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I AS VANGUARDAS FRANCESAS
O cubismo foi uma expressão plástica afinada com a vertigem metropolitana moderna, não
apenas na sua formalização da multiplicidade de pontos de vista, mas também em seu caráter
antiilusionista, de aprofundamento da ruptura modernista com a busca de impressão de
verossimilhança. Tanto a justaposição descontínua de “ângulos” quanto a evidenciação da
fatura da obra – que alcançou, no período pioneiro, sua potência máxima com as colagens
de Picasso e Braque – incorporam à obra de arte experiências urbanas contemporâneas.
Mas, ao mesmo tempo, e para melhor explicitar o caráter formal desta expressão plástica
que se apresentava como radicalmente nova, os cubistas mantinham referências temáticas
clássicas, compondo nus fragmentados e bidimensionalizados (dissolvendo qualquer
ilusão mimética de espaço realista) ou colando pedaços de jornal em sugeridas naturezas-
mortas. Essa recusa ao tratamento direto de temas contemporâneos por parte dos mais
bem-sucedidos vanguardistas daquele momento reforçava o caráter elitista do trabalho
formal desses artistas, reunidos numa espécie de comunidade, inicialmente marginal ao
mundo burguês, mas logo estabelecendo com setores desta burguesia relações de consumo
e distinção através dos marchants.
A guerra, evidentemente, abalou essa efervescência parisiense, mas ela foi retomada ainda
com mais força no período posterior ao conflito. Na França vitoriosa, Paris tornou-se,
nos anos 1920, a capital mundial das artes. Artistas do mundo inteiro foram para lá, e a
comunidade artística marcou a cidade a tal ponto que, nas palavras do jornalista e historiador
William Shirer,
o produto da imaginação do homem não só era levado a sério, como também parecia
mais importante que tudo mais: mais importante que a maneira pela qual se ganhava
a vida ou do que poderiam estar tramando os banqueiros, homens de negócios,
políticos e estadistas (SHIRER, 1969, p. 162).
A experiência da guerra foi incorporada, como tudo mais, a esse torvelinho das vanguardas.
Léger, em especial, referia-se a sua experiência no campo de batalha como um momento
decisivo de inflexão. A I Grande Guerra inaugurou o maquinário e a escala industrial como
O chamado “período mecânico” de Léger, inaugurado pela pintura de uma cena militar,
em O jogo de cartas (1919), explorou essas formas e teve seu coroamento, já em forma
cinematográfica, com Ballet Mécanique.
Tudo isso, entretanto, diz respeito à constituição dos planos. Mas o filme vai além, tomando
essa visualidade cubista e abstrata como um patrimônio já conquistado, a partir do qual a
dimensão temporal – específica do cinema – é explorada.
Isso é feito pela organização, via montagem, de blocos com características formais específicas.
Num primeiro momento estabelece-se, pela moldura realista da imagem de uma mulher
em um balanço, uma coleção de elementos (círculos e triângulos, um chapéu, uma polia
industrial, um sorriso repetitivo) que marcam um padrão rítmico para o filme.
Os blocos que se seguem estão pautados por parâmetros específicos: uma afirmação inicial de
referências geométricas por figuras e deformação prismática, exercícios iniciais de variações
rítmicas, expansão desses exercícios de montagem para a incorporação no fluxo abstrato de
fragmentos de cenas urbanas; o destaque por decupagem e montagem das letras e números
dos tipos gráficos da comunicação de massa. O filme termina apresentando uma espécie de
balé mecânico sintético, com a animação, via montagem, das pernas de um manequim. E,
como epílogo, uma releitura da figura de Chaplin ao estilo cubista do filme – ao mesmo
tempo uma homenagem àquele que parecia aos vanguardistas o maior artista do cinema até
então, e uma proposta de uma nova perspectiva para a arte que nascia.
2 Delluc e Epstein
Mas se Léger era um artista formado na vanguarda plástica do pré-guerra, que passou pelo
cinema em sua trajetória de pintor, houve na França, depois da guerra, uma vanguarda
especificamente cinematográfica. No pós-guerra o cinema foi “descoberto” pelos intelectuais, e
floresceu em Paris o primeiro ambiente critico consistente da história do cinema. Misturavam-
se, e por vezes se sobrepunham, na mesma pessoa as atividades de realização e ensaísmo.
Várias interpretações do cinema surgiram, num ir e vir entre projetos teóricos e filmes.
A marca comum a todo esse campo vanguardista era a defesa da “especificidade” da arte
cinematográfica, a recusa de sua subordinação a parâmetros de outras artes, como o teatro
ou a pintura. Essa defesa – estratégica para a legitimação intelectual do cinema –, ainda
que diversa, considerava a dimensão narrativa secundária ou francamente condenável. Por
exemplo: apesar de o próprio autor de La Roue, Abel Gance, proclamar que o cinema
inaugurava uma era em que toda tradição narrativa seria incorporada nas criações para a
Jean Epstein foi um dos principais deles. Ele acredita que a câmera e suas potencialidades
expressivas – os destaques do enquadramento, o primeiro plano, a câmera lenta, as reversões
de movimento, as variações focais – nos dão um acesso privilegiado, iluminador, ao mundo.
Essa capacidade revelatória, que ele teorizou sob o conceito da “fotogenia”, seria intrínseca
ao cinema, à sua objetividade de captura das imagens e à sua reorganização pela montagem ,
mas deveria ser potencializada por um cinema a contrapelo da sedução narrativa. Segundo
ele: “por que contar histórias? (...) A vida não se deduz como as mesas de chá chinesas, que
se engendram doze sucessivamente, uma após outra. Estórias não existem. Jamais existiram.
Há apenas situações” (EPSTEIN apud XAVIER, 1978, p. 88).
Apesar dessa posição do crítico, o realizador roteirizou e dirigiu adaptações de obras literárias.
A queda da casa de Usher, adaptação do conto homônimo de Edgar Alan Poe, misturado
à história de O retrato oval, do mesmo autor, é provavelmente a mais famosa. A história
do pintor que vê sua mulher definhando enquanto prossegue a realização de um quadro
dela, que parece lhe roubar a vida, é narrada em atmosfera de pesadelo. Para isso, Epstein
emprega um arsenal de recursos que ele apontava como responsáveis pelo poder revelatório
do cinema. Fusões, leves desfoques e variações do diafragma ajudam a compor, junto com
uma iluminação carregada, que explora o contraluz, o clima onírico e fantasmático que
parece ameaçar a integridade da matéria. A câmera lenta é também utilizada em sentido
afim, dando aos movimentos dos atores uma aura de morte, num procedimento exemplar
da busca de uma imantação de sentidos nas situações por parte desse autor muito mais
preocupado com a construção de climas do que com a progressão narrativa.
Veja-se que o elogio de Epstein aos poderes revelatórios do cinema não se traduz por uma
compreensão documental da imagem, nem tampouco numa visão construtivista, como a
dos russos, que discutiremos mais adiante. Próximo a uma estética romântica, que aposta
numa revelação orgânica de dimensões mais essenciais através da imagem, Epstein afirma
que “O ritmo das imagens, é bom que se diga, é o aspecto mais superficial do ritmo
cinematográfico. Ao seu lado, acima, ainda mais importante, é o ritmo psicológico que se
traduz no ritmo da vida das personagens” . Dito de outro modo, o que se busca, através
dos recursos cinematográficos, é “revelar a verdade de um sentimento, de uma atitude
humana”(XAVIER, 1983, p. 179).
A fertilidade das ideais de Epstein é atestada pelos paralelos que se pode traçar com os conceitos desenvolvidos posteri-
ormente por grandes ensaístas, como o “ inconsciente visual” ao qual o cinema, segundo Walter Benjamin, dá acesso, e a
“ontologia da imagem” que, segundo Bazin, estaria na base da sétima arte.
Conferência de Jean Epstein proferida em dez/23, citado em Leprohon ([19--], p. 117).
3 Dadaísmo, surrealismo e Man Ray
Talvez a virulência das polêmicas estivesse potencializada pelo uso difuso que o termo
permitia. Ele fora usado pela primeira vez por Apolinaire, em 1917, para descrever o caráter
da invenção de um balé de Jean Cocteau, musicado por Erik Satie e com uma cortina
feita por Picasso. No caso do cinema, esta flutuação do termo foi, e continua (no âmbito
da história da arte), grande. E os casos de mais sutil distinção são os das fronteiras entre
surrealismo e dadaísmo. Como diz o historiador Virmaux,
Ocorre que cinematecas e cineclubes apresentam sob a etiqueta ‘surrealismo’um certo
número de curta-metragens realizados por volta de 1925, e o público se acostumou
a tomar como ‘surrealismo’ toda essa ‘vanguarda’ muda. Na realidade, há um abuso
de linguagem: uma boa parte destes filmes é de inspiração dadaísta. Confusão
desculpável: vistos desde as estrelas, tanto Dada como o surrealismo podem ser vistos
como duas etapas de um mesmo movimento revolucionário; não somente têm muitos
pontos comuns, como encontram em suas fileiras os mesmos homens.Tratando-se de
filmes, não será sempre fácil determinar se tal obra é mais dadaísta ou surrealista
(MITRY, 1974, p. 156).
O próprio Man Ray se formara como artista no seio do dadaísmo novaiorquino, onde estavam,
em meados dos anos 1910, Marcel Duchamp e Francis Picabia, de quem se aproximou.
O movimento dadaísta teve focos em Paris, Nova Iorque, Berlim e, de modo pioneiro, em
Zurique. Apesar das variantes, havia em comum o espírito de anarquia radical, ao qual
se refere Richter, que no limite atacava a própria existência da arte, como fica claro nos
readymades de Duchamp (como a famosa exposição de um mictório, sob o título de A
fonte, ou os desenhos técnico-industriais copiados por Picabia, como a de uma vela de
ignição que recebeu o nome de Retrato de uma moça americana em estado de nudez).
Os filmes de Man Ray são significativos desse ambiente criativo. Chegado dos EUA em 1921,
o fotógrafo imiscuiu-se no meio surrealista e, entre 1923 e 1929, esporadicamente, realizou
curtas-metragens – quatro, no total), sempre em esquemas de trabalho improvisados, às
vezes por diversão (seu maior investimento artístico estava na fotografia), e às vezes até sob
encomenda de um mecenas rico (como em O mistério do castelo de dados). Como disse
Carlos Augusto Calil,
não é possível classificá-los como rigorosamente dadá ou surrealistas (...) os filmes
de Man Ray, como seu autor, não são dogmáticos nem obras de um crédulo. São
antes produto de uma inclinação à criação que, erotizando os objetos, manifesta uma
postura leve com relação à vida (CALIL, 1996, p. 90).
O primeiro filme de Man Ray, O retorno à razão (1923), um experimento de dois minutos,
transpõe para o movimento proporcionado pelo cinema a sua técnica fotográfica da
raiografia, na qual a película, com objetos a ela sobrepostos (pregos, tesouras, tachinhas
etc.) é impressionada pela luz diretamente, sem o uso de uma câmera. No filme, ele ainda
associa essas imagens (jogos de silhuetas móveis contra um fundo neutro, alternando o preto
e o branco entre figura e fundo) com algumas imagens de fato filmadas, que lembram este
mesmo jogo formal (as luzes noturnas de um carrossel, movimentos de móbiles de papel
contra um fundo neutro).
Em Emak Bakia (“deixe-me em paz”, em basco), tudo é movimento, sem descanso: de novo
as raiografias, de novo luzes noturnas, mas agora com a câmera em perpétuo movimento.
Como as luzes refletidas em prismas giratórios ou as ondas na praia, ou ainda os desenhos
de colarinhos retrocedendo de modo ascendente, por trucagem, em seus movimentos
de queda. Ou ainda, como uma espécie de matriz dessas experiências, o ponto de vista
vertiginoso de uma viagem de carro em alta velocidade. Tudo isso filmado com recorrente
recurso a lentes que distorcem a imagem de modo a ondulá-la. O movimento ondulatório é
a forma desta experiência cinematográfica, que traz ainda a marca da metalinguagem, com
a imagem de seu patrocinador (o milionário Arthur Wheeler), e com a fusão da lente da
câmera e do olho (tal como fará, poucos anos depois, Vertov, em O homem da câmera).
Um outro comentário metalingüístico fecha e coroa o filme: um olho pintado sobre uma
pálpebra. Movimento ininterrupto, fantasia e observação, construção e objetividade, tudo
isso sintetizado numa imagem inquietante.
A estrela do mar (1929) é feito a partir de um poema surrealista de Robert Desnos. Circula
pelas imagens – que, sem se articularem narrativamente, expressam o desejo entre um casal –
uma aura de erotismo. Isso tanto na simbologia das imagens, com fálicas chaminés, femininas
estrelas do mar e flores, e até uma fenda que se abre, como no estilo visual, marcado por
certa lassidão e, principalmente, pelo recorrente uso de um vidro não polido em frente à
objetiva, dando a tudo e a todos um aspecto carnal, tornando o mundo orgânico.
O último filme de Man Ray, O mistério do castelo de dados, é quase que uma
bricadeira inconseqüente, filmada no castelo do visconde de Noailles, cujo título, lembrando
Mallarmé, refere-se ainda, no avançado ano de 1929, ao espírito dadaísta.
4 Entr´acte (1924)
Mas a grande obra-prima dadaísta foi, sem dúvida, Entr´acte. Concebida e realizada no
mesmo espírito espontâneo e anárquico dos filmes de Man Ray, Entr´acte marcou a estréia
de René Clair. Segundo o próprio autor (CLAIR, 1970, p. 24), coube a ele a realização
Clair declarou, à época, que em seu filme “a imagem, absolvida de seu dever de significar,
nasce de uma existência concreta” (MITRY, 1974, p. 117), diferente tanto dos “cine-
romances” (as narrativas ilustradas) quanto dos simbolismos das vanguardas (como em
Epstein), alinhando-se, segundo o autor, a filmes como L´arrouseur arrosé (clássico do
primeiro cinema), Viagem à Lua (de Meliés) e “a alguns cômicos americanos”, exemplos
das “poucas obras dignas dele [do cinema]” (MITRY, 1974, p. 117). Dito de outro modo,
Entr´acte é uma celebração da brincadeira, do potencial lúdico e vital do cinema.
Esse jogo de inversões, que sugere a subversão da ordem cotidiana, segue. A bailarina retorna,
e se revela uma mulher barbada (na verdade, um homem travestido). Surge no terraço um
caçador, atira num ovo, dele sai, como nos truques de mágica, uma pomba, que pousa sobre
o chapéu do atirador. Mas outro caçador surge e atinge o primeiro, que morre, com seu
corpo caindo sobre a rua.
Sobrevém o movimento final, de máxima subversão lúdica: um cortejo fúnebre (do homem
atingido ou não, pouco importa) passa da tristeza e do lamento a uma agitação circense.
De início, o cortejo já se mostra estranho, passando por um parque de diversões. Detalhes
indicam a subversão: salsichas em vez de flores na guirlanda. E no lugar do cavalo, um
camelo puxa o esquife, que logo se desprende, o camelo foge, e o cortejo sai em desabalada
carreira, com a velocidade do filme se alternando entre a câmera lenta e a câmera rápida. A
farsa só termina quando o caixão cai, e se abre. De dentro dele sai um mágico, que com sua
varinha faz todos ao redor desaparecerem, sendo ele próprio o último.
Polêmicas vanguardistas e da história da arte à parte, fica clara a diferença com O cão andaluz,
desde sempre o mais celebrado filme surrealista. Neste filme de estréia (Buñuel só tinha
atuado antes como assistente de Epstein em A queda da casa de Usher, e Dali, seu co-autor,
não tinha experiência cinematográfica) realiza-se de modo acabado o projeto surrealista de
produzir imagens que perturbam o espectador de um modo diretamente inconsciente. O
cão andaluz é um filme vigoroso, enérgico, por vezes violento. Poucas imagens da história
O que se segue a essa abertura fulminante é, mais que misterioso, perturbador. Um estranho
personagem masculino, vestido de um modo que tem algo feminino e tendo uma caixa
pendurada no pescoço, avança de bicicleta, enquanto em paralelo uma moça o espera,
em casa. O ciclista acaba caindo, sendo socorrido por ela. O encontro, frustrado, acaba
ocorrendo de modo apenas parcial, com a mulher beijando intensamente o homem, caído
desacordado. A caixinha é aberta por uma chaveta, numa imagem de conteúdo sexual latente.
É evidente que todo O cão andaluz dá expressão à tensão entre desejo e repressão .
A perda da boca, sugerida como repressão do desejo sexual, culmina a série de imagens
aflitivas, expressões de um intenso combate interno, de uma pisque estruturada por uma
violenta repressão. O filme surrealista de Buñuel busca, antes de comentários ou ilustrações,
dar expressão direta a essa tensão psíquica. Suas imagens pretendem ter o mesmo poder de
condensação de experiências e poder de perturbação que as imagens oníricas.
O filme termina com a fuga da mulher daquela prisão na cena repressora do quarto. Ela
surge na liberdade de uma praia, onde encontra um outro homem, com quem, ao que
tudo indica, o encontro amoroso é possível. Mas, num último volteio simbólico, aparecem
na praia objetos trazidos pelo mar, os pedaços da bicicleta. A imagem final do filme é dos
cadáveres do casal, enterrados pela metade na areia, sendo devorados por insetos. O que
A interpretação marcadamente psicanalítica de O cão andaluz, que sigo aqui, tem como principal referência o livro de
Cesarman (1976, p. 69-86).
parecia uma cena de superação e de encontro vital é pontuada primeiro pelo retorno do
Para pensar o cinema expressionista alemão há que se entender um pouco a situação da capital
alemã – onde esses filmes foram realizados – no contexto europeu de fins do século XIX e
início do XX. Se os filmes expressionistas tratam de relações entre indivíduos e sociedade,
tematizam a individualidade e a massificação, a “vida moderna” na sua definição mais geral,
de vida na cidade, é preciso compreender então que cidade e que sociedade eram essas.
A crítica tem comumente localizado na arte expressionista algumas questões comuns, como,
por exemplo, o conflito pai-filho (BEHR, 1999; GAY, 1978), que poderia ser pensado
simbolicamente como a tradução desta relação de oposição entre os mais velhos – ou a
arte estabelecida – e os mais jovens – ou a arte nova; ou ainda, a nova arte para o novo
homem, ou mesmo a forma universal – apaziguadora – contra a subjetividade que pretende
romper os limites. Esse conflito pai-filho, que aparece literalmente no teatro, na música e
na poesia expressionistas , e que nas artes plásticas é visto de modo mais sutil ou matizado,
parece sublimar, no entanto, algumas questões mais complexas que alimentavam essa
vanguarda, sobretudo no que diz respeito à situação do artista alemão. As artes estavam
tentando estabelecer novas possibilidades de se pensar a sociedade, livre da opressão que
a modernização lhes parecia acarretar, mas não só, estes artistas pareciam determinados a
tomar uma posição intuitiva e “destreinada”, retomando valores pré-industriais (à la Willian
Morris), chegando a condenar as distorções da vida urbana, da ciência e do racionalismo.
Entretanto, a possibilidade de existência desses artistas era justamente o alargamento de
um mercado de artes que lhes propiciava algum ganha-pão fora dos círculos oficiais, e
que só foi possível graças à urbanização e à modernização do país. Mas esta insatisfação
com a “opressão” da vida urbana pode ser mais bem entendida se pensarmos que tais
desenvolvimento e modernização intensos não ocorreriam sem custos.
Peças como Der Sohn (Hasenclever), Vatermord (Arnoldt Bronnen), Vater und Sohn (der Goltz), por exemplo.
Arquiteto inglês, líder do movimento Arts and Crafts, seria muito admirado pelos alemães.
O cinema que se convencionou chamar de expressionista, e que de alguma maneira parece
Ao final da Grande Guerra, a pujante nação indestrutível é uma terra devastada – e o imperador
se vê forçado a abdicar. Em 1918, com a derrota, a República é proclamada por um grupo
de políticos social-democratas reunidos em assembléia em Weimar – a cidade de Goethe –,
e a história alemã entra num novo período. A Revolução, que estava no horizonte da classe
operária, não acontece efetivamente, sendo abortada sob a liderança da social-democracia,
que controla a massa revoltosa e a integra num modelo de estado aceitável para a burguesia:
realizava-se a “democracia de todo o povo”, evitando-se a “ditadura de uma só classe”, pelo
menos no entendimento dos socialistas. No entanto, o que de fato aconteceu foi uma jovem
República formada na esteira das velhas classes aristocráticas, entre interesses burgueses,
numa clara tentativa de impedir a ascensão comunista. É nesse contexto de apaziguamento
das reivindicações proletárias e socialistas que Rosa Luxemburgo e Karl Liebknitch são
assassinados barbaramente pelos frei-corps (forças paramilitares de direita que mais tarde
alimentariam as SS de Hitler), sob o olhar complacente da liderança social-democrata (que
pouco fazem para punir os culpados). Nas palavras de um importante historiador, “a república
nasceu derrotada, viveu em tumulto e morreu em desastre” (GAY, 1978).
Se o Império levara a nação a uma quase-destruição, a culpa pela derrota e pela situação
caótica que a Alemanha se via mergulhada não cai nem em suas costas nem nas de generais,
que conduziram milhares de jovens à morte. Os verdadeiros responsáveis, ao longo de toda
a República de Weimar, serão os políticos da liderança social-democrata que arcaram com
o ônus de assinar o tratado de Versalhes. Se o tratado punha fim à Guerra, as condições de
paz impostas seriam vistas por muitos como condições de vingança dos franceses pela guerra
franco-prussiana. Ainda que o tratado pudesse ser a única solução possível naquele momento,
a pecha de perdedores, fracos, traidores acompanhará sempre os homens do governo, pois os
ressarcimentos de guerra estabelecidos amarraram o Estado, impedindo a jovem República
de se estabelecer, trazendo mais devastação e miséria à já derrotada Alemanha. A República de
Weimar (1918-1933) nasce, assim, sob uma crise econômica sem precedentes, empurrando
as camadas médias para o terreno da direita e contribuindo para a desmobilização gradativa
da imensa classe operária, pelo fato mesmo de ela deixar de ser operária e se transformar num
exército de desempregados – cada vez mais disponíveis, ambas, camadas médias e baixas,
para serem cooptadas pelos nacional-socialistas (GAY, 1978).
No entanto, as crises em geral tendem a ser períodos férteis para as artes, e na Alemanha
de Weimar isso pode ser observado muito claramente: arquitetura, música, teatro, artes
plásticas, em todas as áreas o desenvolvimento é intenso. E o cinema entra numa nova fase,
saindo da esfera local para ganhar as telas do resto do mundo.
Para entender essa produção, vejamos quatro filmes que, grosso modo, podem ser entendidos
como paradigmáticos da cinematografia alemã naquele período. São eles “O gabinete do Dr.
Caligari” (1920), “Nosferatu” (1922), “A última gargalhada” (1924) e “Metropolis” (1927).
Este talvez tenha sido o principal filme alemão do pós-guerra, que revelaria o cinema
germânico para o mundo e criaria uma nova estética cinematográfica – um verdadeiro marco
na história do cinema. Para Peter Gay, o filme exibido em Berlim em 1920 é provavelmente o
“artefato mais celebrado da república de Weimar”, só comparável à Bauhaus – personificando
o espírito de Weimar ao lado da arquitetura de Gropius, a pintura de Kandinsky, os cartazes
de Groz e as pernas de Dietrich (GAY, 1978, p. 119). Vejamos por quê.
O filme parece ter inaugurado novas ambições estéticas, propondo uma relação entre filme
e artes gráficas, entre ator e representação e entre imagem e narrativa, conseguindo atrair a
atenção de um público intelectualizado que até então guardava distância da nova indústria
do espetáculo – ainda incerta de seus caminhos e distante talvez do que até então se entendia
por Arte. O filme também pôde iniciar um processo de reabertura de mercados para a
Alemanha, ajudando a recompor sua imagem de nação causadora da Guerra no exterior.
Além disso – o mais importante, talvez –, o fato de ter servido a um proeminente crítico
da cultura como uma “explicação” da psicologia alemã que levaria ao nazismo, este filme
teve a história de sua produção cercada de lendas e mitos que só recentemente começaram
a ser esclarecidos . O livro De Caligari a Hitler: uma história psicológica do filme alemão,
de Siegfried Krakauer (1947), ajudou a perpetuar o mito de uma história revolucionária e
visionária que nas mãos de um produtor e de um diretor comprometidos com o sistema
torna-se um filme convencional. No entanto, mesmo assim, para este crítico, ele valeria
como essa espécie de condensação ou explicitação do espírito alemão pré-nazista.
Com roteiro de dois jovens escritores que se encontram em Berlim e se tornam amigos,
o tcheco Hans Janowitz e o austríaco Carl Mayer, escrito durante as últimas semanas da
revolução alemã, entre 1918 e 1919, a história unia as experiências de vida de ambos:
a atmosfera de mistério de Praga, cidade da infância de Janowitz e a sua participação
num incidente em Hamburgo, como testemunha involuntária do assassinato de uma
jovem num parque de diversões em Holstenwall – nome que a cidade imaginária do filme
irá tomar –, e a desconfiança de ambos do “poder de um estado autoritário” – nas suas
experiências em relação à convocação para a Guerra. Os dois, ao chegarem a Berlim,
assistem a um espetáculo de hipnose num Parque de Diversões e, depois disso, em seis
semanas terminam um roteiro em que um velho misterioso chega a um parque de uma
cidade – em um tempo indefinido – anunciando o espetáculo de um sonâmbulo capaz
de prever o futuro. Ao mesmo tempo, assassinatos misteriosos ocorrem na cidade. Dois
amigos – alter-egos dos autores – assistem ao espetáculo e um deles recebe a profecia que
só irá viver até o anoitecer. De fato, ele é assassinado, e o outro passa então a investigar,
com a ajuda do pai de sua amada, até finalmente descobrir que é o sonâmbulo Cesare, a
mando do velho homem, o verdadeiro assassino. No entanto, o que ele não pode imaginar
é que este homem é na verdade o diretor de um hospício que, estudando casos médicos
da Idade Média, descobre a história de um tal Caligari que comandava a mente de um
sonâmbulo através de hipnotismo. O médico torna-se obsessivo em descobrir se isso é
O histórico da produção do filme, esboçado a seguir, está calcado no livro de Robinson (2000). 11
possível e, com a chegada de um sonâmbulo ao hospício, toma a identidade falsa de
Apesar desta interpretação de Kracauer ter tido uma enorme e penetrante influência, Peter
Gay levanta uma objeção importante: mesmo sem essa moldura conservadora, a história
original é pouco conclusiva no diagnóstico dessas forças obscuras e das forças libertárias que
a elas se contrapõem. Afinal, a “liberdade” que no filme se opõe à metáfora do obscurantismo
encarnada no médico-hipnotizador é tão-somente a imagem de um parque de diversões.
Espaço lúdico, com certeza, talvez de tons anárquicos, mas pouco calçado politicamente.
Ou seja, é possível que a variação de sentido lida na inserção de uma moldura domesticadora
seja possível graças a uma certa ambigüidade essencial da história, próxima, aliás, das
ambivalentes posições políticas da “revolta” expressionista, que ia, em sua contraposição
à rotinização burguesa de trabalhos militantes, engajados nas tendências comunistas, a
expressões de ambição puramente espiritual
De qualquer forma, o fato de Caligari ser uma história de loucura permitiu os cenários
distorcidos que a partir dali criaram uma nova estética cinematográfica de luzes e sombras e
de representações antinaturais – que ficariam conhecidas como expressionistas. As versões se
somaram e se contradisseram ao longo dos anos, mas o que de fato parece ter ocorrido é que
os dois jovens roteiristas, sem dinheiro, tentando vender rapidamente a história, chegam
ao já na época importante produtor Erich Pommer, que prontamente compra os direitos
de filmagem. Segundo o próprio Pommer, ele percebe a atmosfera macabra e misteriosa da
história – em voga na Europa daqueles anos – e a possibilidade de fazer um filme barato,
baseado em cenários mais ou menos simples, sem nenhuma locação externa. A direção,
que inicialmente seria de Fritz Lang, coube a Robert Wiener – que parece ter sido um dos
responsáveis pela ambientação em cenários expressionistas, chamando para isso três jovens
artistas/cenografistas: Hermann Warm, Walter Röhrig e Walter Reimann. Os três teriam
criado os cenários “amalucados” a fim de chamar a atenção do público, independentemente
da reação positiva ou negativa que se pudesse ter: o importante era algo diferente para
chamar atenção da imprensa e do público. De fato, o que se percebe é que o “estilo
expressionista” do filme, mais que a integração dos pressupostos estéticos expressionistas na
nova arte cinematográfica, era muito mais “um traje para vestir o drama”, condizente com a
atmosfera alemã dos anos 1920 (ROBINSON, 2000). Entretanto, se não há um conteúdo
propriamente expressionista na história, isso não quer dizer que o cenário, o figurino e
mesmo a interpretação dos atores não sejam inegavelmente expressionistas, extraindo lições
da prática teatral extremamente influente na época. A cenografia como um pano de fundo
pintado, misturando elementos lúdicos com linhas disformes, propositadamente chapado,
sem profundidade de campo, com uma fotografia de caráter bidimensional , por vezes
12
utilizando-se de diagramações da tela por jogos de luz e sombra (como na célebres cenas de
O filme é feito por meio de uma série de truques, como, por exemplo, filmar partes da
viagem em negativo, causando um estranhamento à época, com as árvores brancas e
fantasmagóricas contra um céu negro do bosque. Também a cena em que a carruagem
que carrega os caixões de Nosferatu – sem condutor – desce aos solavancos como um
veículo-fantasma ou o veleiro desliza sobre águas fosforescentes causa grande frisson nos
anos 1920. Considerado por uma crítica de cinema alemã o “maior realizador alemão de
seu tempo”, Murnau consegue sair da estilização decorativa anterior para criar de fato
imagens perturbadoras – filmadas ao ar livre, as cenas acabam por dar maior realismo à
história, que deixa de ser um conto estranho para se tornar um filme de terror. Assim, a
natureza – mares, bosques, animais – participa do drama, trazendo para o espectador, a
despeito da sua naturalidade intrínseca, a “noção do sobrenatural” (EISNER, [19--], p.
61). Os planos são concebidos a partir de sua integração na ação dramática, e as locações
não são falseadas por meio de iluminações contrastantes para se obter o aspecto misterioso
e bizarro em que a história se fundamenta. São, na verdade, os ângulos imprevistos que a
câmera do cinegrafista Fritz Arno Wagner capta que provocam os efeitos, bastando para
tornar o castelo de Nosferatu ou a cidadezinha medieval de ruelas estreitas e arquitetura
13
nórdica exemplos desse estranhamento. A atmosfera de pavor é criada às vezes pela lentidão
Mas, ainda que todos esses avanços técnicos possam ser notados, a realidade ainda não aparece
como uma dimensão real . Ela ainda é um símbolo objetivado de reflexos anímicos. O terror
causado pela necessidade e pela opressão sociais ainda aparece interiorizado, sob a forma de
um sofrimento proveniente de um princípio irracional – o “mal” – dentro da própria alma.
Ainda teria que se esperar alguns anos para que esse terror real chegasse às telas dos cinemas.
O velho (Emmil Jannings) vive num subúrbio berlinense – num Mietkaserne, talvez – e
lá é respeitado por todos, pela idade avançada e pela posição que ocupa. Seu uniforme de
botões e galões brilhantes lhe confere autoridade ante seus pobres vizinhos cinzentos, e
também entre seus colegas de serviço, grooms e valetes do grande hotel. Ao perder o posto,
e ser privado do uso de seu uniforme, seu mundo desmorona. Para participar do casamento
da filha o velho ainda consegue roubar o uniforme – mas assim que é descoberto por uma
vizinha mexeriqueira todo o bairro se transforma num pesadelo de velhas desdentadas que o
acusam de embusteiro, e ele perde definitivamente seu amor-próprio. O filme quase não tem
texto entremeando as cenas (tem apenas umas poucas frases que introduzem um segundo
final), entretanto sua história se faz entender de maneira cristalina: trata-se de uma história
que “a gente sabe qual é”, ou talvez porque, como explica Krakauer, o filme seja uma “vitrine
de eventos essencialmente mudos” (KRAKAUER, 1988, p. 123).
Todo o filme parece se identificar com a perspectiva de seu herói. Toda a realidade não é
mais que um reflexo do jogo de suas emoções.
A câmara faz panorâmicas, travellings e balança para cima e para baixo com uma perseverança
que não apenas resulta numa narrativa pictórica de completa fluidez, mas também torna
possível ao espectador seguir o curso dos acontecimentos de vários pontos de vista. A câmara
errante o faz experimentar a glória dada pelo uniforme, assim como a miséria da casa de
cômodos (...) o ator é sujeito passivo da câmara (KRAKAUER, 1988, p. 127).
Enquanto se sente poderoso, o porteiro é filmado de baixo e os objetos com que interage são
a expressão de sua autoridade e prestígio: o guarda-chuva com que leva e busca hóspedes, a
porta giratória do hotel que maneja com destreza. A porta, aliás, é uma espécie de obsessão. A
porta giratória sempre em movimento – algo “entre um carrossel e uma roleta” (KRAKAUER,
1988, p. 124) – mostra hóspedes que entram e saem, os transeuntes pela rua, a chuva lá fora
nos carros. O gerente o observa através da porta de vidro de seu escritório. E quando perde
o emprego, sua imagem passa a ser vista por entre portas, entre o vestíbulo e o banheiro no
A crítica alemã Lotte Eisner insiste no caráter particular do drama: “é uma tragédia tipicamente alemã, só compreen-
sível neste país em que o uniforme é um rei, um deus. Um espírito latino tem bastante dificuldade de apreender todo o
seu alcance trágico” (EISNER, [19--], p. 123). 14
subsolo do hotel. Assim, o impávido homenzarrão se transforma num velho cambaleante, seu
Há também neste filme um final que busca inverter o sentido da narrativa, realista em
termos sociais – ao que tudo indica, devido a um pedido de Jennigs – que não deixa de ser
uma ironia aos finais felizes hollywoodianos. O velho, que poderia morrer ali, abandonado
por tudo e por todos naquele banheiro no subsolo, maltratado por ricos burgueses, tira a
sorte grande ao se tornar herdeiro de uma fortuna e vai terminar comendo caviar e bebendo
champanhe no hotel, sendo atendido pelo próprio gerente que o despedira e distribuindo
gordas gorjetas a todos que lhe passam em frente.
Os efeitos plásticos, sejam eles sombras e distorções ópticas (como no sonho compensatório
do porteiro, que se vê como todo-poderoso, num onírico e transfigurado hotel), sejam
as modulações de cenário, como as transparências dos vidros, revelando camadas não só
de espaço, mas sociais (o dentro e o fora do hotel, o gabinete do gerente e o corredor, a
escada para o banheiro no subsolo), ou as assimetrias do cortiço onde vive o protagonista,
em contraste com a limpidez e simetria do espaço do hotel – tudo isso está social e
realistamente enraizado, sob a mediação da psicologia do protagonista. É como se o cinema
realista herdasse a capacidade de modulação expressiva dos elementos plásticos, típica do
expressionismo (numa antecipação do que acontecerá em larga escala com a migração
de cineastas alemães – Murnau e Fritz Lang entre eles – para os Estados Unidos, sendo
fundamentais no desenvolvimento dos filmes noir).
O filme está ligado ainda a mudanças estéticas vividas na Alemanha na década de 1920.
Se o expressionismo buscava romper com a sociedade burguesa em que se formara, parece
ter surgido naquela década um novo movimento que pregava a necessidade de se rever a
ruptura absoluta e que propunha a busca de formas mais seguras de representação, menos
subjetivas. Buscava-se submeter o sujeito ao objeto, para se chegar à representação ideal: era a
Nova Objetividade (Neue Sachlichkeit) do pós-guerra, que queria “apresentar uma imagem
atrozmente verdadeira da sociedade alemã” (ARGAN, 1993, p. 242). Talvez, de fato, “A
Última Gargalhada” esteja mais próxima da Sachlichkeit da década de 1920, necessária para
o enfrentamento dos reais problemas da sociedade alemã, que os arroubos experimentais do
expressionismo plástico dos anos anteriores à guerra – quando se queria romper com uma
sociedade burguesa em formação. Mas talvez o filme que sintetize essas questões, propondo
uma leitura da sociedade moderna, sem desprezar toda a mentalidade germânica ligada ao
mundo do espírito, seja o “Metropolis”, de Fritz Lang.
4 Metropolis (1926)
Fritz Lang conta que concebeu Metropolis a bordo de um navio, quando vislumbrou a
cidade de Nova York brilhando sob as luzes – a cidade de Metropolis era uma Nova York
supercrescida, uma previsão do futuro, com seus inúmeros arranha-céus, viadutos e auto-
pistas. No filme, a cidade é divida em alta – domicílio dos ricos empresários e seus filhos
– e baixa – onde sem nunca ver a luz do dia vivem e trabalham os operários, verdadeiros
escravos dos que habitam em cima. A história é basicamente a luta dos oprimidos contra
os opressores, que termina com a reconciliação das classes através do reconhecimento da
função de cada um para o bom funcionamento da sociedade.
Talvez a formação como arquiteto de Lang tenha contribuído para a concepção tão
ornamental do filme. Além disso, o diretor também havia trabalhado com Max Reinhardt,
importante diretor de teatro, famoso pelo seu manejo de multidões. Assim, o que mais
15
impressiona em Metropolis são os cenários de ficção científica (o filme é considerado o
A história propõe uma mediação entre as classes através do “amor”, que superaria as
diferenças e os conflitos, baseando-se na compreensão e no entendimento mútuo. Na
verdade, talvez se esperasse um entendimento maior do lado dos trabalhadores, que
precisariam compreender seu papel no funcionamento da sociedade. O enredo é uma
miscelânea de temas e ambientações, desde uma Grécia rediviva, onde os jovens “filhos-
dos-donos” se exercitam em esportes olímpicos, e um harém “jardim-das-delícias”, onde
os mesmos jovens se exercitam em jogos eróticos, até catacumbas da época dos cristãos
primitivos – onde os trabalhadores se reúnem para ouvir as mensagens de fé de uma Maria
pregadora de paz e de paciência pela vinda do “mediador”, a qual se torna a heroína,
a “mocinha” do filme. Ou, ainda, desde os arranha-céus (construídos em maquete, vale
dizer, e multiplicados por muito através de jogos de espelhos) e das autopistas cobertas de
veículos ou da boate exótica ao submundo operário de opressão fabril. Mas não bastasse
tudo isso, há ainda o cientista maluco que cria um robô para destruir o mundo (ou a
cidade) à imagem e semelhança da heroína, mas que na verdade no passado disputou uma
mulher com o rico dono da fábrica, ou seja, é também seu rival.
O conflito expressionista pai-filho também está presente: Freder, o filho, se rebela contra o
pai industrial e tenta se juntar aos operários na cidade baixa. Lá, ele conhece Maria, a santa
(heroína) que exorta os ouvintes a serem pacientes e ensina que a liberdade vem não da
revolta, mas do coração livre para mediar a ligação entre as mãos e o cérebro.
16
III O CINEMA CONSTRUTIVISTA SOVIÉTICO
Depois de outubro, não veio a bonança. Entre 1917 e 1920 as ainda não consolidadas
repúblicas socialistas soviéticas mergulharam numa dura Guerra Civil. No olho do furacão,
os futuros protagonistas do cinema que na segunda metade dos anos 1920 assombraria o
mundo começavam suas carreiras nas fileiras do Exército Vermelho.
Com um pé no front da guerra civil e outro no ambiente cultural onde vanguardistas como
Maiakovski, Malevich e Meyerhold lutavam por uma revolução estética, fez-se uma geração
de cineastas que revolucionaria o cinema para sempre.
A colaboração entre poesia, teatro e artes plásticas vanguardistas seria consagrada na célebre
Mistério Bufo, escrita por Maiakovski em 1918. Nessa peça, a direção de Meyerhold, que
dava prosseguimento à sua dissidência em relação ao realismo psicológico do Teatro de Arte
de Moscou, de Stanislavski, orquestrava a dramaturgia alegórica de Maiakovski e o design
suprematista de Malevich. No início dos anos 1920, Meyerhold lançaria sua proposta de
revolução teatral encenando espetáculos para um público bem popular, onde o grotesco
seria o princípio do método batizado por ele de “biomecânica”. Nesse método, tomavam-se
procedimentos de atuação de diversas tradições – Ópera de Pequim, marionetes, teatro de
feiras – para reutilizá-los na criação de uma ação teatral estranha. Apontava-se, assim, um
novo caminho para a “teatralidade”, reconhecida e exposta como linguagem, e não como
mímese que oculta sua construção.
2 O Construtivismo
A base dessa revolução estética está na recusa da mímese realista, iniciada pelo suprematismo.
Daí desenvolveu-se uma apurada auto-reflexão sobre a arte como trabalho, oposta à
concepção simbolista, segundo a qual o artista era quase que um médium que, através
de símbolos herméticos com poder de comoção inconsciente, expressava sua mais secreta
subjetividade e, através dela, uma outra realidade, invisível e essencial11 . Contra esse artista
espiritual, os construtivistas propunham o artista-engenheiro, que desprezava a expressão
lírica e concentrava-se na tarefa da construção da obra – mais um objeto entre os objetos do
mundo. A revista LEF (Frente Esquerdista das Artes), proeminente publicação construtivista
que, em sua fase mais radical, era dirigida por Maiakovski e Brik, chegou a defender como
programa universal a “factografia”, a arte feita apenas de registros e reconstrução dos fatos
presentes e dos elementos materiais do mundo.
Os artistas – e mesmo essa classificacão de categoria profissional foi renegada por muitos –
dedicaram-se a construir “experiências” (a expressão é da época, evitando a idéia de “obra”)
que expusessem sua “fatura” (expressão utilizada pelo crítico Chklovski para sublinhar a
atenção dada aos procedimentos empregados na realização do trabalho, “a evidência de
sua feitura” (FER, 1998)). A criação era freqüentemente acompanhada de uma atividade
teórico-analítica, de pesquisa sobre os elementos formais das composições (linha, ponto
etc.), o que também seria feito pelos cineastas.
11
Um exemplo recente de simbolismo é o cinema e a teorização de Tarkovski, apresentada em Esculpir o tempo
(1988) – livro no qual o cineasta russo renega explicitamente a herança do cinema de montagem construtivista, em
especial o de Eisenstein. 18
Expondo o modo de construir os artefatos que nos sensibiliza, o construtivismo foi uma
Vamos nos concentrar aqui, após uma breve introdução à escola de montagem soviética, através
de seu pioneiro, Lev Kulechov, nos dois maiores cineastas da URSS, que desenvolveram,
estabelecendo inclusive uma discussão polêmica, as duas principais vertentes do cinema
construtivista: Sergei Eisenstein e Dziga Vertov.
3 Kulechov
Pouco antes da Revolução, Kulechov, então um jovem pintor, foi convidado para trabalhar
nos estúdios de cinema Khanzhonkov como cenógrafo. Em seus primeiros artigos, Kulechov
defende uma ampliação do âmbito de trabalho do cenógrafo para bem além da tradicional
pintura de painéis de fundo. Para ele, era preciso superar a rígida especialização de funções
em prol de um cinema entendido como uma modulação plástica de todos os elementos
envolvidos na composição do plano. Depois de sua participação no esforço de guerra
revolucionário, Kulechov vai estabelecer um estúdio-laboratório onde estudarão, entre
outros, Pudovkin e Eisenstein. Esse estúdio logo será encampado pela Escola Nacional de
Cinema, onde Kulechov sistematizará seus famosos experimentos, como o “efeito Kulechov”,
a “geografia criativa” e a criação de um “corpo cinematográfico”. Nesse último, uma poderosa
demonstração dos poderes da montagem, uma “mulher cinematográfica” foi “construída” a
partir de imagens tomadas de diversas mulheres reais.
Devido a seu interesse pela montagem americana, Kulechov não costuma ser associado
à vanguarda construtivista, o que é no mínimo redutor. De fato, não apenas Kulechov,
mas vários outros artistas soviéticos – para não falarmos da própria estratégia de Lênin
de importação das técnicas tayloristas de organização do trabalho industrial – estavam
fascinados pela modernidade urbana americana. Nova York começava a substituir
Paris como vanguarda social mundial, e os modernistas russos (como, aliás, também
os modernistas brasileiros) sonhavam com arranha-céus, automóveis, enfim, com a
velocidade vertiginosa da vida metropolitana.
O grande legado de Kulechov, que viria a ser uma marca da escola soviética, foi o
estabelecimento da montagem como princípio de construção do cinema. Sua desmontagem
teórica da montagem americana estabeleceu um campo de reflexão que permitiria outras
formas de exploração da linguagem cinematográfica.
12
Para uma história do melodrama, ver Peter Brooks (1985). 19
A codificação enunciada por seus experimentos foi o ponto de partida para as muitas
4 Eisenstein
Depois da Guerra Civil, Eisesntein foi trabalhar no Primeiro Teatro Operário (ProletKult).
Movia-o, como a vários construtivistas, o desejo de superar a antiga arte, vista como uma
substituição covarde da vida real. Eisenstein queria encontrar formas de expressão à altura
da revolução em curso capazes de mobilizar as pessoas, e sua primeira realização nesse sentido
foi, ainda no teatro, a “montagem de atrações”:
A ciência conhece ‘íons’, ‘elétrons’, ‘nêutrons’. Que em arte sejam as ‘atrações’. Dos
processos de produção passou à linguagem corrente um termo técnico que significa
armar as máquinas, os tubos de condução da água, etc. A bela palavra ‘montagem’
significa a ação de armar algo. O conjunto das unidades, que, associadas num todo,
recebem essa dupla significação semi-industrial, semi-music-hall, reunindo em si essas
duas palavras. Ambas saíram das entranhas do urbanismo, e todos nós naqueles anos
éramos terrivelmente urbanistas. Assim aparece o termo ‘montagem de atrações’.
(EISENSTEIN, 1983, p. 39)
13
A referência aparece em El cine de Eisenstein, de Bordwell (1999, p. 26).
14
Novamente, a referência é a compilação de várias fontes feitas por Bordwell (1999, p. 26-28, 143-144). 20
O termo “montagem” indica o caráter inorgânico, construtivista, dessa concepção de
5 Outubro (1927)
Outubro foi uma encomenda governamental, para as comemorações dos dez anos da
revolução. Na base do filme está uma crônica dos acontecimentos de 1917. Vejamos o
resumo da crônica histórica, segundo a competente análise de Bordwell:
“O levante de fevereiro, iniciado espontaneamente pela classe trabalhadora, é rapidamente
apropriado pelas forças burguesas. O governo provisório insiste em seguir participando da
Primeira Guerra Mundial, ao custo de fazer morrer de fome os trabalhadores e de adiar
a reforma agrária. O regresso de Lênin do exílio galvaniza as massas, que se lançam às
ruas de São Petersburgo em julho. Mas o governo provisório reprime a rebelião e prende
os líderes bolcheviques. Alexander Kerenski, ávido de poder mas inepto, se converte no
primeiro-ministro do governo de coalizão. O general Kornilov, antigo aliado de Kerenski,
encabeça uma marcha contra-revolucionária sobre a capital, que é detida por ferroviários
bolcheviques.
Mas não são camponeses ou soldados que comemoram a vitória: os closes de gritos de
saudação são de figuras tipicamente burguesas, e a cena que se segue ao letreiro que anuncia
a instalação do Governo Provisório é a de uma missa.
A cena seguinte nos leva a um campo de batalha, onde russos e “inimigos” confraternizam.
Aqui reina a camaradagem proletária, sublinhada pelas brincadeiras com os capacetes
de campanha, ironizados como símbolos de uma divisão e inimizade alheias a uma
identidade de classe internacional .
Ao longo do filme este tipo de conceitualização construída pela montagem será abundante:
o artificialismo do poder de Kerenski, por exemplo, será figurado pela repetição do mesmo
plano dele subindo as escadas do Palácio de Inverno, como se não saísse do lugar. No
segmento “Deus e a Pátria”, depois de um apelo à manutenção da ordem em nome dessas
forças atávicas, Eisenstein procede a uma desmontagem metódica dessas entidades: uma
sucessão de imagens de divindades, numa descendente de complexidade que termina por
um ídolo muito primitivo; e uma sucessão de emblemas e medalhas militares explicitam a
arbitrariedade dessas construções ideológicas.
22
Se os exemplos citados e as questões por eles suscitadas sugerem a riqueza ensaística de
6 Vertov
No ambiente altamente polêmico do cinema russo dos anos 1920, o confronto entre
Eisenstein e Vertov foi o mais importante. Como vimos, Eisenstein desenvolveu uma vertente
de construtivismo de vocação sintética, interessada em incorporar, de forma revolucionária,
o passado burguês da cultura. A estratégia de Vertov era outra: era preciso fazer tabula rasa
do passado e aderir ao presente através de uma linguagem também contemporânea.
No plano da produção, a utopia de Vertov era substituir a instituição do cinema e seu sistema
de produção, distribuição e exibição pelos “kinoks”, os membros do movimento criado por
ele para a realização de um cinema baseado numa rede coletiva de colaboradores.
15
Sobre as tensões do estilo eisesnteiniano, que caracterizam seu barroquismo, ver também Xavier, em especial, p.
368-374. 23
há um prólogo e um epílogo francamente metalingüísticos, com a colocação em cena da
Na abertura, prédios, anúncios, ruas e praças da cidade surgem como um palco vazio, à
espera da ação. O filme destaca uma mulher dormindo em seu quarto, alguns mendigos
que dormem na praça e o cameraman, que acorda antes de todos para filmar a vida que
começa. As ruas e os rostos são lavados e o espetáculo começa.
No segundo bloco, como que sacudida pelas tomadas feitas pelo cameraman de um trem
em alta velocidade, a cidade desperta: as ruas se enchem de tráfego e pessoas, os operários
acorrem às fábricas, as lojas são abertas. Ao final desse bloco há um momento notável de
reflexividade: em pleno movimento vertiginoso de uma carruagem a imagem se congela,
e nos são revelados os bastidores da construção fílmica. Passamos à sala de montagem, e a
imagem congelada se mostra como fotograma.
No bloco três, a cidade aparece como um fluxo ordenado de trocas sociais. Depois do
motivo ao mesmo tempo concreto e metafórico da porta giratória, segue-se a central
telefônica, o controle do tráfego e chega-se à montagem e à desmontagem das relações
civis, pela exibição de um registro de casamento seguido por um divórcio. Ou seja, o que
nos é exibido pela análise do cine-olho é o fluxo social construído por relações transitivas
e sempre passíveis de reconstrução.
Por fim, a quinta parte traz um painel espetacular dos corpos fora do trabalho, em momentos
de relaxamento, à beira-mar ou empenhados em diversos esportes, coreografados como
balés pelos ângulos, justaposições e variações de velocidade do filme.
Na moldura final do epílogo retornamos à sala de projeção, e o filme a que assistíamos torna-
se filme dentro do filme e, num grandioso “acorde” visual final, vemos o Teatro Bolshoi
– símbolo da arte burguesa – “implodir” por um último efeito de montagem.
Essa descrição das partes de O homem da câmera, entretanto, é enganosa. Dada a substituição
de uma linha narrativa por uma forma de organização baseada num tremendo investimento
nas relações formais entre os planos, esses recortes temáticos são frágeis, dando margens a
diversas propostas de segmentação do filme por parte dos analistas16 . O melhor é tomar o
que foi apresentado como um mapa indicativo, uma orientação que nos auxilie a passar para
o nível fundamental de consideração do filme, ou seja, suas articulações formais.
Um procedimento crucial que, ao mesmo tempo, é próximo das divisões temáticas e revela
como estas são tênues é o que Petric (1987) chama de “montagem disruptiva-associativa”.
Trata-se de interpolações de imagens claramente distintas dentro de uma série, antecipando
e preparando um motivo que será trabalhado numa nova série logo à frente. São como notas
que anunciam uma nova frase melódica que vai se consolidar a seguir. Por exemplo, no final
da seqüência do movimento da charrete surgem planos de tráfego em várias direções. Essas
imagens preparam a seqüência seguinte, centrada no controle do tráfego.
16
Vlada Petric (1987, p. 72-76), certamente o maior especialista no filme, apresenta várias propostas alternativas de seg-
mentação, defendendo, ele próprio, uma segmentação mais sintética do que a aqui apresentada, de apenas duas partes,
além do prólogo e epílogo – o que, coerente com seu foco nos aspectos especificamente formais do filme, diminui a
importância dos temas como critério de divisão. Seguimos aqui, basicamente, a segmentação apresentada por Henri
Gervaiseau (2000). 24
Mas a montagem disruptiva-associativa situa-se ainda no nível mais simples da montagem,
Vertov não era um erudito ensaísta, como Eisenstein. Seus escritos são manifestos,
intervenções pragmáticas nas polêmicas do momento. Seu conceito de “intervalo”,
por exemplo, é uma arma de defesa de uma visão de montagem entendida como uma
atitude epistemológica e política, uma decodificação cinematográfica do mundo frente
ao mundo. Intervalo é “correlação”, entre planos, ângulos, movimentos, luz, velocidades
– entre os elementos cinematográficos com os quais se reconstrói o mundo visual de
modo significativo. Vertov levava esse princípio às raias do delírio, compondo um fluxo de
imagens tão trabalhadas que era impossível ao espectador perceber tudo o que se passava
no plano formal. Aquilo que Eisesntein via como “formalismo”, podemos ver como um
trabalho subliminar sobre o espectador17 .
17
Um ótimo exemplo de análise da montagem vertoviana em seus aspectos mais microscópicos é o da seqüência do
trabalho manual (abertura da parte 4 de O homem da câmera), em Petric (1987, p. 148-155). 25
8 Depois da Revolução
Todos os cineastas que nos anos 1960 trabalharam numa chave que associava estética e
política tinham na escola soviética uma referência incontornável. No Brasil, basta assistir
à cena do massacre de Monte Santo, em Deus e o Diabo na terra do sol (Glauber Rocha,
1964) para percebermos a presença de Eisenstein.
Hoje, com os movimentos modernistas derrotados, o cinema russo dos anos 1920, como
não podia deixar de ser, segue o destino da Revolução que lhe deu origem: permanece na
consciência mundial como promessa sufocada de um futuro para a humanidade.
26
Referências
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BILBATUA, Miguel (Org.). Cine soviético de vanguarda. Madrid: Ed. Alberto Corazon, [19--].
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27
As Vanguardas Cinematográficas dos anos 20 na Europa
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MITRY, Jean. Historia del cine experimental. Valencia: Fernando Torrer Editor, 1974.
PETRIC, Vlada. Construtivism in film: the man with the movie camera, a cinematic
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29