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A Igreja feudal

História – 2021/01

História Medieval – Prof. Érica Christyane

Caio Ribeiro de Siqueira Silva

1 - Igreja e feudalismo 
Mesmo que o termo “Igreja”, com o passar dos séculos, venha adquirir
diferentes tendencias com relação ao seu significado, é basilar, para a plena
compreensão do mundo feudal, que se considere a importância dessa
instituição. Em alguns momentos, a “Igreja” abrange toda gama de indivíduos
inseridos na Eclésia, sejam eles leigos ou religiosos, e, em outros, denota
apenas os pertencentes à hierarquia eclesial de bispos, padres e diáconos,
mas, em todas as ocasiões, se refere a uma instituição que moldou
integralmente a cultura e o imaginário medieval. Seria errôneo dizer que a
Igreja possuía influência apenas no aspecto político, econômico ou cívico
pois, ao tratar de Catolicismo Medieval, nos referimos à constituição de toda
uma cosmovisão e estilo de vida pautado na ortodoxia da fé cristã. Se é
possível afirmar a existência de uma espinha dorsal que mantém de pé as
civilizações ao longo das épocas, seja ela religiosa ou ideológica, sem
dúvidas, a Igreja Católica, em sua missão de salvação das almas, foi a
responsável por conduzir a sociedade Europeia entre a Antiguidade e a
Modernidade. (Baschet, Jerome pg 167 a 169)

2 - Fundamentos do poder eclesial 


Em primeiro plano, faz-se necessário compreender a ideia de um clero
enquanto setor intrínseco à classe dominante, isto é, a aristocracia, pois seria
incorreto designar a ínfima fração de bispos e párocos do feudo como uma
classe por si só. É importante notar como, apesar de nem sempre serem
amistosas, as relações entre a nobreza e o clero sempre foram próximas, e
justamente por meio dessa proximidade que se salientava a formação do poder
dominante no medievo - desde Teodósio até as últimas dinastias francesas.
Sendo assim, partindo da ideia de que o clero ali estava como justo e
imprescindível mediador entre Deus e a humanidade, todo aquele poder
exercido por meio do controle de terras e construções estava calcado em um
sólido princípio de validação por meio do transcendente. A contribuição do
dízimo e das doações firmavam a relação de dependência que esses dois
setores da sociedade possuíam: a Igreja necessitava da contribuição material
para a manutenção de suas posses, e o laicato buscava recompensas
espirituais por meio de suas boas ações. Dessa forma, com a constante
renovação dos sacramentos, conferindo-lhes graças, os leigos e o clero
asseguravam a harmonia da vida medieval. (Baschet, Jerome pg 167 a 178)

3 - Os dons e os contra dons 


Assim como fora anteriormente apontado, um dos mais importantes pilares
que sustentavam a unidade do medievo era justamente a relação de
dependência mútua entre a Igreja e os fiéis. A cosmovisão pautada na mística
cristã era o que, sem dúvidas, movia o sentimento de necessidade de fazer
das doações como meio de salvação, tendo em vista como as obras de
caridade são um dos pontos centrais da teologia católica. Contudo, hão de
ser considerados algumas minúcias com relação a este processo. Em
primeiro lugar, a busca por graças, partindo da noção de caridade, não
poderia ser realizada a partir de um sentimento egoísta de beneficiamento e
interesse pessoal. Entra em jogo um importante conceito teológico; a caritas,
cujo significado é simplesmente a noção pura de uma doação desprendida de
vaidades ou egoísmos, sendo que, a graça alcançada era direcionada não
apenas para o indivíduo que a faz, mas por todos mortos e ancestrais
relacionados a esta pessoa, de modo a reduzir o tempo de purgatório
determinado a elas. (Baschet, Jerome pg 178 a 180)

4 - O movimento monástico 
Diferentemente do monasticismo isolado e espiritualmente distante da
sociedade que era visto na Antiguidade Tardia, a classes dos monges, ao fim
da Alta Idade Média, já possuía um papel de suma importância para a
manutenção da ordem social da cristandade. Sendo verdadeiros polos de
difusão intelectual e de organização sócio-política, um particular monastério
francês chamado Cluny, percebendo a crise que a Igreja enfrentava em sua
relação com o laicato, especialmente a nobreza, lança bases para uma
notória reforma de conduta monástica que mais tarde teria grande impacto. O
século X foi palco para a ascensão do que foi chamado de “Império
Cluniacense” pois, com a adoção da centralização do comando da nova
ordem que surgira, somado à uma fidelidade dedicada somente ao Papa, o
novo modelo de monastério estava mais autônomo para celebrar a liturgia
sem precisar lidar com as exigências e querelas dos bispos ligados à
aristocracia. De certa forma, o que se vê neste momento é o ponta pé de uma
tendencia que iria se desenrolar com primor nas décadas seguintes, no qual o
clero buscaria se desvencilhar inteiramente de qualquer interferência do
laicato aristocrático. Vale notar que, durante este período, mão apenas os
cluniacenses tiveram notoriedade, mas também uma série de novas ordens
de grande influência, como a ordem Cisterciense, fundada pelo grande
Bernardo de Claraval. (Baschet, Jerome pg 184 a 190)

5 - O papado 
Seguindo a tendencia que aos poucos se formava nas primeiras décadas do
século XI, o pontificado de Gregório VII seria responsável por uma das mais
importantes reformas que a Igreja Católica havia passado até o momento,
sendo fundamental para reorganizar a extensão da autoridade e dos papéis
do clero. Tendo como referência os já conhecidos governos de Carlos Magno
e de Bizâncio, cuja atuação na decisão de matérias doutrinárias havia sido
um pouco exagerada, a mudança fundamental da reforma proposta por
Gregório era pautada na delimitação clara entre os poderes temporais e
espirituais. A partir deste momento, não cabia mais à aristocracia o dever de
indicar bispos, mas ao colegiado da diocese e, na mesma linha, foi criado o
colegiado de cardinais, de modo a tornar as eleições papais livres de
interferência do laicato aristocrata. De modo a desligar ainda mais
intensamente a vocação religiosa da vida leiga, também foi promulgada a
obrigatoriedade do celibato para o clero, visto que, anteriormente, padres
poderiam contrair o matrimônio. Ocorre, também, o enrijecimento do processo
de canonização, cabendo unicamente ao Papa a decisão final de canonizar
os santos, anteriormente sendo validados por bispos. Essa série de
mudanças e exigências rígidas por Gregório não ocorreram por conta de um
puritanismo ou por caprichos pessoais, mas pelo ímpeto de sacralização da
ordem, distanciando o clero das frivolidades das querelas com o mundo
secular e dando mais poder para a Igreja em sua tentativa de reafirmar o
poder sobre a sociedade. (Baschet, Jerome pg 190 a 196)

6 - O século XIII 
Com efeito, as radicais mudanças iniciadas pelo Papa Gregório VII resultaram
não apenas em uma nova estruturação da hierarquia eclesial, mas na formação
de um novo modelo de interação entre a Igreja e a sociedade. São colocados
como exemplos comparativos dois modelos arquitetônicos icônicos para
compreender a grandeza dos acontecimentos ocorridos no século XIII: o
românico e o gótico. À primeira vista, algumas características estilísticas de
Igrejas não dizem muita coisa, contudo, ao colocar em paralelo as mudanças
ocorridas no seio da Cristandade, se torna possível extrair muitas conclusões
valiosas. A Igreja que anteriormente se escondia por trás de grossos e
rudimentares muros de pedra em afastadas zonas rurais, agora, no século XIII,
expõe o implacável poder absoluto do Papa por meio de suntuosas e
detalhadas catedrais que se lançam no meio das grandes cidades europeias. A
Igreja nunca estivera tão próxima e tão distante do laicato ao mesmo tempo;
próxima pois as novas ordens monásticas e catedrais urbanas passaram a
tornar ainda mais socialmente dinâmica a vida devota, e distante pois nunca os
bispos tiveram tanta autonomia para comandar sem interferência externa. Se
torna claro como, a reforma hierárquica gregoriana lançou as bases para uma
nova forma de enxergar o Catolicismo, gravitando das remotas abadias
interioranas para o centro de cidades como Paris. No século XIII, o absolutismo
papal refletira diretamente na nova face imponente de uma Igreja que não
abaixaria mais a cabeça para Imperadores, e nenhuma outra forma de poder
secular. (Baschet, Jerome pg 196 a 207)

7 - Os mendicantes 
Em meio às novidades artísticas, teológicas e arquitetônicas começadas no
século XIII, é evidenciado um momento de profunda importância para o
desenvolvimento da evangelização católica nos próximos séculos: as ordens
mendicantes. A mudança hierárquica inaugurada pelo Papa em 1075 não foi o
único aspecto transformado na Igreja pois, alguns anos depois, Francisco de
Assis atenderia o chamado divino por uma reforma na conduta e catequização
dos religiosos, fundando a insigne Ordem Franciscana – um dos mais notórios
signos da cristandade medieval. Os franciscanos tinham como proposta um
cristianismo completamente desprendido dos bens materiais, dedicando-se
inteiramente à evangelização e ao auxílio nas mais baixas camadas da
sociedade, se alinhando com a progressiva urbanização das cidades e suas
necessidades. Juntamente à ordem fundada por São Francisco, nascia na
França a ordem Dominicana, fundada por Domingo de Guzmán - outra célebre
ordem dedicada à pregação e defesa da ortodoxia da fé através dos estudos.
Sendo assim, acompanhando as drásticas mudanças demográficas, políticas e
sociais do medievo, essas duas ordens se firmariam como o estandarte da
nova face do monasticismo cristão, preservando a austeridade do ascetismo
beneditino, mas sem perder o contato com a vida real e cotidiana nas cidades;
optando pela vida de conversão e contato com todas as camadas da
sociedade. (Baschet, Jerome pg 207 a 213)

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