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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

CENTRO DE HUMANIDADES
CURSO DE GRADUAÇÃO EM FILOSOFIA

ANTONIO ANTENOR LOBO NETO

TÍTULO: Elemento dialético de formação do cinema por Walter Benjamin.

FORTALEZA – CEARÁ
2023
RESUMO

Este trabalho se funda em uma amostragem da dialética proposta por Benjamin,


para questionar e advertir sobre esse caráter de instrumentalização ideológica que o
desenvolvimento da técnica possui, buscando também apresentar a capacidade do
cinema de realizar uma emancipação e práxis social.
Palavras-chave: cinema; Benjamin; práxis.
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1- Introdução

Diante de um conjunto de fatos políticos contemporâneos de sua época como a


ascensão do Nazifascismo, o desenvolvimento do progresso técnico e o colapso da
lógica capitalista culminando em guerras, Walter Benjamin trata de realizar uma
análise social sobre o surgimento de um novo modo de percepção atrelado ao
progresso da técnica. Nessa perspectiva, buscarei expor alguns elementos de sua
obra “A obra de arte na era da sua reprodutibilidade técnica”, na qual se leva em
consideração a tese de que “não é possível pensar o cinema desvinculado da
política”.

Essa abordagem dialética oferece uma visão profunda e multifacetada do cinema,


revelando as tensões e contradições inerentes à sua evolução e impacto na
sociedade. Ao compreender melhor como se estabelece as influências externas
(políticas) na técnica cinematográfica, podemos ter uma noção sobre como se
manifesta diante de nós certos conceitos enganosos e ideológicos disfarçados de
“entretenimento”. Logo, mediante uma filosofia da arte, encontrar-se-ia uma reflexão
entre arte e técnica, tentando se configurar assim uma “politização dos filmes”, pois
o cinema como esse agente de criação e expressão de valores modifica e impacta
fortemente as ralações dentro da cultura.

2- Condições Históricas e Sociais do cinema.

Algumas mudanças na sociedade e na indústria foram fundamentais para a


formação do cinema como uma forma de arte reprodutível. A indústria
cinematográfica surgiu como uma resposta à demanda por entretenimento em
massa. Nesse sentido, Benjamin afirma ocorrer um “abalo da tradição”, pois, nesse
estado de renovação da técnica produtivista, cria-se uma “relação íntima com os
movimentos de massa de nossos tempos” (p.58). Ou seja, esse valor da tradição de
experiência única começa a ser questionado, e com a possibilidade de uma
reprodução da arte em massa, a indústria cinematográfica começa a crescer
rapidamente, com a criação de estúdios de cinema e a produção extensa de filmes.
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Nesse contexto, decorre o fenômeno de democratização da arte. A partir daí, o


cinema se tornou uma forma popular de entretenimento em todo o mundo.
Consequentemente também se torna um agente responsável pelo modo de
percepção das pessoas, haja visto que os filmes são influenciados pelas condições
sociais e políticas da época. Durante a Primeira Guerra Mundial, o cinema foi usado
como uma ferramenta de propaganda pelos governos para influenciar a opinião
pública. Após a guerra, o cinema se tornou uma forma de arte e expressão, com
cineastas como Sergei Eisenstein e Fritz Lang criando filmes que exploravam
questões psicológicas e políticas.

Desse modo, tendo em vista o “crescimento progressivo das massas e à intensidade


crescente de seus movimentos”, o cinema passa a modificar a função social da arte,
sendo está destinada à reprodutibilidade para o coletivo.

3. Elemento parasitário e ideológico do cinema.

No que diz respeito à modificação da totalidade e função da arte, Benjamin destaca


que no início fundada sobre o ritual, agora funda-se sobre uma difusão massiva
como forte instrumento político. De acordo com Benjamin, “Encontrou-se, na
representação por meio da aparelhagem, uma aplicação altamente produtiva para a
auto alienação do ser humano” (p.78).

Essa análise de Benjamin levanta questões profundas sobre o impacto do cinema na


experiência humana e na arte, sugerindo que a reprodutibilidade técnica do cinema
pode levar a uma forma de alienação do espectador em relação à realidade
representada. Tendo em vista que, se utiliza essa técnica (cinema) como um novo
modo de exposição das figuras políticas, na qual diante de toda uma aparelhagem e
orientações ideológicas, se constroem uma narrativa e um campo de ação mais
dominador.

Nesse viés, a aplicação política nos filmes se encaminha para duas complicações,
sendo a primeira: um exploração capitalista que transforma os ideais revolucionários
em contrarrevolucionários, pois considerando a pequena burguesia como uma
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“massa”, teremos então a manifestação segundo Le Bon dos traços de pânico como
representação da realidade e aspirações, neste caso se tratando do “entusiasmo
com a guerra, o antissemitismo ou o impulso de autopreservação”. Tal significação
de valores contrarrevolucionários quando imposto sobre uma classe proletária,
distorcem ou falsificam o interesse original de emancipação, o que prevalece é
apenas representações ilusórias. Sobre isso, cito o trecho: “Disso segue que vale
para o capital cinematográfico, no particular, aquilo que vale no geral para o
fascismo: que uma carência incontornável por novas formas sociais seja explorada
secretamente no interesse de uma minoria possuidora” (p.83).

Ademais, verifica-se como outra adversidade o “culto às estrelas” que em


consonância com seu caráter de mercadoria, se encaixa na lógica do fascismo em
sua busca de se alcançar um culto para entregar suas concepções para o público. A
reação massiva do público por sua vez instaura uma percepção acrítica, ou seja, o
cinema com o potencial de modificar a relação da massa com a realidade, dá a
possibilidade de penetrar intensivamente nessa ilusão e consequentemente nos leva
para uma perspectiva mais reacionária frente aquilo que é oposto aos ideais dessa
massa burguesa ou do líder (figura política).

Para Benjamin, essa “tecnicização criou a possibilidade de uma vacinação psíquica”,


ou seja, no caso da apropriação do fascismo pela instrumentalização do cinema,
configura-se o “o desenvolvimento forçado de fantasias sádicas ou de alucinações
masoquistas”. Desse modo, esse crescente consumo de catástrofes pode gerar uma
“tendência a aceitar confortavelmente a bestialidade e a violência como aparições
que acompanham a existência”. Deve-se atentar então, para esse perigo de uma
introjeção no inconsciente das massas, pois é a partir disso que se manifesta as
tentativas de repressões impostas por essa figura política ou classe dominante.

4. Possibilidade de emancipação.

Mesmo diante dessas complicações citadas, o cinema é uma forma de arte que
reflete e responde às contradições e tensões da sociedade e da cultura, e essa
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relação é influenciada pela interação dialética entre desenvolvimento da técnica e


formas de expressão da subjetividade humana.

Essa interação pode ser vista em movimentos cinematográficos ao longo da história


do cinema. Entre eles podemos citar o expressionismo alemão na década de 1920,
que buscava expressar os sentimentos e emoções do artista de forma subjetiva e
distorcida. Em seus temas destacava-se a representação da loucura, aberrações,
pesadelos e o horror, ou seja, verifica-se uma representação e interpretações
psicológicas e subjetivas sobre uma Alemanha pós primeira guerra, que encontrava-
se imersa no trauma e depressão. Outrossim, também temos o movimento do
neorrealismo italiano, pautado na necessidade de registrar e denunciar a realidade
das pessoas pós Segunda Guerra, configurando no cinema uma estética mais
atrelada ao viés político de emancipação e contra a opressão, dando voz e imagem
a classe trabalhadora por viés de uma aparelhagem documental da realidade social.

No Brasil, essa tendência se manifesta nos movimento do cinema marginal e do


cinema novo, como uma frontal contraposição à estética militarista, épica, formalista
e opulenta do fascismo. Essas tendências, foram fundamentais para se promover
uma representação realidade de forma realista e crítica. Nesse sentido, os filmes
passam a ser utilizados como ferramentas para exposição temas sociais e políticos,
com potencial crítico em relação à desigualdade, pobreza e violência.

Nesse sentido, podemos verificar uma práxis no que diz respeito esse outro modo
de manifestação. O cinema por essa via tem um impacto significativo na construção
de uma identidade cultural, além de expandir os limites da linguagem e da
diversidade. Conforme Benjamin, “Dentre as funções sociais do filme, a mais
importante é gerar o equilíbrio entre o ser humano e a aparelhagem” (p.87).

5. Considerações finais.

Sendo assim, ficou exposto uma breve análise sobre esse elemento dialético na
instrumentalização do cinema, evidenciada pela interação entre a arte e o progresso
da técnica, bem como pela influência mútua entre o cinema e a recepção das
massas. O cinema não apenas reflete a realidade, mas também a transforma,
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criando uma dinâmica dialética entre a arte e o mundo como é apresentado. A


discussão sobre esse efeito da percepção e comportamento das massas, frente à
alienação das obras operativamente impostas com viés contrarrevolucionários é
crucial para se conseguir propor uma reflexão crítica sobre a “desprivatização do
capital cinematográfico”, ou seja, tentar criar condições de possibilidade para uma
emancipação contraria à uma estatização política repressiva.

Por fim, a tentativa central foi uma tentativa de autoconhecimento sobre esse
mecanismo que tanto se consome nos tempos modernos, como é o caso dos filmes,
para se questionar sobre como aquilo que consideramos um mero entretenimento,
muitas vezes pode estar corrompendo e falseando uma realidade completamente
distorcida. Desse modo, é fundamental trazer uma práxis política para esse âmbito,
buscando sempre por novas formas de superação da lógica capitalista e da
representação das bases sociais mais oprimidas.

REFERÊNCIAS

BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica.


L&PM. Porto Alegre, RS. 2017

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