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Madeline Hunter

Por Desígnio

#02 – Série Medieval


Sinopse
Obrigado pela honra...

No momento em que Rhys viu a deslumbrante jovem


vendendo sua cerâmica requintadamente trabalhada no mercado,
ele ficou cativado. Mas o rico maçom1 nunca teria adivinhado que
apenas alguns dias depois, um mal-entendido colocaria Joan nas
ações da cidade e ele se tornaria seu salvador improvável. Após a
dura experiência, Rhys cuida carinhosamente do corpo machucado
de Joan ― e seu orgulho ferido. No entanto, ele deseja fazer muito
mais... para satisfazer o fogo que acende entre os dois no momento
em que estão sozinhos.
Rhys não poderia saber que Joan certa vez desfrutou de uma
vida mais privilegiada. Ela não teve escolha senão se tornar uma
serva contratada, mas ela está determinada a vingar os crimes que
arruinaram sua família e destruíram seu mundo. Quando Rhys se
encontra com seu empregador para comprar cerâmica ― e compra a
ela ― Joan fica furiosa. Ela promete resistir a cair sob o feitiço do
bonito e imponente Rhys. Mas a sua resolução suaviza rapidamente
quando tentada pelos poderosos feitiços de Rhys, e ela só pode
esperar encontrar uma maneira de evitar a rendição ao seu potente
desejo...
― NÃO VAI CORRESPONDER O BEIJO, JOAN?
Ela sentiu seu rosto arder.
— Não.
— Nunca?
— Não. — Ela desejou que isso não soasse tão egoísta. Seu
olhar baixou para onde suas mãos se espalharam sobre o peito de
bronze. — Eu nunca quis.
Ele levantou o queixo para que ela tivesse que olhar para o
rosto dele novamente. Sua expressão a deixou sem fôlego. Intenso
e conhecedor. Duro, macio e quente, assim como o corpo dele.
— Isso não é verdade. Você quer agora.
Talvez quisesse. Talvez fosse isso que a fascinou. Ela
certamente não queria fugir.
A suave pressão na cabeça dela. Um braço forte a guiando.
Não para a boca dele. Mais abaixo, até que seus lábios descansaram
em seu peito, acima de suas palmas.
O leve gosto, o cheiro, fez seus pensamentos se embaçarem.
Todos os seus sentidos se encheram com ele. Ela realmente não
decidiu, apenas aconteceu. Ela beijou e moveu os lábios e beijou
novamente. Um prazer rico começou a pulsar como uma respiração
rápida. Ela moveu a mão e beijou novamente.
Capítulo I
Parecia uma estátua de calma dignidade colocada num mar
de caos vulgar.
O mercado rugiu e espirrou ao redor de seu corpo imóvel.
Camelos de peles e barris, de porcos e peixes, lotavam o pequeno
espaço que ela reivindicara para suas mercadorias. Seu vestido
esfarrapado, de um tom prateado pálido e exibindo vestígios de
bordado elegante, contrastava completamente com os marrons
práticos e cores extravagantes que enchem o quadrado. Junto com
sua coroa e trança loira, o vestido criou uma coluna de tons claros
em um mundo muito manchado. Ela era toda uma suave brancura,
exceto por sua pele. Bronzeada pelo sol, possuía um brilho dourado
que iluminava seus olhos azuis.
Foi o lampejo de serenidade pálida que primeiro chamou a
atenção de Rhys enquanto ele caminhava pelo mercado em frente à
Catedral. Então o cabelo revelou-se e os olhos. Ele já havia
diminuído a velocidade para ver o rosto dela mais claramente antes
de perceber sua mercadoria.
Ela não os apregoou. Ela ficou em silêncio atrás da caixa de
madeira rudimentar que mostrava o que ela vendia. Seu rosto
delicado permaneceu impassível, como se ela não notasse os corpos
empurrando, às vezes pressionando-a deliberadamente. Ele não era
o único homem a perceber que essa pomba esfarrapada era muito
bonita.
Ele não a reconheceu. A maioria dos vendedores eram caras
velhas, vistas aqui regularmente. Ela era uma estrangeira,
provavelmente, e não da cidade. Ela veio para o dia para fazer
algumas moedas.
Ele se sentiu um pouco triste por ela. Apesar de sua postura
rígida, ela o atingiu como vulnerável, em perigo de ser quebrado. Ele
duvidava que ela estivesse bem. A caixa era baixa, não mais alta
que os joelhos, e as mercadorias eram quase invisíveis. Ele teve que
passar muito perto para inspecionar os itens estabelecidos nele.
Louça ele não tinha interesse em tais coisas, mas ele tinha
interesse nela. Ele levantou casualmente a xícara mais próxima e
uma faísca de esperança iluminou seu olhar frio.
A xícara era simples, mas bem feita. Surpreendentemente, não
era simples terracota queimada ao sol. Ele tinha sido disparado e
seu brilho indicava que tinha sido esmaltado.
— As bordas são muito finas. Você tem uma roda de oleiro? ―
ele perguntou enquanto examinava. E ela. Ela realmente era muito
bonita, mas de perto ele podia ler fadiga em sua expressão relaxada
e desânimo em seus olhos azuis.
— Não. Eu só usei bobinas.
— Com muito cuidado, porém. A forma é muito regular.
Seu interesse atraiu outros, como era o comum nos mercados.
Uma mulher corpulenta, a esposa de um comerciante rico a julgar
pelo seu vestido, parou e espiou criticamente. Algo chamou sua
atenção. Enfiando a mão gordinha entre as xícaras, ela ergueu uma
pequena figura.
Ele estava tão distraído com o oleiro que não havia notado as
pequenas estátuas. A esposa do mercador segurava uma Virgem de
pé, talvez com um palmo de altura. Tinha sido cuidadosamente
modelado os drapeados e pintado com esmaltes coloridos.
A mulher examinou a pequena figura, passando os dedos pelo
rosto e pelas costas, segurando-a na posição vertical para julgar sua
aparência. Rhys fez sua própria inspeção ao lado.
— Quanto? ― A mulher perguntou, com os olhos aguçados e
pronta para negociar com afinco.
— Oito cents.
— Oito cents?!
— Cinco, então.
A mulher gemeu e suspirou e demorou e debateu. Finalmente,
os cinco cents emergiram de sua bolsa.
O oleiro parecia bem satisfeito.
Rhys mergulhou nas mercadorias, afastando algumas delas.
Duas outras estátuas estavam lá. Uma Santa Agnes com seu
cordeiro e uma Santa Catarina com sua roda. Ela poderia ter
repetido a figura e mudado o atributo, mas ela não o fez. Cada um
era único em pose e muito realista.
— Você pretende comprar alguma coisa?
Sua voz tinha uma pequena borda. Seus olhos azuis o fitavam
com ceticismo.
Ele sabia o que esse olhar revelava. Ele não fora o primeiro
homem a se demorar, fingindo estar interessado em louça.
— Você cria as estátuas também?
— Quando eu tenho tempo e argila.
— Eles estão todos queimados.
— Eu conheço um ladrilhador que me deixa usar seu forno.
Ele levantou a Santa Agnes.
— Para que servem?
Isso a atrapalhou.
— Eles são estátuas.
— Sim, mas qual é o propósito deles? As xícaras e tigelas têm
um propósito. Todo mundo precisa deles. Para que serve este
santo?
— Devoção.
— Há igrejas para isso, com estátuas muito maiores.
— Algumas pessoas gostariam de ter uma em suas casas, disse
ela defensivamente.
— Você vendeu muitos?
Ela fez uma careta, admitindo o ponto.
— Somente um, no dia em que cheguei ao mercado.
— Então você deve cobrar mais de cinco cents.
Ela revirou os olhos.
— Se eu vendi apenas um a cinco cents, não venderei nenhum
caso aumente.
— Você vai vender tanto quanto, mas receberá o que eles
valem, e eles serão mais valorizados por aqueles que os comprarem.
Estas não são coisas práticas. A maioria não lhe dará nada, mas
aqueles que pagarão cinco cents pagarão um xelim. — Para provar
isso, ele tirou um xelim da bolsa e colocou na caixa.
Ela olhou a moeda avidamente, depois olhou para ele,
desconfiada novamente.
Sua cautela não o insultou. Uma coisa bonita como ela, sozinha
no mercado, provavelmente recebeu muitas proposições.
— Só para a estátua. Mas devo avisá-la. Sou maçom, e posso
roubar a pose de um santo de pedra algum dia.
Seu olhar varreu-o com uma avaliação rápida. Ele sabia o que
ela pensava. Ele não parecia um pedreiro hoje. Suas vestimentas
eram muito boas para o trabalho. Um homem não empunhava um
cinzel e um martelo com uma longa túnica e botas altas.
Rhys se afastou, carregando Santa Agnes. Ele olhou para a
pequena figura e riu de si mesmo. Um homem que pudesse fazer
estátuas de pedra dificilmente precisaria comprar objetos de barro.
Ele supôs que ele tinha comprado como uma forma de elogio,
de um artesão para outro. E como um tipo de bajulação, de um
homem para uma mulher. Havia um pouco de pena também. Ele
gostou da ideia de que ele havia feito o dia um sucesso para ela.
Ele riu novamente. Um xelim por dez minutos com uma mulher
bonita. Ainda assim, mesmo sem a estátua, ele não teria se sentido
enganado.
Ele atravessou a praça em direção a uma taverna
movimentada. Se esquivando do letreiro baixo, ele entrou em suas
profundezas sombrias, frias.
Ele comprou duas cervejas e as levou para a mesa livre perto
da janela. Estava mais quente aqui, mas ele podia admirar a estátua
na luz. Colocou-a nas tábuas ásperas e a rodou com cutucadas das
pontas dos dedos. Ela realmente era muito habilidosa.
Ele olhou pela janela. Enquanto a multidão se movia, ele a
vislumbrou. Aquele vestido parecia muito triste. A elegância antiga
de uma senhora, provavelmente comprado em terceira mão. Talvez
os pedacinhos de bordado não tivessem se desgastado ainda
quando ela o conseguiu.
Um corpo grosso deslizou pela abertura da janela, bloqueando
sua visão. Um rosto apareceu. Uma barba loira bem aparada em
boca aberta pela surpresa por encontrá-lo olhando diretamente
através de um palmo de distância. O homem olhou por cima do
ombro e depois correu para a porta.
Ele se aproximou de cara feia, sentou-se no banco oposto, e
virou de costas para que sua cabeça não estivesse na janela.
— O que você está pensando? A cidade inteira pode nos ver
aqui.
— Se o fizerem, eles verão um pedreiro e um funcionário do
bispo dividindo uma mesa em uma taverna lotada. Beba sua cerveja,
John, e ninguém vai pensar duas vezes em nossa companhia.
John enxugou a testa com a manga.
— Eu tive que esperar por você por muito tempo. O sol está
me assando.
— Você é afortunado por eu ter vindo, desde que eu sei o que
você quer e não tenha interesse em ouvi-lo. E eu estou atrasado
porque eu estive em Westminster, esperando uma audiência com a
Rainha. Ela quer falar sobre uma adição a uma de suas casas de
campo, e me fez esperar durante todo o dia. Vamos ser rápidos com
isso, já que preciso voltar e esperar um pouco mais.
O rosto de John caiu.
— Uma casa de campo? Com certeza você não pode estar
pensando em sair de Londres.
— Eu posso, e farei, se houver trabalho a ser feito em outro
lugar.
— Mas os planos... seus relatórios...
— Não tenho nada a relatar, não que tenha concordado em
fornecer tais coisas. Mas você pode dizer ao bispo Stratford que não
ouvi nada. Não há fofoca. Não se preocupe. Nada. Quanto aos
planos, duvido que valha a pena apoiar. Há apenas homens
assustados conversando e esperando, o que é uma espécie de alívio.
O último plano foi mal concebido e mal executado, e foi somente
pela graça de Deus que o meu papel não foi descoberto.
A conversa contundente deixou John nervoso. Ele enfiou a
cabeça pela janela para ter certeza de que ninguém se escondia
contra a parede.
Rhys aproveitou a oportunidade para procurar a oleira
novamente. Ela parecia ter outro comprador.
John se inclinou sobre a mesa com uma expressão séria. Rhys
deliberadamente se afastou para que não parecessem dois
conspiradores tramando traição. O que eles eram, para todos os
efeitos.
— Eu vou confiar em você ―, disse John. ― Wake está
levantando um exército na França. Lancaster e meu bispo estão lhe
enviando dinheiro. Na próxima primavera
— Isso não vai acontecer. Os barões fizeram as pazes com a
rainha Isabella e seu amante Roger Mortimer.
Isso não seria como três anos atrás, quando o país se levantou
para receber a invasão de Isabella para ajudá-la a depor o marido e
coroar o filho. Por um lado, o atual rei não é o inimigo. Sua mãe e
seu amante são os mesmos líderes que abraçamos como salvadores
naquela grande rebelião.
— Eles se tornaram usurpadores!
— Como alguns de nós achamos que aconteceria. Quem
conhece Roger Mortimer teme sua ambição. Os barões deveriam
controlá-lo, mas eles se mostraram fracos e divididos.
— Mortimer ignora o conselho. Ele até se coloca acima do
jovem rei e deve ser derrubado.
— Então é a luta do rei Edward.
— Ele é um rapaz.
— Ele tem dezoito anos.
John corou até as raízes de seu cabelo curto e loiro.
— Eles compraram você. Eles lhe dão o status de um mestre
construtor e permitem que você projete algumas estruturas, e como
um cachorro que jogaram alguns ossos, você esqueceu suas velhas
lealdades.
Rhys mal suprimiu a vontade de se aproximar e agarrar o
pescoço carnudo de John.
— Eu não me esqueci de nada. Arrisquei mais do que você
naquela rebelião, balconista - só para ver um rei mau sendo
substituído por uma má rainha e seu amante faminto. Apenas para
ver a união dos barões se despedaçar uma vez que conseguiram
ganhar com a mudança. Se você quiser saber quem foi comprado,
olhe para os castelos do reino. — Ele engoliu sua raiva e olhou
através da praça novamente. Eu me cansei disso, John. Estou fora
disso e procuro apenas praticar meu ofício. Se a rainha quer que eu
reconstrua uma casa de campo, eu farei isso.
John começou uma bajulação de voz baixa. Rhys não deu
ouvidos. Sua atenção se distraiu com uma comoção no mercado.
Dois grupos de jovens desceram duas pistas ao mesmo tempo.
Um, feito de escudeiros com librés de seus senhores, exibia o alto
astral arrogante de jovens que esperavam a deferência do mundo. O
outro, uma gangue maltrapilha de garotos descalços como os que
atormentavam a cidade, mostrava a raiva que se produz nos
homens sem nada para fazer.
A multidão mudou sutilmente para evitar os dois grupos, mas,
como o destino quis, eles cruzaram os caminhos um do outro no
meio da praça. Nenhuma gangue andaria ao redor do outro.
Eles se enfrentaram. Palavras afiadas foram trocadas, depois
gritaram insultos. Oito caras ricos zombaram. Sete pobres rosnaram.
Rhys ignorou as exortações de John e bebeu sua cerveja. A
multidão se espalhou, abrindo espaço para o drama.
Haveria uma briga, com certeza. Um pouco de emoção para
animar a tarde. Um espetáculo para discutir nos próximos dias.
Era para isso que os mercados eram.
Ele mentalmente colocou seu dinheiro nos jovens da cidade,
apesar de estarem em menor número. Isso seria uma briga de rua,
não um torneio de armadura. Além disso, era importante mostrar
lealdade a si mesmo nessas coisas.
— Quanto?
Joan examinou o homem que admirava Santa Catarina dela.
Magro e pálido, com um rosto rabugento e um chapéu ricamente
coberto, ele parecia rico o suficiente para comprar coisas
impraticáveis.
Ela o deixou olhar mais enquanto ela continha sua excitação.
Pensar que ela poderia vender as três estátuas hoje!
Ele realmente parecia gostar disso.
— Um xelim.
Seu olhar estalou para ela em surpresa.
— Demorou uma semana para ser feita, e é cozida. Você não
encontrará nada melhor, ela acrescentou rapidamente, desejando
não ter sido tão imprudente. É claro que o pedreiro a tinha elogiado,
esperando por algo mais por sua moeda.
Ela perderia essa venda porque quase acreditara no que ele
dissera sobre o valor de suas mercadorias.
— Um xelim, seu marido coloca um alto preço em sua
habilidade.
— A habilidade é minha.
Ele instantaneamente olhou para a estátua com novos olhos.
Os críticos. Ele imaginaria que ele viu todas as imperfeições que ele
esperava no trabalho feito por uma mulher.
Isso aconteceu muitas vezes. Ela poderia inventar um marido
artesão e dizer às mentiras dos compradores, mas seu orgulho não a
deixaria. As estátuas eram dela. Ela as fez.
— Cinco cents, ele ofereceu.
Foi o que ela conseguiu para a Virgem. Ela deveria estar feliz
por isso. Mas o repentino desdém desse homem a incomodou.
— Um xelim. Vale muito mais, e não vou aceitar menos. Ela se
arrependeu das palavras assim que elas soltaram seus lábios. Ainda
assim, uma parte rebelde dela sentia que esse homem não merecia
Santa Catarina e que ela a quebraria em pedaços antes de deixá-lo
ficar com ela por cinco cents.
Para sua surpresa, ele não se afastou. Isso a surpreendeu
ainda mais quando seus dedos foram para sua bolsa. Um xelim
pousou em sua caixa quando ele se virou. Se ele tivesse jogado
apenas cinco centavos, ela teria agarrado com a mesma rapidez. Na
verdade, ela não podia arcar com o orgulho que ainda a
atormentava.
Ela enfiou o dinheiro no corpete, entre os seios. Ele se juntou
ao peso úmido das outras moedas ali. Quase três xelins hoje. Uma
fortuna, graças a esse mestre pedreiro.
Ela se lembrou de seu olhar atento admirando sua xícara. E
ela. Pela primeira vez ela não se importou tanto, apesar de seu
tamanho intimidador. Ele não tinha olhado. Aqueles olhos azuis
revelaram o interesse de um homem, mas não a fome nua que ela
conhecia muito bem.
E ele realmente apreciara o ofício dela. Ela podia dizer pela
maneira como ele tocava as mercadorias. Isso não tinha sido uma
mentira, mesmo que pudesse ter sido uma desculpa.
Ela tinha sido um pouco rude com ele. Ela desejou poder
agradecer-lhe agora. Ele estava certo sobre as estátuas. Como
pedreiro, ele provavelmente tinha alguma experiência em como
essas coisas eram valorizadas. Tinha sido generoso da parte dele
contar a ela.
Um bom homem. Bonito também, com uma mandíbula firme e
rosto angular e nariz bem formado. Ele usava os cabelos escuros e
limpos na nuca, como os operários faziam, para afastá-los de seus
rostos. Olhos gentis. Azul profundo.
A pele dos lados dos olhos dele se enrugou quando ele sorriu.
Pequenas linhas haviam se formado ali e nas bordas de sua boca.
Talvez ele tenha sorrido muito.
Ela descobriu que ela estava sorrindo agora também. Na
verdade, parecia estranho, mas uma luminosidade adorável entrara
em seu coração e ela não conseguia se conter.
Quase três xelins. Talvez... talvez...
Alguns jovens entraram na praça de uma faixa lateral próxima,
e ela imediatamente avistou a cabeça loira de seu irmão Mark entre
eles. Graças a Deus por isso. Ele havia desaparecido depois de
deixar sua caixa aqui de madrugada, e ela se preocupou que ela
teria que carregá-la de volta para o outro lado do rio.
Ela tentou chamar sua atenção, mas ele conseguiu não notar.
Ele ficou com o grupo de amigos, parecendo que planejava
atravessar a praça e ser engolido novamente pela cidade. Seus
companheiros eram problemas.
Todos usavam expressões duras e fortes de jovens que
queriam lutar com o mundo.
Ela não podia ignorar o fato de que Mark se encaixava
perfeitamente. Percebeu que apagava o sol de seu humor.
Não só raiva e dureza o combinavam com os outros. Suas
roupas também. Pouco mais que trapos, sua túnica e sua manta já
haviam sido remendadas e desgastadas quando ela as comprou de
um criado. Ela não podia pagar melhor. Mark tinha crescido tanto
nos últimos dois anos que isso tinha sido tudo que ela pôde fazer
para mantê-lo em qualquer roupa.
Ele odiava aquela túnica verde. Ele se ressentia do que isso
significava. Toda manhã, quando ele a arrastava, seu coração doía
por ele. Dia após dia, ela observava sua raiva crescer e sentiu a
tempestade se formando em sua alma. Quando eles estavam juntos,
seu trovão silencioso tremeu através do ar, dentro dela.
Ela o viu olhar a praça, e uma onda de pânico bateu dentro
dela. Ela estava perdendo-o. Às ruelas desta cidade e àqueles maus
jovens e o desespero causado pela pobreza. Aos quinze anos, ele
não era mais o garoto que confiava em sua irmã mais velha e sua fé
perdida cortava como uma faca. Ele não acreditava mais em suas
garantias de que as coisas mudariam para melhor. Talvez ele tenha
adivinhado que ela não acreditava nisso na maior parte do tempo
também.
Mas às vezes ela ainda fazia. Como hoje. Seus seios
embalando quase três xelins. Talvez ela ainda pudesse fazer dar
certo para ele. Eventualmente.
A cabeça de Mark parou. O mesmo aconteceu com os outros
meninos. A multidão começou a produzir padrões abruptamente
diferentes. Ela se levantou na ponta dos pés para ver o que estava
acontecendo.
Uma preocupação doentia instantaneamente torceu seu
estômago. Mark e seus amigos haviam confrontado um grupo de
escudeiros.
As coisas estavam ficando feias rapidamente. A multidão se
esvaiu da briga iminente, formando um círculo espesso que
rapidamente bloqueou sua visão.
Medo e frustração dispararam em sua cabeça. Ela não implorou
para ele ficar fora de problemas? Não foram essas as suas últimas
palavras para ele esta manhã? Agora ele seria espancado ou
quebrado, ou os santos sabiam o que!
Ela pisou no meio da multidão e abriu caminho. No momento
em que ela saiu da primeira fila de espectadores, a luta estava em
andamento.
Nuvens de poeira subiam em torno da confusão de punhos e
estrangulamentos. Mark era grande o suficiente para se segurar,
mas seu rápido exame viu um hematoma vermelho sob seus olhos
antes que um conjunto de nós dos dedos acertasse sua mandíbula.
Ela olhou desesperadamente em volta da multidão. Nenhum
dos homens parecia inclinado a pará-lo. Na verdade, eles estavam
gritando incentivos e apostando. As duas gangues haviam se
transformado uma forma sangrenta de esporte.
Algo em meio à confusão chamou sua atenção e congelou seu
sangue. Um dos escudeiros, um jovem usando a farda de Mortimer,
recebeu um duro golpe de Mark no seu belo rosto. Ele desmoronou
no chão e agarrou o nariz com um grito de dor. Por um instante ele
ficou ali espantado. Então o ódio flamejante iluminou seus olhos.
Quando ele ficou de pé, sua mão foi para o cinto. De repente, um
punhal estava cortando o ar.
Todo mundo viu que a diversão havia se tornado mortal. A
multidão se aquietou e os jovens pararam. O escudeiro olhou para
seus inimigos e apontou o ar para afastá-los. Os meninos da rua
recuaram, mas se recusaram a correr.
Mark não se mexeu. Ela sabia por que, e gemeu que o destino
poderia ser tão cruel a ponto de provocá-lo com um desafio de um
dos servos de Mortimer. Ele ficou lá arrogantemente, desafiando o
escudeiro a tentar.
Eles se encararam no silêncio que se formou, e parecia que
cordas invisíveis queriam juntá-los. Ela viu - não, ela sentiu - o
momento exato em que a morte de seu irmão se tornou inevitável.
Fúria caiu em sua cabeça. Fúria por Mark, e por esta cidade, e essa
multidão que não dava a mínima para nenhum desses garotos.
Ela caminhou direto para as linhas de combatentes. Ela
adiantou-se até ficar entre Mark e o escudeiro. Ignorando a ordem
irada de seu irmão para sair do caminho, ela sacudiu o dedo para o
rosto ensanguentado do escudeiro.
— Quão pouco cavalheirismo que você mostra. Você saca uma
arma contra aqueles que não têm nenhuma? Sua força não pode
vencer ele, então você alcança a vantagem fácil. É claro que você
vai se tornar o mais covarde dos cavaleiros. Considerando as cores
que você veste, eu não estou surpresa.
O olhar do escudeiro a varreu com confusão, mas um sorriso
de escárnio retorceu seu rosto quando a avaliação foi concluída. Não
é uma dama, esse olhar dizia. Apesar de toda a conversa fina,
apenas uma ninguém empobrecida.
— Saia do caminho, cadela. E cuidado com a sua língua ou
você vai pendurar em uma forca no final dessas cores.
— Uma grande ameaça de um mero lacaio a não mais do que
seis e dez anos. Seu senhor não fará nada a seu pedido. Ele nem
sequer sabe seu nome ainda.
— Eu disse se mova.
— Eu não vou. Nós já sabemos que você é um covarde. Você é
tão grande que você vai usar essa adaga contra uma mulher?
Com raiva exasperada ele embainhou sua arma, mas apenas
para libertar sua mão. Ele estendeu a mão para ela e empurrou.
Outra mão apareceu do nada. Agarrou um dos braços do
escudeiro, impedindo-o abruptamente.
Compridos dedos apertados. Todo o corpo do jovem se sacudiu
e seu aperto afrouxou dela. Eles apertaram um pouco mais e um
estremecimento de dor quebrou o sorriso do escudeiro.
Foi o pedreiro. Ele ficou ali completamente à vontade,
esmagando com calma o braço do escudeiro.
— Ela está certa. Você é um covarde se colocar as mãos em
uma mulher, disse ele.
— Você esquece com quem você lida, o escudeiro cuspiu,
enfiando as cores da manga sob o nariz do pedreiro.
— Eu lido com um garoto que não sabe quando perdeu uma
luta justa. Um brilho de aço brilhou nos olhos azuis do pedreiro. Ele
não parecia tão gentil como na barraca dela. — Essas mãos podem
quebrar pedra, garoto. Seu braço será uma coisa fácil em
comparação. Leve seus amigos e vá embora.
Ele soltou seu aperto. O escudeiro recuou, com o rosto
vermelho.
— Meu senhor vai ouvir isso!
— Não, se você é inteligente. Esta cidade tem leis contra o uso
de armas em suas ruas. Seu senhor não vai tomar gentilmente você
causando problemas dentro dessas paredes. Agora vá, ou eu mesmo
vou dizer a Mortimer sobre o seu comportamento.
O escudeiro se juntou a seus amigos. Vestindo sua arrogância,
eles se afastaram rindo, como se tivessem vencido o dia. Com a
partida, o mercado voltou a fluir, cuidando dos negócios.
O pedreiro virou-se para a turma heterogênea de valentões de
rua.
O comando era inconfundível. Eles começaram a sumir na
multidão.
Mark fez que ia se juntar a eles. O pedreiro o pegou pela nuca
enquanto passava.
— Este pertence a você? Ele perguntou, balançando-o para
enfrentar Joan.
Mark parecia pronto para lutar novamente. A boca apertada do
pedreiro sugeriu que ele quase esperava que isso acontecesse.
— Sim, Joan disse miseravelmente. Ela nunca tinha visto seu
irmão tão bravo. Ele nunca iria perdoá-la pelo constrangimento de
sua interferência.
— Eu pensei assim. O mesmo cabelo. A mesma bravura. Ele
colocou Mark de lado. — Você deveria pegar suas mercadorias e
partir por hoje. Se alguém for até um policial, você não quer estar
aqui quando ele vier.
— Nós iremos imediatamente. Obrigada por sua ajuda.
Mark ficou parado ali, pensativo e fervendo. O pedreiro olhou-o
severamente.
— Ajude sua irmã, garoto.
Isso foi a gota d'água. O punho de Mark voou. O pedreiro
simplesmente o pegou em sua mão esquerda. Joan nunca tinha
visto um homem se mover tão rapidamente.
A fúria de seu irmão ficou mais escura. O pedreiro apenas
segurou o punho com firmeza, olhando para trás. Seu embaraço
cresceu tão intenso que ela queria desaparecer.
A expressão do pedreiro suavizou-se um pouco, como se ele
compreendesse algo do tumulto que ressoava em seu irmão.
— Sua irmã salvou sua vida. Aquele escudeiro estava
preparado para te ferir. Agora, seja um homem e tire-a da cidade.
O pior da raiva de Mark se rompeu, como se ele tivesse ouvido
alguma verdade naquelas palavras calmas. Ele baixou o punho e
caminhou até a barraca dela.
— Sinto muito por isso. Ele é muito orgulhoso e não gosta mais
que eu brinque de mãe ―, disse Joan. ― Mais uma vez, agradeço
de todo o coração.
Ela foi se juntar a Mark. O pedreiro juntou seus passos aos
dela.
— Vocês dois estão sozinhos?
— Sim. mas como eles estavam sozinhos. Ela duvidava que
quaisquer duas almas no mundo estivessem mais sozinhas do que
Mark e ela.
Mark colocou a louça no chão e virou a caixa. Uma pilha de
trapos esperava, mas ele não os tocaria. Seu orgulho traçou linhas
muito claras sobre essas coisas. Ela não se importou. Ela mesma
havia ensinado a ele onde as linhas deveriam estar.
Ela se ajoelhou e começou a enrolar a louça para que não
quebrasse na caminhada para casa. Para sua surpresa, o pedreiro
ajoelhou-se e começou a ajudar. Havia algo desconcertante sobre
sua força ao lado dela. O calor de sua proximidade a confundiu de
maneira tola.
Suas mãos levantaram uma xícara gentilmente e a enrolaram
em um pano antigo. Ela quase o parou. Ela não queria que ele visse
e tocasse aqueles pedaços de pano sujo. Ele poderia reconhecê-los
pelo que eles eram, os remanescentes de uma vida que havia sido
destruída e despojada. De repente, inexplicavelmente, ela sabia que
ela iria querer morrer se ele tivesse pena dela.
— Você vendeu a última estátua, disse ele, enquanto pegava
uma tigela das mãos dela e cuidadosamente guardava na caixa.
Ela assentiu enquanto envolvia rapidamente o último copo.
— Eu pedi um xelim, como você aconselhou. Você estava
certo. Ele pagou.
Ele sorriu para ela. Ela se sentiu corar sob seu olhar sutil e
sinuoso. Ela ficou ainda mais nervosa. Suas mãos ficaram
desajeitadas e a xícara rolou para fora do pano, caiu no colo e caiu
no chão.
Ele pegou o pano e fez um rápido trabalho no copo.
Levantando-se, ele ofereceu sua mão para ajudá-la.
Ela olhou para aquela mão, e algo triste inchou seu coração e
queimou sua garganta. Era apenas um simples gesto, mas fazia
anos que qualquer homem tinha dado a ela essa pequena cortesia.
Ela aceitou e levantou-se rapidamente. Sua palma sentiu o
calor seco dele e a pele calejada. Ele não se vestia como um
pedreiro, mas possuía as mãos firmes de um. E os ombros largos.
Ele não era um homem volumoso, mas sua força era evidente em
suas linhas altas e magras.
Mark levantou a caixa e eles atravessaram a praça. Mais uma
vez o pedreiro caminhou ao lado dela.
Ela não queria que ele a seguisse. Sua ajuda tocou memórias
vulneráveis que ela não podia se dar ao luxo de reconhecer. Ele a
lembrava dos velhos tempos em que alguém sempre a protegia, e
ninguém esperava que ela fosse forte, e nenhum homem jamais se
atreveu a olhar lascivamente. Ele enfraqueceu algo em seu núcleo e
a fez vacilante e nostálgica. Ela não podia mais se permitir o luxo de
sua gentileza.
— Meu irmão vai ficar comigo. Mais uma vez agradeço,
mestre... Ela percebeu que não sabia o nome dele.
— Rhys
— Eu agradeço a você, mestre Rhys.
Ela disse isso com uma nota de despedida, mas ele não saiu.
— Você não precisa andar com a gente. Nós já atrasamos
muito você até agora.
— Eu vou te levar para fora da cidade. Esses escudeiros podem
decidir reconquistar seu orgulho com uma vingança fácil.
Sua mente viu novamente o perigo que Mark enfrentara, e a
ajuda corajosa de Rhys.
A lembrança parou abruptamente em alguns detalhes
ignorados pelo medo do momento.
— Aquele escudeiro agia como se conhecesse você, ela disse.
— Eu o vi em Westminster.
— Você vive lá?
— Eu moro em Londres, mas meu trabalho me leva ao palácio
na maioria dos dias.
Seu coração começou a bater lentamente de cautela.
— Você disse que você iria denunciá-lo ao seu senhor. Isso era
uma ameaça vazia?
— Eu passo por Mortimer na maioria dos dias. Se eu quisesse
falar com ele, eu esperava que pudesse. Ele não disse isso com
orgulho. Ela fez uma pergunta e ele simplesmente respondeu.
— Você pratica seu ofício para ele? Ela ouviu a amarga
acusação em seu tom. Deu voz ao calor repentino em sua cabeça.
Ele a ajudara e ela deveria ser grata, não importando quem ele
fosse e a quem servisse, mas emoções terríveis, muito mais antigas,
começaram a agitar seu coração.
Ele inclinou a cabeça para ver o rosto dela. Um pouco daquele
brilho de aço voltou a seus olhos.
— Sim.
— Você trabalhou em seus castelos? Suas fortificações? Você
conserta as paredes das fortalezas que ele destrói enquanto ele
estupra o reino?
— Raramente. As paredes do castelo não exigem rendilhado e
estátuas.
— Mas você o serve, no entanto, tanto quanto seus cavaleiros
e arqueiros.
— Eu sirvo a coroa.
— A coroa está sob o pé dele.
— O escudeiro estava certo, mulher. Você fala muito
livremente.
— É o único benefício da pobreza. Liberdade para falar, pois
minha opinião não tem sentido. Pelo menos eu não sou um lacaio
para um açougueiro, como aquele escudeiro. E você.
Ele ouviu as últimas palavras, embora ela não as tenha dito.
Seu rosto endureceu com o insulto, mas ele não respondeu a isso.
Sua presença não mais se sentia reconfortante e protetora.
Pelo contrário, o oposto. Se ele se movia entre a corte, ele era
perigoso. Se ele servia Mortimer, mesmo como artesão, sua honra e
caráter não eram confiáveis.
Isso a entristeceu. Foi bom acreditar nele por um tempo. Foi
lindo pensar que ele era generoso.
— Você mora fora da cidade? ele perguntou.
— Sim.
— Em Southwark?
— Sim. Ela não hesitou com a mentira. Ele havia feito o tipo de
perguntas que ela recebia de homens que logo ofereciam um mau
negócio. Ele poderia ser mais suave do que a maioria, mas não era
diferente. Pode-se conhecer um homem através de quem ele servia,
e ele servia ao pior. Ele sem dúvida esperava que ela lhe pagasse, e
não com louça. Ele gostava dela dessa maneira. Estava nos olhares
quentes que ele deu a ela.
Isso a preocupou. Ela não queria o interesse de um homem
que passasse por Mortimer todos os dias. Ela não queria que ele
lembrasse de nada sobre ela, muito menos onde ela poderia ser
encontrada.
No portão ela parou e olhou para ele.
— Eu te agradeço, disse ela, tentando tornar as coisas
amigáveis, mas ao mesmo tempo sendo desdenhosa.
— Essas são as únicas palavras que você conhece? Além da
conversa cortante que é perigosa e insultuosa?
— Que outras palavras você quer?
— Não a oferta de seus favores, como você teme. No entanto,
desde que eu arrisquei uma briga com um punhal, saber o seu nome
seria bom.
— Perdoe-me. É apenas...
— Eu sei como é, linda pomba. Você é sábia em ter cuidado.
— Joan. Meu nome é Joan. Não havia perigo em dar isso.
Havia milhares de Joans em Londres.
Mark chamou impaciente do portão.
Rhys recuou e fez uma vaga reverência.
— Até nos encontrarmos novamente, Joan. E tente ficar de
fora das brigas de rua.
Ela assistiu com alívio enquanto ele voltava para a cidade. Ela
também experimentou uma pontada de arrependimento
melancólico.
Houve alguns minutos deliciosos lá quando ele a fez se sentir
como a garota que ela tinha sido uma vez.
Eles nunca se encontrariam novamente, se ela pudesse evitar.
Capítulo II
Rhys seguiu o pajem na antessala da rainha Isabella. Três
dias de espera finalmente resultaram no encontro que ela exigira.
Ela se sentou em uma cadeira esculpida enquanto uma de suas
damas arrumava seu cabelo castanho. O luxo a rodeava: azulejos
espanhóis coloridos e tapetes intrincados, tapeçarias flamengas e
xícaras de prata adornadas com joias. Ela o deixou ficar de pé por
um longo tempo, até que o último fio de ouro fosse entrelaçado em
suas tranças enroladas. Uma inspeção de seu rosto comprido em um
espelho, alguns ajustes para a perfeição, e então ela finalmente
reconheceu sua presença.
Sua pálpebra mostrou a confiança de uma mulher que jogou
um jogo audacioso e venceu. Rhys não se opunha a rainha, mas seu
mau julgamento nos homens. A abdicação forçada de seu marido há
quase quatro anos poderia ter salvado o reino como ela havia
prometido.
— Disseram-me que você é o pedreiro responsável pela minha
janela na capela aqui. Também me disseram que você supervisionou
parte do novo edifício em Windsor no ano passado —, disse ela. —
Eu tenho uma pequena casa de campo que eu quero ampliar. O
Mestre Stephen sugeriu que você pode ser a pessoa certa para isso.
— Isso é generoso da parte do Mestre Stephen.
Estranhamente, desde que o Mestre Stephen, o principal construtor
da Rainha, tinha um filho adulto que também seria ideal para o
trabalho.
— Então vamos discutir isso. Ela virou a cabeça. — Mortimer,
você se juntaria a nós?
Um movimento no canto mais escuro da câmara chamou a
atenção de Rhys. Um homem estava lendo pergaminhos em uma
escrivaninha lá. Ele se levantou e caminhou até a cadeira da rainha.
A mandíbula de Rhys se apertou. Não desgostava da rainha,
mas odiava Roger Mortimer. Ele odiava a pompa e a arrogância do
homem. Ele odiava a boca flácida, a barba escura encaracolada e os
olhos inchados. Ele desprezava a maneira como o homem abusava
de qualquer poder que ele tivesse. Ele se ressentia como o inferno
do que ele ajudou a criar.
Mortimer ficou ao lado de Isabella e colocou a mão no ombro
dela. Ela deslizou a sua para cima e entrelaçou os dedos nos dele. O
gesto simbolizava a força de seu afeto, que a levara a se apegar ao
poder que ela deveria ter entregue a seu filho agora. Sob a
influência desse homem, a rainha havia se tornado uma mulher
fraca e extravagante.
— Esta mansão é muito pequena —, explicou Isabella. — Eu
estou pensando em um novo salão, apto para o meu séquito, e
novas câmaras, também. Você terá que ir lá e ver como as coisas
estão e depois consultar comigo. Mas eu quero que esteja pronto
para que possamos ficar lá em nosso caminho quando visitamos as
marchas galesas.
As marchas galesas. Domínio privado de Mortimer. Ele
conseguiu agarrar a região inteira, e Isabella o elevou a Conde de
Março. Rhys crescera na fronteira galesa. A única coisa boa sobre a
situação atual era que mantinha o homem aqui, e longe daquelas
propriedades onde ninguém e nada controlavam sua crueldade.
— Onde fica essa propriedade?
— Wessex.
— A senhora sabe se há uma pedreira nas terras, ou nas
proximidades? Se não, o custo será muito alto.
— Não se pode esperar que eu saiba de coisas como pedreiras.
Você terá que determinar isso. Quanto ao custo, discutiremos isso
quando você voltar.
— E se, no meu retorno, você decidir que o custo é muito alto?
Mortimer sorriu com condescendência benigna.
— Você está preocupado que este projeto não se concretize, e
que você invista seu tempo e sua jornada em vão. Você será muito
bem recompensado por qualquer trabalho que você realize para nós.
Naquele momento, Rhys sabia com certeza que essa audiência
não era realmente sobre construção.
Foi Mortimer quem fez a abertura. Ele bateu o queixo
pensativamente.
— Você é familiar para mim. Como eu te conheço? Ah, eu me
lembro agora. Você não é o pedreiro que serviu como mensageiro
para a causa da Rainha? Fomos informados de como você era útil.
Como você também pegava pedaços de informações enquanto você
estava fazendo o seu ofício.
— Muito poucos pedaços. Afinal, sou apenas um pedreiro.
— Um maçom?
— Sim, eu cortei estátuas, arabescos e molduras naquela
época, e ainda faço entre projetos de construção.
— Sua associação é poderosa. Ouvem-se rumores sobre isso.
Dizem que seus membros sabem mais sobre o que ocorre no reino
do que nossos próprios xerifes.
— Viajamos para o nosso ofício e fazemos fofocas como todos
os viajantes. Mas qualquer peregrino sabe tanto quanto nós. Agora,
quanto a esta mansão, quando você quer que eu vá e inspecione o
que precisa ser feito?
— Bem, isso depende, não é? Isabella disse.
— Depende, minha senhora? De quê?
Ela suspirou com exasperação.
— Não seja tão denso quanto a pedra que você corta.
Queremos saber o que está sendo dito, que rumores e histórias você
ouve. Há traição em todo lugar, e precisamos saber disso. Você deve
nos contar os pedaços de informação que você pega enquanto faz o
seu trabalho. Queremos ouvir a notícia de qualquer reunião dos
barões, levada à cidade pelos maçons que atravessam. Se você nos
servir bem, o trabalho na mansão é seu e muito mais.
Então era assim. Um suborno total.
— Muito mais, Mortimer ecoou. De fato, a rainha está
considerando um novo palácio inteiro lá, e não apenas uma
ampliação. Ela quer que a Igreja estabeleça um novo bispado
também e construa uma catedral.
Um muito bom suborno. Um magnífico. Todo pedreiro sonhava
em se tornar um mestre construtor, e todo construtor sonhava em
planejar palácios e catedrais. Ele tinha que dar Mortimer seu devido
crédito. O homem certamente sabia como comprar alguém. Não é
de admirar que ele tivesse a maioria dos barões comendo na sua
mão.
— Eu duvido que qualquer coisa que eu ouça seja novidade, ou
de qualquer valor.
— Deixe que nós decidamos isso. Essas coisas são mais
complexas do que um homem como você pode entender.
Apesar do suborno, eles realmente não estavam oferecendo
uma escolha.
— Eu farei o meu melhor, é claro.
Eles o dispensaram e voltaram a atenção um para o outro. As
portas grossas fecharam os seus murmúrios. Ele caminhou até o
corredor, imaginando quanto tempo ele poderia satisfazê-los com
pequenos pedaços de nada.
Ele quase não a notou.
Perdido em seus pensamentos, andando pelas ruas da cidade,
passou pelo pelourinho2 sem olhar para cima. Ele estava vagamente
ciente de que uma multidão se reuniu para assistir a algum pobre
coitado sendo punido, mas era uma ocorrência muito comum para
distraí-lo.
Ele fez uma pausa para comprar uma nova pera de um
vendedor na esquina. Foi enquanto ele pagava que por acaso olhou
para as pequenas encruzilhadas. E então notou que o cabelo claro
da pessoa presa era de uma cor familiar, e que o vestido cinzento da
jovem presa ali estava coberto de pedacinhos de bordados
esfarrapados.
Sua cabeça e mãos pendiam frouxas de seus buracos. Ele
olhou para o sol. Tinha passado o seu pico, então ela já estava lá há
horas. Ele se perguntou se ela estava mesmo consciente.
Ele se aproximou e empurrou a multidão provocante até que
ele ficou bem abaixo dela. Os pelourinhos foram colocados em uma
plataforma e sua cabeça ficou nivelada com os joelhos. Ele afastou o
alimento apodrecido que havia sido jogado nela e levantou os
objetos despejados a seus pés para anunciar o motivo de sua
punição.
Azulejos. Ele examinou dois pedaços quebrados e viu o
problema. Eles não foram queimados corretamente e devem ter
quebrado assim que foram colocados. Ela dissera que usava um
forno de ladrilho, não que ela mesma fizesse ladrilhos. Achava difícil
acreditar que a mulher que tomava tanto cuidado com sua louça e
estátuas poderiam ser responsáveis por tal trabalho de má qualidade
como estas pavimentadoras de piso.
Ele olhou para cima. Ele podia ver o rosto dela daqui. Corada
pela tensão de sua posição, estava marcado com determinação. Ele
se inclinou para ver melhor, e ela o notou. Ela fechou os olhos e a
umidade vazou até as bordas.
Ele deu um passo para o lado. De lá, era óbvio que ela era
muito baixa para o pelourinho. Ela estava esticada na ponta dos pés
e, mesmo assim, praticamente pendurada no pescoço.
Um homem se aproximou. Sorrindo como um rato, ele circulou,
aproveitando sua vulnerabilidade. Quando ele chegou ao fundo, ele
brincou com a saia dela. O tecido velho se partiu como se fosse feito
de nada além de ar.
O rasgo expôs sua perna cremosa da coxa ao pé. Encantado
com sua fortuna, o homem agarrou a carne.
Instantaneamente enfurecido, Rhys o alcançou, girou e jogou-
o na rua.
Sua nova humilhação animou a pequena multidão. Alguns
jovens decidiram que ela faria bom esporte agora.
Provocando e circulando, eles tentaram agarrar também. Rhys
teve que bater cabeças juntas para pôr fim a isto.
Ele olhou para o rosto dela novamente. Lágrimas escorriam
pelas suas bochechas. Ela estava quebrada. Bem, ela durou mais
que a maioria.
Ele voltou para o vendedor de peras.
— Quanto? Para todos eles? E a caixa?
Atônita, a mulher nomeou seu preço. Ele pagou e carregou a
caixa para a multidão. Depois de colocar algumas peras em sua
túnica, ele a subiu. Fruta era para a rua.
Os espectadores se esforçaram para pegar a comida de graça.
Enquanto eles escolheram e lutaram, ele trouxe o caixote até o
pelourinho. Pulando para cima, ele colocou ao lado de Joan.
— Ajoelhe-se. Isso vai te levantar.
Ela tentou, mas mal conseguia se mexer. Ele ergueu cada
perna e cuidadosamente dobrou-a na caixa. Seu corpo soltou um
profundo suspiro de alívio e um gemido de dor.
Ele baixou a cabeça até a dela e ofereceu uma pera.
— Você pode comer?
Ela balançou a cabeça e estremeceu. Ele moveu a trança para
o lado e viu o motivo. Um vergão vermelho e feio circulava seu
pescoço e mandíbula de onde ela estava pressionado contra o
pelourinho. Se ela tivesse perdido a consciência ou seu precário
equilíbrio, poderia ter sido estrangulada. Isso não pretendia ser uma
sentença de morte, mas às vezes era.
Ele se moveu atrás dela e amarrou a saia dela junto.
— Eu vou ficar aqui, Joan. Ninguém vai te tocar de novo.
Ninguém vai te machucar. Acabará em breve.
Seus ombros esbeltos tremeram e ele ouviu um soluço
abafado. O som torceu algo dentro dele. Ele teria gostado de ficar lá
em cima, bloqueando-a de vista, mas isso não seria permitido. Certo
ou errado, a sentença foi ordenada e ela teria que pagar. Ele deu
um tapinha nas costas dela, tentando dar conforto, mas isso só a fez
chorar mais.
— Tenha calma, linda pomba. Eu estarei lá embaixo, onde você
pode me ver.
Ele pulou da plataforma e assumiu uma posição na frente dela.
Cruzando os braços, de frente para a rua, ficou de sentinela para
que ninguém tentasse prejudicar a pobre mulher de qualquer
maneira.
Foi a gentileza dele que a quebrou. Ela havia lutado contra a
humilhação e a dor com orgulho e raiva, mas não tinha defesa
contra a bondade. Ele lhe dera permissão para ser fraca e ela
desmoronara.
Ela podia ver a cabeça e costas dele o tempo todo. Ele apenas
ficou ali esperando, como se não tivesse nada melhor para fazer. Em
uma ocasião ele se virou e olhou para cima, verificando-a com uma
expressão preocupada e algumas palavras de segurança.
Doía engolir, mas pelo menos ela não precisava mais lutar por
cada respiração. Seu corpo parecia tão esticado que ela se
perguntou se algum dia estaria certo de novo.
Aos pés dela estavam os ladrilhos que a haviam colocado aqui.
Não seus azulejos. George supervisionara o forno no dia em que
foram feitos. Ele estava bêbado, mas não bêbado o suficiente para
passar o dia dormindo como de costume.
De vez em quando gostava de interpretar o grande artesão.
Geralmente ela encontrava uma maneira de evitar que os resultados
errados fossem vendidos, mas ele os vendeu assim mesmo.
Ele provavelmente adivinhou que eles eram ruins. Foi por isso
que ele insistiu que ela trouxesse o próximo vagão.
Então ela enfrentaria a queixa, e não ele.
Um movimento abaixo a alertou. O pedreiro estava saindo. Ela
não podia culpá-lo. Tinham sido horas. Ela levantou a cabeça um
pouco para poder vê-lo ir embora. Isso significava que ela também
podia ver a pequena multidão. As pessoas iam e vinham parando
para apreciar o espetáculo. Ninguém ficou muito tempo. Estava
quente na encruzilhada. As horas ao sol a deixaram tonta e
acrescentaram a agonia da sede à longa lista de torturas.
A deserção de seu protetor a esvaziou. Seu coração se
agarrava desesperadamente, tentando encontrar alguns resquícios
de força, mas havia apenas fraqueza dentro dela agora. Quando eles
a levassem para baixo, o que eles fariam com ela? A deixariam em
uma pilha nesta plataforma? A jogariam na sujeira do lado de fora
do portão? Ela não podia andar, ela tinha certeza. Ela duvidava que
pudesse engatinhar.
Ela olhou para os azulejos através dos olhos borrados e
amaldiçoou George. O pequeno pico de raiva produziu um
pouquinho de força. Ela agarrou os dois com o que restava de seu
sentido. No pequeno redemoinho de fúria que encheu sua cabeça,
ela esqueceu onde estava.
Como se atreve a me insultar? Como se atreve a colocar as
mãos em mim? Meu pai vai ouvir isso. Meu marido vai te matar...
Mas alguém colocou as mãos nela. No ombro dela. Ainda meio
enlouquecida, ela virou a cabeça para morder e lutar. A fúria negra
morreu em um instante, e ela estava de volta ao pelourinho,
olhando para o pedreiro. Ele ficou ao lado dela novamente,
segurando um copo.
Ele olhou nos olhos dela com preocupação e segurou a xícara
abaixo do rosto.
— Você está ficando doente do sol. Coloque seus lábios nisso e
beba o que puder. Está muito cheio, e você deve conseguir beber
um pouco disso.
Era cerveja, não água. Ela engasgou mais do que ela bebeu,
mas um pouco desceu. O maravilhoso fluxo de líquido espesso
esfriou sua garganta.
— Feche seus olhos. Ela fez isso, e o resto da cerveja
derramou sobre sua cabeça quente. — A fonte está muito longe,
então isso terá que servir. O sol está começando a se pôr, Joan.
Aguente um pouco mais.
Ela não tinha certeza se queria aguentar. Seria muito agradável
não fazer isso.
Mas parecia que Rhys não planejava dar a ela muita escolha.
Ele retomou ao seu lugar aos pés dela, só que desta vez ele a
encarou. Falando como se conversassem em uma taberna, ele
começou a contar histórias de antigas lendas. Enquanto o sol se
movia e a cerveja secava em sua cabeça, sua voz a mantinha no
mundo, mas um muito pequeno, onde apenas os dois existiam.
Crepúsculo e frescor frio.
As encruzilhadas estavam vazias agora. Dois homens subiram
os degraus da plataforma. Um trabalhou a chave na madeira, e o
pesado braço de madeira balançou acima de sua cabeça.
Ela tentou se remover. Ela não podia. Quando ela endireitou os
ombros, parecia que estava empurrando a pedra.
Mãos firmes seguraram sua cintura e a afastaram. Ela começou
a vergar, caindo. Braços a arrastaram antes que ela batesse na
plataforma.
— Por que você está querendo se preocupar com essa
vagabunda, Mestre Rhys? uma voz arrastada disse. — Basta colocá-
la para baixo. Um de seus parentes vai vir para ela.
— Ninguém está aqui. Eu vou cuidar dela.
— Como você preferir, mas há maneiras mais fáceis de chegar
ao céu do que ajudando ela.
— Provavelmente sim.
Ela machucou tudo. Doía tanto que os braços, sob os ombros e
os joelhos pareciam vigas de ferro. Até mover o pescoço um
pouquinho causava dor nela.
Escadas e depois escuridão. Silêncio, exceto por suas botas.
— Você está acordada, Joan?
— Sim. Ela não podia ouvir se sua voz saiu ou não. Também
não tinha certeza absoluta de que estava acordada. Os edifícios que
passavam pareciam muito escuros, apenas um borrão de formas.
— Você tem algum parente além do seu irmão? Algum amigo
da cidade?
Ela conseguiu balançar a cabeça.
— Então eu vou levá-lo para minha casa. Você pode descansar
lá.
Ela estava à deriva, vagamente consciente dos braços e do
peito de Rhys, e sua respiração em seus cabelos, e o ritmo de seus
passos pela cidade.
Luzes. Primeiro uma, depois três e depois mais. As chamas
queimaram bem em frente do nariz dela. O cheiro de sebo começou
a limpar sua cabeça.
As velas iluminaram seu rosto quando ele se inclinou para
acender a última. Ele parecia ainda mais bonito do que o habitual
sob seu brilho. De repente, ela pôde ver uma câmara. Uma cozinha
de bom tamanho. Tudo muito limpo.
Rhys a colocou em um banco contra a lareira e moveu uma
mesa próxima. As velas queimaram. Ele trouxe uma xícara e um
pouco de pão.
— Aqui está um pouco de cerveja. Tente beber e comer. Molhe
o pão se sua garganta doer muito.
Seu braço parecia de chumbo, mas ela moveu-o devagar e
levou o copo e o pão para o colo.
Ele tirou a túnica e foi para um nicho próximo. Ele rolou uma
banheira alto na direção da lareira.
Ela mordiscou seu pão encharcado e observou seu corpo
magro se mover.
Ele continuou encorajando-a a comer enquanto ele cuidava de
seus negócios. Ele acendeu o fogo, depois saiu pela porta do jardim
e voltou com baldes de água. Ele andou de um lado para o outro até
que a banheira estava cheia. Ele colocou a última água na lareira
para aquecer.
— Você pode falar agora? Sua garganta está melhor?
Perguntou, enquanto buscava cerveja.
— Um pouco. Saiu um sussurro rouco. Ela gesticulou na
direção do banho. — Para mim?
— Sim.
Isso significaria se mover.
— Não.
— Sim. Ninguém sabe mais sobre corpos doloridos do que
pedreiros, e você vai me agradecer amanhã. Além disso, eu não
quero insultar você, mas entre os frutos maduros que bateram em
você e a cerveja que eu joguei na sua cabeça, você tem um cheiro
terrível.
— Você quer dizer que sou eu? Eu pensei que era você.
Ele riu e pareceu satisfeito com a pequena piada dela.
Tranquilizado. Ele se inclinou contra a lareira e olhou para ela do
outro lado da banheira.
— Eu não sabia que você também fazia azulejos.
Ela sentiu alguma obrigação de explicar, mas tentou mantê-lo
ambíguo. A comida a tinha restaurado o suficiente para lembrar que
ela tinha que ser cautelosa com esse homem.
— Eu trabalho para um ladrilhador. Eles eram dele, não meus.
Para seu desalento, era tudo o que ele precisava.
— Do outro lado do rio? O pátio de cerâmica do lado de fora
de Southwark? A casa do velho Nick? Eu conheço as mercadorias.
Os construtores confiavam no pai, mas não compravam do filho.
— As mercadorias ainda podem ser confiáveis, se George ficar
bêbado e não interferir. Alguns dias o destino não é tão bom. Ele
está impaciente com o forno e não o deixa na temperatura correta.
— Então George deixou você ser punido por seu mau ofício.
Como você veio trabalhar para um homem assim?
— Seu pai estava vivo quando eu comecei. Nick me ensinou.
Quando George herdou o pátio, eu fiquei.
— E suas estátuas e potes podem ser feitas lá. O barro é dele?
Você usa algum para suas próprias mercadorias?
Ela se achou exausta demais por qualquer emoção, mas ficou
horrorizada por ele ter adivinhado isso.
— Eu administro o pátio. Se não fosse por mim, George Tiler
não teria dinheiro para gastar nas tavernas e nos bordéis que ele faz
em sua casa. Sim, eu salvei e uso restos. Você vai me chamar de
ladra agora?
Em comparação com as ações, isso será uma dor rápida e
menor.
— Duvido que George lhe pague o suficiente pela sua
habilidade. Se você encontrou uma maneira de equilibrar a balança,
não diz respeito a mim.
Sua aceitação insípida não a tranquilizou. Ela odiava que ele
soubesse disso sobre ela. Ela disse a si mesma que George lhe devia
o barro e lenha para o forno, mas sabia que era uma forma de
roubo. Rhys provavelmente pensava mal dela agora. De repente,
parecia um castigo pior do que o pelourinho. Não fazia sentido. Se
ele trabalhava para Mortimer, ele era certamente de caráter
duvidoso. Ainda assim, ela descobriu que não poderia enfrentá-lo.
Ela colocou a xícara na mesa.
— Eu irei agora. Estou melhor.
Ela cambaleou sob seus pés. Ele estava ao lado dela em um
instante, gentilmente pressionando-a de volta para baixo.
— Você vai ficar, comer, tomar um banho, e então você vai
descansar.
— Sua esposa não vai te agradecer por esta caridade. Quando
ela souber da minha história, ela vai pensar que você sujou sua casa
impecável.
Rhys levantou os baldes e despejou seu conteúdo quente na
banheira. O vapor úmido soprava para ela, e até aquele toque vago
de consolo a acalmou. Seus músculos praticamente suspiraram
audivelmente. Fazia muito tempo que ela tinha apreciado um banho
quente.
— Eu deveria agradecer-lhe. Mais uma vez, disse ela. — Estas
não são as únicas palavras que eu conheço, mas são as que eu me
vejo dizendo muito para você. Você é um homem gentil.
Ele caminhou até uma prateleira e abriu uma caixa velha.
— Não me ache melhor do que eu sou. Acontece que eu não
tenho uma esposa, ele voltou para a banheira com um pedaço de
sabão. — Não há ninguém aqui para ajudá-la neste banho além de
mim.
Qualquer inclinação para se lembrar dele como um protetor
desapareceu em um piscar de olhos. Algo no jeito que ele estava ali
causou tanto quanto suas palavras. De repente, eles eram um
homem e uma mulher sozinhos à noite em uma casa vazia. Para sua
surpresa, ela percebeu que pensar nele daquele jeito não a enojava,
como acontecia com outros homens - como definitivamente deveria
ser com um dos lacaios de Mortimer. Pelo contrário, o oposto. A
vibração de cautela que batia em seu sangue possuía uma excitação
atraente que a confundia.
— Espero que você não seja excessivamente modesta.
— Modesta o suficiente para que eu não possa permitir sua
ajuda nisso.
— Eu não vejo outra maneira.
— Se não houver outro caminho, não vou me banhar.
— Se você não fizer, estará incapacitada por dias.
— Então eu vou fazer isso sozinha.
— Seu espírito voltou, mas duvido que a sua força tenha. Você
tem certeza de que consegue se virar sozinha?
— Eu posso. Deixe-me, e eu vou.
Ele foi até um baú e tirou uma toalha, colocando-a, junto com
o sabonete, no banco.
— Eu estarei lá fora no jardim. Me chame quando tiver
terminado. Você pode se banhar, mas não pode subir sozinha.
— As escadas?
— Para as câmaras. Para dormir. Eu dificilmente vou levá-la
todo o caminho de volta para o pátio de azulejos hoje à noite, e se
você tentar andar você não vai nem chegar à rua.
— Eu não posso permitir isso também.
Ele deu-lhe um sorriso lento.
— Eu não estou tentando seduzir você, Joan. Haveria pouco
prazer nisso quando você está tão ferida que não pode se mover.
Com isso, ele estava fora da porta.
Este homem deve pensar que ela caiu de um carrinho de nabo
esta manhã. Todos sabiam que os homens eram capazes de sentir
prazer mesmo que a mulher estivesse meio morta. Ela deixaria a
água quente restaurá-la e depois voltaria para o outro lado do rio.
Ela certamente não poderia ficar aqui a noite toda.
Ela lentamente se acalmou. Suas pernas se rebelaram com
uma dor oca, mas finalmente se seguraram.
Seu vestido amarrava nas costas. Ela tentou alcançar o nó.
Seus braços, meio congelados por estarem em cima do pelourinho,
simplesmente não alcançariam as costas. Ela mal conseguia passar
as mãos pelos quadris.
Era ridículo. Absurdo. Sua mente não se sentia tão doente
quanto seu corpo agia. Irritada por seu desamparo, ela forçou os
braços a se moverem.
Algo puxou e torceu e atirou com dor. Sua visão se apagou por
um instante e seu ombro atingiu a parede da lareira. Deslizando pela
superfície áspera, ela afundou em um amontoado no banco.
Ela esperou a cabeça clarear. Ela debateu sua situação e, com
um suspiro pesado, abandonou seu orgulho.
Forçando sua voz rouca tão alto quanto podia, ela chamou o
nome dele.
Ele veio imediatamente, carregando mais dois baldes de água.
Ele sabia que ela falharia. Ele estava esperando.
Ele colocou a água perto da lareira. Ele se aproximou e sentou
ao lado dela. Sem dizer uma palavra, ele começou a despi-la.
Capítulo III
Rhys puxou o laço de seu vestido. As linhas da costura
provavelmente haviam sido fitas de prata, mas agora tiras de couro
cruas seguravam as costas juntas.
Ele tentou permanecer desinteressado, mas se mostrou
impossível. Sua condição fez sua excitação especialmente inútil, mas
despi-la o afetou de qualquer maneira.
Joan também tentou. Sua expressão gelou em algo meio
severo, meio sonolento e muito distante. Ainda assim, seu embaraço
era palpável. E provocante.
Havia algo praticado em sua pose. Ele imaginou que não era o
primeiro homem a despi-la.
Isso não o surpreendeu. Ela parecia estar em seus vinte e
poucos anos. Seria raro uma mulher atingir essa idade sem ter pelo
menos um homem em seu passado.
Ele decidiu deixá-la em sua combinação para que pudessem
fingir alguma modéstia. Apenas o tecido cinza ficou aberto para
revelar que ela não usava nada por baixo. Uma listra cremosa de
pele brilhou do pescoço até a covinha na base da espinha.
— Me passa a toalha —, ela disse, ficando muito rígida.
Ele passou para ela. Afastando-se, ela abaixou o vestido de
seus ombros e desdobrou a roupa para proteger seus seios. Ele se
viu encarando as costas elegantes, esguias e ágeis, com uma
firmeza sutil que falava em trabalho físico. Ela afinava suavemente,
então aumentava com um toque sutil em seus quadris. O vestido
ajeitado obscurecia o progresso daquelas curvas.
Ele se levantou e ajudou-a a ficar de pé. O vestido esfarrapado
deslizou para baixo. Sua descida escorregadia revelou o resto.
Cintura fina. Quadris arredondados e fundos. Pernas bem
torneadas.
Sua boca ficou seca enquanto sua beleza se revelava à luz das
velas. O carcereiro estava certo. Havia maneiras mais fáceis de
chegar ao céu do que isso.
Ela se virou rapidamente, apertando a toalha contra o peito.
Seu tecido fino moldava suas curvas e a borda inferior tremulava ao
longo do topo de suas coxas. Nudez explícita teria sido menos
erótica.
Ela o olhou com cautela, alerta para sua vulnerabilidade. Mas
algo mais passou entre eles também. Estava em seus olhos e seu
embaraço e a vaga separação de seus lábios. Ele conhecia as
mulheres bem o suficiente para reconhecer os sinais. O que quer
que ela pensasse ou sentisse, ela também não era inteiramente
indiferente.
Isso tornou mais difícil. Ele suprimiu a vontade de colocar a
mão na curva da cintura dela. Em vez disso, ele ergueu sua adorável
e suave nudez em seus braços.
— Você não tem que ter medo. Eu não sou indiferente, mas
não vou tentar fazer nada sobre isso.
Ela agarrou e esticou a toalha para ter certeza de que cobria o
essencial.
— Porque você perderia a graça de ser um bom samaritano?
— Sim, e porque você ainda cheira mal. Ele a levou para o
banho. — Você tem que deixar a toalha de lado agora. Queremos
que ela seque para mais tarde.
— Você não tem outra?
— É a única aqui.
— Feche seus olhos então. Agora, me abaixe sem olhar.
— Eu não acho...
— Coloque-me e depois vá atrás de mim.
— Eu vou tentar, mas você deve sentar no fundo e é profundo.
Firme agora... você não é leve, e fazendo isso sem ver... não...
inferno.
Assim que Joan tocou na água, tentou se soltar. Na luta
confusa que se seguiu, ela se debateu, ele agarrou, ela afundou e
ele caiu. Ele acabou se apoiando em cima dela com as mãos no
fundo da banheira.
A água espirrava até as axilas. Belos seios enfrentaram-lhe a
um palmo de distância. Macios e redondos e gentilmente cheios. Os
mamilos eram cor-de-rosa na maneira das mulheres justas. Rosados
e apertados. Ele não se incomodou fingindo que não percebeu.
Ela instantaneamente se cobriu com os braços e afundou até
os seios ficarem submersos na água escura. O fogo mostrava
apenas feminilidade fantasmagórica e fluida o suficiente para manter
seu sangue retumbante.
— Por favor. Atrás de mim.
Ele pegou o sabonete e jogou para ela. A água escorria de sua
camisa encharcada, fazendo poças nas tábuas do assoalho. Ele tirou,
tirou uma concha e um pano limpo, e se ajoelhou por trás daquela
bela costa.
— Saia agora. Eu posso fazer isso.
Ele a ignorou, porque é claro que ela não podia. Usando a
concha ele derramou água sobre a cabeça dela.
— Me dê o sabão.
Joan soltou sua longa trança e ele a lavou. Ela tinha muito
cabelo e levou muito tempo. O sabonete tornou a água leitosa,
finalmente obscurecendo seu corpo. Exceto o alto de suas costas. E
a linha sinuosa de seus ombros e pescoço. E os joelhos dobrados
aparecendo, pegando a luz do fogo.
Ela começou a se lavar. Doía-lhe mover tanto os braços, mas
sabia que ela não o deixaria fazer por ela. Tudo bem. Acariciar esses
membros, mesmo para limpá-los, não seria uma boa ideia.
Ele trouxe um dos baldes de água quente. Usando o pano, ele
fez um bloco molhado que ele pressionou no pescoço dela.
Ela assustou-se e recuou do calor. Mas a compressa logo se
tornou calmante e ela aceitou. Ele podia sentir ela se soltando
debaixo de sua mão. A curva protetora de seus ombros se afundou
lentamente.
— Você disse que está sozinha, Joan. Você é viúva?
— Não exatamente. Eu estive noiva uma vez. Ele está morto.
— Você escolheu não se casar novamente?
— Eu não tenho interesse em encontrar um marido. O
casamento pode interferir com uma pessoa fazendo o que precisa
ser feito.
Ele entendeu o que ela queria dizer. Ele próprio evitou por
causa de coisas que precisavam ser feitas. Era estranho ouvir uma
mulher dizer isso, no entanto. Ele se perguntou que propósito a
levara a rejeitar uma vida normal.
Ele refez a compressa e segurou-a nas costas dela, abaixo do
ombro, onde a posição dela teria causado os piores nós. Um
pequeno gemido de alívio escapou dela. Soou para todo o mundo
como uma mulher sendo dada prazer.
Ele empurrou as tiras molhadas de cabelo para fora do
caminho para que ele pudesse fazer o outro lado.
— Como você veio para Londres?
Ela deslizou para cima para que ele pudesse alcançar melhor,
cruzando os braços sobre o corpo para que ele não tentasse espiar.
— Minha família morreu, exceto Mark. Viemos para cá porque
eu conheci Nick Tiler alguns anos antes, onde eu morava. Ele veio
fazer tijolos para uma mansão na região e me deixou brincar com o
barro. Eu esperava que ele me desse trabalho, já que ele havia dito
na época que eu tinha talento. Ela encolheu os ombros. — Eu não
conseguia pensar em outro lugar para ir.
— Onde era a sua casa?
— As marchas ocidentais.
— Temos mais em comum do que criar estátuas, pois a minha
família também vem de lá. Você cruzou toda a largura da Inglaterra?
Esse é um longo caminho para uma mulher e um menino viajarem
sozinhos.
— Eu não tinha ideia de quão longe era quando eu comecei.
Demorou três meses e o pouco dinheiro que eu tinha. Mas Nick me
aceitou, então não foi uma jornada perdida.
Todo o caminho desde as marchas com um jovem irmão a
reboque. Ele ficou impressionado.
Ele mesmo fizera aquela viagem quando tinha cerca da idade
de Mark, com um pai para protegê-lo e moeda suficiente para as
hospedarias. Mesmo assim, tinha sido difícil e às vezes perigoso. Ele
estava fugindo de problemas e buscando um futuro livre, e somente
esses objetivos haviam feito valer a pena. Ele duvidou que ela teria
feito isso apenas para encontrar trabalho em um pátio de azulejos.
Ele colocou a compressa quente na borda de suas costas e
pressionou suas costelas abaixo do braço. As pontas dos dedos
roçaram o suave volume de seu seio. Ela endureceu em objeção,
mas o conforto do calor a derrotou.
— Quando eu era um jovem aprendiz, a esposa do meu mestre
costumava fazer isso —, explicou ele. — Depois de alguns anos meu
corpo se acostumou ao trabalho. Se eu realmente me machucava,
ela também fazia isso. Ele colocou as pontas dos dedos sob os ossos
do ombro e firmemente circulou.
Ela arqueou em choque.
— Isso machuca!
— Isso se torna uma boa dor. Fique quieta.
Ela aceitou e depois deu as boas-vindas. Lentamente, os nós
se suavizaram e ela ficou flácida. A cabeça dela descansou nos
joelhos.
Provavelmente ajudaria as pernas dela também. E os braços.
Ela nunca permitiria isso, mas uma imagem ficou na cabeça dele. Ele
a viu deitada nua em uma cama enquanto ele lentamente passava
as mãos por todo o corpo dela.
— Esta é uma boa casa —, disse ela, para distrair os dois,
como se adivinhasse seus pensamentos. — Maior do que a maioria
na cidade.
— Grande demais para uma pessoa, é o que você quer dizer.
Ganhei algum dinheiro há alguns anos e a coloquei na terra como a
maioria faz. Eu construí a casa com o objetivo de vendê-la.
— Mas você não fez?
— Eu vou um dia, espero. Mas há um poço, que é conveniente,
e um jardim de bom tamanho onde eu possa trabalhar. Eu me
acostumei com os dois luxos. E é a primeira casa da cidade que eu
concebi, então eu tenha uma afeição por isso.
Ela levantou a cabeça e olhou ao redor da cozinha mais
atentamente.
— Você construiu você mesmo?
— O trabalho em pedra.
— Você projetou também? Você é um construtor?
— Eu ajudei um mestre construtor por alguns anos, e comecei
a servir como um na época em que comprei essa propriedade.
Ela torceu para vê-lo. Doía o suficiente para que ela fizesse
uma careta, mas isso não a impediu. Nem o fato de que os braços
cruzados dela dificilmente cobriam seus seios com eficácia.
— É assim que você os serve? Mortimer e a Rainha? Como um
mestre construtor?
Seus olhos azuis brilharam de raiva. Ela usou o tom acusatório
que adotou quando ele a acompanhou até o portão da cidade três
dias antes.
— É como eu sirvo a coroa.
— Então você diz, mas são realmente eles.
— Por enquanto, parece que é.
— Eles gastam a riqueza do reino em seus luxos. Você os
ajudou em sua extravagância?
— Há muitos construtores para a coroa. Meus projetos foram
poucos e não muito extravagantes.
— Mas você espera por mais e melhores.
Sua provocação beligerante o irritou.
— É meu ofício e minha habilidade e como eu como. Sim,
espero por melhores.
Ela estava cavando algo, e ele se ressentiu de sua abordagem.
Ruim o suficiente para debater suas escolhas em seu coração. Ele
não precisava dessa mulher forçando-o em palavras.
Ela não recuou.
— Você disse naquele dia que não trabalha nas paredes do
castelo deles, mas um dia será pedido para você, não é? Não
esculpir arabescos, mas planejar e projetar as fortalezas e as
fortificações. Quando Mortimer rouba uma propriedade, ele chama
um de seus construtores para vir e melhorar as defesas que
falharam em seu ataque. Um dia esse construtor será você, não
será?
— Eu duvido disso. Eu não sou um dos favoritos dele.
— Você diz a si mesmo isso, mas você sabe que o dia chegará.
Você é jovem para um mestre construtor. Isso significa que você é
mais habilidoso do que a maioria. Quando se trata das paredes que
sustentam o poder, habilidade é o que importa.
— Você não sabe do que está falando. Habilidade raramente é
tudo que importa neste mundo.
Ela olhou com desprezo por seu rosto e corpo.
— Eu acho que você já fez sua escolha, em seu coração. Você
fará o que for pedido se a moeda está certa, e dirá que você só
aumenta seu ofício. Você provavelmente dirá a si mesmo que não
importa, que não é o ato de um homem que faz com que a injustiça
continue.
Ele se ressentia como o inferno daquele olhar sabido. Uma
pequena fúria rodopiou em sua cabeça.
— Se eu disser a mim mesmo isso, será porque é verdade. Eu
sou pedreiro, mulher, não um cavaleiro ou barão. Os maçons
constroem estruturas. Outros constroem o poder e o mundo.
— Os maçons são como os homens que fazem máquinas de
cerco. Eles não podem levantar uma espada, mas não pode haver
guerra e nenhum poder, sem eles.
— Você tem uma raiva profunda sobre algo muito acima de
você. Como todas as pessoas ignorantes, você vê o mundo de forma
muito simples, e expressa opiniões estúpidas com ousadia.
— Eu não sou tão ignorante e estúpida que eu não conheça
um lacaio quando vejo um.
Lacaio.
— O que você vê é um homem rapidamente lamentando um
ato impulsivo de caridade e ficando muito irritado por ter sido
insultado em sua própria casa. Não me culpe pela injustiça neste
reino. Se você acha que um pedreiro pode mudar qualquer coisa,
você está enganada.
— Qualquer um com coração e determinação pode mudá-lo.
Maçons e agricultores e até mesmo...
— E mesmo ladrilhadores? Se você acredita nisso, você está
pior do que enganada. Você é uma sonhadora e uma tola.
Ela reagiu como se ele tivesse batido nela.
— Melhor tola do que vítima voluntária! Melhor sonhos que dão
propósito, do que resignação que amortece a vontade de alguém!
Ela parecia meio louca, quase desesperada. Ele ouviu
acusações em seu grito, mas também algo mais, como se ela
proclamasse isso por sua própria causa, em vez de insultá-lo. Ainda
assim, o insulto estava presente e sua raiva aumentou em resposta.
Não era uma raiva normal. Tinha sido misturado com um
desejo espantoso durante toda essa discussão.
Ele queria silenciar essa mulher corajosa e ingrata que lançava
insultos mais mordazes do que imaginava. Não com a mão ou
palavras, mas com um beijo. Ele queria abraçar sua paixão rebelde e
transformá-la em um fogo mais imediato.
A imagem de uma tomada febril entrou em sua cabeça
enquanto ela olhou para ele. Não ajudava que a discussão a fizesse
indiferente à sua nudez. A visão clara de seus seios e coxas só
tornava sua imaginação mais vívida. A quente e tumultuosa fantasia
derrotou seu controle de uma forma que as intimidades físicas não
conseguiram. Sua expressão desafiadora apenas inflamou os
impulsos que ele estava lutando. Ele tinha que pegá-la e tornar isso
real ou sair.

Ele estava com raiva. Ela não se importava.


Sua cabeça se partiu com indignação lívida. Como ele ousa
chamá-la de tola? O que esse pedreiro sabia sobre ela e seus
sonhos? Como ele poderia entender algo disso? Sem dúvida, desde
que seus honorários fossem pagos, não havia injustiça no mundo
que valesse a pena para ele.
Ele olhou para ela enquanto o silêncio ecoava com suas
palavras furiosas. Foi longo o suficiente para ela perceber que mais
do que raiva havia colocado em seu rosto essa expressão severa e
mais do que fúria causou aqueles reflexos de aço. Seu olhar vagou
por ela, e de repente ela ficou alerta para o que ele viu. Ela havia se
esquecido de sua nudez no calor de suas emoções, mas ele não
tinha.
Ele ia tocá-la, com raiva e desejo. Ela podia ver o impulso
naqueles olhos azuis.
Bom. Então ela poderia bater nele. Ela queria. Ela precisava
afastar as dúvidas às quais suas palavras cruéis haviam dado voz.
Dúvidas que viviam em seu próprio coração, mas que ela guardava
em silêncio, a fim de que não lhe roubassem nenhum motivo para
viver.
Ele mudou. Por um instante sem fôlego, ela se preparou.
Ele não a alcançou. Ele se levantou para pegar o último balde
da lareira e derramou seu conteúdo fumegante para renovar o calor
do banho então saiu da câmara.
Ela recolheu suas emoções e se acalmou, e deslizou na água.
O último balde tornara o banho maravilhosamente quente de novo,
e isso acalmava sua alma tanto quanto seu corpo.
Ela não poderia ter realmente obtido o benefício se ele ainda
estivesse por perto, mesmo que ela não tivesse visto o perigo dele
naqueles últimos momentos. Seu corpo pode ter se soltado sob suas
compressas e dedos, mas em seu núcleo uma consciência dele
torceu e amarrou todo o tempo em que ele se ajoelhou atrás dela.
Ele não tinha procurado por ela, mas ele queria. Não apenas
no final, mas a partir do momento em que ele a levou para esta
casa. Não, desde a primeira vez que ele falou com ela. Estava ali,
grosso, como a umidade que subia do banho.
Eventualmente...
A água de repente perdeu seu calor. Um calafrio abalou-a até
os dedos dos pés.
Era hora de sair desta casa.
Empurrando-se para cima, ela testou suas pernas. Eles não
mais pareciam separados do corpo dela. Com cuidado, ela saiu da
banheira. Curvar-se para pegar a toalha quase a fez cair, mas ela
pegou e se secou rapidamente.
Ela podia andar agora. Lentamente. Rigidamente. Ela foi até o
banco. Agarrando o banco para se equilibrar, ela se inclinou para o
vestido.
Ela ergueu a roupa manchada e esfarrapada. Cheirava. Deu a
volta no nó onde Rhys havia amarrado a saia rasgada. Remendar
não iria consertar isso, nem mergulhar no rio nunca deixaria limpo.
Ela parecia uma tola, uma pobre mulher se exibindo em trapos
de melhor qualidade. Mas fora tudo o que ela precisava usar e agora
não tinha nada.
Ela precisava comprar uma roupa nova. Levaria um de seus
preciosos xelins, e ela conseguiria pouco mais que outro trapo na
barganha.
Isso a frustrou tanto que ela cerrou os dentes para contê-lo.
Os xelins não eram para isso. Ela não era escrava no calor apenas
para se alimentar e se vestir. Ela trabalhava e trabalhava para um
propósito, para um sonho. Só que o sonho permaneceu para
sempre, fora de alcance, não importava o quanto ela se esforçasse
para alcançar, porque a necessidade de sobreviver manteve-se
frustrando-a.
Uma sonhadora e uma tola. As palavras de Rhys ecoaram em
seus ouvidos, e parte da raiva voltou, misturando-se com a
frustração. Ela piscou para conter as lágrimas de ressentimento.
Não era tolice sonhar com a justiça. E de alguma forma, algum
dia, ela tornaria o sonho real, para ela e Mark. Ela encontraria
dinheiro o suficiente para contratar um campeão para lutar por ela.
Ela enviaria um valente cavaleiro para vingar o pior, e talvez até
para devolver a vida que lhes fora roubada.
Ela faria certo, ou ela morreria tentando.
Ela jogou a toalha de lado. Virando o vestido, ela o abaixou
para se vestir. A luz do fogo cintilou em alguns pontos de bordado.
Ela parou e olhou fixamente. A luta saiu dela e uma profunda
tristeza tomou o seu lugar.
Os pequenos pontos cresceram e derreteram quando sua visão
ficou embaçada. Ela tinha visto aquela decoração perfeitamente
trabalhada ao longo dos ombros em uma trepadeira cintilante de
hera. O vestido estava tão bonito em sua cor cinza.
Tão maravilhosamente impraticável, como convinha a um
vestido de casamento.
Agora estava imundo e irregular, como a vida que simbolizava.
Só um golpe de sorte perversa a trouxe das marchas. Ela o usava na
noite em que saíra porque a luxúria e a vaidade de um homem
tornavam seu humor cruel.
— Este vestido, Joan. Eu quero que você use esta noite. E você
virá para minha cama. Você virá neste vestido, e removerá enquanto
eu assisto, e então você se ajoelhará aos meus pés e implorará pelo
meu favor.
Ela ouviu as palavras novamente, como se elas fossem
sussurradas em seus ouvidos. A respiração dela encurtou, como se
um punho apertando tirasse o ar dela. Lágrimas a cegaram.
Sua mente agarrou-se desesperadamente ao sonho vivificante,
que era tudo que a mantinha forte.
Um movimento rompeu a memória doentia. Uma presença
apareceu ao lado dela.
Rhys ficou ali, segurando uma longa roupa de cama. Seu olhar
deslizou pela nudez dela, depois até o rosto dela.
A preocupação entrou em seus olhos azuis, não raiva ou
luxúria.
Ele colocou a roupa ao redor dela. Seus braços circularam seus
ombros até que o pano a envolveu. Eles descansaram nela por um
momento, como uma tentativa de conforto. Braços fortes. Se ela se
afundasse contra eles, nunca cairia.
Ele se afastou e gesticulou para o pano cinza pendurado em
sua mão.
— Você não pode usar isso. Não é adequado para mais do que
embrulhar sua louça.
— Vai servir até eu comprar outro.
— Você não pode dormir nele. Vamos ver o que podemos fazer
com ele no dia seguinte.
Ela sacudiu e deu um passo para dentro.
— Não. Eu vou...
— Você não vai. Nem vai tentar ir para casa como você pensou
em tentar.
— Meu irmão...
Ele tirou a roupa da mão dela e a colocou de lado.
— Deixe-o se preocupar. Eu aposto que você fez tantas vezes
quando ele não voltou de uma noitada. Amanhã ele ficará tão
aliviado que você está segura que ele lhe obedecerá por alguns dias.
Não discuta comigo. Não pode retornar hoje à noite. É tarde demais
e você precisa descansar.
Ele não esperou pela resposta dela. Ele levantou-a nos braços
e levou-a para fora da cozinha.
Escuridão e escadas. Ela não conseguia ver nada, nem mesmo
ele. Mas ela sentiu os braços dele através da cortina, embalando
seus ombros e joelhos. E ela sentiu o peito e a respiração dele.
Ele a abaixou. Em uma cama. Um colchão de penas. Fazia
anos... Ela afundou nisso. Seu corpo gemeu de prazer. Então
congelou quando a precaução a agarrou rígida.
Um colchão de penas. Provavelmente sua cama.
Ela começou a protestar, mas as botas soaram nas tábuas.
— Vá dormir, Joan.
Ela esperou até que seus passos se distanciassem. Ele havia
descido as escadas. As colinas de penas a apoiavam como nuvens,
tentando-a dolorosamente.
Seus olhos se ajustaram ao luar sombrio. Ela podia ver pela
janela. Um pedaço de céu aparecia acima do teto pontudo de uma
casa do outro lado da rua. Algumas estrelas manchando a escuridão.
Eles brilhavam e se multiplicavam enquanto ela ficava sonolenta.

Rhys esvaziou o banho e limpou o chão molhado. Ele pendurou


a toalha e a camisa. Inclinando-se para terminar o trabalho, ele
arrancou o vestido.
Em sua mente, ele a viu novamente como a tinha visto quando
ele entrou com a roupa de cama. Ela estava em pé diante do fogo,
completamente nua, suas tranças úmidas pendendo como
trepadeiras sobre os seios e as costas. Ela tinha estado
incrivelmente adorável e totalmente imóvel. Ela estava olhando para
este vestido como se tivesse entrado em transe.
Ele nunca esqueceria a expressão no rosto dela. Raiva ardente.
Desdém tremendo. Não para o vestido sujo. Para outra coisa, em
sua cabeça e coração.
Ela parecia completamente perdida por um momento quando
ela o encarou. Tão perdida que sua nudez não importava para ele,
mais do que para ela. As palavras duras que trocaram de repente
não significavam nada. Ele a teria tomado em seus braços para
oferecer algum conforto, se o momento não tivesse passado.
Ele dobrou o vestido e colocou-o no banco. O pano era muito
caro. Poderia ainda ser de alguma utilidade para ela.
Ele voltou para o quarto. Ela deveria estar dormindo agora. Ele
duvidava que ela iria se mexer por muitas horas.
Deitou-se de lado com o linho enrolado sob os braços,
envolvendo-a em dobras fantasmagóricas até os tornozelos. Seu
cabelo seco se espalhava ao redor dela, um halo de ouro alcançando
o luar. Ela parecia com um anjo adormecido.
Ele tirou as botas e se esticou ao lado dela, ao longo da borda
da cama. Ele tinha trabalho para fazer de manhã e não podia arcar
com a dor de dormir no chão. Ela iria acordar muito depois dele,
então dividir uma cama não a assustaria. Era grande o suficiente
para dois e ela estava morta para o mundo.
Ele não estava, no entanto. Nem estava morto para ela. Levou
mais tempo do que deveria para ele adormecer.
Tê-la ao lado dele parecia estranhamente normal,
considerando que ela era quase uma estranha. Outras mulheres
tinham deitado lá, às vezes, mulheres com quem ele tinha maior
familiaridade. Distrações, às vezes procuradas e outras não, de
outras partes mais importantes de sua vida.
Joan não perturbou a cama assim. Equilibrou-o, como se seu
peso tivesse sido projetado para se ajustar ao vazio que esperava
ali.
Ela se virou durante o sono e encolheu-se contra ele como
uma criança ferida em busca de proteção. Seus joelhos
pressionaram as costas dele e sua respiração aqueceu seu ombro.
Ele não fez nada para movê-la, ou a si mesmo.
Capítulo IV
Eles ficaram perto do padre. A carnificina pela qual eles
passaram a fez querer vomitar. Ela continuou apertando a mão de
Mark para incentivar a sugestão de ser corajosa. Consolá-lo era tudo
o que mantinha a compostura intacta.
Eles tentaram em vão evitar as poças de sangue. Ao redor
deles soldados estavam tirando dos mortos armas e roupas. Sons de
festa e celebração soaram pelo quintal. O mesmo aconteceu com os
lamentos de outras mulheres e crianças que haviam entrado no
pátio para reivindicar seus homens mortos.
O padre fez uma pausa e gritou para Deus. Ele se virou para
ela, sua expressão lamentável.
— Joan, não...
— Vou vê-lo e fazer uma oração sobre ele. Fique de lado.
Ele hesitou, e então se moveu para revelar o homem que ele
bloqueara de vista.
Sua respiração ficou presa. Mark começou a chorar. Ela o
abraçou, mas não desviou o olhar.
Seu pai estava lá, sua armadura com listras vermelhas
pegajosas. Seu capacete havia sumido e uma expressão desafiadora
ainda mascarava seu rosto.
Um desfiladeiro escuro cortou sua garganta e ombro de onde o
golpe da morte havia quebrado sua vida.
Sua espada não estava em sua mão, mas em sua bainha.
O horror disso a entorpeceu. Ela já tinha visto a morte antes,
mas não assim. Sua mente ficou atordoada quando seu espírito
tentou recuar.
Uma voz. Um chamado. Ela mal ouviu enquanto lutava para
acreditar que isso era apenas um sonho.
Um toque no ombro dela. As visões e sons no pátio atacaram-
na novamente. Ela rosnou ressentimento na direção do homem que
a tocou.
Os sacerdotes se afastaram, mas ele apontou para a fortaleza.
Ela virou. Um cavaleiro armado estava na frente da porta. Ela o
reconheceu.
Guy Leighton. O vencedor. O conquistador.
Foi sua voz. Seu chamado. Agora ele gesticulou para o padre.
E ela.
O padre gentilmente pegou o braço dela, empurrando-a para
frente.
— Deus nunca abandona os fracos, ele sussurrou. Seu reino
não é deste mundo. Tudo o que está aqui passa.
Ela olhou para o pai. A imagem dele deitado ali nunca passaria.
Ela sacudiu a mão do padre e caminhou para frente. Mark
também encontrou força e saiu do abraço. A comoção no quintal
acalmou-se um pouco e os soldados se separaram para formar um
corredor através da destruição.
O vencedor esperou. Com o visor para baixo, ele era todo de
aço e sangue, nada mais. Ele ainda segurava sua espada
desembainhada.
Ela parou na frente dele.
Ele gesticulou para um escudeiro ao seu lado, e o jovem
levantou a mão e removeu o capacete. Não apenas aço e sangue,
mas um homem com olhos incendiados pelo inferno.
O olhar daqueles olhos pousou em Mark. Seu coração começou
uma batida horrível. Ainda havia morte neste cavaleiro. Ele gostava
do poder de matar.
Mark também viu, mas não quebrou. Ele se endireitou, como
se desafiando o homem a fazê-lo. Talvez como ela, ele desejava ser
poupado da miséria de recordar esse dia.
— Ele é apenas um menino ―, disse ela. Não saiu mais do que
um sussurro. — Você não precisa fazer isso.
O olhar quente se deslocou para ela.
Um longo olhar, com fogos diferentes substituindo lentamente
os da morte. Apenas tão infernal quanto, no entanto. Tão perigoso.
Ela nunca tinha estado tão sozinha, tão desprotegida, como ela
esteve durante a sua sinuosa inspeção.
Ele estendeu a mão e ergueu o queixo com o aço da luva para
que pudesse inspecionar o rosto dela mais diretamente.
— Sim. Talvez eu não precise fazer isso.

Uma dor em seu ombro a chocou e a levantou abruptamente


das profundezas do sono. Ela cambaleou em direção à consciência
em um confuso e sonolento torpor. Ela vagamente sentiu o leito de
penas abaixo dela. Ela sentiu o corpo ao lado dela.
Guy Leighton.
O pesadelo de repente cresceu real e imediato.
Uma desolação horrível tomou conta dela. Uma sensação
desesperada de estar presa espalhou pelo seu peito, tornando-se
tão intensa que ela não conseguia respirar. A falta de ar a apavorou.
Seu corpo inteiro tremeu enquanto ela lutava por ar.
Ele se levantou e se virou. Seu coração gemeu em desespero e
encolheu-se para algo muito pequeno.
— Joan? Tem alguma coisa errada? Você está doente?
A voz calma penetrou seu desespero. A última sombra do sono
se dissipou. De repente, ela viu mais nitidamente, mais claramente,
quando o tempo e o lugar se firmaram.
Não era Guy.
Alívio a encharcou. Maravilhoso e grato alívio. Ela parecia ter
sido arrastada para a praia depois de quase se afogar, tão física era
a sensação de salvação.
Claro que não era Guy. Não havia perigo disso. Ela estava livre.
Ela e Mark haviam escapado.
O homem olhou para ela. Cabelo emoldurava seu rosto e luzes
brilhavam nas sombras escuras de seus olhos. Não era Guy, era
Rhys. Ele deve ter se juntado a ela depois que ela adormeceu.
Ela fechou os olhos e ficou muito quieta, esperando que ele a
achasse adormecida. Ela sabia que isso não era realmente
necessário. Rhys não iria machucá-la. Se ele ainda não tivesse feito
isso, não o faria agora.
Ele se acomodou ao lado dela e adormeceu novamente.
Ela deveria sair desta cama, mas seu alívio foi tão completo
que não deixou espaço para o medo. Ela achou sua presença
dominante muito reconfortante.
A lembrança do pesadelo queria permanecer vívida.
Ela continuou beliscando sua mente e mostrando seu horror.
Certamente voltaria se ela dormisse.
Ela instintivamente procurou o conforto da força calma de
Rhys. Ela se aconchegou contra ele, como se servisse de proteção
contra o velho horror. Em seu sono, ele moveu o braço até que ele a
circulou, dando abrigo.
Isso deveria assustá-la, mas não aconteceu. Mas sim a fez se
sentir deliciosamente segura.
A cama de penas era maravilhosa. Limpa e não profanada. Ela
ouviu a respiração regular perto de sua orelha, e seu ritmo
reconfortante a levou de volta ao sono.
Os sons da cidade a despertaram. Eles entraram pela janela
aberta com a luz do sol. Uma linda brisa fresca fluiu sobre seu
corpo.
Seu corpo nu. Ela olhou para as roupas de cama ao redor dela.
Ela piscou o sono e lembrou onde ela estava. E se lembrou do
pesadelo meio acordado. Ela sentiu novamente o terrível pânico
antes de perceber que o homem ao lado dela era Rhys.
Ela olhou ao redor da câmara enquanto resistia à tentação de
se afastar novamente. Para um homem que possuía uma casa
ampla, ele vivia de forma simples. A sala só tinha alguns baús de
roupa e um banco.
Ela se sentou. A rigidez da noite anterior havia diminuído um
pouco. Ela podia se mover sem muita dor agora. Ela tentou as
costas e o pescoço para ver como estavam as coisas e olhou para a
nudez dela novamente. Ela dormiu ao lado dele assim.
Uma pilha de pano na beira da cama chamou sua atenção. Ela
alcançou. Vestuário. Três vestidos e um turno3. Ela sacudiu o
primeiro para inspeção. Era um simples manto verde sem
decoração, mas de tecido de boa qualidade.
O barulho da rua capturou sua atenção. O mesmo aconteceu
com uma dor no estômago. O dia estava meio terminado. Ela
precisava se pôr a caminho imediatamente. Ela já havia ficado muito
tempo nesta casa de propriedade de um dos empregados de
Mortimer.
Ela se levantou e vestiu o vestido verde. Pertencia a uma
mulher maior. Um ombro ameaçou escorregar pelo braço dela. O
laço curto no pescoço não ajudava muito, não importando o quanto
ela o puxasse com força.
Fazendo o melhor que podia, ela levantou as outras roupas em
seus braços e deixou a câmara.
O solar também continha pouca mobília, apenas uma mesa,
cadeira e alguns bancos. Ela olhou em um cômodo no outro
extremo. Uma pequena sala de trabalho, continha apenas uma mesa
e um banco. Ele não parecia ser um homem muito interessado em
objetos. Ela teve a sensação de uma pessoa solitária, preocupada
com outras coisas além de confortos e rotinas típicas.
Ela desceu ao nível mais baixo, apenas um grande salão de
aparência fresca. Ela passou para a cozinha na parte de trás.
Impecável. Não utilizada. Sons de tilintar vieram do jardim e ela os
seguiu.
Ela agradeceria por sua ajuda e partiria. Suas pernas ainda
doíam, mas elas a levariam de volta para o pátio de azulejos.
Rhys montou um banco à sombra de um espinheiro. Apoiado
na frente dele, em uma tábua inclinada de bom comprimento,
estava uma mulher de pedra. Ele se inclinou sobre ela com martelo
e cinzel, cuidadosamente cortando as dobras de suas vestes.
Ele parecia estar esculpindo um santo. Partes eram apenas
desbastadas, mas outras seções estavam quase terminadas.
Era um trabalho duro. Mesmo com a brisa, seu peito
bronzeado mostrava um brilho de suor. Ele usava apenas calças de
couro. Não se arriscaria bom pano a pedra áspera e cinzéis afiados.
Ele se endireitou e inspecionou enquanto afastava os pedaços
pequenos. Ela reconheceu a posição angulosa da cabeça e o olhar
criterioso. Era assim que ela fazia suas pequenas estátuas.
Pensamento e depois trabalho. Decisões e, em seguida, ação.
Seus olhos gentis podiam crescer incrivelmente intensos em
momentos como esse, quando ele contemplava alguma coisa.
Admirando seu perfil, ela percebeu que seu belo rosto vinha de
bons ossos e não se desvanecia com a idade, ao contrário dos rostos
de homens mais suaves.
Ele se inclinou e virou uma roda embaixo do banco. O santo
inclinou-se mais alto até quase estar em pé. Ele saiu do banco e
levantou uma ferramenta diferente.
Ele a notou e fez uma pausa. Seu olhar era mais direto e mais
familiar do que o esperado de um novo amigo. Os acontecimentos
de ontem à noite, especialmente de compartilhar uma cama,
mudaram as coisas. Eles haviam criado uma intimidade primitiva que
ele não parecia inclinado a ignorar.
Uma lembrança da noite invadiu sua mente. De seus carinhos
ao lado dele. Dele segurando-a. Ele também se lembrava. Estava em
seus olhos e modos, como se ela tivesse concedido a ele certos
direitos com aquele abraço.
Ela tinha sido estúpida. Quebrada, fraca e descuidada. Ela
deveria sair dali. Ela pegaria seu vestido velho, mudaria para ele,
entregaria a ele essas roupas e partiria. Havia perigo nessa amizade
com um construtor da coroa.
Ele gesticulou para a árvore.
— Aqui há cerveja e queijo. Venha e coma.
Ela ouviu um tom de ordem, como se ele tivesse adivinhado o
impulso dela de fugir. Talvez ele tenha visto o medo. Não apenas o
grande com que ela vivia todos os dias, mas também um novo e
pequeno. Este homem bonito, com sua força talhada na rocha,
continuava lhe dando santuário, mas ele também a fazia se sentir
muito vulnerável.
A dor oca no estômago tomou a decisão por ela. Não haveria
nada para comer no pátio de azulejos.
Um pouco mais de tempo não poderia doer. Ela andou em
volta dele e encontrou uma mesa rústica enfiada na parede do
jardim. Pranchas simples haviam sido colocadas em cima de blocos
de pedra. Pão, queijo e bebida esperavam sob panos limpos.
Rhys continuou com o cinzel. Ela gostava de vê-lo trabalhar.
Ele possuía uma força diferente de um lutador, mais magro e mais
definido. A pedra esculpida criara lajes lisas e ondulações apertadas.
Ele fez uma pausa para uma longa inspeção, depois largou
suas ferramentas. Ele caminhou até um poço perto da parede mais
distante e derramou água sobre sua cabeça e corpo. Pingando com
pequenos riachos que serpenteavam pelo seu peito, ele voltou e se
sentou ao lado dela.
Ele puxou a amarra do cabelo e passou os cabelos escuros
para trás com os dedos. A luz do sol atravessava as folhas,
dançando sobre os ângulos de seu rosto e fazendo seus olhos azuis
brilharem.
O humor latente dos eventos da noite passada se intensificou.
À luz do dia e à brisa fresca, pareciam sonhadores, mas muito
presentes. Sua proximidade a deixava nervosa. Ela quase saltou de
sua pele quando ele se aproximou e casualmente começou a
desembaraçar os nós de seu cabelo.
Ela serviu-lhe um pouco de cerveja.
— Que santo será?
— Úrsula. É para a igreja paroquial. Eu disse que se eles
comprassem a pedra, eu iria trabalhar. Ele sorriu e essas rugas
encantadoras se formaram.
— O padre me prometeu uma indulgência no pagamento.
— Mas nenhuma moeda, eu garanto.
Ele riu.
— Sim, de uma igreja paroquial, sem moeda. Claro.
— Espero que a indulgência seja muito grande.
— Enorme. Entre a estátua e minha virtude na noite passada,
eu deveria ir direto para o céu.
Ela decidiu ignorar a referência fácil para a noite passada, mas
sabia em seu coração que ele não estava falando de seus atos de
bom samaritano.
— É um trabalho duro. Minhas estátuas são brincadeira de
criança em comparação.
— Elas são diferentes, mas não são mais fáceis. Eu sou
desajeitado com barro. Olha. Ele alcançou uma caixa perto da
parede e levantou uma pequena moita seca. Era um modelo para o
seu santo, mas apenas da maneira mais áspera.
— Eu só preciso das grandes formas como guia. O resto está
na minha cabeça. Também não posso moldar nem trabalhar tão
pequeno.
— E eu não posso imaginar lascar pedra que não pode ser
colocada de volta. E se você cometer um erro?
— Bem, nós pedreiros tentamos muito não fazer isso. Ele
empurrou a tábua de queijo para ela. — Coma. Ele pegou as pontas
do cabelo dela novamente, penteando com os dedos. Ele não estava
realmente tocando-a, mas parecia que ele estava, e ela ficou muito
consciente disso. Ele agia como se o que já havia passado entre eles
fizesse dessa informalidade uma questão menor.
Ela deveria ir embora. Agora. Sua alma sabia disso.
Mas o queijo tinha um sabor maravilhoso e rico e seu
estômago parecia muito vazio. Ela mal resistiu engolindo todo o
pedaço.
— Coma tudo —, Rhys ordenou gentilmente.
— Você pensa em me engordar?
— Eu acho que você dá ao seu irmão a maior parte de suas
porções e que eventualmente isso prejudicará a sua saúde. Se daqui
a pouco eu vou para uma taverna e pego um pouco de carne, eu
aposto que você dará tudo ao seu irmão.
— Estou começando a me sentir como um cão vadio de quem
você teve pena. Um banho, um pouco de comida, um pouco de
higiene. Se você me der carne também, vou encher esse vestido
antes de ir embora. Onde você encontrou isso? Você andou pela
estrada pedindo caridade para mim?
— Eu tenho uma amiga na ala. Ela é proprietária de uma
pousada próxima e tem um coração generoso. Eu visitei enquanto
você dormia esta manhã. Ela estava feliz em compartilhar sua boa
sorte. Ele olhou para o vestido que caía de seus ombros. — Eu sabia
que eles seriam muito grandes, já que a Moira é mais...
— Mulher?
— Você é muito feminina, Joan. Ela é muito... abundante. Ele
penteou os dedos um pouco mais alto.
Mais perto.
Ela tocou as outras roupas que ela colocou na mesa.
— Abundante em sua bondade também. Ela é sua amante?
Isso realmente divertiu ele.
— Se ela fosse, ela dificilmente me daria vestidos para vestir
uma mulher que tinha acabado de dormir na minha cama.
Ela realmente poderia ter passado sem que ele mencionasse
isso. Tê-lo pendurado no ar ao redor deles era ruim o suficiente.
— Apenas uma velha amiga ―, ele continuou. — O marido dela
é um lorde, e de bom grado me mataria se eu sequer pensasse em
algo mais.
Seu marido é um lorde. A paz deixou o jardim imediatamente.
A brisa fresca ficou fria. Isso era o que ela temia. Mesmo com
bondade, ele poderia colocá-la em perigo.
— Não. E eu não posso aceitar essas roupas também. Vou
colocar meu vestido velho antes de sair, e você vai devolver estes
para ela.
— Eu não posso devolvê-los. Isso iria insultar o doador. Nem
eu tenho qualquer utilidade para eles. Você também pode mantê-
los.
— Eu não quero a caridade dela e também não quero a sua.
Ele sorriu para o cabelo em suas mãos, em seguida, colocou as
tranças sobre o ombro enquanto olhava diretamente em seus olhos.
— A caridade implica doações altruístas, Joan. Moira tem
motivos puros, mas nós dois sabemos que eu não.
Sua franqueza tranquila a desanimou mais que um inesperado
apalpar. Ela tinha muita experiência com avanços brutos ou
maliciosos. Sua raiva sempre lhe servia bem então.
Pelo menos ele lhe dera um aviso justo, mas, com toda a
honestidade, aquele olhar quando ela saíra de casa, também. Ela
começou a se levantar.
— Eu tenho que ir agora. Já é tarde e eu tenho demorado
muito tempo.
Seus dedos se fecharam em seu pulso, parando-a.
— Você não tem que correr como um coelho de um lobo.
Ela acenou com a cabeça ao seu alcance de forma significativa.
— Eu não tenho?
— Eu não falei de nada que já não sabíamos. Nem isso vem só
de mim.
— Você certamente é um homem corajosamente confiante.
— Confiante o suficiente. E não tão ousado, apenas experiente
o suficiente para saber quando eu perco meu tempo, e quando eu
não o faço. Agora sente-se. O dia já passou e você ainda está
dolorida. O pátio de azulejos estará lá no dia seguinte.
Ele a segurou até que ela se sentou, então a soltou. Ela pegou
os restos do queijo e decidiu ser tão franca quanto ele.
— Você está dizendo que eu deveria ficar até o dia seguinte?
— Sim.
Ela assentiu com resignação.
— Então você espera o reembolso. Mestre Rhys, que preço
você coloca em um banho, uma cama e um pouco de cerveja e
queijo?
— Eu não sei. Quantas moedas você tem?
— Nenhuma, e você sabe disso.
Ele sorriu pensativo.
— Ah. Então devemos encontrar outro caminho.
— Não do jeito que você quer, confie em mim.
— Eu estava brincando com você, Joan. Você é uma mulher
muito desconfiada.
— Não muito desconfiada. Apenas não inocente.
— Você sabe em seu coração que eu não espero nada como
pagamento. Se eu fizesse, eu já teria tentado reivindicá-lo. Ontem à
noite, quando você não saiu da minha cama, ou esta manhã,
enquanto você estava nua em meus braços.
Falar sem rodeios disso novamente provocou uma reação
alarmante nela. Um pouco de calor físico desceu do coração dela.
Parecia muito com a cautela usual, mas excitante.
— Eu estava esperando que você seria bom o suficiente para
não falar disso.
— Isso significaria fingir que não aconteceu. Eu não sou tão
bom assim.
— Eu não procurei sua cama. Nem esperei compartilhar com
você.
— Você sabia que eu estava lá. Você acordou e me viu.
— Eu não me lembro disso. Eu não devo ter acordado
completamente. Ela mentiu descaradamente, sem ousar admitir que
ela havia permitido tal coisa.
— Despertou o suficiente, mas não é isso que importa. Nós
dois sabemos que eu quero você, mas eu não aceitaria você em
pagamento, mesmo que você oferecesse.
Ela deveria ter se sentido mais aliviada, mas o desejo se
sentou entre eles agora, como um fantasma dando substância por
sua honestidade. Seu coração bateu rapidamente em resposta à sua
presença.
— O que, então?
Ele acariciou os dedos no cabelo dela até que ele segurou a
cabeça dela. Ele olhou para ela com o calor de um homem. Não
ousado, mas confiante e experiente.
— Eu peço apenas um beijo, e não como pagamento.
Capítulo V
― Não? ele perguntou suavemente.
Ela quase o parou, porque isso arruinaria tudo. As lembranças
de sua bondade morreriam.
Talvez isso fosse o melhor. Isso deveria destruir essa agitação
estúpida e feminina que a preenchia agora. E isso seria uma espécie
de pagamento. Ela poderia sair, não sentindo que lhe devia algo
pela ajuda dele.
— Sim. Mas apenas um pequeno beijo curto.
— Nós vamos parar quando quiser.
Ela preparou todo o seu ser para o ataque. E então a gentileza
a confundiu ainda mais. Apenas um toque quente de lábios. Uma
carícia cuidadosa de sua boca na dela.
Para sua perplexidade, isso não a enojou. Acordou um
formigamento em suas bochechas. Ele continuou fazendo isso,
fazendo aquele beijo em uma dúzia de toques e beliscões, e a
sensação se espalhou por seu rosto e pelo pescoço e começou a
descer ainda mais. Ele parecia estar provocando seus lábios com
uma pena.
Ele parou. Ela olhou para ele, com medo do que veria em seus
olhos. Sua expressão a surpreendeu. Um desejo frágil mostrou, mas
não fome feroz. Calor profundo suavizou seu interesse masculino,
transformando-o em algo que não insultava, mas lisonjeava.
Eles ainda estavam sentados separados, seus corpos angulados
se encontrando no espaço. Ele a beijou novamente.
Mais firme. Mais forte. Não um pedido, mas uma demanda. A
sensação trêmula baixou como um rubor interno, deslizando por ela.
Uma inundação de formigamentos flutuou dentro dela. Em toda
parte. Na cabeça dela, nas pernas e nos seios. Eles pulsaram
rapidamente. Seu total espanto a deixou desamparada.
Não era para ser assim.
Rhys recostou-se contra a parede e a empurrou para ele. O
ângulo inclinado a deixou instável.
A tontura também. Seu equilíbrio cambaleou. Ela se atrapalhou
para se segurar e as palmas das mãos pousaram no peito dele.
Calor delicioso fluiu em suas mãos. Apenas o suficiente para
acalmar e tornar sua pele sensível à sua pele e músculos tensos. Ele
era duro e suave e quente, tudo ao mesmo tempo.
Ele a manteve lá, apenas segurando a parte de trás de sua
cabeça. Apenas seu braço estendido apoiava seu corpo inclinado
enquanto ela se apoiava contra seu peito. Ele parou o beijo e olhou
nos olhos dela. Seu olhar profundo a fez tremer ainda mais do que
aquele beijo tinha feito.
— Você não beija de volta, Joan?
Ela sentiu seu rosto queimar.
— Não.
— Nunca?
— Não. Seu olhar baixou para onde suas mãos bronzeadas se
espalharam sobre seu peito bronzeado. Pedaços de luz solar
movendo-se dançaram sobre sua pele.
— Eu nunca quis.
Seus dedos gentilmente serpentearam através do cabelo em
seu couro cabeludo. Ele levantou o queixo com a outra mão para
que ela tivesse que olhar para o rosto dele novamente. Sua
expressão a deixou sem fôlego. Intenso e sabedor. Duro e macio e
quente, assim como o corpo dele.
— Isso não é verdade. Você quer agora.
Suave pressão na cabeça dela. Um braço forte a guiando. Não
para a boca dele. Mais abaixo, até que seus lábios descansaram em
seu peito, acima de suas palmas.
O leve sabor, o cheiro, fez seus pensamentos se confundirem.
Todos os seus sentidos se encheram com ele. Ela realmente não
decidiu, apenas aconteceu. Ela beijou e moveu os lábios e beijou
novamente. Um prazer rico começou a pulsar como uma respiração
rápida. Ela moveu a mão e beijou novamente. Seu braço abaixou
para abraçá-la e sua boca pressionou seu cabelo. Ela sentiu uma
tensão aumentar nele, mas não parecia ameaçador. Suas
apreensões foram derrotadas, vencidas pela deliciosa sensualidade
que animava seu corpo.
Ela impulsivamente beijou o entalhe no centro do peito, no
colarinho e depois no pescoço. Ele segurou-a para ele, encorajando-
a. Quando ela virou o rosto para cima, ele estava esperando.
Não gentil. Ela não se importou com a expressão apaixonada
de sua excitação. Isso só aumentou suas próprias reações para onde
elas quase a subjugaram. Algo louco e ansioso fervia nela. Ela nunca
tinha sido tão consciente de seu próprio corpo, e suas respostas
involuntárias continuavam a assustá-la.
Rhys a moveu. Aconteceu tão fácil, tão naturalmente, que ela
mal notou até que ela estava inclinada sobre o colo dele, olhando
para ele, com os quadris pressionados contra a coxa dele. Erguendo
os ombros com o braço, ele beijou novamente. Sua palma calejada
acariciou seu rosto, depois desceu até seu pescoço e braço.
Seu corpo gritou ao seu toque. Medo e desejo visceral se
misturavam caoticamente. Ela quase o parou, como deveria ter feito
há muito tempo. Mas sua boca se movia de maneira mordaz e
cortante em seu pescoço e orelha. Uma nova intensidade bloqueou
tudo de sua mente, exceto como era bom.
Sua carícia firme continuou se movendo. Escovando o lado de
seu peito. Ao longo de sua cintura. Afundando em seu quadril e
perna. As partes do corpo dela perto da mão dele se mexeram com
antecipação desavergonhada. Ela agarrou seu ombro para firmar
seus sentidos cambaleantes. Quando ele reivindicou sua boca
novamente, ela beijou de volta com prazer, acolhendo uma maneira
de liberar o desejo que crescia e crescia.
Ele a ergueu mais alto, até que ela quase se sentou. O beijo se
tornou febril e insistente - para ela também. Sua própria vontade,
seu querer, a mistificava. Uma compulsão física havia assumido, e
insistia em ter o seu caminho. Ele controlou isto com os braços dele
e os beijos dele e a excitação surpreendente da mão dele.
Ele tocou o rosto dela e apertou os lábios suavemente.
— Abra para mim, Joan. Se você não fizer isso, eu vou
enlouquecer aqui.
Apesar da sensualidade tonta, ela hesitou. Mas uma carícia
tentadora ao longo de seu quadril e coxa, e a respiração sedutora
que excitava sua bochecha, a fez girar novamente. Confiar nisso não
seria muito horrível, ela concordou.
Não foi horrível de todo. Isso criou uma intimidade profunda e
surpreendente. A conexão a deixou tremendo e emocionalmente
exposta.
Algo mudou nele também, como se ele sentisse a
vulnerabilidade dela e estivesse esperando por ela. Ele a apertou
mais perto, até que seus seios esmagaram seu peito. Ele envolveu
seus quadris com o outro braço. O abraço possessivo a continha
com uma dominação gentil.
Ele aprofundou o beijo, puxando-a para mais alto. Seu abraço
se transformou em carícias que se moviam livremente, agora
reivindicando em vez de procurar. Abaixo por seu corpo, então para
cima, provocando a antecipação e fazendo o desejo ansioso. Sua
mão roçou seu seio. Sua palma e dedos se fecharam sobre ela.
Prazer incrível. Insistente e vivo. Esvaiu-se qualquer
pensamento de recusa. Ele a tocou de maneiras que só a fizeram
querer mais. E mais. E mais. Ela mal podia pensar por causa do
poder daquele querer. Isso tomou posse dela.
Seus dedos procuraram o laço do vestido.
— Eu quase não saí hoje de manhã quando acordei e encontrei
você nua em meus braços. Eu devo ter olhado para você por uma
hora. Eu quero ver você de novo agora, acordada e ciente de mim.
O decote solto estava aberto, largo o suficiente para ele
deslizar por seu ombro e expor seu seio. A brisa fazia cócegas, e
então sua palma áspera fez o querer ainda pior.
Ela ficou pendurada no pescoço dele, com medo de soltar. Ele
brincou com a ponta do seio dela até uma loucura frenética
desequilibrada. Ela ofegou de novo e de novo quando ficou mais
forte.
Ele parou seu beijo constante e faminto e olhou para ela
enquanto ele fazia o desejo intenso e dolorido. Sua expressão fez
seu coração pular e depois correr.
— Você nunca quis isso antes, também, não é? Você está
surpresa. Não pelo meu toque, mas pelo prazer.
Ela apertou os olhos contra o ombro dele para esconder seu
embaraço. Rhys já conhecia essa parte dela melhor do que ela.
Sua cabeça mergulhou.
— Vamos ver como eu posso te surpreender. Sua língua tocou
seu seio, atormentando-a com novas excitações. Ela fechou os olhos
e tentou conter o delírio.
Ele não iria deixá-la. Ele usou sua boca e dentes para empurrá-
la além de todo controle.
Isso quase aconteceu. Ela quase se afogou nele. Seu corpo
queria, e o resto dela não tinha voz. Ele acenou para a imprudência.
O forte conforto de seus braços e o toque sabido de suas mãos
prometiam que o resto seria tão maravilhoso quanto isso.
Ela acreditava nisso. Por mais algum tempo ela se abandonou
a isso. A ele.
Essa carícia de novo. Firme e possessiva. Ao longo de seu
corpo, seu estômago, suas coxas. Alcançando em baixo e aquecendo
sua perna nua. Mais alto, criando tremores pulsantes que a faziam
doer. Caloroso e confiante e sabendo. Mais alto, até que todo o
corpo dela balançou com desejo.
Um toque. Um toque gentil e magistral.
Um momento celestial de incrível prazer a absorveu, e então o
êxtase desmoronou. Seu corpo e alma recuaram da sensação em
horror. O prazer se tornou perigoso. Instantaneamente, com uma
claridade devastadora, ela sabia que tinha ido longe demais. Ele a
atraiu mais profundamente do que seu passado a deixaria ir.
Ela agarrou seu pulso e afastou a mão dele.
Ele congelou, ainda segurando-a para ele.
Ele tocou o queixo dela e a fez olhar para ele.
— Por quê?
— Você disse que nós iríamos parar quando eu quisesse.
— Eu teria jurado que você queria.
— Você conhece a mente de uma mulher tão bem? Ela se
desvencilhou e se afastou. Se sentia ridícula.
Ela se apressou a endireitar seu vestido.
— Eu ofereci um beijo só.
Seu olhar a perfurou.
— Você ofereceu mais do que isso, linda pomba.
— Não era o que você buscava.
Ele sorriu e levantou as mãos em sinal de rendição.
— Peço desculpas pelo mal-entendido. A culpa foi minha.
Ela desviou o olhar e suspirou.
— Não. Foi minha.
A memória da paixão ainda encharcava os dois, tornando as
coisas tremendamente desconfortáveis. Ela não podia encará-lo.
Um beijo. Deveria cortar as conexões nascidas do banho e da
cama da noite anterior. Em vez disso, intensificaram-nas e teceram
novas e mais fortes. Ela tinha viajado mais longe com Rhys em
menos de um dia do que ela pensou ser capaz de ir com qualquer
um, nunca. Isso a desconcertou.
— Preciso ir agora.
Ele se levantou.
— Não. Você me ofereceu um beijo e eu lhe ofereci uma boa
refeição. Eu voltarei logo. É o mínimo que posso fazer depois de ter
sido tão generosa.
Ela suspeitou que ele zombou dela. Ela não podia culpá-lo. Não
eram crianças, mesmo que ela tivesse agido como uma assustada.
— Você está dizendo que ainda quer que eu fique para o
jantar?
Ele deu a ela um olhar pensativo, como se debatesse sua
resposta.
— Eu acho que eu quero que você fique o tempo que você
quiser, Joan.
Ele andou até a casa, deixando-a sozinha. Ela estava grata por
ele ter saído.
Ela lutou para livrar-se da confusão que o ato de fazer amor
evocara. Ela deveria sair antes que ele retornasse.
Esta casa e jardim eram sedutores. Então, ele acabou sendo
também. Ela não esperava isso.
Ela pensou no que a esperava do outro lado do rio. Não havia
realmente nenhuma escolha a não ser voltar hoje. Ele poderia tentá-
la a se afastar da pobreza e preocupação, mas nunca do propósito e
objetivo. Era para isso que ela vivia agora. Banhos quentes e camas
de penas nunca amenizariam as necessidades espirituais. Até os
beijos de prazer surpreendente não podiam fazer isso. Eles poderiam
ajudá-la a esquecer por um tempo, mas até que ela conseguisse
justiça, não conheceria paz.
Ela gostaria de esquecer. Ela não achava que isso seria
possível. Ele criara uma fantasia de prazer que obscureceu todo o
resto. Por um tempo. Até certo ponto.
Passos de bota vieram da casa. Ela olhou para cima,
desanimada que Rhys tivesse retornado tão rapidamente. Só que
não era Rhys. Um jovem ruivo se aproximou dela.
— Seu mestre está aqui?
Ele achava que ela era uma criada.
— Não. Ele trabalha hoje. Parecia uma mentira sensata. Ela
não queria o jovem esperando aqui.
Ele a olhou de cima a baixo.
— Um homem dedicado, se ele deixa alguém como você para
manejar seu martelo.
Não apenas um servo, mas um sedutor. Bem, isso também era
bastante comum.
— Ele não vai comer se ele não trabalhar.
Um sorriso de lobo surgiu em seu rosto.
— Quem precisa de pão se houver outras iguarias.
— Deixe essa propriedade agora, seu garoto rude. Se você
tiver negócios com ele, volte mais tarde.
Ele se ressentiu do tom dela. Ricos ou pobres, altos ou baixos,
sempre faziam, como se esperassem que ela fosse lisonjeira.
Ele puxou um pergaminho da manga e jogou-o na mesa.
— Se certifique que seu mestre receba isto, mulher.
Ele caminhou de volta para a casa.
Ela pegou o pergaminho. Suas extremidades dobradas estavam
seladas. Ela reconheceu o selo impresso com cera. Ela já tinha visto
isso antes, nos estandartes desenrolados pelo exército de Guy.
O selo pertencia ao próprio Mortimer. E parecia que Rhys o
conhecia bem o suficiente para receber mensagens privadas.
Uma fúria profana avermelhou sua mente. Aquele selo sempre
anunciara um desastre para ela. O poder por trás dele arrancara sua
vida de seu alcance.
Uma resolução quente instantaneamente a enrijeceu. Ela
pegaria de volta, tudo que pudesse, por Mark, se não por ela
mesma. Ela iria vingar os crimes, pelo menos. Ela não podia tocar
em Mortimer, mas podia exigir justiça sobre o porco bastardo do
Guy Leighton que o servia.
Nada mais importava, de repente. Não a bondade nem o
cuidado. Não o doce prazer debaixo da árvore.
O último dia poderia nunca ter acontecido. Rhys era o que ela
o acusara de ser, um lacaio para um homem malvado que
contratava açougueiros para fazer o que ele pedia. Foi um erro
esquecer isso.
Ela levou o pergaminho para a cozinha e colocou-o na mesa
com uma xícara segurando um canto. Seu velho vestido cinza estava
dobrado no banco perto da lareira, e ela o pegou. Ela olhou para o
vestido verde que ela usava. Não vinha dele, mas daquela amiga.
Ela iria mantê-lo, mas não os outros.
Ela olhou ao redor da cozinha e lutou contra as lembranças da
noite passada. Suas mãos a despindo e seus braços a levantando
para o banho. Sua preocupação quando ele a encontrou nua perto
fogo. A sensação de proteção na noite passada e os tremores de
excitação quando ele olhou para ela.
Em seu desespero, ela se apegara à ajuda, esquecendo-se do
custo e do perigo. Nem sua generosidade foi pura. Ele tinha apenas
esperado passar o tempo. A doação não foi altruísta. Ele admitiu isso
e provou isso agora mesmo.
Ele queria que ela ficasse. Ela sabia o porquê. Ela não foi
reduzida a isso ainda, no entanto. E se ela alguma vez negociasse
desse jeito, ela esperaria mais do que simples confortos em troca.
Ela exigiria muito mais do que esse pedreiro sabia pagar.
Ela correu pelo corredor, saiu para a rua e correu pela pista.
Capítulo VI
Um maçom que queria viver não recusava o chamado de
Roger Mortimer. Ainda assim, Rhys esperou um dia antes de
responder à convocação. Ele decidiu que seria longo o suficiente
para lembrar Mortimer que ele lidava com um cidadão livre de
Londres, mas não tão longo a ponto de enfurecer o senhor mais
poderoso do reino.
Ele encontrou Mortimer em um banco em seu jardim privado
em Westminster, sozinho com uma jovem mulher. A Lady pareceu
perturbada, como se temesse que ela estivesse sendo forçada a
jogar um jogo que ela só poderia perder.
Rhys conhecia aquele olhar. Sua familiaridade evocava
imagens dolorosas de sua juventude.
Alívio velou seus olhos quando sua chegada os interrompeu.
Mortimer a dispensou e ela disparou para o portal do jardim.
Rhys experimentou uma reação intensa e visceral à pequena
cena. A maneira que Mortimer usava as mulheres o enojava. Ele
usava todo o seu poder para subjugar os fracos, a fim de conseguir
o que queria.
Ele não estava sozinho nisso. Muitos senhores achavam que
tinham direito a qualquer mulher que os atraísse. Mas Rhys havia
visto em primeira mão o que acontecia a uma mulher desejada por
Roger Mortimer. Ele tinha apenas catorze anos na época, e a
injustiça havia marcado seu jovem coração. Ele observara a angústia
daquela mulher quando Mortimer a aprisionou. Ele a ouvira gritar
enquanto ela gerava o bastardo morto do homem que ela detestava.
Detalhes surgiram, especificamente e claramente, fora do lugar
em suas memórias, onde eles haviam recuado há muito tempo.
Uma mulher bonita, de cabelos escuros e pele clara, descendo
lentamente uma escada... Seu tio sentado junto ao fogo, recusando-
se a assistir... Um silêncio tão profundo que se podia ouvir os
estômagos famintos rugindo.
Ninguém foi apoiá-la na curta caminhada até o cavaleiro que
esperava lá fora. A vida de todos dependia de ela aceitar a
vergonha, mas as mulheres não queriam ser tocadas por ela. Os
homens não queriam que parecesse que eles agradavelmente a
entregaram.
Esta injustiça final enfureceu-o. Se seu pai e seu tio não
lutassem, eles poderiam ao menos dar-lhe conforto. E assim ele foi
até ela, então ela não estaria totalmente sozinha.
Antes de chegarem ao cavaleiro, ela falara.
— Diga ao meu marido que vou permanecer intocada nas
formas que importam.
Ele admirara sua força, mas o custo dessa determinação era
alto. Quando Mortimer finalmente se cansou dela, ela voltou com
uma alma tão entorpecida que nada poderia tocá-la novamente.
Ele ficou na grama a vinte passos do banco. As imagens vívidas
o atordoaram e escureceram sua mente quando inesperadamente
emergiram.
Mortimer gesticulou para ele se aproximar.
— Você toma seu tempo, pedreiro. Eu enviei uma convocação
para você dois dias atrás.
— Eu não estava lá, e tinha outros assuntos para atender
também. Por favor, não envie mensageiros para a cidade
novamente. Eu estou em Westminster com frequência suficiente
para você me encontrar aqui.
A boca de Mortimer franziu em aborrecimento.
— Você está sobrecarregado para um artesão.
— Um homem tímido não tem utilidade para você.
Mortimer não o convidou para sentar no banco, mas Rhys fez
assim mesmo, para mostrar o quão ousado ele poderia ser. Ele se
ressentiu dessa convocação. Como aquela mulher, ele sentiu que
estava sendo atraído para um jogo que não poderia vencer.
— Não tenho nada para lhe dizer. Faz apenas alguns dias,
disse ele.
Mortimer considerou isso.
— Está muito quieto. Ele apertou os olhos pensativamente.
Você conhece Addis de Valence?
— Eu conheci o Lorde de Barrowburgh. Ele tinha mais que o
conhecido. Addis era casado com Moira, a mulher que lhe dera as
roupas para Joan.
— Disseram-me que ele está na cidade. No calor do verão.
Nenhum lorde usa suas casas de Londres agora.
— Sir Addis não é um inimigo para você. Ele lutou bravamente
pela causa da Rainha. Ele ocupou Londres para ela. Ele não tomou
parte no levante de Lancaster contra você dois anos atrás.
— Mas ele não veio ao tribunal. Ele não se apresentou à
rainha.
— Ele é um homem rude, não é dado a pequenas cortesias. Ele
tem um filho novo. Talvez isso o distraia.
— Você sabe muito desse homem que você apenas conheceu
— A casa dele é na minha ala. E eu conheço a esposa dele
muito bem, desde antes do casamento deles.
Mortimer sorriu lascivamente.
— Você conhece? Uma mulher exuberante, não? Nascida de
servos, é dito. Tais mulheres são as melhores, as mais apaixonadas.
Ela chamou minha atenção, eu admito. Se você conhece a esposa,
você pode visitar lá. Eu estou muito curioso sobre Addis. Ele
mantém seus pensamentos muito bem. Nunca se sabe onde ele
está.
— Duvido que ele confie em mim. Não somos amigáveis.
— Você serviu junto na causa da Rainha. Isso cria um laço.
Use isto, e sua amizade com a esposa. Veja o que você pode
aprender. Algo está fermentando. Eu posso sentir o cheiro. Mortimer
pareceu verdadeiramente preocupado.
— Descubra o que é, e você terá mais do que jamais sonhou.
O que você quiser.
Não havia mais nada para discutir, então Rhys saiu de bom
grado. A reunião o havia perturbado. Mesmo sem o favor da rainha,
Mortimer era o senhor de um quarto do reino. Ele não era um
homem para se desafiar. Ele também era o tipo de patrono que todo
construtor precisava se tentasse deixar sua marca.
Mais do que você jamais sonhou. O que você quiser. Ele
sonhava com palácios e catedrais e prefeituras. Ele sonhava em
esculpir estátuas da maneira como ele as imaginava e não como os
padres exigiam.
Ele sonhava em deixar um legado na pedra que deixaria sua
marca no tempo, de modo que, daqui a algumas eras, as pessoas o
veriam e se admirariam a mente e arte o trouxeram à existência.
O que você quiser. As palavras se repetiram em sua cabeça,
repetidamente. Ele não seria o primeiro homem a se alinhar com o
poder para seus próprios propósitos. Nem o primeiro a pôr de lado
princípios para alcançar seus objetivos.
Felizmente, ele não seria tentado a fazê-lo. Nada estava
fermentando, e se alguma coisa acontecesse, Addis de Valence não
estaria no meio dela.
Ele pegou o cavalo e foi para casa. Tomou um longo caminho,
vagando de mercado em mercado, mais consciente do que queria
admitir que esperava ver uma mulher loira vendendo louça.
Ela estava enchendo a cabeça dele por dois dias. Ele continuou
vendo seu rosto e corpo. Imagens de sua surpresa sem fôlego
sempre provocavam uma excitação imediata. Os lábios vermelhos
separados, os olhos brilhantes e assustados suspiros poderiam
imergi-lo em um mar de desejo.
Eu nunca quis. Talvez não antes, mas ela queria com ele. Foi
muito natural tê-la nos braços debaixo da árvore. Ela se encaixava
neles com tanta certeza quanto seu corpo se moldara contra o dele
enquanto dormia.
Ele não se lembrava de estar tão interessado em uma mulher.
Não apenas na cama dela, embora esse impulso também fosse mais
forte que o normal. Ele se perguntou sobre ela. Ela fora temperada
pela perda e pela vida, e a experiência produzira uma rica
complexidade que o intrigava. Ele também se preocupou. Por duas
vezes ela precisara de ajuda. Se isso acontecesse novamente, ela
não tinha ninguém além de um irmão mais novo para cuidar dela.
Certamente, aquele ladrilhador para o qual ela trabalhava não
a ajudaria. Ele poderia até mesmo mandá-la para a cidade
novamente com mais bens danificados, e sua punição na segunda
vez seria pior que a primeira. Alguém deveria explicar a George Tiler
que deixar uma mulher responder por seu mau ofício era covarde, e
que abandoná-la para ser jogada na sarjeta depois de um dia no
pelourinho era desprezível.
Sim, alguém deveria definitivamente ter algumas palavras com
o homem sobre isso.
Era tudo o que ele precisava. Apenas uma desculpa, como sua
consideração esta manhã que ele precisava de novas xícaras, e que
as queimadas, de bordas finas, seriam boas.
Ele abruptamente virou seu cavalo e refez seu caminho. Ele
mirou na London Bridge e na cidade de Southwark.
O pátio de telhas estava em um dedo de terra que se projetava
para o Tâmisa, a cerca de um quilômetro e meio de Southwark.
Quando Rhys se aproximou, ele viu trabalhadores carregando
bandejas de ladrilhos de um longo prédio de palha, e outros se
afundando em uma enorme cuba, pisando fundo para separar argila
do solo. As trabalhadoras eram mulheres, todas vestindo apenas
túnicas sem mangas e lenços.
Um pequeno chalé se apoiava na estrada e pequenos barracos
flanqueavam a borda da água em volta das obras. Rhys amarrou o
cavalo a uma árvore morta atrás da casa e deu a volta até a porta.
Um homem de cabelos cor de areia descansava à sombra de
seus beirais, largado em um banco ao lado de um cantil pendurado
em um gancho perto da porta. Sua barba avermelhada e seus olhos
líquidos o declararam bêbado, e mal passava do meio-dia. Ele
observou as mulheres enquanto bebia de uma xícara de louça
lascada.
Ele não notou o visitante até que Rhys ficou ao lado dele. Por
um momento ele pareceu inseguro quanto a receber ou ressentir-se
da interrupção de qualquer coisa que ele pensasse sobre as
mulheres. Rhys não teve dificuldade em imaginar o que era, e isso
fez seu temperamento se agitar.
— Quem é você?
— Meu nome é Rhys. Eu sou pedreiro e construtor.
George se iluminou.
— Então você vem procurando por telhas. Bem-vindo, bem-
vindo. Ele gesticulou para o banco para Rhys se sentar, então
levantou a xícara com uma expressão questionadora.
Rhys olhou para o bêbado sujo e manchado de vinho. Ele se
lembrou de Joan sofrendo de sede no pelourinho, e a raiva mortal
vazou em sua cabeça.
— Acho que o vinho está secando demais no verão. Na
verdade, acho que esquenta demais aqui. Podemos falar em sua
cabana?
— Há uma brisa do rio aqui e a vista é muito agradável.
George sorriu indiferentemente para as mulheres seminuas.
— Eu preferiria a casa de campo.
George encolheu os ombros e abriu caminho para sua casa.
Rhys seguiu e fechou a porta atrás dele.
— Agora, quantas telhas você precisa, Mestre Rhys?
— Eu não vim para comprar telhas.
— Sem telhas, hein? Estranho que você queira entrar aqui,
então, se o que você quer barganhar está lá fora. Ou talvez você já
saiba qual te agrada?
Então George fez um pouco de devaneio ao lado. Rhys resistiu
ao impulso de terminar a conversa imediatamente ao dividir o
homem em dois.
— Eu não vim para comprar uma mulher, mas para falar sobre
uma. Quatro dias atrás, uma delas passou o dia no pelourinho de
Londres com seus ladrilhos a seus pés.
— Ela os queimou errado, e tentou esconder os resultados
entre os bons. Garanto-lhe que minhas mercadorias podem ser
confiáveis. Foi uma ocorrência rara que não vai acontecer
novamente. Quando ela voltou, eu a repreendi profundamente.
O temperamento de Rhys se partiu. Ele alcançou o pescoço da
túnica na frente dele. Com um balanço arrebatador, ele bateu o
telhador atordoado contra a porta. Segurando George pelo pescoço,
ele forçou o rosto para as tábuas.
— Se você bateu nela
— Não! Não bati... eu não... O rosto esmagado de George se
contorceu de medo. — Eu falei com ela, foi tudo.
— Até mesmo isso foi demais. Você a enviou para levar sua
punição, seu bastardo. Você nem mesmo veio para ela quando
acabou.
— Eu não sabia! Ela não voltou, e eu percebi que ela tinha
fugido, para escapar de sua dívida comigo. Tinha a minha carroça,
não tinha, e todas aquelas peças? Eu pensei que ela tinha roubado
tudo, não acabado no pelourinho.
— Se você pensasse assim você teria procurado por ela. Rhys
puxou George para longe da porta e segurou-o pelo colarinho da
túnica.
— Que dívida? Você falou de sua dívida com você.
— Eu tenho a marca dela. Ela assinou um contrato. Cinco anos.
Ele jogou George de lado.
— Encontre. Eu quero ver essa marca.
George assentiu nervosamente e cutucou e cavou em um baú.
Finalmente, um pergaminho dobrado e manchado surgiu.
Ele ofereceu com uma mão trêmula.
Rhys segurou o documento para a luz da janela. Parecia legal.
A pequena boba de fato colocou seu nome nisso. Ligou-a ao
ladrador por cinco anos em troca de dez xelins e o uso de uma
cabana.
Ele odiava escrituras e o modo como se aproveitavam do
desesperado. Uma pessoa não deveria ter que escolher entre
liberdade e sobrevivência. Não foi um aprendizado que Joan adquiriu
com sua marca, assim como o uso decente de tais coisas. Ela se
inscreveu na escravidão por pouco mais que abrigo.
Fúria cortou sua cabeça. Ele realmente queria dar um soco no
rosto de George. O ladrilheiro se encolheu, como se pudesse ver o
que estava chegando.
- Um bom negócio para você, George. Ela é mais habilidosa
que a maioria dos ladrilheiros, certamente mais habilidosa que você.
George parecia insultado apesar de sua pose encolhida.
— Ela é habilidosa, mas dificilmente melhor do que a mim. Ela
é útil para o trabalho, mas não muito mais que as outras.
— Eu acho que ela dirige o trabalho, enquanto você se senta e
fica bêbado e olha lascivamente para ela. E deixa outros porcos
olharem também.
— Eu faço o trabalho. É o meu ofício, como o do meu pai. Ela é
útil, mas não é necessária.
— Então você não se importará em perdê-la. Estava fora antes
mesmo que ele soubesse que estava pensando nisso.
George franziu a testa com confusão. Rhys apertou com força
o ombro dele e acenou para a escritura na frente do rosto dele.
— Você deu a ela dez xelins e uma cabana. Eu digo que vale
mais que um quilo. Você não concorda?
George parecia pronto para concordar com qualquer coisa se
isso o mantivesse vivo. Rhys não tinha decidido essa parte ainda.
— Eu lhe enviarei muito. Um homem virá com o dinheiro
amanhã, e você assinará isto para mim. Você aceita?
— Eu aceito.
— Mais uma coisa.
— O que você quiser. Apenas não...
— Você já a forçou ou a vendeu para algum homem? Enquanto
ela vivia nesta propriedade e trabalhava para você, você a
machucou? Ele imaginou isso quando perguntou, viu o medo e o
desamparo dela, e quase se moveu para o pescoço de George.
— Nunca! Eu juro a Deus e a todos os santos que eu nunca...
— Você me disse que você vende essas mulheres.
— Ela não faria isso, por moeda ou não. Ela odeia homens,
sabe. Por que, uma vez eu apenas sugeri, de forma amigável, que
poderíamos compartilhar um pouco de cerveja, e naquela noite eu
acordei para encontrá-la aqui com um uma faca na minha garganta
me dizendo para não ter ideias. Ela pode ser mal-humorada e
irritante assim. Inferno de uma coisa, se você pensar sobre isso. É
minha propriedade, não é? Quem é ela para...
— Se eu descobrir que você fez, se você a insultou ou deixou
os outros fazerem isso, eu voltarei.
— Se ela diz que aconteceu, ela está mentindo. Eu nunca...
— Fique aqui. Não saia até que estejamos fora.
George afundou em um ressentido mau humor.
— Sim, mas para um homem que alegou que ele não queria
comprar uma mulher, você fez um pouco demais para o meu senso
de comércio, ele murmurou.
Rhys saiu do chalé e foi para o sol. Lá, com George fora de
vista, a fúria começou a diminuir, deixando algum espaço em sua
mente para outras coisas.
Como a dura constatação do que ele acabara de fazer.
Ele olhou para as obras de azulejos. Joan o notou. Ela
caminhou em direção ao barraco de George, mas parou no meio do
caminho. Ela ficou lá, olhando para ele com curiosidade, com as
mãos nos quadris, parecendo tão mal-humorada quanto George
havia advertido que ela poderia estar.
Ele olhou para o pergaminho sujo em sua mão. Ele não podia
acreditar que acabara de comprar isso. Foi um impulso insensato
nascido da raiva. Em um momento ele estava condenando tais
coisas, e no próximo...
O ato precipitado o surpreendeu. Não apenas porque ele não
acreditava na liberdade sendo comprada e vendida, mas por causa
da responsabilidade e dos vínculos que ela acarretava para ele. Ele
havia evitado essas correntes. Elas interferiam no modo como um
homem como ele escolheu para viver e fazer o que ele deveria.
E ele deveria se virar e desfazer isso. Agora. De uma vez só.
Joan cruzou os braços sobre o peito. Ela parecia muito curiosa
agora, e um pouco desconfiada.
Ele a imaginou no mercado e no pelourinho. Ele a imaginou
afastando George e seus amigos bêbados. Ele viu imagens dela
corajosa e quebrada.
Ele provou seus lábios novamente, e a suavidade de seu peito,
e sentiu seu corpo aconchegado contra ele na cama e pressionando
seu peito em um abraço sem maldade.
Ele desceu o degrau de terra em direção a ela, sabendo que
ele fez a escolha por muitas razões, e que apenas metade delas era
racional e honrosa. Nem todas eles tinham a ver com protegê-la.
Então, novamente, o desejo de proteger foi muitas vezes
associado ao desejo de possuir.
Ela assistiu ele vindo. Ela conseguia ser muito bonita, mesmo
quando vestida em uma túnica incrustada de argila e um lenço sujo.
A expressão impertinente em seu rosto não lhe pareceu
especialmente acolhedora.
Ele suspeitava que não ficaria mais amigável muito em breve.
— O que você está fazendo aqui? Ela exigiu quando ele se
aproximou dela.
— Eu vim para comprar algumas das suas louças.
Sua expressão se suavizou.
— Você fez?
— Sim.
— O que você queria com George, então? Eu acho que você
também veio para intimidar ele a meu respeito, sobre o que
aconteceu. Ela não soou como se ela aceitasse a interferência.
— Isso é verdade. Eu também vim por isso. Mas as coisas
ficaram um pouco confusas lá.
— Como assim?
— Eu realmente vim comprar algumas louças. Ele levantou o
pergaminho.
— Mas, como aconteceu, eu comprei você em seu lugar.
Capítulo VII
― Você comprou-me?
— Não você, na verdade. Apenas sua escritura.
— Você não pode fazer isso.
— Eu posso, e eu fiz.
— Então volte lá e desfaça.
— Não. A barganha está feita.
Ela pensou que sua cabeça iria se dividir. Ela passou por ele,
olhando atentamente para o chalé de George.
— Quando eu terminar com aquele preguiçoso, bêbado, não
haverá barganha.
Ele pegou o braço dela e a puxou de volta alguns passos.
Ela sacudiu a mão e encarou-o. Ele retornou um olhar duro
que dizia que ela não passaria.
— Certamente você fez isso como uma piada.
— Não.
— Então por quê?
— Eu não gostei da ideia de você endividada com tal homem
de forma alguma, muito menos com sua liberdade.
— Um impulso cavalheiresco. Quão generoso. Desde que você
interferiu para proteger minha liberdade, me dê a minha escritura.
Quando for minha, farei com que George me pague o salário que
deveria.
— Eu não vou deixar você aqui. George vende essas mulheres
como prostitutas. Eventualmente, ele também venderia você desse
jeito.
— Ele não ousaria.
— Ele não tem escrúpulos.
— E seus escrúpulos são muito confusos, se você me compra
para impedir que eu seja comprada por outro.
Um vago reconhecimento disso passou em seus olhos, mas sua
expressão firme não se suavizou.
— Vamos pegar suas coisas. Você vem comigo. Meu cavalo
está atrás da cabana.
Com a visão meio turva de raiva, ela olhou dele para a cabana.
Um pensamento terrível entrou em sua mente febril.
Ele tinha vindo aqui com a intenção de levá-la embora. Era o
seu propósito real. A escritura só tornara isso mais fácil e impedia
que ela tivesse uma escolha. Ele trouxera um cavalo para fazer a
viagem de volta à cidade com ela mais convenientemente.
Por quê? Ele havia sido recentemente convocado por Mortimer.
E se, falando com os homens, Rhys tivesse mencionado a
ladrilhadora chamada Joan...
Ela forçou para baixo o medo que subiu em uma onda
nauseante. E se ele tivesse? Havia muitas Joans e um pobre não
merecia maiores atenções. Não havia razão para Mortimer suspeitar
que Joan, a ladrilhadora, fosse a mesma Joan que poderia
testemunhar seus piores crimes e dar substância aos rumores sobre
eles.
Talvez ele supusesse que a outra Joan estivesse morta de
qualquer maneira e se esquecera dela.
Ela esperava que fosse assim, mas ela não podia contar com
isso.
— Seu irmão está aqui? Rhys perguntou.
Seu coração pulou uma batida. Muitas Joans, mas menos que
tinham um irmão chamado Mark. Menos ainda que haviam andado
para aqui das marchas galesas há três anos.
— Por que você veio hoje? Quem te mandou?
— Estou começando a pensar que o diabo me enviou. Vamos
pegar suas coisas agora. Se seu irmão não está aqui, vamos deixar
instruções para ele seguir quando ele voltar.
— Não vou com você.
— Você prefere ser escrava e prostituta para George?
— Se uma mulher se prostitui, não importa quem é o homem.
Não espere a minha gratidão por ser você em vez disso.
— Eu não pretendo isso.
— Então talvez você espere algum outro benefício disto?
Ganhar favor com alguém?
— Eu não espero nada além de problemas com isso. Vou
ganhar favor de ninguém, e só recebo palestras dos guardiões da
minha guilda e do padre da minha paróquia. Agora, vamos embora
deste lugar. O sol e seu humor quente estão evaporando o pouco de
bom humor que me resta.
Ele caminhou para frente, puxando-a junto. Ela se livrou de
seu aperto novamente e marchou ao lado dele, mal contendo sua
preocupação. Mesmo que isso tivesse acontecido como ele disse, ela
e Mark seriam muito mais vulneráveis vivendo dentro das muralhas
de Londres.
E ela teria de abandonar o pátio de azulejos. Ela não sentiria
falta do trabalho, mas sentiria muito a perda do forno. Como ela
poderia ganhar dinheiro se não pudesse fazer suas mercadorias?
Os outros trabalhadores observaram enquanto ela e Rhys se
dirigiam para sua cabana.
— Só as mulheres trabalham aqui? ― ele perguntou.
— Somos mais baratas. Ele não paga quase nada. As mulheres
que vêm aqui não têm outra escolha, exceto os bordéis.
— Exceto que isso serve como um bordel à noite.
— Elas dizem a si mesmas que é diferente. Todas pensam que
vão sair algum dia.
— Como você pensou, sem dúvida. Mas você ainda está aqui,
não está? Ele lhe paga? Mesmo com a escritura? Mesmo que você se
recuse a trabalhar à noite?
— Apenas o suficiente para comida. A escritura não tem valor
se eu morrer de fome.
Ele murmurou uma maldição.
— Por que você assinou uma coisa dessas?
— Para sobreviver. ― Ela abriu a frágil porta do barraco. —
Quando Nick morreu, eu estava desesperada. Nick nos deixou morar
aqui de graça, mas George não. Precisávamos de um teto sobre
nossas cabeças e alguma moeda. Minha esperança era comprar o
pergaminho de volta em um ano, mas...
Mas. Assim como talvez, isso a impediu de novo e de novo.
Sua vida tinha sido uma série de ambas as palavras por três anos.
Ela vestiu o vestido verde. Não demorou muito para arrumar
suas posses em um saco caseiro. Algumas túnicas, opacas e
marrons do barro desbotado. O trapo esfarrapado de tecido
cinzento. Duas louças e tigelas. As ferramentas brutas que ela fez
para trabalhar detalhes em suas estátuas.
Ela enfiou a mão debaixo da tábua para pegar as moedas
escondidas e sua faca de comer. Ela levantou cuidadosamente uma
tábua de madeira debaixo do único banco. Ela segurava suas novas
estátuas. Ela carregou a caixa que continha o que sobrou de sua
louça embrulhada, e contemplou os pequenos santos.
— Enrole-os no vestido cinza e os embrulhe, ― disse Rhys.
— Não tem sentido. Eu não vou ter como queimá-los.
— Há outros fornos. Use todas as suas roupas se precisar.
Vamos deixar que seu irmão leve a caixa quando ele vier.
Ela tentou, sem muito entusiasmo, protegê-los, sabendo que
era inútil. Ele se agachou e ajudou, embrulhando o que ela havia
começado.
— Você não deveria ter feito isso —, ela murmurou. — Eu
sempre lidei com George. Ele precisa de mim aqui. As obras vão
falhar sem mim.
— O dia virá quando ele precisar de moedas mais do que você.
Então você teria encontrado um homem estranho entrando neste
barraco, e nenhum recurso além de submissão ou espancamento. ―
Ele levantou e estendeu a mão. — Venha. Você está feito com este
lugar.
Ela olhou ao redor do barraco sombrio e rudimentar que tinha
sido sua casa. Apesar de sua pobreza, eles tinham estado seguros
aqui.
Ela tinha que saber o que ela enfrentava.
— Você realmente veio hoje para comprar louça? E só para
censurar George?
Ele ficou ao lado dela. Sua força alta dominava o pequeno
espaço e ela.
— Sim. Mas eu também vim ver você, para ter certeza de que
você estava bem.
— Você jura que foi tudo? Que você não veio aqui planejando
me levar embora?
Ele não respondeu imediatamente. Ela esperou, a cautela que
ela conhecia muito bem.
— Eu não acho que eu planejei lhe levar embora. Mas eu não
posso jurar.
Sua mão apareceu novamente. Ela desejou poder confiar nele.
Ela se levantou sozinha.
— Se você é um homem honesto, temo que você se arrependa
disso. Se você não for, eu certamente o farei.
— Parece que nós dois vamos ter uma chance.
— Parece que você não me dá escolha a não ser fazê-lo.
Ele levantou o saco e abriu a porta.
— Isso é verdade, Joan. Eu não lhe dou escolha. Você virá
comigo agora.
Seu irmão seguiu algumas horas depois. Rhys ouviu-o chamar
da rua, procurando Joan.
Deixou a pequena sala de trabalho e desceu as escadas até a
porta. Cheiros de sopa e pão enchiam o salão. Como a desordem de
cozinha que Joan já havia causado, coisas tão comuns eram
novidades interessantes aqui.
Mark ficou na rua, segurando a caixa de madeira. Ele era
grande para a idade dele. Seus ombros já haviam se ampliado,
dando à sua juventude um aspecto solto e magro. Seu cabelo loiro
pendia direto até os ombros, e seus olhos, surpreendentemente
escuros em um tão justo, deram a Rhys uma inspeção muito hostil.
— Então é você, ― ele disse.
— Sim, sou eu.
Rhys o levou para a cozinha. Joan mexeu um pouco de sopa
na lareira. Ele saiu para o jardim, deixando Mark com ela para que
eles pudessem falar em particular.
Ele foi até o banco onde a estátua estava apoiada. Ele
começou a trabalhar no rosto ontem. Ele sempre fazia isso perto do
fim. Seus santos eram famosos por sua humanidade, porque ele não
confiava nas fórmulas tradicionais para suas poses e personagens.
Ele esperava que os rostos surgissem em sua mente. Quando eles
vinham para ele, eles eram compostos de muitos que ele tinha visto
na cidade, de olhos e bocas e expressões marcadas em sua
memória.
Essa Úrsula seria digna e emotiva, mostrando tanto a confiança
de seu nascimento elevado quanto a aceitação de seu sofrimento.
Não acima de todos, como muitos mártires esculpidos.
Mark saiu da casa carregando a caixa. Ele colocou na mesa
debaixo da árvore e encarou Rhys. Um pouco arrogante. Um pouco
defensivo. O homem da família estava pronto para discutir os
termos.
— Ela diz que eu posso ficar aqui também.
— Eu dificilmente vou deixar você no beco.
Mark considerou isso, então o lançou com um olhar
conhecedor.
— Você não tem esposa.
— Parece que não.
— Ela não vai se prostituir para você, ― ele desviou o olhar, ―
eu também não vou.
— Eu não estou procurando nenhuma prostituta, muito menos
você.
— Não importa o que você chama, ela não vai fazer isso.
Contanto que você aceite isso. ― Ele puxou dois sacos dobrados do
topo da caixa. — Eu trouxe nossas camas. Que bem que eu fiz,
hein? Mesmo um pedreiro não teria três. Elas precisam de palha, no
entanto.
Rhys fez um gesto para o portal distante e levou Mark ao
estábulo.
Os olhos do jovem se arregalaram de alegria quando entraram.
— Você possui um cavalo?
— Aquele ali.
Ele entrou na baia e começou a verificar dentes e pernas como
se soubesse o que estava fazendo.
— Ele parece ser um bom animal. O que, cerca de seis anos?
— Como você aprendeu sobre cavalos?
— Meu pai teve um. Nós não fomos sempre tão pobres.
Nada mau, se o pai fosse dono de um cavalo.
— Você pode tomar conta dele, já que você parece saber tanto
sobre eles.
— Se você não o usar todos os dias, vou exercitá-lo também.
Rhys imaginou o jovem feliz galopando pelas ruas da cidade,
causando estragos.
— Deixe-me pensar sobre isso. Agora, a palha limpa está lá.
— Eu direi a Joan onde está.
— Não, você vai fazer isso sozinho.
Mark pareceu chocado.
— Eu não encho paletes.
— Você faz se você quiser comer.
— Você não entende. Ela não vai permitir isso.
— Você não entende. Não é a palavra dela agora, mas a
minha. Se você mora aqui, você vai trabalhar. Haverá tarefas todos
os dias. Você cuidará do cavalo e cuidará do jardim. O teto do
estábulo também precisa ser refeito. Você não vai mais viver do
trabalho de sua irmã.
Mark ressentidamente pegou uma braçada de palha e ficou de
mau humor todo o caminho de volta para a casa.
Eles acharam a comida pronta. Duas tigelas esperavam na
mesa da cozinha. Rhys entrou no corredor. Lá, sozinho na longa
mesa, estava a última tigela e xícara.
Ele voltou para a cozinha.
— Mova sua louça lá comigo.
— Servos não comem na mesa do mestre —, disse Joan,
empertigada.
— Este mestre não escolhe comer sozinho. É por isso que eu
sempre fui às tavernas. Mova-as.
Foi uma refeição silenciosa. Joan manteve os olhos na comida,
como se não quisesse ver o ambiente. Ou ele. Mesmo quando ele
elogiou sua culinária, ela não respondeu.
Mark não percebeu o constrangimento. Ele devorou tudo o que
estava à vista e teria tomado o último pão se Joan não tivesse
batido na mão dele. Lembrando-se da fome implacável daquela
idade, Rhys quebrou um pequeno pedaço e empurrou o resto para
ele.
Joan pegou o pão de seu irmão e bateu de volta na frente de
Rhys.
— É seu, não dele. Pare de misturar as coisas. Pare de agir
como se fosse diferente do que é.
Ele empurrou o pão de volta para o menino.
— Tome isso, e encha as paletes.
Mark lançou um olhar para os dois. De repente, alerta para a
tensão, ele saiu rapidamente.
Rhys se levantou e olhou para baixo, para a cabeça inclinada
de Joan.
— Eu tenho que ir encontrar alguns homens, Joan. Quando eu
voltar, você vai me explicar o que você acha que é, já que você
parece saber melhor do que eu.
Ele não voltou depressa. Joan passou o tempo todo em um
tumulto, esperando pelos sons de seu retorno. Ela temia que ele não
voltasse sozinho, mas com guardas que levariam seu irmão, e
provavelmente ela também.
Várias vezes, enquanto lavava as xícaras e limpava a cozinha,
quase sucumbiu a um ataque de pânico. Ela quase chamou a Mark
para dizer que eles deveriam correr. Rhys tinha ido a Westminster,
para informar que ele os tinha. A refeição tinha sido apenas um
gesto para embalá-los em complacência. Para engordá-los para
matar.
Correr para onde, no entanto? Essa consideração sempre se
intrometeu e forçou pensamentos mais racionais. Ela não tinha
provas reais de que ele soubesse quem ela era ou os crimes que ela
poderia provar. Nenhuma mesmo. Ela estava deixando sua
imaginação anuviar seu julgamento. Se Mortimer suspeitasse, ele
não precisaria ter enviado Rhys ao pátio.
Sua guarda poderia tê-la encontrado lá tão facilmente quanto
aqui.
Ela debateu de um lado para o outro, repetidamente, tentando
decidir o que fazer. O sol se pôs em sua agitação, tirando a escolha
de suas mãos. Mark colocou seus paletes perto da lareira da cozinha
e logo adormeceu na sua cama.
Ela andava de um lado para o outro no corredor, sentindo o
estômago, ouvindo através do silêncio os sons de cavalos e botas.
Finalmente ela ficou esgotada pelo medo. Ela saiu pelo jardim
até o poço, para lavar a argila e os solos de cozinhar.
A cidade foi para a cama. Estava muito quieto agora, muito
pacífico. Isso a acalmou. Escondida pela noite e pela parede, ela
deslizou os braços para cima através do amplo decote do vestido e
deixou o corpete e o cinto caírem ao redor de seus quadris para que
pudesse se lavar mais completamente.
A água fria era boa. Isso animou sua pele. A noite a secou com
um frio sutil, deixando-a muito alerta.
De repente ela o sentiu. Ele estava aqui no jardim. Sentado à
mesa, debaixo da árvore. Ela não se virou e olhou, ela apenas
reconheceu sua presença.
Ele esteve lá o tempo todo. Ele havia retornado pelo portal do
jardim muito antes. Durante todo o tempo em que ela se lavou, ele
estivera assistindo silenciosamente ao luar.
Ela rapidamente puxou a sua túnica para cobrir seus seios. Ela
o ouviu se mover e se levantar e caminhar na direção dela.
— Você deveria ter dito alguma coisa e feito a sua presença
conhecida ―, disse ela acusadoramente.
— Eu não pude. Meu coração estava na minha garganta.
Ela se atrapalhou para encontrar as mangas da túnica. Ele veio
por trás dela e chegou ao redor, fazendo isso por ela.
Seus braços cercados e fechados, mesmo quando eles
ajudavam. Com o coração batendo, ela empurrou os braços.
As pontas dos dedos de Rhys roçaram seu ombro, fazendo-a
tremer.
Ela se afastou, então ele não parecia tão perto.
— Você foi a Westminster?
— Eu fui à Guildhall. Por que você achou que eu tinha ido ao
palácio? Ninguém trabalha lá tão tarde.
— Eu pensei que talvez você tenha respondido a essa
convocação.
— Eu fiz, mas não esta noite.
Ela ainda se atrapalhou desajeitadamente com o vestido. Ele
assistiu. Ela teve a sensação de que ele podia ver mais dela do que
ela dele. Sua atenção a deixou tão exposta que ela poderia estar
nua ao lado dele.
— Se você sabe sobre essa convocação, você ainda estava aqui
quando o mensageiro chegou. Eu me perguntei sobre isso. Ele
ofendeu você? É por isso que você saiu?
Ela finalmente conseguiu colocar o vestido. Ela colocou-o nos
ombros com alívio, mas ainda se sentia nua.
— Ele foi ofensivo o suficiente, mas não foi por isso que saí.
— Então por quê?
— Porque eu não queria ficar. Eu não queria que continuasse.
Mas parece que você não entendeu isso. Sua vaidade colocou muito
peso em alguns beijos. Eu não quis dizer nada com eles.
— Eu já beijei o suficiente para saber o que eles queriam dizer.
Você já?
— Muitas vezes, como você diz. Na minha mente.
Ele estendeu a mão e passou os dedos na boca dela.
— Exceto que você nunca beijou antes, porque você não
queria.
Ela virou o rosto, mas a mão dele não caiu. As pontas dos
dedos se demoraram em sua pele.
Melhor ter isso agora.
— Você quer que eu durma com você, não é? Você mentiu no
pátio de azulejos. Você disse que não pretendia isso.
— Eu nunca vou forçar você, linda pomba. Mas eu não vou
fingir que o que se passa entre nós não existe.
Ela se forçou a afastar-se do toque dele e interromper o
contato.
— Nada se passa entre nós. Eu não gosto de homens dessa
maneira.
— Você gosta desse homem dessa maneira. ― Suas mãos a
alcançaram, delicadamente fechando em seus ombros. Virando-a, de
modo que seus quadris agora descansassem contra o poço.
Ele acariciou os braços dela até as mãos dela, e os afundou na
borda, deixando-a espalhada e vulnerável, e ficando tão perto que
seu peito roçou seus seios.
— Algo definitivamente se passa entre nós, Joan. No mínimo,
um prazer muito promissor.
Ele beijou seu pescoço, depois seu ouvido, depois sua boca.
Mais que promissor. Surpreendente. Ele fluiu e formigou e
afundou rapidamente, como se ela estivesse esperando por isso. Ela
percebeu que ela estava. Antecipação tinha sido parte de sua
preocupação e seu medo, e até mesmo sua raiva, complicando todas
as suas emoções.
Os impulsos do desejo despertaram e cresceram e cresceram.
Ele suavemente mordeu o lábio inferior, exigindo mais.
Isso a assustou. Uma arrepiante tristeza se intrometeu no
prazer, como se mãos invisíveis a puxassem para fora. Ela nunca
poderia permitir o que ele queria. Nem o passado nem o futuro a
deixariam.
Ele parou, como se sentisse sua retirada. Suas mãos
acariciaram seus braços até os ombros.
— Você é uma mulher confusa.
— Talvez eu seja apenas uma mulher virtuosa. Há algumas
poucas no mundo.
— Eu não penso nessas coisas de forma tão comum, Joan. Eu
também não acredito. Mas se eu estiver errado, e ofender sua
virtude, diga-o. Olhe nos meus olhos e diga que você pensa que isso
é pecado, e nunca mais vou tocar em você.
Ela não poderia. Ele ouviria a falta de convicção e saberia que
ela mentia. Suas ideias sobre o certo e o errado, sobre a virtude,
haviam sido abandonadas há muito tempo. Isso não estava errado
dessa maneira. Se era algo, era muito certo.
Rhys pegou o rosto dela com as duas mãos.
— Você acha que sabe o que isso é, Joan. Estou mais curioso
sobre o que isso pode ser.
Suas mãos ásperas e gentis lembraram-na do cuidado no
mercado, nos estoques e no banho. Suas palavras a atraíram com
lembranças do vínculo forjado naquela noite e depois exploraram o
dia seguinte debaixo da árvore. O anseio se espalhou intensamente.
Seu coração doía tanto que ela queria chorar.
Ela tirou as mãos dele.
— Eu não posso deixar isso ser nada mais do que é. Eu não
vou ficar em Londres por muito mais tempo. Há coisas que eu devo
fazer em breve.
— Que coisas?
— Coisas enterradas no meu coração das quais eu não falo. Eu
não tenho nada para lhe dar, além do serviço que você comprou.
Não há nada que eu possa tirar de você, exceto algumas noites de
abrigo.
— Há amizade e prazer, no mínimo.
— Se eu alguma vez me deitar com um homem, não será para
isso.
— O que então? Você disse que não queria casamento.
— Não, definitivamente não é casamento. Essa escravidão é
ainda mais permanente do que a escritura. Se eu quisesse isso, eu
poderia tê-la agora, e me poupado três anos no pátio de azulejos.
— Então, por que você se guarda, se não carinho ou
segurança?
Eu quero um homem morto.
Ela quase disse isso. Ela chegou tão perto que ela sabia que
ele estava enfraquecendo-a e atraindo-a para confidências que
colocariam em risco tudo.
— Eu me salvo para mim e para deveres e planos muito mais
antigos do que o seu conhecimento de mim. Eu não vou deixar você
interferir neles.
Ela escorregou entre ele e o poço e começou a andar de volta
para a casa. Ele entrou em sintonia com ela.
— Nós não resolvemos quais serviços você espera, ela
lembrou, buscando refúgio em coisas práticas para esconder suas
emoções instáveis.
— Elas vão se acomodar. Só não penso em você como uma
serva, então não insista que eu a trate como uma.
— Então eu sou sua convidada?
— Desde que você não será minha amante, eu suponho que
você é.
— Você oferece uma hospitalidade estranha. Hóspedes normais
podem ir embora.
— Eu não vou segurá-la contra a sua vontade. Você pode ir
embora quando eu souber para onde vai, e que será cuidada, e não
voltará para o pátio.
— Essas são muitas condições.
— Elas são as que eu estabeleço. Comprar essa escritura me
deu obrigações assim como direitos. Eu sou responsável por você
agora. Uma nova firmeza entrou em seu tom.
— Eu não aceito nem as obrigações nem os direitos. Vou sair
quando eu escolher, sem explicações para você. Eles entraram na
cozinha. — No entanto, eu não espero fazer isso hoje à noite, então
você não precisa vigiar.
Com sua partida, ela afundou no banco contra a lareira. Ela
sentiu como se estivesse prendendo a respiração por horas.
Ela deveria acordar Mark e ir embora. Ela estaria livre de Rhys
e a confusão que ele continuava evocando nela.
Mas como eles viveriam uma vez que suas moedas acabassem?
Ela tinha apenas duas coisas para vender para garantir sua
sobrevivência. Seu ofício e ela mesma. Ela não sabia onde encontrar
trabalho no primeiro, e não conseguia tolerar a ideia de recorrer ao
último.
Ele sabia disso. Ele sabia que a necessidade a manteria aqui
com mais segurança do que qualquer escritura. Sim, ele era um
homem, e nisso não é melhor ou mais gentil do que a maioria.
Mas eles estavam seguros aqui por um tempo. Ela estava certa
agora que Rhys ainda não sabia. Mas algum dia ele poderia
descobrir. Então o que? Manter-se em silêncio poderia custar-lhe
caro, ao mesmo tempo que expô-los asseguraria o favor de um
homem poderoso. Ela não contaria com nenhum homem se
arriscando por ela, mesmo um homem que perguntava o que
poderia ser aquilo.
Ela olhou para Mark. Seu estômago estava realmente cheio
pela primeira vez em anos. Ele não tinha ido procurar problemas na
cidade hoje à noite. Este lugar seria bom para ele.
Eles ficariam enquanto ela planejava o que fazer em seguida.
Ela começaria a aprender sobre outros terrenos e fornos. Livre de
George, ela poderia ganhar moedas por sua habilidade agora. Talvez
daqui a algumas semanas... talvez...
Capítulo VIII
Joan jogou água no piso de tábuas e esticou-se para
esfregar um canto do chão do solar. Ela fazia isso todos os dias,
mesmo que dificilmente precisasse. Apenas Rhys usava essas
câmaras superiores e passava pouco tempo na casa. Ainda assim,
ela fez isso junto com outras tarefas extras. Ela não queria nada
desequilibrado nesse arranjo.
Esse esforço seria especialmente notável hoje. Havia chovido e
só agora o sol da tarde estava surgindo. A leve brisa soprando na
janela carregava a mistura de frescor e umidade fétida que só uma
tempestade de verão poderia causar. O chão não secaria
completamente antes que Rhys retornasse esta noite.
Uma gargalhada e um barulho de passos se elevaram acima
dos sons da cidade. Um estridente barulho de brincadeira juvenil
caiu na casa da rua e começou a subir as escadas até ela. Mark
tropeçou no solar, ainda cutucando e empurrando outro garoto ao
seu lado.
— Esta é minha irmã, Joan ―, disse ele, apontando para o
outro com cotovelo. — Esse é David.
David parecia ser um pouco mais jovem que Mark. Ele era mais
baixo e mais magro, e ainda não havia começado aquele
crescimento rápido e viril que ocorrera com Mark no ano anterior.
Um menino lindo, porém, com cabelos castanhos dourados e
profundos olhos azuis.
— Ele é aprendiz de mercador e vive algumas ruas atrás,
explicou Mark enquanto ele e David andavam pela sala,
curiosamente examinando seu conteúdo.
— Você não deveria estar no seu negócio, então? ela
perguntou ao garoto, levantando-se de sobre joelhos para
cumprimentá-lo.
— Meu mestre foi para Westminster hoje, para mostrar
algumas sedas para uma dama. Os meninos mais velhos foram com
ele e ele fechou a loja. Ele olhou para o quarto de dormir. — Não há
muito aqui para uma casa tão grande, não é? Sempre parecera
estranho, apenas um homem em tal lugar. Não é tão grandiosa
quanto a casa do meu senhor, mas é muito grande para uma
pessoa.
— Bem, há três aqui agora, não é. Ao menos por um tempo,
disse Mark em um tom superior. Ele obviamente decidiu que a idade
e a força ditavam a hierarquia nessa nova amizade.
David olhou pela janela. Algo chamou sua atenção e uma
expressão peculiar quase dura velou seu rosto. Por um momento ele
lembrou Joan das dificuldades da rua que Mark conhecera. Seria
como Mark encontrar um novo amigo que tivesse gosto por
problemas.
Ele continuou olhando - tempo suficiente para que ela ficasse
curiosa. Ela jogou o pano no chão e foi até ele e olhou também.
Quando ficou claro que ela não viu nada de especial interesse, ele
apontou.
— Lá, na sombra daquele beco estreito. Há um homem lá. Eu o
vi quando chegamos, e ele não se moveu. Você deveria dizer ao
Mestre Rhys que pode haver um ladrão que esteja interessado nesta
casa.
Ela apertou os olhos. Lentamente, uma forma mais escura
tomou forma na sombra escura.
— Ele pode ter aprendido que está vazia na maioria dos dias,
disse David. — Ele pode estar esperando que esteja vazia
novamente.
Um pequeno ponto de medo apunhalou seu estômago. Sim,
pode ser um ladrão ou apenas alguém vagando por aí. Ou pode ser
um homem enviado para aprender sobre a mulher que morava aqui
agora.
Ela sabia que não fazia sentido, mas não conseguia controlar o
medo com argumentos racionais. Sempre possuíra vida própria. A
preocupação começou a apertar dentro dela contra sua vontade.
— Veja o que eu encontrei, anunciou Mark.
Ela girou para vê-lo de pé ao lado de um baú aberto, radiante
de prazer. Ele segurava um arco longo e uma aljava de flechas.
— Eu tinha visto o alvo no estábulo, mas achei que pertencia a
um vizinho. Há uma boa adaga aqui também.
— Você está cansado de comer? Você anseia por dormir em
um campo? Você sabe que você não deve mexer no baú dele. Eu
não quero que nos joguem fora antes de eu encontrar outro lugar
onde eu possa trabalhar.
Mark sorriu enquanto admirava o arco.
— Ele não vai expulsá-la, e ele sabe que você não vai ficar se
eu não puder.
Se seu amigo ouviu a insinuação, ele não demonstrou. Ele se
juntou a Mark no baú e levantou a adaga.
— Todos os cidadãos possuem algumas armas para defender a
cidade. Porém, estas são muito boas.
Mark foi para as escadas.
— Eu vou pegar o alvo. Faz tanto tempo, eu me pergunto se
eu tenho algum olho sobrando Deve ser mais fácil de usar do que da
última vez. Eu cresci muito desde então.
— Não, você vai colocá-los de volta onde você os encontrou,
ela repreendeu.
— Eles estarão de volta antes do anoitecer. Se ele descobrir,
apenas me culpe. Com isso, ele desapareceu descendo as escadas,
com David e o punhal o seguindo.
Ela sabia quando tinha perdido uma discussão com ele. Ele
estava se exibindo para seu novo amigo, e ele nunca iria desistir
agora.
Ela foi até a janela com vista para o jardim. O alvo surgiu
através do portal. Mark colocou o disco cheio de palha em cima de
um banco contra a parede oposta. Percorrendo o comprimento do
jardim, ele tomou sua posição, posicionou uma flecha e deixou-a
voar. Um apito disparou na paz da noite.
Uma pontada em seu coração combinou com o baque da flecha
acertando o alvo. Ela conhecia muito bem o som dos arcos longos.
Fazia anos desde que suas orelhas tocaram com a música doentia,
no entanto. Ouvi-lo novamente lembrou que isso não era brincadeira
de criança, pois todos os meninos riam e brincavam.
Tanto a preocupação quanto o orgulho encheram seu coração.
Mark tinha um bom olho. A maioria dos garotos não conseguia
segurar um arco até os catorze anos mais ou menos, mas ele era
grande para a idade e forte, e o pai colocara um em suas mãos no
ano anterior à partida.
Ela voltou a esfregar. Periodicamente, ela se levantou e olhou
para a sombra do outro lado da rua.
O homem no beco não se mexeu.
Sua presença implacável predava em sua mente.
No momento em que o chão brilhava escuro e úmido de ponta
a ponta, ela havia se transformado em uma pilha de agitação.
Ela odiava essa preocupação. Odiava o que isso fazia com ela.
Bem, ela não tinha intenção de passar o resto do dia sendo
propriedade dela. Se o perigo fosse real, ela descobriria.
Ela levou o balde até o jardim e despejou a água no jardim.
— Coloque as armas de volta no baú agora, ela ordenou aos
meninos. — Então volte aqui. Eu tenho algo para vocês fazerem.
Talvez fosse o tom dela que obtivesse a obediência deles, ou
talvez eles tivessem se cansado do jogo deles. Uma tempestade de
exuberância juvenil entrou na casa e subiu as escadas, depois voltou
para ela.
— O homem no beco do outro lado da rua vai sair em breve.
Eu quero que você o siga e veja onde ele vai.
David apontou ao mesmo tempo para o portal do jardim.
— Vamos esperar algumas casas abaixo e seguir seu rastro.
Vamos, Mark, eu vou te mostrar. Nós não vamos perdê-lo. Estas
ruas e becos são o meu reino.
Ela andou a passos largos pela casa e saiu pela porta da
frente. Ela marchou através da pista, direto para a sombra e até o
homem.
— Eles enforcam ladrões em Londres, disse ela, marcando sua
memória com seu corpo corpulento, barba loira e rosto redondo.
Suas roupas eram simples, mas bem feitas. Ele era um ladrão de
sucesso, se ele era um em tudo.
Seu confronto abrupto o perturbou.
— Quem é você, mulher, para se atrever a me acusar de tal
coisa? Eu não sou ladrão.
— Então por que você está espreitando aqui? Escondendo-se
assim?
— Eu não espreito nem me escondo. Eu precisava mijar. Há
homens que fazem isso abertamente na sarjeta da pista, mas eu
não sou um deles.
— Se você estava mijando, o bom Deus lhe deu uma bexiga do
tamanho de um lago, vendo quanto tempo eu tenho te visto aqui.
O homem inchado de indignação.
— Inferno de uma coisa, quando uma empregada ameaça um
homem pacífico. E uma mulher serva ainda por cima. Veja como
você fala com seus superiores, ou eu vou ter você punida.
— Por quem? Esta mulher não responde a ninguém. Saia
sozinho, ou eu vou pegar minha faca e tirar um pouco do ar quente
de você.
— Inferno, ele murmurou. Mas ele saiu do beco e seguiu pela
estrada.
Ela esperou na cozinha que Mark retornasse, a preocupação
latente a deixando ansiosa. Agir ousadamente não significava que
ela realmente se sentia muito corajosa.
Os garotos demoraram muito tempo para chegar. Finalmente
eles entraram no jardim, satisfeitos com a aventura. Ela os
encontrou ao lado do santo encapuzado.
— Ele foi a uma taverna e bebeu um pouco de cerveja sozinho,
relatou Mark, afundando na bancada.
— Então ele caminhou para o oeste e se dirigiu para Newgate.
— Ele deixou a cidade?
— Não, ele foi para outra taverna. Só que desta vez ele se
sentou com um homem. Esperamos que ele partisse por um longo
tempo, mas finalmente desistimos desde que o anoitecer está
caindo.
— O outro homem usava algum libré?
Mark ficou sério. De repente, ele entendeu por que ela os
mandara seguir o homem.
— Não, ele não usava libré.
Não havia muita informação, mas pelo menos sua presa não foi
para Westminster, ou encontrou alguém na casa de Mortimer.
David estava de olho na coluna de lona apoiada na bancada de
trabalho. Ele levantou a borda e olhou para a estátua embaixo.
— O homem que ele encontrou não usava libré, ele repetiu,
abaixando a cabeça para ver melhor. — Mas pelo corte de suas
roupas e pela moda de seus cabelos, acho que ele era francês.
— Você não pode saber com certeza, disse Mark, um pouco
irritado por seu amigo ter colhido mais do que ele.
David sorriu e encolheu os ombros e continuou examinando o
santo. Algo naquele sorriso disse a Joan que ele sabia disso com
certeza. Um aprendiz de mercador teria um olho para essas coisas.
— Bem, se o outro era francês, isso é estranho, Mark
murmurou.
Joan concordou. Era muito estranho.
Rhys arrumou suas ferramentas e se preparou para ir para
casa. Para Joan. Ele reconheceu com tristeza que pensava dessa
maneira. Escultura de arabesco exigia grande habilidade, mas pouca
atenção, e assim metade de sua mente poderia permanecer nela
enquanto ele trabalhava. Não foi algo que ele aceitou inteiramente.
Ela estava rapidamente enchendo seu mundo. A casa e o
jardim. Seus aposentos. Ela imprimiu sua presença, como tantas
pegadas femininas em barro molhado. Ele voltava para casa todos
os dias ao pôr-do-sol, espantado com a forma como ela agora
marcava seus espaços.
Tê-la em casa era uma forma de tortura. Uma pequena e
fascinante dança de desejo silencioso esperava por ele todas as
noites. Desejo mútuo, que ela se recusava a reconhecer. Ele a
observou andar com muito cuidado, de modo que ela não se
aproximasse muito dele, não importava como ele se movesse.
Ele esperou pelo passo em falso que a enviaria em seus
braços.
Ele pendurou o saco de ferramentas no ombro e seguiu os
outros pedreiros para fora do pátio da abadia.
Ao aproximar-se do portal, viu o jovem de cabelos vermelhos,
a quem Mortimer enviara com demasiada frequência com
convocações impacientes. O pajem não usava libré.
O menino nem precisava mais falar. Rhys apenas deu um
passo ao lado dele e aceitou a escolta para o pequeno jardim
privado onde Mortimer gostava de realizar suas reuniões.
Pelo menos nenhuma mulher temerosa sentava ao lado dele
dessa vez.
— Nenhuma palavra, pedreiro? Perguntou Mortimer,
rabugento.
— Por favor, lembre-se que eu ainda devo ganhar meu pão. Eu
tenho um trabalho que me ocupa. E é claro que eu não posso relatar
nenhuma palavra se nenhuma palavra estiver sendo dita.
— Elas estão sendo faladas. O que você aprendeu sobre Sir
Addis?
— Eu lhe disse que a esposa dele está repousando desde o
nascimento de seu filho. É muito cedo para visitá-la sem levantar
suspeitas. Em poucos dias, talvez.
Mortimer mordeu uma pera. Chupou o suco ruidosamente
enquanto contemplava o artesão diante dele.
— Em alguns dias, então. Quanto a você ganhar seu pão, eu
tive um pensamento sobre isso. Um novo projeto. A pequena rainha
de Edward está insatisfeita com seus aposentos. Ela quer um novo
muro colocado, e algumas outras mudanças. Sua mãe está inclinada
a permitir que ela mantenha a menina feliz.
Rhys sentiu como se tivesse passado uma corda no pescoço e
que Mortimer tivesse começado a puxá-lo para um abismo.
— O rei não preferiria escolher o construtor por conta própria?
Isso é o costumeiro.
— Ele é muito jovem para saber de tais coisas. Um construtor
é o mesmo para ele. Vai levar algum tempo, eu acho, para construir
essa parede. Um bom tempo, quando você vai estar nas câmaras
frequentemente, fazendo o seu ofício.
Sim, frequentemente o suficiente para se tornar invisível.
Vendo quem vinha e ia e ouvindo uma palavra estranha ou duas que
poderiam revelar muito mais do que o pretendido.
E Mortimer estaria esperando por tudo isso. Seria muito difícil
afastá-lo com pequenos pedaços de nada.
Ele enfrentava outra dança agora. Ele poderia apreciar o
desejo que enchia suas noites, mas odiaria o da sobrevivência que
marcaria seus dias.
O fardo disso transformou o humor dele quando ele voltou
para a casa. Ele não queria fazer parte disso. Ele se afastara da
política e da intriga após a rebelião, mas, como um tolo, deixara que
John e outros o atraíssem de volta para ajudar na infeliz revolta
contra Mortimer dois anos atrás. Esse desastre resolveu
completamente sua desilusão. O fracasso dos barões em apoiar
Lancaster e Stratford provou, sem sombra de dúvida, que ele não
poderia mudar muito no mundo, já que os homens mais poderosos
mudavam suas lealdades à medida que se adequava ao seu ganho.
Ele não queria estar ouvindo Stratford, e com certeza não
queria fazer isso por Mortimer. Ele desejava apenas ficar em paz
para praticar seu ofício. Queria percorrer as ruas da cidade sem
olhar por cima do ombro e, quando chegasse à sua casa todas as
noites, queria fazer amor com uma bonita ladrilhadora de pele
bronzeada pelo sol, cabelos sedosos e um espírito indomável.
Um espírito que ele sentiu enquanto colocava o cavalo no
estábulo e atravessava o jardim. Um espírito que, em seu humor
sombrio, pareceu-lhe um desafio perturbador quando atravessou a
soleira da cozinha.
Joan notou-o imediatamente. Ela estava debruçada sobre uma
panela na lareira e não podia vê-lo, mas com seus passos ela se
mexia levemente, como se para abrir espaço para sua presença.
Um retiro sutil. O anúncio de um limite. O primeiro passo na
dança.
Geralmente ele achava a arte dela no jogo intrigante.
Esta noite acordou o diabo nele.

Ela sempre sabia quando ele voltava para a casa. Mesmo


quando ele vinha pela frente e ela não o ouvia, ela sentia sua
chegada. Esta casa poderia ser muito ampla para uma pessoa, mas,
no que lhe diz respeito, ele a preenchia completamente.
E então ela soube que ele estava no estábulo antes de ouvir os
sons lá. Sentiu-o caminhar em direção a ela pelo jardim, embora ela
não se virasse para olhar. Sentiu-o no limiar tão certo como se ele
tivesse tocado seu ombro.
Era sempre assim, e isso a perturbava muito, mas naquela
noite aquela presença parecia mais forte e menos benigna do que o
normal.
— Onde está Mark? ele perguntou. — Ele não veio para cuidar
do cavalo.
— Me desculpe, eu tinha esquecido que você levou o cavalo.
Ele encontrou um novo amigo hoje. Um aprendiz de mercador. Ele
está jantando lá.
Ele atravessou a cozinha em direção ao corredor. Ela manteve
a atenção na sua agitação e instintivamente se afastou para um lado
para lhe dar mais espaço para passar.
Seus passos pararam.
— Pare de fazer isso. Você me insulta com isso, como se você
achasse que, se eu chegar a dez passos de você, eu te prenderei
contra a parede e a violarei.
— Eu não posso...
— O inferno que você não pode. Ele saiu a passos largos. Ela o
ouviu ir até o solar.
Bondade, mas seu humor era tempestuoso. Ela desejou não ter
cedido ao pedido de Mark para comer com seu amigo.
Rhys desceu e Joan rapidamente serviu a sopa e levou as
tigelas para o corredor. Ele ficou ali bebendo a cerveja que ela
preparou para esperar por ele. Ele havia tirado a túnica de couro e
colocado uma sem mangas.
Ele observou cada movimento enquanto ela pegava a sopa e
voltava para a cozinha procurando o pão e o queijo.
Sim, ela nunca deveria ter deixado Mark comer em outro lugar.
Esta grande casa de repente pareceu-lhe pequena demais.
Forçando uma cautela peculiar, ela carregou a comida e tomou
seu lugar.
Ele sentou no final da mesa como sempre. Ela tentou se
afastar um pouco sem ser óbvia. Não ajudou muito. Eram apenas os
dois, joelhos quase se tocando, próximos um do outro. Muito mais
perto do que parecia quando Mark se juntava a eles.
Ela manteve os olhos na sopa e tentou ignorar a sensação de
estar sentada ao lado de uma nuvem de tempestade.
— Eu gostei do seu irmão, mas estou feliz que ele coma em
outro lugar hoje à noite, ele finalmente disse. — Você o carrega com
você nas horas da noite e se certifica de que ele está sempre ao seu
lado. É agradável fazer uma refeição com você assim, sem o seu
escudo humano entre nós.
Ela não achava que o uso de Mark fosse tão óbvio quanto isso.
— O andar de cima está molhado, disse ele. — Muitas vezes
está, mas não como hoje.
— Está úmido hoje por causa da chuva, por isso não secou
rápido.
— Você não precisa esfregar todos os andares todos os dias. É
excessivo.
— Eu não me importo com o trabalho.
— Eu me importo. E vai danificar as pranchas ao longo do
tempo.
— Eu não vou estar aqui o tempo suficiente para danificar as
tábuas.
— Eu sei por que você faz isso. Tudo isso esfregado. Para
provar que você ganha seu sustento, então...
— Como o esfregar é para o seu benefício, e a fortaleza é o
seu custo, não vejo por que você deveria se importar.
Exceto pelo brilho que entrou em seus olhos, ela poderia ter
pensado que ele não tinha ouvido sua interrupção.
— Para provar que você ganha seu sustento, então não
esperarei outro pagamento, finalizou.
Pelo menos os joelhos doloridos não haviam sido adquiridos
em vão. Só que ela não esperava falar disso.
— Eu lhe disse que não seria assim, Joan. Eu fiz alguma coisa
para assustá-la, ou para fazer você pensar que eu menti quando
disse isso? Eu te tratei com qualquer coisa exceto respeito?
— Não. Mas... Ela se conteve.
Rhys olhou direto nos olhos dela.
— Mas está sempre lá. Isso é o que você ia dizer, não é?
— Sim, sempre lá. Sempre que você volta e até mesmo
quando você está fora. Como uma névoa tão grossa que pode pegá-
lo na mão. Você falou muito ousadamente no poço naquela primeira
noite, e veja o que isso fez. Eu não estou com medo de você, mas
você me deixa cautelosa.
Ele estendeu a mão. Meio hipnotizada, meio chocada, ela viu
aquela mão vir. Um toque. A carícia mais gentil em sua bochecha.
— Isso não vem apenas de mim, linda pomba. Nunca veio.
Nem da minha honestidade no poço. Você é tão cautelosa comigo
porque você sabe que seria bom entre nós.
Por um momento ela não conseguiu se mexer. O calor de sua
palma áspera parecia segurá-la no lugar e entrar em sua pele e
sangue. Um calor fascinante e estimulante.
Ela se afastou e se levantou caminhando até o final da mesa,
para que esta formasse uma barreira entre eles.
— Aqui está você, a primeira noite que meu irmão não está
presente, sendo exagerado novamente. Se eu mantenho um escudo
humano por perto, parece que faço com bom senso. Você insiste
que não me desrespeitou, então prossiga e me mostre de fato.
— Não há desrespeito em um toque de carinho.
— Não é só carinho. Você disse no primeiro dia que não está
tentando me seduzir, mas acho que é o que você pensa em tentar
hoje à noite.
— Não há desrespeito em querer uma mulher também.
— Há se ela não estiver interessada, se ela não quiser.
Ele olhou do comprimento da mesa para ela. Ela achou sua
expressão insondável.
— Você continua dizendo que não está interessada. Você tem
certeza? Porque eu acabei de ver algo em seus olhos e senti um
tremor embaixo da minha mão que dizia o contrário.
— Estou muito certa. Exceto que ela não estava. Algo dentro
dela balançou avidamente a promessa oferecida naquele toque. Uma
falsa promessa, ela sabia. Sem esperança. Mas sua feminilidade
havia respondido de qualquer maneira.
E Rhys sabia disso.
— Então venha sentar e terminar sua refeição. Se você
realmente não está interessada, você está segura comigo.
Ele estava brincando com ela. Desafiando-a. Se ela retomasse
seu lugar, ele a tocaria novamente, talvez apenas uma vez, para
testar sua falta de interesse.
O clima entre eles se contraiu terrivelmente, sedutoramente,
com sua atração invisível e seu fraco impulso. Ele fez isso
deliberadamente, como uma declaração de poder. Apenas a barreira
da mesa impedia-a de deslizar pelas tabuas até ele.
— Então, ele finalmente disse. — Pelo menos não temos mais
que fingir. Mas se isso é tão forte que está sempre lá, no ar que
respiramos, estou me perguntando por que você nega isso.
— Eu expliquei isso. Eu não estarei aqui por muito tempo.
— Sim. Você tem um lugar para ir e algo importante para
fazer. Outra coisa que temos em comum. Ao contrário da maioria
dos homens, eu entendo isso, já que eu me encontro na mesma
posição. Mas parece que você não. Desde que eu não procure te
amarrar ou te parar, o que é que você teme que aconteça em meus
braços nesse meio tempo?
— Desapontamento.
Um olhar muito direto. Um sorriso lento e sensual. Uma luz
perigosa naqueles olhos azuis.
— Bem, Joan, eu prometo fazer o meu melhor.
Ela falara impulsivamente uma confissão, mas ele ouvira um
desafio. Tão bem. Iria humilhá-la se explicar.
— Se eu quiser descobrir o quão bom é o seu melhor, vou
deixar você saber. Levou todo o seu tremor de equilíbrio para dizê-
lo.
A luz do desafio cintilou novamente em seus olhos. Ele a olhou
muito calorosamente, aquela tempestuosidade surgindo.
Ela meio que esperava que ele se levantasse e andasse até ela
e colocasse sua rejeição à prova.
Ele não fez isso. Ele relaxou de volta em sua cadeira, e ela
sentiu que o pior tinha passado.
Ela começou a recolher as tigelas e a bandeja.
Ela se moveu rapidamente, temendo que ele pudesse estender
a mão para ela.
Temendo isso, e esperando por isso. Esperando muito
esperançosamente, admitiu com pesar. Ele também sabia disso. Ela
podia sentir que ele sabia.
Ela virou-se para a cozinha com seu fardo.
— Fugindo?
— Sim.
— Eu me pergunto o que você faria se eu não te deixasse.
A ideia atraiu a metade dela, mas a outra metade
instantaneamente desnudou suas garras.
— Eu odiaria você.
— Isso é o que eu costumo deduzir. Quando não acontece, é
porque é noite e estou sonhando.
— Você me imagina complacente, então?
As menores rugas se formaram, mas o sorriso era duro e o
olhar muito direto.
— Complacente? Isso soa domesticado e derrotado. Não, Joan,
eu imagino você como eu te conheço. Gemendo de prazer e só
querendo mais.
Ela fechou os olhos e sacudiu o feitiço que ele havia lançado.
Ela se afastou dele e caminhou para a cozinha, tentando parecer
digna apesar de suas pernas bambas.
Nenhum passo a seguindo. O alívio bateu nela, mas outra
coisa, um anseio frustrado que ela não podia negar, bateu por baixo.
Parecia que evitar um tipo de desapontamento significava
engolir um tipo diferente e mais confuso.
Capítulo IX
Vendedores entupiam o mercado. Não apenas vendedores de
comida, como era normal nesta seção do mercado.
A temporada para os dias de feira e os festivais haviam
chegado, e mercadores e artesãos de toda a região parariam em
Londres enquanto viajavam de uma feira a outra.
Joan empurrou a multidão, carregando sua cesta. Este não era
o mercado mais próximo da casa de Rhys.
Ela decidira obedecer a sua ordem e não esfregar mais o chão
diariamente. Em vez disso, ela usou o tempo para se aventurar pela
cidade quando comprava provisões. Deu a ela a chance de visitar as
lojas que vendiam louças e ladrilhos e perguntava sobre os artesãos
que as forneciam.
Diminuiu a velocidade quando passou pelo carrinho de um
oleiro e deu um exame afiado em suas mercadorias. Forno
queimado. Ela havia notado vários outros com xícaras e tigelas nos
mercados nos últimos dias.
— Estes são muito bons —, disse ela, levantando uma tigela.
Não apenas forno queimado. Ele usara uma roda. — Você não é de
Londres. Sua casa está por perto?
— Kent
Kent. Não muito longe de tudo.
— Eu vejo algumas peças no seu carrinho. Você também faz
isso?
— Elas são do meu irmão. Nós compartilhamos um forno.
— Você vai ficar aqui a semana toda?
O oleiro sacudiu a cabeça.
— Há um dia justo em Canterbury na próxima semana. Estou
indo para lá em dois dias, para conseguir um bom lugar. Se for
azulejos o que você quiser, vá até lá. Meu irmão estará comigo.
Ela estudou o cabelo grisalho e o rosto suave do oleiro. Ele
parecia bastante amigável. E seguro o suficiente. Ela abordou o
assunto que já havia criado com vários outros artesãos hoje.
— Você faz todos os potes você mesmo?
— Eu tenho dois aprendizes e alguns trabalhadores para
preparar o barro, mas a maioria deles aqui é meu.
— Eu faço potes também. Não em uma roda, mas muitos não
podem dizer, eles são realmente bons. Eu estou procurando um
lugar para fazer meu ofício. Eu também trabalhei em um pátio de
azulejos. Talvez você ou seu irmão precisem de outro trabalhador.
Ele a olhou curiosamente.
— Você espera moeda, ou apenas abrigo e conselho?
— Moeda. Meu ofício é muito bom.
— O ofício de todos é bom, ouvi-los contar.
— Eu posso te mostrar. Eu tenho algumas xícaras que fiz. Eu
vou me encontrar com outro mestre amanhã na Catedral para
mostrar a ele minha habilidade. Eu também posso lhe mostrar se
você quiser. Você não encontrará ninguém melhor que eu. Será uma
barganha para você, já que eu trabalho tão bem e duramente como
qualquer homem, mas custo muito menos.
— Eu não vou estar de pé em uma catedral dando lances por
uma mulher. Eu tomo cerveja naquela taverna ali de madrugada.
Traga essas xícaras suas antes de eu deixar a cidade e veremos o
que é o quê.
Ela prometeu encontrá-lo e abriu caminho através da multidão.
Uma excitação inebriante animava seu passo. Que sorte ela teve
com dois ceramistas procurando trabalhadores hoje. Em quinze dias
ela teria ido embora desta cidade. Considerando o que aconteceu
naquele jantar com Rhys, isso não seria rápido o suficiente, mas
teria que ser feito.
Ela caminhou para fora do mercado, fazendo planos. Ela sairia
antes que Rhys acordasse e traria apenas as melhores xícaras. Se
ela assasse o pão de amanhã hoje à noite, haveria comida para ele
de manhã e, quando ele fosse interrogá-la sobre sua ausência, tudo
estaria resolvido.
Botas pararam ao lado dela. Uma presença familiar aqueceu
seu lado. Surpreendida, ela olhou para encontrar Rhys sorrindo para
ela.
— Você está longe de casa, Joan.
— As aves no mercado da vizinhança eram magras. Decidi
visitar esta. E posso estar longe de casa, mas você está mais longe
de Westminster.
Ele aliviou-a do peso da cesta.
— Eu costumo voltar para a cidade depois do jantar. Os outros
maçons usam o tempo para dormir, mas eu não preciso disso. Eu
estou indo para uma loja de escriba para comprar algum
pergaminho. Por que não vem comigo? É um lugar interessante.
Como ele levava a cesta, ela foi junto. A loja de um escriba
seria uma boa diversão.
Ele andou por várias ruas desde a rua do mercado, entre
outras lojas que pareciam muito boas. Ela olhou em suas janelas
quando ela passou. Um ourives e um peleiro. Tecidos ricos podiam
ser vistos além das persianas de um comerciante, e ela reconheceu
uma cabeça marrom dourada entre eles. David, o novo amigo de
Mark, a viu e fez uma saudação.
— Meu mestre morava nessa área, então a maioria desses
artesãos são velhos amigos. Esse escriba passa alguns de seus
pergaminhos. Isso me poupa o trabalho de encontrá-lo em outro
lugar, já que não preciso de muito, explicou Rhys enquanto liderava
o caminho.
Seu amigo parecia um escriba de muito sucesso. A maioria
trabalhava em mesas na catedral, não em uma loja.
Este ainda tinha um aprendiz.
Ela olhou para os pergaminhos e lençóis e o livro que o
aprendiz decorou com tintas coloridas. Rhys comprou duas folhas de
pergaminho cremoso. Ela viu muitas moedas trocarem de mãos.
Do lado de fora da loja, largou a cesta e cuidadosamente
dobrou os lençóis.
— É muito caro, disse ela.
— Sim. Minha única indulgência. Outros homens compram
facas ornamentadas ou móveis ricos. Eu compro as coisas dos
sonhos.
— Isso é quando você não está desperdiçando sua prata em
mulheres relutantes.
Ele sorriu.
— Eu te disse, Joan. Você é o material dos sonhos também. Ele
enfiou um dos lençóis no cesto. — Essa é para você. Eu vou te dar
uma pena e um pouco de tinta. Espero que você perca o seu ofício.
— Será um desperdício pecaminoso. Manchas, tinta e desenhos
não são o material do meu ofício. Ou meus sonhos.
— Tudo é design. É tudo uma manifestação do mesmo ofício.
Se você cometer erros, você pode raspá-los. Eu vou te mostrar
como.
Ele desceu a rua e parou na loja de ourivesaria.
— Agora que penso nisso, o que realmente queremos está
aqui.
— Ouro? Oh, sim, isso é realmente o material dos sonhos.
Ele torceu o dedo e chamou-a para segui-lo para dentro.
O único ouro visível era um santo em miniatura sendo
trabalhado pelo mestre na parte de trás da loja. Um pequeno torno
segurou-o enquanto ele arqueava ao longo de suas linhas delicadas.
Ele os acolheu e continuou seu trabalho, mas ele continuou olhando
para ela e quebrando sorrisos de menino em sua atenção.
— É oco, disse Rhys. — Não tem volta e será anexado a algo -
um relicário, eu acho.
O ourives assentiu.
— Sim, um relicário para os Blackfriars.
— Para torná-lo oco, e menos desperdício de ouro, ele faz um
núcleo de barro. Então o santo é moldado em cera, depois coberto
com gesso, explicou Rhys. — Ele aquece tudo, a cera derrete e o
ouro derretido é derramado na cavidade. Quando esfria e endurece,
ele quebra o gesso, tira-o da argila, e ele tem seu pequeno santo.
Para todos os metais preciosos é o mesmo processo. É assim que os
sinos da igreja são fundidos.
— Então devo terminar, que é o que estou fazendo agora,
disse o ourives. — Talvez um dia você faça uma estátua de bronze,
Rhys. A rainha é rica o bastante para isso.
— Mesmo ela não é tão extravagante. E eu não moldo, eu
esculpo. Ele gesticulou para Joan. — Mas minha amiga aqui trabalha
com argila. Talvez você tenha algum extra que nos venda.
Ela olhou para ele surpresa, e depois para o ourives com uma
esperança descarada.
O ourives baixou seu arquivo e debateu.
— Eu não tenho muito, e há outras figuras para fazer. Ele
olhou para ela e quebrou em um dos seus sorrisos. Ela sorriu de
volta e ele corou. — Oh, sim, eu acho que poderia vender um
pouco.
Ela assistiu maravilhada quando mais algumas moedas
apareceram. Rhys pegou a pequena moita e a largou na cesta. Não
era muito, mas faria uma estátua.
Ou duas xícaras. Recém-trabalhadas xícaras secas que ela
poderia trazer para os ceramistas amanhã, para provar que a
habilidade era realmente dela.
— É melhor eu levar isso de volta para casa para você, disse
Rhys. — O barro torna muito pesado.
Isso foi muito gentil da parte dele. Ele muitas vezes era gentil.
Exceto quando ele estava comprando sua escritura. Ou ameaçando
seduzi-la. Talvez ele estivesse sendo especialmente agradável hoje
para compensar a outra noite.
Ele trouxe o cesto para a cozinha e saiu pelo corredor. Ela
pegou o barro e levou-o para a mesa debaixo da árvore. Ela se
sentou e olhou para o caroço, cutucando-o com os dedos. Seria legal
fazer uma estátua. Ela havia imaginado várias nas últimas semanas
que queriam ser formadas. Como ela não podia queimar o barro, ela
poderia fazer um, depois reutilizar o barro e fazer outro,
repetidamente.
Não, seria melhor formar as xícaras. Não muito divertido, mas
mais útil no momento.
Suas contemplações absorveram-na completamente, e assim
os passos próximos a assustaram.
Rhys não havia saído depois de tudo. Ele colocou uma pena e
um pote de tinta na mesa.
Ela olhou para eles e para o barro. Ela pensou no pergaminho
ainda guardado na cesta. Tinha sido muito agradável hoje, visitando
as lojas, andando e conversando.
Ela pressionou a massa flexível e seus dedos afundaram. Era
tão bom.
— Obrigado por isso. Por me ajudar a encontrá-lo. Eu vou
pagar o que custou.
— É um presente. Eu não suportaria ficar fora do meu ofício.
Tenho certeza de que é o mesmo com você.
Seu coração se aqueceu com a consideração dele, mas ela não
queria que ele lhe desse presentes. Ela encontraria alguma maneira
de recompensá-lo, mesmo que ele nunca soubesse.
Talvez ela começasse pelo menos uma estátua e depois, mais
tarde, a transformasse em xícaras.
— Joan, o Mestre James e o Mestre Neil não estarão esperando
para se encontrar com você. Os dois homens decidiram que não
precisam de uma trabalhadora bonita, afinal.
Suas palavras silenciosas penetraram sua euforia. Ela olhou em
choque.
— Você viu? Você me seguiu? Você falou com eles depois de...
De repente, ele parecia menos gentil.
— Não é bem que eu tenha feito. Nem todo homem que
trabalha com argila é tão flexível quanto George. Se eles
concordaram em se encontrar com você para discutir tal coisa, não
era sua habilidade em seu ofício que eles tentaram comprar.
— Seria uma vez que eles vissem meu ofício.
— Sua habilidade é alta, mas a deles é maior.
— Exatamente. Eu poderia ter aprendido com qualquer um
deles. Eu poderia ter tido a chance de dominar a roda, ou aprender
a usar slips. Você não tinha o direito de interferir!
A luz brilhou em seus olhos. Seu rosto ficou duro e severo.
De repente, ela entendeu. Raiva disparou através dela.
— Você não fez isso para me proteger. Você fez isso porque
decidiu que não vai me deixar sair. Ela levantou o barro e jogou de
volta para baixo.
— Você procurou me apaziguar com isso.
Ele não respondeu, mas sua expressão dura respondeu
claramente.
— O que você disse para eles? Com que palavras você desfez o
que eu havia cuidadosamente começado?
— Eu disse que você pertence a mim. Isso saiu de forma
simples e firme.
Fúria bateu em sua cabeça. Ela sentiu sua mandíbula apertar.
— Não, pedreiro. Eu pertenço a mim, e nunca esqueça disso.
Seus olhos ardiam. Ele a levantou do banco. Sua expressão fez
seu coração pular.
— Sim, você pertence somente a você, Joan, e eu nunca
esqueço isso. Ele a puxou em seus braços. — Nunca me esqueço de
nada. Nunca esqueço isso. Nem você. Sua boca reivindicou a dela
em um beijo forte e exigente.
Foi a sua confusão sem fôlego que permitiu o beijo profundo,
não seu livre arbítrio. Ele a pegara inconsciente, isso era tudo. Ela
freneticamente disse a si mesma, enquanto mergulhava em um
turbilhão caótico. A atração forçada a puxou, tornando-a indefesa.
Beijos com mordidas. A raiva deles a aqueceu e potenciou,
uma série febril de desafios, triunfos e derrotas, com a última
inteiramente dela.
Quando sua maestria estava completa, quando ele provou a
ela o poder do desejo, ele pegou o rosto dela e olhou nos olhos
dela.
— Sim, nenhum de nós esquece. Eu posso estar no meu
quarto, e você na cozinha, e está lá. Sua expressão era muito
sabida. Ainda grave, ainda com raiva. — Então me diga, Joan, sobre
como você pertence a você sozinha, e como eu não tenho direitos
ou reivindicações. Mas primeiro me diga por que isso te assusta
tanto que você arriscaria sua segurança para escapar dela.
A raiva a inundou novamente. Raiva de si mesma, por ter
permitido aquele primeiro beijo debaixo daquela árvore.
Ressentimento pela fraqueza que a levou a buscar refúgio em um
homem, qualquer homem, principalmente em alguém que a queria
assim. Um homem sobre quem ela podia confiar em apenas uma
coisa, com certeza. Que ele a desejava.
A raiva era principalmente consigo mesma, mas também havia
algo para ele. Pela maneira como ele continuava a encurralá-la,
pedindo-lhe para encarar algo que ela não queria olhar.
Algo terrível, entorpecente e oculto. Algo enrugado e invisível,
mas não morto.
Ela pegou a raiva e jogou-o com motivos que ela podia falar.
— Você age como se tivesse me protegido com essa
interferência, mas não é mais isso, pedreiro, não é mais como
quando você me tirou do pátio. Já que você fracassou, já que eu
não serei sua amante, deixe-me ir embora.
— Você quer fazer esta base, mas você sabe que não é. Se eu
procurasse uma companheira de cama, eu poderia ter pegado a
moeda que dei a George e comprar prostitutas por anos.
— Então compre-as. Ela se afastou com força. Ele a soltou.
Que bom que ele fez, pois ela estava pronta para agredi-lo se ele
segurasse firme. — Compre-as, Rhys, porque isso nunca será.
— Já é. E nós dois sabemos disso.
— Não, não é. Nem nunca será. Nunca. Nem vou estar em sua
casa por muito mais tempo. Eu quero ganhar moedas com o meu
ofício, não apenas moldar para o meu divertimento. Eu vou
encontrar um lugar onde eu possa. Quando o fizer, eu irei embora e
nem todo o prazer do mundo me impedirá. Ela caminhou em direção
à cozinha, desesperada para acabar com isso.
— Eu acho que você tem medo que ele vai pará-lo.
— Fique de lado e veja se isso acontece. Ela atirou o desafio
por cima do ombro. — Você não sabe nada sobre mim. Quem eu
sou e o que temo não tem nada a ver com você.
Ela foi até a taverna e a Catedral no dia seguinte, mas nenhum
de seus ceramistas estava esperando por ela.
Quaisquer que fossem as palavras que Rhys usara, elas tinham
sido eficazes. Provavelmente, seu tamanho e força haviam falado
com bastante eloquência.
Ela tentou ignorar o barro que ele lhe dera, mas acenou como
uma sirene. Na época do mercado, ela havia destruído as xícaras
feitas com fúria rebelde no dia anterior e começado um dos santos
que ela já moldara em sua mente.
Mark acompanhou-a ao mercado, nenhum dos dois muito
satisfeitos em fazê-lo. Rhys era inteligente, ela tinha que dar isso a
ele. Ele dera a Mark uma tarefa adicional. Ele havia ordenado a seu
irmão que carregasse sua cesta de mercado para que ela estivesse
livre do fardo. Claro que Mark se recusou a vagar por toda a cidade
fazendo o trabalho de uma mulher, visitando lojas e visitando
artesãos. Ao selá-la com o irmão, Rhys a acorrentou ao mercado da
vizinhança.
Eles retornaram com provisões mais cedo que o normal.
Entraram pelo portal do jardim e levaram a comida para a cozinha.
Mark foi para o corredor.
Ele estava subindo para pegar o arco que ele usava todos os
dias enquanto Rhys estava fora, e ela havia deixado de discutir
sobre isso. Ele estava inquieto apesar de seu trabalho no estábulo e
no jardim. Mirar no alvo por uma hora, geralmente o tirava de sua
irritabilidade.
Ela não o ouviu na escada, no entanto. Em vez disso, ele
voltou para a cozinha.
— Não é divertido hoje, ele murmurou. — Ele voltou cedo. Ele
está lá em cima. Eu o ouvi andando. Melhor planejar mais do que
pão e queijo para o jantar.
Na verdade, ela planejara pouco mais. Agora ela teria que ir ao
mercado novamente. Ela entrou no corredor, com a intenção de
dizer algumas palavras pontudas sobre dar-lhe algum aviso se ele
esperava fazer a refeição do meio-dia na casa.
Ela ouviu os passos de uma vez. Ela congelou e ouviu
atentamente o peso deles. Sua nuca arrepiou-se.
Não era Rhys. Ela conhecia seus passos muito bem. Bem
demais. Quando ele estava aqui, o pulso de seu sangue combinava
com seu ritmo e, quando ele estava ausente, eles ecoavam no vazio.
Ela voltou para a cozinha.
— É outra pessoa, tenho certeza, ela sussurrou.
Os olhos de Mark se iluminaram de excitação.
— Eu irei ver. Nenhum ponto em nos ter com ele se ele é
roubado enquanto nós nos sentamos no jardim.
— Você não está indo até lá desarmado.
— Eu tenho meus dois braços e punhos.
— Eu vou com você.
Ele começou a objetar, mas ela o avisou com os olhos para não
se incomodar. Gesticulando para que ela ficasse atrás dele, ele
atravessou o corredor.
Os degraus acima foram até o final, onde ficava a pequena
sala de trabalho.
Ela subiu as escadas na ponta dos pés atrás de Mark.
O intruso deve ter ficado ocupado na sala de trabalho, porque
ninguém estava esperando para pular no solar. Mark deslizou para o
baú que continha as armas. Ele levantou a tampa e puxou o arco e
uma flecha. Enquanto ele encaixava o cabo na corda, ela agarrou a
adaga.
Sons abafados, como um rato farfalhando pelos escombros,
vinham da sala de trabalho. Mark caminhou em silêncio até o limiar
da pequena sala, ergueu a arma e entrou.
— Então é você, ela o ouviu dizer.
— Jesus, uma voz assustada chorou.
— Joan, vá levantar o grito e consiga um policial. Temos um
ladrão aqui. Sem dúvida ele já encheu sua túnica.
— Um ladrão. Eu não sou ladrão. Reviste-me se quiser, não
tomei nada.
— Eles podem revistar você quando eles te enforcarem.
— Me pendure!
— Fora. E não tente correr. Esta flecha vai te encontrar se a
adaga da minha irmã não.
Passos arrastados.
— Jesus —, o ladrão murmurou. — Inferno.
Um homem entrou na vista. Corpulento e bem vestido de
cabelos loiros e barba. O homem do beco.
Mark o seguiu para fora, a cabeça da flecha tensa a palmo de
suas costas.
— Cuidado com isso, garoto. Acalme-se um pouco, vai? Um
deslize e...
— E você está morto. Não esqueça.
Joan cumprimentou-o com a ponta da adaga.
— Mark manterá isso apontado para você enquanto eu for
buscar o policial. Se você rouba desta casa, você roubou dos outros.
— Eu juro que não sou ladrão. O homem afundou em um
banquinho, parecendo em pânico. Ele deu um tapinha nervoso na
túnica.
— Vê? Nada.
— Então por que você está aqui? Qual é o seu interesse por
esta casa?
Ele olhou para ela com cautela e um pouco suplicante. Ele
acenou em direção a Mark.
— Diga ao seu irmão para tirar sua mira de mim, vai?
Ela imaginou que ele queria mais do que isso. Houve uma
oferta para explicar em seus olhos.
— Mark, leve o arco para o andar de baixo, para o caso de ele
tentar fugir. Vou ouvir o que esse homem tem a dizer antes de pedir
ajuda.
Mark não gostou, mas a ideia de impedir uma fuga dramática
deve ter sido um apelo. Ele relaxou o arco e desceu os degraus.
Joan deixou o intruso ver sua adaga claramente.
— Se há uma razão para eu não ir ao policial, é melhor
explicar.
— Não é o policial que eu gostaria de evitar. É seu mestre. Eu
preferiria que ele não soubesse que eu estive aqui.
— Estou certo disso.
— Não, não é o que você pensa. Não roubo. Meu nome é John.
Eu sou um funcionário do Bispo Stratford.
Isso a surpreendeu. Stratford era um bispo poderoso, igual a
qualquer senhor.
— Que interesse um bispo poderia ter em Rhys? É essa
intromissão a proposta de Stratford?
— Não. Ele não sabe... Eu tinha a esperança de descobrir com
certeza, antes de ir para ele... Inferno, isso é um emaranhado, e
temo que eu seja estrangulado pelo nó.
— Melhor ser estrangulado pelo nó de um emaranhado do que
pelo laço de um ladrão.
— Oh, sim, melhor que isso. O lembrete o ajudou a decidir.
— Olhe aqui, mulher. O que você acha daquele homem que se
pavoneia ao redor dos palácios reais e conduz a mãe do rei pelo
nariz? Qual é a sua opinião sobre o conde de março?
— Mortimer? Eu o odeio.
Ele piscou na maneira firme e plana que saiu. Sua expressão se
iluminou.
— Bem, meu bispo o odeia também, assim como eu. Há alguns
que pretendem derrubar esse homem, você vê.
— Fico feliz em ouvir isso. O que isso tem a ver com esta casa?
— Eu tenho alguma preocupação de que seu mestre possa
interferir em nossos planos. Eu estava procurando aprender se estou
certo.
— Um pedreiro não pode interferir nos planos de um bispo.
Acho que você está mentindo.
— É aí que o emaranhado entra. Veja, eu conheço Rhys.
Pensando que ele fosse simpático a causa, eu disse a ele coisas que
eu não deveria, depois de algumas cervejas como é o hábito entre
amigos. Agora eu me preocupo que ele possa ter traído essa
confiança. Tenho razão para pensar que ele se encontrou com
Mortimer.
— Ele é um construtor da coroa. Mortimer teria projetos. Se
eles se encontrassem, provavelmente era só por isso.
Ela deixou seu tom zombar dele, mas um pequeno arrepio de
preocupação passou por ela. Rhys recebeu uma intimação naquele
dia. Ele definitivamente havia se encontrado com Mortimer pelo
menos uma vez.
— Sim, poderia ser apenas isso. Mas eu gostaria de ter certeza,
entende? Porque se fosse outra coisa, se a minha fala tivesse sido
repetida, eu precisaria dizer ao bispo e aos outros, o que causará
desagrado a eles. Por outro lado, se é apenas um projeto de algum
tipo, não preciso levantar a história toda, preciso?
Ele sorriu para ela, esperançoso.
— Então, você pode ver porque eu preferiria que ninguém
soubesse que eu estive aqui, não é? Se eu tiver que começar a
explicar, isso só vai piorar o emaranhado.
— Você achou alguma coisa aqui? Alguma indicação de que
sua confiança foi quebrada?
— Seu irmão me interrompeu. Talvez eu possa apenas... Ele se
virou ansioso em direção à porta da sala de trabalho.
— Não.
Ela deveria entregar este homem para a cidade. Ela deveria
dizer a Rhys que John estava aqui e o que John pensava.
Mas lealdades e medos mais antigos surgiam, sufocando
quaisquer novos que ela pudesse ter para o pedreiro que a
alimentava.
Alimentou-a enquanto ele esperava, e tentou atraí-la para mais
do que ela jamais lhe daria. E encontrou maneiras de impedi-la de
sair.
Sua hesitação deu a John nova confiança.
— Eu posso ver como você pode achar errado me deixar
espiar. Mas talvez, se você favorecer a causa do bispo, se ver ou
ouvir alguma coisa, ou encontrar alguma coisa enquanto faz sua
limpeza e tal, apenas por acidente, você pode me avisar.
Ele queria mais que acidentes. Seus olhos disseram isso,
apesar de suas palavras.
— Só peço porque há muita coisa em jogo. Só queremos que o
homem seja abatido e seus crimes desfeitos.
Sim, crimes. Crimes terríveis. Ela sabia o quão terríveis.
— Haveria gratidão. Tal ajuda não passaria despercebida, ou
sem recompensa, arriscou. — Alguns xelins, pelo menos. Seria uma
pena ter planos importantes desfeitos simplesmente porque eu não
sabia se podia confiar em um velho amigo. Seria bom saber o que
Rhys é, e onde ele está. Você vê isso, não vê?
Sim, seria bom saber o que ele tinha certeza. Qual Rhys era o
verdadeiro? O bom, gentil, oferecendo proteção, ou o lacaio que
usava olhos azuis e confortos físicos para seduzir uma mulher?
John aliviou-se do banco.
— Melhor se eu sair agora. Você vai chamar o seu irmão, não
vai? Diga a ele para me deixar passar?
Ela não parou seu caminho para as escadas. E então ela tomou
uma decisão, ou parte de uma.
— Não volte aqui, disse ela.
— Eu não vou. Mas se você quiser falar comigo, facilmente eu
posso ser encontrado na primeira taberna no mercado após a
catedral.
Ela duvidava que ela iria querer falar com ele. Ele estava
errado. Rhys poderia servir Mortimer como construtor, mas não
como informante. Tampouco achava que ela acharia o que John
procurava, quanto mais procurá-lo.
Ela estava quase certa de todas essas coisas. Quase.
Capítulo X
O homem que andava lentamente dentro do pátio da capela
quando Rhys voltou ao trabalho depois do jantar na abadia não
usava libré, mas ele parecia familiar. Rhys o tinha visto em volta de
Westminster.
O pajem de cabelos vermelhos deveria estar doente.
— Você está esperando por mim? Rhys perguntou quando o
homem chamou sua atenção.
— Sim. Você é esperado.
Ele não foi levado ao jardim desta vez. Em vez disso, sua
escolta levou-o ao palácio por uma entrada de trás e por um
conjunto estreito de escadas. Depois de atravessar várias câmaras,
encontrou-se entre dois guardas do lado de fora dos aposentos
reais. A porta se abriu e, de repente, Rhys olhava diretamente para
o rosto do rei da Inglaterra.
— Aqui está o pedreiro, disse seu acompanhante.
— Você deve ser Rhys, Edward disse, gesticulando para que
ele entrasse. — Eu ouvi de sua habilidade. Ele passou um braço ao
redor de sua câmara. — Minha esposa e eu desejamos algumas
mudanças, e minha mãe me diz que você é o melhor.
A câmara servia de antessala para os aposentos reais. Tinha
sido mobiliada ricamente, mas não tão opulento como o da mãe do
rei. Isabella e Mortimer mantiveram a casa do rei sem fundos.
Edward estava sentado em uma cadeira almofadada e
esculpida que mal cabia sua estrutura estranhamente alta, e
gesticulou para Rhys se sentar em outra nas proximidades.
Edward olhou para ele. Rhys também olhou um pouco. O
jovem que havia sido coroado há três anos transformou-se em um
rapaz alto e forte de dezoito anos. Cabelos alourados pendiam de
seus ombros, e uma barba curta e pontiaguda fazia com que ele
parecesse alguns anos mais velho. Dizia-se que ele tinha mais em
comum com seu avô do que com seu pai, mas a maneira como ele
aceitava o modo como sua mãe e seu amante usurpavam seu poder
não falava bem sobre seu caráter.
— A maioria das mudanças está nas outras câmaras, não
nesta. Minha esposa quer que nosso filho fique perto dela, e deseja
que uma pequena parte de seu quarto seja dividida para isso. O
chão, como você pode ver, é só tábua, e ela acha isso muito pobre.
Ela tinha azulejos em sua casa em Hainault. Ela gostaria de algo
semelhante aqui.
Ele se levantou e levou Rhys para o quarto real.
— Há uma outra pequena mudança que eu gostaria. Ele
apontou para uma parede. — Eu quero uma porta lá.
Aquela parede estava em ângulo reto com a que continha a
entrada principal da antessala. A entrada através da qual ele
acabara de chegar, e do lado de fora estavam guardas - guardas
leais à Rainha.
Mortimer não havia dito nada sobre uma nova porta. Rhys
olhou para a parede e sabia com certeza que ele não queria este
projeto.
— Você não precisa de um maçom para fazer a partição ou
porta. Um pedreiro bruto é mais habilidoso em tais coisas.
— Eu fui assegurado que você é discreto. Eu preferiria que o
trabalho fosse feito silenciosamente.
Ele ficou mudo, esperançoso.
— Não se pode cortar blocos de pedra em silêncio.
— Haverá o trabalho da telha fazendo barulho também, e a
nova partição, e minha mãe vai assumir que é isso. Ela deu sua
aprovação para essas mudanças, na esperança de apaziguar minha
esposa. Quem vai dizer o que som faz?
Inferno.
— Sinto-me honrado por você ter procurado o meu ofício, mas
talvez outro...
— Fui informado de que você é o melhor que posso encontrar
para meus propósitos. Minha mãe confia em você porque você
ajudou sua causa, mas eu sei algo que ela não sabe - que você
também ajudou os homens que mais tarde tentaram limitar seu
poder. Sim. Mestre Rhys, você é o pedreiro deste projeto.
Desnecessário dizer que ele havia sido recrutado contra sua
vontade de espionar Mortimer, não havia como escapar disso.
— Claro que vou fazer o trabalho. Posso começar de uma vez.
Quanto às telhas, sua rainha tem preferência pelas cores? Quer que
eu as pegue da Espanha?
— Ela sabe exatamente o que quer. Se você tiver que esperar
para buscá-los na Espanha, faça isso, mas prefiro patrocinar
artesãos ingleses se pudermos.
Edward liderou o caminho para o apartamento ao lado.
Philippa, de cabelos castanhos, estava sentada em seu próprio
quarto.
Não era uma grande beleza, era verdade, mas ela possuía uma
expressão doce, especialmente agora, enquanto segurava o filho.
Ela descreveu os azulejos que ela conhecia da casa de seu pai.
Rhys pediu um pergaminho e uma pena e rapidamente desenhou
um. Eles fizeram arranjos para o acesso dele às câmaras, e então
Rhys se despediu.
Ele não retornou ao pátio da abadia. Ele foi para casa, então
não haveria chance de ser chamado por Mortimer neste dia. Ele
tinha uma boa desculpa, uma vez que uma mudança de última hora
no design do vidro da janela exigia alguns recálculos em relação à
montagem da pedra.
Mas ele seguiu para sua sala de trabalho por outro motivo. Ele
também queria traçar em pergaminho seu conhecimento acumulado
da organização das câmaras do palácio. Se a memória o servisse
corretamente, a parede que esperava por uma nova porta separava
os aposentos de Edward daqueles do Guardião do Selo Privado.
Ele se perguntou quem e o que passaria pela nova porta
quando ela fosse cortada.
Joan certificou-se de que a sopa estava fervendo e tirou o pão
da noite do forno. Ela deixou alguns cents e um jarro na mesa para
lembrar Mark de ir comprar a cerveja quando ele voltasse. Ele nunca
estava em casa durante estas horas da noite. Era quando seus
novos amigos, os aprendizes como David, finalmente estavam livres
e ele sempre ia em busca deles.
Armando-se com uma vassoura e um pano, ela subiu as
escadas. Ela seguiu para a pequena sala de trabalho.
Em suas duas semanas aqui, ela não tinha limpado lá. Embora
Rhys não tivesse proibido, ela sentiu que sua intrusão não seria
bem-vinda. Mas ela decidiu invadir hoje, e não apenas para varrer.
A câmara era bem pequena. A longa mesa apertada ficava
abaixo de uma janela que dava para a rua, e os sons da cidade
fluíam para dentro.
Estava cheio de pergaminhos. Uma prateleira segurava rolos
deles, junto com sua pequena Santa Inês. Mais cobria a mesa. Eles
pareciam espalhados, mas alguma coisa na maneira como estavam
sugeria que ela perturbaria as coisas se ela os arrumasse.
Ela não tinha intenção de perturbá-los - pelo menos não muito.
Seria bom saber o que ele é. Sim, seria. Ela não gostava de
morar aqui sem saber, e as suspeitas de John a perturbavam.
Uma folha no topo mostrava uma pequena igreja, uma porta
de pedra, um rendilhado de janela e um portão da cidade. As
imagens inclinavam-se para um lado e para o outro, como se
alguma ideia lhe ocorresse e ele simplesmente pegasse o
pergaminho mais próximo e anotasse. Também mostrava cifras e
símbolos.
Alívio borbulhou nela. Apenas desenhos para seus projetos.
Não o que John suspeitava, o que quer que fosse.
Ainda...
Ela cautelosamente levantou o canto de um deles e espiou
abaixo. Então outro. Uma pontada de culpa a esfaqueou. Rhys
poderia ter interferido em sua vida e planos, ele poderia falar de
proteção quando ele realmente queria dizer luxúria, mas ele não fez
nada para machucá-la. John provavelmente era apenas um tolo
desconfiado. Ela não deveria deixar que suas acusações a
afetassem.
As palavras de John ecoaram em sua cabeça. Por uma justa
causa. Para trazer um homem do mal para baixo.
Talvez só mais alguns, perto do topo, só para ter certeza...
Passos soaram nas escadas. Ela sabia quem era. Sentiu isso.
Ela olhou para a janela em pânico. Havia pelo menos uma hora de
luz sobrando. Ele não deveria estar de volta tão cedo.
Ela pegou a vassoura e começou a varrer.
Ele entrou na câmara, sombriamente bonito em sua túnica sem
mangas e calças de couro.
— Você está de volta cedo hoje. Ela alcançou a vassoura em
um canto para pegar uma teia de aranha. Seu coração bateu no
chamado.
E da sua presença. Ela sempre se sentia um pouco em guarda,
um pouco consciente, quando ele estava em casa.
Seu comportamento na outra noite em sua refeição só piorou a
situação. Não importa o que eles falaram, outro diálogo silencioso
continuou entre eles sem parar. Um íntimo.
— O idiota que está no comando do vidro mudou seu design,
então eu devo mudar a localização do rendilhado.
Ele chutou um banco para a mesa e sentou-se. Ele vasculhou
os pergaminhos até encontrar uma folha bastante vazia. Abrindo
uma caixa, ele puxou um instrumento de madeira em forma de um
V. Ela se aproximou para dar uma olhada melhor nele.
— O que é isso?
— Se desenha círculos com isto. Olhe. Ele colocou um dos
braços do aparelho em linha reta e depois moveu o outro ao redor.
Uma linha cinza apareceu em um círculo perfeito. Ele moveu os
braços para mais perto. — Veja, maior ou menor. Experimente.
Ela colocou a vassoura de lado, pegou a ferramenta e fez um
círculo sozinha.
— Uma pequena imagem do infinito, disse ele. — Sem começo
nem fim, e perfeito na forma, todos os pontos igualmente distantes
do centro.
— Essa é uma maneira muito poética de pensar em um círculo.
— Se você trabalha com geometria por muito tempo, parece
um tipo de poesia. Meu mestre costumava dizer que Deus estava em
números. Sente-se aqui e eu lhe mostrarei algo quase mágico.
Ela deslizou para o banco e ele entregou-lhe uma régua de
medição.
— Primeiro você fará um quadrado perfeito. Seguindo suas
instruções, ela desenhou uma com uma vara queimada que ele
retirou da caixa.
— Agora pegue o ponto da ferramenta e coloque-o bem no
meio da linha inferior. Abra-o até que o bastão esteja em um dos
cantos superiores. Agora desenhe o arco de um círculo no lado de
fora do quadrado, mas pare quando chegar o mesmo ponto em que
a linha inferior deve continuar. Continue a linha inferior do quadrado
até esse ponto, depois termine o retângulo.
Ela teve um pouco de dificuldade em fazer o ponto ficar parado
enquanto ela virava o outro braço. Ele cobriu a mão dela com a sua
e estendeu a mão para guiá-la.
Seu toque e proximidade fizeram seu coração subir. Ele se
atrapalhou o suficiente para que demorasse um pouco para acertar
o desenho.
— Parece um monte de problemas apenas desenhar um
retângulo.
— É um especial. É chamado de retângulo de ouro. A adição
no lado da praça é outro retângulo da mesma proporção que o
grande. E isso pode ser novamente quebrado em um quadrado e
outro retângulo dourado. E então continue.
Ela sentiu uma profundidade que causou um pouco de frio,
como se sua mente tivesse roçado contra algo profundo.
— Simplesmente continuar, quer dizer? Outra imagem do
infinito. Não se pode deixar de ficar impressionado com isso.
Rhys pareceu satisfeito por ela ter visto aquilo.
— Construtores usam o retângulo de ouro o tempo todo. Ele
dá proporções agradáveis que o olho acha harmonioso. É
frequentemente a medida básica usada para iniciar catedrais.
— É como mágica. Talvez seu mestre estivesse certo, e Deus
está em números.
— Muitos aprendizes odeiam aprender a geometria necessária
para ser um pedreiro, mas eu sempre achei que isso me permitiu ver
um pouquinho de como a mente do Criador funciona.
A maioria das pessoas recorreu à oração para aprender isso,
não para números. Ele não falou de aprender a vontade de Deus.
Ele queria dizer compreender o mistério.
Ela nunca conhecera alguém que contemplasse essas coisas.
Ela sentiu que isso não era algo que ele explicasse com
frequência. Ele estava deixando-a ver um pouco de como sua mente
funcionava.
— Às vezes penso que sinto um pouco de Sua mente quando
trabalho o barro, disse ela, esperando que não parecesse terrena
demais em comparação. — Quando está indo muito bem, e minhas
mãos não podem errar, e a figura toma forma exatamente como
minha mente a vê. Nesses momentos é como um transe, mais
espiritual do que estar na igreja. Sem palavras e pura, mas não
quase tão sólido e absoluto quanto esses números.
— Sim, mas é muito semelhante. Só não é a Mente que
conhecemos quando o nosso ofício nos move dessa maneira. É a
Alma.
Ele entendeu exatamente. Isso a surpreendeu. Ela não
percebeu que era o mesmo para todos que faziam formas com as
mãos. Rhys também conhecera esse êxtase especial.
Reconhecer que compartilhavam essa experiência mais
particular a tocava mais seguramente do que qualquer mão podia.
Ele poderia ter invisivelmente acariciado sua alma.
O clima a aqueceu e provocou um anseio melancólico. Eles
tinham muito em comum. Ambos estavam longe do lugar de suas
famílias e haviam provado o poder da criação. Pela aparência desta
casa, com seus escassos móveis e falta de esposa e filhos, ele vivia
como se também estivesse a caminho de outro lugar, para fazer
algo que precisava ser feito. Ela quase perguntou se ele já decidira
onde e o que seria.
Ele olhou para ela com compreensão íntima. Este momento de
especial empatia não precisava de palavras. Ele tecia um feitiço
entre eles que ela achava impossível de negar ou quebrar.
A expectativa puxou, tentando juntá-los. Apertou com uma
força palpável quanto mais eles olhavam. Ela pensou que ela iria cair
nele com tanta certeza quanto naquele dia debaixo da árvore.
— Você está esperando que eu te beije, Joan?
Ela desviou o olhar, envergonhada por tê-lo deixado pensar
assim.
A mão dele segurou seu queixo e virou o rosto para ele. Seu
polegar gentilmente acariciou seus lábios, fazendo um pequeno
tremor bater neles. Ele gentilmente pressionou aquele pequeno
pulso, deixando-a saber que ele entendia o que significava.
— Eu acho que você está.
Ela recuou e se levantou, triste por ter que negar a doce
proximidade que acabavam de compartilhar. Ela se virou e caminhou
em direção à porta. Parecia muito longe.
Um movimento atrás dela. Um braço se esticou, bloqueando o
caminho dela. Uma mão forte, bronzeada e masculina, pressionada
contra a parede, completando a barreira.
— Eu não posso deixar você correr desta vez, Joan. Eu não sou
tão bom assim.
Ele aqueceu o lado dela. Não a tocava, mas ela o sentiu de
qualquer maneira, e seu coração começou a martelar. Ela manteve
os olhos naquela mão e braço.
— Olhe para mim, Joan.
Ela não ousou. Ela deveria passar debaixo daquele braço e
realmente correr. Ele não estava a prendendo aqui, não realmente.
Mas suas pernas não tinham força para isso. Nem havia a vontade
nela.
Calor em seu cabelo, sua têmpora. Não um beijo, apenas a
respiração dele. Ainda não a tocando, mas de alguma forma mais
perto. Toda ela alerta para ele. Expectante. Torcendo com força.
Sua voz calma, tão perto que poderia ter sido um sussurro e
ela teria ouvido.
— Vire-se para mim, linda pomba. Eu não estou tentando
seduzir você, mas não deveria ser assim.
Ela virou a cabeça para aquela voz. Para explicar que não
deveria ser de maneira alguma. Foi por isso que ela fez isso.
Seu beijo silenciou quaisquer palavras que ela pudesse ter
falado.
Um beijo maravilhoso. Quente e promissor. Um convite para
explorar as conexões nascidas nesta câmara.
Sua feminilidade voou para a vida de uma só vez. Ela escapou
das correntes forjadas pelo passado e fugiu. As asas bateram em
seu coração, seu corpo, seu sangue. Sua esperança a fez querer
chorar.
Talvez... talvez...
Ele sabia. Ele a virou para ele, e seu braço deslizou atrás dela
em um abraço. Seu aperto a apoiou como uma pedra e a inclinou
para ele.
Palma contra sua bochecha, ele animou seu rosto e pescoço
com a boca, a respiração e os dentes. Ele começou a controlar o
vento sob aquelas asas esvoaçantes.
Tentando. Atraindo. O desejo que eles compartilharam aqui
ainda cercava os dois. Ele ofereceu mais do que mero prazer com
seu toque. Ele sempre o fazia.
Mas foi o prazer que a hipnotizou. Ele apenas construiu e
construiu, enchendo-a com uma antecipação convincente. Isso
encobria o pensamento e o medo da maneira mais maravilhosa.
Encharcava de luz brilhante e brisa de primavera.
Ele olhou para ela. Nenhum triunfo cintilou naquele olhar.
Confiança, sim e força, mas nenhuma das luzes humilhantes de um
conquistador de olho no vencido.
— Você não beija de volta, Joan?
A questão do jardim. Memórias passaram por todo o seu corpo.
A glória dessa jornada. A devastação esperando no final.
Mas Rhys já a havia atraído para o caminho novamente, e a
liberdade parecia tão boa, tão certa. Libertados de seus laços, as
asas não ficariam paradas. Eles bateram mais freneticamente
enquanto ele olhava nos olhos dela, e o desapontamento parecia
uma coisa pequena e impossível.
Talvez... talvez...
Ela o abraçou e beijou de volta.
Ele a puxou para mais perto e seus beijos ficaram mais febris.
Ele procurou um ponto abaixo da orelha dela e o tocou até que seus
sentidos começaram a se dividir. Ele a beijou novamente e desta vez
entrou nela, destruindo o pouco que ela tinha sobre quem ela
deveria ser.
Com permissão concedida, ele não pediu novamente. Uma
carícia, firme e possessiva, alisou o lado dela, como se reivindicando
e íntima como se estivesse nua. A sensação a deixou sem fôlego. Ela
arqueou enquanto o caminho quente pressionava ao longo de sua
cintura, quadril e coxa.
Beijos no pescoço e mais baixo. Beijos cuidadosos, deliberados
e quentes. A força sólida de seu braço a arqueou mais alto enquanto
ele arrastava os lábios até seus seios. Ele a atormentou, movendo a
boca em torno dos seus picos.
Sua mente se apagou e ela ficou frenética. Nada além de uma
necessidade ansiosa existia nela. Uma necessidade deliciosa que era
uma com o prazer.
Ele cresceu tão intenso que ela implorou. Com seu abraço e
uma oferta de seus seios e uma pressão que guiou a cabeça dele,
ela pediu por mais. Quase com a voz dela também, mas os suspiros
audíveis que se filtravam em seus sentidos entorpecidos eram
bastante eloquentes.
Ele a fez esperar um pouco mais, torturando-a. Quando o beijo
dele voltou para sua boca, ela quase chorou em protesto. Mas sua
mão substituiu sua boca em seu peito, provocando-a com carícias
delicadas.
A necessidade gritante a empurrou para a falta de vergonha.
Ela beijou de volta insistentemente, loucamente.
Um toque. Uma sutil escovação contra os mamilos, primeiro
um, depois o outro. Dois instantes de alívio extraordinário, não mais.
Apenas o suficiente para faze-la cambalear em abandono. Apenas o
suficiente para lembrá-la do prazer que ele lhe daria em breve.
Não tão breve. Ele a pressionou contra a parede. Levou uma
eternidade para ele desatar o vestido. Uma eternidade passou
enquanto ele deslizava a lã e sua combinação de seus ombros. O
pano caiu até os quadris dela.
Ele olhou para a nudez dela e depois para os olhos dela,
enquanto a mão dele acariciava seus seios nus.
Calor conhecido olhou para ela. E talvez, desta vez, algumas
luzes de triunfo em resposta a seus suspiros.
— Eu te disse, Joan. O que existe entre nós não vem apenas
de mim.
Sua cabeça abaixou. Seus dedos sacudiram em uma ponta e
sua língua na outra. O prazer fluiu acentuada e profundamente em
seu estômago e seus quadris. Ele a enviou para um lugar
surpreendente. Um mundo diferente, um de felicidade.
Por um tempo. Mas o prazer rapidamente doeu de novo, e com
um desejo impaciente de outra coisa. Uma parte diferente dela
começou essa demanda implorando. Apesar de seu estado intrigado,
ela sabia que ele estava de fato seduzindo-a. Ele estava usando o
prazer para atraí-la passo a passo, até que ela estaria com fome não
por um toque, mas por tudo dele.
Ela não se importou. Deveria preocupá-la, mas não havia
espaço para isso. Ela havia perdido esse jogo com aquele primeiro
beijo e aquele primeiro “talvez”. A palavra parecia ecoar através dela
enquanto subia mais alto em sua paixão. A glória do voo deles era
tudo que ela conhecia.
Não, não tudo. Algo mais se intrometeu. Um som distante,
vago, mas familiar. Uma comoção de vozes e passos. Ele roncou
baixo nas bordas de seu mundo privado, então ficou mais alto. Ela
tentou ignorá-lo, mas sacudiu a paz e entrou na casa.
Estava a meio caminho da escada antes que ela claramente
entendesse sua fonte. Marcos e Davi. Chegando com as armas,
assumindo que Rhys ainda não estava em casa.
Realidade brilhou completamente. Ela empurrou, colocando
espaço entre seus corpos e olhou para baixo. Em sua nudez e a mão
forte segurando seu peito. Na intimidade que ela jurou evitar, e a
evidência de sua debilidade tola.
Com o terrível erro de uma mulher seduzida pela esperança,
agarrando o que ela não podia ter.
Rhys a soltou. Sem uma palavra ele entrou no solar. Ela o
ouviu caminhar até as escadas. Ela ouviu o turbilhão parar no meio
da agitação quando os garotos o viram. Ela ouviu a negação
silenciosa da entrada nos aposentos superiores e os pés recuando
pelo corredor e saindo para o jardim.
Mas ela ouviu mais do que isso enquanto se recuperava
freneticamente. Ela também ouviu o passado na voz de seu irmão e
a verdade em seus passos.
Ela reatou seu vestido. Ela olhou para cima e viu Rhys
encostado no batente da porta, observando-a.
Ela não conseguia olhar para ele e manteve a atenção no nó
que amarrava.
Ela sentiu seu rosto queimando. Ela não sabia o que dizer, só
que não podia falar as palavras que ele queria ouvir.
Ela olhou para a mesa e para o retângulo dourado que haviam
feito. Seu coração se torceu.
— Eu me pergunto sobre essa mágica que você me mostrou,
disse ela, batendo no pergaminho. — O retângulo continua ficando
cada vez menor, até que ele desapareça. Para então, não é?
— Não, continua invisível.
Isso parecia impossível de entender.
— Funciona da outra maneira também. Pode ficar maior e
maior até cobrir toda a criação.
Isso foi ainda mais difícil de imaginar.
Ela foi até a porta, esperando que ele a deixasse sair do que
acabara de acontecer.
Não era pra ser. Ele a puxou em seus braços. Não um abraço
retentor, mas firme. Ele a beijou e um eco melancólico do que
acabavam de compartilhar sussurrava através dela.
— Eu não deveria deixar você ir, disse ele.
A voz de Mark, provocando seu amigo sobre uma garota,
chegou do jardim através das janelas do solar.
— Eu não deveria deixar você ir. Eu deveria te beijar
profundamente e te abraçar e te levar para a minha cama. Eu
deveria despir o seu corpo adorável até que você esteja nua, como
você estava naquela primeira noite, e como você esteve nos meus
sonhos. Eu deveria te deitar e fazer amor com você, porque eu acho
que está muito claro para nós dois o que isso pode ser. Ele a beijou
novamente. — Venha para mim esta noite.
Um aperto de desejo apertou seu coração. Foi tão bom estar
em seus braços. Tão bom fingir por um tempo.
Ela tocou o rosto dele. Algo nela triste, ameaçando sua
compostura.
— Ah, Rhys, não seria como você pensa. Isso só nos traria
infelicidade.
Ela se forçou a dar um passo para trás e para longe, e através
do limiar. Ela agarrou a clareza da voz de seu irmão enquanto
flutuava na brisa da noite e deixou isto puxar ela pelo solar.
Ela parou na escada, respirando profundamente para engolir o
nó apertado dentro de sua garganta, então continuou, para que
Rhys não ouvisse sua hesitação e adivinhasse sua confusão. Andou
pesadamente, tão desapontada como sabia que ele estaria.
Ele falou sobre o que isso poderia ser como se a glória os
esperasse, mas ela sabia diferentemente. Se isso continuasse, ela
não podia olhar nos olhos dele e só ver o calor. Eventualmente, ela
também enfrentaria a plena reflexão de si mesma, e havia lugares
mutilados em seu coração que ela não se atrevia a examinar.
Ele poderia dar prazer a ela, mas acabaria se quebrando, não
importava o tipo de homem que ele era. Ele sonhou com eles juntos,
mas ela nunca fez. E se isso acontecesse, se ela imaginasse em seu
sono que Rhys ou qualquer homem a estava tomando, ela não
duvidava que a sensação de estar presa e afogada a acordaria
imediatamente.
Capítulo XI
Rhys começou a trabalhar na nova parede nas câmaras
reais. Sua presença criou uma intrusão nas primeiras horas do
primeiro dia, não mais. Muitos servos vieram e foram. Ele
simplesmente se tornou o único que ficou.
Invisível. Insignificante. Um obstáculo no caminho, muito
parecido com uma cadeira ou banco.
Ele deixou o trabalho absorvê-lo. Ele decidiu encarar a nova
pedra exatamente como a antiga, então a nova parede apareceria
como parte do tecido original.
Isso quase o distraiu dos pensamentos de Joan. Pensamentos
febris, cheios dos sons de seu prazer e do gosto de sua pele.
Curiosos também, que se perguntavam sobre o modo como ela
negava algo tão certo. Ele contemplou as barreiras que ela mantinha
entre eles. Barreiras não apenas à paixão, mas a uma paz sedutora
e unidade que ele sentia possível com ela, esperando apenas fora de
alcance.
Ele evitou começar a nova porta. Ninguém sugeriu que ele se
apressasse com isso. Ele queria acreditar que levava apenas a uma
câmara vazia que Edward planejava usar como guarda-roupa, e
começou a se convencer disso.
Ele não ouviu nada durante dias. Nenhum boato que valesse a
pena oferecer a ninguém. Ele começou a se sentir um pouco
presunçoso. A eterna preocupação de Mortimer poderia apenas ter
trazido Rhys Mason a favor do rei, sem nenhum custo ou perigo.
Bem, deixe o conde de março se preocupar. Talvez isso seja
ruim para sua saúde.
E então, uma palavra, apenas uma. Murmurada por um jovem
cavaleiro entrando no quarto da rainha com o rei. Parte de uma
conversa principalmente sobre quando o jovem veio se despedir de
Philippa. Uma única palavra clara em meio a um fluxo quase
silencioso.
Addis.
Não era uma palavra que ele queria ouvir. Especialmente
desde que nenhum barão passou por esses guardas reais para
entrar nessas câmaras, apenas cavaleiros novos em suas esporas.
Amigos, com quem um jovem rei iria beber e prostitutas, não o tipo
de homem que poderia liderar conspirações.
Nem o tipo de homem que se esperaria encontrar no círculo de
Addis de Valence, o senhor de Barrowburgh, e casualmente falando
seu nome.
Seu martelo caiu um pouco mais depois que ele ouviu esse
nome. Ele tentou bater seu som fora de sua cabeça, e se convencer
de que ele tinha ouvido errado.
Ele tentou dizer a si mesmo que poderia ignorá-lo. Mas
Mortimer também falara esse nome e expressara suspeitas.
Ele interrompeu seu trabalho um pouco mais cedo e voltou
para a cidade. Mortimer esperava que ele visitasse a casa de Addis
de Valence. Não deveria ser adiado por mais tempo.
Rhys enfiou a cabeça pela porta do corredor da estalagem.
Uma mulher estava sentada perto da janela mais distante com um
bebê em seu peito.
— Você está sozinha, Moira?
— Addis está no solar, se é isso que você quer saber.
— Sim, é isso. Ele se aproximou e olhou para o pequeno bebê.
— Ele parece ser um menino saudável. Dois filhos em três anos. Seu
marido deve estar satisfeito.
— Satisfeito o suficiente para que ele brinque com um
enquanto eu alimento o outro. Deixe-me chamá-lo, para que ele
possa cumprimentá-lo.
— Não, deixe-o com seu filho. É você que eu venho ver, e ele
sabe disso. Ele puxou um banco contra a parede e sentou-se onde
ele podia vê-la através do crepúsculo entrando pela janela.
Cabelos castanhos abundantes caíam ao redor de seu corpo. O
bebê amamentava com contentamento sonolento, como se
conhecesse a bondade de sua mãe. Moira tinha um coração que
alimentaria o mundo se fosse permitido. Se ele alguma vez
esculpisse uma imagem de Caridade, ele usaria a memória dela
quando ela se sentava assim, amamentando.
Ele quase a amou uma vez. Não do jeito que ele fazia agora,
como um velho amigo. Ela tinha sido a única mulher antes de Joan
sobre quem ele se perguntou o que poderia ser. Ela tinha sido serva
de Addis então, e seu senhor a desejava. Rhys achou que era a
mesma história que ele havia testemunhado quando menino, e
provavelmente a cortejou mais rapidamente por causa disso. O que
ele não sabia era que Addis possuía seu coração com mais
segurança do que sua liberdade. Ela amara o filho de Barrowburgh a
maior parte de sua vida.
Seu senhor a amava também. Ele finalmente se casou com ela,
apesar de seu baixo nascimento, e deixou seus filhos terem o
sangue dela.
Rhys não gostava muito de Addis, e a tensão sobre Moira ainda
pairava entre eles. Seu respeito pelo homem aumentou dez vezes,
no entanto, quando esse casamento ocorreu.
— Faz mais de duas semanas que você chegou, Rhys. Você
estava muito ocupado?
— Sim. Uma janela na abadia. A doação veio da Rainha, e o
abade queria que fosse rápido, para que os fundos não fossem
desviados para alguma extravagância. Havia dez de nós lá.
— Então você não estava na cidade todos esses dias.
— Eu só retornei à noite.
A luz apagada captou um brilho travesso em seus claros olhos
azuis.
— Para estar com sua ladrilhadora?
Inferno.
— Moira...
— Não, não. Você não precisa me explicar. Eu não posso
deixar de estar curiosa, no entanto. Você já teve mulheres antes,
mas esta é a primeira vez que você leva uma para sua casa. O bebê
havia adormecido. Ela o mexeu e se cobriu. — Dizem que ela é sua
serva agora.
— Como você ouve essas coisas? Você ainda está repousando.
Você nem sequer esteve na igreja ainda.
— Eu tenho servos. Tenho visitas. Eles juraram me trazer
qualquer fofoca digna de ser ouvida. Imagine minha surpresa ao
saber que os melhores boatos eram sobre você. Ela levantou o bebê
até o ombro e deu um tapinha.
— Alguns dizem que você a comprou, mas eu deixei saber que
você é o último homem a fazer isso.
Ela sorriu com expectativa, esperando por sua gratidão. Ele
olhou brandamente pela janela. Com o canto do olho, ele viu o rosto
dela cair.
— Rhys, você não fez.
— Não é...
— Você? O homem que se levantou contra Addis sobre suas
reivindicações em mim? O homem que não tomou aprendizes
porque ele não acredita em títulos que duram até dez anos?
— Eu não aceitei nenhum porque a responsabilidade por eles
restringe meus movimentos, não porquê...
— O homem que ajudou a depor um rei, porque ele disse que
o abuso de poder havia infringido os direitos do povo? Você
comprou a liberdade de uma mulher e fez dela sua amante?
— É verdade que eu comprei sua escritura, mas não a seguro.
E ela não é minha amante.
Ela franziu o cenho para ele com ceticismo.
— Realmente? Ela não compartilha sua cama?
— Verdadeiramente. ― E então, porque era Moira, ele sorriu.
— Não que eu não tenha oferecido.
Ela deu a ele um olhar muito maternal. Simpático, mas muito
sabedor.
— Parece que você está tentando o diabo.
— Sim, estou certamente fazendo isso. E ele estava. O diabo
dentro dele. A voz que, tarde da noite, calculava as chances de
sucesso se ele perseguisse Joan mais agressivamente, e isso pesava
a força da paixão contra a determinação dela. E de seus medos.
Apenas suas suspeitas sobre o último o impediam agora, não seus
princípios muito alardeados.
— Talvez você devesse mandá-la embora, disse Moira. — Vou
dar a ela trabalho aqui e pegar o irmão também.
— Não.
Ele disse isso com força suficiente para que ela franzisse a
testa com desaprovação.
— Então você não a segura com a escritura, mas com sua
necessidade de comida e abrigo.
Estou inclinado a mantê-la comigo de qualquer maneira que
puder. Então lá estava, admitiu sem rodeios. Ele nunca pensara em
ver o dia em que entenderia por que Addis forçara Moira a continuar
sendo sua escrava, mas ele o fazia agora.
— Você se importa com essa Joan? Não é apenas luxúria
temporária, espero.
Ele riu.
— Há muita luxúria, Moira. O suficiente para que eu não tenha
certeza do que penso sobre o resto.
— Você deve trazê-la para a festa batismal na próxima
semana. Eu devo conhecê-la e examiná-la.
— Olha quem apareceu? uma voz perguntou das sombras.
Rhys se virou para ver Addis de Valence andando em direção a
eles. Ele sabia que Addis viria. Ele estava esperando por ele.
— Então é você, pedreiro. Uma das mulheres disse que um
homem tinha se esgueirado no portão. Louco e silencioso, ela o
descreveu.
— Saudações, Addis. Eu vim para admirar seu novo filho.
— E minha esposa, eu aposto.
— Uma aposta tola para mim e ganhos fáceis para você. Eles
trataram como uma brincadeira, mas uma nota baixa na voz de
Addis disse que ele ainda tinha suspeitas sobre o interesse de Rhys
em Moira. Por isso ele descera do solar.
— Olha quem apareceu? ele repetiu.
— Uma mulher, disse Moira.
— Sua mulher? A bonita que você levou para sua casa?
O Senhor de Barrowburgh normalmente não participava das
fofocas da cidade. Moira deveria ter contado a ele.
Moira levantou-se com o bebê encostado no peito.
— Eu devo colocar este pequenino na cama. Não saia, Rhys.
Eu tenho um vestido rosa e um véu para enviar de volta para Joan.
Ela levou o bebê embora, deixando-o sozinho com o marido.
— Sua mulher parece orgulhosa, disse Addis, sentado na
cadeira que Moira usara. O último raio de luz atingiu o lado
esquerdo de seu rosto, revelando uma longa e profunda cicatriz que
cortava a linha do cabelo escuro até a mandíbula.
— Isso é bom. Alguns homens preferem mulheres tímidas, mas
eu sempre achei que era porque esses homens são fracos demais
para lidar com qualquer outra coisa.
— Ela é orgulhosa o suficiente. E ela não é minha mulher. Ele
não iria entrar nisso com Addis, no entanto.
Infelizmente, Moira provavelmente contaria tudo sobre isso.
— Como você vai, Rhys? O seu trabalho está te levando para o
palácio ultimamente? Addis perguntou casualmente, como um velho
amigo se atualizando. Exceto que eles não eram velhos amigos.
— Sim. Acabei de terminar uma janela. Uma das doações da
Rainha. Agora tenho a honra de fazer algum trabalho nos aposentos
do Rei. Você me recomendou a Edward, Addis? Ele disse que os
homens em quem ele confia falam por mim.
— Eu posso ter feito isso.
— Ele mencionou que sua mãe colocou meu nome primeiro?
— Ele pode ter feito isso.
— Eu não acho que eu deveria te agradecer por isso. Você me
colocou em uma situação impossível, e uma que eu não procurei por
conta própria. Eu estou pisando na beira de um precipício com isso.
Isso só torna meu caminho mais estreito.
— Você fala como se não soubesse onde colocar seus pés ou
suas lealdades.
— Quando arrisco minha vida por minha lealdade, gosto que
seja minha escolha e por uma razão que valha a pena.
— Você fala como se alguém esperasse algo de você. Isso
seria Mortimer, eu acho. O que ele quer?
Addis falou como se ele assumisse que a expectativa ainda não
havia sido atingida. E então Rhys respondeu mais honestamente do
que ele poderia ter feito.
— Informação. Ele cheira alguma coisa, assim ele diz.
— De fato? Para onde ele virou o nariz?
— Bem, Addis, no momento, na sua direção.
Um silêncio pulsou enquanto ele absorvia aquilo.
— Ele era específico sobre isso?
— Muito específico.
— Ele deve estar muito ocioso nos dias que correm, se ele
fareja na minha direção. Eu sou a menor das suas preocupações.
— Você não está no bolso dele. Ele vai desconfiar de qualquer
barão que não esteja.
Estava escuro, mas Addis dava a impressão de poder ver Rhys
muito bem. Luzes douradas cintilavam em seus olhos escuros.
— Você veio aqui hoje para saber se as suspeitas dele estão
corretas?
— Eu vim visitar Moira e saudar seu novo filho.
— Mas se a sua visita fosse conhecida, Mortimer presumiria
que você tivesse pelo menos tentado.
— Sim, ele assumiria isso.
— Eu acho que você é treinado o suficiente para andar naquele
precipício. Você não vai cair. Visite quantas vezes você precisar para
manter Mortimer satisfeito.
Foi a oferta de um camarada, se não um amigo. Não foi a
rebelião que forjou esse laço de confiança entre eles. Foi a Moira.
— Você deveria visitar a Rainha.
— Então ele suspeitaria que você tinha me avisado, e
começaria a cheirar você. Estou a salvo do homem de maneiras que
um pedreiro nunca poderia estar. Eu não tenho negócios com a
Rainha, e não vou me incomodar em alimentar sua vaidade.
Uma mulher entrou com duas velas para lhes dar alguma luz.
Addis esperou que ela fosse antes de falar novamente.
— Você não tem lealdade a mim, mas nunca permitiria que
Moira ou seus filhos fossem feridos. Acho que você veio esta noite
não apenas para visitar minha esposa, mas para me alertar do
interesse de Mortimer por mim.
— Eu poderia ter mencionado isso antes de sair.
— Eu sou grato por isso. Estou feliz que você tenha esperado
até que Moira não estivesse presente. Eu não quero preocupa-la
com algo que não tem importância.
Ele descansou confortavelmente na cadeira. A cicatriz lhe dava
um rosto meio bonito e jovem e meio velho e ameaçador. Suas
últimas palavras soaram com uma nota peculiar. E um pedido.
Ali estava a palavra, o tom ou o suspiro que falava mais do que
o pretendido. Era o que Rhys estava esperando, e a verdadeira
razão pela qual ele tinha vindo. Ele agora sabia com certeza que
Mortimer farejava por um motivo e na direção certa.
O Senhor de Barrowburgh trouxera sua família para Londres
durante esse verão quente porque algo o impedia de esperar ventos
mais frios.
Rhys dormiu irregularmente e, eventualmente, não dormiu
nada. O encontro com Addis o forçou a ver a verdade.
Algo estava realmente fermentando. Agora que ele admitiu
isso, ele se lembrou de outras palavras, pausas e olhares de espanto
- coisas que ele havia deliberadamente ignorado, mas não podia
mais.
John havia falado de um exército sendo criado na França. Soou
absurdo, já que a rainha Isabella era francesa, e certamente saberia
sobre isso. Mas havia regiões onde sua influência não se estendia,
lugares como a Bretanha ou Bordeaux, ou outras áreas que John
poderia ter chamado de França, mas que não eram leais à família
real francesa.
Ele considerou sua situação, e o aborrecimento o deixou
inquieto. Caso alguma ação ocorresse, Mortimer nunca acreditaria
que ele não sabia de antemão. E se fracassasse, John sem dúvida
diria a Stratford e Lancaster que certo pedreiro poderia ter ajudado
e não o fez. Ele pode reivindicar mais do que isso, se ele parasse
para pensar. Ele poderia supor que o pedreiro tinha traído eles.
Addis poderia assumir isso também.
O que aquele pedreiro poderia fazer, com uma palavra, uma
pausa ou um olhar próprio, intencional ou não. Nada explícito, mas o
suficiente para um homem perspicaz como Mortimer supor a
verdade. Pode até ser o melhor, se isso acabasse com essa tolice
antes que vidas fossem comprometidas.
Droga. Ele conhecera esse tipo de perigo antes, mas então ele
tinha aceito por vontade própria.
Ele balançou as pernas e sentou-se na beira da cama. Era
noites assim quando ele se arrependia de não ter se casado. Seria
bom ter uma amiga agora. Um pouco de suavidade feminina poderia
distraí-lo.
A câmara parecia confinada, como se suas paredes o
encurralassem tão seguramente quanto a situação que ele
contemplava. Ele vestiu algumas roupas e foi até o jardim,
procurando o céu sem limites.
Ao passar pela cozinha, Joan se mexeu em seu catre. Ele fez
uma pausa e olhou para ela, seu espírito foi aliviado imediatamente.
As preocupações desta noite tornaram-se algo para se preocupar em
outro dia.
Ele gostava de vê-la dormir, mesmo que ele não pudesse ver
muito na escuridão. Ele saboreou ainda mais este momento porque
ela iria embora em breve. Ele não duvidava disso agora. Sua
negação do que havia se passado entre eles na sala de trabalho
havia provado isso. Não seria nada que ele fizesse que a mandasse
embora. Seria algo em si que não tinha nada a ver com ele. Ela
tinha feito isso muito simples.
Ele se perguntou o que era. Ele quase a invejou por esse
objetivo que a consumiu. Ele se lembrou dela naquela primeira noite
nesta cozinha, bramando o grito de um rebelde por justiça e
ignorando as realidades que ele lançava de volta para ela.
Era uma crença quente e juvenil que conflitava com a velha e
cansativa experiência. Ela o lembrou de si mesmo dez anos atrás.
Ele provavelmente tinha sido mais severo com ela por causa disso.
Fosse o que fosse, isso a levaria embora. Prazer e afeição não
a segurariam. Nem o conforto desta casa. Ela resistiu ao domínio de
ambos, assim como não se misturava com os vizinhos ou encontrava
um lugar mais privado para se aninhar à noite. Ela não queria
vínculos para amarrá-la. Ele entendeu isso. Ele tinha vivido isso. Era
mais fácil ser corajoso se você não tivesse nada a perder.
Ela falou de precisar de moedas. Ele deveria apenas dar a ela.
Era o que qualquer amigo faria.
Ele deveria, mas ele não faria. O afeto que ele tinha por ela
não era apenas o de um amigo. Ela estava certa; a ajuda e bondade
não eram altruístas da parte dele. Ele nunca fingira o contrário. Ele
tinha sido honesto sobre isso, com ela e ele mesmo.
Ela parecia tão adorável dormindo lá. Esta casa era um lugar
mais amistoso com sua presença. Ela poderia recusar a proximidade
que ele procurava, e negar o que isso poderia ser, mas ele ainda
gostava de tê-la aqui. Andar naquele precipício todos os dias seria
mais fácil se o caminho o levasse a ela todas as noites.
Ela precisava de moedas. Ela iria embora para encontrar uma
maneira de consegui-las - a menos que ela pudesse encontrá-las
aqui. Bem, ele poderia ajudar com isso. Não abnegadamente, não
imediatamente, mas ajudaria mesmo assim.
O sono dela se tornara inquieto, como se ele se intrometesse
em seus sonhos. Ela virou de lado e se encolheu, como se um
pesadelo a tivesse reclamado.
Ele se abaixou e tocou seu ombro. Seu corpo endureceu. Ele
balançou suavemente. Ela virou de costas e deu de ombros.
Ele sabia quando ela acordou. Ele a sentiu olhando para ele.
— Venha comigo, Joan.
— Não.
Ela havia entendido mal.
— Não para minha cama. Para o jardim. Eu quero falar com
você.
Ele saiu, sem saber se ela iria o seguir. Desde aquele dia em
sua sala de trabalho, ela trabalhou duro para restabelecer a
distância.
Ele esperou entre as flores na parede oposta, onde nenhuma
árvore ou casa obscurecia o céu.
Ela chegou. O luar brilhava suavemente em seu cabelo
enquanto ela caminhava em direção a ele.
— O que você quer?
— Eu tenho uma proposta a fazer. Você disse que procurou
esses ceramistas no mercado para ganhar moedas. Eu conheço uma
maneira de você fazer isso.
Ela girou nos calcanhares para refazer seus passos.
— Quando eu lhe disse para ir comprar prostitutas, não quis
dizer que seria uma para você.
— Eu nunca iria rebaixar a nossa amizade, oferecendo dinheiro
para isso. É uma proposta diferente que eu tenho.
Isso a impediu.
— Continue.
— É o meu novo projeto. Ele requer ladrilhos, mas eu não sou
ladrilhador. Eu posso julgar a qualidade uma vez que eles são feitos,
mas não os trabalhos que os farão. Eu precisarei delegá-los, e tenho
certeza que o estaleiro pode fazer o trabalho bem se eu fizer a
barganha. Se você visitar esses pátios comigo, saberá se o ofício foi
feito como deveria ser assim que as peças forem feitas.
Ela passou as mãos por uma planta crescida enquanto pensava
sobre isso. O gesto a fez parecer infantil.
— Você me pagaria para fazer isso?
— Sim.
— Quantos?
— Tudo o que você diz que vale a pena.
— Eu iria visitar os pátios com você e julgar o forno e a
habilidade dos trabalhadores, isso é tudo?
Isso não demoraria muito em tudo.
— Eu gostaria que você visitasse novamente algumas vezes,
uma vez que a comissão fosse dada, para ver se está sendo
executada corretamente. E as câmaras têm piso de tábuas, então
você provavelmente deve ver se elas precisam de algum trabalho
antes que as telhas sejam colocadas.
— Onde estão essas câmaras?
— Em Westminster.
Seus braços arrebatadores pararam.
— Câmaras de Mortimer?
— Não. Câmaras do rei.
— Seu novo projeto é para o rei? Verdadeiramente para a
coroa então.
— Você poderia dizer isso e seria parcialmente certo. Pelo
menos a metade certa, e talvez mais, se ele pudesse fingir
ignorância onde não havia.
Ela passeou pelas flores, pensando.
— Vou visitar os pátios. Quero dez centavos para cada um que
eu julgar. Se ainda estiver aqui quando os ladrilhos são feitos, quero
dez xelins para supervisionar a qualidade. Mas não irei aos
aposentos com você. Encontre um homem que pavimenta para
julgar o chão.
— Seria mais fácil se você fizesse isso.
— Eu não quero ir a Westminster. Eu me sentiria tola lá, entre
pessoas tão grandiosas.
— Você estaria comigo e eu dificilmente sou grande. Ninguém
percebe pessoas como nós.
— Não.
— Como você preferir. Daqui a alguns dias, começaremos a
visitar os pátios.
— Um dos ceramistas do mercado, o de Kent, tem um irmão
que faz peças. Suas mercadorias pareciam boas.
— Então vamos começar com ele. Há uma outra coisa. Em dois
dias o novo filho de Moira será batizado. Ela pediu para você ir ao
banquete.
— Você disse que o marido dela é um lorde. Haverá cavaleiros
e tal lá?
— Há poucos na cidade. Serão principalmente pessoas da ala.
Ela demonstrou bondade. Você deve vir agradecê-la. Você sabe que
deve.
Ela não gostou. Ele podia sentir sua agitação sobre a ideia.
Talvez ela se preocupasse que assistir com ele apenas convencesse
os vizinhos do que já suspeitavam, que ela o servia com mais do
que comida e esfregando.
— Sim, se na maior parte forem pessoas da ala, eu irei e
agradecerei a ela. Eu não gostaria de ser considerada ingrata, disse
ela, voltando-se para a casa.
Ela disse isso com resignação. E uma nota de preocupação.
Capítulo XII
Moira avistou-os imediatamente quando entraram no grande
salão. Ela se apressou, seus olhos azuis claros analisando Joan, em
seguida, olhando para ele em aprovação.
— Eu repreendi Rhys por não nos apresentar mais cedo, disse
ela, pegando as mãos de Joan. — Venha conhecer meu marido e
meu filho, e a criança cujo nascimento celebramos hoje.
Addis estava ao lado do berço que continha a criança. Seu
filhinho Patrick pairava de modo protetor, radiante de alegria por
toda a atenção adulta que se apoderava dele e de seu pequeno
irmão. O lorde de Barrowburgh examinou Joan com uma curiosidade
contundente, e ela empalideceu um pouco sob a inspeção do
homem forte.
Moira levantou o bebê sonolento de seu ninho. Para surpresa
de Rhys, ela não o colocou nos braços de Joan como seria de
esperar, mas no seu.
Isso mexeu com ele mais do que ele esperava. Ele olhou para
o rosto inocente e fresco e admirou-o. Ele sabia que Moira tinha
colocado a criança em seus braços para argumentar a respeito de
laços e amor por toda a vida. Tocou-lhe que ela se preocupou com a
felicidade dele.
A criança fez o que poderia ser um sorriso e ele sorriu de volta.
Ele olhou para cima e viu Joan assistindo. Seu rosto permaneceu
calmamente agradável, mas um brilho de umidade cobriu seus
olhos. Ele sentiu uma onda de infelicidade sair dela.
Moira deve ter percebido isso também. Ela pegou o filho dele,
mas não ofereceu o pacote para Joan.
Em vez disso, ela colocou o bebê de volta no berço e, em
seguida, levou Joan em direção a um amontoado de mulheres
falantes.
O que o deixou sozinho com Addis.
— Seu filho já cresceu, Addis. Como você o batizou?
— Ela não te contou? Ela pediu que eu o chamasse de Rhys.
Ele se afastou quando ele disse isso. Considerando as notícias
surpreendentes, Rhys não teve escolha a não ser seguir.
— Eu estou honrado.
— Ela disse que sua amizade foi altruísta e que você uma vez
apontou para o caminho que levou à sua felicidade.
Ele se lembrou daquele dia. Não tinha sido verdadeiramente
altruísta. Um homem inteligente não se casava com uma mulher
cujo coração pertencia a outro. Se ele tivesse aceito o que Moira
ofereceu, o fantasma do Lorde de Barrowburgh teria compartilhado
sua cama todas as noites de suas vidas.
— Ela queria você como padrinho também, mas eu não podia
permitir isso.
— É óbvio.
— Será? Se você acha que é por causa do seu nascimento,
você não me conhece bem.
Sua caminhada casual levou-os até o final do corredor, perto
da cozinha. Addis abriu a porta e mostrou o caminho. Com passos
mais determinados, apontou para o jardim, rebocando Rhys.
Ele finalmente parou em uma mancha ensolarada de grama
alta e flores silvestres atrás de uma grande árvore.
— Eu deixei Moira pensar que eu achei você inadequado para
defender a criança, mas não era — Addis disse uma vez que ele
tinha garantido sua privacidade. — Eu não quero que você pense
que você está obrigado a Barrowburgh dessa forma. O nome do
bebê é um assunto menor, mas uma afinidade oficial não seria
conveniente agora, para nenhum de nós.
— Você não precisa explicar. O nome é honra suficiente e mais
do que eu mereço.
Addis arrancou uma flor amarela comprida de seu talo. Ele
posicionou os dois para que ninguém pudesse os ver da casa.
— Edward quer saber se você é leal a ele.
— Claro. Ele é meu rei.
— Não é uma lealdade comum de que ele fala.
Addis estava cheio de surpresas hoje, mas esta surpreendeu
Rhys mais.
— Você está dizendo que ele está se juntando a Lancaster?
Que o exército que está sendo comprado na França vai levar sua
bandeira?
— Ele não amarrará seu destino a Lancaster nem àquele sonho
de um exército. Ele reúne homens a seu lado em quem ele
pessoalmente confia e agirá em seu próprio nome e em seu próprio
tempo.
— Ele reuniu muitos? Ele sabia a resposta. Ele saberia se
metade do reino apoiava o jovem rei.
— Um punhado até agora, não mais.
— Ele precisa de barões e cavaleiros, não de pedreiros.
— Ele precisa do pedreiro que corta aquela porta para ser
jurado a ele. Certamente você sabe disso. Ele precisa do pedreiro
que alimenta informações de Mortimer para oferecer a comida certa
na hora certa.
— Eu acho que você me atrai para o perigo, Addis. E a causa
parece sem esperança.
— Não há tanto perigo. Não é traição servir a um rei ungido.
— Eu vou ter certeza de explicar isso para o carrasco.
Addis riu.
— Assim como eu. Você está com ele?
O pedido fez com que a paixão pela justiça que uma vez ardia
em seu sangue tremulasse viva. Ele experimentou a emoção de
afetar seu mundo, não apenas aceitando-o.
Mas essa antiga paixão encontrou a competição da
entorpecente desilusão que ele usara por dois anos.
E do desejo irresistível de descobrir o que poderia ser com
Joan. O efeito agudo dessa última emoção revelou-se
surpreendentemente forte. Pela primeira vez, ele tinha algo a
perder.
— Eu não vou trair o que você me disse, e vou manter a porta
em segredo. Além disso, não posso me comprometer com isso.
Vozes perturbaram o silêncio do jardim e chamaram sua
atenção. Moira e Joan tinham saído da casa e juntas admiravam as
flores enquanto conversavam.
— Como você pode arriscar o futuro dela e dos meninos? Rhys
perguntou.
— Ela não sabe, mas se soubesse ela não o faria de outra
maneira.
Ele queria dizer que era o preço do casamento do filho de
Barrowburgh. Mas ela sabia, e Addis sabia que sim, mas eles fingiam
o contrário. Ela tornara mais fácil para Addis conseguir Rhys sozinha
porque queria homens em quem pudesse confiar ao lado do marido.
Joan inclinou-se para cheirar uma rosa tardia. Moira disse algo
que fez as duas rirem.
— Como você pode ter a chance de perder tudo isso?
Addis olhou de um jeito que sugeria que muita coisa havia sido
revelada pela pergunta.
— Eu não pretendo perder nada. Mas se eu fizer, eu posso
trabalhar nos campos com minhas próprias mãos e ser um homem
feliz se minha esposa e filhos estiverem ao meu lado.
— E se você perder a sua vida? O que então?
Moira os notou e disse que a festa logo seria servida. Eles
começaram a andar em direção a ela.
— Esse é um perigo eterno para um cavaleiro. Confesso que
sempre dormi melhor, sabendo que, se o pior acontecer, há um
pedreiro que eu sei que nunca recusará o santuário para minha
família.
Algo mais do que uma amizade normal existia entre Moira e
Rhys. Joan podia sentir isso no calor que mostravam um ao outro e
na liberdade com que falavam. Ela se perguntou se Rhys alguma vez
amou essa mulher nascida de servos. Talvez ele ainda fizesse. Ela
não podia culpá-lo. Moira era adorável.
Reconfortante e generosa e cheia de coração. Ela teria sido
boa para Rhys. Ele teria ficado feliz com ela.
Isso foi o que sua mente disse, mas seu coração não era tão
gentil. Este se ressentia da facilidade que demonstravam um com o
outro e retorceu-se quando eles se beijaram em saudação, e
continuou se retorcendo durante todo o banquete.
Ela realmente não se importava, é claro. Não era da sua conta
se ele se dobrasse como um tolo pela esposa de um lorde.
Mas quando ela se viu sentada com Moira enquanto o
banquete diminuía, a curiosidade levou a melhor sobre ela.
— Você parece conhecer Rhys há muito tempo.
— Não muito tempo, mas ele é um dos meus amigos mais
queridos.
— Você o conheceu enquanto morava em Londres?
— Logo depois que vim aqui pela primeira vez. Servi Addis na
época. Eu era sua serva. Ela não fingiu que era algo para ser
esquecido.
— Então você era vizinho da ala? Você conheceu Rhys no
mercado? Joan esperava que ela não soubesse que tinha sido
semelhante ao seu primeiro encontro com ele. Não que isso
realmente importasse ou teria algum significado.
— Não no mercado, e não como vizinhos. Ele veio para a casa
uma noite. Ele trouxe alguns homens. Foi logo antes da rebelião, e
eles vieram pedir a Addis para se juntar a eles.
Joan apenas olhou para os olhos azuis da mulher que segurava
uma criança nos braços. Certamente ela tinha ouvido errado.
— Esses homens vieram pedir a Addis que se unisse contra o
rei? Para prender seu juramento de fidelidade?
— Addis não previu nada. Sua casa tinha sido tomada
enquanto ele estava na cruzada. Ele não fez nenhum juramento ao
último rei.
Não era a informação sobre Addis que importava.
— Mas Rhys os trouxe, você disse. Ele estava com eles.
— Claro que ele estava com eles. Toda Londres estava com
eles. Todo o reino estava com eles.
Não todo o reino. Não o pai dela.
— Se Rhys trouxe homens para Addis, ele deve ter estado
intimamente envolvido.
— Ele foi um dos poucos cidadãos de Londres que ajudaram
mais e arriscaram mais do que a maioria.
— Quanto? A pergunta saiu muito agudamente.
Moira a olhou com curiosidade.
— Talvez você devesse pedir a ele para falar sobre isso.
— Não é segredo, é? Quanto ele estava envolvido? Quanto ele
arriscaria?
— Ele arriscou tudo, como Addis, e todos os que estavam em
pé para impedir o que estava acontecendo. Se eles tivessem
falhado, teria sido traição e todos eles teriam morrido.
Sucesso ou não, ainda era traição. Uma traição que colocara
Roger Mortimer no poder e mandou Guy Leighton para as marchas
galesas.
Ressentimentos e raiva instantaneamente a inundaram. Por um
momento, ela nem conseguiu ver.
— Temo ter angustiado você, disse Moira gentilmente. — Eu
pensei que você soubesse. Todo mundo em Londres faz. Rhys foi
muito valioso para a causa, e quando a rainha pousou ele cavalgou
para encontrá-la, tão bravamente como qualquer cavaleiro. Ele foi
um dos presentes quando o rei abdicou em favor de seu filho, junto
com Addis e eu e membros de todos os graus, de bispos a servos.
Joan quase não conseguiu absorvê-lo. Ela tinha sido tão
estúpida. Tão cega. Não é de admirar que ele trabalhasse no palácio
e tivesse sido elevado a mestre em uma idade tão jovem. Não é de
admirar que Mortimer tenha enviado uma intimação para ele e se
encontrado com ele. Não tinha sido a habilidade com pedra que o
trouxera para aquele círculo.
Ele ajudara a depor um rei e recebera status e prestígio por
seu papel. Ele havia levantado Mortimer e fora recompensado por
sua ajuda.
Ele havia escolhido o lado vencedor e se beneficiado.
E homens que haviam escolhido o lado da honra haviam sido
destruídos.
Pedaços de horríveis lembranças passaram pela sua cabeça.
Flechas de dor apunhalavam seu coração em cada uma delas.
Ela sabia desde o começo, mas ignorara os sinais e seus
instintos cautelosos. As suspeitas de John estavam certas. Rhys
havia servido a Isabella e Mortimer uma vez e voltaria a fazê-lo. Ele
não queria que seus fregueses caíssem e os avisaria se soubesse
dos planos de derrubá-los.
Ela ergueu o olhar ofuscado do chão. Moira a estava olhando
com preocupação e muito interesse.
Ela forçou a compostura em si mesma e fez sua expressão ficar
em branco. Addis de Valence também apoiou a rebelião, e Roger
Mortimer. De repente, ela se sentiu muito vulnerável nesta casa.
— Era maior que um homem, Joan. Moira disse como se
muitos momentos não tivessem passado. — Quanto ao que
aconteceu depois da abdicação, essas coisas seguem seu curso e
nem sempre podem ser direcionadas. Pelo menos, por um pedreiro.
Isso não a acalmou. Ela experimentou medo e agitação, como
ela não tinha em muitos meses. A velha vulnerabilidade e cautela
possuíram-na, e as palavras de Moira não as acalmaram em tudo.
Nenhuma palavra poderia.
Rhys estava caminhando, conversando com um comerciante.
Ela não podia acreditar que ela tinha sido tão estúpida e tão
facilmente cegada por um rosto bonito. Ele era pior do que ela
pensava. Não um mero lacaio. Enquanto sua vida estava sendo
despedaçada, suas mãos estavam entre as que agarravam as bordas
do tecido.
Isso a oprimiu. Encheu sua cabeça até que ela se sentiu meio
enlouquecida.
Ela não podia mais ficar sentada aqui. Ela não conseguia
conversar sobre vizinhos e crianças e fingir que nada havia mudado.
Ela se levantou.
— Eu preciso me despedir agora. Por favor, diga a Rhys que eu
me sinto mal e voltei para a casa.
— Deixe-me avisa-lo, para que ele possa te levar de volta.
— Não, não. Isso saiu duramente, como um comando. Ela
respirou fundo para se acalmar. — Por favor, não. Eu preferiria ficar
sozinha, para que eu possa descansar.
Moira a soltou. Rhys não viu a partida dela e não a seguiu.
Capítulo XIII
― Eu decidi analisar o chão da câmara depois de tudo. Eu
irei e olharei para você.
Joan disse assim que Rhys quebrou o jejum duas manhãs
depois da festa. Foi a primeira conversa que ela iniciou em todo esse
tempo. Não eram as palavras que ele estava esperando para ouvir.
Acusações. Insultos. Foi o que silenciosamente gritou dela
durante o silêncio e ele sabia o porquê.
Moira dissera que Joan sabia sobre seu papel na rebelião.
Ele sabia como ela se sentia em relação a Mortimer, e o poder
que a rebelião lhe entregara. Ela fez suas opiniões sobre isso muito
claras naquele primeiro dia no banho.
Ainda assim, a reação dela foi extrema. Ele passou os últimos
dois dias pensando sobre isso, juntando pedaços, uma palavra, um
olhar, um suspiro.
Um ódio, uma procura, uma negação.
Não seria do jeito que ele pensava.
— Eu poderia ir hoje, disse ela enquanto se agitava em torno
da cozinha, encontrando tarefas para fazer, assim ela poderia evitar
vê-lo.
A oferta rápida surpreendeu-o. Seu retraimento nesses últimos
dias foi completo. Isso o feriu mais do que ele gostava de admitir.
Ele não gostou da ideia de viver com ela assim, como dois
estranhos. Ele não queria apenas o serviço que comprara, mesmo
que isso fosse tudo o que ela afirmava oferecer.
E assim, embora ele tivesse jurado a si mesmo dez vezes que
não iria encorajar sua raiva e acusações, ele o fez de qualquer
maneira.
— Moira me disse que te contou como ela e eu nos
conhecemos.
Um olhar afiado, que poderia cortar aço.
— Sim, ela me contou. Como você ajudou aquele açougueiro.
Você ainda faz?
Ele disse a si mesmo que ele leu muito no olhar penetrante
dela. Ainda assim, ela esperou como se quisesse saber.
Ele olhou de volta, e esperou que ela acreditasse nele desde
que parecia importar.
— Não, eu não faço.
Algo passou em seus olhos. Um leve amolecimento. Um
momento de hesitação. Então vazio.
Uma palavra. Um olhar. Uma pausa.
Uma missão e um sonho.
— Por que você tem esse ódio de Mortimer, Joan?
— Eu não aprovo o que ele está fazendo e não estou sozinha.
— Suas emoções excedem em muito o descontentamento
habitual. Moira disse que você ficou muito angustiada na festa, e
você me tratou como um inimigo desde então.
Ela instantaneamente parecia muito cautelosa.
— Como sua família morreu? Você nunca disse.
Ele provavelmente deveria deixá-la em suas memórias, mas
tendo começado a se perguntar, ele agora descobriu que precisava
saber.
— Você o culpa por isso? Depois da rebelião, ele não conheceu
nenhuma restrição nas marchas. Seu exército atacou sua cidade?
— Sim, ela disse amargamente. — Eu o culpo por isso.
E você. Estava lá em seu tom e o olhar que ela atirou nele.
— Seu irmão conhece cavalos, e diz que seu pai possuía um.
Você perdeu mais do que sua família, não perdeu?
— Sim, mais que minha família.
— O que aconteceu?
— Eu não falo disso.
— Não, não fala, mas eu te peço que o faça agora.
Seus olhos brilharam ferozmente. Sua boca endureceu, como
se ela apertasse os dentes.
— Seu exército veio, para tomar pela força a propriedade de
um senhor que tinha permanecido leal ao último rei. Meu pai se
juntou à luta. Ele morreu quando o castelo caiu. Assim como todo
homem que defendia a fortaleza. O novo senhor era um homem vil,
um dos favoritos de Mortimer. Ele levou tudo o que pertencia a
qualquer pessoa que estivesse contra ele, tudo em nome da coroa.
Então, Mark e eu saímos daquele lugar e viemos para cá.
Ela passou por isso apenas falando rapidamente. Raiva
cintilante brilhou por trás de suas pálpebras piscando.
— Sua queda foi maior do que eu imaginava. Achei que você
era uma mulher da cidade, uma filha de artesão. Mas seu pai tinha
terras. Ele não era um pobre livreiro, era? Era um fazendeiro e
soldado da cavalaria, a partir de seu relato. Não é de admirar que o
seu irmão conheça cavalos, e pensava estar abaixo dele encher as
paletes.
— Não tenha pena de mim. Não posso suportar isso de
ninguém, muito menos de um homem que era em parte
responsável, mas finge que não. Um homem que esconde o que
realmente é.
Então era assim.
— Eu não menti para você.
— Você fez. Você me deixou pensar que seu ofício sozinho lhe
trouxe sua posição, mas era outra coisa.
— Em parte era outra coisa. Eu gosto de pensar que minha
habilidade com pedra ajudou.
— Você me enganou.
— Não. A mera menção de Mortimer a afligiu o suficiente para
evitar falar sobre isso, e o que aconteceu anos atrás não tinha
nenhum significado entre nós.
— Como você pôde apoiar alguém como ele? Como você pôde
colocar esse homem em posição de fazer o que ele fez?
— Não era sobre ele. Apoiamos a rainha e seu filho, e lutamos
para livrar o reino de um rei que era o peão de homens sem honra
ou escrúpulos. Talvez na casa de seu pai você não tenha visto como
era naquela época
— Você está dizendo que eu estava cega pelo conforto?
— Estou dizendo que você era jovem, protegida e isolada da
injustiça.
— Isso certamente mudou, não foi?
— Joan, o que aconteceu com você e sua família me machuca.
Mas não havia como saber o que aconteceria e o último rei tinha
que cair. Não vou me desculpar por ajudar a derrubar um monarca
que não estava apto para o trono.
— Quão confortável você deve estar em seus princípios
elevados. Como é reconfortante saber que você fez a coisa certa.
Como é fácil jogar um jogo perigoso quando você se certificou de
que você não tinha nada a perder exceto sua vida.
— Isso dificilmente é uma coisa pequena.
— Eu aprendi que se sacrificar é muito mais simples do que
sacrificar aqueles que você ama. Você não formou nenhuma família
e não criou raízes, de modo que você nunca teve que enfrentar essa
terrível escolha. Você poderia ignorar os inocentes que seriam
pisoteados, porque nenhum daqueles inocentes pertenciam a você...
Bem, eu não me lembro daqueles tempos em que homens nobres
faziam grandes feitos em nome de altos ideais. Eu vejo apenas um
pátio de castelo cheio de sangue, e homens corajosos massacrados
quando se renderam, e um conquistador com olhos como os de um
demônio que escapou do inferno.
Ela se virou abruptamente e caminhou de volta para a lareira.
Ele observou aquelas costas, severas com repúdio, e sabia que toda
a conversa no mundo não o absolveria.
Ele recuou para coisas práticas - por enquanto.
— Se você estiver disposta a verificar o chão, venha para
Westminster hoje mais tarde. Eu te encontrarei no portão e te
levarei para as câmaras. Depois sairemos para Kent e veremos o
pátio da telha. Eu sei que não fica longe da cidade.
Ele esperava que ela se opusesse. Uma mulher que decidira
desprezar um homem não gostaria de passar tantas horas com ele.
Ela considerou e assentiu. Colocando o cabo do caldeirão sobre
o braço, ela saiu para ir ao poço.
Ele deu uma boa olhada no rosto dela quando ela passou. A
determinação definia sua expressão e os fogos iluminavam seus
olhos.
Uma palavra. Um olhar. Um suspiro.
Ela partiu bem antes do entardecer. Ela saiu de casa pouco
depois de Rhys. Ela fez seu caminho para o mercado e caminhou
pelo seu comprimento.
John não estava na taverna perto da catedral. Ela se sentou
em um banco em uma mesa no canto escuro e esperou. Se ele não
viesse esta manhã, ela voltaria outra vez.
A mulher que colocou a cerveja deu-lhe um olhar interrogativo
e ela balançou a cabeça em resposta. Ela não tinha moeda para
cerveja, e não iria ter por um longo tempo. Mas ela logo teria
moedas para outras coisas mais importantes.
John entrou na câmara escura. Ele olhou ao redor. Joan teve a
sensação de que ele não procurou ninguém em particular, apenas
um rosto familiar. O que quer que ele tenha feito para o Bispo
Stratford, ele usou essa taverna como seu estudo particular.
Ele a viu e se aproximou. Ele deslizou para o banco em frente
a ela.
— Já faz algum tempo. Não achei que você ia ajudar.
— Você não me disse que Rhys havia ajudado a rebelião. Eu
poderia ter vindo mais rápido se você tivesse.
— Não esperava que importasse. Isso foi diferente. Muitas
ajudaram. Eu fiz. Mas alguns de nós buscam desfazer nosso erro, e
outros só buscam se beneficiar disso.
— E você teme que ele seja um dos últimos.
— Eu me pergunto, é tudo. Ele estava conosco, mas não está
mais. As lealdades mudam. Ele fez uma pausa e acariciou a barba.
— Você sabe se a dele mudou?
— Eu olhei na casa, entre as coisas dele, ontem. Eu olhei para
todos os pergaminhos naquela sala de trabalho. Eu não encontrei
nada. Foi mais difícil do que ela esperava. A culpa e o medo da
descoberta aceleraram seu sangue o tempo todo. Ela examinou
pergaminhos que revelaram seu olho interior, sua imaginação, a
inesperada sensação de traição se intensificou. Mesmo quando seu
ato repudiava suas conexões, o que ela viu as apertou.
Alguns dos desenhos tinham sido previsíveis e acabados, mas
outros, às vezes não mais do que linhas sinuosas, tinham exibido
momentos fantasiosos. Excêntrico e livre. Impraticável ou
impossível. Estátuas que se moviam do jeito que a pedra nunca
conseguia. Entradas em formas que nunca seriam construídas.
Ela baniu essas imagens de sua mente e fechou seu coração
ao homem que as criara.
— Você disse que haveria moeda.
— Mas você não encontrou nada.
— Eu terminei o que você começou. Agora você sabe o que foi
naquela casa descobrir. Você procurava evidências de um jeito ou de
outro, e eu as trouxe.
Ele franziu a testa, mas admitiu o ponto. Ele pescou em sua
bolsa e um xelim pousou na mesa.
— Não, eu quero três. Eu arrisquei muito fazendo isso. Se ele
descobrir, eu estou na rua.
— Alguém como você nunca vai estar na rua. Há outros
homens que precisam... de governanta.
Seu pequeno olhar levou-a de volta.
— Quatro xelins agora.
Ele começou a se encher de indignação, pronto para tagarelar.
— Eu digo que vale apenas um.
— Então você é um trapaceiro, e eu não vou te ajudar mais. Vá
dizer ao seu bispo do seu erro estúpido em falar muito livremente.
Enfrente sua ira por ter seus planos desfeitos, e possivelmente por
nada.
Isso tirou o ar dele.
— Você acha que pode ajudar mais? Tornou-se vital saber o
que ele é. Ele trabalha nos aposentos do rei agora. Se ele estiver no
bolso de Mortimer, o rei deve ser avisado.
Sim, importante saber o que ele é, e não apenas pelo amor do
rei.
— Eu moro em sua casa. Eu vou ajudá-lo em seu ofício,
mesmo no palácio. Se ele está ajudando Mortimer, eu acho que vou
saber em breve. Ela bateu na mesa. — Mas se eu fizer isso, se
souber que ele é, quero cinco libras, não alguns xelins.
Ele mordeu o lábio e refletiu sobre isso.
— Sim, cinco libras, mulher. Mas não pense em me alimentar
com ar.
— Eu não iria fabricar uma história. Se eu fosse uma dessas
pessoas, eu teria trazido a você recados hoje que eu mesma havia
escrito.
Ela se levantou, sentindo-se suja por sua presença e pela
sujeira dessa taverna. Ainda era cedo para encontrar Rhys, mas ela
queria estar longe desse homem.
— Se eu descobrir alguma coisa, vou deixar aqui como e onde
me encontrar. Toda a cidade provavelmente sabe que você se senta
aqui todos os dias, e eu não quero ser vista com você.
Seu rosto endureceu em seu tom.
— É pela justiça de Deus que fazemos isso. Por uma boa
causa.
Ela pegou as moedas, virou-se e saiu. Sim, pela justiça de
Deus. E ela própria.
Entrar na cidade de Westminster levou toda a sua bravura.
Ela nunca tinha vindo aqui, nem mesmo para vender seus
produtos. Quando ela se aproximou do palácio, seu sangue começou
um pulsar horrível nascido do velho medo.
Ela manteve sua determinação e encontrou um portal onde
servos iam e vinham. Se ela descobrisse o que John queria, ela teria
toda a moeda de que precisava de uma só vez. Se ela não o fizesse,
seu trabalho para Rhys pelo menos lhe traria um pouco, e suas
visitas aos terreiros forneceriam os meios para conseguir mais.
Ela ignorou o modo como tudo isso deixava seu coração
pesado. Ela se lembraria de que ele ajudara a reduzi-la a tal
esquema, e que tal homem não deveria receber confiança, muito
menos lealdade.
Ela se aproximou de uma mulher corpulenta carregando um
balde e perguntou onde poderia encontrar os aposentos do rei.
A mulher levantou as sobrancelhas.
— Ninguém vai lá a menos que seja chamado. Se você tiver
uma petição, aguarde os dias em que é feito, ou veja o pessoal dele.
— Eu não venho por uma petição, ou ver o Rei. Eu vou
encontrar um pedreiro que está trabalhando na obra.
— Ah, esse é o Rhys. Todos nós o conhecemos. Um rosto e
corpo assim, as mulheres notam. É estranho que ele lhe diga para
vir para os aposentos, embora. Não estão prontos, e ele não está lá
agora de qualquer maneira. Eu acabei de vê-lo em outro lugar.
— Ele não me disse para ir aos aposentos, mas para encontrá-
lo no portão. Mas eu estou adiantada, então pensei...
— Venha comigo. Eu lhe mostrarei onde ele está, mas você
deve esperar e não entrar.
Com o balde balançando, ela subiu alguns degraus e passou
por algumas passagens, depois apontou para uma janela. Lá
embaixo, num pequeno jardim, dois homens sentavam-se em
bancos encostados na parede. Um deles era Rhys.
— Quem é o outro homem? Ela suspeitou da resposta, mesmo
quando ela perguntou.
— Você é uma ignorante, não é? Esse é Roger Mortimer,
nenhum outro. Agora, vou lhe mostrar onde esperar lá embaixo, o
lugar onde seu mestre vai passar quando ele for embora.
Ela mal ouviu a mulher. Ela continuou olhando para os dois
homens. Eles pareciam muito casuais um com o outro - não como
um conde falava com um pedreiro, e dava comandos sobre algum
projeto. Mais como amigos. Ou confidentes.
Raiva se apertou através dela. Então tristeza. A tristeza se
mostrou mais poderosa. Estrangulou seu coração e encheu sua
garganta e encheu seus olhos.
A mulher gesticulou e a levou de volta para baixo. Ela não ficou
onde foi dito que Rhys iria passar, no entanto. Assim que a criada
saiu, ela correu pelo palácio, pedindo instruções para voltar para o
portal através do qual ela havia entrado.
Ela mergulhou ao ar livre e afundou-se contra a parede. A
tristeza queria dominá-la.
Conter isso era mais difícil do que controlar a fúria que ela
tinha conhecido quando Moira contou sobre Rhys e a rebelião. Essa
raiva tinha sido aguda e quente, um fogo queimando em sua
cabeça. Isso parecia uma inundação de melancolia que ameaçava
afogá-la.
De alguma forma, ela lutou para se manter na superfície.
Como sempre nestes últimos três anos, ela se agarrou àquilo que lhe
dava um propósito.
Ela se afastou da parede e procurou direções diferentes. Não
para um lugar dentro do palácio.
Ela teria moedas em breve. Muita moeda. Cinco libras.

Joan não estava no portão na hora marcada. Rhys esperou


muito tempo em um lugar onde não podia perde-la, olhando os véus
e os rostos das mulheres que passavam.
Ela não queria vir. O mais provável é que ela tenha mudado de
ideia novamente.
Ele não sabia o que o fez virar e olhar para o quintal distante,
o local onde a parede externa curvada desaparecia atrás dos
edifícios. Ele apenas fez, como se uma voz invisível tivesse
alcançado seus ouvidos na brisa.
Ele sabia que era Joan apesar da distância. Ele reconheceu o
vestido marrom que ainda pendia frouxamente, mesmo que ela
tivesse ganhado algum peso em sua casa. Ele viu a elegância de seu
passo e a inclinação familiar de sua cabeça. Ele viu tudo, como se
ela estivesse bem na frente dele.
Um homem caminhava ao lado dela. Um cavaleiro usando
armadura. Ele deve ter vindo do pátio de treinamento.
Rhys não foi até ela, mas ficou no portal, observando. Joan
deu alguns passos para o lado, inclinando a cabeça para um lado e
para o outro, examinando o homem forte de maneira nada sutil. O
cavaleiro se aproximou e tocou seu rosto. Ela virou-se ligeiramente,
mas não fugiu. Um desânimo, mas não um completo repúdio.
Seu peito se apertou. O aperto do ciúme o surpreendeu. Seus
pensamentos se aqueceram e abriram novos caminhos.
Talvez ele tenha entendido mal. Talvez o humor dela nos
últimos dois dias não tivesse nada a ver com ele e o que descobrira
no banquete. Essa resolução em seu rosto e olhos pode indicar outra
coisa. Ele poderia estar vendo a decisão de uma mulher de atingir
seu objetivo de qualquer maneira possível. Negociar com algo que
não seja dinheiro, se necessário.
Talvez não fosse a maneira como ele pensava, porque ele não
poderia dar o que ela realmente queria.
Ela se afastou do cavaleiro, indo embora, afastando-o. Ele
imaginou suas palavras. Não venha mais longe. Um homem espera
por mim, e ele ficará descontente em me ver com você. Ele gosta de
pensar que há algo entre nós e que ele tem reclamações sobre mim,
embora eu tenha dito a ele muitas vezes que não é assim.
Ela caminhou em direção a ele com um passo alegre. Joan, a
ladrilhadora, estava bem satisfeita com sua visita a Westminster.
Ele não mencionou o que acabara de ver. Ele a levou aos
aposentos do rei e ela caminhou sobre as tábuas, observando
aquelas que precisavam de trabalho. Não demorou muito, já que a
rainha estava doente e não podiam entrar em seus aposentos. E
então eles estavam na estrada para fora da cidade, para o campo de
Kent, antes do meio-dia.
Cada momento que ela estava com ele, um ensopado de
emoções fervia nele. Ciúme e raiva, curiosidade e preocupação. As
palavras e olhares e pausas brilharam em sua memória de novo e de
novo, alinhando-se de um jeito ou de outro, formando elos para
várias conclusões. Algumas eram irritantes, algumas preocupantes e
algumas tingidas de ressentimento. Mas todos elas eram trágicas.
Ele suspeitava que agora sabia onde ela estava indo e o que
ela tinha que fazer. Ele também achava que havia adivinhado uma
das razões que a guiavam, e por que ela supunha que nunca
poderia ser do jeito que ele pensava.
Ele esperava por Deus que ele estivesse errado sobre a última
parte, mas não achava que estava.

Rhys não ficou por perto no pátio de azulejos. Ele a deixou


examinar o forno e falar com os trabalhadores sozinha. Ele estava
tomando cerveja com o ladrilhador quando ela terminou, então ela
caminhou até a propriedade onde o irmão que era um oleiro
manipulava seu ofício.
Ela ficou parada ali, observando a roda e fazendo perguntas
sobre um barro cinza claro especial que ele tinha. Ele veio do solo
perto de Dover, explicou, e fazia xícaras mais finas do que as
comuns. Parecia-lhe que faria belas estátuas.
Ela perguntou sobre o trabalho, mas sem entusiasmo. Isso não
seria necessário agora. Ela teria sua moeda e muito em breve. E
cinco xelins seriam suficientes. Aquele cavaleiro ficara feliz em
conversar com uma mulher que sorria para ele, mesmo que ela
fosse de baixo nascimento. Ele havia assegurado a ela que, se a
causa fosse justa, um campeão poderia ser ganho por cinco libras.
Seus modos haviam sugerido que, se a mulher fosse justa e
desejosa, a pessoa poderia ser paga sem moeda alguma. Mas ela
sempre soube disso.
Rhys estava esperando na carroça quando ela saiu do galpão
de oleiro.
— O trabalho é bom, mas o quintal é pequeno, explicou ela ao
subir ao seu lugar. — Eu não acho que eles possam fazer a
quantidade necessária enquanto o tempo ainda estiver bom.
— Vamos checar alguns outros antes de decidir, então.
Isso significaria mais viagens desse tipo, um pouco mais longe
de Londres do que esse pátio nos arredores da cidade.
Isso significaria passar mais horas ao lado de Rhys.
Ele ficou pensativo e quieto o dia todo. Ela provavelmente
falou muito precipitadamente de manhã, quando ele perguntou
sobre sua casa. Ela tinha acabado de dizer isso, dando voz às
memórias e imagens horríveis que a atormentavam desde a
revelação de Moira.
Ele dissera que não ajudava mais Mortimer. Por um momento
ele a convenceu.
Sua mente havia rejeitado isso imediatamente, mas dentro
dela, algo queria desesperadamente acreditar que ele havia falado
honestamente.
Ela olhou para o perfil dele, tão bonito em seus planos claros.
Seus olhos azuis estavam cheios das sombras do pensamento e
talvez também de raiva e desprazer. Ele meditava sobre algo. Talvez
seu encontro com Mortimer não tenha saído como planejado.
Não, não era isso. Ela apenas sabia disso. Olhando para ele,
sentando-se com ele, estar perto dele pela primeira vez em dois
dias, perturbou-a. Sua proximidade minou sua resolução e quebrou
sua certeza. Ela pensou nos dois homens no jardim. O que ela
realmente tinha visto? Não muito. Nada condenatório. Seus
sentimentos de traição depois de ouvir as palavras de Moira fizeram
com que ela assumisse mais do que deveria.
Ela viu os olhos dele novamente pela manhã quando ele disse
que não ajudava Mortimer. Viu a intensidade deles e ouviu a
declaração firme. Ele havia falado as palavras com tanta clareza
quanto alguém faz um voto ou um juramento.
Seu medo e raiva repudiavam isso, mas seu coração dizia que
ele não mentira. Agora mesmo, sentada ao lado dele, sentindo o
homem mais que o conhecendo, a voz de seu coração falou mais
alto.
Ela não descobriria o que John procurava. Ela nunca veria
essas cinco libras.
Aceitar isso a surpreendeu. Não houve decepção. Em vez disso,
uma ligeira leveza entrou em seu humor. Depois de dois dias de
rancor apertado, essa nova certeza acalmou seu espírito de uma só
vez.
O que só fez sua cisma parecer mais sombria.
Ele a notou o observando. Isso o tirou de seu devaneio. A
maneira como sua boca endureceu a fez desejar que não.
— O que você queria com esse cavaleiro, Joan?
Ele tinha visto. Seu humor profundo tinha a ver com ela. Ele
estava com ciúmes.
— Cheguei cedo e fui assistir ao jogo de espadas no pátio de
treinamento. Só elogiei sua habilidade.
— Um longo elogio.
— Eu também fiz algumas perguntas a ele. Não foi o que você
achou.
— O que eu acho, Joan? Que você parecia uma mulher solta,
bajulando um belo jovem?
A insinuação a fez queimar de vergonha e indignação.
— Então você me quer solta só para você? Você deveria ter
deixado isso claro.
O brilho ficou rígido.
— Sim, só para mim. Está claro o suficiente, mesmo que nunca
falemos sobre isso.
Ela decidiu que não falar nada poderia ser uma boa ideia.
Exceto que ele não permitiria isso.
— Que perguntas você fez a ele?
— Sobre o cavalo dele. A vida dele. Tais coisas como isso.
— Não seja evasiva, Joan. Eu aprendi a saber quando você
mente.
— Se eu minto é porque você é muito curioso.
— Você perguntou sobre sua vida e seu cavalo. Você
perguntou sobre a bolsa dele?
— Porque eu faria isso?
— Porque você examinou o homem como se você quisesse
comprá-lo.
Sua visão surpreendeu-a. Quanto ele suspeitava?
— Exceto que não poderia ser isso, poderia? Ele continuou.
— Mesmo se você abrigasse algum plano infantil para vingar
sua família, você não poderia pagar por ele.
Infantil!
— Claro que não. Veja como você é bobo.
— Claro, você pode pensar em pagar com outra moeda, mas
você não teria esperado três anos para isso. A menos que você de
repente tenha ficado impaciente.
— Nós falamos as gentilezas habituais, isso é tudo. O que eu
disse a Sir Gerard não é da sua conta. Não tem nada a ver com
você.
Foi a coisa errada a dizer. Relâmpagos brilhavam naqueles
olhos azuis.
Ele inclinou a carroça para fora da estrada, ao lado de um
bosque de árvores. Ele pulou para fora e levantou-a. Ela lançou
objeções para ele, mas ele a ignorou. O rosto estava duro como
pedra, olhos faiscando, ele arrastou-a entre as árvores.
— Sim, não tem nada a ver comigo. Você me diz isso com
frequência. Onde você está indo e quando você vai sair e o que você
vai fazer e o que está em seu coração não tem nada a ver comigo.
Ele puxou-a contra um carvalho, em seus braços. — Mas tem tudo a
ver comigo, porque isso acontece.
Ele a beijou. Difícil. Furiosamente.
Um beijo de demanda e reivindicação. Uma afirmação da
capacidade de possuir sua paixão, se ele escolhesse.
Isso a assustou. Não o calor nem o ferro do abraço dele. Sua
reação a assustou. Por toda sua indignação e choque, aquele beijo a
derrotou imediatamente. Mesmo quando ela lutou, seu corpo ficou
flexível. A voz interior da negação desapareceu, abafada por um
ataque de afirmação visceral. Aquelas asas de sua feminilidade
voaram e subiram, e subiram, se gloriando na altura vertiginosa
possibilitada pelos ventos de sua tempestade.
Nada importava. Não seus receios ou seus planos ou suas
decisões. Aquele mundo deixou de existir quando ele a beijou.
Sempre deixava. Ela não tinha resistência contra a beleza daquilo.
Seu coração ansiava por ter as coisas difíceis obscurecidas.
Ele terminou o beijo, mas não a soltou. Ele descansou contra o
carvalho e puxou-a para mais perto. Ele aliviou o joelho entre as
pernas até que ela se sentou, os dedos dos pés mal roçando o chão.
Seus olhos brilharam quando ele viu sua reação à pressão firme.
— Esta parte da sua vida definitivamente tem a ver comigo,
Joan. Na minha opinião, isso significa que o resto também tem.
— Você tem a parte mais pobre, Rhys. A maneira mais fraca de
fazer uma reclamação.
Seu joelho continuava pressionando-a, mantendo sua excitação
viva, lembrando-a de onde isso poderia ter ido.
Deveria ter ido.
— É o caminho mais antigo entre homens e mulheres, linda
pomba. O primeiro caminho. E se você não se juntar a mim neste
prazer, eu não poderia pensar em reivindicar mais do seu corpo ou
seu coração ou sua mente.
Ele falou muito. Do que isso poderia ser. Seu coração se
torceu. Isso nunca poderia acontecer, não com ela. O primeiro
modo, o caminho mais antigo, o caminho essencial para o
compartilhamento que ele queria dizer, estava bloqueado para ela.
Ela tinha que fazê-lo entender como isso era impossível. Que
doloroso.
— É apenas prazeroso até certo ponto para mim, e então isso
morre. Eu lhe disse desde o início que eu não posso dar a você o
que você quer, que eu não gosto de homens dessa maneira.
Ela esperava mais surpresa. Em vez disso, ele apenas a
envolveu com os braços e olhou para ela.
Um olhar longo e pensativo. Muito longo, muito pensativo.
— Você se entregou ao seu prometido, Joan?
A pergunta a surpreendeu.
— Você fez?
— Não.
— Então você era uma donzela quando ele morreu?
Ele cutucou algo ferido e dolorido. Ela recuou da intrusão.
— Eu não acho que você é virgem agora. Eu estou errado
sobre isso?
Ela rangeu os dentes.
— Não. Agora você está contente? Você vai deixar isso em
paz?
— Eu quero saber por que você tem medo disso. Por que o
prazer morre?
Ela lutou para controlar as terríveis emoções que suas
perguntas evocavam, mas elas começaram a vazar em seu coração.
— Aconteceu alguma coisa quando o exército veio? Depois que
seus homens foram mortos e você estava desprotegida? É por isso
que você quer ganhar dinheiro e conhecer um campeão? Você
sonha em vingar a perda de mais do que sua família e casa?
Ela não pôde responder. Ela não podia encará-lo. Ela queria
que ele parasse de perguntar sobre isso. Queria tanto que ela
levantou o rosto desesperadamente para beijá-lo. Para distraí-lo.
Ele aceitou a oferta, mas não beijou de volta. Ele quebrou-a
gentilmente, como se soubesse o que ela estava fazendo.
— Joan, você foi estuprada?
Mortificação fluiu através dela. Totalmente engoliu ela. Sua
garganta e olhos ardiam enquanto lutava para reprimir o ataque da
desgraça. Medo e desgosto e tristeza mortal explodiram através
dela.
E raiva também. De Rhys. Ele não podia deixar isso em paz.
Ele teve que cavar e cavar até que ele minou suas frágeis defesas.
Ele teve que jogá-la de volta, apenas para satisfazer sua vaidade
que a negação dela não era um repúdio a ele.
Mal controlando as lágrimas sem sentido que ela jurara nunca
mais verter de novo, ela o empurrou bruscamente para fora de seus
braços. Ela o encarou, mais furiosa do que jamais estivera em sua
vida.
Ele queria saber? Ele precisava saber? Então deixe-o saber,
droga.
— Não foi estupro. Eu não fui forçada. Ela começou a voltar
para a carroça. — Eu fui de bom grado. Eu me vendi.
Capítulo XIV
O diabo nele havia assumido, e agora ele se arrependia
profundamente.
Joan seguiu o resto do caminho em absoluto silêncio. Sem
movimento. Uma figura esculpida em pedra, com toda a sua
humanidade escondida sob uma superfície dura.
Ele se virou e vislumbrou os olhos dela. Sombreados de dor,
eles olharam para dentro e não notaram nem a preocupação nem o
ambiente. Ele conhecia aquele olhar. Ele tinha visto isso antes, em
uma mulher de cabelos escuros carregando um bastardo morto em
seu ventre.
Eles voltaram para a cidade uma hora antes do pôr do sol.
Joan pulou da carroça quando ele parou no estábulo e correu para
dentro da casa. Ele desatrelava os cavalos quando Mark chegou para
cuidar dos cavalos
— O que é isso? Mark perguntou, levantando um grande saco
de cordel. — É muito pesado.
Rhys esquecera que estava ali.
— É argila.
— Argila? Para Joan? Deixe-me ir dizer a ela. Ela parece infeliz.
Isso vai alegra-la.
— Não, entregue para mim. Deixe-a ficar sozinha agora. Cuide
do cavalo e depois visite seu amigo David.
Rhys levou a sacola para o jardim e a colocou sobre a mesa.
Como a luz do sol ainda era forte, e como Joan precisava de sua
privacidade, ele descobriu a estátua. Inclinando-o para baixo, ele
escarranchou o banco perto do rosto e pegou sua fina ondulação
para terminar a boca.
Úrsula, a virgem mártir. Ela havia morrido em vez de se deitar
com o líder pagão dos hunos. Onze mil jovens morreram com ela em
nome da pureza cristã. Ele decidiu que não gostava muito de Úrsula
e dos outros santos virgens, mesmo que ele amasse essa estátua.
Que mensagem sua história deu às Joans do mundo que tiveram
que negociar com o diabo para sobreviver?
Ele se perdeu no trabalho como ele esperava que acontecesse.
E assim não a notou no jardim até que ela colocou a xícara de
cerveja na mesa.
Apesar de sua infelicidade, ela foi até a taverna. A cerveja
fresca tinha se tornado um pequeno ritual, e toda noite esperava por
ele no corredor quando ele voltava. Se a noite esfriara, ela
geralmente também acendia o fogo na lareira e colocava a cadeira
do mestre por perto. Ele raramente a usava, no entanto.
Normalmente levava a cerveja de volta para a cozinha e passava o
tempo antes do jantar com ela e Mark.
Ele olhou para o rosto dela e sua tristeza rasgou seu coração.
Ele adivinhara a história dela, mas nunca suspeitara do quão crua
ainda era sua alma.
Muito crua. Aceitara as coisas que podia mudar e ignorara as
que não podia, mas isso não enfraquecia as piores tristezas. Uma
dor que não foi abraçada teria o seu dia eventualmente. Ela
lentamente saia do esconderijo, destruindo o que quer que estivesse
em seu caminho.
Ela começou a voltar para a casa, mas notou o saco.
Ele assistiu enquanto ela considerou isto, e cutucou seu lado
curiosamente. Ela espiou dentro. Ele retornou ao seu trabalho.
Nada. Nenhum som em tudo. Finalmente ele olhou.
Ela ainda olhava para o saco, mas sua expressão havia perdido
sua letargia.
— Você comprou isso para mim?
— O oleiro de Kent tinha extra. Ele estava disposto a me dar
um pouco.
— É muito bom barro. E é muito.
— Você pode colocar um pouco de água para salvar, não?
Ela puxou o saco e olhou para o caroço, como se não se
lembrasse do que fazer.
Ele se levantou e encontrou uma tábua larga. Ele colocou do
outro lado do banco.
— Você pode trabalhar aqui.
— Eu não tenho forno.
— Por um preço, George vai deixar você usar o dele. E mesmo
se você não puder queimá-los, é a arte que dá satisfação tanto
quanto o produto. Pelo menos é para mim.
— Sim, para mim também.
Ele retornou ao seu lugar. Ela contemplou o barro. Arrancando
um grande pedaço, ela levou para o quadro.
— É muito duro. Requer amassar.
Ignorando sua presença, ela desamarrou o vestido e o tirou.
De braços e pernas nuas, vestindo apenas a sua túnica, ela montou
o banco e afundou as mãos na massa acinzentada.
Ela não se perdeu nela, no entanto. Ele poderia ter ido
embora, mas os pensamentos dela não foram. Eles silenciosamente
tremeram pelo ar. Ele sentiu sua tristeza tão certamente quanto a
ferramenta em sua mão.
A argila provou ser muito dura. Quase inflexível.
— Precisa de um pouco de água, não? ele perguntou.
— Provavelmente, ela disse.
Levantou-se e tirou um pouco do poço, trouxe-o de volta e
escarranchou o outro lado do tabuleiro. Ele pingou um pouco e
depois emprestou suas próprias mãos e força para a tarefa.
Eles amassaram juntos em silêncio. Seus movimentos eram
rotineiros e não muito eficazes. Seus joelhos nus espiaram para fora
da túnica engatada, mas ela nem percebeu ou não se importou.
— Você sabia, ela murmurou.
— Eu imaginei. Eu não tinha certeza.
— Como?
— Coisas que você tinha dito. Pedaços aqui e ali. Eu sou um
pouco treinado para ouvir os pensamentos por trás de uma palavra
ou duas.
— Então você tinha que perguntar, porque você esperava que
não fosse verdade.
— Essa verdade não importa para mim, Joan. Não da maneira
que você pensa.
Ela olhou para cima com total descrença, depois bateu com o
punho no barro.
— Bem, isso importa para mim.
Ele debateu seu curso e esperou escolher o caminho certo.
— Quando eu era menino, apenas mais novo que Mark, uma
mulher que eu conhecia chamou a atenção de um homem poderoso.
Ele era o filho do senhor, Lorde local e acostumado a ter o que
queria. Ela o recusou, mas ele não aceitou. Ela era livre, da família
de um artesão, mas isso não importava.
Ela não olhou para ele, mas seus dedos esticaram-se tensos
através do barro.
— Ele poderia ter ido pegá-la sozinha e a forçado, mas não foi
assim. Em vez disso ele a fez sofrer. Não apenas ela mesma, mas
sua família. Ele garantiu que ninguém lhes vendesse comida ou lhes
desse trabalho. Ele ameaçou todos que poderiam ajudar, mas nunca
a machucou diretamente. Todos os seus parentes passaram fome,
até mesmo as crianças.
Suas mãos pararam. Ela olhou para o barro.
— O que ela fez?
— O que ela poderia fazer? Ela foi até ele. De bom grado,
como sua vaidade queria. Mas não havia nenhuma vontade nisso. Se
ele tivesse segurado uma faca em sua garganta, teria sido mais
escolha dela do que era. Ele não a acolheu como amante, mas fez
com que ela negociasse pela família dela, para que ela conhecesse o
poder dele. Foi a primeira de muitas degradações.
Ela fechou os olhos. Um tremor sacudiu seu corpo.
Ele deslizou a mão sobre a dela.
— Pelo que você foi forçada a negociar, Joan?
Ela mal se mexeu, mas a mão sob a dele arranhou o barro.
— Por Mark, ela sussurrou. — Pela vida do meu irmão. Ele o
teria matado e ninguém mais poderia impedi-lo.
Jesus. Ele segurou a mão dela com força, tanto para conter
sua própria emoção quanto para acalmar a dela. Ela não precisava
dizer quem ele era. Não tinha sido algum cavaleiro bêbado pela
vitória, mas o homem que brandia a bandeira de Mortimer.
— Você não tinha escolha, querida. Veja isso, e saiba a
verdade disso, e nunca diga que se vendeu novamente.
Seus ombros se curvaram para baixo. As lembranças
começaram a derrotá-la.
Ele estendeu a mão para ela.
— Joan...
Ela levantou a mão para afastá-lo.
— Não. Por favor, não. Saia agora. Por favor, me deixe em
paz.
Ele se levantou, relutante em abandoná-la assim. Ela parecia
terrivelmente frouxa e, tragicamente, lamentavelmente sozinha. Ele
pensou que seu coração iria quebrar por ela.
Ele acariciou a cabeça dela com as pontas dos dedos quando
ele passou, de leve o suficiente para que ela não sentisse. Mas ele
sim.
— Eu sinto muito, Joan. Eu deveria ter visto isso mais cedo. Eu
temo que toda vez que eu toquei em você, isso só fez você lembrar.
Ela amassou com todas as suas forças, rezando para que o
barro absorvesse o horror tão suavemente quanto suas mãos. Não
aconteceu desta vez. O desespero cresceu e cresceu, enchendo-a
até que sufocou o peito e a garganta em sua demanda para sair. Ela
usou toda a sua força para mantê-lo contido, mas seu poder
devastador aumentou implacavelmente até que suas mãos e o barro
se borraram das lágrimas que fluíam em seus olhos.
Já era hora, quer ela quisesse ou não. Por mais de três anos,
ela nunca enfrentou o desespero, mas não tinha escolha agora. Suas
perguntas abriram as cicatrizes frágeis, e tudo começou a fluir, como
o sangue de uma ferida putrefata. Ela não podia parar desta vez.
Nenhum dos antigos santuários serviam a ela bem o suficiente. Não
a raiva ou o ódio ou mesmo o barro.
Muitas vezes procurou escapar em seu ofício, mas agora ela
encontrou a liberação. Ela bateu e espetou ferozmente quando as
emoções a atormentaram. Soluços ofegantes saiam dela com tanta
força que machucavam e dobravam todo o seu corpo. Lágrimas
caíram como uma cachoeira na massa que ela esmurrou. As
lembranças forçaram-se em sua mente tão vividamente que três
anos poderiam nunca ter passado.
Imagens de Guy, de suas exigências e tato, eram as menores.
O verdadeiro inferno não tinha sido à noite, exceto quando ela
acordou e experimentou a sensação sufocante de aprisionamento.
Ela havia enfrentado o que ocorreu com seu corpo há muito tempo.
Reviver o resto disso a devastou, no entanto. O entorpecimento de
sua alma. O desamparo solitário. O ódio por si mesma e desgosto. A
sensação de ser tão impura que nenhum banho poderia purificá-la.
Ela lutou reconhecendo tudo isso, lutou tanto que seu corpo
doeu. Encheu-a de qualquer maneira. Derramou dos lugares que ela
havia escondido, inundando-a até que ela gemeu em rendição.
Soluçando incontrolavelmente, afogando-se na desolação, ela
continuou atacando cegamente o barro. Sua mente continuava
fugindo, tentando encontrar abrigo, mas não havia onde se
esconder.
Sua cabeça doía. Ela pensou que seu peito iria explodir.
Os soluços a sufocaram tanto que ela não conseguia respirar.
Ela cruzou os braços sobre o corpo em uma tentativa frenética de se
manter unida.
Parecia uma dor, a pior dor que ela já conhecera. Dar-lhe um
nome tornou-o um pouco melhor, mas também mais intenso.
Enfrentar a perda partiu seu coração. Isso aguçou a dor com uma
nostalgia mordaz.
Ela se inclinou, pressionando os braços cruzados em seu corpo
dobrado com tanta força que se machucou. Ela finalmente lamentou
pela vida arrancada dela. Não o conforto, mas a felicidade e a
inocência. A confiança e fé. Ela lamentou por sua infância e pela
garota que ela fora uma vez.
Ele soprou através dela como uma tempestade mortal. Ela
perdeu a cabeça por um tempo e só existia dor severa. Dor que
ameaçava despedaçá-la.
Lentamente, como todas as tempestades, diminuiu um pouco.
Ela tentou recuperar algum controle. Engolir a angústia que disparou
cãibras pelo corpo dela. Forçando de volta as lágrimas queimaram
seus olhos e engrossaram sua garganta.
Calma veio devagar. Trouxe um novo conhecimento e uma
nova aceitação e o mais vago alívio.
Ela ficou consciente de si mesma do banco e do barro.
Crepúsculo tinha caído no jardim. Ela desdobrou os braços e
deslizou as mãos sobre a massa no quadro entre os joelhos. Sua
violência criou caroços e buracos e vales irregulares.
Ela apertou e alisou até que ela tivesse uma forma redonda e
plana. Uma compulsão para trabalhar deslizou por ela.
Como a linha do sol se espalhando por um campo depois de
uma tempestade, a esperança de consolo espiou através de sua
miséria e a chamou.
Ela havia encontrado conforto em seu ofício antes. Talvez ela
pudesse agora. Foi uma coisa boa levantar a destruição. Ela faria
algo bonito, uma imagem dos velhos tempos, e daria forma ao que
restou da parte dela que uma vez conheceu a bondade.
Cheirando a tristeza ameaçadora, ela deixou as mãos se
moverem. Ela não faria uma estátua desta vez, mas uma placa em
relevo. Ela escavou e modelou, fazendo as formas subirem e
incharem.
Isso a absorveu completamente. A paz veio, melancólica, mas
segura. A luz ficou tão fraca que ela não pôde ver o que ela fazia.
Apenas emergiu, fluindo diretamente de sua alma para seus dedos,
pulando sua mente. Parecia tão certo, no entanto. Seria perfeito.
Linda e perfeita e boa. Um pequeno monumento a quem ela fora
outrora e ao que uma vez conhecera.
— O que você tem aí?
Era Mark, vindo em sua direção pelo portal do jardim. Ela se
endireitou e percebeu que a escuridão havia caído.
— Eu não tenho certeza. Um rosto, eu acho. Pai, eu acho.
Ele ficou muito quieto. Ela instantaneamente se arrependeu de
dizer isso. Ela não queria atraí-lo para sua infelicidade.
— Traga-me uma vela, você faria?
Ele entrou na cozinha e voltou com uma pequena vela. Ela
pegou isso dele.
— Vá e durma um pouco agora.
Ele alegremente obedeceu. Ele não gostaria de ver o rosto do
pai. Ele carregava suas próprias feridas e as lambia do seu próprio
jeito. Ela baixou a pequena chama. Sua luz bruxuleante enviou o
menor brilho sobre o barro.
Sua cegueira produzira algo bastante grosseiro, mas a
aparência era distinta.
Não o rosto do pai. Não era uma imagem de sua infância, mas
um homem de seu presente.
Era Rhys.
Capítulo XV
Ele foi para a janela do solar novamente e novamente. O
som do seu luto levou-o até lá.
A noite caiu e ela ainda estava sentada no banco. Não a carícia
sentimental de antes, no entanto. Ela trabalhava o barro agora.
Isso era um sinal de esperança. Suas mãos expressariam o que
sua alma precisava saber. Criar algo a partir de materiais básicos era
um ato espiritual, assim como uma habilidade física. Poderia haver
cura nele. Ele havia percebido, quando menino, que essa era uma
grande razão pela qual ele nunca deixaria de lado o cinzel, não
importando quantos edifícios ele planejasse.
Uma pequena luz apareceu. Ele viu a centelha piscar enquanto
ela estava sentada imóvel, segurando-o na sua mão. Ela parecia
mais calma.
Ele se virou, deixando-a em sua privacidade novamente. Ele
sentou-se na cadeira onde tinha mantido a vigília enquanto ouvia os
soluços dela subirem do jardim.
Ela não gostaria de saber que ele tinha ouvido. Ele teria
preferido que não, porque a tristeza dela arrancou seu coração. Foi
empatia que o manteve aqui tanto quanto carinho. Também foi
culpa. Não apenas por trazê-la a esse estado, mas também por não
impedir os eventos que destruíram sua vida.
Sua mente viu-se como um jovem, decidido a fazer sua própria
justiça por uma alma destruída. Ele não havia pensado nisso como a
coisa certa a fazer; simplesmente pareceu a única coisa a fazer. Os
marqueses que tinham mais poder do que os barões fizeram em
outras partes do reino. O filho do homem que era a lei nunca
responderia à lei. E esse crime era perspicaz. Se uma mulher fosse
de bom grado, como poderia alegar ter sido forçada?
Havia sido semanas de planejamento e prática com o arco.
Dias de observação silenciosa. Quando a oportunidade chegou, no
entanto, ele experimentou um instante de covardia. Essa hesitação
levara ao fracasso e, em seguida, à corrida pela Inglaterra para
escapar da busca pelo assassino oculto que ousara tentar tal coisa.
Se ele tivesse sido mais corajoso e mais rápido, Mortimer teria
morrido naquele dia. O reino teria sido poupado de suas ambições.
Nenhum exército teria ido para a casa de Joan há três anos.
Nenhum capanga teria a degradado.
Ele veio a esta cidade jurando lutar quando necessário, e
nunca hesitar novamente. Não apenas para aquela mulher, e não
apenas contra Mortimer. Esse compromisso tinha governado sua
vida e suas escolhas tão certamente quanto a vontade de construir.
Mas o destino pode ser caprichoso. Na luta pela justiça, ele
ajudara a dar mais poder ao homem cuja crueldade ele queria
vingar quando jovem. Ele havia feito um governante do estuprador
que ele uma vez tentou matar.
Todos os seus riscos, todos os seus ideais, foram jogados na
sua cara. Pior, na verdade ele tinha sido um agente ativo na
corrupção de suas próprias crenças.
Ele levantou um pergaminho enrolado do chão por sua bota.
Ele tinha pegado algumas de suas fantasias para trazer aqui para se
distrair da miséria no jardim. Isso foi sem esperança. Ele poderia
espiar os desenhos, mas na verdade não vira nada disso. A parte
dele que importava tinha estado lá embaixo com ela, sentindo sua
dor, rezando para que aquelas lágrimas limpassem o pior da miséria
oculta de seu coração.
Ele desenrolou o plano. Foi um antigo, feito durante a rebelião.
Com a guerra ameaçando, ele havia transformado sua imaginação
em castelos. Mostrava uma fortaleza e paredes, com todas as suas
partes articuladas. Foi muito detalhado, de formas que poucos de
seus projetos já foram.
Ele chama seus construtores para consertar as paredes. Algum
dia esse construtor será você.
Ela tinha visto seu coração uma vez. Visto mais do que ele
queria admitir para si mesmo. Seu próprio senso de justiça, ainda
quente e puro, havia reconhecido a perda de fé quando confrontado
com isso.
Passos lentos soaram nas escadas. Seria Mark, trazendo água
para a noite.
Uma coroa loira e uma vela acesa emergiram da escada. Então
um rosto delicado e olhos muito azuis. Não era Mark. Joan decidiu
tomar esta tarefa esta noite.
Ela observava o balde para certificar-se de que nenhuma água
se derramasse. Ela entrou no solar e começou a ir até o quarto
antes de vê-lo sentado perto da lareira.
Ela parou, o pesado balde esticando seu braço duro. A
pequena chama que ela segurava lançava sombras sobre sua túnica,
braços e pernas. Ela não havia se lembrado de colocar o vestido de
volta.
Ele olhou para o rosto dela, esperando por um sinal de que ela
havia vencido as memórias, e não o contrário.
Sua postura havia retornado. Aquilo era um bom sinal. Ela se
segurou orgulhosamente, mas ele viu a fragilidade daquela pose. Ele
sentiu que, dada a metade do motivo, ela iria quebrar novamente.
Ele queria ir até ela, mas ela poderia não querer isso.
— Quem era ela? A mulher que você me contou. Como você a
conheceu?
Sua voz soava distante. Ela continuou a conversa do jardim,
como se duas horas de inferno não tivessem intervindo.
— Minha tia. A esposa do irmão do meu pai.
Ela fez uma pausa, como se demorasse para que sua resposta
penetrasse e fosse considerada.
— Então você foi uma das famílias que sofreu.
— Sim.
Outra pausa.
— Você a amou?
— Ela era uma jovem noiva, não muito mais velha do que eu.
Eu a amava como uma tia, mas talvez de outras formas também.
— Vocês todos queriam que ela fosse até ele, não é? Para que
não morresse de fome, e todos a desprezaram mesmo quando ela
os salvou?
Ele sabia onde isso estava indo e amaldiçoou o mundo por
suas ideias simplistas de virtude e as cargas que eles colocam nas
mulheres.
— Não posso falar pelos outros, mas não a desprezei. Honrei-
a.
Seu corpo ficou tenso. O balde balançou. A água lambia sua
borda.
— Você me despreza? Você vê uma mulher contaminada
quando olha para mim agora? Isso saiu com firmeza, como um
desafio. Ela olhou para ele, esperando para ver se ele mentia.
Ele estendeu a mão.
— Por favor, venha até aqui, Joan.
Ela hesitou, depois abaixou o balde e se aproximou. Ele soprou
a vela dela e a colocou de lado, depois pegou a mão dela e levou-a
aos lábios.
— Quando olho para você, vejo uma donzela corajosa que
salvou a vida do irmão.
— Não é uma donzela.
— Sim, uma donzela. Intocada nas formas que importam.
Seu olhar continha alguma gratidão e um pouco de segurança.
Ela ficou lá, como se não soubesse como sair. Ele segurou a
mão dela e esperou que ela decidisse por que ela havia vindo.
— Por favor, não diga a Mark. Ele não sabe. Eu trouxe a água
porque ele estava me fazendo perguntas. Ele queria saber por que
eu estava no jardim e o que havia acontecido para me deixar triste.
Espero que ele esteja dormindo quando eu voltar.
Não foi por isso que ela veio. Ela parecia muito linda diante
dele à luz das velas. Um pouco misteriosa e muito sozinha. Um
pouco infantil em sua distração. Ela pertencia a si mesma, mas até
os fortes precisavam de apoio às vezes.
— Posso ficar aqui até ele dormir?
— Você pode ficar o tempo que quiser. Você pode ficar a noite
toda. Você é sempre bem-vinda.
Ela entendeu a oferta. Ela contemplou, timidamente tocando
sua mudança.
— Na última vez sua cama foi casta.
Talvez a escolha dela realmente tenha vindo do desejo de
proteger seu irmão de aprender a verdade. Talvez ela simplesmente
buscasse abrigo na solidão de sua dor. Seu coração não se importou
porque ela veio. Ele estava apenas grato que ela iria deixá-lo
confortá-la um pouco. Ele ficou aliviado por ela não estar sozinha
com seus pensamentos esta noite.
— Será de novo. Tão casta quanto você quiser, Joan. Por
quanto tempo quiser.
Sua boca tremeu em um pequeno sorriso. Ela parecia
desajeitada e envergonhada, mas também calorosa e bonita. Ela
olhou para as manchas crocantes nos braços e joelhos. Estou
coberta de barro.
—Vou sujar as roupas.
Ele se levantou e a entregou na cadeira.
— Sente-se aqui e vamos lavá-la.
Ele trouxe o balde e se ajoelhou diante dela. Ele pegou um
pano e começou a limpar o barro seco.
Ela permitiu isso. Como um soldado exausto pela batalha, ela
se sentou fracamente, suas lindas pernas pendendo da cadeira,
enquanto ele cuidava dela. O clima daquela primeira noite, quando
ela se banhou em sua cozinha e depois dormiu ao lado dele,
emergiu novamente no silêncio.
A cama pode ser casta, mas seria íntima. Em sua necessidade,
ela parecia aceitar isso.
Ele levantou e estendeu a mão. Ela saiu da cadeira e pegou.
Ele começou a soprar as velas.
— Podemos trazer uma? A última vez, quando acordei, por um
momento eu pensei...
Ele levantou a mais longo.
— Deve queimar a maior parte da noite. Eu quero que você
saiba que sou eu quem está ao seu lado.
Ele a levou até o quarto e colocou a vela em um baú. Deu uma
luz fraca, mas suficiente.
Ela ficou pensativa, como se não pudesse decidir como fazer
isso. Com um pequeno encolher de ombros, ela levantou o lençol,
subiu na cama e se aconchegou do outro lado.
Ele sorriu para seu embaraço e se despiu. Ele deslizou sob o
linho ao lado de suas costas curvadas.
Ela não veio até ele para poder ficar sozinha. Ele tocou o
ombro dela.
— Venha aqui.
Ela se virou para o braço dele como se estivesse esperando
pelo pedido. Ela se encaixava perfeitamente contra ele, quente e
feminina, com a cabeça no ombro dele e a respiração no peito dele.
Sua trança pendia ao longo de seu braço. Ele levantou-a com a
mão segurando-a perto e usou a outra para soltar o elástico. Soltar
o cabelo dela o ocupou por algum tempo, enquanto ele aproveitou
para tê-la ali.
Ela relaxou. Seu corpo ficou flexível, moldando-se
perfeitamente. Ela se aninhou mais perto e descansou a mão no
peito dele.
Seu corpo se mexeu de um modo silenciosamente agradável.
Ele havia prometido que esta cama permaneceria casta o quanto
quisesse, e seria. Mas não para sempre. Ela dera o primeiro passo
para a liberdade e ele a guiaria pelo resto do caminho.
Ele espalhou o cabelo solto sobre o braço e o lençol. A pouca
luz fazia um mar de ouro cintilante.
— O que aconteceu com ela?
Ele não achava que essa parte da história a confortaria muito.
— Ele se cansou dela e ela voltou.
— Ela voltou inteira?
Ela entendeu o que aconteceu muito bem, mas também era a
história dela.
— Não.
— Onde ela está agora? Com seu tio ainda?
— Ela morreu cerca de um ano depois.
— Ela se matou?
O jeito franco que ela fez a pergunta o gelou.
— Não. Mas ela abraçou a morte.
Ela não tinha lutado.
— Eu pensei em fazer isso. Uma vez, no caminho até aqui,
paramos em um lago. Parecia tão pacífico. Calmante, plácido e
limpo. Apenas entrou na minha cabeça entrar e não sair.
Seu coração inchou. Ele acariciou o braço dela com as pontas
dos dedos e escondeu sua reação.
— Mas eu precisava cuidar de Mark. Ele tinha apenas doze
anos. Isso me impediu. E a raiva também. Fúria porque nos
tornamos vítimas. Em vez disso, jurei pela memória do meu pai
desfazer tudo o que pudesse, pelo menos para Mark. Para recuperar
nosso lar e trazer alguma justiça sobre esse homem. Eu irei
também. Você estava certo hoje. Eu estava perguntando a Sir
Gerard sobre campeões. Eu guardo a moeda das minhas estátuas
para contratar um. Algum dia enviarei um cavaleiro para fazer
aquele homem pagar por tudo o que ele fez para nós. Vou lançar
um desafio a esse diabo, e ele é tão vaidoso que aceitará isso.
Foi uma admissão nascida da intimidade da cama e da crueza
de sua tristeza. Ela compartilhou os pensamentos de seu coração,
mas ela também deu a ele um aviso justo. Ela poderia ter
enfrentado tudo isso hoje, mas ela não mudou de ideia. Eu não vou
ficar, e agora você sabe o porquê.
Ele não iria discutir com ela sobre isso agora. Em outra
ocasião, ele apontaria a futilidade de seu sonho e a necessidade de
deixar de lado.
Eles ficaram quietos no humor pungente de sua revelação. Ele
beijou a cabeça dela, apenas uma vez, para deixá-la saber que ele
não a julgou mal por aquele momento de fraqueza no lago. Ela
escolheu lutar contra a letalidade e não entregar sua vida ou sua
alma a ela. Ele admirava sua força, não importava onde ela a
encontrasse.
— Você estava errado sobre o que você disse no jardim, ela
sussurrou. — Quando você saiu. Eu não quero que você pense isso.
Seu toque não me fez lembrar.
— Fico feliz em saber disso. Dói-me pensar que te machuquei.
— Você não fez. Na verdade, isso me fez esquecer por um
longo tempo, até certo ponto. Eu não achei isso possível. Mas isso
foi assustador também, porque eu não posso me deixar esquecer,
posso? Eu não posso fazer o que é certo se eu não me lembrar.
Ela falou como se estivesse trabalhando em alguma coisa em
sua mente algo que tem a ver com ela, ele e seu abraço.
Ele considerou sua resposta com cuidado, tentando não fazer
uma por interesse próprio.
— Você deve viver isso como seu coração lhe diz, Joan. Mas se
eu fosse você, eu esqueceria quando pudesse, e lembraria quando
eu precisasse.
Ela ficou em silêncio por um longo tempo. Ela mal se mexeu,
mas ele percebeu que ela não dormia. A expectativa de palavras não
ditas batia no silêncio. Ele não podia dizê-las. Tinha que ser ela.
Apenas quando ele aceitou que ela não o faria, ela o
surpreendeu.
— Você quer me beijar?
— Você sabe que eu quero.
Ela pensou sobre isso.
— Mesmo que não possa ser... embora...
— Apesar de.
— Não é porque você sente pena de mim, não é? Eu não posso
suportar isso.
Ele saiu do abraço e se virou para olhar para o rosto dela.
— Não me imagine melhor do que eu sou. Meu interesse em
você nunca foi altruísta, e não é agora. Eu acho que o dia virá
quando não morrerei por você e eu sou vaidoso o suficiente para
pensar que posso fazer esse dia chegar em breve.
Um pequeno sorriso torto brincou em seus lábios.
— Vou me sentir muito tola, sabendo que não serei mais o que
você quer.
— Seja o que for, será suficiente. Vou me certificar de que
você não se sinta tola.
Emoções cintilavam nos olhos dela. Dúvida. Cuidado. Desejo.
Ela havia levantado a possibilidade e ele não podia deixar a decisão
inteiramente com ela agora. Seu corpo não deixaria. Se não fosse a
hora, se não fosse bom, ambos saberiam imediatamente.
Ele tocou de leve a boca que recentemente havia ficado aberta
com soluços de luto.
— Eu não vou pedir nada mais do que você pode dar. Você
confia nisso?
Ela assentiu. Ele só podia imaginar o salto de fé que tomou. Ela
tinha que saber o quão vulnerável ela estaria.
— Então vamos devagar, para que nada te assuste. Ele beijou
seus lábios macios, testando. Depois de um momento ela beijou de
volta. Seus braços se levantaram para aceitá-lo. Sua confiança
lisonjeou e agradou-o, e levantou uma resposta feroz que ameaçava
rugir através dele.
Ele a beijou pacientemente até que sentiu sua excitação
crescendo. Ele resistiu a acariciá-la até que sua cautela e
constrangimento desapareceram e seus braços o agarraram com
mais força, e então ele gentilmente acariciou seu braço, esperando
até que ela estivesse pronta para mais.
Ele se entregou, saboreando a pele delicada de sua garganta e
lambendo a borda sensível de sua orelha.
Sentindo os pequenos tremores nas bochechas dela com as
pontas dos dedos. Sentindo o calor subir até que ela se esticou e
flexionou e virou o rosto para que sua boca pudesse alcançar os
pontos mais sensíveis em seu pescoço. Desde que ele deixou de
lado sua própria satisfação, ele pôde desfrutar do caminho lânguido
desse ato amoroso.
Ele atraiu seus lábios abertos. Calor, suavidade e intimidade o
absorveram. Mesmo com as sensações obscurecendo sua mente, ele
nunca perdeu o contato com suas reações. Mesmo quando ele
entrou de novo e de novo, e forçou o controle sobre o seu desejo
crescente, ele permaneceu alerta para a linguagem não falada de
seus braços e corpo e suspiros silenciosos.
Com uma resolução estrita, ele se apegou à promessa de que
nada a assustaria.
Uma nova tensão entrou em seu abraço. Seu corpo arqueou
em um convite. Ele acariciou sua orelha.
— Você quer que eu te acaricie?
— Sim, ela suspirou.
Ele espalmou ao lado dela, ao longo da cintura, quadril e coxa.
Ela se mudou para ele com um movimento elegante. Um lindo
suspiro abafado respirou nele. Sua paixão aumentou rapidamente
então. Confiante e disposta, ela o deixou conduzir.
Ela era tão adorável, ele parou de beijar para poder observar a
maneira como ela moldava os longos e lentos trajetos de sua mão.
Ela virou-se ligeiramente, acenando para o peito.
Ainda não. Ele pretendia ir muito devagar. Ele tinha um
objetivo além desta noite. Ele mostraria a ela exatamente o que isso
poderia ser, para que ela voltasse de novo e de novo, até que
chegasse o dia em que ela se entregasse a ele.
Ele a encheria de novas lembranças, para que as antigas não
encontrassem mais espaço para viver.
Ele a virou de barriga para baixo. Ela o encarou de olhos
arregalados. Ele beijou sua bochecha em segurança, e então
empurrou seu cabelo para o lado para que ele pudesse olhar para
ela. A combinação caiu suavemente pelas costas e parte inferior até
o meio das coxas. Lindas pernas esticadas abaixo.
Ele se curvou e beijou ao longo de sua espinha através do
tecido, até a pequena cavidade na parte baixa de suas costas.
Seu corpo flexionou e sua respiração encurtou em reação. Ele
gostava desses sussurros de choque prazeroso, tanto quanto a
sensação de seu calor em seus lábios.
Desejo conquistou sua surpresa. Seu corpo se movia de formas
que ela não controlava. Ele moveu a moveu para que pudesse
saborear sua pele, e se abaixou para beijar suas coxas. Ela separou-
os ligeiramente, oferecendo uma nova vulnerabilidade. Ele cheirou
sua excitação e uma umidade almiscarada tocou seus lábios.
Ele teve que se forçar a se afastar do que ela, sem saber,
ofereceu. Um calor forte entrou em sua cabeça e sangue, e a
decisão de ir mais longe do que ele planejara simplesmente
aconteceu, a conclusão natural de suas respostas prontas.
Ele moveu o turno mais alto, revelando-a. Suas costas
mergulharam e seu traseiro subiu com a exposição. Ele a empurrou
para os ombros dela, e então deslizou até que ela estava nua no
brilho da vela, como ele a havia visto naquela primeira manhã e a
imaginou tantas vezes desde então.
Ele acariciou seu traseiro tenso e redondo. Ele ficou mais firme
e mais alto. Ele explorou mais baixo. Suas coxas se separaram mais.
Gritos curtos e ansiosos soavam em cada respiração, abafados pelo
travesseiro.
Ele gentilmente massageou a parte de trás de suas coxas, seus
dedos roçando de perto a fonte da umidade sugando sua pele. Uma
melodia de prazer ansioso saiu dela.
Um toque no ombro dela foi o suficiente para ela se virar,
agarrando-o a ela em um abraço apertado. Ela juntou-se aos beijos
ferozmente, abrindo-se para a união, faminta, o que não fez nada
para aliviar as batidas em sua cabeça que seu erotismo inocente
estimulava.
Seus beijos ficaram frenéticos. Seus gritos soaram frustrados.
Ela o puxou para mais perto e continuou se transformando em sua
carícia. Ela cambaleou à beira do abandono que a havia
surpreendido debaixo da árvore no jardim.
Ele poderia levá-la lá, ele poderia dar-lhe satisfação, mas ele
queria saber que ela tinha escolhido. Ele acariciou sua coxa interna
oferecendo, e pressionou seus lábios em sua têmpora para acalmá-
la.
— O que você quer, amor? Me diga.
Nenhuma resposta no começo. Então um sussurro, não mais
que o espírito de uma voz.
— Tudo. Vamos tentar. Eu quero tudo com você.
Ele não esperava isso. Uma voz interior avisou que esta noite
era cedo demais, mas a necessidade e o triunfo rugiam mais alto.
— Você está certa?
— Sim. Por favor.
Ele a tocou intimamente, testando. No jardim, o prazer dela
havia morrido com isso, e ele esperou para ver se aconteceria
novamente.
Uma flexão, defensiva e cautelosa, tensão passou através dela.
Então isso escorregou e ela abriu as pernas.
Nenhum pensamento, então. Nenhum debate. A fome enviou
uma chama através de sua cabeça. Ele se moveu em cima dela.
Outra flexão. De alguma forma ele se forçou a parar,
esperando.
Mais uma vez ela conquistou. Ela o puxou para mais perto e o
beijou.
Ele começou controlando o impulso de seu corpo para
rapidamente pegar o que lhe era oferecido.
Uma tensão. Um calafrio. Com seu primeiro toque, estremeceu
tudo através dela.
Ele parou de novo, mal respirando pelo esforço que levou. Um
grito primitivo em sua cabeça instigou-o a ignorá-lo.
Ela não o afastou. Ela não resistiu, mas ele sabia o que havia
acontecido. Ela não iria parar ele, mas eles tinham ido mais longe do
que as memórias permitiriam.
Ele pairou ali, pressionado pelo calor dela, lutando contra o
desejo que insistia para que continuasse. O desejo quase o
dominou. Rangendo os dentes, amaldiçoando-se, ele se afastou e
empurrou as pernas dela juntas.
Elas se fecharam sobre ele, isso foi o suficiente. Ele aceitou a
liberação e o alívio.
Ele abriu os olhos depois do instante de prazer, as mãos dela
cobriam seus olhos.
— Sinto muito, ela murmurou.
— Era cedo demais, isso é tudo. Eu deveria saber disso.
— Eu pensei que poderia.
— Eu não quero sua bravura, Joan. Eu não quero que você se
force. Quando for a hora, você saberá.
— Pelo menos eu não te deixei... pelo menos você não é... isso
teria sido... eu teria me sentido ainda mais tola então.
Ele a beijou até que seu embaraço caiu, então a puxou para se
aninhar em seu abraço durante a noite.
— Da próxima vez não vamos apressar as coisas, e vou cuidar
do seu contentamento também.
— Estou satisfeita o suficiente. Eu não acho que poderia saber
mais.
Ela poderia, e ela faria. Mas isso esperaria por mais uma noite.
Ele a envolveu em seus braços, para que ela não se sentisse
tola, ou qualquer coisa exceto protegida. Ela se encaixou contra ele
muito bem, como se tivesse sido moldada para combinar com ele.
Capítulo XVI
Ela se aproximou da cadeira do senhor no corredor. O
homem errante sentava-se nela, um homem muito jovem e muito
complexo. Ele a avaliou com o tipo de interesse que o último lorde
nunca demonstrara.
O pesar tinha matado seu medo dele. Os horrores dos últimos
dias a haviam entorpecido. Ela sabia o que ele queria, mas ela já
havia decidido que ela iria se matar primeiro.
Ele a olhou possessivamente. Foi assim desde que ele a viu
pela primeira vez. Ela havia assumido que primeiro dia que ele iria
violá-la, mas ele não tinha.
— Você vai sentar aqui e comer, Joan. Eu não vou ter você
definhando.
Ela tomou o lugar ao lado dele. Seu tom solícito fez sua
amargura derramar-se. Seu calor parecia água fervente jogada no
gelo de seu coração.
— Você não tinha que matar Piers.
— Ele me desafiou. Foi ingrato da parte dele. Eu o poupei
quando a fortaleza caiu, porque uma vez tínhamos lutado pelo
mesmo senhor. Ele me paga ameaçando minha pessoa.
— Você o forçou ao desafio. Você tem sido muito familiar
comigo. Ele é... ele era meu prometido, meu marido aos olhos de
Deus. Sua honra e a minha não lhe deixaram outra escolha senão
desafiá-lo, apesar de suas feridas, e você sabia disso.
Ele sorriu suavemente. Um sorriso encantador, mas mortal em
sua linha frágil.
— Sim, seu marido. Agora ele não mais ficara entre nós.
Ela entendeu de repente. Ela viu a horrível verdade. Piers foi
atraído para esse desafio. Isto tudo tinha sido deliberado, decidido
assim que Guy soube o que Piers era para ela. Foi um jogo para este
cavaleiro, com ela tanto a isca como o prêmio.
— Você é um louco se você acha que a morte dele me deixa
mais disposta. Eu só te odeio mais.
Ele tomou um gole de vinho com muita calma. Seus olhos
brilharam com triunfo.
— Você será minha e você estará disposta. Você pode me
trazer apenas seu ódio a princípio, mas isso vai mudar. Sua
segurança depende do meu favor.
— Você acha que eu me preocupo com a minha segurança?
Espero que algum dia você saiba perder, e aprenda como a morte
pode ser um presente quando tudo o que você ama foi destruído.
Ele a olhou novamente. A luxúria brilhando em seus olhos fez
seu estômago revirar.
Ele virou a cabeça e olhou para algo no corredor.
— Nem tudo o que você ama foi destruído. Eu tenho sido
generoso.
Seu olhar seguiu o dele. Ela viu o que absorvia sua atenção.
Seu irmão Mark sentava-se com os funcionários. Um arrepio subiu-
lhe pelo pescoço e arrepiou suas costas.
Sua mão cobriu a dela.
— Não é mera luxúria, Joan. Eu posso satisfazer isso sem
custo, e nós dois sabemos. Mas a sua beleza e maneira me tem, e
eu estou apaixonado o suficiente para querer que você me aceite
por sua própria escolha.
A rebelião aumentou por um instante, mas ela forçou a
submissão. Ela desistiu de toda a esperança naquele momento, e
provou a amarga bile de rendição.

O pesadelo se desvaneceu, e ela sabia que tinha sido um


sonho enquanto vivia seus últimos momentos.
Ela saiu do sono em paz. Nenhum pânico de afogamento.
Nenhuma armadilha desesperada. A luz prateada do amanhecer mal
dava forma ao homem cujo braço e mão descansavam
possessivamente em seus quadris, mas ela não precisava vê-lo para
saber quem era. Cuidado e bondade podiam ser sentidos no peso de
seu toque.
Ela deveria acordá-lo. Ele chegaria atrasado ao palácio. Mas a
doce proteção de seu abraço tornou o ressurgimento do mundo
gradual e administrável. A luz da realidade invadiu a sala
lentamente, iluminando a cena da intimidade da noite anterior.
As memórias sonhadoras de seu ato de amor evocavam uma
onda de constrangimento e confusão.
Se ela soubesse até onde iria, ela poderia não ter deixado. Ela
nunca imaginou que o prazer pudesse consumir todo o seu ser. Ela
não suspeitava que a carícia do homem certo pudesse acalmar as
necessidades físicas e espirituais.
Por um tempo. Até certo ponto. A lembrança de seu fracasso
envergonhou-a novamente.
Ela provavelmente havia cometido um erro na noite passada.
Em sua necessidade de seu calor e força, ela havia começado algo
que não conseguia completar, mas não sabia como parar.
Sua mão pressionou sua nudez com mais firmeza e a
aproximou mais. Ela virou a cabeça e seus olhos perceptivos
olharam de volta. Não dormia. Ele ficou para esperar que ela
acordasse. Ele sabia que o novo dia traria apreensões.
Ele beijou seu seio, apenas em afeição, mas isso a despertou
de qualquer maneira. Ele havia descoberto uma parte dela que
nunca seria capaz de se esconder dele novamente, e ele sabia disso.
— Você chegará muito tarde, disse ela.
— Eu não respondo a ninguém lá. Ele se esticou e se levantou.
Ele foi até a porta e abriu-a e voltou com um balde de água.
— Você quer que eu fale com o seu irmão, ou você vai?
Ela olhou para o balde. Claro que Mark estaria acordado agora.
Quando ele trouxe a água, o solar vazio confirmou onde ela passou
a noite.
— Eu vou, disse ela, não ansiosa por isso.
Enquanto Rhys se lavava e se vestia, ela encontrou sua
combinação e a vestiu. Sua referência a Mark falou de suas
suposições sobre como as coisas mudaram entre eles e suas
expectativas para o futuro.
Ela não tinha considerado isso. Ela não pesara nada na noite
passada. Acabara de acontecer e suas emoções cruas não queriam
contemplar as consequências.
Sua felicidade adquiriu um sabor de nostalgia. Ela não podia
ficar nesta casa, nem negar o que ocorrera. Também não podia
fingir que haveria mais. Isso seria insensível e insultuoso.
Ela começou a se levantar.
— Vou pegar comida pronta.
Ele se aproximou e ficou ao lado da beira da cama para que ela
não pudesse sair.
— Eu vou encontrar alguma coisa.
— Eu deveria... nós deveríamos... Seu olhar não a deixou
terminar. Ele sabia o que ela estava pensando: deveríamos
encontrar uma maneira de colocar o vinho derramado de volta no
barril.
— Você não foge mais, Joan. Eu não vou deixar você. Eu avisei
a você que eu não sou altruísta nisso. Ele se inclinou e a beijou.
— Nem você vai sair tão cedo. O que você tem que fazer pode
esperar um pouco.
Pelo menos ele falou como se entendesse que isso não poderia
continuar por muito tempo. Suas emoções emaranhadas
encontraram um alívio vago nisso.
— Quando você conversar com Mark, diga a ele que não há
mais necessidade de dois paletes na cozinha. Você vai dormir aqui
comigo.
Ele saiu e ela se levantou e endireitou a cama. Ela se lavou
devagar, querendo atrasar encarar seu irmão. Ela nem tinha roupas
aqui. Ela teria que descer do jeito que estava, vestida apenas em
sua combinação.
Ela não ouviu gritos. Mark não havia confrontado Rhys.
Quando ela desceu as escadas e entrou na cozinha, ela sabia por
quê.
Mark se sentou perto da janela, olhando para o jardim. Ao som
dela, ele se virou para ela. Seu coração bateu com a visão dele. Não
foi um menino que a perfurou com olhos de fogo. Um jovem com o
rosto esculpido pela raiva a cobriu com o olhar.
Não, ele não disse uma palavra para Rhys. Ele guardou tudo
para ela.
Ele pegou o vestido rosa, empilhado no banco ao lado dele e
jogou para ela.
— Vista-se.
Ela o vestiu, sentindo-se infantil e confusa sob o olhar dele.
Suas idades poderiam ter sido revertidas esta manhã, com ele sete
anos mais velho que ela, em vez do contrário.
— Então ele espera que você se prostitua agora?
Ela não conseguia explicar o que havia acontecido na noite
anterior, mas não era isso, e não apenas porque estava incompleto.
— Ele queria você desde o começo, mas achei que ele deixaria
a decisão para você.
— A escolha foi minha.
— Ah, sim, mas a escolha de um demônio. Ele nos deu uma
casa decente e comida decente, e esperou até que nos
acostumássemos a isso antes de fazer parte da barganha da cama.
Foi isso que aconteceu ontem, não é? O último movimento em seu
jogo. Ele disse que você tinha que ir até ele ou sair, não é? É por
isso que você ficou tão perturbada quando voltou. Sua mandíbula se
apertou e ele desviou o olhar. Eu não vou deixar você se vender
para me alimentar. Eu vou nos ver mortos primeiro.
— Não foi assim. Ele não é assim.
— Ele é um homem, irmã, e nisso somos todos iguais.
— Ele não é.
Ele de repente compreendeu. Seus olhos queimaram mais
quentes.
— Você tem afeição por esse pedreiro?
Seu tom incrédulo a incomodou.
— Sim, ela disse bruscamente.
A tempestade que vinha crescendo nele por três anos quebrou.
As últimas semanas tinham feito aquela tempestade se acalmar, mas
agora ela rodou para fora dele.
— Ansiosa por isso ou não, você não nasceu para ser a amante
de um artesão.
— Eu também não nasci para trabalhar o barro. Ou morar em
um barraco. Ou usar trapos.
— Você vê isso como uma melhoria? Você encontrou
contentamento de repente na casa deste homem? Você encontrou a
felicidade em sua cama? Você vai esquecer tudo porque ele lhe
mostra um pouco de prazer e alimenta sua carne?
— Eu não disse isso.
— Uma coisa boa que você não fez, porque os nossos destinos
estão amarrados. Eu nunca esquecerei qual deveria ser esse destino,
mesmo que você possa ser atraída a aceitar o que aconteceu com
alguns vestidos descartados e uma cama de plumas seca. Eu sou
seu sangue, seu parente masculino, e eu lembro a você que você
não pode se entregar a ninguém sem a minha palavra.
O ressentimento negro encheu sua mente. Não apenas seu
tom de voz o aumentou, mas também o modo como ele falava de
Rhys.
— Como você se atreve a me dizer sobre os seus direitos sobre
a minha pessoa. Como ousa me acusar de ser comprada? Eu me
sinto humilhada tanto quanto você. Se eu escolher esquecer isso
brevemente enquanto eu conhecer alguma gentileza e afeição, você
não vai parar-me ou interferir.
— Não é o breve esquecimento que eu me preocupo, irmã. É a
tentação de esquecer para sempre. A pobreza do pátio de azulejos
não poderia quebrá-la, mas a paz e a facilidade desta vida poderiam.
Ele se levantou. — Deixei tudo para você no alto. Estou pensando
que é hora de liderar essa batalha, em vez de me deixar depender
da vontade inconstante de uma mulher.
— Inconstante! Eu nunca vacilei. Por três anos eu tenho me
escravizado para fazer isso certo, e para preservar o seu orgulho.
— Não é o meu orgulho que me preocupa, mas o seu. Ele está
fazendo você perder de vista quem você é, e onde você pertence.
Você foi trazida tão baixo que isso parece com a salvação.
— Isso não é verdade!
— Está escrito em cima de você. Ele foi para o corredor e seus
passos soaram nas escadas. Momentos depois ele voltou, o arco e a
aljava em suas mãos.
Ele foi para o estábulo para o alvo. Nas duas horas seguintes,
enquanto ela misturava e amassava pão e começava a sopa da
noite, ele deixou flecha após flecha voarem. Os assobios formaram
uma melodia doentia que cantava sua raiva.
Ela parou e observou-o pela porta aberta. Ele parecia tão alto
agora, e largo de maneiras que ela não tinha notado antes. Ele
estava como um homem e não um jovem estranho. O puxão
repetido da corda não o cansou.
Há quanto tempo isso vinha acontecendo? Algum tempo, ela
imaginou, só que ele não lhe confidenciara as decisões que ele
debatia em seu coração e as lembranças que atormentavam sua
alma. Ele havia fugido delas, tanto quanto ela, mas na noite
anterior, por algum motivo, ele não conseguira mais fazer isso. Ele
se afastou de sua infância e abraçou sua masculinidade naquelas
horas sombrias, e ela não estava lá para consolá-lo.
Finalmente, os assobios mortais cessaram. Ele colocou a
coronha e levou o arco para a cozinha. Ele ficou atrás dela enquanto
ela se mexia.
— Quantas moedas você tem? Ele perguntou.
— Insuficiente.
— Quantas? Uma demanda desta vez.
— Um pouco mais de duas libras.
— Dê-me um deles.
Ela se virou, as mãos nos quadris.
— Não. Eu ganhei, e vou mantê-las, e vou lidar com isso como
sempre planejei fazer.
— Não em breve.
Ela não podia discutir com isso. Os anos provaram que ele
estava certo.
— O que você quer com as moedas?
— Eu vou comprar uma espada. Eu devo conseguir uma antiga
com isso.
— Você não sabe...
— Eu sei o básico, e posso praticá-los, pelo menos. Eu posso
construir minha força, e procurar aprender mais. Me dê o dinheiro,
Joan. É tempo. Na verdade, já passou da hora.
Ela queria discutir com ele, mas podia ver claramente que seu
conselho se tornara sem sentido. Um menino pode obedecer a sua
irmã, mas um homem não.
Ela procurou atrás da pilha de mantimentos pela a pequena
bolsa que ela tinha escondido lá. Ela tirou as preciosas moedas. Ela
tentou manter sua preocupação fora de sua voz.
— Prometa-me que você não fará nada precipitado. Prometa-
me que você vai se dar o tempo para aprender.
— Rhys sabe sobre nós? Ele pegou as moedas e as guardou.
— Não.
— Eu não penso assim. Sua atenção o lisonjeava, e você sabia
que o interesse dele esfriaria se ele soubesse.
— Não é por isso.
— Então por quê? Você não confia nele? Você passou a noite
na cama de um homem de quem duvida?
Ela fez? Ela olhou para o coração e sabia que não duvidava
mais de Rhys. Ele não a trairia nem a machucaria por seu próprio
ganho ou segurança.
Mas isso só significava que agora ela o colocava em perigo, em
vez do contrário.
— Não diga a ele, disse Mark. — Se ele não souber, ele nos
deixará ficar mais algum tempo. Isso me dará tempo para aprender.
— Vai levar anos para você ganhar a habilidade para encontrar
Guy.
— O tempo que eu tiver terá que ser o suficiente.
A preocupação tornou-se um punho pesado batendo dentro de
seu peito. Ele se mataria. Ela não suportaria perdê-lo também.
— Você deve jurar para mim que você não fará nenhum
movimento até que você tenha me dito, disse ela. — Prepare-se
como você deve, mas não deixe seu temperamento levá-lo à
imprudência. Eu não vou dizer ao Rhys, e vamos ficar, e você pode
praticar. Você vai jurar isso para mim?
Ele hesitou, depois encolheu os ombros.
— Sim, falarei com você antes de ir ao encontro dele.
Talvez sua determinação quente diminuísse. Talvez demorasse
anos até que ele se sentisse pronto, e ela teria tempo de ganhar as
moedas para contratar um cavaleiro treinado, um campeão, em vez
disso.
Capítulo XVII
O cavalo continuava dando-lhe problemas. Mesmo com São
George ao seu lado, em vez de cavalgando, o peso do corpo do
animal era demais para as pernas de barro.
Ela murmurou sua frustração. Rhys olhou ao redor da justa
Santa Úrsula.
— A pedra é ainda mais pesada. Deixe-a apoiada em seu
animal e os amarre como um só, como fazem os pedreiros. Isso
ajuda a suportar o peso.
Ela estudou as figuras. Poderia funcionar.
Rhys retornou ao seu trabalho, seu rosto obscurecido
novamente pela maior parte do santo.
— E arredonde mais sua garupa. Você não está acostumada a
moldar animais, e eles não podem ser escondidos pelas roupas. Vá
para o estábulo e veja como um cavalo é formado. Isso tornará o
seu melhor.
Ele estava certo. Enquanto o cavalo parecia bem à primeira
vista, as partes não pareciam realmente naturais com um exame
minucioso.
Agora que ela pensava sobre isso, São George tinha pernas
desajeitadas. Desde que ele usava armadura, ela não podia
escondê-las com roupas, também. Ela sorriu para si mesma. Ela
teria que fazer um estudo mais detalhado das pernas de Rhys
quando elas estavam nuas.
Ela trabalhou em alguns detalhes que não precisariam de tais
lições. A luz estava desaparecendo, mas ela queria que a tarde
durasse para sempre. Tinha sido tão pacífico neste domingo,
trabalhando juntos no jardim. Mark tinha ido ao rio com alguns
amigos, e ela e Rhys haviam passado o dia assim, com ele
esculpindo em uma das extremidades do banco e ela modelando na
outra. Trabalhar seu ofício ao lado de alguém que entendia isso,
compartilhando conselhos e conversas ocasionais, acrescentou uma
profunda riqueza ao ato de criação.
Não é a mente que conhecemos, é a alma. Sim, foi isso que
continuou construindo entre eles. Até na cama. O prazer físico
continuava surpreendendo-a, mas era depois, quando ele a abraçou,
que ela se sentia mais próxima. Seus corpos poderiam nunca se
juntar, mas eles tinham começado a se moldar em um nível mais
profundo. Hoje, compartilhando isto, formando realidades a partir de
matéria básica, eles conheceram a alma juntos. Uma parte de seu
espírito havia aderido a ele nestes últimos dias e horas, e nunca
mais se separaria.
A brisa carregava uma frieza que alertava para o declínio do
verão. O remendo de flores perto da parede tinha crescido para uma
profusão de cores em um último esforço para fazer sementes. Os
dias encurtaram. Não haveria muitas tardes como esta pela frente.
Deixou a estátua de lado e inclinou-se para retirar mais barro
do balde. Ela jogou no quadro e começou a amassar.
Rhys largou suas ferramentas. Ele veio e montou o banco atrás
dela. Com um alcance que abraçou ela, ele emprestou sua força
para a tarefa. Seus dedos apertaram a massa escorrendo junto com
os dela, correndo e deslizando em maravilhosos toques sensuais. Os
fortes braços e mãos de bronze a hipnotizavam. Seu calor enviou
arrepios requintados pelo corpo dela.
— Eu estive pensando em usar o quintal de George para as
telhas, — disse ele enquanto se inclinou para pressionar um
pequeno beijo em seu pescoço.
Ela voltou-se surpresa ao olhar para ele.
— Não seja ridículo. Você sabe o quão ruim eles serão.
— Eu acho que eles serão bons o suficiente.
— George é um idiota enlouquecido. Ele passará bens
inferiores, se puder. Uma queima ruim e os resultados serão ruins
em todos os vagões.
— George é um tolo, mas você não é. Eu estava pensando que
talvez você devesse administrar o quintal enquanto essas peças
fossem feitas.
O contentamento feliz desapareceu, como a ilusão de um
sonho perdido ao acordar. Seu estômago se contraiu.
Ela voltou sua atenção para o barro.
— Você devolveu minha escritura a George para que eu
pudesse fazer essas peças?
— Isso é uma coisa estúpida para perguntar.
— Não é tão estúpido, se você espera que eu administre o
quintal.
— Eu não espero, só peço. Eu comprei o quintal ontem. Ele
falhou com a sua partida e George ficou feliz por estar livre disso.
— Você comprou o pátio de azulejos? Você é dono agora? Ela
passou a perna por cima do banco e ficou de pé para poder olhá-lo.
— Sim. O único problema é que eu não tenho nem o tempo
nem a habilidade para fazê-lo funcionar. Mas você tem.
Seu batimento cardíaco acelerou. Se Rhys possuía o quintal,
ele era dono do forno.
Rhys se concentrou no barro, como se não percebesse que
acabara de lhe oferecer a resposta para todos os seus sonhos e
planos.
— Você vai fazer isso?
— Claro que vou fazer isso. Posso queimar minhas estátuas lá
também?
— Você pode queimá-las e esmaltá-las e usar o que você
precisa da argila.
Ela mal podia conter sua alegria.
— Eu vou garantir que você tenha as telhas do rei igual a
qualquer uma da Espanha. Eu mesmo vou pintar o esmalte em cada
uma, se precisar. Eu vou esperar até que todas estejam prontas
antes de levar minhas próprias mercadorias para o mercado.
— Eu acho que você pode roubar alguns dias antes disso.
Ela jogou os braços ao redor dele.
— Eu não posso acreditar que você fez isso. Um forno! Eu
posso moldar estátuas durante todo o inverno, e queimá-las, e
vendê-las. E eu me certificarei de que o pátio funcione. As
mercadorias serão tão boas que você poderá pedir um alto preço, e
assim terá um bom lucro, eu prometo.
Ele a rodeava com os braços. Puxando-a em seu colo, ele
moveu suas pernas para que elas abraçassem seus quadris e ela o
encarasse.
— Assim como você. Esta é uma parceria. O pátio pode ser
meu, mas a habilidade será sua. Você dividirá qualquer renda que
trouxer.
Ela procurou seu rosto em espanto. Ele entendeu o que ele
estava fazendo? Ela sabia o rendimento que um pátio da telha daria
em um bom ano, e metade disso seria quase tudo de que ela
precisava. No próximo verão, seu objetivo estaria ao alcance.
E ela estaria deixando-o.
Um turbilhão de tristeza percorreu sua alegria. Ela se aninhou
mais perto, não querendo pensar sobre isso. Ela segurou-o com
força e disse a si mesma que deveria ser grata que ele não
entendesse que ele havia acabado de dar o primeiro passo em
direção à sua despedida.
Seus lábios pressionaram o cabelo dela. Ela inclinou a cabeça e
olhou nos olhos dele e viu que ele entendia. Ele simplesmente não
acreditava que quando chegasse a hora, ela realmente iria embora.
E nesse instante ela sabia que não iria querer. Isso significaria
abandonar o melhor amigo que ela já teve, e afastar-se do vínculo
mais próximo que ela já havia experimentado. Uma parte dela seria
arrancada. Mesmo quando ela revolvesse o tecido rasgado de sua
vida, haveria novos buracos que nunca poderiam ser preenchidos.
Ela provou a angústia que ela conheceria naquele dia. As
reivindicações do passado, de sua família e de seu irmão, tornariam
a partida inevitável. Ela fez juramentos à memória de seu pai que
ela nunca poderia esquecer.
Havia mais em jogo do que o seu contentamento e a felicidade
que ela encontrara neste jardim e com este homem.
Seu abraço apertou e ele a ergueu para um beijo. Não era
gentil, do jeito que ele costumava começar. Não cuidadoso, mas
febril e profundo. Paixão explodiu através dela, misturando-se com a
tristeza até que uma pungência do coração a encheu. Ele a beijou
como se tivesse visto o futuro em seus olhos e procurou argumentar
sua causa. Muito dela, muito, queria que ele ganhasse o debate.
Ele se levantou, com ela nos braços e levou-a para o
espinheiro onde sentou-se no banco com seus membros ainda em
volta dele.
Ele puxou seu vestido de seus ombros e empurrou-o até seus
quadris até que ele se aglomerou em torno de sua cintura, cobrindo
quase nada. Seus beijos pararam, mas a febre não arrefeceu. Ele
abaixou suas costas até que seus ombros descansaram na borda da
mesa e seu corpo nu se afastou, muito parecido com uma de suas
estátuas na tábua inclinada.
Suas mãos se moveram sobre o corpo dela. Ele poderia ter
sido o modelador e ela o barro. Ele acariciou e alisou e circulou,
observando suas mãos com profunda concentração. Suas próprias
mãos só podiam alcançar seus antebraços, e ela se agarrou
desesperadamente enquanto as sensações despertadas por suas
carícias determinadas atraíram sua consciência.
— Você sempre começa se segurando como se você não
soubesse se você quer isso, Joan, mesmo que você queira. Ele
apertou seus mamilos até que ela arqueou com desejo. — Você se
agarra como se temesse, mesmo que você deseje.
O prazer urgente a deixou muito instável para responder.
— O abandono ainda assusta você. O que você tem medo de
perder quando abraça? Um mundo passado que não espera seu
retorno?
Ele deslizou as mãos pelos braços dela e soltou-a. Ele colocou
as palmas das mãos na mesa até os braços dela se estenderem para
se apoiarem em seus ombros.
— Eu não quero qualquer restrição em sua paixão hoje, nem
mesmo a de um abraço.
Seus olhos quentes examinaram o caminho de suas mãos até
seus quadris e coxas. Ele aliviou-a para que ele pudesse moldar seu
traseiro em suas palmas. Ele observou francamente o ritmo de seu
corpo, como se pudesse ver o pulso oculto causando-o.
Ele olhou para os olhos dela e ela sabia o que ele faria. E assim
não chocou muito quando ele se levantou, e a deslizou de volta na
mesa até que ela ficou deitada nua na brisa, como uma festa erótica
e rústica. Ele permaneceu sobre ela, e suas mãos ásperas
trabalharam sua maravilhosa magia, transformando sua paixão em
um delírio maluco.
Ele levantou as pernas e dobrou os joelhos e colocou os pés
em seus ombros. Segurando o traseiro dela nas palmas das mãos,
ele ergueu os quadris bem alto como uma xícara sagrada e inclinou-
se para ela.
Por um momento, ela temia que o prazer morresse, mas isso
não aconteceu. A confiança ajudou-a a dar um novo passo e a
aceitar uma liberdade especial. O triunfo produziu uma euforia
surpreendente. A maioria de seus sentidos a deixou.
Nada existia além do tormento do prazer e do padrão borrado
de folhas e céu e luz do sol acima de sua cabeça.
Ela subiu com intensidade assustadora até que nada
importasse além de sua necessidade. Seu corpo implorou e então,
ao longe, sua voz também. Ele abaixou os quadris e colocou a mão
nela, acariciando onde seus beijos tinham criado uma sensibilidade
latejante. Ela olhou para o corpo aberto e esparramado para vê-lo
observando seu rosto enquanto ele a levava a um longo e violento
alívio.
Isso a deixou à deriva em uma louca neblina de sentidos
saturados. Ele a trouxe de volta ao banco novamente, ocupando-o
como antes. Seu perfume masculino e a dureza de seus braços e
peito a cercaram quando ela caiu em seu abraço.
Sua voz calma fluiu em seu ouvido.
— Da próxima vez que acontecer, eu quero estar dentro de
você.
— Talvez eu possa em breve. Eu quero.
Ele beijou sua têmpora.
— Talvez não seja o passado que interfere tanto agora, mas o
futuro. Eu quero que você pense sobre isso. Talvez, sabendo o que
você deve fazer no futuro para vingar o que aconteceu no passado,
você não está se permitindo qualquer vida no presente.
Ela pensaria sobre isso. Ela iria. Mas agora não. Ela não queria
essa confusão ainda. Ela só precisava segurá-lo nessa serenidade
que ele lhe dera.
Tão pacifico. Se ela ficasse aqui para sempre, ela poderia ser
feliz. Poderia vir o dia quando ela não pensasse sobre o que tinha
sido perdido, porque ela se deleitava com aquilo que tinha sido
ganho.
Talvez ela devesse repudiar o dever. Ela poderia aceitar o que
aconteceu. Ela poderia ser a nova Joan em uma nova vida e um
novo mundo. A ideia a atraiu mais do que ela esperava.
Um ligeiro som quebrou sua felicidade saciada. Ela virou a
cabeça e olhou para o jardim. Mark entrou pelo portal se inclinou e
deslizou algo por trás das flores altas ao longo da parede.
A espada. Mark não tinha ido ao rio. Ela havia encontrado
outro xelim faltando, e imaginou que ele tinha pegado para pagar
alguém para ensiná-lo. Foi assim que ele passou o dia do Senhor.
Empunhando uma espada e preparando-se para a vingança.
Passou por eles a caminho da casa, mas não os notou
entrelaçados à sombra da árvore.
Ela tentou imergir novamente no contentamento que acabara
de conhecer. Ela lutou para recuperar a inocência disso, mas ela não
podia.
Ela virou a cabeça para onde podia ver o banco, com sua
grande estátua de pedra perto do centro e sua pequena argila na
outra ponta. Apesar de seus tamanhos diferentes, eles se
equilibravam naquela longa prancha e criavam uma harmonia
agradável. Um design perfeito.
Ela marcou sua memória com suas formas, e a forma como
sentia Rhys, e o som de seu batimento cardíaco. Ela queria lembrar
a unidade deste dia para sempre.
Capítulo XVIII
As estátuas de Joan estavam em uma procissão digna na
mesa alta que Rhys havia feito para ela.
Todos no mercado que passavam por eles notaram.
Uma senhora que havia comprado o São Jorge trouxe um
amigo de volta para olhar o São Sebastião. Aquele atraiu muita
atenção. Vestindo apenas uma tanga e amarrado a um tronco de
árvore, ele olhava para o céu, esperando pela palma da mártir. As
flechas perfurando seu corpo não diminuíram sua força.
A mulher olhou o peito nu muito apreciativamente. Joan
realmente não queria vendê-lo, e nomeou um preço de dois xelins
na esperança de desencorajar uma compra. Não funcionou. Não
houve barganha, e as moedas apareceram instantaneamente.
Joan lamentou ver a estátua desaparecer. Ela havia seguido as
lições de Rhys sobre o estudo de formas reais ao elaborar suas
réplicas. Como resultado, o tronco, o rosto e as pernas de Santo
Estêvão, eram muito familiares para ela.
Ela viu São Sebastião ser levado, e seu coração brilhou pelo
homem que fora seu modelo. Se Rhys não tivesse lhe dado nada a
não ser essa melhora em seu ofício, ela ficaria grata para sempre.
Mas ele tinha feito muito mais.
Ela passava a maioria dos dias gerenciando o pátio de azulejos
agora. Ele cantarolou com atividade do jeito que tinha sido na vida
de Nicholas. As pavimentadoras do rei mantinham muitos
trabalhadores ocupados, especialmente ela. Ainda assim, todos os
dias ela arranjava uma hora ou mais para fazer seus santos. O
trabalho era duro e cansativo, mas ela nunca havia conhecido tal
contentamento. E esperando na casa pelos pequenos prazeres da
partilha de pão e histórias com Rhys, e eventualmente a felicidade
perfeita de dormir em seus braços.
Suas felizes contemplações a distraíram. Ela olhou cegamente
para sua fileira de santos e pensou sobre aquela cama de penas, e o
que aconteceu ali, e o jeito que ela não mais se lembrava das
experiências ruins.
Ela calmamente tomou uma decisão. Ela estava pronta para
completá-lo, faria esta união tudo o que poderia ser. Ela esqueceria
enquanto pudesse e, mais tarde, muito mais tarde, lembraria do que
deveria.
Ela não notou a nova aproximação de um patrono até que ele
ficou ao lado da mesa dela, mesmo assim, ela não olhou para cima e
apenas cumprimentou-o, deixando-se apreciar o calor de sua
decisão, e a maneira como isso mexeu com seu sangue. Ela
lamentou que Rhys não estivesse na casa. Se ele estivesse, ela
arrumaria essas estátuas e voltaria imediatamente. Poderia até
entregá-las a todos, se isso apressasse seu retorno a ele.
Rhys se juntaria a ela em breve. Ele estava vindo buscá-la,
para que pudessem visitar os aposentos do rei novamente e
reavaliar o chão. De repente, ela não pôde esperar para vê-lo.
O homem não seguiu em frente. Sua presença se intrometeu
mais e mais. Ainda apenas meio consciente dele, ainda absorvida
com sua resolução alegre, seu olhar abaixado o via apenas em
pedaços.
Botas finas. Uma rica, verde, cota na altura do joelho. A linha
dura de uma boa espada.
Um aroma vago e picante.
Cuidado rugiu através dela, atordoando-a em estado de alerta.
Seus instintos lembravam aquele cheiro exótico e perigoso. Isso fez
a pele em seu pescoço e arrepiar no couro cabeludo.
Ela congelou e se recusou a olhar mais alto. Medo e terror
gritaram, aniquilando seu contentamento. Ela apenas ficou olhando
para seus santos, rezando para que ela estivesse errada.
Uma mão se estendeu. Um dedo usava um anel que ela havia
visto antes.
Seu coração caiu e quebrou, e ela sabia com certeza que sua
felicidade acabara de ser destruída.
Ela recuou do toque no queixo, mas isso não o impediu. Ele
forçou sua cabeça para cima, até que ela olhou em um rosto que ela
odiava.
— Por que você age como se um fantasma tivesse aparecido?
Ele disse. Afinal, você é quem deveria estar morta.
Por um momento desesperado ela desejou que ela estivesse.
Por um instante ela se arrependeu de não ter entrado naquele lago
há três anos.
Ele inclinou a cabeça e estudou o rosto dela, tanto quanto seus
patronos fizeram com suas estátuas.
— Ainda é adorável. E muito mais inteligente do que eu jamais
suspeitei.
Ela não se mexeu. Ela nunca deixara que ele visse seu medo, e
ela não o faria agora. Mas o terror absoluto a encheu como um apito
interminável e estridente.
Guy Leighton era o diabo encarnado, usando o rosto de um
anjo. Bonito. Quase etéreo. Seus cabelos dourados e olhos violetas e
rosto perfeito e de ossos finos ainda parecia infantil quando ele
estava calmo. Mas ela tinha visto o fogo do inferno naqueles olhos, e
o prazer doentio que ele tinha ao sentir dor e morte.
Considerando sua feia alma, sua beleza física a atingiu como
um tipo de pecado, uma corrupção da própria natureza.
Ela tinha visto imediatamente como seu coração estava
aleijado. Ele sentiu que ela poderia dizer. Isso o fascinou e
alimentou tanto sua vaidade quanto sua crueldade.
Outro homem se aproximou para inspecionar suas
mercadorias. Guy deu-lhe um sorriso mortal. O homem se afastou.
Ele ainda segurava o queixo dela. Ele não soltou, apenas
caminhou ao redor da mesa dela e a puxou para a parede da
Catedral, levando-a como um animal.
Ele a empurrou na sombra, contra a pedra, e bloqueou seu
corpo com o dele, com o braço apoiado acima de sua cabeça, ele
examinou seu rosto.
— Eu estive procurando por você, Joan. Toda a semana eu
tenho visitado mercados em busca da oleira loira bonita.
— Como você soube procurar?
— Um homem veio até mim. Ele esteve nesta cidade enquanto
peregrino, e viu você em um mercado. Desde que ele tinha ouvido
falar da sua morte, ele não podia acreditar que era realmente você,
mas eu fiz. Eu soube imediatamente que você me enganou, e não
havia morrido enquanto atravessava aquele rio. Ele acariciou
levemente sua bochecha. Seu estômago se virou violentamente. —
Fico magoado por você ter fugido depois de tudo que havíamos
compartilhado e pelos riscos que eu tive por você. Você é uma
cadela ingrata, Joan.
A última parte saiu em um tom frágil. Ele parecia um amante
que havia sido traído. Ele agia como se ela tivesse abandonado algo
lindo. Talvez ele pensasse que ela tinha. O mundo existia para ele
apenas como ele via.
— Muito ingrata para merecer suas atenções. 'Todo mundo
pensa que eu estou morta, e como você pode ver, eu poderia muito
bem estar. Deixe-me para a minha vida humilde e deixe todo mundo
assumir que meus ossos estão no rio.
Ele achou seu argumento desesperado divertido.
— Não é tão simples assim.
Não, não era. Ele não veio aqui apenas procurando por ela.
— Seu irmão também sobreviveu, suponho.
Ele fez a pergunta muito suavemente, mas ela viu o interesse
afiado em seus olhos. E algo mais.
Algo que ela nunca tinha visto antes. Medo.
— Ele não fez. Eu quase não o fiz, também. O rio o arrastou
para longe. Eu peguei um galho de árvore, mas ele...
— Nenhum de vocês cruzou o rio onde encontramos as roupas
lavadas. Foi um truque, e seu corpo respirando prova isso.
— Não, ele morreu. Eu juro para você.
— O homem disse que ele viu um jovem loiro da idade de Mark
com você mais tarde. E um homem alto de cabelos escuros.
Um novo medo surgiu, desta vez por Rhys.
— O homem era um estranho. O jovem era seu parente e não
meu irmão. Eu não conheço nenhum deles, e estava apenas
conversando como se faz nos mercados.
Ele pegou o rosto dela em sua mão e segurou-o para um
exame profundo. Seu agarre apertou suas bochechas apenas o
suficiente para doer.
— Você está mentindo. Você nunca foi boa nisso, e três anos
não ensinaram muito a você. Ele vive, como você faz. Isso é muito
estranho, Joan. Eu disse ao meu senhor que vocês dois tinham
morrido. Será muito inconveniente explicar o erro.
— Então não explique isso.
Ele se encostou na parede para que seu corpo se alinhasse
contra o dela. Seu abraço soltou suas bochechas e deslizou para
baixo, acariciando seu pescoço e ombros. Ela suportou para comprar
algum tempo para Mark, Rhys e ela, mas sua essência se encolheu
com repulsa.
— Eu senti sua falta. Acho que até lamentei um pouco quando
veio a notícia de que você havia morrido.
— Duvido que você tenha sentido minha falta. Tenho certeza
de que sua cama nunca está fria.
— Não é o mesmo. Você foi um desafio convincente. Ter você
me deu um prazer maravilhoso. Eu não acho que tomar uma
fortaleza supera isso.
— Bobagem. Quando você toma uma fortaleza, você pode
colocar homens na espada.
— E quando eu te peguei eu poderia fazer você sentir coisas
contra a sua vontade. Certamente você não esqueceu essa parte.
Ela suprimiu a vontade de vomitar e fechou os olhos para ele.
Ela parou de respirar para não inalar aquele aroma picante. Ela
queria que ele fosse embora, e que este dia começasse de novo. Ela
rezou para que, quando abrisse os olhos, estivesse no leito de penas
de Rhys e descobrisse que isso fora um pesadelo.
Os dedos de Guy passaram por seu rosto, delineando seu
nariz, queixo e mandíbula.
— Talvez eu não precise explicar ao meu senhor. Talvez
possamos continuar a barganha de antes. Ninguém nunca me
entendeu como você fez. Eu senti sua ausência.
Ela olhou para ele em estado de choque e viu que era
parcialmente verdade. Não por causa de coisas físicas. Ele poderia
conseguir isso de outras mulheres.
Sua perversa vaidade sempre gostou muito do ódio dela. Isso
atraiu-lhe do mesmo modo como o afeto fazia com pessoas normais.
Tudo estava de cabeça para baixo com ele. Deformado. Seu ódio o
tinha absorvido do mesmo modo que o amor fazia com outros
homens.
Ele estava certo. Ela o entendia muito bem. Ainda melhor do
que ele imaginou. Ele poderia oferecer a barganha novamente, mas
ele não honraria mais agora do que da primeira vez. Ela nunca
realmente manteve seu irmão seguro. Ela apenas havia adiado a
morte dele naquela época. Os acidentes que quase tinham
reivindicado a vida de Mark a forçou a ver a verdade. Essa foi a
degradação final, perceber que ela havia se vendido por nada.
Ela se lembrou do momento exato em que finalmente admitira
aquilo para si mesma. Pressionada contra a parede da Catedral, ela
experimentou a desolação sem esperança novamente. Mas aquele
momento sombrio também deu origem à raiva e à força, e agora
seus fogos também reapareceram em seu sangue.
Ela havia vencido esse homem uma vez. Sido mais esperta do
que ele. Ela poderia fazer isso de novo. Ela não deixaria o medo
derrotá-la. Ela não seria sua vítima.
Ele viajou pela Inglaterra por causa dela e de Mark. Ele estava
sozinho agora e procurara nos mercados sem acompanhamento. Ele
tinha ordens para ter certeza de que Mark morresse como seu pai e
todos os outros homens e escudeiros que haviam defendido isso, e
ele a procurara por conta própria, porque temia que Mortimer
tivesse descoberto que ele não havia extinguido todas as
testemunhas desse massacre.
O que significava que só ele sabia que ela e o irmão ainda
estavam vivos.
Ela tinha que atrasá-lo. Ela precisava de tempo para encontrar
Mark e sair de Londres.
— Você oferece os mesmos termos? Meu irmão estará seguro?
Seu corpo inteiro se rebelou contra as palavras. Ela quase engasgou
com elas.
— Eu vou protegê-lo como sempre fiz. É apenas uma pequena
decepção do meu senhor, e você vale bem a pena.
Guy Leighton falou com sinceridade. Mentiu impunemente. Ele
acreditava nas palavras como as dizia, mas abandonaria facilmente
as promessas quando elas se mostrassem inconvenientes. Essa
sempre foi a coisa mais assustadora sobre ele. Ele não possuía
consciência alguma. Nenhum senso normal de errado.
Ele pegou o braço dela.
— Venha comigo agora. Eu estou ficando no palácio, mas
ninguém lá a conhecerá. Você pode me mostrar como você é grata
antes de nós pegarmos seu irmão.
Uma negação cuspindo quase gritou dela. Ela lutou para
manter o desgosto fora de sua voz, e as lembranças ressuscitadas
fora de sua mente.
— Você não pode pensar em ficar em Westminster, com Mark
e eu em seu quarto. Não há como estarmos seguros lá.
— É só por pouco tempo. Eu saio daqui a dois dias.
— Então eu virei até você daqui a dois dias. Eu não serei sua
até que meu irmão esteja a salvo, e até que eu veja que você está
comprometido com o seu lado do nosso acordo.
— Você virá agora e me dirá onde encontrar o Mark.
— Não. Será como eu digo, ou eu morrerei antes que você
descubra onde encontrá-lo. Eu irei morrer antes de concordar em
conhecer suas habitações.
— Três anos te deixaram com a língua afiada demais. Essa
vida humilde te deixou asquerosa. Eu preferia muito mais você como
você era, menina e dócil.
— Eu não sou mais uma garota. Se é isso que você quer, vá
encontrar outra.
Guy a examinou como faria com um cavalo dócil que
inesperadamente mostrara algum espírito.
— Não, eu acho que vou gostar de você desse jeito. Será
emocionante ter seu ódio a céu aberto. Nós nos encontraremos no
Templo no terceiro dia, e sairemos dali de uma vez.
— Você deve vir sozinho, pronto para partir.
— Eu não viajei para cá sozinho, e meus homens devem voltar
comigo, mas você não tem nada a temer deles. Seu irmão e você
estarão sob minha proteção como antes.
Ele finalmente se afastou. Ela engoliu um profundo suspiro de
alívio quando ele parou de tocá-la.
Seu olhar se fechou com o dela, e muito passou naqueles olhos
violetas. O vínculo doentio do passado e o que se esperava no
futuro. Outra coisa cintilou neles também. Pequenas luzes de raiva,
suspeita e ciúme. Ela sabia o que aconteceria se aquelas pequenas
chamas encontrassem combustível.
— O homem de cabelos escuros visto com você na feira. Qual
era o nome dele?
Seu coração bateu horrivelmente. Ela achatou as palmas das
mãos na pedra fria em suas costas para se firmar.
— Eu não sei. Ele era um estranho para mim.
— Espero que você fale a verdade. Confio que ele não tenha
roubado o que é meu.
— Não. Você me arruinou para outros homens.
Sua vaidade gostava de ouvir isso. Ela duvidava que ele
entendesse como ela queria dizer isso, e quão completamente ela
tinha sido arruinada.
Guy se aproximou novamente e pegou o rosto dela entre as
mãos.
— Não pense em me frustrar, Joan. A última traição foi
demais, e eu não serei tão generoso da próxima vez. Tenha certeza
de que você estará no Templo como combinado, ou eu vou caçar
seu irmão e matá-lo como um cachorro. Onde quer que você vá, eu
vou te encontrar, e vou punir quem te ajudar.
Ela sabia disso, isso aconteceria, não importa o que ela fizesse.
Se trouxesse Mark ao Templo, ele morreria e, depois de um breve
inferno na cama de Guy, ela também, pois sabia demais. Se ele
soubesse sobre Rhys... Jesus, se ele soubesse sobre Rhys...
Sim, ela o entendia muito bem. Ela não tinha nada a perder em
desafiá-lo.
Ele pressionou um beijo nela. Ela mal conseguiu não engasgar.
Ele mergulhou em um arco cortês de adeus.
— Até daqui a dois dias, doce Joan. Não deixe de estar no
Templo.
Joan afundou-se contra a parede e a desolação a envolveu. Ela
fechou os olhos ardentes e agarrou a pedra fria nas costas. Algum
pedreiro tinha cortado esses blocos, e os colocou diretamente, e eles
permaneceriam no tempo a menos que outro pedreiro os puxasse
para baixo.
Ela desejou que a vida pudesse ser tão sólida e segura. A dela
sempre parecia ser feito de palha. Tempestades feias continuavam
rugindo, explodindo as pequenas estruturas de sua felicidade antes
que ela tivesse a chance de fazê-las voltar para casa.
Ela não lutou contra o desânimo. Ela não tentou segurar as
lágrimas que escorriam por suas bochechas.
O luto pelo que acabara de ser perdido não a enfraqueceria
porque, mesmo quando as emoções a dominavam, ela sentia os
outros esperando pela sua vez. Raiva, resolução e determinação
feroz pairavam nas margens de sua tristeza. Ela permitiu-se
chafurdar por alguns momentos na miséria, antes de juntar sua
armadura e marchar para frente para proteger os homens que
amava.
A mágoa pungente a afogou como um mar escuro e sem fim.
Apesar da dor, ela a achava calmante em comparação com o que ela
sabia que viria a seguir. Ela deve ter se encostado na catedral por
uma hora, tão atemporal era sua imersão. Finalmente, ela se forçou
à superfície, à luz do sol e à realidade que a esperava.
Ela abriu os olhos. O olhar intenso e questionador de um
homem a olhou de volta. Seu coração pulou para a garganta.
Rhys estava à sua mesa, segurando as rédeas do cavalo,
bloqueando o mercado com a carroça.
Vendo sua expressão desconfiada, ela sabia que nenhuma hora
havia passado, mas apenas alguns instantes. Ele estava lá enquanto
Guy falava com ela. Ele tinha visto tudo. Ele havia observado os
toques e beijos e agora estava decidindo o que fazer com aquilo.
Rhys escolheu acreditar em uma explicação que a favorecesse.
Um brilho de fúria forte acendeu quando ele se virou para observar
a forma recuada de um cavaleiro de cabelos dourados vestido de
verde. Nunca tirando os olhos das costas de Guy, ele se inclinou e
amarrou as rédeas na mesa. Ele começou a andar atrás do homem
que ele assumiu ter ofendido ela.
Ela correu, sabendo que ela voou em direção a desgosto. Ela
esperava encontrar uma mentira que não iria machucá-lo, mas isso
não seria possível agora. Ela não podia deixá-lo confrontar Guy, não
importava o custo do orgulho dela. Ela não podia deixar Guy
adivinhar quem era o homem de cabelos escuros no mercado.
Ela agarrou o braço dele, forçando-o a parar.
— Não. Ele é um cavaleiro e usa sua espada.
Rhys tentou afastá-la.
— Deixe-o desembainhar sua maldita espada, por tudo que eu
me importo.
Ela se agarrou desesperadamente.
— Não se mate por causa da coragem de um tolo.
— Você tem tanta certeza de que eu não posso ser melhor que
ele? Eu sei do que eu estou falando. Eu não deixo ninguém insultar
você assim, e ele saberá logo.
— Você está tão certo de que viu um insulto?
— Suas mãos estavam em cima de você.
— Você me ouviu chorar? Eu estava lutando com ele?
Rhys virou pedra. Ele olhou para ela, e algo novo queimou em
sua expressão.
— O que você está dizendo?
— Eu estou dizendo que não vou deixar você lutar com ele só
porque você encontrou algo que eu não esperava que você visse.
Ela teria morrido de bom grado dez mortes para evitar ver a
descrença que o invadiu. Ela observou-o tentar se convencer de que
ela não queria dizer o que ele tinha ouvido. Um desejo sem fôlego
saturou seu coração, e ela implorou silenciosamente que ele visse
sua mentira, mesmo que ele não estivesse em segurança a menos
que ele acreditasse nela.
Eles ficaram lá enquanto o mercado se movia ao redor deles,
duas formas imóveis, falando apenas com os olhos. Ele esperou que
ela desse o sinal de que ele havia entendido mal. Ela forçou uma
demonstração de indiferença, embora quisesse abraçá-lo e explicar a
terrível e precária verdade.
Ela sofreu por causa dele e de Mark. Ela manteve a angústia
profunda dentro dela e assistiu a desilusão lentamente cortar sua
confiança em farrapos.
Um homem que passava empurrou os dois. Rhys recuou e
olhou ao redor.
— Estamos nos tornando um espetáculo. Vamos arrumar suas
mercadorias e ir ao palácio.
— Eu não quero ir ao palácio. Guy poderia estar lá, então ela
não poderia se arriscar, especialmente com Rhys. Também não
havia mais sentido em medir os pisos, mesmo que Rhys ainda não
soubesse disso.
— Isso deve ser feito em breve.
— Sim, mas não hoje. Quero voltar para a casa. Se você tiver
negócios em outro lugar, eu andarei.
— Não, nós vamos voltar juntos, e você pode se explicar lá,
disse ele com firmeza, pegando-a pelo braço e empurrando-a para a
carroça e a mesa.
Ele ajudou-a a embrulhar as estátuas e a desmontar a mesa.
Suas mãos maravilhosas e talentosas trabalharam rapidamente, e
seu rosto bonito e gentil permaneceu impassível. Exceto seus olhos.
Estava tudo neles para ela ver, desanimando-a tanto que ela se
perguntou se poderia continuar com aquilo.
O passeio de carroça foi silencioso e durou o suficiente para
que sua decepção se transformasse em raiva. Ela sentiu o humor
dele se transformar ao lado dela. Ela quase podia ouvir sua mente
concluir que ela estava brincando com ele como tolo.
Ela sentiu sua alma tomando passos distintos e determinados
para longe dela.
Isso partiu seu coração. Ela queria tanto derramar a verdade e
poupar a ambos a fealdade que viria. Ao invés disso, ela teria que
colocar mentira sobre mentira até que ela construísse uma parede
de decepção que pudesse protegê-lo de seu perigo.
Apenas o medo dela por ele mantinha sua resolução intacta e
sua miséria oculta. Melhor tê-lo amargo que morto.
Se ela lhe contasse a verdade, se ela admitisse quem Guy
realmente era, ele não faria a coisa sensata e a ajudaria a fugir. Ele
iria encontrar esse demônio, e sua bondade não seria páreo para o
mal.
Deixou-o no beco para cuidar do cavalo e foi esperar na
cozinha. Sentada perto da janela, ela tentou planejar como levaria
Mark embora, mas sua mente não iria cooperar. Sua cabeça doía de
seus esforços para segurar sua tristeza. Queria fugir dela e ansiava
por desabafar a dor.
Rhys aproximou-se dela devagar, caminhando pelo jardim
como se não o recebesse mais do que ela. Ele passou pelo banco
com seu santo e parou para olhar embaixo do espinheiro. Isso quase
a desfez. Seus olhos filmados como lembranças inocentes
arrancaram seu coração.
Esqueça quando puder e lembre-se quando for necessário. Ela
se fortaleceu e segurou a dor. Era hora de lembrar.
Ele entrou e olhou para ela, e ela soube imediatamente que ele
ainda esperava ouvir que ele havia entendido mal. Apesar de sua
raiva e sua franqueza, ele ainda acreditava nela.
Ele iria forçá-la a dizer coisas que o faria desprezá-la.
— Quem era ele?
— Um cavaleiro chamado Sir Guy. Um famoso campeão. Ele
veio me encontrar no mercado várias vezes agora. Ele alega ter se
apaixonado.
— Ele parecia pouco mais que um jovem. Não mais do que
vinte e dois.
— Valentia com armas é muitas vezes grandioso então.
— Aconteceu alguma coisa para fazer você pensar que
precisava da amizade dele? Alguma coisa a assustou e você não
achou que minha proteção seria suficiente?
— Não, ele é famoso por sua habilidade em armas. Eu lhe
disse que estou procurando por um homem assim.
— Você me disse que planejava pagar com moedas, não
permitir o que eu vi.
— Isso pode levar anos, e Sir Guy não quer moedas de mim,
de qualquer maneira.
— Não, ele não, bonita pomba. Isso estava claro. Ele cruzou os
braços sobre o peito, como se quisesse conter a raiva que começara
a incendiar seu olhar. — Eu não acredito que você possa fazer isso.
Eu não acho que você possa se dedicar a isso.
— Eu também não pensei, mas acho que suas atenções não
me afetam muito. Parece que as coisas são diferentes agora.
Doeu ela dizer isso. O enfureceu ouvir isso. Seus olhos
brilhavam e ela sabia que ele queria bater nela. Ele não iria, no
entanto. Ela também sabia disso.
— Estou feliz que eu possa ser ajudado, Joan. É bom que você
tenha me achado tão útil ao redescobrir sua feminilidade. Estou
aliviado por tê-la ajudado a se preparar para o seu grande objetivo.
Mesmo em seu desespero, ela não podia deixá-lo reduzir as
coisas a isso.
— Eu não dormi com você por esse motivo.
— E eu não toquei em você para que, quando você estivesse
completa, pudesse se dedicar a outro homem. Agora vejo por que
você não arriscaria isso comigo. Se tudo desse errado, talvez você
não consiga fazê-lo depois com outro. Isso atrasaria seus planos por
um longo tempo, não seria?
Seu tom mordaz a atravessou. Ela teve que desviar os olhos
para manter a compostura. Seu coração batia dolorosamente com o
esforço de bloquear a memória fugaz daqueles momentos
ensolarados antes que Guy tivesse aparecido quando ela tinha
decidido que ela iria arriscar com Rhys. Hoje, assim que voltassem a
esta casa, ela estava ansiosa para se entregar a ele.
Só que agora, aqui estavam eles, falando pela última vez, e
tudo o que ela podia oferecer a ele era insulto e mágoa.
— Você fala de se vender de verdade dessa vez. Você sabe
disso, não sabe?
— Sim.
Ele desviou o olhar desanimado. E desgostoso.
— Talvez se eu tivesse me oferecido para matar por você,
teríamos ambos encontrado mais contentamento.
— Eu nunca quis isso de você.
— Não. Você precisa de um assassino profissional, não é? Um
tão cansado que ele troque a morte por prazer. Isso não vai
acontecer do jeito que você planeja. Um cavaleiro honrado não
aceitará tal barganha. Aqueles que fizerem não serão confiáveis para
fazer a ação.
— Este pode ser, eu acho.
— Isso nunca vai acontecer. Nenhum homem vai ficar contra
alguém na liga com Mortimer.
— Alguns homens sim. Este vai.
— Se ele faz, se ele ganha, o que você ganha? Vingança? Nada
mais, isso é certo. Não a propriedade do seu pai, e não a sua antiga
vida de volta. Outro irá substituí-lo, e nada vai mudar. Ele é o
agente. Mortimer é o poder. Sua busca é um sonho infantil. A garota
que fugiu dos horrores da guerra pode não ter entendido o quão
impraticável era um sonho, mas agora você é uma mulher.
Sua lógica implacável rasgou as fundações de algo mais antigo
do que a confiança dela nele. Ele atacou mais do que sua
honestidade com suas palavras, e jogou mais do que sua traição em
seu rosto.
— Pode ser um sonho infantil, mas isso me sustentou. É tudo o
que eu tive para me manter viva por três anos. Talvez eu só
conheça vingança, mas isso será algo, pelo menos.
A raiva o deixou de repente. Ele deu-lhe um olhar longo e
penetrante. Ele deve ter encontrado o que procurava, porque a
resignação deslizou sobre ele.
Ele foi até a porta do jardim.
— O passado a escraviza ainda mais do que eu imaginava. Vá
e encontre seu campeão. Eu posso ver que eu terminei meu
propósito em sua vida. Ofereça-se a ele. Se isso vai te libertar disso,
eu quase rezo para que ele aceite a barganha. Eu esperava que você
desistisse disso, mas posso ver que nunca o fará.
Ele estava saindo. Afastando-se da sua vida. Ela se levantou e
quase correu para agarrá-lo. Ela queria chorar e gritar que ele
estava errado, que seu coração não havia sido acorrentado pelo
passado.
Exceto que tinha sido.
Ela precisava explicar antes que eles se separassem para
sempre. Ela queria que ele entendesse.
— Por três anos, o objetivo de alguma justiça era tudo o que
eu tinha. Se eu tivesse desistido, eu teria abandonado tudo o que eu
já fui. O que eu teria segurado então?
Ele mal olhou para ela. Mas no breve encontro de seus olhares,
ela viu uma decepção tão profunda que a surpreendeu.
— Eu. Você poderia ter me segurado.
Ele caminhou até o portal do jardim, sem nunca olhar para
trás. Ele não parou para olhar para o espinheiro desta vez.
Capítulo XIX
Rhys rodou cegamente pela cidade, alimentando sua fúria
com visões do cavaleiro tocando e beijando Joan. Sua insípida
admissão de que pretendia trocar seus favores pelos serviços de um
campeão continuava gritando em sua mente, abafando os sons de
seu senso racional.
Ele sabia que estava reagindo como um garoto inexperiente, e
isso só piorava as coisas. Ele se ressentiu como o inferno que ele a
deixou chegar perto o suficiente para afetá-lo assim. Com o sangue
rugindo perigosamente e amaldiçoando silenciosamente, ele
espreitava as ruas e becos, esbarrando nas pessoas e esperando
que algum homem fosse bater de volta então ele poderia começar
uma luta para tirar isso dele.
Joan o vira pelo tolo que ele era. Ela jogou com suas simpatias
e deu o mínimo necessário para conseguir o máximo que podia em
troca. Ela o segurou com uma das mãos enquanto acenava para os
cavaleiros com a outra e planejava negociar como um comerciante o
que ela alegava ser incapaz de oferecer a ele. Ela provavelmente até
havia mentido sobre o que havia acontecido com ela. Ela não era
nada além de uma prostituta implacável, implacável e sem coração.
O insulto raivoso pegou-o rapidamente. Sua raiva obscura
quebrou um pouco, apenas o suficiente para ele ver a imagem de
Joan que seu orgulho ferido estava esculpindo. Ficou em sua mente
em devassa glória, uma combinação de tentação e provocação.
Tinha pouca semelhança com a mulher que ele conhecia.
Ele se lembrava da angústia dela no jardim e da timidez em
sua cama. Não, ela não mentiu sobre essa parte.
A admissão relutante não ofereceu alívio. Isso só complicou
algo que ele queria manter simples.
Ele queria - precisava - pensar o pior. Mas mais lembranças se
intrometeram, doces e comoventes que interferiram em seus
esforços para deixar seu afeto se transformar em ódio.
Ainda fervendo, ainda ressentido, ele seguiu em frente com
novo propósito. Ele seguiu para a Catedral e para o local onde ele
estava quando viu Joan na sombra da parede. Reviver a traição
certamente derrotaria sua fraqueza por ela.
Ele deixou a memória emergir, mas veio devagar, desprovido
do choque que sentira, e mais claro agora do que a realidade tinha
sido.
Ele percebeu o que ele realmente havia observado lá. Joan em
seu vestido marrom, pressionada contra a parede, o rosto bloqueado
pelos ombros de um homem. Sua aceitação de carícias e um beijo.
Mas nenhuma saudação óbvia dessas atenções. Nenhum abraço de
retorno. Ela ficou rígida de orgulho - ou talvez de medo.
Seus olhos da mente a viram ao lado dele na carroça e depois
na casa. Retirada, contida, cheia de dignidade e sem
arrependimento. Calma. Calma demais, considerando o que ela
admitiu. Seu rosto impassível e os olhos tão opacos que ele não
podia ler seus pensamentos.
Ele a via indiferente como um repúdio maior para a busca de
um cavaleiro, mas talvez tivesse sido realmente uma defesa.
Ela realmente aceitara o toque daquele homem? Ou ela mentiu
para impedir que um pedreiro lutasse com um cavaleiro
empunhando espadas?
Ele não queria acreditar na primeira possibilidade, mas não
achou a última mais reconfortante. Ele não gostou da ideia de que
ela havia destruído o que existia entre eles porque não acreditava
que ele pudesse se proteger. Ou ela.
Ele poderia engolir o insulto se isso significasse que ela se
importava com ele. Talvez ela tenha feito, mas não o suficiente.
Nem tudo o que ela disse em seu argumento foi pronunciado com
indiferença. Quando ela falou de seu objetivo sustentando-a e
confiando em nada mais, chamas familiares de determinação
iluminaram seus olhos.
Não foi o começo da discussão que havia cortado o mais
profundo, mas o fim.
Ele continuou sua caminhada com pensamentos mais calmos.
Ele se perguntou sobre aquele cavaleiro de cabelos dourados. Talvez
ele realmente fosse um grande campeão. Talvez ele tivesse se
apaixonado por Joan, e veria isso por ela. Então, novamente, ele
poderia ser um covarde arrogante que atraiu as mulheres com sua
beleza e suas promessas.
Esperando que fosse o último, para que ele tivesse uma
desculpa para espancar o homem, ele apontou os passos na direção
de alguém que pudesse saber sobre o jovem Sir Guy.

Um criado trouxe Rhys ao jardim onde Moira estava sentada na


grama, tecendo uma cesta. Tinha sido o seu ofício quando ela era
pobre, e ela ainda praticava isso para o seu prazer.
Ela olhou para cima e cumprimentou-o com um sorriso sereno
que caiu um pouco quando ele se aproximou. A raiva ainda rugia
nele, e ele imaginou que ela pudesse ver seu humor.
Moira gesticulou para que ele se sentasse ao lado dela no
chão, como costumava fazer anos atrás, quando chegou a esta casa
cortejando a boa cesteira. Ele raramente olhava para aqueles dias,
ou se perguntava o que poderia ter acontecido com ela, mas ele
chegou perto de fazer isso agora. Moira era nova e honesta e tão
aberta quanto ele jamais imaginaria. Ele achou isso muito atraente
no momento.
— Estou feliz que você esteja aqui, disse ela. — Eu ia mandar
um criado para você em breve. Estamos deixando a cidade esta
tarde, e eu queria ver você antes de sairmos.
— Você e o bebê são capazes de viajar?
— Já faz quase um mês. Não sou uma senhora da corte
delicada, e o bebê se contenta em dormir, não importa onde esteja.
Addis decidiu que é um bom momento, antes das chuvas caírem.
Ela pegou uma cana de um balde de água e começou a tecer
ao longo do topo da cesta, terminando sua borda.
— Eu vou dar isso a você para levar para Joan. Eu gosto dela,
mas ela é uma pessoa complexa. Eu acho que ela e eu poderíamos
nos tornar boas amigas, mas eu nunca vou realmente acreditar que
a conheço.
Sua primeira reação foi aborrecimento com essa crítica. Ele
lembrou a si mesmo que era Moira, que não costumava criticar
outras mulheres para se divertir.
Ela virou seus claros olhos azuis para ele. Um pequeno cenho
franziu a testa.
— Você a conhece?
Um dia atrás ele teria jurado que sim, mas agora se
perguntava.
— Bem o suficiente.
Ela sorriu.
— Bem o suficiente é suficiente.
Eles conversaram sobre coisas simples, do filho dela e seu
ofício. Sentar com ela na grama o acalmou. Ele a procurara como
cortesia, mas agora ele demorou. Se ela estivesse saindo da cidade,
talvez não voltassem a falar por muito tempo.
Ela imaginou que ele não veio apenas para vê-la.
— Addis está no solar, disse ela quando terminou a cesta e
entregou a ele. — Diga a Joan que ela deve secar por alguns dias. E
você deve tentar nos visitar em Barrowburgh. Traga Joan se puder.
Vou aproveitar a companhia dela. Ela fixou-o com um olhar aberto e
sincero.
— Você sabe, eu acredito, que nossa casa está sempre aberta
para você e para os seus.
Ele viu mais significado em seus olhos do que ela jamais
colocaria em palavras. Os instintos da natureza bateram em seu
sangue nascido de servos. Ela podia sentir o cheiro do perigo na
brisa e sabia dos riscos que o seu marido estaria correndo em breve.
Ela assumiu que o homem em frente a ela compartilharia esses
riscos.
Talvez ele fizesse. De repente, ele não tinha nada a perder
novamente.
Ele levantou a mão dela e beijou-a.
— E minha casa está sempre aberta para você, Moira.
Ele encontrou Addis no solar, embalando pergaminhos
enrolados em uma caixa de madeira.
— Esta partida de Londres é súbita, Addis. Eu confio que você
não está fugindo para a sua vida.
— É hora de ir, isso é tudo.
— Os planos do rei foram reservados por algum tempo?
— Mortimer está observando muito de perto. Vamos nos
dispersar, para fazer a observação mais difícil. Mas se você falar com
ele, diga a ele que acha que as suspeitas dele estão corretas. Deixe
que ele saiba que Edward fica inquieto.
— Isso só vai forçar a mão dele.
— Sua mão foi forçada no dia em que Edward ficou maior de
idade. Deixe-o saber que o tempo está se esgotando. Vamos ver o
quão ousado usurpador ele é.
— Você está pronto para isso?
Addis não respondeu. Ele não explicaria mais a um homem que
não havia jurado a causa. Ele colocou a caixa no chão e derramou
um pouco de vinho em duas xícaras.
— Sente-se e beba comigo, pedreiro. Fale-me de coisas
simples e descomplicadas.
Rhys notou as sombras nos olhos de Addis. Não, eles não
estavam prontos, e este cavaleiro sabia disso. Algo estava
empurrando as coisas para a frente muito rapidamente, ou as
suspeitas de Mortimer ou a impaciência do rei. Addis não fugiu
exatamente de Londres por sua vida, mas levou sua família embora
para protegê-los.
Eles se sentaram em duas cadeiras perto da lareira na grande
câmara que segurava a cama com cortinas do senhor.
— Eu vi um cavaleiro na cidade hoje, Addis. Um rosto que eu
não conhecia.
— Você conhece todos os rostos?
— A maioria deles. Ele era jovem, e não usava a farda de um
lorde que eu pudesse reconhecer. Rico, no entanto. Muito bem
vestido para um jovem sem patrono. Eu o ouvi chamar Sir Guy.
O nome tirou Addis de seus pensamentos.
— Descreva-o.
— De cabelos dourados. De tamanho médio. Muito bonito,
quase como uma mulher. Uma espada com uma pedra amarela no
punho.
— Você descreve Guy Leighton. Ele é o homem de Mortimer,
libré ou não. Se ele foi chamado para Westminster, não é uma boa
notícia.
— Como assim?
— Ele é o tipo de homem que mataria um rei e adoraria fazer
isso.
Isso não era de fato uma boa notícia, e não pelas razões pelas
quais Addis se preocupava. Não só falou contra o personagem de
Guy, mas sugeriu que Joan poderia se envolver em algo muito
perigoso.
— Como você o conhece?
— O irmão da minha primeira esposa se envolveu com ele anos
atrás, quando ele não era mais do que um menino. Ele foi
implacável, e os anos o pioraram. Ele chamou a atenção de
Mortimer durante a rebelião. Mortimer deu a Guy um exército e
enviou ele para assegurar as marchas galesas do Norte, para tomar
as terras que tinham pertencido a Despenser e Arundal. Ele fez isto
em nome da coroa, mas realmente nos interesses da Casa de
Mortimer. Você ouviu falar do banho de sangue; não preciso lembrar
você disso. Mas Leighton pode ser culpado de mais do que os atos
costumeiros de guerra. Dizem que ele até se livrou de mulheres e
crianças que se mostraram inconvenientes.
Rhys ficou muito quieto. As palavras penetraram uma a uma,
mas na metade ele sabia o que estava por vir.
Nenhum grande campeão pressionara Joan contra a muralha
da Catedral, mas o homem que a usara mal.
Ele percebeu que estava esperando por isso. Ele veio a Addis
para ouvir em palavras. Seu orgulho o cegara para a verdade, mas
sua alma entendera.
— Houve um inquérito em um caso, continuou Addis. — Nada
poderia ser provado, mas uma menina e seu irmão se afogaram em
um rio, e a mão de Guy é vista nela.
A câmara ficou muito quente de repente, e o corpo de Rhys
muito frio.
— Um inquérito? Isso é incomum. Na guerra, as pessoas
morrem o tempo todo.
— Não os filhos de um barão. Não o filho e a filha de um lorde.
Seu sangue começou a pulsar lentamente.
— Conte-me sobre isso.
— Aconteceu há três anos. Mesmo que as histórias sejam
verdadeiras, ele não pagará até enfrentar a condenação eterna.
— Diga-me de qualquer maneira. Quem era esse barão?
— Marcus de Brecon. Suas terras ficavam ao sul dos
Despensers. Muito menores que esses, mas ele era um inquilino-
chefe, jurado diretamente ao último rei.
Rhys sabia de Marcus de Brecon. Os nomes de todos os
senhores do marcher eram familiares para aqueles que tinham vivido
na região.
— De Brecon era um homem honrado, e não trairia o
juramento de fidelidade durante a rebelião. E assim, após a
abdicação, ele ficou vulnerável. Mortimer alegou que tinha estado
em aliança com os Despensers e enviou Guy Leighton para dissertá-
lo. Há aqueles no conselho que insistem que foi uma jogada
independente, mas os documentos trazem o selo do rei - e enquanto
todos suspeitam que Mortimer usa o selo com impunidade, ninguém
pode provar isso.
Rhys ouviu, mas outra voz se juntou silenciosamente à história.
A voz de Joan, falando na cozinha, veio do exército dele, para tomar
à força a propriedade de um senhor que permanecera leal ao último
rei. Meu pai era dono de propriedade na região e se juntou à luta.
— Você realmente quer dizer que ninguém vai arriscar o
desagrado de Mortimer ao tentar provar isso. Marcus morreu na
batalha?
— Ele resistiu. Leighton não ofereceu termos, nunca o faz.
Ele morreu quando o castelo caiu. O mesmo aconteceu com
meu noivo e quase todos os homens que defenderam a fortaleza.
— Dizem que ele foi abatido depois que ele finalmente se
rendeu, que todos dentro da fortaleza foram massacrados, mas,
novamente, não há provas. Com o filho e a filha mortos, não havia
ninguém para pedir ao rei ou ao Parlamento por justiça, e nenhuma
testemunha a quem os tribunais considerariam confiável. Como eu
disse, havia um inquérito sobre tudo isso, incluindo o
desaparecimento do herdeiro e sua irmã. Lancaster tentou agitar o
descontentamento dos barões com a história, mas isso não deu em
nada. Mas muitos acham esses afogamentos muito convenientes.
Isso removeu testemunhas e o desafio do menino ao controle de
Mortimer sobre a terra.
O novo lorde era um homem vil, um dos favoritos de Mortimer.
Ele não conhecia nenhuma lei além de sua vontade. Ele tomou tudo
o que pertencia a quem estava contra ele, tudo em nome da coroa.
Então Mark e eu saímos daquele lugar e viemos para cá.
Jesus.
Uma onda de agitação o inundou. Ele não podia ficar parado,
então levantou-se e caminhou enquanto sua mente acomodava essa
surpreendente descoberta.
— Seus nomes. O filho e a filha. Como eram chamados?
— Eu não estava no conselho quando isso foi discutido. Se
seus nomes foram dados a mim, eu não me lembro deles.
Mark e Joan. Seus nomes eram Mark e Joan.
Deu as costas a Addis e fingiu admirar uma tapeçaria na
parede para que o lorde de Barrowburgh não visse o que isso lhe
fizera.
Emoções conflitantes derramaram através dele. Ondas de
assombro seguiram ondas de raiva. Ela o havia enganado, não por
mentiras, mas por omissões. Ela não confiara nele o suficiente para
confiar em tudo. Ela não se achou segura com ele. No começo ele
podia entender isso, mas depois...
Ela não era filha de um mero cavaleiro ou cavaleiro da
pequena nobreza. Ela era Joan de Brecon, nascida do sangue mais
nobre.
Eu me salvo para mim e para deveres e planos muito mais
antigos do que o seu conhecimento de mim. Eu não vou deixar você
interferir com eles.
Sua mente substituiu as imagens tecidas da tapeçaria por
outras. Joan, vendo seu honrado pai ser abatido. Joan, enfrentando
Sir Guy sozinha no inferno que seu mundo se tornara, percebendo
que só ela estava entre seu irmão e sua extinção. Joan, olhos
ardendo de raiva e determinação, apegando-se ao sonho da justiça
para que sua alma não morresse.
Ela estava certa. Ela não podia ignorar o passado. Ela não era
uma pessoa sem nome que pudesse esquecer para sempre. Ela e
seu irmão tinham corrido por suas vidas, mas sempre houve o
perigo de que o passado os seguiria.
E isso aconteceu. Ele a alcançou hoje no mercado.
" — Eles estão vulneráveis", ele ouviu sua voz dizer, enquanto
sua mente via Sir Guy pairando sobre Joan na Catedral. Presunçoso
e familiar. Predatório, como um falcão que pegara uma pomba
indefesa em suas garras.
Ele sacudiu a imagem e se virou. Addis observou-o com
curiosidade.
— Eles estão vulneráveis. Mortimer e a Rainha. Ele é
descuidado em seu próprio palácio. Ele assiste e fareja, mas espera
pela visão e o cheiro de um exército. Eu ando por Westminster
livremente, e estive totalmente sozinho com ele várias vezes. Seria
uma coisa fácil para mim...
— Não. Veio como um comando inflexível. — Quando você for
levado você será executado, e Edward não será capaz de pará-lo,
não importa como ele resolva as coisas. Nem este deve ser o
trabalho de um assassino. Deve ser o movimento do Rei, e legítimo,
e deve também lidar com a rainha, não apenas seu amante.
— Então deixe Edward se mover. Não em um campo de
batalha, mas em sua própria casa. Você diz que ele tem um
punhado em quem ele pode confiar. Deixe-os ir com ele até a
Rainha e Mortimer, e prendê-los.
— Mortimer pode ser vulnerável a um artesão, mas não ao rei
que ele segura. Ele está cercado por guardas quando vê Edward.
— Se não é esperado, pode ser feito. Mesmo em Westminster,
mas certamente em outra propriedade, onde a guarda será mais
magra. Quão forte é a influência de Mortimer sobre seus
seguidores? Ele os compra com poder, e eles o abandonarão quando
isso não existir mais. O reino está cansado de seus excessos, e eu
não posso ser o único que está enojado do que ajudei a fazer. Um
pequeno grupo, Addis. Um movimento rápido. Ele terminará antes
que ele possa organizar seu apoio, e até mesmo sua guarda
doméstica hesitará em derrubar um rei ungido.
Addis levantou-se e andou de um lado para o outro. Seu corpo
grande circulou a câmara várias vezes enquanto as luzes douradas
em seus olhos escuros ardiam profundamente.
Rhys assistiu ao debate interno. Ele esperava que ele tivesse
influenciado Addis. Joan não podia se dar ao luxo de esperar o rei
reunir um exército.
— Pode funcionar, disse Addis. — Não em Westminster, mas
em outro castelo. Um bando pequeno, como você diz. Se eles
conseguirem acessar os aposentos da Rainha, isso pode ser feito.
Ele cruzou os braços sobre o peito. — Sim, pode funcionar. Talvez
seja necessário. Se Mortimer chamou Guy Leighton até ele, pode ser
que ele esteja considerando um movimento discreto. Tais homens
não têm escrúpulos sobre assassinato como eu faço.
Guy não veio para isso. Ele não foi chamado. Ele veio sozinho,
para encontrar o filho e filha de Marcus de Brecon. Ele veio para
matar o menino que ele já havia prometido que estava morto. E a
irmã.
— A porta da antessala do rei está terminada?
— Sim, foi cortada.
— Bom. Eu acho que antes de tirar minha família de Londres
hoje, vou ter alguns negócios com o Guardião do Selo Privado. Mas
se eu vou fazer isso, eu preciso cuidar disso agora. Ele agarrou o
braço de Rhys em amizade. — Pedi-lhe que falasse de coisas
descomplicadas, e o fez. Nós, barões, assumimos que é preciso um
exército para lutar por uma causa, mas seu plano simples me atrai.
Se puder, fale com Mortimer novamente. Diga a ele que existe
agitação na cidade, então ele se considerará inseguro em
Westminster. Deixe-o saber que o rei expressou impaciência.
— Há mais alguma coisa que você quer que eu faça?
Addis levantou uma sobrancelha.
— Você está com a gente, então?
Sim, ele estava. Não pelo o reino e não pelos princípios
elevados. Não por nada sublime ou complicado. Ele estava com eles
por causa de Joan. Se Mortimer caísse, então Guy Leighton cairia e
ela teria sua justiça.
Ela estaria segura. Mais do que isso, ela poderia ter sua vida
de volta.
— Eu estou com você, mas eu rezo para que não seja como da
última vez. Eu não quero ver outro banho de sangue.
— Edward não conhece nada além de conflitos em sua jovem
vida. Ele procura curar o reino. Não haverá campanha de vingança.
Exceto contra Mortimer, é claro. O rei é muito amargo em relação a
isso, e ele tratará o usurpador como deveria.
— Então eu falarei com Mortimer amanhã, e o avisarei como
você pede. E se precisar de mim, mande uma mensagem.
Eles desceram juntos para o pátio. Moira estava no limiar do
corredor e ele acenou para ela se despedir.
Addis sorriu com tristeza.
— Ela ficará aliviada por você estar comprometido. Ela não
confia na lealdade fugaz das pessoas de alto-nascimento. Ela diz que
elas são como palha, rapidamente dispersas quando o vento muda.
— Você disse a ela?
— Ela já sabia. Ela sente um pouco de falta, observando das
sombras como ela faz.
Sim, ela sentia um pouco de falta. Ela havia visto Joan mais
claramente em uma tarde do que ele depois de vários meses.
― Você a conhece?
— Ela se preocupa, disse Addis. — Pelo o bem dela, eu
gostaria de terminar isso rapidamente.
— Vamos realmente terminar desta vez, Addis. Vamos
completar o que começamos e, finalmente, acabar com isso.

Capítulo XX
A casa estava escura e silenciosa quando Rhys entrou no
jardim. Nenhum brilho vinha através da janela da cozinha para
penetrar no crepúsculo crescente.
Joan se foi. Ele sabia que ela iria. Ela não podia mais ficar. Não
apenas por causa da sua discussão e das palavras com as quais eles
se separaram. Ela precisava fugir novamente, para se esconder do
diabo.
Ele parou entre o espinheiro e a bancada de trabalho. Ele não
queria entrar. Ela poderia ter ido, mas a presença dela não teria. Os
fantasmas de seu perfume e risada esperavam por ele. O jardim
também não era desprovido dela, mas seria pior na cozinha e no
corredor. Seria insuportavelmente intenso em sua câmara e sua
cama.
Sentindo-se oco como o enorme silêncio que o rodeava, ele se
sentou na bancada de trabalho. Algo caiu da prancha com seu
movimento, e ele tateou no chão por isso. Seus dedos se fecharam
em uma das pequenas ferramentas de Joan, um pequeno pedaço de
ferro que ela usava para alinhar padrões em sua argila. Algumas
outras peças de metal ainda estavam onde ela as havia deixado,
aqui no local onde ela montou o banco para formar suas estátuas.
Rhys a imaginou, sua expressão concentrada e suas mãos se
movendo, o sol da tarde revelando a forma de seu corpo sob a fina
combinação.
Ela deve ter saído muito rapidamente se ela se esqueceu de
pegar as ferramentas. Claro que ela tinha. Ela precisava se afastar
rapidamente se ela iria proteger seu irmão. E talvez ela pensasse
que protegia outra pessoa também. Talvez ela quisesse cortar sua
conexão com esta casa imediatamente para proteger o homem que
a possuía.
Essa noção deixou um gosto amargo em sua boca. Uma coisa
era aceitar que ela não achava que ele pudesse protegê-la. Era
muito pior admitir que ela se sentia obrigada a protegê-lo.
Ela provavelmente estava com muito medo. Doeu seu coração
pensar em como ela se forçou a esconder isso dele. O tempo todo
que eles voltaram para esta casa, durante todo o seu confronto
terrível, ela estava segurando o terror dentro dela. Pior que isso, ela
estava vivendo de novo as velhas lembranças de sua barganha. Não
duvidava que Sir Guy tivesse reaberto as feridas curadas e,
provavelmente, pretendia infligir outras novas.
Ela deveria ter dito a ele. Ela deveria ter deixado ele ajudá-la.
Ela duvidou que ele iria? Ou achava que ele fugiria do perigo e a
deixaria sozinha? Ela se preocupou que se ele soubesse quem ela
era, e o que a seguia, ele a abandonaria para salvar sua própria
pele?
Ela deveria ter dito a ele, droga. Se não semanas atrás, então
hoje.
A prancha ereta da bancada o protegeu da vista da casa. De
manhã cedo ele havia saído e terminado a santa. Ela esperava
rigidamente agora, em toda a sua calma dignidade, que ele a
levasse até a igreja onde ela assistiria as gerações passarem pelo
seu portal.
Como tantas vezes em sua vida, ele acalmou seu tumulto
interior, voltando-se para o seu ofício. Ele se levantou e puxou a tela
da pedra. Ela apareceu lá, quase em tamanho natural, uma coluna
negra em um mundo escuro. Ele passou a ponta dos dedos sobre os
olhos que tinha alisado hoje, verificando a superfície para ter certeza
de que não precisava mais de trabalho.
Sua mão parou. Em sua cegueira, ele sentia mais do que
jamais vira. Ele deslizou os dedos para baixo, sobre o nariz e as
bochechas, para os lábios e mandíbula. Os golpes invocaram
memórias dolorosas de tocar esse rosto antes, muitas vezes, em
paixão e afeição. Não pedra dura então, mas carne aveludada e vida
pulsante.
Santa Úrsula, uma virgem mártir. A filha de um rei e de
nascimento nobre. Ele a havia esculpido em vestes ricas e
embelezadas, como lhe convinha, e lhe dera a dignidade e o rosto
de uma mulher de alta estatura que conhecia intimamente.
Ele deixou a ponta dos dedos nos lábios dela, e eles quase
pareciam reais sob seu toque. Você a conhece? Seu coração
conhecia. Sua alma e sua essência tinham visto tudo isso. A verdade
do seu nascimento, e o que ela perdeu, e o que ela lutou para
recuperar. Ele havia guiado seu cinzel sem que ele percebesse. Seu
ofício havia expressado o que sua mente não queria reconhecer. Ele
não queria admitir o quão desesperador seu amor seria.
Ela deveria ter dito a ele. Exceto que ela tinha. Ela nunca tinha
realmente escondido sua nobreza dele. A primeira vez que ele a viu
no mercado, ela a vestia com mais segurança do que seu vestido
cinza esfarrapado.
Um som vago penetrou em sua absorção. Ele olhou por cima
do ombro, depois se virou. Outra coluna escura ficava nas sombras
espessas perto da casa. Outra forma feminina drapeada, imóvel e
rígida, o encarava. Não feita de pedra, no entanto. Medo,
preocupação e alívio não saíram da pedra.
Joan não foi embora. Ela ainda não havia saído.
Ele não sabia o que dizer para ela. Ela não confiava nele e ele
não podia ajudá-la a menos que ela confiasse.
Mesmo assim, sua interferência poderia causar mais problemas
do que ajuda. Ela poderia de fato estar mais segura se ela e Mark
simplesmente desaparecessem novamente.
Ele percebeu que não precisava dizer nada, porque isso não
importaria. Ela já havia escolhido seu curso. Ela correu do passado
para o futuro e não o incluiu.
Ela ainda não havia saído. Mas ela iria embora para sempre
muito em breve.

Ele sabia.
Estava em sua postura e seu silêncio e no modo como ele
olhou para ela. Joan não podia ver seu rosto na escuridão, mas não
duvidou que aqueles intensos olhos azuis brilhavam com seu novo
conhecimento de como o havia enganado.
Ela teria dado qualquer coisa para Rhys nunca ter descoberto.
Já tinha mudado as coisas. Ele a encarou de maneira diferente. Não
com deferência repentina ou restrição. Não, Rhys não pensava nos
nobres como seus melhores. Não era choque ou consternação que
se estendeu dele para ela do outro lado do quintal do jardim. Ela
sentiu algo muito mais triste vindo para ela. Algo pungente.
Aceitação e arrependimento. Resignação e talvez um pouco de raiva.
Ele ficou ali como um homem que calmamente percebeu que
estava perdendo seu tempo.
— Você não se foi.
Ela fez uma careta. Ele tinha demorado o dia todo para
retornar então ele não esperava encontrá-la aqui.
— Eu pensei que fosse, mas eu não consegui encontrar Mark.
Ele deve voltar em breve, e nós iremos embora imediatamente.
— Estou feliz que você não tenha ido embora.
Ele quis dizer isso. Seu coração se esticou. Ela estava feliz por
não ter ido embora ainda, embora fosse muito mais difícil agora.
Terrivelmente difícil.
— Venha e sente-se comigo enquanto esperamos pelo seu
irmão, Joan.
Ela se aproximou e eles se acomodaram no banco lado a lado.
Ela se deliciou com a segurança final de sentir seu calor e força. Ela
estava feliz que seus últimos momentos seriam aqui no jardim, neste
banco, no local onde eles compartilharam seus momentos mais
profundos e conheceram a alma um do outro.
— Quanto tempo você tem antes de ele começar a procurar de
novo?
Sim, ele sabia. Ele adivinhou tudo.
— Um dia. Nós podemos estar fora da cidade até então, e bem
adiantado no nosso caminho.
— Para onde você irá?
— Norte.
— Deixe-me levá-lo até o Edward. Em vez de fugir novamente,
vá para o Rei e obtenha a justiça que você quer.
— Eu não posso arriscar isso. Se eu entrar em Westminster,
nunca verei o Rei. Nem ele pode fazer muito por mim. Ele é apenas
um peão. Outro detém o poder.
— Nem sempre será assim, eu prometo a você.
— Talvez não, mas agora é assim. Se Edward reivindicar o seu
lugar, eu serei a primeira na fila para pedir a ele.
— Eu acho que ele vai muito em breve.
— Não breve o suficiente.
Ele suspirou profundamente. Infelizmente. Seu próprio coração
respondeu. Todo o jardim parecia encharcado de melancolia, como
se as plantas e as árvores esperassem a morte de algo bonito.
— Eu irei com você. Vou levar você e seu irmão para fora da
cidade e levá-lo para Sir Addis. Ele sabe da sua história, e ele lhe
dará um santuário.
— Nós não podemos nem provar quem somos. O mundo acha
que estamos mortos. Traremos a Sir Addis e Moira nada além de
problemas, e a inimizade da Rainha e Mortimer.
— Então vamos fugir para o norte como você planejou.
— Eu não quero que você venha com a gente, Rhys. Hoje Guy
me viu como um amor há muito perdido, mas muito em breve ele
me verá apenas como a mulher que o traiu. Sob qualquer ponto de
vista, ele vai retaliar você se ele souber do tempo que passei aqui.
Rhys pegou a mão dela e esticou os dedos entre os dela com
firmeza.
— Eu não me importo com isso. Ele assusta você, mas ele não
me assusta. Iremos juntos.
— Não. Ela apertou a mão dele para enfatizar sua
determinação.
O silêncio os cercou, mas palavras não ditas o preencheram.
Acusações de decepção, mas também promessas. Ela desejou que
as últimas pudessem ser ditas. Sua garganta se apertou e seu
coração queimou com o esforço para se manter forte.
Ansiava por abraçá-lo e dizer que um dia estaria segura e
voltaria, e eles recomeçariam e finalmente descobririam o que
poderia ser. Só que isso não aconteceria assim, e Rhys sabia disso.
Ela desejou que pudesse, no entanto. Ela desejou não dever nada
ao passado e ao futuro.
Ela sofria com a perda iminente do que eles tinham
compartilhado. Ela rezou para que ele entendesse o quão feliz Joan
a ladrilhadora havia sido com Rhys Mason.
Ele a puxou em seus braços. Seu forte abraço a derrotou. Ela
afundou contra ele e inalou tudo o que ele era, e lágrimas encheram
seus olhos.
— Você poderia ter me dito, disse ele. — Você poderia ter
confiado em mim.
— Eu não pude, no começo. E então... eu sabia que só teria
você por um curto período de tempo, Rhys. Se você soubesse quem
eu era...
— Se eu soubesse quem você era, eu também saberia que
teríamos um ao outro apenas por um curto período de tempo. Você
sempre avisou sobre isso, mas eu esperava por mais.
— E eu deixei você esperar, menti para mim mesma que talvez
pudesse ser mais, também. Um ano pelo menos. Talvez eu quisesse
que nós acreditássemos nisso enquanto podíamos, então este dia
não iria sombrear nosso tempo juntos. Foi egoísta e cruel de minha
parte.
— Não, não egoísta. Talvez eu esteja feliz por você não ter me
contado. Ele acariciou o rosto dela e o virou para ele. — E eu estou
feliz que você não tenha ido embora esta noite, para que possamos
nos separar com um beijo, e não com as palavras duras que falamos
esta manhã.
O toque de seus lábios queimou todo o seu ser com calor. Ele
tinha sabor de bondade e justiça e tudo o que ela havia perdido
anos atrás. Ele a beijou lindamente, pela última vez, demorando-se
de um modo que despertou sua alma e sua feminilidade.
Um barulho penetrou sua felicidade triste. Passos percorreram
o jardim. Ela se agarrou ao momento desesperadamente,
bloqueando a intrusão, não querendo ouvir os sons que indicavam o
fim.
Ele quebrou o beijo, mas segurou-a com força. Uma figura
passou por eles e parou perto da estátua.
Joan relutantemente virou a cabeça. Mark não olhava para o
abraço, mas para a santa de pedra apoiada. Ele ficou como um
soldado, as pernas separadas e apoiadas, costas e ombros ao
quadrado, as mãos cruzadas atrás dele.
— Eu olhei para ela esta manhã, disse ele, acenando para a
estátua. — Você completou o rosto.
— Sim.
— Ela é muito bonita, e você lidou com ela com grande
habilidade e carinho. Mas acabou agora, não é. É hora de ela deixar
este jardim. Você terminou com ela.
Rhys escovou o cabelo de Joan com os lábios e afrouxou o
abraço.
— Pegue o cavalo, ele sussurrou. Tome o que você precisar.
Seu coração gritou um protesto quando ele se levantou,
separando-se dela.
Ele se afastou, indo para a casa, levando partes dela com ele,
trazendo lágrimas que nunca se curariam.
Sim, acabou agora. Ele terminou com ela.
Ela tentou acalmar suas emoções e ver além da dor. Mark
esperou, dando-lhe um pouco de tempo.
Ela teve que se recompor. Ela teve que explicar para seu irmão
o quão longo e feito era. Eles precisavam sair e encontrar algum
jeito de atravessar o portão da cidade hoje à noite.
Ele se mexeu um pouco. Sua mão direita emergiu de suas
costas. Uma linha longa e escura apareceu ao seu lado.
Ele segurou sua espada.
Seu coração parou, depois recomeçou com um ritmo rápido e
desesperado.
— Ele está aqui. Na cidade, ele disse, sem rodeios.
Não admira que ele tenha falado com tal finalidade para Rhys.
— Eu sei. Como você descobriu?
— O homem que eu pago para me treinar é o pai de um dos
guardas da casa de Mortimer. Ele fofoca quando está bêbado e eu
me certifico de que isso aconteça com frequência.
— O que mais ele te contou?
— A chegada daquele cara foi inesperada. Ele não foi
chamado. Acho que ele veio nos procurar.
— Talvez não, mas não podemos arriscar. Eu também descobri
que ele estava aqui. Eu estive esperando por você, para que
possamos sair esta noite.
— Não. A palavra saiu com muita calma.
Ela percebeu o que ele estava pensando. O que ele planejava
fazer. Ela ficou de pé.
— Você não pode. Será exatamente o que ele quer.
— Nós não correremos mais como criminosos. Eu não.
— Você é um menino.
— Homem o suficiente para saber que tenho apenas uma
escolha nisso.
Ela agarrou o braço dele.
— Ele sabe que estamos aqui. Ele me viu. Você entende como
isso é perigoso? Ele estará olhando e esperando. Você não será
capaz de pegá-lo de surpresa.
— Eu nunca pretendi. Eu não sou um covarde que golpeia um
homem por trás.
Santos.
— Isso vai ser como Piers. Você esquece tão facilmente? Seu
orgulho está deixando você cego? Você não é páreo para ele. Ele vai
te matar.
— Então eu vou morrer com honra, onde o mundo inteiro veja,
e antes eu vou deixar que todos saibam o que ele é, e o que ele fez.
E você vai sobreviver e contar o resto. Ele estendeu a mão e alisou a
mão sobre o cabelo dela. — Todo o resto. O que aconteceu com o
pai e os outros pode ser desculpado pela guerra, mas não o que
aconteceu com você.
Deus querido, ele sabia. Ele sempre soube. E agora ele iria
para a morte dele ao invés de viver com isso sem problemas.
— Não faça isso por mim. Eu estou viva, pelo menos, e você
também. Eu não quero sua bravura em meu nome.
— As mulheres nunca o fazem. É por isso que os homens não
pedem permissão, e eu não peço a sua agora. Só lhe digo porque
prometi.
— Você vai morrer. Você ainda é tão inexperiente, você não
compreende isso? E o desafio público não mudará nada. Nada.
— Isso vai mudar tudo. Apesar da minha juventude, ele não
será capaz de resistir a me encontrar, e todos que o virem o
conhecerão pelo assassino que ele é.
— Na melhor das hipóteses você vai ferir sua honra. Você acha
que um homem assim se importa com essas coisas?
— O que importa é que eu me importo com essas coisas.
Ele não estava escutando. Seu orgulho o fazia surdo. Ela
agarrou o braço dele com mais força, até seus dedos arranharem.
— Eu imploro, irmão, não faça isso. Não me deixe sozinha.
— Você não estará sozinha. Quando tudo tiver acabado, o
conselho do Rei cuidará da sua segurança. Eles encontrarão um
marido forte, que protegerá você e nossas terras até que você tenha
um filho.
Mark não entendia. Cheio de heroísmo precipitado da
juventude, ele não percebia que não seria assim.
Ele era apenas um garoto quando isso aconteceu, e ele não
havia percebido que cada movimento que Guy havia feito fora
dirigido por outro homem. Um homem que de bom grado enterraria
seu irmão e a ela e alegremente ignoraria as questões levantadas
pelo ato ousado de Mark.
Foi culpa dela. Ela manteve seu orgulho vivo, respirando em
suas brasas sempre que a pobreza ameaçava extingui-lo. Ela
alimentou sua raiva com histórias das atrocidades de Guy. Ela nunca
o levou além disso, para levar em conta a mão distante que guiara a
coisa toda.
E agora era tarde demais. Ele havia trabalhado sobre isso
durante todo o dia e tomado a sua decisão. O caminho da bravura
brilhava diante dele, e ele não ouviria palavras que insistiam que
tudo seria fútil.
Ela podia entender isso. Por três anos ela também não tinha
visto. Em seu ódio por Guy, ela ignorou a totalidade disso. Ela
sonhara em destruir o mal menor, quando um maior era a fonte de
seu poder.
— Espere um dia. Dê-me um dia, eu te imploro. Vou fazer isso
direito.
— Você não pode realizar em um dia o que três anos não
puderam fazer acontecer.
— Eu posso. Eu sei como.
— Se você pensa em comprar um campeão, tire a ideia da sua
cabeça. Você não tem a moeda e eu não vou permitir a alternativa.
— Rhys tem a moeda.
— Ele não tem. Ele usou para comprar o pátio de azulejos.
Então, sua bonita amante poderia praticar seu ofício, e estar
vinculado a ele em uma parceria. Lhe custaram vinte libras, eu ouvi.
Eu duvido que seu pedreiro tinha muito mais do que isso escondido
sob as tábuas do assoalho.
A notícia a surpreendeu. Ela não tinha pensado sobre o custo
do quintal, e a perda potencial do investimento quando ela saísse.
Tornou-se mais uma miséria para aumentar sua aflição.
— Eu ainda peço um dia. Eu sei outra maneira de resolver isso.
Se eu estiver errada, se eu falhar, um dia não vai importar. Na
verdade, isso tornará mais fácil. Você não terá que procurar por
Guy, porque ele estará esperando por você. Depois de amanhã, no
templo. Ele acha que nós iremos.
A cabeça de Mark se virou em choque.
— Você falou com ele?
— Sim.
— Você prometeu isso a ele?
— Para comprar algum tempo, então poderíamos ir embora.
— Que outras promessas você fez? Ele parecia furioso.
— O que ele queria ouvir. O que ele precisava acreditar, então
ele não procuraria por você imediatamente.
Ele se acalmou um pouco e considerou as opções.
— O Templo na parte alta estará cheio nessa hora. Se nos
encontrarmos assim, muitos verões. Seu orgulho de menino gostava
disso, como se isso fizesse alguma diferença.
— Se eu falhar e você encontrá-lo, vou me certificar de que
toda a cidade de Londres o veja.
Ele vacilou.
— Seria melhor do que ir até ele no palácio, suponho.
— Muito melhor.
Ele chutou a ponta da sua espada. Foi um gesto infantil,
revelando o menino que ainda vivia dentro do homem.
Joan queria pegar aquela criança em seus braços e repreendê-
lo e protegê-lo e proibir este jogo perigoso.
— Somente um dia?
— Um dia. Eu saberei amanhã à noite se eu tiver tido sucesso.
Ele encolheu os ombros.
— Suponho que depois de três anos, isso pode esperar um dia.
Alívio escoou através dela. Alívio e entorpecimento. Ela fizera
uma promessa e agora só poderia evitar a morte encontrando uma
solução muito rapidamente.
Havia apenas uma que funcionaria.
Nenhum campeão. Nenhuma moeda. Sem tempo. Isso deixou
apenas ela, sozinha. Ao vir procurá-los, Guy forçou a mão de
maneiras que ela nunca havia previsto.
Sem mais fugas. Sem mais sonhos. O passado pressionava as
costas dela e a espada de seu irmão bloqueava o futuro. No dia
seguinte, tudo estaria terminado. Realmente acabado e feito.
Ela soltou o braço de Mark e alisou a palma da mão no ombro
dele.
— Eu quero que você vá para a casa de David esta noite. Eu
quero que você espere lá até eu vir e pegar você amanhã.
— Por quê? Guy sabe onde você mora? Você se preocupa que
ele venha a esta casa? Se assim for, eu não vou deixar você para
enfrentá-lo sozinho.
— Ele não sabe. Mas eu vou dormir melhor se você estiver
seguro e escondido, apenas no caso. É tolice minha, mas nós
mulheres somos assim.
— Oh, sim, se você vai se preocupar a noite toda, eu irei.
— Você provavelmente deveria deixar a espada aqui.
— Eu suponho que eu deveria. Ele desceu o jardim e colocou a
arma atrás das plantas ao longo da parede, em seguida, apontou
para o portal.
Ela correu e parou ele. Ela olhou para ele na escuridão e
desejou poder ver seu rosto claramente. Ela passou uma carícia
pelos ombros fortes e pelos braços dele, e a lembrança dela sentiu a
estrutura de um menino e um jovem, embora suas mãos viajassem
ao longo do corpo de um homem.
Uma onda de nostalgia a lavou e uma nova expectativa de
perda perfurou seu coração. Ela pegou as mãos dele e levantou-as
para o rosto. Ele se mexeu, desconfortável com a intimidade no
meio dos meninos de sua idade.
Ela se esticou na direção dele e beijou sua bochecha.
— Você tem sido meu mundo, Mark, e minha vida, por três
anos. Um dia mais, e eu finalmente vou fazer tudo certo. Você terá
tudo de volta.
Ele parou de repente.
— Assim como você. Vamos recuperar nossa casa como a
deixamos, de mãos dadas.
Ela estava grata por ele não poder ver seu rosto e as lágrimas
transbordando em seus olhos.
— Sim, de mãos dadas. Vá para David agora.
Ele hesitou, como se sentisse sua tristeza oculta. Como se ele
soubesse. Ele a alcançou impulsivamente e agarrou-a num abraço
desajeitado contra o peito.
Ele a soltou e foi até o portal.
— Eu vou esperar por você. Só até as vésperas, no entanto. Eu
voltarei aqui se você não vier ou me mandar uma mensagem.
Ele queria dizer que retornaria para a espada. Seu coração
suspeitava que ele não a encontraria aqui se tivesse que esperar
tanto tempo.
Ela entrou no beco e viu como ele foi engolido pela noite. Ela
esperou muito depois que ele desapareceu pelo caminho,
imaginando que ela ainda poderia vê-lo. Então ela fechou o portal e
foi se sentar entre as flores e encarar a única escolha que restou.
Nós vamos recuperar a nossa casa como a deixamos, de mãos
dadas.
Era assim que deveria ser. Esse era o sonho e o plano.
Mas isso não aconteceria dessa maneira agora. Se ela fizesse o
que tinha que fazer, não viveria para ver aquele dia.
Capítulo XXI
Joan sentou-se entre as flores, anormalmente atentas aos
seus cheiros. Ela passou as mãos por elas deleitando-se com as
texturas de seus talos fibrosos e pétalas macias. As brancas
brilhavam como pequenos fantasmas na noite, refletindo a luz vaga
lançada pela lua.
Seus sentidos absorveram tudo, momento a momento. A
realidade existia de uma nova maneira. Mais nítida. Imediata. Era
como se Deus tivesse diminuído o tempo para ela esta noite, e
aumentado sua consciência, para que ela pudesse viver o mais
completamente possível.
Força lutou com medo em seu coração, mas foi o medo que
alimentou a força. Medo por Mark e por Rhys. Se o seu irmão fizesse
o que ele planejava, alguém da ala reconheceria o jovem corajoso e
depois procuraria Guy ou Mortimer para falar da casa onde o filho de
Marcus de Brecon estava morando.
Ela não tinha escolha, e isso era uma coisa boa. Dado uma, ela
teria corrido e corrido. Ela teria passado a vida correndo e nunca
mais viveria no presente.
Neste momento, neste jardim, o presente existia como nunca
existiu antes. Era sempre assim no final?
Os sentidos do corpo só se tornam completamente vivos antes
de morrerem? Ela mergulhou as mãos entre as flores até o solo e
saboreou a sensação de escuridão fresca em torno de seus dedos.
Não havia escolha, mas ela não gostou do que enfrentou. Ela
não era tão forte. Ondas de pânico subiram de novo e de novo, e só
o medo por Mark e Rhys os impediu de dominá-la. Ela rezou para
que o medo não a abandonasse amanhã, ou fosse afogada pelo
temor arrepiante da sua própria vontade.
Ela estava feliz por não ter visto a solução mais cedo. Suas
ideias infantis a compraram três anos.
Até a pobreza deles parecia bonita agora, porque a levara a
esta casa e ao homem que a possuía. O sonho tolo a manteve viva
por tempo suficiente para conhecê-lo.
Seu espírito se encolheu com os pensamentos de amanhã. Ela
não duvidava que ela teria sucesso. Ela iria se certificar de que ela
teria. Mas ela não mentia para si mesma. Não haveria escapatória
depois que ela parasse a mão que moveu as peças no tabuleiro de
sua vida.
A terra, a brisa e o céu sabiam disso. Ligaram-na a eles neste
preciso presente. Eles permitiam que ela os visse e sentisse como
nunca antes. A consciência aguda de seus sentidos e alma tanto a
acalmaram como a afligiram.
A casa assomava sombriamente na outra extremidade do
jardim. Um homem dormia lá dentro. Ela imaginou Rhys naquele
leito de plumas e seu coração se agitou ansioso pelo conforto de seu
abraço seguro.
Ela deveria ficar aqui fora no jardim e dormir nas flores. Eles
haviam se despedido e ele pensou que ela tinha ido embora. Ela já
havia deixado o dever destruí-los. O caminho corajoso, o certo, seria
permitir que ele começasse a esquecê-la.
Seu coração não concordava e sofria pelo vínculo que conhecia
com ele. Nesse presente nitidamente real que a saturava, ela
precisava se agarrar a ele, conhecê-lo e tocá-lo tão completamente
quanto seus dedos experimentaram as flores e o solo. Fisicamente,
espiritualmente e totalmente.
Sua mente discutiu com seu coração. Avisou que ele
adivinharia o que ela planejava e tentaria impedi-la. Dizia que, se
fizesse isso, seria o maior e mais imperdoável engano.
Não, nenhum engano. Isso era agora, e o resto seria amanhã.
Apenas o mundo atual existia esta noite.
Não o ontem com suas memórias, e nem o amanhã com seu
dever.
Ela se levantou e caminhou em direção à casa. Realmente não
havia escolha. Não sobre o amanhã e não sobre esta noite.
Rhys não estava dormindo. Assim que Joan entrou na cozinha,
ela o viu em pé junto à lareira, os braços cruzados sobre o peito, ele
olhava para as brasas como um homem em transe e não reagiu aos
passos dela.
Ela o viu de forma mais completa e precisa do que nunca. Um
homem forte e bonito, contido e completo em si mesmo. Um homem
bom, que tinha sido muito generoso com ela, e que receberia
apenas dor por sua bondade.
Mas isso seria mais tarde, e isso era agora. Muito agora. O
último agora que ela teria. Ela rezou para que ele entendesse. Ela
esperava que compartilhar o que poderia ser por mais uma noite o
ajudaria a perdoá-la.
Uma premonição da dor da manhã deslizou por ela. Uma
nostalgia oca a encheu. Com determinação feroz, ela forçou isso
para fora dela. Ela recuperou o presente, e a alegria de vê-lo
novamente tomou o seu lugar.
A maior parte do seu lugar. A tristeza que a aguardava não
podia ser completamente banida. Permaneceria, colorindo seu
vínculo. Foi a tristeza que tornou o presente tão real.
A cabeça de Rhys se moveu levemente e seus ombros ficaram
tensos. Ele finalmente percebeu que ela estava lá.
— Eu pensei que você tivesse ido embora. Eu vi você sair pelo
portal. Ele não olhou para ela e falou com a lareira.
— Eu voltei. Mandei Mark para a casa de um amigo para
passar a noite.
— Por quê?
— Eu duvido que teríamos saído pelo portal da cidade tão
tarde.
— Então você pretende sair amanhã em vez disso?
— Sim. De madrugada.
— Sozinha?
— Sozinha.
Ela mal podia ver o perfil dele, mas era o suficiente. A linha de
sua boca endureceu e sua expressão escureceu.
Ele estava com raiva. Ela não podia culpá-lo. A recusa de sua
ajuda o insultou, seus enganos só pioraram as coisas. Ela adivinhou
quais conclusões ele tinha tirado enquanto ele olhava para aquele
fogo baixo.
— Não é por causa de quem somos, Rhys.
— É tudo sobre quem somos, querida.
— Não é. Não duvido da sua bravura ou do seu valor como
protetor. Mas perdi muito nisso e não vou perder mais se puder
evitar.
Ele não respondeu a isso. Ele manteve sua posição longe dela,
e seu olhar no fogo brilhante.
— Se você não quer que eu fique aqui esta noite, eu vou
embora. Eu tenho uma moeda para uma pousada.
— Não aumente o insulto. Não sou tão covarde que jogaria
uma dama na rua.
Seu tom agudo a cortou. Ela precisava desesperadamente
diminuir a distância entre eles.
— Não é uma dama que vai ficar, mas Joan ladrilhadora.
— Nunca houve uma Joan ladrilhadora, apenas um pedreiro
muito obcecado para aceitar isso. Apenas um homem disposto
demais a abraçar a autoilusão, e nunca perguntar o nome real da
mulher que não nasceu da arte que ela praticou.
— Isso não é verdade. Quando você me conheceu, e até hoje,
eu era como você me conhecia.
— Não, Joan. O fantasma da dama estava sempre em você,
determinado a renascer, desesperado por isso. Você nunca
esqueceu. Mesmo em meus braços o passado possuiu você. Ele
finalmente se virou, olhos azuis brilhando com luzes profundas que
revelavam o quão longe suas contemplações tinham ido. — Eu me
pergunto se foi isso, tanto quanto as lembranças de Leighton, que
impediram você de se entregar a mim.
— Eu te imploro para acreditar em mim quando digo que não
foi.
— Eu acho que você não conhece sua própria mente muito
bem. Se eu tivesse sido um homem diferente, um homem igual
àqueles que você perdeu, um cavaleiro, teria sido diferente. Você
teria confiado em mim para endireitar o mal feito a você. Você teria
visto um futuro comigo que iria além dessas poucas semanas.
— Eu não posso dizer o que minha mente teria pensado. Eu só
sei que isso não teria feito diferença para o meu corpo, ou meu
coração. Eu nunca te enganei, Rhys.
Sua expressão suavizou um pouco.
— Só que é tudo parte da mesma coisa. Todas as facetas da
joia do seu passado, e seu voto de usá-la novamente assim como
quando você nasceu. Se eu tivesse admitido a verdade para mim
mesmo, eu teria entendido melhor, eu teria sabido desde o começo
que você não poderia colocar de lado, nada disso, incluindo as
memórias que mataram o prazer. Se você perdesse uma parte,
temia perder tudo. Você me avisou naquela primeira noite na minha
cama.
— E você me disse para esquecer enquanto eu podia, e para
lembrar quando eu deveria. Você me mostrou como esquecer, e eu
fiz, mas eu nunca vou esquecer o que nós compartilhamos.
Rhys sorriu vagamente. Infelizmente.
— Eu temo que nem eu, minha pomba. Esse é o problema que
eu lido agora.
Ele se aproximou e sentou no banco abaixo da janela. Ele
olhou para fora, como se pudesse ver algo além da escuridão.
— Se você precisa sair de madrugada, você deve dormir. Use a
câmara e a cama. Eu vou subir e te acordar à primeira luz.
Foi um repúdio gentil, mas inconfundível. Ele ficara feliz em vê-
la no jardim, mas não estava feliz por tê-la aqui agora. Sua presença
interferia em sua construção de uma parede na qual ele conteria
quaisquer emoções que sentisse.
Ela deveria ir embora e deixá-lo com isso. Ela não deveria pedir
mais do que ele queria dar. Mas ela não conseguiria dormir naquela
cama sozinha. Ela ficaria acordada a noite toda, esperando o
amanhecer, temendo a provação a seguir, e sentindo o humor e a
presença do homem que vigiava lá embaixo.
Como ela os sentia agora. Eles encheram a cozinha,
engrossando o ar, cercando-a como uma nuvem espessa. Os velhos
laços, a atração física e as conexões emocionais, ainda se estendiam
entre eles, puxando com mais força que jamais tinham feito. Como
tudo mais esta noite, ela os experimentou intensamente, e seu
coração e corpo se agitaram.
Rhys havia decidido que acabara, mas não tinha. Ainda não.
Amanhã seria em breve.
— Se você não quiser subir comigo, ficarei aqui com você.
— Você fala de uma despedida longa demais, querida.
— Eu não quero falar adeus de jeito nenhum. Isso é para
amanhã.
Ele se mexeu e a encarou.
— Então o que? Meu humor não é bom, e eu não estou com
disposição para falar sobre o que aconteceu ou vai acontecer, até o
amanhecer. Isso só vai levar a discussões, e me impedir de
encontrar alguma paz.
— Uma paz que virá somente se eu não estiver com você?
— Sim, Joan. Eu posso nunca esquecer de você, mas isso não
significa que eu não tentarei.
Perfurou seu coração ouvi-lo colocar isso em palavras. Apenas
sua necessidade desesperada de conforto a mantinha brava.
— Isso pode esperar pelo amanhã também, não pode? Não é
conversa o que eu quero de você, Rhys. Eu também não estou no
clima de muita conversa.
Ele apenas olhou para ela. Sua pose casual no banco não
mudou, mas um novo poder entrou no ar. Veio dele e forçou seu
estado de alerta ainda mais, de uma maneira fisicamente excitante.
— Então o que é que você quer de mim, Joan?
— Eu quero esta noite. Eu quero dormir ao seu lado mais uma
vez. Eu quero seu abraço e seu beijo e seu toque. Eu quero
esquecer por mais algumas horas.
— Eu não acho que posso fazer isso.
— Você já fechou seu coração para mim? Começou a esquecer
tão rapidamente?
— Não, e é por isso que eu não posso fazer isso. Eu não posso
confiar em mim mesmo com você esta noite. Eu quis você por muito
tempo, desde o primeiro momento que te vi. Quando eu pensei que
havia um futuro, minha fome poderia esperar o seu tempo. Eu
poderia me dar ao luxo de esperar. Mas não há mais futuro nem
mais tempo e eu não sou um santo. Eu sei o que está em minha
cabeça e meu sangue agora, e seria insensato para nós fazermos
isso. Eu não acho que eu pararia, e se eu terminasse machucando
você, isso seria uma lembrança amarga para nós dois.
— Então não pare. Eu não quero você pare.
Lá, ela disse isso. Ela não podia voltar atrás agora. Nem queria.
Ele não se moveu nem emitiu um som. Ele apenas olhou para
ela, mas ela sentiu sua reação. Ela sentiu o efeito de suas palavras
sobre ele e o jeito que elas cutucavam a fome da qual ele falava.
Calafrios de antecipação dançaram através dela. Ela esperou
que ele se levantasse e chegasse até ela. Certamente ele não
poderia resistir ao modo como o velho puxão se apertava. Tenso.
Ferozmente.
— Eu disse a você no primeiro dia que eu não aceitaria você
como pagamento, mesmo que você oferecesse, minha senhora.
— Eu devo muito a você, mas não ofereço nada em
pagamento dessa dívida. Faço isso por mim mesma, para que
quando eu for embora amanhã, eu saiba que o que tivemos é
inteiro. E não é uma dama que quer você. É apenas Joan
ladrilhadora.
Ainda assim ele não veio até ela. Ela desejou que houvesse
alguma maneira de convencê-lo de que não seria como da primeira
vez, que o prazer não morreria. Não havia perigo de machucá-la,
porque as únicas memórias que viviam para ela naquela noite eram
as dele.
Não havia palavras que pudessem explicar isso. Havia ainda
menos que pudessem transmitir quão completamente o presente
existia para ela agora.
Isso não importava. Este não era um momento para palavras.
Ela caminhou até a lareira e cuidadosamente colocou um
pouco de combustível nas brasas. Ela cutucou até que pegou, e as
línguas quentes emitiram sua luz dourada e dançante.
Ela abriu o colarinho de pescoço em seu vestido marrom. Ela
se virou para ver seu olhar intenso. A nova luz esculpia seu rosto
lindamente, e os azuis de seus olhos pareciam quase negros em
suas profundezas.
O vestido escorregou de seus ombros e deslizou para baixo.
Sua observação silenciosa fez coisas surpreendentes para ela.
— Você não tem que fazer isso.
— Sim, eu tenho. Para mim. Então a lembrança será boa, e
não haverá arrependimentos.
Ela empurrou as correias de seus braços para baixo. Ela
abaixou o tecido, expondo seus seios. Sua pele se tornara tão viva
que a descida escovada do pano a despertou como uma carícia.
A combinação caiu. Ela o encarou do outro lado da sala, nua,
exceto pela luz do fogo. A maneira lenta que ele olhou para ela,
toda ela, a fez de repente tímida. Ela trouxe a trança para frente e a
desamarrou para esconder a quão incerta ele a deixou.
Ele assistiu seu cabelo soltar. Ela sacudiu os fios até que eles
fluíram ao redor dela.
Ainda assim ele não veio até ela. Seu olhar subiu por seu
comprimento até que ele a olhou nos olhos. Sua expectativa do que
ela oferecia podia ser vista nos planos rígidos de sua expressão e na
intensidade de sua atenção.
Ainda assim, ele não se mexeu, mas a espera não era
desagradável. O desejo pulsava nos momentos que passavam,
excitando-a tanto quanto um toque. Apesar de sua distância, eles
pareciam tão conectados quanto quando em um abraço.
Isso a afetou fisicamente. Seus seios se endureceram e suas
pontas se apertaram. Uma deliciosa tensão encheu sua barriga. Sua
garganta ficou seca.
Ele poderia, mas não fez nada para preencher o espaço. Uma
faísca de desafio brilhou em seus olhos.
— Você vai me fazer ir até você, não é? ela disse, de repente
entendendo.
— Sim.
— Assim fica claro que foi minha escolha e minha decisão.
— Sim.
— Isso não é muito generoso da sua parte.
— O que eu quero hoje à noite não tem nada a ver com
generosidade. Eu quero tomar você, e possuir você, e me enterrar
em você. Venha aqui para mim se você está tão certa que você me
quer do jeito que eu quero você. Me mostre que você realmente
precisa que isso seja completo entre nós antes de sair. Caso
contrário, pegue o vestido e corra até a câmara, e nos separaremos
ao amanhecer, como fizemos no jardim.
Sua voz foi afiada o suficiente para fazê-la parar. Ele não
estava zangado e não era realmente perigoso, mas avisou-a sobre o
que esperava. Ainda mais do que suas palavras, seu tom deixou que
ela soubesse exatamente onde sua mente e seu sangue estavam
hoje à noite.
Isso enviou um arrepio através dela. Não de medo. A excitação
profunda estremeceu, zumbindo em seus membros. A sacudiu tão
profundamente que ela se perguntou se poderia andar.
Ela podia, e deu um passo em direção a ele. Seu olhar a atraiu
para mais perto, puxando-a para frente como se ele puxasse uma
corda invisível.
Finalmente ela ficou na frente dele, tão perto que sentiu o
calor dele ao longo de sua pele nua. Ela também sentiu a tensão de
antecipação nele e a força do poder contido. Sua própria excitação
aumentou em reconhecimento, liberando anseios famintos. Eles nem
sequer se tocaram, e ela já respondia aos prazeres que aguardavam.
Eles encheram sua imaginação e atormentaram seu corpo.
Ele se endireitou e espalmou suas mãos fortes e maravilhosas
em seus quadris. O calor e aspereza de sua pele eram como um
toque de êxtase. Ele a puxou entre as pernas e alisou o rosto contra
os seios dela.
Ela acariciou seus dedos em seus cabelos e segurou-o ao ritmo
de seu coração.
— Você não acreditou que eu poderia fazer isto.
— Não, não hoje de todos os dias. Não depois de vê-lo
novamente.
— Isso não é sobre hoje, ou sobre ele. Eu tinha decidido antes
que ele me encontrasse. Eu estava esperando você vir, então eu
poderia te contar.
Ele a olhou surpreso, se levantou e passou os braços em volta
da nudez dela.
— Então isso é apenas sobre nós. Finalmente, só nós.
— Sim, só nós. Finalmente. Muito finalmente. Mas o
contentamento de seu abraço, de sentir seu corpo pressionado ao
longo do dela, submergiu facilmente a onda de arrependimento que
se elevou com aquela palavra.
Segurá-lo era celestial, mas ela precisava de mais. Queria mais.
Ambos precisavam. Tremeu na pressão de suas apreensões, e fluiu
pelos caminhos de suas longas carícias. Algo poderoso esperava.
Uma força maravilhosamente turbulenta, silenciosa, mas palpável,
lutando contra a contenção deste prelúdio.
Ele a beijou e a força se soltou em uma rajada febril. Sua
necessidade encontrou a dele em uma paixão desesperada,
alimentada pela perda iminente do outro. A fome em sua alma
combinava com a de seu corpo, e ambos estavam ansiosos por tudo
o que isso poderia ser.
Seus beijos quentes e cortantes prometiam que finalmente
teriam isso. Eles alertavam que não poderia haver retenções. Seus
medos e sua decência tinham respeitado as barreiras por muito
tempo, mas não seria assim hoje à noite. Finalmente.
Seus sentidos se encheram dele. Sua pele sentiu as texturas de
sua pele, cabelos e roupas em uma cascata de novas sensações,
alerta. Sua respiração aqueceu seu pescoço, e o toque de sua língua
disparou prazer em seu sangue.
Seus braços abraçaram a necessidade que se elevava
selvagemente em sua estrutura, e seu próprio desejo revelou-se
nele, subindo triunfantemente, pedindo mais e mais.
Ficou louco, impaciente e selvagem. Ele beijou. segurou e
tocou com maestria controladora, como se quisesse absorvê-la.
Consumi-la. Seu coração implorou para que ele tomasse tudo dela.
Sua alma ansiava por se juntar a ele.
Ela precisava de mais proximidade, mais conexão. Ela agarrou
a roupa dele, ansiosa para tirar as barreiras que interferiam. De
alguma forma eles tiraram a túnica e a camisa. Ela pressionou as
palmas das mãos e os lábios no peito nu e se perdeu no gosto da
pele dele e na batida do seu coração.
Ele a levantou e segurou. Beijos apertados em seus cabelos e
mãos acariciando seu traseiro, ele a encorajou vagando e circulando
a língua. Ela amava o que isso causava a ela, como seu corpo ficava
tenso e sua respiração diminuía. Ela ansiava para seus dedos
encontrassem seu objetivo. Ela suavizou as palmas das mãos para
pressioná-lo, e os músculos de seu torso se apertaram sob suas
mãos.
Ele tomou seu tempo, atormentando sua necessidade,
fazendo-a esperar. Seu corpo pulsava com desejo. A necessidade a
desequilibrou. Ela olhou para cima para encontrá-lo assistindo seu
corpo balançando com satisfação sombria.
— Por favor. Toque-me lá. Eu vou morrer se você não fizer.
Sua mão se moveu. Olhos acesos com um novo tipo de paixão,
ele observou sua reação. Ela o deixou ver. Deixou-o ouvir isto.
Flexível no apoio de seu abraço, ela se submeteu ao prazer
torturante. Congratulou-se com isso.
Ele a ergueu e recostou-se no banco abaixo da janela.
— Aqui. Agora. Não posso esperar pela cama no andar de
cima.
Ele a puxou para seu colo, com os joelhos sobre os quadris,
como fizeram sob o espinheiro naquele domingo. Ele abaixou-a para
que sua boca pudesse alcançar seu seio. Com os braços apoiados no
peitoril atrás dele, a brisa excitando sua pele quente, ela pairou ali
enquanto a língua dele sacudia e lambia e as mãos dele soltavam o
resto da roupa.
Seus seios nunca foram tão sensíveis. O tormento delicioso a
deixou tremendo. Ela se abaixou e acariciou-o enquanto ele tirava
suas roupas.
Ele deixou por um tempo. Em uma doce unidade de sensação,
eles exploraram o prazer. Língua e toques circulando e alisando seus
mamilos, ele brincou com sua loucura até que os gritos suspiraram
com cada uma de suas respirações ofegantes.
Ele tirou a mão dela e a colocou de volta no peitoril.
— Não mais. Não é a sua mão que eu quero a cercar-me.
A posição a deixou equilibrada sobre ele, vulnerável e passiva,
faminta e esperando.
Sua boca e mão a despertaram mais especificamente. A
necessidade centrou-se baixo, onde ele havia acariciado antes. Ela
imaginou aquele toque novamente, e muito mais, e pedidos
necessitados emergiram para fora dela. Implorando, palavras e
declarações de desejo derramadas com abandono.
Sua outra mão acariciou a parte interna das coxas com firmeza
e comando. Antecipação consumiu sua mente e ela chorou com
impaciência. Sua carícia se elevou em resposta e acariciou
profundamente. Alívio gemeu através dela. Fora dela.
Foi apenas uma breve pausa. Seus toques lentos e
conhecedores fizeram seu corpo ganhar vida. O foco de seu prazer
pulsava com uma sensibilidade surpreendente. Rapidamente se
tornou frenético. A fome a possuiu até que suas pernas tremeram e
ela chorou pela intensidade. Toda ela, seu corpo, alma, coração e
mente, toda a atenção, consciência e experiência do presente,
uniram-se em um desejo totalmente consumidor, desesperadamente
insistente.
— Agora, ela implorou. — Agora, assim, não espere. Eu quero
você agora. Agora.
— Sim, Joan. Agora. Sua voz baixa soava tão firme quanto a
dela e sua respiração era irregular e curta. Ele tomou seus quadris
firmemente em suas mãos e abaixou-a.
Houve a mais breve hesitação assim que ele entrou nela, como
se ele checasse a reação de seu corpo. O prazer não morreu. Ela
sabia que não iria, mas a ternura a atravessou pelo gesto, apesar de
todas as suas advertências, ele ainda se preocupava com ela. Ela
não duvidava que ele teria parado se sentisse o velho medo.
Ela se aninhou mais baixo, absorvendo a plenitude
maravilhosa, flutuando na súbita calma de sua paixão, esta ainda
clamava pela realização plena, mas ambos esperavam, imóveis,
entrelaçados no abraço mais próximo, saboreando o que finalmente
era.
Finalmente. Sim, isso coloriu o momento. Aprofundou-o. Seu
coração absorveu a tristeza mútua que tornou esta noite mais
importante do que deveria ser. Ela sentiu sua determinação em
conhecer tudo com ela, já que não haveria outra chance.
Ele a beijou profundamente, levantou-a gentilmente e
mostrou-lhe como se mexer.
— Agora venha para mim, amor. Deixe-me sentir você se
perder nisso. Eu quero estar enterrado assim em seu corpo quando
sua paixão te libertar.
Começou devagar, um delicioso sabor de sua união, uma
junção de mais do que seus corpos e saturada de conexões tão
profundas que seu coração quase explodiu. Amor, alegria, tristeza e
arrependimento passaram por ela. Fora dela. Para ela. Seus
corações viajaram juntos, e a plenitude e fricção e construção só os
aproximaram.
O prazer ficou ansioso e exigente. Seus sentidos dispararam e
voaram para longe até restar apenas um.
Toda a sua consciência centrou-se nele em uma busca dolorida
e completa pela conclusão. Ela perdeu o controle de seu corpo, mas
ele não o fez. Ele segurou seus quadris, parando seu balanço
abandonado, forçando-a ainda, apenas quando ela pensou que não
poderia suportar o tormento da necessidade por mais tempo. E
então sua paixão exigiu mais dela. O poder de seu desejo a enviou
mais alto, lançando-a para a liberdade de que ele falou. O prazer
aumentou dolorosamente, delirantemente, e seus impulsos a
empurraram o resto do caminho. Gritando e implorando, ela agarrou
a realidade dele quando o êxtase a atravessou.
Ele se juntou a ela lá, na maior liberdade. Juntos, eles sabiam
tudo o que isso poderia ser.
Finalmente.
Ele a segurou para ele, em um mundo flutuante e feliz de
contentamento. Sua respiração saciada se derramou em seu ouvido
e seu firme abraço ligou seus corpos na glória. Ela o experimentou
muito especificamente, muito alerta. A paz encharcou seu coração
ao agradecer pelo dom de conhecê-lo.
Ela se aninhou contra ele na cama de penas onde ele
eventualmente a carregou. Eles fizeram amor no jardim, sob o
espinheiro e novamente na bancada. Ele a levou para os lugares que
importavam, para completar o que havia começado em cada um
deles, para finalmente conhecer o que havia sido compartilhado.
Ela não dormiu e nem ele. Eles não falaram, no entanto. Seu
abraço afastou o mundo que esperava. Ela estava mais grata por
isso do que ele poderia imaginar.
Ele se virou silenciosamente e afastou os lençóis que os
aqueciam na noite fria. Ele se moveu em cima dela, dobrou suas
pernas e entrou nela novamente.
Peso apoiado em seus braços, ombros e peito pairando acima
dela, ele olhou para baixo na luz bruxuleante da vela destripada. Ela
viu a expressão dele e soube que a mente dele não tinha estado
tranquila naquela última hora.
Ele falou enquanto ele lentamente estocava nela.
— Você não vai sair de madrugada. Você não vai fugir. Você
vai ficar comigo por qualquer tempo que nos resta. Eu vou lidar com
esse homem agora, e o resto será resolvido em breve.
Ele não estava fazendo um pedido. Ela estava grata por não ter
que responder. Não queria falar do amanhecer e da despedida, e de
quão profundamente o deixaria. Ela não queria pensar em quão
pouco tempo eles tinham.
Ela encorajou sua paixão para que ele não adivinhasse o que o
silêncio dela realmente significava. Ela insistiu com seu toque e
palavras para deixar o prazer obscurecer a verdade um pouco mais.
Ela se perdeu na pura liberdade e o atraiu para fazer o mesmo.
Rhys dormiu depois disso. Ela estava deitada nele, o rosto
pressionado contra o dele, engolindo a respiração. Ela encheu a
última hora com a beleza desta noite, e tirou força de seu amor. Ela
encheu seu coração, inchando-o de alegria e tristeza e gratidão e
arrependimento pungente. Ela viveu tão completamente como já
tinha. Uma vida inteira passou naquela cama de penas.
Ela sentiu quando o amanhecer se aproximou. Ela relaxou por
baixo do braço de Rhys e saboreou um longo olhar para o rosto
dele. Angústia lavou através dela, mas o medo reviveu para lhe dar
coragem.
Ela se vestiu em silêncio em suas roupas mais simples. Ela
prendeu uma touca e um véu em torno de sua cabeça na esperança
de que o tecido obscuro ajudasse, mesmo que não fosse. Ela se
virou uma última vez para a cama, e escovou o beijo mais gentil em
sua bochecha.
Afastar-se provou ser muito mais difícil do que ela jamais
imaginara. Ela teve que se arrancar da cama, e uma parte dela se
recusou a ir, se partiu de sua alma e ficou lá, para permanecer para
sempre nessa doce união.
A dor derrotou sua compostura, mas não sua força. Piscando
de volta a tristeza, abraçando o medo fortalecedor, ela se virou.
Ela o deixou, finalmente, para ir e fazer o que tinha que fazer.
Capítulo XXII
Joan podia ter estado invisível, de tão facilmente que se
moveu por Westminster. Suas visitas ao palácio com Rhys haviam
feito dela uma figura familiar o suficiente para que ela não fosse
notada.
Ela fingiu ir para os aposentos do rei, mas seguiu em uma
direção diferente quando o caminho estava livre. Segurando a cesta
perto do corpo, mantendo a cabeça abaixada, dirigiu-se ao pequeno
jardim.
O jardim de Mortimer. Seu retiro particular onde ele planejou
suas ambições e encontrou espiões e mensageiros. E pedreiros, às
vezes.
Ela espiou pelo portal. Um dossel de seda estava no centro,
para proteger o grande homem do sol quente de hoje. Flores
coloridas espalhavam-se em raios, e todos os caminhos levavam à
cadeira almofadada em que ele se sentava.
Ele ainda não estava lá. Mas ele viria. O dia estava claro e ele
procuraria esse lugar.
A beleza exuberante a perturbou. O mal deve recuar ante a
bondade abundante encontrada na natureza. Seus lugares privados
deveriam ser escuros e sombrios. Esse jardim sugeria que a alma de
Mortimer não era de todo ruim.
Por um momento, sua determinação vacilou. Ela se lembrou
das estacas. A vida e o futuro de seu irmão, e talvez o de Rhys
também. Os barões do reino poderiam ser muito fracos para
enfrentar esse homem, mas ela não ousava ser.
Ela viu uma sebe alta onde poderia se esconder e esperar. Ela
deixou o portal aberto mais amplo.
Por Mark e por Rhys. Por seu pai e Piers. Por todas as vidas
pisoteadas e esmagadas nos últimos anos. Por ela mesma.
Uma mão deslizou pelas costas dela, chocando-a. Dedos se
fecharam em seu ombro, parando-a. Ela congelou, olhando para as
flores.
Ela se esforçou para encontrar uma desculpa de por que ela
tentou entrar neste jardim. Ela agarrou a cesta com mais força,
rezando para que este guarda não olhasse para dentro.
— Você está perdida, doce senhora?
A voz transformou seu sangue em gelo. Não só porque
pertencia a Guy Leighton, mas por causa de sua perigosa
ressonância.
Ela teria preferido ser pega pelo próprio Mortimer.
Ela puxou a compostura. Ela não ousava deixá-lo ver seu
terror.
Ela se virou devagar. Guy a avaliou com desconfiança.
— Sim, ela disse, fingindo alívio.
— Eu tenho seguido você, Joan, enquanto você se esquiva.
Quem você procura? Suas pálpebras se abaixaram sobre incêndios
sinistros. — O rei?
Santos, ele suspeitou que ela tinha vindo para exigir justiça.
Ele pensou que ela procurava Edward, para derramar sua história e
implorar sua intercessão.
— O que eu iria querer com o rei? Ele apenas me acharia uma
serva, tentando reivindicar o lugar de uma mulher morta. Ela forçou
um sorriso doce. — Na verdade, eu estava procurando por você. Um
pajem me direcionou para o seu quarto, mas eu perdi o meu
caminho. Eu pensei que este jardim poderia oferecer um curto
caminho para a parte do palácio além dele.
O perigo diminuiu um pouco. Apenas o suficiente para lhe dar
esperança.
— Por que você me procurava?
— Eu pensei sobre a nossa conversa no mercado, e me
arrependi de como nos separamos. O choque de ver você me
perturbou, e eu não era eu mesma. Vim para agradecer por perdoar
minha precipitação, e por me oferecer para continuar a proteger
meu irmão. Você arrisca muito em fazê-lo, e eu queria que você
soubesse minha gratidão.
Ela ficou aquecida enquanto dizia as palavras, e rezou para que
Guy assumisse que era uma delicadeza feminina que a fez corar, e
não o desgosto interno contra o qual ela lutava.
Sua vaidade respondeu como ela esperava que fizesse.
Incêndios diferentes acenderam em seus olhos. Bile subiu para sua
garganta quando sua luxúria começou a queimar.
Ele tinha um olhar faminto, como o de um animal a olhar para
sua presa. Tão diferente do que ela havia conhecido recentemente.
Tão feio comparado com a beleza da noite passada.
Ela não pensaria nisso agora. Ela não podia aguentar. Mas a
comparação causou um toque de piedade em seu terror. Guy, por
todo seu poder, beleza e riqueza, nunca saberia o que poderia ser.
O estado de alerta para o presente não a deixara, e agora ela
olhava naqueles olhos e via mais profundamente do que no
passado. Em meio à luxúria, ela percebeu outra fome minúscula.
Triste. De repente, ela o conhecia ainda melhor do que antes.
Melhor do que ela gostaria.
Guy Leighton suspeitava do que sua alma morta lhe negava.
Ele reconheceu o vazio. Sua compreensão dele era talvez o mais
próximo que ele já chegara de uma verdadeira conexão humana. Foi
por isso que ele saboreou seu ódio e o estimulou. Era por isso que
ele a queria, e a mantinha viva, e se preocupara em tentar fazer
com que a morte de Mark parecesse um acidente.
Sua nova visão não suavizou seu coração. Piedade misturou
com o ódio e medo, mas não os acalmou.
Ele estava perdido e ela não podia salvá-lo, mesmo que o que
restasse de sua humanidade se perguntasse se ela poderia.
Seu braço deslizou ao redor dela, e ele a guiou para longe do
portal.
— Você não deveria ser vista aqui. É o lugar de Mortimer.
Venha comigo.
Ela segurou o arrepio de medo para que ele não sentisse o
tremor dela e forçou seus pés a se moverem.
Ela deixou que ele a conduzisse pelo palácio.
Por Mark, Rhys e ela mesma, ela foi com ele.
Ela não podia fazer isso. Assim que entraram na câmara de
Guy, ela percebeu. Por nada, nem mesmo para sobreviver e
terminar o trabalho deste dia.
Era uma câmara bem equipada. Mortimer valorizava o homem
que ele havia colocado nela.
Ela não conseguia olhar para ele. Memórias invadiram sua
cabeça, mas não dele. Um rosto diferente e um toque diferente e
uma paz encharcada de carinho encheram seus pensamentos e
coração.
Guy uma vez tirou dela tudo que era bom. Ele destruiu tudo o
que a fez quem ela era. Ela não podia deixá-lo fazer isso de novo.
Ela não desistiria do que reivindicara para si mesma na noite
anterior.
Ela não deixaria a liberdade ser novamente algemada por essa
vergonha adormecida, nem mesmo como um estratagema para
alcançar o grande objetivo.
Ele pegou a mão dela e a puxou para a cama ricamente
coberta. Ela cavou em seus calcanhares.
— Não. Eu não vim aqui para isso. Ainda não. Eu só queria
falar com você, e deixá-lo saber o quanto estou feliz por estarmos
juntos novamente.
Suas palavras soaram através do silêncio. Ela ouviu o pânico
nelas e se amaldiçoou por revelar isso.
Guy gostou da sua resistência. Ele sempre fez. A disputa havia
começado. Seu deleite na inevitável vitória, assegurada por seu
comando sobre a vida e a morte, o fez sorrir.
Seus dedos apertaram, como um lembrete de quão facilmente
ele poderia esmagar tudo o que ela amava.
— É claro que é por isso que você veio. Nossa barganha nunca
foi selada com palavras.
Ela soltou a mão e recuou, segurando a cesta no estômago
como um escudo.
— Tome as palavras desta vez e espere mais um dia.
Ela se atreveu a recusá-lo apenas uma vez, há muito tempo, e
pagara caro pelo insulto. Ele avançou nela com uma expressão que
dizia que ela faria isso agora de novo.
Ela se afastou, mas ele continuou vindo. Lentamente,
horrivelmente. Ela olhou freneticamente ao redor da câmara,
procurando uma maneira de se libertar, procurando a esquiva que
iria impedi-lo.
Não houve nenhuma. Ela estava presa. Encurralada. Ela evitou
sua crueldade no passado com submissão, mas ela não podia fazer
isso hoje. A feminilidade renascida nos braços de Rhys não aceitaria
tão facilmente uma nova morte.
Finalmente, não havia mais nenhum lugar para se mover. Suas
costas atingiram a parede e ele ficou a um braço de distância.
— Eu te aviso, não me toque. Não será como você pensa. Não
agora. Ainda não.
— É claro que vai, se eu comandar isso. Estou feliz que você
tenha tentado brincar comigo, doce Joan. Eu considerei esconder
minha raiva com o insulto de sua traição, mas eu não vou precisar
agora. Vai me dar um grande prazer quebrar seu orgulho
novamente, como eu fiz quando nos conhecemos.
Ele estendeu a mão para ela. Ela encolheu-se contra a parede
e enfiou a mão no cesto.
Seu aperto se fechou em seu pescoço.
Ela fechou a mão no cabo de uma faca de cozinha.

Rhys acordou abruptamente e soube imediatamente que algo


estava errado. Ele ficou imóvel com os olhos ainda fechados,
esperando que seus outros sentidos o tranquilizassem.
Sua pele detectou o vazio ao seu lado, e seu coração tomou
um ritmo lento e pesado. O cheiro do amor deles o cercou, mas
nenhum outro se intrometeu. Nenhum pão assando abaixo. Nenhum
alho-poró fritando para sopa. A casa também estava silenciosa.
Vazia. A melodia da respiração dela havia desaparecido daquela
cama.
Ele se forçou a olhar e se mover. Se levantou e vestiu algumas
roupas. Enquanto fazia isso, notou como a câmara estava vazia de
repente. Não só porque ela não estava nela. Todos os seus
pertences, todos os itens, foram removidos.
Ele desceu para a cozinha, suas botas dando passos muito
altos no silêncio. Nenhum sinal do habitual ritual da manhã esperava
por ele lá. Nenhuma cerveja ou bagunça doméstica. Não havia
aquecimento de água. Nem Joan espiando no forno. Nada.
As roupas que ela havia tirado ontem à noite haviam
desaparecido. Ele as imaginou em seus montes a seus pés, como a
espuma do mar dando origem a uma deusa. Ele a viu novamente,
tanto ousada como tímida, decidindo por ambos como seria.
Outras imagens invadiram sua cabeça. Maravilhosas, de sua
paixão livre e abandono sem fôlego. Ele sentiu seu corpo
novamente, ouviu suas palavras de amor caírem nele entre seus
gritos implorantes.
A ausência de Joan pressionou-o tão tangivelmente quanto sua
presença alguma vez fez. Ele segurou a indignação tentando tomar
o controle dele. Ele foi até o jardim e procurou na bancada e no
chão ao redor, pelas ferramentas que encontrara na noite anterior.
Eles foram embora, como tudo mais. Olhando para aquele
banco, ele finalmente aceitou a verdade disso.
Ele experimentou algumas respirações de calma absoluta e
antinatural. E então sua cabeça se partiu com ressentimento vívido.
Ela realmente fez isso. Ela fez tudo, deu tudo de si e levou
tudo dele, e depois foi embora. Ela o deixara conhecer o paraíso e
depois o empurrara de volta ao purgatório. Só ficaria pior agora, já
que ele sabia com certeza o que perdera.
Ele se lembrou da última vez deles. Ele interpretou seu abraço
como aceitação. Ele lhe dissera que ela precisava ficar e achava que
ela concordava. Cada beijo, cada toque que eles tinham
compartilhado parecia falar uma promessa de amanhã. Não para
sempre, mas pelo menos algum tempo. Mais de uma noite, droga.
Ele andava furiosamente, incapaz de manter seu corpo em
repouso. Ele queria acertar alguma coisa e ficaria feliz em rasgar a
árvore pelas raízes se isso fosse aliviar o calor em sua cabeça.
Ela estava lá fora, Deus sabia onde, fugindo e com medo. Ela
deixou seu terror de lado por algumas horas, ela havia
experimentado a liberdade, mas agora o passado a acorrentava
novamente. Ela não tinha entendido ele na noite passada quando
ele disse que ele iria lidar com o homem?
Voltou para a cozinha, imerso em emoções caóticas e
conflitantes. Raiva para ela e preocupação por ela. Amor que rasga
o coração e amargura contundente. Resignação total e determinação
ardente. Todos eles caíram juntos e se misturaram e fundiram,
levando-o a uma decisão cristalizada.
Joan não aceitaria sua ajuda, mas isso era maior do que ela.
Ela poderia não o deixar protegê-la, mas ele não era impotente para
fazê-lo de qualquer maneira. Ele não precisava da permissão dela
para terminar isso.
Ela correu de Guy Leighton, mas aquele homem estava nos
ombros de outro, e era hora de esse apoio cair. Rhys havia jurado
isso, e apenas proteger Joan o teria desviado da causa. Já que ela
havia recusado essa honra - certo, maldição - ele colocaria em
movimento o plano que Addis e Edward completariam.
Ele lavou-se e fez a barba e preparou-se para encontrar com o
grande homem. Ele ensaiou as palavras com as quais convenceria
Mortimer a deixar Westminster. Ele faria o usurpador temer por sua
segurança e, assim, torná-lo mais vulnerável.
O tempo todo que ele forçou seus pensamentos para o
assunto, imagens de Joan, da noite passada, do que ele havia
segurado brevemente e perdido com a mesma rapidez, pairavam no
fundo de sua mente.
Ele foi para fora novamente, para pegar o cavalo selado. No
limiar, ele fez uma pausa e olhou de volta para a cozinha. Ele
esperava que o riso e o cheiro dela assombrassem a casa depois que
ela partisse, mas nada dela permaneceu. Nada mesmo.
Ela levara tudo com ela. Cada item, e até o fantasma dela. Não
havia evidências que comprovassem que ela compartilhara sua vida
naquelas semanas.
Em seu medo, o corte estava completo. Corajoso e implacável.
Rhys encontrou Mortimer em seu jardim, comendo frutas sob o
dossel.
Ele aceitou as frutas oferecidas a ele e bebeu um pouco de
vinho. Ele fez Mortimer perguntar o que ele tinha descoberto, e
então deixou-o suspeitar que ele tinha algo de volta. Em resposta a
questões pontuais, a informação surgiu pouco a pouco, quase de
forma apologética. Ele fez pouco disso e falou de rumores vagos e
ouviu pedaços e fragmentos. Ele ofereceu sua própria opinião de
que tudo era muito barulho por nada.
Quando Rhys se despediu, Roger Mortimer, o conde de março,
amante da rainha e o homem mais poderoso do reino, ficou muito
preocupado. Seu espião estúpido acabara de confirmar suas próprias
suspeitas. O denso pedreiro simplesmente não compreendia o
significado do que acabara de ser relacionado.
Rhys apontou para a porta mais próxima do palácio. Uma vez
no prédio, ele considerou seu próximo passo.
Sua parte nisso estava feita. O resto seria trabalho para o rei e
seus cavaleiros. Ele nem precisou relatar essa reunião. Quando
Mortimer deixasse Westminster, Addis saberia o que fazer.
Eles não precisavam mais dele. Ninguém fazia.
O que o deixou livre para seguir seu sangue. E agora seu
sangue queria punir um homem que quase destruiu uma mulher
indefesa.
Não Mortimer. Addis estava certo, e a mão de um assassino
não deveria resolver isso. Mas em algum lugar deste palácio
esperava outro homem, antecipando o prazer doentio que vinha de
forçar os fracos a se degradarem.
Joan fugiu, mas a partida não garantiria sua segurança desta
vez.
Rhys começou a procurar por um rosto bonito e predatório. Os
fogos da justiça queimavam nele como não faziam há anos. Poderia
ser o último ato de sua vida, mas ele se certificaria de que Guy
Leighton não pudesse caçar os filhos de Marcus de Brecon.
Ele perguntou a um servo que passava onde encontrar Guy
Leighton. A mulher dirigiu-o para a câmara entregue ao convidado
de Mortimer.
Não havia garantia de que o homem estaria lá, mas ele foi
mesmo assim. Não importava onde ele o encontrasse. A privacidade
de uma câmara seria útil, mas se ele tivesse que enfrentá-lo no meio
do pátio de treinamento do palácio, ele faria isso.
Um arranhão na porta não trouxe resposta. Ele estava prestes
a procurar em outro lugar quando o som mais vago veio de dentro,
mal penetrando na madeira grossa abaixo de seus dedos.
Ele gentilmente empurrou a porta entreaberta. Respiração
pesada, marcada por minúsculos sons desesperados, chagaram até
ele.
Ele empurrou mais forte. A porta se abriu para revelar uma
cena de horror.
Sangue vermelho e fresco. Uma piscina crescente, espalhando-
se do corpo de Guy, se aproximando da cesta de Moira.
Uma mulher, olhando para baixo com os olhos desesperados e
arregalados.
Ele entrou e fechou a porta rapidamente. Joan não respondeu
ao som. Ela apenas ficou olhando para o corpo imóvel de Guy e
fechou os olhos. Seu rosto estava tão branco que parecia mais
morto que o do inimigo. Seus braços pendiam rigidamente,
afastados de seu corpo como se ela se equilibrasse precariamente.
Respirações saíam dela, carregando aqueles minúsculos
gemidos ofegantes.
Sangue manchava sua mão e seu vestido marrom.
Ela decidiu se tornar seu próprio campeão.
Ela percebeu que não estava sozinha, e virou os olhos atônitos
para ele.
E então ele viu como sua gola caía baixo em seu pescoço,
revelando marcas vermelhas em sua pele onde alguém a agarrou.
Ele teria matado o homem então, se Joan ainda não tivesse feito
isso.
— Ele está morto, ela sussurrou.
— Sim, parece que ele está. Deixe o diabo tê-lo. Para o inferno
com Guy Leighton. Nada importava, exceto salvá-la de ser
descoberta e não havia muito tempo. Ele foi até um baú de roupas,
abriu-o e jogou fora os itens até encontrar um manto.
— Você tem que sair daqui. Alguém viu você vindo?
Ela não respondeu apenas ficou olhando.
As perguntas teriam que esperar até mais tarde. Ele jogou a
capa ao redor dela para esconder o vestido manchado de sangue, e
deslizou a cesta em seu braço.
— Venha comigo agora.
Ela desviou o olhar e deixou que ele a levasse até a porta.
Agarrando-a em um abraço apertado, ele a levou através dos
compartimentos e passagens. Ele escolheu um caminho mais longo
do que o necessário para evitar as partes ocupadas do palácio. Ele
fez uma escada e um portal perto dos estábulos.
Um grupo de guardas da casa aproximou-se deles, indo em
direção aos apartamentos reais. Rhys puxou Joan para um canto e
protegeu-a com seu corpo enquanto ele pressionava um beijo em
seus lábios frios. Os guardas passaram e gritaram encorajamento
lascivo para os amantes.
Ele sentiu a vida voltar para ela com seu beijo. Seu corpo
pulsava sob o dele. O calor substituiu o frio e seu rosto pálido ficou
vermelho. Ela ficou alerta para o que ele estava fazendo e saiu do
choque.
Ele gentilmente acariciou seu pescoço.
— Ele machucou você.
— Eu não o deixaria... Não de novo. Não agora. Não depois...
Ela piscou com força. — Eu tinha uma faca. Ela está abaixo dele. Eu
cortei o braço dele, mas isso não o impediu. Então ele foi para o
lado dele, mas eu não me lembro como.
Ele a puxou do canto e a acelerou sua fuga. Um medo maior
do que ele jamais conhecera o dominava. Não por si mesmo, mas
por ela - pelo que aconteceria se ele não a afastasse antes que
algum escudeiro ou criado entrasse naquela câmara e levantasse o
grito.
— É por isso que você veio aqui? Por que você saiu?
— Eu vim aqui para matar Mortimer, não ele.
Jesus. Ele quase agradeceu a Deus que Guy a encontrou e
forçou a mão dela em uma câmara privada. Se ela tivesse atacado
Mortimer, ela já estaria morta.
— Eu deveria terminar isso agora e acabar com tudo isso, Joan
sussurrou vagamente.
— O inferno que você vai. Continue andando, mulher, ou eu
vou levar você.
Seus lábios se afinaram. Uma centelha de rebelião tentou
pegar fogo, mas morreu, e apenas um desânimo triste olhou para
ele.
— Eu não posso, de qualquer forma. Eu não tenho mais uma
arma, e agora você foi visto comigo. Eu não acho que sou corajosa o
suficiente em qualquer caso. É muito mais difícil do que eu pensava.
Seu coração foi para ela. Guy certamente merecia morrer, e ela
só se defendera. Mas, sim, foi muito mais difícil do que ela pensava.
Nos estábulos, ele chamou seu cavalo, montou e levantou-a
atrás dele. Ele mal resistiu à vontade de atravessar o pátio e o
portão. Ele mantinha o animal para passear apenas repetindo para si
mesmo que não deviam chamar atenção.
— Você ficou escondida a manhã toda? Enquanto esteve com
ele? ele perguntou, pesando o perigo dela.
— Sim.
Isso aliviou um pouco. Seu rosto não era bem conhecido no
palácio. Qualquer um que a tivesse visto com Guy poderia se
lembrar de uma mulher de baixa estatura sendo lisonjeada por um
cavaleiro.
Era possível que o criado com quem ele falara lembrasse sua
pergunta, no entanto. Ele contava com isso sendo improvável.
Servos raramente ofereciam informações em tais situações, para
que os olhos da suspeita não se voltassem para eles.
Ele não podia ter certeza de que ela estaria segura, no
entanto. Alguém que a tivesse visto com Guy poderia falar sobre
isso. Definitivamente, haveria uma pesquisa. Ele não podia arriscar
nem uma pequena chance de que ela pudesse ser acusada.
Eles finalmente saíram pelo portão. Uma vez nas ruas da
cidade, ele moveu sua montaria para um trote. Ele foi em direção a
Londres, mas não para ficar. Eles iriam pegar o irmão e depois ir
embora para sempre.
Seus braços apertaram-se confortavelmente. Sua cabeça se
acalmou contra suas costas. O resultado de sua provação estava a
derrotá-la.
— Estou tão feliz que você adivinhou, disse ela. — Estou tão
feliz que você me seguiu.
Ele pressionou as mãos sobrepostas contra o estômago. Ele
não disse a ela que não a seguira, que havia assumido que ela já
havia partido da cidade. Tampouco disse que não a havia seguido
até os aposentos de Guy, mas fora para lá por conta própria, por
seus próprios motivos.
Ele nunca precisaria explicar isso. Uma vez que o choque
passasse, ela descobriria essa parte por si mesma.
Newgate acenou à frente. Ele normalmente via isso como um
portal para a liberdade e a entrada para um santuário. Mas agora as
muralhas de Londres poderiam ser perigosas e confinantes.
Era hora de encontrar segurança em outro lugar.
Capítulo XXIII
Ela o deixou cuidar dela. Ela parecia aceitar que eles estavam
juntos agora.
Ele a deixou para arrumar a carroça enquanto ia pegar Mark. O
encontrou vagando pela loja onde David servia como aprendiz. O
mestre não estava à vista e Rhys estava contente por isso.
Mark reagiu com desconfiança.
— Ela disse que viria.
— Ela me enviou em vez disso.
— Eu acho que eu deveria esperar por ela.
— Você virá agora. Se isso significa amarrá-lo e arrastá-lo, eu o
farei.
— Como eu sei que você pode ser confiável, e que você veio
por ordem dela e não de outra pessoa?
— Você sabe. Mais ao ponto, eu sei. Tudo isso. Ele se virou
para David. — Se alguém vier perguntar, ele não esteve aqui. Você
não o viu em dois dias. Diga ao seu mestre e aos outros que eu
disse para todos vocês reivindicarem isso.
Mark seguiu Rhys para fora da loja.
— Você diz que sabe tudo. O que isso significa?
— Eu sei quem você é. Eu sei que Guy Leighton deixou
Mortimer pensar que o herdeiro de Brecon havia perecido em um
rio. Eu sei que Guy soube que você está vivo e veio atrás de você.
Sua irmã não me disse isso, mas eu sei de qualquer maneira.
— Ela realmente te enviou? Acabou? Ela encontrou um jeito de
terminar?
— Ela certamente fez isso.
— Ela foi ao rei?
— Não, ela foi para Guy.
Mark cuspiu uma maldição.
— Então ela não terminou nada. Eu deveria ter adivinhado o
que ela pretendia fazer. Eu disse a ela que não iria suportar isso,
que eu iria nos ver mortos antes que ela concordasse com isso de
novo. Ele andou furiosamente. — Se ela acha que isso vai me
impedir, ela está errada.
Rhys agarrou Mark e empurrou-o contra um prédio.
— Impedir você de quê?
— De ser um homem. De agir como o filho do meu pai, em vez
de um bastardo covarde.
— Você disse a ela que planejou desafiar Guy Leighton? É por
isso que você e ela não saíram ontem à noite?
— Eu disse que morreria com honra, não como uma lebre
correndo para o chão. Eu disse a ela que não vamos mais nos
esconder.
— Bem, você vai se esconder agora, garoto. Você vai fazer o
que for necessário para salvar sua irmã. Ela não foi a Guy para
negociar. Ela matou o homem, e eu serei amaldiçoado se eu deixar
sua presunção interferir em afastá-la daqui.
— Ela o matou?
— Foi para se defender, mas está feito do mesmo jeito.
— Eu disse a ela que lidaria com ele!
— Como eu fiz, mas ela tratou disso sozinha. Se eu posso
deixar de lado o meu orgulho, você também pode. Agora, se mova,
e se você disser uma palavra para censurá-la, se eu vejo alguma
crítica em seus olhos, eu vou tratá-lo como o homem que você diz
ser e fazer você desejar que você nunca tivesse nascido.
Rhys agarrou Mark pela nuca e empurrou-o para a frente pela
ruela.
Joan tinha terminado de arrumar a carroça quando eles
voltaram. Ela saiu da cozinha assim que eles entraram no jardim já
com o vestido trocado.
Ela enfrentou seu irmão com cautela, esperando por sua raiva.
Rhys viu emoções muito diferentes assombrarem os olhos escuros
do jovem. Alívio que ela estava viva e inteira. A preocupação de que
ela pudesse ser caçada agora porque sua própria arrogância forçara
sua mão. Outra coisa também sombreava sua expressão. Culpa.
Uma culpa terrível que se infeccionou durante três anos.
Rhys colocou a mão no ombro de Mark.
— Não se culpe por nada que tenha acontecido, ou que você
fosse jovem demais para protegê-la. Não se sinta envergonhado
com os sacrifícios que ela fez para mantê-lo vivo.
Os olhos de Mark enevoaram-se. Rhys apertou seu ombro.
— Vá até ela. Vou me certificar de que tudo esteja pronto.
Marcos foi até a irmã e abraçou-a. Rhys voltou ao beco e
esperou. Ele não podia vê-los através do portal, mas seu olhar caiu
sobre a santa esculpida sob sua tela.
Eventualmente alguém da ala viria, curioso sobre sua ausência,
e seria encontrada. Ela seria levada para a igreja e estabelecida em
seu devido lugar. Úrsula serviria ao dever para o qual fora criada.
Outros cuidariam disso.
Joan apareceu e caminhou em direção a ele com Mark ao seu
lado. Como a nobre santa cuja forma ela bloqueou a visão, ela
escolheu o martírio em nome de uma grande causa. Ela tinha ido a
Westminster para salvar a vida de seu irmão novamente, sabendo
que, se matasse Mortimer, certamente também morreria.
Havia escolhido o curso antes de vir a ele na noite anterior.
Tinha estado em seu coração o tempo todo.
Pensar em seu relógio secreto da morte fez sua garganta
apertar. Seu orgulho queria encontrar alguma raiva em sua
decepção, mas nenhuma surgiu. Tudo o que importava era que ela
havia escolhido passar suas últimas horas em seus braços.
Mark carregou uma espada velha que ele enfiou na carroça
sem explicação.
— Eu arrumei o arco e a adaga. Também enrolei a maior parte
de seus pergaminhos, disse Joan. — Eles estão envoltos naquele
cobertor lá.
Ele não havia pensado nos pergaminhos, nem em nada além
da segurança dela.
— Nós já deveríamos ter ido embora. Entre na parte de trás
com seu irmão. Tente descansar um pouco.
Ela andou a passos largos até a frente da carroça.
— Não, eu vou sentar aqui.
Ele subiu ao lado dela e tomou as rédeas. Sua mão pousou em
sua coxa, e de seu aperto ele poderia dizer que ela entendia o
perigo deles. Mas o gesto falava de confiança. E de unidade, por um
pouco mais de tempo, pelo menos.

O coração de Joan saltava toda vez que um cavaleiro os


alcançava, e não se acalmava novamente até os cascos passarem.
Ela disse a si mesma que ninguém sabia procurá-la, que ninguém a
seguiria, mas ela experimentou o medo da caça da mesma forma.
Ela manteve a mão em Rhys. Ela precisava sentir sua solidez.
Sua presença a acalmou e aumentou sua preocupação. Ele
protegeria ela e Mark, mas se o pior acontecesse e eles fossem
levados, ele agora compartilharia seu destino.
Ela precisava tocá-lo por outras razões. O calor sob sua mão a
fez lembrar que ela estava viva.
A surpresa disso agitou seu sangue de formas poderosas.
Houve uma euforia em receber um alívio depois de esperar o fim.
Ela se divertiu, mesmo enquanto ouvia os sons da perseguição.
A sensação dele também manteve as emoções mais sombrias à
distância. Não apenas o medo. Não só a culpa de ter falhado em seu
objetivo, e de colocá-los todos em um perigo pior do que antes.
Profundamente dentro de seu coração, ela lentamente chegou a um
acordo com o que ela tinha feito. A imagem de Guy caindo, e de
seus olhos atônitos se fechando, ameaçava assombrá-la.
Ela se agarrou um pouco mais forte e se encostou nele.
— Eu quero fazer amor.
— Você acha que pode esperar até pararmos para a noite? É
possível aqui em cima, enquanto eu seguro as rédeas, mas os
viajantes que passam podem achar isso muito obsceno, e então há o
seu irmão...
Seu humor quieto quase fez as coisas parecerem normais
novamente.
— Sim, pode esperar. Mas esse dia me fez precisar de você de
maneiras que não posso explicar. Ela descansou a cabeça no ombro
dele. — Você pode encontrar em seu coração algum conforto para
dar a filha de Brecon? Você pode abraçar uma mulher que matou
um homem?
Rhys tomou as rédeas em uma mão e moveu o braço para
cercá-la.
— Estou honrado em fazer isso. Eu só esperava o sinal de
como você não planejava lidar com isso, para que você decidisse
como seria entre nós, desde que você pretendia que a noite passada
fosse tanto um começo e um fim.
— Estou além das decisões agora. Não posso pensar no
amanhã, muito menos em tais noções como princípios e fins. Quanto
a como será entre nós, só sei o que preciso agora, e isso é me
perder em você, e esquecer todo o resto.
— Então eu vou me certificar de que você faça. Nós dois
esqueceremos enquanto pudermos, e depois nos lembremos quando
devemos.
O sol se movia devagar demais. A estrada continuava subindo
para encontrá-los. Ela se aninhou ao lado dele, agarrando-se de
corpo e alma ao consolo que ele lhe dava. Finalmente, na última luz
do dia, ele conduziu a carroça para algumas árvores afastadas da
estrada.
Com a espada na mão, Mark foi explorar os arredores
enquanto Rhys tirava os cobertores e Joan encontrava um pouco de
queijo e pão. Eles não começaram um fogo, apenas fizeram um
acampamento grosseiro entre as agulhas de pinheiro que estavam
no chão.
Mark retornou para informar que havia um lago próximo, onde
as árvores encontravam um campo. Ele finalmente largou a arma e
levou um balde para pegar um pouco de água. Quando ele voltou,
sentou-se para comer sua refeição simples, com a espada
novamente ao seu lado.
— Onde estamos indo? ele perguntou a Rhys.
— Oeste. Para Barrowburgh, a propriedade de Addis de
Valence.
— É mais seguro ir a Lancaster, se vamos nos apresentar como
filhos de nosso pai.
— Addis lhe dará santuário. Ele não é amigo de Mortimer, e ele
pode ser confiável. Lancaster pode usar você como peões, e
abandoná-lo se isso se adequar à sua estratégia do momento. Se
Addis os aceitar, ele lutará uma guerra antes de permitir que algum
mal chegue a vocês.
— E se ele não nos aceitar?
— Ele vai. Eu conheço o homem. Você terá que confiar no meu
julgamento sobre isso.
— Então vivemos em Barrowburgh até Mortimer envelhecer e
morrer? Até um castelo pode ser uma prisão.
Rhys afastou as mãos e puxou Joan para o círculo de seus
braços.
— Não vai demorar tanto. De um jeito ou de outro, isso vai
acabar logo.
Ele parecia muito certo disso. Ela saboreou seu abraço, e seu
corpo começou a antecipar mais, mas suas palavras lançaram uma
mortalha sobre a paz que ele ofereceu. Ela não conseguia pensar no
amanhã, mas ele sabia, e parecia que ele não esperava que
houvesse muitos amanhãs para compartilhar.
Ela se virou em seu corpo e deixou que seu calor destruísse a
sombra que suas garantias haviam criado.
Mark olhou para eles e levantou-se exasperado.
— Inferno, eu não vou ficar aqui se vocês dois vão... Ele pegou
um cobertor e sua espada. — Eu vou dormir perto da estrada. Se
alguém vier, eu vou levantar o choro. Tentem notar.
Seu movimento através das árvores mal cessou antes que Rhys
a deitasse. Eles se uniram, quentes e impacientes, numa paixão que
fez o perigo do dia desaparecer. Nada existia para Joan, apenas seu
gosto e toque, e sua excitação exultante a fez lembrar o que
significava estar completamente viva.
Rhys tentou retardar as coisas. Ele começou a tirar o vestido
dela, mas ela não podia esperar por isso.
— Não. Entre em mim. Isso é tudo que eu quero desta vez. Eu
estive pensando em pouco mais durante esta jornada.
Ele se aproximou dela e encheu seus braços, seu corpo e seu
coração. Ela gemeu de alívio e deixou a plenitude obscurecer todo o
resto. Seu beijo a fez esquecer os horrores deste dia e os perigos do
próximo. Seu toque a deixou se esconder de pensamentos sobre os
poucos amanhãs atribuídos a eles. Sua presença tornou-se seu
mundo inteiro, e bloqueou sua contemplação do irmão em vigília
pela estrada, e o futuro que ele simbolizava.
Ela chegou ao clímax antes dele e ficou feliz por isso. Ela
adorava estar alerta para o poder de seu próprio fim, e saboreava o
modo como o desejo de construir o fazia se mover nela. Ele falou o
nome dela baixo, mas claramente quando o prazer atingiu o pico. A
ternura naquela única enunciação penetrou em sua alma. Ela nunca
esqueceria seu som.
Ela segurou seu peso para ela depois, olhando para as copas
das árvores apontando contra o céu iluminado pela lua. O rico
aroma de pinheiro flutuava ao redor deles na brisa fresca, e sua
respiração calmante brincava em seu ouvido. Ela embalou seus
quadris entre suas coxas, fazendo a unidade durar, fazendo
memórias da beleza da noite e da pura alegria de segurá-lo.
Ele aliviou seu peso dela e rolou de costas puxando-a para ele.
— Você está com raiva sobre a noite passada? Que eu não lhe
contei? Era fácil perguntar a ele. Não havia nada sobre ele que ela
temesse.
— Não. Eu deveria ter adivinhado, no entanto. Eu deveria ter
sabido que você seria ousada o suficiente para tentar.
— Ainda...
— Eu teria preferido se você tivesse me deixado cuidar de
você, eu não vou mentir sobre isso. Você sabia que eu faria o que
fosse preciso para protegê-la. Eu te disse isso. Mas eu não posso me
ressentir que você veio para mim, mesmo sabendo o que você
planejou fazer. Você me honrou ontem à noite.
Ela se aconchegou mais perto. Ela poderia dizer-lhe qualquer
coisa. Essa era a melhor parte de sua intimidade.
— Eu falhei. Com Mortimer.
— Agradeço a Deus por isso, porque significa que você está
viva. Perdoe-me, mas é assim que me sinto.
— Agradeço a Deus por ter feito isso também. Acho que teria,
de qualquer forma. Não acho que teria sido corajosa o suficiente
para fazê-lo.
— Você não é nada se não for corajosa, Joan. Mas se um
homem teve que morrer, melhor que seja Guy Leighton. É o destino
de outro fazer Mortimer cair.
A menção de Guy trouxe de volta a imagem de sua morte.
— Eu não gosto do que fiz hoje, ela sussurrou. — Mesmo por
auto defesa, eu não gosto disso. Eu não gosto de mim mesma por
ter feito isso.
Ele a beijou, depois se sentou e estendeu a mão.
— Vamos para a lagoa. Eu acho que você deve lavar todo o dia
fora de você e fora de sua mente.
— Como uma purificação?
— Sim. Mas também me dará a chance de te ver nua neste
luar.
Despojados de suas roupas, eles correram de mãos dadas até
a borda mais distante da floresta onde a lagoa brilhava na noite.
Eles deslizaram pelo banco úmido e se sentaram para deixar o fluxo
purificá-los. De frente um para o outro, brincaram com a água e um
com o outro, fazendo brincadeiras e beijando-se.
Seu humor se iluminou quando seu medo e culpa foram
embora. Não foi a água que a purificou e ajudou-a a recuperar
alguma inocência. Foi Rhys. Sempre foi.
Ele levantou um punhado de água e deixou pingar sobre seus
ombros e seios, se inclinou para frente e lambeu os riachos. Ela
acariciou a cabeça curvando-se para sacudi-la de prazer.
— Você está amarrado ao meu perigo agora. Eu queria evitar
isso.
— Estou amarrado a você. O perigo é uma pequena parte dele,
e um que vamos derrotar.
— Eu acho que sempre vou me arrepender de não te dar mais,
mais cedo.
— Eu não quero seus arrependimentos. Não esta noite, ou
amanhã. Eles são apenas mais cadeias. Você carrega o suficiente.
Eu quero que você esqueça deles por enquanto, para que possamos
ser livres juntos por tanto tempo quanto possível
Sua língua circulou baixo para pegar uma gota em seu mamilo.
Ela o apertou mais perto.
— Eu tenho uma nova cadeia que eu nunca vou esquecer ou
me arrepender. Eu sempre estarei ligada a você. Eu nunca estarei
livre disso.
Ele se afastou, para poder ver o rosto dela.
— Então isso vai lhe trazer infelicidade.
— Você nunca pode me trazer infelicidade. Essa corrente me
dá alegria. Eu a uso com orgulho. Seu peso vai me lembrar que eu
conheço o melhor amor, não importa a vida que eu viva.
— Você tem certeza? Eu não quero que isso torne o seu dever
mais difícil para você.
— Eu tenho mais certeza. Ela levantou a mão, com a palma
voltada para ele. — Eu vou jurar. Não, eu vou fazer uma promessa
para provar isso.
Rhys ficou muito quieto.
— Você não pode fazer isso. Você sabe disso, e eu também.
— Estamos livres esta noite. Nus como o dia em que nascemos
e tão afastados das preocupações do mundo como Adão e Eva. O
vínculo existe, não importa o que o futuro nos reserva. Você não
quer colocar em palavras? Você espera me esquecer ainda, como
você pretendia ontem à noite?
— Eu nunca vou esquecer. Eu vou viver desse amor toda a
minha vida. Então lá estava, a admissão de amor deles. Ele disse
isso com tanta calma. Ela se perguntou se ele sempre soubera o que
isso poderia ser.
Ele colocou a palma da mão contra a dela e inclinou os dedos
entre os dela.
— Então vamos fazer nossos próprios votos, Joan. Honestos e
verdadeiros, para que ambos possamos lembrar as palavras à
medida que envelhecemos.
Seu calor fluiu para ela através da conexão. Ela podia sentir
sua força vital como um pulso.
— Você é o marido do meu coração e o amor da minha vida.
Onde quer que eu esteja, faça o que fizer, você está comigo e eu
com você. A parte de mim que importa viverá com você para
sempre. Eu aceito a corrente que nos liga com alegria, porque nesta
unidade eu conheci a mais pura liberdade.
Rhys colocou a outra mão contra o rosto dela.
— E você é a esposa do meu coração e o amor da minha vida.
Nos aspectos que importam, estamos unidos para sempre e
viveremos juntos até a morte. Eu prometo minha vida para protegê-
la e sempre responderei ao seu chamado. Eu aceito esta corrente
com alegria, porque em nossa unidade finalmente conheci a
liberdade pura.
Ele selou seus votos com um beijo suave, tão terno e amoroso
que seu coração encheu seu peito. Ele a pegou em seus braços e
levantou-a da água.
— Você está ficando gelada. Venha e deite nessa pedra para
que eu possa ver toda você neste Éden.
A baixa rocha plana ainda mantinha o calor do sol, como se a
natureza tivesse providenciado uma cama confortável para eles. Eles
se esparramavam sob as estrelas e a lua, desfrutando de sua união
no mundo intemporal que apenas uma noite silenciosa poderia criar.
Ele correu as pontas dos dedos sobre o corpo dela, como se
atraísse as lembranças de sua forma em sua mente. Suas leves
caricias ao mesmo tempo confortantes e excitantes, misturava-se
deliciosamente com a brisa que secava sua pele e o calor que subia
da pedra.
Aquele toque sinuoso a levava ao delírio antes que ele a
beijasse. A paixão não era desesperada desta vez, mas lenta e cheia
de alma e imbuída das emoções de seus votos.
Ele usou as mãos e a boca para levá-la a uma sensualidade
requintada. Ele escorregou da rocha e a acomodou na beira do leito
de casamento de pedra. Ele abriu as pernas e se inclinou para beijar
e saborear a essência de sua feminilidade. Sua consciência subiu
para as estrelas.
Ele gentilmente virou-a para que ela abraçasse o calor da
rocha e suas pernas se alinhavam ao seu lado. Ele ergueu os quadris
dela e entrou nela, e a segurou firmemente com suas mãos fortes e
ásperas enquanto seus impulsos os uniam em uma longa e bela
consumação.

— Ele não vai acreditar em nós. Ele vai pensar que somos
impostores.
Mark soltou as palavras assim que viu Barrowburgh. Eles
pararam na extremidade dos campos que cercavam a cidade e o
castelo.
As paredes maciças que se erguiam à distância apresentavam
uma visão formidável. Rhys podia entender como eles poderiam
intimidar os jovens que viveram na pobreza por três anos. Joan
parecia um pouco preocupada também.
Rhys agarrou as rédeas e dirigiu-se ao portão da cidade.
— Ele acreditará em você. Vestimentas humildes não fazem o
homem se olhos espertos estão buscando a verdade. Addis saberá
que você não é impostor.
Na verdade, ele estava contando com Moira acreditando e
convencendo Addis.
Os portões da cidade estavam abertos, mas os do castelo não.
Addis não estava dando nenhuma chance para que Mortimer
pudesse enviar espiões.
Demorou algum tempo para o guarda do portão receber
permissão para deixá-los passar. Quando finalmente rolaram a
carroça para o pátio interno, o Lorde e a Senhora de Barrowburgh
estavam esperando.
Moira correu para cumprimentá-los. Ela agia como se a sua
chegada súbita, poucos dias depois dela, não fosse nada incomum.
Addis foi mais direto. Ele andou de um lado para o outro da
carroça, olhando seu conteúdo. Ele terminou sua inspeção dando a
Joan um longo exame considerado. Então ele virou o rosto marcado
para Mark, que conseguiu não se encolher, por pouco.
— Sua partida de Londres foi súbita, pedreiro. Confio que você
não estava fugindo para salvar sua vida.
Rhys sorriu ao ouvir suas próprias palavras faladas de volta
para ele.
— Na verdade, nós estávamos.
Isso parou as amabilidades que Moira e Joan estavam
trocando. O senhor da mansão levantou uma sobrancelha.
Era hora de explicar. Rhys cutucou Mark e Joan para frente.
— Eu apresento a vocês os filhos de Marcus de Brecon. Eles
vieram pedir para você estender sua proteção para eles.

— Há quanto tempo você sabe?


Addis esperara até que Rhys lhe contasse sobre a visita a
Mortimer e a descoberta de Joan com Guy Leighton, para fazer suas
perguntas. Estavam sozinhos no solar do lorde, com a antiga espada
de Barrowburgh quase enchendo a parede acima da cabeça de
Addis. Addis poderia morar em uma pousada pública enquanto
estivesse em Londres, mas aqui em sua propriedade seu poder e
riqueza eram visíveis em todos os lugares.
— Eu adivinhei quando você me contou a história deles.
— Então você se apaixonou antes de você saber. Perdoe-me,
mas Moira diz que é assim entre você e Joan, e ela raramente está
errada.
— Sim, ela raramente está errada.
Addis estendeu a mão para derramar mais vinho na xícara que
Rhys segurava.
— Sinto muito pela sua decepção.
Essa simples declaração dizia tudo. O lorde de Barrowburgh
imaginou que Rhys estava esperando por um futuro que seria
impossível agora. Este barão pode ter casado com uma mulher
nascida de servos, mas a filha de um barão não tinha escolha nessas
coisas. Desobedecer a seus parentes para se casar abaixo de sua
posição significaria ser separado de sua família, de sua vida e de seu
passado.
Isso já aconteceu com Joan uma vez. Rhys não deixaria isso
acontecer novamente. Nem ela.
— O menino tem os olhos de seu pai. Conheci de Brecon há
muito tempo, quando era escudeiro. Joan deve parecer com sua
mãe, que nunca vi. Moira suspeitou de algo, embora não fosse isso.
Ela mencionou que achava que Joan guardava algum segredo que
ela temia revelar. Confesso que me distraí com outras coisas e não
prestei muita atenção.
— Você estenderá sua proteção?
— Eu irei. Esperançosamente, não será por muito tempo. Eu
sei o que é ser roubado da casa de alguém. O menino não
conhecerá paz até que isso seja vingado.
— E se Joan for acusada da morte de Guy Leighton?
— Se é sabido que ela estava lá, vamos chamá-lo do que era.
Uma mulher defendendo sua virtude. Eu duvido que Mortimer venha
a Barrowburgh para exigir que eu a entregue. Não depois de tê-lo
deixado tão preocupado quanto você deixou. Vou mandar um
mensageiro para Edward amanhã, para que ele saiba o que você
disse a Mortimer, e que você está aqui comigo. Acho que você deve
ficar até vermos como o vento está soprando.
Sons metálicos fracos começaram em algum lugar lá fora.
Addis levantou-se e caminhou até uma janela. Rhys se juntou a ele.
Em um pátio de treinamento abaixo, um jovem de cabelos
loiros aparecia com um cavaleiro careca. Addis entregou Mark a seu
mordomo depois de descobrir sua história e depois de ouvir seu
pedido para ser treinado em armas.
— Ele mostra força e a promessa de habilidade. Ele terá que
trabalhar duro para compensar os anos perdidos, no entanto. Ainda
assim, eu acho que ele tem os ingredientes de um excelente
guerreiro. Quando ele receber a sua casa de volta, ele estará capaz
de protege-la.
— Ele tem o coração para isso e a vontade.
Addis olhou por cima. A compreensão calma de um amigo
apareceu em seus olhos.
— Foi boa sorte terem te conhecido, mas talvez não tenha sido
a sua conhecê-los.
Rhys observou Mark brandir sua arma e percebeu que não era
apenas Joan que se importaria de perder.
A partida de Mark de sua vida criaria um vazio. Ele sentiria
falta do menino.
— A fortuna sorriu para mim naquele dia no mercado quando
os conheci. Ele se virou para ir e encontrar Joan. — Diga ao seu
mordomo para trabalhar com ele até que ele caia. Faça dele o
melhor guerreiro da Inglaterra.
— Para que ele possa protegê-la?
— Sim. E a ele mesmo.
Capítulo XXIV
― Você está contente aqui?
Joan se virou ao som da voz de seu irmão. Ele se aproximou
dela ao longo da parede. Ele ainda usava a túnica acolchoada que se
encaixa sob a armadura. Seu cabelo escorria com a água com que
ele se lavou depois de horas de treinamento com espada.
— Contente o suficiente. Não tanto quanto você, já que você
passa os dias praticando em armas. Eu estou ociosa demais em
comparação, e isso me deixa inquieta.
Ela baixou o olhar para o telhado da capela do castelo. Rhys
estava lá, fazendo bordas de hera nos pilares do cruzamento. Era
um presente para Moira. Ele havia encontrado uma maneira de
evitar a ociosidade pelo menos.
— Você passou três anos trabalhando como uma serva. Você
não está acostumada a ser tratada como uma dama, isso é tudo.
Temos nossos lugares de volta, irmã, e eu juro por Deus que parece
glorioso.
Sentia-se glorioso, como se um mundo de cabeça para baixo
tivesse sido ajustado de novo. Mas também parecia estranho e
sonhador e um pouco distante, como se ela andasse através da
neblina invisível. Ela vivia nessa fortaleza, no luxo que uma vez
conhecera como seu por direito, mas uma parte dela via tudo com
os olhos de outra mulher. Os olhos de Joan ladrilhadora.
— Não são os nossos verdadeiros lugares. Apenas uma das
nossas pernas está de volta nesse mundo, e apenas pela
generosidade de Sir Addis. Pode levar muito tempo até que
estejamos completamente de pé, por conta própria, e não apoiados.
Quanto a ser tratada como uma dama, às vezes me deixa
desconfortável. Eu não havia notado a deferência quando era mais
jovem. Fazia parte do tecido sem costura do meu mundo. Agora eu
vejo pelo que é.
— É o que é devido a você, como convidada do senhor.
— Os criados não dão a Rhys as mesmas cortesias, mesmo que
o tratem como um hóspede também. De maneiras sutis eles fazem
distinções, e isso me irrita.
— Eu duvido que isso o irrita. Ele conhece o seu lugar, como
você deve se lembrar do seu. Ele é um artesão, e é raro o suficiente
que se sente à mesa alta de um lorde. Ele não espera que o povo do
castelo pense que isso o torna mais do que ele é.
Ela engoliu o desejo de repreendê-lo pela maneira como ele
falou de Rhys. Ele só deu voz à verdade. Se ela achava a verdade
irritante e triste, não era culpa do seu irmão.
Ela olhou por cima dos campos.
— Eu também tinha me esquecido disso. Como é diferente das
grandes cidades. O que se sentia ao estar em um muro alto e ver
milhas do mundo espalhadas ao seu redor, até que a terra encontre
o céu à distância. Quando vim aqui no dia seguinte à nossa
chegada, foi a visão que me fez acreditar que realmente acontecera,
mais do que as boas-vindas e a promessa de segurança. Por um
momento eu estava de volta em casa e era uma garota novamente.
— Você realmente estará de volta em casa um dia. Assim que
eu puder fazer isso acontecer.
— Não apresse seu treinamento por mim. Guy está morto, mas
outro vai tomar o seu lugar. Aproveite o tempo para se preparar
bem. Como eu disse, estou contente o suficiente aqui.
— Muito contente, talvez.
Seu tom a fez se afastar da imagem impressionante do mundo
circulando. Ele tinha o rosto de um homem agora. Ele usava os
olhos e o cenho de alguém muito mais velho que seus anos.
— Muito contente? Como assim, Mark?
Ele se endireitou, a imagem de um irmão forçado a exercer sua
autoridade. A semana aqui só alimentara seu senso de
prerrogativas. Todos o tratavam como o chefe da família.
— Muito contente porque seu pedreiro está com você. Ele
deveria ir embora.
— Moira pediu para ele ficar.
— Você tem que acabar com isso.
— Isso vai acabar em breve. Cedo demais.
— Eu esperava que, uma vez que você estivesse longe de
Londres e daquela casa, você visse a futilidade disso. Ele faz, se
você não. Você pode ter apenas uma perna de volta em sua antiga
vida, mas ele não pode andar ao seu lado mais longe. — Sua boca
afinou, como se ele estivesse preparado para uma tarefa
desagradável. Eu quero que você pare de visitar sua cama.
— Ainda não. Não agora.
— Sim, agora, irmã. Vou deixar claro. Eu não peço isso. Exijo
isso.
— E eu desafio a demanda. Estou plenamente ciente do meu
dever para com você e nossa família. Eu sei o que me aguarda. Mas
me foi dado algo que não vou deixar de lado até que eu precise.
— Inferno, Joan, todo o castelo sabe que você se deita com
um artesão todas as noites.
— Eu não deito com um artesão, embora ele seja tão
habilidoso que eu ficaria honrada em fazê-lo. Eu deito com um
homem. O homem que salvou minha vida.
— Sou grato a ele. Não pense que eu não sou. Quando estiver
em meu poder, mostrarei. Eu lhe darei terra ou moeda ou qualquer
riqueza que ele queira. Mas eu não lhe darei você.
— Nem ele vai pedir para você. Como eu, ele sabe que nós
desfrutamos de um breve alívio. Ele entende você e eu e os outros
como nós muito bem. Ele nem se ressente do lugar que nós damos
a ele, porque sua mente e coração não são aprisionados pelas
noções do mundo de tais coisas. Quando ele precisar, ele irá
embora. Mas eu lhe digo agora, irmão, que sempre que você falar
comigo sobre ele, é melhor fazê-lo com respeito. Nenhum de nós irá
encontrar essas qualidades novamente, e haverá momentos quando
você for o senhor de Brecon que amaldiçoara por não ter homens
tão verdadeiros quanto Rhys ao seu lado.
— Eu não disse que ele não é um bom homem, ele o é
verdadeiramente. Eu disse que minha irmã não pode ser sua
amante.
— Castigue-me se quiser, mas a menos que você exija que
Addis me tranque, eu vou viver com Rhys enquanto eu puder. No
entanto, antes de fazer tal pedido, lembre-se de com quem o senhor
dessa fortaleza se casou.
— Isso foi diferente, e mesmo assim seus próprios funcionários
acham que ele está meio louco por causa disso.
— Sim, foi diferente. Eu acho que você é jovem demais para
perceber quão maravilhosamente diferente foi.
— Eu não sou tão jovem. Velho o suficiente para saber dos
riscos que você corre. Temo que você vai ficar grávida. Devo dizer-
lhe que, se você fizer isso, não mudará nada. Você é minha para
dar...
— Eu sou minha para dar, e enquanto eu puder, eu me
entrego a ele. Se eu parir um bastardo, ele vai pegar a criança, e
criá-lo mais forte e mais livre do que eu jamais poderia. Eu não vou
te negar o seu direito de dar minha mão, em qualquer aliança que
requeira a honra de nossa família, mas meu coração rejeita tais
correntes mundanas e usa outra de minha própria escolha.
— Você está meio louca mesmo. Se condena à infelicidade com
essas noções e me condena a ser o agente de sua miséria.
— Ah, Mark, você é tão ignorante. Quando eu quebrar isso,
não vou realmente desistir das coisas importantes. Não começou
quando fizemos amor. Não vai acabar quando pararmos. Ela voltou
para o horizonte. — Vá e prepare-se. Aprenda o que deve fazer para
tornar nossa velha vida inteira de novo. Mas até que essas vidas ou
suas lágrimas nos separem, vou pegar o que puder e dar o que
escolhi dar.
Joan disse a Mark que estava contente, mas na verdade ela
não estava. Ela e Rhys viveram seu amor sob uma espada
pendurada, sabendo que ela um dia iria cair e cortá-los para
sempre.
Isso tornou seu tempo agridoce, e o abraço noturno
dolorosamente pungente. Até mesmo o prazer foi obscurecido pela
antecipação da perda. Ela não podia mais encontrar abandono. Ela
não podia se perder no presente agora que o futuro a rodeava.
Demasiadas vezes, quando ela estava em seus braços, uma
melancolia sentimental a dominava.
Seu mundo inteiro parecia compartilhar a antecipação pesada.
Havia um clima na casa que ela não sabia nomear. Uma expectativa
palpável encheu o ar. Era como se todos esperassem por algo.
Lembrou-a daqueles dias após a abdicação, quando seu pai, Piers e
os cavaleiros sempre pareciam estar ouvindo os sons de um
exército.
No começo, ela assumiu que era a preocupação dela que
causou isso. Mesmo quando os dias passaram e nenhum cavaleiro
seguiu de Westminster em busca da ladrilhadora vista com Guy
Leighton naquele dia, o clima ainda persistia. Ela disse a si mesma
que imaginava, e que sua própria espera conflitante, sua própria
impaciência para terminar o que começara e suas próprias orações
de que o tempo ficasse parado para ela e Rhys, era a fonte disso.
Mas vinha dos outros também. A espera encobriu Addis e até Moira.
Então um dia desapareceu de repente. Um novo humor se
espalhou na casa. Um zumbido silencioso de excitação encheu o ar.
Mark chegou no final da noite para lhe dizer que a espera
havia acabado e que Addis, o rei e alguns outros planejavam
prender Mortimer no castelo de Nottingham, onde a rainha Isabella
havia mudado a comitiva.
— Isabella e Mortimer convocaram Edward para Nottingham
como se ele fosse algum servo. Eles querem que ele explique os
rumores de que eles ouviram que ele trama contra eles. Eu digo que
é malditamente ousado da parte deles. Ele é o rei, não Mortimer.
Então ele irá, mas mais cedo do que eles esperam, e ele vai liquidar
os dois.
Ele andava de excitação, contando a história.
— Eu também devo ir. Não ao castelo, mas para Nottingham.
Vou servir como um dos escudeiros de Sir Addis e estar por perto
para que ele possa me apresentar ao Rei quando terminar.
— Parece muito arriscado. Apenas alguns homens, você diz.
Eles estarão muito vulneráveis.
— É brilhante. Será glorioso.
— Será um banho de sangue. Eles estarão em terrível
desvantagem dentro daquelas paredes. Mortimer ordenará à guarda
dele para cortá-los em pedaços. Com Edward morto, ele fará os
barões declararem a Rainha como monarca oficial, e continuar como
ele tem feito.
— Você não entende de guerra.
— Você não descreve uma guerra. Você fala de um bando de
ladrões que roubam uma casa.
Joan passeava ao redor de seu quarto, imaginando que esse
esquema ousado iria facilmente dar errado, agitado por uma
excitação desagradável.
— E se eles falharem? O que acontece com você então?
— Estarei com o séquito de Addis. Estarei a salvo.
— Se Addis for morto, ninguém em seu séquito estará a salvo.
— Pare de ser uma mulher assim. É Addis e Rhys que
enfrentam o perigo, não eu.
Isso a impediu de andar. Abruptamente.
— Rhys? O que ele tem a ver com isso?
Mark parecia muito com alguém que sabia que ele havia falado
imprudentemente.
— Ele vai com você? Por incrível que pareça, essa ideia a
deixou mais calma, não que um pedreiro pudesse proteger Mark
melhor que um bando de cavaleiros.
— Não. Ele partirá para Nottingham ao amanhecer. Nós
esperaremos alguns dias mais.
— Por que ele vai em tudo?
Os dedos de suas botas de repente o fascinaram.
— Não sei. Algo sobre um projeto para o rei.
Não fazia sentido. Qualquer projeto para o Rei poderia esperar
até depois dessa ação.
Mark girou e foi para a porta.
Ela o interceptou.
— Quanto você conhece desse plano?
— O que eu te disse.
Ela o encarou.
— Um pouco mais.
— Diga-me esse um pouco mais. Agora. Por que Rhys vai para
Nottingham?
Ele tentou parecer maduro e superior. Ela não estava com
humor para jogar com seu orgulho. Ela agarrou o cabelo dele como
costumava fazer quando ele se comportava mal quando menino.
— Ow! Droga! Jesus, eu não sou um...
— Então me diga o que eu peço.
Ele soltou as tranças e recuou, indignado e envergonhado.
— Eu já te disse mais do que deveria. Se você quer descobrir
tudo isso, fale com Addis. Quanto ao por que Rhys está vindo, eu
espero que seja porque foi ideia dele para começar.
Ele se esquivou dela e correu para fora da câmara antes que
ela pudesse fazê-lo explicar.
Ela pegou uma vela acesa e seguiu em seus calcanhares. Ela
seguiu para uma câmara na torre sul próxima.
A porta não estava trancada, mas a câmara estava escura. Sua
chama lançava uma luz vaga sobre um monte de sacos de couro
amontoados contra a parede perto do limiar.
O silêncio a cumprimentou, mas ela sabia que Rhys estava lá.
Ela sentia a presença dele, tão sólida e forte quanto a rocha que ele
esculpia.
A cama onde ela dormia em seus braços estava vazia. Ela
levantou a luz. Mal chegava na parede oposta, mas o encontrou lá.
Ele estava com os braços apoiados em ambos os lados da janela
estreita, o rosto virado para o luar e as brisas frescas fluindo para
dentro.
Ele usava apenas suas calças de trabalho de couro. Sua pose
fazia os músculos fortes de seus ombros e costas tensos e definidos.
Ele sentiu sua chegada. Uma sutil flexão de seu corpo e uma
súbita mudança no ar a anunciou. Ele se virou e descansou contra a
parede, braços cruzados sobre o peito.
Joan gesticulou para os sacos.
— Parece que você está indo embora.
— Sim. De madrugada. Eu ia lhe contar hoje à noite.
— Aonde você vai?
— Longe. Está na hora. Nós dois sabíamos que o dia chegaria
quando tivéssemos que nos separar. Para onde eu vou quando isso
acontecer não importa.
— Importa se você viajar para Nottingham. Mark me disse o
que Edward planeja fazer.
— O menino ainda tem muito a aprender se ele fala tão
livremente.
Ele não estava facilitando. Ele agia distante, como se estivesse
escondendo alguma coisa. Sim, ele pretendia contar a ela, mas não
tudo. Ele estava planejando mentir.
— Por que você vai a Nottingham agora? O projeto do Rei
pode esperar até que isso termine.
— Pode esperar, mas não precisa. É assim que acontece com
os artesãos. Cavaleiros e reis lutam suas batalhas, mas precisamos
continuar ganhando nosso pão.
— Eu não acho que você vai apenas para ganhar o seu pão.
— Talvez você esqueça quem eu sou. O que eu sou.
Ela pingou um pouco de cera no topo do parapeito solitário da
câmara e pressionou a vela para ficar em pé.
— Você é um homem que ajudou a depor um rei. Acho que
amanhã você será um homem se preparando para depor um
usurpador. Por favor, me diga qual será o seu papel. Quero saber
que perigo você enfrentará.
Ele se voltou para a janela.
— Muito pouco perigo. O papel é pequeno.
Um nó de medo se formou em seu peito, e sua confirmação só
o tornou mais espesso. Ela foi até ele e abraçou-o por trás,
colocando a cabeça nas costas dele.
— Diga-me, por favor.
Ele hesitou, então se moveu para trazê-la para frente debaixo
do braço. Ele ainda olhava para a noite.
— Há passagens subterrâneas que permitirão que Edward se
aproxime sem ser visto. Homens de confiança estarão no portão
interno e o deixarão passar. Mas uma vez na fortaleza, ele estará
vulnerável. Eu farei uma distração, isso é tudo. Algo para distrair os
guardas enquanto Edward alcança os aposentos da rainha. Não deve
ser difícil.
— Se o plano do rei falhar, será sabido que você estava
envolvido.
— Possivelmente.
— Certamente. Mark disse que esse movimento foi sua ideia.
Há quanto tempo você está planejando com Addis?
— Não muito tempo.
— Desde antes de nos conhecermos?
Ele não respondeu, mas ela olhou para o perfil dele e soube a
verdade.
— Por que você não me contou?
— Eu esperava que fosse em vão, e não queria que você
ficasse desapontada. E eu jurei sigilo. Quanto menos pessoas
souberem de tais coisas, melhor.
Ele falou com tanta calma, como se não compreendesse seus
riscos. Ela não conseguia pensar em mais nada além do perigo
mortal que ele enfrentava.
Ele partiria ao amanhecer. A espada pendente finalmente cairia
e ele seria separado dela para sempre. Se esse plano precipitado
funcionasse, seus mundos se separariam. Se falhasse...
Bile subiu até sua garganta. Imagens invadiram sua cabeça, e
as antigas que a atormentaram por três anos se transformaram em
novas. Medonho e hediondo.
Sangue em um quintal e corpos torcidos na morte. Uma
espada caindo e olhos desafiadores até o fim. Os olhos de Rhys.
Exceto que talvez não venha tão misericordiosamente. Um rei
poderia liderar essa ação, mas uma rainha faria a punição se
falhasse. Addis poderia sobreviver, mas haveria uma morte terrível
para um artesão comum que ousasse conspirar contra uma pessoa
da realeza.
Um medo profano tomou posse dela, tornando-a flácida. Um
novo pavor, mais terrível e mais cru do que qualquer outro que
conhecera nos últimos anos, deixou-a fria e trêmula.
Ela teve que pará-lo.
— Eu não quero que você faça isso.
— Essa é outra razão pela qual eu não lhe contei.
— Eu suplico que você não faça isso. Não é seu...
— Não é meu lugar?
Ela se preocuparia com o orgulho dele mais tarde.
— Sim, não é o seu lugar, nem a sua batalha.
— Eu me lembro de uma mulher de olhos de fogo me dizendo
que qualquer um pode resistir à injustiça, até pedreiros. E é a minha
batalha por sua causa, se não por mais nada. Eu posso não ser o
campeão que você procura, mas eu posso fazer a minha parte.
Seu coração brilhou com a confirmação que ele a amava o
suficiente para arriscar sua vida fazendo o certo por ela. Mas o medo
por ele também cortava como faca, rasgando sua compostura. Ela
apertou o rosto contra o ombro dele.
— Espere um dia mais. Um dia só. Um pouco mais de tempo...
Um pouco mais de tempo para segurá-lo, e fazer memórias para
sustentá-la. Um pouco mais de tempo para convencê-lo a não ir.
— Um dia, depois outro e outro... Não será mais fácil deixá-la
um dia ou um mês depois. Quanto mais cedo eu chegar a
Nottingham, maior a chance de que isso aconteça como planejado.
Sua calma determinação a fez frenética.
— Você não me honra com isso.
— E você não me honra em tentar me dissuadir.
— Eu não quero isso de você. Ela tentou fazer sua voz fria e
firme, mas saiu um gemido.
Ele olhou para ela e passou a mão pela bochecha dela.
— Não é só sobre você, Joan. Isso é parte disso, mas não é
tudo.
— Isso não me tranquiliza. Se fosse apenas sobre mim, eu
poderia ser capaz de pará-lo, ela murmurou miseravelmente,
enxugando os olhos.
— Não perca a noite desse jeito. Isso não vai acontecer.
Ela ouviu a decisão em seu tom. Reconheceu isso. Não, isso
não aconteceria. Ele estava onde ela estivera recentemente, e seu
caminho não seria desviado.
Rhys esperou como ela, pelo amanhecer. Ele enfrentava uma
provação e sabia seu custo potencial. Ele estava saboreando a brisa
e a noite quando ela entrava, e morando naquele presente
comovente que só existe quando não se espera futuro algum.
A luz mostrou o suficiente de sua intensidade para ela saber
onde sua alma estava esta noite. Ela se lembrou de sua própria
vigília escura. Empatia agitou seu amor, e seu coração inchou com o
desejo de proteger e confortar.
Ela olhou para ele. Tudo dele. Devagar e com cuidado, para
que ela sempre se lembrasse. Ele parecia tão esplêndido para ela.
Bonito e duro, lavrado com dignidade e força. Sua expressão
cinzelada não mostrava fraqueza, mas sua humanidade ainda tinha
suas necessidades.
Suas palavras tornaram isso explícito.
— Eu agradeço por tentar, Joan. Eu irei valorizar a evidência
de que você colocou minha vida acima de sua busca. Mas eu não
quero mais falar disso. Nem da separação que aguarda. Nem de
nada além de amor.
Ele deu um passo atrás dela e começou a desamarrar o laço
nas costas dela.
Ele trabalhou o laço lentamente, apreciando como seu lento
progresso a fez tremer, como um murmúrio sussurrando através de
seu corpo e da noite. Ele poderia não ter notado, mas seu estado de
alerta o tornava mais perspicaz para tudo, então ele também sentiu
a tristeza nela, e sua consciência dolorida de que esta seria a última
vez.
— Eu gostaria que ainda estivéssemos em Londres. Ou no lago
atrás dos pinheiros, ela disse melancolicamente.
Ele alisou a mão pela abertura que ele tinha feito, e saboreou o
calor sob o tecido do turno fino.
Ela arqueou-se tão sutilmente ao toque dele.
— Sim. Mas aqui é onde estamos agora e não podemos mudar
isso.
Ele tirou o vestido dos ombros dela, ele deslizou de seu corpo
em uma pilha no chão. Depois foi trabalhar em sua trança. Ela não
se virou. Ela sabia que ele queria saborear cada momento.
— Eu sempre vou me arrepender de ter trazido você para isso,
Rhys. Você estava contente antes de me conhecer. E seguro.
— Não tão contente. E talvez muito seguro. Eu estava com
falta de propósito, e invejei o seu, o que quer que fosse. Proteger
você me deu um. Não se arrependa de nada, linda pomba. Um
homem que não tem nada que valha a pena lutar não está
realmente vivo.
Ele colocou o cabelo sobre o ombro e se inclinou para beijar
sua nuca. Então seu ombro, enquanto seus dedos deslizavam a
combinação deles. Ele deslizou para baixo.
— Não se mexa. Você é tão linda e eu quero olhar para você
neste luar.
A lua dava-lhe um brilho pálido na escuridão. Adorável. Etérea.
Ele adoraria essa imagem dela para sempre. Ela permaneceu imóvel
como uma estátua, mas não era pedra o que suas mãos encobriram
enquanto seguiam suas curvas. Seu calor falava de sua vida, espírito
e necessidade, e sua pele tremia sob seu toque, como se seu pulso
respondesse.
Ela era tão lindamente formada. Ele a beijou de volta, para
honrar tudo o que ela era. Joan, filha de Marcus de Brecon. Joan, a
ladrilhadora. Esta noite ela ainda era ambas as mulheres. Nas
próximas horas, pelo menos, ela ainda estava em seu mundo.
Ele beijou mais baixo, ao longo das esplêndidas e delicadas
saliências de sua espinha. Ele caiu de joelhos como seus beijos
descendentes. Ele pegou a maciez de seus quadris em suas mãos e
pressionou sua boca nas ondas redondas.
Ela vacilou. Sua quietude desapareceu e seu corpo se flexionou
em resposta. Os gemidos suaves se misturaram com sua respiração.
Ela agarrou a borda da janela, curvando-se levemente, firmando-se.
Ele lambeu e beliscou o topo de suas coxas. Com um — sim—
ofegante, ela as separou, e ele deixou sua língua apertar e explorar.
Seu perfume fez a doce névoa de desejo nublar sua cabeça. A
demanda por mais bateu nele.
Ele acariciou das pernas até os quadris dela.
— Vire amor. Eu quero provar você totalmente.
Ela o encarou, encostando-se na parede, olhando para baixo
com olhos brilhantes. A luz da janela e a vela tocavam seus seios,
braços e pernas, criando sombras fluidas e misteriosas. Ele levantou
as mãos e acariciou tão suavemente quanto o ar da noite fluiu. Ele
deslizou seu toque pelo queixo e pelo pescoço dela. Um rubor
aqueceu o caminho, e um pulso vívido percorreu a conexão. Ele
diminuiu o ritmo, para acariciar a maciez dos seios dela, e se divertiu
com a ingestão aguda de ar. Ele puxou-a em direção a ele,
dobrando-a até que ele pudesse beijar seus lábios.
Sua resposta faminta dizia onde ela estava. Ela agarrou seus
ombros e beijou de volta mais agressivamente do que nunca. Seu
pequeno ataque enviou desejo em fúria por ele. Ele moveu a boca
para o pescoço dela e depois para os seios que acariciava.
Ele brincou com ela com a língua, e seus sons de prazer
encheram seus ouvidos, sua cabeça, seu sangue. Ela arqueou-se e
avançou, implorando por mais, seus dedos arranhando seus ombros,
a cabeça jogada para trás em abandono.
Ele controlou o impulso furioso de se levantar e imediatamente
reivindicar o que esperava. Removendo seu aperto, ele colocou as
costas contra a parede. Ajoelhando-se de perto, ele beijou mais
baixo. Sobre o estômago, ao redor do umbigo. Ainda mais abaixo.
Ele estendeu a mão para o tornozelo, mas não teve que guiá-
la. Ela se pressionou contra a parede e olhou para baixo com olhos
ardentes.
— Sim, totalmente, ela sussurrou enquanto ela dobrou o joelho
e descansou o pé em seu ombro.
Nenhum pensamento. Sem restrições. Segurando seus quadris
em suas mãos, ele beijou sua coxa em seu objetivo e lambeu.
Seus gritos ascendentes e carne pulsante absorveram sua
consciência. Ela balançou devagar, ritmicamente, enquanto ele
explorava mais profundamente e a fome se tornou primitiva. Ele a
manteve no limite, frenética com uma necessidade que o despertou
mais do que o gosto dela, antes que ele finalmente a fizesse gritar
em uma liberação gloriosa.
Ele se levantou e a esmagou contra ele. Seu aroma e
respiração ofegante o imergiram em uma nuvem de sensações.
Sua suavidade feminina rendeu-se fracamente em seu abraço
apertado.
Ele pegou a mão dela para guiá-la até a cama.
— Venha, deite-se comigo agora. Deixe o marido do seu
coração te amar enquanto ele puder.
Para sua surpresa, ela resistiu e se manteve firme.
— Nós amaremos um ao outro, não só você a mim. Ela
acariciou até o fecho de suas calças. — Depois de tal começo, meu
sangue subiu. Não espere que eu seja tímida.
Sua roupa afrouxou e ela roçou em seus quadris. Ela o olhou
nos olhos com uma nova confiança. Desejo queimando através dele
como um incêndio.
Ela recuou e olhou para o corpo dele francamente. Havia uma
promessa naquela inspeção que o aturdiu, e também elevou sua
ânsia. A lembrança de estar dentro dela varreu-o, e ele quase a
prendeu contra a parede para torná-la real.
Seu olhar caiu para o membro dele. Ela estendeu a mão e
gentilmente correu as pontas dos dedos de ambas as mãos para
cima e para baixo. Ela o havia tocado antes, mas não corajosamente
assim. Isso tornava o prazer enlouquecedor.
Ela sorriu maliciosamente. Sedutoramente seu dedo circulou.
— Eu estou querendo saber se eu ainda posso ser capaz de
convencê-lo a ficar.
— Se for defender sua causa assim, você é bem-vinda a tentar.
Ela riu. Seu coração pulou ao som. Ele esperava uma noite
cheia de alma, imbuída de sua tristeza.
E ele. Ele estava grato pelo sinal de que haveria alegria
também.
E então ela o surpreendeu ainda mais. Ela inclinou-se para
oferecer algo que não havia feito antes. Sua cabeça mergulhou. O
tempo diminuiu. Seu corpo silenciosamente implorou por isso com
uma antecipação acelerada. A sensação de seus lábios beijando-o, e
de sua língua sacudindo maliciosamente, quase desfez seu controle.
Foi apenas um gosto, não mais. Uma promessa torturante. Ela
beijou seu corpo e ofereceu seus lábios aos dele.
— Não agora, eu acho. Ainda não. Eu quero jogar primeiro.
Ele agarrou-a em um aperto muito áspero e beijou-a na boca
com muita fome.
— Pode ser um jogo perigoso para você, linda pomba.
Especialmente hoje à noite.
— Você nunca pode ser perigoso para mim. Eu quero que nós
sintamos tudo juntos e vivamos um no outro. Eu não acho que isso
seja perigoso, apenas delicioso e profundo.
— Se quisermos sentir tudo juntos, tenho algum trabalho a
fazer, já que estou enlouquecido com a sua falta, mas você já está
saciada.
— Não muito trabalho. Acho que a saciedade passa.
Ele se certificaria de que sim. Rapidamente. Ele a queria
vulnerável ao prazer. Ele queria que ela tremesse de paixão
enquanto ele tremia, e cheio do uivo silencioso que exigia mais e
mais.
Ele levantou-a e levou-a para a cama e deitou-a. A visão dela
ali, nua e disposta, tornava seu desejo apertado e caótico.
Seus braços se levantaram para recebê-lo em um elegante
gesto de convite. Ele se juntou a ela, e sua proximidade acalmou um
pouco sua fome. A unidade de pele e calor encantou sua alma.
Ele queria que a noite durasse para sempre e tentou retardar o
tempo. Ele acariciou sua pele macia até sentir ela ir de encontro a
sua mão, impaciente por mais. Seu toque circulou seus seios
eternamente até seus suspiros ficaram irritados. Mesmo assim, ele
lhe deu prazer com pinceladas e toques tentadores, e esperou que
ela voltasse a atingir a intensidade da necessidade que obscurece o
mundo.
Ele passou a língua ao redor da ponta de veludo de seu seio.
Seus braços caíram para os lados da cabeça enquanto ela se
arqueava e se oferecia. Ele sacudiu e chupou e excitou o outro seio
dela com a mão dele, e se deleitou em triunfo quando abandono
absoluto a reivindicou.
Diferente desta vez. Ela provou isso imediatamente. Ela
deslizou para longe e o empurrou para baixo. Com os olhos
brilhantes de paixão e confiança, ela montou seus quadris e sentou-
se em suas coxas.
Ela parecia gloriosa e selvagem e escultural em sua beleza. A
luz brincava no cabelo dourado que fluía ao redor de seu corpo.
Seus seios espiavam por baixo da cortina de cabelos.
Ela empurrou o cabelo para trás para que ele pudesse olhar. E
ele fez. Em toda ela, todas as partes e linhas. A parte mais quente
aconchegou-o de perto, e ele podia sentir o pulso e a umidade que
seu olhar criava.
As pontas de seus seios lhe ofereceram uma promessa firme e
sedutora. Ele a guiou para que ele pudesse saboreá-las novamente.
Não pelo prazer dela dessa vez, mas pelo dele.
Ele se perdeu nele. Os sons de sua paixão tornaram-se uma
nuvem musical na qual ele se elevou cada vez mais. Seu corpo
balançou devagar, apenas o suficiente para escovar seu membro de
novo e de novo. Ele se abaixou e acariciou sua fenda, e seus gritos
ficaram frenéticos. Ele sentiu sua necessidade e começou a implorar.
Ela se afastou e sentou-se novamente.
— Eu disse que nos amaríamos hoje à noite, e não apenas
você a mim. Você me tenta a esquecer minha promessa. — Ela
acariciou o peito dele. Mas acho que sei como fazer isso. Acredito
que posso adivinhar o que você quer.
Ela se inclinou para frente e beijou-o, e então moveu os lábios
para o pescoço dele. Diferente desta vez, desde que ela não seguiu
o seu exemplo. Uma mudança sutil estremeceu através do prazer.
Sua ousadia tornou mais erótico para ambos.
Seus beijos se moveram para seu peito e sua língua para seu
mamilo. Todo o tempo suas mãos se tocaram em carícias sedutoras
e sedosas sobre seu corpo.
O desejo se tornou aguçado e decisivo. Ele chegou a girá-la e
assumir o controle.
Ela recuou de seu aperto e sentou-se novamente.
— Você é muito apressado. Tenho promessas a cumprir.
Ela olhou para o seu pênis que se erguia na frente de sua
barriga. Ela gentilmente arranhou uma unha da base até a ponta.
Ela olhou nos olhos dele.
— Sim?
— Por favor.
Suas explorações construíram um delírio de sensações. Sua
brincadeira o levou à beira outra vez.
Quando ela tirou as coxas e virou-se para usar a boca, ele
pensou que ele morreria por causa disso.
Ele quase sucumbiu. Ele mal recuou do fim sendo retirado
dele. Os maiores desejos desta noite o puxaram de volta e ele a
alcançou.
Ele a deitou de costas e abriu as pernas e se ajoelhou entre
elas. Ele colocou a mão nela e lentamente tocou até que seus gritos
encheram a pequena câmara. Ela dobrou os joelhos e levantou os
quadris.
— Entre em mim. Por favor. Agora. Eu quero sentir você
dentro de mim.
Ele pressionou os joelhos dela contra o peito dela para que ela
estivesse aberta e esperando. Ele se levantou e acariciou o mais
profundamente possível.
O caos clareou por um momento e um profundo
contentamento brilhou como o sol. Nada e ninguém se intrometeu
na luz. Ele tinha se preocupado que a sua separação fosse sombrear
desta vez, e ficou aliviado por não ser assim.
A calma não durou muito. Um desejo penetrante e incessante
assumiu o controle. Ele levantou-se em seus braços e retirou-se, e
olhou para baixo para assistir seu corpo aceitando-o novamente. Ele
fez uma série de investidas lenta e longamente e cada uma parecia
mais profunda e mais firme que a anterior. Ele queria acariciar seu
calor aveludado para sempre, e ouvir o contentamento gemer por
dez vidas.
Ficou louco no final, duro, pegajoso e barulhento. Seu agarre e
respiração ofegante não exigiam gentileza, e o poder nele dominava
toda a restrição.
O alívio veio como um cataclismo, dilacerando sua consciência.
Ele não experimentou nada físico por um longo momento. Nem
mesmo o corpo dela embaixo dele. Sua respiração e cheiro estavam
lá, e seu coração e amor, mas nada que tivesse substância.
Lentamente, o mundo se intrometeu. Suas formas ressurgiram.
Ele encontrou-se esparramado sobre ela, envolvido por seus braços
e pernas, seus lábios pressionados contra sua têmpora.
Uma leve umidade deslizou entre seus rostos. Ele se levantou e
olhou nos olhos dela.
Seu sorriso estremeceu de sua emoção. Ele a beijou, para selar
e saborear o que eles tinham compartilhado. Ele se moveu para o
lado dela e a colocou contra ele.
As horas que passavam não estavam desesperadas. Eles se
abraçaram num silêncio feliz e depois novamente em paixão.
Ela insistiu para que ele pegasse tudo o que ele pudesse
imaginar e deu tudo o que ela podia. Ele nunca tinha conhecido tal
paz como ele experimentou naquela cama emprestada. Foi a união
irrestrita da noite com ela que causou isso. Um homem não pode
temer a morte enquanto está morando no paraíso.
O sono lentamente os reivindicou, ela descansou nos braços
dele, o corpo dela esparramado em cima dele, a bochecha dela ao
tórax dele.
— Eu não te convenci a ficar, apesar de tudo? ela murmurou
sonolenta. — Eu realmente não esperava.
Ele apenas beijou a cabeça gentilmente em resposta e esperou
a aurora no santuário de seus braços.
Rhys empacotou a carroça levemente. Parecia estranho se ele
não levasse algo, mas não queria que o peso extra diminuísse seu
ritmo.
O pátio do castelo estava quieto e vazio, exceto por alguns
criados bocejando. Podia-se sentir a casa se espreguiçando ao
acordar, mas o silêncio latente da noite recente ainda pairava no ar.
Ele engatou o cavalo e colocou as rédeas sobre um poste. Então ele
voltou para a fortaleza, para ir e se despedir de Joan.
Provavelmente a sua despedida final. Quer ventos bons ou mal
esperavam no final desta jornada, não haveria mais noites como a
última. Ele estava determinado a não pensar nisso quando a beijou
na despedida. Ele não queria que sua alegria um com o outro fosse
prejudicada pela tristeza.
Uma figura drapejada apareceu caminhando no topo dos
degraus da torre. Uma mulher, cabeça e corpo obscurecido por um
manto, desceu em sua direção. Ele pensou a princípio que poderia
ser Moira, mas a coluna de tecido era pequena demais.
Ela levantou a cabeça e a capa caiu para trás. Sorrindo
largamente, Joan desceu para encontrá-lo.
Ele desejou que ela tivesse esperado dentro. Ele a deixara na
cama e prometera voltar. Ele queria que sua última visão dela fosse
como ele a conhecera durante a noite.
Ela fez uma pausa para beijá-lo e caminhou até a carroça. Algo
grosso e volumoso emergiu de debaixo do manto dela. Deixou cair
um saco entre os braços dele, depois virou-se, parecendo demais
com uma mulher preparada para uma discussão que pretendia
ganhar.
Ele foi até ela e olhou para a nova bagagem.
— O que é isso?
— Um saco com algumas roupas.
— Eu não deixei vestes para trás.
— Elas são minhas. Eu vou com você.
— O inferno que você vai. Você está ficando aqui, onde estará
segura.
— Eu estarei segura com você. Eu sempre estive.
— Eu estou entrando na cova de um leão, mulher. Você é a
última pessoa que estaria segura lá.
— Eu sou desconhecida para eles. Se alguém suspeitasse da
morte de Guy, nós teríamos sido pegos na estrada. O mensageiro
não ouviu nenhuma notícia de uma busca por mim, ou por qualquer
pessoa com minha descrição. Mesmo que Mortimer me veja, ele não
saberá quem eu sou.
— Eu não arrisco você, e essa é a minha última palavra. Agora
me beije docemente, para que eu possa estar no meu caminho.
Ela cruzou os braços.
— Eu estou indo. Você irá fazer o mesmo trabalho que em
Westminster. Você precisou de um ladrilhador lá, e vai precisar de
um em Nottingham também. Somos parceiros nos trabalhos de
azulejo, e é apropriado que eu esteja com você.
— Você não está vindo, Joan. Se você não me obedecer, vou
dizer a Addis para trancar você.
— Eu não acho que ele vai. Eu já falei com ele, e ele concorda
que o risco é pequeno.
Ele apontou para as escadas.
— Então vou explicar mais claramente.
— Se você insistir em questionar o seu julgamento, você o
encontrará no solar. Ele ainda está deitado com Moira, e eu não
acho que ele tenha gostado da minha intrusão, se você sabe o que
eu quero dizer. Duvido que ele aprecie mais a sua.
A insinuação fez com que ele parasse.
— Então vamos esperar até que ele termine o que ele está
fazendo.
Ela o abraçou e olhou para cima com olhos suplicantes.
Incomodava-lhe que ela o enfraquecesse imediatamente.
— Rhys, não insista em me frustrar. Meu irmão vai estar lá, e
eu não posso simplesmente sentar aqui me preocupando com ele e
você.
— Moira estará sentada aqui. Você pode se preocupar, se
precisar se preocupar.
— Moira tem filhos. Se ela não o fizesse, ela certamente viria.
Ela lembrou a Addis que ela havia se juntado a ele quando ele veio
para retomar sua casa. Foi isso que o influenciou no meu plano, eu
acho.
Isso era tudo que ele precisava, Moira conspirando contra ele.
— Se eu não sair com você, seguirei com Addis e Mark. Esperei
muito tempo para isso, e verei a honra de minha família restaurada
quando isso for feito. Negar-me não me impedirá.
Ela se aproximou um pouco mais, de modo que sua rebelião
fosse imbuída de um argumento silencioso que era muito mais
convincente do que o verbal.
— Eu irei, de um jeito ou de outro. Estou resolvida.
Ele sabia o que aquilo significava e viu a verdade disso em sua
expressão. Ele olhou para o solar. O senhor e a senhora fazendo
amor lá não seriam de nenhuma ajuda nisso.
— Eu não vou entrar no castelo. Vou ficar em uma pousada, e
esperar por você para me trazer novidades. Estaremos juntos, pelo
menos, na viagem e, em seguida, à noite em Nottingham. Eu perdi
muito tempo com você, por favor não me tire o que resta.
Falar de suas noites juntos, derrotou-o. A chance de prolongá-
las, mesmo que por uma semana, se mostrou muito sedutora. Seu
coração dizia que o risco não seria tão grande, embora seu melhor
julgamento ainda insistisse que qualquer risco era demais.
— Você deve ficar na cidade, longe do castelo.
— Claro.
— Quando Addis chegar, você esperará com seu irmão e não
interferirá.
— Certamente.
— Se eu sentir qualquer perigo, você vai embora
imediatamente. Você deve me obedecer nisto.
— Eu serei obediente, mestre.
Ele ajudou-a a subir na carroça e subiu para pegar as rédeas.
Ela sorriu com satisfação.
Mestre, inferno. Ela o havia trabalhado como o barro de uma
estátua.
E ele estava feliz por isso.
Capítulo XXV
Rhys esteve em Nottingham Castle por quatro dias antes que
Mortimer percebesse que ele estava lá. A comissão do rei bastara
para lhe dar entrada e ele se ocupou com o projeto, permanecendo
invisível entre os outros artesãos e criados. Se não fosse a chegada
de um camareiro para preparar os aposentos de Edward para a
visita convocada, ele poderia nunca ter sido notado.
O chamado de Mortimer veio no dia seguinte, enquanto se
preparava para voltar à estalagem onde Joan esperava.
O grande homem não estava sozinho. Um nó de seus
cavaleiros encheu um canto escuro de sua câmara, onde brincavam
com dados. Rhys olhou para eles apenas o tempo suficiente para
contar cinco.
Addis poderia lidar com cinco. A espada de Barrowburgh era
conhecida por cortar uma larga faixa.
— Outra comissão? Você é afortunado pelos favores reais,
ponderou Mortimer ao ouvir o motivo de sua presença.
— Ele aprovou meu trabalho em Westminster, e procura
favorecer sua esposa com isso, não a mim. Eu achei imprudente
recusar.
— Ele sabe do serviço que você fez por mim?
— Ele certamente sabe do trabalho que eu fiz na construção de
edifícios, e sabe que alguns eram para a Rainha. Mas eu não acho
que ele suspeite de qualquer outra coisa. Um mestre construtor não
recusa o projeto de seu rei, isso é tudo que eu quis dizer.
— Talvez você soubesse que ele está vindo para cá daqui a
três dias.
— Eu não sabia disso. Recebi apenas a comissão e não as
confidências. Os reis não discutem seus movimentos com pedreiros.
O lembrete de seu status baixo parecia ajudar. A vaga suspeita
caiu da expressão de Mortimer e ele perdeu o interesse. Ele nem
sequer deu uma despedida. Sua atenção simplesmente se afastou.
Rhys esperou até que sua presença não se tornasse mais
significativa do que a de uma peça de mobília, depois caminhou até
a porta.
Ao fazê-lo, o riso explodiu em meio aos cavaleiros do jogo.
Ele olhou para o som no momento em que o nó se soltou. Um
raio de luz de uma janela próxima cortava a escuridão, iluminando
uma figura agachada que pegava alguns ganhos.
A cabeça do cavaleiro se inclinou para trás, revelando uma
visão completa do rosto dele. Seus olhos perderam a alegria e
ficaram alertas, como se sentissem alguma coisa errada. Seu olhar
passou pela câmara, parando no artesão perto da porta. Suas
pálpebras se estreitaram em escrutínio, e então algo pensativo e
sombrio obscureceu sua expressão.
Rhys continuou a sua calma retirada, mas seu sangue correu e
seu coração bateu com alarme. Guy Leighton estava vivo.
De alguma forma, Rhys conseguiu não atravessar o castelo
como um louco. Dirigiu-se diretamente ao pátio e ao portão, o
tempo todo amaldiçoando-se de cem maneiras diferentes.
Ele deveria ter se assegurado de que o corpo sangrando
tivesse sofrido um golpe fatal. Ele deveria ter encontrado a faca e
enfiado no coração de Leighton.
Ele deveria ter acorrentado Joan em Barrowburgh.
Não é de admirar que não houvesse busca. Guy não diria a
Mortimer quem fora o atacante. Ele não admitiria que sua luxúria
permitira que os filhos de Marcus de Brecon vivessem. Crianças que
podiam testemunhar sobre o massacre realizado sob o comando de
Mortimer.
Não, ele ficaria em silêncio e faria a busca ser silenciosa.
O quanto suas investigações revelaram? Teria ele descoberto
que Joan morava em Londres com um pedreiro? Ele sabia sobre o
pátio de azulejos e seu trabalho nos apartamentos do rei? Ele
precisa apenas fazer as perguntas certas para descobrir tudo isso.
Ele era provavelmente o tipo de homem que poderia descobrir
informações.
Mesmo que ele não tivesse, Joan não estava segura aqui. Rhys
teria que levá-la para longe de Nottingham. Addis e Edward teriam
que se mover sem ele.
Ele a encontrou na pequena câmara que compartilhavam em
uma pousada na principal rua comercial da cidade. Ela estava
sentada na janela, observando a agitação abaixo.
Ele se aproximou e fechou as persianas. Ele pegou um saco de
couro e começou a enfiar suas roupas nele.
— Nós estamos indo embora agora.
— O que aconteceu?
— Guy Leighton não está morto. Acabei de vê-lo com
Mortimer.
Ela empalideceu.
— Você tem certeza? Você o viu apenas uma vez, brevemente.
Talvez...
— Aquela breve visão queimou minha mente. Era Leighton, e
ele parecia muito sério e apto para um homem morto.
— Não pode ser. Todo aquele sangue...
— Não é suficiente, parece. Ou talvez ele seja verdadeiramente
um demônio e não possa ser morto com uma faca. Deixou cair as
ferramentas no saco com as roupas dela e enfiou a adaga também.
— Nós deixaremos o resto. Eu não quero me atrasar. Ele jogou a
capa sobre os ombros e segurou o braço dela para convencê-la.
— Você é muito apressado. Não precisamos fugir, e você não
precisa abandonar o plano do rei por causa disso. Guy não pode
saber que eu estou aqui. Addis deve chegar amanhã, e o rei
também. Um dia a mais e estará acabado. Eu ficarei nesta câmara, e
nem mesmo abrirei as persianas até lá.
Ele se lembrou do véu pensativo que havia caído sobre os
olhos de Guy. Foi o olhar que alguém tem quando duas metades de
uma cadeia mental de repente se ligam.
— Um dia é muito longo. É uma chance que eu não aceitarei.
Tampouco permitirei isso a você. Venha comigo agora. Você
prometeu sua obediência nisto, e eu ordeno a você.
Apressou-a a sair da estalagem e desceu o beco até o estábulo
onde o cavalo estava descansando. Quando o cavalariço começou a
levar o animal ao vagão, Rhys o deteve. Eles também deixariam isso
para trás.
Ele não queria que nada retardasse sua partida de Nottingham.
Ele selou o cavalo enquanto o cavalariço ajustava o freio. Joan
esperou, os braços cruzados sobre o peito e os pés batendo com
aborrecimento.
Ele tomou as rédeas para levar o cavalo para fora do estábulo.
Sua mão se fechou sobre a dele, impedindo-o.
— Você abandona a carroça e suas roupas. Também deixa sua
palavra solene. Para um homem com grandes ideias, suas
preocupações são muito pequenas de repente.
— Você não é uma preocupação pequena. Não para minha
mente e meu coração.
— Nem você é para mim. Meu coração está feliz que você
queira ir embora. Estou aliviada que ao buscar minha segurança,
você também estará a salvo. Mas se Edward falhar porque nós
fugimos, será um esboço amargo para nós dois.
— Eu não procuro comprometer sua ação. Por sua causa, se
não as razões maiores, eu oro para que ele seja bem-sucedido. Mas
o corpo vivo de Leighton muda tudo, na minha mente. Por minha
conta, eu teria qualquer chance, mas se o dano vem a você, será
mais do que amargo. Será como veneno.
— E será venenoso para mim se a minha demanda para o
acompanhar aqui significa que a causa está perdida.
— Não será perdido. Eles não precisam de mim.
— Eles precisam desesperadamente de você. Você me disse os
números dentro daquelas paredes. Um desvio pode significar a
diferença. Se Addis falou levemente de seu papel, era apenas para
permitir que você recusasse sem constrangimento, já que caso
fracassem seu destino será pior que o dele. Você sabe a verdade
disso. Eles estarão muito mais vulneráveis se você não fizer o que é
esperado.
Sim, ele sabia disso. Foi por isso que ele não recusou, e o que
ele aprendeu desde que chegou a Nottingham só confirmou que
essa ação rápida poderia terminar mal. Cinco guardavam Mortimer
em seu quarto e mais quinze esperavam no corredor e nas câmaras.
A mão de Joan ainda cobria a dele. Fechou-se com mais força
e ela tocou o rosto dele com o outro.
— Se você me mandar sair, eu o farei. Mas se você optar por
ficar, não haverá culpa se eu me ferir.
Ela exigiu uma escolha que ele não queria fazer. Sua mente
correu com as opções e suas consequências. Seu toque gentil o
persuadiu a pesar cuidadosamente, e seus poucos momentos de
deliberação pareciam muito mais longos do que deviam ter sido. O
cheiro fétido de cavalo e o doce odor de feno se ergueram ao redor
deles enquanto ele olhava nos olhos sinceros dela e enfrentava o
horror de equilibrar sua segurança contra os objetivos maiores.
Algo triste passou em sua expressão. Ela também pesava e se
equilibrava. O desejo de seu próprio amor de protegê-lo enfrentou
sua necessidade de ver Mortimer quebrado.
Eles fizeram suas escolhas no mesmo instante, mas Joan falou
primeiro.
— Eu estou sendo tola. Você está certo. Ela soltou a mão dele
e se afastou. — Vamos deixar esta cidade. Vamos fugir do reino, se
necessário.
— Nós vamos deixar a cidade, mas não o reino, ou até mesmo
o condado. Eu vou encontrar algum lugar longe daqui para esconder
você, e voltar sozinho. É a sua segurança que importa, não a minha.
Eu cuidarei disso, e voltarei para terminar isso.
Um adorável e perturbado beicinho brincava na boca dela.
— Eu deveria ter ficado em silêncio, se a sua solução é nos
separar.
— Seu silêncio não teria me cegado. Uma vez que
estivéssemos a uma milha do lado de fora do portão, eu teria visto.
Com a sua segurança garantida, meu medo por você teria diminuído
o suficiente para que eu pensasse direito.
Rhys circulou seus ombros com o braço e levou o cavalo para o
beco. Ela se inclinou contra ele enquanto andavam, e ele deixou-se
saborear a extensão flexível de seu corpo pressionado ao seu lado.
Alguns passos de unidade. Um breve passeio de intimidade. Ele
fechou os olhos e deu um beijo na seda do cabelo dela e deixou seu
coração sentir tudo o que já sentira.
A luz por trás de suas pálpebras sutilmente diminuiu. Uma
escuridão se intrometeu no brilho que eles compartilhavam.
Seu corpo ficou rígido debaixo do braço. Seus passos pararam
com um solavanco.
Ele abriu os olhos e encarou o beco. A entrada para o estábulo
foi bloqueada.
Guy Leighton estava lá, com quatro de seus homens.
Capítulo XXVI
Joan rasgou uma faixa de tecido da manga de seu vestido e
limpou gentilmente um pouco de sangue do rosto de Rhys. Ele se
encolheu e então fez uma careta quando a reação agravou outros
ferimentos.
Não houve defesa contra os golpes no estábulo. Com dois
homens segurando-o contra a parede, ele ficou com apenas sua
raiva e força para protegê-lo.
— Você está gravemente ferido.
— Estou dolorido, mas não tão ferido. Eu vou viver.
Sim, ele viveria por um dia ou dois. Guy queria ele vivo, para
que ele pudesse tomar seu tempo, enquanto ele fazia o pedreiro
pagar pelo insulto de roubar o que ele considerava sua propriedade.
Apenas a luz mais fraca vazava através de algumas aberturas
de ar perfuradas no alto de uma das paredes da cela de pedra. Eles
não estavam na fortaleza. Guy jogou-os em uma cavidade enterrada
nas fundações da parede interna do castelo.
Rhys cuidadosamente mudou sua posição contra as pedras
úmidas onde eles estavam sentados. Ela sentiu a dor dele como se
estivesse em seu próprio corpo.
— Ele não sabe por que estamos aqui, disse ele. Mortimer
pode ver um padrão nisso, mas Guy não, e ele nos escondeu aqui
para que seu senhor não descubra sobre você.
— Ele pode não saber por que estamos aqui, mas ele tem você
do mesmo jeito.
— Em menos de um dia vai acabar. Edward deve chegar em
Nottingham esta noite. Ele vai se mover logo após o amanhecer.
Guy vai cair com seu lorde. Um dia só, Joan. Não fique perturbada.
Como ela não podia ficar perturbada quando o homem que ela
amava estava espancado ao lado dela? Esses golpes foram
metódicos e punitivos.
E haveria mais.
— À sua maneira, acho que ele se importa com você. O
suficiente para arriscar o descontentamento de Mortimer, o que não
é pouca coisa para Guy.
— Tudo o que ele sente por mim, não é uma emoção normal.
— Não, não é normal. Não é simples luxúria. Ele sente a sua
força, então fazer você se submeter tem um prazer especial. Eu não
tinha adivinhado isso antes. Ele não me puniu com o espancamento
tanto quanto você. Ele sabia que golpear o seu o próprio corpo não
a derrotaria.
Ela foi forçada a assistir. Ela recuou da memória dele. Ela teria
alegremente mudado de lugar com Rhys. A dor física seria fácil de
suportar em comparação com a tortura de vê-lo brutalizado.
Ele levou a mão à boca e gentilmente pressionou seus lábios
inchados nela.
— Você não negocia por mim, Joan. Você não vai para ele.
Quebrou o coração dela que ele sabia do que se tratava.
— Eu pensei que você tivesse ido muito longe para ter ouvido
a demanda de Guy. Ele falou apenas para meus ouvidos.
— Eu não ouvi nada, mas eu vejo a mente do homem. Se ele
simplesmente buscasse vingança pela sua faca, nós dois estaríamos
mortos agora. Se ele quisesse estuprá-la primeiro, ele poderia ter te
tomado lá no estábulo, ou forçado você de volta para a cama dele
na fortaleza. Um homem mais simples teria, mas ele não é simples,
é? Não foi assim antes, e não será agora, mesmo que você quase o
tenha matado Ele ainda quer a ilusão de que você está disposta. Ele
gosta de fingir que há mais entre você do que existe.
Seu estômago se revirou quando velhas lembranças surgiram,
provando a verdade disso. Guy, solícito e generoso.
Guy, cortejando-a como se fossem amantes. Suas carícias
insistentes foram mais degradantes que estupros. Em defesa, seu
corpo aprendera a não sentir nada.
Ela havia se esquecido disso com Rhys e finalmente derrubado
a parede que a preservara da humilhação.
— Você não vai para ele. Não importa o que aconteça comigo,
você não vai.
— O último homem que me disse isso morreu pela espada de
Guy. Por nada. Ele simplesmente fez do meu irmão o próximo
prêmio.
— Seu irmão está seguro agora. Faça o que deve para salvar a
si mesma, mas não deixe que ele me use para quebrar a sua
vontade. Não me proíba a honra que você permitiu àquele último
homem.
A luz vaga desapareceu quando a noite caiu. Eles não falaram,
e ela esperou que ele dormisse. Ela não podia abraçá-lo por causa
de suas feridas, mas seu amor tentou cercá-lo e sua mão
permaneceu nele o tempo todo.
Ela rezou para que Guy os esquecesse. Ela implorou aos santos
que Mortimer exigisse a presença de seu melhor homem como
guarda. Com o passar do tempo e a respiração de Rhys se tornando
mais regular e profunda, ela ousou esperar que não houvesse mais
tortura.
Não era pra ser. Nas horas antes do amanhecer, as pedras
sutilmente tremeram com ecos sonoros. Os fantasmas de
movimentos que se aproximavam perturbaram a paz crua que eles
compartilhavam. Ela rangeu os dentes e olhou através da escuridão
para a porta.
Uma chave rangeu severamente na fechadura. Ela mal engoliu
o pedido de misericórdia que queria sair.
A mão segurando a dela apertou.
— Você não vai para ele.

Cãibras tiraram Rhys do esquecimento reconfortante. Raios de


vermelho riscaram a escuridão.
Dor. Isso fez com que ele se aproximasse muito rápido, e seu
corpo se dobrou instintivamente para se proteger. Isso só fez piorar,
e seus olhos se abriram para um vazio escuro que poderia ter sido o
fundo de um abismo.
Na miséria da consciência renovada, ele não notou nada além
da dor. Ele se forçou a verificar todas as suas partes, testando o
dano. Aliviado que ele estava inteiro, ele deitou de costas e
lentamente se levantou.
Foi então que, quando os gritos embotaram e sua mente
encontrou alguma acomodação para sua condição, ele percebeu que
estava sozinho.
Ele não precisava de uma luz para saber disso. Ele não se
incomodou em dizer o nome dela. Ele estava tão certo disso quanto
na manhã depois de terem feito amor pela primeira vez.
Uma nova dor o atravessou, tornando as outros insignificantes.
Marcou seu coração com cortes repetidos. Não iria parar. Apenas
continuou cortando.
Ele agarrou a parede e se forçou a ficar de pé. Os novos golpes
não foram suficientes para mantê-lo no chão.
Isso só aumentou a angústia. Ele deveria estar meio morto
pelo menos.
Joan deve ter feito sua barganha logo depois que Guy chegou.
Ele deveria ter sido mais forte. Se ele tivesse ficado consciente,
ela nunca teria feito isso.
Ele amaldiçoou alto, para ela e para si mesmo e para o homem
que brincou com eles. Sua voz trovejou nas pedras. Ele a imaginou
com Guy, e um rugido primitivo arrancou dele.
Ele se forçou a se mover, afastou a dor e testou sua força.
Descobriu que a dor não era suficiente para impedi-lo. Seus
músculos foram maltratados, mas não rasgados. Carregar pedras e
balançar um martelo lhe dera uma espécie de escudo.
As sombras mais vagas emergiram da escuridão. Pequenos
riachos de luz cinzenta filtravam-se pelos orifícios de ar. O primeiro
brilho da aurora começou a oferecer uma iluminação sutil à sua
prisão.
Quanto tempo ele esteve fora? Quanto tempo desde que ela
saiu? Quanto tempo Guy a tinha em seu poder?
Ele tentou não contemplar isso, mas sua mente se encheu com
as provocações de Guy. Cada golpe de um punho foi seguido por
descrições do que aconteceu durante aquelas semanas antes de ela
escapar. Guy semeara imagens que agora torturavam pior que todas
as feridas corporais.
As imagens encheram-no de uma raiva que obscureceu sua
condição. Isso entorpeceu as feridas e bloqueou o sofrimento. Ele
agarrou a loucura e segurou-a. Quando aquela porta se abrisse
novamente, ele mataria o homem, não importando quantas espadas
estivessem vindo para ele.
Ele descansou contra uma parede e esperou. Cada fibra do seu
corpo preparada. Ele pegaria o demônio pelo pescoço e o levaria de
volta para o inferno com suas próprias mãos e todas as armas na
terra não o derrotariam antes de terminá-lo.
Ele centrou sua vontade, juntou toda a sua força para atacar e
esperou pelo som da chave na fechadura.
Chegou mais cedo do que ele esperava. Uma nova explosão de
fúria atravessou-o enquanto o metal batia contra o metal. O barulho
anunciava mais do que seu próprio destino. Isso significava que Guy
tinha terminado com Joan por agora. Suas memórias tomaram vida
novamente. Os medos tomaram forma.
Ela poderia até estar morta.
Ele deslizou para onde poderia atacar rapidamente, escolhendo
um canto que uma tocha na entrada não iluminaria.
A porta se abriu. Uma sombra escura entrou. Ele estava na
metade do caminho para agarrá-lo antes que ela penetrasse em sua
indignação por ser pequena, magra e solitária, e que nenhum passo
de bota soou nas pedras.
Joan
Ela se abaixou, olhando ao longo das paredes para ele.
— Rhys? Onde você está?
— Aqui, atrás de você.
Ela se virou, mas ele não podia ver seu rosto no escuro. Ele
não tinha certeza se queria.
— Você pode andar? Não há muito tempo. Devemos ir
rapidamente.
— Eu posso andar. Ele poderia voar se precisasse.
Ela saiu pela porta e ele a seguiu. Eles roubaram a passagem
baixa alinhada com outras celas.
— Ele te deu a chave?
— Eu não contei com tanta generosidade. Eu roubei a chave.
Quebrei um tijolo aquecido contra sua cabeça e peguei. Ele não está
morto, entretanto, e pode acordar, então devemos partir
imediatamente.
Um tijolo de aquecimento. De uma cama.
— Eu te disse para não negociar por mim.
— Se eu não tivesse, você não teria vivido até o amanhecer.
Ele usava uma adaga quando ele veio, e desembainhou quando você
caiu. A escolha foi minha para fazer, não a sua.
As imagens invadiram novamente e a raiva queimou.
Eles chegaram ao pequeno portal que dava para o quintal. Ele
abriu-a. Dois cavaleiros passeavam.
Ele tocou o braço dela para dizer a ela para esperar.
Sua mão cobriu a dele e pressionou firmemente.
— Não foi como você pensa. Eu fingi obediência para que ele
baixasse a guarda, mas nada aconteceu. Eu posso ter rido quando
senti o tijolo, mas ele não tinha me tocado ainda.
Ela falou seriamente. Talvez ela tenha dito a verdade. Talvez
não. Ela nunca o deixaria saber se ela havia comprado a vida dele
com mais do que um sorriso.
— Mesmo assim, você não deveria ter ido a ele. Não por minha
causa.
— Repreenda-me uma vez que estivermos longe daqui. Agora
mesmo, sair dessas paredes é o mais importante. Você acha que
poderíamos apenas atravessar o portão? Ele contou apenas para
alguns de seus funcionários sobre nós, e o guarda não deve parar
nos.
— Você vai andar. Vá para a cidade e encontre seu irmão e os
cavaleiros que vieram com Addis. O amanhecer se aproxima, e eu
devo fazer algo antes de me juntar a você.
— Não. Você não tem utilidade para eles em seu estado.
— Meu estado não é tão ruim. Eu acho que tenho a força de
um cavalo apesar de meus ferimentos. Nenhuma dor entra em
minha mente, Joan. Não há espaço para isso, por causa da fúria que
me possui.
— Ponha sua raiva de lado e encontre algum sentido. Guy
pode estar procurando por você. Eu não o machuquei muito, temo,
e mesmo agora ele pode estar a caminho daqui. Você deve vir
comigo, e nós devemos ir agora.
— Espero que ele esteja procurando. Se não, eu o encontrarei.
— Deus tenha misericórdia, Rhys. Eu imploro, fuja comigo
enquanto podemos. Eu não quero vingança contra ele. Essa parte do
passado morreu para mim. Nosso amor a matou. Eu não vou
arriscar você a seu poder horrível. Isso não me importa mais. Eu não
me importo.
— Eu me importo. Isso importa para mim.
Ele abriu a porta na largura de um corpo. A luz fluía entre eles,
e ele podia ver sua angústia e medo. Ele acariciou o rosto dela e
saboreou sua pele macia e suave sob os dedos. Ele se inclinou para
beijar seus lábios.
Ele demorou um instante, depois a empurrou para a luz.
— Para o portão, querida. Eu ordeno isso a você, como a
esposa do meu coração. Não corra. Deixe parecer que você é
apenas um servo passeando pela cidade. Torne-se Joan ladrilhadora
novamente. Torne-se invisível.
Não havia perigo de ela correr. Ela mal conseguia se mexer.
Seus pés poderiam ter sido feitos de chumbo.
O pátio estava acordando para a manhã e Joan viu todos os
detalhes com precisão assustadora. Um cão castanho trotou ao
longo da parede da fortaleza. Cavaleiros se estendiam na porta do
alto das escadas. Uma linha lenta de servos entrava pelo portão,
pronta para começar seu trabalho.
Parecia um quintal de castelo tão normal. Calma e sonolenta e
quieta. Nenhuma atenção foi dada a muita coisa, muito menos a
mulher humilde se arrastando ao longo da parede em direção ao
portão.
Ela não suportaria deixar Rhys. Ela rezou para que ele mudasse
de ideia e viesse com ela. Se ele não fosse, ele morreria aqui. E
seria culpa dela. Não importa o que mais ele alegasse, ele fez isso
por ela.
De alguma forma, suas pernas se moviam em obediência ao
seu comando. Ela esperou ouvir o passo dele atrás dela. Ela
implorou para ele encontrar seu senso e se juntar a ela nesta
partida.
Ela se aproximou do portão e ele ainda não tinha vindo. Ela
enfrentou a ponte levadiça aberta. Seu coração esvaziou.
Ela hesitou em dar os passos finais. Uma batalha caótica
travada nela.
Uma voz gritou pelo quintal, cortando a paz da manhã e
silenciando o debate do seu coração.
Joan girou no som e sua atenção se voltou para sua fonte. Guy
estava no topo dos degraus da torre, gritando para o portão ser
fechado.
Seu olhar varreu o quintal. Parou nela, prendendo-a no lugar.
Perigo olhou para ela. Sua expressão dizia que não haveria perdão
para essa última traição. Mesmo o preço do corpo dela não
compraria a vida dela.
A ponte levadiça começou a descer.
Os servos pressionaram contra a parede, buscando refúgio do
problema que o grito havia anunciado. Ninguém se mexeu, exceto
Guy. Ele desceu os degraus em direção a ela. As cabeças dos
cavaleiros e dos habitantes do castelo se agrupavam em portas e
janelas, atraídas pela perturbação.
Ele chegou ao quintal e apontou para ela. Só um tolo não teria
temido o que queimava em seus olhos.
Outro movimento. Outro homem. Rhys saiu da parede. Ele
caminhou até o centro do pátio, bloqueando o caminho de Guy.
Ele apenas ficou lá, forte apesar de suas feridas. Ela duvidava
que alguém além dela iria detectar a rigidez que indicava que era
apenas o poder de sua vontade que o manteve em pé.
Guy parou, reconhecendo um desafio quando via. O silêncio se
quebrou quando botas e sapatos desgastados marcaram a chegada
de mais soldados e servos. Cavaleiros desceram os degraus do
corredor. Um círculo de observadores tomou forma.
Os dois homens mediram um ao outro. Joan também mediu e
sabia que seu amor seria destruído em breve. Guy não usava
espada, mas seu punhal pendia do cinto. Rhys morreria se isso fosse
mais longe. Sua fúria e determinação não podiam protegê-lo de uma
lâmina.
Ela deu um passo em direção a ele. O braço dele saiu do seu
lado, reto e firme. Sua palma a encarou com a ordem de ficar para
trás.
Ela olhou desesperadamente em volta da multidão, na
esperança de encontrar alguém que pudesse impedir isso.
Máscaras de excitação a olharam de volta. Toda a atenção
centrou-se no círculo aberto do pátio e nos dois homens que
prometiam algum esporte sangrento. Ninguém notou seu olhar
suplicante, ou qualquer outra coisa.
Não, nem todo mundo assistia. Ao longo da parede, atrás da
multidão, alguns corpos se moviam. Muito lentamente, um por um,
alguns dos criados que tinham acabado de chegar se dirigiram para
a escada da torre. Eles não pareciam mais do que formas mutáveis
de marrom e cinza, seus corpos e cabeças obscurecidos por velhos
mantos.
Edward. Ele estava dentro.
Ela desviou o olhar para que não chamasse atenção para eles.
Quantos ela viu? Cinco?
Sete? Rhys reconheceu os cavaleiros curvados se arrastando
entre os criados? Ele sabia que eles estavam aqui?
Sim, ele sabia. Ele esperou o máximo que pôde antes de
começar. Deixou o pico de expectativa da multidão começar a cair
antes de voltar a subir mais alto.
— Você tem muito a que responder, Leighton.
— Não é suficiente, se você ainda pode ficar de pé.
— Eu não estou falando de mim mesmo.
— Um cavaleiro ungido não responde ao seu pedreiro inferior.
— Você faz hoje.
Um grupo de cavaleiros riu. Guy sorriu para eles, depois
inclinou a cabeça enquanto considerava Rhys.
— Você deve saber que vai morrer. E para quê?
— Para minha dama.
— Para aquela cadela assassina? Ela pode ter o sangue, mas a
alma dela é de prostituta. Eu a tive novamente, você sabe. Esta
manhã. Ela implorou por isso. Ela gemeu por mim.
— Você mente, mas não tem valor. Você terminou com ela.
Aqui, hoje, você responderá por tudo isso.
Guy virou-se para os espectadores e estendeu os braços. Como
um jogador em um concurso de mistério, ele apelou para o público
deleito.
— Ele não é um campeão ímpar, mas o desafio é claro. Ele não
é digno dos meus esforços, e ela não é digna de seu sacrifício, mas
ainda assim ele insiste em forçar isso. Eu fui generoso em dar a ele
a chance de se retirar, não?
Os cavaleiros certamente pensaram assim. A maioria dos
servos concordou.
Ele cerimoniosamente removeu seu punhal e colocou-o aos pés
dos cavaleiros.
— Eu não gostaria que dissesse que eu tinha uma vantagem
injusta.
O gesto deu a Joan pouco conforto. Ele não precisaria de um
punhal contra um homem que ele já havia espancado até a
inconsciência há apenas uma hora.
Guy enfrentou Rhys novamente - não mais angelical em sua
beleza, sem mais humor em seu rosto. Expectativa animada ardia
em seus olhos, e a antecipação transformou sua expressão.
- Então defenda a honra de sua dama, pedreiro. Deixe que o
julgamento de Deus lhe mostre a verdade. Morra sabendo que tudo
o que ela lhe contou foi uma mentira para esconder sua culpa pela
rapidez e avidez que ela renunciou à sua virtude.
A multidão não sabia como Rhys já estava machucado, mas
Guy sabia. Ele andou para frente com impunidade e balançou.
Rhys levou o golpe. Ele cambaleou, mas não caiu. Joan sentiu
o impacto do punho, ouviu seu baque surdo e tirou o fôlego dela.
Figuras encapuzadas escorregaram os degraus da torre.
Rhys deixou mais três golpes caírem, até que o último grupo
de Edward foi engolido pela escuridão no topo da escada.
Quando Guy balançou a próxima vez, seu punho encontrou a
barreira implacável de uma mão que poderia quebrar pedra.
Guy olhou em choque para a mão que segurava a dele em seu
torno.
Olhos acesos com o fogo do inferno se ergueram. Os fogos da
justiça resplandeceram.
A mão esmagadora imobilizou Guy. Dor quebrou em sua
expressão, e seu corpo se dobrou.
— Acho que você deveria pedir perdão, disse Rhys.
— Você é louco.
— Um louco é perigoso. Ele não sente dor, como um homem
sensível. Ele não conhece restrição. Implore seu perdão.
— Sob o comando de um lapidário? O inferno que eu vou.
Rhys sorriu e rugas se formaram. Não charmosas dessa vez.
Perigosas. Seus olhos pareciam aço polido refletindo o céu.
— Estou feliz que você não vai. Agora este lapidário tem uma
desculpa para quebrar todos os ossos do seu corpo.
Ele levantou o braço de Guy até que o homem se esticou e deu
um soco no estômago. Se Guy fosse uma estátua, um grande
pedaço de pedra teria voado.
Outro golpe mandou Guy se esparramar no chão.
O silêncio da multidão quebrou. O verdadeiro concurso havia
começado. Um barulho encheu o quintal enquanto gritos insistiam.
Em algum lugar da fortaleza, os homens se moviam através de
câmaras desertas para uma rainha e um usurpador cujos comandos
não seriam ouvidos.
Parecia durar para sempre. A luta não foi toda unilateral. Guy
era rápido e Rhys, por toda a sua loucura, havia sido muito
enfraquecido durante a noite.
Rhys nunca desceu. Os olhos de Joan enevoaram-se. Sua
preocupação doentia não conseguia obscurecer completamente seu
orgulho. Ele ficou de pé por ela. Ele havia tomado aqueles primeiros
golpes pela causa do rei, mas agora ele a defendia. Protegia a ela.
Ele lutou por sua honra e sua liberdade e sua vida.
Nenhum cavaleiro na Inglaterra poderia ter mostrado mais
coragem.
Guy voou novamente e pousou perto dela. Rhys cambaleou e
levantou-o pelo pescoço da túnica. Ele balançou.
Não um golpe, mas um duro tapa no rosto que fez a cabeça de
Guy retroceder.
— Ela gemeu para você? Ele bateu de novo. — Eu quero que
você gema, para que você aprenda a ouvir a diferença entre prazer
e desespero.
Guy ficou flácido e não se defendeu da punição. Um
movimento na beira da multidão atraiu a atenção de Joan. Dois
cavaleiros se separaram e começaram a se aproximar de Rhys por
trás.
Uma voz soou pelo pátio, instantaneamente silenciando a
multidão. Um comando firme ordenou aos cavaleiros que ficassem
para trás.
Addis e um jovem de cabelos castanhos estavam no topo da
escada. Nenhum capote cobria sua armadura. O manto do jovem
usava o brasão real.
Foi Edward quem emitiu o comando. Se sua presença, sua
armadura e espada não anunciavam o que ocorrera, então, o tom de
autoridade e suas palavras o fizeram.
Choque se espalhou pela multidão. De repente, ninguém se
importou mais com a luta entre um cavaleiro e um pedreiro.
Rhys ainda pairava sobre Guy. Joan foi até eles. Ela olhou para
o homem que destruiu sua vida. Ela não podia negar que ela sentia
alguma satisfação em vê-lo humilhado assim.
A mulher que ela era hoje não precisava disso, mas a garota
que ela já tinha sido ainda amava.
Rhys parecia não ter notado que as coisas haviam mudado. Ela
tocou o ombro dele, chamando-o de volta do lugar onde ele havia
ido para encontrar sua força.
— Acabou. Edward derrotou Mortimer, e os guardas sabem
disso. Eles não estão resistindo.
Ele olhava para o homem meio consciente em suas mãos. Ele
não pareceu ouvi-la.
— Está feito, Rhys. O portão está aberto novamente, e os
homens de Barrowburgh estão entrando para proteger o castelo.
Sua atenção não vacilou de seu inimigo. A fúria em sua
expressão não diminuiu. Ela pensou que ele iria bater em Guy
novamente.
Uma nova presença aqueceu seu lado. Addis entrou no lugar
ao lado dela.
Rhys ainda segurava Guy.
Addis desembainhou a espada e ofereceu-a.
— Termine, se você quiser. Não haverá julgamento sobre isso.
Ele é um homem morto de qualquer maneira, e isso pode ser uma
misericórdia se ele enfrentar o destino de seu lorde.
Rhys voltou seu olhar de aço para a espada. Ela esperava que
ele alcançasse o punho. Ela poderia dizer que ele queria.
Ele soltou seu aperto e Guy caiu de volta na terra.
— Deixe o carrasco tê-lo.
Sua falsa força o abandonou imediatamente. Ele começou a
afundar. Joan se apressou para se oferecer como apoio. Ele se
inclinou sobre ela e juntos seguiram Addis e se dirigiram para os
degraus.
Confusão os cercou. O pátio fervilhava de agitação. A notícia
da queda de Mortimer zumbiu no ar. Ela ouviu tudo, mas não sentiu
excitação nem triunfo. Parecia uma coisa tão pequena de repente.
Ela só se importava que Rhys estivesse vivo, e que o braço dele
circulasse seus ombros, e que seus passos caíssem ao lado dos dela.
Uma corrida atrás dela. Uma onda de perigo. Seus instintos
sabiam disso antes de seus sentidos.
Rhys também sabia. Seu braço a empurrou para frente, em
Addis. Ela cambaleou e se virou e viu Guy se lançando, com o braço
levantado e o punhal brilhando.
Aconteceu rápido, rápido demais para ver claramente. Seu
choque absorveu apenas pedaços dele. Detalhes fraturados
apareceram, precisa e lentamente.
A adaga caindo para ela. Rhys pegou a própria lâmina no
aperto de sua mão esquerda e lançou seu corpo em Guy. Sangue
escorrendo pelo seu braço e a adaga se movendo de novo. Outra
garra, uma rápida reviravolta e dois homens se esparramam no chão
em uma luta de morte.
Então quietude. Nenhum movimento em tudo. Ambos pareciam
mortos.
Um grito silencioso rasgou através dela. Sua respiração parou.
Ela sentiu como se seu coração tivesse parado de bater.
Lentamente, Rhys rolou o corpo abaixo dele. A adaga estava
tão profundamente incrustada no peito de Guy que apenas seu
punho aparecia. Guy olhava com os olhos arregalados para o céu.
Os fogos morreram e seus olhos se transformaram em gelo violeta.
Addis levantou Rhys da sujeira e do sangue. Ele colocou um
braço flácido no pescoço e começou a arrastar o amigo para a
fortaleza.
Sua voz explodiu acima da confusão, ordenando a seus
homens que mandassem um cirurgião imediatamente.
Capítulo XVII
― Nunca podemos dizer, é claro, disse o cirurgião. — Eu
vi cortes de espada como estes que curaram bem o suficiente para a
mão segurar uma arma. Se não, graças a Deus não foi sua mão
direita.
Rhys não falou, nem viu o novo sudário tomar forma. Os
poucos minutos de lavagem e unção com bálsamos lhe disseram o
que ele precisava saber. Livre dos chumaços de tecido e pontos, ele
havia testado o movimento de sua mão.
O cirurgião pareceu incomodado com a falta de resposta de
seu paciente. Ele não percebeu que não era indiferença que
manteve Rhys em silêncio.
Ele recolheu suas tigelas e pomadas. Ao sair da câmara, Addis
entrou.
Ele gesticulou para a bandagem branca.
— Como está isso? Não há inflamação?
— Parece e cheira limpo.
— Graças a Deus por isso. Aquele açougueiro queria tirá-la,
mas eu disse que faria na cabeça dele tudo o que ele fizesse com a
sua mão, e ele repensou isso. Não dê ouvidos às sanguessugas e
coisas assim. Elas ignoram essas coisas. Deixe-a curar e, em
seguida, ver como funciona. Foi-me dito uma vez que eu nunca iria
andar de novo, mas eu ando.
— Mesmo que o dano seja permanente, não é tão horrível.
Edward vai me nomear seu principal construtor hoje. Eu vou ter
tempo para esculpir mais, e eu não vou morrer de fome por perder
meu ofício.
Addis fingiu que era uma boa notícia, mas a expressão em seus
olhos dizia que ele entendia a verdade disso. Perder o ofício
significava perder parte de si mesmo.
A tristeza por isso viria depois. Uma tristeza diferente esperou
hoje.
— Você vai andar com a gente?
— Não. Eu irei e verei seu irmão reconhecido, mas quando
você os levar para casa, eu não irei.
— Você falou com ela sobre isso?
— Eu vi pouco dela desde que a rainha de Edward chegou.
Philippa finalmente encontrou um amigo em quem ela pode confiar,
e está com ciúmes do tempo de Joan. Uma dama de companhia
para a Rainha da Inglaterra não desiste de suas obrigações sem
explicar o porquê, e eu não sou uma explicação adequada. Ela foge
quando pode, mas eu não perco esses momentos falando do que
espera.
Addis assentiu vagamente. Uma simpatia silenciosa o encobriu.
Ele poderia não falar sobre isso, mas ele entendeu o que logo seria
perdido.
— Você volta para Londres, então?
— Tenho pensado que vou primeiro visitar a casa da minha
juventude. Não voltei há anos e, enquanto estava deitado, me vi
ansioso por vê-la novamente. Meus pais estão mortos, mas eu tenho
parentes lá.
— Então você vai para o oeste. Isso torna mais fácil pedir um
favor a você. Vou levar meus homens comigo quando escoltar Mark
e Joan para as terras de seu pai. Você pode ir a Barrowburgh a
caminho das marchas? Moira espera por mim e eu não quero que
ela fique ansiosa.
— Terei prazer em levar para a notícia de sua segurança e do
que aconteceu. Isso daria à sua jornada algum propósito. Na
verdade, ele se dirigiria para o oeste principalmente porque ele não
queria voltar para Londres ainda. Depois de hoje, ele precisaria de
mais tempo antes de voltar para aquela casa.
Addis sentou-se e eles falaram dos acontecimentos dos últimos
dias. Mortimer fora enviado a Westminster para aguardar sua
execução, e a rainha Isabella fora banida para CastleRising. Guy
Leighton foi enterrado, a única fatalidade da ação. Edward enviara
um decreto por toda a terra, anunciando que tomara as rédeas do
poder, e os barões haviam começado a chegar a Nottingham para
mostrar apoio ao rei. Os primeiros a chegar foram alguns leais ao
usurpador e Edward tinha sido magnânimo em seu perdão.
Algumas cabeças selecionadas rolariam, mas não haveria novo
banho de sangue.
Os sinos da capela tocaram. A conversa deles secou. Addis
levantou-se.
— Vamos terminar, então. É bom e certo que você esteja lá,
porque o dano na ação foi principalmente seu.

Pessoas de todos os graus ocupavam o corredor. Uma


atmosfera festiva encheu o espaço e as mesas de comida
esperavam.
Primeiro, no entanto, Edward faria uma audiência, e
favoreceria aqueles que o ajudaram, e escutaria as petições como
um bom rei deveria.
Ele entrou com sua jovem rainha. Ela trouxera sua coroa e
seus mantos com ela, e eles caminharam até as cadeiras
estabelecidas para servir como seus tronos. Ao grito de alegria dos
barões, o rei finalmente tomou seu lugar de direito.
Rhys mal ouviu o resto. Mesmo quando ele foi chamado e
recebeu o favor do rei, ele não escutou completamente.
Sua atenção havia sido absorvida por uma mulher em meio às
damas que haviam arrastado Philippa para a câmara.
Joan.
Ela parecia incrivelmente bonita. A rainha havia decorado sua
nova amiga com as melhores roupas. Um vestido tão azul quanto
safiras fluía como água em seu corpo estreito, e as decorações
enfeitadas de joias mergulhavam em seus seios e quadris. Ele
percebeu que nunca a tinha visto em uma roupa que se encaixava
antes. Seu cabelo loiro tinha sido trabalhado em um rolo intrincado
em torno de sua cabeça, e outro rolo, de preciosa seda azul e fios
dourados, repousava sobre ele sob um véu dourado transparente.
Mais seda atravessava a longa trança pendurada nas costas.
Ela havia sido transformada, transformada em alguém preciosa
e nobre e mais valiosa que as pérolas. Uma mulher de beleza e
dignidade a ser desejada de longe por muitos. Um prêmio a ser
ganho apenas na mesa de aliança e política.
Ela parecia um pouco triste. Sua expressão se iluminou apenas
quando ele se aproximou para receber sua nova posição. Ele não
ficou perto dela por muito tempo. Por toda a gratidão de Edward,
um pedreiro era uma questão menor, e as coisas mais importantes
esperavam.
As petições começaram e Addis avançou. Ele chamou Mark
para se juntar a ele. Com a mão no ombro do jovem, ele explicou a
história que Edward já sabia, mas que os outros barões deveriam
ouvir. Pediu a Edward que devolvesse as terras de Brecon ao filho
de um homem que não fizera nada de errado, mas que apenas
obedecera ao seu juramento como ele o entendia.
O rei gesticulou para Mark. Menos de três anos de idade os
separavam. Por um momento, foi um jovem olhando para um
jovem, e não um rei examinando um peticionário. Edward ofereceu
sua mão em amizade antes de posicioná-lo em uma demanda por
fidelidade.
Mark levantou-se depois do juramento e estendeu o braço para
as damas de companhia.
— Esta é minha irmã, meu senhor. Eu imploro sua bênção a
nós dois.
Joan se adiantou para finalmente recuperar sua vida. Elegante.
Beleza de tirar o fôlego. Algo doloroso e orgulhoso inchou no peito
de Rhys. Ele olhou em volta para os barões e cavaleiros. Todos os
olhos masculinos se fixavam nela.
Tinha começado. Mas então, Philippa provavelmente planejara
isso e tornara a exibição mais magnífica com essa intenção. A
generosidade de uma rainha exigia tais esforços para um amigo.
Influenciar alianças organizando casamentos era o poder mais
importante que ela exercia.
Edward abriu um sorriso infantil.
— Eu lhe dou ao boas-vindas, senhora. E me vejo meio
aturdido por você. Depois da minha rainha, você é a mulher mais
amável da câmara hoje.
— Obrigada, meu senhor.
— Seu marido está aqui com você?
Ela hesitou. Mark respondeu por ela.
— Seu prometido morreu.
— Recentemente? Sinto uma melancolia em você.
Mais uma vez, Mark teve que responder.
— Três anos atrás, mas ela ainda lamenta tudo o que foi
perdido.
Compreensão entrou nos olhos de Edward.
— Bem, isso acabou agora. Seu irmão vai sentar na cadeira do
seu pai em breve, Lady Joan. E você vai se sentar ao lado de um
senhor de nossa escolha. Uma beleza como a sua não deve ser
desperdiçada em pesar.
Mais uma vez ela hesitou. Rhys só conseguia enxergar as
costas dela. Finalmente, sua voz falou clara e firmemente, com mais
determinação do que gratidão.
— Obrigada, meu senhor.
Edward disse outra coisa, mas Rhys não deu ouvidos. Ele se
virou e atravessou as pessoas em direção à porta.
Estava concluído. Joan Ladrilhadora tinha ido completamente
embora, e a filha de Marcus de Brecon ressuscitou em toda a sua
glória.
Ele caminhou até o quintal. Encostou-se à parede da torre e
respirou fundo o ar fresco.
A dor em seu peito não veio apenas de suas feridas curando.
Estava terminado, mas ainda não terminara.

Philippa não deixava Joan sozinha. A rainha era uma menina


doce, mas muito grata por encontrar uma amiga que se separava
das suspeitas e decepções dos últimos anos. O vínculo rápido
tornou-se invasivo.
Joan sofreu as introduções contínuas aos senhores e
cavaleiros. Repetidamente ela tentava se afastar, apenas para ter
Philippa acenando para outro homem.
Ela continuou procurando na multidão por Rhys. Ela precisava
vê-lo. Mark dissera que Rhys não os acompanharia para o oeste
quando partissem hoje, e ela precisava convencê-lo a mudar de
ideia.
Não poderia terminar agora, assim. Ela havia se sentado em
sua cama nos primeiros dias enquanto ele começava a se curar, mas
desde que a rainha chegara, havia apenas alguns minutos
encharcados com a horrível consciência de que ela perdera o
controle sobre seu futuro.
Outro homem. Outra introdução, e outro arco cortês. Outra
inspeção apreciativa e outra bajulação florida.
Ela não podia suportar. Logo, cedo demais, ela lidaria com a
vida que esses pretendentes representavam. Agora ela queria se
agarrar à atenção de outro homem e às memórias de uma vida
diferente.
Uma dor encravada nela, profunda e baixa sob seu coração.
Ela estava perdendo o controle sobre o que tinha sido.
Ela sentiu que estava escorregando desde que Mortimer caiu,
apesar de apertar-se. Perdera sua solidez. Fluía como a areia mais
fina encontrando caminhos através de seus dedos.
A refeição estava acabando. A dança parou.
Do lado de fora, cavalos e carroças esperavam. Eles deveriam
partir assim que as festividades terminassem.
Ela precisava encontrar Rhys. Falar com ele. Se aquecer em
sua presença, apenas os dois sozinhos juntos, por alguns
momentos, pelo menos. Ela precisava implorar para ele ir com ela,
pelo menos por alguns dias. Ela precisava segurá-lo uma última vez,
por mais uma noite, pelo menos. Ela precisava...
Outro homem. Não era um pretendente. Addis de Valence
parou na frente dela. Palavras floridas fluíram de sua boca, mas não
para ela. Ele se dirigia à rainha.
Ele olhou para Joan e depois para a porta, e ela entendeu. Ele
não era um homem dado aos jogos da corte, mas ele poderia jogá-
los se ele escolhesse. Ele escolheu agora, por distrair Philippa. Ele
logo teve a rainha rindo e corando.
Joan deslizou silenciosamente para longe.
Ela correu pelo corredor e saiu para as escadas. Abaixo, no
pátio, os homens de Barrowburgh esperavam. A procissão que a
levaria para casa preparava-se para partir.
Ela examinou o quintal e encontrou Rhys. Ele estava de pé
contra a parede, com os braços cruzados e a mão amarrada contra o
peito. Ele havia falado levemente daquela ferida, mas ela sabia que
isso o machucava.
Ela desceu correndo os degraus, rezando para que Philippa
mantivesse Addis por muito tempo. Horas. Dias.
Para sempre.
Ele a viu chegando e abriu os braços para ela. Ela afundou em
seu calor e força, e saboreou cada pedacinho de seu toque
enquanto acariciava suas costas suavemente.
Ele a colocou longe e olhou para ela. Mais do que a apreciação
de um homem apareceu em seus olhos.
— Edward mentiu. Você era a mulher mais bonita do salão, e
nenhuma rainha a superava.
Ela tocou a seda azul. Por alguma razão, ela se sentiu muito
envergonhada por seu luxo.
— É seu vestido, ajustado para mim por suas costureiras. Eu
não gosto muito disso.
Ele gentilmente tocou a coroa de seda e ouro e o véu.
— Você pertence a uma tapeçaria, linda pomba. Uma onde
galantes cavaleiros cortejam suas damas e anjos cantam no céu, e
estandartes e cavalos enfeitados anunciam a vinda do melhor
sangue.
Ele falou de quem ela era e para onde ela estava indo. Ele
sorriu, mas uma nuvem de tristeza desceu sobre os dois.
Seus olhos intensos olhavam para os dela. Sabendo. Aceitando.
Ele era mais forte do que ela jamais seria.
— O rei e sua esposa favorecem você e seu irmão. Tudo ficará
bem agora.
— Como pode estar bem se você não está comigo? Por favor
venha conosco. Um dia só. Não pode fazer mal algum.
— Um dia só. Então outro dia. E outro. A separação não será
mais fácil com o atraso.
Ele falou gentilmente, mas com finalidade. Seu coração ficou
pesado, como se absorvesse uma dor que nunca cederia.
Ela não o teria separado dela. Ela não poderia. A dor disso a
mataria. Já sentia uma angústia sufocante que a deixava lutando
para respirar.
Lágrimas se abriram, e ela não pôde segurá-las.
— Eu não irei. Cumpri meu juramento com a memória de meu
pai. Temos tudo de volta, e Mark tem o seu lugar. Eu ficarei com
você. Voltaremos a Londres e viveremos juntos e iremos conhecer a
felicidade novamente.
Ele roçou os lábios contra ela, silenciando o fluxo de palavras
dela.
— Seu irmão ainda é jovem, e ele precisa da sua orientação.
Ele vai precisar muito da aliança que Edward planeja para ele. Seus
deveres não podem ser jogados tão facilmente, e nós dois sabemos
disso.
— Eles podem, se eu quiser. Eu só preciso decidir e escolher a
liberdade com você.
— Não é tão simples, amor. Não apenas o dever chama você.
Por três anos, recuperar sua vida foi tudo o que lhe sustentou. É
uma parte da sua alma e do seu coração, mesmo que você não
reconheça isso agora. Você não pode virar as costas para o objetivo
que agora que está nas suas mãos.
Ela se agarrou ao peito dele e chorou em sua túnica. A noção
de que esta seria a última vez que ela o segurava rasgou sua
compostura em pedaços.
— Eu posso virar as costas para isso. Eu não me importo com
isso. Eu não quero isso. Eu odeio esse vestido e véu. Eu odeio
aqueles senhores dentro do corredor.
Ele aninhou seu rosto contra a cabeça dela.
— Você odeia seu irmão? Você pode dar as costas para ele? A
honra de sua família e seu lugar nisso? É disso que você fala. Ele
está aqui agora, não muito atrás de você. Vire-se e veja-o.
Lentamente, ela olhou por cima do ombro. Mark estava ao lado
dos cavalos, impaciente para sair. Ele não os assistia, mas ela
poderia dizer que ele tinha visto o abraço deles na sombra da
parede.
"Nós vamos recuperar a nossa casa como a deixamos, de mãos
dadas. "
Rhys limpou algumas lágrimas, mas elas continuaram fluindo.
— Você não pode abandoná-lo, nem o restante. Você não
estará completa se você negar isso agora. Você deve ir para casa.
Você deve recuperar tudo, e ficar em triunfo onde você foi
derrotada. Uma vez que você fizer, você vai saber que você
pertence lá, como eu já sei.
Sons atrás dela. Movimentos. Ela ouviu a voz de Addis,
chamando os homens para montar.
Ela se pressionou contra Rhys, e correu as palmas das mãos
sobre seus ombros e braços, sentindo sua solidez com intensidade
desesperada. Imagens dele, esculpindo no jardim, de pé abaixo dos
estoques, olhando para ela com amor, encheram sua cabeça. As
lágrimas não puderam chegar rápido o suficiente. Elas recuaram em
sua garganta e então em seu coração, escaldando-a com seu poder
não gasto.
Ele a beijou. Um último beijo. Um a durar por toda a vida.
— Vá agora.
Ela não pôde. Ele teve que empurrá-la para longe dele.
Ela não conseguia se mexer. Ela se ressentia do dever de
espera. Se ela desse um passo, todos os outros seguiriam, e o
caminho deles a levaria embora daquele homem que a salvara de
muitas maneiras.
Sua expressão se apertou e seus olhos ficaram velados.
— Vá, linda pomba, antes que eu comece a chorar com você.
Eu sempre me lembrarei dos votos privados que fizemos. Estaremos
juntos para sempre nas maneiras que importam.
Ele virou os ombros dela, de modo que ela enfrentou Mark.
Ela ficou imobilizada, rasgada em dois.
Seu irmão assistiu e esperou. Sua expressão dura se suavizou.
Ele estendeu a mão para ela.
Ela olhou para trás, para uma decisão final.
Foi negada a ela. Rhys havia ido embora.

Capítulo XVIII
― Eu agradeço a você por ter feito esta viagem para me
contar tudo. Eu ouvi sobre o decreto de Edward, mas é claro que eu
me preocupei com Addis.
Os toques de Moira gentilmente aplicaram um bálsamo sobre a
palma cicatrizando de Rhys enquanto ela falava. Ela insistiu em
cuidar disso ela mesma ao ver as bandagens quando ele chegou. Ele
passou a última hora bebendo seu vinho com uma mão enquanto
ela banhava a outra. Ele tinha desviado sua atenção da cicatriz crua,
regalando-a com histórias animadas sobre os grandes eventos que
ela havia perdido.
Ela preparou a bandagem para envolver sua palma.
— Eu acho que sua história está incompleta, no entanto, da
maneira que você montou no portão. Aqueles dias na sela exigiram
mais força do que você tinha. Você sofreu muito, meu amigo, e deve
ficar alguns dias e descansar.
Ele sabia que ela suspeitava do verdadeiro motivo de sua
condição. Não fora a jornada que o havia cansado, nem as feridas
cicatrizando, mas a falta de sono. Pensamentos de Joan o
atormentavam à noite.
Ele quase virou para o norte enquanto cavalgava. Vez após vez
ele teve que parar de ir para a estrada por onde ela viajava. Apenas
a dor de sua separação o impediu de fazê-lo.
Ele nunca mais queria passar por isso novamente.
— Você vai ficar como eu peço?
— Sim, alguns dias.
Eles se sentaram no sol, banhados pela luz que entrava pelas
grandes janelas. Uma enfermeira embalava o bebê em um canto e o
pequeno Patrick brincava com um brinquedo no chão.
A domesticidade o acalmou. O mesmo aconteceu com a
amizade de Moira.
Ela deixou de lado o potinho de unguento e segurou a mão
dele na dela.
— Há quanto tempo você recebeu esse corte?
— Uma quinzena.
— Parece que foi bem costurado.
— O homem fez o melhor que pôde.
— Não é bom o suficiente, temo. Você perdeu a força nessa
mão, não é?
— Não fecha como deveria. Acho que nunca fechará.
— É muito cedo para saber disso.
— É o que Addis diz. Mas eu sei disso.
Ela deve ter visto como ele estava certo, e não ofereceu mais
falsas esperanças.
— Sinto muito.
— Eu ainda posso segurar uma pena. E ainda posso criar com
minha mente se não minhas mãos. Ser o construtor principal do Rei
me trará riqueza, e status igual a um cortesão. Eu não perdi tanto.
— Isso não é verdade, Rhys. Você perdeu muito, e o fato de
que você nunca mais vai esculpir é apenas uma parte disso.
A tristeza em sua voz o tocou. Sondou sua dor oculta.
Algo nele começou a rachar, como se a borda fina de uma
cunha de metal tivesse começado uma fissura em uma pedra macia.
Ele olhou para a criança brincando nas proximidades. O
pequeno Patrick sorriu com a atenção. Ele se levantou e deu alguns
passos para se aproximar. Ele sorriu com um grande sorriso e bateu
no joelho de Rhys.
— Acima.
Rhys levantou o joelho. A criança riu e empurrou, mostrando o
que ele queria dizer.
— Ele quer que você cruze as pernas para que ele possa
montar sua bota— explicou Moira. — É um jogo que Addis joga com
ele.
Rhys cruzou as pernas. Patrick montou o pé de botas e se
inclinou para a perna, braços estendidos. Rhys o embalou para cima
e para baixo.
Os gritos de prazer da criança ecoaram pela câmara.
Rhys riu. Então, de repente, a alegria morreu e o som ficou
preso em sua garganta. Patrick ainda cavalgava, rindo de prazer,
mas a voz e o rosto da criança diminuíam. A fissura cresceu e
cresceu, como um martelo batendo na cunha, e profunda tristeza
derramou através da crescente lacuna, engolfando sua mente e
entorpecendo seus sentidos.
Mãos tiraram a criança do pé. Passos recuaram. Os uivos
indignados de Patrick e a agitação do bebê desapareceram por trás
de uma porta fechada.
O silêncio envolveu-o. Ele olhou cegamente para o local onde o
rosto inocente da criança tinha acabado de estar.
Braços maternais deslizaram ao redor dele. A mão de uma
mulher pressionou a cabeça em um ombro suave. Seu coração
golpeando alegrava o conforto, mas só o enfraquecia mais.
Ele respirou fundo e começou a se afastar.
— Inferno, Moira, seu marido nunca vai entender. Ele vai me
matar se ele souber disso.
Ela com firmeza aliviou sua cabeça de volta para baixo.
— Ah, Rhys, você ainda não o entende. Ele levou três
mensageiros para Nottingham e não precisava de você para fazer
essa viagem por ele. Ele enviou você para mim, para que você
pudesse compartilhar sua tristeza com um amigo.
A profundidade da generosidade de Addis o moveu mais do
que ele poderia conter. Derrotou suas defesas. A fissura atingiu seu
coração.
E então, porque era Moira, ele quebrou.
A neve cobria a cidade de Londres, e o céu nublado prometia o
cair da noite. Rhys virou o cavalo para a alameda onde ele morava e
deixou o cavalo encontrar o caminho de casa.
Ele havia atrasado seu retorno o mais que podia. Ele ficou com
Moira por mais alguns dias e depois foi para a cidade de sua
juventude. Seu tio o recebeu com carinho e lhe deu uma cama pelo
tempo que quisesse. Houve bons momentos lá, cercados pelos
primos nascidos da segunda esposa de seu tio.
Os jovens achavam que seu papel na queda de Mortimer era
uma aventura esplêndida, mas seu tio o seguira até o cemitério
certa noite para ter uma conversa particular. Enquanto eles olhavam
para os túmulos de seus pais, e de uma mulher de cabelos escuros e
um bebê sem nome, lembrando o que seu tio tinha falado.
— Se você fez isso por si mesmo, para avançar sua posição,
que assim seja. Mas se você fez isso por ela, e pelo que aconteceu
todos aqueles anos atrás, você ainda tem noções que precisam ser
consertadas. Que os senhores e bispos se preocupem com o seu
grande mundo. Os homens como nós vivem em um pequeno, e há
contentamento em nossos jardins que os nobres nunca conheceram,
vá e sirva o rei agora, e construa seus castelos e igrejas, e torne-se
rico a partir de seu favor, mas faça sua vida em seu ofício e em uma
família, se você quer conhecer qualquer paz. Não há nenhum ponto
em arriscar seu pescoço sobre quem detém o poder, garoto. Um é o
mesmo que o próximo a nós, e a justiça vem e vai ao seu capricho.
Encontre uma boa mulher e cuida do que é importante agora.
Talvez ele fizesse. Talvez fosse hora de deixar de lado as
noções de menino e aceitar o que era a vida. Sua nova posição na
corte significava que ele poderia até se casar acima de sua posição,
se quisesse. Não muito acima, mas havia cavaleiros que o aceitariam
para suas filhas. Ele procuraria uma mulher prática com
propriedade, que buscasse apenas segurança, e que não se
importasse com o fato de o amor do marido dela viver para sempre
com outra pessoa.
Ele parou alguns edifícios longe de sua casa, no lugar onde um
beco o levaria de volta ao estábulo. Sim, ele deveria começar uma
família e encontrar a paz que seu tio falou. Em um ano ou mais, ele
poderia ser capaz de fazer isso. Não nesta casa, no entanto. Não
haveria contentamento em seu jardim, nunca mais.
Alguns garotos passeavam. Um se afastou e veio cumprimentá-
lo. Era o amigo de Mark, David.
— Finalmente está de volta? Você perdeu todos os banquetes.
A enfermaria ficou bêbada por uma semana depois que o decreto foi
lido, e todos foram para a execução. Os homens continuaram
procurando por você, já que ouvimos que você estava no meio do
mesmo, da última vez. Eles teriam comprado toda a cerveja que
você poderia beber. Onde você esteve?
— Fui visitar minha casa de infância.
— Ah, bem, então você celebrou com eles lá. De qualquer
forma, foi um grande momento. Você quer que eu leve o seu cavalo
de volta? Mark me mostrou como prepará-lo.
A ideia de evitar a entrada do jardim atraiu Rhys. Ele
desmontou e entregou as rédeas.
David guiou o cavalo pelo beco, mas fez uma pausa.
— Ouvi dizer que Mark é um barão agora.
— Ele é.
— Ele sempre disse que tinha segredos que me
surpreenderiam. Eu não posso esperar até que ele volte e me conte
sobre isso.
— Ele não voltará. Ele voltou para sua casa.
— Ele pode visitar quando ele chegar ao tribunal. Ele puxou as
rédeas.
— Entre e se aqueça. Eu cuidarei do cavalo e deixarei suas
malas do lado de fora do portal do jardim.
O jovem levou o cavalo embora. Rhys desceu a pista até a
porta dele.
Ele ainda não queria entrar. O tempo todo não diminuíra nem
um pouco. Bem, isso não poderia ser evitado para sempre. Até que
ele comprasse outra casa, ele teria que dormir em algum lugar.
Ele girou o trinco, entrou e esperou que o vazio o atacasse.
Não foi o vazio que fluiu sobre ele. Não ausência. Ela enchia o
ar. Ele entrou em um lugar assombrado pelo fantasma de sua
presença e em uma nuvem de memórias.
Seu breve retorno à casa no dia em que fugiram deixou seus
remanescentes. Ele meio que esperava cheirar o pão.
Ele fechou os olhos e saboreou a sensação disso. Tocando a
respiração de seu fantasma desaparecendo valeu a dolorosa mágoa.
Ele absorveu completamente, porque não duraria. Iria vazar a
cada minuto que ele vivesse neste lugar sem ela. Muito em breve
isso mais uma vez se tornaria a casa muito ampla para uma pessoa.
Ele se forçou a olhar e deixar que isso começasse a acontecer.
Ele entrou no corredor para aceitar o futuro.
Um som. Quieto e vago.
Outro, mais distinto. Veio da cozinha.
Seu coração começou a bater. Lentamente. Difícil. Disse a si
mesmo que era apenas David, trazendo as malas em vez de deixá-
las no jardim. Ou o vento batendo em um obturador solto.
Os vagos sons continuaram. Ele olhou para a lareira,
explicando-os, ressentindo-se da lamentável esperança que acabara
de construir.
Um novo som. Uma voz. Uma mulher cantarolando. Sua
melodia sinuosa deslizou em direção a ele como o crescente
filamento de uma videira.
Forçando-se a se mover, ele caminhou em direção à cozinha.
Capítulo XXIX
Calor e luz. Não vinha apenas do fogo na grande lareira. A
mulher na câmara produzia seu próprio brilho, e todo o seu ser
corou em resposta.
Joan estava ao lado da janela. A mesa havia sido movida para
perto e uma persiana estava aberta para o dia frio e nublado. Uma
prancha de trabalho descansava sobre ela, segurando a forma de
argila de uma figura.
Ela moldava com dedos hábeis, atentos a sua tarefa. Perdida
em seu ofício, ela não o ouvira entrar na casa.
Ela usava um vestido cinza de tecido fino, com linhas azuis
bordadas trançadas ao longo do pescoço. Ela tinha desamarrado as
mangas e as empurrado para cima, revelando os braços e mãos
cremosos de uma dama, mas manchas de barro ainda haviam
manchado o tecido caro. Um robusto casaco azul e uma touca e um
véu estavam empilhados no final do banco. O conjunto parecia caro
o suficiente para ser vestido na corte.
Ela deve ter vindo a Westminster para visitar a rainha. Ele a
imaginou inventando alguma desculpa e escapulindo para esta
visita, sem saber que ele estava em uma jornada. Ele a viu
esperando, entediando-se e finalmente saindo para o jardim e para
o barril em que ainda havia um pouco de argila e decidindo passar o
tempo fazendo aquilo que ela amava.
Então, novamente, talvez ela soubesse que ele estava fora e
tivesse vindo somente pelo barro.
Se sim, ele não se importava. Ele se entregou à alegria de vê-
la. Ele pagaria caro por esta visita, mas também não se importava
com isso. Observá-la moldar o barro, sentindo sua intensidade, valia
a pena de uma centena de pausas.
Ele permaneceu no limiar por um longo tempo, compartilhando
seu ofício vicariamente, experimentando a alma através de seu
arrebatamento silencioso, observando a pequena figura crescer mais
definida. Ele pensara em nunca mais conhecer esse poder
novamente, mas ela, sem saber, lhe deu o dom de saboreá-lo mais
uma vez.
Finalmente, a luz do dia ficou fraca demais. Ela recuou e
considerou seu progresso com as mãos nos quadris. Ela olhou para
a lareira, mas sabia que seu calor secaria a argila muito rápido, e
que ela não poderia continuar em sua luz.
Sua expressão mudou enquanto ela olhava para as chamas.
Ela percebeu que não estava sozinha. Seu olhar disparou e
encontrou-o nas sombras ao lado da porta.
Ela sorriu, mas seus olhos brilhavam com a umidade. E com
outra coisa. Suas mãos voltaram para seus quadris, espalhando mais
argila no tecido em tons cinza.
— Você levou o seu tempo voltando para casa, Rhys Mason.

Ele foi até ela, tomou o rosto dela entre as mãos e


experimentou os lábios que ele beijara tantas vezes em seus sonhos
nas últimas semanas. Ela poderia ter deveres para a honra de sua
família agora, mas o amor deles permitia a ele pelo menos essa
intimidade.
Ela o deixou, e permaneceu, e pareceu triste quando ele se
forçou a se afastar.
— Você está na cidade há muito tempo? ele perguntou.
Ela começou a envolver a estátua em panos úmidos.
— Sete dias.
— Estou feliz que voltei antes de você sair.
Ela completou sua tarefa em silêncio. Algo derramava dela, e
não era apenas felicidade em sua reunião.
Finalmente, quando o tabuleiro foi retirado e a estátua
colocada em uma prateleira, e a mesa limpa, ela começou a arrumar
as mangas.
Seu coração caiu. A noite cairia em breve. Sem dúvida, a
rainha esperava sua presença.
Sua vida aguardava seu retorno.
Ela não colocou o manto. Ela olhou pela janela para o jardim,
parecia uma estátua elegantemente trabalhada, iluminada pela luz
prateada da noite.
— Você não deveria ter me feito sair com eles. Em Nottingham.
Você deveria ter me deixado ficar com você.
Ela não trouxera seu amor para ele, mas sua raiva.
— Deus sabe que eu odiei fazer isso, Joan, mas você tinha que
voltar. Mandar você fazer isso era a coisa certa.
— Eu não queria que você fizesse a coisa certa. Eu queria que
você fizesse a coisa egoísta, então eu também poderia. Meu coração
quebrou quando você me deixou lá. Eu não conheci nada além de
dor por semanas. Eu odiei você por ser forte e bom, e por me fazer
passar por isso.
— Se foi um erro você voltar, me desculpe. Se ver sua casa lhe
trouxe dor...
— Não foi isso que me afligiu, mas que você me deixou ir.
— Eu nunca deixei você ir embora. Se meu julgamento se
provou errado, eu sofri por isso tanto quanto você.
Ela suspirou e se virou e afundou no banco.
— Seu julgamento não foi errado. Foi como você disse. Eu
precisava passar por aqueles portões, e ver os homens de Guy
deslocados, e assistir meu irmão sentar na cadeira do lorde. Eu
precisava visitar o túmulo de meu pai e dizer a ele que estava
acabado, como eu havia jurado que estaria. — Ela fez uma pausa e
olhou para as mãos salpicadas de barro em seu colo. — Eu precisava
recuperar meu quarto e... e minha cama, e a pessoa que eu tinha
sido uma vez. Eu precisava fechar o círculo e completá-lo. Foi bom
que eu fui para casa, eu não posso negar isso.
Ele se sentou ao lado dela e pegou a mão dela na sua. O barro
tornara muito suave.
— Então eu estou feliz por você.
Eles se sentaram juntos em silêncio, compartilhando uma
conexão deliciosa. Ela colocou a outra mão sobre a dele, de modo
que ela o incluísse.
— Eu visitei o pátio de azulejos. Trouxe mais barro para que as
lajes do Rei pudessem ser acabadas. Levará algum tempo com o
tempo frio, mas elas devem estar prontas. Não seria bom para o
principal construtor da coroa deixar um projeto incompleto.
Ele não havia pensado no pátio de azulejos ou no projeto do
rei em todas essas semanas.
— Não faria com que esse investimento se perdesse,
acrescentou ela.
Ele também não havia pensado nisso.
— Suponho que não.
Mais silêncio. Houve uma profunda paz em apenas sentar com
ela, segurando a mão dela. Eles compartilhavam a mais profunda
paixão, mas ele nunca precisara disso para amá-la.
— Eles escolheram um marido para mim.
A paz se despedaçou. Suas peças caindo cortaram como
lâminas.
— Ele veio para Brecon. Eu o conheci. Ele detém terras perto
de York e é um dos favoritos de Edward. Será uma grande aliança
de famílias.
— Tão cedo? Seu irmão...
—Addis recebeu a custódia do meu irmão, até que Mark
descubra o que ele deve saber. Barrowburgh irá protegê-lo e dar o
conselho e a orientação, não eu. Também é bom. Ele não ouve mais
a voz de uma mulher.
— Este senhor é um bom homem, você acha?
— Sim, um bom homem.
As profundezas de sua reação o surpreenderam. Uma raiva
visceral se dividiu em sua mente. Ele sabia que ela seria dada a
outro, mas ouvir isso enviou chamas saltando através de seu
sangue.
Ela veio dizer-lhe isto, não para trabalhar com argila ou visitar
um velho amante. Quando suas mãos se separaram desta vez, seria
verdadeiramente a despedida final.
Ele olhou para o perfil delicado dela. Ela poderia fazer isso. Ela
poderia fazer qualquer coisa se ela colocasse sua vontade nisso. Ela
havia se provado mais forte do que o desespero causado pela
miséria e degradação. Esse destino, decretado pelo nascimento e
pelo dever, seria uma coisa pequena em comparação, e ela
floresceria na casa daquele homem se escolhesse aceitá-lo.
Uma decisão se formou nele, sólida como rocha. Não era uma
talhada do bom e certo, mas de desejo egoísta e necessidade
sincera.
Ele esperava que ele estivesse certo, e que as correntes de seu
amor fossem mais fortes do que as do dever e do sangue.
Ele tocou a bochecha dela e virou o rosto dela. Ele rezou para
que o que ele planejasse fazer nunca lhe trouxesse infelicidade.

Sentar com ele, segurando-o, enchia Joan com a sensação de


estar protegida e vulnerável ao mesmo tempo. Ela se deliciava com
a segurança, mas seu toque evocava desejos que não podiam ser
ignorados. Não hoje, depois de todo esse tempo distante. Ela queria
ser absorvida completamente por ele, não apenas amada em
silêncio.
Ele não sabia por que ela realmente voltou a esta casa?
Ela continuou esperando que ele a beijasse novamente. Ela se
perguntou se teria que ser ousada sobre isso.
Certamente ele podia sentir o que estava construindo entre
eles. A pressão de suas mãos estava imbuída disso.
A conexão mudou de reconfortante para sensual.
As pontas dos dedos dele tocaram a bochecha dela. Ele virou o
rosto e olhou nos olhos dela. Calor e amor a encaravam, mas um
pouco daquele brilho de aço também aparecia.
— Se você for se casar com esse senhor, você não deveria ter
vindo aqui.
— Não há mal nenhum em visitar um amigo.
— Eu nunca a reconheci apenas como uma amiga. Você não é
Moira, e eu nunca vou te amar como em parentesco.
— Eu não peço isso a você.
— É bom que você não o faça, porque falar daquele homem
levantou o diabo em mim. Mas eu acho que você sabia que seria
assim.
Sim, ela sabia que aconteceria. Ela contava com o ciúme
tornando-o menos bom.
Ele a beijou. Não foi como o primeiro. Não em saudação, ou
afeto contido.
Por semanas ela encheu seus sentidos com memórias dele. Ela
esperou impacientemente pelos tempos sozinha quando pôde
entregar-se às fantasias. Saboreá-las. Mergulhar sua mente no
espírito de seu toque e cheiro e carícia. Seu amor havia se tornado
outro mundo para o qual ela escapava todas as noites, e muitas
vezes durante o dia. Tornou-se mais real do que o salão e as
câmaras em que ela morava.
Tinha sido um mundo triste, no entanto. Um cheio de saudade
melancólica e pesar doloroso. Vivendo no espírito do amor, mas
nunca provando sua realidade, manteve a dor de sua separação viva
e afiada.
Ela provou a realidade do amor agora. Ela segurava um
homem sólido, não um fantasma. Ela aceitou beijos profundos e
carícias possessivas, e sentiu novamente o que as memórias haviam
perdido. A fisicalidade da intimidade a desfez.
A beleza disso, o realismo, fez com que ela se recompusesse.
Ela enterrou o rosto no peito dele para que ele não visse, mas
ele sabia de qualquer maneira. Ele segurou-a com mais força e deu
um beijo nos cabelos dela.
— Eu estou fazendo você infeliz.
Segurar as lágrimas a sufocou. Ela só conseguia abanar a
cabeça. Ele não sabia que era alegria que a dominava, não tristeza?
Ele não podia dizer?
Ele guiou o rosto dela para cima e afastou as lágrimas com os
lábios.
— Eu quero que você durma comigo esta noite. Nos meus
braços e na minha cama. Eu quero acordar de manhã e te encontrar
nua ao meu lado. Você não vai nos negar esta noite. Eu acho que é
por isso que você veio aqui. Estou errado?
— Você não está errado. Ela veio para isso, mas também para
muito mais. Uma noite e depois outra. E outra...
Ela estendeu a mão e passou os dedos pelos planos do rosto
dele. Ela tinha esquecido como apenas olhar para ele poderia fazer
seu sangue brilhar.
Eles não se apressaram. Eles se abraçaram, e ela saboreou um
contentamento que ela pensou que nunca conheceria de novo. O
êxtase podia esperar a noite e o leito de plumas. Um arrebatamento
mais quieto os uniu neste banco.
— Vai escurecer em breve. Devemos mandar dizer ao palácio
que você vai ficar aqui, ou a rainha pode ter sua guarda procurando
por você.
— Ela não vai, porque eu nunca fui ao palácio e ela nem sabe
que eu saí de casa. Eu estive nesta casa a semana toda, esperando
por você.
Ele levantou um pouco da saia dela.
— É um traje de tribunal. Eu apenas presumi que você tivesse
vindo a Westminster.
— É tudo o que tenho, isso e os outros como antigamente.
Mark não me deixava ficar com os meus outros vestidos. Ele disse
que eles o lembraram dos anos ruins.
— Mark sabe que você veio me visitar? Estou surpreso que ele
permitiria isso.
— Eu não pedi permissão a ele. Ele viu minha determinação e
não tentou me impedir. Ele até pediu que eu pedisse um favor ao
melhor pedreiro da Inglaterra. Venha, vou lhe mostrar o que é.
Ela se levantou e pegou a mão dele e levou-o para o início do
crepúsculo. Ela quase esquecera o favor. Na verdade, foi realmente
um presente. Ela ansiava pela surpresa dele.
Ela o levou para a bancada perto do espinheiro. A tela cobria o
objeto grande apoiado nela.
— Feche seus olhos.
Ele olhou para o banco com curiosidade, depois suas pálpebras
caíram. Ela puxou a cobertura para revelar não sua Santa Úrsula,
mas um bloco branco de pedra cintilante.
— Veja.
Ele fez. Ela viu o choque dele, mas nada do prazer que ela
esperava.
— É de mármore, disse ela.
— Eu sei.
— O primeiro ato de Mark quando chegamos em casa foi
mover o túmulo de meu pai. Ele quer uma estátua colocada na
capela perto do sepulcro onde ele está agora. São Jorge, em
armadura, para homenagear a morte do pai. Mármore, ele disse, o
melhor que há, a ser esculpido pelo melhor pedreiro, que significa
você. Não foi fácil encontrar esse bloco. Um bispo o trouxe da Itália
para seu próprio túmulo.
— É uma pedra boa, Joan.
Sua falta de entusiasmo a confundiu.
— Você nunca trabalhou mármore antes?
— Eu fiz. Duas vezes. Mas eu não posso esculpir esta estátua.
— Por quê? Vai ser magnífico, e você pode fazer o que quiser.
Mark confia em seu julgamento, e não pede desenhos. Ele sabe que
você terá projetos de construção, e que levará muito tempo, se é
isso que o preocupa.
Ele caminhou até a pedra. Ele tocou sua superfície, passando
as pontas dos dedos pelo seu comprimento. Remorso sombreando
sua expressão.
Ele levantou a palma da mão esquerda. A cicatriz da adaga de
Guy era grossa e vermelha, cortando da base do polegar até a do
dedo menor.
— Eu não posso esculpir para você. Eu não posso segurar o
cinzel.
Sua declaração surpreendeu-a.
Ela pegou a mão dele e estudou a cicatriz. Ela sentiu ao longo
de sua crista feia.
— Não parece mutilado. Os ossos estão inteiros.
— Não são os ossos. Outra coisa.
— Você disse que o cirurgião lhe disse que deveria estar certo.
Você disse que Addis sofreu muito pior e que o tempo o curou.
— Tanto o cirurgião quanto Addis ofereceram esperança, mas
eu sabia. Antes mesmo da cura começar, eu sabia.
— Você sabia errado. É cedo demais para se desesperar. Você
só tem que trabalhar de novo, e usar suas ferramentas, e com o
tempo...
— Deus sabe que eu tentei. Eu peguei emprestado as
ferramentas de um pedreiro na cidade do meu tio e tentei por dias.
É preciso força para segurar um cinzel sob a força de um martelo, e
minha mão não tem mais. Veja. Eu não posso fechar meu punho
com força.
Ele não podia fazer mais do que uma garra. Ele tentou forçá-lo.
Seu braço inteiro ficou tenso com a tensão. Seus esforços
quebraram seu coração.
Ela se inclinou e apoiou a bochecha na palma da mão dele.
— Foi por mim que você perdeu isso.
— Como as perdas vão, essa foi pequena.
Não pequena. Enorme. A magnitude disso a encheu.
— Eu vou estar construindo ainda. Palácios e igrejas, como eu
sonhei. Mais foi dado do que foi tirado.
Ela olhou para ele e seus olhares se encontraram. Apesar de
todas as suas palavras corajosas, ambos sabiam a verdade. Ele
poderia construir, mas ele nunca iria esculpir. Com seus desenhos e
geometria, ele poderia ver a mente, mas nunca mais conheceria a
alma.
Ela soltou a mão dele. Ela foi até a caixa de madeira perto da
mesa e a abriu. Ela ergueu o martelo e o cinzel que continha.
— Não vai ser assim. Eu não vou aceitar. Você vai tentar e
tentar até que sua mão esteja certa. Você vai esculpir a estátua do
meu pai.
— Sua determinação não vai mudar isso, linda pomba.
— Vai. Você vai ver. Ela entregou as ferramentas para ele. —
Pegue-os. Você verá.
Rhys relutantemente pegou as ferramentas nas mãos. Sua
expressão calma quebrou quando sentiu seu peso e formas.
— Joan...
— Por favor, tente. Eu não posso suportar que você tenha
perdido essa parte de si mesmo. Isso é injusto. Injusto. Certamente
não era para ser.
Ele ficou irritado com a insistência dela. Ela estava com medo
de que ele jogasse as ferramentas para baixo e fosse embora.
— Por favor. Por mim.
Sua mão direita apertou a alça do martelo. Sua esquerda se
fechou na base do cinzel. Raiva ardia em seus olhos.
— Sim, vou tentar mais uma vez, por você, para que você
possa ver como está. E depois disso, você nunca mais vai falar
comigo sobre isso.
Ele olhou para a pedra e uma intensidade especial lentamente
substituiu a raiva. Ele mediu o bloco, julgando suas profundidades e
força, tomando sua decisão. Sua expressão lembrou-a daquele
maravilhoso domingo quando ela o viu esculpir enquanto ela
moldava.
— Você vê a figura nela? ela perguntou.
— Sim, seu São Jorge está nela.
— Então ele precisa apenas ser libertado.
Ele olhou para as ferramentas. Então ele levantou o cinzel e
colocou-o obliquamente perto de um canto do bloco.
Ele balançou o martelo.
Aterrou na outra ferramenta.
O cinzel deslizou e voou, aterrissando na terra.
Seu baque surdo bateu apenas quando um silencio sacudiu seu
coração. Era verdade. Sua mão não tinha força para segurá-lo.
Um silêncio frágil encheu o jardim. Ele parecia resignado e
ressentido. Ele não gostava de ter de enfrentar isso novamente, na
frente dela.
Uma tristeza profunda, escondida sob sua força, vazou através
de suas barreiras e fluiu em sua direção.
Seus esforços para contê-lo torceram seu coração.
— Não é justo que você seja o único a perder, quando você
não tem nada a ganhar.
— O mundo nem sempre é justo. Você sabe disso melhor do
que eu. E eu ganhei muito. Tudo o que eu queria para você. Eu não
me arrependo de nada, e não terei pena de mim por isso.
Ainda bravo. Sempre forte. Mas ela sabia que ele se
entristecia.
Ela ansiava por encontrar alguma maneira de consolá-lo. Ela
queria devolver-lhe essa parte essencial de sua vida.
Certamente havia alguma maneira de corrigir essa injustiça.
Ela andou em volta dele e pegou o cinzel. Seu frio
comprimento de metal repousava pesadamente em suas mãos.
— Pegue de novo. Coloque na pedra, onde deveria estar. Eu
vou segurar para você.
— Não funciona assim, querida. Quando eu escavo, minhas
duas mãos se tornam uma. É tudo uma única ação e um único
pensamento.
— Aceite. Faça. Você não tem mais nada a perder senão outro
momento de orgulho.
Ele suspirou profundamente e gesticulou. — Então fique aqui,
e eu colocarei suas mãos onde deveriam estar.
Ela deu um passo à frente dele, dentro da curva do braço
esquerdo dele, e ergueu o cinzel em ambas as mãos. A palma da
mão se fechou sobre o aperto dela e colocou a ferramenta na pedra.
— Não, nós não podemos fazer isto. Se eu perco, suas mãos
estarão quebradas.
— Você não vai perder.
Ele hesitou. Ela segurou firme, recusando-se a mover-se.
A mão dele cobriu a dela mais completamente, para protegê-la.
Ela centrou todas as suas forças em manter essa ferramenta no
lugar.
Ele balançou. O impacto abalou todo o seu corpo, mas ela não
soltou. Uma fratura apareceu e o cinzel escorregou na pedra. Mais
quatro balanços e um pequeno pedaço de pedra deslizou para
longe.
Ela olhou para o que eles tinham feito, então de volta para ele.
Ele parecia tão chocado quanto ela se sentia.
Uma risada explodiu dela, junto com sua alegria e assombro.
— Eu realmente não achei que funcionaria.
Isso o fez rir também. Ele balançou a cabeça com exasperação
divertida.
— Jesus, mulher, sua teimosia é ao mesmo tempo uma
maldição e uma bênção. Quem teria pensado que fazer telhas lhe
daria tal força?
— Novamente. Vamos fazer de novo.
Ele colocou o cinzel.
Mais e mais, eles arrancaram pedaços brancos. Ela se tornou
uma extensão dele. Um corpo, não dois, realmente trabalhavam a
pedra. Duas mãos, não quatro, seguravam as ferramentas.
A conexão ficou intensa. Uma unidade de propósito os uniu.
Primeiro seus corpos agiram como um só e depois suas almas.
O transe da criação deslizou para dentro dela como sempre
fazia quando trabalhava em seu ofício. Ela cumprimentou sua
chegada com um sorriso. Só que desta vez foi diferente. Ela não
estava sozinha nisso. Eles haviam compartilhado antes, mas não
como isso. Eles não se encontraram naquela euforia, mas entraram
entrelaçados.
Ela não precisava da orientação dele para o próximo corte.
Suas mãos se moveram, sabendo para onde ir agora. Ela viu o santo
preso na pedra, mas ela fez isso através dos olhos de Rhys. Ela
sentiu como se mover, como se sua mente silenciosamente falasse
com ela.
A experiência a encantou. Eles haviam se fundido na
intimidade final.
Ela olhou para ele. Seus olhares se encontraram. Sim, Rhys
sentiu também. Seu poder inebriante brilhou em seus olhos.
O entendimento total fluiu entre eles.
Ela começou a mover o cinzel mais uma vez. A mão cobrindo a
dela a parou. Ele arrancou a ferramenta e a jogou de lado.
O martelo caiu no chão. Seus braços a rodearam. Ele abraçou-
a e inclinou-se para beijar seu pescoço.
A intimidade não desapareceu. Mudou e se aprofundou e ela se
derreteu nele tão completamente que se perdeu.
Seu abraço despertou mais que desejo. Pressionar suas costas
contra ele, sentir seu corpo, evocou a dor de sua separação.
Experimentar mais uma vez tudo o que isso poderia ser, sabendo
que hoje, neste nível mais profundo, a fazia doer com pensamento
daquilo que eles tinham facilmente abandonado.
Ele a abraçou, embrulhou em seus braços, lábios pressionados
em seu pescoço, sua emoção a rodeando.
— Você não deveria ter me deixado ir. Você não deveria, ela
sussurrou.
— Não, eu não deveria. Eu deveria ter ido com você, e deixar
você terminar, e depois levar você comigo.
Ele ainda a segurava perto, a mão dele acariciando suas costas
para trabalhar no laço de seu vestido.
Antecipação borbulhou através dela. Eles não esperariam a
noite e o colchão de penas. Eles não podiam agora.
O vestido afrouxou. Ele virou-a e apertou-a contra o mármore.
Ele deslizou o tecido de seus ombros e tirou a sua combinação.
Observando-o olhar para ela a atormentava mais do que as
mãos segurando os seios e os dedos acariciando sua pele.
— Eu vou fazer amor com você agora. Eu falei de uma noite,
mas depois que eu possuir você de novo eu nunca vou deixar você
ir. Ele mergulhou para beijar seus dois mamilos. Ela sentiu aquele
calor escovando todo seu corpo. Acendeu uma chama. Uma
necessidade desesperada de proximidade total instantaneamente
bateu nela.
Ele levantou a saia e acariciou sua perna nua. O ar frio lambeu-
a, mas ela não se importou. Logo ela teria seu calor envolvendo-a.
Enchendo-a.
Sua mão se moveu mais alto, até que ele a segurou.
— Eu decidi na cozinha que não posso deixá-la sair de novo,
Joan. Eu não sou tão forte e bom. Eu planejo amar você tão bem
que você vai ficar aqui. Não apenas para uma visita, mas para
sempre.
Seu toque a deixou sem fôlego. Ela mal conseguia falar.
— É por isso que estou aqui, Rhys. Por que voltei. Para
conhecer a liberdade com você para sempre.
Ele olhou nos olhos dela enquanto intensificava o prazer.
— Você vai dizer ao seu irmão que esta é a sua casa agora.
— Eu já disse, meu amor. Eu já disse. Mark não aprova, mas
ele vai entender algum dia.
Ele encostou-a contra a pedra. Levantou o joelho dela e
entrou. Toda ela, corpo e alma, gemeu de alívio. Ela agarrou-o e
apoiou a cabeça no ombro dele. A união fez deles uma forma,
erguendo-se do mármore como uma estátua viva do ato de amor.
O prazer aumentou demais para palavras e restrições. Seu
corpo chorou por mais, mas o mais doce cumprimento já saturou
sua alma.
— Eu quero que você se case comigo e acrescente votos de
casamento aos que fizemos naquela noite. Vamos nos unir em nosso
amor diante do mundo.
Sua proposta flutuou para ela na respiração ofegante de sua
paixão. Seus olhos estavam embaçados pelo som das palavras que
ela rezara para ouvir. Ela segurou mais firme e eles se moveram
com mais força.
— Oh, sim.
— Você será minha esposa, verdadeira e legalmente, e terá
meus filhos.
— Sim, amor, ela engasgou. — Sim.
— Vamos viver juntos para sempre e encontrar nossa
felicidade neste jardim. Você será tudo o que importa para mim.
Sua voz veio baixa e irregular.
— Tudo que importa.
Ele a beijou de modo que no final eles estavam totalmente
unidos. O poder disparou através dela tão violentamente que a
pedra balançou em suas costas.
Ela o segurou para ela, sentindo sua respiração lentamente se
acalmar em seu pescoço e sob seus braços. Lágrimas escorriam pelo
seu rosto e ela não tentou segurá-las.
Ele beijou sua bochecha molhada. Ele não perguntou por que
ela chorou. Ele não precisava. Ele estava com ela na alegria.
Ela podia sentir que esse amor o havia movido tanto quanto
ela.
Ele tocou sua testa na dela. Nenhuma parte dela faltava uma
conexão com ele, e seria assim para sempre, mesmo sem contato
físico.
— Estou muito grato por você ter voltado, disse ele. — Tão
grato que eu estava errado sobre o futuro que você deveria ter.
— Eu tive que voltar. Se não tivesse, eu teria mais uma vez
vivido uma vida enquanto sonhava com uma passada.
Ela tocou seu rosto, para moldar uma lembrança de como ele
parecia no doce resultado dessa união perfeita. Não era necessário
agarrar-se desesperadamente às emoções que inchavam seu
coração. Ela poderia esperar por uma vida inteira desses momentos.
— Eu tive que voltar porque eu pertenço a você, Rhys. Meu
coração não poderia estar feliz em nenhum outro lugar, nem poderia
me sentir segura longe de sua força. Eu tive que voltar para a nossa
casa, querido. Você é o marido do meu coração, e você é meu
campeão.

Fim
Notas

[←1]
Na tradução original pode ser traduzido tanto como mestre construtor ou
pedreiro livre. Como um membro de uma ordem internacional estabelecida
para ajuda mútua e comunhão, que realiza elaboradas cerimônias secretas.
[←2]
[←3]
vestido reto e sem corrente de uma mulher.

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