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Teoria da Imagem 2018.

Professora Michelle Sales


Aluna Maria Paganelli

Resenha do texto
Cinema e periferia: constituição de um campo
Ângela Prysthon
Escolhi o texto ​C​ inema e periferia: constituição de um campo, pois vi nele uma possibilidade de
abordar um assunto que me interesso muito: a importância das identidades periféricas emergirem e
se manterem com voz nos lugares de fala, de forma que todos os seres humanos estejam
representados de maneira digna e respeitosa na sociedade. Um direito de todos nós.

Ângela Prysthon começa seu texto chamando atenção à demanda do olhar interdisciplinar ao
Terceiro Cinema. Este termo faz referência à produção cinematográfica dos países do Terceiro
Mundo quais temos um vasto campo de estudos culturais como potência ao cinema contemporâneo.

O ​descentramento é observado como principal elemento na construção de imagens e narrativas no


Terceiro Cinema, nos anos ‘50 e ‘60 e intensificadas a partir da década de ‘80. Não um
descentramento territorial, mas sim do sujeito e das identidades pela fragmentação social;
geográfico, pelo desenvolvimento industrial; e cultural, pelas tendências multiculturais e diálogos
interculturais.

Em paralelo a isso, no texto ​Culture class: art, creativity, urbanism. part I da artista contemporânea
Martha Rosler, é feita uma grande análise sobre a gentrificação estadunidense, também nesta época
do pós-guerra. O que acontecia ali nos Estados Unidos, era visto no mundo inteiro como exemplo
de sociedade, como grande influência nos países ocidentais. Havia uma forte industrialização, um
êxodo rural intenso para as novas cidades-centro-industriais, e com o território em transição, toda a
sociedade também se configurava em novos valores e novas dinâmicas de poder.

​ O clima geral era de reconstrução de identidades, com um ​boom de esperanças de um mundo novo,
o mercado logo tratou de​ aproveitar o momento para lançar o ​American dream new way of life, lema
revolucionário em que o grande sonho, por mais que distante da grande parte da população
​ ocidental, podia ser facilmente consumido em ​fast foods, com o cinema de Hollywood e toda a
cultura pop que se espalhava mundialmente.

O sistema da produção cinematográfica deste período se dava por um Primeiro Mundo com o
modelo hollywoodiano, capitalista e ocidental, sendo necessário um estouro de vendas para
bancarem as próximas levas de filmes, um sistema dependente, um ciclo vicioso de produção.

Conforme​ o artigo ​A indústria cinematográfica do leste europeu e o modelo socialista, ​por Rodrigo
Vasconcellos, a realização de filmes no Mundo Socialista estava atrelada ao conceito de
“administração cultural”, os principais realizadores eram os estúdios estatais, unidades que tinham
uma relativa liberdade criativa e uma equipe relativamente fixa. Para fazer parte das instituições
realizadoras o profissional tinha que ser filiado ao sindicato da sua categoria.

Segundo Prysthon, o termo ​Terceiro Mundo surgiu na década de ‘50, dado pelos demógrafos e
geógrafos franceses na pós- Segunda Guerra Mundial, começou a ser usado oficialmente depois da
conferência de Bandung, em 1955, referente às nações “não-alinhadas” ao pensamento ideológico
capitalista ou socialista. Daí o nome “Terceiro Cinema”, não necessariamente uma produção das
nações do Terceiro Mundo, mas um movimento que discutia o papel da periferia na sociedade, das
identidades colonizadas.

O que unificava a produção deste “gênero” eram seus temas: a pobreza, a opressão social, a
violência e a recuperação da cultura dos colonizados e oprimidos. O Terceiro Cinema se recusa a
virar uma voz homogênea com um estilo definido e um modelo padrão, a sua produção é
reconhecida como conjunto através da forma, através de procedimentos que se assemelhavam em
técnicas simples, abertas, e de ideias complexas e revolucionárias. Alguns exemplos de formas
distintas eram o Neo-realismo Italiano, com uma abordagem formal de baixo custo e linguagem
direta e a Nouvelle Vague com uma abordagem “cinema de autor”, utilizando muito linguagens
individuais e autênticas.

Com um paralelo existencialista e o humanismo em declínio, a identidade “Terceiro Mundo” surgia


com um caráter revolucionário de ideal libertário antiimperialista. O Terceiro Cinema se dava na
​ mesma forma. Na década de ‘60 é que foi mais disseminado o termo ​Terceiro CInema com o
movimento ​Nouvelle Vague (tradução: Nova Onda), transformando a estética do cinema; com o ​Neo
Realismo Italiano e o ​Free Cinema Britânico, que mostravam uma Europa com um caráter mais
terceiro mundista, e no Brasil, o ​Cinema Novo movimento com grande influência dos movimentos
antes ditos.

É interessante, pois com o foco numa cultura marginalizada e não antes tida como protagonista, as
fronteiras ideológicas se dissolvem e há um conflito grande na moral do espectador, que é levado
por uma nova narrativa, um outro olhar diante dos fatos. É exatamente surgindo uma pluralidade de
vozes e não mais repetindo o mesmo discurso de colonizador (seja do lado direito ou esquerdo do
hemisfério terrestre), que cria-se um embate de forças antagônicas existentes e, sobretudo,
pertencentes à mesma história: mundo tecnológico e o mundo natural, ocidente e oriente, universal
e regional, tradição e modernidade, macro e micro, dentro e fora, etc… Trazendo a reflexão que a
História não é uma verdade absoluta, mas existe, além de pontos de vista diferentes, a dualidade
indissociável à natureza das coisas.

Não só na produção do cinema contemporâneo que surgia esta flexibilização de definições, mas
também na maneira de analisar, catalogar, pensar, viver e construir um diálogo interdisciplinar
sobre ela, de forma que o convite à transformação também retornava ao espectador.

Vejo esse momento como o princípio da exposição de muitos problemas em relação às


problemáticas questões de se contar “A História”, pois começa a surgir o quesito sobre o lugar de
fala, por exemplo, no cinema, pessoas e grupos marginalizados da sociedade não tinham seu espaço
para poder produzir seus próprios filmes. O protagonismo dos filmes do Terceiro Cinema, como
vimos, é a realidade periférica da sociedade, e por mais que o relato dessas outras realidades já
fosse um grande avanço para a época, ainda eram feitos por uma burguesia, narrativas criadas pelo
olhar de alguém que tinha o poder de fazer cinema naquela época falando sobre aqueles que ainda
não tinham esse poder.
Através da intensa exposição de contracultura no cinema contemporâneo e não só nele, como
também em outras formas artísticas e políticas, como a Tropicália, os hippies americanos, o
Blackpower, etc… , os processos de descolonização, de conscientização social e de luta política
fazem parte da grande crise da modernidade que implica também no caos cultural mundial.

No cinema brasileiro, vemos o assunto vindo à tona com um acontecimento muito bonito
ressaltando a importância do narrador pertencer à realidade das histórias contadas: a refilmagem do
filme ​5x favela (1962), de Marcos Farias, Miguel Borges, Cacá Diegues, Joaquim Pedro de Andrade
e Leon Hirszman​do. Já no século XXI, ​5x favela, agora por nós mesmos (2010), de Luciana
Bezerra, Manaira Carneiro, Wagner Novais, Cacau Amaral, Rodrigo Felha, Luciano Vidigal e Cadu
Barcelos, ​foi o primeiro longa-metragem brasileiro totalmente concebido, escrito e realizado por
jovens moradores de favelas.

Não só a ascensão da periferia nos lugares de fala, mas também das mulheres, que tanto do lado
colonizador, quanto no lado colonizado, durante longos milênios teve sua presença menosprezada
de qualquer mérito. Lembrei de ressaltar este ponto quando me vi escrevendo à este trabalho o
nome de duas diretoras do filme citado acima.

Enfim, a importância destas conquistas se dá pela possibilidade de enxergar espaços e novos


caminhos mais respeitosos com as identidades, gêneros, sexualidades e culturas diferentes
contrapondo a poderosa cultura colonial do homem-branco-hetero-cis(…) ditador da História como
ensinada nas escolas dos países colonizados. Estes exemplos de acontecimentos que trazem
dignidade e refletem a ascensão, por mais que lenta, das minorias na contemporaneidade.

“Ter direito à voz, é ter direito à humanidade, então quando eu não tenho direito à voz, a minha
humanidade está sendo negada.” - Ribeiro, Djamila.

BIBLIOGRAFIA:

-http://www.cult.ufba.br/enecult2007/AngelaFreirePrysthon.pdf
-https://filmenomundo.wordpress.com/2014/02/19/a-industria-cinematografica-do-leste-europeu-e-o
-modelo-socialista/
-https://southwarknotes.files.wordpress.com/2009/12/rosler-culture-class-123.pdf
-https://pt.wikipedia.org/wiki/Cinco_Vezes_Favela
-https://pt.wikipedia.org/wiki/5x_Favela_-_Agora_por_N%C3%B3s_Mesmos
-https://pt.wikipedia.org/wiki/Contracultura_da_d%C3%A9cada_de_1960
-https://www.youtube.com/watch?v=6JEdZQUmdbc

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