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ANTROPOLOGIA DA ARTE

BENJAMIN, Walter. A Obra de Arte na Era da


Reprodutibilidade Técnica. In Magia e Técnica, Arte e
Política – Ensaios Sobre Literatura e História da Cultura.
São Paulo. Brasiliense. 2012.

Lucas José Cravalho Teixeira

Walter Benjamin nasceu em Berlim em 1892, no ano de 1940 morreu ao tentar fugir
das tropas do exército nazista na travessia da França para a Espanha. Neste período de 48 anos
que viveu, acompanhou grandes e intensas tranformações na história ocidental impulsionadas
pelo que chamamos de modernidade para nos referir sobre as mudanças que marcaram a
passagem dos séculos XIX-XX. A invenação de novos maquinários e meios de produção, a
experiência da vida urbana e das multidões nas cidades, o aumento da velocidade na produção
de mercadorias, a fé inquebrantável na ciência e a primeira guerra amparada por esta fé, a
invenção dos meios de reprodução como aparelhos fonográficos, máquinas fotográficas e o
cinema, o surgimento dos líderes fascistas como Hitler e Mussolinni, a revolução
bolchevique de 1917, as vanguardas atrtísticas do início do século XX, formam um conjunto
de fenômenos que estão contidos nesta passagem de tempo e que são imprescindíveis e
profícuos nos escritos de Benjamin.
Em A Obra de Arte na Era da Reprodutibilidade Técnica (1935-1936), bem como em
boa parte de seus escritos, Walter Benjamin passa por todas essas tranformações e, nesse
trabalho em específico, demonstra como as alterações históricas na base econômica altera
também nosso modo de percepção dos objetos artísticos e fomenta a criação de novas formas
de expressão artística. O início de sua análise explica a alteração no campo da cultura como
uma consequência das mudanças de ordem econômica e social orientado por uma leitura
vinculada ao materialismo histórico: “ tendo em vista que a superestrutura se modifica mais
lentamente que a base econômica, as mudanças nas condições de produção precisaram de
mais de meio século para refletir em todos os setores da cultura.” Nos diz o autor.
A era da reprodutibilidade mecânica dos objetos artístico, é entendida como um
reflexo do modo de produção capitalista, uma alteração das condições históricas, assim como
já houverá outras formas de lidar com a arte, também situado em outros tempos condicionado
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por outras condições materiais. A particularidade aqui, na nossa era da reprodutibilidade


técnica, reside na produção dos objetos artísticos ausentes daquilo que o autor chamou de
aura, ela se perderá com a reprodução mecânica da arte. A aura presente no objeto artístico é
um sentimento que envolve um misto de percepção e sensações na contemplação da arte o “
aqui e agora da obra de arte, sua exsitência única no lugar em que ela se encontra”.
Acrescentemos que, num mundo em que da replicação de imagens virtuais a todo
instante são compartilhadas e o consumo audiovisual em diversas plataformas de reprodução
de vídeos e música, talvez de maneira muito restrita, poucos se aproximaram de um objeto
aurático. Por outro lado, alterou nossa forma em lidar com os objetos artísticos e intensificou
aquilo que Benjamin havia percebido no comportamento das massas, a necessidade possuí-los
e de tê-los próximo de si.
No momento histórico – a era - da reprodução mecânica, foi a fotografia que gerou
um grande deslocamento e o ponto de inflexão da na nossa forma de se relacionar com as
imagens. A reprodução mecânica de imagens, explica o autor, liberou as mão da criação das
imagens – como ocorria ao escupir uma estátua no mundo grego ou pintar um quadro como
na idade média - e restringiu a relação com a imagem no campo sensorial da visão.
Nossa milenar tradição em lidar com preponderância com o sentido da visão e com as
imagens, carregamos da tradição grega - circunscita na era da obra de arte montável - em
criar seus duplos através das estátuas escupidas em pedras, e da tradição cristã de representar
seus santos em imagens religiosas, ambas estão direcionadas para o uso ritualístico e,
portanto, a inscrição teologica esteve presente nos objetos artístico como parte do seu
contorno aurático. No entato, a relação com a imagem sofrerá uma abalo promovido pela
fotografia porque além de liberar as mãos e restringir a criação da imagem no campo da visão,
a fotografia também retirou o caráter teológico parasitário que acompanhou a imagem antes
da reprodutibilidade técnica.
Considerado por Benjamin como o agente de reprodução mais poderoso, o cinema
expressa, no marco do fascismo, a estetização da política. O autor observa que aquela
liberação da imagem da prática ritualística fez com que essa se refundasse com força na esfera
política. A política dos governos fascistas e dos interesses da economia capitalista, utilizam-
se do cinema e de estratégias de persuasão, como o sistema de estrelato que, além de
promover o culto à personalidade promove também uma consciência corrupta que ofusca a
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consciência de classe.
O cinema aqui, não aparece como uma arte reificada, ela é desvelada como uma
expressão artística que carrega intencionalidade, o autor diz que “ (…) vale para o capital
cinematográfico o que vale para o fascismo em geral: ele explora secretamete, no interesse de
uma minoria de proprietário, a inquestionável aspiração por novas condições sociais.”
Termina dizendo que, por esta razão, a expropriação desse capital cinematográfico é uma
exigência do próprio proletariado.
Walter Benjamin usa a expressão “capital cinematográfico”, este capital que investido
na construção dos filmes é por ele considerado contra-revolucionário e se vale de estratégicas
de técnicas de montagem cinematográfica que buscam criar o efeito de ilusão promovido pelo
cinema naturalista – o cinema dos estúdios norteameicanos -, bem como o uso de estrela para
o culto da persoladidade. O ilusionismo no cinema, transmite a impressão de “um aspecto
da realidade livre de qualquer manipulação pelos aparelhos, precisamente graças ao
procedimento de penetrar, com aparelhos no âmago da realidade”. Essa aparência de realidade
conseguida no processo de montagem e do conjunto de aparatos técntos para montar e captar
as cenas, resulta naquilo que críticos cinematográficos, como o brasileiro Ismail Xavier,
chama de efeito janela. Esta é uma metáfora usada para representar a fé na imagem do cinema
como apresentação da realidade, “ fé no mundo da tela como um duplo do mundo real”
( XAVIER, 2014, p.25).
Qual seria o cinema que escaparia dessa lógica, entre os imperativos do domínio
econômico e da manipulação do domínio fascista? Nesta direção, é interessante notar, que o
autor reconhece que há um cinema livre do domínio fascista e capitalista, e assim cita Charles
Chaplin como um diretor de cinema progressista que coincidentemente havia produzido um
dos seus clássicos, Tempos Modernos, no mesmo ano que Benjamin havia finalizado A Obra
de Arte na Era da Reprodutibilidade Técnica (1935-1936). Os papéis de “vagabundo”,
operário, imigrante, ex-detento, entre outros na sua filmografia, problematiza e subverte as
relações sociais controladas pela política fascita e pelas relações de trabalho.
Para Benjamin, o cinema e sua abrangência forma espectadores como semi
especialistas no assunto, em que comentar sobre os filmes passou a ser tão comum como
comentar sobre eventos esportivos , tal abrangência assim, aponta para exigência das massas
em fazer parte do cinema e serem filmadas. Pois Benjamin afirma que com a arte
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cinematográfica, a exemplo do que chamou de filme de atualidades, é comprovada a


oportunidade de todos apararecerem na tela. O que o autor chama de filme de atualidades,
refere-se ao gênero que predominava no catálogo dos produtores no ínicio da exibição
cinematográfica, a exemplo de filmes de viagem, lutas de boxe, filmes de guerra, registro de
acidentes (DA-RIN,2008). Essa referência é interessante porque nos mostra a popularizão do
cinema vinculado ao cotidiano de pessoas simples na europa oriental, neste sentido, para o
autor, no cinema russo, os diretores conservaram esta participação das massas ao permitir que
elas interpretem a si mesma dentro do ofício que lhes está reservado no filme.
Neste ponto sobre a participação das massas no cinema, o autor constata que na
indústria cinematogŕafica ociental por meio de “concepções ilusórias e especulações
ambivalentes” os filmes buscam corromper o interesse da massa pelo cinema através da
publicidade e da exposição da figura femina.
O vínculo entre o cinema e a política aparece no texto aberto nas seguintes frentes: o
cinema e o capital cinematográfico, cinema e o seu uso progressista, o cinema como veículo
de propaganda de guerras e de governos fascistas – a estetização da política – e finda a
discussão com a menção à resposta do comunismo que vislumbra a politização da arte. Serão
nestas duas antinomias - estetização da política e politização da arte - que agora nos
concentraremos.
Walter Benjamin, certamente havia conhecido muitos filmes de propaganda fascista,
citamos como exemplo o conhecido filme de propaganda do Partido Nazista Alemão da
cineasta Leni Riefenstahl, O Triunfo da Vontade (1934), no qual vemos multidão alucinada
que saúda Hitler, contempla grandes marchas militares e exibem suásticas estampas em
bandeiras.
Por outro lado, já temos os clássicos dos cineastas soviéticos como Serguei Eisenstein
e Dziga Vertov, certamente também conhecido por Benjamin, que exprimem sua arte através
de um cinema que destaca os valores da sociedade soviética em construção sob os princípios
comunistas, o que aproxima das convicções de mundo de Benjamin. A politização da arte se
proliferou no cinema soviético, encontramos em filmes conhecidos como: O Encouraçado
Potemkim (1925), Outubro (1927) de Einsenstein e em O Homem com a Câmera (1929) e
em Entusiasmo (1931). São filmes temáticos que destacam personagens coletivos – como o
operário, o marinheiro, os motins - e se distanciam do capital cinematográfico, da propaganda
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fascista, do sistema de estrela e do culto da personalidade. Temos assim uma oposição


diametral entre: a estetização da política e a politização da arte.
Na particularidade do capital cinematográfico e dos regimes fascistas a respeito do
uso do cinema em sua propaganda política, “a reprodução em massa corresponde de perto à
reprodução da massa”, Walter Benjamin nesta equação, nos mostra que através da captação
feita pela na filmagem dos movimentos das massas presente em desfiles, nos comícios
espetaculares e eventos esportivos, esta enxerga sua expressão e possui seu rosto reproduzido
na imagem. Desta maneira, ela está presente no campo imagético e até exprime suas
exigências de mudanças nas relações de produação, porém ao mesmo tempo, estas relações
são inalteradas no campo da sociabilidade. A reprodução das massas, portanto, esfetiva-se a
partir do uso das técnicas cinematográficas mobilizadas e empenhadas na construção
imagética da figura, do perfil e do lugar da multidão na vida política. Neste ponto, diz o
autor, o fascismo “desemboca, consequentemente, na estetização da vida política”
A política estetizada converge para a guerra, afirma o autor, pois, “somente a guerra
permite dar um objetivo aos grandes movimentos de massa, preservando as relações de
propriedade existente”. Para complementar esta união perversa entre o fascismo e arte,
Benjamin cita o futurista italiano Marinetti, dizendo sobre a guerra colonial da Etiópia: “ nós
futuristas constestamos a afirmação de que a guerra é antiestética” daí para frente Marinetti
continua com o elogio às máquinas e equipamentos de guerrra, aos perfumes e aos odores da
decomposição, para afirmar que a guerra é bela.
Por fim, Walter Benjamin diz que o fascismo, a exemplo de Marinetti, espera que pela
espetacularização da guerra ocorra a satisfação artística e mudança da percepção sensível
alterada pela técnica. Convém aqui citar na íntegra os últimos trechos deste texto, que abre
uma perspectiva de enfrentamento à estetização da política através da própria arte: “ Sua
autoalienação antingiu o ponto que lhe permite viver sua própria destruição como prazer
estético de primeira ordem. Eis a estetização da política, como a prática do fascismo. O
comunismo responde com a politização da arte.”
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
DA-RIN, Silvio. Espelho Partido – tradição e transformação do documentário. Rio de Janeiro:
Azougue Editorial 2006.
XAVIER, Ismail. O Discurso Cinematográfico – A opacidade e a transparência. São Paulo:
Paz e Terra 2014.

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