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ARAUJO, Valdei Lopes de. As estruturas para entender o pós-guerra. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, p. 7 - 7, 30 out. 1999.

As estruturas para entender o pós-guerra


cional-Socialista. Em Heideg- ria ser entendida como uma ex- ameaça, o monopólio da políti- Em um dos melhores mo- moral e política, levou a crise
CRITICA E CRISE: UMA
CONTRIBUIÇÃO À PATOGÊNESE ger, Koselleck descobre a His- pansão da crise inerente ao mo- ca e do público pelo Estado mentos do livro, Koselleck narra que este próprio dualismo
DO MUNDO BURGUÊS tória dos Conceitos, campo no delo europeu, cujas origens da- deixou de ser uma evidência as etapas pelas quais a crítica impedia que fosse
Reinhart Koselleck qual irá concentrar a maior par- tam do surgimento da moderni- necessária. É neste momento passou até estender sua compe- compreendida a mo uma crise
Trad. Luciana Villas-Boas Castello-Branco
Contraponto/EdUERJ, 256 páginas R$
te de sua atividade intelectual. dade utópica no século 18, que a moral reivindicará prer- tência das artes à religião e, fi- política. A filoso fia da história
30.00 Com Koselleck a História A cerrada estrutura dialética rogativas políticas e a esfera nalmente, ao Estado. Para a tra- burguesa ao esta belecer um
dos Conceitos (Begriffges- da tese é desenvolvida ao lon- privada do homem burguês dição humanista o crítico era o sentido utópico pai a história,
VALDEI LOPES DE ARAUJO gchichte) transforma-se em um go dos três capítulos do livro. exigirá seus direitos sobre a erudito por definição, o ilumi- entendida agora com processo,
importante campo de pesquisa. No primeiro, Koselleck estuda condução da vida pública. nista abandona este caráter para encobria o desfecho c crise em
Crítica e Crise é a tese de Sua maior realização é o.Di- a estrutura política montada No segundo capítulo, Kosel- se definir como portador de es- sua forma revoluciona ria. A
doutoramento apresentado por cionário de conceitos históri- pelo Estado absolutista como leck desenvolve a dialética do pírito filosófico, ou seja, a capa- moralização da política
Reinhart Koselleck em 1954, cos fundamentais, organizado uma resposta às guerras civis lluminismo. Possibilitado peia cidade racional de julgar os prós realizada pelos iluministas es
publicada pela primeira vez em por Koselleck, Otto Brunner e religiosas do século 17. Ao se- estrutura do Estado absolutista e contras de uma questão, colo- condia a politização total da
1959. O argumento desenvolvi- Werner Conze desde 1960 e parar moral e política, os teóri- que subordinou a moral à polí- cando-se acima dos partidos co- Sociedade. Se o Estado
do ao longo do livro procura lançado em 1972 em oito volu- cos do absolutismo baniam as tica, o lluminismo inverterá a mo advogado da razão. Passan- absoluto podia reservar um
demonstrar que o Estado abso- mes, contendo 120 verbetes dos disputas religiosas do interior relação ampliando o espaço de do por teóricos como Richard espaço de 1i berdade para a
lutista é o pressuposto do Ilu- quais onze são de autoria do do Estado, cindindo o indiví- ação da esfera moral, A inven- Simon, Bayle, Voltaire, Diderot consciência indi vidual, a
minismo da mesma forma que próprio Koselleck. Em 1974, duo em duas partes: o cidadão, ção da lei moral por Locke e Kant, o autor demonstra como ordem política ilustração nao
este o é da Revolução Francesa. ao assumir a cadeira de teoria que devia obediência ao prínci- criou uma jurisdição cujo juiz este processo - aparentemente toleraria a exceção, ela ter: que
Reinhart Koselleck é, sem da história na recém criada pe e o homem que, no interior é o indivíduo em sua convicção apolítico, movido pelo reino da dominar as consciências e as
dúvida, o mais importante e in- Universidade de Bielefeld, Ko- de sua consciência, era livre. E interior, que deve ser expressa crítica contra o Estado - era de convicções. Sua consequência
fluente historiador alemão do selleck encontra condições fa- nesta brecha, aberta pelo abso- socialmente e mediada pela fato uma ação política que, en- lógica é a ditadura permanente
pós-guerra. Nos anos de forma- voráveis para desenvolver uma lutismo para o exercício da li- opinião pública. Criou-se desta coberta, converteu a crítica em da "vontade geral" tal corri
ção na Universidade de Heidel- intensa atividade intelectual. berdade interior, que se insta- forma o modelo de ação políti- hipocrisia e abriu caminho para imaginada por Rousseau.
berg, Koselleck assiste aos se- As primeiras frases da intro- lou o Iuminismo. ca indireta, que caracterizou o crise que culminou na Revolu- Passados quarenta ano:
minários Karl Löwith e Hans- dução do livro anunciam o O lluminismo surge da bi- lluminismo no interior do Es- ção Francesa. Crítica e Crise parece ter
Georg Gadamer. Através de diagnóstico do autor sobre a si- partição entre público/privado, tado absolutista, cujas possibi- No capítulo conclusivo Ko- registrado o último suspiro d
Gadamer trava contato com tuação histórica do pós-guerra, interior/exterior, homem/cida- lidades foram exploradas por selleck mostra que a disputa en- modernidade utópica. Resta
Heidegger, então afastado da marcada pela bipolaridade e dão realizada pelo Estado Ab- duas formações sociais típicas tre a emergente sociedade bur- nos perguntar se o caráter
universidade devido ao seu en- pela Guerra Fria. A crise, então soluto. Quando as guerras civis da Ilustração: a república das guesa e o Estado absolutista, político da crise por ela
volvimento com o Partido Na- vivida em escala global, deve- religiosas deixaram de ser uma letras e as lojas maçônicas. agravada pelo dualismo entre encoberta é hoje mais
evidente.

Valdei Lopes de Araujo é historiador

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