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Neste trabalho, tenho por finalidade, promover algumas reflexões sobre os conteúdos
ideológicos no filme Metrópolis (Lang, 1927). Para esta tarefa, percorrei por quatro
objetivos: I – Expor brevemente uma contextualização do espírito da época em que o
filme foi projetado; II – Desvelar os enunciados ideológicos presentes em algumas
personagens; III – Problematizar a síntese acerca do tema central do filme. Cabe
mencionar, que as assertivas acerca desta tarefa são algumas sínteses das apropriações
na minha experiência com o expressionismo alemão e do meu apreender sobre alguns
estudos na Teoria Crítica que trazem o tema ideologia à baila. Deste modo,
compartilharei as leituras que pude ter até o presente momento.
Para acepção, esta expressão de arte surge como resposta ao romantismo (idealismo
alemão) e aos resquícios do pensamento iluminista. Neste sentido, se o romântico está
associado ao sonho e ao devir que não se realiza, o expressionismo seria o pesadelo
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seguido das repressões e recalques do sujeito – do inconsciente como sombra e mal
estar humano como existência.
Marcados por este contexto, Fritz Lang e sua esposa Thea Von Harbou são os
compositores principais do filme, com muitos conflitos políticos na relação que
acabaram por respingar em alguns conteúdos ambíguos durante a longa metragem –
carregada de inspiração e analogias do pensamento cristão e do Lago dos Cisnes
(Tchaikovsky - 1879) entre outros elementos mitológicos. No filme, cada personagem
simboliza ao menos uma alegoria como narrativa.
O nome Metrópoles sugere uma cidade com mais força do que os seres humanos que
nela habitam, ou seja, a submissão da força e liberdade para manter o avanço
tecnológico e o sistema vigente a serviço de uma minoria. Visto isso, nas cenas que
carregam os contornos futuristas com o gigantismo da cidade pelos seus viadutos e
arranha-céus em paralelo com as engrenagens mecânicas e a vida operária. A cidade em
toda a sua onipotência desde a abertura do filme remete a um futuro indefinido pela
insignificância dos operários que habitam no subsolo para que o progresso continue em
paralelo com o gozo dos ricos pelos seus divertimentos no alto dos prédios da cidade.
Dada essas exposições, cabe a pergunta: O que se desvela como ideológico na grande
cidade? Para respondê-la, é necessário trazer à luz a concepção de ideologia da qual irei
me ocupar.
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Nas sociedades modernas em processo de industrialização a concepção de ideologia foi
modificada do modo como era entendida anteriormente, ou seja, na concepção
Baconiana como o culto aos ídolos, e, portanto, como a manifestação da falsa
consciência. Com o advento da sociedade moderna, as formas como as ideias são
produzidas pelas pessoas e a negação dos conteúdos ideológicos por uma ciência com
seu pensamento positivista que tem como pretensão assumir aparente neutralidade
diante das produções objetivas do espírito.
Após esta breve acepção do conceito de ideologia que tratarei, enquanto roteiro do
filme, para responder a pergunta lançada é necessário percorrer um breve caminho na
trama – em seus elementos macros. A primeira exposição está na abertura do prelúdio e
nas formas como as imagens são projetadas – em justaposição entre o relógio, as
engrenagens das máquinas e os operários caminhando com rostos pálidos, cansados
seguido de um corpo frágil – ritmados pela multidão emparelhada ao som e movimento
das máquinas. Esse cenário se passa no subsolo da cidade onde os trabalhadores
produzem com uma jornada de 10 horas semanais e habitam. Aqui também há uma
analogia ao culto a Baal, quando os ponteiros da máquina sobem e elas explodem
levando a vida de alguns operários que não conseguiram controlar o seu funcionamento.
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De acordo com os pressupostos desta grande cidade apresentada há as ideias de sujeito
pertencentes a uma sociedade capitalista em que o conceito de liberdade e as
necessidades atendidas nem sempre verdadeiras são elementos valorativos. No entanto,
Marcuse (1967) irá questionar os desdobramentos destes imperativos, há uma liberdade
que é administrada pelas relações de trabalho mal distribuídas: “Não obstante, essa
sociedade é irracional como um todo. Sua produtividade é destruidora do livre
desenvolvimento das necessidades e faculdades humanas; sua paz, mantida pela
constante ameaça de guerra; seu crescimento, dependente da repressão das
possibilidades reais de amenizar a luta pela existência (ibid, 1967, p. 14)”.
Neste sentido, há uma justificação por todos, desta condição estabelecida como estilo de
vida – Uma realidade Unidimensional que nega os antagonismos entre o sujeito e a
ordem estabelecida no plano do pensamento. Outro conteúdo que aparece nestas
primeiras cenas é a aceleração do tempo, uma vez que agora as atividades do ser
humano são controladas pelo ritmo do funcionamento das máquinas.
Nestas cenas, pode ser feita uma analogia com a junção do princípio do prazer com o
princípio de realidade – elementos associado à cultura. Porém, não com um
funcionamento ligado a sublimação como nas sociedades pré-industriais. Este ambiente,
trás a tona aquilo que Marcuse (1967) irá chamar de “desublimação repressiva”, ou seja,
o desejo é exposto de modo a manter um controle sobre o individuo pela manipulação
dos seus conteúdos– novamente uma falsa aparência de liberdade. Como mecanismo
psicológico, a desublimação elimina pelo imediatismo toda a consciência dos conflitos
sociais tornando-os controláveis. Visto que a sublimação como forma de adaptação do
ego é a capacidade de trocar as metas sexuais por outras metas não exatamente sexuais
– tendo como elemento o adiamento da satisfação (Laplanche & Pontalis, 2001).
Feita esta aproximação interpretativa, o Jardim Eterno seria um ambiente idílico em que
as pulsões seriam controladas pela aparência da conciliação. O conflito de classes é
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escamoteado pelas distrações oferecidas de forma imediata. Enquanto isso, os pais das
crianças ficam na nova Torre de Babel, são prédios e salas amplas e muito confortáveis.
E tem como principal atividade contar os lucros e rendimentos decorrentes da produção
dos operários.
Podemos notar aqui, o produtivismo nas relações, e a vida administrada pelos turnos,
pela hora do relógio. Enquanto o trabalhador está imerso em uma jornada que o impede
de ter tempo livre para poder reivindicar a ordem social o empregador fica condenado a
contagem dos lucros, as técnicas de repressão e controle da classe trabalhadora. Ambos,
trabalhador e empregador ficam compartilham da mesma lógica, ou seja, suas vidas são
administradas pela produção e manutenção desta sociedade.
Até este ponto, podemos notar no filme o conflito de classes e a exploração pelo
trabalho via acumulação de bens advinda do processo de mais valia; ou então, ao
pensamento de massa sempre ritmado a nova forma de racionalidade técnica. Porém,
estes elementos são pano de fundo para algo enquanto conteúdo ideológico que ora está
presente ora está oculto nas cenas – as formas de acesso ao poder e elementos
totalitários na grande cidade administrada pela racionalidade técnica, ou nas palavras de
Marcuse (1967, pp.24-25):
Outro ponto a ser elucidado é o modo como o roteiro foi disposto organizado em um
processo dialético que permeia entre o movimente de vida (tese) no prelúdio e o
movimento de morte (antítese) no interlúdio vindo a síntese no poslúdio. No aspecto,
micro este movimento é tomado com a epigrafe: “O mediador entre a cabeça e as mãos
deve ser o coração!”. E, será neste elemento que me debruçarei como síntese feita por
Lang (1927) a partir da alegoria proposta em algumas cenas e personagens. No sentido
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de entender se esta síntese nega a força oposta desta sociedade que se mostra
unidimensional ou é algo previsto como os subterfúgios pelo estabelecido.
Para entender melhor a epigrafe do filme, há uma série de justificações que poderão
delinear a construção da assertiva. O primeiro ponto é o pensamento messiânico, a
necessidade de um mediador que será o salvador do conflito entre a mão (operários) e o
cérebro (Joh- projetor de toda a cidade). Freder filho de Joh Fredersen é o messias; um
rapaz inocente que percebe a exploração dos operários para que ele e outros filhos de
empresários possam gozar de conforto e luxo. Indignado com tanta desigualdade após
ver Maria levar os filhos dos operários para o Jardim Eterno, vai até o subsolo da
cidade, entra em contato com o mundo do trabalho e troca de lugar para operar uma
máquina com George citado sempre como 11811.
A segunda personagem é Joh Fredersen, entendido como o cérebro da cidade, pois foi
quem projetou a sua grandeza, em termos representação simbólica esta personagem
assume a forma do Estado. Um homem focado nos resultados que a produtividade dos
operários lhe confere. Sua preocupação é em manter o controle para que os
trabalhadores não consigam ser bem sucedidos nos seus planos para modificar a
situação de opressão que se encontram.
Se Freder é o salvador de todos, Joh no sentido analógico conferido ao filme por meio
da reprodução dos mitos cristãos é o arquiteto. Há aqui a construção de uma relação
edípica, em que Freder tenta subverter a lei tentando entrar em contato a vida dos
operários no subsolo. Quando assume a posição de outro operário é chamado para um
encontro nas catacumbas, e encontra Maria falando palavras de paz, pedindo calma aos
operários, pois o mediador deles estava chegando. Esta personagem será a mais
complexa dentro do roteiro, pois em termos ideológicos ela irá representar a consciência
e a resistência dos funcionários ao não atribuírem como natural a realidade em que
vivem, expressando o reconhecimento de uma vida que nega a sua plenitude – a
princípio, este reconhecimento oposto ao que a realidade tenta implantar poderia
expressar algum elemento emancipatório.
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incitando a violência. Para que os detentores do poder possam justificar o uso da
violência contra os trabalhadores. Ou ainda, a Maria- robô é usada como instrumento de
manipulação dos ricos por meio da luxuria e indução dos desejos sexuais, nesta parte é
feita a analogia com a prostituta da Babilônia –por espalhar uma série de blasfêmias.
Além disso, a experiência do sujeito também se tornaria profana, agora com uma cultura
que é submetida somente a aspectos afirmativos. No qual, “a sexualidade se torna um
veículo para os best-sellers da opressão” (Marcuse, 1967, p.87). A Maria-robô,
enquanto analogia a falsa consciência, se utiliza da desublimação repressiva como
mecanismo de controle, com os operários pela via da agressividade (e até mesmo a
culpabilização das máquinas e não da lógica por de trás deste sistema) e no caso dos
ricos pela liberação sexual. Este mecanismo é muito próximo a conceituação feita por
Marcuse (1967, p.87): “O conceito de desublimação controlada implicaria a
possibilidade de uma liberação simultânea da sexualidade e da agressividade
reprimidas...e essa desublimação seria compatível com o crescimento das formas
sublimadas e não-sublimadas de agressividade. Essa é desenfreada em toda a sociedade
industrial contemporânea”.
Cabe ainda elucidar quanto à personagem Maria, que diferente dos outros operários, ela
não olha para baixo. Seu olhar é perdido no infinito como se pudesse avistar a
imensidão quando está em cima de um púlpito falando acerca da profecia do
mensageiro ou quando está cumprindo um papel de educadora com crianças. Suas falas
carregam sempre um discurso religioso. Em uma segunda leitura, para além do sentido
dado pelo filme, independente da forma Maria-humana ou Maria-robô há o uso de
terminologias religiosas como forma de lidar com as massas, ou seja, a manipulação do
pensamento pelo uso de conteúdos emocionais.
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A terceira personagem relevante para a discussão carrega em suas narrativas elementos
de um sujeito unidimensional em relação a concepção humana, pelo viés do
homem-máquina é Rotwang. Para o inventor, que ao longo do filme caminha entre a
ciência e o ocultismo significa a Maria-Robô como “mais perfeita e obediente
ferramenta que o homem já teve”. A busca de um corpo dócil e perfeito é carregada
pelo ideal de sujeito para manter o controle da sociedade – um sujeito extremamente
eficiente administrado pela racionalidade técnica.
Deste modo, Rotwang controla o robô rebelde, agitador e profano – em suas ordens só
consegue avistar o fim, a ausência do futuro pela destruição humana. Na cena em que
mostra a sua criação e o seu fascínio pela sua semelhança com o humano, acima do
Robô há um pentagrama invertido e há na casa do cientista em todas as portas um
pentagrama pendurado. Em termos históricos passamos da magia para a técnica
propagada pelo conhecimento científico. Neste sentido, a ciência moderna também
estaria a serviço da dominação, pois não admite a complexidade, usa de um pensamento
estéril que nega a ideologia e não permite se opor as forças que o controlam.
Cabe enfatizar, que o filme foi lançado 6 anos antes da ascensão do regime Nazista,
porém Harbou, compartilhava dos ideais da juventude nazista. Motivo pelo qual, Lang
com uma perspectiva progressista mais alinhada as defesas de uma sociedade socialista
rompeu com a relação. Por isso, o filme é comprometido com mensagens que ora
criticam ideologias totalitárias de uma sociedade industrial ora enaltecem o fascínio
pelas máquinas e pensamento messiânico.
E, antes de me aproximar da síntese feita pelo filme, há ainda diante da revolta dos
funcionários e a ação de morte a máquinas uma cena sútil, mas carregada de conceitos,
que é o esquecimento das crianças na cidade dos operários. Quando a cidade começa a
alagar porque a máquina principal foi destruída o desespero e o caos se instala com a
preocupação das crianças estarem mortas com a preocupação de Joh ter perdido o seu
filho.
As crianças são salvas pela Maria-humana e levada para o Jardim Eterno junto com
Freder. Esta é outra analogia feita pelo conceito de futuro, ou melhor, o medo de um
futuro perdido pela violência e a barbárie. E, com a esperança de um futuro em que
igualdade seja uma realidade, ou seja, que os filhos possam compartilhar do mesmo
espaço e das mesmas condições. No entanto, cabe notar que na segunda guerra,
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podemos perceber o que houve foi exatamente o sacrifícios de jovens com alistamentos
- um futuro sacrificado.
O final do filme carrega muitas ambiguidades, assim como a relação e a visão política
de Lang e Harbou. Pois, há a cena em que um operário (simbolizando a mão) e Joh
(simbolizando o cérebro) querem fazer as pazes, porém necessitam do mediador Freder
(simbolizando o coração) para isso. A mensagem dúbia é carregada de uma dupla
interpretação. A primeira seria uma visão mais ingênua em que a superação dos
conflitos sociais se daria por meio do consenso e da mediação entre as pessoas.
Este posicionamento muito se assemelha com o papel que a cultura de massa afirmativa,
e posteriormente a Indústria Cultural à partir da década de 40 passa a ocupar na
sociedade atual, pela aceitação dos interesses particular sendo o de todos, e ainda, o
processo com que esta aceitação ocorre é por meio da manipulação das emoções e
estandardização dos comportamentos pelo rádio, da TV e da literatura (Adorno e
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Horkheimer, 1947). Em termos históricos, há uma transição no controle das massas da
religião para a mídia propagando uma cultura afirmativa que nega qualquer elemento
oposicionista à estrutura de vida com uma existência alienante.
Á princípio a intencionalidade dada ao filme pelo diretor e pela roteirista era para ser
uma subversão do real. E neste ponto, as cenas em que denunciam a liberdade do sujeito
moderno administrada pelo trabalho ou então o incomodo de Freder pela forma de
distribuição de renda, de certo modo cumpre esta função. No entanto, quanto o
desfecho provoca um sentido afirmativo da cultura, passa a reproduzir a própria
condição que anteriormente era criticada, provocando conformismo. Percebe-se neste
caso, que mesmo quando algo é para se opor ao status quo ele é absorvido em certo
grau.
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isso não aconteça, é necessário se tomar enquanto objeto para crítica e resistência da
realidade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
FILMOGRAFIA:
METROPOLIS, real. Fritz Lang, Alemanha, 1927 (Filmes Costa do Castelo, 2006 –
versão completa).
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