Você está na página 1de 6

Afro-sambas como forma de ver o brasil e a música sacra afro-brasileira também.

Afro-sambas como um LP que tem que ser entendido como contendo 2 lados:

LADO A: Baiano, Gege-nagô

LADO B: Carioca, Banto. tradição do samba urbano do rio de janeiro

sambas com batucada no início da década de 30:


-na pavuna (almirante)
-eu vou pra vila (noel)

muitos sambas com temática e sonoridade de macumba entre 1917 e 1932. A partir de 32
há uma adequação dos padrões estéticos do samba p/ público consumidor de uma indústria
da diversão padronizada. “samba fonográfico”, “desmacumbização”.

Bossa-Nova seria o ápice da desafricanização do samba.

mas nas décadas de 50 e 60 há o que Abdias Nascimento chama de “descoberta da áfrica”,


uma reorganização e fortalecimento do movimento negro brasileiro. (processo articulado à
descolonização da áfrica, pan-africanismo).

FUNDAMENTO DA MÚSICA NO COMPLEXO DAS MACUMBAS:

Os tambores são a conexão entre o aiê (mundo visível) e o invisível (orum)

o tambor no candomblé é iniciado como um ente, ritualizado para que faça essa conexão

lembrar que candomblé é um transe de expressão. orixás, voduns e inquices moram dentro
de você. os rituais são as expressões desses corpos

toques pra cada orixá:


(keto e jeje)
oxalá → igbin (caramujo, lentidão)
xangô → alujá (fogo, relâmpago) (canto de xangô)
oxumaré → bravum
ogum → adahum
ossain → corin ewe (canto de ossanha)

nos candomblés de angola (banto) os toques são mais soltos e feitos com a mão
3 toques: abuzenza, cabula, congo

SEGUNDA AULA:
LADO A (dialoga com o candomblé baiano, a mitologia dos orixás)

- Vinicius e a dialética de amor-dor em que um supõe o outro

CANTO DE OSSANHA
- Dialoga com dois mitos bastante conhecidos de Ossanha, que não exigiam grande
conhecimento da cultura de terreiro.
(mito do canto de ossanha: um rei, certo dia, quis casar sua filha mais velha, mas só daria
sua filha em casamento se o pretendente soubesse o nome de suas três filhas. Anuncia o
concurso no mercado. Ossanha, interessado em casar com a filha do rei, se esconde numa
árvore de Obi e começa a imitar um pássaro, com perfeição. As três filhas do rei, que
brincavam nas redondezas, escutam seu canto irresistível. Disfarçado de pássaro, ossanha
indaga seus nomes e elas revelam. Ossanha então vai ao palácio do rei, ganha o concurso
e desposa a filha mais velha.)
Ossanha é o que imita o canto de qualquer pássaro. É o canto que ilude, que seduz, que
atrai. Matreiro, enganador.
(mito da briga entre Ossain e Xangô: Ossain pega as folhas que curam, dadas a ele por
olodumaré. Ossain coloca as folhas numa cabaça, pendura elas ali. Xangô fica totalmente
curioso, convence Oiá a ventar para derrubar a cabaça, que estava no alto da árvore. Mito
do compartilhamento do saber. Cada orixá se apodera de uma folha. Os orixás sacaneiam
ossain: “você não tem mais utilidade”. Mas é Ossain que detém o saber de qual é o canto
certo para despertar o poder da folha. Ossain ensina os cantos errados para cada orixá. Os
orixás ficam perdidos, Xangô fica indignado. Aí surge uma rivalidade entre ambos.)

Na letra de vinicius, a perspectiva do amor é entendida como enganadora, matreira, como o


canto de ossanha.
“O homem que diz vou não vai”, ideia heraclitiana de ausência de fixidez, mudança
constante. Ideia ligada ao Omi-eró, água da tranquilidade, ou água da paciência. Banho de
cheiro com folhas maceradas de forma ritualística. O segredo da folha que, em contato com
as outras, transforma-se em outra coisa ao mesmo tempo que preserva suas características

Tradição de terreiro da música responsiva: há alguém que puxa e alguém que responde.

Violão de Baden Powell nesta faixa faz um ritmo de korin ewé, embora a estrutura da
música seja um samba.

oráculo do candomblé jeje nagô (iorubá): o jogo dos búzios, conforme a combinatória que
sai (odu, signo), faz referência a um mito. Esse mito diz respeito à sua pergunta ao oráculo,
mas cabe a você interpretar de que maneira o mito revela algo sobre a sua história. se você
quer saber se embarca ou não em uma relação amorosa e o oráculo te responde com o
mito do canto de ossanha, você tem que entender se no mito você é ossain, a filha ou o rei.

melodia em tom menor: embrenhar na floresta, aos poucos, melodia meio labirinto. melodia
em tom maior: se abre a clareira.

CANTO DE XANGÔ
Xangô no candomblé brasileiro: Orixá famoso, desde a primeira casa do candomblé baiano
(barroquinha), que era dedicada a xangô.

Xangô é um personagem histórico, o quarto rei (Alafum) da cidade de Oió. Oió viveu seu
apogeu quando dominou uma área que ia desde o vale do Niger até o Daomé (atual
Benim). Império altamente militarizado e expansionista, que dominou outros povos.
Explicação possível para a expansão do culto de Xangô.

Xangô teria se matado por conta de uma grande vergonha. Mas seus súditos negam, dizem
que ele se encantou no fogo, entrou por um buraco na terra, tornou-se um orixá.

saudação a xangô: oba coço araê obanixé kawo cabecilê (o rei não se matou, venham ver o
rei, ele está na terra)

mitos de xangô, ligados ao amor e à justiça. Xangô se envolveu com quatro mulheres:
oxum, oba, oia, iemanjá (que em outros mitos é sua mãe). (pro simas, quarteto em si
cumpre o papel das quatro mulheres)

xangô antigamente tinha quatro toques: batá, alujá, tonitobê e kakakaumbó. atualmente,
com raras exceções, o que se toca para xangô o alujá (buraco, em português, segundo
verger).

O canto de xangô é um alujá inequívoco, desde o violão do Baden.

(a música, para os africanos, pode alterá-lo fisicamente. Guerra peixe, no terceiro congreso
afro-brasileiro, realizado no recife, faz uma comunicação em que compara as escalas
sudanesas com a tradicional escala pentatônica chinesa.)

Música cíclica é o tempo cíclico dos iorubas.

agodô: uma qualidade de xangô. xangô mais velho, mais do mato do que do palácio. o
velho que dá conselho

BOCOCHÊ (O SEGREDO)

(bocochê: palavra que não quer dizer nada, segundo todo mundo que estudou)

canção que prepara o canto de iemanjá

canto sobre a morte no mar, uma menina que sabe que vai morrer. homenagem às canções
praieiras de caymmi (segundo a hipótese do simas)
resposta a “O Mar” de Caymmi: a interlocutora do eu-lírico é rosinha de chica, a
personagem de Caymmi.

IEMANJA

ieie- omo -eja = mãe - filhos - peixe


a mãe dos filhos peixes

o mar de iemanjá, como a floresta de ossain, é a abertura ao inesperado a partir da entrega


ao amor

TEMPO DE AMOR

início do lado B (relação com as macumbas cariocas)

Não se refere a nenhum Orixá

estrutura de samba carioca:

- percussão,
- violão ritmado,
- violão com baixaria,
- ritmo binário

Repetição da temática do amor e da dor

simas supõe uma referência ao mito de oxaguiã (jovem oxalá, o santo da cabeça de
vinicius, feito por mãe menininha), que termina de construir um imenso castelo e sente uma
“agonia da paz”. Pois ele precisa da motivação da tormenta, da guerra (oxaguiã é o senhor
da guerra). Oxaguiã destrói o castelo que ele próprio construiu.

relação com o CANTO DE OXALUFÃ, um igbin para o velho oxalá em parceria com
Toquinho.

CANTO DO CABOCLO PEDRA PRETA

Samba em homenagem a Joãozinho da Goméia, um baiano que foi iniciado para


mutalambô (oxossi) e matamba (iansã) por Jubiabá no rito bacongo (candomblé de Angola).
Joãozinho tinha ascendência indígena, e relação forte com essa cultura. Daí trabalha com o
Caboclo da Pedra Preta.
Primeiro pai de santo a admitir-se publicamente como performista como sendo Arlete, no
teatro de revista. Introduziu nos palcos dos teatros brasileiros a dança afro. Destaque de
escola de samba e concursos carnavalescos (rival de clovis bornay)
Baden frequentava à Goméia. O Caboclo da Pedra Preta em pessoa foi quem o autorizou a
gravar os afro-sambas.

Samba de caboclo = gênero típico dos candomblés, tocado nos finais dos xirês.
(na tradição baiana bate-se o samba dos caboclos no 2 de julho)
Na mística do samba de caboclo, cada instrumento é uma pessoa, e tem um gênero. O
pandeiro é homem, a viola é mulher. Nos versos de vinícius, são os elementos masculino e
feminino em tensão:

Pandeiro não quer que eu sambe aqui


Viola não quer que eu vá embora
Pandeiro quando toca faz Pedra-Preta chegar
Viola quando toca faz Pedra-Preta sambar
O pandeiro diz: Pedra-Preta não samba aqui, não
A viola diz: Pedra-Preta não sai daqui, não
Pedra-Preta diz: Pandeiro tem que pandeirar
Pedra-Preta diz: Viola tem que violar
O galo no terreiro fora de hora cantou
Pandeiro foi-se embora e Pedra-Preta gritou:

Masculino x feminino
(joãozinho) (arlete)

Música sobre a tensão de gênero e sexualidade de joãozinho da goméia. A “violação” do


pandeiro. A transformação de pandeiro em viola. O macho é derrotado no final do embate

TRISTEZA E SOLIDÃO

Consulta ao babalaô (babalorixá, o sacerdote do culto iorubano aos orixás, que consulta o
ifá, os búzios, e informa o mito sorteado ao consulente). O babalaô consulta o orum-ilá. O
personagem vai ao babalaô, mesmo sendo umbandista.

Pode perfeitamente ser o personagem dos outros sambas. É o angustiado a cuja angústia
vem responder os mitos tratados no resto do disco

Para pedir pra ela voltar pra mim/ por que assim eu sei que vou morrer de dor = versos
ambíguos. parece que ele vai morrer de dor se ela não voltar, mas também parece que ele
vai morrer de dor se ela voltar. É a ideia do tempo de amor. “Você vai se entregar e vai ser
uma catástrofe, mas vai”. O personagem optou por entrar na floresta e entrar no canto de
ossanha.

O disco é uma leitura do amor a partir do terreiro.

LAMENTO DE EXU

Normalmente exu é quem abre tudo, é aquele que é cantado primeiro no xirê.

ordem do xirê: orgum, oxossi, ossanha, omolu, oxumaré, ibeji, xangô, oxum, iansã,
iemanjá… oxalá.

todo o disco segue a ordem do xirê, menos esse lamento de exu.

em toda casa do candomblé, antes do xirê você presta contas a exu (o padê). é uma farofa
que se faz pra exu. O objetivo do padê é você reverenciar exu. Há duas versões sobre a
necessidade do padê: uma versão diz que é pra você contemplar exu p/ que ele não faça
traquinagens e atrapalhe a festa. Outra versão diz que é porque exu é o grande
mensageiro. Liga o invisível (orum) ao visível (ayê). Ele tem que abrir os caminhos.
No padê, há duas sacerdotisas: a yadagã (prepara a farofa de exu) e yamorô (dança com o
padê de exu). No final da dança você leva o padê pra fora. Cerimônia que pode ser
assistida só por quem tem sete anos de casa (os outros membros tem que ficar de cabeça
abaixada). Canta-se e bate-se cabeça p/ ina, um exu primordial, o grande exu do tempo.
Não são pontos traquinas e fogosos como outros de exu. O canto a ina é um lamento, muito
sério.

Isso pressuporia que o lamento p/ exu abrisse o disco, e certamente a inversão não foi um
erro. Baden e Vinicius sabiam o que estavam fazendo. A faixa fecha o disco, e o fato dela
abrir caminhos indica que

1) o disco é cíclico. sinaliza p/ o recomeço


2) a faixa abre os caminhos p/ o que virá a partir do disco, como consequência dele.

É uma faixa corajosa, composta num momento em que se associava no imaginário popular
(como ainda hoje) exu e o diabo. Era muito raro nos candomblés você iniciar um fiho de
exu. Quando algum filho de exu aparecia, iniciava-se ele p/ ogum ou oxossi.

Exu, orixá paradoxal. promove a desordem p/ que a harmonia prevaleça.

Vinicius, sobre o fato da faixa ser instrumental, disse que “todas as outras letras já são o
lamento de exu”.

Você também pode gostar