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Começar explicando o contexto histórico da polêmica:

→ os anos 20 na Alemanha: Benjamin, Arendt, Weber, Mies van der Rohe, Gropius, Fritz Lang, Paul
Klee, Martin Heidegger, Kandynski, Chagall, Rosa Luxemburgo, Clara Zetkin, Wilhem Reich, Carl
Jung, Theodor Adorno, Max Horkheimer, Edmund Husserl, e também os três protagonistas desta aula:

Lukacs, Brecht, Bloch.

Nem todo mundo dessa galera era marxista (Heidegger e Jung foram mesmo colaboradores
do nazismo), mas todo mundo de alguma maneira entrou em contato com o marxismo, que
tinha raízes fundas na alemanha e estava na época impulsionado pelo triunfo da Revolução
Bolchevique na rússia, em 1918. O movimento comunista se expressava politicamente na
alemanha através do KPD (partido comunista alemão). A revolução alemã

→ A partir de 1933, com a chegada de Hitler ao poder, eles vão pro exílio em diversas partes do
mundo.

→ A partir do sétimo congresso da 3a Internacional, em 1935, realizado em Moscou, o movimento


comunista dá uma guinada radical na sua política: de um ultra-esquerdismo que considerava mesmo
os sociais democratas como “social-fascistas”, o congresso presidido por Dimitrov passa a defender
uma frente ampla de todos os setores democráticos contra o fascismo que ascendia e se preparava para
tomar (por exemplo) a áustria e a espanha. É neste de frente ampla que, no mesmo ano, é realizado em
Paris um congresso de escritores em defesa da cultura. Uma das decisões tiradas neste congresso é a
da fundação de uma revista – sediada em Moscou – que reunisse a contribuição dos intelectuais
alemães exilados. A Das Wort.

→ O que nos interessa aqui é que, nessa revista, vai se expressar uma importante questão interna do
marxismo: a diferença brutal de perspectiva entre os marxistas que então ocupavam o poder e estavam
concentrados na instauração e gestão de um estado (a URSS) e aqueles que estavam fora do poder,
buscando formas de alcançar a revolução.

→ Essa querela atravessa uma outra, que me parece estar mal digerida pelo marxismo até hoje: de que
maneira o movimento revolucionário do proletariado deve olhar para a herança cultural burguesa?
Não que naquela década de 1930 fosse relevante na europa ou na rússia uma posição, entre a
intelectualidade comunista, de que o marxismo devesse ser tão iconoclasta a ponto de fazer tábula
rasa da cultura burguesa, para reconstruir uma cultura proletária do zero. Essa posição, na URSS tinha
sido representada por grupos como o prolekult e os futuristas, surgidos no âmbito do processo
revolucionário e atuantes de maneira independente do partido

O poeta proletário Vladímir Kiríllov lançou o desafio: "Em nome do amanhã vamos
atear fogo em Raphael, destruir os museus e esmagar as flores da arte... Nós
respiramos um tipo diferente de beleza". Vladímir Maiakóvski, o principal poeta da
Revolução, autor de "À esquerda" e "Ordem ao Exército da Arte", ecoa esses
sentimentos: "É chegada a hora de balas perfurarem os muros dos museus!".

https://www.scielo.br/j/ea/a/yPjrxSGWGGnqxGZ3QChkndd/?lang=pt
Mas, enfim: em 1930 que juízo o marxista deve fazer do passado? O que é joio e o que é
trigo, entre as manifestações culturais da burguesia?

- De um ponto de vista das autoridades soviéticas, o comprometimento com o legado


artístico burguês passa a ser uma dupla vantagem. Em um primeiro lugar, é uma
forma de controle, que permite ao partido calar os esforços esteticamente
revolucionários dos grupos independentes do partido. Em segundo lugar, uma
posição de conservação do patrimônio burguês (que do ponto de vista
europeu/russo, também significa “patrimônio ocidental”, ou “cânone ociental”) é a
abertura de mais uma ponte de diálogo entre os comunistas e outros setores de
esquerda, no âmbito da frente ampla. Nessa perspectiva o que parece iconoclastia
em movimentos como o expressionismo alemão aparece aos olhos soviéticos como
problemático por ser virtualmente aparentado dos esforços dos futuristas russos, e
por colocar em xeque a ideia da Frente Ampla como uma linha de defesa da tradição
do ocidente.

- De um ponto de vista alemão, o comprometimento com a “tradição” era tema


espinhoso, visto que uma versão deturpada da tradição histórica alemã havia sido
apropriada pelo nazismo (o romantismo alemão, etc), que por outro lado atacava a
“arte degenerada” (modernismos, etc.). Valorizar o expressionismo, assim,
significava demarcar uma oposição ao nazismo.

- Inútil tentar recuperar a história da polêmica com os registros que tenho dela. O livro
do João Barrento e o do Jameson discordam loucamente em dados objetivos.

FIM DA INTRODUÇÃO HISTÓRICA

LUKÁCS:

Argumento de Lukács: Lukács defende a tradição artística clássica e o primeiro realismo (de
Balzac) contra o expressionismo. O expressionismo seria problemático ao apresentar a
realidade de modo fragmentário, descontínuo e confuso. Na sua perspectiva, contudo, (e aí
está a originalidade) o problema não está numa suposta falta de fidelidade do
expressionismo no seu retrato do real, mas sim – ao contrário – no caráter imediato dessa
representação. Representa-se imediatamente a impressão afetiva que se tem do real.
Assim, o expressionismo e outros modernismos seria fragmentários, descontínuos e
confusos porque a nossa percepção imediata e cotidiana da realidade também é assim.

Segundo Lukács, devido ao poder do capitalismo de dar uma aparência autônoma às suas
instituições e elementos super-estruturais, “a consciência”do indivíduo que vive sob o
regime capitalista vai perceber os elementos realidade autonomamente, sem atentar para a
relação estrutural que eles teriam entre si. O expressionismo seria a expressão dessa
autonomização
O momento de crise, no capitalismo, seria aquele em que se revela seu caráter inteiriço, de
totalidade composta por partes articuladas. Totalidade é um conceito fundamental em
Lukács, que aqui aparece dessa forma.

O papel da arte: tornar essa totalidade articulada, a partir do qual é composto o capitalismo,
perceptível mesmo fora dos momentos excepcionais de crise. “realismo”, aqui, significa
portanto mostrar a realidade dos fenômenos por trás da sua aparência. Tem um caráter de
desvelar!

Esse desvelar é fruto de uma dialética: a arte recupera elementos da vida que o leitor
percebe em sua experiência cotidiana, mas não mais na voragem descontínua com que ele
costuma percebê-los, e sim “elaborados” em uma articulação que revele seu nexo lógico.
Contra o argumento (de Bloch) de que o expressionismo é deformado porque revela uma
sociedade burguesa deformada, Lukács afirma que muito melhor é o Thomas Mann, que
também representa a mesma sociedade, mas colocando “a descoberto a essência, as
causas, as mediações da imagem deformada”.

Aqui é importante desmistificarmos o primeiro mito sobre Lukács: o argumento dele aqui
não é “conteudista”, não iguala arte e propaganda ideológica, nem pode ser reduzido à uma
defesa da arte panfletária que “denuncia” os males do capitalismo. Não. Para ele, qualquer
romance realista seja que obedeça às regras da composição clássica e seja escrito por uma
pessoa arguta – quer isso esteja ou não nas intenções do autor – vai desvelar a totalidade
do capitalismo, porque essa é a propriedade do estético.
CENTRALIDADE DO ESTÉTICO NO PENSAMENTO DE LUKÁCS.

Balzac (monarquista) e Dickens (liberal) não eram marxistas, mas eram “argutos” e
desvendavam os mecanismos sociais por trás das ações de seus personagens. O mundo
de suas obras representado como uma teia de relações, tornada visível pela ação dos
personagens.

talvez recuperar os exemplos das cenas dos cavalos em Zola e Balzac.

O trabalho do artista:

1 - viver; experimentar a vida; a praxis;


2 - “um pesar e um medir de todas as experiências subjetivas – tanto do seu conteúdo
quanto de sua forma – tomando como referência a realidade social, um perscrutar mais
profundo da realidade, para se descobrirem as influências reacionárias do mundo
imperialista nas próprias vivências e ultrapassá-las criticamente. (É claro que aqui vai
implícita uma ambiguidade:
3 - “re-cobrir artisticamente as relações a que se chegou”.
BLOCH

dois textos: um defendendo o expressionismo, outro atacando o conceito de realismo de


lukács.

→ Muito importante! Bloch (com Eisler) reivindica o expressionismo não como uma oposição à
tradição, mas como um herdeiro da poesia épica medieval germânica, do sturm und drang e do
Romantismo alemão. é uma tentativa de recuperar o legado alemão das mãos do nazismo. Uma
apropriação produtiva e atualizada da tradição, longe da louvação estéril

→ o expressionismo como auto-investigação subjetiva utilizada como motor para desvelar os campos
de possibilidade no real, ainda confusa, ainda sem os amparos que o marxismo poderia oferecer. Por
isso, em última instância, algo que falhou e degenerou no subjetivismo sem objeto. (o argumento
implícito: o marxismo deve amparar e fortalecer essas experiências, para que não falhem novamente)

Existe um “excedente poético” no trabalho do artista. Existe, por outro lado, um “excedente
de tendência e latência”, além dos fatos, na realidade (seria uma condição ontológica). O
marxismo é por ele reivindicado como a melhor forma relacionar o primeiro excedente ao
segundo, de modo que ele seja revelado.

Para Bloch, o marxismo abre as portas da percepção da realidade. O que para o indivíduo
inserido no capitalismo aparece como monotonia e solidão, o capitalismo desvela como um
drama repleto de violência e possibilidades utópicas. Ao revelar a complexidade e o
dinamismo da realidade, torna-a perceptível como “uma quase infinidade de problemas”.

Se o melhor que o capitalismo poderia oferecer ao artista fantasista e imaginativo eram


bolha onde ele era tolerado como piada de salão, o marxismo lhe abre as portas de um
mundo em que suas fantasias podem efetivamente serem amparadas, respaldadas, pelo
real.

o trabalho do artista realista (como em Lukács) seria o de revelar intuitivamente o real


naquilo que ele realmente é: os fatos mais a latência deles, as suas tendências. Mas, para
Bloch, nem só o artista pode revelar isso: também a criança, o louco, o conto de fadas, a
religiosidade popular também possuem excedentes poéticos e podem produzir discursos da
latência.

Isso vale inclusive para olhar o passado, a história (aqui ele antecipa o argumento da
história à contrapêlo), mas o ponto mais importante do argumento do Bloch é sobretudo o
futuro (seu conceito mais importante é o de Utopia).
Para ele, o marxismo compreende a realidade como algo “aberto e objetivamente
fragmentário”, oposição fundamental a Lukács).

então se aproveitará do discurso poético para não ser a mera mentira, e sim uma força
produtiva da realidade (Brecht já seria isso). Sobre Brecht;

BRECHT

O mais radical do debate:

- se há consenso de que a arte é o conhecimento de alguma coisa, então o que


importa é conhecer. Não se pode colocar no centro da questão a escola, ou a
técnica literária. Será realista toda obra que, usando o procedimento mais adequado
naquele caso – e cada caso é um caso – chegar mais perto do real. “tem que se
procurar os meios conforme os fins. o povo sabe disso”.

- Inversão do sentido da palavra “formalismo”. P/ Lukacs, formalista é todo aquele que


invista nas variações formais de uma obra de arte. P/ Brecht, formalismo não seria
preocupar-se com questões de forma. Seria, isso sim, repetir a forma clássica
confiando que, num mundo dinâmico, ela vá ser sempre capaz de desvelar suas
estruturas (como quer lukács). Aproxima-se do sentido corrente de formalismo: “ele
tem formalmente razão” significa que ele tem razão na forma, mas não no conteúdo.
Forma que permanece, esvasiada do sentido que já teve.

- Desejo, em Brecht, de romper com a ideia de arte enquanto um todo fechado em si


mesmo, com uma ideia de mundo da arte. Reivindicação da arte para o domínio da
ciência (no sentido de experimento livre, destemido, aberto ao improviso, bricoleur).
Esse lugar do cientista “fundo de quintal”, que quer chegar a uma verdade objetiva
mas intui e improvisa no caminho, é genial pra desmistificar a oposição entre razão e
subjetividade. Reconhecer que o pensamento tem um momento de “jogo”, e que
neste processo ocorrem “deslizes”, “emoções” e “associações” é para ele um “lugar
comum”: isso acontece, todo mundo sabe que acontece e tudo bem. O que ele
rejeita é uma sobrevalorização desse momento, uma arte inteiramente voltada para
a investigação do inconsciente, como se apenas ali houvesse uma verdade sincera.
Pois “também no inconsciente pode haver mentiras, que foram colocadas
conscientemente ali por alguém”.
- Brecht é um pouco injusto, acusando Lukács de defender a forma clássica como
uma simplificação para facilitar o entendimento das massas. com todos os erros de
Lukács, isso não está lá.

- O argumento de Brecht é mais próximo de um “prolekult” do que de um futurista. Ele


valoriza muito em seu texto relatos de experiências em que representou e/ou
montou suas peças em contato com proletários, e aprendeu com a forma como eles
alteravam seu texto ou reinterpretavam seu sentido, mesmo que isso prejudicasse a
harmonia estética da obra segundo algum padrão clássico. “para o povo tomar
posse de sua herança, tem de fazê-lo por um ato de expropriação”. Baseado nessa
experiência, Brecht pode acusar Lukács de fetichizar o popular.

Brecht discorda

Ele recoloca a questão: o artista burguês tem um papel, que é o de tornar a vida do homem
possível no “mundo árido” do capitalismo.

Brecht desloca o problema do “desvelamento”: não se trata de revelar algo oculto


sobre o real. Se trata de, através da arte, mostrar o caminho para a tomada do
poder. Arte realista como um “procedimento” realista: colocar em movimento forças
motrizes da revolução.

De Karen Barros para Todos: (3:04 PM)


karenblackbarros@gmail.com
De Daphne Madeira para Todos: (3:05 PM)
daphne.madeira@gmail.com
De Ricardo Aguinelo Gomes Cá para Todos: (3:06 PM)
ritchasgomes@gmail.com

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