de tempo, poder e autoridade de mandato, dando a segurança que a liberdade do povo fosse sempre garantida (mesmo que na prática não ocorresse exatamente dessa forma). As principais instituições que formavam o corpo cívico romano eram: o Senado, figura tão simbólica para esse período Romano; as magistraturas, divididas entre cargos de maior e menor autoridade; e por fim, mas não menos importante, as assembleias, teoricamente responsáveis pelo equilíbrio do poder do Estado e das vontades do povo. Os magistrados eram divididos entre cinco principais cargos, todos encarregados de um aspecto diferente do corpo cívico: no topo havia os dois Cônsules, a autoridade máxima do Estado, detentor do imperium, que lhes permitiam comandar e emitir ordens aos exércitos, conduzir questões públicas, além de presidir e liderar o Senado; logo em seguida, havia os pretores, incumbidos de exercerem a justiça (também detentores de imperium).Por fim, nos magistrados inferiores estavam os Censores, realizando o censo e supervisionavam os gastos públicos; os Édis, responsáveis pelos serviços e obras públicas, e os Questores, uma espécie de tesoureiro oficial do Estado. Como dito antes, de modo a garantir a liberdade do povo, todos os cargos, com exceção dos Censores, tinham um mandato de apenas um ano. No entanto, uma particularidade do magistrado de Cônsul, é que, caso fosse necessário, o Senado poderia votar para a instauração do cargo extraordinário de ditador, que atribuía ao consulado a detenção de poderes de ordem ainda mais poderosos em momentos de guerra ou revoltas. (CORASSIN pg. 25 a 27) O imperialismo e a expansão romana: Acredita-se que o processo de anexação de regiões vizinhas, como o Lácio, a Etrúria e a Campânia, e, posteriormente de completa unificação da península itálica, tenha sido extremamente rentável para os cofres públicos romanos e principalmente para os grandes detentores de terras. A incorporação de diferentes regiões da Itália central, com seus diferentes costumes e modelos políticos certamente representou um empecilho para o Estado romano, sendo necessária a criação de uma verdadeira missão diplomática entre os nobres dessas regiões conquistadas e as autoridades romanas, relações essas, que perdurariam até o final da República. Com efeito, verifica-se que o tão grandioso sucesso militar de Roma ao expandir seus territórios está intimamente com a própria organização econômica e política da República: Tinham colônias em pontos estratégicos, ajudando no abastecimento das tropas, formando, assim, uma máquina de guerra autossustentável, em detrimento da má localização das cidades inimigas; havia sempre uma grande disponibilidade de soldados ao dispor do Cônsul; e por fim, cultivavam uma longa política de diplomacia, podendo negociar e conceder cidadania a povos conquistados, sendo um fator de grande importância para a instauração de relações mais estáveis entre as colônias e Roma. No entanto, o grande momento de virada e atualização romana para o status de superpotência mediterrânea, foi no estourar das Guerras Púnicas. Evidentemente Cartago, uma das maiores potências na bacia mediterrânea, ao se ver ameaçada pelo nascimento de um novo império ultramarino, recorreu ao conflito armado para frear as novas conquistas de Roma. Isto posto, o final da Primeira Guerra Púnica terminou com as autoridades cartaginesas firmando um acordo de paz, que, poucos anos depois seria quebrado pela mesma, reiniciando um longo processo de conflitos que perdurariam até 146 a.C, com a derrota definitiva de Cartago, e a elevação de Roma como os senhores do mediterrâneo. Imediatamente após a queda de Cartago, iniciou-se um encadeamento sem precedentes de conquistas de outras regiões vizinhas da península Itálica, como a Grécia (dando fim ao império Macedônico), a península Ibérica e regiões do norte da África. Sendo assim, a conquista territorial dessas regiões possibilitou ainda mais o enriquecimento das elites romanas, atuando incessantemente na extração de metais preciosos, além, obviamente, na expansão de terras destinadas ao cultivo. (CORASSIN pg. 29 a 37) O senado na república: A glória militar advinda das vitoriosas campanhas de conquista de novas regiões elevou enormemente o valor e a influência que a instituição do Senado possuía na vida cívica romana. Dessa forma, iniciou-se um processo de elitização e de exclusividade cada vez maior para o cargo de Senador, e, consequentemente de Cônsul, sendo este, destinado apenas para um seleto grupo aristocrático que se julgavam mais importantes. Certamente a vasta aquisição de novas terras agrárias por toda a Itália e o Mediterrâneo representou fortemente a prosperidade dessa nova elite que cada vez mais se diferenciava da baixa nobreza. O sucesso advindo das pilhagens, saques e conquistas das novas regiões eram a maior fonte de enriquecimento dessa alta aristocracia, que, com o tempo, tornou cada vez mais difícil para cidadãos “comuns” serem qualificados o suficientes para ocupar o prestigiado cargo de senador. O distanciamento cada vez mais proeminente entre a baixa aristocracia e os senadores enriquecidos pela nova fase da república, resultando no estabelecimento de uma oligarquia senatorial altamente poderosa e influente, que, gradualmente gerava uma nova tensão entre as classes inferiores na hierarquia sociopolítica romana. Nota-se também a emergência de um novo grupo de comerciantes romanos que tiveram um crescimento econômico exponencial durante as práticas imperialistas romanas, a chamada ordem equestre. Os chamados “novos ricos” de Roma, consistiam em um grupo fortemente enriquecido, que se tornou um dos mais prestigiados indivíduos da sociedade romana, e, dessa forma, possuindo incontáveis propriedades agrárias, que acentuaram ainda mais o descontentamento do povo com a elitização das terras. (CORASSIN pg. 38 a 42) Os conflitos agrários: Inegavelmente, um dos mais notáveis resultados do nova configuração política e econômica da República foi o tensionamento entre as relações sociais da plebe e os grandes latifundiários da elite. Os estragos causados pelos constantes conflitos que Roma enfrentou (principalmente as guerras púnicas) foram elementos catalizadores para o empobrecimento generalizado da plebe romana. Endividados e sem-terra, os soldados- agricultores, ao voltarem da linha de frente, se depararam com suas pequenas propriedades completamente destruídas, e certamente, não possuíam os recursos necessários para a reforma dessas terras tornadas improdutivas. Com efeito, sendo obrigados a vende-las para proprietários mais ricos, iniciou-se em Roma uma tensão social, principalmente no meio rural, que dificilmente seria controlada até o fim da República. No entanto, a classe que mais inflamaria os conflitos agrários não eram os plebeus, que, ao menos possuíam plena cidadania, mas os escravos trazidos das zonas conquistadas por Roma. As pilhagens e tomada de estrangeiros como escravos nas novas terras fundiárias foram indubitavelmente a maior fonte de renda e motor da máquina de guerra romana alimentada por essas propriedades agrárias. Especialmente nas propriedades dedicadas ao pastoreio se iniciou um processo de revolta por parte dos escravos para com os seus donos, de modo a obterem a sua liberdade e retornarem à sua terra natal. Uma das mais notórias revoltas agrárias desse período ocorreu na Sicília no ano de 74 a.C, liderada por Espártaco, um escravo da Trácia. O movimento definitivamente obteve alguma atenção, entretanto não havia a menor chance de os escravos beligerantes enfrentarem de maneira igualitária o exército romano, quer reprimiu com brutalidade as revoltas. Com efeito, o surgimento de figuras como a de Tibério e, posteriormente, de seu irmão Caio Graco, era apenas uma questão de tempo, tendo em vista a crescente inquietação por parte da plebe que ansiava por uma melhor distribuição fundiária. É interessante ressaltar como, Tibério e Caio Graco, na realidade, não eram revolucionários que buscavam subverter a constituição, pelo contrário, eram tribunos da plebe que tinham como objetivo efetivar as já existentes leis de delimitação de terras, completamente ignoradas pela elite agrária, e que, ainda assim, continuaram agindo na ilegalidade. Ambos os Gracos foram assassinados por uma conspiração do Senado, e, dessa forma, tornando-se ícones deste momento vivido na República. (CORASSIN pg. 43 a 57) As guerras civis: Assim como no final do período monárquico, os últimos 100 anos da república foram marcados por uma incontrolável instabilidade social, econômica e política. Revoltas dentro do território romano borbulhavam a todo o momento, como a Guerra Social, no ano 91 a.C, que foi causada por uma revolta generalizada por parte de cidades vizinhas (antigos aliados de Roma, possuidores do título de socii), que em um ato de protesto à autoridade romana, que se negava a lhes concederem cidadania, promulgaram a criação de um Estado paralelo dentro de Roma. Frente a esse cenário atípico de desordem social, figuras como a de Mário e Lúcio Sila surgiram de modo a tomar as rédeas do governo e reorganizar o aparelho estatal, no entanto, o resultado foi uma tomada forçada do cargo de ditador por Sila, tornando ainda mais caótico o cenário que Roma vivia. E dessa maneira se passaram as últimas décadas da República: diversas tentativas de golpe e reformas radicais na detenção do poder, incontáveis revoltas, tumultos e atentados a figuras políticas. Por fim, o cenário político que Roma enfrentava foi firmada uma resolução por homens influentes e especialmente relevantes para a sociedade no momento. Licínio Crasso, Pompeu e Júlio Cesar tornaram por instaurar o Primeiro Triunvirato, uma tentativa de estabilização e de organização do poder. Contudo, com a morte de Crasso em uma terrível derrota durante uma campanha no Oriente, instaurou-se uma tensão entre Pompeu e Júlio Cesar, ambos interessados em tomarem o poder para si. Dessa forma iniciou-se a guerra civil em Roma no ano de 49 a.C, momento crucial para a definição do destino da República nos próximos anos. Sendo assim, com a vitória de César, Roma enfrentaria uma virada em sua história tão grande quanto a queda dos reis. César adquiriu o status de ditador vitalício, obtendo plenos poderes sobre o exército e sobre as demais magistraturas. Além disso, foi instaurada uma profunda reforma em diversos pontos tocantes à política e a economia: a constituição foi alterada, o Senado agora contava com 900 membros (diluindo o seu poder e tornando-o mais fraco), e, por fim realizou uma série de medidas altamente populares entre a plebe, como a distribuição mais justa de trigo às camadas mais baixas e um maior controle sobre o poder dos governadores das colônias, impedindo abusos e atitudes tirânicas. A morte de Cesar resultou na criação do Segundo Triunvirato, agora formado por Marco Antônio, Otaviano e Lépido, no entanto, pouco tempo foi necessário para a resolução do último grande conflito civil na República. Com Lépido enfraquecido, e Marco Antônio morto em sua covarde fuga para a Macedônia, Otávio Augusto agora se tornara princeps de Roma. General absoluto das forças militares, e antecessor de toda uma nova linha de soberanos, Otávio já não possuía mais o título de cônsul, mas de Imperador, dando assim, fim à República Romana. (CORASSIN pg. 58 a 62)